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O LARINGECTOMIZADO: INDIVÍDUO PORTADOR DE CÂNCER DE LARINGE

Algumas das cidades brasileiras estão entre aquelas de maior incidência mundial de câncer de laringe.
O diagnóstico dessa doença, se realizado precocemente, permite um tratamento mais conservador,
deixando menores seqüelas para o indivíduo. Além disso, quando o tumor é diagnosticado tardiamente, o
tratamento do paciente muitas vezes exige a laringectomia total¸ uma cirurgia que envolve a remoção da
laringe. Embora essa seja uma poderosa opção de tratamento, sua conseqüência mais penosa é a perda da voz
produzida pelas pregas vocais.
Tal situação é ainda mais preocupante quando sabemos que muitos indivíduos operados não têm acesso a
uma reabilitação adequada, que lhes permita a recuperação da comunicação oral.
O paciente laringectomizado, embora tenha perdido a capacidade de produzir a voz com a laringe, pode
adquirir uma nova voz, produzida no esôfago, a chamada voz esofágica.
O homem aprende com as crises que enfrenta. O diagnóstico de câncer é ainda uma realidade muito dura
de ser aceita. O tratamento do câncer de laringe exige uma reorganização total do indivíduo e do ambiente em que
vive. A compreensão desta nova condição pode transformar o sofrimento em experiência de vida.
Essencialmente, o tratamento do câncer de laringe não acaba na sala de cirurgia, mas sim quando o
paciente retoma o curso de sua própria vida, na qual a comunicação é de incontestável valor. O papel do paciente
e de sua família nesse processo deve ser valorizado.

A VOZ NORMAL:

A voz humana é uma das melhores formas de comunicação do homem com o mundo. Através da voz, o
ser humano expressa seus pensamentos, suas emoções, sentimentos e opiniões, interagindo, assim, com seus
semelhantes.
Sem a voz, a vida de um indivíduo torna-se mais complicada, já que ela perde seu meio de comunicação
mais conveniente e prático, passando a apresentar limitações para se fazer compreender pelos outros. Isto,
evidentemente, torna a convivência mais difícil.
A voz não participa apenas da fala, mas também de uma série de outras emissões, como o choro, o riso, o
canto, o suspiro, o pigarro, o espirro e a tosse. A produção da voz é iniciada na laringe (um tubo localizado na
região do pescoço). Dentro da laringe, encontramos as pregas vocais, popularmente conhecidas pelo nome de
“cordas vocais”, pois se pensava que elas eram tiras semelhantes aos instrumentos de corda, como o violão. Na
verdade, as pregas vocais são duas dobras de músculo e mucosa (uma fina camada de tecido que recobre o
músculo) e estão paralelas ao solo.
Durante a respiração, as pregas vocais ficam afastadas uma da outra, o que permite que o ar entre nos
pulmões. Porém, ao falar, as pregas vocais se aproximam e vibram, ao mesmo tempo que o ar sai dos pulmões,
produzindo um som básico, semelhante ao de um vibrador elétrico.
Esse som básico viaja desde as pregas vocais até a face, saindo para o ambiente através da boca e/ou do
nariz. Principalmente na boca, esse som vai ser amplificado e modificado pela movimentação de uma série de
estruturas que aí se encontram (a língua, os lábios, a mandíbula e o véu palatino, onde está a úvula, conhecida
como “campainha”). São as movimentações dessas estruturas que formam os sons da fala de uma língua. Assim,
quanto mais corretos forem esses movimentos, mais clara e compreensível será a fala do indivíduo.
De modo resumido, as pregas vocais produzem um som básico que ser amplificado e modificado na
cavidade da boca para se transformar nas vogais e consoantes que formam a fala.
A voz normal é a voz produzida sem esforço e que soa agradável ao ouvinte. A voz laríngea, que emitimos
normalmente, é muito flexível e permite que façamos uma série de variações, quer seja em qualidade, em
freqüência (voz mais aguda ou fina e voz mais grave e grossa), em intensidade (voz mais fraca e voz mais forte)
ou em suas características psicodinâmicas (voz mais autoritária, mais agressiva, mais doce, voz alegre, voz triste,
entre outras).
Qualquer alteração que impeça a produção natural da voz gera uma disfonia, ou seja, uma alteração
vocal. Um simples resfriado ou um câncer de laringe podem deixar a voz rouca e é por isso que uma alteração de
voz que permaneça por mais de duas semanas deve ser encarada seriamente.
A mais séria doença que causa rouquidão na voz é o câncer ou carcinoma da laringe. Quando um
indivíduo é diagnosticado com essa doença, o tratamento pode requerer uma cirurgia e, para a retirada do tumor,
pode ser necessária a remoção total da laringe, a chamada laringectomia total. O objetivo desta cirurgia é
retirar a doença, porém, como conseqüência da remoção da laringe, o paciente perde a capacidade de produzir o
som básico que usamos na construção da voz e da fala. Assim, o tratamento do paciente exige a perda da voz
laríngea, todavia, há outros recursos alternativos para se adquirir uma nova voz.

O CÂNCER DE LARINGE:

O câncer representa um crescimento muito veloz e desorganizado de células atípicas (células deformadas)
que comprometem a saúde dos tecidos envolvidos. Esse crescimento desorganizado de células forma o tumor. O
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câncer de laringe é um tipo de tumor que apresenta grande chance de tratamento e cura quando detectado
precocemente, pois ele tende a se manter restrito na laringe, sem se espalhar pelo corpo (metástase).
INCIDÊNCIA: esse tipo de câncer é muito freqüente e apresenta maior ocorrência em homens do que em
mulheres, em geral com idade variando entre 50 e 70 anos.
ETIOLOGIA ASSOCIADA: os mecanismos que envolvem o desenvolvimento do câncer são muito
complexos e ainda não totalmente conhecidos, porém existe uma associação muito forte entre os hábitos nocivos
à saúde, como o cigarro e o álcool e o aparecimento desta doença, embora não sejam esses os únicos fatores
envolvidos. Dessa forma, é importante ressaltar que não necessário beber e fumar para desenvolver um câncer de
laringe, pois existem pessoas que nunca apresentaram esses hábitos mais desenvolveram o câncer. A questão é
muito complexa e há características individuais, constitucionais, genéticas e aspectos de predisposição familiar
envolvidos.
USO DE CIGARRO: o fumo é altamente nocivo para todo o organismo, mais particularmente para o
sistema respiratório, agredindo diretamente a laringe e os pulmões. A fumaça do cigarro passa pela laringe e suas
toxinas são depositadas diretamente sobre as pregas vocais, o que é uma forte agressão aos tecidos desse órgão.
São inúmeras as substâncias carcinogênicas envolvidas na confecção de um cigarro. O exame de um paciente
fumante mostra sinais desta agressão, que podem ir desde uma vermelhidão generalizada na laringe (hiperemia),
inchaço de seus tecidos (edema), irritação constante de todo o órgão (laringite crônica) até o desenvolvimento de
lesões com células desorganizadas (carcinoma ou câncer).
CONSUMO DE ÁLCOOL: o consumo de álcool também tem sido relacionado ao câncer de laringe. Além
de todos os malefícios que o indivíduo alcoolista sofre, comprometendo suas atividades profissionais e sociais, e,
não raramente, gerando um sofrimento enorme a si mesmo e aos seus familiares, o álcool causa uma irritação
semelhante a do cigarro, porém, com ação principal de redução das respostas de defesa do organismo, o que é
chamada de imunodepressão. A bebida não passa diretamente pela laringe, mas sim por um segundo tubo que
fica atrás dela, o esôfago )por onde passam também os alimentos). Assim sua ação é indireta, mas nem por isso
menos prejudicial. Dentre as bebidas alcóolicas, as destiladas, como o uísque, a vodca, a pinga e o conhaque, são
mais lesivas que as fermentadas como a cerveja e o vinho, mas se houver mistura entre as destiladas e as
fermentadas, haverá maiores riscos para a saúde vocal.
Alguns autores afirmam que a possibilidade de indivíduos fumantes apresentarem câncer de laringe é 40
vezes maior em relação aos não fumantes e que o efeito associado do uso do tabaco e álcool triplica a
possibilidade do risco de câncer.
SINTOMAS DO CÂNCER: os principais sintomas do câncer de laringe são alteração de voz do tipo
rouquidão, dor à deglutição e dificuldades respiratórias. O sintoma mais comum e geralmente o inicial é a
rouquidão. Qualquer rouquidão que perdure por mais de quinze dias deve ser avaliada por um médico. Porém, em
nosso meio, muitos indivíduos não dão a merecida importância a essa alteração na voz, acreditando ser apenas o
resultado de uma gripe malcurada ou de uma infecção forte, procurando atendimento somente quando passam a
sentir dor ao engolir alimentos ou a própria saliva ou ainda quando começam a apresentar dificuldades
respiratórias (dispnéia). Nesses casos, geralmente o tumor já se encontra em estado mais avançado e o que
poderia ser tratado com uma cirurgia menor, retirando-se apenas uma parte da laringe e não comprometendo
essencialmente a produção da voz, passa a necessitar de uma cirurgia mais ampla, provocando a perda de toda a
laringe. Com a perda total da laringe, o paciente sofrerá várias modificações nas funções desse órgão,
principalmente na respiração e na produção da voz.

O ANTES E O DEPOIS DA CIRURGIA:

A RESPIRAÇÃO:

A respiração inicia-se no nariz. O ar passa por ele, é filtrado, aquecido e umedecido, segue pela
faringe(região de transição entre nariz e boca), daí passa para a laringe e a traquéia até, finalmente, atingir os
pulmões. Todo esse percurso se dá durante a inspiração, ou seja, quando o pulmão se enche de ar.
Na expiração o caminho do ar tem sido contrário, inicia-se pelos pulmões, passa por todas as estruturas
citadas até que o ar seja expulso para o ambiente pelo nariz ou pela boca.
Após a cirurgia o trajeto respiratório será totalmente alterado. Com a retirada da laringe não há mais
ligação entre os pulmões e as vias aéreas superiores (o nariz e a faringe). O ar entrará diretamente para os
pulmões através de uma abertura (traqueostoma) na traquéia e desta sairá para o meio ambiente. A porta de
entrada e saída do ar não é mais o nariz ou a boca e passa a ser, portanto, essa abertura que foi realizada
cirurgicamente na base do pescoço, o chamado traqueostoma. Assim, o ar entra e sai pelo traqueostoma, que
deverá permanecer invariavelmente aberto para que o indivíduo continue vivo e respirando, já que a boca e o nariz
não possuem mais nenhuma comunicação com os pulmões.

A PRESENÇA DO TRAQUEOSTOMA:

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O traqueostoma é o orifício criado cirurgicamente na base do pescoço, após a retirada da laringe,
responsável pela entrada e saída de ar no organismo, durante a respiração. O tamanho e a forma deste orifício
variam de indivíduo para indivíduo, mas, de modo geral, podemos dizer que ele apresenta uma abertura suficiente
para uma respiração livre quando é maior que o diâmetro do dedo mínimo da mão de um indivíduo adulto. O
traqueostoma não tem capacidade de filtrar aquecer ou umedecer o ar, funções estas realizadas pelo nariz. Por
isso, é necessário que se utilize um protetor de tecido (de preferência, fibra natural como o algodão). que também
terá como função reter qualquer secreção produzida pelo pulmão ou por tosse eventual. Já que o nariz e a boca
não se comunicam mais com os pulmões, evidentemente as secreções destes passarão a ser expelidas pelo
traqueostoma. O paciente laringectomizado geralmente adapta-se muito bem a esta situação, aprendendo a
manter o orifício livre e limpo de impurezas.
Logo após a cirurgia e nas primeiras semanas que se seguem, o paciente laringectomizado geralmente
utiliza uma cânula de plástico ou de metal para manter a forma da abertura do próprio traqueostoma. Esta
cânula nada mais é que um tubo curvo que se molda no orifício do traqueostoma e dirige-se para dentro da
traquéia, evitando que ocorra uma diminuição de calibre desta nova entrada de ar. Na maior parte dos pacientes,
o orifício criado estabiliza-se rapidamente e não há mais a necessidade deste tubo, porém alguns indivíduos
apresentam uma tendência de fechamento do traqueostoma e sentem-se mais seguros com a utilização constante
de uma cânula.
A cânula deve estar sempre limpa. Ela é facilmente removível para limpeza, devendo ser lavada com água
e sabão neutro e, em seguida, deve ser seca com toalha limpa e reinserida no orifício. É importante que não
permaneça resto de sabão ou similares na cânula, quando ela for reintroduzida no organismo.

A FALA:

A fala é realizada durante a expiração do ar, ou seja, para emitirmos os sons, as sílabas, as palavras e as
frases usamos o ar como combustível.
O ar passa pelas pregas vocais, provoca uma vibração nas mesmas, e, após a ação das estruturas
articuladoras do aparelho fonador (os lábios e a língua, principalmente), forma-se o que ouvimos como fala.
Com a retirada cirúrgica da laringe e o conseqüente desvio do fluxo aéreo proveniente dos pulmões para a
traquéia e diretamente para o meio ambiente, o indivíduo perde a capacidade de produzir fala com o ar expiratório
pulmonar.
O laringectomizado deverá adquirir meios alternativos para a fala, sendo o mais natural, o aprendizado da
voz esofágica.
A voz esofágica é uma voz produzida pela vibração das paredes do esôfago, o tubo que originalmente
ficava atrás da laringe, por onde passam os líquidos e alimentos.
Para adquirir a voz esofágica: o paciente passa por um treinamento onde aprende a introduzir o ar do
meio ambiente para dentro do esôfago, retendo-o em sua porção superior e, em seguida, soltando-o em direção á
boca para que seja articulado e se transforme nos sons da fala.
Portanto, na voz laríngea, sua voz antiga, eram as pregas vocais que vibravam. Agora, na voa esofágica,
sua nova voz, serão as paredes do esôfago que realizarão essa vibração. Na voz antiga, o ar do ambiente que
entrava pelo nariz dirigia-se aos pulmões e servia tanto para a respiração como para a construção da fala. Agora,
para a construção da voz esofágica, não temos como utilizar o ar pulmonar, que servirá apenas para fins
respiratórios e, portanto, devemos introduzir ar no esôfago pela boca, para depois expulsá-lo novamente, para ser
articulado e transformado em fala.
A voz esofágica é uma voz de qualidade rouca, um pouco mais baixa que a normal e de freqüência grave
(tom grosso). O paciente laringectomizado geralmente leva, em média, um mês para aprender o mecanismo
básico de emissão em voz esofágica, e desenvolve a fala entre 3 e 6 meses de reabilitação.
Alguns pacientes apresentam maiores dificuldades que outros no aprendizado da voz esofágica devido a
uma série de limitações de natureza orgânica (tecidos muito duros ou dificuldade de deglutição) ou
psicológica (desânimo ou depressão).
A experiência dos autores permite afirmar é que motivação, apoio familiar e necessidade de se
comunicar são qualidades que auxiliam a superar até mesmo obstáculos físicos, contribuindo decisivamente para
que o paciente se torne um bom falante esofágico.
Finalmente, se o paciente não conseguir adquirir essa nova voz, após todos os recursos terem sido
esgotados, há outras opções através de aparelhos chamados vibradores laríngeos ou de próteses implantadas
cirurgicamente, que podem oferecer meios alternativos de comunicação. O mais importante é manter vivo o desejo
de se comunicar e buscar o melhor método para fazê-lo.

A RADIOTERAPIA E A QUIMIOTERAPIA:

Em alguns casos, além da cirurgia, o paciente pode necessitar de outros tratamentos complementares,
como a radioterapia e a quimioterapia.

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Na radioterapia, o paciente passa por sessões de aplicação de raios semelhantes a “banhos de luz”. Esse
tratamento tem como objetivo a destruição de células atípicas (as células dos tumores) e, nos casos de tumores
muito pequenos, pode até mesmo substituir a cirurgia. Esta técnica causa uma fibrose ou enrijecimento dos
tecidos na região onde são feitas as aplicações e este tecido fibrosado pode levar vários meses para ficar
menos rígido. Além disso, o paciente pode sentir uma secreção muito viscosa na boca, como uma gosma difícil
de ser removida. Essa sensação é o resultado da saliva que ficou mais espessa, o que também pode dificultar a
deglutição. Tudo isso tende a melhorar após algumas semanas do término da radioterapia. Para ajudar a reduzir
esses desconfortos, é importante beber bastante água durante todo o dia, de 8 a 10 copos, para melhorar a
hidratação do organismo. Alguns indivíduos também apresentam queixas de deglutição, que podem ser
decorrentes do enrijecimento da musculatura do esôfago ou devido a dificuldades de se adaptar às novas
condições anatômicas pós-cirurgia, que se reduzem com o passar do tempo.
A radioterapia pode acelerar o processo de deteriorização de dentes que não estavam em boas condições
de saúde, portanto, é preferível removê-los antes das sessões, se esta for à orientação de seu médico.
A quimioterapia é um tratamento medicamentoso endovenoso, ou seja, feito através de injeções, realizado
geralmente após a cirurgia e raramente nos casos de tumores de laringe.
É o médico que realiza a indicação desses tratamentos e as dosagens necessárias. Embora sejam
tratamentos agressivos, eles podem ser vitais para garantir sobrevivência.

O OLFATO E A GUSTAÇÃO:

Com o desvio do fluxo aéreo respiratório, o ar deixa de passar pelo nariz e, por essa razão, o indivíduo
laringectomizado apresenta uma redução acentuada da percepção dos odores ambientais e dos alimentos. As
substâncias voláteis, como os perfumes em spray e o cheiro da gasolina, são ainda percebidas, mas de forma
muito leve.
Através de treinamento específico é possível voltar a sentir parcialmente os odores, o cheiro de perfumes e
dos alimentos. Nesse treinamento são aprendidas manobras para capturar o ar com a boca e injetá-lo para trás e
para cima, em direção ao nariz. O ar, uma vez ocupando a região nasal, estimulará as células responsáveis pelo
olfato, fazendo assim com que a pessoa sinta o cheiro desejado. Além disso, existem pequenos terminais nos
alvéolos pulmonares que apresentam uma certa capacidade olfatória.
Após a cirurgia, o paciente laringectomizado poderá também apresentar uma diminuição ou uma distorção
da gustação. Isto se dá devido à dificuldade olfatória, que pode acarretar um prejuízo secundário na percepção
dos sabores dos alimentos.
Com o passar do tempo o paciente vai se adaptando a essas limitações, que geralmente não representam
maiores problemas.

A ALIMENTAÇÃO:

Após a alta cirúrgica, o indivíduo laringectomizado deverá retornar paulatinamente a sua alimentação
habitual. No hospital, o paciente sua uma sonda nasogástrica (um tubo através do qual uma dieta especialmente
balanceada é ministrada, evitando o esforço das paredes do esôfago e da base da língua, que foram manipuladas
durante a cirurgia de retirada da laringe. Após a retirada da sonda nasogástrica, quando o paciente vai para casa,
geralmente não há mais nenhuma restrição alimentar. Alguns indivíduos queixam-se de uma certa dificuldade ou
sensação dolorosa ao engolir pedaços maiores de alimentos sólidos, porém, este desconforto passa já no primeiro
mês.
A persistência de engasgos e dificuldades para engolir devem ser imediatamente comunicadas ao médico.
Um outro fator importante a ser lembrado é que as próteses dentárias muitas vezes não se adaptam mais
corretamente após a cirurgia, portanto, novas próteses ou adaptações deverão ser feitas pelo dentista. É
importante que sua dentadura esteja bem adaptada, pois você deverá articular corretamente os sons da fala. para
que seja compreendido.

OS ESPORTES E OUTRAS ATIVIDADES DE LAZER:

Esportes são importantes para a saúde geral do corpo e da mente. Lazer é essencial para relaxar e
aproveitar a vida. Os únicos esportes que são mais arriscados são aqueles que envolvam água, como a natação,
pois a água pode entrar no traqueostoma, chegando aos pulmões, causando tosse, descontrole, pneumonia ou até
mesmo asfixia. Mas isto não impede que o laringectomizado participe de uma pescaria, desde que tome os devidos
cuidados. Existem adaptadores desenhados para a prática da natação que, porém, são disponíveis apenas no
exterior.
Apenas um lembrete: explique aos seus familiares e aos seus amigos mais próximos que se algo lhe
acontecer e você precisar ser reanimado, através da chamada respiração boca a boca, no seu caso a respiração
deverá ser feita boca no traqueostoma, jogando-se o ar diretamente dentro dos pulmões.

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A maioria dos esportes são liberados: andar de bicicleta, correr, caminhar, andar a cavalo entre outros. No
início, o laringectomizado poderá se sentir cansado, pois a laringe, que era a válvula que controlava a saída do ar e
que ajudava no momento do esforço, não existe mais. Mas o organismo se adapta muito antes do que
acreditamos!
É importante que o laringectomizado descubra outras atividades que lhe são prazerosas, como cuidar de
plantas e jardins, de animais em geral, de aquários, jogar dominó com os amigos, costurar, ler livros, fazer
artesanatos em geral, entre outros.

O USO DO TELEFONE:

É possível para o laringectomizado voltar a falar no telefone. Aliás, o telefone é um microfone que vai
ampliar automaticamente a voz. Porém, podem ocorrer situações em que a pessoa que estiver do outro lado e não
conheça seu interlocutor pense que se trata de uma brincadeira ou de um trote, porque a voz esofágica é rouca e
muitos não estão acostumados a ouvi-la. Mesmo assim, o laringectomizado não deve desistir e sim continuar
fazendo a recebendo seus telefonemas.

O CANTO:

O laringectomizado poderá cantar, mas será um canto limitado. Músicas que variem um pouco a melodia
podem ser cantadas com a voz esofágica. Ainda existem alguns laringectomizados que conseguem assobiar. Isto é
possível para alguns e depende de treino, mas tudo deve ser feito com paciência e dedicação.

O RELACIONAMENTO FAMILIAR:

O laringectomizado não deve se isolar. Fazer e receber visitas de amigos é muito importante. No começo,
a família e as pessoas mais próximas não compreendem bem o que aconteceu e podem estar tão desinformadas e
assustadas quanto o próprio laringectomizado estava no começo. Este é um bom momento para que o paciente
tranqüilize seus familiares e amigos, explicando-lhes o que aconteceu e que está tudo bem. Isto será excelente,
pois só o que desconhecemos nos amedronta, se entramos em contato com uma nova situação, aprendemos a
compreendê-la e a aceitá-la.

A VIDA SEXUAL:

Após a cirurgia o laringectomizado pode pensar que não é mais sexualmente atraente e amado e, por
vezes, observa-se uma redução no desempenho sexual, porém isso é devido ao estresse que envolveu todo o
tratamento da doença e a energia desprendida no processo de adaptação às novas condições. Se o cônjuge
(marido ou esposa) considerava-o sexualmente atraente e amava-o antes da cirurgia, não será esta situação que
mudará o sentimento. Vínculos afetivos são muito complexos, mas seguramente, não dependem de uma
traqueostoma ou de uma laringectomia total. As pessoas são amadas e admiradas pelo que são em termos de
caráter e conduta e não é raro observarmos casais que ficam ainda mais unidos e afetivos após a cirurgia.
Ocorrerão algumas adaptações na vida sexual do casal, devido às mudanças físicas ocorridas,
principalmente com o ar saindo pela base do pescoço ou a possível presença de secreção ou odor forte na região
do traqueostoma, assim como o próprio barulho da respiração. Mas existem várias formas de minimizar estes
problemas. Em primeiro lugar, o odor do traqueostoma, se presente, pode ser diminuído mantendo-se esta região
sempre limpa e seca. Quanto ao barulho da respiração, pode-se aprender a controlá-lo paulatinamente e pode-se
reduzi-lo usando um protetor.
O laringectomizado deve ser paciente consigo e com seu cônjuge. É preciso sempre se lembrar que tudo
voltará ao normal. Se o laringectomizado tinha um bom relacionamento conjugal antes da cirurgia, não haverá
motivos para que ocorra uma crise neste relacionamento. Pelo contrário, ele poderá até melhorar, pois os vínculos
verdadeiros se fortificam nos momentos difíceis.
Por isso, o laringectomizado deve voltar à vida normal lembrando-se do quão é valiosa para si mesmo e
para os que convivem a sua volta.

OS CUIDADOS NO PÓS-OPERATÓRIO IMEDIATO:

Após a laringectomia total, o paciente utilizará dois pequenos acessórios para auxiliar sua recuperação: a
sonda nasogástrica e a cânula traqueal.
A sonda nasogástrica é um tubo plástico que vai do nariz até o estômago, através do qual uma dieta
preparada será injetada, até que a cicatrização dos tecidos ocorra e o paciente possa se alimentar normalmente. É
importante, depois de injetar o alimento preparado através da sonda, introduzir água, evitando o entupimento da
sonda, além de mantê-la sempre bem fechada quando não estiver em uso.

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A cânula é uma peça dupla, composta de um anel de fixação no pescoço e de um tubo curvo que se dirige
para dentro da traquéia. A cânula serve para manter o traqueostoma aberto até que seus tecidos se cicatrizem,
possibilitando a respiração. Tanto a cânula como o traqueostoma, em si, devem ser mantidos sempre limpos,
utilizando-se escova e detergente, enxaguando-a, retirando o excesso de água e recolocando-a no local adequado.
O médico dirá quando a cânula pode ser retirada definitivamente, o que varia de pessoa para pessoa.
No hospital, as secreções expelidas do traqueostoma serão aspiradas pela enfermeira, com uma sonda.
Depois, o próprio paciente cuidará desta limpeza. É comum que no período logo após a cirurgia, pela manhã, haja
uma quantidade maior de secreção, o que vai diminuindo com o passar do tempo. Os tecidos internos da traquéia,
próximos ao traqueostoma, inicialmente bastante avermelhados, também vão sofrendo um processo de
queratinização (endurecimento) pela exposição ao ar, e vão se transformando, tornando-se muito parecidos com a
pele do pescoço que circunda a área do orifício.
Outro cuidado a ser tomado é usar um protetor sobre o traqueostoma, já que antes o nariz filtrava,
aquecia e umedecia o ar que entrava nos pulmões. No paciente laringectomizado é o protetor que vai ter a função
de filtro, impedindo a aspiração de sujeiras, poeira, poluição, água ou insetos. Esse protetor deve ser de um tecido
que cubra o traqueostoma sem sufocar, como a malha de algodão e que permita um fácil acesso ao traqueostoma,
se houver necessidade de limpá-lo.
Alguns cuidados com o traqueostoma são fundamentais:
1) Não deixar entrar água durante o banho, pois esta água irá para os pulmões, podendo provocar tosse irritativa
ou até mesmo uma pneumonia. Para isso, deve-se lavar a cabeça deitando-a para frente depois lavando o
corpo, do traqueostoma para baixo.
2) Pelo mesmo motivo não será mais possível mergulhar no mar ou na piscina.
3) Na praia, além do protetor, deve usar uma camiseta para evitar que raios de sol irritem a área do
traqueostoma. Para os indivíduos de pela clara, protetor solar é essencial.
Nos Estados Unidos e na Europa existem alguns adaptadores de borracha e metal, que possibilitam ao
laringectomizado voltar a nadar, chamados larkel (tubo que os mergulhadores usam para manter a cabeça
dentro da água por longo tempo). Trata-se de um tubo externo, com um anel que se adapta à traquéia e que
desvia o ar dos pulmões para a boca.
Não se esqueça de realizar freqüentemente uma boa higiene bucal, escovando os dentes, gentilmente as
gengivas e removendo e escovando também as próteses dentárias, se for o caso. Avise ao seu médico se você
perceber qualquer lesão ou úlcera de difícil cicatrização na cavidade da boca ou na língua.

O TRABALHO MULTIDISCIPLINAR COM O PACIENTE LARINGECTOMIZADO:

Após a cirurgia, o ideal é que o paciente receba um acompanhamento multidisciplinar, envolvendo


profissionais de diversas áreas da saúde, tais como: o médico, o enfermeiro, o fisioterapeuta, o psicólogo e o
fonoaudiólogo, entre outros. Este acompanhamento auxilia a reabilitação do paciente e sua reintegração social,
fazendo com que ele compreenda mais rapidamente as mudanças ocorridas e suas novas condições anatômicas e
funcionais.
O médico geralmente coordena o trabalho dos profissionais envolvidos e acompanha as condições de
saúde do paciente, que deverá comparecer religiosamente às consultas de controle, para assegurar uma boa
evolução de seu tratamento.
O enfermeiro orienta quanto aos aspectos gerais do pós-operatório e é quem tem mais contato com o
paciente e a família no pós-operatório imediato, sendo o responsável por oferecer uma condição de conforto geral
ao paciente e à família, ministrando, praticamente, quase todas as orientações gerais, desde a higiene, a
alimentação e os cuidados específicos com o traqueostoma, a cânula e a sonda nasogástrica.
O fisioterapeuta avalia as condições dos pacientes que apresentam dificuldades ou odores na
movimentação da cabeça, dos ombros e dos braços após a cirurgia e realizam o trabalho de reequilíbrio muscular.
O psicólogo tem um papel muito importante não somente pelo trabalho de orientação e atendimento
psicológico que pode desenvolver com o paciente laringectomizado, mas também pelo apoio que oferece à família,
trabalhando com os sentimentos de medo, angústia e dúvidas a respeito do futuro. Uma laringectomia total exige
do paciente e de sua família uma profunda adaptação às novas condições de vida. Para pessoas de caráter mais
rígido, pouco flexíveis e com dificuldades de fazer mudanças, essa nova situação pode representar um verdadeiro
desafio.
O profissional em odontologia (dentista ou cirurgião bucofacial) apresenta diversas funções: cuidar da
saúde geral dos dentes, realizar a retirada de dentes remanescentes ou em mau estado de conservação, que
sofrerão com a ação da radioterapia e adaptar próteses dentárias, caso seja necessário.
O Fonoaudiólogo tem como função principal cuidar da reabilitação vocal do paciente, ensinando-lhe
como produzir a voz esofágica, introduzindo e expulsando o ar do es6ofago. Nos casos de difícil aprendizado da
voz, poder também auxiliar no uso de outras opções de reabilitação como a laringe eletrônica. O aprendizado da
voz esofágica é feito por meio de terapias, que podem ser individuais ou em grupo. A principal vantagem da
terapia em grupo é possibilitar o contato com outros indivíduos na mesma situação e criar laços de solidariedade,

O laringectomizado: informações básicas – Mara behlau.


fazendo com que o paciente não se sinta sozinho, todavia, o atendimento individual acelera o processo de
reabilitação do paciente.

COMEÇANDO UMA NOVA FASE DA VIDA:

O laringectomizado passa por momentos difíceis desde a suspeita e o diagnóstico do câncer até sua
reintegração social. Pode ocorrer uma fase inicial de negação, onde o paciente diz que não é nada ou que nada
aconteceu com ele. Alguns indivíduos podem ter reação oposta e ficarem profundamente deprimidos, angustiados
e entregues, não colaborando em seu tratamento. Ambas as situações são compreensíveis.
A depressão é muito comum e pode surgir em um ou vários momentos. A primeira situação que pode
representar uma crise para o paciente é quando o médico comunica o diagnóstico e informa o tipo de tratamento a
ser realizado. Outros momentos importantes são o operatório imediato, quando o paciente se vê na Unidade de
Terapia Intensiva, cheio de tubos e sem controle de seu corpo e, finalmente, quando ele volta para casa, já
operado, porém tendo que enfrentar um processo de reabilitação e sem a proteção que o hospital e corpo de
enfermagem lhe davam, podendo ocorrer nova crise de depressão e desânimo. Tais fases são conhecidas e
esperadas e, portanto, é essencial que o paciente e a família compreendam esse processo transitório e colaborem
para que realmente situações representem crises de passagem.
Existem vários motivos para que o laringectomizado fique deprimido, como a mudança na aparência, a
dificuldade de se comunicar e as dúvidas de como será sua vida deste momento para frente.
Felizmente, há mais de cem anos esse tipo de cirurgia é realizado com sucesso e sabemos que a vida do
indivíduo volta praticamente ao normal. Evidentemente serão necessárias algumas modificações, mas flexibilidade
e adaptação às novas circunstâncias é o que caracteriza o ser humano. Uma coisa deve ficar muito clara: não é
porque o indivíduo ficou sem laringe que ele se tornou um inválido ou privado de suas capacidades mentais e de
seu poder de decisão. Pelo contrário, é neste momento que o laringectomizado deve valorizar ainda mais sua vida
e a relação com as pessoas que lhe são queridas. São inúmeros os depoimentos de pacientes que, após toda a
depressão e a crise associada à cirurgia e às suas novas condições encararam a vida de um modo melhor,
recuperando muitos valores que haviam se perdido ao longo do tempo.
Quanto ao trabalho, se o paciente não era aposentado, é essencial que ele retorne às suas atividades
profissionais assim que liberado pelo médico. O laringectomizado não deve ter medo de retornar ao trabalho. Em
geral existem grandes problemas, apenas quando os trabalhos exigem muito esforço físico ou quando a
comunicação oral é imprescindível.
Se o indivíduo era trabalhador braçal, que dependia da força dos braços, ele vai encarar uma limitação
para carregar pesos ou empunhar uma enxada. Antes, a laringe funcionava como um a válvula para controlar o ar
que saía dos pulmões, fechando-se fortemente no momento em que o indivíduo pegava objetos pesados,
aumentando a pressão abdominal e facilitando o esforço. Agora, o laringectomizado não tem mais esta válvula
auxiliar, porém seu organismo, aos poucos, irá se acostumar com esta nova condição.
Ambientes de trabalho que variam muito a temperatura entre quente e frio ou que contenham gases ou pé
podem irritar a traquéia e pulmões. Por isso, é necessário proteger adequadamente o traqueostoma, usando, por
exemplo, além do protetor de costume, um protetor de espuma por baixo, procurando-se evitar a entrada de
qualquer partícula pelo traqueostoma.
O laringectomizado poderá ter dificuldades maiores no desempenho de suas funções, principalmente se
seu trabalho depende de comunicação oral. Inicialmente, pode ser que o paciente comunique-se apenas
articulando as palavras, sem som, o que pode obrigá-lo a repetir várias vezes uma frase, até ser compreendido, ou
ainda falando apenas algumas palavras com a voz esofágica. Mas, mesmo assim, ele não deve desistir e tentar se
comunicar, quer seja articulando, escrevendo ou utilizando gestos, enquanto paralelamente vai desenvolvendo a
voz esofágica. A pior situação é a de decidir não se comunicar.
Qualquer opção é melhor que o silêncio. Articule, escreva, faça gestos, repita algo quantas vezes for
necessário, mas se comunique. Valorize o que nos diferencia de todos ou outros seres vivos. Comunique-se!

O laringectomizado: informações básicas – Mara behlau.

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