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NÚCLEOS DA BASE (NB)

2. COMPONENTES ANATÔMICOS E FILOGENÉTICOS

Originalmente, considerava-se do ponto de vista estritamente anatômico apenas cinco NB: o


núcleo caudado, o putâmen, o globo pálido, o corpo amidalóide e o claustro. Dessas estruturas,
apenas duas não se relacionam diretamente com a função motora: o corpo amidalóide
(relacionado com o comportamento emocional e a memória) e o claustro (de função
desconhecida, embora se especule que esteja relacionado com função visual). O putâmen e o
globo pálido constituem o núcleo lentiforme e esse, juntamente como o núcleo caudado forma
o chamado corpo estriado.
No final do século vinte passou-se a incluir um novo componente do corpo estriado, mais
precisamente uma área ventral e contígua a ele, denominado corpo estriado ventral, reservando
ao corpo estriado “original” a designação corpo estriado dorsal. O corpo estriado ventral é
constituído por três estruturas: a substância inominada, o núcleo accubems e o tubérculo
olfatório. A substância inominada situa-se na base do cérebro, superiormente ao trígono
olfatório e à substância perfurada anterior e ventralmente ao globo pálido e à comissura anterior.
O núcleo accumbens localiza-se em posição anterior e ventral no cérebro, inferiormente ao
putâmen (mais especificamente na porção em que ele se liga à cabeça do núcleo caudado) e
superiormente à substância perfurada anterior. O tubérculo olfatório é uma pequena eminência
situada posteriormente ao trígono olfatório e anteriormente à porção substância perfurada
anterior.
Filogeneticamente, o corpo estriado dorsal é dividido em neostriado ou striatum, formado
pelo núcleo caudado e o putâmen, e o paleostriado ou pallidum, constituído pelo globo pálido.
Já o corpo estriado ventral divide-se em striatum ventral ou estriado ventral, formado pelo
núcleo accubems e o tubérculo olfatório, e pallidum ventral ou pálido ventral que corresponde
à substância inominada.
No sentido funcional mais amplo, alguns autores também consideram como parte dos NB
certas estruturas que mantêm importantes conexões e íntimas relações funcionais com os
“verdadeiros” NB, a saber: a substância negra (situada no mesencéfalo), o núcleo subtalâmico
(principal constituinte do subtálamo no diencéfalo) e o núcleo tegmental peduncular pontino
(situado na a formação reticular parabraquial pontina).

3. COMPONENTES FUNCIONAIS E SUAS CONEXÕES


Cinco conceitos são fundamentais para a compreensão anatômica e funcional dos NB:
a) suas lesões não resultam em paralisias, mas sim em disfunção dos movimentos e também
podem causar déficits significativos cognitivos e de percepção;
b) anatômica e funcionalmente, são agrupados em circuitos que processam diferentes tipos de
informação;
c) eles funcionam primariamente através de desinibições;
d) suas patologias podem resultar de disfunções das interações neuroquímicas entre os seus
componentes e dependem não apenas de neurotransmissores, mas também de receptores, da
localização das sinapses e de outros fatores que atuam nos seus neurônios;
e) eles integram circuitos paralelos que seguem o trajeto córtex cerebral NB tálamo
córtex cerebral.
Em resumo, os NB integram e modulam informações corticais através de múltiplos circuitos
paralelos que influenciam os movimentos, seja por feedback com o córtex cerebral, seja através
de centros sub-corticais. Alterações desses circuitos, por doenças degenerativas, vasculares ou
infecciosas, resultam em disfunções características dos circuitos lesados.

3.1 Complexo Estriado


Considera-se como complexo estriado a unidade funcional composta pelo neostriado
(striatum) e o estriado ventral. O neostriado é constituído pelo núcleo caudado e putâmen,
que têm origem comum e conexões entre si (apesar de separados posteriormente por fibras da
cápsula interna), enquanto o estriado ventral é composto pelo núcleo accumbens e o
tubérculo olfatório. Este último, apesar de receber fibras sensitivas olfatórias, é considerado
parte do estriado ventral devido às suas similaridades estruturais, químicas e funcionais.
As principais aferências ao neostriado são fibras provenientes do córtex cerebral ou fibras
córtico-estriadas. Ele também recebe fibras do tálamo (fibras tálamo-estriadas), da
substância negra (fibras nigro-estriadas) e do núcleo tegmental peduncular pontino (fibras
pedúnculopontino-estriadas). Por sua vez, o neostriado projeta eferências principalmente ao
paleostriado (fibras estriado-palidais), à substância negra (fibras estriado-nigrais) e, em
menor quantidade, ao núcleo subtalâmico (fibras estriado-subtalâmicas).
Os neurônios do complexo estriado apresentam tamanho moderado e grande número de
espinhas ou espículas dendríticas que, em geral, alcançam apenas a região onde se localiza o
corpo celular. Seus axônios formam as únicas fibras eferentes do neostriado e têm como
principal neurotransmissor inibidor o GABA (ácido gama-amino-butírico), mas podem conter
outros (também inibidores), em especial neuropeptídeos, como a substância P e a encefalina.
Elas disparam poucos potenciais de ação espontaneamente e precisam ser ativadas por fibras
aferentes e, portanto, quando ativadas exercem tanto ação inibitória como moduladora sobre as
suas “células-alvo”. O neostriado possui também neurônios colinérgicos (excitatórios) que
formam circuitos locais que modulam a atividade neoestriada. Na patologia denominada
Doença ou Coréia de Huntington há perda progressiva das células espinhosas médias e dos
neurônios colinérgicos do complexo estriado.

3.2. Complexo Pálido


O complexo pálido é constituído pelo paleostriado ou pallidum (globo pálido) e pelo pálido
ventral (substância inominada). O globo pálido é dividido pela lâmina medular medial em
porção interna e porção externa, mais frequentemente denominadas pálido-interno e pálido-
externo. A substância inominada contém no seu interior um grupo de neurônios que formam o
núcleo basal de Meynert.
Os neurônios do paleostriado são essencialmente GABAérgicos (inibidores) e disparam
espontaneamente, inibindo tonicamente (continuamente) as suas células-alvo. Os neurônios do
núcleo Basal de Meynert são grandes e colinérgicos. Na Doença de Alzheimer há grande perda
desses neurônios, bem como de neurônios colinérgicos de outras áreas, como córtex cerebral,
hipocampo e área septal. As duas partes do globo pálido estão reciprocamente conectadas
(fibras pálido-palidais), mas se prestam a diferentes funções. As principais aferências ao
paleostriado são axônios das células espinhosas médias do neostriado (fibras estriado-palidais)
de dois tipos: os que se projetam ao pálido-interno (e à substância negra) e contêm os
neurotransmissores GABA e substância P e os que chegam ao pálido-externo e contêm GABA
e encefalina.
O pálido-interno participa da chamada via motora direta dos NB (ver adiante) e projeta-se ao
tálamo, através das fibras pálido-talâmicas que se dividem em dois feixes: a) a alça lenticular,
originada na região lateral do pálido-interno e contorna a perna posterior da cápsula interna; b)
o fascículo lenticular (campo H2 de Forel), originado da região dorso-medial do pálido-interno,
atravessa a cápsula interna entre o núcleo subtalâmico e a zona incerta (área de transição entre
o diencéfalo e o mesencéfalo). As fibras de ambos os feixes se incorporam, no final de seu
trajeto, para formar o fascículo talâmico (campo H1 de Forel) que se situa dorsalmente à zona
incerta que termina nos núcleos ventral anterior, ventral lateral (intermédio) e centro-mediano
do tálamo. (Obs: também existem o fascículo subtalâmico e as fibras do campo pré-rúbrico que
formam o campo H de Forel).
O pálido-externo, intimamente relacionado com o pálido ventral, participa da via indireta
motora dos NB (ver adiante). Essa porção recebe muitas aferências do complexo estriado (fibras
estriado-palidais) e poucas do núcleo subtalâmico (fibras subtalâmico-palidais) e da parte
reticulada da substância negra (fibras nigro-palidais) e emite eferências ao núcleo subtalâmico
(fibras palido-subtalâmicas) e à substância negra (fibras palido-nigrais).

3.3. Núcleo Subtalâmico


Na realidade é um conjunto de pequenos núcleos situados no diencéfalo, ventralmente ao
tálamo e à zona incerta e anterior à substância negra. Recebe eferências do pálido-externo
(fibras pálido-subtalâmicas), do córtex cerebral (fibras córtico-subtalâmicas), da substância
negra (fibras nigro-subtalâmicas) e do núcleo tegmental peduncular pontino (fibras
pedúnculopontino-subtalâmicas). As suas principais eferências são para ambas as porções do
globo pálido (fibras subtalâmico-palidais) e para a substância negra (fibras subtalâmico-
nigrais). Essas conexões, especialmente aquelas com o pálido-interno são parte essencial da
via indireta dos NB.
Os neurônios subtalâmicos são excitatórios e usam o neurotransmissor glutamato. Em
condições normais eles estão inativos, devido à constante inibição dos neurônios do pálido-
externo. Se aquelas aferências são removidas, eles tornam-se altamente excitáveis e essa
atividade é parcialmente mediada pelas fibras aferentes provenientes do córtex cerebral.

3.4. Substância Negra


A substância negra, situada no mesencéfalo, possui uma parte reticulada (situada na borda
medial das fibras descendentes corticofugais da base do pedúnculo cerebral) e uma parte
compacta (adjacente à área tegmental ventral* com a qual se assemelha citoarquitetural e
funcionalmente).
A maioria das aferências à substância negra é proveniente dos complexos estriado e pálido, mas
também recebe conexões do córtex cerebral (fibras córtico-nigrais), do subtálamo (fibras
subtálamo-nigrais) e do núcleo tegmental peduncular pontino (fibras pedúnculopontino-
nigrais).
A parte compacta é formada por neurônios que contém melanina (o pigmento que lhe confere
a cor negra), têm como neurotransmissor dopamina e projetam-se para o neostriado (fibras
nigro-estriadas), podendo excitá-lo ou inibi-lo, dependendo do receptor dos neurônios pós-
sinápticos (D1 excita e D2 inibe)**.
A parte reticular é formada por neurônios inibitórios GABAérgicos, cujos axônios têm grande
número de colaterais que possibilitam um largo território de ação. Eles se conectam com o
neostriado (fibras nigro-estriadas), colículo superior (fibras nigro-tectais) e núcleo tegmental
peduncular pontino (fibras nigro-pedúnculopontinas). Eles possuem alta taxa de disparo e
inibem tonicamente suas conexões-alvo e constituem importante influência sobre outros centros
motores.
As partes compacta e reticular estão interconectadas. Dendritos de neurônios da parte compacta
vão à parte reticular onde liberam dopamina livre (por mecanismo não vesicular), cujos níveis
modulam o potencial de repouso dos neurônios da parte reticular, tornando-os mais ou menos
susceptíveis à despolarização, dependendo do tipo de receptor (D1 excita e D2 inibe)**. Por
sua vez, colaterais de axônios de neurônios GABAérgicos da parte reticular se ramificam
intensamente na parte compacta, onde estabelecem sinapses. Essas interações, formam um
conjunto de circuitos ou alças entre as duas partes da substância negra.
*A área tegmental ventral, situada medialmente à substância negra, contém grande número de
neurônios dopaminérgicos e se conecta com o estriado ventral, o corpo amidalóide e outras
estruturas do sistema límbico e também com neurônios do complexo estriado que possuem
receptores do tipo D2 para a dopamina. Na esquizofrenia há aumento do número de receptores
D2 e da sua sensitividade ao neurotransmissor e, portanto, os neurolépticos – drogas que
bloqueiam esses receptores – são úteis no controle da doença.
**Além dos receptores dopaminérgicos D1 e D2, três outros foram identificados: D3, D4 e D5.
Como possuem propriedades farmacológicas semelhantes às de D1 ou de D2, eles foram
reunidos em dois grupos: a) D1-like que inclui D1 e D5; b) D2-like que engloba D2, D3 e D4.
D1 é abundante em regiões tipicamente dopaminérgicas do encéfalo, tais como o neostriado,
a substância negra, o núcleo accumbens e o tubérculo olfatório e parece mediar as ações da
dopamina relacionadas com o controle de movimentos e com as funções cardiovascular e
cognitiva.
D5 tem distribuição muito mais restrita e, em geral, em níveis muito mais baixos e sua ação
ainda não está esclarecida.
D2 é encontrado em altos níveis em regiões tipicamente dopaminérgicas do encéfalo e media
as ações da dopamina relacionadas com o controle de movimentos e com certos aspectos do
comportamento e com a secreção de prolactina pela hipófise.
D3 e D4 se localizam nas áreas límbicas do encéfalo e, embora as ações dos receptores não
sejam ainda totalmente conhecidas, parece que eles mediam ações da dopamina relacionadas
ao comportamento, às emoções e às funções cognitivas. Adicionalmente, evidências recentes
mostram que D3 também se encontra expressado em áreas motoras dos núcleos da base,
desempenhando importante papel na geração de movimentos.
Considera-se que os neurônios dopaminérgicos do SNC estão localizam-se essencialmente na
área tegmental ventral e na substância negra e, em menor quantidade, no hipotálamo. Suas
fibras dopaminérgicas se organizam em quatro sistemas:
a) Nigro-estriatal - neurônios da substância negra parte compacta que se projetam ao putâmen
e núcleo caudado que têm receptores D1 e D2 e pouco D3. É o principal sistema e corresponde
a cerca de 70% dos circuitos dopaminérgicos do SNC.
b) Mesolímbico - originado na área tegmental ventral e se projeta ao núcleo accumbens (D2 e
D3) e área septal (núcleo septal lateral), núcleo amigdaloide, giro parahipocampal (córtex
entorinal ) e hipocampo (D4 e D5) ;
c) Mesocortical - originado em neurônios da área tegmental ventral e se projeta principalmente
para o córtex pré-frontal (D4);
d) Túbero-infundibular - Emerge principalmente do núcleo arqueado do hipotálamo (e também
de outros núcleos hipotalâmicos) e se projeta para a eminência mediana do hipotálamo (D1),
onde inibe a liberação de prolactina pela adeno-hipófise.

3.5. Núcleo Tegmental Peduncular Pontino


O núcleo tegmental peduncular pontino que se situa na formação reticular parabraquial
pontina, contém neurônios colinérgicos que se conectam com todos os componentes dos NB e
núcleos a ele associados. Por exemplo, em relação à substância negra, ele recebe fibras da parte
reticular e envia fibras para a parte compacta. Ele também se conecta com núcleos motores do
tronco encefálico (que se projetam sobre a medula espinhal).
Há a hipótese de que lesões das conexões entre o núcleo tegmental peduncular pontino e os
NB pode ser parcialmente responsável por alterações motoras, como o tremor e a coréia (ver
adiante). Mais recentemente, tem crescido o número de evidências que relacionam este núcleo
com o controle da marcha. Especula-se que a sua lesão resulte em um fenômeno chamado
freezing ou bloqueio motor: o paciente não consegue andar, pois suas pernas, apesar de estarem
com a força normal, ficam imobilizadas temporariamente.

4. CIRCUITOS OU ALÇAS PARALELO(A)S


As informações que chegam ao NB podem fluir em distintos circuitos ou alças paralelos(as).
Esses circuitos ou alças originam-se de diferentes regiões do córtex cerebral, passam por áreas
diferentes dos NB e do tálamo e retornam a áreas corticais funcionalmente distintas. Assim,
cada um pode ser considerado um canal independente que processa determinado tipo de
informação. São cinco os circuitos ou alças paralelos(as) dos NB:
a) motor(a) - relacionado com o controle motor somático (foi tema do parágrafo anterior; mais
detalhes serão fornecidos adiante);
b) oculomotor(a) - envolvido no controle do olhar e na orientação espacial;
c) pré-frontal dorsolateral - relacionado com funções ou processos cognitivos;
d) órbito-frontal lateral - idem ao anterior;
e) límbico(a) - participa das funções emocionais e viscerais.
Dos cinco, merece detalhamento o circuito ou alça motor(a), pois as alterações mais evidentes
após lesões dos NB são motoras. Os demais são apresentados, a seguir, apenas de modo
esquemático.

O circuito motor se origina de quatro áreas corticais: motora primária, motora suplementar,
pré-motora e cortical somestésica (elas serão detalhadas na aula de Córtex Cerebral). Neurônios
dessas quatro áreas se projetam sobre o putâmen e daí partem fibras eferentes que vão ao pálido
interno e à parte reticular da substância negra. Essas duas regiões se conectam com os seguintes
núcleos talâmicos: ventral anterior, ventral lateral (na realidade sua porção oral) e
centromediano. O primeiro envia fibras para a área cortical pré-motora, os dois primeiros para
a motora suplementar e os dois últimos para a motora primária. A substância negra e o globo
pálido enviam projeções primárias ao tálamo, mas também se projetam ao tronco encefálico,
especificamente ao colículo superior e à formação reticular. Desse modo, os circuitos dos NB
afetam tanto as eferências do córtex motor como centros motores do tronco encefálico.
No circuito motor a ação dos NB sobre suas conexões-alvo é geralmente inibitória e existem
duas vias motoras: a via direta e a via indireta, dois circuitos paralelos que têm ações opostas
sobre as conexões-alvo (Obs: os demais circuitos ou alças mencionadas anteriormente também
possuem vias direta e indireta).
As duas vias controlam o fluxo de impulsos nervosos do tálamo ao córtex cerebral, sendo que
a via direta facilita esse fluxo, enquanto a via indireta o inibe. Assim, ambas equilibram a
inibição dos NB sobre suas conexões-alvos.
A via direta provoca a desinibição do tálamo e, por consequência, o aumento da ativação do
córtex motor. A desinibição talâmica é devida à ação inibitória das fibras estriado-palidais sobre
os neurônios do pálido-interno (e da substância negra reticular) que, então, deixam de inibir o
tálamo (as fibras pálido-talâmicas são mais importantes porque têm uma alta taxa de atividade
espontânea e inibem tonicamente os neurônios talâmicos). Desinibido, o tálamo excita o córtex
motor, cuja atividade aumenta.
A via indireta desinibe o subtálamo e, por consequência, inibe o tálamo e diminui a atividade
do córtex motor. As fibras estriado-pálidas inibem o pálido lateral que tem ação inibitória sobre
o subtálamo (as fibras pálido-subtalâmicas têm alta atividade espontânea e inibem tonicamente
o subtálamo). Assim, a inibição do pálido externo faz cessar sua ação inibitória sobre o
subtálamo. Desinibido, o subtálamo passa a excitar o pálido interno que tem ação inibitória
sobre o tálamo. Assim, inibido, o tálamo deixa de ativar o córtex motor e este terá menor
atividade.
Seguem-se dois esquemas das vias direta e indireta: o primeiro é simplificado, contendo
apenas os circuitos mais importantes; o segundo, completo, mostra todas as vias de conexão.
Com o uso de métodos de imagem (ventriculografia, tomografia computadorizada e ressonância
magnética) pode-se usar a estereotaxia (técnica que permite localizar um ponto no espaço a
partir de três coordenadas) e localizar com precisão determinados alvos no encéfalo (como
núcleos, por exemplo). Assim, tornou-se possível realizar cirurgias nas quais uma agulha é
colocada em pontos precisos das vias direta e indireta.
Estes procedimentos são muito úteis no tratamento de pacientes com diferentes distúrbios do
movimento (na doença de Parkinson, por exemplo), mediante a termocoagulação (destruição
do núcleo por aquecimento, através de aparelho de radiofreqüência) de um núcleo hiperativo
ou a sua imobilização elétrica, feita através da implantação de um marca-passo no referido
núcleo. O método esterotáxico também permite o estudo da fisiologia dos NB em seres
humanos vivos.
Uma das contribuições destas técnicas é a revelação de que a via indireta exerce papel mais
importante no controle motor do que a via direta, pois a estimulação estereotáxica dos circuitos
da via indireta é mais efetiva do que a dos circuitos da via direta. Tal observação é confirmada
pelo fato de que as drogas agonistas dos receptores da via direta não têm eficácia farmacológica
significativa. No entanto, não se conhece ainda a razão dessa supremacia da via indireta.

5. FUNÇÕES GERAIS DOS NÚCLEOS DA BASE


Graças aos circuitos anteriormente mencionados, os NB exercem vários papéis fisiológicos,
alguns dos quais ainda não totalmente compreendidos. No entanto, podem-se atribuir a eles a
seguintes funções
- Controle motor; - Seleção e automatização - Controle da motivação;
de rotinas;
- Controle da motricidade - Controle da atenção;
ocular; - Controle de funções
- Controle do afeto.
“executivas”;

6. ALTERAÇÕES DOS NB
As mais conhecidas funções dos NB estão associadas aos sistemas motores somático (circuito
motor) e visual (circuito oculomotor). No entanto, ainda não está bem esclarecido o papel dos
circuitos pré-frontal dorsolateral, órbito-frontal lateral e límbico nos distúrbios cognitivos e
associativos.
Lesões dos NB podem provocar alterações significativas que podem ser aparentemente opostas
em diferentes pacientes. Assim, podem ocorrer alterações hipocinéticas ou hipocinesias, com
redução dos movimentos, ou alterações hipercinéticas ou hipercinesias, com aumento dos
movimentos.

6.1. Hipocinesias
As mais importantes e características da Doença de Parkinson, são a acinesia, dificuldade de se
iniciar o movimento, e a bradicinesia, redução da velocidade e da amplitude do movimento.
A acinesia parece ser devida a perda da habilidade de planejar os movimentos ou orientá-los
numa posição desejada. Vários estudos revelam que os NB são ativados durante a fase de
planejamento do movimento ou quando o indivíduo está fazendo um movimento “guiado
internamente”, isto é, movimento para uma posição na qual não há qualquer estímulo. Portanto,
há perda da função dos NB de gerar e planejar movimentos programados.
A bradicinesia é devida à ruptura do equilíbrio entre as vias direta e indireta para o tálamo,
resultando num aumento da ativação dos músculos antagonistas e não necessariamente na
diminuição da atividade da musculatura agonista.
Os dois tipos citados de hipocinesias parecem ser devidos às lesões do neostriado
(especificamente do putâmen) que resultam na perda da inibição exercida por ele sobre a pálido
interno (via direta) que continuaria ativo tonicamente e inibiria o tálamo. Assim, haveria
diminuição do fluxo de impulsos do tálamo para o córtex cerebral e, por consequência,
acarretaria menor atividade dos neurônios do trato córtico-espinhal e de outras vias
descendentes. Além disso, a maioria das conexões da via indireta permaneceria intacta e o
núcleo subtalâmico excitaria a pálido interno (sobretudo quando o córtex dispara mais impulsos
do que o normal) resultando numa inibição ainda maior do tálamo. Ou seja, a perda da
desinibição do tálamo pela via direta e o aumento da sua inibição pela via indireta tornam o
paciente menos apto a executar os movimentos adequados.
A doença de Parkinson é o melhor exemplo de patologia hipocinética, sendo caracterizada por
acinesia, bradicinesia, tremor de repouso, rigidez (hipertonia muscular), perda de reflexo
postural e distúrbio dos movimentos oculares. O paciente apresenta uma gama sinais típicos,
entre os quais destacam-se: tremor de repouso (manifesta-se quando o indivíduo está “parado”
e é bastante evidente nas mãos, onde os dedos se movem como se enrolassem continuamente
um cigarro ou contassem dinheiro); postura fletida (hipertonia de todos os músculos flexores);
escassez de movimentos; dificuldade de iniciar os movimentos; andar “arrastado” (os pés
parecem presos ao chão e os passos curtos e bruscos lembram “passos apressados”, alternados
com passos quase normais); olhar “vazio”; máscara parkinsoniana (a face fica rígida como uma
máscara, devido à hipertonia dos músculos faciais). Essa doença é causada pela perda de
neurônios dopaminérgicos da substância negra que se projetam para o neostriado. A dopamina
tem efeito excitatório na via direta, mas é inibitória na via indireta. A perda desses neurônios
causa profunda alteração química no estriado, com aumento da atividade das suas projeções
para o pálido-externo e diminuição das projeções para o pálido-interno. O resultado é
semelhante ao já descrito para lesão do neostriado.

6.2. Hipercinesias
Elas se expressam sob a forma de discinesias, das quais as formas mais comuns são a coréia, o
balismo (também agrupados sob a denominação balismo-coréia) e a distonia.
A coréia é caracterizada por fluxo contínuo de movimentos imprevisíveis. Por vezes os
pacientes com movimentos coreiformes têm a aparência de estar dançando. Na verdade, coréia
em grega significa dança. A causa mais comum desta hipercinesia no nosso meio é Coréia de
Sydenham. Trata-se de doença auto-imune onde o sistema imunológico ao tentar livrar-se de
infecção por certo tipo de bactéria estreptococos ataca os núcleos da base. Uma outra causa
comum é Doença de Huntington, afecção degenerativa autossômica dominante e devida à
mutação do braço curto do cromossomo 4. Além de coréia, os portadores desta enfermidade
apresentam demência (perda das funções intelectuais), alterações do comportamento (depressão
ou seu oposto, mania) e outros movimentos anormais. Nesta doença há perda seletiva de células
espinhosas médias do neostriado que se projetam ao pálido externo e de neurônios colinérgicos
do complexo estriado, portanto neurônios associados à via indireta.
O balismo consiste em coréia mais intensa de modo que os movimentos são de grande
amplitude. Sua causa mais conhecida é lesão vascular do núcleo subtalâmico contralateral.
Como os movimentos geralmente acometem apenas uma metade do corpo, dá-se o nome
hemibalismo. O nome balismo-coréia justifica-se, pois, como foi dito, o balismo pode ser
considerado uma coréia mais intensa. Além disso, na evolução do balismo é frequente as
alterações se abrandarem e a doença assumir as características da coréia.
A distonia caracteriza-se pelos movimentos distônicos que produzem posturas anormais e/ou
torção da parte corporal afetada. Sua localização mais comum é no pescoço - distonia cervical
ou torcicolo espasmódico. Este último nome se explica pela frequente presença de torção no
pescoço. Outras áreas corporais também podem ser afetadas, tais como as pálpebras
(blefaroespasmo – dificuldade de manter os olhos abertos), região da boca (distonia
oromandibular), entre outras. Quando em porções distais das extremidades é comum se usar o
termo atetose (do grego, verme) para designar os movimentos distônicos. Neste caso a
hipercinesia consiste em movimentos vermiformes, isto é, um constante contorcer das porções
corporais afetadas.
As bases anatômicas das distonias são menos conhecidas. Presume-se, no entanto, que possam
ser explicadas por distúrbios na via indireta da alça motora, resultando na perda de neurônios
excitatórios subtalâmicos. Há um desequilíbrio entre a excitação dos neurônios pálido-
subtalâmicos (pela via direta) e sua inibição (pela via indireta) que tem como resultado uma
diminuição da inibição das células talâmicas e o consequente aumento na atividade do córtex
motor.

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