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FILOSOFIA

DA EDUCAÇÃO
Prof. JHONATAN DIÓGENES DE OLIVEIRA ALVES

001
005 Aula 1: Filosofia e educação

012 Aula 2: A função da Filosofia da Educação

019 Aula 3: A Educação em Thomas Hobbes

025 Aula 4: A Educação em John Locke

033 Aula 5: A Educação em Jean-Jacques Rousseau

041 Aula 6: A Educação em Augusto Comte

048 Aula 7: A Educação em Michel Foucault

056 Aula 8: Filosofia da Educação no Brasil

063 Aula 9: Principais correntes filosóficas

071 Aula 10: Valores morais

078 Aula 11: A relação entre moral, ética e lei

085 Aula 12: Ética aplicada

094 Aula 13: Tendências pedagógicas da educação brasileira

102 Aula 14: A educação contemporânea e sua filosofia

109 Aula 15: Filosofia da Educação na formação do professor

116 Aula 16: Educação enquanto ação política

002
Introdução
Olá, aluno(a)! Seja bem-vindo(a) a esta disciplina!

Como forma de acolhida, gostaria de lhe apresentar resumidamente qual


é o objetivo deste material e qual conteúdo vamos trabalhar ao longo de
nossas aulas.

Primeiramente, o objetivo desta disciplina é conceituar as diversas áreas


da educação, bem como da filosofia, que norteiam a ideia de Filosofia da
Educação – que são duas áreas distintas, porém, passíveis de se comple-
mentarem. São as diversas expressões de suas abordagens que formaram
e ainda formam o significado da reflexão filosófica dada à pedagogia. Ou
seja, nosso estudo será teórico, refletindo a respeito dos diversos movi-
mentos que a História nos legou e que serviram de base para organizar o
pensamento sobre as possibilidades de se educar.

Para adentrarmos este campo da pesquisa filosófica e pedagógica, primei-


ramente veremos o que é a filosofia, bem como o que é a educação, para
depois compreendermos como esses dois campos puderam dialogar no
pensamento dos autores clássicos e, posteriormente, na prática de uma
filosofia aplicada. Contaremos com o apoio do pensamento de filósofos
clássicos tais como Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704),
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), Augusto Comte (1798-1857) e Michel
Foucault (1926-1984) sobre suas teorias e a relação delas com o cenário
educacional da época.

Em seguida, adentraremos o pensamento educacional brasileiro. A partir


dele, veremos a influência dos autores estrangeiros, sobretudo a de Rou-
sseau, na formação dos docentes no século XX e a interpretação que eles
faziam de seus textos para a construção de uma prática pedagógica mais
assertiva. Isso se refletia nos cursos de pedagogia da época e formavam
um perfil de educador que era multiplicador de ideias fundamentais para
o convívio social e identificação de quem era o homem e qual deveria ser
sua contribuição para a construção do coletivo. Tudo isso demonstra que
o que entendemos por educação atualmente possui uma raiz, sendo os
períodos históricos e seus sujeitos fundamentais para a compreensão do
cenário intelectual atual.

003
Ao falarmos em Filosofia da Educação, tendemos mais para o campo filosófico já que,
a partir da teoria organizada na primeira, é que se constrói a prática da segunda. Do
mesmo modo, é olhando para a educação que a filosofia vai se posicionar, analisando o
contexto em que a prática foi exercida, para dela e/ou para ela, formular as suas críticas.

Dessas críticas é que encontraremos subsídios para dar continuidade ao nosso estudo e
identificar quais as principais correntes filosóficas que compõem o pensamento educa-
cional. Pelo idealismo, materialismo e a escolástica, perceberemos o papel que a filosofia
desempenhou na construção de valores, isto é, o que consideramos fundamental em
nossas vidas e nos conceitos que criamos a respeito do que é bom para cada um de nós,
qual o peso de nossas ações e o quanto isso afeta o meio no qual estamos inseridos.

Não somos uma ilha! Essa afirmativa representa a necessidade que temos de socializar
e lidar com o diferente. Assim, somos convidados a nos inserirmos num grupo e nele
nos desenvolvermos. Chamamos isso de sociedade, e as regras da convivência atreladas
à cultura local é que evidenciam quem somos de fato, quais são nossas escolhas e de
que modo elas contribuem para nosso crescimento pessoal e social. Para sustentar os
pilares teóricos daquilo que consideramos como sociedade ocidental, discutiremos o
significado de moral, lei e ética e suas principais expressões a respeito do homem e da
sua convivência social e ambiental.

Por fim, nossas últimas aulas trarão uma abordagem a respeito da filosofia da educação
moderna e para o trabalho. Por elas, finalizaremos toda essa análise, voltando nosso
olhar para uma interpretação a partir do século XX sobre a construção teórica dos sabe-
res que até hoje dão sentido àquilo que consideramos importante na educação formal,
a começar pelo próprio educador, para posteriormente alcançar o educando. A filosofia
estará presente em toda essa caminhada, numa nova roupagem chamada de existen-
cialismo. A ação resultará de uma autoidentificação do homem, que primeiro descobrirá
o que quer para depois dizer quem ele é no embate com os preceitos instituídos pela
sociedade. Nesse embate, lembramo-nos de Paulo Freire, não apenas enquanto pe-
dagogo, mas teórico que, por meio de suas ideias, reformulou a cultura ao possibilitar
que a educação e a reflexão sobre ela se estendesse a todos, indistintamente. Convido
você a caminhar comigo nessas leituras a fim de aprofundarmos nossas pesquisas e
discussões. Tenha um ótimo estudo!

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01

Filosofia e
Educação

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Conceituando Filosofia
Caro(a) aluno(a),

Quando você ouve a palavra Filoso a, o que lhe vem à mente? Pare para pensar um
pouco sobre isso, pois geralmente a interpretamos como algo muito vago, sem
“cienti cidade” ou sem resultados comprovados e úteis. Porém, não se desespere, pois
pensar assim se tornou algo muito comum, tendo em vista que alguns conceitos
modernos de loso a se sobrepuseram ao verdadeiro signi cado dessa ciência.
Filoso a de vida, por exemplo, se de ne na possibilidade de cada indivíduo identi car
quais valores, tipos de pessoas, locais, experiências espirituais, hábitos diários e até
mesmo quais sentimentos cabem em suas vidas (ARANHA; MARTINS, 2016). Contudo,
o conceito clássico de loso a vai além do mero “achismo” e remonta ao berço da
Grécia Antiga, entre os séculos VII e VI a.C.

A palavra loso a deriva de duas outras: philo e sophia. Philo pode signi car amor,
amizade, irmão; enquanto Sophia seria sabedoria, conhecimento. Dessa forma,
Filoso a seria a busca e/ou o amor pelo conhecimento.

Nessa perspectiva, a loso a é a ciência cuja intenção é conhecer, re etir, dialogar


com a fonte do conhecimento humano, isto é, o próprio pensar. Isso não signi ca dizer
que as demais ciências não pensam; é certo que cada uma delas possuem o seu
objeto de estudo: a biologia estuda a vida, a sociologia investiga a sociedade, a história
pesquisa os fatos ocorridos no passado e atualmente. Mas e a loso a? O que ela
pesquisa? O objeto de pesquisa da loso a é o próprio pensar (ARANHA; MARTINS,
2016).

Ou seja, de forma organizada, ela observa as proposições que são transmitidas e ditas
como verdadeiras e as coloca em dúvida, fazendo com que seja possível tecer vários
questionamentos acerca daquilo que antes era considerado como verdade absoluta. O
que é o amor? A verdade existe? Por que estamos neste mundo? Questões como essas
que por vezes nos parecem tão simples de serem respondidas são levadas às
inúmeras possibilidades no pensamento losó co, que não aceita soluções fáceis e
aparentemente óbvias. É a investigação sobre as coisas, porém, de forma
sistematizada, levando em consideração os aspectos naturais, físicos e antropológicos
para chegar a uma teoria que resolva determinada situação, sem contradizer-se em
seus pressupostos. Sobre isso, Chauí a rma:

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Um dos legados mais importantes da Filoso a grega é, portanto, essa
diferença entre o necessário e o contingente, pois ela nos permite
evitar o fatalismo - “tudo é necessário, temos que nos conformar e nos
resignar” -, mas também evitar a ilusão de que podemos tudo quanto
quisermos, se alguma força extranatural ou sobrenatural nos ajudar,
pois a Natureza segue leis necessárias que podemos conhecer e nem
tudo é possível por mais que o queiramos (CHAUÍ, 2000, p. 23).

Com a loso a, nos tornamos mais críticos, porém, mais livres, pois, não será qualquer
resposta que satisfará nosso desejo pelo conhecimento. A busca pela verdade se torna
algo indispensável para uma vida feliz. Foi o que aconteceu com os gregos, que não
podiam mais conviver com a obviedade dos mitos que lhes foram contados por
séculos, enquanto o mundo à sua volta exigia novas respostas, as navegações traziam
novos horizontes e a vida se estendia para além de suas ilhas.

Conceituando Educação
Numa outra perspectiva, falamos agora de Educação e qual a compreensão que se
tem sobre ela. Há uma diferença entre o termo educação e aprendizagem. No
dicionário Aurélio, por exemplo, a palavra educação se resume basicamente como um
processo de se aprender uma habilidade ou a formação de novas gerações conforme
sua cultura, ou então a aplicação de métodos pedagógicos num determinado
contexto. Já a palavra aprendizagem seria o processo, a duração, o exercício teórico e
prático para se adquirir o conhecimento (AURÉLIO, 2019). Por mais que haja a
distinção de um termo para o outro, eles se complementam no processo pedagógico.
Por esse motivo, por mais que utilizemos o termo educação ao longo do texto, você
saberá que me re ro a esta junção: a habilidade e formação de novas culturas, mais o
exercício de se adquirir o conhecimento.

Falar de educação, assim no singular, seria limitar por demais a sua abrangência.
Contudo, Brandão (2005) amplia o debate a respeito dessa ciência e a identi ca pelas
diversas perspectivas possíveis, a começar por uma mais remota, a educação indígena.

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A educação é, como outras, uma fração do modo de vida dos grupos
sociais que a criam e recriam, entre tantas outras invenções de sua
cultura, em sua sociedade. Formas de educação que produzem e
praticam, para que elas reproduzam, entre todos os que ensinam-e-
aprendem, o saber que atravessa as palavras da tribo, os códigos
sociais de conduta, as regras do trabalho [...] (BRANDÃO, 2005, p. 10,
grifo do autor).

Começando pela educação da tribo indígena, o autor nos apresenta a primeira


característica da educação: a livre formação da personalidade humana. Ou seja, numa
retomada histórica percebemos que ela não se limitava ao conteúdo programático de
uma instituição escolar, até porque a escola sequer existia nesse período
contextualizado pelo autor. Avaliações, exercícios, registro de presença, reunião com
os pais e responsáveis, giz e lousa; tudo isso não representava a realidade da
educação, tendo em vista que no contexto indígena, educar tinha outro signi cado,
isto é, um signi cado prático.

Por esse motivo, podemos compreender que educar é uma tarefa que acompanha a
humanidade desde os seus primórdios, antes mesmo da instituição escolar existir. Na
realidade das primeiras tribos, educar era fazer das expressões naturais do indivíduo
os modelos que fossem vistos e reproduzidos pelo grupo. A descoberta do mundo se

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fazia no improviso, em que todos, conforme seus dons tornavam-se aprendizes uns
dos outros para posteriormente reproduzir as ações que deram certo e evitar aquelas
que falharam.

Desse modo, os mais velhos transmitiam aos mais novos seus conhecimentos, e esses
por sua vez, iam construindo sua personalidade aprendiam as tarefas que lhes cabiam
e, aos poucos, se tornavam participantes ativos daquela comunidade. Nesse modelo,
ser ágil, cauteloso, disposto às atividades e com consciência de grupo, era o que se
esperava do jovem membro da tribo (BRANDÃO, 2005).

Mais adiante, essa ideia de educação é confrontada pelos preceitos que foram trazidos
pelos colonizadores. O homem branco, isto é, o civilizado, trouxe uma outra
perspectiva de educação, fazendo com que sua cultura predominasse sobre a de
origem indígena. Nessa nova cultura que se apropriou das terras, dos bens e do
próprio signi cado de trabalho e serviço daquela comunidade local, a educação servia
como instrumento de seleção e desigualdade, conforme dirá Paviani:

Em nossa sociedade, a educação em geral e a educação escolar particularmente


impõem-se como algo necessário para a sobrevivência do grupo e da própria
sociedade. Ela perde o caráter da espontaneidade e torna-se um meio de controle e de
reforço da desigualdade social, apesar de não ser este o propósito das pessoas e dos
educadores (PAVIANI, 1987, p. 10)

Assim, identi camos dois contextos no qual a educação tem o seu signi cado alterado.
Para as tribos indígenas, era o aperfeiçoamento e o descobrimento dos dons de cada
membro em favor do coletivo; já em nossa sociedade, que é movida por um forte
apelo econômico e a busca pelo primeiro – senão, o melhor lugar – educação
representa a competição constante entre os seus pares.

Estes são somente dois exemplos do que possa ser educação, porém, a história nos
legou diversos momentos, nos quais cada grupo soube responder ao signi cado do
que seria essa ciência. Monroe (1956) faz uma bela apresentação sobre o sentido de
educação e a caracteriza em dois momentos principais: o primeiro é essa educação
primitiva que vimos há pouco, encontrada nos selvagens e nos povos bárbaros, que
tinha como função a transmissão dos aprendizados adquiridos pelos mais velhos a m
de que o jovem adquirisse os valores de seu povo. Já o segundo momento se deu com
o progresso da história, o qual gerou diversas teorias. Com as inúmeras tendências e
métodos pedagógicos, a educação se burocratizou, o que tornou muito mais
complicado a compreensão sobre qual o objetivo, a organização e o resultado que
devemos esperar dela (MONROE, 1956).

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Por esse motivo, a de nição de educação pode ser realizada pela interpretação das
diversas expressões trazidas pela história e seus intelectuais. Infelizmente não temos
tempo nem espaço para isso. Porém, o que podemos concluir dessa rica ciência é que
o seu principal atributo se encontra na necessidade de modi car, desenvolver e
despertar habilidades no homem em seu processo de identi cação pessoal e social. A
partir daí todos os detalhes a respeito de seus métodos e demais componentes se
tornam detalhes que se modi cam conforme os interesses de cada grupo que a
exerce.

Conceituando Filosofia da
Educação
Após vermos o que é a loso a e o que é a educação, temos condições de conciliar
esses dois termos e chegar a uma conclusão sobre o que seria essa ciência híbrida
composta por duas áreas distintas – a loso a e a educação.

Ghiraldelli Júnior (2007), ao falar desse tema, faz a comparação entre o lósofo e o
pedagogo para depois de nir o papel do lósofo da educação. Pois bem, seguindo sua
lógica e refazendo a leitura sobre o conceito de loso a e de educação,
compreendemos que a loso a ou o lósofo é aquele que se preocupa com questões
aleatórias, por vezes incompreensíveis numa primeira observação, ou até mesmo
banais, nas quais jamais teríamos interesse ou curiosidade em questionar. Já o
pedagogo ou a pedagogia se detém nas práticas da educação, nos métodos de
aprendizagem e o modo no qual estes estão sendo aplicados (GHIRALDELLI JÚNIOR,
2007).

Por m, a loso a da educação é uma parte da loso a que vem questionar a


educação em alguns aspectos, nos quais a pedagogia não encontra instrumentos e
contextos para agir. Ela geralmente se expressa na crítica realizada sobre as
pedagogias dadas, ou seja, os resultados que são corriqueiramente aceitos como
imutáveis ou difíceis de se alterarem.

Ele é especialista em criar um discurso a respeito da boa pedagogia; e esta, não raro, é
a negação da pedagogia vigente de algum local ou tempo. O lósofo da educação é tão
aborrecedor para aqueles que se recusam a ver problemas na educação quanto o

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lósofo em geral o é para aqueles que odeiam questionar qualquer coisa. Mas o
lósofo da educação não é inimigo do pedagogo. Ele é um bom amigo – ao menos do
pedagogo inteligente. A pedagogia utilizada corriqueiramente – aquela que regra o
que é feito na educação vigente -, e que se tornou banal por ser consensual, é o
objeto de questionamento do lósofo da educação (GHIRALDELLI JÚNIOR, 2005, p.
30, grifo nosso)

Assim, o lósofo da educação é o que traz as suas observações para o campo da


educação. Para isso, ele precisa ser alguém atento à sua época, conhecedor dos
movimentos políticos e sociais que emergem em seu tempo.

Para saber mais sobre esse teórico, nos deteremos na análise de sua atuação em
nossa segunda aula, aprofundando o estudo sobre seu trabalho ao longo da história.

A relação entre loso a e educação acontece todas as vezes que a


re exão losó ca se estende aos conteúdos pedagógicos. Porém, antes
de se complementarem, loso a e educação são áreas distintas e
autônomas. O que as torna compatível é a necessidade que uma tem da
outra no percurso de formação do homem enquanto ser cultural. Ou
seja, é a necessidade que a educação encontra de pensar sobre a sua
atuação e função na sociedade, ao mesmo tempo em que a loso a
permeia todos os espaços dos saberes, tornando-se útil e ao mesmo
tempo incômoda para os que não gostam de se deparar com
questionamentos.

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02

A função da
Filosofia da
Educação
012
O Filósofo da educação
Caro(a) aluno(a),

Para entendermos melhor o papel do lósofo da educação, utilizaremos dessa aula


para aprofundarmos os conceitos que regem a sua re exão e sua linha de atuação.

Ao discorrermos sobre ele, percebemos que, assim como a educação, o lósofo da


educação teve diversos per s ao longo da história. O que eu quero dizer com isso é
que, para que ele pudesse se posicionar a respeito dos movimentos pedagógicos
vigentes em cada período, foi preciso que estivesse atento à sua época, conhecesse a
política e o formato social que compunha sua sociedade, bem como ter re exões
originais que fossem úteis aos problemas que aquele momento histórico enfrentava.
Todas essas características acima citadas formam aquilo que Leclerc chama de per l
intelectual:

O intelectual é um indivíduo intrometido, curioso por natureza, que


vai além, devido a seu espírito investigador e crítico, de toda
implantação pro ssional. Sartre acrescentará, que, quando um físico
especialista do átomo fala de ssão nuclear, ele fala enquanto
cientista; mas, quando se pronuncia sobre o uso militar do átomo, ele
se exprime enquanto intelectual (LECLERC, 2004, p. 17).

Esse indivíduo curioso e que se interessa por aquilo que não lhe diz respeito forma a
essência do lósofo. Isso não signi ca que o intelectual é alguém fofoqueiro, que se
diverte com os problemas alheios e sempre quer saber mais para depois comentar a
respeito. Ele é o tipo de pessoa que não consegue se conformar com a realidade sem
questioná-la, pois entende que as coisas ao nosso redor são bem mais do que
aparentam! Na verdade, esse sentimento losó co, desejoso por ir além do óbvio, é
intrínseco em todo homem e mulher.

Tenho certeza de que você, em certos momentos da vida, já parou para se questionar
a respeito de sua existência, do valor da vida, do signi cado de amor, de morte, de
Deus, etc. A diferença entre nós e o lósofo da educação é que ele dedica sua vida a
observar os fatos e contextos que se relacionam com a educação, buscando o
fundamento dos fatos pedagógicos, enquanto nós nos contentamos com as respostas
corriqueiras e raramente as questionamos. Sem se limitar às respostas óbvias, prontas
e inalteradas, o lósofo da educação investiga para conhecer o problema a fundo e

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tenta solucioná-lo com suas teorias. Nem sempre seus apontamentos são corretos,
porém, o importante é que ele soube se posicionar e dizer o que acreditava ser
pertinente (GHIRALDELLI, 2005).

Para ele, não é su ciente saber que há, por exemplo, um problema no modo como
uma criança se relaciona com a outra no ambiente escolar, ou então que em certos
momentos ou períodos de aula os alunos tendem a ser mais rebeldes. Ele radicaliza
suas respostas e leva as possibilidades aos extremos no intuito de encontrar uma
solução satisfatória para o problema em questão. Desse modo, não devemos esperar
que um lósofo da educação dê uma resposta qualquer, isso porque o modo como ele
enxerga o mundo é fora do padrão. Logo, o pensamento losó co não é obvio, mas
ele deseja contribuir com a re exão, trazer um novo olhar sobre o problema e ser
capaz de criar, gerar ciência e conhecimentos (ALVES, 2012).

Levar as pessoas à re exão sobre questões de cunho educacional e pedagógico é o


que torna alguém um lósofo da educação (GUIRALDELLI JÚNIOR, 2005). Essa tarefa
não é fácil, pois, para seu efetivo sucesso, é necessário despojamento; é preciso sair
do óbvio para enxergá-lo além das fronteiras do comodismo: “Nessa escola sempre
fazemos assim!”, “Essa turma é difícil mesmo!”, “Se a família não deu conta de educar,
quem dirá eu!”.

Infelizmente, frases desse tipo são frequentes em ambientes educacionais, sobretudo


na escola. Por vezes, a justi cativa do problema ou do cenário em questão está
sempre no outro, na tradição, naquilo que foi pensado de uma forma num
determinado momento, porém, continua do mesmo jeito após décadas! Para o lósofo
da educação, é impossível aceitar o que já está dado, pronto, inquestionado! Ele
precisa assumir o seu papel de interventor, ora pelo silêncio, ora pelas palavras, mas
sempre levando o outro a perceber que se é possível inovar e ir além das soluções já
pensadas e dos caminhos já trilhados.

Por vezes as soluções encontradas pelo intelectual e, no nosso caso, pelo lósofo da
educação, não poderão ser aplicadas. Contudo, este pensador fará de tudo para
expressar suas ideias em textos claros, que atinjam o seu alvo e sejam, no mínimo,
diretivos para a construção de um pensamento diferente daquele existente
(GHIRALDELLI JÚNIOR, 2005).

Perceba que, ao apresentar o trabalho do lósofo da educação, não estou dizendo que
ele mudará a realidade ou vai solucionar o problema da escola com trabalhos sociais,
visita às famílias, mutirão para mobilizar a sociedade em favor da educação,

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reformular o quadro de alunos de uma escola ou distribuir cestas básicas para as
famílias mais carentes daquele bairro. Sabe por que ele não irá solucionar os
problemas da educação com ações práticas? Porque essa não é a sua função!

O intelectual – e essa de nição se encaixa no papel do lósofo da educação – se detém


na produção teórica, e a sua expertise está no conhecimento sobre o seu meio e na
formulação de ideias esclarecidas a respeito dele, isto é, sobre o momento no qual
está inserido (LECLERC, 2004).

O lósofo da educação é o sujeito que enfrenta de frente a problemática da educação


por vezes diluída no meio social. Ou seja, quando isso acontece, é sinal de que a
questão pedagógica está escondida e ainda não foi identi cada, o que leva os
intelectuais a caminharem em outra direção na busca de uma solução para o
problema (ALVES, 2012). Vejamos um exemplo de como o trabalho intelectual age na
prática, referente a essa questão.

Numa entrevista dada em 2016 à revista Superinteressante, o promotor Carlos


Eduardo Fonseca da Matta, da 3º Procuradoria de Justiça de São Paulo, deu a seguinte
declaração ao ser questionado sobre sua opinião a respeito da redução da maioridade
penal enquanto medida para diminuição do número de crimes cometidos por
menores infratores:

015
Claro. Sou totalmente favorável a baixar a idade de responsabilidade
penal. A sociedade não pode car à mercê de criminosos violentos,
sejam eles maiores ou menores de 18 anos. Isso não signi ca que um
menor que tenha furtado uma camiseta deva car anos na cadeia.
Nesse caso é razoável aplicar uma medida socioeducativa. Mas é
muito diferente quando esse menor pratica crimes graves, como
estupros, sequestros e latrocínios. Nesse caso, ele tornou-se um
bandido perigosíssimo e é necessário defender a sociedade. Hoje, as
leis federais e estaduais americanas, bem como as de todos os países
da Europa ocidental, determinam a imposição de medidas de caráter
penal a menores de 18 anos que comentem crimes graves. No Brasil,
não. Isso é um estímulo à criminalidade (MATTA, 2016).

Indiferente de sermos favoráveis ou não a diminuição da menoridade, o que ca


evidente nesse recorte é que o promotor tratou em solucionar o problema da violência
pelo ponto de vista mais lógico. É natural que queiramos acabar com essa situação
com o aumento da segurança, do policiamento público, com leis mais rígidas, etc.
Todavia, lembremos que frente às respostas óbvias, o lósofo encontra soluções
inovadoras. Confrontemos as considerações de Matta com os dados apresentados
pela Revista Exame em uma reportagem feita naquele mesmo ano:

De acordo com o Ipea, para cada 1% a mais de jovens entre 15 e 17


anos nas escolas, há uma redução de 2% na taxa de pessoas
assassinadas nos municípios brasileiros. “Segundo as nossas
estimativas, a probabilidade de um indivíduo com até sete anos de
estudo ser assassinado no Brasil é 15,9 vezes maior de outro
indivíduo que tenha ingressado na universidade, o que mostra que a
educação é um verdadeiro escudo contra os homicídios no Brasil”,
a rma o responsável pelo estudo, Daniel Cerqueira, doutor em
economia pela PUC-Rio e técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea
(EXAME, 2016).

Por mais que você já saiba e tenha ouvido por diversas vezes que a solução para a
violência possa ser o investimento em educação, nem sempre temos dados que
comprovem como isso possa ser aplicável. Além disso, sendo nossa intenção tratar a
respeito da atuação do lósofo da educação, esse exemplo é importante para

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percebermos que, ao diagnosticar o problema da violência como falta de investimento
em educação, a reportagem nos convida a abandonarmos o óbvio e encontrarmos
outras estratégias para acabar com a violência!

Isso seria seguir uma lógica contrária às demais, o que exige coragem, mas também
conhecimento! É por isso que opiniões que expressam caminhos opostos àqueles aos
quais estamos acostumados precisam de fundamentos teóricos sólidos, com
justi cativas plausíveis e de fácil acesso e compreensão. Nisso, o lósofo da educação
necessita ser perito! Porém, para se chegar a bons resultados, é preciso pensar fora do
padrão, opor-se às respostas dadas e engessadas para encontrar outra explicação,
outra maneira de entender aquela mesma situação, mas por uma ótica diferente
(PAVIANI, 1987).

Ou seja, se você já está saturado(a) de saber que a educação é atualmente o meio


mais e caz para erradicação da violência e de outros dé cits sociais, foi porque
alguém ousou ir além do problema em si e abriu margens para outras interpretações.
A esses pensadores damos o nome de intelectuais da educação, ou então, lósofos da
educação.

Esses indivíduos corajosos estiveram presentes por toda a história, e ainda estão! Em
muitos momentos, seus trabalhos foram pioneiros, precisaram enfrentar a oposição
da época e de toda a sociedade por serem considerados ofensivos, descabidos e até
mesmo por serem interpretados como obras diabólicas, que tinham como intenção
acabar com a unidade da sociedade que era instituída pelos valores cristãos. Nas aulas
seguintes, veremos alguns deles e o modo com suas re exões contribuíram para a
expansão do tema da educação em sua época.

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Conforme vimos, a ideia de intelectual é próxima a do papel do lósofo
da educação. Na verdade, o lósofo é por si só um intelectual, e se faz
pela observação do ambiente no qual vive, pelo conhecimento sobre a
história da humanidade e da sua cultura e por propor alternativas na
compreensão sobre o cenário educacional de seu período.

Um dos autores que trabalham a respeito do que seja um intelectual e o


per l que esse possa assumir é o lósofo Antônio Gramsci. Vale a pena
conhecer um pouco mais das suas observações a respeito dessa
temática. Acesse lá!

O vídeo está Disponível aqui

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A Educação em
Thomas Hobbes

019
O papel do estado na
filosofia e educação de
Thomas Hobbes
Vamos dar mais alguns passos em direção ao nosso estudo sobre alguns lósofos
clássicos e o modo como suas teorias contribuíram para uma re exão pedagógica.
Iniciaremos essa nossa abordagem histórica a partir do pensamento do lósofo
Thomas Hobbes.

Thomas Hobbes nasceu no ano de 1588, na cidade de Westport, na Inglaterra. Filho de


um sacerdote anglicano, foi criado no período do reinado da rainha Elisabete I (1533-
1603), recebeu educação formal a partir dos seus quatro anos de idade e se formou
pela universidade de Oxford no ano de 1608. Era teórico político, lósofo e
matemático, porém, atuou como preceptor do jovem William Cavendish, que
futuramente se tornaria o Duque de Devonshire. Nessa época, ele tinha somente vinte
anos de idade!

Na história da loso a, Hobbes é identi cado popularmente como o pensador


pessimista quando o assunto é natureza humana (LIMONGI, 2012). Ele, John Locke e
Rousseau são os três principais lósofos contratualistas, isto é, pensadores que
defenderam a ideia de que a sociedade civil era organizada a partir de um contrato,
teoricamente falando, porém, seria um contrato. Por exemplo, quando fazemos uma
compra, ou nos matriculamos em um curso, ou quando entramos num
relacionamento ou num emprego novo, nós assumimos uma responsabilidade.
Algumas dessas coisas listadas não precisam de um contrato formal, com
reconhecimento de rma ou coisas do tipo. Porém, ao fazer a promessa de que irá
pagar a compra, ou irá frequentar o curso, ou então que será el ao (à)
companheiro(a) e às regras do novo trabalho, você está automaticamente assumindo
um compromisso, semelhante a um contrato ctício, feito verbalmente, mas que lhe
torna moralmente responsável por honrá-lo.

Pois bem, nessa ideia de contrato, cada um dos três pensadores trouxe a sua
contribuição e o seu entendimento sobre como este deveria funcionar. Regra geral
para os três: o estado de natureza deveria ser retomado para que o homem pudesse
se adequar à vida num contrato social. Ao tratarmos de suas loso as, acredito que
isso tenha cado claro, porém, vale a pena retomar:

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Jean-Jacques Rousseau: O homem selvagem abandonaria sua liberdade natural para
viver num acordo. Ele faria isso porque o progresso o impulsionou, e a necessidade de
produzir roupas para se proteger do frio, armas para caçar e abrigo para se proteger o
zeram dependente de outros homens. Sendo assim, a vida em sociedade precisou
ser criada. Porém, para que o homem tenha uma vida em comum sem perder sua
felicidade, era necessário que sua liberdade não fosse retirada. Por isso, as leis civis
deveriam ser formuladas por todos, em conjunto, para que todos as aceitassem e se
sentissem livres mesmo num contrato social. Rousseau valorizava a liberdade.

John Locke: O contrato social já existia, porém, deveria ser reformulado. Nessa
reformulação, ninguém teria o direito de retirar de um cidadão aquilo que ele
conquistou com o seu trabalho. Por esse motivo, educar o homem seria necessário
para que ele aprendesse a respeitar a sua natureza, que era originariamente egoísta.
Ou seja, quando o homem lutasse por seus direitos e competisse com os outros para
alcançar o melhor lugar, ou então pensasse primeiramente em si, isso não seria ruim,
pois ele estaria permitindo que sua natureza se expressasse. Ou seja, os bens que ele
adquirisse seriam frutos de seu esforço, pois na ordem social, ele soube ser o melhor.
Por isso que o dono da terra não deveria mais ser o senhor feudal, tampouco o rei,
mas era aquele que a tivesse cultivado. Locke valorizava a propriedade privada.

Após retomarmos o pensamento de Rousseau e Locke, devemos compreender qual a


contribuição trazida por Hobbes.

Assim como em Rousseau e Locke, para Hobbes o estado de natureza era importante
e deveria ser cultivado, sobretudo em uma de suas principais características: o
egoísmo. O homem é mau por natureza! É isso que Pierre Bayle considera ao falar
sobre Hobbes, a rmando que o autor assim interpretou o homem natural (BAYLE,
1982). Porém, vamos car com algumas interpretações mais modernas, como a da
professora Maria Isabel Limongi, que entende o pensamento de Hobbes sobre a
natureza humana como egoísta (LIMONGI, 2012).

Em “Leviatã”, Hobbes faz uma descrição da espécie humana e a rma que desde o
princípio da vida, o homem sempre procurou realizar seus desejos, colocando-se
acima de tudo e de todos. Para conquistar seu território, ele assassinava os demais e
destruía as espécies e a natureza, acreditando ser superior e gerando um estado
permanente de guerra (HOBBES, 1983). Nada poderia parar o homem, pois, sua sede
pelo poder era algo constante e sem limites. Dessa ideia é que o autor retira sua
certeza de que o homem não é naturalmente bom.

021
De um modo geral, os homens são basicamente todos iguais, sendo as diferenças
entre eles, mínimas. Apesar disso, a disputa do homem estaria no desejo de provar
aos demais que sua inteligência é maior, sua força é superior, até que todos obedeçam
e aceitem sua autoridade. Dessa forma, o mais esperto sempre vence, pois antecipa o
golpe que sofreria do inimigo.

O interessante de estudar Hobbes é que sua leitura sobre o homem e a sociedade são
muito atuais. Ainda percebemos essas atitudes de arrogância, prepotência e orgulho
em nós, não é mesmo? Hobbes, ao olhar para o gênero humano e identi car a
corrupção que havia em seu comportamento, entendeu o porquê da existência da
sociedade. Ou seja, o fato de a vida social ser ainda hoje uma realidade, seria porque,
sem ela, nós não estaríamos vivos. Entende isso?

Se no estado de natureza o homem seria movido por seus desejos egoístas de sempre
ser o melhor, ter maior vantagem sobre os demais, ter o poder em suas mãos etc., ele
faria de tudo para alcançar seus objetivos, nem que para isso fosse preciso agredir,
violentar, torturar e matar os seus inimigos. Com isso, o resultado seria a
sobrevivência do mais forte e o assassinato dos mais fracos. Semelhante a uma selva,
o que determinaria o tempo de vida de alguém seria a sua agilidade para fugir do
predador, isto é, um outro homem, um bicho da sua própria espécie!

Para fugir dessa sina que o egoísmo humano proporcionaria ao mundo, a sociedade e
suas leis seriam aquelas que protegeriam o homem do próprio homem, pois, caso não
houvesse interferência, esses atacariam aos seus próprios semelhantes. Daí vem a
famosa frase de Hobbes: “O homem é o lobo do homem”. Cercado por leis que regram
o seu comportamento, o homem aprendeu a viver com o outro, porém, caso ele seja
deixado à mercê de suas próprias vontades, o resultado seria o retorno a um estado
contínuo de guerra (LIMONGI, 2012). Nesse ponto, vale perguntar: e onde entra a ideia
de educação em Hobbes?

O lósofo não tratou especi camente sobre educação, ou seja, o modo como educar o
indivíduo para a sociedade que ele idealizava. Porém, sua loso a se posicionou a
favor de um governo soberano e forte, que deveria conduzir o homem à paz e à
sociabilidade harmônica. Portanto, seria essa condução o fator pedagógico de seu
pensamento, visto que ele tinha um m a ser alcançado com suas ideias e que não
poderia ser realizado caso deixássemos o homem agir por conta própria, pois ele não
é naturalmente sociável. Em outras palavras, as leis e os mandos sociais são
pedagógicos, nos educam e nos tornam conscientes daquilo que nos é permitido ou
não, certo ou errado, bom ou ruim, aprendendo a conviver, partilhar nossos talentos e
a lidar com as diferenças.

022
Parece um pouco utópico Hobbes depositar tanta con ança nas leis, pois, ao olharmos
para a sociedade, percebemos que os casos de violência, agressões, roubos e mortes
são constantes, mesmo vivendo em sociedade. Estaria Hobbes enganado ao dizer que
as leis seriam o elemento responsável pela educação para a convivência em
sociedade? Na verdade, não!

Lembremos que Hobbes acredita que alguns aspectos do estado de natureza devem
ser preservados na vida em sociedade. Neste caso, o egoísmo humano tem um
propósito principal, que é o de conservar a própria vida. O homem, ao assumir o
contrato social, garante a sua sobrevivência em troca de não mais agir pelo seu
impulso ao obedecer às leis. Desse modo, pensando primeiramente em si, o homem
estaria contribuindo para a aplicabilidade do bem comum. Parece contraditório, mas
não é!

Sabe quando você leva uma “fechada” de um outro carro no trânsito? Ou então
quando você é mal atendido por um(a) vendedor(a) numa loja? Ou ainda quando
precisa utilizar o banheiro público e o encontra sem nenhum sinal de higiene? Em
todas essas situações, você provavelmente pensaria: “Que coisa horrível! Como pode
alguém agir dessa maneira?!”. Ao se deparar com uma situação que não lhe agrada,
automaticamente você entende que aquilo poderia não ser confortável para uma
outra pessoa e, portanto, você evita reproduzir tal comportamento. As experiências
negativas nos fazem entender como é ruim não ter o mínimo de consideração por
parte de terceiros, e isso lhe faz repensar seu comportamento.

Por mais que isso possa aparentar uma atitude altruísta, na verdade não passa de
uma re exão egoísta, pois não seria pensar no outro, mas é pensar em você! Não faço
igual porque não quero que façam comigo! Não roubo porque não quero ser roubado,
quero segurança! Não quero sofrer! Não quero ser humilhado(a), esquecido(a),
traído(a), julgado(a), etc.

Segundo Hobbes, a partir do momento em que o homem pensasse e agisse se


colocando em primeiro lugar, o bem estar social seria uma consequência de atitudes e
pensamentos egoístas que, por querer viver numa sociedade melhor, num bairro
melhor, numa casa melhor, se educou para cumprir com aquilo que a lei estipulasse.
Ou seja, em Hobbes percebemos que o problema está no cuidado que temos em
apontar como os outros devem agir, pensar, ser. É como se o lósofo nos dissesse:
“Você quer mudanças? Então comece por você! Se tem sofrido com a violência, acabe
com ela primeiramente na sua casa, no trânsito, nas opiniões preconceituosas, etc.”
Atitudes assim poderia ajudar a mudar o contexto social.

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No entanto, não sejamos tão românticos ao ponto de acreditar que o comportamento
individual sanaria todos os males da sociedade. Lembremos que em Hobbes, o
homem é egoísta por natureza e precisa ser controlado. Se mesmo vivendo em uma
sociedade com leis, a vida humana ainda se encontrar em risco, a culpa não seria das
pessoas, mas do próprio governo. Hobbes acreditava em um governo absolutista, em
que sua força deveria ser maior que a do povo, pois, caso o governo abrisse brechas, o
caos e a guerra se instalariam novamente na sociedade (HOBBES, 1983).

Ou seja, quando o governo é fraco, a sociedade se perde e a natureza humana ca


descontrolada. Portanto, o direcionamento das forças do cidadão deve ser submetido
aos interesses e vontades de quem está no poder, pois este saberá o que é melhor
para o povo, tendo em vista que este con a em seu líder, uma vez que depositou em
suas mãos a con ança de suas vidas.

Assim, concluímos nossa aula sobre Thomas Hobbes e sua contribuição para o campo
da educação. Veremos, no próximo conteúdo, o pensamento de outro teórico da
educação, bem como sua contribuição para a nossa discussão losó ca pedagógica.

Uma das mais famosas frases de Hobbes foi: “O Homem é o lobo do


Homem”. Nesse confronto eterno que a raça humana vive conforme
nos ensina a loso a hobbesiana, tudo seria guerra e morte caso o
homem não fosse “domado” pela força da vida em sociedade que se
respalda na lei para poder agir. Entretanto, as leis têm sido su cientes
para que os homens deixem de se atacarem? A cantora Pitty canta a
música “Lobo”, inspirada nas ideias de Thomas Hobbes, e expressa bem
o centro de seu posicionamento político. Vale a pena conferir!

O vídeo está Disponível aqui

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04

A Educação em
John Locke

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A Educação em John
Locke: a formação do
burguês
Após conhecer a respeito da educação em Thomas Hobbes, vamos discutir sobre o
pensamento do lósofo inglês John Locke. Locke nasceu no dia 29 de agosto de 1632,
na aldeia de Somerset, na cidade de Wrington, Inglaterra. Era lho de um funcionário
do tribunal e capitão do exército parlamentar, recebeu uma educação formal, pois
desde os seus quatorze anos de idade frequentou escolas. Na realidade, a formação
de Locke foi extensa e, além do curso de loso a (que em sua época recebia o nome
de “Artes”), ele estudou Medicina e Ciências Naturais.

Seu pensamento ganhou destaque na Inglaterra de seu período, pois, semelhante a


Rousseau, Locke foi alguém que não se contentou com a ideia de educação, sociedade
e política que eram vigentes em seu contexto. Apesar de não ser muito conhecido o
seu discurso voltado à educação, ele apresentou algumas notas a respeito do que
considerava válido a ser transmitido ao homem, visto que, segundo ele, a grande
responsável pelas habilidades que uma pessoa possa ter seria a educação que ela
recebeu (LOCKE, 2000). A obra na qual ele se dedica à pedagogia é “Alguns
pensamentos sobre a educação”, publicada em 1693. Cambi, ao falar sobre John Locke,
a rma:

[...] foi, de maneira geral, o representante de um pensamento crítico


que pretende submeter toda a rmação à prova da experiência e,
portanto, colocar no centro do próprio trabalho os princípios da
veri cação experimental e da inferência empiricamente provada
(CAMBI, 1999, p. 316).

Vamos agora entender o seu contexto para assim chegar aos fundamentos de sua
teoria. O período no qual ele viveu era governado pela monarquia, por isso, passou
pelo reinado de Carlos I (1625 -1649), acompanhou a sua execução, bem como ainda
era vivo no período do Protetorado, que foi o momento no qual dois lordes assumiam
temporariamente o lugar do rei, visto que o seu posto estava vacante.

026
Durante esses governos, sobretudo o de Carlos I, os ingleses viviam sob a imposição
das abusivas ordens reais. Carlos I acreditava que o poder real era divino, portanto,
todos deveriam obedecê-lo e servi-lo com extrema devoção. Suas decisões se
impunham sobre às diretrizes da igreja da Inglaterra, sobre os impostos que se
tornavam cada vez mais elevados, e tudo isso sem consultar o parlamento, pois seu
desejo era o de governar sozinho (SILVEIRA, 2017). Por esses e outros motivos, Carlos I
é considerado pela história um dos primeiros monarcas a promover o governo
chamado de absolutista.

Passar por todas essas experiências de governos mal-sucedidos zeram de Locke um


intelectual descrente naquele tipo de ordenamento social. Vamos tentar pensar como
Locke e re etir sobre seu posicionamento: imagine você viver num governo em que,
mesmo com a mudança do líder, os problemas continuam os mesmos e todas as
tentativas de melhoria não deram certo. Além disso, novos ares chegavam, os desejos
de progresso permeavam a mente das pessoas que queriam se sentir livres para
planejarem suas vidas e alcançarem sucesso. Contudo, frente a um governo que
limitava às possibilidades de ascensão, toda tentativa de desenvolvimento seria
infrutífera. Por esse motivo, Locke acreditava na autonomia, na independência.

Diferentemente de um poder real que viesse de Deus, sua máxima se concentrou na


ideia de uma veri cação, isto é, só seria possível acreditar naquilo que fosse provado,
que a experiência demonstrasse que era possível de acontecer e ser real, tanto na

027
política quanto na educação. Essa teoria inaugurada por Locke é conhecida como
empirismo (CAMBI, 1999).

O pensamento lockeano foi o responsável por mudanças signi cativas, não somente
na Inglaterra, mas também na França do século XVIII. Assim como Rousseau e tantos
outros autores, Locke acreditou que as mudanças sociais se tornariam efetivas caso
contasse com o trabalho da educação. Crente disso, o autor considerou a natureza
humana como o princípio da organização social, sendo necessário educar o homem
para que este fosse ele mesmo enquanto se desenvolvia dentro de seu grupo.
Contudo, a compreensão que Locke tinha do signi cado de natureza era diferente
daquela elencada por Rousseau, conforme vimos anteriormente. Nele, contrário às
ideias do lósofo de Genebra, no estado de natureza o homem seria regido pela razão.
Mais que isso, no estado de natureza, a desigualdade não é algo produzido, mas fruto
desse estado, e o egoísmo é uma das características próprias do homem (LEONEL,
1994).

Trazer esses aspectos se faz importante para que posteriormente possamos


compreender o conceito de educação desse pensador. Percebamos que, ao contrário
daquilo que entendemos por educação nos dias de hoje, para pensadores clássicos
como John Locke a educação que se recebia de seus iguais e a instrução adquirida
formalmente eram uma só. Isso porque o aprendizado não se dava somente pela
instituição escolar, não era uma tarefa exclusiva da escola ensinar preceitos básicos de
sociabilidade e valores morais. Tudo isso se percebia no próprio contexto social, se
cobrava em casa e os conhecimentos acumulados eram transmitidos de geração em
geração. Ou seja, ser homem e ser cidadão eram propostas complementares, ambas
movidas pelo raciocínio lógico e pelas ciências (LEONEL, 1994).

Ao olhar para a sua sociedade e realizar suas críticas a respeito de sua estrutura, Locke
não desejava revolucioná-la a ponto de acabar com os ensinamentos que ela continha
para lhe dar outros princípios. Pelo contrário, seu projeto se con gurava na
potencialização do saber adquirido pela experiência humana para que aquele que o
possuísse pudesse se destacar em seu grupo. Você consegue entender isso? Consegue
perceber a grande re exão teórica que Locke produziu em sua época?

Vamos detalhar esse conceito para que a essência do pensamento político e


pedagógico de John Locke não passe despercebido. A sociedade na qual ele vivia
estava pautada numa política absolutista, na qual os indivíduos não tinham liberdade
para serem o que desejassem: aí se encontrava a crítica de Locke.

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Havendo sido tomados os cuidados adequados para manter o corpo
forte e vigoroso, de tal forma que possa ser capaz de obedecer e
executar as ordens da mente, a tarefa seguinte e mais importante é
dispor a mente corretamente, de modo que em todas as ocasiões
ela seja inclinada a não consentir senão com o que seja
adequado à dignidade e excelência de uma criatura racional
(LOCKE, §31, 2000, grifo nosso).

Enquanto criatura racional por natureza, o homem não deveria se submeter aos
mandos de um governo que se dizia superior a todos por ordem divina a ponto de
diminuir o seu povo e fazê-lo sofrer. Desse modo, caberia ao homem assumir a sua
essência que era racional e pôr em prática a sua origem egoísta, a m de que seu
intuito fosse de ser sempre o melhor dentre os seus (LEONEL, 1994).

Para alcançar tal empreitada, o caminho seria a educação. Educando o homem da


sociedade, porém, tendo como base a sua natureza, o resultado seria um indivíduo
incapaz de se subordinar a um preceito que considerasse vazio, pois saberia que sua
capacidade racional o convidava a sempre buscar o melhor para si e,
consequentemente, para a sua sociedade. Com isso, vemos que na educação lockeana
o educando não se contentaria com a submissão, mas o seu desejo de liberdade
tomaria à frente de sua conduta social, fazendo-o um homem corajoso, capaz de
construir a sua própria história e ser merecedor de todos os méritos alcançados. Em
outras palavras, esse ser educado nesses moldes pre gurava o homem burguês do
século XVIII.

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Porém, vale lembrar que tal liberdade garantida ao educando não se daria em todo o
processo de aprendizado. Inicialmente, seria necessário que o aluno renunciasse aos
seus desejos, pois “o grande princípio e fundamento de toda a virtude e valor está
colocado nisto: que um homem seja capaz de negar a si mesmo seus próprios
desejos[...] (LOCKE, §33, 2000, grifo do autor). A renúncia de si no momento certo faria
o educando se concentrar em suas capacidades intelectuais, para posteriormente
gozar de toda felicidade que o seu esforço e conhecimento lhe renderam.

Como se daria na prática a proposta pedagógica de Locke? Vejamos: sua teoria


valorizava o cuidado com o corpo e com a mente, isso porque se trata de instrumentos
pelos quais o homem demonstra as suas potencialidades. Em Locke, a educação, a
partir da experiência, é o que conduziria o homem ao conhecimento, pois todos
nascem rasos intelectualmente. Ao a rmar isso, o lósofo ia mais uma vez de encontro
com os valores de sua época, pois ignorava a crença nos conhecimentos inatos que
cada homem trazia consigo desde sempre. Se o conhecimento é algo que se adquire
por meio do intelecto, então não seria correto dizer que alguém canta, escreve,
cozinha ou exerce qualquer atividade porque possui um dom (CAMBI, 1999).

Com isso, o que se tem é um tripé responsável pela formação do ser, que são o físico,
o moral e o intelectual. Seguindo esses três princípios, seria possível alcançar
futuramente o homem ideal para a nova ordem social que despontava, contrária aos
movimentos do regime monárquico. A partir de um ensino reformado, o que se
encontraria era um homem também reformado. O grande mal da sociedade estaria na

030
condução da formação do homem, dirá Locke. Por vezes, os pais – que devem ser os
grandes guardiões dos cuidados de seus lhos -, permitem desde cedo que estes se
deixem corromper pelos maus costumes, acreditando que nada lhes acontecerá,
tendo em vista sua pouca idade. Locke os alerta acerca desse engano que, por vezes,
inocentemente cometem. Assim ele escreveu:

Eles amam seus pequenos, e isto é sua obrigação; mas seguidamente


regozijam-se, junto com a pessoa deles, também com suas faltas. Eles
não podem ser obstruídos, dizem. Deve-se-lhe permitir que façam
suas vontades em todas as coisas; e não sendo capazes de grandes
vícios na infância, os pais pensam que podem, com su ciente
segurança, condescender com suas pequenas irregularidades, e
fazerem eles próprios gracejos com esta bela perversidade, a qual
lhes parece conveniente a esta idade inocente. Mas a um pai
carinhoso, que não teria corrigido o lho por uma travessura
perversa, mas o desculpado, dizendo: “É coisa pequena”, Solon, muito
bem respondeu: “Sim, mas o costume é uma grande coisa”. (LOCKE,
§34, 2000).

O amor não pode limitar os lhos, tampouco fazê-los dependentes dos cuidados
paternais. Desse modo, todo carinho em excesso deve ser evitado, pois se não houver
esse cuidado, o risco de se perder todo o trabalho de formação do homem se torna
eminente.

A educação nesses moldes não é leve, e essa rigidez pedagógica é perceptível nos
detalhes. Locke pretendia permitir que o educando experimentasse a dor e
aprendesse a conviver com ela. Isso faria de seu aluno um homem conhecedor de si e
de seus limites, mas também de seus potenciais. A renúncia dos prazeres na infância
serviria para lhe fazer forte, semelhante a um soldado que ao enfrentar as di culdades
da batalha, se esforça em superá-las, até chegar ao ponto de não mais sofrer tanto
com as condições às quais é exposto, pois, aprendeu a lidar com o sofrimento.

Por m, o resultado da educação lockeana seria o Lorde Inglês, isto é, homem culto,
capaz de interagir com os demais, negociar e se posicionar livremente frente aos
problemas de seu tempo de forma decidida e in uente, sempre prezando pela
propriedade privada que é o símbolo da sua independência, visto que este sujeito não
é mais o súdito subjugado aos mandos de um rei tirano, mas é o burguês
independente, criador de sua história e que adquiriu com todos os esforços
desprendidos a independência de sua vida e o sucesso pessoal, pro ssional e social.

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Prossigamos nossos estudos a respeito do pensamento clássico como uma expressão
teórica dos fundamentos que compõem a loso a da educação.

Ao falarmos da educação em Locke, o que podemos destacar de todas


as suas considerações é o processo e o resultado de sua proposta. O
fato de educar indica que o homem não pode permanecer no estado de
natureza no qual estava inserido. Por isso, educar é desnaturar, fazendo
o sujeito assumir posturas que inicialmente não lhe eram próprias.
Nessa perspectiva, em Locke, o cidadão que não cumpre com as regras
de sua cultura e sociedade é considerado “deseducado”. Por isso,
diferente de lósofos como Rousseau, a educação em Locke é visível, se
expressa nos gestos, na fala e na postura que o indivíduo tem diante da
vida em sociedade. Em suma, sua educação é social, pois tem a função
de levar o homem a obter sucesso enquanto cidadão membro de um
grupo.

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05

A Educação em
Jean-Jacques
Rousseau
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A Teoria da educação de
Rousseau: educação e
política
Ao falarmos sobre os lósofos da educação, encontraremos diversos nomes nas mais
variadas épocas históricas. Contudo, alguns grupos obtiveram destaque e se tornaram
referenciais de ideias inovadoras e, por vezes, polêmicas a respeito dos fundamentos
que regiam o conceito de pedagogia, educação, ensino, etc. Um desses pensadores foi
Jean-Jacques Rousseau.

Rousseau nasceu no ano de 1712, na cidade de Genebra, Suíça. Filho de um relojoeiro


foi criado pelo pai até seus dez anos de idade, tendo em vista que sua mãe faleceu
devido às complicações que tivera em seu parto. Quando tinha dezesseis anos de
idade, Rousseau foge de sua cidade natal e parte em busca de novas experiências pelo
mundo afora. Viajou bastante, morou na Itália, teve aulas de latim e italiano, passou
por uma experiência religiosa e quase estudou para ser padre após sua conversão ao
catolicismo (SIMPSON, 2009). Porém, não contente com a vida que levava, voltou para
a estrada em busca de um lugar que o acolhesse. Seu paradeiro foi a cidade de Paris,
na França, onde passou a maior parte de seus anos.

Sua experiência pelo mundo afora o fez observar o homem em suas mais diversas
expressões: ricos, pobres, camponeses, homens felizes, outros amargurados com a
vida que levavam, pessoas que eram exploradas e tentavam a todo custo serem livres.
Por m, após observar todos esses cenários, Rousseau conclui que: “O homem nasce
livre, e por toda a parte encontra-se a ferros” (ROUSSEAU, 1999, p. 53). Com isso, o
autor quis dizer que a sociedade do século XVIII, sobretudo naqueles lugares nos quais
ele havia passado, eram permeados por indivíduos aprisionados, que viviam
subjugados aos mandos daqueles que detinham o poder, e que como consequência
dessa realidade, vivam infelizes.

Vale ressaltar que esse aprisionamento ia muito além de grades de ferro que
poderiam prender um homem. Os ferros aos quais Rousseau se referia não eram
físicos, mas ideológicos. O cidadão estava preso aos preceitos sociais que lhe foram
impostos ao longo dos anos, era cativo dos costumes e dos valores que a sua
sociedade lhe impunha sem poder se libertar deles, pelo menos até aquele momento
(BOTO, 2017).

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Rousseau havia enxergado o problema de sua época: além de ter que conviver com
uma realidade totalmente desigual e injusta, ele ainda precisava cumprir com os
hábitos e costumes típicos daquele contexto. A polidez nas relações, as boas maneiras
e as regras de etiqueta, o seguir à moda e o trato com as pessoas conforme o seu grau
de importância, o modo como alguém deveria se portar à mesa, etc. Tudo isso fazia
parte do cenário do século XVIII, principalmente na França, que contava com famosos
manuais de civilidade que se tornaram extremamente populares na época, em
especial aquele que havia sido escrito por João Batista de La Salle, intitulado “Règles de
la bienséance et de la civilité chrétienne” (ARIÈS,1986). Esse manual continha
ensinamentos sobre como uma pessoa deveria agir nas mais diversas ocasiões.
Vejamos um exemplo:

Apenas deitado, é preciso cobrir todo o corpo, fora o resto que


sempre deve car descoberto. Tampouco se deve tomar postura
alguma inconveniente, com a desculpa de maior comodidade, nem
permitir que o pretexto de dormir melhor se sobreponha ao decoro.
Não é cortês dobrar as pernas, mas deve-se estendê-las, e convém
deitar-se ora de um, ora de outro lado, pois não é apropriado dormir
deitado de bruços (LA SALLE, 2012, vol. III, p. 360).

Talvez você possa se perguntam sobre qual o problema em seguir regras de etiqueta
ou então ser bem-educado(a) e cumprir com uma determinada postura quando se
está na frente de alguém importante. Na verdade, quem é que não gosta de encontrar
pessoas simpáticas por onde passa, ou então ser bem tratado?

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Pois bem, para responder a essa questão, devemos primeiramente lembrar que a
resposta óbvia não cabe aqui, uma vez que estamos tratando de loso a da educação.
Por isso, nossa primeira tarefa é compreender qual a crítica realizada por Rousseau,
bem como o que isso tudo tem a ver com educação.

Para Rousseau, ao seguir todos esses preceitos sociais, reproduzir os comportamentos


aceitos por aquela sociedade, o homem abandonava a sua essência, sua origem. Ou
seja, o lósofo entendia que o motivo das grades ideológicas e consequentemente da
infelicidade humana se encontrava no distanciamento de nossa natureza, que estava
sempre cumprindo com os mandos sociais, porém, se esquecia de buscar aquilo que
lhe era próprio e lhe fazia feliz.

Aqui, encontraremos a relação que Rousseau faz do problema social com a educação.
Todos os males que afetam o homem em sociedade são frutos das relações sociais e,
por esse motivo, não se deveria culpabilizar o homem pelos excessos que ele cometia
no convívio com os demais. Ao invés de dizimar a espécie humana, ou então acabar
com a sociedade, era preciso direcioná-la a outro caminho, numa nova perspectiva de
vida. Isso só seria possível se o instrumento utilizado para salvar a humanidade fosse a
educação (ROUSSEAU, 1973).

Pode soar estranho utilizar termos como “grades ideológicas”, “salvação”, “dizimar a
espécie”, etc. Porém, devemos entender que a infelicidade humana era um problema
levado a sério pelo lósofo, e se ocupar da educação como o remédio capaz de acabar

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com tal con ito fazia com que suas re exões se tornassem propostas inovadoras,
típicas de um intelectual da educação.

Ao educar o homem para aprender a ser ele mesmo, a conviver com seus sentimentos
e seus desejos e obedecer primeiramente à mestra natureza, a felicidade e a liberdade
voltariam a ser suas principais características, conforme acreditava Rousseau:

Que se destine meu aluno à carreira militar, à eclesiástica ou à


advocacia pouco me importa. Antes da vocação dos pais, a natureza
chama-o para a vida humana. Viver é o ofício que lhe quero
ensinar. Saindo de minhas mãos, ele não será, concordo, nem
magistrado, nem soldado, nem padre; será primeiramente um
homem (ROUSSEAU, 1973, p. 15, grifo nosso).

Para isso, os exageros de uma educação cheia de vícios deveriam ser retirados da
formação desse novo homem. Porém, como construir esse novo homem, sendo que
todos os que estavam inseridos naquela sociedade eram corrompidos pela cultura? No
intuito de não errar em seu projeto político pedagógico, Rousseau criou para si um
personagem, uma criança ctícia que se chamaria Emílio (SIMPSON, 2009).

Emílio era uma criança órfã, seu único referencial familiar seria Rousseau, que
cumpriria com o papel de preceptor do menino e o iria acompanhar até o dia em que
chegasse à vida adulta. Emílio teria uma infância diferente das crianças daquela
sociedade: não viveria na cidade, não teria a companhia de outras crianças, não
tomaria banhos quentes, não seria socorrido quando caísse ou chorasse sem motivo,
não se cobriria com inúmeras peças de roupas para se agasalhar, não caria preso ao
berço, mas andaria livremente pela casa; não comeria alimentos so sticados, mas
comeria frutas e pães e beberia água. En m, sua educação inicial seria oposta àquela
praticada à época e, por esse motivo, Rousseau a chamava de educação negativa
(ROUSSEAU, 1973).

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O nosso olhar contemporâneo já de início identi ca a proposta de Rousseau como
total loucura! Como seria possível que uma criança não recebesse os cuidados básicos
que sua tenra idade necessitava? Porém, o que o lósofo vem questionar é
exatamente essa certeza da necessidade dos cuidados que consideramos básicos.
Para ele, toda a atenção que se dava à criança em seus primeiros anos de vida eram
práticas que levavam o homem aos maus hábitos. Por exemplo, o fato de se pegar a
criança todas as vezes que ela chorava, levaria a pequena a entender que, para ter
suas vontades satisfeitas, bastaria chorar, mesmo que não tivesse nenhum motivo
para isso, pois o que importaria era que seu desejo seria atendido por um adulto. Com
isso, não estaria ele formando mais uma vez o homem de seu tempo, que sempre
quer ser atendido conforme suas vontades, sem pensar nos demais e nas
necessidades alheias? Tente analisar as ideias de Rousseau de um ponto de vista
losó co e você perceberá que elas possuem coerência.

Educando a criança nesses moldes, Rousseau acreditava que conseguiria sanar os


problemas de sua época, pois uma sociedade melhor só seria possível com um
homem melhor.

Porém, aqui surge uma dúvida: como seria possível educar o homem para a sociedade
sendo que ele estava afastado dela, vivendo no campo e aprendendo a ser o oposto
do homem social? Quando falamos de vida em sociedade, precisamos entender que o
que rege a sua organização são as leis, e estas julgam quais dos nossos
comportamentos são aceitáveis ou não. Ou seja, a sociedade indica quais valores

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morais são cabíveis ou não em sua estruturação. Cassirer (1999) nos auxilia nessa
questão e responde a essa pergunta sobre quais os valores morais que devem
conduzir a vida em sociedade, da seguinte maneira:

Os verdadeiros princípios da moral não se fundam em qualquer autoridade seja


humana seja divina, nem no poder da prova silogística. São verdades que só se deixam
apreender intuitivamente; mas justamente essa intuição não é negada a ninguém, pois
constitui a força fundamental e a essência do próprio homem (CASSIRER, 1999).

Com essas palavras, Cassirer expressa uma das grandes novidades do pensamento
rousseauniano para a época. O homem aprende quais valores morais devem conduzir
sua vida em sociedade a partir do momento em que ele olha para dentro de si mesmo.
Ou seja, ao ouvir os apelos da natureza, o homem não caria abandonado e sem
rumo. Sua natureza, conduzida por uma educação natural, lhe daria a resposta sobre
como deveria agir, quais os valores lhe fariam bem e quais ações lhe seriam
prejudiciais.

Isso signi cava que Rousseau depositava tamanha con ança no homem e na
educação que esse deveria receber a ponto de lhe dizer que, para ser feliz novamente,
era preciso se ouvir, se cuidar, assumir quem de fato ele era sem ter medo de sofrer
represálias, pois a felicidade e a justiça aconteceriam quando cada indivíduo se
descobrisse como único, ao mesmo tempo em que entendesse que isso não o faria
melhor ou superior aos demais, mas os colocaria em pé de igualdade, pois a essência
humana seria a mesma.

O fato é que ser único signi cava que cada indivíduo era responsável por si, sem
precisar agradar a ninguém. Quando essa autorresponsabilidade era compreendida
por todos, o resultado era uma rede de pessoas que tinham interesses em comum,
ideais coletivos e objetivos que juntos não gerariam discórdia, mas união. Essa
resposta parece um tanto utópica, não é? Pois, de fato, ela o é mesmo! Contudo, ser
utópico para Rousseau não signi cava que suas ideias não poderiam existir, apenas
que ainda não havia nenhum outro homem que tivesse tentado colocá-las em prática
(ULHÔA, 1996).

Portanto, Rousseau é um referencial daquilo que consideramos um lósofo da


educação. Mas não somente ele! Prossigamos o nosso estudo re etindo a respeito do
trabalho de outros pensadores.

039
Apesar de termos nos concentrado no pensamento pedagógico de
Rousseau, ele foi um autor que trabalhou diversos temas ao longo de
sua vida. Rousseau se interessava por botânica, medicina, música,
história, educação, política, etc. Para conhecer outro trabalho realizado
por ele, disponibilizo o link de uma de suas composições musicais,
intitulada Le devin du village (O adivinho da aldeia), composta pelo
lósofo no ano de 1752. Para quem gosta de música clássica, essa
composição expressa bem o gênio rousseauniano:

O vídeo está Disponível aqui

040
06

A Educação em
Augusto Comte

041
O Positivismo de Comte -
Sociedade, política e
ciências: a educação
positiva
Prossigamos com nosso conteúdo, agora falando a respeito do pensamento do
lósofo Augusto Comte. Isidore Auguste Marie François Xavier Comte nasceu no ano
de 1798, na cidade de Montpellier, França. Seu pai era funcionário público e sua vida
sempre foi muito simples desde a infância. Comte estudou na escola politécnica, que
era uma novidade para a sua época, pois, além de ter sido inaugurada quatro anos
antes de seu nascimento, também representava a conquista pelo direito de uma
educação que todos poderiam ter acesso. Isso não signi cava que essas escolas
fossem totalmente gratuitas, mas que não se destinavam a uma única classe, pois
todos tinha acesso a elas, tornando o conhecimento cientí co de acesso público
(CAMBI, 1999).

Desde jovem, Comte tinha uma visão diferenciada de sua época. Certamente porque
viveu no período da Revolução Francesa, viu de perto as barbáries do con ito de
classes e as lutas entre burguesia e revolucionários, acreditou que seria possível
constituir uma ordem social diferente daquela vigente. Porém, ele era pobre e sem
qualquer reconhecimento público; encontrar espaço para divulgar seus pensamentos
não seria tarefa fácil. Somente a partir do momento em que conseguiu trabalho como
secretário do Conde Henri de Saint-Simon é que pôde apresentar para a alta
sociedade francesa aquilo que tinha em mente sobre como deveria funcionar a política
daquele período. Em 1826, criou o Curso de Filoso a Positiva, que daria início à teoria
sobre o signi cado das ciências, da política, da sociedade e da educação.

Tudo começa com a seguinte re exão: a sociedade atual é decadente e está cada dia
mais a caminho da ruína! Ou seja, o movimento revolucionário havia despertado em
Comte o sentimento de que os valores morais que sustentavam a pirâmide da
estrutura social francesa estavam sendo derrubados. Não que os costumes da
monarquia fossem os mais assertivos na condução do povo, pois havia reivindicações
populares que tinham seu grau de razão e verdade quando se diziam descontentes
com o velho regime. Portanto, para acabar com toda aquela contenda, era necessário
um novo regime, uma nova lei, em suma, uma nova sociedade (COMTE, 1983).

042
Ao olhar para o modo como o homem, sobretudo o revolucionário, se comportava em
sociedade, Comte não acreditava que aquilo era o resultado da corrupção humana,
assim como supunha outros pensadores como, por exemplo, Rousseau. Para ele, tais
comportamentos de guerra e críticas intensas representavam que o caminho que a
humanidade deveria percorrer para a evolução da espécie estava acontecendo
naturalmente, e tudo aquilo era transitório.

Graças a um contraste que, em nossos dias, deve parecer de início


inexplicável, mas que, no fundo, está em plena harmonia com a
verdadeira situação inicial de nossa inteligência, num tempo em que
o espírito humano está ainda aquém dos mais simples problemas
cientí cos [...] (COMTE, 1983, p. 44, grifo nosso).

A humanidade deveria passar por três estágios: teológico, metafísico e positivo.


Segundo Comte, o período no qual ele vivia estava no segundo estágio, mas que logo
caminharia para o terceiro e último, graças à novidade trazida por sua loso a.
Vejamos o que signi cava cada um desses estágios:

Teológico: vivido pelos homens pré-históricos, foi o período no qual a crença


humana supunha que o que governava o mundo eram seres celestes e as
divindades, e a fé em um único Deus era o momento mais avançado do estágio
teológico.
Metafísico: é o estágio intermediário, no qual a crença nos deuses se encerra,
surgem as revoluções populares e se questiona o poder estabelecido. A incerteza
sobre o que é a vida em sociedade, qual a origem do homem e se Deus existe são
traços fortes desse estágio.
Positivo: sendo o último estágio, é quando a humanidade acaba com as dúvidas
sobre sua origem, pois não mais se questiona sobre ela, isso porque não importa
mais o antes, mas o que vale é o agora! Acaba-se a fé monoteísta, que é
substituída pela fé na humanidade, ou seja, o centro do universo é o próprio
homem e aquilo que ele vive e faz. Sem adorar qualquer Deus, o homem
descobre que ele é o responsável pela criação, pela morte, pelas alegrias e
tristezas que o circundam.

Acreditando que a humanidade deveria se resumir apenas no tempo presente, sem se


preocupar com questões históricas e de seu passado, Comte estava preocupado em
solucionar o con ito de classes que existia em sua época. Por mais que ele tenha
escrito após o período revolucionário e não estivesse mais presenciando os con itos

043
sociais, sua intenção foi a de organizar o pensamento desestruturado que ainda
perdurava na população. Os resquícios do con ito habitavam a mente das pessoas,
que ainda se sentiam perdidas em meio a tantas mudanças políticas e sociais (BERGO,
1983).

É por isso que o estágio positivista não parava por aí: sua intenção primeira era alterar
o modo como o homem pensava, a começar por uma nova interpretação de
a rmativas básicas construídas com o passar do tempo. Vejamos sobre elas:

A explicação sobre a origem do homem não deveria ser religiosa, mas cientí ca.
Isto é, ao falar sobre a espécie humana, o instrumento utilizado deveria ser os
dados, os números e tudo aquilo que pudesse ser demonstrado.
A natureza humana é relativa. Isso signi cava que não havia uma determinação
sobre o porquê o homem existe, tampouco a necessidade de se pesquisar sobre
qual a nossa origem, qual o lugar em que estamos e para onde iremos. Essas
perguntas que são clássicas da loso a se tornam irrelevantes no pensamento
comtiano, visto que, tanto o homem quanto o seu conhecimento são relativos e
temporais.
Sem se preocupar com o movimento dos tempos, o positivismo de Comte a rma
que as leis naturais são invariáveis, ou seja, não se alteram. Por esse motivo, ao
conhecer o homem hoje, o conhecerei amanhã. O mesmo se daria com as
ciências: ao estudar a biologia humana, a sociologia, a matemática, a astronomia,
a física, a antropologia e a química, as leis seriam as mesmas em qualquer
espaço e tempo. Com isso, o positivismo tratava de um conhecimento universal e
que caminharia unido um ao outro, sendo uma ciência complemento da
seguinte. O resultado seria uma loso a sã, sem deuses e sem con itos
ideológicos.

Todos esses conceitos formavam basicamente a ideia que Comte elucidava para a
organização social e da espécie humana. E semelhante aos demais pensadores
tratados até aqui, o que valida o seu pensamento numa re exão pedagógica é o fato
dele compreender que a educação seria o caminho mais assertivo para se alcançar o
desenvolvimento de seu projeto losó co.

044
A Educação Positivista
Comte, ao falar sobre educação, criou um passo a passo sobre como ela deveria
acontecer. Vejamos de que forma o autor formulou o seu raciocínio.

Todos nós nascemos dentro de uma sociedade, certo? Para Comte, o papel dessa
sociedade era o de retirar o indivíduo de seu egoísmo, ou seja, mostrar para ele que a
humanidade é formada por muitos e que estes devem se ajudar mutuamente. Esse é o
papel da sociedade: educar o homem para se dispor ao outro, gerando uma
personalidade altruísta, isto é, que se solidariza com o próximo (MESQUIDA, 2012).

Ao tratar sobre solidariedade, Comte se referia ao aprendizado do amor que deveria


ser ensinado pela mãe, que seria a principal responsável pela formação humana da
criança, ensinando-lhe desde os primeiros anos de idade a amar a sua espécie,
respeitar a hierarquia daqueles que lhe são mais velhos e superiores e se desenvolver
conforme os bons exemplos que adquirir ao longo de sua vida.

A educação começa com a vida, sendo que a humana se divide em três fases:
ascendente, estacionária e descendente. A fase na qual toda a educação positivista se
desenvolveria seria a ascendente, e as outras seriam a da idade adulta e a da velhice.
Vejamos um pouco mais sobre o estágio ascendente.

Ele ocorreria até os 28 anos de idade. Nela estariam os períodos mais importantes da
identi cação da criança com o seu grupo. Guiada pela mãe, a criança desenvolveria os
seus sentidos e bons hábitos. Aqui, ela deveria aprender sobre educação estética, que
é o gosto pela dança, arte, música, etc., ao mesmo tempo em que conheceria sua
língua materna e todas as outras que pudesse aprender. Seus sentidos deveriam ser
treinados pela mãe, que lhe ensinaria a ser afetuosa, carinhosa e bondosa (COMTE,
1983).

Como é possível perceber, o sucesso desse estágio dependeria majoritariamente do


cuidado que a mãe reservasse ao acompanhamento da criança, tendo a missão de
deixar em sua memória boas lembranças e recordações marcantes de sua infância. O
que acompanharia esse estágio seriam os valores morais que se resumiriam no
respeito às tradições e aos costumes de sua família e pátria. Isso levaria a criança para
uma vida harmoniosa em sociedade, pois a veneração, o apego e a bondade são
motores que a impulsionariam na vida social.

045
A educação começaria em casa, mas seria concluída na escola, e essa seria pública. Ou
seja, conduzida pelo governo, a escola receberia a criança com os ensinamentos
básicos vindos de casa, e sua tarefa seria potencializar todos os preparos familiares
com um conhecimento cientí co, que se daria pelas ciências positivas em três níveis
de estudos:

1º Estudo da existência universal e do mundo – pelas disciplinas de matemática,


astronomia, física e química, o aluno compreenderia a formação do universo, aquilo
que o compõe e qual a ordem estrutural das coisas.

2º Estudos acerca da vida – nessa fase, ele aprenderia os conteúdos de biologia,


sociologia, geogra a, história, economia e direito. Partindo de uma leitura biológica
sobre o que é a vida, o aluno seria encaminhado para uma re exão acerca do
desdobramento dês sa na sociedade, sua organização política, o modo como vive cada
cultura e a maneira que se organizam politicamente.

3º Base da conduta futura – aqui entraria a base moral, ou seja, o ensinamento sobre
os comportamentos válidos em sua sociedade, o que deve ser respeitado ou não,
repetido ou ignorado, incentivado ou reprimido para que a vida em sociedade possa
funcionar em plenitude.

Essa proposta demonstra uma preocupação latente de Comte com a existência de


uma ordem universal que dominasse o homem e as ciências ao seu redor. Com isso, a
sociedade teria pleno controle sobre a vida de cada homem, bem como daquilo que
ele pensasse, sentisse, e a forma como ele enxergaria o mundo, pois todos os seus
passos estariam determinados e prontos para serem postos em prática por uma
educação concluída e pré-elaborada.

046
O pensamento comtiano é muito organizado! Ele estruturou a
humanidade em período e fez o mesmo com as ciências, dando-lhes um
começo, um meio e um m (no sentido de nalidade). Desse modo,
Comte acreditava que se as ciências fossem positivadas, haveria um
momento em que seria possível ter controle total sobre as ciências, a
sociedade e até mesmo do homem. Parece algo muito futurístico, não
é? Mas isso já existe! Alguns cientistas defendem a possibilidade de se
produzir e utilizar “pílulas” para acabar com o sofrimento gerado pelo
m de um relacionamento, até porque, quem nunca sofreu por amor
que atire a primeira pedra!

Fonte: Disponível aqui

047
07

A Educação em
Michel Foucault

048
A escola como partícipe
das “instituições
disciplinares”
Dando alguns passos adiante, analisaremos agora o pensamento contemporâneo do
pensador Michel Foucault.

Foucault nasceu em Poitiers, na França, no ano de 1926. Sua família era


tradicionalmente de médicos, o que lhe garantiu uma infância estável e confortável.
Aos vinte anos de idade, estudou psicologia e loso a na Escola Normal Superior, e em
1952 se diplomou na área de psicopatologia. A partir dali, iniciou sua carreira como
docente na Universidade de Lille, onde seu trabalho ia além de uma re exão histórica,
mas buscava compreender os mecanismos que levavam às pessoas em sociedade a
seguirem determinados padrões comportamentais, afetivos, sexuais, etc.

Após algum tempo como professor, publicou a obra “A história da loucura”, um


trabalho que surgiu a partir de sua tese defendida em 1961. Por essa obra, Foucault
começou a ganhar visibilidade externa e era convidado a participar de debates, dar
entrevistas, palestras e a falar para o grande público sobre suas ideias. Ele faleceu no
ano de 1984 por complicações em decorrência do vírus da AIDS, do qual era portador.

Semelhante a Thomas Hobbes, Foucault não foi um pensador que dedicou o seu
trabalho a re etir diretamente sobre o contexto educacional. Suas obras tratavam
sobre a ideia de homem e como ela havia sido instrumentalizada pelas instituições.
Moldando os indivíduos conforme suas pretensões, as diversas instituições engessam
o processo de desenvolvimento humano, limitando o seu trabalho a fazer com que os
homens apenas respondam aos seus anseios, validando com essa atitude o seu poder
sobre todos eles. Suas análises levaram em consideração a ideia de que o per l de
homem constituído em cada contexto histórico foi moldado pelas instituições sociais
(LEBRUN, 1985). Isso caracterizou aquilo que consideramos em Foucault como uma
abordagem ao discurso, ou seja, as ideias que levaram as pessoas a serem aquilo que
elas são, a agir da maneira que agem frente ao outro, frente às coisas, frente aos
valores morais e, frente a elas mesmas (MUCHAIL, 1985). Nessa perspectiva,
encontramos o viés educacional de Foucault, pois a escola enquanto instituição social
também cumpre com o papel de formar cidadãos e disseminar em seu interior um

049
tipo de disciplina, de ideias e re exões que complementam o per l de homem que ela
entrega para a sociedade. Por tal re exão, falaremos a respeito de Foucault enquanto
lósofo da educação.

O autor em questão se encaixa, num primeiro momento, na abordagem


fenomenológica que, trabalhando numa perspectiva antropológica, leva seus leitores a
compreender a seguinte a rmativa: não há uma de nição do que seja o homem.
Vamos entender um pouco melhor essa questão: sabe quando ouvimos dizer que
cada pessoa tem um dom ou que nascemos destinados a alguma coisa, ou então que
há pessoas que nascem boas e outras nascem ruins? Para a fenomenologia, isso não é
verdade! Cada indivíduo se constitui e se descobre conforme as experiências, os
movimentos históricos, sociais e políticos que vivencia, que formam a sua existência e
lhe trazem signi cado enquanto pessoa (NICOLA, 2005).

Foi por essa linha que caminhou a re exão de Foucault; inspirado nos pensadores
gregos, que nunca chegaram a uma de nição do que fosse o sujeito, seu trabalho
como um todo se dedicou a se opor à ideia de uniformizar o comportamento humano
(FOUCAULT, 1994). Para ele, as instituições sociais possuem mecanismos próprios que
cumprem com a função de gerar homens e mulheres “iguais”. O sentido aqui não é de
“igualdade” em que todos têm as mesmas oportunidades. Não! As instituições são
aquelas que, segundo Foucault, mecanizam o ser humano e o fazem agir conforme lhe

050
é solicitado pelo sistema. A escola e seus agentes se enquadram nessa interpretação,
sendo também uma das instituições responsáveis atualmente por moldar o homem
conforme os interesses daqueles que governam (CARVALHO, 2014).

Quando falamos em “agir conforme o sistema”, a crítica foucaultiana vai mais a fundo,
identi cando aquilo que as instituições sociais promoveram ao longo dos anos para
construir o per l de homem civil que almejavam. Por uma arqueologia do saber, ou
seja, numa escavação história sobre como se deu os diálogos e as relações de poder
nas principais civilizações ocidentais, Foucault contextualizou o seu século e constatou
que as instituições que o compunham produziam, cada uma em sua especi cidade,
um saber que levava o homem a um posicionamento uniforme e dominado por
ensinamentos padronizados, isto é, que levavam os indivíduos a pensarem e agirem
de maneira igual, reproduzindo comportamentos semelhantes (MUCHAIL, 1985).

A questão para Foucault não se reduzia a ideologias que eram ensinadas nas
instituições. O que ele percebeu foi que, mais que ideologias transmitidas, essas
instituições disciplinares trabalhavam para conduzir o homem em todos os seus
aspectos. Isso acontece quando o sujeito é retirado de sua privacidade e levado para
um determinado local onde passará horas, por vezes dias, a seguir prescrições de
como deve se portar, como agir, o que comer, como falar, o que deve sentir ou não,
amar ou não, etc.

Foucault traz vários exemplos de instituições que possuem essa função: a prisão, o
hospital, o exército, a sessão de terapia, o trabalho e, por m, a escola. Todos esses
cumprem, conforme sua expertise, com a função de formar o homem nos moldes da
sociedade na qual ele está inserido. Apesar da diversidade cultural e das mudanças de
uma sociedade para a outra, praticamente todas caminham no mesmo intuito, que é o
de fazer o indivíduo obediente, submisso, cuidadoso e pací co. Até o nal da Idade
Média, o método utilizado por tais instituições era o da força física, ou seja, por meio
de castigos corporais se ensinava ao indivíduo como ele deveria agir: na prisão, era a
solitária; nos hospitais psiquiátricos, eram os tratamentos de choque; na escola, a
palmatória, a humilhação verbal, etc. Após esse período, a estratégia mudou para
aquilo que Foucault chamou de docilização do corpo (FOUCAULT, 1994).

Semelhante aos demais lósofos da educação, Foucault foi um pensador que


identi cou em sua sociedade um sistema de formação do homem que tinha um
ordenamento muito claro em todas as suas ações, sendo essas intencionais. A
docilização do corpo se deu a partir do momento em que as instituições sociais
deixaram de ser locais de suplício para administrarem o seu atendimento por meio do
ensinamento. Ao invés de obrigar o homem pela força física a cumprir com aquilo que

051
se exigia, a disseminação da ideia de aprendizado, formação, reeducação e outras
palavras clichês levaram o homem a aceitar o status de aprendiz, ou seja, alguém que
precisava estar disponível a se desenvolver, modi cando seu comportamento em prol
do seu bem estar no cenário social (CARVALHO, 2014).

Com isso, o sujeito se desenvolveria para atender aos interesses governamentais, sem
levar em consideração o que de fato é seu enquanto pessoa, e perdia a oportunidade
de vivenciar a experiência de ser homem pelos seus próprios interesses, sua própria
vontade e aquilo que lhe chamasse a atenção.

Contudo, podemos supor que ninguém em sã consciência renunciaria a sua liberdade


em prol de uma causa que não lhe fosse justa, ou que não lhe dissesse nada! Por esse
motivo, os ensinamentos transmitidos ao homem pelas instituições são “verdades”
prontas, inquestionadas e que devem ser assimiladas por aqueles que delas se
aproximam.

[...] é preciso indagar até que ponto o que se cogita para a Educação –
como processo de socialização da cultura da vida, no qual se
constroem, se mantêm e se transformam saberes, conhecimentos e
valores – não passa de redundância das condicionantes matrizes de
saberes e comportamentos aos quais os sujeitos estão submetidos ao
longo de suas experiências com a instituição escolar (CARVALHO,
2014, p. 110).

Numa disciplina constante de nossos corpos e comportamentos, Foucault a rmou que


o indivíduo é instruído diariamente para que se torne um ser normalizado. Ou seja, o
que se pretende é introduzi-lo num modelo existencial considerado como bom e
correto, que deverá ser posto em prática em determinada cultura e sociedade, a m
de avaliar o comportamento de cada indivíduo. Isso signi ca que homem em
sociedade é submetido a um exame moral constante: se é bom e normalizado quando
se cumpre tudo o que se pede, se é ruim e anormal quando não consegue se adequar
a todas as regras estipuladas (FOUCAULT, 1994).

O homem moderno carrega em si esse valor moral e, por vezes, o desejo por ser
aceito (porém, isso não é uma regra!). Para validar sua necessidade de participação e
associação no grupo, a escola se torna o local privilegiado para que a adequação ao
padrão esperado seja alcançada. Vejamos como isso acontece: a criança é retirada de
sua casa, levada para um estabelecimento onde passará por volta de cinco horas ou
mais distante de sua família, e lá ela deverá cantar quando lhe pedirem, formar la, se

052
sentar, escrever o que a mandarem, ler ou fazer silêncio, sempre atenta às ordens que
lhe forem dadas. Caso ela consiga cumprir com tudo aquilo que lhe for pedido ao
longo daquele período, ela será considerada apta, isto é, normal. Se o resultado for
diferente do esperado, o que teremos é uma criança fora dos padrões, tida como
desajustada, anormal (MOREIRA, 2018). Todas essas práticas, bem como a
organização, o formato, a cor e os materiais utilizados na escola, servem como entes
normalizadores da criança.

A escola é somente um exemplo desse sistema que permeia todo o cenário social.
Foucault trouxe em suas ideias a compreensão de uma sociedade que se move por
interesses bem articulados, isto é, todas as suas ações são intencionais (CARVALHO,
2014). O problema disso tudo é que o homem acaba vivendo sob cautela, sem ter a
oportunidade de se conhecer e crescer enquanto indivíduo consciente. É como se ele
vivesse numa espécie de prisão, constantemente vigiado. Sobre essa perspectiva
Foucault utilizou em sua teoria o pensamento de Bentham.

Em 1785, o lósofo e jurista Jeremy Bentham idealizou a prisão perfeita, chamada de


pan-óptico. Numa estrutura circular, as celas estariam no entorno da obra, o que faria
do centro um espaço vazio, preenchido somente por uma guarita, ou seja, uma
construção também circular, porém, de vidros ou grades que não permitissem ao
prisioneiro saber se estava sendo observado ou não. Sabendo que ali dentro haveria
um guarda, porém, sem nunca saber em qual momento ele era visto pelo mesmo, as
chances de tentar fugir ou de gerar uma rebelião seriam reduzidas drasticamente.

053
Figura 1: Estrutura do pan-óptico

Foucault se utilizou dessa ideia ao descrever o homem moderno e a sua realidade


social. Segundo ele, vivemos numa sociedade pan-óptica, na qual somos vigiados a
todo tempo, por diversos meios e lugares. Nas escolas, nas ruas, nas igrejas, nos
presídios, etc., o indivíduo é cercado por agentes que observam o seu comportamento
e estão prontos para lhe aplicar uma punição. Ambiguamente, cumprimos com o
papel de observados, mas também de observadores, ou seja, os que “atacam” aqueles
que ousarem fugir do padrão e se comportarem de maneira anormal. Nossa punição
não é física (como já dizia Foucault), mas moral, pois julgamos e excluímos os que não
se enquadram nos ensinamentos transmitidos pelas instituições e que ferem a
obediência e a servidão culturalmente aceitas no ambiente social (FOUCAULT, 1994).

A re exão de Foucault e aquelas trazidas pelos demais pensadores trabalhados até


aqui nos auxiliaram na compreensão de como se expressou, e ainda se expressa a
crítica losó ca dada à educação. É pelo conhecimento de seu período, bem como
pela intenção de promover um debate a respeito dos fatores que in uenciam e
delineiam a educação e suas expressões, que esses intelectuais da educação
contribuíram para a promoção de sua época e de um conhecimento que levasse o seu
período e/ou os posteriores a uma análise de suas certezas e expressões do saber
pedagógico. Espero que até aqui você possa ter me acompanhado e compreendido
todo o esquema de re exão proposto. Continuemos a nossa re exão na aula seguinte.

054
O escritor George Orwell escreveu uma obra intitulada “1984”, em que
conta a história de Winston, um homem que vivia numa sociedade
completamente dominada pelas ordens do Estado, em que cada
cidadão, apesar de ser obrigado a viver sozinho, cumpria com a mesma
ordem que era dada para todos. A única forma de contato que o
indivíduo tinha com outra pessoa era por meio de uma câmera e áudio
por onde lhe eram passadas as ordens que deviam ser cumpridas.

O livro foi publicado no ano de 1949, e apesar da distância que existe


entre a época na qual foi escrito e os tempos atuais, ele retrata como
que por mágica muitas das nossas questões sociais. Programas de TV
foram inspirados nessa obra e, mesmo sendo um conto de cção, suas
tramas nos levam a uma re exão sobre a vida vigiada e conduzida por
ordens externas que muito se assemelham a nossa.

Acesse o link Disponível aqui

055
08

Filosofia da
Educação no Brasil

056
As primeiras expressões
da construção da
disciplina de filosofia da
educação no Brasil
Olá, aluno(a)!

Até a nossa aula número 7, vimos o pensamento de alguns lósofos que se


aproximavam em suas leituras acerca de seu tempo com a re exão educacional. A
estes denominamos como lósofos da educação, pois souberam em seu contexto
apresentar ideias que não se contentavam em aceitar o quadro educacional e/ou
político vigente. Porém, vale questionar se a compreensão sobre o pensamento de tais
autores de ne a ideia de loso a da educação. Para isso, devemos olhar para a
história da disciplina em si e identi car o modo como ela foi construída, bem como o
que deve caracterizar sua práxis.

A Filoso a da Educação enquanto disciplina curricular sempre esteve atrelada à


disciplina de História da Educação, isso porque tal conteúdo não possuía autonomia
para se desvincular e criar um campo de saber próprio. Pelo menos foi assim até o ano
de 1970, quando se inauguraram no Brasil os primeiros cursos de pós-graduação em
Educação (AGUIAR; WELLER, 2016). O que se via a partir desse momento era bem mais
que o surgimento de uma nova área do saber educacional e losó co, mas
principalmente a autoanálise que a loso a fazia sobre sua atuação frente ao campo
pedagógico.

Semelhante a essa ideia, Pagni (2014) também nos apresenta que o caminho utilizado
para se autoa rmar enquanto campo do saber autônomo se deu pela leitura do
pensamento educacional dos autores das escolas losó cas. Ou seja, semelhante ao
que zemos aqui em nosso curso, a loso a da educação se constituía pelo
conhecimento de autores que discorriam a respeito da educação em suas loso as,
tratando-a numa perspectiva analítica e crítica (PAGNI, 2014).

Contudo, alguns passos estavam por serem dados, e a autocrítica da importância


dessa disciplina tomava o debate acadêmico com a seguinte questão: estudar loso a
da educação se resume em conhecer o pensamento dos lósofos que tratam a

057
respeito da educação ou ela deve ser interpretada por outras vertentes de re exão?
Alguns trabalhos se tornaram pioneiros nessa tarefa de compreender qual era a
verdadeira identidade da loso a da educação, a começar pela obra de Paulo
Ghiraldelli Júnior (2000). Pagni a rma que Ghiraldelli demonstra em sua obra “O que é
Filoso a da Educação”, a busca por responder à problemática levantada alguns anos
atrás por Saviani (1983) e Dumerval Trigueira Mendes (1987) sobre a identidade da
loso a da educação e como ela poderia estar menos desvinculada de uma crítica à
política (PAGNI, 2014). Esse trabalho de nia um norte para a área, compreendendo
que, até aquele momento, ela estava mais próxima à loso a que da educação em si.

Professor Dermeval Saviani – um dos pioneiros da Filoso a da Educação

Um outro autor que merece destaque é o professor Antônio Joaquim Severino, sobre
quem Pagni diz

Alguns trabalhos de Severino (1990; 2000) parecem se situar num


momento de transição em que, sem abandonar por completo a
tradição [...]. O resultado desse movimento do campo foi, senão a
manutenção de uma saudável inde nição enquanto tal, ao menos
certa pluralização do debate e a multiplicação de perspectivas
teóricas [...] (PAGNI, 2014, p. 777)

058
Ou seja, por meio de Pagni, podemos compreender que Severino leva em
consideração a validade em discutir sobre o pensamento dos lósofos a respeito da
educação, porém, não seria somente essa a identidade dessa área de conhecimento,
sendo possível ao pensamento losó co educacional ir além dessa perspectiva.

Compreender o movimento de identi cação da loso a da educação enquanto fato


histórico é perceber que, semelhante à loso a e a educação em si, esse campo do
saber não seguiu uma trajetória linear, tampouco se de niu de modo exato e objetivo.
O seu saber passou pelo processo de aceitação por parte da academia e de seus
teóricos, sobretudo no campo losó co, em que tal disciplina precisou conquistar seu
espaço e respeito no cenário universitário brasileiro. Albuquerque demonstra em seu
trabalho, oriundo de pesquisas de campo, qual a percepção que os cursos de loso a
tinham a respeito da disciplina de loso a da educação. Assim, ela a rma que:

[...] a disciplina Filoso a da Educação é concebida como “coisa de


educadores”, ou seja, é relativa às Faculdades de Educação e não às
Faculdades de Filoso a as quais, por sua vez, estariam mais
preocupadas com aqueles saberes que têm mais tradição no campo
acadêmico ou com os saberes de natureza mais teórica e, portanto,
menos aplicada como parece ser o caso da educação (ALBUQUERQUE,
1998, p. 50).

A veri cação desse cenário no qual a relação entre loso a e educação era vista como
útil somente para um dos lados enfraquece a ideia de uma aliança equilibrada. Quem
está para quem: a loso a está para a educação ou é a educação que “necessita” do
pensar losó co?

De modo geral, a década de 1990 retratou que a segunda a rmativa era a mais
correta, tendo em vista que a percepção do saber losó co dado à educação deveria
passar pela leitura dos pensadores clássicos, privilegiando a ação da loso a e não o
da educação. Albuquerque apresenta essa realidade em sua pesquisa de campo com
trinta programas que possuíam a disciplina, constatando a seguinte realidade no
cenário educacional brasileiro daquela década:

A evidência empírica da existência de uma certa ênfase na loso a em


relação aos aspectos mais pedagógicos pôde ser observada tanto na
literatura que se propõe a explicitar essa problemática, quanto na
análise dos trinta programas da disciplina Filoso a da Educação.

059
Alguns desses programas atribuem um certo privilégio a temas da
loso a ou, de maneira sutil, eles arrolam como conteúdo temas de
loso a da educação, mas muitas vezes terminam enfatizando
primeiro a loso a para depois chegarem à educação, se é que de
fato chegam até ela (ALBUQUERQUE, 1998, p. 50).

Além dessa re exão levantada por Albuquerque sobre o modo como a loso a da
educação era compreendida nos programas de educação e licenciaturas nos anos
noventa, temos Paviani, que faz um trabalho muito próximo, porém, com foco nos
per s das disciplinas em si.

Para o autor, há várias realidades de programas de loso a da educação que são


utilizados pelos cursos de pedagogia e outras licenciaturas. O primeiro e mais comum
é aquele no qual se trabalha o pensamento dos lósofos, apresentando os seus textos
e o modo como eles questionaram sua sociedade. O segundo per l é aquele que
introduz o aluno em leituras sobre a educação, numa perspectiva losó ca, seja do
ponto de vista da lógica, da política, da estética ou da ética. A terceira e mais
adequada, segundo Paviani, é trazer o aluno à re exão sobre o que é e o porquê da
loso a e do losofar. Mesmo que se utilize de textos clássicos, a leitura deles em cada
época chamará a atenção do aluno conforme os problemas vigentes. Partindo desse
processo de aprender a losofar, a produção do conhecimento será consequência de
todo trabalho (PAVIANI, 1987).

De nada valeria levar o aluno ao conhecimento histórico sem trazê-lo para uma
re exão atual, ou seja, sobre a educação vigente e os seus desa os, de modo crítico e
organizado (PAVIANI, 1987). Contudo, analisando os per s elencados por Paviani,
poderíamos nos perguntar: onde está o conteúdo pedagógico nesses modelos de
programa? A resposta do autor é a seguinte:

O exercício da consciência crítica diante das ciências, das ideologias,


dos costumes e dos comportamentos permite a integração do
pensamento e da ação, favorece o espírito democrático, forma o
senso de tolerância e de respeito e atendimento dos interesses e
necessidades dos mais diversos segmentos sociais. A loso a da
educação, neste sentido, tem a função de questionar o homem
situado concretamente no tempo e no espaço a partir de uma
re exão radical e global, tarefa que as ciências não têm condições de
efetivar (PAVIANI, 1987, p. 17).

060
Partindo desse princípio analítico, adentramos o pensamento de Mazotti (1999), que
amplia a de nição de loso a da educação, considerando-a como uma área cientí ca
do saber. Ou seja, deixando de interpretar o pensamento educacional de cada lósofo
como meros discursos de opinião, se concentraria todo esse conhecimento em
a rmativas que seguissem uma lógica, alinhados sistematicamente, de modo que
pudessem ser justi cáveis na teoria, mas também na prática, conforme nos apresenta
Mazotti:

É no âmbito da loso a racional, seja ela qual for, que a loso a da


educação pode ser posta como uma disciplina que tem por objetivo a
elucidação dos conhecimentos educacionais e das teorias
pedagógicas. Nesse caso, o objeto da loso a da educação é
constituído pelos conhecimentos e instrumentos necessários ao
esclarecimento determinado pelas características daqueles
conhecimentos (MAZOTTI, 1999, p.17).

Em outras palavras, seria dizer que o papel da loso a da educação era fazer todos os
esclarecimentos necessários para que a pedagogia funcione bem.

Por m, Pucci (1998) trouxe à discussão outra característica da loso a da educação,


considerando como sua identidade a problematização em si. Ou seja, a partir do
momento em que a loso a deixasse de fazer questionamentos, ela perderia sua
identidade. Guiado pelo pensamento de Adorno, Pucci a rmava que a positividade da
loso a, isto é, a utilização dela para um agir prático, seria descaracterizá-la, tendo em
vista que o seu grande diferencial é a inutilidade que essa possui para o mercado, pois,
ao mesmo tempo em que ela se auto a rma, em seguida já é possível que se negue e
contradiga tudo o que havia a rmado anteriormente. Seu produto gera prejuízo, não
vende porque a propaganda opositora é feita por ela mesma (PUCCI, 1998). Isso
resulta num saber indeterminado e lhe garante autonomia, mas ao mesmo tempo lhe
exige que não se acomode com os fatos, tampouco se conforme com as declarações
impostas, pois, seu compromisso histórico é com a verdade e não com os valores das
sociedades.

O mesmo é possível dizer sobre a loso a da educação, pois, ao se deparar com os


problemas pedagógicos, não é seu dever solucioná-los, mas a re exão que levanta
sobre o modo como eles são vistos, bem como o modo como ela própria os encara,
fazem desse saber um conhecimento puramente teórico, sem nenhum compromisso
com a práxis (PUCCI, 1998).

061
Olhando todos esses pensamentos, podemos a rmar que eles retiram o peso que a
loso a da educação carregava consigo, ou que ainda possa carregar. Isso porque o
seu saber, como dirá Pagni, se concentra na interpretação e na leitura dos diversos
caminhos que tal conhecimento pode percorrer, sem limitar-se a uma padronização de
conteúdos a serem transmitidos (PAGNI, 2014).

Desse modo, concluímos dizendo que não há uma de nição especí ca para o qual seja
o papel da loso a da educação. A leitura dos lósofos clássicos, a de nição que eles
trazem sobre o que é educação, a interpretação da educação por um viés lógico,
estético, ético ou político; a crítica losó ca sobre ela mesma e os caminhos
pedagógicos existentes, o pensar losó co como caminho para se gerar um educador
crítico, etc., todos esses foram e ainda são instrumentos válidos para se fazer loso a
da educação. É desse modo que essa disciplina está arquitetada nos mais variados
programas de pedagogia e licenciaturas, inclusive no nosso! Perceba que muitas das
de nições atribuídas a ela permeiam a nossa ementa. Isso nos põe no movimento
histórico como protagonistas de um saber que se constrói e se valida conforme as
necessidades do tempo e de cada espaço social.

Filoso a não é um conhecimento pronto! O mesmo se aplica à Filoso a


da Educação. Dizer o que funciona e o que não funciona não é o papel
dessa ciência, mas sua especi cidade se encontra na dúvida, no
questionamento, no levantamento de possibilidades e hipóteses.

Desse modo, a loso a da educação é um saber a se construir que


nunca está inteiramente pronto, pois o dia em que isso acontecer, ela
deixará de ser loso a e se tornará conhecimento técnico ou histórico.
Por esse motivo, o papel do lósofo da educação se caracteriza pela
exigência da criticidade, pela inconformidade com o óbvio e pela
vocação por querer sempre conhecer o novo, sem nunca se limitar a
uma única resposta. Fica a dica!

062
09

Principais
correntes filosóficas

063
Idealismo
Olá, aluno(a)!

Prossigamos com nossos estudos, agora falando sobre algumas das principais
correntes losó cas que estão presentes na história da loso a. Ver sobre tais
correntes losó cas se torna importante para que entendamos que nenhum
conhecimento é neutro e todo saber está imbuído de alguma ideologia, explícita ou
não.

O termo ideologia se tornou odioso nos últimos anos, principalmente pela onda de
protestos, noticiários e comentários em redes sociais dados num contexto político, em
que a todo momento o utiliza para designar alguma ideia falaciosa que se impõe sobre
a população. Todavia, ideologia na loso a nada mais é que um conjunto de ideias
que se a rmam, mas que podem ser debatidas, discutidas e reivindicadas. Ou seja,
ideologia está presente em qualquer lugar (ARANHA; MARTINS, 2016).

Nessa perspectiva, as correntes losó cas trazem algumas ideias que compõem
variados quadros de verdades, ou seja, pressupostos que se de nem como válidos
pelo ponto de vista nos quais são interpretados. Nossa intenção nesta aula é
apresentar somente três deles, mas que representam bem as principais expressões do
pensar losó co.

Começamos com a corrente losó ca do idealismo.

O idealismo tem suas origens na loso a de René Descartes (1596-1650).


Diferentemente daquilo que erroneamente por vezes se apresenta, o idealismo não é
de origem platônica, e o porquê vamos entender agora. Platão acreditava na existência
de dois mundos, sendo o nosso o lugar das cópias, da reprodução de um
conhecimento primeiro que não habitava a nossa realidade, mas pertencia a uma
outra dimensão, a um outro mundo (REALE, 1990). Esse segundo mundo era o das
ideias, onde a verdade sobre o homem e as coisas se expressava visivelmente e
continha a essência de tudo o que existe aqui. Ou seja, o que Platão defendia compõe
a corrente losó ca do realismo, não do idealismo.

O conceito de idealismo está amparado na de nição de ideia mesmo. É a


interpretação que cada indivíduo faz a respeito de algo, tomando para si o que é
verdadeiro ou falso conforme sua vontade. Descartes utilizou como princípio de seu

064
método a sua famosa máxima “Penso, logo existo”, que indicava a sua escolha pela
razão como aquela que conduziria todo o processo de descobrimento da verdade das
coisas.

A partir dessa certeza primeira, ele constrói toda a sua loso a,


tomando por regra geral que somente as coisas que concebemos
clara e distintamente são verdadeiras e com isso buscou eliminar do
universo a qualidade deixando apenas a quantidade, i.e, extrair do eu
um mundo de pontos e guras geométricas (MENEGHETTI, 2004,
p.374-375).

Levando em consideração a forma das coisas sem se deixar guiar pela aparência que
elas possuem, o idealismo cartesiano se propunha a simpli car ao máximo todo o
conhecimento e as possíveis verdades que ele hipoteticamente possuísse. Retirando
os excessos, caria somente o que poderia ser racionalmente validado para o sujeito
que o analisava, fazendo da verdade uma certeza oriunda do próprio homem. Com
isso, ele retirava a crença em qualquer outra coisa que não fosse o próprio indivíduo e
sua razão. Seria o mesmo que dizer: se temos cérebro, ele nos é su ciente para
pensarmos por nós mesmos, sem qualquer crença em deuses, energias cósmicas ou
qualquer coisa que fuja à racionalidade humana.

Essa foi somente a base do pensamento idealista, porém, encontramos sua


continuidade em autores tais como Immanuel Kant (1724-1804) e Georg Wilhelm Hegel
(1770-1831), cujas loso as dão continuidade a essa re exão na qual o conhecimento
das coisas ocorre pela interpretação do sujeito ora pela experiência, como é o caso de
Kant, ora pela razão pura, como a rmava Descartes. Em Hegel, a consciência, as ideias
e aquilo que consideramos como verdade ou não está em constante mudança, sendo
esse próprio movimento o que expressa a realidade e constrói a história, isto é, pela
expressão e posicionamento humano sobre os fatos que estão em eterna mudança. A
isso Hegel denominou de dialética. Esse termo não é novo na loso a, mas com ele
ganhava um outro caráter.

065
Materialismo Histórico
Dialético
A dialética de Hegel se tornou a base para o surgimento do Materialismo, que na
loso a de Karl Marx é compreendido como materialismo histórico dialético.
Dialética em Hegel era a compreensão que o lósofo tinha acerca da essência em si.
Diferentemente do pensamento clássico dos lósofos gregos que acreditavam que o
homem possuía uma essência imutável, Hegel defendia a tese de que a verdade, as
coisas, a natureza e o próprio homem estavam em constante transformação. O
movimento dialético se dava num ciclo composto por a rmações versus negações, que
resultavam em negações das próprias negações. Ou seja: tese, antítese e síntese
(CUNHA; CUNHA, 1999). Marx se utilizou dessa dialética para criar o seu materialismo.

A ideia de materialismo data muito antes de Marx, contudo, utilizamos de sua


de nição, pois suas ideias zeram contraste com todo o posicionamento da loso a
tradicional ao interpretar a dialética hegeliana e toda a história da humanidade de um
ponto de vista diferente. Marx utilizou da tese de que a matéria que provinha da
natureza havia sido modi cada pela ação do homem sobre ela com o passar dos anos.

066
Sua inteligência e capacidade racional o levaram a empregar sobre as coisas a sua
força e modi cá-las. Da madeira, ele fez a casa; da pedra uniforme, ele inventou a
roda; da rocha, ele a ou e criou suas armas. Todas as coisas que ele pudesse alterar
para o seu proveito, assim ele o fez! Contudo, essa mudança não se limitou aos
objetos, mas se estendeu ao seu semelhante.

Aquele que tivesse mais força se sobrepunha aos demais, e a relação que antes era de
igualdade encontrou uma hierarquia. Assim, cada um era de nido conforme o seu
trabalho, sua capacidade e poder sobre os objetos e os demais homens. Nessa
perspectiva, constituíram-se a sociedade e as classes sociais como fruto da criação
humana, em que cada membro possuía um lugar conforme suas habilidades e
importância adquirida. A partir dessa divisão, formavam-se, segundo Marx, a
consciência humana e a ideia de quem o homem era no mundo (SOUZA; DOMINGUES,
2009).

Perceba a diferença da corrente idealista para a material histórico: na primeira, a ideia


de quem sou eu e o que são as coisas era de nida pela pura racionalidade, que
refutava as falsas informações e cava somente com o que pudesse ser veri cado
conforme o entendimento pessoal de cada indivíduo. Já na segunda, essa mesma ideia
de quem sou eu e o que são as coisas se explicaria pela relação que se produziu entre
as pessoas ao longo da história e a consciência que tal dinâmica social gerou no
homem em sociedade.

Essas correntes losó cas trazem as suas especi cidades e nos levam a uma terceira.
Falaremos agora sobre a loso a da Escolástica.

067
Filosofia Escolástica
Outra expressão losó ca - e que remonta ao período medieval - é a escolástica.
Novamente, na intenção de conhecer a origem do mundo e do homem, essa teoria
buscou interpretar a loso a grega a partir do pensamento teológico cristão a partir
do século IX. A re exão era conduzida pelos lósofos-teólogos, chamados de Padres
da Igreja. Temos vários nomes que se destacam, tais como Jerônimo, Gregório Magno,
Ambrósio e Agostinho (ALMEIDA, 2012). Daremos destaque às re exões trazidas por
Tomás de Aquino no século XIII, tendo em vista que suas ideias representam bem esse
período que perdurou até o século XVI.

A re exão sobre o homem nesse período se dava na educação universitária. A


universidade era o local de debate e da presença dos lósofos-teólogos que se
utilizavam de seu cargo como professores para trabalhar a identidade do homem
medieval e o modo como eles se explicavam (OLIVEIRA, 2013). O que demarcou as
posições de tais pensadores foi o trabalho que cumpriam de utilizar do pensamento
losó co grego e dar-lhe um sentido transcendental cristão. Ou seja, do mesmo modo
que a loso a interpretava a vida terrena como super cial, ou mesmo banal quando
não vivida em função da experiência losó ca, os lósofos-teólogos complementavam

068
tal ideia com o discurso cristão de que a busca pela verdade deveria ser concluída na
pessoa de Jesus Cristo para que a libertação da ignorância não fosse somente
corporal, mas também espiritual (NUNES, 2006).

Para Tomás de Aquino, a busca pela elevação espiritual e intelectual era própria do
homem, tendo em vista que o que lhe dava sua forma humana era sua alma. O
intelecto não seria fruto do corpo, mas da alma que assim é constituída. Do mesmo
modo que o ser vegetativo das plantas não está em seu físico, mas na alma que elas
possuem. Daí a importância da alma para que o corpo pudesse desempenhar o
intelecto de forma proveitosa, mas também do corpo para a alma, a m de que essa
tivesse um local para existir com exceção da alma humana. Vejamos:

Isso quer também dizer que a alma não existe como uma espécie de
conceito universal antes da união com o corpo; na verdade, ela não
existe de forma alguma antes de sua união com o corpo. Por outro
lado, porém, e estritamente falando, a alma humana não depende do
corpo para existir, à medida que o Aquinata a concebe como tendo
sido criada por Deus (ALMEIDA, 2012, p. 46).

Sendo a alma humana a mais frágil dentre aquelas que possuem sabedoria
(comparado com os anjos), ela necessita do corpo para adquirir o conhecimento. Ele
seria o instrumento que permitiria que ela sentisse e aprendesse sobre o mundo e as
coisas que ele possui.

Sua principal obra foi a “Suma da Teologia”, em que Tomás de Aquino elabora um
resumo do que era a fé cristã para que a base do cristianismo e a interpretação
católica fossem estudadas pelos alunos de teologia. Questões de cunho moral são
apresentadas em suas páginas como uma forma de traduzir a necessidade da
dignidade das relações, o que re etiria no diálogo do homem com Deus. Por exemplo,
ao debater a “Questão sobre o Respeito”, Tomás de Aquino inseria seus alunos à
compreensão social sobre o modo como deveriam se relacionar com os demais,
sobretudo os que eram dados como seus superiores, tendo em vista a distinção que
tal cargo possuía. Tal análise possuía forte relação com a experiência cristã de amor a
Deus, pois, ao aprender a conviver com a hierarquia, o indivíduo simultaneamente
compreenderia a teologia cristã e seu ensinamento sobre o serviço e devoção. Com
isso podemos dizer que sua obra se resumia na teoria atrelada a uma prática
(OLIVEIRA, 2013).

069
Com isso, podemos entender que a loso a Escolástica representou não somente um
momento de forte in uência cristã sob a vida social, mas por ela, a investigação a
respeito do homem transcendia. Ou seja, apesar de identi car o homem como ser
detentor de duas realidades distintas (corpo e alma), a dimensão da fé cristã não teria
sentido se não fosse demonstrada nas relações com as demais pessoas. Isso revela
que, nessa perspectiva, o homem deveria estar em sintonia com a sua alma para que
suas relações sociais tivessem signi cado e fossem construtivas. Caso contrário, o que
estaria em jogo era a organização da vida social, mas também a sua própria
construção antropológica (OLIVEIRA, 2013). Com isso, o que se viu no período
escolástico foi a conciliação do pensamento bíblico com o aristotélico na de nição
sobre a origem do homem.

Apesar de termos trabalhado aqui somente três correntes losó cas,


existem muitas outras expressões de pensamento. É interessante
perceber a capacidade que as ideias possuem de formar “mundos”
dentro de nosso mundo. Ou seja, pelas linhas losó cas, é possível
identi car o per l das pessoas e o modo como elas enxergam a vida e
as situações do cotidiano. Você já sabe qual a sua linha de pensamento
losó co? Não? Então faça o teste e descubra!

Acesse o link: Disponível aqui

070
10

Valores morais

071
Valores morais: caminho
para a reflexão ética
Estimado(a) aluno(a), prossigamos com nossas aulas, trabalhando agora com a ideia
de valores. Nosso objetivo com esse conteúdo é nos aproximarmos da re exão ética.

Tendo em vista que acabamos de analisar três correntes losó cas históricas – o
idealismo, o materialismo e a escolástica – cabe questionar: qual delas seria a mais
assertiva? Infelizmente (ou felizmente) não há uma resposta única para essa pergunta,
pois mesmo com a re exão sobre qual pensamento é correto e qual não é, até hoje
não se encontrou uma resposta! Os diversos conceitos trabalhados pela loso a não
possuem uma verdade absoluta na qual todas as outras se apoiam.

Mesmo falando sobre loso a da educação, não seria correto criar dogmas sobre o
que seria verdadeiro ou falso no campo pedagógico ou na compreensão do
pensamento educacional. Desse modo, mais que ensinar “o certo e o errado”,
devemos aprender a nos posicionar de modo ético frente às adversidades losó cas e
educacionais. Para isso, é necessário que entendamos o princípio da re exão ética, ou
seja, a quê ela se destina. A base para sua compreensão é a identi cação daquilo que
podemos compreender e considerar como um valor. Ao abordarmos esse assunto,
certamente não trataremos sobre a ideia de valor econômico, mas ao utilizar o termo
“valor” nos referimos aos valores éticos.

Constantemente atribuímos valor às coisas, isto é, damo-lhes um signi cado, um juízo


de valor conforme o nosso juízo de realidade nos permite compreender o que é real.
Por exemplo, quando vejo uma obra de arte e penso que ela é bonita, ou então ao
contrário, quando as cores não me agradam ou não é tipo de arte que admiro etc.,
nesses dois casos, estou designando um valor àquele objeto. Nesse caso, o juízo de
realidade se aplica sobre o fato existente, ou seja, a presença de um quadro, uma obra
de arte. A partir do momento que eu o observo e digo a mim mesmo o que acho sobre
ele, estou atribuindo um juízo de valor. Em outras palavras, aplicamos o juízo de
valores conforme o ser vivo ou o objeto mobiliza a nossa afetividade, não nos
deixando indiferentes frente a sua presença (ARANHA; MARTINS, 2016).

Podemos nos perguntar sobre qual o modo em que esses valores são constituídos, ou
seja, de que maneira eles são formados. Por mais que vivamos numa mesma cultura,
o choque de valores é uma realidade que compõe nossa sociedade. Você já parou para

072
se perguntar sobre isso? Por que alguns gostam de verde e outros preferem o azul?
Ou, então, por que tem gente que prefere o frio e outros o calor? Como pode existir
em uma mesma família pessoas com comportamentos e opiniões tão diferentes?

O que podemos a rmar, numa re exão social e losó ca, é que todo homem inserido
em sociedade passa por três fases de adaptação cultural, o que consequentemente
in uenciará sua identi cação ou não com certos valores assumidos por aquele grupo.
Vejamos.

1. Herança cultural: Primeiramente, nós herdamos os valores. Ao nascermos,


somos inseridos em uma cultura e, independentemente de nossa adesão ou não
a ela, suas características nos precedem, são seguidas pela maioria das pessoas e
os valores que ela propõe permeiam praticamente todos os espaços sociais.
2. Avaliação: Conforme vamos crescendo, tais valores nos são ensinados nos
diversos segmentos sociais: primeiramente em casa, depois nos demais espaços
como, a escola, a igreja, o parque, as ruas, etc. De acordo com os valores
culturais e o modo como agimos diante deles, nossos atos são avaliados como
bons ou ruins, certos ou errados.
3. Resposta social: Frente à avaliação que recebemos pelo comportamento que
temos diante dos valores estabelecidos por nosso grupo, estamos sujeitos a
sanções ou bônus. Por exemplo, se cumprimos com nossos compromissos
nanceiros, adquirimos crédito, mas se somos negligentes com ele, recebemos
alguma punição, seja uma multa ou a proibição de comprar novamente por um
determinado tempo. O mesmo acontece quando descumprimos qualquer outra
regra social.

A caminhada por esses três estágios é natural no processo de descoberta de si


enquanto membro de um grupo social. Por eles é que nos identi camos enquanto
pessoa, assumimos aquilo que mais se aproxima de nossos ideais e nos leva ao
compromisso com os demais. Em outras palavras, os valores são o caminho para a
formação do sujeito moral.

Definindo “Moral”
Aquilo que de nimos como bom ou ruim, certo ou errado, diz qual o tipo de pessoa
que desejamos ser em nossa sociedade. Por isso, entendemos que nenhum de nós
nasce moral, ou seja, não nascemos sabendo o que é correto ou não. Muitos

073
pedagogistas, dentre eles, Rousseau, já a rmavam isso quando escreviam que a
criança não possuía maldade em suas ações, pois, não sendo seres morais, o que as
motivava a agir eram seus sentimentos (ROUSSEAU, 1973).

Lembremos que não são todos os lósofos que compreendem a moral da mesma
forma. Immanuel Kant, por exemplo, avalia a moral numa dimensão universal, ou seja,
mais que se ater aos mandos de um grupo ou uma situação em particular, uma
máxima pode ser considerada moral, caso seja aplicável universalmente. Isso ocorre
porque, a priori, ele utiliza a ideia da racionalidade humana, que é igual em todos os
homens, e por esse motivo não considera as experiências particulares. Ele as chama
de Imperativo Categórico que, oriundas da razão, tornam-se obrigações que todos os
homens devem seguir indistintamente (CANDIOTTO, 2010). Contudo, seguimos uma
interpretação geral, que nos diz que não nascemos moral, mas nos tornamos moral,
pois esse estado de ser nada mais é que uma construção (ARANHA; MARTINS, 2016).

Resumidamente, podemos dizer que moral é um conjunto de normas e regras criadas


por um grupo social. O sujeito moral é aquele que age bem ou mal, de acordo com as
regras de determinado grupo e período. Num primeiro momento, os valores morais
são herdados conforme o grupo no qual somos introduzidos, que, como bem
dissemos, possui regras próprias. Conforme as relações sociais se alteram, as regras
morais também vão se rede nindo e se adequando às necessidades de cada época e
cultura. Isso indica que elas não são estáticas ou eternas, mas suas transformações
ocorrem com o tempo.

Não camos alheios a essa transformação temporal, mas quando aderimos a uma
certa cultura, compactuamos com as suas regras e valores morais. O ato moral, apesar
de ser uma regra, só pode existir na liberdade, isto é, quando o aceitamos e decidimos
exercê-lo. Isso ocorre por se tratar de um compromisso que criamos com os demais
membros de nosso grupo e iniciamos a nossa vida social.

Todas as vezes que prometo pagar, ou quando me matriculo em um curso, ou até


mesmo quando inicio um novo emprego ou um novo relacionamento afetivo, existe
uma relação de con ança e compromisso que devem ser honradas. Por meio desses
vínculos que criamos com os demais, deixamos a infância e adentramos a vida adulta,
repleta de responsabilidades, exigências e comprometimento com os outros (ARANHA;
MARTINS, 2016).

Perceba que o ato moral não se dá no isolamento do sujeito. Ao mesmo tempo em


que ele provoca um efeito na pessoa que se compromete, também afeta a sociedade,
representada na gura das pessoas com quem pactua. A partir desse momento, temos

074
um dever com os outros, ou seja, estamos obrigados a cumprir com o que
prometemos. O mais interessante disso é que essa obrigação não ocorre de modo
externo, mas internamente somos “acusados” por nossa consciência daquilo que
devemos fazer ou do modo que devemos agir.

Por exemplo, imagine que você esteja caminhando por uma rua e, logo à sua frente
encontra uma senhora que, descuidadamente, deixou cair uma nota de cem reais no
chão. Diante de uma situação como essa, qual seria a sua primeira atitude?

Se o seu primeiro pensamento foi o de avisá-la sobre o dinheiro que acabara de cair e
lhe devolver a nota, meus parabéns! Sua consciência moral está bem treinada! Sem
utilizar do pretexto de que “quem perdeu foi descuidado” ou de qualquer outra
justi cativa para se apossar do dinheiro, a sua consciência foi a primeira a lhe cobrar
aquilo que deveria ser feito, sem que ninguém precisasse lembrá-lo(a). Isso ocorre
porque, ao assumir o compromisso de cumprir com as regras sociais, o próprio sujeito
se impõe o cumprimento das normas que aprendeu desde pequeno, demonstrando
que a prática da moral não deve necessariamente ser sinônimo de coerção, mas de
liberdade (ARANHA; MARTINS, 2016).

Toda essa questão soa muito bem quando a observamos na teoria. Contudo, sabemos
que a prática da moral não é uma tarefa fácil, pois vivemos num mundo de muitas
desigualdades. Por diversas vezes, vemos e ouvimos relatos de pessoas que justi cam

075
o seu descumprimento das regras morais porque passavam fome ou tinham qualquer
outra necessidade que precisava ser sanada imediatamente; o que a fez roubar, furtar
ou agir contra aquilo que fora combinado entre todos no acordo coletivo.

Vários lósofos escreveram (em especial, os contratualistas Hobbes, Locke e Rousseau,


trabalhados aqui) sobre a necessidade da vida em sociedade, mas que essa somente
sobreviveria caso houvesse um pacto social que fosse capaz de unir todos os cidadãos
em um único acordo. Isso nos leva a pensar sobre qual seria o melhor caminho para
continuar nossa vida em sociedade, cumprindo com as regras morais, mas de um
modo que fosse acessível e confortável para a todos, ou pelo menos para a maioria.

Isso seria possível? Como conciliar as necessidades particulares com as questões de


cunho social, que exigem padrões bem elaborados de regras que sirvam a todas as
realidades? As regras morais são sempre justas com aqueles que não conseguem se
adequar aos seus padrões? Quem precisa ser reavaliado: os costumes morais ou o
homem que neles não consegue se posicionar?

Questões como essas são importantes para a sociedade geral, mas também para a
escola e para a loso a que se aplica nela, pois é nesse espaço em que se valida o que
é considerado correto ou não nas relações sociais que se desenvolverão no futuro.
Como forma de combate às práticas imorais, isto é, aquelas que ferem a sociedade
como um todo, mais que aplicar severas punições aos “desajustados” que não se
enquadram nos padrões morais, o que se propõem aqui é um trabalho losó co.

Ou seja, após entender os meandros do contexto moral, queremos, pela ética,


identi car quais os caminhos que se fazem necessários para um ajuste da moral.
Entendemos a ética não como uma resposta pronta, mas como um olhar re exivo
sobre aquilo que tradicionalmente e culturalmente fundamenta as ações morais
(CANDIOTTO, 2010). Desse modo, convém aprofundar nossa análise sobre esse
conteúdo para compreender qual é o papel da ética na relação com os pressupostos
morais que compõem uma sociedade.

076
Moral é um conjunto de normas que existe num grupo social e
recebemos desde pequenos. Portanto, a moral é a regra! Isso exige que
o indivíduo aprenda a conviver com os ensinamentos, ou seja, os
valores que lhe são transmitidos para que possa fazer parte do grupo. O
desejo de ser aceito é algo natural do ser humano, e faz com que
cumpramos determinadas regras para encontrarmos o nosso lugar
dentro de uma comunidade. Geralmente isso é bom, pois nos traz
identidade, forma nossa personalidade paralela aos ensinamentos que
recebemos e complementa a nossa vida através das relações sociais.

Portanto, aderir aos preceitos morais é importante para que o homem


se realize socialmente e crie juízo de valor sobre os seus atos e o dos
demais, sabendo distinguir o certo do errado, o que é bom ou ruim, etc.
A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDBE 9394/96 nos traz
em seus primeiros artigos o direito que toda pessoa tem de aprender e
ensinar, sendo a educação uma expressão clara dos valores morais que
devem ser transmitidos a todos os cidadãos.

077
11

A relação entre
moral, ética e lei

078
Moral e lei
Caro(a) aluno(a), ainda falando sobre a de nição de ética, passaremos primeiramente
pelo estudo sobre a moral e a lei.

Num primeiro momento, vimos o signi cado de moral e como esse conjunto de
normas e regras criadas por um determinado grupo social se constituíam nas relações
sociais. Dando um passo adiante, notemos que o conceito de moral se aproxima muito
daquilo que entendemos como lei. Apesar das semelhanças, esses dois conceitos são
diferentes. Vejamos um pouco mais sobre eles.

Conforme Candiotto (2010) existem algumas regras morais que são consideradas
imprescindíveis para que a vida dos indivíduos e da sociedade possa uir bem. Por
isso, elas deixam o caráter moral para assumir os traços de lei. Ou seja, a diferença se
encontra no tipo de julgamento que cada uma delas irá exercer sobre o indivíduo
(CANDIOTTO, 2010). O comentador continua apresentando algumas diferenças entre
esses dois conceitos. Organizaremos elas em tópicos a m de se tornar mais visível e
didático:

1. Moral é um julgamento pautado naquilo que o indivíduo é ou aparenta ser. O


que a moral leva em consideração são os comportamentos pessoais, do grupo ou
da cultura, que podem revelar os sujeitos em sua essência. Muitas vezes, o que
está em jogo pode ser o modo como a pessoa se veste, por exemplo, mas
também de onde ela veio, com quem ela anda, os lugares que ela frequenta e as
suas atitudes, que “revelam” quem ela é. Já a lei não se preocupa tanto pelo o
que a pessoa aparenta, mas por aquilo que ela fez. “Nesse caso, os indivíduos são
julgados não tanto pelo que são, mas em função daqueles atos considerados
proibidos” (CANDIOTTO, 2010).
2. Tanto a lei quanto a moral são prescritivas, ou seja, determinam verbalmente e
textualmente o que é certo ou errado. Por exemplo, o código de conduta de uma
empresa se encaixa num “termo moral” que é estabelecido textualmente entre
ela e o colaborador. Porém, a lei se baseia no exterior do sujeito e não em suas
particularidades. Diferentemente ocorre com a moral que, por vezes, se
fundamenta em questões subjetivas para se a rmar, como, por exemplo, o fato
de alguém se vestir semelhante aos demais membros do grupo para encontrar
aceitação nele.
3. Outra questão importante é que a lei possui um prazo. Após o cumprimento da
sentença estipulada, ela se encerra. Com a moral não funciona assim, sendo o
seu julgamento indeterminado. Por exemplo, alguém que já foi preso, porém,
cumpriu com a sentença e se encontra em liberdade, não possui mais nenhuma
dívida com a sociedade, pois a lei lhe foi aplicada. Porém, o julgamento moral

079
sobre seu passado poderá interferir em oportunidades futuras de emprego, de
relacionamento e até mesmo de convivência social.

Mais que tratar sobre a lei como uma forma de diferenciá-la da moral, vale dizer que
ela também é instrumentalizada pela ética no intuito de averiguar se o que ela
determina é coerente com o princípio da dignidade e dos direitos humanos. Isso
signi ca que ela também é questionada pela re exão ética, pois, por vezes, a lei pode
se distanciar daquilo que é fundamental à vida humana, privilegiando alguns grupos e
negando o direito de outros. Um exemplo muito marcante que podemos utilizar é o do
Movimento Pelos Direitos Civis nos Estados Unidos, entre 1955 a 1968, no qual se
buscava o m da segregação racial que cultural e legalmente era adotado em todo o
país.

Banheiros para brancos e para “pessoas de cor”, escolas, assentos em transportes


públicos, vagas em empresas, comércios, bares, restaurantes e tantos outros lugares
que, de maneira legal, adotavam tratamento diferenciado conforme a cor da pessoa
(AMARAL; PINHO; NASCIMENTO, 2014). O sistema racista foi autenticado na década de
1980 pela Suprema Corte Norte Americana, com leis aplicáveis em todos os estados
(MOEHLECKE, 2009). Foram necessários muitos embates políticos e a luta de homens e
mulheres para que essas leis fossem revogadas, o que não aconteceu de uma hora
para outra, mas levou anos.

Depois do início do processo de dessegregação, foi aprovada em


1957, uma Lei de Direitos Civis criando uma comissão cuja função
seria investigar infrações aos direitos civis e também violações aos
direitos de voto, e em 1960 foi elaborada outra Lei de Direitos Civis
visando garantir o voto negro; mas ambas ainda enfrentaram a
oposição sulista (MOEHLECKE, 2009, p. 26).

Martin Luther King, Malcolm X e tantos outros negros que perderam a vida na luta por
seus direitos nos mostram que, por vezes, as leis incorrem num erro ético e não
conseguem atingir o ideal de preservação e manutenção da segurança e da vida de
seus cidadãos.

Porém, falamos sobre moral, discorremos sobre a lei, mas ainda não tratamos sobre o
signi cado de ética. Passemos agora para a compreensão do que ela é e qual o seu
papel em meio ao contexto social.

080
O que é ética?
Após veri car o signi cado de moral e de lei, passemos a re exão sobre o signi cado
de ética para a loso a.

A de nição de ética é muito ampla, e pode ser encontrada em diversos lósofos. De


modo geral, ética é a re exão sobre as noções e princípios que fundamentam a vida
moral. Esses princípios e noções vão depender da concepção de ser humano tomada
como ponto de partida por cada cultura e sociedade (ARANHA; MARTINS, 2016). Numa
retomada histórica, o primeiro a de nir a ética como um saber losó co foi Aristóteles
(384 a.C. – 322 a.C.). Classi cada por ele como um conhecimento prático, a ética serve
para nos auxiliar a compreender qual a melhor maneira para viver bem sem ferir os
princípios da justiça. Para isso, é necessário que haja uma de nição de bem, para que
a ética possa atuar (CANDIOTTO, 2010).

Tal de nição do que seja o bem, ou então daquilo que é o correto, nos é dado pela
moral e pela lei. Portanto, a ética em Aristóteles é a investigação sobre o melhor modo
de agir diante de uma moral e/ou lei estabelecida por um determinado grupo. Por isso
que, para que ela exista, se faz necessário a norma, a regra moral e a legalidade, que
são características próprias da vida em sociedade.

Para além da caracterização aristotélica, convém sublinhar que a Ética é ainda uma
“re exão propriamente losó ca” no sentido de que não prescreve imediatamente o
que é correto ou incorreto, o que deve ou não deve ser feito aqui e agora. Pelo
contrário, ela procura investigar por que devemos agir ou não, desse ou daquele
modo. Sua função é esclarecer a respeito da melhor ação; mas quem decide agir é
o indivíduo. À ética cabe argumentar por que, do ponto de vista racional,
determinados princípios são mais valiosos que outros (CANDIOTTO, 2010, p. 14, grifo
nosso).

Cumprindo com a missão de ser um “alerta” para as nossas ações pessoais, políticas e
sociais, a ética se enquadra no pensamento losó co como a consciência racional que
não se contenta em cumprir com aquilo que lhe é prescrito. É por isso que o termo
“código de ética”, presente em alguns códigos de condutas de algumas empresas, não
é adequado. Sendo a ética componente da investigação losó ca a respeito das
a rmativas morais e legais que temos em sociedade, como poderia se constituir num
código?

081
Para exempli car de que modo a ética atual nas relações sociais, utilizemos de um
conto árabe que remete à gura do profeta Maomé em uma situação delicada. A
história conta que um homem fugia de uma quadrilha de bandidos violentos quando
encontrou, sentado à beira do caminho, o profeta Maomé. Ajoelhando-se à frente do
profeta, o homem pediu ajuda:

- Essa quadrilha quer o meu sangue, por favor, proteja-me!

O profeta manteve a calma e respondeu:

- Continue a fugir bem à minha frente, eu me encarrego dos que o estão


perseguindo.

Assim que o homem se afastou correndo, o profeta levantou-se e


mudou de lugar, sentando-se na direção de outro ponto cardeal. Os
sujeitos violentos chegaram e, sabendo que o profeta só podia dizer a
verdade, descreveram o homem que perseguiam, perguntando-lhe se o
tinha visto passar. O profeta pensou por um momento e respondeu:

- Falo em nome daquele que detém em sua mão a minha alma de


carne: desde que estou sentado aqui, não vi passar ninguém!

Os perseguidores se conformaram e se lançaram por outro caminho,


enquanto o fugitivo teve a sua vida salva.

Essa história já foi utilizada em diversas bancas de concursos para


pre gurar qual o signi cado de ética e moral. Você conseguiu perceber
onde está o comportamento ético?

O profeta, pela posição de guru e modelo espiritual para a sua cultura, tinha a
obrigação moral de não mentir! Todavia, diante de uma situação que colocava em
risco uma vida inocente, essa regra moral foi desa ada, sendo necessário encontrar
uma resposta adequada para ela. Eis o dilema: mentir para salvar uma vida ou falar a

082
verdade para manter minha honra? A resposta do profeta não fugiu da regra moral, ao
mesmo tempo em que não a a rmou de modo sentencioso. Ele usou da ética, pôs-se a
re etir para encontrar a melhor solução.

No momento em que é questionado pelo bando sobre o paradeiro daquele que estava
sendo procurado, ele racionalmente encontrou o equilíbrio entre seu compromisso
moral e a importância de se zelar por uma vida. Ao explicar para aqueles indivíduos
que desde o momento em que estava sentado ali (sendo que ele mudara de posição),
não havia visto ninguém com aquelas características descritas passar por ele, Maomé
soube ser ético, sem ferir aos princípios morais, tampouco car cego diante dele.

Uma moral que desumaniza não pode ser considerada como boa. A tarefa vivida em
sociedade e seus preceitos devem ser o de defender o homem, garantindo sua
inclusão e acesso aos seus direitos. Nesses casos, a ética se torna essencial para que o
homem não se torne prepotente e deseje dominar o mundo com suas ideias, sem
levar em consideração que não somos os únicos a ocupar esse planeta.

O papel da ética é o de por em xeque as verdades absolutas que permeiam as


relações sociais, fazendo do homem o protagonista de sua participação em seu grupo.
Sem se contentar com as respostas dadas, a pessoa e o(a) pro ssional ético(a) é
aquele(a) que compreende quem é e aquilo que lhe é próprio em sua posição, porém,
se atenta em dar respostas novas, priorizando sempre a vida e o bem estar social.

Essa re exão é tão importante, que a ética deixou de ser um assunto somente da
loso a e passou a ser discutida em diversas outras áreas, criando parcerias com
outras ciências e áreas de atuação. É a chamada ética aplicada. Na próxima aula,
veremos sobre ela e de que modo a ética tem contribuído de modo prático para uma
vida mais equilibrada e justa.

083
Numa democracia como a nossa, a lei é algo estabelecido pelos
representantes eleitos pelo povo. Sua função é tornar a vida social mais
harmônica, capaz de gerar resultados de ordem e equilíbrio, em que
todos são assistidos de maneira igualitária. A diferença entre moral e
lei está, sobretudo, no prazo e no modo de execução. Ninguém vai
preso por se relacionar afetivamente com mais de uma pessoa, mas
será julgado(a) pela moral do grupo como alguém de comportamento
inapropriado. Esse é um dos exemplos do modo como a moral se
expressa. No caso de um crime, a lei é aplicada, mas ela tem um prazo
de início e de m. Para a moral, porém, o julgamento pode durar
eternamente, ainda mais se o caso foi divulgado pelas mídias sociais e
se tornar o “assunto do dia”. Enquanto os holofotes da memória
popular não forem apagados, o culpado será assim considerado por
vários anos.

084
12

Ética aplicada

085
O que é Ética Aplicada?
Ao discorrer sobre o conceito de ética, vimos que ela atua como “a consciência crítica”
do conhecimento, sem deixar que os preceitos morais e as leis sejam criados sem
qualquer tipo de re exão sobre suas máximas. Com o passar do tempo, a atuação da
re exão ética se ampliou, e o seu trabalho é indispensável para a compreensão atual
do mundo e das relações humanas, recebendo o nome de ética aplicada.

A ética aplicada é um ramo contemporâneo da loso a e sua função é gerar um


diálogo referente às questões práticas que exigem uma argumentação racional. Seu
início se deu a partir dos acontecimentos do século XX, como as guerras mundiais, o
uso de armas nucleares em combates e consequentemente a morte em massa de
grupos e nações (ARANHA; MARTINS, 2016). Tais situações exigiam uma re exão a
respeito do valor da vida humana e o modo como o próprio homem havia se tornado
o seu maior inimigo.

A raça humana não poderia se tornar refém daqueles que detinham o poder
econômico e cientí co, por isso, a ética aplicada questionava, por exemplo, o risco da
manipulação genética, os cuidados que deveriam ser tomados com o meio ambiente,
as causas da pobreza em determinados regiões do planeta e excesso de riquezas em
outras, a injustiça e a desigualdade social (ARANHA; MARTINS, 2016).

O que se constatava, a partir de 1960, era a necessidade de uma nova consciência


global, pois o homem não era dono do planeta apesar de ter acreditado nisso por
séculos. Seus atos haviam devastado diversas populações de outras espécies, alterado
o clima do planeta e contaminado as águas de rios com suas armas químicas, tudo
isso sem qualquer re exão e preocupação coletiva.

O homem precisava se tornar responsável por seus atos, sendo a ética aplicada o
campo de conhecimento losó co capaz de ajudá-lo nessa tarefa. A partir desse
momento, a ética saía da re exão subjetiva, ou seja, de uma consciência particular
para permear as relações coletivas, o pensamento de empresas, de grupos, de
governos, etc. (ARANHA; MARTINS, 2016). A ética aplicada se estende a diversas áreas
de conhecimento. Em nosso estudo, vamos apresentar três delas, começando pela
bioética.

086
A Bioética
A bioética é uma ciência híbrida que reúne o pensamento humanístico com o
cientí co. Seu surgimento se deu na década de 1970 pelos trabalhos publicados por
um professor norte americano chamado Van Rensselaer Potter, e seu objetivo como
ciência é identi car até que ponto a intervenção humana sobre a vida e/ou a
formulação dessa é aceitável (JUNQUEIRA, 2007). Nela, discutem-se questões tais como
a manipulação do genoma humano, a escolha do sexo do bebê antes de seu
nascimento, a clonagem humana, a produção de vegetais híbridos e de outros
alimentos que tenham alterações em seu genoma, a fecundação in vitro e a
comercialização e exportação de espécies de animais para regiões que não são de sua
origem, ou seja, a biopirataria.

Todas essas questões são abordadas pela bioética, no intuito de diminuir os impactos
que ações de transformações tão profundas poderiam causar na vida em sociedade e
até mesmo no nosso planeta. Imagine você tendo a possibilidade de escolher qual
seria a cor dos olhos de seu lho, o tom da pele dele ou o nível de sua capacidade de
raciocínio, tudo isso antes dele nascer; ou então poder ter acesso a uma fruta que
contenha reunida em seu DNA todos os nutrientes de uma refeição completa.

Aparentemente, tudo isso seria incrível, não é? Mas será que seria bom? Todos teriam
acesso a essas novidades? No caso da fruta híbrida, o que aconteceria com os demais
agricultores e produtores de alimentos? Parariam de produzir? O mercado alimentício
se desequilibraria? Ou então, no caso de uma criança modi cada geneticamente
conforme o desejo dos pais, você já imaginou como seria concorrer a uma vaga de
emprego ou da faculdade com uma pessoa que tenha nascido com vantagens
intelectuais produzidas por intervenção da ciência? Não estaríamos criando uma raça
melhorada que, ao ser considerada superior, encontraria privilégios sobre os
obstáculos da vida?

Pode parecer exagero, mas se não fosse pela intervenção de pesquisadores como
Potter, que se ocuparam em re etir sobre os benefícios e malefícios do uso
desenfreado das possibilidades ou ideais cientí cos, nossa sociedade sofreria ainda
mais com as desigualdades que a permeiam.

Certamente, a ciência não se resume em previsões trágicas como as que foram


elencadas acima. Ao mesmo tempo em que há riscos a serem considerados, os
benefícios também são empolgantes. Por exemplo, a possibilidade de alterar o

087
genoma humana para que doenças hereditárias sejam erradicadas seria uma
conquista histórica e que bene ciaria a todos.

Contudo, a cautela por parte da ética aplicada não é em vão. Ao agir desse modo, essa
ciência cumpre com o seu papel e permite que a ciência e a humanidade re itam
sobre seu posicionamento, antes de qualquer sentença.

A Ética Ambiental
Um outro ramo da ética aplicada é a ética ambiental. Sua temática é muito moderna e
tem encontrado sucesso na adesão tanto das empresas quanto das pessoas. É comum
nos depararmos com propagandas comerciais e banners de empresas que ressaltam
que o seu diferencial está no cuidado com o meio ambiente e na preservação da
natureza. Tudo isso teve início com a re exão ética.

A ética ambiental trata dos meios de se preservar e racionalizar os recursos naturais


que são nitos e, portanto, não devem ser desperdiçados conforme os interesses
econômicos que movem a sociedade atual. Sem se limitar a uma re exão sobre os
ecossistemas, o que se avalia é o modo como o homem tem interagido com o meio
ambiente (COUTINHO, 2009). A cultura do consumo em excesso, o uso constante de
agrotóxicos para produção de alimentos, o desmatamento e a poluição de rios,
transformando-os em esgotos a céu aberto, bem como a diminuição de espécies
importantes para o equilíbrio do planeta etc.; todos esses fatores devem ser
repensados e questionados pela ética ambiental.

088
A relação harmônica do homem com a natureza é uma das temáticas da bioética |
Fonte aqui

Por mais distante que possa aparentar, os agravos cometidos contra a natureza
incidem diretamente na vida humana, inclusive na sociedade. Infelizmente, nosso país
presenciou no início de 2019 o desmoronamento da barragem da empresa Vale, na
cidade de Brumadinho, MG; fato que evidenciou o quanto os interesses privados
podem ser fatais quando sobrepostos à vida humana.

A manutenção inadequada e a fraude nos laudos técnicos das barragens teriam


causado a tragédia que acometeu a cidade de Brumadinho, tanto que os pro ssionais
responsáveis pela averiguação foram presos, mas depois soltos, como nos mostra a
reportagem realizada na época:

Os laudos são assinados por pro ssionais da Vale e Tüv Süd. Entre os responsáveis por
parte da companhia alemã estão os engenheiros Makoto Namba e André Yassuda.
Eles foram presos na semana passada, suspeitos de crimes ambientais, falsidade
ideológica e homicídio. O advogado dos dois engenheiros anexou os relatórios no
pedido de liberdade feito à Justiça mineira, para tentar mostrar que Namba e Yassuda
cumpriram com suas responsabilidades pro ssionais e apontaram a situação da
barragem. O Tribunal de Justiça de Minas (TJ-MG) negou o pedido liminar de habeas
corpus. A defesa recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) (G1.GLOBO, 2019).

089
Por essa razão, o desenvolvimento sustentável se faz imprescindível. Isso signi ca que
o progresso das tecnologias deve estar alinhado às necessidades do planeta, sem ferir
os seus recursos, mas harmonizar a fragilidade e as necessidades da existência
humana com o ambiente no qual estamos inseridos (COUTINHO, 2009). Esse trabalho
pode ser desenvolvido na parceria entre governos e empresas privadas, o que nos leva
à terceira expressão da ética aplicada, que é a ética dos negócios.

Ética nos Negócios


A ética nos negócios levanta questões sobre a responsabilidade social das empresas.
Ou seja, por mais que uma empresa não seja pública, ela possui o dever de contribuir
com a sociedade que a sustenta, garantindo que seus negócios tenham preocupação
que vão além do lucro.

Na década de 1960, o norte americano Raymond Baumhart fez uma pesquisa com 200
empresas e descobriu que o que faltava nelas era a capacidade de humanização. A
técnica e a ânsia por resultados melhores que as concorrentes não permitiam que elas
enxergassem as pessoas que compunham os seus quadros de funcionários. Após
vinte anos, a empresa Touche Ross fez outra pesquisa com 8.180 executivos e
percebeu que quanto mais à desvalorização das culturas e da sociedade como, por
exemplo, a família, os valores da vida em grupo, os momentos de aprendizado e
entretenimento, etc., deixavam de acontecer, mais frequente se tornava o
desaparecimento das relações éticas no trabalho (ARRUDA, 1989).

Isso se dava pelo fato da pressão pela competição e o alcance das melhores metas e
maiores lucros impedirem que os princípios éticos, humanos e solidários fossem
levados em consideração num acordo de negócios. O resultado foi o aumento do
número de funcionários doentes, queda na produtividade e baixo desempenho geral
por parte dos grupos mais competitivos (ARRUDA, 1989). A partir dessa constatação, a
ética nos negócios começou a ganhar espaço, valorizando não somente os tipos de
negociação que a empresa assume para si, como também o cuidado com os
funcionários e o seu bem estar como estratégia para manter bons pro ssionais, alto
desempenho e pessoas saudáveis em seu quadro de funcionários.

090
Esses são os efeitos da re exão ética quando aplicada na realidade de trabalho, na
cultura e na busca por respostas sobre a vida humana. Utilizando esse princípio,
garante-se a liberdade do homem enquanto ser pensante, ao mesmo tempo em que
une as ciências humanas com as demais, entendendo que o papel desempenhado por
cada uma delas é o bem estar do homem e a sua integridade. Tais fatores contribuem
para a uma vida mais equilibrada entre nós, seres humanos, e o restante da natureza.

Bons resultados e relações saudáveis é um dos desa os para a ética dos negócios.

091
Um gestor temperamental

Imagine que uma empresa contrate um novo gestor na área comercial com a expectativa
de que as vendas aumentem. No início do trabalho, até parece que isso vai acontecer,
mas, com o passar do tempo, os resultados alcançados cam cada dia mais distantes das
metas. Mesmo o gestor sendo um pro ssional com um excelente currículo,
comprometido, trabalhador e responsável, infelizmente, tudo isso não é su ciente: é
preciso atingir as metas.

Mas por que será que o gestor, ainda que bem quali cado, não conseguiu atingir as
metas? Ele não sabe. E quando é demitido tem uma sensação terrível, mas mesmo assim
tenta não se sentir um fracassado. Acredita que bons pro ssionais não cam
desempregados e é consciente de seu valor e de seu potencial. Por isso, prepara-se para
procurar um novo emprego. Atualiza seu currículo, envia para diversas empresas e o
cadastra em alguns sites.
Quando é chamado para alguma entrevista busca conhecer a empresa para se sentir
mais preparado. Pensa que não ter conseguido bons resultados não é motivo para
desanimar. Porém, está consciente que se não der certo dessa vez, sua carreira correrá
sérios riscos.

Consegue uma vaga na área comercial e, após alguns meses, aumenta as vendas
signi cativamente. Procura defender os interesses da Empresa onde trabalha, para que
tenha lucratividade, mas também consegue defender os interesses dos clientes junto à
Empresa. É muito bom negociador e tem a empatia como ponto forte de suas
características.
Depois de um tempo na empresa, recebe uma reclamação de seu principal cliente.
Veri ca o que aconteceu e descobre que a reclamação procede: o setor de produção
cometeu um erro. Resolve ir até a produção para informar o que havia ocorrido e
preparar o pessoal para que corrijam o problema. Chama algumas pessoas da equipe de
produção para discutir a melhor solução e, à medida que explica o que aconteceu,
aumenta seu nervosismo. Não consegue entender como cometeram aquele erro, e
justamente com seu principal cliente. Sem conseguir dominar seus sentimentos, quando
menos se espera grita com o funcionário que ele acredita ter cometido o erro. Depois de
dizer tudo que acha ser importante, acalma-se um pouco e volta para suas atividades.

Quando explode, o gestor temperamental acredita que está com a razão e não percebe
que sua forma de falar magoa as pessoas. Em alguns casos, ele briga com pessoas que
são peça-chave na Empresa, funcionários daqueles que são difíceis encontrar outro com
tamanha competência. Um daqueles que é preciso fazer de tudo para não perdê-lo.
O pior da atitude do gestor é que, quando o funcionário comete algum erro, ele chama a

092
atenção do pro ssional na frente de seus colegas e de uma forma que nem lhe permite
se justi car. Aí, por medo de errar e ser chamado a atenção novamente, o pro ssional
deixa também de tomar novas atitudes, tentar inovar. Isso porque sabe que se cometer
qualquer erro, acabará vendo uma explosão do gestor e se recebe uma repreensão
sente-se arrasado.

A alta direção toma conhecimento do acontecido e como acredita que é possível


conseguir resultados positivos sem impor nada, mostra ao gestor que ele não está
agindo de acordo com os valores da organização. Avisam que mesmo vendendo muito,
isso não é su ciente para o gestor permanecer na empresa. Resolvem, então, lhe dar
uma última oportunidade.
O gestor pensa: o que fazer? Sem resultados é demitido. Com resultados também corre o
risco de ser demitido mais uma vez...
Ao analisar bem o problema descobre que atualmente a liderança na base do “comando
e controle” não obtém o mesmo resultado de há alguns anos atrás.

Seus pensamentos se articulam e se re etem nas seguintes questões:

1. Quando o líder comete um erro, deve ou não pedir perdão? O reconhecimento do


erro ajuda na recuperação da dignidade e na mudança de atitude?
2. Quem pretende ser um vencedor na vida, como deve encarar seus erros?
3. 3. Os erros dos subordinados justi cam o erro do líder?
4. Como evitar a reação por impulso e re etir sobre a solução mais adequada, com a
cabeça fria?
5. Como motivar os subordinados? Como prestigiá-los e desa á-los?
6. Como corrigir os erros dos subordinados?

Fonte: Sonia Jordão Disponível aqui

093
13

Tendências pedagógicas
da educação brasileira

094
Olá, aluno(a)! Vamos continuar nossa caminhada pela Filoso a da Educação e seus
componentes. Após passarmos pelo reconhecimento da ética e a sua aplicação em
alguns segmentos sociais e cientí cos, voltemos o nosso olhar para a educação no
Brasil e o modo como ela historicamente se apresentou a nós.

Daremos atenção aos movimentos que compuseram e ainda compõem a estrutura


escolar predominante em nosso país, que são basicamente dois: a tendências liberais
e as tendências progressistas. Essas duas grandes linhas de pensamento pedagógico
se dividem em outras que foram se organizando com o passar do tempo, conforme a
imagem a seguir nos mostra:

Principais Tendências e suas Rami cações.

095
Tendências Liberais
Começaremos pela tendência liberal de educação e as suas expressões.

Você já ouviu falar desse termo aqui, em nossas aulas. Recordemos a Aula 4, na qual
falamos sobre o pensamento do lósofo John Locke. O liberalismo é uma teoria na
qual se emprega os princípios da individualidade, da liberdade, da segurança, da
igualdade e da propriedade privada para o bom andamento da vida social (ARANHA,
1996). Esses valores foram defendidos pela burguesia, que no século XVII até o XIX se
fortaleceu economicamente e superou o antigo regime feudal predominante em toda
Europa.

E foi nessa perspectiva liberal que caminharam as primeiras expressões pedagógicas


que surgiram no Brasil no nal do século XVIII e início do XIX. O início se deu com a
escola tradicional. Nela, o professor é o centro de todo o aprendizado; é o detentor
do saber, e o aluno é aquele que deve estar ali passivamente para assimilar o que o
professor tem a oferecer. O conteúdo transmitido pelo mestre é o saber pertencente
àquela cultura, e o esforço racional é o principal instrumento para se obter sucesso,
sem qualquer tipo de inovação ou questionamento trazido pelo aluno (ARANHA, 1996).
Dessa forma, garantia-se a continuidade do aprendizado de forma linear e acrítica.

No Brasil, a escola tradicional foi promovida no período do Brasil Colônia, sob o


comando dos padres jesuítas. Como representantes da fé católica, seus ensinamentos
se baseavam nos dogmas da Igreja (OLIVEIRA, 2017). Não apenas no Brasil, mas em
todos os lugares essa escola se adaptava com a realidade do tempo e da cultura. Ou
seja, os elementos trazidos em seu interior estavam de acordo com o comportamento
exercido pela sociedade na qual ela estava inserida. Por esse motivo, a escola
tradicional existiu em vários períodos e contextos, representando variados grupos e
cenários históricos, do século XVI até o XX (ARANHA, 1996).

096
Sala de aula tradicional.

Outra tendência que surgiu no século XIX foi a tendência Renovada, também
conhecida como Renovada-Progressista. Tendo como modelo a escola nova, a sua
bandeira se resumia na defesa de uma escola que fosse para todos, ou seja, que
trouxesse um conteúdo de acesso universal, com o qual o aluno não fosse mais
dependente do professor para aprender, mas descobrisse em si os dons e atributos
que lhe zessem sentido. Nessa proposta de educação, o professor deixava de ser o
centro do processo de ensino-aprendizagem, para dar espaço ao aluno (OLIVEIRA,
2017).

A tendência Renovada-Progressista foi uma das expressões da escola nova, que tinha
por objetivo dar destaque ao desenvolvimento de uma educação que se pautasse no
aluno. Foi o que fez a tendência Renovadora não-Diretiva, que levava em
consideração muito mais que aspectos comportamentais, mas o nível de satisfação e
realização por parte do aluno com aquilo que lhe era proposto desenvolver.

Na escola renovada, o aluno é o centro do processo, existindo uma


preocupação muito grande com a natureza psicológica da criança.
Como a escolha dos conteúdos gira em torno dos interesses infantis, o
professor se esforça por despertar a atenção e a curiosidade da
criança, sem lhe cercear a espontaneidade. Dependendo da escola,
existe maior ou menor não-diretividade, tornando-se o professor
apenas um facilitador da aprendizagem (ARANHA, 1996, p. 167).

097
Perceba que o espaço da criança é visto como o motivo principal de se existir a escola,
sendo ela o seu fundamento e o porquê de todo trabalho docente.

Nessa modalidade, é que surge a re exão sobre o ambiente escolar como local de
desenvolvimento integral da criança, trazendo a formação de seus sentimentos, de seu
corpo e de suas vontades para o centro do debate. O conhecimento decorado não era
bem aceito nesses ambientes, e se privilegiava a prática da descoberta enquanto
conteúdo escolar. Isso também se re etia na diminuição da rigidez e da disciplina, que
eram comuns na escola tradicional (ARANHA, 1996).

Outra vertente liberal que surgiu no século XX, a partir da década de sessenta, foi a
tendência tecnicista de educação. Por ela, a escola se tornava um espaço de
preparação para o mercado de trabalho. Formando mão de obra para as indústrias e
fábricas, sua atuação se deu na formação de alunos que tivessem conhecimentos
práticos e úteis para a vida em sociedade, o cumprimento das regras, dos horários, o
respeito pela hierarquia, dando a entender que cada um alcançaria o seu lugar
conforme o esforço que desprendesse para superar aos demais e se superar,
independentemente de suas origens sociais e econômicas (LIBÂNEO, 1992).

Como a rma Aranha (1996), a escola tecnicista era reducionista, pois levava em
consideração apenas o conhecimento técnico na formação do aluno. Sem se ater às
necessidades humanas, tal ensino acreditava que o progresso social surgiria por meio
de preceitos bem estruturados, conhecimentos cientí cos e o aprendizado mecânico.
Ou seja, apesar de todos esses fatores possuírem sua importância, o que tal escola
não compreendia era a possibilidade de se conhecer o mundo por outras vertentes
que não as cientí cas, além de negligenciar a vontade humana frente a preceitos que
lhe são impostos (ARANHA, 1996).

É possível identi car o norte liberal em todas essas escolas aqui apresentadas. Seja
pelo viés da liberdade do sujeito na sua formação, da individualidade na construção de
homens que alcançam o seu espaço em meio aos demais, ou então na segurança que
um ensino tradicional possa ofertar para que não se erre sobre o modo como agir em
busca do domínio intelectual, temos a primeira expressão pedagógica de ensino que
marcou o cenário brasileiro de educação.

Façamos o reconhecimento agora das tendências progressistas e de suas principais


características.

098
Vale a pena aprofundar a re exão acerca do pensamento liberal e a
relação que ele possui com o sistema capitalista. Recomendo que
assistam à aula do professor Ivan Cláudio Guedes, na qual ele detalha
os aspectos políticos e sociais dessa tendência pedagógica.

O vídeo está Disponível aqui

Tendências Progressistas
Numa oposição clara à proposta da pedagogia liberal, temos a tendência progressista
e suas expressões ao longo da história da pedagogia. Sua estruturação se deu pelas
ideias marxistas, traçando para o ambiente social e escolar um cenário de con ito de
classes, haja vista que se essa teoria subentendia que, a educação havia sido utilizada
por séculos pela burguesia como uma forma de dominação do capital, da população e
dos meios de produção. Dessa forma, sua intenção era gerar um ensino libertador.

Analisando as tendências liberais, sobretudo a tradicional, o que os teóricos da


educação percebiam era uma “escola-quartel”, onde a excessiva severidade das
disciplinas e conteúdo, bem como a rigidez nas relações entre professor e aluno
interferiam no processo de desenvolvimento e aprendizado do sujeito (ARANHA,
1996). Para fugir dessa proposta mecânica e engessada que gurava tal educação, a
tendência progressista ganhava espaço no ambiente escolar, a começar pela escola
libertadora. Tendo Paulo Freire como principal teórico, a escola libertadora se
colocava ao lado do aluno, entendendo que sua educação deveria levá-lo à liberdade
intelectual e política.

099
Formando o aluno para ter um posicionamento intelectual politizado, a preocupação
não se concentrava no conteúdo que seria transmitido, mas nas possibilidades que
esse traria para a reestruturação social e intelectual do indivíduo, levando-o a enxergar
uma sociedade além da sua realidade imediata (SILVA, 2000). Em outras palavras, essa
educação insistia numa transformação do sujeito, sobretudo do mais pobre e
marginalizado que, por conta dos ditames e desigualdades sociais, não conseguiria se
ver preso das amarras da educação liberal, que reforçava em seu método uma
sociedade dividida e hierarquizada.

Um passo adiante na educação libertadora foi a sua expressão a partir do ensino


libertário. Ou seja, o que se considerava como instrumento para educar o sujeito era
a relação que deveria existir entre o vivido e o aprendido. Em sala de aula, a relação
estabelecida entre professor e aluno era de liberdade para o ensino, onde não havia
obrigação por parte do mestre em saber tudo, tampouco ao aluno cabia cumprir com
horários, tarefas e outras exigências corriqueiras (OLIVEIRA, 2017). Sobre o conteúdo,
não haveria sentido para essa tendência transmitir um conhecimento que não fosse
pautado na vivência do aluno, correndo o risco de torná-lo vazio e desnecessário. O
aprendizado deveria se constituir na relação dos grupos e nas experiências informais,
porém, vivenciais e repletas de sentido pelo educando em seu processo de construção
enquanto sujeito humano e político. Sobre a ideia do que seria um aprendizado válido,
Libâneo a rma:

“Conhecimento” aqui não é a investigação cognitiva do real, para


extrair dele um sistema de representações mentais, mas a descoberta
de respostas às necessidades e às exigências da vida social. Assim, os
conteúdos propriamente ditos são os que resultam de necessidades e
interesses manifestos pelo grupo e que não são, necessária nem
indispensavelmente, as matérias de estudo (LIBÂNEO, 1992, p. 11).

Essa tendência, apesar de soar como radical permitiu que a teoria Crítico-Social dos
Conteúdos, ou então a Histórico-crítica encontrasse espaço para atuar na educação.
Nela, a escola se tornava um local de referência, imprescindível para se acabar com as
desigualdades sociais, uma vez que é na escola que se aprende a conviver de maneira
igual, sem qualquer distinção, seja pelo uniforme, pelas regras, horários e exigências
que são exigidas a todos.

Aranha diz que Saviani, em sua obra “Estrutura e Sistema”, analisou a Lei de Diretrizes
e Bases da Educação de 1948, e a conclusão que chegava sobre ela era que lhe
faltavam planos que demonstrassem qual era o ideal de educação brasileira (ARANHA,

100
1996). Ou seja, isso indica que a falta de objetivos claros fazia da escola naquele
período um local de mera reprodução de um sistema social e econômico já pronto e
sem qualquer possibilidade de modi cação. É como se o aluno se perguntasse:
estudar para quê? Minha vida sem o conhecimento escolar não será pior, pois as
opções que a educação traz não são capazes de me retirar da condição social na qual
estou inserido!

Por m, a tendência histórico-crítica ofertava uma educação analítica a respeito da


sociedade, re etindo acerca de suas contradições, dando ao aluno uma visão
inovadora frente aos assuntos de seu cotidiano e das suas experiências. O conteúdo
aqui é valorizado, pois por meio dele se faz novas leituras, de teor crítico, sobre a
cultura dominante, re etindo a partir da prática, mas indo além dela (LIBÂNEO, 1992).
O resultado desse ensino é o sujeito engajado, consciente de si e preocupado com o
todo.

101
14

A Educação
contemporânea
e sua filosofia
102
Educação e Ideologia
Prossigamos nossa re exão losó ca a respeito da educação. Após passar pelas duas
principais correntes pedagógicas brasileiras, façamos um estudo sobre as tendências
pedagógicas atuais, ou seja, para onde tem caminhado a educação contemporânea,
bem como os sujeitos que são atendidos por ela.

Numa comparação com os movimentos educacionais dos séculos passados,


evidenciamos que as características da formação do homem se alteraram
drasticamente. No século XVIII, tínhamos uma educação que ensinava para a
sobrevivência e o esforço pessoal. As pessoas aprendiam a lidar com o sofrimento, a
falta de recursos e a modéstia da vida, sobretudo a rural. Tal educação era dada
principalmente pelas instituições religiosas, que faziam da pobreza e simplicidade
valores cristãos dignos de serem seguidos. O homem se preparava para lidar com as
regras, cumprir com preceitos civis e viver em sociedade. Somente a partir do século
XIX é que esse ideal se alterou, a partir das ideias de Pestalozzi e demais pensadores,
que traziam uma nova perspectiva, centrada na preocupação com a formação
individual e não mais coletiva, ou seja, o homem que se educa a m de se conhecer e
descobrir quem ele era e de que modo poderia se posicionar no seu contexto social
(MONROE, 1956).

O que se evidencia da educação atualmente é a intenção de combinar esses dois


fatores, ou seja, a formação para a sociedade mais a educação subjetiva, de
compreensão e conhecimento do si e de sua natureza. “A educação tem sido de nida
como preparação para a cidadania, como ajustamento à sociedade, como preparação
para a vida social, como aquisição da herança da raça” (MONROE, 1956, p.424). O
papel que a pedagogia/educação assumiram ao longo dos anos de formar o homem
para corresponder aos seus anseios pessoais e os de seu grupo é o que a torna
indispensável para a construção da vida em sociedade, sendo próprio de nossa época
uma educação elaborada por meio de ideologias.

Isso signi ca dizer que a educação que os indivíduos recebem atualmente está
permeada por um conjunto de ideias e ideais, tendo valores morais direcionados e
considerados como bons e verdadeiros por aqueles que a utilizam; a isso chamamos
de ideologias. Numa perspectiva histórica, foi pelo marxismo que a compreensão
sobre o que eram ideologias encontrou explicação.

103
Nele, estudou-se a força que as opiniões expressas socialmente possuem na
formulação de “verdades”. As ideologias são compostas por máximas, sendo que, na
maioria das vezes, a(s) ideia(s) dominante(s) corresponde(m) aos valores do grupo que
está no poder, isto é, que exerce in uência e domínio sobre os demais (CAMBI, 1999).
Isso pode ser exempli cado: você sonha em ter independência nanceira? Pensa em
poder viajar para o exterior, ter o carro do ano, sua casa própria mobiliada, espaçosa e
aconchegante? Já imaginou não precisar trabalhar todos os dias, mas garantir seu
lucro diário, cando em casa junto de sua família e amigos? Pois bem, este certamente
possa ser o sonho de todo mundo! E sabe por quê? Porque vivemos num contexto em
que a ideologia predominante é a do ser consumista, que acredita na ideia de que
será feliz quando possuir todos esses bens acima citados.

Olhando para a história, identi camos que esse fato não é novo! Na França do século
XVIII, por exemplo, todos queriam ser iguais aos burgueses, enquanto esses queriam
ser iguais aos nobres, tanto que sempre tentavam imitá-los, até mesmo na
indumentária (ELIAS, 1994). O modelo de “sucesso” se altera, e com ele os sonhos e
ideais sociais também se modi cam. Com isso podemos perceber que a ideologia
esteve, e continua presente no contexto social, por meio de ensinamentos que
formularam a base das relações civis através de valores que foram ensinados e
incentivados para serem reproduzidos. Tudo isso contou com o apoio da família que
se abriu para os atrativos elaborados pela vida social, e diluiu seus valores nos
estipulados pela comunidade geral (CAMBI, 1999).

Ao assumirmos a existência de ideologias que pairam sobre a vida em sociedade, não


queremos dizer que elas são sempre negativas. Ao contrário, toda cultura possui os
seus traços próprios, o que lhe torna única! A questão a ser debatida é o quanto se
educa atualmente para o autoconhecimento e a capacidade de suprir suas reais
necessidades.

Enquanto a ideologia dominante na educação for aquela do dominador, a cultura


perderá sua essência e o indivíduo viverá em função de valores globais, mas que não o
representam de fato, isso porque

[...] uma correta concepção da cultura deve ser reconduzi-la às suas


raízes ideológico-raciais e compreender através deles tanto as suas
estruturas como as suas articulações disciplinares, desde a arte até a
ciência (CAMBI, 1999, p. 382-383).

104
Alcançar essa autonomia frente às imposições de uma sociedade consumista como a
nossa se tornou um desa o diário. Por esse motivo, a indecisão acerca do como e do
que se deve ser reside na falta do autoconhecimento e identidade. Como disse
Zadorosny, “O homem passou a ser visto por uma ótica instrumental, deixou de ser
concebido como sujeito centrado na práxis para ser considerado consumidor
compulsivo e ‘oco’ de valores” (ZADOROSNY, 2007, p.390). Quando sabemos quem
somos e do que precisamos para sermos felizes, ignoramos os apelos externos para
nos concentrarmos em nossos ideais particulares. Obviamente que agir dessa forma
atualmente seria “nadar contra a maré”, tendo em vista que a cada momento surge
um novo item que o mercado jura que você não conseguirá mais viver sem ele!

Nesse momento deve entrar a educação re exiva, própria da análise losó ca, dando
os indícios daquilo que é essencial e o que é super cial. Capacidade esta que, apesar
de estar se perdendo a cada dia, deve ser enfrentada pela indagação crítica, levando-
nos ao seguinte questionamento: qual é o papel da educação atualmente? Uma das
respostas que se obtém frente à essa pergunta, é a concepção de educação para o
mercado de trabalho.

Em 1988, o cantor Cazuza lançou o clipe de música “Ideologia”. A letra


retrata a decepção do jovem por perceber que todas as crenças que ele
havia construído ao longo de sua vida sobre seus líderes políticos, suas
certezas de vida e o que era certo haviam desmoronado.

O refrão diz: “Ideologia, eu quero uma pra viver!”. Isso reforça a ideia do
pensamento ideológico como próprio de qualquer sociedade que
assume princípios para si. No entanto, ao mesmo tempo se evidencia
pela letra que todas as ideias podem ser desfeitas, reformuladas e
inovadas. Nesse sentido, debater sobre elas é positivo, pois amplia
nossas perspectivas e visão sobre o mundo. Conheça (ou reveja) a obra
em:

O vídeo está Disponível aqui

105
A escola para o trabalho?
Na contemporaneidade, a escola adquiriu um caráter universal como espaço
privilegiado para a ação pedagógica e de acesso para todos. No mesmo contexto,
situa-se o trabalho, tarefa própria do homem e por ele assumida como subsídio para o
sustento de sua sobrevivência. Porém, retomando brevemente a história acerca do
trabalho, foi no século XVIII que surgiu o aperfeiçoamento para a produção por meio
da Revolução Industrial.

O tempo dedicado ao trabalho industrial era imenso, o que ocupava a maior parte do
tempo dos trabalhadores. Por um lado, isso os tornava pro ssionais especializados em
suas tarefas, capazes de desenvolvê-las em qualquer circunstância e até mesmo
transmiti-las para os outros. Nessas condições, temos a primeira relação do trabalho
com a educação, visto que o homem se desenvolvia tecnicamente por meio de sua
relação com a indústria. O agir pedagógico se formalizaria mais adiante, como uma
forma de garantir a continuidade da indústria e do trabalho de seus operários
(MANACORDA, 2010).

O exemplo mais próximo que temos desse período foi o surgimento da escola
politécnica, inaugurada no nal do século XVIII. Essa instituição, da qual pensadores
como, por exemplo, Augusto Comte foi aprendiz, formava pro ssionais para atuarem
nas diversas áreas de conhecimento. A experiência adquirida com a própria função,
depois a necessidade de melhorar suas habilidades naturais a partir de técnicas
especí cas, con guravam a relação entre o saber e o trabalho (MANACORDA, 2010).

Uma das vertentes que temos atualmente é o uso da educação como forma de
desenvolvimento econômico e social. Na linguagem do mercado, o capital humano, ou
seja, o trabalhador em si, quanto mais instruído, melhor contribuirá com o
desenvolvimento do setor no qual está inserido. É o que diz o Mapa estratégico da
Confederação Nacional da Indústria de 2014:

Uma variável simples, mas poderosa, de sinalização das condições da


produtividade sistêmica é o nível de dispersão de capital humano
entre empresas parceiras em uma cadeia de produção. Tudo o mais
constante, quanto maior for a dispersão do capital humano entre
empresas, tal como medido pela média da escolaridade, treinamento

106
pro ssional, certi cações, número de engenheiros e pro ssionais
técnicos e indicadores de performance e desempenho, maior será a
probabilidade de se observar os efeitos negativos associados à
discrepância de produtividade. Por outro lado, quanto mais
homogêneos forem os indicadores de capital humano e de
desempenho, menor será a probabilidade de que os efeitos negativos
da discrepância de produtividade afetem a produtividade sistêmica
(CNI – 2014, p. 23).

Aparentemente, formar o indivíduo para o trabalho pode ser sinônimo de


desenvolvimento econômico e social, sendo dever do educador encorajar tal ação.
Essa aceitação da escola como local de formação para o trabalho é cultural e data do
século XIX, porém, podemos a rmar com certeza que a escola prepara para o
trabalho? Ou seja, é garantido ao indivíduo que ao passar por suas estruturas, ele
conseguirá se posicionar pro ssionalmente no futuro?

Falando numa perspectiva losó ca e consequentemente crítica, também devemos


concordar que há algumas questões a serem consideradas. Apesar dos possíveis
benefícios econômicos e sociais que a instrução gera para a indústria, ao
considerarmos uma “escola para o trabalho”, temos uma instituição que insere o
sujeito em regras para posteriormente alcançar as competências pro ssionais (CAMBI,
1999). Todavia, esse “alcançar” não pode ser garantido nem mesmo pela própria
instituição escolar.

Isto é, o modelo de escola atual, segundo Cambi, se ocupa com uma crise identitária,
tendo em vista que, ao mesmo tempo em que todos os saberes lhe são designados e
se torna sua responsabilidade administrá-los e transmiti-los, há em sua estrutura e
conteúdo a tarefa de estimular o sujeito a aprender a aprender. Tendo o trabalho se
tornado algo secular, a escola se detém em outra tarefa, que é a de apenas instruir
(CAMBI, 1999), o que se tornou sua atividade guia e lhe faz cada dia mais burocrática e
impaciente com os resultados que deve alcançar, enquanto é pressionada por todos
os lados e setores da sociedade, da família ao Estado, a m de encontrar um objetivo
que realmente lhe guie.

Isso por dois motivos principais: o primeiro é este identi cado acima, a impossibilidade
atual de atrelar a formação com o trabalho, tendo em vista que não há oportunidades
para todos. O segundo fator é o currículo escolar, que não mais prepara para o
trabalho, mas contempla diversos conhecimentos sem um norte especí co (SEGNINI,

107
2000). Por vezes, ouvimos nossos alunos a rmarem que aquilo que veem em sala de
aula não contribui de forma signi cativa com sua atuação pro ssional. Diante dessa
realidade, a escola precisa agir.

Por m, podemos considerar que o aumento da população e o não crescimento de


oportunidades para todos zeram com que os sistemas de ensino se tornassem mais
seletivos. Num mundo competitivo, o que temos é uma escola que tenta se equilibrar
para dar conta da missão que lhe foi con ada, sem poder assumir novamente a tarefa
de preparar para o mundo do trabalho, pois sem qualquer garantia de sucesso
pro ssional, resta-lhe a formação do homem na multiculturalidade e incerteza de seu
futuro. Desse modo, a re exão sobre sua atuação não deve se encerrar aqui, mas o
questionamento sobre suas diretrizes deve compor nossa atuação docente em busca
de uma resposta para o quadro educacional brasileiro atual.

108
15

Filosofia da Educação
na formação do
professor
109
A formação filosófica e
pedagógica do professor
no Brasil
Caro(a) aluno(a), estamos quase no nal de nossa disciplina. Para complementar
nossas observações a respeito da loso a da educação e as suas temáticas, veremos
agora os aspectos de sua aplicação na formação do professor. Nos últimos anos, um
dos principais temas abordados na formação docente tem sido a compreensão do
lugar que a loso a tem ocupado nela. Ou seja, questionando a loso a da educação
que é ensinada nas universidades, o que se discute é qual o modo de aliar a sua teoria
com uma prática e caz.

Para essa investigação, os PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) possuem o


modelo a ser alcançado pelos cursos de licenciatura no Brasil, uma vez que suas
considerações trazem como proposta de formação um conteúdo que seja capaz de
levar o futuro professor a um aprendizado re exivo. Sem se limitar à reprodução de
conteúdo, todo conhecimento apresentado na disciplina de loso a da educação
dever permitir ao aluno que as abordagens trazidas em sala de aula o levem a buscar
novas possibilidades para os dilemas que são próprios da escola e da educação como
um todo (TREVISAN, 2011). Tal experiência sanaria as limitações existentes na
elaboração das ementas dessa disciplina, permitindo que o seu saber possa encontrar
instrumentos para se tornar parte da prática diária do pro ssional da educação.

Digo isso porque dentre as ciências, as humanas é a que melhor consegue dialogar
com a loso a da educação. Essa relação é histórica e data desde os gregos antigos,
sempre no desejo de solucionar os con itos humanos, partindo de uma profunda
interpretação de quem era o homem, quais as suas características e como elas
poderiam colaborar ou não no encontro dele com o outro e consigo mesmo (SANTOS,
2017). Desse modo, vamos detalhar melhor essa primeira parte no intuito de xar
nossa temática, ok?

O que se avalia nesse primeiro momento acerca da disciplina de loso a da educação


é a maneira como ela é desenvolvida nos cursos de licenciatura de nosso país.
Fazendo uma comparação, o que se evidenciava em meados dos anos de 1990 era que
sua matriz curricular possuía um forte apelo histórico, movida por re exões que
levavam o aluno à uma compreensão técnica sobre tendências pedagógicas,

110
metodologias, autores e contextos didáticos. Todavia, o resultado dessa formação ao
longo dos anos tinha sido a de professores que recebiam somente pressupostos
normativos, conforme apontou uma pesquisa realizada por Rocha (2009), referente à
disciplina de Filoso a da Educação na formação dos professores primários
paranaenses no período 1946-1971. Assim ela descreve em sua conclusão:

Portanto, pode-se a rmar que, no período de 1946 a 1971, a


disciplina Filoso a da Educação ministrada no processo de formação
dos professores primários paranaenses tinha um caráter mais
normativo que um caráter de re exão e crítica de teorias e
práticas educacionais (ROCHA, 2009, p. 20, grifo nosso).

Essa conclusão soma-se à a rmativa trazida por Severino sobre a ausência de


referenciais sobre a Filoso a da Educação nos primeiros anos em que a disciplina era
ministrada nos cursos de pós-graduação em educação do país. Essa realidade se
alteraria apenas a partir da criação do grupo de nível nacional de pesquisadores sobre
Filoso a da Educação (SEVERINO, 2000). Formando o seu conhecimento próprio, a
Filoso a da Educação se con gurava como um saber válido e independente.

Entretanto, de que valeria um saber que não fosse útil? Ou seja, qual a função de um
conhecimento que não é visualizado, expresso numa prática? Esse é o questionamento
contemporâneo sobre a necessidade da educação, sobretudo a importância dos
conhecimentos humanísticos. Permeada por valores positivistas que entende a ciência
apenas do ponto de vista prático, encontramos na sociedade atual a cobrança feita
sobre a escola para que a educação justi que o porquê de sua existência.
Consequentemente, essa pergunta se estende ao docente, que se vê forçado a dizer e
a convencer a sociedade sobre a importância de sua pro ssão.

Para o professor em formação, tais perguntas podem levá-lo a dúvidas maiores. Por
exemplo, você já se perguntou por que precisa aprender a história da educação? Ou
então qual o sentido de estudar o que pessoas disseram séculos atrás, sendo que as
necessidades atuais são tão diferentes daquelas? Até mesmo esta disciplina pode lhe
trazer esse tipo de questionamento sobre a validade dela para sua formação, e isso é
normal, pois, uma vez questionado, o aluno também irá questionar aqueles que, em
sua concepção, poderiam lhe trazer uma resposta; nesse caso, algum professor de seu
curso.

111
Sobre essa questão, é importante dizer: não temos compromisso com a prática! É isso
mesmo! Nós, professores, sobretudo os da área de humanas, na qual a Filoso a da
Educação se enquadra, não nos relacionamos diretamente com a prática e não temos
o dever de resolver seus questionamentos. Sei que tal a rmativa pode não soar bem,
já que, enquanto lhos de nosso tempo, reproduzimos os questionamentos que nos
são feitos por nossa cultura e sociedade, sendo um deles sobre a e ciência do
trabalho docente. Porém, vamos entender o signi cado dessa desobrigação do
docente com a prática ao olhar para a formação do pedagogo.

O lugar da filosofia nos


cursos de pedagogia
Sabemos que a pedagogia é um saber que se dá historicamente por sua aplicabilidade.
Na realidade, é isso que se observa na educação dos tempos atuais: a prática tem
dominado todos os cenários, validando os conhecimentos por meio de uma ação.
Contudo, voltamos a uma questão de identidade que, no nosso caso enquanto
professores, se constrói pelo ser docente, o qual pertence a categoria dos intelectuais
(LECLERC, 2004). É claro que isso não nos torna “inúteis” para a atualidade, sobretudo
o docente que trabalha com conteúdos agudamente teóricos. Apesar da moderna
valorização da ação, do fazer em si e o esquecimento da teoria, o trabalho docente se
faz pela compreensão de que sua “prática” deve existir na elaboração de uma teoria
que possa ser vivencial.

A virada da prática no campo do conhecimento moderno não


signi ca, entretanto, um esquecimento da teoria, esvaziada dos seus
fundamentos em benefício de metodologias e técnicas. Antes disso,
signi ca que há uma nova interdependência entre o teórico e o
prático, e não a simples diluição de um dos polos contrastantes no
outro. Em síntese, de certo ponto de vista, se a teoria não for prática,
isto é, se ela não impelir à ação, torna-se inócua, vazia e sem sentido
para o mundo em que vivemos (TREVISAN, 2011, p. 205).

112
Porém, a vivência em si não nos compete! Enquanto professor, não posso me
responsabilizar pelas escolhas que você, aluno(a) fez frente ao saber adquirido. Desde
o aceite pelo conhecimento até o modo como ele seja utilizado, tudo isso compromete
o sujeito que dele fez uso, e não quem o oportunizou.

Isso responde ao questionamento moderno da função da educação, pois se desvincula


de um “fazer” para se inserir em um “ser”. Trevisan, ainda tratando a respeito das
interpretações sobre a teoria e a prática e qual delas deve ser considerada como a
mais assertiva na formação docente, bem como na atuação dessa pro ssão, nos traz a
seguinte re exão, digna de ser lida conforme foi escrita pelo autor:

A ideia de partir deste tipo de prática para pensar a formação


esquece que ela própria já está informada por uma teoria, a
saber, uma teoria que rejeita o contexto de descoberta,
operando apenas no âmbito do contexto de validação do
conhecimento (TREVISAN, 2011, p. 206, grifo nosso).

Contudo, ao olhar para o trabalho do pedagogo, essa a rmativa se torna distante da


realidade de tal pro ssional. Ele, no campo da educação, é quem mais se dedica a
aplicar seu conhecimento a partir da experiência e a vivência educativa. Faz parte de
sua essência levar a teoria para uma prática efetiva, conforme diz Mühl e Mainardi,
que a rmam que o pedagogo é o pro ssional que se faz por meio da ação (MÜHL;
MAINARDI, 2017). Porém, lembremos que nossa temática se refere à Filoso a da
Educação, esse saber híbrido que é composto pelo alinhamento da pedagogia com a
loso a. Por isso, a a rmativa de que o professor é mais responsável por uma teoria
que pela prática se encaixa perfeitamente no campo da pedagogia e no modo como a
loso a da educação nele se insere.

Mesmo não tendo local de destaque, a loso a esteve presente ao longo da história
do curso e na formação do pedagogo, abordando os fundamentos do conhecimento
pedagógico a partir de lósofos e demais intelectuais. Mühl e Mainardi (2017) fazem
um alerta sobre o desaparecimento dessa disciplina da matriz curricular dos cursos de
pedagogia, o que con rma mais uma vez o quanto a prática tem se sobreposto à
teoria, sem levar em consideração os efeitos que isso acarretará na formação do
professor e no futuro da educação escolar. O que alega sua pesquisa é o
distanciamento que a loso a sempre teve das ciências, visto que a postura desta
sempre foi a de “superior” aos demais conhecimentos por ser interpretada como a

113
responsável pela crítica e oposição às ideias trazidas por cada saber, bem como a nova
tendência do conhecimento ser mais prático que teórico (MÜHL; MAINARDI, 2017).
Aqui há uma crítica ao modo como o saber losó co foi apresentado.

Por outro lado, os autores avançam em suas considerações e chegam à conclusão de


que, historicamente, a pedagogia se limitou a ser um saber do senso comum, com
pouca objetividade, devido ao seu caráter humano.

Sob a alegação de ser uma ação prática, muitos pedagogos têm


insistido na ideia de que a aprendizagem ocorre pela prática e que a
teorização não traz, de modo geral, uma contribuição efetiva
para o desenvolvimento da prática. Em nome da experiência prática
e da e ciência didática, a re exão tem sido dispensada e a pedagogia
reduzida a ao ensino de métodos e técnicas de ensino (MÜHL;
MAINARDI, 2017, p. 14).

Frente a esse equívoco, as perdas são diversas e o papel do conteúdo pedagógico na


formação docente tem se dizimado, sendo a pura pedagogia insu ciente para lidar
com tais problemas. Nesse contexto, temos novamente a percepção da importância
do saber losó co para a formação docente enquanto conteúdo teórico e prático,
permeado por re exões dos diversos pensadores elencados ao longo da história da
loso a e da educação.

O caminho percorrido pelos autores clássicos pode ser instrumento guia para a
trajetória de formação docente na atualidade. Ou seja, numa junção entre loso a e
pedagogia, é possível retomar as possibilidades do conhecimento, desconstruindo a
obviedade dos saberes para lançá-los a uma crítica construtiva capaz de trazer novas
respostas frente aos problemas corriqueiros. Pansarelli, na introdução de sua
dissertação de mestrado, recorda-nos da importância e da necessidade dos clássicos.
Olhar para as considerações trazidas por eles, segundo o autor, não traduz uma
pretensa necessidade de reproduzi-los nos dias de hoje. Ocorre que, frente aos ruídos
das inúmeras teorias contemporâneas e o desejo por saber qual é a “menos
incorreta”, o trabalho pedagógico se perde em considerações vagas. Por isso, vale
retomar aos clássicos e ouvir a sinfonia de suas ideias a m de que se descubra o que
ainda não foi dito em nossos dias (PANSARELLI, 2014).

Para concluir, podemos a rmar que, diante do desejo de se formar o educador, faz-se
indispensável o trabalho losó co aliado ao pedagógico. Desse modo, a educação
encontraria a solução para as suas principais questões que a constituem.

114
Primeiramente, a formulação e assertividade na identidade do professor: pro ssional
intelectual capaz de gerir sua prática a partir da validação de suas teorias, sendo sua
expertise a elaboração, explanação e veri cação do conhecimento que propõe ao seu
aluno. Em segundo lugar, a transformação do saber pedagógico que, apesar de
historicamente se dar a partir de uma prática, amplia seus horizontes na junção de seu
saber com a teoria apreendida pela loso a e seus pensadores. Com essas duas
questões pontuadas, a formação docente encontrará respaldo para se tornar e caz e
indispensável na construção de novos saberes para a sociedade como um todo.

Percebe que a relação existente entre loso a e pedagogia dá sentido e


identidade ao trabalho docente? A loso a é a ciência responsável pela
re exão, pela teoria e pelos diversos conhecimentos que possam existir
sobre os mais variados assuntos. Em uma palavra, loso a é o
conhecimento teórico. Em contrapartida, a pedagogia é o campo do
saber que se preocupa com uma prática, o modo como o conhecimento
será aplicado, a quem ele atingirá e de que modo fará isso.

Sendo dois campos de saberes tão distintos e ao mesmo tempo tão


próximos, eles se alinham na atuação docente. Isso porque o docente é
o indivíduo que possui como instrumento de trabalho o seu
conhecimento. É pelo seu saber que ele se insere no mercado de
trabalho e contribui para a ciência enquanto pesquisador, mas também
para a formação de novos pro ssionais, educadores ou não. Nisso, ele
acumula em sua função o ser e o fazer, sendo sua expertise o ser, mas
que não teria fundamento e utilidade se não produzisse um fazer.
Portanto, o professor é o pro ssional que, pela teoria, permite que a
prática seja viva e e caz.

115
16

Educação enquanto
ação política

116
Educação e expressão
política
Finalizando nossa disciplina, nossa última aula abordará a questão da educação e sua
estreita relação com a política. No século XVIII, a imperatriz da Áustria, Maria Teresa,
ao assinar o decreto para a constituição da Comissão da Corte, disse que “A instrução
é e sempre foi, em cada época, um fato político” (MANACORDA, 2010, p. 301). Isso
representa o sentido que queremos dar a essa aula, trazendo a relevância que toda
consideração pedagógica traz para o contexto político.

Aristóteles a rmou que “O homem é um ser político”, o que signi cava que este havia
sido feito para viver com os demais de sua espécie. A convivência com os outros
homens, além de permitir que nos conheçamos, garante a cada um o aprendizado de
que, o pensar e o opinar são condições intrínsecas a qualquer homem, e que pela lei
se tornou direito a ser exercido e respeitado por todos. Dessa forma, a principal
exigência para se viver em sociedade é a capacidade de aceitar o diferente (VELASCO,
2018).

Toda ação pedagógica possui um m social em sua execução e planejamento. E a


partir desse planejamento é que se desdobrará as ideias de ética, moral, cidadania,
liberdade, etc. Os pressupostos que fundamentam a ação pedagógica se encontram
no modelo de sociedade vigente. Isso explica o porquê de a educação se alterar
conforme os valores políticos e culturais, vistos que, em cada realidade, esses são
dados numa perspectiva própria. Vejamos um exemplo.

Em 2014, o jornal “O Globo” trouxe na coluna “Sociedade” uma pesquisa realizada pela
Universidade de Stanford, EUA, na qual se identi cava que a educação oriental e
ocidental possuíam o mesmo valor e e cácia (O GLOBO, 2014). Diferentemente do que
se pensa, os dois per s de educação são bons, pois cada um deles atende a um ideal
de sociedade e não é possível fazer comparações de uma realidade com a outra.

Estes resultados sublinham a importância de compreender a variação


cultural na forma como as pessoas interpretam a si mesmos e suas
relações com os outros. Enquanto os pais europeus e americanos dão
asas para que as crianças voem por conta própria, os asiáticos
oferecem um vento constante sob as asas de seus lhos - descreveu
Fu, principal autor do estudo (O GLOBO, 2014).

117
O senso comum tende a interpretar obediência, subserviência, silêncio, disciplina, etc.
como valores que devem ser exigidos, sobretudo pela escola. Por vezes, nós,
educadores, caímos nesse engodo e queremos que nossos alunos somente cumpram
com o que impomos, sem criticar ou se opor aos nossos planos. Apesar de parecer
mais fácil e aparentemente ser o correto, essa interpretação não corresponde a uma
educação democrática e capaz de formar bons cidadãos.

O senso crítico precisa ocupar o espaço da sala de aula, da educação infantil ao ensino
superior, em que todas as considerações trazidas pelo aluno são dignas de serem
ouvidas e re etidas, uma vez que o espaço escolar é privilegiado por possuir as
tendências pedagógicas necessárias para a instrução dos sujeitos. Mais do que isso,
educar vai além do ensino em si e deve encaminhar o educando para uma
compreensão e atuação no contexto social feitas na liberdade (VELASCO, 2018). Essa é
a característica principal do ensino brasileiro, diferentemente de outras realidades,
pois a nossa educação corresponde às nossas necessidades sociais.

Portanto, conforme nos diz a Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional 9394/96, a
necessidade da instrução formal em nosso país e o modo como ela se desenvolve
estão pautados na liberdade para o trabalho e para a vida social (BRASIL, 1996). Como
referencial desse modelo de educação, podemos olhar para a gura de um pensador
contemporâneo que soube unir em seu trabalho as dimensões política, pedagógica e
social. Vejamos a teoria de Paulo Freire.

Paulo Freire: educador e


teórico
Trazemos para discussão o pensamento de Paulo Freire porque, o que encontramos
em suas considerações para a educação nacional, se mistura numa proposta
pedagógica, porém política, conforme entendemos o signi cado de educação política.
Não nos referimos à Freire como modelo político, mas pedagógico e losó co para a
realidade nacional, isso porque, frente a desigualdade econômica e a difícil condição
social e política da população, ele inaugura uma educação que, ao alfabetizar por meio

118
de questões do cotidiano, faça o sujeito enxergar as possibilidades de sair de sua
condição precária e encontrar novos mecanismos para se recolocar socialmente
(PILETTI; PILETTI, 2018).

Nessa caminhada, a educação se faz o instrumento motor, levando para a educação


de jovens e adultos a libertação de suas limitações intelectuais e sociais, com temas
críticos, porém, a partir da linguagem do seu cotidiano. Desse modo, o ato do
professor não é desinteressado, apenas cumprindo com uma função externa. Ao
contrário, o professor para Freire é alguém engajado e intencionado em sua tarefa de
educar. Para isso, ele foge do método corriqueiro de adaptar o seu aluno aos
conhecimentos e mundo já estipulado e dividido (FREIRE, 1975). Certamente que essa
postura exigirá do mestre muito mais empenho e coragem, pois a intenção dessa
educação é desestabilizar. Nessa proposta retomamos a ideia do diálogo para sair do
conhecimento e chegar no sujeito.

O caminho, por isto mesmo, para um trabalho de libertação a ser


realizado pela liderança revolucionária não é a “propaganda
libertadora”. Não está no mero ato de “depositar” a crença da
liberdade nos oprimidos, pensando conquistar a sua con ança, mas
no dialogar com eles (FREIRE, 1975, p. 58).

119
Perceba que a linguagem utilizada pelo autor nos remete a um diálogo político, isso
porque, em sua compreensão, a educação não teria sentido se não levasse o indivíduo
a uma ação social, por si e por todos. Quando Freire fala em outros momentos sobre
uma educação domesticadora, ele se refere ao modelo vigente em sua época, no
qual a escola cumpria somente com a função de transferir conhecimentos, sem
qualquer preocupação política e social com aquilo que estava ensinando. Já quando
propõe uma educação para libertação, acreditava que o ato de conhecimento devia
se fundar numa ação transformadora do sujeito e da realidade na qual ele se
encontrava (FREIRE, 1975).

O mais interessante em sua proposta é a percepção que ele tinha a respeito do modo
como ela deveria acontecer. O que tornava sua pedagogia mais desa adora era o fato
de exigir que todo o trabalho realizado com o aluno não fosse convincente, mas
realista. Ou seja, a tarefa da educação não era “resgatar” os seus sujeitos, mas
mostrar-lhes os rumos da história e aprender com ela ao mesmo tempo em que
construíam a sua própria. Para isso, era necessário acabar com o analfabetismo
político, que seria uma percepção ingênua dos fatos e do mundo. Segundo Freire,
(2011), “o ‘analfabeto’ político, experimentando um sentimento de impotência em face
da irracionalidade de uma realidade alienante e todo-poderosa, procura refugiar-se na
falsa segurança do subjetivismo”.

Cuidando somente de seu próprio interesse, o sujeito sem conhecimentos políticos


claros enxerga o futuro pronto, sem esperanças e perspectivas de mudanças porque
não consegue perceber que a mudança do amanhã se encontra naquilo que é feito
agora. Desse modo, a educação política seria aquela que quer transformar a realidade
social através da ajuda mútua entre educadores e educandos, desmisti cando a
realidade pela ação e conhecimento.

O modo pelo qual essa educação se organizaria seria pelo comprometimento que
educador e educando teriam em conhecer a realidade dos fatos, para assim poder
alterá-los. Por isso a ciência não é neutra, tampouco a educação! Ao entrar em contato
com uma realidade, elas sempre acabam escolhendo um lado, mesmo quando se
silenciam diante de um fato, pois o silêncio também é um posicionamento. Ela deve
partir para a re exão, mas também levar a ação, sem car passiva, visto que a
mudança social só ocorrerá na prática, nunca apenas na consciência. A isso Freire
chama de Consciência-mundo: uma consciência que vem da prática (FREIRE, 2011).

120
Aparentemente, essa proposta soa como utópica e impossível de acontecer, tendo em
vista que já existe uma educação estruturada e uma proposta política que permeia os
espaços educacionais e econômicos do país. Contudo, Freire explica que haveria uma
mudança de paradigmas e valores, a começar pelos sujeitos que seriam educados.

Por meio dessa proposta, a educação dominadora seria substituída pela


humanizadora, sendo o ato de conhecer que interfere na relação entre consciência e
mundo; assim, conhecer o novo seria possível! Chega-se a essa conclusão porque o
que se tem hoje veio de uma busca frente a um conhecimento anterior (velho), o que
indica que a mudança é possível (FREIRE, 2011). Portanto, ação cultural e educacional é
conhecer e reconhecer o conhecimento existente, fato que não ocorre com quem
recebe a educação dominadora, que é apolítica.

Por m, o que podemos concluir é que a ação política, mais que uma imposição
tendenciosa sobre o ato de educar, é na realidade a base para qualquer a rmativa
pedagógica. Quando se identi ca a política vigente de um país, a educação dele
poderá caminhar para dois rumos, aceitar e validar os ideais políticos e culturais por
meio de ações pedagógicas, ou então refutá-los e torná-los mais democráticos e
participativos nos diversos segmentos em que a educação possa encontrar espaço
para atuar. No caso de Paulo Freire, seu modelo de educação seguia a segunda
vertente, tornando-se objeto de transformação dos sujeitos que necessitavam serem
mais que observadores sociais, mas indivíduos ativos e politizados.

121
Conforme vimos, o senso comum tende a acreditar que a obediência e a
submissão aos preceitos sociais são valores que devem ser ensinados
pela escola. Contudo, muitos se esquecem ou não compreendem que a
nossa realidade cultural não permite que tais ensinamentos encontrem
adesão por parte dos educandos. Isso não signi ca que nossa cultura
não sabe educar! Muito pelo contrário, apenas indica que a nossa
história e realidade social foi e continua sendo permeada por políticas
de igualdade social, de classe, gênero, etc.

Participamos da ONU e de seu grupo dos Direitos Humanos desde a sua


fundação em 1948 e somos um país diversi cado e rico em povos
imigrantes desde a colonização. Todos esses fatores não podem ser
ignorados, pois corroboraram a formação de nossa identidade. Numa
cultura oposta à nossa, trago o discurso da ativista de direitos humanos
norte-coreana Yeonmi Park, que fugiu de seu país em 2007 e se
refugiou na Coreia do sul em 2009. No vídeo, ela apresenta a realidade
que seu povo vivencia: são proibidos de ler jornal, ouvir música, assistir
TV e fazer ou receber ligações do exterior.

Assista ao vídeo Disponível aqui

122
Material Complementar
LIVRO

Título: Emílio ou da Educação


Autor: Jean-Jacques Rousseau
Editora: DIFEL
Sinopse: nessa obra, o filósofo Jean-Jacques Rousseau traz a história
da França do século XVIII ao mesmo tempo em que apresenta como
seria a formação de seu aluno fictício, Emílio. Essa é uma das suas
principais obras, além de ser considerada um referencial pedagógico,
e também é lido pela perspectiva filosófica, o que tornou a sua crítica
sobre a França e a estruturação social conhecida.
Comentário: Recomenda-se essa obra, tendo em vista a temática de
nossa disciplina. Apesar de ela trazer somente a crítica rousseauniana
referente ao século XVIII, nela se torna evidente o cenário social da épo-
ca e quais instrumentos o autor utiliza para desfigurar aquele cenário,
tendo em vista a busca pela liberdade e felicidade humana. Por ele, é
possível identificar o lado utópico da filosofia, crente na possibilidade
de ascensão do homem frente às imposições materiais, políticas e so-
ciais que compõem a época, mas que fazem parte de todo e qualquer
cenário onde se encontre o homem em relações sociais.

123
Conclusão
Chegamos ao final de nossa disciplina! Nela, pudemos compreender o signifi-
cado da Filosofia da Educação e perceber que essa ciência híbrida se formou
a partir da junção de duas áreas distintas de conhecimento: a Filosofia e a
Pedagogia/Educação. Ao conciliar Filosofia com Educação, o que se obteve foi
a leitura filosófica direcionada aos problemas da educação, começando pelo
trabalho de filósofos que compuserem suas obras e nelas tentaram respon-
der aos problemas políticos e sociais de sua época, apelando para a educação.

Caminhando pelas leituras de Thomas Hobbes, John Locke, Rousseau, Com-


te e Foucault, identificamos de que modo cada um desses autores contribuiu
com a análise da educação em seus contextos, direta ou indiretamente
tratando a respeito dos impactos que a educação traria para suas filoso-
fias. Vale ressaltar que a leitura desses filósofos se tornou crucial para que
pudéssemos avançar em nossas leituras e chegar ao pensamento filosófi-
co-pedagógico no Brasil.

Não somente nessa disciplina, mas no início dos cursos de pós-graduação


em educação do país, foram as leituras dos pensadores clássicos que deram
o respaldo para se constituir os primeiros movimentos da Filosofia da Edu-
cação. Permeada pela leitura dos filósofos e de suas obras que tendiam para
uma reflexão pedagógica, a Filosofia da Educação ganhava corpo e começava
a se estruturar como uma ciência autônoma, capaz de trazer seus próprios
questionamentos e respondê-los a partir dos instrumentos que se construíam
com o passar do tempo e do aperfeiçoamento de tal disciplina. É claro que,
assim como todo conhecimento, a ordem de reflexão que se utilizou para
embasar a problemática educacional foi constituído conforme o momento
histórico, bem como a intenção do período no qual foi escrito. Por isso, vimos
as principais correntes filosóficas, que seria o Idealismo, o Materialismo e a
Escolástica. Certamente as demais correntes teriam muito a contribuir em
nosso debate, porém, as três selecionadas para esse momento souberam
representar a diversidade intelectual que existe nos saberes filosóficos.

Mesmo assim, fomos adiante e vimos que, independentemente da corrente


filosófica utilizada, toda ação educativa, social e cultural estava permeada
por valores de ordem moral. Isso significa que a condução de toda reflexão e
prática deve primeiramente passar pelo crivo da moral a fim de se registrar

124
o que é considerado bom ou ruim, certo ou errado no contexto social. Em um primeiro
momento, essa análise é social, pois nos permitiu compreender o que era valor e moral,
mas depois se tornou filosofia ao inserirmos em nossas aulas a definição de ética.

A ética permeia o espaço da filosofia, pois faz questionamentos acerca dos valores
morais e das leis criadas para cada grupo e aplicadas friamente. Seriam as leis sempre
justas? Todas as sentenças morais são corretas ou é possível que ela contenha equívo-
cos? Ou seja, a ética sempre questiona e leva os grupos a repensarem suas posturas
morais, tornando a vida em sociedade mais fraterna e saudável. Essa presença da ética
é tão importante que foi necessária sua expansão, partindo dos dizeres filosóficos para
adentrar os diversos campos de saberes e ações sociais. No nosso caso, vimos três deles:
a bioética, a ética dos negócios e a ética ambiental.

Em cada uma delas, percorremos o cerne de seu objetivo e quais os resultados que sua
pesquisa poderia trazer. Conhecendo mais sobre cada uma delas, pudemos interagir
com a ciência, criando parceria entre ela e os conhecimentos humanos.

Voltando nosso olhar para a pedagogia em si, tratamos das tendências pedagógicas
e delas retiramos os principais movimentos que compuseram o cenário educacional
brasileiro. Mais que histórias do passado, as tendências pedagógicas ainda sobrevivem
na escola atual, sendo papel do professor equilibrar sua metodologia para que possa,
na medida do possível, caminhar por todas elas, entendendo suas expressões e aquilo
que cada uma trouxe de bom na construção dos conhecimentos e da formação humana.

Na educação moderna, vimos o quanto a educação atual está permeada por ideologias e
o papel que ela possui na construção de uma sociedade equilibrada. Apesar do termo ser
interpretado pejorativamente, ideologia é o conjunto de ideias e pensamentos que podem
ser debatidos e dialogados. Todo conhecimento possui suas verdades, porém, o que as
torna válidas é a capacidade de dialogar com as demais de forma democrática e civilizada.

Nessa perspectiva, vimos que esse tipo de ensino deve permear a formação do educa-
dor. Lidar com questões históricas e ao mesmo tempo fazer delas conteúdos transfor-
madores é dever do professor, e nisso se dá sua prática. Por fim, vimos que a educação
é uma expressão política, e por tal motivo, deve levar os seus sujeitos a uma atuação,
inserindo-os numa vida feliz, mas engajada na defesa da vida e dignidade humana, as-
sim como dizia Paulo Freire.
Foi um prazer caminhar com você até aqui! Agradeço a companhia e desejo que nos
encontremos nas próximas oportunidades de estudo. Forte abraço.

Prof. Me. Jhonatan D. O. Alves.

125
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