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O ENSINO DO TRIVIUM E DO QUADRIVIUM, A LINGUAGEM E A


HISTÓRIA NA PROPOSTA DE EDUCAÇÃO AGOSTINIANA
doi: 10.4025/imagenseduc.v2i1.15808

Maria Rita Sefrian de Souza Peinado*


* Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. mritapss@hotmail.com

Resumo: Ao eleger o conhecimento do Trivium e do Quadrivium como necessários à


compreensão e ensino das Escrituras, Santo Agostinho (354-430) marca a educação
medieval com a preservação do conhecimento produzido na Antiguidade. A linguagem
como instrumento de ascendência sobre as pessoas não se limitaria ao âmbito da religião,
uma vez que a orientação agostiniana ocupou preeminência na educação em função das
condições institucionais e políticas decadentes no Império Romano, estendendo suas
influências no período medieval. Por meio de uma análise que leva em consideração os
aspectos históricos, sociais, políticos do período, bem como a formação educacional de
Agostinho, as fontes, algumas obras do autor e a historiografia revelam a influência e
extensão da proposta de educação cristã para a formação do homem por meio do ensino.
Nesse sentido, a teorização sobre a linguagem, o conhecimento da história sagrada e secular
se constituem como fundantes à educação pela argumentação e por princípios e conceitos
comunicados.
Palavras-chave: Agostinho. Trivium. Quadrivium.

ABSTRACT: THE TEACHING OF TRIVIUM AND QUADRIVIUM, THE


LANGUAGE AND THE HISTORY OF EDUCATION IN AUGUSTINIAN
PROPOSAL. By electing the knowledge of the Trivium and the Quadrivium as necessary
for understanding and teaching The Scripture, Saint Augustine (354-430) marks the
medieval education with the preservation of knowledge produced in Antiquity Age. The
language as an instrument of influence over people is not limited to the realm of religion,
since the orientation Augustine held preeminence in education in terms of institutional and
political conditions in the decadent Roman Empire, extending their influence in the
medieval period. Through an analysis that takes into account the historical, social, political
period, as well as the educational background of Augustine, the sources, some works of the
author and historiography reveal the influence and extent of the proposed Christian
education for the formation of man through education. In this sense, theorizing about
language, knowledge of sacred and secular history are constituted as foundational to
education by the arguments and principles and concepts disclosed.
Keywords: Saint Augustine, Education, Teaching.

Tendo como eixo norteador a premissa e aos leitores de suas obras relacionavam-se às
metodológica de que os projetos de educação e características peculiares de um período de
de ensino das diferentes épocas correspondem transição.
às diferentes necessidades sociais, no decorrer Conforme destacamos, nos chamaram a
deste trabalho, procuramos situar Agostinho no atenção as circunstâncias resultantes das
universo histórico, intelectual, religioso e familiar migrações dos nômades e da desagregação
de sua época. Ao analisar os aspectos política do Império Romano. Nas quais
particulares da vida, bem como da formação de percebemos que sua proposta de educação que
Santo Agostinho em face dos aspectos gerais da contempla muitas questões relativas ao ensino,
sociedade, percebemos que algumas questões emergia das necessidades que os tempos e a
desse contexto foram abordadas pelo autor e demanda impunham. O atendimento dessas
destacadas pela historiografia que o estudou. necessidades somente poderia ser realizado por
Pudemos reiterar, com base nesses historiadores, pessoas que tivessem condições culturais e
que a ênfase de Agostinho sobre alguns aspectos religiosas para tal. Ao ensinar seus discípulos,
de sua educação familiar e cultural, bem como o Santo Agostinho preparou-os para formar
cuidado com que ele se dirigia aos seus ouvintes outros; assim, juntamente com a evangelização,
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o conhecimento e a cultura se difundiam entre candidatos ao sacerdócio com instrução


os povos nômades e remanescentes romanos. mínima necessária ao desempenho
Um aspecto da vida desse autor que nos sacerdotal. A escola episcopal alojava-se na
incita a refletir é a necessidade que sentiu de se igreja catedral ou na residência do bispo. A
igreja tornou-se a única educadora
recolher em uma pequena propriedade rural para
daqueles tempos, pois era a única
se dedicar exclusivamente ao estudo e à instituição que tinha condições e meios
meditação das Escrituras. Lá ele estudava, para educar e instruir (NUNES, 1979, p.
meditava, escrevia e compartilhava com seus 103).
amigos os resultados de seus esforços. Embora
esse recolhimento tenha durado por um período Foi desse ponto de vista que procuramos
de aproximadamente três anos, entre sua identificar as diretrizes gerais da educação cristã
conversão ao cristianismo e o período em que que ele defendeu em algumas de suas obras. Para
foi aclamado presbítero, conforme o costume, além delas, fomos identificando, no processo de
essa experiência permaneceu como um ideal leitura e análise, alguns aspectos de sua proposta
formativo tanto no estilo de vida que levou que podem ser considerados como elementos
desde então, quanto eu seus preceitos e educacionais que ultrapassam os limites de uma
instruções sobre o ensino. Antes, de se formação cristã datada e, ultrapassando
converter, Agostinho teve amante, oscilou entre fronteiras de espaço, de tempo, inclusive
várias filosofias, ou seja, conhecia o mundo e fronteiras culturais, permanecem como um
apreendeu em seu tempo as circunstâncias em legado para outras épocas, especialmente para o
que vivia o ser humano. Enfim utilizou todo o pensamento educacional do Ocidente. Nesse
seu conhecimento previamente alcançado para sentido, a contribuição de Agostinho
esmiuçar sua análise sobre os diferentes temas de permaneceu pela proposição de um ensino que
que tratou. Ele transmitiu seu conhecimento por contemplava não somente a formação ideológica
meio de seus escritos, livros, cartas, diálogos e religiosa, mas os conhecimentos produzidos pela
sermões, de modo que seu exemplo permaneceu humanidade. A proposta de Santo Agostinho
nas Igrejas em que seus discípulos eram os era, portanto, uma proposta de erudição por
responsáveis, pois esses também tinham a parte daqueles que se dispunham a ensinar e a
responsabilidade de formar outros cristãos. cristianizar os povos.
Suas reflexões sobre o ensino ultrapassaram Seus postulados vigoraram por gerações no
o âmbito de uma simples proposição e se período medieval e têm permanecido na cultura
tornaram práxis educativa. O próprio autor ocidental. Em alguns aspectos mais timidamente,
atuava em uma escola organizada na em outros mais vividamente.
proximidade da sede episcopal. Entre tantos aspectos, pontuamos que, em
sua proposta de formação do cristão, ele
Após sua conversão ao cristianismo, Santo valorizou a postura de quem ensina.
Agostinho dedicou-se ao ensino, educando O percurso formativo e a vida de dedicação
os clérigos em sua residência,
aos estudos proporcionaram a Agostinho a
proporcionando-lhes o conhecimento e
formação religiosa. ‘Conta Posídio que condição de pensar que a formação do cristão
Santo Agostinho, quando bispo, educava passaria pela necessidade do conhecimento de
os clérigos na sua residência, onde eram leitura e de escrita. Por isso, ao defender
instruídos e recebiam alimentação e roupa’ ferrenhamente a necessidade de os cristãos
(NUNES, 1979, p. 108). compreenderem as Escrituras, ele identificou os
conhecimentos essenciais e os meios a ser
Conforme Nunes (1979), os livros desse utilizados para formar aqueles que formariam
autor tornaram-se manuais lidos na Idade Média outros cristãos.
pelos padres, que seguiam suas orientações e Por isso, nosso objetivo é analisar alguns
seus ensinamentos ao ensinar nas escolas aspectos do ensino valorizados por Santo
paroquiais. Agostinho, na expectativa de que despertem
novas reflexões, frisando que todos esses
As escolas paroquiais exerceram essa conhecimentos, de seu ponto de vista, deviam
função formadora, elas funcionavam na ser incutidos nos homens para que eles tivessem
igreja matriz da paróquia ou na casa mais condições de se aproximar do pensamento
paroquial, com o intuito de preparar os divino.
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ostentação pueril de enganar o adversário


A adoção do trivium e quadrivium (AGOSTINHO, A Doutrina Cristã, L. II,
cap. 32, § 48).
O primeiro deles é a eleição dos
conhecimentos do Trivium e do Quadrivium como Assim, ele distingue as diferentes formas do
necessários para a compreensão e divulgação das raciocínio.
Escrituras.
Para Santo Agostinho, a compreensão das Uma coisa é conhecer as regras do
silogismo e outra conhecer a veracidade
Escrituras pelo estudioso pressupõe o saber ler e
das sentenças. Pelas primeiras, aprende-se
escrever e também o conhecimento do Trivium e o que é deduzido logicamente, o que é
do Quadrivium. O Trivium, composto pelas deduzido ilogicamente e o que repugna à
disciplinas: gramática, dialética e retórica, é um razão. A dedução lógica é esta: “Se ele é
conjunto de conhecimentos que abrange desde a orador, é homem”. A dedução ilógica: “Se
forma da escrita, o significado das palavras, a ele é homem, é orador”. E a dedução que
lógica do pensamento até ao uso da linguagem repugna à razão: “Se ele é homem, é
que deveria ser escolhida para comunicar e quadrúpede” (AGOSTINHO, A Doutrina
ensinar o que se compreendeu. Esta linguagem, Cristã, L. II, cap. 35, § 52).
segundo a perspectiva da retórica, obedece a
formas de estilo, a métodos para se alcançar o As disciplinas do Trivium, portanto,
fim desejado – a comunicação, ou seja, o ensino. constituíam, na perspectiva do autor, um
Em sua análise dos campos de instrumento para se chegar a conclusões lógicas
conhecimento do Trivium na educação medieval, ou ilógicas, verdadeiras ou falsas. Essa forma de
Durkheim afirma que: raciocínio, esse conhecimento, deveria ser
utilizado no exame das Escrituras.
O trivium tinha por objetivo ensinar a
própria mente, isto é, as leis às quais E quando cada um tiver encontrado tudo
obedece ao pensar e expressar seu o que aprendeu de proveitoso em outros
pensamento, e, reciprocamente, as regras livros, descobrirá muito mais
às quais deve sujeitar-se para pensar e abundantemente aí. E o que é mais, o que
expressar-se corretamente. Tal é, com não aprendeu em nenhuma outra parte,
efeito, a meta da gramática, da retórica e somente encontrará na admirável
da dialética. Esse triplo ensino é, pois, superioridade e profundidade destas
totalmente formal. Manipula unicamente Escrituras. [...]. Bem munido por essa
as formas gerais do raciocínio, abstração formação e não estando mais paralisado
feita de sua aplicação às coisas, ou com o por signos desconhecidos, o leitor manso
que é ainda mais formal do que o e humilde de coração, submisso ao jugo de
pensamento, ou seja, a linguagem Cristo, carregado com um fardo leve,
(DURKHEIM, 1995, p. 52). fundado, enraizado e edificado na
caridade, poderá lançar-se ao exame e à
As regras da lógica deviam fazer parte da discussão dos signos ambíguos das
Escrituras, sobre os quais, no próximo
formação do estudioso das Escrituras, não
livro, eu me preparo a discorrer, conforme
apenas com o objetivo de articular discussões o Senhor se dignar me inspirar
para enganar o adversário, mas para convencer (AGOSTINHO, A Doutrina Cristã, L. II,
da verdade, que, para Santo Agostinho, era a cap. 43, § 63).
verdade contida nas Escrituras. Ao discorrer
sobre “os conhecimentos relativos não aos Nesse sentido, o Trivium, como parte do
sentidos do corpo, mas à razão ou potência ensino e da aprendizagem do cristão, tinha a
intelectiva da alma”, ele destaca a ciência do função de formar seu pensamento por meio da
raciocínio (AGOSTINHO, A Doutrina Cristã, L. ciência do raciocínio e esclarecer os diferentes
II, cap. 32, § 48). aspectos da linguagem, os quais lhe abririam a
possibilidade de interpretar as escrituras.
A ciência do raciocínio é de muitíssimo Para Santo Agostinho,
valor para penetrar e resolver toda espécie
de dificuldades que se apresentam nos [...] a ignorância da natureza das coisas
Livros santos. Só se há de evitar o desejo dificultaria a interpretação das expressões
de discussões (libido rixandi) e certa
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figuradas, quando estas se referissem aos Assim, para santo Agostinho, a leitura, a
animais, pedras, plantas ou outros seres matemática, a natureza, a música, o
citados freqüentemente nas Escrituras e conhecimento das línguas e a memória
servindo como objeto de comparações tornam-se condição primeira para a
(AGOSTINHO, A Doutrina Cristã, L. II, conversão do cristão. O cristão deve ser
cap. 17, § 24). antes de tudo um ser que consegue
entender e interpretar os escritos sagrados
Segundo ele, para a compreensão eficaz das pelo conhecimento e não somente pela fé.
Escrituras, o estudioso deveria passar, O cristão também deve entender as
necessariamente, pelo conhecimento das coisas, relações sociais de cada tempo presente
vivido pelos homens, pois são elas que
da ciência do raciocínio e das instituições
imprimem os signos do conhecimento. É
humanas, dominar os sentidos das palavras e dos exatamente por isso que o autor chama a
signos, conhecer outras línguas, entre outros atenção para as mudanças que ocorrem de
aspectos importantes do conhecimento. uma dada sociedade para outra (p. 6).
Dessa maneira, tão importantes como os
conteúdos do Trivium, são os conhecimentos do Nesse sentido, para Agostinho, os
Quadrivium, que consistem num conjunto de conhecimentos que compunham as disciplinas
conhecimentos objetivos e abstratos de do Quadrivium eram pré-requisitos à formação do
aritmética, geometria, música e astronomia, os cristão.
quais também eram úteis, segundo Santo Para Durkheim (1995), em sua análise sobre
Agostinho, à compreensão das expressões os campos de conhecimento, o Quadrivium
referentes a essas artes utilizadas nas Escrituras
como objeto de comparações a fim de alcançar o [...] era um conjunto de conhecimentos
entendimento das coisas espirituais e, relacionados com as coisas. Seu papel era
consequentemente, a rejeição das ficções tornar conhecidas as realidades externas e
supersticiosas. suas leis, leis dos números, leis do espaço,
A astronomia teria como objeto de estudos a leis dos astros, leis dos sons. Assim, as
ciência dos astros, da natureza e de seu poder. artes que abraçava eram chamadas artes
reales ou physica (1995, p. 52).
Santo Agostinho alertava, porém, que não se
deveria utilizar esse conhecimento para tirar
É importante destacar que se atribuía um
prognóstico de horóscopos, como faziam os
sentido alegórico às quatro disciplinas.
genetlíacos, hoje chamados astrólogos. Em lugar
Procurava-se um significado oculto nos
de fazer conjecturas exatas para o tempo futuro,
números, nos astros. Desse modo, as disciplinas
calcular o curso dos astros ou da lua, dizer qual a
fase dentro de um período passado ou futuro, a do Quadrivium ofereciam um conjunto de
conhecimentos externos, necessários à
astronomia era importante para desvelar o
sentido das Escrituras como ciência dos astros compreensão das ilustrações ou de expressões
figuradas dos Livros Santos.
criados por Deus. Assim, ele combatia um
hábito característico do paganismo.
Um homem fala com tanto maior
Quanto à importância da aritmética, sabedoria, quanto maior ou menor
Agostinho afirmava que a ignorância dos progresso faz na ciência das santas
números impedia a compreensão de expressões Escrituras. E eu não me refiro ao
figuradas ou simbólicas empregadas nas progresso que consiste em ler bastante as
Escrituras. O mesmo vale para as noções escrituras ou aprendê-las de cor, mas do
musicais. Segundo ele, tanto a música quanto os progresso que consiste em compreendê-las
números eram colocados em lugar de honra em bem e procurar diligentemente o seu
muitas partes das Escrituras. sentido (AGOSTINHO, A Doutrina Cristã,
A música, nesse contexto, não deveria ser L. IV, cap. 5, § 7).
entendida como a arte do canto, mas como a
disciplina que estabelecia as relações da música Assim, percebemos que a proposição
com a aritmética, com a harmonia dos astros e agostiniana para a difusão do cristianismo
com as leis da acústica. passaria pelo conhecimento do Trivium e do
Segundo Oliveira (2008) Quadrivium, já que, como as Escrituras foram
escritas em linguagem humana, era necessário

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utilizar a ciência das coisas terrenas para explicar Le Goff (2007) destaca o fato de essa
os princípios abstratos da religião. escolha de conteúdos feita por Agostinho ter
Gilson (2001) destaca a importância com permanecido até o século XII e XIII, o que, de
que os Padres e Agostinho, em particular, nossa perspectiva, implica a permanência do
consideravam a cultura clássica, especialmente as conhecimento elaborado na Antiguidade.
“[...] artes liberais, bastante apropriadas ao uso
da verdade e ainda alguns preceitos morais Entre as escolhas culturais essenciais que o
muito úteis” (AGOSTINHO, A Doutrina Cristã, cristianismo medieval fez, em primeiro
Livro II, cap. 41, § 60). Elas seriam uma forma lugar, e sobretudo está a das classificações
de o homem melhor interpretar as sagradas científicas e dos métodos de ensino.
Transmitida por um retórico latino cristão
Escrituras.
do século V, Marciano Capella, a
classificação e a prática das artes liberais
Para compreender o texto todos os dominam o ensino medieval. Divididas em
recursos das artes liberais eram requeridos, dois ciclos, o do trivium, ou artes da palavra
isto é, toda a erudição enciclopédica de (gramática, retórica e dialética) e o do
Varrão: história (II, 28); geografia, quadrivium, ou artes dos números
botânica, zoologia, mineralogia, (aritmética, geometria, música e
astronomia (II,29); medicina, agricultura, astronomia), estas artes recomendadas por
navegação(II,30); a dialética, tão útil para Santo Agostinho vão, nos séculos XII e
discutir as questões colocadas pela XIII, fornecer o fundamento do ensino
Escritura (II, 31-35); enfim, a aritmética, universitário na faculdade propedêutica
com suas diversas aplicações às figuras, dita faculdade de artes (LE GOFF, 2007,
aos movimentos e aos sons (II, 38). Mas p. 26).
achar-se em condições de compreender a
Escritura não é tudo, é necessário, além
disso, saber falar a seu respeito. É aqui que Em A Doutrina Cristã fica evidente o papel
intervém a Retórica, à qual é consagrado do conhecimento clássico na formação
todo o livro IV da obra: porque os cristãos intelectual dos cristãos, tendo em vista que estes
podem e devem ensiná-la, quais os deveres deveriam ensinar outros cristãos, reforçando,
de um professor de retórica cristão e como assim, o entendimento que continuava
os autores sacros uniram a eloqüência à motivando o desenvolvimento do trabalho
sabedoria. Que satisfação para Agostinho intelectual nas Igrejas, nos mosteiros, nas escolas
pensar que as Escrituras realizam, assim, o paroquiais e episcopais.
ideal de Cícero! Aliás, ele cita-o Nessa corrente, A Doutrina Cristã se tornou
expressamente ao descrever o gênero de
manual de educação e de ensino para a sociedade
estilo e de eloqüência que convém ao
cristão; ele se entrega a uma exegese em medieval, uma vez que nele Agostinho deu nova
regra de texto do Orator, 29, para explicar roupagem às leituras das Escrituras. Diferindo
como, em que sentido o orador cristão de Tertuliano, por exemplo, que no segundo
pode observar os preceitos aí contidos, e século, não concordava que os cristãos
essas discussões não eram, para ele, ensinassem as letras, por considerá-las saber
simples debates acadêmicos, já que, pagão. Nesse aspecto, as orientações
expulsa do fórum e confinada às salas de agostinianas foram adotadas nas escolas
escola desde Júlio César, a eloqüência paroquiais e nas dos mosteiros por conter a
vinha de reencontrar um público e concepção de educação cristã e por definir o
retomar vida nas igrejas. Ambrósio,
conjunto de disciplinas que deveria ser ensinado.
Cipriano, Agostinho não reivindicavam a
tarefa de conduzir o povo ao bem comum Os escritos dos padres e dos monges,
da Cidade terrestre, mas acaso não eram os posteriores ao século V, evidenciam o
guias do imenso povo da Cidade celeste conhecimento da proposição agostiniana.
em peregrinação até Deus? (GILSON, Uma vez que Agostinho considerava que o
2001, p. 209). domínio do conhecimento clássico fornecia
subsídios para o conhecimento das coisas
Assim, imbricado na cultura clássica, espirituais e propiciava condições de aprimorar a
Agostinho fundamenta o corpo teórico que daria fé, ele defendia que o homem cristão fizesse uso
a sustentação à compreensão e à difusão da do pensamento racional, no qual a linguagem
doutrina cristã. tinha papel fundamental. Por isso, em item
específico, vamos analisar a importância que ele
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deu à linguagem, ao conhecimento das línguas e compreender as palavras contidas nas


aos sinais como instrumentos de entendimento e Escrituras. A nosso ver, apresenta, de fato,
comunicação. um roteiro de como se deve proceder para
ser cristão. Do seu ponto de vista, a
conversão é um processo de
A importância da linguagem
aprendizagem. No seu tempo, em geral,
não se nascia cristão, mas se tornava, pela
Em seu artigo Agostinho e a Educação Cristã: aceitação da doutrina (OLIVEIRA, 2008,
um olhar da História da Educação, Oliveira (2008) p. 6).
destaca alguns aspectos elencados por Santo
Agostinho para a formação do cristão, entre os Assim, com os recursos da linguagem, como
quais a linguagem e necessidade do metáforas, alegorias, comparações, diálogos com
conhecimento da escrita e das letras. perguntas e respostas didaticamente organizados,
os mestres articulariam os dois conhecimentos,
Ao apresentar um roteiro de como se os das ciências e as verdades divinas, levando os
tornar cristão, Agostinho nos brinda com discípulos a entender as coisas espirituais. Por
um verdadeiro programa de estudos,
meio da linguagem comparativa, o próprio
necessários, em nosso entender, para
qualquer aprendizagem e que independe Agostinho trata de temas abstratos
da época em que o estudo se realiza. O estabelecendo relações com outras situações
autor destaca a importância da linguagem, concretas ou com objetos conhecidos pelos seus
do conhecimento da escrita, portanto, das ouvintes. O próprio Agostinho utiliza muitas
letras, da necessidade do aprendizado do comparações no decorrer da sua obra para levar
cálculo, de se entender a música, de se os leitores a entender conceitos complexos e
conhecer as instituições nas quais e para abstratos por meio de assuntos conhecidos.
quais se realizam determinados estudos, de Em seu livro A Trindade, ele explica que,
se conhecer a língua na qual o estudo está tendo como finalidade levar os homens a
sendo realizado. Dentro deste aspecto,
entender os princípios divinos: “[...] a Escritura,
destaca a precaução necessária em relação
às traduções. Do ponto de vista no seu modo de expressar, acomoda-se aos
agostiniano, saber a língua no qual o texto costumes humanos, pois fala a criaturas
foi escrito é condição para o bom humanas (Santo Agostinho, A Trindade, L. I, cap.
entendimento da mensagem contida no 12, § 23)”.
mesmo (OLIVEIRA, 2008, p. 6). Nessa acepção, a linguagem é o principal
instrumento de transmissão do conhecimento.
Vários autores destacam que, ao se Por meio dela, o ensino se efetivaria entre os
manifestar a respeito da linguagem, Santo indivíduos e se difundiria na sociedade.
Agostinho levanta questões que ultrapassam sua Em seu De Magistro, quando tratou da
concepção religiosa, a exemplo da importância necessidade de conhecer o significado e o
que a leitura, o conhecimento de línguas, a conceito das palavras, o fez com vistas a que elas
precaução com as traduções têm para a obtenção pudessem ser utilizadas adequadamente no
ou produção do conhecimento. ensino.
A importância da linguagem decorre do fato Nessa obra, a função da fala é abordada por
de que é esse meio de comunicação humana que meio de um diálogo com Adeodato, seu filho,
faz das Escrituras um modo de aproximação de que aos dezesseis anos contribuiu com as ideias
Deus para com o homem: pelo que está que foram registradas.
expresso em suas obras, os homens podem Uma das ideias que Agostinho discutiu é a
atingir a inteligibilidade de Deus. necessidade de se ter claro o que pretende
quando se fala, ou seja, o autor discutiu a
Assim, quanto maior for a capacidade das questão da intencionalidade da linguagem
pessoas de usarem a linguagem, melhores (AGOSTINHO, De Magistro), detalhando a
suas condições de se apropriar dos significação da palavra e enfatizando a
sentidos e ensinamentos contidos nos necessidade de pensar no que queremos ensinar
textos bíblicos. Por conseguinte, as
quando falamos. Ou seja, de seu ponto de vista,
conversões ocorrerão de maneira mais
consciente. Na verdade, Agostinho não se trata de ensinar apenas palavras, mas
apresenta diversos aspectos que julga também o que elas significam, o conteúdo que
serem elementos essenciais para se
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elas transmitem e, por isso, ele discute também a Segundo Horn, para se entender o que
questão dos signos. Agostinho pretendia com a definição das
Na medida em que a linguagem estabelece a palavras como sinais, é necessário considerar
comunicação entre as pessoas, ele considerava uma importante distinção: a palavra como um
que o conhecimento dos signos constituía-se em sinal que representa (substitui) o objeto e como
elemento potencial de aprendizagem. Da mesma um meio de comunicação, de conhecimento.
forma que a palavra que se profere pode ser
percebida pelo ouvido, a palavra escrita Poucos anos depois da sua redação, no
apresenta-se como um sinal para os olhos, escrito De magistro, do ano de 389,
despertando na mente o que se percebe com os Agostinho já se apóia muito claramente
ouvidos. nessa definição, quando define palavras
(verba) como sinais (signa) (2,3). Sem
Segundo Horn (2006), esse aspecto do
dúvida, para entender corretamente a
pensamento era tão inovador, que o autor foi concepção ali contida, tem-se de
considerado um precursor da concepção diferenciar entre duas funções, nas quais as
semiótica. palavras podem aparecer como sinais (cf.
De magistro, 2002). (HORN, 2006, p. 7).
Um ponto que se destaca por todo o
pensamento agostiniano sobre a filosofia Assim, a primeira função estaria relacionada
da linguagem é a tese de que palavras ao campo da semântica:
representam sinais. Parece residir aqui uma
inovação digna de nota, diante dos seus
Por um lado, pode-se ter em vista uma
predecessores, razão pela qual
função substitucional (nisso pensamos nós
repetidamente se afirmou que Agostinho é
contemporâneos, via de regra): palavras
o patrono de uma concepção semiótica (de
designam algo, na medida em que elas,
teoria dos sinais) da semântica, ou, ainda,
como sinais, estão por esse algo como que
da teoria do significado lingüístico (cf.
‘a modo de substituição’. Assim a palavra
Coseriu, 1969; Eco, 1984 apud HORN,
‘mesa’ designa o objeto mesa, na medida
2006, p. 6-7).
em que ela, como fonema (sinal sonoro)
ou como grafema (sinal escrito), está para
Horn (2006) informa ainda que essa uma mesa no mundo das coisas físicas
definição de linguagem aparece em outras obras (HORN, 2006, p. 7).
de Agostinho anteriores ao De Magistro:
Na segunda, os sinais têm um sentido
Agostinho dispõe de uma série de constitutivo do conhecimento e, segundo o
observações interessantes e modos de autor, é com essa acepção que Agostinho
visão originais sobre o fenômeno da
considera a palavra em suas orientações sobre o
linguagem. A sua intenção, contudo, não
reside no desenvolvimento de uma ensino.
filosofia sistemática da linguagem. Ao
fundo, encontra-se, antes, a sua pretensão Por outro lado, palavras podem ser
teológica de comprovar a presença de uma tomadas como sinais num sentido ainda
realidade divina no nosso falar e pensar. mais geral, a saber, constitutivo do
Apesar desse interesse de conhecimento conhecimento. Palavras abrem para nós
incomum, pode-se atestar a Agostinho que novos conteúdos de saber, na medida em
a sua ocupação com filosofia da linguagem que formam o veículo de uma exposição,
alcança, nas diferentes fases biográficas, de uma narrativa ou de uma argumentação
um nível absolutamente respeitável. oral ou escrita. Palavras desvelam à
Possuímos, primeiramente, um tratado ouvinte ou ao leitor algo novo; elas
juvenil com o título De dialectica, que se apresentam a ela ou a ele algo até então
ocupa com algumas questões de filosofia não-sabido. É esse segundo significado
da linguagem e de teoria dos sinais, e que Agostinho tem em vista com a sua
sabemos que existiu um tratado surgido tese do caráter de sinal das palavras, e não
simultaneamente, De grammatica, o qual, uma teoria de semântica. Palavras são
porém, já cedo se perdeu (HORN, 2006, sinais, não primariamente em sentido
p. 6). substitucional-semântico, mas sim em
sentido constitutivo do conhecimento
(HORN, 2006, p. 7).

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Mammì (2000) assinala que Agostinho relevante na aplicação em persuadir o que


atribui a existência de signos à necessidade de considerava como verdadeiro. “Eis o que
comunicação entre os homens. constitui o talento da palavra ou da eloquência:
os princípios e preceitos dessa arte unidos ao
Os signos lingüísticos nascem da empenho engenhoso da linguagem,
impossibilidade de as almas humanas especialmente exercitada a realçar a riqueza do
comunicarem-se diretamente entre si, após vocabulário e do estilo” (AGOSTINHO, A
a queda no pecado; sua função é ensinar Doutrina Cristã, Liv. IV, cap. 3,§ 1).
conceitos ou transmitir vontades. Em
Os jovens, segundo Santo Agostinho,
síntese, a linguagem é um instrumento que
permite que as almas ajam uma sobre deveriam aprender essa arte em estudos à parte,
outra (p. 347). conforme a disponibilidade que tivessem. Os
mais ocupados com o serviço da Igreja poderiam
Nesse sentido, na medida em que visava o assimilar a eloquência lendo ou estudando os
ensino, era essa a função das palavras que bons oradores nas obras eclesiásticas e
Agostinho usava amplamente. Para ele, sua principalmente nas Escrituras.
importância advinha do sentido que elas É intrínseco ao ser humano, dotado da razão
poderiam transmitir ao ouvinte. Pelas palavras se e da possibilidade de usá-la, distinguir a função
estabeleceria uma comunicação entre a das palavras, bem como conhecer o que elas
contemplação individual interior e o outro. significam. Nesse sentido, Santo Agostinho
Para Mammì (2000) a comunicação por destacou a superioridade do conhecimento
meio das palavras, em Agostinho, assumiu conceitual em relação ao morfológico.
proeminência na ação de uma alma sobre outra, O desconhecimento dos signos próprios,
porque elas contêm a possibilidade de ensinar, para Santo Agostinho, era um fator que
de convencer, enfim, de transformar as atitudes comprometia a compreensão, mas também o era
pagãs em atitudes cristãs. o dos signos figurados, muito utilizados nas
Acrescentamos aqui um aspecto destacado Escrituras. “Ora, há duas causas de
por Mammì (2000) no pensamento de incompreensão do texto da Escritura. A verdade
Agostinho: sua concepção de que as palavras encontra-se oculta por signos desconhecidos ou
têm função mnemotécnica de chamar à mente os por signos de sentido figurado. Com efeito, os
conteúdos da consciência. signos são ou próprios ou figurados”
Ao que ensina é primordial ter domínio da (AGOSTINHO, L. II, cap. 10, § 15). Esses
palavra para utilizá-la, ou seja, tendo em vista a signos figurados consistiam em expressões da
finalidade básica da linguagem, ensinar vida cotidiana utilizados para o ensino de outra
pressupõe o uso da palavra com conhecimento significação. Segundo o autor, para alcançar a
do seu significado. Seu uso adequado resulta na compreensão das passagens de sentido alegórico,
compreensão, por parte do destinatário, da era necessário, primeiramente, o conhecimento
mensagem que se quer transmitir; já seu uso das palavras em seu sentido próprio.
indevido implica distorções e equívocos na Assim, para conhecer o sentido próprio e
mensagem, os quais comprometem a eficácia do figurado das palavras, de forma a aprofundar a
ensino. compreensão das Escrituras, era necessário ao
Ressaltando esta questão, podemos pensar estudioso latino conhecer o grego e o hebraico,
que o uso adequado da linguagem é inerente ao verificando também a validade das traduções.
livre-arbítrio, uma vez que este possibilita ao ser
humano fazer as escolhas apropriadas também Para combater a ignorância dos signos
próprios, o grande remédio é o
no que se refere ao uso das palavras,
conhecimento das línguas. Os
especialmente quando se ensina. conhecedores da língua latina, a quem
Diante do fato de que a arte da palavra pode pretendemos instruir neste momento,
persuadir para o bem ou para o mal, Agostinho necessitam, para chegar a conhecer a
fez, em A Doutrina Cristã, a seguinte pergunta: fundo as divinas Escrituras, de duas outras
“por qual razão as pessoas honestas não poriam línguas, a saber, o grego e o hebraico. Elas
seu zelo a adquiri-la em vista de se engajar ao lhes permitirão recorrer aos exemplares
serviço da verdade?” mais antigos, no caso em que há infinita
Assim, Santo Agostinho discutiu o porquê variedade de traduções latinas lhes traga
de se utilizar a arte da eloquência por tê-la como
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alguma dúvida (AGOSTINHO, A Livros santos, ainda quando forem


Doutrina Cristã, L. II, cap. 11, § 16). aprendidos fora da Igreja, em vã erudição
(AGOSTINHO, A Doutrina Cristã, L. II,
O contato com os textos originais permite cap. 29, § 42).
verificar que a mesma palavra pode ter
significados diferentes nos distintos idiomas. A história, portanto, mesmo que não fosse
Esse desconhecimento prejudicaria a aprendida como parte da formação cristã,
compreensão do sentido originalmente constituía um instrumento para a formação da
proposto. memória e da identidade do indivíduo na
Por isso, ele aponta as vantagens do estudo contemplação das Escrituras.
comparativo das diversas traduções latinas, o que O conhecimento e os argumentos históricos
também poderia auxiliar a compreensão dos permeiam as obras e os discursos de Agostinho.
textos sagrados: “A diversidade de traduções, Com base no conhecimento histórico que ele
contudo, tem sido mais ajuda do que obstáculo à tinha, pôde articular suas análises e seus
compreensão do texto, isso ao se tratar de argumentos nessa perspectiva.
leitores não negligentes. De fato, o exame de Outro aspecto que Santo Agostinho destaca
muitos códices, com freqüência esclarece certas são as instituições humanas, que, para ele, se
frases obscuras (AGOSTINHO, A Doutrina referem ao conhecimento histórico e literário
Cristã, L. II, cap. 12, § 17)”. produzido pela humanidade. A primeira vista,
Além dessas questões teóricas a respeito da poderíamos pensar no acesso restrito a essas
linguagem, o autor descreve várias estratégias de obras. No entanto, elas não foram desprezadas,
retórica, que poderiam ser utilizadas no ensino antes se tornaram em fundamentos teóricos para
cristão. Nesse sentido, a conversão de Agostinho os cristãos chegarem a uma compreensão mais
proporcionou-lhe um imenso campo de aprofundada do ensino contido nas Escrituras.
trabalho. Os conhecimentos que trouxe do Deveriam, inclusive, segundo o autor, ser
passado, dos critérios que os antigos haviam aprendidas de memória.
produzido foram direcionados para a formação
de indivíduos, os quais não apenas fariam parte Toda essa parte de instituições humanas
da sociedade que principiava a se formar, mas se que são convenientes para as necessidades
da vida, os cristãos não têm razão
tornariam seus dirigentes. E o fizeram
nenhuma para evitá-la. Eles devem, bem
fundamentados na educação cristã e no ao contrário, à medida de suas precisões,
conhecimento historicamente produzido pela dedicar-se a seu cumprimento e aprende-
humanidade. las de memória (AGOSTINHO, A
As normas que ele elaborou para orientar o Doutrina Cristã, L. II, cap. 26, § 40).
estudioso das Escrituras na compreensão da
mensagem cristã tornaram-se profícuas naquela Finalmente, devemos considerar a
sociedade que carecia de ser instruída nas letras, consciência desse autor em relação ao seu tempo
na fé e na civilização. Tratava-se de auxiliar os histórico. Várias são suas referências a fatos
que sabiam menos a compreender as Escrituras históricos, quando se tratava de se posicionar
e ensiná-las. diante dos problemas e buscar explicações e
soluções para eles. Por esse meio, ele se
A Importância do Conhecimento e do contrapunha àquelas explicações que
Ensino da História para a Educação considerava insuficientes para responder aos
problemas enfrentados naquele período de
Nesse sentido, a mensagem a ser transmitida transição.
perpassava pelo conhecimento da história, Recorrer à história produzia condições de
apresentado por Agostinho como uma forma de apreensão de princípios e valores que deveriam
retomar princípios, conceitos e ensinar aos permanecer e daqueles que deveriam ser
homens como agir diante das circunstâncias. transformados por hábitos fundamentados na
Para Santo Agostinho, proposição cristã que confrontava os costumes
pagãos.
[...] todos os informes que a ciência Ao estabelecer a relação com o
chamada história nos oferece sobre o conhecimento do passado, entendemos que
sucedido nos tempos passados nos são de Santo Agostinho ofereceu parâmetros para situar
grande ajuda para compreendermos os
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historicamente tanto a prática formativa, quanto 40142000000100020&lang=pt>. Acesso em: 14


os conteúdos programáticos que deveriam ser nov. 2009.
preservados, difundidos, com vistas à produção
do conhecimento que os cristãos assumiriam, em NUNES, R. A. da C. História da educação na
virtude da desarticulação política do referido Idade Média. São Paulo: EPU, 1979.
período.
Em síntese, Agostinho foi um autor que OLIVEIRA, T. Agostinho e a Educação Cristã:
dedicou grande parte de sua vida ao estudo das um olhar da História da Educação. Notandum ,
Escrituras e à difusão da educação cristã. Ao 17, jul-dez. 2008. Disponível em:
fazê-lo, elaborou orientações para o ensino, <http://www.hottopos.com/notand17/terezinh
discutiu os conhecimentos teóricos que a.pdf>. Acesso em: 05/09/11.
deveriam ser ensinados, bem como as estratégias
para se ensinar corroborando com a educação
do medievo, na medida em que seus postulados
permaneceram norteando a educação no Recebido em: 09 de novembro de 2011.
ocidente durante séculos. Aceito em: 15 de dezembro de 2011.

REFERÊNCIAS

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Jardim Amarante. 17. ed. São Paulo: Paulus,
2004.

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Ricci. 3.ed. São Paulo: Abril Cultural, 1984.

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palavras e palavras sem som no pensamento de
Santo Agostinho. Estudos Avançados, 2000.
Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ar
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PEINADO, M. R. S. de S. Imagens da Educação, v. 2, n. 1, p. 1 - 10, 2012.

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