Você está na página 1de 25

Vladimir Soloviev

Breve História sobre


Anticristo

Tradução: Murilo Resende Ferreira


Em uma cidade situada no Mediterrâneo, cinco russos se encontraram por acaso:
um velho general, um político, um jovem príncipe, uma senhora, e um desconhecido
(Senhor Z).
Soloviev nos reporta três de suas conversas. Este é o último fragmento que restou.
O Político: Uma vez que agora está bem claro que nem os ateus, nem os “verdadeiros
cristãos” da espécie do príncipe, representam o Anticristo, é hora de que você nos deixe
o seu retrato.
O Senhor Z: Isto é o que você deseja! Mas você está realmente satisfeito com uma destas
numerosas representações de Cristo, sem excluir aquelas criadas por pintores de gênio?
Para mim, nada me satisfez. Eu acho que é porque Cristo é a encarnação, única e, portanto,
não como qualquer outra, da essência do bem. Para representa-lo, o gênio artístico é
insuficiente. Devemos dizer o mesmo do Anticristo, que é uma encarnação, única em sua
perfeição, do que é o mal. É impossível pintar o seu retrato. Na literatura religiosa,
encontramos apenas os seus traços e os seus esboços da sua descrição.
A Senhora: Deus nos guarde de ter o seu retrato! Diga-nos porque você prefere ficar com
o necessário, que será o seu trabalho, e diga-nos se ele virá em breve.
O Senhor Z: Eu posso satisfazê-la melhor do que pensa. Há apenas alguns anos, um de
meus colegas de estudos, que havia se tornado monge, ao morrer deixou-me um
manuscrito que estava em seu poder, mas que ele não desejou nem pôde imprimir. Tinha
por título: “Breve História sobre o Anticristo”. Como parte de um quadro histórico
preconcebido, esta composição dá, eu creio, tudo quanto com a maior verossimilhança se
pode dizer sobre esta questão, de acordo com a Escritura, a Tradição da Igreja e o bom
senso.
O Político: O autor não será o nosso amigo Varsonophii?
O Senhor Z: Não, deram-lhe um nome mais rebuscado: Pansophii.
O Político: Pansophii? Um polonês?
O Senhor Z: Nem um pouco, ele era o filho de um sacerdote russo. Se você me der um
minuto para ir ao meu quarto, eu tratei para você este manuscrito, e você poderá lê-lo;
não é longo.
A Senhora: Vá! Vá! E volte em breve.
Enquanto o Senhor Z foi buscar o manuscrito, o grupo vai passear no jardim.
O Político: Eu não sei o que é, se é a minha percepção que está afetada pela idade, ou se
é a natureza que está mudada? Mas constato que em qualquer época do ano e em qualquer
lugar eu não vejo mais agora a clara transparência dos dias como outrora. Basta ver hoje:
não há uma nuvem; estamos longe do mar e ainda assim tudo parece ligeiramente
sombreado, esta não é a claridade perfeita. Você notou, General?
O General: Noto isso há muitos anos.
A Senhora: Notei também por um ano, mas na minha alma como na atmosfera eu não
vejo mais “claridade perfeita” de que fala. Em todos os lugares parece reinar como uma
preocupação, como uma premonição de uma catástrofe. Estou convencida, Príncipe, que
você também sente isso.
O Príncipe: Não, eu não notei nada em particular: a atmosfera parece ser o que sempre
foi.
O General: Você é muito jovem para ver a diferença: você não tem um termo de
comparação. Quando eu olho para o tempo em que eu tinha cinquenta anos, como a
diferença é significativa!
O Príncipe: Eu acho que a sua primeira suposição é a verdadeira; a sua percepção está
enfraquecida.
O Político: Nós estamos velhos, isto é certo; mas a terra tampouco rejuvenesce; e se sente
como um duplo cansaço.
O General: O mais provável é que o diabo com seu rabo põe uma névoa na claridade
divina.
A Senhora (apontando para o Senhor Z, enquanto este desce do terraço): iremos em breve
nos informar.
Todos retornam seus lugares anteriores, e o Senhor Z começa a leitura do manuscrito.
O Senhor Z: “Breve História sobre o Anticristo”1.

Pan-mongolismo! Eis um nome selvagem, Mas que agrada muitíssimo a meus


ouvidos, Como se estivesse pleno de presságios Da gloriosa providência divina.

Senhora – De onde vêm essas palavras de ordem? Senhor Z – Acredito que do próprio
autor. Senhora – Bem, estamos escutando.
Senhor Z. (passa a ler) – O século 20 foi a época das últimas grandes guerras e revoluções.
A maior dessas guerras teve sua causa distante no movimento do Pan Mongolismo, que
se originou no Japão ainda no século 19. Os japoneses, em tudo miméticos, e que
demonstraram tanta rapidez e sucesso na cópia das formas exteriores da cultura européia,
também assimilaram algumas idéias de extração inferior. Tendo aprendido em jornais e
livros didáticos de história que existiram no Ocidente movimentos como o Pan-
helenismo, o Pan-germanismo, e o Pan-islamismo, passaram a proclamar ao mundo a
brilhante idéia do Pan-mongolismo – a unificação sob sua bandeira de todas as raças da
Ásia Oriental, com o objetivo de conduzir uma guerra decisiva contra os intrusos
estrangeiros, isto é, os europeus. Tirando vantagem de que a Europa se encontrava em um
conflito final e decisivo com o mundo islâmico no começo do século 20, eles tentaram
iniciar o seu grande plano – primeiro invadindo a Coréia, depois Pequim, onde, apoiados

1
Até aqui, o texto é da edição publicada pela Editora Santa Cruz de 2016. Em frente o texto foi
encontrado na internet no si blog “O Reacionário”. Link:
https://muriloresende.wordpress.com/2016/10/10/um-breve-conto-sobre-o-anticristo-vladimir-
soloviev/
pelo partido revolucionário chinês, depuseram a antiga dinastia Manchu e colocaram em
seu lugar uma linhagem japonesa. Logo os conservadores chineses aceitaram essa
solução, já que compreendiam que dos males este era o menor e que “os laços familiares
tornam todos os povos irmãos, queiram eles ou não”.

A independência da antiga China como um estado já tinha se provado insustentável e a


sujeição aos europeus ou aos japoneses um destino inevitável. Estava claro que a
dominância japonesa, apesar de abolir as formas exteriores do Estado chinês, não
interferiria nos fundamentos da vida nacional, enquanto a dominação européia, que
apoiava os missionários cristãos por motivos políticos, ameaçava a própria base espiritual
da China. O ódio nacional e imemorial aos japoneses tinha se desenvolvido em uma época
sem contatos com os europeus, passando a ter o caráter de um feudo familiar ridículo
diante da dominação dos últimos.

Os europeus eram o absolutamente estrangeiro, os verdadeiros e puros inimigos, e sua


predominância nada prometia de sedutor para a ambição nacionalista. Por sua vez, o Pan-
Mongolismo possuía uma aura mágica e sedutora, que era, além de tudo, mais aceitável
a suas mentes que a necessidade de assimilação da cultura européia.

“Compreendem, irmãos obstinados, ” diziam repetidamente os japoneses, “ que


aceitamos armas dos cães ocidentais, não porque os apreciamos, mas simplesmente para
destruí-los com suas próprias ferramentas? Se vocês se juntarem a nós e aceitarem nossa
orientação prática, logo poderemos não só expulsar os demônios brancos de nossa Ásia,
mas também conquistar suas terras e estabelecer o verdadeiro Reino do Meio em todo o
mundo. Vocês têm razão em seu orgulho nacional e seu desprezo aos europeus, mas
precisam alimentar esses sentimentos com ações e não com sentimentos. Nesse sentido,
estamos muito à frente de vocês e devemos lhes mostrar o caminho do ganho mútuo. Se
olharem ao redor, verão quão pouco ganharam com sua política de autoafirmação e
desconfiança de nós, seus amigos e protetores naturais. Vocês já viram como a Rússia, a
Inglaterra, a Alemanha e a França quase repartiram seu país, e como todas as suas
tentativas de reação só puderam expor a inofensiva cauda da serpente”.

Os chineses consideraram esse argumento razoável, e a dinastia japonesa se afirmou com


toda a solidez. Seu primeiro cuidado foi, obviamente, criar um exército e uma marinha
poderosos. A maior parte das tropas japonesas foram estacionadas na China e serviram
de núcleo para um exército colossal. Os oficiais japoneses que falavam mandarim se
provaram instrutores muito superiores aos europeus e a imensa população chinesa, junto
com a Manchúria, Mongólia e Tibete, forneceu uma oferta suficiente de bom material
humano. Já se tornara possível ao Imperador testar o seu poder recém-conquistado
expulsando os franceses do golfo de Tonkim e do Sião e os ingleses de Burma, além do
acréscimo de toda a Indochina ao Reino do Meio. Seu sucessor, o segundo Imperador,
chinês por parte de mãe, combinava em si mesmo a astúcia e tenacidade chinesa com a
agilidade, energia e empreendedorismo dos japoneses. Mobilizou um exército de quatro
milhões no Turquestão chinês e, enquanto Tsun-li-Yamin informava confidencialmente
ao embaixador russo que o objetivo era a invasão da Índia, o Imperador subitamente
invadiu com suas imensas forças toda a Ásia Central Russa. Ali, ao voltar contra nós toda
a população, rapidamente cruzou o Ural, saqueando a Rússia Central e Oriental com suas
tropas.

Ao mesmo tempo, os exércitos russos, mobilizados de forma confusa, se apressavam para


enfrentá-las na Polônia, Lituânia, Kiev e Volhyn, em São Petesburgo e na Finlândia. Sem
plano algum para uma longa campanha, e deparando-se com uma imensa superioridade
numérica, as qualidades guerreiras dos russos acabaram se provando suficientes somente
para que perecessem com honra.

A velocidade da invasão não lhes permitiu uma concentração apropriada, e batalhão após
batalhão foi aniquilado em batalhas desesperadas e sem esperança alguma. As vitórias
mongólicas também exigiram grandes perdas, mas que foram facilmente repostas com a
ajuda das ferrovias asiáticas, enquanto o exército russo, recomposto com duzentas mil
almas e concentrado na fronteira da Manchúria, executava uma tentativa abortiva de
invadir a China.

Após deixar algumas de suas forças na Rússia, para que nenhum novo exército nascesse
naquele país – e também para destruir os inúmeros focos de guerrilha – o Imperador
atravessou a fronteira da Alemanha com três exércitos. Mas desta vez houve tempo
suficiente para os preparativos e um dos exércitos mongólicos foi brutalmente derrotado.
No entanto, um partido revanchista se encontrava então no poder em França e logo os
alemães se depararam com um exército de um milhão de baionetas em sua retaguarda.
Disposto entre a foice e o martelo, o exército alemão foi forçado a aceitar os termos de
paz honrosos oferecidos pelo Imperador chinês. Os exultantes franceses fraternizavam
com as faces amarelas que se espalhavam pela Alemanha e logo perderam qualquer
arremedo de disciplina militar. Aproveitando a ocasião, o Imperador ordenou que seu
exército executasse todos os aliados que não fossem mais úteis, uma ordem que foi
executada com toda a pontualidade chinesa.

Em Paris, trabalhadores sans patrie organizaram um levante e a capital cultural do


Ocidente alegremente abriu suas portas ao Senhor do Oriente. Curiosidade satisfeita, o
Imperador partiu para a Bolonha, onde, protegido pela frota naval vinda do Pacífico,
rapidamente preparou os transportes que levariam seu exército para a Inglaterra. O
Imperador precisava de dinheiro, no entanto, e por isso os ingleses conseguiram comprá-
lo com a soma de um milhão de pesos. Em um ano, todos os Estados europeus tinham se
submetido como vassalos à dominação do Imperador Chinês, que, tendo deixado tropas
suficientes para a ocupação da Europa, retornou ao Oriente para organizar expedições
navais contra a América e a Austrália. A nova opressão mongol sobre a Europa durou
cerca de meio século. A vida interior daquela época foi marcada pela mistura geral de
idéias europeias e orientais, realizando em grande escala uma repetição do antigo
sincretismo alexandrino. No domínio prático, três fenômenos acima de tudo foram
característicos: a grande entrada de trabalhadores chineses e japoneses na Europa e a
consequente gravidade dos problemas sociais e econômicos; a contínua ação das classes
dominantes no sentido de ações paliativas para resolver esses problemas; e, por último, a
crescente atividade de sociedades secretas internacionais, que organizavam uma grande
conspiração européia para a expulsão dos novos mongóis e o restabelecimento da
independência européia.

Essa colossal conspiração, apoiada pelos governos nacionais, na medida em que


conseguiam escapar dos vice-reis do Imperador, foi organizada com maestria e coroada
com o mais brilhante sucesso. Uma hora muito bem planejada assistiu o começo do
massacre dos soldados mongóis e da aniquilação e expulsão dos trabalhadores asiáticos.
Concentrações secretas de tropas européias foram subitamente reveladas em diversos
lugares, e uma mobilização geral se desenrolou de acordo com os planos previamente
elaborados.

O novo Imperador, que era um neto do grande conquistador, se dirigiu da China para a
Rússia, mas suas inumeráveis hordas sofreram uma derrota excruciante nas mãos do
grande exército europeu. Seus remanescentes dispersos retornaram para o interior da
Ásia, e a Europa respirou novamente em liberdade. Se o meio século de submissão aos
bárbaros asiáticos foi fruto da desunião dos Estado europeus, uma grande e gloriosa
independência foi atingida pela organização internacional das forças conjuntas de toda a
população européia. Como consequência, a antiga organização dos Estados individuais
foi destituída de sua importância por todos os lados, e os últimos traços das antigas
instituições monárquicas gradualmente desapareceram. A Europa do século 21 era uma
aliança de nações democráticas em maior ou menor grau – os Estados Unidos da Europa.
O progresso da cultura material, em vários sentidos interrompido pelo jugo mongol e a
guerra de libertação, agora se desenrolou com força ainda maior.

No entanto, os problemas da consciência interior, como as questões sobre a vida e a morte,


o destino último do mundo e da humanidade, só se complicaram com os últimos avanços
nos campos da psicologia e da fisiologia, permanecendo, como sempre, insolúveis.
Somente um resultado importante se fez aparente, apesar de sua negatividade: a teoria
materialista finalmente colapsou. A noção do universo como um sistema de átomos
dançantes, e da vida como o resultado de uma acumulação mecânica das mais ínfimas
mudanças da matéria não mais satisfaziam um único intelecto pensante.

A humanidade superara o estágio da infância filosófica. Por outro lado, tornou-se


igualmente evidente que ela tinha perdido a capacidade infantil para a fé ingênua e
inconsciente. Idéias como a da criação divina a partir do nada não eram mais ensinadas
nas escolas fundamentais. Um certo patamar elevado em relação a tais assuntos tinha
evoluído, e nenhum dogmatismo poderia arriscar sequer um passo abaixo dele. E, apesar
do ateísmo da maior parte dos intelectuais, os poucos crentes se tornaram pensantes por
uma necessidade imperiosa, cumprindo as palavras do Apóstolo: “ Sede crianças em
vossos corações, mas nunca em vossa razão”.

Naquele tempo, havia entre os poucos espiritualistas e crentes uma pessoa notável –
muitos o consideravam sobre-humano – que pouco retinha de um coração infantil. Era
ainda jovem, mas devido a sua genialidade, já na idade de trinta e três anos tinha se
tornado um grande pensador, escritor e figura pública. Consciente do grande poder do
espírito que nele habitava, sempre fora um firme espiritualista, e seu intelecto cristalino
sempre lhe mostrara a verdade sobre o que se devia acreditar: no bem, em Deus e no
Messias. Acreditava neles, mas só amava a si mesmo. Acreditava em Deus, mas nas
profundezas de sua alma involuntariamente e inconscientemente preferia a si mesmo.
Acreditava no Bem, mas o olhar onisciente do Eterno sabia que aquele homem dobraria
seus joelhos diante do poder do Mal assim que algo grandioso lhe fosse oferecido – não
através do engano dos sentidos e das paixões vis, nem mesmo através do engano superior
do poder, mas tão somente através de seu amor próprio incomensurável. Esse amor
próprio não era nem instinto inconsciente nem ambição insana. Seu gênio, beleza e
nobreza de caráter excepcionais, a sua reserva, desinteresse e atitude simpática a todos os
necessitados pareciam justificar abundantemente o imenso amor próprio desse grande
espiritualista, asceta e filantropo. Seria ele culpado, sendo tão dotado da graça divina, de
enxergar nesses dons os sinais da especial benevolências dos Céus para com sua pessoa,
como se acima dele só se elevasse o próprio Deus? Em uma palavra, ele acreditava ser
aquilo que em realidade somente o Cristo era. Mas essa concepção do seu alto valor se
mostrava na prática não no exercício do dever moral para com Deus e o mundo, mas na
conquista do privilégio e da admiração à custa de outros, e especialmente do Cristo. A
princípio não guardava sentimentos hostis contra o Cristo. Reconhecia sua importância
messiânica e seu valor, mas era sincero em ver nele somente seu maior precursor. A
realização moral do Cristo e aquilo que o tornava único eram realidades acima de um
intelecto tão turvado pelo amor próprio. Então pensou: “Cristo veio antes de mim, e eu
depois. Mas o que, na ordem do tempo, aparece tardiamente, é, em essência, de maior
importância. Eu vim por último, no fim da história, e por essa razão sou o mais perfeito.
Sou o salvador final do mundo, e o Cristo meu precursor. Sua missão foi me preceder e
preparar o terreno para minha chegada”.

Ao pensar assim, o super-homem do século vinte e um aplicou a si mesmo tudo que fora
dito nos Evangelhos sobre a segunda vinda, a explicando não como o retorno do mesmo
Cristo, mas como uma substituição do Cristo preliminar pelo final – isto é, por si mesmo.
Neste estágio, o homem vindouro apresentava poucas características e traços originais.
Sua atitude diante de Cristo se assemelhava, por exemplo, a de Maomé, um homem
sincero, e que não pode ser acusado de nenhuma intenção maligna. Esse homem
justificava sua preferência egoísta por si mesmo diante do Cristo de outra forma. “Cristo”,
dizia ele, “ que pregava e praticava o bem moral na vida, era um reformador da
humanidade, enquanto eu fui chamado a ser o benfeitor dessa mesma humanidade,
parcialmente reformada e parcialmente incapaz de ser reformada. Eu darei a cada um
aquilo que pedir. Como moralista, Cristo dividiu a humanidade através da noção do bem
e do mal. Eu a unificarei com benefícios que são necessários tanto ao homem mau quanto
ao homem bom. Serei o verdadeiro representante daquele Deus que faz a chuva cair sobre
o justo e o injusto. Cristo trouxe a espada; eu trarei a paz. Cristo ameaçou a Terra com o
Dia do Julgamento. Mas eu serei o último juiz, e meu julgamento não será o da justiça,
mas da misericórdia. A justiça a ser distribuída em minhas sentenças não será retributiva,
mas distributiva. Julgarei cada um de acordo com aquilo que merece, e darei a todos
aquilo de que precisam”.

Entorpecido por esse espírito magnificente, ele agora esperava por um chamado
inequívoco de Deus para começar o trabalho de salvação da humanidade – por um
testemunho óbvio e marcante de que era o filho primogênito e unigênito de Deus.
Esperava e sustentava a si mesmo com a consciência de suas virtudes e dons sobre-
humanos, pois, como diziam, era um homem de moral irretocável e de um gênio
excepcional.

Então, esse homem justo e orgulhoso aguardava a sanção do Altíssimo para começar a
salvar a humanidade; mas não viu qualquer sinal claro. Já tinha passado dos trinta anos.
Três anos mais passaram. Subitamente, um pensamento atravessou sua mente e o
comoveu no centro de seu ser. “ E se,” pensou ele, “ por algum acidente não sou Eu, mas
o outro… o Galileu. E se ele não for meu anunciador, mas o verdadeiro salvador, o
primeiro e o último? Neste caso, ele deve estar vivo… Mas onde está então? E se vier
subitamente até mim, aqui e agora? O que direi a Ele? Não serei forçado a dobrar meus
joelhos diante dele como o mais ridículo dos cristãos, como um camponês russo que diz
sem compreender: “Senhor Jesus Cristo, perdoa-me, este homem pecador? Não serei
forçado, como uma velha polonesa, a me prostrar? Eu, o gênio sereno, o super-homem!
Não pode ser! E aqui, ao invés de seus antigos raciocínios e reverência fria a Deus e a
Cristo, um medo repentino nasceu e cresceu em seu coração, seguido de uma inveja
flamejante que consumiu todo o seu ser, e por um ódio ardente que acabou com todo o
seu fôlego. “Sou Eu, sou Eu, e não ele! Ele está morto- e assim ficará por toda a
eternidade! Ele não – não, não se levantou” Ele apodrece em seu túmulo, apodrece como
os perdidos…”. Com sua boca espumando, apressou-se convulsivamente para fora da
casa, através do jardim, e correu por um caminho pedregoso no silêncio da negra noite.

Sua fúria arrefeceu e deu lugar a um desespero, duro e seco como as pedras, sombrio
como a noite. Parou de frente a um precipício acentuado, de cujo fundo podia escutar os
vestígios de som da corrente d’água que atravessava as pedras. Uma angústia insuportável
dominava o seu coração. Subitamente um pensamento atravessou sua mente. “Devo
chamá-lo? Devo perguntar-lhe o que fazer ?”. E em meio às trevas podia ver uma imagem
pálida e marcada pela aflição. “Ele tem misericórdia de mim…. Ó, não, nunca! Ele não
se levantou! Ele não! Ele não!”. E saltou do precipício.
Mas algo firme como uma coluna d’água o susteve no ar. Sentiu um choque como que
elétrico e algum força desconhecida o lançou de volta ao rochedo. Por um momento ficou
inconsciente. Quando voltou aos seus sentidos percebeu que estava ajoelhado a alguns
passos do precipício. Uma estranha figura brilhante como uma luz fosforescente se erguia
diante dele, e seus dois olhos atravessavam sua alma com um brilho doloroso e penetrante.
Viu esses dois olhos perscrutadores e escutou uma voz pouco familiar vindo de dentro ou
de fora dele – não podia distinguir – uma voz sem graça e diminuída, mas distinta,
metálica e informe como uma gravação. E a voz lhe disse: “ Ó, meu filho amado! Que
toda minha benevolência esteja contigo! Por que não vieste a mim? Porque paraste para
adorar o outro, o malicioso, e seu pai? Eu sou seu deus e pai. E aquele mendigo
crucificado – ele é um estranho tanto para mim quanto para vós. Eu não tenho outro filho
que vós. Tu és o único, o único gerado por mim, igual a mim. Eu vos amo, e nado peço a
vós. Tu és tão belo, grande e poderoso. Faça vosso trabalho em vosso próprio nome, e
não meu. Não tenho qualquer inveja de vós. Amo-vos. Nada exijo de vós. Aquele que vós
considerais como Deus, exigiu de seu filho obediência, a obediência absoluta – até a
morte na cruz – e até mesmo naquele momento não o ajudou. Nada exijo de vós, e ainda
vos apoiarei. Por vós mesmo, por vossa própria dignidade e excelência, e por meu próprio
amor desinteressado por vós, eu irei vos ajudar! Receba o meu espírito! Assim como meu
espírito vos deu nascimento em beleza, agora ele vos dará nascimento no poder”.

Com essas palavras, a boca do super-homem se abriu involuntariamente, dois olhos


cortantes se aproximaram de sua face, e ele sentiu uma respiração gelada que invadia todo
seu ser. Sentiu em si tal força, tal vigor, tal leveza e tal alegria, como nunca houvera
experimentado. Naquele momento, a imagem luminosa e os dois olhos desapareceram
repentinamente, e algo ergueu o homem até o ar e o transportou até o jardim diante da
porta de sua casa.

No dia seguinte, os visitantes do grande homem, e até mesmo seus serviçais, se


impressionaram como seu ar especialmente inspirado. Impressionariam-se ainda mais se
vissem com que velocidade e facilidade sobrenaturais estava escrevendo, trancado em seu
gabinete, o seu famoso trabalho intitulado O Caminho Aberto para a Paz Universal e a
Prosperidade.

Os livros e a atividade pública pregressa do super-homem tinham sempre se defrontado


com uma crítica severa, apesar de que sempre de pessoas de convicções religiosas
excepcionalmente profundas, o que já as desqualificava imediatamente (bem, no fim das
contas, estou falando da vinda do Anticristo) quando tentavam mostrar, em tudo que o
homem vindouro escrevia ou dizia, os sinais de um amor-próprio e de uma presunção
excepcionais e excessivos, e de uma completa ausência de verdadeira simplicidade,
franqueza e sinceridade.
Mas seu novo livro trouxe para seu lado até mesmo os antigos críticos e adversários. Esse
livro, composto após o incidente no precipício, demonstrava uma genialidade pouco
evidente no passado. Era uma obra que tudo abraçava e tudo resolvia. Unia um nobre
respeito às tradições e símbolos antigos com um radicalismo ousado em questões sociais
e políticas. Juntava uma liberdade de pensamento sem limites com a mais profunda
apreciação de tudo que fosse místico. O individualismo absoluto se encontrava lado a
lado com um zelo ardente pelo bem comum, e o mais elevado idealismo dos princípios
se combinava delicadamente com uma perfeita objetividade nas soluções práticas para as
necessidades da vida. Tudo isso combinado e sedimentado com um gênio artístico tal que
todo pensador e homem de ação, não importando quão sectário fosse, podia facilmente
ver e aceitar a totalidade desde seu ponto de vista particular, sem que precisasse sacrificar
nada no altar da verdade, se elevar acima de seu ego, nem renunciar realmente a seu
sectarismo e todas as suas deficiências e inadequações.

Esse livro maravilhoso foi imediatamente traduzido nas línguas de todas as nações
civilizadas, e muitas das não civilizadas também. Durante todo o ano, milhares de jornais
em todas as partes do mundo foram inundados de propaganda dos editores e de elogios
dos críticos. Edições baratas com fotos do autor venderam aos milhões, e todo o mundo
civilizado – que era quase todo o globo naquele momento – ressoava com a glória do
grande, do incomparável, do único!

Ninguém ergueu sua voz contra o livro. Por todos os lados foi aceito como a revelação
da verdade completa. Nele, todo o passado era recebido com plena e completa justiça, o
presente era avaliado com toda imparcialidade e catolicidade, e o mais feliz dos futuros
era descrito de modo convincente e prático, levando todos a dizer: “Finalmente temos o
que precisamos. Aqui está o ideal que não é uma Utopia. Aqui está um plano que não é
um sonho”. E o maravilhoso autor não somente impressionou a todos, como também
soube ser maleável a todos, de forma que palavra do Cristo se realizou: “ Venho em nome
do Pai, e vós não me aceitais. Outro virá em seu próprio nome – e ele vós ireis aceitar”.
Pois é necessário ser maleável para ser aceito.

É verdade que algumas poucas almas piedosas se perguntavam, ao mesmo tempo que
elogiavam o livro, o porquê do nome de Cristo jamais ser mencionado; mas outros cristãos
respondiam: “É melhor assim. Tudo que é sagrado foi tão maculado no passado por todo
tipo de fanático, que um autor moderno e profundamente religioso deve ser reservado
nessa seara. Já que o livro está imbuído do verdadeiro espírito cristão de amor ativo e de
boa vontade generosa, o que mais poderia ser desejado? “ E todos concordaram. Logo
após a publicação de “O Caminho Aberto”, que tornou seu autor o homem mais popular
de toda a terra, deveria se realizar um congresso internacional dos Estados Unidos da
Europa em Berlim. Essa União, criada após uma série de guerras civis e internacionais
que se seguiram à libertação da opressão mongol e resultaram em uma considerável
alteração do mapa europeu, agora se encontrava ameaçada, não pelo conflito das nações,
mas pela luta interna de várias facções políticas e sociais.
Os principais dirigentes da política européia, que pertenciam à poderosa irmandade
maçônica, ressentiam a falta de um poder executivo comum. A unidade européia que
tinha sido obtida a um custo exorbitante estava prestes a se estilhaçar. Não havia qualquer
unanimidade no Conselho da União, pois nem todos os assentos estavam nas mãos dos
maçons.

Os membros independentes do Conselho entravam em acordos separados, e esse estado


de coisas ameaçava fazer eclodir uma nova guerra. Os “iniciados” resolveram então
estabelecer um executivo de um homem só dotado de uma considerável autoridade. O
principal candidato era o membro secreto da Ordem – “o homem vindouro”. Ele era o
único candidato de fama mundial. Era por profissão um militar, e por fonte de renda um
rico capitalista, e isso permitia seu livre trânsito nos círculos militares e financeiros. Em
outro tempo poderia ter sido lançada contra ele sua origem extremamente obscura. Sua
mãe, uma mulher de reputação duvidosa, era muito conhecida em ambos os hemisférios,e
o número daqueles que poderiam considerá-lo como filho era demasiadamente grande.
Essas circunstâncias não podiam ter qualquer peso em uma época tão avançada a ponto
de ser a última. O homem vindouro foi quase que unanimemente eleito presidente
vitalício dos Estados Unidos da Europa. E quando ele apareceu no palco em todo o
glamour de sua beleza e poder sobre-humanos e, com eloquência inspirada, expôs seu
programa universal, a assembléia foi tomada pelo encanto de sua personalidade e, em
uma efusão de entusiasmo, decidiu, mesmo sem votação, dar a ele a mais elevada honra
como Imperador Romano. O congresso se encerrou em meio ao júbilo geral, e o grande
homem publicou um manifesto que começava com as seguintes palavras: “ Nações do
Mundo! Dou-lhes a minha paz,” e concluía, “Nações do Mundo! As profecias foram
cumpridas! Uma paz eterna e universal foi assegurada. Toda tentativa de destruí-la se
deparará com uma oposição determinada e irresistível, já que um poder moderador se
estabeleceu sobre a Terra, sendo ele mais poderoso que todos os outros poderes, em
conjunção ou separados. Esse poder inconquistável e insuperável pertence a mim, o
escolhido da Europa, o Imperador de todas as suas forças. A lei internacional finalmente
garantiu um poder de sanção há muito em falta. Doravante, nenhum país ousará dizer
“Guerra” quando eu disser “Paz”! Povos do mundo, paz a todos!”

Esse manifesto atingiu seu objetivo. Em todos os lugares fora da Europa, particularmente
na América, poderosos partidos imperialistas se formaram e compeliram seus governos a
se juntar aos Estados Unidos da Europa sob a suprema autoridade do Imperador Romano.
Ainda restavam algumas poucas tribos independentes e pequenos Estados em partes
remotas da Ásia e da África, mas com um pequeno, mas dedicado exército de russos,
alemães, poloneses, húngaros e turcos, o Imperador saiu em marcha militar do Leste
Asiático até o Marrocos e, sem muito derramamento de sangue, subjugou todos os
Estados insubordinados. Em todos os países do mundo ele instalou vice-reis, escolhendo-
os entre a nobreza nativa que tinha recebido uma educação européia e que lhe era fiel.
Em todos os países pagãos, as populações nativas, grandemente impressionadas e
seduzidas por sua personalidade, proclamaram-no como seu supremo deus.
Em um único ano, uma monarquia realmente universal no sentido próprio e verdadeiro
da palavra se estabeleceu. As raízes das guerras foram radicalmente destruídas. A Liga
Universal da Paz se encontrou pela última vez, e tendo realizado um panegírico exaltado
ao Grande Pacificador, dissolveu-se devido à sua presente e futura irrelevância.

No começo de seu segundo ano de reinado, o Imperador Mundial publicou um manifesto:


“ Nações do Mundo! Eu lhes prometi a paz, e enfim a realizei. Mas a paz só é jubilosa
com prosperidade. Aquele que é ameaçado pela pobreza durante a paz não pode ter
qualquer prazer em tal situação. Conclamo, portanto, que todos os famintos e
desabrigados do mundo venham a mim, e então lhes darei comida e abrigo!” Assim ele
anunciou o simples a abrangente programa de reforma social que já tinha sido articulado
em seu livro e que agora capturava todas as mentes nobres e saudáveis. Devido à
concentração de todos os recursos financeiros do mundo em suas mãos e todas as suas
propriedades colossais, o Imperador podia de fato realizar uma reforma em acordo com
os desejos dos pobres, sem causar muitos problemas aos ricos. Todos recebiam agora de
acordo com suas capacidades e toda capacidade de acordo com seu trabalho e mérito. O
novo senhor do mundo era acima de tudo um filantropo de coração gentil e não somente
um filantropo, mas até mesmo um filozooísta, um amante da vida. Era vegetariano,
proibiu a vivissecção e instituiu uma dura supervisão sobre os abatedouros, ao mesmo
tempo que as sociedades de proteção dos animais recebiam grande encorajamento de sua
parte. Mas havia algo mais importante do que esses detalhes: a forma mais fundamental
da igualdade se estabeleceu no seio da humanidade, a igualdade da saciedade universal.
Isso se deu no segundo ano do reinado. Os problemas sociais e econômicos foram
finalmente resolvidos. Mas se a saciedade é questão de primeira importância para os
famintos, deixa de sê-lo para os que já estão satisfeitos. Até mesmo os animais saciados
desejam algo além do sono: querem brincar. E isso vale ainda mais para a humanidade
que sempre buscou o circo após o pão.

O Imperador sobre-humano entendeu o que a massa desejava. Naquele tempo um grande


mágico, abrigado em uma densa nuvem de fatos estranhos e histórias selvagens, veio até
ele em Roma do Extremo Oriente. Um rumor, que se espalhou entre os neo-budistas,
concedia a ele a origem divina em uma relação do deus-sol Suria e alguma ninfa dos rios.
Esse mágico, Apolônio seu nome, era sem dúvida um homem de gênio. Metade europeu,
metade asiático, um bispo católico in partibus infidelium, combinava em si mesmo de
maneira marcante as últimas aplicações e conclusões da ciência ocidental com a arte de
utilizar tudo que era verdadeiro e saudável no misticismo oriental. Os resultados dessa
combinação eram impressionantes. Apolônio aprendeu, dentre outras coisas, a arte semi-
científica e semi-mística de direção voluntária da eletricidade atmosférica e os homens
diziam que podia fazer chover fogo dos céus. No entanto, apesar de ser capaz de
maravilhar a imaginação do público com vários fenômenos inauditos, não abusou desse
poder para qualquer fim egoísta. Foi esse homem que veio ao grande Imperador, o saudou
como o verdadeiro filho de Deus, declarando que tinha descoberto em livros secretos do
Oriente certas profecias inegáveis que apontavam o Imperador como o último juiz e
salvador do Universo, e lhe ofereceu seus serviços e toda a sua arte. O Imperador,
completamente encantado por esse homem, aceitou-o como uma dádiva dos céus,
decorando-o com todos os mais belos títulos e tornando-o seu constante companheiro.
Então as nações do mundo, depois de terem recebido de seu senhor a paz universal e a
abolição universal da fome, receberam naquele momento a possibilidade da fruição
inesgotável dos milagres mais diversos e extraordinários. E assim terminou o terceiro ano
do reinado do super-homem. Após a feliz solução dos problemas sociais e políticos, a
questão religiosa veio a tona. A questão foi levantada pelo próprio Imperador,
primeiramente em sua aplicação ao Cristianismo. Naquele tempo, a situação do
Cristianismo era como se segue: seus seguidores tinham diminuído enormemente em
número e contavam no máximo 45 milhões de pessoas em todo o mundo; mas,
moralmente, conhecera um progresso acentuado e ganhara em qualidade o que perdera
em números. Indivíduos que não estivessem ligados ao Cristianismo por qualquer laço
espiritual não eram mais contados como cristãos. As diversas denominações cristãs
tinham diminuído igualmente em número, e assim a relação proporcional entre elas
permanecera quase que intocada. Quanto aos sentimentos mútuos, a hostilidade não tinha
dado lugar inteiramente a sentimentos mais amenos, mas tinha diminuído
consideravelmente, e pontos de conflito tinham perdido muito de sua antiga vivacidade.
O Papado há muito fora expulso de Roma, e após muito vaguear encontrou refúgio em
São Petesburgo, com a condição de evitar qualquer proselitismo ali e em todo o país.

Na Rússia, o Papado rapidamente se simplificou. Deixando praticamente intocado o


número de seus colégios e ofícios, foi obrigado a infundir em seus trabalhos um espírito
mais fervoroso, e a reduzir ao máximo seus rituais e cerimônias elaborados. Muitos
costumes estranhos e sedutores, apesar de não serem completamente abolidos, caíram por
si mesmos em desuso. Em todos os outros países, particularmente na América do Norte,
o sacerdócio católico ainda tinha um bom número de representantes dotados de uma forte
vontade, energia inexaurível, e caráter independente, o que permitiu fundir a Igreja
Católica em uma unidade desconhecida no passado, preservando sua importância
internacional e cosmopolita.

Quanto ao Protestantismo, que ainda era liderado pela Alemanha, especialmente desde a
união da maior parte da Igreja Anglicana à Igreja Católica – o Protestantismo tinha se
purgado de suas tendências excessivamente negativas, e os apoiadores dessas tendências
decaíram na apatia e na descrença religiosa. A Igreja Evangélica continha agora somente
aqueles que eram sinceramente religiosos. Era comandada por pessoas que combinavam
um vasto conhecimento com um sentimento religioso profundo e um desejo crescente de
trazer à vida em suas próprias pessoas a imagem viva do verdadeiro Cristianismo antigo.
A Ortodoxia Russa, após os eventos políticos que alteraram a posição oficial da Igreja,
perdera muitos dos seus milhões de falsos membros nominais; mas ganhara o júbilo da
unidade com a melhor parte dos “velhos crentes”, até mesmo com os mais profundamente
sectários. A Igreja revivificada, apesar de não crescer em números, começou a crescer na
força do espírito, a qual revelou particularmente na luta com as numerosas seitas
extremistas (algumas não inteiramente carentes de elementos demoníacos e satânicos)
que estabeleceram raízes no povo e na sociedade.

Nos primeiros dois anos do novo reinado, todos os cristãos, temerosos e cansados da
quantidade de revoluções e guerras precedentes, olhavam para seu novo senhor e suas
reformas pacíficas em parte com esperança benevolente e em parte com simpatia sem
reservas e até mesmo entusiasmo fervoroso.

Mas no terceiro ano, assim que o grande mágico fez sua aparição, sérios temores e
antipatia começaram a crescer nas mentes de muitos ortodoxos, católicos e protestantes.
O Evangelho e os textos apostólicos que falavam do Príncipe deste Mundo e do Anticristo
eram agora lidos com mais cuidado e davam margem a conversas acaloradas. O
Imperador logo percebeu alguns sinais de que uma tempestade estava se formando e
resolveu encerrar o assunto apressadamente. No começo do quarto ano de seu reinado,
publicou um manifesto a todos os verdadeiros cristãos, sem distinção de igrejas,
convidando-os a eleger ou apontar representantes de peso para o congresso mundial a ser
realizado sob sua presidência.

Naquele tempo, a residência imperial foi transferida de Roma a Jerusalém. A Palestina já


era uma província autônoma, habitada e governada principalmente por judeus. Jerusalém
era uma cidade livre e agora imperial. Os locais sagrados cristãos permaneceram
intocados,mas, sobre toda a grande plataforma de Haram-esh-Sheriff, passando por
Birket-Israin e as tendas até a mesquita de El-Ax e o estábulos de Salomão, foi erigido
um imenso prédio, que incorporava além das duas pequenas mesquitas antigas, um
enorme templo imperial para a unificação de todos os cultos, e dois palácios imperiais
luxuosos com bibliotecas, museus e apartamentos especiais para experimentos mágicos e
exercícios. Era nesse prédio metade templo, metade palácio, que o congresso iria se
realizar em 14 de setembro. Como a Igreja Evangélica não tem qualquer hierarquia no
sentido próprio da palavra, a hierarquia católica e ortodoxa, seguindo o pedido expresso
do Imperador, e para que que uma maior uniformidade de representação se desse, decidiu
admitir aos procedimentos do congresso um certo número de membros laicos conhecidos
por sua piedade e devoção aos interesses da Igreja. Assim que estes foram admitidos, no
entanto, parecia impossível excluir do congresso o clero, tanto das ordens monásticas
quanto seculares. Dessa maneira, o número total de membros do congresso excedeu os
três mil, enquanto cerca de 500.000 peregrinos cristãos inundaram Jerusalém e a
Palestina. Entre os membros presentes, três homens eram particularmente conspícuos. O
primeiro era o Papa Pedro II, que comandava legitimamente a parte católica do congresso.
Seu predecessor falecera a caminho do Congresso, e um conclave foi realizado em
Damasco, o qual elegeu com unanimidade o Cardeal Simone Barionini, que tomou o
nome de Pedro. Ele era de origem plebéia, da província de Nápoles, e tinha se tornado
famoso como pregador da Ordem Carmelita, tendo obtido grande sucesso em sua luta
contra uma seita satânica que vinha se espalhando em São Petesburgo e imediações,
seduzindo não somente os ortodoxos mas também os fiéis católicos. Elevado à
arquidiocese de Mogilov e depois à posição de Cardeal, sempre fora marcado para a tiara.
Era um homem de cinquenta anos, de estatura média e de constituição forte, com uma
face vermelha, um nariz torto e sobrancelhas grossas. Tinha um temperamento impulsivo
e ardente, falava com fervor e gestos grandiosos, e mais entusiasmava do que convencia
sua audiência. O novo Papa não tinha confiança alguma no Imperador, e olhava para ele
com um olhar desaprovador, ainda mais com o fato de que o Papa recém-falecido,
dobrando-se à pressão do Imperador, tinha tornado cardeal o Chanceler Imperial e grande
mágico do mundo, o exótico Bispo Apolônio, que Pedro considerava um católico
duvidoso e quase certamente uma fraude.

O líder efetivo, mas não oficial, dos membros ortodoxos era o Ancião João, muito
conhecido do povo russo. Oficialmente, ele era considerado um bispo aposentado, mas
não vivia em um monastério, permanecendo sempre em viagem ao redor do mundo.
Muitas histórias lendárias circulavam sobre ele. Algumas pessoas acreditavam que era
Feodor Kuzmich, isto é, o Imperador Alexandre I, que tinha falecido há três séculos e
agora retornava à vida. Outros iam além e diziam que ele era o verdadeiro Ancião João,
isto é, o apóstolo João, que nunca morrera e que agora reaparecera nos últimos dias. Ele
próprio nada dizia de sua origem e juventude. Era agora um homem muito velho mas
vigoroso, com cabelos brancos e uma barba dotada de um tom meio amarelado, meio
esverdeado, alto, magro de corpo, com bochechas rosadas e plenas, olhos vivos e
expressão gentil e amorosa em sua face e sua fala. Vestia-se sempre com roupas brancas
e um manto.

Liderando os membros evangélicos estava o mais culto dos teólogos alemães, o Professor
Ernst Pauli. Ele era um homem baixo e sábio, com uma grande testa e nariz e uma face
perfeitamente barbeada. Seus olhos se distinguiam por uma ferocidade peculiar, mas
ainda assim eram suaves. Ele esfregava incessantemente suas mãos, balançava sua
cabeça, franzia suas sobrancelhas e erguia seus lábios; ao mesmo tempo que com olhos
brilhantes dizia gravemente: “Isto! Aquilo! Isso também!”. Suas vestes carregavam toda
uma aparência de solenidade – uma gravata branca e uma jaqueta pastoral longa decorada
com todos os símbolos de sua ordem.

A abertura do congresso foi imponente. Dois terços do imenso templo, devotado à


unificação de todos os cultos, estavam coberto de bancos e outros arranjos para os
membros do congresso. O outro terço era tomado por uma plataforma elevada onde foram
colocados o trono do Imperador e um trono menor um pouco abaixo, destinado ao grande
mágico – que era ao mesmo tempo cardeal e chanceler imperial – e atrás deles fileiras de
poltronas para os ministros, cortesãos e oficiais, enquanto ao lado estavam fileiras ainda
mais longas de poltronas destinadas a não se sabia quem.

A galeria estava tomada pela orquestra, enquanto na praça adjunta foram instalados
regimentos de guardas e uma bateria de armas para os salves triunfais. Os membros do
congresso já tinham comparecido às cerimônias respectivas nas várias igrejas: a abertura
do congresso seria completamente laica. Quando o Imperador, acompanhado pelo grande
mágico e sua corte, fez sua entrada, a banda começou a tocar a “ Marcha da Humanidade
Unificada”, que era o hino internacional do Império, e todos os membros se levantaram,
e, abanando seus chapéus, ecoaram três gritos entusiasmados: “Vivat! Hurrah! Hoch!” O
Imperador, de pé em frente ao trono e estendendo sua mão com um ar de benevolência
majestosa, proclamou com uma voz agradável e sonora: “ Cristãos de todas as
denominações! Meus amados súditos, irmãos e irmãs! Desde o começo de meu reinado,
que o Altíssimo abençoou com feitos gloriosos e maravilhosos, não encontrei nenhum
motivo para me decepcionar com vocês. Vocês sempre realizaram suas tarefas em
consonância com sua fé e consciência. Mas isso não é suficiente para mim. Meu amor
sincero, meus caros irmãos e irmãos, exige reciprocidade. Desejo ser reconhecido como
seu verdadeiro líder em toda e qualquer iniciativa executada para o bem-estar da
humanidade, não por um mero senso de dever, mas sim pelo amor que vocês têm por
mim. Portanto, além do que faço para todos, estou prestes a lhes mostrar a minha
benevolência especial. Cristãos! O que posso lhes dar? O que posso lhes dar, não como
súditos, mas como correligionários, meus irmãos e irmãs! Cristãos! Digam-me o que é a
coisa mais preciosa do Cristianismo para vocês, afim de que direcione meus esforços
neste sentido!

Parou por um momento, esperando uma resposta. O salão reverberava com sons abafados.
Os membros do congresso consultavam uns aos outros. O Papa Pedro, com gestos
ardorosos, explicava algo a seus seguidores. O Professor Pauli, balançava sua cabeça e
mordia ferozmente seus lábios. O Ancião João, dobrando-se diante dos bispos e monges
orientais tranquilamente tentava transmitir algo a eles.

Após esperar alguns minutos, o Imperador novamente se dirigiu ao congresso com o


mesmo tom educado, no qual, no entanto, podia-se ouvir uma nota rarefeita de ironia: “
Caros cristãos”, disse ele, “Eu entendo como lhes é difícil me dar uma resposta direta.
Vou ajudar-lhes. Desde tempos imemoriais, vocês caíram na infelicidade da divisão em
várias denominações e confissões, de forma que hoje quase nada têm em comum. Como
não conseguem concordar entre si, espero trazer a harmonia dando a cada denominação
o mesmo amor e a mesma disposição em satisfazer o verdadeiro desejo de cada uma.
“Caros cristãos! Sei que para muitos, e não os menores, a coisa mais valiosa do
Cristianismo é a autoridade espiritual dada a seus representantes legais – claro que não
para seu benefício pessoal, mas para o bem comum, já que sobre essa autoridade reside a
verdadeira ordem espiritual e a disciplina moral necessária a todos. Caros irmãos e irmãs
católicas! Quão bem compreendo sua visão de mundo, e como desejaria basear meu poder
imperial na autoridade de sua liderança espiritual! Para que vocês não creiam que isso é
somente adulação e palavras ao vento, eu, doravante, declaro solenemente que agrada ao
poder autocrático que o Supremo Bispo de todos os católicos, o Papa de Roma, seja
restaurado a seu trono em Roma com todos os antigos direitos e privilégios associados a
seu título e concedidos por meus predecessores, de Constantino em diante.
“Em troca, irmãos e irmãs católicos, desejo receber somente seu reconhecimento amoroso
de minha pessoa como seu único protetor e patrono. Que aqueles que aqui me reconhecem
em seus corações e consciências como seu único protetor e patrono se dirijam para o
lado!” E aí apontou as cadeiras vazias da plataforma. E instantaneamente, quase todos os
príncipes da Igreja Católica, bispos e cardeais, a maior parte do laicato e quase todos os
monges, proclamando com exultação “Gratias agimus! Domine! Salvum fac Magnum
imperatorem!”, ergueram-se à plataforma, e, inclinando humildemente suas cabeças
diante do Imperador, tomaram seus assentos.

Abaixo, no entanto, no meio do salão, reto e impávido, como uma estátua de mármore,
permanecia o Papa Pedro II em seu assento. Todos aqueles que o cercavam estavam agora
na plataforma. Mas a diminuta multidão de monges e fiéis que permanecia abaixo se
moveu cada vez mais próxima dela, formando um denso círculo a seu redor. E podia-se
escutar o murmúrio controlado que deles emergia: “Non praevalebunt, non praevalebunt
portae inferni”.

Com um olhar preocupado direcionado ao Papa imóvel, o Imperador novamente ergueu


sua voz: “Caros irmãos e irmãs! Eu sei que há entre vocês muitos para os quais a coisa
mais preciosa no Cristianismo é a tradição sagrada – os antigos símbolos, os antigos hinos
e orações, os ícones e rituais antigos. O que, de fato, poderia ser mais precioso para uma
alma religiosa? Saibam, então, meus amados, que hoje eu assinei um decreto e separei
vastas somas de dinheiro para o estabelecimento de um museu mundial de arqueologia
cristã em nossa gloriosa cidade imperial, Constantinopla.

“Esse museu deverá ter o objetivo de coletar, estudar, e resgatar todos os monumentos da
Igreja antiga, mais particularmente da Igreja Oriental; e peço que selecionem amanhã um
comitê para decidir as medidas a serem tomadas, de forma que a vida moderna, a moral
e o costumes sejam organizados o mais próximo possível das tradições e instituições da
Sagrada Igreja Ortodoxa.”

“ Meus irmãos e irmãs ortodoxos! Aqueles de vocês que favorecem esse desejo meu, que
podem em sua consciência interior me chamar de verdadeiro líder e senhor, subam até
mim!” Nesse momento a maior parte da hierarquia do Oriente e do Norte, metade dos
antigos velhos crentes e mais da metade do clero, dos monges e do laicato ortodoxo se
ergueu com exclamação jubilosa à plataforma, lançando olhares suspeitos aos católicos,
que já ocupavam orgulhosamente seus assentos. Mas o Ancião João permanecia em seu
lugar, e suspirou bem alto. E quando a multidão ao seu redor se afinou grandemente,
deixou seu assento e se juntou ao Papa Pedro e seu grupo. Foi seguido pelos outros
ortodoxos que não subiram à plataforma. Então o Imperador falou novamente: “ Estou
ciente, caros cristãos, que há muitos dentre vocês que valorizam supremamente a posse
pessoal da verdade e o livre exame das Escrituras. Não preciso aqui desenvolver minha
visão acerca do assunto. Talvez vocês saibam que, na minha juventude, escrevi um longo
livro sobre o criticismo bíblico, que gerou muitos comentários excitados e criou a base de
minha popularidade e reputação. Em memória disso, presumo eu, a Universidade de
Tubingen poucos dias atrás pediu que aceitasse o título de Doutor em Teologia honoris
causa. Respondi que aceito com todo o prazer e gratidão.

“E hoje, simultaneamente como o decreto do Museu de Arqueologia Cristã, assinei outro


decreto estabelecendo um instituto mundial para o livre exame das Sagradas Escrituras
de todos os pontos de vistas e em todas as direções possíveis, e para o estudo das ciências
subsidiárias – para cujo fim reservo aqui e agora um milhão e meio de marcos. Conclamo
a todos que olham com sinceridade para esse ato de boa vontade de minha parte e que são
capazes de reconhecer-me, com sentimento verdadeiro, como líder soberano, que subam
até o novo Doutor em Teologia.”

Um estranho e sutil sorriso atravessou levemente os belos lábios do grande homem. Mais
da metade dos doutos teólogos se moveu para a plataforma, mas de forma lenta e
hesitante. Todos olhavam para o Professor Pauli, que parecia enraizado em seu assento.
Ele abaixou sua cabeça, curvou-se e retraiu-se.

Os doutos teólogos que já tinham chegado à plataforma pareciam se sentir estranhos, e


um deles subitamente abaixou suas mãos em renúncia, e, tendo pulado escada abaixo,
correu para o Professor Pauli e seus companheiros e lá ficou. Nesse momento, o Professor
ergueu sua cabeça, se levantou sem parecer ter algum objetivo definido, e passou então
pelos bancos vazios, acompanhado por seus correligionários que tinham resistido à
tentação.Tomou seu assento ao lado do Ancião João, do Papa Pedro e de seus seguidores.
A maior parte dos membros, incluindo agora quase todos os hierarcas do Oriente e do
Ocidente, estavam na plataforma. Abaixo permaneciam apenas três grupos de membros,
se aproximando cada vez mais ao redor do Ancião João, do Papa Pedro e do Professor
Pauli. Agora, com uma voz ofendida, o Imperador a eles se dirigiu: “ O que mais posso
dar a vocês, povo estranho? O que querem de mim? Não posso compreender. Digam-me
vocês mesmos, cristãos, abandonados pela maioria de seus amigos e líderes, condenados
pelo sentimento popular. O que vocês mais valorizam no Cristianismo”

Foi aí que o Ancião João se levantou com uma vela branca e respondeu calmamente:
“Grande Soberano! O que mais valorizamos no Cristianismo é o próprio Cristo – em sua
pessoa. Tudo vem dele, pois sabemos que nele reside a plenitude da Divindade em carne.
Estamos prontos, senhor, para aceitar toda dádiva de sua parte, desde que reconheça a
mão do Cristo em sua generosidade. Nossa cândida resposta à sua pergunta, sobre o que
pode fazer por nós, é esta: Confesse agora e diante de nós o nome de Jesus Cristo, o Filho
de Deus, que veio na carne, se ergueu, e que retornará – Confesse seu nome, e nós o
aceitaremos com todo amor como o antecessor de sua gloriosa segunda vinda”
O Ancião terminou sua fala e fixou seus olhos na face do Imperador. Uma mudança
terrível tinha se operado nela. Uma tempestade infernal agitava seu interior, como aquela
que ele experimentou na fatídica noite. Tinha perdido completamente seu equilíbrio
interior, e concentrava todos os seus pensamentos na preservação do controle exterior,
para não se trair de forma inoportuna. Estava realizando um esforço sobre-humano para
não se lançar com urros selvagens sobre o Ancião João e despedaçá-lo com seus dentes.

Subitamente ouviu uma voz familiar de outro mundo: “ Permanecei em silêncio e nada
temas! “ Ele permaneceu então em silêncio. Somente sua face, lívida como a morte,
parecia distorcida e seus olhos esbugalhados. Enquanto isso, ainda durante a fala do
Ancião João, o grande mágico, adornado de seu manto tricolor que cobria quase toda sua
púrpura cardinalícia, podia ser visto manipulando freneticamente algo oculto abaixo dele.
Os olhos do mágico estavam fixos e brilhantes, e seus lábios se moviam levemente.
Através das janelas abertas do templo uma imensa nuvem negra podia ser vista cobrindo
o céu. Logo, a completa escuridão se instalou.

O Ancião João, impressionado e assustado, olhou para a face do Imperador silencioso.


Subitamente voltou a si e, virando-se para seus seguidores, gritou com uma voz
esmaecida: “Pequeninos, é o Anticristo!”

Nesse momento, um grande raio atravessou o templo, seguido de um estrondo


ensurdecedor. Ele acertou o Ancião João. Todos ficaram estupefatos por um segundo, e
quando os cristãos emudecidos recuperaram os sentidos, o Ancião se encontrava morto
no chão.

O Imperador, pálido mas calmo, se dirigiu à assembléia: “Vocês testemunharam o


julgamento de Deus. Eu não desejava tirar a vida de ninguém, mas o meu Pai Celestial
vingou seu filho amado. Acabou. Quem se oporá ao Altíssimo? Secretários, escrevam
isto: O Concílio Ecumênico do Todos os Cristãos, após um tolo oponente da Majestade
Divina ser alvejado pelo fogo do céu, reconheceu unanimemente o soberano Imperador
de Roma e de todo o Universo como líder supremo e senhor”

De repente uma palavra, alta e distinta, atravessou o templo: “Contradicatur!” O Papa


Pedro se ergueu. Sua face se avermelhou de sangue, e,tremendo de indignação, ergueu
seu cajado na direção do Imperador: “ Nosso único Senhor”, disse ele, “ É Jesus Cristo,
o Filho do Deus Vivo! E você acabou de escutar quem é! Fora! Caim, assassino! Vá
embora, encarnação do demônio! Pela autoridade de Cristo, eu, o servo dos servos de
Deus, expulso-o eternamente, cão sarnento, da cidade Deus, e entrego-o a seu pai Satanás!
Anátema! Anátema! Anátema!
Enquanto falava, o grande mágico se movia incansavelmente sob seu manto. Mais alto
do que o último “Anátema!” soou o trovão, e o último Papa caiu morto no chão. “ Assim
morrem todos os inimigos pela mão de meu Pai!” clamou o Imperador. “Pereant,
pereant!” exclamaram os assustados príncipes da Igreja.

O Imperador se virou e, apoiado pelo grande mágico e acompanhado por toda sua
multidão, caminhou lentamente para fora da porta atrás da plataforma. Permaneciam no
templo somente os corpos e um pequeno grupo de cristãos quase mortos de medo. A única
pessoa que não perdeu o controle sobre si mesmo foi o Professor Pauli. O horror geral
parecia ter elevado nele todos os poderes de seu espírito. Ele até mudou de aparência; seu
semblante se tornou nobre e inspirado. Com passos determinados, caminhou até a
plataforma, tomou um dos assentos antes ocupados por algum oficial, e começou a
escrever em um pedaço de papel.

Quando terminou, ergueu-se e leu em voz alta: “ Para a glória de nosso único Salvador,
Jesus Cristo! O Concílio Ecumênico das igrejas de Nosso Senhor, reunindo-se em
Jerusalém, com nosso abençoado irmão João, representante da Cristandade do Oriente,
expôs o enganador, o inimigo de Deus como o verdadeiro Anticristo previsto nas
Escrituras; e depois nosso abençoado pai, Pedro, representante da Cristandade do
Ocidente, com toda a justiça e legalidade o expulsou para sempre da Igreja de Deus;
agora, diante dessas duas testemunhas de Cristo, assassinados pela verdade, este Concílio
Ecumênico decide: cessar toda comunhão com o excomungado e sua assembléia
abominável, e ir para o deserto e ali esperar pelo retorno inevitável de nosso verdadeiro
Senhor, Jesus Cristo.”

O entusiasmo dominou a multidão, e elevadas exclamações podiam ser ouvidas de todos


os lados. “Adveniat! Adveniat cito! Komm, Herr Jesu, komm! Come, Lord Jesus Christ!”
O professor Pauli escreveu novamente e leu: “Aceitando unanimemente este primeiro e
último ato do último Concílio Ecumênico, assinamos nossos nomes” – e aí convidou
todos os presentes a fazê-lo. Todos correram para a plataforma e assinaram seus nomes.
E por último na lista em grandes caracteres góticos podia-se ler: “Duorum defunctorum
testium locum tenes Ernst Pauli.”

“ Caminhemos agora com a arca de nossa última aliança,” disse ele, apontando para os
dois mortos. Os corpos foram colocados em macas. Lentamente, cantando hinos latinos,
germânicos e eslavos, os cristãos caminharam para o portão que levava para fora de
Haram-esh-Sheriff. Ali a procissão foi parada por um dos oficiais do Imperador
acompanhado por um esquadrão de guardas. Os soldados permaneceram na entrada
enquanto o oficial lia: “Por ordem de sua Divina Majestade, para a iluminação do povo
cristão e para sua proteção de homens sinistros que espalham a tentação e a rebeldia,
consideramos necessário que os corpos dos dois agitadores, mortos pelo fogo dos céus,
sejam publicamente exibidos na rua dos cristãos (Haret-em-Nasara), na entrada do
principal templo de sua religião, conhecido com o Templo do Sepulcro de Nosso Senhor,
ou templo da Ressurreição, para que todos se persuadam da realidade de sua morte. Seus
seguidores obstinados, que ignominiosamente rejeitaram nossas dádivas e insanamente
fecharam seus olhos aos sinais patentes do próprio Deus, por nossa misericórdia e
presença diante do Pai Celestial, foram salvos de um morte merecida pelo fogo do céu, e
serão deixados livres com a única proibição, necessária para o bem comum, de não
viverem em cidades e outros lugares habitados, evitando com isso que possam perturbar
e tentar os inocentes e ingênuos com suas invenções maliciosas”

Quando os oficiais terminaram sua leitura, oito soldados, ao sinal do oficial,


aproximaram-se das macas que carregavam os corpos. “Que se cumpra aquilo que foi
escrito”, disse o professor Pauli. E os cristãos que seguravam as macas passaram-nas
silenciosamente para os soldados, que foram embora através do portão noroeste.

Os cristãos, tendo saído pelo portão nordeste, caminharam rapidamente rumo ao Monte
das Oliveiras e depois Jericó, por uma estrada que tinha sido previamente esvaziada de
outras pessoas por soldados e dois regimentos de cavalaria. Nas colinas áridas próximas
de Jericó, decidiram esperar por alguns dias. Na próxima manhã, peregrinos cristãos
simpáticos vieram de Jerusalém e contaram o que vinha ocorrendo em Sião.

Após o jantar da Corte, todos os membros do congresso foram convidados a um vasto


salão real (próximo ao suposto assento do trono de Salomão), e o Imperador, dirigindo-
se aos representantes da hierarquia católica, disse-lhes: que o bem-estar da Igreja exigia
claramente a eleição imediata de um digno sucessor do apóstata Pedro; que sob as
presentes circunstâncias a eleição deveria ser sumária; que a sua presença como
Imperador compensaria amplamente as inevitáveis omissões no ritual; e que ele, em nome
de todos os cristãos, sugeria que o Sacro Colégio elegesse seu amado amigo e irmão
Apolônio, para que sua amizade próxima pudesse unir a Igreja e o Estado de forma firme
e indissolúvel em benefício mútuo. O Sacro Colégio se retirou para uma sala separada
para um conclave e, em uma hora e meia, retornou com seu novo Papa, Apolônio.

No mesmo momento em que se desenrolava a eleição, o Imperador estava persuadindo


os representantes ortodoxos e protestantes de forma humilde, sagaz e eloquente a colocar,
em vista da nova grande era da história cristã, um fim a todas as dissensões antigas, dando
sua palavra de que Apolônio extinguiria todos os abusos da autoridade papal conhecidos
na história. Persuadidos pela fala, os representantes ortodoxos e protestantes realizaram
um ato de unificação de todas as igrejas, e quando Apolônio apareceu com os cardeais no
salão foi recebido com gritos de júbilo por todos os presentes, e um bispo grego e um
pastor evangélico lhe apresentaram seu documento. “Accipio et approbo et laetificatur
cor meum,” disse Apolônio, assinando-o. “Sou tanto verdadeiramente ortodoxo e
protestante quanto sou católico,” acrescentou ele, e trocou beijos amistosos com o grego
e o alemão.
Dirigiu-se então ao Imperador, que o abraçou e por longo tempo o deteve em seus braços.
Nesse momento, línguas de fogo começaram a voar pelo palácio e pelo templo. Elas
cresceram e se transformaram em formas luminosas de seres estranhos e flores nunca
dantes vistas caíram, preenchendo o ar de um perfume desconhecido. Sons encantadores
de música, que moviam as profundezas da alma, produzidos por instrumentos pouco
familiares, foram ouvidos, com vozes angelicais de cantores invisíveis cantando a glória
do novo senhor do céu e da terra. De repente, um barulho subterrâneo terrível foi ouvido
no canto noroeste do palácio sob “Kubbet-el-Aruah”, “ o domo das almas”, onde, de
acordo com a crença islâmica, se escondia a entrada do inferno.

Quando a assembléia, convidada pelo Imperador, dirigiu-se para aquele rumo, todos
podiam escutar claramente inumeráveis vozes, agudas e penetrantes – infantis ou
demoníacas- exclamando: “ O tempo chegou, libertem-nos, caros salvadores, caros
salvadores!”. Mas quando Apolônio, ajoelhando-se no chão, gritou para baixo algo em
uma língua desconhecida por três vezes, as vozes desfaleceram e cessou o barulho
subterrâneo. Enquanto isso, uma vasta multidão cercava Haram-esh-Sheriff por todos os
lados. A escuridão se instalou e o Imperador, junto ao novo Papa, mostrou-se no terraço
leste – o sinal para uma tempestade de júbilo. O Imperador se curvou afavelmente para
todos os lados, enquanto Apolônio tirava esplêndidos fogos e foguetes de grandes cestos
trazidos pelos diáconos dos cardeais. Inflamando-os com um mero toque de suas mãos,
lançou-os um após o outro no ar, onde brilhavam como pérolas fosforescentes e
explodiam com todas as cores de um arco-íris. Quando chegavam ao chão, todas as faíscas
se transformavam em incontáveis folhas de cores variadas, que continham a indulgência
completa e absoluta de todos os pecados – passados, presentes e futuros. A exultação
popular superava todos os limites. É verdade que muitos disseram ver com seus próprios
olhos muitas dessas indulgências se transformarem em horrorosos sapos e cobras. Mas a
maior parte do povo estava imensamente satisfeita, e as festividades populares se
prolongaram por dias. Os prodígios do novo Papa superavam toda a imaginação, tornando
uma tarefa desesperançosa a mera tentativa de descrevê-los.

Nas montanhas desérticas de Jericó, os cristãos remanescentes se devotavam ao jejum e


oração. Na noite do quarto dia, o Professor Pauli e nove companheiros, montados em
asnos e levando consigo uma carroça, se esgueiraram em Jerusalém e, passando por ruas
laterais de Haram-esh-Sheriff até Haret-em-Nasara, chegaram até a entrada do Templo
da Ressurreição, à frente do qual, no pavimento, estavam os corpos do Papa Pedro e do
Ancião João. A rua estava deserta naquela hora da noite, já que todos tinham ido para
Hasam-esh-Sheriff. Os guardas dormiam pesadamente. O grupo que veio atrás dos corpos
os encontrou intocados pela decomposição, nem mesmo duros ou pesados. Colocaram-
nos em macas e cobriram-nos com capas que tinham trazido. Pela mesma rota intrincada,
retornaram a seus seguidores. Mal tinham abaixado as macas até o chão quando
subitamente o espírito da vida pôde ser visto voltando aos corpos. Os corpos se moveram
sutilmente, como se estivessem tentando se livrar das capas em que estavam enrolados.
Com gritos de alegria, todos ajudaram e logo ambos os homens ressuscitados se ergueram,
seguros de si e saudáveis.

Disse então o Ancião João: “ Ah, meus pequeninos, não partimos de forma alguma! Direi
a vocês o seguinte: é hora de realizarmos a última oração de Cristo a seus discípulos –
que eles possam ser um, assim como ele é um com seu Pai. Para essa unidade em Cristo,
honremos nosso amado irmão Pedro. Deixem que ele finalmente pastoreie os rebanhos
de Cristo. Ai está, irmão!” E colocou seus braços ao redor de Pedro. Então se aproximou
o Professor Pauli. “ Tu est Petrus!”(“ Tu és Pedro!”) disse ao Papa, “Jetzt ist es ja
grundlich erwiesen und ausser jedem Zweifel gesetzt”. “ ( Agora isso foi provado e
colocado para além de qualquer dúvida”). E segurou firmemente a mão de Pedro com sua
mão direita enquanto estendia a mão esquerda a João dizendo: “ So also Vaterchen nun
sind wir ja Eins in Christo”(“ Agora, caro pai, somos um em Cristo”).

Desta forma, a unidade das igrejas se realizou no meio da noite em um lugar elevado e
deserto. Mas a escuridão noturna foi subitamente iluminada por uma luz brilhante e um
grande sinal apareceu nos céus; era uma mulher, vestida com o sol e com a lua sob seus
pés e uma coroa de doze estrelas em sua cabeça. A aparição permaneceu imóvel por muito
tempo, e então começou a se mover lentamente na direção sul. O Papa Pedro ergueu seu
cajado e exclamou: “ Eis o nosso estandarte! Sigam-no! E caminhou atrás da aparição,
acompanhado tanto por ambos os anciões quanto por toda a multidão de cristãos, indo
para a montanha de Deus, para o Sinai…

(Aqui o leitor parou.)

Senhora: Ora, porque não continua? Sr. Z: O manuscrito acaba aqui. O Padre Pansófio
não pôde terminar sua história. Ele me disse quando já estava doente que pensava em
concluí-lo assim que ficasse melhor. Mas não melhorou, e o fim da história está enterrado
com ele no cemitério do Monastério de Danilov. Senhora: Mas você lembra o que ele lhe
disse, não lembra? Por favor, conte-nos. Sr. Z: Eu lembro dos traços principais. Após a
partida dos líderes espirituais e representantes do Cristianismo para o deserto arábico,
multidões de fiéis sinceros começaram a aparecer em todos os países, e o novo Papa com
seus milagres e prodígios foi capaz de corromper sem volta todos os cristãos superficiais
que ainda não tinham se desapontado com o Anticristo. Declarou que pelo poder de suas
chaves podia abrir as portas entre o mundo terrestre e o além-túmulo. A comunhão dos
vivos e dos mortos, e também dos vivos e dos demônios, tornou-se uma ocorrência diária,
e novas formas desconhecidas de luxúria mística e demonolatria começaram a se espalhar
entre o povo. No entanto, mal tinha o Imperador começado a se sentir firmemente
estabelecido em seu fundamento religioso, e, tendo se submetido à sugestão persistente
da voz sedutora de seu “pai” secreto, mal tinha também se declarado a única verdadeira
encarnação da Divindade suprema do Universo, um novo problema surgiu de onde
ninguém esperava: os judeus se levantaram contra ele.
Essa nação, cujo número tinha chegado a trinta milhões, não ignorava os preparativos
para a consolidação do sucesso mundial do super-homem. Quando o Imperador transferiu
sua residência para Jerusalém, espalhando secretamente entre os judeus o rumor de que
seu principal objetivo era realizar a dominação do mundo por Israel, os judeus o
proclamaram seu Messias, e sua exultação e devoção a ele não conhecia limites. Mas
agora tinham se erguido subitamente, cheios de fúria e sedentos de vingança. Essa
reviravolta nos eventos, prevista tanto nos Evangelhos quanto na tradição da igreja, foi
narrada pelo Padre Pansófio com grande simplicidade e realismo.

Vejam vocês, os judeus, que consideravam o Imperador como um israelita de sangue


verdadeiro e perfeito, descobriram inadvertidamente que ele não era sequer circuncidado.
No mesmo dia toda Jerusalém, e no outro toda a Palestina ergueu-se em armas contra ele.
A devoção irrestrita e ardorosa ao salvador de Israel, o Messias prometido, deu lugar a
um ódio ilimitado e ardoroso ao enganador, o impostor indecente. Toda a nação judia se
ergueu como um só homem, e seus inimigos se surpreenderam ao ver que no fundo a alma
de Israel vivia não pelos cálculos e aspirações de Mamón, mas por um poder que tudo
absorvia – a esperança e a força de sua fé eterna no Messias.

O Imperador, tomado de surpresa pela súbita explosão, perdeu todo o autocontrole e


emitiu um decreto sentenciando à morte todos os judeus e cristãos insubordinados.
Milhares e milhares de homens que não conseguiram se armar foram cruelmente
massacrados. Mas um exército de judeus, composto de um milhão de homens,
rapidamente tomou o controle de Jerusalém e prendeu o Anticristo em Haram-esh-Sheriff.
O único apoio do Anticristo era uma porção de guardas que não eram fortes o suficiente
para vencer a força do inimigo. Ajudado pela arte mágica do Papa, o Imperador teve
sucesso em atravessar a linha inimiga, e rapidamente apareceu na Síria com um exército
inumerável de pagãos das mais diferentes raças. Os judeus avançaram para encontrá-lo
com poucas chances de sucesso. Mas mal tinham se encontrado os exércitos quando um
terremoto de violência inaudita ocorreu. Um enorme vulcão, com uma cratera gigante, se
ergueu no Mar Morto, ao redor do qual o exército imperial estava acampado. Rios de fogo
fluíam rumo a um lago flamejante que engoliu o próprio Imperador, junto com suas forças
inumeráveis – sem mencionar o Papa Apolônio, que sempre o acompanhava, e cuja
mágica de nada serviu. Enquanto isso, os judeus se apressaram para Jerusalém, tomados
pelo medo e o temor, clamando por salvação ao Deus de Israel. Quando a Cidade Santa
já se encontrava a vista, os céus foram tomados por raios vívidos do leste ao oeste, e eles
viram Cristo vindo até eles em seus paramentos reais, e as feridas dos pregos em suas
mãos estendidas. Ao mesmo tempo, o grupo de cristãos comandado por Pedro, João e
Paulo veio do Sinai a Sião e de vários outros cantos se aproximaram multidões triunfantes,
consistindo de todos os judeus e cristãos que tinham sido mortos pelo Anticristo. Por mil
anos, viveram e reinaram com o Cristo.
Aqui, o Padre Pansófio desejava encerrar sua narrativa, que tinha por fim não um
cataclismo universal da criação, mas a conclusão de nosso processo histórico que consiste
na aparição, glorificação e destruição do Anticristo.

O político – E você pensa que essa conclusão se aproxima? Sr. Z – Bem, ainda haverá
muita confusão e falatório no palco, mas o drama inteiro já está escrito até o fim, e nem
os atores, nem a audiência terão o poder de mudar qualquer coisa. Senhora – Mas qual o
sentido absoluto desse drama? Eu não entendo porque o Anticristo odeia tanto a Deus, já
que ele mesmo é essencialmente bom e não mau. Sr.Z – Esse é o ponto. Ele não é
essencialmente mau. Esse é todo o significado. Retiro minhas prévias palavras de que
“Não se pode explicar o Anticristo somente por provérbios”. Ele pode ser explicado por
um simples provérbio, “Nem tudo que brilha é ouro”. Vocês conhecem bem o brilho do
ouro falso. Retire-o e nenhuma força real permanece – nenhuma. General – Mas notem
vocês, também, de que forma caem as cortinas desse drama histórico – com a guerra – o
encontro de dois exércitos. Nossa conversa termina onde começou. Como isso lhe agrada,
Príncipe? Meu Deus! Onde está o príncipe? O político – Você não notou? Ele saiu
calmamente durante aquela passagem comovente onde o Ancião João joga o Anticristo
contra a parede. Eu não queria interromper a leitura naquele ponto e depois me esqueci.
General: Eu aposto que ele fugiu – e pela segunda vez! Ele se controlou na primeira vez
e retornou, mas tudo isso foi muito para o coitado. Não podia aguentar. Pobre de mim!
Pobre de mim!

Fim

Você também pode gostar