Era de longe a paciente mais estranha daquela casa. Provavelmente
desde a construção da mesma. O lugar havia sido feito em 1943, para atender a demanda de soldados ingleses feridos na Segunda Guerra. Mais precisamente, dos que haviam perdido alguma parte de seu corpo. O trabalho geral da casa era a produção de próteses, e recuperação dos pacientes, assim como a reintegração deles no dia a dia. Fora financiada pela senhora Devitt, cujo o sobrenome dava o título do hospital. Na verdade, a própria estrutura era uma antiga casa de veraneio da burguesa, com exatos catorze quartos. Quando foi recebida, a pintura branca estava desgastada, e todos os móveis haviam sido retirados do lugar. Mas agora, três anos depois, a pintura havia sido totalmente lixada, e as tábuas velhas das paredes haviam sido trocadas por novas, feitas de carvalho e envernizadas. Treze quartos continham uma janela pequena, decorada com uma cortina branca de seda. Haviam recebido um criado mudo, que ficavam ao lado de uma cama, cada um com um belo vaso de cerâmica, onde a maioria dos pacientes deixavam as flores que ganhavam. Haviam barras de madeira para o apoio e todos os quartos continham um urinol. O quarto restante era destinado a produtos de limpeza e enfermaria. A enorme cozinha havia recebido um forno industrial, e a grande mesa de jantar era utilizada por todos os pacientes capazes de se levantar da cama. A sala de estar havia sido despida de todos os objetos decorativos e fora posto uma enorme mesa para servir como uma escrivaninha, e logo foi identificada como uma sala de espera, apesar da ausência de sofás ou poltronas, para o conforto dos clientes. Não faziam grande falta, pois o chalé era isolado, ficando a quarenta e três quilômetros do centro de Londres. Era um dia de viagem a carroça e duas horas no carro. Ela havia chegado em novembro, de 1945. Havia se recuperado completamente em fevereiro de 1946, mas quem veio buscá-la somente apareceu em maio daquele ano. Então irei descrever de forma rápida a estadia da garota naquela casa. Havia aparecido em um uniforme inglês esfarrapado, com sangue nos cabelos e poeira sobre seus ombros. Tinha quebrado o braço esquerdo e havia conseguido várias contusões ao longo de seu corpo. Quando lhe foi inferido, soube responder com precisão seu nome e sua idade. Violet Oakwood, e apesar de não saber seu aniversário, oficiais superiores de seu esquadrão acreditavam que ela tivesse por volta de dezesseis anos, no final daquele ano, dezessete. A jovem falou que não tinha parentes consanguíneos vivos, e que a única pessoa que era responsável por ela era o Capitão Robert Willians, que não podia ser contatado, pois havia perdido seus dois braços em batalha. Não, não sabia se ele estava vivo. Não, não sabia nem ao menos sobre os relatórios de sua última batalha. Respondeu todas aquelas perguntas com calma e destreza, com o linguajar de alguém muito mais maduro do que a idade aparentava. Após um banho tomado com delicadeza, Violet mostrou ter cabelos loiros sedosos, da mesma cor do trigo, e olhos azuis como uma safira. Não demonstrou nenhuma reação quando colocaram o osso de seu braço no lugar, nem quando tiveram que lhe fazer pontos em vários ferimentos de faca. Nos sete meses que ficara na casa, não falou nada, a não ser que lhe fosse estritamente necessário, ou quando os médicos lhe faziam perguntas sobre seu bem-estar. Todos os dias, os pacientes que conseguiam ou sabiam escrever ganhavam um pedaço de papel e uma caneta tinteiro, os quais usavam para escrever cartas para seus parentes queridos. Violet Oakwood havia aceitado fazer parte do exercício, apesar de se recusar a fazer todos os outros. Insistia em comer em seu quarto, com a argumentação de que não precisava de interações com os outros pacientes. Também se recusara a dar uma volta pela casa, assim como todos os outros, apesar de fazer caminhadas ocasionais em círculos dentro de seu próprio quarto. Passava a maior parte do tempo, olhando pela pequena janela de seu quarto, e quando aceitou o papel, a enfermeira se tornou estranhamente esperançosa. Todos no hospital se compadeciam do estado dela, e cada progresso em seu comportamento era uma vitória para toda a equipe médica, que não se preocupava somente com o estado de saúde de seus pacientes, mas também com o estado mental. E parecia que a guerra havia abalado toda a mentalidade de Violet. Aquele era o primeiro sinal de que a sanidade da garota ainda estava intacta, e que talvez, somente talvez, a garota poderia esquecer todo este trauma de guerra, e viver uma vida normal. A esperança da equipe médica durou dois dias, até eles perceberem que as cartas que a misteriosa jovem escrevia, na verdade, eram relatórios militares de sua própria recuperação, que ela insistia não estar debilitada o suficiente para tirá-la da guerra. Todas eram enviadas para o Major Comandante Robert Willians. Apesar da aversão de vários médicos, foi resolvido que ao menos, a garota se dedicar tanto as cartas era um passatempo melhor do que a inatividade anterior. Passou-se assim, sete meses. No sexto mês, foi lhe dado alta, e sua sanidade foi provada intacta, apesar de parecer que a garota ainda estava sofrendo dos traumas da guerra. Em todo esse tempo, Violet Oakwood nunca sorriu, nem saiu de seu próprio quarto, e nem falou nada além do necessário. Nunca chegou a conversar realmente com ninguém, mas escreveu cartas diárias para o Capitão, sendo que nenhuma delas foi enviada. Nesta época, chegou uma carta de um sargento à casa. A carta havia sido obviamente escrita por Autômata. Violet nunca chegou a saber o conteúdo exato da carta, mas a mensagem havia sido clara. O sargento à buscaria em um mês e a levaria para sua residência, onde ele se disporia a todos os custos que ela lhe infringisse, por ordem de seu Major Comandante. Toda a equipe médica comemorou naquele dia, pois tinham grande preocupação com o futuro da jovem, que não tinha pais e nem parentes vivos, mas a notícia foi recebida pela mesma indiferença que a garota demonstrava a toda novidade que lhe era dada, apesar de que no fundo, estava feliz por finalmente voltar as linhas frente da batalha. No sétimo mês, ela mesma se encarregou de arrumar seus poucos pertences em uma mala gasta que lhe foi providenciada pelo próprio Devitt. Estes eram dois uniformes verdes da guerra, e um par de botas extras. Não tinha nenhum pertence a mais. Ela ganhou roupas do hospital, um belo vestido que não cabia mais em alguma médica do local. Era preto em branco, extremamente simples, apesar de não combinar com as botas que Violet usava. Seu cabelo foi penteado até brilhar e preso em uma linda trança, com uma fita vermelha. A única coisa que realmente usava para o enfeite era um broche de prata em formato de lobo. E o mais importante, Violet se recusou a tirar a máscara de porcelana que cobria seu rosto. Quando o enorme carro castanho chegou, Violet foi levada para fora, com sorrisos e aconchegos. Os médicos lhe davam um adeus alegre, e enfermeiras choravam com lenços em suas mãos. Violet não se importou e não demonstrou reação por baixo da prótese que usava em seu rosto. Mas apesar de tudo, no fundo sentiu alegria. Alegria por finalmente sair para o lado de fora, depois de sete meses de recuperação naquela grande casa com cheiro de morte, remédios, e de doença. Ela se dirigiu até o chofer, que lhe deu um sorriso aconchegante e abriu a porta do carro. Usava um elegante colete negro, com direito a gravata e calças da mesma cor. Usava sapatos de couro, e parecia ter algo entre cinquenta e setenta anos. Tinha o cabelo grisalho e ostentava um belo bigode. Fechou a porta do carro, e entrou nele, no lado do motorista. Após alguns minutos de viagem, Chris rapidamente percebeu que o homem se sentia incomodado com a falta de conversa e a máscara brilhante em seu rosto, que a deixava sem expressões. Mal sabia ele que ela nunca demonstrara nada. Com ou sem máscara. Quando o motorista abriu a boca, a senhorita Oakwood foi mais rápida. - Não é uma máscara. É uma prótese. E não quero falar sobre este assunto. Somente me leve ao major comandante e seu trabalho estará completo. O chofer não soube o que responder. Não sabia que a garota que buscaria era tão estranha. Estranha não era a palavra certa. A jovem parecia quebrada. Seria uma longa viagem de três dias.
Capítulo Um
Era quente. As luzes a cegavam, permitindo que suas pupilas focassem
somente no uniforme puído, mas bem arrumado do homem a sua frente. Ela piscou, tentando afastar aquelas duras memórias de sua cabeça. Olhou para o broche de raposa em exposição. Era prateado. Não brilhava demais. Era simplesmente cinzento. “Parecem seus olhos”, ouviu-se dizendo. Parecem seus olhos. Parecem seus olhos. Parecem seus olhos. Piscou com força os olhos, tentando afastar o fluxo de pensamentos que percorriam por sua mente. Aquilo acontecia bastante desde que fora afastada do Major Comandante. Fluxos de memórias intermináveis passavam por sua cabeça, se enroscando como cobras em seu cérebro. Memórias calorosas do homem de cabelos negros mal penteados e olhos brilhantes cinzentos. Um homem que ela nunca vira sem algum uniforme militar. O homem que ela tinha que se reportar a todo momento, esperando novas ordens. Violet Oakwood sabia que, a partir do momento que o Major entrasse pela porta, tinha de manter-se sã e firme, sem deixar-se levar pelos seus pensamentos em momento algum. Não podia também demonstrar o quando aquela maldita máscara machucava seu rosto e como suas pernas doíam, mal-acostumadas e sem treino. Ela era uma máquina de guerra, e devia agir como tal. Sabia que a qualquer momento que falhasse em sua missão, ela seria reportada, e descartada como um brinquedo quebrado. Ninguém gosta de brinquedos quebrados. Fazia já meia hora que chegara ao ponto final de sua viagem. Londres era muito mais extensa do que imaginara, e Violet se sentira extremamente pequenina e sem rumo naquela grande cidade. Tomou seu tempo analisando todos que andavam nas ruas, e nas carroças, imaginando em quanto tempo poderia conquistar aquela cidade, se fosse essas as suas novas ordens. Não demoraria muito de certa forma. Não com as estratégias do Major. Tomou um tempo para analisar a sala pela qual se encontrava. A mansão era cheia de portas, quartos e salas de jantar e estar. Era bela, e ao que Oakwood conseguiu analisar, o Major não morava sozinho naquela residência. Conseguiu escutar ao menos duas mulheres conversando em um dos quartos. Violet nada sentiu. Nunca havia visto aquela mansão, e não sabia que o Major era dono de tais propriedades. Agora, sentava-se elegantemente sobre uma cadeira estofada em veludo, em frente a uma grande escrivaninha de pinho, cujos os papéis se empilhavam naturalmente. Uma enorme poltrona inutilizada no momento combinada com o móvel. Logo atrás, uma suja janela mostrava a cidade do terceiro andar da mansão. Os telhados e chaminés, as fumaças, as gritarias, os homens sujos de graxa, as carruagens e os carros. Era uma visão de tirar o fôlego. Violet nada sentiu. Esperava pacientemente que o Major abrisse as enormes portas duplas às suas costas, e começasse a ler relatórios de combates, explicando a próxima missão em que os dois embarcariam juntos para livrar mais um exército das forças do império nazista. Mas quem abriu as portas não foi o Major Comandante. O homem usava uma barba rala ruiva, assim como seu cabelo, que estava preso em um pequeno rabo de cavalo. Usava uma bufante camisa branca por baixo de um colete bege, e uma gravata borboleta. Tinha olheiras em baixo dos castanhos e um sorriso em seus lábios. Violet fez um gesto súbito. Levantou-se bateu os calcanhares e observou- o sempre sem expressão. O homem por um momento parou, antes de cumprimenta-la desajeitadamente com o mesmo cumprimento, não tão bem executado quanto o da moça. Ela sentou-se e esperou que o homem fizesse o mesmo. Suor escorria pela testa e pela barriga magricela do homem. Ele se sentia em posição extremamente desconfortável, mas Violet não conseguia dizer o que lhe deixava nervoso. Oakwood tinha um defeito fatal. Nunca aprendera o que eram emoções e como identificá-las, pois nunca se preocupou em senti-las. Sempre viveu na guerra. Havia nascido em meio dela. E a guerra havia lhe ensinado algo: Quem sentia era frágil. Fraco. Ia ser destruído pelo inimigo hora ou outra. Acreditava profundamente nisso até que conhecera o Major. O homem era um tenente do exército frio e cruel, e que também fora a primeira pessoa que a abraçara na vida. Ele sentia sentimentos o tempo todo e tentava descrevê-los para Violet, apesar de nunca obter sucesso. Era como explicar as cores, dizia ele, explique a cor azul para um cego. Não se acha palavras para explicar. A torrente de memórias invadiu a mente de Violet novamente. As escadarias. A igreja. O sangue. Uma mecha negra do penteado do Major presa em sua testa devido à grande quantidade de sangue que escorria de seu couro cabeludo. “Viva,” dissera ele. As lembranças pararam quando o homem ruivo, sentado atrás da enorme escrivaninha, chamou sua atenção. Não sabia quanto tempo permaneceu presa nos labirintos de sua memória, mas tinha que parar com isso. O major não a perdoaria caso acontecesse em sua frente. - Perdão senhor. Quando o Major irá chegar? O homem ruivo sentado à sua frente parou por um momento gaguejou algumas palavras e parou. Respirou fundo e abriu novamente a boca, desta vez, não encontrando palavras para falar. Violet esperou pacientemente. Sabia dizer que o homem estava nervoso, mas não conseguia descobrir o motivo. Via esse tipo de comportamento somente nas linhas de frente do exército, quando o Major dava sinal para atacar. Os homens, depois de tanto treinamento, de terem demonstrado tanto amor pela pátria, tremiam gaguejavam e imploravam a seus comandantes respectivos para que fossem embora. Violet realmente não conseguia compreender o medo do homem para que ele temesse algo no meio da na maior capital do estado britânico. Por um momento cogitou pensar que o próximo alvo era aquela enorme capital. O ruivo respirou fundo novamente, e desta vez, palavras saíram de sua boca: - Violet, a guerra acabou. Aquelas palavras não fizeram sentido a Violet. Ela nunca havia encontrado as duas juntas. A guerra acabou. Não podia acabar. A guerra nunca acabava. Nunca ela sabia disso. A única coisa constante em sua vida era que sempre havia guerra. Ela sempre teria de matar homens em campo e teria que seguir lutando. Sempre. Sempre ficaria ao lado do Major em um campo de batalha, e sempre o ajudaria e o protegeria de todo o mal que ele encontrasse. Por um momento se viu na situação do homem. Abriu a boca, mas nenhum som saiu. Observou o empresário por algum tempo, que a olhava com preocupação. - Qual será minha próxima missão? – perguntou com um tom desapaixonado. O mesmo tom de sempre, como se para ela, aquela notícia não a tivesse chocado. Hesitou por um momento antes de acrescentar – Tenente Hoggins. O homem piscou os olhos surpreso. Desta vez recuperou-se mais rápido e conseguiu disfarçar sua preocupação com tom sempre presente de sarcasmo em sua voz. Dando um sorriso de dentes brilhantes respondeu: - Tenente não sou mais. Chame-me somente por Sr. Hoggins, sou um homem de negócios agora. Sem nenhuma expressão, mas com sua cabeça anuviada por perguntas, olhou para o homem que a observava. Estava preocupado com a reação da garota, mas esta não demonstrava reação nenhuma. Talvez já soubesse das notícias. Pelo menos, uma boa parte delas. O sorriso de Hoggins vacilou. - Onde está o Major? – perguntou ela, com a voz de uma boneca. Uma voz desprovida de amor e compaixão, mas com uma leve entonação. Antes de responder, Sr. Hoggins tomou um tempo para analisá-la. Vestia um puído vestido azul, e sua máscara de porcelana refletia os raios solares, deixando seu rosto, de certa forma, assustador. Os olhos da garota pareciam ser tão mortos quanto a própria máscara, quase não se via brilho neles. - Ele está... – O sorriso de Hoggins vacilou um pouco – Em um hospital, se recuperando de certas feridas em batalha. Sem expressão alguma, apesar do homem ruivo acreditar que vira um brilho passageiro nos olhos da garota. Olhos azuis inertes como uma morta. Cabelos loiro brilhante e bem penteado, amarrado em um rabo de cavalo. - Qual minha próxima missão? – Perguntou ela novamente. Naquele momento, Hoggins deu o sorriso mais verdadeiro desde que entrara naquela sala, antes de responder. - Sua próxima missão é encontrar-se com sua nova família. Capítulo 2
Era uma bela casa.
Tinha flores plantadas nos beirais das janelas. Brincos de princesas, pingo de ouro, cinerárias enfeitavam as tábuas pintadas de um lilás claro. Roseiras circundavam o terreno, fazendo companhia ao antigo muro de pedra que definia aquele pedaço de terra como “Propriedade dos Bakers”. Ou, pelo menos, era o que aquela pequena placa de bronze dizia, logo abaixo de uma abertura para cartas. Violet não conhecia nenhuma daquelas flores, à não ser duas: As famosas rosas, e a flor que lhe designara nome, violetas. A casa era tranquila e agradável, fazendo contraste com todos os pensamentos que Violet sentia. Esperança rodava por seu âmago e preenchia seu corpo. A preocupação da possível morte do Major sumira de sua cabeça, e deu lugar a uma quietude confortável. O Major estava vivo. Aquilo era tudo o que precisava. Desde que o Sr. Hoggins e ela entraram no carro, Violet permaneceu calada durante a viagem, apesar de estar um pouco curiosa com o que significava tudo aquilo. Uma nova família? Talvez, aquilo significasse que ela seria mudada para um novo regimento enquanto o Major estivesse acamado. Ainda assim, esta definição parecia estranha. Família. O Major constantemente falava para seu regimento que eles deveriam lutar por suas famílias. A definição que Violet dava àquela palavra parecia errônea, ainda mais quando o enorme carro de Hoggins parara em frente à enorme mansão lilás. Com certeza aquele não era lar de um regimento militar. Sr. Hoggins, com o suor escorrendo por sua testa sob o Sol escaldante presenteou-lhe com mais um sorriso brilhante antes de perguntar a garota. - O que acha? – a verdade era que Sr. Hoggins, se sentia extremamente desconfortável sempre que estava perto da garota. Mesmo aquele agradável e quieto lugar deixava aquela maldita máscara mais e mais assustadora. As bordas brancas dando lugar a pele pálida. O jeito em que uma boca fora esculpida na porcelana. Uma boca entreaberta, para que uma pequena abertura permitisse a comunicação. O jeito que os olhos frios da garota vasculhavam cada detalhe dos cômodos e das pessoas, procurando fraquezas em seu interior, como se estivesse vendo qual a melhor maneira de estraçalhá-las de dentro para fora. Ela parecia não ser afetada por nada. Nem pelo frio ou calor extremos. Nem pelas piores notícias. Nem por estar sendo arrastada de casas em casas, sem apresentações posteriores. Parecia estar pronta para servir. Pronta para agir. Hoggins somente queria se afastar da garota. - Nada a relatar. – Respondeu a garota, com o mesmo tom sem emoção de sempre. Novamente o sorriso de Hoggins vacilou. Quanto tocaram a campainha, uma velha senhora, usando pequeninos óculos dourados atendeu. Tinha os dentes um pouco tortos e amarelados. Era gorda e usava um coque, prendendo seus cabelos brancos alinhadamente. Usava um grande vestido florido e o cobria com um avental sujo de farinha. Logo que abriu a porta, jogou os braços em volta de Sr. Hoggins, fazendo com que Violet percebesse o quanto a idosa era pequena. - Nathaniel! Quanta saudade meu netinho querido! – Logo voltou seus olhos a Violet, e deu um sorriso carinhoso e continuou – Prazer minha querida, meu nome é Adelaide Baker. A garota bateu firmemente os calcanhares e se pôs em posição de sentido. - Violet Oakwood se apresentando senhora. Soldado do Quarto Regimento de Infantaria de Vossa Majestade. Por um momento, os dois adultos piscaram surpresos. Adelaide recuperou-se primeiro: - Não se deve cumprimentar os outros desta forma, minha querida – falou a anciã, dando um sorriso doce. Primeiro, deve-se curvar-se. Não, não tanto. Isto. Segure seu vestido desta forma. Agora apresente-se novamente. Violet hesitou por um momento, antes de falar - Violet Oakwood se apresentando... - Não, não, não – falou docemente Adelaide – Violet Oakwood é seu nome? Apresente-se desta forma – e sussurrou algo no ouvido da menina. Pela primeira vez, Sr. Hoggins percebeu que a postura da moça vacilou levemente. Por um mísero segundo o ex-sargento quase conseguiu vê-la como uma humana. - Violet Oakwood, ao seu dispor – falou a moça sem emoção. A boca da velha abriu-se em um sorriso de satisfação - Isso mesmo, garota. Isso mesmo. – A anciã virou-se para o Sargento Hoggins – Ela logo se tornará uma bela dona de casa. A garota estava surpreendendo Hoggins. Pela primeira vez em toda a viagem, ergueu os olhos