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A África Fantasma pensada pelo antropólogo Michel Leiris não tem nada de especial àqueles que procuram um
invencíveis. Nada. Há no mundo obras muito mais pujantes neste sentido, não justificando as mais de 600 páginas
desta África.
Aviso dado, pode-se anunciar do que se trata o livro. Trata-se do diário pessoal que Leiris manteve ao longo
da Missão Etnográfica e Lingüística Dacar-Djibuti, da qual fez parte como secretário-arquivista. Missão delegada
pela França ao também antropólogo Marcel Griaule, percorreu, entre 1931 e 1933, por terra do Oceano Atlântico
ao Mar Vermelho com a missão de coletar dados sobre o Império Francês na África e peças para o Museu do
Homem em Paris; e é relatada em seus marasmos e misérias intestinas nos diários de Leiris.
E não fosse o relato sobre as migalhas comezinhas da missão, o robusto livro se converteria em um almanaque de
anomalias do século XIX que, por um acaso das circunstâncias, foi publicado no século seguinte. Em outras
palavras, o que está em foco na África apresentada não são as proezas do homem branco capaz de sobrepor suas
grandezas sobre as terras mais insalubres e remotas; mas sim as baixezas do império colonial: as vontades de
real por parte do homem branco, crimes, éticas dissolvidas em justificativas torpes etc.
A um só tempo, Leiris expõe as entranhas e as distâncias grandiosas do projeto colonial, mas tudo com um olhar
frente à realidade. Além disso, sofre com as aberrações geradas pelo pretenso humanismo enunciado nas
metrópoles: para compor o Museu do Homem, era necessário violar o próprio homem. O conhecimento universal
sinalizado na Europa decompunha-se na mesquinharia arrogante colonial, que autoriza saques e violências
Além de colocar em perspectiva a nobreza colonial, a narrativa também consegue expor as dificuldades que
cercaram o próprio empreendimento colonial, tradicionalmente retratado com europeus invencíveis cruzando
vazios demográficos nas ricas e misteriosas terras africanas. Iluminando tanto as diversidades locais quanto as
dúvidas e as dificuldades da missão, A África Fantasma abre portas para reflexões mais equilibradas sobre as reais
Destaca-se, também, a riqueza iconográfica da obra de Leiris, que traz registros fotográficos de uma África
distante da Europa e repleta de história integrados com importantes esforços de descrição daquelas populações;
ainda que, por vezes, presos a referenciais rasos sobre os costumes locais e impregnados de preconceitos e
cansaços.
Por fim, é interessante observar um relativo valor literário dos diários. A grande capacidade de acomodar
descrições locais com os impulsos de ação dos integrantes da missão é uma constante no livro. E cenas de ação
que poderiam inspirar alguns romances aventureiros são postas na perspectiva do saque patético e antiético; a
culpa e a vergonha, enfim, têm uma chance de rondar o europeu. A África Fantasmaparece mais escancarar os