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SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO
Prof. DR. TIAGO VALENCIANO PREVIATTO AMARAL
005 Aula 01: O Estudo das Ciências Sociais
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Introdução
Caro(a) aluno(a), este livro didático da disciplina “Sociologia” tem por objetivo geral
fornecer subsídios para responder à seguinte questão: qual é o papel e a
importância de estudarmos a Sociologia em um curso superior?
Tal pergunta surge como uma espécie de guia que irá balizar os temas e
conteúdos aqui apresentados. Mais do que fazer uma defesa da relevância desses
conhecimentos, o livro pretende aguçar a sua consciência crítica, dialogando com
questões fundamentais para a compreensão do convívio do homem em
sociedade e na sociedade, além das interfaces assumidas pelo sujeito em relação
à cultura e ao comportamento em nosso meio social.
Imagine que em uma rua, ao ser visualizada pela televisão, existem várias pessoas
caminhando. Ao observarmos atentamente, cada uma tem uma expressão facial
diferente: algumas estão serenas, outras preocupadas, outras sorrindo. Os
pensamentos também são os mais diversos: o retorno do trabalho para casa, a
ida até a universidade, o cuidado com os lhos quando chegar em casa e o
encontro marcado com seu amor.
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As aulas a seguir contemplarão uma viagem pela Sociologia e sua história. Os
chamados “autores clássicos” terão suas ideias apresentadas e analisadas, como
Auguste Comte, Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx. O balanço dessa
miscelânea de propostas é a viagem pela Sociologia, passando pela barreira da
modernidade e atingindo a pós-modernidade.
Nossa trajetória procura, neste sentido, demonstrar que a Sociologia é uma área
que dialoga com diversos ambientes pro ssionais e, principalmente, que a
disciplina não é um espaço vago de conhecimento humano: a nal, todos nós
vivemos em uma sociedade, nos relacionando diariamente com seres humanos.
Nada melhor do que esta disciplina para demonstrar como é complexa a
manutenção das relações sociais.
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Essa forma de analisar o que é a ciência também nos faz compreender o que ela
aponta. Em geral, a palavra “ciência” tem relação com a pesquisa e com a
descoberta de novos conhecimentos, que serão posteriormente utilizados em
nosso cotidiano. Qual é, porém, a necessidade de haver uma Ciência Social, um
conhecimento da sociedade e sobre ela? É justamente neste ponto que o
paradoxo citado acontece.
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Esse é o desa o das Ciências Sociais desde sua gênese: explicar a partir de
mecanismos cientí cos o comportamento da sociedade, que se move
constantemente em busca de uma realidade diferente daquela que nós
vivenciamos. Talvez por esse estilo peculiar é que o conteúdo aprendido seja tão
abstrato e tão difícil de ser medido e tocado. Nosso esforço está em demonstrar
como as ciências sociais se tornaram um importante e necessário instrumento
para a análise deste “mundo de maluco” em que vivemos, que clama a cada nova
descoberta por uma análise apurada de nossa realidade social.
Costumamos argumentar que as Ciências Sociais anseiam pelo con ito e pelo
debate. De fato: sem os problemas entre as relações humanas seria muito difícil
imaginar como o cientista social teria seu objeto de estudo, isto é, a sociedade,
caracterizada pelas disputas sociais existentes. Desta forma, rea rmamos o
ponto de largada da trajetória de formação dessa área: o con ito entre os seres
humanos. Não tratamos aqui das brigas entre vizinhos e familiares ou as que
acontecem em um jogo de futebol, mas sim as disputas quase invisíveis na
sociedade, que o cientista social tornará objeto de seu estudo. Ou seja, os
espaços de disputa política em que um grupo debate contra outro(s); a
a rmação de práticas culturais e os con itos ocasionados por essas políticas
a rmativas com as demais culturas existentes; a dinâmica competitiva do
mercado de trabalho e, por m, as próprias relações sociais, palco de todos os
primeiros con itos.
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Observe que “con ito” é a palavra-chave para compreender as Ciências Sociais.
Quais são, porém, as origens dessa área de conhecimento? Qual a relevância de
estudarmos esse tipo de conteúdo no Ensino Superior? Além disso, será que as
Ciências Sociais irão colaborar com a formação acadêmica? São estas as
perguntas que pretendemos responder nesta aula.
Observamos que, apesar das universidades terem surgido como espaço para a
transmissão do conhecimento, precisavam dialogar mais com a comunidade,
uma crítica que permanece até os dias de hoje. O papel, portanto, das Ciências
Sociais neste contexto é estabelecer a conexão entre o acadêmico e o popular,
entre a erudição do conhecimento e a praticidade das pessoas, entre a teoria e a
prática.
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A ruptura cultural ocasionada a partir do Renascimento e do m da sociedade
medieval na Europa oportunizou que o homem (pautado pelo antropocentrismo)
passasse a gurar como centro das preocupações de pesquisas acadêmicas,
discussões losó cas e da sociedade em si. O foco direcionado para o homem
enquanto “centro do universo” abriu espaço para o protagonismo das Ciências
Sociais, que são basicamente um produto das transformações ocorridas no período
entre e a Revolução Industrial e a Revolução Francesa (principalmente após esses
períodos), conforme trataremos a seguir.
Com tais descobertas, a explicação medieval de que a sociedade europeia era uma
“operação divina” deixou de imperar, surgindo assim diversas teorias para explicar a
evolução da sociedade e do seu relacionamento com o outro. Um processo de
estranhamento, isto é, de olhar o outro de forma diferente para conhecer melhor a si
mesmo, obteve sucesso na relação da Antropologia com as demais ciências. Paralelo
a isso, a Antropologia dialogou com a Medicina, buscando explicações biológicas para
a existência de um outro não europeu.
Após essa divisão de áreas de atuação entre o antropólogo de campo (que trabalhava
em conjunto com pesquisas na seara da Biologia e da Medicina) e o antropólogo
histórico-cultural, a Antropologia passou a ter de forma evidente seu objeto de
pesquisa, consolidado na segunda metade do século XIX: o homem e seu duplo
relacionamento, com seu eu interior e com o mundo exterior, ou seja, a sociedade
propriamente dita.
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na Economia, na Antropologia, na Psicologia, entre outras. Abrangente em relação aos
objetos de pesquisa, a Sociologia pode ser considerada como a mãe de todas as
Ciências Sociais.
Foi neste contexto que a Sociologia passou a intervir nas discussões políticas da
sociedade. Daí nasce a terceira e mais recente das Ciências Sociais: a Ciência Política.
Dialogando com a política permanentemente — e, por que não, praticando a política
desde seu nascimento —, a Sociologia estabeleceu uma relação de proximidade com
a política, até mesmo conversando com a Filoso a, que em sua origem se destinou a
estudar os comportamentos políticos.
A Ciência Política teve origem no nal do Século XIX nos Estados Unidos e buscava se
estabelecer desde então como uma ciência “autônoma”, isto é, uma área de atuação
própria, sem ser confundida com a Filoso a, a Sociologia ou encarada como uma
subárea do Direito, por exemplo. Por esse caráter recente e multifacetado, tem
quebrado barreiras quanto ao pensamento político, na busca de estabelecer o seu
principal objeto de pesquisa: as relações de poder.
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Além de estudar as relações de poder, a Ciência Política tem o desa o de explicar
como o Estado é constituído, seja enquanto ente governamental ou como espaço em
que os políticos irão expor suas ideias, conduzir os rumos de uma determinada
população, en m, fazer política. A última vertente de estudo da Ciência Política são os
Sistemas Políticos, que têm por nalidade estruturar um Estado especí co, além de
incorporar as regras de disputas eleitorais, por exemplo. Observamos, assim, que há
um ingrediente especí co para que haja um cientista político analisando algum
fenômeno em geral: o poder e o local onde esse poder é aplicado, normalmente um
Estado, um partido político ou um conjunto de forças políticas.
As três áreas das Ciências Sociais (Antropologia, Sociologia e Ciência Política) tentam
explicar, ora em conjunto, ora em separado, a complexa sociedade em que vivemos.
Cultura, relações sociais e relações de poder são as palavras-chaves que estruturam o
grande leque do aprendizado que essas áreas podem nos proporcionar, variando de
acordo com o interesse de cada pesquisador.
Você se lembra de que, no início desta aula, foi visto que a ciência busca um padrão
de comportamento que a sociedade, às vezes, não pode oferecer por seu dinamismo
próprio? Após nossos últimos apontamentos, esse paradoxo cou mais fácil de ser
enxergado. Isso porque as Ciências Sociais não são exatas, mas são múltiplas e
dependem de diversos ingredientes para que haja um produto nal, uma conclusão
de determinado fenômeno social.
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A trajetória percorrida até aqui procurou oportunizar a você, aluno(a), a possibilidade
de conhecer e avaliar a importância das Ciências Sociais diante da sociedade como
um todo, analisando como e porque a Antropologia, a Sociologia e a Ciência Política
são sua base principal.
Dessas três áreas, vamos nos concentrar neste livro somente em uma: a Sociologia.
Nosso próximo objetivo é avaliar, de forma pontual, o panorama em que a Sociologia
foi constituída e qual é a sua trajetória ao longo dos anos. A apresentação deste
cenário é importante para veri carmos como e porque essas duas áreas importam
para fundamentar as bases. Vamos lá!
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02
O crescimento urbano desse período pode ser medido pela vida em Londres, a
primeira grande cidade industrial do mundo, no centro de uma economia que já
foi por quatro séculos a maior do mundo, a inglesa. Londres praticamente
triplicou a sua população entre os séculos XVIII e XIX. A massa populacional que
passou a migrar para a cidade, com o chamado êxodo rural, fez crescer uma
cidade desconexa e desordenada.
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Os operários se concentraram em torno das fábricas ou em cortiços. Sem vias
planejadas, as cidades estavam com problemas de ocupação. As moradias eram
mal ventiladas, muitas delas tinham apenas um cômodo, onde cava toda
família, faltava saneamento e todos estavam expostos a um ambiente úmido e
insalubre que provocava doenças, como tifo, cólera, varíola e escarlatina. Essas
epidemias passaram a preocupar o Estado. A busca de um saneamento básico
levará, entre outras atitudes, a promover o zoneamento urbano e as políticas de
saúde pública.
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XVIII e XIX, estando longe de uma complexa rede de produção com setores
especí cos em um alto grau de quali cação como temos hoje. A sobrevivência
passa a custar a sujeição a uma condição desumana de trabalho.
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empregadores de auxiliares sem experiência (HOBSBAWM, 1982, p. 66-
67).
Em certa maneira, até nossos dias, a quali cação de mão de obra é um elemento
determinante para a forma como se estabelece a relação de trabalho e sua
remuneração. Como Hobsbawm aponta, nos primeiros momentos da Revolução
Industrial essa condição já se apresentava. Ela se agravou com a massa de
pessoas disponíveis para serem utilizadas pela produção capitalista, mas o grau
de quali cação se ampliou e se aprofundou. Com isso, a maioria dos seres
humanos disponíveis hoje para o trabalho não utilizados.
As relações de trabalho são marcadas pela violência sem nenhuma garantia. Não
há, nos primeiros tempos da indústria, uma legislação favorável aos operários. A
violência das relações no ambiente industrial se estende pela vida urbana e se
expressa no cotidiano das cidades europeias durante o nascimento da indústria.
Uma violência que terá formas distintas de ser compreendida e de gerar reação.
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Para o poder público, buscando atender ao interesse da empresa nascente, será
fundamental estabelecer mecanismos de controle social para garantir a ordem
nos espaços urbanos. Policiamento ostensivo nas ruas e instituições para o
aprisionamento e tratamento daqueles que não se adaptavam à vida urbana era
um exemplo.
Por outro lado, havia muito mais pobres que, diante da catástrofe social
que não conseguiam compreender, empobrecidos, explorados, jogados
em cortiços onde se misturavam o frio e a imundice, ou nos extensos
complexos de aldeias industriais de pequena escola, mergulhavam em
total desmoralização. Destituídos das tradicionais instituições e padrões
de comportamento, como poderiam muitos deles deixar de cair no
abismo dos recursos de sobrevivência, em que as famílias penhoravam
a cada semana seus cobertores até o dia do pagamento, e em que o
álcool era “a maneira mais rápida para se sair de Manchester” (ou de
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Lille ou de Borinage). O alcoolismo em massa, companheiro quase
invariável de uma industrialização e de uma urbanização brusca e
incontroláveis, disseminou “uma peste de embriaguez” em toda a
Europa. Talvez os inúmeros contemporâneos que deploravam o
crescimento da embriaguez, como da prostituição e de outras formas de
promiscuidade sexual, estivessem exagerando. Contudo, repentina
aparição, até 1840, de sistemáticas campanhas de agitação em prol da
moderação, entre as classes médias e trabalhadoras, na Inglaterra,
Irlanda e Alemanha, mostra que a preocupação com a desmoralização
não era nem acadêmica nem tampouco limitada a uma única classe.
Seu sucesso imediato teve pouca duração, mas durante o restante do
século a hostilidade à embriaguez permaneceu como algo que tanto
patrões quanto movimentos trabalhistas tinham em comum.
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Paralelo a essas correntes, e muitas vezes sendo um contraponto a elas, os
movimentos herdados das correntes naturais também emergiram. É o caso do
Positivismo inaugurado por Comte na França. As teses do pensador francês
viriam a inspirar aqueles que consideravam que a análise da vida social deveria
estar fundada nos mesmos critérios dos fenômenos biológicos. É o que veremos
adiante!
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Para além da própria Revolução Industrial, precisamos citar alguns
acontecimentos que, na prática, transformaram as relações de
produção:
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Auguste Comte e
os Primórdios da
Sociologia
Nascido em 1798, na França, em Montpellier, Auguste Comte foi ainda muito
jovem um especulador da vida social e da dinâmica das Ciências Naturais. Dois
interesses que na maioria dos pensadores era uma contradição inconciliável,
mas para aquele que veio a ser um dos fundadores da Sociologia era uma
possibilidade que se mostraria inovadora, por meio da busca de trazer as leis
naturais para a análise da vida social.
Traçando um caminho próprio, Comte busca então uma análise mais objetiva
dos fenômenos sociais e passa a considerar o método das Ciências Naturais
como um instrumento fundamental na construção de princípios para entender o
desenvolvimento da sociedade humana. Para ele, a sociedade ocidental era o
cume de uma cadeia evolutiva do conhecimento desenvolvido pelas sociedades
humanas. Nesta evolução, as sociedades passaram por estágios semelhantes,
mas algumas ainda se encontram, segundo ele, em uma etapa mística do
pensamento, a infância.
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Para ele, a própria Física Social, nome dado à Sociologia em sua origem, estava
ligada a esse processo de desenvolvimento e deveria ter como objeto de estudo
a compreensão dos fenômenos sociais como resultado da evolução que as
diferentes civilizações viveram até chegar à “Europa civilizada”:
Entendo por Física Social a ciência que tem por objeto próprio o estudo
dos fenômenos sociais, considerados com o mesmo espírito que os
fenômenos astronômicos, físicos, químicos e siológicos, isto é, como
submetidos a leis naturais invariáveis, cuja descoberta é o objetivo
especial de suas pesquisas. Propõe-se, assim, a explicar diretamente,
com a maior precisão possível, o grande fenômeno do desenvolvimento
da espécie humana, considerado em todas as suas partes essenciais;
isto é, a descobrir o encadeamento necessário de transformações
sucessivas pelo qual o gênero humano, partindo de um estado apenas
superior ao das sociedades dos grandes macacos, foi conduzido
gradualmente ao ponto em que se encontra hoje na Europa civilizada. O
espírito desta ciência consiste, sobretudo, em ver, no estudo
aprofundado do passado, a verdadeira explicação do presente e a
manifestação geral do futuro (COMTE, 1989, p. 53).
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Na própria citação, é possível compreender a evolução do conhecimento
cientí co e os seus estágios. A Física Social é fruto de um desdobramento das
Ciências Naturais, por meio de um processo de evolução que tem como princípio
a Matemática, desdobrando-se em sua evolução na Astronomia, na Física, na
Química e na Biologia (Fisiologia para ele). A Medicina seria para Comte a Ciência
que se aproximaria no exercício da pro ssão do per l de interferência do físico-
social. Cabe ao médico diagnosticar a doença diante dos dados levantados
empiricamente, cabe ao sociólogo a análise dos fatos sociais diagnosticados
pelos mesmos critérios da Medicina, ou seja, a Fisiologia.
O método defendido por Comte se sustenta nos mesmos critérios das Ciências
Naturais. Para ele, o pesquisador dos fenômenos sociais deve se postar diante
de seu objeto da mesma forma que o físico, o químico ou o biólogo. Deve-se
ater, ainda, aos fatos observáveis, mensuráveis e que necessitam ser
comparados e classi cados. A objetividade é um critério fundamental para o
cientista social positivista.
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qualquer período histórico, ele é uma dessas constantes. O engraçado nos dias
atuais é o quanto as pessoas desprezam a função do trabalho na construção de
um projeto de estabilidade futura.
A maturidade social não é algo fácil dentro de uma sociedade na qual as forças
são diversas. Para Comte, a conquista de um desenvolvimento econômico em
um grau mais elevado só pode ser alcançada após a sociedade atingir uma
maturidade na capacidade de agir fundada na razão cientí ca. Para ele, o
crescimento do capitalismo está relacionado diretamente a isso. A economia só
pode se desenvolver na condição da sociedade industrial após o aprimoramento
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cientí co e técnico dos meios de produção. Dessa forma, o capitalismo é um
estágio superior do desenvolvimento econômico, em especial quando se deixa
levar pelas leis de mercado e se orientar por uma racionalidade cientí ca.
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permite a análise pela cadeia de fenômenos observáveis, mas apenas de forma
super cial, ainda sem uma comprovação empírica e que siga leis previamente
estabelecidas pela observação.
Há leis naturais que regem os fenômenos para Comte, as quais devem ser os
elementos que conduzem a observação. Contudo, resultam da pesquisa
constante de comprovação de sua existência, como as leis da Física e da
Química. Um avanço neste sentido só foi possível na sociedade atual. Nela, o
pensador considera que a maturidade atingida pela Ciência já permite utilizar os
métodos das ciências naturais para compreender os fenômenos sociais.
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Diante dessa maturidade do pensamento físico e da possibilidade de um estágio
superior da organização da vida social, a sociedade poderia atingir um progresso
nunca visto antes, que resultaria de uma harmonia estabelecida entre os
diferentes órgãos (funções) sociais. Integrados e na busca de um mesmo sentido
de ação, os organismos sociais resultariam, então, em uma submissão ao órgão
maior, o corpo social.
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O estágio positivo é o último na escala do pensamento de Auguste Comte,
direcionado para organizar as teorias acerca da sociedade via física social, ou
seja, a partir da explicação de uma ciência que possa analisar os movimentos
dos corpos em/na sociedade. O positivismo, que posteriormente se tornou uma
loso a de vida e religião, em que a ciência era a máxima de seus dogmas,
obteve muitos adeptos no Brasil do contexto da Proclamação da República em
1889. O lema da bandeira nacional (ordem e progresso) é uma derivação do
lema do positivismo proposto por Comte: o amor por princípio, a ordem como
base e o progresso por m. Vale ressaltar que a religião positivista era vista
como a “religião da humanidade”, uma espécie de profecia imanada por Comte,
que imaginava angariar adeptos, crentes em seus ideais.
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O funcionamento da sociedade, para Comte, obedeceria a
diretrizes predeterminadas para promover o bem-estar do maior
número possível de indivíduos. Além de uma reformulação geral
das ciências e da organização sociopolítica, o lósofo planejou
uma nova ordem espiritual, inspirada na hierarquia e na disciplina
da Igreja Católica, que considerava muito e cientes. A nova
doutrina, porém, se dissociava totalmente da teologia cristã, que
Comte rejeitava por se basear no sobrenatural, e não no
materialismo cientí co. No m da vida, ele chegou a preconizar a
construção de templos positivistas, onde a humanidade, e não a
divindade, seria venerada. O lósofo via a humanidade como uma
entidade una, que chamou de Grande Ser.
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Émile Durkheim
e o Fato Social
Também francês, o pensador Durkheim foi in uenciado pelas teses comtinianas.
Contudo, não foi apenas um desdobramento ou aprimoramento, foi a superação
das teses positivas e a apresentação de novos ingredientes, que deram um salto
qualitativo na análise da sociedade industrial.
Esse reconhecimento não foi tarefa fácil para ele, que foi também fundador da
escola francesa. Durkheim in uenciou os pensadores que vieram depois dele a
se aprofundarem na relação entre ciência e sociedade. O critério cientí co ao
conhecimento social foi a tônica de sua obra. Contudo, esse conhecimento deve
traçar regras claras para a análise da vida social, sem deixar de levar em
consideração as diferenças existentes em condições distintas de sociedade. Ou
seja, não é possível uma generalização da ordem social estabelecida, mas é
possível entender a dinâmica de cada sociedade com suas especi cidades, por
meio do conjunto de relações solidárias e do grau de coerção e coesão que ela
promove.
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ao mesmo título que as coisas materiais, embora de maneira diferente
(DURKHEIM,1960, p. 52).
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Ainda em relação aos fatos sociais, é importante salientar que eles tem três
características básicas: o poder de coerção, ou seja, de que as pessoas se
comportem de determinada forma, através de certa pressão que a sociedade
nos exerce; a exterioridade em relação aos indivíduos, isto é, antes mesmo de
nascermos, já havia a atuação dos fatos sociais independentemente de minhas
vontades (a educação, as leis e alguns costumes sociais, por exemplo); e a
generalidade, vez que os fatos sociais acabam se manifestando na maioria dos
indivíduos.
Podemos citar, caro (a) aluno (a), dois exemplos que determinam o que são os
fatos sociais. O primeiro deles é o casamento (ou, em um termo mais moderno,
a união estável/moradia em conjunto). Nos associamos enquanto casais pelo
motivo do ser humano não conseguir viver isolado e, em termos biológicos, para
a procriação. O casamento é um fato social pois há o poder de coerção da
sociedade para que possamos nos unirmos a alguém, além de existir antes da
minha própria vontade (posso ser fruto de um casamento, por exemplo) e há a
crença social geral de que os casamentos se manifestam por si só.
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As condições em que se realiza a Educação estão baseadas em fatos que
interligados, de alguma forma, vão gerar os fatores que permitem que ela
ocorra. Logo, o ambiente de educar e os condicionantes da educação não são
apenas os seus agentes diretos (alunos, escola, professores, funcionários,
currículo escolar etc.). Muito mais que isso, a Educação é resultado de uma
complexidade social mais intensa e ampla. Uma relação que vai além dos muros
da escola e que envolve a construção solidária de todos seus elementos. Os
seres humanos que convivem dentro do ambiente escolar são resultado de
outros fenômenos que os produzem, além do dia a dia de sala de aula.
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Outro elemento importante a ser considerado é a condição em que a sociedade
organiza a sua vida material. Durkheim busca no entendimento da divisão do
trabalho social a premissa para a compreensão dos fenômenos que a sociedade
produz. As sociedades, ao longo da história, promoveram um crescimento da
divisão do trabalho e se organizaram de forma cada vez mais complexa. Nas
sociedades industriais, segundo o pensador francês, a divisão do trabalho social
atingiu um grau intenso e extenso, o que promoveu uma tensão entre os
elementos que a compõe. Contudo, e pela divisão social do trabalho, não
podemos considerar a particularidade e a individualidade como critério para o
entendimento da ordem social e dos fatos que ela produz.
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O fato social, segundo Durkheim, consiste em maneiras de agir, de
pensar e de sentir que exercem determinada força sobre os
indivíduos, obrigando-os a se adaptar às regras da sociedade onde
vivem. No entanto, nem tudo o que uma pessoa faz pode ser
considerado um fato social, pois, para ser identi cado como tal,
tem de atender a três características: generalidade, exterioridade
e coercitividade.
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Conforme citamos ao longo desta aula, um exemplo prático de
fato social são as normas jurídicas, o casamento, o idioma, as
regras sociais. Faça um teste em relação aos fenômenos sociais
existentes e analise, caso a caso, se há ou não um fato social, a
partir do modelo pensado por Durkheim.
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05
Max Weber e
o Tipo Ideal
De todos os sociólogos que vimos até agora, Max Weber é o que ocasiona um
sentido importante de re exão sobre as contradições humanas. Ele coloca uma
questão vital em sua obra: “seria o homem um ser puramente racional e capaz
de direcionar sua vida pela razão?”. Esse é um tema central no trabalho do
pensador alemão e um dos precursores do existencialismo.
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Se não quero pecar não pratico tal ato, porque as consequências virão no juízo
nal. Esse comportamento pode não ser ilegal, não ter qualquer tipo de restrição
jurídica nem provocar uma reação social que o condene, mas muitas pessoas
não o praticam, temendo uma suposta punição em uma existência pós-morte.
Esse é um exemplo de um fato social inspirado em modelo. Nela, a ética religiosa
determina uma ação.
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poupança, esse é um exemplo de uma ação futura. Em algumas civilizações, já
que falamos do ato de poupar, a preocupação em prevenir uma possibilidade de
crise pode ter consequência direta em uma política econômica. Os japoneses
têm, por tradição, poupar. Logo, em alguns casos, aquecer a economia nipônica
dá relativo trabalho, já que fazer os japoneses irem às compras não é uma tarefa
fácil. No Brasil, pelo resultado do endividamento das famílias brasileiras pelo
crédito fácil, o modelo econômico é oposto.
Hoje, mais de 50% dos casais, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geogra a
e Estatística, do Censo de 2010 (IBGE, 2010), não se casaram no civil ou no
religioso. Ou seja, a maioria dos casais não adota o ritual do casamento, a
cerimônia. Porém, as festas de casamento são cada vez mais um espetáculo. Sua
idolatria está na aparência requintada da cerimônia e não na permanência da
união. Se casar é uma festa, o casamento, para alguns, é uma prisão.
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Esses modelos serão explicados aqui separadamente, mas apenas como uma
forma didática para facilitar a compreensão, pois na vida social se dão em
conjunto. Jamais encontraremos um modelo agindo de forma pura. Por muitas
vezes, a existência de um determinado modelo está associada a existência de
outro. Um exemplo, que veremos a seguir, é a tradição e a emoção, modelos que
tendem a se complementar.
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comportamento com o dinheiro deveria ser racional e lógico, já que ele é apenas
um meio de atender às nossas necessidades.
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Pelo senso comum, a rmamos que os alemães são orgulhos, assim como os
japoneses. Comentamos do nacionalismo norte-americano, do bom humor
italiano e da hospitalidade brasileira como características desses povos. Essas
características são esperadas quando nos relacionamos com alguém que tenha
como identidade uma dessas nacionalidades e sua característica especí ca. Não
espero de um italiano a mesma passividade de um nipônico diante de uma
mesma situação.
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A honra é para algumas comunidades algo caro, que deve ser preservada e estar
presente diante de situações em que aquilo que se deseja preservar está
ameaçado. Colocamos no início dessa exposição os indianos e sua organização,
mostrando a forma como eles se comportam em determinado momento
associada a um valor que não existiria em outra civilização, é isso que estamos
reforçando aqui.
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analisa o trabalho de operárias protestantes e pietistas, que se concentram de
forma singular em relação ao trabalho, quase não cometendo acidentes e se
igualando às operárias conservadoras:
Vale lembrar que a educação, por exemplo, deve ser analisada por esse aspecto
do valor associado à dedicação do conhecimento. A busca por compreender
racionalmente o mundo a nossa volta tem que ter um sentido que vá além da
objetividade de estudar. A razão lógica que justi ca o estudo já é conhecida e,
por muitas vezes, vira apenas retórica. Agora, compreender os benefícios
culturais que a educação gera está associado a valores agregados à busca do
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saber. Enquanto estivermos valorizando os que não têm uma dedicação ao
estudo, estimularmos os benefícios aos que se desviam da conduta do
conhecimento, vamos colher problemas.
Agora vamos tratar dos demais modelos de ação que ainda restam abordar aqui,
o emocional e o tradicional, que se completam, determinando também as ações
sociais, segundo Weber.
Afetiva
A ação afetiva é aquela na qual o comportamento é movido por um sentimento,
seja ele de afetividade, de rejeição, de sedução ou de ódio. A vingança também
pode ser considerada um modelo determinante da ação social. Vivendo um
momento de êxtase coletivo, uma paixão por determinado evento político, o
comportamento da sociedade pode ser alterado. A associação da emotividade à
tradição pode ser um exemplo dessa intenção.
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Em uma sociedade, pode ocorrer uma emotividade associada a fatos que
abalam o sentimento de unidade coletiva, como já vimos o exemplo da
Alemanha entre as duas guerras mundiais. Há, porém, a emotividade que pode
levar à depressão e descrença na unidade. Em alguns países, o sentimento de
depressão gerou comportamentos preocupantes. Se pensarmos na grande crise
econômica durante a quebra da Bolsa de Nova Iorque, em 1929, o número de
suicídios cresceu signi cativamente. Não podemos negar o sentimento de
desespero que levou uma parte dos suicidas a colocarem m em suas vidas por
terem perdido todo o seu patrimônio. Em outros países, a falência não traria
esse desespero, principalmente naqueles em que a oportunidade econômica
não é vista com uma condição para todos.
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Tradição
A tradição é um modelo de repetição associado a um valor que permanece.
Muitas vezes, o comportamento permanece, mas o valor acaba se
desassociando dele. Uma tradição é a condição em que se mantém um
determinado comportamento arraigado em uma sociedade e que gera um
sentimento (modelo emocional) muitas vezes de segurança. A permanência de
um regime de governo, um ritual religioso, uma comida típica e uma tradição de
liderança são alguns exemplos.
A tradição deve ser entendida como uma condição importante para que certos
comportamentos se realizem e acabem por valorizar a prática necessária em
uma sociedade. Hábitos repetidos ao longo do tempo e que demonstram
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civilidade acabam por valorizar uma relação estável. A preservação da
democracia como um ambiente político é uma racionalidade, mas também pode
ser uma expressão de tradição ao longo do tempo.
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Max Weber nasceu em Erfurt, na Alemanha, em 1864, e faleceu
em Munique, em 1920. Seus trabalhos estão ligados à Economia
Política, uma das áreas nas quais se graduou na Universidade de
Heidelberg, mas trabalhou em diversas universidades de prestígio
na Alemanha. Sua carreira acadêmica é marcada por instabilidade
emocional, mas uma produtividade avassaladora. Filho de um
empresário bem-sucedido e de uma nobre com formação religiosa
conservadora, Weber teve em seu irmão outro pensador de
sucesso: Alfred Weber. A esposa de Max, Marianne Weber, foi sua
mais importante auxiliar e biógrafa. Suas teses se direcionaram
para o entendimento dos aspectos culturais na vida econômica. A
obra em que Weber coroa suas teses é A ética protestante e o
espírito capitalista.
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06
Karl Marx e o
Materialismo
Histórico
A crítica ao capitalismo é a característica mais forte do alemão Karl Marx. Ele foi
um herdeiro da escola idealista, que teve em Hegel sua maior expressão, e não
poupou a sociedade capitalista de sua forma irônica de tratar temas caros ao
interesse do liberalismo. Em outros momentos, enfatizou as contradições que a
sociedade industrial apresentou em seu tempo e ainda hoje expressa. De suas
teses, e por ele mesmo, nasceu a defesa do socialismo cientí co e a idealização
da sociedade comunista. O socialismo deve ser, para ele, uma busca da classe
operária, que vive uma luta de classes como em nenhuma outra sociedade que a
antecedeu. O proletário deve ser a classe revolucionária sob a pena de perder o
bonde da história.
56
sobre a economia e o Estado. A burguesia se constituiu como classe dominante
na sociedade capitalista após tomar o poder e destituir o sistema feudal. As
teses liberais, para Marx, seriam a expressão ideológica da burguesia, seu
instrumento de explicação do mundo. Essa ideologia foi imposta aos demais
membros da sociedade e serve para legitimar os interesses da dominação.
O proletário deve se libertar dessa dominação ideológica, mas para isso deve
compreender cienti camente como a sociedade capitalista se sustenta. Quais
são as condições em que o capitalismo constrói a vida humana, as formas de
dominação e, principalmente, de exploração. Por isso, a necessidade de
entender o modo de produção da vida material no capitalismo e desvendar as
condições em que se dá o acesso dos seres humanos às suas necessidades. É
aqui que se destaca o papel da mercadoria, a condição única em que se
adquirem as necessidades humanas. Tudo o que necessitamos só pode chegar
até nós em forma de mercadoria na sociedade capitalista.
57
necessita. O ser humano da sociedade industrial já não consegue perceber a
importância do seu trabalho na produção de sua existência e dos demais seres
que com ele compartilham os interesses de consumo dos bens industriais. A
complexa rede de produção industrial fez com que os trabalhadores não fossem
mais capazes de entender como os bens foram gerados. Por isso, a burguesia
utiliza os meios imateriais mediante a ideologia para incutir na classe operária a
falsa ideia das condições e das relações sociais.
58
Essa forma da mercadoria que Marx expõe é o fetiche. Ele se constitui como o
valor estabelecido pela burguesia para o produto, no qual a mercadoria encobre
a condição material e real de produção, passando a ser propagada como fruto
de uma idealização do homem. A vida se justi ca da imagem fantástica dos
objetos produzidos pela sociedade industrial. Esse preenchimento que a mesa
produz com seu encantamento em forma de mercadoria, um objeto que só falta
“dançar por conta própria”, preenche o vazio entre as condições de produção e a
consciência do homem. Isso demonstra que o ser humano perdeu a
compreensão das relações que produzem sua vida.
Essa condição capitalista é o fator determinante das instituições que temos hoje
em nossa sociedade. Independentemente de qual seja a proposta de ação e
atuação promovida pelas mais diversas instituições sociais, dando sempre este
ar de aparência democrática, ela está subordinada às condições capitalistas de
produção e, por isso, reproduz seus interesses. A escola é um bom exemplo
dessa falsa ideia de liberdade de pensamento que o liberalismo induz. Segundo
Marx, a educação está instituída dentro das relações capitalistas, dessa forma, o
conteúdo e as disciplinas apresentados aos alunos e a forma como são
organizados acabam por favorecer a compreensão burguesa de mundo.
59
A burguesia utiliza todos os meios para justi car o seu poder, mas
principalmente justi car a propriedade privada dos meios de produção, formas
que permitem a ela dominar as relações que produzem a vida material. Desde
que a maquinofatura se estabeleceu como principal meio de transformação da
natureza em produto, a classe burguesa passou a ampliar a capacidade
produtiva das máquinas. Dessa forma, a dominação se torna mais intensa na
medida em que os trabalhadores se transformam apenas em uma extensão das
máquinas que detêm a inteligência produtiva. Tendo a propriedade das
máquinas, a classe burguesa detém o controle sobre a produção da vida.
É bom fundamentar, porém, que o salário nada mais é que a quantia paga pela
venda de nosso trabalho. Se vendemos o nosso trabalho por um determinado
valor, o que determina o quanto ele vale? Se formos entender o mercado de
trabalho, ele vale a proporção de riqueza que é capaz de produzir e a quantidade
de pessoas habilitadas para realizá-lo. Quanto mais indivíduos aptos à realização
de uma determinada tarefa, mais baixo será o salário (lei da oferta e procura).
60
trabalhadores e, por consequência, o número de operários dos quais depende.
Os que são menos necessários como força de trabalho tendem a ganhar cada
vez menos ou serem excluídos da condição de força produtiva.
Existe também a mais valia relativa, segundo Marx, que são as mudanças
efetuadas nas técnicas de produção que reduzem o custo nal do produto.
Equipamentos novos, formas de organização espacial do maquinário,
terceirização de etapas da produção, en m, tudo o que permite reduzir os
custos de produção. Hoje vivemos um investimento acentuado nas inovações
técnicas da produção. O principal motivo é garantir uma maior lucratividade das
empresas capitalistas nos custos nais dos seus produtos.
Note, caro (a) aluno (a) que o materialismo histórico de Marx se constitui, como
exemplo, na mais valia, que determina como as relações sociais ocorriam nos
primórdios do capital, enquanto crítica do autor: de exploração dos
trabalhadores por parte da burguesia, uma crítica social relevante para o autor.
61
O marxismo foi concebido como teoria transformadora da
realidade. Por essa razão, suas primeiras grandes expressões –
Marx, Engels, Lênin, Trotsky, Rosa Luxemburgo, Gramsci, – foram,
ao mesmo tempo, indissoluvelmente, teóricos e dirigentes
revolucionários. Suas análises e denúncias estavam
comprometidas com captar o nervo do real com suas contradições
como motores da realidade, para poder compreendê-la na sua
dinâmica e decifrar suas alternativas. Seu trabalho teórico estava
intrinsecamente comprometido com projetos de transformação
concreta e radical da realidade. Daí essa identidade indissolúvel
entre trabalho teórico e direção política revolucionária, prática
intelectual e trabalho partidário, as fronteiras entre suas
atividades como teóricos e como dirigentes revolucionários eram
tênues, a ponto que a primeira sistematização da ideia do
comunismo – o Manifesto Comunista – foi encomendada
politicamente e serviu como documento básico do primeiro
partido internacional dos trabalhadores.
62
07
Os Clássicos
Ainda Importam?
Durante nossa jornada, analisamos alguns autores considerados clássicos da
Sociologia (Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx), que formam sua base de
explicação tradicional. De antemão, sinalizamos que eles são os mais explorados
pela Sociologia, tanto no Ensino Médio quanto no Ensino Superior.
Evidentemente que, em algum momento de nossas vidas, estudamos esses
autores como se falassem a “verdade absoluta” sobre a Sociologia, o que
evidencia a face da disciplina perante as demais.
64
Essa caminhada sobre os chamados “clássicos” da Sociologia nos
remete à seguinte questão: será que esses autores, cada qual com
sua possibilidade de re exão, ainda podem ser considerados
clássicos? Além disso: qual é a medida encontrada para dizer que
Durkheim, Weber e Marx ainda in uenciam os comportamentos
sociais, isto é, a nossa vida e as nossas atitudes em/na sociedade?
São essas questões que pretendemos discutir, a m de expor os
motivos pelos quais tais autores ainda importam (ou não) no
ambiente de re exão da Sociologia.
65
de origem de uma sociedade urbana não igualitária, era possível observar que
alguns comportamentos inerentes às diferentes classes sociais se repetiam ao
longo dos anos.
66
SOCIEDADE MODERNA
Relação entre
Pensador indivíduo e Conceitos principais
sociedade
Sentido da ação
Ação social e individual;
de acordo com o
sentido; subjetividade;
Max Weber (1864-1920) sujeito; mundo
signi cado de ação;
Sociologia social como uma
autonomia;
compreensiva/fenomenológica rede de
racionalidade;
intersubjetividade;
burocracia.
eu/”outro”.
Materialismo histórico;
superestrutura;
infraestrutura;
Indivíduo como
fetichismo da
Karl Marx (1818-1883) produto das
mercadoria; capital;
Objetivismo relações sociais
alienação; exploração;
de produção.
luta de classes;
ditadura; revolução;
dialética.
Veja que nesse quadro cada um dos autores clássicos da Sociologia possui
relação com a sociedade moderna e, por que não, com a atual sociedade pós-
moderna/globalizada. Analisando cada um deles, notamos que o relacionamento
67
entre o indivíduo e o outro/mundo exterior é diferente, porém com o sentido de
que a sociedade é um elemento essencial para compreensão de nossa realidade.
Por outro lado, Weber pondera que cada ação possui sentido a partir do
momento em que um indivíduo a exercer. Logo, a sociedade é uma espécie de
“rede”, em que a subjetividade constante dos indivíduos está presente e só é
desfeita a partir do momento em que uma ação se torna social, isto é, tem como
sentido a pessoa que a recebe de quem a executa.
O quadro a seguir também auxilia na compreensão dos motivos pelos quais tais
autores são considerados clássicos da Sociologia. São abordados, ainda os
períodos históricos que cada um dos autores analisou, a sociedade e a a rmação
de teorias assertivas acerca da realidade social.
68
IDADE ANTIGA/ IDADE
IDADE MODERNA
MEDIEVAL CONTEMPORÂNEA
Sociedade
Mudança social Modernidade
Tradicional
Nessa abordagem, Sell (2012) aponta quais são os legados que cada um desses
autores deixou para análise da sociedade contemporânea. Marx analisou a
Revolução Industrial como basilar na Idade Moderna, e tal revolução culminou
na consolidação do modo de produção capitalista e suas possibilidades de
con guração social ainda vigentes.
69
tendência dos pensadores da atualidade, pois ainda é nos pensadores clássicos
que os contemporâneos buscam a sustentação de suas teses, senão na
totalidade.
Outro fator que nos faz considerar importante o estudo dos clássicos das
Ciências Sociais é o preparo que ele nos dá para a leitura de outros teóricos da
atualidade, os quais possuem uma formação fundada no trabalho dos primeiros
grandes cientistas sociais e suas análises de uma sociedade que continua
baseada nos elementos da economia de mercado, industrial e nanceira. Isso
acrescido de um aumento complexo das relações de produção e de divisão do
trabalho social.
70
Observando os processos associativos e formas sociais - por meio
das estruturas econômicas e históricas, pelas divisões sociais do
trabalho social, ou interações e motivações individuais – é possível
aferir que todos os clássicos possuem contribuições
importantíssimas para análises sobre construção de movimentos
sociais. Percebeu-se que alguns autores privilegiam a in uência
das estruturas históricas e sociais manifestadas no
desenvolvimento de sistemas econômicos e instituições
fundamentadas em determinadas consciências coletivas,
enquanto outros valorizavam mais as relações entre indivíduos,
focando os conteúdos, sentidos e motivações atrelados às ações
sociais.
71
08
Sociologia de
Pierre Bourdieu
Outro autor que pode ser inserido nesta seleta categoria de clássicos da
Sociologia é Pierre Bourdieu, nascido em 1930 e falecido em 2002. Com raízes
ncadas no campo, desenvolveu boa parte de sua Sociologia (e por que não
Antropologia) buscando evidenciar a necessidade de abordar a(s) disciplina(s)
como fundamentais para compreender a natureza humana.
73
O habitus, na de nição clássica de Bourdieu, é um sistema de posições sociais
duráveis que o indivíduo sofre ao longo dos anos, que tem por objetivo a
articulação da sociedade com o comportamento individual. A partir desse
comportamento “moldado” pela sociedade e com as in uências individuais, o
sujeito aprende uma língua, obtém costumes, valores e a noção da realidade
social, além, é claro, de criar suas próprias ideias, que também irão contribuir
para a modi cação da sociedade em que está postado.
74
maneira inovadora para resolver os novos problemas que surgem na
convivência social e satisfazer suas necessidades e suas concepções
(PRAXEDES, 2015, p. 15).
Logo, um campo é uma teia em que as relações objetivas, dotadas de signi cado
e nalidade especí ca, são colocadas em prática por intermédio da posição em
que um agente se localiza. A partir dessas posições do campo, os atores
distribuem suas forças (ou capital, ao modo de Bourdieu), impondo os limites de
atuação, a correlação de virtudes, en m, o espaço próprio de atuação.
75
Um campo, na visão de Bourdieu, pode ser algo mais especí co
(como uma cidade, uma comunidade com regras próprias) ou
nossa sociedade em geral. A ideia de campo, para o autor, surge
no sentido de demonstrar que existem campos sociais especí cos,
em que cada sujeito dispõe de suas forças e fraquezas para jogar
o jogo que cada campo requer. Ou seja, não basta pertencer a um
campo ou a uma sociedade: é preciso conhecer e se habituar às
regras existentes para poder melhor conviver neste campo ou
nesta sociedade.
76
forças (agentes, instituições) em presença no campo.
As estratégias dos agentes são entendidas se as relacionarmos com suas
posições no campo.
Entre as estratégias invariantes, pode-se ressaltar a oposição entre as
estratégias de conservação e as estratégias de subversão (o estado da
relação de força existente). As primeiras são mais frequentemente as dos
dominantes e as segundas, as dos dominados (e, entre estes, mais
particularmente, dos “últimos a chegar”). Essa oposição pode tomar a
forma de um con ito entre “antigos” e “modernos”, “ortodoxos” e
“heterodoxos” [...].
Em luta uns contra os outros, os agentes de um campo têm pelo menos
interesse em que o campo exista e, portanto, mantêm uma “cumplicidade
objetiva” para além das lutas que os opõem.
Logo, os interesses sociais são sempre especí cos de cada campo e não se
reduzem ao interesse de tipo econômico.
A cada campo corresponde um habitus (sistema de disposições
incorporadas) próprio do campo (por exemplo, o habitus da lologia ou o
habitus do pugilismo). Apenas quem tiver incorporado o habitus próprio do
campo tem condições de jogar o jogo e de acreditar na importância desse
jogo.
Cada agente do campo é caracterizado por sua trajetória social, seu habitus
e sua posição no campo.
Um campo possui uma autonomia relativa; as lutas que nele ocorrem têm
uma lógica interna, mas o seu resultado nas lutas (econômicas, sociais,
políticas...) externas ao campo pesa fortemente sobre a questão das
relações de força internas.
77
posição que ocupam no mesmo mundo que pretendem transformar ou
conservar (BOURDIEU, 1989, p. 8).
78
Portanto, o capital simbólico poderá ocasionar “poder e legitimidade” ou, então,
“poder simbólico” ao agente social, mediante a sua identi cação no campo. Cada
campo também é detentor de um habitus próprio, e somente quem compreende
as regras do campo pode se apropriar desse habitus e, consequentemente,
entender o estilo de determinado campo. Da mesma forma, cada integrante do
campo é descrito conforme a trajetória social adquirida (como visto, a trajetória
é a construção de certos capitais acumulados ao longo dos anos), além do
habitus e da posição ocupada dentro do campo.
79
Trajetórias e biogra as: notas para uma análise
bourdieusiana
80
Os conceitos de campo e habitus para Bourdieu ainda são
complexos? Acompanhe este vídeo do professor Tiago Valenciano
que, com exemplos, explica o autor.
81
09
A Sociologia
no Século XX
Evidente notarmos, caro (a) aluno (a), que a sociologia estava em constante
processo de aperfeiçoamento e expansão a partir do nal do Século XIX. Com a
xação da disciplina considerando a “santíssima trindade” (Marx, Weber e
Durkheim) enquanto matriz básica de explicação sociológica, veri ca-se um
crescimento rápido da quantidade de pensadores que passaram a indagar qual
seria o destino da humanidade.
83
A popularização da sociologia nos Estados Unidos ocorreu a partir da Escola de
Chicago, sobretudo. Os créditos voltados para a Chicago são dados pelo foco
principal na pesquisa urbana, com enfoque direcionado para entender como a
cidade, complexa por si só, poderia transformar a vida das pessoas. Note, caro
(a) aluno (a), que as grandes metrópoles estavam em constante crescimento.
Mas, para cada cidade que crescia, aumentava a quantidade de problemas: lixo
doméstico sem destinação correta, doenças sanitárias, trânsito desorganizado e
caótico, crescimento urbano desorganizado, tensões sociais oriundas da grande
concentração populacional como a violência urbana, entre outras.
84
O crescimento da sociologia no Século XX desacelerou em virtude das duas
grandes guerras mundiais e das revoluções na China e na Rússia. Note que a
história do pensamento humano também é fruto dos acontecimentos históricos.
É muito difícil dissociar o conhecimento sociológico dos fatos históricos, vez que
o laboratório de pesquisa do sociólogo é a sociedade. A partir do momento em
que a sociedade está em guerra, a cultura, a educação e o pensamento crítico,
de fato, diminuem, pois as preocupações bélicas ganham o centro dos debates.
85
O “renascimento” da sociologia ocorreu na década de 1950 com Talcott Parsons,
defendendo uma espécie de “sociologia abstrata”, em que os modelos teóricos
criados pelo autor teriam maior validade do que os casos reais. Para além das
críticas à Parsons, os sociólogos tentavam retomar os rumos da disciplina,
marcada pela crítica contundente e a explicação teórica e prática dos elementos
que compõem a vida social.
86
além disso: os novos tempos (pós-modernos) estavam em construção – do
individualismo – o “Eu impulsivo” e a “Década do eu”; do consumo – de
novos mercados; e do informalismo;
o desenvolvimento dos direitos humanos desde a declaração das Nações
Unidas em 1948 – até o movimento de direitos civis e o movimentos das
mulheres;
a guerra contínua e o con ito internacional – principalmente no Vietnã;
a aurora espiritual “Era de Aquário” e o crescimento dos movimentos de
contracultura;
o renascimento e a simultânea morte lenta do mundo marxista;
o avanço da consciência global principalmente por meios de comunicação
de massa. Cada vez mais, como disse Todd Gitlin, “o mundo inteiro estava
assistindo”. Os símbolos haviam se tornado globais. (PLUMMER, 2015, p.
77)
87
Wright Mills (1969) descreve o pensamento sociológico como uma
prática criativa, que de ne como “imaginação sociológica”. Essa
prática criativa seria a tomada de consciência sobre a relação
entre o indivíduo e a sociedade mais ampla. Trata-se da
capacidade de conectar situações da realidade, como os interesses
em disputa, percebendo que a sociedade não se apresenta de
determinada forma por acaso.
88
Os conceitos de campo e habitus para Bourdieu ainda são
complexos? Acompanhe este vídeo do professor Tiago Valenciano
que, com exemplos, explica o autor.
89
10
A Nova Fase
da Sociologia
O que chamamos de “nova fase” da sociologia diz respeito justamente ao
momento mundial após a década de 1970. Note que ainda atravessávamos o
período da Guerra Fria, que encerrou simbolicamente após a queda do Muro de
Berlim no início da década de 1990. Com o m do muro – e da guerra, passamos
a enxergar uma recon guração das forças produtivas e políticas mundiais.
91
Ainda a partir da década de 1990, podemos observar o avanço em
massa da internet pelo globo. O salto de computadores públicos
ligados à rede mundial de computadores foi de 100%, comparado
com os anos anteriores. A quantidade de computadores
fabricados também foi avassaladora e, da mesma forma, podemos
acompanhar os primórdios da comunicação em massa e digital
com os correios eletrônicos (e-mails). Não demorou e os espaços
de bate-papo na internet surgiram, com salas e servidores criados
para a comunicação quase que instantânea. Paralelo a isto, os
computadores se tornaram cada vez mais modernos, com
tamanho diminuto e rapidez no processamento de dados. Serviços
antes feitos por humanos passaram a ser executados por
máquinas e o estilo de vida também foi recon gurado com o
avanço da internet e do mundo digital.
92
Economia Cultura Informação
Aculturação / Hibridismo
Blocos econômicos Internet
cultural
93
não é mais voltado só ao indivíduo, tomado singular e coletivamente
como povo, classe, grupo, minoria, maioria, opinião pública. Ainda que
a nação e o indivíduo continuem a ser muito reais, inquestionáveis e
presentes todo o tempo, em todo lugar, povoando a re exão e a
imaginação, ainda assim já não são "hegemônicos". Foram subsumidos,
real ou formalmente, pela sociedade global, pelas con gurações e
movimentos da globalização. A Terra mundializou-se de tal maneira que
o globo deixou de ser uma gura astronômica para adquirir mais
plenamente sua signi cação histórica.
94
análise sociológica procura compreender nossas relações sociais atuais,
considerando como e por quê estamos nesta grande “aldeia global”, em que
diversas questões que outrora pareciam locais tem impactos mundiais. Resta-
nos, portanto, seguir utilizando os métodos de compreensão sociológica para,
então, responder à questão inerente ao período: qual é o destino da sociedade
global?
95
O celular se consolidou como o principal meio de acesso
domiciliar à internet no Brasil. De acordo com o Instituto Brasileiro
de Geogra a e Estatística (IBGE), 92,1% do acesso à rede passou a
ser feito pelo dispositivo móvel. O dado é de 2015 e faz parte do
suplemento de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgado
nesta quinta-feira (22). Em relação à 2014, o uso do celular para
acesso à internet aumentou em 11,7 pontos percentuais.
96
11
O Processo de
Socialização e o
Multiculturalismo
A nal, quais são os desa os da sociedade em um sistema atual, pautado pela
cultura global e massi cada, em que há a constante valorização do local e, ao
mesmo tempo, a in uência global, conforme apontado por Stuart Hall (2006)? O
objetivo deste tópico é problematizar a questão do multiculturalismo, presente
em nossa sociedade, questionando você, aluno(a), se esse fenômeno interfere
em nossa sociedade e quais são seus desdobramentos.
98
Com a relação existente entre vários grupos ou comunidades, há a
incidência do chamado multiculturalismo, ou seja, várias culturas
estão presentes em um campo determinado, em um espaço dado.
Para entender esse fenômeno, iremos tratar os aspectos do
multiculturalismo: o eurocentrismo, em que a cultura é tratada
como homogeneizante, penetrando pelo conhecimento disciplinar
prejudicial; a necessidade dos estudos culturais; os signi cados
desse multiculturalismo e o conceito de pós-colonialismo.
Ainda nesta linha de pensamento, Edward Said a rma que a relação entre o
colonizador e o colonizado é intrigante, vez que o colonizado assume posição
secundária e sua representação pode não ser a exata, da maneira como era, já
que o colonizador traduz o colonizado, evidenciando a visão do seu trabalho de
campo. O colonizado assim é de nido:
99
Pobreza, dependência, subdesenvolvimento, variadas patologias de
poder e corrupção e, por outro lado, realizações notáveis de guerra, na
alfabetização, no desenvolvimento econômico: essa mistura de
características assinalava os povos colonizados que se haviam libertado
em um nível, mas permaneciam vítimas de seu passado em outro (SAID,
2003, p. 115).
100
Os estudos sobre a cultura tomam grande importância para Giroux. Considerar
algo melhor ou pior, comparado com outro, por exemplo, é perigoso, vez que
toda cultura possui sua importância e deveria ser exposta de modo relacional,
não competitivo. Logo, qualquer projeto de hierarquizar culturas deve ser
abolido. Por conseguinte, esses estudos produzem nos pesquisadores “uma
análise continuada de suas próprias existências” (GIROUX, 1997, p. 185).
101
separado, ou seja, cada qual com sua identidade, não se relacionando com os
demais. No multiculturalismo comercial, argumenta-se que as diferenças surgem
em nichos de mercado, dada a importância de fornecer os desejos desses
nichos. Atender aos anseios das minorias para estancá-las é a missão do
multiculturalismo corporativo. Esse estancamento supõe o domínio da maioria.
E, o modelo defendido por Hall (crítico), interroga as relações de poder e as
desigualdades entre os grupos. Assim, qual multiculturalismo seguir? Ou então
devemos respeitar todos esses rostos multiculturais? Hall indaga:
102
Essas diversas anotações sobre o multiculturalismo apresentam uma face
deveras salutar para discuti-lo. Afastando o eurocentrismo das Ciências Sociais,
combatido por Wallerstein, e também as impressões do colonizador acerca dos
colonizados, como dito por Said, o tema multicultural deve ser anotado,
observando que há sim a necessidade de respeitar e principalmente dialogar,
não criando pirâmides hierárquicas das culturas e disciplinando as culturas
como partições independentes. A ótica de estudo multicultural deve transcender
os laços do local, buscando em novas culturas a diferença, importante para a
formação intelectual de cada um. Assim, não só haverá o reconhecimento das
diferenças de cultura, mas um reconhecimento valorizado das vozes outrora
sufocadas por culturas aqui entendidas como dominantes.
Portanto, pensar nesta seara multicultural é lidar com o dia a dia da nossa
própria existência: se a última está em constante mudança, com a inserção de
novas práticas, a primeira também acompanha as transformações sociais,
viajando sem parada pelas mudanças existentes em/na sociedade.
103
No Brasil, o debate sobre o multiculturalismo tem sido o palco de
distância entre discurso e prática social. Precisamos contextualizar
tal discurso, histórica e sociologicamente. Uma forma de fazer isso
é analisar como este fenômeno surgiu enquanto ideal de
sociedade em alguns países europeus, que há muito tempo estão
tentando lidar com diferença étnica, racial e cultural a partir de um
conjunto de medidas públicas. Nas considerações sobre o
multiculturalismo e o Brasil, é importante aproveitar tanto o
debate como o olhar "de fora", sem reduzir a re exão,
comparando apenas Estados Unidos e Brasil. Interessa enfocar os
países europeus que receberam uma forte imigração, sobretudo a
partir do segundo pós-guerra, as assim chamadas sociedades
multiculturais, nas quais existe uma relação orgânica entre
discursos, leis e práticas multiculturais. Re ro-me concretamente a
Alemanha, França, Bélgica, Holanda e Inglaterra. Nesses países, na
base do multiculturalismo encontram-se três fontes clássicas.
104
As políticas de ações a rmativas são importantes também para a
propagação do multiculturalismo. Nesta apresentação sobre o
multiculturalismo, de Livio Sansone, podemos re etir acerca do tema:
“A ação a rmativa tem sido a forma que alguns estados, sobretudo depois
da Segunda Guerra Mundial, têm escolhido para reverter, com certa rapidez,
um quadro de desigualdades extremas e duráveis. Índia, Malásia, Austrália,
África do Sul, entre outros, vêm experimentando medidas compensatórias
para castas, grupos de cor, grupos étnicos e outros desfavorecidos como os
de cientes visuais. A América Latina é, de fato, a região em que
experimentos vêm se realizando nesse sentido somente a partir dos anos
noventa, que correspondem à consolidação da re-democratização na região.
Países com grande experiência nesse sentido são Suécia, Canadá, Austrália,
Nova Zelândia, Holanda e, de alguma forma, Inglaterra e parte dos Estados
Unidos. Em época mais recente, com a ideia que a diferença cultural pode
ser um enriquecimento em lugar de enfraquecimento no convívio social de
uma escola, universidade ou até empresa, experimentos multiculturais estão
sendo feitos em países de imigração mais recente, por exemplo, na Europa
meridional e, nalmente na América Latina. Neste último caso, trata-se de
experimentos no sentido de ampliar e rever os currículos escolares,
incorporando saberes até então deixados fora, como aqueles relacionados
com o ser indígena ou negro. Etno-educação (Colômbia, Equador, Nicarágua
e, em alguma medida, México) ou educação à diversidade (Brasil e Argentina)
têm sido os termos que caracterizam essa nova fase, mais plural, no mundo
da educação.”
105
12
Transformações
Sociais Mundiais
Para compreendermos a organização da sociedade contemporânea, é
necessário relembramos que a atual sociedade atravessa um momento de
alteração das concepções de sujeito. Saímos de um sujeito iluminista, passando
por um sociológico até atingirmos o pós-moderno (HALL, 2006), os quais
auxiliam na explicação da trajetória do homem se relacionando e vivendo em/na
sociedade ao longo dos anos. Critérios como o lugar em que um produto é
fabricado ou o tempo em que há comunicação — seja essa distante sicamente
— demonstram como a sociedade globalizada tende a consumir tudo o que está
a sua volta.
Antes de argumentarmos acerca de cada tipo de sujeito, conforme fez Stuart Hall
em A identidade cultural na pós-modernidade (2006), vamos estabelecer um
panorama da atual sociedade, o que nos auxiliará a compreender por que
chegamos nesse estágio de desenvolvimento humano. Sem dúvida, a capacidade
de produção gera uma parte considerável dos bens de consumo que são
ofertados em nossas vidas. Além disso, também in uencia as produções
regionais, sejam elas integradas à cadeia mundial de produção ou as que
atendem a mercados locais. Estamos ligados às condições econômicas mundiais,
mas não percebemos isso. Se observarmos a nossa volta, há uma grande
quantidade de bens de consumo que só poderia ser produzida por essa
integração mundial, o que Octávio Ianni denomina “nova divisão internacional do
trabalho”.
107
empolgantes de pertencimento, que não encontramos em nossa vizinhança.
Mentir e ser enganado na rede mundial de computadores é um ritual
estimulante para os internautas. Nela, podemos ser o que queremos sem
termos que assumir o peso de uma escolha que a vida real exige.
Vivemos duas vidas e nos sentimos um único ser. Posso ter que me incomodar
com o meu trabalho, com as atividades reais que exerço para sobreviver, mas
também posso construir um círculo de amizades que me desloquem para uma
condição oposta à minha vida do trabalho. Meus laços de amizade e de convívio
social podem gerar um agrupamento com rituais próprios e vestimentas
especí cas. Tribalizamos o mundo urbano e constituímos identi cações que a
moda fornece os objetos sagrados. Emo, dark, skinhead, se quiser reeditar o
movimento hippie também é possível.
108
Estamos nos rodeando dos bens de consumo, eles estão por todos os lugares e
é com eles que construímos uma convivência íntima. Eles nos identi cam e nos
colocam no centro de um mundo aparente de movimento. Tudo a nossa volta
parece se movimentar, parece estar agindo com uma dinâmica que nos agrada,
pois estamos no comando com nossos “controles remotos” e botões digitais
dando movimento e parando uma parafernália eletrônica que se movimenta ao
nosso prazer. Se formos entender as condições em que esse convívio ocorre,
vamos perceber que estamos parados, estáticos, enquanto as coisas se
movimentam a nossa volta. Nossos lhos falam do cansaço do dia marcado por
horas à frente do computador, navegando na internet, conversando pelo celular
por mensagens que não têm m. Estamos exaustos de não fazer nada e de
dialogar com “coisas” e não com pessoas.
Jean Baudrillard, cientista social francês, lósofo e fotógrafo, tem como um dos
seus principais temas a “sociedade de consumo”. Ele considera que estamos
vivendo a vida dos objetos, estamos cada vez mais rodeados desses bens
eletrônicos:
109
igualdade buscada pelas teses liberais, por meio da racionalidade do convívio
social, agora está traduzida na coleção de objetos disponíveis no mercado. A
democracia, a república e a liberdade, conceitos fundamentais da vida humana,
têm na aquisição de bens no mercado o meio mais e ciente de se fazer sentir
cidadão. Não se quer o direito à defesa de uma sociedade para todos, se quer o
direito a poder consumir de cada um. As teses educacionais, as propostas de
programa de saúde e a necessidade de organização da vida pública e do
planejamento urbano estão colocadas em segundo plano diante da necessidade
de consumir.
Essa falsa busca de igualdade pelo consumo encanta até mesmo nas políticas
governamentais. Se formos considerar o interesse do Estado em promover o
acesso da população a bens por meio de crédito, concluímos que se
transformou em programa social a inclusão da cidadania na condição de
consumidor.
110
Nesse mesmo sentido, exaltam-se os programas de inclusão digital que
promovem a informatização das escolas e o acesso dos alunos à internet, como
se o objeto pudesse dar habilidade ao usuário apenas por existir. Estamos
distantes de uma alfabetização adequada, já não conseguimos estabelecer uma
relação lógica entre a mensagem e seus interlocutores em sala de aula, agora
consideramos que a presença do computador realizará a competência de quem
o manipula. Isso não irá ocorrer. Não é difícil perceber, porém, de onde surge a
ideia de e ciência com a aquisição. Parte considerável dos celulares que estão
nas mãos dos cidadãos não estão executando a função de comunicar, mas estão
promovendo atividades para preencher a ociosidade. A aula passa mais rápido
com um computador ou celular nas mãos.
111
Ora, as identidades que assumimos perante a sociedade estão livres, não
dispostas de lugares xos, trafegando de forma individual de acordo com o
interesse de cada cenário. Somos atores prontos para vestir um novo
personagem, preparados para entrar e roubar a cena, conectados
permanentemente à internet, ditando padrões de moda, comportamento e
relações sociais — ainda que este não seja o objetivo: ditar um padrão.
Note que esses três tipos de sujeito auxiliam na compreensão de nossa relação
com o meio social com o passar dos anos. A Sociologia, enquanto Ciência, surge
justamente no apogeu do sujeito sociológico e, conforme apontado na Unidade I,
as preocupações giravam em torno da complexidade da sociedade moderna.
112
falando, pois uma transmissão em tempo real pode facilitar que esse
mecanismo ocorra. Logo, a noção de perto/longe e tempo/espaço são alteradas
nessa sociedade globalizada.
113
Sociologia no tempo das redes sociais
114
13
A Globalização e
Pós-modernidade
O itinerário percorrido nesta unidade visou dois objetivos claros e pontuais
acerca da Sociologia: a relação dos clássicos com a atualidade e como essa
Ciência tem se relacionado com a globalização, presente em nosso cotidiano.
Observe que esses objetivos nos auxiliam a compreender a questão geral
implícita nos estudos sociológicos apresentados: demonstrar a importância e a
objetividade da Sociologia em uma sociedade cada vez mais complexa e difícil de
ser compreendida.
Tal alteração se re ete nas relações sociais, cada vez mais efêmeras, fugazes, em
que a existência de relacionamentos duradouros é bem menor. Essa agilidade
na comunicação, transposta para as relações sociais, remete ao conceito de
“modernidade líquida”, trabalhado pelo sociólogo Zigmunt Bauman:
São esses padrões, códigos e regras a que podíamos nos conformar, que
podíamos selecionar como pontos estáveis de orientação e pelos quais
podíamos nos deixar depois guiar, que estão cada vez mais em falta.
Isso não quer dizer que nossos contemporâneos sejam livres para
construir seu modo de vida a partir do zero e segundo sua vontade, ou
que não sejam mais dependentes da sociedade para obter as plantas e
os materiais de construção. Mas quer dizer que estamos passando de
uma era de 'grupos de referência' predeterminados a uma outra de
116
“comparação universal”, em que o destino dos trabalhos de
autoconstrução individual […] não está dado de antemão, e tende a
sofrer numerosa e profundas mudanças antes que esses trabalhos
alcancem seu único m genuíno: o m da vida do indivíduo (BAUMAN,
2001, p. 22).
117
Bauman acreditava, portanto, em uma liquidez nas relações sociais. Para ele, a
pós-modernidade se con gurava em uma “ausência de ordem”:
118
Outro sociólogo que articulou um pensamento acerca da modernidade foi
Anthony Giddens. Para ele, a modernidade estava passando por um período de
consequências de seu amadurecimento e não estávamos (estamos) em um
período de pós-modernidade:
119
O paradigma clássico das ciências sociais foi constituído e continua a
desenvolver-se com base na re exão sobre as formas e os movimentos
da sociedade nacional. Mas a sociedade nacional está sendo recoberta,
assimilada ou subsumida pela sociedade global, uma realidade que
não está ainda su cientemente reconhecida e codi cada. Á sociedade
global apresenta desa os empíricos e metodológicos, ou históricos e
teóricos, que exigem novos conceitos, outras categorias, diferentes
interpretações. "Sempre houve um enorme debate sobre como a
sociedade e o estado relacionam-se, qual deveria subordinar o outro e
qual encarnar os valores morais mais elevados.
O único problema era que, à medida que o tempo corria, mais e mais
anomalias revelavam-se inexplicadas nesse esquema de referência; e
mais e mais lacunas (de zonas da atividade humana não pesquisadas)
pareciam emergir". Ocorre que a sociedade global não é a mera
extensão quantitativa e qualitativa da sociedade nacional. Ainda que
esta continue a ser básica, evidente e indispensável, manifestando-se
inclusive em âmbito internacional, é inegável que a sociedade global se
constitui como uma realidade original, desconhecida, carente de
interpretações.
120
14
Desigualdade Social
no Brasil e no Mundo
Um dos problemas que afetam o Brasil há anos diz respeito às desigualdades
sociais existentes em nossa sociedade. É difícil, por um lado, estabelecer políticas
sociais justas ou que pelo menos tragam maior noção de justiça (ou seria
igualdade?) para os brasileiros. Mas, também não podemos afastar a
possibilidade de amenizar as diferenças sociais econômicas nacionais. Então,
como é possível conceituar e apontar os fatores que levam o Brasil a ser um dos
países mais desiguais do mundo? Podemos acabar terminantemente com a
desigualdade social nacional?
123
Ao passo que a justiça é buscada, há ainda a seguinte questão: é possível termos
direitos iguais? A chamada “sociedade civilizada” tem como máxima o
estabelecimento de direitos iguais perante a lei, algo que ainda não é totalmente
aplicado – sobretudo no Brasil. Ainda que os direitos civis sejam igualmente
estabelecidos, falta, da mesma forma, critérios para estabelecimento da
igualdade como um todo.
Observe, caro (a) acadêmico (a) que a manutenção de direitos totalmente iguais
em busca da então chamada igualdade é algo complexo de ser estabelecido.
Justiça, igualdade e direitos iguais são conceitos, conforme expostos, ainda
difíceis de serem alcançados totalmente. No entanto, a ideia é que no sistema
capitalista haja uma amenização das desigualdades sociais, que podem ser
menos ou mais acentuadas, conforme a sociedade de que estamos tratando.
124
A falta de acesso à educação é, de fato, um dos grandes
problemas sociais do Brasil. Além das condições ruins de
transporte e da necessidade dos pais incluírem rapidamente os
lhos adolescentes no mercado de trabalho para ampliação da
renda familiar, a educação sempre é a primeira a ser cortada de
qualquer orçamento familiar. O nível da educação básica brasileira
(do ensino fundamental ao médio) ainda é muito ruim, mesmo
que houvesse uma diminuição na taxa de analfabetismo nacional.
O acesso ao ensino superior ampliou em regiões carentes do
Brasil, principalmente com ferramentas como esta – a educação à
distância. Porém, pelo segundo ano seguido o Brasil ocupa a
posição 79ª de 189 países do mundo em relação à educação, sem
evolução aparente.
125
Por m, as estruturas básicas do Brasil ainda não funcionam por igual. A rede de
saneamento básico e de atendimento à saúde não tem a mesma qualidade de
prestação de serviços nos estados do Sudeste comparado com os do Norte, por
exemplo, e faltam remédios nos postos de saúde de diversos municípios. O
sistema viário, fundamental para o desenvolvimento do país, ainda é
estritamente rodoviário, estrangulando a capacidade de alavancar as ferrovias,
hidrovias e aeroportos do Brasil.
Todos estes ingredientes geram consequências muito ruins para o nosso país.
Aumento do desemprego, favelização e violência com números de assassinatos
e mortos em acidentes de trânsito exorbitantes revelam um Brasil gigante pela
própria natureza, mas ainda muito carente de oferecer e sustentar a chamada
“igualdade de oportunidades”, clamada por todos, mas sem um futuro a ser
vislumbrado.
Todo este cenário de desigualdade social revela, mais uma vez, números muito
ruins para quem mora por aqui. O Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH),
elaborado pelas Nações Unidas, traz em números esta realidade. O
levantamento usa como referência o chamado Índice de Gini, uma forma de
calcular a disparidade de renda. Observe no grá co abaixo a colocação do Brasil
em níveis mundiais:
126
Este grá co revela que o país é o décimo mais desigual do mundo, estando “a
frente” apenas da Colômbia e do Paraguai na América do Sul. Tal dado nos
mostra que o Brasil precisa avançar muito no quesito de desigualdade social e,
neste sentido, cabe à sociologia demonstrar com números os problemas sociais
por aqui enfrentados.
Esta aula, caro (a) acadêmico (a), é para demonstrar justamente os problemas
que levam à desigualdade social brasileira, no sentido de explicitar uma re exão
acerca do que toda a sociedade passa por aqui. As causas e consequências
foram apontadas: nos cabe agora, enquanto pesquisadores e educadores,
agirmos na transformação desta infeliz realidade.
127
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geogra a e Estatística
(IBGE), conforme dados do ano de 2016, a desigualdade no Brasil
ainda alcança índices muito altos. São alguns dados divulgados
pelo Instituto: cerca de 889 mil pessoas são consideradas ricas no
Brasil; aproximadamente 45 milhões de brasileiros vivem com um
rendimento mensal que é inferior ao valor de um salário-mínimo;
cerca de 15 milhões de brasileiros vivem em situação de pobreza
extrema.
128
15
O Processo
Doença-Saúde e
os Fatores Sociais
Para avaliarmos as questões que envolvem as doenças no Brasil, por exemplo, é
preciso enxergarmos como a saúde pode prevenir a quantidade de doenças no
país. Existem políticas públicas voltadas para esta nalidade? Podemos a rmar
que há um processo social envolvendo a série de doenças que afetam
diretamente a população nacional?
Esta aula prevê, caro (a) aluno (a), que façamos uma breve re exão acerca dos
problemas sociais que envolvem o Brasil e, por conseguinte, as doenças que
tanto atrapalham a execução de políticas públicas e cazes quando olhamos para
a sociedade como um todo.
Por tabela, a doença é um processo em que a dor e o sofrimento nos privam das
ótimas condições de saúde. Portanto, é um fator complicador ao nosso bem-
estar, às nossas condições físicas, mentais e sociais de paz e de bom
desempenho das atividades cotidianas. Não é errado argumentar que uma boa
saúde é condição fundamental para que possamos trabalhar, estudar, nos
divertir, en m, viver.
Neste sentido, a saúde não se manifesta, não exige atenção do Estado. A doença
sim: é o que ocorre de patologia, de problemas que atrapalham toda a
sociedade. Émile Durkheim, sociólogo já estudado por nós, diz que a sociedade
pode sim entrar em um estado de anomia ou de patologia. Vamos avaliar estes
conceitos?
130
Entre os trabalhos importantes de Durkheim estão a de nição da anomia e
patologia, dois elementos diferentes da sociedade atual que merecem um olhar
mais cauteloso em nossa sociedade. Faz-se necessário compreender que eles
não cumprem a mesma função dentro do corpo social. Mais ainda, as
sociedades não apresentam o mesmo per l médio de conduta. Ou seja, o que
pode ser considerado patológico e anormal para uma determinada sociedade,
para outra pode não ser.
Logo, o que temos que levar em conta neste momento sobre anomia e patologia
é a condição em que os dois elementos se dão em uma determinada sociedade.
Determinados fenômenos são naturais a determinados momentos e tendem a
se acomodar ao longo do tempo e desaparecer dentro da ordem social ou
estabelecer um novo comportamento. Isso se chama anomia, que pode ser um
fenômeno de transição ou só existir na condição de passagem para outro
estágio da vida social.
131
Em momentos de revolução, uma sociedade apresenta comportamentos que
fogem à normalidade. A desordem se estabelece pela falta de uma regulagem
dentro da ordem social, na qual acontecem as diferentes funções que a
sociedade necessita para sua existência. As condições sociais nesse ambiente de
transição acabam por propiciar, por exemplo, ações de violência ou de
degradação moral. Não é por acaso que se desenvolveu o alcoolismo e o
homicídio durante a Revolução Industrial.
132
sociedades, o suicídio é uma demonstração de problema, de uma patologia.
Representa, dessa forma, uma falta de orientação para os membros de uma
determinada sociedade, que não consegue ser incorporada ao corpo social.
Ambientes com jovens que têm renda elevada, alto grau de ociosidade diária e
falta de laços afetivos familiares podem ser propícios para o suicídio. Também
pela falta de afetividade, pela ociosidade e pela rejeição funcional os idosos têm
mais propensão ao suicídio. Mulheres se suicidam menos que os homens. Elas
tendem a constituir vínculo intenso com as comunidades e promover e ciência
de função em instituições sociais.
Temos que lembrar que o suicídio para Durkheim é um fato social, analisado
pela condição coletiva do fenômeno e não pela sua particularidade. Não
interessa quem o cometeu, mas quais os fatores que o fazem ocorrer em
determinada proporção e com um per l que se destaca na ordem social. Dessa
forma, por mais que o suicídio pareça, a uma primeira vista, uma decisão do
indivíduo, ele é visto pela Sociologia como uma condição construída pela
sociedade, um ambiente fértil para o autoextermínio.
133
nanceiros avaliando a formulação e a implementação de políticas públicas para
investimentos na doença do que na saúde. Note a quantidade de unidades de
saúde, por exemplo, que são construídas a cada ano: o enfoque, às vezes, é
maior na patologia do que na prevenção, na promoção do bem-estar.
Para Gadamer (1997), saúde e doença não são duas faces de uma
mesma moeda. De fato, se considerarmos um sistema de saúde,
como, por exemplo, o SUS, é possível veri car que as ações
voltadas para o diagnóstico e tratamento das doenças são apenas
duas das suas atividades. Inclusão social, promoção de equidade
ou de visibilidade e cidadania são consideradas ações de saúde.
134
Você já pensou quais são as questões básicas que poderiam
envolver o processo doença-saúde? Quais seriam as alternativas
para diminuirmos a quantidade de doenças no Brasil? Avalie estes
pontos que podem mudar a questão na prática, agindo:
135
16
Temas Atuais e
Relevantes para
a Sociologia
Conforme exposto em nosso livro, a sociologia atravessa há anos por diversas
fases. Saímos do momento de consolidação da disciplina, nos casos de Comte,
Durkheim, Weber e Marx enquanto clássicos; passamos pelo momento de
xação do conteúdo sociológico nos Séculos XIX e XX; enfrentamos as duas
grandes guerras mundiais e o contexto de guerra fria; e, por m, as novas
tendências da globalização e da pós-modernidade.
137
Esta experiência de 30 anos (de 1985 em diante) nos demonstra que o valor
democrático voltou para car. Possíveis ameaças à democracia são descartadas
a todo o momento, seja pela crítica especializada, pela imprensa, pelos partidos
políticos, en m, por quem pratica e acredita que a política no país ainda tem
solução. Um levante ditatorial no atual contexto é algo totalmente descartado e
só de pensar nas experiências do Brasil e de outros países relativas à ditadura, o
medo e o terror psicológico já retornam.
Os tempos hoje são outros na política brasileira. E é sobre este último período
democrático que vamos nos concentrar neste capítulo. Muitas coisas mudaram e
a máquina pública está mais complexa, recheada de detalhes e de mecanismos
desconhecidos de grande parte da população. A confusão de termos e conceitos
é evidente e a gestão pública (a moda do momento) é muito citada na teoria, em
uma prática distante que parece não se con rmar.
138
cidadãos de volta ao debate público, permitindo três mecanismos importantes
direcionados à participação política: o plebiscito, o referendo e os projetos de
iniciativa popular.
139
A tabela abaixo da notícia relacionada à dívida pública brasileira mostra-nos
como é complexo equacionar orçamento público positivo com capacidade de
investimento satisfatória. A dívida pública brasileira atingiu um teto estimado de
4,3 trilhões em 2019 e, neste sentido, a quantidade de impostos pagos pelos
brasileiros ainda não seria su ciente para fazer face às despesas existentes.
140
aquilo que deveria ser básico para qualquer gestor. No entanto, muitos governos
rompiam o limite de arrecadação e este mecanismo foi necessário para colocar a
casa em ordem.
141
Atualmente fala-se muito em administração gerencial, em que as hierarquias e a
delegação única e exclusiva de um tipo de serviço deixam de existir no setor
público. Ao invés da gura do chefe há o líder (ou gerente), que busca reduzir
custos e agilizar a resposta às demandas existentes. Ela emerge a partir da
segunda metade do Século XX, com o cidadão e contribuinte de impostos sendo
a gura mais importante. Este espírito de contribuição também é agregado à
ideia de participação democrática, segundo a qual todos são “proprietários” do
governo, contribuindo solidariamente para o caixa do setor público. Sendo
assim, o montante disponível na gestão pública é de todos e,
consequentemente, todos devem zelar, scalizando e participando dos
acontecimentos da política.
Um outro tema relevante para o debate sociológico – para além destes que
estão no campo da sociologia política – é a questão da pós-verdade.
Diferentemente do termo “fake news”, que são notícias falsas, o conceito de pós-
verdade está relacionado a criarmos uma narrativa condizente para moldar a
opinião pública, com forte apelo à emoção e à crenças pessoais.
Note, caro (a) acadêmico (a), que o termo inclusive foi escolhido como a palavra
do ano de 2016, dada sua relevância no debate atual. Cabe, portanto, à
sociologia analisar tal fenômeno, lançando luz sobre esta temática, um dos
desdobramentos da vida on-line que experimentamos atualmente.
142
comportamento sinalizado diante da pós-verdade, por exemplo. Esperamos que
você, caro (a) acadêmico (a), possa discernir acerca destes conteúdos, jamais
perdendo a capacidade de re exividade sociológica.
143
Conclusão
Durante este livro didático, nosso objetivo foi fornecer subsídios para você, caro(a)
aluno(a), pensar acerca dos fundamentos da Sociologia. Nossa proposta era
articular autores da Sociologia Clássica, com as bases da sociologia
contemporânea, além de realizar um passeio sobre as condições das atuais
relações sociais. A questão geral desse livro está voltada para compreender como
nós nos relacionamos com a vida em/na sociedade.
144
Material Complementar
Livro
Condição Pós-Moderna
Autor: David Harvey
Editora: Edições Loyola
Livro
Livro
Editora: Vozes
Sinopse: A partir da importância de Marx, Durkheim e Weber
para a matriz sociológica, Carlos Eduardo Sell retoma a teoria
sociológica demonstrando os modelos básicos de pensamento
dos autores, as características de cada um e os desa os
propostos para a análise da modernidade.
145
Filme
Crash — no limite
Ano: 2004
Sinopse: A proposta do lme é debater a mistura étnica de
diferentes classes sociais após Jean Cabot, esposa de um
promotor de uma cidade ao sul da Califórnia, ser assaltada por
dois negros. Após o roubo, um acidente de trânsito acaba
aproximando diferentes pessoas, o que demonstra os atuais
modelos de relações sociais da pós-modernidade.
Filme
A Vila
Ano: 2004
Sinopse: Em 1897, uma vila parece ser o local ideal para viver:
tranquila, isolada e com os moradores vivendo em harmonia.
Porém esse local perfeito passa por mudanças quando os
habitantes descobrem que o bosque que os cerca esconde uma
raça de misteriosas e perigosas criaturas, por eles chamados de
"Aquelas de Quem Não Falamos".
Web
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146
Referências
ARISTÓTELES. Physis. Trad. de R. Water eld, com int. e notas de D. Bostock.
Oxford: Oxford University Press, 1996.
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BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 2009.
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CASTRO, Celso. Textos básicos de sociologia. Rio de Janeiro: Zahar, 2014.
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DAMATTA, R. Relativizando: uma introdução à Antropologia Social. Rio de Janeiro:
Rocco, 1981.
DURKHEIM, Émile. As regras do método sociológico. 2. ed. Tradução de Maria Isaura
Pereira de Queiroz. São Paulo, 1960.
DURKHEIM, Émile. Da divisão social do trabalho; As regras do método sociológico;
O suicídio; As formas elementares da vida religiosa. Seleção de textos de José Arthur
Giannoti. Tradução de Carlos Alberto Ribeiro de Moura. 2. ed. São Paulo: Abril
Cultural, 1983.
148
MONTAGNER, M. A. Trajetórias e biogra as: notas para uma análise
bourdieusiana.Sociologias, Porto Alegre, a. 9, n. 17, jan./jun. 2007.
SAID, E. Re exões sobre o exílio e outros ensaios. São Paulo: Schwarz, 2003.
SELL, C. E. Sociologia clássica: Marx, Durkheim e Weber. Petrópolis: Vozes, 2012.
149