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CIP – Brasil.

Catalogação-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

D619t Dinville, Claire


Biblioteca Fonoaudiológica A técnica da voz cantada / Claire Dinville;
tradução / da 2. ed. original / e prefácio da
edição brasileira Marjorie B. Couvoisier
Hasson – Rio de Janeiro: Enelivros, 1993.
(Biblioteca Fonoaudiológica)
160p. Tradução de: La Voix chantée-sa technique
Bibliografia
ISBN 85-7181-021-4
A Técnica 1. Voz – Educação. 2. Canto. 3. Foniatria. I.

da
93-0063 Título. II. Série.

Voz Cantada CDD – 784.93


CDU – 784.9

Coordenação Editorial:
Maria Cláudia Chagas

Capa e Editoração Eletrônica:


Claire Dinville L T Informática

Revisão:
Léa Mayon

Produção Gráfica:
Mário Salvador Faillace

A presente tradução originou-se da segunda edição da obra em


francês, La Voix Chantée As Technique, pela Masson,
ENELIVROS Paris, 1982, 1989
ISBN: 2-225-81714-6 – ISSN: 0-399-1849

Reservados todos os direitos de publicação em língua portuguesa desta


edição à ENELIVROS EDITORA E LIVRARIA LTDA.
ÍNDICE Capítulo 1 – A voz cantada

1. A voz cantada....................................................................
Qualidades da voz........................................................... O cantor não aprende a usar um instrumento materializado, pois ele
• A altura....................................................................... possui os órgãos fonatórios e a fonte de energia necessária, o sopro,
• A intensidade............................................................... para produzir o som. A serviço da música, o sopro possibilita modular,
• O timbre...................................................................... enriquecer e sustentar as sonoridades vocais e torná-las mais
• A homogeneidade ........................................................ expressivas.
• A afinação ................................................................... Através da articulação e das múltiplas modificações do colorido vocal, a
• O vibrato .................................................................... voz cantada tem excepcionais possibilidades e qualidades capazes de
• O alcance da voz ......................................................... suscitar, aos que são sensíveis, todo um conjunto de sensações e
A classificação................................................................ emoções, assim como estados de ânimo coletivos.
• Fatores predominantes.................................................. Nenhum instrumento é comparável à voz, ela é a única que tem o
• Fatores secundários...................................................... privilégio de unir o texto à música. Mas, só emociona dependendo da
sensibilidade e da musicalidade do intérprete. Pois, além das notas e
2. A função vocal.................................................................... palavras, existe algo invisível, impalpável, que é preciso adivinhar,
O aparelho respiratório.................................................... sentir. expressar e que não está escrito.
A laringe........................................................................ Para o cantor, a voz também é uma atividade artística e intelectual da
As cavidades de ressonância............................................ qual a inteligência participa, mas a primazia é dada à expressão e à
• A língua...................................................................... emoção. A voz é, para ele, um canto interior e vibrante através da qual
• A mandíbula................................................................ pode liberar pensamentos e sentimentos que não poderia expressar de
outra forma.
3. O gesto vocal....................................................................
É também verdade que o cantor expressará de modos diferentes esse
A respiração................................................................... canto interiorizado e sentido, segundo sua concepção da obra a ser
A articulação.................................................................. interpretada e das infinitas nuances da sua voz. Seu poder expressivo
A noção de apoio............................................................ refletirá tanto seu temperamento como sua personalidade. A voz e a
Registros e passagens..................................................... personalidade estão estreitamente relacionadas e são inseparáveis já
que traduzem o ser humano na sua totalidade.
4. A técnica vocal...................................................................
Entre o corpo e a voz existe uma íntima relação. É com eles que o
Exercícios de respiração.................................................. cantor exterioriza sua afetividade e desempenha o papel intermediário
Exercícios de vocalização e de articulação........................ entre o público e a obra musical. Mas, para isso é preciso que ele
• Exercícios para o grave e o médio.................................. possua uma técnica precisa e impecável a fim de poder dominar as
• Exercícios de articulação das vogais............................... inúmeras dificuldades que vai encontrar. Será, principalmente, pelo
• Exercícios de articulação das consoantes........................ domínio do sopro que ele poderá dominá-las e usar seus dons.
• Exercícios de preparação para o ataque..........................
• Exercícios para treinar a mobilidade e a agilidade............ Abordaremos este assunto neste livro porque, para o cantor, é o meio
• Exercícios para fortificar as pregas vocais....................... mais seguro para responder às exigências da música, da interpretação
• Exercícios de agilidade preparando para o trinado............ e para não trair as obras que ele deverá interpretar.
• Exercícios de preparação de um texto.............................

5. Comentários sobre as causas dos erros de técnica e sobre suas Qualidades da Voz
conseqüências................................................................... 0 cantor pode variar voluntariamente as qualidades integrantes da voz,
seja ao mesmo tempo ou isoladamente. No canto estas qualidades
Generalidades....................................................................... dependem da duração, daí a necessidade de desenvolver uma
Conclusão............................................................................ tonicidade e agilidade muscular que respondam a este imperativo.
Freqüentemente, é através do controle auditivo que o cantor modifica a Estas diferentes formas artísticas são realizadas por mecanismos
qualidade de sua voz. Mas é necessário, também, que ele o faça por extremamente delicados, por todo um conjunto de movimentos
meio de uma técnica apropriada, utilizando movimentos precisos, pela musculares e pela maior ou menor tonicidade.
percepção de certas sensações que determinam as coordenações
Mas o timbre pode ser transformado com a utilização de certos
musculares, sendo elas mesmas funções destes diferentes parâmetros.
métodos que o modificam, enquanto é a realização do mecanismo
fisiológico da voz que permitirá desenvolver e apreciar o timbre natural
A Altura do cantor.
Para mudá-la, é preciso mudar a pressão expiratória. Isto é, modular o
grau de tonicidade da musculatura abdominal, assim como o volume
A Homogeneidade
das cavidades supra-laríngeas que modificarão a posição da laringe, o
fechamento glótico, a freqüência das vibrações das cordas vocais e o É uma qualidade essencial, que está em função da distribuição das
deslocamento da sensação vibratória. zonas de ressonância e da fusão das diferentes sonoridades vocais
dada sua interação permanente. Ela só pode ser realizada pela
harmonização progressiva de todos os órgãos indispensáveis à
A Intensidade fonação. Ou seja, por um sistema de compensação sobre toda a
extensão e sobre todas as vogais de modo a atenuar ou reforçar certos
Ela depende da pressão sub-glótica, ou seja da sustentação abdominal
formantes.
que permite a potência. A intensidade se concretiza por uma sensação
de tonicidade que se distribui pelos órgãos vocais. Ela é percebida
como uma energia transmitida, pouco a pouco, ao conjunto das A Afinação
cavidades de ressonância e aos músculos faringo-laríngeos. O cantor,
Ela é o par da homogeneidade. Trata-se da pressão e da tonicidade
durante seu trabalho, deve ter consciência do dispêndio muscular que a
bem distribuídas que irão determinar uma coaptação adequada das
intensidade requer, da dinâmica vocal apropriada e generalizada que
cordas vocais, assim como uma acomodação das cavidades de
provocarão o enriquecimento do espectro sonoro.
ressonância. A afinação é regulada por movimentos extremamente
A intensidade (ela varia dependendo das vozes, de 80 a 120 dB) delicados, pelo domínio de um conjunto de sensações às quais é
aumenta com a tonicidade e está associada à altura tonal. preciso ficar muito atento associado ao controle auditivo vigilante.
Alguns cantores cantam "baixo" porque eles não sustentam o sopro
devido a uma hipotonia muscular. Outros cantam muito "alto", eles
O Timbre
"empurram", seja por excesso de pressão ou porque o sopro se gasta
É o resultado dos fenômenos acústicos que se localizam nas cavidades rápido demais. O som em geral localizado muito "em cima" é errado e
supra-laríngeas. É modificando o volume, a tonicidade dessas áreas, desafina.
assim como a dos lábios e das bochechas, que o som fundamental,
emitido pela laringe, vai ser enriquecido ou empobrecido
voluntariamente segundo a ordem, o número; a intensidade dos O Vibrato
harmônicos que o acompanham e que são filtrados nestas cavidades
Ele tem um interesse estético evidente, e um papel primordial porque
conforme a altura tonal e a vogal.
ele dá à voz sua riqueza expressiva, sua leveza e seu poder emocional.
A riqueza do timbre está em função do uso dos ressonadores, da Ele se caracteriza por modulações de freqüência (na razão de cinco a
pressão sub-glótica, da posição mais ou menos alta da laringe, mas sete vibrações por segundo, além disso é o trêmulo), acompanhadas
também do fechamento glótico, da qualidade das mucosas, condições de vibrações sincrônicas da intensidade (dois a três decibéis) e da
estas, essenciais à qualidade do timbre, assim como da morfologia. altura (1/4 de tom e 1/2 tom) que tem uma influência sobre o timbre.
Estas flutuações são criadas pelo cantor e têm uma ação musical
0 timbre é definido de diferentes maneiras. Fala-se do seu colorido e
importante.
este está diretamente relacionado com a forma dos ressonadores. Fala-
se da amplitude que corresponde às sonoridades extensas e redondas, O vibrato só se adquire à medida que o cantor domina sua técnica e
do mordente, da espessura, do brilho que cresce e decresce com as realiza da melhor maneira possível a junção faringo-laríngea: seu
modificações da intensidade e estão em correlação com a tonicidade mecanismo fisiológico corresponde a finas tremulações do conjunto da
das cordas vocais. musculatura respiratória e laríngea.
Sem vibrato a voz é achatada, inexpressiva e sem calor humano. Ele A Classificação
não existe nas crianças nem nas vozes incultas.
Para um professor inexperiente, é um problema difícil e delicado. É
também um problema sério pois dela vai depender a carreira do cantor.
O Alcance da Voz Existem vozes naturais que podem ser imediatamente classificadas.
Outras, mais numerosas, só podem ser classificadas após longos
Quaisquer que sejam as mudanças de timbre, de intensidade, de altura
meses.
ou as modificações das condições ambientais, a técnica vocal deve
permanecer a mesma. 0 cantor deve simplesmente adaptá-la a estes Comumente, os professores de canto confiam no seu ouvido, na
diferentes parâmetros. facilidade do aluno para o grave ou para o agudo, na tessitura, e
principalmente no timbre. Mas a apreciação de sua qualidade varia com
A voz é produzida , se ressente, se transforma no interior de nossos
cada indivíduo! Não podemos tomar como referência somente o gosto
órgãos. Do ponto de vista funcional, o alcance vocal está sempre
do professor ou do aluno, nem o resultado da técnica (se o indivíduo
relacionado com a energia gasta e se traduz, principalmente, pela
não é mais um iniciante). Esta última seria conseqüência de uma
consciência de uma tonicidade generalizada no corpo inteiro, às
pesquisa sistemática da ressonância palatal, nasal, bucal, sendo
sensações proprioceptivas mais perceptíveis e ao enriquecimento do
importante que, através de um trabalho bem adaptado, se possa
jogo acústico do timbre.
distribuí-las harmoniosamente, obtendo-se desta forma as
A voz, diferentemente dos outros instrumentos, não é materializada e características acústicas do timbre natural do cantor.
por esta razão é mais difícil de controlar. É por este motivo que o
Para ser válida, a classificação da voz deve ser feita, principalmente,
cantor deve ter à sua disposição, uma técnica segura, consciente,
sobre as bases anatômicas, morfológicas e acústicas. É preciso
baseada nas sensações e movimentos precisos que lhe permitirão não
considerar vários fatores, dos quais uns são predominantes e outros
perder o domínio da voz quando estiver nas grandes salas, nas igrejas,
são secundários.
ao ar livre ou nos estúdios desprovido de acústica
Assim pode-se dizer que, a condição essencial para que a voz tenha
alcance é o controle das sensações internas. São as sensações Fatores Predominantes
musculares que, particularmente, informam sobre a atividade dos
A tessitura - é o conjunto de notas que o cantor pode emitir facilmente.
órgãos e seguindo-se a elas é a sensação de vibração que permite
situar o tremor vibratório. Isto é tão evidente que muitos cantores A extensão vocal - abrange a totalidade dos sons que a voz pode
colocam a mão sobre a caixa craniana para sentí-lo melhor. Este realizar.
procedimento não é recomendável (salvo momentaneamente), pois
- A forma e o volume das cavidades de ressonância, variáveis para
quando é suprimido, a cantor tem a impressão de não ter mais voz e
cada indivíduo.
fica desorientado.
- O comprimento e a espessura das cordas vocais.
0 cantor sente a necessidade de localizar essas sensações e os
instrumentistas também as buscam. Alguns deles tocam com os olhos - O timbre é uma qualidade do som que permite diferenciar cada
fechados para sentir as vibrações de seu instrumento, juntar se a ele, pessoa, de reconhecê-la... Ele é apreciado de modos diferentes.
isolar-se do público e concentrar se melhor. Por estas mesmas razões a
famosa cantora negra Marian Anderson cantava sempre de olhos
fechados. Fatores Secundários
Buscar o alcance da voz procurando lançá-la para "a frente" é um erro - A capacidade respiratória e o desenvolvimento torácico e
fundamentaL Esta atitude provoca a contração da laringe, das cordas abdominal.
vocais, que contraem as cavidades de ressonância e passam a exercer
- A altura tonal da voz falada, desde que o sujeito utilize aquela que
uma pressão exagerada. Levam, pois, a um esforço generalizado do
corresponde à sua constituição anatômica.
corpo todo, com todas as conseqüências que isto pode ter sobre a
laringe e sobre o timbre. Não é por um excesso de intensidade que a - A amplitude vocal que indica uma voz com sonoridades amplas,
voz terá um melhor alcance. Antes de tudo, o que importa é poder arredondadas sobre toda a extensão vocal.
realizar uma distribuição do trabalho muscular, bem como adotar as
- A intensidade que permite a potência sem esforço.
corretas atitudes orgânicas, a fim de obter uma voz homogênea que
possua, desde a saída dos lábios, o máximo de riqueza acústica.
- O temperamento que representa o conjunto das qualidades do tórias e articulatórias corretas. Pois não podemos classificar uma
cantor em relação às suas possibilidades vocais. pessoa que faça um esforço, seja ao nível da respiração ou dos órgãos
vocais e que não saiba usar a respiração nem as cavidades de
- As características morfológicas. Geralmente admitimos que um
ressonância.
tenor ou um soprano são brevilíneos, baixos e gordos, que um baixo ou
um contralto são altos e magros!... Mas isto não é uma constante. Há Temos seis categorias principais para classificar as vozes das mulheres
tantas exceções que estes fatores não podem ser considerados como e dos homens. Em cada uma delas encontramos diferenças de
determinantes. Eles podem apenas confirmar os fatores predominantes extensão. Estas podem variar de algumas notas, de intensidade, de
e facilitar a classificação. amplitude vocal, de volume e de timbre. Estas particularidades
justificam sub-categorias e usos variáveis.
Devemos considerar, também, que numerosas pessoas apresentam
desarmonias nos órgãos vocais e respiratórios. Desta forma podemos Duas vozes não fazem parte da classificação habitual. São elas: a voz
encontrar cantores com cordas vocais grandes e caixas de ressonância de apito e a voz de falsete.
pequenas, ou uma capacidade respiratória insuficiente, ou pequenas
A voz de apito é muito rara. Ela permite, a um soprano agudo,
cordas vocais com um grande ressonador, ou uma laringe assimétrica:
acrescentar algumas notas à extensão normal e chegar a atingir o dó
Uma corda vocal ou uma aritenóide mais desenvolvida de um lado,
6. Nesta tessitura, as cordas vocais apresentam uma pequena fenda
uma assimetria faringo-laríngea provocada por uma escoliose cervical.
fusiforme.
Tudo é possível! Quando existe muita discordância, a voz, mesmo
sendo muito bela, será curta, ela terá poucos graves ou um agudo
limitado. Mas quando estas discordâncias são pouco sensíveis, dada a
capacidade de adaptação dos órgãos vocais e se utilizamos uma boa Extensão das vozes
técnica respiratória, elas poderão ser compensadas com eficácia. Voz feminina Voz masculina
Sabemos que um cantor pode produzir sons que parecem ser de boa
Soprano dó3-fá5 Tenor dó2-ré4
qualidade, mas emitidos com péssimas coordenações musculares, o
que leva mais ou menos rapidamente, a dificuldades vocais. Acontece Mezzo lá2-si4 Barítono sol1-lá3
também que uma pessoa adquire um timbre particular por mau hábito,
por uma técnica mal adaptada ou por imitação. Ela pode estar Contralto mi2-lá4 Baixo dó1-fá3
cantando numa outra categoria de voz, forçando nos graves, ampliando
Voz de apito dó1-dó6
anormalmente sua extensão em direção aos agudos etc... Pois, quando
é jovem, o cantor pode fazer de tudo com sua voz e portanto pode
mudar seu timbre natural. Estas múltiplas modificações podem ser
explicadas pelas possibilidades de adaptação das cavidades de
ressonância, que permitem uma grande variedade de coloridos Nos homens, a voz de falsete diz respeito à possibilidade de alongar a
utilizados de maneiras diferentes dependendo do caráter da obra extensão vocal. No momento da passagem para o falsete, acontece um
musical. descanso laríngeo. A coaptação das cordas vocais é incompleta, e sua
junção em profundidade está reduzida. 0 gasto de ar é muito grande.
É importante saber que a classificação da voz falada se processa como
Esta voz não pode ser aumentada ou diminuída e carece de harmônicos
a da voz cantada. É o mesmo instrumento, a mesma constituição
agudos.
anatômica, a mesma função fisiológica Deve haver concordância entre
as duas vozes, tanto para o timbre como para o modo de emissão.
Caso contrário, ou o cantor está mal classificado, ou ele modifica a
altura tonal da voz falada, geralmente tornado-a mais grave. De
qualquer modo, é prejudicial para um cantor, falar ou cantar com uma
voz que não corresponda à sua constituição anatômica. Portanto,
quando se fala é preciso lembrar daquilo que chamamos "o uso
primordial da voz". Para um soprano é aproximadamente o ré 3 para
um mezzo si 2 e para um contralto, sol 2. Em definitivo, o melhor
critério para a classificação do cantor é quando a emissão se apóia no
bom uso do sopro, o que é obtido graças ao controle das atitudes fona-
Capítulo 2 – A função vocal O trabalho dos músculos, os movimentos dos órgãos, e a consciência
do tremor vibratório estão associados à propagação da onda sonora
através da cavidade faríngea que segue a parede músculo-
A função vocal e um conjunto, um todo inseparável e homogêneo, membranosa situada ao longo da coluna vertebral. É aí o lugar da voz
determinado pela interação entre os diferentes órgãos vocais e como dizem os cantores. Lugar este que eles buscam com a ajuda de
respiratórios. E uma atividade muscular que só pode se desenvolver e sons de boca fechada, meio utilizado para chegar a um resultado
adquirir qualidades emocionais e expressivas buscando um conjunto de sonoro, a uma sensação vibratória sentida de modos diferentes
sensações proprioceptivas e cinestésicas que se apóiam nas leis da segundo a mobilização da laringe, a riqueza harmônica do som laríngeo
física, da acústica, da fonética e da fisiologia dos órgãos. e a altura tonal.
Ela é vivida como um fenômeno vibratório e como uma sensação global Estas sensações não são percebidas pelo ouvinte, mas são essenciais
de movimentos e de trabalho muscular. No que diz respeito à para o cantor. Elas constituem um meio eficaz de domínio após um
respiração esta é sentida, principalmente, como uma sensação de longo treinamento. O conjunto destas sensações deve ser completado
resistência, de sustentação firme e ágil ao nível da cinta abdominal, do pelo controle áudio-fonatório, isto é, pela escuta da própria voz, já que
grande reto, da parte inferior do tórax e da região para-vertebral. o rendimento acústico é controlado pelo ouvido, o que permite avaliar e
apreciar a qualidade dos sons. Assim o cantor utilizará, por um lado as
Esta sensação de tonicidade muscular que é, ao mesmo tempo, uma
possibilidades de dominar a voz que ele escuta por via aérea e, por
sensação de mobilidade e de movimentos, informa sobre a atividade
outro lado, um conjunto de vibrações buco-faríngeas, nasais e
dos órgãos, sobre sua posição, seu grau de flexibilidade e eficácia.
laríngeas que chegam ao ouvido interno por intermédio da via óssea
Quanto às cavidades supra-laríngeas, é preciso buscar uma sensação Para os sons graves, chegam pelos músculos abaixadores da laringe,
de alargamento, de afastamento dos pilares que vai repercutir ao nível para os agudos, pelos músculos elevadores deste órgão.
do véu palatino e da parede faríngea. É ao mesmo tempo a consciência
As sensações auditivas variam em função do lugar onde o cantor se
de um trabalho muscular necessário para a preparação de uma forma,
encontra e em função da acústica. Algumas vezes lhe parece que sua
uma atitude na qual os fenômenos acústicos e articulatórios vão se
voz vibra demais. Outras vezes, ele escuta mal e sua voz lhe parece
realizar normalmente e estarão associados a uma ligeira tensão, muito
ensurdecida Se o cantor não quiser forçar sua voz, deverá estar atento
difusa, da musculatura da laringe (figura 1).
às sensações internas- musculares e vibratórias - pois estas não
variam e não dependem do lugar onde ele se encontra.
A aquisição da voz cantada se dá, pois, com o auxílio destas sensações,
que são o resultado das atitudes e das relações complexas cuja
conscientização é indispensável para a qualidade e estabilidade vocal.
Aos principiantes é preciso dar informações sensoriais e vibratórias,
através de exercícios e de procedimentos complementares, que
permitam as coordenações musculares que agem diretamente sobre a
respiração e ao mesmo tempo sobre os órgãos vocais e articulatórios. E
para facilitar a pesquisa destas diferentes sensações, que os
professores de canto utilizam um vocabulário de expressões
imaginárias, de metáforas, de evocações subjetivas acrescentadas da
representação mental do som, de seu colorido, de seu mecanismo, o
que indiretamente acarretará a postura fonatória.
O professor deverá dar exemplos e explicações coerentes e válidas que
permitirão, ao aluno, encontrar um equilíbrio entre a pressão
expiratória e a emissão vocal, concretizada por uma dinâmica
generalizada.
Figura 1 – a) ... (em pontilhado), zona onde se situam as sensações musculares
de alargamento. 1. Úvula; 2. Pilar; 3. Pilar; 4. Parede faríngea; 5. Língua.
b) Sensação muscular ao nível do véu palatino.
O Aparelho Respiratório
O aparelho respiratório compreende o tórax no interior do qual se
encontram os pulmões. O tórax é composto de doze pares de costelas,
fixas atrás na coluna vertebral, que formam uma curva côncava para
dentro e inclinada para baixo. Por intermédio das cartilagens costais,
elas se inserem no osso esterno, na frente, com exceção das duas
últimas costelas, as flutuantes, que permitem uma maior mobilidade da
parte inferior do tórax no sentido antero-posterior e lateral (figura 2).
As costelas estão ligadas umas às outras por músculos inspiradores e
expiradores. Um conjunto muscular muito poderoso recobre a caixa
torácica e permite os movimentos necessários à entrada e saída do ar
pulmonar.

Figura 3 – Diafragma.

A cinta abdominal é composta de vários músculos, dos quais os


principais são: o transverso do abdômen (figura 4), o grande oblíquo, o
pequeno oblíquo (figura 5) e o grande reto (figura 6), que garantem a
estática e participam, também, na sua totalidade da dinâmica
respiratória e da sustentação da voz.
É preciso lembrar do grande dorsal, na região lombar (figura 7) que é
utilizado na inspiração, mas principalmente na expiração.

Figura 2 – Vista anterior da caixa torácica. 1. Coluna Vertebral; 2. As costelas


verdadeiras presas ao esterno; 3. As falsas costelas; 4. Clavícula; 5. Esterno; 6.
Omoplata.

O tórax está separado do abdômen por um músculo (figura 3): o


diafragma, cujas inserções são vertebrais, costais e esternal. E uma
fina parede músculo-tendinosa, móvel, uma espécie de cúpula cuja
parte central abaixa durante a inspiração, comprimindo as vísceras
abdominais, e subindo durante a fala ou o canto. É o músculo mais
importante da respiração, cujos movimentos são influenciados pela
movimentação ativa da musculatura costo-abdominal. A subida
progressiva do diafragma garante a pressão expiratória necessária à
fonação, através de uma ascensão resistente.

Figura 4 – 1. Músculo transverso do abdômen; 2. Púbis; 3. Osso ilíaco.


O trabalho desta musculatura poderosa e indispensável à firmeza das
costelas durante o canto. A atividade deste conjunto de músculos
permite modular, regular a pressão expiratória, segundo as exigências
da música, por um controle consciente e permanente.
A capacidade pulmonar varia de indivíduo para indivíduo, segundo a
idade e o sexo. Ela difere também conforme a posição: menos
importante na posição deitada, mais profunda quando o sujeito está de
pé e um pouco menos quando sentado.
Seguem os números recebidos por vários autores e após numerosos
exames espirométricos.
Após uma inspiração profunda, a capacidade máxima (jamais utilizado
no canto) varia de um indivíduo para outro. Para os homens, entre
3,50 e 5,30 litros (Caruso fazia 4,50 litros). Para as mulheres, entre
1,80 e 3,70 litros. Normalmente, na voz cantada, a capacidade oscila
entre 1 e 1,50 litros, dependendo do comprimento da frase.
Ela varia também conforme o tipo de respiração. Na respiração costal
superior ela é mínima, porque é a parte mais estreita da caixa torácica,
Figura 5 – 1. Grande reto; 2. Pequeno Figura 6 – Grande reto. permitindo pouco desenvolvimento e provocando contrações
oblíquo; 3. Grande oblíquo; 4. Cúpula intempestivas da região do pescoço e dos músculos laríngeos. Ainda, a
diafragmática; 5. Cúpula diafragmática
direita.
subida do diafragma fica limitada devido à ausência de movimentos
abdominais. Já a respiração costo-abdominal facilita o alargamento no
sentido antero-posterior, aumentando assim a capacidade respiratória,
sem esforço, e possibilitando a subida do diafragma.
A capacidade não é a principal razão da eficácia respiratória. O mais
importante é o controle do sopro, do modo como ele é economizado,
disciplinado e utilizado conscientemente, a fim de fornecer a pressão
que corresponde às necessidades da música.
Quaisquer que sejam as dificuldades de adaptação da respiração à
fonação, é importante que os movimentos abdominais e torácicos
estejam sempre relacionados à quantidade de ar inspirado. Muitas
vezes, o cantor não percebe que ele toma ar demais ou, ao contrário,
pouco ar.
Se usarmos o espirômetro durante o treinamento respiratório,
poderemos obter informações interessantes com dois testes: um que
mede a capacidade pulmonar e outro que demonstra a eficácia do
trabalho muscular.
Eis aqui três exemplos:
- Cantora profissional: capacidade normal, três litros expiração lenta,
38 segundos;
Figura 7 – 1. Músculo grande dorsal; 2. Coluna vertebral.
- Aluna no final do curso: capacidade normal, três litros e meio
expiração lenta, 16 segundos;
- Aluna no meio do curso: capacidade normal, dois litros e meio
expiração lenta, 34 segundos.
Quando o sopro não é disciplinado, existe uma diminuição no segundo Alguns são os abaixadores ou elevadores da laringe. Outros são
teste. Estes exemplos mostram que a capacidade não é o elemento músculos constritores. Alguns permitem a adução ou abdução das
mais importante, e sim que é o domínio da tonicidade e a agilidade dos cordas vocais e sua mobilidade. A laringe está envolvida por massas
músculos que importam. musculares cervicais cujas contrações excessivas podem impedir e
comprimir a circulação sanguínea no nível dos vasos de grosso calibre.
Ela é ricamente vascularizada e a sua inervação é de grande
A Laringe importância.
A laringe está situada acima da traquéia, à frente da parte inferior da No canto, como na palavra falada, a laringe, que é um órgão móvel,
faringe, atrás e sobre a base da língua, ao nível das quatro últimas deve estar livre para executar movimentos de elevação ou
vértebras cervicais. Ela compreende numerosas cartilagens ligadas e abaixamento que estão relacionados com as flutuações da linha
articuladas entre si, como também aos órgãos vizinhos, através dos melódica. Mas ela só pode se elevar, abaixar ou deslocar-se da frente
ligamentos e das membranas (figuras 8 e 9) . Sua mobilização é feita paia trás, através dos movimentos da língua, da mandíbula e das
com o auxílio de um conjunto de músculos que se distribuem em todas modificações no volume das cavidades de ressonância. Desta forma a
as direções e que estão recobertos de mucosa. laringe garante sua mobilidade e o mecanismo normal das cordas
vocais. Ela muda, também, de lugar conforme a posição da cabeça
(inclinada à frente, ela se abaixa; levantada, ela se eleva), conforme a
pressão expiratória e as atitudes articulatórias que são o resultado de
um mecanismo fisiológico regulado por movimentos precisos e que
dependem da nossa vontade.
Também, pode prestar-se, através de um treinamento singular, a
adaptações diferentes das que acabam de ser descritas ou, ainda, a
atitudes pré-determinadas, automatizadas e contrárias à sua função
fisiológica. Se obrigarmos a laringe a adotar uma posição
constantemente baixa, portanto contraída na totalidade da extensão
vocal, ou a uma atitude sempre muito elevada, não haverá uma
relação entre a localização do órgão e a altura tonal. Nos dois casos,
Figura 8 – As cartilagens da laringe. 1. Epiglote; 2. Osso hióide; 3. Tireóide; 4. estas posições anti-fisiológicas impedem a adaptação das cavidades de
Aritenóide, cricóide; 5. Face posterior da traquéia. ressonância, modificam as vibrações das cordas vocais, atrapalham os
movimentos de articulação e alteram o timbre. A emissão torna-se em
pouco tempo, difícil, sempre que certos princípios básicos não são
respeitados.
A laringe é o elemento vibrante, já que ela contém as cordas vocais.
Estas são em número de duas, de cor branca nacarada. Elas são
constituídas por pregas musculares localizadas horizontalmente
(figuras 10 e 11). Sua inserção anterior está situada ao nível do pomo
de Adão. Sua dimensão varia segundo o sexo, a idade e a categoria da
voz (de 14 a 21 mm para as mulheres, de 18 a 25 mm para os
homens). Elas estão inseridas nas cartilagens ligadas entre si por uma
musculatura que garante seu funcionamento, e são recobertas por uma
mucosa estimulada por movimentos ondulatórios de baixo para cima e
da frente para trás. As cordas vocais executam movimentos de
aproximação e afastamento que correspondem à altura tonal. Quanto
mais sua freqüência é alta mais agudo é o som (assim, o lá3 (o lá do
diapasão) faz 440 vibrações duplas por segundo. O lá2 faz 220 e o lá4
Figura 9 – Lado direito da laringe. Face interna. 1. Base da língua; 2. Epiglote;
faz 880). É o inverso para o som grave. Sua coaptação mais ou menos
3. Bandas ventriculares; 4. Ventrículos de Morgagni; 5. Cordas vocais; 6.
Traquéia.
profunda e firme varia na pressão e na quantidade segundo a nota As Cavidades de Ressonância
emitida Elas podem, também, se alongar, se esticar. se estreitar, se
Elas estão situadas à frente da coluna cervical, isto é, atrás da parte
alargar ou relaxar.
óssea e do maxilar e se seguem à laringe. Elas são compostas pelo
baixo ou oro-faringe, limitada embaixo pelas cordas vocais, à frente
pela epiglote e a base da língua, e atrás pela parede anterior da coluna
vertebral, que é recoberta pelos músculos constritores. Ao lado estão
os pilares, prolongados acima pelo véu palatino. Acima e atrás das
fossas nasais, o cavum, ou rino-faringe (figura 12).

Figura 10 – Corte da laringe (inspiração-fonação). 1. Bandas ventriculares; 2.


Ventrículos de Morgagni; 3. Cordas vocais; 4. Traquéia.

Figura 12 – 1. Sinus; 2. Fossas nasais; 3. Cavum; 4. Véu palatino; 5. Língua; 6.


Epiglote; 7. Cordas vocais.

Estas cavidades possuem paredes fixas (maxilar superior e palato


duro) e paredes móveis (mandíbula, língua, epiglote, lábios e véu
palatino). Suas formas e dimensões são variáveis dependendo das
pessoas. Alguns destes órgãos têm um sentido muscular (língua, lábios
e mandíbula) e outros não têm (véu palatino, laringe e cordas vocais).
No interior desta cavidade se encontra o véu palatino (terminado pela
Figura 11 – Cordas vocais. úvula) que se segue ao palato. Ele pode ter um diâmetro transversal e
sagital mais ou menos desenvolvido e ser mais ou menos longo e
musculoso. Qualquer que seja sua forma, o mais importante é sua
As cordas vocais fornecem um som complexo composto de um mobilidade. Sua posição depende das atitudes articulatórias e varia,
fundamental que representa a altura tonal e os harmônicos agudos que segundo a ausência ou a presença de nasalização (figura 13). Neste
o acompanham e são múltiplos deste som. Elas entram em vibração e caso, ele se abaixa e deixa passar um pouco de ar nas cavidades
são comandadas pelo cérebro e controladas pelos centros de audição. nasais. Ele muda também, segundo os movimentos da mandíbula, dos
No momento da emissão laríngea, várias condições devem estar lábios, da laringe e o alargamento, mais ou menos pronunciado da
reunidas: uma pressão regulada conscientemente, a acomodação das faringe. Ao nível dos pilares, do véu palatino e da parede faríngea, este
cavidades supra-laríngeas e uma boa colocação da ressonância 0 alargamento é sentido como uma atividade muscular importante e
conjunto desta atividade muscular realizará os sinais acústicos de muito sensível (figura 14).
freqüência variável e os sustentará.
Através dos músculos que a unem aos órgãos circunvizinhos, ela
intervém na abertura bucal, nos movimentos do véu palatino e na
tonicidade e firmeza da articulação.
Como todos os músculos desta região estão relacionados entre si,
diretamente, e se continuam por suas fibras musculares com os
músculos da hipo-faringe e da laringe, toda contração para baixo e
para trás vai desencadear uma ação de outros músculos desta região,
enquanto que toda posição normal da base da língua atenua as
contrações deste conjunto de músculos.
Do mesmo modo, toda ação, que procura alargar transversalmente as
cavidades de ressonância, terá tendência a atenuar a ação dos
músculos que fecham ou estreitam a abertura da hipo-faringe e da
parte posterior da boca.

A Mandíbula
Ela é o órgão móvel da articulação e, também, comanda a atitude da
laringe, o volume das cavidades supra-laríngeas em sinergia com os
Figura 13 – 1. Elevação do véu palatino; 2. Descenso do véu palatino. movimentos da língua. Quanto aos lábios, eles regulam a atribuição do
ressonador bucal anterior.
É nesta grande cavidade faríngea, que o som emitido pela laringe vai
desenvolver o timbre pessoal do cantor e onde se dará o acordo vocal
realizado entre a laringe, órgão vibrador, e as cavidades supra
laríngeas, órgão ressonador. Aí também são realizados os movimentos
de articulação, dos quais a voz é o suporte. A mandíbula tem um papel
essencial no que diz respeito à coloração dos timbres e à compreensão
do texto cantado.
É, pois, o lugar de uma atividade muscular permanente já que há uma
mobilidade constante dos órgãos contidos nas cavidades supra-
laríngeas. Suas possibilidades de adaptação permitem ao cantor
distribuir, a seu bel-prazer, as zonas de ressonância (figura 15) ou
seja, de modificar a composição acústica das sonoridades, já que é no
nível destas cavidades que os harmônicos são filtrados, onde alguns
Figura 14 – A cavidade bucal. 1. Véu palatino; 2. Úvula; 3. Pilar anterior; 4. serão aumentados e outros diminuídos. É por um automatismo
Pilar posterior; 5. Amígdala; 6. Língua; 7. Parede faríngea. acústico-fonatório controlado pelo ouvido, pelas modificações muito
sutis, muito finas, que se pode obter uma grande variedade de
sonoridades e adaptar o conjunto destes mecanismos às exigências do
A Língua texto, da música e da expressão.
Ela é um órgão muscular móvel, feita de numerosos músculos (17 Esta facilidade de adaptação voluntária ou involuntária explica a
músculos) e ligada à epiglote e à laringe. Ela pode e deve executar realização de um timbre ou de uma emissão particular, conforme o
movimentos extremamente precisos, em diferentes pontos da cavidade gosto do professor ou do aluno.
bucal. É o principal órgão da articulação. Ela encontra pontos de apoio
sobre diferentes partes da abóbada palatina e pode realizar, tanto Mas ela não estará obrigatoriamente de acordo com as possibilidades
movimentos da ponta em direção às arcadas dentárias inferior ou do cantor, nem às regras da fisiologia vocal, da fonética, da acústica e
superior, como elevar a base até a parte posterior do palato. da física. Cedo ou tarde elas levarão à dificuldades de outra natureza.
Devemos assinalar a importância desta grande cavidade faríngea para Capítulo 3 – O gesto vocal
o cantor, pois este é o lugar privilegiado para as infecções e
inflamações. Efetivamente, a face posterior da faringe pode estar
congestionada pelo muco retro-nasal descendente, pelas inflamações Quando chega o momento de emitir a voz, o cantor deve preparar-se
dos sinus que atingem a laringe, por um cavum obstruído por física e mentalmente para cantar. E preciso que ele se concentre e faça
vegetações, pelas amígdalas infectadas ou pelo catarro tubário. Todas a representação da imagem acústica do som, sua altura, seu colorido
estas inflamações ou infecções supra-laríngeas se transmitem à do ponto de vista auditivo, de seu mecanismo e das sensações que ele
mucosa da faringe e da laringe e modificarão o tipo de contração dos provoca Este comando motor e sensorial, que faz parte dos centros
músculos que os recobrem bem como a qualidade das mucosas. Elas, nervosos, provocará os diversos movimentos dos órgãos e o trabalho
também, atrapalharão a respiração do cantor, obrigando-o a pigarrear da musculatura.
e a modificar as sensações indispensáveis ao controle da voz cantada.
Isto quer dizer que, praticamente o cantor se colocará em posição
fonatória. O que exige:
- O controle do gesto da respiração e da quantidade de ar inspirado,
necessário para o exercício escolhido. É uma preparação consciente,
indispensável e da qual depende a emissão vocal.
- A adaptação voluntária da postura das cavidades de ressonância,
o afastamento dos pilares correlacionado à elevação do véu palatino e
o trabalho da parede faríngea.
- A verificação dos pontos articulatórios: da língua e dos lábios
conforme a letra pronunciada. Atitude essencial para a livre execução
dos movimentos naturais da laringe.
A partir do momento em que se inicia o canto, é preciso considerar a
necessidade, desde as notas graves, da preparação de uma forma, de
um molde. Mas, subindo os exercícios de meio tom, não há uma
modificação súbita da técnica, existe uma continuidade, uma
progressão a todos os níveis, tanto no que diz respeito à pressão
expiratória, ao aumento de volume das cavidades supra-laríngeas
Figura 15 – 1. Ressonância faríngeas; 2. Ressonâncias bucais; 3. Ressonâncias como para o deslocamento da laringe (figura 16) e do lugar de
nasais. ressonância que se faz no mesmo sentido. De uma nota a outra, existe
um modo de transmissão difícil de realizar que evolui pouco a pouco e
do qual é preciso fazer a representação, já que é a única maneira de
conseguir que o trabalho muscular e as atitudes dos órgãos se
modifiquem a cada nota progressivamente.

Figura 16 – Movimentos ascendentes


da laringe, da língua e do véu
palatino indo do grave ao agudo. 1.
Laringe; 2. Língua; 3. Véu palatino.
Tornando a descer a escala, normalmente a laringe abaixa, Ao mesmo tempo que estes movimentos são executados, o cantor deve
progressivamente, acompanhada de um relaxamento da musculatura. se preocupar com a direção que ele vai dar ao sopro. Ele deve dirigí-lo
Se este é excessivo, a voz cai, perde o timbre e desafina. verticalmente ao longo da parede faríngea, paia trás e para o alto em
direção ao véu palatino para desembocar, no que habitualmente
Para evitá-lo, o cantor deve manter a pressão bem como o modo de
chamamos de, lugar de ressonância, que é o lugar onde a sensação de
distribuição do sopro e o lugar de ressonância. É preciso conservar
tremor vibratório é sentida Ele se situa, no grave e no agudo, acima do
uma certa energia, apesar da descida da escala e de não perder a
véu palatino. Um pouco à frente no grave e cada vez mais atrás e em
direção ascendente do sopro.
cima à medida que vai nos agudos (figura 18).
É importante lembrar que, indo-se do grave ao agudo, há uma abertura
progressiva da boca, associada ao afastamento dos maxilares no lugar
onde eles se articulam, bem como uma sensação difusa da tensão
laríngea e uma leve elevação da base da língua.
Se, à medida que o som sobe, o colorido exato da vogal não é
conseguido, é porque o cantor, procurando arredondar as sonoridades,
ou bocejando os sons, modificou a posição intrabucal que corresponde
à vogal pronunciada
Ao contrário, se ela foi respeitada, se obterá o timbre vocálico próprio
de cada vogal, correspondente às zonas específicas dos formantes.
Graças à técnica, o timbre extra-vocálico, particular a cada um de nós,
é obtido.
Os diferentes formantes (freqüências que servem para determinar o Figura 18- Distribuição das ressonâncias, do grave ao agudo.
timbre) serão distribuídos de tal forma que, ao sair dos lábios, a voz
possua uma acústica que corresponda à do cantor. Admite-se que a
voz cantada comporta vários formantes (figura 17): Nestas condições, a voz deve dar a impressão de estar suspensa -
- F 1 na parte posterior da entre 250 a 700 Hz acima de uma linha imaginária- sustentada pelo sopro. Isto é
importante, pois da direção imposta ao sopro, dependerá todo um
- F 2 na cavidade bucal, de 700 a 2.500 Hz. conjunto de coordenações musculares que terão uma influência sobre a
- O formante do canto, situado acima do véu palatino entre 2.800 a qualidade da emissão, portanto sobre o timbre (figura 19).
2.900 Hz para os homens e 3.200 Hz para as mulheres. Para provocar o aumento de volume das cavidades de ressonância e a
Este último corresponde à percepção do tremor vibratório, isto é; no elevação do véu palatino, os professores de canto usam diferentes
lugar de ressonância que dá à voz seu timbre e seu alcance. procedimentos e se servem de um vocabulário imaginário, que varia
conforme a técnica que eles preconizam.
0 conjunto disto permite um bom fechamento glótico, uma voz que
comporta todas as qualidades necessárias. Compreendendo, intuitivamente, que não temos uma ação direta sobre
os movimentos do véu palatino, uns sugerem: para fazer curvatura do
som, para arredondar a sonoridade, para sombrear, cobrir o som,
bocejar, etc. São procedimentos que têm sua utilidade, mas que não
devem ser usados em detrimento da exatidão da vogal, ou seja da
homogeneidade vocal e da compreensão do texto.
0 cantor deve conscientizar-se da importância dos princípios de base
da técnica vocal e usar do feed back de sua voz, já que ela é o
resultado de um comportamento adquirido com a ajuda de uma
atividade muscular determinada e das diferentes sensações que são a
Figura 17 base desta técnica.
É através de um treinamento progressivo, bem dirigido, que o - Poder cantar sobre toda a extensão vocal sem registro e
principiante descobrirá e desenvolverá suas sensações e que aprenderá respeitando o colorido exato das sonoridades vocais.
a dominar a tonicidade e a agilidade de seus músculos. Ele deve saber,
- Ter uma voz afinada e homogênea, tanto na intensidade quanto
também, que mesmo nos momentos de grande intensidade, é preciso
na suavidade, sem modificação do timbre e que tenha alcance sem
ter sempre a possibilidade de fazer mais ou de poder dominar a
esforço.
musculatura
Dada a complexidade dos fenômenos a serem resolvidos, o cantor terá
Segundo esta técnica, é preciso haver uma coesão, uma continuidade
a ajuda do controle visual, que lhe facilitará na apreciação dos
entre os dois extremos: sensação de sustentação do sopro e de tremor
movimentos da articulação, da língua e da mandíbula - desta forma
vibratório. Os órgãos vocais e respiratórios estão unidos uns aos outros
evitando as contrações intempestivas do rosto e da respiração.
de modo harmonioso e equilibrado, sem jamais dar a impressão de
esforço localizado aqui ou ali, à exceção de uma sensação muito difusa Este procedimento de facilitação será completado pelo controle tátil, no
de tomada de posição fonatória e de um trabalho bem distribuído, mais nível da região abdominal, do grande reto e da base do tórax, dando
ou menos sustentado ou firme, segundo as exigências da música. Este conta dos erros da mecânica respiratória e da qualidade do trabalho da
conjunto de movimentos e sensações procurado, sistematicamente, musculatura costo-abdominal concomitantemente. Também é possível,
tornar-se-á após um longo treinamento, uma sensação global dos sentir os esforços laríngeos colocando os dedos de cada lado do pomo
movimentos e das sensações que correspondem à técnica da voz de Adão. E do mesmo modo para sentir a posição muito alta ou muito
cantada, ao mesmo tempo que um meio de controle eficaz e válido baixa da laringe em relação a sua posição normal.
para todas as vozes.
Todo o treinamento vocal e respiratório deve ser feito de pé, numa
Tudo isto não é fácil de realizar. Na maioria das vezes é preciso atitude firme sem rigidez. A cabeça deve estar na posição correta, o
recorrer a longos anos de trabalho progressivo e pesquisas pessoais. olhar dirigido ligeiramente acima da linha do horizonte. No início, os
exercícios terão uma pequena duração,* duas vezes por dia de 15 a 20
É necessário ter um professor com bom conhecimento pedagógico, que
minutos, podendo chegar a duas horas ou mais num tempo mais ou
possa dar explicações claras e coerentes, bem como exemplos válidos
menos rápido.
tanto sobre a respiração como sobre o modo de emissão: reproduzir o
que é feito pelo aluno, mostrar o que ele deveria fazer, chamando a Para os vocalises, o cantor pode recorrer ao piano, mas o menos
atenção para as diferenças. Isto é evidente. Estas são indicações possível, para não duplicar a voz, o que atrapalha o controle da
necessárias para o principiante, e ao mesmo tempo um modo de qualidade do timbre e a afinação.
desenvolver seu senso crítico, de afinar seu ouvido, de ajudá-lo no seu
trabalho e de favorecer o gosto pelo belo canto. Não se trata, para o
aluno, de imitar a voz do professor ou de procurar um determinado A Respiração
timbre! Trata-se, simplesmente, de aprender a reconhecer que toda
A voz só existe a partir do momento em que a expiração pulmonar
anomalia da voz, ou todo êxito, deve encontrar sua significação na
fornece uma pressão suficiente para fazer nascer e manter o som
consciência do gesto e do controle da sonoridade. Assim, pelo uso de
laríngeo.
uma correta técnica ele desenvolverá sua verdadeira voz.
Aprender a cantar, é inicialmente aprender a respirar, ou seja treinar
Há pessoas que gostam de compreender porque motivos lhes pedimos
para obter uma respiração adaptada ao canto.
tais movimentos ou atitudes (neste caso, um esquema do conjunto dos
órgãos da respiração e da fonação facilitam a pesquisa das sensações e A respiração é vital, pois ela garante as trocas químicas entre o ar e o
a compreensão dos fenômenos). sangue. Neste caso é um gesto inconsciente, instintivo, cujos
movimentos são regulares, rítmicos, simétricos e sincrônicos. Mas,
Não devemos recusar a dar as explicações que eles desejam. Para o
para o aprendiz de canto, os movimentos respiratórios devem ser
cantor, cujo instrumento não é materializado, representar os
conscientes e disciplinados, para tornarem-se ativos e eficazes, após
fenômenos que se passam no interior dos seus órgãos é uma ajuda
um longo treinamento e, desta forma, serem colocados a serviço da
preciosa e necessária, assim como o exemplo próprio. 0 cantor faz, ele
função vocal e da música.
mesmo, seu instrumento. Ele não deve desenvolvê-lo conforme seu
gosto pessoal. Trata-se, unicamente, de aprender a utilizar a voz que a Este treinamento põe em jogo o comando nervoso e todo um conjunto
natureza lhe deu. Isto só acontece quando se respeita as leis da física, muscular apropriado a fim de adquirir a agilidade e a firmeza
da fonética, da acústica e da fisiologia. É o único modo de responder a indispensáveis a toda atividade muscular.
certos imperativos.
No canto, como na voz falada, a respiração deve ser costo-abdominal A respiração na voz cantada difere em alguns aspectos daquela que
porque ela favorece os movimentos do diafragma e permite um gesto usamos na voz falada, isto devido às exigências impostas pela música
mais ágil e mais eficaz. Portanto, para o cantor não se trata de deixar o sopro escoar sem
controle. Ao contrário, ele deve aprender a economizá-lo; dosá-lo, isto
Três forças musculares distintas, complementares e sincrônicas entram
é regular constantemente o gasto de ar segundo a intensidade, a altura
em jogo:
tonal, o timbre, a extensão e a duração da frase musical.
- vertical, obtida pela mobilização do grande reto; Voluntariamente ele deve retardar o fechamento das costelas com a
ajuda da sustentação abdominal e da solidez dos músculos para-
- transversal, graças ao músculo transverso, quase horizontal;
vertebrais. São as massas costo-abdominais que, tomando ponto de
- oblíqua, realizada pela contração do músculo grande oblíquo, apoio sobre a coluna vertebral, regulam a pressão expiratória É sobre
reforçado pelo músculo grande dorsal fixo (dorso-lombar). esta musculatura dorso-lombar que os músculos da cinta abdominal e
os da parte inferior do tórax vão encontrar um ponto de resistência
No ato da inspiração, o ar que chega aos pulmões por via nasal
(figura 20). Portanto, na voz cantada há uma tonicidade muscular que
provoca um alargamento da cavidade abdominal que avança
não é necessária na voz falada, a não ser para os comediantes, mas
ligeiramente, assim como o grande reto na sua descontração. Ao
em grau menor.
mesmo tempo as costelas inferiores se abrem lateralmente e mobilizam
os músculos da região para-vertebral. Como conseqüência estes
movimentos provocam: o abaixamento do diafragma, o alargamento
vertical e transversal da caixa torácica e possibilitam uma respiração
ampla e profunda.
A região costo-clavicular permanece imóvel para evitar os movimentos
intempestivos que se propagariam no nível do pescoço, dos ombros e
da laringe. A maneira como se inspira é importante pois dela depende a
expiração.
Durante a expiração, a cinta abdominal, assim como o grande reto se
contraem para fornecer a pressão e regulá-la, enquanto o diafragma
volta à sua posição e as costelas se fecham (figura 19). São os
movimentos da parede abdominal e do tórax que revelam a subida e a
descida do diafragma, que é o músculo mais importante da respiração
e que não possui uma direção muscular. Figura 20 – (Em pontilhado) localização das sensações musculares.

A firmeza costo-abdominal e dorsal constitui o que chamamos de


manutenÇão do sopro. Mas esta firmeza, esta atividade da musculatura
jamais deve ser excessiva Ela deve ser equilibrada, dosada, nunca dar
a impressão de esforço, de excesso, ela deve estar apta a relaxar a
todo momento. A sensação de sustentação respiratória, do trabalho
muscular, nada tem a ver com o bloqueio do diafragma, ainda
recomendado por numerosos professores de canto. Isto é tão nocivo à
voz, pois imobiliza o diafragma e impede a regulação e dosagem da
pressão expiratória necessária à vibração das cordas vocais e cujo
modo de vibração muda constantemente. Elas devem receber uma
pressão conforme as flutuações vocais, o que impõe constantes
modificações da tonicidade muscular da parede abdominal, reguladora
da pressão. É a agilidade e a tonicidade da musculatura que permitem
uma melhor expansão e uma pressão melhor distribuída.
Figura 19 – A respiração costo-abdominal.
............ inspiração ______ expiração
Após um longo treinamento, bem conduzido, constata-se um melhor freqüência de vibrações das cordas vocais é mais rápida Esta forte
controle dos movimentos respiratórios, que o trabalho da musculatura pressão requer uma maior atividade da musculatura costo-abdominal e
está bem dividido, equilibrado e que a atividade muscular permite uma mais firmeza na região para-vertebral. É preciso retardar o fechamento
sustentação sem esforço. Pois, a qualidade da voz não requer uma das costelas.
pressão excessiva, desmedida, assim como a força muscular não
Entre estas posições extremas, devemos intercalar todas as diferenças
requer a rigidez dos músculos, mas sim sua tonicidade, sua
intermediárias impostas pelas variações de altura, de intensidade, de
possibilidade de firmar se ou de relaxar a todo momento conforme a
timbre e de duração. No que diz respeito ao extremo agudo
vontade do cantor.
(agudíssimo), deve-se impedir o aluno de inspirar uma quantidade
Para se obter este resultado são precisos longos anos de trabalho, muito grande de ar. Erradamente ele pode pensar que quanto mais ar,
principalmente no início. Algumas pessoas são rígidas, ou porque não mais ele pode sustentar o agudo. E, exatamente, o contrário. Ele
se aplicam àquilo que é proposto, ou porque lhes pedem coisas além confunde capacidade e pressão, isto é quantidade de ar inspirado e
do que podem realizar, ou ainda porque é da sua própria natureza. tonicidade muscular. Mais ar do que o normal no agudo obriga a laringe
Outras pessoas, ao contrário, adquirem rapidamente, um gesto ágil, a uma contração exagerada e também obriga a coaptar fortemente as
uma capacidade suficiente e conseguem um equilíbrio entre o trabalho cordas vocais. No canto jamais é preciso inspirar o máximo de ar, isto
dos músculos abdominais e a abertura das costelas. Para estes, o é, reservado à uma certa ginástica respiratória.
treinamento será fácil e eficaz, ainda mais se forem atentos e tiverem
Como todos os exercícios de vocalização são executados de semi-tom
(isto é raro) o instinto do canto. Outros, e talvez sejam muitos, terão
em semi-tom, indo do grave ao agudo e inversamente, é necessário
dificuldades a superar e os professores deverão adaptar os
modificar constantemente a capacidade ou a pressão. Isto quer dizer
procedimentos às possibilidades e à morfologia do aluno, mas sempre
que à medida que se sobe, a capacidade tende a diminuir e a pressão
referindo-se aos mesmos princípios. Eles terão que considerar se o
aumenta pouco a pouco. O contrário acontece quando se desce a
aluno tem um tórax estreito e longo, ou os que o têm curto e largo,
escala. Trata-se sempre da dosagem da quantidade de ar inspirado e
isto para citar somente os dois casos extremos. Os brevilíneos
do grau de tonicidade imposta à musculatura costo-abdominal e para-
apresentam, muitas vezes, uma respiração inversa Será preciso
vertebral. Estas modificações são impostas devido às constantes
restabelecer neles o trabalho da musculatura abdominal e dorsal, com
mudanças de altura, duração, intensidade, timbre, pela posição da
o mínimo de movimentos torácicos, ou seja uma respiração baixa. Ao
laringe e pela freqüência vibratória das cordas vocais. Quando se trata
contrário, para os longilíneos que facilmente exageram os movimentos
de sons ligados ou de sons ppp (sons pianíssimos) a regulação do
da caixa torácica superior sem a participação da cinta abdominal, será
sopro é mais minuciosa e mais delicada Para os sons ligados o gasto de
necessário desenvolver ao máximo a musculatura abdominal bem
ar deve ser controlado, mas não retido. Quando o som aumenta de
como a da região dorso-lombar e a das costelas. Isto é, no sentido
intensidade, é necessário, por uma contração progressiva da cinta
transversal.
abdominal e do grande reto, intensificar a pressão regularmente. No
Assim que o cantor inicia os exercícios de vocalização -que são também momento em que o som diminui, a reserva de ar começa a se esgotar,
exercícios de respiração-será preciso que eles se adaptem a cada um então é preciso manter a pressão para compensar a falta de ar, ainda
dos alunos. Será o momento de chamar a atenção sobre os diferentes com mais atenção, pois as possibilidades de apoio diminuem e o cantor
ritmos respiratórios e sobre a relação que existe entre a quantidade de tem tendência a relaxar a musculatura. A atividade é menos dinâmica
ar inspirado e a pressão expiratória. Estas, quase sempre estão que nos sons mais intensos, mas ela deve ser constantemente dosada.
inversamente relacionadas, o que impõe a dosagem das duas A qualidade do timbre será obtida pelo aspecto muscular, pelo controle
dependendo da altura tonal, da intensidade e da duração da frase do sopro, pela manutenção do lugar de ressonância e do volume.
musical. Estes dois últimos Parâmetros exigem uma grande quantidade
Para os sons ppp, que necessitam pouco ar, é preciso fornecer uma
de ar. Quando as frases têm uma certa duração, o sopro deve ser bem
pressão média, igualmente sustentada, que irá progredindo até o final
dosado desde o início, porém isto vai depender da frase começar pelo
da frase, principalmente se ela se situa no agudo. Com a ajuda de uma
grave ou pelo agudo. No primeiro caso (grave), normalmente há um
pressão bem dosada, o som manterá seu colorido vocal e se
gasto maior do ar por causa das vibrações mais lentas das cordas
estabilizará Mas, como para os sons ligados, a atenção deve se voltar
vocais, o que exige pouca pressão. Gastar muito ar impede de timbrar
para a conservação da forma das cavidades supra-laríngeas e do lugar
o grave, ou incita a comprimir. É preciso moderar as contrações ativas
de ressonância Os órgãos devem estar bem unidos uns aos outros,
da cinta abdominal e tratar de manter o sopro, estendendo sua
com a constante preocupação de uma mediação eficaz do sopro.
duração. Ele deve ser economizado, mas não retido. No segundo caso
(agudo) o gasto de ar é médio e a pressão é mais forte, já que a
.
Quando as frases são muito intensas, é preciso uma grande quantidade Quando o cantor confia na sua própria habilidade e ignora a
de ar, mas principalmente uma boa sustentação abdominal, bem baixa; importância da respiração, podem aparecer, logo depois, dificuldades
apoiando-se sobre os músculos dorsais e para-vertebrais. No agudo importantes: perda dos agudos, passagens, furos na voz, dificuldades
extremo, nunca se deve usar o máximo de pressão. E preciso ter com os sons ligados, com os sons ppp, etc., seguidos de problemas
sempre a impressão de que se pode fazer mais. Não se deve confundir orgânicos como: nódulos, monocordite, etc.
firmeza muscular com esforço ou rigidez da musculatura.
Excetuando-se as alterações orgânicas ou as doenças gerais, não há
Se o som começar por uma vogal, não devemos usar logo toda a outro motivo paia as dificuldades vocais encontradas a não ser uma
pressão que corresponde ao som a ser emitido, mesmo que seja um técnica errônea do sopro, ou a ausência de técnica. Como a
som agudo que exija uma pressão muito grande. É preciso "entrar no musculatura vocal e respiratória forma um todo coerente, e sendo o
lugar do som" com agilidade e precisão. Imediatamente depois deve-se sopro 0 motor da voz, toda anomalia respiratória vai repercutir (muitas
aumentar a pressão através da contração abdominal ativa e vezes rapidamente) sobre o modo de vibração das cordas vocais, sobre
progressiva. Isto deve ser feito muito rápido de modo que não se a atitude da laringe, bem como sobre o volume das cavidades supra-
perceba, auditivamente, nenhuma diferença de timbre ou de afinação. laríngeas. Isto acarretará um desajuste do automatismo vocal e
No momento do ataque, além da regulação do sopro é preciso ter respiratório.
preparado antecipadamente os órgãos de ressonância nos quais ele vai
O cantor que pretende seguir uma longa carreira, deve possuir uma
se distribuir, e situar através do pensamento o lugar onde o som vai
técnica impecável do sopro. Não existe nenhuma razão para que a voz
vibrar. Reconhecemos um bom cantor pelo modo como ele ataca o
- que é um instrumento frágil, caprichoso, sensível e dependente do
som. Alguns o atacam com golpe de glote, outros tomam a nota por
estado geral e psicológico - não seja treinada metodicamente, e não
baixo. Os dois procedimentos são detestáveis. 0 primeiro porque
empiricamente, como geralmente acontece. Dada a fragilidade da voz,
traumatiza as cordas vocais, o segundo porque indica uma falta de
o cantor deve possuir uma técnica correta, já que o controle da
sincronismo entre a pressão e a vibração das cordas vocais.
emissão não é feito unicamente pelo ouvido. Por esta razão, mesmo
Para realizar esta técnica do sopro, a musculatura do tórax e do produzindo belas sonoridades, ele precisa saber a que se devem suas
abdômen deve ser capaz de fornecer mais ou menos tonicidade qualidades. Ele deve, também, ser capaz de remediar os
conforme a vontade do cantor, isto mesmo durante a duração de um aborrecimentos passageiros como por exemplo o cansaço! Neste caso é
som ou de uma frase musical. Portanto, sustentar o sopro subentende preferível dar menos intensidade e compensar com mais timbre, isto
poder intervir na dosagem de pressão a todo momento. quer dizer, usando ao máximo as cavidades de ressonância.
Comandar a musculatura respiratória é facilitar os movimentos naturais Desta forma, mesmo para os mais dotados, o trabalho regular da
da laringe, da articulação, bem como adaptar as cavidades de respiração tem por objetivo treinar a musculatura a fim de adquirir a
ressonância. A voz cantada exige uma atividade muscular permanente, agilidade e a tonicidade necessária à toda atividade muscular. Assim,
constantemente adaptada a todas as situações. 0 cantor deve estar transformar um gesto instintivo num gesto disciplinado e dominado,
atento ao trabalho de seus músculos e estar consciente de sua técnica permitirá ao cantor responder a todas as dificuldades encontradas.
respiratória da qual depende a qualidade das sonoridades.
Longos meses são necessários para que um cantor possa sentir e
A Articulação
realizar o que se exige dele. Freqüentemente o iniciante, se ele tem
facilidades, não acredita na necessidade de se preocupar com seu Aprender a cantar, não é procurar um belo timbre, desenvolver a
sopro. Ele prefere "se escutar". Cabe ao professor ser bastante extensão, a agilidade, a facilidade vocal, é também ser compreendido
persuasivo e exigente, demonstrando através de exemplos por quem o ouve. Esta deveria ser a preocupação constante do cantor,
surpreendentes que a beleza do timbre, a afinação, a facilidade da já que a voz tem o privilégio, em comparação aos outros instrumentos,
emissão, as possibilidades expressivas dependem, principalmente, da de unir a palavra à música.
técnica respiratória
Do ponto de vista da fonética, articular falando ou cantando são duas
As práticas são mais difíceis de serem aceitas quando o cantor não é realidades muito diferentes, apesar dos movimentos da articulação
mais um iniciante. Se ele tem automatismos errôneos (geralmente serem os mesmos que na palavra falada. No canto há um imperativo
antigos) dos quais não tem consciência, ele terá sempre a tendência de que é a qualidade e a afinação dos sons e isto num registro muito
pensar que são seus órgãos vocais que estão alterados ou deficientes e extenso, o que implica na preparação consciente de uma forma, um
não sua técnica. modelo, uma postura (o que é a mesma coisa) que corresponda à nota
emitida. É desta forma que se introduzirão os movimentos necessários
à pronúncia das vogais e consoantes. Não se pode relaxar a tonicidade língua. Para manter esta atitude não se deve exagerar os movimentos
muscular necessária à pronúncia das mesmas, nem deixar cair o lugar dos lábios para algumas letras (m, p, u, o...) para não prejudicar as
de ressonância, tanto para as vogais quanto para as consoantes, cujo atitudes das cavidades de ressonância.
papel é o de unir os sons entre si, o que é mais difícil com algumas
A abertura da boca deve estar, sempre, relacionada com a elevação do
como: p, t, cs...
véu palatino e a da laringe, ou seja, em correlação com a altura tonal.
No entanto, algumas destas letras facilitam o cuidado extremo com o Ela pode ser moderada no grave, ou um pouco mais aberta no médio
legato - que é uma sensação de continuidade, de encadeamento das para não impedir a pronúncia de certas letras que exigem o
sonoridades. São as consoantes nasais (m, n, nh) e as consoantes fechamento dos lábios ou uma aproximação dos maxilares e, também,
sonoras (l, r, b, d, v, j, z, g). No momento de sua emissão, a laringe para permitir um bom uso das cavidades de ressonância. A boca abre
adota a posição fonatória de acordo com a altura tonal e a sensação de progressivamente à medida que os sons sobem e ao mesmo tempo que
tremor vibratório é localizada, assim como deve ser realizada a o volume da grande cavidade faríngea aumenta e que o véu palatino se
sustentação abdominal. Estas consoantes sonoras servem de eleva.
trampolim para as vogais que se seguirão e que deverão ser sentidas
Ao contrário, nos sons agudíssimos, o alargamento e a subida do véu
sobre o mesmo plano de ressonância. Desta forma, elas influenciam a
palatino são máximos e a tensão resultante exige a abertura
vogal que se segue, e muitas vezes a que precede, não prejudicando a
pronunciada da boca. Por este motivo, nesta tessitura, não é possível
qualidade da voz. Tudo deve ser unido, ligado, guardando uma
articular certas letras nitidamente a não ser as que fazem parte das
sustentação eficaz. Isto permite cantar num bom plano de ressonância,
vogais abertas (a, é, e).
sem perda da sensação de vibração, nem modificação da tonicidade.
Em seguida, será necessário buscar o mesmo resultado e as mesmas Sabemos que respeitar as posições articulatórias é indispensável, mas
sensações com as outras consoantes menos favoráveis. certamente não está excluído favorecer mudanças ao colorido
expressivo da voz para responder às exigências da interpretação. Este
Articular bem não é, no entanto, exagerar nem deformar os
papel é destinado, principalmente, às pequenas modificações do
movimentos articulatórios: abertura excessiva da boca, tanto no grave
volume das cavidades supra-laríngeas e aos movimentos dos lábios. É
como no médio, ou abertura exagerada em altura e sobre todas as
através de uma prudente reunião das ressonâncias, que a voz, já
sílabas, entre outras coisas!
formada no nível dos lábios, se tornará mais redonda, mais clara, mais
Ao contrário, o que permite a identificação da articulação, é a precisão timbrada, mais brilhante, acrescentando ou suprimindo certos
dos movimentos. Cada vogal ou consoante tem um mecanismo línguo- harmônicos, ou seja, agindo sobre certas zonas de ressonância. Com a
palatal definido que tem uma repercussão sobre as atitudes dos órgãos ajuda destas modificações, todos os coloridos acústicos são possíveis
supra-glóticos. Esta ação repercussora determina, também, a posição sem que para isto seja necessário mudar de técnica.
da laringe, a forma e a tensão das cordas vocais. Cada letra tem um
Visto que no canto devemos recorrer, constantemente, às descrições
valor acústico e fonético que a identifica.
imaginárias, às sensações subjetivas, criadoras de sensações internas
- Para as vogais, este valor depende do ponto de apoio da língua e de coordenações musculares; visto que a representação mental do
sobre as partes às quais ela se opõe. som, assim como a imitação têm conseqüências indiretas sobre a
resolução de certas dificuldades, como as da articulação na voz cantada
- Quanto às consoantes, elas são formadas pelos movimentos de
ou as da localização das sensações vibratórias, podemos tratar de
fechamento ou de estreitamento do orifício bucal e são emitidas com
resolvê-las mais facilmente se as representarmos em dois planos
ou sem participação de ressonância nasal (alguns vogais também, na,
diferentes que se superpõem, separados por uma linha imaginária
on, ã).
(figura 21).
- Quando a tensão dos lábios e dos músculos dos órgãos vocais
aumenta, isto tem como conseqüência, do ponto de vista da acústica, o
reforço da intensidade dos sons.
A articulação será mais precisa e compreensível conforme a técnica
vocal adotada. A melhor atitude, a mais natural e eficaz, é a que facilita
o timbre e a articulação. Ela é provocada por um movimento muito
ligeiro dos lábios no sentido transversal simultâneo à uma mobilização
das bochechas. É um movimento que se parece com o sorriso, porém Figura 21 – Linha imaginária
sem excesso, sem careta, sem esforço nem rigidez da mandíbula ou da
- Primeiro plano situada na cavidade bucal, lá onde se localizam os Por outro lado, é através da execução precisa dos movimentos
movimentos da articulação (língua, véu palatino e lábios). articulatórios que se modifica, indiretamente, aqueles necessários à
fonação, isto quer dizer, a posição da laringe, o modo de vibração das
- Segundo plano, no nível das cavidades de ressonância, onde se
cordas vocais, os movimentos do véu palatino aos quais podemos
sente o tremor vibratório, localizado muito em cima, acima do véu
acrescentar ou suprimir certos harmônicos para obtermos o jogo
palatino. Esta representação mental tem por, resultado uma voz clara e
acústico próprio de cada vogal. Condição essencial esta ao
redonda A clareza corresponde à riqueza do timbre, a redondeza ao
reconhecimento dos textos cantados, assim como a qualidade das
volume das cavidades de ressonância. Ao contrário, quando a voz se
sonoridades. Ainda, uma boa articulação acrescenta muito à expressão
situa no baixo-faringe ou na cavidade bucal, falto-lhe clareza e brilho.
e ao alcance da voz.
Há falta dos harmônicos agudos que enriquecem o timbre. As vogais
são pouco diferenciadas, a articulação das consoantes é relaxada e o
texto torna-se incompreensível (figura 22).
A Noção de Apoio
0 apoio é entendido de diferentes maneiras pelo cantor. No que diz
respeito a respiração, alguns preconizam: de apoiar-se no sopro, de
apoiar-se no diafragma ou de bloqueá-lo!... (como podemos nos apoiar
ou bloquear o diafragma que é um músculo sobre o qual não podemos
agir diretamente e que nós não sentimos?). O que fisiologicamente
não quer dizer nada! Realmente, está provado há muito tempo que na
voz cantada, assim como na voz falada, a atividade do diafragma é
constante, já que é a subida diafragmática que garante a pressão
expiratória.
A atividade muscular não pára nunca, o que obriga o cantor a um
treinamento específico e repetido de modo que tenha a sua disposição
uma musculatura abdominal firme e ágil, pronta pata regular a
pressão, a qualquer momento, dependendo das exigências da música
Quanto ao lugar de ressonância da voz, o que se recomenda na maioria
das vezes, é buscar o apoio na máscara! Mas isto é muito vago. Para
alguns pode ser sobre os dentes, nas bochechas, na parte anterior da
cabeça, nos sinus, nas fossas nasais... Isto é, sempre para a frente.
Porém, isto não é uma realidade fisiológica. Estes órgãos são fixos, não
móveis, portanto eles não podem se adaptar aos sons da laringe. E
para o cantor, unicamente, a busca da sensação de firmeza, de
segurança, de estabilidade vocal, que ele realiza com a ajuda de
sensações subjetivas.
A emissão para a frente permite rapidamente o enriquecimento das
sonoridades. A voz parece brilhar, mas ela não tem qualidade.
Rapidamente ela se torna dura, comprimida, metálica, porque ela
comporta um excesso de harmônicos agudos. Esta busca de hiper-
timbre só é obtida por um excesso de pressão que obriga a laringe a
manter uma posição muito elevada, a uma coaptação exagerada das
cordas vocais, a um estreitamento das cavidades faringo-laríngeas
Figura 22 – Principais posições articulatórias (figura 23) ou seja, a esforços desproporcionais do conjunto da
musculatura respiratória e vocal.
tes, daí o termo de voz de peito.
No extremo da extensão vocal, a voz de cabeça caracteriza-se por uma
elevação da laringe, por vibrações mais rápidas das cordas vocais e por
uma energia transmitida sob a forma de sensações vibratórias nas
cavidades buco-faringo-nasais, ou seja, na caixa craniana, lugar
favorável à sua percepção e sua propagação.
Nestes dois casos extremos, é a transmissão por via óssea e muscular
que originaram estes dois termos. Para a parte média da voz, há uma
modificação das sensações vibratórias realizada pela mescla das zonas
Figura 23 – Voz para a frente; determina esforços velo-faríngeos e de ressonância que permite passar para a voz de cabeça mais
articulatórios. Em pontilhado .......... emissão comprimida. facilmente.
O cantor que realiza estes registros utiliza vários modos de emissão. E
estes modos ele só pode manter sobre algumas notas o que o obriga,
Apoiar a voz num ponto preciso, para a frente, requer movimentos constantemente, a mudanças de posições orgânicas.
musculares muito intensos, contrações abdominais muito rígidas que
repercutem inevitavelmente sobre'a qualidade e a prontidão da voz. É A existência de registros implica na noção de passagens e torna falsa a
o tipo mais difundido de emissão, o mais fácil de adquirir e também o concepção e a realização da homogeneidade da voz. A partir do
mais nefasto. Aquilo que foi obtido facilmente torna-se rapidamente o momento em que o aluno ouve falar de registros, ele se esforçará em
mais difícil. fazer o que lhe é pedido, isto é "fazer a passagem", o que não é outra
coisa senão tratar de camuflar mais ou menos bem.
Problemas vocais de todo tipo intervêm: dificuldade para os sons
ligados, quebras da voz, perda do agudo, falta de homogeneidade, As passagens são percebidas cada vez que há um desacordo entre o
cansaço vocal, rouquidão... som laríngeo e a acomodação das cavidades de ressonância. Elas são
também a conseqüência da pesquisa de sonoridades muito
Como a voz se coloca conforme a direção dada ao sopro, e é aí onde particulares, ou seja, de um treinamento vocal errado. É assim que,
preparamos uma postura, uma forma, ao invés de aconselhar a por exemplo, se o cantor dá demasiada importância ao harmônicos
procurar um ponto de apoio para a frente, devemos: relaxar a graves na parte inferior de sua voz, a subida da laringe será retardada
musculatura respiratória, e preparar a forma na qual o sopro vai se e a sinergia das cavidades supra-laríngeas se fará de modo difícil. Por
difundir, segundo uma direção vertical, atrás e para cima, em direção outro lado, se na mesma tessitura a laringe está localizada muito em
ao véu palatino. É uma direção subjetiva que leva à sensação de uma cima, as cordas vocais estarão exageradamente unidas e haverá um
voz aérea, que paira, sustentada pelo sopro, impossível de sentir e excesso de harmônicos agudos. Enfim, a faringe estará contraída assim
modular quando o apoio respiratório é rígido e quando a voz procura como a musculatura abdominal. Após algumas notas, se produzirá um
apoiar-se na frente. relaxamento, o que tornará a passagem audível. Estes dois exemplos
Quando este modelo é adotado, a voz dará ao ouvinte, a impressão de demonstram uma pressão inadequada, uma ação faringo-laríngea
ter um alcance muito grande porque terá adquirido ao sair dos lábios, e prejudicial. Quem fala em passagem, fala de uma má adaptação dos
através de um trabalho bem distribuído, o jogo acústico que movimentos naturais.
corresponde ao timbre pessoal do cantor. Não podemos deixar de notar que, por razões fisiológicas e acústicas
(esta questão ainda gera controvérsias entre os médicos, os
fisiologistas, os foneticistas, os especialistas em acústica e os
Registros e Passagens cantores), a passagem existe. Subindo ou descendo a escala nas
Há muito tempo se admite que a voz cantada se divide em três vogais - i -, - é-, não podemos deixar de reconhecê-la. Neste caso, as
registros. Fala-se de voz de peito, voz mista, voz de cabeça. notas de passagem se beneficiam da postura exigida no alto do teclado
vocal, assim como da pressão, o que a torna, acusticamente, inaudível.
Comumente estes termos designam sensações vibratórias percebidas Para evitar as mudanças de emissão, é preciso realizar aquilo que os
no nível dos diferentes órgãos ressonadores, que determinam variados antigos Italianos recomendavam "preparar a passagem desde as notas
modos de emissão. É assim que para o grave, o abaixamento da graves".
laringe e as vibrações mais lentas das cordas vocais se transmitem ao
esqueleto ósseo torácico e provocam sensações internas muito diferen-
Isto quer dizer: acomodação contínua do conjunto de movimentos Capítulo 4 – Técnica vocal
necessários à fonação e à articulação. Ou, ainda, o deslocamento
progressivo das zonas de ressonância obtido pela fusão dos diferentes
coloridos, pelo alargamento da cavidade faríngea, pela elevação do véu Exercícios de Respiração
palatino, ou seja por meio de maior tonicidade de toda a musculatura
A respiração deve ser treinada independentemente do canto. Os
velo-faríngea e pelo deslocamento da sensação de tremor vibratório,
exercícios respiratórios devem ser feitos diariamente, durante todo o
que é produzido no mesmo sentido que os sons. Se o conjunto deste
período dos estudos vocais, para desenvolver e agilizar a musculatura
trabalho não é contínuo, se não for feito nota após nota, dar-se-á
respiratória, pelo menos durante vinte minutos várias vezes ao dia.
sempre, obrigatoriamente, uma modificação brusca das posições vocais
Depois de alguns meses, a pessoa terá adquirido uma respiração mais
e articulatórias, portanto uma mudança evidente de timbre. É
ampla, realizada sem esforço. 0 treinamento será contínuo durante
desenvolvendo-se de modo gradual os movimentos da fonação, os
toda a carreira do cantor, mesmo que seja apenas alguns minutos por
abrandando como acaba de ser indicado, que o cantor terá a impressão
dia, associado ou não à ginástica corporal.
de um mecanismo que evolui no tempo, e do qual terá como
representação uma espécie de teclado vocal. Se a pessoa não realiza o que lhe pedimos adequadamente, por
diferentes razões, começaremos os exercícios em decúbito dorsal. Para
facilitar o gesto respiratório, iniciaremos com movimentos naturais e
flexíveis na posição deitada. Geralmente eles são muito limitados, mas
fáceis e instintivos. Depois, bastará pedir que os identifiquem para que
eles se ampliem e para que a capacidade aumente. Quando o cantor
tiver consciência do que deve fazer, então ele deverá praticar o mesmo
exercício de pé.
Nos casos difíceis, diferentes procedimentos podem ser utilizados:
começar o exercício de respiração pela expiração, o que pode ser
provocado por uma ligeira pressão das mãos no nível da cinta
abdominal e da base do tórax. Este procedimento evita os movimentos
excessivos e desordenados que podem ser conseqüência de uma
respiração infreqüente e facilita a inspiração seguinte. Se o indivíduo
abre pouco as costelas, será preciso decompor a inspiração em dois
tempos: primeiro tempo, com um ligeiro avanço da parede abdominal
(que se descontrai); segundo tempo, abertura das costelas e contração
da região para-vertebral. Em seguida, é preciso realizar a inspiração
num só tempo e cuidar para que as costelas não se abram
exageradamente.
Esta abertura deve ser completada no momento da contração
abdominal, isto é, no momento do ataque, sobretudo no agudo a fim
de dar maior firmeza ao sopro.
Em seguida, o aluno deverá treinar a respiração rápida, pois esta é
freqüentemente usada na voz cantada e com o mesmo gesto. Se esta
respiração precede uma frase curta, pouco intensa e de pouca
extensão, as costelas mexerão pouco.
A penetração do ar será sempre nasal, de preferência. Exceto quando
os silêncios musicais forem muito breves. Neste caso, é preciso
respirar ao mesmo tempo pelo nariz e pela boca. Mas para que a
respiração possa desempenhar seu papel e ser eficaz, as fossas nasais
devem permitir que a respiração seja equilibrada, que o ar possa
passar sem ruído pelas narinas e que as cavidades nasais não estejam
obstruídas por cornetos hipertrofiados por desvio do tabique nasal, etc. Exercícios para o Grave e o Médio
No canto, a respiração está submetida a diferentes imperativos: Se no grave o aluno tem dificuldades para usar os ressonadores, será
duração das frases musicais, silêncios breves, intensidade, altura tonal interessante usar as vogais nasais, precedidas, em certos casos, de
etc., o que implica em diferentes pressões e modificações da uma consoante nasal (nasalizar não significa colocar a voz nas fossas
capacidade pulmonar. 0 cantor deve, através de exercícios apropriados, nasais. É contar com a ajuda das ressonâncias detrás do nariz para
treinar diferentes ritmos inspiratórios e expiratórios respondendo às aliviar a laringe, enriquecer as sonoridades e evitar a voz sombria. Não
exigências da música. Ele poderá variar da seguinte maneira: confundir com o falar fanhoso). À medida que o exercício sobe de meio
em meio tom, será preciso mudar as nasais na ordem a seguir, o
- Inspiração lenta - Expiração lenta.
inverso será utilizado na descida.
- Inspiração lenta - Expiração rápida.
- Inspiração rápida - Expiração lenta.
grave ã grave grave nh grave
- Inspiração rápida - Expiração rápida.
an n
Este meio permite dar-se conta de que há momentos nos quais é
ã m
preciso intensificar os movimentos ativos ou ao contrário moderá-los,
economizá-los. agudo on agudo agudo agudo
Para prolongar a duração da expiração e desenvolver a musculatura
costo-abdominal, o iniciante depois de uma inspiração lenta ou rápida
Esta escolha leva em conta a abertura progressiva das cavidades
tratará de prolongar a expiração da consoante sss; inicialmente de
supra-laríngeas.
modo regular em seguida começando devagar e aumentando
progressivamente (como um crescendo), imediatamente se sente que o No médio alto, as vogais nasais se tornam mais difíceis dado o
aumento só se faz com mais firmeza da musculatura abdominal, isto é abaixamento do véu palatino. Como as vogais orais, elas precisam de
com mais pressão. Durante a emissão desta consoante, não se deve um aumento do volume das cavidades de ressonância.
fazer esforço laríngeo. No início do treinamento a duração será de dez
É necessário aproximar-se progressivamente da vogal correspondente,
segundos, em seguida ela poderá atingir quarenta segundos variando a
sempre guardando o colorido da nasal, sem modificar a pressão (figura
intensidade para mais ou para menos.
24).
Entre cada movimento, é bom colocar uma pausa de dois a três
segundos depois da inspiração e cinco segundos, pelo menos, depois
da expiração. Isto permite aos músculos se relaxarem e facilita a grave ã torna-se e grave
penetração de ar e o controle dos movimentos.
na ............ a
ã ............ u*
Exercícios de Vocalização e de Articulação
agudo on ............ o agudo
Por ser o sopro um dos elementos da técnica vocal, todos os vocalises
serão precedidos, no início dos estudos, por exercícios de respiração
correspondente ao vocalise escolhido. Quando lentos, a respiração será * u francês
relativamente lenta e profunda. Se forem rápidos, ela será breve e
menos importante. De todo modo, é preciso ficar em posição fonatória
durante as retomadas de ar. Trata-se pois da dosagem realizada pelas modificações sutis da posição
dos órgãos. Em seguida, estes exercícios serão praticados com todas
Os exercícios que se seguirão terão por objetivo mostrar como se
as vogais. Para o grave e o médio, as emissões com boca fechada são
emprega a técnica respiratória e vocal. Trata-se de um esquema que
muito usadas pelos professores de canto (figura 25). Este
pode ser desenvolvido e completado dependendo das pessoas. Mas, a
procedimento permite situar melhor as sensações vibratórias. Quando
técnica continua sendo a mesma, assim como os princípios. 0 objetivo
bem aplicado é muito eficaz, desde que não se procure o tremor
principal é o de conseguir a coordenação do conjunto dos mecanismos,
vibratório muito à frente, e de que não haja esforço laríngeo. É com
partindo da tessitura e em seguida sobre toda a extensão vocal.
leveza e usando a pressão que se pode subir sem esforço.
Boca fechada.

Figura 25 – Sons com a boca fechada. - Sensação vibratória.

Às vezes acontece que o grave não timbra. As cordas vocais coaptam


mal. Há um gasto muito grande de ar. Neste caso deixa-se o sopro
quase parado, cuidando para retardar o fechamento das costelas e com
poucas contrações abdominais. E, à medida que os sons sobem ir
aumentando pouco à pouco a pressão usando de preferência as vogais
claras (é, i).
Neste tipo de exercícios de pouca extensão, se o mecanismo é normal
obtemos belas sonoridades: É preciso memorizá-los e desenvolvê-los
sobre toda a extensão vocal.
Muitos cantores se queixam de não ter os graves. Isto deve-se, muitas
vezes, a laringe estar situada muito em cima e não se relaxar ao
descer a escala Esta posição de esforço impõe o fechamento laríngeo
que abafa a sonoridade. Utiliza se preferentemente as vogais u, ô, que
facilitarão o relaxamento laríngeo.

Figura 24 – Vogais orais e nasais.


Nós podemos encontrar dificuldades também, quando impomos
sistematicamente a projeção da língua à frente (figura 26) com o
pretexto de ampliar a cavidade faríngea (ou em posição muito baixa),
ou a elevação da base da língua em direção ao véu palatino para
facilitar a subida da laringe.
Nos dois casos, isto determina uma atitude anormal da língua cujo
esforço repercute nos órgãos circunvizinhos e modifica a qualidade do
timbre. Não se deve, jamais, impor-lhe uma determinada posição,
constante, já que os movimentos internos da articulação mudam, de.
modo muito preciso, tanto para as vogais como para as consoantes.

Por exemplo, se a firmeza da musculatura é bem sentida sobre as


vogais i ou e, devemos tratar de mantê-la sobre as vogais mais abertas
Figura 26 – a) Língua abaixada; b) Língua para frente; c) Língua elevada como a ou e, isto é, mais relaxadas. É um procedimento de facilitação.
sistematicamente em direção ao véu palatino. 0 inverso é verdadeiro.
A pressão deve ser regulada desde o início e mantida regularmente.
Exercícios de Articulação das Vogais
Nestes exercícios, durante a subida dos sons, há também uma
Nos exercícios que se seguem, podemos conceber várias séries de progressão no alargamento da faringe, uma subida do lugar de
vogais reunidas conforme as dificuldades de cada pessoa. De todo ressonância e um aumento da pressão (o aumento da pressão
modo as vogais devem ser agrupadas levando-se em conta seu abdominal é indicado pelo sinal <, a diminuição pelo sinal contrário >.
parentesco acústico, seu comportamento interno, que se concretizam O alargamento das cavidades pelas curvas mais ou menos importantes
por modificações extremamente finas do conjunto dos órgãos vocais de acordo com a tessitura. Nós as indicamos como exemplo, somente
assim como da pressão expiratória, tanto para as notas sustentadas, em alguns exercícios).
como para a estabilidade e homogeneidade do som (figura 27).
As vogais serão utilizadas na seguinte ordem:
No momento da mudança de vogais, se tivermos encontrado um bom
grave i...ê grave grave u...i grave
lugar de ressonância, é preciso guardá-la. É uma imagem irreal mas
que incita a firmeza do som. i...u* u...u*
i...a u...e
agudo i...ó agudo agudo u...ó agudo
* u francês

Figura 27– Vogais agrupadas.


Esta ordem não é imutável. Quando a segunda vogal é mais propícia Se ao subir de meio em meio tom, o volume das cavidades de
pode-se, também, tomá-la como ponto de partida para o exercício ressonância não está suficientemente ampliado, devemos usar a letra
subseqüente. “L" sem colocar a ponta da língua no lugar habitual, mas apoiando-a de
dois a três centímetros para trás no palato (figura 28).
Estas misturas variadas, esta pesquisa constante da fusão das vogais,
não tem outro objetivo senão de dar-lhes o mesmo timbre. Assim, se a
voz tende a ser obscurecida, engrossada, será interessante usar de
preferência as vogais ê, i, u (u francês). Isto exigirá uma maior
tonicidade das cavidades de ressonância, uma ascensão da laringe
assim como da zona de ressonância e um aumento dos harmônicos
agudos. Ao, contrário, se a voz é muito clara, muito para a frente, será
preciso arredondar as sonoridades acrescentando-se harmônicos
graves. Isto é, escolher as vogais u, o, a.. Estes expedientes modificam
indiretamente os componentes acústicos dos sons, que dependem da
acomodação das cavidades supra-laríngeas ao som emitido pela
laringe.
Há uma dificuldade comumente evocada pelos cantores que é a do -e-
mudo, muito freqüente em francês, principalmente no final das frases.
Figura 28 - a) Posição normal da língua para a letra "L". b) Língua voltada,
No interior dos grupos de sílabas, é preciso manter o som numa forma voluntariamente, na direção do véu palatino a fim de provocar o afastamento
tão tônica como a que precedeu ou a que se segue. No final de frases, dos maxilares e dos pares.
é também com a ajudá da firmeza da vogal ou da consoante que o
precede e sustentando-se a pressão que poderemos manter uma boa Esta posição tem como conseqüência o alargamento da faringe, a
zona de ressonância. subida do véu palatino, o afastamento dos pilares e dos maxilares, ao
nível onde eles se articulam. A ponta da língua retoma seu lugar no
momento da emissão da vogal.
Exercícios de Articulação das Consoantes Em seguida, será necessário misturar as vogais e consoantes numa
A utilização das consoantes nasais permite manter vogais e consoantes ordem qualquer.
sobre o mesmo plano de ressonância, portanto, une bem os sons entre No final das frases, a terminação de um som nasal introduz um novo
si e facilita a colocação em posição fonatória. colorido e facilita o final deste som, especialmente em algumas línguas.
Para o grave e o médio, é preferível usar as consoantes na seguinte Da mesma maneira para as consoantes duplas.
ordem: nh, n, m, indo-se do grave ao agudo e inversamente. Exemplo: menschen, meinen, sordern, darum, losen, em alemão ou
melhor ainda em italiano - momento, montamento, quando accende,
sento un affetto... etc.
Assim pois, no interior das frases, a união dos sons entre si é facilitada,
por certas consoantes, particularmente pelas nasais e pelas consoantes
sonoras.
No canto, a continuidade é assegurada pelo prolongamento das vogais
e pela maior duração das consoantes em relação à linguagem falada.
Geralmente sua preparação é mais firme, mas quando a língua se
Cantar um texto sobre a mesma nota. separa do ponto de apoio, ou quando os lábios se abrem, os
movimentos são mais nítidos, mais precisos. Na rapidez, eles são mais
breves, mas igualmente firmes.
Exercícios de Preparação para o Ataque sincrônico com a elevação do véu palatino, da laringe e da zona de
ressonância. No final do exercício, a sustentação abdominal não deve
Em toda ação voluntária, o pensamento precede o ato, portanto toda
ser relaxada, senão a inspiração seguinte seria invertida.
preparação mental, toda imagem subjetiva terá conseqüências sobre o
conjunto dos mecanismos, particularmente quando se trata do ataque
agudo, o que acontece nos exercícios que seguem:
Os Sons Ligados
Estes exercícios serão precedidos da prática de respiração que permite
sentir a importância da pressão do sopro, cada vez que se aumenta sua
intensidade. É o que precisa ser feito nos seguintes exercícios:

No primeiro exercício, o mais importante é ter consciência daquilo que


foi realizado com as notas agudas, ligando os sons entre si. E na
segunda vez renová-lo, no momento do ataque, depois de ter
respirado.
O fato de subir de uma nota à outra ou de modificar a intensidade, leva
Anota mais importante, nos exercícios ascendentes é sempre aquela
a sustentar e alargar as cavidades supra-laríngeas. Mas, para que elas
que precede a nota aguda. Ela deve ser colocada de tal modo - isto é
não se fechem novamente, e para que não haja modificação do timbre,
numa boa zona de ressonância - que não haja nada mais além de
é necessário imaginar que elas continuam a alargar-se e que a pressão
juntar a pressão e arredondar a sonoridade passando-se sobre a nota
é mantida constantemente. Não se trata de uma posição rígida, ao
superior.
contrário, uma atividade
constante que modela o som, o sustenta e trabalha-o para manter a
afinação, sem modificar a qualidade da voz, apesar das mudanças de
intensidade. Vemos assim como a sustentação abdominal é importante.
A escuta das sonoridades deve ser permanente de modo a propiciar a
intervenção do mecanismo que acaba de ser descrito e que é válido
também para o terceiro exercício. Tudo isto com conhecimento de
causa. Os exercícios serão trabalhados de meio em meio tom do dó 3
ao lá 4 para um soprano.
0 exercício acima pode servir como o precedente. A primeira nota é Exercícios para combinar a extensão, a agilidade, a rapidez, a
encontrada três vezes. É comum que na terceira vez a nota seja intensidade, a destreza, assim como as mudanças de vogais (as notas
sempre melhor. Realmente ela se beneficia do que foi realizado antes e envolvidas por um círculo são as que preparam o lugar da nota seguinte).
ela é bem conduzida pelo sopro. É esta posição que deve ser tomada
no ataque da primeira nota. Se, nesses exercícios, as cavidades não se
abrem suficientemente no momento do ataque, será necessária a ajuda
da letra "L".
Cada vez que o ataque é mal realizado, é por que as cavidades supra-
laríngeas não foram preparadas de antemão, que a pressão foi mal
regulada, o que torna impossível uma boa ressonância.
Neste tipo de exercício, a respiração deve intervir em cada nota
ascendente, para aumentar a pressão abdominal, ao mesmo tempo que
a firmeza da musculatura para-vertebral é mantida. Este mecanismo é
Conforme a tendência da pessoa, de se contrair ou de permanecer A primeira escala em i, ou ê, à plena voz, a segunda vez com u, ppp,
relaxada, usaremos as vogais abertas ou fechadas. ou ao contrário, dependendo do modo como a pessoa reage.
Como podemos repetir várias vezes o mesmo tema, é preciso manter a
pressão ao subir e relaxa-la somente no início da subida seguinte,
menos na última vez para não estar em posição inspiratória, o que
inverteria os movimentos respiratórios.

A mesma técnica será adotada para os exercícios que seguem, sempre


alternando as vogais.

Como regra geral, subir uma escala, a intervalos ascendentes é:


aumentar a pressão, alargar as cavidades de ressonância (ver figura
Uma vez lentamente, três vezes depressa, mudando as vogais. 29), dirigir o sopro para cima e para trás, acima do véu palatino, tanto
no grave como no agudo, de modo que a sensação de tremor vibratório
esteja sempre "localizada no alto". Descer a escala, é controlar a
descida da laringe, mas sem deixar cair a zona de ressonância, nem a
pressão e sem fechar as cavidades de ressonância.
Na subida dos sons, a maioria dos cantores se preocupa principalmente
com as notas agudas. Se elas são difíceis, isso pode ter as razões mais
variadas. Pode ser que elas estejam comprimidas, que haja falta de
homogeneidade. É sempre por que a adaptação ao treinamento, no seu
conjunto, não foi progressiva. Pode ser que a voz passe rapidamente,
suba e desentoe. Para evitar este defeito, é preciso manter a
respiração baixa no grave, dar pouca pressão e, no entanto, não reter
Uma vez lentamente Três vezes depressa
o sopro; não se trata de parar a atividade mas somente economizá-la,
mantê-la, e cuidar da direção do sopro.
Às vezes, o cantor canta desafinado por outros motivos. A voz sobe
sobretudo no final das frases ou sobre uma nota sustentada muito
tempo. As cordas vocais coaptam fortemente, a voz fica comprimida, o
cantor exerce pressão.

Estes exercícios permitem aos órgãos vocais retomar, normalmente,


sua função. À laringe de reencontrar sua mobilidade com a condição de
que a língua e a mandíbula estejam flexíveis, que a respiração se
adapte às mudanças de altura e de intensidade e que as cavidades de
ressonância se modifiquem ao mesmo tempo. Apesar destas
flutuações, a sensação de tremor vibratório deve situar-se sempre
acima do véu palatino.
Se, apesar destas precauções, os órgãos estiverem muito rígidos
podemos fazer este exercício da seguinte maneira:

Figura 29 – Elevação do véu palatino e alargamento das cavidades de


ressonância.

Outras vezes canta muito baixo, por conta de uma má adaptação


respiratória. Por falta de sustentação, o sopro não resiste e é gasto
rapidamente. As cordas vocais coaptam mal e as cavidades de
ressonância não mantêm a postura. A voz é velada. Por todas estas
razões, pode ser que o cantor não consiga sustentar um som sem
desafinar.
Em todo caso, o cantar desafinado causa sensações bem diferentes
daquelas que são consideradas normais quando se canta certo. O
Exercícios para Fortificar as Cordas Vocais
cantor deve poder reconhecê-las.
Quando a voz está destimbrada, velada em toda sua extensão, as
Ele precisa "sentir" se está desafinando, pois ele pode não ter
cordas vocais coaptam mal e deixam passar o ar. Estes exercícios
consciência deste fato.
devolverão a elas a tonicidade.

Exercícios para Treinar a Mobilidade e a Agilidade


Eis alguns exemplos:

Este último exercício inicia com pulsações espaçadas, portanto melhor


percebidas, em seguida cada vez mais próximas, podendo ir até os
A técnica, em seu conjunto, é a mesma que nos exercícios
semi-tons. Neste momento, se aumentarmos a pressão vigorosamente,
precedentes. Mas, dada a rapidez, sempre buscando a leveza, o som
o trinado pode aparecer.
deve permanecer redondo, claro e parecer mais agudo.
Será necessário mantê-lo com muita energia até o fim. Passa-se a
Se a musculatura se mantiver dócil, ágil, leves contrações abdominais
escutar uma sonoridade que parece bi-tonal, na qual a nota superior
serão involuntariamente produzidas a cada ataque. Mas se estas
domina. Este procedimento é muito mais rápido que a repetição de
contrações se localizarem na parte superior da caixa torácica é por que
duas notas cada vez mais depressa.
a respiração está invertida.
0 professor pode ajudar o aluno de duas maneiras. Primeiramente
Quando a pessoa está muito relaxada, momentaneamente podemos
mostrando, ele mesmo, como a laringe sacode durante o trinado. Em
começar os exercícios pelo médio. Deste modo, os músculos estarão
seguida, colocando o dedo médio sobre o pomo de Adão do aluno e
mais firmes e as cordas vocais coaptarão melhor. Descendo-se para o
fazendo movimentos de baixo para cima para facilitar as sacudidelas
grave, bastará manter a firmeza dos ressonadores e a do sopro para
laríngeas.
que a voz permaneça timbrada.

Exercícios de Preparação de um Texto


Exercícios de Agilidade Preparando para o Trinado
Chega um momento onde é preciso abordar os textos. É um problema
Neste tipo de exercício é necessário memorizar os sons a serem
delicado que exige a resolução da qualidade do timbre, da amplitude
reproduzidos; é evidente, mas para realizá-los facilmente é preciso
vocal, da homogeneidade, do alcance, da afinação, associadas às
sentir a laringe móvel (o que pode ser controlado, também, com o
mudanças de intensidade, de extensão e de duração.
dedo), ágil, livre paca executar rapidamente os grupos, as notas
breves...
Para ultrapassar estas diferentes dificuldades, vários procedimentos Capítulo 5 – Comentários sobre as causas dos erros da
podem ser propostos: técnica e sobre suas conseqüências
- Falar o texto em voz alta, para que o ouvido se habitue à
diferenciação das vogais e à clareza das consoantes, caso contrário
As causas que levam aos erros de técnica são extremamente variadas.
pode acontecer a um cantor, acostumado a uma certa cor de voz - por
Dependendo das pessoas, elas podem alterar, mais ou menos
exemplo, a voz sombria -, acreditar estar articulando corretamente e
gravemente, as características do timbre, assim como os órgãos
estar sendo compreendido, quando na realidade cada sonoridade está
vocais, e modificar o gesto respiratório.
maculada de um colorido anormal que torna o texto incompreensível.
As principais causas são:
- Cantar o mesmo texto na mesma nota, subindo em semi-tons do
sol 3 ao ré 4, para uma soprano. - A falta das noções elementares das leis que regulam a função
respiratória e vocal. Daí advêm os erros de técnica que culminam nas
anomalias importantes do gesto vocal.
- Os métodos empíricos baseados sobre uma experiência pessoal ou
na pesquisa de um timbre particular, imposto por um professor de
canto e que não corresponde à voz natural do cantor, nem a sua
conformação, nem às suas possibilidades.
- A classificação prematura, o erro de classificação ou a
- Vocalizar a melodia com uma vogal particularmente favorável a desclassificação voluntária, razões estas que maltratam a voz, que a
fim de se conscientizar das modificações do volume das cavidades de cansam excessivamente ou a deterioram.
ressonância e do deslocamento da sensação vibratória impostas pela
- O uso da voz profissional antes que a técnica esteja corretamente
frase cantada.
assimilada ou que a interpretação dos papéis não corresponda às
possibilidades do cantor.
- A prática do canto coral, amador ou profissional, o que favorece o
maltrato e o cansaço excessivo, principalmente se a pessoa está
usando sua voz numa classificação errada.
- O maltrato vocal, trata-se de uma intoxicação lenta e progressiva
que se instala insidiosamente e intervém após um excesso de trabalho.
Encontra-se isto, particularmente naqueles que procuram um hiper-
- Unir o texto e a melodia conservando na memória aquilo que foi
timbre. No início não há lesão, mas as alterações das cordas vocais
realizado e percebido anteriormente.
aparecem depressa e aumentam com o tempo. Concomitantemente, há
hipersecreção e pigarros e as cordas vocais tornam-se rosadas, depois
vermelhas e deformadas. Estas perturbações aparecem, geralmente,
nos cantores que não se preocupam com a respiração, ou quando esta
se encontra mal-adaptada. Também naqueles que recebem orientações
errôneas, nos que são mal e/ou prematuramente classificados. Enfim,
quando há uma má higiene vocal e geral.
- A fadiga vocal excessiva é a conseqüência de esforços prolongados
tais como: notas sustentadas muito tempo, abuso de notas agudas, ou
trabalhar a voz quando há rouquidão. As cordas vocais ficam
Após ter assimilado a técnica, restará ao cantor abordar as regras
vermelhas assim como os órgãos vizinhos. As modificações da forma
clássicas, o repertório contemporâneo e ter a sabedoria de recusar
das cordas vocais e de sua tensão aparecem logo depois.
tudo aquilo que estiver fora do seu alcance e de suas possibilidades
vocais. - Tanto para o maltrato como para a fadiga excessiva, a musculatura
perde sua agilidade e sua resistência. Segue-se uma diminuição do
rendimento vocal, assim como modificações das particularidades
acústicas do timbre que podem ir da voz velada à mais discreta - A falta de tonicidade da cinta abdominal que não pode, desta
chegando à rouquidão persistente e às deformações das cordas vocais, forma, desempenhar seu papel de sustentação. A voz é velada e lhe
portanto a uma incoordenação entre o trabalho dos órgãos vocais e falta intensidade. A inspiração é normal, mas o ventre é empurrado
respiratórios. para a frente durante o canto.
Estas diferentes causas terão repercussões sobre a respiração, seja por - Os movimentos inspiratórios são desproporcionais e não estão
que a maneira imposta de respirar não é fisiológica, seja por que o relacionados com a quantidade de ar inspirado. Neste caso, a
cantor tem dificuldades próprias. capacidade pode ser insuficiente ou exagerada.
Eis aqui as mais importantes causas destas dificuldades: Na maioria dos casos, as imperfeições do gesto respiratório impedem
ou limitam a subida do diafragma Decorrem disto, esforços de
- A respiração invertida. O ar é tomado na parte superior do tórax e
compensação, especialmente no pescoço, nos órgãos laríngeos e peri-
determina esforços no nível dos ombros, do pescoço e dos músculos
laríngeos. Fica difícil regular e sustentar a respiração em função das
laríngeos. Durante a fonação, o ventre se contrai, se imobiliza, é o
exigências da música, o que leva mais ou menos rapidamente aos
bloqueio diafragmático, o que torna impossível os movimentos naturais
problemas de emissão devidos a um trabalho mal distribuído, excessivo
deste músculo. A voz é áspera por falta de agilidade da musculatura
ou insuficiente, conforme cada caso. A laringe fica prejudicada nos seus
respiratória.
movimentos naturais, a faringe modifica seu volume, as cordas vocais
- Os movimentos respiratórios exagerados são acompanhados por coaptam demais ou de modo insuficiente, daí se seguem as alterações
uma capacidade respiratória muito grande; por uma dilatação do timbre, as modificações da duração, da intensidade e da altura
exagerada dos alvéolos pulmonares, podendo provocar o enfisema e tonal.
fazendo com que a voz se eleve muito. Com freqüência ao emitir notas
No que diz respeito à articulação, as dificuldades observadas,
agudas, o cantor eleva toda a parte superior da caixa torácica e inspira
geralmente decorrem de orientações errôneas, por desconhecimento
o máximo de ar (é suficiente um litro e meio para a frase mais longa).
das regras da fonética, de emissões que utilizam atitudes anormais
Ele confunde capacidade e pressão.
determinando uma rigidez muscular, ou pela falta de tonicidade.
- A rigidez muscular tem como conseqüência uma capacidade
É preciso impedir: a abertura da boca em altura na maioria das sílabas
insuficiente e impossibilita a adaptação do gesto respiratório ao da
(o que abafa a voz e deforma a articulação), a posição transversal
emissão, devido à ausência do jogo diafragmático.
exagerada dos lábios, de modo pouco estético e pouco habitual. E,
- A respiração costal-superior nos dois tempos da respiração. ainda, evitar a rigidez da mandíbula, a expressão crispada do rosto, os
Somente a parte superior da caixa torácica mexe. Este modo de movimentos inexatos da língua e o tremor a que ela é submetida nos
respirar tem como conseqüência uma hipertonia da musculatura agudos, às vezes mesmo em toda a extensão vocal. Este defeito muito
abdominal, que nos momentos de forte intensidade ou no extrema difundido, indica uma sonoridade que não encontrou seu lugar, que
agudo é obrigada a um acréscimo de trabalho. mexe com cavidades mal-adaptadas ao som da laringe e, sobretudo, a
um sopro mal direcionado ou, ainda, a um excesso de pressão. Isto
- A abertura exagerada das costelas sobre as quais o cantor toma
começa com um tremor regular associado a um vibrato exagerado que
apoio. Isto limita a possibilidade de movimento da cinta abdominal bem
pode levar à voz caprina.
como sua agilidade.
Freqüentemente ressaltamos ao longo deste trabalho, - dada sua
- Os movimentos da parede abdominal são muito exagerados e são
interação com os órgãos circunvizinhos -, a importância dos
feitos em detrimento da abertura lateral das costelas e do trabalho da
movimentos articulatórios, pois é por seu intermédio que as
musculatura dorso-lombar. Ou encontramos contração, somente ao
sonoridades vocais são criadas e que certos problemas de timbre
nível da cavidade epigástrica, por falta de tonicidade do grande reto, ou
podem ser corrigidos.
a parte superior deste músculo é empurrada para a frente no momento
da fonação. É evidente que todo cantor, que deseje ser compreendido, deveria
respeitar certos princípios. Se os oradores cometessem os mesmos
- O trabalho do grande reto é mal compreendido. Ao invés de
erros, utilizassem as mesmas deformações da articulação que
relaxar na inspiração,ao mesmo tempo que a parede do abdômen, ele
observamos em alguns cantores, eles também não seriam
se contrai e é empurrado para a frente, o que limita os movimentos
compreendidos. Algumas pessoas argumentarão que a voz cantada
abdominais.
exige movimentos e tensões mais desenvolvidas que a voz falada. Mas,
já que existem cantores dotados de uma voz poderosa cujo texto é
.
percebido inteiramente e atravessa a ribalta, por que não deveria ser No que diz respeito à emissão vocal, devemos abolir tudo aquilo que
igual para os outros? É normal escutar certos cantores e não saber em incomodará ou impedirá a acomodação das cavidades supra-laríngeas
que idioma eles cantam? ao som emitido pela laringe:
Temos que observar atentamente as posições da laringe, localizada - buscar um timbre específico, muito claro ou muito sombrio, o exagero
muito em cima ou muito embaixo em relação à altura tonal. Nestas das ressonâncias guturais, palatais, faríngeas e nasais, indica sempre,
condições é fácil imaginar o esforço pedido à toda a musculatura uma péssima distribuição das zonas de ressonância.
circunvizinha para impedir a laringe de executar os movimentos de
- o esforço para colocar a voz na frente, mesmo nos momentos de
ascenso ou descenso e o incômodo imposto à articulação.
grande potência - o que incita a empurrar - quando todos os
A posição muito baixa da laringe pode ser conseqüência de uma má- fenômenos acústicos são experimentados no interior dos órgãos.
adaptação do bocejo. Este procedimento pode ser utilizado, pois
- a voz na máscara ou sobre os lábios.
bocejar nos permite tomar consciência de que os pilares, o véu
palatino, assim como a parede faríngea estão em tensão muscular e - o abuso de certos apoios que representam esforços excessivos.
provocam o alargamento transversal das cavidades de ressonância. Ele
- cantar muito alto ou baixo demais, muito grave ou muito agudo em
não é ineficaz nem perigoso, desde que se leve em conta que bocejar
relação às possibilidades naturais. Insistir demais sobre notas agudas
exige uma enorme tensão da musculatura, a ponto de provocar,
ou em passagens extensas.
simultaneamente, um recuo da língua em direção à hipo-faringe o que
impõe o abaixamento da laringe e impede os movimentos destes dois - inclinar a cabeça para a frente, o que impede os movimentos
órgãos (figura 30). Podemos pensar no bocejo quando se trata da laríngeos e indicam a pesquisa da voz na parte anterior da cabeça.
musculatura velo-faríngea, isto pode ser útil em alguns casos, desde
- o "golpe de glote" ou tomada da nota por baixo que resulta da falta
que isto não impeça a mobilidade da língua e da laringe.
de sincronização entre a pressão sub-glótica e a postura das cavidades
faringo-laríngeas.
- treinamento vocal sempre na mesma vogal.
- abuso da voz de cabeça que, não sustentada pode levar à voz de
falsete.
- uso abusivo do portamento (vício de má formação musical. Trata-se
de passar de uma nota para outra passando por notas intermediárias
que se encontram entre a primeira nota e a segunda nota a ser
cantada) o que indica a falta de sinergia entre os órgãos vocais e
respiratórios.

Todas estas pesquisas ou abusos do gesto vocal vão determinar,


Figura 30 - O bocejo. Trabalho importante do véu-palatino, mas esforço principalmente, um comportamento de esforço que terá conseqüência
excessivo da língua e da laringe. sobre o timbre da voz.
Serão alterações tais como:
Podemos observar cantores cuja laringe está sempre posicionada muito
- a voz estridente, que é o resultado de uma voz clara demais,
em cima e desta forma há falta de flexibilidade. Nesta atitude
exageradamente brilhante e localizada na frente. O cantor força sua
excessiva, a base da língua se eleva e se contrai exageradamente
laringe que está muito no alto. Suas cordas vocais coaptam
contra o véu palatino, o que diminui o volume da cavidade faríngea.
fortemente, a língua contraída recua em direção ao véu palatino, este
Estas duas posições extremas são muito usadas como base da técnica último participando também do esforço. Os ressonadores estão
do canto. Elas são anti-fisiológicas, por que impõem ao mesmo tempo contraídos e seu volume diminuído. Pouco a pouco surgem as
uma coaptação excessiva das cordas vocais, uma modificação do dificuldades nas notas graves, mas principalmente nas agudas, assim
timbre, uma pressão expiratória intensificada demais, assim como uma como nos sons ligados e nos sons ppp.
má união faringo-laríngea.
- a voz obscurecida é uma voz que comporta muitos harmônicos Os sinais que permitirão distinguir estas anomalias variadas são os que
graves. A laringe se fecha mal, falta firmeza aos ressonadores assim o professor de canto escuta e vê (que os "closes" da televisão põem
como para os órgãos articulatórios. Desta forma, a voz não chega aos em evidência).
ressonadores e não tem alcance. 0 gasto de ar é excessivo, a
a) Os problemas de timbre são tão numerosos que é preciso tentar
articulação é indiferenciada, incompreensível, há falta de clareza na
definir as suas causas. Estão entre elas:
articulação das vogais e consoantes.
- a fonação com esforço: órgãos contraídos, rigidez generalizada,
- a voz gutural; nela a respiração é rígida e fornece um excesso de
pescoço entumecido, veias salientes e menos freqüentemente a falta
pressão. A faringe está contraída na sua totalidade. A língua apoiada
de tonicidade.
atrás atrapalha os movimentos naturais da articulação, assim como os
da laringe. - a posição anormal da boca, da língua, a articulação apertada, a
mandíbula contraída e o rosto crispado.
- A rouquidão passageira. Se após meia hora de canto, a voz falada
enrouquecer, isto indica uma classificação errônea, cansaço vocal - elevação ou abaixamento excessivo da laringe.
devido aos esforços vocais, maltrato por ter cantado enquanto jovem
- a má acomodação das cavidades supra-laríngeas ao som da laringe.
demais ou durante muito tempo seguido, uma técnica mal assimilada
ou, ainda, quando 0 cantor canta partes muito difíceis para ele. - a respiração mal-feita e mal-utilizada.
- A voz velada pode ser um problema passageiro ou permanente. É o b) Os problemas dos quais o cantor se queixa:
resultado do funcionamento defeituoso dos órgãos vocais e
- cansaço vocal, sensação de tensão interna excessiva, mal localizada
respiratórios que podem levar à uma falta de tensão das cordas vocais.
na faringe, sensação de comichão, de ardor ou de secura da garganta,
É uma voz despojada de harmônicos agudos.
a vontade de pigarrear e mucosidades.
- A voz branca, fraca, sem timbre, indicando não somente uma pressão
- dor unilateral, incômodo para deglutir e crispações de um lado.
expiratória insuficiente, mas também uma falta de tonicidade da
cavidade faringo-laríngea. A língua achatada e mole obriga a laringe à c) Finalmente, aquilo que o laringologista constata:
uma posição muito baixa.
O exame da laringe mostra problemas congestivos, após a repetição
- Falta de homogeneidade na voz. Se caracteriza por zonas destes traumatismos laríngeos que correspondem a erros de técnica
destimbradas. As vogais claras são estridentes, as abertas estão Inicialmente, as cordas vocais se apresentam túrgidas depois elas se
engrossadas e as nasais nasalizadas demais. Ainda se constata a tornam rosadas e logo a seguir vermelhas. A hiperemia passageira da
existência de passagens, de falhas na voz, das fífias (sons discordantes mucosa desaparece após algumas horas de descanso. Ela indica um
da voz ou de instrumentos musicais) e dificuldades para os sons desacordo entre o órgão vibrador - a laringe, e o órgão ressonador-as
ligados e semi-tons (sobre toda a extensão ou sobre algumas notas). cavidades supra-laríngeas. Estas incoordenações motoras, que
repercutem desfavoravelmente na emissão vocal, obrigam as cordas
- A voz caprina é sempre o resultado, mais ou menos rápido, de uma
vocais a um trabalho de suplência secundário.
emissão forçada, uma respiração mal dosada, um mal direcionamento
do sopro, ou seja uma técnica defeituosa. Ela acontece num dado Duas disodias (perturbações da voz cantada) importantes afetam os
momento quando o cantor não consegue mais manter o esforço. O cantores de modo particular. São elas: a monocordite e a hemorragia
resultado é uma espécie de tremor muscular (associado ao tremor sub-mucosa (principalmente nas cantoras no período da menstruação,
vocal) que se propaga a todos os órgãos, movimentos convulsivos da da gravidez, da menopausa e se houver um problema no tubo digestivo
mandíbula, da língua, do queixo, da úvula, perceptíveis à visão e à ou uma doença endócrina, pulmonar ou renal). A primeira geralmente
audição. Há uma variação de altura e intensidade. aparece após os esforços vocais prolongados: cantar numa tessitura
aguda demais, ou com uma intensidade exagerada, ou trabalhar muito
- A diminuição da intensidade, as dificuldades com os semi-tons, com
tempo as notas do extremo agudo, em suma, trabalhar em excesso.
os sons ligados, a duração insuficiente do sopro, a falta de
homogeneidade, a evidência das passagens, dos registros. A hemorragia sub-mucosa aparece bruscamente, com tendência a
reaparecer depois de um esforço violento: notas agudas forçadas,
As dificuldades surgem pouco a pouco, imperceptivelmente e após um
sustentadas durante muito tempo etc. Uma das cordas torna-se
período que parece normal, seguido de uma fase de dificuldades
vermelha e a voz desaparece subitamente. Após um repouso forçado,
crescentes, quando aparecem as alterações ou as lesões das cordas
estas disodias regridem, mas voltam se as causas não são suprimidas.
vocais.
- Um problema freqüente nos cantores é o nódulo ou nódulos de uma Generalidades
ou das duas cordas vocais. Incontestavelmente este é o sinal de uma
técnica errônea e de esforços contínuos.
Dadas as conseqüências que podem intervir sobre as cordas vocais,
- Como conseqüência das deformações, elas apresentam duas fendas
portanto sobre o rendimento vocal, é normal que os cantores sejam
glóticas. Disto decorre um escape de ar que o cantor trata de
informados que, como os oradores, eles estão à mercê das
compensar juntando-as fortemente, senão a voz fica velada.
perturbações funcionais ou orgânicas. Particularmente os esforços
Ainda como conseqüência dos esforços vocais ou do cansaço excessivo, impostos aos órgãos da respiração ou da fonação podem, com o passar
podem ocorrer deformações das cordas vocais que influirão no do tempo, ou bruscamente, ocasionar problemas orgânicos. Do mesmo
fechamento glótico. Uma das cordas ou as duas estão hipotônicas, ou modo as lesões ou inflamações podem degenerar em problemas
não coaptam na parte posterior. Elas estão flácidas e flutuantes. O funcionais, que repercutem um sobre o outro e se mantém
movimento vibratório fica alterado e sua amplitude diminuída. A voz é mutuamente. Trata-se finalmente de um círculo vicioso do qual só se
velada (figura 31). pode sair tratando-se a lesão ou as inflamações bem como cuidando de
restabelecer uma emissão fisiológica adequada, eliminando
rapidamente os problemas causados.
É preciso assinalar, também, que todo trabalho excessivo, toda
emissão ou respiração mal realizada, implica não somente na
diminuição das possibilidades vocais, mas também provoca a
hipersecreção, isto é, muco, que neste caso não desaparece apenas
com tratamento local, mas sim pela aquisição de uma técnica
adequada.
Os cantores devem suspeitar de todas as infecções dos órgãos supra-
laríngeos (rinite, sinusite, faringite etc.) mesmo temporárias, que criam
mucosidades que irão descer para a laringe e infectá-la, assim como as
obstruções ou desvios importantes das fossas nasais. Portanto tudo
aquilo que possa atrapalhar a respiração e a distribuição das zonas de
ressonância. Todas as condições que modificam as características
acústicas do som, determinam as dificuldades vocais e incitam ao
esforço.
Esses fenômenos congestivos da faringe e da laringe devem ser
tratados, porque eles podem tornar-se crônicos, provocar tosse e
Figura 31 – Deformações e alterações das cordas vocais. 1. Nódulos Kissing; 2. pigarros traumatizando, desta forma, as cordas vocais. Esses
Pólipo; 3. Monocordite; 4. Paresia de adução; 5. Talho na corda vocal; 6. Glote estados.congestivos podem provir dos brônquios ou dos pulmões e
ovalar. provocar mucosidades. Estas podem, também, provir do tubo
digestivo. Realmente, todas as alterações deste órgão ou dos intestinos
(úlceras, colite, etc.) podem levar a dificuldades vocais por via reflexa.
Reações vaso-motoras no nível das vias respiratórias aero-digestivas
podem aparecer, assim como mucosidades criam um terreno favorável
às lesões inflamatórias. Além disso existirá também uma perturbação
respiratória Dada a hipersensibilidade da musculatura abdominal, esta
fica impedida de desempenhar seu papel de sustentação o que reduz
os movimentos do diafragma. Progressivamente, a voz toma-se
hipotônica e perde seu timbre, sua potência e seu alcance.
Enfim é importante mencionar o que parece incompatível com a
carreira lírica:
- As desarmonias importantes que não podem ser compensadas pela Portanto, em graus muito variáveis, todos esses distúrbios podem
técnica e que obrigam a compensações desproporcionais e raras (no repercutir desfavoravelmente sobre a voz, comprometer o rendimento
caso de uma fissura sub-mucosa, por exemplo), as quais vão repercutir vocal, podendo levar a angústias graves do tipo obsessivo: medo do
sobre a qualidade e a facilidade da voz, sobre sua extensão e desta agudo, perda da memória etc.
forma comprometer a carreira do cantor.
Nestas condições, fica muito difícil para o cantor, dominar o "track"
- Todas as doenças pulmonares e cardíacas susceptíveis de criar (todos os cantores conhecem este medo) aquele que provoca os
dificuldades respiratórias, uma falta de desenvolvimento torácico, uma distúrbios fisiológicos: salivação excessiva ou secura da garganta,
hipotonia, a fonastenia, um nervosismo excessivo, um desequilíbrio transpiração, distúrbios da bexiga ou do intestino, batimentos
psicológico, a saúde ou órgãos vocais frágeis, distúrbios digestivos, cardíacos etc. ou aquele que intervém em certos momentos ou frente à
relaxamento excessivo da musculatura abdominal, obesidade, uma certas dificuldades.
eventração (hérnia), asma ou enfisema.
De todo modo, para sobrepujá-los, o melhor meio é ser capaz de
- As cantoras devem suspeitar dos problemas circulatórios que podem dominar sua técnica, mesmo nos momentos difíceis. A respiração pode
determinar perturbações vocais importantes. Se a conexão vaso- ser uma ajuda preciosa. Antes de entrar em cena, basta fazer algumas
motora entre o órgão vocal e o órgão sexual está alterada o incômodo respirações calmas e profundas, assim como nas pausas musicais
vocal se acentuará na época da menstruação (nos dias que a precedem suficientemente longas, para restabelecer o ritmo cardíaco e desviar a
ou nos seus primeiros dias), principalmente se já existia antes. Além atenção dos outros problemas.
disso haverá ainda a presença de mucosidades.
Disto tudo, devemos saber que para seguir uma carreira lírica é preciso
- As doenças dos órgãos sexuais, assim como o período menstrual estar em bom estado geral e psicológico, além dos dons necessários
alteram a voz, dá-se uma hipotonia. Durante a gravidez e na época da que são inatos. E dada a sensibilidade e a fragilidade dos órgãos vocais
menopausa, pode haver uma mudança de tom para mais grave e uma e respiratórios é preciso abster-se de um certo modo de vida: evitar as
falta de potência. Mas isto vai depender muito do estado geral de mudanças bruscas de temperatura, o ar condicionado, a umidade e
saúde. Certamente as exceções são numerosas. Há mulheres que não especialmente não fumar, nem beber álcool, não cantar durante a
apresentam estas influências na voz durante estes períodos, isto por digestão e sempre que possível ter um sono calmo e reparador.
que são equilibradas e têm os órgãos vocais em perfeito estado, Praticar, paralelamente o treinamento vocal e respiratório e se possível
utilizando~s normalmente. É preciso considerar que a idade real nem acrescentar exercícios de ginástica corporal.
sempre corresponde à idade fisiológica. No entanto, é evidente que
Evitar tudo aquilo que possa irritar as cordas vocais: tosse excessiva,
para algumas mulheres as perturbações circulatórias ou problemas nos
pigarreio freqüente etc. É preciso, também, evitar o uso abusivo de
órgãos genitais criam dificuldades passageiras: voz velada, baixa de
medicamentos: gotas, gargarejos que no decorrer do tempo podem
tonalidade, a ponto de não conseguirem arcar com seus compromissos.
provocar irritação. Desconfiar das cirurgias inoportunas das cavidades
- Os tratamentos hormonais (nas mulheres) tornam a voz instável e nasais, a menos que a obstrução ou os desvios sejam importantes. No
provocam uma baixa de tonalidade. As cordas vocais ficam rosadas e caso de infecção ou hipertrofia das amígdalas, às vezes é necessário
logo depois vermelhas e podem apresentar edema, espessamento e suprimí-las. Trata-se, não somente, de um distúrbio importante no que
coaptam mal. diz respeito à distribuição das ressonâncias, mas também a causa de
esforços inúteis. No caso da remoção das amígdalas, pode acontecer do
- As pessoas com hipertireoidismo apresentam períodos passageiros de
cantor ser obrigado a reajustar sua técnica devido ao aumento do
rouquidão, mas sempre recidivos. 0 timbre é ensurdecido, o agudo
volume da hipo-faringe.
torna se difícil e muitas vezes o canto torna-se impossível. Nos casos
de hipotireoidismo, a voz é fraca, sem modulação e pouco timbrada. Enfim, não acreditar que os medicamentos, as pastilhas, o mel!... e
Acontece a mesma coisa com os que têm uma hipo-função das outros produtos sejam remédios eficazes. São paliativos que não
glândulas supra-renais, que devido à uma astenia têm pouca solucionam os problemas e que mantêm a hiper sensibilidade do
intensidade vocal e se cansam muito depressa Ao contrário, os que têm cantor.
uma hiper-função das supra-renais possuem uma musculatura potente,
0 melhor meio de evitar as dificuldades funcionais e sua repercussão é
uma voz de grande alcance e bem timbrada.
possuir uma boa higiene vocal, isto é, uma técnica impecável, mantida
- Dada a importância do controle auditivo, toda disacusia regularmente, tanto da voz cantada como da voz falada. Os cantores
comprometerá gravemente a emissão vocal. devem considerar tanto uma como outra e cuidá-las.
Classificar a voz falada é tão desastroso como classificar a voz cantada. Conclusão
As conseqüências são as mesmas, elas são numerosas e às vezes
graves. Falar numa tessitura que não corresponda à sua classificação
normal, obriga as cordas vocais a um modo de vibração para o qual Tendo em vista as numerosas e variadas concepções no que diz
elas não são feitas, a uma acomodação anormal das cavidades de respeito à técnica da voz cantada, podemos nos perguntar como
ressonância, a um deslocamento do tremor vibratório privando a voz reagirão os cantores ao lerem este livro. Alguns dirão que cantar não é
falada da sua riqueza harmônica, ou seja das suas qualidades estéticas tão difícil como dizem. Há cantores para os quais algumas indicações
e expressivas. sobre o sopro, a zona de ressonância, foram suficientes para que eles
chegassem a resultados satisfatórios. Outros fizeram longas carreiras
Há cantores que pensam resolver o problema do agudo, cantando em
com uma técnica mais ou menos certa e sem grandes problemas... o
mezzo (o uso da voz grave é sempre feito em detrimento do agudo)
que é verdade. A primeira resposta para isto é que todo cantor
sendo soprano, ou ainda os que cantam em soprano e falam em
iniciante sempre faz progressos, independentemente da técnica
contralto! Não há nada mais chocante para o ouvido do que escutar um
utilizada, e que em seguida é possível produzir sonoridades de certa
cantor usar sua voz cantada normalmente e falar com uma voz
qualidade, com um mecanismo substituto.
diferente (termos a impressão de não estar escutando a mesma
pessoa). Só podemos admitir uma razão para a baixa tonalidade da voz Podemos responder, também, que nem todo mundo reage do mesmo
falada ou cantada, é a idade, e isto varia de indivíduo para indivíduo. 0 modo, e isto nos mais diferentes assuntos. No que diz respeito à voz
agudo pode diminuir, a extensão pode perder algumas notas, mas isto cantada, é muito freqüente observar jovens cantores que rapidamente
não se deve a uma mudança de categoria vocal e sim à idade, quando apresentam uma voz caprina, ou que chegam a ter nódulos. Também
o potencial muscular pode diminuir ou o estado geral mais ou menos encontramos artistas, em final de carreira, que tiveram dificuldades
deficiente não permite mais a tonicidade muscular necessária ao vocais importantes sem alterações laríngeas. Isto é mais raro.
extremo agudo. Porém, isto não implica de modo algum na mudança Portanto, é preciso considerar aqueles que possuem uma poderosa
de tessitura da voz falada ou cantada. musculatura, uma laringe sólida, belas cordas vocais, um bom
equilíbrio psicológico e que mesmo maltratando sua laringe quase não
São numerosos os cantores que, após uma desclassificação voluntária,
terão problemas.
tiveram que interromper uma carreira que teriam podido prosseguir
por mais tempo, se, tivessem usado a mesma tonalidade para a voz Porém, não se trata destas pessoas. Trata-se de todos aqueles que
falada e cantada. possuem uma bela voz, que são dotados em todos os aspectos, que
têm um belo futuro pela frente, porém uma laringe mais frágil que não
deve ser maltratada, nem sobrecarregada a fim de evitar as
complicações orgânicas, mais ou menos graves, que podem acontecer
algumas vezes rapidamente.
Esses cantores, sem o suporte de uma técnica apropriada, utilizarão -
inconscientemente mecanismos de compensação no caso de uma
fraqueza passageira. No início quase não haverá esforço, mas logo
depois estes serão renovados e progressivamente determinarão
modificações da técnica, portanto do timbre, ao qual o ouvido se
acostumará pouco a pouco.
As dificuldades aumentarão e os cantores se preocuparão cada vez
mais com sua voz. Este estado de insegurança e de inquietação é
particularmente traumatizante e do ponto de vista nervoso,
extremamente esgotante.
Ao invés disto, se o cantor sente e sabe o que faz, e porque o faz, ele
terá à sua disposição - nos momentos difíceis - a possibilidade de usar
os princípios básicos da sua formação, e poderá constantemente
readaptar sua técnica.
Isto é muito importante, pois não podemos esquecer que a voz Todavia, mesmo com estes cantores particularmente dotados, nada
maltratada torna-se frágil, principalmente por que ela depende do pode ser duradouro e válido se não levarmos em conta os princípios
estado geral, psicológico e nervoso. básicos da técnica vocal.
Fala se muito, na França, da crise do canto. Ela é evidente. No entanto É evidente que isto não é suficiente para se fazer de cada cantor um
há tantas vozes belas no nosso país como em outros lugares. artista excepcional. Ele pode adquirir o estilo, a declamação, a
inteligência do texto, a interpretação mas nada poderá lhe dar aquilo
Não seria melhor falar da crise no ensino do canto, por falta de
que ele deve possuir em si mesmo: um belo órgão vocal, e
professores qualificados? Esta é a principal razão do escasso número
principalmente aquele dom raro e insubstituível "o instinto do canto".
de cantores franceses nos nossos teatros e nos grandes palcos
Se a natureza foi generosa: a musicalidade e a sensibilidade lhe
estrangeiros.
permitirão comunicar, aos outros, aquilo que o texto e a música
Tornam-se professores de canto - muitas vezes oficialmente - cantores evocam para ele.
que fizeram belas carreiras, interrompidas muito cedo devido à
Nós esperamos que o conteúdo deste livro tenha permitido aprofundar
problemas não resolvidos. Tornam-se, também, professores os
o conhecimento da técnica vocal, além de obter um acordo sobre as
acompanhadores que, em contato com numerosos cantores,
regras fundamentais e sua aplicação. Elas deveriam servir de base para
adquiriram um vocabulário e uma aparência de técnica resumindo
a formação dos professores de canto, a fim de que eles possam educar
aquilo que acreditaram compreender!
e desenvolver a voz dos jovens cantores que lhes serão confiados.
Finalmente, são numerosos os que jamais fizeram carreira, ou se Desta forma, estes serão capazes de responder às exigências e à
dedicaram muito pouco a ela, e de repente tornam-se professores, sem diversidade de obras que eles irão executar, graças à sua técnica.
dificuldades, pois esta profissão não está regulamentada na França.
No entanto, trata-se de um ensino delicado e difícil, que exige muitas
qualidades: uma cultura musical extensa, um ouvido apurado, seletivo,
capaz de discernir a menor alteração do timbre, e também o gosto pela
pedagogia.
Como cada aluno é um caso particular, nada deve ser sistemático. É
preciso adaptar-se constantemente, modificar os procedimentos, as
descrições imaginárias que podem provocar reações diversas conforme
as pessoas.
Quando se trata de técnica vocal, nada é fácil de explicar. Alguns
mecanismos - os mais importantes são inconscientes, involuntários.
Eles não são palpáveis nem visíveis. Eles derivam de movimentos
voluntários. É esta dificuldade de fazer compreender e realizar a voz
cantada, que faz com que cada professor tenha um vocabulário
pessoal, e não é fácil criar um que possa ser o mesmo para todos,
como acontece com os outros instrumentistas.
É por isto que o exemplo é importante. Porém, a imitação só é
tecnicamente benéfica, se o cantor puder, ao mesmo tempo, reportar
se a um mecanismo e às sensações que ele possa reproduzir
conscientemente. Os exemplos são úteis, também, por que permitem
ao aluno desenvolver seu senso crítico, a sensibilidade é a seletividade
de sua audição bem como o gosto pelo belo canto. Os jovens cantores
deveriam.receber um ensinamento baseado no conjunto de regras que
regem a produção da emissão e não em noções empíricas como
geralmente acontece. 0 objetivo essencial é o de desenvolver a voz
natural do aluno. Alguns conseguem de improviso. Outros só adquirem
através de uma boa técnica e após um longo trabalho.
A Técnica da Voz Cantada, de Claire Dinville, vem preencher uma
lacuna no mercado editorial brasileiro, além de nos ensinar, por
exemplo, que a insegurança e inquietação do cantor com sua voz
são traumatizadas e, do ponto de vista nervoso, extremamente
esgotantes. Mas, se o cantor sente e sabe o que faz, ele terá à sua
disposição – nos momentos difíceis – a possibilidade de usar os
princípios básicos da sua formação, podendo constantemente
readaptar sua técnica.

O objetivo essencial dos ensinamentos de Dinville é o de


desenvolver a voz do aluno. Alguns, naturalmente dotados,
conseguem de improviso. Outros só adquirem através da técnica e
de muito trabalho. Mas é possível, para ambos os tipos, aprender a
exercitar a arte do canto lírico.

Claire Dinville carrega o trunfo de ser, além de uma conceituada


fonoaudióloga, musicista, cantora e professora de canto, e nos
brinda com um livro excepcional, escrito para aqueles que queiram
seguir a carreira do canto lírico e aos fonoaudiólogos em especial,
mas com uma linguagem suficientemente simples e acessível para
os leigos em geral.

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