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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS

CAMPUS - SOROCABA

Talita Soares da Silva

LEITURA E ANÁLISE DO LONGA-METRAGEM ELEFANTE

SOROCABA/SP

2015
Tema: Pensar numa temática sobre educação é uma tarefa difícil. O tema escolhido
tem por objetivo tratar de uma sociedade sistematizada exterior ao ambiente educacional
que reflete suas contradições dentro da estrutura física da escola. O longa-metragem
“Elefante” traz alguns dos reflexos da fragilidade da estrutura social e a análise que
fazemos é baseada nos conceitos trabalhados pro Adorno.

Introdução

O presente trabalho tem como objetivo refletir sobre os conflitos e problemas diários
que aparecem de forma objetiva e subjetiva no ambiente escolar. Palco reprodutor de
toda sociabilidade, reflete todas as ações exteriores sejam politicas, econômicas,
culturais, sociais ou da própria singularidade do aluno.

O longa-metragem “Elefante” produzido por Gus Van San narra de forma fictícia os
assassinatos que ocorreram na Columbine High School, em 1999, Colorado (EUA).
Narrado de forma tranquila retrata o cotidiano dos jovens, as cenas são trazidas com
várias perspectiva e visões, vidas entrelaçadas, ao mesmo tempo em que trabalha com a
singularidade dos personagens, certo caos e barbárie são apresentados por Van.

A partir dos exemplos trazidos pelo longa-metragem, refletimos sobre a violência


que se manifesta na escola das mais variadas maneiras. Elefante traz uma série de
problemáticas sobre a sociedade e sobre as escolas. Para refletir essas problemáticas,
tomemos como autor base Theodor Adorno, onde partiremos dos conceitos de Barbárie e
Emancipação.

Barbárie, por que vivemos em uma época na qual é a condição de existência da


própria sociedade capitalista, onde o individuo perde potencial de resistência sobre os
mecanismos que regem essa sociedade e, Emancipação, pois a democracia vem através
do esclarecimento, e a Educação deve ser esclarecedora, não autoritária e evitar a
barbárie buscando a emancipação humana. A educação recebe o papel de
transformadora da sociedade.
Leitura e análise do longa-metragem Elefante

Elementos Gerais apresentados pelo filme

O filme “Elefante” traz a criação de paradoxos que não norteiam as causas ou


motivos pelos quais acontecem os assassinatos. Van não traz só a ideia de motivos
indeterminados, analisados apenas sobre um ponto de vista seja psicológico, moral,
cultural, mas também traz a ideia de que a soma de todos esses pontos fazem da
questão indeterminável. Não há objetivo em trazer as causas concretas dos assassinatos,
é como se fosse um ponto indefinível.

O filme traz uma sequência cronológica formada por recortes, presente passado e
futuro acontecendo simultaneamente, que permitem certa impressão das prováveis
causas dos assassinatos, ao mesmo tempo em que traz uma fragilidade dos personagens
e cenas paradoxais.

Logo de inicio, nos é mostrado à história de John, um personagem que enfrenta as


consequências de ter um pai alcoólatra. É o personagem que cuida do pai, o que faz
chegar atrasado à escola e ser punido por isso. Vale atentar para o olhar autoritário e
punitivo do diretor sobre John que é demonstrativo da educação autoritária que Adorno já
critica. Isso de certa forma retrata parte da pressão referente a uma estruturação familiar
pré-definida como modelo ideal.

Elias sai pelas ruas fotografando e mostrando sua visão do mundo. Seu desejo em
fotografar o acompanha junto com sua câmera até a escola. Van usa dessa lente para
linkar as cenas com os problemas de cada personagem. Outros personagens são o
Diretor, Nathan e Carrie o “casal invejado”, Acadia que participa do grupo de debate sobre
gênero e Benny só aparece no fim do filme.

O filme traz a questão tratatada contemporaneamente como bullying. A personagem


Michelle retrata a discriminação decorrente do cotidiano das relações sociais entre os
adolescentes. Michelle é exposta por não ter o corpo padrão, não usar shorts na aula de
Educação Física, sofre com o tratamento dos colegas e não entra nas relações pré-
estabelecidas ali, representa a figura da grande excluída dentro da escola. O individuo se
sente objeto e não sujeito.
Brittany, Jordan e Nicole, são personagens que representam as típicas “patricinhas”
da escola. Na cena do refeitório, nota-se a tentativa de controle sobre tempo e espaço de
uma colega sobre a outra, autoritarismo reflexivo que elas exercem. Na sequencia da
cena, as garotas apresentam bulimia, transtorno característico pelo excesso de medidas
ao ponto de vomitar a comida ingerida para não obtenção de peso. Isso reflete a
padronização corporal e social, propõe objetificação, vindos das propostas da indústria
cultural que, como pontua Adorno, impede a formação de indivíduos autônomos,
independentes, capazes de julgar e de decidir conscientemente.

Eric e Alex são os personagens assassinos do filme. Apresentam diversas


problemáticas. Nota-se que a família de ambos não aparece no filme, a vaga presença se
da em cenas onde nem mesmo o rosto é mostrado como no caso da mãe de Alex no café
da manhã, traz de forma subjetiva a ideia de ausência. Em outra cena, Alex também sofre
com o bullying, esta na sala de aula, é atacado por seus colegas de forma intencional com
bolas de papel higiênico molhado, expondo Alex ao restante da sala. Uma das cenas
interessantes do filme é o contraste da cena onde Alex está em seu quarto tocando
“Sonata ao Luar” de Beethoven, onde a câmera percorre o quarto, e Eric esta jogando um
jogo violento no computador. É a tranquilidade e o terror na mesma cena.

Elefante então traz através das estruturas físicas da escola a reprodução da


sociabilidade. Um ambiente de complexidades tratada a partir de cada individuo, traz
sincronia, simultaneidade dos acontecimentos, histórias que existem e se complicam no
mesmo tempo, a solidão em que cada personagem parece estar. Traz a subjetividade
sem responder nem julgar os motivos dos assassinatos.

A problemática das escolas e a visão de Adorno

Se pensarmos a educação a partir das concepções de Adorno, trabalhamos com os


conceitos de barbárie e emancipação. Por isso fala sobre “elaborar o passado”, onde esse
elaborar é encerra-lo, liberta-se e deixar de viver a sombra de um passado, rompendo
com seu encantamento através do esclarecimento. Não é perder a história, porque a
sociedade burguesa perde a história, mas sim não repetir o que aconteceu.
Para Adorno a barbárie representa algo muito simples, com todo desenvolvimento
tecnológico da civilização, as pessoas encontram-se relativamente atrasadas a este
desenvolvimento que é da sua própria civilização, isso leva a serem

tomadas por uma agressividade primitiva, um ódio primitivo ou, na terminologia


culta, um impulso de destruição, que contribui para aumentar ainda mais o perigo
de que toda esta civilização venha a explodir, aliás uma tendência imanente que a
caracteriza. (ADORNO, p. 154)

Desta forma é como se a barbárie já estivesse posta.

No filme Elefante começamos com as cenas de bullying, onde já temos uma


manifestação de barbárie. O individuo age com violência tanto na esfera física como na
psicológica (como no caso de Michelle) perante outro que considera, a partir de padrões
de sociabilidade, como inferior.

A vitima dessas ações passa a ser tratada como culpada, e a gravidade de tais
acontecimentos são justificáveis a alegar que as vitimas deram “motivos quaisquer”. A
personagem Michelle reage com isolamento, o passado real converte-se em inocência
que vai existir na memória dos que se sentem afetados, onde a própria culpa se torna
complexo, e os outros, agem como se não tivesse acontecido.

O que mais incomoda Adorno quando ele fala sobre Auschwitz1, não é apenas o
genocídio, mas as condições sociais objetivas da barbárie, toda frieza, burocracia e
aceitação das pessoas sobre as mortes. Quando os personagens Eric e Alex agem de
forma fria assassinando os estudantes, sendo a maior manifestação de barbárie dentro do
Columbine, a culpa não seria somente deles, mas de todo o sistema e pessoas que
aceitam isso de forma passiva. A tranquilidade e calma das pessoas ao redor da escola
retratada por Van traz um pouco dessa aceitabilidade da barbárie.

A chacina no Columbine seria a prova de que a barbárie continua existindo na


sociedade, a pressão social continua se impondo, os mecanismos que tornam as pessoas
capazes de tais atos ainda existe. “Os culpados não são os assassinos, culpados são
unicamente os que, desprovido de consciência, voltaram contra aqueles seu ódio e sua
fúria agressiva” (ADORNO, p. 121).

1
Auschwitz foi um dos maiores campo de Concentração durante o Nazismo. Para Adorno significa a maior
manifestação da Barbarie no contexto Alemão.
Considerações Finais

O filme Elefante traz uma a relação de escola, sociedade e o reflexo de violência


nela existente. Ao pensarmos as chacinas como o máximo da barbárie e possível
concordar com Adorno quando ele diz que o sentimento presente em Auschwitz ainda
existe em nossa sociedade. Quanto maior a repressão e autoritarismo, maior vai ser a
reação de violência. Existem condições objetivas que permitem que a barbárie aconteça.

Elefante traz uma sociedade problemática, apática, que deveria ter na educação a
possibilidade de mudança. A exigência de que a barbárie não se repita cabe no caso de
Auschwitz, no caso do Columbine e no caso de nossas escolas atuais.
Referencia Bibliográficas

ADORNO, Theodor W. Educação e Emancipação. Paz e Terra.

ANTUNES, Deborah Christina; ZUIN, Antônio Álvaro Soares. Do Bullying Ao


Preconceito: Os Desafios Da Barbárie À Educação. Universidade Federal de São
Carlos, São Carlos, 2008.

COUTINHO, Karyne Dias. FREITAS, Alexander de Freitas. A Invenção de Chacinas


Escolares: das representações psi às rotas de fuga. Universidade Federal do Rio
Grande do Norte (UFRN), Natal, v. 39, n. 1, p. 303-323, jan./mar. 2014. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/edreal/v39n1/v39n1a17.pdf> Acessado em: 09 dez. 2015.

Elefante, disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ivDC6IiKR7Q> Acessado


em: 07 dez. 2015.

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