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da prática pedagógica
O texto constitui o elemento articulador do processo de ensino-apren-
dizagem da língua portuguesa. Essa relevância pedagógica decorre de
duas razões bastante claras: por um lado, o objetivo do ensino da língua é
produzir, no aluno, a capacidade de elaborar textos de qualidade, em di-
ferentes contextos e com diferentes objetivos, explorando ao máximo os
recursos linguísticos; por outro, na condição de unidade discursiva – que
se configura, portanto, como uma totalidade – os textos têm a faculdade
de apresentar os recursos da língua (recursos do código ou recursos para
a constituição de significado) em situação real de uso. A análise desses
recursos, em situação de uso real, permite sua compreensão contextua-
lizada, promovendo um processo de ensino-aprendizagem que supera a
improdutiva memorização de regras gramaticais abstratas, característica
do ensino dito tradicional. Por estas razões, o texto é o ponto de partida e
o ponto de chegada do ensino da língua.
Concepção de texto:
articulação de código e sentido
O ato discursivo é a prática da interação, entre sujeitos, por meio da lin-
guagem verbal. É o exercício da interlocução, a ação verbal dotada de in-
tencionalidade. A análise do discurso implica considerar a linguagem em
relação às suas condições de produção, levando em conta os interlocuto-
res e a situação de interlocução como constitutivos do sentido. O discurso
se manifesta por meio de textos, os quais se caracterizam por constituírem
uma totalidade significativa, isto é, uma unidade de significação relacio-
nada a uma situação. Enquanto tal, os textos independem da extensão,
podendo ser constituídos até por uma única palavra – o grito de socorro!,
por exemplo, em uma situação real de necessidade de ajuda.
coerência, para, por si só, produzir comunicação: em outras palavras, deve constituir um texto.
Todo texto caracteriza-se pela textualidade (tessitura), rede de relações que fazem com que
um texto seja um texto (e não uma simples somatória de frases), revelando uma conexão entre
as intenções, as ideias e as unidades linguísticas que o compõem, por meio do encadeamento
de enunciados dentro do quadro estabelecido pela enunciação. (grifos da autora).
Pseudotextos
No ensino da língua, infelizmente, é comum apresentar-se aos alunos textos
produzidos especialmente com a função de destacar um aspecto do código (é o
caso dos textos de cartilha) ou da norma gramatical, para fins pedagógicos. Ao
secundarizarem a função de interlocução, via de regra, esses textos perdem as
características próprias do discurso real. Tornam-se pseudotextos.
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cada frase, tomada em si mesma, tem um significado que pode ser apre-
endido.
Porém, é muito fácil constatar que eles não se parecem com os textos que escre-
vemos ordinariamente, pois quando lançamos mão da linguagem (oral ou escrita)
em situações de uso real, fazemos isso de uma forma muito diferente, articulando
os enunciados para o desenvolvimento de um tema, com um determinado objeti-
vo em mente e nas condições concretas que o contexto apresenta.
Textos reais
Quando escrevemos de verdade, ou seja, em situações reais de interlocução, o fa-
zemos de uma forma muito parecida com o discurso oral. Vejamos os exemplos:
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Carlos,
Uma vez meu pai foi caçar e Não esqueça de pagar a presta-
deu de cara com uma cobra. Ele foi ção do liquidificador, na loja. O valor
indo para trás, foi indo, foi indo e é mais ou menos R$16,00. Deixei o
caiu num buraco. O meu avô puxou dinheiro dentro do jarro, em cima
ele com um cipó. Ele escapou da da geladeira. Guarde o troco!
cobra, mas quebrou a perna!
Cláudia
As declarações do Imposto de
Renda, referentes ao ano-base de
2001, deverão ser entregues até esta
quarta-feira, dia 31. A Receita Federal
não deu sinais de que vai adiar este
prazo, o que constituiria um segundo
adiamento, dado que o prazo original
venceu em 28 de abril.
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o texto apresenta:
unidade temática;
coerência argumentativa;
coesão interna.
o texto não é:
um amontoado de frases;
fechado em si mesmo.
Cabe lembrar que, embora exista uma relação bastante estreita entre a orali-
dade e a escrita, cada forma de linguagem apresenta aspectos específicos, visto
empregar códigos distintos.
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O texto oral:
O texto escrito:
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Por esta razão, o estudo gramatical é importante, mas, fora dos textos, fora
das situações reais de interlocução, configura uma metodologia pouco eficaz se
o intuito é a produção de um leitor/escritor autônomo.
Como já afirmamos:
Tanto os aspectos da codificação/decodificação quanto os da organização textual obedecem
a uma lógica, a uma ordenação, a um certo regramento. O que é que determina essa lógica?
É a gramática? Se pensarmos na gramática enquanto um livro que prescreve regras do bem
escrever, a resposta é não! Isto, porque há infinitas maneiras corretas de se dizer a mesma
coisa e a gramática normativa não é capaz de prever todas essas possibilidades que um
falante ou escritor podem criar. Mas, se pensarmos na gramática como um conjunto flexível de
convenções que permitem criar significado, então, a resposta é sim. (KLEIN, 2000, p. 48)
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Texto complementar
Considerações teórico-metodológicas
sobre alfabetização
(KLEIN, 1996, p. 21-22)
Daí por que fica difícil ensinar a escrever através do estudo da gramática
descritiva ou gramática normativa, que registram os fenômenos da língua
fora das situações reais de uso e onde essa determinação do contexto não
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Isso não quer dizer que tenhamos os gramáticos em baixa conta. Eles
fazem um trabalho importante de apontar as regras da língua. É um traba-
lho muito parecido com aquele que faz o autor do dicionário. Mas, assim
como ninguém aprende a falar usando o dicionário, também não se aprende
a escrever usando a gramática. Os dois são, no entanto, importantes como
fonte de consulta, sempre que surge uma dúvida quanto ao “jeito certo” de
falar ou escrever.
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