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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE FILOSOFIA

MAIARA RÚBIA MIGUEL

FILOSOFIA NO BRASIL:
ANTÔNIO JOAQUIM SEVERINO

CAMPINAS

2014
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS APLICADAS

CURSO DE FILOSOFIA

MAIARA RÚBIA MIGUEL

FILOSOFIA NO BRASIL:
ANTÔNIO JOAQUIM SEVERINO

Trabalho de aproveitamento da disciplina


Filosofia no Brasil e América Latina do curso de
Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, sob orientação do professor Paulo
Moacir Godoy Pozzebon.

CAMPINAS

2014
INTRODUÇÃO

A filosofia pode ser compreendida como o amor ao conhecimento. Nesse sentido,


muitos homens e mulheres amaram o conhecimento, e tendo a admiração ou a própria
inquietação aliada, querendo ou não, conseguiu contribuir para a construção do conhecimento
humano. Mas, dentre esses homens e mulheres será que não existe nenhum brasileiro? Será
possível existir filósofo?

Antônio Joaquim Severino é um dos grandes intelectuais brasileiros que pode ser
conhecido como filósofo, não só pelo seu comprometimento e amor pelo conhecimento, mas
também pela sua capacidade de compreensão da tarefa da filosofia no Brasil. Sendo assim, é
possível afirma a existência de filósofo brasileiro. Severino repensa questões sobre política,
educação e até mesmo no âmbito da ética partindo e considerando correntes da tradição do
pensamento, a saber, o personalismo. Aos olhos de Severino, o personalismo além de ser atual
é relevante para poder repensar questões, que não são tão abordadas no Brasil, de modo
refletido, atual é comprometido.
SEVERINO E O PERSONALISMO NA REALIDADE BRASILEIRA

Muitos daqueles que hoje se lançam na tarefa de estudar filosofia no Brasil acreditam
não ser possível o desenvolvimento de um pensamento sistemático filosófico brasileiro, por
isso acabam desenvolvendo atividades teóricas tendo como base um sistema que já foi
desenvolvido por um filósofo anterior, e que na maioria das vezes não é brasileiro, mas sim
europeu, ou até mesmo se esquecem de se posicionar sobre o sentido da tarefa do filosofar,
pois a reflexão filosófica atual no Brasil “não vincula em si a exigência de um desdobramento
teórico explicito para a análise e discussão dos problemas relacionados com as esferas da
política e da educação” (SEVERINO, 2011, p. 257).

Será que não pode ser afirmado que existem filósofos brasileiros? Será tão difícil
encontrar alguém que possa reconhecer a importância da tradição do pensamento e ao mesmo
tempo pensar os problemas e questões atuais do Brasil? É possível ultrapassar os comentários
sobre Kant, Heidegger e Aristóteles e pensar na tarefa da filosofia no Brasil? Essas são
algumas das questões que podem ser feitas para muitos pesquisadores, mas pelos estudos da
filosofia no Brasil é possível afirmar que existe filosofia no Brasil, e que existem pessoas
competentes pensando problemas reais do contexto da politica, educação, ética no Brasil,
como o próprio filosófo Antônio Joaquim Severino.

Existem outros pensadores, homens e mulheres que se desdobram em pensar a


realidade brasileira na perspectiva filosófica, pois grandes correntes do pensamento como o
tradicionalismo, positivismo, neotomismo, ou até mesmo estudos sobre fenomenologia,
hegelianismo, o personalismo e outras correntes não seriam ouvidas hoje. O desafio que o
filósofo brasileiro abraça é desenvolver um sistema, um discurso filosófico que não seja
populista, além de deixar de ser um mazombo que comenta filosofia de europeu para pensar
questões politico-educacionais na atualidade, que é o que Severino tenta fazer.

Severino afirma categoricamente que a discussão sobre a temática político-


educacional brasileira na atualidade ocupa poucos espaços, mas ele partindo de seus estudos
sobre o personalismo trabalha tal assunto, e repensa a partir da filosofia de Emmanuel
Mounier como a política brasileira pode ser reorientada, uma vez que Severino reconhece que
os pontos fundamentais da antropologia personalista de Mounier possui relevância, além de
ser atual e contar com a possibilidade de abordar problemas políticos e éticos não resolvidos
na atualidade do contexto brasileiro.
A importância, e a atualidade do pensamento político de Mounier é de grande
relevância, tendo em vista o que Severino reflete, pois o pensamento personalista contribui
para dar compreensão a discussão e reorientação dessa realidade, já que a filosofia
personalista mounierista, é ainda, sobretudo uma filosofia da práxis, que demanda um
compromisso de reflexão e ação sobre a realidade, portanto as intuições filosóficas de
Mounier de natureza antropológica, a saber, a afirmação da pessoa, a afirmação da condição
existencial permite que a dignidade da pessoa humana seja o ponto nuclear, isto é, a dignidade
da pessoa humana é a referência de todos os valores.

Severino em uma entrevista cedida para IHU-Online1 afirma que Mounier certamente
diria aos pensadores brasileiros, responsáveis pela construção de mediações significativas
para a construção de nossa história, que sua produção filosófica precisaria estar muito atenta
às condições de encarnação e de transcendência das pessoas que formam esta sociedade, por
isso, caberia aos filósofos brasileiros não construir sistemas de significantes abstratos, mas de
contribuir, com um pensamento criativo e crítico, lançando esclarecimento para sua
superação, tendo em vista a emancipação das pessoas no seu interior.

“A idéia que me parece muito forte no personalismo mounierista é que a razão de ser
do conhecimento, o que lhe dá sua legitimação, é seu intransigente compromisso
com a construção da cidadania, entendida esta como aquela qualidade de vida que
permite a todos existir concretamente, fruindo de todas as condições objetivas e
subjetivas que constituem a própria infra-estrutura de nossa existência real”
(SEVERINO, IHU-ONLINE).

Assim sendo, as ideias do personalismo ajudariam a traçar novas perspectivas para


crises políticas de qualquer sociedade, e em especial, poderia traçar um novo modo de
conceber a própria política brasileira, onde a subjetividade do ser humano deve ser afirmada.
Repensar a temática política educacional que o próprio Severino afirmou possuir
pouco espaço, a partir desse sistema personalista mounierita é o modo que o brasileiro
encontrou para estabelecer um sistema que repense a política no Brasil. Esse é o exemplo de
que é possível fazer filosofia no Brasil, sem ficar somente em comentários.
Severino afirma ainda que política e educação precisam ser assuntos mais discutidos,
mais refletidos, e que além disso, são mediações insuperáveis da própria existência humana,
portanto a apreensão e compreensão do sentido da existência humana constituem, na
realidade, a única justificativa que possa legitimar a própria reflexão filosófica (SEVERINO,
2011, p. 257).

1
IHU: Instituto Humanitas Unisinos.
Pois bem, o repensar proposto por Severino se inicia no próprio repensar do sistema
econômico vigente em nosso contexto, a saber, o capitalismo. Aos olhos de Severino o modo
de ver e existir atuais, desse perfil neoliberal que afirma a exacerbação do individualismo, do
consumismo, da indústria e etc, não instaura uma ordem diferenciada sob a compreensão e do
respeito da dignidade humana, mas o que está de fato acontecendo é a plena maturação das
premissas e promessas da própria modernidade (SEVERINO, 2009, p. 157). Isso, no fundo,
não passa das mesmas críticas, uma vez feita por pensadores do século XIX, pois não é nada
mais moderno do que o próprio individualismo dos dias de hoje.
Com isso, cabe a esse momento certa atenção, e o personalismo expressa, nesse
sentido, segundo Severino, tanto uma filosofia quanto uma pedagogia política, ou seja, um
instrumento de análise dessa realidade como roteiro de ação transformadora, e o diferencial
desse instrumento, para o personalismo é o engajamento, ora, o filósofo tem que ser
simultaneamente profeta e pedagogo, respondendo pela denúncia, pelo anúncio e pelo
encaminho de propostas de ação histórica (SEVERINO, 2009, p. 158).
Com as referências filosóficas do personalismo em mente, é possível tecer um
repensar na área da educação brasileira, sobretudo pelo fato da educação não ser somente
concebida como um simples processo institucional, mas precisa ser um investimento no
humano. É claro que o personalismo afirma o humano, e afirma a transcendência da pessoa,
por isso a educação deve ser o investimento desse ser que é o centro de todas as discussões. E
isso, não se dá somente na particularidade da relação pedagógica pessoal, segundo a leitura de
Severino sobre a aplicação do personalismo na realidade brasileira, mas as intervenções
educacionais devem ser a autêntica responsável pela construção, formação de uma
personalidade integral. Na medida em que existe a preocupação pela construção do homem,
existe a humanização.
A educação exige a eticidade. Esse compromisso ético da educação, que se estende ao
exercício profissional dos educadores, por assim dizer, se acirra nas coordenadas histórico-
sociais em que nos encontramos (SEVERINO, 2009, p.160), por isso a atividade dos
professores deve ser entendido como investimento intencional sistematizado na consolidação
das forças construtivas das mediações existenciais dos homens. Sendo assim, o educador não
deve possuir uma formação meramente técnica, senão precisa também de uma formação na
ordem política, ou seja, expressar sensibilidade às condições histórico-sociais da existência
dos sujeitos envolvidos na educação. Sendo assim, a política, a atividade profissional se
tornará intrinsecamente ética (SEVERINO, 2009, p. 161).
Severino afirma que até hoje no Brasil não foi possível implementar um projeto
civilizatório mais abrangente, por isso é preciso fazer seu renascimento, que para isso, leva a
comunidade a superar opressão, exclusão, pobreza, e ainda, superar o ter. Essa análise é feita
partindo da leitura da filosofia de Mounier, que conseguiu entender essas mesmas questões
presentes hoje no Brasil, nos anos 30 a 50 no Europa.
A contribuição de Severino para a filosofia no Brasil é marcante. Sobretudo quando se
pensa no personalismo no Brasil, que foi graças a esse pensador brasileiro que foi melhor
conhecido nas grandes universidades brasileiras. Mas, o que deve ser percebido é que essa
leitura que Severino realizou sobre Mounier possui grande importância quando se tenta
repensar as questões mais problemáticas de nosso país, a saber, política, educação, saúde e
ética, além de permitir o repensar da dignidade humana e as relações do homem, portanto
Severino defende que a grande contribuição que o personalismo pode fornecer para o repensar
da construção do homem e do projeto civilizatório do Brasil passa pela educação para a
cidadania. Por isso, o que pode ser inferido é que aquilo de melhor que é pensado hoje no
âmbito educacional deve possuir uma inspiração madura e crítica do pensamento personalista,
que propõe e consolida um projeto humanista de transformação qualitativa de toda nossa
realidade individual e social (SEVERINO, 2009, p. 162).
“Educar a pessoa hoje, em nossas condições, é educar para essa dimensão da
cidadania, é despertar a humanidade junto dos homens para consolidar a civilização,
é assegurar a todos a condição de cidadãos, numa sociedade verdadeiramente
democrática, que é aquela que consegue assegurar a todas as pessoas a fruição dos
bens naturais, dos bens políticos e dos bens culturais que são necessários para sua
realização como pessoas portadoras de uma eminente dignidade.” (SEVERINO,
2009, p. 162).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É muito comum ouvir que não existe filosofia no Brasil, afinal isso é o que muitos dos
estudantes de filosofia brasileiros dizem, mas isso é o reflexo do que os próprios estudantes de
filosofia têm ignorado, pois na medida em que se pensa a própria história do Brasil, e a
história dos homens e mulheres que ajudaram na construção desse país fica fácil perceber
influência como: positivismo, tradicionalismo, neotomismo e outros. Portanto, é mais do que
certo afirmar que existe filosofia no Brasil.
Para confirmar a existência de filósofos no Brasil, e que é possível ultrapassar meros
comentários, temos como exemplo o Antônio Joaquim Severino, que é um dos grandes
intelectuais brasileiros que conseguem considerar o que já foi desenvolvido como sistema
filosófico, e consegue transpor tais sistemas para a realidade que se vive, a saber, a realidade
brasileira.
O Brasil possui muitos outros nomes como Miguel Reale, Marilena Chauí, Lima Vaz e
outros, mas foi o Severino que desenvolveu estudos sobre o personalismo, e o modo como o
personalismo pode influenciar o repensar da realidade política e da realidade da educação nos
dias de hoje.
A afirmação do ser humano é uma das premissas de Mounier, e Severino resgata isso e
afirma que afirmando o ser humano, se afirma a dignidade humana, e colocando essa questão
no centro das discussões práticas e teóricas é que é possível articular os assuntos acerca da
política, educação e ética, já que essas áreas devem reconhecer em seu centro nuclear a
dignidade humana.
No Brasil é preciso repensar a educação, pois além de ser um dos assuntos que não são
tão discutidos, deve afirmar a construção humana. Deve ser advertido que a construção
humana nesse sentido não é técnica. Severino reflete que a educação meramente
institucionalizada, não favorece e nem mesmo contribui para a construção do homem, e nem
mesmo o auxilia a meditar sua vocação ou estimula a tal engajamento, haja vista os inúmeros
analfabetos funcionais sendo “formados” pelo sistema educacional de nosso país.
No âmbito da política, de acordo com o que Severino demonstra, é preciso reorientar e
repensar a própria estrutura política, porque diante de todos os escândalos, onde está a
dignidade do povo brasileiro? O que os nossos representantes fazem para afirmar a dignidade?
Essas são questões que devem ser feitas, pois até então, o que se percebe é o interesse, a
afirmação do egoísmo, o que deve ser erradicado desse sistema.
Por essa reflexão proposta é possível notar a importância de Severino para o
pensamento brasileiro, e é difícil desconsiderar o que ele vêm produzindo. Esse pensador é
reconhecedor da importância da tarefa da reflexão da filosofia, talvez seja esse sua motivação
e perseverança na filosofia no Brasil.
REFERÊNCIAS

SEVERINO, A,. A filosofia contemporânea no Brasil: conhecimento, política e


educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.
_______________________. Entrevista com Antônio Joaquim Severino.
Disponível em: http://www.paradigmas.com.br/parad28/p28.10.htm. Acesso em: 14 de
Agosto de 2012.
_______________________. Humanismo, Personalismo e os desafios sociais da
educação contemporânea. Revista Educação, Poder e Cidadania. Cuiabá. V.18, n.36, p. 155-
163, Jan/Abr. de 2009.

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