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AULA
Reflexões metodológicas a
partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos
Metas da aula
Demonstrar como a experiência vivida e a exigência de rigor teórico
podem se conciliar na construção do trabalho científico e
relacionar projeto de pesquisa acadêmica, projeto político-
pedagógico e projetos comunitários, tendo como base o rigor
metodológico e o compromisso ético do produtor do conhecimento.
objetivos

Esperamos que, após o estudo desta aula, você seja


capaz de:
• realizar exercícios que contribuam de forma ativa
para uma reflexão e uma redação crítica
e autônoma de seu próprio objeto de pesquisa;
• identificar a importância social e o rigor
metodológico necessários nas três situações
mencionadas na aula: projeto de pesquisa,
projeto político-pedagógico e projetos comunitários;
• aplicar princípios metodológicos em situações
ligadas ao seu campo de investigação.
PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

“E no final, o amor que você leva é igual ao amor que você dá”
(Beatles,“The End”)

Leis e direitos

Numa parede da escola se encontravam as “leis”. Mais importante


que as leis era o fato de que elas tinham sido sugeridas e aprovadas
pela assembléia de alunos. Aquele documento representava a
vontade coletiva de crianças, professores e funcionários. Era o
seu “pacto social” de convivência. Lembro-me de alguns itens.
“Todas as pessoas têm o direito de dizer o que pensam sem
medo”(ALVES, R. A escola dos meus sonhos).

INTRODUÇÃO O trecho a seguir, assim como os demais que servirão de roteiro de discussão
nesta aula, foram extraídos de provas da disciplina Pesquisa e Projeto Político-
Pedagógico 1 do curso CEDERJ/Unirio.
As respostas dadas às atividades desta aula não dependem propriamente
de um conteúdo informativo disponibilizado antes dos exercícios, mas da
incorporação de uma perspectiva que busca fazer do aluno um pesquisador
autônomo. Isto significa que o aluno deve levantar dados e superar
preconceitos sociais e institucionais. Superar os roteiros tradicionais das aulas
também é uma atitude política que deve ser avaliada e reavaliada criticamente
pelos alunos, que são também avaliadores do material didático a partir de
critérios institucionais.
Por isso, antes de qualquer conteúdo que direcione e apenas informe,
você deve se dispor a ler mais um fragmento do texto de Rubem Alves
– utilizado nas demais aulas – e responder ao desafio político e didático
colocado a partir da reflexão tecida nas aulas anteriores de PPP 6: fazer da
monografia um símbolo dos primeiros ideais e compromissos dos jovens
educadores; estabelecer uma interação com os chamados orientadores
que traga contribuições humanísticas e supere a mera utilidade técnica;
pensar na disciplina da pesquisa qualitativa científica sem perder o prazer,
a criatividade e a ludicidade possíveis nas atividades humanas; e manter uma
postura crítica diante do mundo e das práticas institucionais e acadêmicas.
O fio condutor comum a todas as aulas – as questões políticas e metodológicas
existe e pode ser sintetizado dizendo que os sonhos pessoais e coletivos, de
educadores e de acadêmicos podem conviver. O rigor ético e o compromisso
com a produção e socialização do conhecimento devem existir dentro e fora
dos espaços acadêmicos.

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MÓDULO 1
ATIVIDADE

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AULA
1. Leia a seguir os dois fragmentos de Rubem Alves e escreva sobre o
que refletiu, evidenciando o caráter político e os aspectos metodológicos
envolvidos nas duas situações relatadas. Lembre-se de recuperar o espírito
das aulas de PPP 6 e praticar a arte de ver a realidade cotidiana com a
postura de um aluno pesquisador.

Essa rede livre de comunicação, responsabilidade e ajuda estava


silenciosamente exibida em dois quadros afixados na parede. Num
deles estava escrito: Preciso que me ajudem em, no outro, Posso
ajudar em. Qualquer aluno que esteja com um problema, antes de
procurar a professora, escreve o seu pedido no primeiro quadro:
Preciso que me ajudem em regra de três, e assina o nome, Fátima,
por exemplo. Aí, o Sérgio, passando pelo quadro, vê a mensagem da
Fátima e pensa: A Fátima não sabe regra de três. Eu sei. Vou ajudá-
la. E isso acontece naturalmente, é parte do cotidiano da escola.
Não é preciso pedir licença à professora e nem há hora certa para
se fazer isso. O segundo quadro é o contrário: quando um aluno
se sente competente em um saber, ele o anuncia aos colegas e se
coloca à disposição. A capacidade de ensinar um saber a alguém
vale por uma avaliação. E é o aluno quem a faz. É ele que se sente
competente. Assim vão eles praticando as virtudes de ensinar, de
aprender e de se ajudarem uns aos outros.

Voltei à Escola da Ponte em 2001. Perguntei sobre o tribunal.


O professor José Pacheco contou-me que o tribunal não existia mais.
Fora abolido pela assembléia. Percebeu-se que ele era uma instância de
punição e não de recuperação. E passou a relatar-me o incidente que
produzira a sua dissolução. Um aluno violento fora levado ao tribunal
para responder por uma agressão. A assembléia da escola nomeou,
como de praxe, um advogado de acusação. O réu escolheu um colega
para defendê-lo. A assembléia se reuniu para o julgamento. A acusação
foi devastadora, disse-me o professor José Pacheco. Reuniu as provas
e estabeleceu de forma cabal a culpa do réu. Eu pensei: ele está perdido,
não há saída. Entrou em ação o advogado de defesa. Ele não negou o que
fora apresentado pela acusação, nem apresentou fatos que minimizassem
a culpa do réu, mas lembrou aos membros do tribunal que todos eles
eram cristãos, freqüentavam a missa e o catecismo. E que, na igreja, se
ensinava que o amor nos leva a ajudar aqueles que estão em dificuldades.
Concluiu: ‘Pois esse colega tem estado em dificuldades há muito tempo
e todos sabíamos disso`.

E agora estamos prontos a puni-lo. Antes que o tribunal dê a sentença,


e em nome da nossa coerência, quero que respondamos o que fizemos
para ajudá-lo. Esse foi o fim do tribunal. No seu lugar estabeleceu-se uma
comissão de ajuda. Hoje, na Escola da Ponte, quando algum aluno começa
a apresentar problemas de comportamento, essa comissão se adianta
e nomeia colegas para ajudá-lo, com a missão de estar sempre por perto

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PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

do dito aluno. E, quando se percebe que ele vai fazer algo inadequado, os
colegas entram em ação para tentar dissuadi-lo.
(ALVES R. A escola dos meus sonhos)

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RESPOSTA COMENTADA
Nos fragmentos apresentados você pode perceber como a
capacidade e as dificuldades de cada aluno (e suas percepções e
explicitações) permitem construir uma auto e uma heteroavaliação
criativa, desde que encontrem espaços institucionais para isto; desde
que façam parte do projeto político-pedagógico vivo e cotidiano de
uma escola ou grupo.
Levada ao extremo, esta atitude pode ser o instrumento de
construção de uma identidade coletiva, de uma rede de ações
coerentes, solidárias e educativas e não apenas de práticas punitivas
e de rotulação e estigma social. A indisciplina, os “alunos problemas”
e o castigo podem ser enfrentados analiticamente e politicamente
tomando como ponto de referência esta ilustração verídica de uma
escola que foi considerada “sem solução” pelas políticas e pelos
educadores burocratas e conservadores.

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MÓDULO 1
AS IMPRESSÕES, REPRESENTAÇÕES VALORES E PRÁTICAS

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NO DIA-A-DIA ESCOLAR

AULA
Vamos analisar um primeiro relato dramático – de uma série de
depoimentos de alunos da disciplina de PPP1 do nosso curso – destacando
os aspectos metodológicos relevantes para quem, como você, reflete e
escreve o trabalho final do curso que está concluindo. Possivelmente os
depoimentos utilizados nesta aula encontrão eco em outros educadores,
estudantes e professores, pois estas não são vozes isoladas, mas são
representações sociais compartilhadas por quem vivencia a realidade
brasileira. Portanto existem motivos metodológicos e éticos para
homenagear os alunos reconhecendo sua voz política.

Quando comecei a ler sobre as aulas de PPP1, fiquei encantada


como deveria ser feito na escola onde trabalho o PPP e comecei
a questionar e a querer saber.

Percebi que não acontece nada do que o livro propõe. A equipe


pedagógica não dá informações, só fica na sala de orientação
conversando com alunos e solicitando que cada professor monte
projetos individuais. Ex: idoso, folclore.

Sugeri que reunissem todos os professores e construíssem um


projeto único para toda a escola. Obtive ‘não’ como resposta; que
cada professor deveria fazer o seu. Não temos mais reuniões com
todos os professores juntos. Acredito que seja porque comecei a
questionar demais.

Quero e vou ser uma professora pesquisadora e investigadora, mas


não sei nem por onde começar. Estou tentando ter acesso ao PPP
da escola.

O tratamento conferido a este e aos demais fragmentos não


priorizará uma análise pontual das situações narradas, mas destacará
as dimensões que podem direcionar e redirecionar a postura de alunos
e professores diante do mundo institucional.
Percebe-se que o entusiasmo e a curiosidade expressos no
depoimento da professora são violentamente podados pela lógica da
frieza institucional e pelas estratégias autoritárias que dissimulam
este autoritarismo e fragmentam a ação política coletiva no mundo
organizacional escolar.

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PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

Mas a protagonista do caso mencionado não abandona seu


propósito de cidadã e educadora, lançando uma dúvida no ar – não
saber por onde começar.
Para tentar responder por onde “começar a ser uma professora
pesquisadora e investigadora” – como merecidamente anseia a anônima
aluna do curso – e estabelecer um ponto de ligação com as dúvidas que
afligem os alunos no momento da produção dos trabalhos de conclusão
de curso – é necessário desfazer alguns preconceitos que pairam no
mundo escolar e acadêmico.
O primeiro deles é o de que monografia não tem nada a ver com
projeto político-pedagógico e muito menos com projetos comunitários.
Pode não coincidir com os interesses corporativos e fragmentados
existentes no mundo das instituições de ensino; ou com o descompromisso
político e ético que nossas práticas e estudos cansam de nos ensinar.
A relação existente está nos princípios que fundamentam a
produção de conhecimento (seja de que espécie for) e até no caráter crítico
e no rigor de estratégias de luta que a Ciência possui em potencial.
A aluna, autora do trecho reproduzido, já tem o teor crítico e
a indignação “científica” que não devem ser perdidos em nome de um
suposto refinamento acadêmico. Esta premissa serve também para o
momento da produção monográfica que não deve estar esvaziada de
compromisso com a revisão da realidade vivenciada na sociedade e nas
instituições de ensino desde o momento da escolha do tema, até o momento
da escrita do trabalho, passando, certamente, pelo trabalho de campo.

QUAL A RELAÇÃO ENTRE PESQUISA MONOGRÁFICA,


PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO E PROJETO
COMUNITÁRIO?

Monografia
Existe um certo equívoco em se dizer que a monografia é um
trabalho individual, solitário, e que o projeto político-pedagógico é uma
produção coletiva, por isso devendo ser mantido longe das preocupações
e produções acadêmicas dos graduandos.
Qualquer momento de escrita é tecnicamente individual. No
entanto, tanto o conhecimento em linhas gerais, quanto uma pesquisa
são frutos de uma interação, de um diálogo. A pesquisa monográfica
é, portanto, uma produção coletiva. Sempre existirá alguém que será

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MÓDULO 1
o secretário, o escriba, o relator, o escrivão de um debate coletivo. Tal

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distinção – a partir do caráter individual e coletivo – entre monografia

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e projeto político-pedagógico parece esconder intenções de enfraquecer
o compromisso coletivo da educação e exacerbar a ideologia do mérito
individual. O que parece mais plausível: concentrar esforços práticos e
teóricos para a análise de uma realidade que conhece e participa, ou escrever
sobre um tema monográfico imposto pelos interesses acadêmicos?
Esta pergunta não tem por intenção criar mais um mal-entendido
dentre outros já existentes. Sabemos, por exemplo, que, por vezes, pode
haver uma confusão entre um plano de ação limitado a uma turma ou
unidade escolar e um projeto político-pedagógico. A realidade local
precisa, certamente, fazer sentido dentro de um campo político teórico
mais amplo. Mas se o projeto político é algo maior em extensão, em
fundamentação teórica e em estratégias de participação real das pessoas,
pequenas atitudes como as descritas por Rubem Alves são ilustrações de
mudanças estruturais. O quadro de avisos ou a comissão de ajuda que
aparecem nos fragmentos fornecidos para a Atividade 1 poderiam ser
quaisquer outras coisas, mas com o mesmo significado.
O importante é que não se percam as motivações que surgem ou
se visualizam nas situações vivenciadas nas práticas cotidianas. Ampliar
as possibilidades de diagnósticos, fortalecer as bases teóricas a partir
das quais conhecemos a realidade não requer abandono ou diminuição
das dimensões do universo microssocial. É importante ampliar a visão
da educação para fora do espaço da sala de aula – o que já é feito por
muitos, como os depoimentos evidenciam, quando se referem à relação
escola, família, trabalho etc.

Projeto Político-Pedagógico
O que é um projeto político-pedagógico? Uma bússola, um norte,
uma direção para a vida da escola, para o futuro dos alunos? É assim
que aparece nas representações sociais das professoras:
“O PPP é a vida da escola num documento.”
“Ele é a direção para a escola.”
“Ele é um parâmetro, a bússola da escola.”
“O PPP existe para mudar, para melhorar a educação, a escola
como um todo. É para termos um norte em nossos objetivos e
não ficarmos andando em círculo, repetindo erros sem chegar
à qualidade necessária para o trabalho educacional.”

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PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

“Não conseguimos alcançar nenhum objetivo com o nosso


aluno sem antes desenvolver um projeto...”
“Um projeto poderá mudar o futuro de nosso aluno.”
(Trechos da avaliação de PPP 1 – CEDERJ/Unirio)

Vale mencionar que os diversos depoimentos, mesmo que


parecidos em seu conteúdo, pertencem a cidades distantes do interior
do Rio de Janeiro. Além disso, a questão formulada na prova de
onde foram extraídos, era uma questão aberta, em momento algum
direcionava as respostas dos alunos. Isto aumenta o valor da convergência
das representações sociais e da indignação política contida nestes
depoimentos. Tal questão de prova não foi aplicada pensando na
produção do material das aulas de PPP 6. Foi inserido aqui como forma
de demonstrar o potencial da pesquisa e para confirmar o valor ético e
político de suas colocações.
Os relatos a seguir apontam na mesma direção, acrescentando de
forma explícita a importância metodológica e estratégica da pesquisa
aplicada ao projeto educacional:
“O PPP existe para fazer uma avaliação da metodologia
aplicada, dos recursos utilizados, enfim, uma análise de sua
escola.”
“Se é obrigatória a participação dos professores na
formulação do PPP (LDB 9.394/96), por que, em muitas escolas,
os professores nem conhecem os PPPs que os regem?”
“A escola deveria ter um espaço de tempo reservado para
este trabalho tão importante, pois é nesse momento que podemos
refletir sobre as atitudes que estamos tomando, corrigir o que não
deu certo e planejar para a mudança e para o sucesso.”
“O PPP deve ser elaborado com o envolvimento de todos
os membros da escola, mas infelizmente não é isso que acontece na
realidade. Muitas vezes apenas os diretores e os coordenadores são os
responsáveis pela construção do projeto, colocando, assim, o corpo
docente e os funcionários em geral à margem deste processo.”
Você deve estar percebendo que os fragmentos disponibilizados
foram frutos de um trabalho de seleção metodologicamente estratégico.
Eles não foram lançados arbitrariamente, inclusive porque fontes
primárias não falam por si só. No entanto, para evitar um direcionamento
prejudicial neste momento de sua produção de trabalhos de final de curso,

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MÓDULO 1
você deve utilizá-los – como já foi dito na Introdução desta aula – não

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como material informativo, mas como roteiro para uma atitude ativa e

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investigadora de sua parte. Sugiro a seguinte atividade prática:

ATIVIDADE

2. Independentemente do tipo de trabalho de final de curso que estiver


fazendo, procure uma instituição de ensino e entreviste diversos segmentos
– alunos, funcionários e diretores. Avalie o grau de conhecimento, informação
e participação que cada setor tem a respeito do projeto político-pedagógico.
Compare os depoimentos obtidos com os encontrados nesta aula. Não se
esqueça de elaborar um roteiro mínimo de situação de entrevista antes de
ir a campo. A seguir selecione alguns depoimentos e explicite os critérios
utilizados para os fragmentos selecionados.

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RESPOSTA COMENTADA
A atividade tem por objetivo a reflexão das fronteiras, ambigüidades
e paradoxos existentes entre as diretrizes institucionais e o universo
dos segmentos que compõem a instituição de ensino visitada. Sua
capacidade de elaboração de um roteiro e os critérios para a análise
do material serão igualmente úteis para exercitar as habilidades
necessárias para a produção da pesquisa monográfica. Escreva
livremente sem se preocupar com limites de laudas.

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PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

De volta aos depoimentos analisados, é lamentável constatar que,


se por um lado há o reconhecimento da importância das dimensões que
envolvem a pesquisa e o projeto político-pedagógico, por outro lado, há a
percepção do artificialismo (do distanciamento dos ideais programáticos
com as práticas dos grupos) do PPP nas instituições de educação. E o
pior – com a cumplicidade dos professores.
“A minha escola não tem projeto político pedagógico
e a carência de auxílio pedagógico é muito grande. A maioria
dos professores ainda está apenas preocupada em transmitir
conhecimento sem levar em conta o que e como poderia
melhorar a aprendizagem do aluno.
“Sem falar na questão da disciplina, que a professora
só sabe dizer que não agüenta mais tais alunos e que fulano
não tem jeito.”
“O projeto político-pedagógico foi feito para
eliminar a carência da aprendizagem. Hoje em dia o que
mais vemos nas escolas são alunos que, pela idade, já
deveriam estar lendo, ou vivem repetindo a série.”
“O projeto político-pedagógico foi construído para
aperfeiçoar a melhoria dos educandos nas escolas, formando
assim, professores pesquisadores capazes de articular,
estabelecer, interagir e estarem voltados para a realidade do
aluno, modificando assim o universo em que vivem.”
“Participei, ano passado, da construção do projeto
político-pedagógico da escola em que trabalho e confesso
que foi uma experiência confusa e, no fim, sem propósito.
Nos foi entregue um guia que deveria ser seguido, mas
apresentava questões que não condiziam com a realidade
da escola, pedia soluções quase impossíveis e não esclarecia
como deveríamos formulá-las.”
(Trechos da avaliação de PPP 1 – CEDERJ/Unirio)

Analisemos agora a relação entre projeto político pedagógico,


pesquisa e produção acadêmica.

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MÓDULO 1
Projeto Político-Pedagógico, Pesquisa e Produção Acadêmica

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Alguns trechos dos depoimentos deixam mais evidentes a

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importância metodológica (e suas respectivas etapas) da pesquisa e do
projeto político-pedagógico e o salto qualitativo do caso individual para
uma perspectiva mais ampla. Podemos perceber ainda a possibilidade de
conciliar pesquisa escolar e acadêmica. Isto poderia ocorrer através de
vínculos criados entre escola e universidade, mas também, fazendo com
que os professores assumam seu papel de pesquisadores.
A preocupação com a “solução” de problemas, com o “retorno”
que os professores poderiam dar, indicam uma visão ampla do papel da
educação. Não parece existir ingenuidade ou confusão entre o papel da
pesquisa e do projeto político-pedagógico e ações de trabalho limitadas
a situações pontuais sem maiores implicações.
Na seqüência dos depoimentos aparecem respectivamente tais
dimensões metodológicas e a interação entre escola e universidade:
“O projeto político-pedagógico é um dos maiores
solucionadores de situações problematizadoras na prática
de ensino. Partindo desta situação, o professor, no caso de
uma escola, vai investigar, pesquisar, questionar para que
se inicie uma pesquisa na resolução de um problema. Daí é
feito um trabalho cujo objetivo é alcançar todos os alunos
possíveis, para que a dúvida de uns dê a solução de muitos.
Um projeto também visa ao desenvolvimento de outras
dificuldades, embora haja muitos que não enxerguem; ele
vai além do que os olhos podem ver. Cabe a cada professor
fazer valer o desenvolvimento deste e o resultado será
obtido conforme a ação do professor... Enfim o projeto
político-pedagógico inicia-se com uma situação problema
e finaliza com a solução.”
“Abre a possibilidade de os professores pesquisadores
apresentarem suas práticas cotidianas aos professores
acadêmicos e juntos encontrarem soluções e respostas que
favoreçam também a comunidade.”
Poderíamos acrescentar no título deste subitem “Projeto
Político-Pedagógico, Pesquisa e Produção Acadêmica” a
expressão resultados – Projeto Político-Pedagógico, Pesquisa
e Resultados: Escolares e Acadêmicos.

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PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

“A escola que trabalha com um projeto político-


pedagógico bem elaborado tem muitas vantagens a curto
prazo e a longo prazo.”
(Trechos da avaliação de PPP 1 – CEDERJ/Unirio)

No tópico a seguir, a discussão a respeito dos fundamentos e das


estratégias que norteiam as práticas educacionais com vistas aos belos
ideais programáticos vai se ampliando ainda mais.

Projeto Comunitário
O termo projeto comunitário não é utilizado aqui com nenhum
grande rigor acadêmico. Refere-se a atitudes culturais, práticas, analíticas
que extrapolam o ambiente escolar formal e que mantêm uma certa
autonomia em relação à cooptação da burocracia pública e do peleguismo
das associações comunitárias.
Os trechos a seguir irão demonstrar o quanto muito do que se faz
ou se poderia fazer em uma escola tem ou poderia ter de saldo positivo
para além da escola, ou da chamada “comunidade” (termo já muito
esvaziado de sentido assim como muitos outros como participação,
cultura, cidadania).
Esta forma clara e aparentemente ingênua de se referir ao potencial
das transformações, que têm como espaço simbólico a escola, pode
encontrar eco em muitas análises consideradas de sucesso no mundo
acadêmico. Os depoimentos a seguir compartilham do espírito dos
projetos de extensão universitária. No seu limite estariam os projetos
tipicamente comunitários desenvolvidos com pastorais, associações,
grupos de religiosos, organizações não-governamentais, movimentos
sociais como o dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), grupos de
artistas independentes e assim por diante:
“Podemos melhorar a integração social, até mesmo
familiar, criando projetos onde possamos trazer a família
para a escola, ou até mesmo levar a escola até a família.”
“O PPP bem elaborado trata inclusive das ações em
que a escola pode ajudar os alunos fora dela.”
“Um PPP é um planejamento em cima de planejamentos
anteriores da escola.”
“É através do PPP que se torna mais real a nossa
vontade de uma educação mais qualificada para os nossos
alunos.”

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MÓDULO 1
“Existem pessoas que acham que o PPP é só uma

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exigência do governo e que devemos fazê-lo para garantir

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verba (na escola pública) e não para executá-lo.”
“Projeto político porque se almeja formar cidadãos
capazes de viver em sociedade; e pedagógico pois objetiva
formar professores críticos, reflexivos no seu cotidiano
escolar.”
“O PPP ajuda a minimizar a dicotomia existente em
nossa sociedade entre aqueles que ‘sabem’ e aqueles que
‘não sabem’. Os que sabem elaboram propostas brilhantes
e os que não sabem executam tais propostas.”
(Trechos da avaliação de PPP 1 – CEDERJ/Unirio)

Seria possível falar-se mais de projetos estritamente “comunitários”.


No entanto, basta, por hora, fazer duas observações. A primeira é a de
que um levantamento de dados – tanto no mundo escolar, como em outros
espaços em que a exploração material e a cultural são intensas – deve
ser equilibrado com um levantamento de impressões menos formais.
Dados formais devem ser conhecidos, mas não é aconselhável limitar-se
a eles, com o risco de reproduzir os estéreis diagnósticos de problemas
insolúveis na prática.
A segunda observação é a de que o esforço necessário a qualquer
tipo de diagnóstico, de pesquisa é relevante, trate-se de um projeto
comunitário, popular, de uma pesquisa, escolar ou acadêmica. Não
podemos classificar de forma preconceituosa tais esforços intelectuais e
políticos em uma escala hierárquica de estilo evolucionista. Os esforços
de levantamento de dados e impressões; as articulações políticas
preliminares e permanentes que viabilizam um projeto; o transitar no
difícil terreno das verdadeiras alianças políticas (em terrenos onde às
dificuldades materiais somam-se as ideológicas), típicas dos projetos
comunitários são tão grandes quanto os levantamentos bibliográficos;
as justificativas teóricas e o rigor metodológico exigidos nas pesquisas
acadêmicas escolares.

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PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

Figura 5.1:Cartão comemorativo do dia 15 de maio – Dia do Assistente Social do


Conselho Regional de Serviço Social do Rio de Janeiro. As amplas metas de justiça
social que incluem educação, liberdade, trabalho, igualdade e saúde, não são
propriedade exclusiva de nenhum segmento, deve ser de todos nós.

ATIVIDADE

3. Faça uma consulta na internet e acesse alguns sites (www.mst.org.br,


www.greenpeace.org.br, www.une.org.br, www.pastoraldacrianca.org.br) de
movimentos sociais como o movimento estudantil, o movimento ecológico,
o movimento dos trabalhadores rurais sem-terra, movimento indígena e
analise suas produções educativas, suas bibliotecas virtuais. Produza um
comentário a respeito dos conteúdos consultados. Acrescente um comentário
sobre suas impressões subjetivas, valorativas em relação aos movimentos
pesquisados. O objetivo é ampliar as fontes de pesquisa, alargando a visão
dos agentes e agências sociais existentes na sociedade.

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MÓDULO 1
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PARA ALÉM DAS FRONTEIRAS DA “ESCOLA” E DA
“COMUNIDADE”

A divisão dos depoimentos feita a partir das palavras-chaves


Monografia,; Projeto Político-Pedagógico, e Projetos Comunitários
não é suficiente para dar conta da riqueza do material e das possíveis
análises. Uma análise mais demorada do material extrapolaria os limites
possíveis nesta aula. Mas é certo que serão as mesmas autoras anônimas
destes depoimentos que os estarão reencontrando e ressignificando suas
próprias concepções, valores e propostas metodológicas e políticas.
“Quando tentamos aplicar o que é certamente
melhor para os nossos alunos, somos cortados e não
podemos fazer desse jeito, porque o prefeito não gosta, a
secretaria de educação não quer, e se insistirmos, iremos
perder nosso emprego. Na teoria é fácil, mas na hora da
prática fica superdifícil, ainda mais quando o município
envolve muita politicagem.”
“É um compromisso de toda a comunidade escolar
para construirmos uma escola de qualidade onde todos
estejam felizes. Que seja uma escola onde o aluno goste
de freqüentar.”

Os dois últimos fragmentos transcritos sinalizam para o fato de


que as fronteiras entre a escola e o mundo social podem ser resgatadas
não apenas nas reflexões, mas nos dilemas que impulsionam a vida. A
opressão institucional afeta a escola, o aluno e o professor – professor
este que, apesar de todos os problemas e limitações, continua tendo no
seu horizonte de esperanças e lutas a felicidade e o gosto pela descoberta
do mundo.

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PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

ATIVIDADE

4. Escolha uma história infantil que possibilite a discussão metodológica


e política sobre o significado do espaço escolar na formação integral do
cidadão. Ao narrar a história no estilo de uma redação, destaque elementos
que povoam a realidade prática, os objetivos, as cores, as representações e
os afetos das crianças – sonhos, atitudes dos colegas e dos educadores.
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RESPOSTA COMENTADA
Para tornar as reflexões finais desta aula mais suaves e sintonizadas
com o universo infantil, deixe-se levar por uma das diversas histórias
infantis existentes que têm como cenário a própria escola. A leitura
será uma espécie de recompensa ao seu trabalho de pesquisa
bibliográfica. Procure mergulhar no mundo infantil sem perder todo
o caráter crítico desenvolvido ao longo destas aulas. Faça como o
poeta Carlos Drummond de Andrade e prepare uma canção “...que
faça adormecer as crianças e acordar os homens.”

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MÓDULO 1
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AULA
ATIVIDADE FINAL

Acesse o site do Ministério da Educação www.mec.gov.br e faça um levantamento


sobre os diversos programas existentes no campo da educação – do orçamento à
merenda, da informática aos projetos de leitura. Reflita sobre como estes projetos
estão incorporados nas escolas de sua localidade.

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CEDERJ 65
PPP 6 | Reflexões metodológicas a partir da dimensão política
dos projetos pedagógicos

RESPOSTA COMENTADA
Tal conhecimento a respeito dos programas do Ministério da Educação
que norteiam o mundo escolar é fundamental para diversos projetos
monográficos e sociais, sem dúvida, pela importância que têm para
a formação e trajetória dos professores. Esta atividade procura
não direcionar as atividades especificando um ou outro programa,
justamente para lembrá-lo de que, quando se conclui uma etapa da
formação, há sempre a necessidade de renovar a disposição para a
organização de dados básicos que emolduram as reflexões no campo
da educação.

RESUMO

Espera-se de um resumo não apenas um relato da aula, mas uma síntese de


conceitos ou idéias chaves. Noções de pesquisa, metodologia, ciência, balizadas
por uma conduta ética e crítica, estão presentes no formato das aulas e dos
exercícios. A própria proposta da aula é exercitar toda uma postura autônoma e
criativa trabalhada ao longo da disciplina e até mesmo do curso. No início desta
aula – recapitulando o propósito da disciplina – procurei situar a monografia como
um símbolo dos primeiros ideais e compromissos dos jovens educadores (Aula 1),
estabelecendo uma interação com os chamados orientadores com vistas a superar
a mera utilidade técnica (Aula 2); pensar na pesquisa qualitativa científica sem
perder a disciplina, o prazer, a criatividade e a ludicidade possíveis nas atividades
humanas (Aula 3); e manter uma postura crítica diante do mundo e das práticas
institucionais e acadêmicas (Aulas 4 e 5). O fio condutor existente entre as aulas
– as questões políticas e metodológicas – pode ser sintetizado lembrando que os
sonhos pessoais e coletivos, de educadores e de acadêmicos, podem conviver. O
rigor ético e o compromisso com a produção e a socialização do conhecimento
devem existir dentro e fora dos espaços acadêmicos.

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AULA MÓDULO 1
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