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Prólogo

Essa não é uma história de amor. Poderia ser, mas o mundo nunca concordou
comigo.

Nossa história começou como um conto de fadas. Passou por toda aquela
fase de fantasia e encantamento para então começar o pesadelo. O que vou
contar agora envolve inúmeras pessoas da nobreza e aristocracia da Inglaterra.
Por este motivo, utilizei apelidos ou somente seus títulos para preservar suas
identidades.

Todos, sem exceção, me amaram de alguma forma. Mas eu só amei um


homem em toda a minha vida. E é essa história que eu quero contar.
Capítulo 1

Cresci em Astoria*, uma pacata cidade praiana no fim do mundo. Não que eu
soubesse que era o fim do mundo, aliás, achava que era gigantesca! Conforme
fui crescendo, percebi que não passava de um bolsão de areia com vista para o
mar, onde as pessoas viviam um universo paralelo e não faziam ideia da vastidão
do mundo real. Obviamente eu também não. Então, poucos podem me julgar
quando, aos 15 anos, conheci Raoul. Ele chegou em Astoria como um furacão,
destroçando coraçõezinhos numa velocidade vertiginosa. Ele tinha 23 anos, um
Adônis** no auge da masculinidade. Meninas como eu não sabiam o que
significava desejo. E em Astoria, isso era novidade para todas as meninas com
mais de 13 e menos de 25 anos. Sim, Astoria vivia com o estigma de casar suas
meninas virgens, da corte dos rapazes, dos bons partidos. Todas que tinham uma
condição de vida melhor aprendiam como conseguir um bom partido, como
encantar um nobre rico e sumiam no mundo para sempre. Não foi o meu caso.
Minha mãe morreu quando eu tinha 7 anos. Meu pai foi logo depois, afogado na
tristeza de perder o grande amor de sua vida. É história conhecida em Astoria
que meus pais não tiveram mais filhos para que minha mãe pudesse se dedicar
totalmente ao meu pai. Depois de uma temporada em alto mar, meu pai só tinha
olhos para minha mãe. Eles se trancavam no quarto por dias, às vezes semanas.
E eu não imaginava o que eles faziam, mas logo depois meu pai sorria como um
bobo da corte e minha mãe corava sempre que olhava pra ele. Pra mim, isso era
amor. O sorriso bobo e as maças do rosto vermelhas. Então, quando corei a
primeira vez que Raoul me olhou, achei que estava amando. E não poderia estar
mais certa.

A família dele, diziam, era aventureira, conhecia o mundo todo e se


encantara com a simplicidade de minha cidade, portanto decidiu morar lá. Raoul
imediatamente encontrou trabalho junto aos pescadores e arrancava suspiros
quando se dirigia as docas. A pele morena de sol, aliada aos cabelos castanhos
escuros lhe davam um aspecto viril, mas o olhar era seu verdadeiro encanto:
olhos de predador. Raoul sabia do fascínio que causava nas mulheres, era seguro
de si e decidido. Então foi muito difícil entender por que ele havia se interessado
tanto por mim. Todos falavam da minha beleza, mas me achava uma menina
totalmente comum, com cabelos pretos e olhos castanhos escuros. Não me via
tão bela quanto minha melhor amiga, Sabrina, loira, de olhos azuis, magérrima e
alta. Eu não sabia que ter curvas fazia muito mais apelo aos homens, então nunca
me achei bonita, com minha cintura fina num quadril largo e seios fartos. Há um
ano meus seios tinham surgido do nada, na velocidade da luz, e eu fazia de tudo
para esconde-los. Quando ia ao píer, percebia os olhares dos homens, mas me
causava mais medo do que qualquer outra coisa. Graças a influência de meu tio,
nunca tive problema entre os marinheiros. Ele era um oficial da Marinha
Mercante e, depois da morte de meus pais, me adotou com muito gosto, já que
ele e minha tia nunca puderam ter filhos e o amor que meu tio sentia por sua
irmã morta foi transferido para mim. Ele me mimava, me tratava como uma
princesa e, apesar de minha tia sempre estar em busca de um cavalheiro
adequado para me casar, meu tio me protegia de tudo e todos: queria que eu
fosse livre como um homem, que pudesse escolher meu noivo e que pensasse
por si, por isso me ensinou a ler, escrever e sempre líamos os mesmos livros para
travar embates sobre nossos próprios pontos de vista. Quando ele morreu, seis
meses atrás, sofri a perda de meu companheiro de leitura, professor e protetor.
Não ia mais a marina, a menos que fosse necessário e com o tempo percebi que
o respeito permaneceu, mesmo depois de sua morte. Minha tia chegou a
conclusão que era imperativo que eu me casasse com um bom partido que nos
desse sustento, então se empenhava ainda mais em juntar dinheiro para me
mandar para o continente para uma temporada. Com sorte, encontraria um
marido rico e me casaria com, no máximo, 18 anos. Raoul nem entrou para a
lista de “solteiros cobiçados” de minha tia, visto que ele não era tão rico. Tinha
uma vida tranquila, sua família tinha posses, mas minha tia era ambiciosa.
Queria um marido que me cobrisse de joias, que conhecesse o mundo, que
vivesse numa cidade grande. Na minha lista de “solteiros cobiçados” só existia
Raoul, desde o dia que ele me encarou com aqueles enormes olhos verdes e
sorriu. Meu coração disparou, minhas pernas bambearam e tropecei numa pedra.
Só senti fortes braços me levantando e uma voz de barítono me perguntando se
eu estava bem. Levantei meus olhos e me perdi naquela imensidão verde.

- Você está bem? – seus olhos eram zombeteiros e ele se esforçava para não
rir.
- Não... sim... bem.... – meu cérebro não processava mais informação
nenhuma e eu não conseguia tirar meus olhos da sua boca.

- Foi um tombo e tanto, acha que pode ficar em pé?

- Errrr.... eu... não... como... – ele sorriu.

- Deve ter batido a cabeça... não consegue nem falar! – ele foi afrouxando o
aperto em minha cintura até que meus pés tocaram o chão.

- Sim, consigo falar. Pode me soltar agora, obrigada.

Eu devia estar um pimentão. Senti as maçãs do meu rosto pegando fogo, mas
não havia nada que eu pudesse fazer.

- Você é linda – ele disse, tocando meu queixo – poderia segura-la todo o dia.

E com essa frase, ele me deixou plantada no meio da rua, corada,


envergonhada e sentindo algo que nunca tinha sentido antes no meio das pernas.

Dois dias depois, nos encontramos na casa do Dr. Caranguejo. Era conhecido
assim por andar meio de lado, pobre velhinho. Era o médico da aldeia, todos o
amavam e respeitavam. Então, quando ele resolvia dar uma festa, todos
compareciam e já tinha se tornado uma tradição a festa do solstício de verão. Eu
tinha certeza de que encontraria Raoul, então passei horas diante de um espelho
experimentando vestidos, sapatos, penteados e sai de casa com a sensação de que
meu esforço tivera sido em vão. Sabrina resplandecia num vestido verde água,
com os cachos louros soltos, se espalhando até a cintura. Quem olharia pra mim?
Minha resposta veio no instante em que pus os pés na casa do Dr. Caranguejo:
Raoul. Ele estava lindo, com uma calça escura, uma camisa imaculadamente
branca, e casaca preta, com botas que podiam refletir nossa imagem, tamanho
seu brilho. Não consegui desviar o olhar, mas segui por um lado do salão e, tão
logo cheguei a mesa de bebidas, ouvi a minhas costas:

- Você fica ainda mais linda de amarelo. Como se sente? Ficou com alguma
hematoma do tombo? - antes mesmo de virar, já estava corando. Seus olhos
estavam ternos, com uma pitada de preocupação.

- Oh, estou ótima, obrigada! Sem hematomas.

- Quer dançar? – Lá estavam os olhos de predador.

- Eu... eu não saberia... – mais uma vez eu estava gaguejando diante do


homem mais lindo que eu vi em toda a minha vida. Do alto de seus 1,96m, eu
parecia uma criança. Era intimidador.

- Não sabe dançar? Ora, vamos eu te ensino, sem cobrar nenhuma taxa! – ele
sorria da própria gracinha. Sorri também.

- Não é isso. Só não saberia dizer se é apropriado. Nem sei seu nome! – sabia
o nome dele desde seu primeiro dia em Astoria, todas as meninas sabiam.
Alguém tinha feito um dossiê que tinha todos os detalhes conhecidos de sua
vida, altura, peso, cor dos olhos e cabelos, seus gostos, manias, enfim... as
meninas eram profissionais!
- Raoul, a seu dispor! Ele fez uma reverência e me deu o braço, seguindo
para a pista de dança. Enlaçou minha cintura, colocando minha mão em seu
ombro e segurando a outra.

- Agora que já sabe o meu nome e estamos dançando, posso saber o seu?
Afinal, já sei que é linda, desastrada e não tem hematomas! Mas sinto que estou
em desvantagem, não sei que nome dar a garota dos meus sonhos...

Corei e baixei meus olhos, estava envergonhada com o discurso dele e sabia
que estava sendo vigiada por todos no salão. Ele tocou meu queixo e ergueu meu
rosto – você me enfeitiça ainda mais quando cora assim. Por favor, me diga ao
menos seu nome!

- Chrissy. Meu nome é Chrissy.

- Isso me parece mais um apelido que um nome, mas já é um começo! –


quem sorriu agora fui eu.

- Meu nome é Christine, mas todos me chamam de Chrissy.

- Christine. Eu não sou “todos”. Para mim, você será Christine, pelo menos
até que eu pense em algum apelido tão lindo quanto você e que só eu e você
saibamos, é assim que vou lhe chamar.

Conversamos um pouco e ele se mostrou surpreso em perceber que, ao


contrário da maioria, eu não me interessava por vestidos, laços, rendas. Eu
sempre amei a literatura e a arte. A música e história. Quando a música acabou,
agradeci e virei em direção a Sabrina, que me olhava com uma mistura de inveja
e curiosidade. Antes de conseguir dar um passo, senti uma mão tocando a minha.
– Não quer beber alguma coisa? Estou sedento! – Aquele olhar poderia me matar
a qualquer momento. Novamente senti sua mão em minha cintura, me levando
em direção a mesa de bebidas. Finalmente criei coragem:

- Você não vai dançar com as outras moças?

- Para quê? Se só tenho interesse em uma? – seus olhos estavam agora verdes
escuros, com um certo ar de desdém. – Sou um homem direto, Christine, não
perco meu tempo com o que não me traz prazer. – ele abriu um meio sorriso. –
Gostaria de dar uma volta na praia? A noite está maravilhosa!

Meu coração estava na garganta e eu travava uma batalha entre a vontade de


ir com ele até o inferno e o medo de não poder voltar atrás. – Não acho que seja
adeq....

- O que é adequado, Christine? Devo ir até sua casa e pedir a seu pai para
cortejá-la??? – sua voz tinha um tom frustrado.

- Meu pai está morto.

- Oh, meu Deus! Eu sinto muito! Jamais imaginaria...

- Tudo bem, você não sabia. – agora quem corava era ele.
- Pois então, devo leva-la a um passeio imediatamente! Preciso compensar
minha estupidez nesse instante! – e foi me empurrando pela porta da varanda, até
que estanquei.

- Não posso. O que as pessoas vão dizer?

- Vamos fazer assim: vamos ficar aqui fora, vendo o mar, recebendo esta
brisa maravilhosa no rosto e eu prometo que não daremos mais de dez passos
para longe da varanda, onde todos podem nos ver. Que tal?

Sorri. – Tudo bem. E assim fizemos.

Os dez passos dele eram vinte passos meus, mas ele não trapaceou: deu dez
passos, parou e se virou. – Opa, este é nosso limite, mocinha, pode parar. – Eu
ri.

- Que sorriso lindo. Quero vê-la sorrir de novo. – ele tocou meu rosto e
seguiu com o dedo de uma orelha a outra. – você é linda. Por que quis me jogar
para sua amiga?

- Eu não quis joga-lo para minha amiga! Eu só não entendo como pode me
achar bonita... – seus dedos bloquearam minha boca.

- Nunca mais diga isso. Você é linda e não deixe que ninguém lhe diga o
contrário! Vou lhe explicar o que você não entende: sua amiga é loura, alta, com
olhos claros, magra como uma tábua... como todas as damas “adestradas” da
sociedade. Não há nada de especial ali! Reconheço que o conjunto seja
harmônico, mas o que há de diferente? O que faz um homem olhar uma segunda
vez para uma mulher como sua amiga? Você, Christine, tem o cabelo negro
como petróleo, que brilha até mesmo agora, com a luz da lua! Seus olhos são tão
expressivos... quero saber o que está pensando, quero saber por que você cria
ruguinhas quando pensa muito ou como sorri com os olhos quando está alegre!
Você é inteligente, divertida e audaciosa! Você pensa, Christine, coisa que todas
essas “bonecas” não fazem. E seu corpo... ah, Christine, seu corpo foi desenhado
para o pecado!

Meus olhos estavam tão arregalados que achei que fossem saltar de órbita.

- Viu só, seus olhos expressam tudo o que sente! Não se assuste, é só uma
expressão! Quero dizer que seu corpo é lindo e qualquer homem mataria para tê-
la! – Ele se aproximou novamente e tocou meu rosto – quero descobrir todos os
seus segredos, Christine! Você me seduz com todo o seu esplendor e nem faz
ideia disso. Sua inocência, aliada a sua inteligência e sensualidade me deixam
louco!

Foi como se tivesse atingido meu limite, me virei e corri! Corri o máximo
que pude, com os sapatos nas mãos, pela areia da praia. O desejo era arrebatador
e eu tinha medo de mim mesma. Tinha medo de sucumbir aqueles olhos e medo
do que podia vir depois. Quando cheguei em casa, não conseguia respirar e o
medo ainda estava correndo junto com meu sangue.

Dois dias se passaram até que eu encontrasse Raoul novamente. Apertei o


passo quando o vi, mas é claro que ele me alcançou.

- Christine, por favor! Permita que eu peça desculpas por meu


comportamento. Você é jovem, pura e ingênua e eu passei dos limites. Prometo
que não vai acontecer de novo.
- Promete?

- Você impõe os limites. Eu os respeito.

Sorri. Balancei a cabeça concordando e segui meu caminho. Ouvi o grito já


ao longe – eu prometo, Christine, e nunca quebro minhas promessas!

Depois disso, nos víamos diariamente. Raoul aceitou todos os limites e


nunca mais me tocou, somente duas vezes quando tropecei e alegou que era puro
reflexo, o que não fazia muita diferença, estava grata por ter impedido minhas
quedas. Decidiu que meu apelido seria Pequena e que só ele me chamaria assim,
que eu não permitisse a mais ninguém usar o apelido. Sabrina começou a ficar
enciumada, pois éramos inseparáveis até Raoul chegar. Apesar disso, ela não se
opunha a ter o rapaz sempre conosco, mas nas raras vezes em que estivemos
sozinhas sempre tentava me aconselhar, pedindo que eu tivesse cuidado.
Respondia sempre da mesma forma:

- Mas ele nem me toca! Que mal ele poderia me fazer?

Sabrina sempre estava ressabiada com alguma coisa e eu achava estranho


uma mulher tão linda como ela não ter pretendentes. Ela dizia que estava se
guardando para um Visconde que passava os verões em Astoria e que prometeu
casar-se com ela. Como sua vida amorosa parecia parada, ela se interessava pela
minha e eu acabava confidenciando meus segredos e os de Raoul para ela.
Tentava seguir seus conselhos, na esperança de que Raoul me pediria em
casamento se me portasse como uma dama. Tentava imitá-la, apesar de não ter
muito sucesso, pois, como Raoul já tinha reparado, minha sede por
conhecimento era ilimitada. Sempre questionava, debatia, não me satisfazia com
uma resposta vaga. Tentava manter a postura ereta, mas isso não durava mais do
que alguns minutos. Tentava rir baixinho, tentava não parecer tão interessada em
assuntos que não fossem vestidos, bordados, afazeres domésticos, mas não
conseguia disfarçar por muito tempo, a vontade de saber, de conhecer, de
entender era maior. Tentava sempre seguir as regras que nossa sociedade
impunha, mas algumas regras de decoro e etiqueta eram difíceis de seguir. Como
no dia em que ele apareceu montado num belíssimo garanhão negro.

- Quero te levar a um lugar que eu descobri. Será seu presente de aniversário


de 16 anos.

- Mas você só tem um cavalo... – ele ergueu uma sobrancelha, o riso


zombeteiro aparecendo...

- Vamos lá Christine, acho que já provei que não vou passar dos limites. Por
favor...

Aceitei sua ajuda e subi no lombo de Golias, me encaixando no meio de suas


pernas. O calor do corpo dele fazia o meu começar a reagir. Ele enlaçou minha
cintura com um braço e segurou as rédeas com o outro, cavalgando
delicadamente a princípio. Era o cúmulo da indecência! Eu estava sozinha, num
cavalo, no meio das pernas de um homem! E não me importava nem um pouco!
Quando o trote virou um galope, ele sussurrou em meu ouvido – agarre-se em
mim, Christine, não quero que você caia e quebre o pescoço! – e eu agarrei.
Depois de passar por um bosque com árvores centenárias, um córrego e subir e
descer uma montanha, chegamos a uma gruta, próxima a um lago. Nasci em
Astoria e não conhecia aquele lugar e o forasteiro o descobriu em 5 meses!!!

- Oh, é lindo! – estava maravilhada.

- Calma, essa ainda não é a melhor parte. Vamos entrar? Ele me segurou pela
cintura, me desmontando de Golias, e seguiu para dentro da gruta. Sentir suas
mãos em mim causava uma febre que eu nunca queria curar. Arrepiava-me dos
pés à cabeça, me fazendo respirar aceleradamente. Lá dentro, uma toalha
estendida no chão continha frutas, queijos, pães, geleias, suco, água, flores e
velas iluminavam tudo ao redor.

- Oh meu Deus, Raoul!

- Feliz aniversário, Pequena! – ele se aproximou e, hesitante, dirigiu suas


mãos ao meu rosto, aguardando que eu o impedisse, mas eu não o repeli. Então
ele me tocou e prosseguiu se aproximando até estar a poucos centímetros. Eu
podia sentir sua respiração ofegante e meu peito subia e descia loucamente.

- Não tenha medo. Eu não mordo... a menos que você queira. – ele sorriu,
sussurrando. Então tocou meus lábios com os seus. Meu primeiro beijo foi doce,
terno. Quando achei que explodiria, dei um passo para trás, ofegando. Eu ainda
não sabia controlar minhas emoções e todas aquelas sensações novas eram
demais para mim. Raoul pediu desculpas e tentou se aproximar.

- Não precisa pedir desculpas, eu... eu não...

- Pequena, foi só um beijo, não sei por que não confia em mim, mas eu já
disse que não quebro minhas promessas...

- Eu sei.... não é que eu não confie em você... – não conseguia encará-lo.

- Por favor, me diga então o que é!!! – ele segurou me rosto, forçando-me a
olhar em seus olhos.
- Eu não confio em mim quando estou com você. – confessei e aquilo foi o
suficiente para deixa-lo ardendo.

Ele puxou meu corpo contra o seu e o beijo tornou-se desesperado. Não
conseguia pensar em outra coisa que não fosse aquele corpo colado ao meu, as
sensações que ele provocava. Senti uma parte do corpo dele que não imaginava o
que era, mas, talvez por instinto, me assustei. Ele percebeu e intensificou o beijo,
me ensinando – toque minha língua com a sua, Pequena, não tenha medo. –
medo era uma das milhares de coisas que eu estava sentindo, mas segui suas
instruções. Suas mãos começaram a percorrer o meu corpo e, com sua língua,
traçou uma linha de arrepios até minha orelha – Lembre-se que os limites são
impostos por você. Não faremos nada que você não queira, meu amor.

Senti sua mão em meu seio. Ele apertava meu mamilo e continuava a beijar
meu pescoço. Enfiei meus dedos entre seus cabelos e os agarrei com força,
queria que ele me devorasse. Não existiam mais limites, eu estava entregue.
Achava que não podia ser mais delicioso que aquilo, mas podia. Ele levantou
minhas saias e me tocou no ponto mais sensível de meu corpo. Nem sabia que
aquele ponto existia, mas era mágico! Ofeguei e me agarrei ainda mais àquele
corpo que me deixava louca.

-Ah, Pequena, como eu lhe desejo! Preciso de você... – ele continuava me


beijando e começou a puxar meu vestido para baixo, expondo meus seios. Dei
um salto para trás, tentando me cobrir.

- Você não quer que eu a toque aí? – ele olhava para os meus seios com
volúpia. Como não obteve resposta, se aproximou novamente – já lhe disse que
não farei nada que você não queira, Pequena – cobrindo meus seios novamente,
ele me abraçou. O momento tinha acabado por conta de minha insegurança. Não
queria que acabasse, então me enchi de coragem e agarrei-me a ele novamente.
A dança de nossas línguas começou com mais luxúria. Toquei sua mão e a levei
ao meu seio. Ele suspirou em minha boca e abaixou novamente meu vestido.
Quando senti sua língua em meu mamilo, minhas pernas viraram geleia e ele me
deitou sobre a toalha, empurrando tudo o que havia nela para o chão. Quando ele
me montou, senti novamente algo rígido em meu abdome. Arregalei os olhos e
ele me explicou – isso é o que você faz comigo, Pequena – e levou minha mão
até sua ereção, que pulsava. Continuava sem saber o que era, mas o que ele me
disse fez-me sentir poderosa, então, continuei com a mão ali, sem saber o que
fazer. Ele desabotoou suas calças e senti sua pele quente e macia. Ele segurou
minha mão e começou a fazer movimentos de vai e vem enquanto ainda me
beijava. Quando soltou minha mão, eu continuei, sem desgrudar meus lábios dos
dele. Ele se deliciava com minha boca, meus seios e me acariciava o meio das
pernas, me fazendo ficar cada vez mais ofegante. De repente, senti como se fosse
explodir, cair de um precipício, voar. Não contive o grito e relaxei. Ele segurou
minha mão, aquela que o tocava de maneira desesperada.

-Pequena, se você continuar, não vou conseguir me segurar, por favor, pare.
Ele respirava com dificuldade e parecia frustrado em me pedir para parar.

Parei, meio confusa. Ele não tinha colocado minha mão lá? Não tinha me
ensinado o que fazer? Adivinhando meus pensamentos, ele continuou – não o
quero em sua mão. Quero ele aqui. – e me tocou novamente naquele ponto
mágico, que me levava ao céu. Mais uma vez estava com os olhos arregalados e
ele interveio – mas isso não vai acontecer, pelo menos não hoje, Pequena. Ele
tocou meu rosto, sorrindo. – Venha, vamos comer, precisamos voltar antes que
alguém dê por nossa falta na cidade.

Depois desse dia, nossas carícias foram ficando cada vez mais intensas. Não
se passava um dia sem que Raoul me levasse ao céu, tocando naquele ponto
secreto de meu corpo e eu ia ao céu gritando seu nome. As conversas com as
meninas tinham alto teor erótico e agora eu entendia o que elas queriam dizer.
Um dia, criei coragem e perguntei:

-Vocês sabem como o homem coloca “aquilo” na gente? – Todas me olharam


como se minha cabeça tivesse sumido. – Como você sabe dessas coisas,
Chrissy???
- Bem... vi um livro na biblioteca do Dr. Caranguejo e fiquei confusa com as
imagens... consegui enganar a todas, menos Sabrina, que me olhava com uma
mistura de curiosidade e reprovação.

- Bem, isso se chama sexo. Deve ser feito depois do casamento. Minha mãe
não gosta – disse Mary sem muita empolgação. – deve doer, pois ela sempre
chora depois. Eu peguei meus pais no ato, por assim dizer... ela parecia não estar
gostando e meu pai suava em cima dela, como um cavalo sobre a égua... meu pai
gritou e eu corri até perder o folego. Agora é engraçado, mas no dia.... Todas
ficamos estupefatas com a declaração. Passado o constrangimento inicial, todas
começaram a falar de suas experiências (que não passavam de beijos roubados e
conversas ouvidas atrás de portas) e chegamos à conclusão de que não era algo
bom. Eu não conseguia entender. Tinha sido tudo tão maravilhoso, como poderia
terminar com algo ruim? Raoul me dizia que aquilo era a “cereja do bolo” e que
aguardaria até que eu estivesse preparada, mas como se preparar para isso?

Era esse o nível de ingenuidade das meninas de Astoria.

Naquela mesma noite o procurei, em nosso refúgio, já que era isso que a
gruta havia se tornado. Depois de um abraço cheio de saudade, disse:

- Não quero fazer sexo.

Raoul engasgou e cuspiu todo o suco que bebia enquanto me esperava.

- Talvez se você não fosse tão direta e um pouco mais clara, eu entenderia!
Pequena, que história é essa de “não querer fazer sexo”?

- Dói. Agora sim, ele me olhava como se 10 braços tivessem crescido ao


redor de minha cabeça!

- E como você sabe??? Por favor, não me diga que sabe por experiência
própria! Eu não poderia suportar....

- É claro que não! É que...

Ele esperou, tentando se recuperar do susto.

- Eu estava conversando com as meninas... – ele suspirou, aliviado e


gargalhou. Eu comecei a ficar irritada com a soberba dele!

- Pequena, nunca quebrei nenhuma promessa que fiz a você... confia em


mim? Eu assenti, a contragosto.

- Sim, dói. Mas apenas na primeira vez, eu prometo. Você vai descobrir que
depois é algo muito prazeroso. Prometo que vou te levar ao céu todas as vezes
que nos amarmos. E nunca mais diga “fazer sexo”, faremos amor!

Eu ainda não estava totalmente convencida. Como poderia doer somente


uma vez e não doer mais? E se era prazeroso, talvez a dor não fosse tão
excruciante? Algumas dúvidas ainda pairavam em minha cabeça. Apesar disso,
travava uma batalha entre o medo, a curiosidade e a necessidade de Raoul.

Ele se aproximou e tocou meu rosto. – Jamais sentiria prazer se soubesse que
você não está sentindo o mesmo. Eu amo você, Pequena. – Ele nunca havia dito
que me amava. Aquilo, pra mim, bastou. Esqueci todas as dúvidas e resolvi
confiar nele.
- Então faremos amor, Raoul, pois eu também amo você!

Ele sorriu, estendendo seus braços para mim. Quando me abraçou, senti todo
o calor daquele corpo que eu tanto desejava. Ele tocou meus cabelos, os
beijando. Deixou uma trilha de beijos pela minha orelha, pescoço, até o vale
entre meus seios.

- Você cheira tão bem! Eu fico louco só de sentir seu cheiro!

Agarrei seus cabelos e suspirei. Ele sempre sabia o que dizer para me deixar
ainda mais apaixonada por ele. Ele seguiu me beijando e, lentamente, começou a
desabotoar meu vestido. Quando senti a seda deslizando para baixo, tentei me
cobrir, mas ele não me permitiu.

- Nunca esconda sua nudez de mim, Pequena. Você é linda demais para se
esconder.

Ele segurou minha mão para que eu saísse de dentro daquele monte de seda a
meus pés e se ajoelhou diante de mim. Tirou uma sapatilha, tocando minhas
pernas e me fazendo arrepiar. Enquanto tirava meus sapatos, roçava o nariz em
meus joelhos. Deixou mais beijos em minhas pernas e subiu a mão para soltar
minhas meias das ligas. Enquanto as soltava, grudou seus olhos nos meus e
repetiu – Você é linda demais para se esconder, Pequena. Linda!

Depois de muito tempo me torturando ao tirar minhas roupas, ele me deitou


sobre um cobertor e tirou a camisa. Perdi o fôlego com a visão daquele peitoral
largo, com músculos definidos e abdome liso. Ele era lindo, dos pés a cabeça e a
imensidão verde de seus olhos não desviava nunca de mim. Ele deitou sobre meu
corpo e começou a me beijar novamente.

- Hoje, vou te levar ao céu de muitas maneiras, Pequena. Quero que sinta
tanto prazer que não ouse sequer pensar em um dia me deixar.

Desceu da minha boca para meus seios, dando atenção a um de cada vez.
Tocava-me na parte mais íntima de meu corpo, me fazendo gemer e ofegar.
Quando os beijos chegaram ao meu ventre, ele levantou a cabeça e, com os olhos
de predador que sempre me fascinaram disse – Abra-se pra mim, meu amor. E
não deixe de me olhar.

Quando sua língua tocou minha umidade, achei que fosse morrer. O desejo
era infinitamente maior que a vergonha e, por mais que quisesse fechá-las, abri
ainda mais as pernas. Ele sorriu.

- Ah, Pequena, você é deliciosa. Sonhei tanto com isso e descobri que a
realidade é ainda melhor que o sonho!

Quando eu não pude mais resistir aos avanços de seus dedos e língua, me
lancei em um gozo furioso, gritando e segurando seus cabelos. Para mim, aquilo
era devastador. Mas não era nem o começo para ele.

Raoul levantou-se, tirou o resto das roupas voltou a subir em mim. Fiquei
assustada com seu tamanho, mas estava curiosa demais para saber como tudo
aconteceria.

- Perdoe-me, meu amor, prometo que vou tentar ao máximo não permitir que
sinta dor. Mas vai passar e quando passar, vou dar todo o prazer que puder para
compensar você.
Isso, aliado ao tamanho dele, fez com que eu me retesasse e começasse a
repensar o “fazer amor”. Mesmo assim, permiti que ele colocasse seu membro
em minha abertura. Fui relaxando aos poucos, a medida em que ele se segurava e
tentava ser gentil, me beijando e dizendo o quanto me amava. Quando a dor
veio, ele já estava na metade do caminho e parou novamente.

- Por favor, me perdoe, Pequena. Você está bem?

Respirei fundo e movi meu quadril na direção dele. Ele entrou inteiro em
uma nova estocada. Parou. A barreira fora rompida, eu sentia minha carne se
abrindo e a sensação não era boa.

- Por favor, me diga que você está bem. Diga alguma coisa!

- Só me dê um tempo, por favor!

Ficamos naquela posição parados por algum tempo, enquanto Raoul somente
me beijava, sussurrando palavras carinhosas e me dava o tempo necessário para
que voltasse a respirar. Assenti e então Raoul começou novamente a se mexer,
tocando meus mamilos. Depois os lambeu e a dor deu lugar ao prazer que sentia
antes de ser penetrada.

- Ah, Pequena, você vai ser a minha morte!

Como era maravilhoso poder senti-lo inteiro dentro de mim, sem dor, só
prazer. Quando finalmente o vi sem nenhuma roupa fiquei um pouco assustada.
Nunca imaginaria que aquilo tudo fosse caber em mim. Mas cabia.
Perfeitamente.

Eu já não aguentava mais, queria o alívio mais que tudo e, como sempre,
Raoul leu meus pensamentos, pois me tocou naquele que se tornou seu lugar
favorito e em um minuto eu estava caindo do meu precipício particular, desta
vez, com Raoul junto.

Ele teve seu alívio, gritando que me amava. Passamos algum tempo na gruta
e a realidade nos acordou.

- Não podemos passar a noite aqui, Pequena. Apesar de não querer me


separar de você nunca mais, temos que voltar.

Quando chegamos perto da minha casa, ele me abraçou, beijando o topo da


minha cabeça.

- Foi a melhor noite da minha vida. Gostaria que ela nunca acabasse,
Pequena.

- Eu também não quero que acabe. Agarrei-me a ele, sentindo seu cheiro e
seu calor. Ali era meu lar.

Entrei em casa na ponta dos pés, pela porta dos fundos, quando ouvi a
conversa:

- Pois ela passa todas as tardes e foge todas as noites para a gruta com ele!
Nem sabia que essa gruta existia, mas ela me disse que vivem como amantes lá!
- Isso é impossível!

- É mesmo? E onde ela está agora? Com certeza não está em seu quarto!

O chão abriu sob meus pés. Sabrina contava sobre mim e Raoul para minha
tia, coisas que só confidenciei a ela e ainda inventava detalhes mais picantes para
horroriza-la. Não sabia como sair dessa e, enquanto rezava por um milagre,
minha tia entrou na cozinha, seguida de Sabrina. Ela chorava. Quando me viu,
seus olhos se transformaram.

- O que pensa que está fazendo? Quer virar uma prostituta? Acha que esse
menino vai casar com você, podendo lhe ter sem comprometer-se? Você está
arruinada!

- Não! Raoul me ama! – não consegui pensar em mais nada, a não ser dizer a
verdade. A reação de minha tia foi ainda pior. Talvez ela tivesse a esperança de
que eu diria que nunca me encontrei com Raoul, que Sabrina estava mentindo,
qualquer coisa. Mas eu já tinha falado a verdade e não poderia voltar atrás. Na
verdade eu queria que todos soubessem o quanto eu o amava e queria me casar e
passar o resto da vida com ele, mas a realidade me despertou do meu sonho, me
enviando para um pesadelo.

- Você nunca mais vai sair desta casa, Christine, nunca mais vai se encontrar
com esse rapaz, nem que eu tenha que amarra-la ao pé da cama!

Sabrina sorria e me olhava com desdém.


- Como pôde, Sabrina? Pensei que era minha amiga!

- Claro que sou, por isso estou aqui! Sabia que seu querido Raoul não só
esteve com você, como também esteve com Sunny e Bertha? Amanhã deve
propor casamento a Otilia, soube de fontes fidedignas! Você foi só mais uma que
ele prometeu amar eternamente para se apossar de seu corpo e sua virtude! Não
posso acreditar que foi tão ingênua, Chrissy! – Ela estava piorando a situação e
se colocando do lado de minha tia. Aquilo não era bom.

- Não... não pode ser... – eu estava confusa. Não queria acreditar nela, mas
achei que ela realmente podia estar preocupada com minha reputação, já que não
consegui pensar em nada que pudesse justificar tamanha traição.

- Christine, você sempre foi muito ingênua e sonhadora. Mas está na hora de
uma dose bem grande de realidade. Raoul é homem, tem necessidades. Você
serviu muito bem a ele, como as outras meninas e agora, ele vai se casar com
uma que não se deitou com ele na primeira oportunidade. Homens são assim,
não gostam de mulheres atiradas! – minha tia continuava atacando, totalmente
enraivecida pelas novidades trazidas por Sabrina.

Aquilo foi como um soco na boca do estômago. Senti a bile subindo e só


consegui correr para fora para vomitar. Minha tia me seguiu, me puxando para
dentro.

- Não, mocinha, não vai mais pôr os pés para fora desta casa para nada! Só
sairá daqui para Syon, menina!

- Tia, por favor...


- Não quero mais ouvir nada que sai de sua boca! Você se desgraçou, não há
futuro para você! Todas as economias que guardei para sua temporada agora
serão usadas para te mandar para um convento!

Ela me empurrou até meu quarto e trancou a porta, que só era aberta para
servir minhas refeições. Uma semana depois, minha tia voltou ao meu quarto,
quando abriu a porta, meus baús e o coche já estavam me aguardando para Syon.
Capítulo 2
10 anos depois...

Sinto a claridade em meu rosto e começo minha rotina diária para acordar: me
espreguiço, rolo de um lado para outro na cama e me espreguiço novamente.
Não quero levantar, a noite foi longa.

Recebi dois clientes numa noite só. Ganhei o dinheiro que outras mulheres
levariam uma semana para ganhar. O que posso fazer, se sou requisitada pelos
homens mais ricos e poderosos de Londres? Cobrar caro. Muito caro. Depois de
tornar-me a cortesã, todos os homens foram caindo aos meus pés, um por um, até
o Rei. É claro, pertencer ao Monarca tem seu preço. Por isso, depois de uma
conversa franca entre lençóis, expliquei que sempre estaria a disposição dele,
desde que não vivesse no Palácio e pudesse ter outros clientes. Tocando-o e
chupando como eu fiz, seria difícil ele me negar algo. Depois tentou me
convencer a voltar atrás, mas isso eu não faria. Poderia chupa-lo e toca-lo
quantas vezes ele quisesse, mas teria meus clientes e viveria em minha casa. A
viagem até o Palácio durava cinco minutos, eu demoraria mais para me preparar
para ele do que para ir até lá! Foi fácil. E lucrativo. Meu “salário” sempre está
aumentando, basta que o Rei continue feliz. E meus outros clientes sempre
sabem como me manter feliz também, basta que encham meus bolsos, além de, é
claro, joias, obras de arte, presentes caríssimos, que chegam a minha casa todos
os dias. Às vezes meus empregados nem sabem o que fazer com tantos presentes
que chegam ao mesmo tempo. Duques, Marqueses, Condes, Viscondes, Barões...
todos me querem e nem todos podem ter. O preço é altíssimo e eu não dou
descontos. Não, não me interesso mais por homens, não depois de tudo o que
aconteceu e tudo o que aprendi desde então. Meu coração fechou-se para
sempre, a única coisa que está disponível é meu corpo. As lembranças amargas
me ajudam a manter a frieza e a lucidez, nunca mais vou me apaixonar. Ainda
sinto uma pontada no peito quando lembro...
“Meus baús e o coche já estavam me aguardando para Syon. A viagem era
longa, tivemos 3 paradas. Na primeira, não pensei, segui meus instintos. Fugi
da estalagem pelos fundos e corri para o bosque. Não sabia onde estava, nem
para onde ir, estava com a roupa do corpo e com muita fome, mas continuei
correndo. A tristeza de saber que nunca mais veria Raoul, de não saber se tudo
o que Sabrina dissera era verdade me corroíam e meu peito ardia, meus pulmões
não aguentavam mais. Mas eu corri, corri e corri. Decidi confrontá-lo. Orientei-
me e consegui chegar a uma estrada conhecida. Segui por ela até a casa de
Raoul. O dia já acabava e quando cheguei, bati com força na aldrava. Uma
mulher baixinha e roliça atendeu, perguntou o que eu queria. Implorei para que
chamasse Raoul, mas ela me disse que ele não estava, que não passava a noite
em casa há 5 dias, que devia ter viajado com a noiva. Aquilo, para mim, foi a
prova cabal de que tudo o que Sabrina disse era verdade. Embrenhei-me na
mata, com lágrimas nos olhos e continuei correndo, apesar dos galhos me
arranhando e da escuridão. Passei parte da noite correndo e a outra parte
tentando dormir, mas fui vencida pelo medo e pelo frio. ‘Melhor morrer do que
ir para um Convento!’, pensei. Fiquei encolhida embaixo de um Salgueiro até
adormecer. Fui acordada com um chute e imediatamente entrei em estado de
alerta. 3 homens me cercavam e tive a certeza de que não sobreviveria ao
episódio.

- Ora, ora, o que temos aqui! Carne fresca!

Dei dois passos para trás e esbarrei no segundo homem:

- Como cheira bem essa selvagenzinha!

Tentei correr, mas eles me agarraram. Não tinha mais nada a perder, então
me debati, chutei, mordi. Perdi. Eles eram 3 e muito maiores e mais fortes do
que eu. Levaram-me para um acampamento, amarraram-me a uma árvore e
saíram. Voltaram com outro homem, alto, com os cabelos tão negros quanto os
olhos e a pele escura. Soltaram-me da árvore e me atiraram ao chão, com as
mãos amarradas e uma corda no pescoço.

- Interessa? Só está suja, mas parece pouco usada, meu Senhor!

Levei algum tempo para entender que falavam de mim. O homem alto me
olhava de cima abaixo. Pegou minha mão, me levantou e me virou. De costas
para ele, ainda amarrada, senti que ele cheirava meus cabelos.

- 2 libras. Nada mais.

- Fechado, Senhor!

Eles me soltaram e no instante em que tentei correr, o homem alto me


colocou em seu ombro e foi andando, como se carregasse uma pena. Gritei com
ele, pedi que me colocasse no chão. Ele só obedeceu quando entramos em sua
tenda.

- Não precisa ter medo, não vou lhe fazer mal. – calmamente, ele soltou as
cordas que me amarravam.

- Você me comprou como um objeto! Como posso acreditar em você? – Eu


queria mantê-lo ocupado no assunto para tentar pensar em uma rota de fuga.

- Se eu realmente quisesse lhe fazer mal, não teria lhe comprado. Poderia
deixa-la a mercê dos 3 corsários que lhe trouxeram.
Fazia sentido. Mas não me convenceu totalmente. O homem alto falava
baixo, tinha uma elegância e altivez inerentes, parecia um lorde, apesar da
barba, os cabelos compridos e rebeldes, o diamante na orelha. Pediu a algumas
mulheres que providenciassem um banho e roupas limpas e, enquanto me
banhavam, preparou uma bandeja com frutas, pão e vinho. Sentou-se ao meu
lado no chão, serviu o vinho e colocou uma uva em minha boca. Eu estava
apavorada, então fazia tudo o que ele me pedia ou sugeria. Ele me olhava de
maneira calma, como se estivesse aguardando as perguntas que sabia que eu
faria.

Depois de me alimentar, vendo que eu não me pronunciei, resolveu iniciar a


conversa:

- Imagino que queira saber quem eu sou e onde está. Sou Nikolai Rosengerb,
Príncipe dos Ciganos. Você está segura aqui. Meu povo jamais lhe tocará, você
agora é minha protegida.

A conversa se estendeu até que não percebi mais que era cativa. Acabei
adormecendo e acordei na cama. Senti o calor e a rigidez atrás de mim e dei um
pulo quando percebi que Nikolai ainda dormia abraçado a mim. Meu susto o
acordou e, quando Nikolai não tirou os olhos do meu corpo, percebi que estava
nua. Puxei o lençol e me enrolei nele rapidamente.

- Nunca deve esconder sua nudez, minha ‘Prama’.

Meus olhos se encheram de lágrimas. Raoul havia dito a mesma coisa.


Como doía.

- Por que choras?


Ele tocou meus cabelos e sorriu para mim.

- ‘Prama’, por favor, não chore. Não vou lhe fazer mal. Não deve se
envergonhar de sua nudez e não deve se preocupar, não fizemos nada, apenas
dormimos. Usamos nossos corpos para nos manter aquecidos e isso é tudo. Não
tocaria em um só fio de seu cabelo se fosse lhe causar algum mal. Você não é
uma escrava aqui.

Ele me colocou em seu colo, penteou meus cabelos e me deu um beijo na


testa.

- Um dos maiores prazeres da vida é ter alguém cuidando de nossos cabelos.


Alguém que os lave, escove, cuide. – ele falava enquanto trançava meus cabelos.
– É livre para ir, ‘Prama’. Mas para onde iria?

Novamente, fazia sentido. Eu não tinha mais ninguém. Ele me soltou e saiu
da tenda dizendo que voltaria com o desjejum. Voltou com pães, café, chá.
Alimentou-me novamente, colocando bocados de pão preto em minha boca.

- Coma, minha ‘Prama’, você deve ter sofrido muito a noite passada.

Nikolai cuidou de mim, tratou-me como uma rainha. E eu fui ficando, até o
dia em que senti fortes enjoos e acabei vomitando dentro da tenda. Não
consegui sair a tempo. Nikolai me olhava desconfiado, mas não disse nada,
saindo novamente. Uma menina voltou com um balde e começou a limpar o
chão.
- Me desculpe, por favor, deixe que eu mesma limpo.

- Oh, o Príncipe jamais permitiria! Não se preocupe, já estou acabando.

Senti o enjoo novamente e consegui correr. Dei de cara com Nikolai e acabei
vomitando em cima dele! Arregalei os olhos – Por favor! Por favor, me perdoe!
Eu não sei, deve ser algo que comi, vou pegar um pano limpo...

- ‘Prama’, há quanto tempo não tem suas regras?

- Minhas regras? – eu não sabia. Não tinha pensado nisso e, para ser
honesta, adorei, pois sentia muitas cólicas quando sangrava. Voltei o olhar para
ele, confusa.

- Eu não sei, talvez uns 2 meses...

- ‘Prama’, seu ventre carrega uma criança! Por isso anda enjoando, não tem
fome em alguns momentos e muita fome em outros...

Não podia ser. Eu nem sabia como uma mulher engravidava e, depois da
explicação de Nikolai, achei muita ironia do destino ter engravidado em minha
primeira e única noite!

- ‘Prama’, talvez seja a hora de me contar sua história...


- Já lhe disse, sou Christine, não tenho ninguém.

-Não, ‘Prama’, quero saber quem é você realmente.

Com a necessidade crescente de expurgar tudo aquilo de mim, contei minha


história a Nikolai. Quando terminei, ele continuava a me olhar com a mesma
ternura de sempre.

- Não vai me dizer que sou uma meretriz e que mereci passar por tudo que
passei? – Ele sorriu um sorriso triste. Tocou meu rosto com a delicadeza que lhe
era peculiar.

- Se eu pudesse lhe dizer algo que valha a pena, lhe diria que talvez você
devesse procurar Raoul e ouvir sua versão.

Mas a mágoa era muito grande a essa altura do campeonato, pois culpava
Raoul por tudo o que tinha passada até o momento e pela gravidez, como se só
ele quisesse aquilo!

7 meses depois, o fruto de meu amor nasceu. Nikolai escolheu o nome: Yago.
Foi o segundo dia mais feliz de minha vida.

Nikolai, que parecia me conhecer como ninguém, nunca mais falou sobre
Raoul ou aquela noite. Em seus 32 anos, era um homem sábio. Ensinava-me a
sabedoria dos ciganos, me contava histórias dos lugares que conheceu, me
ensinou francês, italiano e algumas coisas em Romani. A língua cigana era
usada somente por ciganos e eu, apesar de protegida do Príncipe, não era
cigana. Aprendi os costumes ciganos e me interessei pela língua depois de uma
de nossas conversas:
- O que significa ‘Prama’?

- Por que perguntas?

- Ora, você sempre me chama assim. Quero saber do que me chama! – ele
sorriu, o olhar era malicioso.

- Um dia, ‘Prama’. Um dia lhe contarei!

Ele cuidou de mim e de Yago. As mulheres da família me ajudavam nos


cuidados com o bebê, afinal era quase como se uma criança cuidasse de outra.
Nikolai o ensinou a andar e a primeira palavra de Yago foi ‘Prama’. Antes
mesmo de mamãe!

A vida entrava nos eixos quando Nikolai me procurou para mais uma
conversa.

-‘Prama’, estamos indo para a Grécia. O mar nos chama e não podemos
ficar aqui. Vida é movimento.

- Mas eu amo este lugar! Não podemos ficar?

Ele tocou meu rosto, sempre terno.

- Você pode, ‘Prama’. Sempre foi livre.


- Você me comprou, Nikolai.

- Sim. Para poder libertá-la. Aqueles homens a venderiam de qualquer


forma. Apaixonei-me por você no instante em que te vi. Não podia permitir que
alguém lhe fizesse mal. Se quiser ficar, não poderei mais lhe proteger, mas não
vou lhe deixar sozinha neste mundo.

Ele estendeu-me um cartão de visitas.

- Vou leva-la até ela. Ela vai lhe ajudar.

No cartão, apenas um nome: Madame Toulouse.

No dia seguinte, eu e Nikolai chegamos em Londres. Paramos na porta de


um casarão muito bem cuidado, com um belíssimo jardim, em estilo vitoriano.
Nikolai encheu meus bolsos de moedas e me disse que, caso mudasse de ideia e
não quisesse mais ficar com Madame Toulouse, podia entrar em contato com ele
através dela. Aquelas moedas eram tudo o que eu tinha e comecei a pensar em
como ia viver. Não tinha referências e quem em sã consciência empregaria uma
menina com uma criança nos braços?

Quando o mordomo abriu a porta, saudou Nikolai e pediu que entrássemos.


Madame Toulouse nos recebeu 15 minutos depois em uma sala de visitas muito
elegante. Logo pensei que ela me daria um emprego como criada em sua casa.

- Nikolai, Príncipe dos gatos, você vai partir? Com quem terei sonhos
libidinosos, homem lindo? – Nikolai sorriu.
- Você pode sonhar com quem ou o que quiser, ‘Jag’. Você pode tudo.

- Ele não é maravilhoso? – Ela me olhava sorrindo.

- Esta é Christine, aquela de quem lhe falei. Vai cuidar dela?

- Como posso negar algo que me pedes, Príncipe. Sou sua súdita, me tens de
corpo e alma!

- Cuide dela com sua vida, ‘Jag’. Pois eu pertenço a ela. Se me der licença,
gostaria de me despedir em particular.

- Claro, Príncipe, fique à vontade. E você, Christine, me dê esse belo


rapazinho, vou leva-lo até a cozinha e começar a mimá-lo desde já! Seja bem
vinda!

Quando Madame Toulouse saiu, Nikolai sentou-se em uma poltrona,


levando-me para seu colo.

- ‘Prama’, Madame Toulouse é uma cafetina. Foi cortesã por muitos anos,
hoje está aposentada e vive da fortuna adquirida em seu trabalho. Ela me deve
um favor, sei que vai cuidar muito bem de você e lhe dar tudo que necessita. Mas
não se esqueça de que eu voltaria do inferno se precisasse de mim. Não hesite
em me procurar se precisar de algo para você ou Yago. Para qualquer coisa,
está entendendo? – eu assenti e não pude deixar de sentir um pouco de ciúmes
pelo tratamento que ele dedicou a Madame Toulouse. Afinal, há 3 anos eu era a
mulher na vida dele.
- Vejo que gosta de chamar as pessoas por apelidos em Romani. ‘Jag’? –
Nikolai sorriu.

- Significa ‘fogo’, ‘Prama’. Essa mulher é um vulcão prestes a entrar em


erupção! Nunca conheci mulher tão fogosa. Não se engane, pois a idade chega
para todos, mas quando a conheci, ela era uma das mulheres mais belas de toda
a corte, rivalizando até mesmo com você. Ela perdeu parte de sua beleza
externa, mas continua sendo uma mulher maravilhosa por dentro. Sei que vai
cuidar bem de você.

- E, apesar de ser uma bela mulher, você vai partir e eu ainda não sei o que
significa ‘Prama’...

- ‘Prama’ significa ‘joia’. Você é um diamante, dos mais raros, Christine.

Então, ele fez um último pedido.

- Passaria a noite comigo? Não como um amigo que lhe estendeu a mão,
mas como um homem?

Meu primeiro instinto foi negar. Mas eu devia minha vida e a de Yago a ele.
Iria morar com uma cafetina e já sabia exatamente como conquistaria minha
independência, então simplesmente respondi com um sorriso:

- Sim, ‘Sinto’. É claro que sim. – Ele sorriu ao ouvir-me chama-lo de


‘homem’ em Romani. Levantou-se comigo ainda em seu colo e me levou ao
quarto que tinha disponível para ele na casa de Madame Toulouse.
Não dormimos nada naquela noite.

Nikolai era um homem extremamente sexual e não tinha pressa. Despiu-me


lenta e sensualmente. Ele aproveitava cada minuto, cada centímetro de pele
desvendada. Não houve uma só parte de meu corpo que sua língua não tivesse
percorrido. Com ele aprendi que o ato sexual pode ser feito com todo o corpo.
Senti prazer até mesmo quando ele me penetrou por trás, me massageando na
frente. Ele me explicou que não era uma prática muito apreciada pelas mulheres
porque os homens não sabiam prepara-las. Explicou também que era uma forma
de amar que muitos homens preferiam, pois a sensação de sobrepujar a mulher
era indescritível. O poder que aquele ato causava era o principal afrodisíaco e a
mulher que dominasse aquela arte teria os homens a seus pés. Penetrou-me pela
frente, olhando em meus olhos e dizendo palavras carinhosas em meu ouvido.
Penetrou-me em pé, contra a parede, de maneira violenta, dizendo as maiores
obscenidades. Colocou-me de quatro e me penetrou agarrando meu pescoço e
puxando meus cabelos. Penetrou-me por trás, pela frente, em minha boca, entre
meus seios. Ejaculou em todos os lugares, me levando ao orgasmo junto com
ele. Ensinou-me a nunca ter pudor, vergonha ou qualquer sentimento negativo.
Estávamos amando e não há vergonha nenhuma nisso, tudo é permitido quando
os envolvidos estão dispostos. Como disse, ele era paciente e nunca buscava seu
alívio me deixando para trás. Sua estamina era interminável e, enquanto eu
achava que não podia aguentar mais, ele começava tudo de novo. Tive muitos
orgasmos e percebi que homens eram movidos pela excitação, pela lascívia e
pela luxúria. Quanto mais me excitavam, mais energia eles tinham. Ensinou-me
a atingir prazer sozinha e a dar prazer ao parceiro de todas as formas que ele
estava me dando. Narrava o que eu deveria fazer, como chupar, lamber, tocar. A
cada nova lição, eu era recompensada com um orgasmo.

Nikolai me ensinou a dar prazer a uma homem e obter prazer dele. Ensinou-me
posições que traziam o orgasmo mais rápido e outras de formas mais lentas. Ele
era uma máquina na cama, afiadíssimo, viril, fogoso, libertino. Não tinha
inibições. Seu corpo era perfeito e seus dotes impressionantes. Mas sua atitude
era seu maior trunfo. Nikolai podia satisfazer qualquer mulher, da mais doce a
mais depravada e sabia disso. Era como um relógio: sempre sabia a hora exata
para tudo. Tocava nos pontos mais eróticos e conseguia me tirar o folego
repetidas vezes, sem nunca esmorecer. Era como tentar vencer uma corrida
contra um cavalo. Ele sempre estava pronto para mais.

Quando finalmente dormi, exausta, quando o dia já raiava, Nikolai partiu.


Foi meu primeiro cliente. Entreguei-me a ele por uma noite por ter me salvado,
por ter me ensinado diversas línguas, história, geografia, filosofia. Por me
matar a fome e o desejo. E por me ensinar tudo o que podia fazer com um
homem. Ou quase tudo.

O restante, aprendi com Madame Toulouse.

Logo em nossa primeira conversa deixei claro que queria me tornar uma
cortesã. Contei a ela minha história e disse que queria minha independência e
jamais entregaria meu coração novamente. Não havia outro caminho para mim.
Ela concordou. Yago vivia em sua casa, como seu filho. Como eu estaria sempre
ocupada com meus clientes, me manteria sempre por perto, mas Madame
Toulouse assumiu sua tutela, cuidando de sua educação, vestimenta, sustento.
Ela foi uma mãe para nós dois. Yago se tornaria um cavalheiro. E eu, da noite
para o dia, virei sua aluna, a mais aplicada.

Aprendi todas as artes da corte, desde quais talheres utilizar num jantar
formal, dançar, usar sapatos de salto, postura, até sobre etiqueta, nobiliarquia,
política, matemática, sociologia, latim.

Fui ensinada a seduzir homens e mulheres, a praticar todos os atos que


Nikolai havia me iniciado, a ser uma dama na sociedade e um furacão na cama.
Aprendi que entre quatro paredes, o freguês deve ser saciado, sempre, a
qualquer custo. Se busca apenas uma ouvinte, a terá. Se busca alguém que lhe
dê conselhos, ouvirá os mais sábios, da boca mais sensual possível. Se quer uma
mulher que satisfaça sua esposa, para que ele apenas se deleite com a visão, é
isso que ele deve ter. Se mais de um homem quer compartilhá-la, cabe a cortesã
não deixar nenhum dos dois (ou três, quatro...) sair insatisfeito, dando atenção a
todos, sem distinção, nem preferência. A cortesã deve ser um camaleão, se
adaptar a toda e a qualquer situação. Se um homem quer uma mulher recatada,
ele terá. Uma devassa, que fala como um marinheiro bêbado também. Tornei-me
todas em uma só. Fui instruída a seduzir até quando não se deve, a todo
momento, em qualquer lugar. Sedução era minha única e mais poderosa arma.
Em um dos testes de Madame Toulouse, seduzi um padre no meio da missa. E
tive sucesso. O pobre suava, começou a gaguejar e, quando saiu do púlpito,
meio torto, não conseguiu esconder a ereção. Eu estava pronta.

A aprendiz superou a mestra. Meu debut na aristocracia foi lendário.


Madame Toulouse não poupou despesas naquela noite e fui arrematada por 300
libras, valor até hoje nunca superado por nenhuma cortesã. O homem que me
arrematou era um senhor roliço, de pele vermelha, parecia um peru. Achei que
não conseguiria sequer tocá-lo, mas as palavras de Madame Toulouse
reverberavam em minha mente: ‘é só o seu corpo. Nenhum homem deve ter sua
mente, seu coração, sua alma. Todos têm sua beleza e você deve procura-la para
poder superar os obstáculos que encontrar no caminho para a cama de alguém.’
Sorri, tomei sua mão e segui para o quarto. Ele foi muito gentil, um perfeito
cavalheiro. E vi que Madame Toulouse estava certa. Ele não era nem um pouco
atraente, mas sua doçura, gentileza e carinho me fizeram ver sua beleza. Depois
desse dia, nunca disse ‘não’ a qualquer homem. Podia ser feio, bonito, alto,
baixo, carinhoso, grosseiro, aceitei todos eles. Claro que sofri alguns abusos,
alguns homens gostavam de violência e faziam coisas que não podia acreditar
que lhe causassem prazer. Apanhei, chegando a ficar marcada, fui sufocada,
sodomizada sem nenhum cuidado. Já bati, penetrei homens e me deitei com suas
mulheres. Conheci homens belíssimos que causariam náuseas nas ‘daminhas’
petulantes da alta sociedade caso descobrissem seus gostos peculiares. Estive
com todos os tipos de homem e todos da aristocracia. Entendi que quanto mais
subisse na escala nobiliárquica, mais alto seria meu preço. Quanto mais alto
meu preço, maior minha notoriedade. Quanto maior a notoriedade, mais
novidades devia apresentar e nunca decepcionei. Nunca perdi um cliente. Ao
contrário, minha clientela só aumentava.

Tornei-me famosa e o Rei decidiu que eu devia ser dele. Percebi então que
tinha chegado ao topo. Não precisaria mais da ajuda de Madame Toulouse e
nem abusaria mais de sua bondade, pois nunca deixou de me ajudar, criou meu
filho e ainda me tratava com uma filha.

Depois de 3 anos com Nikolai e 7 com Madame Toulouse, finalmente decidi


ter minha independência e passei a atender meus clientes por conta própria.
Comprei minha casa e só saía dela quando ia ao Palácio Real ou a casa de
Madame Toulouse. Yago já estava com 9 anos e realmente virara um pequeno
cavalheiro. Sempre muito carinhoso comigo, ele, ao lado de Madame Toulouse e
todos os criados da casa, chorou quando lhe disse que iria partir. Expliquei que
somente iria para outra casa, prometi que o veria todos os dias e o levaria
comigo assim que possível. Ele se acalmou, me abraçando e dizendo que
esperaria ansiosamente por minhas visitas. Madame Toulouse tinha lágrimas
nos olhos, o que só dificultou as coisas.
- Você é a filha que nunca tive, Christine. Sempre sonhei com filhos e, além
de me proporcionar isso, me deu um neto! Quem, com a minha vida, já tão
velha, poderia imaginar que eu teria meu sonho realizado?

- Você fala como se eu estivesse partindo para sempre! Estarei a 15 minutos


daqui, pare de ser uma chorona sentimental!

- Não preciso mais esconder meus sentimentos, minha menina, já tenho


idade para poder falar o que penso e o que sinto, ainda que seja inconveniente –
ela replicou, me tomando em seus braços.

- Não se torne gananciosa, nunca demonstre suas fraquezas. E quando achar


que não pode mais suportar, estarei aqui, minha menina!

Beijei sua testa e agradeci por tudo. Ela sempre seria a mulher que me
ensinou tudo sobre a vida. Amo Madame Toulouse e daria minha vida por ela.
Juntamente com Nikolai, ela se tornou parte de meu coração e nunca esqueceria
de tudo que fez por mim. Segurei as lágrimas, agradeci novamente e sai, sem
olhar para trás.”
Capítulo 3

Hoje não é um dia comum, tenho que ir ao Palácio. O Rei esteve viajando e já
recebi uma mensagem informando que ele chega hoje e me quer o aguardando
em sua cama. Não que não seja um homem atraente, mas gosto muito mais de
nossas conversas do que do ato sexual. Apesar de sua libido estar em dia, o sexo
é morno. No entanto, pegamos fogo em longos debates políticos e aprendo
muito. Sempre fui sedenta por informações, conhecimento, então fica fácil
escolher os debates ao sexo. Mas duvido que o Soberano concorde comigo.
Quando sair do Palácio, devo comparecer a uma festa com um cliente antigo. É
um bom negócio para os dois, ele fará muitos contatos para futuras sociedades e
eu posso atrair novos clientes. O único problema nisso é que o Rei pode me
atrasar. A boa notícia é que sei exatamente como deixa-lo exausto. Escolho
minhas roupas íntimas que foram feitas especialmente para mim por uma
costureira francesa renomada. Todas as minhas roupas de baixo são criações dela
e garanto que muitos homens me procurariam com menos frequência se suas
mulheres utilizassem os talentos da costureira. Para o Rei, a preta. Para o
Marques, a branca. O Marques gosta de pensar que sou a pureza personificada
que fica louca quando descobre o prazer com ele. Deixo separadas as roupas de
baixo e o vestido azul turquesa, terei pouco tempo quando voltar do Palácio.
Coloco meu vestido verde água e me olho no espelho. Não prendo os cabelos e a
única coisa que se vê em meu colo é o pingente de rubi, esta será a única coisa
que vai permanecer em meu corpo depois que o Rei chegar. Saio em disparada,
já estou atrasada. Quando chego ao Palácio, um lacaio me acompanha. Entro nos
aposentos do Rei, hoje é tudo muito comum para mim, mas lembro da primeira
vez que pus meus pés aqui e decidi que um dia teria uma cama como a dele. E é
exatamente numa dessas que eu durmo todas as noites. Não no quarto que
mantenho especialmente para atender meus clientes, que muda de decoração de
acordo com seus gostos, mas no meu quarto de dormir, aquele que tem a minha
decoração, o meu estilo, a minha cara.

Tiro o vestido, pingo uma gota de meu perfume atrás de cada orelha e
joelhos e me deito. Saboreio as uvas que estão na mesa ao lado da cama e tomo
um gole do vinho quando a porta se abre. O Rei está abatido, mas seus olhos
brilham quando me vê. Ele não diz uma palavra, simplesmente começa a se
despir. Eu o olho de cima a baixo, e o que ele encontra em meus olhos é luxúria.
Eu o desejo. Eu o quero. E ele fica excitado só de perceber isso. Não é um
homem bonito, mas extremamente charmoso. Seu corpo é atlético, o Soberano é
um guerreiro.

Ele se aproxima da cama e me puxa pelas pernas. Começa beijando meus pés
por cima da meia e sobe as mãos para tirá-la. Quando as solta das ligas, desce as
mãos novamente, me arranhando com suas unhas. Meus pés estão livres e ele
beija dedo por dedo. Segue beijando minha canela, panturrilha, joelhos. Suas
mãos estão logo acima, nas coxas, próximas as minhas nádegas. Eu gemo
quando ele beija a parte de trás de um dos meus joelhos e o apoia em seu ombro.
Ele me toca. Começo a ofegar à medida que seu dedo me massageia, fico úmida
imediatamente. Ele continua beijando minhas coxas e quando lambe meu ponto
mais sensível, agarro seus cabelos. Ele ri. Sabe que está me deixando louca e vai
se arrepender deste martírio depois, pois vou castiga-lo. Ele não terá chances
contra mim. Finalmente decido que é minha vez e, com pé que está apoiado na
cama, roço seu membro. Ele geme e não para de me chupar, então tenho que
puxa-lo pelo cabelo. Quando seu rosto está próximo ao meu, mordo seu lábio
inferior e digo com a voz mais inocente possível:

- Vossa Majestade estava sentindo minha falta?

Ele acena com a cabeça, então agarro seu queixo e lhe beijo
desesperadamente. Minha mão já substitui meu pé e eu estou agarrada a seu
membro como se fosse a última vez que poderei tocá-lo. Meu outro pé continua
em seu ombro e ele tenta voltar a me massagear. Não permito, pois agora é
minha vez. Tiro o pé de seu ombro e o viro, jogando-o de costas na cama. Então
engatinho até o meio de suas pernas. Ele está ansioso pelo que vem a seguir,
adora isso. Eu toco a ponta do seu membro com a língua. Olho para ele enquanto
faço isso. Ele dá um grunhido quando o enfio inteiro em minha boca. Continuo
chupando, usando minha língua e acaricio suas bolas com uma mão e seu
mamilo com a outra. Continuo aumentando o ritmo e a força em minha boca, a
sucção agora é mais intensa. Ele está ofegante. Eu estou no controle. Paro de
chupá-lo e ele me olha como se eu o tivesse esfaqueado. Viro de costas,
montando nele. Quando minha pélvis encontra a dele, ouço um rosnado, ele está
gostando, mas vai adorar quando eu subir para a primeira estocada e ele tiver
uma visão privilegiada de tudo o que está acontecendo. Começo a subir
lentamente e, quando chego na ponta, olho para trás. Ele me olha e tocando
minhas nádegas, me abre mais ainda. Seu dedo brinca com meu outro orifício e,
com a cabeça ainda virada para ele, fecho os olhos e passo a língua por meus
lábios. Ele delira quando desço com tudo. Estou me sentindo devassa hoje e
quero escandaliza-lo. Quando subo novamente, passo a mão por minhas nádegas
e penetro meu outro orifício com um dedo. Gemo alto e desço por seu membro,
ele não vai aguentar muito. Olho de novo para trás e pergunto se ele quer me
penetrar ali, onde meu dedo está. Ele faz que sim e eu me levanto, lambo
bastante o membro dele e me sento novamente, mas agora de frente. Enquanto
ele penetra meu outro buraco, me massageio olhando para ele. Começo a gemer
descontroladamente. Não demora muito até que ele se despeje dentro de mim
gritando meu nome. Apesar de já ter se aliviado, ele permite que eu continue
enterrada nele e me massageando até sentir meu alívio também. A melhor parte
está para começar. Depois de recuperar o fôlego e nos acomodarmos na casa de
banho, discutimos suas ações com relação a França. Fico feliz em saber que ele
segue meus conselhos. Ele mais ouve do que fala, fica sugando meus seios
enquanto ouve minhas sugestões. Sua língua circula meus mamilos que já estão
doloridos de tanta excitação. Manobro para que ele me possua mais uma vez, ele
ainda está disposto. Cavalgo por um tempo, enquanto direciono meus seios para
sua boca. Ele abocanha quase o seio todo, guloso que é. Debruço no beiral,
deixando meu traseiro arrebitado para ele. Ele me lambe com gosto e depois
volta a me penetrar. Diz obscenidades em meu ouvido, começa a ofegar e se
despeja dentro de mim, mas dessa vez não gozo. Não importa, estou aqui para
satisfazê-lo, não o contrário. Depois do banho, me visto para ir embora e, como
sempre, ele pede que eu fique um pouco mais. Nunca fico, mas ele tem
esperanças de que isso vá acontecer um dia. Já na porta para ir embora, ele me
entrega um estojo de veludo. Brincos de diamante são os presentes que trouxe de
sua viagem. Agradeço e saio, pensando em usá-los mais tarde.

Quando chego em casa, só tenho tempo de tomar outro banho, utilizar-me


das poções que Madame Toulouse me ensinou para evitar doenças e gravidez e
me arrumar. Quando estou terminando meu penteado, minha camareira avisa que
o Marques chegou. Um dos meus clientes mais antigos, temos uma sintonia
impressionante na cama. Apesar de ser 25 anos mais velho que eu, tem um
apetite condizente ao de um garoto. Ele gosta de tudo um pouco e eu também.
Nossa ligação sexual é tão grande que quase sempre atingimos o orgasmo juntos.
Além de belíssimo, o Marques é um libertino que ficou viúvo muito jovem e não
perdeu tempo com o luto, se entregou a vida boêmia e hedonista. Não mantém
amantes, mas tenho certeza que, se tivesse, eu seria sua primeira opção.
Felizmente, ele não pensa nisso, pois jamais aceitaria e, provavelmente, perderia
um bom cliente com a minha negativa.

Quando desço a escadaria, ele suspira.

- Quando acho que você não pode ficar mais bonita, você me prova que
estou errado!

- Bondade sua, Vossa Excelência! Tento, na medida do possível, me igualar a


sua elegância para nossos encontros. Embora nós dois saibamos que minha cama
é o lugar onde Milorde fica mais espetacularmente belo, elegante... e nu.

Ele beija meu pescoço, sente meu cheiro e sussurra em meu ouvido:

- Primeiro a obrigação, minha delícia, depois a diversão. E vamos nos


divertir muito se tudo der certo na festa do Barão. Soube que o Duque de Devon
finalmente voltou a Londres depois de viajar por todo o mundo e estará lá e
preciso dele para poder continuar com meu projeto da estrada de ferro. Se ele me
patrocinar e ainda convencer o Rei, serei um Marques muito mais rico! – o
provoco mais um pouco, até que ele não aguenta e me joga no sofá. Só levanta
meu vestido, afasta minha roupa íntima, tira seu membro para fora da calça e me
penetra, uma estocada seca e violenta.

- É assim que você gosta, não é? Você gosta de me provocar para que eu te
ataque!
- Sim, Marques, gosto de você assim, bruto, descontrolado!

- Então, aguente! – ele arremete com ainda mais força, sua pélvis bate na
minha freneticamente.

- Mais forte, mais forte! – grito fechando os olhos. Eu estou prestes a ter um
orgasmo, mas me seguro. Sei que ele quer que eu goze com ele.

- Delícia, venha comigo! – ele gemeu, estremecendo, enquanto eu sinto os


espasmos de meu próprio orgasmo. Ele tomba no sofá ao meu lado. Levanto,
sigo em direção ao espelho que tenho no hall, arrumo meu cabelo, que saiu do
lugar. Retoco meu batom, aliso as saias de meu vestido e estou pronta.

- Vamos ao trabalho então!

Chegamos a Mansão dos Northumberland depois de mais uma sessão de


sexo dentro da carruagem e o lugar já está entupido com toda a aristocracia. O
cheiro da arrogância impera e toda a parte feminina me olha com desdém, pois
claramente não fazem ideia quem é a mulher de braço dado com o Marques, que,
desperta cobiça de muitas mulheres, por sua beleza e fortuna. Ele cumprimenta a
todos, sem nunca me soltar e me apresenta com meu pseudônimo para essas
ocasiões: Madame Toulouse. Claro que alguns fazem alusão a lendária cafetina,
mas ninguém comenta e acreditam que eu seja mesmo uma francesa que mora há
alguns anos na Inglaterra. Naturalmente isso se aplica a ala que ainda não faz
parte da minha clientela. Meus clientes me tratam como uma dama e seguem
com a farsa. Aplico um leve sotaque quando falo e às vezes até respondo em
francês, graças ao meu sempre querido Nikolai, não tenho nenhuma dificuldade
com a língua. Enquanto as mulheres me desdenham, os homens me desejam.
Posso reconhecer o desejo em cada um daqueles olhares. Os poucos que não me
desejam são velhos demais e não se dão mais ao luxo de desejar alguém, ou são
loucamente apaixonados pelas esposas, que estão a tiracolo. Continuamos
seguindo pelo salão quando anunciam a chegada do Duque de Devon. Quando
olhamos para a porta, meu coração para. Tenho certeza absoluta que vou ter um
mal súbito. Não posso acreditar, não é possível! E, embora seja impossível,
reconheceria aqueles olhos em qualquer lugar, a qualquer tempo.

O Duque de Devon é Raoul!


Capítulo 4

Entro em desespero, o Marques percebe.

- Você está bem, minha delícia? – sussurra em meu ouvido.

- Claro, Vossa Excelência, só preciso de uma bebida.

- Vou buscar algo para você.

- Não! Eu mesma posso fazer isso, vá cumprimenta-lo! – eu não podia correr


o risco de ficar sozinha e Raoul me reconhecer. Precisava de uma rota de fuga e
o Marques ia distraí-lo enquanto eu a procurava. Como isso podia estar
acontecendo? Como Raoul tinha se tornado um Duque? Como ele tinha o poder
de me deixar naquele estado? Tantas perguntas sem respostas rondavam minha
cabeça que acabei esbarrando com outro cliente, o Visconde Tagarela.

- Madame Toulouse, que honra encontra-la aqui esta noite! Ele disse em voz
alta e sussurrou em meu ouvido: - Terá tempo para mim depois da festa?
Adoraria poder terminar a noite em sua cama!

- Boa noite, Milorde! – Respondi laconicamente e cochichei – temo que não


possa atende-lo esta noite, mas poderemos agendar algo para depois de amanhã.
– continuei andando na direção contrária do Duque e não ousava a olhar na
direção dele novamente. Quando cheguei ao final do salão, abri a porta em
minha frente e segui por um corredor escuro, não fazendo ideia de onde estava.
Tateando, percebi que se tratava de uma sala íntima. Continuei tateando até que
encontrei um canapé, onde me sentei, exausta. Não conseguia respirar e tremia
como uma vara verde.

Percebi que não estava sozinha na sala e tentei fugir sem atrapalhar o que
obviamente era um casal que havia fugido para uma sessão de sexo depravado.
Voltei pela mesma porta que entrei e dei de cara com o Marques Libertino... e o
Duque!

- Minha querida, estava a sua procura! Este é o Duque de Devon, minha cara.
Sua Graça, esta é Madame Toulouse.

Raoul ergueu uma sobrancelha ao ouvir o nome pelo qual o Marques me


chamara, ligando os pontos e sabendo que era um pseudônimo capcioso. Levou
minha mão aos lábios e a beijou, demoradamente, muito mais do que o decoro
permitia, sem nunca tirar aqueles lagos verdes de mim.

- É uma honra estar em companhia de uma dama tão bela. De que parte da
França vem, Milady? Conheço cada quarteirão daquele belo país. – Ele sorria e o
Marques não percebeu o sarcasmo em sua voz.

- Sou de Paris, Sua Graça, uma cidade grande, tão grande que é impossível
conhecer cada quarteirão...

- Ah, tenha certeza... eu conheço cada quarteirão de Paris e, se houvesse


cruzado com a Milady, não esqueceria...
- Tenho estado em Londres há algum tempo, Sua Graça. Talvez por isso não
tenhamos nos encontrado, infelizmente. Frisei o infelizmente e cerrei meus
olhos, na esperança de que Raoul me poupasse um pouco. Mas ele tinha outros
planos.

- Concederia a honra de dançar comigo?

- Sua Graça, eu adoraria, mas prometi ao Senhor Marques...

- De forma alguma, minha cara! Será uma honra ceder a minha dança para o
Duque de Devon! – se eu não tivesse controle, nesse exato momento poderia
socar o Marques! Não tendo escolha, pousei a mão naquela que ele me estendia
e seguimos para a pista de dança. Raoul me conduzia como se me exibisse a
todos, porém não olhou para mim até nos virarmos um de frente para o outro
para iniciar a dança. Como na primeira vez em que dançamos, Raoul levou uma
de minhas mãos até seu ombro e segurou a outra próxima a seu peito. Quando os
primeiros acordes da música se iniciaram, ele esticou o braço com a postura
perfeita de valsa e me conduziu pelo salão.

- Você não mudou nada, Pequena. Apenas ficou mais bela! – não havia ironia
em sua voz, mas seus olhos eram frios.

Não conseguia falar, só me concentrei em manter minhas pernas firmes e não


desmaiar.

Ele tocou meu queixo, levantando meu rosto para que o encarasse.

- Parece que viu um fantasma, Pequena. Está tudo bem?


Abri a boca para responder, mas ele continuou.

- Madame Toulouse, ou qualquer que seja o seu nome, posso saber por que
está tão pálida? Está se sentindo bem? – Ele queria me enlouquecer e não me
permitia responder nenhuma de suas perguntas.

- Fique tranquila, Madame Toulouse, ninguém ainda percebeu que conheço


você. Conheço cada centímetro de sua pele e todo o seu corpo. Mas esses idiotas
não fazem ideia disso. – ele foi descendo a mão que ia em minha cintura até a
curva de meu quadril. E a distância em que dançávamos estava longe de ser a
permitida pelo decoro. Ele me agarrava descaradamente na frente de toda a
sociedade! Aquilo foi o limite para mim.

- Não me importo que saibam que me conhece, Vossa Graça. Só não entendo
o que faz aqui sem sua esposa! – seus olhos se arregalaram. – O que foi?
Esqueceu-se que é casado? Ou é viúvo? Talvez ela tenha morrido de desgosto
em saber que o marido seduziu uma moça de 16 anos e outras duas antes de
propor casamento? E essa história de “Duque”? Sério? Como conseguiu a proeza
de fazer todos acreditarem que é um nobre? Gostaria de ver a cara de todos esses
esnobes se o vissem trabalhando nas docas de Astoria! Fingi um sorriso
sarcástico.

- Nunca me casei, minha senhora. Deve ter se informado mal. Mas não se
preocupe. Não guardei mágoas por ter me abandonado para fugir com outro.
Apesar de não poder deixar de pensar na ironia de tudo isso. Trocou-me por um
Conde e perdeu um Duque! Raiva é o que mais se aproxima do sentimento que
nutro por toda essa história. – ele dizia tudo com uma calma e frieza
impressionantes. Era como se nada o abalasse.

Arregalei os olhos ao ouvir aquilo.


- Conde? Do que está falando?

- Ah, Pequena, você está mal informada, mas eu sei de tudo o que aconteceu
depois que você fugiu!

A valsa acabou e ele me conduziu de volta ao lado do Marques, não sem


antes sussurrar em meu ouvido:

- Nossa conversa ainda não acabou, mas, a menos que tente fugir novamente,
vamos nos encontrar de novo.

Virando-se para o Marques, ele continuou:

- Senhor Marques, sei que quer falar comigo, mas lamento em dizer que
devo ir. Gostaria de lhe convidar para almoçar amanhã, o que acha? Ficaria
deleitado se Madame Toulouse pudesse acompanha-lo.

- Mas é claro, Vossa Graça!

- Sinto muito, Senhores, mas não poderei acompanha-los. De qualquer


forma, agradeço imensamente o convite...

- Talvez então possa me acompanhar ao Hyde Park para uma cavalgada? –


Raoul não permitiu que eu terminasse minha frase. Como não era algo de bom
tom renegar um Duque por duas vezes em frente a um subalterno, assenti.
- Claro, Vossa Graça, ficaria encantada.

- É um encontro, então. Estarei ansioso para revê-la. – ele curvou-se,


pegando minha mão e novamente a beijou por mais tempo do que o decoro
permitia. Quando levantou, virou-se e saiu, com toda sua altivez e seus olhos
eram duas pedras de gelo.

- Minha delícia, você impressionou o Duque! Dizem que ele é um homem


frio e cruel, mas você notou como te olhava? Ele a deseja!

Sim, Marques, ele me deseja. Morta!


Capítulo 5

Na casa do Marques, o sexo não foi o que costumava ser. Não consegui parar
de pensar em Raoul e em nossa conversa, mas não podia deixar de fazer meu
trabalho e o Marques teve tudo pelo qual pagou. Conversamos um pouco até que
o assunto “Duque” surgiu na conversa. O Marques me contou que ele recebeu o
título do Rei, seu grande amigo, por seus trabalhos no exército britânico como
estrategista. Sabia que ele tinha também um cargo militar importante, mas não
soube me dizer qual era. Depois de deixar a casa do Marques, passei o resto da
noite em claro, pensando em tudo o que acontecera no Baile. Resolvi que não
adiantaria mais ficar rolando na cama e levantei. Pedi que trouxessem água e
pétalas de rosas para minha banheira e, quando me deitei submersa em água
quente, consegui relaxar um pouco. As palavras dele não saiam da minha
cabeça. O que ele queria dizer sobre trocá-lo por um Conde? Ele não tinha se
casado com Otilia? Tinha ingressado no exército? Era amigo do meu cliente
mais importante? O que o Rei diria se soubesse que tenho um filho de um de
seus conselheiros? O que ele faria se soubesse que tinha um herdeiro? Meu
Deus! Sai correndo da banheira, vesti uma roupa de montaria e segui galopando
até a casa de Madame Toulouse.

Passei a manhã com Madame e Yago, era incrível como eu sentia saudade
deles mesmo tendo os visto apenas dois dias atrás.

Madame Toulouse, sagaz como sempre, percebeu que eu estava aflita.

- O que foi, minha filha? O que lhe aflige?

- Nada, Madame, estou bem!


- Minha filha, você pode enganar todos os homens com quem já esteve, pode
ter me superado com suas artimanhas de sedução, mas acha mesmo que
conseguiria me enganar?

Suspirei e acabei contando tudo o que ocorrera.

- Oh, minha filha! Um grande amor do passado! O pai de seu filho! Pelo
modo como seus olhos brilham quando fala dele, já sei que meu genro é um
homem belíssimo!

- Não diga sandices, Madame! Ele não é seu genro, nem nunca vai ser! Ele
não faz ideia da existência de Yago! Além disso, ele acha que o troquei por um
Conde! Um Conde! De onde ele tirou essa ideia? Não acreditava que ele, ainda
um plebeu, pudesse se apaixonar por mim... que dirá um Conde! Por favor, Yago
deve ser nosso segredo mais bem guardado. Preciso pensar em uma forma de
contar sobre nosso filho a ele. Eu não suportaria se ele o levasse de mim!

- Minha filha, ele não levará. Não percebe? Ele fez toda essa cena porque
ainda a ama! Ninguém teria todo esse trabalho para desgastá-la se não se
importasse!

- Madame, começo a achar que sua idade afeta sua mente! Sempre foi tão
esperta, o que aconteceu com você? – debochei descaradamente

- Ah, minha filha, lhe faço a mesma pergunta. Somente uma pessoa cega não
enxergaria um estratagema tão claro!
Dizendo isso, voltou-se para a porta e pediu que servissem o chá. Depois de
muita conversa, sempre sobre o Duque, ela me apressou, dizendo que eu me
atrasaria para encontra-lo.

- Não importa, eu não vou!

- Ah, você vai sim, vocês tem muito o que conversar!

- Não, eu não vou! Não entende? Por que eu iria me encontrar com um
homem que me abandonou quando eu tinha apenas 16 anos? Que partiu meu
coração e se casou com outra? Que mantinha um relacionamento comigo e
outras duas meninas, tão inocentes quanto eu? Que não se dignou sequer a me
procurar? - eu segurava as lágrimas, mas a raiva era tão grande que minha voz
saía embargada. Madame Toulouse suspirou.

- Ele não se casou com ninguém e esse é só um dos muitos furos que a sua
história tem. Você pode se permitir sentir raiva dele, mas tenho certeza que a
verdade vai lhe mostrar que ele sempre foi e sempre vai ser seu grande amor. E
se o destino resolveu que vocês deviam se reencontrar, isso deve significar
alguma coisa! Venha, minha menina, vamos colocar um belo vestido, fazer um
belo penteado e encontrar com o belo Duque de Devon para esclarecer o que os
separou há tanto tempo!

*******************************************

Cheguei ao Hyde Park com quase uma hora de atraso e não me senti nem um
pouco mal com isso. Ao contrário: rezava para que ele não estivesse mais lá.
Minhas orações foram interrompidas e entendi que Deus não estava me ouvindo:
- Está atrasada, Madame Toulouse. – A voz de barítono atrás de mim fez
minha nuca arrepiar.

Virei para encontrar Raoul segurando seu garanhão negro vestido a


perfeição. Passei por ele com desdém e me dirigi ao cavalo:

- Golias... senti sua falta!

O cavalo entendeu e baixou a cabeça até tocar meu ombro, como se dissesse
que também sentia a minha. Afaguei-o com carinho e perguntei para Raoul, sem
tirar os olhos de Golias.

- Estou aqui. O que quer de mim?

- O cavalo merece um carinho, e eu não mereço um “boa tarde”? Onde estão


seus modos, Pequena?

- Boa tarde, Vossa Graça. Como está? – fiz uma mesura debochada.

- Acho que já fomos muito longe para continuar com essa formalidade, não
acha?

- Não somos mais os mesmos, Vossa Graça. Milorde agora é um Duque.


- E você, Pequena? Deve ser tratada como? – empalideci – Como pôde?

- Como pude? Como ousa a julgar o que fiz quando não sabe nada do que
aconteceu comigo? Você fez muito pior!

- Fiz o quê? Busquei você por mais de um ano? Revirei toda Astoria e todas
as ilhas e toda a Inglaterra, na esperança de encontra-la antes do casamento com
o Conde? Sonhei em me ajoelhar a seus pés pedindo que não casasse com ele?
Que, embora ainda tivesse muita mágoa por ter me trocado por ele, ainda a
queria? Não teve a decência de me contar olhando em meus olhos, deixou uma
carta! Mais fria que isso, impossível! – seu tom de voz tinha aumentado
consideravelmente.

- Você continua com essa história de Conde? Que Conde? Que carta?

- Aqui, Christine! Aqui! – Ele retirou um papel do bolso e me estendeu. Um


papel de carta, muito amassado, manchado, antigo. A caligrafia realmente se
parecia com a minha, mas sabia que não era.

Raoul, me perdoe, mas meu coração sempre pertenceu ao Conde de Sussex,


que finalmente retornou para se casar comigo! Nossa noite foi maravilhosa, mas
não posso deixar a oportunidade de casar com um Conde para viver uma
aventura! Minha tia nunca me perdoaria e sei que viveríamos infelizes e nos
odiaríamos.

Espero que encontre uma boa moça de sua estirpe e seja feliz.

C
- Você só pode estar louco se pensa que fui eu quem escrevi isso!

- Diga que essa caligrafia não é sua, Christine! Diga que isso tudo é mentira
e eu lhe perdoarei por tudo o que fez!

- Tudo o que fiz? Está louco! Eu não fiz nada! E como essa carta chegou até
você? Por que não me procurou?

- Ah, eu procurei, Christine, já disse! Procurei por todo o país e quando disse
que conhecia cada quarteirão da França não menti. Quando disse na carta que o
Conde era de Sussex imaginei que talvez as coisas não fossem como você
imaginou e tivesse fugido para a França! Continuei minha procura até que não
tinha mais esperanças de encontrá-la. Cheguei a conclusão que era verdade o que
disse na carta, que não me queria mais. Se quisesse já teria me procurado... só
não fiquei mais decepcionado do que fiquei há alguns dias atrás, quando
descobri que você tinha se tornado uma cortesã! Uma cortesã, Christine!

- Não importa! Isso aconteceu há 10 anos! Foram 10 anos de mágoa, raiva e


decepção! Que diferença faz?

- Faz toda a diferença para mim! – ele estava perdendo a compostura


rapidamente e eu não conseguia mais me controlar então, como há 10 anos atrás,
em nosso encontro na praia, eu corri.

- Você não vai me escapar novamente, Madame Toulouse! – ele gritou e sua
voz me perseguiu até minha casa.
*********************************

Desde a volta de Raoul em minha vida não conseguia mais me concentrar.


Não tenho vergonha de admitir que atingi o orgasmo com alguns clientes
pensando nele, em seu toque, seus lábios, seu corpo. Ele era o único homem a
quem me entreguei de livre e espontânea vontade, o único que me fizera sentir
prazer, luxúria e amor de uma só vez. O único. Mas 10 anos haviam se passado e
tudo o que aconteceu nesse tempo não podia ser ignorado. Eu tinha um trabalho
a cumprir, precisava do dinheiro se queria mandar Yago para Eton. Mais alguns
meses e ele seria aceito e eu precisava garantir que ele se formaria. Para isso,
precisava honrar com meus compromissos e atender todos os meus clientes.
Desde então, evitei a sociedade e os atendia em minha casa, onde me sentia
segura, onde não existia possibilidade de encontrar com o Duque. Tinha uma
série de compromissos, mas minha cabeça passava metade do tempo pensando
em minhas obrigações e a outra metade pensando nele. Era desgastante. Até que
chegou o dia em que eu daria o grande baile de máscaras anual. Era o único dia
do ano em que abria minha casa para todos. Desde os mais nobres clientes até os
mais humildes estariam juntos, sem distinção e precisava providenciar todo o
necessário para que a noite fosse um sucesso. Dançarinas, músicos, prostitutas
da mais alta classe estariam lá. Elas não perderiam por nada a oportunidade de
ganhar muito dinheiro por um taxa módica. Todos adoravam trabalhar para mim,
principalmente nesse dia, pois o dinheiro era alto e ninguém saía prejudicado. As
damas já estavam em casa, os lacaios lustravam a prataria e tiravam a porcelana
dos baús onde ficavam guardadas, as arrumadeiras já tinham tirado pó do grande
salão e todas as mesas já estavam dispostas ao redor da pista de dança. Modéstia
a parte, eu tinha um dos salões mais belos de Londres, que davam acesso ao
terraço e ao jardim nos fundos da casa. O caminho de cascalhos levava a um
labirinto e todos que vinham ao baile se deliciavam com mulheres por todo o
gramado, pelas alamedas de grandes carvalhos e na chegada ao centro do
labirinto sempre havia um prêmio para quem chegasse primeiro. Não eram
somente as máscaras, o baile, o glamour. Era a libidinagem, a devassidão, a
luxúria que meu baile trazia que fazia com que todos disputassem um convite.

As flores vermelhas já decoravam o salão, toalhas de linho brancas com


detalhes dourados já cobriam as mesas, tendas alvíssimas foram montadas no
jardim e podia sentir o cheiro fabuloso dos canapés que vinha da cozinha quando
subia as escadas para começar meu ritual de beleza. Primeiro um bom banho
com pétalas de rosa, depois uma massagem com óleo de amêndoas para adocicar
minha pele, maquiagem, penteado e então as minhas já famosas roupas íntimas e
o vestido. Esta noite eu queria ser o centro das atenções, portanto pedi que as
meninas utilizassem vestidos de todas as cores, menos vermelho. Esta noite, só
eu estaria usando a cor do pecado. Decidi que usaria meu cabelo solto, com os
cachos negros descendo até a cintura. Finalizei minha produção com uma
máscara dourada e batom vermelho. Olhei para o espelho que ocupava toda uma
parede de meu quarto para verificar se não havia esquecido nada e borrifei meu
perfume favorito. Estava pronta. Seria leiloada novamente para uma noite
especial, com direito a 24 horas de minha companhia. Meus clientes nunca
tinham tido esta oportunidade, meus encontros nunca duravam mais de 2 horas e
esta noite eles poderiam ficar até o dia seguinte. Iria ganhar o dinheiro que
faltava para a educação de Yago e ainda me sobraria um pouco, tinha certeza.

A casa já estava lotada e a maioria dos convidados já tinha chegado quando


resolvi fazer minha entrada. Ouvi suspiros, “ohs”, “ahs” e mantive o sorriso no
rosto, sempre cumprimentando a todos aqueles cavalheiros que me idolatravam!
Servi-me de uma taça de champanhe e abri a noite:

- Sejam todos bem vindos ao meu humilde lar! É uma honra poder contar
com a presença dos Senhores mais distintos, belos e lascivos de Londres! Espero
que se divirtam! Eu sei que vou me divertir muito!

Recebi risos e aplausos e continuei seguindo pelo salão. As meninas estariam


ocupadíssimas essa noite e Madame Toulouse só tinha selecionado as melhores.
Cerca de 50 prostitutas se espalhavam entre os convidados, além daqueles que já
chegaram com suas amantes, acompanhantes e até mesmo esposas que tinham
gostos singulares. Alguns convidados eu sequer conhecia, mas estava ansiosa
por novos clientes. Todos estavam animados e as tendas no jardim já estavam
ocupadas. Alguns gritinhos podiam ser ouvidos do labirinto e fui relaxando,
percebendo o sucesso do baile. Por onde se olhava só era possível dar de cara
com máscaras e mais máscaras. Todos estavam a caráter e isso causava frisson,
já que podiam omitir a identidade de alguns convidados mais tímidos. Aqueles
que não tinham pressa lotavam a pista de dança e os músicos eram bem
ecléticos, tocando desde quadrilhas, minuetos, e a valsa veneziana, considerada
escandalosa pela sociedade, mas muito apreciada em meus bailes. Em resumo,
era um sucesso. Fui ao encontro de Madame Toulouse do outro lado do salão,
que me aguardava para resolvermos os últimos detalhes.

- Querida, quando quiser começar o leilão, me avise.

- Sim, dentro de alguns minutos, podemos começar. Vou pedir aos músicos
que façam uma pausa.

Pedi que parassem a música e me dirigi ao palco montado para a orquestra.

- Meus caros, como sabem, meu baile anual sempre guarda uma surpresa
para todos que participam dele. Este ano não seria diferente, e teremos um leilão.
O prémio do leilão será... esta serva que vos fala. Mas não pensem que é só isso.
O vencedor poderá me ter até amanhã a noite. Um dia inteiro comigo, onde
tudo... absolutamente tudo pode acontecer!

Fui ovacionada por todos os convidados e fiz uma oração para que
conseguisse muito dinheiro para não me preocupar mais com Yago. Madame
Toulouse já estava ao meu lado, segurando minha mão e começou:

- Meus Senhores, os lances começam com 50 libras. Eu ouvi 75?

- 75!

- Oh, meu querido Visconde, 75! Quem dá mais?


- 100!

- 125!

- 200!

- Oh, Senhores, desse jeito não vou conseguir acompanhar. Lembrem-se que
está pobre leiloeira já é idosa!

Depois de todos os risos sobre a piada de Madame Toulouse, recomeçaram


os lances.

- Acredito que ouvi o Conde Devasso dizer 250 libras! – o referido Conde
sorriu, assentindo.

- 300 libras – o Barão Afogueado não desistiria tão fácil.

Quando chegaram 550 libras, estava sem fôlego. Não podia acreditar que
chegaria a tanto!

- 550 libras, alguém dá mais? Alguém?

Quando Madame Toulouse ia finalizar o leilão e eu passaria 24 horas com o


Conde (que ironia!) de Sussex, a quem havia acabado de ser apresentada, uma
voz do fundo do salão chegou até Madame Toulouse:

- 1000 libras!

Todo o salão ofegou e permaneceu em silêncio. Eu não conseguia ver quem


havia feito o lance e Madame Toulouse olhava incrédula, achando que se tratava
de alguma brincadeira. Todos olharam para trás para tentar ver quem era o dono
daquele lance quando Madame Toulouse recuperou a postura:

- Eu entendi direito? 1000 libras?

A voz que vinha passando por entre todos no salão repetiu:

- Sim, Madame, a Senhora entendeu direito, 1000 libras.

Quando vi o dono do lance, fiquei boquiaberta, com os olhos arregalados e


pálida. Raoul continuava seguindo em direção a Madame Toulouse.

- Quem dá mais? – ele disse, já que Madame Toulouse ainda estava perplexa
com seu lance.

- Dou-lhe uma, dou-lhe duas...

Quando Raoul tirou o martelo da mão de Madame Toulouse e bateu, todos


aplaudiram e o burburinho sobre o valor do arremate começou. Todos voltaram a
festejar e Raoul seguiu em minha direção, sem tirar os olhos de mim. Eu ainda
estava pasma, então não sai do lugar. Ele parou na minha frente e fez uma
reverência. Pegou minha mão e, como sempre, beijou demoradamente.

- Acredito que 24 horas não sejam suficientes para responder a todas as


questões que não foram respondidas, mas já é um começo!

- Está louco mesmo! 1000 libras? Por uma cortesã? Uma prostituta? Uma
meretriz? – desdenhei.

- Nunca tive que pagar para ter uma mulher, Pequena. Estou pagando por seu
tempo. E vou exigir todas as respostas para minhas perguntas. Tudo o que tenho
entalado por 10 anos! – ele mostrou os dedos das mãos para dar ênfase ao tempo.
– Seu corpo já foi meu, Pequena, mas agora só quero minhas respostas. Isso é
tudo o que espero de você, nada mais.

Dizendo isso, ele se dirigiu a mesa de bebidas. Foi como se eu tivesse


tomado um tiro. Se eu ainda tinha um coração, ele morreu naquele instante.
Segui pelo corredor até minha sala íntima e, depois de 10 anos, chorei por Raoul
novamente.

Quando o último convidado se foi, restaram apenas Madame Toulouse e


Raoul. Ele me ganhou no leilão e não ia a lugar algum, não até a noite do dia
seguinte. Madame Toulouse tocou seu rosto e aconselhou:

- Seja gentil, menino. Ela sofreu muito para chegar até aqui. Tanto quanto
você. Não machuque só porque foi machucado. Pelo que sei, talvez nem tenha
sido ela a lhe machucar.
Raoul sorriu um sorriso triste. Beijou a mão de Madame Toulouse e seu
rosto. Cochichou em seu ouvido:

- Madame, não tenho intenção de machucar ninguém. Só quero respostas e


depois vou embora da vida dela, assim como voltei.

- Espero que esteja errado, menino. É muito lindo para passar a vida
sofrendo sozinho!

Ele gargalhou e ela se foi, piscando para mim.

Quando ficamos sozinhos, ele me olhou. Senti um arrepio pela frieza que vi
naquele olhar.

- O jantar está servido, por favor, me acompanhe.

- Não vim para jantar. Como disse, só quero respostas.

- Pode ter suas respostas, comendo ou não. Mas estou faminta, não comi
nada no baile, então, se puder me acompanhar...

Esta noite eu tentaria algo novo, não usaria minhas técnicas de sedução. Não
usaria meu melhor sorriso, não usaria meu corpo. Esta noite eu usaria a única
coisa que não usava mais desde que Nikolai fora embora e contei minha história
a Madame Toulouse: a verdade. E, em troca, exigiria a mesma moeda.
Capítulo 6

Seguimos para a sala de jantar e Raoul deve ter pensado melhor e decidiu me
acompanhar. Comemos em silêncio e ele não tirava seus olhos de mim. Quando
a sobremesa foi servida, decidi que aquilo já estava beirando o ridículo e,
nervosa, resolvi tomar uma atitude. Não foi a melhor atitude, mas cheguei a
conclusão que nada poderia ser pior do que aquela situação. Resolvi brincar. Mas
quem brinca com fogo...

- Gostaria de provar sua sobremesa... na cama? Tenho certeza que vai olhar
esse bolo de morango com outros olhos... estiquei minha perna e coloquei meu
pé no meio das pernas dele.

Ele continuou me olhando, uma mistura de raiva e desejo, mas não deu o
braço a torcer. Segurou meu pé entre seus joelhos e respondeu.

- Já lhe disse que nunca paguei para me deitar com uma mulher e não vai ser
agora, aos 33 anos, que vou começar.

- Podemos então começar o interrogatório? Sei que ainda temos 22 horas,


mas não gosto de fazer meus clientes saírem insatisfeitos. E como você disse que
24 horas seriam insuficientes para responder a todos as suas perguntas...

- Podemos. Podemos começar com a sua explicação para ter desaparecido.


Quando recebi sua carta, não acreditei. Não é possível que aquela menina
ingênua tenha se tornado ardilosa da noite para o dia. Sem contar que, se eu
fosse o conde, não aceitaria mercadoria usada...

Aquilo me acertou como um soco. Ele conseguia me atingir com cada frase
que usava, parecia ter ensaiado por anos para não perder nenhuma oportunidade
de me machucar.

- Já que você acredita que, mesmo naquela época, eu não valia muito,
proponho um jogo: uma verdade por outra. Eu conto uma verdade, você
também. Parece-lhe justo, Vossa Graça?

- Justo não é uma palavra que eu usaria com você, mas aceito seu jogo.

Novamente ele me machucava. A mágoa estava se transformando em raiva.

- Então vamos lá: eu nunca enganei você. Não conhecia nenhum Conde,
aliás, conheci o Conde de Sussex esta noite, veja você! Ele não é um de meus
clientes e nunca sequer tinha visto seu rosto. No dia em que me entreguei a você
na gruta, voltei pra casa e minha tia me trancou num quarto, prometendo me
mandar para a Abadia de Syon. Sua vez.

- Nunca estive com nenhuma outra mulher enquanto estive com você. Eu a
amava. Nunca me casei e nem tomei a virtude de outra mulher em Astoria. O
que aconteceu? Por que você tornou-se uma cortesã, ao invés de uma freira?

- No caminho para a Abadia eu fugi. Andei pela mata por um bom tempo até
reconhecer onde estava e como chegar em sua casa. Quando cheguei, sua
cozinheira me disse que você tinha viajado com sua “noiva”. Onde você estava?

- Meu irmão recebeu uma convocação para o Exército. Ele era um garoto
ainda e achei que seria mais seguro se eu fosse em seu lugar. Tentei lhe contar,
mas não me permitiam falar com você, me disseram que você estava “se
resguardando”, pois sua reputação tinha sido manchada graças a mim. Foi um
escândalo ainda maior, pois apareci no dia seguinte e me bateram a porta na cara
novamente. No terceiro dia, cheguei pronto para pôr a casa abaixo, quando
recebi sua carta. Fui embora e, no dia seguinte, estava no regimento para o Fort
Williams. Não havia mais nada que me segurasse em Astoria e eu não tinha mais
nada a perder. Sua vez. Para onde você foi?

- Fui atacada depois de sair da sua casa por 3 mercenários. Felizmente, eles
queriam me vender, portanto não me violentaram. Fui vendida para um cigano
que cuidou de mim junto a sua tribo. Estava suja, com frio e com fome e não tive
outra escolha a não ser acompanha-lo. Fui amarrada, com uma corda no pescoço,
tratada como gado, mas ele me acolheu. Deu-me de comer e um lugar para não
morrer de frio. Nunca mais voltei a Astoria. Quem lhe deu a carta que eu
“supostamente” escrevi? – eu tinha medo da resposta, mas precisava saber.

- Sabrina. No terceiro dia, quando comecei a gritar na porta de sua casa, sua
tia saiu e disse que eu nunca mais devia por meus pés ali, você era uma menina
ainda e eu havia me aproveitado disso. Disse que eu era um libertino, que
seduzia meninas e que você era só mais uma de minhas conquistas. Eu não podia
acreditar. Aquilo foi como um soco na boca do meu estômago. Quando sua tia
bateu a porta, Sabrina veio ao meu encontro antes que eu pudesse gritar
novamente. Entregou-me a carta e disse que eu era um homem bom e merecia a
verdade. Senti uma alegria indescritível quando vi sua letra! Mas a dor que senti
quando li... – ele balançou a cabeça, como se a simples lembrança do que
aconteceu pudesse lhe causar a mesma dor novamente. Baixou os olhos, respirou
e voltou-se para mim. - Sabe, quando estava na guerra, fui atingido por uma
bala. É estranho. Não doeu tanto quanto eu imaginei que doeria. Ler sua carta
doeu muito mais...
Eu via dor nos olhos dele. Como eu imaginei na época, Sabrina nos traiu.
Não existia Conde nenhum, carta nenhuma. E ele nunca tinha estado com Sunny
ou Bertha e nunca foi noivo de Otilia. Aquilo me deixou com ainda mais raiva.
Lágrimas brotaram em meus olhos e não consegui segura-las.

- Por que choras? Se arrepende do que fez? As coisas não saíram como
imaginava, hum? – ele desdenhava, traçando círculos com os dedos na toalha.

- Eu não escrevi essa carta, Raoul. Não percebe? Sabrina nos traiu! Foi ela
quem disse para minha tia onde eu estava, com quem e o que estava fazendo! Ela
era a única que sabia! Não sei porque ela fez isso, mas fez! – ele esmurrou a
mesa.

- Não! Pare de mentir! Você disse que diria a verdade! Agora está culpando
outra pessoa para eximir seus erros? Mentirosa!

Agora ele gritava e todo o ódio represado por 10 anos rompeu-se de uma
vez. Ele levantou da mesa, batendo o punho com força, derrubando taças e
talheres.

- Nunca imaginei que pudesse sentir tanto ódio por alguém! Eu gostaria de
matá-la! Eu gostaria de nunca ter colocado meus olhos em você! Eu gostaria de
nunca ter te conhecido!

- Por favor, não diga isso!

- Digo mais: eu nunca mais quero colocar minhas mãos em você, a não ser
que seja em seu pescoço para torcê-lo! Mentirosa! Leviana! Meretriz!

Ele esbravejava, deu a volta na mesa e estava muito próximo. Eu continuava


sentada, se o desejo dele era me matar, que matasse. Lembrei então que tinha um
filho para cuidar, se minha vida não valia nada para ele, valia para Yago.
Levantei-me num rompante:

- Você também não é nenhum santo, Raoul! Se me amasse como disse,


continuaria me procurando!

- Cale-se! Nunca mais se dirija a mim pelo meu nome, não tem mais esse
direito! Vai se dirigir a mim como Milorde ou Vossa Graça! Nunca mais diga
meu nome! Você não é digna de dizer meu nome!

Ele agarrou minha garganta, mas não apertou. Aproximou seu rosto de mim,
de maneira que eu podia sentir seu hálito, uma mistura de whisky e hortelã. Ele
passou a língua pela minha boca e minhas pernas bambearam. Sentia raiva por
não conseguir me controlar quando ele estava perto, mas não tinha forças para
resistir. Fechei os olhos e permiti que ele me beijasse. Seus lábios estavam
grudados aos meus, sua língua invadia minha boca com voracidade. A mão que
segurava minha garganta continuava firme e a outra lutava para não me tocar.
Ele travava uma luta interna, entre se entregar ao momento e resistir. Por fim, a
resistência venceu. Com um grito desesperado, ele continuou:

- Nunca mais me convide para sua cama, você se deita com qualquer um,
mas eu não me deito com prostitutas!

Dizendo isso, ele soltou minha garganta e saiu da sala. Eu cai na cadeira, sem
forças para fazer mais nada, chorando copiosamente. A muralha que levei 10
anos para erguer ao redor de meu coração ruiu. E não havia mais nada dentro
dela.

Depois do que pareceram horas, ele voltou para a sala. Tinha pago 1000
libras por 24 horas comigo, não iria embora depois de apenas 4 horas.

- Amanhã vamos encontrar Sabrina. Ela vai nos dizer quem está mentindo e
você vai ficar feliz em saber que nunca mais me verá na sua frente! Diga-me
onde posso dormir.

Eu o acompanhei até o quarto onde recebia meus clientes. O quarto estava


pronto para receber o vencedor do leilão, então aquele quarto pertencia a ele até
o dia seguinte. Ele notou que havia uma porta de ligação para outro cômodo,
mas não perguntou onde dava. Entrou no quarto observando tudo e, depois de
avaliar o quarto, bateu a porta, sem uma palavra.

Fui para o meu quarto e deitei na cama vestida como estava. Chorei tanto
que o cansaço me venceu e adormeci, esquecendo de trancar a porta de ligação,
que dava diretamente no quarto onde o Duque descansava.

O dia ainda não tinha nascido quando ouvi um soluço. Sem me mexer, abri
os olhos e vi um vulto sentado embaixo da janela. A luz do luar invadia meu
quarto, iluminando meu corpo, nu. Pulei na cama quando me lembrei que havia
deitado de roupa e tudo. Ele levantou a cabeça.

- Não se preocupe. Apesar de ter direitos, afinal eu paguei, não toquei em


você. Só tirei seu vestido para que ficasse mais à vontade.

Sentei na cama e subi o lençol para cobrir meus seios.


- Vossa Graça, por que está aqui?

- Eu não consegui dormir. Eu tenho tanta raiva dentro de mim. E você é o


alvo dela. Você me tirou tudo, Pequena.

Ouvi-lo me chamar pelo apelido que me deu era música para meus ouvidos.
Mas seus gritos ainda reverberavam em minha cabeça, “meretriz, prostituta”!
Não me movi, até que ele, de joelhos, apoiou-se nos pés da minha cama.

- Por favor, quebre esse feitiço, sua bruxa! Liberte-me de te amar tanto! – ele
chorava desesperado.

Afastei o lençol e ajoelhei a seu lado. Ele se virou, seus olhos não tinham
mais a frieza que vinha me olhando.

- Se eu soubesse fazer isso, juro que o faria. Mas não consigo nem mesmo
mandar em meu coração, como posso mandar no seu?

- Meu coração sempre lhe pertenceu, Pequena. Você fez o que bem quis com
ele!

- Não! Eu juro, pela vida de meu filho... – percebi muito tarde o que tinha
dito.

- Filho? Você tem um filho?


- Eu... sim... eu...

Ele se levantou. Tentava respirar, tentava se controlar, mas por mais que
dissesse que não acreditava em mim, por mais que seu cérebro pensasse em
milhares de possibilidades, ele já sabia a resposta.

- Quantos anos tem seu filho, Christine?

O pânico tomou conta de mim. Sabia que tinha que mentir, mas nunca
consegui esconder nada de Raoul. Arrisquei.

- Não seja tolo, você não é o pai!

- Quanto anos ele tem?

Continuei esperando intervenção divina, mas ela não veio.

- CHRISTINE!

- 9. Ele tem 9 anos. Completa 10 em sete meses.

Suas feições mudaram. Agora sim, existia ódio puro.


- Christine, vou perguntar só uma vez e você sabe que posso mata-la e sair
ileso, afinal serei um Duque que matou uma prostituta. Posso pensar em um
milhão de desculpas para fazer isso, portanto não vou perguntar de novo. Quem
é o pai dele?

Quando ele virou-se para mim, ao fazer a pergunta, avançou em minha


direção, agarrando novamente minha garganta. Quando chegou na parede, os
olhos transbordando ódio, ameaçou:

- Eu só tenho que apertar...

- E nunca saberá se é seu filho ou não, nem onde ele está... foi a última
cartada, para ambos. Raoul afrouxou a mão em minha garganta e perguntou
novamente. Cheguei a um beco sem saída. Respondi imediatamente.

- Você.

Quando ainda pronunciava a palavra, o Duque desmaiou.


Capítulo 7

Ele acordou em minha cama. Minha criada estava conosco, não queria mais
ficar sozinha com ele e levando-se em consideração a maneira como ele
acordou, eu estava certa em não querer.

- Eu quero meu filho! Eu quero meu filho agora!

Eu agora tinha entrado no modo mamãe urso e não pensava em nada além de
Yago.

- Acalme-se, Vossa Graça.

- Não me peça pra me acalmar, maldita!

- Você pode conhecer seu filho, quando e se conseguir se controlar.

- Você tem ideia do que fez com a minha vida? Eu larguei tudo para ir a uma
guerra, que pouco me interessava, para morrer! Eu não queria mais viver sem
você! Passei 10 anos da minha vida pensando que tinha sido trocado pela mulher
que amo e descubro que ela é a maior cortesã da Inglaterra! E ainda tem um filho
meu! Por Deus, como posso me controlar?
Ele gesticulava, andando pelo quarto sem camisa e não se dava conta de
quão lindo ele era. Eu estava apavorada, mas meu corpo estava em êxtase de ver
o homem mais lindo de todo o mundo ali, tão perto. Eu rezava para que ele se
acalmasse, só assim poderíamos conversar e, quem sabe um dia, contar tudo a
Yago. Eu não podia permitir que ele chegasse na casa de Madame Toulouse
alegando ser o pai de meu filho, bagunçando sua cabecinha. Yago cresceu numa
tribo cigana, mudou-se para casa de Madame Toulouse ainda bebê e não
entendia porque morava com a “vovó” e não com a “mamãe”. O “papai” só ia
deixa-lo mais confuso e eu queria ter certeza de que ele não se importaria em
saber quem era quem, desde que fosse amado. Finalmente Raoul saiu do transe
em que estava há algum tempo, balbuciando coisas sem sentido e parou na
minha frente.

- Quero meu filho. Sou um Duque e agora sei que tenho um herdeiro. Não
posso permitir que ele continue em companhias tão questionáveis quando ele
pode ter a vida de um nobre!

- Só por cima de meu cadáver! – aquilo me indignou.

- Christine, você já me levou além do meu limite, não vou mais tolerar isso!

- Seja razoável, o que vai dizer a ele?

- A verdade! Algo que você devia ter feito há 10 anos!

- Por favor...
- Agora vai implorar? Com que direito você me implora alguma coisa?

Aproximei-me dele e tentei o golpe de misericórdia:

- Imploro como você me implorou há alguns minutos atrás para não me amar
tanto. Eu amo você. Nunca deixei de amá-lo e faria tudo de novo, mesmo
sabendo que o teria só por uma noite. Poderia passar a vida inteira sozinha,
desde que o tivesse nessa única noite só para mim. Foi a noite mais feliz de
minha vida e me deu nosso filho. Iria para um convento de bom grado, se
pudesse desfrutar de nosso amor por uma maldita única noite e soubesse que
seria nossa única chance de ficar juntos! Acabei fugindo por acreditar que ainda
existia uma chance para nós. Então, perdoe-me se não me arrependo de ter me
deitado com você! Perdoe-me se você foi traído, assim como eu e comeu o pão
que o diabo amassou, assim como eu! Perdoe-me por não ter te procurado antes,
por achar que você estava casado e feliz com Otilia. Perdoe-me por fraquejar e
não ter lutado por nós, mas era muito jovem e não sabia mais o que fazer! Mas
não me tire a coisa que mais amo e me faz te amar ainda mais!

Eu estava ajoelhada a seus pés, como ele tinha feito a poucos minutos atrás.
Ele me levantou e tocou meu queixo, fazendo com que eu o encarasse. Sua voz
era baixa, ele tinha se transformado. Seu olhar voltara a ser gélido e ele mantinha
a postura ducal.

- Eu poderia perdoar tudo, Christine, se descobrisse que tudo o que me


contou hoje é verdade. Mas esconder meu filho?

- Eu pretendia te contar, eu só não...

- Você devia ter me contado no dia do Baile na Mansão do Barão! Na


primeira oportunidade em que me viu!

- Eu queria, eu só não sabia como, eu esperava um momento...

- Meu Deus, será que não vê? Não há um momento certo para isso! Você
tinha que tentar, todo dia, todas as vezes! Se não conseguiu me contar no Baile,
devia ter me contado no dia seguinte, no Hyde Park! Você devia ter tentado me
contar todos os dias até conseguir! Você não me procurou por acreditar que eu
estava casado, mas devia ter me contado! Você me tirou o direito de ser pai por
10 anos, Christine! Como posso lhe perdoar por isso?

Eu não sabia a resposta. Ou melhor, sabia, ele não poderia me perdoar nunca.
Ele tinha razão. Eu não o perdoaria se fosse o contrário. Eu o mataria. Não me
restava outra alternativa, a não ser provar que eu não era a pessoa horrível que
ele acreditava que eu era e que o amava mais do que tudo.

- Quero então lhe pedir uma coisa.

- Você crê que tem o direito de me pedir alguma coisa? Eu nem sei mais
quem você é!

Eu suspirei. Engoli minhas lágrimas e pensei no meu filho. Ele podia


continuar me atacando, mas agora outra vida estava em jogo e essa não seria
prejudicada.

- Por favor, me dê a chance de explicar tudo a ele. Deixe-me contar quem


você é e só depois apresenta-lo. Por favor, não o assuste, não o afaste de mim.
Ele vai para Eton nos próximos anos, não quero que ele parta sem saber que
ainda tem uma mãe...

- Como ele vai para Eton? Como ele conseguiria? – Raoul ficou
impressionado.

- Com dinheiro, Vossa Graça. Muito dinheiro. – respondi. Uma ponta de


orgulho aparecia em minha voz. Sim, a prostituta podia bancar Eton para seu
filho. A prostituta nunca poderia aparecer em frente aos amigos do filho, mas
poderia lhe dar uma vida digna da nobreza. A prostituta poderia lhe comprar um
título e ninguém o rejeitaria, desde que a prostituta vivesse nas sombras. A
prostituta cometeu inúmeros erros, mas não erraria com o futuro do filho.

Ele pensou por algum tempo. Pareceu-me que ele reconsiderou a maneira
como decidi criar nosso filho, pois não imaginava que eu seria capaz de mandar
um filho para Eton.

- Quero vê-lo antes de partir. Quero passar um tempo com ele. Não sei
quando ele vai, mas você vai providenciar nosso encontro, o mais rápido
possível. É o máximo que posso lhe oferecer.

- Obrigada! Obrigada! – Beijei suas mãos e fiz uma prece silenciosa


agradecendo a Deus. Raoul não era um homem mau, ao contrário: o homem que
eu sempre amei era bom.

Algumas horas depois, o sol nasceu e eu me preparava para sair. Tinha uma
missão importantíssima e não queria perder mais tempo. O Duque me preveniu:
- Vou tentar dormir um pouco, a noite foi exaustiva. Quando acordar devo ir
à Câmara dos Lordes e ter com o Rei. Quando voltar, quero saber tudo e, ainda
hoje, conhecer meu filho.

Assenti e saí em disparada para a casa de Madame Toulouse.

Quando me viu na sala de leitura, ficou surpresa:

- Minha filha o que está fazendo aqui tão cedo? Não se entendeu com o
Duque? – ela me olhava com compaixão.

- Madame, por favor me perdoe, não tenho tempo para lhe contar agora,
preciso falar com Yago. Onde ele está?

- Ora, aquele traquinas sem modos está na cozinha, tomando seu desjejum.
Ele diz que “gosta do quentinho do forno e do cheiro de pão”! Onde já se viu,
um cavalheiro comer na cozinha?

Corri para lá sorrindo! Yago era mesmo meu filho!

Quando cheguei, ele desceu da cadeira e correu em minha direção:

- Mamãe, mamãe! A que devo a honra de sua visita tão cedo?

- Uau, meu cavalheiro é mesmo muito educado e charmoso! Mamãe precisa


conversar muito sério com você.
- Mamãe, eu não sei quem te contou, mas não foi minha culpa!

Eu gargalhei. Ele devia ter aprontado alguma e pedido segredo a Madame


Toulouse!

- Falaremos disso mais tarde, meu amor. Agora, mamãe tem que lhe contar a
história de como você nasceu.

- Puxa, você nunca quis me contar, eu sempre quis saber! Houve muito
sangue? Alguém vomitou? – eu continuava gargalhando

- Não é esse tipo de história, meu amor! Já se perguntou quem é seu papai?

Seus olhos brilharam de surpresa.

- Eu tenho um papai? Pensei que só tivesse a mamãe e a vovó!

- É claro que você tem um papai! Todo mundo tem um papai e uma mamãe.

- Robert não tem mamãe. Ela foi para o céu. – disse, pensativo.

- Robert perdeu a mamãe, mas ele a teve, caso contrário ele não estaria aqui!
- Faz sentido. Quem é meu papai?

- É exatamente esta história que eu quero lhe contar, sente-se aqui...


Capítulo 8

Cheguei em casa no horário do chá da tarde, o Duque ainda não tinha voltado.
Fiquei inquieta, pois nunca tinha trazido Yago para passar algum tempo em
minha casa, não queria expor nada a ele. Claro que eu deveria contar minha
história algum dia, mas esperava poder contar quando ele fosse mais velho, mais
maduro e entendesse que tudo o que fiz foi por ser levada pela tristeza de perder
Raoul associada ao fato de ter que me sustentar e dar uma vida boa para ele. Sem
referências, sem amigos eu nunca teria chance de arranjar um emprego de
preceptora, professora ou qualquer trabalho parecido. Simplesmente segui o
fluxo de minha vida. Era isso ou tentar a sorte sem a ajuda de Madame Toulouse.
E, verdade seja dita, ela nunca me pressionou para seguir esta vida, mas eu sabia
que era a maneira mais rápida de conseguir dar um futuro a Yago, portanto não
pensei duas vezes. Antes mesmo de me sentar com Madame Toulouse, já estava
decidida que aprenderia seu ofício e guardaria cada centavo para meu filho. Com
exceção da casa, todo o dinheiro estava numa conta bancária em seu nome, que
ele nem sabia da existência e era administrada a distância, por Nikolai. Ele
mandava mensagens ao administrador da conta e me autorizava a guardar cada
vez mais dinheiro nela. Não me tornei uma mulher rica como Madame Toulouse,
mas estava no caminho, como ela tão sabiamente me ensinou. E estava nos meus
planos contar tudo a Yago, mas não imaginava que aconteceria tão cedo.

A porta se abrindo me fez sair de meus devaneios. Raoul regressava. Devia


ter passado em sua casa, pois estava com outra roupa e banho tomado. Pude
sentir o cheiro de sua colônia, que me embriagou.

- Como foi? Conte-me tudo – ele sentou em um canapé em minha frente, os


cotovelos apoiados nos joelhos, as mãos no queixo.

- Nosso filho já sabe de sua existência. Expliquei que circunstâncias levaram


você ao exército e que agora você está de volta e estarão sempre juntos. – Raoul
sorriu.

- Tenho dois favores a lhe pedir: o primeiro é que não conte a ele o que faço.
Eu vou contar, mas quero que ele tenha maturidade para entender.

- Entender o que? Que você preferiu a vida mais fácil a lutar por nós? – eu
não esperava por isso, mas preferi não falar nada a respeito, embora continuasse
doendo ouvir as constantes ofensas de Raoul. Todos acreditam que a vida de
uma cortesã é “fácil”. Poderia citar uma centena de pessoas que não aguentariam
essa vida “fácil” por uma semana. Ignorei o comentário ferino e continuei.

- O segundo é que nunca o abandone. Se você decidir que não quer fazer
parte disso, vá embora agora. Não faça com que ele te ame se não pretende ficar
na vida dele. Não o puna por meus erros. Saiba que se decidir ficar, vai estar
constantemente em minha companhia. E sei o quanto isso é difícil para você.

- Vou tentar ao máximo me acostumar com sua presença indesejada,


Christine, não se preocupe. Eu só não fiz parte da vida de meu filho antes porque
você tirou isso de mim.

Segurando as lágrimas, saí da sala. Quando voltei, trazia Yago comigo.

- Meu amor, quero lhe apresentar alguém.

Raoul levantou-se do canapé e não se conteve: caiu de joelhos e chorou.


Chorou por muito tempo, afinal, era impossível não ver que Yago era seu filho.
Ele tinha os cabelos castanhos escuros e os olhos verdes do pai. Já era alto para
sua idade, então não poderia ter puxado isso de mim, já que sempre fui baixinha.
E era espirituoso como Raou. Ele podia se ver 23 anos mais novo. Yago tinha
todos os traços do pai, o que me fazia sorrir toda vez que olhava para o meu
filho. Ele se tornaria um homem belíssimo e, com sorte, maravilhoso como o
pai, que continuava chorando quando toquei seu ombro e sussurrei em seu
ouvido:

- Você o está assustando... por favor, fale com ele!

- Oh, meu caro... não se assuste! Eu estou chorando de felicidade! Você é um


belo rapaz! – Yago se aproximou meio ressabiado e Raoul tocou sua face.

- Você é meu papai? – Raoul riu.

- Sim, eu sou seu papai! Eu amo você! – Agora quem ria era Yago.
Imediatamente ele correu para os braços de Raoul e eu não pude mais conter as
lágrimas. Quantas noites eu sonhei com aquela cena? Não era exatamente como
eu tinha imaginado, mas era lindo mesmo assim!

- É verdade que você é do exército, papai?

- Sim, sou General!

- Uau! Quando for grande, quero ser do exército também! Mas mamãe disse
que eu tenho que estudar primeiro! Já sei ler, escrever e fazer continhas! Mamãe
também está me ensinando francês, não sei por que eu preciso ir para Eton!
- Precisa ir para estudar mais! Para ser um grande General tem que estudar
muito, meu filho! N´est-ce pas vrai, Maman***? – Raoul respondeu para
mostrar a Yago que ele também falava francês.

Sorri para os dois.

- Oui, Papa, c´est vrai****!

- Mamãe, papai também fala francês!

- Sim, meu amor, papai fala francês. Melhor que a mamãe! – O olhar de
Raoul agora era outro. Não havia raiva, ódio ou rancor. Pela primeira vez, seus
olhos brilhavam como há 10 anos atrás.

Eles passaram a tarde toda brincando, conversando e se conhecendo. Não


adiantava eu viver com medo de que Raoul o levasse de mim, tinha que dar um
voto de confiança. Dei privacidade aos dois, rezando para que Raoul cumprisse
com o prometido e não contasse sobre mim e não o abandonasse. Lembrei-me
que Raoul sempre me dizia que nunca quebrava sua promessas e sorri. Era uma
lembrança agridoce, mas agora não doía tanto. Ele estava ali e nada mais
importava.

Jantamos juntos e, depois do jantar, me sentei ao piano e Raoul e Yago


cantavam cantigas infantis. Rimos muito e mantivemos a postura perante nosso
filho. Não ouvi uma só crítica de Raoul a mim e não disse nada de negativo
sobre Raoul. Ele só me olhou de soslaio quando Yago me chamou de “Prama” e
disse que seu nome era cigano, que achava que Nikolai era seu papai.

- Não, meu rapaz, eu sou seu papai. Nikolai só cuidou de você e da mamãe
enquanto papai estava na guerra. O que é “Prama”?

- Yago, está na hora de ir dormir, vamos para a cama! – não achei prudente
estender a história de Nikolai.

Raoul levantou-se do chão onde estivera com Yago e seus olhos eram
suplicantes:

- Ele acabou de conhecer o pai. Não pode dormir mais tarde? Somente hoje?

Meu primeiro instinto foi permitir. Mas sabia que uma guerra eclodiria a
qualquer momento e não arrisquei.

- Já passou há muito a hora de dormir, Raoul. Além disso, seu tempo acabou.
– mostrei a ele o relógio, que marcava 10 horas da noite.

Raoul se retesou e me encarou.

- Você está me expulsando por causa do leilão da noite passada? – Yago me


olhou, curioso:

- Leilão, você foi num leilão ontem, mamãe?

Apertei os olhos e suspirei.


- Fui, querido, papai queria comprar algumas obras de arte para sua casa...

- Meu filho, porque não se prepara para dormir enquanto eu e sua mãe
conversamos um pouco? Papai logo estará com você para colocá-lo na cama.

Yago se agarrou as pernas de Raoul. Quando o pai abaixou e pegou o filho


no colo, Yago disse:

- Estou muito feliz, papai! Quem sabe não preciso ir para Eton tão cedo,
agora que está aqui!

- Ah, rapazinho, boa tentativa, mas você vai para Eton, sim! Papai não vai a
lugar nenhum e, quando se formar, vou estar aqui, esperando por você! – Raoul
o colocou no chão e ele correu escada acima para se arrumar para dormir.

Raoul se virou, os olhos frios e cruéis estavam de volta.

- Eu não posso acreditar que você disse na frente do meu filho sobre o leilão
de ontem! Você prometeu!

- Eu não acredito que você me expulsou na frente do NOSSO filho! Você


ainda não entendeu, não é? Eu não vou a lugar nenhum, Christine. A menos que
você queria continuar a ver nosso filho, você vai ter que me ver o tempo todo.
Não me interessa o que faz da sua vida, mas o que faz da vida do nosso filho diz
respeito a mim também! Se para continuar na vida dele eu tenha que passar por
cima de você, tenha certeza, é exatamente o que farei!
- Eu gostaria de vê-lo tentar!

- Se é isso que quer, tente me afastar dele de novo!

Comecei a gargalhar. Ele me olhou, espantado.

- Isso é ridículo! Conseguimos ser civilizados a tarde inteira e agora já


estamos nos atacando! Quem acreditaria que eu algum dia nos amamos tanto? –
sentei na cadeira a mesa de jantar e apoiei a cabeça na mão. Estava exausta. Não
sabia mais o que fazer para que pudéssemos conviver de maneira civilizada. Mas
não conseguíamos ficar 5 minutos na companhia do outro sem que um ataque
viesse. Minha atitude pegou Raoul de surpresa, que não conseguiu disfarçar a
frustação. Baixou a cabeça e sussurrou.

- Amei muito, Christine. Nunca neguei isso. Mas não posso mais negar tudo
o que você fez, o que a sua vida se transformou. Tenho um filho e isso muda
tudo.

Ele pegou seu chapéu, sua casaca e saiu, deixando-me sem fôlego e ardendo
de desejo por ele. Sabia que a partir de agora ele estaria o tempo todo por perto.
Eu ganhava minha vida cobrando por sexo. Que desafio seria conviver com
único homem que eu desejava e que não me queria em sua cama? Nem de graça?
Capítulo 9

No dia seguinte, acordei com a porta de meu quarto sendo esbofeteada:

- Christine, onde ele está? Abra esta porta!

Levantei correndo, vesti meu robe e abri a porta.

- Meu Deus! O que deu em você?

- Onde ele está Christine? – O Duque estava soltando fogo pela boca.

- De quem estamos falando, por favor? – eu sabia exatamente de quem, mas


queria ganhar tempo para tentar acalmá-lo. Não percebi que só o deixava mais
nervoso. Ele entrou no quarto me empurrando até que eu encostasse na parede
não tivesse nada entre nós, a não ser nossa respiração. Ele agarrou meu queixo,
me obrigando a olhar para ele.

- Você gosta de brincar com fogo, não é, Christine? Sempre gostou. Seu rosto
estava tão próximo ao meu que foi difícil me controlar e não beijá-lo.

- Não sei do que está falando, mas se está procurando por Yago, ele não está.
Sua preceptora o aguardava, tive que leva-lo de volta. Ele não pode se dar ao
luxo de perder aulas, principalmente agora, que falta tão pouco para Eton. Não
vou mais escondê-lo de você, Raoul, eu prometo. E eu não quebro minhas
promessas.

Raoul se afastou e arrumou sua postura.

- Volto para o almoço. Quero meu filho aqui quando chegar.

- Sim, vou providenciar seu encontro, porém não podem passar a tarde aqui!

- Tudo bem, eu posso leva-lo... espere um momento... por que não podemos
passar a tarde aqui? Por que eu não paguei? É por isso Christine?

- Não é nada disso. Preciso trabalhar, Raoul. Tenho clientes para receber e...

- E nosso filho não pode atrapalhar, não é? Ou será por que sua vida é tão
vergonhosa que não suportaria se ele soubesse?

- Raoul, por favor...

- Diga-me onde ele está e eu resolvo tudo. Pode ficar com seus “clientes” –
ele disse, cruzando os braços e apoiando na lareira.
Respirei fundo. Era cansativo. Raoul não dava trégua em seus ataques, a
menos que Yago estivesse junto. Era difícil pra mim não ter mais o controle de
minha vida. Mas era mais difícil estar tão perto de Raoul e não poder sequer
tocá-lo.

- Se puder se acalmar e me ouvir...

- Não, não posso. Preciso ver meu filho.

- Nosso filho, Raoul. Você insiste em me lembrar disso a todo momento.

- Porque você se esqueceu disso por 10 anos!

- Você faz questão de me lembrar disso também.

- Talvez se você não tivesse agido de maneira tão leviana...

- Escute, eu sei que sou culpada, eu sei que devia ter te contado, eu sei que
cometi muitos erros até chegar aqui. Você tem ideia do que é descobrir que está
grávida quando mora numa tribo de ciganos? Dar graças a Deus por ser salva e
ter um cobertor para dormir e comida para comer? Você tem ideia o que é viver
da bondade dos outros? Eu tive muita sorte, Raoul. Poderia estar morta e você
teria se livrado de mim, mas não teria Yago. Sei que não fiz as melhores
escolhas, mas tinha apenas 16 anos! 19 quando Madame Toulouse me fez uma
cortesã. Não sei como você era aos 19, mas eu não tinha para onde ir, eu não
tinha ninguém! Pode entender isso? Estranhos me ajudaram, Raoul! Estranhos! –
Desabei em uma cadeira. – Eu não me orgulho do que sou Raoul. Mas pode, por
gentileza, parar de me lembrar disso o tempo todo? Pelo menos por um dia?

Ele estremeceu. Talvez tenha se apiedado de minha fragilidade. Com um


rosnado, continuou.

- Faça o que quiser. Só me diga onde está meu filho. – Não, ele não se
cansava.

- Pode aguardar um momento? Só tenho que me vestir e posso ir busca-lo...

- Eu posso ir busca-lo, Christine. Qual o problema?

- Eu só quero... – então ele percebeu:

- Você tem medo que eu fuja com ele? Meu Deus, é isso! Por quem me
tomas? Acha que sou como as pessoas com quem convive, Christine? Que não
tem moral, não tem escrúpulos, que PAGAM para estar com você? – e lá estava
ele, me atacando novamente. – Nunca quebro minhas promessas, não vou leva-
lo. Por enquanto. Se você tentar me afastar dele ou prejudica-lo de alguma
forma, eu juro, Christine, que nunca mais o verá. Mas tem a minha palavra que
só quero estar com o meu filho. Não tenho intenção de tirá-lo da mãe. Ele já
sofreu demais.

Aquilo me magoou ainda mais. Nunca pensei que meu filho tivesse sofrido.
Ele sempre teve de tudo, apesar de uma família pouco convencional, não achei
que o estava prejudicando. Assenti, me dirigindo a minha penteadeira. Escrevi
num papel o endereço de Madame Toulouse e entreguei a Raoul.
- Por favor, vá busca-lo depois das 11:00. Ele tem aulas na parte da manhã.
Você pode almoçar com ele, passarem a tarde toda juntos, mas agora deixe-o
estudar.

- Não sou nenhum animal, Christine, posso perfeitamente deixa-lo estudar.


Vá cuidar de seus clientes.

Dizendo isso, ele se foi.

Eu estava emocionalmente exausta. Raoul me consumia, de todas as


maneiras. Porém, o dever me chamava, eu precisava trabalhar.

Quando o Visconde chegou, eu queria me esconder, mas pensei em Raoul,


fantasiei que era ele quem chegava e o levaria a minha cama. Não foi preciso
muito para conseguir meu alívio. O Visconde nunca chegaria aos pés de Raoul,
mas minha mente fértil fez o Duque estar em minha cama e fazendo tudo aquilo.
Embrenhei-me na fantasia com todas as minhas forças.

Raoul chegou e não pôde esperar. Ele agarrou meu pescoço e me beijou de
maneira apaixonada. Consegui me desvencilhar do beijo apenas para pegar sua
mão e leva-lo para a cama. Quando subíamos a escada, ele não aguentou, me
puxou novamente para um beijo e, me carregando no colo, finalmente chegamos
ao quarto. Ele abriu a porta com um chute e me jogou na cama. Eu gargalhei. Era
maravilhoso! Ele começou a se despir, sem tirar seu olhar do meu. Não havia
mais ódio, nem raiva, nem mágoa. Só amor e desejo. Quando ele estava
totalmente nu, sentou-se em uma cadeira e ordenou que eu me despisse. Eu me
levantei imediatamente e fiz o que ele mandou. Eu mal podia esperar para tocar
seu corpo. Quando estava completamente nua, ele mandou que eu me ajoelhasse
entre suas pernas.

- Já sabe o que fazer, não é?

Agarrei seu membro e chupei com vontade. Ah, não via a hora de mostra a
Raoul tudo o que havia aprendido como cortesã! Eu o mataria de prazer e ele
seria meu para sempre!

Quando ele não podia mais aguentar, agarrou meus ombros e me jogou
novamente na cama.

- Fique de quatro, quero ver esse traseiro lindo enquanto a possuo!

Eu virei, ansiosa. Já estava pronta, eu precisava dele!

Raoul agarrou meus cabelos e me penetrou de uma vez. Como era bom!

Com uma mão ele puxava meus cabelos, com a outra agarrava minha nádega
enquanto me penetrava.

- Você gosta disso, não gosta?

- Sim, muito!

Raoul continuou, puxando meu cabelo com ainda mais força, enquanto me
estocava, me fazendo perder o folego.

- Ah, meu Deus! Por favor, não pare!

Aquilo foi como jogar lenha na fogueira! Raoul continuava me atacando, sua
pélvis batendo com força contra minhas nádegas, meus cabelos puxados faziam
minha cabeça tombar totalmente para trás. Ele grunhia cada vez mais alto, até
que se apoiou em minhas costas e começou a me massagear.
- Quero me derramar dentro de você, enquanto você encontra seu alívio!
Vamos!

- Sim! Sim! Por favor, não posso mais segurar...

Ele intensificou o movimento de seus dedos e eu atingi o orgasmo de


maneira violenta! A força de meu alívio foi tão grande que não vi quando ele
gozou. Só me deitei na cama e ele deitou por cima de mim. Seu suor escorria
pelas minhas costas.

- Uau! Isso que é serviço bem feito!

Eu ainda estava entorpecida. E tentando voltar a respirar normalmente.

- Vou lhe dar um bônus por hoje, Christine! – o Visconde estava estupefato.
E eu sai de minha fantasia com o Duque devastada.

- Oh, obrigada... o Senhor Visconde é muito bom para mim. – A decepção


veio com a mesma força do orgasmo, mas consegui segurar as lágrimas.

Dissimulei durante toda a conversa até que o Visconde perguntou:

- Há algo de errado, Christine? Você não parece bem...


- Perdoe-me, Visconde, estou muito cansada. O Senhor estava impossível
hoje, talvez eu devesse pagá-lo pelo sexo esplendoroso!

Eu sabia que todo homem sentia-se mais macho ouvindo isso.


Principalmente se uma cortesã atingisse o orgasmo e, naquele dia, não tinha
como disfarçar. Era claro que meu orgasmo tinha sido intenso, ele sabia que
tinha me levado ao delírio.

- Bem, fico feliz em saber que vou para a Escócia a deixando nesse estado.
Gostaria de pensar que só eu tenho esse poder! – ele gargalhou.

- Ah, Visconde, só você tem! – Gargalhamos juntos.

Quando bati a porta de meu quarto, finalmente sozinha, olhei-me no espelho


e admiti para mim mesma:

- Esse poder só um homem tem.


Capítulo 10

Tomei um banho e saí, tinha que me apresentar ao Rei. Escolhi minha melhor
roupa íntima, coloquei um vestido violeta, com os brincos de diamante que ele
havia me dado em nosso último encontro. Olhei-me uma última vez no espelho e
parti, imaginando onde Raoul e Yago poderiam estar.

Quando cheguei no Palácio notei que algo estava errado, pois não fui
enviada diretamente ao quarto, mas a biblioteca que o Rei mantinha no mesmo
andar da sala do trono. O lacaio que me levou até lá não me era conhecido e,
embora eu tenha tentado explicar-lhe quem eu era, ele simplesmente me colocou
dentro do cômodo e saiu, batendo a porta sem uma só palavra. Alguns minutos
depois o Rei entrou. Fiz um reverência e com os olhos cerrados disse:

- Vossa Majestade, que prazer revê-lo! Imagino que queria sair um pouco da
rotina... – fui andando em direção a uma mesa, sentando-me nela com as pernas
abertas. O Rei me seguia com o olhar e percebi decepção e tristeza neles. – Algo
errado, Majestade?

- Christine, preciso conversar com você e preciso que seja honesta em tudo o
que disser nessa sala... tudo poderá e será usado contra você caso minta para o
Rei.

- Não estou entendendo...

- Em nosso último encontro, conversamos sobre as colônias americanas e


sobre quão lucrativo seria, dependendo de minhas escolhas...
- Sim, Majestade. Acredito que o Norte lhe traria mais lucros...

- Sim, eu me lembro. Lembro que, mais exatamente, falei que começaríamos


a colonização por Santo Domingo...

- Sim! Santo Domingo seria a Colônia mais lucrativa, de acordo com seus
planos...

- Não falei sobre isso com mais ninguém, Christine... – eu continuava


olhando para o Rei confusa. Aquela conversa não fazia o menor sentido. Fiz uma
nota mental para voltar a ler os jornais. A volta de Raoul estava mexendo com
minha cabeça e eu não fazia ideia do que ocorria com o resto do mundo. – Você
deve ter conversado sobre isso com mais alguém...

- Majestade, não sei o que está acontecendo, mas tudo o que conversamos
em seu leito fica lá! Nunca disse nada a ninguém...

- Nem mesmo a um amante? A um homem com quem se deitou e se


apaixonou? Um traidor, Christine?

Apesar de não fazer ideia sobre o que o Soberano estava falando, gelei. A
palavra traidor era muito forte e nunca era usada de maneira leviana.

- Vossa Majestade, por favor, continuo não entendendo. O que houve? Eu lhe
asseguro que não mencionei Santo Domingo ou qualquer uma das colônias a
ninguém! Jamais o trairia!
O Rei então foi até a porta e gritou:

- Tragam o traidor aqui!

Em poucos minutos meu medo se transformou em desespero. Os guardas


trouxeram um homem ensanguentado, ferido, torturado. Quando o “traidor”
levantou o rosto, vi dois lagos verdes em meio a muito sangue.

- Raoul! Ah, meu Deus! – Corri em sua direção e segurei seu rosto:

- O que fizeram com você? – O Rei me agarrou pelos cabelos e me lançou


para o outro lado da sala, me mantendo longe do Duque.

Raoul não disse uma palavra, mas seu olhar agora era de alerta.

- Vossa Majestade, eu garanto que não disse nada a esse homem!

- Silêncio! Quero ouvir a versão dele.

Os guardas levantaram Raoul e ele olhou para o Rei:

- Não conheço essa mulher, não sei quem ela é!


- Tem certeza? Ela é capaz de enfeitiçar qualquer homem, não duvido que
tenha enfeitiçado meu conselheiro e general! Como ela sabe seu nome?

- Não sei quem ela é, Majestade! Nunca mentiria para o Senhor. Eu não a
conheço. Obviamente ela deve saber o nome do Duque de Devon! – Meus olhos
se encheram de lágrimas. Raoul estava se sacrificando por mim. Sabia que
estava mentindo, não só por dizer que não me conhecia, mas porque nunca
conversamos sobre as colônias. Ele sequer sabia que eu atendia ao Rei!

- Devo então entender que agiu sozinho? Ouviu nossas conversas?

- Sim, eu temia por sua segurança e coloquei guardas para escutar suas
conversas com essa rameira. Quando soube suas intenções sobre as colônias vi a
oportunidade de ganhar muito dinheiro com o Soberano Francês com
informações praticamente inofensivas. Eu não traria prejuízo a Inglaterra, Vossa
Majestade só lucraria menos. E foi assim que a França tomou a dianteira e
colonizou Santo Domingo antes que Vossa Majestade pudesse fazer qualquer
coisa. – Então entendi tudo. Alguém havia vazado informações para a França e o
Rei queria culpados.

- Maldito! – Ele deu um tapa na cara de Raoul, o sangue espirrou nas


paredes. - Raoul, eu poderia acreditar em você. Mas ficou difícil depois de saber
que meus guardas o detiveram com uma criança. Essa criança foi criada desde a
tenra idade na casa de Madame Toulouse, não foi? – fiquei pálida como o
mármore e Raoul não disse uma só palavra.

- Fiquei curioso para saber por que você ficou tão preocupado com aquele
garoto e não foi difícil saber que ele era filho da prostituta! – o Rei falava como
se eu não estivesse lá.
- Estamos dividindo a mesma mulher e ela divide meus segredos com o
General de meu exército? Com o meu melhor conselheiro? Eu lhe dei um título,
Raoul, confiei em você!

- A criança não significa nada para mim, assim como a rameira! Não me
deitei com ela e não o faria, mesmo se ela não se deitasse com Vossa Majestade.
Eu não me deito com prostitutas. O único motivo para eu ter me preocupado foi
por se tratar de uma criança, maldição! Seus guardas atacaram o coche em que
estávamos e o jogaram no chão! – ofeguei, desesperada por mais informações
sobre Yago.

- Sim, e você partiu para cima dos guardas, ferindo gravemente um deles e
ameaçando o outro de morte! Aquele garoto significa muito para você! Ou a mãe
dele... afinal, o que você estava fazendo com aquele garoto?

- Vossa Majestade, por favor! – eu suplicava

- Cale-se! Vocês vão ser enforcados o mais breve possível!

- Não, por favor, tem que me ouvir! Ele não é o traidor! – finalmente
consegui a atenção do Rei. Ele virou-se e Raoul fechou os olhos.

- Como você sabe que ele não é o traidor? – O Rei espumava.

- Não... – Raoul suspirou


- Eu sei que ele não é o traidor... porque agi sozinha, eu repassei as
informações.

O rei suspirou e Raoul só balançava a cabeça de um lado para outro.

- Vai acreditar numa prostituta, Vossa Majestade? Obviamente ela busca


notoriedade! Acha que vai seduzi-lo e conseguir seu perdão, tornando-se a
famosa cortesã que foi perdoada pelo Rei!

- Se é isso que ela busca, só vai encontrar a forca. Prendam essa desgraçada!
O Duque deve ser preso e enforcado com ela!

Levaram-nos por um corredor que ficava cada vez mais escuro. Descemos
por uma longa escadaria até chegarmos a Masmorra. Jogaram Raoul em uma
cela, com as mãos ainda amarradas, e a mim em outra. Agarrei as barras que nos
separavam:

- Raoul, meu Deus, o que fizeram com você!

- Mulher tola! Agora vão enforca-la. Por que não ficou quieta? O que vou
fazer agora?

- Ah, Raoul, como isso foi acontecer?

- Não sei, mas o traidor ainda está livre. Fui acusado por alguém
injustamente. Não sabia nem que você atendia ao Rei! Meu amigo, dormindo
com você! Maldição!

Eu olhava para ele indignada. Estávamos prestes a morrer enforcados e ele


estava com ciúmes?

Um guarda se aproximou e levou Raoul. Antes de sair, ele me disse:

- Não fale com ninguém, não assuma nada!

- Mas Raoul...

- Inferno, Christine! Uma vez na vida, faça o que eu lhe peço! – Raoul gritou
antes de ser arrastado pelo guarda.

**********************************

Passei o que pareceu uma eternidade até que alguém aparecesse. O guarda
trazia uma caneca e um prato nas mãos.

- Por favor! Por favor, preciso falar com o Rei! – Eu suplicava, grudada às
barras da cela.

- Tire as mãos das grades! Vamos! Como se o Rei quisesse ouvir algo que sai
da boca de uma meretriz!
Eu recuei e ele abriu a porta da cela. Deixou o prato e a caneca no canto da
porta e a trancou novamente.

- Espero que goste de sua refeição – o guarda disse numa gargalhada.

Aquilo era uma lavagem, com água numa caneca tão suja que não se podia
beber.

Joguei a água nas mãos e lavei meu rosto. A comida ficou para os ratos que
dividiam a cela comigo.

A escuridão da masmorra me fez perder a noção do tempo. A falta de comida


também. Comecei a delirar, acreditando que um dos guardas era Yago, que já
estava crescido e voltava de Eton. Quando desmaiei duas vezes seguidas, o
guardas resolveram me trazer algo melhor para comer e forçaram goela abaixo.
Eu não podia morrer sem dar ao Rei o prazer de me enforcar. Eu não fazia ideia
de onde estava Raoul e toda vez que alguém aparecia para me interrogar, eu
ficava muda, como Raoul havia me pedido. Um dia, tiraram-me da cela e me
levaram para uma sala do outro lado da Masmorra. Algemaram minhas mãos em
correntes penduradas no teto e começaram a me interrogar. Continuei muda,
como prometi a Raoul e fui espancada e chicoteada. Depois de um tempo só
conseguia pensar em Yago e tudo tornou-se suportável. Não sentia mais o
chicote e estava tão entorpecida que cheguei a sorrir para um guarda antes que
ele me desse uma bofetada.

Os dias tornaram-se semanas. As semanas, meses. Todos os dias, recebia


minha dose de tortura e permanecia calada.

Numa das sessões, fui levada para a cela mais cedo que de costume. Não
tinha apanhado tanto e começava a aprender o padrão das agressões. Aquele dia
tinha sido diferente e, quando cheguei a cela, entendi o motivo. Raoul estava
descontrolado:
- Quem autorizou esse espancamento? Quem lhes disse que podiam
importunar a prisioneira? Se descobrir que fizeram isso de novo, estarão mortos
antes de ouvirem minha voz novamente.

Ele cuidou de meus ferimentos sem dizer uma palavra. Eu tinha os lábios e
os olhos inchados, o sangue corria livremente por um corte em meu supercílio.
Ele limpou meu rosto com cuidado, com um pano limpo. Sentia algumas
lágrimas suas caírem em minhas costas enquanto ele aplicava unguentos nas
chibatadas. Eu não tinha forças nem mesmo para chorar. Só consegui pronunciar
uma palavra:

- Yago...

- Ele está bem, não se preocupe. Eu vou tirá-la daqui! Eu prometo, Pequena!
Nosso filho está bem, só sente sua falta. Como pôde ser tão tola e se colocar
nessa situação, Christine? Por quê?

Eu sequer tinha forças para falar. Mas Raoul continuou:

-Lembra-se do dia em que nos conhecemos? Meu Deus, você sempre foi
linda! Eu me apaixonei imediatamente. Você tropeçou e caiu. Senti como se
proteger-te fosse a razão da minha vida. Eu te queria como nunca quis
ninguém...

E com isso, desmaiei, prometendo a mim mesma que não me entregaria, que
veria meu filho novamente e que Raoul estaria salvo. Nem os hematomas,
cortes, marcas em meu corpo fariam com que eu pusesse a vida de Yago e Raoul
em risco.
Meu estado era tão lastimável que não me dei conta de que Raoul proibira os
guardas de me torturarem novamente. Quando acordei alguns dias depois e vi
meus ferimentos, percebi que ele estivera ali enquanto eu dormia, pois não
estavam infeccionados. Eu conseguia ouvi-lo ao longe, falando comigo, mas não
tinha forças para nada. Mas ouvir sua voz já era um bálsamo. Senti um alívio
muito grande. Ele estava salvo. Claro que um Duque jamais seria condenado
junto com uma cortesã. Eu morreria sozinha e feliz por ter salvado o único
homem que amei da forca. Ele seria um pai maravilhoso para Yago, o
compensaria pelos 10 anos ausente, ainda que a culpa não fosse dele.

A única coisa que acontecia na minha vida naquele tempo eram períodos de
delírio e dor. Apesar de não me espancarem mais, as feridas já tinham sido
feitas, o estrago fora grande. Sonhava com Astoria, quando eu e Raoul corríamos
na praia, brincando como duas crianças. Como nos amávamos, como sorríamos e
como sentíamos a leveza da vida passar por nós. Foram tempos maravilhosos e
sempre os levaria comigo. Delirava acreditando estar de volta a Astoria, com
Raoul e Yago, e fazíamos as mesmas coisas, na companhia de nosso filho. A
fome já não me incomodava, ao contrário: fazia com que eu delirasse ainda mais
e esses eram os melhores momentos, quando a realidade estava tão distante que
eu sequer sentia dor. Eu conseguia visualizar o lugar onde nasci, meu tio, meus
pais, todos estavam lá comigo, Raoul e Yago. Não sabia mais diferenciar a
realidade do delírio, do sonho e não me importava mais. Tudo o que eu queria
era que Raoul fosse salvo daquela armação. Eu morreria feliz, sabendo que um
homem inocente não fora para a forca, mesmo que eu também não tivesse feito
nada de errado. Só esperava que tudo acabasse logo e que Raoul pudesse seguir
sua vida, dando dignidade ao nosso filho.

Finalmente, o dia de meu julgamento chegou. Madame Toulouse conseguiu


entrar na Masmorra com Raoul antes do julgamento. Ela trazia um vestido e
frutas. Eu não conseguia tirar meus olhos dele. Com sua farda de General, a
barba feita, ele era lindo. Eu me apaixonava por ele novamente toda vez que o
via. Consegui sorrir, embora nenhuma palavra tenha saído de minha boca.

- Oh, minha menina! – ela chorava e tocava minha face. – Oh, Vossa Graça,
temos que salvá-la!
- Dou minha palavra, Madame, Christine vai para casa ainda hoje. Ainda
hoje ela dormirá em sua cama. – Seu olhar tinha confiança e amor.

Eu estava tão magra que o vestido ficou enorme. Arrastava no chão, junto
com as correntes que me prendiam. O peso delas fazia com que eu me arrastasse.
Eu era um espectro do que fora um dia. Meus cabelos estavam imundos e não
tinham mais o brilho. As marcas por meu corpo colocavam dúvidas sobre onde
doía mais. Era tudo tão surreal que eu nem mesmo conseguia mais me lembrar
de como minha vida era antes da prisão. Queria somente que tudo acabasse e que
deixassem Raoul e nosso filho em paz. Eles seguiriam sem a mancha de uma
cortesã na vida deles. Com o tempo eu seria esquecida até mesmo por eles e eles
conseguiriam ter uma vida normal. A ideia de ser enforcada já não era mais tão
assustadora.

Madame Toulouse penteou meu cabelo e limpou meu rosto, para que eu
ficasse mais apresentável.

Os guardas vieram e fui levada para a sala onde aconteceria o julgamento.


Estava lotada, com todos da nobreza e aristocracia, todos os meus clientes
estavam lá. Eu podia ver em seus olhos tristeza, mas também medo. Suas vidas
poderiam ser expostas ali. Gostaria de poder dizer-lhes que jamais trairia a
confiança deles, mas apenas sorri para o nada. Se a vida de Raoul dependesse
disso, apontaria para cada um deles, olhando em seus olhos.

Fitei uma última vez Raoul e Madame Toulouse e fiz uma oração para que
tudo acabasse rapidamente.
Capítulo 11

O julgamento começou.
O Rei pediu que eu me aproximasse e que narrasse os acontecimentos:

- Vossa Majestade, não posso lhe dizer o que aconteceu. Eu juro que não sei
quem foi o traidor. O que posso lhe dizer com toda certeza é que o Duque nada
tem a ver com isso. Ele é um homem bom, honesto e jamais trairia sua
confiança. Sou culpada por hoje ele estar sob os olhares de todos e por
acreditarem que ele pode tê-lo traído, pois o amo. – todos os presentes ficaram
estupefatos. – Mas acredite, conheço o Duque de Devon, melhor do que muitos
aqui, e posso afirmar que ele é um homem íntegro e nunca trairia sua coroa em
troca de dinheiro ou o que quer que possam ter oferecido. Sou culpada por amá-
lo tanto que não pensei duas vezes em colocar-me em seu lugar para ir para a
forca, pois vocês enforcariam um inocente. Sou culpada por não ter tido muitas
escolhas em minha vida e acabar como uma cortesã que serve a muitos dos
homens aqui presentes. Sou culpada por permitir que terceiros decidissem sobre
minha vida e não ter lutado pelo amor que senti desde a primeira vez que vi o
Duque de Devon, há 10 anos atrás. Sou culpada por não ter coragem nem
maturidade para viver ao seu lado, por talvez não tê-lo amado como ele merecia.
Sou culpada por ter acreditado em mentiras ao invés de confiar no amor que
sempre senti por ele. Sou culpada por deseja-lo mais do que a própria vida, por
sonhar em ter suas mãos me tocando novamente. Sou culpada por sonhar com
seus beijos, com seu toque, com seu amor. Sou culpada por ter esperança de um
dia ainda ser feliz ao lado dele, pois eu só seria realmente feliz assim. Por tudo
isso, sou culpada. Mas não por trair a coroa. Nem eu, nem Raoul. Não tenho
mais medo. Sei que posso ser enforcada injustamente. Mas seria mais injusto
enforcar um homem tão inocente quanto ele. Eu não sou nada, Vossa Majestade.
Só uma mulher que se deitou com homens para poder sobreviver, para dar uma
vida melhor a meu filho. O Duque de Devon é muito importante para a coroa.
Graças a ele, nosso reino prospera. Graças a ele, eu vivo. Raoul, eu amei você
desde o primeiro dia e vou te amar para sempre! Se tenho algum
arrependimento, é o de não poder tê-lo em meus braços novamente, de não poder
tocá-lo, de não poder estar ao seu lado, sentindo seu calor, seu corpo, sua
respiração e seu toque. Eu só me arrependo de não ter enfrentado o mundo para
poder estar com você! – Raoul me olhava desesperado. Ele queria acabar logo
com aquilo e queria que tudo saísse como planejado. Evitava olhar para mim
para não causar ainda mais estrago, mas quando me ouviu, pude contemplar seus
olhos se encherem de lágrimas e seu sorriso.

Todos os presentes cochichavam, mas ninguém se atreveu a me defender ou


a contradizer o que testemunhei.

Eu precisava expurgar meus demônios, precisar fazer Raoul entender que


todos os erros que cometi foram consequência de minha imaturidade, de medo,
de tê-lo amado tanto que não tinha mais razão para viver quando ele se foi. Eu
precisava mostrar a ele que nada poderia ser pior do que passar o resto da minha
vida sem ele. Eu preferia morrer a viver assim. Eu precisava ir em paz, que ele
tivesse a certeza de que sempre foi amado e que nunca ninguém me teve de
corpo e alma, só ele. Eu precisava confessar tudo o que guardei por 10 anos.

Deram a palavra a Raoul que, aproximando-se do Rei, dizia para que todos
ouvissem:

- Vossa Majestade, fomos todos enganados por uma pessoa que fez tudo isso
por não conseguir ter as coisas que Christine teve. Uma pessoa que não poderia
sequer chegar aos pés de Christine e, por pura inveja, ciúme e maldade, pôs em
andamento um plano para derrubá-la, sem pensar nas consequências de seus
atos. Peço sua misericórdia para trazer uma testemunha importante no caso.
Assim como essa testemunha vai provar que o voto de confiança dado a mim
para desvendar o mistério foi merecido, também trará a verdade sobre a mulher
que amei por toda a minha vida e a inocentará! – Houve uma grande comoção
depois de Raoul confessar que amava uma prostituta condenada. Ele mostrava
orgulho do que tinha dito e desafiava com o olhar a todos que estavam presentes.
- Silêncio! Vossa Graça pode chamar sua testemunha – disse o Rei,
aguardando que Raoul continuasse.

- Chamo então Nikolai Rosengerb! – Não podia acreditar no que estava


ouvindo! Nikolai voltara para me salvar?

O Príncipe dos Ciganos entrou no recinto com sua altivez e beleza. Todos
suspiraram e o Rei permaneceu impassível.

- Vossa Graça está brincando? Espera que eu ouça o que um Cigano tem a
dizer?

- Não somente um cigano, Majestade, mas o Príncipe deles, muito respeitado


por sua liderança e complacência. Ele é a testemunha chave e devo dar todo o
crédito a nossas descobertas a ele, visto que foi ele quem descobriu quem estava
passando informações ao Monarca francês, além de trazer aqui a este julgamento
quem realmente devia estar sendo julgada! – o burburinho continuou.

- Silêncio! Vou permitir este Circo, Vossa Graça, por conhece-lo e saber de
sua idoneidade. Mas fique claro que não vou simplesmente acreditar na palavra
de um cigano só porque acreditou. Se ele trouxe o culpado, que o apresente, caso
contrário, todos irão para a forca junto com a Meretriz.

Nikolai ignorou o que o Monarca havia dito de seu povo e se posicionou ao


lado de Raoul.

- Por favor, Senhor Nikolai, queira nos contar o que descobriu.


- Estava na Escócia quando uma grande amiga enviou-me uma carta
contando tudo o que se passava aqui. Com minha protegida presa, prestes a ser
enforcada, não tive escolha, a não ser voltar para a Inglaterra e iniciar a busca
dos verdadeiros culpados.

- E o que descobriu, Senhor? – Raoul estava ansioso.

- Depois de interrogar muitas pessoas, descobri que uma mulher do passado


de Christine estava mais próxima do que imaginavam, vigiando todos os seus
passos. Ela fora casada com um barão falido e foi para a França numa tentativa
de recuperar seus bens. Como não funcionou, ela conseguir trabalho no Palácio
para que tivesse acesso as informações. Ouvia conversas atrás das portas,
seduziu lacaios e teve a oportunidade perfeita quando ouviu o Rei contando
sobre as Colônias Americanas a cortesã da qual ela invejava. Encontrou a
oportunidade perfeita para prejudica-la e, ainda, ao Duque que amava. – Raoul
arregalou os olhos para Nikolai – Sim, a mulher queria o Duque para si. Por isso
armou esse plano ardiloso, para se livrar de sua rival e para punir o homem que
não a quis.

Falando isso, Nikolai pediu que trouxessem a mulher. O falatório aumentou a


medida que a mulher se aproximava. Com minha altura e todo o tumulto, não
conseguia ver quem era a culpada, meu coração ribombava no peito e eu sentia o
suor correr em minhas costas. Ela andava de maneira altiva e arrogante entre
todos e seu queixo estava erguido.

Quando ela se aproximou, eu e o Rei ficamos pálidos. Foi o Rei o primeiro a


se pronunciar:

- Justine, o que você fez? – ela somente sorriu.

- Vossa Majestade, o verdadeiro nome dela é Sabrina. Ela vai lhes contar
tudo – disse Raoul, que não se dignou a olhar para ela, tamanho seu ódio.

- Ela se infiltrou em meu Palácio para se vingar de sua paixão adolescente?


Como você nunca soube disso, Raoul?

- Infelizmente, Vossa Majestade, Sabrina é ardilosa, como o Senhor Nikolai


tão sabiamente apontou. Nunca nos encontramos nos corredores do Palácio e ela
manteve sua presença e seu nome no anonimato. Em uma de nossas reuniões, lhe
expliquei a necessidade de criar uma guarda que fizesse também a contratação,
averiguação e checagem de todos os seus empregados, mas Vossa Majestade
achou que eu estava sendo exagerado. Aí está a prova de que precaução nunca é
demais. – O Rei engasgou com a reprimenda velada de Raoul, mas continuou:

- Mulher maldita, o que podes dizer aqui? És realmente culpada?

- Culpada? Culpada por quê? Por estar cercada por homens patéticos, que
não conseguem segurar as calças? – O público se exaltou novamente. Raoul
prosseguiu. Ele salivava, queria a cabeça dela numa bandeja.

- A Senhora deve se dirigir ao Rei como Sua Majestade! Ele fez por merecer!

- Ah, fez, Raoul? Tudo o que ele sabe fazer é trepar e trazer joias caríssimas
para essa vagabunda! Quem se preocupa com o Reino? “Vossa Majestade”? Não
me faça rir!

- E você vai se dirigir a mim como “Vossa Graça”. Eu sei que fiz por
merecer! O que acha de nosso reino ou da dama que foi acusada injustamente
não me interessa! Quero que conte tudo o que fez para chegar até aqui. Todos
estão ansiosos para saber qual o seu objetivo. Sei que eu estou.

- Dama? Pois bem, “Vossa Graça” - ela respondeu com ironia – Vamos lá,
por onde eu começo? Ah, já sei, vamos falar da vagabunda! – Raoul deu um
passo em direção a Sabrina, mas Nikolai o segurou, balançando a cabeça.

- A vagabundinha nunca sequer havia beijado um homem. Se fazia de pura e


santa, mas na primeira oportunidade, deitou com o único homem por quem me
apaixonei! Eu era a beldade da cidade, deveria casar com o próprio Rei, apesar
de acha-lo bem sem graça – o Rei começou seu protesto, mas ela o ignorou e
continuou – eu sempre tive comportamentos impecáveis, era desejada por todos,
um exemplo de comportamento adequado e decoro. Mas não tinha um maldito
título, não era nobre. Sofria por ter todos os meus desejos e anseios guardados só
para mim! Eu queria ter a vida que sempre sonhei, viver em Londres, ter muito
dinheiro, ser invejada por todas as mulheres! Quando finalmente apareceu
alguém que me fez abrir mão de todas as conquistas que eu poderia atingir com
alguém da nobreza, ela o enfeitiçou! Sim, ela nunca tinha falado sobre homens
ou qualquer coisa do gênero. Era insignificante. Não tinha modos, era uma
selvagem! Só sabia ler livros, seu tio, que Deus o tenha, a criou como um
homem! Ele acreditava que ela deveria saber pensar! Como uma mulher poderia
ser tão idiota a ponto de pensar que isso seria possível? Achou que encontraria
um nobre que a amasse por ser inteligente? Pois foi só o “Duque” aparecer e ela
nos perguntava sobre sexo e vivia grudada a ele! Mencionei que ele nem sequer
era nobre? Ainda assim estavam disposta a abrir mão de encontrar um marido
com título para ficar com ele! Mas saibam que o famigerado Duque de Devon
ganhou seu título, por lamber as bolas do Rei!

- Senhora, está pisando em terreno arenoso aqui! É de conhecimento geral


que o Duque de Devon recebeu seu título em agradecimento por seus serviços
pela coroa. Está falando de um General condecorado, portanto deve medir suas
palavras antes que seja condenada a forca por outro crime! Perceba também que
eu nem entrei no mérito de ter se referido a “minhas bolas”, ou me achar sem
graça. Esse tipo de opinião você pode guardar para si. Curiosamente, mesmo
sendo sem graça, já tive a Senhora em minha cama e tive a mesma opinião a seu
respeito! – o Rei a preveniu, tirando risos de todos os presentes. Apesar da piada,
ele tinha o olhar sério e compenetrado. Sabrina espumava, estava sendo
interrogada, corria o risco de ir para a forca e ainda foi ridicularizada pelo Rei.
Raoul nem piscava, não se importava se ela o chamasse de bobo da corte, desde
que ela confessasse seus crimes.

- Ha ha ha, devo tomar cuidado com o que falo, caso contrário, vou para a
forca. Se não falo, vou para a forca também. Você são patéticos, fracos e só
pensam em estar no meio das pernas dessa mulher! Achou que fui sem graça,
Majestade? Talvez se houvesse fogo em suas calças meu desempenho fosse
melhor! Enfim, não importa. Continuando, o Duque foi trabalhar nas docas de
nossa cidade e ela imediatamente se jogou para cima dele como uma cobra dá o
bote em um rato! E o idiota caiu como um patinho! Eu tentava conversar com
ele, mas era como falar com um doente mental! Ele só sabia falar dela, só queria
saber da vida dela, coisas sobre ela. Na noite em que finalmente conseguiu beijá-
la, acreditam que ele me disse que ia pedi-la em casamento? – Fiquei pálida e
olhei para Raoul. Ele fitava o chão, como se lembrando de tudo o que ela dizia.
Não estava triste ou envergonhado. Parecia resignado com o que ouvia. Ela
continuou:

- Quando ela me contou que se encontravam numa gruta, não foi difícil
segui-los para descobrir o que faziam lá. Na noite em que ela abriu as pernas
para ele, assisti a tudo! Devia ser eu! Eu deveria estar lá, eu deveria ter sido
deflorada! Mas o idiota só queria ela! Cheguei a propor que tivesse as duas!
Sabem o que ele me disse? Que só tinha uma mulher para ele e eu não era essa
mulher! Um tolo! Tinha que ser implacável, então contei para a tia da meretriz o
que ela andava fazendo quando sumia com o Duque! Fui tão perfeita que,
enquanto contava tudo para a tia ambiciosa, ela apareceu, com cara de tola, pois
tinha acabado de ser penetrada por ele! O cheiro dele ainda estava nela! Eu
queria matá-la, mas deixei que sua tia se encarregasse de acabar com sua vida!
Mas a tia era tão imprestável quanto ela e tentou manda-la para um convento. A
tia era tão incompetente como todos os que tive que subornar, seduzir e me
deitar para chegar a nobreza! No fim, ela acabou fugindo. Não pude acreditar em
minha sorte! Ela morreria de fome ou de frio e eu teria o Duque! Até que esse
animalzinho a encontrou e cuidou dela! – Nikolai riu irônico. – enquanto bolava
um plano para destruí-la, casei-me com um Barão imprestável, armei toda a
coisa para que minha honra fosse manchada e ele fosse obrigado a casar comigo,
mas o imbecil estava falido e eu precisava me livrar dele, já tinha conseguido o
título. Então inventei a história de ir para França. Sabia que o Duque estava lá e
poderia me reaproximar, além de tentar conseguir algum dinheiro para salvar o
baronato do imprestável do meu marido! Ele foi até a França atrás dela! Ele
revirou o país inteiro atrás da meretriz enquanto ela se deitava com todo mundo!
Enquanto o ciganinho a tratava como rainha! E ela ainda teve um filho! O
diabinho é a cara do pai! Quando o cigano resolveu ir para Grécia, vi minha
nova oportunidade: ou ela morria ou eu morreria tentando. Parti da França com o
dinheiro que consegui e sem o Duque. Meu orgulho já estava ferido, mas eu não
ia deixar de me vingar. Fiquei surpresa quando descobri que ela não tinha ido
para a Grécia com o Cigano e resolvi voltar para Londres e me reaproximei do
Duque. Anos se passaram até ele voltar da guerra e eu conseguir voltar ao
convívio dele. Sabia que tinha que ser paciente, que deveria consolá-lo enquanto
me aproximava cada vez mais e tentaria seduzi-lo aos poucos, até que essa
mulherzinha fosse apenas uma lembrança distante na cabeça dele. Estava indo
tudo bem, o Barão havia morrido e me deixado cheia de dívidas que acabei
pagando parte delas com o dinheiro que consegui na França, despistando o
restante dos credores. O Duque não falava mais nela, ainda via tristeza em seus
olhos, mas comecei a ter esperanças no dia em que ele seria meu. Mas quando
ele me beijou e me chamou de Christine... – Eu olhei para Raoul, não acreditava
que ele a tinha beijado. Ele continuava a olhar para o chão. Fiquei enfurecida!
Ela seguiu com sua história:

- O desgraçado me beijou e me chamou de Christine! Ele me beijava...


pensando nessa vagabunda! Todos temos limites. Aquilo foi a gota d´água! Mas
eu não desistia tão fácil Devia ficar perto dela, poderia conquistar o Duque
depois. Levou algum tempo para descobrir onde a maldita estava, tive que
subornar muita gente para descobrir. Mas a cafetina morava numa fortaleza e
meu plano, que era sequestrar o menino não saiu do papel.

- Sua maldita! – eu esbravejava, tentando me livrar dos grilhões para ataca-


la. - Se alguma coisa acontecesse com Yago eu...
- Silêncio! Cale-se, você ainda está sendo julgada! – o Rei vociferou. Eu
estava cega, mas Raoul passou discretamente por mim, tocando em meu ombro,
e me pediu que ficasse quieta, Yago estava seguro.

- Se algo acontecesse com o diabinho? Você nem o criou, deixou-o na mão


de uma cafetina. Você abandonou seu homem, seu filho e ele ainda a quer! Eu
daria tudo para ele! Tudo! Mas esse idiota não me quis, apesar de virar um
libertino! Todos os dias havia uma mulher diferente em sua cama, mas ele não
me queria! Poderíamos ter sido amantes! Nem isso ele quis! As mulheres
falavam de como ele era insaciável, de como era bom de cama e eu sonhava
quando seria minha vez! Mas ele acabou reencontrando esta ordinária e voltou a
ser o idiota de 10 anos atrás! Todas as mulheres a odiavam, pois o Duque só
queria ela! Ele dispensou toda e qualquer mulher que o procurou depois de tê-la
reencontrado! Resolvi me infiltrar no Palácio e dar minha cartada final. Não
tinha mais truques na manga e sabia que era só uma questão de tempo ele
descobrir o bastardo e querê-lo para si! Tinha que conseguir fazer a informação
do filho chegar aos ouvidos dele. Consegui o emprego de camareira real. Por
mais que possa parecer difícil, foi muito fácil passar despercebida pelo Duque.
Ele sequer olhava para outras mulheres! Depois de tê-la reencontrado, era como
se ele tivesse virado um padre. O libertino, lascivo, insaciável, que se deitava
com todas as mulheres da corte não queria mais ninguém! Não havia uma
mulher que não havia sucumbido aos seus encantos, na Inglaterra ou na França e
ele não queria mais ninguém! Poderia ter todas! Mas escolheu a prostituta! E o
mais engraçado disso tudo é que ela cobrou! E caro! Ele a teve de graça há 10
anos! Poderia ter qualquer mulher agora e pagou por ela! – Raoul a encarava
enfurecido, mas permaneceu quieto.

- Quando o Rei se interessou por mim, foi só a cereja do bolo! Deitei-me


com ele e consegui recuperar todo o dinheiro que o idiota do meu marido havia
perdido! Apesar de ser horrível, valeu a pena recuperar o dinheiro com os
presentes que o tolo me dava. Porém, minha alegria durou pouco, pois o Rei
também preferiu a meretriz! Ele podia se deitar comigo, mas preferia pagá-la!

- Achei que fosse um sinal divino ter descoberto a passagem secreta que
dava no quarto do Rei. Era uma tortura ter que ficar ouvindo seus gemidos
fingidos enquanto o Monarca montava nela, mas descobri que ela era sua
confidente também! Não demorou muito para ouvir informações valiosíssimas e
foi então que arquitetei o plano para incriminar os dois pombinhos e ficar rica!
Abandonei o plano de fazer o Duque descobrir o bastardo e comecei a passar as
informações para o francês. Depois que estivesse rica e fora de Londres, faria
com que ele descobrisse e minha vingança estaria completa. Ele nunca a
perdoaria por esconder o bastardo e eu estaria rica, esperando que ele finalmente
ficaria comigo. Mas ela contou tudo a ele e ele aceitou! A perdoou e continuou
frequentando sua casa! Tive que me contentar com a acusação de traição que
recaiu sobre os dois! Nunca me senti tão feliz quando soube da surra que o
Duque levou na prisão e de como se desesperou quando a idiota se incriminou
para livrá-lo! Recebi muito dinheiro e fui para a Escócia para aproveitar minha
fortuna. Só não contava que encontraria com o Ciganinho. Ele ficou bem
quietinho quando me descobriu morando em um castelo na Escócia, mas tem
muitos amigos influentes, o Ciganinho. Quando voltou e me trouxe arrastada de
volta, sabia que alguma coisa estava errada. A grande fortuna que ganhei do
Monarca francês se esvaiu mais rápido o que pensei, pois o Ciganinho disse ao
restante dos credores de meu marido onde eu estava. Maldito! Estava novamente
falida, não tinha mais marido, não consegui conquistar o Duque e a vagabunda
estava como queria, com o filho, todos os homens a seus pés e o Duque de volta.
Como podem ver, não tenho nada a perder. Então, por que não expor a vida
devassa do Duque, do Rei e, de quebra, desmoralizar todos os homens desta
corte para que essa vagabunda não tenha mais clientes? Vocês me dão nojo! Se
deixam levar pela luxúria e se deitam com qualquer uma. Mas não são capazes
de valorizar uma mulher decente que os ame!

O falatório começou novamente e Sabrina tentava gritar por cima das vozes,
mas já não era mais ouvida.

- Ordem! Silêncio, todos vocês! – O Rei esbravejou e todos se calaram, com


exceção de Sabrina.

- Cale-se, mulher! Você será enforcada no raiar do dia de amanhã, por crimes
e ofensas contra a coroa e por injúria a um nobre! Guardas, levem-na!

Os guardas se aproximaram de Sabrina, prendendo seus braços a grilhões.


Ela continuava a gritar, mas ninguém mais a ouvia, o escândalo já estava
instalado.

- Christine, você é livre para ir.

Mais guardas apareceram e me tiraram os grilhões. Meus pulsos ardiam e


não consegui me mover, pois o tumulto se instalou na sala do julgamento e
Raoul não conseguiu se aproximar de mim. Ele gritava, mas Nikolai me puxou
por uma porta lateral e corremos em direção a uma carruagem que nos
aguardava. Quando entrei na carruagem, pulei em seu pescoço e chorei.

- Você voltou! Você veio me salvar!

- Eu disse que você podia contar comigo, “Prama”. Para qualquer coisa.

- Quando você chegou? Como Raoul o descobriu?

- Quando vocês foram presos, Raoul solicitou uma reunião ao Rei. Por todo
o seu trabalho como General, os guardas levaram sua mensagem ao Rei, que lhe
concedeu a reunião. Obviamente o Monarca relutava em acusar um servo tão
leal. Não foi a toa que Raoul recebeu o título e tornou-se General. Disse que
tinha uma história para contar e que o Rei deveria dizer como a história acabaria:
se os dois amantes morreriam ou viveriam felizes para sempre. Contou toda a
história de vocês ao Rei, sem esconder sequer um detalhe. Professou seu amor
por você e pediu que ele lhe desse um voto de confiança e permitisse que ele
investigasse o caso. Jurou que, se não encontrasse o culpado, o Monarca poderia
mata-lo pessoalmente e o Rei aceitou. Ele então procurou a única pessoa que
poderia ajudá-lo...

- Você! – segurei suas mãos, sorrindo.

- Gostaria de pensar que fui a primeira opção, “Prama”. Mas não foi ele
quem me procurou. – Olhei para Nikolai confusa. Estava fraca, os dias na prisão
não me permitiam raciocinar direito. Não consegui matar a charada.

- “Jag” me enviou uma carta me suplicando para que eu o ajudasse. Se


tivessem me contado a história desde o começo, teria vindo antes, “Prama”.
Perdi muito tempo da investigação por não saber detalhes da história. Por favor,
me perdoe! Quase não chego a tempo! O Duque nunca me perdoaria. E eu
também não.

- Oh, meu Deus! Madame Toulouse! Como ela está? Preciso vê-la! Preciso
ver Yago, preciso ter certeza de que ele está bem!

- Acalme-se, “Prama”. Yago está com ela, estão lhe aguardando em sua casa!

Finalmente pude relaxar. As lágrimas vieram com força descomunal. Toda a


dor, todo o sofrimento havia acabado. Mas um fato ainda me machucava. Raoul
não só tinha beijado Sabrina, como tinha se tornado um libertino. Depois de me
acusar por ter me deitado com tantos homens, saber que ele tinha deitado com
todas as mulheres disponíveis na Inglaterra e na França me magoou. Ele tinha se
tornado um falso moralista e usado meu trabalho para me desmerecer. Chorei
tanto que acabei dormindo, exausta, no colo de Nikolai.
Quando finalmente cheguei em casa, Madame Toulouse e Yago me
esperavam na porta. Yago correu em minha direção, mas Nikolai foi mais rápido
e o agarrou:

- Cuidado mocinho! “Prama” está muito machucada, muito fraca e muito


cansada! Você é o homem da casa, deve cuidar dela!

- Sim, Papa, vou cuidar. – eu me agarrava a Nikolai e Yago e chorava


descontroladamente, até que minhas pernas falharam e Madame Toulouse veio
ao meu encontro e entramos os 4 ao mesmo tempo. Acabei desmaiando no sofá.
Quando acordei, estava em minha cama, com Yago dormindo a meu lado,
Nikolai cochilando em uma cadeira e Madame Toulouse entrou alguns minutos
depois, com uma bandeja cheia de guloseimas e chá.

- Minha menina está fraca, precisa se alimentar. Está tão magra, minha
menina! – Ela sentou-se ao meu lado na cama e começou a servir o chá. – Coma,
meu amor, precisa ficar forte! – seus olhos mostravam toda sua preocupação. Ela
cuidou de mim como uma verdadeira mãe. Ela sempre cuidou de mim. Madame
Toulouse era a personificação da bondade, sua benevolência não conhecia
limites. Toquei sua mão, com a voz embargada.

- Madame, nunca agradeci por tudo o que fez. Jamais serei capaz de retribuir
seu amor e o de Nikolai.

- Minha menina, você já retribuiu! Eu já lhe disse que você é a filha que
sempre sonhei. Yago... – seus olhos se encheram de lágrimas, sua voz, embargou
– ouvi-lo me chamando de vovó é a coisa mais maravilhosa que já senti em
minha vida!
- Vejo que as coisas voltaram a ser como eram. Já posso partir tranquilo. –
Nós duas olhamos para Nikolai, que se espreguiçava como um animal selvagem.

- Ah, Príncipe dos Gatos! É sempre uma tristeza vê-lo partir. Preferiria vê-lo
nu em minha cama novamente! – Madame Toulouse era uma devassa quando se
tratava de Nikolai.

- Madame! Há crianças no recinto! Espere! Você e Nikolai?

- Ah, minha criança, quem resiste a esse homem encantador? Ou você acha
que ele me pagou? – Sorri. Entendia perfeitamente o que ela queria dizer.

Nikolai deu seu sorriso mais sedutor, beijou a minha mão e se despediu :

- É sempre um prazer estar em sua companhia, “Prama”. Não se esqueça:


sempre que precisar, estarei aqui. Não importa o quê. “Jag”, sempre ao seu
dispor, você sempre pode tudo.

Beijei sua mão e agradeci ao Príncipe dos Ciganos por ser o homem mais
íntegro, sábio e sedutor que conheci! Da mesma forma que ele chegou, partiu.
Capítulo 12

Alguns dias depois, recebi a visita de Raoul. Ele chegou com flores e sentou-se
na cadeira ao lado de minha cama. Eu não sabia dizer se estava feliz ou não com
sua visita. Além da mágoa sobre tudo o que foi revelado no julgamento, ainda
não entendia porque ele demorou tanto para vir. Já estava em casa há dias e ele
não apareceu.

- Como se sente? – disse, beijando minha mão.

- Estou me recuperando.

- Imagino que esteja com raiva de mim.

- Não saberia dizer se é raiva. Talvez mágoa. Ultimamente não sei dizer o
que sinto. Tudo o que aconteceu me deixou entorpecida. Parece que minha vida
de antes nunca existiu. Sou outra pessoa agora.

- Faria alguma diferença se eu tivesse lhe contado? – vi súplica em seus


olhos.

- Não sei. O problema não foi saber que você beijou Sabrina e tornou-se um
libertino. O problema foi ser julgada por ter me tornado uma cortesã. Você me
disse que não se deitava com prostitutas, mas acabou se deitando com qualquer
uma.

- Sim. Deite-me com qualquer uma e não foram poucas. Sim, tornei-me um
libertino e praticamente fui expulso da França quando levei a mulher de um
Conde e de um Marques, as duas juntas, para minha cama. Era um devasso, não
tinha pudores e não me preocupava com as mulheres que estavam em minha
cama. Para mim, elas eram apenas um pedaço de carne, descartável. Eu dormia
com elas e depois sumia. Nunca me deitei com a mesma mulher duas vezes.
Nunca as chamava pelo nome, sempre pensava no seu. Eu tinha um desejo
ardendo dentro de mim e não podia aliviá-lo, você não estava lá para me trazer
paz. Eu buscava aquilo que não tinha em todas as mulheres, Pequena. E, quando
não encontrava, descartava a todas como um chapéu velho. Eu não conseguia me
desligar de você, não conseguia esquecê-la. Eu sinto muito. Sinto por você e por
elas. Tornei-me um monstro e perdi a mulher da minha vida por acreditar
naquela maldita. Eu não sei o que posso lhe dizer, senão que sinto muito.

- Eu também, Vossa Graça. Eu também.

Lágrimas rolavam de meus olhos e o Duque se aproximou, enxugando-as.

- O que vamos fazer? – seus olhos eram uma súplica. Ele queria que eu
decidisse nosso futuro?

- Eu não posso lhe dar essa resposta, Vossa Graça. Eu preciso me recompor,
para poder pensar claramente. Gostaria de dizer que não me importo com o seu
passado, há algum tempo atrás isso seria verdade, mas depois de ter sido tão
julgada, se dissesse que não me importo com o seu passado estaria mentindo.
Você foi tão implacável com o meu...
- E você aceitou minhas críticas e julgamentos com graça e nunca me
machucou de volta. Uma pessoa muito sábia me disse que eu não devia
machucá-la só porque fui machucado. Devia tê-la ouvido. – ele levantou-se,
beijou minha mão e foi embora.

****************************************

Dias se passaram até que eu conseguisse sair da cama. Eu estava recuperada


fisicamente, mas emocionalmente em frangalhos. Sentia a falta do Duque, o
evitava todos os dias, quando ele passava para ficar com Yago. Mas precisava
resolver todas as questões que me assombravam.

Eu precisava esquecer tudo. Não podia permitir que o passado atrapalhasse


meu futuro. Mas o fato de Raoul ter me julgado foi pior do que saber o que ele
fazia enquanto eu tentava ganhar meu sustento. Não me importava com quantas
mulheres ele tinha se deitado, desde que ele também não se importasse, o que
não era o caso. Para Raoul importava e muito. Doía muito ouvir Madame
Toulouse mentir todo dia, dizendo que eu estava dormindo, pois ainda não estava
bem. Eu o estava punindo, mas automaticamente me punia também. Madame
Toulouse achava tudo aquilo um absurdo.

- Vocês se amam e tem um filho para criar! Está na hora de começar do zero,
esquecer o passado e viver essa linda história de amor! Será que a vida não lhe
ensinou nada?

Eu queria viver a minha história de amor, queria muito. Mas meu orgulho
estava tão ferido que eu não conseguia ter discernimento e tomar uma decisão.

Quinze dias depois da visita de Raoul, recebi outra visita inesperada. Estava
prestes a ficar louca de saudades, pois não tive mais notícias do Duque. Yago me
contava tudo o que tinham feito, mas, sempre que tentava descobrir se ele sentia
minha falta, Yago dizia que ele sequer mencionara meu nome. E aquilo me
machucava, embora eu soubesse que tinha o impelido. Eu não queria dar o braço
a torcer e queria que ele tentasse, que ele me procurasse, que ele insistisse.
Fiquei decepcionada com esse comportamento e a mágoa só aumentou. Mas meu
visitante me trouxe um pouco de esperança:

- Como se sente, Christine? – o Rei sentou-se em uma cadeira em meu


quarto. Já estava recuperada, embora tivesse inúmeras cicatrizes em minhas
costas e pulsos e, com certeza, minha carreira como cortesã estava acabada.
Jamais poderia receber outro homem com tantas cicatrizes! Meu corpo, que
outrora era desejado, se transformou em motivo de escárnio. Nem todos os
unguentos do mundo fariam aquelas marcas sumirem.

- Com o coração partido, mas sobrevivendo, Vossa Majestade. – Ele sorriu,


sem graça.

- Querida, não tem que se torturar assim. Você sabe que ele a ama. Por que
não o procura?

- Depois de tudo o que aconteceu, não acho que ele me queira. Acredito que
tudo foi tão desgastante que ele está cansado ou desistiu. Como foi dito, ele é um
libertino. Pode ter a mulher que quiser, por que insistiria em uma cortesã que
escondeu o filho por 10 anos e o fez sofrer tanto?

- Porque o coração não escolhe quem vamos amar, sua tola! Raoul está
acabado. Ele passa os dias dormindo, as tarde com o filho e as noites bebendo.
Quando me procurou, há cerca de 10 dias atrás, entregou seu cargo no regimento
e o título. Disse que sua família sempre gostou muito de viajar e que era isso que
ele faria: se perderia no mundo. Talvez fosse encontrar com o irmão, que vive
em Creta com a esposa. Só ficaria aqui até que o filho fosse para Eton e partiria.
Ele estava desgrenhado, com a barba mal feita e estava bêbado. Claro que não
dei ouvidos a ele, disse que concordava com tudo, embora o cargo e o título
ainda sejam dele, e pedi que meus guardas o seguissem.

- E o que aconteceu?

- Ele foi para uma taberna, bebeu mais ainda, arranjou uma briga, socou dois
homens por acreditar que eram seus antigos clientes, esfaqueou outro e voltou
para casa carregado pelos guardas. Dormiu no hall de entrada. – o Rei ria da
situação, mas eu estava me sentindo a pior das pessoas.

- Vossa Majestade, ele passa daqui quase todo dia para ver Yago. Nunca mais
mencionou meu nome.

- Pelo que ele me contou, você disse a ele que estava magoada. Ele se
afastou para que você conseguisse curar suas feridas. Sabe, querida, apesar de
nosso relacionamento ser estritamente profissional, me afeiçoei a você. Você
sempre foi inteligente, espirituosa e, claro, muito talentosa na cama. Mas não era
só isso. Sempre a vi como uma criatura frágil, que criou essa armadura que a
transformava num furacão! Mas por trás da armadura, a menina frágil e perdida
continuava lá. Eu podia ver isso em seus olhos. Tornamo-nos amigos, não é? –
Assenti. Era verdade. – Pois bem, lembro-me de um dia em que conversamos
sobre sua vida e me disse que confidenciaria um segredo: Nenhum homem tinha
sua alma, somente seu corpo. Confesso que me senti menos homem aquele dia,
tinha certeza que você se deitaria comigo mesmo que eu não pagasse! Entendi
que você não poderia entregar sua alma, com a vida que você levava e isso me
entristeceu. Seu olhar estava morto. Mas isso mudou. E eu percebi que foi
quando Raoul voltou a sua vida. Percebi tarde demais, devo acrescentar, mas
percebi, porque vi o mesmo em Raoul. Ele tem 33 anos e nunca se envolveu com
nenhuma mulher. Não lhe parece estranho? Nenhuma amante sequer. De repente,
ele estava sorrindo, com um brilho nos olhos que só se vê em idiotas
apaixonados. Raoul é um idiota. E você também, se não for atrás dele.

Quando o Rei partiu, passei a tarde pensando em tudo que ele havia me
contado. Madame Toulouse entrou no quarto com a bandeja de chá.

- Ah, minha menina, confesso que adoro vê-la assim, tão dependente de
mim! Sinto-me útil e uma mãe muito cuidadosa! – Eu sorri

- Não consigo acreditar que você já foi a maior cortesã da Inglaterra! É mole
como manteiga! – adorava provoca-la. Ela me deu um tapa na mão e riu.

- Menina mal criada! Quem a ouve pensa que não lhe dei educação! – Nós
duas gargalhamos. Ela era realmente minha mãe!

Comemos por um tempo em silêncio até que eu a intimei:

- Vamos, desembuche! Sei que você está procurando uma maneira de


introduzir algo no assunto e não sabe como. Fale logo!

- Você nunca me perguntou sobre Sabrina. – ela me olhava apreensiva,


enquanto esperava minha resposta. Parei a xícara a caminho de minha boca. Não
esperava por isso.

- Não. Nunca perguntei. – coloquei a xícara nos lábios e engoli o líquido


amargo.

- Não quer saber o que aconteceu?


- Ela foi enforcada?

- Sim.

- Então é só isso que preciso saber.

- O Duque fez questão de estar a frente dela. Antes que o carrasco puxasse a
alavanca, ele gritou que a encontraria no inferno para continua-la odiando.

Soltei a respiração que nem percebia que tinha segurado. A raiva que Raoul
guardava dentro de si era enorme. Era um fardo muito grande. Permaneci em
silêncio. Madame continuou:

- Eu assisti a tudo ao seu lado. Quando ela finalmente encontrou a morte, ele
segurou minha mão e disse que estava tudo acabado, que você poderia viver em
paz. Em nenhum momento ele se preocupou consigo. Ele só pensava em você.
Até quando vai tortura-lo?

- Eu não estou o torturando! Eu só não sou forte como acreditei que seria...

Eu não sabia nem o que pensar. Ainda que conseguisse passar por cima de
tudo aquilo, ainda existia o fato de eu ter sido cortesã e me deitado com todos os
homens que faziam parte de seu círculo de contatos. O que aconteceria quando
Raoul se deparasse comigo conversando com algum deles? Ou se algum deles
faltasse com respeito a mim? Eu tinha que pensar nisso tudo e, com o título de
Duque, Raoul também. Ele não podia manchar sua reputação por minha causa.
Eu já estava maculada. Ele tinha o respeito de todos, do Rei, inclusive. Como
poderia viver com uma mancha como eu em sua vida? Aquilo me corroía e me
fazia ter medo de encontrar Raoul, então eu fugia, sempre trancada em meu
quarto. Quando não estava pensando em Raoul, estava com Yago, aproveitando
seus últimos dias antes de Eton.

- Papai disse que vai morrer de saudade!

- Eu tenho certeza que sim! Eu também vou. Vovó e Papa também, tenha
certeza! – acariciei sua cabeleira escura e beijei sua cabeça.

- Papai disse que serei um cavalheiro quando sair de lá e que devo cuidar de
você. Eu perguntei por que ele não cuidava e ele disse que sempre vai cuidar de
nós dois. Mas primeiro mamãe precisava se curar. Você está doente, mamãe?

- Não, meu amor, não estou doente. Papai quis dizer que mamãe precisa
resolver muitas coisas.

- Ele me prometeu que vai cuidar de você enquanto eu estou em Eton. E


papai nunca quebra suas promessas!

Eu ri. Essa frase saía da boca de Raoul o tempo todo. E era verdade, ele
nunca quebrava suas promessas. Quando disse que estava magoada, ele
respeitou. Ele me prometeu, há dez anos atrás que eu imporia os limites e ele
respeitaria. Ele estava respeitando agora, não quebraria sua promessa. Meus
olhos se encheram de lágrimas.

- Já fez suas tarefas, meu cavalheiro?


- Mamãe, eu posso explicar...

- Pois vá AGORA buscar a preceptora e faça todas as suas lições! Logo você
estará em Eton! – eu dei um tapa em seu traseiro, sorrindo – Menino travesso!

Quando Yago correu gritando em direção a seu quarto, tomei uma decisão.
Eu prometi que sempre o amaria e não quebraria minha promessa!
Capítulo 13

Vesti meu melhor vestido, me maquiei, arrumei meus cabelos sai do quarto em
busca de Madame Toulouse.

- Uau, vejo que vai sair! – Ela me encontrou no corredor.

- Preciso de um favor. Vou resolver uma questão de uma vez por todas e
preciso que cuide do Yago para mim.

- Vá, minha menina, e não volte sem o Duque! Ela me beijou a testa e eu saí
correndo. Sabia que ele estaria na Câmara dos Lordes, então me dirigi a sua casa
e fiquei esperando. O arrependimento bateu quando vi as horas passando e a
ansiedade começou a me dominar. Já estava quase desistindo, insegura, quando
ele chegou.

- Pequena, por que não disse que viria? Acabo de sair de sua casa. Fui buscar
Yago, mas quando Madame Toulouse me disse que você estava aqui, achei
melhor adiar nosso passeio de hoje e checar o que está acontecendo. Está tudo
bem? – ele tocou meus ombros e senti um choque percorrer todo meu corpo.

- Vossa Graça, preciso falar-lhe – eu estava nervosa e morrendo de medo de


meter os pés pelas mãos. Tremia dos pés à cabeça, mas, pelo menos, resolveria
aquele impasse de uma vez por todas.
- Pequena, por favor...

- Não! Eu preciso falar... por favor, me perdoe! Perdoe-me por não ter sido
forte, por não ter enfrentado minha tia e lutado por nós. Perdoe-me por acreditar
em Sabrina. Perdoe-me por não lhe contar sobre Yago. Perdoe-me por lhe julgar
por seu passado tão duramente! Por favor, Vossa Graça. Tenha misericórdia, fiz
tudo isso por mágoa, por medo, por ser estúpida e não pensar em nada além de
nosso filho.

Raoul tocou meu rosto, seus olhos brilhavam

- Pequena...

- Por favor, entenda que nunca deixei de amá-lo! Eu jamais teria ido embora
e nunca, nunca trocaria você por um Conde, Duque, nem mesmo pelo Rei! Você
sempre foi meu único amor! Perdoe-me! – Eu segurava seus braços com tanta
força que os nós de meus dedos já estavam brancos. Aquilo devia estar doendo,
então afrouxei um pouco. Ele suspirou.

- Pequena...

- Oh, me desculpe, eu estava te machucando! É que eu estou muito nervosa,


eu não sabia se te encontraria e tinha medo que me repelisse... – ele colocou a
mão em meus lábios e sussurrou.

- Shhhhh.... respire, Pequena...


Inspirei e expirei algumas vezes, até que ele sorriu, dizendo:

- Pequena, eu a perdoei! Eu perdoei tudo desde o dia em que lhe reencontrei!


Eu nunca deixei de amá-la! Quem precisa pedir perdão sou eu! Eu nunca devia
ter sido tão severo em lhe julgar quando eu não havia sido um exemplo a ser
seguido! Não me importa se você é uma cortesã, eu amo você. Perdoe-me por
não ter te encontrado há 10 anos atrás. Perdoe-me por ter permitido que Sabrina
se colocasse entre nós.

O alívio foi tomando conta do meu corpo e eu relaxei um pouco. Isso me deu
coragem. Eu precisa colocar tudo em pratos limpos, não podia existir mais nada
entre nós.

- Falando em Sabrina... – eu tinha medo de estragar tudo, mas foi mais forte
do que eu.

- O que quer saber? Trocamos uma verdade por outra?

- Certo. Você realmente a beijou?

- Tecnicamente, não... eu estava bêbado pela vigésima noite seguida, depois


de voltar de uma campanha com o regimento. Tinha passado alguns dias em
Londres e voltei para Astoria para pegar todas as minhas coisas e mudar de vez
para a Capital. Ainda não conseguia acreditar que você tinha me “trocado por
um conde”, aliás, nunca me conformei com isso. Ela estava em Astoria, sabe-se
lá Deus o que estava planejando por lá. Levou-me da taberna para casa, me
colocou na cama e tentou me seduzir. Eu não conseguia nem me mover direito,
não entendo o que ela pensou que fosse acontecer ali. Enfim, quando percebeu
que eu não iria possuí-la, ela deitou-se ao meu lado, se aninhou em meu peito e
se aproximou para me beijar. Quando seu lábio tocou o meu, chamei-a de
Christine. Ela se enfureceu, me deu um tapa e saiu. Eu estava tão bêbado que ri e
gritei: Pequena, eu não quebrei os limites! Que loucura. Eu mal podia me manter
em pé. Minha fala estava desconexa e eu não tinha forças para nada. Como ela
pôde achar que eu conseguiria possuí-la? – ele ria com a lembrança e eu me pus
a rir também.

- Jura que foi só isso que aconteceu? Eu fiquei morta de ciúme!

- Eu juro, Pequena! Lembro de ter acordado no dia seguinte com uma dor de
cabeça lancinante e a marca do tapa no rosto. Quando lembrei do acontecido,
agradeci aos céus por não ter condições de me “levantar”, se é que me entende.
Provavelmente eu a possuiria achando que era você. E teria adorado cada
segundo. Pois cada segundo com você sempre foi maravilhoso. Minha vez. Você
deitou-se com Nikolai? – Gelei. Se não havia acontecido ainda, chegara o
momento em que eu estragaria tudo. A verdade é sempre a melhor saída.
Respirei fundo:

- Sim. Antes que ele partisse para a Grécia. Sempre o considerei meu
primeiro cliente. Não pude negar-lhe depois de tudo que ele havia feito por mim.
Pode me perdoar por isso também?

- Sim. Eu só perguntei porque fiquei louco de ciúme também. A maneira


como ele te olhava... eu precisava saber. Sei que ele sempre vai fazer parte da
sua vida, por isso lhe aviso: se ele tocar em um fio de cabelo seu...

- Não seja bobo, eu só quero você! Eu também precisava saber, por isso
perguntei da Sabrina. Gostaria de saber um pouco mais... – eu disse, me
afastando dele lentamente, sem soltar suas mãos.

- O que mais você quer saber, Pequena?


- Bem, Vossa Graça disse que poderia tê-la possuído achando que fosse eu.
Gostaria de saber o que teria feito...

E aquele olhar predador que me encantou há dez anos voltou com força total.
Raoul começou a se aproximar, enquanto eu dava passos para trás.

- Por favor, diga meu nome, meu amor!

- Ah, posso chama-lo por seu nome? Não devo dirigir-se ao poderoso Duque
de Devon por “Vossa Graça”? – fiz uma mesura debochada. Quando tentei me
virar para correr, Raoul agarrou minha cintura e me virou para ele. Eu ria e me
debatia tentando fugir.

- Você deve se dirigir ao Poderoso Duque de Devon como “Raoul”, “meu


amor”, ou “meu senhor”. Pode se dirigir também como “meu marido”. – Meu
sorriso sumiu e perdi o fôlego.

- O quê? – meus olhos estavam arregalados, meu coração batia


descompassado. Eu não queria criar esperanças de que tinha entendido o que ele
disse, mas era tarde demais para não sonhar. Depois de tudo o que aconteceu,
seria feliz sendo somente amante de Raoul. Mas ele queria casar!

- A menos que você não queria... sempre respeitei seus limites, Pequena. Mas
o Rei emitiu uma licença para meu casamento há 15 dias...

- Você... você pediu uma licença para se casar comigo... mesmo não sabendo
se nos entenderíamos?
- Pequena, eu nunca desistiria de você. Eu lhe dei espaço para que pudesse
pensar calmamente e descobrir por si própria que não existia a menor
possibilidade de não ficarmos juntos! – ele encostou sua testa na minha - eu amo
você. Amo há 10 anos! – fechei os olhos e sorri

- Eu também te amo, Raoul!

- Agora, continuando nossa conversa... sobre como eu a possuiria...

Raoul tocou meu rosto com delicadeza.

- Eu a tocaria assim... e a beijaria assim...

Ele agarrou minha cabeça e beijou-me com desespero e desejo. Sua língua
invadiu minha boca e toquei seu peito, arranhando sua pele por cima da camisa.

Ele levantou minhas saias e me ergueu, fazendo agarra-lo com as coxas pela
cintura. Foi subindo a escadaria até seu quarto, sem deixar de me beijar.

Quando entramos em seu quarto, ele sentou-se na cama, comigo ainda em


seu colo, e começou a soltar as fitas do corpete.

- Eu vou amar cada pedacinho do seu corpo, Pequena, e vou te fazer gozar de
várias maneiras diferentes. Você vai gozar na minha mão, na minha boca, no
meu membro, quantas vezes quiser. E quando não puder mais aguentar, eu vou
continuar te amando, até que não tenha forças para levantar dessa cama! Está me
entendendo?
Ele dizia tudo isso massageando meu clitóris. Eu já estava mais do que
pronta. Assenti, mordendo seu lábio.

- Ah, você está encharcada, meu amor! Você está pronta pra mim! Mas eu
ainda vou me divertir muito antes de dar o que você quer.

Ele me deitou na cama e começou a me despir. Como há dez anos atrás, tirou
meus sapatos e começou a beijar meus pés e minhas pernas.

- Eu nunca esqueci seu cheiro. Ele me deixa louco! - Ele lambia minhas
coxas, enquanto soltava as ligas. Quando todas as fitas e colchetes estavam
livres, ele puxou o vestido com tudo, me deixando nua em sua cama.
Aproximou-se, deitando no meio de minhas pernas.

- Agora, não me recordo muito bem do seu sabor... se me permite, tenho que
relembrar... abra as pernas para mim, meu amor. E não deixe de me olhar. – a
mesma coisa que ele havia me pedido há 10 anos atrás. Ele queria me
enlouquecer.

Ele desceu por meu corpo, deixando uma trilha de beijos, desde o pescoço
até o ventre. Quando tocou meu clitóris com a língua, não conseguia entender
como ainda não tinha atingido o orgasmo. Eu estava desesperada por ele e cada
toque seu era uma tortura. E ele foi impiedoso. Sua língua me acariciava,
incansável, e eu me agarrei a seus cabelos e gemi alto.

- Oh, Raoul, você vai me matar!


Ele parou por um momento, apenas para dizer

- Ah, esse é o meu plano, Pequena! Vous sentirez la petite mort d


innombrables fois*****!

Aquilo foi o suficiente. Ouvi-lo dizer que me faria gozar inúmeras vezes em
francês me levou ao limite e eu atingi meu primeiro orgasmo em sua boca. Não
conseguia parar os espasmos e gritei, enlouquecida. Raoul sorria, ainda me
massageando, mas agora, com a mão.

- Eu disse que não quebro minhas promessas. Na boca já foi, vamos ver
como me saio com a mão... – eu ri descontroladamente

- Raoul, por favor...

- O que foi, Pequena? Algum problema? – ele me massageava sem dó, e eu


já estava prestes a conseguir meu alívio pela segunda vez quando ele sussurrou
em meu ouvido

- Só de pensar em como devo penetrar esse corpo já fico louco... devo tê-la
de quatro? Montada em mim? Devo estoca-la contra a parede? Devo fazê-la
cavalgar sentado na cadeira? Não consigo pensar em que maneira devo possuí-la
primeiro...

E ouvindo isso, atingi o segundo orgasmo.


- Pequena, isso é ridículo. Como vou provar a você que posso continuar o dia
inteiro com isso se você se entrega tão fácil assim? – seu olhar debochado fez
com que eu acabasse com aquilo

- Chega, “Vossa Graça”, agora quem manda aqui sou eu! – eu o empurrei, na
tentativa de fazê-lo cair de costas na cama para montá-lo.

- Ah, mas não mesmo! – Ele agarrou minhas nádegas e me jogou na cama,
segurando meus pulsos acima da cabeça. Gemi. Ele percebeu que senti dor e
parou. Olhou para meus pulsos e viu as marcas. Seu olhar entristeceu
imediatamente.

- Por favor, Raoul, não estrague o momento...

- Eu sinto tanto, Pequena!

- Se você não continuar o que estava fazendo, vai sentir mesmo! – agarrei-o
pelos cabelos e o beijei violentamente. Ele quase tocou meus pulsos de novo,
mas só entrelaçou seus dedos aos meus, segurando minha mãos acima da minha
cabeça. Intensifiquei ainda mais o beijo, movimentando meu quadril em direção
a seu membro, que parecia que ia explodir, de tão ereto.

- Então, fique quietinha e deixe-me cumprir com o prometido. Sabe que eu


nunca quebro minhas promessas...

Ele me penetrou de uma só vez. Devia estar se controlando tanto que apertou
ainda mais meus dedos.
- Eu devo lhe dizer que já faz algum tempo, Pequena, não sei quanto ainda
vou aguentar...

Ele começou a se mover lentamente. Eu não queria que ele saísse dali nunca.
Encarei aqueles olhos verdes e não desgrudamos mais nossos olhares.

- Eu amo você. Eu quero me casar com você. Eu quero mais filhos com você.
Eu quero envelhecer com você. Sempre foi você, Raoul. Sempre.

Ele sorriu, aumentando a velocidade, sem tirar seus olhos de mim.

- Eu quero tudo isso, Pequena, e muito mais!

As estocadas se tornaram intensas e quando senti o arrepio que percorria meu


corpo anunciando o orgasmo, Raoul gritava meu nome, se aliviando comigo.

- Ah, meu Deus! Nunca foi assim, foi? Aquela noite, a gente se amou tantas
vezes, nunca foi tão... tão...

- Maravilhoso? – Completei sua frase, ofegante.

- Eu ia dizer Divino, mas maravilhoso também pode ser usado para descrever
o que acabamos de fazer! – ele passou as mãos nos cabelos e levantou-se da
cama.
- Onde você vai? – apreciar aquele traseiro desfilando também não era nada
mal...

- Vou buscar uma toalha, estou banhado em suor! Não se preocupe, Pequena,
eu ainda não acabei com você!

Sorri. Aquilo estava realmente acontecendo. Eu realmente tinha o homem


que eu amava na cama e ele estava lá de livre e espontânea vontade.
Ironicamente, pensei que ele realmente não quebrava suas promessas. Estava na
cama com uma cortesã, sem ter pagado por ela.

Quando Raoul voltou, a toalha estava enrolada em sua cintura.

- Eu gostava mais quando a toalha não estava aí... – ele deu um de seus
sorrisos mais sedutores, deixando a toalha cair displicentemente.

- Seu banho está pronto, Alteza! – ele me estendeu as mãos.

Estava tão entorpecida com tudo que havíamos acabado de fazer que me
esqueci completamente que estava nua. Quando passei por Raoul, ele viu minhas
costas e empalideceu. Voltei-me para ele e lembrei das cicatrizes. Tentei me
esconder, virando para ele e cruzando os braços, mas ele segurou meus pulsos.
Seus olhos tornaram-se sérios.

- Já lhe disse para não fazer isso. – ele abriu meus braços, apreciando minha
nudez.
- Deixe-me ver.

- Raoul...

- Pequena, deixe-me ver o que fizeram com você. – Eu me virei e ele tocou
as marcas. Ouvi seu suspiro.

- Venha, vou dar um banho em você. Prometo que tomarei cuidado.

- Não se preocupe, não doem mais.

- Eu lhe prometo que vou descobrir quais foram os guardas que fizeram isso
e eles serão punidos. Vou puni-los pessoalmente.

- Raoul, por favor. Vamos deixar o passado para trás. Esqueça isso. – Ele
suspirou novamente, frustrado. Percebendo que era um assunto que me
incomodava e sabendo que não me convenceria a mudar de ideia, ele beijou
todas as cicatrizes e meus pulsos antes de me colocar na banheira com pétalas de
rosa e água morna.

- Agora que está relaxada, deixe-me mostrar o que posso fazer embaixo d
´água...

E ele me mostrou. Repetidas vezes.


**********************************

Quando voltamos para cama, ele queria fazer planos. Mas eu ainda tinha
muitas dúvidas, não podia e não queria macular seu nome. Queria passar o resto
de minha vida com Raoul, mas não queria que ele abrisse mão de nada.

- Raoul, se casarmos, você será o escândalo da sociedade. Casar-se com uma


cortesã? O que fará quando encontrar com os homens com quem me deitei?

- Não se preocupe, Pequena. Eu entreguei meu título e cargo para o Rei.


Vamos embora daqui.

- Meu amor, esquece-se que eu conheço o Rei? Ele não lhe contrariou por
você estar bêbado, mas ele não aceitou. O título e o cargo ainda são seus. Não
me perdoaria se abrisse mão de tudo por mim.

- Por nós, meu amor. Estou abrindo mão de tudo por nós. O Rei vai ter que
aceitar. – Ele beijou minha testa e sorriu. Virei-me para ele, me apoiando em um
cotovelo.

- Bom, acontece que eu também não aceito. Vamos morar em uma de suas
propriedades no campo. Você mantém o título e o cargo e quando o Rei precisar
de você, é só lhe chamar. O que acha?

- Me parece uma boa ideia. Mas não sei se vou conseguir manter meu cargo.
Não suportaria voltar para Londres deixando você e Yago no campo... vou
conversar com o Rei.
Na manhã seguinte, Raoul levantou-se cedo. Fez a barba, colocou sua farda
de gala e se dirigiu ao Palácio. Voltou à tarde, levemente alterado:

- Acredito que Vossa Majestade deve gostar muito de você. De mim. De nós!
– Sua fala embotada era difícil de decifrar.

- Raoul... está bêbado? – Ele fez um sinal, como se medisse algo entre o
polegar e o dedo indicador.

- Só um pouquinho... estou, sim. Mas não pude evitar, meu amor. Afinal, o
Soberano ficou tão feliz em saber que vamos nos casar e morar no campo, que
não pude deixar de comemorar com ele! Mantive meu título e agora sou um
oficial reformado! Fique tranquila, só bebemos duas garrafas de whisky!

Abri um sorriso e o abracei. Enquanto o tinha em meus braços, fiz uma prece
agradecendo tudo o que vinha acontecendo em minha vida. Meu General
desajuizado estava bêbado. Eu também. Embriagada de felicidade, amor, desejo.
Esses afrodisíacos me faziam querer mais e mais dele.

- Vamos, meu bravo soldado, vamos lhe dar um banho e acabar com essa
bebedeira. Não quer que seu filho lhe veja assim, hum?

- Meu filho... você... eu sou o homem mais feliz do mundo! – ele levantou os
braços e perdeu o equilíbrio. Não pude deixar de rir. – Vai me acompanhar no
banho?

- Sim, meu amor. Não vou mais desgrudar de você!


O banho durou horas. E quando acabou, Raoul estava totalmente sóbrio e eu
estava exausta e saciada.
Capítulo 14

Eu estava tensa e parecia uma adolescente. Nikolai me olhava através do


reflexo do espelho embevecido. Madame Toulouse chorava.

- Madame, pare com isso! Parece uma mocinha virgem! – provoquei,


tentando disfarçar meu próprio nervosismo.

- Minha menina vai casar! E com um Duque! É demais para meu pobre
coraçãozinho!

Troquei um olhar cúmplice com Nikolai. Nossa grande amiga era a rainha do
drama!

- Vamos? Raoul deve estar desesperado, achando que você fugiu novamente!
Está atrasada, “Prama”!

- Vamos. Espere! Chequei o espelho uma última vez, borrifei meu perfume e
voltei a Nikolai.

- Agora sim, podemos ir!


Quando chegamos a Mansão Devon, meu coração batia descompassado.
Nenhum padre em sã consciência casaria uma cortesã na igreja. Resolvemos
então casar na Mansão Devon, no jardim próximo a uma gruta muito parecida
com a de Astoria, construída a pedido do Duque. Passamos por tanta coisa que
era difícil de acreditar que conseguiríamos ficar juntos, finalmente. Graças ao
título e ao respeito que todos tinham por Raoul, nunca tivemos problemas com
meus antigos clientes, ao contrário. Todos mostraram que nutriam um carinho
por mim, já que ameaçaram Raoul, caso ele não cuidasse de mim
apropriadamente! Embora não tenha gostado muito das ameaças, chegou a
conclusão que era melhor pensar que eu era muito querida por ser uma pessoa
especial, do que se martirizar de ciúmes, achando que todos ali cobiçavam sua
futura duquesa.

Fiz uma pequena oração em agradecimento, segurei o braço de Nikolai e


segui em direção a Raoul. Ele me esperava com seu melhor sorriso e olhos que
sempre me fariam suspirar. Eu nunca me cansava de sua beleza.

A cerimônia foi simples e íntima, apesar de alguns convidados ilustres, como


a Vossa Majestade em pessoa. Ele não perderia aquilo por nada!

Yago estava maravilhado. Estaria em Eton em uma semana, mas, naquele


dia, ele estaria, finalmente, com papai e mamãe. Juntos.

Quando a cerimônia acabou, seguimos para a casa de Madame Toulouse que


ofereceu um almoço em nossa homenagem. Depois de todos os convidados
partirem, Nikolai ergueu uma taça.

- Que vocês vivam o que deveriam ter vivido há 10 anos. Que você olhe
“Prama” como a luz de sua vida e que ela sempre o veja com os olhos do amor.
“Prama”, cuide de “Sinto” como a coisa mais preciosa que possui. E amem.
Amem muito, tragam muitas crianças para este mundo! – Ao som de nossas
risadas, tocamos as taças e bebemos. Raoul sussurrou em meu ouvido:

- Vou ter que aprender mais uma língua, Pequena?


- Não, meu amor, pois essa nem eu aprendi! Mas lhe conto mais tarde o que
significam “Prama” e “Sinto”.

Nikolai partiu no mesmo dia, mas não sem antes passar pela casa de uma
preceptora que estava muito triste por seu pupilo partir para Eton. A preceptora
precisaria de um ombro forte e sensual para poder chorar a saudade do rapazinho
e Nikolai era uma alma gentil que estaria lá para isso...

Madame Toulouse pegou a mão de Yago, seguindo para a cozinha.

- Vamos comer nossos doces na cozinha, Tesouro da vovó, lá o forno deixa


tudo quentinho e o cheiro de pão é muito bom! – Ela virou-se piscando para
mim. Quem diria que a maior cortesã da Inglaterra viraria a avó mais coruja?

Ela parou na porta, antes de sair do salão.

- Você entrou na minha vida para me trazer alegrias, Christine. Eu não


poderia estar mais feliz! – Meus olhos encheram-se de lágrimas e corri em sua
direção, lhe apertando em meus braços.

Ela continuou agarrada a mim e, olhando para Raoul, soprou-lhe um beijo:

- Cuide dela. Você e ela merecem tudo! E você, - ela disse, virando-se para
mim – aproveite sua lua de mel. Eu vou aproveitar meu netinho, pois vocês
insistem que ele deve ir para Eton! Ele é tão novo, poderia ficar mais alguns
anos...
- Não! – Respondemos em uníssono, Raoul e eu.

- Meu Deus, achei que avós podiam dar algum palpite na vida dos netos... –
ela saiu resmungando.

- Estou exausta. Podemos ir para casa? Não vejo a hora de tirar esse vestido
enooooorme!

- Ah, Pequena, eu também não vejo a hora de tirar esse vestido...


Epílogo

Dez anos se passaram depois que Raoul voltou para minha vida. Estávamos
aguardando a volta de Yago, que estava na França desde que se formara em
Eton. Em breve ele iria para Oxford e queria passar um tempo ao lado dos pais.
Ouvimos o galope de um cavalo e Raoul me abraçou, sorrindo. Seus olhos
estavam rasos d´água e ele lutava para conter as lágrimas. Ele estava ainda mais
bonito, com os cabelos grisalhos e ruguinhas charmosas ao lado dos olhos.
Corremos como dois adolescentes para a porta, quase atropelando o mordomo.

- Papa! Maman! – Yago gritava, com o cavalo em disparada pela entrada de


nossa casa.

Quando desceu do cavalo, seu pai o levantou do chão em um abraço de urso.


Quando o soltou, ele fez o mesmo comigo. Yago era um homem lindo e alto
como seu pai. Tinha que olhar para cima para conversar com os dois! Tinha
ainda o ar de rebeldia dos adolescentes, mas, como o pai, era muito seguro de si
e deve ter destruído muitos corações na França.

- Meu Deus, como você está magro! – Yago e Raoul reviraram os olhos. –
Espere só até sua vó vir seu estado...

- Mãe! Pare com isso, por favor!

- Meu menino, tão magro, tão mal cuidado! – choraminguei, escondendo o


riso. Raoul piscou para o filho, cúmplice.

- Eu já tenho 20 anos! – ele fingia indignação. Raoul só conseguia nos olhar,


a felicidade não cabendo no peito. Quando finalmente conseguiu falar, já me
deixava de fora:

- Vamos, rapaz, temos muito o que conversar. Uma garrafa de whisky nos
aguarda em meu escritório!

- Como está Aurora? Nem acredito que tenho uma irmã! Ela é tão linda
como “Prama”?

- Está a caminho, com sua avó! Ela é infinitamente mais bonita do que
“Prama”! – respondi sorrindo

- Rapaz, você vai ter problemas. Ela é linda como sua mãe e dramática como
sua avó. Não posso acreditar como pode ser tão mimada com apenas 7 anos! Sua
mãe e sua avó a mimam muito! – Raoul piscou para mim.

- Mimada pela mãe e pela avó? Só pelas duas? Ela faz você de bobo, Raoul!
– ele franziu a testa e levantou a sobrancelha, discordando.

- Não me importa, o importante é que antes éramos somente nós 4, além de


Nikolai. Estive com ele, aliás, enviou vários presentes e uma joia cigana para
Aurora! Agora somos em 5, nossa família cresceu desde que vocês decidiram
parar de gracinhas e ficarem juntos! – Yago sempre nos provocava, alegando que
perdemos muito tempo antes de nos casarmos com brigas desnecessárias.
- Errado, meu menino... não somos 5... – desafiei Yago. Raoul me encarou,
confuso.

- Somos 6, mas ainda não sei se você terá outra irmã ou um irmão! – Raoul
me rodopiou no alto, sorrindo e chorando ao mesmo tempo. Yago ainda me
olhava perplexo:

- Meu Deus, vocês não conseguem tirar as mãos um do outro mesmo! – ele
era espirituoso como o pai! Raoul não deixou por menos.

- Não, meu rapaz, não consigo! Eu amo essa mulher! – Raoul gritava!

- Eu também amo vocês!!! – gritei junto

Enquanto gritávamos, rindo, ouvimos a chegada da carruagem que trazia


Madame Toulouse e Aurora.

Quando Aurora desceu da carruagem, Yago se ajoelhou a sua frente e ela


agarrou se pescoço. Rodopiaram juntos, rindo, enquanto Madame Toulouse
ralhava com os dois por não a ajudarem a descer da carruagem. Começou a
gritar quando Yago soltou Aurora e passou a rodopiar com ela!

- Tesouro, vai matar a vovó, pare com isso agora! – ela gritava, rindo com
ele. Por fim, os 3 deram as mãos e vinham em nossa direção, sorrindo. Nem em
meus sonhos mais impossíveis seria capaz de vislumbrar uma cena tão linda.

- Nunca imaginei que pudesse ser tão feliz! – sussurrei no ouvido de Raoul.
Ele piscou, sorrindo:
- Eu sabia. Eu prometi a mim mesmo que te encontraria e seríamos muito
felizes. E eu nunca quebro minhas promessas!

Sim, essa é uma história de amor. Finalmente o mundo resolveu concordar


comigo!
Fim
Glossário

*Astoria – Cidade fictícia onde se passa a História

** Adônis – Na mitologia grega, Adônis era um jovem de beleza ímpar. As


deusas Perséfone e Afrodite se apaixonaram por ele.

*** N´est-ce pas vrai, Maman – Não é verdade, Mamãe?

**** Oui, Papa, c´est vrai! – Sim, é verdade, Papai!

***** Vous sentirez la petite mort d innombrables fois – Você terá orgasmos
inúmeras vezes (os franceses utilizam a expressão “pequena morte” para se
referir ao orgasmo)

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