Você está na página 1de 3

1

Métodos de determinação e eliminação de ascarel


no óleo isolante de transformadores.
I. Antonello1, UFSC, E. Sapelli1, UFSC, P. de B. Silva1, UFSC, D. Silva1, UFSC, A. R. Martins2,
CELESC, E. Humeres1, UFSC, I. G. de Souza1, UFSC, e N.A. Debacher1, UFSC.

na formulação de plastificantes, tintas, adesivos e pesticidas


Resumo-Os bifenilas policlorados (PolyChlorinated Biphenyl) [1,4].
(PCB’s) são substâncias extremamente estáveis, tóxicas e muito Em 1978 começaram a surgir as primeiras leis americanas
usadas no Brasil até a década de 80, como isolantes em trans- restringindo seu uso. Hoje a lei americana considera como
formadores, conhecidas como ascarel. A eliminação dos resí- PCB puro, concentrações acima de 500 ppm; de 50 a 500
duos deve ser realizada por processo de destruição ou recicla-
gem sendo uma tarefa onerosa que exige técnica e pessoal espe-
ppm amostras contaminadas com PCB; 5 a 50 ppm possi-
cializado. Desta forma a busca por novas metodologias capazes velmente contaminadas por PCB; e concentrações inferiores
de promover a sua eliminação e a sua detecção no ambiente, se a 5 ppm como isentas de PCB [2].
torna cada vez mais importante. Neste trabalho são mostrados No Brasil não há registros de produção de PCB’s, sendo
resultados da remoção do cloro da molécula do PCB usando o que todo o produto foi importado principalmente dos Esta-
ânion radical naftaleno como reagente e dos métodos da quan- dos Unidos [1,3] e Alemanha. As restrições para seu uso
tificação do íon cloreto livre. foram implementadas a partir de 1981 [1,3]. líquidos isolan-
tes que contenham quantidades superiores a 1.000 ppm de
Palavras-chave— PCB’s, ascarel, descloração, mercu- PCB’s, são considerados PCB’s puros, entre 50 – 500 ppm
rimetria, potenciometria. devem ser descontaminados ou eliminados. A eliminação
dos resíduos deve ser realizada por processo de destruição
I. INTRODUÇÃO ou reciclagem. Os processos de incineração em fornos ou
Os compostos organoclorados (fig. 1) resultante da reação por pirólise devem apresentar eficiência máxima de
do grupo bifenila com cloro anidro na presença de cataliza- 99,99995 [2].
dor, [1] são denominados genericamente de bifenilas poli- A substituição do ascarel na industria de transformadores
clorados (PolyChlorinated Biphenyl) (PCB’s) contendo de 1 foi preferencialmente pelo silicone líquido ou “Óleo silico-
a 10 átomos de cloro na sua fórmula química geral, C12H10- ne”. As características físico-químicas e elétricas deste ma-
nCln [1,2]. O produto comercial é uma mistura de 130 con- terial é semelhante a do óleo isolante mineral.
gêneres conhecida como “Aroclor”. Os sinônimos mais co- A substituição do ascarel por óleo de silicone nos trans-
muns são: biphenyl chlorinated, chlorinated diphenyl e di- formadores resultou na contaminação devido a falta de crité-
phenyl chlorinated [3]. rios técnicos durante o processo. Desta forma muito dos
grandes transformadores ainda em operação no Brasil estão
3 2' 3'
Cl 2 Cl contaminados com o ascarel em níveis acima dos permitidos
4
1 1' 4' pela legislação vigente.
Os PCB’s são substâncias extremamente estáveis não re-
5 6 6' 5'
agindo com a maioria dos nucleófilos. Desta forma a busca
Figura 1. Fórmula química geral dos PCB’s por reagentes capazes de promover a desalogenação destes
se torna uma ferramenta bastante poderosa para a sua elimi-
Este material foi produzido em vários países, com dife- nação. Neste trabalho são mostrados resultados da remoção
rentes denominações, sendo comercializado no Brasil com o do cloro da molécula do PCB’s usando o ânion radical naf-
nome de “Ascarel”, [1] denominação também dada ao líqui- taleno como reagente e dos resultados da quantificação do
do isolante, usado em transformadores e capacitores até a íon cloreto livre.
década de oitenta, composto de 75% do Aroclor 1254 e 25%
de triclorobenzeno. II. MATERIAIS E MÉTODOS
Devido ao grande emprego de PCB’s até a década de 80 Os reagentes e solventes empregados na síntese e caracte-
estima-se que a produção mundial acumulada, foi de apro- rização foram obtidos comercialmente da Aldrich, Merck,
ximadamente 1.200.000 toneladas. Deste total, cerca de Nuclear, Synth, Quimex e Vetec, todos em grau analítico.
60% foi utilizado em transformadores e capacitores, 15% Apenas o tetraidrofurano (THF) foi seco antes do seu uso,
para fluídos de transferência de calor e 25% como aditivos através de procedimento descrito na literatura [5]. A analise
da % de água no THF foi feita pelo do método Karl-Fischer.
A. Preparação do Ânion-Radical Naftaleno
Este projeto foi apoiado financeiramente pela programa CELESC de
P&D. Em um balão de três bocas, coberto com papel alumínio,
1. Departamento de QUÍMICA UFSC, Debacher@qmc.ufsc.br. sob um fluxo (1 L min-1) de nitrogênio seco de alta pureza,
2. CELESC, . alexandrerm@celesc.com.br foram adicionados: 10 g de naftaleno (0,078 mol), 1,8 g de
2

sódio metálico (0,078 mol) e 60 mL de THF seco, figura 2. da em λmáx = 323, 425 e 550 nm, sendo esta última a que
_ determina a cor verde da solução.
A figura 4 mostra o espectro de RMN 1H do ânion radical
o THF
+ Na Na
+ naftaleno em DMSO-d6. Os picos correspondentes ao tetrai-
drofurano em δ 3,6 e δ 1,7 ppm e o pico em δ 2,5 ppm a-
THF proximadamente referente ao DMSO-d6, foram omitidos do
espectro, pois o solvente representa 85 % do total das espé-
Figura 2. Estrutura do ânion radical naftaleno. cies, desta forma foi necessário ampliar o espectro, defor-
mando com isso, as bandas do solvente.
A mistura foi deixada sob agitação magnética na ausência O espectro do anion radical naftaleno, figura 4 a, apresen-
de luz por três horas obtendo-se uma solução esverdeada. O ta apenas um pico em δ 7,10 ppm, esperava-se a presença de
produto, ânion radical naftaleno :Naft•-Na+, foi identificado dois picos ao invés de apenas um, para o ânion radical nafta-
por espectroscopia UV-Vis e ressonância magnética nuclear, leno, correspondentes aos hidrogênios α e β do nafatleno.
RMN. Porem no ânion a ressonância, acontece de duas maneiras:
B. Descloração de Organoclorados [8] na forma de pares de elétrons e homolíticamente, desta
forma os hidrogênios α e β são indistinguiveis. A figura 4 b
Os estudos iniciais da reação de descloração foram reali-
mostra a presença de dois picos δ 8,04 e 7,64 ppm caracte-
zados usando uma solução padrão de 1000 ppm (cloreto),
rísticos dos hidrogênios α e β do naftaleno, que aparecem
em óleo mineral, de 1,2,4 – triclorobenzeno. A reação foi
após a decomposição do ânion radical naftaleno.
feita em um funil de separação, adicionando-se 10 mL de
solução padrão e 2,5 mL de :Naft•-Na+, sob agitação por 10
Figura 4. Espectro RMN 1H do e Ânion Radical Naftaleno
min. Em seguida neutralizou-se com HNO3 0,1 mol L-1. A
fase orgânica foi lavada várias vezes com pequenas porções
de água para proceder a extração do cloreto. O mesmo pro-
cedimento foi seguido com amostras reais.
C. Determinação de Cloreto pelo Método Potenciométrico. a b
Transferiu-se uma alíquota da fase aquosa para um bé-
quer e adicionou-se o ajustador de força iônica (ISA, Na-
NO3 5 mol L-1). Fez-se a leitura através do eletrodo íon sele- em DMSO (a) recém preparado, (b) após sua degradação.
tivo [6]. O aparelho foi previamente calibrado com padrões
de NaCl (3,55 – 35,5 – 355 ppm). Foram usados os potenci- B. Reação do Ânion Radical Naftaleno.
ômetros: Orion mod. 920A com eletrodo combinado íon
seletivo, Orion Chloride Plus, 9617 e o Analion AN2000 O :Naft•-Na+ apresenta um potencial de redução de -2,5
com eletrodo de íon seletivo, Cl 651. V, similar a outros solventes como NH3, - 2,59 V e em hexa
metil fosforamida (HMPA) – 2,96 V. A vantagem está no
D. Determinação de Cloreto pelo Método Mercurimétrico fato de que as reações laterais são minimizadas e muitas
Em uma alíquota com um volume conhecido da amostra determinações do ponto de equivalência em titulações po-
manteve-se o pH abaixo de 2, adicionou-se 1 mL de indica- dem ser através da colorimetria, visto que o ânion formado é
dor misto e titulou-se com Hg(NO3)2 0,0141 mol L-1 até de coloração verde intenso [9].
coloração roxa [7]. A aplicação deste ânion radical é grande como, doador de
um elétron que promove ciclização radicalar de cetil-
III. RESULTADOS E DISCUSSÃO alquenos e cetil-alquinos, além de ciclização redutiva de
cetonas acetilênicas esteroidais, redução de epóxidos, possi-
A. Identificação do Ânion Radical Naftaleno bilita acoplamento de cetonas e tiocarbonilas funcionais;
A figura 3, mostra o espectro de UV-Visível, do ânion ra- remove grupos protetores mesitil, tosil e benzil gerando o
dical nafatleno em THF. alqueno ou álcool correspondente [9]. De maneira geral, as
reações de :Naft•-Na+, com haletos de alquilas (RX) são
regidas por quatro sub reações: redução, redução bimolecu-
lar, mono-alquilação e di-alquilação.
Os produtos da alquilação são geralmente derivados 1,2 -
e 1,4 - dihidronaftalenos, sendo que a proporção bimolecu-
lar depende muito do halogênio. Iodetos têm bom rendimen-
to ~70 %, brometos 10 %, cloretos 1 % e fluoretos não rea-
gem.
A tabela 1 mostra os resultados comparativos da análise
de amostras de óleo de transformador contaminadas com o
ascarel (~75% aroclor e ~25% triclorobenzeno). As amos-
tras foram padronizadas por cromatografia gasosa e os valo-
Figura 3. Espectro de UV-Vis., do ânion radical nafatleno res em ppm são aproximados. O método não especifica
quantos átomos de cloro estão na molécula do bifenila e
O ânion apresenta três bandas, com comprimentos de on- qual a porcentagem de aroclor e triclorobenzeno.
3

As análises realizadas pelo método potenciométrico e minar os índices de contaminação e também demonstra ser
mercurimétrico levaram em conta a descloração de todas as uma ferramenta a ser usada na destruição dos PCB’s.
espécies organocloradas existentes na amostra (aroclor e
triclorobenzeno). Portanto o resultado indica o total de íons V. AGRADECIMENTOS
cloreto na amostra sem especificar qual a origem dos íons
Os autores agradecem ao programa CELESC de pesquisa
indicando apenas que nas amostras existem íons cloreto
e desenvolvimento pelo financiamento e ao Departamento
provenientes de espécies organocloradas.
Os resultados comparativos entre as duas técnicas podem de Química da UFSC pelo apoio e infra-estrutura.
ser observados na tabela I. Isto considerando que na molé-
cula do bifenila temos em maior porcentagem as espécies VI. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1242, 1254 e 1260, respectivamente 42%, 54% e 60% em [1] J.C.P. Penteado, J.M. Vaz, “O Legado das Bifenilas
peso do átomo de cloro na molécula do bifenila com 12 á- Policloradas”, Química Nova, vol. 24, nº.3, pg. 390-
tomos de carbono. Desta forma para comparar estes dados 398, 2001.
temos que a média entre 42, 54 e 60 é = 52%, portanto os [2] P. E. de T. Salgado, Bifenilas Policloradas, Poluentes
valores dos métodos potenciométrico e mercurimétrico de- Orgânicos Persistentes, POPs, Série Cadernos de Refe-
vem ser multiplicados por um fator de aproximadamente 2, rência Ambiental, vol 13, cap 2, pg. 65-119, Salvador,
para comparação com os dados cromatográficos. 2002.
Esses resultados demonstram que o método de desclora- [3] J. A. Silva, “Resíduos de Bifenilas Policloradas (PCBs):
ção juntamente com a determinação de íons cloreto por po- Metodologia e Aplicação em Amostras de Óleo Isolan-
tenciometria e mercurimetria é adequado para determinar te”. Tese de Mestrado, Instituto de Química de Arara-
qual o grau de contaminação que o óleo se encontra. Esta quara, Universidade Estadual Paulista, UNESP, São
metodologia pode indicar claramente com segurança os ní- Paulo, 1997.
veis de contaminação do óleo dentro de uma faixa de ±50 [4] L. R. Silva, M. M. Ferreira, “Estudo do Coeficiente De
ppm, baseado na legislação brasileira vigente. Partição Octanol-Água de Bifenilas Policloradas Utili-
zando Parâmetros Topológicos”, Química Nova, vol.
TABELA I 26, nº. 3, pg. 312-318, 2003.
RESULTADOS COMPARATIVOS PELOS MÉTODOS POTENCIOMÉ- [5] A.Voguel, Química Orgânica, Vol 1, 3a Ed., Pg 154,
TRICO E MERCURIMÉTRICO 1980.
Amostras de óleo de Potenciométrico Mercurimétrico [6] APHA, AWWA & WPCF, Chloride Potenciometric
transformador a cloreto, ppm b cloreto, ppm c Method, In: Standard Methods for the Examination of
A ~50, ppm 26,8±12,4 37,1±7,0 Water and Wastewater, 14th Ed. Washington, (APHA
B ~50, ppm 27,5±4,0 26,0±5,2 408c)1193p, pg 874-5, 1975.
C ~400, ppm 162,3±34,0 176,3±37,4 [7] American Public of Health Association – Standard Me-
D ~400, ppm 170,8±36,0 165,5±45,0 thods for the Examinations of Water and Wastewater.
13th Ed. New York, pg 769, 1965.
E -, ppm 23,5±8,7 25,6±15,7
[8] D.L. Pavia, G.M. Lampman G.S. Kriz, Introduction to
F -, ppm 14,7±2,2 19,1±5,5
a Spectroscopy, 2nd Ed. Pg 217, 1996.
Amostras de óleo de transformador padronizadas através [9] S.D. Burke, R. L. Danheiser, John Willey & Sons Ltd,
de cromatografia gasosa. New York, USA. Handbook of Reagents for Organic
b,c
Total de íons cloreto no óleo após a reação de desclora- Synthesis, Oxidizing and Reducing Agents, 2000.
ção.

IV. CONCLUSÕES
A conversão total do naftaleno em ânion radical naftale-
no, proporciona uma solução de coloração verde intenso,
estável na ausência água e luz e a baixas temperaturas (-
10oC).
As reações de descloração de aletos de arilas com ânion
radical naftaleno mostrou-se muito eficaz obtendo excelen-
tes resultados.
Os métodos, potenciométrico e mercurimétrico usados na
determinação de cloreto revelam-se como uma metodologia
operacional barata, que pode ser empregada em análise de
campo.
Esses resultados demonstram que o método de desclora-
ção juntamente com a determinação de íons cloreto por po-
tenciometria e mercurimetria é adequado para determinar
qual a faixa de contaminação que o óleo se encontra indi-
cando com segurança os níveis de contaminação do óleo
dentro de uma faixa de ±50 ppm.
Os resultados obtidos são consistentes permitindo deter-

Você também pode gostar