Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Extorsão indireta
Na última aula falamos sobre o final do furto, roubo e extorsão. Falta falar sobre a extorsão
indireta, fechando o Capítulo II do Título II da Parte Especial do Código Penal.
Art. 160:
Extorsão indireta
Art. 160 - Exigir ou receber, como garantia de dívida, abusando da situação de alguém, documento que pode
dar causa a procedimento criminal contra a vítima ou contra terceiro:
O exemplo mais clássico de extorsão indireta ocorre quando alguém aceita, como garantia
de dívida, um cheque sabidamente sem fundo. O cheque pode dar início a uma ação penal
por estelionato. Então abusa-se da situação de necessidade de uma pessoa, emprestando a
ela qualquer bem de valor e empregando, como garantia de dívida, qualquer documento
que tenha condições de dar início a uma ação penal. O documento funciona como um
instrumento de coação ou chantagem. Pode ser, além do cheque, um documento de
próprio punho em que a vítima alega ter cometido um crime. Tem que ser documento
escrito. A extorsão indireta é um abuso de necessidade garantido por um documento
escrito que possa ensejar ação penal.
Alteração de limites
CAPÍTULO III
DA USURPAÇÃO
Alteração de limites
Art. 161 - Suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para
apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia:
Usurpação de águas
Esbulho possessório
II - invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas,
terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório.
Temos usurpação simples, que é o crime do art. 161. Usa-se da supressão e alteração para
alterar um limite de terra.
A partir desse momento temos a configuração da usurpação, seja esse limite estabelecido
pela cerca, divisória, tapume, ou então pela árvore que os vizinhos convencionaram como o
marco entre as duas propriedades.
No art. 161, caput, temos a alteração em relação aos limites da terra. No § 1º, temos a
tipificação do crime de usurpação de águas. Exemplo: temos um pequeno rio e várias casas
à margem, que foram compradas em função da presença daquele rio ali. Se um dos
moradores resolve construir uma represa, os outros não terão mais rio passando perto de
suas casas. Isso é usurpação. O mesmo também para desviar o rio. Cuidado: a usurpação
de águas só se verificará se a venda das casas tiver sido condicionada à existência desse rio.
Em regra, o caput fala do limite da terra. O agente altera os limites para tomar uma parte
de terra para si.
No § 1º temos a previsão para águas. Na usurpação de águas, o impedimento não precisa
ser total para que o crime se configure.
No esbulho, para que tenhamos crime, precisamos ter a invasão do prédio com mais de
duas pessoas ou que a invasão seja feita com violência ou grave ameaça. Se a conduta é
praticada com intenção de apossamento, falamos em esbulho possessório, crime que
recebe a mesma pena do caput. A violência ou grave ameaça é à pessoa, não à coisa.
Se o ato resultar em violência superior à lesão corporal leve, responderá o sujeito pelo
crime de usurpação mais a lesão corporal grave ou gravíssima. Se resultar em morte, ele
responderá também por homicídio. Ambos os concursos são materiais. Só não se responde
por dois crimes se por acaso a violência resultar somente em vias de fato ou lesão corporal
simples, pois neste caso ainda estamos na norma do esbulho.
Qualificação doutrinária:
Art. 162:
Art. 162 - Suprimir ou alterar, indevidamente, em gado ou rebanho alheio, marca ou sinal indicativo de
propriedade:
Também é caso de usurpação, mas são bens móveis, porque os animais são semoventes.
Qualificação doutrinária:
Dano
Art. 163:
CAPÍTULO IV
DO DANO
Dano
Dano qualificado
II - com emprego de substância inflamável ou explosiva, se o fato não constitui crime mais grave
III - contra o patrimônio da União, Estado, Município, empresa concessionária de serviços públicos ou
sociedade de economia mista; (Redação dada pela Lei nº 5.346, de 3.11.1967)
Pena - detenção, de seis meses a três anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
O que vem a ser? A norma do crime de dano existe para a proteção do patrimônio. O dano
é, então, a destruição, inutilização ou deterioração de coisa alheia. Seja ela bem móvel ou
um bem imóvel. A doutrina faz a diferença entre destruição, inutilização e deterioração.
Acham-se decisões nos dois sentidos. Por isso a importância dessa diferença. Não se trata
de destruição porque, quando se desparece com o objeto, ele ainda é próprio. Mas se
desmancho a coisa para fazê-la desaparecer, temos destruição, então há dano.
O que seria uma destruição? Tomemos um relógio. Destruir seria fazê-lo em pedaços.
Inutilizar: tirar os ponteiros, ou as engrenagens. E quanto à castração de animais, temos
inutilização ou deterioração? Depende. Se o animal era o garanhão reprodutor, sua
castração implica inutilização. Se ele é um animal comum, a castração pode ser entendida
como uma deterioração. Será uma ou outra. Na prática, essa diferenciação não acontece
muito, ela é feita mais para fins doutrinários e de prova.
Parágrafo único: causa de aumento ou qualificadora? Temos nova pena, então os incisos
são qualificadoras. Cuidado com a doutrina, que falará em “dano majorado”. Não é dano
majorado, pois majorante é causa de aumento, e aqui temos qualificadoras.
Quando teremos o crime qualificado de dano? Quando tivermos violência ou grave ameaça
à pessoa. O cuidado que temos que ter nessa qualificadora é que o crime de dano não se
confunde com furto ou roubo. No furto e no roubo há vontade de assenhorar, enquanto
que no crime de dano a vontade é de destruir, inutilizar ou deteriorar.
O que temos que ter cuidado? Questão de prova: se alguém se utiliza da violência ou grave
ameaça após o dano, responderia o agente pelo dano simples mais a violência, ou pelo
dano qualificado? Para que se tenha dano qualificado pela violência ou grave ameaça, ela
tem que ser anterior ou concomitante ao dano. Se for posterior, responde-se em concurso
material pelo dano e pela violência ou grave ameaça.
Também temos dano qualificado quando usamos explosivo ou material inflamável para
destruir, inutilizar ou deteriorar. Se por acaso o explosivo ou material inflamável foi capaz
de colocar em risco a pessoa, estaremos no art. 250 ou 251. Não pode causar risco às
pessoas; se causar, não responde o sujeito por dano qualificado.
Patrimônio público: que patrimônio público é esse? Bens da União, dos estados, dos
municípios, das concessionárias públicas e das sociedades de economia mista.
Trabalhamos com o princípio da reserva legal. E aí, dentro do inciso III, falamos do
Distrito Federal ou das permissionárias do serviço público? Não. Então, como fica a
situação do DF e das permissionárias? A jurisprudência já se manifestou nos dois sentidos:
há e não há o crime de dano qualificado. Não há manifestação nem do Superior Tribunal
de Justiça nem do Supremo Tribunal Federal a respeito. No TJDFT, o que temos? Ao
destruir banco da praça, o sujeito não responderá por dano qualificado.
Motivo egoístico: não pensem que esse motivo é raiva, inveja, dor de cotovelo, que são
coisas já abrangidas dentro do dano, do caput. O motivo egoístico, então, não pode ser
simplesmente a raiva, o ódio, ou o ciúme; é necessário que as circunstâncias sejam mais
graves. É o que se chama de “motivo do motivo”. Lembram da dosimetria e as
circunstâncias do art. 59? Achamos isso na obra de Bitencourt e de Magalhães Noronha.
Exemplo: castrar animal alheio para não haver competição na venda de sêmen. Ou destruir
outro carro de corrida para que se obtenha vantagem na competição. O ônus de
comprovação é do Ministério Público.
Prejuízo considerável à vítima: quando a destruição de algo é grande para a vítima? O valor
sentimental não qualifica o dano. O prejuízo considerável que tem que ser um
valor econômico. Se for a bicicleta de 1990 que vale hoje R$ 23,00, mas que é o transporte
da pessoa, então sim, há prejuízo grande para a vítima, e o dano é qualificado. O prejuízo
tem que ser patrimonial. Para o valor sentimental temos a indenização por dano moral no
cível.
Art. 164:
Art. 164 - Introduzir ou deixar animais em propriedade alheia, sem consentimento de quem de direito, desde
que o fato resulte prejuízo:
É um crime de dano também: desde que o fato resulte prejuízo! Então também há dano.
Para introduzir animais nalgum lugar, deve haver um ato comissivo para tal. Ou
simplesmente deixar-se o animal adentrar em propriedade alheia. Se não causar prejuízo,
não falamos em nenhum crime. Se minha cabra comer a horta do vizinho, falamos em
dano.
Essa introdução de animais pode ser tanto introduzir como deixar entrar.
Não admite tentativa. Por quê? Porque o crime é condicionado ao efetivo prejuízo.
Aconteceu o prejuízo, temos o crime. Deixei o animal porque queria que ele comesse toda a
plantação.
Observação: não existe dano na forma culposa no Código Penal, só em legislação especial.
Art. 167:
Ação penal
Art. 167 - Nos casos do art. 163, do inciso IV do seu parágrafo e do art. 164, somente se procede mediante
queixa.
Dano em coisa de valor artístico, arqueológico ou histórico
Art. 165 - Destruir, inutilizar ou deteriorar coisa tombada pela autoridade competente em virtude de valor
artístico, arqueológico ou histórico:
Art. 166 - Alterar, sem licença da autoridade competente, o aspecto de local especialmente protegido por lei:
Esses dois artigos foram revogados pela Lei 9605 de 1998. É uma Lei específica. Quando
falamos em dano a coisa protegida por lei, ato administrativo ou decisão judicial, temos
outra pena. Não aplicamos o art. 165, mas a Lei 9605. Risquem o art. 166 em seus Códigos
e coloquem essa observação. Pelo princípio da especialidade, a lei específica será aplicada
em detrimento da lei genérica. Art. 62 da Lei 9605:
Seção IV
II - arquivo, registro, museu, biblioteca, pinacoteca, instalação científica ou similar protegido por lei, ato
administrativo ou decisão judicial:
Parágrafo único. Se o crime for culposo, a pena é de seis meses a um ano de detenção, sem prejuízo da
multa.
Há dano culposo? Não no Código Penal. É fato atípico, e a pessoa só responderá na esfera
cível. Então a previsão da Lei 9605 é a única possibilidade de dano na forma culposa.
O mesmo para o art. 166. A partir do momento em que o Código Penal fala em local
protegido por lei, ao se ter alteração da estrutura do local, temos crime. A lei 9605 dispõe
que há o crime se é feita alteração de lugar protegido por lei ou se feita em
desconformidade com a licença obtida para essa alteração. Lei, ato administrativo ou
decisão judicial. Temos, portanto, um alargamento do art. 166. A tutela jurídica está não
apenas para os lugares do Código Penal, mas também pelos previstos em lei.
O plano arquitetônico de Brasília é tombado. “Puxadinho” nas comerciais nada mais é que
uma alteração de local protegido por lei. Também quando se tem a autorização para
modificar, mas ela não é seguida, ou quando a autorização é extrapolada.
Crime subsidiário: princípio da consunção. No crime de dano, temos que ver se realmente
a intenção do agente era de destruir, inutilizar ou deteriorar. Se tenho inveja dos óculos de
alguém, e desfiro um tapa na cara do felizardo pretendendo quebrar-lhe a armação,
respondo pelo dano qualificado (já que fiz com violência), ou pelo dano e pela lesão
corporal? Só pelo dano qualificado pela violência, pois a intenção era só destruir os óculos.
Para saber, basta verificar a intenção do agente. Se quero bater no indivíduo, não respondo
pelo dano, pois os óculos eram apenas “uma pedra no meio do caminho”. Até porque
acerto a coisa culposamente. Pode-se discutir entretanto que, se pretendo agredir alguém
que usa óculos, é perfeitamente previsível o dano ao objeto, e provavelmente estarei agindo
com dolo eventual, pois causarei dano, e não me importarei com o resultado. Eu deveria,
portanto, responder pela lesão corporal em concurso material com o dano praticado com
dolo eventual. Mas isso ainda não é aceito, salvo numa monografia ou numa questão
subjetiva. Não aceitem isso para responder questões objetivas.
Apropriação indébita
Art. 168:
CAPÍTULO V
DA APROPRIAÇÃO INDÉBITA
Apropriação indébita
Art. 168 - Apropriar-se de coisa alheia móvel, de que tem a posse ou a detenção:
Aumento de pena
I - em depósito necessário;
Essa apropriação é diferente de subtração. Por quê? Nesta, pego a coisa sem o
consentimento da vítima. Na apropriação, temos inversão no animus. Chama-se isso
de animus nocendi: intenção de prejudicar. Na apropriação temos a entrega da coisa, de
boa-fé, pelo legítimo possuidor ou proprietário para o agente. O agente não subtraiu, e não
toma a coisa contrariamente à vontade do dono. Ele recebe espontaneamente, e sabe que
terá que devolver no futuro. A partir do momento em que a pessoa que recebeu está no
poder da coisa, ela pode ter vontade de ser dona, e tem vontade de assenhoramento. Nisso
temos a apropriação indébita. A apropriação indébita só acontece no momento em que o
legítimo possuidor ou proprietário pede a coisa de volta e o agente nega. Note que, quando
o legítimo possuidor ou proprietário entrega ao agente, o agente estava, àquele momento,
de boa-fé. Se restar provado que estava de má-fé, não falamos mais em apropriação
indébita, mas em estelionato.
A apropriação indébita é diferente do furto porque neste temos a retirada da coisa sem a
vontade do dono. Na apropriação, temos a entrega da coisa pelo dono.
Inciso II: é um rol taxativo. Essas pessoas que têm a detenção, a posse da coisa em razão
de tem essa condição terão causa de aumento. Não existe apropriação indébita qualificada,
mas apropriação indébita majorada.
Por fim, é bom nos perguntarmos se há causa de aumento se a coisa é entregue em razão
do ofício, emprego ou profissão no seguinte caso: o operador de caixa da loja recebe
dinheiro dos clientes, e o coloca no caixa em função do ofício ou emprego. Ele recebe o
dinheiro de boa-fé. A partir do momento em que aquilo está ali, falamos em furto ou
apropriação indébita caso ele resolva levar para casa? Furto! Porque não tivemos o
consentimento do dono da loja. A vítima é o dono da loja. Costuma cair em prova. Importa
saber quem entrega e para quem. Quem entrega tem que ser a vítima.
Art. 168-A:
Art. 168-A. Deixar de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e
forma legal ou convencional:
I – recolher, no prazo legal, contribuição ou outra importância destinada à previdência social que tenha sido
descontada de pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público;
II – recolher contribuições devidas à previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos
relativos à venda de produtos ou à prestação de serviços;
III - pagar benefício devido a segurado, quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido
reembolsados à empresa pela previdência social.
§ 3o É facultado ao juiz deixar de aplicar a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de
bons antecedentes, desde que:
I – tenha promovido, após o início da ação fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da
contribuição social previdenciária, inclusive acessórios; ou
II – o valor das contribuições devidas, inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela
previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento de suas execuções fiscais.
Deixar de repassar aos cofres da previdência os valores das contribuições sociais e
previdenciárias dos segurados. Quando deixo de repassar a contribuição previdenciária, o
desconto do INSS feito no salário, que é feito em folha de pagamento pelo empregador,
estamos fazendo apropriação indébita previdenciária. O caput, então, fala em deixar de
repassar a contribuição previdenciária dos segurados.
§ 1º: temos duas condutas que incidem na mesma pena. Deixar de recolher, e não
de repassar, a contribuição sobre o salário, e no inciso II falamos em recolhimento
previdenciário sobre produtos ou serviços.
Discussão: poderíamos ter essa modalidade culposa? Pode o sujeito dizer que não queria
causar prejuízo ao erário? Para o STF, sim. Para o CESPE, portanto, sim também. Na
doutrina acharemos muita coisa diferente a esse respeito.
O § 2º: fala em extinção da punibilidade, que deve obrigatoriamente ser observada pelo
juiz caso o agente pague integralmente o débito antes da propositura da ação fiscal. Não
confundam, evidentemente, com ação penal, que começa com o oferecimento da denúncia
ou queixa-crime. A ação fiscal inicia com a entrega da notificação do auto de infração, e
essa notificação tem que ser válida. Então, se o agente paga integralmente o débito, é
extinta a punibilidade.
A Fazenda não executa se o valor for igual ou inferior a 10 mil Reais. Não teremos execução
fiscal. É o que diz a Lei 10522 no art. 20. Se seu débito em relação à previdência for menor
que R$ 10.000,00, o juiz poderá declarar a extinção de punibilidade.