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Porque não há

uma greve geral?


Todos sabemos que a greve geral marcada para o dia 24 de
Novembro não resultará numa paragem total da economia
capitalista, ou seja, numa verdadeira greve geral. Mas também
sabemos que isso não se deve à discordância da maioria dos
trabalhadores com a necessidade de protestar ante as
injustiças e a exploração de que são alvos ou com a greve como
forma de luta.
Que trabalhador, a quem ainda reste um pouco de dignidade, não
acredita que é necessário protestar contra a situação de precariedade e
miséria a que se encontra submetida a maioria dos trabalhadores neste
país, causando algum dano àqueles que são os seus principais
responsáveis e beneficiários – a classe política e patronal?
Que trabalhador, a quem ainda reste um pouco de dignidade, não sente
Boletim Anarco-Sindicalista – Edição especial dedicada à Greve Geral de 24 de Novembro de 2010

uma raiva a crescer-lhe nos dentes quando ouve os mesmos facínoras de


sempre, com a barriga cheia de luxos e privilégios, a pedirem-lhe nova
dose de sacrifícios?
Mas então, porque não há uma greve geral?
A resposta está no medo e no isolamento que nos foram impostos,
uma barreira invisível que nos impede de fazer frente aos nossos PELA GREVE GERAL,
verdadeiros inimigos.
MAS OFENSIVA!
Editada pela Associação Internacional d@s Trabalhador@s – Secção Portuguesa

O medo de sermos despedidos, o medo de perdermos os poucos euros


que nos dão ao fim do mês impede-nos de resistir, quando não nos leva A chamada crise do capitalismo, a tal
mesmo a ver um inimigo, não naquele que nos explora, mas no colega “crise” que continua a encher os bolsos de
que é explorado como nós. Sem termos nenhuma defesa face ao patrão, banqueiros, magnatas da finança e
somos obrigados a satisfazer todas as suas vontades, a aceitar todos os capitalistas em geral, atinge sobretudo a
sacrifícios e humilhações. Protestar afigura-se como um acto romântico grande maioria da população. O governo
de serviço e o patronato continuam a
de jovens irresponsáveis e a greve parece uma relíquia daqueles tempos
debitar mais e mais medidas de ataque às
longínquos em que os trabalhadores pensavam que podiam fazer
nossas condições de vida: congelamento
revoluções. de salários e pensões, aumento de
O isolamento só reforça ainda mais o medo e impede-nos de procurar a impostos, cortes nos subsídios sociais,
nossa força na união com os nossos iguais, os demais explorados e aumentos dos preços dos medicamentos,
humilhados. O isolamento só se pode vencer se soubermos substituir a despedimentos, etc, às quais se junta o
moral burguesa do cada um por si por uma ética do apoio-mútuo, aumento exponencial do trabalho precário
praticando a solidariedade entre trabalhadores. E só rompendo o e dos salários irrisórios. E sem que se
isolamento de que somos vítimas poderemos vencer o medo. Quem vejam respostas à altura destes ataques
temerá ser despedido se souber que uma multidão o vingará e que continuados, que diariamente atiram mais
pessoas para situações de verdadeira
nenhum outro trabalhador ousará ocupar o seu lugar?
miséria social.
Isto só será possível se soubermos recuperar a ideia-base que inspirou a
E porquê? Muito simplesmente porque
formação dos primeiros sindicatos: “a emancipação dos trabalhadores só nos deixamos enredar nas manobras
pode ser obra dos próprios trabalhadores”. Saibamos então unir-nos, político-partidárias dos partidos políticos
sem líderes nem representantes, discutindo os nossos problemas em da esquerda parlamentar, apoiados nos
assembleias de iguais, recorrendo sempre à acção directa, isto é, à acção sindicatos oficiais, acreditando que “eles”
sem intermediários (políticos ou burocratas sindicais), para agir pela vão tomar boa conta da resolução dos
resolução desses mesmos problemas, tendo sempre presente que os nossos problemas. Porque pensamos,
interesses dos que exploram e dos que são explorados jamais serão erradamente, que bastará pressionar o
conciliáveis e que a nossa emancipação só será possível com a destruição governo e o patronato, através de
do capitalismo e do Estado. manifestações e greves pontuais, de
carácter defensivo, para pôr um travão à
Saibamos vencer o medo e o isolamento de que os nossos patrões se
degradação da nossa situação. Porque
alimentam e poderemos ousar protestar. E partindo de uma greve que os acreditamos piamente que o capitalismo,
poderosos querem ordeira e inofensiva poderemos chegar a pôr em cuja motivação é o lucro e cuja base de
causa um sistema que nos transforma em escravos. funcionamento é o roubo do produto do
Contra a exploração capitalista! Pela igualdade social! nosso trabalho, poderá alguma vez ser
melhorado, ou reformado.
Unidos e auto-organizados nós damos-lhes a crise!
Acção Directa
A acção directa é não confiarmos no
parlamentarismo nem nos homens que o
defendem; é não esperar do Estado senão
reformas ilusórias e deprimentes para os que
produzem e sofrem; é não entregarmos as
resoluções das nossas questões com o patronato a
políticos que sempre nos ludibriam; é lutarmos
aberta e directamente com aqueles que O que se quer daqui? É preciso ter lata!
directamente nos escravizam; é confiarmos na
força saída do nosso esforço; é lutar no campo O que se pretende com esta greve
económico-social cada vez com mais energia, de geral? O que seria legítimo esperar,
modo a que abreviemos a queda do patronato e nomeadamente mostrar ao Governo
que, para além da histeria das Bolsas e
do salariato que nos tem presos ao carro da
da pressão de Bruxelas, ele também terá
escravidão capitalista; é, em suma, o meio de
que levar em conta a reacção da rua e
apressarmos, sem receio de cairmos em ciladas temê-la se necessário for? Se assim for, Numa altura em que há
burguesas, o aniquilamento de toda a opressão e a greve já pode ser considerada um falta de emprego, as
escravidão; e é, sobretudo, o revigoramento da fracasso, dada a indiferença com que pessoas ainda têm uma
energia perdida, que, colocando o trabalhador na está a ser acolhida, mas as centrais série de exigências
plena posse das suas faculdades físicas, sindicais que a convocaram, com o seu estranhas.
intelectuais e morais, o eleva e o integra no longo passado de capitulacionismo, não Belmiro de Azevedo, 2009
sentimento da sua personalidade. pensariam em arrancar as massas à sua Patrão da Sonae, 2º homem mais rico
letargia e mobilizá-las, mesmo que de Portugal, com uma fortuna avaliada
Manuel Joaquim de Sousa, anarquista, 1911 em 1,1 mil milhões de euros.
ainda estivessem em condições de o
fazer. Falar de sindicalismo em Portugal
significa falar sobretudo de
Alguns meios de luta do funcionalismo público porque, para a
classe trabalhadora propriamente dita,

anarco-
anarco-sindicalismo o próprio risco de fazer greve já é
demasiadamente grande. É em nome
deste funcionalismo que se declaram as É preciso pensar duas
Boicote greves e as grandes «jornadas de vezes antes de aumentar
1) Boicotar o trabalho na empresa, fazendo com protesto», que desaguam
o salário mínimo.
que a qualidade não seja a desejada, provocando invariavelmente em coisa nenhuma, Francisco van Zeller, 2009
assim o decréscimo do prestígio da empresa em sucedendo-se as derrotas às derrotas, Presidente da Confederação da
questão. mas poderia ser de outra forma? Se Indústria Portuguesa entre 2002 e 2010
2) Boicotar o produto já elaborado ou o serviço depender destas cúpulas sindicais, sem Não me imagino a viver
prestado, ou ainda uma determinada marca, fazendo dúvida que não. O medo de que
com 450 euros mensais.
propaganda que afecte o seu prestígio, por meios qualquer mobilização popular, uma vez
iniciada, fuja rapidamente ao seu
É terrível. Mas com 500
públicos (campanhas e piquetes informativos) ou
controlo e se atreva a formular também não, com 550
outros, desaconselhando a sua aquisição ou
consumo. exigências que se situem além daquilo também não, com 600
que o aparelho político-sindical da também não.
Sabotagem esquerda se pode atrever a propor sem Francisco van Zeller, 2009
Provocar o dano, a inutilização ou a paragem arriscar a pele é demasiado forte.
temporária dos meios de produção (por exemplo
encravando uma linha de montagem ou de Entenda-se: não existe alternativa. Ou
produção), fazendo com que a empresa em questão se aceita em bloco o capitalismo e a
seja atingida nos seus lucros, sem lhe dar a austeridade de que ele precisa, exigindo
possibilidade de tentar reprimir a luta dos seus quando muito uma repartição mais
trabalhadores. justa dos «sacrifícios», ou se começa a
pôr o sistema enquanto um todo em Não existe razão para ir
Greve com ocupação causa... Chorar sobre o leite derramado além do congelamento
A greve com ocupação consiste em os dos salários este ano.
porque «estão-nos a roubar o que Abril
trabalhadores negarem-se por completo a trabalhar, Vítor Constâncio, 2010
nos deu» não serve de muito e, vinda a
sem abandonarem o seu local de trabalho, até que as Ex-Governador do Banco de Portugal,
lamúria justamente da boca de quem actual vice-presidente do Banco Central
suas exigências sejam satisfeitas. Este tipo de greve
escancarou as portas ao ladrão e tornou Europeu. Já em 2009,quando auferia
terá maior sucesso se tiver a SOLIDARIEDADE
esta situação possível, já não há quem se uma remuneração de 250 mil euros
activa dos trabalhadores de outras empresas. anuais (mais as mordomias), havia
deixe comover. Portanto, para todos os
Como continuação desta forma de luta está a afirmado que o elevado desemprego
efeitos, a decisão está tomada: a em Portugal se devia à ”generosidade”
apropriação dos meios de produção pelos
burguesia e o seu comité executivo do subsídio de desemprego.
trabalhadores, fazendo com que a produção continue
podem passar tantos PECs quantos
por sua conta, ou seja, sem chefes nem patrões. Os Associação Internacional
quiserem porque não há alternativa a
lucros obtidos nesta situação de AUTOGESTÃO dos Trabalhadores
isso dentro do sistema, mas entenda-se:
deverão ser repartidos por todos os trabalhadores, – Secção Portuguesa –
o aparelho não pode pura e
sem distinção de posto de trabalho, idade ou
simplesmente admitir que não serve Lisboa: Apartado 50029
capacidades. Para as tarefas que antes
para nada e vê-se na obrigação de fazer 1701 - 001 Lisboa
desempenhavam chefes e patrões, serão designados
algo. Assim sendo, declara a greve, e-mail: aitport@yahoo.com
trabalhadores da empresa, mas num sistema de
sabendo de antemão que não vai Porto: R. Caldeireiros, n.º 213
rotatividade e sem que do seu desempenho resulte
conseguir nada com isso excepto uma 4050-141 Porto
qualquer espécie de prerrogativa ou privilégio,
coisa, que é o que realmente se quer e-mail: sovaitporto@gmail.com
demonstrando-se assim que não são necessários
daqui: mostrar serviço e nada mais.
nem chefes, nem patrões, nem quem enriqueça à http://ait-sp.blogspot.com
custa do trabalho dos outros.

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