Letras de Hoje Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun.

2019
Estudos e debates em linguística, literatura e língua portuguesa
http://dx.doi.org/10.15448/1984-7726.2019.2.32532
Programa de Pós-Graduação em Letras da PUCRS
e-ISSN: 1984-7726 | ISSN-L: 0101-3335

Consciência linguística no Ensino Fundamental:

um estudo com foco no uso de estratégias de leitura
Linguistic awareness in elementary school:
a study focused on the use of reading strategies

Consciencia lingüística en la enseñanza primaria:

un estudio centrado en el uso de estrategias de lectura

Danielle Baretta iD  1
Thaís Vargas dos Santos iD  1
Caroline Bernardes Borges iD  1
1 Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil.

RESUMO
Neste artigo é apresentado um estudo, fundamentado na Psicolinguística, que examinou a
contribuição de materiais de leitura com foco na consciência linguística e no uso de estratégias
de leitura (predição, scanning e leitura detalhada) para alunos do Ensino Fundamental. A pesquisa
envolveu a produção de materiais, o desenvolvimento de oficinas de leitura e a aplicação de pré e
pós-teste. Participaram do estudo 59 alunos do 9º ano do Ensino Fundamental de uma escola pública
de Porto Alegre, RS, Brasil. Os resultados indicaram diferenças significativas entre o pré e o pós-
teste no uso e na consciência linguística no uso das estratégias de leitura, comprovando os benefícios
do material de leitura para alunos do Ensino Fundamental e recomendando no ambiente escolar o
uso de materiais com características semelhantes às desenvolvidas neste estudo.
Palavras-chave: Consciência linguística. Estratégias de leitura. Materiais de leitura. 9º ano.

ABSTRACT
This article presents a study based on Psycholinguistics, that examined the contribution of reading
materials with a focus on linguistic awareness and the use of reading strategies (prediction,
scanning, and detailed reading) for elementary school students. The research involved materials
production, development of reading workshops and pre and post-test application. Fifty-nine
students from the 9th grade of Elementary School from a public school in Porto Alegre participated
in the study. The results indicated significant differences between the pre and post-test in the use
and in the linguistic awareness in the use of reading strategies, proving the benefits of the reading
material for elementary school students and recommending in the school environment the use of
materials with similar characteristics developed in this study.
Keywords: Linguistic awareness. Reading strategies. Reading materials. 9th grade.

RESUMEN
En este artículo se presenta un estudio, fundamentado en la Psicolingüística, que examinó
la contribución de materiales de lectura centrados en la conciencia lingüística y en el uso de
estrategias de lectura (predicción, scanning y lectura detallada) para alumnos de la Enseñanza
Primaria. La investigación involucró la producción de materiales, el desarrollo de talleres
de lectura y la aplicación de pre y post-test. Participaron del estudio 59 alumnos del 9º año
de la Enseñanza Primaria de una escuela pública de Porto Alegre. Los resultados indicaron
diferencias significativas entre el pre y el post-test en el uso y en la conciencia lingüística en
el uso de las estrategias de lectura, comprobando los beneficios del material de lectura para
alumnos de la Enseñanza Primaria y recomendando en el ambiente escolar el uso de materiales
con características semejantes a las desarrolladas en este estudio.
Palabras clave: Conciencia lingüística. Estrategias de lectura. Materiales de lectura. 9º año.

Este artigo está licenciado sob forma de uma licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional,
que permite uso irrestrito, distribuição e reprodução em qualquer meio, desde que a publicação
original seja corretamente citada. http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/deed.pt_BR
244 Baretta, D., Santos, T. V., Borges, C. B.
Introdução
As provas oficiais que analisam o desempenho da
leitura dos estudantes constatam que os alunos brasileiros
alcançam índices insatisfatórios. No relatório1 de 2016, o
Brasil ocupou a 59ª posição no que se refere ao ensino
da leitura. O desempenho médio dos alunos brasileiros
foi de 407 pontos, enquanto a média dos estudantes dos
países membros da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi de 493 pontos.
Segundo relatórios do Índice de Analfabetismo
Funcional2 (INAF), que mensura o nível de analfabetismo
funcional de brasileiros entre 15 e 64 anos, a escolaridade da
população brasileira vem aumentando significativamente.
Esse crescimento, contudo, não se reflete na mesma
proporção em termos de aprendizado. O aumento de
tempo nos bancos escolares não tem garantido resultados
positivos no que se refere ao analfabetismo funcional.
Dados de 2018 indicam a existência, na população
brasileira, de 8% de analfabetos, 22% no nível rudimentar,
34% no nível elementar, 25% no nível intermediário e
apenas 12% no nível pleno. Isso significa que, ainda que o
percentual de alfabetizados tenha aumentado nos últimos
anos, de 61% em 2001 para 71% em 2018, apenas 7 em
entre 10 brasileiros pode ser considerado funcionalmente
alfabetizado.
Para entender essa situação, tem crescido, nas
últimas décadas, o número de pesquisas que estudam
a forma como os alunos processam a leitura, buscando
compreender os caminhos cognitivos percorridos pelo
leitor na construção do sentido do texto. Nesse contexto,
estudos têm destacado a importância das estratégias de
leitura, uma vez que é por meio delas que o leitor interage
com o texto na busca pela compreensão. Além das
estratégias de leitura, pesquisas sugerem que a eficácia
do processo de leitura está relacionada à habilidade do
indivíduo de refletir sobre os próprios conhecimentos
linguísticos (consciência linguística).
Nesse sentido, o estudo aqui relatado, desenvolvido
com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq), Coordenadoria de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio
Grande do Sul (Fapergs) e realizado junto a alunos do 9º
ano do Ensino Fundamental, buscou contribuir com essas
pesquisas, examinando os benefícios de um conjunto de
atividades de leitura para o desenvolvimento do uso e da
consciência no uso de estratégias de leitura.
Para tanto, são apresentados, a seguir, os fundamentos
teóricos que dão suporte ao estudo, a descrição da pesquisa
1 Disponível em: http://download.inep.gov.br. Acesso em: 19 out. 2018.
2 Disponível em: https://www.ipm.org.br. Acesso em: 20 out. 2018.
Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019
realizada e os resultados obtidos. Nas conclusões, são
apresentadas as relações entre a pesquisa desenvolvida e
a prática pedagógica, indicando caminhos possíveis para
o ensino da leitura.
1 Fundamentos teóricos
O estudo relatado neste artigo tem como base os
fundamentos teóricos advindos da Psicolinguística,
que direcionam a análise da compreensão leitora como
processo cognitivo. Desse modo, estruturaram a pesquisa
conceitos referentes à compreensão e processamento
da leitura, ao uso de estratégias de leitura – com foco
na predição, na leitura detalhada e no scanning, as três
estratégias aqui investigadas – e ao desenvolvimento
da consciência linguística. Os tópicos citados são apre-
sentados a seguir.
1.1 Compreensão e processamento da leitura
De acordo com a perspectiva adotada nesta pesquisa,
com base nos pressupostos teóricos da Psicolinguística,
assume-se o ponto de vista que define a compreensão
leitora como processo cognitivo que, de acordo com
Pereira (2008), envolve a realização de processos
ascendentes e descendentes e a utilização de estratégias
cognitivas e metacognitivas de leitura, sob a influência de
determinadas variáveis de leitura.
Com relação aos processos ascendentes e des-
cendentes (SCLIAR-CABRAL, 2009; KATO, 1999),
é possível destacar dois movimentos: o bottom-
up, movimento ascendente de leitura, e o top-down,
movimento descendente. O bottom-up, processo de leitura
realizado das unidades menores do texto para as maiores,
é linear e minucioso, predominando o uso das pistas
visuais do texto. Esse movimento é utilizado de forma
recorrente na leitura de textos sobre os quais o leitor não
tem muitos conhecimentos prévios, culminando em uma
leitura mais vagarosa, que exige maior atenção. As partes
vão formando o todo, de modo que a leitura é construída
por um processo de composição.
O processo top-down (SMITH, 2003; GOODMAN,
1991), envolve o movimento inverso: do todo do
texto para as unidades menores, ou seja, descendente.
Trata-se de uma leitura não linear, em que o leitor
compreende o texto predominantemente com base em
seus conhecimentos prévios. Envolve um processo de
antecipação, da macroestrutura para a microestrutura do
texto, baseando-se na função, inicialmente, para então
chegar à forma.
O sucesso na leitura se dará, portanto, a partir da
habilidade do leitor em realizar os dois processos de
acordo com a situação de leitura com a qual se depara,
Consciência linguística no Ensino Fundamental 245
escolhendo o processo dominante e travando a interação
entre ambos. Os dois movimentos podem ser utilizados
de modo interativo, dependendo do próprio texto, do
objetivo de leitura e dos conhecimentos prévios do leitor.
Essas variáveis guiam o processo de leitura e direcionam
os seus procedimentos.
Em relação às características do texto a ser lido,
enfatiza-se a sua considerável importância para o
estabelecimento da compreensão, visto que, ao observar a
superestrutura do texto que tem a sua frente, o leitor é levado
a identificar o seu gênero textual e, consequentemente, a
recuperar em sua memória as características desse gênero.
Além disso, as pistas deixadas pelo autor no texto também
contribuem para a compreensão leitora na medida em que
o leitor as considera, mesmo que de forma inconsciente,
relacionando-as ao que já sabe. Goodman (1976) diz
que a seleção automática de pistas depende de aspectos
importantes, como os conhecimentos e as experiências
do leitor e, também, o seu nível de desenvolvimento de
pensamento e de linguagem.
Smith (2003) observa a compreensão como processo
ligado à capacidade do indivíduo leitor de entender o
significado do texto a partir da menor quantidade possível
de informação linguística e textual e relacioná-la aos seus
esquemas linguísticos e conceituais. Assim, entende-se
que, quanto mais desenvolvida for a habilidade do leitor
em selecionar as pistas linguísticas mais produtivas e
relevantes para obter o sentido de determinado texto,
melhor será a sua compreensão do respectivo texto.
Os conhecimentos prévios, outra importante variável
do processo de compreensão leitora (SOLÉ, 1998), são
esquemas de conhecimento que construímos ao longo da
vida e que estão relacionados aos elementos constitutivos
da vida do ser humano, como a cultura, os valores, os
procedimentos, ou seja, todos os conhecimentos de todas
as esferas adquiridos ao longo da vida.
Conforme Leffa (1996), novos conhecimentos são
adicionados à nossa memória semântica e organizados
coerentemente em nossa mente à medida que os esquemas
formados pelos conhecimentos anteriores interagem com
as novas informações oferecidas pelo texto. Cabe ressaltar
que, além dos conhecimentos de mundo do indivíduo e
das informações disponibilizadas pela temática do texto
lido, os conhecimentos linguísticos e textuais também são
fundamentais para a compreensão leitora.
Considerando tal ideia, Kleiman (2000) classifica os
conhecimentos prévios do leitor em linguístico, textual
e de mundo. O conhecimento linguístico, portanto,
é essencial para o entendimento de um texto, pois é
através da língua que a informação é transmitida e o seu
sentido é construído de forma interativa com o leitor.
O conhecimento textual, por sua vez, permite que os
conhecimentos linguísticos sejam analisados no todo
Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019
do texto, entendidos em conjunto. Os conhecimentos
de mundo se referem a todas as esferas da vida humana,
como já destacado anteriormente, e são relacionados aos
temas dos textos lidos.
Com relação aos objetivos de leitura, Giasson (2000)
ressalta o seu importante papel no direcionamento da
atividade de leitura do leitor. Dependendo de seu objetivo
de leitura, o leitor modifica suas tomadas de decisão frente
ao texto. Além disso, a intenção do leitor influencia no
que retém e compreende do texto (KLEIMAN, 2000).
As estratégias e procedimentos que serão utilizados
durante a leitura são determinados, em parte, pelo objetivo
de leitura, que aponta ao leitor os caminhos que ele
deve percorrer para chegar onde deseja (STREY, 2012,
CORSO et al., 2013). Solé (1998) destaca, ainda, que o
objetivo legitima a atividade de leitura, pois saber aonde
se quer chegar faz com que o processo tenha sentido e
seja motivador.
Tendo em vista esses aspectos, Stanke (2007),
partindo das palavras de Kleiman, sugere que a escola
busque proporcionar ao aluno atividades que o possibilitem
reconhecer o seu papel ativo na leitura e na construção do
sentido, através do engajamento de seus conhecimentos
prévios e objetivos de leitura. Esse engajamento do leitor
na construção do sentido do texto se dá por meio das
estratégias de leitura, tópico detalhado a seguir.
1.2 Estratégias de leitura
O processo de compreensão ocorre em decorrência
dos procedimentos adotados pelo leitor tendo em vista
os movimentos de leitura que realiza e as variáveis de
leitura que envolvem esse processo. Esses procedimentos
– denominados estratégias de leitura por Solé (1998) –
ajudam-no a realizar e a regular a sua atividade de leitura.
É a partir deles que o leitor seleciona, avalia, persiste
ou abandona determinadas ações para atingir os seus
objetivos de leitura frente ao texto.
Leffa (1996) classifica as estratégias de leitura,
dependendo de sua natureza, em cognitivas e meta-
cognitivas. As estratégias cognitivas são caracterizadas
por seu traço inconsciente, pois ocorrem de maneira
automática, sem consciência por parte do leitor. Desse
modo, são utilizadas de forma intuitiva de acordo com
as variáveis e os processos realizados. Por outro lado,
as estratégias metacognitivas são utilizadas de modo
consciente, quando o leitor monitora e observa o próprio
processo de leitura.
Examinando a literatura sobre o assunto (BOEFF,
2011), é possível elencar as estratégias de leitura mais
recorrentes nos estudos psicolinguísticos: o skimming,
o scanning, a predição, o automonitoramento, a auto-
avaliação, a autocorreção, a inferência e a leitura
246 Baretta, D., Santos, T. V., Borges, C. B.
detalhada. Neste estudo, foram investigadas e selecionadas
para produção e aplicação das atividades pedagógicas,
especificamente, as estratégias predição, leitura detalhada
e scanning.
A predição está relaciona à atividade de realizar
previsões sobre o que está por vir no texto. De acordo com
Pereira (2002), essa estratégia é constituída por outras
estratégias mais específicas, como o automonitoramento
(o leitor deve estar atento aos seus conhecimentos prévios,
às pistas linguísticas e às próprias predições de leitura), a
autoavaliação (o leitor avalia essas antecipações e constata
se estão de acordo com as pistas e os conhecimentos
prévios) e a autocorreção (modifica essas antecipações à
medida que as julgue inadequadas).
É importante destacar que a predição não envolve
apostas ao acaso, sem nenhuma base. O leitor realiza as
suas previsões com apoio em seus conhecimentos prévios
associados às pistas linguísticas apresentadas no texto.
Não se trata, portanto, de um procedimento aleatório,
mas sim de uma estratégia a partir da qual o leitor
realiza importantes inferências por meio de seu jogo de
adivinhação – o chamado guessing game, proposto por
Goodman (1976).
Sendo assim, uma situação pode ser prevista em uma
narrativa a partir de uma passagem anterior da história,
assim como pode ocorrer a predição de uma palavra com
base no campo semântico predominante no texto. Em um
poema, por exemplo, uma palavra pode ser prevista com
base em rimas apresentadas nos versos antecedentes, e
assim por diante.
A estratégia de leitura detalhada, como o próprio
nome indica, refere-se à leitura minuciosa do texto, com
atenção aos detalhes. Está inserida no processamento
bottom-up, visto que envolve a leitura na direção das
menores unidades linguísticas do texto, em suas minúcias,
até as unidades maiores, para chegar ao todo. O leitor
utiliza essa estratégia quando pretende apreender todas as
informações do texto, ou seja, quando necessita de todas
as informações para uma situação posterior, como realizar
uma prova ou elaborar um resumo, por exemplo.
Essa estratégia, utilizada a partir de movimentos
lineares, em que o leitor volta a atenção para cada pista
linguística do texto, auxilia nas situações em que não se
têm conhecimentos prévios suficientes sobre o assunto
tratado no texto. Assim, será uma leitura atenciosa,
utilizada frequentemente em situações em que o léxico
do texto é pouco conhecido, a sintaxe é constituída por
frases longas e complexas ou a textualidade exige esforço
cognitivo alto.
O scanning consiste na estratégia em que o leitor
examina o texto e explora-o de acordo com o seu objetivo,
através de uma leitura dinâmica. Pode estar em busca de
alguma informação específica, por exemplo, como quando
Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019
se procura o prazo de validade em uma embalagem.
Ou ainda pode realizar uma exploração do texto para
recuperar alguma informação perdida ou esquecida na
primeira leitura. É possível que não tenha compreendido
alguma palavra ou passagem e precise retomar para
recuperar o sentido do que havia lido.
Nota-se, desse modo, que o uso dessa estratégia
sempre estará relacionado ao objetivo do leitor,
que pode ser a busca de uma informação pontual, o
detalhamento de uma informação que já havia sido, em
parte, compreendida, o entendimento de uma situação
específica, entre outros. É importante ressaltar que, para
a utilização da estratégia de scanning, o leitor necessitará
de conhecimentos prévios sobre o texto, seja sobre seu
tema ou sobre sua natureza linguística.
Tendo em vista a funcionalidade e a importância
das estratégias de leitura para o processo de leitura e
para a efetivação da compreensão leitora, assume-se a
importância do desenvolvimento de seus usos desde o
ensino básico nas aulas de Língua Portuguesa. Além
disso, destaca-se a importância da investigação desses
aspectos fundamentais para o sucesso da leitura.
1.3 Consciência linguística
De acordo com Spinillo, Mota e Correa (2010), a
consciência linguística – aqui investigada no que tange a
sua relação com a compreensão leitora – está relacionada
ao conhecimento da própria linguagem, sua constituição
e organização, associando-se à habilidade de manejo dos
elementos linguísticos. Essa consciência pode focalizar
algum segmento linguístico, considerando o contexto dos
demais segmentos. A partir disso, a consciência linguística
é dividida em categorias, que, de acordo com Gombert
(1992), têm por base os segmentos que constituem o foco
de atenção.
A consciência fonológica envolve a capacidade
de identificar, isolar, manipular e segmentar, de forma
deliberada, os elementos fonológicos da língua. Refere-se
tanto à consciência de que a língua falada pode ser
segmentada em unidades distintas: as palavras em
sílabas (consciência silábica) e as sílabas em fonemas
(consciência fonêmica), quanto à consciência de que
estas unidades podem repetir-se em diferentes palavras
(BYRNE; FIELDING-BARNSLEY, 1989).
A consciência lexical corresponde à habilidade de
segmentar a linguagem oral em palavras, considerando
tanto aquelas com função semântica, como os
substantivos, adjetivos e verbos, quanto aquelas que
adquirem sentido no interior das sentenças, como as
conjunções, preposições e artigos.
A consciência sintática refere-se à capacidade de
refletir e manipular a estrutura gramatical das sentenças.
Consciência linguística no Ensino Fundamental 247
Esse tipo de consciência leva em conta o caráter
articulatório da linguagem humana que permite que,
com um número limitado de unidades, o indivíduo possa
combiná-las de modo a construir um número infinito de
enunciados. Esse tipo de consciência, portanto, possibilita
o reconhecimento das regras convencionais de combinação
entre as palavras que organizam a linguagem de modo
a produzir enunciados que façam sentido (BARRERA;
MALUF, 2003).
A consciência pragmática diz respeito à habilidade
de refletir e de monitorar a linguagem com relação ao
contexto em que ela se insere. Esse tipo de consciência
abrange fatores que vão além do componente linguístico,
centrando-se na capacidade de reflexão sobre o uso da
linguagem, envolvendo aspectos relacionados ao sentido
das palavras e as suas repercussões nos interlocutores
em uma situação de comunicação. É por isso que o
seu desenvolvimento está fortemente associado às
experiências do indivíduo em seu meio.
A consciência textual, termo cunhado por Gombert
(1992), abrange todos esses níveis de consciência e é
definido como uma atividade em que o indivíduo tem
como objeto de análise o texto, examinando as suas
propriedades a partir de um monitoramento intencional.
Segundo Gombert (1992), o monitoramento intencional,
que caracteriza a consciência textual, diz respeito tanto
aos aspectos formais do texto como às informações
apresentadas no próprio texto. Desse modo, o autor
o divide em monitoramento da coerência, da coesão e
da estrutura. O monitoramento da coerência refere-
se à habilidade de refletir sobre as relações de sentido
entre as frases que formam um texto. O monitoramento
da coesão, por sua vez, envolve as relações de ligação
entre termos de uma frase e a inter-relação entre as
sentenças. A coesão refere-se aos marcadores linguísticos
do texto que contribuem para sua unidade, tais como as
conjunções, pronomes, advérbios, entre outros. Por fim,
no monitoramento da estrutura, o texto é tomado como
unidade de análise a partir de sua organização geral,
distanciando-se do conteúdo veiculado para aproximar-
se da forma, da configuração linguística do texto. Esse
monitoramento, portanto, refere-se à reflexão consciente
acerca de aspectos que caracterizam os diferentes gêneros
textuais (SPINILLO, 2009, p. 85).
Gombert (1992) estudou a consciência linguística
e suas abordagens a partir da análise de pesquisas
realizadas por diversos autores. Desse estudo, apresentou
um modelo de desenvolvimento metalinguístico no qual
destaca a existência de dois tipos de comportamentos no
tratamento da linguagem.
Segundo o autor, durante a aquisição da linguagem,
as crianças manifestam comportamentos linguísticos
espontâneos, não controlados conscientemente e, por
Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019
isso, elas não são capazes de explicitar verbalmente
os tratamentos linguísticos que utilizam. Esses com-
portamentos, denominados epilinguísticos por Gombert
(1992), estão em ação em toda manifestação linguística
e evoluem espontaneamente a partir do desenvolvimento
da linguagem (SPINILLO, 2009). Segundo Spinillo
(2009), são exemplos de atividades que demonstram
comportamentos epilinguísticos: corrigir uma palavra
imediatamente após pronunciá-la, realizar ajustes
tais como escolher uma palavra mais apropriada para
substituir outra, entre outros. A autora comenta que este
tipo de reflexão sobre a linguagem, que é feito de maneira
espontânea e a um nível implícito, servirá de base para
reflexões futuras mais controladas e explícitas a respeito
dos aspectos da linguagem. Essas reflexões resultam
em comportamentos autocontrolados, decorrentes de
um processo de consciência. Tais comportamentos são
denominados comportamentos metalinguísticos.
Através da exposição teórica aqui apresentada é
possível entender a sustentação das atividades pedagógicas
e dos métodos utilizados, que serão desenvolvidos a
seguir.
2 Organização e realização da pesquisa
O estudo teve como objetivo central verificar
a contribuição de oficinas (20 horas) contemplando
materiais com foco em estratégias de leitura (predição,
scanning e leitura detalhada) de texto literário – fábula –
constituído de estrutura narrativa predominante, para o uso
e a consciência no uso dessas estratégias por alunos do 9º
ano do Ensino Fundamental (EF). Com base nesse objetivo,
norteou o trabalho a seguinte questão de pesquisa: “Qual
a contribuição de oficinas contemplando materiais com
foco em estratégias de leitura (predição leitora, scanning e
leitura detalhada) de fábulas, para o uso dessas estratégias
e a consciência linguística nesse uso?”
Participaram da pesquisa 59 estudantes do 9º ano do
EF de uma escola pública da cidade de Porto Alegre (RS).
Todos os alunos participaram das oficinas de ensino.
As atividades de ensino foram organizadas em
módulos, sendo cada módulo constituído de três partes:
atividades de estratégia de leitura de predição; atividades
de estratégia de scanning; e atividades de leitura detalhada,
elaboradas a partir da leitura de fábulas. Cada atividade
era constituída de uma tarefa de uso da estratégia de
leitura em foco e de uma tarefa de consciência no uso
dessa estratégia, na qual o aluno devia explicar o processo
realizado e as informações observadas para resolver a
tarefa. As oficinas (20 horas) foram conduzidas por duas
professoras bolsistas, por dois graduandos de Letras e por
seis alunos da escola investigada, com a supervisão de
uma doutoranda de Letras.
248 Baretta, D., Santos, T. V., Borges, C. B.
A análise das contribuições das oficinas foi realizada
com base nos resultados do pré e pós-teste aplicados
antes e depois das oficinas. Os testes apresentavam
textos do mesmo gênero textual presente nos módulos
das oficinas (fábula), sendo constituídos de tarefas de uso
da estratégia, seguidos da solicitação da explicação do
processo realizado e das informações observadas para
resolver a tarefa.
Os dados obtidos foram tabulados e organizados
com base nos seguintes critérios: em relação ao uso
das estratégias de leitura, as respostas dos participantes
receberam 0 ponto, para o caso de erro, e 1 ponto, quando
havia acerto. Nas perguntas de justificativa, a consciência
linguística dos participantes foi avaliada de acordo com
os níveis elaborados com base nos estudos de Gombert
(1992), Poersch (1998) e Spinillo (2009). Os níveis
considerados foram:
a) Nível 1 (estado subconsciente): nível de consciên-
cia mais elementar, caracterizado pela pouca ou
total ausência da capacidade de explicitação das
informações e procedimentos utilizados para reali-
zar as tarefas. O participante encontra-se nesse nível
de consciência quando deixa a questão em branco
ou a responde de forma confusa e equivocada.
b) Nível 2 (comportamento epilinguístico): nível de
consciência intermediário, caracterizado pela
capacidade relativa de explicitação das informa-
ções e procedimentos utilizados para realizar as
tarefas. O participante encontra-se nesse nível
de consciência quando oferece indícios de como
processou a questão, mas com formulações vagas
e imprecisas.
c) Nível 3 (comportamento metalinguístico): nível
de consciência mais avançado, caracterizado
pela capacidade de explicitação das informações
e procedimentos utilizados para realizar as
tarefas. O participante encontra-se nesse nível de
consciência quando demonstra ser capaz de fazer
reflexões sobre o texto e sobre seus procedimentos
de análise de forma clara e articulada.
Na correção dessas perguntas, foram atribuídos 2
pontos para as respostas classificadas no nível 3, 1 ponto
para as classificadas no nível 2 e 0 para o nível 1.
No tópico seguinte são apresentados os resultados
obtidos com base nos dados coletados.
3 Resultados
O desempenho dos participantes foi examinado
sob dois pontos de vista. Inicialmente, avaliou-se o
uso das estratégias propriamente ditas (perguntas de
compreensão) para, em seguida, verificar o nível de
consciência linguística (perguntas de justificativa).
Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019
Para analisar o uso das estratégias de leitura e o nível
de consciência linguística no uso dessas estratégias, as
respostas dos participantes foram organizadas e tabuladas
de acordo com os critérios anteriormente mencionados.
Foram utilizados testes estatísticos não paramétricos
tendo em vista que o resultado do teste de Shapiro-
Wilk para a análise da distribuição dos escores de uso
das estratégias e de consciência linguística no uso das
estratégias permitiu recusar a hipótese de normalidade
(p < 0,05). Assim, adotou-se o teste de Wilcoxon pareado
para a comparação das estratégias entre o pré e o pós-teste
e o teste de Kruskal-Wallis para a comparação entre as
estratégias em cada momento avaliado, assumindo-se um
nível de significância de 5% (p ≤ 0,05).
A Tabela 1 apresenta o número e a porcentagem de
respostas às perguntas de compreensão por estratégia.
Tabela 1 – Número e porcentagem de respostas às
perguntas de compreensão por estratégia
Estratégia de Pré-teste Pós-teste
Crescimento
leitura (n=59) (n=59)
Predição leitora 16 (27,11%) 36 (61,01%) 20 (33,89%)
Scanning 33 (55,93%) 56 (94,91%) 23 (38,98%)
Leitura detalhada 26 (44,06%) 56 (94,91%) 30 (50,84%)
Fonte: Elaboração própria.
No pré-teste, o teste de Kruskal-Wallis revelou
diferenças significativas entre a predição leitora e a
leitura detalhada (p = 0,01) e, entre predição leitora e
scanning (p = 0,00). Isso pode ser explicado pelo fato
de que o percentual de acerto no uso da predição foi
consideravelmente inferior aos demais, não atingindo os
30%. As estratégias scanning e leitura detalhada, por sua
vez, apresentaram percentuais próximos aos 50%, não
sendo encontradas diferenças significativas entre elas
(p=0,07). Tais resultados demonstram que os alunos na
faixa etária e escolar analisada apresentam dificuldades em
realizar predições sobre o texto. Uma possível explicação
resulta das características dessa estratégia. Atividades de
predição exigem que o aluno integre diferentes partes
do texto e as relacione aos seus conhecimentos prévios
a fim de levantar hipóteses sobre eventos que ainda não
foram mencionados. Sendo assim, é possível que diante
desse tipo de pergunta, o aluno considere não ser capaz de
responder, pois não encontra a informação solicitada no
texto. O desempenho mais expressivo no uso das demais
estratégias, scanning e leitura detalhada, que demandam
a atenção a informações claramente expressas no texto,
corrobora essa hipótese.
Com relação ao pós-teste, o teste de Kruskal-
Wallis relevou valores de significância semelhantes
aos encontrados no pré-teste na comparação entre as
estratégias, apresentando diferenças significativas entre
Consciência linguística no Ensino Fundamental 249

predição leitora e as demais estratégias (p = 0,00). Isso
se deve ao fato de que, embora todas as estratégias
tenham apresentado crescimento com relação ao pré-
teste, a estratégia de predição foi a que apresentou menor
evolução entre as três, mantendo, assim, a diferença
anteriormente existente entre elas.
Comparando os resultados do pré e do pós-teste entre
si, é possível observar que a estratégia leitura detalhada
é a que obteve maior crescimento: 30 pontos no escore e
50,84 no percentual. As estratégias scanning e predição
leitora apresentaram valores de crescimento semelhantes,
sendo 23 pontos no escore e 38,98 no percentual e 20 pon-
tos e 33,89 no percentual, respectivamente. Constata-se,
portanto, que houve ganho de conhecimentos referente
ao uso das três estratégias de leitura contempladas na
pesquisa. Esses resultados foram tratados estatisticamente
por meio do teste de Wilcoxon pareado. O cálculo
estatístico revelou diferenças significativas entre o
desempenho inicial (pré-teste) e final (pós-teste) dos
participantes, com valores de p inferiores a 0,05 na
comparação das três estratégias, comprovando os bene-
fícios do material de leitura para o aprimoramento do uso
de estratégias de leitura.
Além do uso da estratégia, verificou-se, a partir das
respostas fornecidas às perguntas de justificativa, o nível
de consciência linguística no uso dessas estratégias. A
Tabela 2 apresenta o desempenho dos participantes sob
esse ponto de vista.
leitura detalhada com um crescimento de 62,63% no
pós-teste em relação ao pré-teste. Isso se deve ao fato
de que no pré-teste, essa estratégia foi a que apresentou
menor percentual de respostas no nível mais avançado de
consciência linguística (nível 3 = 6,77%). No pós-teste, a
predição leitora foi a estratégia que teve menor número
de respostas no nível 3, apresentando também o menor
crescimento na comparação com o pré-teste (13,7%).
Nesse caso, respostas classificadas no nível 2 eram
mais frequentes na predição (47,4%) do que nas demais
estratégias. Em todas as estratégias, observou-se uma
diminuição do percentual de respostas no nível 1. Esses
resultados evidenciam que as oficinas com as atividades
de leitura contribuíram para o desenvolvimento do nível
de consciência linguística no uso das três estratégias
analisadas.
Além da análise das respostas por níveis de
consciência, foram examinados os casos de regressão
(quando, no pós-teste, o participante passa para um nível
inferior); de estabilidade (quando o participante, no
pós-teste, permanece no mesmo nível) e de progressão
(quando, no pós-teste, o participante passa para um
nível superior). A Tabela 3 apresenta os resultados dessa
análise.
Tabela 3 – Número e porcentagem de respostas que
regrediram, estabilizaram e progrediram de nível de
consciência linguística do pré-teste para o pós-teste

Tipo de progressão PL (n=59) SC (n=59) LD (n=59)

Tabela 2 – Número e porcentagem de respostas às Regressão 10 (16,9%) 01 (1,6%) 01 (1,6%)
perguntas de justificativa por níveis e estratégias Estabilidade 22 (37,2%) 18 (30,5%) 10 (16,9%)

Pré-teste (n=59) Pós-teste (n=59) Progressão 27 (45,7%) 40 (67,7%) 48 (81,3%)

Níveis de
consciência PL SC LD PL SC LD PL = predição leitora; LD = leitura detalhada; SC = scanning.
Fonte: Elaboração própria.
32 26 40 12 03 03
Nível 1
(54,2%) (44,06%) (67,7%) (20,3%) (5,08%) (5,08%)

Nível 2
16 17 15 28 01 15 Os dados apresentados na Tabela 3 revelam que,
(27,1%) (28,8%) (25,4%) (47,4%) (1,69%) (25,4%)
entre as estratégias, a predição leitora foi a que apre-
Nível 3
11 16 04 19 55 41
sentou maior número de casos de regressão, com
(18,6%) (27,1%) (6,77%) (32,2%) (93,2%) (69,4%)
16,9% das respostas. Nas demais estratégias, esse per-
PL = predição leitora; LD = leitura detalhada; SC = scanning; Nível 1 = estado
subconsciente; Nível 2 = comportamento epilinguístico; Nível 3 = comportamento centual não alcançou os 2%. Com relação aos casos de
metalinguístico.
Fonte: Elaboração própria.
estabilidade, a leitura detalhada apresentou o menor
percentual, com menos de 20% de ocorrências. Em
seguida, aparece a estratégia scanning com 30,5% e,
O teste de Wilcoxon revelou que no pós-teste por último, a predição com 37,2%. Nas situações de
respostas classificadas no nível 3 eram significativamente progressão, verifica-se um destaque para a leitura deta-
mais frequentes que no pré-teste. Embora em todas as lhada com 81,3% dos casos. A estratégia scanning registra
estratégias haja progressos da primeira para a segunda o segundo maior percentual e a predição foi a que obteve
testagem, o percentual mais expressivo foi observado o menor percentual de progressão no nível de consciência
na estratégia scanning, tendo em vista que, após as linguística.
oficinas, 93,2% das respostas demonstraram um nível A partir dos dados da Tabela 3, verificou-se o tipo de
de consciência mais avançado. Apesar disso, a estratégia progressão apresentado em cada estratégia. Essa análise é
que apresentou maior avanço entre as testagens foi a apresentada na Tabela 4.

Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019

250 Baretta, D., Santos, T. V., Borges, C. B.
Tabela 4 – Número e porcentagem de respostas que
progrediram de nível de consciência linguística do pré-teste
para o pós-teste
Tipo de progressão PL (n=27) SC (n=40) LD (n=48)
Nível 1 para 2 14 (51,8%) 01 (2,5%) 10 (20,8%)
Nível 1 para 3 09 (33,3%) 23 (57,5%) 27 (56,2%)
Nível 2 para 3 04 (14,8%) 16 (40%) 11 (22,9%)
PL = predição leitora; LD = leitura detalhada; SC = scanning; Nível 1 = estado
subconsciente; Nível 2 = comportamento epilinguístico; Nível 3 = comportamento
metalinguístico.
Fonte: Elaboração própria.
Com relação aos dados da Tabela 4, é possível
observar que o progresso foi mais tímido na predição,
uma vez que 51,8% das respostas passaram do nível
1 para o 2. As estratégias scanning e leitura detalhada
apresentaram percentuais semelhantes de respostas
que evoluíram do nível de consciência linguística mais
inferior (nível 1) para o mais superior (nível 3), com
57,5% e 56,2% dos casos, respectivamente. No entanto,
a estratégia scanning foi a que apresentou avanços mais
substanciais, pois 40% das respostas avançaram do nível
2 para o nível 3, enquanto na leitura detalhada esse
percentual foi de 22,9%. É possível observar que o uso do
material de leitura possibilitou uma progressão expressiva
(PL = 33,3%; SC = 57,5% e LD = 56,3%) de respostas
caracterizadas pela pouca ou total ausência de explicitação
das informações e procedimentos utilizados (nível 1) para
respostas nas quais o participante demonstra ser capaz de
fazer reflexões sobre o texto e sobre seus procedimentos
de análise de forma clara e articulada (nível 3).
Concluída a exposição dos dados coletados e os
resultados obtidos, são apresentadas a seguir as conclusões
do estudo.
Considerações finais
Os resultados dão condições para responder à questão
de pesquisa previamente apresentada neste artigo: Qual
a contribuição de oficinas contemplando materiais com
foco em estratégias de leitura (predição leitora, scanning e
leitura detalhada) de fábulas, para o uso dessas estratégias e
a consciência linguística nesse uso? Os resultados obtidos
evidenciam os benefícios dos materiais elaborados para
os alunos do 9º ano do EF, na medida em que os dados
alcançados no pós-teste são superiores ao pré-teste nas
três estratégias de leitura investigadas.
Esse desempenho dos alunos após a realização das
oficinas permite associar a contribuição dos materiais à
metodologia e ao conteúdo das atividades direcionados
para o desenvolvimento do uso das estratégias de leitura
e da consciência no seu uso, aspectos essenciais para o
processo de compreensão do texto. A escolha da fábula
como gênero textual para a construção dos módulos
Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019
também favoreceu o trabalho, sendo a complexidade
textual das fábulas selecionadas equivalente ao nível
escolar dos alunos. Além disso, os alunos puderam superar
a antiga concepção de fábula como um sendo gênero para
trabalho exclusivamente com alunos de séries iniciais.
Cabe destacar também as condições em que foram
desenvolvidas as oficinas. A condução de um trabalho
realizado em parceria universidade/escola, constituindo
uma equipe integrada por professores de escolas atuantes
em sala de aula, bolsistas de iniciação científica júnior,
alunos de iniciação científica em nível de graduação e
um doutorando favoreceu o desenvolvimento de um
trabalho organizado e sistematizado. Esse contexto deve
ter contribuído para a evolução significativa dos alunos
do 9º ano após a realização das oficinas.
Sob a perspectiva do desempenho no uso das
estratégias, analisando os resultados a partir de um
ranking de evolução, a estratégia de leitura detalhada se
destaca na primeira posição, registrando o maior índice
de crescimento entre as três estratégias investigadas,
seguida da estratégia scanning e da predição leitora.
Esse resultado indica mais afinidade dos alunos com as
estratégias de leitura detalhada e de scanning, na medida
em que revelam, respectivamente, os maiores índices de
crescimento na comparação pré e pós-teste, bem como os
percentuais mais próximos de 50%, já no pré-teste.
A predição leitora, por sua vez, constitui a estratégia
de menos afinidade, sendo a que apresentou menor índice
de acertos tanto no pré-teste quanto no pós-teste na
comparação entre as estratégias. Esse resultado permite
levantar hipótese e orienta a reflexão acerca do tipo de
condução do trabalho de leitura desenvolvido nas escolas.
Uma hipótese pode ser a complexidade característica
da estratégia de predição, a qual exige processamentos
cognitivos mais complexos para a sua realização durante a
leitura. Outro fator pode estar associado às características
do trabalho escolar, fundamentado, essencialmente, na
obtenção das informações superficiais do texto, sem o
direcionamento adequado para a organização linguística
do gênero em foco e sem o estabelecimento de relação
entre as partes do texto e os conhecimentos prévios do
leitor. Os resultados revelam a carência de um trabalho
contínuo com base, especialmente, na identificação e
na seleção das pistas linguísticas do texto, as quais são
essenciais para a realização do procedimento preditivo.
Por essa razão, é mais complexo para o aluno executar
uma tarefa que exija tal postura frente ao texto.
Cabe salientar que, apesar do crescimento da
estratégia de predição ser inferior ao das outras duas
estratégias investigadas, ele é significativo na compa-
ração pré e pós-teste, evidenciando a contribuição dos
materiais construídos para o aprimoramento do uso dessa
estratégia.
Consciência linguística no Ensino Fundamental 251
Esse resultado da estratégia de predição leitora
somado às hipóteses mencionadas acima indicam a
necessidade de ampliação do período de tempo para o
trabalho com a predição, oportunizando ao aluno maior
contato com essa estratégia.
No que se refere à consciência no uso das estratégias,
os resultados apresentam comportamento bastante similar
aos obtidos no uso das estratégias, sendo a predição a
estratégia com menor índice de crescimento no nível
3 (nível de consciência plena), embora apresentando
crescimento estatisticamente significativo. Já, quando
considerado o seu desempenho no nível intermediário
de consciência (nível 2), a predição se destaca como a
estratégia com maior índice de crescimento nesse nível.
Esse resultado corrobora a necessidade de ampliação do
tempo de trabalho com a estratégia a fim de proporcionar
aos alunos um conjunto diversificado de experiências com
a predição leitora.
Entre os dados que se destacam nessa modalidade,
está o da estratégia de scanning, a qual obteve maior
percentual de respostas no nível 3 (nível mais avançado
de consciência), seguida da estratégia de leitura detalhada.
Esse comportamento comprova os benefícios dos
materiais utilizados também para o desenvolvimento da
consciência linguística dos alunos, especialmente quando
considerados os resultados do pré-teste referentes ao uso.
Os resultados relativamente positivos dos alunos no uso
das estratégias de scanning e da leitura detalhada não se
estendem ao desempenho nas atividades de consciência
sobre o seu uso, refletindo, mais uma vez, a influência de
um trabalho escolar sem foco na organização linguística
do texto. Após a realização das oficinas, os alunos do 9º
ano apresentaram, no pós-teste referente à consciência
no uso das estratégias, um conjunto de respostas mais
consistentes, apoiadas nas informações textuais e
explicitando os procedimentos utilizados para a realização
da tarefa proposta. Esse dado corrobora os benefícios de
um material sistematizado e com objetivo estabelecido.
Considerando os dados da consciência no uso das
estratégias sob a perspectiva da progressão do desempenho
nessa modalidade, é possível constatar o predomínio de
casos de progressão do pré-teste para o pós-teste em todas
as estratégias investigadas. Os poucos casos de regressão
evidenciam uma característica frequente nos estudos
sobre consciência e já explicitada por muitos estudiosos
do assunto. De acordo com os pesquisadores, durante
a realização de tarefas que exigem a explicitação do
processo realizado, é comum a presença de inconsistências
em algumas respostas, sendo um reflexo da dúvida gerada
a partir do próprio processo reflexivo, o qual acaba
induzindo, muitas vezes, o participante ao erro.
Os resultados da pesquisa aqui relatados contribuem
para o entendimento dos baixos níveis de desempenho em
Let. Hoje, v. 54, n. 2, p. 243-252, abr.-jun. 2019
leitura apresentados no início deste artigo. Além disso,
a contribuição dos materiais para o aprimoramento dos
conhecimentos dos alunos do 9º ano do EF, evidencia
a relevância de pesquisas voltadas para o ensino e
estimula, consequentemente, a ampliação da pesquisa
apresentada, considerando novos materiais com conteúdos
diversificados (outros gêneros textuais e outras estratégias
de leitura).
No que tange especificamente à pesquisa, os resultados
revelam a importância e a necessidade de estimular a
aproximação universidade/escola, promovendo, assim, a
interação entre integrantes da comunidade escolar e da
comunidade acadêmica, relação benéfica para o encontro
de caminhos mais produtivos para a educação brasileira.
Para tanto, é fundamental a criação de editais por órgãos
de fomento à pesquisa que estimulem essa parceria.
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Orcid: https://orcid.org/0000-0003-2679-7671
E-mail: danielle.baretta@acad.pucrs.br
Thaís Vargas dos Santos
Doutora em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande
do Sul (PUCRS), Porto Alegre, RS, Brasil. Professora de Língua
Portuguesa no Colégio Monteiro Lobato, Porto Alegre, RS, Brasil.
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7514-4381
E-mail: thais.vsantos@hotmail.com
Caroline Bernardes Borges
Doutoranda em Letras no Programa de Pós-graduação em Letras da
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS),
Porto Alegre, RS, Brasil.
Orcid: https://orcid.org/0000-0001-8815-9195
E-mail: carolineh_borges@hotmail.com
Endereço: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
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