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com/lacanempdf

Marie-Hélene Brousse

"O inconsciente é a política"


Seminário Internacional

Organização
Carmen Sílvia Cervelatti

Escola Brasileira de Psicanálise - São Paulo


1 • edição - Maio de 2003
São Paulo - SP
Tnnscriç&s
Eliana Machado Figueiredo (português)
Maria Noemi de Araújo (francês)

Revisão tknica
Carmen Sílvia Cervelatti
Sandra Arruda Grostein

Rmslo de portugub
Celso William Cavicchia

Notu bt'"bliogr6ficas
Carmen Sílvia Cervelatti
Eliana Machado Figueiredo

Tradução simuldnca das Conferencias


Clary Khalifeh

Projeto grüiço e editoração clctrõnica


Duo Creative Designers

Agradecimentos especiais
Maria Bonomi
Marizilda Paulino
Silvana Cardoso de Almeida

Seminário Internacional promovido pela


Escola Brasileira de Psicanálise - São Paulo,
Novembro de 2002
Texto não revisto pela autora

Dados Internacionais de Catalogação na Public:açlo (CIP)


(Cimara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Brousse, Marie-Hél!ne.
�o inconsciente é a política" I Marie-Hélêne Brousse. -
São Paulo: Escola Brasileira de Psicanálise, 2003.

ISBN 85-89632-01-6

Bibliografia

1. Psicanálise e inconsciente 2. Barros, Romildo do Rego


3. Grostein, Sandra Arruda 4. Nicéas. Carlos Augusto li. Título

CDD-150.195

índice para catilogo sistem!tico:


1. Psicanálise: inconsciente 150.195
• Sumário

O inconsciente é a política
Marie-Hélene Brousse

Apresentação
Sandra Arruda Grostein 07

Prefãcio
Angelina Harari 09

Conferências
O analista e o político:
"Alcançar em seu horizonte a
subjetividade de sua época" 13

• A psicanálise no tempo dos "mercados


comuns e dos processos de segregação" 33

O futuro da psicanálise depende da


..insistência do real" 59
Apresentação

- -� -- - Sandra Arruda Grostein

Este lhTo é uma tentativa de recuperar e preservar na escrita um


bom encontro de psicanalistas preocupados com o futuro da
psicanálise e de sua inserção na cultura.
Pois, "se o sucesso da psicanálise é seu fracasso", que futuro
podemos esperar para ela?
O eixo do livro se sustenta nas três conferências proferidas por
Marie-Hélene Brousse em São Paulo - a primeira O analista e o
político: "Alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua época", a
segunda A psicanálise no tempo dos "mercados comuns e dos
processos de segregação" e, finalmente O futuro da psicanálise
depende "da insistência do real".
Além delas contamos com as intervenções dos três debatedores,
Romildo do Rêgo Barros, Sandra Grostein e Carlos Augusto Nicéas, e
com as contribuições dos coordenadores Rômulo Ferreira da Silva e
Carmen Sih·ia Cervelatti. Há também a introdução de Cássia Maria
Rumenos Guardado, o encerramento que coube a Maria do Carmo
Dias Batista e as perguntas do público.
Marie-Hélene Brousse é psicanalista, membro da Escola da
Causa Freudiana de Paris e os outros ou são membros da Seção São
Paulo ou da Escola Brasileira de Psicanálise. As duas Escolas fazem
parte da Associação Mundial de Psicanálise.
O leitor \'ai encontrar, nas páginas seguintes, um debate muito

7
interessante, tendo a psicanálise de orientação lacaniana como bússola
para abrir os caminhos ainda não explorados das aproximações e dos
distanciamentos na relação da psicanálise com as psicoterapias.
As propostas apresentadas são otimistas quanto ao futuro, pensado
a partir da possibilidade de a psicanálise "desembaraçar-se das suas

O Seminário, "O inconsciente é a política", ocorreu em novembro


melhores amigas", a ciência (aplicada à saúde) e a psicoterapia.

de 2002, no anfiteatro da Pinacoteca do Estado de São Paulo, como


uma atividade que marca as relações de troca de trabalho entre as

O título, "O inconsciente é a política", sugestão de Jorge Forbes,


Escolas da AMP, uma iniciativa da Seção São Paulo da EBP.

foi recortado de uma articulação de Jacques Lacan feita no Seminário


XIV, revisitada por Jacques-Alain Miller em seu curso de 2001-2002,
no âmbito da Seção Clinica de Paris VIII.
Os significantes que movimentam os analistas da AMP e os
convocam à pesquisa estão amplamente representados neste livro.
Uma citação de Freud, no "Mal-estar na civilização", utilizada
por Marie-Hélene Brousse, concentra e condensa nosso objetivo com
a publicação deste livro:
"As pessoas, em todos os tempos, deram o maior valor à ética, como
se esperassem que ela, de modo específico, produzisse resultados
especialmente importantes. De fato, ela trata de um assunto que pode ser
facilmente identificado como sendo o ponto mais doloroso de toda
civilização. A ética deve, portanto, ser considerada como uma tentativa
terapêutica - como um esforço por alcançar, através de uma ordem do
superego algo até agora não conseguido por meio de quaisquer outras
atividades culturais. Como já sabemos, o problema que temos pela frente
é saber como livrar-se do maior estorvo à civilização - isto é, a inclinação,
constitutiva dos seres humanos, para a agressividade mútua" 1•

Nota
' Freud S. "O mal-estar na ci,·ilizaçào'' ( 19.29): Edição Standard Brasileira das Obras
Completas de Sigmund Freud. Vol. X..\] (19.27-1931); Rio de Janeiro: Imago Ed.,
1974, p. 167.
Prefácio

Angelina Harari

Este é um livro que mostra não somente três conferências, sobre


um tema candente da psicanálise, exposto com preciosismo pela
autora, mas também o trabalho dos comentadores aliado ao atento
público, este último constituído essencialmente pela comunidade
vinculada à Seção São Paulo da Escola Brasileira de Psicanálise.
As conferências de Marie-Hélene Brousse inserem-se no marco
de uma atividade contínua da EBP: os assim chamados Seminários do
Campo freudiano. Nestes, por um lado, as Seções/Delegações da EBP
coordenam-se, duas a duas, para convidar um colega do Campo
freudiano, e por outro escolhem, uma a uma, o tema que se articula
melhor ao trabalho da comunidade local.
No convite feito à autora, levou-se em consideração o enlace
inconsciente/política, cuja abordagem anterior de Lacan foi atualizada
por Jacques-Alain Miller em maio de 2002. A atualização ocorreu no
marco da criação de outra Escola da Associação Mundial de
Psicanálise, dessa vez na Itália.

inconsciente é a política fundamentada em citações marcantes do texto


Marie-Hélene Brousse procede a uma análise do tema o

de Lacan, chamando a atenção não somente pela época, como ainda


pela inspiração com que foram ditas. Tais citações foram extraídas dos
seguintes textos: "Função e campo da fala e da linguagem em
psicanálise"'. de 1953; "A direção do tratamento e os princípios de seu

9
poder", de 1958; "A psiquiatria inglesa e a guerra", de 1947;
"Proposição de 9 de outubro ... " de 1967. Além disto hã nas
conferências referências mais gerais de Lacan e de Freud, assim como
do curso de Jacques-Alain Miller na Universidade de Paris VIII.
O leitor terá oportunidade de se deparar com várias chaves
lógicas encadeando os três capítulos, são vários os desdobramentos
possíveis aos quais a autora nos conduz.
Eis, à guisa de introdução do leitor ao livro, um, entre vários
possíveis, encadeamento lógico dos capítulos a respeito do tema O
inconsciente é a política:
• na primeira conferência a autora mostra como a dialética do
desejo não é jamais individual no campo analítico; portanto o
inconsciente está no cerne da política e isso se reflete no
interesse do analista em alcançar em seu horizonte a
subjetividade de sua época:
• em seguida, a conferencista marca a relação entre-a união dos
mercados (globalização) por um lado, e os processos de
segregação por outro, como a universalização em que, com o
intuito de anular as diferenças, vê a segregação ressurgir;
• por último, e sempre partindo de Lacan, postula que o futuro da
psicanálise está ligado ao fracasso em satisfazer a demanda do
mestre.

Falta apenas dizer que esta publicação acontece num momento


institucional importante da Seção São Paulo, uma vez que a
Editora/Diretora Sandra Grostein (2001-2003) termina sua gestão. O
livro fica como resíduo-letra do trabalho de uma Diretoria.

10
• INTRODUÇÃO

"O inconsciente é a política"

- -- ----�- - �- --- - - - - - Cássia Maria Rumenos Guardado

"Eu não digo a política é o inconsciente, mas simplesmente, o


inconsciente é a política". Essa frase de Lacan, no Seminário 14, A
lógica do fantasma1 , foi colhida por Jacques-Alain Miller e deu base às
suas (dele, Miller) intuições milanesas para desenvolver as relações
entre o inconsciente e a política.
O primeiro ponto a se destacar é a preferência dada por Lacan à
afirmação o inconsciente é a política, determinando-lhe a "competência",
como sendo a de um psicanalista, pois propõe uma definição do
inconsciente como aquilo com que um analista tem (sempre) que lidar.
A fórmula o inconsciente é a política caminha não só com a
definição de Lacan de que o inconsciente é ó discurso do Outro (A),
na medida em que o Outro é dividido e não existe como "Um"
(elaboração própria a seu primeiro ensino), como também com a
asserção de que o inconsciente tem a ver com o laço social, justamente
porque não há relação sexual.
Para Lacan, o inconsciente se produz na relação do sujeito com o
Outro (A) e, depois (em seu ensino), no encontro do sujeito com o
Outro sexo.
Assim, o inconsciente tem a ver com e se produz a partir do laço

11
O inc:on<.:i�n,� I a polu,.:a

social, e sendo o inconsciente aquilo com que um analista tem sempre


a ver, o analista, e a psicanálise, têm a ver com o laço social, aquilo que
faz o laço com o Outro e com os outros, aquilo que o coloca frente a
frente com a cidade e com a subjetividade de sua época.
Sem abrir mão de seus princípios, sem abdicar daquilo que faz a
sua particularidade, a fratura e a "ex-sistência" do Real, a psicanálise
faz face à lógica da totalização, (de) monstrando o furo, o equívoco,
fazendo vacilar o sintoma, liberando o sinthome, fazendo aparecer o
laço social como forma de suplência ao Real.
O witz de Freud é, para Lacan, a forma por excelência na qual o
inconsciente se mostra político, fazendo laço social, laço com o O utro,
seja através do jogo do significante, seja do jogo com a letra, como faz
Lacan, ele mesmo, ao final da aula de 10.12.1976, no Seminário O
Sinthomli. Ali ele joga com seu auditório e seu próprio nome, Jacques
Lacan, para dizer-lhes que estava satisfeito de até onde tinha chegado
com eles aquele dia e que assim eles tinham sua "claque'.', mesmo sua
')aclaque", a que ele acrescentaria um han!, o que lhe dava um alívio,
e assim ele fazia de seu nome próprio, um nome comum. Eu diria
aquilo que faz laço com o Outro e com os outros, como Joyce, que
pode se tomar, com o seu Here Comes Everybody, Homem Comum.
Enfim, a bela e justa tradução em português do livro homônimo de
Anthony Burgess sobre Joyce.
É o que poderemos acompanhar e discutir nesse Seminário
Internacional do Campo freudiano, nestas três conferências, com a
convidada Marie-Hélene Brousse e o trabalho e o debate, sempre na
linha da transferência epistêmica, de nossos debatedores.

Notas
' Lacan, J. Seminário 14, A lógica do fantasma. Seminário inédito.
' Lacan, J. Seminário 23, O sinthoma. Seminário inédito.

12
lª CONFE�NCIA 26/11/2002
• PRIMEIRA CONFERÊNCIA 26 l 1 '2002

O analista e o político:
"�Jca�çar,em seu horizonte1a
subjetividade de sua época"
- -- -- Marie-Hélcne Brousse

O tema desta conferência, amplamente discutido no âmbito da


Associação l\lundial de Psicanálise, interessa à medida que particulariza
o momento arual naquilo gue concerne à psicanálise. Vamos resumi-lo --t­
em algumas frases: {� sucesso da terapêutica,I e em particular da
p�oterapêutica, com·�-�-º-�!��Q!ico,�_ctncipal!.)lente na Europa, a
��nunciar legalmente_a respeito do seu exercício. Dessa maneira, o
lugar_da psicanálise em relação às psicoterapias e ao campo da saúde
mental se encontra questionado. para �esponder e se situar com relação
a esses diferentes pontos, a psicanálise busca, a partir dos seus próprios
fundamentos. analisar a época na qual ela está inserida e a partir daí se
1 �'
cesp.2.nsabilizar por seu lugar./Esses três seminários serão dedicados a
um aprofundamento sobre esses diferentes pontos. O primeiro tema, O
analista, e não a psicanálise, e o político. O desenvolvimento seguirá a
orientação dada por Lacan, o qual conduzirá a um posicionamento.

Um silêncio é rompido
Primeiramente. devemos constatar que não é uma tradição dos
analistas assumir ou tomar uma posição política publicamente. Isso já
ocorreu na história da psicanálise, mas nesses últimos anos os analistas

15
O ,noon.5..·:�r:tt> � a poli11..·�

� ( >V ff !.le.; n·u ..J.-O"í 'l\"t>'(' e J_,;� cu.\ i"ll a..,......_,o. t,' �. (<.'). C-cY\ Í-.J r.,;._ l.e,.. ,
permaneceram em silêncio. As Cartas à opinião esclarecida, de
Jacques-Alain Miller, vieram romper um longo silêncio. Miller, que
criou a Associação Mundial de Psicanálise (AMP), havia reservadQ. o
seu trabalho à teoria e à clínica analítica se dirigindo essencialmente a
um público de analistas, no interior de uma comunidade de trabalho.
No ano passado, pela primeira vez, depois de vinte anos, ele saiu do
seu silêncio e se dirigiu à "opinião", como ele chamou, além das
instituições. Portanto, podemos dizer que ele retomou o seu lugar na
cidade. Ele o fez por razões éticas e também por razões ligadas ao
4r avanço e\!_defesa da psicanálise lacaniana na nossa sociedade, Eº
início do século_ XXI. .. Defesa porque a psicanãlise é mui�o
freqüentemente atacada. Ela se encontra sempre em uma situação
particulitr . e..111 relaç!9 ªQ QO<!� É raramente reconhecida na
universidade e, se está presente no campo da saúde mental, é mais pel�
fato de os analistas,,um a um, optarem por este trabalho. Talvez esteja
bem assim, porém!isso implica gue o discurso analítico· não esteja po
\.-!) mesmo Iug_!,I" 9.\:!e os outros discursos, É necessário tomá-lo conhecido.
,

O analista e a política
Para refletir sobre qual a !.�l�<;>.fu11damental que o analista tem
com a dimensão política1 a partir do ensino de Lacan, usamos duas
referêncjas. que não são exatamente da mesma época, às quais
_acrescentarei uma terceira. Foram escolhidas pela clareza.
A primeira, "alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua
época"', citação de "Função e campo da fala e da linguagem em
_psicanálise", texto de\ 1953,,no qual Lacan enuncia claramente, pela
primeira vez, a tese que irá orientá-lo em sua leitura de Freud e
re.valuciaoar a psicanáijse. É o momento em que Lacan apresenta o
axioma "o inconsciente é estruturado como uma linguagem", quando
se inicia a orientação estruturalista da psicanálise e se articula o avanço
da teoria do inconsciente com o da lingüística.
No campo analítico, ele diz que a dial�tica do desejo não é jamais
•f ' ,",
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(. /� fr� H
- e . v.q_,,,!· . .
,1 ac,
indiv�<!_llal_; Não vamos tirar as conseqüências disso'imediatamente.\Não 'lE..,{;
há nada que pareç_ª mais individual do que fazer uma análise. O sujeito
fala a respeito do que el��m de mais íntimo, do gue ele tem de mais
singular. confessa o seu inconfessável.\Eis aí uma p_r:áH�_a qye .Qª_rec�
centrada no indivídu�_que aconte�e den_tr� de um consultório, 1distante
d�s laços soc��is que � suj �_ito estabelece, isto é, distante do coletivo\
,2 q�e quer di�er então "a dialética não. é individual':J Isso faz,
evidentemente, referência ao inconsciente estruturado como uma
linguagem., Na perspectiva ai_ialítica, a oposição individual/coletivo
q
não é válida, e desejo que o sujeito visa a decifrar é sempre o deseio
--===- -
do Outro, uma vez que passa pelos desfiladeiros do significant�
Além disso, Lacan sublinha n�L!,inguagem\ tanto sua ! natureza
histórica como també� sistêmica,J um sistema diferente conforme as
lín�.t Ele até se perguntou se os japoneses têm um inconsciente,
levando-se em conta a natureza da língua japonesa. Portanto, existe
1 historicismo da língua, ela traz em si a história e os traços fundamentais da
civilização. É nessa perspectiva que podemos compreendei o que ele dirá
mais tarde: o inconsciente é lítico - essa proposição que, sem a
referência ao desejo do Outro, nos esforçaríamos para considerar evidente.
Em Milão2, J.-A. Miller, relembrou que\a política é o inconsc_ient�fa
perguntou: será que o senso comum compreende isso? P��ig_'!�-� lapsos
do_s_ _políti<;o� e depois os interprete, e intel]!_�te--ª-_ 'Ô®_política como �
interpretam os fenômenos de formação do inconsciente. Ele retoma a
proposição dizendo:�'? mconsc1ente e a poHiicaJ que está em defas.�� Ã
com relação ª-�s� (?rientação do senso comum,\�Êo1Jtica e o!!Jsj}aicZen!�) ·
Miller ressaltou algo que é muito preciso: é modéstia de Lacan quando ele
diz isso. Ele é modesto, pois afinal de contas ele dá uma definição do
inconsciente. Para um analista é perfeitamente legítimo e mesmo
desejáve l. Ele não_ � �j_!__e_ <;mr _\ID"!a definicào 9.9._@líti�9. Q_gµe afinal
�e_ ç_Qntas nãQ_�flll nada_mlli�_do ql!�_uma interpretação se!vagem.
Tudo isso nos conduz à expressão em questão,}, levando-s�
c�nta o fato de 9.1Je a dialética-
do desejo não
--·- - -- é indiY.idua.1.Jexige-se
__ ... do

17
'-= .... • "'' ' - ..... � - ......._,...,... � . ... - . -- - - {' - , ,
�lista que ele se interesse pela dimensão_d.Q .I>.ºlítico e da cidDde.
Lacan chega ao ponto de dizer que aquele que não quiser se interessar
por isso, não pode ser analista. Eu vou citar a frase inteira. Ele fala do
analista: "Que antes renuncie a isso, i>_oi:t--ª�tºi. q!-!_ef!1_ não �e_gujr
alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua, �oca. Pois, como
poderia fazer fie seu ser o ei_x o de tantas vi�s 19uem nada soubesse da
\dialética gue o compromete <;om essas ,l;j4as num movimento
àmhó�3 • É uma frase belíssima, em primeiro lugar, porque é uma
definição do trabalho do analista: "fazer de seu ser o eixo de tantas
vidas". Não é dessa forma que ele falaria a respeito disso mais tarde,
porém um ponto permaneceu constante até o final do seu ensino: que a
1 �áti��_do analista \o compromete em seu próprio se�. Além disso, é

interessante a forma como ele fala dos analisandos: �·tantas vidas'�


mostrando que a experiência analítica do analisando é uma experiência
que não �nas terapêutica e sim uma.experiência étiça, que col�
_questão os fundamentos essenciais de seu destino. ,A ruào_�.alo
analista deve se interessar ��a s��jetividade de sua época �e��
)vidas são tomadas �<!_ �jal�tJcl! 4� u111 _m��i!!!_ent� _sir1_!�óli�2· Lacan

simbólico da cjvilizacàDNÉ isso que o analista deveria poder decifrar.


definiu como tal o que Freud chamou de "civilização" - 1 moviment�

Podemos dizer que para Lacan existe, do ponto de vista do


analista,,um imperativo de d_e cifr�!]lento do movim�nto simbóliç_o, o
que ele mais adiante no texto chamará de ('a espiral a que o arrasta su�
Jpgca".\Q__ecifrar, portanto, o Outro gµei a Qutm si���nguanto
efeito da língua. __i;_o?emos dizer�se trata de um dever de saber. É a
q
_primeira relação ue o analista _ tem _ com � política.l Poderíamos
representar isso com o materna que Lacan apresentou desde então.
\Tr<!ta-se de decifrar S (fJ,_ 01c1 sej�.1. o significante do Ou!rº--�-e nãº
--existe,
-== que só existe sob essa forma de significante, do movimeot9
simbólico. Pode parecer paradoxal associar o Outro que não existe e
decifrar o movimento simbólico. Ou seja, o Outro, que se reduz ao
conjunto de significantes, é um Outro que �ó exis_!� como s_�b!ante.,_

1
v, ": J-011:;e,la1� ,.."' -�·o 1 -, :� �b (( ,,,0 1n,":Jll. ;...:,,.,..._ �'l"co.
r.,.: � ;+!,,",r,õ,u
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w�'v-"J, J,._ '�) ,:) .,_,. e_,. :�'
--= -'-- ------
com_o _!!l�_ctU_i na significa_nte. Não se trata de um ser supremo ou
malvado, de malvadez-LNão se trata de UJ!I parceiro maquiavélico qu�
�-
tenta subjugar-nos ou nos explorar.
ling�em tªI como da nos permeia�
--- É simplesmente _a estl}!�ura da .l. ·
Portanto, Lacan exige do analista efetuar esse deciframento e ai
cons tituir um saber. Embora Freud não tenha abertamente apresentado
suas opções políticas, ele escreveu "O mal-estar na civilização" e
"Psicologia de grupo e a análise do ego", dois textos sobre a guerra.
Então'\podemos
e
__.,.
e.çrcd>er �m �lguns textos qye Freud se mos!@
interessado pela subjetividade de sua épocaj
Uma segunda maneira, a meu ver, de aproximar a relação do
analista com a política é · u_m _ dev�r__de �aber1 um dever d� ato. �
_2_odemos conceber a análise sem a dimensão do ato. E nesse nível se- �
·---- - ' === --=:z: - '
apresenta também a questão do político.:,
Façamos uma pequena digressão, usando o texto "A direção do
tratamento e os princípios de seu poder" . Na última página há uma
descrição de Freud, o analista, num estilo eminentemente lírico. "Quem
terá ainda a ingenuidade de se ater, no tocante a Freud, à imagem de
burguês bem situado de Viena que espantou seu visitante André Breton,
QQ!:.!1-�0 � aureolar de nenhum convívio com as.Mênades? Agora que já
não temos senão sua obra,'�caso não �ç_onheceremos_ _nela um rio d_<! [o.,gQ
que nada deve ao riach_o artificial de Franço_is Mauriac? [ ... ] Quem
trovejou como esse homem de gabinete ç_omrLo açambarcamento d_()
gozo por aqueles que amontoam sobre os ombros dos outros os fardos da
necessidade?';4 E a descrição continua, mas trata-se de um retrato que
implica a questão do político, às vezes pela crítica de uma sociologia
simplista da posição de Freud, o "burguês de Viena" é um rio de fogo. E
lá podemos ver como � pen�amento dç l.!)c_a_!!_ t1:1m pe_nsa!!_lento _ que
i nclui um ju!g_a111��t� pgJj!_Íf.Qi..mo.stnmgC!_ �e\O\campo da so<:!ol9g_ia não
_ �_
e o da p_sicanálise"' Nã�_ é_ poí9U� a pessoa é aquele bu�ês t>em
comportado vivendo em uma casinha normal, que do ponto de vista do
dcsrjo_ não é um_ grande subversivo.

19
Essa descrição mostra o analista como homem de desejo, e de um
desejo articulado ao insuportável, ou seja,1um desejo que não recu��iante
�on!9 do insyportávrl_�da.um. É o que Freud chamou de "a Coi�",
cf:as Ding,. o centro vazio de cada analista. E por que vazio? PQ_rqll� �-9
P.Onto ondep_ .si.ijci� ���O sujeito esvanece exatamente ali onde ele
�e aproximado ponto do que é insuportável, o ponto de horror.\
Muitas vezes, no Seminário 7 - A ética da psicanális�, Lacan
lembra Aristóteles. Ele confronta a ética da psicanálise com a ética
aristotélica. Resumindo, / Aristóteles clefine o campo� �ti_ca,
c_on_��d�do g_tE .o meioé.J> gµe está fora desse campo, tudo o que eJe
chama de monstrµa§Q. t!.ldQ� � �a ordem dQ_g_ue_s��de imagi11ar�
de pior exista Ele exemplifica com os atos de barbáries, com os tiranos
de sua época e, completa, disso não se fala porque não faz parte das
coisas humanas, portanto não faz parte do campo da ética.
Diferentemente, a psicanális� - por consid�r_a! o -�_o_n�truº-�-º
não como uma_j@rtic_l!_��Ld!!de.1.2,e alguns � sim c.9mo en�<_?n�r_ável �1}1
todos os humanos, mesmo que com modalidades diferentes, mas
«.:....::; - - - ----�- · - - - - •

certamente para todos -,coloca então no centro do sujeito um ponto


de horror que o faz yacjlarl Eis aí o retrato de Freud, aquele que não
recuou diante disso, diante do horror. \Podemos dizer que cada
analista não deve recuar diante do horror, I>Qis, dessa mªneira, o mais
1 horrível é o mais humaJ'!O e passível de ���-�nalisado. Isso conduz a
pensar a relação entre o analista e o políticq, não apenas na vertente
do saber, 1�s na vertente do ato,t ou seja, ,a forma ge respondg
através do ato ª-��e ponto central.l Daí a necessidade de rever a
noção de neutralidade do analista.

A neutralidade do analista
O que é a neutralidade do analista? Não é um eu não vou tomar
partido. O analista é forçosamente alguém que se compromete, que se
envolve e que toma partido. Como definir esta_ neutral_i�ad�,_ !endo
como fundo o comprometimento?
Em primeiro lugar, considerar-se il eutro não significa e sta r fora
da subj etividade de sua época . É não a pena s estar dentro dessa
su bjetividade como ta mbém sa ber se orientar nela .
E m segundo lugar, �q ue a neutra lida de seria ma is uma
neu tralização do jui z!;)-: O ana lista não tem que julgar, ele não é um juiz.
Lacan diz isso em uma conferência:\quem sou eu para j ulga r essa v ida
�e confessa?; Portanto. nada de sugestão, nem de j uiz. nem de
conselheiro_J A neutra lidade do a na lista dev e ser definida e baseada
nesses dois pontos. li; uma neutra lidade com rela ção a o eu.J. e a o
supereu) ma s é uma neutralidade que é de um compromisso para o
suj eito.l É uma espécie de adiamento do p�çonceitp e_.de. escolha,.
escc:,lhas q ue lhe são própria s enquanto s ujçito e _ não enqua nto a na lista.
'º analista não está presente na a nálise enquanto sujeito, e sua
neutra lida de diz resp eito ao eu, à a daptação soc ia l e a o supereu =;-:sz
seut

im perativo de gozoj E�, é um:i n�utra lidade que diz resp�ito a os
.

. Por outro la do, é o


. �mperativos presentes gp_ gj�çpcsa �o roestre
c��ruame nto com relação à orientação do suj ei to, ou seja.lo delti.,<>.c
Tcpgyanto cjrculando na ca deia de signifi cante�_gue é o suj eit�. E m
cada interpret�ão esse engajamen�-9�0 . Porta nto, o a na lista
não é neutro da mesma maneira como nós entendemos a S uíça como
um país neutro. Tra ta -se de uma neutra lida de muito mai s c omplica da.
Trata-se de uma neutralidade política? Pa ra responder, introduz irei um
terceiro termo, a noção de discurso.
� .J..: -'A L� 't , e � � tb� J.o� .."°) ,x;·s w ( 'i,� .
c,o disclll'SQ� o laço social gue implica I.QlLfi;çio_sobre o gozg,,
Laca n, em 1 95 3 ,\ refere-se à subj etiv idade dll_ �a é_p� c-� , _em
t�r_m os de movimento--.S.iJnM.lico,f Mais tarde, isso será re duzido à
dimensão do disc urso, através da proposição de quq_a psica ná lise é u m
�isc urso� segundo uma definição que encontra mos no Seminário 1 7 -
O avesso da psicanálise. É uma definição que engloba todos os
di scursos, desde a categoria do disc urso em gera l até o da ps icanálise.
isto é, u.ma forma ção humana que serve c omo freio pa ra o g ozo. A
® 4 17eu&i&olor.Pé :/-Ó �t ·i{ oi,� �·/.o ()t,o
� � -ÍJ- I /_ � .:. .... A - � • - (; 2} J ,, U-LJ-u (/ . _ / /.
�- �-
_,. •.,'.; " ,.
estrutura do discurso da psicanálise é a mesma daquela simbolizada
..

por Lacan como discurso_ do mestre, discurso da histérica,_ dis�urso


universitário - os_q.u.atm .grandes...moJklo.s..Jle_d�cy�Q_ e_m__ Lacan iJ)
discurso é o laço social que imQ.lica s�l_!lpre un:iJreio sobre o gozo, uma
ordenação do gozo, uma organização d�ozo humano: um freio, um ,
limite, portanto, um modo de organização do gozo. Como laço social,
a psicanálise implica urn\two)sobre o g;�--
Contrariamente, há um outro tipo de saber,\ pois a psicanálise é
Y,m laço social e um sabs,r:. Mas poderíamos dizer o mesmo de todos os
discursos, pois todos os discursos i m..Itlic!lm um_ saber. Em
compensaçãoÍhá ;i saber que não implica o laço social,\o que não
sigri_i �ca_ _que ele não _esteja_preso pu dentro de outros laços sociais,
mas significa que, enquanto tal, enquanto saber,\não implica um laço
social.' Esse saber �.r�_nte é a ciênciaJ Portanto, Lacan faz uma
oposição entre, por um lado, a ciência, 1!.ª qual _há um saberl�..não
l.li:n_� ordenação do gQZO, e a psic_aflá!is'2.Pº� outro !ado, que �-UDl s�Q�
que não é sem relação com o saber científico, mas �ue é também um
-----�---- - - ·- - ----
laço socia.!J E justamente po.rque a psicanálise�é. ...w11,-Jaç.o .sººª1.
1
portanto um tratamento do gozo, que ela _ está necessariamente
misntqida na gues.tà.a do político .:
� _..,_
Indo ao centro do problema, a expenencia analítica é uma ·
, experiência que se propõ�ratar o gozg,lgue propõe.elucidatuelação
o
do sozo e laco sociall Trata-se, em uma análise,\4� modificar a
relação do sujeito com o sisnjficante-�stre(ou seja, modificar a
posição do sujeito a partir do lu_gar que ele ocupa !!Q discurso .do.
mestre, ou melhor,-ll, interpretação gue eJe havia fejtp do djsçnp59 do
mestreJ Colocar em evidência os significante�-:m<:s�rey proporciona
uma outra experiência, urna experiência inédita que, como diz Lacan,
através da prática de um outro laço social leva o sujeito a mudar de
posição em relação ao significante-mestre.,
Essa é a versão ativa do analista em relação à dimensão política.
É por isso que Lacan está certo de que todo discurso do mestre possui
�r _ A c;._i..,._vA e. rv a�;,� _ �. "éª l'""f' ,,:e))-... n o,clf110,uw d<)
� • A ;...,.,..; . r, ""' ,�· l � 22,.e; ,U nJ .f�..co /c?W.J.Ji _[. / trn,V/__
uma voc ação totalitári a., ) nclusive aq�ele do m�_!��.A�m.9_� ri1Jil- N ão
� "
são apenas os tiranos que têm essa vocação totalitária.\Q_�isc urso do
,me stre coloc a um si�n ificante no posto de çqm andgJE é por essa razão
que a psic aná�se_ opera sobre o discurso do mestre, na medida em que
\;le está pre sente no sujeito e mesmo ele o constitui. �por isso que_ a
psicanálise é mal vista. 1Nem vamos falar dos regimes totalitários, pois
de stes ela sempre foi excluí da. �as também não é muito be m vista
@ando o saber é po� to pelo me� tr� _na posição de siiJlifi cante:m,e s�
- o saber cientificoJ
Regularmente me dizem que a psicanálise é um assunto de guru e
que não_!e m_ ;_mesmi1 efi cácia que C!_S !ntidepressivos e que, de qualquer
forma, g �S�Jº progresso da neuropsicologia, não iremos mais precisar
dela�1Janto agui como na França, são publicados a.rtigg��-AAUnCi!!!1_(!
�10rte da psicanálise. A__p_sicanálise está morta, e deve ser enterrada, ou
ainda, ela n ão es_tá suficientemente morta e devemos matá-la.
Acredito que isso tem a mesma estrutura da operação analí tica,
haja vista quelo tratamento que a experiência analí tica dispensa a_2
�iscu�so d��!!'e���_e\Lmp ede que ela sej a politicam�nte correta.1 A meu
\" er, é isso �ue dá ao analista o dCY.!:f de política:Ld,evolver ao suj eito a
colha1 a escolha decidida.:.. OJ.l melhor.__a�C,,Q.}ruLw:�- �-ª
\�
relação com_ o significa��'::":1��

Notas
Lacan, J. .. Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise", in Escritos; Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1 998, p. 322.
' '.\liller, J.-..\. "'lntuitions milanaises [I)", in Mental - Revue lntemationale de Santé
.\lenta/e e Psychanalyse Appliquée, n º 1 1. décembre 2002, pp. 9-2 1 .
.
,'Q Lacan, J. .Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise", in Escritos-, Rio
de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1 998, p. 322.
' Lacan. J. · ·_.\ direção do tratamento e os princípios de seu poder", in Escritos: Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed .. 1 998, p. 648.
Lacan, J. O Seminário - Livro 7: A ética da psicanálise; Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ed., 1 988. p. 1 4.
·, � 1 .
C: c,,,,ul ()! d, (}..O a. v1 0 &-s,4 o cÚ vtJõ 6lÍ:-t
; ,s-C-1/w, : d( v'iY v ('l( ai) �
_ j) O Cc(cJ'Ív,,
� fh C.{; ff,q WúdtJJé &J
�!li !Ottl-0 &ft}
,,
o
Debate

� - -- Romildo do Rêgo Barros

Marie-Hélene Brousse trouxe-nos uma mensagem preciosa.


Normalmente, quando se fala de política, se pensa no coletivo. Quando
se diz "deve-se participar da política", se está dizendo, em geral, que
se deve sair do privado para o público. Por exemplo, "você que é um
privilegiado, deve ajudar os não privilegiados". Ou, como se dizia em
1 968, "não_ fiqu� - �arado, voc_ê é exploraqo','.
A política- seria-aquilo que tem .que ver com- . o -público..1 e a moral
-- - - .. -- -- - - . - - - ----

��_p_�ad<:!. Faz-se uma escolha moral para se ajudar a dimensão


política do público. Quando Marie-Hélene Brousse diz que a separação
fgUre o iodjyjdual e coletivo, em psicanálise, deixa de existir como
t-op_osiÇ.ão. ela nos faz dar um _!lvanço_ muito grande/ A partir daí, já não
se trata simplesmente de sair do campo do privado para o público, mas
�alizar antes de tudo o político no campo do privadg. Isso tem de
fato tudo que ver com o nosso tempo.
Participei de uma mesa redonda no Tribunal de Justiça do Rio de
Janeiro, num encontro de psicólogos jurídicos, e um desembargador,
que estava na mesma mesa que eu, disse algo que eu não sabia, e que
tra nsm ito a vocês sem ter confirmado se entendi corretamente a
afirmação \a partir da Constituf�ào ll��fl�ira de 1 988, a le_gitim�çã,2_
,

2S
dos filhos não se dá mais simplesmente pelo casa�ento, mas por algo que
s�hama �·sentimento filial", que é de alguma forma <;>_reconhecimento
l
qQ!pais �[_parte dos filho,Vlsso mostra um dos paradoxos da noss;;
época, uma vez que se toma algo, �_m_ princípio _privado, como e
sentimento, comq_critériQ_çie legkir_n�ª-2· Ao mesmo tempo, o Estado se:
dá o direito de -�uma ingerência cada vez maiOLna privad9, ou at�_!!C:
íntimo.� O mesmo desembargador, por exemplo, acha que num futurc;
mais ou menos próximo, o Estado vai ter o direito de se imiscuir não sé.
no casamento como instituto legal, mas também terá uma palavra a dizer'
sobre a existência ou não de afeto; ele vai buscar penetrar nesse âmbito. !
-f7' Para esta nossa discussão.l!_oca.Jjzei alguns dos sentidos da palavra·
"subjetividade" nos Escritos de Lacan. É uma palavra que na nossa época'
ganhou uma importância muito grande, e me pareceu que o sentido·
consagrado atualmente não é exatamente o mesmo sentido gue dá Lacan.
Subjetividade corresponde para Lacan, mesmo em épocas muito diversas
do seu ensino,V1o_gue poderíamos chamar de efeitos dt! suieito. e não a
uma configuração qualquer, que fosse próxima do indivíduo psicológico. !
Por exemplo, a subjetiYidade surge no texto de Lacan em :
oposição ao mental, ou à rede de alianças simbólicas. Neste sentido, é j
uma noção que\�ao esta !l_!�ito_1�!!81:: �11 <!e sil'!_t_o_n:i.�J � subjetividade é!
aquilo que s e precipita dç_YfillL.�ª vontade , � .um_a-�rt�i
organj:za�º·J Entào�_tem ck_fato um caráter mais ou menos 1
subversiyo. O que vale dize!"__ q!:_le .!_�m g_ç_saída !-1.JTI caráter político. 1
Ora, se costumamos dizer - Marie-Hélene Brousse trouxe-nos uma
contribuição importante sobre essa questão - que vivemos em útft lempo
em quef os laços sociais são estruturados a partir do discurso ao dãcifnçji
mesmo tempo sa�.!n_()�-9�e_a ci�ncja. 9ã_Q __ i_r.r}p!i_ç1:t u_rn. _disc!IfSO,. n_��
implica um laço social. Podemos concluir que os laços sociais interessam
de muito perto aos psicanalistas, uma vez que cada um deles yaj apresentar
µm tr2E.Sº J?IÓprio. A subjetividade vai aparecer para um psicanalista
fundamentalmente como tropeço. como algo que não está no seu lugar.
Em certo sentido, c�da tropeço vaj set O��J)discurs-9 n��.ti&!na.

ç:
�i _. v,,l (,Ío,"'rt'n iv?
r'/ 4 e. t/n, <LI C4t '.;.., ·:.e, eh (' &'M ú, -1 ·11 . ' 7-'"'
- ' � j) .:... . . •
""
/J O � � .: - ; �... j � -" C,(:) � ,,·, �� "M;. ' [• ,., [:.J'·.Ji"' ,;...�"\ C "'" •)
O totalitari smo, por exemplo, produz sintomas, que são facetas do
que chamamos de "subjeliYi.dade__de nosso tempo".
Quando Lacan faz o e!Qg_io de F�d, quando se opõe à critica de
André Breton, que ficou decepcionado por encontrar em Freud a
imagem de um burguês bem comportado de Viena, L.acan está dizenjo
que não é exatamente a participação pública pgHtjca de Freud que o
�cteriza como a to�de fogo que B!e!?E_ d�sejava ter .
encontrado, \mas'Jo fato dweJer �ciado, posto a nu, aquilo que é/?;)
segregadoJ \0 que Marie-Hélene Brousse çbamou. de �monstnrnso." ,
e�tá l!ª verdadd no cerne do indiv@ijili",g_g _�()J_ett�o.'
O que Freud inventou politicamente foi a idéia - expressa em uma
prática sistemática - de que tratar um tropeço da lógica de um Qi�ç_urso,
isto é, tratar um sintoma\é contesJar ���e - �isçurso, e ir mais longe do_9!!� (�,
a tentativa frustrada da his�til!.Jl!J.k se.re1u1e à i!TIRQtêQ�J\JJ --::· �;:". ::-��;r,·-�· ,;
Então, me pareceu muito feliz a demonstração de Marie-Hélene
Brousse, de que o analista,\__!endo º!1 não uma E_articipação coletiva
visível,! não pode esquecer que \o fato de agir
.. como analista já é ,'B---;
E2m�
.

Gosto muito de uma definição que _ deu_ Lacan da a_nálise.


. _
Lacan dizia que\a analise é "ª_ir_rupção do erivado no públ ico"i Quer
dizer, .n!<? é nem <:> privado e nem C> _púi?li.c;:.9. É uma irrupção, �ma -!?
espécie de duração sem tempoJque chamamos �-AW ; .)

Foi muito interessante que Marie-Hélene Brousse tenha


terminado a conferência dela apelando para o que poderia ser o grande
objetivo da política, que seria lgI�f: o._calJI�<> c:l,a
� � :),•1' (j t;,', (i\ JJL_ W, �
.J:�ª�r4 ',).,�:-
.2 "...

Perguntas t �, M vo- ,;_-;:, t. e.._ v..i ·..,..� , cJ.,.. "" .J),


'r,1 '4)1. :,...J r,,,,_·,)o'/\W)
:_ -t .:.; ,__.:. 1 1,.l, ,
Angelina Harari " i , , ,. .I . r"·- , ,.� '
' r- m,IJ (?-v,U,/-l f_ 1 I i.<Yi , ,,� ·
Quero colocar uma visão que é um pouco lateral; ela não está no
cerne da exposição de Marie-Hélene Brousse e nem nos comentários
de Romildo. É uma questão que toca no tema da neutralidade do
analista. Marie-Hélene Brousse trouxe um esclarecimento, quando ela
junta o termo neutralidade e o termo engajam�pto. Também é uma

27
Lneutraliclade COJn u m engaj amento) O lateral da minha questão tem que
ver c om algo que discu timos em u m carte l sobre a c ontratransferência.
Uma c olega no carte l pe rgu ntava a re spe ito da relação e ntre a
neutralidade e a c ontratransferên_ç ia. QIJ� dize r.:.. ...Q. filie seria esse
engajame nto? Em um_ movim_!f!t� p�ic analítico e sse eng�me nto_foi
entendido como o analist�ter de se colocâr na relação analítica. Então,
c oloc ar- se se ria falar a partir dos seu s se ntimentos, dos seus
julgamentos, preconceitos etc. Eu gostaria de que Marie-Hélene Brousse
pudesse falar u m pouc o sobre e ssa relação, 'sobre esse "sai r ç}Q_silênc io".
Enquanto formulava minha pergunta, me dei c onta de que o tema que
-...:-�--=-..:.==-�...:e..;: ::.
nos reúne, i�nconsciente é a_ políti?, surgiu e m um curso de J. -A.
Miller, logo após uma e tapa em que e le trabalhava a\§�ratrãnsferené'§
Então, há alguma relação?

Gostaria de fazer algu ns c omentários a re spe ito da interve nção de


Marie-Hélêne Brousse

Romildo sobre as observações que e le faz das difere nte s definições


propostas por Lac an sobre o te rmo subjetividade. O que e le c hama
efe ito de sl!ieito, isto é, unplic a u ma dife renc iação e ntre o eu, o
��pe���� saj�i�; simplesme nteJefeito do signific ante, tomado e m
1
�adeia. N ão há indivídu o numa análise , não é a polític a do indivíd�o. /
-
é_ a..P. olític a do suje ito que inte ressa nu ma análise.\ _...
--V À s perguntas da Angelina vou re sponde r apre sentando um c aso
c línico. Trata- se de u ma jove m que faz análise há dois anos; que já fe z
algumas e sc olhas fundamentais na orientação de su a existênc ia. Ela
abandonou o seu parce iro e e ntrou e m u ma nova relação. Neutralidade
do analista é: eu não te nho nada a dize r sobre a esc olha que e la faz de
seus parce iros. A e sc olha de sse novo parce iro é feita de tal forma, que
eu me sma, sua analista, c�idero que e lª_e..s..tá c.olocando no exterior
u m interlocutor qll_e �stá �_e nt!oÊ��a '!lesma, ou seja, e sse home m se ria
u m testa- de-fe rro, e está c laro que ele é um pof!a-�OJ: de_!l mil
_?rie!) tação, que é_ u ma orie ntaç ão para_ _,.rll!, Ela c ompartilha da

28
orientação política deste parceiro. Na verdade, essa orientação política
não é exatamente a minha, portanto - contratransfer_ê ncia. Se estivesse
na perspectiva de analisar a contratransferência, eu teria fei� uma
intervenç�o .f_Q__f!1 _�el��E_él_�_s._sa escolha política, alh�.s., essa escolha iria
impl icar numa viagem 120.lítiça_ . qu� _e ra_ _ m1Jitº arris�ada,. Nossa
orientação_ nos pr9íQe de fazer i_sso pois(temos o princípio de que a
contratransfe_rência é a somató�a dos ereconceitos do analista/Nesta
linha, poderia considerar que minha critica dessa posição política seria
apenas um dos meus preconceitos. Tendo uma vez apontado realmente
um pouquinho esses aspectos, ela teve uma reação e me colocou
devidamente no meu lugar. �o mel! l_!]_gªr, ne;it.e caso, era_tentar fazer
com que ela des_cpbrisse\9ual era a sua causa nessa escolha política (0
humanitária, portanto, nessa escolha de ideal.\
Por não considerar isso na definição da contratransferência,
conseqüentemente por calar um pouco o comando da interpretação,
permitiu-me tentar fazer com que ela decifrasse a orientação de gozo
que se encontrava no âmago de sua escolha amorosa - uma
identificação
----- - -- - -
com- a vítima e _uma presença incontestá�e_l - - -- --- - -
da pulsão de
f!19rt;.1 Isso levou um certo tempo, mas ela conseguiu chegar lá. Eu tive
de lQJl!a rurn� de_çisão....u.m_ poucQ_ di.fiçi1.._qu_e_ era a de não colocar todo
ºª
º..J!l�Q transferenc_il!l J>a1ªn�_ para_irri11edir que ela fosse para
aquele local extremamen!�rjgoso, como el�ueria _ ir._fja acabou
i_Qd-9/Mesmo que eu tenha dito estar preocupada, nada mais do que isso,
mas também nada menos. Para onde ela iria exigia que ela tomasse
algumas medidas para que garantisse que ela pudesse voltar./A idéia de
�nnanecer nesse lugar tem para ela um sentido de morrer 1�. foi �
ela ouviu,1Voltou, pelo menos fisicamente, ela teve um mau encontro, ela
se deparou com o ponto de horror, ao qual me referi. Efl"I - � gebra

tinha. enç911!r.�..Q o "a " minúsculo1


l�caniana. podem_o� dj�€:r que _no lugar do grande p1!_i <!_e_ �-� <l> (A,) - ela .

Isso me parece responder à questão da neutralidade. Para que o


analista seja neutro em relação a um ponto central deve fazer a_pare��
_i;i -.; ( , (; . ·../ , · ,: ....;, r, � ,:.,..,l-:":° t41. de ( ,, cl, � t.;.__y ca:.::�:C, - ,i_ V' CÍ<f
/ ,.,., 115
r: r f<·Ay,,=r o 1 ;,ú;, c.,._.<-.,."1 29 .<.t , , e. r c,-<< 6 t;. · ,..-.v cJ .S d., r,..u;,. -
� ! _: :: O '""·onscicnre � .J polioc:J _;i · •

o ·r· - . , . \ .:_. -'/��
/�'.. ·" , .:_
J . ,.,-

, _ J,._.' �.;! � ,,,,_::


sob os�deais as suas articulações com o i_mperativo Jê'go�o� o 'que, nã9
. ,·,/ ,r,· .e;.. �'!J , ,_
exclui, naturalmente, que existam ideais, pois o analistà, como disse
Lacan, não é alguém que desencoraja seu analisante ou que o conduza
a uma posição de ceticismo nem tampouco a encontrar uma solução
cínica. Existem perdas de identificação em uma análise, 111_<1s isso não
�.S!liD_c_a _ql!� s� �aia de !lma -ªJláli�e sem ideais, . si01p!esme_!l!e_não s�
tem a mesma po��ão que se tinha anteri.Qr:rr!_ente com_ reh1ção_�
ideais, ou seja, e!es estão llrt_�culados por um lado ao ,1. maiúsculo
barrado (A) e de outro lado ao a minúsculo/Há o Outro que não existe
e há a questãQ do obj�to perdido. \A neutralidade poderia �_E_ uma

Sandra Anuda Grostein


Quero retomar a sua articulação entre o discurso como um laço
social e que � freio ao gozo.� per:isannos que em uma análise há_ugia
circulação nos q:ua!ro disçursos, nós não �stamos, durante toda o temP9
---------
em que a análise ocorre,'\no
� discurso analítico. Peço um esclarecimento
se qualquer um dos discursos, discurso do mestre, discurso da histérica,
discurso universitário, o analítico,\qualquer um deles te_fl! a mesma
funçã�, se operam da mesma maneira, digamos assim� sobre o gozo,
so�e uma organização do goz,g,. um ordenamento do gozo'l.J

Marie-Hélene Brousse
Sim, todo discurso implica um freio ao gozo. Essa frase é de
Lacan. Mas há diversas maneiras de entender o gozo. O discurso é da
ordem ��_strutura da linguagem e implica forçosamente em uma
organização de um modo de gozo. Portanto, todo discurso opera dessa
forma. Com relação às quatro modalidades de discurso que Lacan
constrói a partir de seu esquema de quatro lugares,\em cada um deles
�iste um lugar para o gozo que não é __ ocupado pelo mesmo
significante.Jf_i>_f'!anto existe em cada discurso uma modalidadt: d�
gozo dif�r�I!!.� Por outro lado, temos que observar, e é extremamente
-
f ' .-

_:::r,- "-()(
· ea r.· . ,,..iv, .._, l, v
/ - . . , ,, [ Ç_ tJ ,} CJ
,/ ,,./(· _� tt.( 11 {1? { ·l l _';) '. , ét:; :'{ ?" ' /� '[(_ V" -' 1..: • .
- v.- ,
0 .
0 - , ;,

-- �. /,-. · /, ,/ ,3_._ __ ,.. _....._


importante, que o discurso do�!I!__�_!!gorosamente o avesso do.
----
-
- - -- -- �
Jiscurso analit_i�o- �s� leva Lacan a dizer gue o discu�? _do mestre�
1ambém é o discurso do inconsciente,\já que o inconsciente é o efeito
das relações de linguagem nas quais somos capturados/- ,é lógico
cons iderar que o inconsciente, na verdade,_é o discurso do �estr_� :,)
- . - - - - - -- - --\
- - -
O tratamento que o discurso analítico_ faz 1e_111_ �� _dispositivo novo,
diferente, <!a relação do sujeito com o significante 1le,.ya a �!fl�
modificação da posição do1sujeito em reJa.Ç�Q ao gozg. �oderiamos dizer
que esta �a .�_i!i:_rença �ntre a ciênci�: �_sicanális�: 1a psicanálise é uma
-2
escolha sobre uma modali�Ad��parti�u!a_r de tratamenJ<>..sobre o gozo ..
Existe a!g9sIJ1-f-Q!!!_l!l!1 e.ntr�l:! ciência e a psicanálLse ºº-s��!ido_ _d!! 9.1:!_e
���1,1a;_furrcionam� parti� da m�Íerialidade da le_trw_ e.pO� ou sej:,
as duas funcionam afastando a questão da ,significação e do sentido. 11
==
Não existe um manual sobre efeitos do gozo, uma equação ou
uma fórmula química. A psica_!!�)_i��_ acei!aJratar do gozo, mas IJão �-ª­
mesma operaç!o
- - --
que
.
a -ciência
-- -
faz -sobre
-- o gozo. Em poucas palavras
- �--- - .
-
se alcança _a_f<:>�_!lla__do _fan_!asma19ue pode ser1 resumida erri.Jrases 9u
�rasll �u ainda em uma frase quando se é -�reudian�,\e ao mesmo
1empo ocotre ��e_ indicação 4o freip sg.l)re Q_ �o ./ O próprio
fato de se construir a fórmula do fantasma � uma administração _Q(?
gozo! uma administração pel_? nomeaçàoJ
2ª CONFERtNCIA 27/11/2002
Rõmu/o Ferreira da Si/\·a

N a conferência anterior, M ari e-Hélene Brousse abordou o tema O


analista e o político: "A lcançar em seu horizonte a supjetfridade de sua
época". E la contextualizou o inconsciente estruturado como uma
li nguagem em Lacan em "Função e campo da fala e da lingu agem em
p sicanálise", \���and() que� oposiç ã� �ntte__ o indivtdual e o coleti vojJ)
deixa de ser válida, poi s a dialética do desrjo oão. é, iodixhl!!.�.l : " o desej o
é �- deajQ_A o O utro]. O _ �ll_é!_lj s� _ep co_!l tra- s�_, en�o�'.em pgsiçãg de :)
deciframento do simbólico, �'-! �ej a,_deve_agir no deciframento do O utr_?
si mbólico.e.. nquanto
� �fejto -� lingua . 1 0 materna S de A barrado se apresenta.
N o texto "A direção do tratamento e os pri ncípios de seu poder"
1,

há uma definição de Freud, analista, que o coloca claramente local izado


na subjetividade de sua época. Com os quatro discursos: mestre,
histérica, univers itário e analítico, Lacan propõe que a experiência
an alítica, inédita para o sujeitot modifique a relação com o signific;wte�' "j)
m,.:EI,ejTrata-se de uma outra modalidade de laço social: portanto. o
an alista está metido em política. E la ilustrou a neutralidade do analista
com um belo fragmento de um caso clínico, mostrando que
neutralidade é não julgar e não aconselhar. N. eutralidade - - --- - é- -�
não agir
segundo a �ubjetividade do_�n�lis�a1...ou seja,,, CQITI .Q� se�s pré,:-ç.QDÇ.eito�
- - r·
<�
35
• SEGUl\DA CONFERÊ�CIA 27 1 1 2002

A psicanálise no tempo dos


"mercados comuns e dos
processos de segregação"
Marie-Hélene Brousse

Para da r início a essa conferê ncia, utiliza remos uma referê ncia de
Lacan, uma referência a ntiga, de 194 7, após a S e�da Guerra-
iyt undia l, um texto belíssimo escrito pa ra uma revista de p siquiatria na
-- ·- ----

França,
- - - � -L---'Évolution ea
· - ingl esa-==--=
psychiatrique, intitulad°' {'A J?Siguiatria
g�.;!!,ª".@a conclusão desse texto, dua s frases fo ra m selecionadas.
-

Antes de fazer a citação se faz necessária uma explicaç ão por que esse
texto fo i escolhido. De um lado, p orque ele é interessa nte e, de outro,
p or ser um texto de 1947 , escrito exata mente 20 anos a ntes de 1967, de
quando extra ímos outra referê ncia para essa conferê ncia, a saber, a
"Prog_osição de 9 de outubro d� 1967 sobµ: o psjçapa)jsta da Escola ".
Primeira cita ção, que se encontra a o fi nal do texto "A psiquiatria
inglesa e a guerra": �Minha exposição encerra-S�!t<;>_Q_onto em que se­
vislumb_ra os horizontes ue nos io'etam na vida 6bl1êã"'.a té mesmo, 1
que horror\..,�!..l? olíti� S e� dl!YJcbJ \! í enco�tra��mos -ohioos dê
.

interessej para nos compensa rem de��e� apaj xo_n_a ntes trabalhos <;lo ti.RQ
' dosli8em dos produtos de desintegraç_ã_o_uréj��E�para.frel!.!ª fabulante',
produtos eles mesmos inesgotáveis desse esnobismo de uma fal
ciência. .. "1• E m outras pala vras, a qui é a idéia de qu���nc9ntram coisa�
mais interessantes na psicanálise dq QO� t9_g� y ista p olit ic� do que no
exemplo que é dado, que seria a mudança do índice de a lguma

37
O in,.:on,...·,�nr� � :1 politi..·a

substância na unna. É por isso que ele fala dos trabalhos sobre os
produtos de uma falsa ciência. E_!e__empre� o termo "fal sa ciênc�"
porque considera que a utilização da ciência nesse tipo de trabalho não
é_ outra coisa que 1:l_f!l�Je.11t�U.!Ya..lkse ap rop.riaLd.Ç YJ!!?.. fal�éi. l�g_iti_maçª"o.
,­ A segunda frase: "_)>ara dizer a verdade.\os riscos inerentes a taJ
.·; r�-�ito .gelos interesses coletivoy'na prática pareceram reduzir-se a
proporçõ es ínfimas, � esta guerra. penso eu, demons trou cabalmente
queln ão é de uma dea,asjada jnd.Qcilidwk dos jpdjyjdyos qu e advirão
! os perigos do futuro human_oj Fica doravante claro que as forças
, sombri as do superego se coligam aos mais frouxos abandonos da
consciência para CQ.IJ!luzir º�l!_omens a uma mortejl,Ç eit<!_por causas ao
me_nos hu_m<1 n11 s_. ·�q ue��Jlll�� _a_p a�5,...e�S?Elº,,�çti_fi ci.2._!)�_p_e> r i� so é
h,e!élLc,27' Portanto, esta já é uma perspectiva bastante clara de que 1�
G
pe��_ e os ri scos nã_o virão d�__i ndocilidade dos indivíduos., e a
psicanálise escalberia.\âe.lÍYess.� que escol her, a indocil idade ao in vés da
��ilidede f: essa docil idade é apenas o p oder do sup ereu e os abandonos
da cons ciência. fornojá foi dito. supere11 + e,r - sacri.icio, c_oostge(ilQdo
que o sacàficia não é absah:uamentc, cm si mesmo, heréic�

supereu + eu = sacrifício

- -- A orientaç ão que Lacan dá


- -à _psicanálise não é de modo- --
algum
s- acri ficial e nem do l ado da docilidade. Em 1 947, já aprofundou um
--· -" · --- - - - - - - --�-- - - - -

- c_onfl ito com a psicanálise do el! e as p ersp ectivas de readap tação do eu.
--- - - - - --- -�---

Em 1 967, vinte anos mais tarde, ele defi ne �is..�o os hori zontes
O horizonte da psicanálise e os pontos de fuga

que estão presentes na frase de 1 94 7, os horizontes que nos prole.� r.i�


vida pública pel a política. Ele os define através de três pon_to� de fu_ga. Isso
supõe um--ª---.�ferê_ncia à perspectiva: o hori zonte ao longe é del imitado
através de pontos de fuga, ou seja.,� elementos da,..3rs�ctJ��-"I:1JY1-�:
<J.,o hori zonte da QSicanálise em ex tensão, is�º é, _gsicanál ise_ à_.!lle9� q�

38
el a se aplica ao laço social. É a psicanálise à medida_ qtJ� JJào determin�
um_ real socil!!_, no_qual está submersa. O� trê!_PQ...n!_os de f'llj_a__eermi!.1:.'!1
�':!�� tanto (!_g_Ue def] ne a época q_uan to o mundo 9ue determina a
organização da pr_§pri� psicanáli se. Esses pontos de fuga, diz ele, são os
Desej o_ _ressaltar toda. a i mportância desse termo. N ão se trata de
f2_,7°gj:
trori a nem de i deologia e sim de,coisas advindas da experiênci a.,..
D�s d�i s prif!1ei ros pontos de fuga, que são as coordenadas do
nosso h_?�Z0�!�4U m é ex traído d a CUBi?,:F: O da tran smi ssão do
carro
�b�r ana)jtjçp I Para L acan,\!..Prática da psicanáli se é defini da pelos
três pontos de Üiia a pattic de três diPJ�o��- o simbólico, o
i�magi ná ri o e o real ,

pnmeiro ponto de fuga: o ÉdiJX? não é soll!Ç!Q_


�(V\. 0 � 0 4
-1 "t,�"�!
O p ri mei ro ponto é aquele que é extraído da clíni ca. O que a clíni ca
analíti ca nos demonstra é que\o É dipo é um problema para a psi canálise,
_ em 1 967 . F� claro que hoj e já não é mais um groblem� . O problemaj á
foi soluci onado. Mas naquele momento Lacan di zia que se tratava de um
p roblema. Para Freud, por outro lado, o É dipo era uma solução.
D ev emos ressaltar alguns elementos que nos perm itam
compreender \porqu�_ L acan considera que um dos pontos que
�����ª ª-P��ij naÜtica é a inadeq11açã9 do �urar1te toda a ·
primeira parte do ensino de Lacan, ele se dedicou a reler, portantQJ
� .
reinterpretar o Edipo .freudiano� A parti r desta i nterp retação ele
� onstrui u a clini ca difere_ncia_l _p sicanalíti ca, �le demonstrou que o/
Edipo freudiano é egui vale_11_ te ao N ome-do-Pai - metáfora pater:na. il

,-
-- - - - - --
= Nome-do-Pai = metáfora pate���
-
-

Édipo
'·------------- �-
� rante um tempo, L acan desenvolveu um a psicanálise ori entada •
eJ truturalmeote em sua elín� em sua práti ca, centrando-a n�
�� áfora pat��sse seri a o tempo um, o pri meiro tempo do ensi no
de Lacan.
l
(} /1�"'(''.i �� l;-t,Y. v>O r11 !_.j!.4J.,, ! ..,vv\Ü .J�, ..,.,-.o,.. 1
b· . 'r/ {.. c ,J -r
1 . \ � "'· "' Ir 7\ '1\ 0,._
,Em 1 967, os efeitos da cHoica a obrigaram a rnr:dar de ..po5jcão.
O Édipo engy�mto Norne-do-Paj é um problema para a psicanálise.
peixou de ser uma solução./
No Seminário J 7, O a, ·esso da psicanálise', encontramos a
formula�o�e�e prob�ema e já uma nova respo � Nesse seminário ele
faz uma apá)jse��rutural dos (mnos edipianos em Freu07 o próprio
Édigg, "lotem e Tabu", "Moisés e o ManÔteísw.y: - ãplicando-o método
�!!II'- e, - >'
!_ 1. ' � , '
de análise estrutural dos mitos, de Lévi-Stranss• E ele chegâ a uma
fórmula que fornece a verdade desses mitosJ o gue faz com que não sejam
_!Tlais mitos.�le retira deles as suas caract�risticas épic_llS para mostram.uai
_é a função desses mitos, W!!Zind()-()s a uma fóillllll;J
A partir da análise desses mitos, ele produz uma fórmula - o
Édipo, o mito edipiano assegura a seguinte equivalência_;, q .12fil, ..P!.Í
_m orto, N_ome-do-Pa i $�1ente1� condjçijo de _&ºZU.� i- 1 i - 1;- u_J

P =- - -Nome-do-Pai
· ----
(pai morto) = condição do gozo ' r
- -- - - , _ "'1·-<--.'�
,'= ..tz.
;-, . ·ai '
E Lacan acrescenta: este é o desejo de Freud. A igéia de percorrer
o mito fundador _ da psir,anáJise. o mito do Édipo,J QUe a .�
paterna é aquela que regula o 5020. Que re�ula. ou seja,'9 ue o orien�
e o limi!!J É a funcão paterna que , destina os lugares ao gozo Jlºr e
1
\ocaljzá-lo acaba controlando-o. ,
� clinica mostra que querer atribuir a o pai essa Junção de
ignificante-mestre, "á ue é o siimificante re ula e rQ.dUZ o g(?Zl?
- ou melhor, que gerencia, �E!i� �o -, não correspo�
.!º real que a experiência analitic:,. imQ§e, quer seja a experiência das
'.psicoses, das neuroses nu das per,ersões.1
O que mostra a clínica? Q!e não conseguimos nos Uy_rar 99 g_Q.�.9
atribuindo-o ao pai ou ao mestre/E. de fato. o gozo, as ex eriências de
o o satisfa ão da ulsão ortanto , se aram o be a verdade
que significa isso?
- Se considerarmos que o saber é S 1 + S2, o
- -- -.. . .. .. ··- --- .... · · - · ......-==-�-------
S!8!}_ffjç_ante paterno �ais
- " todos
. os significantes
---·----
ordenados a partir dele
- -
40
nãg. rew.:it am o gozo e então o gozo �parece e �urg�_ com� _ un:i_a�erdade
di ssociada de um saber.. Existe uma dissociação entre o saber de um
- · - -- --
l ado e a v erdade do outro. 1
· - -·.. .

- ' " -,.J � � '• ''· C


I

S1 + S2 {saber) 1 Verdade

Isso produz algo assim como �·eu sei bem, mas mesmo assiw". �
Ou então a relação que o sujeito tem com o seu sintoma; y, or exemplo,
o sintom a obsessivo, O.J!Ç dido de verificação, o ritual,\guando o s.ujçito
-
�iz "eu sei qlle_ é absurd�0 _ mas eu}1ào 9onsi&o me i mpedir", o saber
está separado da verdade. "Eu sei bem, mas não adianta: a ve rdade está
no meu sintoma". J.
E Lacan acrescenta no texto: "... mesmo para a criança, apesar do
que se pensa, o pai é aquele que não sabe nada da verdade"6.�
operaç�o de análise dos mitos freudianos penn ite mostrarL a função do
�me-do-: Paj na c onstituição do saber I em _ contradição com_ 7as
evidências da clínicat Conseqüências: ,Q,tdip o nã o é a solução. �� �
n���� sário matar nenh um p ai para g� zar. M esmo os significantes
freL1_ dianos como trauma, sedução ou sintoma, não têm .nada que \'.Cr_c;,
c�_1��Portanhl,l a cli nica contemporâ nea é a prova dessa não­
�� ção com o pai./ No interior da psicaná!ise_ existe mna....c.r:itica .à
i_ç!eolo� ia edip iana. Não são os nossos adversários q ue criticam o
a

Édipo. -Somos nós mesmos.' E nós o fazemos a partir da experiência


;inalítica cli nica E conseqüentemente, se ara iio� ser fei

("§ S�gundo ponto de fuga: a solução Escola


- O segundo ponto de fuga - e isso se e.!!f2!!l ra do lado da dim�
do imaginá.ti.o - se refere ao que foram e ao que devem ser as
(}],,!� ""w-t
'J \ 'V\..',) ti�
-'i< ���
, . , _
�-1z#1(?n� �� .-l.�I1z. ,o
41 , ,, I' , �
--inj
./ ')
....;+,·�

, ,, .,. "\._ 0 Ó( .() AA\ • """'· · . - • ..i A.a ... • d - L'Y,: .-. - ,,-.- ,n/
Ã) - - ,1/... .-(1 l.
O 1m.:onftC1enre ,} :, ,-.,lit11.·;1

i!_lsti�uições_de p�lca_aj_fü� Ou seja, a or�nização de sua transmissão,


e seu avanço e dos meios que ela cria para a formação de seus
analistas. Portanto, é uma crítica aos g_rupos psicai:iªlíti�s. Laçan diz
que elas respondem aos modelos descritos por Freuq, da Igreja e do
Exército, ou seja, totalmente regulados pela função paterna na sua
�ierarquia, nas identificações imaginárias do &cupo, no tratamento do
siber sob forma de um manual ou de jargões, lugar-comum.
A transmissão da psicanálise vai em direção de uma recusa em
�stionar a teo�clínica.J O que Lacan tem em mente quando faz
essa crítica das instituições psicanalíticas é a IPA. A ------
-- . �ir- desse
---- ponto de

� �le apresenta_ a solução, q_ue é a Escola. Portanto, diz não ao grupo


imaginário, hierárquico, edipiano, e sim,à solução Escola, onde o saber
fica livre da trrefa com relação ao si_ggificante-mestre (Sl}JPara que haja
gsquisa não precisa haver o significante-mestrezJ Por exemplo, fui
convidada por uma americana que faz formação em análise lacaniana e
também uma formação psiquiátrica e psicanalítica em Nóva York, num
dos lugares mais prestigiados da IPA, o _ Çolum_bia In�tjtut. Ela ao mesmo
tempo está na Escola de Medicina de Columbia e no Instituto de
Psicanálise de Columbia. 'Nesta minha v_isita fiz uma Apre�entaçào de
.J:>acientes, na qual falei durante um determÍ!!a_do tempo. Ent_r:e_".:'_i�ei u_�
senhora que, sem dúvida algumª, til!t-ª-ya-:§e de uma esquizofrê_n� Aliás,
foi interessante conversar com ela. Num _ dado momento perguntei-lhe
onde
-
ela havia nascido.\_Ela me disse que--tinha
-- - - -
nascido no Vietnã. --- �
Na
verdade, ela havia m1�cido no Bronx. Ela não havia dialetizado sua
invenção de ter nascido no Vietnã. Ela não fez nada com isso, nenhum
delírio. Com relação a esse aspecto, ela se limit�a diz_e! aquilo.
Dando continuidade às minhas atividades no Instituto de
Colúmbia, fiz uma reunião de trabalho com os estudantes e os
professores. Nessa reunião, um professor de psicologia, com formação
em psicanálise, fez a seguinte observação: "�sta senhora falou do
Yietnã. F�lar t�lvez seja um exagero, ela nos deu um significante -
Ykto.i\.. Podemos observar que na época da Guerra do Vietnã, ela seria

42
�hn.:-Hêlênt: Brow.�

urna cri ança." Eu concordei com ele sobre a c_oincidência de dat as. Aí
de disse: " pois bem, se ela falou Vietnã era para dizer q ue na sua
infã ncia os pais dela bri gavam, portanto, �o falar em Viet nã ela est ava ,
se referindo ao desespero que ela sentia quando criança frente ao
espetáculo de ver seus pais se enfrent ando".@ aqui um v�irQ 1
pa rtidário do Édipo, a pont o de nã-9 sa�ermos quem delira mai_s, a
p1 ciente ou o psicanalist a.(�_essa i_nterpretação, o É dip o est á mais do
lado do delí ri o. �l!_ respondi que ele, o psicanalista, tinha sido muitQ
g__c neroso em relação à estrutura, gue eu não estava segura de q ue o
mundo int erno dessa senhora fosse determinado �elo con!J it o ent re se�
papai e sua mamãe, ist o é, pel o conflito edipiano.
-� N a perspectiva da
--==-=-=-=--�
clínicà de ori entação lacaniana, a escut a dos pacientes psicóticos é uma
liç ão para entra���- undo � e-��m outro tjp9__de arquitetura; uma
arquitetura diferente daquela dos neuróticos.
A crítica à descrição do Édipo, o__além-do-É dipo, como primeiro
ponto de fuga, associada ao conceito de Escola como lugar de debate e de
fonnacão, qu_e nã_o sej a mais org3!1izado pelo�i_gnific_�nte-rn�stre, isto nos--=>
conduz à idéia de uma psicanálise gue se desenvolve num cenári o político ·'-
·,

rgtalmçqte difereot,;J_ Existem muitas maneiras de tratar essa constata�o;


por exemplo, se o pai não regula mais o gozo, então podemos fazer o que
quisermos, isto é, uma nova �_j.DCiedade dos irmão� no sent!4º
"Totem e Tabu", na época da ciência. O que é a democracia na época da
ciência? S eri a ainda um a democracia dos cidadãos, que est avam mais
ligados ao signifi cante- mest re, QY seri a uma democracia dos
c_ onsmnidores. ou até mesmo dos produtos, ou ainda do material lmmano
que está majs relaciaoado ao obj etO çlo gue ao s�ificant e-mestre?\
_d-i.. Ir' 1
\,. -rv-�°'-
(-=g O terceiro ponto de fuga: o campo de concentração � � t ·" ' ' " '
Q t erceiro ponto de fuga diz resp.Çjto ao real. Lacan o enuncia ao
fo lar dos campos de caoceotraçãn .\É a reação do precursor em relação
�W: .Le�ºyajys;rá a partir do� emanej ament o dos grupos sociais J
P!! l a ciênciaJ Precisamente pela universalização que ela propiciou.
d

43
Portanto, temos aí o campo de concentração., ,os agrupamentos sociais
como nova organização no real,J
Os três J!!)ntos, a{ém-do-Édipo, µ_ma f�colí! e o C.!l!EPº_ d.e
conc�!TafàO, sà_Q_ º�- pQntos atrall�� quais Lacan agarra _a
..JDQdernidé!cl.€: .\ Acrescentamos ainda esta frase: "Nosso futuro de
mercados comuns encontrará seu equilíbrio num.extensão
ao
cada vez mais
<!_ura dos processos de �gregacão"·. O conjunto desses três pontos está
c9rr�lacionªº.9 ªº �rni.niQ_(IQ saber científi@_s_obre os laços sociais.
;, CQmo situar o dese · o o s1cana 1sta nessa con untura.
Em primeiro lugar, nós temos que nos assegurar e nos convencer de
que a e_sicanálise não é wn abrigo contra a ciência, pois quando é utilizada
como abrigo ela desaparece como clínica. � proponho uma nova esc�tà
P.ara o discum1 do mÊstre que é cgnjuntural, ou, mais exatamente, wna
concretizacão dos símbolos lltil�dos _pQr Lacan para_ <:!escrever o disc�
do mestre. Vocês já viram que o mestre não é mais o pai. Então, a escrita
que Lacan dá para o discurso do mestre é a seguinte:

DM
s, 52 I ·. J

S · a

O S I é o significante-mestre, que �__!Kente �o �j_ Sfl,!r�o,_que


determina
·� _o -saber (S� este é o patamar do Outro (A); temos o sujeito
-
--
_(�) que é efeito da cadeia significante, o sujeito que decorre dessa cadeia;
� o objeto de gozoJa).__ao_qw,.L�l� estárelacionado. 1Essa equação, como
sabem, é a fórmula do fantasma <i O a). O fantasma é determinado pelo
Outro na medida em que, articula o significante-mestre com o saber..(SJ - S2J
p , C.: t L I , e..• r'

OM
s, {A
s a {S
'., u -r I..J, ; .,, '-,.,J .

Qual o valor que podemos dar. nesta é,eoc�1 .ao S 11? Qual poderia
ser o significante-mestre operacion�I. uma vez q�e não é mais o pai?

44
O discurso do mestre moderno
Vam o! recllp erard o tex to de Lacan o term o que ele utilizou em
t 967 , �a época dos m ercados comt.mS - 1.!_l]lp�ríodo _ l!I U it o particular
_;Europa. M esm o que tenha se tomado um m ercado com um úni co,
R

vam os �bstifl!i�___!!!ercado com um pqr_ _g! ob<!liza�o. com o Jacques­


Alain M iller fez em seu curso O lugar � o JaçcJ". O Sõ é econômico,
portanto p odem os chamá-lo de\globalização dos m ercados� Já o Spé o
modo de saber que corresponde a essa globalizaçfil�,- Bom. isso é algo
a

que Lacan não diz, então temos que inventar. Prop onho - é apenas um a
hipótese -, 110 1 ug�r do_ �ª�! inssr��e:! ai� 1:f'!Ilº\Rçocedirne.r1rg.v á que a
maior parte das empresas produz m anuais de procedimento. não �p_e nas
� s empresas, was todas as instituições, 1 São esses procedim entos que
re&-Úlàm a condi.ita dos fu ncionári� s q��ndo s� !!�t� de adm inistrar
seres hum anos, m as que também organizam o t�_ J!l.J?O de uma pesquisa
cienti fica./Por exemplo, para um procedim ento parà exp erimentação
de m edicam entos está incluída a seleção de sujeitos cobaias. Além
diss.o, na França o termo procedim ento'º tem um duplo sentido j á que
também denota um procedim ento jurí dico/Não podemos fazer um jogo
de palavras� um sa_ber que �r�ait!_ri9!f�m en�e o_gozo, e 9!1_e �� f}lzer
_
isso !ªZ de� ae� recer a sirigulandag e\ Em todos os McDona/d 's do
mundo tanto o hambúrguer com o o sorriso daquele que o vende são os
mesmos. O u p elo m enos fazem de tudo p ara serem o m esm o.
O camp o de concentração· no discurse> de> mestre ocup ará o lug ar
do pequeno o_I ugar do go:zt:>; I sto é,\ohnodo _predom inante de gozo Í
ªt
:i)!•aJtDeote é Q da.w reg a�o!- portanto, ' seg.regação é a OQVa solução
dada ao g ozo.
1

procedimento
campos de

45
Jacques-Alain Miller, em s eu curso O lugar e o laço, utilizou a
expressão de um italiano, Antonio Negri, autor de O Império1 1Jalienaf.ào
autônoma - o processo2or meio do qual a e_r�ria pe��.? se coloca no
campo de concentração.\!:omemos_um exe�� homoss ex u�lid<1de�n9
mundo todo ela se tomou uma posiç ãoL um campo de concent�o
gozo - uma auto-segregação. t_um gueto _DQ gual se escolhe se fechar.
Então, �os <campos de concentracãg. ex pressão que, a meu ver, deve
ser usada no plural. \�s es guetos produz em mundos Pª=�los-1 Essa
expressão eu encontrei há bastante tempo num autor de livros de
suspense/policiais americanos, autor de Dália Negra, James Ellroy, que
em sua autobiografi a fala de s i próprio e de que ele, numa determinada
época de sua vida, vi_v_i� num� f!lundo paralelo, que s e refere a um
momento preciso, em que ele viv ia numa comunidade �Jack. des toando
dessa comunida de, e e.sses mundos não s e enc_ontravamsx ce.to, diz el�
/
�m moms_ntos de ç_x�IQsào de violência, qye ele chamava- d� tunrnltos.\Os
mundos paralelos s e encontram atravé�EC>JUºJHI.to , pelo saque. Entª9, �
lfil! mundo que inva de .Q.J)utro....é um encontro viokm.94
N� lu�ar d� suj eito bé![Tad�(�) no di�CJJLS9_ q9_me5! re eu
_
proponho as rede�, 1
Miller fala � m redes flexiye isí moduláveis, _ flutuantes, por ond�
circula a maes tri a. Portanto, podemos dizer que do lado do sujeito (� )
e do objeto (a) com o qual ele está relacionado -!q ue é estaJllienaçJo
. l1,ltônoma, 1 Jacques-Alain M iller diz dela que s e trata de umaI bela
-
definiç ão da "ex tim_i4 ade'1"-, e��a -��tL_midªci e de� .f�_!'ta forma
caracteriza o s ujeit_q . Eis, então, uma proposta para a escri ta do
di���rs o do mestre 1 ou, para dizê-lo de
- �oderno,\pós-N ome-do-Pai
· ·.-.... �l -
forma mais precis a,\de tal forma ql,!e o Nom�-do -Pai nãp s eja mais o
.

� l!á gutros S1 que não são redutíveis aopo_der paterno e, por outro
lado�n:_o há determinação caus al entre o SI e o gozo.
li
Vamos novamente nos bas ear no mesmo curso de M iller, f no qual
ele estuda a modificação que s ofre a psicanálise ao longo dos avanços na
--=---,-- --

obra de Lacan. Ele ressalta no início do ensino de Lacan uma parte em


1 --- �-- - ---- - - -�
T::7 ·- ==--·- - ·3
· 1 L 1 -"" , L.
1
ú l: c..:.C a u ;_é'> 1 e u il'{� -.-/.:
46
2-"' c.: ':.'YG
_.J---
d.( aafo /�.: 'A---r""f' � t.{ e�
lj U /
t ,,. u� t �.r · ,. , ,. . • , ( f.. í t ( L.'-L •
q ue. e� função da revisita do Édipo pela �ra paterna, �� mos
que _f�er isso q�e �il_l��ma��- 1:1'!1ª ��a _dis�ipif§),\uma �poca � .
djsc1plmaula ps1car:m�1num mundo onde a funçao paterna podia ter
J
esse papel, de fazer a disciplina do gozofoa medida em que nossa época
���
- disciplinar, como podemos qualificá-la? ·�
A solução mais simples seria dizer qu�é a época da globalizaçã� -.,.
se
É uma éeoca quando\ 'JS polít�s empaljdecem se comparadas às
e�conomias.f Existe uma espécie de desvalorização da dimensão do
político, e portanto daq�ele� gu�c...�esemp�n.ham esse paprl. E esses não
se beneficiam mais da transferência ao Pai. Como dizia Lacan, mesmo
as crianças não acreditam que o Pai seja a verdade. E ainda, !ll�_çm
pensa que o Presidente da República sabe. Ninguém acredita que o
Bush seja grande coisa. N.ós supomos neles um_gQ.��DÓS �.!QValTlos
esse gozo, a tal ponto gµe v�m.o.s__pr�. em se tratando de Clinton, se
procurar, achamos. Portanto, n�sse período, que não é mais o períajo
disciplinar, o significante que Jacques-Alain Miller utiliza_ parª­
repre�entar t�ssa época, lé uma época de íãrranjoJ <2JJue nós estamos
prepa�do _c:omo S I para colocar no lugar �i1 Qual é o novo par S 1
- gozo?/Sobre esse par nós sabemos que não há relação sexual-_ l
Na ��ressão ·�n.ão hiLrcla.ção _sexwr.....o___terrrw rel�çi_q_���
fün�amental, pois o sexual nós sabemo� que sempr.e há. A expressão
"não há relação sexual" causou escândalo na década de 60 e 70. Hoje,
em 2002, é perfeitamente_ admissível por todos( Mas, como já disse,
não com relação_ �o _ fa�o_ �e qlle !!!o haj a algo sexual, gtl�tf!ti<>1 L;
�unca o sexual esteve tanto em voga,\já que o gozo não está mais
!imitado pela disciplinvExistem imagens disso em todos os lugares.
I;:�tamos convencidos de que nãoh� relafào.\
E o que está presente no lugar da relação? Seria a equivalência, a
cquh·aiência das normas. J\sJlonnas se equ1;:m. Daí a importância ,._·
F . - - E.

do direito. que permit� legislar sobre essas equivalências.f


- �

De certa forma,\a _R.sicanálise _está perfeitamente de _acordo com essa


�rienta5ão do discurso � ine_s!fe ela é pontual, ela não está atrasada.
1
."' . · f · l . · /l'r_ ( · ... ir ',, ( (_./t( · Yc' ?t-f
- ...,__
' A, f r/"1,L<-{ H t C.. i,_�: LC( J . ( �t ( L,, .
,'
Portanto, é importante que possamos precisar com o que a psicanálise
pode, a partir do tratamento analítico, ,contribuir para o que colocar no
Jugar de S l j Bem entendido, não são os mercados comuns. Não que
tenhamos algo contra os mercados comuns, nem mesmo contra a
globalizaçã<:>, uma ye.z___q_ue _ yirn falar--ª-QUL no___l3rasil. 1'.'1ós mesmos
�enc_emos a uma empresa globalizada da psicanálise, porém, podemos

- ..
dizer que \temos algo contra o comuml já que D.Qssa prática clínica se
sustenta no singular e não no comum. 1 Interessa-se pelo particular�n_ã_o
pelo unive_rsal\Qp�g��I� s�l���� ;,Ánào �(3$_ pr��i�.
O dever sorrir de uma certa maneira em determinadas condições não
assegura nada, nem mesmo que se deva sorrir. O fato de passar uma vida
vendendo hambúrgueres no McDonald 's, não quer dizer que sorrir seja a
resposta adequada, do ponto de vista do sujeito. Não �e_mos ganl!ltir_�
haja solução do sujeito universal, l!'is não há solucão universal.

Notas
' Lacan, J. "A psiquiatria inglesa e a guerra", in A querela dos diagnósticoS', Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1 989, p. 24-25.
' Idem, p. 25.
1 Lacan, J. O Seminário - Livro 1 7: O ai·esso da psicanálise; Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed., 1 992.
'Jden,_.__cL,,�-ªPítulo VllI; C,Po mito à estrutura", pp. l 1_1 - 1 24. '.
' Idem, p. 1 1 3.I
• �m, p. 122.
' Lacan, J. "Proposição de 9 de outubro de 1 967 sobre o psicanalista da Escola", in
º2fjQ Lacaniana n º 1 7, novembro de 1996, p. 1 2.
• Idem. - - - - - - -- --- - - · - - '
• Miller, J.-A. Seminário inédito (2001-1002).
'"NR: Procedimento significa em português: ato ou efeito de proceder; 1 ) maneira de
agir, modo de proceder, conduta, comportamento; 2) modo de fazer, técnica. método; 3)
forma estabelecida por lei para se tratarem as causas em juízo e para o cumprimento
dos atos e trâmites do processo.
11
Hardt, M. & Negri, A. Império; Rio de Janeiro: Ed. Recorei, 200 1 .
1

� _ -é11, i c \
1i- - ,.
uL� t:'c ,o<u e =C " ''; w( clo, J"'L_
�u: � S lt )ru1:,,, +i ·cvri , k �-'- �t. ;L Ta vu k1 1-{8 1-<
l!.u â .
I ; ,' ic· z ,_
' _1.;;_.,, (-..,., / .
Debate
Da ética ao avesso da psicanálise
Direito, avesso e vazio
Sandra Arruda Grostcin

O curso de Jacques-Alai n Miller encerrado em junh o deste ano,


do qual saiu o título deste seminário, foi vári as vezes cit ado por Marie­
H élene Brousse. Em suas últ imas aulas,\ M iller refez, em t rabalh o
c2 n�t o com Éri c La�t, o cami11h_o _p ercorri dop or �l!can que vai d9
Seminário 71 A ética da psicanálise ao Seminário 1 7, O __av�sso da

Do Seminário 7, Laurent ressalta que U> ara Lacan exi ste uma
pyicanálise,j

-
\�-m-u-ta_ç_ã9 no que di�re§,Pe�t_o à guestãa c1a des_w, e umawet iç!g com
relação ao gozo. Ele usa a expressão(acumulari ao invés de ígoza_.id Já no
...,

Seminário 1 7 - ele frisa bem a questão do desejo e do gozo - h á uma


permissividade em relação ao gozo.\Espera-se que o suj eito não tenha
mais vergonha de seu gozo, e que se envergonhe sim do seu dese.i9.
N esse meu esboço, �ou__b�_!!Q Seminário 7 el�IJJ� ntos (l�e
colaborem para o melhor entendiment o sobre essa relação entre desejo
�� o nas art iculações feitas por Lacan. Na página 1 62 do Seminário
7, em port ug uês, ele diz: ..Q uando lhes dou uma fórmula como o
desejo do homem é o desejo do Outro, trata-se de uma fó rmula
fn3 embora Freud não t enha procurado forn ecê-la como t al. [ ... ]
citei-lh es uma fó rmula muit o curta que aproxima os mecanismos

49
respec ti�os da histeria, da neurose ob sessiva e da paran óia, -�
termos de sublimaç� o - a arte, a religião e a ciênc ia. ( ... ] E ssas
in dic ações n os ajudarão a art ic ular, em toda a sua gen erali dade, a
fórmula c om que, no final, c.!!_egaremos a pnar a função da
sub limaç_ão n a teferênc ia à Coisa", das Ding. ( . . . ] "E ssa Coisa, da qua .
J
todas as formas criadas_ pelo h_oJ'l'le_f1! _são do registro da sublimação '
i
será sempre representada po r um vazi o, preci samente pelo fato de el
n ão poder ser representada por outra c oisa - ou, mais ex atamente, d
ela n ão poder ser represen tada sen ão por outra c oisa.1 Mas, em tod�
form a de sublimação o vazio será determ inante. [ . .. ] Toda ar1e_ sei
caracter:_iP! _por_ µm cgtQ_rnQdo_de OJgMli_;zação em tomo desse vazio.1
[ . . . ] � religiãe>_c o�t� em._ todos os modos de evitar esse vazLo". [ . . . ] E;·
a ciênc ia, "o discurso da ciência r ej eita a presença da Cojg_.. .", das Ding,
" . . . u:ina_v _ez__q11�_.e.m sua perspectiva� delineia o ideal do - - saber
-- - ----�-� - ·.:: :-
absoluto, i�to éJ. de algo ��l ec: e, n o en tanto, a Coisa não a
-

levan do ao mesmo temp o em conta"'.


.
.
En tão, a arte or�º-i�a_ o vazio, l! religiã� evita e a c iência rej��
Ao retomar o Seminário 1 7, e_!11_relaç ão uem1 issividade do
gozo, L auren t diz <}!le! o mestre- e Marie-Hélen e desenvolveu bem em
sua con ferência - que l5l significante-mestre ÍÍXí!_ o suj eito em(sji)
regime de gozo;1Lauren t rec upera então n a págin a 1 97 do Seminário
1 7: �E u sou liberal, c omo todo mun do, l!Q_en as n a medida em que sou
_ antiprogressist�?:? ó que estou metido em um movimento que merece
ser c hamado de progressista, p_ois t progressis��m ver fundamentar-se o-='
<!i_sc urso p sic ari alítico, na m�dida em que este completa o c írc ulo que
poderia, talvez,'-permitir a vocês situarem ex atamente aquilo contra o
que se revoltam4 0 que não impede que isso c on tin ue func ionan do bem
- - -- - - - -

paca. E os primeiros· a c olaborarem c om isso, aqui mesmo em


Vinc enn es, são \'Q_C ês, pois desem� nham a função dd hilotâi\ de�
r� im�JVoc ês tamb ém n ão sabem o que isso quer dizer? O regim� Q
�_? stra_ para vocês. E le dj:z: - Vejam como_gg�!!!'"· Ou seja, é atrav�
do regime político �� pod�p_os �lc ançar '!q ssas modalida_de�=de_gozo.

so
Para melhor exemplific ar isto, teremos que voltar à referência das
ú ltimas au las � á c itado curso de J.- A. Miller.,
N esse c on texto, n essa discu ssão entre Miller e Lau ren t, ele uti liza
a fa mosa frase de maig de 1968 para fa lar da permissividade do gozo:
··� ibido proibir". Estudando n esse curso e trabalhando esse texto,
lem brei- me da frase "proibido proibir", tran sportada dos mu ros de
Paris, em 1968, para São Pau lo. Aqui, mesmo n essa époc a, ela
rep resentou uma músic a - e representa até hoje - um momento, u ma
época. C aetan o Veloso, num festival de Músic a Popu lar Brasileira,
ap resenta su a can ção É Proibido Proibir. Rec ebe do públic o, em suas
próprias palavras, no livro Verdade Tropical: "A platéia, n o Auditório
do TUC A (o Teatro da Universidade Católic a tinha sido a esc olha dos
organizadores do FIC ) , predominan temente estu dantil e c omprometida
com u m n ac ion alismo de esquerda (quer dizer, antiimperialista), reagiu
com violenta indign ação. Várias caras c on hec idas se mostravam
ostensivamen te hostis a mim [... ] e não pouc os entremeavam as vaias
convenc ionais (uuuuuuuu), c om xin gamentos e palavrões"� . N o palc o,
"À medida que os rostos cu riosos - mas nem por isso livres do ódio
que os fizera desaparec er - ressurgiam, minha ira e meu c onfuso
entusiasmo c resc iam e, numa voz a u m tempo desc on troladamen te
insegu ra e c on fiantemen te profétic a, eu disse:\Essa .é�a juventu de qu e
di z que gu�r: tomar o poder?"3 Todos aqui se lembram dessa c en a. "�
vocês forem em política como são em estétic a, estamos f�!of'.
C omo eles são �m_J>? lít_ica? �!3 Lac an, \ são fixados em seu
regime de gozo.\ O que isso tem_il !'er c om a psic análise n o tempo dos -­
mercados c omu11� e dos proc� ssos de segregação?
Rec orro aqu i a ou tra referênc ia, dessa vez sugerida por N ic éas,
um texto de Alexan dre S teven s, pu blic ado n a Omicar? digital 4 1 -4Z'.
Cito de manei ra livre o �corte�_ele fez._tla_\;'Pro_p osição de ..9.-.de.
ou tu�ro de 1967 sobre o psican�ns_ta da Esc ola". E111 relação aos
cam pos de c onc entração, deve- se ver qu e eles são resu ltado dos
rem a_n ejam�n tos . dos__$�p-os-sociars --feitos p eJ�_di�Cl;! rSE

51
universalizante da ciência.\ Os campos de conc�ntração são modelQs
1
que antecle_��- os efeitos �egregativos. E o que prnduz esse ef��o
é uma oer versig,\m��- ª própria estrutura do QiSÇU!SO da �iência. Os
1mercados comuns! (nós temos atualmente, aqui no Brasil, uma
discussão profunda sobre a ALCA - Associação Livre de Comércio
das Américas), têm os mesmos Jypdamentos universalizantes do
d isc urso da ciência, e, consegüente)1!.ent�, o�_ m._es�g� e_fe__i!.2;'
se_gre8ª_tivo� Stevens diz que . o discurso analítico é uma resposta
possível, diferente, pois se o mestre,\'5e o disct1rso do mestre, q_�e é_o
avesso da psicanálise, f ixa o sujeito no seu regime de go30, o di�cu�o
analítico visa dissociaI,g.,suieito de.;SÇl.\,.Sjgni.ficante-mestre P.ara fazer
perceber o gozo que o sujel!Q. �t,ira d�sss.__significan.!.SJP discurso da
ciência rejeita o vazio, �isc!1cso da psicanálise o inclui:)
E hoje, como anda a relação do sujeito com o seu gozo? O
i_rnp�rativ�cada vez mais obedecido. Goza-se com a droga, goza­
se com o Big Brother, goza-se na depressão, goza-se na' fome.
Vou concluir com duas perguntas, uma para Marie-Hélene Brousse.

esse curso de Jacques-Alain Miller. Então, no livro O Império, os autores


As nossas referências são as mesmas, já que estamos usando como base

dizem: "O império pode apenas is��e �� Como as ações


da multidão se tomam políticas?"•. Eles respondem: "Devem fazer parte
diretamente e c_orn a consciência adeq1,1a� às c:,peraçé:>es �pre�ajva_s do
impé�o; ,a�v,�s_de rnovimen��s militantes:n. Sendo que, aqui no Bras ·1,
por exemplo, nós poderíamos pensar no MST, um �
�-� --------
.. --- tipo de- organização
- - ----
q_uel faz fac�isse tipo de culfüra polit1cãJ
Então, a minha questão é: a___rnudan_ça de regime de __g_qzo,_que se
�opõe alcanç_ar com a psicanálise, também _tem a ver_ com _ urna
militância, com um movimento? O que é exatamente a lítica lacaniana?
Disse que ia fazer duas questões, essa que acabei de fazer à
Marie-Hélene Brousse, e urna segunda que eu mesma vou responder.
Por que fazer um seminário de psicanálise na Pinacoteca do Estado?
Seria fácil arrumar motivos para não fazer: pouco prático nesse

S2
horário. um local super perigoso, muito trabalho para conseguir. o
público diminuiu, muitos obstáculos etc, etc, etc. Então. por que
escolhemos a Pinacoteca?
Simplesmente, porque:
· É bonito!

Notas
' Lacan. J. O Seminário - Livro 7: A ética da psicanálise-, Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Ed., 1 988, p. 1 � .
' Veloso. C . Verdade Tropical; São Paulo: Companhia das Letras. 1 997 . p . 30 1 .
' Idem. p . 303.
' Idem.
• Stevens, A. "Camp de concentration. marché commum et segrégation··. in Omicar?
Digital - Re!lJe electTQ11ique_ fl!ultilingl!_e_ de psychanalyse (publiee a Paris par
Jacques-Alain Miller) n º 4 1 -42; Paris: AMP[UQBAR].
• Hardt. M. & Negri. A. Império; Rio de Janeiro: Ed. Record, 200 1 , p. -423.
º Idem.

Perg,m.tas
Rômulo Ferreira da Silva
Gostaria de insistir na questão sobre o porQuê da escolha desse
tem!j já que Marie-Hélene Brousso. observou que há um sucesso da
= rapêutic,al Gostaria de que ela nos precisasse um pouco mais. pois
psicote
neste momento, na verdade, a psicanálise tem sido sempre criticada, e
anunciada a sua morte; existe uma tentativa do poder público em
�uliln1Êr:!tá-la: por que neste_!!!_omento Lçs�movímento tà,g JigQ,[95.�
principalmente na AMP, d.� coloc._.!r,_�ªn�li�t?_füLCe���l!�caJ i
�� : M u.. '(e;:) til�. ��" c<:i J e v Ç;A_)J.A'"I. \.l'\ , �
Participante V (). r)J rf 0,'-)-/,,1-pv, �
f-..1 W. '-'À�· v tJ.) t\. \� ,
�/ 1)\) • rl.Ag-u'N � � .;.,, "" 9 · CiJ � UX, � ! •'YI V
A minha pergunta é sobre o conceito �c,/Jtico. Entendi, a partir
da sua outra conferência "O analista e o político", que somente é
possíYell �aJjzar o político na própria _experiência analíti.ci Como
(
pensar então a relação entre psicanálise e política, ou entre a psicanálise
e o político. Haveriam doi!i conc.eiJQs <:lis!in_tQs d�!i-��-P-Olí!_i_�o?

S3
Carlos Augusto Nicéas
A minha questão diz respeito à conseqüência a ser tirada do debate,
da solução proposta pelo analista com relaçã� à singularidade e 11?º às
soluções universais. Isso, estando claro, eu me lembrei do Seminário 1 1 de
Lacan, em que ele já se contrapunha ao que chamava de "soma dos
preconceitos do analista", ou seja, o sistema do ego do analista, e isso
podendo oferecer uma resistência ao processo de análise, ou seja, alcançar,
conseqüentemente, uma solução singular para o sujeito. Ora, me parece
que nos tempos atuais, diante dos fatos da pó/is, há um equívoco com o
�I nos defrontamos muitas vezes. Em nome do analista, no seu trabalho
de dirigir tratamentos, não poder fazer uso dos próprios preconceitos, ou
seja, é desejado que esse sistema egóico do analista tenda ao mínimo a
partir de sua análise pessoal; �quívoco é�em_ n_ome do anali�� -�r vi�o
como alguém gue_.___nessa direção do tratamento, não possa fazer valer os
�us preconç�itos�l�tas yezes confunde, me parece.i a posição dele
I,!ª cidade como alguém que devesse estar do lado das _regulamenta���
das normas, ditas normas liberadoras ets;, Isso, para mim, não quer dizer
que o analista não tenha uma posição política enquanto cidadão, mas eu
\ fico me perguntando se ele não deve, não só n_a_di�ão dos ��e_nt()§,
obedecer à questão de- singularidade,
- ,m
ser orientado por isso, mas
\_!$em.unhar sobre o que esses sujeitos segregado�dizeQ_t..,Mm iil um nas �
1
próprias análises\Eu pergunto aqui a Marie-Hélene Brousse, como ela vê
\ o testemunho dessas soluções de._��. feitas pelo �nalista na
pólis, na cidade? Isso persistindo para além das curas que ele dirige.

Participante
Eu gostaria de pedir um comentário sobre a questão do que
pode
ser a democracia na época da ciê�ia, considerando a possibilidade da
'7 democracia e os _r_g,rnentantes do discurs� do_mestre, con:i_o a ciênc�a
,) 1 e o c�_p_i!_a_lismq,2�rukLpa.res_ �m - Qp9sição
_
., Então, se tomarmos a

d . -ét���cracia como possibilidade da diferença, eu poderia me arriscar a


dizer que o sujeito da psicanálise é o sujeito da democracia?

54
Manc-H:l�c Brous!iC'

Maric-Hélene Brousse
E u agradeço às perguntas, que são muito interessantes.
A primeira: se a mudança do regime de gozo produzida pela
psi canálise teria alguma relação com os movimentos de militância.
Essa questão me lembra duas idéias. É provável que, mesmo que a
psicanálise seja um discurso específico;�la não está só, ela não é única em
n---------
ossa cn.ilização que se orienta da fo�a com....2.._o faz. Provavelmente,
--

apesar das diferenças de campo, já que o nosso campo é especificamente


o campo do inconsciente, podemQS�()!_ que outras orien�ções _ de
di��o tenham recebido ecos � v_ i�o_ da_pficanálise. Além disso, ,
acredito que wicanálise tenha E!9(iuzido efeitos muito impo[tWtes na
subjeti,idade de nossa época, refµ;o,.me.ao.teatr�.f.O!ltemporâneo.©, meu
ver nos moyimentos artísticos encontramos .um disc_w:so que deseDYolY.c_a

-----
mesma lógica da psicanálise. ' Por exemplo, um dramaturgo muito
-· - --··-' �- -

conhecido na Europa, Edward Bond, inglês, cujas peças são apresentadas


na França com muita freqüência. Em sua dramaturgia, traz as mesmas
questões feitas anteriormente neste contexto, com relação à época e ao
sujeito.\.,E_ntão, �- o!?_ras_d!_!!.rte e l'!_OS artistas, encontraríamos caminhos
c�mv�rgen!es c�m o _da psicanálise.! E, aliás, em relação a isso, relembro o
que Lacan disse a respeito de Marguerite Duras como artista, citando
livremente: o artista precede o analista, e que M�rite Duras o p_recede,
a eJe L3:can, em vários pontos. Qiz isSQ.pQr razões diferentes da polidez,
uma vez que os analistas não são muito polidos. \
Introduzindo a questão da política lacaniana, devemos ser muito
exigentes, correndo o risco mesmo de sermos pretensiosos, eu diria
que � a política da psicanálise . \Qs analistas não têm lições a dar aos
cidadãos '()u melhoL não há nada que os autorizaria a ter uma opinião
4 l .ID8'> esclacecida que a dos ecoooroisras, dos políticos, dos cidadãos de
J•m modo sra! , Por outro lado, enquanto analistas eles tê��c uma , .
gsilítica da psicanálise. Em primeiro lugar,_ ele�c!_e�em tomar partido,
têm de se engajar e, em segundo.Jazer com gue a psicanálise se�
eossível, e continue sendo. Isso obriga os analistas a se questionarem

ss
sobre a orianização da sociedade. E xistem m odos � e organização
�od al que imp eQ em q ue a�icaná li�e exista, e até a proíbem. Portanto,
a p artir de uma política da psicanálise, o analista pode ser levado a
analisar a política, a vida públ ica de um m odo geral. Mas m e p arece
� que ��a t:ire� fündamentªI é a de elaborar uma política para a
1 psicaná lise, a partir dos seu�_pr�2_ri os fundam entos.
A escolha do tema Q iacanscience é a política deve -se ao fato de,
saberm os q ue estamo s m udando de época, p ortanto, devemos nos
p erguntar: no.9 ue está por vir, ainda bavern lugar para a psicaná lise?,
Lacan rep etiu vári as vezes, m as é algo que sup ostam ente
deveri amos saber: a psicanálise nem sempre exi stiu. Ela tem uma data de
nascim ento, portanto é urn a formação h umana q ue exige condições sócio­
econômicas prgpícias para sua çzcistência, é um produto da civiliz.ação. Se
houve um periodo em que ela não existiu, h averá o mo!Jlento de_ �µ
desaparecimento _ e _cabe aos analistas se preocw,ao;m �QP� gyando iss2
ocorrerá__:!_ E por\estannos num m om ento de m udança de éPQc� é-..$
..' · fundam ental �portância nos preocup armos com o futuro da__psicanálise,
C om r elação ao conceito de p olítica, já respondi ao falar da
resp onsabilidade do analista de elaborar um a p olítica própri a para a
p sicanálise, a p olítica da p sicaná lise, q ue é de nossa responsabilidade,
nos levará a nos interrogarmos so�re a p olít_iç_ª, s_gbr:e ª_ vida_púbU ca em
�ral,
- -- assim
- - como a economia, ---isto é, inscrever nossa- prática, nossa
clínica no con�exto @��E!l- ir_:1 a.--1
--- --- - ------- ------

Há provavelm ente duas definiçõ es de p olítica: a� líti_ca do nosso


_,, .
- c�� o e a .politi cª m ais glob�I.
Com re lação à questão sobre o efeito da posição do analista na pó/is
farei duas observações. A p osição do psicanalista na cidade é centra l. N ão
se trata de um a idéia m egalom aníaca. é o fato de que a nossa atividade de
analista nos conduz ª\����rmeados_ QOr uma_ in� i�� -���
qiferente� de �llj eitos que_n_ão � _!:�C(? n_tram em nenh!!_f!l 01:_1tro_!�g� a nà?
), ·
�er na sala_de�� Soc ialmente apresentam m odos de vida totalm ente
diferentes. já no consultório são escutados um após o outro. É por isso que

S6
eu digo que do analista é central na 'lis. É com o um
observatório, wn desfile dos modos de gozo e de vida.
Q uanto ao fato dos analistas e starem do lado das novas normas, me
p arece que eles têm muitas dificuldades em fazer isso.v\ psicanálise não
é wn abrigo, ao dizer isso Lacan criticava aos analistas da IPA. Já em
relação à comunidade lacaniana cabe a cri tica de�e há entre nós muitos
analistas gue são saudosjstas Escandaliz.am- se com os modos de
1
���ução_�istida; �gusti�-se. lte>rroti��. c9m i; os novos pais
homoss_�Xll.ai� e ingyietam-se em____§sç. aos. . desenvolvimentos de �
to1ªlmente novas) Devemos nos esforçar para não considerar como
mel hores os modos de gozo antigos. Sea disciplina familiar não mais e,çist�
'\"

não q�er dizer que quando existia encontrávamos no paraíso. Os analistas


�-�Q mais habilitados �.saber 9..l.!� ª_farniliª-��t<>gênjÇ!l. Aliás._ nã.o
existe wna família igual à outra! É importante que nós lutemos para não
ocupar e ssa posição reacionária e saudosista em relação às:n� -�9�
Com rela ção _à questão do ana lista test emunhar soluções
singulares pªra cadª -ªnalisante e não soluções universais, podemos /. .
-
dizer que foi exatamente J>ara responder a essa . questão que Lacan \5/
in ve ntou o dispositivo d. �asse , ou stjL _<J.ual é_ a sQ! uç ão sjngu lar que
voc_ê enco ntro�sua. . aná lise?J Você pode transmiti-la?,Por isso não
há p sica nálise _ aelica d!' a o ca mpo do social que não este ja
- -, z:::.

intri��ca� ente_ relacion_ªcpl à psica nálise .fill!:J


A questão da democracia na época da ciência me inte ressa - e a
mane ira com o você a formulou é ade quada. O sujrito da democrac_ia}
��-r�a_ o_suieJ.10 da an� l_ts�? É u ma que stão, logo não te nho a resposta. É ):
uma que stão que a inda se encontra em seu iní cio. Talvez, dentro de
alguns anos, podere mos comparar nossas re spostas, a s suas, as minha s y
e a de ou tras pe� soas de nossa corn uni�a de.
.f-.Ú-- · )··) f r . r, ,. ,1-f!:T • C ' \ � p - 4 . Ó C, q- . _ Q, " 1> ,',' ".e (_
Nota R.-
V�.... C\l,,11\ J. �- - � ' \ .._1 �
-- ,./

� - <i, - 'SJ
' LACAN, J. O Seminári4 Livro /: Os escritos técnicos de Freud; Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, l 98�
3ª CONFE�CIA 28/11/2002
-- Carmen Si/,·ia Cen-el3tti

E ste Sem inário I nternacional é com posto por três c onferências,


que podem ser tomadas isoladame nte ou e nlaçadas a três. Por e ssa
razão, quero tomar prese nte s algum as das articulaçõe s de M arie­
Hélê ne Brousse em suas conferências anteàores
M arie-Héle ne Brousse e nfa tizou a frase de L acan utilizada no
título de sua prime ira conferência: "Que ante s renuncie a isso (à prática
do analista) , portanto, quem não conseguir alcançar em seu h oriz onte
a subjetiv idade de sua époça". O analista deve ."fazer de se ursêa o e i.x.9
de ta ntas Xi�" . Essas vidas, por sua vez, são tomadas na dialétic a de
ym maviroento simbólico , nome que L acan dá ao que F re ud
de nom inou civ ilização.\
ImersQ_f!.Q� aspe ctos éticos da psicanállse e na es piral de sua
época, o que o analista df:_ve saber? Decifrarl? O utro, de cifrar e sse !.
rrrgyif!le nto simbólic_&.d.! tjyilizaçào, p_erl'Jl�ª® .P� la_ ling uag�m .
Para tratar de sta que stão ''Que é um analista?''. também na
prime ira conferência, M arie-Hé le ne Brousse re tom ou L acan fa la ndo
de Freud: o analista é um h omem de de se jo, desejg e���� _ �
l!� iç1,1_)_ad<\!o insupon.ª-vel de cfilla um�-�-ª� v_i��S_J!l!_e têm seu e ix o no
_ ser do analista. Um desejo que não deve recuar fre nte ao i_!l supon áve l!..

61
O 1ncon54·1�ncc i a polít":'

ao horror. o horror nada mais é do que o humano. e analista�


responder com o _ato _ao vazi� ce11tr,I, po horror e não segregá-lo, como
p!_o�e� civilização,
Na segu11da conferência, A psicanálise no --tempo dos "mercados
- - - -
- -- -- - -- - - -- -- - - -
com tJ_l]S e_q<Js proces�os de segreg_��<i.', Marie-Hélene Brousse tomou
como centro de suas articulações a "Proposição de 9 de outubro de
1 967 sobre o psicanalista da Escola", texto no qual Lacan delimitou
nossos horizontes através de três pontos de fuga\Os pontos de fuga dão
as coordenadas para caracterizar a época em gue se está;... portanto, são
pontos que determinam a psicanálise e estabelecem o horizonte da
prática analítica.
fo pri111çgfLp.9J!t.2._g_e fuga} é proporcionado pela clinica
psicanalítica e é da. ordem do Sjmbólico: o Edipo não é solução. O
Édipo tomou-se inadequado, já dizia Lacan em seu primeiro ensino, e
Marie-Hélene Brousse reviu o que fez Lacan reler e reinterpretar o
��ipo freud!ano_em� me!ª-[ora__pate_rn.--ªe com�o Nome-do-Pai. Nesse
texto de 1�, Lacan afinnou\Q�os�os d�l��i� demonstr�,1!1
-
que o_ Édipo tomou-se um prºblemaJ O gªi não mais equivalia à
� --- - - - -
condição de go�.?· esse foi � de��jo �e Freud e serviu naquela épocll.
@_o_J>_Qdemos m;i.i!i l!...tri_buir --ª�l�ssa função d� �ignificante-mestre,
o significante não tem mais função reguladora,1 ele não _orienta, não
�i(!lit! o �o�Não é mais esse o real que a experiência analítica impõe.
- -
\Ó a i está �e arado do ozo · a é oca do além-do-Édi o.
üsegundo ponto de fu diz respeito à transmissão do saber
analítico. É da ordem do Imaginário . Ao criticar a IPA e\.ls identificações
,,;,;,:.:��e���IIII" Lacan propôs em seu lugarijí Escola{ que articula,,,-:
além-do- i 'A Escola é um local que não �
organizag9,1pelo_sigqificao1e-roesru. A Escola é solução.
; -- \ O terceiro ponto·de -ruga · é da ordem do Real. Os campos de
; concentração produzem/mundos earalelos�s grupos de segregação.
Atualfl!ente, a se��g�çª-°- � �n:iodaJ !d�de _E_� g�:2-� dc:,f1!inante 1 é a
-
5ioluçio pa 11J o gozo.

,; {,a ;.Z[ V"Y°'..Q � � r../o µ�. 62


Lacan amarrou, borromeanamente, a modernidade com esses três
pontos de fuga.
Marie-Hélene Brousse propôs uma nova maneira de escrever o
Discurso do Mestre. é o Discurso do Mestre moderno, pós Nome-do-J>aj.

/1' C. p
globalização -+ procedimento ' ... , , , '"'
• r,J.-,pÍJ/.,. 0 ,._d.f .::-
. j/';·fi'v'. .,.,.,;:-, �·'C. .,- - redes
1
campos de

-·t,1__ ( ..;.,
concentração _.:,:, . ..- .

No lugar de S 1 , que ocupa no discurso do mestre o lugar de agente,


ela colocou a globalização, fazendo referência ao "mercado com_uJE"· Na
época atual, o ··mercado comum" é chamado de globalização.
Substituindo S2, no lugar do outro, ela propôs colocar os procedimentos.
São vários os locais que�"! aí ordenar o_goz9: no lugar da produção, do
objeto ela propôs campos de concentração, e no lu�ar da verdade, as
a,
redes. São redes flexíveis, moduláveis, por onde o domínió circula.
Mais recentemente, os mercados comuns tomaram-se uno, trata-se
de um mercado comum, é a globalização do mercado, ela nos disse. Os
manuais de procedimento das empresas e das instituições passaram a
or�enar o gozo, "juridificando-o". O gozo circula em redes flexíveis e
moduláveis.
Para concluir essa segunda conferência, recuperou Jacques-Alain
Miller, em seu curso -1 O lugar e o laço. Estamos numa época que não
é mais disciplinar, a fu_nção paterna não mais �isciplina_ o go_z-9.
Estamos numa época de arranjo, em que reina a não-relação. No lugar
da relação há � �quivalência das no!!!!_a,s, o que requer o Direito para
legislar essas equivalências.
A psicanálise. disse ela, está na hora certa. A psicanálise contribui
colocando no lugar do significante-mestre não o comum (do mercado
comum), não o universal, e sim o singular, é essa a nossa prática clínica.
Se o Édipo não é mais solução, se o Édipo nàQ está mais em

_c�coEl o surgimento da dialética _Q_o de�ej� no inconsciente

63
o ina,nsc,�n,� � ,1 roJitü:a

freudiano, !!__Psicanálise ainda é a solução, oferece soluções singulares


.., ao gozo�- ca<!! HCEJ
Finalmente, Marie-Hélene Brousse apresentou-nos um percurso
da psicanálise. Seu nascimento foi pontual e provocado pela
civilização. Desde o Édipo freudiano, a clínica veio se impor em além­
do-Édipo. Na época atual a psicanálise "ex-siste". E se nem sempre ela
existiu, poderá não mais existir.
Nessa conferência, a terceira e última, Marie-Hélene Brousse
falará sobre o futuro, o futuro da psicanálise. Para introduzir o tema,
recorto algumas frases de sua autoria: "É claro que há wn futuro para
a psicanálise [ ... ] basta abrir os olhos para o mundo contemporâneo,
[ ... ] é possível pensar porque há espaço para a solução e para a
invenção analíticas"2 •

Notas
' Como sugeriu Jacques Lacan em "Subversão do suj eito e dialética do desej o no
inconsciente freudiano", in Escritos-, Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1 998, p. 807.
' Entrevista de Marie-Hélene Brousse, Cana de São Paulo, boletim dB Escola
Brasileira de Psicanálise-São Paulo, ano 1 O. n º 1, março de 2003, p. 1 7.
• TERCEIRA CONFERÊNCIA 2811 1 /2002

O futuro da psicanálise
depende da "insistência do real"

� -- -- - -· -- - Marie-Hé/ene Brousse

Como calcul ar o fu turo a partir de uma dupl a referência, um


dupl o referencial? Poderí amos dizer que o fazemos ao ordenar as
coordenadas da época, tal como mencionamos anteriormente, sobre
uma abscissa, � sican!l ise pur�.
Vou novamente util izar-me do texto de Lacan de 1 947, "A
psiquiatria ingl esa e a guerra". Sel ecionei uma frase bel a, a partir da
qual podemos entender claramente o contexto da época da frase, mas
também podemos entendê-l a no contexto atual: "Em compensação, o
desenvol vimento que neste sécul o crescerá, dos meios de agir sobre o
psiquismo, ,uma manipulação combinada das imagens e paixões j á_
util izada_�O!Jl �uc�sso contra nosso jul gamento, nossa resol ução, no�� a
u nidad� _1�10_�1)1 darão ocasião para novos abusos do poder"'.
Gostaria de ressal tar vários pontos nessa fr ase. "Uma
manipul ação combinada das imagens e das paixões." Isso ainda é
muito mais verdadeiro hoje do que em 1 947. É uma defi n_i�o da mí��
e_.Q-ª!!i_ç_!..1l a!7!1_�!!�e__ �a tel evj sã.9. Escolhem- se as imagens, elas são
construídas e, eventualmente, são manipul adas, associadas ao manejo
das paixões, paixões de segurança. Por exempl o,_ na _frª-.1!&_ exist�
sempre o uso__q��- o _pplítico faz da angústia e do_ . � edo �� c, u! ro.

65
Portanto, a frase de Lacan nos permite dar luma d�füti,ção _q.uase atual
dos meios de ação sobre o psiquismo . Ele disse que isso já tinha sido
utilizado e com sucesso. Podemos dizer que a partir de 1 947, essa ação
continuou avançando em termos globais.
Miller, no curso ao qual me referi várias vezes, falando em Milão,
na Itália, destacava que o chefe de Estado italiano, Berlusconi, tinha
três redes de televisão. Portanto, ele havia se �nstit�íd_o _c�mo me�!fe
da manipulação das imagens � das _pai��s. Nesse contexto, Miller, ao
encerrar o colóquio Os psicanalistas na pó/is, concluiu dizendo que
não existe mais..A..QQ/is. HQje o�!�mos m_?_ is próximo do sentido de
ágora é uma ágora totalmente nova - a televisão.,
Dessa maneira podemos mais uma vez ressaltar o caráter
visionário de Lacan, em 1 94 7, quanto a esse ponto. �c�rl!r�i 4�r_uma
c!_efinição precisa aos três termos �v9cad()_s _I)_()!_ _Laca� _ p�ra falar do
e_siqui�!!lº· ��se='?siquismo é manipulado pelas imagens e pelas
paixões. E ele defineis�\'és �e_três termo_§,;
• julgamento
• resolução
• unidade moral
De uma maneira anacrônica buscarei definir esses três termos
bem tradicionais no campo do psiquismo.
O �e �gnifi�a o ju_lgam�nto e_!!l_!�rmo_� de psican_Mise 'ª�anjaJ}_aJ
�ropo_nho di��r_g_ll� <>j!!!gª_lll�n!9 $ _S 1 -S2 �E -º pensamento,Porém,
pensamento no sentido definido pela psicanálise, nós somos �11same__11to_

-�
e não, (!ensa-se.

julgamento -+ s, - S2 (pensamento)

O segundo termo é a resolução. nossa resolução:

resolução -+ Até

66
Mi1ne-HélCnC" 8rou.'iS('

I sso é, claramente, �rTlperativo ético: "n ão ceder � respeito do


seu desejo"J . A n ossa resolução é Até, termo grego utilizado por L acan
em seu com entário sobre Antígona, no próprio Seminário 7. N ossa
resolução é, portanto, o ponto a p artir do qual� nós cedeí]!IOS,_S_IJ_!" girá
a depressão. N a verdade não há m uitas leis em psicanálise, m as eu
considero essa com o uma das leis da clínica. E isto pode ser verificado
de m odo corriqueiro, pelo m enos na clínica das neuroses. quan�o o
s�J�ito cede c om relação ao seu desej o, ele se deprim e. Evidentemente,
e�j�em inúm eras razões para c eder em relação ao se� - �� sejo. Lacan se
refere a uma determinação política do poder sobre a resolução. Assim
com o Creonte tenta fazer Anti gona ceder, em 194 7 Lac an c ham a a
atenção para o fato de que estão tentan do fazer c om q�e nós
renunc iemos,'ic edamos com respeito a algo que não é n egociável.'. N ão
é negoc iável não porque não queiram os negociar, m as porque é
impossí vel negociarmos ta� nto.f
Finalm en te, temos a terceira resolução, - � unidade m oral,_ termo
Jurpreendente, porque coloca questão imediatamente sobre a divisão
do sujeito: unidade/divisão. � c�edito que, neste caso, Lacan não se
refir:!_� o_ ��- Então,\o que nos dá unidade m oral, se_� t�™---�
unidad_�orª11J
N o vocabulário psicanalític o p9 den:ios chamar a _!!!'tidade mQi:al
de c ast_��. portantol a/-q, , no lugar do m atern a do fal!_!��ma S
barrado pun_ç ão a (� O a). 1

a
-rp

C onsidero essa passagem no texto muito interessante, pois


,, introduz a q uestão a respeito do futuro,\ evidencian do o futuro das
manipulações sobre o psiguismoJ
\ P_roponho associar a perspectiva de futuro p arª a__p�icanálise à
tera_p_�ll!l c;J --- - - - -- - -· -:e_; .,;� J.I . •;,,�:. r,w-J,&'h : � - ! - -� .· 1
.
M,- -..;v, �J- o . .L '
67
,...,.��w t,Q'.,Q • �
A terapêutica e a psicanálise
Para concluir estas citações iniciais, eu gostaria de retomar uma
frase de Freud, do final do texto "O mal-estar na civilização".
Esta será a frase que eu vou manter em mente durante toda esta
apresentação. "As pessoas, em todos os tempos, deram o maior valor à
;éficâ\ como se esperassem que ela, de modo específico, produzisse
resultados especialmente importantes. De fato, ela trata de um_assunto
que pode �er facilmente i_clentificado _ como _ sendo� o ponto mais
dol_oros_Q__ _de _ ��.2 civilizaçãoJ �é!i_ç_a [moral] deve,_ j!Orta_!lto! ser
e:onsiderada como uma tentativa _terapêutica - co111<> um esforço por
alcançar, atra��s_ d� uma ordem do superego algo até agora não
conseguido por meio de qy_ªisquer outras atividades çultu_raj!i."•
Essa frase é especialmente interessante, porque ela traça uma
equivalência funcjonal entre_a_ moral e a tera_J!êutic�efinindo_os dois
como imperativo�d� sup�reu. O ponto de impacto da terapêutica e da
moral, por conseguinte, é identificado por Freud como lo ponkl m�i�
fraco de toda e Qualquer civili�aç!_o . �

moral = terapêutica

Se isso fosse um seminário, eu faria a pergunta a vocês:L9!1al é _o


l?onto fraco �� ivilização? Eu acho que para todos os que são
freudianos, e nós o somos,\o ponto mais fraco de_lodA_gyilização é a
pulsão de morteiO que most!._a_ �e a pulsão de morte é o alvo da moral
�a terapêutica. Trata-se de domá-la, clç_inibj-1ª,__de contrJ>lá-lª·
� Em gue p�nto _l].g� e�coI1tramos hoje.? 'li_tória tº1a,1 da tera.iêutica,
A terapêutica está em todo lugar e de todas as formas. �o ��11ªs s9�
a forma de psicoterapia, mas também sob a forma de terapia médica_._
Portanto�ós estamo� numa soci;,<J9di;..5l.9s cuidadps QJ�dicos, dos
![atamentos da dor de existir.l
Vou dar um exemplo concreto. Não deve ser igual aqui no Brasil,
e certamente não deve ser igual em todas as classes sociais. De

68
�1:ariC'·•lélcnC' Brous!I.C'

qualquer fonna, na França, quando alguém es_!á de luto, quando perde


umaye�s�(l!.l�riil a, de uma maneira bastan�sistt!mática os médicos
prop_õ�m_ o U!i_O de antidepressivo:
Vou relatar o exemplo de uma paciente cujo irmão estava em
tratamento médico, pois tinha sido submetido a um transplante de rim,
dez anos antes, e a saúde dele estava alterada novamente. Não
conseguindo mais trabalhar, estava numa dependência total dos
tratamentos. Por outro lado, ele aceitava a situação e a psicóloga do
serviço hospitalar que o atendia - foi a minha paciente que me relatou
isso - dizia a ela: "eu acho que seu irmão está um pouco deprimido
atualmente". Bom, esse senhor está à beira da morte, sabe que vai perder
a esposa, os filhos, a vida, e "está um pouquinho deprimido··. Se ele não
estivesse deprimido, diríamos que ele estaria em mania. Em - suma,
- trata-
-

se de dar_um noll!_e terapeutg_ável ao que Lacan ch�ou de dor de existir.


Temos, então, conseqüentemente, a vitória da terapêutica, quando
os cuidados médicos vêm ocupar também o que anteriormente era de
responsabilidade_º1l_ relig.iful__ou a_mé�dos _ disciplinares,, A
terapêutica persegue os mesmos objetivos, descritos por Freud, isto é,
reduzir o ponto mais frágil da civilizaçãQj
Para nós, psicanalistas, o problema está no fato de que, como
observou Éric Laurent, recentemente, em Paris,\! ps�can�lise se fez f.
aceitar i:1ª civ���ção, entrando pela_pgrta do teraQ_êu_tjco. Jacques-Alain
Miller, em seu curso no ano de 2002, destaca que certamente a psicanálise
se distinguiu do medicina! em sua origem, mas, de qualquer forma. se
apresentou como sendo da ordem do terapêutico. Então, podemos dizer
que a psicanálise entrou na civilização surfando na onda do terapêutico.
Aliás�la alimentou todas as psicote1EQiª5,i_�� se prolifrnu:am desde
� E mesmo quando elas pretendem ser antipsicanalíticas. ou seja,
não ser da ordem da linguagem,\ elas não podem ser pen_sadas sem a
lin�gem, ou melhor, sem a transferência. Mesmo as terapias mais !_ ·
�<>&!!_itivistas, a partir do momento em que instalam uma relação clín i ca
com o paciente, operam através da transferência.

69
/ __ "\. _ _ _ r · ·- - - -
Da mesma forma, contrariamente ao que poderíamos acreditar, o
desenvolvimento da ciência no campo da terapêutica não enfraqueceu
o desenvolvimento das terapias do psiquismoXonstitui-se, então, uma
aliança entreJ, produto da ciência aplicada à saúde mental e as técnicas
psicoterapêuticas,\seguindo-se os objetivos do eu e do supereu./
Em suma, o sucesso da terapêutica étuma aliança sagrada entre a
ciência e a religião, ou entre a ciência e a moral. E é por isso que se coloca
o problema çl9 futuro da psicanálise, que não é nem de uma ordem, nem
de outra. Ou seja,�ão é uma ciência, nem tampouco uma religião, e fica
além da morall Então, qual é o futuro para a psicanálise?
Lacan_procu_r�u_a Lf!es-mé dicalization da psicanálise. Freud já
pensava nisso. Por exemplo, ele diz: "em psicanálise a tera�!!H�_a não
p�_e_ matar a_ciên_�·. uma vez que Freud acreditava que a psicanálise
era uma ciência. Ou então, a fórmula de Lacan:, a cura acgntece por
--=-� Lacan vai--- além:
acréscimo.
�-- - -- -a _partir do final dos anos 60, ele a atrai
totalmente para_�ra �O C!m_RQ__cia t�raw
Como já disse, oào _é_ p_rop_i.çio_.à_psicanálise colocar-se em abrigo;
portanto, não �_e_ria _eficaz_t��tar se _E_roteger contra a onda _ do
t�_í!Pªll_tico. Simplesmente, prefiro dizer que o futuro da psicanálise
não es__!_á colado ao futl.!ro da terapêutica. '.

A psicsuá)ise e a ciência
Para melhor considerar o futuro da psicanálise, será preciso voltar
ao Seminário 1 7, 10 avesso da psicanálise. no qual Lacan afirma que a
psicanálise é um discurso./
Em primeiro lugar, ela é da ordem da estrutura da linguagem, na
medida em que �gem determina as mQ<ialidages dos l�ços soçiª-1_s.
Mas, tprincipalmente, e contrariamente à ciência, ela tem relação com o
gozo.\Diferencia-se da ciência, e particularmente da ciência aplicada (a
química aplicada à saúde mental): a p�icanfilise e a psicoterapia.
Vejamos as semelhanças e as diferenças sempre dentro do objetivo
de precisar qual é o futuro da psicanálise - pois, como sabem, o futuro

70
d_� iência ��tá_garantido e estQI! te!'ltando convencê-los de que o fu turo
da psicanális e também. E ntre a psicanálise e a psicoterapia ex iste uma
primeira relação: ambas são djscursos/ Relaciono a psicanálise à ;J
formalização do discurso do analista, e a psicoterapia, como já puderam
perceber, eu relacion_o ao disc;ucsa do mestre. � p sicot�r�p� � !.
diferencia da ciência n_a medida em cr_ue �. ciê(!� ia _!! ão é cli�_curso.
O ponto de convergência entre a ciência e a psicanálise poderia
ser o de que � são saberes sobre o real. A ciência, todos
concordam. trata-se de um saber sobre a matéria e que depende da
matematiza ção da matéria, ou seja, reduz a matéria à escri ta. A
\psicanálisj utiliza exatamente o mesmo método, já que ela trabalh a a
linguagem como materialidade, dito de uma outra maneira, trabalha
com aquilo Q_ue há de real na linguagem. A materialidade do signo. o
som e a marca. A psicanálise, portanto, também depende da escrita.
A té poderíamos dizer que Lacan consagra esse parentesco entre a
ciência e a psicanálise em torno da escri ta, em pequenas letras, dizendo
que \g que pode determinar j ustamente o futuro da psicanális e é a
impossibilidade, para o suj eito fa lante, de escrever a relação sexuali,1
Pois bem, a escrita do real pela letra, se é possível p ara a ciência,
na psican álise está presente so b a forma_ .9.Q. impossh:el. Poderíamos
nos valer dos dois sentidos da palavra " letra" , em francês: lettres - as
letras no sentido matemático do termo, os maternas, que, como sabem,
são a própria orientação do ensino de Lacan -; �)ettre�- no. �ç_ntido
das "obras consagradas na literatura" . Ç om isso Lªcªll.Qô�e__comp arar
o _r�sultado de_!!�an�li-� eL a uma tirada espirituosa. um poema., O final
-�r-.�·- - - · - - " . • • - - - - - - - -- -·- - --- •

da análise\se encontra aí, entre o matern a e o poema/


O utro ponto em comum entre a ciência e a psicanálise é a
aplicação. \Entendemos que é a ps icanáljse apljçada que Laçan deseja

co locar no lugar da psicoterapia,\
Para colocar a psicanálise aplicada no lugar das psicoterapias,
fa z- se nece ssáriof atender à s exigências da civiliza�ão/ Já desenvolvi
anterior me nte que a aplicação do saber científico responde à s

71
exigências do mercado comum, da globalização. Em minha proposta
de interpretar o discurso do mestre segundo a fórmula na qual o
mercado comum vem ocupar o lugar do S 1 , no novo discurso do
mestre, a aplicação do saber científico responde também às exigências .' .
�-&O�, isto é, r�_spondeJlo . o�e.queoa a..
Portanto, a aplicação do saber científico às coisas humanas
atende a estes dois imperativos, -�er�ado comui'!!_-:: �.glQbali�_ -
e ao gozo. Isso implica,. um mínimo de suj��to. Como conseqüência, ..
encontramos, no campo da clínica, o_ t�atamento pela molécula. ,.--J

A psicoterapia e a psicanálise
O tema da aplicação da psicanálise à terapêutica será desenvolvido
um pouco mais adiante; neste contexto pretendo ainda retomar a relação
da psicoterapia c<;>m a psic�álise. No materna baseado em Saussure,

S (significante)
s (significado)

a psicanálise se interessa pelo significante, numa tentativa constante e


dificil de neutralizar o significado. Podemos dizer, por outro lado, que a
psicoterapia se interessa, essencialme�lo significado, se interessa -�
pelo sentido.// E nisto podemos reconhecer. neste interesse pelo
significado e pelo sentido, o que no inicio deste texto destaquei na frase
de Lacan: "ela se interessa pela manipulação combinada das imagens e
das paixões"'. Portanto, pela elaboração de um senso comum.lComo se
fala em mercado comuJ!1 existe também um senso comum.
\� psi�.Q�erapja �e dá por meio do desenvolvimerito e da prolife@ç�o
dos significados, ou seja, do sentidotTemos então a seguinte proposição:
a psicoterapia trata o real pela linguagem, trata o_real_�_s_entido.\
,se a psicanálise aplicada à te_@Qêl:)tic� t!�!á aplic�da_AJ�.rapêutica
é eorque trata algo, sabemos que a psicanálise tem efeitos terapêuticos,
que ela trata.

72
Então.\&ostaria de propor o seguinte: !ratar a linguagem e não por
meio da limruagem, pois,estamos doentes da linguagem . Em outras
palavras,\tratar a linguagem é tratar o império do SI e o gozo. �
Tratamento que se dá aohratar o simbóljço corno
semblante. Ou, em
outras palavras, curar-se da linguagem gelo sintoma.
Corno podemos esclarecer wn pouco mais o futuro da psicanálise?
Se houver um futuro para a psicanálise, não será nem o da ciência
e nem o da psicoterapia. É necessário que ela encontre o seu lugar,
sabendo que as suas duas melhores amigas_são a ciência e a
psicote!apia ( considerando melhor -ª-m�ç_omQ_!.��-ª--stue to_!lla tudo:<i
o que nos pertence). A psicanálise não conseguirá nunca se livrar delas,
portanto, deverá levá-las em consideração.
Então qual é o futuro da psicanálise?

O futuro da psicanálise e a "insistência do real"


Lacan se refere a isso nwna conferência proferida em Roma, cujo
título é "A terceira''(,, pois era a terceira vez que ele se apresentava lá. É wn
�exto bastante dificil, mas extraordinário. Vou reswnir quase literalmente o
raciocínio de Lacan, pois dele retirarei algwnas conclusões.
Lacan estava prestes a demonstrar que o sintoma provém do real.
Ou seja,\o sujeito responde �s incidências do real atravé, do s�!:ltoma.
Lacan diz: "Chamo sintoma àquilo que vem do real. Isso significa que
se apresenta como um peixinho cuja boca voraz se fecha se lhe enche
de sentido. Então, das duas uma: ou o faz proliferar [ ... ] ou explode"'.
O sintoma tenta se alimentar do sentido, mas para o analista e para a
psicanálise, o sentido do filntoma é o próprio real. Quando o analisante
chega e apresenta o sintoma ao analista,\tem-se um índice dQ._te.al ÇO[ll
o gual ele lida. Portanto, para a psicanálise "o sentido do sintomªJ..2
real , o reaJ enquanto se çoJoca como obstáculo para impedir que as
coisas andem, q�ndeOlJl!l_s.entidtt.de . .daLCQDt� c;le �i _!IlesmasAe
maneira satisfatória, ��litj°atória ê2 m_enp§__pa_rn ,Q. m,e����e"8 • Este é um
dado clínico básico. O__J!!!!oma impe�suiei.tf>�-r.��nder como

73
Concl uindo, o futuro da psicanálise, me parece, depende de uma
c apacidade de imple mentar e ssa nova al iança do real c om o se mbl ante e
de mostrar que ,o gozo como tal só exi ste ao fa/asser' 2 • Nossa c ivilização
é atualmente caracteriza� pela passagem ao ato e também pelo acting-out
Nel a, a meu ver, a psicanálise tem a função de apresentar-se c omo uma
prática do ato. Um ato consiste e m colocar-se, o próprio ato, de acordo
c om o texto e também em c ol ocar o sentido c onforme o texto.

Notas
' Lacan, J. "A psiquiatria inglesa e a guerra", in A querela dos diagnósticos-, Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1 989, p. 25.
' Miller, J.-A. "lntuitions milanaises ( 1 ]", in Menta/ - Revue lntemationale de Santé
Menta/e e Psychanalyse Appliquée, n º / /, décembre 2002, pp. 9-2 1 .
' Cf. Lacan, J. O Seminário - Livro 7: A ética ela psicanálise-, Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Ed., 1 988.
' Freud, S. "O mal-estar na civilização" ( 1 929); Edição Standard Brasileira das Obras
Completas de Sigmund Freud, Vol. XXI ( 1 927- 1 93 1 ); Rio de Janeiro: Imago Ed.,
1 974, p. 1 67.
' Op. cit. "A psiquiatria inglesa e a guerra", p. 25.
• Lacan, J. "A terceira", conferência pronunciada em 1 974 em Roma, publicada em
Lemes de la École lreudienne nº / 6, "La troisiême"; Paris, pp. 1 78-203 e em Jacques
Lacan - lntervenciones y textos 2, '1..a tcrcera"; Buenos Aires: Ed. Manantial, 1 988,
pp. 73- 1 08.
' NR: Para a tradução dos trechos do texto "A terceira" foram utilizados os textos em
francês (p. 1 85) e em espanhol (p. 84).
• Idem.
• Idem, p. 1 86 (em francês) e p. 85 (em espanhol).
'" Idem, p. 1 87 (em francês) e p. 87 (em espanhol).
" Op. cit. "A psiquiatria inglesa e a guerra", p. 25.
,: A palavra. fa/asser é a tradução de parlêtre, utilizada por Lacan.

76
Debate

Carlos Augusto Sicéas

Para este debate, trouxe notas breví ssim as que se transformaram


em hiper-b reví ssim as, porque um texto que Marie-Hélene Brous se
indic ou, entre outros, c omo referênc ia bibliog ráfic a, "A terc eira", foi o
texto que esc olhi para m e servir de introdução ao debate.
Ora, eu n ão repetirei a seqüênc ia de afirmaçõ es que extrai do
texto de Lac an, pois Mari e-Hélene Brousse ac ab ou de fa zê -lo,
articulando- as de uma m aneira extremam ente fina.
Duas pontuações feitas por Marie-Hélene Brousse na c onferê nc ia
anterior já se art ic ulavam à s c onsideraçõ es tra zidas por ela sob re '·A
terc eira" de Lac an. A prim eira delas refere- se à i,"si�anáT ise'. ao ins ist ir
em dizer que esta não_p oderia ser um abrig o para a c iênc i?, pois s e ela
o fosse, desaparec eria c om o c li nic a. Em term os de fu turo da
psic análise, isso m e parec eu importante, porque o que pude ret irar
dessa afirmação foi a exig ênc ia de que tentar fazer existir a psic aná lis e
no mundo parec e equivaler a vê-la so�reviver somente na m edida_em
qu� ela permanec er c om o c lí nic a. !
Um a seg unda pontuação é uma reformulação contemporâ nea do
disc urso do m estre, no q ual se pode ler, no lugar de agente. os
m ercados c om uns. Isso impõe repensar uma orientação para o des ejo

77
O mconJCumtr e • politi&.'a

do analista confrontado com essa nova fórmula do discurso do mestre.


O que seria, parece, uma orientação que não o faz engajar-se no que é
comum, mas, ao contrário, que o põe a trabalhar, onde ele estiver, seja
no consultório ou fora dele�ip.<> i11§trumento eficaz d� possibiUdade
qe aparecimento de soluções singulares_<l_o_ �ujeitº_'.J
Essas duas pontuações me fizeram voltar para o texto "A terceira"
em que, justamente, Lacan retoma a questão do discurso do mestre.
Vou me permitir repetir, entre as afirmações de Lacan já citadas pela
palestrante nessa conferência, aquela que diz respeito ao�qi�-��-º-�º
mestr�_:__"seu fim é__o_ c;k_que as coisas entrem no mesl!lo�ompa�s() de
todo o mundçt - e ele acrescenta, como Marie-Hélene Brousse
sublinhou,\que isso não vale I?_ara o real, _p_o�que J �s�ame11_te o real é o
_
�e_ i:iã� _ cessa de con�orrer para e �tra�a�_essa_ C3l_!!1JnÊ_a��- Por
=--1 conseguinte�o real ne� �__2 ffi-UQgQ e nem c�_µpiv��_ru, r
De qualquer maneira, gostaria de me situar diante dessa questão
de o real permanecer como a referência para a ação do analista,
expondo uma dificuldade particular minha, desejoso de melhor
aprender sobre ela�Como podemos nos !e!'JXiil!ª�- �-e uma maneira
mais rigoros�d_o_f�to de �� psic��ljse J�nll�_a v_er e li_fazer com o
real? Para mim é ainda muito dificil aprender isso nos textos, aprender
como se pode transmitir que a palavra do analista consegue orientar as
análises na direção do real, pode ser uma palavra, a do analista, que
funcione nessa perspectiva de ter como referência o não sentido. O fato
é esse, mas não é tão simples dizer como isso se dá, até porque é
complicado dizer algo sobre uma experiência na qual, quando se a
vive, �da ve_z q_ue a gente !!_bre a !,oca já está no registro d_o sentido.
Essa dificuldade de entendimento não impede o analista de se exigir
sustentar uma direção de tratamento orientada para o real, mas tenho
dificuldades de precisar exatamente a natureza, de dizer
inequivocadamente qu_�lav� produt<>ra-�e ato �eria es�!, em_ termos
de ma!erialidade da intervenção do analista,
Interessou-me ainda, como Marie-Hélene Brousse a precisou,

78
,1.uic-H\!'l('nc eruu..sc

voltando ao ano de 1 974. que é o ano da conferência de Lacan. a


questão da religião. Interessou-me não só o Lacan profético como o
Lacan até pessimista, falando da possib_ilida�_ c!_o cl��aparecimento da
psicanál_ise e �o_��torno _<!_<!_ v�rdadeira relig_i ão.
Eu poderia. nessa perspectiva, trazer à nossa lembrança a mesma
preocupação de Lacan, alguma coisa presente outra vez num texto
posterior ao "A terceira", tudo o que compõe o chamado "Lettre de
dissolution" 1 • Da mesma forma que em 1 974, em 1 980 Lacan alerta\'a
novamente os analistas para o retomo da religião, no momento da
dissolução de sua Escola, denunciando então, no interior da formação
em casta dos analistas de Escola que "não estiveram à altura", o
retomo possí\'el do sentido religioso na vida e na organização da
instituição psicanalítica. Por isso, naquele momento ele voltou ao que
já dissera antes. no "A terceira": "�-e_stabilidade da religião vem do
fato de_gue_ o sentido é sempre religioso. Saibam_ qu� e�t� se�
!:.€:!igioso vai_ fazer um bQQ111 d9 . qµ�I vo_cê!>_ nã(? têm a menor idéia.
P-ºI� a religião é a morada original _do sentido".2
Por esse ato da dissolução, Lacan pretendeu justamente, ir contra
o sentido do religioso . Ele próprio diz: dissolver "para que a
psicanálise não seja uma religião . . ." e continua: " ... COI!IO ela tende,
iJr.� istiv�)_rnente. a ser, desde que a gente imagine que a in�rpretaçã9
sôop_e�ª--�ºITl o senti do''. '}
Termino aqui minha intervenção. Penso que, com este seminário.
que se debruça sobre a afirmação de Lacan de que "o inconsciente é a
política", nosso engajamento atual de tratar o real em nossa prática da
psicanálise aplicada à terapêutica pareça se inscrever, na orientação
lacaniana, como uma política, como a política, a mais atual da
psicanálise. Responder. �ntã_Q. pela p�icanálise_r::iª_atuaJidade. nas
instituições, onde mais�_Qde sofrer desilusões, é a definição de
nossa política. Mais do que isso, mais do que uma definição de uma
política da psicanálise, mas por meio da orientação que ela lhes possa
imprimir. Na realidade, uma luta já engajada. Jacques-Alain Miller.

79
O incons.c1t:"nr� i a politica

por exemplo, no testamento, como ele chamou, de saída das funções de


Delegado Geral da Associação Mundial de Psicanálise, não hesitando
em nos apontar Q__!_�r:n?n1J_ q1:1� ocupa11_1os eil! comum com o adversário,

ou seja, com as psicoterapias, chega a �om�ar o nosso campeão na

competição,l�ª!!lPe��l�-c hama de psicanálise aplicada. Aplicada à
terapêutic!:] Uma luta já engajada. Um outro exemplo ainda desse
engajamento é o seu texto, Marie-Hélene Brousse, intitulado: "4 menos
l "', no qual você chama a psicanálise aplicada de máquina de guerra,
descrevendo as duas partes do escrito assim: numa primeira parte, você
trata a psicanálise aplicada com..9 µma má@i!.1_a de �erra e, noutra parte,
se posiciona contra a dissolução mesma da psicanálise. Um texto que se
concl�i, sobretudo, por uma idéia que para você é quase uma palavra de
ordem: criar até instituições outras para aplicar a psicanálise..
Na conferência anterior, alguém se pergunta\"a pela militância do
analista. Como não ler, em textos como esse, o boom atual da
psicanálise?'\Não parece que, atualmente, enquanto psicanalistas
"aplicados", estamos justamente ind� lá, onde o real insiste? Então,
descontando ou subtraindo a ironia de Lacan, certamente a psicanálise
terá boas chances de permanecer um sintoma, de crescer e de se
multiplicar, agora que <fuQQrno� 11té de __Il}_á_quinas _g� guerra
"�r:�.Y���nas" co!.1_ti�!Jando a orientar a_m_icanálise gara c, reª1,

Notas
' Lacan, J. "Lettre de dissolution", in Autres écrits, Paris: Éditions du Seuil, 200 1 .
' Idem, p . 3 1 8.
' Ibidem.
' Brousse, M.-H. "4 moins I ", in La Jettre mensuelle nº 2 I I. septembre 2002, p. 2-5.

Marie-Hélene Brousse
Fiquei muito sensibilizada com a forma autêntica como você se
referiu a essa questão fundamental, que é a questão do real.
Nós, psicanalistas lacanianos, temos a tendência de falar do real
como repetição e fazer disso um mistério, para nada dizer. Seria uma

80
espécie de curinga quando encontramos dificuldades em articular,
então é a hora de usar o curinga, o real. Portanto, agradeço-lhe a
pergunta, a qual exige de mim uma maior clareza e me permite falar
mais um pouco sobre o real.
O real tem que ver com a escrita, e Galil(llijá__ dizia: "o livIJ>_.!!Q
JJlundo �stá escrito em linguagem ma_groªti_ça.''.... Nós preferi.!Jlos _d_i�e_!
q!:!� a ciência escreve _o Jivro do mundQ n_uf1!a li_I!fillªgem m�el!!áticª.
Portanto, para a ciência, o real tem o seu campo traçado pelo campo da
escrita, em que o real é o que ainda não pode ser escrito. À medida que
a_ ciência progride e�ua escrita, o real, enquanto aquilo que ainda não .
está escrito. recua.
Para a religião, desde sempre, tudo já foi escrito e, em particular,
a religião mulçumana levou isso até o extremo. E se está escrito,
portanto, não há problema.
A ciência por sua vez tenta escrever o que ainda não está escrito,
i;>essa manei� � ciência faz�
conseqüentemente escreve-se cada vez mais.
��-Q campo do real frent� aquilo qye ainda é impossível de ser escrito. _
Na psicanálise também estamos no campo da escrita. No campo
da escrita e de uma decifração, pois temos que escrever um texto.
Lacan falou de uma forma ma��L.nos Estados Unid.os, dirigi!}�o-�e
a um público q�e não _estava familiarizado com s.eu �nsamentoL�ele
disse: po�e p_ areçer.I!M.C!QQx_ªl�ud�sicanális�
é_ uma q.uestão de escrita (!Qr mais -��nsemos tratar-se de uma _
1
questão de fala ,

O campo do real na psicanálise é o campo da sexualidade. É o sexo


o impossível de se escrever. E vocês conhecem a _t�� de �can��q�� �
impossível de ser e.scrito é a relação, é a relação sexual. �é nest� p_onto que
- - - - - - - --
--------
existe uma perseverança do real.. Não- - é que o sexo seja impossível-
-- - -- ---
de
. \� �
es�rever de- um modo geral, mas é impossível de escrever no campo do ser
- . - -. - -- -- - - - -
falante.vNa biologia, na sociologia e mesmo na antropologia, ele está
perfeitamente escrito, é possível se escrever algo a respeito das diferenças
entre os sexos, a respeito da variável sexo. É no campo do gozo que a_

81
O ,n,.:ons,:n:111� j a p.llitu:a

questão d,a relação sexual é impossív el de ser escrita, pelo menos até agora.
Portanto, para os psicanalistas e para os analisandos o real em
qu estão é o mesmo.\!: acan propõe o segu inte: se este real insistir, então
a p sicaná lise continu ará sendo um sjntnma Cabe a questão: o que uma
aná lise fa z de um real que não se conh ece?
Numa análise escreve-se o seu própri o fa ntasma, como está neste
texto pri meiro magistral. Esta entrada ruidosa na clínica do fantasma,
o texto freu diano "Bate- se nu ma criança"i, então a psicaná lise não
coloca o fa ntasma no lugar daqu ilo qu e é impossível de se escrever. Ao
contrári o. a psicanálise desloca o fa ntasma deste lu gar justamente
escrevendo-o'lPropõe f�___1:1.lar esse iITIQQ��j vel, no� eá-lo, a partir d�_
u� ificante-ch ave_._ ou ª!!l®.J:lo....que chamei de texto do sujeito,
� mais como uma e9uivalência e não como u ma relação. M as nós já
v imos qu e não é uma equ ivalência. Portanto, trata-se de criar u ma
outra form a de equ ivalência.
Retomo a qu estão sobre o passe, como eu fu i Mais-um de um
cartel do passe, redigi o relatóri o, no qual nos perguntá vamos a
re speito do lu gàr ���pe����ni�p-síci{náli se. Esser�laiOiiõ
partiu de algu mas constataçõ es nos depoimentos de passe, a respeito
da formu lação de tal impossível. A través de tentativas da
imaginari zação do impossível, do impossível de ser escri to.
Quanto à psicanálise aplicada, nós estamos nu ma época em que
nos opomos à solução da dissolu ção da psi caná lise nas psicoterapias.
---- --==:;:==::;.=:==�==:;;=-
Eessa solução obrig a cada analista em sei.! ato a saber responder P�!
/
qu e está do lado da psicaná lise e não da �� E isso tanto nos
seu s consu ltórios, na sua terapêu tica, quanto nas institu içõ es onde ele
;.: - - - ·- -- -

se encontra.
Ag ora, o último ponto com relação à interpretação. N ós estamos
nu ma comu nidade, dada ao diá logo, e percebemos que a geografia não
nos atrapalh a. Essa é a vertente positiva da globalização. Enquanto
v ocê coloca a questão da interpretação como central, a questão da
ps icaná li se aplicada, Jacqu es-A lain M iller, em seu curso deste ano,

82
iniciou perguntando: "será que a psicanálise ainda pode ser oracular?""'
Ou seja, será que ela ainda pode propor interpretações oraculares?
Então, talvez vocês possam continuar com essa reflexão.

Nolas
' Cf. Lacan, J. "Conférences et entretetiens dans des universités nord-américaines", in
Scilicet 617, p. 13.
' Freud, S. "Uma criança é espancada: uma contribuição ao estudo da origem das
perversões sexuais" ( 1919), in Edição Standard Brasileira das Obras Completas de
Sigmund Freud, Vol. XV I I (1918-1919); Rio de Janeiro: Imago, 1974.
' Miller, J.-A. Seminário inédito (2002-2003).
Encerramento
"O sonho da razão erige monstros" 1

Maria do Carmo Dias Batisu

Em nome da Diretoria da Seção São Paulo da Escola Brasileira de

"O inconsciente é a política", agradeço a presença de cada um de vocês.


Psicanálise e da Comissão Organizadora deste Seminário Internacional

A Comissão Organizadora é formada por Carmen Silvia


Cervelatti, Luiz Fernando Carrijo da Cunha, Marizilda Paulino,
Roberto Flores, Sandra Arruda Grostein e eu. Quero agradecer em
especial à Sandra, por oferecer-me a coordenação da Comissão.
Agradeço à confiança, à tranqüilidade, à interlocução e à busca
constante de consenso que possibilitaram à Comissão trabalhar de
forma corajosa e eficaz.
Agradeço ainda à Diretoria da Escola Brasileira de Psicanálise.
particularmente à Angelina Harari, Diretora-Geral.
À Associação Mundial de Psicanálise, ao propiciar intercâmbios

vida e conseqüência ao mundial de seu nome e fortalece a orientação


específicos entre Escolas, como o deste Seminário Internacional, dá

lacaniana no mundo. Agradeço muito.


Aos participantes das mesas, coordenadores e debatedores,
agradeço pela escuta atenta e pelas questões instigantes e produtivas.
favorecedoras de ainda maior detalhamento e extensão das idéias e

85
O llk·onsúr:-ntr:- t:- • poliuca

conceitos trabalhados por Marie-Hélene Brousse. São eles: Romildo


do Rêgo Barros, Sandra Arruda Grostein e Carlos Augusto Nicéas,
debatedores, e Rômulo Ferreira da Silva, Luiz Fernando Carrijo da
Cunha e Carmen Silvia Cervelatti, coordenadores.
Agradeço também à precisa tradução de Clary Khalifeh, sempre
elogiada pelos conferencistas convidados; e ao trabalho exaustivo da
secretária da EBP-São Paulo, Dolores Costa.
Agradeço aos nossos patrocinadores: Pinacoteca do Estado de
São Paulo, através de seu Diretor, Marcelo Araújo; Revista Carta
Capital; a artista plástica Maria Bonomi. Agradeço à crença na
psicanálise, motivação do patrocínio.
Quero destacar a importância das atividades preparatórias ao
Seminário, por colocarem em discussão o tema "O inconsciente é a
política", aproximando-o do cotidiano da Seção, incentivando seus
membros ao estudo e à participação. Cito-as: o número especial da Carta
de São Paulo, possível graças ao empenho e competência de' Carmen
Silvia Cervelatti; o Ministro Celso Lafer: com extrema gentileza e
presteza respondeu ao convite e enviou o texto "Reflexões de um antigo
aluno de Hannah Arendt sobre o conteúdo, a recepção e o legado de sua
obra, no 25º aniversário de sua morte", publicado na Carta de São Paulo
- Boletim da Seção São Paulo da Escola Brasileira de Psicanálise, Ano
9, n º 8, novembro de 2002, Edição especial; a apresentação feita por
Maria Cecília Galletti Ferretti das aulas XVII, XVIII e XIX do Curso de
Jacques-Alain Miller (200 1 /2002), aulas nas quais Miller desenvolve o
tema "O inconsciente é a política"; a Sessão de Cinema, com projeção
do filme "Diário de uma camareira", de Luis Buiiuel, demonstrativo de
relações do inconsciente com a política, conduzida por Marco Antonio
Guerra, professor doutor da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da
USP e por mim; a conferência "O amor à política em Hannah Arendt",
proferida pela professora doutora da Faculdade de Direito da USP,
Cláudia Perrone-Moisés; a vemissage dos trabalhos mais recentes da
artista plástica Tereza Salazar, realizada na sede da EBP-SP.

86
"-l.1ric•Hclcnc Brou,i.'K'

Bem, para agradecer-lhe, Marie-Hélene Brousse, gostaria de pôr


em relevo dois pontos por Yocê trabalhados. O primeiro, sua afirmação:
"a neutralidade analítica é política e essa neutralidade é a neutralização
do indivíduo, do supereu e do eu do analista". Porém, sempre atenta à
subjetividade de sua época. adverte que essa neutralidade política pode
conduzir o analista a dar respostas que acentuem a vocação totalitária do
discurso do mestre. Portanto, o dever político do analista, ÇQ!!}Q _clj�se
você, é devolver �o�ujeito ! J>_o�dade de escolha em r�filão_aos_
significantes-mestres que o condj�ion?m:

S2
DM
a
7

Ao mesmo tempo, Yocê propôs uma nova escrita para o discurso


do mestre, e este é o segundo ponto. Colocou no lugar do �
mercados comuns, a globalização; no lugar do saber, os
procedimentos, normas, experimentos, processos jurídicos. Com sua
permissão vou juntar também � r.J_?_ãc:J_ � �s��Jl!&..l!! d�_S2. No lugar do
�jJ�_co�Q��u as .!�<!_e�_fl_exív��--e-_11wd_ubivei��� �oroioa5ãa, oas
quais ele (o sujeito), é sempre êxtif!1�; no lugar do objeto a, colocou os
campos de concentração. entendendo-os de forma ampliada como
campos de segregação. Vários campos de concentração-segregação,
muito atuais, noYas soluções oferecidas ao Outro.
Então, partindo da idéia que há algo de premonitório na arte, na
obra de um artista, gostaria de articular pontos de sua fala a um artista
e parte de sua obra, que me são muito caros. Trata-se de Francisco de
Goya y Lucientes. Goya, no final da vida, surdo e quase cego, faz uma
série de gravuras demonstrativas de sua desilusão com o humano e
com a razão, que chamaYa de "estupidez do homem".
A essas gravuras denominou caprichos ou provérb ios ou
disparates ou sonhos, conforme a série. Obra extraordinária, de
estranha e fascinante beleza, expressa a intimidade do autor, suas

87
fantasias inconscientes. Monstros, estranhas figuras, grupos de
humanos e semi-humanos, de animais e de semi-animais, mistura do
bestial e do fantástico. O inconsciente. Goya cunha, na época, a
expressão "o sonho da razão erige monstros" e a obra em gravura
permanece propositalmente irracional. Podemos apenas gozar a
beleza, a imaginação, a flutuação e a indefinição das angustiadas
formas: seu significado, até hoje, sempre escapou às inúmeras
tentativas de decifração. Não poderemos nunca gozar as verdades mais
íntimas do autor supostamente contidas nesses si gnificados.
Há uma barra ao gozo da compreensão. Uma barra separa a razão
da desrazão, a razão consciente da dinâmica pulsional do inconsciente.
Belo exemplo do saber-fazer com o Real. Exemplo de Goya, em 1 8 1 9.
C� o fora-de-sentido assim produzido temos nós de nos virar, temos
nós de saber-fazer.
Ao atualizar o discurso do mestre às marcas do contemporâneo e
criticar a posição do analista quando potencializa o totalitarismo, você,
Marie-Hélene, parece dizer "o sonho da razão erige monstros": nosso
embate é o embate com o Real. Seu Seminário levou-me a isto.
Agradeço muito. Em nome de cada um de nós.

Nota
' De Salas, J. Los proverbias de Goya; Barcelona: Ed. Gustavo Gibi, 1 987/ 1 989.

88
Bibliografia

Brousse, M.-H. "4 moins l ", in La Jettre mensuel/e n º 21 1, septembre


2002, p. 2-5.

De Salas, J. Los proverbias de Goya; Barcelona: Ed. Gustavo Gibi,


1 987/1 989.

Freud, S. "O mal-estar na civilização" ( 1 930), in Edição Standard


Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Vol. XXI ( 1 927-
1 93 1 ); Rio de Janeiro: Imago Ed., 1 974.

Freud, S. "Totem e Tabu" ( 1 9 1 2), in Edição Standard Brasileira das


Obras Completas de Sigmund Freud, Vol. XIII ( 1 9 1 3- 1 9 1 4); Rio de
Janeiro: Imago Ed., 1 974.

Freud, S. "Moisés e o monoteísmo - Três ensaios" ( 1 939), in Edição


Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, Vol.
XXIII ( 1 937- 1 939); Rio de Janeiro: Imago Ed., 1 975.

Freud, S. "Uma criança é espancada: uma contribuição ao estudo da


origem das perversões sexuais" ( 1 9 1 9) in Edição Standard Brasileira
das Obras Completas de Sigmund Freud, Vol. XVII ( 1 9 1 7- 1 9 1 9); Rio
de Janeiro: I mago Ed., 1 976.

89
F reud, S . "Psicol ogia de grupo e a anál ise do ego" ( ] 921 ), in Edição
O incon..'fCÍtnlr." � a pol111ca

Srandard Brasileira das Obra s Completas de Sigmund Freud,


Vol.X\"111 (1920- 1922); Rio de Ja neiro: Imago Ed. , 1976.

Ha rdt, �f. & Negri , A. Império; Rio de Ja neiro: Ed. Record, 2001.

La ca n, J. "A psiquiatria ingl esa e a guerra" in A querela dos


diagnósricos; Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1989.

La can, J. O Seminário - Livro I: Os escritos técnicos de Freud ( 195 3-


195 4); Ri o de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1983 .

La can, J. O Seminário - Livro 7: A ética da psicanálise ( 195 9- 1960);


Ri o de Janeiro: Jorge Zaha r Ed., 1991.

La ca n, J. O Seminário - Livro I 7: O avesso da psicanálise ( 1969-


1970); Ri o de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1992.

Laca n, J. Seminário 14, A Lógica do Fantasma. Seminário inédito.

Lacan, J. Seminário 23, O Sinthoma. Seminário inédito.

La ca n, J. "Função e ca mpo da fala e da lingua gem em psicanál ise"


( 195 3 ), in Escritos; Rio de Janeiro: Jorge Za ha r Ed., 1998.

Laca n, J. "A direção do tratamento e os princípios de seu poder", in


Escritos:. Ri o de Janeiro: Jorge Zahar Ed. , 1998.

Lacan, J. "Subversão do sujeito e dialética do desejo no inconsciente


freudia no", in Escritos; Rio de Janeiro: Jorge Za har Ed. , 1998.

Lacan, J. "Proposição de 9 de outubro de 1967 sobre o psicanalista da


E scola . . in Opção Lacaniana, nº 1 7, novembro de / 996.

La can, J. "Lettre de dissol ution" , in Autres écrits; Pa ris: É ditions du


Seuil, 200 l .

Lacan, J. "Conférences et entretetiens dans des univers ités nord­


américaines", in Scilicet 617.

90
�larn:-l l.:"l('nc Dr�

Lacan, J. "La troisieme", in Lettres de la École freudienne, n º 1 6; Paris.

Lacan, J. "La tercera", in lntervenciones y Textos 2; Buenos Aires:


Manantial, 1 988.

Miller, J.-A. "Intuitions milanaises [ l ]", in Mental - Revue


lntemational de Santé Menta/e et Psychanalyse Appliquée, n º 1 1,
dezembro/2002, pp. 9-2 1 .

Miller, J.-A. Orientacion Jacanienne 111, 4, O lugar e o laço. Seminário


Inédito, 200 1 /2002.

Miller, J.-A. Seminário inédito (2002-2003).

Stevens, A. "Camp de concentration, marché commum et segrégation", in


Omicar? digital - Revue electronique multilingue de psychanalyse (publiée
a Paris par Jacques-Alain Miller) n º 41-42; Paris: AMP[UQBARJ.

Vários autores. "O inconsciente é a política"; Carta de São Paulo -


Boletim da Seção São Paulo da Escola Brasileira de Psicanálise, ano 9,
n º 8, novembro de 2002, Edição Especial.

Veloso, C. Verdade Tropical; São Paulo: Companhia das Letras, 1 997.

91

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