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A idéia desse texto é fazer uma explanação sobre o estado geral da arte da Arqueologia
Subaquática no Brasil, colocando a disposição do leitor, para quaisquer esclarecimentos, o
blog do Laboratório de Arqueologia de Ambientes Aquáticos (LAAA), do Núcleo de Arqueologia
da Universidade Federal de Sergipe (NAR / UFS): http://arqueologiadeambientesaquaticos.
blogspot.com/
Quase legal Mesmo com a existência de uma legislação específica, a Lei Federal 10.166/00,
que contradiz todos os pressupostos da proteção ao patrimônio cultural brasileiro, a
Arqueologia subaquática brasileira vai se impondo. No ano passado ela deu um passo
importantíssimo em direção ao último obstáculo para sua consolidação efetiva no cenário
nacional: o político, que ainda insiste em manter a referida Lei!
Dezesseis anos se passaram desde o início das discussões oficiais sobre essa temática no
seio da Arqueologia brasileira (SAB de 1993) até a Audiência Pública realizada no dia 2 de
setembro de 2009, na Comissão de Educação, Cultura e Esporte do Senado Federal, a pedido
do Senador Cristovam Buarque, Relator do Projeto de Lei nº 45, de 2008, que dispõe sobre o
patrimônio cultural subaquático brasileiro e revoga os arts. 20 e 21 da Lei nº 7.542, de 26 de
setembro de 1986, com a redação dada pela Lei nº 10.166, de 27 de dezembro de 2000.
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Um mergulho na Arqueologia Subaquática brasileira
Vale ressaltar que, o PL 45/08 teve sua origem no Projeto de Lei 7566/06, de autoria da
Deputada Federal Nice Lobão, e foi inspirado na Moção do I Simpósio Internacional de
Arqueologia Subaquática realizado na SAB de 2005, em Campo Grande. Em virtude do
interesse da Deputada Lobão pelo tema, pudemos auxiliá-la na redação final do seu PL, sendo
que o mesmo tramitou e foi aprovado em todas as instâncias na Câmara dos Deputados, mas,
quando chegou ao Senado sofreu algumas alterações visando melhor ajustá-lo, diante da nova
proposta para com o patrimônio cultural subaquático, às responsabilidades da Marinha
brasileira e do IPHAN.
As alterações ao Projeto de Lei foram feitas por várias mãos: Marinha do Brasil, com a
participação do Estado Maior da Armada e da Diretoria do Patrimônio Histórico e
Documentação; Patrimônio Material e Fiscalização do IPHAN; e especialistas da Arqueologia
brasileira, representando a SAB. Chamando atenção, que essa integração institucional marcou
a reaproximação entre a Marinha do Brasil e o IPHAN, que não discutiam oficialmente esse
tema desde a Reunião da SAB, em 1993.
Nesse sentido, cabe o comentário pessoal, por ter participado da mesa redonda realizada na
VII Reunião Científica SAB, em João Pessoa, em 1993, que iniciou a discussão sobre o futuro
da Arqueologia Subaquática no Brasil. Por ter percebido e vivenciado o silêncio das instituições
federais depois deste referido encontro, posso afirmar o quão importante foi para a nossa
causa esse ajustamento institucional entre Marinha e IPHAN sobre o PL45/08. Para efeito de
registro é interessante lembrar que esse evento pode ser classificado como a entrada da
Arqueologia brasileira em um domínio que até então havia sido deixado de lado, como se fosse
um ramo do mergulho. Participaram da mesa a arqueóloga Maria Cristina Mineiro
Scatamacchia, do MAE-USP; o Almirante Max Justo Guedes, da Marinha do Brasil, a
arqueóloga Maria Lúcia Pardi, do IPHAN – IBPC na época ; e o autor deste texto, na qualidade
de arqueólogo especialista no assunto.
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Agora basta esperarmos pela volta das atividades dos parlamentares, envolvidos nas eleições
nacionais, e pelo bom senso dos juristas que irão debater o assunto. Lembrando que, no
contexto do Direito Internacional a decisão está a nosso favor. Porque tanto a Convenção dos
Direitos do Mar da Onu, que o Brasil é signatário, como a Convenção da UNESCO para a
Proteção do Patrimônio Cultural Subaquático, coincidem com o texto do Projeto de Lei em
questão.
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Nesse contexto, devemos destacar também outros centros e pesquisadores que começam a
ganhar destaque nesse cenário, como os trabalhos de Ana Nascimento, da Universidade
Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), o mestrado de Carlos Rios (2008), e o seu
doutoramento em andamento na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), bem como, o
fato desta instituição ter aberto uma vaga para professor em Arqueologia Subaquática neste
ano, para o curso de graduação em Arqueologia; os trabalhos e Rodrigo Torres no Rio Grande
do Sul e seu mestrado defendido na Universidade Federal de Pelotas, bem como o seu
doutorado que acaba de ter início no Institut of Nautical Archaeology (Texas A&M University); o
trabalho do Tenente Ricardo Guimarães, que defendeu sua dissertação de mestrado e hoje
responde pela Arqueologia Subaquática da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação
da Marinha do Brasil; o mestrado em andamento de Bruno Sanches Ranzani da Silva, pela
Universidade Federal de Minas Gerais, sob orientação de Andres Zarankin; a integração do
arqueólogo Francisco Noeli, após uma formação em mergulho, à frente dos trabalhos da ONG
PAS, em Santa Catarina; as atividades, como consultores dos doutores emArqueologia
Subaquática, Leandro Duran, Paulo Bava-de-Camargo e Flávio Calippo, em vários trabalhos de
contratopelo país, e, por fim, a criação do Laboratório de Arqueologia de Ambientes Aquáticos,
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Os Parâmetros de Qualidade para esse tipo de pesquisa Se na primeira parte do texto nos
preocupamos em descrever os problemas encontrados na discussão pública entre duas
maneiras de se intervir sobre o patrimônio cultural subaquático: Arqueologia X Caça ao
Tesouro, ou seja, produção do conhecimento X aventura lucrativa e destrutiva do patrimônio;
essa parte final fica restrita a outro tipo de preocupação, relativa à qualidade das intervenções
arqueológicas propriamente ditas, e esperadas
Cabe alertar aos colegas arqueólogos, e, principalmente, aos que atuam em contratos
ambientais que a inclusão dos ambientes aquáticos (lacustres, fluviais, marítimos e oceânicos)
já encontra jurisprudência em vários estados brasileiros, com apoio de algumas
superintendências do IPHAN e do Ministério Público Federal; e que a não inclusão dos
mesmos em projetos juntos a esses ambientes pode ser considerada uma falta grave, isso sem
falar na perda irreparável para construção do conhecimento sobre a própria área estudada.
Cada vez mais defendemos a importância de o arqueólogo mergulhar. A intenção com esse
texto é incentivarmos a formação de mais especialistas para que o ambiente aquático se torne
algo acessível e não um fator limitante, como foi considerado durante muito tempo. Nada
justifica, por exemplo, uma pesquisa realizada as margens de um ambiente aquático não se
estender para dentro d’água. Seguindo esse raciocínio gravuras rupestres submersas foram
estudadas na Amazônia (PA), bem como a porção submersa do Porto Organizado de Salvador
(BA), e a área de impacto da ponte que liga o Oiapoque (AP) à Guina Francesa, dentre outros
estudos.
O que não podemos aceitar é que esse tipo de atividade, uma conquista da Arqueologia, volte
a ser considerada como um ramo do mergulho e seja passada a terceiros despreparados. Os
mergulhadores, desde que devidamente treinados, são bem vindos a esses projetos como
colaboradores dos arqueólogos mergulhadores. Mas, não podemos abrir mão desse domínio a
eles. Exemplos desastrosos no mundo, e também no Brasil (recentes) apontam para a
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Já falamos em diferentes fóruns que o ideal, para colocarmos fim a esse risco da terceirização
de mergulhadores, seria se cada equipe pudesse preparar alguns de seus arqueólogos em
mergulho e seguidamente nos métodos e técnicas da Arqueologia Subaquática. Possibilidade
essa que não acarretaria em grandes investimentos, principalmente, considerando que os
recursos para esse fim podem sair dos próprios projetos realizados, ou de investimentos
futuros, sobretudo, considerando os inúmeros trabalhos para serem realizados nos ambientes
aquáticos no Brasil. Ressaltando que, esses arqueólogos não precisam desistir de suas
atividades tradicionais, em superfície. Eles se tornariam um tipo de arqueólogo “anfíbio”, que
pode interagir com qualidade tanto na terra quanto submerso. Acreditamos que essa prática,
além do que já vem acontecendo ultimamente, com os cursos de bacharelado e de
especialização, aumentaria significativamente o número de especialistas nesse domínio,
possibilitando um maior aproveitamento do potencial arqueológico brasileiro submerso e de
interface.
Para finalizar podemos afirmar que a ameaça da manutenção da Caça ao Tesouro em nosso
país, no caso do PL45/08 não ir adiante, poderá ser brevemente solucionada, uma vez que a
Marinha do Brasil, o IPHAN e a SAB estão em sintonia. O que nos preocupa atualmente,
enquanto a regulamentação da profissão de Arqueólogo não acontece, é outro tipo de
exploração comercial, não tão nociva quanto a caça ao tesouro, mas que pode trazer sérias
consequências ao patrimônio cultural subaquático, que é a contratação de mergulhadores
terceirizados para fazerem o papel de olhos e mãos de arqueólogos que não mergulham,
debaixo d’água.
Gilson Rambelli
Pesquisador de Produtividade Científica do CNPq;
Coordenador do LAAA/NAR/UFS; laaa.nar.ufs@gmail.com
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