Você está na página 1de 8

Técnicas de regência – Emanuel Martinez

12. ANACRUSE, ATAQUE E CORTE


Os movimentos de Anacruse (preparação) e Ataque (início) são sem dúvida os gestos
mais importantes na direção musical. É através dele que conduzimos o grupo musical
ao início da obra, ou a uma nova retomada.
Este sinal deve conter todas as informações pertinentes para que o início seja feito
corretamente. É através deste gesto que levamos todo um grupo musical (coro,
orquestra ou banda) a iniciar junto.
Não é apenas um gesto de início, é um dos gestos mais importantes e completos que
carregam toda informação necessária para o correto início ou retomada musical.
Quando me refiro a uma retomada, eu estou falando de paradas, por exemplo,
ocasionadas por uma Fermata com corte, ou outras suspensões do tempo ou da
música, aniquilando uma seqüência ou uma passagem, assim, quando este
procedimento (interrupção) acontece, reinicia-se todo o procedimento de preparação
e reinício da atividade musical.
Neste movimento inicial deve constar pelo menos: o andamento, a dinâmica, tipo de
articulação, que instrumentos devem tocar, o caráter musical, além de outras
informações que estarão atreladas ao trecho musical em questão. Este gesto inicial
define o início da apresentação musical a partir deste momento.
Todo o início ou retomada é sempre antecedido por um movimento preparatório.
Como o maestro dirige por antecedência, este gesto deve conter todas essas
informações necessárias, ou seja, sempre que houver uma estagnação, uma parada do
gestual, obrigatoriamente se faz necessário reiniciar todo o processo de forma clara e
objetiva.
Mas o que é Anacruse? É a nota ou o conjunto de notas que antecedem um
determinado tempo ou compasso. Podem ser indicadas a partir do tempo ou parte de
um tempo. Dentro da regência há dois processos anacrústicos: um proveniente do
movimento preparatório que antecede o início da música e/ou a Anacruse musical
propriamente dita. A Anacruse musical provoca a sensação de condução sonora de um
tempo fraco ou parte fraca de um tempo sobre um tempo forte, que pode ser o início
de um compasso.
Um lembrete importante: em condições normais (pela visão da teoria musical
convencional), o tempo mais forte de um compasso é o primeiro, sendo que os demais
tempos perdem força dentro do compasso.
Veja os exemplos:
Exemplo 1

Anacruse a partir da subdivisão (parte de tempo fraco) de um tempo fraco


Técnicas de regência – Emanuel Martinez

Exemplo 2

Anacruse a partir de um tempo (integral) fraco de um compasso

Exemplo 3

Anacruse a partir da subdivisão do terceiro tempo (tempo fraco).

Usando o Exemplo 3 como modelo para explicar o gestual de duas maneiras bem
distintas:
1. Quando o tempo musical for rápido: o processo do gesto é normal, com a
regência dos tempos inteiros. Neste caso como a Anacruse está localizada
sobre parte do terceiro tempo, o gestual sai do segundo tempo em direção ao
terceiro tempo (início do tempo está ausente da escrita) como se fosse um
ictus (primeiro tempo com gesto descendente), com o objetivo de destacar o
início do terceiro tempo – neste caso a subdivisão acontece naturalmente sem
precisar indicá-la – seguindo o quarto tempo e assim sucessivamente. Já o
processo de chamar a atenção começa um pouco antes, com a elevação dos
braços sobre o espaço dedicado ao primeiro tempo. Em resumo: todo o
processo de início envolve duas ações: o de chamar a atenção e o movimento
preparatório culminando no Anacruse musical;
2. Quando o tempo musical for lento, a regência poderá ser subdividida para
favorecer a exatidão musical, indicando-se todas as colcheias. O processo do
gestual segue de forma análoga ao modelo acima, só que ao invés de dirigir a
integra do tempo o regente irá indicar a subdivisão do tempo (a colcheia). O
processo de chamar a atenção acontece sobre o segundo tempo e a anacruse
utiliza-se do movimento do segundo tempo para o início do terceiro tempo,
(ausente da escrita musical), com o movimento do gestual partindo da
esquerda para a direita onde estará sendo indicado o início do terceiro tempo
(ausente da escrita musical) culminando com a subdivisão do terceiro tempo
onde se encontra a primeira nora escrita, seguindo para o quarto tempo e sua
consequente subdivisão escrita.
Outra forma de indicar esta subdivisão é através de gestos opostos: indica-se o
terceiro tempo à direita com movimento para a esquerda para indicar a subdivisão do
terceiro tempo, seguindo-se para a direita novamente para indicar o quarto tempo,
seguindo-se para a esquerda em ascensão para culminar na saída para o primeiro
Técnicas de regência – Emanuel Martinez

tempo que acontece na linha imaginária horizontal, tendo claro o foco do ictus do
primeiro tempo, a indicação mais importante.
Exemplo 4

Este exemplo de Anacruse a partir do terceiro e quarto tempo (tempos fracos) do


compasso. O gestual parte do segundo tempo, da esquerda para a direita, deixando
claro o ictus que indica o terceiro tempo.

Exemplo rítmico do Anacruse a partir do primeiro tempo. O Anacruse aqui é precedido


pela regência do primeiro tempo, com a indicação do gesto partindo da direita para
esquerda, indicado claramente o ictus do segundo tempo onde se inicia a partitura.

Antes de o maestro levantar o braço para a primeira admoestação, deverá ter certeza
das informações que deverá transmitir através do gestual. Alguns maestros afoitos ou
inexperientes, ao se virarem para o grupo musical já levantam as mãos e depois de
começar, querem modificar alguma coisa que não deu certo, o que dificilmente
conseguirão, portanto, quando o maestro se posiciona, antes de iniciar deve ter o
tempo necessário para observar todos os músicos se estão prontos e de refletir sobre
o que vai dirigir.
O processo inicial deve passar pelos seguintes pontos:
1. A preparação do maestro e do grupo. O maestro deve certificar-se
todos os músicos estão prontos e atentos;
2. A indicação clara por parte do maestro, do levare, que é a respiração
de todos;
3. Culminando com o início da obra, ou reinício de uma passagem, com
a consequente produção sonora.
Todo o início de gesto deve ser preparado. Eu sugiro a meus alunos que o
posicionamento das mãos deve ficar em dois tempos antes da nota escrita, ou seja, a
primeira posição é de atenção, a segunda posição é o movimento de respiração que
antecede o som. Em outras palavras, o ato de reger inicia-se com o sinal de atenção,
seguido da respiração que culmina com a realização do som.
Técnicas de regência – Emanuel Martinez

Ficaria assim representado:


Tempo forte do compasso

Primeiro tempo: Segundo tempo:


Atenção. Respiração.

No primeiro tempo do compasso o maestro chama a atenção de seus músicos para o


início da obra, com o levantar dos braços; no segundo tempo do compasso o maestro
mostra a respiração que prepara o inicio da música sobre o terceiro tempo. Como o
maestro está iniciando a música, a posição de atenção não deve ficar na posição de
primeiro tempo – em baixo – e sim na posição de atenção. Esta altura das mãos vai
depender da disposição do grupo, se está sentado ou em pé, conforme explicação
contida no item:
Orientações gerais para o estudo
O processo inicial do gesto desencadeia o seguinte processo:
1. A PREPARAÇÃO com o levantar dos braços pedindo atenção – esteja seguro
que os músicos estão atentos ao seu gestual, porque este é o processo que
antecede o início do gestual que desencadeia todo o processo sonoro. Vale
ressaltar que quando o maestro faz o sinal de atenção o processo musical da
obra inicia-se na memória do maestro antes de iniciar nos músicos e no
público;
2. À RESPIRAÇÃO ou o LEVARE é o gesto que antecede o início da obra, gesto que
antecede início do processo sonoro na memória do músico; este gesto sempre
deve ser apresentado em movimento contrário à entrada, facilitando dessa
forma a compreensão dos músicos. Por exemplo, se a entrada acontece no
quarto tempo, o gestual que precede a entrada deverá ser marcado da direita
para a esquerda, com a indicação clara no ictus do quarto tempo. Este gesto
deve ser muito claro (vide a informação anterior sobre as características deste
gesto) e nele devem constar todas as informações necessárias para a execução
da obra. Na minha avaliação é o gesto mais importante da regência.
3. Com o INÍCIO da obra no ATAQUE abre-se o início do processo sonoro para o
público. A sonoridade produzida pelo grupo musical vai depender
exclusivamente do movimento anterior – o Levare.
Este processo mostra como funciona a leitura da obra para o maestro, em resumo, ele
precisa ler a obra, ele precisa visualizar a obra em sua mente com uma certa
antecedência para passar as informações para o músico que repassa esta informação
para o público. Observando isso, eu insisto na real importância da direção antecipada
por parte do maestro. Eu digo ainda mais, que através destes procedimentos
conhecemos a fibra e a técnica do maestro.
Técnicas de regência – Emanuel Martinez

A técnica da antecipação é apreendida, deve ser praticada pelo maestro. Um músico


só pode realizar a música à sua frente, depois de visualizar as informações do maestro.
Alguns regentes chegam a dirigir um tempo antecipado, especialmente em
movimentos lentos. Quanto mais lento for o tempo, maior será o tempo para a
resposta sonora ao gesto, e, por conseguinte, quanto mais rápido for o tempo, menor
será a diferença entre o gesto e a resposta sonora.
CORTE
Durante a execução de uma obra musical temos a necessidade de realizar diversas
interrupções do som da orquestra, da banda ou do coral proveniente de uma Fermata,
de uma respiração após uma nota longa, de uma pausa, ou até pelo final de um
movimento ou de uma obra.
Há várias formas de realizar essas interrupções, seja de uma forma brusca ou de uma
forma progressiva. Para cada situação há uma maneira de realizar essa interrupção
sonora. A forma do corte está associada ao caráter do que antecede ao corte. Se a
passagem é enérgica, vigorosa, o gestual do corte deverá demonstrar essa energia,
esse vigor, o contrário deverá acontecer em uma passagem suave, com menos vigor
mantendo a proporcionalidade da energia e do vigor da passagem.
O corte poderá ser total ou parcial:
 Total - quando interrompemos o som de todo o grupo musical num só sinal;
 Parcial - quando interrompemos em parte a sonoridade do grupo.
Abaixo temos um exemplo tirado do final do Alleluia de Randall Thompson, obra para
coro “a cappella” onde aparecem os dois tipos de corte - Total e Parcial.
O primeiro corte parcial aparece no naipe dos Contraltos no terceiro compasso deste
exemplo (compasso 76). A interrupção acontece exclusivamente nos Contralto,
enquanto que as demais vozes permanecem cantando; o segundo corte parcial
acontece no quarto compasso (compasso 77) no naipe dos Sopranos, Tenores e Baixos
enquanto que o contralto permanece cantando o LA2 que se prolonga até o final da
obra, quando teremos o corte total para todas as vozes.
Técnicas de regência – Emanuel Martinez

Cabe ao maestro deixar claro o fim do gesto e deixar claro que todos os músicos, sem
exceção, deverão seguir este gesto e interromper o som ao mesmo tempo, sem deixar
“um rabo” para traz, como se diz na gíria. Na maior parte das vezes os ditos “rabos”
são ouvidos em movimentos lentos ou em dinâmicas suaves. Cabe ao maestro
observar e exigir que todos façam corretamente o corte do som, se precisar, deve ser
ensaiado para se ter firmeza na execução. Vale se observar, que há obras musicais
onde pode acontecer de a maioria dos músicos cortarem, enquanto que outros devem
permanecer soando para um corte posterior. Isso precisa ficar claro para a orquestra
ou conjunto musical, já que no caso dos grupos instrumentais cada músico possui
apenas a sua parte, assim não sabe o que ocorre com os demais instrumentos. Lógico
que após a primeira passagem toda a orquestra saberá o que está acontecendo. Nas
partes vocais, em geral, cada cantor possui a grade vocal das demais vozes, o que
facilita esta leitura de primeira vista.
Gestos imprecisos com certeza trarão finalizações imprecisas, respostas duvidosas, por
isso cabe ao condutor propor, mostrar, induzir a todos os músicos a uma resposta
coordenada, homogenia e precisa. Isso é fruto de muito trabalho que demonstra a
qualidade de seu diretor.
Assim podemos classificar basicamente em quatro tipos de corte:
1. Corte final imediato: especialmente ao final de uma obra, ou depois de
fermatas pode haver a necessidade de um gesto que defina a suspensão de um
som. Este sinal precisa ser bem definido para não confundir os músicos para
um sinal de impulso. Quando o sinal de corte é realizado sem fermatas, o gesto
do corte é uma conseqüência natural da seqüência de gestos anteriores, e
pretende-se que este gesto seja horizontal na sua maioria das vezes, de dentro
para fora partindo do ictus para a direita, quando realizado com a mão direita,
e para a esquerda quando realizado com a mão esquerda em um movimento
circular (veja sugestão abaixo), no entanto dependendo do contexto musical
outras formas de corte são passíveis de ser utilizadas, como um gesto para
cima, ou para baixo, além dos já mencionados acima, o importante é que as
mãos parem firmemente sem se movimentar. A interrupção do gesto define o
ponto exato do fim do som.

2. Corte seguido por um impulso: este tipo de corte é utilizado dentro do


contexto musical, não ao final da obra, por exemplo. Em alguns casos, utiliza-se
este tipo de corte logo após uma Fermata, por exemplo, ou na mudança de
andamento, ou em uma cesura provocada pela presença de dois traços
paralelos ( // ). Emprega-se este tipo de corte quando há uma continuidade de
alguma forma, quando não se interrompe definitivamente. O gesto indica o
Técnicas de regência – Emanuel Martinez

corte e já realiza o gesto preparatório para uma continuação, tudo no mesmo


gesto. Em todo o caso, neste gesto, ele deve ser realizado de forma clara para
que também de forma clara se sinta o sinal de preparação para um novo
reinicio.
3. Corte progressivo abstrato: O corte progressivo é proveniente de uma nota
longa ao final de uma obra ou provocado por uma Fermata, por exemplo, e que
este som seja em diminuendo. Como demonstrar isso: cabe ao condutor
realizar o gesto apropriado de forma progressiva de um diminuendo. Este sinal
de diminuendo pode ser feito com um gesto vertical de cima para baixo com
um movimento descendente da mão junto ao corpo indo até o ponto em que a
mão fica relaxada e paralela ao corpo, uma outra indicação parte de um gesto
horizontal que vem de fora para dentro com a indicação de parada ao centro
do corpo. Como estes gestos não possuem um movimento exato de corte, não
há um sinal claro circular de corte, por exemplo, eu o chamo de corte
progressivo abstrato. O corte advém da parada do gesto em algum ponto do
espaço.
4. Corte curto no ictus: Este corte acontece sobre uma nota/figura curta, indicada
com um pizzicato ou com um staccato, ou qualquer outro sinal com resposta
curta similar. Na regência, este corte é indicado quando se dirige o ictus com
seu corte imediato, ou seja, o maestro mostra a intenção e interrompe o gesto
num único sinal. Em geral este tipo de corte, independente do tempo em que
ele se encontre, é feito com o movimento do pulso de cima para baixo - sinal
percutido - indicando o efeito escrito (pizz ou stacc) e o corte num mesmo
sinal.
Técnicas de regência – Emanuel Martinez

Você também pode gostar