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SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO.

POR: DANIEL SOTELO


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ÍNDICE.

Introdução.
A Importância da Sociologia e da Sociologia da Religião para os estudos Bíblicos
e Teológicos.

I – Sociologia da Religião.
1 – Sociologias Tradicionais.
2 – Sociologia da escola Americana.
3 – Sociologia Marxista.

II – Temas e Formas da Sociologia da Religião.


1 – Experiência Religiosa.
2 – Instituições Religiosas.
3 – Seitas.
4 – Castas.
5 – Denominações.

III – Religião e Conflitos Sociais.


1 – Religião e Classes Populares.

IV – Religião e Lutas de Classes.


Introdução.
1 – O problema de uma Sociologia Latino Americana das Religiões.
2 - Afinal, o que seria Sociologia das Religiões.
3 - O campo Religioso como produto dos Conflitos Sociais.
3-1- A religião na Sociedade.
3-2-A religião no modo de produção da sociedade.
3-3- A Religião nas sociedades divididas em classes.
3-4- A Religião numa sociedade complexa como a América Latina.
3-5- A religião no meio da estrutura de classes em conflitos.
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3-6- A Religião na dinâmica conflitiva das classes sociais.


4 - O campo religioso como terreno relativamente autônomo de conflitos sociais.
4-1- Interesse religioso e Produção Religiosa.
4-2- A fragmentação conflitiva de interesse e do trabalho religioso.
4-3- A produção religiosa especializada como produção transacional.
4-4- Procura e produção de consumo de bens religiosos.
5 – O campo religioso como fator ativo nos conflitos sociais.
6 – Conclusão.

V – Religião e Modos de Produção.


Introdução.
1- Definição.
2- Religião e coesão social nos diversos modos de produção.
3- Representações simbólicas e funções das Religiões.
4- Características das Sociedades pré – capitalistas de classes.
5- Modos de Produção.
6- Condições sociais da gênese e do desenvolvimento dos grandes sistemas
Religiosos do Oriente.
7- A religião na formação social da Palestina do século I e o protagonista sócio
– religioso: Jesus.
8- Estrutura de classes, poder político e correntes ideológicas.
9- O protagonista sócio – religioso: Jesus.

VI – Gramsci e a Questão Religiosa.


Introdução.
1- Definição do fenômeno religioso.
2- Evolução histórica.
3- Cristianismo como movimento religioso.
4- Ligação com o Baixo Império – A Igreja depois do Edito de Milão.
5- Transformação intelectual da classe Feudal.
6- As revoluções e o declínio da Igreja.
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7- Considerações finais.

VII - Pentecostalismos.
Introdução.
1 – Histórico das primeiras igrejas Pentecostais.
2 - Gênese do Pentecostalismo.

VIII - Bibliografia
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INTRODUÇÃO.

A IMPORTÂNCIA DA SOCIOLOGIA E DA SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO PARA O


ESTUDO BÍBLICO E TEOLÓGICO.

Pouco tempo atrás, ninguém imaginava a importância tão grande que teria
a Sociologia e a Sociologia da Religião para os estudos Teológicos. Como
sabemos e estudamos, na história da Teologia a grande importância que teve a
história das Religiões (Religionsgeschichte) e a própria Filosofia.

Esta última influenciou o pensamento Teológico e ainda marca presença na


teologia primeira – mundo. A Filosofia sempre trouxe influência marcante em
períodos teológicos como: o idealismo Kantiano na teologia alemã, a dialética no
pensamento barthiano, o existencialismo no pensamento bultimanniano, e outros
mais. Somente na década de 70 começou a se configurar na América Latina uma
nova forma de se fazer teologia.

A Teologia da Libertação baseada na leitura dos quatro lados, isto é, sociologia


política, econômica e a ideologia. Passou a ver e encarar uma nova forma
teológica. Claro está que a Filosofia preponderante foi a Dialética Marxista. Desta
Forma a Teologia passou a ser influenciada pela Sociologia, e a Sociologia da
Religião onde as novas formas de igreja e de experiências religiosas passaram a
ser sentidas.

Estamos falando agora de Sociologia e Sociologia das Religiões. Isto pode


ser visto na obra de Clodovis Boff:
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 Teologia e Prática; onde ele mostra a relação da filosofia e Teologia, da


TEOLOGIA e Sociologia, e que mudança esta mudança ocorreu no terceiro
mundo. Como e porque a Sociologia se torna importante no estudo da
Teologia? São os aspectos sociais que determinam as formas religiosas.
Existem teorias importantes a este respeito. Emile Durkheim em suas obras
“As formas Elementares da vida Religiosa”, mostra extremamente o que o
título fala, discutiremos mais acerca deste trabalho.

William James em seu trabalho sobre: “As variedades da Experiência


Religiosa”,também trabalhou este aspecto. O nosso trabalho começa com um
estudo sobre a importância da Sociologia da Religião para o estudo teológico, do
estudo bíblico e sociológico, do começo ao fim. Vemos na primeira parte, as
“Sociologias das Religiões” e suas escolas, que se diferenciam nos continentes
onde são aplicadas.

Depois veremos algumas “Teorias Sociológicas da Religião”, na Segunda


parte e na terceira parte, um trabalho importante que se tem feito na América
Latina e no Brasil que é a “Religião e os Conflitos Sociais”, para finalizar, na
Quarta parte uma “Sociologia do Protestantismo”.
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I - SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO:

Sociologias Tradicionais.
Sociologia Americana.
Sociologia Marxista.

Conforme alguns autores, e existem várias formas de se fazer sociologia da


religião e de acordo com Henri Desroche (1986) achamos que esta classificação
pode ser definida como: as tradicionais ou antigas, a americana ou ainda como
anglo-americana e a nova tendência na América Latina de uma leitura de modos
de produção da religião como sendo de orientação marxista.

Essencialmente as duas primeiras analisaram os aspectos da instituição


eclesial como: a igreja em si, o templo, o culto, o rito e assim por diante; enquanto
que a última tendência se preocupou mais com as formas de produção religiosa e
as formas de alienação e da ideologia que são produtos finais de uma religião
dominante.

A Sociologia da Religião começou de uma forma dentro do cristianismo e da


teologia. As outras formas anteriores, eram estudos mais de cunho histórico e
sistemático, como também comparativo das religiões. A preocupação com os
aspectos sociais apareceu bem depois.

1. SOCIOLOGIAS TRADICIONAIS (Henri Desroche).

Por isso, Henri Desroche (1986) demonstra que a Sociologia da Religião


começou nas primeiras décadas deste século.
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Nomes mais importantes são os de: Roger Bastides (que trabalhou muito
tempo no Brasil e na USP), G. Mensching, Joachim Wach, G. Le Bras, T. F. Hoult,
Max Weber, F. Engels, Ernest Troeltsch, Emile Duerkheim, Marcel Mauss, etc.

Este grupo preocupou-se em fazer uma análise sociológica da Religião,


onde era importante o confronto com outras religiões para se verificar
semelhanças e diferenças nos cultos, ritos, mitos, instituição, etc. O estudo
tradicional está também no aspecto em que a sociologia deveria ser utilizada nos
estudos das religiões e denotava ainda o sentimento religioso de cada estudioso
ou pesquisador.

Ainda existiam aspectos ligados a uma teologia dominante no pesquisador e isto


influenciava o campo sociológico a ser estudado como: a eclesiologia (Ernest
Troeltsch), sociologia católica (J. Leclerc), a moral de cada religioso, a sociologia
cristã (Ernest Troeltsch), as seitas (Weber e Troeltsch), judaísmo antigo (Weber),
sociologia do protestantismo (Roger Mehl), sociologia do protestantismo brasileiro
(Waldo Cesar e Emile Leonard), etc. A teologia no inicio exerceu tão forte
influência nos estudos sociológicos da religião que esta era denominada de sócio -
teologia ou Teologia da Sociedade.

O sucesso posterior da Sociologia da Religião teve três atitudes essenciais:


a desconfessionalisação, a desclericalização, e a dessacralisação. A última ou
dessacralisação pressupunha o sumiço das analises das doutrinas e aproximação
de análises das concepções religiosas de uma sociedade. A
desconfessionalisação mostrava o desaparecimento da concisão eclesial ou
religiosa. Por fim, a desclericalização que retira dos estudos a referência clerical.

Ainda nestes estudos, tradicionais, E. Duerkheim estudou as formas


elementares da experiência religiosa, outro tradicionalista foi William James que
trabalhou com as “variedades da experiência religiosa” e os temas preferidos
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sempre foram às formas de expressão religiosa. O que demonstra ainda a


influência de aspectos religiosos na sociologia da religião.

Outros estudiosos partiram para análise antropológica da religião como:


Robert Lowie com os estudos de religiões primitivas, Joan M. Lewis trabalhou
com a questão do êxtase religioso ; R. H. Tawney sobre as religiões e o
surgimento do capitalismo, numa perspectiva mais sócio – econômica, esta obra é
quase semelhante à famosa e consagrada obra de Max Weber sobre a “Ética
Protestante e o Espírito do Capitalismo”. Enquanto que Vittorio Lanternari se
preocupou com as formas da religião dos oprimidos, sendo assim, uma nova ótica
da religião.

2. SOCIOLOGIA DA ESCOLA AMERICANA (Peter Berger).

Como vimos, esta escola também chamada de anglo-americana tem a


influência de dois alemães emigrados para os EUA: Peter Berger e Thomass
Luckmann. Esta sociologia também tem como representantes Thomas O’Dea e
um católico chamado Gregory Baum e outros mais. Esta sociologia é baseada na
gênese da religião de forma clássica de ver a religião de um ponto de vista
burguês.

Enquanto que a sociologia tradicional explicava os fenômenos religiosos


através da teoria sociológica e fora denominado de teoria funcional, e nada mais
é, como funciona as religiões em seus cultos, era sua magia e que a religião traz
em si uma função moral para o homem, carrega o individualismo na função social
de cada um, traz os valores individuais de cada crente a religiosidade e a
experiência individual.
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A distinção entre o sagrado e o profano, a instituição religiosa, o culto, a


crença e o mito de cada religião e ainda, a organização é sua fonte de pesquisa.

A tendência desta escola limita-se e está voltada para a análise de religião


à sociedade. A religião e a estratificação social, a conversão, a cultura, a igreja e o
“mundo”, e outros aspectos tomaram tendência mais burguesa.

Esta escola não se preocupou de fato com questões fundamentais dos


conflitos sociais, que podem provocar diferentes comportamentos religiosos, não
analisa o sistema da troca que existe na religião que é um aspecto de economia: a
troca de mercadorias representa a troca de benefícios entre o crente e as
divindades, ou como no sistema capitalista, o que pode mais, compram com seu
poder os benefícios religiosos, e isto a sociologia marxista fará muito bem em sua
análise da religião desmascarando tudo.

3. A SOCIOLOGIA MARXISTA (Kar Marx, Henri Desroches).

Esta corrente sociológica só tem entrado no campo da sociologia da religião


recentemente. Como faz a analise o marxismo apenas entre as questões da
ideologia e da alienação. Agora na América Latina entra em cena esta forma para
analisar o mundo subdesenvolvido e a denominação, os aspectos sócio-
econômicos. Anteriormente, ainda existia forma deformantes da religião e ainda
isto acontece. Estas armas eram provocadas por aspectos exteriores e que a
religião era utilizada como dominação e subjugação dos substratos da economia e
da sociedade.
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Nesta forma a Sociologia da Religião mostra outros modos específicos que


tornaram a religião o “ópio do povo” (Marx). Esta sociologia nos ensina como uma
sociologia Latina – Americana da religião deve ser feita nestas condições. Esta
sociologia deverá determinar o campo religioso como produto dos conflitos sociais
e também da religião como um local de conflitos, e por fim, a religião como campo
da ação dos conflitos.

Após estas considerações iniciais, resta-nos aprofundarmos ao que se tem


feito e o que se deve fazer na Sociologia da Religião, para que possamos, melhor
compreender e fazer Teologia e nos Estudos da Bíblia.
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II. - TEMAS E FORMAS DA SOCIOLOGIA DA RELIGIÃO.

1 – A Experiência religiosa: (W. James/E. Dürkheim).

A experiência religiosa refere-se ao ato de cada etapa da vida humana. A


religião e um aspecto da mesma que liga as etapas críticas decisivas na
experiência humana. A religião é a classificação de várias formas da
experiência humana – o sagrado e o profano: Emile Durkheim e Rudolf Otto. O
profano se refere a tudo aquilo que não é o religioso, que faz parte da
experiência cotidiana de cada indivíduo.

Durkheim mostrou que o sagrado é superior ao profano, o sagrado é a esfera da


reverência, da obediência. É a influência, o poder, a força, ou crença no ser
superior. Conforme Otto, o sagrado ou santo é o luminoso, o tremendum, o
misterium, o tremendum et fascionorum. É a expectação de algo superior a si
mesmo, é o caráter extraordinário do fenômeno, a fascinação pelo poder.

Conforme a antropologia e fenomenologia chegaram-se a definir o sagrado


como aquele que desperta sentimentos e que se caracteriza simultaneamente por
terror ou atração, amor e medo, louvor e fascinação. M. Weber chamou de
carisma o que Durkhein denominava de sagrado e Ottto de santo. M. Weber
define carisma como a qualidade individual que cada indivíduo pode ter, aquilo
que separa um indivíduo comum de outro, que pode Ter poderes sobrenaturais,
sobre-humanos ou excepcionais.
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Estes poderes ou sentimentos estão acessíveis também a seres comuns e não


apenas a excepcionais, é que estes atos são tidos como de origem sagrada ou
divina e que através destes o indivíduo pode ser tratado como um líder.

O carisma tem aspecto de sagrado, que atua no profano com grande


influência social e econômica, como determinou o próprio Weber. O carisma para
ele, tem três características essenciais: o extraordinário pois é diferente e atua
fora do cotidiano e da rotina; espontaneidade, pois, atua como novas formas e
movimentos novos, fugindo da rotinização social e econômica e ele é criador
porque cria novas fontes de atuação. Vimos então que a experiência religiosa é
dada através do sagrado e que sua manifestações tem também os aspectos do
além dos citados: o respeito e a fascinação.

O sagrado indica um poder que, embora se manifeste na experiência está além


desta, e a experiência religiosa é uma experiência desse poder. A experiência
religiosa é uma resposta a coisas experimentadas no sagrado. A religião e o medo
onipresente ou medo imaginário da consciência humana, é a emoção, busca
consciente ou o inconsciente da realidade última. A religião é a resposta do
homem a pontos críticos nos quais experimenta o poder fundamental do sagrado.

A experiência religiosa é o encontro com um além, com um poder que está além
das coisas e acontecimentos, como um poder fundamental entendimento como
base da existência: é a partir da experiência religiosa que se desenvolvem as
crenças, as práticas e organizações religiosas, que respondem as perguntas
básicas através de seus sistemas de crenças e que dão meios de ajustamento
através de uma relação como além. Pesquisando vários autores que falam da
experiência religiosa: Tillich, Buber, Simmell, Feuerbach, Freud, eles conceituaram
da seguinte maneira:
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P. TILLICH: A experiência religiosa está relacionada com o que é santo. O


princípio fundamental da religião não é apenas adquirido
intelectualmente, mas é como um encontro pessoal. A experiência
religiosa é um encontro com o além, com um poder que está além
das coisas e acontecimentos, como um poder fundamental
entendido como base da existência.

M. BUBER: Ele mostra que a experiência religiosa é a relação do “eu – tu”, a


relação humana com a divindade, onde o “eu – coisa” está em
relação com os outros. O eu – tu é fundamental para a experiência
humana. Esta relação eu – tu é uma relação de presença, presença
do eterno, o homem no eu – tu responde uma presença do tu
infinito.

G.SIMMEL: A experiência religiosa tem a forma de elevação e isolamento. Na


elevação, o indivíduo está em relação com os outros e se sente
completamente no isolamento é onde os indivíduos buscam alguns
aspectos importantes da relação humana. Para ele, a religião é
essencialmente relação e que nestas relações os homens
modelam, exprimem atitudes e sentimentos. A relação se refere
com relação no sagrado, relação entre indivíduos, relações sociais,
relações de rituais e crenças.

L. FEUERBACH: Se preocupa mais com a religião real ou a concepção de Deus


– que é anteopologia: “toda a afirmação de Deus é uma auto-
afirmação do homem”.

“A religião é a primeira forma indireta de autoconhecimento do homem”.

Isto denomina o autor, como sendo pregações humanas de concepções religiosas,


o homem se aliena de si mesmo e é por isso prejudicado em sua
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auto-realização. Deus representa a substâncialização da sociedade,


que apoia a moral do homem. A experiência religiosa, para ele, é
uma experiência do ponto crítico, no que pode ser denominado de
situação-limite; onde o homem, impulsionado pelo pensamento ou
pelos acontecimentos da vida, ultrapassa o aqui e o agora.

Na situação limite, o homem atinge um grau de transcendência diante do além.


Este além é experimentado como sagrado, e ele, o homem
responde com correspondente ambivalência, é atraente e
fascinante apesar de amedrontador e ameaçador.

S. FREUD: Ele Mostrou que a religião pouco fez para nos defender da
natureza, onde se inclui a nossa natureza. A religião é uma ilusão,
pois ela faz deixar de lado a relação entre seu conteúdo e a
realidade. Para Freud, a religião nasce da necessidade de tornar
tolerável a fraqueza do homem, é a situação da afloração no
indivíduo da infantilidade. Por outra ocasião, ele dizia que a religião
é a representação, onde Deus é a figura paterna. Temer o pai
significa, temer a Deus ou vice-versa.

Concluindo, pode-se dizer que a teologia é a tentativa de usar um método


racional da filosofia para explicar o que existe nas experiências religiosas de
várias tradições. J. Wach em sua Sociologia da Religião propôs critérios universais
para reconhecer a experiência religiosa:

a) – A religião uma resposta ao que é experimentado como realidade


fundamental;
b) – A experiência religiosa é uma resposta total de ser total ao que é aprendido
como realidade;
c) – A experiência religiosa é a mais intensa experiência de que o homem é
capaz;
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d) – A experiência religiosa inclui um imperativo, um compromisso que leva o


homem a agir.

Para J. Wach, ainda existem experiências pseudo - religiosas e semi- religiosas.


As primeiras são não religiosas e os homens a utilizam como se fossem religiosas.
As segundas são encaradas como realidades fundamentais e de sete realidades
finitas.

2 - INSTITUIÇÕES RELIGIOSAS (Max Weber).

Nas sociedades existem dois tipos de organizações religiosas: primitivas e


arcaicas; onde a religião é os fenômenos difusos e muitos organizações,
associações, a famílias e grupo de trabalho têm caráter religioso. Com a evolução
e a diferenciação interna surge a estratificação. As instituições surgem através da
função do carisma de seus líderes, fundadores e discípulos.

A manutenção do carisma, liderança, fundadores, se encontram nos


interesses, ideais e materiais de cada um dos mesmos. A evolução das religiões,
das organizações depende de seus fundadores. Se perpetuarem os mesmos,
ocorre a estratificação que é a manutenção do status. Isto ocorreu com o
Judaísmo, Cristianismo e todas as religiões com carismas, líderes e fundadores
que tiveram seus dons e lideranças perpetuadas.

Existem vários aspectos que tornam a perpetuação viável: a oração, o culto,


a irmandade, a pregação, a liturgia, as pregações e as crenças.

O culto é a reunião dos gestos, palavras e meio simbólico de transmissão; é


a expressão de sentimento, atitudes, relações e isto tem caráter intelectual.
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O culto é o ritual religioso que consiste de linguagem, gesto, canto,


refeições sacramentais e do sacrifício. O ritual e a liturgia são expressões de
atitudes que se desenvolvem em torno de incidentes, crises e transições
importantes na vida do indivíduo e do grupo: o nascimento, puberdade, doença, a
mudança de status e a morte, são marcados por rituais e são denominados de
ritos de passagem. O culto começa como expressão espontânea e depois é
enquadrado e padronizado conforme cada instituição.

Ele é institucionalizado. O culto passou a ser a representação da


experiência religiosa e a maneira pelas quais os fiéis exprimiam sua relação com o
sagrado. A institucionalização do ritual, a padronização das palavras, gestos e
procedimentos fazem parte da estratificação social. A institucionalização da
religião está no nível intelectual e da crença. Esta expressão intelectual pode ser
de duas formas: a mítica e a racional.

O mito é a forma primordial da expressão intelectual de atitudes e crenças


religiosas, esta é a afirmação dramática da vida humana, é um tipo complexo de
afirmação do homem. O mito resulta da emoção e seus antecedentes emocionais
mostram a concepção inicial da natureza da vida; o mito é a forma de ser o
mundo.

Outros fatores de evolução da instituição religiosos foram demonstrados por


A. Comte composto de três aspectos: o estágio primitivo onde o homem vivia a
religião como magia, o estágio metafísico onde o homem começa a pensar sobre
si e o mundo que o cerca e o estágio positivo, onde para ele, é o mais importante,
é a era científica onde a apreensão e a formação de conceitos é mais profunda.

Conforme M. Weber, a ética protestante auxiliou através das concepções


teológicas as orientações dos seres humanos, influindo significativamente na
sociedade e na ação humana. O ascetismo do protestantismo acentuava a
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eliminação de elementos mágicos e míticos na interpretação religiosa focalizando


a atuação do homem mais nas suas ações e no mundo. Aqui começa o processo
de secularização.

Recordando, foi a centralização do culto e a oração que possibilitou a


formação de uma organização religiosa e a sua instituição. A institucionalização foi
possível através do culto da doutrina e da organização de comunidades.

3 - SEITAS (Max Weber).

Para falar de seitas, é necessário também falar de instituição, o que vimos


anteriormente, que podemos resumir agora. A instituição é a igreja que se
acomodou ou se comprometeu com as formas institucionais e as organizacionais.
Ela se estratificou socialmente.

A igreja a qual participa através do seu nascimento, fundação. A


administração da mesma é pela hierarquia, dogma e que a sua geografia coincide
com a etnia, e a estrutura social. Existe uma tendência para se encaixar na
sociedade, os seus valores e instituições se acomodam entre si.
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A seita é a separação em relação à sociedade, afasta-se e desconfia em
relação ao mundo, suas instituições e valores. Há um separatismo em atitude e
estrutura social. Acentua-se a experiência da conversão, anterior à qualquer
participação. A adesão voluntária, espírito de regeneração, uma atitude de
austeridade ética e ascética.
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Para Ernest Troeltsch a seita é “uma sociedade voluntária, composta de


crentes cristãos, rigorosos e explícitos, unidos entre si, pelo fato de todos terem
experimentado o novo nascimento”.

“Os grupos sectários de vez em quando formam grupos de protestos, como


exemplo na Antiguidade o foi o monasticismo o que se separou do mundo como
protesto por ser coisa do demônio”. A seita pode permanecer na igreja como foram
as ordens religiosas ou sair dela formando outro movimento que H.R. Niebulir
chamou de denominação.

4 - CASTAS (Max Weber).

Este termo foi criado por Max Weber para mostrar nas religiões orientais –
China e Índia – a hierarquia religiosa das mesmas. Ele queria designar o
funcionamento, que ele denominava sendo a burocracia religiosa destas religiões.
O próprio termo designa a idéia de pureza e preservação de um determinado
grupo social que pratica a endogamia, onde se te atividades profissionais,
crenças, cerimônias, ritos; não se pode passar de casta para outra ou grupo social
para outro: nasce-se nos mesmos.

A casta em sua origem hindu é uma estratificação social onde são


importantes a cor e o nascimento. Os brancos são a casta sacerdotal, depois os
guerreiros e príncipes, após estes os agricultores e por fim os escravos.

Os que não têm casta são os párias e todos estes tem importância na
religião.
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5 - DENOMINAÇÕES (Henri Richard Niebuhr).

Como vimos, um pouco atrás, que as seitas são fusões, rachaduras


ocorridas nas instituições e que seitas são aquelas que não passa de uma
geração de seus fundadores e se tornam estratificadas dando origem a outras
formas institucionais religiosas. As seitas são formas de protesto dentro das
instituições e formando outras igrejas. Nos EUA dentro do protestantismo ocorreu
isto e as formas no protestantismo foram chamadas de denominacionalismo
(Denominações). Denominação vem do inglês americano “denomination” que
designava as diversas igrejas e confissões dentro do protestantismo.
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III – RELIGIÃO E CONFLITOS SOCIAIS (Otto Maduro).

Falamos antes que, a Sociologia da Religião na forma e análise tradicional


e com orientação formalista sempre preocupou mais com as formas religiosas, do
que com os ritos e os mitos, os cultos e as instituições. De uma época para cá a
Sociologia da Religião de orientação Marxista. E utilizando mecanismos e
utensílios marxistas se preocupam mais com a religião nos conflitos sociais:
religião e classes populares; religião e lutas de classes. Ela mostra a religião em
comparação com as classes sociais e como ela funciona nas mesmas.

A Sociologia da Religião, nesta perspectiva mostra as características


religiosas e seus conflitos sociais em dois aspectos mais importantes: as classes
populares e as lutas de classes. A primeira, como funciona a religião nas classes
populares, pois sabemos como ela se dá na classe média (protestantismo
histórico) ou na burguesia (setores da igreja católica) e na classe alta ou
dominante (setores a igreja católica). A Segunda reflete a religião e as lutas de
classes: a luta de classe reflete a luta também das religiões.

Antes de entrar nestes dois aspectos, analisaremos a religião e os conflitos


sociais. Sempre estes conflitos estiveram interligados à religião e aos conflitos
sociais, sejam eles, de classes dominante ou dominada. Conforme alguns autores,
o sectarismo e outros aspectos religiosos se tornam conflitos religiosos por que
existem os conflitos sociais: diferentes classes, sociedades diferentes. Outros
ainda enfatizam aspectos étnicos nos conflitos sociais e religiosos. Agora a
cultura, o trabalho, a guerra, o governo, o saber e a ciência trouxeram
ambigüidades e conflitos religiosos.
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Todos os aspectos sociais trazidos como conflito para a religião colocam o homem
em conflito consigo e em conflito social, não conseguindo superar os conflitos
sociais se utiliza a religião para superá-los e isto os estudiosos denominam
alienação. Sendo que, a religião pode se apresentar como consolo emocional para
o homem e se tornam o “ópio do povo”(Marx).

1 – RELIGIÕES E CLASSES POPULARES (Francisco Catarxo Rolim).

A questão fica no termo do que é e o que não é popular. Em contraposição


ao popular existe a elite. O popular é uma classe ou classes dentro de uma classe
social. Este aspecto tem sido debatido amplamente dentro do catolicismo no
Brasil. No protestantismo como o protestantismo histórico não entra nesta análise,
pois é uma religião burguesa, de classe média e dominante. Ficando assim
apenas o Pentecostalismo como classe popular e o catolicismo nas CEBS.

A religião nas classes populares funciona como a forma de espontaneidade


de expressão das formas religiosas: os ritos, os cantos, a leitura da Bíblia, as
reuniões. Estes aspectos funcionam sem a institucionalização, exemplo disto é o
surgimento das CEBS no catolicismo. E no Pentecostalismo as reuniões em
quaisquer locais como: cinemas, antigos bares, supermercados, estádios, praças
públicas, etc. sem se preocupar com o espaço sagrado existente no
protestantismo histórico.

No catolicismo, toda a hierarquia existente acaba na democracia das CEBS,


as doutrinas elitizantes e os dogmas ficam no modelo popular, apenas as crenças
nos santos, e as expressões mais simples de fé tornam possível e afloradas.
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As doutrinas passam a ser devoções, as devoções passam a ser inclusive


particulares e pessoais. Para os pentecostais as experiências que devem ser
contadas e relatadas a todos nas reuniões como: a possessão Espírito Santo, a
profecia, as línguas, curas e milagres.

Na religião, nas classes populares se evidenciam: a existência de uma


classe marginalizada e denominada que não tenta se organizar para se libertar,
mas é uma forma de resistência para tentar a sobrevivência nas diferentes formas
de opressão e de ideologia, fazendo uma ideologia particular e se instalando numa
forma de fuga do mundo.

No catolicismo ou nas CEBS há uma consciência política e de organização


de resistência e de luta para sair de uma situação de opressão para uma vida
social mais digna, no Pentecostalismo diferente se faz transposição do aqui e o
agora para o além ou no céu.
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IV – RELIGIÃO E LUTAS DE CLASSES (Otto Maduro).

INTRODUÇÃO.

Nestas páginas tem um fichamento do livro de Otto Maduro: Religião


e lutas de classes.

Otto desenvolve em seu livro o tema: as inter-relações do campo


religioso e os conflitos de classe.

É uma tentativa de sistematização de suas interrogações interiores,


as quais procurou responder, a partir da teoria marxista da religião e do estudo da
sociologia da religião.

Como católico latino-americano marcado pelo Concílio Vaticano II. e


a Assembléia do CELAM em Medelín (1968), procurou entender as relações entre
a sociedade e a Igreja Católica em alguns aspectos – tais como: os conflitos de
classe que influência uma religião e a sua maneira de agir. Por que a dominação
de uma classe sobre outra influi na visão religiosa do mundo que se desenvolve
numa sociedade de classes?

Otto vê em K. Marx a solução para o seu questionamento Político -


religioso interior. Este nasce do seu compromisso evangélico com a libertação do
povo oprimido na América Latina “Como e por que a Igreja e a Sociedade na
América Latina chegaram ao ponto em que estão hoje? E quais as mudanças,
hoje, possíveis? E como alcançá-las?”.
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Dividiu a sua obra em quatro capítulos, trabalhando o tema com


clareza e remetendo a cada momento o leitor a uma reflexão comprometida com a
situação da América Latina.

O primeiro capítulo é intitulado de: “o problema uma sociedade latino-


americana das religiões”. Aqui ele apresenta e discute os conceitos de religião, de
sociologia, de sociologia das religiões, questiona a existência de uma sociologia
latino-americana das religiões a partir da práxis e da libertação.

O segundo chama-se: “o campo religioso como produto dos conflitos


sociais”. Otto lembra neste capítulo que existem vários aspectos para se estudar
as inter-relações do campo religioso com o conjunto dos conflitos sociais
presentes nas sociedades latino-americanas. Dos quais ele destaca: a profunda
influência que exerce a estrutura social sobre o campo religioso, inclusive os
conflitos inerentes a esta estrutura social.

Já o terceiro capítulo, Otto transcorre a respeito da especificidade


sociológica do campo religioso dentro da sua própria dinâmica. Mostrando que, no
fato sociológico do campo religioso como o campo social tem – em parte – uma
atividade particular própria (autônomo, não esquecendo que este campo estará
sempre situado em um contexto social determinado, que limita e orienta (isto é,
que relativa o contexto) a específica autonomia da religião. Dá como título a este
capítulo: “o campo religioso como terreno (relativamente autônomo) de conflitos
sociais”.

Finalmente, no quarto capítulo, Otto focaliza a questão dos


condicionamentos religiosos das lutas sociais, analisando a relação de influência
do campo religioso nos conflitos sociais, isto é, o campo religioso como produtor
de relações sociais. Este capítulo enuncia como: “o campo religioso como fator
ativo nos conflitos sociais”.
26

1. O PROBLEMA DE UMA SOCIOLOGIA LATINO-AMERICANA DAS


RELIGIÕES.

Significa crença em Deus (ambiente sócio-geográfico –


ideológico) = dicionário.

Origem latina, usada muito antes do Cristianismo, e sua


etimologia não são claras.

Re-legere re - ligare
“Reler ou interpretar ao “ voltar a escolher ou aceitar
RELIGIÃO -------- pé da letra” em definitivo”

CÓDIGO UM CAMINHO DE VIDA

Re - ligare
“Amarrar de novo ou fortemente”

Religião seria alguma coisa, fiel e restrita


observância de um compromisso a que
alguém se tinha ligado.
O termo está presente nos idiomas cuja história está
estritamente ligada ao Cristianismo.
27

Para o propósito do seu livro, Otto define sociologicamente assim


religião:

“Uma estrutura de discursos e práticas comuns a um grupo


social referente a algumas forças (personificadas ou não, múltiplas ou
unificadas) tidas pelos crentes como anteriores e superiores ao seu
ambiente natural e social, frente às quais os crentes expressam certa
dependência (criados, governados, protegidos, ameaçados, etc.) e diante
das quais se consideram obrigados a certo comportamento em sociedade
com seu “semelhantes”.

“Ciência da sociedade”.

Vocábulo nascido dentro da língua francesa, 1839


criado por
Auguste Comte.

SOCIOLOGIA ------ Etimologia: societas (latim) = sociedade


Logos (grego) = ciência, estudo.
28

Seu objeto: as relações sociais

Surgem num momento de transformação, inventos,


migrações, guerras, revoluções, conflitos e descobertas.

2 - Afinal, o que seria Sociologia das Religiões?

Nasce juntamente com a Sociologia – Comte; Marx; Durkheim = percebem


na religião um componente das lutas sociais dos processos políticos e das
transformações culturais, que está profundamente imersa nessa dinâmica da
sociedade e por ela é atravessada de lado a lado.

CONCEITO: estuda a religião como fenômenos sociais, a influência que as


instituições religiosas exercem sobre os processos sociais e o
condicionamento que a dinâmica da sociedade impõe ao
desenvolvimento das religiões.

FENÔMENOS RELIGIOSOS = FENÔMENOS SOCIAIS: produzidos, situados,


limitados, orientados, estruturados e com uma influência
sobre a sociedade em que se encontra.

OBJETO: discurso religioso como análise dos fenômenos religiosos.


29

TAREFA: Reconstituir a dinâmica social que se encontra por trás da “auto-


imagem” das instituições
Religiosas, procura elaborar uma explicação das características de crenças
práticas no meio de seu contexto social específico.

E por fim o autor nos deixa uma questão: Existe uma sociologia latino-
americana das
Religiões?

À principio, a sociologia das religiões, foi um instrumento utilizado pela


Igreja Católica para entender o que se passava na América Latina após os anos
50, isto é, as mudanças sociais que estavam ocorrendo no seio da sociedade
latino-americana.

Tendo como modelo de análise europeu e não a realidade latino-americana.


O que podemos perceber no Catolicismo ainda hoje predominante e
dependente.

Otto ao estudar estas questões, opta por uma sociologia crítica-política das
religiões tendo como ponto de partida a práxis e a libertação do povo oprimido.
Por isso, ele diz que, o campo religioso é produto, terreno e fator ativo nos
conflitos sociais de uma sociedade.

3 . O CAMPO RELIGIOSO COMO PRODUTO DOS CONFLITOS SOCIAIS.


30

Neste capítulo, o autor faz uma introdução sociológica ao estudo das


relações do campo religioso com os conflitos na gestão da sociedade, sobretudo
no que diz respeito à América Latina no fim do século XX.

Entende como campo religioso, uma “porção do espaço social constituído


de instituições e atores religiosos em inter-relação”, define com isto o que Otto
compila de François Houtart, In: “Sociologie de L’Eglise comme institution”.

3.1. A Religião na sociedade.

Nenhuma religião opera no vazio. Toda religião, ou aquilo que entendemos


por “religião”, é uma realidade situada num contexto humano específico: um
espaço geográfico, um momento histórico, um meio ambiente social concreto e
determinado. A religião existe em função dos homens (que sentem fome, sede,
frio, calor, sono... que procuram satisfazer as suas necessidades, etc.), pois, ela é
concreta, porque precisa do ser humano para ter vida.

A religião não é um departamento estanque na sociedade. Uma religião,


qualquer que seja, só existe na medida em que se encontre situada num contexto
social particular; isto, quer dizer que, a ação de qualquer religião está limitada pelo
contexto social em que opera, isto é, que suas alternativas de atuação (de pensar,
dizer e praticar sua mensagem religiosa) estão limitadas por tal contexto
(independentemente da consciência e das intenções dos agentes religiosos,
porque a religião opera com os instrumentos socialmente acessíveis no contexto
do qual ela existe, como por exemplo, a estrutura da língua de um determinado
grupo.
31

A religião, qualquer que seja, opera sempre em cada caso concreto, numa
sociedade estruturada de um determinado modo, a estrutura de cada sociedade
limita e orienta as possibilidades de atuação de uma religião no seu interior, como
por exemplo, o judaísmo.

3.2. A Religião no modo de produção da sociedade.

O modo de produção de cada sociedade constitui a estrutura central, ou


infraestrutura, dessa sociedade.

Entendendo como modo de produção a organização de atividade de


produção e reprodução da vida humana, isto é que meios são adequados para
mantê-las. Essa forma depende do conteúdo organizavel nela e por ela: O grupo
humano, os recursos naturais acessíveis ao grupo, o conjunto de instrumentos de
trabalho usados pelo grupo, a experiência e os conhecimentos adquiridos pelo
grupo, e os usos e costumes do grupo.

Cada grupo humano tem o seu modo peculiar de produção, isto é, este,
regulamenta o acesso aos meios de produção, à distribuição da força de trabalho,
à partilha dos produtos como também influência indiretamente outros aspectos
sociais importantes.
Do mesmo modo que a religião esta sempre situada num contexto social
específico assim, também, ocorre quanto ao modo de produção.

O modo de produção específica de uma sociedade fixa os limites dentro


dos quais tal religião pode ali atuar. Assim, o modo de produção específico de
32

cada sociedade particular condicionará as possibilidades e impossibilidades, a


importância, o significado, as funções, as formas de organização, os discursos, as
práticas, o desenvolvimento, as transformações e a difusão mais provável que
cada religião poderia esperar e conseguir no meio da sociedade concreta em que
atua.

3.3. A Religião nas sociedades divididas em classes.

Além do conteúdo organizável, outros fatores influenciam no modo de


produção, tais como: o modo tradicional de produção que o grupo conheceu, as
relações sociais internas e externas.
A partir daí pode-se classificar os diversos modos de produção em dois
grupos: os comunitários e os assimétricos.

Os comunitários são aqueles que em tudo, todos participam, enquanto os


assimétricos apenas uma minoria dominante participa dos resultados finais da
produção.

Na América Latina atualmente há a predominância dos modos de produção


assimétricos, sobretudo o capitalismo; mas há também uma minoria – indígenas,
camponeses - que possuem traços da produção comunitária.

Ao observar que uma sociedade seja qual motivo, se organiza dentro de um


modo assimétrico de produção, este fato gera um processo progressivo de
estruturação da sociedade em classes sociais. Classes sociais com graus de
poder bem diversos, relações de dominações e interesses objetivamente
contrapostos como, por exemplo: o sistema colonial de Portugal e Espanha na
América Latina.
33

Uma sociedade assim organizada tem sempre a minoria no poder, pois,


está com o controle dos meios de produção, que domina uma maioria
subordinada.

O poder desigual de controlar a produção – a distribuição e o uso dos meios


de produção, a distribuição da força do trabalho e a partilhar de bens produzidos –
traz relações de denominação entre os diversos em que se vai dividindo a
sociedade em torno da produção.

Enquanto uma minoria vai-se constituindo um conjunto de classes


dominantes, aumentando sua capacidade de decisão sobre o trabalho, o
descanso, a vida e a saúde, por sua vez, a maioria torna-se um conjunto de
classes dominadas, que perdem paulatinamente o poder de decidir o rumo da sua
vida.

Nesta forma de sociedade, as relações sociais, se situam em torno de


interesses contrapostos, isto é, a minoria, que tem o poder da produção nas mãos
quer manter de qualquer maneira uma organização assimétrica de produção,
enquanto a maioria dominada, e tenta sair da situação de domínio e recuperar o
poder decisório da sociedade. Daí, concluirmos que, uma sociedade com um
modo assimétrico de produção é uma estrutura objetivamente conflitiva de
dominação social.

Portanto, qualquer religião dentro desta sociedade, terá a estrutura social


atravessando, limitando e orientando a ação das instituições religiosas, queiram
esses ou não. Quer dizer, a estrutura conflitiva de dominação de qualquer
sociedade de classes estabelece uma maneira específica, os limites dentro dos
quais uma religião pode operar em seu seio e as tendências que atravessarão e
orientarão a atividade religiosa nessa sociedade (diferentes classes, poder nas
relações de produção).
34

3.4. A Religião numa sociedade complexa como a América Latina.

A estrutura básica das sociedades latino-americanas não está organizada


em um único e isolado modo de produção, mas por um conjunto articulado de
vários modos de produção coexistentes, isto gera uma complexidade dentro da
sociedade.

A população da América Latina a partir da colonização européia começa


então a atravessar um processo em que seus indivíduos e grupos são recolocados
em novas classes sociais – por exemplo, as sociedades pré-colombianas -,
mesmo no caso em que suas estruturas tradicionais são parcialmente preservadas
(mas uma nova relação social, imposta externamente como relação de
subordinação).

No meio de tal reestruturação já não é possível – salvo exceções – referir-


nos a uma religião situada numa estrutura de classe. Temos que falar, então, de
um campo religioso situado num processo conflitivo de reestruturação da divisão
em classes na sociedade. Esse processo é gerado pela macroestrutura dos
modos de produção articulados assimetricamente sob um modo de produção
dominante, e determina as marcas específicas do foco social de limitações e
orientações (contraditórias e assimétricas) exercidas sobre o campo religioso por
aquela macroestrutura.
35

Assim o processo religioso fica restrito aos caprichos da sociedade em que


ele está inserido.

Dessa maneira, a América Latina é conduzida no final do século XIX por um


caminho em que se instaura um campo religioso dividido, com uma Igreja
predominante, onde se ocupa um lugar secundário na sociedade latino-americana,
tanto objetiva quanto subjetivamente, e estando cada vez mais distante do resto
das instituições sociais; operando-se um processo de burocratização cada vez
mais permeável à consulta, às pressões e aos conflitos. Surgindo um discurso
religioso bastante complexo, sistematizado e conflitivo.

3.5. A Religião no meio da estrutura de classes em conflito.

As sociedades latino-americanas são sociedades de classes. Isto significa


dizer que, na América Latina, a produção dos bens necessários para a
sobrevivência do povo, bem como o modo de adquiri-los, então organizadas de
maneira desigual e assimétrica quanto:

- Ao acesso aos meios de produção;


- À distribuição da capacidade de trabalho;
- À partilha dos produtos finais do trabalho humano. Tendo sempre uma
minoria no poder e uma maioria explorada.

Esta situação determina um conflito de interesses, que atravessa todas as


dimensões da vida social e desarticula com o todo, indivíduo ou grupo atuante no
meio de tal sociedade, independente de qualquer coisa. Trata-se do conflito entre
36

as classes objetivamente interessadas em preservar e usufruir a estrutura social


em que elas ocupam na posição dominante, e as classes de algum modo
interessadas em transformar essa mesma estrutura em que ocupam uma posição
subalterna.

Assim sendo, toda ação religiosa, numa sociedade de classes é uma ação
que não está nem por fora nem por cima dos conflitos de classes: agentes,
públicos e contexto de toda a ação religiosa numa sociedade de classes, toda
ação religiosa é uma ação efetuada no seio dos conflitos de classes e, como tal, é
uma ação atravessada, limitada e orientada por tais conflitos.

As variações significativas no caráter de uma ação religiosa no interior de


uma classe social independente da posição objetiva que cada setor público
atingido ocupa na estrutura de classes da sociedade. Por conseguintes, a rejeição
ou aceitação (e o grau desta ou daquela) de uma religião, sua interpretação
seletiva, uma difusão (de massa ou setorial, lenta ou rápida) e suas expressões a
nível prático hão de variar significativamente de uma classe social para outra no
seio de uma época e sociedade.

3.6. A Religião na dinâmica conflitiva das classes sociais.

Toda classe social é um grupo móvel em processo de construção ou


destruição ou reconstrução, que geralmente é um processo duplamente conflitivo,
e sua posição na divisão social do trabalho são em cada caso concreto, um
momento ou ponto desse processo de sua construção/destruição como classe;
sempre partindo de uma situação preliminar.
37

Por isso, a relação de cada classe social – em um momento histórico


determinado – com o campo religioso ficará determinada não só pela posição
estrutural desta classe na divisão social do trabalho (perspectiva estática – mas –
também – pelo processo que levou esse grupo a ocupar aquela posição
(perspectiva dinâmica)).

Nesse sentido, então, a relação de cada parcela de classe com o campo


religioso estará condicionada também pelas quatro dimensões do processo de
construção na qual está inserida: origem particular, trajetória peculiar (ascendente,
estacionária, ou descendente), a conjectura concreta (relações), a estratégia
específica. Esta quarta dimensão é a que nos interessa dentro da formação de
uma classe.

Entendendo como estratégia de uma classe as possibilidades e tendências


objetivas que traçam o futuro provável (econômico, político, cultural) de um grupo
social e orienta por esse motivo, seu pensamento e sua ação independentemente
da consciência e da vontade das pessoas envolvidas. Tal estratégia pode ser
então de conquista do poder, de conservação do poder adquirido, de reivindicação
reformista, de submissão transacional ou de resistência diante da marginalização.

Para melhor entendermos esta questão, observemos o exemplo: As


necessidades religiosas de uma favela operária de origem camponesa, trajetória
descendente de marginalização, conjuntura desfavorável e estratégia de
submissão transacional, não será as mesmas necessidades religiosas de um
bairro operário de origem operária, trajetória ascendente de modernização,
conjuntura favorável e estratégia de reivindicação reformista.

Provavelmente – diga-se de passagem – o grupo da favela será bastante


receptivo, muito provavelmente, a seitas religiosas do tipo “Testemunha de Jeová”,
enquanto o do bairro será extremamente refratário a qualquer sistema religioso do
tipo apocalíptico.
38

A dinâmica conflitiva inerente a toda a sociedade de classe é, em princípio,


uma dinâmica assimétrica, isto significa que a sociedade se caracteriza pelo poder
desigual que existe nos diversos setores do trabalho (meios de produção,
distribuição da força do trabalho e dos produtos finais) e pelas relações conflitivas
entre os dominados e dominantes pelo poder da direção da sociedade.

Por conseguinte uma religião qualquer dentro dessa sociedade conflitiva


está submetida a um conjunto de limitações e orientações geradas pelo mesmo
processo de dominação, e tendentes a fazer da mera dominação uma verdadeira
hegemonia. Isto é a leitura, a interpretação e as definições oficiais (éticas,
litúrgicas, doutrinárias) originada da mensagem fundadora da religião estará
limitada e orientada pela classe dominante vigente.

Esse processo de submissão do campo religioso à dinâmica da dominação


de classe resulta do interesse objetivo das classes dominantes em conseguir
consolidar sua dominação e instaurar sua hegemonia.

Está estratégia implica no exercício da coerção e da persuasão a fim de


obter o consenso geral do seu domínio hegemonia – condição para se declarar
dirigente, tanto no poder material (econômico, político, militar,...) como no poder
simbólico (moral, educacional, literário, artístico,..., religioso). A dominação de uma
classe social não surge da noite para o dia. Nenhuma sociedade de classe é uma
sociedade de pura dominação. Diante da dominação, os dominados sempre
exercem de alguma forma de resistência.

A submissão é sempre um processo conflitivo cheias de reveses e paradas.


Portanto, todo o grupo social que aparentemente se vê dominado, se vê
imediatamente colocado independentemente de sua vontade e consciência em
uma estratégia de resistência à dominação.
39

Toda classe dominada tem como interesse conseguir o máximo de


autonomia possível. Este fato gera conflito porque vai de encontro com o interesse
da classe dominante de consolidar a sua hegemonia.

Esse interesse das classes subalternas em conseguir autonomia religiosa


exerce sempre um significativo impacto sobre a estruturação e a dinâmica do
campo religioso. Gerando um conflito latente ou aberto entre os dominados
(autonomia) e os dominantes (hegemonia) gerando cismas e movimentos
sectários.

Concluímos que, a resistência de classes à dominação também há de


exercer, assim, suas próprias orientações e limitações sobre a leitura, a
interpretação e as definições oficiais derivadas da mensagem fundadora de uma
religião dada que atue no seio das classes subalternas.

4 - O CAMPO RELIGIOSO COMO TERRENO RELATIVAMENTE


AUTÔNOMO DE CONFLITOS SOCIAIS.

O campo religioso, não é só produto das relações dos conflitos (macro)


sociais, mas se constitui a si mesmo como uma rede específica de relações
(micro) sociais, com uma certa realidade e estabilidades próprias e particulares.

4.1. – Interesse Religioso e Produção Religiosa.


40

Algumas sociedades e certos grupos sociais tendem a elaborar uma visão


do mundo total ou parcialmente religiosa, o interesse em dispor de uma
representação comunicável do meio ambiente, que lhes permita situar-se e atuar
dentro dele, se define como interesse especificamente religioso, que se
caracteriza pela necessidade de dirigir o seu comportamento.

A religião qualquer que seja, não é tão-somente nem primariamente um


conjunto dado, já estruturado, de práticas e discursos referidos a forças
sobrenaturais e meta-sociais.

Qualquer religião é o resultado de um processo de produção, produto de


um trabalho socialmente objetivo de estruturação da experiência coletiva de uma
comunidade (ou de um grupo social), a partir do contato com uma personalidade
carismática e tendo na base o interesse de contar com uma visão do mundo
referida à forças sobrenaturais e meta-sociais. A religião antes de cristalizar-se em
sistema de práticas discursos é o processo de produção, antes de ser produto.

O campo religioso, precisamente enquanto conjunto de atores de


instituições sociais especificamente encarregados da produção religiosa constitui
então a instância mediadora do impacto dos conflitos sociais sobre a produção
religiosa como tal; e essa instância é capaz de obstaculizar, facilitar, filtrar
seletivamente ou dirigir as influências que, surgindo fora do campo religioso,
tendem, no entanto, a exercer-se sobre esse campo como tal.

O fundamento da autonomia de uma religião qualquer se dá


sociologicamente falando em três dimensões:

a).Subjetiva, enquanto visão do mundo capaz de orientar satisfatoriamente


uma comunidade ou um grupo social, em seu meio ambiente sociocultural;
41

b).Objetiva, enquanto conjunto de práticas e discursos socialmente


compartilhados;
c). Propriamente institucional, enquanto produzidos, reproduzidos,
conservados e difundidos por um corpo estável de funcionários
organizados.

4.2. . A Fragmentação Conflitiva do Interesse e do Trabalho Religioso.

A primeira grande divisão do trabalho religioso consiste no “laicado” (massa


objetivamente despojada dos principais meios legítimos de produção religiosa) e
no clero (corpo especializado de funcionários).

O campo religioso tende a refletir a mesma divisão do trabalho que a


sociedade que influí, e daí os interesses religiosos formam um conjunto conflitivo e
assimétrico estruturado.
Essa fragmentação do campo religioso se dá em três níveis:

a) No nível da divisão entre clero e laicado: o clero quer dominar os bens


religiosos enquanto que o laicado luta para obter os bens religiosos (meios de
salvação);

b) No nível específico da divisão social interna do laicado: o interesse religioso do


laicado se torna a procura religiosa dirigida ao clero, que gira em torno de dois
pólos fundamentais: o da classe dominante – legitimação da dominação – e
das classes dominadas – compensação da sua condição subalterna e uma
tentativa de contra-legitimação da ordem estabelecida.
42

c) No nível específico da divisão interna do clero: o interesse religioso redunda


em estratégia de conquista e conservação do poder religioso. Determina a
estruturação do clero como um corpo com relações de denominação em seu
próprio seio (“alto clero” x “baixo clero”).

A divisão interna do trabalho religioso tem como conseqüência um duplo


conflito (clero/laicado; alto clero/baixo clero), e isto vai Ter implicações
grandemente significativas para a organização, as práticas e os discursos
religiosos produzidos no seu seio. Daí se fazer necessário a sistematização e a
moralização do discurso religioso.

4.3. A Produção Religiosa Especializada como Produção Transacional.

A produção religiosa elaborada numa sociedade de classes tem um trabalho


religioso especializado e é sempre, uma produção transacional, isto é, uma
produção que por efetuar usem meio de interesse múltiplos, diversos, conflitivos e
assimétricos tende a satisfazer de modo parcial e desigual todas e a cada uma
das diversas categorias e frações interessadas nessa mesma produção.

A dinâmica do campo religioso, isto é, sua atividade e as transformações dessa


atividade, encontra seu fundamento precisamente nos inevitáveis conflitos e nas
correlativas transações surgidas da diversidade de interesses entre clérigos e
leigos e entre as diferentes categorias de clérigos e também entre as diversas
frações de laicado.
43

4.4. A Procura, Produção e Consumo de Bens Religiosos.

As relações que ocorrem entre o campo religioso e os conflitos sociais no nível


especificamente religioso distinguem-se em três momentos da produção de bens
religiosos (discursos, ritos, normas, objetos,...); o momento da procura, o da
produção propriamente dito e o do consumo de bens religiosos.

Concluindo, o campo religioso é o terreno onde se condensa o poder religioso


enquanto resultado das lutas e transações prévias entre leigos e clérigos, o
terreno onde se manifesta o poder religioso enquanto momento do processo de
expropriação/apropriação dos meios da produção religiosa, e o terreno onde se
trava a luta pelo poder religioso enquanto objeto dos conflitos sociais.

5. O CAMPO RELIGIOSO COMO FATOR ATIVO NOS CONFLITOS SOCIAIS.

O campo religioso é um meio de ação na sociedade sobre si mesma: para que os


seres humanos possam produzir, reproduzir e transformar suas relações, isto é,
para que a sociedade possa atuar sobre si mesma, é de mister que esses seres
humanos percebam seu meio sócio natural de maneira compreensível e
comunicável.
44

Para que este último seja factível, é preciso que haja uma representação –
compreensível e comunicável da experiência coletiva em uma cosmovisão
compartilhada pela coletividade em pauta, que permita a seus integrantes situar-
se, orientar-se e, por conseguinte, atuar sobre seu meio sócio- natural.

Ora se o campo religioso está nas sociedades de classes com


especialização do trabalho religioso uma instância social encarregada de elaborar
uma cosmovião (com a especificidade de se achar referida a forças sobrenaturais
e meta—sociais) .

As funções sociais de uma religião em um contexto social determinado


podem variar conforme as variações estruturais e conjunturais da sociedade em
destaque, e podem variar segundo as variações históricas, estruturais e
conjunturais do campo religioso, podem variar desta para aquela época, de um
lugar para o outro, de um grupo social para o outro, desta para aquela religião, de
uma categoria de clérios para outro.

A função conservadora, desempenhada eventualmente por um sistema


religioso em uma sociedade de classes, é uma função desempenhada
exclusivamente mediante a difusão e inclusão de um produto religioso adequado
aos interesses da classe dominante.
45

6. CONCLUSÃO.

Otto Maduro expõe no seu livro um quadro e marco teórico da gênese, da


estrutura e das funções sociais do campo religioso em sociedade presidida por
relações conflitivas entre classes sociais, como a latino-americana.

Mas deve ficar bem claro que, o campo religioso não é unicamente um
produto dos conflitos sociais nem tampouco realidade absolutamente
independente, desligada dos conflitos sociais.
O campo religioso é uma realidade parcialmente produzida pelas relações
sociais e autônomas, onde é também fator que atua produzindo relações sociais.

Produto, terreno e fator ativo nos conflitos sociais em nosso continente, o


campo religioso constitui uma das dimensões onde sociedade latino-americana,
quase sempre sem o saber sequer, decide hoje, a partir de seu passado, as
possibilidades, os limites e as orientações de seu futuro próximo.
46

V. RELIGIÃO E MODOS DE PRODUÇÃO (F. Houtart).

INTRODUÇÃO.

Abordagem deste livro é marxista, retém a epistemologia essencial e os


métodos macro-sociológicos de análise. Ele considera a religião como um
componente da superestrutura das sociedades, sempre aliada à classe
dominante.

As funções sociais da religião são iguais às relações (estruturas) sociais e as


práticas exigidas por sua reprodução.

A religião pode fornecer a explicação e a justificação das relações sociais, bem


como constituir o sistema das práticas destinadas a reproduzi-las. Por exemplo,
temos o hinduísmo, com o sistema de castas era fruto de uma decisão divina, e
consequentemente uma estrutura social.

O objetivo deste, e é analisar as funções sociais da religião nos diversos tipos


de sociedades que precedem o desenvolvimento do capitalismo.

Eis o que abordaremos:

- Modo de produção Tribal


- Modo de produção Tributário
47

- Modo de produção Escravagista


- Modo de produção Feudal.

Será abordado também, algo sobre as religiões do Oriente bem como o


Judaísmo.

1 - Definição.

Modo de Produção: Representação simplificada, ideal, de diversas formas de


organização da vida social, isto é, da natureza dos elementos que as compõem,
de suas relações e das bases estruturais de sua própria transformação: o campo
econômico, campo político, ideológico (conjunto de modalidades onde repercutam
sua própria realidade).

“A organização da economia nos modos de produção pré-capitalistas, baseia-


se em categorias intermediárias entre 2 extremos: a economia tribal e a economia
capitalista.

2 . Religião e Coesão Social Nos Diversos Modos de Produção

a) As sociedades tribais: caracterizada pela simples ocupação do meio de


produção e pela liberdade de trabalho. Primeira formação de tribos onde há
oferendas e sacrifícios. A economia não conhece intercâmbios comercias, o
48

produto é distribuído no interior do grupo segundo um sistema de troca


regulado pelas relações de parentesco, que assume as relações de produção.
A produção é feita para sustento próprio.

b) Um exemplo desta sociedade tem no Antigo Israel, que eram os clãs e no


Budismo com as castas. As significações religiosas são as que se elaboram
em torno do fenômeno da natureza e as ligadas às expressões sociais do
grupo. A natureza personifica as forças naturais, adquirem poder sobre estas
(ilusório), e nas expressões sociais temos o TÓTEM que representa o grupo
enquanto unidade social ou, o lugar de residência do divino..... A passagem
para o tributário se dá quando é preciso aumentar a produção, para pagamento
do rei, exército...

c) Modo de Produção Tributária: Forma social diretamente derivada das


sociedades tribais (segundo Marx). Sistema dominante: político, daí organiza-
se a vida material. Como exceção do tótem a religião é a mesma da sociedade
tribal. A base da religião é a troca, a produção do excedente: é preciso produzir
para pagar os tributos impostos.

d) Modo de Produção Feudal: Também é o poder político (sistema dominante)


que organiza a economia e se apropria de um tributo em espécie e em serviço
fixado sobre a produção dos grupos de base; apropriação do meio de produção
(a terra).

e) Modo de Produção Escravagista: o homem é obrigado a passar tributo,


quando não consegue mais produzir para pagá-los, torna-se escravo ou
compra os mesmos. O trabalhador escravo faz parte dos meios de produção.
Não se encontra uma leitura religiosa da escravatura, a relação de produção é
transparente, pois o escravo constitui objeto de intercâmbio mercantil, ou seja,
apropriação da terra e da força de trabalho.
49

Todos os modos de produção se caracterizam em diferentes níveis, por um


desenvolvimento relativamente fraco das forças produtivas.

A existência de excedentes (produção maior que o consumo), é fundamental,


na origem das sociedades de classes. Com exceção das sociedades tribais, todos
os modos de produção baseiam-se na apropriação dos excedentes.

3 Representações Simbólicas e Funções da Religião .

As sociedades tribais são dependentes das forças naturais. Os clãs do Sul da


Índia representavam as forças da natureza sob forma de uma multidão de
“espíritos organizados por um chefe e dotados de uma vontade e uma inteligência
superior às dos homens”.

As práticas rituais têm como objetivo neutralizar as forças adversas agindo,


direta e eficaz sobre elas, com a intenção geralmente de um agente religioso, o
feiticeiro, como mediador:
.
“Um dos clãs (Kuravas) identificava-se com o tótem e cada aldeia reproduzia
as mesmas práticas. Era sob a árvore tótem, que as realizava a assembléia dos
anciãos, era o lugar de habitação da divindade etc., o tótem era o ponto de
encontro entre os cosmos, a ordem social e a natureza”.

No modo de produção tribal, a necessidade de assegurar a solidariedade entre


os grupos que devem se integrar em uma estrutura de relações de parentesco, a
fim de garantir sua continuidade, constitui a base das representações das relações
sociais.
50

A expressão de unidade (o tótem) não se reveste uma conotação religiosa. A


vida sobrenaturalizada torna-se própria essência do divino.

4 - Características das Sociedades Pré-Capitalistas de Classes .

(a) Modo de Produção Tributária: O excedente era feito por intermédio de um


intercâmbio de serviços. Havia um dualismo entre grupos de caráter familiar
como forma de relação social.

(b) Modo de Produção Escravagista: O excedente era feito por total sujeição de
um grupo de constituído pelas forças de produção e o meio de produção.
Foram das relações sociais: dualismo entre cidadãos livres e escravos
empregados diretamente pelo Estado.

(c) Modo de Produção Feudal: Pela apropriação do meio de produção era feita a
apropriação do excedente e a forma das relações sociais era de dualismo entre
os possuidores do meio de produção e aqueles que detêm a sua utilização.

Agora começa a surgir uma classe capaz de substituir sem Ter que produzir
por si própria os seus meios de subsistência (apropriação de um excedente).

5 - Modos de Produção.
51

A. Modo de Produção Tribal: As sociedades tribais são exemplos das


sociedades não diferenciadas, ou seja, das sociedades sem classes.

Havia uma distribuição de trabalho entre as gerações ou entre os sexos. O


sistema de parentesco, baseado na troca de mulheres, regulava o uso de
produção, apresentando-se como predominante no conjunto social.

O uso do meio de produção era coletivo, bem como a organização trabalho


e a distribuição do produto social.

Havia diferenças de categorias, mas sem que os indivíduos dos grupos


fossem dispensados de uma participação direta na produção.

A religião servia no campo simbólico as contradições resultantes das


relações com a natureza, e as contradições no campo das relações sociais de
parentesco, e fornecia um sistema de construção do sentido global do homem e
do universo.

B. Modo de Produção Tributário: As relações de produção se


estabelecem por meio de um tributo a pagar em espécie ou em serviço,
ou até mesmo em moeda. As entidades locais mantêm a apropriação do
meio de produção (terra) e organizam o processo de trabalho. O Estado
realizava obras de prestígios (palácios e templos), encarregava-se de
grandes obras de irrigação, explorava minas e empregava artesãos a
seu serviço.

b.1.) – As funções da religião no modo de produção tributária:


52

A seqüência religião/natureza no modo de produção tributário continuaria


sem alteração. Há um fortalecimento das forças produtivo origem da produção de
excedente.
Continuidade da existência das entidades locais (clãs ou aldeias); produção
religiosa igual com funções transformadas.
Abandono de expressões próprias (tótem, por exemplo), a aceitação da
superioridade da divindade principal do grupo dominante.

C. Modo de Produção Escravagista: A não liberdade significa ser


possuído por um outro ser humano, que dispõe não só da força
produtiva, mas pela pessoa.

As relações sociais não tinham a religião como ponto de referência, nem


por parte dos escravos nem dos senhores.

Essa sociedade lia o conjunto das relações sociais em termos da vontade


divina (ordem social desejada por Deus), não considerando justificável a relação
servil. Havia pouca ação por parte da Igreja para mudar a situação.

D. Modo de Produção Feudal:


53

- Feudo: uma porção de terra entregue sob a sentença judicial a um


senhor. Ponto de vista, sociológico é um conjunto Associal dominado
pelas relações de produção estabelecidas entre camponeses e
senhores de terra. Os camponeses viviam do excedente, e os
senhores eram submetidos às obrigações extras econômicas. As
relações de produção caracterizam-se pela propriedade jurídica da
terra pelos camponeses (arrendamento) em troca de corvéias, taxas.

d.1.) As funções da Religião no modo de produção feudal:

A necessidade social de religião é determinada por uma


função essencialmente ideológica. A religião cumpre uma função ideológica por
excelência em um sistema de homogeneidade estrutural, ou seja, resolve
simbolicamente para todos os grupos, as oposições existentes ao nível das
relações sociais e do exercício do poder. Já que a apropriação do meio de
produção é que torna a base de absorção do excedente e da organização do
trabalho a representação é sempre religiosa.

6 - As Condições Sociais da Gênese e do Desenvolvimento dos Grandes


Sistemas Religiosos do Oriente.

Desenvolvimento das religiões asiáticas conjuntamente com as sociedades


de classe e contribuição da solidez das estruturas sociais.
54

As religiões tradicionais do Sul e Leste da Ásia achavam-se ligadas às


classes dominantes, na sua gênese; isso marcou seu desenvolvimento e suas
presentes funções:

a. HINDUÍSMO: Religiosamente há vestígios arqueológicos que


demonstram a existência de um culto à deusa mãe (terra) e um deus
da fertilidade, do grupo étnico, na índia composto de ancestrais, que
ainda hoje se encontra na metade meridional da península. Com
invasão dos arianos (para ocupação de terras), os drávidas foram
para o sul. Os arianos eram populações nômades cuja organização
social era tribal. Com a sedentarização houve mudanças na sua
organização social.

A sedentarização repercutiu sobre as crenças e práticas religiosas: 1 º. O


mito cósmico se tornou mais complexo para explicar a origem dos elementos de
ser ambiente; 2º. A crença nos espíritos desaparece e aparece um panteão de
divindades personificadas; 3º. A água constitui elemento central; 4 º. Aparece uma
seqüência nova no sistema religioso: o culto dos ancestrais, que fortalecia a
dimensão tribal, dos grupos.

b. BUDISMO: Seu fundador Gautama preocupado com a miséria


material e moral e com os sofrimentos rejeitou a solução
apresentada de que tais coisas eram conseqüências, da conduta de
cada um. Sua posição aliviava-se o ascetismo à reflexão teológica. A
iluminação (central do budismo) representa o momento que Buda
55

começa sua vida intinerante divulgar seu sistema (identifica as


causas do sofrimento individual ou social à sede de prazer, vida,
riqueza ou/ e poder. A luta contra o sofrimento implica na destruição
desses desejos.

O Budismo constitui um sistema de normas e condutas favoráveis à


manutenção da ordem social.

c. CONFUCIONISMO: Kung Fu-Tze seu fundador tinha como ensino


ajudar à superação do caos político e restaurar a paz. Sua doutrina
reintegra crenças religiosas anteriores: respeito aos ancestrais,
insistência nas cerimônias sacrificiais dos reis, necessidades de
obediência e de conformidade com a vontade de Tien (o céu).

Socialmente colocam em violência os valores da classe aristocrática feudal,


só quem pode garantir a estabilidade da ordem social é a família patriarcal.

d. TAOÍSMO: Da mesma época do confucionismo. No início foi mais


filosofia do que religião. Seu fundador Lao Tse (Fundador).

As comunidades taoístas não tinham projeto de transformação social,


apesar de esperarem por um imperador perfeito. Mas mesmo assim no tempo das
crises econômicas surgiram comunidades que organizaram em sociedades
secretas para rebelião.

e. JUDAÍSMO: Os descendentes de Abraão formaram 12 clãs fixados


no Egito como escravos. Mais ou menos 1.250 a.C. as tribos
abandonam o Egito indo para diversas regiões da Palestina. Mais ou
menos 1.200 se estabelece a união das 12 tribos. Houve um acordo
56

político religioso entre esses grupos para proteger um santuário


central que simbolizava a origem e crença no mesmo Deus. A
religião criava a coesão social. Na história do povo judeu, o judaísmo
cumpriu grandes funções sociais como elemento central na unidade
das tribos.

7 A Religião na Formação Social da Palestina do Século I e o


Protagonista Sócio – Religioso: Jesus.

A Palestina estava ocupada pelos romanos: relação colonial exercida por


uma sociedade cujo modo de produção era escravagista sobre uma sociedade
que caracterizada pelo modo de produção tributário.

8.1. A Formação Econômica: Atividade econômica: agricultura e pecuária


(incluindo pesca) e a produção artesanal. Forças produtivas; arados
em rodas técnicas de pesca relativação empíricas, produção artesanal
primitiva. Os escravos cobriam amplo setor da atividade produtiva e de
serviço que eram comprados por contrato escrito como mercadorias e
animais. A atividade mercantil era próspera, controlada por um sistema
de impostos (insuportáveis com Herodes).

8.2. A Formação Social: Sistema social complexo, constituído por um


sistema de classes sociais típicos do modo de produção tributário.
57

8 - ESTRUTURA DE CLASSES, PODER POLÍTICO E CORRENTE


IDEOLÓGICAS.

a. SADUCEUS: Desse grupo provinha os anciãos controlavam a


administração da justiça no tribunal Supremo (Sinédrio); do mesmo
grupo provinha a elite sacerdotal que administrava o templo e era
responsável pelo culto. Portanto, concentravam todo o poder político
em suas mãos. Foram os maiores colaboradores da dominação
romana na Palestina e sempre mantiveram uma política de
conciliação, pelo medo de perder seus cargos e privilégios. A ala
nacionalista do judaísmo os odiava.

Na religião eram conservadores: aceitavam apenas a autoridade da lei


escrita e rejeitavam as concepções aceitas pelos escribas e fariseus. Como grupo,
desapareceram com a destruição do Templo pelos romanos em 70 d.C.

b. FARISEUS: Inicialmente aliados à elite sacerdotal e aos grandes


proprietários de terra, deles se afastaram para dirigir o povo, embora
sempre à distância deste. O povo (para eles) era maldito, pois
desconheciam a Lei, logo, não poderiam se salvar

Eram nacionalistas e hostis ao império romano. Na religião eram


caracterizados pelo rigoroso cumprimento da Lei em todos os campos e situação
da vida.
Acreditavam na predestinação, ressurreição e messianismo.
58

c. ESCRIBAS: No tempo de Jesus, este grupo estava em ascensão.


Seu poder redizia no saber. Especialistas na interpretação da
Sagrada Escritura.

Tinha influência no Sinédrio (como juristas) e na Sinagoga (interpretes da


Sagrada Escritura).

Apesar de não pertencerem economicamente à uma classe abastada,


gozavam de uma posição estratégica, monopolizavam a interpretação da Sagrada
Escritura, tornando-se os guias espirituais do povo, influenciando a vida social e
determinando até mesmo as regras que dirigiam o culto.

d. ESSÊNIOS: Saído dos Fariseus. Sua organização comunitária,


caracterizava pelo sacerdócio e a hierarquia, rigoroso legalismo,
espiritualidade apocalíptica e a pretensão de representar o
verdadeiro povo de Israel.

9 O PROTAGONISTA SÓCIO RELIGIOSO: JESUS.

Jesus foi proveniente de círculos escribas e fariseus. Opôs-se a nobreza


sacerdotal e grande burguesia, ao baixo clero e a pequena burguesia escriba
farisaica. Sua vida de pregação desenvolveu-se na Galiléia. Região de
crescimento do Zelotismo e Movimento Messiânico.
59

Sua classe foi a pequena burguesia artesanal, mas sua base social era
constituída, pela massa marginalizada do processo de produção e pelas massas
camponesas sem instrução.

10 CONCLUSÃO.

Toda desigualdade entre grupos sociais deve encontrar sua


explicação a fim de criar um consenso social.

Na medida em que a representação da relação social torna-se


desigual, ocorre uma projeção no campo sobrenatural. A transformação do
principal meio de produção, da terra para o capital financeiro, destrói toda
representação religiosa das relações sociais de produção.
60

VI. GRAMSCI E A QUESTÃO RELIGIOSA.

Introdução.

Antônio Gramsci, fundador do partido comunista italiano em 1921,


destacou-se como um dos mais brilhantes teóricos marxistas deste século.

Nascido em Ales (Sardenha) em 1891, filho de camponeses pobres,


lutou desde criança pela sobrevivência. Ao ganhar uma bolsa na Universidade de
Turim em 1911, estudos, filosofia e literatura, participando do comitê do Movimento
Socialista, criou em 1917 a Associação Proletária de Cultura, interpretando as
massas na ação política. Redator do Avanti e da revista L’Ordine Novo, criada
por ele, publicou na mesma o “Programa da Fração Comunista”, primeiro
documento oficial do PCI, lançando o manifesto Per il Congresso dei Consigli de
Fabrica, apesar das violentas reações dos industriais.

Ativista e organizador, foi designado para representar o partido em Moscou, onde


casou com Julia Schucht. Fundou em 1923 o jornal Lúnita, enunciando a aliança
entre os extratos pobres da classe operária do norte e os campesinos do sul.
Como líder e deputado nacional, lutou contra o fascismo na Câmara e na
Imprensa, sendo preso em 1926, apesar da imunidade Parlamentar, e
sentenciando a vinte anos, não obstante os protestos do mundo inteiro.

Este foi o período mais crítico de sua vida, porém de maior vigor
intelectual, apesar da decadência do organismo na miserável prisão. Nos 32
cadernos escritos no cárcere, palpita não somente uma incrível força de vontade,
mas o fruto de um pensamento genial num esforço prodigioso de memória,
deixando-nos o testemunho do profundo sentido histórico numa concepção
ousada do marxismo, na consciência do que somos como produto deste processo.
61

Faleceu tuberculoso em 19370, aos 46 anos, onze dos quais prisioneiro da


ditadura, e “.... mantendo alta a dignidade do homem”, como firmou Croce.

O fenômeno religioso é um dos temas essenciais do pensamento de


Gramsci, naturalmente que sua perspectiva não leva em consideração a religião
enquanto fé, enquanto crença, mas sim o aspecto político da “dominação” pela
Igreja, através da religião, das classes operárias e camponesas, alvo de sua
atuação política.

O enfoque de Gramsci não é, entretanto, exclusivamente político, o que o


distingue de outros teóricos marxistas. Sua reflexão sobre a religião levou-o a
uma análise sociológica da classe camponesa e de sua integração religiosa e a
uma análise histórica da religião não como fé mas enquanto ideologia.

Ainda que em certos momentos muito regional ou limitada no que diz


respeito a contextos históricos determinados (o que em parte é explicável pelo fato
de Ter sido escrita na prisão e não em liberdade e com possibilidade de consulta a
outros textos), a obra de Gramsci nos apresenta uma visão coerente, produto de
reflexão obstinada e iluminada, do fenômeno religioso que não pode ser ignorada,
por mais que discorde de seus pressupostos teóricos.

Como Gramsci não escreveu um trabalho único sobre o fenômeno


religioso, mas aborda o tema em ocasiões diversas e esparsas em sua obra, a
tomada de contato com seu modo de pensar é facilitada pelo trabalho de H.
Portellim, que captou e filtrou nos escritos de Gramsci aquilo que se refere ao
problema da religião e sua importância para a compreensão da sociedade política,
formulando uma esclarecedora visão de conjunto, que tentaremos apresentar em
linhas gerais.
62

1. DEFINIÇÃO DO FENÔMENO RELIGIOSO.

A definição de religião como tipo particular de ideologia só permite captar


uma parte do fenômeno religioso. Para Gramsci, não é menos necessário o
estudo da Igreja como aparelho ideológico. Este estudo vai se basear na análise
histórica do papel despenhado por esta categoria de intelectuais, mas não sem
antes definir o aparelho religioso em relação ao aparelho do Estado Clássico e em
relação ao conjunto dos aparelhos ideológicos.

A análise gramsciana da Igreja e da religião baseia-se numa redefinição do


Estado. Se a Igreja se apresenta ao mesmo tempo como uma casta intelectual
autônoma e como o equivalente, ao nível ideológico, do aparelho do Estado em
nível repressivo, é porque ela constitui uma das engrenagens essenciais do
verdadeiro Estado, afirma Gramsci.

O Estado, tal como o entende Gramsci é constituído pelo conjunto


“sociedade civil + sociedade política, a função dominação – e os aparelhos
repressivos correspondentes – e a função hegemônica – e os aparelhos
ideológicos correspondentes”.

A definição gramsciana de Estado permite definir a Igreja como aparelho


ideológico do Estado e por isso precisa suas relações com a “sociedade política”.
O segundo problema que a análise do fenômeno religioso levanta situa-se
no nível das relações entre os diversos tipos de aparelhos ideológicos e
principalmente as existentes entre partidos políticos e Igrejas. Estes dois tipos de
aparelhos estando estreitamente relacionados.
63

O estudo privilegiado das ideologias políticas e religiosas e de sua difusão é


necessário na medida em que elas constituem as duas principais formas de
concepção do mundo. Por isso, o estudo da religião exige uma análise prévia das
relações entre sistema político e sistema religioso.

Nos “Quaderni” Gramsci sublinha principalmente, a partir dos exemplos


francês e americano, a correspondência entre multipartidarismo e unidade
religiosa, sectarismo religioso e unidade política. Sendo a estrutura dos sistemas
políticos e religiosos e suas relações recíprocas amplamente influenciadas pelas
existências e força de castas intelectuais tradicionais.

O segundo fator histórico essencial não é estrutural, mas está ligado à


relação entre aparelho ideológico (Igrejas, partidos) e o aparelho do Estado (forças
de coerção em geral).

Assim, a multiplicidade das seitas religiosas é, efetivamente, a


conseqüência, segundo Gramsci, das limitações às liberdades políticas. Aliás, a
criação de seitas religiosas não é fruto de iniciativas populares, mas ao contrário,
de uma decisão dos correspondentes da classe dirigente, que as utilizam para
canalizar os movimentos que não podem se organizar dentro do quadro político:
portanto, as seitas religiosas não passam de ramificações do aparelho ideológico
– religioso do estado. Portanto, sistema político e sistema religioso são
estreitamente dependentes. E, para além de sua interação, o problema que se
apresenta é o de saber qual é o aparelho ideológico dominante.

Durante o período medieval, a Igreja católica é ao mesmo tempo, aparelho


ideológico e aparelho político na medida em que ele detém o monopólio
ideológico. Mas, depois da contra-reforma esta função permanece apenas
parcialmente: a análise gramsciana da Ação Católica, dos partidos católicos
demonstra que a Igreja ainda continua um ramo do aparelho político.
64

A tendência geral vai permanecer, todavia, caracterizada um recuo político,


e, um acantonamento no domínio religioso.

Gramsci prevê, tendo em mente o partido de tipo comunista, que, ao


contrário, o partido político moderno na medida em que se afirma como a
expressão de uma Weltanschauung, tenderá a absorver o conjunto das funções
do futuro Estado que ele propõe, e, portanto o conjunto de sua estrutura
ideológica. Dessa forma ele englobará, superando-o qualitativamente, o aparelho
religioso, tendendo assim a tornar-se o novo tipo de aparelho ideológico
dominante.

Definindo a religião como uma forma de ideologia e a Igreja como um


aparelho ideológico de Estado, Gramsci dispõe dos dois instrumentos conceptuais
necessárias o estudo da função histórica do catolicismo.

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA.

Gramsci divide a evolução histórica do fenômeno religioso (catolicismo em


particular) em 4 períodos:

2.1. Aparecimento como movimento revolucionário.


2.2. Ligação com o Baixo Império.
2.3. Transformação em intelectual de classe feudal.
2.4. Declínio.

3. Cristianismo como movimento revolucionário.


65

A análise do cristianismo primitivo não é nova na literatura marxista. Ela


estabelece entre “revolução cristã” e revolução socialista.

Engels dedicou-se, sobretudo ao estudo da formação progressiva da


religião tentando reconstruir o filão ideológico do cristianismo (Fílon e Sêneca) e
depois sua elaboração propriamente dita – do apocalipse às cartas de Paulo.
Gramsci não se pronuncia sobre esta questão porque, para ele, o verdadeiro
problema está em saber concretamente que função ideológica e política
desempenha o cristianismo.

Esta questão que já havia sido entrevistado por Engels foi desenvolvida por
Gramsci de maneira original.

Engels analisou as seguintes questões:

- Quais eram os grupos sociais e nacionais cristianizados;


- Por que sua revolta assumiu a forma de uma religião;
- Por que o cristianismo triunfou das outras religiões da época.

Gramsci retoma parcialmente esta problemática, mas o faz a partir de dois


temas constantes nos Quaderni: a passagem da concepção cristã do mundo à
atitude prática cristã e à análise do cristianismo como tipo de movimento
revolucionário.

Gramsci e Engels completam-se assim de maneira notável: se a religião


cristã pode triunfar facilmente sobre seus rivais, foi porque ela os superava
ideologicamente – Engels -, mas sobretudo porque levava a uma norma de
conduta prática revolucionária – Gramsci. A isto Gramsci acrescenta que o
cristianismo primitivo teve a vantagem de Ter intelectuais notáveis capazes
precisamente de traduzir a religião em atitude prática.
66

Deste ponto de vista, Paulo desempenhou um papel determinante que


Gramsci compara ao de Lênir com relação ao Marx:

“Cristo – Weltanschauung – Paulo –Organizador, ação expansão da


Weltanschauung”.
A qualidade essencial de Paulo é, aos olhos de Gramsci, Ter sabido
elaborar prática – tanto em nível moral como político – na Weltanschauung cristã;
em resume, o fato de Ter sido um estrategista revolucionário.

A análise do cristianismo primitivo nos Quaderni está, efetivamente, ligada a


das estratégias revolucionárias.

A par das estratégias revolucionárias tradicionais “guerras de


movimento”, “guerras de posições”, Gramsci acrescenta a ”revolução
passiva”, uma passividade total em nível político e militar e um poderoso
determinismo fatalista em nível ideológico e que, portanto, se caracteriza pela
ausência de toda luta determinada contra a antiga classe dirigente, o que na
realidade leva a uma solução de compromisso, a uma ”revolução-restauração”.

Assim, o determinado fatalista da religião cristão, graças principalmente à


função da providência e ao tema da ressurreição igualitária, mesmo em condições
de luta totalmente negativas transforma-se em uma formidável força de resistência
moral, de coesão, de perseverança paciente e obstinada.

Além disso. Gramsci considera que a forma ideológica e política específica


do cristianismo primitivo – a resistência não violenta, se explica melhor ainda pelo
fato de que os povos oprimidos militares exerciam uma verdadeira hegemonia
cultural.
67

O cristianismo primitivo, para Gramsci, é tanto a expressão da resistência


dos povos os Romanos eram submetidos, especialmente os da civilização
helênica – como das classes subalternas propriamente ditas.
O cristianismo aparece, pois, inicialmente como um movimento ideológico e
político dos povos oprimidos e das classes subalternas. Tornando-se ideologia
oficial da classe dirigente, vai modificar consideravelmente esta função inicial.

4 . Ligação com o Baixo Império = A Igreja Depois do Edito de Milão.

Depois do Edito de Milão o cristianismo sofre uma transformação profunda,


conseqüência da modificação de suas relações com o aparelho de Estado
Imperial. A partir do momento em que se tornou a maneira exterior de pensar de
um grupo dominante, sua sorte e sua difusão não podem ser separadas da
história geral e, portanto, das guerras. Assim, o movimento de resistência não
violenta dá lugar a um aparelho ideológico que doravante utilizará a ajuda do
braço secular para vencer seus adversários. Teria se verificado no cristianismo o
que ocorre nos períodos de restauração em relação aos períodos revolucionários:
a aceitação atenuada e camuflada dos princípios contra os quais se lutara.

A conseqüência do Edito de Milão foi neutralizar as classes subalternas


pela união da hierarquia eclesiástica com o Império, através de algumas
vantagens corporativas e, sobretudo, do reconhecimento do cristianismo como
ideologia oficial e da Igreja como aparelho ideológico de Estado.
Gramsci sublinha particularmente dois aspectos que sobreviverão ao
desaparecimento do Império romano: o cosmopolitismo e o papel do Papa.

O cosmopolitismo era um fenômeno necessário na medida em que o


cristianismo se firmava como religião universalista e foi forçado pela sua
aproximação com o aparelho do Estado, ele mesmo cosmopolita e centralizado.
68

No nível ideológico, o culto imperial era o fundamento deste cosmopolitismo


intelectual. Como conseqüência da aliança Império - Igreja, esta herda
atribulações religiosas do imperador. Depois da queda do Império, o Papa herdará
a tradição do culto imperial. Na visão de Gramsci o papado teria feito uma
combinação entre os atributos do Sumo Pontífice e os do imperador divinizado.

Esta restauração não se limita à estrutura e ao papel da Igreja: ela atinge a


religião. Gramsci sublinha que ao difundi-se entre os grupos subalternos, o
cristianismo sofre a influência dos cultos pagãos, influência esta de que vimos o
exemplo com relação ao Papa; forma-se assim, uma religião popular muito
diferente do cristianismo oficial e cujas características sobreviveram: superstições,
feitiçarias, etc.

Por isso, a aliança como o Império romano modifica radicalmente o


cristianismo primitivo sob seu tríplice aspecto de movimento das classes
subalternas, de organização eclesiástica e de religião. É com esta nova face que a
Igreja vai tornar-se a estrutura ideológica do mundo feudal.

5 .Transformação Intelectual da Classe Feudal.

A situação da igreja medieval é a de uma categoria de intelectuais


orgânicos que controlam a sociedade civil feudal: esta organicidade repousa em
duas características permanentes do clero medieval: sua osmose econômico
político com a aristocracia e seu monopólio ideológico.

Gramsci considera que a igreja está, em larga escala na origem da


sociedade feudal. Depois das invasões e diante da decadência da civilização
urbana, os mosteiros tornaram-se os únicos centros intelectuais. É em torno dos
69

mosteiros que se estabelecem às novas estruturas sociais feudais, cuja partir de


uma divisão social do trabalho entre intelectuais religiosos e servos - artesãos.

A influência da Igreja sobre a estrutura da sociedade medieval não se situa


só no meio do rural: as sedes episcopais tornam-se centros religiosos e também
econômicos desempenhado papel importante na origem das colunas medievais.

Nos dois casos – no meio rural e urbano, a igreja aparece, pois, como uma
das origens da sociedade feudal. Gramsci conclui que esta origem explica sua
preeminência e a preeminência da instância intelectual, e, sobretudo, ideológica,
na Europa medieval: o vínculo orgânico entre a Igreja, casta intelectual, e a
estrutura feudal é um vínculo invertido: a casta intelectual está na origem da
classe fundamental da qual se tornará o intelectual orgânico.

Em razão de sua função econômica, a Igreja aparece, pois, como uma


categoria social ambígua, ao mesmo tempo classe feudal e casta intelectual.

A multifuncionalidade do clero explica, de outro lado, que sua preeminência


não se apoia unicamente em sua função ideológica; fora de seu papel econômico
com fração da aristocracia feudal, a Igreja controla certo número de ”serviços”.
Estes diferentes serviços correspondem a três funções específicas:

 Uma função ideológica dominante ligada ao monopólio ideológico da


igreja e que inclui o controle de todos os aparelhos culturais,
principalmente do ensino;
 Uma função repressiva: a justiça, sobretudo durante a Alta Idade Média;
 Uma função social, dirigida principalmente para as classes subalternas.

A função social não sendo mais que uma função secundária, pois a
assistência é a conseqüência do controle da Igreja sobre as classes subalternas.
70

Segundo Gramsci, ela está ligada à atividade da Igreja – aparelho econômico e


não da Igreja, organização religiosa.

A função repressiva é conseqüência, sobretudo, da hegemonia ideológica


da Igreja. É importante lembrar o prevalecimento do direito canônico sobre o
direito romano.

A função essencial da Igreja continua sendo a função ideológica: a religião


católica é a concepção oficial do mundo da sociedade feudal e a igreja, enquanto
aparelho ideológico único, encontra-se em situação privilegiada, na medida em
que todas as atividades superestruturais devem conformar-se ao quadro
ideológico do qual ela tem o controle e cuja reprodução ela assegura – Igreja,
Universidade, artes, etc.

A partir do século XIII a Igreja entra num período de crise, sofrendo


sucessivas contestações provindas dos domínios em que ela própria recuou
(direito, ciência). Essas contestações foram reabsorvidas enquanto ela manteve
sua hegemonia, exercendo sua função histórica.

O despertar da vida econômica e comercial depois dos anos mil e ascensão


da burguesia trouxe como conseqüência a volta do direito romano, para
regulamentar as novas relações sociais. Isto levou a uma redução do domínio do
direito canônico e as profundas modificações em sua estrutura.

Outro fenômeno que atingiu particularmente a hegemonia ideológica da


Igreja foi o desenvolvimento das línguas vulgares em detrimento do latim.
Colocando ao alcance do povo a cultura e as idéias, os responsáveis por esta
tendência tornaram-se “um fermento de heresia”.
71

Onde esta oposição do domínio ideológico da Igreja se apresenta de modo


mais claro é nos movimentos religiosos populares, que mereceram assim a reação
mais forte da Igreja.

Quando a ruptura foi total e assumiu a forma de luta política e ideológica


(heresia) a Igreja muitas vezes utilizou a força para tapar as brechas de sua
hegemonia (a inquisição, por exemplo).

Quando a ruptura não afetava a base ideológica da hegemonia a Igreja


adotou a tática de reabsorver ou recuperar o movimento contestatório,
canalizando-o para estruturas oficiais e integrando ou eliminando os líderes. Nem
sempre esta tática teve a mesma eficácia em longo prazo: é o caso de certas
ordens monásticas, que conservaram em seu bojo o fermento da reforma
ideológica: assim os dominicanos, dos quais saiu Savanarola, ou os Agostinianos,
de onde saíram a reforma e o jansenismo.

Enquanto na Baixa Idade Média a Igreja ainda tem forças para conservar o
controle ideológico da sociedade, a partir do renascimento o conflito se radicaliza
e torna-se uma crise orgânica.

6 . As revoluções e o Declínio da Igreja.

Gramsci chama de ”heresias” aqueles movimentos que apesar de em sua


concepção serem movimentos político - ideológicos, reveste-se de caráter
religioso na medida em que a Igreja Católica é a ideologia dominante. Assim
Gramsci não só considera as Reformas Luteranas e Calvinistas, mas também as
Revoluções Francesa e Inglesa.
72

Esses movimentos têm uma base social comum, a burguesia, e uma


estratégia comum frente às classes populares subalternas, além disso, têm 3
características básicas: são obra de pensadores nacionais, opondo-se ao
cosmopolitismo que domina a Weltanschauung católico-feudal, efetuam uma união
em torno de um ideal nacional e reinserem o povo na vida política e cultural e
finalmente, difundem uma ”reforma intelectual e moral”.

Gramsci analisa historicamente esses movimentos contestatórios, que em


sua opinião marcam uma evolução decisiva para a independência religiosa (e,
portanto, político - ideológica) em relação ao mundo católico - feudal. Ele mostra a
Igreja se vê obrigada a recorrer ao auxílio do aparelho repressivo do Estado, à
coação e repressão, perdendo assim progressivamente sua unidade e sua
autonomia frente ao Estado.

Subordinando-se ao Estado, a Igreja definitivamente seu caráter democrático, a


ponto de na Revolução Francesa a Luta deixar o terreno estritamente religioso
(ideológico) e passar a um campo abertamente político, envolvendo o clero (e,
portanto, a Igreja) na medida em que este estava intimamente identificado à
classe dirigente que era alvo do movimento.

A revolução Francesa completa, portanto, a crise ideológica da Igreja e a


coloca em posição subalterna.

A visão gramsciana completa o ciclo colocando o marxismo como herdeiro


e realizador na prática dessas três correntes. Gramsci utiliza para sua análise do
marxismo como ideologia os critérios que esboçou para o estudo do catolicismo,
na tentativa de evitar no primeiro a trajetória declinante do último.
73

7 . Considerações Finais.

Segundo Portelli o verdadeiro problema por Gramsci na sua análise da


religião é o de pesquisar porque a Weltanschauung religiosa não conseguiu forjar
uma norma de vida religiosa, e não se prolongou por uma práxis. Segundo ele,
com exceção do período heróico do cristianismo primitivo, os indivíduos e as
massas que tentaram conformar sua conduta prática à sua religião foram
condenados e/ou recuperados pela Igreja, que não cessou de impedir a realização
de uma verdadeira ”práxis”, tanto em nível individual como coletivo, a práxis
cristã fracassou, sob a pressão dos intelectuais religiosos, para tornar-se apenas o
“ópio do povo”.

Gramsci não se interessa essencialmente pela religião concepção do


mundo, mas, sobretudo pela norma de conduta prática que corresponde a cada
religião. Deste ponto de vista, a religião pode conduzir a atitudes totalmente
oposta: a ativa e progressista do cristianismo primitivo ou do protestantismo, ou a
passiva e conservadora do cristianismo jesuitizado. É esta Segunda forma que
Gramsci qualifica de opiácia, porque elas correspondem a uma fase declínio, na
qual a religião esgotou sua função histórica e só se mantém pelos artifícios e/ou
pela repressão.

A religião não é automaticamente o “ópio do povo”: ela se torna tal


quando, superada por uma concepção superior do mundo, impede toda evolução.
““A religião cristã, que em certo período histórico e em condições históricas
determinadas, foi e continua a ser uma” necessidade”, uma forma necessária da
vontade das massas populares, uma forma determinada de racionalidade do
mundo e da vida. “Mas, também neste caso trata-se do cristianismo ingênua, não
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do cristianismo jesuitizado, transformado em simples ópio para as massas


populares”.

Portanto, o determinismo católico é necessário quando corresponde a um


movimento popular, mas deve ser combatido quando leva as classes subalternas
à passividade.

A crítica gramsciana da religião está, pois, subordinada à apreciação da


função histórica de cada ideologia religiosa. A religião é, assim, estudada como
forma particular de ideologia.

Podemos aplicar esta crítica o nosso contexto de país do Terceiro Mundo,


espoliado pelo capitalismo civilizado do Primeiro Mundo, onde o catolicismo é
ainda uma força importante e quando a Igreja tenta uma reaproximação com o
povo, de diversa forma, inclusive ideológica – Teologia da Libertação – fazendo-
nos indagar em que medida esta visão sociológico – política enriquece nossa
concepção e nossa prática da religião cristã.
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VII. O PENTECOSTALISMO (Francisco Catarxo Rolim).

Introdução.

Os Pentecostalismos continuam sendo um assunto atual e interessante,


também continua despertando um enorme interesse aos sociólogos, antropólogos,
teólogos e pastoralistas.

Este trabalho como diz o tema é uma análise sócia religiosa do


Pentecostalismo no Brasil, que também está interessado em saber e questionar se
tomar alguns conceitos marxistas e procedimentos determinista que esvazia essa
religião de sua dimensão específica, ou pelo contrário, vem esclarecer vários
problemas comumentes colocados de maneira arbitrária.

Este trabalho não tem a pretensão de ser conclusivo, que fique claro que
existem alguns problemas que pedem continuidade e mais aprofundamento.

Toda análise como sabemos não é neutra, é feita a partir de uma formação.
Nisto se enquadra também à ideologia pentecostal, pois usa religião, não está
apenas preocupada com o sacral. Não é politicamente neutra não esta imune à
força das relações sociais. A história das religiões mostra que as crenças,
movimentos e teologia sempre estiveram associadas com a situação social de sua
época.

Este é um ponto principal em mira pela nossa perspectiva: apresenta a


religião pentecostal como determinada pelas relações sociais e classes sociais.
Como diz Marx; “não é a consciência dos homens que determinam os seus ser,
mas, ao contrário, é o seu ser social que determina a sua consciência”.
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1. HISTÓRICOS DAS PRIMEIRAS IGREJAS PENTECOSTAIS.

Os Pentecostalismos é um fenômeno recente no Brasil. Apareceu entre nós


no início da Segunda década do século XX., Com a fundação da congregação
Cristã no Brasil, em 1910, na capital paulista, no bairro Brás, povoado
praticamente de integrantes italianos.

O seu fundador foi o Italiano; Luigi Francescon; que viveu nos Estado Unido
e converteu-se ao Pentecostalismo. Foi presbiteriano e freqüentou por um tempo a
igreja presbiteriana de São Paulo, mas saiu fundando assim a primeira igreja
pentecostal do Brasil.

Um ano mais tarde surge a Igreja da Assembléia de Deus em 1911, em


Belém do Pará. Sendo que o seu primeiro nome foi Missão de Fé Apostólica, mas
logo o nome foi mudado. Vieram para o Brasil missionários suecos que também
moraram nos Estado Unido com a intenção de fundar a nova religião. Começaram
freqüentar a igreja Batista de Belém do Pará e através de vigílias de oração
dividiram a igreja, fundando assim a Segunda igreja pentecostal em 1911.

Somente em 1940 é que todas as regiões do Brasil foram atingidas pelo


Pentecostalismo, melhor dizendo Assembléia e Congregação Cristã.

A Igreja Internacional do Evangelho Quadrangular surgiu nos Estados


Unidos, em Los Angeles, pelo ano de 1918. Ela apareceu no brasil sob forma de
uma campanha, a cruzada de evangelização, barracas de lona, desmontado de
uma região para outra.
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O Brasil para Cristo teve como seu fundador Manuel de Melo que da
Assembléia de Deus e depois, foi o Evangelho Quadrangular e em 1955, lançava
seu movimento que batizou com o nome que deu a mesma.

A Igreja de Nova Vida, seu templo foi inaugurado em 1970 em Botafogo, no


Rio de Janeiro, é uma igreja elitista e o seu bispo norte americano Roberto Mac
Alister.

2. GÊNESE DO PENTECOSTALISMO.

Estaremos abordando aqui hipóteses sobre o surgimento do


Pentecostalismo no Brasil, como ele se processou e quais os fatores que gerou
este fenômeno.

Primeiramente gostaria de lembrar que fazer uma análise sobre este


movimento é uma tarefa difícil devida ser um fenômeno amplo e complexo, e sua
dificuldade maior se encontram na sua dimensão transcendental ou supra-social
que ela comporta e também é um conjunto especificamente religioso.

As mudanças sociais ocorridas no Brasil nos anos 30, e a partir desta


época, com a política brasileira tendenciosamente voltada para a industrialização
e produção com vistas para o mercado interno, e com a urbanização progressiva,
sem industrialização correspondente em conseqüência da migração interregional o
crescimento e surgimento pareceu aos olhos de muitos analistas deste assunto
como um fenômeno religioso intimamente ligado aos processos de
urbanização/migração/industrialização.

Ao Lado entanto destes fatos, assistimos ao mais profundo


empobrecimento da história brasileira, com milhões de compatriotas vivendo a
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situação que os economistas chamam de miséria. Ao lado da industrialização, que


não só concentrou a renda, mas também concentrou a população no meio urbano.
Estes fatores são da maior importância para a explicação do fenômeno
pentecostal, no Brasil.

Os Pentecostalismos não nasceram aqui no Brasil, foi uma experiência


trazida para cá, através de alguns pentecostais vindos dos Estados Unidos. Esses
fundadores trouxeram além de suas experiências religiosas, suas concepções
capitalistas, suas formações e vivências religiosas totalmente voltadas para o
sacral. Sem abertura para o social, sem experiência político social.

Um dos fundadores deste movimento, Luigi Francescon veio para o Brasil


como imigrante e seus primeiros adeptos foram seus compatriotas. A congregação
Cristã buscava no imigrante italiano o seu suporte social, aproveitando-se dos
elementos católicos entre os italianos e convertendo-os aos Pentecostalismos.

Para se Ter uma idéia da predominância de italianos na congregação


cristã, basta dizer que seus hinos eram cantados em italiano até década de 30,
quando aparece a terceira edição do hinário desta igreja, metade em italiano,
metade em português.

O imigrante reage na nova situação buscando, geralmente por ensaios, um


grupo no qual possa sentir afinidade emocional e reconhecimento de sua própria
pessoa. Entre várias alternativas que lhe apresentam podem escolher a mais
acessível, isto é o pentecostalismos.

O movimento da igreja Brasil para Cristo e Evangelho Quadrangular


escolheu São Paulo como o lugar para o seu surgimento. Todos nós sabemos que
São Paulo é o centro da migração. Suas mensagens são para as pessoas pobres,
por isso teve uma boa acolhida.
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VIII - BIBLIOGRAFIA.

FIROLAMO, G. Sociologia da Religião, Paulus, SP, 1999.

PORTELLI, H. Gramsci e a questão religiosa, Paulus, SP, 1996.

WACH, J. Sociologia da Religião, Paulus, SP, 1994.

WEBER, M. Sociologia de la Religion, Taurus, Madrid, 1994.

WEBER, M. A ética protestante e o espírito do capitalismo, Pioneira, SP,


1984.

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