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Globalização, Ajuste e Reforma d o Estado:

Um Balanço da Literatura Recente*

EU Diniz

Na América Latina e em geral nos países cente, bem como as experiências concretas de
do Terceiro Mundo, os desafios associados à reforma levadas a efeito nas duas últimas dé­
crise dos anos 80 determinaram, entre suas cadas, refletem diferentes concepções e abor­
conseqüências mais relevantes, além do ques­ dagens acerca do novo Estado destinado a
tionamento do antigo modelo de desenvolvi­ substituir o antigo modelo altamente interven­
mento, a necessidade de uma ampla revisão de cionista e centralizado. Perspectivas teóricas
conceitos e noções que se supunha consolida­ divergentes e visões ideológicas contraditórias
dos. Ao colocar em primeiro plano a questão tomam extremamente complexo o quadro das
da reforma do Estado, a discussão contempo­ alternativas possíveis.
rânea impõe a busca de novas formulações O presente texto tem por objetivo apre­
teóricas acerca do Estado, de suas relações sentar e discutir as principais linhas analíticas,
com a sociedade, o mercado e a política. que se apresentam na literatura internacional e
Se no momento anterior, correspondente na produção brasileira, procurando destacar
ao auge da industrialização substitutiva, trata-
va-se de expandir o Estado e ampliar sua capa­ seus contrastes e similitudes, sem, contudo,
cidade de intervenção, a década de 80 viria a pretender oferecer um tratamento exaustivo da
deparar-se com o desafio de formular uma bibliografia disponível. Ao contrário, o que se
nova concepção do papel do Estado, tendo em propõe é um esforço de sistematização bastan­
vista alcançar mais altos níveis de racionalida­ te específico, articulado em torno de um eixo,
de e eficiência, dentro de um contexto demo­ qual seja, a crítica das perspectivas reducionis-
crático. Sob esta ótica, os aspectos qualitativos tas e dos enfoques dicotômicos que tolhem a
adquirem centralidade, tomando-se necessário reflexão ainda dominante nesta área. Sob este
deslocar a atenção para os requisitos com vis­ aspecto, é possível, desde logo, detectar uma
tas a uma ação estatal eficaz na implementação crise de paradigmas e da capacidade analítica
das políticas públicas e na consecução das diante da complexidade dos processos em cur­
metas coletivas. so e dos problemas envolvidos na relação entre
Por outro lado, a produção intelectual re­ a implementação da agenda neoliberal e os

* Em sua primeira formulação, este texto foi apresentado no Encontro da Associação Brasileira de Ciência Política
em dezembro de 1996. O texto atual foi desenvolvido no âmbito da pesquisa “Reconfiguração do Mundo Público
Brasileiro: Sistema Político e Reforma do Estado”, realizada no Iuperj, com o apoio do Programa de Reforma do
Estado da CAPES, durante o ano de 1997. Uma primeira versão, ainda bastante preliminar, sob o título “Globaliza­
ção, Governança e Reforma do Estado”, foi publicada em Textos para Discussão, n.° 391, Instituto de Economia da
UFRJ, abril de 1997.

BIB, Rio de Janeiro, n. 45, 1,° semestre de 1998, pp. 3-24 3


requisitos da consolidação da democracia, nos mente, no campo da política comparada, per­
países em desenvolvimento. mite desvendar alguns dos principais dilemas
Além do reducionismo das principais envolvidos nesse processo nos planos teórico
abordagens, cabe ressaltar as ciladas que de­ e empírico.
correm de visões dicotômicas tão difundidas, Deslocando o foco para a dimensão inter­
quanto equivocadas, que aprisionam o debate nacional, é preciso levar em conta o fato óbvio,
dentro de certas polaridades, tidas como uni­ porém freqüentemente esquecido, de que a
versais. Entre estas, gostaria de destacar, em influência dos fatores exógenos não é direta,
primeiro lugar, a dicotomia Estado-mercado, senão que mediatizada pelas condições e ca­
que contrapõe uma visão maximalista— presa racterísticas do país considerado. Por esta ra­
ao paradigma estatista — a uma concepção zão, cabe privilegiar uma perspectiva que inte­
minimalista, responsável pela idealização do gre os dois planos da análise, combinando o
mercado. Em segundo lugar, cabe mencionar peso relativo das variáveis externas e internas.
o confronto entre racionalidade governativa e Como explicar a forma pela qual se dá a arti­
imperativos democráticos, aquela informada culação entre estas dimensões, eis o desafio
por uma lógica concentradora e discricionária, que se coloca, até porque a globalização não
cm contraste com a dinâmica deseentralizado- elimina o fato de que, dentro do sistema de
ra, plural e competitiva do jogo democrático. nações, cada Estado está submetido a duas
Tais polaridades e enfoques reducionistas ordens de pressões, aquelas que expressam
constituem verdadeiras camisas de força às tendências globais, ao lado das que refletem o
quais se tenta ajustar realidades complexas e jogo interno de interesses.'
multifacetadas. Neste quadro, à reflexão acadê­ Um enfoque unilateral e reducionista aca­
mica impõe-se a busca de novas formulações ba prisioneiro das limitações deterministas,
leóricas que possam dar conta das relações Esta- tornando-se incapaz de apreender a especifici­
do-sociedade, mercado e política, por um lado, dade das decisões governamentais. Nesta linha
bem como, no plano externo, da articulação Es- de reflexão, a agenda de reformas seria perce­
lados nacionais-Sistema internacional.
bida como mero reflexo de injunções do siste­
ma internacional. E, mais ainda, expressando
A Discussão internacional uma tendência inexorável, seria a um tempo
O objetivo de reformar o Estado, num inócua e irrealista a procura de vias alternati­
contexto de mudanças drásticas na ordem vas. Se as mudanças internas refletem de forma
mundial, definiu-se num quadro marcado por automática decisões e processos que se situa­
duas ordens de questões. No plano interno, riam para além das fronteiras nacionais, estan­
verificou-se a dupla necessidade de enfrentar do, desta maneira, fora do controle das autori­
a crise econômica e garantir a consolidação da dades responsáveis pela posição dos diferentes
democracia. Considerando-se a dimensão ex­ países, seriam nulos os graus de liberdade.
terna, configurou-se uma nova relação de for­ Independente de ideologias e de orientações
ças na arena internacional, impondo-se abusca políticas, as elites dirigentes tenderiam a agir
de formas adequadas de lidar com as restrições de maneira uniforme e predeterminada, sob o
decorrentes da globalização da economia e do impacto dos imperativos externos. No outro
predomínio das redes financeiras internacio­ extremo pode-se situar a abordagem que privi­
nais, em escala mundial. A conjugação destes legia os fatores internos, desconsiderando os
fatores dificultou a formação de um consenso requisitos da inserção no sistema internacional.
em torno da agenda das reformas prioritárias, Tal perspectiva dá também origem a visões uni­
tornando a definição do conteúdo e do alcance laterais, calcadas no pressuposto da autonomia
de cada uma delas uma tarefa extremamente de Estados nacionais considerados enquanto
complexa, tanto do ponto de vista conceituai, entidades insuladas, imunes aos efeitos da glo­
quanto prático. A literatura produzida recente­ balização.

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A tentação reducionista termina por refor­ to deve ser ressaltado. Estados fortes e autôno­
çar as antigas explicações de teor determinista mos tendem a dispor de condições favoráveis,
presentes em algumas formulações da teoria da em comparação com estruturas estatais fragi­
dependência, tão em voga nos anos 60 e 70. lizadas e, portanto, destituídas de instrumentos
Embora amplamente refutadas nas décadas adequados de gestão. Sob este aspecto, cabe
subseqüentes, o vezo determinista deste tipo de salientar o contraste entre a capacidade relativa
visão continua presente. Tal perspectiva esva­ dos Estados que se defrontam no contexto
zia as decisões governamentais de seu teor internacional e o grau de subordinação de cada
estratégico, já que, sob o impacto de pressões governo às forças externas. Quanto mais fraca
inabaláveis, não há evidentemente margem a autoridade estatal, maior a propensão a recor­
para escolhas entre alternativas distintas. No rer ao estoque externo de competência técnica,
entanto, não só o conteúdo, como até mesmo o que, por sua vez, tende a agravar e perpetuar
o timing e a oportunidade das decisões, a sele­ as carências internas em termos de uma máqui­
ção de prioridades, a capacidade de antecipa­ na estatal apropriada, criando-se, assim, um
ção ou, ao contrário, a excessiva demora, ou círculo vicioso de efeitos perversos.
ainda a tibieza na avaliação dos riscos, têm Os países africanos constituem um exem­
conseqüências do ponto de vista da consecu­ plo extremo deste tipo de dilema. Em um estu­
ção das políticas e dos resultados alcançados. do sobre o impacto diferencial dos fatores in­
Em contrapartida, a abordagem aqui pro­ ternacionais (Stallings, 1992, p. 73), ressalta
posta, ao não descartar a política como um que, no caso da África, “o FMI e o Banco
importante aspecto da análise, coloca em evi­ Mundial desempenharam um papel muito mais
dência um primeiro tipo de paradoxo, para o evidente do que na América Latina, tanto per­
qual gostaria de chamar a atenção. Trata-se da suadindo os governos a adotarem as políticas
relação entre o poder de barganha dos Estados [de estabilização de estilo ortodoxo], quanto
nacionais e a busca de formas vantajosas de definindo seu conteúdo”. A falta de qualifica­
inserção internacional, pois, se a globalização ção técnica de suas burocracias, continua a
é um processo histórico irreversível e inevitá­ autora, colocaria esses países numa situação de
vel, nem por isto torna-se menos relevante a forte dependência em relação à assistência não
ação de cada governo na procura de caminhos só financeira, como também técnica das insti­
próprios. Na história do capitalismo e do pro­ tuições internacionais, particularmente as
cesso de internacionalização, Estados que se agências multilaterais. Em outros termos, além
destacaram pela concentração de poder políti­ da influência externa na formação da agenda,
co e militar alçaram-se a posições hegemôni­ os técnicos estrangeiros tornar-se-iam respon­
cas, influindo fortemente nas decisões levadas sáveis pelo desenho e implementação de pro­
a efeito nos foros internacionais. No momento gramas específicos.
atual, em que os Estados Unidos, embora sob O excesso de envolvimento externo pode,
novas condições, recuperaram sua hegemonia, portanto, determinar condições desfavoráveis
apesar de plenamente afinados com o processo para o aumento de capacidade governativa, por
de globalização, sempre deixaram de cumprir sua vez indispensável para o êxito do ajuste e
as regras multilaterais, que impuseram aos de­ a recuperação econômica. Reproduzem-se, as­
mais países, quando tal comportamento lhes sim, as causas da dependência, inviabilizando
pareceu mais favorável aos seus objetivos. A qualquer esforço de reforma do Estado mini­
mesma tática é adotada pelos outros países mamente consistente. Por contraste, outros
centrais quando atingidos em seus interes­ países, embora aderindo fortemente à agenda
ses, aliás cada vez mais coincidentes com o neoliberal, preservaram uma importante mar­
de suas corporações (Tavares, apud Camargo, gem de independência, como ocorreu com o
1997, p. 23). Chile, que realizou o ajuste e implementou
Nesta ordem de considerações, outro pon­ reformas liberalizantes, antes que os demais

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países do Terceiro Mundo o fizessem, mas não pacidade governativa e recuperar a credibili­
privatizou suas minas de cobre, adotando uma dade das instituições estatais.
orientação mais seletiva na implementação das Persiste, porém, uma dificuldade que au­
mudanças. Nesta linha, cabe ainda citar os menta a complexidade da questão da reforma
esforços de alguns países latino-americanos — do Estado, no momento atual. Constituiu-se,
Argentina, Brasil e Peru — para evitar a orto­ na maioria dos casos, um consenso negativo
doxia em suas experiências estabilizadoras, acerca do Estado que não se quer ter, perdu­
empreendidas entre 1985-1987, Apesar do fra­ rando, entretanto, um forte desacordo quanto
casso de tais experimentos heterodoxos, repre­ ao modelo de Estado que se deve construir. O
sentaram, certamente, importante processo de desenho do novo Estado ficou, de fato, atrela­
aprendizagem, permitindo a identificação de do às reformas e prioridades econômicas, sen­
deficiências institucionais, além do aprimora­ do seus parâmetros definidos sob o impacto do
mento de diagnósticos sobre crise, inflação e primado da economia. Tal tendência expres­
ajuste. sou-se pelo predomínio de uma concepção es­
Deste modo, a globalização não exclui, se treita, resultando no privilegiamento de diag­
não que reafirma a relevância da política do nósticos reducionistas, que terminaram por
interesse nacional, não no sentido de um na­ restringir a reforma do Estado às metas de corte
cionalismo autárquico ou xenófobo, mas en­ de gastos e redução do déficit público. A as­
quanto capacidade de avaliação autônoma de censão de governos conservadores em países
interesses estratégicos, tendo em vista formas de posição estratégica no jogo de poder mun­
alternativas de inserção externa. Por mais que dial, como os Estados Unidos, a Inglaterra e o
tenha avançado a integração do sistema inter­ Canadá, criaria condições favoráveis para a
nacional, persiste a tensão entre a esfera nacio­ aceitação do enfoque neoliberal, segundo o
nal e a ordem mundial globalizada. Ainda que qual o gigantismo estatal e o excesso de gastos
se aceite a idéia de crise do Estado, isto não
significa, como ressalta Camargo, constituiriam o cerne da crise do Estado. Nos
termos do chamado “Consenso de Washing­
“um prelúdio de morte, mas um momento de ton”, o refluxo do Estado, a liberalização, a
transição para novos padrões de articulação entre desregulação e a privatização seriam os aspec­
uma governabilidade puramente nacional e novas tos prioritários da nova agenda.3Durante toda
formas de atuação, nos planos internacional e a década de 80, estas foram as diretrizes domi­
multilateral, contrariando a idéia liberal de que o nantes (Rezende, 1996).
mercado, com sua dinâmica de liberdade total e Na América Latina, esta perspectiva foi
de desconhecimento das fronteiras nacionais, é o acentuada pela reação à concepção maximalis­
único candidato viável para substituir a função
reguladora e integradora do Estado nacional” (Ca­ ta de Estado herdada do passado, o que levou
margo, 1997, p. 35). à visão oposta de teor minimalista. Em conse­
qüência, o tema da reforma do Estado foi apri­
Deslocando o foco para as variáveis inter­ sionado teoricamente pela dicotomia Estado-
nas, a década de 90 assistiu à configuração de mercado, reativando um liberalismo de matiz
uma visão menos economicista em comparação ordodoxo, consagrador da fórmula redução
com o enfoque dominante no passado recente, drástica do tamanho do Estado — primazia do
atribuindo-se prioridade à ação dos governos na livre mercado nas decisões relativas à alocação
definição de estratégias de adaptação ativa às de recursos. Neste sentido, o esforço reformis­
novas condições internacionais. (Grindle e ta viu-se reduzido às propostas de enxugamen­
Thomas, 1991; Stallings, 1992; Evans, 1992). to da máquina estatal, o que, em muitos casos,
Tornou-se mais clara a percepção de que recei­ implicou a mutilação do aparelho burocrático
tas econômicas ortodoxas ou heterodoxas não e, em decorrência, o aumento de sua ineficiên­
constituem condição suficiente para o êxito no cia. Observou-se o predomínio de uma agenda
enfrentamento da crise, impondo-se criar ca­ negativa de desmantelamento do legado do

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passado, em franco descompasso em relação à baixa efetividade dos mecanismos de controle
complexidade das tarefas a serem desempe­ e de cobrança externos (Conaghan e Malloy,
nhadas pelo Estado num mundo globalizado, 1994; Diniz, 1995, 1997a e b; 0 ’Donnell,
em que competitividade e capacidade de inser­ 1991). A concentração decisória no Executivo
ção estratégica se transformaram em chave se fez pela exacerbação de suas funções legis
para o sucesso. A despeito de sua inadequação, lativas, esvaziando a capacidade governativa
o minimalismo se impôs, em detrimento da do Congresso, a despeito do alargamento for
visâo mais pertinente e mais rica da reestrutu­ mal de suas prerrogativas, naqueles países em
ração do Estado. No Brasil, a experiência do que a crise econômica coincidiu com o desen
governo Collor no campo da reforma do Esta­ cadeamento de um amplo processo de demo ­
do enquadra-se nesta categoria (Diniz, 1997a, cratização.
esp. cap. 5). Embora a delegação de autoridade ao
Ademais, a primazia atribuída às priorida­ Executivo seja um imperativo da administra­
des econômicas, ao engendrar uma abordagem ção moderna, tendo em vista os ganhos de
reducionista de reforma do Estado, gerou pa­ eficiência que proporciona (Haggard, 1996,
ralelamente uma visão de eficiência em termos pp. 14-15), por outro lado, a partir de um
do primado da técnica, perspectiva que se tor­ determinado nível, torna-se prejudicial, impli
nou dominante no debate internacional. No cando a subordinação do Legislativo e o com
que diz respeito ao modelo de Estado, tal orien­ prometimento de suas funções de controle e
tação se traduziu na ênfase na hipertrofia do supervisão das ações da burocracia. Como é
poder da burocracia estatal. Verificou-se uma sabido, a ausência de freios institucionais ao
tensão crescente entre a consecução das refor­ poder burocrático favorece a generalização das
mas orientadas para o mercado e a consolida­ práticas de rent-seeking ou busca de rendas por
ção da democracia, dado o reforço acentuado parte dos interesses privados. Trata-se do pro ­
das prerrogativas do Executivo, configurando cesso identificado por uma certa corrente da
o chamado paradoxo neoliberal. Como ressal­ literatura como captura do Estado, mediante o
tam Haggard e Kaufman (1992, pp. 24-25), qual as políticas estatais se afastam cada vez
para os governos reduzirem seu papel na eco­ mais do interesse público, tornando-se inefi­
nomia e expandirem as forças do mercado, o cientes e particularistas em seus objetivos
fortalecimento do Estado tornou-se imprescin­ (Krueger, 1974, 1990). Descontrole de gastos,
dível, o que resultou não só num esforço de desperdício de recursos e desvios de verbas
aumento de suas capacidades administrativas tendem a aumentar o déficit público, levando,
e financeiras, mas também de seu poder de por sua vez, ao agravamento da inflação. No
decisão autônoma. caso da América Latina, historicamente, a fra­
Em nome da supremacia do mercado, ex­ gilidade da autoridade estatal assumiu propor­
pandiram-se os poderes regulatório e interven­ ções incontrastáveis. Assim, o legado da antiga
cionista do Estado, segundo uma lógica con­ ordem foi um Estado sobredimensionado,
centradora e discricionária que consagraria o porém débil em termos da eficácia na obten­
modelo tecnocrático de gestão. Na Argentina, ção de conformidade e aquiescência às suas
através dos Decretos de Necessidade e Urgên­ decisões. A incapacidade de arrecadar im­
cia (Palermo, 1996, pp. 193-195), nos países postos, exigir o cumprimento da lei, punir
andinos através dos Decretos de Emergência, fraudes e sonegações, combater a corrupção
no Brasil, mediante os Decretos-Leis e Medi­ e produzir políticas sociais efetivas repre­
das Provisórias, em toda a América Latina, sentou a outra face da primazia do Estado,
enfim, os programas de ajuste seguiram o mo­ configurando uma síndrome de inoperância
delo do governo burocrático, caracterizado e incompetência, em grande parte responsá­
pela tendência ao desequilíbrio institucional vel pela crise fiscal presente (Przeworski,
no tocante à articulação entre os poderes e à 1994, p. 194; Diniz, 1997a, p. 26 ).

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Em outros termos, o reforço indiscrimina­ império dessa proibição, os chefes do Execu­
do da autonomia do Estado amplia paralela­ tivo, apoiados por sua coalizão parlamentar,
mente as possibilidades da elite estatal agir em ou, como no caso do Peru de Fujimori, por
defesa do interesse próprio, anão ser que sejam intermédio de um golpe, empenharam-se em
efetivos os mecanismos que obriguem o gover­ alterar as regras às quais seus mandatos esta­
nante a prestar contas de seus atos aos cidadãos vam subordinados, tornando-se os principais
(Przeworski, 1996b, p. 23). Assim é que a beneficiários da mudança constitucional indu­
excessiva amplitude da delegação acaba por zida por seus repectivos governos.
aumentar os incentivos e diversificar os espa­ Cabe considerar, por outro lado, que a
ços para a irresponsabilidade política das elites estabilidade das regras é um dos principais
que ocupam os cargos estratégicos na adminis­ requisitos da consolidação democrática, sobre­
tração pública. Mais uma vez, na América tudo em países com uma longa tradição de
Latina este tipo de risco revela-se particular­ debilidade legal, como o Brasil durante o regi­
mente grave, dados os déficits de account­ me militar (1964-1985), quando os generais na
ability historicamente consolidados. chefiado governo mudavam as leis sempre que
Nesses países, configurou-se a tendência à lhes parecia conveniente, configurando um
formação de regimes híbridos, democracias de- caso típico do chamado casuísmo. Por esta
legativas, segundo alguns (O’Donnell, 1991, razão, a ruptura com essa prática constitui um
1993), democracias incompletas, segundo outros imperativo da construção de uma nova ordem
(Conaghan e Malloy, 1994, esp. cap. 4), carac- política, sem as fragilidades do passado, repre­
(crizando-se pela combinação dos seguintes sentadas, sobretudo, pelo desregramento e pela
Iraços: alto grau de autonomia do Executivo, instabilidade institucional.
marginalização do Legislativo em face de um Esse tipo de evolução recupera a atualida­
processo decisório fechado e excludente, cres­ de de uma discussão que se desenrolou entre
cente disjunção entre escolha eleitoral e políti­ os anos 70 e 80, relacionada à afinidade entre
cas públicas, fraqueza dos partidos políticos, estratégias bem-sucedidas de estabilização
primazia da economia como disciplina condi- e/ou ajuste e regimes autoritários (Skidmore,
cionadora da política pública, baixa credibili­ 1977; Kaufman, 1985). Inspirando-se nos ca­
dade do Estado como agente do interesse pú­ sos chileno e mexicano, o argumento de que o
blico, desqualificação da política percebida sucesso das reformas neoliberais exigiria go­
como força negativa e obstrucionista, contra­ vernos fortes de forma a controlar demandas,
ção da esfera pública, regressão da noção de vencer resistências e eliminar o efeito de coa­
cidadania com o esvaziamento dos direitos so­ lizões de veto, chegou mesmo a alimentar certa
ciais e, finalmente, refluxo das organizações desconfiança em relação à democracia, neces­
sindicais. sariamente mais aberta à pressão de demandas
Desse modo, se o risco de um eventual e interesses conflitantes. Segundo esta visão, a
retrocesso autoritário pela via do golpe militar conjuntura internacional de crise, marcada
parece estai' descartado, o debilitamento do pela premência de medidas de alto impacto,
sistema democrático pelo desrespeito sistemá­ imporia um estilo de governo insulado da po­
tico à ordem legal constituída transformou-se lítica. Paralelamente, configurou-se um racio­
numa tendência, ainda que sob o manto da cínio prisioneiro do determinismo econômico,
vigência dos procedimentos formais da demo­ associando-se graus de autonomia estatal e
cracia. Tornou-se um comportamento recor­ modalidades de gestão governamental a impe­
rente o presidente em exercício, com o respaldo rativos de natureza econômica.
do Congresso, alterar as regras constitucionais Se na década de 90 este tipo de diagnós­
em vigor, tendo em vista a aprovação do prin­ tico tornou-se rapidamente obsoleto pela pro­
cípio da reeleição, negado pela maioria das pagação de estudos mostrando a inexistência
Constituições latino-americanas. Eleitos sob o de relação entre regime político e resultados

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eficientes de políticas econômicas ou, ainda, sição à dinâmica plural e competitiva do jogo
invalidando o pressuposto da incompatibilida­ democrático. A ênfase no papel primordial das
de entre formas democráticas de governo e burocracias insuladas para viabilizar a execu­
capacidade de enfrentamento da crise dos anos ção da agenda das reformas assumiu o primeiro
80 (Remmer, 1986, 1990; Nelson, 1990; Hag- plano das discussões (Waterbury,1989; Ged­
gard,1986; Haggard e Kaufman, 1989; Mara- des, 1994b). Algumas experiências nacionais
vall, 1994; Geddes, 1994a), passou-se, por ou­ seguiram de perto esse modelo. Novamente,
tro lado, a conviver com o fortalecimento de no Brasil, o governo Collor representou um
práticas pouco compatíveis com o primado do caso paradigmático de voluntarismo e perso­
governo representativo. nalismo no exercício do poder presidencial.
Em outros termos, ao binômio globaliza- O Plano Collor I seguiu a via coercitiva
ção-esgotamento do Estado intervencionista de implementação, preterindo a negociacão e
corresponderia o gradual reforço da analogia privilegiando a mudança induzida pelo mane­
entre primazia da agenda neoliberal e difusão jo de instrumentos técnicos e administrativos,
de uma concepção minimalista de democracia, pela atribuição de amplo poder de decisão a
que a esvaziaria de seu conteúdo substantivo, uma tecnocracia insulada do escrutínio público
deslocando a ênfase para a noção de mercado e avessa à consulta. O êxito dessa forma de
político sob a égide de regras e procedimentos produzir políticas depende de doses crescentes
garantidores do jogo partidário-eleitoral. de rigidez e rigor, já que a execução do progra­
Ademais, seus pressupostos tornar-se-iam su­ ma se faz por intermédio do caráter compulsó­
ficientemente elásticos para permitir a coexis­ rio das medidas e da ampliação contínua da
tência de regras com baixo grau de consistên­ regulação econômica. No limite, cria-se uma
cia interna. Analisando o impacto institucional excessiva dependência dos mecanismos coer­
das estratégias de reformas, Bresser Pereira,
Maravall e Przeworski (1993, pp. 193-194), citivos de gestão, podendo levar ao isolamento
ressaltaram os efeitos políticos perversos do e à corrosão das bases de sustentação política
estilo tecnocrático de gestão, nos seguintes do governo (Diniz, 1997a, cap. 5).
termos: Cria-se um círculo vicioso de efeitos per­
versos, pois o ideal da burocracia insulada
“De modo geral, [as reformas] são adotadas por protegida do controle público, ao aprisionar o
decreto ou, então, são forçadas a tramitar pelo Estado à meta inatingível de situar-se acima
Legislativo sem incorporar as modificações que dos conflitos, acaba por aumentar a taxa de
poderiam refletir as divergências de interesses e irracionalidade, recriando os obstáculos a uma
opiniões, revelando um estilo político claramente
autocrático, em que os governos procuram des­ ação estatal eficiente (Bresser Pereira, Mara­
mobilizar seus apoiadores em vez de adequar seus vall ePrzeworki, 1993). Além disto, esta estra­
programas mediante uma consulta pública. Em tégia só tem eficácia a curto prazo, ao conferir
resumo, a sociedade acaba aprendendo que pode maior rapidez à tomada de decisões, eliminan­
votar, mas não escolher; o Legislativo acaba se do os custos e dificuldades da negociação po­
convencendo de que não desempenha papel al­ lítica. Por outro lado, tende a criar obstáculos
gum na elaboração das políticas; e os partidos à implementação, ao colocar em segundo pla­
políticos, sindicatos e outras organizações nas­ no a busca do consentimento ativo dos atores
centes tomam consciência de que suas vozes não do jogo democrático (Diniz, 1995). Assim,
contam. Assim, o estilo político autocrático [...]
tende a minar as instituições representativas [...].” alguns autores passariam a questionar a cha­
mada falácia tecnocrática, que preconiza res­
Tais considerações põem em relevo um tringir ao máximo o acesso de políticos e gru­
terceiro paradoxo, qual seja, o contraste entre pos de interesse à formulação de políticas
racionalidade governativa e imperativos de­ como forma de conferir rapidez e eficácia ao
mocráticos, o primeiro conduzindo ao insula- processo decisório (Haggard, 1995, p. 15).
mento burocrático das decisões, em contrapo­ Ressaltando os equívocos desta visão, esses

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autores apontam os ganhos em termos de pro­ responsabilidade política constitui fator pri­
dutividade e de recuperação da autoridade es­ mordial para o bom governo, o que implica a
tatal, resultantes do maior intercâmbio com o obrigação dos dirigentes de responder por suas
sistema representativo.5 ações (World Bank, 1994, p. 12), quer diante
Resumidamente, estes são alguns dos da sociedade, quer diante de outras instâncias
principais desafios que se colocam no campo de poder.6
da teoria da reforma do Estado, já que a refor­ Sob esta ótica, a reforma do Estado não
mulação que se impõe não se restringe ao seria apenas uma questão de aumento de sua
domínio da prática governamental, se não que eficiência administrativa, mas envolveria ain­
envolve uma ampla revisão teórico-conceitual. da a revitalização dos mecanismos de cobrança
Autores como Evans (1989; 1992), Przewors- e de prestação de contas. Tais aspectos seriam
ki (1994), Malloy (1993), Grindle e Thomas crescentemente enfatizados. À luz do paradig­
(1991), Haggard e Kaufman (1992), Faucher ma agente-principal, Przeworski ressalta a re­
(1993) ePalermo (1995), entre outros, em seus levância do fortalecimento da accountability
trabalhos mais recentes, enfatizariam, crescen­ como condição do aprimoramento do regime
temente, a dimensão política da reforma do democrático (Przeworski, 1996a). Assumem o
Estado. Assumem o primeiro plano questões primeiro plano os diferentes mecanismos ins­
ligadas à negociação e à capacidade de articu­ titucionais pelos quais os governos se capaci­
lar bases de sustentação de forma a garantir a tam a controlar o comportamento dos agentes
continuidade das políticas. privados, ao mesmo tempo em que os cidadãos
Assim, por exemplo, Evans (1992) expli­ adquirem os recursos para o controle dos atos
ca o êxito do Estado desenvolvimentista nos do governo. Cidadãos, políticos e burocratas
chamados tigres asiáticos por um complexo de articulam-se estreitamente mediante o pleno
fatores, parcialmente resumidos na noção de funcionamento do sistema representativo e dos
“autonomia inserida”, que significa a combi­ mecanismos de responsabilidade pública.
nação de independência em face de interesses Dessa maneira, os anos 90 caracterizam-
de caráter particular com capacidade de inser­ se pela importância atribuída à noção de go­
ção na sociedade, configurando um Estado vernança, entendida como capacidade gover­
ativo, com forte poder regulatório e alta capa­ nativa em sentido amplo, o que envolve as
cidade de fazer valer suas decisões, tendo, ao várias dimensões do ato de governar. Entre
mesmo tempo, alto respaldo político. A força estas, sobressaem os aspectos institucional,
da sociedade civil torna-se, pois, importante técnico, administrativo e político, que, em sua
componente da eficácia da ação governamental. interdependência, respondem pela eficácia da
Caminhou-se, assim, para um relativo ação estatal. Nesse sentido, a eficiência do
consenso acerca da relevância das condições Estado não pode ser reduzida a questões como
políticas para o sucesso da administração da o tamanho da máquina administrativa ou à
crise. A melhoria da capacidade de governo capacidade de tomar decisões com rapidez e
passa a ser vista como pré-requisito da reforma agilidade, pela concentração, centralização e
econômica, ao contrário da tendência anterior fechamento do processo decisório. O termo
a enfatizar a precedência das políticas econô­ governança responde à necessidade de um en­
micas. Como ressaltam Haggard e Kaufman foque abrangente e multidimensional.
(1992, p. 331), as elites governantes e a tecno­ Tais dimensões devem, ademais, ser con­
cracia foram surpreendidas por um documento sideradas em sua articulação interna, já que a
do Banco Mundial, de 1989, no qual se admitia relação entre elas nem sempre é harmoniosa,
explicitamente a centralidade da governance podendo mesmo ser contraditória, como de­
para explicar o desempenho econômico de paí­ monstra Grindle em recente estudo na área da
ses do Terceiro Mundo. E mais, em documento política comparada (Grindle, 1996). Assim,
posterior, esta mesma agência afirmaria que a como já foi salientado anteriormente, a ênfase

10
unilateral na capacidade técnica, entendida ex­ desgaste tem raízes profundas e causas com­
clusivamente à luz da perspectiva tecnocrática, plexas, o que desde logo toma inapropriadas
tem levado ao reforço do chamado núcleo duro abordagens conjunturais e reducionistas.
do Estado, consolidando um estilo caracteriza­ Sob o impacto do surto desenvolvimentis­
do por alto grau de insularidade burocrática e ta dos anos 70, ainda durante o regime militar,
pela ampliação irrestrita do poder legislativo o país passaria por mudanças profundas, que
do Executivo. Esta forma de maximização da alterariam radicalmente seu perfil. A socieda­
capacidade técnica, por sua vez, tende a criar de evoluiu para um sistema híbrido (Diniz e
sérios entraves ao aumento das capacidades Boschi, 1989, pp. 60-64), caracterizado pela
administrativa e política do Estado, postergando coexistência de antigas e novas configurações
a reestruturação do aparelho estatal e despoliti- organizacionais e institucionais, no qual, ao
zando artificialmente o processo decisório, o que lado do corporativismo em transição, formas
acentua o descompasso entre reformas econô­ diversificadas de intermediação de interesses
micas e políticas. Em outros termos, a moder­ ocupariam um espaço cada vez maior. Tais
nização econômica é desencadeada à custa da mudanças estavam em estágio avançado quan­
preservação da face tradicional da política. do eclodiram os primeiros sinais de reversão
Ademais, a busca do êxito na área econômica de tendências na esfera internacional (Santos,
e o atrelamento da reforma do Estado à meta W., 1985). Portanto, tal como foi ressaltado
da austeridade orçamentária e financeira estão anteriormente, as interpretações dicotômicas
freqüentemente associados ao enfraquecimen­ seriam inapropriadas, impondo-se uma abor­
to da capacidade administrativa, com a dete­ dagem”^capaz de integrar os dois planos da
rioração da máquina burocrática, a degradação análise, associando à dimensão externa os con­
do serviço público e a perda de status do fun­ dicionamentos internos relacionados com a
cionário, inviabilizando a provisão de bens e a corrosão da ordem pregressa (Diniz, 1995).
produção dos serviços públicos essenciais. Uma das principais manifestações da ero­
são da antiga ordem foi a crise fiscal de amplas
A Crise do Estado no Brasil: proporções que afetou os Estados latino-ame-
Principais Formulações ricanos nas três últimas décadas, e que termi­
O diagnóstico sobre a crise do Estado no nou por inviabilizar o financiamento da matriz
Brasil sofreu variações significativas ao longo protecionista e autárquica que, em um prazo de
das duas últimas décadas. Uma primeira ten­ 50 anos, transformara países como o Brasil em
dência foi a de associá-la unilateralmente às complexas sociedades urbano-industriais
inj unções externas. Segundo esta ótica, o aban­ (Bresser Pereira, 1996). Ao ser aprofundado
dono do modelo desenvolvimentista do passa­ (Werneck, 1987; Bresser Pereira, 1992,1993,
do e do padrão de ação estatal que lhe deu 1995), este diagnóstico revelou aspectos es­
suporte seria uma exigência inexorável da cri­ senciais da crise, destacando as distorções que
se e da constituição de uma nova ordem na o Estado desenvolvimentista acumulara ao
esfera internacional. longo do tempo, responsáveis pelo comprome­
Embora os condicionantes externos não timento de sua capacidade de governar. Nes­
possam ser desconsiderados, é preciso também ta linha, define-se a crise fiscal, não apenas
levar em conta o complexo de fatores que pelo déficit público, mas também pelo alto
conduziram à corrosão da ordem estatista, em grau de endividamento externo, pela pou­
seus diferentes níveis, tais como as formas pança pública negativa e, em conseqüência,
predominantes de articulação Estado-socieda- pela falta de recursos para o Estado financiar
de, as relações capital-trabalho, o padrão de suas operações e atividades essenciais (Bres­
administração do conflito distributivo ou, ain­ ser Pereira, 1996, p. 50).
da, a modalidade de relacionamento entre os Por outro lado, a literatura especializada
setores público e privado. Este processo de revelou outros aspectos que não podem ser

11
desconsiderados, entre os quais cabe destacar cimento econômico para o país, a formulação
a disjunção Estado-sociedade, expressão das de uma política industrial, as propostas de ate­
mudanças estruturais desencadeadas pelo pró­ nuação das desigualdades sociais seriam siste­
prio êxito da industrialização substitutiva no maticamente postergados em nome de uma
Brasil (Santos, W., 1985). Entre as décadas de rígida escala de prioridades, unilateralmente
50 e 70, à medida que se constituía no país uma identificada com o combate à inflação. Os
sociedade urbano-industrial altamente com­ projetos igualitários, implicando aumento dos
plexa e heterogênea, observou-se gradualmen­ gastos sociais, seriam interpretados sob o ân­
te o processo de extenuação do Estado corpo­ gulo de sua extemporaneidade. Privilegiou-se,
rativo, legado dos anos 30, em sua capacidade portanto, uma agenda minimalista, em franco
de conter e administrar uma sociedade civil em descompasso com a dinâmica democratizante,
expansão que viria a adquirir crescente densi­ cujos efeitos apontariam na direção oposta,
dade organizacional. O hiato entre uma insti- determinando aumento da participação, forte
tucionalidade estatal rígida, dotada de fraco pressão por incorporação política e ampla di­
potencial de incorporação política e uma estru­ versificação de demandas (Diniz, 1995). Desta
tura social cada vez mais diferenciada e mati­ forma, enquanto o processo de democratização
zada aprofundou as tensões associadas ao pro­ levava ao aumento da mobilização social e
cesso de modernização. Evoluiu-se para uma política, o êxito das políticas econômicas seria
estrutura multifacetada e multipolar de repre­ interpretado em termos da necessidade de ex­
sentação de interesses, através da qual a diver­ pandir os mecanismos de controle e disciplina,
sidade dos grupos extravasou do arcabouço de forma a reduzir os riscos de instabilidade.
institucional vigente, implodindo o padrão de Em contraposição, segundo a nova pers­
controle corporativo do Estado sobre a socie­ pectiva aqui destacada, um aspecto crucial da
dade (Diniz e Boschi, 1991). Este profundo crise institucional brasileira está representado
processo de reordenamento social, ainda em pelo aprofundamento da defasagem Estado-
curso, expressa-se pela coexistência de forma­ sociedade, ao lado da ineficácia do poder pú­
tos corporativos, pluralistas e clientelistas, ao blico na gestão dos problemas mais prementes,
lado de estilos predatórios e universalistas de tais como os baixos níveis de crescimento eco­
interação de atores, pela intensa atuação de nômico, a desigualdade, a deterioração social,
lobbies e grupos de pressão, ou ainda pela os altos índices de exclusão e violência. Para
busca de novas formas de expressão de identi­ lidar com este tipo de questões, a reforma do
dades sociais reprimidas, como o Movimento Estado não pode estar dissociada da revitaliza­
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra — MST, ção das instâncias de representação e das prá­
no seu esforço de abrir espaço na agenda pú­ ticas de negociação, tendo em vista o aprimo­
blica para o enfrentamento da questão agrária. ramento das condições de governabilidade
Tais tendências radicalizariam a obsolescência democrática (Melo, 1995; Ugá, 1997).
da matriz estatista concentradora e evidenciariam O legado da antiga ordem manifesta-se
a urgência de um padrão mais descentralizado e também pela tendência à privatização do Esta­
flexível de ação estatal (Diniz, 1997b, p. 10). do, traço associado à modalidade específica de
Em contraste com este quadro, um fator articulação entre os setores público e privado,
conjuntural veio a agravar o divórcio Estado- propiciado pelo padrão corporativo de inter­
sociedade. A prioridade atribuída aos progra­ mediação de interesses historicamente conso­
mas de estabilização econômica e o acirramen­ lidado (Diniz, 1978; Boschi, 1979; Melo,
to dos conflitos em tomo da alocação de 1990). A representação privilegiada das elites
recursos escassos traduziram-se no estreita­ empresariais com a exclusão paralela dos tra­
mento da agenda pública, com o deslocamento balhadores e a ausência da mediação partidá­
dos itens relacionados às reformas sociais. O ria, associadas à centralidade do Executivo e à
esforço de definir uma nova estratégia de cres­ concentração do processo decisório no aparato

12
burocrático, consagrariam um formato estatal Na discussão em torno do diagnóstico da
impermeável ao controle público. Configurou- crise do Estado, a debilidade da dimensão legal
se um sistema de arenas fechadas e monopo­ dos Estados latino-americanos foi enfatizada
lizadas por um pequeno círculo de interesses, por O’Donnell (1993, esp. pp. 1356-1360)
isoladas das pressões sociais e infensas aos como um traço de continuidade que, a partir
mecanismos de cobrança (Diniz, 1997a). dos anos 80, manifestar-se-ia sob forma parti­
O estreitamento dos vínculos entre elites cularmente aguda. Configura-se, assim, uma
estatais e empresariais, em certos momentos situação de baixa institucionalidade, dando
no tempo e em certas agências burocráticas, origem à expansão das chamadas “áreas mar­
sob os efeitos de um contexto fracamente com­ rons,” isto é, a proliferação dos espaços em que
petitivo, gerou situações de intrincado entrela­ a presença estatal se torna tênue ou mesmo
çamento de interesses e mesmo de subordina­ inexistente. Nas palavras do autor, “um Estado
ção do público ao privado. Sob diferentes forte, independente do tamanho de sua buro­
designações, como captura do Estado (Stigler, cracia, é aquele que efetivamente estabelece a
1975; Tollison, 1982), caráter bifronte do cor­ legalidade e que não é percebido pela maioria
porativismo (O’Donnell, 1976), ou privatiza­ da população como apenas uma arena para a
ção do Estado ( Diniz e Boschi, 1991; Diniz, satisfação de interesses particularistas” (idem,
1992), diferentes autores chamariam a atenção p. 1358). Em conseqüência, a dimensão repu­
para as distorções e perda de eficiência da blicana, que se refere à credibilidade do Estado
gestão estatal, em conseqüência do prevaleci- como instituição que opera em nome do inte­
mento da ótica dos interesses privados. Forte resse público e que é essencial para caracteri­
no sentido do poder decisório nele concentra­ zar um sistema poliárquico, torna-se extrema­
do, o Estado brasileiro revelou-se extrema­ mente debilitada, dificultando o processo de
mente débil quanto à sua eficácia na obtenção consolidação democrática.
de conformidade e de aquiescência às suas De forma similar, focalizando o caso do
decisões. Brasil, Santos refere-se ao híbrido institucional
A hipertrofia estatal manifestar-se-ia por brasileiro, chamando a atenção para a insufi­
intermédio de uma burocracia centralizada, ciência da cobertura legal e jurídica proporcio­
com alta discricionariedade, porém ineficaz, nada pelo Estado, ocasionando um grau extre­
caracterizando-se por alta permeabilidade aos mo de retração da esfera pública e exacerbando
interesses dominantes e baixo grau de respon­ o hobbesianismo social (Santos, W., 1992,
sabilidade política. Como em outros países 1993). Desta forma, ter-se-ia uma modalidade
latino-americanos, a incapacidade de arreca­ de democracia peculiar, em que a esfera poliár-
dar impostos, punir desvios de recursos públi­ quica se sobrepõe a grandes vazios institucio­
cos, evitar desperdícios, combater a corrupção, nais, nos quais o que prevalece é a ausência de
produzir e administrar políticas redistributivas, direitos e a falta de acesso à ordem legal, o que
tornou-se crônica. Na verdade, representou a reduz, se não inviabiliza, o exercício da cida­
outra face da insularidade do Estado, configu­ dania.
rando uma situação de desequilíbrio perma­ Finalmente, no que se refere à produção
nente, síndrome de inoperância e prepotência, de políticas públicas, o Estado brasileiro en­
que se traduziria na presente crise fiscal. Esta frentaria sérias dificuldades de implementa­
é, aliás, como salienta Przeworski (1994, p. ção, enquanto os entraves à capacidade deci­
194), uma característica não só dos países da sória seriam sistematicamente contornados
América Latina, como do Leste Europeu, nos pelo recurso ao insulamento burocrático, ten­
quais a fraqueza do Estado se revela por sua dência amplamente referida pela literatura.7
incompetência na cobrança de tributos e sua Este complexo de fatores produz um quadro
inépcia na preservação da efetividade das de­ particularmente crítico. Eis porque, ao lado da
terminações legais. crise fiscal, apontada pelo diagnóstico oficial

13
como componente central da crise do Estado sões que, segundo a ótica de Michael Mann
(Bresser Pereira, 1995), outros elementos, (Mann, 1986, pp. 246-248), caracterizam o
igualmente relevantes, não podem ser descon­ poder do Estado, quais sejam, os poderes des­
siderados. Entre eles, o baixo grau de account­ pótico e infra-estrutural.9 O primeiro diz res­
ability e a baixa capacidade de fazer valer as peito à capacidade de as elites estatais tomarem
leis e decisões governamentais merecem refe­ iniciativas que transcendam a negociação ins­
rência especial. titucionalizada com grupos da sociedade civil.
À inexistência e baixa eficácia dos meca­ O segundo refere-se à capacidade do Estado
nismos de controle externo, por parte dos dife­ penetrar efetivamente a sociedade civil e im­
rentes poderes e da própria sociedade, associa- plementar logisticamente as decisões políticas
se a prática da reforma pelo alto, de longa por todo o seu domínio. Tal visão tem a vanta­
tradição no país, produzindo condições adver­ gem de permitir a ruptura com a dicotomia
sas à institucionalização dos mecanismos de Estado forte-Estado fraco, tão comum à maio­
cobrança e prestação de contas. O desenho ria das análises e que constitui uma camisa de
institucional prevalecente, por sua vez, conso­ força, já que, em grande parte das situações
lidou uma estrutura de oportunidades e incen­ históricas, o Estado é forte numa dimensão e
tivos francamente desfavorável à responsabili­ fraco na outra. Ademais, como ressalta Reis, o
zação pública dos governantes. Ademais, a enfoque de Mann rejeita as antíteses simples
baixa presença do Estado em segmentos e entre Estado e sociedade civil, pois tais termos
áreas expressivas do país, sua omissão na pres­ estão temporalmente articulados, variando
tação de serviços essenciais, na provisão uni­ seus respectivos graus de autonomia de um
versal de bens públicos e na garantia da ordem momento a outro (Reis, 1991, pp. 47-48). Des­
legal, claramente inexistente em parte substan­ ta forma, não faz sentido atribuir ao poder do
cial do espaço social, transformaram-se num Estado um grau permanente, a-histórico de
fator de agravamento do quadro de deteriora­ autonomia, como se se tratasse de um atributo
ção social. Assim, a reforma social e a reforma fixo do Estado, passível de ser assegurado
do Estado são estreitamente interdependentes. mediante algum tipo de mecanismo institucio­
Tais traços foram exacerbados pelos go­ nal. Este é o equívoco, por exemplo, das aná­
vernos da Nova República, em nome da maior lises que ressaltam a eficácia da fórmula tec-
eficácia no enfrentamento da crise. Toma-se, nocrática como receita institucional para
pois, pertinente deslocar o foco para o contras­ garantir o insulamento burocrático e, simulta­
te entre a hipertrofia do poder decisório da neamente, aindepedência, ou mesmo aisenção
cúpula governamental e a falência executiva de um Estado supostamente eqüidistante do
do Estado. Assim, os pontos de estrangula­ jogo político e do conflito de interesses. Nesta
mento estão situados, sobretudo, no âmbito da linha de argumentação, é possível caracterizar a
implementação e da garantia da continuidade crise do Estado, que se acentua com o advento da
das políticas formuladas (Diniz, 1995, 1996, Nova República, como resultante do descompas­
1997a). Observou-se o fortalecimento do po­ so entre o reforço do poder despótico paralela­
der de Estado, quanto à sua alta margem de mente ao debilitamento do poder infra-estrutural
ação independente, em virtude da forte con­ do Estado (Diniz, 1997b, pp. 2 e 3).
centração do processo decisório na cúpula tec- A despeito do argumento que enfatiza a
nocráticae, especialmente, pelo vastojjoder de eficácia da insularidade burocrática se referir
decreto da Presidência da República. Por ou­ reiteradamente à falta de cooperação do Con­
tro lado, pelos motivos já assinalados, verifi- gresso como um dos principais obstáculos à
cou-se a persistência de grande parte dos obs­ realização das reformas, uma parte da literatu­
táculos à eficácia da implementação. ra especializada vem destacando que, ao longo
O referido contraste adquire maiorclareza dos últimos governos, o que se tem observado
quando se introduz na análise as duas dimen­ é a proliferação de decisões tomadas com ex­

14
pressivos graus de liberdade, sem consulta e de um Legislativo agressivo e indisciplinado
sem transparência, por um pequeno círculo que carece de sustentação empírica (Diniz, 1995;
se localiza em instâncias enclausuradas na alta Fiori, 1993). Se em algumas oportunidades, a
burocracia. Tais esferas administrativas si­ ação do Executivo foi obstruída pela resistên­
tuam-se fora do controle político e do escrutí­ cia do Congresso, o saldo, sobretudo no que
nio público. Este poder de decisão ampara-se diz respeito às áreas decisivas para o comando
na hipertrofia da capacidade legislativa do da economia, revela a supremacia do primeiro.
Executivo, cuja produção legal — mediante o Este poder tem, de fato, determinado a agenda
uso indiscriminado de Decretos-Leis e Medi­ e o conteúdo da produção legal do país, pro­
das Provisórias — a partir do governo Sarney, cesso, em grande parte responsável pela corro­
tem sido sistematicamente superior à produção são da autonomia do Legislativo (Monteiro,
m édia do Congresso (M onteiro, 1995a, 1995a, 1995b; Figueiredo e Limongi, 1994,
1995b), desequilíbrio que persitiria no decor­ 1995). Situando o caso brasileiro como uma
rer dos últimos cinco anos. forma de democracia com poder concentrado,
Assim, por exemplo, entre 1985 e 1988, Santos reafirma que a legislatura é um poder
foram promulgados 376 Decretos-Leis, en­ menorno processo decisório do país, acrescen­
quanto entre os governos Sarney e Itamar tando, porém, uma nova dimensão à análise,
Franco, entre edições e reedições, observou-se qual seja, as características organizacionais do
o total de 1.269 MPs (Pessanha, 1997, p. 102). próprio Legislativo, que ajudam a explicar por
Levantamentos mais recentes mostram uma que os políticos contribuem para reforçar esta
tendência crescente à utilização desses instu- situação periférica (Santos, F., 1997).
mentos legais, ao longo dos quatro governos As evidências sugerem, portanto, que não
civis, destacando-se o atual presidente que, só só o Congresso não foi obstáculo, como favo­
no ano de 1995, já havia superado os demais, receu as iniciativas presidenciais, fato particu­
larmente marcante no atual governo. Tais con­
com 450 MPs (Diniz, 1997a, p. 182). Segundo siderações permitem uma ruptura com as
dados da Câmara dos Deputados, o atual go­ análises mais correntes acerca da crise de go­
verno, até agosto de 1997, havia editado e vernabilidade correspondente à primeira déca­
reeditado um total de 1.551 MPs, superando os da pós-autoritarismo (1985-1995), centradas
governos anteriores em termos de média men­ no pressuposto da forte pressão de demandas
sal de emissões: 8,15, em contraste com 3,32; sociais e/ou políticas, gerando paralisia deci­
3,45 e 7,25, para os seus antecessores, os pre­ sória. Alternativamente, o risco de ingoverna-
sidentes Itamar Franco, Collor e Sarney (San­ bilidade pode ser associado ao acentuado de­
tos, L., 1997). Nas palavras de Monteiro, o sequilíbrio entre os poderes despótico e
Plano Real “promoveu a mais intensa interven­ infra-estrutural do Estado brasileiro.
ção regulatória na economia, desde 1990. Para
tanto, lançou-se mão de uma peculiar âncora Considerações Finais
institucional, a volumosa emissão de Medidas
Provisórias, o equivalente a 70% do total de O diagnóstico da crise do Estado extrapo­
MPs dos anos 90, ou cerca de 2/3 de toda a la, portanto, as questões ligadas à autonomia
emissão já ocorrida, desde a criação deste me­ burocrática, envolvendo, principalmente, a ca­
canismo, em 1988” (Monteiro, 1996, p. 15). pacidade de gerar adesão e garantir sustentabi-
Cabe ainda destacar que, no atual período pre­ lidade política às decisões. Sob este ponto de
sidencial, nenhuma das MPs examinadas pelo vista, a pergunta fundamental refere-se a como
Congresso foi rejeitada, enquanto no conjunto maximizar a eficácia da ação estatal. A discus­
dos governos anteriores apenas 19 o foram são contemporânea adota um enfoque abrangen­
(Pessanha,1997, p.102). te, compreendendo não só os aspectos técnicos e
Por conseguinte, o argumento que vê o administrativos, como também a dimensão polí­
Executivo paralisado pelo poder de bloqueio tica das atividades governamentais. Assim,

15
cabe destacar os requisitos políticos que possi­ os incentivos para a promoção do interesse
bilitam uma ação eficiente por parte do Estado público. Por contraste, sob a vigência de me­
(Geddes, 1994; Haggard, 1996). O êxito dos canismos e procedimentos que induzam os
programas governamentais requer, além dos decisores a prestar contas dos resultados de
instrumentos institucionais e dos recursos fi­ suas ações, garantindo, ademais, transparência
nanceiros controlados pelo Estado, a mobiliza­ e exposição pública das políticas, a promoção
ção dos meios políticos de execução. A garan­ do bem-estar geral e das metas coletivas toma-
tia de viabilidade política, por sua vez, envolve se menos problemática. A luz da perspectiva
estratégias de articulação de alianças e coali­ principal-agente, Przeworski chama a atenção
zões capazes de fornecer respaldo às decisões, para este ponto, ressaltando a importância do
qualquer que seja o regime político em vigor fortalecimento dos mecanismos de controle e
(Grindle e Thomas, 1991; Silva, 1993). supervisão da burocracia, de forma a reverter
Tais requisitos são contemplados pelo distorções e interferências particularistas no
conceito de governança, cuja pertinência vem processo decisório. Em suas palavras, o uso
sendo crescentemente ressaltada por alguns abusivo do poder de decreto em países como
trabalhos voltados para esta temática. Tal Peru, Argentina e Brasil, em anos recentes, ao
como definido por uma recente corrente da restringir a informação e o debate, reduziria a
literatura, governança significa a capacidade efetividade dos mecanismos de cobrança,
de o governo resolver aspectos da pauta de aprofundando o déficit de responsabilidade
problemas do país através da formulação e da política (accountability) historicamente acu­
implementação das políticas públicas perti­ mulado (Przeworski, 1996a, p. 27).
nentes (Conaghan e Malloy, 1994, p. 14). Em Portanto, os altos níveis de poder discri­
outros termos, trata-se da capacidade de tomar cionário concentrados no Executivo, sob ajus-
e executar decisões, garantindo seu efetivo tificativa de garantir eficácia na gestão das
acatamento pelos segmentos afetados, contri­ reformas, têm custos para o processo de con­
buindo, desta forma, para assegurar sua conti­ solidação da democracia, sem produzir condi­
nuidade no tempo (Cohen e Rogers, 1992, ções favoráveis à isenção, no processo de pro­
1995; Hollingsworth, Schmitter e Streek, dução de políticas. E preciso não esquecer que,
1994; Conaghan e Malloy, 1994; Locke, ao mesmo tempo em que as reformas produ­
1995). Neste sentido, a noção de governança zem perdedores, dão origem a coalizões ven­
envolve não apenas a capacidade de o governo cedoras; da mesma forma que intensificam
tomar decisões com presteza, mas também sua clivagens intere intra-setoriais e deslocam an­
habilidade de sustentar suas políticas, gerando tigos padrões de representação corporativa,
adesões e condições para o desenvolvimento abrem espaço para novas formas de pressão,
de práticas cooperativas, o que implica romper com a difusão das atividades de poderosos
com a rigidez do padrão de gestão pública lobbies e alianças transnacionais, envolvendo
dominante. Trata-se de criar condições de in­ atores externos e internos. Enfim, desarticu-
serção social e de incorporação política onde lam-se antigas coalizões distributivas e criam-
possível e apropriado (Evans, 1989, 1992). se novas, reativando-se o jogo dos interesses.
Segundo o enfoque tecnocrático, de longa Em síntese, superar a dicotomia Estado-
tradição no país, o confinamento burocrático mercado implica formular um novo paradigma
seria o fator adequado ao aprimoramento da para pensar a reforma do Estado. A partir da
qualidade das decisões, maximizando seu teor literatura examinada, é possível sugerir a ne­
universalista. Entretanto, o desenho institucio­ cessidade de conceber novos estilos de gestão
nal em que se baseia este estilo de gestão não governamental, reformulando as práticas mais
só não elimina as práticas de rent-seeking, convencionais de administração pública. A
como também não é apropriado à consecução criação de espaços de negociação e de incenti­
de objetivos sociais, reduzindo, ao contrário, vos introduzidos por novos arranjos institucio­

16
nais permite conduzir a formação e o modo de do aperfeiçoamento das capacidades de co­
atuação dos grupos da sociedade na direção mando, de coordenação e de implementação
almejada. Este resultado, porém, não pode ser do Estado, além de requerer o aprimoramento
produzido aleatoriamente, implicando, ao con­ dos meios de intervenção na ordem associati­
trário, acionar instrumentos que viabilizem a va. Em última instância, alcançar tais objetivos
inserção do Estado na estrutura social, sem exige uma estratégia política para conduzir
abdicar de sua autoridade e de seu poder de acordos e alianças, articulando arenas de nego­
coordenação. ciação às instituições estatais.
Evitar a captura do poder público por inte­ Em síntese, a sugestão de um novo para­
resses particulares ou — o que nada mais é digma para pensar a reforma do Estado impõe
senão a outra face da questão — o uso abusivo não só uma ruptura com os enfoques tecnocrá-
das prerrogativas do cargo por parte da buro­ tico e neoliberal. Requer ainda a redefinição do
cracia é uma tarefa complexa. Requer que se conceito dominante de autonomia estatal, bem
produza um meio institucional e associativo como do modelo de gestão pública a ele asso­
favorável ao desempenho governamental efi­ ciado. Aquele é entendido predominantemente
ciente. Não se trata de contrapor o mercado ao em termos de concentração do poder decisório
Estado, mas de criar condições institucionais na cúpula burocrática, visando ao aumento de
que induzam os atores individuais a agirem de sua capacidade de eliminar pressões e de ven­
modo compatível com os interesses coletivos cer resistências. Este é interpretado como cam­
(Przeworski, 1996b, p. 22). Aqui também re­ po privilegiado para a atuação de técnicos e
vela-se o anacronismo dos antigos desenhos especialistas, dotados do monopólio dos ins­
institucionais e a atualidade dos mecanismos trumentos de ação governamental, de acordo
capazes de atenuar a defasagem governantes- com uma visão que encara eficiência como
governados, reduzindo o duplo divórcio Exe- supremacia do saber técnico. O pressuposto
cutivo-Legislativo e Estado-sociedade (Diniz, deste tipo de enfoque dominante é o de que
1997, p. 197). autoridade estatal e eficiência técnica seriam
Desta forma, a noção de eficácia do Esta­ incompatíveis com transparência e abertura do
do implica, além das questões ligadas à com- processo decisório, ou com a extensão da par­
pêtencia e eficiência da máquina estatal, levar ticipação. Como num jogo de soma zero, se­
em conta os aspectos associados à sustentabi- riam dinâmicas contraditórias. Em contrapar­
lidade política das decisões e à legitimidade tida, segundo uma outra linha analítica, a visão
dos fins que se pretende alcançar por meio da de capacidade governativa sugerida pressupõe
ação governamental. Aumentar os graus de o aumento da participação e a ampliação dos
governabilidade de uma ordem democrática controles externos, pelo reforço dos mecanis­
não exige apenas um melhor desempenho da mos e procedimentos formais da prestação de
máquina burocrática, elevando seu nível técni­ contas ao público, ao lado da institucionaliza­
co, mas também o reforço da responsabilidade ção das práticas de cobrança por parte dos
do Estado em face das metas coletivas e das usuários dos serviços públicos e dos organis­
demandas dos diferentes segmentos da socie­ mos de supervisão.
dade. Algumas experiências recentes, embora
O problema da governabilidade deve ser incipientes, apontam na direção aqui indicada.
examinado em seu teor multidimensional, en­ No âmbito do governo federal, as Câmaras
volvendo os instrumentos institucionais, os re­ Setoriais, que funcionaram nos governos Col-
cursos financeiros e os meios políticos de exe­ lor e Itamar, abriram espaço para o desenvol­
cução. Por sua vez, a reforma do Estado, vimento de um padrão tripartite de negociação,
crucial para a construção de uma nova ordem, envolvendo os atores interessados, empresá­
implica expandiras condições gerais de gover­ rios e trabalhadores, ao lado de autoridades
nança do conjunto do sistema estatal, através governamentais, na busca de soluções acorda­

17
das para áreas específicas de políticas. Na es­ o fortalecimento da autoridade estatal, aumen­
fera local, os Conselhos Municipais nas áreas tando de uma forma não convencional a efi­
de desenvolvimento urbano, transporte, habi­ ciência da máquina governamental. Trata-se de
tação, saneamento e meio ambiente, bem como novos experimentos que poderão mudar efetiva­
os exemplos de orçamento participativo ilus­ mente os estilos de gestão pública, bem como as
tram experiências de local governance, cada formas de articulação Estado-sociedade.
vez mais difundidas.10 Este último combina
participação direta com o reforço da democra­ (Recebido para publicação
cia representativa, consulta e negociação com em dezembro de 1997)

Notas
1. Em recente trabalho, Lima discute com propriedade este ponto, concluindo: “Na atualidade,
perdeu qualquer relevância pensar a política internacional desvinculada da dinâmica interna.
Da mesma forma que é cada vez mais problemático analisar a política doméstica sem
considerar o contexto externo” (1996, p. 415).
2. Como argumentam Melo e Costa (1995, p. 101), “ Contribuições recentes deslocaram o plano
de análise para a consideração das fontes externas dos processos políticos internos, em
particular dos processos de formação de coalizões entre atores. Ou seja, a questão da interação
fatores externos/fatores internos aos países passa a ser privilegiada, ainda que de forma
incipiente”. Desta perspectiva integrada, a análise acerca de como se formam e operam as
redes transnacionais de conexão constitui um tema da maior relevância.
3. Para uma discussão das políticas preconizadas pelo chamado Consenso de Washington, ver
Williamson, (1993).
4. Pereira (1998, pp. 81 e 82 principalmente), ressalta também, em recente resenha sobre a
literatura internacional, a importância atribuída à fórmula do insulamento burocrático como
meio de aumentar a eficácia da ação estatal.
5. Nas palavras de Bresser Pereira, Maravall e Przeworski (1993, p. 191), “Assim, consideramos
que a decisão de subordinar a estratégia de reforma ao jogo das interações das forças políticas
é superior em todos os três aspectos: aperfeiçoa a política, gera apoio para a continuação das
reformas e ajuda a consolidar as instituições democráticas. Não acreditamos que seja preciso
sacrificar a discussão pública para se obter planos econômicos corretos”.
6. Em pesquisa realizada sob o patrocínio do Banco Mundial, Leila Frischtak discute o conceito
de governance, enfatizando a dimensão da capacidade de liderança dos governantes para o
êxito das políticas de reforma (Frischtak, 1996, pp. 1-30).
7. Em livro publicado recentemente, Edson Nunes faz um balanço da bibliografia pertinente
(Nunes, 1997).
8. A concentração do poder decisório na alta tecnocracia e a precedência do Executivo em
relação ao Legislativo não se verificam apenas na esfera da política macroeconômica,
envolvendo os programas de estabilização e ajuste, mas também no que se refere a grande
número das políticas setoriais, nas áreas industrial, social e cultural (Santos, Rua e Costa
Filho, 1991; Castro, 1991; Rua e Aguiar, 1995; Diniz e Boschi, 1998).
9. Em um interessante estudo sobre a República Velha, Elisa Reis (1991) utiliza de forma
particularmente arguta a perspectiva de Michael Mann aqui salientada.
10. Em recente trabalho Bo§chi faz um balanço da literatura sobre o tema da governança local no
Brasil, apontando seu alcance e seus limites (Boschi, 1997).Ver também Coelho e Diniz
(1997) para uma discussão do conceito de governance e análise de algumas experiências de
local governance.

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Resumo
Globalização, Ajuste e Reforma do Estado: Um Balanço da Literatura Recente
O presente artigo tem por objetivo avaliar a produção teórica formulada na presente década, tanto
no Brasil como no meio acadêmico internacional, para a análise da reforma do Estado, tema que
se tornou prioritário a partir do início dos anos 90. Sem pretender oferecer um tratamento exaustivo
da bibliografia disponível, propõe-se, ao contrário, um esforço de sistematização bastante espe­
cífico, articulado em torno de um eixo, qual seja, uma análise crítica das perspectivas reducionistas
e dos enfoques dicotômicos que caracterizam parte considerável da produção nesta área. Ao
detectar uma crise de paradigmas e da capacidade analítica para lidar com a complexidade das
questões envolvidas, o artigo conclui, enfatizando a necessidade de a reflexão acadêmica buscar
novas formulações teóricas que possam dar conta das relações Estado, mercado e política,
internamente, bem como, no plano externo, da articulação Estados nacionais — sistema interna­
cional, na fase atual marcada pela globalização capitalista e pela consolidação da democracia.
Abstract
Globalization, Economic Adjustment, and State Reform: An Evaluation of Recent Literature
The article evaluates the current decade’s theoretical production in Brazil and in the international
academic world with regards to State reform, an issue that moved to the top of the agenda in the
early 1990s. With no pretense of offering an exhaustive examination of all available bibliography,
the article instead undertakes a systematization focused around a specific question: the critical
analysis of the reductionist and dichotomous approaches that have characterized a large part of
production in this area. What is detected is a crisis in paradigms and an inability to deal analytically
with the complexity of the issues involved. Academic reflection must now pursue new theoretical
formulations able to account for the relations between State, market, and politics within the
domestic sphere, while in the international arena it is necessary to account for relations between
nation-states and the international system, characterized by capitalist globalization and democratic
consolidation during the present phase.

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