Você está na página 1de 32

Problemas com o funcionalismo

Ned Block

1. 0 Funcionalismo, behaviorismo, fisicalismo

A visão funcionalista da natureza da mente humana é neste momento amplamente


aceite. Da mesma forma que o behaviorismo e o fisicalismo, o funcionalismo
procura responder à questão ‘O que são estados mentais?’ Vou preocupar-me aqui
com as formulações do funcionalismo nos termos da teoria da identidade. Elas
dizem por exemplo que a dor é um estado funcional, da mesma forma que as
formulações do fisicalismo nos termos de teoria da identidade dizem que a dor é um
estado físico.
Vou começar por descrever o funcionalismo e esboçar a crítica funcionalista ao
behaviorismo e ao fisicalismo. Em seguida argumentarei que os problemas que o
funcionalismo atribui ao behaviorismo e ao fisicalismo afectam o próprio
funcionalismo.
Eis uma caracterização do funcionalismo que é provavelmente suficientemente vaga
para ser aceitável para a maior parte dos funcionalistas: cada tipo de estado mental
é um estado consistindo numa disposição para agir de certas maneiras e para ter
certos estados mentais, dados certos inputs sensoriais e certos estados mentais.
Assim formulado, o funcionalismo pode ser visto como uma nova incarnação do
behaviorismo. O behaviorismo identifica estados mentais com disposições para agir
de certas maneiras em certas situações de input. Mas, tal como os críticos têm
apontado (Chisholm 1957; Geach 1957; Putnam 1963) o desejo de alcançar a
finalidade G não pode ser identificado com, digamos, a disposição para fazer A nas
circunstâncias de input em que A conduz a G, uma vez que, afinal, o agente pode
não saber que A conduz a G e portanto pode não estar disposto a fazer A. O
funcionalismo substitui os inputs sensoriais do behaviorismo por ‘inputs sensoriais e

! 3.!
estados mentais’; e substitui as disposições para agir behavioristas por disposições
para agir e ter determinados estados mentais.
Por essa razão, as condições necessárias da mentalidade que são postuladas pelo
funcionalismo são a este respeito mais fortes do que as postuladas pelo
behaviorismo. De acordo com o behaviorismo, é necessário e suficiente para
desejar que G que um sistema seja caracterizado por um certo conjunto (talvez
infinito) de relações input-output; i.e. de acordo com o behaviorismo, uma sistema
deseja que G apenas no caso de um certo conjunto de condicionais da forma
‘Emitirá O dado I’ for verdadeiro acerca dele. De acordo com o funcionalismo, no
entanto, um sistema pode ter estas relações input-output e no entanto não desejar
que G; pois de acordo com o funcionalismo, um sistema desejar que G depende de
ele ter estados internos que têm certas relações causais com outros estados
internos (e com inputs e outputs). Uma vez que o behaviorismo não tem tal requisito
do ‘estado interno’, há sistemas possíveis acerca dos quais o behaviorismo afirma e
o funcionalismo nega que têm estados mentais. Uma forma de dizer isto é dizer que
de acordo com o funcionalismo, o behaviorismo é culpado de liberalismo, i.e. é
culpado de adscrever propriedades mentais a coisas que de facto não as têm.
Apesar da diferença que acabei de esboçar entre funcionalismo e behaviorismo, os
funcionalistas e os behavioristas não estão muito distantes uns dos outros em
espírito. Shoemaker (1975) por exemplo, diz: “Numa certa forma de o ver, o
funcionalismo em filosofia da mente é a doutrina segundo a qual os termos mentais,
ou psicológicos, são, em princípio, elimináveis de uma certa maneira” (pp. 306-7).
Os funcionalistas têm tendido a tratar os termos para estados mentais numa
caracterização funcional de estado mental de uma forma muito diferente do
tratamento em termos de input e output. Assim, na versão mais simples, a versão
Máquina de Turing, da teoria funcionalista (Putnam, 1967; Block & Fodor, 1972), os
estados mentais são identificados com a totalidade dos estados da Máquina de
Turing que são eles próprios implicitamente definidos por uma tabela da máquina
que explicitamente menciona inputs e outputs descritos de forma não mentalista.
Na versão de Lewis, os termos para estados mentais são definidos por meio de uma
modificação do método de Ramsey, de uma forma que elimina o uso essencial de
terminologia mental das definições, mas que não elimina a terminologia de input e
output. Isto é, ‘dor’ é definida como sendo sinónima de uma descrição definida
contendo termos de input e output mas nenhuma terminologia mental (ver Lewis

! 3'!
1972). Além disso, o funcionalismo nas versões máquina e não máquina, tem
tipicamente insistido que as caracterizações de estados mentais devem conter
descrições de inputs e outputs em linguagem física. Armstrong (1968), por exemplo,
diz:
“Nós podemos distinguir entre ‘comportamento físico’, que se refere a qualquer
acção ou paixão do corpo meramente física, e comportamento propriamente dito,
que implica uma relação com a mente (…) Ora, se na nossa fórmula ["estado da
pessoa apto a provocar um certo tipo de comportamento"] `comportamento'
significar `comportamento propriamente dito, então nós estaríamos a dar um relato
de conceitos mentais em termos de um conceito que já pressupõe a mentalidade, o
que seria circular. Por isso é claro que na nossa fórmula, ‘comportamento’ tem de
significar ‘comportamento físico’ (p. 84)
Portanto, o funcionalismo pode ser dito ‘atirar abaixo o mental apenas na periferia’ –
i.e através de especificações físicas, ou pelo menos não mentais, de inputs e
outputs. Uma tese maior deste artigo é que, devido a esta característica, o
funcionalismo não chega a evitar o tipo de problema que correctamente critica no
behaviorismo. Também o funcionalismo é culpado de liberalismo, e pelas mesmas
razões que o behaviorismo. No entanto, ao contrário do behaviorismo, o
funcionalismo pode ser naturalmente alterado para evitar o liberalismo – mas
apenas ao custo de um falhanço tão ignominioso como o primeiro.

O falhanço de que falo é aquele de que o funcionalismo considera o fisicalismo


culpado. Com ‘fisicalismo’ refiro-me à doutrina segundo a qual a dor, por exemplo, é
idêntica a um estado físico (ou fisiológico). Como muitos filósofos argumentaram
(nomeadamente Fodor, 1965, e Putnam, 1966; ver também Block & Fodor, 1972),
se o funcionalismo é verdadeiro, o fisicalismo é provavelmente falso. O ponto atinge
a clareza máxima nas versões Máquina de Turing do funcionalismo. Qualquer
Máquina de Turing abstracta dada pode ser realizada por uma ampla variedade de
dispositivos físicos; de facto é plausível que, dada qualquer correspondência
putativa entre um estado de Máquina de Turing e um estado configuracional físico
(ou fisiológico), haja uma realização possível da Máquina de Turing que seria um
contra-exemplo a essa correspondência. (Veja-se Kalke, 1969; Gendron, 1971;
Mucciolo, 1974, para argumentos não convincentes a favor do contrário; ver
também Kim, 1972.) Portanto, se a dor é um estado funcional, ela não pode por

! 3/!
exemplo ser um estado cerebral, porque criaturas sem cérebros podem realizar a
mesma Máquina de Turing que criaturas com cérebros realizam.
Devo enfatizar que o argumento funcionalista contra o fisicalismo não apela
meramente ao facto de uma Máquina de Turing abstracta poder ser realizada por
sistemas com diferente composição material (madeira, metal, vidro, etc…).
Argumentar assim seria como argumentar que a temperatura não pode ser uma
magnitude física porque objectos com estruturas microfísicas diferentes podem ter a
mesma temperatura (Kim, 1972). Objectos com estruturas microfísicas diferentes,
por exemplo objectos feitos de madeira, metal, vidro, etc, podem ter muitas
propriedades microfísicas interessantes em comum, tais como energia cinética
molecular com um mesmo valor médio. O argumento funcionalista contra o
fisicalismo é antes que é difícil ver como poderia haver uma propriedade física de
primeira ordem (ver nota 4) não trivial em comum a todas e apenas às realizações
físicas de um dado estado de Máquina de Turing. Tente-se pensar num candidato
plausível! No mínimo, o ónus recai sobre aqueles que pensam que tais propriedades
fisicas são concebíveis – o ónus de nos mostrarem como conceberíamos uma tal
propriedade. Uma maneira de exprimir este ponto é dizer que, de acordo com o
funcionalismo, o fisicalismo é uma teoria chauvinista; ele retira propriedades mentais
de sistemas que de facto as possuem. Ao dizer que estados mentais são estados
cerebrais, por exemplo, os fisicalistas excluem injustamente todas as pobres
criaturas sem cérebro que no entanto têm mentes.
Um segundo ponto maior deste artigo é que o mesmo argumento que o
funcionalismo usa para condenar o fisicalismo pode ser usado igualmente contra o
funcionalismo; na verdade qualquer versão do funcionalismo que evite o liberalismo,
acaba por cair, como o fisicalismo, no chauvinismo. O artigo tem três partes. A
primeira argumenta que o funcionalismo é culpado de liberalismo, a segunda que
uma forma de modificar o funcionalismo para evitar o liberalismo será ligá-lo mais
intimamente à psicologia empírica, e a terceira que nenhuma versão do
funcionalismo pode evitar ambos, o liberalismo e o chauvinismo.

1.1 Mais acerca daquilo que o funcionalismo é

! 33!
Uma forma de pôr alguma ordem na incrível variedade de teorias funcionalistas é
distinguir entre aquelas que estão feitas em termos de Máquinas de Turing e
aquelas que não estão. Uma tabela de Máquina de Turing lista um conjunto finito de
estados de tabela de máquina, S1 . . . Sn; inputs, I1 . . . Im; and outputs, O1 . . . Op.
A tabela especifica um conjunto de condicionais com a forma: se a máquina está no
estado Si e recebe o input Ij, ela emite o output Ok e entra no estado Sl. Isto é, dado
qualquer estado e input, a tabela especifica um output e um estado seguinte.
Qualquer sistema com um conjunto de inputs, outputs e estados relacionados da
forma especificada pela tabela é descrito pela tabela e é uma realização do
autómato abstracto especificado pela tabela. Para ter o poder de computar qualquer
função recursiva, uma Máquina de Turing deve ser capaz de controlar o seu input
de certas maneiras. Nas formulações standard, o output de uma máquina de Turing
é considerado como tendo dois componentes. Ela imprime um símbolo numa fita,
depois move a fita, assim trazendo um novo símbolo para o leitor de input. Para a
Máquina de Turing ter pleno poder, a fita deve ser infinita em pelo menos uma
direcção e móvel em ambas as direcções. Se a máquina não tem controlo sobre a
fita, é um ‘transdutor finito’, uma máquina de Turing bastante limitada. Os
transdutores finitos não têm que ser vistos como tendo de todo fita. Aqueles que
crêem que o funcionalismo da máquina [machine functionalism] é verdadeiro devem
supôr que saber exactamente quanto poder tem o autómato que nós somos é uma
questão empírica. Se nos formos Máquinas de Turing de pleno poder, o ambiente
deve constituir parte da fita. Em geral os funcionalistas da máquina consideram a
máquina em questão como um autómato probabilista – uma máquina cuja tabela
especifica condicionais com a seguinte forma: se a máquina está em Sa, e recebe
Ib, tem uma probabilidade p1 de emitir O1; p2 de emitir O2; . . . pk de emitir Ok; r1
de entrar em S1; r2 de entrar em S2; . . . rn de entrar em Sn. Por uma questão de
simplicidade, vou usualmente considerar a versão determinista da teoria.
Uma versão muito simples do funcionalismo da máquina (Block & Fodor, 1972)
afirma que cada sistema tendo estados mentais é descrito por pelo menos uma
tabela de Máquina de Turing de um tipo especificável e cada tipo de estado mental
do sistema é idêntico a uma dos estados da tabela da máquina. Considere-se, por
exemplo, a Máquina de Turing descrita na tabela abaixo (cf. Nelson, 1975):

! 3+!
Pode-se ter uma imagem crua da versão simples do funcionalismo da máquina
considerando a pretensão que S1 = desejo de 10 cêntimos [dime-desire], e S2 =
desejo de 5 cêntimos [nickel-desire]. Claro que nenhum funcionalista pretenderia
que uma máquina de Coca Cola deseja o que quer que seja. Antes, a versão
simples do funcionalismo da máquina descrita acima avança uma pretensão
análoga com respeito a uma tabela da máquina hipotética muito mais complexa.
Note-se que o funcionalismo da máquina especifica explicitamente inputs e outputs,
e implicitamente estados internos. (Putnam 1967, p. 434) diz: "Os Si, repetindo, são
especificados apenas implicitamente pela descrição, i.e., especificados apenas pelo
conjunto de probabilidades de transição dadas na tabela da máquina. Para ser
descrito por esta tabela da máquina, um dispositivo tem que aceitar moedas de 5
cêntimos e moedas de 10 cêntimos como inputs e dispensar Coca Colas como
outputs. Mas os estados S1 e S2 podem ter virtualmente qualquer natureza (mesmo
naturezas não físicas), tanto quanto essas naturezas conectem os estados uns aos
outros e aos inputs e outputs especificados na tabela da máquina. Tudo o que nos é
dito sobre S1 e S2 são estas relações; assim, pode-se dizer que o funcionalismo da
máquina reduz a mentalidade a estruturas de input-output. Este exemplo deve
sugerir a força do argumento funcionalista contra o fisicalismo. Tente-se pensar
numa propriedade física de primeira ordem (ver nota 4) que possa ser partilhada por
todas, (e apenas por) as realizações desta máquina!
Também se pode categorizar os funcionalistas conforme eles vejam as identidades
funcionais como parte da psicologia a priori ou da psicologia empírica. Os
funcionalistas a priori (por exemplo Smart, Armstrong, Lewis, Shoemaker) são os
herdeiros dos behavioristas lógicos. Eles tendem a ver as análises funcionais como

! 34!
análises do significado dos termos mentais, enquanto que os funcionalistas
empíricos (por exemplo Fodor, Putnam, Harman) vêem as análises funcionais como
hipótese científicas substantivas. Vou referir-me ao primeiro como “Funcionalismo”,
e ao segundo como “Psicofuncionalismo” (vou usar ‘funcionalismo’ com um ‘f’
minúsculo como neutro entre Funcionalismo e Psicofuncionalismo. Ao distinguir
entre Funcionalismo e Psicofuncionalismo usarei sempre maiúsculas).
O Funcionalismo e o Psicofuncionalismo e a diferença entre eles podem ser
tornados mais claros em termos da noção da frase-Ramsey de uma teoria
psicológica. Termos para estados mentais que aparecem numa teoria psicológica
podem ser definidos de várias maneiras por meio da frase-Ramsey da teoria. Todas
as teorias da identidade de estados funcionais podem ser compreendidas como
definindo um conjunto de estados funcionais (ou propriedades funcionais) por meio
da frase-Ramsey de uma teoria psicológica – com um estado funcional
correspondendo a cada estado mental. O estado funcional correspondendo à dor
pode ser chamado o correlato ‘Ramsey-funcional’ da dor, com respeito à teoria
psicológica.
Nos termos da noção de um correlato funcional Ramsey com respeito a uma teoria,
a distinção entre Funcionalismo e Psicofuncionalismo pode ser definida da forma
seguinte: o Funcionalismo identifica o estado mental S e o correlato funcional
Ramsey com respeito a uma teoria psicológica de senso-comum; o
Psicofuncionalismo identifica S com o correlato funcional Ramsey de S, com
respeito a uma teoria psicológica científica.
Esta diferença entre Funcionalismo e Psicofuncionalismo dá origem a uma diferença
em inputs e outputs específicos. Os Funcionalistas estão restringidos a especificar
inputs e outputs que são plausivelmente parte do conhecimento de senso comum;
os Psicofuncionalistas não sofrem restrição semelhante. Embora ambos os grupos
insistam em especificações físicas ou pelo menos não mentais de inputs e outputs,
os Funcionalistas requerem classificações externamente observáveis (por exemplo
inputs caracterizados em termos dos objectos presentes na vizinhança do
organismo, outputs em termos de movimentos de partes do organismos). Os
Psicofuncionalistas, por outro lado, têm a opção de especificar inputs e outputs em
termos de parâmetros internos, por exemplo sinais em neurónios de input e output.
Seja T uma teoria psicológica de senso comum ou psicologia científica. T pode
conter generalizações da forma: quem quer que que esteja no estado w e receba o

! 3*!
input x, emite o put y e entra no estado z. Escrevamos T como
T (S1 . . . Sn, I1 . . . Iw, O1 . . . Om)
Em que os Ss são estados mentais, os Is os inputs e os Os os outputs. Os Ss são
para ser entendidos como constantes de estados mentais, não variáveis, por
exemplo ‘dor’ e da mesma forma para `I's e `O's. Assim, poder-se-ia também
escrever T como:
T (dor. . , luz de 400 nanómetros entrando pelo olho esquerdo. . , dedo grande do pé
move-se um centímetro para a esquerda. . . )
Para se ter a frase Ramsey de T, substitua-se os termos de estados mentais – mas
não os termos de input e output – por variáveis, e prefixe-se um quantificador
existencial para cada variável:
! F1 ... ! Fn T (F1 ... Fn, I1 ... Ik, 01 ... 0m)
Se F17 for a variável que substituiu a palavra ‘dor’ quando a frase Ramsey foi
formada, então nós podemos definir dor como se segue em termos da frase
Ramsey:
x sente dor (?)
! F1 ... ! Fn T [(F1 ...Fn,I1 ...Ik,O1 ...Om)& x tem F17)
O correlato funcional Ramsey de dor é a propriedade expressa pelo predicado no
lado direito deste bicondicional. Note-se que este predicado contém constantes de
input e output, mas não constantes mentais, uma vez que as constantes mentais
foram substituídas por variáveis. O correlato funcional Ramsey para dor é definido
em termos de inputs e outputs, mas não em termos mentais.
Por exemplo, seja T a teoria que a dor é causada por lesão na pele e causa
preocupação e a emissão de “Ai”, e a preocupação [worry], por seu lado, causa
franzir das sobrancelhas. Então a definição de Ramsey seria:
x sente dor ~ Há 2 estados (propriedades) o primeiro dos quais é causado por lesão
na pele e causa a emissão de “Ai” e o segundo estado causa as tripas contrairem-
se, e x está no primeiro estado.
O correlato funcional Ramsey da dor com respeito a esta “teoria” é a propriedade de
estar num estado que é causado por lesão da pele e causa a emissão de “Ai” e
outro estado por sua vez causa tripas contrairem-se (Note-se que as palavras `dor' e
`preocupação' foram substituídos por variáveis, mas os termos para input e output
permanecem).

! +1!
O correlato funcional Ramsey de um estado S é um estado que tem muito em
comum com S. Especificamente, S e o seu correlato funcional Ramsey partilham as
propriedades estruturais especificadas pela teoria T. Mas há duas razões por que é
natural supôr que S e o seu correlato funcional Ramsey serão distintos. Primeiro, o
correlato funcional Ramsey com respeito a T pode “incluir” no máximo esses
aspectos de S que são capturados por T; quaisquer aspectos não capturados por T
serão deixados de fora. Em segundo lugar, o correlato funcional Ramsey pode
deixar de fora algo do que T captura, pois a definição Ramsey não contém o
vocabulário "teórico" de T. A teoria do exemplo do ultimo parágrafo só é verdadeira
acerca de organismos que sentem ‘dor’. No entanto, o predicado que exprime o
correlato funcional Ramsey em T não contém esta palavra (uma vez que ela foi
substituída por uma variável), e por isso pode ser verdadeira de coisas que não
sentem dor. Seria fácil fazer uma máquina simples que tivesse alguma dor artificial,
uma sobrancelha, um ‘Ai’ gravado, e dois estados que satisfizessem as relações
causais mencionadas, mas sem nenhuma dor.
A hipótese ousada do funcionalismo é que para alguma teoria psicológica, esta
suposição natural de que um estado e o seu correlato funcional Ramsey são
distintos, é falsa. O Funcionalismo diz que há uma teoria tal que dor, por exemplo, é
o seu correlato funcional Ramsey com respeito a essa teoria.
Um ponto final preliminar: dei a impressão enganadora de que o funcionalismo
identifica todos os estados mentais com estados funcionais. Uma tal versão do
funcionalismo é obviamente demasiado forte. Seja X um duplicado célula a célula
seu, recentemente criado (que é, como é óbvio, funcionalmente equivalmente a si).
Talvez você se lembre de ter feito o bar mitzvah. Mas X não se lembra de ter feito o
bar mitzvah, porque X nunca fez o bar mitzvah. Na verdade, alguma coisa pode ser
funcionalmente equivalmente a si mas falhar a conhecer aquilo que você conhece,
ou (verbo), o que você (verbo), para uma ampla variedade de verbos de sucesso, ou
completude. Pior ainda, se Putnam (1975b) tem razão em dizer que "significados
não estão dentro da cabeça", sistemas funcionalmente equivalmentes a si podem,
por razões semelhantes, falhar em ter muitas das suas atitudes proposicionais.
Suponhamos que você acredita que a água é molhada. De acordo com argumentos
plausíveis avançados por Putnam e Kripke, uma condição para a possibilidade de
você acreditar que a água é molhada é uma certa conexão causal entre você e a
água. O seu “gémeo” na Terra Gémea, que está conectado da mesma forma com

! +)!
XYZ e não com H2O, não acreditaria que a água é molhada.
Se se vai defender o funcionalismo, ele deve ser construído ou concebido como
aplicando-se apenas a uma subclasse de estados mentais, aqueles estados mentais
"estreitos" cujas condições de verdade estão de alguma forma dentro da pessoa.
Mas mesmo assumindo que uma noção de estreiteza de estado psicológico pode
ser satisfatoriamente formulada, o interesse do funcionalismo pode ser diminuído
por esta restrição. Mencionarei este problema apenas para o pôr de lado. Tomarei o
funcionalismo como sendo uma doutrina acerca de todos os estados mentais
“estreitos”.

1.2 Robôs com cabeça-de-homúnculos

Nesta secção vou descrever uma classe de dispositivos que são prima facie um
embaraço para todas as versões do funcionalismo na medida em que eles mostram
o funcionalismo como culpado de liberalismo – classificando sistemas sem
mentalidade como tendo mentalidade.
Considere-se a versão simples do funcionalismo da máquina que já descrevi. Ela diz
que cada sistema tendo estados mentais é descrito por pelo menos uma tabela de
Máquina de Turing de um certo tipo e cada estado mental dos sistema é idêntico a
um dos estados de tabela da máquina especificado pela tabela da máquina.
Vou considerar que os inputs e outputs são especificados por impulsos neuronais
nos orgãos sensoriais e neurónios de output motor. Esta suposição não deve ser
vista como restringindo-se ao Psicofuncionalismo e deixando de fora daquilo que
pode ser dito o Funcionalismo. Como já foi mencionado, toda a versão do
funcionalismo assume alguma especificação de inputs e outputs. Uma especificação
Funcionalista serviria também para os propósitos daquilo que se segue. Imagine-se
um corpo que é externamente como um corpo humano, o teu corpo digamos, mas
internamente muito diferente. Os neurónios dos orgãos sensoriais estão ligados a
um banco de luzes numa cavidade oca na cabeça. Um conjunto de botões conecta
com os neurónios de output motor. Dentro da cavidade reside um grupo de
pequenos homens. Cada um tem uma tarefa muito simples: implementar um
‘quadrado’ da tabela da máquina adequada que te descreve a ti. Numa parede está
um painel no qual está afixado um cartão de estado, i.e. um cartão que tem um
símbolo designando um dos estados especificados pela tabela da máquina. Eis o

! +"!
que fazem os homenzinhos: vamos supôr que o cartão afixado tem nele um ‘G’. Isto
alerta os homenzinhos que implementam os quadrados G – os homens-G, como se
auto-intitulam. Vamos supôr que a luz que representa o input I se acende. Um dos
homens G tem a seguinte tarefa única: quando o cartão diz ‘G’, e a luz I’’ se acende,
ele pressiona o botão de output 0.9, e muda o cartão de estado para ‘M’. Raramente
é solicitado a este homem-G que execute a sua tarefa. Apesar do baixo nível de
inteligência requerido de cada homenzinho, o sistema como um todo consegue
similar-te a ti, porque a organização funcional que eles foram treinados para realizar
é a tua. Uma máquina de Turing pode ser representada como um conjunto finito de
quádruplos (ou quintúplos, se o output for divido em duas partes): estado actual,
input actual; estado seguinte, output seguinte. Cada homenzinho tem a tarefa
correspondente a um único quádruplo. Com os esforços dos homenzinhos, o
sistema realiza a mesma (razoavelmente adequada) tabela da máquina que tu
realizas e é portanto um equivalente funcional teu.
Vou descrever uma versão da simulação com cabeça de homúnculos, que tem mais
possibilidades de ser nomologicamente possível. Quantos homúnculos são
necessários? Talvez um bilião já seja suficiente.
Vamos supôr que convertemos o governo da China ao funcionalismo, e que
convencemos os seus funcionários a realizar uma mente humana durante uma hora.
Damos a cada uma das pessoas do bilião de pessoas na China (esolhi a China
porque tem um bilião de habitantes) um rádio de duas direcções especialmente
desenhado, que as liga da forma apropriada a outras pessoas e ao corpo artificial
mencionado no exemplo anterior. Substituímos cada um dos homenzinhos por um
cidadão da China mais o seu rádio. Em vez de um painel para afixar coisas
arranjamos as coisas de forma a ter letras exibidas numa série de satélites
colocados de forma a poderem ser vistos em qualquer lugar na China.
O sistema de um bilião de pessoas a comunicarem umas com as outras mais
satélites desempenha o papel de um ‘cérebro’ exterior conectado com o corpo
artificial por rádio. Não há nada de absurdo acerca de uma pessoa estar conectada
com o seu cérebro por rádio. Talvez chegue o dia em que os nossos cérebros serão
periodicamente removidos para limpeza e reparação. Imagine-se que isto é feito
inicialmente tratando neurónios e ligando o cérebro ao corpo com um químico que
lhes permite esticarem-se como elásticos, assim assegurando que nenhumas
conexões cérebro-corpo se quebram. Em breve astutos homens de negócios

! +.!
descobrem que conseguem atrair mais clientes substituindo os neurónios esticados
por ligações de radio, de forma a que os cérebros possam ser limpos sem provocar
o inconveniente ao cliente da imobilização do seu corpo.
Não é de todo óbvio que o sistema corporal-China seja fisicamente impossível.
Poderia ser funcionalmente equivalente a ti durante um curto espaço de tempo, uma
hora, digamos.
“Mas”, poderias tu objectar, “como poderia alguma coisa ser funcionalmente
equivalmente a mim durante uma hora? Não será que a minha organização
funcional determina digamos, como é que eu reagiria a não fazer nada a não ser ler
o Reader’s Digest durante uma semana? Lembremo-nos que a tabela da máquina
especifica um conjunto de condicionais da forma: se a máquina está em S e recebe
o input I, ela emite o output O e passa a S… Estes condicionais devem ser
entendidos como conjunção. O que dá a um sistema a organização funcional num
tempo não é apenas o que ele faz nesse tempo, mas também os contrafactuais
verdadeiros acerca dele nesse tempo: o que ele teria feito (e quais teriam sido as
suas transições de estado) se ele tivesse tido um input diferente, ou se tivesse
estado num estado diferente. Se é verdadeiro de um sistema num tempo t que ele
obedeceria a uma dada tabela da máquina não importa em qual estado estivesse e
não importa qual input recebesse, então o sistema é descrito em t pela tabela da
máquina (e realiza em t o autómato abstracto especificado pela tabela), mesmo se
ele existe apenas por um instante. Para a hora em que o sistema Chinês está, ele
tem de facto um conjunto de inputs, outputs, e estados dos quais tais condicionais
conjuntivos são verdadeiros. Isto é o que faz qualquer computador realizar o
abstracto autómato que realiza. Evidentemente, há sinais aos quais o sistema
responderia e aos quais tu não responderias, por exemplo, inteferência rádio
maciça, ou uma cheia do Rio Yangtze. Tais eventos podem causar um mau
funcionamento, perturbando a simulação, tal como uma bomba num computador
pode impedir este de realizar a tabela da máquina que ele foi construído para
realizar. Mas assim como o computador sem a bomba pode realizar a tabela da
máquina, o sistema consistindo em pessoas e corpo artificial pode realizar a tabela
da máquina tanto quanto não existirem interferências catastróficas, por exemplo
cheias, etc. “Mas”, pode alguém objectar, “existe uma diferença entre uma bomba
num computador e uma bomba num sistema Chinês, porque no caso deste último
(ao contrário do primeiro), os inputs tal como estão especificados na tabela da

! +'!
máquina podem ser a causa do mau funcionamento. Actividade neuronal pouco
normal nos orgão sensoriais da Província de Chungking causada por uma bomba ou
por uma cheia do Yangtze podem fazer o sistema virar louco”
Resposta: a pessoa que diz sobre qual sistema está a falar tem a prerrogativa de
dizer que sinais contam como inputs e como outputs. Eu conto como inputs e
outputs apenas actividade neuronal no corpo artificial ligado por rádio com as
pessoas da China. Sinais neuronais nas pessoas de Chungking não contam mais
como inputs a este sistema do que fita de input posta por um sabotador entre os
contactos do interior de um computador contam como o input do computador.
Evidentemente, o objecto consistindo no povo da China mais o corpo artificial tem
outras descrições de Máquinas de Turing sob as quais sinais neuronais nos
habitantes de Chungking contariam como inputs. Um tal novo sistema (i.e., o objecto
sob tal nova descrição de máquina de Turing) não seria equivalente a ti. Da mesma
forma, qualquer computador comercial pode ser redescrito de uma forma que
permite fita amarfanhada no seu interior contar como input.
Descrevendo um objecto como uma Máquina de Turing, estabelece-se uma fronteira
entre o interior e o exterior. (Se contarmos apenas impulsos neuronais como inputs
e outputs, traçamos esta linha no interior do corpo; se contamos apenas
estimulações periféricas como inputs, traçamos a linha na pele.) Ao descrever o
sistema chinês como Máquina de Turing, tracei a linha de forma tal que ela satisfaz
um certo tipo de descrição funcional, uma descrição que você poderia também
satisfazer, e uma descrição que de acordo com o funcionalismo justifca atribuições
de mentalidade. O Funcionalismo não afirma que todo o sistema mental tem uma
tabela da máquina do tipo que justifica atribuições de mentalidade com respeito a
toda a especificações de inputs e outputs, mas antes apenas com respeito a alguma
especificação.
Objecção: O sistema chinês funcionaria demasiado lentamente. O tipo de eventos e
processos com os quais normalmente temos contacto passaria demasiado
rapidamente para o sistema os detectar. Assim, seríamos incapazes de conversar
com ele, jogar bridge com ele, etc.
Resposta: É difícil ver por que é que a escala de tempo do sistema teria
importância. Será realmente contraditório ou nonsense supôr que poderiamos
deparar-nos com uma raça de seres inteligentes com quem apenas pudéssemos
comunicar através de dispositivos como fotografias de lapso-de-tempo? Quando

! +/!
observamos essas criaturas, elas parecem quase inanimadas. Mas quando vemos
filmes de lapso de tempo [time-lapse movies] vemo-las conversarem umas com as
outras. Na verdade descobrimos que elas estão a dizer que a única forma que têm
de fazer sentido de nós é observar-nos em filmes desacelerados. Tomar escalas de
tempo como sendo totalmente decisivas parece cruamente behaviorista.
O que torna o sistema de cabeça-de-homúnculos (contemos os dois sistemas como
variantes de um único sistema) que acabei de descrever como um contra-exemplo
prima facie ao funcionalismo (da máquina) é que há dúvidas prima facie acerca de
se ele tem de todo estados mentais – especialmente acerca de se tem aquilo a que
os filósofos têm chamado de várias formas ‘estados qualitativos’, ‘sentires crus’ [raw
feels], ‘qualidades fenomenológicas imediatas’. (Tu perguntas: E a que é que os
filósofos chamaram estados qualitativos? Eu respondo, só em parte brincando:
“Como Louis Armstrong disse acerca do jazz, Se tens que perguntar, nunca vais
saber “ [you ain't never gonna get to know]. Nos termos de Nagel (1974), existe uma
dúvida prima facie acerca de se é como alguma coisa ser o sistema de cabeça-de-
homúnculos.
A força do contraexemplo prima facie pode ser tornada mais clara desta forma: o
funcionalismo da máquina diz que cada estado mental é idêntico a um estado da
tabela da máquina. Por exemplo, um estado qualitativo particular Q é idêntico a um
estado da tabela da máquina Sa. Mas se não é como nada ser o sistema de cabeça
de homúnculos, ele não pode estar em Q mesmo quando está em Sa. Assim, se
existe uma dúvida prima facie acerca da mentalidade dos sistema de cabeça de
homúnculos, existe dúvida prima facie de que Q = Sa, i.e., uma dúvida de que o tipo
de funcionalismo sob consideração seja verdadeiro. Chamemos a este argumento o
Argumento dos Qualia Ausentes.

1.3 A proposta de Putnam

Uma forma de lidar com o problema colocado pelos contra-exemplos da cabeça-de-


homúnculos que os funcionalistas podem escolher é o dispositivo ad hoc de os
estipular ‘para fora da vista e da existência’. Por exemplo um funcionalista pode
estipular que dois sistemas não podem ser funcionalmente equivalentes se um
contém partes com organizações funcionais características de seres sensientes e
outro não. No seu artigo em que avança a hipótese de que a dor é um estado

! +3!
funcional Putnam estipula que “nenhum organismo capaz de sentir dor possui uma
decomposição em partes que separadamente possuam Descrições” (do tipo de
Máquina de Turing que pode estar no estado funcional que Putnam identifica com a
dor). O propósito de tal condição é excluir ‘organismos’ (se é que estes poderiam
contar como tal) tais como enxames de abelhas como sentidores únicos de dor
(Putnam,1967, pp. 434-435). Uma forma de preencher o requisito de Putnam seria:
um organismo sentidor de dor não pode possuir uma decomposição em partes
todas as quais teriam uma organização functional característica de seres
sensientes. Mas isto não excluiria o meu exemplo da cabeça de homúnculos, uma
vez que este tem partes não sensientes, como o corpo mecânico e os orgãos
sensoriais. Não resultará também ir ao extremo oposto e requerer que nenhuma
parte seja sensiente. Ou de outra maneira mulheres grávidas e pessoas com
parasitas sensientes já não poderiam contar como organismos que sentem dores. O
que parece ser importante em exemplos como a simulação cabeça-de-homúnculos
que descrevi é que os seres sensientes desempenham um papel crucial a dar à
coisa a sua organização funcional. Isto sugere uma versão da proposta de Putnam
que requer que um organismo que sinta dor tenha uma certa organização funcional
e que não tenha partes que (1) possuam elas próprias esse tipo de organização
funcional e também (2) desempenhem um papel crucial a dar ao sistema global a
sua organização funcional.
Embora esta proposta envolva a noção vaga de ‘papel crucial’, ela é suficientemente
precisa para nós vermos que ela não vei ser suficiente. Suponhamos que há uma
parte do universo que contém materia muito diferente da nossa, materia que é
infinitamente divisível. Nesta parte do universo há criaturas de muitos tamanhos, até
mesmo criaturas de tipo humano muito mais pequenas do que as nossas partículas
elementares. Numa expedição intergaláctica, estas pessoas descobrem a existência
do nosso tipo de materia. Por razões que apenas elas conhecem, elas decidem
devotar as próximas centenas de anos a criar a partir da matéria delas substâncias
com as características físicas e químicas (excepto ao nível das partículas sub-
elementares) dos nossos elementos. Controem hordas de naves espaciais de
diferentes variedades aproximadamente do tamanho dos nossos electrões, protões
e outras partículas elementares, e cada uma das naves é feita de modo a imitar o
comportamento dessas partículas elementares. As naves também contêm
geradores para produzir o tipo de radiação das partículas elementares. Cada nave

! ++!
tem uma tripulação de especialistas na natureza das nossas partículas elementares.
Eles fazem isso para produzirem enormes (pelos nossos standards) massas de
substâncias com as características físicas e químicas do oxigénio, do carbono, etc.
Pouco depois de terem conseguido tal coisa, tu vais numa expedição a essa parte
do universo e descobres ‘oxigénio’, ‘carbono’, etc. Sem teres conhecimento da sua
real natureza, estabeleces uma colónia, usando esses elementos para cultivar
plantas para alimentação, para ter ar para respirar, etc. Uma vez qu as nossas
moléculas estão constantemente a ser trocadas com o ambiente, tu e os outros
colonizadores vêm (num período de poucos anos) a ser compostos principalmente
da ‘matéria’ feita das pessoas minúsculas nas suas naves espaciais. Serias menos
capaz de sentir dor, pensar, etc apenas porque a material de que és composto
contém (e depende disso para as suas características) seres que têm eles próprios
uma organização functional característica de criaturas sensientes? Penso que não.
Os mecanismos electroquímicos básicos pelos quais as sinapses operam são hoje
bastante bem conhecidos. Tanto quanto se sabe, mudanças que não afectam estes
mecanismos electroquímicos não afectam a operação do cérebro e não afectam a
mentalidade.
Os mecanismos electroquímicos nas tuas sinapses não seriam afectados pela
mudança na tua matéria. É interessante comparar as pessoas-partículas-
elementares com os exemplos das cabeças-de-homúnculos com que o capítulo
começou. Um primeiro palpite natural acerca da fonte da nossa intuição de que as
simulações de cabeça de homúnculos inicialmente descritas não têm mentalidade é
que eles têm demasiada estrutura mental interna.
Os homenzinhos podem estar às vezes aborrecidos, às vezes excitados. Podemos
mesmo imaginar que eles deliberam acerca da melhor maneira de realizar uma
dada organização functional e fazem alterações com o propósito de terem mais
tempo de lazer. Mas o exemplo das pessoas-partículas-elementares que acabei de
descrever sugere que este primeiro palpite está errado. O que parece importante é a
forma como a mentalidade das partes contribui para o funcionamento do todo.
Há apenas uma diferença notória entre as pessoas partículas-elementares do
exemplo e os primeiros exemplos com homúnculos. No primeiro, a mudança em ti à
medida que te tornas infestado de homúnculos não é uma mudança que faça
qualquer diferença no processamento psicológico (i.e. o processamento de
informação) ou no processamento neurológico, mas apenas na tua microfísica.

! +4!
Nenhuma técnica de psicologia ou neuroficiologia humana revelaria qualquer
diferença em ti. No entanto, as simulações cabeça-de-homúnculos descritas no
início do capítulo não são coisas às quais teorias neurofisiologicas verdadeiras
acerca de nós se apliquem e se elas foram concebidas como simulações Funcionais
(e não Psicofuncionais), elas não precisam de ser coisas às quais teorias
psicológicas (de processamento de informação) verdadeiras acerca de nós se
aplicam. Esta diferença sugere que as nossas intuiçoes são em parte controladas
pela concepção não irrazoável de que os nossos estados mentais dependem do
facto de nós termos a psicologia e/ou a neurofisiologia que temos. Por isso alguma
coisa que difere de nós marcadamente em ambas as dimensões (lembremo-nos de
que é uma simulação Funcional e não Psicofuncional) não deve ser assumida como
tendo mentalidade apenas com base em ter sido desenhada para ser
Funcionalmente equivalente a nós.

1.4 Será a dúvida prima facie meramente prima facie?

O Argumento dos Qualia Ausentes apoia-se num apelo à intuição de que as


simulações cabeça-de—homúnculos não teriam mentalidade, ou pelo menos qualia.
Afirmei que esta intuição dá origem à dúvida prima facie de que o funcionalismo seja
verdadeiro. Mas intuições que não são apoiadas por argumentos baseados em
princípios não são propriamente terreno sólido. Na verdade intuições incompatíveis
com teorias bem-fundadas (por exemplo, a intuição pré-copernicana de que a Terra
não se move) vêm a desaparecer. Mesmo campos como a linguística cujos dados
consistem maioritariamente em intuições frequentemente rejeitam tais intuições -
como por exemplo que as frases seguintes são não-gramaticais - com base em
fundamento teórico:

The horse raced past the barn fell.


The boy the girl the cat bit scratched died13.

!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
13
Achei preferível manter os exemplos em inglês (eles significam: ‘O cavalo que correu ao lado do celeiro caiu’
e ‘O rapaz que a rapariga que o gato mordeu arranhou morreu’). (N. da T.)

! +*!
Estas frases são na verdade gramaticais, embora difíceis de processar. O apelo às
intuições quando estamos a ajuízar a posse de mentalidade é no entanto,
especialmente suspeito. Nenhum mecanismo físico parece muito intuitivamente
plausível como um lugar para os qualia, muito menos um cérebro. Será um pedaço
de matéria cinzenta a abanar mais apropriado intuitivamente para ser lugar de
qualia do que um conjunto de homenzinhos? Se não é, talvez haja também uma
dúvida prima facie acerca dos qualia dos sistema com cérebros-na-cabeça?
Existe, no entanto, uma diferença muto importante entre sistemas com cérebro na
cabeça e sistemas cabeças-de-homúnculos. Uma vez que nós sabemos que somos
sistemas com cérebros na cabeça [brain-headed systems] e que temos qualia,
sabemos que sistemas com cérebros na cabeça podem ter qualia. Por isso, mesmo
que não tenhamos nenhuma teoria dos qualia que explica como é que isso é
possivel, temos razões de peso para não considerar quaisquer dúvidas prima facie
que existam acerca dos qualia dos sistemas com cérebros na cabeça. É claro que
isto faz do meu argumento um argumento parcialmente empírico – ele depende do
conhecimento daquilo que nos faz vibrar. Mas uma vez que este é conhecimento
que de facto possuímos, a dependência dele não deve ser vista como um defeito.
Há outra diferença entre nós, os cabeças de carne, e os cabeças-de-homúnculos:
eles são sistemas desenhados para nos imitar, mas nós não somos desenhados
para imitar o que quer que seja (aqui apoiamo-nos noutro facto empírico). Este facto
impede qualquer tentativa de argumentar com base numa inferência para a melhor
explicação a favor dos qualia dos cabeças-de-homúnculos. A melhor explicação dos
gritos e esgares dos cabelas de homúnculos não são as suas dores mas o facto de
eles terem sido desenhados para imitar os nossos gritos e esgares.
Algumas pessoas parecem sentir que o comportamento complexo e subtil dos
cabeças de homúnculo (comportamento tão complexo e subtil - mesmo tão
‘sensível’ às características do ambiente, humano e não humano, como o teu
comportamento) é ele próprio razão suficiente para pôr de lado a dúvida prima facie
de que os cabeças de homúnculos tenham qualia. Mas isto é apenas behaviorismo
cru.
O meu caso contra o Funcionaismo depende do seguinte princípio: se uma doutrina
tem uma conclusão absurda que não temos nehuma razão indeependente para
subscrever e se não há forma alguma de eliminar explicativamente o absurdo ou de
mostrar que ele é enganador ou irrelevante, então não aceitemos a doutrina. E eu

! 41!
digo que não há razão independente para acreditar na mentalidade dos cabeças-de-
homúnculos, e não conheço maneira de afastar explicativamente o absurdo da
conclusão de que eles têm mentalidade (embora evidentemente o meu argumento
seja vulnerável à introdução de uma tal explicação). A questão, então, é se há
alguma boa razão independente para acreditar no Funcionalismo. Um argumento a
favor do Funcionalismo é que ele é a melhor solução disponível para o problema
mente-corpo. Eu creio que esta é uma má forma de argumento, mas como também
penso que o Psicofuncionalismo é preferível ao Funcionalismo (por razões
mencionadas mais abaixo), adiarei a consideração desta forma de argumento para
a discussão do Psicofuncionalismo.
O único outro argumento a favor do Funcionalismo que eu conheço é o de que se
pode mostrar que identidades Funcionais são verdadeiras com base em análises do
significado de terminologia mental. De acordo com este argumento, as identidades
Funcionais serão justificadas da mesma forma que se pode tentar justificar a
pretensão de que o estado de ser um solteiro é idêntico ao estado de ser um
homem não casado. Um argumento semelhante faz apelo a banalidades [platitudes]
de senso comum acerca de estados mentais em vez de verdades de significado.
Lewis diz que caracterizações Funcionais de estados mentais estão na província da
psicologia de senso-comum e não na da ciência profissional (Lewis, 1972, p. 250)
(ver também Shoemaker, 1975, e Armstrong, 1968). Armstrong diz coisas equívocas
sobre questões de analiticidade. (Ver Armstrong, 1968, pp. 84-85, and p. 90.) E ele
continua insistindo que caracterizações Funcionais deveriam "incluir apenas
banalidades que são conhecimento comum entre nós – toda a gente as sabe, toda a
gente sabe que toda a gente as sabe, etc " (Lewis, 1972, p. 256). Falarei
principlamente acerca da versão da "banalidade” do argumento. A versão da
analiticidade é vulnerável a essencialmente às mesmas considerações, bem como
às dúvidas quineanas sobre analiticidade.
Estou disposto a conceder, para propósitos de argumentação, que é possível definir
qualquer estado mental dado em termos de banalidade que dizem respeito a outros
termos de estados mentais, termos de input e termos de outuput. Mas isto não me
compromete com o tipo de definições de termos mentais nas quais toda a
terminologia mental foi eliminada via Ramseyficação ou algum outro dispositivo. É
simplesmente uma falácia supôr que se cada estado mental é definível em termos
de outros (mais inputs e outputs), então cada estado mental é definível de forma

! 4)!
não mentalista. Para ver isto, consideremos o exemplo dado há pouco. Na verdade,
vamos simplificar a questão ignorando os inputs e outpts. Vamos definir dor como a
causa do cuidado [worry], e o cuidado como o efeito da dor. Nem uma pessoa tão
toldada que consegue aceitar isto tem de aceitar uma definição de dor como a
causa de algum coisa, ou a definição de cuidado como o efeito de alguma coisa.
Lewis diz que é analítico que a dor é o ocupante de um certo papel causal. Mesmo
se ele tem razão acerca do papel causal, especificado em parte de forma
mentalista, não se pode concluir que é analítico que dor seja o ocupante de
qualquer papel causal, especificado de forma não mentalista.
Não consigo ver nenhum argumento decente a favor do Funcionalismo baseado em
banalidades ou analiticidade. Além disso, a concepção do Funcionalismo como
baseado em banalidades óbvias, ou evidências, deixa-nos em trabalhos nos casos
em que as banalidades não têm nada a dizer. Recordemos o exemplo dos cérebros
a serem removidos para limpeza e rejuvenescimento, sendo as conexões entre o
nosso corpo e o nosso cérebro mantidas por rádio, enquanto andamos por aí a
tratar dos nossos assuntos. O processo demora uns dias, e quando está completo,
o cérebro é reinserido no corpo. Ocasionalmente, pode acontecer que o corpo de
uma pessoa seja destruído num acidente enquanto o seu cérebro está a ser limpo e
rejuvenescido. Se fosse ligado a orgão sensoriais de input (mas não de output) um
tal cérebro não exibiria nenhuma das conexões óbvias do costume entre
comportamento e feixes de inputs e estados mentais. Se, como parece plausível,
um tal cérebro pudesse ter quase todos os mesmos estados mentais (estreitos) que
nós temos (e como um tal estado de coisas poderia tornar-se típico), o
Funcionalismo está errado.

2.0 Psicofuncionalismo

Ao criticar o Funcionalismo eu fiz apelo ao seguinte princípio: se uma doutrina tem


uma conclusão absurda que não temos nenhuma razão independente para aceitar,
e se não há nenhuma outra maneira de afastar o absurdo, ou de mostrar que ele é
enganador ou irrelevante, e se não há razão para acreditar na doutrina que em
primeiro lugar conduz ao absurdo, então não se aceite a doutrina.
Eu disse que não havia nenhuma razão independente para aceitarmos que a

! 4"!
simulação Funcional cabeça-de-homúnculos tenha quaisquer estados mentais. No
entanto, existe uma razão independente para acreditar que a simulação
Psicofuncional cabeça-de-homúnculos tem estados mentais, nomeadamente que
uma simulação Psicfuncional tua seria Psicofuncionalmente equivalente a ti, de
forma que qualquer teoria psicológica verdadeira acerca de ti seria também
verdadeira acerca dela. Que melhor razão poderia exisitr para atribuir quaisquer
estados mentais que estajam no domínio da psicologia?
Este ponto mostra que qualquer simulação Psicofuncional tua partilha os teus
estados mentais não qualitativos. No entanto, na próxima secção, vou argumentar
que permanecem ainda assim dúvidas acerca de se ela partilha os teus estados
mentais qualitivos.
Há uma outra maneira de o Psicofuncionalismo escapar ao tipo de argumento que
apliquei ao Funcionalismo. Assumindo, como argumentei atrás, que o
Psicofuncionalismo é preferível ao Funcionalismo, nós poderíamos montar um
argumento de "inferência para a melhor explicação” a favor do Psicofuncionalismo:
"Que mais poderiam estados mentais ser se não estados Psicofuncionais?" Por
exemplo, Putnam (1967) faz a hipótese de que o (Psico)funcionalismo é verdadeiro
e depois argumenta persuasivamente que o (Psico)funcionalismo é uma melhor
hipótese do que o behaviorismo ou o materialismo. Mas este é um uso muito dúbio
de "inferência para a melhor explicação". Porque, que garantia temos nós de que
exista uma resposta à questão "O que são estados mentais?" do tipo da respopsta
que behavioristas, materialistas, e funcionalistes têm querido? Além disso, a
inferência para a melhor explicação não pode ser aplicada quando nenhuma das
explicações disponíveis é sequer boa. Para uma inferência para a melhor explicação
ser aplicável, duas condições têm de ser satisfeitas: nós temos que ter razão para
acreditar que uma explicação é possível, e pelo menos uma das explicações
disponíveis tem de ser minimamente adequada. Imagine-se alguém discutindo a
favor das soluções propostas para o Problema de Newcomb com base no facto de
apesar do defeito fatal deste, ele ser a melhor das soluções propostas. Isso seria
uma piada. Mas será que o argumento a favor do funcionalismo é melhor?
Behaviorismo, materialismo, e funcionalismo não são teorias da mentalidade da
mesma forma que a teoria de Mendel é uma teoria da hereditariedade. O
behaviorismo, o materialismo, e o funcionalismo (e o dualismo também) são
tentativas de resolver um problema: o problema mente-corpo. É claro que este é um

! 4.!
problema quanto ao qual dificilmente pode ser garantido que ele tenha uma solução.
Além disso, cada uma das soluções propostas para o problema mente-corpo incorre
em sérias dificuldades, dificuldades que eu pelo menos estou inclinado a encarar
como fatais.
Até aqui, não argumentei contra o Psicofuncionalismo tal como este se aplica a
estados mentais não qualitativos como crenças e desejos. Mas há um forte caso a
ser levantado contra este, nomeadamente que ele recai no chauvinismo. Afinal,
criaturas que são muito diferentes de nós na sua mecânica mental podem ainda
assim pensar e acreditar. Discutirei este assunto com mais detalhe na secção 3.0.
Quero agora ir atrás do Psicofuncionalismo tal como este se aplica aos qualia.

2.1 Serão os qualia estados psicofuncionais?

Comecei este artigo descrevendo um dispositivo cabeça-de-homúnculos e dizendo


que há uma dúvida prima facie acerca de se ele tem quaisquer estados mentais,
especialmente acerca de se ele tem estados mentais qualitativos, como dores,
comichões e sensações de vermelho. A dúvida especial acerca de qualia pode
talvez ser explicada pensando acerca de qualia invertidos em vez de qualia
ausentes; faz sentido, ou parece fazer sentido, supôr que objectos a que ambos
chamamos verdes me parecem da forma como objectos a que ambos chamamos
vermehos te parecem a ti.
Parece que nós poderíamos ser funcionalmente equivalentes mesmo se a sensação
que belos hidrantes evocam em ti fosse qualitativamente identical à sensação que a
relva evoca em mim. Imagine-se uma lente inversora que quando colocada no olho
de um sujeito resulta em exclamações como "As coisas vermelhas agora parecem
da forma que as coisas verdes costumavam parecer, e vice-versa." Imagine-se
ainda um par de gémeos idênticos, um dos quais teve tais lentes implantadas desde
o nascimento. Os gémeos crescem normalmente e aos 21 anos são funcionalmente
equivalentes. Esta situação oferce pelo menos alguma evidência de que o espectro
de um está invertido relativamente ao espectro do outro (ver Shoemaker, 1975, nota
17, para uma descrição convincente de inversão intrapessoal do espectro.) No
entanto, é muito difícil ver como poderíamos fazer sentido de uma inversão análoga
do espectro com respeito a estados não qualitativos. Imagine-se um par de

! 4'!
pessoas, uma das quais acredita que p é verdadeiro e que q é falso enquanto a
outra acredita que q é verdadeiro e que p é falso. Poderiam estas pessoas ser
funcionalmente equivalentes?
É difícil ver como poderiam. Na verdade, é difícil ver como é que duas pessoas
poderiam ter esta diferença nas suas crenças e não haver nenhuma circunstância
possível na qual esta diferença de crenças se menifestasse em comportamento
diferente. Os qualia poderem ser supervenientes à organização funcional de uma
forma que as crenças não o são.
Há outra razão para distinguir firmemente entre estados mentais qualititativos e não
qualitativos ao falar de teorias funcionalistas: o Psicofuncionalismo evita os
problemas do Funcionalismo com estados não qualitivos, por exemplo, attitudes
proposicionais como crenças e desejos. Mas o Psicofuncionalismo pode não ser
mais capaz de lidar com os estados qualitativos do que Funcionalismo o era. A
razão é que os qualia podem bem não estar no domínio da psicologia.
Para ver isto, vamos imaginar como seria uma realização da psicologia humana
com cabeças-de-homúnculos. A teoria psicológica actual parece dirigida para a
descrição de relações de fluxo de informação entre mecanismos psicológicos. O fim
parece ser decompôr tais mecanismos em mecanismos psicologicamente primitivos,
"caixas negras " cuja estrutura interna cai no domínio da fisiologia e não no domínio
da psicologia (ver Fodor, 1968b, Dennett, 1975, and Cummins, 1975; objecções
interessantes são levantadas em Nagel, 1969.) Por exemplo, um mecanismo quase-
primitivo poderia ser um mecanismo que emparelha dois items num sistema
representacional, se eles são espécimes do mesmo tipo. Ou os mecanismos
primtiivos poderiam ser como os de um computador digital, por exemplo eles
poderiam (a) somar 1 a um dado registo, e (b) subtrair 1 de um dado registo, ou se o
registo contiver 0, ir para a instrucção n (indicada). (Estas operações podem ser
combinadas para cumprir qualquer operação de um computador digital; ver Minsky,
1967, p. 206.) Considere-se um computador cujo código de linguagem de máquina
contém apenas duas instruções correspondendo a (a) e (b). Se tu perguntas como é
que ele faz multiplicações ou resolve equações diferenciais, ou processa o
pagamento de salários, a resposta pode ser dad mostrando-te um programa
embebido nos termos das duas instrucções em linguagem da máquina. Mas se tu
perguntas como é que ele adiciona 1 a um dado registo, a resposta apropriada ser-
te-á dada com um diagrama de circuitos e não com um programa. A máquina está

! 4/!
montada [hard-wired] para somar 1. Quando a instrução correspondendo a (a)
aparece num certo registo, os conteúdos de outro registo "automaticamente"
mudam de certa forma. A estrutura computacional de um computador é determinada
por um conjunto de operadores primitivos e pelas formas como operações não
primitivas são constituídas a partir deles. Assim, não importa à estrutura
computacional do computador se os mecanismos primitivos são realizados por
circuitos de tubos, circuitos de transistores, relés, etc. Da mesma forma, não importa
para a psicologia de um sistema mental se os seus mecanismos primitivos são
realizados por um ou outro mecanismo neurológico. Chamemos a um sistema a
"realização da psicologia humana" se toda a teoria psicológica verdadeira acerca de
nós é verdadeira acerca dele. Considere-se uma realização da psicologia humana
cujas operações psicológicas primitivas são levadas a cabo por homenzinhos, à
maneira da simulacro cabeça-de-homúnculos que foi discutido. Talvez um
homenzinho produza items de uma lista, um a um, outro homenzinho compare estes
items com outras representações para verificar se eles se emparelham, etc.
Há boa razão para supôr que este sistema tem alguns estados mentais. Atitudes
proposicionais são um exemplo. Talvez a teoria psicológica venha a identificar
lembrar-se que P com ter ‘armazenado’ um objecto semelhante a uma frase que
expressa a proposição que P (Fodor, 1975). Então se um dos homenzinhos pôs um
certo objecto semelhante a uma frase em ‘armazém’, nós podemos ter razões para
olhar para o sistema como lembrando-se de que P. Mas a não ser que ter qualia
seja apenas uma questão de ter determinado processamento de informação (o que
é no mínimo uma proposta controversa, como se verá em discussão posterior), não
existe uma tal razão teórica para olhar para o sistema como tendo qualia. Em suma,
há talvez tantas dúvidas acerca dos qualia deste sistema de cabeça-de-homúnculos
como havia acerca dos qualia da simulação Funcionalista cabeça-de-homúnculos
discutida mais atrás neste capítulo.
Mas o sistema que estamos a discutir é ex hypothesi alguma coisa acerca da qual
alguma teoria psicológica é verdadeira. Por isso qualquer dúvida de que tenha
qualia é uma dúvida de que qualia caiam no domínio da psicologia.
Pode ser objectado: "O tipo de psicologia que tens em mente é a psicologia
cognitiva, i.e., a psicologia dos processos de pensamento; e não é surpresa
nenhuma que os qualia não estejam no domínio da psicologia cognitiva!" Mas eu
não tenho a psicologia cognitiva em mente, e se parece ser assim, isso explica-se

! 43!
facilmente: nada do que sabemos acerca dos processos psicológicos que subjazem
à nossa vida mental consciente tem o que quer que seja a ver com qualia. O que
passa por "psicologia" da sensação de dor, por exemplo, é (a) fisiologia, (b)
psicofísica (i.e., estudo das funções matemáticas relacionando variáveis de
estímulos e variáveis de sensações, por exemplo a intensidade de som como
função da amplitude das ondas sonoras), ou (c) uma ‘misturada’ de estudos
descritivos (ver Melzack 1973, Ch. 2). Destes, apenas a psicofísica pode ser vista
como sendo acerca de qualia per se. E é óbvio que a psicofísica toca apenas o
aspecto funcional da sensação, não o seu carácter qualitativo. Experiências
psicofísicas feitas em ti teriam os mesmos resultados que experiências feitas em
algum sistema Psicofuncionalmente equivalente a ti, mesmo se ele tivesse qualia
ausentes ou invertidos. Mas se os resultados experimentais se mantiverem
inalterados caso os sujeitos das experiências tenham ou não qualia invertidos ou
ausnetes, não se pode esperar que tais experiências lancem qualquer luz sobre a
natureza dos qualia.
Na verdade, com base no tipo de aparelho conceptual neste momento disponível
em psicologia, eu não vejo como é que a psicologia, numa forma semelhante à sua
presente incarnação, poderia alguma vez explicar os qualia. Não conseguimos
conceber neste momento como é que a psicologia poderia explicar os qualia,
embora consigamos conceder como é que a psicologia poderia explicar crenças,
desejos, esperanças, etc. (see Fodor, 1975). Que alguma coisa seja hoje
inconcebível não é uma boa razão para pensar que ela é impossível. Poderiam ser
no futuro desenvolvidos conceitos que tornaria concebível o que é hoje
inconcebível. Mas tudo o que temos para prosseguir é o que sabemos, e com base
naquilo que temos para prosseguir, parece que os qualia não estão no domínio da
psicologia.
Não constitui objecção à sugestão de que os qualia não são entidades psicológicas
que os qualia sejam o próprio paradigma de alguma coisa no domínio da psicologia.
Como tem sido frequentemente sublinhado, é em parte uma questão empírica saber
o que está no domínio de qualquer particular ramo de ciência. A liquidez da água
vem a revelar não ser explicável pela química mas antes apenas pela física sub-
atómica. Ramos da ciência têm a cada momento do tempo um dado conjunto de
fenómenos que procuram explicar. Mas pode ser descoberto que algum fenómeno
que parecia central a um ramo da ciência está na verdade sob o âmbito de um

! 4+!
diferente ramo. O Argumento dos Qualia Ausentes explora a possibilidade de o
estado Funcional ou Psicofuncional que Funcionalistas e Psicofuncionalistas
querem identificar com a dor poder ocorrer sem que quaisquer qualia ocorram.
Também parece concebível que os últimos ocorram sem os primeiros. Na verdade,
há factos que dão plausibilidade a esta forma de ver as coisas. Depois de
lobotomias frontais, os pacientes tipicamente reportam que ainda sentem dores,
embora as dores já não os perturbem (Melzack, 1973, p. 95). Estes pacientes
exibem todos os sinais ‘sensoriais’ da dor (por exemplo, reconhecer picos como
aguçados), mas frequentemente têm pouco ou nenhum desejo de evitar estímulos
‘dolorosos’.
Uma ideia sugerida por estas observações é que cada dor é de facto um estado
composto cujos componentes são um quale e um estado Funcional ou
Psicofuncional. Ou, o que redunda no mesmo, cada dor é um quale
desempenhando um certo papel Funcional ou Psicofuncional. Se esta ideia é
correcta, ela ajuda a explicar como é que as pessoas têm acreditado em teorias tão
diversas acerca da natureza da dor e de outras sensações: elas enfatizaram um
componente em desfavor do outro. Proponentes do behaviorismo e do
funcionalismo tiveram um componente em mente; proponentes da definição
ostensiva privada tiveram outro. Ambas as abordagens erram ao tentar dar uma
teoria de alguma coisa que tem dois componentes de natureza diferente.

3.0 Chauvinismo versus Liberalismo

É natural entender as teorias psicológicas a que o Psicofuncionalismo se refere


como teorias da psicologia humana. No Psicofuncionalismo assim entendido é
impossível que um sistema tenha crenças, desejos, etc. excepto tanto quanto as
teorias psicológicas verdadeiras acerca de nós forem verdadeiras acerca dele. O
Psicofuncionalismo (assim entendido) estipula que a equivalência a nós é
necessária à mentalidade.
Mas mesmo que a equivalência Psicofuncional a nós seja uma condição para o
nosso reconhecimento da mentalidade, que razão há para pensar que ela é uma
condição da mentalidade ela própria? Não poderia haver uma ampla variedade de
processos psicológicos possíveis que subjazem à mentalidade, dos quais nós
instanciamos um tipo? Vamos supôr que encontramos Marcianos e que

! 44!
descobrimos que eles são, em traços gerais, Funcionalmente (mas não
Psicofuncionalmente) equivalentes a nós. Quanto conhecemos Marcianos, achamo-
los tão diferentes de nós como os humanos que conhecemos. Desenvolvemos
amplos intercâmbios culturais e comerciais com eles. Estudamos, Marcianos e
Terrestres, mutuamente, a ciência e as revistas de filosofia, vamos ver os filmes que
os outros fazem, lemos os romances que os outros escrevem, etc. Posteriormente
os psicólogos Marcianos e Terrestres comparam notas e descobrem que a
psicologia subjacente dos Marcianos e dos Terrestres é muito diferente. Cedo
concordam que a diferença pode ser descrita da seguinte maneira. Pensamos em
humanos e marcianos como se eles fossem produtos de design consciente. Num tal
projecto de design, haverá várias opções. Algumas capacidades podem ser inscritas
(inatas), outras aprendidas. O cérebro pode ser desenhado para cumprir certas
tarefas usando tanta capacidade de memória quanta for necessária para minimizar
o uso de capacidade de computação; ou, por outro lado, o designer pode escolher
conservar espaço de memória e apoiar-se sobretudo em capacidade de
computação. Inferências podem ser realizadas por sistemas que usam uns poucos
axiomas e muitas regras de inferências, ou em alternativa, poucas regras e muitos
axiomas. Agora imagine-se que o que os psicólogos Marcianos e Terrestres
descobrem ao comparar notas é que os Marcianos e os Terrestres diferem como se
fossem o produto final de opções de design maximamente diferentes (compatíveis
com equivalência Funcional aproximada em adultos). Devemos nesse caso rejeitar
a suposição de que os Marcianos podem apreciar os nossos filmes, acreditar nos
seus resultados científicos, etc? Devem eles ‘rejeitar’ a sua ‘suposição’ de que nós
‘apreciamos’ os romances deles, ‘aprendemos’ com os seus manuais, etc? Talvez
eu não tenha dado informação suficiente para respondermos a esta questão. Afinal,
pode haver muitas maneiras de preenchermos a descrição da diferença Marcianos-
humanos nas quais seria razoável supôr que simplesmente não há materia de facto
aqui, ou mesmo para supôr que os Marcianos de facto não merecem atribuições
mentais. Mas seguramente há muitas maneiras de preencher a descrição da
diferença Marcianos-Terrestres que esbocei nas quais seria perfeitamente claro que
mesmo se os Marcinaos se comportam de forma diferente de nós em experiências
psicológicas, no entanto eles têm desejos, gozos, etc. Supôr outra coisa seria
chauvinismo humano cru. (Recordemos que teorias são chauvinistas tanto quanto
negam falsamente que sistemas têm propriedades mentais e liberais tanto quanto

! 4*!
atribuem falsamente propriedades mentais)
Uma sugestão óbvia de saída desta dificuldade é identificar estados mentais com
estados Psicofuncionais, tomando o domínio da psicologia como incluindo todas as
criaturas com mentalidade, incluindo Marcianos. A sugestão é definirmos
"Psicofuncionalismo" em termos de uma psicologia "universal" ou "transversal a
sistemas", e não da psicologia humana como assumi anteriormente. Uma psicologia
universal, no entanto, é um empreendimento suspeito. Porque, como é que nós
havemos de decidir que sistemas devem ser incuídos no domínio da psicologia
universal? Uma possível forma de decidir quais sistemas têm mentalidade e
pertencem portanto ao domínio da psicologia universal seria usar alguma outra
teoria da mentalidade desenvolvida, por exemplo o behaviorismo ou o
Funcionalismo. Mas um tal procedimento estaria pelo menos tão mal justificado
como a outra teoria utilizada. Além disso, se o Psicofuncionalismo tem de pressupôr
alguma outra teoria da mente, mais vale aceitar a outra teoria da mente em vez
dele.
Talvez a psicologia universal evite este problema do ‘domínio’ da mesma forma que
outros ramos da ciência o evitam ou procuram evitá-lo. Outros ramos da ciência
começam com domínios tentativos baseados em versões intuitivas ou pré-científicas
dos conceitos que essas ciências são supostas explicar. Depois tentam desenvolver
géneros naturais de uma forma que permita generalizações legiformes que se
apliquem a todas ou quase todas as entidades nos domínios pré-científicos. No
caso de muitos ramos da ciência – incluindo ciências biológicas e sociais como a
genética e a linguística – o domínio pré-científico revelou ser apto para a articulação
de generalizações legiformes.
Ora, pode ser que sejamos capazes de desenvolver a psicologia universal da
mesma forma que desenvolvemos a psicologia terrestre. Decidimos com uma base
intuitiva e pré-científica que criaturas incluir neste domínio e trabalhámos para
desenvolver géneros naturais de teoria psicológica que se apliquem a todos ou pelo
menos à maioria deles. Talvez o estudo de um amplo leque de organismos
encontrados em diferentes mundos conduza um dia a teorias que determinam
condições de verdade para a atribuição de estados mentais como crenças, desejos,
etc, aplicáveis a sistemas que são pré-teoricamente bastante diferentes de nós. De
facto tal psicologia trans-mundial requereria sem dúvida um novo leque de conceitos
mentalistas. Talvez vá haver famílias de conceitos correspondendo a crença,

! *1!
desejo, etc, i.e. uma familia de conceitos-semelhantes-a-crenças [belief like
concepts], conceitos-semelhantes-a-desejos [desire like concepts], etc. A ser assim,
a psicologia universal que desenvolveremos será, sem dúvida, dependente de quais
novos organismos nós descobrirmos primeiro. Mesmo se a psicologia universal for
de facto possível, haverá no entanto certamente muitos organismos possíveis cujo
estatuto mental é indeterminado. Por outro lado, pode ser que a psicologia universal
não seja possível. Talvez a vida no universo seja tal que simplesmente não vamos
ter base para decisões razoáveis acerca de quais sistemas estão no domínio da
psicologia e quais não estão. Se a psicologia universal é possível, o problema que
tenho estado a levantar desaparece. O Psicofuncionaismo-Universal evita o
liberalismo do Funcionalismo e o chauvinismo do Psicofuncionalismo humano. Mas
a questão de saber se a psicologia universal é possível é certamente uma questão a
que não temos neste momento possibilidade de responder. Eis um resumo do
argumento até aqui:
(1) O Funcionalismo tem a consequência bizarra de nos fazer pensar que uma
simulação tua, baseada em cabeças-de-homúnculos, possui qualia. Isto remete o
ónus da prova para o Funcionalista, é ele que tem que dar alguma razão para se
aceitar a sua doutrina. No entanto o único argumento a favor do Funcionalismo na
literatura não é bom, e por isso o Funcionalismo não dá nenhum sinal de ser capaz
de lidar com o ónus da prova.
(2) Simulações Psicofuncionalistas nossas partilham quaisquer estados nossos no
domínio da psicologia, por isso o cabeça-de-homúnculos Psicofuncional não lança
dúvida sobre as teorias psicofuncionais de estados cognitivos, apenas sobre as
teorias Psicofuncionais dos qualia, existindo a dúvida acerca de se os qualia
pertencem ao domínio da psicologia.
(3) As teorias psicofuncionalistas dos estados mentais que se situam no domínio da
psicologia são no entanto, e sem qualquer esperança de alteração, chauvinistas.
Por isso uma versão do funcionalismo tem problemas com o liberalismo e a outra
tem problemas com o chauvinismo. Quanto aos qualia, se eles pertencem ao
domínio da psicologia, então o Psicofuncionalismo quanto aos qualia é tão
chauvinista como o Psicofuncionalismo quanto às crenças. Por outro lado, se os
qualia não pertencem ao domínio da psicologia, o cabeça-de-homúnculos
Psicofuncionalista pode ser usado contra o Psicofuncionalismo quanto aos qualia.
Pois a única doisa que protege o Psicofuncionalismo quanto ao estado mental S do

! *)!
argumento dos homúnculos na cabeça é que se tu tens S, então qualquer simulação
Psicofuncionalista tua tem de ter S, porque a teoria correcta de S aplica-se a ela
tanto quanto se aplica a ti.

3.1 O problema dos inputs e dos outputs

Por isso, especificações físicas de inputs e outputs não dão. Além do mais,
terminologia mental ou de ‘acção’ (por exemplo, dando um murro à pessoa que nos
ofendeu) também não pode ser utilizada, uma vez que usar tais especificações de
inputs e outputs seria desistir do programa funcionalista de caracterizar a
mentalidade em termos não mentais. Por outro lado, como se recordarão,
caracterizar inputs e outputs simplesmente como inputs e outputs é inevitavelmente
liberal. Eu, por mim, não vejo como possa existir um vocabulário para descrever
inputs e outputs que evite quer o liberalismo quer o chauvinismo. Não estou a
pretender que este seja um argumento conclusivo contra o funcionalismo. Antes, tal
como o argumento funcionalista contra o fisicalismo, é melhor vê-lo como um
argumento do ónus da prova. O funcionalista diz ao fisicalista: “É muito difícil ver
como poderia haver uma caracterização física única de inputs e outputs de todas as,
e apenas das, criaturas com mentalidade”. Em ambos os casos o que foi dito é
suficiente para fazer com que seja da responsabilidade daqueles que pensam que
pode haver tais caracterizações esboçarem a forma como estas seriam possíveis.!!
!
Referências

Armstrong, D. A materialist theory of mind. London: Routledge & Kegan Paul, 1968.
Bever, T. The cognitive basis for linguistic structures. In J. R. Hayes (Ed.), Cognition and the
development of language. New York: Wiley, 1970.
Block, N. Are absent qualia impossible? Philosophical Review, 1980, 89(2).
Block, N. & Fodor, J. What psychological states are not. Philosophical Review, 1972, 81, 159-81.
Chisholm, Roderick. Perceiving. Ithaca: Cornell Univemty Press, 1957.
Cummins, R. Functional analysis. Joumal of Philosophy. 1975, 72, 741-64.
Davidson, D. Mental events. In L. Swanson & J. W. Foster (Eds.), Experience and theory. Amherst,
University of Massachusetts Press. 1970.
Dennett, D. Content and consciousness. London: Routledge & Kegan Paul, 1969. Dennett, D. Why
the law of effect won't go away. Journal for the Theory of Social Behavior. 1975,
5, 169-87.

! *"!
Dennett, D. Why a computer can't fee1 pain. In: Synthese, 1978a,38,3.
Dennett, D. Brainstorms. Montgomery, vt.: Bradford, 1978b.
Feldman, F. Kripke’s argument against materialism. Philosophical Studies, 1973; 4 16- 19.
Fodor, J. Explanations in psychology. In M. Black (ed.) Philosophy in America. London: Routledge
and Kegan Paul, 1965.
Fodor, J. The appeal to tacit knowledge in psychological exptanation. Journal of Philosophy. 1968b,
65, 627-40.
Fodor, J. Special sciences, Synthese 1974, 28, 97-115.
Fodor, J. The language of thought. New York: Crowell, 1975.
Fodor, J., Bever, T. & Garrett, M. The psychology of language. New York: McGraw-Hill, 1974.
Fodor, J. & Garrett, M. Some syntactic determinants of sentential complexity. Perception and
Psychophysics, 1967, 2, 289-96.
Geach, P. Mental acts. London: Routledge & Kegan Paul, 1957.
Gendron, B. On the relation of neurological and psychological theories: A critique of the hardware
thesis. In R. C. Buck and R. S. Cohen (Eds.), Boston Studies in the philosophy of science VIII.
Dordrecht: Reidel 1971.
Grice, H. P. Method in philosophical psychology (from the banal to the bizarre). Proceedings and
Addresses of the American Philosophical Association. 1975.
Gunderson, K. Mentality and machines. Garden City: Doubleday Anchor, 1971. Harman, G. Thought.
Princeton: Princeton Univcrsity Press 1973.
Hempel, C. Reduction: Ontological and linguistic facets. In S. Morgenbesser, P. Suppes & M. White
(Eds.), Essays in honor of Ernest Nagel. New York: St. Martin s Press. 1970.
Kalke, W. What is wrong with Fodor and Putnam's functionalism? Nous, 1969, 3, 83-93.
Kim J. Phenomenal properties, psychophysical laws, and the identity theory. The Monist. 1972, 56
(2), 177-92.
Lewis, D. Pychophysical and theoretical identifications. Australasian Journal of Philosophy. 1972,
50(3), 249-58.
Locke, D. Myself and others. Oxford: Oxford University Press, 1968.
Melzack, R. The puzzle of pain. New York: Basic Books, 1973.
Minsky, M. Computation. EngleWood Cliffs, Prentice-Hall, 1967.
Mucciolo, L. F. The identity thesis and neuropsychology. Nous, 1974, 8, 327-42. Nagel, T. The
boundaries of inner space. Jounal of Philosophy. 1969, 66, 452-58.
Nagel, T. Armstrong on the mind. Philosophical Review, 1970, 79, 394-403.
Nagel, T. Review of Dennett's Content and consciousness. Journal of Philosophy. 1972, 50, 22l1-34.
Nagel. T. What is it like to be a bat? Philosophical Review. 1974. 83, 435-50.
Nelson, R. J. Behaviorism is false. Journal of Philosophy. 1969, 66, 417-52.
Nelson, R. J. Behaviorism, finite automata & stimulus response theory. Theory and Decision. 1975, 6,
249-67.
Nelson, R. J. Mechanism, functionalism and the identity theory. Journal of Philosophy. 1976, 73, 364-
86.

! *.!
Oppenheim, P. and Putnam, H. Unity of science as a working hypothesis. In H. Feigl, M. Scrivcn & G.
Maxwell (Eds.), Minnesota studies in the philosophy of science II. Minneapolis: University of
Minnesota Press, 1958.
Pitcher, G. A theory of perception. Princeton: Princeton University Press, 1971.
Putnam, H. Brains and behavior. 1963. Reprinted as are all Putnam’s articles referred to here (except
"On properties ') in Mind, language and reality: Philosophical Papers, (Vol. 2). London: Cambridge
University Press, 1975.
Putnam, H. The mental life of some machines. 1966. Putnam, H. The nature of mental states
(originally published under the title Psychological
Predicates). 1967.
Putnam, H. On Properties. In Mathematics, matter and method: Philosophical papers, Vol. I.
London: Cambridge University Press, 1970. Putnam, H. Philosophy and our mental life. 1975a.
Putnam H. The meaning of`meaning. 1975b. Rorty, R. Functionalism, machines and incorrigibility.
Journal of Philosophy, 1972, 69, 203-20.
Scriven, M. Primary Philosophy. New York: McGraw-Hill. 1966. Sellars, W. Empiricism and the
philosophy of mind. In H. Feigl & M. Scriven (Eds.), Minnesota studies in philosophy of science I.
Minneapolis: University of Minnesota Press, 1956.
Sellars, W. Science and metaphysics (Ch.6.). London: Routledge & Kegan Paul I968.
Shoemaker, S. Functionalism and qualia. Philosophical studies, 1975 27, 271-315.
Shoemaker, S. Embodiment and behavior. In A. Rorty (Ed.), The identities of persons. Berkeley:
University of California Press, 1976.
Shallice, T. Dual functions of consciousness. Psychological Review. 1972, 79, 383-93. Smart, J.J.C.
Reports of immediate experience. Synthese, 1971, 22, 346-59. Wiggins, D. Identity, designation,
essentialism, and physicalism. Philosophia. 1975, 5, 1-30.

! *'!

Você também pode gostar