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arte brasileira contemporânea

um prelúdio
Entrevistas com críticos e curadores de arte selecionados
por Paulo Sergio Duarte
Rio de Janeiro, maio a julho de 2008

As entrevistas que se seguem foram feitas pelo curador


e crítico de arte Paulo Sergio Duarte, visando à inserção
de trechos dos depoimentos no DVD que acompanha
arte brasileira contemporânea este livro e que é dirigido por Murilo Salles. O projeto
um prelúdio
propôs ao curador o desafio de conceituar e fazer uma
introdução (em mídias diferentes: um livro e um DVD)
capaz de oferecer chaves ao público não especializado
para a compreensão do complexo e plural universo da
arte contemporânea. Agrupando artistas com diver-
sas linguagens e abordando as principais questões que
trazem surpresa e perplexidade para este público, sem-
pre à luz da história e tecendo suas relações com a arte
no mundo.
Ao longo do trabalho, percebemos que essas entre-
vistas, se publicadas na íntegra, seriam excelente fonte
de pesquisa e informação. Um material que permitirá
cotejar a diversidade de análises críticas e, simultanea-
mente, as coincidentes questões que tocam os teóricos
especializados e induzem a uma ampla reflexão sobre a
arte hoje, excluindo os conceitos fechados.
É este o trabalho que a edição do livro Arte Brasile-
ira Contemporânea, um prelúdio mostra neste CD Rom.
Esperamos que sejam um ponto de partida para no-
vas investigações e algumas luzes para os leitores.

Silvia Roesler,
Rio de Janeiro, 7 de outubro de 2008
arte brasileira contemporânea
um prelúdio

sumário

1_ Ana Paula Cohen 1


2_ Fernando Cocchiarale 29
3_ Ferreira Gullar 41
4_ Gloria Ferreira 60
5_ Ivo Mesquita 73
6_ Lisette Lagnado 91
7_ Luisa Duarte 104
8_ Luiz Camillo 116
9_ Luiza Interlenghi 131
10_ Marcelo Araujo 147
11_ Paulo Herkenhoff 160
12_ Paulo VenâncioFilho 174
13_ Rodrigo Naves 187
14_ Ronaldo Brito 195
15_ Sônia Salzstein 208
16_ Sugestões de leitura
arte brasileira contemporânea
um prelúdio

créditos

Projeto e proponente
Instituto Cultural PLAJAP/ Jacqueline Plass
Projeto, coordenação e edição
Silvia Roesler Edições de Arte
Projeto gráfico
eg.design
Edição de textos
Paulo Sergio Duarte e Fernanda Lopes
Revisão e padronização
Alexandra Bertola
Versão para o inglês
Steve Yolen e Peter Warner
Transcrição das fitas gravadas
Vania Chalfum Gomes de Almeida e
Margaret Bugarin Mansur
Transcrição para a entrevista de Ronaldo Brito
Danielle Prado e Reynaldo Picozzi
Produção do CDRom
CDA Produção Gráfica e Digital
Ferreira Gullar
Entrevista realizada por Paulo Sergio Duarte

PAULO SERGIO DUARTE_ Gullar, para começar, você tem desenvolvido uma das raras vozes que mani-
festam uma perspectiva crítica muito aguda em relação ao panorama da arte contemporânea. Evidente-
mente você se diferencia de muitos críticos desse tipo de ponto de vista por causa da sua biografia e da
sua experiência.
Na década de 1950, não somente a sua poesia tinha um caráter desde A luta corporal, uma contribui-
ção, que era no panorama da literatura brasileira uma contribuição inovadora e inédita, como posterior-
mente você desenvolveu, logo depois de Mário Pedrosa, uma das raras reflexões mais agudas sobre uma
teoria da arte no Brasil. Na sua prática poética e também experimental naquele período, você chegou aos
limites daquilo que somente 11 anos depois, 12 anos depois, Lucy Lippard chamaria de desmaterialização
do objeto de arte. Você chegou à desmaterialização completa do poema, quando você enterra um poema.
Posteriormente, você revisa uma série desses paradigmas e continua uma produção literária e poé-
tica de grande envergadura e também uma produção crítica que se intensificou desde a Revista Módulo,
revista criada por Oscar Niemeyer, onde você também desenvolvia uma crítica. Você continua mantendo
uma visão importante, tem uma contribuição importante. Em um coro onde todos tocam uníssono, você
aparece com uma voz dissonante, mas pertinente. Lembro-me que Miles Davis tem uma frase, que até
foi reproduzida depois pelo Caetano Veloso no disco Tropicália, ironizando os Estados Unidos: “que ma-
ravilhoso esse país nosso que coloca 100 músicos para tocar uníssono”.
Existe hoje no panorama do sistema da arte – vamos chamar assim essa coisa que envolve museus, cura-
dores, academia, críticos – certa ausência de distanciamento em relação a esse meio.
Vamos a uma pergunta específica. Você, tendo esse tipo de experiência, que é uma experiência rara,
atravessando esses diversos momentos de uma formação de um olhar moderno no Brasil, como você
vê a diferença em relação àquela situação do final dos anos 50 para a situação de hoje, no Brasil? O que
significava aquela situação no final dos anos 50? Você tinha um diálogo intenso, tinha um debate com os
concretistas de São Paulo. A meu ver, uma contribuição original, o Manifesto neoconcreto – já escrevi isso
em um livro – dialoga de igual para igual com qualquer produção teórica de qualquer lugar do mundo. E
um vetor mais importante ainda, creio, que era quebrar a ilusão de uma visão positivista da arte, como se
a arte pudesse ser uma experiência que se passava na plena objetividade, como uma análise científica do
mundo. Você, ao criticar aquele positivismo que estava muito impregnado na visão de certos teóricos de

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São Paulo e artistas, dá uma contribuição para recolocar, não apenas a questão do debate entre neocon-
cretismo e o concretismo, mas para recolocar a questão da arte em um plano que ela estava situada, pelo
menos, desde Kant. Ou seja, uma experiência estética não vai se passar nunca como uma demonstração
de um teorema matemático.
Vendo a situação daquela época e vendo a situação hoje, o que você assinalaria como grandes
mudanças?

FERREIRA GULLAR_ Tenho aqui que definir a minha visão com relação àquela época para comparar
com a de hoje. Acredito que aquele momento, o movimento da arte concreta, estabelece uma ruptura na
arte brasileira com relação à tradição modernista que nasceu, vamos dizer, em 1919 com Anita Malfatti,
e 1922, com a Semana de Arte Moderna, por aí. Essa coisa que se desenvolve nos anos 20, nos anos 30
e 40. A aparição da arte concreta é uma ruptura drástica com o que não tem nada que ver. Aquela arte
tinha raízes nacionais. Tinha busca de certo primitivismo, inclusive como está em Macunaíma, como está
na pintura de Tarsila. Uma coisa do Brasil primitivo, do Brasil ingênuo. É uma vinda por cima dos anos da
2ª Guerra Mundial, uma ruptura com relação à fonte tradicional da arte brasileira que é Paris. Aí derruba
e vem a arte concreta, que por sua vez é conseqüência do que surgiu com Mondrian e com a Bauhaus.
É uma arte de caráter racionalista, que é derivada da ruptura da eliminação da figura e a busca de uma
linguagem nova, que, sem a figura, que linguagem será essa? Uma linguagem da geometria? O que sig-
nificam as formas geométricas? O que elas são?
Terminou sendo o seguinte. Um tipo de experiência puramente sensorial. Alguns dos quadros do
Max Bill, por exemplo, são experiências do campo visual, a exploração da dinâmica visual. Esse negócio
vai dar mais tarde na op-art, quer dizer, uma arte de dinamismo visual, da exploração do campo visual
a partir de Vassareli. Qual o conteúdo que vou botar na geometria, nessas figuras? O que elas represen-
tam? Por que os significados não estão no ar. Não existe no ar, não voam como mosca. Está nas lingua-
gens. Se a linguagem é X, o significado só pode ser por aí.
Então, intuitivamente, comecei a sentir que aquilo era uma coisa limitativa, porque eu, como poeta
que tinha mergulhado em uma experiência que resultou na desintegração da linguagem e que, de certo
modo, provocou a poesia concreta, não por antecipá-la, mas por criar uma situação de fato, quer dizer,
você destruiu a outra linguagem, então tem que criar uma nova. Quem ganhou foram eles, mas em fun-
ção de ter destruído.
Mas eu não tinha nada a ver com aquilo. Sempre fui uma pessoa buscando, perplexo diante do mun-
do, diante das coisas e não a busca de soluções superficiais, sensoriais. A arte neoconcreta é a tentativa
de dar conteúdo subjetivo, simbólico para a geometria. Simplificando. Porque quando fiz meus poemas
espaciais – o primeiro que fiz o livro-poema – estava ali a origem da participação do espectador na obra
de arte. Ele não é nada genial. Ele é só um livro e, como livro, se manuseia. Quando transformo o livro
em uma estrutura manuseável, um poema que não pode ser publicado em outro livro senão com aquela
forma, então eu tenho um objeto espacial que eu manipulo. E daí nasce a participação do espectador.
Como? Em função de uma decorrência natural das coisas. E uma vez feito isso, vou fazer o poema espa-
cial, como Lembra, que bota a palavra embaixo do cubo, e a mão é utilizada para levantar o cubo e se
poder ler a palavra. Aí depois quero utilizar o corpo e faço o poema enterrado, para entrar o corpo inteiro
dentro do poema. Desce pela escada, abre a porta e entra no poema.
Essa coisa do corpo que já está no livro A luta corporal. É o que vai desintegrar a nossa herança de

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neoconcretos, a nossa herança geométrica e vai levar Lygia Clark e Hélio Oiticica a abandonar tudo e
romper os limites: é tudo corpo, é tudo sensorialidade, porque não tem significado. Porque o grande
problema me parece ser qual é o sentido que tem isso? Qual é o sentido? Porque Lygia faz o Bicho, que é
a escultura manuseável, depois de ter feito o Casulo, que é o abandono da pintura, pois estou diante da
tela em branco. E diante da tela em branco só tenho duas opções: ou deixo de pintar, ou volto a pintar.
Se volto a pintar, volta toda a problemática de novo: figura, fundo e tal. Não volto a pintar e não vou mais
ter com o quadro uma relação de pintor. Agora vou ter uma relação real. Vou estufar a tela, vou agir sobre
a tela, não vou mais pintar sobre a tela. Vou agir sobre, vou transformá-la materialmente. Estufa, e de
estufa vai para o Bicho que cai no chão.

PSD_ Lembro-me desse texto seu. Da Linha orgânica passa para o Casulo.

FG_ Então é a substituição da significação intelectual pelo trato pessoal, corporal com as coisas. Objetos
relacionais, o que é isso? Esses objetos podem servir para reestruturação do self, do eu profundo. Lygia
entra então aí em uma mitologia freudiana, psicanalítica, buscando significado para uma coisa material
que se nega a ter um significado intelectual. É um problema. Isso aí vai derivar até as últimas conseqüên-
cias. Saiu o limite da arte, aquilo ali já é uma coisa que ela própria dizia: “O que eu faço não é arte”. Tentou
transformar em terapia.
Por outros caminhos, a arte da Europa, dos Estados Unidos terminou embicando também por aí, por
uma falta de aceitar a arte, a pintura como a criação de significados que estão relacionados com a figura,
que estão relacionados com o mundo objetivo, com a natureza e até com o imaginário poético. Uma
coisa que vai ficando cada vez mais material, mais destituída de fantasia. Isso está ligado ao problema do
artesanato, porque toda essa crise era deflagrada por uma arte artesanal em uma sociedade industrial,
porque o ready-made é isso. Não é nada mais do que isso. Está pronto, não precisa fazer. Artesanato já
era. Não tem que fazer. A indústria faz.

PSD_ A pintura do Andy Warhol é um processo industrial. Ele chamava o ateliê dele de fábrica.

FG_ Claro. Claro. Mas qual foi o uso da tecnologia? Quais foram os elementos de tecnologia que vieram
a substituir o artesanato, a linguagem artesanal? Todas as tentativas não deram em nada. A única arte
tecnológica que existe é o cinema, que tem significado, tem linguagem, que criou todo um mundo ima-
ginário com todos os recursos de uma linguagem própria e não está em nenhuma outra arte. O close de
uma mão ou de um olho, ou um long shot criam experiências expressivas que o ser humano desconhecia.
Mas fora daí, não vejo o que tem de novo. Resultou o seguinte, do ready-made que é o “eu não fazer”,
porque já está pronto, vou para o meu próprio corpo, e aí me crucifico em uma traseira de fusca, ou sirvo
café vestido de garçom. No final é a performance que é eu sem arte. Eu sou a arte. O meu corpo não tem
artesanato nem tem tecnologia. Então eu sou a arte.
Isso aí é uma coisa que, não tenho dúvida alguma, não é de fato arte. Isso é uma coisa niilista. Isso é
a liquidação do mundo imaginário do ser humano. O mundo é inventado por nós e nós vivemos em um
mundo inventado por nós que é o mundo da cultura. A destruição da arte é uma coisa negativa. Botar
cocô em uma lata e mandar para o museu, isso é uma coisa abominável. Arte são 20 mil anos de tentativa
do homem de criar a fantasia e a imaginação, e o cara diz que arte é merda.

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PSD_ Mas ali havia uma atitude do Piero Manzoni. Quando o Manzoni faz isso em 1960, ele é um pintor
também. Ele faz aquilo como um gesto irônico de negação de mostrar: “olha, isso aqui é...”

FG_ Sim, mas é entendido como sendo...

PSD_ É claro.

FG_ Então é essa coisa também. Eu me visto de garçom e, em vez de expor quadro, fico servindo café
dentro da galeria. Estou dizendo o quê? Estou dizendo que a arte não interessa. Tanto faz servir café,
como expor quadro.
Trata-se de um impasse. Não se trata de vigarice, não se trata de burla, não se trata de farsa. Trata-
se de um processo cultural que deu nisso em função de uma quantidade de problemas e de contradições
e de coisas do mundo contemporâneo. Agora, isso só não é inevitável, pelo seguinte. Por que a literatura
não seguiu esse rumo? Por que o Finnegans Wake não se transformou no ready-made do Duchamp e ser-
viu de exemplo para a literatura? Já imaginou o desastre que teria sido?

PSD_ É. Realmente... Mas talvez a experiência ótica seja um pouco diferente da experiência literária.

FG_ Não. O que estou falando é outra coisa.

PSD_ Por exemplo. Eu sei o que você está falando com pertinência, mas veja bem. Vamos pensar
ainda no campo da arte. Quando a modernidade abandona os grandes temas, os temas eruditos, os
temas da arte, digamos assim, da alta cultura. Claro que Chardin já tinha feito isso no século XVIII, mas
quando o Cézanne pinta 30 vezes a montanha Saint Victoire, ou pinta 40 vezes um monte de maçãs
no ateliê dele, esses temas não têm a eloqüência de um quadro histórico, de um quadro religioso. Não
tem a eloqüência de um quadro mitológico onde havia toda uma narrativa embutida. Apesar de as
pessoas olharem, quem estava participando daquele sistema cultural entendia perfeitamente. Aquilo
é o julgamento de Páris: a maçã da discórdia foi lançada lá na festa e ele está fazendo o juízo de quem
é mais belo. Vi a Anunciação de Cristo. Quando é um monte de maçã, um monte de maçãs repetido 30,
40 vezes, não é mais maçã, é pintura.

FG_ Mas ele próprio dizia.

PSD_ Claro.

FG_ Mas a problemática é essa. Transforma o mundo em pintura. Isso aí é o impasse. É o caminho do im-
passe: quando a arte desiste de fazer a fantasia e faz a realidade. A arte sem transcendência não existe.

PSD_ Isso que é o importante.

FG_ Arte sem transcendência não existe. O que Cézanne faz? Como ele não pode transcender temati-
camente, ele desintegra a linguagem. Ele transcende violentando a linguagem. Ele destrói o realismo

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violentando a linguagem, porque o realismo não é arte. Busca da realidade não é arte. A arte é a nega-
ção da realidade, é a reinvenção da vida. O Velásquez só faz arte quando faz As meninas. Quando ele
faz aquele boi, aquele cavalo, igualzinho, aquilo ali, é banal. Quando ele faz o espelho de As meninas é
porque ele tem que transcender, ele tem que fazer alguma coisa que seja mais do que imitar banana,
imitar maçã. Tem que violentar, porque a vida é pouca. Porque a vida não basta, por isso que então dá
para copiar a vida.
Os instrumentos que tenho são esses que os homens criaram. Porque se pretende apresentar essa
arte como fenômeno da época, o fatalismo do progresso é a evolução da sociedade. Então se chegou a
isso. Não é verdade. Se isso fosse verdade, todas as artes teriam seguido o mesmo caminho, porque você
diz: “Não, mas uma arte ótica é diferente”. Mas por que Joyce fez o Finnegans Wake? Porque é a mesma
coisa. O Joyce era um naturalista. Ele é um naturalista chato que fica descrevendo as coisas minuciosa-
mente, buscando a transcendência. Isso é o que ele é. Aí quando ele descobre o fluxo da consciência,
pensa: “Estou sendo transcendente sem ser irreal”. Então, aí se termina chegando ao Finnegans Wake,
que é a tentativa, que nem Cézanne, de criar uma linguagem tão contraditória que ela seja rica em si
mesma, mesmo sem significado, mesmo indecifrável que seja. Mas sucede que se seguisse o rumo dele,
se seguisse, não tinha Jorge Luis Borges, Faulkner, João Guimarães Rosa. Não teria nada disso. Teria o
quê? Essa merda que tem aí de nego nu, matando cachorro. Essa coisa ridícula da larva de mosca. Isso é
uma coisa... Faça o que quiser.

PSD_ Sei que você não viu a exposição do Tunga que tinha as moscas.

FG_ Não. Não vou ver.

PSD_ Eram várias esculturas. Não eram larvas de moscas. Era uma cena, encenada com música, com um
conjunto tocando música clássica.

FG_ Isso não me interessa. Não fui ver simplesmente porque isso não me interessa.

PSD_ Porque quando fala larva, parece que tinha larvas de mosca, mas não era isso.

FG_ Mas ele não botou aquilo como uma exposição de escultura. Botou uns espelhos, umas coisas que vi
em fotografia, mas o que se falava que ele próprio declarou era que o negócio era larva de mosca, porque
é a novidade que ele tem. Qual é a outra novidade? Ele é escultor?

PSD_ Ele se considera um escultor. A luz de dois mundos, que vi no Louvre, é uma escultura em que o
tipiti é bem característico da nossa região, mais até do Norte do que do Nordeste. O tipiti, que é usado
para espremer a macaxeira, para espremer o aipim também, para tirar a mandioca braba. Ele espreme
as cabeças, que são réplicas de cabeças da antiga civilização européia. Está pendurado lá, enquanto tem
em cima de uma rede de dormir, que é uma coisa típica também nossa. Não é européia, a rede de dormir,
a maca em espanhol, a hamack em inglês.

FG_ Uma exposição antropológica.

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PSD_ É. Aprendi com o Cascudo. Mas é uma escultura. Tem uma beleza estética, procura essa trans-
cedência.

FG_ Não vamos discutir.

PSD_ Mostro as imagens até para você ter o olhar. Tem uma preocupação escultórica, tem uma preocu-
pação em transcender o imediato. Chama-se A luz de dois mundos não por acaso, porque tem o esqueleto
de um índio degolado na cama, enquanto o tipiti espreme as cabeças de antigas civilizações. É um con-
junto de questões ali com significado, cheio de significado.

FG_ Pois é, mas não estou interessado nisso. Quando me meti em artes plásticas, fiz porque gosto de
gravura, de desenho, de pintura. Por exemplo, jamais iria ver uma exposição de biologia, porque não é
o meu campo. Não estou interessado nisso. Não estou dizendo que o cara não pode fazer, que o cara
não queira fazer. Só estou dizendo que não é o meu terreno e não estou interessado nisso, tanto que
abandonei isso. Chegou a um determinado momento que abandonei, porque vi que isso estava me
levando para um terreno que não é o meu, não é o que eu queria, não é o meu mundo. Então, saí fora
daquilo. Não porque negasse o que eu tinha feito. Não. Tanto que depois até indiquei o trabalho da
Lygia Clark para ser prêmio da Bolsa de Valores e escrevi sobre a Lygia na época. Mas o problema é
esse. Chegou a um ponto em que aquilo não me interessa mais. Objetos relacionais, o negócio do ego,
não é a minha. Estou fora disso. Tudo bem, pode fazer à vontade que não tenho nada com isso. Agora,
não é a minha, não estou interessado nisso.

PSD_ Nessa situação atual, você vê ainda possibilidade, dentro das chamadas artes visuais ou artes
plásticas como chamamos em português, no Brasil. Lá fora chamamos só artes. Já sabe o que está fa-
lando. Aqui temos que botar esse complemento nominal, esses adjetivos. Mas você acha que na atual
situação existem artistas que chamem sua atenção e que você se sente interessado pela obra que eles
estão desenvolvendo?

FG_ Alguns artistas sim, como Siron Franco, como o Antonio Henrique Amaral, como o João Câmara.
Tem até um rapaz agora que vi que era de Goiás, esqueci o nome dele. Recebi um catálogo com quatro
artistas e um deles tem uns desenhos que são preciosos. Tem também a Lucia Laguna, que expôs lá no
Paço Imperial ano passado (2007). Acho interessante.

PSD_ A pintura da paisagem que ela faz, a casa dela vista do morro da Mangueira.

FG_ Acho muito interessante aquilo. E outras coisas, até instalações como eu vi, que o menino fez lá no
Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro que era tudo vermelho.

PSD_ O desvio para o vermelho do Cildo Meireles.

FG_ É. Muito bonito. É uma coisa muito forte, muito expressiva. Outras coisas não me interessam. Não é
a minha, não tenho nada a ver com aquilo porque é outro mundo, é outra coisa.

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PSD_ Você estava falando para a literatura. Você estava fazendo um paralelo quando interrompi.

FG_ Só estava dizendo por que não é só na literatura. Vanguarda houve no teatro, houve na literatura,
houve na poesia, houve no romance, houve na música. Todos esses gêneros artísticos receberam a rica
contribuição que a vanguarda trouxe, porque a vanguarda estreou caminhos novos da linguagem em
todas as artes. Essas coisas foram incorporadas e essas artes voltaram ao seu leito criativo normal, que
permite às pessoas participarem das coisas. Então, o único caminho onde isso não aconteceu foi nas
artes plásticas. Pelo menos em um setor, em uma tendência que se chama hoje de arte contemporânea,
que não pode ser ensinada a ninguém. Já imaginou um jovem artista dizendo: “Quero ser como o Tunga”.
Ele vai falar com o Tunga. O que o Tunga vai dizer para ele? Não se pode ensinar, não pode ser transmitido
a ninguém. São só gênios. Só pode ser gênio. Ou é gênio ou não é nada. Não existe isso!
Fui numa exposição do Tunga há muitos anos em uma galeria naquela época. Tinha uma massa de
bronze desfiado e tal. Olhei aquele negócio amorfo, gigantesco, falei assim: “Isso aqui está à venda?”.
“Não, o que está à venda está aqui”, e aí abriu uma gaveta com uma porção de desenhos do Tunga. Quer
dizer, então aquilo é marketing. O que vende é o desenho, porque ninguém compra aquilo. As coisas
são feitas e destruídas. Quando presidente da Funarte, fui à sala onde estavam as obras premiadas pelo
Salão Nacional de Arte Moderna, que era propriedade da Funarte. A Heloisa Lustosa queria a sala para
fazer lá o Espaço Mário Pedrosa. Eu disse: “É uma coisa razoável. Então, Heloisa, vou fazer o seguinte.
Vou pegar todos os trabalhos que estão nesta sala e vou doar aos respectivos estados”. Por exemplo, se
o cara é de Goiás, se tiver obra dele lá, faço um contato com uma instituição de lá, dôo a obra, porque a
Funarte não tem condições de guardar isso. Então, vou doar para o Rio Grande do Sul, para onde for. Fui à
sala. É inacreditável. É um amontoado de coisa velha, de coisa desmembrada, não tinha nada. Era lixo.

PSD_ Isso eram os prêmios?

FG_ Os prêmios do Salão Nacional. Era lixo. Um pedaço de uma corrente enferrujada num canto, eu
disse: “Pertencia a quem?”. O rapaz que tomava conta lá respondeu: “Não sei, doutor”. Estava tudo
caindo aos pedaços. Borrachas podres eram as obras. O que tinha? Quatro quadros na parede. Era o
que tinha. Então, o que é isso, cara? É o mundo sem história. É o aqui e agora, o oportunismo, a venda,
o comércio. O que é isso?
Um espanhol me encontrou uma vez em um avião, falou assim: “Vivi no Brasil muitos anos, voltei
para a Espanha. Estou vindo aqui de visita. Queria mostrar meu álbum”. Aí mostrou o álbum dele, uma
exposição que ele fez na Espanha. Raízes de árvores gigantescas, dois metros, três metros de altura.
Dez raízes de árvores, 20 raízes de árvores, em um salão envidraçado. Aquilo devia pesar meia tonelada.
Eu falei assim: “Depois dessa exposição, o que você fez com essas raízes?” – “Joguei fora.” – “Sua obra?
Jogou tudo fora?” – “É” (risos).

PSD_ Como você vê a obra de Krajcberg hoje no Brasil? Só por associação.

FG_ Tem algumas coisas interessantes. Ele é um artista criativo, ele tem algumas coisas interessantes,
mas tem um lado ali que acho meio charlatão que é de falar em ecologia quando aquilo nasce porque
queimam as florestas. O dia que parar de queimar os matos, acaba a obra dele. Acaba.

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PSD_ Claro.

FG_ Algumas coisas são interessantes. Mas não é a coisa que eu gosto mais. Acho que as coisas que ele
fazia muito antes disso eram melhores. Conheci o Krajcberg quando ele começou. Ele fazia gravuras,
fazia pintura. Era mais interessante.

PSD_ Aquelas formas dos relevos orgânicos.

FG_ Aquelas coisas também. O caminho dele lá. Depois ele entrou nesse rumo aí.

PSD_ Não, fiz a associação por causa do rapaz das raízes.

FG_ Mas o Krajcberg, pelo menos, preserva e ele trata aquilo como uma obra de arte. Ele faz, ele traba-
lha, ele usa aquilo como uma matéria da obra dele, da expressão dele. Mas o outro, que é mais evoluí-
do do que ele, já não faz mais nada disso, simplesmente expõe. Certamente aquilo tem um significado
transcendental que devia estar em algum texto ecológico, ou então alguma coisa sobre o cosmos. Não
sei, que diabo, é qualquer coisa que se escreve. Eu, toda vez que ouço uma palestra sobre arte contem-
porânea, não entendo nada.

PSD_ Eu soube que no Banco do Brasil você também falou isso. Não entendeu nada (risos).

FG_ Não, porque a dona mesmo falou meia hora e eu não entendi nada do que estava escrito ali. Claro,
tinha relações com sociologia, com ecologia, com política. Mas está falando de quê? Não tem nada a ver
com arte. Um artigo que li sobre as valises, a exposição de valises de avião daquela menina...

PSD_ Jac Leirner.

FG_ Ela citava Heidegger, e mais uma porção de coisas. Vá ser penetrante... O que tem aquilo a ver com
Heidegger? Ela citava Marx, que também não tem nada a ver com Heidegger. Tudo misturado, uma
confusão. Então, sinceramente, acho que isso aí não tem futuro. Eu escrevi no jornal Folha de S.Paulo
um artigo sobre a última grande obra de repercussão mundial, internacional, que foi a morte daquele
cachorro. Amarrou o cachorro, botou na galeria para matar.

PSD_ Sabe que o cachorro não morreu e não foi nada disso a história. É claro, aquilo não é obra de arte,
mas você sabe a história qual foi?

FG_ Não sei.

PSD_ Ele deu ao cachorro o nome de um operário que foi assassinado no país dele e ninguém noticiou a
morte do operário, que foi assassinado numa manifestação, na América Central, no país dele. Aí ele deu
o nome do operário ao cachorro. Ele dava comida à noite ao cachorro, fingindo, quando ninguém estava
na galeria. Um dia, desapareceu com o cachorro. Falou mais sobre a morte do cachorro do que sobre a

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morte do operário no país dele. Não é obra de artista, é uma ação política.

FG_ Duvido até que seja política. Quer dizer, pode ter a melhor das intenções. O que ele quer dizer? Que
não se fala da voz do operário? Estou fora disso. Eu disse, acho isso tudo uma grande bobagem. Há muita
charlatanice em todo esse esquerdismo de araque aí.

PSD_ Não. Claro. O que ele quis dizer foi isso. É mais fácil noticiar a morte do cachorro do que do
operário.

FG_ Mas o que saiu, o que veio como notícia foi isso. E eu mesmo disse: “Há algo de mentira nisto aqui”.
Mas como isso se coaduna com o que se faz, então, na verdade é a mesma coisa. Só é obra de arte, se
faço na galeria.

PSD_ Porque se fizer na esquina, vai ser preso.

FG_ Se eu amarrar o cachorro e disser que estou matando o cachorro em um galpão do cais do porto, tam-
bém não é obra de arte. A mesma coisa do urinol do Duchamp, que aquele cara até quebrou. O cara fez com
o Duchamp muito pior do que o Duchamp tentou fazer com o Leonardo da Vinci. Você soube, não é?

PSD_ Claro, claro.

FG_ O cara chegou e quebrou o urinol todo do Duchamp. Quer dizer, em vez de botar bigode, que não é
mais o caso, quebrou o urinol todo e depois foi processado.

PSD_ Quebrou o original... (risos).

FG_ Que não era original...

PSD_ Não. Tem vários.

FG_ E aí, o problema é o seguinte. É que o advogado falou assim: “Não, mas eu compro por 96 euros um
novo e dou para vocês. Não tem problema”. Quer dizer, convenhamos. O negócio é que o cara quer tapar
o sol com a peneira, porque é a busca do novo pelo novo. É o que chamo de paletó de três mangas. Sabe
que nunca foi feito, porque só temos dois braços. A coisa mais fácil que tem é fazer isso. Porque o que não
tem limite, porque é o contrário. As coisas têm que ter limite.

PSD_ Pois é, mas essa questão do limite hoje. Existe limite hoje? Existe uma norma? Porque aquela questão
do urinol do Duchamp ia contra a norma. Tinha um atrito muito forte com os valores da época. E hoje?

FG_ Quer dizer, o Siron, quando ele pinta a pintura dele, ele tem as normas que ele estabelece.

PSD_ Claro.

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FG_ Quando o fulano faz as gravuras dele lá, tem as normas que ele busca.

PSD_ Quem é este que você está citando? O gravador quem é?

FG_ Não, qualquer um.

PSD_ O Samico, vamos dizer.

FG_ Eu quando faço meu poema, tenho as normas.

PSD_ O que você acha da situação do Samico hoje na arte contemporânea?

FG_ Ultimamente não tenho visto as coisas dele. As últimas coisas que vi do Samico eram aquelas
gravuras.

PSD_ Ele continua fazendo uma por ano.

FG_ Uma por ano.

PSD_ É.

FG_ Acho de alta qualidade, muito pessoal, muito própria...

PSD_ É um encontro muito complexo e refinado do erudito com o popular naquela gravura dele.

FG_ Sim, sim.

PSD_ Com todo o imaginário que tem a origem no cordel, nas capas de cordel.

FG_ É. Mas ele se afastou um pouco, por exemplo, dessa fase em que havia uma liberdade formal maior,
uma inventividade formal maior. Prefiro essa fase.

PSD_ Sei. Você prefere essa fase.

FG_ Embora eu ache a outra, que é de uma execução primorosa, de um rigor admirável, mas tem menos
inventividade do que essa fase, onde ele estava mais ligado ao popular, à referência do cordel, da xilo-
gravura do cordel.

PSD_ Eu expus na Bienal do Mercosul uma instalação do Siron Franco. Siron Franco também faz insta-
lação.

FG_ Faz, faz.

Ferreira Gullar | arte brasileira contemporânea 50


PSD_ Foi uma experiência muito dramática, foi aquela da experiência do césio lá em Goiânia.

FG_ É.

PSD_ E ele expôs uma série de camas. Você conhece esse trabalho?

FG_ Sei. Conheço. Até escrevi um poema sobre esse negócio dele, sobre césio.

PSD_ Vou aproveitar que estou aqui para falar um pouquinho de literatura. E a poesia hoje? Como você
está vendo a poesia no Brasil hoje?

FG_ Bom. Não tenho uma visão global da coisa, porque hoje se publica muita coisa no Brasil. O Brasil é
um país muito grande e cada dia que passa tem mais centros de atividades diferentes, poetas em tudo
quanto é canto. Então é muito difícil.

PSD_ Dos que você tem lido, quem lhe chama atenção?

FG_ Alguns me chamam atenção. Alguns que têm qualidade. Mas em outros, noto uma tendência que
predomina em certa área, que há um hermetismo, que há uma poesia que é falada pela palavra ou a bus-
ca de uma linguagem requintada, de uma linguagem hermética. Confesso que não sei se eu não entendo,
porque muito burro não sou. Se eu não entendo, imagino o leitor comum. Quer dizer, então para quem
aquilo é feito? Não sei. Realmente não sei. Acho que o sentido da vida é o outro, e o sentido que a gente
faz é o outro. Fazer para mim mesmo, vou virar maldito porque sempre falava uma coisa: não pensem
que vou cortar minha orelha. Não vou. Não quero ser mártir, não quero ser o maldito. Não quero ser nada
disso. Se estou aqui é para tentar me comunicar com as pessoas. Se tenho a possibilidade de descobrir
na vida, nessa árvore, na esquina alguma coisa que me pareça surpreendente ou que mereça ser dita para
os outros que vi, que faz parte da vida deles também, então melhor. Agora, escrever para que ninguém
entenda, realmente não tem opção. Devo ser uma pessoa antiquada.

PSD_ Assim como você vê nas artes o Siron Franco, João Câmara, que você citou aí, você vê na poesia
alguém com quem você tenha mais afinidade?

FG_ Não, não é que eu tenha afinidade, mas há poetas, não vou citar aqui porque são muitos. Há poe-
tas diferentes uns dos outros que têm qualidades indiscutivelmente de poesia. São poetas mesmo. São
poetas. Há vários. E aqui, não só no Rio ou São Paulo, mas nos outros estados, no Nordeste. Eu recebo
livros. Quando gosto, escrevo, respondo. Agora, o problema: grande poeta, como Drummond, isso aí
não acontece toda hora. Mas a poesia não se faz só disso.

PSD_ É como a arte também.

FG_ É como a arte também.

Ferreira Gullar | arte brasileira contemporânea 51


PSD_ Fazer arte só com Cézanne...

FG_ Aí, acaba. Mas existem uns poetas bons que estão escrevendo e mantêm viva a poesia. Claro que não
existe um público gigantesco para poesia, mas isso não tem importância, porque para coisa de qualidade
não existe grande público. Nunca existiu mesmo.

PSD_ Você acha que diz respeito também à música, à arte.

FG_ Existe uma arte mais acessível.

PSD_ Claro. E na música, no caso...

FG_ O samba, por exemplo. Agora, é claro que para ouvir Bach já é um público menor.

PSD_ Claro.

FG_ É um público menor, mas acho que não é preciso você escrever para multidões ou que seja visto por
multidões. O mundo não é assim. Eu não vivo em uma cidade de 10 milhões de habitantes. Vivo em uma
cidade de 30, 40 pessoas, que são as pessoas com quem me entendo, que conheço. O cara pode ler meu
livro e não me conhece, não sei quem é ele. Se ele me encontra na rua e fala assim: “Pôxa, li seu livro” e
tal. Aí é diferente. Passa a existir para mim. Mas se o cara ficar pensando nisso, nessa coisa multitudiná-
ria, gigantesca, que, inclusive, aliena todo mundo porque o cara se sente intimidado. Viver em um mundo
de milhões de pessoas, quando vou ser conhecido pelo último chinês lá de trás da muralha da China?

PSD_ Gostaria de perguntar uma coisa para você que tenho curiosidade porque eu vi. Como foi a sua
passagem daquela experiência toda? Eu era muito jovem na época. Só comecei, na verdade, a ter um
contato mais íntimo com a arte, depois do golpe. Entrei para o Partido Comunista com 17 anos em 1963.
Eu achava importante. Aí a camarada Helena se reuniu comigo no escritório no Marquês de Herval e ad-
mitiu que a Juventude Comunista tinha acabado. E eu achava importante lutar por aquelas coisas. Essa
passagem que hoje me parece muitas vezes caricata, mas existe uma contribuição à qual não consegui
captar: sua passagem de 1959, 1960 para a experiência do CPC. Você fez parte do CPC por um ano.

FG_ Fui presidente.

PSD_ Pois é. Foi presidente do CPC. Como foi sua passagem por essa nova experiência?

FG_ A passagem é o seguinte. O esgotamento, no meu caso, da experiência de vanguarda. Quer dizer,
da minha poesia, das coisas que estava fazendo depois do poema enterrado. Estava eu, Hélio Oiticica,
Reynaldo, Thereza minha mulher, um grupo de amigos. Aí propus o seguinte: que fizéssemos uma expo-
sição terrorista, uma espécie de ação terrorista com a arte neoconcreta. Pegássemos os nossos objetos
e espalhássemos de madrugada pela cidade. Quando amanhecesse, o pessoal ia ver nos jardins, nas pra-
ças, aquelas coisas estranhas que eram as obras do Hélio Oiticica, as minhas, da Lygia. Aí, o Hélio Oiticica

Ferreira Gullar | arte brasileira contemporânea 52


ficou meio assim, não falou nada não. Depois, eu falei: “O grande problema que tem é o seguinte: que
alguém vai pegar. Por exemplo, o meu poema que tem um cubo em cima, o cara vai roubar o cubo, deixar
alguma peça da outra obra, o cara vai tirar”. Então, falei: “Acho que essa solução não dá. Tenho uma idéia
melhor. Hélio, vamos fazer uma exposição que começa às 5 da tarde e termina às 6 horas. Botamos um
dispositivo explosivo debaixo de cada obra e, quando chegar às 6 horas, a gente dinamita a exposição, o
encerramento da exposição. Dinamita tudo”.

PSD_ Isso foi em que ano?

FG_ Foi em final de 1959, por aí. E o Hélio só escutando. E o Jardim: “Como é? O que você acha? Acho
uma boa idéia!” Aí, o Hélio falou assim: “Não vou destruir minhas obras não, pô. Não estou de acordo com
isso não”. Aí comecei a rir, falei: “Tudo bem. Então a gente não faz essa exposição”. Mas veja bem, era a
primeira antecipação da vanguarda em um nível extraordinário.

PSD_ É

FG_ Em 1959, propor fazer isso. Mas isso refletia já o meu descontentamento com relação àquilo que
eu estava fazendo. Porque eu pensava assim: “Estou fazendo esses objetos, vou guardar isso onde? Não
sou escultor, não sou pintor. Que diabo é isso? E depois fiz esse poema enterrado, essa coisa”. O poema
enterrado inundou lá no Rio na inauguração.
Aí fui trabalhar em Brasília a convite do José Aparecido, no governo Jânio Quadros. Isso foi logo no
começo de 1961. Quando cheguei lá comecei a me envolver com a questão da cidade, com os problemas
próprios do candango e com as coisas que tinha que fazer lá e, por acaso, caiu na minha mão um livro La
pensée, de Karl Marx. Comecei a ler. De noite, não tinha o que fazer naquela cidade fantasma. Comecei a
concordar com a visão do cara, porque eu tinha a mania de ler filosofia. Não concordava com os outros
filósofos. Concordava com todo mundo, não concordava com ninguém. Comecei a ver um pensamento
mais concreto naquilo. Como eu já tinha dado aquela experiência minha na arte neoconcreta como uma
coisa que não queria mais continuar, porque, para mim, aquilo era um desvio, um descaminho, eu não
queria mais fazer aquilo. Quando voltei de Brasília, quando o Jânio renunciou, me convidaram para fazer
um negócio lá no CPC e, como eu estava sem rumo nenhum mesmo e já estava preocupado com a ques-
tão social, aceitei.
Em Brasília comecei a redescobrir o Brasil, a virar brasileiro, e a partir daí as minhas leituras passaram
a ser leituras relacionadas com o conhecimento do Brasil, do país Brasil que eu desconhecia. Eu sabia tudo
sobre arte francesa, inglesa, americana e do Brasil não sabia quase nada, essa que é a verdade. O meu
envolvimento foi um pouco casual em face de terem me convidado, mas coincidindo com essa minha mu-
dança da visão ideológica, da minha preocupação com o Brasil e em abandonar a vanguarda. Tanto que,
depois daí, tudo que eu tinha escrito, nunca mais publiquei, nem dei prosseguimento àquilo. Por exemplo,
o livro que tinha escrito, Crime na flora, o livro feito em seguida a A luta corporal, que era uma tentativa de
reconstruir a linguagem em um nível inteiramente delirante, e os poemas escritos depois, os poemas que
eu tinha desenhado, poemas espaciais, nada disso. Eu abandonei tudo e deixei tudo dentro de uma pasta
e só fui mexer nisso depois que voltei do exílio. Foi aí que voltei a mexer, mas também não foi publicado.
O formigueiro foi o primeiro poema concreto que escrevi, que nem era concreto. Primeiro poema daquele

Ferreira Gullar | arte brasileira contemporânea 53


tipo buscando uma coisa espacial, foi de 1955, e publicado 30 e poucos anos depois. De modo que a minha
ida para o CPC foi um pouco conseqüência disso: “Esse caminho não vou seguir mais, não quero mais saber
desse troço de vanguarda, desfazer dessa coisa formal”. Toda ruptura é meio radical.

PSD_ Eu estava na França quando você publicou o Poema sujo. Só voltei em 1978. Mas aquele período
ali, você não acha também que é um pouco contrário? Há o outro lado da moeda do vanguardismo na
medida em que a experiência do CPC fica colada demais na imediaticidade da comunicação, a arte com
inteligibilidade imediata.

FG_ Sim, mas escuta. A única diferença é que essa leitura pode ser feita do ponto de vista formal, mas
do ponto de vista da realidade, ninguém estava preocupado. A preocupação era: eu quero me comunicar
porque quero fazer revolução. É o contrário. Não estou interessado em arte. Estou interessado em fazer
a revolução. Tenho que levar consciência às pessoas para que elas embarquem nessa minha visão de que
tem que mudar o Brasil. Esse é o problema.

PSD_ Está abandonada mesmo a pesquisa formal.

FG_ É. Está abandonada a arte. Quer dizer, a arte passa a ser um instrumento para fazer a revolução.
Tanto que depois houve uma autocrítica, provocada, aliás, por mim, com a qual o Vianninha concor-
dou, porque ele também estava preocupado com isso, que era o abandono da qualidade. Chegou uma
hora que nós nos embargamos. Nós fizemos um tipo de teatro pobre e rudimentar para nos comunicar
com a massa e não nos comunicamos com a massa. Então não fizemos nem bom teatro, nem nos co-
municamos com a massa. Então eu disse: “Que porra é essa?”. Fomos para a favela da Praia do Pinto,
que não existe mais, e chegamos lá com um auto nosso denunciando o imperialismo, pedindo reforma
agrária e tal. Só as crianças ficaram vendo, os adultos foram todos embora. As mulheres ficaram da
janela olhando. Acabou aquilo e eu falei: “Vianninha, estamos apresentando isso aqui para quem? Para
as crianças aqui que nem sabem o que é imperialismo ou reforma agrária?”. A gente ia para o sindi-
cato dos bancários, só a diretoria do sindicato, que era comunista, ficava vendo e não tinha público.
No sindicato não tinha ninguém para ver, só meia dúzia de gatos-pingados. Falei: “Estamos falando
para nós mesmos, cara. Tá errado.” Tanto que, quando veio o golpe, que nós criamos o grupo Opinião,
nossa posição foi oposta. Quando escrevemos Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come, quisemos
fazer uma obra-prima teatral, fazer uma peça que fosse política, mas que tivesse a mais alta qualidade
dramatúrgica e literária possível.

PSD_ Tem os intérpretes também, excelentes, na Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.

FG_ Sim. Mas a nossa disposição era fazer uma peça que fosse literariamente de alto nível e dramatur-
gicamente de alta qualidade. Então era posição oposta àquela que era a equivocada, da simplificação
revolucionária.

PSD_ Claro. Houve nas artes plásticas manifestações dentro do CPC? Havia, não é, porque um grupo lá
do Rio Grande do Sul desde os anos 1950...

Ferreira Gullar | arte brasileira contemporânea 54


FG_ É que fazia o realismo socialista. O Carlos Scliar, a Renina Katz e tal. Mas aquilo era uma outra coisa,
era uma coisa anterior.

PSD_ É anterior, mas nos anos 60 não houve?

FG_ Não, não. Não houve. Houve uma ou outra, mais manifestação política depois do golpe, de descon-
tentamento dos artistas de querer protestar e tal, mas não na obra propriamente. Como ato político.
Essa coisa de voltar ao realismo, fazer uma arte política no plano das artes plásticas engajada, não.

PSD_ Quando vocês criaram o teatro Opinião, logo depois, a Ceres Franco e o Jean Boghici fizeram a
exposição Opinião 65, aproveitando até a deixa do teatro Opinião.

FG_ É verdade.

PSD_ Eles fizeram uma exposição de arte. Naquela exposição, o que chamou sua atenção ali, o que o
interessou? Tinha Antonio Dias, Rubens Gerchman.

FG_ Eles. Se não me engano, até escrevi sobre a exposição. O Rubens Gerchman, o Carlos Vergara. Todos
eles estavam lá. Era a nova geração.

PSD_ Você viu a exposição do Vergara, no Paço, esse ano?

FG_ Fui. Fui. Achei legal a exposição dele. Achei legal. Por isso que digo, porque esqueci de mencionar
Vergara quando falamos nesse pessoal que está aí fazendo arte. O trabalho do Vergara é muito interes-
sante, a coisa que ele fez lá no Paço. Porque o que acho é o seguinte. Outro dia também teve uma expo-
sição lá, e estava a Lucia Laguna e tinha a Lena Bergstein, também no Paço Imperial. As gravuras dela
eram um experimento com tela e uma impressão com pó de metal.

PSD_ Você sabe que a Lucia começou a pintar tarde.

FG_ Eu soube.

PSD_ Ela é professora, se aposentou e depois de aposentada começou a pintura e a observação. Tenho
até uma conversa com ela interessante de uma exposição que fiz lá na galeria da Cândido Mendes, con-
versamos e gravei a conversa.

FG_ Mas aproveitando isso que você falou. Arte é sempre uma coisa rara, quer dizer, arte de boa qua-
lidade é sempre uma coisa rara. Então a pintura não está morta pelo fato de que, de vez em quando,
aparece a pessoa que tem o talento e faz, porque para ter pintura tem que ter pintor, como para ter
música tem que ter músico.

PSD_ Ronaldo Brito disse uma vez para mim isso: “Matam a pintura, mas esquecem de avisar aos pintores”.

Ferreira Gullar | arte brasileira contemporânea 55


FG_ É claro. Porque eles aparecem. Porque pintores maravilhosos a dar com os pés, nunca houve. Às
vezes uma geração junta assim, como juntou em Paris, naquela época, uma quantidade de gênios, mas
isso é uma coisa raríssima. Não é sempre assim. Mas é isso que digo: o cara pode, com seu talento, inde-
pendentemente de se está na moda ou não, porque nos anos 50 as artes plásticas estavam na moda. Nos
anos 50, a inauguração de Bienal de São Paulo era badalada por todas as revistas do Brasil, por todos os
jornais. Eram entrevistas, quatro, cinco, seis páginas da revista Manchete falando sobre a Bienal de São
Paulo, sobre a exposição. Artes plásticas era um sucesso. Todo mundo falava. E depois, por motivos os
mais diversos, hoje é o mínimo. Inaugura a bienal, mal se sabe que inaugurou.

PSD_ A bienal está em declínio, mas em compensação o sistema da arte hoje tem uma popularidade
que não tinha.

FG_ Mas a bienal não se compara com o que era.

PSD_ Claro. A bienal perdeu a função. Mas a Tate Modern, por exemplo, esse museu novo na Inglaterra,
eu fui lá fazer uma palestra e visitei pela primeira vez em 2002. Eles me contaram, quando inauguraram,
eles esperavam um milhão de visitantes, tiveram 5 milhões.

FG_ Imagine.

PSD_ Cinco vezes mais. O sistema da arte plástica foi o último resíduo da cultura a resistir a entrar na
indústria do entretenimento, mas agora está dentro.

FG_ Entrou. É.

PSD_ Tenho conversado com as pessoas, alguma coisa mudou com os números. Antes, na antiga Tate,
eu tinha certo recolhimento para contemplar as pinturas do Rothko. Hoje é impossível. A atitude de con-
templação é impossível porque, nos cinco minutos que você está lá, passam 500 pessoas, 50 pessoas, 60
pessoas ou 100 pessoas em cinco minutos.

FG_ É verdade. Então não pode mais.

PSD_ Como você vai exercitar a contemplação de uma obra que precisa ser contemplada?

FG_ Da mesma maneira que se você for para o Louvre não dá mais para ver. É a mesma coisa. Multi-
dões. Não dá.

PSD_ Pois é.

FG_ Você quer o detalhamento de um quadro, não dá. Não pode. Aliás, na Mona Lisa, o dia que fui lá,
a última vez que fui lá, tinha um funcionário que dizia: “Olha aqui. Vamos. Anda”, porque a fila era tão
gigantesca, cada um demorava no máximo dois minutos olhando.

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PSD_ Pois é.

FG_ O cara veio do Japão, o cara ficava dois minutos olhando a 20 metros de distância.

PSD_ Isso está generalizado. A capela de Scrovegni, em Pádua, você só pode ficar 15 minutos dentro
dela agora. Ela tem um sistema de renovação de ar, do lado externo e lado interno. Você fica em uma
câmara e vê um vídeo durante 15 minutos. É o tempo enquanto o grupo está lá dentro. Quando ter-
minou de ver o vídeo você entra: tem 15 minutos lá dentro e tem essa câmara para não contaminar
com o ar externo o lado interno. Tudo bem, mas aí a função e a inteligência do trabalho, como você vai
perceber? Então ficou complicado.

FG_ Ficou complicado. Tem gente demais no planeta.

PSD_ Vamos voltar para o Opinião 65, naquela época.

FG_ É. Achei uma coisa legal, mas como era na verdade um protesto. Era um protesto do ponto de vista
exterior à arte. A exposição virou, apareceu como um protesto ao regime que tinha acabado de se insta-
lar, mas as obras, em si, elas não eram engajadas. Não eram. Eram obras, pinturas.

PSD_ Mas tinham visão crítica da sociedade, como naqueles trabalhos do Antonio Dias, ou nos trabalhos
do Gerchman.

FG_ Sim. Claro. Algumas tinham. Mas não era uma coisa como era no teatro, como era no CPC. Era uma
coisa mais distante.

PSD_ Claro, claro. Voltando agora de novo, então, nessa situação atual, você vê também na poesia uma
tendência ao hermetismo? Essa tendência ao hermetismo seria também a dificuldade de significar, de
produção com significado?

FG_ Não sei qual é a razão não. Não sei. Essas coisas não têm muita explicação. Porque estou convencido
de que a sociedade é quântica, não é mercuniana não. As coisas não têm muita lógica, muita conseqüên-
cia. Pode acontecer uma coisa, pode acontecer outra, não é mesmo? O acaso e a necessidade são de tal
maneira entremeados que, de repente, pode ocorrer que um determinado poeta desse grupo imprima
um rumo que os outros decidem seguir por alguma razão circunstancial que tem consistência momentâ-
nea para ele, aí vai naquele rumo. É claro que talvez tenha uma explicação mais geral do ponto de vista
do que eles concebem como poesia, mas, sinceramente, o que me surpreende é isso. É que há um desli-
gamento com respeito à comunicação com as pessoas. A preocupação, não é uma preocupação grande,
porque também não tenho essa. Nunca escrevi pensando: “Estou fazendo isso para ser entendido”. Não
é bem isso. Quer dizer, eu tenho que estar revelando alguma coisa que me alimente, que me deslumbre
a mim mesmo. Eu sou o primeiro leitor, sou o primeiro espectador. Entende? Fico perguntando, pois é,
mas é que o cara pode ter uma atitude segundo a qual os valores dele são aqueles. É aquele preciosismo
vocabular, aquela coisa. A minha preocupação é de que o que estou dizendo comova as pessoas, porque

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eu também quero me comover com o que escrevo. Não estou escrevendo, não escrevo profissionalmen-
te. Escrevo movido por um espanto, por alguma coisa. Escrevo muito raramente. Se não me comovo,
não escrevo. Entendeu?
Por exemplo, eu estava sentado nessa poltrona aí vendo televisão. Aí fui me levantar, tocou o tele-
fone. O osso da minha perna, o fêmur tocou na bacia, toc. Aí fui lá, atendi o telefone. Pensei: “Nossa, foi
o osso. O que é isso? Tenho aqui essa cadeira, mas um osso. Acabo de sentir materialmente que bate um
no outro, faz barulho. Osso pensa? Eu sou esse osso ou sou essa mente”. Então começa uma coisa que
nasce um poema. Quer dizer, de uma coisa real, de uma descoberta, de uma surpresa da própria vida.
Não é preestabelecido. Então vou encontrar a forma para dizer essa coisa: acidente na sala. Aconteceu
uma coisa que é isso, que é a mais banal do mundo, mas envolve perguntas. Eu leio aquilo, já li isso uma
vez numa sala, numa palestra, as pessoas pediram: “Leia um poema inédito” e tal. Então, as pessoas se
comovem, elas entendem. Elas nunca pensaram aquilo, mas não pensaram porque é difícil de pensar,
não tiveram a oportunidade de pensar. Então, tem a ver com elas. Agora, aquilo que leio ali não tem a ver
comigo e não tem a ver com ninguém, até porque o cara mal consegue entender. Então, não sei. Pode ser
um caminho aí. Não sei.

PSD_ Bom, acho que está muito bom o que fizemos aqui. Era muito importante ter a sua contribuição.
Quero agradecer muito.

Entrevista realizada em 3 de julho de 2008 na residência de Ferreira Gullar, no Rio de Janeiro

Ferreira Gullar (São Luís, MA, 1930)


Vive e trabalha no Rio de Janeiro
Poeta, crítico de arte e jornalista. Publicou seu primeiro livro de poemas, Um pouco
acima do chão, em 1949. Em 1951 mudou-se para o Rio de Janeiro, onde colaborou
com jornais e revistas como poeta e crítico de arte. Inicia sua carreira escrevendo para
revistas, como O Cruzeiro e Manchete, e jornais, como Diário Carioca, Jornal do Brasil
e Diário de Notícias. Integra a equipe que elabora o Suplemento Dominical do Jornal
do Brasil e deflagra a renovação do periódico como um todo (1956). Participou, entre
outras, da I Exposição nacional de arte concreta (MAM/SP e MEC/RJ, 1956-57), com o
poema concreto O formigueiro, e da I Exposição de arte neoconcreta (MAM/RJ, 1959),
com o Livro-poema. É autor de inúmeros textos sobre arte moderna e contemporânea,
muitos deles reunidos em livros como Etapas da arte contemporânea (Revan, 1999),
Cultura posta em questão: vanguarda e subdesenvolvimento (José Olympio, 2002), e
Argumentação contra a morte da arte (Revan, 2003). Foi o autor de textos fundamen-
tais para a arte brasileira, como Manifesto neoconcreto e Teoria do não-objeto, ambos
de 1959. Adaptou e escreveu, ainda, textos para a televisão. Entre seus livros de poe-
mas estão: A luta corporal (1954), considerado um marco na história da poesia brasi-

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leira, Dentro da noite veloz (1975), Poema sujo (1976), Na vertigem do dia (1980), Muitas
vozes (1999) e Rabo de foguete (1998). Desde 2004, assina uma coluna aos domingos
no jornal Folha de S. Paulo. Gullar recebeu o prêmio Jabuti 2007 de Melhor Livro de
Contos e Crônicas, por Resmungos (Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006).
Recentemente publicou pela editora Cosac & Naify Relâmpagos – dizer o ver (2003) e
Experiência neoconcreta: momento-limite da arte (2007).

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