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ABSTRACT: The literature of Clarice Lispector is presented as fiction that gives rise
to symbolic representation, highlighting signs of psychoanalytic gestures, since the
characters are confronted with conflicting situations in search of their identity. The
present article focuses on the observation of metaphors that indicate the play
between the cognitive, physical, political and symbolic gestures in the dialogues,
which occurs sometimes in a monological way, sometimes in a dialogical way, and
sometimes in the discourse of soliloquy. The theoretical basis is Freud (1995), Platão
(1997), Aristóteles (1998), Gotlib (1999), Pontieri (1999), Silva (2005), Beigui (2006),
Homem (2012), and Santos (2012).The analysis showed that the psychoanalytic
gesture in Clarice Lispector with a psychological, cognitive, symbolic, physical,
political and theatrical characterization of the characters leads to a theatrical and
∗
Doutora em Letras pelo Programa de Pós-Graduação, em Estudos da Linguagem (PPgEL), do
Departamento de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Linha de
pesquisa: Poéticas da Modernidade e da Pós-Modernidade.
∗∗
Doutor em Estudos da Linguagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2015). É
professor adjunto da Universidade Federal Rural do Semi-Árido, atuando no Departamento de
Ciências Humanas, do Campus Multidisciplinar de Angicos.
∗∗∗
Mestre em Engenharia de Petróleo e Gás pela Universidade Potiguar (UnP-RN, 2013). Atualmente
é professor com dedicação exclusiva na Universidade Federal do Oeste do Pará – UFOPA.
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OdisseiA ISSN: 1983-2435
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OdisseiA ISSN: 1983-2435
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OdisseiA ISSN: 1983-2435
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OdisseiA ISSN: 1983-2435
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OdisseiA ISSN: 1983-2435
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com ódio de si mesmos e do outro. No caso da personagem, o seu ódio não era do
seu esposo, mas talvez de si. Ao chegar ao zoológico, a protagonista se depara e
projeta sua busca pelo ódio de si nos animais. A sua decepção ocorre por encontrar
sempre o oposto do que procurava, uma espécie de espelho invertido. A imagem
que ela busca encontra-se sempre no contrário do que procura. Há, na busca da
protagonista, toda uma performance acompanhada pelo gesto simbólico.
Vale destacar ainda que a mão é bastante citada, não como utilizada
comumente para pegar algo, mas sim como uma totalidade da personagem. Uma
parte que emerge o todo. Beigui (2006) em sua tese apresenta “a mão” em Clarice
Lispector como símbolo de todo um campo tateável e imperativo do gesto, sendo
este variável, apresentando-se ora como forma de aproximação do escritor e do
leitor, demarcando o espaço entre ambos; ora como forma de interferir interiormente
em uma ordem preestabelecida, operando como elemento catalisador, como em:
“então estendo a mão e salvo uma criança.” (BEIGUI, 2006, p. 105). Nesse
fragmento, vê-se a mão como meio de organização e redenção.
Para Beigui (2006), a mão em Lispector apresenta-se de maneira abundante
em sua escritura. Mesmo como símbolo, o jogo gestual está presente, esse jogo não
ocorre pelas mesmas vias e funções. “A mão que escreve, a mão que prepara, a
mão que segura, a mão que brinca, a mão que mata.”( BEIGUI,2006,p.107). E ainda
cita a ação da mão em Carlota do conto A Imitação da Rosa: “Mas quando viu as
horas lembrou-se, num sobressalto que a fez levar a mão ao peito, que se
esquecera de tomar o copo de leite” (LISPECTOR, 1998, p. 36). A utilização da mão
pela protagonista acaba significando uma maneira de interceder nas suas ações,
que por sua vez poderia ser realizada pelo corpo, ou mesmo por uma parte do
corpo, pelos sentidos e, essa mediação acontece por meio de gestos físicos e
simbólicos. “Com os punhos nos bolsos do casaco, olhou em torno de si, rodeada
pelas jaulas fechadas. Continuou a andar” (LISPECTOR, 1998, p. 126).
As narrativas de Lispector desenvolvem uma sensibilidade em direção a algo
que ultrapassa o argumento visual ou estético na obra, pois os sentidos são
aguçados. Grande parte das narrativas da autora é marcada pelo gesto simbólico,
presente também, como se viu, em: O Grande Passeio, Restos de Carnaval, O
Búfalo, entre outros. Paralelamente a ideia de uma epifania gestual, verificou-se que
a duplicidade do eu é uma constante na obra da autora. O duplo do gesto, o duplo
do nomear, correspondem, inevitavelmente, ao conjunto de objetos e símbolos: o
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103
OdisseiA ISSN: 1983-2435
Por fim, há uma vida considerada para muitos como sem sentido, uma pessoa
que vive apenas do trabalho para casa. A existência da personagem é recheada de
lembranças do passado, o que facilita de certa forma, a constituição do seu eu
presente. “nunca mais vi Jack nem queria vê-lo” (LISPECTOR, 1998, p. 13). Isso
porque quando criança a protagonista se entregava a Jack. Ao ser visitada por
Ixtlan, Ruth, ela mesma, mudou sua forma de ver as ações referente à comida da
carne. “Ela nunca tinha sentido o que sentiu. Era bom demais. Ela queria que não
acabasse nunca. Como era bom meu Deus. Tinha vontade de mais, mais e mais”
(LISPECTOR, 1998, p. 17). A personagem foi tomada pelos olhos e pelo coração. “–
Eu te amo, meu amor! Meu grande amor! […] Eu me vos oferto” (LISPECTOR, 1998,
p. 17). A maneira de a personagem demonstrar amor a Ixtlan representa uma forma
de se entregar ao homem desejado, visto que ao dizer que se “oferta”, subentende-
se que se entrega de corpo inteiro.
Desta feita, pode-se dizer que na escrita de Clarice as personagens
encontram-se também encenando seus gestos, teatralizando, no sentido em que
sua construção subjetiva em relação aos seus personagens está voltada para o fato
que se desenvolve do exterior para o interior, possibilitando ao leitor conhecer o eu
de suas figuras dramáticas. Há um rompimento do ritmo da linguagem que leva a
entender o interno das coisas e do ser, no caso demonstrado especificamente por
Ruth de Miss Algrave. A sua narrativa gestual apresenta-se quase como de maneira
interativa entre interior e exterior, não estabelecendo hierarquia entre esses dois
níveis de percepção. O que importa em Clarice é a relação corpo-ambiente. É dessa
relação que a cena vive: “Ixtlan! Volte logo! Não posso mais esperar! Venha! Venha!
Venha!” (LISPECTOR, 1998, p. 19).
Entende-se que um meio utilizado por Lispector não separa em suas
personagens o vivido e o simbólico, é o físico, ou melhor, a gestualidade física, de
suas personagens, que ora se encontram presentes, ora ausentes. Nesse jogo de
presença e ausência, próprio da arte teatral, estabelece-se a poética da autora.
Assim, a escrita gestual de Lispector traduz a força que a palavra carrega, pois
através da literatura a autora concretiza a sua visão do ser e das coisas, das coisas
invisíveis e visíveis.
Percebe-se o quanto a literatura possibilita, através da palavra, apresentar o
que é muitas vezes silenciado pela própria palavra, o historiar no silêncio, uma vez
que Lispector consegue, por meio de sua escrita, “operar uma travessia em direção
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107
OdisseiA ISSN: 1983-2435
não há justiça nessa narrativa, nem a divina, nem a social: “Até que viesse a justiça
um pouco mais doida. Um que levasse em conta que todos temos que falar por um
homem que se desesperou porque neste a fala humana já falhou, ele já é tão mudo
que só o bruto grito desarticulado serve de sinalização” (LISPECTOR, 1999, p. 126).
O próprio tom de oração de Clarice é uma ironia, pois parece que para a
narradora o final trágico de Mineirinho pode ser evitado por Deus, é como se não
existisse um Deus vivo, pois a dor do protagonista não diz respeito só a ele, mas a
todos os sujeitos terrenos: “O que eu quero é muito mais áspero e mais difícil: quero
o terreno” (LISPECTOR, 1999, p. 127). Clarice não quer o sublime, quer o terreno. A
dor da experiência teatralizada por Mineirinho é sempre uma dor corporal simbólica,
dividida entre a dor individual da personagem e a dor coletiva.
A narradora utiliza do gesto político, pois se apresenta angustiada na
descrição da morte violenta do “criminoso”, que até o décimo terceiro tiro era
considerado uma ameaça à sociedade, mas para a narradora é nesse tiro – o
décimo terceiro – que ela também morre porque somos o outro: “Porque eu quero
ser o outro” (LISPECTOR, 1999, p. 124). É na união entre o pensamento da
narradora e o plano físico que se dá o apelo teatral dessa narrativa, ou melhor, da
obra clariceana. Assim, para a narradora Mineirinho é “bandido” para aqueles que
veem seus assassinatos e roubos, mas, no entanto, a justiça que se faz aqui na
Terra é uma injustiça. Isso posto, por observar no conto: “Na hora de matar um
criminoso – nesse instante está sendo morto um inocente” (LISPECTOR, 1999, p.
127).
Logo, o pensamento da narradora perpassa a ação, visto que ela é ciente de
que se o outro tivesse feito algo para mudar a vida da personagem, o fim de
Mineirinho não seria tão trágico. O sentir-se culpada pelo que aconteceu com
Mineirinho é uma espécie de denúncia, por parte da narradora, em relação ao
descaso que vivem os menos favorecidos socialmente. O tom de oração que Clarice
dá ao gesto político-social de coletivizar as injustiças sociais talvez seja um meio de
o leitor refletir sobre os gestos políticos em nosso cotidiano.
Considerações finais
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OdisseiA ISSN: 1983-2435
PONTIERI, R. Clarice Lispector: uma poética do olhar. São Paulo: Ateliê Editorial,
1999.
Recebido em 08/12/2017
Aceito em 18/03/2018
Publicado em 23/03/2018