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BRASILINA MARIA DA SILVA, 65 anos

FAR: Fale sobre a sua vida como rezadeira e as dificuldades em torno desse
ofício.

BMS: Vou começar pelo início, meu caminho foi meio atrapalhado no início,
porque eu não queria aceitar, quando chegou essa "riqueza", na minha memória
eu não queria aceitar, eu tinha 14 anos e pertubava muito a minha mãe, porque
tava sonhando com essas coisas e não queria prosseguir e minha mãe sempre
dizia: "Você vai aceitar, é o senhor Jesus que está te dando essa luz, e você tem
que aceitar e tem que fazer caridade pra quem chegar".

E nisso eu ficava envergonhada, e quando chegava as criancinhas pra se benzer,


aí chegava duas, três pessoas, aí minha mãe me colocava pra benzer a criança e
ela ía benzer os problemas de outra pessoa e nisso eu fui me acostumando, só
que depois eu fiquei esquisita, eu casei e não queria mais aceitar o caminho de
Deus, aquele caminho que eu seguia, mas a minha mãe me chamou a atenção e
me disse: "é coisa do mal, Jesus não tá feliz, ele te deu a riqueza e tu não quer
acolher".

Aí nisso eu continuei, só que meu filho mais velho adoeceu, aí eu disse: "meu
deus será que isso é ilusão de minha cabeça, ou é verdade?" eu vou fazer um
teste se é verdade, benzi meu filho, eu tinha 15 anos, eu era mãe do meu primeiro
filho, aí comecei a benzer o menino, aí o menino foi parando de vomitar, foi
ficando espertinho, eu tirei três galhinhos de mato e benzi de novo aí fiquei
acreditando mais, eu vim ficar mais confiante depois dos quinze anos.

FAR: O que tinha o seu filho?

BMS: Tava com ventre caído e olhado, com licença da palavra ventre caído é
assim, você "obra" verdinho, aquilo bem cortadinho, aí nós leva pro médico, tem
aquelas cólicas pesadas, o médico diz: "mãe, isso aí não é problema pra médico,
leve pra uma benzedeira que benza olhado e ventre caído que ele fica bom".

Aí nisso eu fui me acordando, fui rezando, e fui achando muito importante esse
caminho que Deus me deu, e minha mãe era feliz, porque lá nasceu nove
mulheres, nove filhas mulher e nenhuma nunca se interessou por essa benção,
também nunca teve esse sonho que eu tive, que ninguém nunca me ensinou, sou
analfabeta, "num" leio nem escrevo, nada, nada disso eu tenho, só a riqueza que
Deus me deu foi essa.

Aí depois que fui amadurecendo, consegui, foi espalhando a fama, eu não era
daqui, sou pernambucana, aí cheguei aqui, foi mais estranho pro povo se
acostumar comigo, por ver que muita gente não acredita na palavra de Deus,
muita rezadeira só leva o nome de catimbozeira, e eu não tenho nada de
catimbozeira, isso aqui foi um sonho que Deus me deu, foi de nascença, foi do
"belço", ninguém sonha uma verdade de noite e no outro dia eu confirmo e é
verdade, é verdade.

E nisso eu fui deixando o povo falar e tome ramo, com muita força e com muita fé
em Deus, tá entendendo, mas nunca assim, um olhado, uma dor de dente, se o
dente não tiver inflamado, eu rezando com fé em Deus, como se diz vai
"amuderando" até ficar bom, um olhado, a criança pode tá esmorecida, vomitando
tudo que botar no estômago dele, eu rezo aquela criança, ela já toma outro ar.

Assim, um bichinho engasgado ou qualquer ser humano, eu rezo e com pouco ele
joga aquela espinha pra fora, espinha de peixe, muita gente já se engasgou, ficou
três "sumanas", marcou até cirurgia pra ir fazer em Campina Grande, e indicaram
que eu rezava, Jesus é quem cura, o bom é que o pecador tenha essa
consciência, mas, aí foi lá, foi lá da banda de Serra Branca e ía se operar na
quarta-feira, o lado do pecoço dele chega tava vermelho que queria estourar por
fora, aí eu olhei e disse: "mais meu filho por quê você não me procurou? Porquê
eu não sabia".

Nisso eu rezei, o rapaz me agradeceu e já saiu nos "enguios", nos "enguios" e eu


disse:"Não tenha medo, ela entrou com fé em Deus ela sai", quando chegou bem
pertinho da minha casa só fez virar assim, vomitou a espinha com um raio de
sangue, isso aí foi Deus, eu não tenho essa força, mas a gente pede com fé Jesus
tá curando, "ói" pode ter cinquenta médicos perto de mim, e chegar um rezador e
eu não possa me rezar, chegue um rezador que reze pelo menos uma Ave Maria
eu já tô feliz, eu sei que eu tô curada, foi Deus que ensinou a gente.

Aí nisso eu continuei até hoje, tem vez que "mar de monte" chega com a perna,
com aquele vermelhão criado, pega uma linha coloca na "agúia" e fica dizendo as
palavras e costurando num paninho e dizendo as palavras, quando é no outro dia
a pessoa já vem melhor, "nós reza três vez", se é "mar de monte nós reza três
vez".

FAR: O que é "mar de monte"?

BMS: Aquele vermelhão que dá nas pernas, quando a gente tem algum problema
no sangue, aí se arranha, a gente reza com muita fé em Deus, muita gente "véia"
que era doente.

Povo grande me procura, eu tenho até vergonha de me aproximar de gente rica,


por que rico só confia no dinheiro e no médico e a gente tem que confiar é em
Deus, só Deus, por que se Deus não valer, não tem um médico da terra que vá
provar aquilo que aprendeu, e Deus cura de verdade, ninguém tem dúvida, bota
pra Sumé, ou bota pra Campina Grande não, Deus cura naquela hora é só você
ter fé, mas, agora se você se rezar e não tiver fé em Deus, é mesmo que jogar
uma banheira d'água no campo, aquilo dali vai embora.

Quando chegar na casa de uma rezadeira, no que você se benzer pra ser
benzido, você tem que ter fé em Deus, porque as palavras são bem aplicadas no
seu corpo, no ser humano ou num animal. Num cavalo, o povo aí bota dinheiro
pra comprar, bota dinheiro pra comprar, o dono não quer vender, com pouco o
bicho amanhece sem querer comer, quando o filhos de Seu Hugo que Deus já
levou, os filhos dele chama a gente pra ir benzer, é diferente do oferecimento do
ser humano, do bichinho bruto.

O ser humano é batizado, e o animal é um bichinho bruto, a gente tem que ter
divisão do que faz pra não se prejudicar, mas, muita gente não confia na riqueza
que Deus da a gente, não tem aquela confiança, mas essa é uma confiança que
Deus dá a gente pra cumprir e eu vou cumprir até morrer, não vou correr do tempo
não, de jeito nenhum, não existe outro caminho.

Chega crente na minha casa, pra eu seguir a crença deles, eu não vou ser contra
a lei de vocês, é uma lei boa, mas sou católica e não troco, e tenho uma "patente"
que Deus me deu que eu não posso jogar fora, não posso bater a porta para um
ser humano, aí hoje, chega quatro, cinco crianças, gente adulto, gente com o "pé
criado" pra eu benzer, amanhã tem uma placa aqui: "D. Lica hoje não reza mais,
D. Lica vai ser crente", não, Deus não aceitou isso, foi no que eu nasci, me criei e
fui adotada, aquilo que Deus me adotou desde novinha e eu vou seguir, tá
entendendo?

Foi no mês passado, eu passei um aperreio tão grande, é porque a gente que é
pecador, tem hora que tem o pensamento fraco, meu filho vai completar 50 anos
agora em 27 de março, ai ele sofreu um começo de infarto e foi nternado, na
segunda feira eu "sube", através do telefone, a mulher dele ligou pra mim, eu
fiquei três dias suspensa, só rezando, so pedindo a Deus e ele lá morre mas não
morre, sei que fez duas cirurgias, passou trinta e dois dias internado e Deus curou
ele, sexta-feira 13, ele foi fazer a revisão dessas duas cirurgias, pra saber a
condição dele, mas confiamos tanto, confiamos tanto em Deus, que do começo do
infarto só escapou ele, o médico disse q ele, que se ele tivesse passado mais
cinco minutos, ele tinha entrado no ospital sem vida, mas eu não acredito que foi o
médico que curou ele nã, eu acredito que foi nosso pai todo poderoso, porque o
tanto que eu orei, Jesus tava presente nas mãos daqueles médicos, pra conseguir
acertar aquelas cirurgias e não dá nada de errado, sem a guia de Deus ninguém
não é nada, sem a força ninguém é nada, Jesus pra mim é tudo, só a riqueza que
ele me deu.

Olhe pode chegar aqui vacas e bois, "carros bom", pra dizer assim: Isso aqui é pra
você rezar isso ou aquilo, é porque muita gente se engana, pensa que o rezador é
pra destruir, é pra seguir o mal, não, rezador de Jesus é pra fazer o bem, não
escolher a quem, porque se você chega aqui, e você não trouxe "cem real pra mim
dá" ou cinquenta, você vai embora, ou se você chega com vinte, trinta ou
"quarenta real" eu coloco pra rezar dentro da minha casa.

FAR: Por que tanta gente confunde o rezador com algo ruim?

BMS: Porque a maioria, muita gente mexe com essas coisas erradas e quem não
conhece a gente, vem pela primeira vez, vem conhecer o tipo do caminho que nós
segue, qual o tipode reza que nós reza pra quem e pra quem não, chega e não
quer perguntar, o que é que a senhora reza? Como a senhora reza? A senhora faz
isso? Não. A senhora faz isso? Não, aqui é o caminho de Deus, o mal não vem
em minha busca, porque Deus vai "arrebater" tudo, todo o mal, aí ela não, mas me
disseram que essa mulher mora na entrada do Cordeiro e reza de tudo, eu
disse:"Aí não sei, eu sei de mim, eu só rezo isso, isso e isso", tá entendendo?

É isso aí que eu consigo, é isso aí que eu quero pra mim, pra meu ser humano,
quando a gente não quer queimar o pé a gente não quer que nenhum ser humano,
nosso irmão queime também não, nós tem que querer o bem pra nós todos, né
isso, porque da vez que nós ama nosso ser humano, Jesus também tá amando e
seguindo a gente no nosso caminho. Tem hora que eu penso eu Deus, me
disseram que a senhora era isso, isso e isso, Deus proteja, Deus perdoe, porque é
só quem pode perdoar, quem é ninguém nessa vida pra julgar o que faz e o que
deixa de fazer em a gente ter a prova, e Deus tá provando que eu não sou aquilo
que o povo diz, nisso é que eu crio forças e sigo em frente e parece que cada vez
Jesus cura mais a situação daquelas pessoas que me buscam, aquelas pessoas
que me procuram e as palavras de Deus tem mais força.

FAR: O que a senhora mais reza, quais as doenças que mais aparecem para a
senhora rezar?

BMS: O que mais aparece aqui é olhado, é perna criada, pé criado, é dor de
dente, é espinhela caída, quando a pessoa abre os peitos, pega peso ou cai, fica
com "os peito" criado, sol na cabeça, porque tem horários que você sabe que a
gente não pode receber a resta do sol, dez horas do dia e duas horas da tarde,
porque tem um raio que atinge, se você tiver com um boné ou chapéu tá livre, mas
você sem prevenção, sem boné nem chapéu, aquel raio ofende, o sereno da noite,
e nisso a pessoa fica sofrendo com aquela dor de cabeça aguniada todos os dias,
todos os dias, eu rezo também, sol, sereno, criado, ventre caído, ferida de boca,
você pensa que é fácil, mas não ´não, as vezes a mãe já tem gastado muito
dinheiro com remédio e a alegria da criança inchada, a gente reza com uma
lãnzinha de algosão benzendo, coloca assim perto do fogo, a gente rezando,
enxugando a lãnzinha. passa na babinha da criança e a feridinha secando.

É muito importante a gente ver isso e ver que tá tendo futuro, tem gente que tem
uma preguiça de rezar, eu rezo mais que uma pessoa por dia, porque isso não
adoece, porque a ofensa de ninguém passa não, só tem um problema que se a
gente rezar muito, muitas vezes por dia ataca as vistas da gente, que é o "mar de
monte", a pessoa que reza, tem que rezar com três folhinhas verdes na mão,
rezando com aquelas folhinhas verdes, é pra tá com aquelas folhas na mão pra
cortar o fogo em brasa, esquenta que racha a perna do ser humano é muito
perigoso, mas outra coisa eu não tenho medo não, dor de dente, essas coisas,
espinhela caída que é "os peito aberto", quando a pessoa cria com peso, a gente
reza.

Deus sabe muito bem o que tá fazendo, o rezador tem que saber o que tá
fazendo, tem que saber cumprir o seu caminho, porque muitos atrapalho vem pra
desviar a gente do caminho certo e eu não posso me desviar porque foi do
"belço", como é que eu ía aprender se ninguém me ensinou, eu não sei ler, não
sei copiar, se uma pessoa copiasse pra mim e eu soubesse ler, aí eu tava vendo,
tava aprendendo, aí foi dom de Deus por isso que sou feliz e digo que é um
caminho certo, um caminho muito feliz, mas um caminho muito perseguido pela
língua de alguém que não entende e que não conhece a verdade, muita gente me
procura, mas muita gente me critica d dizer muitas coisas, mas eu só entrego a
Deus, que Deus faça justiça, porque só Deus que pode julgar e Jesus e ele não
julga, ele só faz a gente pagar pelo preço que a gente deve, eu não ligo não que o
povo fala de mim, de jeito nenhum.

E se chegasse aqui e eu dissesse é tanto, com uma mãe com o filho se


acabando,é tanto, chegasse um engasgado, eu só rezo por tanto, aí não, isso aí
era meio de vida, um caminho errado que eu tinha seguido, mas o caminho de
Deus eu sigo até o fim, eu salto até dentro do fogo faiscando, essa profissão que
Deus me deu, você acredita nisso, que seu salto pr salvar um se Deus me der a
permissão, porque sem ele eu não podia lutar nem saber de tanta coisa boa como
eu sei, a gente não precisa se dedicar e nem ensinar a quem não merece, que
agora tá com a palavra de Deus na boca e depois com palavrão, não quer
respeitar o ser humano, não quer amar o ser humano como a si próprio, e é por
isso que eu digo, que pra rezar precisa ser forte e tem que saber se segurar nas
mãos de Deus porque fica atraindo as pessoas pro caminho que não é certo,
procure o seu caminho da igreja que é pra desviar pra ver se fica tudo perdido.

FAR: A senhora reza com os poderes de Deus, mas, existem rezadores que
rezam de outra maneira?

BMS: Tem, eu vejo falar que aqui tem, esses negócios de centro espírita, eu não
desfaço, mas também não boto muita fé. Eu não creio que depois que a gente
morre, ainda se encoste junto de outra pessoa pra ir fazer o bem a ninguém, nisso
aí eu sou descrente, partiu desse lado eu sou descrente, mas tem, eu mesmo não
acredito, a não ser no amor de Deus, na força de Deus, mas que tem, tem.

A moça mesmo que eu rezei, não sei nem como é o nome do lugar, fazia mais de
um ano que se tratava em Campina, em Taperoá, em muitos cantos, a mulher
disse que já tinha deixado dinheiro de comprar um carro bom, aí eu disse, como a
senhora gastou esse dinheiro, desculpe a minha pergunta, ela disse não, eu ía
prum canto precisava de um trabalho, como era esse trabalho eu não entendo, e
eu ía gastando pra ver o futuro dela, tomou muito remédio pra se matar, não
dormia de noite com dois troços sacudindo ela, puxando o lençol da cama dela, e
isso e isso.

Aí vem pra cá, quando ela veio pela primeira vez, espantada com tanto medo a
bichinha, uma moça tão bonita, anda hoje lembro dela, o cabelo "bem lôro, aiva",
quando eu terminei de rezar, eu disse:"Se Deus quiser a sua filha vai ser
curarada", as lágrimas da mãe chega correu, eu disse:"pode ter fé em Deus, que
ela vai voltar a estudar, vai voltar a ser a pessoa de coragem que era e ela vai ser
muito feliz, que ela não tem doença pra médico", aí a mãe dela botou a mão no
bolso me deu cinquenta "real", e eu disse: "muito obrigado, me desculpe que eu
não aceito não, porque palavra de Deus não tem preço, não é qualquer outro
material que a gente possa negociar, é a palavra de Deus e tem que ser certa".

Aí ela enjoou-se, acho que disse sem querer, que tinha casa de gastar de
quinhentos a seiscentos "real" e nada foi resolvido, tem gente que se ilude, tem
gente que se ilude com essa gente que fala aqui, que vou fazer isso e disso vive,
vive de enganar o ser humano, mas a Deus ninguém engana. Eu sou aquilo que
Deus fez, tô aqui porque Deus consentiu, aquilo ali foi Deus que permitiu a você,
eu nem sou mais, nem sou menos e não quero ser melhor do que ninguém, eu
não sou contra crente, nem contra outra pessoa qualquer e se alguém quiser
seguir esse caminho e me deixar, não tá errado de nada.

Aí a moça foi embora e eu fiquei pensando, meu Deus é tão fácil de Jesus curar
as coisas que só ele pode, a pessoa sofrer um ano, tomar injeção, com três dias
ela me ligou: "D. Lica diga aonde eu tô? Eu tô indo pro colégio", eu disse: que bom
minha filha ouvir sua voz assim tão feliz", agora ela vai casar daqui pro final desse
mês, essa mesma moça que tava louca, louca de "avoar" pedra e ficou boa graças
a Deus, porque é que eu não sou feliz, nao é coisa material, nem presente que faz
você feliz não, o que faz você feliz é chegar uma pessoa com uma dor e ser
socorrido por Deus, e eu pedir com força e fé e fazer promessa e ser valido e
socorrer aquelas criaturas, porque tem gente que não entende o que é bom, que
dinheiro não é tudo não sem Deus primeiramente a gente não vive.

A gente tem que comprar o pão de cada dia, mas tem tanta coisa de valor que a
gente deveria segurar e saber dar valor, que é aquilo que Deus dá a gente, com
muita força, muito amor, muito conforto, porque não é a todo mundo que Jesus dá
uma "patente" dessa não, é como se fosse uma patente de ouro que a gente tem
que segurar, é um dom de Deus, desde o dia que eu nasci, que minha mãe
sempre falava pras minhas irmãs, que só era eu que ía puxar o dom que Deus deu
a ela, que ela era rezadeira, rezadeira fina e a minha avó era de família de caboclo
brabo, acho que por isso que nós trouxemos essa força de saber, minha avó foi
pega dentro de caixote no mato (acho que é isso, 24:20 video 02), foi criada,
depois casou, depois minha mãe nasceu, minha mãe era da família de caboclo
brabo, é minha forma de dizer que eu não entendo bem, mas que entende diz que
quem tem sangue de caboclo brabo tem inteligência e tem um dom de Deus,
dizem, mas na realidade eu não posso explicar isso bem explicado não, porque no
meu tempo ninguém me explicou de verdade o que era e o que não. Minha mãe
morreu com oitenta e quatro anos, minha mãe era parteira, tinha noite de pegar
três quatro crianças, fazer o parto de três meninos.

FAR: Fale um pouco sobre a sua mãe

BMS: Minha mãe se chamava Joana Maria da Conceição, ela era uma mulher
muito trabalhadeira, ela criou, teve quinze filhos, criou mais dois netos, era uma
mulher muita sofrida, passou muita dificuldade pra criar a gente, eu que sou a
caçula, não sei nem lhe contar da vida dela, mas ela sempre passava pra gente
que meu pai ía pro sul e ela ficava com os outros pequenos, no sul de Alagoas,
"ajuntava meus irmão maior" e ía cortar cana e ela ficava cuidando da gente, e
teve uma vez que ele foi e ela ficou gestante, esperando um bebê, aí tinha um
roçado de fava, trabalhava numa área bem alta, aí minha mãe foi colher a fava e
chegou lá minha mãe começou a sentir pra ter o menino, ela não teve demora,
limpou debaixo de uma árvore, um juazeio, tirou as folhas e os espinhos se deitou
e lá teve o néném.

Ela ganhou três filhos no mato, no roçado trabalhando, e ela era forte, nesse
tempo mulher andava vestida, era uma saiona por debaixo, outra saiona por cima,
um casaco de manga comprida, aí minha mãe não teve demora, quando tudo tava
realizado ali na mão de Deus, aí ela só fez embrulhar o meu irmão e deixou pra
cortar o "imbigo" em casa, que lá não tinha como, olhou o saco de fava que tinha
apanhado, meu pai ía chegar no domingo isso era no sábado, aí jogou o saco de
fava no joelho com o menino no braço, de resguardo, tinha acabado de ganhar
menino naquela hora, do joelho jogou pro ombro, do ombro pra cabeça, porque
ela sabia que em casa não tinha comida e meu pai quando chegasse era noite, e
meus irmãos era tudo pequeno e ão podia ir pro roçado e ela fez essa
extravagância.

Aí minha mãe chegou em casa, tudo bem, aí tomou banho, deu banho na criança,
cortou o "imbigo" e quando meu pai chegou no domingo a noite, tava a panelada
de fava, capão feito, porque nesse tempo as mulheres capavam os frangos pra
deixar "eles bem grandão", hoje ninhuém nem fala nisso que é ignorante ou
ignorado, mas antigamente tinha, aí minha mãe contou como tinha sido o
acontecimento, aí passou-se.

Quando foi no outro dia minha mãe tava numa farinhada era longe de casa e
apertou-se pra ganhar neném de novo, aí minha mãe disse: "aqui não dá pra ficar"
aí chamou meu pai, nesse tempo não tinha médico, nem enfemeira, nem vacina,
num tinha pré-natal, nos era acompanhada só pela força de Deus, aí meu pai
disse: "Vai pra casa, que eu vou só tirar essa fornada de farinha e vou ir pra
buscar uma parteira", quando chegou em casa, minha mãe já inha ganhado
neném pertinho de casa, que não deu tempo nem de entrar, minha mãe ganhou
três filhos assim, a vida era muito difícil, mas era uma vida boa, porque era todo
mundo unido, todo mundo trabalhava, nós lucrava muito, isso era fava, isso era
feijão, isso era milho, meu pai todo ano desmanchava um terreno de roça. A casa
era cheia, nunca faltou o pão de cada dia, eu sou a caçula, mas eu encontrei
muitas barrigas de bacalhau(entendi isso 29:18 vídeo 002), saco de açúcar dentro
da casa, aquelas crises passou e minha mãe continuou com fé em Deus,
conforme a cobertura que nós tem dentro de casa.

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