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MENSILE SPED. IN ABB. POST.
Tar. Economy Taxe Percue Tassa Riscossa Roma.
ED. TRENTA GIORNI SOC. COOP. A R. L.
ISSN 1827-627X
na Igreja e no mundo
In caso di mancato recapito rinviare a Uff. Poste Roma Romanina per la restituzione al mittente previo addebito.
If undelivered please return to sender, postage prepaid, via Romanina post office, Roma, Italy.
ANO XXIX - N.6 - 2011 R$ 15,00 - € 5 En cas de non distribution, renvoyer pour restitution à lʼexpéditeur, en port dû, à: Ufficio Poste Roma Romanina, Italie
ano XXIX
N. 6 ano 2011
EDITORIAL
CAPA
ESTADOS UNIDOS
A volta à simplicidade da fé católica
Entrevista com o cardeal Donald Wuerl — de G. Cubeddu 34
3OGIORNI
nella Chiesa e nel mondo REPORTAGEM DA TURQUIA
NESTE NÚMERO
Gráfica
Conselho de Administração
Giampaolo Frezza (presidente),
Proximidade e misericórdia — por G. Valente 52
Marco Pigliapoco - marcopgl@30giorni.it Massimo Quattrucci (vice-presidente),
Vincenzo Scicolone - Enzo@30giorni.it Giovanni Cubeddu, Paolo Mattei, Só a humildade nos livra das chantagens
Marco Viola - marcoviola@30giorni.it Roberto Rotondo, Michele Sancioni,
Gianni Valente Entrevista com Carlos Aguiar Retes — por G. Valente 54
Imagens
Paolo Galosi - galosi@30giorni.it Diretor responsável
Roberto Rotondo
Colaboradores NOVA ET VETERA
Pierluca Azzaro, Françoise-Marie Babinet, Tipografia
Marie-Ange Beaugrand, Maurizio Benzi, Arti Grafiche La Moderna Introdução — por P. Mattei 60
Lorenzo Bianchi, Massimo Borghesi, Via di Tor Cervara, 171 - Roma
Lucio Brunelli, Rodolfo Caporale,
Pina Baglioni, Lorenzo Cappelletti, ESCRITÓRIO PARA ASSINATURA E DIFUSÃO
Lebreton, teólogo crente — por L. Cappelletti 64
Gianni Cardinale, Stefania Falasca, Via Vincenzo Manzini, 45 - 00173 Roma
Giuseppe Frangi, Silvia Kritzenberger, Tel. +39 06 72.64.041 Fax +39 06 72.63.33.95 Um idealismo imprudente — por L. Cappelletti 66
Walter Montini, Jane Nogara, Stefano M. Paci, E-mail: abbonati30g@30giorni.it
Felix Palacios, Tommaso Ricci, Giovanni Ricciardi De segunda a sexta-feira das 9h às 18h
e-mail: abbonati30g@30giorni.it
Colaboraram neste número ANIVERSÁRIOS
Miguel H. Díaz, Jamie T. Phelphs Este número foi concluído na redação
dia 23 de julho de 2011 “Uma gratidão que cresce de ano em ano”
Escritório Legal
Davide Ramazzotti - d.ramazzotti@30giorni.it Impressão concluída no mês de agosto de 2011 Entrevista com Georg Ratzinger
— por R. Rotondo e S. Kritzenberger 72
CRÉDITOS FOTOGRÁFICOS: Reuters/Contrasto: Capa; pp.21,55,57;
Andrew Stern/Redux/Contrasto: Capa; Osservatore Romano: pp.4,5,74; Bbc Video-2008:
pp.7,8,11,14,16,17,18,20; Getty Images: pp.22-23,35,37,58; Lorenzo Biondi:
pp.23,24,25,26,27,28,29,30,31,32,33; Romano Siciliani: pp.26,48,50,64-65; SEÇÕES
Rafael Crisostomo/Catholic Standard: pp.34,37,38; Associated Press/LaPresse:
pp.35,36,46,48,55,56,57,59; Piotr Spalek/Catholic Press Photo/CNS Photo: p.36;
Magnum/Contrasto: pp.40,46,46-47,47,49; Arquivo Mill Hill Missionaries: p.41; CARTAS DOS MOSTEIROS 6
Arquivo The Sisters of the Blessed Sacrament: p.42; Arquivo Oblate Sisters of Providence:
p.43; Luke Sharrett/Redux/Contrasto: p.44; Paolo Galosi: p.45; CARTAS DOS SEMINÁRIOS 13
Afp/Getty Images: pp.52-53,58,58-59; Gianni Valente: pp.52,53; Celam: p.54;
Lalo De Almeida/Contrasto: p.56-57; Keystone/Getty Images: p.72; Corbis: p.74 CARTAS DAS MISSÕES 14
Suplemento Leitura espiritual: Pontifícia Comissão de Arqueologia Sacra: Capa; pp.1,3,5, CORREIO DO DIRETOR 19
7,8,9,10,11,13,14,17,18-19,20,21,22,23,24.
30DIAS NA IGREJA E NO MUNDO 48
30DIAS Nº 6 - 2011 3
Editorial
O mais importante
são as notícias do exterior
por Giulio Andreotti
O mais importante são uma só. Eu era um menino e muitas coisas não enten-
as notícias do exterior, dia: como quando uma vez o pároco, ao ver-me com o
L’Osservatore, disse-me: “Muito bem, assim você po-
porque no conformismo que de saber todos os dias quem foi recebido pelo Santo Pa-
dre”. Na época isso não tinha grande importância para
temos ao nosso redor, ter uma mim, já que não me recebia, porém mais tarde pude
constatar como se podia dar notícias até mesmo atra-
fonte que apresenta as coisas vés da listas das audiências. Como quando, em setem-
bro de 1948, foi enviado a Pio XII o laicísssimo embai-
com uma certa objetividade xador em Washington, Alberto Tarchiani, para explicar
ao Papa porque para a Itália teria sido um bem aderir ao
é um privilégio que não Pacto Atlântico, fato pelo qual havia alguns receios por
parte do Vaticano: no dia seguinte o L’Osservatore
se pode deixar escapar. não publicou a notícia da audiência na usual lista da pri-
Também é interessante meira página, mas uma breve nota informava sobre a
presença em Roma do embaixador Tarchiani. Fato
a seleção, a ordem e o modo que, junto com uma reportagem do dia seguinte sobre
as desordens que aconteciam na área vermelha de Ber-
como são propostas lim publicada nas páginas internas, deu a De Gasperi e
a mim a sensação de que a audiência teria acontecido e
as notícias do exterior que tinha sido positiva.
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como recolhemos dos seus augustos lábios” com a in-
dicação entre parênteses das fontes das citações, in-
cluindo as referências do Migne. Respondeu-me: “Por
que o senhor não diz diretamente ao Santo Padre?”. E
a conversa acabou ali mesmo.
Em fases alternadas discute-se sobre a oficialidade
ou sobre a oficiosidade do L’Osservatore. Uma vez a
oficialidade era férrea. Hoje talvez não, mas não quer
dizer que o jornal tenha mudado, porque um jornal re-
flete uma situação: é que mudaram os tempos e o que
era manchete ontem, hoje termina na última página e
vice-versa. Creio que também pelas posições a serem
Acima, Guido Gonella na redação do L'Osservatore Romano assumidas, o caminho do equilíbrio seja sempre o me-
lhor: ser prudentes, não pretender dizer sempre a últi-
Voltando aos vinte anos de regime fascista, é de ma palavra, mas ter sempre a convicção de se deter na
grande importância recordar que o L’Osservatore era penúltima. Todavia a tradição tem o seu valor, e ainda
o único instrumento que nos dava notícias sobre os hoje apoiar uma tese ou uma citação no L’Osservato-
acontecimentos na Itália e no mundo. Com efeito, re dá uma importância que em outro jornal não existi-
eram anos nos quais era proibido falar de coisas italia- ria. Hoje como então: Palmiro Togliatti motivou o voto
nas que não fossem os comunicados do Ministério da favorável aos Pactos Lateranenses na Assembleia
Cultura popular do regime, e comprar o L’Osservato- constituinte citando “os sinais” do L’Osservatore e
re num certo sentido era arriscado, mas qualificava um convidando Pietro Nenni a não subestimá-los.
pouco as pessoas, coisa quase incompreensível hoje Mas se tivesse que dizer qual foi a mais surpreen-
que somos todos iguais no nosso conformismo e ao dente “reprimenda” dada pelo L’Osservatore que eu
mesmo tempo somos todos diferentes no nosso indivi- lembre, eu diria a do cardeal Ottaviani quando em ní-
dualismo. vel governamental e institucional houve um aumenta-
Na época o jornal era boicotado e os fascistas fa- do desenvolvimento das relações entre a Itália e o go-
ziam piquetes nas bancas, algumas pessoas foram verno soviético. No campo eclesiástico houve muito
agredidas ao comprá-lo, como o historiador Claudio mal humor a que deu voz o cardeal Ottaviani (de resto
Pavone. Apesar disso, o L’Osservatore era tão solici- uma grande figura de sacerdote romano). No dia se-
tado que superou a tiragem de duzentos mil exempla- guinte, o L’Osservatore escreveu em poucas palavras
res por dia. Principalmente os Acta diurna de Guido lapidares que o cardeal Ottaviani “exprimia suas
Gonella, que na época trabalhava no L’Osservatore ideias pessoais”. Hoje nos parecem momentos de
como redator de política externa, eram muito solicita- normal administração, mas na época, para o tempo a
dos e lidos com atenção, pois eram uma importante ja- que nos referimos, eram viradas que marcavam épo-
nela aberta para o mundo. Gonella, através da sua se- ca. Ter um parecer levemente diferente queria dizer
ção, filtrava notícias de países estrangeiros que a vigia- agir por conta própria.
da imprensa italiana ignorava ou apresentava de ma- Mas hoje, qual poderia ser o papel do L’Osservato-
neira ultrajante. Os Acta diurna foram um precioso re Romano no meio de tanta mídia?
instrumento de informação internacional que aproxi- O mais importante são as notícias do exterior, por-
mou entre outras coisas ao mundo da Igreja também que no conformismo que temos ao nosso redor, ter
muitos homens que estavam afastados. Mas todo o uma fonte que apresenta as coisas com uma certa ob-
L’Osservatore teve um papel extraordinário que hoje jetividade é um privilégio que não se pode deixar esca-
é importante recordar: como quando publicou as men- par. Também é interessante a seleção, a ordem e o
sagens de solidariedade que o papa Pio XII enviara aos modo como são propostas as notícias do exterior. Por-
chefes de estado da Bélgica, Holanda e Luxemburgo que isso também é um juízo – uma avaliação – mesmo
invadidos pelo exército de Hitler. se implícita, que revela como se pensa. Quanto ao res-
Na época, para nós jovens, só atravessar o limiar da to, não sendo do ramo, deixo o juízo sobre a crônica
redação do L’Osservatore era uma honra e um título vaticana e sobre os artigos teológicos aos eclesiásticos.
nobre. Algumas vezes Gonella me recebia abusiva- Porém gostaria de concluir essa minha mensagem
mente desobedecendo o regulamento do diretor, o de felicitações ao L’Osservatore com um passo de Vit-
conde Giuseppe Dalla Torre, que não queria visitas na torio Bachelet, que alguns anos atrás o L’Osservatore
redação. Pensei que não era notado, porém anos mais Romano publicou na seção de pensamentos espiri-
tarde li uma entrevista do ex-diretor do L’Osservatore tuais e que conservo sempre entre os meus papéis pela
na qual ele contava, até divertido, de todas as vezes que sua perdurável atualidade: “Os tempos ao nosso redor
entrava no escritório de Gonella e eu me escondia não são fáceis: as dificuldades políticas, as incertezas,
atrás da porta, e depois ele perguntava ao seu redator: as contradições nos advertem que será um caminho
“Mas quem é o cujo?”. muito arriscado, que requererá todo o nosso sentido
Uma curiosidade ligada ao conde Giuseppe Dalla de responsabilidade, principalmente toda a nossa sim-
Torre: uma vez escrevi-lhe que achava bizarro introdu- ples fé, toda a nossa viva esperança, toda a nossa mais
zir todos os discursos do Papa com a premissa: “Assim verdadeira caridade”. q
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Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros
Convite à oração
A redação de 30Giorni convida a todos, em particular as
pessoas consagradas dos mosteiros de clausura, a rezarem
por padre Giacomo Tantardini. Há alguns meses ele vem-se
tratando de um câncer de pulmão. Que o Senhor nos conceda
pedir com confiança o milagre da cura. Aos pais pedimos a
caridade de fazerem os seus filhos rezarem.
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Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros
Imagens da China
As imagens que ilustram estas páginas
foram extraídas do documentário Wild China,
produzido pela BBC em 2008
Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros
Senhor abençoe o seu trabalho e o recompense com cer nada por su cuenta”
o cêntuplo. (Jo 5,19), de padre Giaco-
Muito obrigada. Esperamos continuar a receber mo Tantardini. Fascinou-
sua revista. nos pela profundidade de
Fraternalmente, ideias e pelo modo como
são expressas. Foi o tema
as irmãs clarissas capuchinhas sacramentárias de uma reflexão bela e
profunda em nossas reu-
niões comunitárias, e eu ti-
DOMINICANAS CONTEMPLATIVAS ve vontade de lhe dizer is-
DO CONVENTO MADRE DE DIOS to, para que saiba o bem
Manatí, Porto Rico que esses escritos espiri-
tuais fazem a todos nós
A meditação sobre a Santa Páscoa nos fez bem que os recebemos graças a
sua bondade.
Manatí, 25 de maio de 2011 Sigam em frente com a ajuda de Deus e contem
com a nossa oração, a fim de que possam continuar a
Estimado senhor Giulio Andreotti, difundir tudo o que pode ajudar espiritualmente tantas
é um prazer escrever-lhe para lhe expressar a nossa pessoas. Todos os dias levamos até diante de Deus o
gratidão por sua fidelidade no envio da revista senhor, senador Giulio, seus familiares e seus colabo-
30Días. Nós lhe agradecemos porque a leitura da re- radores, para que os abençoe abundantemente.
vista, tão interessante, nos é de grande utilidade. Agradeço-lhe em nome de toda esta comunidade
Nestes dias de Páscoa de Ressurreição, como encarte de dominicanas contemplativas.
da revista, o senhor nos enviou um opúsculo com uma
meditação sobre a Santa Páscoa, “El Hijo no puede ha- irmã María del Amor, O.P.
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Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros
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Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros
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Cartas dos mosteiros Cartas dos mosteiros
há textos de teologia ou outros que eu gostaria de tualmente, já há muito tempo. Queremos que receba
entender melhor. Além disso, poderia compartilhar a nossa gratidão por todo o bem que faz, mantendo-
a revista com sacerdotes latino-americanos que fa- nos informadas sobre a atualidade da Igreja e sobre o
zem o doutorado em Innsbruck, na Universidade que acontece ao seu redor. É um instrumento muito
dos Jesuítas. valioso e muito útil, que aproxima mais da Igreja e dos
Eu, a minha superiora, as minhas dez companhei- nossos irmãos no mundo.
ras austríacas e a nossa postulante alemã rezamos pe- Que o Bom Deus o abençoe e a seus colaboradores
lo senhor e por toda a sua equipe. Deus conceda ao pelo trabalho que realizam, por sua grande generosi-
benfeitor universal da vida contemplativa muita saúde dade e bondade, com abundantes graças e bênçãos.
e ainda muitos anos de vida. Conte com nossas orações e que nossa Mãe, a Virgem
Com atenção, do Carmelo, o guarde em seu Coração imaculado.
Gratas e unidas na oração do carmelo,
irmã María Antonieta de la Cruz Victoriosa, A.P.
madre Ana del Niño Jesús, prioresa, e comunidade
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Cartas dos mosteiros
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Cartas dos seminários
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Cartas das missões Cartas das missões
MISSIONÁRIOS SALESIANOS
Ron Phibun, Tailândia
Da Tailândia
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Cartas das missões Cartas das missões
MISSIONÁRIOS JESUÍTAS
Kannur, Kerala, Índia
Muitos usarão
Who prays is saved
e rezarão e serão salvos
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Cartas das missões Cartas das missões
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Cartas das missões Cartas das missões
Caro senhor,
meu nome é Léonora Agomma, sacerdote. Tive a ale-
gria de descobrir na casa de um amigo o livrinho Qui
prie sauve son âme. Eu o achei maravilhoso e real-
mente muito útil para todo cristão. Gostaria de saber
como poder obtê-lo, dado que tenho a intenção de pro-
pô-lo aos meus catecúmenos, que este ano são 190. Tomo a liberdade de apresentar-me. Sou padre
Obrigado. Reuberson Ferreira. Faço parte da Congregação dos
Missionários do Sagrado Coração. Tenho um ano e
padre Léonora Agomma meio de padre e trabalho no interior do Amazonas na
imensa diocese de São Gabriel da Cachoeira, no ex-
Dangbo, 6 de junho de 2011 tremo norte do Brasil. Desde abril do ano passado fui
designado para assumir uma paróquia nesta área. Tra-
Caro senhor, ta-se de um trabalho necessário, contudo, imensa-
recebi os livrinhos Qui prie sauve son âme e gostaria mente árduo. Trabalhamos basicamente com os po-
de expressar, com esta carta, não apenas a minha gra- vos indígenas (mais de 23 etnias). Aqui já há uma his-
tidão, mas também a dos meus catecúmenos e fiéis, tória de mais de cem anos de trabalho missionário e de
aos quais distribuí todos os livrinhos domingo passa- evangelização protagonizado pelos salesianos e coad-
do, no final da missa da tarde. juvado pela nossa congregação.
Foi, para eles, uma satisfação imensa, e aqueles Estando nesta região e sentindo a realidade, pude
que não o receberam não param de me pedir. Tudo é perceber que, em muitos aspectos, o povo tem uma
graça. Deus os abençoe pelo grande bem que fizeram profunda fé e uma prática constante do catolicismo,
a esses jovens. sobretudo nas gerações mais maduras. Uma preocu-
Agradeço-lhes infinitamente. pação, contudo, tomou-me de assalto, os mais jovens
Se for possível, gostaria de conhecer melhor têm pouca formação religiosa e até as orações princi-
30Jours. pais do cristianismo estão sendo desaprendidas.
Lendo a revista 30Dias, que o bispo diocesano D.
padre Léonora Agomma Edson Damian me repassa quando acaba de ler, per-
cebi na riqueza das páginas que descortinam o mundo
eclesial, bem como a maravilha que é esse pequeno
MISSIONÁRIOS DO SAGRADO CORAÇÃO opúsculo chamado Quem reza se salva. Creio que em
São Gabriel da Cachoeira, Amazonas, Brasil nível de subsídio para uma meditação e revisão das
orações principais do cristianismo ele seja fabuloso.
Quatrocentos exemplares de Quem reza Revirando a biblioteca da diocese achei um exemplar
se salva para o povo indígena da amazônia e ratifiquei meu pensamento.
Com disposição em adquirir uma quantidade ra-
São Gabriel da Cachoeira, 3 de junho de 2011 zoável (cerca de quatrocentos exemplares), decidi pes-
quisar os valores. Esse fato contudo desanimou-me, a
Estimado Sr. Giulio Andreotti, saudades! nossa paróquia não tem condições de pagar tão alto
Caro Diretor da revista 30Dias, agradeço imensamente custo. Por isso resolvi pedir-lhes que me doassem esse
pelo rico trabalho que o senhor presta à Igreja e cordial- material. Comprometo-me, se preciso, em ajudar a
mente o cumprimento como um irmão menor em Cristo. custear as despesas de expedição. Enfim, esse é o ¬
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Cartas das missões
meu desejo para poder servir melhor este povo indíge- do Quênia, e ficamos muito felizes por lê-la e ser infor-
na da amazônia. mados das notícias sobre a Igreja Católica por meio
Por fim, despeço-me fraternalmente e aguardo desse importantíssimo meio de informação.
uma resposta sua (oxalá seja positiva). Agora estou novamente em casa, pois o bispo da
Com afeto, nossa diocese de Iglesias nos chamou de volta, pela
nossa idade: eu tenho 82 anos e o meu confrade, 76.
padre Reuberson Ferreira, M.S.C. Agora a missão está sob a responsabilidade dos Mis-
sionários da Consolata de Nairóbi, que estão desen-
volvendo um ótimo trabalho.
DIOCESE DE IGLESIAS Lembro e tenho saudade da leitura de 30Giorni,
Nuxis, Carbonia-Iglesias, Itália que foi também muito útil para aprender inglês, e
gostaria de continuar a receber sua revista. Mas, co-
30Giorni do Quênia para a Sardenha mo eu era pobre na missão no Quênia, sou pobre
também agora: ajudo numa grande paróquia em Car-
Nuxis, 19 de junho de 2011 bonia, onde o dinheiro é pouco.
Se o diretor e vocês puderem me ajudar, eu po-
Caros amigos, deria celebrar missas segundo as suas intenções.
até o ano passado fui missionário no Quênia (por de- Deus abençoe a todos vocês, às suas famílias e ao
zesseis anos), ao lado de outro padre, em Camp Gar- seu trabalho.
ba, no vicariato apostólico de Isiolo. Recebemos regu-
larmente a revista 30Giorni em inglês, a língua oficial padre Giulio Ballocco
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Correio do Diretor
ARQUIDIOCESE DE OLINDA E RECIFE
Recife, Pernambuco, Brasil
COMPANHIA DOS SACERDOTES DE SÃO SULPÍCIO DE A presente carta é para agradecer calorosamente por
MONTREAL todas as edições que recebi e para encorajá-lo a continuar
Montreal, Quebec, Canadá esta obra de educação da inteligência e da fé na Igreja.
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Correio do Diretor
REVISTA LEAVES, DOS MARIANNHILL FATHERS
Dearborn, Michigan, EUA
Caro diretor,
desejo parabenizá-lo pelos três artigos e pelo comen-
tário à segunda parte do livro do papa Bento XVI Je-
sus of Nazareth, no número 3 de 2011 de sua revista.
Os artigos são: A look at the Jesus of the Gospels
DIOCESE DE ÁSTI and a hearing of His words, do cardeal Georges Cot-
Ásti tier, O.P.; Faithful to the declaration ‘Nostra aetate’,
de Riccardo Di Segni; e The dividing line runs bet-
“Boa imprensa” para o hospital de Ásti ween trust and skepticism, de Rainer Riesner. Res-
pectivamente escritos por um católico, um judeu e um
Ásti, 17 de junho de 2011 protestante, os artigos dão três perspectivas equiva-
lentes mas diferentes do pensamento do nosso Papa;
Bom dia, e cada um deles afirma o que ele diz. Não achei ne-
sou um sacerdote da diocese de Ásti, há cerca de dez anos nhuma outra revista deste lado do oceano Atlântico
capelão no hospital de minha cidade. Decidi escrever im- com as mesmas análises equilibradas sobre este livro.
pelido pelo desejo de pôr à disposição dos cerca de qui- Mantenham esse excelente jornalismo.
nhentos doentes do hospital e de seus familiares um pou- Leio há mais de um ano a edição em inglês de sua
co de “boa imprensa”. Graças a Deus a capela do hospital revista, e devo dizer que o inglês é excelente. Presumo
está numa posição de passagem e é muito frequentada. que a maior parte dos artigos sejam em italiano, e por
Há algum tempo instalei um expositor em que quem entra isso está claro que quem traduz para a edição em in-
pode encontrar (gratuitamente) revistas e pequenas ima- glês faz um trabalho excelente!
gens. A afluência de pessoas é tão grande, que as revistas
desaparecem rapidamente (para acabar nos quartos dos padre Thomas Heier, C.M.M.,
doentes) e o expositor fica vazio com frequência. O orça- diretor responsável
mento da capela não me permite fazer assinaturas e por
isso pensei em pedir sua colaboração. Qualquer revista,
mesmo números antigos, será bem recebida e talvez esta PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA ARGENTINA
obra de bem possa-se tornar também um modo de dar a “SANTA MARÍA DE LOS BUENOS AIRES”
conhecer as suas publicações a um público no mínimo va- Buenos Aires, Argentina
riado e numa condição existencial que o torna muito dis-
ponível à mensagem cristã. 30Dias, Quem reza se salva
Fico à espera de uma resposta de sua parte e lhes e o Credo do povo
desejo todo o bem no Senhor, de Deus na Argentina
padre Claudio Sganga
Buenos Aires,
Ásti, 22 de junho de 2011 9 de junho de 2011
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A capa
de Quem reza se salva
em língua chinesa
para pedir uma assinatura gratuita de sua prestigiosa re- Peço-lhe também alguns exemplares do livrinho Chi
vista, na edição em língua espanhola. Seria de grande prega si salva e do Credo do povo de Deus, de Paulo VI.
utilidade para a formação de muitas pessoas que encon- Pedindo a Deus que este meu pedido possa ser res-
tro em meu trabalho pastoral, particularmente casais e pondido, cumprimento-o com cordial estima, no Senhor.
jovens. O motivo do meu pedido é que eu não poderia
de modo algum pagar por uma assinatura. padre Omar Horacio Lorente
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Reportagem
22 30DIAS Nº 6 - 2011
TURQUIA
Procede-se lentamente, um horas para a celebração: as três ir- ção era praticamente impossível,
passo de cada vez. Vemos isso em mãs “Filhas da Igreja” que vivem mas depois de tê-lo expropriado, o
Tarso, cidade natal de São Paulo, na cidade obtiveram há pouco a governo mandou demolir e em
onde chegamos em 26 de junho, permissão para entrar e arrumar a 2010 construiu, custeando as des-
no domingo anterior à festa dos igreja. O tempo para os preparati- pesas, uma nova igreja. A fachada,
santos Pedro e Paulo. A comuni- vos é pouco, faz-se tudo meio às fiel ao tradicional estilo dessas re-
dade local recebeu a autorização pressas. E há ainda menos tempo giões, mostra uma sensibilidade
para celebrar a missa na igreja de- no final da missa para tirar todas as nova aos problemas dos cristãos.
dicada ao Apóstolo das gentes. cadeiras e os paramentos: os fiéis Muitas vezes a colaboração
Construído pelos cruzados no sé- deixam rapidamente o lugar para nasce nas relações entre as pes-
culo XII, com a chegada da Repú- os turistas que pagam o ingresso. soas, mas está alcançando tam-
blica o edifício foi transformado Na “laica” República da Turquia bém o plano das instituições. Em
em um depósito. Somente há pou- é o Estado que controla para que a setembro desse ano, por exem-
cos anos, graças à insistência dos atividade religiosa são saia dos li- plo, o município de Istambul publi-
padres capuchinhos e ao apoio do mites fixados pela Constituição e cará junto com a Santa Sé um livro
governo, o monumento foi refor- pela lei. As Igrejas não têm um re- sobre a presença cristã na cidade
mado e reaberto. Também nesse conhecimento legal. Mas há al- no século XVII. Pela primeira vez
caso como museu. Faltam poucas guns anos a situação das minorias o símbolo de uma instituição turca
religiosas melhorou sensivelmen- será imprimido junto ao da Igreja
te. O governo do Partido da Justi- Católica.
ça e do Desenvolvimento (AKP) Infelizmente, justamente nos
mostrou-se atento às suas solicita- anos em que as relações entre o
ções. Nem sempre as promessas governo de Ancara e os cristãos
foram mantidas, mas a nova classe parece mudar, a pequena Igreja da
de dirigentes turca manifestou Turquia foi atingida por tragédias
uma disponibilidade ao diálogo como o assassinato do padre An-
que não havia no passado. E o diá- drea Santoro e de monsenhor Lui-
logo, em alguns casos, deu frutos gi Padovese. Para esclarecer aque-
muito concretos. les crimes será preciso ainda muito
O presidente da fundação sírio- tempo, mas por enquanto o poder
católica de Istambul, Zeki Basate- político quis demonstrar a sua pro-
mir, conta-nos da vez que foi pro- ximidade aos amigos das vítimas.
testar porque uma antiga igreja sí- Monsenhor Franceschini, arcebis-
ria de Alexandreta – Iskenderun po de Esmirna e administrador pro
para os turcos – há anos era usada tempore do vicariato apostólico de
como cinema para filmes eróticos. Anatólia, conta-nos que o ministro
Restituir o edifício à sua antiga fun- da Justiça, Sadullah Ergin, em soli-
dariedade, foi a Iskenderun para o
Acima, a fachada na nova igreja enterro do bispo assassinado.
sírio-católica de Alexandreta, “Perguntou-me se tínhamos algu-
na província meridional de Hatay; ma solicitação a fazer”, recorda
aqui abaixo, o imponente mausoléu de monsenhor Franceschini. “Res-
Atatürk em Ancara pondi-lhe que queríamos saber a
verdade, nada mais”. Há pouco
mais de um ano de distância, está
sendo aberto o processo contra o
assassino do bispo e os eventuais
mandantes. Muitos nos testemu-
nham a solicitude das autoridades
em querer que a justiça siga rapida-
mente os trâmites. Isso em um lu-
gar, onde em outros tempos, espe-
rar-se-ia uma indiferença ou mes-
mo aberta hostilidade.
30DIAS Nº 6 - 2011 25
Reportagem
cançar a meta desejada”. São pa- de guindastes e canteiros de lher. “Hoje, aquela parte da socie-
lavras de monsenhor Antonio Lu- obras. A economia circula, a clas- dade entrou por sua vez em um
cibello, núncio apostólico junto à se média aumenta e aumenta o processo de moder nização”,
República da Turquia. “Existem já bem-estar. prossegue Koptas. “O AKP quer
sinais eloquentes que levam à esta Mas as finanças não são sufi- demonstrar que também os mu-
direção”. cientes para explicar o sucesso do çulmanos podem ser verdadeiros
O resultado das eleições de 12 partido. “O AKP tornou-se a voz democratas”.
de junho passado será recordado do povo muçulmano esquecido Não é a primeira vez que um
como um divisor de águas da his- pelo processo de modernização partido de inspiração islâmica
tória turca. A AKP de Recep da Turquia”. A explicação é-nos chega ao poder. Tinha aconteci-
Tayyip Erdogan conquistou 50 dada por Robert Koptas, jovem do em 1996, quando o governo
por cento dos votos, um resultado diretor da revista semanal em era administrado por Necmettin
sem precedentes. Andando pelas idioma ar meno de Istambul, Erbakan. No seu Partido do Bem-
periferias de Istambul entende-se Agos. Por muitas décadas a Tur- estar muitos apoiavam a introdu-
um dos motivos deste triunfo. Os quia “laica” olhou para a religião ção da lei islâmica, a sharia, e o
centros financeiros estão cintilan- como um estorvo. Modernidade – próprio primeiro-ministro tinha
do de arranha-céus de recente dizia-se – corresponde a seculari- estreitos contatos com algumas ir-
construção. Nos novos bairros zação. Uma mensagem que os mandades “sufi” (isto é, de místi-
populares amontoam-se os gran- turcos de fé muçulmana muitas cos muçulmanos) conhecidas pe-
des edifícios, em meio a uma selva vezes tiveram dificuldade em aco- lo seu apoio à islamização do Es-
por causa da ʻlaicidadeʼ turca, não do islã, que a hoje em dia, qual país pode-se dizer cristão? Quando
“É Igreja não pode existir oficialmente”. Sua excelên-
cia monsenhor Louis Pelâtre, vigário apostólico de Istam-
cheguei à Turquia, quarenta anos atrás, pairava um ar de
xenofobia. Hoje ainda permanecem alguns problemas
bul, descreve-nos a situação da comunidade cristã na para as minorias, mas em outros lugares é diferente? Se
Turquia vista da metrópole sobre o Bósforo. na França um imigrante que se chama Mohammed pro-
cura trabalho, tem as mesmas chances dos outros para
Como estão mudando as condições de vida dos encontrá-lo?
cristãos da Turquia? No Ocidente – principalmente depois da morte de
LOUIS PELÂTRE: Uma mudança evidente. Por um la- monsenhor Padovese – ouviu-se falar de uma cris-
do porque a comunidade católica mudou sua “fachada”: tandade “assediada” na Turquia. É verdade?
chegou um grande número de imigrantes das Filipinas, Foi uma tragédia, mas não creio que tenha se tratado
dos países da África, enquanto o número dos que provêm de um um fato causado por um sentimento anticristão.
dos países do Levante, a região mediterrânea oriental, Fala-se de um movimento subterrâneo no Estado turco,
está diminuindo. Estão indo embora ou para a França ou que agiria contra o atual governo e que emergiu com o ca-
outros países europeus. Os que vão embora esperam so Ergenekon. Mas ainda hoje é realmente difícil enten-
encontrar uma vida mais fácil em um país “cristão”... Mas, der as causas daquele assassinato.
26 30DIAS Nº 6 - 2011
TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio
Alguns dizem que hoje a Turquia seja um país me- teve na prisão, enviou-me alguns bilhetes, também para
nos “laico” e portanto menos seguro para os cris- todas as personalidades públicas da cidade. Ainda hoje
tãos... muita gente é contrária às mudanças desejadas por ele;
Não concordo com isso. Sou francês e conheço o la- mas foi a democracia que nos levou à situação atual e o
do “duro” da laicidade: na minha Bretanha era proibido resultado do voto deve ser respeitado.
construir escolas católicas. E recordo que a laicidade de A Turquia pode representar um “modelo” de con-
Atatürk inspirou-se na francesa: a religião é muito con- vivência entre islã e democracia?
trastada, mesmo a muçulmana. Apenas o aspecto iden- Fala-se de “modelo turco” e isso já é interessante.
titário e cultural é absorvido. Erdogan não tem nada de Pode-se não concordar com tudo o que Atatürk fez, mas
fanático, é um político inteligente: entendeu que precisa a laicidade da Turquia teve uma influência extraordiná-
dirigir-se ao povo por aquilo que o povo é, não como se ria no Oriente Médio. Hoje a Turquia parece ter encon-
gostaria que fosse. Em relação aos cristãos, é por cau- trado um novo equilíbrio, mas a passagem para além da
sa da “laicidade” turca – não do islã – que a Igreja Católi- laicidade “dura” ainda não terminou.
ca não pode existir oficialmente no país. Não me parece L. B.
que o problema para os cristãos seja devido ao fato que
é permitido às jovens usar o lenço na universidade...
Pode-se esperar alguma novidade sobre o reco-
nhecimento oficial da Igreja?
Atualmente é impossível que o Estado reconheça a
Igreja: é contra a Constituição, que não reconhece ne-
nhuma religião, nem mesmo o islã. Porém, parece que o
primeiro-ministro Erdogan queira mudar as coisas. Ele
mesmo sofreu essa situação, quando era prefeito de Is-
tambul: acabou na prisão por “ataque à laicidade”, ao ci-
tar um poeta que definia os minaretes “as nossas baio-
netas”. Teve muitos problemas por uma citação: mais ou
menos como Papa Ratzinger em Regensburg... Antes
daquele acontecimento Erdogan e eu nos encontráva-
mos com frequência, e durante o período de em que es- Ofertório na igreja de Santo Antônio de Pádua, em Istambul
30DIAS Nº 6 - 2011 27
Reportagem
companheiros, com as mãos volta- trário, como a imprensa europeia dando – no país como também no
das para o céu. Simbolizando que mostra geralmente. Ao mesmo exterior.
as duas Turquias não são por nada tempo, uma maioria de turcos
incompatíveis. pensa que o comportamento ge- O “modelo turco”
“Os ocidentais que olham ao ral da sociedade para com a reli- Em 2002 era difícil imaginal que o
AKP”, explica ainda Roberto gião tenha mudado, e mudado AKP pudesse dar uma virada tão
Koptas, “veem muçulmanos e para melhor. significativa na política turca. Em
têm medo. Eu, como armênio, O conflito entre as duas meta- eleições surpreendentes, nenhum
não tenho medo do AKP. É ridícu- des da Turquia – secular e religio- dos partidos de governo teve condi-
lo dizer que o AKP queira introdu- sa – certamente não se esgotou. ções de superar o limite dos 10 por
zir a sharia. São simplesmente A tensão voltou a subir em 2007 cento para entrar no Parlamento.
muçulmanos, muçulmanos prati- quando Abdullah Gül foi eleito Conseguiram, justamente, apenas
cantes, como grande parte da po- presidente da República. Por al- o partido de Erdogan (AKP) e os ke-
pulação deste país. Aquela parte gum tempo pareceu que uma par- malistas do Partido Republicado do
do país que quer estar presente no te do exército estivesse pronta Povo (CHP). Os islâmicos modera-
Parlamento, nas universidades, e para intervir maciçamente no ce- dos encontraram-se com 35% dos
é muito ‘sadio’ que o queira”. A nário político. Foi o ano dos as- votos a controlar os dois terços do
ideia da islamização da sociedade, sassinatos de Hrant Dink, jorna- Parlamento.
analisando realisticamente, não lista armênio na época diretor da “AKP era um partido novo”,
funciona. Em um estudo promovi- Agos, e do padre Andrea Santo- comenta ainda o professor Dede,
do pelo Centro Tesev – uma insti- ro. Em outros tempos a tensão “com experiência apenas nas ad-
tuição financiada na sua maioria entre laicistas e islâmicos teria le- ministrações locais”. Erdogan,
pela Open Society de George So- vado os militares a intervir para seu líder, não pôde nem mesmo
ros – mostrava-se que de 1999 a restabelecer a ordem. Mas o gol- se candidatar: quatro anos antes
hoje o número de mulheres que pe de Estado não aconteceu. Era um tribunal tinha-o banido “para
usa o lenço diminuiu. Não o con- o sinal de que o clima estava mu- sempre” da vida política por “inci-
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TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio
tação ao ódio religioso”. Em um os dias discute-se sobre o “modelo demonstrando alguma coisa aos
comício tinha citado uma poesia turco” nos jornais da Turquia e da que diziam: ‘islã e democracia são
turca do início do século XX: “As região do Oriente Médio. incompatíveis’”.
mesquitas são os nossos quartéis, Não há dúvida de que os mode- Hoje o Oriente Médio olha pa-
as cúpulas os nossos elmos, os mi- los políticos são difíceis de serem ra a Turquia com interesse. Gran-
naretes as nossas baionetas e os exportados. Isso nos é recordado de parte disso é mérito do minis-
fiéis os nossos soldados”. Foi elei- por Cemal Usak, partindo de uma tro do Exterior Ahmet Davutoglu,
to apenas em 2003, depois da experiência do seu país: “Nos reconfirmado no seu cargo de-
mudança da lei por parte do Par- anos Setenta havia grupos de in- pois das eleições. A política de
lamento. telectuais turcos que procuravam “zerar problemas com os vizi-
Nessas condições não eram importar versões ‘árabes’ do islã. nhos” criou ao redor do país um
muitos os que acreditavam na du- O único êxito foi o de produzir ra- clima favorável à colaboração.
ração da experiência AKP. “Nos dicalismo”. O mesmo pode valer Não apenas em campo político:
primeiros anos de governo”, con- para papéis invertidos: “Demo- as exportações turcas para os paí-
ta-nos ainda Dede, “falei com mui- cracia e direitos humanos são va- ses limítrofes aumentam em ritmo
tos expoentes egípcios da Irman- lores universais que valem em to- acelerado. O afluxo de turistas es-
dade Muçulmana que eram céticos dos os países, mas cada país deve tá em crescimento constante. An-
com o que acontecia na Turquia. A adaptar aqueles valores dentro de cara exporta cultura, além de
virada na credibilidade do partido seu próprio contexto”. mercadorias.
chegou com o início do processo Robert Koptas também nos Este soft power “poder sua-
Ergenekon”, ou seja, ainda em alerta com relação às simplifica- ve”, não passou inobservado na
2007, quando soube-se que alguns ções: “Quando se fala de modelo Europa. E entre os europeístas
oficiais do exército planejavam um turco, é preciso entender bem do mais conscientes, são muitos os
golpe de Estado e acabaram na pri- que se fala. O modelo é a demo- que propõem que não se deve
são por isso. Foi então que “o AKP cracia, não a Turquia como tal. Se perder a ocasião histórica de
demonstrou ter maior poder do o modelo fosse a Turquia como aproximar Oriente e Ocidente.
que a antiga burocracia secularis- foi até hoje – uma democracia Depois do voto de junho, Erdogan
ta”. Hoje muitos jovens políticos ‘protegida’ pelas armas do exérci- quis mostrar que ainda está inte-
da Irmandade vêm à Turquia para to – então não, obrigado. Mas o ressado ao diálogo com a União
aprender com o AKP. Quase todos que agora acontece no país está Europeia, instituindo um Ministé-
rio especial para isso, sob a dire-
ção de Egemen Bagis. Mas as ne-
A avenida beira-mar de Alexandreta. gociações estão paradas. Os seus
Na Turquia é comum ver mulheres capítulos mais delicados estão blo-
vestidas “à ocidental” que caminham queados. Ao invés de fazer pres-
ao lado de mulheres com lenços sões sobre temas importantes –
como a tutela dos direitos das mi-
norias – Bruxelas fechou-se em
um não que às margens do Bósfo-
ro parece ideológico.
Reformas e compromissos
Na realidade, quanto à tutela das
minorias ainda há muito o que fa-
zer. A Constituição atualmente
em vigor afirma que a liberdade
religiosa pode ser exercida so-
mente até o ponto em que não
violar o princípio da laicidade do
Estado. A lei turca não reconhece
a existência das Igrejas cristãs.
Emre Öktem, professor de Direi-
to Internacional na Universidade
de Galatasaray, em Istambul, aju-
da-nos com um exemplo: “O pa-
triarcado ortodoxo de Istambul
não tem personalidade jurídica.
Tecnicamente o próprio patriarca
é um simples funcionário que tra-
balha para a fundação que admi-
nistra a igreja de São Jorge”. As
“fundações” são as únicas insti- ¬
30DIAS Nº 6 - 2011 29
Reportagem
tuições religiosas admitidas pela Naquele momento um dos pro- muito avançada, longe da situa-
lei. Mas até tempos recentes a sua blemas que mais preocupava a ção concreta. Ainda por algum
existência foi submetida a pesa- comunidade ortodoxa era a ques- tempo poderia ser necessário
das restrições. “Uma lei de 1936 tão da cidadania dos bispos. “Se- contentar-se com os favores.
proibia a compra de propriedade gundo a lei turca, todos os bispos Também outras questões mui-
ou o direito de herança para as que trabalham na Turquia para o to delicadas permanecem insolú-
fundações religiosas”, continua o patriarcado devem ser cidadãos veis. Como a do seminário orto-
professor. “Se um fiel doava uma turcos. Apenas um pequeno nú- doxo na ilha de Heybeliada, no
propriedade à Igreja, a doação mero de bispo o era. Na ocasião mar de Marmara. A Constituição
era anulada”. Erdogan prometeu dar-lhes o di- turca impõe que todo o ensina-
“Em 2002”, prossegue Öktem, reito de cidadania para trabalhar mento religioso seja submetido ao
“uma modificação da lei sobre as aqui e em perspectiva também ser controle do Estado. Nesta situa-
fundações foi colocada nos paco- eleitos patriarcas”. Mantendo ção, é impossível para as Igrejas
tes de harmonização criados no aquela promessa o primeiro-mi- cristãs seguir os jovens com a vo-
contexto de reaproximação entre nistro ajudou o Sínodo ortodoxo a cação ao sacerdócio. Padre Dosit-
a Turquia e a União Europeia. Foi sobreviver. heos comenta ainda: “Sua Santi-
a primeira lei que consentia a com- A benevolência do poder para dade e o Sínodo têm convicção de
pra de propriedades por parte das com a minorias manifestou-se que o primeiro-ministro Erdogan
fundações. Mais tarde, em 2008, muitas vezes em “favores” deste queira realmente encontrar uma
uma nova lei consentia também a gênero. Porém muitas vezes ouvi- solução para o problema. Mas o
restituição das propriedades ex- mos dizer que os favores – por Estado – em Ancara – faz resistên-
propriadas no passado por parte mais que seja bem aceitos – não cia. Esperamos para o ano próxi-
do Estado”. são suficientes. É também neces- mo, com a nova Constituição”.
Os apertos de mão do primei- sário que alguns direitos sejam São muitas as expectativas que
ro-ministro Erdogan com os líde- formalizados. A advogada Kez- convergem ao redor da promessa
res religiosos do país não são ges- ban Hatemi, que se dedica há feita pelo AKP de uma reforma
tos puramente simbólicos. Padre anos às causas das minorias, fala- constitucional. Mas apesar do
Dositheos, no Patriarcado ecu- nos da hipótese de que Ancara as- enorme sucesso eleitoral, o parti-
mênico de Istambul, conta-nos do sine acordos com as várias Igrejas do de gover no não dispõe da
encontro entre o chefe de gover- cristãs, seguindo o modelo dos maioria necessária para mudar a
no e Sua Santidade Bartolomeu I. Estados europeus e da Alemanha Constituição de modo unilateral –
Era o dia 15 de agosto de 2009. em particular. É uma proposta isto é, sem colaborar com outras
30 30DIAS Nº 6 - 2011
TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio
“A tolerância
não basta. Porém...”
Os apertos de mão, a elei-
ção de um cristão, a lingua-
gem política que se modifi-
ca. Voltemos mais uma vez
às palavras de Robert Kop-
tas de Agos: “Até hoje no
‘discurso público’ turco os
armênios e os cristãos fo-
ram sempre considerados
inimigos, mas aquele discur-
so público está mudando”.
A questão das minorias ain-
da é enfrentada em termos
de ‘tolerância’, é verdade.
Reportagem
32 30DIAS Nº 6 - 2011
TURQUIA. Um modelo para o novo Oriente Médio
ta pouco para dar um testemunho se trata de fazer ou dizer alguma diar esta terra santa. Santa por-
de fé. “Se olharmos os números”, coisa particular. É suficiente estar que aqui nasceu Paulo, viveram
diz-nos o núncio, monsenhor An- aqui, nesta terra santa onde vive- Barnabé e Pedro. São João foi
tonio Lucibello, “a nossa presença ram os apóstolos e confiar no Se- enterrado em Éfeso, sob as ruínas
na Turquia é mínima: somos como nhor”. de uma basílica que dá para o mar.
uma pequena paróquia de uma ci- A experiência da Igreja da Tur- Nossa Senhora, que segundo a
dadezinha ocidental. Mesmo as- quia está toda aqui. É o ar de casa tradição seguiu João nestes luga-
sim, o nosso discreto testemunho que se respira no meio da criança- res, aqui se “adormentou” e foi
dá frutos, é estimado e seguido”. da no pátio de padre Domenico, elevada ao céu.
Se tivéssemos que ‘medir’ o estado em Antioquia. Também em Tar- Os padres capuchinhos fazem
de saúde da Igreja local levando so, quando os religiosos almoçam questão de recordar do conselho
apenas em conta os números, o junto com os fiéis vindos de locali- de São Francisco aos frades que
cenário seria triste. Ao invés, nas dades próximas para festejar São partiam para a Ásia Menor. Há
pessoas daqui a felicidade que se Paulo. Padre Roberto, com seus dois modos de fazer a missão:
manifesta pela fé é um fato eviden- 85 anos dos quais mais de 60 aqui “Um modo é que não briguem
te. “Não é necessária uma presen- na Turquia, doa o dinheiro da pas- nem provoquem disputas, mas
ça rumorosa”, continua monse- sagem para uma família que não sejam submetidos a toda criatura
nhor Lucibello, “ao som de tambo- pode pagar a viagem para voltar humana pelo amor de Deus e
res. Mas é fundamental um teste- para casa. As irmãs dali, durante confessem ser cristãos”. O teste-
munho de vida, que não se impõe a refeição, indicam a monsenhor munho discreto. “O outro modo
com o espetáculo”. Franceschini um casal de noivos é que, quando virem que agrada
Uma irmã, que saiu da Itália ou uma criança, atualizando-o so- ao Senhor, anunciem a palavra
nos tempos da morte de Padove- bre os matrimônios e os nasci- de Deus”. Atentos às coisas do
se, confessa-nos as suas preocu- mentos. mundo, capazes de seguir e reco-
pações na chegada à Turquia. Pode-se perguntar: com tão lher todo o bem que acontece ao
“Sem poder usar o hábito de reli- poucos cristãos, o que têm a fazer seu redor. q
giosa, sem poder ensinar religião os padres na Turquia? Na realida-
nos colégios, eu pensava: mas o de sempre têm o que fazer entre
que eu vou fazer ali! Eu que na Itá- as necessidades do povo local e a
lia estava acostumada a ir a todas acolhida dos peregrinos. Mas
as manifestações... Mas quando “não se trata de fazer alguma coi-
se chega aqui entende-se que não sa”. É suficiente estar aqui, custo-
30DIAS Nº 6 - 2011 33
C A PA
A volta à simplicidade
da fé católica
por Giovanni Cubeddu
ncontramos o cardeal Do- textos catequéticos e teológicos da confissão que chamamos “The
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ESTADOS UNIDOS. Entrevista com o cardeal Donald Wuerl
Biografia
ascido em Pittsburgh, na Pennsylvania, há 71 anos, Donald
N William Wuerl foi ordenado sacerdote em 1966, depois de
ter estudado, entre outros lugares, no Pontifical North American
College, o seminário americano de Roma. Foi nomeado bispo
em janeiro de 1986 pelo papa João Paulo II. Depois de dois anos
em Seattle, foi transferido para sua cidade natal. Em 2006, Ben-
to XVI o escolheu para a arquidiocese de Washington. Em 2008,
o arcebispo Wuerl hospedou o papa Bento XVI durante sua via-
gem apostólica aos Estados Unidos, e no consistório de novem- Bento XVI impõe o barrete cardinalício a Donald Wuerl
bro de 2010 foi criado cardeal. Em maio passado tomou posse por ocasião do Consistório de 22 de novembro de 2010
da basílica de que é titular em Roma, São Pedro in Vincoli. na Basílica de São Pedro, no Vaticano
30DIAS Nº 6 - 2011 35
C A PA
déssemos tocá-lo. Entre todos es- crente, alguém que segue a Cristo, Nos EUA também, os cató-
ses grandes momentos de encon- age com benevolência, com amor, licos vivem em meio a forças
tro, o ponto mais alto é a Eucaris- com verdade e com justiça. Todas as que muitas vezes se opõem.
tia. Jesus disse: “Fazei isto em me- ações que tornam visível a presença De um lado, como lembram os
mória de mim”. E nós entendemos de Cristo em nós são o que faz exis- bispos norte-americanos no
que todas as vezes que o fizésse- tir o Reino. Uma vez um homem documento In Support of Ca-
mos Ele estaria conosco. Creio que se apresentou como ateu me techetical Ministry (Em aju-
que os nossos jovens se dão conta perguntou: “O que traz gente como da do ministério do catecis-
de que isso não apenas é simples, vocês ao mundo?”, entendendo por mo), “vivemos numa socieda-
mas verdadeiro. O que hoje pedi- “gente como vocês” a Igreja. Eu lhe de cada vez mais secularizada
mos que os nossos jovens façam é respondi: “A que se assemelharia o e materialista”; de outro lado,
dar a resposta que Pedro deu mundo se nos séculos passados, nos há as minorias hispânicas, ne-
quando Jesus perguntou aos discí- milênios passados, não nos tives- gras e asiáticas, que são por-
pulos: “E vós, quem dizeis que eu sem sido ensinados os dez manda- tadoras de uma abordagem
sou?”. Essa é a pergunta que dirigi- mentos? Se não nos tivesse sido dito diferente...
mos aos nossos jovens: “Vós,
quem dizeis que é Jesus?”. Simão À esquerda, o cardeal Wuerl em oração
Pedro respondeu: “Tu és o Cristo, diante das correntes de São Pedro,
o Filho do Deus vivo”. Estamos guardadas na basílica romana
ajudando os nossos jovens a fazer de São Pedro in Vincoli, por ocasião
a mesma profissão de fé – a dizer a da tomada de posse, domingo, 8 de maio
Jesus Cristo: “Tu és o Filho de de 2011; abaixo, o cardeal com duas
Deus, eu creio em ti”. E nos damos religiosas, em sua chegada para a missa
conta de que os nossos jovens res- de Páscoa na Basílica do Santuário
pondem. Não é complicado. Nacional da Imaculada Conceição,
Quando Jesus falava, não era difí- em Washington, a 24 de abril de 2011
cil de entender. A meu ver, aconte-
ce que a resposta de fé acaba por
ser recoberta por parâmetros que
são mundanos. Por isso os nossos
jovens hoje nos têm pedido: “Fa-
lem-nos de Jesus, falem-nos do seu
Evangelho”.
Em sua carta pastoral de
2007, God’s Mercy and the
Sacrament of Penance (A mi-
sericórdia de Deus e o sacra-
mento da penitência), o se-
nhor lembra que a “nova cria-
ção” é simplesmente um ho-
mem que é redimido. que nos devemos tratar uns aos ou- Entre as coisas que reconhece-
São Paulo nos diz que a batalha tros com dignidade, se não nos ti- mos e que o papa Bento XVI nos
dentro de nós é entre o homem ve- vesse sido dito que somos chama- lembrou quando esteve aqui há três
lho que quer resistir ainda e o ho- dos ao amor recíproco e a cuidar do anos, em 2008, penso que existam
mem novo, a nova criação que se último dos nossos irmãos? Como três barreiras para a proclamação
manifesta, o homem em graça, o você acredita que seria o mundo?”. do Evangelho nos Estados Unidos,
homem que é redimido na graça. E ele replicou, e de modo louvável: que são o secularismo, o materialis-
Acaso não foi justamente isso que “Seria um desastre”. Esses são to- mo e o individualismo. Tudo isso é
Jesus veio fazer? Curar tudo o que dos sinais do Reino que abre uma cada vez mais evidente em nossa
estava quebrado. A nova criação, a brecha no mundo. cultura. Muito do que nos é propos-
criação da graça, é o Reino – a pre- Uma das alegrias de ser bispo é to como cultura americana é gerado
sença de Deus, da paz, do amor, da que você tem de circular por toda a pelas indústrias de entretenimento e
justiça, da compaixão, da cura. A diocese. Nas paróquias desta Igre- de informação. Quando vamos até
nova criação começa para cada um ja local vejo gente que vive sua fé e o povo, nas paróquias, no mundo
de nós no batismo. Cada um se tor- tenta seguir Cristo criando seus fi- em que as pessoas trabalham, há
na no batismo criatura da nova cria- lhos, procurando ajudar seus filhos realmente ainda muito dos valores
ção. Só que a velha criação está ain- a seguirem o caminho de Cristo. cristãos de base. Raramente ouvi-
da lutando para nos dominar e a no- Vemos pessoas que cuidam dos mos falar deles na mídia. Esses valo-
va criação busca abrir uma brecha idosos e dos doentes, que vão ao res são censurados. Qualquer coisa
nisso tudo. Cada um de nós é um ci- encontro de quem é necessitado, que tenha relação com a religião, a
dadão do Reino. E o Reino vem jus- tentando fazer todas as coisas que fé, a espiritualidade do povo é cen-
tamente agora, cada vez que um Jesus disse. surada e somos tentados a crer que
36 30DIAS Nº 6 - 2011
ESTADOS UNIDOS. Entrevista com o cardeal Donald Wuerl
À esquerda, o arcebispo de Washington, Donald Wuerl, ao final de um encontro de oração na Old Saint Mary’s Catholic Church;
à direita, no Verizon Center, para celebrar a missa com vinte mil jovens por ocasião da reunião anual pela vida, em janeiro de 2010
o que vemos na tevê ou ouvimos no valores democráticos são Armory e outros cinco mil nas igre-
rádio ou lemos nos jornais é tudo. uma coisa, e a fé católica, ou- jas de toda a arquidiocese. Por meio
Não é. Mas, de outro lado, como o tra. Levando em conta essa das vozes de todos esses jovens, a
senhor sugeria, temos hoje todos es- distinção clara, como o se- Igreja dizia simplesmente, no mun-
ses migrantes que chegam. Nesta ar- nhor se relaciona com os po- do político em que vivemos, que a
quidiocese celebramos a missa em deres civis? vida humana é um dom de Deus.
vinte línguas diferentes todo fim de Na minha opinião, devemos ter Em seu país, o debate so-
semana... vinte! É uma bênção esse várias coisas em mente. A primeira: bre a reforma da saúde não
reflexo da Igreja universal, na capital esta é uma sociedade democrática e terminou. A Igreja Católica
dos Estados Unidos. Os imigrantes pluralista. A segunda: que, como não pode apoiar quem promo-
trazem consigo a riqueza da fé. Mui- bispo da Igreja Católica, tenho uma ve o aborto, mas isso é bem
tos deles trazem consigo um senti- mensagem a levar a esta sociedade diferente de se opor a uma lei
mento da comunidade e da família, democrática e pluralista. Na cerimô- que garanta assistência social
tão dramaticamente necessário em nia da tomada de posse da diocese, e de saúde a pessoas que nun-
nossos Estados Unidos seculariza- há cinco anos, eu disse na homilia ca teriam condições de tê-la.
dos. Estamos assistindo à introdução que parte da responsabilidade da Às vezes parece que a Igreja
do que é definido o “matrimônio ho- Igreja na capital da nossa nação, Católica nos EUA se engajou
mossexual”, como se o matrimônio nesta “capital do mundo”, é anun- apenas na batalha pro life
já tivesse deixado de ser a realidade ciar o Evangelho em meio a todas as (pela vida), numa batalha con-
verificável de um homem e de uma outras vozes. Não condenamos as tra o governo.
mulher que se unem, prometendo outras vozes, mas esperamos ter a li- Essa é maneira como às vezes a
viver juntos, gerar e educar filhos. Os berdade de fazer ouvir a nossa. A Igreja Católica é pintada, como se
imigrantes trazem consigo um senti- minha experiência em Washington estivesse interessada apenas na
mento de comunidade e de comu- é que se você está preparado para o tentativa de abolir o aborto. Depois
nhão eclesial. Sua experiência da fé diálogo, para discutir e ouvir, então do governo, o maior provedor de
é uma experiência que inclui a Igreja às vezes tem a possibilidade de levar assistência nos Estados Unidos é a
e por conseguinte a doutrina cristã, a o Evangelho para dentro da discus- Igreja Católica. Estamos em todos
tradição apostólica e os bispos como são. É muito importante para a Igre- os níveis da assistência à saúde, da
sucessores dos apóstolos. Isso se ja estar presente. Deve estar presen- administração do serviço social, do
afasta da herança protestante arrai- te nos esforços que caracterizam cuidado com os sem-teto, dando
gada nos Estados Unidos, segundo a hoje o ambiente político, social e apoio aos pobres por meio dos
qual “Jesus é o meu salvador, e não cultural. Devemos ser fiéis apenas a bancos de alimentos e dos dispen-
preciso de mais nada”. A Igreja Ca- nós mesmos. Devemos ser fiéis ao sários paroquiais. Somos também,
tólica sempre disse, ao contrário, Evangelho, claros ao dizer o que é e depois do governo, a maior entida-
que “Jesus instituiu uma família, uma o que não é, o que é certo e o que é de dedicada à educação, particular-
família de fé”. Parte da tarefa que te- errado. Um exemplo disso é a voz mente dos pobres e dos necessita-
mos à nossa frente, após a afluência da arquidiocese no movimento pela dos. A Igreja Católica está compro-
de imigrantes, é a necessidade de vida, motivo pelo qual temos tanto metida com tudo o que está ligado
afirmar os valores tradicionais da fa- orgulho de ter todos os anos uma à ordem que Jesus nos deu de ali-
mília e da comunidade. reunião de jovens e a missa pela vi- mentar os famintos, dar de beber
No documento que acaba- da. No ano passado havia trinta e aos que têm sede, vestir os nus e vi-
mos de citar, os bispos norte- cinco mil jovens, vinte mil na missa sitar os doentes e os encarcerados.
americanos sublinham que os no Verizon Center, dez mil no D. C. Nós o estamos fazendo. Mas ¬
30DIAS Nº 6 - 2011 37
C A PA
nunca somos descritos dessa for- só. Quando Saulo perguntou: “Há não muito tempo, termi-
ma, não obtemos nenhum reco- “Quem és tu?”, a voz lhe respon- nada a missa de Páscoa, um
nhecimento. Em 2007, os bispos deu: “Eu sou Jesus, que tu perse- homem se aproximou pergun-
americanos publicaram um docu- gues”. A Igreja e Cristo são uma coi- tando-me se realmente tinha
mento chamado Faithful Citi- sa só. Paulo foi o meio dessa revela- pretendido afirmar o que ele
zenship (Cidadania fiel), que é um ção. Hoje de manhã, ao celebrar a ouvira na homilia: ‘O senhor
guia para os católicos que entram missa, eu disse que não podemos disse que Jesus ressuscitou
no processo eleitoral. Creio que celebrar os santos Pedro e Paulo em seu corpo, não unicamen-
esse texto contenha um ensina- sem reconhecer que temos um laço te em sua mensagem’”.
mento muito sólido. E gozou do com Roma. Quando tive o grande Ele ressuscitou. Em certas esco-
consenso unânime dos bispos privilégio de tomar posse da igreja las as pessoas podem ter recebido
americanos. Faithful Citizenship titular de São Pedro in Vincoli, em o ensinamento de que a ressurrei-
diz aos católicos e a quem quer que Roma, lembrei às pessoas presen- ção era mais um modo de dizer que
o leia que há um amplo leque de te- tes que todos temos um vínculo es- qualquer outra coisa, e que Ele res-
mas, e que é preciso considerá-los pecial, todo católico tem um vínculo suscitou no sentido de sua capaci-
todos. Jesus nos pede que cuide- com Pedro. Nós o temos porque ele dade de influenciar. Nós dizemos:
mos da mulher quando dá à luz a é a pedra de comparação da nossa “Não, não! Ressuscitou no Seu
sua criança, mas depois que assis- fé. Ele vive hoje, carrega hoje o no- corpo”. Uma vez, na universidade,
tamos a ambos, como também que me de Bento e é Pedro, a quem nos um de meus alunos me disse: “O
acudamos os idosos e quem neces- dirigimos quando queremos saber o senhor afirma que Jesus ressusci-
sita de assistência. Todas essas coi- que Jesus nos diz hoje. tou dos mortos”. “Sim, porque é o
sas são parte do grande quadro de Como arcebispo de Was- que a Igreja nos ensina”, respondi.
referência do serviço da justiça so- hington, qual é a sua expe- E ele: “Bem, mas o senhor quer di-
cial católica. riência mais cara? zer realmente no seu corpo e...”.
Hoje é a festa dos santos Para mim, hoje, a característica “Sim, é nisso que consiste a res-
Pedro e Paulo. De manhã, na mais alegre da Igreja é perceber surreição”, eu disse. Ele não sabia
missa no Franciscan Monaste- que estamos bem no meio de uma que a Igreja crê nisso. Agora sabe.
ry of the Holy Land, aqui em nova evangelização. Nós nos asse- Estou contente por contar aos jo-
Washington, ouvi o sacerdote melhamos à Igreja do início, que vens quem é Jesus realmente. Tu-
dizer na homilia que o Senhor sai e diz às pessoas pela primeira do aquilo de que precisamos é o
extraiu dois grandes santos vez quem é Jesus. Ele ressuscitou, Credo dos Apóstolos. Quando es-
de duas personalidades im- está conosco. Hoje muita gente es- tou em Roma resido sempre no
prováveis: um pescador e um tá ouvindo isso pela primeira vez. Pontifício Colégio Norte-Ameri-
perseguidor. Creem tê-lo ouvido e já o saber, cano, pois foi o meu seminário e é
É o modo como trabalha o Se- mas na realidade o estão ouvindo para lá que ainda hoje vão os se-
nhor. Quem pensaria numa coisa talvez pela primeira vez. A emoção minaristas de Washington. Toda
dessas... que a rocha sobre a qual é que hoje a Igreja se abre a um fu- vez que vou para lá levo todos os
Cristo iria construir sua Igreja seria turo totalmente novo, e isso é mo- seminaristas de Washington à Ba-
um rude e impetuoso pescador... tivo para estarmos contentes. Da- sílica de São Pedro. Celebramos a
No entanto, com a graça de Deus qui a cinquenta anos o povo olhará missa às 7 da manhã, depois subi-
ele se tornou a rocha sobre a qual se para trás e talvez diga que aqueles mos da cripta e ficamos na frente
apoia a Igreja. E havia Paulo, que eram os dias em que toda a renova- do altar da confissão para rezar
perseguia a Igreja, e com a graça de ção da Igreja estava começando. todos juntos o Credo dos Apósto-
Deus se tornou o canal para revelar Num de seus artigos o se- los. E digo a eles: “Este é realmen-
que a Igreja e Jesus são uma coisa nhor recentemente escreveu: te o lugar certo”. q
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OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS
História de uma
fidelidade incomum
Notas sobre os black catholics,
num diálogo com Jamie T. Phelps,
da Xavier University of Louisiana
30DIAS Nº 6 - 2011 39
C A PA
rar dessa santidade “ferial”. Nós sentia a pressão de viver num bairro transformação do mundo nos pare-
acolhemos qualquer um: ainda nos “ecumênico”, em que havia duas cem claramente dimensão constitu-
lembramos bem da América do sé- igrejas protestantes – uma presbite- tiva da pregação do Evangelho, ou
culo XIX, quando as igrejas para os riana, a leste, e outra batista, a oeste seja, da missão da Igreja pela reden-
brancos eram separadas das igrejas – e duas católicas – uma ao norte e ção do gênero humano e a liberta-
para os negros – em linha com a outra ao sul. Eu era obrigada a cami- ção de qualquer estado de coisas
cultura daquele tempo e com as nhar mais que as pessoas da minha opressivo”. Crescendo como pes-
normas legais – e, embora as mis- idade para ir à missa, e isso exigia de soas negras, aprendemos o que sig-
sas fossem celebradas para todos mim um certo esforço. Até porque, nificava marginalização e o que era
segundo o rito latino, as assem- ainda por cima, não entendia bem o descrédito. Mesmo que isso não
bleias dos fiéis eram compostas a quando via certos católicos se com- nos tenha definido, tínhamos cons-
partir do critério étnico. portarem de maneira muito pouco ciência de quão pouco nos conside-
Documentos conciliares como a cristã e certos protestantes serem, ravam os grupos culturalmente do-
Gaudium et spes estão em profun- ao contrário, “muito” cristãos, e minantes. Quando a Igreja nos ensi-
da consonância com a sensibilidade não entendia a interpretação domi- na de novo que a justiça é um ele-
dos black catholics. A necessidade nante da extra Ecclesiam nulla sa- mento central do Evangelho, con-
da Igreja de ir para o mundo é algo lus. Graças a Deus muitas coisas forta-nos saber que não é verdadeira
que nos pertencia mesmo antes do mudaram desde então. Igreja aquela que não busca a justi-
Concílio: sempre convidamos os Um outro texto basilar para nós, ça. Evangelização e justiça social são
outros a fazer parte da Igreja. Meus black catholics, é A justiça no as nossas dimensões quando somos
amigos protestantes, por exemplo, mundo, procedente do Sínodo Igreja em missão.
me convidam sempre a participar Mundial dos Bispos de 1971. Meu A vida nos interessa, e como to-
de suas celebrações religiosas, e al- coração cantou quando li ali que dos os fiéis católicos somos real-
gumas vezes aceito. Desde criança “agir pela justiça e participar da mente contrários ao aborto, e o so-
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OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS
mos de maneira ativa. Afinal, nos bramos também o Congo do século Cyprian Davis, o primeiro católico
Estados Unidos a realidade é que o XVI, sob o rei Afonso, que convidou afro-americano foi Esteban, um es-
maior número de abortos atinge as os missionários portugueses a difun- cravo batizado na Espanha que
crianças afro-americanas. dir o cristianismo. A sua atividade, chegou aos Estados Unidos em
Eu gostaria também de mencio- porém, foi de certa forma contígua 1536 com alguns exploradores de
nar a questão da homossexualidade. ao comércio de escravos, e esse é o língua espanhola. Entre os séculos
A comunidade negra nunca margi- lado amargo da história, em que o XVI e XIX, os batismos na Igreja
nalizou os homossexuais: a Igreja mal esteve lado a lado com o bem. Católica de escravos africanos con-
nos ensinou que a prática da ho- Sabemos, porém, que, mesmo que duzidos às colônias eram adminis-
mossexualidade é um pecado, e, nos tenham estimado menos do que trados com o consentimento dos
mesmo tendo aprendido isso desde valíamos, nos deram a fé. senhores. Aqueles que fugiam dos
pequena, nunca perdemos de vista Na realidade, pelo fato de ter- assentamentos ingleses na Caroli-
a humanidade. Os jovens homosse- mos sido por longo tempo escra- na e na Geórgia eram convidados
xuais que faziam parte do nosso am- vos, podem-se encontrar espalha- pelos espanhóis a encontrar a li-
biente eram bem-vindos, participá- dos um pouco por toda parte católi- berdade na Flórida, onde lhes era
vamos todos com sinceridade da vi- cos romanos de origem africana. É oferecida a possibilidade de aceitar
da da comunidade, tanto os homos- o caso, por exemplo, de Benedito, o catolicismo romano. Uma das
sexuais quanto os heterossexuais. E o Mouro, na Itália, e de São Martin metas dos africanos era a cidade de
creio que a doutrina da Igreja indica de Porres, no Peru. Provavelmente Saint Augustine, na Flórida, onde,
exatamente isso. muitos dessa “diáspora” não se re- entre os séculos XVIII e XIX, eles,
A Igreja nos ensina que devemos conheceriam na definição de black segundo os testemunhos de docu-
cuidar dos pobres. A maioria dos catholics, e começaria entre nós mentos oficiais, viviam como es-
negros americanos é gente de baixa uma discussão – como acontece cravos, libertos ou soldados.
renda, e não porque sejam pregui- por exemplo com os afro-caribe- Antes da Guerra Civil America-
çosos: é simplesmente a posição as- nhos – sobre os limites do conceito na muitas razões impediam uma
sinalada para eles nos Estados Uni- e sobre sua inclusividade. Pois, se ampla atividade missionária em fa-
dos. É fácil para nós obedecer a esse eu me declarasse afro-americana a vor dos negros, livres ou escravos,
preceito, pois frequentemente o po- um africano continental, acentuaria para que fossem evangelizados e
bre é o nosso irmão, a nossa irmã, a as nossas diferenças, enquanto, se batizados. Nós fomos convertidos
nossa tia ou o homem no fim da rua. me definisse simplesmente “ne- “um por um”. Não em grupos ou
Nós não somos pessoas que fazem gra”, apostaria na nossa origem como comunidades: não tivemos
habitualmente valer seus parentes- africana comum e indiscutível, e nenhuma aplicação do cuius regio
cos: se você vive no bairro, para “negro” se tornaria assim uma bela eius religio. O agravante era, quan-
mim é um ir mão ou uma ir mã; palavra de boas-vindas... do muito, que nos Estados Unidos
quando uma família programa um Segundo a história dos black ser católicos despertava imediata-
piquenique, já sabe que todas as catholics redigida pelo beneditino mente suspeitas. A “fundação” ¬
crianças da vizinhança irão tam-
bém. É isso, somos facilmente uma
família ampliada... E é natural que
entre os ensinamentos da doutrina
social o da dignidade das pessoas te-
nha ressonância em nosso espírito.
As raízes e a conversão
“um a um”
Chegamos agora às raízes. A nossa
história começa na África, com o
florescimento do cristianismo nos
séculos III e IV. No Norte da África, a
comunidade cristã era culturalmen-
te romana e mediterrânea, mas
também bérbera e negra. E são
“nossos” Padres como Orígenes,
Agostinho, Cirilo de Alexandria, as
santas mártires Perpétua e Felicida-
de, Santo Antão, São Moisés, o
Monge do Deserto, os santos papas
africanos Vítor, Melquíades e Gelá-
sio: nós os reclamamos com grande Padre Herbert Vaughan, fundador da Sociedade Missionária de São José de Mill Hill,
orgulho, os sentimos parte de nós. sentado, no centro da foto, com alguns padres missionários e colaboradores.
Como sentimos nossa a história da Na primeira fila, com o rosário nas mãos, podem ser reconhecidos
Igreja no Egito ou na Etiópia. Lem- dois afro-americanos, Baltimore, 1870
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do Estado – uso intencionalmente A escravidão e 1831, e, alguns anos depois, das Ir-
as aspas porque a América já era “as congregações negras” mãs da Sagrada Família.
habitada pelos nativos – foi obra Mas é preciso admitir que a relação Mas o que significa exatamente
dos wasp, e os católicos que migra- do catolicismo com quem era negro “congregação de religiosas ne-
vam para a América eram malvistos foi um pouco... complexa. Do sécu- gras”? Tanto as leis então vigentes
e considerados emissários do Papa lo XVI ao XIX, bispos, clero e laica- quanto a prática faziam que, quando
com o mandato de sufocar a auto- do católicos interpretaram a escravi- homens e mulheres negros se candi-
nomia conquistada em relação à dão como “uma instituição socioe- datavam à vida sacerdotal ou religio-
Europa. Para não irritar ainda mais conômica legal”. No período colo- sa, simplesmente não fossem acei-
os brancos anglo-saxões protestan- nial anterior à Guerra Civil America- tos. Não havia uma norma no orde-
tes, que eram também administra- na, a Igreja não combatia a escravi- namento canônico que os recusas-
dores do comércio de negros, a dão, como eu já disse, mas pedia se, mas a prática era que a situação
Igreja Católica foi relutante em de- que se tornasse mais humana. Foi fosse manipulada para mantê-los de
nunciar a escravidão, para não apenas em 1839 que o papa Gre- fora, alegando alguma razão que
gório XVI, referindo-se ao Brasil, soasse legítima: talvez porque fos-
condenou o “indigno comércio com sem filhos de um matrimônio não
o qual os negros são reduzidos à es- canônico, ou porque não havia cer-
cravidão”. O debate do século XIX teza de que tivessem sido católicos a
focalizou-se na dimensão moral do vida inteira. Os obstáculos que em
comércio de escravos e o resultado outros casos eram normalmente re-
foi que alguns permaneceram neu- movidos se tornavam, aqui, absolu-
tros, outros abolicionistas, outros tos para quem tinha ascendência
ainda antiabolicionistas, ao mesmo africana. O fruto disso foram justa-
tempo em que houve quem desejas- mente as “congregações separa-
se uma abolição gradual. Apesar das”. Na prática, porém, as Irmãs
disso, existiam aqui e ali bispos e sa- Oblatas da Providência acolheram e
cerdotes que continuavam, de mo- instruíram também crianças não ne-
do às vezes necessariamente espo- gras, filhas de europeus.
rádico, a batizar os escravos e a dar-
lhes a vida sacramental e a instrução Depois da Guerra Civil
religiosa. Antes da Guerra Civil foi Depois da Guerra Civil e no mo-
promovida pelo episcopado a fun- mento da reconstrução do Estado
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OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS
e sacerdotes, religiosas e leigos A nossa iniciativa leiga ponder às mudanças que ocorriam
“brancos” também ajudaram de al- Existe uma iniciativa leiga dos na Igreja e às introduzidas pelos
guma forma. Entre essas novas black catholics, e merece ser men- movimentos pelos direitos civis,
congregações se distinguiram os cionada para encerrar. Ela come- resgatamos justamente a tradição
padres josefitas – Josephite Fat- çou antes que o termo “ministério dos congressos e a mantivemos nas
hers, descendência direta dos mis- leigo” se tornasse uma espécie de décadas seguintes. A herança do
sionários ingleses de Mill Hill –, gra- mantra nos documentos eclesiásti- século XIX foi revivida no XX, até a
ças à iniciativa de John Slattery. cos, como certamente acontece criação da Agência Nacional para
John era um jovem de origem irlan- hoje nos Estados Unidos. Quem os Católicos Negros, o National Of-
desa nascido em Nova York, que se deu vida a essa iniciativa leiga foi fice for Black Catholics, em 1970.
tornou sacerdote na Grã-Bretanha, Daniel Rudd, que descobriu e co- Na mesma linha está o Catholic In-
na Sociedade Missionária de São nheceu as organizações católicas terracial Council, em que brancos e
José de Mill Hill, para depois voltar na Europa e importou seu modelo negros trabalham lado a lado nos
à América e fundar os padres josefi- para os EUA no século XIX, geran- mesmos projetos. Na época da luta
tas, que tiveram a tarefa específica do, a partir de 1889, os congressos pelos direitos civis foi criado tam-
– objeto de um voto religioso – de dos católicos negros, o National bém o National Black Catholic
exercer seu ministério entre as pes- Black Catholic Congresses. Em vi- Clergy Caucus, uma fraternidade
soas negras. Padre Slattery estava da, organizou cinco, em que bis- de sacerdotes afro-americanos com
convencido, e podemos ler isso em pos, sacerdotes e leigos negros – a missão da ajuda mútua e a todo o
sua correspondência, de que, se tenho em arquivo fotos desses en- clero. Já que nos ajudar e ajudar os
além dos sacerdotes negros acei- contros e, sinceramente, não ve- outros é um anseio que sempre nos
tasse em seu instituto também pa- mos nelas muitas mulheres... – acompanhou, o Instituto para Estu-
dres de ascendência europeia, es-
tes últimos acabariam por gravitar Uma religiosa
de preferência ao redor dos am- das Oblatas da
bientes que lhes eram culturalmen- Providência com
te afins, deixando de lado os ne- uma criança no
gros. É esse o motivo do “voto ne- Mount Providence
gro” dos padres josefitas. Ainda ho- Child Development
je eles trabalham quase exclusiva- Center de Baltimore,
mente com os afro-americanos. no Estado de
Sua escola Santo Agostinho, em Maryland
New Orleans, existe ainda hoje e
tem uma história gloriosa.
Nasceram depois a Sociedade
do Verbo Divino, os Padres do San-
to Espírito e os edmundinos. Os
Padres do Santo Espírito abriram
uma escola para jovens em Rock-
castle, na Virgínia, chamada “Aca- procuravam desenhar uma plata- dos sobre os Católicos Negros, o
demia Militar Santa Ema”; a Socie- forma comum, até para ter mais Institute for Black Catholic Studies,
dade do Verbo Divino fundou o se- voz no ministério eclesial geral. Era da Xavier University, tem também
minário menor “Santo Agosti- natural que Rudd se encontrasse essa paixão original. No início foi
nho”, no Mississippi. trabalhando lado a lado com padre frequentado por qualquer um, bran-
Das numerosas congregações Slattery, como de fato aconteceu. co ou negro, que quisesse aproxi-
masculinas e femininas fundadas No início do século XX, Tho- mar-se da história dos black catho-
para a missão exclusiva entre os mas Wyatt Turner fundou um gru- lics; hoje é um destino buscado
negros, muitas, fora as que citei po denominado Federação dos principalmente por afro-america-
agora, acabaram cedo, por se diri- Católicos de Cor, Federate Colo- nos. Eu gostaria de sugerir a quem
girem a todos, sem levar em conta red Catholics. Ele estava realmen- for aos Estados Unidos por razões
a cor da pele. te amargurado pelas constantes de trabalho sacerdotal ou religioso
Manteve-se fiel ao mandato ini- desordens raciais e tinha assistido que o visite. É um centro missioná-
cial a congregação das Irmãs do ao linchamento sem processo de rio, que nasceu para permitir justa-
Santíssimo Sacramento – fundada 75 negros. Quando um sistema mente a quem não é negro que ve-
por Catarina Drexel, canonizada doente e racista não aceita mudan- nha ao nosso encontro mais facil-
há onze anos –, cuja missão era e é ças, erupções de violência devem mente, e toque com suas próprias
promover paróquias e escolas para infelizmente ser esperadas. Wyatt mãos o que a comunidade negra
os negros e os nativos americanos. procurou, no entanto, soluções deu e dá à nossa Igreja.
Também o instituto onde hoje le- construtivas e tentou ajudar a Igre-
ciono, a Xavier University, em ja com sua federação. (Texto transcrito
Louisiana, foi fundado por Santa Quando, na década de 1960, por Giovanni Cubeddu
Catarina Drexel. nos vimos na necessidade de res- e revisto pela autora)
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We e nosotros
no mosaico dos States
por Miguel H. Díaz
O da população norte-ameri-
cana, ndr] nos diz que nos
Estados Unidos temos 195,8 mi-
que se sentem também blacks, ne-
gros, estabelecendo assim eviden-
temente um vínculo com a comu-
compreensão e colaboração, ten-
tativa que hoje representa o princi-
pal compromisso de minha missão
lhões de brancos, 37,7 milhões de nidade negra americana. em Roma. E tive de admitir que
negros, 50,5 milhões de hispânicos Mesmo antes de ser um diplo- muito devemos aprender da ma-
e 14,5 milhões de asiáticos. mata junto à Santa Sé, eu me per- neira como eles olham para o mun-
Mas, se fizermos aos hispâni- guntava como os católicos afro- do, para as pessoas e para o encon-
cos uma pergunta acerca da sua americanos contribuíam para a tro entre a religião e a sociedade.
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OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS
reitos civis – que produziram per-
A ascensão das minorias sonalidades como Martin Luther
King Jr. – e enfim as leis sobre os
hispânicas e afro-americanas direitos civis. O presidente Oba-
ma é o herdeiro desse longo ca-
torna cada vez mais concreto o minho. Estamos diante de ho-
mens que lutaram para que, no
“e pluribus unum” e ajuda os mesmo contexto da sua humani-
dade e da sua dignidade, também
Estados Unidos a entenderem a sua blackness – a sua negritude
– fosse acolhida. A história dos
melhor o mundo. Com a católicos negros foi a história de
uma fidelidade incomum: tiveram
palavra Miguel H. Díaz, seus profetas, tiveram grande pa-
ciência e constância, e sobretudo
embaixador dos Estados acreditaram que no fim o bem
Unidos junto à Santa Sé triunfaria sobre o mal. E é eviden-
te, sobretudo em seus cantos spi-
rituals, que para afirmar a sua
À esquerda, o presidente Barack Obama ao final humanidade diante de quem os
de um comício sobre a reforma da saúde em College Park, definia menos que humanos eles
no Estado de Maryland, em setembro de 2009; se inspiraram em todo um mundo
abaixo, a anual Queens Hispanic Parade pelas ruas de tradições religiosas de culturas
de Nova York diferentes. Quem hoje sofre ou
Miguel H. Díaz,
embaixador
dos Estados
Unidos junto
à Santa Sé
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O filósofo norte-americano
Josiah Royce (1855-1916)
46 30DIAS Nº 6 - 2011
OS CATÓLICOS AFRO-AMERICANOS
ricano à presidência tenha-se tem raízes na fé e que tanto con- nos States. Creio que a propósi-
tornado presidente dos Estados tribuiu para a construção do ima- to disso a imagem do mosaico –
Unidos, tendo norteado sua cam- ginário coletivo dos americanos. ou, se quiserem, da paella... –
panha pelo modelo central do A comunidade afro-americana seja mais pertinente que a do
yes we can, que nos diz que po- não separa o secular do sagrado; melting pot. Pois no mosaico
demos alcançar maiores resulta- ela encontra a maneira de perce- são preservadas todas as partes
dos se estamos juntos, e não um ber a santidade dos comporta- que compõem o rosto final, e na
contra o outro, começando pelo mentos nos detalhes da vida coti- paella todos os ingredientes são
bairro e indo até o nível das rela- diana. E creio que isso tenha um importantes para dar sabor: isso
ções internacionais. valor, pois lembra também aos é, justamente, “e pluribus
Quando, nos Estados Unidos, diplomatas e aos políticos que unum”. Isso influenciará positi-
nos estendemos em debates so- muitas vezes a religião pode ser vamente também a nossa políti-
bre a secularização e alguém afir- usada erroneamente – e ainda o ca externa, pois os Estados Uni-
ma que não existe lugar na socie- será, pois isso está na história dos – tornando-se cada vez mais
dade para os portadores de deste mundo –, mas mesmo as- o microcosmo do nosso planeta
ideias religiosas, a comunidade sim continua a ser uma força que –, graças também a suas dinâmi-
afro-americana já tem a resposta constrói o bem comum. cas inter nas, poderão com-
pronta. Mesmo sem incomodar Enfim, talvez alguém possa ter preender melhor as dinâmicas
mais uma vez Martin Luther medo de que nos Estados Unidos globais.
30DIAS Nº 6 - 2011 47
Curtas Curtas Curtas Cu
3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUN
O PRESIDENTE PERES,
O DIRETOR DE 30DIAS E A PAZ
NA TERRA SANTA
SAGRADO COLÉGIO Roma, foi nomeado bispo de tas as demissões de monse- licismo de maioria’, aquela
A morte de Sterzinsky Sabina-Poggio Mirteto. nhor Luciano Bux, que com- massa de italianos em torno
e Swiatek Em 24 de junho monse- pletou 75 anos em 29 de ju- de cinquenta por cento da
nhor Giovanni Tani, 64 nho, do cargo de bispo de população que se limita a
No dia 30 de junho depois de anos, desde 2003 reitor do Oppido Mamertina-Palmi. respeitar os preceitos mais
uma longa doença faleceu o Pontifício Seminário Maior gerais e ir à igreja no Natal e
cardeal Georg Maximilian Romano, foi nomeado arce- na Páscoa. Resiste, ao invés,
Sterzinsky, 75 anos, arcebis- bispo de Urbino-Urbania- IGREJA/1 pelo menos há vinte anos,
po emérito de Berlim. No dia Sant’Angelo in Vado. Do povo cristão ao ao redor de trinta por cento,
2 de julho foi nomeado o seu Em 28 de junho o cardeal “catolicismo militante” o ‘catolicismo de minoria’ de
sucessor: monsenhor Rainer Angelo Scola, 70 anos em quem vai à missa todos os
Maria Woelki, 55 anos, desde novembro, desde 2002 pa- O jornal La Repubblica pu- domingos, dentro do qual se
2003 auxiliar de Colônia. triarca de Veneza, foi no- blicou, em 7 de julho, uma reforça até mesmo, e isso é
No dia 21 de julho faleceu meado arcebispo de Milão. síntese feita por Michele uma herança do impulso de
o cardeal bielo-russo Kazi- Em 2 de julho foram acei- Smargiassi sobre o conteúdo Wojtyla, um dez por cento de
mierz Swiatek, 96 anos, arce- de um estudo do catolicismo ‘catolicismo militante’ for-
bispo emérito de Minsk. Com na Itália, Geografia dell’Ita- mado por animadores de pa-
a sua morte o Colégio cardi- lia cattolica, de Roberto róquias e de membros ativos
nalício fica com 196 purpura- Cartocci, professor de Ciên- dos movimentos eclesiais”.
dos, dos quais 114 eleitores. cias Políticas em Bolonha.
Segundo o estudo, “nos últi-
mos anos aconteceu, silen- IGREJA/2
ciosamente, um terremoto O desaparecimento
ITÁLIA nos costumes religiosos na- da fé tradicional
Novos bispos cionais. Uma transição de
em Sabina, Urbino, consciências, uma decanta- No jornal La Repubblica de
Milão. Demissões em ção, uma eletrólise que des- 7 de julho Giancarlo Zizola
Oppido pedaçaram o país em duas comenta o estudo de Rober-
Mamertina partes: no Norte a seculari- to Cartocci, Geografia
zação, e no Sul a devoção”. dell’Italia cattolica, expli-
No dia 10 de junho monse- Trata-se de um processo len- cando que “nas ruínas do ca-
nhor Ernesto Mandara, 58 to “que corrói somente o que tolicismo” insinua-se por to-
anos, desde 2004 auxiliar de Angelo Scola os sociólogos chamam ‘cato- dos os lados “um modelo ¬
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urtas Curtas Curtas Curtas
NDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO
ORIENTE MÉDIO
Abraham Yehoshua e a proclamação do Estado palestino
Crianças palestinas observam uma manifestação de judeus ortodoxos na cidade antiga de Jerusalém
“A campanha realizada por Israel contra a iniciativa afastar do Estado israelense eventuais perigos. Tais
palestina para obter o reconhecimento de um Estado proteções militares, segundo o escritor, “não danifica-
próprio na Assembleia das Nações Unidas em setem- riam a identidade nacional palestina (assim como as
bro próximo, na minha opinião, é política e moral- bases militares estrangeiras na Europa e em outras re-
mente incorreta e ligada à questão do reconhecimen- giões durante a Guerra Fria). Uma presença militar é
to internacional das fronteiras de 1967”. São palavras substancialmente temporária e num amanhã, muda-
de Abraham Yehoshua, publicadas no La Stampa de das as circunstâncias, seria possível removê-la. Do
13 de julho. O artigo, depois de uma digressão históri- mesmo modo, os civis israelenses em encrave no inte-
ca sobre a resolução da ONU de 1947, que estabelece rior do estado palestino seriam uma constante provo-
o nascimento de dois Estados, “um judaico – Israel – , cação que reacenderia ódios e desavenças”. O artigo
e um árabe – a Palestina”, e sobre as sucessivas guer- conclui-se assim: “A eventualidade de uma multidão
ras árabo-israelenses, continua explicando como: “o de civis palestinos, entre os quais mulheres e crianças,
reconhecimento de um Estado palestino dentro das que tomam conta das ruas dos vilarejos e cidades para
fronteiras de 1967 estabelecerá a decisão tomada pe- manifestar de modo não violento (como acontece ulti-
las Nações Unidas em novembro de 1947 com rela- mamente em vários países árabes) contra postos de
ção à repartição da região, sustentada na época por guarda e assentamentos israelenses na Cisjordânia de-
Israel e sobre a qual se baseia a sua legitimidade inter- pois da decisão da ONU em setembro me deixa muito
nacional. Portanto se o governo de Israel é sincero em inquieto. A ANP saberia controlar tais manifestações?
querer reconhecer um Estado palestino – como decla- E o que faria Israel? Enviaria o exército para reprimi-
rou várias vezes – por que se opõe tanto à prevista re- las com a força? E os extremistas israelenses como
solução de setembro? Creio que a única razão seja a reagiriam às manifestações diante de suas casas? Tal
referência às fronteiras de 1967”. Clara alusão, a últi- cenário pode ser evitado se o governo de Israel apoiar
ma, às teses de alguns políticos israelenses que denun- em setembro a resolução das Nações Unidas e enca-
ciaram a impossibilidade de defender tais fronteiras. minhar logo negociações diretas sobre todas as ques-
Porém, segundo Yehoshua, uma prudente presença tões controversas, como convidou a fazê-lo o presi-
militar, israelense e internacional, seria suficiente para dente dos Estados Unidos”.
30DIAS Nº 6 - 2011 49
Curtas Curtas Curtas Cu
3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUNDO 3ODIAS NO MUN
50 30DIAS Nº 6 - 2011
Reportagem
Proximidade e misericórdia
por Gianni Valente
52 30DIAS Nº 6 - 2011
AMÉRICA LATINA
e de emprego para si e para os ou-
tros, orações e missas pelos entes
queridos falecidos, a alegria e o
descanso da lida. À frente do pa-
dre Flávio formou-se uma fila, fei-
ta dos muitos que se confessam.
“Bautismos aquí, batismos aqui”,
está escrito numa faixa pendurada
numa árvore. Embaixo, numa
mesinha, dois jovens tomam nota
dos pedidos de novos batismos.
Até mesmo de pessoas que se
aproximam por simples e instinti-
va curiosidade. Desde a noite an-
terior, quando começou a misión,
ali, na frente mesmo da “Carpa
Católica”, foram celebrados treze
batismos de jovens e adultos, que
já tinham sido preparados pelos
catequistas leigos com que depois
prosseguirão a catequese pós-ba-
tismal. De repente e sem aviso
prévio, chega o próprio arcebis-
po, dom Jorge Mario Bergoglio.
Ele cumprimenta um por um os
jovens e as jovens, e abraça padre
Facundo, que logo derrama a sua
voz de trovão no megafone:
“Adelante, aproximem-se todos
da Carpa Misionera; daqui a al-
guns minutos celebraremos a mis-
sa”. Até um bêbado para. Às onze
de manhã, já está um pouco em-
briagado. Aproxima-se de Bergo-
Acima, peregrinos
com a imagem
de Nossa Senhora
Aparecida na grande
esplanada da Basílica
de Aparecida, no Brasil
Na página ao lado
e à direita, duas fotos
da Carpa Misionera na
Plaza de la Constitución,
em Buenos Aires,
durante a missa A capela Santa María Madre
celebrada pelo cardeal del Pueblo, no bairro Bajo Flores,
Jorge Mario Bergoglio em Buenos Aires
tuição argentina, o maçom Juan santo das causas urgentes. E de- glio. Mede-o de cima a baixo, qua-
Bautista Alberdi. Chamam-na pois alguns deles começam a cir- se perplexo: “Já vi você em algum
Carpa Misionera, Tenda Missio- cular por toda a área da estação, lugar...”, murmura. E acrescenta:
nária da Igreja Católica. Trouxe- distribuindo a quem passa e às “Você é católico? Então diga você
ram com eles uma imagem da Vir- pessoas paradas um santinho a missa!”. Padre Facundo pede a
gem de Luján, a Nossa Senhora com a imagem de Jesus e uma mesma coisa, trazendo-lhe os pa-
venerada no santuário nacional. oração. Muitos se aproximam, ramentos para a celebração. De-
Ao seu redor, dispuseram mesas pedem uma bênção, deixam nas pois, diante de um pequeno grupo
com pequenas imagens do Meni- caixinhas nas mesas pequenas de jovens, velhinhos, mães com
no Jesus e de Santo Expedito, o mensagens com pedidos de saúde crianças e passantes que fica- ¬
30DIAS Nº 6 - 2011 53
Reportagem
ram lá por acaso, o cardeal jesuíta ressa. Se houvesse no mundo in- imensa Avenida 9 de Julio –, a coi-
faz uma homilia de poucas pala- teiro um só homem ou uma só sa mais importante é facilitar, não
vras. “Peçamos a Jesus tudo aqui- mulher, Ele teria oferecido a sua fazer seleções, não impor obstá-
lo de que necessitamos. Peçamos vida do mesmo jeito, por aquele culos a esse desejo de Jesus. Abra-
tudo isso ao Pai em nome d’Ele, único homem ou aquela única çando cada aceno de espera que
peçamos a Ele, para que Ele peça mulher”. jorra gratuitamente nas circuns-
ao Pai. Como os pobres que Lhe Por isso, pensa Bergoglio – e tâncias fortuitas e fugazes que o
pediam tudo, quando passava pe- também Facundo, padre Flavio e tempo presente oferece. Fazer
las ruas e eles o cercavam. Jesus todos os padres de Buenos Aires como fez o apóstolo Filipe, com o
gosta muito de estar conosco, que de vez em quando vão fazer eunuco a quem anunciara a Boa
com todos nós, com todos aque- batizados e confissões nas esta- Nova ao longo do caminho. “Aqui
les que passam pela rua. É uma ções, nas praças, até sob o obelis- temos água. Que impede que eu
coisa que antes de tudo Lhe inte- co da Plaza de la República, na seja batizado?”, perguntara o eu-
nuco quando passavam perto de
um riacho. “Filipe batizou o eunu-
co. Quando saíram da água, o Es-
pírito do Senhor arrebatou Filipe.
O eunuco não o viu mais e prosse-
guiu sua viagem, cheio de alegria”
(At 8,36-39).
Cresce o sentimento
de precariedade,
mas crescem também
as possibilidades de encontro
“No Evangelho”, repetia o car-
deal Aloísio Lorscheider, “os en-
contros mais belos de Deus com a
humanidade aconteciam na rua.
Foto dos participantes da 33ª Assembleia do Conselho Episcopal Latino-Americano Séculos de história de cristianismo
(Celam), realizada em Montevidéu de 15 a 20 de maio de 2011 não nos dizem outra coisa”.
54 30DIAS Nº 6 - 2011
Acima, à esquerda, um grupo de meninas peruanas no dia de sua Primeira Comunhão na igreja de Las Mercedes, de Lima; à direita, o
refeitório para os pobres no convento de los Descalzos, em Lima, Peru, onde os franciscanos oferecem uma sopa chamada Porciúncula
No tempo atual, toda a Améri- Quatro anos depois, os bispos aberto e em pleno andamento.
ca Latina parece uma imensa es- e os outros convocados para a No qual – como sempre acontece
tação em que tudo se move e nada 33ª Assembleia do Conselho – as intuições mais cheias de espe-
está parado em seu lugar. Em que Episcopal Latino-Americano, rea- rança evangélica florescem e de-
processos econômicos e sócio- lizada em Montevidéu de 15 a 20 sabrocham na trama cotidiana
culturais imponentes mudam e às de maio passado, verificaram jun- dos pastores mais envolvidos na
vezes reviram a vida dos indiví- tos o caminho feito até aqui. vida concreta do povo de Deus.
duos e das multidões. A missa e os Questionaram-se e se confronta- Um primeiro dado ajuda a eli-
batismos administrados na esta- ram novamente com as intuições minar equívocos muitas vezes fo-
ção de Constitución são uma ima- e o olhar lançado sobre o Conti- mentados pelas propagandas cle-
gem concreta – entre as muitas nente expressos na conferência ricais e anticlericais: os bispos
possíveis – da Missão Continental de Aparecida. pastoralmente mais sensíveis têm
que as Igrejas latino-americanas, Nas palavras e nos juízos de al- cada vez mais claro que a missão
neste contexto de rápidas mudan- guns deles, recolhidos por continental não é uma estratégia
ças, prescreveram a si mesmas 30Giorni nesse encontro, o dis- ou um programa. Nem um apelo
em 2007, em Aparecida, na últi- cernimento compartilhado pelos a novas militâncias para recon-
ma Assembleia Geral do Episco- representantes do episcopado se quistar posições perdidas. “A mis-
pado Latino-Americano. apresenta como um caminho são continental delineada em ¬
posicionar do ponto de vista pastoral nessa perspecti- dioceses formadas por pessoas que vão e vêm todos
va. Em Aparecida, essas experiências convergentes se os dias, para satisfazer a suas necessidades vitais. As-
encontraram e se reconheceram, e todo o episcopado sim, é preciso que nos encarreguemos de todas as no-
latino-americano escolheu caminhar pela estrada que vas condições da convivência. Por exemplo, facilitando
elas sugeriam. o acesso aos sacramentos, de forma que os requisitos
Que elementos favorecem essa nova unidade de exigidos pela paróquia não se tornem um motivo para
intenções compartilhada? perder qualquer contato com a Igreja.
A constatação de que estamos passando para um Nas décadas passadas, a chamada Nova Evan-
novo contexto social. É um processo que percebemos gelização apostava muito nos grupos e nos movi-
sobretudo nas grandes áreas urbanas, que continuam mentos organizados. Hoje, que reflexões são su-
a crescer. Nesse sentido, a missão proposta em Apare- geridas pelo que ocorreu com os Legionários de
cida foi preparada também pela reflexão sobre as me- Cristo?
galópoles. A migração do campo para as cidades é uma Esse episódio nos diz que é preciso ter uma atitu-
constante na vida da América Latina. Mas hoje esses de de humildade, a atitude que Bento XVI tem-nos
fenômenos marcam a passagem de um tempo em que mostrado sempre. Reconhecer que a fragilidade hu-
os valores cristãos eram aceitos por todos para uma si- mana comporta necessariamente a possibilidade real
tuação em que os modelos mudam e vai-se formando de quedas, do pecado. É inútil que nos apresentemos
uma sociedade pluricultural. diante da sociedade pretendendo que a Igreja seja
E o que isso comporta, do ponto de vista pasto- uma espécie de instituição humana perfeita, em que
ral? tudo funciona. Essa, certamente, é uma boa inten-
Não podemos pensar que a nossa tarefa prioritária ção. Mas sabemos também que entre nós as fragili-
seja ficar o tempo inteiro parados na porta de entrada, dades e as misérias humanas levam a situações la-
verificando se as pessoas possuem ou não os requisi- mentáveis de escândalo e contratestemunho. E a ati-
tos administrativos para fazer parte da Igreja. Este é o tude de humildade sugerida por Bento XVI nasce da
tempo de um anúncio do essencial do cristianismo, a to- confiança de que a graça de Deus opera, e pode mu-
dos. Às pessoas tal como elas são, na condição concre- dar as coisas. Só assim não somos reféns das ex-
ta em que vivem hoje, com as expectativas que têm pressões da mídia que se esforçam por denegrir a
agora. Na área do México em que me encontro, há doze instituição eclesiástica. ¬
30DIAS Nº 6 - 2011 55
Reportagem
Aparecida”, explica com palavras enquanto tal não interessa, não apostava tudo na fórmula quase
tão simples quanto decididas Ri- importa. É apenas um instrumen- mágica da “evangelização da cul-
cardo Ezzati Andrello, arcebis- to. O Concílio Vaticano II repete tura”, entregando nas mãos de
po de Santiago do Chile, “não é e que a Igreja é sacramento, e um elites militantes a tarefa de read-
não pode ser entendida como um sacramento em si mesmo só tem quirir para a igreja um espaço cul-
projeto de reconquista das por- sentido como sinal e instrumento. turalmente influente no cenário
ções de poder sociológico que a Isso é a Igreja. Existe apenas para público, como se dizia nas déca-
Igreja está perdendo na América servir os homens indicando a eles das de 1980 e 1990.
Latina”. Até porque, como sa- o rosto de Cristo”. Assim, na A missão continental, repete o
lienta Rubén Salazar Gómez, América Latina parece já ter pas- brasileiro Geraldo Lyrio Rocha,
arcebispo de Bogotá, “a Igreja sado também a época de quem arcebispo de Mariana, “não é uma
Muitos continuam a olhar para as Igrejas latino- laborações possíveis, mas ao mesmo tempo livre para
americanas com os olhos das décadas de 1960 e dizer o que pensa sobre como deve ser a sociedade. In-
1970. Continuam a denunciar como insídia mais felizmente, esse esquematismo ideológico de que eu
grave a redução da mensagem cristã a ideologia falava antes, e que é totalmente inapropriado para olhar
política. É nesse pé mesmo que estão as coisas? para a Igreja, não parece totalmente superado em al-
Já há anos o esforço de construir e impor um “ma- guns países. Alguns ainda consideram fundamental o
peamento” ideológico dos membros da Igreja parece discurso ideológico para orientar seu governo e suas
inútil e superado, se é que alguma vez essa já tenha si- políticas, e orientar também as massas. Mas, ao lado
do uma chave de interpretação adequada para conhe- dos exemplos de uma continuidade na rígida posição
cer realmente os rostos e as experiências das Igrejas ideológica de antigamente, existem outros, mais prag-
da América Latina. Aparecida viu a Igreja tal como ela é máticos, de pessoas que pensam nas políticas sociais
hoje, e o que o Espírito Santo lhe inspira agora. Eu creio como instrumentos para resolver os problemas.
que esse documento tenha sido um sinal evidente de E em sua nação, qual é o problema que marca
como essas leituras ideológicas caíram por completo. mais o tempo atual?
Na comunhão da Igreja podem viver lado a lado sensi- No México, um problema grave é o impacto geral
bilidades diferentes e diferentes abordagens ao enfo- do tráfico de drogas e de dinheiro ilegal. Problemas
car as coisas. que não podem ser resolvidos se faltar uma verdadei-
Frequentemente a mídia e mesmo as agências ra colaboração internacional. De modo particular, a
de imprensa católicas descrevem os homens de dos Estados Unidos. Eles deveriam ter uma posição
Igreja como representantes de uma força “antago- muito mais rígida para impedir a passagem das ar-
nista” em relação a governos e grupos políticos mas para o México. O México não produz armas, não
que vêm prevalecendo na América Latina. É uma há lá uma única fábrica de armas e de armamentos
imagem plausível? militares. Como é possível que as armas sejam en-
Com relação ao itinerário histórico da América Lati- contradas com tanta facilidade do outro lado da fron-
na, vem crescendo a convicção de que a Igreja tem de teira? Isso certamente é consequência de uma práti-
ser muito livre perante os governos. Respeitando a au- ca criminosa.
toridade constituída, procurando favorecer todas as co- G.V.
56 30DIAS Nº 6 - 2011
AMÉRICA LATINA
Acima, à esquerda, nas proximidades da igreja de San Cayetano, em Buenos Aires, fiéis recebem a bênção por ocasião da festa do
santo padroeiro do trabalho e do pão; à direita, distribuição de comida em um refeitório de bairro em Buenos Aires
mobilização, ou uma lista de coi- sa “receber a Boa Nova, não de atua na história”. Um dado diante
sas novas a fazer e de momentos a evangelizadores tristes e desalen- do qual a Igreja tem o mandato de
organizar, mas um certo espírito tados, impacientes ou ansiosos, no mínimo não complicar o que é
que deveria ser a marca de cada mas de ministros do Evangelho, simples. “A questão é passar de
expressão e articulação da vida da cuja vida irradia o fervor de quem uma ideia de Igreja como regula-
Igreja. Em momentos de passa- recebeu, antes de tudo em si mes- dora da fé para a de uma Igreja fa-
gem e de grandes mudanças co- mos, a alegria de Cristo” (n. cilitadora da fé”, diz, usando uma
mo os que estamos atravessando, 552). Mesmo em meio às muitas frase um pouco de efeito mas efi-
aumentam as preocupações e o reflexões, indicações e suges- caz, Eduardo Horacio García,
sentimento de precariedade, mas tões, a missão continental não foi bispo auxiliar de Buenos Aires en-
também as possibilidades de en- delineada como o termo de um carregado da pastoral para a ar-
contro. Por exemplo, com os oi- trabalho dos agentes de pastoral, quidiocese portenha.
tenta por cento dos brasileiros o fruto de quem pretende cons- Talvez esteja toda aqui a con-
que, no Brasil católico, vivem a truir a Igreja com seu esforço, às versão pastoral que o documen-
sua vida longe das práticas cotidia- vezes partindo do zero. Pois “o to de Aparecida delineia como
nas da Igreja”. mais decisivo na Igreja é sempre fruto da gratidão e tarefa própria
O documento de Aparecida a ação santa de seu Senhor” (In- das Igrejas latino-americanas pa-
chamou a atenção também para trodução, n. 5). E cada passo no- ra o tempo presente. Nas refle-
o fato de que na América Latina vo “só pode acontecer se valori- xões de muitos bispos, a palavra
estão em andamento processos zarmos positivamente o que o Es- mais recorrente, não por acaso, é
de secularização e de que a fé, pírito Santo já semeou” (n. 262). cercanía, proximidade. Traço
que por cinco séculos animou a O ponto de partida é essa fé que, distintivo de uma Igreja que se
Igreja e a vida do continente, já mesmo em meio a todos os es- ofereça a todos como uma “mãe
não se transmite de geração em quecimentos, as fraquezas e os que vai ao encontro, uma casa
geração com a mesma facilidade possíveis desregramentos, conti- acolhedora” (n. 370). Assim, os
de antes. O texto convidou as nua a mostrar-se nas devoções bispos desta época eclesial rea-
Igrejas latino-americanas a liber- mais simples do povo, com a tam os fios de continuidade ¬
30DIAS Nº 6 - 2011 57
Reportagem
À esquerda,
católicos venezuelanos
durante a procissão
do Domingo de Ramos,
em Maracaibo
À direita,
a tradicional
procissão
do Domingo
de Ramos em Cali,
no departamento
de Valle del Cauca,
na Colômbia
58 30DIAS Nº 6 - 2011
AMÉRICA LATINA
“É inevitável”, observa o arcebis- querda, com líderes de diferentes ciais, é representada como uma
po Stanovnik, “que quando al- proveniências e posturas – ex- corporação em busca de privilé-
guém pensa construir, ‘fazer’ a guerrilheiros, ex-militares, nacio- gios”. Segundo o arcebispo chile-
Igreja como projeto e conquista nal-populistas, pragmático-refor- no Ricardo Ezzati, “na linguagem
próprios, acaba por fazer uma au- mistas –, chamados, de uma for- política há quem às vezes quer fa-
tocelebração”. Acrescenta os ar- ma ou de outra, a administrar uma zer passar a ideia de que a estrutu-
cebispo Porras: “Pretensões co- conjuntura econômica em expan- ra eclesiástica é um fator de atraso
mo essa marcam a história do ca- são, processos reais de integração que freia a sociedade e as cons-
tolicismo latino-americano desde política, desequilíbrios crescentes ciências, e denuncia sua pretensa
o início. Basta ler os documentos e programas sociais compensató- tentativa de recuperar um mono-
publicados pelo Vaticano no quin- rios que impactam as condições pólio social e cultural perdido. A
to centenário da descoberta da de vida de milhões de pessoas. meu ver, é preciso evitar confir-
América. Na época, havia quem, Uma efervescência continental mar esse estereótipo. E evidenciar
por rigidez disciplinar, pretendes- em cuja representação pela mídia que a Igreja não busca nenhum
se que os sacerdotes ou os religio- os homens de Igreja normalmente poder, nenhuma hegemonia.
sos fossem filhos legítimos, cresci- são relegados ao papel fixo de Quer apenas comunicar ao nosso
dos em famílias regulares, capa- censores severos. Seriam eles povo uma mensagem de liberta-
zes de fornecer um dote. Já na- emissários de uma corporação ção boa para todos”. Também o
quela época, entre os séculos XVI sempre em luta com líderes políti- cardeal Julio Terrazas Sando-
e XVIII, chegavam de Roma cen- cos e governos e ancorada à agen- val, arcebispo de Santa Cruz de la
tenas e centenas de dispensas, pa- da dos temas eticamente sensí- Sierra, define como caricatura cô-
ra contornar essas pretensões ri- veis: defesa da vida, da família, da moda aquela que reduz a Igreja a
goristas”. liberdade de educação. um contrapoder: “Na Bolívia, nos
O fato é que entre os bispos últimos anos, a Igreja manteve-se
Uma Igreja contrapoder? convocados a Montevidéu duran- em silêncio à espera de que acon-
O Celam, desde os tempos em te a última assembleia do Celam tecessem as mudanças tão deseja-
que quem o guiava e inspirava ninguém pareceu ter a intenção das pelo povo. Só começamos a
eram espíritos livres como o bispo de dar crédito e quem sabe relan- falar quando ouvimos discursos
chileno Manuel Larraín e dom çar o perfil hipermediatizado da que convidavam a eliminar o
Hélder Câmara, sempre refletiu o Igreja como bloco “beligerante” ‘Deus dos cristãos’ e afirmavam a
sentimento predominante dos alternativo aos poderes munda- divisão entre duas Igrejas, a dos ri-
episcopados latino-americanos nos. Para todos, os traços distinti- cos e a dos pobres”. Conclui o co-
diante das mutáveis geografias so- vos inatos à ação eclesial são os do lombiano Rubén Salazar Gómez:
ciais e políticas da região, esse fervor apostólico e da mansidão. “É uma deformação imposta pela
cruzamento de povos e nações “A imagem de uma Igreja como mídia, que enfatiza apenas os dis-
que dom Hélder definia com ra- força antagonista”, explica o arce- cursos dos eclesiásticos sobre te-
zão “o continente cristão do Ter- bispo venezuelano Porras, “é útil mas de moral sexual. A Igreja de-
ceiro Mundo”, quando chamava a governos e regimes populistas ve fazer o possível para escapar
seus confrades a combater a misé- que frequentemente caem na divi- do mecanismo daqueles que a pin-
ria “que destrói a imagem de Deus nização do próprio poder. Quan- tam como uma corporação políti-
que existe em cada homem”. do isso acontece, a Igreja, justa- ca antagonista. Deve fazer isso
Hoje se consolida com o tem- mente por sua imanência ao povo mostrando a todos, com humilda-
po nesses países e aumenta cada e pelo olhar livre de messianismos de, que não busca nada para si
vez mais a fila de governos de es- com que avalia os problemas so- mesma”. q
Fiéis com a imagem do papa João Paulo II durante uma missa campal no dia
de sua beatificação, na Cidade de Guatemala
30DIAS Nº 6 - 2011 59
Um comentário à frase de padre Luigi Giussani
Introdução
por Paolo Mattei
A
frase de padre Luigi Giussani dirigida a João Paulo II no início da déca-
da de 1990, “não, Santidade, não é o agnosticismo; o gnosticismo, es-
te sim, é que é o perigo para a fé cristã”, despertou o interesse não
apenas dos nossos leitores. O jornal italiano Avvenire recordou-a num peque-
no artigo que resume com precisão as palavras e as intenções de padre Gius-
sani. Nós o transcrevemos integralmente: “Na última edição de 30Giorni há
uma frase de padre Luigi Giussani: ‘Não é o agnosticismo; o gnosticismo, este
sim, é que é o perigo para a fé cristã’; assim dizia a João Paulo II no início da dé-
cada de 1990. Escreve Lorenzo Cappelletti, introduzindo a republicação de
um artigo de Massimo Borghesi de 2003 (O pacto com a Serpente): ‘Passados
vinte anos, podemos nos dar conta do quanto foi antecipadora essa guinada
de padre Giussani. Guinada que pode ser exemplificada também por uma en-
trevista, concedida em abril de 1992, em que o mesmo Giussani fala da perse-
guição àqueles ‘que se movem na simplicidade da Tradição’. Quando o entre-
vistador lhe pergunta se ele se referia a uma perseguição de fato, Dom Giussa-
ni responde: ‘Isso mesmo. A ira do mundo, hoje, não se ergue diante da pala-
vra Igreja, fica quieta até diante da ideia de alguém se dizer católico, ou diante
da figura do Papa como autoridade moral. Aliás, existe uma reverência formal
e até sincera. O ódio explode – mal se contém, e logo transborda – diante de
católicos que se apresentam como tais, católicos que se movem na simplicida-
de da Tradição’”1.
Padre Giussani, naqueles anos, não apenas evidenciou a relação entre o
gnosticismo e a perseguição àqueles “que se movem na simplicidade da Tra-
1
Don Luigi Giussani: ‘Il pericolo oggi è lo gnosticismo’. In Avvenire, 14 jul. 2011, p. 27.
60 30DIAS Nº 6 - 2011
Nova
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ISSN 1827-6288
dição”, mas esclareceu também a forma pela
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Directeur: Giulio Andreotti
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(CONV. IN L. 27/02/04 N.46) ART.1, COMMA 1 DCB - ROMA.
In caso di mancato recapito rinviare a Ufficio XXIX
per la restituzione
ISSN 0390-4539
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Poste Roma Romanina N.4/5 - 2011 - € 5
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rinviare a Uff. Poste Roma Romanina per la restituzione al mittente previo addebito.
If undelivered please return to sender, postage prepaid, via Romanina post office, Roma, Italy.
En cas de non distribution, renvoyer pour restitution à lʼexpéditeur, en port dû, à: Ufficio Poste Roma Romanina, Italie
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“Not ag sticism fé cristã”, poderia sugerir uma hipótese de lei-
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Giussani,L. Cristo é parte presente do real. 30Dias, n. 12, dez. 1998, p. 61.
30DIAS Nº 6 - 2011 61
Um comentário à frase de padre Luigi Giussani
tro das categorias já conhecidas do gnosticismo. Essa hipótese teve em Augusto Del
Noce o seu redator sistemático3.
Mas, à parte essa inteligente e interessante hipótese de leitura do moderno, o
gnosticismo é o perigo para a fé cristã enquanto “frequentemente se infiltra e imobili-
za”, para usar as palavras tão claras de Giussani, o pequeno rebanho, “quase um resto
de Israel”, que é a Igreja.
Hegel, Goethe e Jung, para citar três grandes mestres do gnosticismo moderno, cujas
imagens ilustram a capa da última edição de 30Giorni, não são de per si um perigo, mas
o é aquele que na Igreja, de maneira mais ou menos oculta (“oculto e horrendo veneno”
é a expressão que Santo Agostinho usava para se referir à heresia pelagiana4), “frequen-
temente se infiltra e imobiliza”, e portanto desnatura, a simplicidade da Tradição.
Também a tragédia do massacre de Oslo de 22 de julho pode indicar como o des-
naturamento da fé da Antiga e da Nova Aliança pode transbordar no ódio mais de-
sumano e mais diabólico. De fato, se, em vez de confiar unicamente a Deus na ora-
ção a revelação de Seu mistério (e Apocalipse significa revelação), o homem quer
construí-lo e antecipar por si mesmo, renova a presunção diabólica de ser como
Deus (cf. Gn 3,4-5).
Alguns leitores pediram que lhes fosse esclarecido da maneira mais simples possível
o que é o gnosticismo. Parece-nos que as breves palavras do discípulo predileto, em
sua segunda Carta, digam com insuperável simplicidade o que se entende por gnosti-
cismo, ou seja, por gnose (aliás, melhor dizendo, por falsa gnose, pois a fé em Jesus
Cristo também é conhecimento, despertado pela atração da Sua graça). Escreve São
João: “Todo aquele que se adianta e não permanece na doutrina de Cristo, não possui a
Deus. Aquele que permanece na doutrina, esse possui o Pai e o Filho” (2Jo 9). O perigo
do gnosticismo para a fé cristã se expressa na tentativa de ir além da doutrina de Cristo,
além da fé dos apóstolos. Poderíamos dizer também que o gnóstico não permanece na
humanidade de Jesus, essa humanidade que segundo o apóstolo Paulo contém em su-
perabundante plenitude “todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Cl 2,3).
Aqui, Paulo, para indicar o “conhecimento”, usa justamente o termo grego “gnose”.
Para possibilitar uma maior compreensão das palavras de padre Giussani republica-
mos, acompanhado de um breve perfil biográfico, o artigo de padre Jules Lebreton
sobre Orígenes (185-254), teólogo da Igreja de Alexandria. Escreve Lebreton que a
teologia de Orígenes é “um idealismo que crê se aproximar de Deus perdendo de vis-
ta a humanidade de Cristo”.
3
Del Noce, A. Il problema dell’ateismo. Bologna: 1964. Cf., particularmente, p. 27 e 192.
4
Agostinho. Contra Iulianum opus imperfectum II, 146: “Occultum et horrendus virus haeresis vestrae”.
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vetera
Luca Signorelli, Pregação do Anticristo, capela de São Brício, Catedral de Orvieto. Ao redor do Anticristo, que ouve as sugestões
do demônio e realiza prodígios, encontram-se reunidas muitas pessoas, homens e mulheres, pobres e ricos, jovens e velhos,
gente comum e personalidades ilustres, laicos e eclesiásticos que conversam umas com as outras
Algumas teses de Orígenes foram condenadas pelo magistério da Igreja. Isso não
implica que sua teologia não possa e não deva ser valorizada em tudo o que propõe de
positivo e de útil para a compreensão da doutrina cristã. São-nos caras, nesse sentido,
as palavras de Santo Agostinho: “A regra absolutamente autêntica e inviolável da ver-
dade mostra que deve ser desaprovado e corrigido em cada um aquilo que existe de
falso e vicioso, enquanto deve ser reconhecido e aceito o que há de verdadeiro e reto”5.
Boa leitura.
5
Agostinho. De unico baptismo contra Petilianum, 9, 16.
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Um comentário à frase de padre Luigi Giussani
Lebreton,
teólogo crente
Francês, jesuíta, publicou escritos fundamentais sobre
os primeiros séculos da Igreja. Muitos grandes nomes
lhe são devedores. No entanto, nos mais recentes
dicionários teológicos não há vestígios dele.
Porque amava a fé da tradição antes e mais que
os debates dos homens cultos. Perfil desse personagem
O
recentíssimo Dizionario os títulos acadêmicos não se pôde Com humildade
dei teologi não o nomeia. esquivar de assumir cargos de do- Essa atitude de soberana e humil-
Não encontramos um per- cência. Em 1907, em plena crise de indiferença sempre o acompa-
fil dele nem mesmo entre os cento modernista, foi a ele que foi confia- nhará. “A sua espiritualidade aus-
e dez retratos propostos no Lessi- da a responsabilidade pela cátedra tera contrastava por completo
co dei teologi del secolo XX, últi- de História das Origens Cristãs, com qualquer busca de aventura e
mo volume da famosíssima obra criada ex novo no Institut Catholi- evasão. O padre não expressava
dogmática (que se gaba de ter Von que de Paris para cuidar do delica- desejos”, escreve René d’Ouince
Balthasar e Rahner entre seus emi- díssimo setor histórico-teológico na lembrança que lhe dedicou em
nentes colaboradores) Mysterium dos estudos sobre a Igreja primiti- Études, de 1956. De fato, tam-
salutis. Mesmo assim, reconhece- va. Padre de la Potterie lembra de bém do ponto de vista científico,
ram-se devedores do padre Jules tê-lo encontrado em Paris muitos o padre Lebreton gastou a maior
Lebreton quase todos os chama- anos depois, ocasião em que Le- parte de sua vida em obras que
dos grandes, de Chenu a Danielou, breton confidenciou-lhe que, custam esforço e não trazem gló-
de Leclerq a Lyonnet, de Bouyer a quando chegara, nos primeiros ria, ao menos a que é ganha entre
Marrou, tanto que Emile Blanchet, anos do século XX, “un vent glacé os homens, demarcando a pró-
reitor do Institut Catholique de Pa- soufflait sur Paris”. pria pretensa originalidade. Deus
ris, dando notícia de sua morte, Seria aquele jovem professor sabe o que custa ser um professor
ocorrida em julho de 1956, escre- capaz de suportar o vento gélido sempre disponível por quase qua-
via que na realidade “jamais sabe- do modernismo? Colegas nem renta anos, sintetizar corretamen-
remos qual foi a profundidade e a sempre bem intencionados desde- te em dois volumes a história da
extensão da influência do padre nhavam: “Os seus superiores de- Igreja até Constantino para a
Lebreton”. vem estar loucos para permitir que grande obra dirigida por Fliche e
Nascido em Tours em 1873, você aceite um cargo como este”. Martin, além de estar sempre tra-
Jules Lebreton entrou aos dezesse- “Não briguei para obter esta posi- balhando como escritor para re-
te anos na Companhia de Jesus e ção”, respondia Lebreton. “Cha- vistas como Études e Recherches
depois de ter bilhantemente obtido maram-me para cá. Vim”. de science religieuse (que funda-
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Padre Jules Lebreton. Como Irineu, o padre Lebreton – es-
Nasceu em Tours creve ainda René d’Ouince – “nor-
em 1873, morreu malmente se contentava em expor
em Paris em 1956 com firmeza a doutrina tradicional
da Igreja”. Segundo essa mesma re-
gula fidei que fora de Irineu e que
Lebreton assume no prefácio à His-
toire du dogme, lemos: “A corrente
viva da nossa tradição nos une ainda
mais estreitamente e mais segura-
mente ao passado que os comentá-
rios dos exegetas e as dissertações
dos historiadores”.
O velho servidor
A desconfiança perante as especu-
lações da gnose cristã de Clemente
de Alexandria e de Orígenes volta
em alguns de seus artigos da déca-
da de 1920 (publicados na Itália pe-
la Jaca Book em 1972 sob o título
Il disaccordo tra fede popolare e
teologia dotta nella Chiesa del
terzo secolo, dos quais apresenta-
mos amplos trechos nas páginas
seguintes). Segundo Orígenes, os
simples fiéis são como lactantes, li-
gados a conhecimentos elementa-
res: “Não conhecem senão Jesus
Cristo e Jesus Cristo crucificado,
pensando que o Logos feito carne
é todo o Logos; eles conhecem
ra em 1910 com o padre De proposto à humanidade a partir apenas Cristo segundo a carne: e
Grandmaison e cuja direção assu- do momento da criação do pri- essa é a loucura daqueles que são
miu também, após a morte deste); meiro homem ou apenas depois chamados crentes”.
mas sobretudo resenhar, para o da queda, em previsão dos méri- Mas padre Lebreton quis viver
Bulletin d’histoire dessa revista, tos do Redentor; nessa segunda e morrer como eles. Voltando a
até o fim da década de 1940, inú- hipótese, devemos ser represen- ser como uma criança nos últimos
meros trabalhos alheios. Por tados por Adão, antes de seu pe- anos de sua vida em decorrência
meio século, as obras de uma cer- cado, enquanto orientado por de uma grave doença, confiden-
ta importância de todos os exege- Deus a uma beatitude natural, ciou a uma religiosa idosa e doen-
tas neotestamentários, dos patró- merecida por uma vida piedosa e te como ele: “A senhora entende
logos e dos historiadores do dog- justa, como as forças da natureza como eu, minha madre. O que o
ma passaram pela avaliação aten- podiam assegurar? Se essa hipó- Senhor quer encontrar nos seus
ta de suas análises críticas. Tão tese de uma natureza pura orien- velhos servidores é a confiança
medidas, que para encontrar seu tada para um fim natural tiver de n’Ele. Uma criança não tem medo
relevo é preciso lê-las nas entreli- ser descartada...”. É como se dis- de voltar à casa pater na. Mês
nhas. Trigésimo quarto ano de sesse: os cristãos sabem em que após mês as forças diminuem. Es-
Recherches de science religieu- devem crer, hipóteses são hipóte- ta tarde irei ao médico para tomar
se, apresentação de Surnaturel, ses e ninguém disse que a da natu- as injeções mensais que me aju-
do padre De Lubac: “Todo cristão reza pura deve ser descartada... dam a viver, a pensar, a lembrar-
sabe que Deus propõe como fim O padre Lebreton deixou incom- me das coisas. Quando já não fi-
último para a sua vida a visão bea- pleta a única obra que lhe poderia ter zerem efeito, deixarei de lado tu-
tífica, pela qual ele se unirá eter- dado glória. L’histoire du dogme de do isso e viverei na casa paterna
namente ao seu Criador e Salva- la Trinité des origines au Concile como uma criança dócil e con-
dor; ele sabe que essa visão lhe é de Nicée não chegou a Niceia, pa- fiante, repetindo a palavra: ‘Scio
prometida e lhe será concedida rou em Santo Irineu. Mas talvez não cui credidi. Sei em que depositei
por pura graça de Deus; mas po- tenha sido por acaso. A fé de Lebre- a minha confiança’. Não vai me
de perguntar-se se esse fim foi ton era um pouco como a de Irineu. decepcionar”. q
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Um comentário à frase de padre Luigi Giussani
Nesta e nas páginas seguintes, algumas imagens do ciclo de afrescos conservados no interior do mosteiro de clausura
das Agostinianas dos Santos Quatro Coroados, em Roma. Aqui, acima, a representação da arte Gramática
Um idealismo
imprudente
Jules Lebreton escreveu na década de 1920 dois artigos sobre Orígenes.
A teologia do mestre de Alexandria é “um idealismo que crê
aproximar-se de Deus perdendo de vista a humanidade de Cristo”
por Lorenzo Cappelletti
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a edição 12 de 1922 de Recherches infinitamente perfeito pôde criar? Com o seu
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gar ao que é mais perfeito e mais elevado. Por
isso, é preciso que o cristianismo seja espiritual
e corporal; e, quando é preciso anunciar o
Evangelho corporal, e dizer em meio àqueles
que são carnais que não conhecemos outra
coisa senão Jesus Cristo e Jesus Cristo crucifi-
cado, devemos fazê-lo.
Mas, quando nos encontramos diante de
aperfeiçoados pelo Espírito, que trazem frutos
n’Ele e são apaixonados pela sabedoria celes-
te, é preciso comunicar a eles o discurso que se
eleva da encarnação até o que estava junto de
Deus’” (p. 77-78).
3. A tradição secreta
A tradição única da Igreja, de que fala Irineu e
que é confiada em primeiro lugar à custódia do
bispo de Roma, cinde-se inevitavelmente, de-
pois de Orígenes, numa dupla tradição. “De
um lado a Igreja visível, que mostra, como em
Irineu ou Tertuliano, a sucessão episcopal que
a liga por meio dos apóstolos a Cristo; de outro
lado uma elite, conhecida apenas por Deus,
oculta aos olhos dos homens, que também re-
mete a uma tradição apostólica, mas confiden-
cial, secreta e transmitida clandestinamente”
(p. 94). Se formos a fundo não apenas desco-
briremos que as tradições se tornam duas, uma
exotérica (pública, ou seja, católica), a outra, a
que conta, esotérica (secreta, ou seja, gnósti-
ca), mas também que não transmitem o mes-
mo depositum.
Nem quanto ao objeto: “O ensinamento re-
servado aos simples é o moral; a revelação dos
mistérios, particularmente da Trindade, é o se-
gredo dos perfeitos. [...] Os dois ensinamentos,
um proposto à massa, o outro reservado aos
perfeitos, se distinguem por seu objeto: para
uns a intimação dos preceitos morais, para ou-
tros a revelação dos segredos divinos. [...] Orí-
genes frequentemente opõe o conhecimento
da humanidade de Cristo ao da sua divindade:
aos carnais não é possível pregar outra coisa se- São Paulo nos ombros da personificação da virtude
não Jesus Cristo crucificado, mas àqueles que da concórdia, sob cujos pés jaz o vício
estão apaixonados pela sapiência celeste será ¬ da discórdia, representado provavelmente por Ário
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Um comentário à frase de padre Luigi Giussani
revelado o Verbo que está junto de Deus. [...] mo contraposição de uma fé culta a uma fé
Em primeiro plano põe aqueles ‘que participam simples. Lebreton recorda como nos Philosop-
do Logos que existia no princípio, que estava houmena Hipólito põe na boca de seus inimi-
junto de Deus, o Logos Deus’; depois aqueles gos expressões que em suas intenções deve-
‘que conhecem apenas Jesus Cristo e Jesus riam ser desqualificantes: “Zeferino repete: ‘Eu
Cristo crucificado, pensando que o Logos feito não conheço senão um Deus, Jesus Cristo, e,
carne é todo o Logos; estes conhecem só o além dele, nenhum Deus gerado que sofreu’; e
Cristo segundo a carne: e é a massa daqueles outras vezes: ‘Não foi o Pai que morreu, mas o
que são ditos crentes’” (p. 79-80). Filho’. Essas passagens são confirmadas pelo
Nem quanto ao método. As verdades, dife- conjunto do tratado: Hipólito é um teólogo, or-
rentes quanto ao objeto, o são também quanto gulhoso de sua ciência, grande leitor dos filóso-
ao método de conhecimento: “Uns creem, os fos gregos, os quais denuncia como pais de to-
outros conhecem; os primeiros remetem a das as heresias [mesmo essa condenação infle-
uma autoridade superior garantida pelos mila- xível da heresia a partir, não da simplicidade da
gres e a sua fé é frágil; os segundos contem- tradição eclesial, mas da cultura – permitam-
plam as verdades religiosas às quais aderem e a nos observar – é muito instrutiva: será a mesma
sua adesão é estável” (p. 81). em Orígenes e em muitos outros que se desvia-
Aliás, é possível até chegar a dizer que na rão da fé]. Apresenta-nos os seus adversários:
tradição pública não é transmitida nenhuma Zeferino, um espírito limitado, Calixto, um in-
verdade, mas apenas mentiras devotas: “Mas trigante, seus seguidores, inteligências vulgares
as verdades elementares que são ensinadas ao e espíritos sórdidos” (p. 9).
Povo dos simples são ao menos sempre verda- Ora, a essa contraposição cismática contra
des em sentido estrito? Orígenes afirma-o com os legítimos bispos de Roma não esteve Oríge-
muita frequência e desse ponto de vista se nes alheio. Orígenes chegou a Roma, de fato,
opõe aos gnósticos, mas encontramos tam- justamente na época em que Zeferino era bis-
bém algumas páginas inquietantes em que o po (199-217) e aderiu, parece, ao cisma de Hi-
ensinamento elementar aparece como uma pólito. Foi provavelmente por isso que alguns
mentira salutar: Deus engana a alma para for- anos depois, em 230, quando Orígenes for de-
má-la” (p. 95). posto por seu bispo de Alexandria do Egito,
Enfim, na relação subordinada entre verda- papa Ponciano reunirá em Roma prontamen-
des elementares e verdades mais elevadas, as te um sínodo para aprovar essa decisão, con-
primeiras acabam por resultar fábulas. Nas ho- denando também a Orígenes. Coisa que não
milias sobre o profeta Jeremias, Orígenes fizeram muitos outros bispos da Arábia, da Pa-
compara a ação de Deus à educação que os lestina, da Capadócia.
adultos dão às crianças. Segundo Orígenes, Passam-se alguns anos e, perante um discí-
“nós as enganamos com espantalhos que de pulo de Orígenes, Dionísio, que se tornara bis-
início são necessários, mas cujo vazio elas re- po em 247 na sé alexandrina, o então bispo de
conhecem em seguida” (p. 99). Roma (também chamado Dionísio) toma a pala-
vra denunciando suas teses perigosas. Escreve
4. Roma, guardiã da fé Lebreton: “Diante dessas teses, a posição toma-
Lebreton esclarece bem como Roma desde o da por Dionísio de Roma e seu concílio é a posi-
início resistiu a essa contaminação da fé. Des- ção tradicional da Igreja de Roma. [...] Aqui, co-
creve a contraposição de Hipólito a Zeferino e mo nos outros documentos romanos, o que en-
depois a Calixto (da qual surgiu, no início do contramos é a expressão autêntica da fé: ne-
século III, o primeiro cisma na sé romana) co- nhuma especulação teológica, nenhuma sutile-
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za dialética, pouca erudição escriturística, mas a
declaração categórica da fé professada pela
Igreja. Dionísio de Roma, também pessoalmen-
te, era homem de grande valor: Dionísio de Ale-
xandria dá testemunho disso e São Basílio tam-
bém lhe faz um grande elogio, mas aqui não é
nem o erudito nem o teólogo que fala, é o Papa.
Ele não se compraz nas especulações teoló-
gicas e pouco se preocupa com as dos outros.
Fica claro que a sua argumentação não leva
em conta distinções alexandrinas sutis sobre as
três pessoas ou sobre o duplo estado do Lo-
gos. Ele só se preocupa com conclusões mais
evidentes, quer tenham sido formuladas pelos
próprios autores dessas doutrinas, quer lhe pa-
reçam nascer espontaneamente; e, sendo que
essas conclusões são um perigo para a fé, re-
jeita-as, e rejeita também a teologia da qual
provêm.
A carta de Dionísio de Alexandria, apesar
das suas imprudências e do seu desleixo, estava
certamente bem distante do ensinamento de
Ário; mas a carta de Dionísio de Roma tem já o
acento de Niceia: a mesma preocupação com a
unidade divina, a mesma firmeza soberana e ca-
tegórica na definição da fé. Essa barreira insu-
perável, contra a qual se quebrará sessenta anos
mais tarde a heresia, é a que detém desde então
uma teologia aventureira. Os fragmentos de
Dionísio de Alexandria, como já observamos,
têm um caráter bem diferente da carta de Dioní-
sio de Roma: não encontramos nele um juiz da
fé, mas um exegeta, e sobretudo um metafísico
apaixonado por suas belas especulações. Ele se
compraz delas ainda nessa Apologia destinada
inteiramente a evidenciar a sua ortodoxia, e da
qual conhecemos a maior parte dos fragmentos
pela seleção respeitosa e cuidadosa feita por
Santo Atanásio. Se, malgrado a solicitude do
próprio escritor e de seu defensor, o seu pensa-
mento nos parece muito menos firme e exato
que o do bispo de Roma, concluiremos que sua
São Lourenço nos ombros da personificação da virtude
especulação era para ele um guia menos seguro
da liberalidade, sob cujos pés jaz o vício da avareza, que aquele que era a fé comum para Dionísio de
representado por Judas Roma” (p. 35-36). q
¬
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Aniversários
A família
Ratzinger
depois
da primeira
missa dos dois
irmãos em
8 de julho
de 1951
dia mais importante por ocasião do 60º aniversário de pois destes festejamentos
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BENTO XVI. Os sessenta anos de sacerdócio
tranquilidade mental e física. Mas Quando nos vemos é sempre ção sacerdotal comporta uma par-
fico muito contente por ter festeja- uma grande alegria. Em toda a ticular amizade com Cristo, dado
do, porque houve momentos mui- nossa vida sempre nos reencontra- que confere um mandato especial.
to comovedores, como a belíssima mos e naturalmente não queremos E doa a surpresa e a consciência de
celebração organizada na Catedral renunciar a isso agora na nossa ve- ver como o Senhor “interfere dire-
de Freising pelo Instituto Bento lhice, na qual sentimos de modo tamente”, assim por dizer, na nos-
XVI, que organiza a publicação da particular este sentimento de per- sa vida humana.
opera omnia do Santo Padre. A tença de um ao outro. E em família, como foi vivi-
catedral de Freising é o lugar onde O que o senhor pensou na- do aquele dia?
eu e meu irmão fomos ordenados quele 29 de junho de 1951? O Foi uma experiência de alegria
sacerdotes e sentia-se que a atmos- Papa, ao recordar o dia de sua única. Na nossa vida familiar, que
fera era realmente familiar. Pela ordenação, disse: “Não vos até aquele momento tinha sido a
manhã houve a recitação das lau- chamo mais servos, mas ami- vida de uma normal família, deu-se
des e mais tarde, depois das sauda- gos. Depois de sessenta anos um evento que naquele tempo era
ções e alguns discursos, foi organi- do dia da minha ordenação considerado um dom: o sacerdó-
zado um almoço com os altos pre- sacerdotal ainda sinto ressoar cio, algo que leva à eternidade, a
lados, alguns cardeais, os bispos dentro de mim essas palavras uma outra esfera. Eu tinha três
auxiliares e, naturalmente, os ve- de Jesus, que o nosso grande anos amais do que meu irmão,
lhos amigos de sempre. O segundo arcebispo, o cardeal Faulha- mas foi muito bonito compartilhar-
momento importante foi a missa ber, dirigiu a nós, novos sacer- mos juntos a ordenação e a primei-
na minha solene paróquia de São dotes no dia da ordenação”... ra missa, mesmo se era apenas
No dia 29 de junho de 1951, na Catedral de Freising, o cardeal Faulhaber Os irmãos Ratzinger na saída da Catedral
ordena sacerdotes mais de quarenta seminaristas entre os quais Georg e de Freising no dia de sua ordenação sacerdotal
Joseph Ratzinger
João Batista: a igreja estava lotada Pensei que era uma virada na consequência da guerra que tinha
e a atmosfera era solene. Enfim, o minha vida, como na vida de todo abalado os projetos de cada um de
terceiro festejamento foi a missa o homem que se torna sacerdote, nós. Naqueles anos no seminário
na Basílica de São Pedro em Ro- porque a ordenação sacerdotal dá de Freising, com efeito, as diferen-
ma: havia um comovedor pensa- ao homem uma nova qualidade de ças de idade dos aspirantes sacer-
mento de que o nosso jubileu esta- vida e torna-o um “encarregado” dotes eram grandes.
va ligado à solenidade de recorda- de Cristo, que deve levar o mistério Nos anos de seminário
ção dos santos Pedro e Paulo, tão e a palavra de Jesus Cristo ao mun- quais foram as pessoas que
importantes para Roma e para a do. Com o passar dos anos pude mais influenciaram na sua for-
Igreja universal. compreender o quando fossem mação como sacer dotes e
Para o seu irmão deve ser verdadeiras as palavras do Evange- cristãos?
uma alegria ter o senhor ao lho de João que o cardeal Faulha- Uma figura chave no “Dom-
seu lado nestes dias... ber dirigiu-nos: porque a ordena- berg” de Freising foi o nosso rei- ¬
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Aniversários
74 30DIAS Nº 6 - 2011
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