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O texto que você vai ler é uma crônica de Carlos Drummond de Andrade, poeta e cronista
mineiro, consagrado no Brasil e em todo o mundo. Sua obra está traduzida em várias línguas,
entre elas o inglês, alemão e o espanhol. Seus trabalhos se destacam pela ternura, pelo senso
de humor e pela qualidade da linguagem. O texto está com seus parágrafos numerados para se
localizar melhor as palavras e expressões utilizadas nos exercícios.
CASO DE CANÁRIO
Casara-se havia duas semanas. Por isso, em casa dos sogros, a família resolveu que ele é que
daria cabo do canário:
– Você compreende. Nenhum de nós teria coragem de sacrificar o pobrezinho, que nos deu
tanta alegria. Todos somos muito ligados a ele, seria uma barbaridade. Você é diferente, ainda
não teve tempo de afeiçoar-se ao bichinho. Vai ver que nem reparou nele, durante o noivado.
– Mas eu também tenho coração, era essa. Como é que vou matar um pássaro só porque o
conheço há menos tempo do que vocês?
– Porque não tem cura, o médico já disse. Pensa que não tentamos tudo? É para ele não sofrer
mais e não aumentar o nosso sofrimento. Seja bom, vá.
O sogro, a sogra apelaram no mesmo tom. Os olhos claros de sua mulher pediram-lhe com
doçura:
Com repugnância pela obra de misericórdia que ia praticar, ele aproximou-se da gaiola. O
canário nem sequer abriu o olho. Jazia a um canto, arrepiado, morto-vivo. É, esse está mesmo
na última lona e dói ver a lenta agonia de um ser tão precioso, que viveu para cantar.
– Primeiro me tragam um vidro de éter e algodão. Assim ele não sentirá o horror da coisa.
Embebeu de éter a bolinha de algodão, tirou o canário para fora com infinita delicadeza,
aconchegou-o na palma da mão esquerda e, olhando para outro lado, aplicou-lhe a bolinha no
bico. Sempre sem olhar para a vitima, deu-lhe uma torcida rápida e leve, com dois dedos no
pescoço.
E saiu para a rua, pequenino por dentro, angustiado, achando a condição humana uma droga.
As pessoas da casa não quiseram aproximar-se do cadáver. Coube à cozinheira recolher a
gaiola, para que sua vista não despertasse saudade e remorso em ninguém.Não havendo
jardim para sepultar o corpo, depositou-o na lata de lixo.
Chegou a hora de jantar, mas quem é que tinha fome naquela casa enlutada? O sacrificador,
esse, ficara rodando por aí, e seu desejo seria não voltar para casa nem para dentro de si
mesmo.
No dia seguinte, pela manhã, a cozinheira foi ajeitar a lata de lixo para o caminhão, e recebeu
uma bicada voraz no dedo.
– Ui! Não é que o canário tinha ressuscitado, perdão, reluzia vivinho da silva, com uma fome
danada?
– Ele estava precisando mesmo era de éter – concluiu o estrangulador, que se sentiu
ressuscitar, por sua vez.
I. Assinale a alternativa correta para cada item. 1. A expressão: “… daria cabo do canário…”
(par. 1) significa:
2. Na frase: “Você ainda não teve tempo de afeiçoar-se ao bichinho” (par. 2), a palavra em
destaque pode ser substituída por:
3. Na frase: “Com repugnância pela obra de misericórdia que ia praticar…” (par. 7), a palavra
em destaque pode ser substituída por:
4. Na frase: “O canário …. jazia a um canto…” (par. 7), a palavra em destaque pode ser
substituída por:
5. Na frase: “Tirou o canário com infinita delicadeza…” (par. 9), a palavra em destaque pode
ser substituída por:
6. Nas frases abaixo, aparecem em destaque, expressões da fala coloquial. Relacione as duas
colunas, de acordo com o significado dessas expressões:
1. “…esse está mesmo na última lona…” (par. 7) 2. “…achando a condição humana uma
droga…” (par. 10) 3. “O canário reluzia vivinho da silva…” (par. 14)
8. O que o genro quis dizer com a frase: “Mas eu também tenho coração.”?
9. Por que a família decidiu matar o canário de estimação? 10. Por que o jovem marido
considerou o sacrifício do canário como uma obra de misericórdia?
12. Transcreva do texto a frase que mostra o estado de espírito do personagem depois que
executou o passarinho.
13. As expressões sepultar (par. 10) e enlutada (par. 11) referem-se normalmente à morte de
pessoas. Por que o narrador as empregou referindo-se ao canário?
14. Como você entende a expressão “voltar para dentro de si mesmo” (par. 11)?
15. Na crônica, não aparece o nome do personagem escolhido para matar o canário. Retire do
texto as palavras empregadas para se referir a ele.
18. Na crônica, o canário aparece em duas situações diferentes. Primeiro, ele está muito mal,
semimorto. Depois, ele aparece curado, bem vivo. Transcreva as frases que mostrem o canário
nessas duas situações.
7. Porque ele, sendo novo na família, ainda não tivera tempo de se apegar ao canário.
8. Ele quis dizer que também era sensível e que tinha pena do bichinho.
9. Porque o médico afirmara que ele estava muito doente, não tinha cura.
12. “E saiu para a rua, pequenino por dentro, angustiado, achando a condição humana uma
droga.”
13. O canário era como uma pessoa da família. Todos lhe queriam bem, como a uma criatura
humana.
16. Na verdade, o canário não tinha morrido. A torcida rápida e leve no pescoço não foi
suficiente para matá-lo.
17. O personagem estava desolado com a morte do canário. Ao saber que ele estava vivo,
sentiu grande alivio e felicidade. 18. 1a. – Jazia a um canto, arrepiado, morto-vivo. (par. 7)
2a. – Não é que o canário tinha ressuscitado, perdão, reluzia vivinho da silva com uma fome
danada? (par. 14
Volta e meia a gente encontra alguém que foi alfabetizado, mas não sabe ler. Quer dizer, até
domina a técnica de juntar as silabas e é capaz de distinguir no vidro dianteiro o itinerário de
um ônibus. Mas passa longe de livro, revista, material impresso em geral. Gente que diz que
não curte ler.
Esquisito mesmo. Sei lá, nesses tempos, sempre acho que é como se a pessoa estivesse
dizendo que não curte namorar. Talvez nunca tenha tido a chance de descobrir como é
gostoso. Nem nunca tenha parado para pensar que, se teve alguma experiência desastrosa em
um namoro (ou em uma leitura), isso não quer dizer que todas vão ser assim. É só trocar de
namorado ou namorada. Ou de livro. De repente, pode descobrir delícias que nem imaginava,
gostosuras fantásticas, prazeres incríveis. Ninguém devia ser obrigado a namorar quem não
quer. Ou ler o que não tem vontade. E todo mundo devia ter a oportunidade de experimentar
um bocado nessa área, até descobrir qual é a sua.
Durante 18 anos, eu tive uma livraria infantil. De vez em quando, chegavam uns pais ou avós
com a mesma queixa: “O Joãozinho não gosta de ler, o que é que eu faço?” Como eu acho que
o ser humano é curioso por natureza e qualquer pessoa alfabetizada fica doida pra saber o
segredo que tem dentro de um livro (desde que ninguém esteja tentando lhe impingir essa
leitura feito remédio amargo pela goela abaixo), não acredito mesmo nessa história de criança
não gostar de ler. Então, o que eu dizia naqueles casos não variava muito.
A primeira coisa era algo como “pára de encher o saco do Joãozinho com essa história de que
ele tem que ler”. Geralmente, em termos mais delicados: “Por que você não experimenta
aliviar a pressão em cima dele, e passar uns seis meses sem dar conselhos de leitura?”
O passo seguinte era uma sugestão: “Experimente deixar um livro como este ao alcance do
Joãozinho, num lugar onde ele possa ler escondido, sem parecer que está fazendo a sua
vontade. No banheiro, por exemplo.” E o que eu chamava de um livro como este, já na minha
mão estendida em oferta, podia ser um exemplar de O Menino Maluquinho, do Ziraldo, ou do
Marcelo, Marmelo, Martelo, da Ruth Rocha, ou de O Gênio do Crime, do João Carlos Marinho.
(MACHADO, Ana Maria. Comédias para se ler na escola – prefácio. Editora Objetiva, Rio de
Janeiro, 2001)
Assinale a única resposta correta:
GABARITO 1. a 2. D 3. C 4. C 5. B
Questão 6: 1. (q) 2. (c) 3. (b) 4. (g) 5. (m) 6. (p) 7. (e) 8. (n) 9. (a) 10. (h)
11. (f) 12. (i) 13. (j) 14. (r) 15. (o) 16. (l) 17. (d) 18. (s) 19. (u) 20. (t)
A escada tem vinte e oito degraus. E liga as tirânicas necessidades da mesa de D. Marfisa ao
comércio ambulante e rumoroso que lhe passa pela frente do sobrado. Ao longo dessa escada,
circulam pra baixo e pra cima, incansavelmente, duas pernas finas e esfoladas. São as pernas
de Maria da Conceição – a Ceição. Agora, a carrocinha do verdureiro pára defronte à casa de
D. Marfisa. E, Dona Marfisa comanda:
- Bem. Agora, dá um pulinho lá e pergunta pra ele se tem troco pra uma nota de duzentos.
Ceição vai e volta:
- Pergunta pra ele se não é melhor assentar no caderno. Ceição vai e volta:
- Diz pra ele que não. Leva o dinheiro e paga já. Não quero mais saber de caderno. Ceição vai e
volta:
D. Marfisa confere:
- Tá certo. Mas esta nota parece que é falsa. Dá um pulinho lá e diz pra ele que me mande
outra. Ceição vai e volta. Volta e geme:
- Taí, madrinha.
Então as duas pernas dobram, vergam – os ossos de Ceição quase se desmancham no assoalho
asseadíssimo do sobrado da madrinha.
1. Pelas indicações do texto, entendemos que três pessoas vivem no sobrado. Quais são?
2. Depois da chegada do verdureiro até o fim da transação, a menina desceu e subiu a escada
do sobrado:
a. ( ) vinte e duas vezes b. ( ) oito vezes c. ( ) dez vezes d. ( ) trinta e três vezes
3. D. Marfisa poderia ter diminuído muito o trabalho de Ceição se desse mais de uma ordem
de cada vez. Por que não o fez?
4. Mesmo recebendo as ordens uma a uma, Ceição poderia por conta própria reduzir seu
trabalho. Que deveria fazer para que isso acontecesse?
5. D. Marfisa tinha Ceição sob sua responsabilidade talvez como agregada que recebesse da
madrinha, em troca do trabalho, sua manutenção (casa, comida e roupa) e educação. Na sua
opinião, D. Marfisa estava demonstrando qualquer interesse pela formação da menina? Por
que?
d. ( ) até uma simples compra exige certos cuidados para que não haja exploração.
7. Identifique a frase cuja palavra “nota” tem o mesmo significado na frase a seguir:
8. Ceição anunciou incorretamente uma das verduras vendidas pelo verdureiro. Identifique-a e
escreva-a corretamente.
9. Identifique e substitua a expressão existente nas frases que equivale à palavra
“asseadíssimo(a)”:
c. As ruas da cidade, por serem muito limpas, refletem a boa educação do povo.
Gabarito: CEIÇÃO
2. Alternativa c
3. Porque não tinha ideia do esforço que era subir e descer a escada, seguidas vezes, em
espaço de tempo tão pequeno.
5. Resposta pessoal.
6. Alternativa a.
7. Alternativa a.
MODOS DE DIZER (Mário Bachelet. Antologia Portuguesa. FTD, São Paulo, 1965)
Uma vez um rei sonhou que todos os seus dentes lhe foram caindo da boca, um após outro,
até não ficar nenhum. Era no tempo em que havia magos e adivinhos. O rei mandou chamar
um deles, referiu-lhe o sonho e pediu-lhe que o decifrasse. O adivinho levou a mão à testa,
pensou, pensou, consultou a sua ciência e disse:
– Saiba Vossa Majestade que a significação do seu sonho é a seguinte: está para lhe suceder
uma grande infelicidade. Todos os seus parentes, a rainha, os seus filhos, netos, irmãos, todos
vão morrer sem ficar um só ante os olhos de Vossa Majestade. O rei entrou em cólera, ficou
muito irritado e, chamando os guardas do palácio, mandou decepar a cabeça do adivinho que
lhe profetizara coisas tão tristes. Estava o rei muito acabrunhado com o vaticínio, quando se
aproximou um cortesão e lhe aconselhou que consultasse outro adivinho, porque a
interpretação do primeiro podia estar errada e não devia Sua Majestade se afligir em vão. O rei
adotou o conselho, mandou chamar outro mago e lhe narrou o mesmo sonho, pedindo que o
decifrasse. O adivinho levou a mão à testa, pensou, pensou, consultou a sua ciência e disse:
– Saiba Vossa Majestade que o seu sonho significa o seguinte: Vossa Majestade terá muitos
anos devida. Nenhum dos seus parentes lhe sobreviverá. Nem mesmo o mais moço e mais
forte deles terá o desgosto de chorar a perda de Vossa Majestade. O rei, muito satisfeito,
mandou encher o adivinho de presentes, deu-lhe muitas moedas de ouro, muitos diamantes,
roupas de seda bordadas e um palácio para morar, nomeando-o adivinho oficial do reino.
No entanto, o segundo mago, que recebeu tais prêmios, disse a mesma coisa que o primeiro,
que foi degolado. A única diferença foi a linguagem que ele empregou. Esta fez que ele
recebesseprêmio em vez de castigo.
Interpretação do texto.
1. Cada um dos magos, antes de expor ao rei o significado do sonho, levou a mão à testa para,
com este gesto, indicar…
2. O rei ficou muito triste com o que o primeiro mago lhe dissera porque…
a. ( ) soube que logo perderia todos os seus familiares b. ( ) soube que não viveria muito tempo
c. ( ) soube que ficaria sem o seu trono
3. Um cortesão deu um conselho ao rei, mas não sabemos com que palavras ele realmente se
expressou. Coloque-se no lugar do cortesão e redija a frase que ele deve ter dito ao rei.
a. ( ) Porque ele deu a interpretação errada do sonho b. ( ) Porque ele ficou calado diante do
rei. c. ( ) Porque ele apresentou o significado do sonho de modo agradável
a. ( ) O primeiro mago enfatizou o lado ruim do sonho (a morte de todos os familiares do rei); o
segundo mago enfatizou o lado bom do sonho (o rei iria viver muito).
b. ( ) O primeiro mago usou de palavras grosseiras para dar a explicação do sonho; o segundo
mago ficou calado diante do rei.
a. ( ) é melhor ficar calado para não sofrer as consequências. b. ( ) não se deve dizer a verdade
para não irritar os poderosos.