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1. Da Ação Penal

Como já dito em outras oportunidades, a nossa missão aqui não é construir


uma doutrina sobre ação penal. É nosso objetivo preparar você para identificar
corretamente e elaborar a sua peça em conformidade com a exigência da banca
examinadora, para que, com isso, você possa alcançar sua aprovação.
Já que nosso propósito é construir uma queixa-crime, devemos entender um
pouco sobre a ação penal e, com isso, conseguir identificar, sem dificuldades a peça no
caso apresentado.
A ação penal pode ser pública ou privada, a depender do seu titular. Isso
porque o Estado leva em consideração os bens jurídicos tutelados no caso concreto. Se
a prática delitiva ofende interesses públicos a ação será de titularidade do Ministério
Público e, sendo de interesses privados, será de titularidade do querelante (autor da
ação penal privada).
Por previsão constitucional e legal, há a possibilidade de, em uma ação
pública, havendo inércia do MP, a vítima ou seu representante legal dar início a ação
penal valendo-se da ação penal privada. Nesse caso ela recebe o nome de ação penal
privada subsidiária da pública.
Nesse primeiro momento, o nosso foco será a ação penal privada típica. Ou
seja, aquela que será movida quando o crime praticado tem previsão expressa no
código de que somente se procede mediante queixa.
A título de exemplo, podemos observar que os crimes contra a honra estão
previsto no capitulo V, título I (Dos Crimes Contra a Pessoa) no código penal. No artigo
145 desse código está expresso que:
Art. 145. Nos crimes previstos nesse Capítulo somente se
procede mediante queixa, salvo quando, no caso do
art.140,§2º, da violência resulta lesão corporal.
Portanto, os crimes contra a honra são de iniciativa privada porque a ação
penal se procede mediante queixa, conforme visto acima.
A exceção citada no artigo 145 é o caso da injúria real, ou seja, aquela ofensa
à honra subjetiva que ultrapassa apenas as palavras. É o caso, do tapa na cara, da
cusparada, do puxão de cabelos, do copo de bebida jogado contra a vítima, etc.
Imaginemos, pois, que o autor dos fatos, como forma de humilhar uma pessoa num
baile de formatura, jogue em sua cara um copo de bebida quente. Se essa bebida
causar queimaduras na vítima, incorrerá no caso da exceção do artigo 145, ou seja, a
ação passa a ser pública condicionada em razão da lesão corporal.
A partir disso, passemos e entender que, todas as vezes que o tipo penal
previsto no código penal ou em lei especial tiver a previsão expressa de que a ação
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penal se procede mediante queixa, estaremos diante de uma ação penal privada e,
portanto, o nosso desafio é construir uma queixa-crime.
Não podemos afirmar que todos os crimes contra a honra (calúnia, injúria,
difamação) são de ação penal privada. A lei cuidou de trazer algumas exceções e
devemos ficar atentos a elas, como é o caso de ofensa à honra de servidor público no
exercício de suas funções que é de ação penal pública condicionada, conforme
estabelece o artigo 145, parágrafo único do Código Penal.
Nesse caso atenção especial à Súmula 714 do STF.
O artigo 100 do Código Penal estabelece que, a ação penal é pública, salvo
quando a lei expressamente a declara como privativa do ofendido. No parágrafo
segundo desse mesmo artigo estabelece que, a ação privada será de iniciativa do
ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo.
No código de processo penal, as previsões sobre a ação penal privada se
encontram nos artigos 30, 41 e 44, que sugerimos a leitura e, com certeza, a marcação
em seu material de estudo com as respectivas remissões.
Faça, portanto, as seguintes remissões:
- Artigo 30, CPP – Ver artigo 41 e 44, CPP e artigo 100, CP.
- Artigo 30, CPP – Ver artigo 31, CPP.
- Artigo 31, CPP – Ver Súmula 594, STF – Ver Súmula 714, STF.

Na ação penal privada surgem muitas terminologias jurídicas que você não
está acostumado e, por isso, faz-se necessário uma atenção especial a elas. Mesmo
porque a lei sempre mencionará essas terminologias. Estudem o quadro esquemático
abaixo para que você não tenha problemas com isso.

Querelante – Autor da ação penal privada. Pode ser a vítima ou seu representante.
Querelado – É o autor dos fatos, ou seja, o réu na ação penal.
CADI – Cônjuge, Ascendente, Descendente e Irmão. Representam a vítima, em caso de
morte ou ausência. (Artigo 31, CPP)
Querela – É o litígio, a demanda judicial.

1.1 – Do Prazo Decadencial


É, sem dúvidas, um dos pontos mais importantes no estudo da ação penal
privada. É que você deve ficar atento ao prazo decadencial. Isso porque o Estado limita
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o tempo para que você possa exercer seu direito de queixa. Esse prazo está previsto no
artigo 38 do Código de Processo Penal e também no artigo 103 do Código Penal. De
forma que, a contar do dia em que a vítima souber quem é o autor dos fatos (cuidado
com isso – não é do dia dos fatos), conta-se 06 meses para que a queixa-crime possa
ser oferecida.
A atenção especial a esse ponto se faz necessária porque, em havendo uma
peça de queixa-crime, certamente a banca irá pedir para que você a faça no último dia
do prazo decadencial. Você precisa saber contar prazo decadencial. Então vamos lá.
Primeiro você precisa entender que prazo decadencial é direito material e não
formal. Ou seja, a forma de se contar prazo no direito penal é diferente de se contar
prazo no direito processual.
No direito processual você desconsidera o dia do início e considera o dia do
termino. Já no direito penal, observe o que estabelece o artigo 10 do Código Penal:
Art.10. - O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo.
Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.
(Grifo nosso)
Portanto, é importante saber que o prazo decadencial é prazo penal e não
processual e, por isso, a sua forma de contar é diferente. Mas não há mistérios e
vamos entender como isso ocorre, usando um exemplo pra você.

Filisbina, no dia 10.03.2017, encontrou sobre sua mesa, na sala de aula, uma
carta em que estava escrito que toda turma sabia que ela era uma
vagabunda e burra. Muito ofendida comas expressões, Filisbina faz uma
notícia crime na delegacia e, o delegado, depois de investigar, informou a
Filisbina, no dia 20.03.2017, que quem tinha escrito a carta era Filisbino –
um desafeto que ela tinha na turma. Em posse dessas informações, qual
seria o último dia para Filisbina oferecer uma queixa-crime contra Filisbino?

Resposta: O primeiro detalhe que você deve observar acima é que a data
dos fatos é diferente da data em que ela toou conhecimento da autoria.
Para fins de prazo decadencial vale o dia do conhecimento da autoria.
Desta feita, façamos de forma bem prática. Contamos seis meses a partir de
20 de março e, depois, retiramos 01 dia (lembra-se do dia do início? Pois é,
se contamos ele, no final, temos que retirar 01 dia). Assim o último dia para
oferecer a queixa-crime será 19 de setembro de 2017. Ou seja, seis meses
após março e menos 01 dia. (06 meses menos 01 dia)

Sempre que uma questão lhe apresentar datas, não perca tempo. Faça uma
linha do tempo e vá pontuando todas as informações. Isso será imprescindível para
você não errar prazos.
Quanto às remissões, anote aí:
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- Artigo 38, CPP – Ver artigo 10 e 103, CP.


Quando você estiver diante de uma queixa-crime subsidiária da pública, esse
prazo decadencial se inicia a partir do seguinte ao vencimento do prazo para o
promotor oferecer a denúncia. O artigo 46 do Código de Processo Penal estabelece o
prazo de 05 dias, estando o réu preso e de 15 dias, estando o réu solto. Esse prazo se
conta a partir do dia em que o promotor receber o inquérito policial. Nesse caso, no 6º
dia, se o réu estiver preso, ou no 16º se estiver solto, inicia-se a contagem do prazo
decadencial para a propositura da queixa-crime subsidiária. Fique atento às remissões:
- Artigo 29, CPP – Ver artigo 46, CPP

2. Da Queixa-Crime

Por se tratar de ação penal de iniciativa privada, observe que há uma serie de
requisitos que devem ser observados. Eles estão expressos no artigo 41 do Código de
Processo Penal. Vamos a eles:

I – Da Qualificação das Partes


Já no início da petição você deverá apresentar de forma minuciosa a
qualificação do querelante (vítima) e do querelado (autor dos fatos). Mas cuidado! Use
apenas as informações dadas no caso – nunca invente informações.

Observação: Ao fazer a qualificação, você mencionará


que “fulano, devidamente representado por seu
procurador legal...”. Em sendo queixa-crime, a
procuração deve ter poderes especiais conforme
estabelece o artigo 41, CPP. A prova não irá te cobrar
para fazer procuração, mas na qualificação você deve
mencionar expressamente que “Fulano, devidamente
representado por seu procurador, COM PODERES
ESPECIAIS, vem diante de Vossa Excelência....”. Usar essa
expressão irá demonstrar ao examinador que você tem
conhecimento da necessidade de poderes especiais para
ajuizar um ação penal privada.

II – Da Descrição dos Fatos


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A queixa-crime é a única peça em que os fatos são avaliados e, devem ser


minuciosos. Veja que é o contrário do que tenho dito a você nas outras peças. Aqui
você deve organizar os fatos de forma lógica e cronológica.
Descreva em parágrafos.
Explique o fato em si. Cite a data, o local, as pessoas, as palavras ou gestos
proferidos.

III – Do Direito – Qualificação Jurídica dos Fatos


Ao explicar o direito, seja minucioso. Aponte em qual dispositivo de lei se
enquadra cada ato praticado pelo autor, ora querelado. Se forma vários crimes em um
mesmo contexto, separe-os. Explique cada fato isoladamente dando a ele a tipificação
correta. Vamos trabalhar com um exemplo.
Observe a frase: “Você, Filisbino, é um vagabundo, ladrão. Furtou o
celular do professor. E além de tudo é burro, idiota, não sabe nem
conversar direito”.

Se ela foi proferida contra Filisbino na frente de várias pessoas,


teremos a seguinte tipificação:

- “é vagabundo, ladrão” – Incorreu em Difamação (artigo 139, CP)

- “Furtou o celular do professor” – Incorreu em Calúnia (artigo 138,


CP)

- “é burro, idiota” – incorreu em Injúria (artigo 140, CP).

Veja que, numa mesma frase, tivemos a tipificação de três crimes e, na


construção de uma peça, você deve ficar atento a isso. Fazer a descrição correta e
precisa de cada fato e de cada tipo penal.
Nos parágrafos seguintes, enfrente a presença de eventuais causas de
aumento de pena ou, agravantes.
Lembre-se que, se você tiver que fazer uma queixa-crime em sua prova, você estará
atuando na acusação e não na defesa. Pelo amor de Deus, não vá invocar atenuantes
ou causas de diminuição!

IV – Das Provas a Produzir


No processo penal, o ônus da prova incumbe a quem alega (v.g.artigo 156,
CPP). Nesse caso, como estamos falando da queixa-crime, o ônus da prova quanto aos
fatos alegados nessa petição inicial é do querelante. Portanto, crie em sua peça, uma
espaço para indicar as provas que deseja produzir para provas suas alegações.
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Nesse espaço, informe que irá produzir prova testemunha, cujo rol deve ser
indicado ao final da peça, como veremos ao construir a peça processual.
Informa se deseja outros tipos de prova, como, por exemplo, quebra de sigilo,
perícias em documentos, etc.

V - Dos Pedidos
Lembre-se que sua peça (queixa-crime) é uma petição inicial no processo
penal. Portanto, caberá a você pedir o Juiz que, em recebendo sua queixa-crime,
determine a citação do querelado.
Você também deverá inserir no rol de pedidos, o pedido de condenação ao
final da ação.
O artigo 387, IV do Código de Processo Penal, prevê que o Juiz, quando da
sentença condenatória, fixará o valor mínimo a título de indenização para a vítima. A
jurisprudência sedimentou o entendimento de que, para que o Juiz possa fixar essa
indenização, há que se ter um pedido expresso da parte legítima para tanto. Nesse
caso, da queixa-crime, a parte legítima é o querelante. Portanto, em sua queixa-crime,
insira nos pedidos um valor mínimo a título de indenização nos termos do artigo 387,
IV, CPP.

3. Da Peça Processual – Queixa-Crime

Com base nas informações acima, você verá que a construção de nossa peça
não será difícil. Requer muita atenção, porque essa peça não admite erros bobos. Por
exemplo, errar a data no final da peça pode incorrer em decadência e você perder
valiosos pontos para sua aprovação. Então, fique atento à data que você vai colocar
no final da peça. Observe o comando da questão.
O grande detalhe é saber identificar a peça. Penso que aqui você não terá
nenhuma dificuldade. Isso porque essa peça não guarda nenhuma semelhança com as
peças de prisão e liberdade. Também por seu uma petição inicial, a questão não
mencionará nada a respeito do andamento do processo, já que ele ainda não teria sido
iniciado. Portanto, observe os detalhes:
I – A questão vai relatar um fato.
II – Esse fato terá uma tipificação penal de ação penal privada.
III – A vítima irá lhe procurar para tomar as providências.
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Para que você saiba o endereçamento da sua peça, fique atento às regras de
competência. Teremos um modulo específico de competência e você não poderá
deixar de acompanhar esse módulo.
Mas até lá, observe que o artigo 394 do Código de Processo Penal determinou
que os crimes cuja pena máxima em abstrato não ultrapasse 02 anos, serão julgado no
rito sumaríssimo.
O rito sumaríssimo é previsto na Lei 9.099/95 (Juizados Especiais Criminais).
Todos os crimes de ação penal privada tem pena máxima em abstrato menor ou igual
a 02 anos. Ocorre que, em havendo concurso de crimes, pode ser que a soma das
penas máximas em abstrato ultrapasse 02 anos. Por exemplo, se o autor praticou
calúnia (artigo 138, CP) e difamação (artigo 139, CP) em concurso material (artigo 69,
CP – soma as penas), já teremos a pena máxima em abstrato superior a dois anos. Isso
significa que, a competência não será mais do Juizado Especial. Nesse caso o
endereçamento de sua peça ao invés de colocar “EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR
JUIZ DE DIREITO DO JUIZADO ESPECIAL DA COMARCA....”, você irá colocar:
“EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ...VARA CRIMINAL DA
COMARCA...”.
Observe que se a competência for das varas criminais, o procedimento nos
crimes de calúnia e injúria, o procedimento será o previsto no artigo 519 e seguintes.
Portanto, ao se fazer o pedido, peça para o Juiz designar a audiência de conciliação.
Isso fará toda a diferença diante do caso concreto que a banca examinadora
irá submeter à sua apreciação. Não se esqueça desse detalhe. Volto a reforçar. Assista
à aula de competência.

4. Do Modelo de Queixa-Crime
Na sequência de nossos estudos vamos deixar um modelo básico de queixa-
crime pra você.
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DA


COMARCA DE FIM DO MUNDO

Autos nº.....

FILISBINO DE TAL, já devidamente qualificado nos autos,


vem diante de Vossa Excelência, representado por seu procurador legal, ajuizar o
presente PEDIDO DE REVOGAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA, nos termos do artigo 316,
Código de Processo Penal, apontando como seus argumentos fáticos e jurídicos o que
se segue:

1. DOS FATOS

Em resumo, dê ênfase aos fatos que o Juiz considerou


para decretar a prisão.

2. DO DIREITO

Dê ênfase e enfrente o requisito do artigo 312 que o Juiz


utilizou para decretar a prisão.

Caso haja, enfrente a substituição da prisão por medida


cautelar diversa.

3. DO PEDIDO

Peça a revogação da prisão e a expedição do alvará de


soltura.
Subsidiariamente, peça a substituição da prisão por
alguma medida cautelar diversa.

Nestes termos, pede deferimento.


Fim do Mundo, 10 de abril de 2017.

ADVOGADO
OAB....
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CRIMINAL DA


COMARCA DE FIM DO MUNDO

Autos nº.....

FILISBINO DE TAL, já devidamente qualificado nos autos,


vem diante de Vossa Excelência, representado por seu procurador legal, ajuizar o
presente PEDIDO DE RELAXAMENTO DE PRISÃO PREVENTIVA, nos termos do artigo
5º, LXV da Constituição Federal c/c Artigo 311 ou 313 (conforme for a nulidade) do
Código de Processo Penal, apontando como seus argumentos fáticos e jurídicos o que
se segue:

4. DOS FATOS

Em resumo, dê ênfase aos fatos que evidenciam a


ilegalidade da prisão.

5. DO DIREITO

Dê ênfase e enfrente a nulidade da prisão apontando o


dispositivo de lei que foi violado.

6. DO PEDIDO

Peça a decretação da ilegalidade da prisão e o


consequente relaxamento da mesma e a expedição do alvará de soltura.

Nestes termos, pede deferimento.


Fim do Mundo, 10 de abril de 2017.

ADVOGADO
OAB....

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