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"j3 ilusãO de um paraíso


BETTY J. MEGGER
....

o
COLEÇÃO RECONQUISTA DO BRASIL (2ªSérie)
Irlgldn por Antonio Paim, Roque Spencer Maciel de
D tO Ruy Afonso da Costa Nunes. Diretor até o
volum 92 Mário Guimarães Ferri (1918-1985) Betty J. Meggers
da Smithsonian Institution
VOL. 113

CAPA
CLÁUDIO MARTINS
AMAZONIA
- a ilusão de um paraíso /

Tradução de
MARIA YEOOA LINHARES

Apresentação de
DARCY RIBEIRO

I J IT RA ITATIAIA LIMITADA

(\0

do
Geraldo, 53 -
ahía, 902 -
Fone: 222-8630
Fones: 224-5151 c 226-6997
E íitora Itatiaia Limitada
I I J () 11 I I' N' r Ido, 67 - PABX: 212-4600 222-7002 1 litora h Univ rsi I~lI' I' S'10 I aulo
1
:
I
rtunc do original em inglês:
MAZÔNIA PREFÁCIO À SEGUNDA EDIÇÃO
MAN AND CUL TURE IN A COUNTERFEIT PARADISE

opyright © by Betty J. Meggers


J

N O PREFÁCIO à primeira edição norte-americana deste livro,


que saiu em 1971, lamentei a escassez de pesquisas antropológicas sobre
as populações indígenas da Amazônia. A situação melhorou sensivel-
mente nos últimos quinze anos. Contamos, hoje, com inúmeros estu-
dos que dão conta das estratégias adaptativas dos grupos tríbaís da flo-
resta tropical. Os dados que eles nos oferecem sobre os padrões de sub-
sistência e de ocupação da área, sobre a organização social e as concep-
ções religiosas, refletem nitidamente as compulsões do ecossistema
amazônico. O projeto arqueológico - Programa Nacional de Pesquisas
Arqueológicas na Bacia Amazônica (PRONAPABA) iniciado em 1976,
recuou nosso conhecimento sobre a adaptação à terra firme até o co-
meço da era cristã. Estudos palinológicos e geológicos revelaram episó-
dios de aridez ocorridos durante os últimos cinco milênios, os quais
devem ter afetado drasticamente o suprimento alimentar às populações
humanas da hiléia. Ao levarmos em conta os esforços na luta pela so-
brevivência, para escapar a esses percalços, tornam-se inteligíveis, tanto
a ampla dispersão das línguas e dos traços culturais nativos, quanto
sua distribuição desordenada.
1987
Estes avanços da ciência demonstram que, na medida em que
Direitos de Propriedade Literária adquiridos pela aprofundamos nossa compreensão das culturas indígenas da Amazônia,
EDITORA ITATlAlA LIMITADA habilitamo-nos a avaliar, mais objetivamente, as conseqüências, no que
Belo Horizonte

7
r fere ao ambiente e à sua capacidade de satisfazer às necessidade
humanas, do desmatamento que vem ocorrendo em nossos dias. ~ de
se esperar, portanto, que, ao formularem projetos de exploração mais Sumário
intensiva da Amazônia - região remarcavelmente única - os planeja-
dores do seu desenvolvimento econômico e social se esforcem por
incorporar as irrefutáveis lições da pré-história.

Betty J. Meggers
Washington, abril 1987. Apresentação de DARCY RIBEIRO 1
Prefácio 21
Introdução 2
1. O ecossistema 2
L
2. Adaptação indígena à terra firme 70
3. Aspectos adaptativos da cultura da terra firme 14
4. Adaptação indígena à várzea 17

5. A Amazônia no mundo moderno 209


6. O significado evolutivo da adaptação 21
Bibliografia selecionada 2 4
Sugestão de leituras complementares 2 8
Apresentação

EM SUA SALA de trabalho em Washington, uma mulh r


inquieta medita sobre o destino de nossos mundos amazôní-
. coso Não é, como costuma ocorrer ali, uma conspiradora d
CfA, arquitetando ações preventivas de contra-insurgênci.
Tampouco é uma estrategista hudsoniana, planejando apod -
rar-se de recursos escassos para a eventualidade de futur
guerras. É tão-somente uma antropóloga, que aprendeu a cul-
tivar e exercer a ciência como um meio de ver mais 10n
mais claro e, sobretudo, para sentir mais fundo seu sentim nt
de gente entre gentes.
Falo de minha amiga Betty Meggers. Vejo-a sentada
mesmo lugar onde, há 120 anos, um cacique dos Duwamí h
respondia à carta em que o Presidente dos Estados Uni
"propunha" a compra de seu território tribal para ali edifi
a cidade de Washington. Betty ho e, como Seathl ontem, pa-
dece a dor de sua impotência frente os perigos que prevê, mil.
contra os quais nada pode fazer. Ela como ele só tem a l-
cidade de prefigurar e o dom de falar das ameaças que p m t

sobre "a pureza do ar", o "resplendor das águas" e O v r-


dor das florestas de uma província da terra que é, p r
bos, "como para um recém-nascido o latejar do r
ua mãe".
JI
pro d n I I n gu 11 • 1I1 ar um nh im "tu m I
1 ) 1 d íxou uma carta terrível, por sua retidão e sua do da ci d des e cultura que xamin t 1
1 :1.1, que at hoje nos comove, embora comova apenas. Betty efetuar uma avaliação crítica do sab r ntr p 1 I l
I d um livro sábio e belo: Amazônia: a ilusão de um pa- questões que acreditávamos compreender muito b m rnâ
raíso, que apresento aos leitores das edições mexicana e bra- só agora deixam transparecer suas funções oculta .
ileira; desejando de todo o coração que não nos comova ape- de temas como a anticoncepção, o aborto, o infanti ( j ,
nas. Com efeito, é preciso muito mais do que isso. Já não se guerra, a feitiçaria, os costumes relacionados com vi
trata agora de que as águas e os bosques do Potomac sejam sexual do trabalho. Todos eles comparecem, redefinido
entregues a gente incapaz de amá-Ios e respeitá-los. Trata-se Betty Meggers, como mecanismos de controle do meio-am i ..
de salvar de uma destruição perfeitamente evitável a maior das te e reguladores da população. O mesmo ocorre com f t r
selvas virgens e de defender da poluição o mais portentoso rio aparentemente tão afastados da adaptação comportam nt I,
da terra. Trata-se de salvar, enquanto é tempo, toda uma fon- como o etnocentrismo, as concepções do sagrado e do prof lJ1 )
te prodigiosa de vida para que, ao florescer amanhã, faça da e o adultério. Mas a análise de Betty Meggers vai mais 1 n
Amazônia o grande jardim terrenal que os homens do futuro incluindo em suas indagações o reexame crítico da função
desejarão ver, cheirar, sentir, admirar. lógica da variação das técnicas nativas. de coleta, caça e p -
ca; a reavaliação das características do cultivo itinerante r n-
Para alcançar este objetivo, Betty Meggers dá uma con- lizado mediante a derrubada da mata, queima e plantio; d
tribuição inestimável com este estudo das culturas amazônicas, práticas relativas ao cuidado do corpo; dos processos de con
como parte de um complexo sistema de adaptação ecológica. servação e consumo de alimentos; das formas de organizaç
Em suas poucas páginas, A mazônia constitui uma das obras da aldeia e das dimensões da casa. Reexaminados como r •
mais importantes que a antropologia produziu nos últimos postas culturais específicas a exigências do meio-ambiente,
anos e, sem dúvida, a mais significativa para as zonas tropicais. tes velhos temas, tão trabalhados pela erudição etnológica, r
Utilizando o método comparativo e uma extraordinária capa- surgem à luz de novos questionamentos que iluminam sua
cidade de interpretação e síntese, Betty Meggers submete à faces ocultas.
crítica antropológica o saber científico sobre a vida humana
na selva tropical, proporcionando-nos uma apreciação de uma O mais assinalável, contudo, é sua postura com rela
a temas não só cientificamente significativos por sua cap i
lucidez e clarividência até agora inatingidas sobre a aventura
humana na Amazônia. E também uma veemente advertência dade explicativa, mas também socialmente relevantes. E p -
sobre a catástrofe ecológica que ali se está processando e que cialmente no que diz respeito a essa feia e sofrida humanid d
ameaça uma parte importa te da vida na terra. que a civilização colocou na Amazônia no lugar da gente b 1
e sadia que, ao longo de milênios, construiu ali um habi tnt
Bem sei que uso grandes palavras e minha mão treme ao ecologicamente equilibrado. A autora analisa este tema em
escrevê-Ias. Faço-o porque estou convencido de que elas são três etapas.
justas e verdadeiras. Betty Meggers nos oferece, realmente,
Primeiramente, nos oferece uma perspectiva geral dos d i
uma obra exemplar pelo emprego sistemático do método com-
principais ecossistemas da Amazônia: o das terras altas qu
parativo para examinar transculturalmente um tema e pô-lo à
cobrem milhares e milhares de quilômetros quadrados d pla-
prova mediante a confrontação dos fatos com a teoria. Assim
12 1
n t r i, mbora cob rt s de florestas de uma exuberân- qu ólou I ruditu ti duz uniu:
ci prodigiosa; e a estreita faixa de várzeas - terras baixas eu 'O , M,' além d r c nstruc e: primort
lnundáveis - extraordinariamente férteis porque anualmente r ce ,.., ionuliz ões desafiant ,fund m nta I ,
rejuvenescidas pelo lodo carreado pelas enxurradas que des- squ ma teórico que permite, pela prim ira v '1.,
cem dos Andes. Em seguida reconstitui o sistema adaptativo num ira crítica o desempenho evolutivo do p v
de cinco tribos indígenas habitantes de terras altas e de dois t '\ tr pical.
povos desaparecidos que viviam nas várzeas até um século e N as duas últimas partes do seu livro, Betty 1 r p' (
meio ap6s a chegada dos europeus. d a um balanço das formas modernas de tdap 'ao An. ,
Apesar de ater-se à sua preocupação básica - o exame ni , demistrando que elas levam a um verda ira d . l. ti
do modo pelo qual cada povo, com base em sua cultura, ex-: 1 gico. mpida a harmonia' da comunidade biótica ai 'IUI
plora o potencial de subsistência do ambiente em que vive -, . d pelas lturas indígenas, desencadeia-se ali um pr s o,
suas reconstruções são sínteses admiráveis do quanto se sabe " arenternente irreversível, de deterioração do solo, cxtin no ti I
sobre esses povos. Particularmente os capítulos referentes aos 1'1 ra e extermínio da fauna que conduzirá à liquidação. 111
Omagua e aos Tapajós, que representam o melhor que se tem I razos previsíveis, das bases da vida humana na região, fi tty
escrito sobre sua vida e sua cultura. I rra seu livro com uma lúcida discussão sobre o significado
Os cinco primeiros ensaios foram redigidos graças às d estudo das formas de adaptação à selva tropical para \
observações diretas da autora, à bibliografia etnográfica per- t rias da evolução.
tinente e a entrevistas com etnólogos que realizaram estudos Como acentuamos, o cenário do livro é a floresta arnaz
de campo junto àqueles grupos. Os dois últimos se apóiam na ni a que a autora nos apresenta como uma façanha da s 1
investigação arqueológica e, principalmente, na exploração çao natural. Ali, nas condições mais adversas, a luta pela vi lu
exaustiva de dados dos cronistas que, entre 1542 e 1692, de- t eu, antes da chegada do homem, um ecossistema de c >111
ram notícias dos povos amazônicos das várzeas que eram os pl xidade fantástica, de diver ade quase infinita e de mar I
que contavam com populaçõ~s mais numerosas e possuíam vilhosa integração. Trata-se e uma situação única em
culturas mais elaboradas. AqUI, Betty Meggers faz milagres de sobre terras áridas, envoltas r um calor úmido e suj it·l. .1
dedução à base de informações dispersas e precárias, gra7~s .à dilúvios torrenciais, a nat z e fez a si própria, construiruk
acuidade em perceber os fatos despertada por sua Iamiliari- e como um sistema fecha auto-sustentado de recicla 11I
dade com o ofício dos arqueólogos, que se nutre de elementos de nutrientes que circulam d a e do ar, abastecendo u vid I
escassos. Tendo que apurar tudo a partir de quase nada, con- vegetal e animal. Reabsorve todos os detritos, provo 'um
tando apenas com alguns ossos queimados e restos de cerâ- uma explosão fabulosa de vi ores tal.
mica deixados por povoadores prístinos, os arqueólogos apren- Betty nos mostra como entro desta floresta luxuri I,
dem, necessariamente, a combinar fatos com uma destreza ex- formada nas últimas idades da erra, os homens - ch do
traordinária. Nós, etnólogos, que convivemos longos anos - p r último - fizeram seus n os e os foram variando d
quase sempre de forma grata - com os povos que estudamos, n ordo com diferentes mode daptativos. Conservando
observando-os em toda a complexidade de sua vida, raramen- s n ialmente, os mesmos c/"
te extraímos de nossas pesquisas o saber e o sabor que esta ar- fi r t i animais c permane·~LaI
14
\I ilmcut uni rm ' m ua potencial idades básicas, ur- t 1 t lJ d t ram t r nc ntr do, p
lu utn P idr: geral de adaptação humana à natureza tropi- raí o p rdid . O mais remarcável, a u 1 ,
11. H tty Meggers estuda esse padrão em suas configurações
íund am ntais que respondem à diversificação dos meios natu- idílicas e sadias em sua nudez, às quais atribuíam
ais. ada uma delas encerra em si uma sabedoria milenária, do primeiro dia da criação. Surgem depois os relato d
xpressa na classificação e nominação da floresta e seus seres, sionários, impregnados da preocupação de demon trar qu
para colocá-los a serviço do homem, através da domesticação e podia falar de vida paradisíaca entre populações p~g ,
entre ues ao incesto, ao infa .;. .
das plantas de cultivo, das inúmeras técnicas de coleta, caça
e pesca, da utilização de vegetais e animais que permitiram çao e ca eças. econ eciam que os indígenas eram n
produzir e reproduzir as condições de sobrevivência dos grupos rosos e dotados de uma buliçosa alegria de viver, mas ínsí ti m
humanos sem causar danos irreparáveís à natureza circundante. em que eram inegavelmente preguiçosos e carentes de qualqu
ambição. Seu único prazer consistia em folgar, dançar, fo nl
Assim passaram milênios até que surgiram os agentes de car e rir. -' -- .
nossa civilização munidos, também ali, da capacidade de agre-
dir e ferir mortalmente o equilíbrio milagrosamente logrado Com a chegada destes moralistas virtuosos começa a déb4
por aquelas formas complexas de vida. A agressão européia ele da vida, pois seu objetivo era acabar com os costumes g n..
se fez de man ira .' . elo tílícos. Prossegue com os colonizadores, que vieram depois,
r cos e por sua ítu e cruamente mercantilista, própria de fim de recrutar, em trabalhos forçados, toda aquela humaní
.uem só desejava a ermitisse en- dade folgazã. Imersos nesse redemoinho de virtudes cristã
nq _ m o de motivações mercantis, os amazônicos viram perder- e
rque o dessa o ausent- . abundância dos alimentos que consumiam e dos bens que el
iram a v' próprios faziam e usavam, para produzir, com seu trabalh ,
eara mercadorias exportáveis. Com a civilização começa a era d
- éIras vítimas desta agressão ecológica, econômi- fome e da penúria. Os testemunhos escritos já não falam d
ca e cultural foram as comunidades humanas ori inais, conta- paraíso. Sua imagem preferida é o "inferno verde" e seu maio
minadas, desenraizadas, escravizadas, dizimadas e, finalmente, temor é suscitado pelas "doenças tropicais" trazidas, efetiv
substituídas por outros grupos humanos. Simultaneamente se mente, do além-mar, apodrecendo a vida humana ao longo d
viu afetada a vida animal em sua prodigiosa variedade, che- toda a região.
gando quase a desaparecer as aves que colmavam os céus, os Testemunhei este ciclo secular de vida e morte nos d z
peixes, tartarugas e crocodilos que coalhavam as águas, osani- anos de minha existência dedicados a estudar os povos indí
mais de caça que habitavam as selvas. Muitas espécies foram nas da Amazônia. Vi com meus próprios olhos os indígenas íso
objeto de uma exploração mercantil desenfreada e em geral lados, na alegria de sua existência livre e bela, na candura d
todos os seres viventes experimentaram um fantástico desgaste. sua nudez adornada de plumas e pinturas, na fartura de s u
Betty Meggers reconstrói para nós a crônica terrível desta cultivos, de suas caçadas coletivas e na riqueza de sua eco..
invasão e sucessão ecológica. Passo a passo podemos acompa- nomia voltada à reprodução das condições de sua própria exi ...
nhar sua marcha avassaladora. A princípio, registram-na os te tência. Mas também sofri ao revê-Ios, após alguns ano d
temunhos dos primeiros europeus que, ao ver a floresta p -
16 17

.'Y
1
utato a ivilízação - \ vezes as mesmas pesso 11 m I ta h dif r nt o I
cobrlnd de farrapos sua esquálida nudez envergonhada, sor.• lu ar di t , o que busca é compreend -1 m lh 11\
rindo com suas bocas de dentes podres, .num esforço supremo lhor prot gê-los. Por isso, seu interesse se cone ntr t I t< I )
pq~ expressar alegria ao ver-me conservado e forte. . fatos significativos, que permitem ampliar e melhor r
I Às lições de Betty só tenho a acrescentar, como fruto de curso do saber humano, como nos eventos que dizem
minha própria experiência, uma observação que considero per- aos problemas colocados por sua sobrevivência e' ãcrescíme
tinente e à qual ela também alude. Refiro-me à caracterização to. Graças a esta postura, Betty Meggers jamais abdí
da Amazônia como paraíso terrestre e como inferno verde que, compromisso com a objetividade que a ciência exige. M t
em certos casos, pode corresponder à observação direta e obje- pouco se exime em revelar-nos sua dor ante a tragédia qu v.
tiva dos grupos indígenas das terras altas nas duas estações vem ospovoadores originais deste paraíso inverossímil inv di
do 'ano.' Isto é o que Betty assinala para os povos da várzea. e é pela , ~ivilização européia. E sua tristeza ao ver as pobr
também o que pude observar entre os índios Urubus-Kaapor* precanas formas de .vida humana que a civilização fez ur Ir
que vivem na fronteira oriental da floresta amazônica. Cada nas florestas mais exuberantes da terra. '
ano experimentam dois ciclos bem diferenciados. de subsistên- Temo muito, entretanto, que o problema seja mais gr v,
cia, No período que vai de dezembro a março, existe uma abun- do que Betty Meggers supõe. Com efeito, além das sérias am n-
dância extraordinária de frutos silvestres, de pesca ede caça, ças que ela. aponta, têm surgido outras, nos últimos anos tal-
o que, somado ao produto de suas roças, Ihes garante a fartu- vez ainda mais perigosas, posto. que se apresentam com todo.
ra., Nessas ocasiões eles engordam a olhos vistos e sua vida pa- potencial destrutivo da tecnología civilizadora que está corrom-
rece fácil e alegre. Em outro período do ano, especialmente de pendo o mundo inteiro. Ademais do poder destruidor da ec _
maio 'a agosto, impera a escassez e a penúria. As pessoas, visi- nomia extrativista de produtos florestais, que aniquilou popu-
velmente definham e toda a vida se torna penosa .. Um observa':" lações indígenas e caboclas ao longo de décadas; além do in-
dor que os. visitasse em um desses períodos .teria. uma impres- tentos larvaresde colonização granjeira da Amazônia com cam-
são falsa, de "superabundância paradisíaca ou, de penúria atroz, poneses do nordeste brasileiro, surgiram e se expandiram m
.o que, matiza as imagens que nos proporciona Betty Meggers anos recentes duas formas ainda mais catastróficas de extir-
deste paraíso ilusório que é a Amazônia. pação. Primeiro, a tentativa insana de converter a selva ama-
Dentre a copiosa bibliografia sobre a Amazônia, o livro zônica em campos de criação de gado, levada a cabo r
de Betty . Meggers ~e. destaca por uma qualidade que aprecio milhares de hectares na fronteira sul da Amazônia brasil ira.
.sobretodas as outras. Além de ser um livro sábio, é um livro Segundo, os experimentos tendentes a substituir a floresta ori-
belo, sentido e solidário. Aqui o cientista não estuda gente, ginal por plantações de espécies exóticas, como a gmelina ar-
borea, em imensas extensões da fronteira norte. A primeira
(.) "Os Indios Urubus. Ciclo anual de atividades de subsistên- ameaça, embora levada a efeito por grandes empresas privad ,
cia de uma tribo da floresta tropical", in Anais do XXXI Congresso principalmente estrangeiras, atende a programas oficiais am-
lniemacional de Americanistas, S. Paulo, 1955. Reprcduzido em Bole- plamente subsidiados pelo Estado. Propende, por isso, a ex-
tim Geográfico, vol, XX, n.o" 169, Rio de Janeiro, 1962 e em Virá
sai à procura de Deus. Ensaios de Etnologia e [ndigenismo, Rio de Ja-
pandir-se, com o que produzirá, em poucos anos, um deserto
neiro, 1976, 2.a edição, Editora Paz e Terra. onde antes florescia a selva. A segunda ameaça é empreendida
18 J
1
corpcra multh i n i poderosíssimas que, m vld I
P 10 af d lucro, especulam com a crise da produção mundl 1
á io
.o.••
·J.•..

de papel. Mas ao invés de desenvolverem uma tecnologia de


produção de papel com madeiras heterogêneas, como as que
proporciona a floresta amazônica, destroem fabulosas massas
de celulose da selva original para lançar-se à aventura, de êxi-
to muito improvável, que consiste em introduzir ali uma árvo-
re alienígena. O subsídio oficial em um caso, a especulação in-
ternacional no outro, se somam às graves ameaças estudadas
por Betty Meggers para colocar em risco de destruição irre-
mediável, em nossos dias e sob nossos olhos a mais bela e
prodigiosa das selvas que jamais floresceu.
o ANTROPÓLOGO que trabalhe na Amazônia vê-s _ u.•
perado, numericamente, pelos representantes de outras di i-
Por tudo isto é necessário prestar a maior atenção às plinas. As sucessivas décadas de. negligência começaram a r
advertências de Betty Meggers. Ela nos fala de uma tragédia. compensadas pelos trabalhos, cada vez mais intensos, dos zo6.•
que fatalmente acontecerá se uma luz de clarividência não ilu- lagos, botânicos, geólogos, limnólogos e outros cientistas.
minar prontamente os espíritos dos que têm poder de decisão lamentável, porém, que os antropólogos não venham demon
sobre a política de ocupação da Amazônia. Urge preveni-Ias do trando o mesmo interesse, visto que a população indígena, em
muito que se poderia fazer, com apoio no saber científico, e do face da civilização invasora, começou a sofrer mudanças rápi-
descalabro e pequenez do que se está fazendo. Preveni-Ias e das. Em 1957, quando Darcy Ribeiro advertiu que "J:;: absolu-
adverti-Ias, se possível, com argumentos que soem a seus ou- tamente certo que jamais haverá oportunidade de fazer o qu
vidos como o clamor das vozes dos que serão os netos deser- não for feito agora," havia 143 grupos indígenas no Brasil,
dados e famintos dos que hoje habitam a Amazônia. dois terços dos quais na Amazônia. A partir dessa data, a acul-
turação e a extinção se aceleraram mas, apesar disso, a adv .,
DARCY RIBEIRO tência continua sem ser levada em conta.
Há duas razões para nos preocuparmos. A primeira diz
respeito ao progresso da Antropologia que, como discipli
científica, depende da sua capacidade para testar hipóteses, I -
vando em consideração um largo espectro de dados. As cultu-
ras aborígenes são, por um lado, menos viáveis do que as for-
mações geológicas, os animais e as plantas e, por outro, tran -
formam-se em ritmo muito mais acelerado. Nessas condiçõe
não temos tempo a perder. O hiato que existe nas nossas in-
formações etnográficas sobre os grupos da Amazônia persis-
tirá para sempre, caso não se faça algo de imediato para su-
primi-Ia.
20 21
As sociedades remanescentes revelam uma importância
que ultrapassa o valor que possam representar para a teoria
antropológica. Na medida em que constituem adaptações ma-
Introdução
duras a um determinado tipo de meio-ambiente, elas nos per-
mitem adquirir uma perspectiva do ecossistema como um todo
e que é bem diversa daquela que se poderia ter através de
qualquer outro tipo de investigação científica. Naqueles luga-
res onde já começou a entrar em colapso a adaptação equi-
librada, a pesquisa pode aprofundar a nossa compreensão dos
seus efeitos sobre o meio-ambiente e sobre os povos. A infor-
mação antropológica não deve mais continuar a ser encarada
como fatos estranhos destituídos de utilidade prática; os an-
A UNIDADE BIOLÓGICA do homem com outros organi ..• •
mos, assunto este que desde há muito provocou apaixonad
tropólogos têm uma contribuição fundamental a dar e a obri- discussões> é raramente contestada hoje em dia. As pesquisas
gaçãode fazê-lo. Se continuarmos a ignorar a nossa missão, científicas demonstraram, com clareza, que todas as coisas vi-
não apenas a Amazônia mas todo o planeta pode tornar-se vas possuem a mesma composição e estrutura básicas e revela-
um habitat inadequado ao homem. ram muitas das circunstâncias responsáveis pela diferenciaç
Na. preparação deste livro, recorri à minha experiência evolutiva. Embora tal relação biológica tenha sido reconhecid •.•,
de mais de vinte anos de trabalhos realizados nas baixadas ela é freqüentemente rejeitada como sendo irrelevante par
tropicais da América do Sul, daí não me ser possível mencio-
nar todos aqueles que contribuíram para a formulação das
idéias aqui expressas. Várias foram as pessoas que forneceram
dados e ilustrações e gostaria, portanto, de agradecer parti-
I uma compreensão do desenvolvimento cultural, sob a alegação
de que a cultura é imune à seleção natural.
Quando se compara a situação do homem de há moi
milhão de anos com a do homem de nossos dias, o contrast
cularmente à cooperação de: Protasio Frikel, que esclareceu impressionante. Embora, durante muitos milênios, o impact
certos aspectos das práticas de subsistência dos Xikrin (Kaya- adaptativo da cultura tenha sido pequeno, os ganhos foram
pó); Hilgard O'Rei11y Sternberg, que colocou à nossa disposi- cumulativos. Simultaneamente, o ritmo de mudança, que fora,
ção seu trabalho inédito sobre a várzea próxima a Manaus; até então, tão lento a ponto de passar desapercebido a várin:
Kalervo Oberg, que cedeu as fotografias dos Kamayurá; C. R. gerações de observadores, acelerou-se de tal forma que o nos-
Jones, que forneceu diversas outras dos Waiwai; Jack Mar- so meio-ambiente passou a modificar-se sob nossos próprios
quardt, que seguiu a pista de muitas referências obscuras e Ha- olhos. A capacidade de nos protegermos contra a fome, m
rald Sioli e Clifford Evans, que serviram com interlocutores doenças e as lesões mortais é tão grande que a proliferação d
nas discussões preliminares sobre algumas das interpretações. população começou a constituir motivo de alarme. Refizemos n
As fotografias dos Jívaro pertencem ao National Anthropolo- superfície de nosso planeta segundo o nosso gosto, levando
gical Archives da Smithsonian Institution. Os mapas e os dia- água para os desertos, drenando pântanos e lagos, nivelando
gramas foram desenhados por George Robert Lewis. colinas e alterando a vegetação natural a um grau sorncnt
quiparado, até então, às grandes transformações zeolóztcn
2
:lIm(,ticHs, f\ maior parte das quais se processaram muit
11l1l1slentamente. Adquirimos o poder de vida e de morte sobre
vímento importante em termos de complexidade .. ElIll'utnnto
logo que a diferenciação teve início, ela se processou em ritmo
s outros vertebrados e já levamos à extinção dezenas de espé-
acelerado, em ambos os níveis. Organismos e culturas c101l01l
s. Olhando ao redor, não vemos um ecossistema suavemente
volveram novas características que lhes permitiam invadir 1111"
equilibrado, no qual o homem é, cada vez mais, um elemento
bitats antes inacessíveis ou explorar os antigos, utilizando lH)\IO
discordante; o que vemos é o nosso próprio ecossistema onde
meios. Tanto os vestígios paleontológicos, como os arqueok
todas as formas de vida, com a exceção dos seres humanos e
gicos, testemunham o fato de que muitos caminhos adantut
de alguns animais e plantas domésticos, são consideradas su-
vos eram becos-sem-saída que acabavam por conduzir
pérfluas ou indesejáveis.
tinção, enquanto outros se ramificaram em novas e ínespern ..
Os homens nem sempre pensaram assim. Os povos primi- das direções. A culminação desse processo é a biosfera dlversí ..
tivos consideram-se parte da natureza, nem superiores nem in- ficada e intricadamente integrada, o que torna nosso planet
feriores às outras criaturas, se bem que sejam, freqüentemente, único no sistema solar e, possivelmente, no universo.
superiores a outros grupos humanos. Acreditam que as almas
A tentativa de compreender o lugar do homem na bíos-
dos seres humanos sejam capazes de penetrar nos corpos de
fera é dificultada por um grave problema: a nossa incapacidad
animais e vice-versa e que os espíritos de animais possam exer-
de nos olharmos sem preconceito. A cultura sempre encobr
cer um importante controle sobre o destino dos homens. Tais
ou desvia nossas percepções em virtude de nossas própria
concepções sobrenaturais são transposições, em termos cultu-
idéias, atitudes, crenças, e os processos de pensamento est
rais, dos controles e equilíbrios que existem no nível biológico
integralmente vinculados ao fenômeno que pretendemos es~
para que se mantenha o equilíbrio de um ecossistema. Visto
tudar. Os antropólogos tentaram superar tal óbice ao focali-
que o emprego ilimitado de técnicas de caça, cada vez mais
zarem as culturas primitivas, que não são apenas mais sim...
eficientes, acarretaria uma rápida extinção dos próprios re-
~ ples do que a nossa e, possivelmente, mais destrinçávels, ma
cursos que elas pretendiam tornar mais acessíveis, desenvol-
também nos .são estranhas, de modo que a linha que separ
vem-se sanções sobrenaturais a fim de que o seu emprego seja
observador do observado é mais fácil de ser traçada. Emboru
limitado ou canalizado. Esse tipo de relação funcional entre
as emoções humanas quase sempre interfiram, essa aborda
uma crença religiosa e um instrumento constitui um exemplo
gem antropológica tem tido um considerável sucesso.
do número infinito de elos que servem tanto para enfeixar um
sistema cultural como para torná-Io parte compatível de um Do ponto-de-vista da novidade, a Amazônia é um lugar
ecossistema como um todo. ideal para os investigadores de zonas temperadas estudarem 1\
adaptação cultural. O labirinto fluvial e a floresta virgem en..
A existência de um denominador comum para os fenô-
menos culturais e biológicos está implícita nas suas tendências cerram um mistério que, para nós, pouco perdeu de seu fascí-
evolutivas paralelas. A transformação de organismos unicelu- nio durante os séculos que se seguiram à descoberta da regi
lares em mamíferos superiores tem sua contra partida na trans- pelos exploradores europeus. Até hoje, quando o desafio do
formação de bandos caçadores em nações urbanas. Durante bi- espaço celeste faz com que a maior parte das regiões terres-
tres pareçam triviais, a estatística amazônica permanece ím-
lhões de anos, os organismos se conservaram simples, pequenos
e sofreram poucas alterações. Da mesma forma, durante milha- pressionante. Com uma vazão cinco vezes a do Congo e do
vezes a do Mississippi, o Amazonas contribui com, aproxima ..
res de anos, as culturas não demonstraram nenhum desenvol-
24
dnmeute, um quinto de toda U água recebida anualmente pelo cao bíologlcn. Um-exume du lntcração c111 culturu COII\ (I JlU'II1
nos. Lança no Atlântico, a cada período de 24 horas, ambiente requer uma compilação dos fatos itnpol'IUl\t~H cru
tanta água quanto o Tâmisa leva através de Londres, durante ambas as categorias do fenômeno. Não se truta, cntrcumto, li
um ano. Esta descarga é ainda mais notável em vista do in- uma tarefa tão gigantesca como possa parecer à primeirn vlstu
significante declive da sua bacia; a torre do "Empire State pois nenhum organismo age com a mesma intensidade sobr
Building" em Nova Iorque é quatro vezes mais alta do que todos os aspectos do seu meio-ambiente. Já que a subsístêucln
Iquitos, na região leste do Peru, que fica a 3.700km da foz do é uma necessidade primária da vida, as características de solo,
Amazonas. Sondagens na Ilha de Marajó revelaram uma topografia, clima, flora e fauna mais importantes para a qua-
acumulação de sedimentos de 3.850m de profundidade, quase lidade e quantidade do suprimento alimentar, merecem dOQ·
tão abaixo do nível do mar quanto o é acima do nível do mar taque particular. Ao encararmos a Amazônia desse ponto-do-
a elevação de La Paz, no planalto boliviano. Embora as ca- vista, deparamo-nos com duas sub-regiões marcadamente con•.
racterísticas desses dados não sejam as mais importantes para trastantes em tamanho e diferentes quanto ao potencial ali-
a adaptação humana, o seu caráter espetacular, entretanto, dá mentar: (1) a vasta terra firme, onde os recursos são escasso-
uma impressão exata do meio-ambiente ímpar que é represen- mente disseminados, porém sempre disponíveis; (2) a estreit
tado pelas baixadas tropicais da América do SuL faixa de terrenos alagados, ou várzea, onde a escassez se alter-
A Amazônia é, por outro motivo, um laboratório apro- na com a fartura, à proporção em que o rio sobe ou baixa. S
priado para o estudo da adaptação cultural. Durante os últimos a adaptação é uma causa primária determinante da cultura
milênios, foi alvo de dois sucessivos e distintos tipos de utili- deveríamos encontrar diferenças nos complexos culturais qu
zação humana. O primeiro se desenrolou sob a influência da se associam a essas duas sub-regiões, ];: o que acontece.
seleção natural, resultando dos ingredientes trazidos pelos pri- O reconhecimento de diferenças culturais que têm im-
meiros homens que a povoaram há alguns milênios antes da era portância para a adaptação torna-se mais fácil pela existênci
cristã. O segundo, introduzido no princípio do século XVI, foi de descrições comparadas das principais características de um
um sistema de exploração controlado do exterior, que não amostra representativa de culturas. Cinco grupos foram esco-
apenas destruiu o equilíbrio anteribr mas impediu o estabeleci- lhidos para ilustrar a escala de variação da terra firme e doi.
mento de um novo equilíbrio. O exame desses dois tipos con- outros que servirão para exemplificar a adaptação à várzea. As
trastantes de exploração do mesmo meio-ambiente permite o semelhanças e as diferenças entre esses complexos culturais
reconhecimento de aspectos importantes da relação cultural são bastante ilustrativas quanto à intensidade das restrições am-
meio-ambiente que, de outro modo, permaneceria obscura. bientais e à flexibilidade da resposta cultural. A ação recípro-
No subseqüente estudo do homem no contexto do ecos- ca entre cultura e meio-ambiente que se revela nesta análise
sistema amazônico, duas proposições serão aceitas como váli- fornece' uma base para a reformulação de hipóteses adicio-
'das: (1) o homem é um animal e, como os outros animais, nais sobre o processo geral de evolução cultural.
deve manter uma relação de adaptação com o seu meio-am- A história, no entanto, não termina aí. A Amazônia de
biente para poder sobreviver; (2) embora consiga essa adapta- hoje é um lugar bem diverso do que era anteriormente a 1500
ção, principalmente por meio da cultura, o processo é guiado - não porque o clima e a topografia tenham mudado sensi-
pelas mesmas leis de seleção natural que governam a adapta- velmente, mas porque o desenvolvimento cultural sofreu alte-
'''"'
26 27
dr ti . A degradação que se operou no habitat, so-
no decorrer dos últimos 50 anos, demonstra, c1aramen
Capítulo I
t a lação cultura/meio-ambiente em sua forma mais desar
m ni sa., ~ =:ncia
p ar dOJergotlhQSQ fr~e
do mito da produtividade ilimitad
todas aslmClatIvas em ..gran
o •
ecos sistema
de scata pa~nvolver a região,._c.OQ~t~lui
um dos mais no-
,. .--- •••••• '~-.. !"OIiL.

~eJS paradoxos do nosso tempo


. '" i

A AMAZONIMDEFINIDA

o ESTUDO DA RELAÇÃO entre o homem e o seu meio-am-


biente pode ser realizado de dois modos diferentes: (1) sel -
ciona-se uma determinada cultura e analisa-se a maneira pel
qual ela se articula com o seu habítat; ou (2) escolhe-se u
certo tipo de meio-ambiente e examina-se a variação, atrav
do tempo e do espaço, da adaptação cultural dentro de s u
limites. Já que nunca foram feitos trabalhos de campo, ecolo i-
camente orientados, nas baixadas amazônicas, o segundo m •
todo será, aqui, adotado.
Antes de tentar analisar a adaptação do homem, é n c -
sário definir os limites da Amazônia. A escolha de um crít io
satisfatório exige reconhecer o fato de que nem todos os a c-
tos do meio-ambiente têm a mesma importância para todo
organismos. Ao éontrá~ no decurso de sua evolução, cad
espécie vegetal e animal desenvolve uma relação íntima c m
omente uma pequena parte de seu meio-ambiente total.
nicho pode ser definido em termos de altitude, caracterí tlc
químicas do solo, natureza do suprimento alimentar, t mp r -
tur máxima e mínima e inúmero outro parâmetros. mbor
o f t r r tritivo v ri m qu nt tipo à i id ,n nhu
2
m sp i capaz de flore cer igualmente bem em toda ( li min aix d 1. m, nd m di
ndi es ambientais possíveis. da t mp ratura n o xc d 3 , d
A identificação das características ambientais mais impor- O dia" u mais, do ano, e onde a umidad r 1 tiv
tantes 'para a adaptação humana é complicada pela habilidade r, upcrior a 80%. Pequenos campos par c rn J
que o homem tem de proteger-se, culturalmente, das diferentes li n 1 o solo é demasiado poroso para ret r a rní
condições que lhe são biologicamente adversas. Um setor im- " t stação seca, mas são de importância in ignifi t
portante no qual a cultura nem sempre pode neutralizar de lU 11 o oferecem condições especiais para o aprov it
todo as deficiências ambientais é o que se refere à quantidade hu n. A esar da sua vasta extensão, o ecossistema d fI .•
e qualidade dos recursos para a subsistência. Os vegetais e os t quatoria constItUI uma area caractenstlca e extaordin •
animais, mesmo quando domesticados, têm necessidade de com- rlnm nte homogenea, eVI o a sua õifga história geológi a, ' u
binações específicas de calor, umidade e alimentos nutritivos; 11m uniforme e sua poslçao equatona. Isto que esta c ra •
embora algumas deficiências possam ser culturalmente mode- t ti a morgâmcas estabelecem os ltmites dentro dos qu li
radas, outras resultam de condições físicas, químicas e atmosfé- o 01 r a adaptação biológica e cultural, aí deve começar a no 1
ricas que estão fora do controle humano. Já que a cultura, sem h tia,
um fornecimento concentrado e produtivo de alimento, só pode
atingir um nível mínimo de complexidade, as diferenças no po-
tencial de subsistência constituem, do ponto-de-vista da adapta- () M Ia INORGÂNICO
ção humana, o aspecto mais importante do meio-ambiente.
Assim sendo, a extensão geográfica da bacia amazônica é, á cerca de 600 milhões de anos, na era Precambriana, o
obviamente, um dado inadequado para demarcar a Amazônia, I 1111 Itos guiano e brasileiro, que ocupam os segmentos t n-
visto que o curso superior dos principais tributários irrigam t rionais e meridionais da Amazônia, eram montanhas el vad
regiões que diferem enormemente quanto à altitude, índice plu- d um continente que já caiu no esquecimento. Milhões d
vial, temperatura, topografia e muitas outras características cli- ti r ão química e física reduziram os picos a colina
máticas e edáficas que afetam a subsistência e, de modo especial, dondadas e planaltos isolados, transformando o rico sol d
a potencialidade agrícola. A chuva, a temperatura ou a altitude outrora em granito inerte e areia branca. Durante o Ca b n
não podem também ser tomadas isoladamente, pois que sua r ro, mar se afastou gradativamente, deixando à mostr um,
interação influencia, de forma complexa, o crescimento vegetal. I I n i cortada por rios que corriam para o oeste. Por v lt l
As plantas silvestres são afetadas pelas mesmas condições do 1st nta milhões de anos atrás, ergueu-se a cadeia mont t-
meio como o são as cultivadas, de modo que a ocorrência de nl () u ndina, causando a formação de um extenso lago d
um tipo uniforme de vegetação primária dá uma indicação 1 uu I e, que ocupou a parte central da bacia amazônica du-
quanto à uniformidade geral dos aspectos mais importantes do I IIlt a maior parte da era Terciária (Fig. 1). Durant
meio-ambiente para adaptação humana. doi. p ri dos de inundação, os sedimentos iam sendo d p it-
Nas baixadas sul-americanas, a selva tropical predomina 10, umulando-se, posteriormente, a uma profundidad supc-
2
numa área de 6.500. OOOkm , incluindo a maior parte da I '.OOOm .. No Pleistoceno antigo, a ligação ori nu I ntr
bacia amazônica e estendendo-se em direção ao norte, das o m t i bra il iro e o guiano já tava tão dcsgastad qu n
Guianas até a foz do Orenoco (Fig. 1). De modo geral, a vege- ou a imp dir uma ruptur . Ao oar m, igu iv -
30
I li 1 fundo do lago, resultando daí o fato de que até hoje o
. na) amazônico tem uma profundidade de mais de cem me-
tr em diversos pontos abaixo de Manaus. Nos milênios se-
uint ,o sistema de escoamento da bacia amazônica foi assu-
mindo, gradativamente, a sua presente forma. .
De tal evolução/geológica resultou um terreno extraordi-
nariamente plano. Numa distância de 3. OOCkm, entre a fron-
teira peruana e o oceano, o declive do rio principal é de apenas
65m. Onze de seus afluentes correm por mais de 1.600km sem
serem interrompidos por uma única cachoeira ou corredeira. A
despeito deste declive mínimo, a corrente amazôni~a mantém
uma velocidade média de 2,5 km por hora na estiagem; nas
enchentes, o fluxo mais do que duplica sob a pressão do enorme
volume de água depositado na área de escoamento.
A pequena altitude e a localização equatorial dão à Ama-
zônia uma temperatura extraordinariamente uniforme. Há pou-
ca variação sazonal quanto à duração ou à intensidade do sol,
'e a temperatura média do mês mais quente é somente 3°C
icima da temperatura do mês mais frio. Ocorre uma variação
maior no período de 24 horas, particularmente na estiagem,
quando a média mais alta atinge aproximadamente 32°C e a
C221 PRECAMBRIA"O ~ PAlEozórco § MEsozórco '.
mínima cai para cerca de 21°C. E:;J TERCtÁRIO ~ QUATERNÁRIO

Altas temperaturas se combinam com chuvas pesadas e ig. 1. Estrutura geológica da Bacia Amazônica. A zona de baix \ \
grande umidade. A precipitação é superior a 3. OOOmm por da floresta tropical está demarcada por uma linha mais forte. A I \1
ano, no noroeste e a nordeste, recebendo a maior parte da área t ctentrionais e meridionais são de origem precambriana e pai ().
lca, enquanto que as partes central e ocidental são comp 1 d
um excedente de 2.000mt:1. Em nenhum lugar ela é inferior lirnentos depositados durante o Terciário. Solos de origem r nt
a 1.500mm. Com o declínio da precipitação total anual, ela io r tritos à Várzea, do médio e baixo Amazonas e nas cabec 'ir I
tende a tornar-se sazonal, de modo que a Amazônia tem dois do Ri Madeira, ao sul, onde se depositam anualmente os edim nto
ou três meses por ano com pouca ou nenhuma chuva. Entre- (li d cem dos planaltos andinos. (Segundo Gibbs, 1967, Fig, 2.)
tanto, mesmo durante os meses de "verão", a umidade média
permanece, geralmente, acima de 60 por cento. d chuvas caem em forma de aguaceiros que t m 11
A descrição das chuvas tropicais em termos de médias 1I I kladd liberar, pelo menos, um milímetro de chuv 1
anuais encobre duas características de grande significado eco- m nulo J um mínimo de cinco minutos. Calcula-se que a pr i-
16 i o, isto é, a intensidade e a oscilação. Cerca de 20 por 111, 10 pluví I d es a u c ir ' é 40 v zc maior d qu m
I ttllHIL. t 11 r da , c n tituind um f rmidáv I p t 11 iul li
dlm ntaç o ro ão. o total anual de precipitação u
di tribuição mensal pode variar bastante de ano para ano. Um r ........ ..-\
·······
~o-
ano chuvoso pode receber quatro ou cinco vezes mais água ...•
...•
do que um ano de seca, e até mesmo oscilações maiores podem ...• ...• i \ I
ocorrer. Por exemplo, a área do alto Essequibo, ao sul da Vl
"\
I
Guiana, recebeu 44mm em dezembro de 1954 e acima de o \! I
200-
•• .,.I
3C6mm em dezembro de 1955. Embora, aparentemente, tais l- V
flutuações imprevisíveis não afetem a vegetação agreste, o mes-
LLJ j\ r
,- \ I
mo não se pode dizer das novas plantações que ficam sujeitas ..J \ '. ...I I
a uma ação desastrosa. 100 -
.:
\ ,, /o" 4
Apesar de as chuvas serem três vezes mais fortes do que , .•....
/
/ ".
........... ....
' ......• . .",
.,/ 2
as que caem no centro dos Estados Unidos, a enchente normal ........... ..... .: '.'
'
anual do Amazonas é de cerca de 10m apenas, ou seja, a me-
tade do nível máximo do rio Ohio ao passar por Cincinnati.
0-
-o
Explica-se tal contradição pelo curso equatorial do Amazonas I I I I I I I I I I I I
cujos tributários do norte e do sul têm nascentes em hemisfé- J F M A M J o
J A S N o
rios diferentes. A intensidade das chuvas é regulada pela osci- I I I I I I I I I I I I
lação anual das massas de ar ao norte e ao sul do equador,
seguindo a variação sazonal da posição do sol. Conseqüente-
mente, o período de águas altas ocorre no sul entre outubro
e abril, enquanto, ao norte, ele se dá entre abril e agosto. Já o
que os rios meridionais estão em baixa enquanto os do norte Vl
o
se encontram em alta, suas águas se unem no Amazonas a um o:: o
I-
nível regular (Fig. 2). Se assim não fosse, as enchentes seriam w
catastróficas e o ecossistema da várzea não existiria. O equilíbrio ~
é difícil, sendo, às vezes, perturbado pelas flutuações no início
ou na fase de maior intensidade da estação chuvosa, que podem
ocorrer em parte da área receptora. Quando as chuvas do sul 0-
persistem durante muito tempo ou as do norte começam mais - o
cedo, o que acontece, em média, de quatro em quatro anos, ig. 2. Efeito da Iocalização equatorial do Amazonas sobre o re lm
as terras situadas geralmente acima do nível das enchentes são fluvial, determinando as enchentes e as vazantes. No hemisfério nort
inundadas. Durante a primeira metade deste século, verifica- (linha pontilhada), a estação chuvosa se estende de abril até fin d
ram-se, quatro vezes, severos transtornos no padrão "normal" ago to, enquanto que no hemisfério sul (linha tracejada), os mese d
malores chuvas vão de outubro até fins de maio. Como os tributá ri
das chuvas. Embora, em 1953, o nível máximo só tenha atin- m ridlonaís sobem de nível enquanto os setentrionais começam a b Ix r
gido pouco mais de 2.8 metros acima da média, produziu, en- Amazonas atinge o seu ponto mais elevado em meado de junh :

34
tJ t II1l ,
, ulo. KUSp usa. d . 11m 11
ltas fi m s a au n i , n ua: I
A idade geol6giça aliada. à temperatura quente e às chuvas i I' ni n umidora de oxigênio, aliada a um m i
pesadas são responsáv is pela extraordinária infertilidade do r ncía, fornecem um meio-ambiente mais propící .
solo mazoOlC m contraste com as zonas temperadas, onde quátiea, particular em lugares onde a acidez é mínim ,
o in emperismo físico é o processo primário na formação dos
no Tapaj6s.
solos, o intemperismo químico predomina nos trópicos. A água
quente de chuva que se infiltra no solo dissolve os minerais Menos numerosos, porém muito mais importantes,
solúveis e os carrega através do subsolo e, por fim, para dentro rio de "água branca" que acumulam uma carga de min r i
dos rios. Quanto mais longo é o processo, tanto mais se empo- uspensos, altamente solúveis, e partículas de solo, na m did
brece a camada superior do solo, até que nada mais resta, a em que descem das montanhas andinas. Suas águas "branca",
não ser os elementos insolúveis. barrentas, possuem baixa transparência e são neutras ou li i-
ramente alcalinas. Os seis principais afluentes depositários dr
O baixo conteúdo mineral da maior parte dos rios da bacia
riquezas minerais dos Andes são o Japurá, o Putumayo (Içá),
amazônica atesta o avançado estado do processo de decomposi-
o Napo, o Maraiíon (incluindo o Huallaga), o Ucaiali e o Ma-
ção da planície. Predominam dois tipos de água, ambos carac-
terizados por sua extraordinária pureza e transparência, mas deira (Fig. 1). Embora suas vertentes montanhosas concorram
com somente 12 por cento da bacia amazônica, contribuem, no
diferindo na cor e em outros aspectos. As areias brancas dos
maciços da Guiana e do Brasil servem de nascentes a rios de entanto, com 86 por cento do total dos sais dissolvidos e 82 por
água de cor castanho-escuro, que, nas corredeiras e cachoeiras, cento dos sólidos suspensos descarregados pelo Amazonas. Par-
te de sua pesada carga de sedimentos é depositada anualmente
formam bolhas douradas. A~ margens desses rios de "água pre-
ta" são mal definidas e em declive, sendo cobertas, periódica na várzea, injetando uma camada de solo novo no v elho terreno.
ou permanentemente, pela floresta inundada. Os resíduos desta Não existem verdadeiros lagos na Amazônia e os nume-
vegetação caem no leito no rio e aí se decompõem, consumindo rosos esboços de lagos que aparecem na várzea ou em seu
oxigênio e desprendendo ácidos carbônicos e humííeros, duran- arredores, são formações fluviais, criadas pelo aluvião, pelas
te o processo. O meio-ambiente aquático desta floresta inun- alterações nos cursos ou pelas inundações periódicas das áreas
dada, ou igapó, - estéril, despojado de oxigênio e ácido -, baixas. Lagos fluviais, identificáveis por suas proporções. ate-
é um dos mais notáveis e pouco estudados nichos ecológicos nuadas e contornos tortuosos, são resultantes do bloqueio par-
da Amazônia. Do ponto-de-vista do aproveitamento humano, cial das desembocaduras dos afluentes de águas claras ou pretas
os rios de água preta, e as terras por eles irrigadas, têm um (Fig. 18). O nível das águas é controlado pelo Amazonas, su-
tão baixo potencial na produção de meios de subsistência que bindo quando a pressão do nível máximo do Amazonas impo -
são conhecidos na Amazônia como "rios da fome". Entre os sibilita o fluxo da foz bloqueada, e baixando quando a pressão
principais deste categoria estão o Rio Negro e a maior parte cede. O alto grau de acidez e o baixo teor nutritivo da água
dos seus afluentes da margem direita, bem como os afluentes desses lagos limitam a variedade e a densidade da fauna aquá-
do Tapajós, o Cururu e C( Arapiuns. tica. Menores e bem mais numerosos são os lagos da várzea,
Os rios de "água clata" parecem-se com os rios de água formados nos lugares baixos pela acumulação da chuva e pela
preta no tocante ao baixo teor de sais dissolvidos, à ausência água das enchentes. Apesar da água de chuva ser em si pura
36 37
tiJ11 tis p ar d s r dcma 'Í dam nte turva a ua d Am \.•
â
diz m r' it
z na, mi. tura da dua cria condições ideais para a pl I t s ticul rm ntc
quáticas e para o fitoplankton, os quais, por sua vez, pr 1 i-
ciam o desenvolvimento de uma fauna de densidade e diver i-
m contraste com a maioria dos solos da urop ti I
dade extraordinárias. América do Norte, que se desenvolveram desde o prin ípl 1
A plarrície amazônica, tal como se apresenta hoje em dia, lei toceno, os solos de terra firme mais novos datam do 'J
é o produto de milhões de anos de evolução do ecossistema. cíário. Os maciços guiano e brasileiro estão entre as form
Durante a maior parte do Pleistoceno, a erosão e a sedimenta- mais antigas da terra. Milhões de anos de exposição à int I I-
ção foram favorecidas pela combinação de temperatura elevada périe química lixiviaram seu~ sais minerais solúveis,. dei nd
e abundantes precipitações pluviais. Noventa e oito por cento os solos "maduros" que consistem, sobretudo, de areia e r li \
da Amazônia, portanto, consistem de terra firme, ou terras e que são entre moderada e extremamente ácidas. Em t rm
altas, compostas de solo geologicamente antigo pelo qual cor- de alimentos nutritivos de plantas, as deficiências são tã r \.•
rem rios de água preta estéril ou de água transparente. Apenas ves que solos de igual composição seriam considerados árld
dois por cento são ocupados pela várzea que é rejuvenescida, num clima temperado.
anualmente, pelos sedimentos trazidos da cordilheira andina. A
Um outro "absoluto" é a temperatura que afeta divcr
terra firme e a várzea representam dois habitats distintos den- processos biológicos e químicos decisivos para a manuten
tro da Amazônia; a importância de cada um deles no tocante da fertilidade do solo. Por exemplo, 25°C é a temperatura ad -
ao seu aproveitamento pelo homem, no passado e no futuro, quada para a formação do húmus que é de importância vital.
é inversamente proporcional às suas dimensões relativas. Em solos arenosos, aumenta a capacidade de retenção da água
e de absorção de elementos nutrientes vegetais; em solos argi-
losos, acentua a porosidade e a permeabilidade. Sem isso, uma
o POTENCIAL DE SUBSIST~NCIA DA TERRA FIRME agricultura permanente se torna impossível. A acumulação d
húmus, entretanto, só se processa quando a temperatur~ d
Determinantes primários solo permanece abaixo de 25°C. Se a temperatura subir, a
atividade bacteriana aumenta até o ponto em que a decompo i-
Devido ao fato de ser o ecossistema da terra firme um dos ção do húmus excede a média de sua forma~ã~. O aumen~
mais complexos conjuntos da face da terra, seriam necessários da temperatura também provoca a. \dec~~poslçaAo . da m.aténa
diversos volumes para descrever até mesmo as mais importan- humífera em dióxido de carbono, nitrogênio, amorua e nitrato,
tes interações e ligações de clima, solo, flora e fauna. Feliz- grandes porções dos quais são voláteis e escapam no ar.
mente, não é preciso fazer uma descrição assim tão completa O terceiro "absoluto" é a chuva que atua tanto na super-
para compreender os principais problemas da adaptação huma- fície do solo pela erosão, quanto na sua composição interna,
na. Precisamos apenas conhecer as espécies existentes de "abso- através da lixiviação. Os efeitos erosivos da água aumentam à
lutos" físicos e químicos, visto representarem os fatores básicos proporção em que cresce o ritmo da vazão,de modo que~ se o
aos quais toda a vida vegetal e animal, inclusive a do homem, fluxo é duplicado, a capacidade de escoamento quadruplica, a
deve ajustar-se para sobreviver. Embora atuem muitos fatores, capacidade de transporte aumenta de 32 vezes e o tamanho das
38 39
purt ula tran portada um nt d 64 v zes. Uma v z n lU mtld id i tr p d i a , m uit I Jl I
d a rosão, entra em ação um ciclo que se perpetua c s c I .. irrust m ua raízes, como rp ntína nI
ra, ou seja, a remoção da camada absorvente superior faz au- , d rv r s. Ao ob ervador, parec um icud im] I -
mentar o escoamento; este, por sua vez, acentua a capacidad tr v 1 d v getação, quer se olhe do alto de um avi , tu
de transporte; um maior número de partículas em suspensão d uma canoa no rio. Este exterior denso e compacto 1 v -
agrava a ação abrasiva, a qual desloca mais solo. r r que existem as mesmas condições no chão da m t .
A combinação de temperatura quente e alto índice pluvial ontrário, tal dossel de sombras é tão completo que o mato r
afeta o solo sob outros aspectos. Se, de um lado, a baixa pro- tiro é quase mínimo e o viajante pode, com freqüência, tra-
porção de matéria orgânica produzida pelas temperaturas altas vessar a floresta a pé, quase sem precisar abrir caminho.
acentua a solubilidade da sílica e do caulim, de outro, provoca
a retenção de alumínio e óxidos de ferro. O ferro é precipitado As florestas deste tipo são abundantes onde quer qu
sob a forma de concreções lateríticas, através de uma reação condições de temperatura e precipitação pluvial apre nt J
química, a qual também destrói o fósforo que é necessário para todas as características prejudiciais próprias ao clima da ph n •
o crescimento dos vegetais. Embora esta laterização tenha a cie tropical. Devido ao fato das plantas mais altas necessit r 1
propriedade de aumentar a resistência do solo contra a erosão, de um constante suprimento de matérias nutrientes solúv i ,
reduz também a sua capacidade de reter amônia, sal, potássio para um crescimento- normal e sua reprodução, e como e sa:
e magnésio, todos muito importantes como alimento para as incluem uma quantidade relativamente grande de nitrogêni ,
plantas. Uma vez formada esta laterita, o processo é irrever- fósforo, potássio, cálcio, magnésio e enxofre, a manutenção d
sível. uma vegetação exuberante faz supor que os efeitos negativos da
Apesar das características desfavoráveis quanto ao solo, à temperatura e das chuvas tenham sido superados ou, pelo m -
temperatura e às chuvas, a planície amazônica ostenta uma nos, minimizados. E exatamente o que faz a vegetação e o modo
magnífica vegetação florestal. As árvores são 50 por cento mais pelo qual se alcança esse equilíbrio serve, não somente, com
altas do que as dos bosques das zonas temperadas, e o número um exemplo da complexa interação dos diversos component
das diferentes espécies arbóreas é mais do que 20 vezes supe- do ecossistema mas, também, COIBO uma base para avaliar a
rior ao das florestas européias. A mata tropical é, na maioria diferentes adaptações culturais ao meio-ambiente. da terra firm .
das vezes, tão diversa em composição que difícil se torna para O modo pelo qual a vegetação atenua ou agrava o ef it
o especialista identificar duas árvores da mesma espécie, na do clima sobre o solo pode ser demonstrado pelo exame d
mesma zona. Para o olho inexperiente, entretanto, esta varie- principais características de quatro tipos de combinações d
dade se oculta atrás da uniformidade aparente. Os troncos são plantas. Os dois extremos são representados pela floresta pri-
quase sempre retos e delgados, a base espalha-se muitas vezes mária e por uma total ausência de cobertura vegetal. As po i-
em escoras proeminentes, a casca é lisa e as folhas são verdes, ções intermediárias são ocupadas por duas principais técnica
de tom escuro, coriáceas, ovais e do mesmo tamanho. A varia- agrícolas: a variedade tropical que compreende plantações mi -
ção anual é também insignificante, devido à pequena diferença tas entre os troncos e ramos, as quais perma necem depois qu
de estações. a vegetação abatida é queimada; e a variedade temperada qu
A densa abóbada de folhagem que se forma onde quer que envolve campos limpos e um só plantio.
bata o sol é composta não somente pelas árvores mas, também,
40 Ir 41
A floresta primária d fósf r I t d z v Z S, com n
lhag m t mb m r pr nta um pap 1 imp rt nt n
Uma das realizações mais impressionantes da seleção na- matérias nutrientes do ar. Aproximadament 75 p r
tural é o extraordinário sucesso obtido pela floresta primária potássio, 40 por cento de magnésio e 25 por cento d
contrabalançando os efeitos prejudiciais do clima tropical. Qua- destinados às plantas em crescimento são devolvido
se todas as características contribuem para a conservação e a pela água da chuva que cai das folhas.
reciclagem das matérias nutrientes e para a preservação de um Obtém-se um aproveitamento máximo dos nutri nt
equilíbrio ecológico. poníveis através da justaposição de plantas com diferente n ..
A contínua abóbada de folhagem sempre verde desempe- cessidades, e a vegetação da mata tropical é, conseqüent m -
nha várias funções, entre as quais a captação de nutrientes, seu te, caracterizada pela grande proliferação das espécies, emb
armazenamento e a proteção do solo contra a erosão e insola- apresentando baixa concentração de cada uma dessas espéci .
ção. Aproximadamente 25 por cento da precipitação diária é As diversas espécies vegetais não somente exigem nutrição
retida pelas folhas e o resto atinge o solo com um salpico fino. racterística, como variam na qualidade e penetração da r i .
A eficácia desta cobertura protetora está claramente demonstra- O emaranhado de raízes que daí resulta melhora a estrutur
da em vista das conseqüências do desmatamento. Considerando do solo enquanto as plantas estão vivas e, depois de morta ,
que uma média anual de precipitação pluvial da ordem de fornecem uma boa parte da matéria orgânica a ser tran f r-
2.160mm desloca menos de uma tonelada de solo por hectare, mada em húmus. Por outro lado, os vegetais se tornam men
. durante um período de mais de três anos numa floresta com vulneráveis aos efeitos predatórios e às doenças, graças à di -
um declive de 12 a 15 por cento, 45 toneladas se perdem numa tribuição dispersa dos membros da mesma espécie.
encosta desmatada, embora com a metade deste declive. A Em resumo, a floresta primária da bacia amazônica, tal
densa folhagem também protege o solo da insolação, possibili- como as florestas primárias em outras baixadas tropicais, d
tando o acúmulo de uma pequena quantidade de húmus e a sempenha duas principais funções de conservação: ( 1) e ta..
integração do ciclo de nitrogênio, de modo a que este elemento belecé e mantém um ciclo fechado de nutrientes, de modo qu
vital para o crescimento das plantas não se perca no ar. os mesmos elementos são conservados em contínua circula
Talvez a realização mais espetacular da vegetação seja a e a perda é reduzida ao mínimo; e (2) contrabalança os ef lt .
sua capacidade para captar e armazenar nutrientes. Em climas prejudiciais do clima, interrompendo ou reduzindo a uma pr -
temperados, esses elementos podem ser acumulados no solo porção muito pequena os efeitos da erosão ou da lixivi
enquanto forem necessários, mas em climas tropicais todos os que empobrecem o solo.
elementos que não foram aproveitados imediatamente estão su-
jeitos a se transformarem em lixívia ou, então, a se perderem
de maneira definitiva. O espetacular ritmo de crescimento e a Derrubada total
vasta massa de vegetação tropical são adaptações para uma
nova captação e o armazenamento de nutrientes. A reciclagem Quando toda a vegetação é destruída, o solo fica xp t
é facilitada pela queda de resíduos, três a quatro vezes maior força total do clima. A chuva, ao cair, endurece a up rfi i
do que nos bosques de Nova Jorque, que produzem matérias d t rreno, diminuindo sua permeabilidade. Quando diminui l
orgânicas em proporções que vão de duas vezes, como no caso l rção.>o escoamento aum nta, ac ntuando a rã. N in
42 4
t v 10 d pancada d'água, a insolação eleva a temperatur
10 até o ponto em que a destruição da matéria orgânica p Ia Ilrt ultura lttn trant
bactéria ultrapassa o ritmo de formação, de modo que o húmus
não se acumula. O desaparecimento do húmus baixa a capaci- N maior parte das matas tropicais da b ix d s, . J III

dade de retenção da água do solo e os minerais solúveis são t a 6 feita em roçado provisórios os quais, d p i d 11, 111
rapidamente arrastados para o subsolo onde permanecem fora n s são abandonados, voltando a ser ocupado p 1 l
do alcance das plantas em germinação. Os raios ultravioletas, ~sta' técnica é conhecida como queimada, ou cultivo itin r t
incidindo diretamente, produzem transformações químicas no t rmos estes que descrevem duas de suas principais c t
solo de que resultam a transformação do nitrogênio e do dióxi- ticas: (1) o corte e a queima da vegetação antes do pl nt
do de carbono em gás e seu desaparecimento no ar. Se a tem- (2) a mudança para um novo roçado ao fim de dua u t
peratura subir acima de 25°C, cada grau aumentará a inci- colheitas .. Para os observadores provenientes de zonas t mp
dência de perda de nitrogênio em cerca de 20 a 25 quilos por das, tais como a Europa ou os Estados Unidos, est m t I
hectare, ahualmente.A perda de dióxido de carbono e matéria parece um desperdício de fuão-de-obra, ao mesmo temp 'lu
orgânica, por si só, não é apenas prejudicial mas conduz à destruidor da mata, e as propostas formuladas par~ o aum nto
inversão de um outro processo importante para· a manutenção da produtividade agrícola tropical preco~izam muitas vez
da fertilidade. Quando tais elementos estão presentes, a sílica substituição do sistema indígena pelo CUltIVOpermanente. n-
e o caulim ficam retidos, aumentando a solubilidade dos óxidos seqüentemente, importa examinar o !elativo. sucesso d.os d i
de ferro e alumínio. Quando estão ausentes, a sílica e o caulim istemas no sentido de atenuar os efeitos nOCIVOSdo clima.
se perdem, e os óxidos de. ferro e alumínio são precipitados Apesar de diferir nos detalhes, a agricultura itinerante n
como massa inerte de laterita, destruindo durante este processo bacia amazônica possui várias características constantes e qu
o fósforo existente. podem ser demonstradas pela descri9ão das. práticas agrícola.
Enquanto a superfície do solo ficar exposta ao sol e à usadas pelos índios Munduruku do RIO Tapajós. Ao escolher 10
chuva, o calor e a radiação ultravioleta perpetuam os processos a terra para uma nova roça, os Mll;nduruku dão prefer,ê~cia a
terreno em declive e, por conseguinte, a uma superfície b m
biológicos, físicos e químicos que, inevitavelmente, reduzem a
drenada, pois que a retenção de muita água fará com qu.
fertilidade. A adição de um fertilizante, quer inorgânico quer raízes da nova safra apodreçam no solo. Uma textura argil Sl
orgânico, não elevará o conteúdo de nitrogê~io do solo.. devido é tida como superior a uma arenosa. O tamanho do roçad
à rápida volatilização que ocorre sob os efeitos .do~ raios sola- determinado pelo potencial de produção do solo, assim com
res. A destruição da vegetação florestal desencadeia, portanto, pelo número de pessoas que partilharão da colheita. Es~es r5>
uma série de acontecimentos que ou destroem o solo ou o re- dos são geralmente circulares, a menos que a topografia nao
duzem à esterilidade. Quanto maior for o intervalo entre a permita.
derrubada, limpa e o início de um segundo plantio, tanto maior A limpa começa com a remoção dos arbustos e .das árvor
será o dano causado e mais lenta a recuperação. pequenas, porque são mais difíceis de cortar se d~Ixadas par
depois da derrubada das árvores grandes, e tam~em pa~a qu
se tenha mais espaço pala esta segunda operaçao. A limpeza
preliminar leva três dias. Os Munduruku derrubam as árvores
45
44
andes de uma maneira sistemática. Um especimen mais alto,
na parte mais elevada do declive, é escolhido como "marco". de produtos de diferentes re " .
Usando-o como vértice, demarcam uma área triangular e todas intercalação de espécies a bó qUISItOSnutnentes, assim com
r ore as reduz, a co ticã
as árvores são aí cortadas pela metade. Finalmente, a árvore eIemento particular e aproveita ' ". mpe rçao por UI 1
"marco" é abatida de tal modo que carregará na sua queda as teso A ausência de grandes roça~ maxlI~:o a gama de nutri n-
árvores parcialmente cortadas logo abaixo. Estas, por sua vez, a proteger das pra as ue a os um ormes ajuda tamb m
arrastarão outras, até que toda a área, com cerca de 100 metros quando exemplares ~a ~esm~e al~st:am com menos facílidad
de largura, fique limpa. Todas as árvores que ainda estão de isolados A mondadur especie se encontram disperso
I : a ou segunda lim" ,
pé, assim como as que estão nas bordas e, portanto, fora de va or nusto. embora benefi ' I _ pa e uma prática d
alcance', são cortadas uma a uma. :E: dessa maneira que os Mun- tíção pelos nutrientesa ressa a p ant~çao, eliminando a comp •
duruku limpam um roçado em três dias. a sombra e a proteção ~ont~ a deterI,?ração do solo, reduzindo
As árvores derrubadas ficam secando ao sol durante quase e_fazendo o replantio de imedi:toer~~ao.' ~etardando a colh it
dois meses, antes de serem queimadas. Acende-se o fogo num çao da superfície do solo aos ef ~t lII~nuI o tempo de expo i..
dia em que sopra uma ligeira brisa que serve para alimentar a queima da madeira cortada d elos anosos da insolação,
chama, apenas o suficiente para mantê-Ia sem que se espalhe os quais i~ão beneficiar os bro:sOI~ dalguns n~t~entes ao 01,
pelo campo. Dessa forma, nem toda a madeira é queimada. galhos deIxados no terreno fo . I ecomposIçao de tronco
Assim, os galhos que não foram completamente consumidos cionais, de modo que pode rnece, enta~ente, nutrientes adí-
são recolocados numa pilha para nova queima. gc:rminação. A presença de ~ ser _absorvIdos no P~ríodo d
A época da queima é fixada de modo a preceder as pri- bem serve para desviar a aten _ge~çao em decomposIção tam-
meiras chuvas e o plantio se faz logo a seguir. Não há propria- Uma imitação, entretant~aOn e ce~tas pragas e doenças.
mente cultivo nem outro preparo do solo. Cava-se um buraco de suas características de ad' u~ca Iguala, o real e, ape r
com uma estaca, enterram-se as sementes ou as mudas, e com se equipara à vegetação natu~ptaçao, o CUltIVOitinerante n
o pé empurra-se a terra e cobre-se o buraco. Geralmente, plan- o~ efeitos potencialmente des~~ut~mse~ eSf?rço para compen
tam cerca de uma dúzia de diferentes espécies comestíveis, sen- mo da produtividade de um ro ~~os , ~ clima, O rápido d eU-
do que a mandioca e o inhame ficam juntos no centro e as p~o~a, ,dramaticamente, esse fat~ ~ tlpI~O ?a terra firme com-
outras são arrumadas em pequenos lotes ao redor. A segunda dImmuI ligeiramente no se d' a maiona dos casos, a f
limpa é feita duas vezes no período da germinação e do cres- sensível redução na produ gun o ano. Mas, no terceiro, há u
cimento. A colheita se faz conforme a necessidade, de modo compensa o trabalho de ç~o e, no qu~rto, é tão baixa qu n
que nem toda a safra é colhida ao mesmo tempo. Alguns vege- devolvida à floresta iue 10 m replantIo (Tab. I), A terr
tais, especialmente a mandioca, podem ser replantados logo tauração das condiçõ! exisfo tetoma o longo processo d
en es antes do desmatamento
após a colheita, a fim de assegurar um abastecimento perma-
nente. A diminuição da produtividade leva ao abandono de um A agricultura intensiva '
roçado, ao fim de dois ou três anos.
O método da agricult ' ,
Quando se analisa este tipo de atividade agrícola em termos ciências, é o mais a ro lado ltmerante, apesar de sua d i..
c lógico , é evidente que ele imita as características da vege- técnica d agricultuia f~a °i para o ambiente, sup rand
tu fi r tal em vários aspectos importantes. A intercalação t mperad , n ens va qu pr dominam
(

7
s técnicas compreendem uma limpeza dos campos, TABELA 1
m t da a vegetação removida do lugar ou empilhada para
r queimada. Os tocos e as raízes maiores são arrancados jun- Produção das colheitas mais importantes da terra firme e da várz
t ente com os troncos e os galhos, deixando a superfície do
t rreno a mais limpa possível. Antes de plantar, o campo é
rado, servindo isto tanto para enterrar as ervas daninhas como ( SAFRA
para arejar a terra. Uma única qualidade de plantação é feita Terra firme Várzea 2.a 3.a 4.a 5,a
em fileiras uniformes, numa grande extensão, e conservada
livre de ervas daninhas até que ela esteja bem desenvolvida. Ao Milho 600- 750 520 abandonada abandonad
maturar, a safra é colhida em poucos dias, deixando o solo 1.200 kgs. kgs. kgs.
exposto ao sol e à chuva. No caso de cereais, os talos podem
ser deixados até a primavera seguinte, quando serão revirados Milho 1.500 1.500 1.500 1.500 1.500
kgs. kgs. kgs. kgs. kg.
na ocasião da aradura, depois do que a mesma espécie poderá
ser replantada ou substituída por outra. Mandioca ± 16 ± 12 ± 9 abandonada abandonad
Quando, entretanto, este método é usado nos trópicos, (variedade tons. tons. tons.
acarreta efeitos desastrosos para a terra. Um campo limpo expõe 12 meses)
Mandioca
a superfície à total intensidade dos raios solares, acelerando (variedade 11-17 11-17 11-17 11-17 11-17
a deterioração tanto dos nutrientes como da estrutura física. 6 meses) tons. * tons. * tons. tons. tons.
Uma total erradicação da vegetação preexistente impede a res-
Aipim
tauração ao solo dos nutrientes armazenados. Até mesmo a en- (variedade
xada destrói uma boa constituição do solo, enquanto que uma 6 meses) 8 tons. 8 tons. 8 tons. 8 tons. 8 ton ,
aradura profunda acelera a decomposição da matéria orgânica,
pois que aumenta o oxigênio. Por ocasião da germinação, mui- Arroz do- 1.200 800 600
tos nutrientes já desapareceram ou se volatizaram, e as plantas méstico kzs. kgs. kgs. abandonada aband n
têm que competir pelas sobras. Qualquer praga ou doença pode 3.000- 3.000- 3.000- 3.000- 3.000-
alastrar-se rapidamente por todo o campo, danificando uma Arroz do- 4.500 4.500 4.500 4.500 4.500
boa parte da safra. Resumindo, tais métodos não somente des- méstico kgs, kgs. kgs. kgs. kg.
troem o solo de modo irreparável, como também aumentam o
I Segundo Lima, 1956, pp. 108, 113, 154-157.
risco de uma colheita fracassada. Não há dúvida que o método • A variação na produção reflete as diferenças das variedades.
da agricultura itinerante é o mais apropriado às condições tropi-
cais (Tab. 1).
O predomínio do método de cultivos itinerantes nas bai- do tropical. O fato de conseguir manter a fertilidade do
xadas amazônicas representa, portanto, uma adaptação às ne- t rn, m contrapartida, - e é esse o preço pago -, uma
cessidades especiais do solo e do clima. O fato de que é a única .cntr ão demográfica relativam nte baixa e a in tabilida 1
t cnica agrícola que pode ser usada indefinidamente, sem danos fi n d a população. O mod p 10 qual is r fl t
p rm nentes para o solo, explica seu emprego em todo o mun- I III{ ti ultur 1 rá in m utr pítulo. I

48
a ser acentuado aqui é que a agricultura itinerante não constitui Recursos alimentícios silvestres
um método de cultivo primitivo e incipiente, tratando-se, ao
contrário, de uma técnica especializada que se desenvolveu em A vegetação natural apresenta uma grande variedade, in-
resposta às condições específicas de clima e solo tropicais cluindo centenas de plantas com raízes comestíveis, frutas,
(Fig. 3). mentes, castanhas ou bagas, grande parte dos quais são explo-
rados pelo homem. Muitos são consumidos somente como "tir
gosto" quando, por acaso, são encontrados na floresta. Outr ,
porém, fazem parte da alimentação costumeira, durante tod
o ano, como no caso do plantio, ou durante a safra, como n
VEGETAÇÃO NATURAL CULTIVO ITlrlERANTE CULTIVO PERfoIANENTE
caso da castanha-do-pará. As frutas geralmente amadur c
,
durante a estação chuvosa, antes que as novas plantações t .•
\ \ \\ jam prontas para a colheita, fornecendo, assim, uma importa t

\' '\ fonte de alimentos, justamente na ocasião em que são mais n -


cessárias. Embora potencialmente existentes em larga escala, O
\\ \\
REDUÇAO MINIMA PERDA DOS
alimentos silvestres não se encontram concentrados, devid

\ LL\'..;i
DO IMPACTO NUTRIENTES distribuição dispersa e isolada das espécies, característica d
vegetação das matas tropicais. A exploração de tais recur
\~~r \ \i
,.... jV~'~ÁTEllS
...~ ~ requer, conseqüentemente, bastante tempo, assim como mão-d -
, obra e acesso a uma grande extensão da floresta.
Em conseqüência da distribuição dispersa das plantas
mestíveis, os animais também se encontram espalhados. m
xceção dos caititus e dos macacos, os animais da Amaz n
LIXO
t ndem a viver solitários ou em grupos da mesma famíli, m
'I
~~TORNO DOS 71~g DAS PRAGAS
V z de grandes manadas. São na maioria pequenos e, al un
1"- ANUTRIENTES RECAPTURA PARCIAL r/' I I ~,
~ /1 \ ~ AO SOLO DOS NUTRIENTES RETORNO DOS
d 1 s, notívagos. Entre os principais animais de caça t I
t.--'-1_---J.V--'I))
RECAPTURA DOS NUTRIENTES NUTRIENTES

f ~ '\ J/
PERDA IMPORTANTE DE NUTRIENTES
P l a, que atinge um comprimento de 0,60 a 0,70 rn tro, l
PERDA PARCIAL OOS NUTRIENTES ~
DEVIDA À LIXIVIAÇÃO
PELA LIXIVIAC;ÃO oti e o tatu, ambos do mesmo tamanho. O maior mamíí r
~ + t rr tre é a anta que freqüenta rios e lagos e chega a t r d i
111 tr . Os veados aparecem nas campinas ou em sua vi l-
I h na. Duas espécies de caititus atingem um comprim nt d
Fig. 3. Êxito relativo da vegetação natural; o cultivo um m tro e vivem em bandos que chegam a contar mal I
itinerante e o cultivo permanente neutralizam os efeitos I( O b ç . Os animais mais visíveis da floresta são os rn l-
potencialmente prejudiciais do clima tropical sobre o qu d m ser ouvidos conversando nos topo d rv-
solo da Bacia Amazônica. . S und nt ta t u terr tr (cá d) nt
1
o
elas, há uma especie que atinge mais de 70 centímetros. Mui- cialmente o cálcio, ajuda o desenvolvimento da vegetação 11

tas aves são potencialmente comestíveis; seus tamanhos variam um mínimo de volume e um máximo de proteínas (Fig, 4). A
do mutum que se assemelha a um grande peru até as de pe- proteína concentra-se principalmente nas sementes, por ond
queno porte como as pombas e os tucanos. Os papagaios e as faz a reprodução. Tais plantas fornecem alimento aos anim i ,
araras são procurados tanto pela carne como pela brilhante
plumagem colorida. Outros habitantes da floresta incluem in-
setos, larvas e abelhas. VEGET AÇÃO TEMPERADA VEGETAÇÃO TROPICAL

O peixe oferece a maior variedade de recursos de subsis-


tência. Os rios de água preta e os pequenos riachos têm baixa
produção, assim como diversos rios de água transparente. En-
tretanto, onde os nutrientes são mais abundantes, encontram-se
peixes em tão grande número que passam a integrar substancial-
BA;;~~~LUME
ALTA NUTRiÇÃO 0
ment~ a di~ta _alimentar. As tartarugas aquáticas, os jacarés e .----"-----d
ANIMAIS SELVAGENS

os peixe-bois sao encontrados nos rios maiores. NUMEROSOS


GRANDE
E
PORTE
DE

1\. baixa concentração de alimentos vegetais e animais na


terra firme exerce uma grande importância no padrão de ocupa-
ção humana. Uma outra característica menos evidente dos re- CHUVA LEVE CHUVA PESAOA

cur~os tropicais de subsistência, porém, e que dificulta ainda ~


mais a adaptação, é o baixo teor nutritivo da maior parte das 1 1 REPRODU~AO
VEGETATlVA

plantas tropicais. ALTA FERTILIDADE ORGÂNICA


BAIXA FERTILIDADE INOROÂNICA

Considerações sobre a nutrição

A feliz adaptação conseguida pela vegetação à dura reali-


Fig, 4. Efeito do clima, do solo e da chuva na reprodução da pl t
dade, com baixa fertilidade, forte acidez do solo e outros efeitos e no teor nutritivo.
n~civo~ do clima tropical, faz com que o preço dessa adaptação
nao seja notado. Com um pouco de reflexão vemos, entretanto,
alguns dos quais preferem. as folhas, incluindo o capim, out
que folhas e raízes sintetizados principalmente graças à água
preferem as frutas ou as sementes. Os vegetais das regiõe t m
e à luz solar devem ser deficientes em vitaminas e sais minerais.
Embora isso não tenha grande importância para o ciclo da ve- I radas vivem, geralmente, em grandes concentrações,
getação, dificulta o desenvolvimento da fauna. Assim, os ani- d daí uma grande colheita em uma pequena área. A
mais herbívoros são diretamente afetados e os carnívoros in- t n i m grande escala de plantas comestíveis e saud v
f LV r u a evolução dos herbívoros de grande porte (u
cluindo o homem, indiretamente. '
11' ,v do) e de hábitos gregários (bisão, caribu, caval ).
. N~s climas temperados, com chuvas e temperaturas mé-
N s b ix da tropicai, ntr tanto, a pre ença d chuv
dias baixas, os solos tendem a ter uma relativamente alta fertili-
I fllJ r tur m m dia 1 v d s, juntam nt om uma t iix
dad inorgânica. A disponibilidade de nutrientes minerais, espe-
5
fertilidade inorgânica, produz uma vegetaçã~ de g~a~de porte giram extraordinárias concentrações de valores nutritivos no
e limitado valor protéico. Não havendo proteína suficiente para frutos e nas sementes. Um exemplo notável é a castanha-d .•
a produção de sementes, muitas das plantas tropicais desenvol- pará que, em 100 gramas, contém 50 por cento mais de pro-
veram métodos vegetativos de propagação (Fig. 4). As folhas teínas do que a mesma quantidade de milho. Uma dieta equi..
e o capim desenvolvidos em tais condições são luxuriantes em librada, portanto, não pode ser obtida sem a combinação d
aparência, porém seu limitado teor nutritivo reflete-se na fauna produtos básicos cultivados, além de frutos do mato, castanha ,
que é de pequeno porte e se distribui esparsamente, q~ando caça e pesca. Durante milênios, os grupos aborígenes consegui-
comparada com a fauna das zonas temperadas. Raros sao os ram desenvolver um ciclo sazonal, combinando caça, pesca, co-
animais de pasto e a maior parte dos herbívoros se nutre de leta e atividades agrícolas de tipo e intensidade diferentes, ma
frutas,' castanhas, tubérculos e plantas aquáticas que têm mais que assegura, em cada caso, o fornecimento contínuo dos nu-
valor nutritivo do que as folhas. Mesmo assim, a fauna indígena trientes essenciais sem, todavia, pôr em perigo o ecossistema.
teve que se adaptar a um consumo de proteínas de teor mais tendência para superexplorar um determinado recurso é contro-
baixo do que aquele que seria tolerado pelos animais dos climas lada por várias práticas culturais, algumas das quais parec m,
temperados. à primeira vista, irrelevantes. Um exame mais cuidadoso, n-
Que as populações indígenas das baixadas tropicais tam- tretanto, indica que constituem soluções fascinantes e eficaz
bém se tenham habituado a um baixo consumo de proteínas para o problema da subsistência do grupo, a longo prazo.
se evidencia pela sua excelente aparência física, embora o con-
sumo esteja abaixo dos padrões normais dos climas temperados. POTENCIAL DE SUBSIST1;:NCIA DA VÁRZEA
Além disso, os povos tropicais têm a capacidade de armazenar
proteína no organismo durante muitas semanas, capacidade esta Determinantes primários
que não foi encontrada em habitantes das zonas temperadas. ..
Tal adaptação filosófica explica o costume muito difundido en- Embora a várzea ocupe o coração da bacia amazôni ,
tre os caçadores tropicais de consumirem grandes quantidades onde o clima tropical atinge sua expressão máxima, difer , d
de carne de uma só vez. Adaptações fisiológicas semelhantes são dois modos importantes, da terra firme. Primeiro, o sol ,
também encontradas em relação a outros elementos escassos, anualmente, rejuvenescido por uma camada de aluviõ r·
como o cálcio, certas vitaminas e o sal. Conseqüentemente, teis de origem andina; segundo, o ciclo anual é determin id
doenças de carência são raras entre os povos tropicais cuja ali- pela enchente e pela vazante do rio e não pela distribui o
mentação não tenha sido degradada por modificações recentes. sazonal da chuva local.
No entanto, elas se desenvolvem com rapidez entre imigrantes
de regiões temperadas, quando submetidos à mesma dieta. Os únicos rios que transportam quantidades important
de matérias férteis são o Maraíion e o Ucaiali, no alto P ru,
Embora os povos tropicais se tenham adaptado a um teor Madeira que nasce na Bolívia e o Napo, o Putumaio
nutritivo relativamente baixo ainda assim têm necessidade de J apurá que procedem do Equador e da Colômbia. Por raz
um .mínimo de elementos básicos na alimentação. Os vegetais t pográfícas, a maior parte dos depósitos é carregada par
cultivados são particularmente deficientes em proteína e até v rz a amazônica antes de ser liberada. Conseqüentement , .m-
mesmo o milho e o arroz contêm menos nutrientes quando r, r faixas str itas apar çam ao longo de pequenos trechos d
cultivados nos trópicos. Certas plantas agrestes, entretanto, atín- MI d ira d Puru, várz pr dominant m nt uma orm ..
4
ç o do médio (V. Figs. 1 17), ond iup
uma área de cerca de 60.000 quilômetros quadrados. À r-
porção que o rio se alarga, a várzea também se expande. Acima
do Rio Negro, sua largura é inferior a 25 quilômetros. Entre
o Rio Negro e as primeiras ilhas mais importantes acima da
foz, a largura aumenta para 50 quilômetros. No "delta", atinge
mais ou menos 200 quilômetros. CAMI'O

Apesar de sua área relativamente pequena, a várzea é um C~~':TU.NTE RIO

meio-ambiente complexo e heterogêneo, principalmente porque Fig. 5. Corte transversal, idealizado, da várzea, mostrand t fiO
as águas que carregam os sedimentos se alastram irregularmen- de nichos criados pela alternância de enchentes e vazantes d ri.
te pela várzea. O principal fator responsável por esta desigual- dimensão vertical está exagerada.
dade é o fato de que o ápice da estação chuvosa local precede pela velocidade da corrente que estão constantemente mu n I
o ponto máximo anual da cheia do rio. Ao longo do médio e à proporção que o rio derruba uma marg:m.e forma o~t 1 I (
. ) 'baixo Amazonas, as chuvas começam em novembro ou dezem- lado oposto. As diferenças locais de turbulência também int r.
bro e alcançam sua carga máxima entre março e abril. Du- rem nesse processo de aluvião uniforme, resultando daí I L
rante eS'S6 .. período, a água que se escoa juntamente com a a composição do solo pode variar grandemente dentro d um
precipitação é de grande pureza e abastece os canais, lagoas e pequena área. Além disso, quando uma pestana se torna 'ufl·
lag~s-iexauridos da várzea. Como o Amazonas só atinge o seu cientemente elevada para ficar acima do nível de enchent m
penttt~m'áximo em Manaus dois meses depois que começa a re- anos normais, o solo torna-se suscetível à lixiviação e, con ..
gredir . a. estação clJ".lJvosa,suas águas alcançam alguns lagos qüentemente, a um rápido declínio da fertilidade se for su?m -
apenas quando estes estão completa ou parcialmente cheios. A tido a um plantio intensivo. Por outro lado, onde as condiç
associação' desses dois tipos diferentes de água cria um misto são favoráveis um hectare de várzea recebe anualmente c
de lagos, lagoas "e canais de águas transparentes, preta e bran- de nove toneladas de depósitos contendo amplas quantid
ca, que propiciam uma extraordinária variedade de condições de nitrato de sódio, carbonato de cálcio, sulfato de magn i ,
para o desenvolvimento de plantas aquáticas e vida animal. s perfosfato, clorato de potássio e outros nutrientes important s.
. Na ocasião da cheia, as águas ricas em sedimentos não só O regime do Amazonas é ideal para a agricultura. ...111
se espalham irregularmente pela várzea como, também, deposi- ontraste com o Nilo, que sobe rapidamente e baixa leIl:tam nt ,
tam os sedimentos desordenadamente. As partículas maiores Amazonas leva oito meses para atingir o ponto máximo, -
se assentam nas margens do rio, criando, assim, uma pestana ém apenas quatro meses para voltar. ao nível mín~mo (Fig. 2).
que sobe gradativamente até chegar, por vezes, a 150 metros urante o mês de abril sobe aproximadamente cinco centím .-
de largura (Fig. 5). Esta pestana, ou várzea alta, é mais bem ros por dia, diminuindo a velocidade durante os últimos d i
drenada e inundada menos tempo do que as terras do interior,
meses antes de atingir o seu ponto máximo. Em meados d
ou várzea baixa, que podem permanecer submersas ou alagadas junho, começa a baixar e,' durante o mês de setembro" des~
durante todo o ano, e é geralmente mais apropriada para a 1,7 centímetro por dia. Conseqüentemente, o agricultor, V1
agricultura. Sua fertilidade é, no entanto, muito v~riável, por- de regra, tem tempo de colher sua safra antes que o campo
que o aterramento é afetado pelo contorno do leito do no e
56 57
t 11
fiqu lagado água s r tirem da terra alagada c m 1-
tante presteza, de modo a permitir um bom escoamento nt
rC i u
u ul nta
do novo plantio. Numa enchente normal, apenas alguns centí-
metros de água recobrem a várzea alta, embora ocorram a Pr tica agri olas
intervalos irregulares inundações de 1.80 a 2 metros acima O problema de fazer roçados na várzea ncu 1 I t
do normal. Em Manaus, a diferença entre os níveis mais altos mesmo que na terra firme. Experiências recentes r li. I
e mais baixos é, em média, de cerca de 10 metros. o longo do Rio Guamá, perto de Belém, possibilitaram lnfo •
Em resumo, comparada com uma área igual de terra firme, mações detalhadas sobre o número de homens-dia n CC::55UUIJtt
a várzea apresenta grandes diversificações e variações. Do pon- para cada etapa da operação de limpeza de um hectare m t
to-de-vista da utilização humana, oferece não só recursos natu- de várzea alta e baixa. Uma área de tal proporção contém c r
rais alimentícios, como posibilidades para o seu emprego na de 512 árvores, 80 por cento das quais têm menos de 50 c nU·
agricultura, recursos esses superiores aos encontrados em terra metros de diâmetro. Treze por cento têm diâmetros que v ri
firme. entre 50 centímetros' e um metro, e o restante ultrapassa um
metro de diâmetro.
Vegetação natural
A limpa começa com a remoção dos cipós e árvores m i
A vegetação natural da várzea alta é a floresta mas sua novas, operação esta que consome seis dias de trabalho. S
composição difere da que se encontra na terra firme. Somente necessários dois dias para cingir os troncos de açacu que po -
se desenvolvem as espécies resistentes às inundações periódicas suem uma resina muito cáustica, sendo, portanto potencial-
e, por conseguinte, há grande abundância de palmeiras. A vár- mente nociva. Espera-se para deixar o corte secar, quando
então começa a remoção das árvores. Os troncos são talhado
zea baixa, que é alagada anualmente, favorece tanto a floresta
de modo a caírem uniformemente, cobrindo toda a área. Uma
como o campo, dependendo das diferenças de características
vez abatida a árvore maior, tem-se um efeito de "dominó' vi t
locais, isto é, solo, déêlive;" corrente, profundidade da água e
que as outras árvores começam a cair sob ,a sua pre~são. A
duração da inundação. Em geral, lagos e lagoas são circundados remoção dos galhos grandes dos troncos caldos constituem I
pelos campos que penetram nas margens, à proporção que as etapa final. Foram empregados vinte dias de trabalho, do talh
águas do rio retrocedem, íormando tapetes flutuantes, quando à limpeza. .
as águas voltam a subir. Durânte certos períodos do ano, den-
A queima é feita cerca de um mês e meio mais. tarde, a
sos tapetes de capim flutuante cobrem por completo a super-
meio-dia com céu limpo e boa brisa soprando, depois de qua-
fície dos lagos e canais. As raízes dessas plantas são fontes de tro dias' sem chuva. Gravetos e folhas são empilhados de um
alimentos pára a fauna aquática. Outra vegetação flutuante lado para serem queimados primeiro, ajudando, assim, o fogo
se forma em trechos de água parada, ao longo das margens a pegar. Se a operação for bem feita, so~ente ?s troncos e o
dos rios e lagos de água transparente, mas não se desenvolve galhos maiores são preservados. Outros vmte dias de trabalho
em água preta. são necessários para cortá-los e ernpilhá-los. A remoção do
Trechos de água sempre parada também oferecem uma tocos é um trabalho fatigante que requer o emprego de 377 ho-
grande variedade de vegetação aquática. A espécie mais notá- mens-dias, cujo custo não é compensado por um aumento sen-
vel é a vitória régia, um nenúfar cujas folhas do tamanho sível da extensão de terra produtiva.
58 S9
tr m n Ia V 1 i :t ti
í t r d i ív ara u o da agricultura na vár 1 t du v z m i.
o p dado do plantio. S ele for feito quando a terra está ou u I úm r uit
muito seca ou muito molhada, os efeitos prejudiciais se fazem 'lu t d ano Atlântic ,d um 1 utr .
sentir, tanto para o solo quanto para a germinação. Algumas urop , do T jo a Volga, nã lim nt m i lU
plantações, como a mandioca, preferem uma terra bem drena- P ci s de peixes de água doce; no nt nt , num P qu 1\ )
da e, conseqüentemente, dão-se melhor na alta várzea. Se o P rto de Manaus, chamado Lago Hy u ry, n un
plantio durar várias semanas, o máximo de terra é aproveitado d 400 metros quadrados, descobrimo mai d 1.2
e o roçado se estende progresivamente pelo declive à propor- P ci s diferentes, a maioria das quais ainda não tinh
ção que as águas baixam. O limite mais baixo para a mandioca ncontrada em qualquer outro lugar." (Gonçalv ,
ocorre quando há um período de oito meses entre 0 reapareci- pp. 38-39.)
mento da terra e a inundação seguinte. Já que o milho leva Os peixes do Amazonas são notáveis pela variedad
120 dias para maturar, pode ser plantado em elevações mais tamanho. A piraíba, atinge um comprimento de quase 2,3
baixas. Entretanto, quando plantado na várzea alta, pode dar tros e pesa acima de 140 quilos. Diversas outras espécí d
duas safras por imo. O arroz, uma cultura introduzida pelos peixes têm mais de um rrietro de comprimento. O maior p
europeus, também dá duas safras anuais. de escamas é o pirarucu que chega a medir acima de 1,80 m -
Como a fertilidade do solo é renovada anualmente pela se- tro e pesa mais de 80 quilos. A pescada e o tucunaré, qu t
dimentação, as terras da várzea mantêm a produtividade, ape- entre os mais saborosos, têm mais de 60 centímetros de co •
sar do uso contínuo. Além disso, as safras são quase sempre primento.
duas ou três vezes superiores à primeira safra de uma área igual Embora haja pesca durante o ano inteiro, ela é mai rl \
em terra firme (Tabela 1); com duas safras, a discrepância quando o nível das águas está baixo. O pirarucu, sendo m i ,
é ainda mais acentuada. Sob dois aspectos importantes, a saber, mais fácil de pescar e mais saboroso, quer fresco, quer sal 1-
a continuidade da exploração e a manutenção de uma alta do, tem sido um dos principais alvos da exploração com r i I.
produção, o potencial. agrícola da várzea pode ser comparado Só em 1953, mais de dois e meio milhões de quilos foram
ao das regiões temperadas. tos no mercado, enquanto milhares de quilos foram consumi
por residentes locais. A pesca comercial na ·confluênci'a do i
Recursos alimentícios silvestres Negro e Amazonas rende diariamente cerca de 500 quilo nt
a madrugada e o meio-dia.
Os recursos alimentícios silvestres são também mais con- As tartarugas aquáticas são um outro recurso alim ntí i
centrados e produtivos na várzea do que na terra firme. A tremamente abundante. A espécie maior atinge um com r-
proporção que as águas retrocedem, diversas espécies vegetais mente de um metro e uma média de 25 a 35 quilos d p
aquáticas propagam-se ao longo das margens dos lagos e cor- A f meas põem entre 100 e 150 ovos num buraco ra o, n
rentes, fornecendo uma abundante produção de sementes que pr ia arenosa, quando o nível da água começa a baixar. Tant
atraem grande número de pássaros. O arroz selvagem cresce t rtaruga como os seus ovos são consumidos em grand qu n-
em áreas extensas. tldad p Ia população local e têm sido comercialm nt pl r -
É na água, entretanto, que reside a verdadeira riqueza da li, d sd o tempo coloniaia.. núm ro d v d truíd
várzea. Há mais de cem anos, o famoso naturalista Louis Agas- nu 1m nt para a pr du 1 .11 ul d ntr
60
72 milh c , r presentando a produção de 330.000 a 480.000 abundante aos jacarés que os espera~ à beira d'água, de m n
f m as. Inúmeros outros ovos são também destruídos pelos díbula aberta. As espécies maiores atmgem entre 4, e ~ m t
pássaros, jacarés e outros animais predatórios, os quais também de comprimento e os men~r~s, 2 metros. Tanto os répteis, com
se alimentam das tartarugas recém-nascidas. Milhares de tarta- os seus ovos são comestíveis.
rugas adultas 'são capturadas anualmente quando se reúnem na Há al~mas décadas, a ap~rência da várzea na estaç
praia para a desova e um bom caçador pode conseguir entre seca foi descrita da maneira seguinte: ._
10 a 15 por dia, durante outros períodos do ano. Estes números "Pitoresco e animado é o panorama dessas regioes das p ..
nos fazem acreditar na lenda indígena que diz que nos tempos carias 'no tempo da salga' .. , R~rea~ as chuvas,. os _terren ..
aborígenes o médio Amazonas fervilhava de tartarugas tal ficam secos, a ardência canicul~r ~ mitigada pela viraçao com
como um formigueiro cheio de formigas. Um tipo menor, o tante do 'vento que vem de baixo . . . _. , .
tracajá, mede entre 40 e 50 centímetros e põe de 25 a 30 ovos. As manhãs nesse tempo do ano, sao íncomparave! d
Seu sabor é tido como melhor do que o da tartaruga, porém formosa luminosldade, de contínuo refrescamen;o ~ robusta vid
não prolifera em cativeiro. A matamatá, que tem a ambígua di ., a É a sazão da fartura e da abundancla. Nos Ia ,
íorusrac . fi d d la t tu
distinção de ser o mais' hediondo bicho da Amazônia, chega nos rios interiores, nos inumeráveis 10S e cor as aque ."
a ter 60 centímetros de comprimento. Como prefere os lugares ra infindável de água, única na terra.' superabund~J? o pu ..
lamacentos, é- mais difícil de ser capturado em grande escala. rucu, o tucunaré, este com as ~ores VIVas~o arcD:"ms. '.' .
As águas amazônicas são também habitadas por diversos escada, o tambaqui, o camonm, o aruana, o peixe-boi, CU]
tipos de mamíferos aquáticos. O mais importante é o peixe-boi Ull
xira': enfim toda a numerosa tamíll
pconserva e, a bela '•.•..• . , _'. , • •

que atinge três metros de comprimento e' pesa 1.200 quilos. . ti I'zica não só fastidiosa senao diíícil de reíacíonar.
IC 10 ogi , 'd' , d mussuan
:E: apreciado não só por sua carne mas, também, pelo óleo que É o tempo das tartarugas, os iracajas, os
fornece. O carnívoro boto branco, raramente excede 2 metros outros vários quelônios, saborosos 'pitéos' daquela terra qu
de comprimento e pesa mais de 150 quilos. Embora consumido nos é tão cara. " 1
no período pré-colombiano tomou-se recentemente alvo de su- E a rematar esse quadro pletórico d~ ~an!elSJ?o sem igu ,
perstição, passando a não ser considerado comestível. A carne percorre as estiradas margens dos aguaçals mtermmos, coalh o-
e o óleo do peixe-boi chegaram a constituir importantes produ- do o azul turqueza, tênue, imponderá~el, um mundo d v
tos comerciais no período colonial. Acredita-se Que só os holan- esvoaçantes, garridas, em revoa~a.s turbtlhonantes.
deses exportavam mais, de vinte carregamentos por ano. É bem a reprodução genesica de um outro Paraí o d ·
A abundância de peixes pequenos e sementes silvestres nos tempos bíblicos. . ." (Mendes, 1938: 33/4. )
lagos da várzea, durante a estação seca, atraíam surpreendentes
quantidades de patos, garças, cegonhas e outras espécies de Considerações sobre a nutrição
pássaros. No princípio do século XIX, os viajantes diziam que,
no médio Amazonas, os bancos de areia cobertos de pássaros Embora não tenhamos comparações quantitativas, ni.o h
nos ninhos eram tão extensos que a canoa levava meia hora dúvida de que' o teor nutritivo das plantas e dos amm~~ d
para atravessar de um extremo a outro. Recentemente, na déca- várzea é mais alto do que o da flora e fauna da terra rme.
da de 50, "bandos colossais" freqüentavam os lagos perto de AI m d mais, a várzea é apropriada para o eul~iv v~ l~~lh
Manaus e voavam por cima da cidade em densas nuvens. f nt maí c nc ntr d i min 1
lU um
Os pássaros e seus ovos, por sua vez, fornecem comida
62
ío u mandi ca b t ta-d c . A prot Ina animal tamb 1
I I III I
e ncontra em alto teor e em quantidade inesgotável, ainda I p d. I II 11I
que explorada por métodos aborígenes. Todos esses fatores ope- ln: trun IIt!
ram no sentido de tornar o potencial de subsistência da várzea, I 111\. r r m fitos de mad ira d utro m t ri i I l V
no tocante à utilização humana, bem superior ao da terra firme. ti r pida d integraçã sob os efeito da umidad. m : 11 h
I1 nr omente o estabelecimento humano com muito n I
A várzea, entretanto, não é um paraíso perfeito. A inter-
dur o acarreta modificações no solo capaz s d v II
valos imprevisíveis, o rio sobe 2 metros ou mais acima do nor-
J lização; os acampamentos de curta duração n i
mal, acarretando uma súbita diminuição do suprimento alimen-
v tígios. Em terceiro lugar, a contínua oscilação do 1 it I
tar que teria conseqüências traumáticas numa população que
i as aluviões anuais dificilmente permitiriam qu o t r I
fosse dependente de condições mais favoráveis para a sua sub-
sistência. Portanto, a adaptação favoreceu a estabilização a um d várzea que haviam sido adequados para a ocupação hUI •
nível compatível com uma capacidade mais baixa de armazena- lguns milênios atrás ainda hoje estivessem intatos. Em u rt
mento. Esta circunstância limitou o tamanho da população, lugar, a densa vegetação que encobre a superfície do 01
embora com um teto mais alto do que o da terra firme. onde qualquer artefato que por acaso tenha permanecid n
local. Não é por mera casualidade que a maioria dos v t1 i
do 'homem primitivo no Novo Mundo se encontre em ár a u
A CHEGADA DO HOMEM
são hoje semidesertas, onde até mesmo os menores indí i
Há evidências cada vez maiores, embora não sejam elas são facilmente visíveis, ou então em abrigos rochosos nd
universalmente aceitas, de que o homem penetrou no Novo o refugo se acha concentrado e protegido contra qualquer d -
Mundo através do Estreito de Bering, há cerca de. 40.000 anos. túrbio.
Um local na beira dum lago extinto no México foi datado de Até recentemente, acreditava-se que a floresta tropical d
24.000 anos atrás e uma caverna nas montanhas meridionais do Amazônia havia alcançado sua atual extensão no Pleistoc n
Peru já era habitada há 20.000 anos aproximadamente. Por antigo, tendo sido pouco atingida pelas drásticas mudança li-
volta de 12.000 anos passados, senão antes, os imigrantes che- máticas que recobriam, periodicamente, as regiões temp r dn
garam ao extremo sul da América. A associação de ossos de e as montanhas andinas de gelo glacial. Era difícil, entretant •
animais extintos, entre eles cavalos, .mastodontes, preguiças e conciliar tal estabilidade ambiental com a tremenda diversid
bisões gigantes, com instrumentos de pedra ou osso em vários biológica, uma vez que a moderna teoria evolutiva explic
sítios caracterizam os grupos de caçadores paleoíndios. Os po- especiação sobretudo em termos de isolamento reprodutivo,
vos que fizeram e usaram tais instrumentos viviam, provavel- que dificilmente se daria num habitat homogêneo. Par ,
mente, em bandos compostos de famílias aparentadas e iam de agora, que a floresta tropical não apenas flutuou acentuad -
um lugar para outro na medida em que os recursos alimentícios mente em extensão mas, também, que as duas flutuações mal
se esgotavam ou apareciam plantas comestíveis próprias de recentes foram posteriores à chegada do homem. Há cerca d
cada estação; foi esse o padrão que persistiu em diversas partes 11.000 anos e, ainda, entre aproximadamente 4.000 e 2.000
,I
das Américas até o contato com os europeus. anos atrás, um declínio das precipitações pluviais oca ion
O malogro em descobrir vestígios igualmente tão antigos uma diminuição e uma fragmentação da floresta, tran form n
na Amazônia não implica, forçosamente, que· a região tenha grande parte da Amazônia em campos ou savana . A p pu-
64
lações vegetais e animais ficaram confinadas em refúgi i I- ti 1I , nI Jl1 'l 11
dos da floresta onde começaram a se diferenciar. As e p i irbon ~14 80 to • ( 1- 8 ). Pr v m d
que não podiam ser comportadas num refúgio ou não cons ~ I znd I n llha d M r j6 qu pr duziu fr I
guiam se adaptar às novas condições, quer emigraram quer se t 1\ r donda e de grand pot d
extinguiram. Quanto tempo durou essa situação, até que ponto I I I rnam ntados com largas linha inci
foi a floresta reduzida em sua magnitude, onde ficavam situados linh , cruzada. O fato desse tipo d decoraç t
aqueles locais encravados e de que tamanho eram eles, tais os v rio éculos antes, nas regiões andinas, faz-ri r r qu
fatos que são apenas vagamente conhecidos. As flutuações fo- ultura, conhecida como Fase Ananatuba, trouxe pr v v lm I
ram suficientemente prolongadas e pronunciadas, entretanto, t d ocidente o seu conhecimento na confecção d r 111 I.
para que se desse a especiação em alguns grupos e para que incidência da data arqueológica com o período m L "
outros atingissem o nível de subespécies, de modo que cada t d recuo da floresta sugere que a vegetação esp r t ilv z
vez que a floresta se alterava havia um aumento na diversidade t nha facilitado a penetração das baixadas por grupo qu u-
da fauna e da flora. f ccionavam cerâmica e que eram provenientes de outr r
O efeito dessas oscilações sobre os habitantes humanos é 1 m da Amazônia.
altamente especulativo mas há indícios de que foi importante. A reconstituição da subseqüente história aboríg n
Na colcha de retalhos de línguas faladas nas terras baixas, há ia Amazônica é prejudicada pela natureza vaga e p
três famílias dominantes: Tupi-Guarani, Aruak e Karib. Análi- aior parte da evidência arqueológica. Pesquisas intensa f
ses comparativas pormenorizadas e levantamento de dados lé- fitas em relativamente poucos locais, a maioria das qu i
xico-estatísticos realizados nas duas primeiras por diferentes Ia da região. Felizmente, as áreas adjacentes do Peru, qua-
pesquisadores propiciaram reconstruções semelhantes. Ambas d r, Colômbia e Venezuela são mais conhecidas e tais inf r
as famílias provêm do sudoeste amazônico e das vertentes andi- s, combinadas com os dados recentes relativos à Moam
nas adjacentes, ambas compreendem uma família que se disse- ri .a, ajudam a situar a Amazônia dentro de um quadr
minou amplamente pelas baixadas tropicais e calcula-se que irnplo do desenvolvimento cultural do Novo Mundo, p i I.
essas duas dispersões ocorreram por volta de 5ÜO a. C. Esta m nte com referência à origem dos vegetais comestív i b, i.
cronologia coincide com o período mais recente de aridez, mo- ultivados.
mento em que os grupos humanos adaptados à floresta teriam Se bem que alguns botânicos e arqueólogos ainda t j 111
sido submetidos às mesmas pressões seletivas que caracteriza- m d acordo, a maioria aceita a evidência de que a d m sti 1
ram outros grupos da fauna. Embora não existam dados com- d milho teve início no México antes de 5.000 . . iu
paráveis para os Karib, é de notar-se que eles se concentraram mil nio eguinte, o seu cultivo espalhou-se em direção a n t
ao norte do Rio Amazonas e que predominam na parte mais 1 ul, atingindo o planalto peruano por volta de 3.000 I. •
árida e de matas menos densas da moderna Amazônia; a rut d e tar o milho associado na Mesoamérica e ru r i o
saber, o setor oriental do Rio Negro e ao sul das Guianas onde Al1 Iin à cerâmica decorada com incisões, lembrando til
a média de precipitação pluvial é inferior a 2.000mm por ano I l 'as Ananatub, sugere que estes dois lemento talv z t •
(Fig. 6). Somos tentados a considerar que os de língua Karib nluun ntrad n Amazônia junto, ao terminar o und ml-
penetraram na Bacia Amazônia durante a última flutuação cli- I 11/ n.
mática e se adaptaram às variações do meio-ambiente na medi- A d
da em que a floresta retornava. 1'1 lr li

66 7
•llv tr Manih. t o o rn m h lt t
n h d s, t nd nd -' do México setentrional
nort da Argentina, mas a natureza perecível da planta prejudi-
ca sua conservação mesmo em climas secos. Evidência indireta
do uso da mandioca aparece no litoral colombiano do Caribe
um pouco antes do ano 1.000 a. C. na forma de grandes assa-
deiras de cerâmica do tipo que é ainda usado para a sua pre-
paração pelos índios da floresta tropical. A batata-doce estava
sendo cultivada no planalto do Peru meridional por volta de
4.000 a. C., mas se tal fato procedeu ou se seguiu ao seu cultivo
nas baixadas continua sendo motivo para conjecturas.
A incerteza que cerca a origem e a difusão das plantas
domesticadas tropicais torna evidente que até a reconstituição
mais genérica da evolução da adaptação cultural aborígene à
floresta tropical não pode ser feita com segurança. No entanto,
certas características que pareciam antes surpreendentes come-
çam a fazer sentido uma vez projetadas de encontro à mudança
do meio-ambiente. Por exemplo, a multiplicidade de línguas
e sua distribuição de modo a parecerem uma colcha de retalhos
tornam-se comprensíveis no caso de as drásticas flutuações de
clima e vegetação terem se dado nos últimos 10.000 anos. Bas-
ta apenas considerar que alguns grupos emigaram ou se adap-
taram às condições em mutação enquanto outros permaneceram
em locais encravados na floresta. A separação de populações
que estavam antes em interação teria conduzido à diferenciação
lingüística e cultural, enquanto a adaptação a habitats seme-
lhantes teria favorecido convergências culturais por grupos de
origem diversa. É importante o fato de ser relativamente re-
cente a última fragmentação da floresta não apenas porque for-
nece uma explicação para a evidência de movimentos emdire-
ção à e dentro da Amazônia mas, também, porque propicia
uma base para calcular o ritmo de adaptação cultural.
Antes do contato europeu, o processo de seleção natural
havia produzido uma configuração cultural ímpar na floresta
tropical o que permitiu não somente a satisfação de necessida-
des humanas fundamentais com um mínimo de esforço como,
ainda, se fez em harmonia com o restante do ecos sistema. Um
68 6
Tais hipóteses podem ser testadas' pela análise e com
Capítulo 2 ção das culturas de diversos grupos' indígenas da Am
que habitam sub-regiões com pequenas diferenças quanto
va, topografia e recursos alimentícios. Mas antes que a ad
Adaptação indígena à terra firme 'ção venha a ser considerada como a principal causa das
lhanças culturais, duas outras possíveis explicações devem
eliminadas. Como as semelhanças resultam, muitas veze, d
difusão, é preferível selecionar grupos provenientes de pont
geográficos suficientemente distantes uns dos outros, de m
a não ter havido possibilidade de comunicação recente ent
eles. 'As semelhanças resultantes de ascendência comum
mais difíceis de serem reconhecidos; mas se os outros fat
E MBORA o meio físico da terra firme amazônica se carac- forem iguais, grupos que falam línguas não-aparentadas t
terize pelo elevado índice pluvial, temperatura quente e solo menor probabilidade de partilhar da mesma origem do que aqu ..
empobrecido, nenhum desses fatores se manifesta, uniforme- les com laços lingüísticos entre si.
mente, em toda a área. As diferenças regionais no tocante à º~i~cogrupos setecionados como exemplo de adapt
formação geológica, altitude, topografia, precipitação e flora afe- à terra firme parecem preencher os requisitos de origem in
tam o caráter do solo. A chuva varia em intensidade, freqüência pendente e isolamento recíproco. Os Kayapó e os Kamayurü
e distribuição mensal não só de uma região da Amazônia para vivem perto da orla sudeste da floresta tropical (Fig. 6), r ..
outra mas, também, dentro da mesma região, de um ano para gião esta marcada por uma estação seca que dura cerca de tr
outro. Nem todos os vegetais e animais aproveitam, da mesma meses por ano. Os Kayapó, que falam a língua Je, são h i-
forma, essas diferentes condições e a seleção natural, através tantesda floresta, vivendo principalmente da caça e da col t ,
de milênios, favoreceu sempre as espécies que conseguiram enquanto que -os Kamayurá.são.agricultores e pescadores, vi-
se adaptar melhor. Conseqüentemente, embora a flora e a fauna vem nas margens do r!..~e~falam uma língua pertencent
sejam parecidas em toda a terra firme, importantes diferenças família Tupi-Guarani. -Os Sirionó, que habitam as planíci p
regionais existem quanto à acessibilidade e à abundância das riodicamente inundadas da Bolívia oriental, também falam um
espécies que as compõem. língua Tupi mas diferem muito dos Kamayurá no seu mod I
vida. A margem ocidental da terra firme, onde as chuva
Se a adaptação é um determinante da cultura, então as
pesadamente o ano inteiro, é o habitat dos Jívaro; vivem, b ..
culturas aborígenes deveriam refletir, de dois modos, essa situa-
tudo, de caça e plantas cultivadas e sua língua não tem p
ção ambiental. Primeiro, deveria haver um padrão geral de cul-
t sco próximo com outras línguas. Os Waiwai, de língua ri,
tura em toda a floresta tropical em resposta às características
h bitantes do nordeste da Amazônia, onde as chuvas tamb Jl
gerais de clima e solo que definem a região como um todo.
o constantes durante todo o ano) seguem um padrão d u
Segundo, deveria haver variações locais quanto à subsistência,
i tência semelhante ao dos Jívaro, dando mais imp rt n i ,
tamanho da área ocupada e outras características culturais que r m, às dif rentes colheitas básicas.
se correlacionam com as diferenças locais no tocante à presença
e à abundância meios de subsistência, iv rs fator dificultam a t r f
r liz d p r inc ulturar .
70
ponto a concentração e o tamanho da população pré-colombia-
na foram atingidos pelo contato europeu. Os grupos que toma-
mos como exemplo foram desfalcados; assim sendo, este declínio
recente de população deve ser levado em conta quando se avalia
o papel exercido por determinadas práticas culturais. Um com-
portamento que pareça prejudicial à sobrevivência do grupo
hoje em dia poderia ter sido positivo para a adaptação, no pe-
ríodo pré-europeu, quando as doenças e outros controles bioló-
gicos, que afetavam o tamanho e a densidade da população,
eram menos rigorosos.
Além do declínio da população, a maior parte dos grupos
da terra firme experimentou certo grau de aculturação resultan-
te dos contatos com elementos da civilização européia. Exis-
tem; felizmente, descrições etnográficas bem completas para os
grupos de nossa amostra no momento em que os efeitos desse
contato eram ainda superficiais. Mercadorias européias, tais
como facas, armas de fogo, contas de vidro e espelhos foram
acrescentadas ao inventário da cultura material sem, todavia,
afetar, de forma sensível, a arte e o artesanato indígenas. Ado-
taram-se algumas novas plantas comestíveis, como a banana e
a cana-de-açúcar, sem que, entretanto, viessem elas a substituir
os alimentos básicos dos indígenas.' A alteração mais importante
residiu na diminuição de intensidade dos embates guerreiros,
devido em parte ao declínio populacional e conseqüente dete-
rioração geral da cultura e, ainda, à política de supressão em- Fig. 6. Localização das cinco tribos selecionadas para ilustrar
preendida pelos governos nacionais. adaptação cultural ao meio-ambiente da terra firme em rela to
ao regime pluvial. A precipitação anual excede de 3.000mm nll
Com a abstração das inovações pós-européias, é possível margens oriental e ocidental da área e de 2.00Omm nos outro:
descrever, em linhas gerais, o modo de vida aborígene dos K,a.:- lugares, excetuando-se uma faixa estreita oblíqua através do b I-()
mayurá, !ÍYaro, Kay.ap-º., Sirionó e ~iwai de forma a incluir Amazonas e costeando o limite meridional da Bacia. A linha ur I
as principais informações sobre a alimentação, padrão de po- define os limites da Amazônia.
voamento e ocupação do solo, cultura material, organização
social, ciclo de vida, práticas religiosas e relações com grupos nante a leitura do presente esboço, por outro, permitirá qu
vizinhos. A análise e a comparação de tais características deve- atenção seja focalizada nos elementos culturais mais im
riam revelar as diferenças de padrão que se atribuem às variá- tantes.
veis ambientais. Para facilitar a comparação, as descrições se- A descrição de uma cultura, como a descrição de um
guem um esquema uniforme e afastam-se o mínimo possível pécíe animal, fornece os detalhes que caracterizam d t rmin
dos fatos essenciais. Se, por um lado, a supressão de muitos upo e o dístíngu m de outro grupos melhant. m
pormenores "humanos" interessantes possa tornar menos fasei- 1 bilidad um r qui it p r a d pt o ndíc qu
72 7
se encontram em eonstante mudança, todas as especies e todas a cultura total sempre que se analisa a adaptação. Sup rfi I
as culturas apresentam variações maiores ou menores, através mente, poder-se-ia supor, previamente, que a atenção s J f -
do tempo e do espaço. Descrições de tipos comprovam a varia- nasse aos aspectos que se relacionam, de maneira direta, c
ção numa série de generalizações ou regras. Como todas as meio-ambiente, tais como, o tipo de povoamento, a cultura
regras, algumas são invioláveis e outras tendem a ser desobe- terial e a subsistência. Uma análise mais profunda, entr t nt ,
decidas. Entre as últimas, estão as que se referem à divisão revela que o tempo consumido na aquisição e no processam nt
sexual do trabalho, pois que a doença, ausência ou a morte de dos diferentes alimentos, sua relativa importância na alim 11-
um cônjuge Impõem, com freqüência, ao homem ou à mulher tação, se as tarefas são executadas por homens ou por mulher
uma posição em que há necessidade de executar uma tarefa ou pelos dois sexos conjuntamente, e outros aspectos do c
normalmente destinada ao sexo oposto. As normas do matri- portamento de subsistência, têm repercussão na cultura c m
mônio são mais rígidas mas, mesmo assim, lapsos ocasionais um todo. Quer a análise comece com as práticas religiosas, qu
podem ser"permitidos se, por acaso, a pessoa não consiga arran- com a organização social ou outro setor de um complexo 1~
jar um companheiro para se tornar membro integrante da socie- tural, a explicação do conteúdo e do papel dos elementos 11
dade. Toda cultura, entretanto, tem certas áreas em que os des- causa revelarão, inevitavelmente, relações funcionais com outr
vios são punidos corn a morte; isso significa que a maleabilidade categorias de comportamento passíveis de adaptação. Emb I.
ameaçaria a integridade do sistema; não" podendo, conseqüente- possivelmente, alguns traços culturais sejam, no fundo, arbltr -
mente, ser tolerada. Na Amazônia, tendem a concentrar-se nas rios e, portanto, neutros quanto à adaptabilidade, nossa evid -
. práticas rituais que são terminantemente interditadas a mulheres cia não é suficientemente ampla para confirmar tal julgam nt .
e meninos não-ínicíados. O adultério também pode merecer a Antes de concluir que um traço não tem significação adapt -
pena de morte. tiva, cumpriria lembrarmo-nos da advertência de George O y-
As descrições de culturas e as descrições biológicas têm lord Simpson: "O julgamento humano é notoriamente passív
outro defeito em comum: na organização dos dados, ambas de erros, ainda mais talvez quando se decide que uma d t
recorrem a categorias arbitrárias. Os animais são descritos em minada característica não importa para a adaptação, apenas r-
termos de reprodução, locomoção, respiração, metabolismo e que não conhecemos sua utilidade. " (1955, p. 166.)
outros sistemas componentes; as culturas, por sua vez, são frag-
mentadas em padrões de povoamento, organização social, reli- Nas páginas que se seguem, as culturas dos Kamayurá,
gião e assim por diante. Em ambos os casos, importa lembrar Jívaro, dos Kayapó, dosSirionó e dos Waiwai foram díssecadas
que tais categorias descritivas não são sistemas independentes. e estudadas. Poderemos, assim, comparar suas estrutura
Não somente se completam e se reforçam mutuamente mas, vermos onde estão as semelhanças, onde se encontram as
muitas vezes, as mesmas estruturas são encontradas em mais renças e qual é a natureza destas diferenças. A análise de me-
de"um sistema. Tanto os animais, como as culturas, são organis- lhanças e diferenças no contexto do meio-ambiente da t r
mo altamente" integrados, nos quais algumas partes dominam firme indicará algumas das inter-relações complexas que ar -
sobre as outras mas nos 'quais todas as partes devem ser com- terizam a ecologia cultural.
patíveis, caso o organismo, quer biológico, quer cultural, deva
sobreviver.
A integração explica o fato de ser necessário considerar
74 7
.•------~===~~=-~-=-=======--------:1"""'=-------~--

OS KAMAYURÁ próximas vão se tornando improdutivas. A um pouco m no


de meio quilômetro, vê-se a floresta virgem.
Localização e meio-ambiente - A aproximadamente 12° de As casas comunais, cobertas de sapê, têm os lados par
latitude sul, cinco rios importantes reúnem-se para formar o lelos e as extremidades arredondadas (Fig, 7). Os tamanh
Xingu. Entre esse ponto e a descida do planalto brasileiro, a variam de 17 por 9 metros a 20 por 10 metros, enquanto
cerca de 2° mais além em direção ao sul, não passam de riachos cumeeira atinge cerca de 6 metros. Dois grandes postes sust n-
vagarosos, com ribanceiras baixas e extensas várzeas. Planaltos tam as extremidades da cumeeira e outros quatro menores, colo-
de arenito, com arbustos raquíticos e escassos, delimitam esta cados a, aproximadamente, 70 centímetros um do outro, f r-
parte da bacia do Xingu ao sul e a leste, servindo de barreira mam o arcabouço de uma parede vertical com perto de 2.5m d
ecológica à expansão das tribos que aí vivem. Entre os meses altura. Estacas menores, que vão da cumeeira até uma vi a
de novembro e abril, registra-se uma precipitação em torno de horizontal ao longo da parte superior da parede, sustentam
1.800mm, quando a média mensal atinge 200 a 300mm. Em teto que é feito com palha enrolada por cima de varas fina
contraste, junho, julho e agosto registram menos de 25mm por amarrada à estrutura, de baixo para cima, em fileiras sobr -
mês. Há grande abundância de veados, antas, capivaras, lon- postas. Deixa-se uma entrada no meio de cada lado. No tempo
tras, caititus, macacos e outros mamíferos menores, e os rios frio, ou durante as tempestades, ou quando tocam as flaut
são extraordinariamente ricos em peixes e tartarugas. Aí tam- sagradas, a entrada é fechada com uma porta feita de tolh
bém se encontra grande variedade de pássaros. _ de palmeira. Durante a estação seca, pedaços da cobertura s
Nos últimos anos, a bacia superior do Xingu foi ocupada temporariamente removidos do teto, para deixar entrar a luz.
por onze tribos, com uma população total de somente 750 habi- Cada maloca é ocupada por diversas famílias nuclear
tantes. Seis dessas tribos são do grupo lingüístico Karib, duas aparentadas, cujas redes são armadas dos postes para as par d
do Aruak, duas do Tupi-Guarani e uma tribo fala uma língua (Fig. 7). A rede do marido é armada acima da rede da mulh r
isolada (Trumai). Contam-se 110 Kamayurá, do grupo Tupi- e esta mantém o fogo aceso durante toda a noite para aqu c .
Guarani, com igual representação de homens e mulheres. O bebê dorme com a mãe. As crianças mais velhas armam u
redes perto dos pais. Uma maloca comunal tem espaço p
Padrão de povoamento - Toda a tribo Kamayurá está reunida cinco a oito redes em cada extremidade, ou para 10 a 16 p •
em uma única aldeia situada à margem de um dos pequenos soas quando há uma rede armada em cima da outra. Os obj to
tributários do baixo Kuluene (Fig. 6). A aldeia encontra-se no p ssoais são guardados perto da rede do dono. As flecha o
alto, a cerca de 200 metros da orla da várzea; na estação nfiadas na palha da cobertura, enquanto que os cestos cont ndo
da seca, o leito do rio fica aproximadamente a: um quilômetro o adornos e as cabaças com o óleo de piqui são pendurad
de distância. Seis grandes malocas estão dispostas em forma de a vigas. O centro da maloca é uma área comum a todo
círculo com 100m de diâmetro. No centro, só existe uma nos dias de mau tempo, é usada pelas mulheres para trat r
pequena construção retangular que abriga as flautas sagradas. m ndioca e cozinhar os alimentos. Os objetos domé tico o.
Atrás das malocas, ficam os jiraus provisórios onde secam os alím ntos, incluindo cestas com bolos de mandioca, tub r ul
bolos de mandioca. Em volta da aldeia, são feitas as roças que o , mandioca e peix s co moqu ados ão guard dos (10 lon
avançam, progressivamente, à proporção que as terras mais da p r d .
7 77
Vestuário e adornos - Tanto os homens como as mulher
andam nus, tendo apenas uma corda fina ao redor da cintura,
Na parte dianteira central, as mulheres acrescentam um pequeno
uluri triangular, feito de uma folha especial, dobrada. Ambo
os sexos usam, por vezes, faixas de algodão abaixo do joelh .
Entre os enfeites usados tipicamente pelos homens estão pequ ..
nos brincos circulares, uma faixa de algodão na parte superior
do braço e uma volta de discos de conchas ao redor da cintura.
As mulheres usam colares de contas semelhantes. Por ocasi
das festas ou cerimônias, acrescentam enfeites de penas, sai
e capas de palmeiras e enrolam os tornozelos com enviras d
casca de árvores. O urucu, tinta vermelha tirada de uma plant ,
é usado na decoração do corpo.

Subsistência - Os Kamayurá são agricultores e as roças


REDE propriedades individuais, embora a preparação do terreno p r
FOGO.
o plantio seja feita em comum pelos homens da casa. O cort
das árvores é feito entre junho e agosto, de modo que a qu i
e o plantio 'possam sei' programados para o período que prec d
O 2 4M as primeiras chuvas que começam em fins de setembro (Fi. ).
Antes da queima, os galhos são cortados e empilhados na orl
do roçado, para serem usados, como uma reserva, no fogo d -
méstico. A terra é cavada, formando pequenos montes de apr -
ximadamente um metro de diâmetro, separados entre i
uma distância de 1.50 a 2 metros e nove a dez muda
mandioca são enfiadas em cada monte. Uma vez termin d
plantação, oferece-se aos três espíritos protetores da m nd
uma tigela de batata-doce amassada, A batata-doce é pl nt
entre os outeiros de mandioca, ao lado da roça mais pró m
da aldeia. O milho e o amendoim são plantados por último.
As ervas daninhas são arrancadas antes de dezembro, qu n..
do a plantação já "pegou" e começa a colheita do píquí,
pés de piqui, que produzem uma fruta grande, oleosa, ti
Fig, 7. Planta do terreno e vista lateral de uma casa cornunal Ka-
mangaba, que são uma fruta semelhante ao abrícõ, o pl 1 t
mayurá ocupada por diversas famílias nucleares aparentadas. As redes do ao r dor da ld ia. omo ó frutificam d poi d d
ficam suspensas entre os postes da cumeeira e as paredes das duas qui z n , a p du o co r 1m nt, u nd h I •
extremidades, deixando o centro livre para as atividades dornéstic .

7
O fOiO (X) fica aceso durante a noite, debaixo das redes, para aquecer. 7
tantes estão em tempo de abandonar a aldeia. Entre outros
produtos não-alimentícios, plantam algodão, tabaco, urucu e
cabaça. As mulheres plantam e colhem o algodão e ajudam na
colheita do piqui, da batata-doce e do milho. Qualquer outro
trabalho agrícola é feito pelo homem.
O alimento básico, de consumo diário durante todo o ano,
é o beiju e, por conseguinte, o preparo da mandioca é uma
tarefa contínua. Como envolve três etapas principais, três mu-
lheres geralmente trabalham juntas. Uma descasca os tubérculos
com um raspador feito de conchas e os coloca numa panela
com água. A segunda rala a mandioca descascada, enquanto a
terceira vai colocando a polpa numa esteirinha que, torcida,
deixa que o suco e a goma em suspensão passem através de
uma peneira e caiam num recipiente de barro. Quando todo o
suco venenoso é expelido, a polpa é amassada em forma de
bolo e colocada numa bandeja trançada para secar. Depois de
secar durante diversos dias, está pronta para ser usada ou para
ser guardada. O veneno pode também ser eliminado deixando-
se simplesmente secar as raízes descascadas antes de ralá-Ias,
operação esta que é deixada para quando a mandioca for usada.
Todos os derivados da mandioca durante o seu tratamento
são aproveitados. O suco é fervido durante horas a fio, para
eliminar o venenoso ácido prússico volátil, depois do que é be-
bido, ou feito sopa, acrescentando-se peixe e batata-doce. Antes
de ser fervido, deixa-se a goma assentar, para ser extraída. Faz-
se o beiju, pulverizando-se num pilão os bolos de polpa ralada.
A farinha assim obtida é então peneirada, misturada com um
ESTAC;ÃO

FORA DA
CHUVOSA

ALDEIA
-
••••
AL IMENTAÇÃO

ALIMENTAÇÃO

USO
BÁSICA

SECUNOÁRIA

ESPORÁDICO

pouco de goma e espalhada sobre uma assadeira circular, chata,


formando uma panqueca grande e redonda, conhecida como
beiju que freqüentemente se come recheada de peixe cosido.
Durante o mês de dezembro, o fruto do piqui assume um
lugar importante na alimentação (Fig. 8). Depois de descasca-
do, o fruto é fervido até que a polpa se separa dos caroços. O
óleo sobe à superfície, é escumado e guardado em cabaças. De-
pois de frio, as sementes são reiradas e postas para secar. A
o 1011
polpa é passada por uma p neira e pode ser comida im d t-
mente ou enrolada em folhas e: guardada dentro dágua ond tip d cestos; esculpem colheres, prato,
se conserva meses a fio. ipi ntes feitos de cabaça. Os tamboretes d
Embora haja bastante caça, só os pássaros são geralmente m ntos musicais, principalmente as flautas, ão t m I
comidos. Os pássaros são também capturados vivos e criados p 10 homens. As mulheres fiam e tecem o algod o, tr n I
por causa de suas penas. Os macacos e gatos selvagens são ca- fio de fibra de buriti e tecem redes. Ambos os s xo nu
çados pelos ossos os quais se destinam à fabricação de pontas turam colares e pentes, além de apanharem a lenha, r m
para as flechas. As plantas comestíveis silvestres quase não fa- carregarem fardos.
zem parte da dieta alimentar, mas as castanhas da palmeira A principal arma é um .arco de aproximadament d i J •
bocaiúva, o coco babão e o palmito são comidos na estação tros de comprimento. Quatro homem se especializaram n
própria. Duas espécies de formigas são consideradas iguarias fecção dos arcos que são fornecidos aos demais. A fI
especiais; num dos casos, comem a cabeça e, no outro, as lar- têm cerca de 1.50m de comprimento e consistem de uma v 11' I
vas. O sal ê obtido queimando uma planta do pantanal. de taboca, um remate de madeira-de-lei e uma ponta f it
O peixe é um alimento básico. São tão abundantes nos pinha de arraia, de osso do braço de macaco ou da t I
lagos que, em meio dia de pesca, dois homens armados de arco d anta ou onça. Para caçar anta ou onça usam uma I h
e flechas podem encher uma canoa a ponto de fazê-Ia soçobrar. com ponta feita de uma lasca de taboca. Estas arm tõrn
Uma dessas pescarias rendeu 80 peixes de vinte espécies dife- r nde eficácia numa distância de aproximadamente 30 m tr .
rentes. Barragens e armadilhas são também usadas e represas Outras ocupações especializadas são: a construção d
são construídas de modo a formarem lagunas de águas paradas noas, a tecelagem de redes, a confecção de certos adorno I
que são envenenadas pela imersão de cipós esmagados contendo onchas e o xamanismo. Com exceção da confecção d r d
rotenone que entorpece ou mata os peixes. Há diversos tabus todas as outras são atividades masculinas. O homem t rn
relacionados com os peixes. Por exemplo, não podem ser cozi- amã durante uma doença grave, uma fatalidade que C nt
nhados, comidos ou mesmo tocados por uma mulher mens- al uma vez na vida de qualquer um. A iniciação se dá dur nt
truada. tratamento. O pai do paciente, ou outro velho, fuma t r
De agosto até fins de setembro, quando as águas estão bai- m transe; nesse momento, ele pode retirar o objeto qu I1t ou
xas, as tartarugas surgem para a desova nas extensas praias de n corpo e causou a doença. A natureza do objeto id nti j '"
areia do alto Xingu. As famílias dos Kamayurá acampam, mui- o spírito que estará a serviço do novo xamã, toda a v z n
tas vezes, durante diversas semanas, nas margens do rio, viven- qu for convocado mediante a fumaça do tabaco. O ini i 1 I )
do de tartaruga e ovos. P lta- imediatamente a fazer curas simples com a ajuda
ti u a i tente sobrenatural. Uma doença grave, entr t int
Outras atividades - Os Kamayurá têm uma divisão bem defi- r 'lu r tratam nto por diferentes xamãs, assim tamb )
nida das tarefas segundo o sexo e manifestam, também, uma r tos !lp Iats, pois acredita-se que ela resulta de feitiço. 1 u-
especialização ocupacional incipiente. Os homens fabricam obje- I1t I vid l d um xamã, 1 pode adquirir os pod r d utro
tos para serem usados nas-atividades de subsistência, tais como p rit nuxili r .
arcos e flechas, canoas, remos, armadilhas para peixes e outros
()r 'li 11I Irt o , '/cll- b
82
R
ciais dos Kamayurá. Até o nascimento do primeiro filho, o casal está para nascer. Embora as crianças sejam muito bem-viu I •
reside na casa da mãe, depois do que se muda para a casa do pode ser feito um aborto no caso da última criança n
pa.i do m.a~ido. Pr~d?mina a monogamia embora a poligamia ainda estar mamando. O parto ocorre em público, em c 1 ,

seja permitida e múltiplas esposas são, muitas vezes, irmãs. Por durante um mês, o pai permanece dentro de casa. Enqu
morte do marido, seu irmão assume a responsabilidade pela ele se encontra assim em reclusão, os parentes se encare
viúva, permitindo que continue a viver na mesma casa. Como de fornecer comida para a família. Se a criança tem al
o parentesco é classificatório, o homem tem liberdade de deixar defeito, se nascem gêmeos, ou se a criança anterior ainda stl-
a casa de se? ir~ão de sangue para ir viver em outra, perten- ver sendo amamentada, então se pratica o infanticídio. A cri n-
cente a um irmao de classe, se achar que tem mais afinidade ça nascida de uma mulher solteira também é eliminada.
com ele. O homem que organizou o trabalho para a construção A criança é raramente separada da mãe antes de ser d •.
da casa comunal assume o papel de chefe do conjunto da casa. mamada, o que ocorre entre os três e quatro, anos de idad : At
Por ocasião de sua morte, o conselho da aldeia escolhe o su- completar seis anos, a criança tem liberdade de dormir, com
cessor entre seus filhos ou irmãos mais novos. A casa constitui e brincar quando e onde quiser mas é vigiada constantem nt
uma unidade de trabalho cooperativo para o cultivo das roças, pelos irmãos mais velhos ou pelos adultos. Os meninos de I
a pesca, o processamento da mandioca e outras atividades. Seus de seis anos começam a praticar o tiro com miniaturas de ar o
membros também fazem visitas juntos. e flechas e podem acompanhar os parentes masculinos mai v ..
;\- aldeia é governada por um conselho composto do chefe lhos nas expedições de pesca. As meninas começam um Pu)
da tnbo, dos chefes das famílias e de outros' homens experientes mais tarde a ajudar nas tarefas domésticas, tais como carr
que se reúnem todas as noites ao redor de uma fogueira, no água, tratar a mandioca e tomar conta dos irmãos m nor
meio da praça. O chefe da tribo é escolhido pelos membros do Também ajudam a cuidar da roça e aprender a dançar. At
conselho, entre os parentes masculinos do último chefe, com puberdade, ambos os sexos ficam sob os cuidados das mãe u
base em seus conhecimentos dos costumes e rituais sua habili- os castigam quando desobedecem ou faltam ao respeito r
. '
dade como árbitro nas disputas e competência como xamã. com os mais velhos.
Além de executar as decisões tomadas durante a reunião , as Na puberdade, quando uma criança adquire habilidad 11
responsabilidades do chefe incluem a organização das atividades atividades dos adultos, ele ou ela entra num período de ti it
, da comunidade, tais como o preparo do roçado, o envenena- disciplina e treinamento formal, o que ajuda a marcar a trnn i
mento dos peixes, o comércio, a mudança para um novo local ção entre uma infância despreocupada e as sérias, re p ru I
e a recepção aos visitantes das outras tribos. Durante as guer- bilidades da vida de adulto. Com a primeira menstru ,
ras, ele não desempenha o papel de chefe. Sua posição lhe menina é enclausurada em casa, por três ou quatro mese, tr
confere respeito mas não o livra das obrigações normais dos de uma paliçada, onde passa o tempo fiando, tecendo r
outros homens nem' lhe dá ganhos materiais, em forma de tri- bendo as visitas das mulheres mais velhas que lhe ensin
buto. Somente por ocasião da morte, sua posição extraordiná- médios para abortar, o que fazer durante a gravidez
ria é reconhecida, através de ritos fúnebres especiais. tratar seu futuro marido. Os meninos são enclausurado , i li 1-
m nt , quando atingem os catorze anos e se ocupam m f 'I.
Ciclo de vida -' Durante a gravidez da mulher, os futuros pais rco flechas e outros obj to ,enquanto ão in truíd 1
ob ervam restrições alimentares em benefício da criança que p i 1 h m mai v lh na hi tóri d tribo, n rito
8
4
Fi

e nas crenças, aprendendo a tocar as flautas, a como se com-


\ cova funda, como se fora uma alcova na base, na qual a
portar durante um ataque e, ainda, a importância da continên- fica suspensa entre dois postes. Os parentes próximos cort 1 1
cia e outros aspectos essenciais de seu papel como homem adul- o cabelo, escarificam os braços e se lamentam alto. Depoi d
to. Ambos os sexos são submetidos à escarificação, para aumen- enterro, ficam enclausurados em casa, atrás de um biombo, t
tar a tolerância à dor. A clausura termina em setembro, no a seguinte cerimônia do kwarip.
tempo de cerimônia do kwarip, quando geralmente se realizam
os casamentos. Cerimônias - As festas dos Kamayurá são determinadas pel
Os casamentos são combinados pelos pais enquanto as ciclo do calendário e como os membros de outras tribos par-
crianças ainda são pequenas. Os primos cruzados, verdadeiros ou ticipam das principais cerimônias, elas oferecem oportunidad
classifícatórios, são preferidos. Ocorrem, entretanto, casamentos para transações comerciais, competições esportivas, visitas e f •
intertribais com os prisioneiros ou quando não há um consorte tins, ao mesmo tempo em que o ritual é observado. Os doi
adequado dentro da tribo. Embora ao estrangeiro seja dada grandes festivais são o ciclo de dança de kwarip, no com
uma posição de parentesco, os filhos são considerados somente da estação chuvosa, em setembro, e o cerimonial do iawari, n
meio-Kamayurá. Nove das quarenta mulheres adultas e seis princípio da estação seca, em fins de abril. Há alguma diferenç
dos quarenta e um homens adultos da população Kamayurá, em nesses dois rituais.
1949, provinham de outras tribos; cinco das mulheres e dois dos O cerimonial kwarip, que dura diversos dias, começa c
homens tinham sido prisioneiros. Diversas mulheres da tribo uma reconstituição simbólica do mito sobre a origem da trib .
Waurá haviam sido escolhidas devido aos seus conhecimentos Acredita-se que esta representação anual é essencial para a p r-
de cerâmica. A cerimônia do casamento consiste no casal cortar
o cabelo um do outro, que tinha crescido durante o período de petuação do grupo. Coino expressão concreta do seu significad ,
reclusão. O casamento não liberta o homem do domínio pater- o início do kwarip ocasiona a libertação de meninos e menin .
no. Pelo contrário, os filhos temem a ira do pai durante toda da reclusão a que foram submetidos no período da puberdad
a vida e obedecem a seus desejos. O adultério não é conside- e a celebração dos casamentos que tinham sido combinados h
rado um crime sério; manda o costume, porém, que o cônjuge muito tempo. Danças especiais favorecem o crescimento d
pecador seja espancado. Tanto os homens, como as' mulheres, plantas e o início das chuvas anuais; outras reverenciam C p
adquirem prestígio cumprindo suas obrigações alegre e compe- ritos específicos das árvores.
tentemente e desempenhando, com habilidade, as tarefas que O iawari é um festival secular e é sempre assistido r
lhes forem designadas. Os homens, entretanto, adquirem reno- uma das tribos vizinhas. O acontecimento principal é uma' c m·
me, não pela habilidade na pesca ou no cultivo das roças, mas p tição entre os homens das duas tribos, na qual os m mbr
sim tornando-se campeões de Iuta corporal (huka-huka) ou d uma equipe procuram golpear seus oponentes, nas p rn s
de lançamento de dardos nos jogos competitivos. m dardos de extremidades rombudas arremessados por r-
Os Kamayurá acreditam que a morte possa vir como re- pulsores. A luta corporal é uma outra forma de comp ti
sultado de acidente ou feitiço, mas a causa principal seria a O jovens treinam para essas ocasiões e observam r tri
deserção dos espíritos. O morto é enrolado numa rede e enter- illm ntares e sexuais antes de cada competi ão, AR
rado na praça da aldeia. A posição do corpo depende da idade r' li do jogo ..•o trit m nt ob rvada o indívídu
e da situação social do indivíduo. Para um chefe, cava-se uma torn m d tríb d ui r nd pr tí i .
8 7
quantidades de alimentos são preparadas para a festa que se como estão sujeitos a se quebrarem, há necessidade de um for
segue e, também, para presentear os visitantes antes de sua necimento relativamente certo desses artigos. As flautas, usad
partida. Quanto mais farta for a comida maior será a reputação em muitas cerimônias, são obtidas dos Mehináku, cabend
do anfitrião. outras tribos a especialização em colares de conchas e em
Duas cerimônias de duração mais curta incentivam a abun- noas. Os Kamayurá são os melhores fabricantes de arco .•,
dância de dois alimentos básicos. Homens, mulheres e crianças troca intertribal baseia-se numa escala de valores reconhecid
participam de uma dança em homenagem ao espírito do piqui, na qual, por exemplo, um colar de conchas de caracol vale dois
que se realiza em dezembro, enquanto a tribo está acampada arcos. Os alimentos também são permutados mas têm uma co.
na antiga aldeia onde se faz a colheita. No início da estação tação muito baixa entre os valores relativos da escala. Um
seca, em abril, os homens, usando máscaras, realizam uma sé- tribo, Aweti, especializou-se em comércio. Seus membros via-
rie de danças que têm por fim garantir abundância de peixes jam de aldeia em aldeia, trocando produtos e obtendo arti
durante os meses seguintes. As mulheres e as crianças são ex- de origem européia para serem comerciados com outras trib
cluídas e devem permanecer fechadas dentro de casa.
Guerra - Os Kamayurá vivem pacificamente com as outr
Comércio - A existência de especialistas na manufatura de tribos da bacia do alto Xingu, embora as relações entre el
certos artigos de uma aldeia fez surgir uma espécie de mercado, não sejam desprovidas de tensões. A despeito do contínuo
fato este que ocorre sempre que um grupo acumula um exce- mércio intertribal, das competições esportivas e da. particípaç
dente de mercadorias para a troca. À noite, na praça da aldeia, conjunta nas cerimônias, as emoções existem e observa-se um
é feito o anúncio e, na manhã seguinte, os objetos são dispostos rigorosa etiqueta durante as visitas. Os visitantes nunca pernoi-
de modo a que possam ser inspecionados pelos compradores tam na aldeia do anfitrião. Acampam perto e se retiram 1
em potencial. Quando alguém vê algo que deseja, vai à casa que é possível. Os laços de parentesco que resultam dos cas ...•
escolher um objeto ou objetos para permutar, objetos esses que mentos intertribais, assim como as competições atléticas, SOr-
são colocados em frente ao item de sua escolha. Se o vendedor vem como válvula de escape para dissipar as tensões que, d
concordar, o negócio é fechado. Não discutem nem regateiam. modo contrário, explodiriam em violência.
Se um membro de outra família tem algo para "pôr no mer- Um estado de permanente hostilidade existe entre os
cado", tem a liberdade de colocar o objeto na fileira do ven- mayurá e as tribos que vivem fora da bacia do Xingu. Incurs
dedor. esporádicas ocorrem para aprisionar mulheres e para vingar
O comércio entre aldeias segue as mesmas normas acima, mortes resultantes do último ataque verificado. Os prisioneiro
ocorrendo, geralmente, durante a estação chuvosa quando, en- são adotados. Embora seja difícil julgar a extensão das guerra",
tão, os rios possibilitam a comunicação direta entre as aldeias. travadas antes do contato com o europeu, parecem ter sido me-
A maior parte das tribos do alto. Xingu tornou-se especialista nos intensas do que as que ocorrem entre os Jívaro e as outr
em certos artigos. Toda a cerâmica usada pelos Kamayurá, por tribos da bacia ocidental do Atnazonas.
exemplo, é feita pelas mulheres Waurá; como os utensílios de
cerâmica são essenciais para o processamento da mandioca e magia - Juntamente com o sol, a lua c outros cllJ-
do piqui, assim como para a preparação de outros alimentos e sua cultura, o Criador deu espíritos aos Kamayurá,
s são vistos e ouvtdos somente pelos xnmi-ls que o
8
Os Jívaro ocupam uma área de cerca de 65.000 quil J 1 •
descrevem como anões, pássaros, insetos ou animais. Vivem tros quadrados, limitada a oeste pela encosta das montanh ,
na floresta e no ar e se dedicam a preservar a saúde da tribo a le~te pelo Rio Pastaza e, ao sul, pelo Rio Marafion (Fig. ).
dos Kamayurá e a favorecer o crescimento das plantas e dos Partilham da mesma cultura e falam a mesma língua ma n
animais para a subsistência desses indígenas. Os espíritos po- têm unidade social ou política. Pelo contrário, persistem, r
derosos, que podem ser invocados quando se precisa de auxí- ·os grupos locais, intensas rixas e guerras, apesar das tentativ
lio, também habitam cinco classes de objetos sagrados: duas ~e ~a~ificação recentes e os esforços empreendidos pelos mi -
das flautas sagradas, um chocalho feito de uma cabaça espe- sionanos. Calcula-se que a sua população atual seja de p rt
cial, um zunidor e uma máscara de madeira. Todos são con- de 20.000 pessoas, com o número de mulheres superando o do
servados na casa das flautas, quando não estão em uso, e nunca homens, na proporção de duas para cada homem. ,
devem ser vistos pelas mulheres. A personificação dos espíritos Padrão de povoamento - A aldeia Jívaro consiste de uma úni-
e a representação cerimonial dos mitos tribais são necessários ca maloca comunal, ocupada por uma família extensa e patrí-
para a perpetuação da ordem econômica e social dos Kamayurá. linear. É localizada em lugar fácil de ser defendido, como s j ,
O feitiço não é causado pelos espíritos; estes nunca são um morro, uma curva do rio ou, se o terreno for mais íngr -
representados como sendo malignos. Ao contrário, o mal acon- me, uma saliência rochosa. Embora de fácil acesso a um p -
tece porque um objeto estranho entrou no corpo e é comba- queno rio, a casa é construída a alguma distância da marg m,
tido com a remoção desse objeto, por intermédio de sucção ou para diminuir a possibilidade de ser vista por algum viandant .
pelo fumo do tabaco. O tabaco tem um espírito poderoso, capaz Os caminhos de acesso são bem disfarçados e providos de
de invocar outros espíritos em auxílio ao xamã. Mesmo não madilhas e arapucas, desencorajando, assim, os visitante in-
sendo praticada pelos Kamayurá, a feitiçaria é muito temida. cômodos.
Este perigo latente produz uma corrente subjacente de tensão A maloca tem de quinze a trinta metros de comprim nt ,
nas suas relações com as outras tribos. com os lados retos e as extremidades arredondadas (Fig. ) .
As paredes são solidamente construídas com estacas verticai ,
perto uma da outra, e o teto é de sapê. Uma porta alta
OS JlVARO treita em cada extremidade é firmemente fechada à noite c
tábuas. O interior é dividido em duas metades, uma mas uli
Localização e meio-ambiente - A floresta de chuvas tropicais e outra feminina, mas não há nenhuma separação formal nt
atinge seu limite ocidental nas encostas baixas dos Andes, numa elas. Jiraus de aproximadamente 1.20m de comprim nt
elevação de aproximadamente 1.500 metros. As chuvas chegam 1.50m de largura são construídos ao longo da parede, na
a uma média anual de 2.000 a 2.600mm e, embora os totais dos homens, a uma altura de trinta a quarenta centímetro de
mensais variem, é raro um mês receber menos de 150mm. hão e servem de leitos. A elevação nos cantos continua at
Inúmeros cursos d'água jorram das montanhas e juntam-se para uma altura de cerca de dois metros, onde, então, um out
formar rios que se alargam ao penetrarem na planície. A com- [lrau é erguido para servir de armazém. Uma barra horizont 1,
binação de umidade e calor produz uma vegetação luxuriante I vint ou trinta centímetros da extremidade, serve com d .•
que, por sua vez, favorece uma rica fauna terrestre. Nas cor- 11 o para os pés; embaixo, acende-se o fogo nas noit fri 1 •
rentes rápidas dos penhascos da área ocidental, os peixes são A I n, arabatana ,o t r outros obj to d r .•
rar mas se tornam numerosos logo que a corrente se acalma.
o
priedade dos homens são dispostos ao longo das paredes, en-
quanto que os objetos menores são guardados em cestas ou ma-
lhas penduradas em ganchos suspensos nas vigas, ou são co-
locados na prateleira acima da cama. Um grande tambor, que
é usado para transmitir os avisos, fica pendurado horizontal-
mente perto da porta.
A parte de moradia destinada às mulheres tem um arranjo
semelhante. As camas-jirau que se alinham junto das paredes
são mais compridas do que as dos homens, eliminando, assim,
a necessidade de um descanso para os pés. Têm também pa-
redes laterais e uma cortina mima extremidade para dar um
pouco mais de reclusão. Os fogos para cozinhar alimentos fi-
cam perto da entrada. Como todos os fogões dos Jívaro, eles
são alimentados por três achas de lenha que são empurradas
mais para dentro, à proporção em que vão sendo consumida .
Utensílios de cerâmica, de diversos tamanhos, cabaças de água
FOGO e tigelas, assim como outros objetos de uso doméstico, ficam n
chao ou são guardados em prateleiras suspensas. Amarrados a
O 2 4M
pé de cada cama, ficam dois ou mais cachorros.
Um recenseamento recente realizado em dezessete casa
Jívaro demonstrou que elas são formadas de três a cinco h -
mens .casados, de quatro a dezoito mulheres casadas e de i
a trinta e duas crianças pré-adolescentes. O número de p -
soas em cada casa oscilava entre quinze e quarenta e seis.

Vestuário e adornos - A peça principal do vestuário é um


daço retangular de pano de algodão com que os hom n
enrolam da cintura até abaixo do joelho. As mulheres cri r JJ
um tipo de vestido com um retângulo maior que passa pelo
po, a borda superior por baixo do braço esquerdo e prend nd
acima do ombro direito. Quando amarram um cinto de rd
Fig. 9. Planta do terreno e vista lateral de uma casa comunal dos n cintura, a saia chega até os joelhos. Os adornos típicos ín..
Jívaro, habitada .por uma família extensa patrilocal, Os ho,?ens ocupam lu m uma tira de pele para a cabeça, penas e cordas d I
a metade da direita, ficando para as mulheres e as crianças meno-
res a metade do lado esquerdo, cada qual com sua entrada .própria. Os d ; colares, argolas para o pescoço e outros enfeite f it
jiraus que servem de cama aos homens t~m um d.escanso para os pés,
ficando o fogo aceso durante toda a noite, debaiXO das camas, para
I I m nt ,c n ha , dente, o d pás aros, etc., tub I
aquecer. As camas das mulheres são mais compridas e cercad~s, I?rote- h u nf it d m p n h. d tuc n nu n br 11\"
gendo-Ihes a intimidade. Os fogões para cozinhar, com Ires lições,
2 upam o centro do aíojamento das mulheres.
cas que são enfiadas através de perfurações feitas nos lobos D J
das orelhas. As mulheres usam um pequeno tembetá de bambu
no lábio inferior. Tinta vermelha e preta e tatuagem facial são
outras formas de adorno.

Subsistência - O alimento básico dos Jívaro é o aipim e, con-


seqüentemente, fazem uma grande roça toda vez que cons-
troem uma nova casa. Quando diminui a produção da primeira
roça ou quando necessitam de mais alimento para uma festa
especial, abrem, então, um ou mais roçados na floresta adja-
cente. Os homens se encarregam de cortar e queimar a vege-
tação, enquanto que o plantio, a limpeza das ervas daninhas,
a colheita e a magia das hortas são tarefas que competem às
mulheres, Os homens, entretanto, plantam milho, algodão e
barbasco (veneno de peixe) e observam restrições alimentares
para que as colheitas sejam boas. Além do aipim, os outros ali-
mentos básicos compreendem a pupunha, a batata-doce, a abó-
bora, .o mamão' e o amendoim (Fig, 10). Recentemente, acres-
centaram bananas (pacova e outras espécies) e cana-de-açúcar.
Entre outras culturas importantes de caráter não-alimentício
estão o fumo, o urucu (corante) e diversos narcóticos.
Ao terminar o plantio da mandioca, faz-se uma festa que
dura cinco noites; nessa ocasião, as mulheres da casa cantam
e dançam para incentivar as culturas e protegê-Ias. Magias, en-
cantamentos e restrições dietéticas têm a mesma finalidade, so-
bretudo quando partem das mulheres pois, segundo os Jívaro, J
-_---1.__ - J
elas se relacionam, de forma especial, com as plantas.
A maioria das mulheres vai diariamente à roça cuidar das ESTAÇAO CHUVOSA ALIMENTAGÃO BÁSICA
plantações e colher os alimentos. Outra atividade permanente
FORA OA ALDEIA ALIMENTAÇÃO SECUNOÁRIA
e' incansável das mulheres é a de fazer do aipim uma bebida
- - - USO SPORÁOICO
fermentada da qual vários litros são consumidos, diariamente,
pelos adultos. Ferve-se o tubérculo até amolecer. Amassa-se,
então, metade da quantidade e o restante, depois de mastigado, íclo anual de subsistência dos Jívaro. Peixe, caça, Iplm
é cuspido dentro de uma tigela. A mistura das duas partes lem- con tituem o alimentos básicos durante t do mo. A
bra a consistência de um pirão de batata e fica descansando milho imp rt nt ~ durant ai un m . Utlliz un
nt allm nt Ilv tr .
94
durante um dia até fermentar. Antes de ser consumida, colo- munitária. Fora disso, a pesca é domínio exclusivo dos hom n
cam-se dois punhados do produto numa cabaça com água, o e dos meninos.
que facilita a remoção da fibra mais grossa quando ela sobe à Os alimentos de coleta ocupam uma parte relativ m nt
superfície. Faz-se uma bebida fermentada semelhante com o
fruto da pupunheira. As folhas do aipim são também cozidas
1 pouco importante na dieta dos Jívaro. O palmito é o p i i
vegetal silvestre consumido, via de regra, durante as vi I
e comidas como verduras. ou, então, quando se observam tabus alimentares. Como un
A combinação de três fatores - relativa abundância de tribos do noroeste amazônico, os Jívaro comem grande qu ntl-
caça, paladar onívoro e grande habilidade dos caçadores - asse- dade de insetos. A formiga vermelha é muito apreciada, 111

gura aos Jívaro um suprimento constante de carne. Um ou mais também a larva branca do besouro da pupunheira cujo '8
homens caçam diariamente e o conhecimento profundo que têm já foi comparado ao da salsicha de porco temperada com n 'I.
do meio físico e dos hábitos da fauna, ligado a uma variedade moscada. O ovo de tartaruga é igualmente uma iguaria muíu
de métodos empregados, incluindo a imitação das vozes dos apreciada e corrente na estação própria. A floresta fornece, ln.•
animais, o uso de iscas e armadilhas, bem como a habilidade da, fibras, madeiras, resinas e outras matérias-primas p r
com que manejam a sarabatana e as lanças, produzem, geral- manufatura da maior parte dos artigos que compõem a cultu r
mente, bons resultados no prazo de duas horas. Quando des- material, além de servirem para remédios e o preparo d u
cobrem o rastro de um bando de caititus, organizam. uma caça- tâncias mágicas.
da coletiva e a carne obtida é dividida entre o grupo. Os ca-
chorros são criados e adestrados para a caça e uma das prin- Outras atividades - No tocante às atividades manufatur i
cipais festas dos Jívaro transcorre quando o cachorro atinge o predomina a divisão sexual do trabalho. Os homens ex cut •
seu desenvolvimento completo. Durante o acontecimento, que todas as tarefas ligadas à madeira, isto é, construção de c sn
tem a duração de três dias, praticam a magia para que o animal camas e teares; canoas, remos, tambores, flechas, sarabat n ,
seja dotado de força, resistência e olfato agudo. Os cachorros dardos, estacas para cavar e escudos. Também fazem t
são obrigados a observar certos tabus referentes à comida de fiam e tecem o algodão e fabricam os adornos que usam. A
modo a ativar sua eficiência como caçadores e preservar sua mulheres possuem afinidade especial com a terra e, eon J
saúde e bem-estar. ,t mente, são-lhes atribuídas as tarefas relacionadas com 8 terra,
Os Jívaro não comem veado nem anta, devido às quali- incluindo a agricultura, a cerâmica e a tintura do algodão.
dades sobrenaturais desses bichos, mas consomem todas as -lhes fazer grande parte do trabalho caseiro, ou seja, cozinh ,
outras espécies de caça e pássaros, incluindo macaco, preguiça, pr parar as bebidas, cuidar das crianças e dos cachorro,
capivara, cotia, tamanduá, jacaré e aves, mesmos as menores. r ar água e fardos. Os homens acendem o fogo e traz m
Também não comem cobras, animais e aves de rapina, urubus h de lenha já que ambas as tarefas ligam-se à mad ir .
e pássaros noturnos. As mulheres não caçam nunca; podem, po- O único especialista é o xamã. Sua principal funç
rém, acompanhar os maridos, ajudando a carregar a caça. urar as doenças mas, através do controle que ex rc
Dependendo das circunstâncias, vários são os métodos usa- () mundo dos espíritos, pode influenciar ri tempo, prov r
dos na pesca: mergulhar e pegar o peixe com as mãos, arpão, ort u a doença, identificar o culpado num ca o d m rt .
anzol, armadilhas, rede e veneno. O último é uma atividade co- q ir u conh cim nto por m i d um pr n iad
kk um pr tic nt i nt . f tr 111 m
96 7
deve seguir rigorosos tabus alimentares e sexuais, do contrário
será punido com a morte. A posição do xamã é, de certa forma,
prejudicada pelo fato de que todos os homens e todas as mu-
lheres em idade adequada, quer sejam praticantes quer não,
possuem poderes especiais sobre o mundo dos espíritos e, por-
tanto, a xamã tira pouco proveito material da posição que ocupa.
Já que os Jívaro consideram a morte de qualquer adulto como
um atentado às leis da natureza, pelo qual a feitiçaria é res-
ponsável, e, como todos os xamãs são feiticeiros, convertem-se
no alvo principal de vinganças sanguinárias.

Organização social - Embora os ocupantes de uma casa Jí-


varo formem uma aldeia econômica e politicamente indepen-
dente, eles fazem parte de um grupo social maior, composto de
aproximadamente meia dúzia de casas ocupadas por famílias
aparentadas, espalhadas numa área de cerca de quinze quilô-
metros, ao longo das duas margens de um pequeno rio
(Fig. 11).
A comunidade local não tem chefe, salvo em tempo de guerra,
quando um é eleito entre os participantes. Os membros das
.Fig. 11. Distribuição geográfica de três comunidades Jívaro m tr n
diferentes casas se visitam quase diariamente e participam das do a tendência. para o agrupamento de cinco ou seis casas' ao I n o
festas por ocasião das cerimônias. A família individual é exó- ~e um rio. ~ses grupos de casas abrigam famílias aparentada on
gama e o grupo local é, via de regra, endógamo. Os laços de títuern o maior agrupamento social básico da sociedade Jívar A
parentesco, no entanto, não eliminam o perigo da feitiçaria, de relações entre os membros dos. diferentes grupos são tipícament . ho
ti (Segundo Danielsen, 1949, Mapa lI).
modo que um encontro fortuito na floresta, ou mesmo uma vi-
sita social, podem ser uma ameaça em potencial. Os visitantes,
portanto, anunciam sua chegada, a uma certa distância, por meio mútuo entre ele e suas mulheres que são essenciais pa ljU
de um assovio, e a visita começa com uma troca de cumprimen- dá-lo a atingir sua posição e decisivas para o bem-estar d l r
tos estereotipados entre o visitante e o anfitrião, que dura qua- m lia. As mulheres são importantes, não somente devido \11
se meia hora e durante a qual a tensão é dissipada; só então ntribuição palpável mas, também, por suas influência hr
começa a interação social normal. As relações de hostilidade n turaís:
latente ou ativa predominam com outras comunidades locais, '.'Somente ~ mulher pode agir sobre o espírito fcmlnin d
até mesmo as que distam menos de trinta quilômetros. 111 n1 ca de modo a obter uma produção abundant . ult
O chefe permanente mais importante da sociedade Jívaro v rd pelo homem, daria uma produção muito p qu n . (I
é o homem, o cabeça da família. Embora seu poder seja teori- () uldad d mulh r qu o porco a av r. m n
c m nte absoluto, há uma atmosfera de cooperação e respeito ror 111m d num f r j r pr lJl I

8
ducação ministrada p r uma mãe prudente e habilid , I1 li pul
filhos não se tornarão homens de valor e nem as filhas virã f '" m ," II
ser mães de família inteligentes. O homem que não possuir uma utril . ti n
boa mulher, convenientemente iniciada durante a 'festa das fjU I
mulheres', não somente se achará privado das necessidades da fundar sua própria casa. As mulher d um m . m
vida como também verá sua casa arruinada, apesar de todos os ã ,freqüentemente, irmãs, mas nem sempr. mb r
bens, roças e animais, que tenha tido antes." (Karsten, 1935, íer nças de idade entre a primeira e última mulh r ,
p. 256.) grandes, elas se dão bem, dividem o trabalho cntr )
aparentam sentir ciúmes nem animosidade.
Ciclo de vida - Embora métodos contraceptivos e abortivos As pessoas idosas gozam de alta consideração qu r p
sejam conhecidos, raramente são usados pois que as - crianças maneçam fisicamente capazes de trabalhar, quer não. d
de ambos os sexos são desejadas. A partir de um determinado grandes festas devem ser conduzidas por um velho ou um
momento da gravidez, até que a criança pare de mamar, os pais lha, garantindo, assim, o bom êxito dos rituais. f. m rt
observam vários tabus alimentares e outras restrições, inclusive acontecimento triste, no qual a dor pelo morto se mistura
a continência sexual. Praticam o infanticídio, caso a criança a hostilidade para com a pessoa responsável por a1. uela u ri .
4
nasça defeituosa ou se o pai for de uma outra tribo, mas não. As mulheres cortam os cabelos e se abstêm de pintar s fi
matam os gêmeos. Para incentivar a força espiritual da criança, ou de usar adornos. Se o morto é o chefe da família, o c pu
a mãe faz resguardo em casa, durante três dias após o parto. é colocado num tronco oco, juntamente com certos obj t S
O pai permanece inativo durante oito dias, tendo o cuidado es- soais, e suspenso numa das vigas da casa, depois do qu a
pecial- de não caçar nem usar machete durante esse período. As é abandonada. Outros adultos são enterrados embaixo do h ,
crianças pequenas gozam de grande liberdade mas, quando se
da casa ou nas proximidades. Os objetos de sua propri di·
aproximam dos sete anos, começam a aprender as tarefas dos
que- não estejam intimamente associados com o morto, tai c 111
adultos. Os meninos acompanham os pais à caça e à guerra
a sua melhor tanga, a sarabatana e as lanças extras, sã h •
e são incitados freqüentemente a alimentar o ódio para com
dados pelos filhos, ou, no caso de uma mulher, pelas filh s,
os inimigos e a sede de vingança. Não participam das lutas até
atingirem a maturidade mas se acostumam com o derrama- As mulheres do morto passam a ser da responsabilidad I
irmão do falecido.
mento de sangue, a dor G a morte violenta.
N a puberdade, tanto os meninos quanto as meninas são
Cerimônias - Os Jívaro fazem grandes festas em cinco
submetidos a restrições especiais no tocante à alimentação e
siões: para os meninos, na puberdade; para as meninas, qu n-
outras atividades. A festa de iniciação dos meninos, que ocorre
do se casam; para os cachorros, quando termina o seu ad tra-
quando completam quinze anos, é um acontecimento que d~ra
mento; para os guerreiros, quando trazem a cabeça do inimi ;
cinco dias e ao Qual comparecem membros das outras aldeias.
e para as criancinhas. Os membros de aldeias vizinhas são c n-
Daí em diante, o-menino passa a residir no lado da casa desti-
vidados a participar das cerimônias, dos banquetes e da dan us,
nado aos homens e o casamento se realiza pouco tempo de-
o que dura de cinco a seis dias. Esses rituais confer m f r a
pois. As meninas casam-se, muitas vezes, ainda mais cedo mar,
vida longa aos homenageados e, ainda, asseguram b as sarn s,
100 101
Inuitacaça e sucesso m todos os aspectos da vida, das ativi- I' ulr d pr v w I I di. J ut nv () li
dades de subsistência às relações domésticas. A festa que n- co rir po i' O do C mpo d bat lh
Cerrao período das cerimônias e das restrições que se seguem qu p m t r sido adotada p 1 ini
à captura de uma cabeça requer uma longa preparação, envol- da partida, uma dança guerreira.
vendoo plantio de novas roças ea aquisição de grandes quan- O objetivo da guerra é o de aniquilar toda
~idadesde carne e peixe para a alimentação dos participantes; inimigo. Homens, crianças e mulheres idosas 6.0
Incluitambém a confecção de utensílios de cerâmica, tambore- enquanto que os mais jovens são poupados, no ca o n
tese outros objetos para serem usados pelos convidados. O ho- rem procurado se defender. A casa e tudo o que n Ia
lUemque não cumprir a obrigação de realizar uma dessas ce- contra são queimados, os cachorros são mortos, a roç
rimôniasna ocasião propícia perderá o prestígio e porá, ainda, sada. As cabeças dos adultos que não são aparentados c
emrisco o bem-estar de sua família, incorrendo no desagrado nhum membro do grupo guerreiro vencedor são levada
dosespíritos. troféus depois do que os vencedores se retiram, tão rápido q
to possível. Quando se sentem a salvo de perseguiçõ ,
Comércio - O estado permanente de inimizade mútua entre troem um abrigo temporário e iniciam a redução das caUOI,;UII,
as subtribos dos Jívaro não impede o comércio. Alguns objetos, processo este que requer cerca de vinte horas. O grupo, nt )
como o' sal e a palmeira usada na confecção das flechas não volta à casa onde se celebra a vitória.
sào encontrados em todos os lugares da região. Outros artigos
de comércio são as sarabatanas, o veneno para as flechas, os Religião e magia - Os Jívaro visualizam o mundo c nt ndo
P;quenos tambores e os cães de caça. Em tempos recentes, os espíritos que habitam as pessoas, os animais, as planta
Jlvaro obtinham porcos, galinhas, machados, facas, espingar- acidentes geográficos marcantes, tais como, montes, corr d ir
elas,munição e panos de seus vizinhos civilizados, em troca de e vulcões, e até mesmo certos objetos feitos pelo homem. ..s.
~al,carne de veado e sarabatanas. O comércio é feito em base espíritos podem passar de uma "casa" para outra e os p íto
lll.dividuale uma pessoa que viaja através do território inimigo, das criaturas humanas entram, muitas vezes, em certos anim I
numa missão comercial, corre o risco de se tornar alvo de vin- principalmente o veado e a anta. Os espíritos podem tarnb 11\
gança sanguinária. existir em formas destituídas de corpos. A grande maiori I l.
espíritos é má ou, pelo menos, potencialmente perigosa c hCl nc
9lterra - A abertura de hostilidades pode ser determinada por cessidade de ter cuidado para que não se desperte o seu li".
i~meros incidentes, tais como mortes sucessivas, indicativas de As almas dos xamãs feiticeiros e dos inimigos mortos m JlI-
eltiçaria, o rapto de uma mulher ou o assassinato de um mem- bate ou por vingança são particularmente poderosas mall
~:o do grupo durante sua passagem por território estrangeiro.
~o enviadas mensagens aos homens das aldeias vizinhas, con-
nas. Felizmente, têm medo de barulhos altos de modo qu , p I
espantá-los, basta gritar, chocalhar com os escudos e fazer utro:
vIdando-os a participar. O grupo elege um chefe que exerce tipos de ruídos. A madeira da pupunheira é, também, uma r
g~ande autoridade sobre a organização e a estratégia da expedi- de protetora.
Çélo e é obedecido pelos participantes. As preparações incluem Além do espírito do mundo, há duas outras import nt
aQivinhações para saber qual a hora mais propícia para o ataque divindades: a Mãe-Terra e seu marido. Uma ou outra in-
102 10
vocada em vários estágios do cultivo das roças, através de en- em torno de 5.000 habitantes. Como as aldeias tendem 1
cantamentos, com o fito de ter a sua intercessão na maturação lizar-se longe dos rios principais, onde seriam mais facih I t
das culturas. A Mãe-Terra é particularmente importante por- encontradas, é bem possível que o total seja bastante m i I,
que aparece às mulheres que estão sob a influência de um nar- Em 1954, foi descoberta uma nova aldeia com mais de 500 h •
cótico e as instrui sobre os cuidados que devem ser dispen- bitantes, numa floresta distante quarenta quilômetros da m -
sados às plantas e aos animais. Foi ela que ensinou a agricultura gem esquerda do Xingu. A partir do contato com os europ u
às mulheres. e em grau crescente no decorrer do presente século, os Kay P
Os Jívaro atribuem a morte de um adulto à feitiçaria pela foram severamente dizimados, não só devido a doenças m I
qual alguém deve ser responsabilizado. O xamã invoca seus também, em conseqüência de encontros hostis com os col t r
contatos sobrenaturais para identificar o culpado que, freqüen- de castanha e seringueiros. Aldeias inteiras foram arrasad
temente, vem a ser outro xamã. O culpado pode ter sido até outras ficaram tão reduzidas em tamanho que muitas in titu -
mesmo amigo ou parente do falecido. Sem levar isso em conta, ções sociais importantes chegaram a desaparecer. Um recen
os filhos e irmãos da vítima são obrigados a matar o culpado. mento feito em dois grupos acusou uma pequena predomin n 1
Se isto é impraticável, pode-se substituir o executor por um pa- de mulheres.
rente próximo, homem ou mulher. Estas vinganças sanguiná-
rias são assuntos pessoais e não envolvem a tomada de uma Padrão de povoamento - Os Kayapó alternam uma vid I
cabeça ou a celebração de uma festa da vitória. aldeia, durante a estação chuvosa, com uma existência nôm I ,
durante os meses secos do ano. O tamanho da comunid d
variável e se torna difícil obter cifras fidedignas para os t m
OS KAYAPÚ aborígenes. Tudo indica, porém, que a média normal d v t
sido entre 200 e 700 habitantes, embora se saiba que a p pu
Localização e meio-ambiente - A região situada entre os rios lação de algumas aldeias tenha atingido mais de 1.000 pes
Araguaia e médio Xingu é formada de lagos cercados de flo- Durante a estação seca, toda a comunidade pode mudar- rn
restas e de correntes dágua entremeados por faixas de campos, conjunto ou dividir-se em grupos menores, deixando o fr
sinal da penetração dos planaltos áridos que delimitam a parte e os doentes na aldeia, sob o cuidado de parentes. Par c
sudeste da bacia amazônica. A média pluvial anual de 1.800mm haver nenhum território bem definido ou qualquer inform
tem uma distribuição que varia segundo a estação. Durante os specífica sobre a distância que separa as aldeias. Como I .•
meses de junho, julho e agosto, há pouca precipitação. A caça locam para distâncias de três a cinco dias de viagem da 1 i i
é abundante e a coleta é rica de recursos, sendo a castanha um como raramente encontram, por acaso, outros grupo, t ,/
dos principais produtos da floresta. di tâncias devem ser bem grandes.
Os Kayapó do norte, residentes nesta área (Fig. 6), re- Durante a fase nômade, o grupo segue uma rotina b m 1
presentam um grupo de subtribos que falam uma língua Je e finida. Levantam acampamento de madrugada a m r h p
participam de uma cultura similar mas vivem em estado de um n vo 1 cal, ' dua ou trê hor d di tân 1, n ab ',I I
hostilidade recíproca. Em 1897, estendiam-se por uma área de I I u rr ir . ln t 1 m um n v rnp nt Jll I ou (
100.000 quilômetros quadrados, com uma população estimada t I m tin \ n a um t Ir f ífi r, ti
I 4 10
) VI
N
acordo com o sexo e a id de. As malocas são construída II
mulheres e dispostas de modo a reproduzir o plano da ald i .
As atividades diárias diferem muito pouco daquelas da aldeia.
;'AAO
A aldeia que, por um período indefinido, pode servir como l I ($CADO AN I

base de operações situa-se num lugar bem seco, perto de um


pequeno rio, servindo este, ao mesmo tempo, como fonte de
Ó CASA DO CHEFE

água e local para banhos. Um determinado número de casas


comunais são construídas ao redor de uma praça, em forma de
círculo, e daí saem as veredas que conduzem às margens do
O
PARA A FLORESTA
O
rio, às roças e à floresta (Fig. 12). Se o grupo é grande, cons- •...--- PARA ~
troem-se dois círculos concêntricos de casas. No meio da praça, O RIO
ou em uma das extremidades, situa-se a casa dos homens. E
esta a única construção pública, além do fomo comum, que
serve como centro de reunião das mulheres. O O
As casas são retangulares, tendo em média oito metros de
comprimento por quatro de largura. A parede vertical tem cerca
de dois metros de altura e a cumeeira outro tanto. O arcabouço U O
de vigas e estacas é revestido de. sapê, com exceção da parede
face à praça, a qual fica apenas parcialmente tapada pela sa- <::>
liência do teto de palha. Há uma porta em uma ou duas das PARA O
10°
outras paredes, facilitando o acesso ao interior. A casa dos ho-
mens e a casa do chefe são semelhantes às comuns, embora
maiores.
ROÇADO
:/ CASA DOS HOMENS
Fig. 12. Planta de uma aldeia Kayapó. As casas cornunais, cada uma
As habitações não têm divisões ou características perma- ocupada por uma família extensa rnatrilocal, são dispostas ao redor
da praça. Os caminhos conduzem a quatro direções: ao rio, aos roça-
nentes, exceto os fogos para cozinhar, um para cada área ocupa- dos e à mata (segundo Frikel, 1968, Fig, 2).
da pela família nuclear. Os Kayapó não usam redes. Dormem OS sexos usam trajes especiais, penas e enteites de cabeça,
em cima de folhas de palmeira recém-cortadas, esteiras ou, em lares e outros adornos. Os homens também enfeitam os lábio ,
alguns casos, em camas baixas do tipo jirau. Os utensílios do-
mésticos, os objetos pessoais e adornos das mulheres são pen- Subsistência - Até recentemente, os Kayapó dependiam m
durados nas paredes ou nas vigas. de alimentos silvestres do que de produtos cultivados (Fig, 13).
Primitivamente, as culturas básicas eram o milho e a batat -
Vestuário e adornos - Nenhum dos dois sexos usa qualquer doce, seguidas do aipim e do inhame. Plantam, ainda, o algod ,
espécie de roupa, fora das ocasiões festivas, a não ser alguns o tabaco e o urucu. Diante das pressões restritivas em decor-
enfeites. Pintam desenhos pretos por todo o corpo das crianças; rência da invasão européia, ampliaram-se as roças e novos pr
estas também usam adornos. Durante as danças e festas, ambos dutos -. tais como o arroz, o açúcar e a mandioca - pass r
a ser adorados.
106 107
A c colha do local para a abertura de um novo ro d
feita pelo chefe, após ouvir as sugestões do conselho noturn .
A limpeza do terreno é realizada pelos homens e pelos meni-
nos, antes do término da estação seca para que tenham tempo
de secar e queimar os ramos. O terreno é dividido em lotes para
cada família, competindo a plantação e a limpeza de ervas aos
grupos de família nuclear. Os produtos básicos são colhidos
pelas mulheres. Nos dois primeiros anos, plantam milho e aipim.
No terceiro, substituem esse cultivo pela batata-doce e, como
esta planta continua a produzir durante anos a fio, sua área de
cultivo é relativamente grande.
O prato tradicional dos Kayapó é uma espécie de broa
feita de massa de milho, aipim ou batata-doce, algumas vezes
entremeada com pedaços de castanha-do-pará, carne ou peixe.
A mistura assim obtida é enrolada em folhas de bananeira e
assada em forno subterrâneo coberta com pedras quentes e
limo. Cozinham, da mesma maneira, fatias de carne e palmito.
Peixe, espigas de milho e batata-doce são, entretanto, assados
no fogo. Algumas frutas são amassadas e misturadas com água.
A castanha-do-pará é comida crua ou ralada, de modo a pro-
duzir uma bebida leitosa. Não preparam bebidas ou alimentos
fermen'tados.
A caça é -tanto um esporte como uma atividade de subsis-
tência e os homens são peritos em seguir a .pista e imitar os
sons dos animais e das aves. O chefe de uma família pode sair ~ ESTAÇÃO CHUVOSA _ ALIMENTAÇÃO BÁSICA

para caçar sozinho, durante vários dias, mas, em geral, alguns FORA DA ALDEIA ALIMENTAÇÃO SECUNDÁRIO

parentes masculinos, homens. e meninos, reúnem-se para estas USO ESPORÁDICO

expedições. As caçadas coletivas são organizadas para obter


caititu e anta e, também, quando os índios necessitam de uma
grande quantidade de carne para uma festa. Antes da caçada,
para que os cachorros se tornem mais agressivos, são eles esca- Fig. 13. Ciclo anual de subsistência dos Kayapó. Caça, tartaru8
rificados na cabeça e nas costas com garras de onça e alimen- terrestres (cágados) e batata-doce constituem os alimentos b ic s du-
rante todo o ano, enquanto que a castanha-do-pará e o milho o
tados com carne. Enquanto, porém, vivem na aldeia, os cães os alimentos fundamentais em certos meses do ano. Durante a e ta
devem procurar seu próprio alimento entre os restos jogados seca - de julho a setembro -, a aldeia é aband nada, xc to p !
doentes e incapacitados, e a população se divido em bl\nd d f mílln
fora. O arco e a flecha são usados para caçar aves e para ferir, extensas que percorrem a mata, vivendo do pelxe, J'I lmíto, 1\ t nh
do-pará e frutos silve tre .
108 IÜe
r duzindo a v locidad d utra caças mas a arma tradici n 1 m i I rt d
é a borduna. Os animais de menor porte são divididos entre m s n I1 t d arti utilizado
os parentes, sendo uma parte enviada ao chefe e à mãe ou à nica o produzidos. Não há r d s, t cid
irmã do caçador. Os animais de maior porte, como o veado, ou remos, e somente poucos instrument mu íc 1 .
a anta e o caititu, são entregues ao chefe que se encarrega de pais manufaturas são cestos, esteiras, arcos fl ch
distribuí-Ios. e adornos. Não existe cerâmica e as mulheres p u'
atividades especializadas, a não ser a fiação de algodão
A ,pesca é. mais importante durante a estação seca, quan-
do as aguas baixam e se tornam mais ricas. A hora e o local fecção de certos adornos feitos com sementes e algodão, ..
para uma expedição de envenenamento de peixes são decididos sam a .maior p~rte do tempo cuidando das crianças, pr p r n
a comida, capmando, coletando alimentos, carregando ~ U l
durante a reunião do conselho dos homens. As tarefas são re-
lenha. ~mbora. as casas da aldeia sejam construídas p 1 h
partidas, de modo a que um grupo de homens fique encarre-
mens, sao as mulheres que constroem o abrigo para o
gado. de cortar os cipós venenosos.. enquanto que o outro cons-
comunal e, geralmente, também as malocas nos acampam nt
trói uma barreira de p.edras através do rio , reduzindo " assim
da estação seca.
a velocidade da correnteza. Os peixes apanhados são pouco
A arma tradicional dos Kayapó é a borduna de m
abundantes e, em muitos rios, este método só pode ser empre-
que é usada na caça, na guerra e nas cerimônias. B d
gado uma vez por ano. O arco e a flecha são empregados na
transversal circular, cilíndrica ou ligeiramente mais lar a nu 11
pesca individual e, só recentemente, começou-se a usar o anzol.
ponta, e mede de 0.50 a 1.60m de comprimento. A b r t 1
Por vezes, as crianças têm de pegar peixes para a alimentação nas menores são usadas na caça e as maiores em outra tlv .•
dos doentes. dades. São manejadas com um movimento rápido e um
Uma das principais fontes de alimento é a coleta na selva, suficiente para produzir um som sibilante. Nos combat o lvo
especialmente durante a estação seca. Aproveitam-se de inúme- é a cabeça do inimigo mas, durante as competições e P rtiv
ras plantas, em grande parte, das palmeiras. O palmito é co- os combat~nt.es visam aos ombros e às partes superior
mido cru ou assado. Outro alimento básico é a castanha-do- braços, desistindo, somente, quando estão por demais exau t ' ,
pará. Embora as castanhas amadureçam no fim do verão, elas Segundo tradições orais, o arco e a flecha foram intr du-
só caem no chão quando o talo enfraquece com as chuvas pe- zidos em época relativamente recente. Os arcos medem c re
sadas. Toda a coleta feita durante a estação seca depende de
subir nas árvores o que constitui uma atividade perigosa e é de dois metros de comprimento; as flechas têm de 1,30 1
reservada aos meninos. As castanhas achadas no chão são re- 1,90m. Na extremidade da vara de bambu, que tem, por v .•
colhidas e levadas para a aldeia, onde são armazenadas para ze~, um acabamento de madeira, é inserida uma ponta de -
uso subseqüente. Pegam, também, cágados que são conserva- de!ra, bambu, osso ou, a partir dos últimos tempos, de m t 1.
dos vivos o tempo necessário. São muito abundantes, poden- N ao usam veneno.
do-se obter cerca de 2.000 por ano, dentro de um raio de pou- A única ocupação especializada é o xamanismo e, num
cas horas da aldeia. população de 200 pessoas, há, às vezes, dois ou três xam .
O xamã é um velho ou uma velha que entrou em comunh
Outras atividades - A divisão do trabalho é mais pronunciada com a alma de um morto, de 'um espírito animal ou d um
no setor artesanal do que nas atividades de subsistência. A monstro sobrenatural. O tratamento corriqueiro d um d

110 11
A aldeia Kayapó tem um ou dois chefes. Quando h
à base de plantas medicinais, pinturas de urucu ou pela fumaça
nas um, ele é escolhido, geralmente, entre os chefes das div
do tabaco, é feito por um parente próximo mas, em casos gra-
associações masculinas, segundo sua inteligência e coragem
-ves, consulta-se o especialista. Acredita-se que a maior parte também, por sua seriedade e taciturnidade. Quando há d
das doenças provém da intromissão de um objeto estranho, por chefes, são eles os líderes das duas associações. O chefe exerce
meio de íeítíçaria; tal objeto deve, portanto, ser retirado por a liderança porque sua experiência e seu bom senso são respel
sucção e os xamãs se especializam no tratamento de diferentes tados mas ele não tem poder para forçar a obediência. Além
tipos de feitiçaria. Alguns têm poderes de devolver a alma des- do prestígio, sua posição é recompensada pelos presentes 'lu
garrada ao corpo do paciente que, caso contrário, estaria con- recebe de porções de caça grande, trazida pelos caçadores,
denado a morrer. O pagamento é feito quer o tratamento seja pela posse de uma casa própria. A ordem na aldeia é mantid
bem sucedido, quer não. por membros da classe dos guerreiros alguns dos quais fi
Organização social - A vida dos Kayapó é regulada não ape- de guarda, durante o dia, na casa dos homens. As decisões
nas pelas obrigações de parentesco como também por diferen- ferentes à comunidade, tais como onde e de que tamanho d
tes tipos de instituições sociais. Todas as pessoas passam por verá ser o próximo roçado, quando deverá ser a expedição d
sete ou oito classes sucessivas, no decorrer da vida, cada qual envenenamento dos peixes ou o início da marcha do verão
ligada a diferentes tipos de privilégios e novas obrigações para guinte, são tomadas à noite quando os homens se reúnem 1\
com a comunidade e os colegas de classe. Entre um e três anos casa que lhes é destinada.
de idade, a criança recebe um dos sete nomes rituais e torna-se A casa dos homens é o centro da vida social masculin ••.
membro de um dos quatro grupos, sendo dois para os meninos Embora os chefes de família passem grande parte do dia com
e dois para as meninas; dessa forma, a criança entra numa nova suas mulheres e filhos, voltam todas as manhãs à casa dos h
relação de parentesco com outros membros do mesmo grupo. mens para saudar o nascer do sol. :f: lá que exercem suas atlvl-
Quando o rapaz passa da classe guerreira para a classe dos pais, dades manufatureiras e os meninos recebem instrução nas habl-
ele ingressa numa das associações masculinas que funcionam lidades artes anais, nos costumes tribais e nas virtudes masculin ••".
como grupos de trabalhos cooperativos e mutuamente comple-
mentares dos projetos da comunidade. Ciclo de vida - A partir da concepção até cerca de dois m
Os indivíduos que compõem uma casa constituem uma fa- ses após o parto, os pais seguem restrições. dietéticas para qu
mília extensa matrilocal, reunindo, normalmente, uma mulher, mulher tenha uma gravidez normal e a criança que vai n
suas filhas casadas e solteiras e os filhos de suas filhas. O chefe ja forte e saudável. Quando o feto começa a mexer-se, o ma
e dono da casa é a mulher mais velha. Embora o menino' deixe ido vai dormir na casa dos homens e só retoma quand
a casa materna aos dez anos de idade para ir passar as noites e riança começa a andar. O parto se realiza em companhi
grande parte dos dias na casa dos homens, seus laços mais es- ntas mais próximas. Imediatamente depois, o recém-nascid
treitos continuam a ser, ao longo de sua vida, com as irmãs. levado pela .avó ou por uma tia do lado paterno, de casa cn
Cabe à irmã pintar o homem para as cerimônias, cuidar dele '''su, para ser apresentado aos moradores. Seu corpo é, então,
em caso· de doença grave, preparar o seu cadáver para ser en- ntado de desenhos vermelhos e pretos, seu cabelo é cortado
terrado. Ela recebe também uma parte especial da 'caça que m franja e faixas são colocadas ao redor de suas pernas. T
ou quatro dias após, as orelhas são furadas e, se for rncnln•.•,
ele pega e dá-lhe refúgio durante as dificuldades conjugais.
11 11~4
também o lábio inferior. Enquanto a sua sobrevivência não es-
tiver assegurada, os membros da família fazem uma dieta rigo- ter, contudo, as responsabilidades de uma família; ocup
rosa. Se nascerem gêmeos ou se a mãe morrer durante ou logo lhor lugar no centro da casa dos homens; toma parte n
depois do parto', é praticado o infanticídio. mônias; passa boa parte do tempo em exercícios físicos, pr
rando-se para a guerra; e desempenha um papel important
A criança permanece constantemente em companhia da
manutenção da disciplina na aldeia e ensinando os menino te-
mãe até a idade de sete anos. f: amamentada até quatro ou
nores a se tornarem, por sua vez, guerreiros. Os rapazes n
cinco anos, mesmo que a mãe tenha tido, nesse ínterim, outro
gostam de abdicar desta posição privilegiada, o que acont
filho. Os pais raramente se irritam com os filhos ou os repreen- quando nasce o seu primeiro filho. As moças também
dem. Aos três anos de idade, o corpo é pintado com apurados forçam por evitar a gravidez o que conseguem através d
desenhos geométricos em cor preta, os quais são retocados ao traceptivos orais e métodos mecânicos de aborto.
fim de dez dias para que se conserve o brilho. Adotam, fre- Os casamentos são arranjados pelos pais, muito ant I
. e, também, crianças de
qüentemente , outras crianças, órfãos criança atingir a puberdade e, às vezes, até mesmo logo ap
pais ainda vivos. Neste caso, a criança é dada a um homem ou o nascimento. Realizam-se, geralmente, quando a menina ,t
a uma mulher com quem se deseja estabelecer laços mais es- entre dez e quinze anos e o rapaz .entre quinze e dezoito. A •
treitos. O pai adotivo torna-se irmão ou irmã do pai verdadeiro nogamia é universal mas as ligações e o adultério são frcqü n-
e educa a criança como se fosse sua. tes, embora este último, caso descoberto, seja motivo par di.
Entre sete e dez anos, os meninos das diferentes famílias vórcio. Inicialmente, o marido continua a passar a maior purt I
brincam juntos e se exercitam com pequenos arcos e flechas.
do tempo na casa dos homens, indo para a residência ,d 'U
f:-Ihes permitido acompanhar os homens nas caçadas e pesca- mulher somente à noite. Até que nasça uma criança, o 1
rias. As meninas dessa mesma idade começam a aprender as matrimoniais são tênues e, facilmente, desfeitos por um ou utrc
tarefas das mulheres, entre as quais está- a arte de pintar o
cônjuge. A moça que tenha fracassado no casamento pod t
corpo, e, gradativamente, assumem o papel de pessoa. adulta. nar-se, temporariamente, amante de guerreiros.
Permanecem na casa de suas mães durante toda a Vida, em
Depois do nascimento da primeira criança do casal, h
companhia das parentas. Os meninos, entretanto" a 'par~ir d~s
mem passa da categoria de guerreiro para a de chefe d r ,
dez anos, passam a viver na casa dos hom~~s e Ia sao mst~l-
dos sobre os costumes tribais, adquirem habilidades artesanaís c mília. A proporção que nascem outros filhos, ele leva mai t 1Jl-
aprendem a caçar e a guerrear. Cada menino fica sob os cuida- po com a família, supervisionando as crianças menore, rr "
j ndo comida e tratando das pequenas doenças. Embora d v
dos de um guerreiro, ao lado de quem dorme e o qual lhe serve
tar na casa dos homens, todas as manhãs, ao raiar d di,
de mestre e modelo das virtudes masculinas, a saber: a cora-
gem, a resistência e a força. f:submetido a provações para que a de sentir-se envergonhado ao ser visto na companhia d
I mulher, durante o dia. Há um regulamento severo n I•
se possa tornar rijo e habituado à dor. Durante esse tempo, a
tld d que os parentes pelo casamento devem se evitar ,
mãe lhe traz os alimentos que ele leva para comer na casa dos
t mt , o Kayap6 não pode nunca casar-se com a írm d
homens.
n ulh r d pois da morte do marido dela.
Aos quinze anos, depois de sua iniciação, o me~ino ent~a
na classe dos guerreiros quando, então, começa o período mais
v lhos e as velha d s mpcnham funçõ
rim nía d inici 0, qu r j m x m ,
emocionante de sua vida. Goza do prestígio dos adultos, sem
d ul 1 p r um p r nt
114
t1
lado na ald ia, durante a c tação seca, caso não possa viajar. m 'r I ht n n dll
Quando um h?m~m sent~ que está prestes a morrer, procura r nt p rí d primitiv. 11II
a casa de sua irma. Depois da morte, a mãe, as irmãs e a viúva facas e outras mercadorias
se lamentam em altos brados e se cortam com facas, às vezes
fatalmente. As viúvas raspam a cabeça e não se casam de novo' Guerras - O Kayapó atinge a condição d adult
nem participam de cerimônias e danças, até que o cabelo tenha pois de ter morto alguém em combate. Con nt m n
voltado a crescer. O corpo do defunto é .preparado para o en- Kayapó têm a reputação de belicosos o qu ' ficou de
terro pelas mulheres da família, enrolado numa esteira e colo- nos últimos tempos, com os ataques que moveram aI c 1
cado na cova, juntamente com diversos objetos de seu uso pes- de castanha e seringueiros. Os membros da classe' rio
soal. Sobre ele, colocam-se esteiras e varas para protegê-lo da reiros estão sempre em estado de alerta na eventualid J d
terra. A não ser que as cerimônias próprias tenham sido obser- qualquer ataque e montam guarda durante a noite. O lndlv li
vadas, a alma voltará para atormentar os parentes vivos. que não pertença à aldeia constitui uma ameaça em pot n i I
Cerimônias -' As cerimônias dos Kayapó exercem duas fun- e a hostilidade é mais intensa para com grupos aparentad I
ções principais: a de comemorar os acontecimentos míticos de que para com as tribos estranhas.
significado tribal e a de iniciar os novos membros nos grupos Os chefes das duas principais associações dos homen
de idade e de nome. Antes de cada festa, os homens e rapazes os dirigentes da guerra e em suas mãos repousa a estr t
vão caçar durante duas ou três semanas , conseguindo " assim Antes de uma expedição, fazem um longo discurso ao u
carne suficiente para os dias seguintes. reiros para reforçar-lhes a coragem e despertar-lhes o ntu i -
Entre as celebrações especiais que se estendem, geralmente, mo. A arma de guerra é a borduna. Não é necessário que t d
por diversos meses há uma dirigida por mulheres em homena- ~a!e~ pois ,o~ que p~r!i~ipam. de um encontro guerreiro p d
gem ao tempo em que foram transformadas em peixe e os ho- ?!vIdI~ a glona da vitória fenndo um inimigo, mesmo s t
ja estiver morto. A aldeia derrotada é queimada e as mulh r
mens ficaram sós e tristonhos. Uma outra comemora a dádiva
do milho aos Kayapó e ajuda a garantir uma boa safra. Em e ?rianças que não fugir~m ne~ ~orreram são ~evadaR pri
certos rituais. como o da purificacão de um guerreiro vitorioso nelf~s. e . adotadas pela tnbo vítonosa, O guerreiro que m t
ou o da iniciação dos rapazes na classe dos guerreiros partici- um mmugo deve se submeter aos ritos de purificação que c
pam apenas os indivíduos diretamente interessados, até a parte preendem restrições dietéticas, reclusão na casa dos hom
final quando, então, toda a aldeia adere. Os membros de outras escarificação no peito, em forma de um grande V, começ n
comunidades não são nunca convidados. nos ombros e terminando no wnbigo.
Embora as cerimônias específicas, danças e trajes, variem
Região e magia - Os Kayapó concebem o mundo cheio
em cada ocasião, as festas terminam geralmente do mesmo mo-
espíritos maus devotados à perseguição dos seres humanos.
do. O final deve coincidir, sempre que possível, com a lua cheia.
tes inimigos invisíveis se dividem em quatro categorias: a 1-
Todos põem 'seus adornos e reúnem-se para uma procissão so-
lene ao pôr do sol. As únicas pessoas dispensadas são o doen- ~as dos mortos, uma espécie de poder inanimado que se pr ..
te e as velhas que lamentam um passado que não mais voltará, jeta segundo a vontade de pessoas ou animais, um monstro d
os que morreram e a mocidade perdida. Os cantos e as danças águas e um pássaro mítico. Todos eles podem causar do n
continuam durante toda a noite, ao luar. . ou morte e o principal meio de proteção é perman c r m
116 117
o grupo. O Kayapó, port nto, vita fi solidão o que, no con- I adr o I 110V am 1110 O. i i n viv 11
texto da vida de aldeia, n o é nada difícil. A cerimônia fúnebr 100 ndív duo u mp m num lu
destina-se a agradar a alma do morto, de modo a diminuir seu 1 t v rio meses, na taç o das chuva , 1
pesar em deixar a' terra dos vivos e sua animosidade para com inco em cinco ou de dez em dez dia n
os que ainda gozam da vida. Tanto a tinta vermelha como a ano, na medida em que rareia a caça em torn . O
fumaça do tabaco dão proteção contra os espíritos e uma vez d m a manter, entre si, uma distância de oito
que as mulheres estão particularmente vulneráveis aos ataques, viagem e embora não ocupem territórios claram nt d fil j i I
são elas, mais do que os homens, que fumam. Somente o xamã vitam-se reciprocamente. Se os membros de um grup
tem o dom de estabelecer relações amistosas com um espírito tram, por acaso, o rastro de outro grupo de caça, r tr
cuja ajuda lhe possibilita extrair objetos que foram introduzidos em direção oposta. O deslocamento é feito a pé p i
no corpo da vítima, através de feitiçaria. rionó não possuem embarcações.
O acampamento da estação chuvosa é situado acim
nível de inundação, onde há pouco mato por limpar. Er u I

OS SIRIONú em uma hora, uma habilitação com cerca de 25m de c mprl-


mento por 8m de largura, com capacidade para abrigar d
Localização e meio-ambiente - Na margem sudoeste da flo- 60 a 80 pessoas. Todos os homens participam do trabalh I

resta tropical, entre o planalto brasileiro e as colinas ao pé dos bendo a cada família construir a parte que será por elaocup .•
Andes, a altitude é de somente 150m. O índice pluvial é de da. Escolhem diversas árvores grandes para servirem de p nt ,
cerca de 2.000mm e a estação chuvosa concentra-se entre outu- de apoio, contra as quais uma estrutura de varas é amarra
bro e maio. A combinação de planície e alta precipitação pro- As paredes consistem de folhas de palmeira, de quase 3m d
duz uma extensa inundação durante meio ano. Mesmo na época comprimento, erguidas de encontro a essa estrutura, de m d
da seca, os rios e os lagos são numerosos. O habitat atual dos a terem uma inclinação para o interior num ângulo de c r
Sirionó é a floresta densa, ao sul do Rio Guaporé, entre 63° e de 60 graus. Como os talos variam em comprimento, a cob r-
65° de longitude oeste (Fig. 6). Mais para o oeste, onde os tura da cumeeira fica incompleta, deixando, assim, buraco atra-
Sirionó viviam anteriormente, a floresta se reduz a manchas, vés dos quais escapa a fumaça e penetra a chuva. Nas n it ,
numa campina coberta de relva. Predominam a flora e a fauna chuvosas, os moradores abandonam suas redes e se agacham
típicas da Amazônia. junto ao fogo, - que fica protegido -, a fim de não se mo-
Os Sirionó, que falam uma língua Tupi, entraram em deca- lharem. Não há portas e a entrada é aberta em qualquer lug r
dência, gradativamente, com a intrusão da civilização, Em 1825, da parede. Uma estrutura semelhante, porém ainda mais frãgil,
sua população foi calculada em menos de 1.000 habitantes. é erguida para os acampamentos onde permanecem uma
Embora alguns tenham sofrido a influência dos missionários ou noite.
se tenham estabelecido em fazendas de plantação e gado, mui- O interior é apinhado de redes que são penduradas numa
tos ainda vivem em condições primitivas. Em 1940, um recen- distância entre elas de cerca de um metro, na largura da habi-
seamento feito em dois grupos apresentou uma proporção de tação. Cada adulto, tem a sua própria rede e as crianças dor-
Um homem para 1.2 mulheres. mem com as mães. A família do chefe ocupa o centro. Entr
cada duas redes há um fogo que serve tanto para cozinhar, com
118 11
p ra aquecer. O bj t ] v o guardados nas cestas
baças que são penduradas no meio dos talos das palmeira o O'.._--r-_--'
utensílios de barro são deixados no chão.
Vestuário e adornos - Nem os homens nem as mulheres usam
roupa. Um colar de semente de pupunha, penas e os caninos
de coatis e macacos são os únicos enfeites comuns. O rosto e,
às vezes, o corpo são friccionados com tinta vermelha e as pe-
nas coladas nos cabelos, nas ocasiões festivas. Tanto os homens,
como as mulheres, usam o cabelo cortado rente.
Subsistência - Os Sirionó são, acima de tudo, caçadores e co-
letores, dependendo, secundariamente, da agricultura e da pesca
(Fig. 14). A maior parte do cultivo das roças é feita no início
da estação chuvosa, embora o plantio possa ocorrer .em qual-
quer época do ano. O marido e a mulher trabalham juntos na
limpeza de um pequeno terreno de aproximadamente 15m2
no qual plantam milho, aipim e batata-doce. Algodão, tabaco,
cabaça e urucu são colheitas não-comestíveis. O único instru-
mento de trabalho é uma vara que serve para cavar. Se alguém
prefere caçar em outro lugar, fará aí uma nova plantação para
ser usada enquanto estiver na vizinhança. Não praticam a se-
gunda limpa nem empregam a magia com o intuito de ter uma
boa colheita.
A atividade masculina mais importante é a caça em que
o homem passa, por vezes, a metade do tempo. Sai de casa
~ ESTAÇÃO CHUVOSA _ ALIMENTAÇÃO eÁSICA
antes do amanhecer, levando o arco e a flecha, sozinho ou acom-
FORA OA ALOEIA ALIMENTAÇÃO SECUNOÁ~IA
panhado de algum parente. Embora chegue a caminhar mais
uso ESPORÁOICO
de 60km e seja perito em rastear e preparar armadilhas para
as aves e os animais, ocorre voltar de mãos vazias. Geralmen-
te, entretanto, consegue um macaco ou uma ave. Os Sirionó
não possuem cães, dificultando, assim, a caça à anta e ao cai-
titu. Com exceção das cobras, nenhum outro animal é consi-
derado não-comestível, Contudo o caçador não deve comer' a Fig. 14. Ciclo anual de subs~stência dos irionó. Caça, cágado: pAI.
carne de um animal morto por ele, do contrário seus seme- mito e fruto de rnotacu constituem os alimentos fundamentais durante
o ano. As principais colheitas a rícolas - rnilh , batata-d ce mn-
lhantes não voltarão para serem caçados. Pata atrair a caça, mão - ocorrem somente durante algun meses. alpim eon umldo
fazem uso de magias as mais diversas. esporadicamente ao long d ano. Alimentam-se, durante fi miar p (.
te do ano, de uma ronde varl dado de frutos, LI tnnh outro 111.
m nto sllvcstrcs. A rogllllll'idlld d I' 1;1111 pluvlnl • nd\l~ o Slrlou
120 a uma vida n 11 d durlllll 11 t ç li d nt 11, 1111Int
11 tR o huvo ti. 1 1
por vezes a um dos sexos ocupar-se com atividades tradi lonn I
A pesca também se faz com o arco e a flecha. Ocorre, mente atribuídas ao outro. Por exemplo, o homem pod f i': I
principalmente, na estação seca, quando os peixes se concen- um cesto para levar a comida à casa, embora esta tar .f j
tram nos lagos reduzidos e riachos, momento em que a água considerada da competência da mulher. Além de construir
é mais transparente e o alvo se torna mais visível. Apenas qua- gos, os homens fazem objetos de madeira, tais como esn "1
tro das espécies potencialmente disponíveis são pescadas. A téc- de cavar fusos arcos, flechas, pilões, mãos-de-pilão e, aind ,
nica mais comum é a de deixar frutas caírem dentro da água os recipientes e' utensílios de cabaça. As mulheres fiam o al ..
e acertar no peixe quando este vem à tona para comer a isca. dão tecem redes, cestas, esteiras, cordas, inclusive a corda p
Desta forma, pega-se até uma dúzia de peixes por dia. o arco e fazem colares, ornamentos de penas, utensílios d
A coleta é, geralmente, feita por grupos de famílias nuclea- râmica e cachimbos. Os trabalhos domésticos, isto é, carr r
res ou extensas. As mulheres e as crianças passam a maior par- água, buscar lenha, cozinhar, secar o fumo e tomar conta
te do tempo nessa atividade mas compete aos homens subir em crianças são tarefas igualmente femininas. Os adultos de m-
árvores, quando necessário. Ao colherem as frutas da estação, bos os sexos levam os fardos mas não cabe aos homens tr 11 -
comem o que podem, antes de encherem os cestos e os leva- portar os pertences das mulheres quando se deslocam de acam-
rem para o acampamento. O palmito é o principal alimento pamento. Não há ocupações especializadas de qualquer pc-
porque pode ser obtido durante .todo o ano. Os cágados são cie; não existem nem mesmo os xamãs.
relativamente abundantes e chegam a pesar quatro quilos, po-
dendo ser capturados vivos para serem comidos mais tarde. Não Organização social - Cada bando é uma unidade independ nt
se alimentam de insetos e comem muito poucas raízes. do ponto-de-vista social, político e econômico. Compõe-s d
Queixam-se muito de fome mas, na verdade, ela não cons- quatro ou cinco famílias extensas matrilineares, cada uma li.
titui uma ameaça séria. Comem quase todos os alimentos no quais, .por sua vez, constituída de três a quatro famílias nu 1 1
dia mesmo em que os obtêm, de modo que a alimentação se res. Os casamentos são leitos, normalmente, dentro do m m
torna muito irregular. Há momentos em que quatro adultos co- grupo. A poligamia é restrita ao chefe do bando e a um ou !
caçadores mais proeminentes e, neste caso, as mulheres são v
mem de uma só vez um caititu pesando 30 quilos. Por outro de regra irmãs. Cada família tem em média dois filhos.
lado, o grupo pode passar de dois a três dias sem comer carne.
O bando é mais coeso durante a estação chuvosa, p ri do
Não fazem qualquer esforço para regularizar o fornecimento de
m que leva uma vida sedentária. A não ser no tocante à c n.·
comida e esta só é procurada quando todos os recursos à mão
trução de, casas, não têm atividades sociais ou econômica qu
se esgotaram. Comem muitas frutas cruas mas cozinham ou ~s-
nvolvam o conjunto da comunidade. A maior unidade coop
sam a carne e os vegetais. O milho é comido assado na espiga
tiva é a família extensa na qual os homens geralmente
ou triturado para ser comido com carne ou feito bolos. Fa.zem
juntos, enquanto as mulheres se reúnem para colher frut I rll-
uma bebida suavemente intoxicante com batata-doce, farmha
de mandioca ou de milho, água e mel, ingredientes esses que v tres. Quando conseguem uma quantidade de alimento sup -
são misturados, cozidos e deixados de molho, durante três dias. ri r à que uma família nuclear pode consumir, é o exc d nt
:B consumida, sobretudo, na estação seca. distribuído entre o grupo maior. A respeito das obriga r ..
I r a d parente co, a p~rtilha e faz,. qua e m~r, d mlt
Outra atividades - Embora certas tarefas sejam desempenha- vont d lim nt corníd condid s p r VIt r s p •
; m princípio, pelos homens e outras pelas mulheres, cab tlid d P r nt .. 1
o chefe do bando não tem autoridade e embora possa su- ticos e escarificam as pernas. Tais normas servem par 1101,
gerir uma caçada ou a direção em que o bando deveria cami- gurar a saúde da criança recém-nascida. No dia após o ~ tu'l I
nhar, não há obrigação de obedecê-Io nem punição por não o as sobrancelhas e o cabelo da testa do recém-nascido r
fazer. Não serve de árbitro nas disputas nem. oficia qualquer
movidos e transformados num colar que é usado pela mã . N<
cerimônia. Mantém o prestígio por ser o melhor caçador, o me-
terceiro ou quarto dia, ritos especiais põem termo às restriço
lhor compositor de canções, o 'melhor bebedor e é recompen-
às atividades dos pais, exceto as relações sexuais que s
sado pela posse de diversas mulheres e da parte central da ha- reiniciarão um mês depois.
bitação onde instala a família. Será sucedido por um filho ou
pelo irmão mais novo, recaindo a escolha no que for melhor As cria~ças pequenas são tratadas com muito carinho p r
caçador. As brigas são resolvidas entre os próprios contendores. ambos os pais e, com exceção da dolorosa depilação das
Espera-se que cada um defenda o seu próprio direito, cumprin- brancelhas e da testa feita de quinze em quinze dias, íazem-I h
do as obrigações que lhe competem. Há geralmente brigas en- as vontades assim que começam a chorar. Só são desmama u.
tre os membros da mesma família, a maior parte sobre a dis- a~s três anos de idade, aproximadamente, e logo depoi d
tribuição dos alimentos. Se a briga envolver membros de fa- seis meses recebem comida pré-mastigada. Depois de d n _
mílias diferentes, os parentes intervêm para apaziguar. As mados, os meninos recebem o seu primeiro arco e as m nin
discussões raramente levam à violência, a não ser em caso de um fuso em miniatura. Aos oito anos, a criança já apr nd u
bebida. Se a hostilidade for muito forte, uma facção pode se a maior parte das tarefas adultas e os meninos começam a ca ir
reunir a outro bando ou, então, separar-se dos parentes indo na companhia dos pais, aperfeiçoando, assim, os seus dons d
fundar um novo bando. O assassinato é raro e dele resulta o rasteador e o conhecimento dos hábitos da caça. Por es t 1)-
banimento do assassino por um período de tempo indefinido. po, a criança já aprendeu também os tabus alimentares n
Jamais se emprega a magia em casos de vingança. sários para evitar as doenças cabendo-lhe a responsabilidad I
observá-los. As atitudes agressivas das crianças são encoraj d l.
Ciclo de vida - Quando a mulher engravida, os futuros pais para que se preparem a defender seus direitos quando f r m
observam várias restrições dietéticas para impedir que a criança adultos.
nasça com defeitos físicos ou que desenvolva traços psicológicos Não se comemora com ritos especiais a puberdade do me-
indesejáveis. O parto é feito em casa, perante as mulheres e as ninos mas as meninas se submetem a uma breve cerimônia I n-
crianças, sendo que nenhuma delas procura ajudar a parturiente. te de se tornarem elegíveis para o casamento. Quando um ru
Se o parto for durante o dia, o pai logo sai de casa, ao início po de meninas se aproxima da puberdade, suas cabeça
das primeiras dores, para ir caçar, pois que a criança receberá ra padas pelos pais e elas são levadas para um lugar ituad
o nome do primeiro animal que for morto. O infanticídio não é p rto de água. Constrói-se um jirau onde as crianças ficam n-
praticado mesmo que a criança nasça com o pé aleijado, o que t d durante dois ou três dias. Nesse ínterim, são banh d
ocorre com muita freqüência. Preferem os meninos mas as 111 truídas sobre as restrições dietéticas que devem s guir at
meninas e mesmo as crianças aleijadas são tratadas com a di do casamento. Voltando à aldeia, as meninas se pr p rum
mesma afeição. p r amento, ao tomarem parte em todas atar f, 1)-
Ambos os pais restringem suas atividades nos três dias que I I Hti 'U. v m b t r- e de reI ções sexuai t qu alio
eguem ao parto; ficam perto das redes, seguem tabus dieté- tJnjH iltur mbr qu I va, via d r ra, um 111 .
124 1
o casamento prcf rid ntre um homem e a filh d
irmão de sua mãe. Cerca de 50 por cento dos casamentos ão
desse tipo. O restante se verifica entre primos cruzados classi-
ficatórios. Irmãos entre si casam-se, muitas vezes, com irmãs
entre si e a segunda mulher de um homem é provavelmente irmã
de sua primeira mulher. Não há cerimônia nem termo de pro-
priedade e o casamento começa quando o marido muda sua
rede da área ocupada por sua família para perto da sua mu-
lher. O divórcio é fácil, embora raro. O adultério não é pu-
nido, a não ser que seja demasiadamente flagrante. Neste caso,
a mulher será repudiada e imediatamente se casará de novo. O
principal meio de um homem adquirir posição de destaque é
tomar-se bom caçador, ter diversas mulheres e muitos filhos.
A mulher ganha prestígio dando à luz a muitos filhos, sendo n ntro daa quaa claras do Rio Tapaj6s (primeiro plano) com as águas brancu do 10
capaz de abastecer a casa e pelo casamento com um bom ca- n ,na margem oposta a Santarém.

çador.
O ritmo de vida é rápido para um Sirionó. Desde criança, 2. Rio Napo, tributário de águas brancas, cujas nascentes se looalizam no altlp no d
começa a contribuir para a busca de alimentos, casa-se logo que Fotopafado ao término da estação seca, quando despontam banco. d I no I 11
atinge a puberdade ou mesmo antes e, aos 30 anos, começa a
perder a força e o vigor. Aos 35, já está velho e principia a
consumir mais alimentos do que os que pode obter. Se estiver
muito fraco ou doente para. seguir o bando, será abandonado,
ficando atrás para morrer. Acredita-se que a doença é causada
por maus espíritos que entram pelo nariz ou pela boca, durante
o sono. Como não há tratamento, a doença provoca grande an-
siedade no indivíduo afetado, que se recolhe à sua rede até que
fique curado ou morra. Em tais circunstâncias, poucos vivem
além dos 35 anos e, conseqüentemente, raro é aquele que vê
o nascimento de um neto.
Quando a. mortese aproxima, o moribundo é retirado de
sua rede e deitado em cima de uma esteira ao redor da qual
se sentam as mulheres da família, chorando e esperando o fim.
Depois de morto, o corpo é enrolado em duas esteiras e coloca-
do num jirau, dentro de casa, juntamente com as cabaças de
água, cachimbos, fogo mas nenhum alimento. Os homens dis-
param flechas através das paredes, em todas as direções, parà
126
espantar os espíritos e, então, a casa é abandonada. Os par
próximos observam luto formal por três dias, durante o
jejuam, escarificam as pernas e se enfeitam com penas.
semana depois, o cônjuge sobrevivente casa de novo e, S
a viúva, terá como marido o irmão do falecido. Depois q
carne desaparece, os parentes do morto devem voltar a nt -
rar os ossos, impedindo, assim, que a alma retome sob a form
de monstro, o que poderia acarretar males para a família. O cr •
nio, entretanto, é guardado para servir de proteção contr 1
doenças e a morté.

Cerimônias - A única cenmoma pública realizada pelo


rionó é a. que assinala a entrada na vida adulta, depois do n -
cimento da primeira criança. Transcorre, anualmente, durant
a estação seca, quando é abundante o mel silvestre usado par ,
preparação de uma bebida embriagante. Enquanto a bebida t \
fermentando, os participantes cortam os cabelos, pintam-se Il
urucu e enfeitam-se com penas. Dividem-se, então, em dois ru
pos - um de homens e outro de mulheres -, começam a
ber, a cantar e a dançar. Quando estão meio embriagad , )
homens furam os braços uns dos outros, como também dI
mulheres, com uma espinha de arraia, deixando o sangue pin
gar em pequenos buracos feitos no chão. Na manhã seguint ,
os homens vão caçar e as mulheres colhem palmito, volt n I
à tarde para consumir o resto da bebida. Nessa ocasião d v J \
usar panelas novas para cozinhar e observar tabus aliment r
especiais para evitar que as feridas infeccionem. Acreditam qu
essa cerimônia rejuvenesce os que nela participam e, tamb m,
que atrai a caça.

Comércio - Não há troca de artigos dentro dó grupo, nem n.•


tre diferentes grupos.

Religião e magia - Os Sirion6 acreditam que as víci itu I


da vida, isto é, acidentes, doenças, zar, frio mort, s j m
causadas p r mau pírito invi Iv is. .. t s n p d r 11-

1 7
trolados nem pacificados e o único modo de evitá-Ios é obede-
çer os costumes tribais. Há uma outra categoria de inimigo so- POSTE :::::----f--_~
brenatural que tem a forma de um monstro grande e feio, o qual
fica de atalaia durante a noite para carregar as pessoas e es-
ALPENDRE
trangulá-Ias. As almas dos mortos podem aparecer sob a forma
de fantasmas, caso os ritos fúnebres não tenham sido devida-
mente executados.
O mundo sobrenatural é visto como sendo imune à influên-
cia humana e, dessa forma, não há rituais de grupo nem indivi-
duais. Acredita-se, entretanto, que as restrições dietéticas, os
processos mágicos, o canto e a dança fazem aumentar a caça.
Os sonhos, que ocorrem quando a alma está vagueando, pre-
dizem o futuro.

OS WAIWAI

Localização e meio-ambiente - A costa da Guiana é sepa-


rada da bacia amazônica por uma cadeia de montanhas de baixa
altitude que coincidem hoje em dia com os limites internacio-
nais entre o Brasil e os países do norte. O habitat dos Waiwai
faz parte dos planaltos geologicamente antigos da Guiana, irri- I I I I

4t.4
O 2
gados pelas cabeceiras do Rio Essequibo,' que corre ao norte em
direção ao Atlântico, e pelo Rio Mapuera, que corre ao sul
em direção ao Amazonas. O terreno é ondulado e, durante a
estação chuvosa, forma uma espécie de colcha de retalhos irre- N
I
gular constituída de lugares elevados entre cortados por áreas
inundadas. A precipitação pluvial é maior entre abril e final de
julho e de dezembro a janeiro mas chove durante todo o ano.
As castanhas-do-pará, as tartarugas grandes de água doce .e os
jacarés são raros ao norte da divisa; predominam, porém, a
flora e a fauna típicas da bacia amazônica.
A área da vertente é ocupada por diversas tribos Karib,
Aruak e de filiação lingüística independente mas, via de regra,
de cultura similar. Tendo sido dizimados pelos europeus, são
hoje em dia sobreviventes de grupos em extinção. Em 1937,
128 I I)
os Waiwai de língua Karib tinham uma população de cerca de mede de 11 a 20m. A cobertura externa é de palha, d mo:I I
150 pessoas distribuída em três aldeias, ao sul das montanhas que a única iluminação além dos fogos para cozinhar pr v 111
do Acaraí. Em 1955, eram 170 e viviam em sete aldeias e,spa- de duas portas colocadas em lados opostos. A maior part I,
lhadas pelos dois lados das montanhas (Fig. 6): Nes.se. l?te- tarefas, portanto, é realizada em abrigos construídos ao I
rim entretanto quase foram exterminados por tnbos mimigas da casa. Erguem jiraus do lado de fora, ao redor da casa,
ou 'por doença~, -sendo que a atual tribo. Wai~~i se r~con~ti- põem 0& beijus para secar ou, então, os espalham na b ir d
tuiu com a assimilação de indivíduos de tnbos vizinhas, incluin- mais baixa do teto. Conservam o terreiro da casa sempre 11
do ou Mouyenna, de língua Aruak, os Parukoto e os .Tarum~ d~ varrido. Dele saem veredas em todas as direções: para o r ,
família lingüística Karib. Em 1958, todas as aldeias Waiwai para as roças ou para a fonte de água mais próxima.
se localizavam no alto Essequibo. Entre 1955 e 1958, houv.e Não há divisões dentro da casa mas cada família nucl ar
uma deculturação mas antes disso a influência européia se h- tem sua área bem definida. O chefe da aldeia fica com o :n ..
mitava à aquisição de contas de vidro, facas, .enxadas, canec~s lho r lugar, num lado, longe das portas; em todo o caso, a
de metal, algumas espingardas e socorro médico. A populaçao tribuição é opcional. As redes de uma família nuclear são r.•
atual não é equilibrada segundo o sexo, havendo uma propor- madas formando um triângulo entre um dos postes interno
ção de cerca de três homens para duas mulheres. a parede, ao redor de um fogo. A rede do marido é arm
acima da rede da mulher; esta se encarrega de conservar o fo o
Padrão e povoamento - As aldeias Waiwai consiste~ de uma aceso durante a noite para aquecer. Depois da infância, os m .•
única habitação comunal, em forma circular, que vana_ em ta- nínos dormem com os pais e as' meninas com as mães, até
manho de acordo com o número de seus ocupantes. Sao loca- idade de oito anos, quando, então, cada qual ganha a sua pr
lizadas perto de um igarapé, de fácil. acesso a~ rio, em terren? pria rede. Um irmão solteiro, uma irmã ou um parente ido
suficientemente elevado para que haja plantaçoes durante mui- da esposa podem completar o grupo da família. Ao redor
tos anos. Devido à irregularidade do terreno, há raramente ~u- p rede, atrás das redes, há jiraus onde dormem os cachorro
gar para mais de três roçados e, em conseqüên_cia, as ald~tas d cada família. Cestas, cabaças contendo óleo para o cab t
se mudam de cinco em cinco anos. Se a habitação se detenora u tintas, ornamentos de pena, instrumentos musicais e outr
antes que a terra esteja exaurida, constrói-se outra perto. No ib] tos pertencentes aos homens ficam pendurados na pared
caso da morte do chefe, do xamã ou da mulher de u.m dos u nas vigas; os arcos e as flechas são enfiados na cobertu
dois, a casa é abandonada e queimada. Antig~n:tente ISSO se I apê . Os utensílios femininos, tais como panelas, cabaç ,
fazia sempre que falecia um adulto que nela resl~la. nador de fogo e esteiras ficam em tomo do fogão ou 9
A casa é construída pelos homens aos quais ela se ~es- I dos numa prateleira suspensa nas vigas. Um fogo comu
tina, enquanto que às mulheres c~mpete p~eparar as, bebidas t) ocupa o centro da casa.
que serão consumidas na fes!a de mauguraçao .Um círculo .?e
estacas forma a parede que e reforçada por meio de outro CIr- stuârto e adornos - Uma única peça de vestuário é usad
culo menor, interno, ajudando, assim, a sustentar o teto quan~o os sexos. Para. os homens, consiste de uma tan
a estaca central é retirada depois de pronta a construçac d algodão; para as mulheres, um avental tecido
(Fig. 15). A parede certical tem aproximadamente l.~?m de vid o (antigamente, ram d mentes) .
altura e o teto mede quase 9m nas casas maiores; o diâmetro ulto m um 10n o io d conta b nr 1 d
1
1O
na parte superior do braço, um outro fio .de contas azuis, em-
baixo dos. joelhos e brincos cônicos com um acabamento feito
-de um disco de concha. Tanto os homens como as mulheres
cortam os cabelos na testa formando uma franja; as mulheres
fazem um coque com o resto dos cabelos e os homens o amar-
ram formando um rabo que, no cotidiano, é coberto por um
pedaço de taboca. Há uma grande variedade de colares, pul-
seiras e outros pequenos enfeites, assim como a pintura do rosto
e do corpo que varia conforme o gosto de cada um. As ocasiões
festivas requerem coroas de penas mais aprimoradas, ornamen-
tos para o nariz, cintos e tiras, enfeites esses que são do uso
exclusivo dos homens.
Subsistência - O alimento básico dos Waiwai é a mandioca ,
complementada pelo inhame, a batata-doce, a abóbora e as fru-
tas, como o abacaxi e o mamão (Fig. 16). A banana, (várias
espécies, inclusive pacova), e a cana-de-açúcar foram introdu-
zidas nos tempos pós-europeus. Cultivam também cabaça, al-
godão, fumo, agave e urucu. O desmatamento de um trecho de
floresta é feito entre agosto e setembro, sob à direção do chefe
da aldeia. Todos os homens e meninos participam desse traba-
lho, -exceto os que vão caçar para a comunidade. Em primeiro
lugar, cortam as árvores pequenas, depois fazem incisões nas
maiores de modo que, ao derrubarem uma árvore na orla do
campo demarcado, todas as outras que estão dentro desse raio
também cairão. Depois de deixar secar a madeira por seis se-
manas, fazem a queimada e o campo é dividido em lotes para
cada família. O plantio deve coincidir com as chuvas de rle-

--
~ ESTAÇAO CHUVOSO _ ALlhlENTAÇÃO BÁSICA
zembro; é feito pelos homens que podem ser auxiliados por FORA DA ALDEIA ALlhlENTAÇÃO SECUNOÁ"'A
suas mulheres. Plantam a mandioca, o inhame e a abóbora em USO ESPORADICO
pequenas covas e daí por diante não 'há outros cuidados espe-
ciais. A mandioca é a última a ser plantada. Durante os dois
primeiros anos, fazem, vez por outra, uma 'limpa seletiva. As Flg. 16.. Ciclo anua! de subsistência dos Waiwai. A caça e a mandioca
manivas de mandioca são replantadas à medida em que se faz silo os alimentos b~lcos d~rante todo o ano, acrescidos do peixe. Inh
mo o batata-doce sao cultivos secundários. Embora as frutas lIve8tr
a colheita, até o terceiro ano, quando então o roçado é aban- tartarugas, os ovos e outros alimentos sejam ol\\plorados durant~
rt estações, a coleta não é uma atlvidede Impor; nte d .ubll t n-
donado. I . N o há uma estaçlo oca bem definida e llrupo 1 v vida
O processamento da mandioca ocupa grande parte do tem- otMla durant todo o ano.

2
\

po das mulheres. Embora trabalhem juntas, todas executam as mem animais e aves, com exceção dos carnívoros e da
mesmas tarefas. Colhem a raiz de manhã cedo e a descascam bás. Ingerem, além da carne, o fígado, o coração, os mi
imediatamente ao chegarem à casa. Usam para ralar a man- as tripas. É por ser bom caçador que o indivíduo adquir pr
dioca uma tábua de madeira incrustada de pequenas pedras com tígio e, para aumentar a sua possibilidade de sucesso, utiliz
o formato de dentes e juntam a polpa em esteiras ou em pa- de inúmeras práticas de magia. Entre elas estão as restriçt
nelas ou no fundo de uma canoa abandonada. Quatro mulheres dietéticas, arranhar a pele com as garras de um caxin u 1 I
chegam a descascar e a ralar perto de 55 quilos de mandioca deixar-se picar por formigas e fazer pinturas especiais no r st .
em sete horas. O passo seguinte consiste em espremer a polpa Comem lagartos, sapos, iguanos e cágados sendo que e t po-
numa peneira de forma quadrangular, com um pouco de água, dem ser capturados vivos e guardados o tempo necessário.
para remover parte do suco venenoso. O resto do veneno é Os homens Waiwai também empregam sua pontaria a
extraído fazendo a massa passar por uma cesta tubular flexí- trada na pesca, mirando o peixe de uma canoa, da margem d
vel, chamada tipiti. Os torrões cilíndricos que saem são postos rio ou de um tablado erguido na beira do rio. Preparam ain i
para secar numa prateleira acima do fogão e, depois, pulve- armadilhas e, às vezes (sobretudo quando o local da pesca t l
rizados num pilão de madeira. Depois de peneirada, a farinha isolado pela queda d'água), procedem ao envenenamento, no
pode ser comida pura ou misturada com água ou assada de di- que são ajudados pelas mulheres e pelas crianças. Comem qua ..
versas maneiras. se todas as espécies de peixes e o excedente, não consumid d
O seu principal prato é o beiju (bolo de farinha de man- imediato, é moqueado e guardado.
dioca) que se faz espalhando uma camada da massa esfari- A coleta é uma fonte secundária de alimentos; comem p ..
nhada, com cerca de um centímetro de altura, numa assadeira rém na estação própria, os frutos das palmeiras, os cajus u
redonda de cerâmica. Quando a parte de baixo fica ligeira- castanhas, a castanha-do-pará (também processada para I
mente tostada, vira-se para assar o outro lado. Esta "panqueca" de cabelo), mel, ovos de formiga, de camaleão, de tartaru
posta ao sol para secar pode durar muito tempo. É. geralmente e de jacaré. As plantas fornecem a matéria-prima não som nt
comida em pedaços, embebidos em água ou em pimenta, ou para os utensílios, armas e ornamentos, como também para lscn
enrolada com recheio de peixe eu carne. Quando' é embebida de pesca, veneno de flecha, tinta preta, remédios e muitos tip 1

na água e posta para fermentar durante vários dias, serve de de recipientes. A maior parte da coleta é feita pelos hom ns,
base para muitas bebidas. O suco venenoso é também aprovei- geralmente quando regressam das caçadas ou das pescaria .
tado. Perto de catorze variedades desse tipo de "pão" e, pelo
menos, treze bebidas são preparadas com a farinha de man- Outras atividades - Além da construção da casa e prepara 11)
dioca e com o seu suco. Várias bebidas são obtidas acrescen- d roçado, os homens produzem muitos artigos de uso p ai
tando-se bananas amassadas, sementes de cabaça e castanhas- li familiar. Fazem canoas, arcos, flechas e instrumentos mu j .•
do-pará. iís (tambores, flautas, flautas de cana, chocalhos ) ; esculp n
A caça é o passatempo predileto dos homens que saem de I a quinhos, remos, raladores e recipientes de cabaça; tranç 111
casa, antes do amanhecer, na companhia de um p~rente, mu- ordas feitas com a fibra da palmeira ité e agave; tem r d ,
nidos de seus arcos e suas flechas. Fazem as aves cair na arma- t in a todos os tipos de cestos e esteiras. Tamb m faz fi
dilha, imitando-lhes os pios, mas os caititus, as antas e os vea- 0/'1 J ntos de p na c os vc tuário par a d n s, A mu-
dos são caçados, via de regra, com o auxílio dos cachorros. Co-
134
lheres esculpem os fusos, fiam e tecem o algodão, fazem orna- das responsabilidades do cargo, que incluem: receber c lim J1
mentos e aventais de contas, incrustam os dentes nas tábuas t~r os. hóspedes, .cuidar ~os velhos que não têm parent f iu
de ralar, preparam a tinta de urucu e fabricam objetos de cerâ- mnos Jovens, enviar convites para as festas, saber fazer um lx n
mica. Além disso, atendem às tarefas domésticas, tais como roçado, prognosticar a chuva, organizar os projetos comunit .•
carregar água, apanhar lenha, cuidar do fogo, preparar a co- nos, tais como o envenenamento dos peixes e a prepara ao da
mida e as bebidas. Tanto os homens como as mulheres cuidam roça .. <?ostuma ~a~bém ~er ~amã, embora não seja esta u I
das crianças menores, remam as canoas e carregam fardos. condição necessana. Devido as suas obrigações como anfitri
A principal arma é o arco-flecha. Os arcos têm entre o chefe deve ser casado e, se a mulher morrer, será dcp t
1,75m a 2,75m de comprimento e as flechas mais ou menos no caso de não contrair novo matrimônio. Quando a ald i
o mesmo tamanho. A flecha tem um cano de taquara, um bocal muda de loc~l; alguns membros podem se separar e fundar um
de madeira-de-lei e a ponta de taboca, madeira, osso ou metal. n?v~ comumdade, sob um novo chefe. Afora o prestígio
Para pescar alguns peixes, pegar caititu, tartaruga e anta usam direito de ocupar o melhor lugar na casa, o único sinal d r-
ponta de arpão removível. Para os macacos, usam pontas enve- conhecimento conferido a um chefe é o ato de queimar a ca u
nenadas. por ocasião de sua morte ou da de sua mulher.
Embora os adultos conheçam as tarefas a serem desem- As relações entre as pessoas são reguladas pelo parent
penhadas pelo seu próprio sexo, nem todos, porém, têm os mes- e cada un; c?nhece os direitos e as responsabilidades que t 111
mos dons. Conseqüentemente, a mulher que se distinguiu como com referência a aqueles que chama pelos diferentes nome d
boa ceramista ou o homem que faz cestas mais bonitas podem parentesco. Em caso de disputa entre dois indivíduos, seja por-
trocar seus produtos por outros. A única ocupação verdadeira- q~e a. solicitação de algo foi negada, seja porque um servi
mente especializada é o xamanismo. O rapaz que demonstra na<?f~~ prestad?; a parte ofendida pode pedir ao adversário qu
ter aptidões especiais ou é "chamado", em sonho passa a re- se InICIe um diálogo formal. Daí por diante, se este continu
ceber instrução de um profissional mais velho. Além de efe- a recusar, corre o risco de enfrentar uma vingança sangrcnt ,
tuar curas com o auxílio do fumo, da pimenta malagueta, das O diálogo ritual é também usado para acertar um casam nt
picadas de formiga e magias diversas, tem também poderes para convidar para uma festa, negar uma acusação de bruxari I

interpretar sonhos, provocar doenças e a morte. Sua principal outras diversas ocasiões. Estabeleée um mecanismo ac itáv 1
recompensa é o prestígio que adquire, pois não fica dispensado para se ç~egar a um acordo sem envolver uma terceira p a
dos encargos normais para com a família. como árbitro ou levar a comunidade a um conflito det st d
por todos.
Organização social - A tribo Waiwai é uma unidade lingüís- ,Em geral, os Waiwai dão muita importância à ind p _
tica e social mas a aldeia é a maior entidade política e eco- ,ncla. No entanto, as obrigações recíprocas de parentesco r _
nômica. Os ocupantes são constituídos de famílias aparentadas trlng m bastante a liberdade individual na medida em qu
pela linha materna (por exemplo, a mulher, suas filhas casadas ld ia ,cresce. Po~ outro l~d.o, ~uanto maior for a popul .
e respectivas famílias; ou diversas irmãs e seus maridos, filhos e i r rá o pengo de feitiçaria. Assim o grande d j
parentes matrilineares). O chefe da casa, ou chefe da aldeia, I p nd ncia se torna um fator import~nte faz nd m
é um homem respeitado pelos outros e capaz de se desincumbir tld i s W lwaí cons rv m p qu na b m r II
1 1 7
, 'da - Durante os três ou quatro últimos mese d lOVl1l1 Ia plOIlI I ptu 1 IS 11 I I (li ti I lulclu II

Clcl~ de ~l marido e a mulher evitam certas atividades ~ obser- S 111 111 mjudu diu uttr U/11 li It ( ti IItI 11 111 I 11 p"
l 1111
gravidez, , ões dietéticas. A mulher não deve fazer objetos de d n ívo 1 n iv I , ' ruln nt , r lU I o J 1 1111 IIto til 11111
vam restnç , , '- d t d re ou urna r d F ar' a f' mília da lU ivu, li 111 10 (11 '1111 I
A' nem parncípar das expedições e envenenamen o e
ce~amIcaO' oarto se dá numa maloca especial, com a ajuda do urn a ordo, n vo rnartd arma ua r I n .huu II r li I
peixes
' ' ou rde uma parenta, Praticamicam oo 10 icídi10 no caso de
inf antící sua mulher c a viela de ca do t m iní Í< li 11I <)11 "'111 I 1I
mando êmeos ou se as quatro crianças anteriores forem do mônia. Não há pagamento no ea o d um und \ I o I. M I
nascerem g , " 1 ca rido e mulher têm relativamente o me mo status n . 1111 11111
mesmo seXO do recém-nascido. Os pais permanecem _ ., na ma, o, o adultério era, antigamente, punido com m rt . pul
dürante duas semanas e ambos estao sujeitos a vanos
do parto rimeiros três anos de vida da criança, po,~s sua alma inia era permitida e as co-esposas eram, de pr f r n -j I, lrmn
t~bus n~s Pestá de todo ligada ao ccrpo e, conseqüentemente, Havia também a poliandria.. porém não era C mum, P H VI/ j I
ainda na~ co de perder-se, O pai não deve caçar nem pescar, razões, entre as quais uma notável diferença d i lad 11) I I i
corre o nS - - d d meiro casamento, a morte, a incompatibilidade a indr I 11' I,
- eixes pequenos, e a mae nao eve co~er ca,rne \l-
a nao ser Pperíodo, Embora tais' restrições não sejam ngorosa- mas não a esterilidade, muitos adultos passavam a t r um I ,(_
rante es~ rvadas a limitação da atividade masculina faz com rie de esposas, Devido à escassez de mulheres Waiwai, s ho
mente o ~epossa ~uidar do bebê enquanto a mãe se ocupa da mens foram levados a desposar mulheres de outra tribos: ()
que o p~I da mandioca.. As crianças são tratadas com muito filhos de tais casamentos eram considerados Waiwai.
preparaçao ecialmente pelos avós, Se nasce outro filho, a cr,idn- Uma vez chegados à idade adulta, os homen as
can~ho, eS~mada aos três anos aproximadamente. Aos Cl~CO lheres Waiwai passam por três classes etárias, cada urru
ça e desm eninas começam a ajudar as ~ães c~lhendo as raizes quais está associada a diferentes expressões de tratam nt
anos,mandIOCa,
as ~ enquanto os meninos praticam nro ao alvo com referência. A primeira fase começa na puberdade e termina 11
de
noS arcos e flechas. nascimento da primeira criança e, para os menino , 111 (
seus peque .
casamento. A segunda fase vai até a idade de 45 anos apro i
r:
A ,

inos chegam à puberdade sem qualquer cenrnoma


<?s entre os treze e os quinze anos, recebem uma madarnente e é o período mais ativo da vida, A tere ir l, o
t mpo da velhice, para ser passado descansando ao lado d(
espec.IaI m~; ser usada na parte superior do braço e fur~n;. o
pulseira ~a ..- ambos indicadores do status de adulto. No Im~IO li tos e em atividades mais leves, tais como fazendo c tas, !lI)
septo nasal ão as meninas são isoladas numa maloca especial, to ante aos homens, e fiando, no referente às mulhere , As P "
da menstruaçFi~am reclusas durante cerca de dois meses,. sem IiO' idosas são tratadas com muito respeito mas sofr m a f I
sem portas~inguém, vivendo de farinha e suco de mandioca, da de prestígio, principalmente se, com a morte do cônju 1 • li
fal,ar com oenos e tecendo algodão para passar o tempo. Ao ver m que depender de um parente mais novo ou d ih f
peixes I;'eq ~das recebem pulseiras que serão usadas na par~e da aldeia.
sere~ hbe~ braço e, daí por diante, po~em ter relações sexuais Acreditam que a morte seja causada pela feitiçarí , . alv )
supenor d ridos em potencial. Nos dOIS anos que se seguem, pura os muito jovens e os muito velhos. O moribund arr _
com. os ma m os tabus' alimentares e têm de trabalhar dura-
continuam co indo para um abrigo perto da ca a, onde a p a, ou um I 11 .
mente, rcnt I P rman c até d s nlac. corp r m do no 111 smo

138 1
dia, ou na manhã . uintc, t d . O' obj to d us p ss ('011I r 'Iu Algun artigos essenciais dependem de matéri _
são destruídos, com a exceção do machado, em se tratand de prinu qu não se enc?n~ra em territó?~ Waiwai, ~ que só pod
1

um homem, e do avental de contas, no caso de uma mulher r btído pelo comercio, Os materiaís mais importantes sã
objetos esses que passam para o filho ou a filha. As parentas l taquara para as flechas e as conchas para os ornamentos da
adultas e as crianças cortam o cabelo, enquanto que os parentes (~r ',bas. Estas ~rovê'!l d? baixo Mapuera, habitado pelos Sh _
masculinos acertam as pontas dos rabos-de-cavalo do cabelo. I ,a taquara e o?tIda J~nto aos Mouyenna e Wapíshíana. O
Quando o fogo da cremação estiver apagado, o parente masculi- l ~ out~os artigos feitos com materiais locais podem ser

no mais próximo junta os ossos que não se queimaram, para merciados e fomentam a interação social. Mercadorias de ori-
serem usados no "sopro" mágico que vingará sua morte. Muitas m européia, tais como contas de vidro machados facas
vezes, jamais se chega a descobrir o culpado mas, se a feitiça- nxadas s30 adquiridas dos Wapishiana, e~ troca de tábuas d
ria for bem feita, o culpado morrerá dentro de dois meses. r lar e caes de caça. O comércio é uma atividade individual
ninguém tem o direito de. dispor da propriedade alheia n m
Cerimônias - Os dois principais festivais de dança têm cunho m smo a ~e uma criancinha. Por outro lado, consideram' f lt
secular e são realizados a intervalos irregulares, podendo ser d educaçao negar um pedido.
motivados pela inauguração de uma nova casa, pela retribuição
de hospitalidade ou simplesmente para promover contatos so- uerra - Os 'Yaiwai não têm tradição guerreira e não atac m
ciais, sobretudo entre pessoas em idade de casar. Cada aldeia de surpresa. HOJe em dia não têm vizinhos próximos que am
patrocina uma dança ao menos uma vez por ano e convida m a tranqüilidade da tribo.
membros de uma ou mais aldeias, dependendo, em parte, o
número de convidados da quantidade de comida existente. A Religião e magia - Os seres humanos e os animais, bem como
dança mais comum é a shodewika que dura três a sete dias e ~gumas pla~tas, têm almas ou espíritos cujos hábitos pod m
na qual tomam parte os homens e as mulheres. A dança kamo, vir a ser pengosos. A alma humana não está ligada perman n-
que se realiza com menos freqüência, dura cerca de dois me- t mente ao corpo, durante os três primeiros anos de vida d
ses, com intervalos para as atividades essenciais de subsistência. modo que a c~ança corre o risco de morrer devido à. p' rd
Durante o primeiro mês, os homens dançam com um acompa- d al~a. Os pais devem" .portanto, tomar precauções para qu
nhamento de flautas, longe da vista das mulheres; no segundo t 1 nao aconteça. Os espíritos de alguns animais podem' cau
mês, dançam ao som dos chocalhos e as mulheres acompanham doenças ao avistarem alguém mas, como os espíritos não enx r-
cantando. Não consta que tais danças tenham significado ritual, m a cor vermelha, os Waiwaipintam o corpo com urucu
embora alguns detalhes sugiram que assim tenha sido no pas- uisa de' proteção. Aqueles que se aventuram na floresta à noit
sado. Havia, antigamente, uma dança que se realizava no co- dem ser assassinados pelos espíritos do mato. Somente o xam
meço de janeiro, depois do plantio. Foi: porém, abandonada e t m o dom de controlar certos espíritos, o que ele faz quando
não há notícia de outras festas ou cerimônias relacionadas com f tua as curas.
atividades de subsistência, fases da vida ou quaisquer aconteci- O principal meio de manipular o mundo sobrenatural é
mentos do gênero. tr vés do sopro mágico. Se alguém tenta matar uma pessoa
método mais eficaz é o de soprar sobre o corpo nqllant~

140 141
dorme . Isto , no entanto, é perigoso,. não somente devido tà po~-
bé que o ven o ma-
sibilidade de ser descoberto, mas, tam em, por .." . f t .
Capítul
ico . ode reverter sobre o soprador, com. consequenclas a aIS.
gcom~ alternativa pode-se obter algum objeto que tenha destado
em contato recente , com a vítima,
,. tia .como um. pouco eco-
Aspectos adaptativos da cul
.d m pedacinho de unha ou um fiapo de cabelo, ou qual-
m~e;' o~tro objeto de uso pessoal, cuidadosamente guardado an-
da terra fir
~s de ser soprado. Quando uma pessoa adoece ou sente uma
dor sabe-se que foi vítima do sopro mágico. A menos que con-

S!g~ ~o~ m"á';c::,~~:r.aE:~~~~ç~


des~Obcr:m~U:;'~as~:::~á :e~;
:~t~~: um parente, pode também ser praticad.o contra um
ladrão ou contra alguém de quem se tenha queixa. O so~~~ CONSIDERAÇÕES GERAIS
mágico também pode ser ~tilizado 'para curarol~~~~Ç~b~:d~nte.
fazer com que a caçada seja proveítosa e a c
A S CINCO TRIBOS escolhidas como exemplos de adapt •
ão ao meio-ambiente da terra firme apresentam entre si nu-
merosas semelhanças culturais .. Seus membros alimentam- da
mesmas plantas e dos mesmos animais, que são consegui t )
pelos mesmos métodos; vivem em grupos familiais e habit I/ll
asas comunais; seus ciclos vitais começam com uma infân i I
I preocupada e terminam em enfermidade e morte, quan 10
linda são relativamente jovens. Via de regra, imaginam o mun-
do invisível como sendo hostil e têm muito medo da feiti nri I.
) vestuário é mínimo mas os adornos são, geralmente, pr ru-
o coloridos. As tarefas são fixadas segundo o sexo, n 10
caça e a pesca cabem sempre ao homem. Embora h Ij I
h fe, sua autoridade é mínima e sua posição não o j n til
1I tarefas rotineiras dos homens. O único especialista v rd 1-
li ÍIo o xamã que tem poderes para se comunicar com f r fi
) I r brenaturais. Os festivais periódicos servem mai 1 fi 1\
(lI110V r a solidariedade social do que, propriamente, pur I
I I1 11' brenatural.
I' li. sem lhanças de ordem g ral levaram r nhe j.
nto d um ár a ultur 1 d flor ta tr pi J ujns Ironn iraN
1
14
coincidem, aproximadamente, com as da regiao natural, geo-
Outra característica que se t .
graficamente falando. Um dos motivos para essa correlação é satisfaz a uma necessidade bi ló ~rnou, quase ulllversal, p r 111
a presença das mesmas matérias-primas. Na bacia amazônica, das ligeiramente alcoólicas, f~?t:sgICa, e a manufatura d
por exemplo, a existência generalizada de penas do tucano e frutas da estação Os Jívaro d t' de mand.oca, batata-d ( 11
de papagaios, assim como de tinta vermelha vegetal, explica a I' "
a imento basico principal o "
es acam-se pelo cons
b umo d 11I

unidade subjacente nas variações locais de ornamentos e ador- bida algo fermentada ' arpim, so a forma de um '1 I
nos pintados. Um fator de homogeneização é ainda a superio- bebidas exercem um' ~~e~e~ de sob sua forma natural. 'r li.
ridade de adaptação de certos traços culturais sob determina- úmido que exige uma trans II?po~tante ~um clima qu nt
das condições climáticas. O vestuário é um exemplo. No calor piraçao contmua para rnant r 11
úmido da bacia amazônica tudo que possa interferir na livre cir- te~peratura normal do corpo. A perda de umidade é grand d ..
culação do ar sobre a pele retarda a perda de calor e, conse- mais para ser compensada apenas com a água que se bebe, m _
qüentemente, impede os processos fisiológicos normais. O fato ~o que. s~ faça nesse sentido um esforço consciente. Uma b _
de qu~, entre as cinco tribos que serviram de exemplo, so- l?a adiciona] mais saborosa, entretanto, não somente en _
mente os Jívaro usarem roupas e mesmo assim suprimirem .ja ~ consumo do líquido necessário como, também forn
com freqüência a maior parte delas sempre que se ocupam de vitàminas e calorias. '
alguma atividade física, constitui uma resposta cultural a este Além. desses traços climáticos genéricos o meio-ambi nt
fato biológico. ~I terr~ fIr?Je possui diversas outras caract;rísticas que ex r
A habitação é outro traço intimamente ligado ao meio- t m .efeIto~ Imp?~tantes na exploração humana. Entre elas, pr ..
ambiente. Embora a flutuação da temperatura anual seja mui- mm~ a mfertIhdade do solo que limita a intensidade de 11
to reduzida na bacia amazônica, a variação diária é suficiente- ~proveItam~nto agrícola. Outra característica é a combinaç
mente grande para produzir desconforto. As características fi- alta umIdad~ e temperatura elevada que dificulta o armaz ..
siológicas de adaptação ao calor durante o dia, como sejam, ument,? da maior parte dos alimentos, a não ser durante cur-
temperatura do corpo mais baixa e transpiração imperceptível t( penodos?o an:~. A terceira diz respeito à baixa concentr _
mais alta, representam uma desvantagem nas primeiras horas o de proteI~~ amma~ e vegetal, de tal modo que uma di tu
da manhã, quando a evaporação é reduzida e a temperatura alimentar ~qUlhbrada so pode ser conseguida 'pela utilizaçã d
cai para menos de 20°C. Os povos amazônicos encontraram r ande vanedade de recursos de subsistência.
uma solução para esse problema ao construirem moradias es-
paçosas, com teto alto, paredes e cobertura de palha bem tran-
e óbvio que nenhuma comunidade humana pode sobr vi
v r m que_ seus ~embros consigam as calorias suficiente ' p r I
çada, que dão sempre sombra durante o calor do dia e isola- mu utenç~o d~ VIda, precisando ainda de certa quantidad d
mento contra o ar frio da noite. Dentro de casa, a flutuação ot ín~s, vitaminas e sais minerais. O fato de que a planí j
diária da temperatura também é reduzida, visto que não há 11. mca era bem mais populosa ao tempo da conquista u-
janelas e somente existem duas pequenas portas. Conservam os p. I d mon~tra que aquelas populações tinham realizado um I
fogos acesos durante a noite, perto das redes, propiciando I z dapta~ao. cul~ura~ às características especiais do m i .
aquecimento. O calor irradiado pelos corpos humanos também I id ptação Impl~cafla num equilíbrio entre o tam nh d
contribui, provavelmente, para manter uma temperatura agra- lul L a c~pacld~de d~ produção, a longo prazo, p r p r-
dável durante a noite. o m j - mbi nt , imp díndo, as im, a up r pl r a d I
144
14
fontes de subsistência e, conseqüentemente, uma dilapidação for~a, o desperdício proveniente da armazenagem de um
irreversível dos recursos essenciais. Dois. são os meios princi- lheita sazonal.. ~e bem que relativamente pobres em nutri I t
pais de se conseguir tal equilíbrio: (1) desenvolvendo medidas seu valor n~t~ItIVOpode ser melhorado com o emprego d n -
para maximizar o rendimento dos alimentos de uma determi- todos especiais de processamento, sobretudo quando são f
nada área e (2) impedindo que a população cresça ou se con- mentados. Tan~o os Jívaro como os Waiwai souberam util'i-
centre a tal ponto que venha a pôr em perigo os recursos do zar esse potenc~~l. Somente os Jívaro, entretanto, consom m \
meio-ambiente local. Quando os costumes e as crenças das parte mais nutritiva da planta, que é a folha, rica em rot n .
cinco tribos de nossa amostra forem examinados, segundo essa Outra cultura de alto t,eor .protéico, explorada apenas ~elo J •.
ética, muitos aspectos adaptativos se tornarão evidentes. varo e pelos Kamayura, é o amendoim.
Emb?ra o, milho não seja muito apropriado para o 1
da te:~a flf~e, e cultivado, até certo ponto, por quatro das cín-
Técnicas para maximizar o rendimento da alimentação ~o tn os cItad.as, com a única exceção dos Waiwai. ];: comid
assado, na e,splga, ~ ,e~ forma de farinha; como só dá uma v z
Embora existam em potencial, através da bacia amazôni- por ano e e de. difícil . conservação, constitui um com on nt
ca, os mesmos recursos alimentares básicos, as cinco tribos da Importante da dieta alimentar apenas durante dOI'S p
nossa amostra diferem quanto ao que consideram comestível,
~. ~~
à proporção dos vários alimentos ingeridos e à maneira pela O consumo de ~amíferos, aves, répteis, anfíbios, eix
qual são preparados. Como nenhuma das cinco apresenta si- h~rtarugas e_ovos de. ~ept;is supre as necessidades em pro~eín .
nais de carência alimentar, passamos a admitir que as diferen- I? exceçao dos Sirionó, que consideram toda a fauna salv
ças mencionadas representam soluções alternativas para o pro- o msetos, comestível.' háa tendência a uma concentração n
blema de manter uma dieta equilibrada e de obter alimentos /te dos recursos .exlstentes, e não na utilização de todos el· .
com regularidade. cert~ ponto, ISSOreflete a abundância extraordinária
Conquanto a técnica agrícala de cultivo itinerante seja rtf re'
s alimentos. O melhor exemplo é o dos K amayur á qu
universal, as plantas cultivadas não são sempre as mesmas. Os . m a. pesca a caça, visto que aquela pode ser explorad I
Sirionó, os Jívaro e os Kayapó plantam aipim, enquanto que os intensidade nos lagos dos arredores, sem correr o risco d
Waiwai e os Kamayurá preferem a mandioca brava. Todos con- gotada.
somem grandes quantidades de batata-doce e os Kayapó dela mbora_ as ?utras quatro tribos também se utilizem d
dependem mais do que mesmo da mandioca. A predominância I elas sao a~Ima de tudo consumidoras de carne Iss ri!
de tubérculos no rol dos produtos cultivados explica-se pelo 't I I ~ blem~ pOIS a caça intensiva de animais e ave~ leva in
meio-ambiente. A mandioca, a batata-doce e o inhame nascem v rapidamente ao esgotamento do suprimento local
mesmo em solo pobre, resistem às pragas e são insensíveis aos : 11~llld de condições, entretanto, quanto menor for a . m~-
extremos ou às irregularidades das chuvas, resultando daí uma \( t ~t mais gradativo será o efeito e mai t mp d
produção maior em relação à mão-de-obra empregada do que • til rim nt de alimento . mo v' d d . U 1-
rpn id d d b . . . 1 a nt na pr v
a das outras plantas. Além disso, são permanentes e os tubér- r YIVnci rnai r d qu vid
culos ficam na terra o tempo que for preciso, eliminando, dessa 111of' 11<.1ipta I
qu r UI1 ruim I lI n I111rnI

14 1 7
A • Um exame dos diagramas demonstrando o ciclo de uh
nência na aldeia com a conservação dos recursos naturais. Em têncía anual para cada uma das tribos do nosso exemplo (I' i .
outras palavras, a aldeia precisa mudar-se com bastante fre- 8, .10, 13, 14, 16) revela claramente a relação de compl m 1\
qüência para impedir um dano irreversível à flora e à fauna tanedade entre a exploração de castanhas e frutos ilvet tI ,
mas não tao freqüentem ente a ponto de sacrificar, desnecessa- por um lado e, por outro, a utilização de outras fontes d ,11
riamente, as vantagens em potencial da vida sedentária. Como mentos; Por exemplo, os Kayapó se abastecem de cast nh •
a maior parte das tribos da terra firme transfere suas aldeias d~-para frescas, em agosto e setembro, quando ainda é du-
a cada período de cinco anos, tal prazo representa, provavel- zida a produção ?e suas roças, enquanto que a época da u·
mente, a permanência ótima sob essas condições ecológicas tanha.s maduras e entre dezembro e fevereiro, antes das n v \
típicas. colheitas. A castanha-do-pará é conseguida em grande quanti-
Os Kayapó encontram uma solução diferente para o pro- dade e armazenada, sendo extremamente rica em proteín
blema. Em vez de mudarem a aldeia periodicamente, transfe- outros elementos nutrientes. Outra planta muito nutritiva 11-

rem a comunidade para uma zona diferente de caça durante contrada na entre~safra agrícola é o piqui. Os Kamayurá u•.
mentam a produçao dessa fruta, plantando árvores que' c ntl
certo período do ano. Desse modo, a pressão que se exerce
nu~m sendo exploradas mesmo depois da transferência da ll-
sobre a caça dos arredores da aldeia é aliviada de forma a
dela para outro local. Seleções semelhantes foram também f •
manter um equilíbrio ou, pelo menos, para desacelerar o ritmo
tas com os recursos da fauna; entre os Kamayurá constitui um
de esgotamento. A grande comunidade e o requinte cultural exemplo notável o festim anual de ovos de tartaruga.
dos Kayapó estão em contraste marcante com os Sirionó que
seguem um padrão semelhante de alternar o sedentarismo na , Outro aspecto variável do ciclo de subsistência anual o
~un;ter? de alimentos importantes que entram na dieta. O
estação chuvosa com o nomadismo na estação seca. Talvez a
\yalWaI, em ~m dos extremos, empenham-se na caça e no ul-
qualidade inferior do meio-ambiente dos Sirionó seja o prin-
tivo da mandl?Ca, produtos esses que são preparados de dív -
cipal responsável por esse contraste. sos modos. P:lxes e ?'!'tros tubérculos são também consumi to,
A lista de sementes agrestos comestíveis - castanhas, fru- mas quase nao se utilizam das plantas silvestres. Os K Y I
tos, bagas, raízes e outros produtos vegetais da floresta da terra P r seu lado, demonstram a mesma preferência pela caça I
firme _ é muito extensa e nenhuma tribo jamais conseguiu ex- 1 tu.bérculos, neste caso, a batata-doce. Nos meses de r (
plorá-Ias totalmente. Entre os fatores que influenciam a com- bril, cons?mem milho em grande quantidade. Vivem in 1
posição do ciclo de subsistência anual de cada grupo estão t plantas sl~vestres, especialmente de castanha-do-pará, P li·
os seguintes: (l) a abundância da colheita sazonal; (2) a au- it , frutas diversas e tartarugas. Os Jívaro ostentam outr P l-
sência de conflito entre o tempo de maturação dos alimentos I ,concentrando-se em produtos cultivados e silvestr n-
silvestres e as atividades agrícolas essenciais; (3) a contribui- ontr. dos duran.te todo o ano, com preferência secundária p 1
ção de cada tipo de alimento para o equilíbrio da nutrição. lI!UrB sazonais, como ? milho e a pupunha. Inform 1
Embora as duas primeiras considerações pudessem ter sido evi- 11 mpletas sobre o CIclo de subsistência de cad u I ..
dentes para os povos em questão, a terceira só se teria verifi- rup r velariam variaçõ adicion is qu p d riam
cado através de uma seleção natural, durante um longo perío- t bu condi ~ p cffic d h bit tIL
do de tempo.
14
14
, Apesar das desvantagens climáticas, esses povos d n- I ut I z
volveram técnicas para preservar alguns alimentos durante cur .. n itlv I ti
tos períodos do ano. Com relação à fauna, o método mais se- 011 um I, Vi. t 11 t I
guro é o de conservar o animal vivo. Mas, em muitos casos, I x r r pl n m IIt I.l I P id id
isso não é possível, tornando-se a tartaruga uma exceção im- () 10 h m m, m di a cultural 11It I
portante. As tartarugas são tipicamente estocadas para serem I pr ti • P ra inibir . multiplicação d I
consumidas durante as festas ou como reserva para os dias em t 111 ln d limite, e para distribuir a p puI
que os caçadores voltam de mãos vazias., Em alguns casos, 10" 1 r aproveitada ao máximo a c p id d
quando a pesca foi abundante, chegando a ultrapassar as ne- do mio-ambiente. Assim, muitas prática u]tur l
cessidades do consumo imediato, ou quando há necessidade de I 111 parecer estranhas, ou mesmo cruéis, aos b r
'um, excedente de carne para uma festa programada, o peixe é V I z dos são explicadas em termos de sua imp rt li
moqueado e enrolado em folhas, sendo assim conservado. )J uma ou ambas dessas funções.
A secagem e a fermentação são duas técnicas emprega- Neste ,ponto, convém fazer uma digressão par stnb
das muitas vezes na conservação de plantas comestíveis. As r uma distinção entre a finalidade de uma caract rí ti
raízes de mandioca podem ser estocadas durante algum tempo li ,função '. A finalidad~ se to~na evidente aos que a põ 1
quando estão bem secaa.Por outro lado, a polpa ralada pode pr tí a, devido às sançoes positivas ou negativas qu
ser posta a secar e estocada. Os Kamayurá costumam ferver a nham, Um menino Kayapó, por exemplo, sabe que d v
polpa do piqui, enrolá-Ia em folhas e deixá-Ia dentro d'água, por várias provas, a fim de desenvolver seus dot d
onde se conserva durante meses. Tais métodos não aumen- m e resístêncía. O homem Jívaro tem conscíêncía d q 1
tam expressivamente a garantia de suprimento alimentar nem v vingar a morte de um parente, de modo a pres rv
prolongam a capacidade de utilização das, plantas muito além -estar dos outros membros da família. Os Kamayurá 111
do que caracteriza o seu estado natural. A segurança de sub- m os gêmeos ao nascerem, porque são' um sinal da ir do
sistência no meio-ambiente da terra firme provém, efetivamen- pfrítos para com os pais, por terem estes quebrado um t II u,
te, do ciclo anual de produção de tubérculos, tais como a man- mãe Waiwai se abstém de comer carne para que seu i1I ()
diocae a batata-doce, e da, existência permanente de caça e crescer forte. A mesma característica pode ter um
pesca. Ific do diferente para outra tribo. A finalidade de uma r
nia, por exemplo, pode ser a de assegurar uma c lh lt I
bundante, honrar ou apaziguar as almas dos mortos, ou, 1111
Técnicas de controle do tamanho da população d , estreitar os laços que unem a tribo a seus espírito prot
tor s; a guerra pode ter como finalidade a obtenção d ri..
Para que o ciclo anual de subsistência se desenvolva e se 011 iros ou a vingança contra a injúria; a finalidade do ni..
perpetue, os elementos que o compõem devem existir indefi- IIi mo pode ser insultar a vítima ou adquirir certas qu lld t••
nidamente à mão e num ritmo de produção mais ou menos pessoais admiráveis, como a coragem.
constante. A existência de tais ciclos implica, portanto, num A função de determinado comportamento, por outro lado,
equilíbrio entre a população e o meio-ambiente, de tal modo d ser totalmente diferente e nem sempre é vid 11t pes-
150 ] 1
r)
lação, mas o número de medidas adotadas e a inten id d Iml t tl I h'
I
aplicação diferem consideravelmente de um grupo para out , na P P rt h ulun
lU. 11 i 1,
A relação inversa em intensidade que existe entre os meio d. r mp n p I p ri n
naturais e culturais de controle de população torna-se mais evi- nf ríd p Ia id d , P J c ntr ri
dente quando os Sirionó são comparados com as outras tribos lU ó é alcançada quando s tem h blJi '
da terra firme (Tabela 2), Embora os Sirionó não adotem con- rn ntos, ~ que depende de força, ilid
troles culturais efetivos nas fases pré-natal e juvenil, a família ú s próprias da juventude, g d ItI dlt I-
tem em média apenas duas crianças, A dedução óbvia é a de
Os Waiwai, os Jívaro os Ka a ó
que os controles naturais do ritmo de concepção são de tal Uma variedade de costum~s y p e os K rnayur pr II '111I
modo fortes que as medidas culturais se tornam supérfluas e, população, seja evitando a ~~~c~fet~m o ?e e~v~lvhn 1110 d I
na verdade, há indícios de ser o aborto relativamente comum. ertas proporção de recém-nascid pçao, s,eJa elimin nd Um I
Por outro lado, na fase adulta, os Sirionó seguem um
costume que não se encontra em outros grupos, isto é, o aban-
to são empregados Principalmen~!' A antIconcepção
todo mais usual é o de restrin ir pelos Kayapó, ma 111
I'
dono de indivíduos enfermos ou incapazes de seguir o bando de das relações sexuais Em; , em vaf1?s graus, a int nsld 1
nos seus deslocamentos. Para entender este comportamento, bservados pelos Waiw~i e o~r~aos penodos. de contin n I
deve-se lembrar que estão sob a ameaça da fome, a não ser mente curtos para serem efic mayurá ,seJam d m i I-
que todos os adultos da comunidade sejam sadios. Portanto, população, os do Jívaro e ~zes c~mo_medIdas de contr I J
ferimentos ou doenças graves, que o impeçam de participar na mulher Kayapó deve abster-s ayapo sa,? bem mais Iong . A
busca de alimentos, colocam o indivíduo em perigo, pois que cio da gravidez até qu ~ de relaçoes sexuais desde J 11 _
os outros membros do bando não lhe podem fornecer alimen- deo-se, assim, que não nascer'
a cnança comece a
.
d
an ar, as ur 111
to, nem propiciar o repouso necessário sua recuperação sem, a
à
tenha sido desmamado. Como o~u~~ Í11~0 antes que o ant I'Í )1
com isso, arriscar a sua própria sobrevivência. Em tais circuns- a observância desse tabu o yapo adotam a mono amlu,
tâncias, enfermidades que normalmente não causariam a morte ta a capacidade de procri~ç~or dParte ~a mulher, também lilll-
podem vir a ser fatais. A recuperação é também dificultada, a poliginia é característica e o °a~~;~ .0. ~or outro lad, 11 J
por parte do doente, pelo seu desespero que não é mitigado
por qualquer tratamento médico (os Sirionó não têm xamãs),
com a morte,· como ocorre com ;:10 a mulher é punido
observado pelo marido afasta . os rvaro, um tabu qu jI
nem pela compaixão dos parentes. Se bem que a indiferença m~lheres de seu papel procri~d~~muItan~at;teI?te, duas ou rnui:
proteja os sobreviventes dos danos psicológicos resultantes das rerro deve observar continência . A ~xlgenC!a de que '11 r-
mortes freqüentes, ela intensifica a ansiedade do paciente e, cortado a cabeça de . . .por tres a sers meses, ap t r
em conseqüência, apressa a sua morte. Além do mais, como a . . um Immlgo se tom
VIsta por esse ângulo AI' dl a compreensfv I
perda de apetite é interpretada como um sinal. evidente do _ . em ISSO,a mulher Jívaro deve abst t-
agravamento da doença, o paciente se esforçará por comer, ape- se de relaçoes sexuais enquanto estiver amamentando o fílh
sar dos sistemas gastrinstestinais e, na maioria das vezes, com o que dura de dois a três anos. '
conseqüências deletérias. Não se conceberia que se perpetuasse
.Controles .pré-natais são suplementados pelo infanticídio
um comportamento de tal modo prejudicial ao indivíduo, a me- seletivo. As cnanças defeituosas são li , d
e imma as, exc to ntr
154
1
os Sirionó, devido à crença de que foram gerad p r p I
tos malignos. Enquanto tal prática pode ser compr 1 di h
como um meio de aliviar a sociedade do ônus de aliment r '11-
divíduos potencialmente incapazes de se tornarem membr
úteis tem também, para a adaptação, um outro significado m -
nos óbvio. Ficou demonstrado que a proporção de deformi-
dades aumenta quando a mãe não seguiu uma dieta alimentar
adequada durante a gravidez. O nascimento de um feto defei-
tuoso é, conseqüentemente, um sinal de que a população al- Um dos aspectos mais interessant da cultur \ J v ,
do pelo qual o desequilíbrio demográfico un )
cançou um nível perigoso de concentração, face ao suprimen-
tornou parte integrante do complexo ad~ptativ, nu I
to de alimentos. Nessas circunstâncias, a eliminação de recém-
ulheres assumem o papel principal na busca d Um nto
-nascidos defeituosos não somente aumenta as probabilidades
p rda da metade da população adulta masculina n o 1
de sobrevivência da mãe, removendo o esforço de amamenta-
suprimento alimentar, o que certamente ocorreria e o
ção, como também ajuda a retificar o desequilíbrio entre o ta-
n r nte a cada sexo fosse mais equitativo. Além do mai
manho da população e os recursos de subsistência.
ntraste c0!ll o caçador Sirionó, que passa a metad do'
A ausência de uma alternativa para o leite materno faz mpo exercítando a caça, voltando muitas vezes de mão
com que o infanticídio seja o substitutivo humanitário de uma lu , o Jívaro consegue abastecer de carne a sua família
morte lenta, pela fome, quando a mãe morre. A incapacidade, ~ ando ~penas meno~ ~e um? q,uinta parte de seu t mi> '
por parte da mulher, de alimentar mais de uma criança refor- di repãncía de produtividade e ainda mais acentuada qu nd
ça o costume dos Kamayurá de matar a criança que venha a v mos que um Sirionó alimenta uma só mulher e doi filh
nascer enquanto a anterior ainda esteja sendo amamentada. sso que um Jívaro sustenta duas ou mais mulheres u
Este costume assegura um espaço de três a quatro anos entre IIh. s e ainda fornece um excedente de carne para ser con li
o nascimento dos filhos. Id pelos convidados nas inúmeras ocasiões festivas. Pa ,
Entre os Kayapó e os Kamayurá, os tabus sexuais, o abor- ulheres, a situação é oposta, já que a preparação do prin i 11
to e o infanticídio são aparentemente suficientes para conser- t . Jív_aro é u!ll~ tarefa muito demorada, que compre nd I
var a população dentro dos limites aceitáveis. Contudo, entre ügação do aipim, devendo elas ainda cumprir outra ri-
os Waiwai e, de modo mais efetivo, entre os Jívaro, existem di- s domésticas. Nessas circunstâncias, o meio mais práti {
versos outros métodos culturais importantes, cujo efeito é o de c egurar uma produção adequada é aumentando o núm
eliminar os adultos, principalmente os homens, enquanto pro- d mulher:s, que são produtoras e consumidoras, enqu nt
criadores. Tais métodos incluem a vingança sangrenta, as homens sa? apenas consumidores e, neste ponto, com _
guerras e a morte como punição pelo adultério. rn om as cnanças. O padrão de subsistência dos Jívaro p _
Os Jívaro levaram a vingança e a guerra a tal ponto que nto, não somente possibilita a eliminação de parte dd ho-
. dominam toda a sua vida social. Educam os meninos, desde 11 adultos como também atua, eficientemente para d _
quilíbrio proporcional entre os sexos. '
os primeiros anos, no cultivo das características e atitudes que
...ntre os Kayapó, a existência de uma ela d u rr ir
156
1 7
composta de jovens no pl ndo~ de uas ativid d. i I n i1
conseqüentemente, na fase de maior con~umo de alim nt in ç ntr
aquisição dos quais pouco ou nada contnbuem, repre nt l t idade, p m r p rt d 1
alternativa para como proceder com o excedente de hom n n Jívaro vivem sob pr o o i 1,
adultos. O guerreiro obtém os alimentos fornecidos pela m uma vingança com derr mamento d n u d
ou quando casado, pela esposa. Cabe-lhe apenas conservar nlmígo, levando-?s portanto a arrísc r pr6
saúde e fazer a guerra. Como o encargo de subsistência rep u- uaIdade de condições, é provável qu a circun tlnc:ia.
sa sobre as mulheres e os chefes de famílias, podem esses jovens ç~m a sobrevivência do mais forte e mais apto n
partir para suas incursões guerreiras s,em afetar o suprimen!o t~áno. O mesmo se aplica às vítimas. Para os J/v ro,
alimentar da aldeia. Embora 9S Kayapo tenham uma reputaçao vrsa a exterminar toda a população de uma aldeia lní I •
de guerreiros equivalente à dos Jívaro, a baixa mortalidade im sendo, as oportunidades de sobrevivência dep nd m'
masculina constatada numa proporção quase igual entre os dotes de inteligência, habilidade e força.
adultos faz supor que sua função não é, principalmente, a de
controlar o crescimento da população.
Um aspecto importante da maioria das medidas adotadas Técnic~s de controle da densidade de população
após o parto, de controle da população, é a maneira aleatória
como são aplicadas. É este caráter aleatório que mantém as Embora haja, em potencial, no ambiente da terra ãrm
proporções de sexo e idade adequadas para o funcionamento u~a grande var~ed~de. d_erecursos em plantas silvestres e m
da cultura e evita a eliminação de uma grande parte dos mem- animais, a sua distribuição é rarefeita. Além disso para qu
bros potencialmente mais úteis da sociedade. Quando se con- mante~~a um nível de produtividade razoavelmente alto, a b I.
sideram sob tal ângulo as circunstâncias em que se pratica o xa .fert~hdade do solo obriga a uma mudança freqüente na 10
infanticídio, torna-se evidente que, com exceção do caso de cal~zaçao das. roç~s. S~. assim pode uma população hum n
crianças defeituosas, os critérios são irrelevantes quanto à mais ?ensa VIver mdefInldamente, sem dilapidar de forma Ir
saúde, inteligência, ordem de nascimento ou sexo da vítima. reversível, os recursos alimentícios locais que se encontram d
Da mesma forma, o uso de adivinhações feitas por um xamã persos, em ~ez de concentrados. Não surpreende, pois, ue
Jívaro para identificar a pessoa responsável por uma morte :~m mecam~mos culturais desenvolvidos pelas tribos aa t rr
permite que a escolha recaia sobre um adulto, sem levar em 111~nepara impedir a concentração de população. Por outr
conta sua idade, posição social, habilidade ou mesmo amizade, a o, os seres humanos, como todos os animais sociais re u
parentesco ou hostilidade para com o morto. Embora se aponte rem uma de~sidade mínima de população para a satisf~ ã~ d -
geralmente o homem como culpado, a vingança se exerce, certas necessld~des sociais e psicológicas. Faz-se miste; or
também, tirando a vida de uma das mulheres da família. tanto, cons~gulr um equilíbrio entre a densidade 6tin:a pem
Entre os Kayapó e os Jívaro, a guerra difere, considera- term?s de sl~uação ecológi~a, que é relativamente baixa e a
velmente, da guerra em nossa própria sociedade na maneira ~ensIdade átima p~ra a satisfação das necessidades sociais bá•.
pela qual são escolhidos os guerreiros. Enquanto nós selecio- sicas, que talvez seja bem maior.
namos os homens mais fortes e mais inteligentes para uma car- " .Em ~o~as a,s socie~ades de que tratamos, a unidad co.•
nomica mimma e a famílía extensa. Como a divisão do tr b
158
1
lho é feita segundo o ex , m mbr de e grup p U 1 , 11 I lu . N t
juntamente, os conhecimentos e as habilidades necessária par 11( d 1 OlJ ntJ 1 •
propiciar alimentos, abrigo e equipamento essenciais à sob - um I 1/11 ic t 'lu t nd 0111 1 pl )
\ vivência e à reprodução. A família extensa, conseqüentemente, r I Ir V Uma, unb m p rqu
m t
representa o menor segmento passível de sobreviver indepen- 011 • ntr d d m rg m a nflit qu
dentemente e, em duas das sociedades da nossa amostra, a or- li vm n a. Tanto os Waiwai com os
ganização da comunidade é baseada nesta unidade mínima. As 111 n. brigas dos outros membro d u ilqu r
aldeias Waiwai e Jívaro consistem de uma única casa comu- f I ~ tun nto perigoso pois, se o ca o nã i r lvl 10
nal, separada .do vizinho mais próximo por diversos quilôme- uorí mente, um dos lados ou ambos podem r c r r
tros de floresta despovoada. A existência de fortes sanções que nrl .. I~porta notar que ambas as culturas dã um r 111 I
recaem tanto sobre o agrupamento de casas quanto sobre a tl r à h~~rda~~ pessoal. Karsten (1935, p. 269) diz d , J .•
expansão de uma casa além do determinado tamanho significa V Ir qu~ seu IllmI!ado senso de liberdade e desejo d ind •.
que uma concentração maior de população é incompatível com ( ndênc!a... Co~stltuem uma das razões porque não vlv m
a exploração, a longo prazo; do habitat. rn aldeias m~s, SIm, cada família em separado pois des fOi
O principal fator, entre os Jívaro e os Waiwai, na perpe- rn 1, os c~nfhtos são mais facilmente evitados." F~ck (]
petuação do padrão de comunidade dispersa é o acentuado (. 233) dIZ o ~esmo com referência aos Waiwai: "O W iw
medo da feitiçaria. Em ambas as sociedades, a segurança pes- tudo faz para ~ao se envolver nas brigas entre parentes, m ..
soal só está garantida dentro da família extensa. Qualquer que ~su.as SImpatias estejam claramente de um lado. u
outra pessoa, mesmo parente, é por si perigosa. Embora se tit~de e ditada pelo me.do de provocar um sopro fatal (f iti .•
possa praticar a feitiçaria à distância, a proximidade aumenta na ~, e pelo forte desejo de evitar qualquer interferêncía
o perigo e, portanto, quanto maior for o grupo familiar ua ~I~er~ade pessoal, caso venha a encontrar-se numa situ .'
maior será o risco de um sério conflito que poderá se idêntica. "
degenerar em inimizade mortal. Conseqüentemente, as ca- - E~bora os Kamayurá não pratiquem a feitiçaria, tem III
sas tendem a se subdividir quando o número de ocupan- q~e seja usada co~ra .eles ~or membros de tribos vizinh .
tes excede os limites do bem-estar psicológico. Entre os 1 por..9ue as ~eun~oes.mte~tnbais se efetuam numa atmo f r
Waiwai, pode se dar a separação quando a aldeia se muda para t:ns~o que, a pnmeira VIsta, parece incompatível com a irn-
um novo local. Entre os Jívaro, uma das famílias nucleares p rtancla do acontecimento de ordem econômica e social. m
constitutivas se retira para fundar uma nova casa, quando ela ontr~ste com os Kayapó, os Sirionó, os Jívaro e os Waiw i
já possui vários filhos. O aspecto importante dessa situação é que tem pouco. ou quase nenhum contato mesmo com mem~
o rigor da penalidade que recai sobre a concentração da po- bros de comumdades aparentadas, para não falar nas trib
pulação. Na verdade, uma ameaça de morte paira sobre os tranhas, ~s. ~amayurá. não só dependem dos não-Kamayur
membros de uma casa que tenha ultrapassado o tamanno para a aquisiçao de artigos essenciais, como a cerâmica, p
"optimum" . ~mplo.' como os convidam a tomarem parte em suas festa
Algumas das sanções que impedem a expansão de qual- princrpais. As vantagens da cooperação intertribal têm m
quer estabelecimento individual também proíbem os agrupa- . ntrapartida, .0. pe~igo da superexploração dos recursos' e
medo que a feitiçaria desperta é o método eficaz de impedir
160
161
concentração de muitas p a, num me mie 1, durunt
muito tempo (o "optimum" de duração sendo d termina I
pelo grau de pressão exercida sobre os recursos alimentí j
uerrci
i t 11i.
pondo-o
r qui it n c ário par
Ir d ir rov
r
i up ,I lt,
I IIvolv un
n 111 I
locais). Na sociedade Kamayurá, os laços de parentesco r -
sultantes do casamento com membros de outras tribos imp • hom ns, om r lação ao ;r ng1r po 1
rlnd mais fo tes pois que o ~::o~ ~ pr s,
Ir I (
p I I
dem que a hostilidade se transforme em vingança, com der-
ramamento de sangue, o que viria comprometer os aspectos
benéficos das relações intertribais. Um grande número de con-
t~ afe:a a posição do homem quen~ lh u
11 a Xpoe toda a sua família à retal ou
I
f 1m' vln
u I r
troles e verificações deste tipo impregnam toda cultura que t ,o que acarretará más colheít1 á ação por p rt p
conseguiu realizar uma adaptação a seu meio-ambiente. t • Na verdade, Karsten (1935 as, oenças m sni mo "
Um outro regulador da densidade de população entre as
li rr s se tornaram a tal ontd p. 2~9). observ u u 11 l
vld t que, para suprimi-Ia p . a essencI~ de sua própr]
tribos da Amazônia é a guerra e isto se evidencia pelas diver- ( xternas ou uma muda serram ?ecessánas pod ro ' r"
sas características que a diferenciam da guerra tal qual é feita pr itos morais" Paradox n1ça radica] de suas Indol s u
entre grupos civilizados. Em primeiro lugar, as incursões não _. a mente o ab d
levam à' anexação de terras. Ao contrário, pesadas sanções po- o pressoes acuIturativas fez dímit an ono das gu rr
p rtunidades de sobrevi;ência da In~Ir, em vez de acentuar, '
dem existir contra a aquisição de território. Os Jívaro, por
trutura adaptativa da cult tribo, solapando a íntrínca 1
exe~plo, "temem e detestam a terra de seus inimigos, onde O ura.
pengos sobrenaturais e secretos podem ameaçá-los, mesmo de- utro costume muito difundid
pois de conquistarem .seus inimigos naturais... O território v 1 dentro do contexto dos' o, .que se tornou compr 11"
inimigo é, portanto, abandonado o mais rapidamente possível," i nte da terra firme é o I~pe~atIvos ecológicos do m lo-
(Karsten, 1935, p. 278). Segundo, a maior hostilidade é mui- um dos residentes ad~ltos ~r~n tO~O da casa após a mo t
tas vezes dirigida a outras comunidades pertencentes à mesma u m sse costume com difere t s n os da. nossa amostra _
tribo, em vez de a membros de outras tribos. Karsten diz que 11 , que abandonam a cas~ ~segr?us de Intensidade. O i..
íul; , estão num extremo pOIS da morte de qualqu I
"é uma verdadeira característica Jívaro mover guerra contra
tribos da própria raça e falando a mesma língua," e que o faz m quando morre o che~~quanto ?~ Jívaro, que som nt
objetivo é "aniquilar completamente o inimigo." Dreyfus (1963, I l intermediária estão os W .da .famflia, estão no outro. N I
, arwaí que h . di
p. 93) também diz que "não há o menor sentimento de solida- m nt Com a morte do ch f d ~ oje em Ia, o faz m
I
,.
M e e, o xama ou d
smo quando restrito a un
lh
. a. n;u er de um
riedade tribal entre os Kayapó e, mesmo entre grupos aparen-
tados, a separação sempre conduz à hostilidade." Finalmente, o tume frustra qual uer "s I?oucos IndIVIduos seleto,
os alimentos e bens materiais pertencentes ao inimigo são des- f nra i dade mais alto ~o ~nden~la de manter um grau d'
truídos e a pilhagem jamais constitui o motivo da agressão. v I ' do equilíbrio ecolõ i~oe serta comI?~tíveI com a pr -
n ld td na prática do r fg 'd' Entre os Smonó, a maior in-
Apesar da ausência de recompensas materiais, a guerra é e en o costum deri
parte integrante da cultura dos Kayapó e dos Jívaro. As duas v 1, tu, parecer supérflua díant d e po ena, à prim j-
n I m i r parte do an~ A e" a ~rande mobilidade do gru-
tribos inculcam nos meninos o amor à guerra, narrando-lhes in-
júrias e feitos do passado, estimulando-os a imitar os bravos
162
r t uma m dida de prot ã à zs:
) p rf d sedentário t~rna ~us:~clad total de higiene duran,
u .
da ca a, prova v 1.•

1
SUBSIST:E:NCIA E DIVIS UAL DO TRA ALH
Ivl d trabalh ,p r , ntr
Embora a divisão do trabalho segundo o sexo tenha aí I
d tw fhm . (
c ntrlbulçll
zes biológicas, ela surgiu no decorrer da evolução cultural
como um meio de distribuir o ônus do trabalho da forma mal Tarefas Sirion6 Walwal l(v
equitativa e eficiente possível. Onde quer que as diferen a H M H M H
biológicas tornem um sexo visivelmente superior ao outr
numa determinada atividade, como, por exemplo, cuidar d SUBSISTBNCIA
Caça x
crianças e tarefas que exigem força física, verifica-se que a Pesca x x x
x x x (x)
mesma distribuição é praticamente universal nas sociedades hu- Coleta x x (x) x x
X
Agricultura x x X
manas. Na medida em que a cultura se tornou mais complexa, Derrubada e
entretanto, a divisão sexual do trabalho tornou-se um dos cam- queimada x x x x x
Plantio básico x x (x) X
pos mais variáveis do comportamento social. O estudo da di- Limpa x x x x
x x x x x
visão sexual do trabalho nas cinco tribos da terra firme mostra Colheita x x x x
x x x x X
que a distribuição das atividades aparentemente sem relação DOMBSTlCAS
com a subsistência é parte integrante da configuração adapta- Apanhar água x x x
tiva. Apanhar lenha x x x
x x
Cuidar crianças x x x x
Quando as tarefas atribuídas aos homens e às mulheres Processar man-
x x x (x) x x
são tabuladas e comparadas (Tabela 3) evidenciam-se, de ime- dioca
x x x
diato, dois fatores. Em primeiro lugar, as mesmas atividades ATIVIDADES
são, em essência, executadas pelos Kamayurá, Kayapó, Jívaro, ARTESANAIS
Sirionó e Waiwai. Embora existam diferenças importantes . Fiar o algodão x
Tecer o algodão x x x
x x
quanto à intensidade, à estação e à relativa importância das Fios e cordões x x
x
X
Tecer redes x x
várias tarefas, a subsistência se baseia numa combinação se- x x x
Cestos e esteiras x x x
x
melhante. de alimentos cultivados e silvestres; o artesanato Esculpir madeira x x x
x x
Utensflio.s de ca- x x
abrange as mesmas categorias de matérias-primas e produtos baça x ? ? x (x)
acabados, e as atividades domésticas diárias seguem rotinas pa- Instrumentos de x
música x x x
recidas. As principais diferenças ocorrem quanto à presença ou Adornos de pena x x x
x
Adornos de se- x x
ausência de cerimônias e guerra. mentes, algo-
A segunda característica óbvia é· a falta de consistência d40, ele. x x ? ? x
erAmica x x x
anoas de tron- x x
das tarefas que competem aos homens e às mulheres. Com ex-
tro de árvores x
ceção da pesca e da caça, que cabem sempre aos homens, e x x
das tarefas domésticas, que são sempre executadas pelas mu- x (x) x x x
lheres, a distribuição de trabalho parece, à primeira vista, ser x x

164 x
feita arbitrariamente. Na confecção de obj tos, os Jívaro to nt
Sirionó estão em p610s opostos, já que a maior parte das tar f hm n u t
executadas pela mulheres Sirion6 é feita, pelos homens Jívaro. v tr à mulh r a u pr p r o P n
O padrão dos Kayap6 e Waiwai é semelhante ao dos Jívaro d aqui, o processamento d mandioca Um t
mas os Kamayurá tendem a ficar numa faixa intermediária, de- d m?~ada. O fato de haver uma distribuiç o m f, q
signando para as mulheres diversas obrigações que, em outro atiVIdades artesanais, segundo os sexo d mon tr
lugares, são atribuídas aos homens. Como a cultura é um sis- us da subsistência é dividido mais equilibrad nt
tema integrado, os diferentes padrões devem refletir os diferen- o outros grupos de nossa amostra.
tes realces dados a outras atividades. Na verdade, estão cla- , ~ correlação entre a contribuição para a sub i t
ramente relacionados com o papel dos sexos na subsistência. divisão de trabalho na ~onfecção de objetos é meno d
O peso da subsistência na divisão sexual do trabalho refe- ntre os Kayap6, provavelmente porque, a maior compl
rente a atividades artesanais é bem mais sensível entre os d desenvolvimento da cultura em geral tende a obscur
Waiwai e os Jívaro, Em ambos os grupos, as mulheres passam r lações entre, as diferentes atividades. Como ao hom
a metade do seu tempo no processamento da mandioca. As, zer, ~ maior parte d~s ~ens materiais, deduz-se que a su
mulheres Jívaro são também responsáveis pela plantação e co- trlbuíção para a subslstencia é menor do que a das mulh
lheita dos alimentos básicos. Quando a essas atividades diárias s ,dados, entretanto, não revelam a existência de um d '"'
e demoradas se acrescentam as tarefas de cuidar das crianças, lfbrío. E~bora as mulheres executem a maior parte das tlv
apanhar água e outras obrigações domésticas, vê-se que a mu- dades a~nco~a~, exceto as que se referem à preparação do
lher tem todo o seu dia tomado. As obrigações dos homens ado, _tais atIVI~ades são, no entanto, sazonais; também a pr
para com a subsistência, ao contrário, não tomam 20 por cento paraçao dos alimentos não é tão trabalhosa para elas qu nt.
de seu tempo, ficando o restante livre para outras atividades. é ~ara as_m~lheres Waiwai, Jívaro e Kamayurá, pois q I
Não é, pois, surpreendente que os homens manufaturem a andioca ~a? e o seu alimento básico, Um estudo mai J
maior parte dos objetos usados por. ambos os sexos. r do das, atividades artesanais Kayapó revela outro fator imp:
Igual correlação está subjacente à divisão do trabalho e~- t nte: dIversas" ta~efas complexas, como a de tecer p n
tre os Sirionó, se bem que, neste caso, o papel dos sexos esteja des, faze~ cera~Ica e canoas não estão aí representadas. Mu •
invertido. A caça; principal atividade de subsistência, conso-
_dOSartIg?s feitos pelos homens são relativamente dur v I
me, pelo menos, a metade do tempo dos homens e estes divi-
nao necessitam de uma constante reposição. Na verdad o
dem a responsabilidade com as mulheres em outras atividades
home~s ~~yapó d_edicam a maior parte do tempo à gu '
importantes de subsistência. As mulheres Sirionó, por outro
lado, não gastam muito tempo na preparação dos alimentos e, c:nmomas e nao aos trabalhos manuais de madeira e n
conseqüentemente, ocupam-se fazendo cestos, redes e objetos cçao de cestos, Enquanto não houver dados quantitativ
diversos, Sem grande esforço. ue es~abeleçam a proporção exata da contribuição femini
sculina nas diversas atividades, o que se pode dizer é u
A divisão de trabalho entre os Kamayurá é também re-
padrão da divisão do trabalho segundo os sexos é, tamb
166
1 7
uun 10 I cl 11 tI I ( o
nesse caso, o resultado da distribuição de tarefas na ativi
au n i d .aru t I Hl'i
des ligadas à subsistência.
vid nt qu p d 'J 'r di p tl\ IlUIlI'
I I xidade gradativa ( b. 4). iri n
DIFERENÇAS INCIPIENTES DE COMPLEXIDADE tív s, Ialtando-lhes toda a caract ri ti
CULTURAL h fe da família (devido ao padrão de h bita
1 é também o chefe de múltiplas casas).
Uma ordenação das características geralmente considera- J varo não são muito mais adiantados; possuem ruu ( rn
das como indicadoras do nível de evolução cultural mostra que pecialistas em tempo parcial, dedicam-se a um mínimo I
os Kayapó e os Kamayurá possuem, de modo incipiente, di- omércio intertribal e entre as aldeias, e demon tr m t urnn
versas características adiantadas que não aparecem nas outras rganização incipiente de casas múltiplas, como t mb m um
três tribos. Ambas têm um chefe permanente para casas múl- divisão ocupacional do trabalho em artes e ofícios. O y ,
tiplas e um conselho de aldeia que se reúne todas as noites por outro lado, possuem sete e os Kamayurá onze cal' t r , -
para discutir assuntos de interesse da comunidade. Os Kayapó, ticas importantes. Quanto aos Kamayurá, o desenvolvim nt
com aldeias de mais de 500 habitantes, também possuem di- incipiente de mercados, a especialização ocupacional na con-
versos outros tipos de grupamentos sociais que se entrecruzam fecção de artefatos e as representações nítidas de seres sobr ..
com as linhas de parentesco, estabelecendo assim uma. inte- naturais, são aspectos particularmente dignos de nota.
gração social entre indivíduos que não se relacionam pelo Não resta dúvida que o nível mais baixo de complexidad
sangue ou pelo casamento. Como uma das principais diferen- cultural dos Waiwai e dos Jívaro tem relação com o núm r
ças entre a organização social das sociedades civilizadas ou maior e mais rigoroso de mecanismos culturais para o' controI
pré-civilizadas é a substituição dos laços de parentesco pelos do tamanho da população e sua' concentração nessas dua. t i..
laços civis este aspecto dos Kayapó é de especial interesse. bos. Em outras palavras, os fatores ecológicos que impõem t i
Os Kamayurá manifestam, de forma incipiente, duas outras restrições são os mesmos que impedem o progresso da evoluç
características que têm sido mencionadas com referência ao
aparecimento da civilização: a divisão ocupacional do traba-
lho e a troca formal através de um mercado público. Tais prá- CONCLUSÃO
ticas promovem a circulação de objetos, tanto dentro da aldeia
quanto entre aldeias pertencentes a outras tribos. Por outro A análise da adaptação cultural indígena ao meio-ambien-
lado, os Kayapó, cujas aldeias são muito maiores do que as te da terra firme amazônica faz ressaltar dois fatos básico :
dos Kamayurá, mantiveram o padrão amazônico característico ( 1) o tamanho e a densidade da população são mantidos d n-
da divisão do trabalho segundo os seX0S € uma ínfima troca in- tro de limites específicos por práticas culturais reforçadas; (2)
formal de produtos de não-subsistência entre os membros da dentro dessa limitação, a interação das características especíaí
comunidade. Tais discrepâncias acentuam o fato de que a evo- de cada meio-ambiente com a configuração da cultura preexis ..
lução cultural não se processa uniformemente no conjunto de tente produziu inúmeras variações sobre um único tema bá i..
um complexo cultural, nem em ritmo constante. co. A variação é mais pronunciada no padrão de subsistência.
Embora existam os mesmos recursos alimentícios silvestres
168 1
TAB A 4
ultiv I
Caracterlstlcas culturais de slanlflcaçAo evclutlva entre arupos da
do up
terra firme. m ma pr porç o. nt t nto, qu 1 u
ubsistência anual adotado, todos o 1 m nt
Características Sirionó Waiwai Jívaro Kayapó Kamayurá
enciaís são fornecidos nas quantidades n cesearías
SEDENT ARISMO Conquanto as diferenças de subsístêncí
População da
dicar resultados diferenciais na adaptaç o ao
aldeia ± 80 ± 25 ± 40 150 + == 110 tícios potencialmente existentes, a composição do cí I
Permanência menos de
da aldeia 6 meses ± 5 anos ± 6 anos Indet. == ,10 anos exerce um poderoso efeito sobre o resto da conflgur
tural. Como dependem de alimentos silvestres estacion i
ORGANIZAÇÃO
SOCIAL cisam abandonar periodicamente a aldeia provocand , v
Chefe da casa li li li li li
regra, o fracionamento provisório da comunidade, o qu
Chefe de múltiplas
casas
reta certas conseqüências sociais. 'O modo pelo qual a tlUCUllI
Temporário de subsistência são distribuídas entre os sexos influencia
(guerra) li li
Permanente li li são do trabalho em outras atividades, assim como as ob
Conselho da aldeia
Associações não
li li
ções de parentesco e as formas de casamento. Na maioria d
baseadas em
parentesco li
sas relações, a causa e o efeito não são lineares, de modo
não se pode determinar, no caso dos Jívaro, por exemplo,
ESPECIALISTAS poliginia permitiu que se desse uma ênfase especial à subsi t _
EM TEMPO
PARCIAL cia ou se foi o padrão de subsistência que determinou a in t .•
Xamã x x li li
tucionalização da poliginia. Interferindo nessa situação, no
Atividades arte-
sanais x
tido de complicá-Ia, surgem a elaboração da guerra e sua r.
percussões tanto sobre as responsabilidades da subsist n
COMJ;RCIO quanto sobre a proporcionalidade entre adultos masculin
Dentro da aldeia x femininos. Não há dúvida de que a adaptação cultural um
Entre aldeias ou
intertribal li x processo complexo, no qual os efeitos se transformam em c
Mercado formal li
sas, num ciclo infindável de ação e reação que mantém U
ESTRUTURAS
integração funcional no decorrer de uma mudança constant
ESPECIALI- embora, por vezes, imperceptível.
ZADAS

Casa dos homens li


Com exceção dos Sirionó, as tribos da terra firme apar
Casa da flauta li tam dispor de abundantes recursos de subsistência e, via d
Casa do Chefe li
gra, de uma vida fácil. Na verdade, elas ilustram bem a
RELIGIÃO tência idílica que levou os observadores provenientes de zon
Postes cerimoniais
temperadas a encarar a Amazônia como um paraíso ainda n
(ídolos?) x de todo explorado pelos habitantes indígenas. Entretanto,
170 171
. ii d t que uma abund n i\
perigoso concluir p.rec P ~ ~~ n e xistência de um p t n.
caça e roças produtivas slgmflc.am a e h' to das limit •
ci..al ~ão utilizado. P~l~a:~~::-~odao t~~:a ~~::~eva Adaptação indíg na
ç~es mer:~t~ :00::1~ à conclu-
verdadeiro e que a abundância é. o re-
~~x:~d
indígenas. ~porta também sa~e~i aó~~e p~~fa~lt~~~q~:
logos já verificaram o quanto euelhes
~~i:~S
e uil~rio da adaptação conseguido I;>elos habítant _

ermite o meio-ambien-
são bem menos numer%~!t~o a; conseJüências desastrosas da
te. Como veremos a, ós-euro éia demonstram
exploração descontrolada na l:':z!rlia lon~e de ser a terra A VÁRZEA, da mesma forma que a terra firm , 1111
ainda mais claramente que a ., '. . meio-ambiente variável. Enquanto que na terra firme a v ri •
. -
da pronussao, na-o passa de um paralso ilusôrío. ção deriva de precipitações pluviais, composição do solo to-
pografia, as características principais da várzea dizem r p it
à suscetibilidade diferencial à inundação e extensão desigu I.
Acima da foz do Rio Negro, a largura da várzea é, em m di
apenas cerca da metade daquela que existe ao longo do b i
Amazonas. De maneira geral, isto significa que o dobro d
extensão da várzea é acessível de uma área correspondent O
longo da parte mais baixa do rio. Além disso, a alta várz
acima do Rio Negro tende a ser inundada mais freqüentem t
te do que a parte situada a leste.
Infelizmente, nenhuma das culturas indígenas da várz
sobreviveu, não podendo pois ser estudada pelos antropólo
Em contraste com a terra firme, cuja vastidão a tornou imun
à interferência dos primeiros exploradores europeus, a várz a
era compacta, acessível e vulnerável. Resultou, portanto, qu
o padrão cultural indígena foi completamente destruído no
150 anos que se seguiram à sua descoberta, deixando apen
narrações fragmentadas e impregnadas da parcialidade do
observadores que forneceram os detalhes do caráter anterior
dessas culturas. Embora existam seis descrições reiativam nt
extensas para o período entre 1542 e 1692, os dados forn ci-
dos são geralmente vagos e inconsistentes. Variam muito, p r
17
172
exemplo, os nomes dados às tribos ou "províncias", tornando
difícil saber se duas testemunhas estão falando do mesmo gru-
po. As dúvidas podem ser resolvidas, algumas vezes, compa-
rando-se as distâncias ou os pontos de referência mas a escas-
sez de marcos característicos e a inconsistência das unidades
de medida (por exemplo, dias de viagem em vez de léguas)
tornam muitas vezes impossível a decisão. Além do mais, a
exatidão de informações específicas deve ser avaliada tendo-se
em vista o fato de que, pelo que sabemos, poucos foram os
observadores que tomaram notas durante suas viagens, que as
impressões eram geralmente confiadas à memória sob a tensão
das batalhas e que a tentação de enfeitar ou exagerar, para a
glorificação pessoal, pode ter sido bastante forte.
Apesar das deficiências, entretanto, as primeiras crônicas
atestam com clareza que a densidade demográfica e o nível
de desenvolvimento cultural eram bem maiores na várzea do
que na terra firme, ao tempo do primeiro contato com os eu- IOLI'IIA
IItAllL
•....•....•...• ,
ropeus. Os Omagua do alto médio Amazonas e os Tapajós, ....
~~:-:~;;:=~==~~:s~~~l:::.~
I.. 17. -Extensãoaproximada da várzea amazônica (ár tilhad )
~O--.:tIO Olíllf

da foz do rio do mesmo nome, são mencionados com bastante IlblOrvouque os Omagua habitavam a região entre J ea ifn a . quando Carvajal desceu O Amazon 0111I ~
Nutou, também, que os arredores da foz do Ta aiõso apu e a parte situada entre as confluBnciasdo Coar! • dll 111I11
freqüência em diferentes relatos, de modo a se poder ter uma nome. (Detalhe geográfico segundo Guerra, 19~,l Fi;."'f,;densamente povoados mas não mencionou oe hablt 111 •

descrição geral dessas culturas. Fontes mais recentes acres-


centam detalhes sobre as práticas de subsistência, cabendo à
arqueologia fornecer elementos sobre o padrão de povoamento
.de nível são muito grandes e. uma boa parte da várzea fi
e cultura material. A combinação de diferentes fontes de in-
formações nos permite reconstituir o nível geral de desenvol- ~n~ggada todos os anos. O índice pluvial anual é entre 2.000
vimento cultural atingido na várzea, nos tempos pré-europeus, . mm. Embora chova d,?rante o ano inteiro, caem rnen ,
de 150mm de chuva por mes, entre junho e setembro.
antes de analisarmos as relações entre cultura e meio-ainbiente.
Em 1542, ~ várzea, do Japurá até a metade da área situa-
f~) ·
en;.re o foan e o Pm:us, era habitada pelos Omagua (Fi .
or V? ta de 1690', tinham emigrado para o oeste e viviam
OS OMAGUA n t re os nos Napo e P t . A pnmeira
" .
b I '. u umaio. missão se esta-
Localização e meio-ambiente - Entre os rios Negro e Ja- e e~eu no Putumaío (Içá), em 1686, e vinte e sete outr
purá, a várzea atinge uma largura média de aproximadament iss?es foram funJa~a~ entre os Omagua durante a décad
25km, dos quais somente a metade se encontra ao longe d guínte, .De modo tipicamente espanhol esses ovoam nt
baixo Amazonas. Devido a esta limitação, as flutuações anu t mbét? mcorporaram índios de várias ~utra t~b d
t dos ínstruídos nos sacramento cri tão ,11
n tU111 I.
174
17
vida cívllíz d . A ís
acrescida de fugitivo ai rio, qu pr u Id I. 11,

sagrado contra as brutais incursões portugu sas m u h irqu


escravos. Em 1710, entretanto, expedições particularm nt t Ior, AJ um ald ia t v m ltuada 11 v rz I
vastadoras penetraram na zona das missões, provocando li I IIn s r tin idas por c. n durant ch Ja,
abandono e a retirada dos sobreviventes. A missão de San J A casas dos Omagua eram eon truç ,
chim de Omaguas foi restabelecida abaixo da foz do Uc ial uln.r ,com paredes de tábuas d cedr t t d pulhn LJ
mas, em 1731, tinha apenas 522 habitantes. A língua Omagu , IId 1 de 330 habitantes consistia de uma fil ir 2' 11 .1
que pertence à família lingüística Tupi, foi escolhida pelos mi - rda qual ocupada por uma família extensa. Eram ri (/' :,'
sionários para a comunicação oficial intertribal e para o ca-
tecismo.
111 nte espaçada~ e orie~tadas com o longo eixo perp I di ul'
margem do no. HaVIa uma porta em cada extremid d
Em conseqüência de doenças, de incursões preadoras d nt flor era sempre varrido e guarnecido com redes grand
índios e dos ensínamentos das missões, o modo de vida do t iras e vasos de cerâmica. '
Omagua estava quase extintto nos princípios do século XVIII.
Restam, entretanto, diversos documentos que nos fornecem, te- V(· tu~rio e adorno.s - Ambos os sexos usavam roupas d
lizmente, dados sobre a cultura indígena. Carvajal, que relatou I odao, uma camisa sem mangas que ia até os joelhos n
a primeira descida do Amazonas em 1542; Simon, que por aí t o dos homens, e as mulheres se enrolavam numa saia ~ui-
passou em 1560; Acufia, que desceu o rio em 1639, e Cruz, o t curlt:. Os h?mens quase sempre tiravam as camisas porqu
que fez o mesmo em 1651, contribuiram todos eles com algu-
I as h es tolh~am os movimentos. O pano era pintado com
mas informações. A maior parte dos detalhes provêm, no en- en os colondos.
tanto, do diário de Samuel Fritz que serviu como principal mis- Ú .dOs,
Omagua se distinguiam das outras tribos amazônicas
sionário entre os Omagua, de 1686 a 1723, e presenciou sua VI o as suas ~es:as ~c~,atadas. Fritz observou que este forma-
desculturação bem como o extermínio da tribo. t era dado na infância colocando na testa dos bebês uma e-
u na prancha ,.?U um entrançado de junco amarrado com ~m
Padrão de povoamento - As aldeias ao longo das margens uco de algodao, para não os ferir, e os amarrados pelos om
elevadas do rio estavam tão perto uma das outras que, con- r s a uma pequ_ena canoa que lhes servia de berço" (1922-
fome diz Carvajal, "não havia entre uma aldeia e outra (na 7
I p. 4 -48). A:una, desdenhosamente, descreve o efeito corno
maioria dos casos) a distância de um tiro de besta e a que es- Pbrecendo mais uma mitra mal acabada de bispo do q
tava mais longe não ficava nem a meia légua de distância e eça de um ser humano" (1942,. p. 69). ue a
havia também uma povoação que se estendia por cinco léguas,
ubsistência - Uma . - d .
sem deixar espaço entre uma casa e outra" (1934, p. 198). salta d t d nnpressão e excedente de subsistência
Uma aldeia parecia uma guarnição militar e localizava-se no e o .o~ os pnmeíros relatos. Numa aldeia, os mem-
alto de uma colina, dominando o rio. Outra aldeia se estendi' d~ ~a expedIçao. de Or~llana acharam "uma grande quanti-
por mais de 8km ao longo da ribanceira, a qual se separava e ca~e, peixe e biscoitos, tudo com tanta abundância
da terra firme por um pântano. As grandes aldeias eram divi- ~l ;ra suncíenre para alimentar uma força expedicionária de
I omens durante um ano inteiro" (Carvajal, 1934, p. 192).
176
177
Todas as vezes que desembarcavam para procurar provisões, " A m?ndioca era usada para fazer "biscoito" ou b j I.
achavam grandes quantidades de alimentos. Acufia acrescenta vajal expl~a que embora "este biscoito pareça. estranh ,I1
que "o que é mais surpreendente é o pouco trabalho neces- les q~e nao o .~onhecem ou nunca o viram, pois nã I
sário para obter todas. estas coisas, como pudemos observar de fannha de .tngo, deve ser assinalado que lá os índio tlnh \11
por nossa própria experiência" ( 1942, p. 42). O alimento grandes quantidades de bolos grandes feitos de farinha d
básico era a mandioca; o milho também era :importante. di?ca, assados como biscoitos, e também alguns feitos d n III ,
Qutras culturas eram o aipim, a batata-doce, o amendoim, o fei- mistura de milho e aipim, que se assemelham a um bom p
jão-verde, a pimenta, o abacaxi, o abacate e outras frutas. Tam- (1934, pp. 424-425). De acordo com as primeiras inform
bém cultivavam o tabaco, o urucu, a cabaça e o algodão. Em- sobre o proce~samento da mandioca, as raízes ficavam d n •
bora a pupunheira não seja mencionada, as plantações densas lho durante cinco dias, depois do que eram tiradas de c
encontradas no princípio do século XIX ao longo do médio cadas e amassadas nUIl! pil~~. O suco era extraído passand _,
Amazonas sugerem que houve um cultivo intenso nos tempos a. polpa por ~ma peneira cilíndrica, A massa era então pulv •
aborígenes. rizada e peneIrada para produzir a farinha, que era espalhad I
Fritz dá alguns detalhes dos métodos agrícolas: com a mao numa assadeira e imprensada com uma cabaça p li',
."As plantações. .. que suprem sua subsistência e as casas formar um ~olo chato. As bebidas fermentadas. eram feita d
ou fazendas são geralmente situadas em ilhas, praias ou mar- cacau, mandioca e outros ingredientes, e guardadas em gran-
gens do Rio; todas as terras baixas sujeitas à inundação ... des potes.
Para que não falte comida durante a época da cheia, que co- . Entre outros tipos de alimentos; são freqüentemente m n-
meça em março e dura até junho, costumam colher o produto .ionadas as tartarugas. Os espanhóis encontraram grande quan ..
de suas hortas em janeiro e fevereiro" (1922, p. 50). tidades por todos os lugares onde paravam. Numa aldeia c I
O método acima produziu, entre quatro e seis meses, a .ula-se que ?s currais continham seis a. sete mil animais 'e r _
quantidade de mandioca que seria produzida na terra firme mente havia menos de cem. Como cada tartaruga era "mai r
em um ano e meio. Acufia observou que a inundação anual dos o que uma r?d~ de. bom tamanho", bastava uma para alim n-
campos "os fertiliza com. sua lama, de modo que o solo nunca r ~~a família ínteíra. Dos ovos,· extraíam um óleo gosto
se toma estéril, mesmo se ano após ano é utilizado para o plan- utrítívo. Acufia descreve o método de captura como se s u
tio do milho e da mandioca, que são os alimentos básicos e "Fazem grandes currais, cercados de postes, cavado p
que existem em grande escala" (1942, p. 35). ntro, de modo a que acumulem água da chuva e se tr n
O milho era armazenado em casas ou em celeiros eleva- m m em lagos rasos. Isso feito, quando chega o tempo n
dos. Os tubérculos da mandioca e do aipim eram colhidos antes 1 tart~rugas põem seus ovos nas margens do rio, as trib
da inundação e enterrados em covas. na várzea onde permane- uanlbém deixam suas casas e vão para os lugares onde a t r
ciam até que o nível da água baixasse. Carvajal relata que po... costumam aparecer. Aí elas esperam até que as t rt •
diam ser conservados por dois ou mais anos e, "embora este mecem a cavar os buracos onde põem os ovos. O in-
aipim e mandioca possam apodrecer, quando prensados se tor- n. ntão cortam sua retirada para a água e caem
nam melhores e têm maior substância do que quando fresco , r p ntinamente, de modo que d ntro de pouco t rnpo
e deles fazem bebidas, farinha e beiju" (1934, p. 50). im uma grand quantidade, em m i forç a n '
vi -1 d P t P r r, imp dind - ,,1m, d
17
17(J
moverem, com todo o tempo necessário para amarrá-Ias com rrn do mmnnho do um hOIllUJIl, III..'IIIUJ II'UI1(.'IIUIJ8 011
vários cordões através de buracos feitos na carapaça; jogad iobertos do couros do jacaré, peixe-boi ou
dentro da água, são rebocadas atrás das canoas sem qualquer
N a falta de pedra, os machados o ns 011
dificuldade, até que possam ser colocadas nos currais previa-
co de tartaruga. Cortavam um pedaç
mente feitos, onde ficam presas e alimentadas com ramos e quadrados da parte interna do casco, qu
folhas que as conservam vivas até o momento desejado"
tente, o mesmo era curtido pela fumaça e, ao
(1942, p. 39).
uma pedra, adquiria um gume. Dep.ois de inserld
A pesca era um importante meio de subsistência, pois que
o machado feito desse material cortava muito bem, embora m
os peixes podiam ser conseguidos em grandes quantidades. A
nos rapidamente do que se fosse de metal. As mandíbulns do
arma comum era o arpão mas o envenenamento também se
peixe-boi eram usadas para servir de cabo às enxós. Tábuns,
fazia quando as águas estavam baixas. A presa aquática prefe-
mesas, tamboretes, canoas e outros objetos de madeira eram
rida, entretanto, era o peixe-boi, o qual, conforme diz Acufia,
sculpidos com esses instrumentos e, ainda, com formões, gol..
não era somente delicioso como, também, muito nutritivo, de
ViS e cinzéis feitos de dentes de animais inseridos em cabos
modo que "com uma pequena quantidade a pessoa fica mais
satisfeita e com mais energia tio que se tivesse comido duas madeira, os quais, conforme observou Acuíía, eram "tão cfJ.•
vezes a mesma quantidade de carneiro" (1942, p. 38). cientes para o trabalho como os feitos de aço" (1942, p. 54) I

S troncos de cedro, trazido dos Andes pela cheia do rio, eram


Pouco foi dito nos primeiros relatos sobre a caça terres-
usados como madeira de construção e para fazer canoas.
tre e a coleta de alimentos. Os frutos das palmeiras eram co-
lhidos durante a estação chuvosa e as castanha-do-pará eram O algodão era fiado e tecido pelas mulheres que produ-
uma parte importante da dieta alimentar. Os homens de Orella- iam o pano necessário para o consumo local e, também, um
na acharam uma boa quantidade de mel em algumas aldeias. xcedende para ser comerciado com as tribos vizinhas, atra
A anta eo caititu eram caçados na terra firme. das que eram pela beleza do tecido. Produziam padrões colo-
idos muito bonitos ao ser tecido o pano ou, depois, com o
mprego de tintas.
Outras atividades - A principal arma de caça, pesca e luta
era a lançadeira de dardos. Tinha a forma de uma tábua chata A cerâmica era uma outra arte muito desenvolvida, a jul.•
de cerca de um metro de comprimento e três dedos de lar- ar pela descrição que Carvajal faz da cerâmica encontrada
gura, com um gancho de osso na ponta superior para prender numa aldeia Omagua: "-... havia uma grande quantidade d
o projátil. O arpão, dardo ou flecha tinha cerca de 1.80m de tigos de porcelana, de diversos feitios, jarros e cântaros mui-
comprimento ("nove palmos") e uma ponta de osso ou de to grandes, com capacidade para mais de vinte e cinco arrob ••...,
madeira muito dura que às vezes podia se desprender e ficar outros objetos pequenos, tais como pratos e terrinas e cande-
enterrada na vítima. Para atirar, "a flecha é pegada com a mão labros desta porcelana, a melhor que já se viu no mundo, pois
direita, com a qual a lançadeira é segurada pela extremidade in- de Málaga não é igual, porque esta (i.e. esta porcelana qu
ferior, e colocando a flecha contra o gancho eles a atiram com ncontramos) é vitrificada e enfeitada com todas as cores,
tal força e precisão que não erram a uma distância de cin- stas são tão vivas que deslumbram e, além disso, os desenhos
qüenta passos" (Acufia, 1942, pp. 51-52). Os escudos usados as pinturas que fazem sobre ela são tão bem trabalhados qu
180
181
(nos admiramo) com J iam ( oment ) com lu bllld cI
11'1 10 t nl 1111 nt IH
natural fazer e decorar todas estas coisas ... " (1934, p. 201 V, II J pr d pr v n nt d
.Outros objetos manufaturados incluíam cestas, tromb t , qu tinh m íd dquí ido dur nt
flautas e tambores. d por instrumentos de ferro ou p n , u I
Enquanto o chefe provincial era o único que tinha um modo. O Omagua, arrogantemente e tirad
ocupação especializada especificamente mencionada nas descri- modo senhoril, envia seu empregado ou mpr
ções existentes, a bela qualidade dos tecidos e da cerâmica in- ou sua escrava, em busca de alimento, bebida u utr 1
dicam que existiam especialistas nessas artes, pelo menos em e~elhant~s~ Sob outros aspectos, tratam os empr c
tempo parcial. O aparecimento de uma profissão religiosa que muíta afeição, como se fossem seus próprios filho ,Ih I
tomava todo o tempo está implícito nas diversas responsabili- roupa, comem no mesmo prato, e dormem junto dei d bul
dades e no alto prestígio dos oficiantes religiosos que presta- do mesmo toldo, sem lhes causar o menor aborr cim nt t
vam serviços ao povo como "professores, pregadores, conse- (1922, pp. 48-49).
lheiros e mentores" (Acuíia, 1942, p. 57). Eram consultados
para que explicassem os fenômenos complexos; forneciam er- Ciclo de vida - Os recém-nascidos eram enterrados viv ,)1(
vas venenosas para serem usadas nas vinganças e acompanha- caso de a mãe ainda estar amamentando o filho anterior
vam os guerreiros nas batalhas, empregando seus conhecimen- no caso de nascer uma menina quando os pais queriam um
tos em prol da vitória. menino. Uma pergunta formulada por um dos missionári
possibilitou a informação de que muitas mulheres tinham m r-
Organização social - Cada aldeia tinha um chefe e todas as to dois ou mesmo três filhos.
aldeias de uma "província" eram unidas sob um chefe supe- . O ca~amento se. fazia mediante o pagamento- do preço d
rior que foi descrito por Carvajal como sendo "um grande se- noiva, aSSIm como CInCOanos de serviço, por parte do noiv
nhor, e tendo muita gente sob o seu comando'; (1934, p. 190). ao pai da noiva. '
O governante Omagua, no final do século XVII, tinha o nome . . A~reditavam que a morte de um adulto era causad p r
de Tururucari que quer dizer "deus". Seu poder se extendia feitiçaria, O corpo era enrolado em lençóis e enterrado d nt o
ao longo do rio por mais de cem léguas e era obedecido por de casa. Os ritos funerários, que duravam diversos dias I.
todos "com grande submissão." Os governadores das provín- giam lamentações contínuas, entremeadas de festas e b bid .
cias Omagua e Machipero, que ocupavam a parte oriental do
Cerimônias - Os Omagua tinham um pendor por fe t
rio, eram amigos e se uniam na guerra contra as tribos do inte-
danças, que duravam de dois a quatro dias, e eram marcadr '
rior. pelo consumo de grandes quantidades de bebidas feitas d
No outro extremo da escala social dos chefes estavam os mal!dioca, milho ou Abat.ata~doce.As reuniões ofereciam opor-
escravos que tinham sido capturados em criança, durante as tunidade para conferências durante as quais se planejavam in-
incursões feitas contra as tribos da floresta. Eram empregados cursões de vingança ou de captura de escravos.
nos trabalhos agrícolas e nas tarefas domésticas. Seu papel e
a maneira como eram tratados foram descritos por Fritz: Comércio - Fazia-se pano de algodão para ser comercializad
com as tribos vizinhas.
182 1
Guerras -. Os Omagua viviam m contínuo estado d gu r
com as tnbos do mtenor. Para a defesa, as aldeias eram c r.
cadas, de. paliçadas, ou localizadas em ilhas , onde ficavam in _
cessrveis aos habitantes da terra firme que não. possuíam c _
noas. As incursões eram motivadas pelo. desejo. de vingança
ou de adquirir escravos. Os velhos e as mulheres, que não. pres-
tavam para a escravidão, eram mortos imediatamente, enquan-
to. os cativos de categoria elevada ou coragem notável que,
deixados vivos, representariam um perigo. constante, eram mor- OS TAPAJÓS
tos no. decorrer das cerimônias. As cabeças eram conservadas
dentro. das casas, como troféus. Localização e meio-ambiente - O Tapajós é um rio d
Carvajal descreve graficamente o. ataque dos Omagua aos lara .que alcança o. baixo. Amazonas no trecho que itu ,
primeiros eurüpeus que penetraram naqueles territórios: ap~üxlmadamente, entre o. Rio. Negro e a Ilha de M r j
" . .. vimos muitas canoas vindo. pelo. rio, todas equipa- (Fig. 17 ~.. E nesse ponto que o. canal principal costeia a m .•
das para a luta, alegremente coloridas, e os homens com seus e~ meridional da várzea, obstruindo em parte a foz do 'J
escudos, feitos de peles de lagarto. e couros de peixe-boi e de pajés e formando um lago. de terra firme (Fig. 18). Os n
anta, da altura de um homem pois üs cobrem inteiramente. trafortes d,?s planaltos guiano e brasileiro. atingem suas m i ..
Vinham gritando, tocando. os tambores e as trombetas de ma- re~ extensües mendIOna~s e s.etentriünais nesta região, dand
deira, nos ameaçando. como. se fossem nos comer" (1934, ngem a uma topografia mais variada do. que em qualqu
p. 190). outro .lugar a? longo das margens da várzea. A transform
Religião e magia - Os Omagua acreditavam em diversos es- da .paisagem impressionou Carvajal que a descreveu com
píritos que eram representados por ídolos. Alguns tinham po- maIS.resplandecente terra que vimos e descobrimos ao. I n
der sobre as águas, outros sobre as plantações e outros sobre do no, porque eram terras elevadas com colinas e vales" li I
a vitória nas guerras. O ídolo do. deus da guerra era carregadç uma aparência tão. normal como a da nossa Espanha" (1
na proa da canoa, para assegurar o. bom desempenho. da in- pp. 223, 217).
cursão. Carvajal descreveu, detalhadamente, a maneira de fa- Essa ~aparência normal" refere-se provavelmente Vil
zer e a aparência geral de dois ídolos: t s extensões de campos naturais, notáveis, sobretudo,
" . .. nesta casa, havia dois ídolos feitos de penas, üu ío- lün~o. da m~rgern esquerda, em decorrência das condíçõe li.
lhas de palmeiras de diversos tipos. .. e eram da altura de um mátícas I?C~IS._A unica parte da bacia amazônica que rec b
gigante, e em seus braços, enfiados na parte mais carnuda, ti- uma precipitação anual inferior a 2.000mm é a que se situ
nham um par de discos semelhantes a encaixes de castiçais. Ti- ntre 52~ e ?6° de latitude oeste (Fig. 6). As precipitações sã
nham também a mesma coisa nas coxas, perto. dos joelhos. As trao~dmanamente reduzidas e se concentram entre dezem-
orelhas eram furadas .e muito. grandes, corno as dos índios de ro ~ junho, D~rante a estação seca intermediária, a urnid d
Cuzco, e até mesmo. maiores" (1934, p. 201). Iativa pode carr a menos de 70 por cento. Quando combina-
um solo bem drenado, essa umidad in ufici nt para
184
1 5
manter a vegetação florestal da terra firme. A várzea, que. de-
pende mais das variações do rio do que das chuvas locais, 6
menos afetada pelas condições climáticas citadas.
Quando o Amazonas foi descoberto, a região do Tapajós
era densamente povoada. A vista de tanta gente, a tripulação
de Orellana, já exausta das batalhas que tinh~ travado, deve
ter ficado desanimada. Em todo o caso, Carvajal confessa que
"eram tão numerosos os povoados que surgiam e que íamos
divisando nas ditas ilhas que ficamos preocupados" (1934,
p. 218). Mais adiante, acrescenta, um pouco mal-~umor~da-
mente, que as aldeias "por serem (tão) numerosas nao podI~m
ser contadas e além do mais não foi feita nenhuma tentativa
para isso (contar), visto que não nos deixavam sós o tempo
suficiente para poder fazê-lo" (op. cit., p. 436). No início do
século XVIII, entretanto,. só restavam da população indíge~a
alguns esparsos remanescentes, pois que a maior parte havia
sucumbido vítima das expedições preadoras de escravos, da
ação missionária, das doenças e outras inovações da. civiliza-
ção européia. A deculturação se process~u t~o rapldam:nte I 18. Detalhe da várzea na foz do Rio Tapajós. A densa formação de canais e lagos cessa bruscamente no 111111. I
firme. O bloqueio parcial da foz do Tapajós criou um extenso lago de terra firme ao longo do QUIlO Inr rhn 111
que a filiação lingüística dos índios Tapajós e desconhecida, • A. linhas tracejadas encerram trechos de campos. Os pontos representam sítios arqueológicos com cerdml I ., I"
aJÓiJ alguns dos quais se localizam na .vãrzea (detalhe geO!!ráficosegundo USAF Work Steet 947B e 947 ; !rIr 111111 11
embora se saiba que não era Tupi. U nloaIca de Nimuendaju, mapa inédito no Arquivo do Museu Etnográfico de Gõteberg).

Os dados sobre a cultura dos Tapajós, anterior ao con-


tato são menos detalhados do que os que existem sobre os
Omagua e, em conseqüência, incorporaram-se à descrição ou-
trás informações provenientes da região em geral. As obs~r- numerosos que "davam medo" aos exploradores europeu. A
vações de Carvajal, em 1542, são completadas pelas de Acu~a, densidade demográfíca era tal que "uma aldeia não ficav
em 1639. A principal fonte de documentação, entr~t.anto.' e a mais de meia légua da outra e menos ainda do que i t o
história escrita por Heriarte em 1692. Detalhes adicionais fo-
longo de toda aquela margem à direita do rio, que é a mar
ram fornecidos por investigações arqueológicas.
ul; e posso acrescentar que para o interior, a uma distân i
d duas léguas do rio, mais ou menos, podiam-se ver algum c
Padrão do povoamento - Carvajal descreve um povoado da
randes cidades que resplandeciam, de tão brancas que er m"
margem esquerda do Amazonas que "se encontrava na curva
(op. cit., pp. 216-217). Heriarte declara que uma aldeia Tn-
de um pequeno rio numa grande extensão de terr~ pla~a com
p jó típica possuía entre vinte e trinta casas e que a capital,
mais de quatro léguas de comprimento. Esta aIdela fOI cons-
truída ao longo de uma rua e tinha uma praç~ no meio, co:n
10 lizada na foz do Rio Tapajós, era "a maior e mai p pu! '!
casas dos dois lados" (1934, p. 212). Os habitantes eram t Id de conhecida no di trito", capaz de forn c r 60.000 u r-
1 I 7
reiros. Acufía passou algum tempo numa aldeia de mai d 00 mandioca e várias frutas. O milho era guardado em ce t
famílias. Uma expedição inglesa que explorou o baixo Am • ficavam enterradas na cinza, como medida de proteção
zonas em 1628, também menciona "muitas cidades bem p - o gorgulho. As farinhas de milho e de mandioca eram
pulosas, algumas com trezentas pessoas, outras com quinhen- radas e usadas para fazer pão.
tos, seiscentos ou setecentos habitantes" (Ashburn, 1947, O arroz selvagem, que existia em grande quantidad nu
p. 18). lagos maiores, constituía, em toda essa parte da várzea u
Estes relatos oculares de diversas aldeias grandes são con-
firmados por evidências arqueológicas. Num trabalho realizado
alimento vegetal muito importante. Era usado para fazer p'"
"um vinho muito bom". Vários frutos silvestres eram tamb
em 1923-1926, Nimuendaju localizou 65 sítios que ele calcula- consumidos.
va representarem menos da metade daqueles existentes, de Embora no Rio Tapajós a pesca fosse pobre encontr ..
fato, na região (Fig. 18). Com a exceção de alguns postos de vam-.se, na várzea, em grandes quantidades.: peixes, tartaruga
pesca, todos estavam acima do nível de inundação e a maio- e peixe-bois. Antas, pássaros e outros animais de caça eram
ria se situava nas colinas. A descoloração do solo indica que encontra~os na floresta. Nas aldeias, criavam-se "perus", pato
houve uma fixação de residência bastante estável, descoloração e papagaios.
esta que torna os sítios faéilmentereconhecíveis e lhes dá a
designação local de "terra preta". Outro indício da permanên- Outras atividades - As informações existentes sobre o art ..
cia de aldeias na região é a existência de estradas retas, afun- sanato não distinguem entre atividades masculinas e femini-
dadas, com cerca de 1,50m de largura e um sulco de O,30m, nas. Os vasos de cerâmica e de madeira usados às refeições
ligando as aldeias entre si. Para o suprimento de água, cav~- as cabaças usadas para beber eram decorados habilidosament
vam poços, já que não havia rios na região. Ao longo do RI.o com desenhos bem feitos e pintados em cores atraentes. Car-
Arapiuns, as áreas das aldeias são bastante grandes e os atuaís vajal menciona, de modo especial, a alta qualidade da c r _
residentes delas se utilizam para a agricultura comercial. A mica, como se segue:
maior parte da cidade de Santarém está construída em cima de "Manufaturam e modelam peças grandes feitas de ar il
uma das maiores extensões de "terras pretas" que atingem até com desenhos em relevo, (no estilo) da manufatura roman
1,5Om de espessura. Depósitos mais rasos aparecem em torno assim vimos muitos utensílios, como tigelas e xícaras e outr
dos lagos, sugerindo uma ocupação mais curta, talvez sazonal, recipientes para beber e potes da altura de um homem 111
durante a estação da pesca. capacidade para trinta e quarenta e (mesmo) cinqüenta arr bn:
muito bonitos e feitos de argila da melhor qualidade" (1 4.
Vestuário e adornos - Carvajal descreve os índios Tapajó p. 442).
como sendo muito altos, com cabelos curtos. Geralmente, não A descrição acima aplica-se à cerâmica arqueológica da
usavam roupas mas, para as cerimônias, tinham belas vesti- rea que se caracteriza por sua espessura fina, superfície li
mentas feitas de pertas de diferentes cores, costuradas sobre um cor de creme e desenhos de baixo e alto relevo, assim com
tecido de algodão. pinturas policromas.
A principal arma era o arco-flecha. As flechas eram n-
Subsistência - A principal colheita era o milho que era plan- v nenadas de modo que uma simples picada na p 1 pr v u-
tado na várzea, em grandes roçados. Cultivavam também a
188
va a morte. Como não conh ciam antídotos, o I P i ti qu m lV n , nti
l vulto
temidos pelas tribos vizinhas e tratados, com f tividad, torminavam quando o Vj~h
primeiros europeus. . .
O algodão era transformado em fIO .e co~ ele se tecl 1 omércio - Cerâmica vinho de arroz r
as redes. Usavam também, como alternativa, fIb~a de pal~ i~ om os grupos vizinhos.
ra. As cestas eram usadas para armazenar o milho e muitos
outros fins. As canoas eram bastante grandes, P?d~nd? ca~re- Guerra - <?s Tapajós eram muito temidos p 1 Ir...
gar de 20 a 40 pessoas. Os instrumentos mUSIcaIS incluíam nhas e mantinham sua, supremacía sobre elas por r m 1111 i
trombetas, tambores, flautas e rebecas de três cordas. numerosos, possuírem flechas envenenadas e por est r m I-
pr.e prontos para a guerra. As mulheres guerreiras for m d _
Um indício da existência de especialização artesanal é a
crítas p.or C~,rvajal "lutando à frente dos homens como mulh _
observação de Carvajal de que "os objet?s que eles manu!a-
n;s caplto~s. Lutavam com tal destemor que "os hornen in-
turam fariam boa figura aos olhos dos mais esmerados arte~a~s
dígenas nao ousavam dar-lhes as costas e quem quer que lh
daquela profissão na Eur~pa". (1934, p. 442), onde exístía
dc:;s~~as costas elas matavam com tacapes bem em frente d
uma especialização ocupacional avançada. Tanto o chefe ~u-
premo como os chefes religiosos eram provavelmente especia- nos (1934, p. 214). O mito das Amazonas parece ter sid
baseado nessa, observação.
listas em tempo integral.

Organização social - Cada aldeia tinha um chefe e acima ~e Religião e magia - De acordo com diversas autoridades anti-
gas, ídolos pmtados eram conservados pelos Taoaiõs em s::In.
todos havia um chefe supremo que era rigorosamente obedeci-
tuário especial onde recebiam ofertas de vinho. A observação
do por seus súditos. A autoridade era determinada ~el~s q~a-
é comprovada pela ocorrência de estatuetas de cerâmica pin-
lidades pessoais e não pela hereditariedade. A escravidão eXIS-
tadas ,n~s sítios arqueológicos. Além disso, os corpos dos ch _
tia, parecendo porém ser menos difundida do que entre os
fes, depois de mortos, eram conservados e venerados. Todas a,
Omagua. pessoas .davam um décimo de sua colheita de milho para s
Ciclo de vida - Praticava-se a poliginia e as mulheres adúl- deuses; este milho eram armazenado no santuário e usado par
teras eram punidas com o afogamento no rio. Por ocasião, da preparar o vinho que se destinava às festas.
morte, o corpo era enrolado numa rede e colocado numa pla- Embora se mencionem oficiantes religiosos, a única obri-
taforma especial juntamente com seus pertences e uma esta- gação que lhes era atribuída dizia respeito à leitura de pres á-
gios. "
tueta na cabeça. Depois que a carne desaparecia, os o~sos eram
pulverizados e misturados com vinho que era bebido pelos
parentes e por outras pessoas.
SOBREVIvmCIA DE PADRÕES INDtGENAS NO USO
Cerimônias - Heriarte descreve uma festa que se realizava DE RECURSOS
uma tarde por semana, numa clareira atrás da aldeia. Trombe-
tas e tambores "tristes e funéreos" tocavam durante uma hora , As primeiras informações posteriores ao contato, relativas
ao padrão de' subsistência dos habitantes da várzea, podem ser
,190
191
completadas pelas d cri d atividade cent I ,
pesca e coleta. Embora algumas delas tenham atualm nt In " r tira 1 com lh I' S d mad ir
comerciais, a natureza das técnicas empregadas sugere qu P . A . rn do p i -b i da t rtaru 11 I v uln 11 I
jam remanescentes dos tempos pré-colombianos. I ,.d P ]. de cortada e frita em p qu 11 ' P 111 ,( 11 I1
Os pássaros, atraídos em bandos pela abundância de co.. d P íxe-boí é u ado, c mo aItern tíva, p r m 11\0 fi 111
mida existente nos lagos da várzea, que começam a diminuir ~.rt ugas recém-nascida.s, cozinhadas em tu u i (su o d ,;, 111
de volume, são caçados pelos atuais habitantes, à noite. Este 1 ca e pímenta), constituem uma iguaria muit p 11.
entram cautelosamente nos locais, iluminando o caminho com Durante. os meses de agosto e setembro, qu nd n v I II
uma débil lâmpada de querosene, que possui apenas uma pe- água está baixando, os atuais habitantes do m di
abando a n izon I
quena abertura na frente, e que .é carregada, â cabeça, pelo n m suas casas e vão para os acampamento r vi rit.
chefe do grupo. De cada lado do chefe, um homem carrega d~ pesca, às margens ~os lagos da várzea, a dois ou tr dia 'I
uma rede ou uma estaca. No momento exato, jogam a rede e a ~IstâncIa ..Esta migraçao sazonal é um acontecimento f tiv
estaca é brandida horizontalmente, quebrando os pescoços dos
im descrito:
pássaros que cairam na armadilha. O resto do bando foge ame- "]:'Ijmgué:npode imaginar a alegria com que essa ent s
drontado mas retorna, a seguir, se os caçadores ficarem silen- Ioco~ove. ~ao há mais lídima fraternidade, sobretudo gqu nd
ciosos, de modo que a operação pode ser repetida. Nas vizi- e reune~ a sombra dos apuizeiros e das copadas man u ir
nhanças de Manaus, milhares de patos são mortos anualmente para cozinhar as refeições. Pilheriam, riem, tocam cava~linh
por esse método. cantam. :rosseguem VIagem e penetram o lago. Escolhem un~
Os primeiros exploradores do século XIX observaram que reca?!o a margem, ou mesmo algum já utilizado em outr. .
os índios do baixo Rio Japurá conservavam grandes quanti- ocasroes, e aI. constroem seus tapiris: é a [eitoria, onde nã f 1-
dades de aves caçadas desse modo, assando-as numa foguei ~ tam os tendais de varas ou de paxiúba, que servirão para e t n.
ra e depois empacotando-as entre folhas de palmeiras. Esses dere secar as mantas de pirarucu salgado. Ao fim de doi mo-
volumes eram mantidos debaixo da viga da cumeeira das casas. ses (agosto e setembro), está terminada a safra. É o tempo n
As tartarugas ainda são caçadas às centenas, durante a que se esgotaram as provisões e começam as chuvas Os
baixa do rio, quando se arrastam em direção à praia para a de- ~ores recolhem às igarités o produto do seu trabalh~ ... pAr,1:.
sova. As tartarugas adultas ficam presas em currais, à beira a~"ac~mpamento em conjunto, todos satisfeitos rumo à uu
d'água, o tempo que for preciso. Os ovos são às vezes conser- re~l e~clas. .. No ano seguinte, à mesma épo~a, nova r ~
vados, secando-os ao solou sobre o fogo, donde resulta per- g(~?açao, novo abandono dos lares, rumo aos lagos de p P I"
derem uma terça parte de seu peso e adquirirem um "repug- ítencourt, 1951, pp. 138-139).
nante gosto oleoso". Um grande número é tratado na "man- Embora hoje se venda grande parte dos peixes ue S
teiga" dentro de canoas que foram puxadas para a praia onde apanhad?s é provável que essa mesma maneira de ex 10ra -
os ovos frescos são apanhados. Depois de lavados para retirar , zonal mtens!va existiss.e no período aborígene, quando o x-ç

a areia, os ovos são colocados nas canoas com um pouco de _dente devena ter suprido as necessidades da aldeia na c t _
água e pisados com força até' ficarem completamente amassa- ao chuvosa.
dos. Expostos ao sol durante três dias, o óleo vem à tona para Além do arroz selvagem, a vitória-régia é abundant
n lagos da várzea. As sementes redondas e cur ,qu ão
192
I
produzidas numa cáp ula f i a do tamanh d um aI
b i r
de criança, assemelham-se a feijões ~randes. São comid - munaí ocup da
sadas ou moídas como farinha, servindo para fazer bolos.
tubérculo também é comestível. t i como r des, esteiras, c stas, c rãmíc d rn
A diferenças se manif tam nas arma ,n or nl
Nas vizinhanças de Santarém, camarões minúsculos, pe.-
política, e nas práticas religiosas, muitas d q i
cados em redes e secados ao sol, são tidos como uma gulOS~l-
Ih m às da área andina de onde, certamente, algum II
ma muito apreciada. Os ovos de jacaré são comidos, assim
como o próprio réptil. Dele extrai-se uma gordura que é usa-
rívam. Por outro lado, a adoção desses traços, rnuit
quais representam um avanço sobre o nível de compl
da para preparar ungüentos e tinturas. Embora também se
tingido no meio-ambiente da terra firme, tornou- p
coma o boto branco sua carne é dura e com sabor de óleo.
devido ao meio-ambiente mais propício da várzea.
Continuava sendo caçado, há um século, mas a superstição fez
com que passasse a ser evitado pelos atuais moradores da re- As principais diferenças culturais e sua ímportãncí d _
tativa serão compreendidas com mais clareza se utilizarm
gião. .. '~f . a mesmo quadro de referências que foi aplicado à situação d \
O tambaqui, um dos maiores e mais prou eros p~lxes ~m -
zônicos é facilmente pescado quando as águas estão baixas, terra firme: a saber, técnicas para maximizar o rendimento ali-
aproveiÍando-se de seus curios~~ hábitos. Alime~ta-se de fru- mentar e técnicas para controlar o tamanho da população
sua concentração.
tas que, quando caem dentro d a~a, ele as localiza pelo som.
Os nativos imitam esse ruído, atirando uma pequena pedra
presa a uma linha, enquanto outr~ linha s~ prende a .uma, fruta
que serve de isca. Durante a baixa do no, esse peixe e pes- Técnicas para maximirar o rendimento da alimentação
cado em tal quantidade que não encontra compradores nos
mercados de Manaus. Embora não se encontrem na várzea os principais defeit
do meio-ambiente da terra firme, no tocante à exploração d
Um produto da floresta que. não se ~iga à subsistênc~a é a subsistência - declínio rápido da fertilidade do solo e baí
fibra branca sedosa da sumaumeira, ou arvore do algodao-de-
concentração de recursos em proteína -, outras são as limi-
seda. Há um século ainda era empregada pelos índios na con- tações que afetam a produtividade agrícola. Sendo de dif r _
fecção de lindos tecidos. tes tipos, diferentes são as formas de tecnologia e de comp r-
tamento sócio-político e religioso que podem ter se desenvolvi-
do durante a adaptação. Diversas características da cultura d
CARACTERíSTICAS DA ADAPTAÇÃO À VÁRZEA Omagua e dos Tapajós parecem refletir essa situação.
O fator dominante da várzea é o regime do rio, que regu-
Embora o padrão de cultura indígena da várzea possua la o ciclo anual da vida vegetal e animal e, conseqüentemente,
muitas das características da terra firme, dela difere de forma as oportunidades de subsistência à disposição do homem. A
importante. As semelhanças dizem respeito aos traços que tor- baixa do rio é uma época de abundância concentrada, e m _
nam os complexos da várzea uma parte integrante da área mo. .de superabundância, em alimentos silvestres e , ainda , d
cultural da floresta úmida. Tais semelhanças incluem as cultu- atividade agrícola (Fig. 19), enquanto que o período da ch i
194
1
se caracteriza por uma r latlv cassez de pl nt ilv
e pela distribuição dispersa da fauna aquática. Conqu nt
pesca e a caça sejam possíveis durante a cheia, o rendim nt
por homem-hora de trabalho decresce, provavelmente, apro i-
mando-se daquele que é peculiar ao habitat da terra firm .
principal problema adaptativo é, pois, o prolongamento da far •.
tura no tempo da escassez. Isto pode ser conseguido de duas
maneiras: ( 1) conservando e armazenando alimentos vegetais
e animais para consumo posterior; (2) desenvolvendo uma di-
visão ocupacional do trabalho nas atividades de subsistência, de
modo que os alimentos simultaneamente existentes venham a
ser explorados de forma intensiva.
Os primeiros relatos fornecem inúmeras provas da con-
servação de alimentos e seu armazenamento pelos habitantes HIVEL

MÉOIO

da várzea. A seguinte observação resume a questão: DAS ÁGUAS 5

"É uma gente de grande capacidade de previsão e con-


servam as provisões .à mão até o momento em que fazem a co-
lheita seguinte, e têm outras guardadas no sótão ou em estaca-
das acima do solo do tamanho de um homem e (sic) da altu-
ra que querem; e guardam o milho e os biscoitos (que eles fa-
zem de milho e mandioca misturados ou em forma de pasta) e
uma grande quantidade de peixe assado, peixe-boi e carne de NíVEL
•• ÁXUIIIO
caça" (Carvajal, 1934, p. 398). DAS ÁGUAS

As tartarugas capturadas vivas e guardadas em currais ~ ESTAÇÃO CHUVOSA __ OISPONIBllIDADE CONCENTRADA

nas aldeias serviam como uma conveniente fonte de carne IIIII


ALTA VARZEA
ALAGADA
, ••• MENOS ABUNOANTE E / OU
RETIRADO 00 DEPÓSITO
fresca durante o período da inundação. Carne e peixe tam-
bém eram conservados em potes, cheios de óleo de peixe-boi
ou do óleo extraído dos ovos de tartaruga, ou secados ao sol,
ou, ainda, moqueados. Os Tapajós armazenavam o milho de-
baixo da terra, em cestos. Os Omagua, que se alimentavam
principalmente de mandioca, arrancavam os tubérculos e os
Fig. 19. Ci~lo anual de subsistência postulado para os habitantes in-
enterravam de novo em covas, onde permaneciam até o mo- dig~nas da varzea. Plantas silvestres e animais são encontrados em pro-
mento de serem usados. O arroz selvagem, que dificilmente era fusao dura~te os meses de outubro até final de dezembro, momento
e~ que o ~llv.el~as águas começa a baixar. O milho e a mandioca, que
guardado devido à umidade, transformava-se em vinho. s~o as prmcspais culturas, devem ser colhidos antes que os campos
fiquem alagados. A oscilação entre fartura e fome é compensada pelo
Embora os primeiros viajantes não aludissem a uma divi- desenvol~ento de diversos métodos que visam a conservar e arma-
zenar os alimentos colhidos' na estação.
196 197
sao ocupacional do trabulho nus atividades ligadas à subsí: enquanto os recursos do subsistcn
têncía, pode-se deduzir que ela existia, pela ocorrência, ent inesgotáveis dentro dos métodos aborígener
grupos da várzea, de especialistas em outros ramos e pela flu- administração, estavam eles sujeitos a flutu
tuação dos recursos alimentícios existentes. Em contraste com abundância, o que acarretava certa ínseguranç
I

terra firme, onde o período anual de. subsistência está organi- dependentes. O perigo residia na imprevisibilid
zado de forma à aproveitar; em seqüência, os alimentos sil- nível do rio que, a intervalos regulares, subia e ínundnvn t
vestres e cultivados, a várzea tem períodos alternados de abun- ras que, geralmente, não estavam sujeitas à inundação, ou, I
dância e de escassez. Durante a baixa. do rio, todos os alimen- outro lado, permanecia anormalmente baixo, impedindo as nlu
tos atingem, ao mesmo tempo, a plenitude e devem ser colhi- viões férteis de atingirem os campos. Como o fluxo do Ama-
dos em grandes quantidades não somente para que sejam sa- zonas é determinado pelas chuvas que caem a centenas de qui-
tisfeitas -:as necessidades imediatas mas, também.. para que s lômetros de distância, seu ponto máximo não poderia ser pro-
acumule um excedente a ser consumido nos meses de redu- visto por pessoas que vivem ao longo de suas margens. Além
zida produtividade. O modo mais eficaz para· fazer face a esta do mais, mesmo que fosse possível fazer uma previsão, o vo-
situação é dividir a força de trabalho, atribuindo a cada grupo lume de água não permitiria medidas práticas de controle. A
uma tarefa específica. Além do mais, as operações agrícolas elaboração religiosa é uma resposta característica à insegu ..
na várzea devem ser sistematicamente organizadas, devido às rança da subsistência e, conseqüentemente, não surpreende qu
limitações de tempo impostas pelo regime do rio. Se o plantio se encontrem na várzea os seus habitantes descritos como
se atrasa, a colheita não amadurece antes da inundação; se Q "idólatras". Guardavam-se imagens feitas de cerâmica, madei-
plantio for feito antes do tempo, as sementes e as mudas podem ra ou cipó em santuários onde eram cuidadas pelos sacerdo-
apodrecer. O fator tempo é ainda mais crucial quando são pro- tes, e os seus adoradores lhes traziam oferendas. Alguns deu-
gramadas duas safras, como é o caso do milho. O grau de co- ses tinham poderes especiais sobre as plantas cultivadas, en..
nhecimento necessário para dirigir com eficiência a agricultura quanto outros influenciavam a guerra e atividades diversas.
da várzea levaria, forçosamente, ao aparecimento de especia- Concomitantemente, as atribuições algo limitadas do xamã fo-
listas que dirigiriam parte da força de trabalho, enquanto os ram transformadas nas dos sacerdotes que eram, provavelmen ..
outros .membros da comunidade se encarregariam das ativida- te, oficiantes religiosos em tempo integral.
des de pesca, caça e coleta. Esta forma de distribuição do tra-
balho representa uma resposta lógica ao sistema de abundância
sazonal e corresponde ao grau de estratificação social manifes- Técnicas para. o controle do tamanho da população
tado pelos Omagua e Tapajós. Ambos os grupos eram gover-
nados por um chefe supremo que não só tinha o poder de dar O povoamento indígena da várzea diferia sensivelmente,
ordens como o de exigir obediência. Além disso, o fato de ha- em densidade, do da terra firme. As margens do rio e várias
ver uma divisão de trabalho incipiente nas atividades de sub- ilhas eram habitadas e, em alguns casos, as casas se extendiam
sistência, entre algumas tribos da terra firme, leva a crer que por grandes distâncias. O plano da aldeia era linear, ao longo
uma adaptação à situação da várzea poderia ter se desenvolvi- da praia ou dos dois lados de uma rua, em contraste com o ar-
do simplesmente pela intensificação das características que já ranjo circular característico da terra firme. A estabilidade de
definiam. um ou mais grupos locais. residência também era bem maior. Quanto ao tamanho, en-
198 199
tretanto, a populaçã da ald ia n par ce t r íd 1 uit I • inf ntl di . uni un I
ferente da parte superior da terra firme. Embora, un h f mini morte, mo o fazi m Jv r . N
consta, um povoado Tapajó tenha tido uma populaç~o d 2. Jívaro, tal penalidade se correlaciona c m t
habitantes, o normal era entre 500 e 700, e as aldeias Om \ xuaís impostas aos homens (como vimos anteriorm nt )
eram, em média, bem menores. faz supor que tabus semelhantes também eram 11i I •

Se bem que entre a terra firme e a várzea as semelhan Tapaj6s. Os Omagua praticavam a vingança pel n n I
quanto ao tamanho das aldeias e à composição da casa da f l- mento e pelo assassinato e ambos os grupos da várz vivi \111
mília extensa reflitam a uniformidade básica da cultura am - em luta com os vizinhos da terra firme. Os Omagua m t V"
zônica, as diferenças traduzem as adaptações aos aspectos di - certos prisioneiros, os de idade avançada, de elevada p i
tintivos do habitat da várzea. Uma disposição linear de casa social e de notável coragem. A existência de tais costume in-
é natural numa aldeia orientada para a exploração da várz a dica a necessidade de contrabalançar as tendências naturai
e é uma característica de povoamento ribeirinho, de maneira para o crescimento populacional, apesar da aparente abundân-
geral. Como o acesso aos recursos da várzea é maior ao long cia dos meios de subsistência da várzea.
do rio o povoamento tende a expandir-se no sentido lateral, No tocante aos Omagua, a proposição aciina parece
pela ~argens, antes de começar a espalhar-se em direção ao negada, à primeira vista, pela prática de fazer prisioneiro ,
interior. Assim sendo, é de esperar-se que uma adaptaçao em que possibilita uma taxa de crescimento populacional mais rá-
equilíbrio tome a forma de uma faixa estrei!a do pov~amento pida do que a reprodução normal. A discrepância aparent
quase contínuo, ao longo das margens da varzea, e fOI exata- pode ser resolvida comparando-se a posição dos prisioneiros d
mente o que os primeiros visitantes europeus descreveram. sociedade Omagua com a dos prisioneiros dos grupos da terra
Embora os recursos da- várzea fossem inesgotáveis, dentro firme. Evidencia-se, de imediato, uma acentuada diferença: a
dos métodos de exploração indígenas, eram eles, devido a cau- passo que os prisioneiros da terra firme são adotados dentr
sas naturais, passíveis de dilapidação. Uma adaptação equili- do sistema de parentesco e assumem, portanto, os mesmos di-
brada deveria, em conseqüência, estabilizar a população den- reitos e privilégios dos membros nascidos na comunidade, o
tro dos limites que permitissem enfrentar os anos de escassez prisioneiros dos Omagua eram considerados enquanto propri -
e não no nível mais alto permitido pelas condições ótimas ou dade e suas atividades se definiam pela condição de empreg -
mesmo normais. Uma população que tivesse crescido, quando dos e não pelas relações de parentesco. Embora eles aumen-
os recursos eram abundantes, ficaria vulnerável no momento tassem a força de trabalho, nada indica que possuíssem. habili-
em que tais recursos fossem súbita e drasticamente reduzidos. dades que já não se encontrassem representadas dentro da po-
As resultantes flutuações violentas, quanto ao tamanho da po- pulação Omagua. Em outras palavras, não constituiam um ele-
pulação, poriam em perigo a estabilidade da configuração cul- mento indispensável dentro do sistema social, não passando de
tural essencial para a sobrevivência da comunidade. Nesse con- um apêndice que poderia ser eliminado sem afetar, seriamente,
texto, é compreensível que os habitantes da várzea possuam o funcionamento normal desse sistema. Isso sugere a possi-
vários tipos de traços culturais que contrabalançam o aumen- bilidade de terem exercido a função de escravos na sociedade
to de população entre os povos da terra firme. Embora .contro- da várzea como uma espécie de pára-choque entre o organismo
les pré-natais não sejam mencionados, os Omagua praticavam, social e o meio-ambiente. Nos anos de fartura, sua presença
200 201
permitiria uma utilizaç o m i compl ta dos r eu . di t lbu d 1 1n d m g n , fo p t v I ou
sistência existentes. Quando os alimentos escasseavam, n r . ploraç o ind finida dos r cursos d sub i t n i .
tanto, eram eles descartados sem perigo para a integridad da que parece, o tipo mais eficiente de padr o
sociedade como um todo. Por outro lado, porém, ílutuaç pois que colocava uma quantidade máxima de f
drásticas, quanto ao tamanho da população Omagua, teriam balho na posição de maior acessibilidade, reduzi
sido insuportáveis visto que elas removeriam muitos dos el nimo o tempo de viagem para os campos de cultur
que formam a cadeia de obrigações recíprocas de parentesco, de pesca, bem como o Ônus de transportar os produto p r
sobre a qual repousavam a integração social e, conseqüente- aldeia. Em tais condições, um comportamento que imp di
mente, a sobrevivência. desenvolvimento de aldeias contíguas ou, pelo menos, pou
separadas entre si não teria justificação ecológica,
Se por um lado a guerra tem uma função adaptativa, r
Técnicas para o controle da densidade da população outro, o baixo nível de hostilidade entre as populações da vár ..
zea pode ser interpretado como um indício de que a sua int ..
Embora fosse a belicosidade uma das características mais sificação redundaria num benefício muito reduzido. Diver a.
conspícuas dos habitantes da várzea, a densidade da popula- outras considerações sustentam essa hipótese. Já que uma d ..
ção registrada pelos primeiros observadores indica que aí, ao vastação imprevisível representa uma ameaça igualmente i ..
contrário da terra firme, a guerra não funcionou como um me- previsível para toda a várzea, a garantia de subsistência n
canismo de rarefação. Importa também resssaltar que o foco pode ser melhorada com a expansão territorial ao longo do rio,
primordial de agressão parece ter sido a disputa entre grupos da mesma forma que nenhum ganho recíproco adviria de um
da várzea e seus vizinhos da terra firme. As incursões através guerra entre as províncias da várzea, com a finalidade de faz r
da fronteira da várzea devem ter sido mínimas, embora exis- prisioneiros. Por outro lado, os conflitos com os residentes de
tissem medidas de defesa sob a forma de fortes e zonas "tam- terra firme vizinha eram facilitados tanto pela extensa fron-
pões" desocupadas. Consta mesmo que o chefe dos Omagua teira comum, como pelo esconderijo que a cobertura florestal
teria feito uma aliança com o chefe da província vizinha, para oferecia. Importa, mais ainda, ver que essas guerras exerciam
defesa mútua, contra os vizinhos da terra firme. funções de natureza mutuamente benéfica, ajudando a frear
Informações existentes não indicam que a feitiçaria ou aumento de população da terra firme e fornecendo às soei -
qualquer outro tipo de comportamento que sirva para limitar a dades da várzea os prisioneiros que serviam de "válvula de
concentração populacional da terra firme funcionassem do gurança" necessária para a exploração ótima dos recursos d
mesmo modo na várzea e parece provável que as diferenças, subsistência da várzea.
quanto aos meios de subsistência disponíveis, tornassem tais . . Se a análise anterior for correta nas suas linhas gerais, tudo
sanções inadequadas. A vulnerabilidade da maior parte da vár- indica que a potencialidade da várzea amazônica para o de-
zea à inundação anual e de toda ela à submersão intermitente senvolvimento da civilização não é comparável à dos vale
reduzia a sua adequação para um povoamento permanente. fé~teis dos rios da Ásia e do Oriente Próximo. Os paralelos ge-
Por outro lado, a largura da área produtiva era suficientemen- rais quanto à densidade da população; nível de complexidade
te grande para que uma população mais ou menos contínua, cultural e padrão de hostilidade entre os povos da várzea e do
202 203
interior, que se desenvolv u m todas essas regiões, rvir 1 m: gua p j tamb m ssu m v I' )
para desviar a atenção da existência de uma diferença fund ~ tra o d natureza sócio-política e religi , igu ti It dn 11 ,
mental no referente ao padrão de disponibilidade dos recurso . andina, de onde surgiram no início do períod f rm t v )
Nas bacias fluviais das regiões mais temperadas, as diferença ca de um milênio antes da era cristã. Entre ele, t
em suprimento alimentar segundo as estações são menos senti- plos, os itens religiosos (incluindo os ídolos), a or aníz 1
das pelos fazendeiros da várzea, que possuem uma safra ar- lítica reunindo diversas aldeias sob um chefe perm n
mazenada para os momentos de necessidade, e muito mais pelo divisão ocupacional do trabalho e a estratificaç
caçadores e coletores do interior, que são incapazes de fazer (Tab. 5). Será que esses traços foram também intru
uma preparação adequada para a escassez do inverno. Na área andina na várzea?
Amazônia, ao contrário, a segurança total de subsistência é
. ~ntes de tentar responder a essa pergunta, import di ~
maior na terra firme, devido à produtividade no decorrer do tínguír entre duas categorias gerais de traços culturais. Um
ano dos alimentos básicos, do que na várzea onde seis meses das categorias é representada por armas, estilo do vestuári
de superabundância se alternam com seis meses de relativa achatamento da cabeça copiados pelos Omagua de seus vi.
privação. Os imperativos ambientais excluíram a possibilidade zinhos andinos. Substituindo-se pelos seus equivalentes da i-
de intensificação de ambos os padrões e, assim fazendo, elimi- xada (arco e flecha, nudez, perfuração do lábio ou do lob
naram a Amazônia como um berço em potencial de uma ci- da orelha), os Omagua não afetaram, de modo importante,
vilização mais avancada, sua relaçao de adaptação ao meio-ambiente. Embora as rou-
pas sejam uma desvantagem no calor úmido,consta que p I
Influências andinas na cultura da várzea menos os homens as retiravam nos períodos de atividade físic .
N~s. condições da várzea, a lançadeira é provavelmente t
O nível mais alto de desenvolvimento cultural consegui- eficiente qua~to o arco. Em resumo, substituições desse tip
do pela várzea leva-nos a perguntar se ele é, principalmente, podem ser feitas com relativa facilidade e sem afetar grand ~
um reflexo da maior acessibilidade dessa parte da planície mente a estrutura básica da sociedade.
amazônica às influências procedentes da área andina, ou se As características sócio-políticas e religiosas próprias
pode ser explicado como conseqüência de uma evolução local. Omagua e Tapajós, por outro lado, não são simples substitui
Os Omagua possuem um grande número de traços culturais ções de traços previamente existentes. Em diversos casos
que provêm claramente do planalto. Por exemplo, foram eles intensificações ou elaborações de tendências que já se tinh 1
os únicos, na planície amazônica, a praticar a deformação do manifestado vagamente em algumas tribos da terra firme. Os
crânio ao tempo do contato europeu e uns dos poucos a usar Kayapó e os Kamayurá, por exemplo, tinham chefes perma-
escudos como arma de defesa na guerra, ambas essas caracte- nentes de aldeia e construções que não se destinavam apena
rísticas andinas antigas. Sua principal arma, a lança e a lança- ao us? .doméstico, enquanto que a especialização ocupacional
deira, é também característica da área andina. Por fim, usavam em atividades artesanais e a representação física de espírito
vestimentas de algodão semelhantes às dos povos do planalto, apareceram entre os Kamayurá de forma incipiente (Tab. 4).
conquanto fossem pouco adequadas às condições de calor Pode-se atribuir o aparecimento dessas características à maior
úmido .. concentração de população atingida pelas duas tribos e daí
204 205
se segue que o seu desenvolvimento posterior, por part d TABELA ~
Omagua e dos Tapaj6s, resultou de uma ainda maior d n ida- Traços culturals de signlflcaçllo evolutiva entre os grupos da várzea.
de populacional verificada na várzea. Se é válida a correlação (X? = provavelmente presentes).
entre complexidade cultural e concentração de população, então
é evidente que não é a maior ou menor familiaridade com estas Traços Omaaua Tapaj6s
práticas, por parte de outra sociedade, que poderia provocar a
adoção das mesmas, a menos que essa sociedade tenha alcan- SEDENTARISMO
çado o limiar de uma determinada densidade de população.
Uma vez atingida essa densidade crítica, a adaptação efetiva População da aldeia
Permanência na aldeia
300 + 300 - 2.500
Indefinida Indefinida
não apenas permite, mas também exige, o desenvolvimento de
novos mecanismos integradores, de modo que estes surgirão ORGANIZAÇÃO SOCIAL
quer haja um modelo, quer não. Chefe da casa x x
Chefe de múltiplas casas
A existência de uma íntima relação entre o potencial am- Aldeia x x
biental e o nível de desenvolvimento cultural significa, tam- Aldeias múltiplas x x
bém, que um grupo forçado a transferir-se para uma área de
recursos reduzidos será incapaz de manter seu nível anterior ESTRA TIFICAÇÃO SOCIAL

de desenvolvimento, no caso de ser aquele nível inadequada- Chefe supremo x x


Escravos
mente complexo. Um exemplo arqueológico da simplificação x x
que acompanha a adaptação a uma produtividade mais baixa
ESPECIALISTAS EM TEMPO
de subsistência nos é dado pela cultura pré-histórica Marajoara INTEGRAL
da Ilha de Marajó, na foz do Amazonas. Quando esta cultura Chefe supremo x x
apareceu na ilha, parecia ter possuído uma sociedade mais al- Xamã x? x?
tamente estratificada do que a dos grupos mais recentes da Atividades artes anais
x?
várzea, como os Omagua e os Tapajós. Durante sua permanên-
cia na Ilha de Marajó, sofreu um dec1ínio em complexidade COM~RCIO

que se refletiu, arqueologicamente, no desaparecimento dos Dentro da aldeia x? x?


tipos mais apurados de decoração da cerâmica e de certos itens Entre aldeias ou intertribal x
Mercado formal x
e práticas rituais.
ESTRUTURAS ESPECIALIZADAS

Templo ou santuário x
Conclusão Depósito ou celeiro x
x x
Casa do Chefe x? x?
Embora fragmentários, os dados sobre a adaptação cul- RELIGIÃO
tural indígena ao habitat da várzea indicam que a concentração
Idolos
de população era maior e o nível de 'complexidade sócio-polí- Preces e oferendas
x x
x
206 207
tica mais avançado do qu na terra firme adjac nt . 1 Capítul
resultou de uma melhoria dos recursos de subsistênci nt
duzida pelo homem, mas, ao contrário, de uma adaptaç u1
tural sensível que permitiu a utilização eficiente da singul r A Amazônia no mundo moder
produtividade natural da várzea. Esta produtividade natural
tem dois defeitos importantes: (1) é altamente sazonal; (2)
está sujeita a flutuações imprevisíveis. ~ese_nvolvera~-se. meca-
nismos culturais para compensar as vanaçoes estacionats, mas
a escassez de alimentos que é resultante da inundação, quer
prematura, quer prolo~gada, ~~o é previsíve~ n~m pode ser
contrabalançada. Em tais condições, a adaptaçao fIXOUum teto
DURANTE sua longa história geológica, a Amazôní 1
para o desenvolvimento cultural e, ao que t~do i~di~a, os g~-
pos da várzea, como os Omagua e os Ta~~Jos, anngiram ~ ~l- passou por uma série de fases distintas, cada uma delas inici ~
vel máximo de elaboração cultural permitido pelas condições da por um acontecimento geológico importante que abria n -
vos nichos ecológicos e encerrava velhos, forçando a readapt •
locais ao meio-ambiente. ção da vida animal e vegetal.
O advento do homem alguns milênios atrás não produziu,
provavelmente, qualquer modificação brusca no equilíbrio d
ecossistema porque, inicialmente, os homens eram poucos e
nicho adaptativo era amplo. Até que a população humana cre -
cesse a ponto de o seu tamanho passar a ser prejudicial, coub
à seleção natural levar a termo uma adaptação primorosam n~
te equilibrada aos recursos ambientais. Em conseqüência,
homem aborígine parece não ter sido mais destruidor do qu
os outros organismos da estabilidade, a longo prazo, do ec ..
sistema da floresta úmida tropical.
A chegada dos exploradores europeus no princípio do -
culo XVI trouxe conseqüências bem diversas, por duas razõ
( 1) a principal finalidade não era o povoamento e sim a ex-
ploração comercial; (2) mantiveram um contato íntimo com
a mãe-pátria a quem competia ditar as mercadorias a serem
fornecidas e o preço das mesmas. Portanto, pela primeira v z
em sua longa história, a Amazônia ficou sob a influência con-
tínua d~ um a~ente que era extracontinental e, conseqüente-
mente, unune as forças modeladoras da seleção natural local.
209
208
No decorrer d prim ir 'eu! qu e guiu 11 modo geral, os habitant s qu vlv m n
a devastação foi mínima. Mas por volta de 1615, com rio aparentam sofrer de doenças aguda ou crôní
proliferar estabelecimentos portugueses, ingleses, holand as conseqüências acarretadas por tais do n lonlo I
franceses nas vizinhanças da foz do Amazonas e a rivalid d vista da saúde e como região para nela se mov r, p Irl
política se tornou cada vez mais intensa. Cada nação recruta- Amazônia constitui hoje uma das zonas mais in 1
va milhares de indígenas para defender sua reivindicação à so- rigosas dos trópicos" (Stong e Shattuck, 1913 ;
berania e a mortandade foi tão grande que, em 1631, quando Ashbum, 1947, p. 115).
os portugueses sairam vitoriosos, restavam poucos nativos para A destruição dos habitantes indígenas, bastant tr
serem explorados. Em 1664, as incursões preadoras de escra- ponto-de-vista humanitário, não afetou de modo mar nt I

vos já tinham atingido a foz do Rio Negro; trinta anos depois, ecossistema como um todo. O que o afetou, na verdad , :f
somente algumas dezenas de cativos eram obtidos, mesmo no substituição das práticas culturais indígenas pelas atitu
alto Amazonas onde, um século antes, viviam milhares de Ín- pelo comportamento que se desenvolveram num context
dios. biental muito diverso e incompatível com as condições
As atividades européias poderiam ter sido menos devas- gicas locais. Embora os primeiros exploradores elogias n
tadoras se os colonizadores não tivessem introduzido, inadver- clima saudável e se encantassem com a vegetação exub r 111
tidamente, diversas doenças virulentas e altamente contagio- ficaram horrorizados com a caça às cabeças e o infantí i li
sas. Até 1500, os exploradores contavam que a Amazônia era praticado pelos habitantes. O hábito nativo de mudar d 1..
um lugar extremamente atraente. Sir Walter Raleigh ( 1811, deias conflitava com o sistema europeu de propriedade priv d
pp. 153-154), que tinha viajado extensamente, afirmava que: e povoamento permanente. Uma população rarefeita não p _
"Quanto à salubridade, bons ares, prazer e riquezas, acho que deria fornecer a força de trabalho concentrada que era n
não há comparação com qualquer outra região, quer a leste sária para as grandes explorações agrícolas e a produção v 1-
quer a oeste. Além do mais, o país é tão saudável que, entre tada para a exportação. Alguns desses costumes "primitiv
cem pessoas, ou mesmo mais, .. , não perdemos ninguém, nem foram eliminados, geralmente à força, pelos colonizador
I

ninguém adoeceu ao que eu saiba, nem encontramos qualquer pelos missionários, enquanto outros perderam substância tr I
Calentura, nem outras doenças pestilentas que se encontram vés da aculturação. A fragilidade da atual configuração ul
em todas as regiões quentes, e tão perto da linha Equinocial." .tural da Amazônia é a conseqüência inevitável da introdu io
O aumento da imigração durante o século XVII pôs fim a forçada de um padrão cultural estranho ao meio-ambient d I
esta situação abençoada. Uma epidemia de varíola se alastrou floresta tropical.
pelo baixo Amazonas, em 1621, e uma outra devastou a parte
Uma das características mais surpreendentes da vida n
superior do rio, em 1651. Como os indígenas não tinham imu-
Amazônia de hoje é a ausência de diferenciação regional. A
nidade, aldeias inteiras foram destruídas. Para agravar a situa- longo de todos os rios principais e de alguns tributários men _
ção, a entrada de escravos africanos introduziu a malária e a
res, o povo come a mesma comida, veste roupas semelhant ,
febre amarela. Nada poderia ter sido mais diametralmente opos- vive no mesmo tipo de casa e participa das mesmas crenç
ta à situação descrita por Raleigh do que as condições de
aspirações. Tendo perdido a habilidade de satisfazer suas n
1913: cessidades com os recursos da floresta, é obrigado a compr r
210 211
não somente panos, potes pan Ias, facas e esping rdr f r r' t nd r pr eu t m u
também, muitos gêneros de subsistência básicos, tai r cent ment , o p qu no tamanho da
açúcar, sal, arroz, feijão e café. O pagamento deve s r f it o alto custo de transporte mantiveram o d J
segundo a procura do mercado exportador e não em term finados à várzea e às margens dos tributário
do que a área poderia melhor produzir. As principais ativi- vastas regiões do interior, que permaneceram d p v
dades são }imitadas, por conseguinte, à coleta da borracha, que têm somente remanescentes de grupos indíg n ,DOIllCO
frutas e castanhas, à pesca, à caça em busca de peles (espe- nenhum dano foi causado.
cialmente de onça, jacaré e anta) , à agricultura e à criação de Agora, entretanto, essa reserva também está aro
gado. A distância em que se encontram os mercados, a alta dos devido ao espetacular crescimento da população
preços provocada pela intermediação e uma organização co- gramas de desenvolvimento intensivo de inspiração naei n 1
mercial que impede o vendedor de procurar o melhor preço, internacional. Em 1940, a bacia amazônica tinha 1.876.02
todos esses são fatores que contribuem para restringir o lucro habitantes. Em 1950, como resultado da erradicação da m 1 •
do produtor. Doenças, azares, mau tempo e outras circunstân- ria, febre amarela e outras doenças tropicais, o total atin i
cias atenuantes reduzem, muitas vezes, a produtividade do ho- 2.372.508 e, em 1960, já era de 3.569.066. Nessa prop
mem, deixando-a abaixo do mínimo necessário para suprir as haverá lá mais de sete milhões, em 1985, e mais de onz
necessidades da família. Diante disso, é levado a conseguir cré- lhões no ano 2.000. Em vista da magnitude da degradação
dito com o comerciante local e, urna vez dado esse passo, tor- já ocorreu com uma densidade demográfica que represent u
na-se escravo do sistema, sem qualquer esperança concreta de décimo desta última estimativa, a perspectiva é aterradora.
dele sair. Impossibilitado de comprar os alimentos adequados O crescimento demo gráfico em vista seria em si uma ba
e sem dispor de tempo para pescar ou cultivar um roçado, ele suficiente para o pessimismo, mesmo se determinado ap nu
e seus filhos tendem a sofrer de carências alimentares, o que pelo aumento vegetativo dos habitantes da região que e t
diminui sua resistência para os outros tipos de doença. familiarizados com os problemas do seu meio-ambiente. N
O habitat sofreu uma degradação da mesma ordem. Uma entanto, urna grande quantidade provém de outras parte d
superexploração da terra em torno das grandes concentrações Brasil, onde o mito do paraíso amazônico continua a flore
provocou urna acentuada e provavelmente irreversível dete- Os colonos são muito encorajados pelos Governos Estadual
rioração do solo e da vegetação, causando a extinção local de Federal que vêem no aumento da população a chave da pro
muitas espécies de aves e animais. A superexploração e outros peridade econômica. Programas de estabelecimento de pr)
distúrbios reduziram ainda a incrível densidade, anteriormente priedades rurais individuais, semelhantes àquelas que lev r
existente, de tartarugas, jacarés, aves aquáticas e outras moda- as fronteiras dos Estados Unidos para o oeste, estão prom •
lidades de. vida aquática a simples remanescentes que buscam vendo o povoamento ao longo das estradas que retalham t
esconderijo em lugares distantes e inacessíveis. Os caprichos principais áreas da floresta virgem. A estrada Belém-Brasíli ,
dos compradores vindos de todas as partes do mundo, que terminada em 1960, e a mais recente Brasília-Acre pas
querem animais de estimação exóticos, penas espetaculares, através de regiões que eram antes inacessíveis, nas marg n
adornos estranhos, ou comidas fora do comum, incentivam a oriental e meridional do Amazonas, enquanto a Transamazônl-
dilapidação das espécies, dos animais e mesmo dos insetos. Na ca corta o centro dessa região. Sua construção começou m
medida em que aumenta a escassez, os preços sobem e os es- 1970 e foi acompanhada de um plano vigoroso de coloniz
212 21
fomentado pelo Govern 1 u of ec jud inui num ur r dond. or x mpl, r urm
técnica e social aos colonos m p rspectiva. Este prog 1 floresta em pastagem para o gado, que ada
larga escala está sendo acelerado sem levar em conta os e 'à umidade tropicais e se nutre inadequ dam nt
tórios científicos publicados pelo Instituto Brasileiro de tropical, em vez de usarmos o pasto natural do 1
grafia e Estatística, outra repartição federal, que afirma que zea para a criação de peixes-bois, que se adaptam
região é inadequada para uma exploração intensiva de subsi - dições locais e dão uma maior produção de carne couro.
tência e conclui dizendo que "estamos em vésperas. .. de assí - Outro provável candidato à exploração contr 1li,
tirmos a desastre de enormes proporções". tartaruga-da-amazônia, agora ameaça da de extinç . 0.1 r
A Amazônia também atraiu economistas de gabinete dos cente estudo sobre o ciclo de vida desse animal m t li til
Estados Unidos. O projeto mais ambicioso foi proposto em entre 25 a 80 por cento dos seus embriões são destru d ti)
1967 pelo Hudson lnstitute para a construção de uma repre- os anos pela inundação dos nichos antes de os ov r 111
sa no baixo Amazonas, que transformaria a várzea entre San- chocados. Além disso, os predadores consomem 10 P ,I t ,
tarém e Tefé em um enorme lago, Vários seriam os benefícios das tartarugas recém-nascidas antes que elas consigam ibr
que adviriam dessa proeza de engenharia, conforme .aponta- gar dentro d'água. Cuidados sistemáticos para salvar n
vam: melhoria do acesso às terras altas, facilidade para a na- lhões de indivíduos não somente forneceriam alim nt
vegação de grande calado e estabilização do delta, tornando-o rendimentos para um número maior de pessoas, do qu
maisproprício à utilização agrícola. Quem leu as páginas an- mitem os atuais métodos oportunistas, como também propicm-
teriores verá imediatamente que tal esquema destruiria por riam uma base permanente. A piscicultura é outra indú trl
completo a parte da Amazônia potencialmente mais proveito- que tem um alto potencial de produtividade e de lucro
sa. A várzea, acima da barragem, ficaria inundada para sem- merciais. A silvicultura, que imita a vegetação natural da fI
'pre; a correnteza abaixo seria privada das aluviões anuais que resta, poderia se estender pela terra firme.
são indispensáveis para manter a fertilidade do solo. Feliz- Enquanto, porém, os costumes e procedimentos 1
mente, a adoção do projeto é improvável, não porque fosse incompatíveis com a realidade amazônica, forem predomin 11 •
ecologicamente absurdo mas porque é politicamente detestável. tes, não poderá a pesquisa científica resolver o probl m
Ironicamente, a escolha não está entre uma devastação maior vantagem da várzea é o regime do rio, com su
irreversível e a ausência total de exploração. Se há uma lição chentes e vazantes que renovam a fertilidade do solo
que a ecologia ensina é a de que a adaptação é proveitosa. Os água. No decorrer do processo, ilhas são desfeitas e r f r
habitantes aborígenes, inconscientemente, desenvolveram uma das, canais mudam de curso e todos os pontos de ref r 11
utilização ótima do habitat sob o jogo lento da seleção natu- da paisagem são efêm r . O sistema de propriedade priv d
ral. Teoricamente, deveríamos estar em condições de fazer totalmente inadequado p r essa situação fluida. Diant
tudo melhor, pois que possuímos um conjunto de conhecimen- perspectiva de mudan i pr visíveis dos limites, um proprí •
tos científicos que podem ser aplicados consciente e intensiva- tário relutará em inv t . Pr urará, ao contrário, extrair t
mente para aumentar a produtividade natural da região. En- o lucro possível enqu t du ar a oportunidade. Não há d
tretanto, até hoje, temos dedicado nossos melhores esforços vida de que a soluç V lt r r o sistema indígen d
ao equivalente ecológico de forçar um prego quadrado a entrar exploração cooperativ l ) lU 1 n d p ndia de propri d d

214
com limites estabelecido di trlbuía equitativament o lu r compo to químico, em concentraçõ I o 1\ I
e as perdas. A alternativa, a saber, a tentativa de canaliz r lançados na água, no solo e no ar. Do m m I o I l I\I I
represar o rio para forçá-lo a se comportar de acordo com habitantes aborígenes da Amazônia foram qu III 11 1 I I
exigências legais e sociais estrangeiras, seria não apenas terri- pelas doenças do Velho Mundo, para as quai n I 1111 111
velmente dispendiosa como teria, também, um efeito negativo imunidade, assim também as plantas e os animai qu v Ili
sobre a produtividade natural da várzea. ram durante centenas de milhões de anos são in p 'I. I
Ao entrarmos no último quartel do século XX, encon- enfrentar produtos químicos estranhos, introduzido,
tra-se em suspenso o destino da Amazônia. Se a's próximas mente, em seu habitat. Conhecendo de uma man ir
décadas trarão sua ruína ou salvação, ainda não se pode dizer. como opera a seleção natural, podemos predizer, com
Embora sejam grandes as lacunas no nosso conhecimento, segurança, que dos milhões de espécies que restaram, p U
dispomos de informação suficiente para impedirmos uma de- serão "pré-adaptadas" às novas condições, mas nada g r nt
gradação irreversível. Por outro lado, a elasticidade relativa- que o Romo sapiens venha a figurar entre os sobreviv nt .
mente grande dos ecossistemas temperados fortalece a ilusão Conduzir a humanidade através dessa crise ecológica é O m 1
de que as planícies tropicais podem ser remanejadas com a desafio que a cultura, como mecanismo de adaptação, j mn
mesma impunidade e a lentidão com que, até mesmo os maio- enfrentou.
res distúrbios desencadeiam reações ecológicas, levando com
que se ignorem com facilidade as suas conseqüências em po-
tencial. Enquanto o desejo de explorar a Amazônia tiver raízes
culturais estrangeiras, a possibilidade de um programa racio-
nal de desenvolvimento será nula.
Esta perspectiva é ainda mais trágica porque só o Roma
sapiens, entre todos os seres vivos, tem capacidade de encarar
o seu meio-ambiente dentro de uma escala mais abrangente,
não se limitando à duração de uma vida. Quando avaliamos
as atividades humanas dentro da perspectiva do tempo geoló-
gico, somos forçados a reconhecer que o que está acontecendo
na biosfera hoje em dia nada tem de comum. De fato, desde
que os organismos primordiais -desenvolveram a capacidade de
liberar oxigênio há centenas de milhões de anos, nenhuma das
novas espécies desenvolveu a habilidade de alterar as condi-
ções de adaptação da vida sobre a terra. Os continentes mu-
daram de forma, as geleiras avançaram e recuaram, os mares
se ergueram, as montanhas submergiram e os pólos se deslo-
caram mas os parâmetros físicos e químicos permaneceram
essencialmente os mesmos. Agora, de repente, novos e velhos
216 217
m ranhado r vilh, m um I t II
Capítulo 6 ar ia. O alicerce em nada contribui p ) v
e, se alguns componentes são removid
o
1

significado evolurivo eles se enfraquecerem suficientemente, nt


ção ruirá e desaparecerá. Este não é símplesmen
da adaptação mento teórico, baseado na composição do
res constitutivos, tais como chuva, temperatu ,
1

químicos e físicos, etc. ~ uma conclusão que


vez mais na observação dos efeitos da exploraç
contemporânea.
A AMAZÔNIA,tal como hoje existe, é o produto de mi-
O homem nem sempre foi um elemento destruid
Amazônia. Pelo contrário, nos milênios após sua chcR:l\un.
lhões de anos de evolução geológica e biológica. A vegetação permaneceu um membro em harmonia com a comunidad
luxuriante que envolve sua superfície realizou uma notável tica. Os primeiros imigrantes eram caçadores e coletor
adaptação às condições co~stantes de temperatu~a elevad?, alimentos silvestres, que mudavam de acampamento ao
alta umidade e solos destituídos de elementos nutnentes solu- de poucos dias, como os Sirionó e os Kayapó ainda o llU.,~~1I
veis. Todas as características que a distinguem, o que inclui na estação seca. Cada bando nômade consistia, provalm
uma extraordinária diversidade de espécies, baixa freqüência e de uma família extensa e este grupo aparentado perma
distribuição esparsa de indivíduos da mesma espécie, uma co- sendo a unidade social mínima na sociedade aborígen
lossal capacidade de armazenar nutrientes, folhagem se~pre Amazônia. À proporção em que as baixadas foram sendo p ..
verde e métodos de reprodução predominantemente vegetatívos, voadas, as migrações tendiam a se tornar menos aleatória
representam ajustamentos a condições .edáficas e climá!ica~ se confinarem cada vez mais dentro dos limites territoriai
desfavoráveis. A fauna terrestre que subsiste nessa vegetaçao e ~onhecidos. Concomitantemente, as variações locais do
igualmente diversificada, não-gregária e, também geralmente, de subsistência anual começaram a aparecer, aproveitan
de pequeno porte. Já foram identificadas mais esp~ci~s. d~ das diferenças regionais entre os tipos, abundância e di p J
peixe no sistema amazônico do que no .Congo ~ MI~S:SSIppI bilidade sazonal de vegetais silvestres e de animais. Algu
juntos, abrangendo não apenas uma fascinante disposição de das diferenças nos padrões de utilização dos alimentos ilv
tamanhos formatos e cores, como também exibindo adapta- tres demonstradas pelos agricultores subseqüentes d r v m,
ções especiais fisiológicas e de comportamento à alta acidez, sem dúvida, desse processo primitivo de adaptação d uh
deficiência nutritiva e outras características singulares de seu sistência.
habitat aquático. Dizer que a Amazônia é um ecossisteI?a de Pelo ano 1000 a. C., se não mais cedo, as plantas cult
complexidade fantástica, infinita diversidade e maravilhosa vadas se tornaram um importante componente da subsist n
integração é fazer pouca justiça a esta obra-prima de seleção nas baixadas amazônicas. A dependência para com a agri ul-
natural. Sua complexidade, diversidade e integração não são
tura requer e, ao mesmo tempo, permite um modo de vi I,
produtos fortuitos do processo evolutivo e. sim, aspectos de-
mais sedentário; requer, porque as roças devem ser plant dn
cisivos da configuração. Porque a Amazônia, com todo o seu
I
218
cuidadas e colhidas; p rmit , p rque o alimento que se tinham criado durante milêni
ponível numa maior concentração e abundância locai . IlH olhos dos estrangeiros, a Amazônia era rin ip 11m nt
a vida sedentária é um pré-requisito para a acumulaç l fonte de produtos exóticos que podiam er v n id I I I"
bens, a qual, por sua vez, possibilita uma especialização ocup 1- ços elevados e o fito de lucros imediatos teve p im zi llu t
cional, uma riqueza diferencial, a concentração de poder as vantagens da produtividade a longo prazo. O r JH h
muitos outros progressos técnicos, sociais e religiosos, e com gados mantiveram sua dieta alimentar tradicional pr I d I,
também oferece ao indivíduo uma oportunidade maior de so- constituída de carne, arroz e café, e continuaram a J1lI 01
brevivência em caso de doença ou debilidade, este aumento de tar como uma extensão da sociedade européia na qual \ di-
sedentarismo constitui, inevitavelmente, uma tendência básica visão de trabalho altamente diversificada se ligava a um
da evolução cultural. Num habitat como o da Amazônia, en- plexo sistema de troca comercial. Como o acesso ao mcrcaco
tretanto, concentrações de população cada vez maiores e mais se tornou uma preocupação básica, o povoamento se con 11-
permanentes entram em choque com essa tendência adaptativa trou nas margens do rio, deixando o interior inabitado, a n
primária que preconiza a dispersão e a transitoriedade. Uma ser por alguns remanescentes esparsos de tribos indígena .
solução conciliatória teve de surgir para que houvesse um mistura racial criou uma combinação biológica compost
máximo de benefícios decorrentes de uma vida estável com brancos, pretos e índios mas a integração cultural não obt v
um mínimo de dano irreversível causado ao meio-ambiente. o mesmo êxito. Salvo algumas exceções, como a construção
O padrão cultural que emergiu na Amazônia é tão no- casas, os gostos e as ferramentas de origem européia prev 1 -
tável como forma adaptativa quanto o é a vegetação da flo- ceram sobre os dos indígenas. Artigos essenciais, tais com
resta úmida. A guerra provoca a excitação e fornece um meio roupa, redes, utensílios de cozinha, facas e machados, só era
de adquirir prestígio; mas também ajuda a impedir o aumento conseguidos através de compra. Como a borracha, os cour "
de população. A feitiçaria não somente explica a ocorrência a .castanha-do-pará e .outros produtos da floresta, de valor d
da mort.e numa ~ultura que desconhece germes e infecções, troca, dão um baixo rendimento por homem-hora empregad
como amda repnme a expansão do tamanho da comunidade. pouco tempo sobra para as atividades de subsistência. R I.
Até mesmo um estudo superficial das culturas da terra firme tou daí um declínio na qualidade da alimentação que, por li'
revela numerosas práticas que são direta ou indiretamente vez, reduziu a resistência às enfermidades. :E:óbvio, porta tl
'adaptativas; uma análise mais cuidadosa revelaria, sem dúvi- que a ocupação da Amazônia depois do descobrimento foi UI 1
da, exemplos mais sutis da interação cultura/meio-ambiente. desastre ecológico, dando início a uma incompatibilidade a
Além de s~~ um sucesso ecológico, no sentido de que mantém lerada entre a cultura e o meio-ambiente. Foi também um d -
uma estabilidade que se aproxima do equilíbrio, a adaptação sastre do ponto-de-vista humano, pois que condenou a po
indígena à Amazônia fornece à população humana um modo lação de origem européia a uma existência triste e desolad
de vida saudável e psicologicamente satisfatório. na qual a sobrevivência física se transforma em preocupa
dominante.
~ descobe~a. ~a Amazô~ia pelos ~xploradores europeus
no seculo XVI mICIOUum penodo de rapidas e drásticas mu- Para melhorar esse indesejável estado de coisas, seria n
danças. Doenças novas e mortais dizimaram a população in- cessário haver uma compreensão bem maior do que a qu
dígena e as atitudes culturais estrangeiras substituíram aquelas atualmente possuímos da maneira pela qual a cultura inter ~
220 221
com o meio~ambiente. Para c9?~egui-la, entretanto, dep r' o
MO l~ MA
nos com séríos problemas analíticos, devido ao fato de que TA
a~pectos a~aptativos de um costume ou de uma crença n o
sao percebidos aparentemente pelos membros da sociedade na
qual ele ou ela se manifesta. Pelo contrário, o povo muitas
vezes fornec~ razões convincentes para explicar ,seu compor-
tamento, razoes estas que nada têm que ver com o meio-am-
biente. Assim sendo, é provável que os elementos e as estru-
turas de nossa própria cultura, que são fundamentalmente res-
ponsáveis pelo nosso comportamento não-adaptativo, estejam
mascarados por alguma outra justificação aberta. Além do
~ai~, Ó mesmo ~ipode comportamento geral pode ter funções
distintas adaptativas e evolutivas em contextos diferentes. A
~uerra é um exemplo: na Amazônia, parece ser um expediente
Importa~te para impedir o crescimento e a concentração da
popuI~çao mas, em outros tempos e lugares, serviu como um
mecamsmo para a unificação, de unidades políticas importan-
tes o~ ?ara reforçar. a e~tratificação social ou, ainda, para
s~bStltUlr .uma configuração cultural por outra. Complicando
?Inda n::aIs as COIsas, muitos são os traços que promovem' a
íntegração dentro do grupo e moderam a articulação entre cul-
tura e .meio-ambiente. Nessas circunstâncias, o comportamento
que deixa de ser adaptativo poderá continuar a dar um apoio
psicológico vital à população. Como a perda do moral, é uma
ameaça mais imediata à sobrevivência do que a desarmonia
ecológ~ca, que ,:ia de regra se manifesta tão lentamente que se
torna imperceptível, a seleção natural favorecerá a retenção de
tal traço até que as conseqüências ecológicas atinjam um nível
crítico. Parece provável que conflitos dessa ordem reforçam a
extinção de muitas configurações culturais que floresceram no
passado e tudo indica que representam um dos fatores que
contribuíram para a nossa própria crise ecológica.

222
dade de sobrevivência. ad população explora seu r 11 ( ainda não atingiu seu ponto culminant m 'J.1
conta a fantástica disposição de, organi m
nicho e quanto maior for o número de nichos explorado t n
velmente intrincados que compõem a biosf ra h j
mais eficientemente será o habitat utilizado. A diferenciaç
biólogos atribuem tal avanço à seleção natural qu
tem ainda um outro aspecto que. é de significado evolutiv
a sobrevivência e a amplificação de caracterí ti
bem maior. A seleção natural atua para levar as populações
taram a adaptação a um grande número de nich 011 nt 1\ •
existentes a um estado mais elevado de adaptabilidade às con-
dições vigentes; ela não pode prever condições futuras e, con-
Os a?t~?pól~gos, por outro lado, tentaram explic r r m
da civilização urbana comparando padrão' de povo 111I nto,
seqüentemente, não pode se preparar para o imprevisível. O
tecnologia, organização sócio-política e característic r li io I.
melhor meio de assegurar a sobrevivência em tais circunstân- das primeiras civilizações da Mesoamérica e M s p t mia
ci~s é o de produzir tantos tipos de configurações que, a des-
peito do que possa ocorrer no futuro, algumas delas possuirão (onde os registros arqueológicos são mais completos) pr
as necessárias propriedades adaptativas. Em outras palavras, curando identificar as regularidades nas configuraçõe lU
estarão "pré-adaptadas", não devido à previsão mas como um surgiram nestas duas áreas: O meio-ambiente é geralm 1 t
subproduto acidental da adaptação aos seus prévios nichos visto c.omo um substrato, quer constante quer flexível, obj to
ambientais. de variadas manipulações ou explorações culturais, em v z d
ser encarado como um componente ativo do processo evolutiv .
A diversidade cultural é amplamente confirmada pelos
registros etnográficos e arqueológicos e parece evidente que Se a cultura, entretanto, é um .meio especializado d
tem as mesmas explicações que a variação biológica: isto é, adaptação empregado por uma espécie de mamífero, s gu -
permite uma exploração mais eficiente dos habitats existentes ~ntão que a seleção natural deve ter desempenhado um \p 1
e fornece um número máximo de caminhos em potencial para Importante na evolução cultural, como o foi na evolu 10
o futuro. O primeiro desses aspectos é exemplificado com a lógica. Para confirmar essa suposição é mister que estab 1 I
adaptação à terra firme amazônica; o segundo permitiu a evo- mos dois fatos: (1) que a vida citadina é mais ad tpt ulv I
lução da civilização quando as circunstâncias foram favoráveis. (isto é, tem mais potencial de sobrevivência) para OIl1UI
dade do que a vida em aldeia; (2) que o aparecim nto do li
b~nismo ~ correlato com Uma mudança importa t H I I I
SELEÇÃO NATURAL E O DESENVOLVIMENTO DA soes seletivas. Mesmo um exame superficial da vid 11 11
CIVILIZAÇÃO URBANA ma indica que ambas as proposições. são corr t .
A Civilização urbana possui certas c r t
A correlação entre diversidade cultural e potencial evo- tornam superior à sociedade tribal. O m i r ti ......•••.. »r
lutivo para o adiantamento cultural pode ser esclarecida pelo pulação e sua densidade não somente s v li 1
I estudo do aparecimento do urbanismo. Esta inovação repre- contra o extermínio pelas doenças, fom , 11I·· ••··,."Uil
sentou uma abertura tão importante para a evolução cultural catástrofes, como também possibilitam UJ
quanto foi o aparecimento da vida terrestre para a evolução cultural interna. Mais importante ain ,
biológica. Ambos deram início a um processo acelerado de di- tipo de integração interna, oferec nd
versificação e complexidade crescente que, ao que parece, adaptativas. As culturas, assim com
224
dem ultrapassar determinado tamanho sem melhorar sua - características da sociedade urbana entr diC r 11t
ganização interna. Uma cidade não é simplesmente uma ald i terra firme amazônica. Analisando-as n cont xt
grande, nem um bando sedentário, da mesma forma que o ho- ambiente total, concluímos que eram simplesm nt
mem não é uma ameba inflada. Uma cidade difere de uma locais de um padrão generalizado de cultura da fI r ,t I IIt
aldeia do mesmo modo que o homem difere da ameba, em pical, sem qualquer valor adaptativo especial. Suponh m 11t
diferenciações internas desenvolvidas e em nível mais alto de en~a~to, que esta mesma escala de diversidade s6 i P ,ltlj I
integração, no qual alguns segmentos exercem domínio sobre existisse entre grupos que habitassem um tipo diver d m 1_
os outros. Os mesmos tipos de pressões seletivas são subjacen- am?iente '. Para sermos mais específicos, suponham qu tnl
tes à tendência evolutiva de aumentar o tamanho e a comple- meío-ambíeme fosse a Mesoamérica onde as Iimitr 1
xidade tanto dos animais, quanto das culturas. Na maior parte subsistência, características da terra firme amazônica, n i ..
das circunstâncias, um animal maior ou uma comunidade tissem, Sob condições mais propícias, a seleção deveria f LV ••
maior tem acesso a uma área de subsistência de tamanho recer e, assim, intensificar gradativamente as caracterí ti I
mais considerável do que teria uma comunidade pequena; tem compatíveis com o aumento de densidade da população. li 11.•
também uma vantagem sobre os competidores e predadores quer grupo que possuísse tais características de forma in i
(até que aumentem de tamanho). Entretanto, sem que se me- piente teria uma vantagem seletiva e tenderia a aumentar
lhore a integração entre as partes, um aumento em tamanho densidade ou a expandir sua extensão geográfica, ou amba
teria em contrapartida a perda de eficiência operacional. Há coisas, à custa dos grupos vizinhos.
necessidade também de algum tipo de hierarquia interna. Em Na Mesoamérica, a arqueologia registra seguidas tenta-
outras palavras, alguém tem que ser responsável. Nos orga- tivas de dominação sobre territórios cada vez maiores, p r
nismos, isto conduziu ao desenvolvimento de um sistema ner- parte de "estados" rivais. Além disso, os rivais aparentam t
voso central, Nas culturas, produziu uma classe dominante. possuído. diferentes tipos de mecanismos de integração, e •
Como a integração mais firme melhora a adaptação, ela é Ia- tamente como se eles representassem elaborações cultur i
vorecida pela seleção por meio de uma complicada rede de evolutivas com combinações diversas de características in I-
reações realimentadoras, corretivas e intensificadoras: maior pientes. Alguns enfatizaram a produção e a redistribuição d
suprimeito alimentar ~ maior densidade da população ~ di- produtos através do comércio e das feiras; outros intensi i
ferenciação de função maior ~ eficiência resultante da espe- ram práticas e conceitos religiosos; alguns procuraram modi-
cialização ~ maior suprimento alimentar ~ maior densida- ficar os padrões cooperativos do comportamento de parent _
de ~ melhores mecanismos de troca de produtos e serviços ~ co para satisfazer novos requisitos; outros substituíram os
métodos especializados de defesa, e assim por diante, até que o mentos sociais com base na ocupação, residência, riqueza
potencial ambiental seja totalmente explorado. outros critérios, pelos antigos agrupamentos de parentesc
Se o urbanismo é tão altamente adaptativo, por que não Por analogia com a evolução biológica é de esperar-se ,qu
apareceu em todas as partes da terra? A resposta estaria nos nem todas essas variações foram igualmente bem sucedida,
tipos de pressões seletivas que são exercidas pelos diferentes através dos tempos. O modelo biológico de diversificação ad
tipos de meio-ambiente. Já falamos da expressão incipiente da tativa explica o tipo de variabilidade cultural que exist n
divisão ocupacional do trabalho, estratificação social e outras Amazônia e, ainda, o processo geral pelo qual a civilizaç
226 2 7
desenvolveu na Mesoamérica, mostrando-os como expressões genes provenientes d r a ou ub I I I

de um único processo adaptativo, cionadas.


Do ponto-de-vista evolutivo, o pr J Jl
çar os benefícios da difusão com as vant 11
o SIGNIFICADO ADAPTATIVO DOS MECANISMOS ção é o .mesmo para os fenômenos tanto cultu l [u 11110 I
CULTURAIS ISOLANTES lógicos. Mas, uma vez que a cultura é em potencí 1 1 I
mente transmitida do que a variação genética, disp
No consenso geral, a cultura é o comportamento adqui- cultural de uma capacidade muito maior, não apen
rido e daí disseminado mais livremente, no tempo e no es- pedir que ocorra a diferenciação como, também, par' injct r
paço, do que as características biológicas que não podem rom- traços novos· e incompatíveis nos complexos previamente iso-
per barreiras genéticas. Embora um comportamento não-cul- la??s, destrui~do-os assim. O esfacelamento de sociedades pri-
tural possa ser adquirido, existe uma acentuada diferença na mitivas atraves do mundo, no decorrer das últimas décad
difusibilidade potencial das inovações biológicas e culturais'. sob o impacto da aculturação, com efeitos traumáticos sobr '
Por outro lado, a distribuição limitada de muitas característi- as populações em questão é uma demonstração eloqüente. d
cas culturais e a existência de pronunciadas disparidades entre potencial destruidor da disseminação cultural descontrolad
grupos geograficamente aproximados evidenciam que a capa- e da importância dos mecanismos isolantes para o desenvolvi
cidade de disseminação inerente à cúltura é freqüentemente mento e a manutenção de configurações culturais adaptativa .
inibida. O fato de persistirem distinções entre culturas que es- Como a cultura. é adquirida, não surpreende que as prin-
tão em comunicação freqüente significa, implicitamente, que cipais barreiras à sua transmissão também sejam adquirida .
à difusibilidade cultural latente é negada expressão livre e Uma das mais efetivas, a julgar por sua extensão, é o etnoce -
quem quer que esteja familiarizado com a teoria da evolução trismo ou a convicção de que nossa própria' gente é "gente d
biológica suspeitará, de imediato, que devem existir mecanis- verdade", enquanto que todos os outros grupos são inferior ,
mos isolantes. Entre as plantas e os animais, onde o intercâm- ou mesmo subumanos. O comportamento de tais inferior
bio de caracteres se faz pela miscigenação, o isolamento é não é somente considerado indigno de imitação como tamb
acompanhado por uma mudança no comportamento o que re- pode ser visto como inalienável, juntamente com a cor d
duz a freqüência do cruzamento entre duas populações, per- cabe.los e outros traços biológicos. Esta atitude psico16gi
contínua sendo muito espalhada hoje em dia e manifesta-
mitindo-Ihes diversificarem geneticamente até se tornarem tão
pelo desprezo para com os hábitos alimentares, roupas, mét -
diferentes a ponto de não mais poderem produzir uma descen- dos de adorno pessoal, indolência, agressividade e demais ca-
dência viável. Trata-se de um processo gradual que talvez não racterísticas de outro grupo, traduzindo-se, pois, no esfor
chegue a acarretar a esterilidade biológica, de modo que al- por evitar, tanto quanto possível, qualquer associação com e -
gum gene pode continuar a fluir por via de indivíduos casuais ses indivíduos, a ponto mesmo de sacrificar conforto pessoal
que, porventura, se cruzem. O isolamento comportamental e vantagem material. A utilidade de tais preconceitos com
abre, assim, a porta à diversificação (com suas importantes mecanismo isolante não incide sobre sua validez. Apesar d
vantagens adaptativas) sem impedir de todo o fluxo de novos sua superficialidade aparente, contribuíram para tornar possí-

22
tes desastrosos chegavam a Cuzco era proporcional à di t I
vel a evolução cultural e continuam a promover a diversifica- cía terrestre, o controle das fronteiras setentrionais não od i
ção dos interesses de sobrevivência da humanidade como um ser tão. eficiente quanto o da zona central. Evidentement, m
todo. te~it:Ório menos comprido, de área equivalente, teria sido
Entre as tribos da terra firme da Amazônia, as crenças unidade administrativa mais eficiente e o afastamento d
sobrenaturais constituem mais uma barreira ao intercâmbio forma ideal indica, implicitamente, que houve, na situaçã
cultural. O papel que cabe à feitiçaria no controle da densi- cal, um fator que predominou sobre os demais. Partindo-r
dade populacional já foi mencionado em capítulos anteriores. teoria evolutiva, podemos levantar a hipótese de que es
Além do mais, o medo da feitiçaria é um importante meca- tor era ecológico e que o custo de manutenção' de uma ocíe-
~ismo isolante ~ois que atua mais fortemente entre grupos ad- dade do tipo lnca, situada na floresta amazônica adjacent ,
Jacentes, os quais tendem a ser muito semelhantes e, em con- seria maior do que o de conservar uma integração de ampla
seqüência, muito suscetíveis à influência mútua. Ademais, o proporções num quadro ambiental 'uniforme. A validade de ta
inferência é confirmada por documentos etno-históricos qu
fat? de que a feitiçaria é mais eficaz se for praticada com um
registram os sucessivos e fracassados esforços militares- no n-
objeto pertencente à vítima reduz, ao mínimo, a transferência
tido de incorporar a baixada oriental ao Império lnca .
. de bens materiais, Outro conceito sobrenatural que inibe e re-
Apesar do fato, comprovado pelá evidência arqueológ I
./ duz, ~e~s~ m?do, a taxa de difusão cultural é a idéia de que
o terntono SItuado fora dos limites tribais está infestado de de que os povos andinos eamazônícos estavam engajado no
espíritos hostis. Da mesma forma que os mecanismos. isolantes comércio desde o tempo em que iniciaram a vida agrícola (
mesmo antes disso), .não pôde essa comunicação contínu
biológicos, t.ai~ ~titude~ favorecem a coesão dentro do grupo,
enquanto rrumrmzam SImultaneamente as relações intergrupais. evitar o advento de dois tipos distintos de configuraçõ cul-
U.ma ve~ que tenha surgido uma configuração cultural turais. Com o decorrer do tempo, a seleção favoreceu s .•
?e~ dI~erencIada e altamente adaptada, ela se torna resistente racterístícas que melhor serviam para a exploração de c d l
a mvasao de traços estranhos, assim como uma espécie se tor- meio-ambiente, resultando .daí que objetos, crenças e práti I
n~ impenetrável à ruptura genética, depois de se ter desenvol- adequadas a uma determinada região tendiam a ser cada v
vido uma barreira de esterilidade. Um dos melhores exemplos mais impraticáveis em outra. A dicotomia se reflete no car l
de impenetrabilidade cultural pode ser observado ao longo da ter dos artigos de comércio encontrados nos sítios arqueol I-
fronteira amazônica-andina. No tempo das conquistas espanho- cos da costa do Pacífico, que consistem de matérias-prl 11
las, a maio~ parte: da área andina era dominada pelo Império tais çomo penas, couros, madeira, frutas e drogas, em V. z I
lnca que tinha SIdo formado havia apenas algumas décadas objetos manufaturados. Muito antes do aparecimento do Im-
atravé~ ~e progressivas conquistas militares. No seu apogeu: pério lnca, surgiram duas distintas .configurações, send q
extendia-se do norte do Equador até o centro do Chile, incor- cada qual era suprema no seu próprio habitat e nenhum d I
porando uma população de vários milhões de habitantes; Para duas havia conseguido produzir um impacto important nu
administrar esse extenso território, era necessário haver co- t rritório da outra. A barreira ecológica é tão forte qu l o
municações rápidas, tendo sido criado, portanto, um engenho- i dad ind strial moderna, que substituiu a dos Inca no I I I
?~
o SIstema estradas e m~nsageiros. Como a rapidez com nulto ndino, não conseguiu se implantar no m i .unbi I1t
)1 fi notícías sobre rebeliões, terremotos e outros inciden- li flor, t de chuvas tropicais.
O
mitam a observar e a m dir os organl I I
enquanto que os estudiosos do comp hum 1110
acesso à dimensão psicológica da adapt ção. d m I
A EVOLUÇAO COMO PROCESSO UNIVERSAL tigar a maneira pela qual atitudes, sentimento, I I
idéias interagem com o comportamento e podemo ,
Paralelos semelhantes entre os fenômenos biológicos e qüência, revelar o papel que exercem no desenvolvim I t
culturais poderiam multiplicar-se indefinidamente e com uma preservação das diferenças comportamentais. Até
boa razão. Os processos que daí decorrem não são biológicos, próprio envolvimento psicológico tem prejudicado
porém universais, e são subjacentes a toda mudança, quais- dade que necessitamos atingir para que vejamos a c tu I
quer que sejam os fenômenos implícados, sejam eles físicos, mo o produto da seleção natural e não da engenhosid d
biológicos ou culturais. Devido à circunstância histórica de , mana. Se pudermos vencer esse obstáculo, a compreem
que a Origem das Espécies de Darwin causou um· im- maneira pela qual os fatores psicológicos estão implic d
pacto mais profundo do que as contribuições contemporâneas adaptação e contribuem, assim, para o processo evolutiv
de Spencer, Tylor e outros, no sentido de reconstituir a evo- girá, certamente, como um campo novo e fascinante p r
lução das sociedade humanas, surgiu a noção de que seme- exploração científica.
lhanças entre o comportamento dos fenômenos biológicos e
culturais são simples analogias - e enganosas, além do mais.
Tal preconceito impediu. a aplicação de várias interpretações,
derivadas da investigação biológica, à explicação da adaptação
e da evolução culturais.
O reconhecimento de que a evolução é um processo uni-
versal e que a diversificação e a seleção natural agem com a
mesma força sobre os fenômenos biológicos e culturais não
implica em que todos os tipos de interações responsáveis pela
adaptação biológica sejam mecanismos igualmente importan-
tes de mudança cultural. Assim como as plantas diferem dos
animais no tocante à mobilidade, longevidade, método de re-
produção e outros aspectos importantes,' também as culturas
diferem dos organismos biológicos. Certos processos de adap-
tação são mais comuns entre os animais do que entre as plan-
tas e devemos esperar encontrar diferenças equivalentes de
ênfase entre os fenômenos culturais e biológicos.
Embora a teoria da evolução biológica possa fornecer
sugestões valiosas para a análise cultural, esta cooperação in-
terdisciplinar não é uma relação unilateral. Os biólogos se li-
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1560-61. 1 st Serie, No. 28. Londres, Hakluyt .80- bo do rio Uaupés que habita uma região nos 11m i-
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1953 The major features oi evolution. New York, Simon Murphy, Robert F. e Buell Quain
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1964 "General features of the limnology of Amazonia." rá do alto Xingu). New York, American Ethn 1 •
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Soares, Lúcio de Castro Shepard, Paul e Daniel McKinley (Eds.)
1953 "Limites meridionais e orientais da área de ocor- 1971 Environ/mental. (Vinte capítulos que tratam
rência da floresta amazônica em território brasilei- implicações ecológicas e suas conseqüências
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Yde, Jens Vayda, Andrew P. (Ed.)
1965 Material culture of the Waiwai. Copenhague, Na- 1969 Environment and cultural behavior; ecological stu-
tionalmuseets Skrifter, Etnografisk, Roekk 10. dies in cultural anthropology. (Significado ad I t -
tivo da guerra, práticas rituais, organização 1Ul •
liar, adivinhação e das tensões físicas e psicol
além de outros tipos de comportamento.)
City, New York, Macmillan.
SUGESTÃO DE LEITURAS COMPLEMENTARES
Wagley, Charles
1953 Arnazon town; a study of man in the tropics, (
Boughey, Arthur S. vida rural na Amazônia de nossos dias. ) w
1968 Ecology of populations. (Relação entre os organis- j York, Macmillan.
2 8 2
)I.H 111' ON(lJl IAI 111;,'11 1'1111\1111 1I ti

1. AO li S N I' 1\ A VI~ rE1 DE .!iR AO 1111111


Mário . r·
rrl.
2. A VI', ETA O NO RIO GRAND' DO SUL - . A. M. Llndm n M ri
3. ECOLOGIA: temas e problemas brasileiros - Mário ulm r s (. rrl.
4. VIAGEM PELAS PROVI'NCIAS DO RIO DE JANEIRO ~ MINA (:lm.AI,' 11
Saint-Hilaire,
5. VIAGEM PELO DISTRITO DOS DIAMANTES E LITORAL DO BRA n, 1111
Hilaire.
6. VIAGEM AO ESPÍRITO SANTO E RIO DOCE - Auguste de Saint-Hllalr .
7. VIAGEM ÀS NASCENTES DO RIO SÃO FRANCISCO - Auguste de Solnt.1I1I Ir .
8. VIAGEM À PROVÍNCIA DE GOIÃS - Auguste de Saint-Hilaire.
Este livro AMAZONIA - A Ilusão de um Paraíso 9. VIAGEM A CURITIBA E PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA - August ti 111111·1111 I
de Betty Meggers, é o volume número 113 da Cole- 10. VIAGEM AO RIO GRANDE DO SUL - Auguste de Saint-Hilaire.
ção "Reconquista do Brasil", dirigida por Antonio 11. SEGUNDA VIAGEM DO RIO DE JANEIRO A MINAS GERAIS E A SÃO PA IR
Paim, Roque Spencer Maciel de Barros e Ruy Afon- - Auguste de Saint-Hilaire,
so da Costa Nunes. Diretor até o volume 92, Mário 12. VIAGEM AO BRASIL (1865-1866) - Luiz Agassiz e Elizabeth Cary Agassiz.
Guimarães Ferri (1918-1985). Traduzido por Maria 13. VIAGEM AO INTERIOR DO BRASIL - George Gardner.
Yedda Linhares e Apresentação de Darcy Ribeiro. 14. VIAGEM NO INTERIOR DO BRASIL - J. Emanuel Pohl.
Foi composta com tipos da Família Press Roman, 15. HISTÓRIA DOS FEITOS RECENTEMENTE PRATICADOS DURANTE OITO ANOS NO
corpo 12/12. Notas em corpo 10/10 da mesma fa- BRASIL - Gaspar Barléu.
mília. Pelo processo de "Foto-montagem" realizado 16. O SELVAGEM - General Couto de Magalhães.
por Martim Tapereira, nos estúdios da própria Edi- 17. DUAS VIAGENS AO BRASIL - Hans Staden.
tora. O papel é de fabricação nacional, no formato 18. VIAGEM PELA PROVÍNCIA DE SÃO PAULO - Auguste de Saínt-Hilaire.
66 x 96 - 90 g/m2, especialmente encomendado 19. HISTÓRIA DA MISSÃO DOS PADRES CAPUCijINHOS NA ILHA DO ~IARANII o
para esta edição e fornecido por Samab - Cia. In- Claude d'Abbeville.
dústria e Comércio de Papel, à Av. Amazonas, 311 20. MEMÓRIAS PARA A HISTÓRIA DA CAPITANIA DE SÃO VICENTE - Frei Qspnr li \ ~III·
- Belo Horizonte. Capa concebida pelo artista plás- dre de Deus.
tico Cláudio Martins. Os fotolitos da capa foram 21. NOTAS SOBRE O RIO DE JANEIRO - John Luccock.
executados pela Multicor, à Rua Carijós, 840 - Belo 22. OS CADUVEOS - Guido Boggiani.
Horizonte. Os fotolitos do texto confeccionados 23. PEREGRINAÇÃO PELA PROVÍNCIA DE SÃO PAULO - Augusto Emílio Zaluar.
pela Fototraço Ltda., à Rua Senador Felício dos 24. CONTRIBUIÇÃO PARA A HISTÓRIA DA GUERRA ENTRE O BRASIL E BU IN '
Santos, 176 - São Paulo. Planejamento gráfico e - Por uma Testemunha Ocular.
diagramaçaõ de Alceu Letal. Impressa na Gráfica 25. MEMÓRIA SOBRE A VIAGEM DO PORTO DE SANTOS À CIDADE DE UIAll lui
Bisordi Ltda., à Rua Santa Clara, 54 - Brás - São d'Alincourt.
Paulo, para a Editora Itatiaia Limitada, à Rua São 26. MEMÓRIAS DO DISTRITO DIAMANTINO - Joaquim Felício dos Santos.
Geraldo, 67 - Belo Horizonte, em regime de co- 27. COROGRAfIA BRA ru
A - Alres de Casal.
edição com a EDUSP - Editora da Universidade de 28. A VIDA NO BRASIL - Tbomas Ewbank,
São Paulo. No Catálogo "Geral leva o número 896. 29. VIAGEM PIT RI-: A ATRAV' DO BRASIL - Alcide D. Orbigny.
30. A SELVA ÁMAZONI A: D INFERNO VERDE AO DESERTO VERMELII? I{ 11 ri
Goodland e Jlow rd lrwln.
31. HISTÓRIA I A (l 111 RA
32. HISTÓRIA DA MI'I J 'A P
33. VIAGENS A INTliI I I I IlRA I
34. BRASIL: AMAZ )N IN l
35. NAS SELVAS 111 11 111
36. VIAGEM D I I I 11 I NI 11
37. VIAGEM DE AN 111" 11 J li.
38. IV SIMPÓ [O S 111 I' 1 I, I R J
39/41. VIDA D' D. PI'I 1 (11 • 1\ 1(nl IHHO
1891) - 3 vol. 111m Il'lIl.
42. HISTÓRIA O ~I) I~II N 1I )lI 1111
43. O PAÍS DA AM í'IIN, 11 ti I I(
44. VIAGEM A T I 1I 11 111\ '1\11
45. AS SINGULIII 11 I I I IJ N
46. BRASIL - F rtl I111111II I) 111
. MHM H VI'I VI (il'~MM I I 1'1MA E ERRESTREAOBRASIL- JOllnNI 1111111
(; I NA 111 \I !.'1I A lIumllt n I It , / 7. MEMÓllIA, I' I A, I J viu A 11I TORIA DO REINO DO BRASIL - 2 v IA. 1,111 1.1111
~48. DI RI O DRA IL - W. L. von 'schweg . dos Suntu
49. VIAG'M AO XINGU -lIenri Coudreau. 38. DE RI I~NAI1lA 'GURUPI - Gustavo Dodt
50. VIAGENS PELOS RIOS AMAZONAS E NEGRO - Alfred Russel Wallace. 39/40. III T I I A 'LABORAÇÁO DA INDEPEND~NCIA - 2 v I ,
51. A CAPITANIA DAS MINAS GERAIS - Augusto de Lima Júnior. Mont lro
52. ECOLOGIA DO CERRADO - R. Goodland e M. G. Ferri. 41/42. HlSTORIA I O IMI'Itl I PIUMElRO REINADO - 2 vols. - Tobias Mont lro
53. UM NATURALISTA NO RIO AMAZONAS - Henry Walter Bates. 43. VIA' 1M Mil 1'1' H. A RI GRANDE DO SUL - Conde d'Eu
54. HISTÓRIA DAS ÚLTIMAS LUTAS NO BRASIL ENTRE OS HOLANDESES E OS PORTU- 44. HI TORIA 1 I 1 TrI' 1 fi - Mcllo Nóbrega
GUESES - Pierre Moreau e RELAÇÃO DA VIAGEM AO PAIS DOS TAPUIAS - Roulox 45. IlISTORIA DRA li. JolI'o Armítage
Baro. 46/48. VIAGEM PELO URA IL - 3 vols. - Spix e Martius
55. FESTAS E TRADIÇÕES POPULARES NO BRASIL - Mello Moraes Filho. 49. lIISTÓRIA DO BRASIL - Frei Vicente do Salvador
56/57. VIAGEM PITORESCA E HISTÓRICA AO BRASIL - 2 vols. - Jean Baptiste Debret. 50/54. HISTÓRIA GERAL DO BRASIL - 5 vols. - Francisco Adolfo de Varnhagen
58/59. PLUTO BRASILIENSIS - 2 vols. - W. L. von Eschwege. 55. HISTÓRIA DA INDEPEND~NCIA DO BRASIL - Francisco Adolfo de Varnha 11
60. VIAGEM A ITABOCA E AO ITACAIÚNAS - Henri Coudreau. 56. O DlABO NA LIVRARIA DO C6NEGO - Eduardo Frieiro
57. VIAGEM AO INTERIOR DO BRASIL - G. W. Freireyss
58. O ESTADO DE DlREITO ENTRE OS AUTÓCTONES DO BRASIL - C. F. von MnrtlllA
COLEÇÃO RECONQUISTA DO BRASIL (Formato 16 x 23) - 2ªSérie
59. OS CIGANOS NO BRASIL e CANCIONEIRO DOS CIGANOS - Mello Moraes Filho
60. PESQUISAS E DEPOIMENTOS PARA HISTÓRIA - Tobias Monteiro
1. DOCUMENTÁRIO ARQUITETÕNICO - José Wasth Rodrigues
61/62. COROGRAFIA HISTÓRICA DA PROVINCIA DE MINAS GERAIS - 2 vols. - Cunha Mlllu
2. VIAGEM PITORESCA ATRAVÉS DO BRASIL - João Maurício Rugendas
63/64. HISTÓRIA DO BRASIL-REINO E BRASIL-IMPÉRIO - 2 vols. - Mello Moraes
3/4. PROVINCIA DE SÃO PAULO - 2 vols. - M. E: Azevedo Marques
65/66. HISTÓRIA DO BRASIL - 2 vols. - H. Handelmann
5/7. NOBILIARQUIA PAULISTANA HISTÓRICA E GENEALÓGICA - 3 vols. - Pedro Taques
67/69. HISTÓRIA DO BRASIL - 3 vols. - Robert Southey
de Almeida Paes Leme
70. CULTURA E OPULfNCIA DO BRASIL - André João Antonil
8. VIDA E MORTE DO BANDEIRANTE - Alcântara Machado
71. VILA RICA DO PILAR - Fritz Teixeira de Salles
9. ARRAIAL DO TIJUCO CIDADE DIAMANTINA - Aires da Mata Machado Filho
72. FEIJÃO, ANGU E COUVE - Eduardo Frieiro
10. VIAGEM À TERRA DO BRASIL - Jean de Léry
73. OS CINTAS-LARGAS - Richard Chapelle
11. MEMÓRIAS DE UM COLONO NO BRASIL - Thomas Davatz
74/75. NOTICIAS DO BRASIL (1828-1829) - 2 vols. - R. Walsh
12. TRATADO DA TERRA DO BRASIL - HISTÓRIA DA PROVÍNCIA DE SANTA CRUZ
76. O PRESIDENTE CAMPOS SALES - Tobias Monteiro
- Pero de Magalhães Gândavo
77. HISTÓRIA DA SIDERURGIA BRASILEIRA - Francisco de A. Magalhães 10m s
13. TRATADOS DA TERRA E GENTE DO BRASIL - Padre Fernão Cardim
78. GEOGRAFIA DOS MITOS BRASILEIROS - Luis da Camara Cascudo
14. VIAGEM ÀS PROVINCIAS DO RIO DE JANEIRO E SÃO PAULO - J. J. Tschudi
79/80. HISTÓRIA DA ALIMENTAÇÃO NO BRASIL - 2 vols. - Luis da Camara Cascud
15. REMINISCÊNCIAS DE VIAGENS E PERMANÊNCIAS NAS PROVINCIAS DO SUL DO
'81. VAQUEIROS E CANTADORES - Luis da Camara Cascudo
BRASIL - Daniel P. Kidder
82. O COMÉRCIO PORTUGUÊS NO RIO DA PRATA (1580-1640) - Alice Piffer Ullllbrnvu
16. REMINISCÊNCIAS DE VIAGENS E PERMANÊNCIAS NAS PROVINCIAS DO NORTE DO
83. EPISÓDlOS DA GUERRA DOS EMBOABAS E SUA GEOGRAFIA - E. C. Barr 'Ir
BRASIL - Daniel P. Kidder
84. LITERATURA ORAL NO BRASIL - Luis da Camara Cascudo
17. VIAGEM PELA PROVINCIA DO RIO GRANDE DO SUL (1858) - Robert Avé-Lallernant 85. O MARQUfS DE OLINDA E O SEU TEMPO - Costa Porto
18. VIAGENS PELAS PROVINCIAS DE SANTA CATARINA, PARANÀ E SÃO PAULO (1858) 86. CANTOS POPULARES DO BRASIL - Sílvio Romero
- Robert Avé-Lallernant 87 CONTOS POPULARES DO BRASIL - Sílvio Romero
19. VIAGENS PELAS PROVINCIAS DA BAHIA, PERNAMBUCO, ALAGOAS E SERGIPE 88: O NEGRO E O GARIMPO EM MINAS GERAIS - Aires da Mata Machado Pilha
- Robert Avé-Lallemant
89. TIRA DENTES - Oiliam José
20. NO RIO AMAZONAS - Robert Avé-Lallemant 90. GONZAGA E A INCONFIDÊNCIA MINEIRA - Almir de Oliveira
21. VIAGEM ÀS MISSÕES JESUITICAS E TRABALHOS APOSTÓLICOS - Padre Antônio
91, SUPERSTIÇÃO NO BRASIL - Luis da Camara Cascudo
Sepp, S. J.
92. TRADlÇÕES E REMINISCENCIAS PAULISTANAS - Affonso A. de Preltus
22. IMAGENS DO BRASIL - Carl von Koseritz
93. LOCUÇOES TRADlCIONAIS NO BRASIL - Luis da Camara Cascudo
23. VIAGEM AO BRASIL - Hermann Burmeister
94. ESTUDOS - Literatura Popular em Verso - Manuel Diégues Júnior c outros
24. DEZ ANOS NO BRASIL - Carl Seidler
95. ANTOLOGIA - Literatura Popular em Verso - M. Cavalcanti Proença
25. SÃO PAULO DE OUTRORA - Paulo Cursino de Moura
96. CONTOS TRADlCIONAIS DO BRASIL - Luis da Camara Cascudo
26. VEGETAÇÃO BRASILEIRA - Mário Guimarães Ferri
97. ID~IAS FILOSÓFICAS E POLITICAS EM MINAS GERAIS NO slZ ULO XIX J()
27. NOTICIAS DAS MINAS DE SÃO PAULO E DOS SERTÕES DA MESMA CAPITANIA
Rodrigues
- Pedro Taques de Almeida Paes Leme
28. NA CAPITANIA DE SÃO VICENTE - Washington Luís 98. IDeIAS FILOSÓFICAS NO BARROCO MINEIRO - Joel Neves
99. GETÚLIO VARGAS E O TRIUNrO DO NACIONALISMO BRASILEIRO LlIdwllll. \I 1111I
29/30. BRASIL PITORESCO ~ 2 vols. - Charles Ribeyrolles
100/101. R 'PLICA - 2 vols. - Rui Barbosa
31. VIAGEM DE UM NATURALISTA INGLÊS AO RIO DE JANEIRO E MINAS G 'RAI
- harlcs James Fox Bumbury
,PAR '.10 A OURO PRETO - Lúcia Machado de Almeida
• I '" AT MONÇO 'IROS - Afonso O". Taunay
4, HI I A'I' S hR ANI A Afonso I '1\. Taunny
c LE~'Ac I li' NQUI 'TA I BRASIL (l'onnnto . x .L~
.\ 'I 1\ 11 1" I 1/11

1. O ALEIJADINHO DE VILA RI 'A - Waldemar de Allllcldn Bnrt'osn


2. ALEIJADINHO, PASSOS E PROFETAS - Myriarn Anclrndc Ribeiro de Olf,,' 111
3. AS IGREJAS SETECENTISTAS EM MINAS GERAIS Paulo Krüger Corn-n Mour II

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