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Teoria do desvio produtivo do consumidor

Criada por Marcos Dessaune, advogado e especialista em Direito do Consumidor, a


teoria do desvio produtivo do consumidor foi lançada em 2011 em seu livro: Desvio
Produtivo do Consumidor: o prejuízo do tempo desperdiçado. Esta teoria defende que
todo tempo desperdiçado pelo consumidor para a solução de problemas gerados por
maus fornecedores constitui dano indenizável. O desvio produtivo do consumidor é o
fato ou evento danoso que se consuma quando o consumidor, sentindo-se prejudicado,
gasta o seu tempo vital – que é um recurso produtivo – e se desvia das suas atividades
cotidianas – que geralmente são existenciais. A esquiva abusiva do fornecedor de se
responsabilizar pelo referido problema, que causa diretamente o evento do desvio
produtivo do consumidor, evidencia a relação de causalidade existente entre a prática
abusiva do fornecedor e o evento danoso dela resultante.

A tese do desvio produtivo do consumidor é um marco para a evolução da defesa do


consumidor. É inadmissível que o cliente desperdice seu tempo para solucionar
problemas derivados dos bens criados exatamente com o objetivo de otimizar o seu
tempo.

É notório que inúmeros fornecedores, cotidianamente, empregam práticas abusivas e


colocam produtos e serviços com vício ou defeito no mercado de consumo. Além disso,
muitos desses fornecedores, diante da reclamação do consumidor, ainda resistem à
rápida e efetiva resolução desses problemas de consumo que eles próprios criam. Tal
comportamento induz o consumidor em estado de carência e condição de
vulnerabilidade a despender seu tempo vital, a adiar ou suprimir algumas de suas
atividades existenciais e a desviar suas competências dessas atividades, seja para
satisfazer certa carência, seja para evitar um prejuízo, seja para reparar algum dano.
Portanto, nas relações de consumo todo fornecedor tem o dever de ofertar produtos e
serviços garantindo os direitos básicos do consumidor, artigo 6, do Código de Defesa do
Consumidor. O Cliente deve empregar seu tempo nas atividades de livre escolha e
preferência, e não desperdiçando resolvendo problemas criados por fornecedores. Cabe
a este ofertar no mercado de consumo produtos e serviços que tenham padrões
adequados de qualidade, segurança, contenha informação clara e adequada, não usar de
má-fé, não empregar práticas abusivas no mercado de consumo, não oferecer riscos ou
causar danos ao consumidos, sanar os vícios que seus produtos e serviços apresentem, a
exemplo disso temos o recall, reparar os danos que eles e eventuais práticas abusivas
causem ao consumidor, de modo prático e efetivo.

Jurisprudências

Primeira menção

Em 12/9/2017, no julgamento colegiado do REsp 1.634.851/RJ interposto pela Via


Varejo, a 3ª Turma do STJ, sob a relatoria da ministra Nancy Andrighi, já havia
mencionado o Desvio Produtivo do Consumidor para negar provimento ao recurso
especial daquele fornecedor:” Aliás, já há quem defendam nessas hipóteses, a
responsabilidade civil pela perda injusta e intolerável do tempo útil: Marcos Dessaune
( Desvio Produtivo do Consumidor – O Prejuízo do tempo desperdiçado. À frustração
do consumidor de adquirir o bem com vício, não é razoável que se acrescente o desgaste
para tentar resolver o problema ao qual ele não deu causa, o que, por certo, pode ser
evitado – ou, ao menos, atenuado – se o próprio comerciante participar ativamente do
processo de reparo, intermediando a relação entre consumidor e fabricante, inclusive
porque, juntamente com este, tem o dever legal de garantir a adequação do produto
oferecido ao consumo”, disse a ministra.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.241.259 - SP (2018/0022875-2)


AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.132.385 - SP (2017/0165913-0)

"APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA.


COBRANÇA INDEVIDA. CARTÃO DE CRÉDITO CLONADO.
RESTRIÇÃO E COBRANÇA INDEVIDA. DESVIO
PRODUTIVO DO CONSUMO. DANO MORAL IN RE IPSA.
Conjunto probatório que evidencia a falha na prestação do
serviço. A hipótese dos autos bem caracteriza aquilo que a
doutrina consumerista contemporânea identifica como ¿desvio
produtivo do consumo¿, assim entendido como a situação
caracterizada quando o consumidor, diante de uma situação de
mau atendimento em sentido amplo precisa desperdiçar o seu
tempo e desviar as suas competências ¿ de uma atividade
necessária ou por ele preferida ¿ para tentar resolver um
problema criado pelo fornecedor, a um custo de oportunidade
indesejado, de natureza irrecuperável. Dever de indenizar.
Desprovimento do recurso."
(TJ-RJ - APL: 00072405820098190054 RJ 0007240-
58.2009.8.19.0054, Relator: DES. ANDREA FORTUNA
TEIXEIRA, Data de Julgamento: 30/03/2015, VIGÉSIMA
QUINTA CÂMARA CIVEL/ CONSUMIDOR, Data de
Publicação: 01/04/2015 00:00)

"DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL.


AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. FILA DE
INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. DEMORA NO ATENDIMENTO.
LEI MUNICIPAL. TEMPO SUPERIOR AO FIXADO POR
LEGISLAÇÃO LOCAL. DESVIO PRODUTIVO DO
CONSUMIDOR. PERDA DE TEMPO ÚTIL. DANO MORAL.
CARACTERIZAÇÃO. APELAÇÃO IMPROVIDA. I. Hipótese na
qual restou comprovada a espera excessiva em fila de banco de
aproximadamente duas horas, contrariando a lei municipal
que estipula 20 (vinte) minutos comoprazo máximo de
atendimento. II. O" desvio produtivo do consumidor ", que se
configura quando este, diante de uma situação de mau
atendimento, é obrigado desperdiçar o seu tempo útil e
desviar-se de seus afazeres, gera o direito à reparação civil.
III.Para a fixação do quantum indenizatório por danos morais,
cabe ao magistrado tomar todas as cautelas para que a
indenização não seja fonte de enriquecimento sem causa, nem
seja meramente simbólica, de modo que mantenho o valor de
R$3.000,00 (três mil reais), importância que considero
razoável à espécie. IV-Apelação improvida."
(TJ-MA - APL: 0113792014 MA 0006588-93.2013.8.10.0040,
Relator: ANTONIO GUERREIRO JÚNIOR, Data de
Julgamento: 24/06/2014, SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data
de Publicação: 25/06/2014)

"DANOS MORAIS ? RECUSA POR INSTITUIÇÃO


BANCÁRIA ? PROCURAÇÃO PÚBLICA ? Alegação do banco
de falta de outorga, pela mandante, de poderes especiais e
específicos para o resgate da ordem de pagamento ? Autora
septuagenária e com dificuldade de deambulação, que
outorgou mandato ao seu filho, para representá-la perante
instituições bancárias ? Recusa injustificada da instituição
financeira, porquanto apresentada procuração pública em que
conferidos poderes especiais e expressos para efetuar
retiradas ? Tempo perdido do consumidor, para tentativa de
solução do infortúnio, que acarreta dano indenizável ?
Inteligência da tese do Desvio Produtivo do Consumidor ?
Configuração de danos morais ? Afronta à dignidade da pessoa
humana ? Caso dos autos que não se confunde com mero
aborrecimento do cotidiano ? Indenização fixada em R$
5.000,00 (cinco mil reais) ? Sentença reformada ? Recurso
provido."
(TJ-SP - APL: 00223321620108260032 SP 0022332-
16.2010.8.26.0032, Relator: Fábio Podestá, Data de
Julgamento: 08/10/2014, 8ª Câmara Extraordinária de Direito
Privado, Data de Publicação: 15/10/2014)

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.


Consumidora: Patrocínia Aparecida
Fornecedora: Electrolux.
 Processo: 0000210-16.2018.5.17.0101
A 3ª turma do TRT da 17ª região manteve condenação de reclamada ao
pagamento de dano moral por falta de anotação na CTPS durante o período
em que o vínculo não havia sido reconhecido, bem como pelo não
pagamento das verbas rescisórias.
A empresa sustentou que o autor não provou a existência de afronta à honra
ou à imagem do trabalhador para que a reclamada fosse condenada em
pagamento de danos morais.
Ao analisar o caso, a relatora, desembargadora Daniele Corrêa Santa
Catarina, concluiu que a falta de anotação da CTPS do autor representa
ofensa à dignidade do trabalhador e autoriza o deferimento da respectiva
reparação. Para tanto, a relatora utilizou, por analogia, o entendimento “que
vem se tornando pacífico no âmbito do E. STJ no que tange às relações de
consumo, que diz respeito à teoria do desvio produtivo”.
“Aquela Corte Superior tem entendido que nos casos em que o fornecedor deixa de
praticar ato que lhe era imposto, levando o consumidor ao desgaste de obter o bem
da vida em juízo, impõe-se a condenação daquele ao pagamento de uma indenização
em razão do tempo perdido pelo hipossuficiente.”
Como precedente, Daniele Catarina citou acórdão de relatoria de Moura
Ribeiro, na qual o ministro “assentou claramente que aquele que ao realizar (ou
não realizar) ato que lhe competia, levando à parte contrária ao desperdício do seu
tempo para solucionar questão que não deu causa, deve ressarcir os prejuízos
morais causados”.

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