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PSICOLOGIA POSITIVA

Autoria: Bruna Luise da Silva

1ª Edição
Indaial - 2022
UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Janes Fidelis Tomelin

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Tiago Lorenzo Stachon

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Tiago Lorenzo Stachon
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Jairo Martins
Marcio Kisner
Marcelo Bucci

Revisão Gramatical: Desenvolvimento de Conteúdos EdTech

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech


UNIASSELVI

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XXX p.; il.

ISBN XXXXXXXXXXXXX
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CDD XXXX.XXX

Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
Psicologia Positiva: Origem e Princípios Básicos..................... 7

CAPÍTULO 2
Caminhos Para o Bem-Estar........................................................ 45

CAPÍTULO 3
Contribuições da Psicologia Positiva às Organizações......... 85
APRESENTAÇÃO
Olá! Nesta disciplina você vai conhecer e aprender sobre Psicologia Positiva,
um campo científico que busca investigar as forças e virtudes dos seres humanos,
os caminhos para alcançar o bem-estar e o desenvolvimento de práticas que po-
dem levar as pessoas a seu florescimento.

A Psicologia Positiva vem ganhando visibilidade nas últimas décadas por tra-
zer um novo paradigma para as ciências psicológicas e humanas: e se em vez de
tentarmos adaptarmos as pessoas às circunstâncias, pudéssemos desenvolver o
que elas já trazem de melhor? Essa é uma das perguntas-chave que esse novo
campo vem debruçando esforços em investigar e trazer soluções para aumentar o
nível de felicidade da humanidade.

Compreender o papel das emoções positivas, das qualidades humanas,


do que as pessoas já fazem e que traz resultados positivos em suas vidas, bem
como compartilhar todo esse conhecimento, vem se tornando uma grande missão
da Psicologia Positiva.

Assim, no Capítulo 1 deste livro didático, entenderemos todo o processo de


surgimento da Psicologia Positiva e as razões desse conhecimento estar sendo tão
disseminado e falado em um tempo tão volátil como o nosso. Além disso, percebe-
remos que, embora as pesquisas e evidências científicas sobre o bem-estar sejam
recentes na Psicologia, já se desdobram em grande número e posicionamentos.

No Capítulo 2, serão apontadas as principais intervenções em Psicologia Po-


sitiva, de eficácia e uso comprovados empiricamente, com recursos e exercícios
importantes para conhecê-las e executá-las. Nesse sentido, é importante lembrar
que o aprendizado é válido para os curiosos, dessa forma, coloque em prática e
se aproprie do conhecimento desenvolvido, correlacionando os exercícios propos-
tos com a teoria detalhada.

Por fim, no Capítulo 3, abordaremos os conceitos da Psicologia Positiva aplica-


dos ao trabalho e às organizações. Será possível perceber como esse novo campo
do saber mudou todo um paradigma de estudos em Gestão de Pessoas e bem-es-
tar no trabalho. As teorias trazidas também são alinhadas a exemplos práticos, no-
tícias e exercícios, de modo que o conhecimento se torne vivo e relevante a todos.

A organização deste livro didático foi realizada de tal forma que a Psicologia
Positiva cumpra sua missão, que é levar as pessoas a florescerem em uma vida
plena e significativa. Essa missão aparentemente pretensiosa se torna acessível,
na medida em que os conhecimentos científicos são traduzidos por experiências e
exercícios práticos e simples, mas que dependem da intencionalidade de cada um
de nós em alcançar a nossa própria felicidade.
C APÍTULO 1
PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E
PRINCÍPIOS BÁSICOS

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Compreender de maneira ampla os fundamentos teórico-científicos da Psicolo-


gia Positiva.

 Entender os precursores da Psicologia Positiva e sua contextualização histórica.

 Compreender os caminhos propostos para o florescimento a partir da teoria


PERMA.

 Desenvolver habilidades básicas para o autoconhecimento e suas relações


com uma vida saudável a partir da ótica do florescimento.
Psicologia Positiva

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Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
“De uma forma ou de outra, se a evolução humana é para continuar, teremos
de aprender a apreciar mais a vida completamente” (CSIKSZENTMIHALYI, 2020,
s.p.).

Apesar dos questionamento sobre as emoções, o comportamento humano


e a busca pela felicidade estarem presentes desde a filosofia grega clássica, a
Psicologia só se constituiu como ciência na Era Moderna, quando começou a uti-
lizar métodos rigorosos de observação e experimentação, definindo e estudando
conceitos como consciência e percepção, passando, a cada período histórico, a
ampliar seu objeto de estudo à medida que as mudanças sociais ocorriam e le-
vantavam novas demandas a esse novo campo de estudo.

A Psicologia apresentou diferenças culturais, e em cada região onde germi-


nava, novos focos tomavam conta dessa ciência. Assim, nos Estados Unidos, a
ênfase foi dada no Comportamento Humano; na Europa, a Psicanálise com a dis-
cussão sobre o Inconsciente se tornou um grande movimento.

Com o advento das duas grandes Guerras Mundiais e o desencadeamento


de diversos transtornos mentais, houve a necessidade de compreensão desses
fenômenos, além de investigar comportamentos e estratégias de cuidado para
atender às demandas das indústrias e da educação.

Nesse sentido, a Psicologia veio evoluindo no século XX e trouxe muitas res-


postas sobre os tratamentos para doenças e transtornos mentais, como depres-
são, ansiedade, esquizofrenia etc.
No entanto, algumas questões ficaram muito tempo de fora de seu estudo:
o que torna as pessoas mais felizes? Para além de não adoecer, o que pode
permitir ao homem desenvolver ainda mais suas potencialidades? Essas e outras
indagações começaram a chamar a atenção de um grupo de psicólogos no final
do século XX, que sistematizou esse novo campo de estudo conhecido como Psi-
cologia Positiva.

Dessa forma, neste capítulo, compreenderemos quais as influências e im-


pactos do surgimento da Psicologia Positiva, os seus principais pilares e as teo-
rias que deram início a este movimento que vem revolucionando a forma de com-
preender o ser humano e seus relacionamentos (com o mundo e com si mesmo).

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Psicologia Positiva

2 O SURGIMENTO DA PSICOLOGIA
POSITIVA
A Psicologia se consolidou como ciência requerida nas organizações, institui-
ções e clínicas por ajudar as pessoas a se curarem ou melhorarem aspectos ado-
ecidos de sua saúde mental. Até final do século XX, essa foi sua principal missão
e ênfase: como auxiliar as pessoas que não possuíam uma vida saudável a terem
uma maior qualidade de vida? Como curar a depressão e a ansiedade?

Até então, a Psicologia cumpriu bem essa missão, mas um viés muito im-
portante foi esquecido. Em 1997, ocorreu as Eleições da Associação Americana
de Psicologia (APA), uma das maiores instituições de pesquisa em Psicologia do
mundo. Nesse sentido, novos rumos foram estabelecidos e um forte movimen-
to influenciou pesquisadores do mundo inteiro. Um dos candidatos, Martin E. P.
Seligman, começava a questionar a missão da Psicologia e observar em suas
pesquisas que a Psicologia havia abraçado até então o caminho de reduzir a
infelicidade causada pelas adversidades da vida ou predisposições a trans-
tornos, identificando que buscar reduzir a infelicidade ou minimizar o im-
pacto do adoecimento mental é diferente de desvendar meios para ampliar o
bem-estar dos indivíduos.

Esse fenômeno aconteceu na Psicologia especialmente após Segunda Guer-


ra Mundial, em que todos os recursos alocados para pesquisas foram voltados
para compreender e curar as doenças mentais desencadeadas no pós-guerra,
fazendo com que essa ciência negligenciasse aspectos promotores de uma vida
boa para as pessoas (CSIKSZENTMIHALY; SELIGMAN, 2000).

Assim, ao assumir a direção da APA, Martin Seligman questiona sua lideran-


ça em uma das posições mais respeitadas do mundo na sua área, buscando pen-
sar o que poderia ser tratado em seu discurso de posse e, mais que isso, o que
poderia trazer de novo para a Psicologia enquanto ciência e contribuição para o
bem-estar das pessoas. Logo após as eleições da APA, se deparou com os ques-
tionamentos de sua filha de apenas cinco anos na época, Nikki, e percebeu que
para o melhor desenvolvimento de crianças, como sua pequena filha, a Psicologia
deveria se concentrar em potencializar as forças e virtudes dos seres humanos e
não em corrigir suas falhas:

A vasta literatura de Psicologia sobre o sofrimento não é muito


aplicável a Nikki. Uma melhor psicologia para ela e para as
crianças de todos os lugares é a que considera as motivações
positivas – benevolência, competência, opção e respeito pela
vida – tão autênticas quanto os motivos menos nobres. É aque-
la que investiga sentimentos positivos, como satisfação, felici-

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Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

dade e esperança. É aquela que pergunta como as crianças


conseguem adquirir forças e virtudes cujo exercício leva a es-
ses sentimentos positivos. É aquela que pergunta sobre insti-
tuições positivas (família sólida, democracia, um amplo círculo
moral) que promovem essas forças e virtudes. É aquela que
vai nos guiar por melhores caminhos, para alcançar a vida boa
(SELIGMAN, 2004, p. 45).

Com essa mudança de paradigma em mente, Martin Seligman se aproxima


de estudiosos como os psicólogos Mihaly Csikszentmihalyi (1934-2021), Chris-
topher Peterson (1950-1912) e Ed Diener (1946-2021), dentre muitos outros, que
começam a perceber a necessidade de investigar as qualidades e virtudes huma-
nas e experiências de funcionamento psicológico ótimo, como o estado de Flow.

O Flow consiste em um estado mental que ocorre no momento


em que uma pessoa realiza uma atividade e se sente totalmente
absorvida, em uma sensação de energia, prazer e foco total no
que está fazendo. Nesse sentido, o Flow é definido pela imersão
total no que se faz, bem como por uma consequente perda do
sentido de espaço e tempo (CSIKSZENTMIHALYI, 2020).
No Capítulo 2, detalharemos mais a teoria do Flow e suas impli-
cações práticas para o bem-estar dos indivíduos, bem como seu
reflexo nas organizações.

Assim, nos anos 2000, o anuário da Associação Americana de Psicologia tem


uma edição especial com 15 artigos em Psicologia Positiva, apresentando dentre
eles aquele que seria o documento de sua fundação, o texto intitulado Positive
Psychology: an introduction (Psicologia Positiva: uma introdução).

FIGURA 1 - OS PSICÓLOGOS MARTIN SELIGMAN E MIHALY


CSIKSZENTMIHALYI, FUNDADORES DA PSICOLOGIA POSITIVA

FONTE: https://www.thepositiveencourager.global/s-martin-seligman-work-positive-
psychology/; https://medium.com/interactive-designers-cookbook/flow-state-and-how-
your-game-can-benefit-by-triggering-it-9c1909958fd1. Acesso em: 10 fev. 2022.

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Psicologia Positiva

Nesse manifesto, Csikszentmihalyi e Seligman (2000) retomam as questões


já estudadas na Psicologia acerca do bem-estar e potencialidades do homem.
Para demonstrar o desinteresse da ciência em estudar os aspectos positivos da
vida, trazemos aqui um levantamento das palavras-chave dos artigos científicos
publicados em periódicos entre os anos de 1970 e 1999, o que reforça o argumen-
to de que muito se sabia até então sobre estresse ou depressão e, proporcional-
mente, muito pouco sobre os fatores que poderiam potencializar nossa felicidade:

QUADRO 1 - PALAVRAS-CHAVE DOS ARTIGOS CIENTÍFICOS


PUBLICADOS EM PSICOLOGIA NOS ANOS DE 1970 E 1999

Palavra-chave Quantidade
Happiness 2.745
Well-being 10.471
Depression 69.316
Stress or distress 61.363

FONTE: Adaptado de Kamei (2014)

A partir desse panorama, Csikszentmihalyi e Seligman (2000) propõem a Psi-


cologia Positiva como um campo que avalia o bem-estar, contentamento e satisfa-
ção dos indivíduos (experiências passadas), felicidade e estado de flow (presente),
bem como a esperança e o otimismo (futuro). No âmbito grupal, esse campo cien-
tífico atua em assuntos como virtudes e instituições positivas que movem os indi-
víduos para valores, como cidadania, altruísmo, civilidade, moderação, tolerância e
ética no trabalho. Para melhor visualização, apresentamos um quadro com a descri-
ção dessas áreas de estudo em que se concentram a Psicologia Positiva:

QUADRO 2 - NÍVEIS DE ESTUDO DA PSICOLOGIA POSITIVA

Subjetivo Individual Grupal


Experiências positivas Traços individuais positivos:
Instituições positivas: virtudes
subjetivas: bem-estar, capacidade e vocação para
cívicas e instituições que
contentamento e satisfação amar, coragem, habilidade
levam as pessoas a uma
dos indivíduos (experiências interpessoal, sensibilidade
melhor cidadania, como
passadas), felicidade e estética, perseverança, perdão
responsabilidade, altruísmo,
estado de flow (presente) originalidade, mente aberta,
civilidade, moderação, tolerância
e esperança e otimismo espiritualidade, talentos
e ética no trabalho.
(futuro). elevados e sabedoria.

FONTE: Adaptado de Csikszentmihalyi e Seligman (2000) e Correa (2018).

Esses níveis de estudo são os chamados pilares da Psicologia Positiva, sendo,


portanto, compostos por estudos e intervenções em (1) emoções positivas (experi-
ência subjetiva); (2) caráter positivo (traços individuais e potenciais de cada um); e
(3) instituições positivas (como as instituições humanas podem favorecer o desen-
volvimento positivo dos indivíduos).

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Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

FIGURA 2 - PILARES DA PSICOLOGIA POSITIVA

FONTE: A autora.

Confira o vídeo a seguir que apresenta o fundador da Psicologia


Positiva falando sobre esse campo científico, de maneira clara e
acessível, com suas principais aspirações e ideias: https://www.
youtube.com/watch?v=9FBxfd7DL3E.

Com essa configuração inicial, portanto, a Psicologia Positiva se estabeleceu


como a ciência que busca investigar a experiência subjetiva positiva, dos traços
positivos e das instituições positivas, com o intuito de promover uma melhor quali-
dade de vida e prevenir adoecimentos que nos acometem quando a vida se torna
estéril ou sem significado (CSIKSZENTMIHALYI; SELIGMAN, 2000).

A partir desse marco teórico, outros pesquisadores sumarizaram essa defi-


nição, apresentando a Psicologia Positiva como sendo: “o estudo científico das
forças e virtudes humanas comuns” (SHELDON; KING, 2001, p. 216) e “o estudo
de condições e processos que contribuem para o florescimento e funcionamento
ótimo das pessoas, grupos e instituições” (GABLE; HEIDT, 2005, p. 103).

Em suma, todas essas definições têm em comum a premissa da Psicologia


Positiva como um campo científico sistematizado que busca investigar nos três
pilares descritos (emoções positivas, características positivas e instituições positi-
vas) o que pode levar as pessoas a terem uma vida mais significativa e satisfató-
ria. Como explica Correa (2018, p. 33):

A Psicologia Positiva é a ciência da felicidade que contempla


o estudo das características, aspectos e emoções humanas,

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Psicologia Positiva

com foco em teoria, medição, intervenções e práticas que po-


tencializem, no âmbito individual e coletivo, o bem-estar.

Essas definições trazidas aqui foram integradas para conhecermos e com-


preendermos as bases da Psicologia Positiva, objetivando entender e interpretar
suas contribuições. No entanto, à medida que formos avançando na apresenta-
ção dos temas, perceberemos que esse campo da Psicologia busca uma lingua-
gem mais acessível para traduzir seus resultados em práticas que favoreçam o
bem-estar de todos. Em um tom informal intencional, com o objetivo de popula-
rizar este campo científico e suas descobertas ao maior número de pessoas, os
pesquisadores trazem a partir de suas experiências pessoais a necessidade de
conhecermos e compreendermos melhor o que é essa tal felicidade. Com esse
propósito, a Psicologia Positiva se caracteriza como um campo transdisciplinar,
conversando com diversas áreas do conhecimento. Nesse sentido, é importan-
te frisar um ponto: esse campo de conhecimento é fundamento em evidências
científicas e, por isso, apesar do seu esforço em se tornar popular e auxiliar o
maior número possível de pessoas, não deve ser confundido com autoajuda ou
com fórmulas mágicas para solucionar as nossas vidas. Trata-se, dessa forma,
de teorias e intervenções que nos auxiliam, mas necessitam comprometimento e
envolvimento para fazer sentido em nosso dia a dia.

FIGURA 3 - INFOGRÁFICO - O QUE NÃO É PSICOLOGIA POSITIVA

FONTE: <https://pin.it/52BlEKc>. Acesso em: 10 fev. 2022.

A seguir apresentamos um livro de fácil leitura, mas de muita pro-


fundidade, para compreender os ideais e primeiros resultados
sistematizados da Psicologia Positiva, com exercícios para seu
autoconhecimento:

SELIGMAN, Martin EP. Felicidade autêntica: use a psicologia posi-


tiva para alcançar todo seu potencial. Rio de Janeiro: Objetiva, 2019.

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Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

Já estudou felicidade hoje? Entenda por que esse assunto


virou matéria nas faculdades

Vagas esgotadas:

A criação de disciplinas para ajudar os estudantes a lidar melhor


com o estresse e buscar formas de valorizar o bem-estar é influência
direta da Psicologia Positiva. Essa linha surgiu na década de 1990
a partir da constatação de que a Psicologia estava voltada essen-
cialmente ao tratamento de transtornos mentais e quase nunca se
dedicava à missão de aumentar o nível de satisfação e felicidade
das pessoas, caminho para evitar os transtornos mentais.

Ex-presidente da Associação Americana de Psicologia, Martin


Seligman foi um dos teóricos iniciais da linha, ao defender que
a felicidade pode ser cultivada e “aprendida” – não apenas como
estratégia para aumentar o bem-estar, mas também para lidar
com os dissabores da vida.

Com base nessas ideias, a primeira disciplina sobre Felicidade foi


criada na Universidade de Harvard, iniciativa que foi aos poucos
se disseminando por outros centros educacionais de excelência
dos Estados Unidos e mundo afora.

No Brasil, o pioneirismo entre as instituições públicas ficou por


conta da Universidade de Brasília (UnB). No ano passado, a dis-
ciplina de Felicidade foi oferecida no campus do Gama, que con-
centra cursos de engenharia. As 240 vagas foram preenchidas e
coube aos alunos apresentar como trabalho de conclusão uma
ideia para elevar o nível de felicidade no ambiente universitário.

“A Psicologia Positiva ajuda a lidar com sensações que são co-


muns a todos nós, como desânimo, desesperança, frustração, in-
segurança, que não necessariamente estão ligadas a transtornos
mentais”, explica a professora Sálua Omais, responsável pela
criação da disciplina Felicidade e Inteligência Emocional na Uni-
versidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS).

A disciplina proposta por Sálua à instituição foi acolhida pelo curso


de Odontologia. “A direção do curso entendeu que seria importante

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Psicologia Positiva

para os alunos ter uma formação mais humana, que trabalhasse


também a saúde mental e emocional”, descreve a professora.

No primeiro semestre do ano passado, a turma inaugural da dis-


ciplina teve as 120 vagas ocupadas – 80 para o curso de Odon-
tologia e 40 para outros cursos –, com uma lista de espera acima
de 200 alunos. A procura se repetiu na mesma intensidade no se-
mestre seguinte. “Ficou bem claro o quanto os jovens valorizam
esse tipo de experiência”, conclui a professora.

FONTE: <https://6minutos.uol.com.br/carreira/ja-aprendeu-so-
bre-felicidade-hoje-entenda-por-que-esse-assunto-virou-materia-
-nas-faculdades/>. Acesso em: 10 fev. 2021.

Para finalizar, podemos dizer que a Psicologia Positiva surgiu em um momen-


to em que a ciência buscava novas soluções para o desenvolvimento humano,
considerando aspectos positivos de nossa espécie, o que foi totalmente inovador.
No entanto, veremos na próxima seção que esse pensamento é fundamentado
em bases mais antigas, da filosofia e da própria psicologia.

1 Vimos nesta seção o contexto, o surgimento e os princípios


básicos da Psicologia Positiva. Sobre essas considerações,
assinale a alternativa CORRETA:

a) A Psicologia Positiva é uma abordagem clínica que só pode ser


utilizada por psicólogos.
b) É um campo científico que ignora as emoções negativas.
c) É um campo científico dentro da Psicologia que busca compreen-
der o que pode potencializar o bem-estar das pessoas, a partir do
estudo das emoções positivas, características individuais e insti-
tuições positivas.
d) É uma forma de autoajuda e, por isso, é acessível a todos e está
em relevância na sociedade.

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Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

3 PRECURSORES FILOSÓFICOS E
PRINCIPAIS INFLUÊNCIAS
Todo esse movimento da Psicologia Positiva culminou na necessidade de
compreensão do que seria esse estado de bem-estar e quais caminhos seriam
mais bem-sucedidos. No entanto, apesar de sistematizado na ciência recente-
mente, as investigações sobre o bem-estar possuem suas raízes na filosofia clás-
sica, que tem refletido sobre a felicidade desde seus primórdios.

Muitos filósofos buscaram definir a felicidade e seus caminhos. Um filósofo


em destaque é Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.), que cataloga a possibilidade da
felicidade em três caminhos: “a felicidade é o prazer, a felicidade é a glória ou a
virtude, a felicidade é a contemplação” (PHILIPPE, 2002, p. 33).

FIGURA 4 - ARISTÓTELES (384-322 a.C.)

FONTE: <https://www.ebiografia.com/aristoteles/>. Acesso em: 4 fev. 2022.

Assim, a felicidade seria a última finalidade de nossas ações, como explica


Moreira (2012, s.p.):

Todas essas maneiras de conhecer a felicidade mostram que


ela é um fim último das nossas atividades, pois se procuramos
o prazer é para encontrarmos a felicidade, se vivemos à pro-
cura de glória ou em uma vida virtuosa é porque queremos ser
felizes e, se levamos uma vida contemplativa, é porque encon-
tramos nela a felicidade.

A felicidade seria, portanto, possível de ser definida em momentos de prazer,


de uma vida aprazível, no alcance de realizações (glória ou virtude) ou se utiliza-

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Psicologia Positiva

mos a razão para contemplá-la. No entanto, para Aristóteles, a felicidade a ser


perseguida pelo ser humano se conecta ao conceito de eudaimonia:

a felicidade é a vida plenamente realizada em sua excelência


máxima. Por isso não é alcançável imediata nem definitiva-
mente, mas é um exercício cotidiano que a alma realiza duran-
te toda a vida. A felicidade é, pois, a atualização das potências
da alma humana de acordo com sua excelência mais comple-
ta, a racionalidade (CHAUÍ, 2002. p. 442).

Para Aristóteles, mais importante do que definir a felicidade seria descobrir


caminhos duradouros para encontrá-la e isto seria possível por meio da eudai-
monia. A felicidade eudaimônica, portanto, consiste no uso das virtudes hu-
manas para desenvolver seu potencial máximo e alcançar a autorrealização
(vida significativa).

Em outra direção, filósofos como Aristipo de Cirene (435-356 a.C.) e, posterior-


mente, Epicuro (341-270 ou 271 a.C.) consideram a felicidade como alcançável pela
busca dos prazeres da vida, inaugurando a corrente filosófica hedônica. O hedonismo
se refere à busca de emoções positivas e satisfação dos desejos do indivíduo.

FIGURA 5 - ARISTIPO DE CIRENE E EPICURO

FONTE: <https://bityli.com/jeJzQH; https://bityli.com/MXkDaV>. Acesso em: 4 fev. 2022.

Podemos dizer então, resumidamente, que a ideia de felicidade eudaimônica


está vinculada à busca da realização de nossas potencialidades e crescimento pes-
soal, enquanto a felicidade hedônica remete à experimentação de emoções positivas,
por meio da busca pelo prazer e satisfação de nossos desejos.

O termo eudaimonia é valioso porque se refere ao bem-estar


distinto da felicidade per se. As teorias eudaimônicas susten-
tam que nem todos os desejos – nem todos os resultados que
uma pessoa pode valorizar – produziriam bem-estar quando
alcançados (RYAN; DECI, 2001, p. 145).

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Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

FIGURA 6 - A DÍADE EUDAIMÔNICA-HEDÔNICA DO BEM-ESTAR PSICOLÓGICO

FONTE: <https://doi.org/10.1080/07370024.2018.1555481>. Acesso em: 11 fev. 2022.

Tais bases filosóficas orientaram muitos estudos em Psicologia que são consi-
derados, por sua vez, como correntes influenciadoras da Psicologia Positiva, como
os estudos sobre teorias das emoções na década de 1980, que trazem o bem-estar
como a equação entre emoções positivas e negativas (DAGENAIS-DESMARAIS et
al., 2017). O hedonismo é inserido nos estudos sobre o bem-estar que consideram as
emoções positivas e satisfação com a vida, evidenciando a felicidade como a busca
de prazer e evitação de situações de desprazer (DIENER et al., 2010).

Por outro lado, a eudaimonia na Psicologia é vista em estudos que investigam


pessoas com bom funcionamento psicológico, que sentem suas vidas prosperarem,
com significado e engajamento em suas atividades.

Até aqui vimos as influências filosóficas da Psicologia Positiva.


Perceberemos quando conhecermos os conceitos da Psicologia
Positiva que eles permeiam ora na visão hedonista da felicida-
de, ora na visão eudaimônica, trazendo diversos caminhos para o
bem-estar e uma vida saudável.

Além da filosofia, outros precursores da própria Psicologia influenciaram os es-


tudos do bem-estar, como Abraham Maslow (1908-1970) e Carl Rogers (1902-1987),
que, muito similar ao manifesto de Seligman no final de 1990, realizaram a crítica à
Psicologia da época, que se estava tomada por modelos deterministas do homem
(Behaviorismo e Psicanálise). O movimento chamado Psicologia Humanista culminou
em novos modelos teóricos e metodológicos, considerando aspectos positivos do ho-
mem e suas possibilidades de escolha.

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Psicologia Positiva

A psicologia humanista enfatizava o poder do homem, bem


como as suas aspirações positivas, a experiência consciente,
o livre-arbítrio (não o determinismo), a plena utilização do po-
tencial humano e a crença da integridade da natureza humana.
É fácil perceber como esses temas são bem distintos do beha-
viorismo e da psicanálise (SHULTZ; SCHULTZ, 2017, p. 336).

Behaviorismo: o Behaviorismo, também chamado de Comporta-


mentismo ou Comportamentalismo, tem como objeto de estudo
o comportamento humano, que é resultado das experiências do
indivíduo condicionadas pelo ambiente (determinismo ambiental).

Psicanálise: a Psicanálise é conhecida pelos estudos do incons-


ciente, que é composto por impulsos recalcados. O ser humano
seria assim estruturado em função de um determinismo psíquico,
isto é, pela forma como se fundou seu inconsciente.

Para saber mais, leia o livro a seguir:


BOCK, A. M. B.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. T. Psicologia.
São Paulo: Saraiva Educação SA, 2019.

Os psicólogos humanistas consideraram a ciência psicológica da época determi-


nista, isto é, as teorias não consideravam a liberdade do indivíduo, que era determi-
nado ou pelo seu inconsciente ou pelo seu meio social. Assim, buscavam uma psico-
logia que acreditava nas potencialidades humanas e em sua tendência realizadora,
ideais preconizados e reafirmados hoje na Psicologia Positiva.

FIGURA 7 - ABRAHAM MASLOW E CARL ROGERS

FONTE: <https://maestrovirtuale.com/abraham-maslow-biografia-teorias-
contribuicoes-obras/; https://iptc.net.br/carl-rogers/>. Acesso em: 11 fev. 2022.

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Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

Para Maslow, todo o indivíduo é dotado da capacidade para a autorrealização,


sendo que no estado de maior elevação das necessidades humanas podemos de-
senvolver e utilizar todo o nosso potencial. No entanto, para alcançar esse estado, as
nossas necessidades básicas deverão ser atendidas (SCHULTZ; SCHULTZ, 2017).
Assim, Maslow propõe a hierarquia das necessidades, altamente utilizada por psicó-
logos, estudiosos e organizações contemporâneas.

FIGURA 8 - HIERARQUIA DAS NECESSIDADES DE MASLOW

FONTE: <https://www.linkedin.com/pulse/por-que-pir%C3%A2mide-de-maslow-
%C3%A9-t%C3%A3o-atual-fabiano-goldacker/>. Acesso em: 10 fev. 2022.

De modo convergente, Rogers propõe em suas teorias o conceito de autorreali-


zação, a partir de sua experiência clínica, como uma tendência do ser humano para
realização do self (SCHULTZ; SCHULTZ, 2017). Assim, um ponto fundamental de
sua teoria é a consideração da Tendência à Realização: a vida não é um processo
passivo, mas ativo, e é a partir desse impulso direcional ao crescimento que o ser hu-
mano é motivado, sempre em busca de seu desenvolvimento e crescimento.

Conseguiu perceber as influências do humanismo na Psicologia


Positiva? Assim como na humanista, houve um movimento para
falar das potencialidades humanas, daquilo que estava sendo es-
quecido pela Psicologia. A diferença está na forma de atuação
das duas: atualmente, a Psicologia Positiva não é centrada na
prática clínica, mas sim em pesquisa experimental. Todos os pon-
tos sobre o bem-estar vêm da ciência baseada em evidências.
O humanismo é visto como uma escola dentro da Psicologia, já a
Psicologia Positiva é um campo científico que pode ser inserido
nas tradições psicológicas e em outras áreas do conhecimento.

21
Psicologia Positiva

1 Sobre as influências filosóficas e históricas que culminaram


na Psicologia Positiva, assinale a alternativa INCORRETA:

a) A escola hedonista influenciou os estudos sobre emoções positi-


vas na Psicologia.
b) A escola eudaimônica compreende a felicidade como um estado
de busca por uma vida significativa e autorrealização.
c) O movimento da Psicologia Humanista possui similaridades com a
Psicologia Positiva, por acreditarem nas potencialidades humanas.
d) Carl Rogers e Abraham Maslow podem ser considerados os pais
da Psicologia Positiva, visto que possuem métodos de pesquisas
e objetivos iguais a esse campo científico.

4 DA FELICIDADE AUTÊNTICA
AO FLORESCIMENTO: O
DESENVOLVIMENTO DAS TEORIAS
DO BEM-ESTAR
Podemos dizer que a Psicologia positiva vem perseguir o objetivo, a partir da
própria experiência humana, de identificar, classificar, propor e promover caminhos
para o bem-estar.

FIGURA 9 - CHARGE

FONTE: <https://brainly.com.br/tarefa/36543946>. Acesso em: 24 fev. 2022.

Nesta etapa, vamos fazer um breve percurso sobre as teorias do bem-estar em


destaque. Foi a partir delas que muitas pesquisas foram desenvolvidas, trazendo evi-
dências científicas de soluções para o bom funcionamento psicológico e caminhos
para o bem-estar, como veremos no Capítulo 2.

22
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

4.1 A TEORIA DA FELICIDADE


AUTÊNTICA
A teoria da felicidade autêntica, enquanto campo científico, foi delineada por
Martin Seligman logo no início da estruturação da Psicologia Positiva. No Brasil, essa
teoria ficou conhecida a partir da publicação do livro Felicidade Autêntica: usando a
nova psicologia positiva para a realização permanente.

Segundo Seligman (2011), a felicidade poderia ser alcançada pelas escolhas


que fazemos para tanto. Essas escolhas, que podem nos tornar mais felizes, estão
definidas por este autor em três grandes grupos, conforme a figura a seguir.

FIGURA 10 - ELEMENTOS PARA ALCANÇAR A FELICIDADE

FONTE: A autora.

O primeiro elemento, Emoção Positiva, está ligado às escolhas prazerosas que


fazemos para nos sentirmos bem, confortáveis, entusiasmados etc. Podemos perce-
ber que essas escolhas para a felicidade estão ligadas à escola hedonista e podem
ser resumidas, como sintetizou Seligman (2011), por uma vida aprazível.

Quando estamos estressados e escolhemos ações que vão nos trazer um pra-
zer e conforto, estamos traçando o caminho da emoção positiva ou, como outros pes-
quisadores também chamam, o bem-estar subjetivo (DIENER, 2009).

O bem-estar subjetivo é uma área da psicologia que tem crescido


muito ultimamente, cobrindo estudos que têm utilizado as mais
diversas nomeações, tais como: felicidade, satisfação, estado
de espírito e afeto positivo. De forma ampla, pode-se dizer que o
tema foca como as pessoas avaliam suas vidas (DIENER, 1996).
Mais especificamente, este construto diz respeito a como e por

23
Psicologia Positiva

que as pessoas experienciam suas vidas positivamente. Também


é considerada a avaliação subjetiva da qualidade de vida (GIA-
COMONI, 2004, p. 43).

Assim, a vida aprazível, ou a vida boa, seria alcançada quando houvesse um


equilíbrio entre as emoções positivas e negativas, com maior predomínio das experi-
ências positivas.

FIGURA 11 - TÉCNICAS PARA CULTIVAR EMOÇÕES POSITIVAS

FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/sbcoaching-
sbcoaching--727753621009904574/ />. Acesso em: 16 fev. 2022.

Quando realizamos ações intencionais para vivenciar emoções positivas, pode-


mos não só nos sentirmos bem, mas sermos mais capazes de lidar com situações
estressantes, melhorando nossa percepção e raciocínio.

O segundo caminho apontado é o do Engajamento, que está relacionado às ati-


vidades que desenvolvemos e nosso grau de envolvimento com elas. Quando per-
demos a noção de tempo, seja no trabalho, no estudo ou numa atividade prazerosa,
como um hobby, dizemos que estamos totalmente entregues e envolvidos, o que traz
uma satisfação indireta.

24
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

O engajamento é algo diferente, até oposto, de uma emoção positiva; pois quan-
do você pergunta às pessoas que se entregam a uma atividade o que estão pensan-
do e sentindo, elas geralmente dizem: ‘Nada’. No envolvimento, nós nos fundimos
com o objeto. Acredito que a atenção concentrada exigida pelo engajamento conso-
me todos os recursos cognitivos e emocionais que formam nossos pensamentos e
sentimentos (SELIGMAN, 2011, p. 22).

Diferentemente das emoções positivas que podem ser mais fáceis e acessíveis,
as escolhas por atividades que nos levam ao engajamento dependem do nosso es-
forço em nos envolver e utilizar nossos recursos pessoais. As escolhas por engaja-
mento nos levam à Vida Engajada.

Por fim, o terceiro caminho para felicidade é o Sentido. A vida quando provida
de um significado maior, um propósito, pode levar a um senso de autorrealização,
semelhante ao proposto por Aristóteles. Na dimensão do Sentido, não estamos mais
procurando satisfação individual, mas um significado maior que muitas vezes podem
envolver outras pessoas, causas sociais, espiritualidade etc. A importância de uma
Vida Significativa, ou de um propósito, sentido, também foi muito discutida na Psicolo-
gia e influenciada por pessoas célebres, como o Psicólogo Viktor Frankl (1905-1997),
que viveu em um campo de concentração nazista e a partir de sua experiência con-
seguiu perceber que viver com um propósito pode nos auxiliar a ter uma vida melhor,
ainda que em situações extremas.

No link a seguir você assistirá a entrevista de Viktor Frankl, con-


tando da sua experiência e como a construção de um sentido de
vida pode nos levar a uma vida mais satisfatória: https://www.you-
tube.com/watch?v=hIUQY3tII6M.

Podemos resumir então a teoria da Felicidade Autêntica pela busca por uma vida
aprazível, constituída pela busca por vivências de emoções positivas e experiências
confortáveis; vida engajada, em que eu intencionalmente me envolvo com tarefas ou
atividades nas quais perco a noção do tempo e me sinto em um estado de absorção;
e vida com sentido, quando consigo atribuir um significado maior à minha existência,
um senso de propósito.

25
Psicologia Positiva

Considerando as vias para atingir uma vida boa, segundo a teoria


da felicidade autêntica, o que você poderia fazer hoje (nas condi-
ções em que se encontra) para experimentar mais emoções positi-
vas, engajamento em suas atividades ou mais senso de propósito?

FIGURA 12 - CAMINHOS DO BEM-ESTAR NA TEORIA DA FELICIDADE AUTÊNTICA

FONTE: A autora.

Seligman ilustra esses caminhos a partir de sua própria experiência:

A psicologia positiva, do modo como a concebo, tem a ver


com aquilo que escolhemos por si mesmo. Decidi receber uma
massagem nas costas no aeroporto de Minneapolis recente-
mente porque ela me fazia sentir bem. Escolhi a massagem
por ela própria, não porque dava mais sentido à minha vida
nem por qualquer outra razão. Nós frequentemente escolhe-
mos o que nos faz sentir bem, mas é muito importante que
percebamos que nossas escolhas frequentemente não têm a
ver com o modo como nos sentimos (SELIGMAN, 2011, p. 21).

Ele continua seu relato dizendo que foi a um torturante recital de piano de seu
filho, não porque se sentia melhor, mas porque acompanhá-lo seria o seu dever pa-
terno e, portanto, algo que preenche sua vida de sentido.

O que o autor quer explicar é que a felicidade não está atrelada exclusivamente
às experiências prazerosas: a vida boa está ligada também à forma como realizamos
nossas atividades, nosso trabalho e a quanto de propósito conseguimos enxergar em
nossas ações.

26
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

De qual felicidade estamos falando, afinal?

Como encontrar sentido na vida e felicidade na carreira e nos estu-


dos? As pessoas convivem com emoções felizes e tristes. E esses
sentimentos não estão ligados ao consumo, por exemplo. É possí-
vel ter o prazer de adquirir algo, mas isso passa, pois é volátil.

Dois pilares são vividos simultaneamente, podendo variar em di-


ferentes fases: de um lado está uma vida com mais emoções po-
sitivas do que negativas, conectadas principalmente às relações.
E do outro estão o sentido e o significado de vida que, em casos
bem-sucedidos, podem até ser acompanhados de um propósito.

O sentido é cognitivo: conseguir compreender de maneira racional


o que traz sentido para a vida. Já o propósito é algo que existe com
esse sentido lógico e que já está em operação na sua vida.

“O propósito tem um segredo. A ciência sabe que o que sustenta


toda a percepção de felicidade não são as emoções, mas sim
essa âncora que chamamos de propósito. Ela faz com que a gen-
te olhe para a vida, para além das dificuldades, e entenda que
vale a pena viver, apesar das circunstâncias”.

Segundo a definição de Santo Agostinho, felicidade é “seguir de-


sejando aquilo que já se possui”.

FONTE: FURTADO, C. Como encontrar sentido na vida e feli-


cidade na carreira e nos estudos. 2020. Disponível em: https://
www.pucrs.br/blog/como-encontrar-sentido-na-vida-e-felicidade-
-na-carreira-e-nos-estudos/. Acesso em: 17 fev. 2022.

Vimos até aqui a teoria inicial proposta e desenvolvida por Martin Seligman. Com
a evolução das pesquisas, esse psicólogo ampliou o objetivo da psicologia positiva,
realizou mudanças teóricas e percebeu que outros caminhos também são possíveis e
deveriam ser investigados, como veremos na seção seguinte.

27
Psicologia Positiva

4.2 A TEORIA PERMA DO BEM-ESTAR


Ao lançar a teoria da felicidade autêntica, pesquisadores e críticos argumenta-
ram que o termo “felicidade” está implicado em um estado de “boa disposição”, vincu-
lado necessariamente às emoções positivas. Por isso, a vida engajada e a vida com
sentido pareciam deslocadas do conceito de felicidade. Assim, a felicidade autêntica
estava ligada a um conceito de satisfação geral com a vida que, por sua vez, se re-
laciona ao modo como nos sentimos, mais ou menos felizes. A visão de felicidade
estava vinculada ao estado de humor das pessoas, ignorando outros aspectos que
trazem prosperidade à vida das pessoas (SELIGMAN, 2011).

Perceba que até aqui o desenvolvimento da teoria da Felicidade Au-


têntica, apesar de buscar englobar a vida engajada e a vida com
sentido, ainda traz uma visão hedonista de felicidade, considerando
em sua definição a satisfação na vida como seu objetivo principal.

A partir de tais críticas, Seligman transforma o tema central da Psicologia Positi-


va da felicidade para o bem-estar, trazendo então um novo objetivo para a Psicologia
Positiva:

FIGURA 13 - MUDANÇAS NOS OBJETIVOS DA PSICOLOGIA POSITIVA

FONTE: Adaptado de Seligman (2011).

Florescimento

O florescimento pode ser considerado um estado de funcionamento


psicológico ótimo, alcançado quando experimentamos um alto grau
de propósito, significado, otimismo, competência e satisfação com
nossa própria vida (DIENER et al., 2010; MENDONÇA et al., 2014).

28
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

Concebendo, portanto, a Psicologia Positiva como a ciência do bem-estar, que


busca propiciar o florescimento das pessoas e não apenas estados emocionais positi-
vos, Seligman (2011) propõe uma nova teoria, incrementando os elementos possíveis
para os seres humanos alcançarem uma vida próspera, em seu sentido mais amplo.

A abreviação da teoria do bem-estar é utilizada pela expressão “PERMA”, que


é composta por cinco elementos capazes de levarem as pessoas ao estado de flo-
rescimento, sendo cada letra da sigla indicativa de um desses elementos, na língua
original inglesa, como podemos observar na figura a seguir.

FIGURA 14 - ELEMENTOS DA TEORIA DO BEM-ESTAR

FONTE: Adaptado de Seligman (2011).

Ela se afasta, assim, de um aspecto único possível e cada um de seus elemen-


tos contribui para o bem-estar de maneira independente, a partir das escolhas de
cada indivíduo. Vamos agora compreender cada um desses elementos.

QUADRO 3 - DESCRIÇÃO DOS ELEMENTOS DO PERMA

Elemento Descrição
P - Emoções Positivas As emoções positivas compõem o caminho da “vida
agradável” e continuam presentes como um dos caminhos
para o bem-estar, não mais como elemento central.
E - Engajamento A “vida engajada” apresenta-se como uma trilha para o
bem-estar e é avaliada subjetivamente pela percepção de
absorção decorrente de nossas atividades.
R - Relacionamentos Positivos Construir relacionamentos positivos é estar com o outro e
partilhar emoções positivas e conquistas. Essa é uma das
inovações do modelo PERMA que considera essa dimensão
fundamental da existência humana.
M - Sentido A ideia de pertencer e servir a algo maior que si mesmo
permanece como um elemento independente do bem-estar.
A - Realização A motivação por realizar/conquistar coisas ou alcançar metas
surge como um novo elemento de bem-estar neste modelo.

FONTE: A autora.

29
Psicologia Positiva

Que tal começar a aplicar a teoria do bem-estar em sua vida?


Escolha um dos caminhos apresentados pelo PERMA e estabe-
leça metas. Lembre-se de começar com pequenos passos para
permanecer motivado. Por exemplo, pode inserir no seu dia a dia
atividades com amigos que há muito não encontra, uma atividade
ou esporte que te traz engajamento, ou ainda buscar grupos para
voluntariado. Veja o que faz sentido em sua história de vida e
busque intencionalmente ações para ampliar seu bem-estar!

Essa teoria propõe, portanto, o objetivo da psicologia positiva em avaliar e pro-


duzir o florescimento humano (SELIGMAN, 2011). Atualmente, essas proposições
são disseminadas e pesquisadas ao redor do mundo, por meio do desenvolvimento
de instrumentos de avaliação, experimentos e avanço de práticas positivas para po-
tencializar o que há de melhor nas pessoas.

4.3 A TEORIA DO AMPLIAR E


CONSTRUIR
Barbara Fredrickson é uma psicóloga norte-americana da Universidade da Caro-
lina do Norte que tem estudado e trazido grandes contribuições na Psicologia, pesqui-
sando as emoções positivas e seus impactos para os seres humanos.

FIGURA 15 - BARBARA FREDRICKSON

FONTE: <https://www.meredith.edu/news/meredith-names-barbara-
fredrickson-2018-woman-of-achievement//>. Acesso em 18 fev. 2022.

30
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

Dentre as numerosas pesquisas da cientista, que abarcam pelo menos 100 ar-
tigos publicados e revisados por pares, está a teoria do ampliar e construir, que
possui algumas proposições-chaves:

1) As emoções positivas ampliam o repertório de pensamentos e ações do


indivíduo, estimulando sua criatividade, novos comportamentos, habili-
dades e recursos internos. Por exemplo, se uma pessoa experimenta a
alegria, esta pode despertar o desejo de fazer coisas prazerosas, brincar,
jogar, buscar um hobby, interagir com amigos etc.

Isso significa que ao experimentarmos emoções positivas, estas ampliam nossa


percepção do mundo naquele momento, e ampliamos as possibilidades de construir
novos comportamentos positivos. Por outro lado, ao experimentarmos emoções ne-
gativas, temos a tendência de nos retrairmos. Como explica a própria pesquisadora:
“As mentalidades ampliadas decorrentes dessas emoções positivas são contrastadas
às mentalidades estreitas desencadeadas por muitas emoções negativas (ou seja,
tendências de ação específicas, como atacar ou fugir)” (FREDRICKSON, 2004, s.p.).

A segunda proposição da teoria fala sobre as consequências dessa ampliação


de consciência que as emoções positivas nos geram:

2) Ao ampliar momentaneamente o repertório de ações/pensamentos do in-


divíduo, as emoções positivas promovem a descoberta de novas ações,
ideias e laços sociais, construindo de modo criativo os recursos pessoais
desse indivíduo. Esses recursos podem ser físicos, intelectuais, sociais e
psicológicos (FREDRICKSON, 2014).

Resumidamente, a pesquisadora propõe um ciclo de ampliação de pensamento


gerado por emoções positivas que constroem no individuo recursos que elevam e oti-
mizam sua saúde e bem-estar. A seguir, uma ilustração desse processo:

FIGURA 16 - SÍNTESE DA TEORIA AMPLIAR E CONSTRUIR

FONTE: A autora.

31
Psicologia Positiva

Fredrickson comprovou em suas pesquisas que a vivência de emoções positi-


vas, ainda que aparentemente sejam momentâneas, levam às pessoas a um estado
de bem-estar que, por sua vez, pode levá-las a criar recursos pessoais para situações
difíceis, como a empatia, a solidariedade e a resiliência. Assim, se experimentar-
mos frequentemente emoções positivas, estamos mais propensos a desenvol-
ver meios para o enfrentamento de situações adversas em nossas vidas.

FIGURA 17 - ESPIRAL DAS EMOÇÕES - TEORIA AMPLIAR E CONSTRUIR

FONTE: <https://mapadetalentos.com.br/portal/index.php/pt/blog-
pt/352-licoes-da-psicologia-positiva-em-tempos-de-pandemia-emocoes-
positivas-e-situacoes-adversas>. Acesso em: 24 fev. 2022.

No quadro a seguir podemos conhecer as dez emoções positivas investigadas


pela pesquisadora como aquelas com maior impacto em nossas vidas, nos possibili-
tando aumentar nossos recursos internos:
QUADRO 4 - AS DEZ EMOÇÕES POSITIVAS MAIS
EXPERIMENTADAS PELAS PESSOAS

• 1. ALEGRIA
Emerge quando ocorre um acontecimento inesperado e positivo, gerando a disposição de participar
e se engajar nas interações que estão ocorrendo no momento.
• 2. GRATIDÃO
Surge diante do reconhecimento de outra pessoa, como a fonte de algo bom que lhe aconteceu,
estimulando a capacidade de ser mais generoso e de expressar bondade.
• 3. CONTENTAMENTO (OU SERENIDADE)
Vem à tona quando alguém percebe seu momento atual como sendo altamente satisfatório.
• 4. INTERESSE
Emerge em momentos que consideramos seguros, mas que nos oferecem novidade ou desafio.
• 5. ESPERANÇA
Aparece em situações nas quais tememos que o pior aconteça, mas desejamos intensamente o
melhor, instigando a força necessária para se reunir toda a capacidade e criatividade para mudar as
circunstâncias negativas.

32
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

• 6. ORGULHO
Surge quando se recebe um merecido reconhecimento por um resultado positivo, estimulando
sonhos ainda maiores e objetivos mais desafiadores.
• 7. SENSAÇÃO DE DIVERTIMENTO
Emerge quando algo engraçado ou divertido acontece, ou quando achamos graça em alguma
coisa, dando espaço à jovialidade, à necessidade de compartilhar risadas e à consolidação de
laços sociais duráveis.
• 8. INSPIRAÇÃO
Manifesta-se diante da excelência, estimulando a superação e o desejo de se tornar o melhor
possível, aumentando a motivação para se investir no autodesenvolvimento.
• 9. ENLEVO (SENTIR-SE ENLEVADO OU MARAVILHADO)
Expressa-se diante da beleza, da bondade ou de um poder que parece ser maior que a própria
existência, o que pode propiciar uma mudança no modo como se vê o mundo.
• 10. AMOR
Emerge quando outras emoções positivas são vivenciadas nas relações interpessoais,
promovendo, entre outras coisas, as conexões sociais e a autoexpansão.

FONTE: <https://gente.globo.com/o-poder-das-emocoes-
positivas/>. Acesso em: 16 fev. 2022.

Se você quiser conhecer mais sobre essa teoria e o papel das


emoções positivas no aumento dos nossos recursos pessoais, re-
comendamos os seguintes livros da autora:

• FREDRICKSON, B. L. Amor 2.0: a ciência a favor dos relaciona-


mentos. Rio de Janeiro: Companhia Nacional, 2015.
• FREDRICKSON, B. L. Positividade – Descubra a força das emo-
ções positivas, supere a negatividade e viva plenamente. Rio de
Janeiro: Rocco, 2009.

Podemos dizer que essa teoria supera o caráter meramente hedonista da bus-
ca por emoções positivas para o conforto e prazer, ao situar emoções fundamentais
para cultivar bons valores e recursos em nossas vidas. Ao colocar em evidência a
necessidade de mais emoções positivas, não quer dizer que não vivenciaremos
emoções negativas, mas sim que a vivência de maior positividade nos fortale-
cerá e ampliará nossos recursos internos para um enfrentamento mais favorá-
vel ou com menos impacto negativo em nossa saúde e bem-estar. Ainda hoje, a
teoria do Ampliar e Construir é utilizada como base de muitas pesquisas empíricas,
seja em intervenções na saúde, educação e organizações empresariais.

Nesse primeiro momento, é importante compreender essa teoria e o papel das


emoções positivas. Nos próximos capítulos, compreenderemos as consequências des-
sas emoções positivas para as pessoas e como estão ligadas ao nosso bem-estar.

33
Psicologia Positiva

4.4 A CIÊNCIA DA FELICIDADE


Percebemos até aqui que antes mesmo da constituição formal da Psicologia Po-
sitiva, alguns pesquisadores já estavam envolvidos com o tema. Com o ensejo e o
fortalecimento desse campo, foram abertas muitas frentes de trabalho simultâneas,
trazendo muito investimento financeiro, especialmente nos Estados Unidos.

Uma dessas pesquisas com considerações importantes para a Psicologia Posi-


tiva foi liderada pela professora doutora Sonja Lyubomirsky, da Universidade da Ca-
lifórnia, divulgada para o grande público na obra intitulada A Ciência da Felicidade:
Como atingir a felicidade real e duradoura.

FIGURA 18 - SONJA LYUBOMIRSKY

FONTE: <https://www.ecp20.com/sonja-lyubomirsky>. Acesso em: 21 fev. 2022.

Em suas pesquisas, Lyubomirsky conseguiu comprovar que uma pessoa com


relativo sucesso não é o mesmo que uma pessoa feliz. Isto porque pessoas com
grande sucesso na carreira, donos de corporações e um saldo bancário bem robusto
muitas vezes tinham o mesmo nível de felicidade que seus próprios funcionários. Mas
por que isso acontece? O que e como suas pesquisas conseguiram tais informações?

Para compreender a teoria proposta por Lyubomirsky, é importan-


te compreender o conceito de Felicidade utilizado pela pesquisa-
dora: “Aqui definimos a felicidade como é mais constantemente
definida na literatura, ou seja, em termos de afeto positivo fre-
quente, alta satisfação com a vida e baixa frequência de afeto ne-
gativo” (LYUBOMIRSKY; SHELDON; SCHKADE, 2005, p. 115).
Podemos perceber que essa definição coincide com a perspectiva
hedonista de bem-estar, como vimos na seção anterior, já que se
relaciona ao bem-estar subjetivo.

34
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

O interesse da pesquisadora e de sua equipe era identificar o nível de felicidade


crônica dos indivíduos, isto é, o motivo de algumas pessoas se manterem mais felizes
do que outras e por um período maior do que outras. Assim, para medir o nível de
felicidade crônica, foi considerado o julgamento do indivíduo sobre seu humor e satis-
fação com a vida em dados intervalos de tempo, por exemplo, dois, seis ou 12 meses
(LYUBOMIRSKY; SHELDON; SCHKADE, 2005).

Assim, a pesquisadora e seus colaboradores investigaram três fatores primários


que poderiam influenciar a felicidade crônica: as circunstâncias da vida, isto é, as
oportunidades que temos, o nosso meio socioambiental; os fatores genéticos, que
são nossos traços mais estáveis de personalidade, como extroversão ou introversão,
os quais a pesquisadora chamou de “set point”, ou ponto decisivo; e as atividades
intencionais, ou seja, ações que buscamos realizar para nos tornar mais felizes, de
forma consciente e intencional.

A partir desses fatores, suas pesquisas observaram o seguinte nível de determi-


nação de felicidade crônica:

FIGURA 19 - 3 FATORES PRIMÁRIOS QUE INFLUENCIAM


O NÍVEL DE FELICIDADE CRÔNICA

FONTE: Adaptado de Lyubomirsky, Sheldon e Schkade (2005)

Em seus artigos e livros, Lyubomirsky demonstra através de dados científicos


que 50% de nossa felicidade crônica depende de nossos fatores genéticos, ou “ponto
decisivo” (set point), visto que eles são traços mais duradouros e estáveis, difíceis de
serem mudados. O nosso temperamento raramente é mutável, muitas vezes apenas
nos adaptamos e conseguimos manejá-los para sermos mais aceitos socialmente.
Isto não quer dizer que, caso a pessoas seja introvertida, por exemplo, será mais
infeliz, porque temos características pessoais diferentes, nunca melhores ou piores
do que de outras pessoas. Assim, compreendendo que 50% da nossa felicidade crô-

35
Psicologia Positiva

nica está ligada ao nosso ponto decisivo, isto é, as nossas características mais dura-
douras, percebemos a necessidade de desenvolver o autoconhecimento para fazer
melhor uso desse material genético herdado. Vale lembrar que esse número foi pos-
sível por inúmeras pesquisas com gêmeos, por exemplo. E por que é chamado ponto
decisivo? Porque podemos ter picos de felicidade ao longo do tempo, mas voltamos
ao nosso set point após um período, ou seja, a como nosso temperamento/traços de
personalidade significam no mundo.

A sua teoria aponta ainda que, ao contrário do que pensamos no senso comum,
pessoas que ganham na loteria, por exemplo, ou tem uma grande surpresa positiva
na vida, logo se adaptam ao seu grau de felicidade “usual”, ou seja, a euforia depois
de um período passa e, se não cultivarmos emoções positivas duradouras, esses
“picos” de alegria por conquistas materiais logo se esgotam: é a chamada adaptação
hedonista. O ponto positivo da adaptação hedonista é que ela serve também para
emoções negativas: se eu passo por uma situação dramática, como um acidente,
após o trauma inicial, a tendência é que eu retorne ao meu “set point”, me adaptando
ao meu nível de felicidade mais característico.

Contudo, apesar de sua grande influência, os aspectos genéticos não são os


únicos a determinarem a nossa felicidade (felizmente). Existe ainda a influência do
nosso meio social, histórico, familiar, ou seja, das circunstâncias da vida. Assim, há di-
ferenças, por exemplo, entre uma pessoa que nasceu no Centro-Oeste brasileiro, em
determinada situação econômica e sociocultural, e outra pessoa que vive em uma re-
alidade europeia, com outras influências em sua história. No entanto, a influência das
circunstâncias externas é de apenas 10% em nossas vidas, isto é, apesar do nosso
ambiente explicar se podemos ser menos ou mais felizes, nossa forma de enxergar
o mundo e nossas ações sobre o contexto tem um peso maior em nossa felicidade.

Um documentário muito interessante traz uma síntese dos pontos


desenvolvidos neste capítulo, com a participação de muitos pes-
quisadores aqui citados. Intitulado “Happy” (2012), traz os ques-
tionamentos entre “ter” e “ser”, pesquisas e exemplos reais que
exploram os caminhos possíveis para a Felicidade. Nesse docu-
mentário, podemos ver inclusive pessoas de culturas totalmente
diferentes que possuem também visões distintas sobre sua pró-
pria felicidade, como propõe a teoria da “ciência da felicidade” es-
tudada nessa seção.

Acesse no link a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=pC-


-5SACo2xA

36
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

Por fim, um ponto fundamental que influencia a felicidade ao longo do tempo é


o que a pesquisadora chama de “ações intencionais”, que determina 40% do nosso
bem-estar. As ações intencionais são atividades que realizamos para alcançar
felicidade ou bem-estar, nos engajando e nos esforçando. Aqui está uma am-
pla gama de possibilidades, pois nós, seres humanos, somos muito criativos neste
aspecto: podemos decidir nos exercitar regularmente, meditar, reunir com amigos,
escalar montanhas ou fazer trilhas, mudar a forma como enxergamos uma situação,
buscar uma causa social etc. Podemos dizer que as ações intencionais têm a ver com
a nossa disposição em experimentar o mundo e com as nossas características pes-
soais, pois elas precisam fazer sentido em nossa história.

FIGURA 20 - AÇÕES PARA BUSCAR FELICIDADE

FONTE: <https://bicicletadacuritiba.wordpress.com/2008/04/06/
felicidade-e/>. Acesso em: 24 fev. 2022.

A autora elencou algumas ações intencionais com evidências para o aumento da


felicidade crônica, citadas no quadro a seguir.

QUADRO 5 - 12 AÇÕES INTENCIONAIS PARA O BEM-ESTAR

12 Ações Intencionais para o bem-estar


1) Expressar gratidão
2) Cultivar o otimismo
3) Evitar cismar e fazer comparações sociais
4) Praticar gestos de cortesia
5) Cultivar relações sociais
6) Desenvolver estratégias de superação de dificuldades
7) Aprender a perdoar
8) Aumentar as experiências de fluxo (flow)
9) Saborear as alegrias da vida
10) Comprometer-se com seus objetivos
11) Praticar a religião e a espiritualidade
12) Cuidar do corpo e da alma

FONTE: Adaptado de Correa (2018).

37
Psicologia Positiva

Podemos dizer que o trabalho proposto e investigado por essa teoria traz à tona
o papel importante de estarmos conscientes de nossas escolhas para a felicidade. Os
principais passos seriam: autoconhecimento (para saber o que é mais estável em seu
jeito de ser, seus traços de personalidade), compreensão de que as circunstâncias
atuam em certa medida sobre sua felicidade, e, o mais importante: a partir daí realizar
intencionalmente ações para promover o seu bem-estar e dos outros ao seu redor.

Psicologia positiva versus positividade tóxica

Para entender a positividade tóxica, devemos primeiro diferenci-


á-la da psicologia positiva, um conceito que parece semelhante,
mas é diferente.

“A psicologia positiva foi popularizada pelo psicólogo Martin Selig-


man, que trabalhou muito com os problemas da depressão e deu
uma perspectiva diferente para lidar com diferentes problemas,
situações ou patologias”, explica Rodellar.

Na década de 1990, Seligman, então presidente da Associação


Psicológica Americana (APA), disse em uma conferência que a
psicologia precisava dar um novo passo para estudar do ponto de
vista científico tudo o que torna o ser humano feliz.

Em seu famoso livro The Optimistic Child (A Criança Otimista,


sem edição no Brasil), o psicólogo americano explicou que o pes-
simista não nasce, mas é criado. “Aprendemos a ser pessimis-
tas pelas circunstâncias da vida”. No entanto, ele também disse
que podemos lutar contra esse pessimismo e transformar nossos
pensamentos negativos em mais positivos.

No entanto, isso não quer dizer que, se você se sente triste, tem
que se concentrar em ser feliz. Na verdade, fazer isso provavel-
mente cairá na armadilha da positividade tóxica porque, para tra-
balhar as emoções negativas, você não pode ignorá-las. Primeiro
você deve reconhecê-las e aceitá-las.

O segredo é não levar o positivismo ao extremo. “O conceito de


psicologia positiva ficou um pouco distorcido com o tempo”, diz
Rodellar. “Focar nos aspectos positivos das diferentes situações
que ocorrem na vida pode ser terapêutico e construtivo. O proble-
ma é que levado ao extremo pode gerar uma baixa capacidade

38
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

de enfrentar situações negativas”.

“A psicologia positiva aplicada corretamente é uma prática muito


útil, mas usada indiscriminadamente gera uma visão muito parcial
da realidade e um sentimento de desamparo. Negar situações
dolorosas e prejudiciais na vida é como ver a realidade com um
só olho”, acrescenta Rodellar.

FONTE: <https://www.bbc.com/portuguese/geral-55278174>.
Acesso em: 5 fev. 2022.

1 Sobre a teoria “Felicidade autêntica”, assinale a alternativa COR-


RETA:

a) Propõe quatro caminhos para a felicidade: vida aprazível, vida en-


gajada, vida com sentido e vida realizadora.
b) A vida engajada está relacionada às atividades que desenvolve-
mos e nosso grau de envolvimento com elas.
c) A busca por sentido não pode ser considerada um caminho para a
felicidade.
d) Foi a segunda teoria sistematizada por Martin Seligman, sendo
desenvolvida a partir da teoria do Florescimento.

2 Uma das teorias que investigou os fatores determinantes da felicida-


de foi proposta por Sonja Lyubomirky, psicóloga da Universidade
da Califórnia. Sobre o exposto, assinale a alternativa CORRETA:

a) É uma teoria determinista, pois não acredita na liberdade dos indi-


víduos em buscar ações intencionais para a sua felicidade.
b) Compreende os fatores determinantes da felicidade crônica como
sendo: relacionamentos, cumprimento de metas, circunstâncias
da vida e escolhas.
c) Demonstrou que, ainda que existam fatores genéticos e ambien-
tais determinantes, 40% da felicidade dos indivíduos depende de
suas escolhas (ações intencionais).
d) Caso o indivíduo venha de uma família de pessoas depressivas, é
impossível alcançar um nível de felicidade alto.

39
Psicologia Positiva

3 Muitos estudos apontam para a importância da experiência de


emoções positivas em nossas vidas, como a teoria “Ampliar e
Construir”. Sobre essa teoria, assinale a alternativa CORRETA:

a) Ao experenciar emoções positivas, nos tornamos permanente-


mente felizes.
b) Quando ampliamos a nossa consciência por meio das emoções
positivas, podemos construir novos recursos pessoais, nos tor-
nando mais resilientes às adversidades, por exemplo.
c) A teoria “Ampliar e Construir” foi proposta a partir das pesquisas da
professora Sonja Lyubomirky.
d) A teoria explica que se deve ampliar as emoções positivas e extin-
guir as emoções negativas, pois estas não servem ao indivíduo.

4. Sobre a teoria PERMA, proposta por Seligman, classifique V para


as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Essa teoria propõe o objetivo da Psicologia Positiva, como ava-


liar e produzir o florescimento humano.
( ) Seligman faz a mudança do estudo da felicidade para o estudo
do “bem-estar”.
( ) A felicidade continua sendo elemento central da Psicologia Po-
sitiva.
( ) PERMA significa caminhos possíveis para alcançar o bem-estar,
sendo eles: Emoções Positivas, Engajamento, Relacionamentos
Positivos, Significado e Realização.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) V - V - F - V.
b) F - V - V - V.
c) V - F - F - F.
d) F - F - F - V.

40
Capítulo 1 PSICOLOGIA POSITIVA: ORIGEM E PRINCÍPIOS BÁSICOS

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Este primeiro capítulo teve por objetivo introduzir a Psicologia Positiva em suas
bases gerais, considerando os aspectos políticos dentro da ciência em sua época de
fundação formal enquanto disciplina, lembrando que apesar de ser um movimento
recente na história científica, tem precursores filosóficos desde a Grécia Antiga.

Passamos assim a compreender que nem sempre a Psicologia considerou os


aspectos positivos do desenvolvimento humano. Nesse sentido, a Psicologia Positiva,
liderada inicialmente por Martin Seligman e Mihaly Csikszentmihalyi, vem buscar em
uma perspectiva atualizada e empírica evidências científicas de que somos porta-
dores de forças e virtudes, as quais podem elevar nosso bem-estar e propiciar uma
sociedade em que as pessoas possam florescer.

Assim, lançado o manifesto inicial, nos anos 2000, o que se vê é uma prolifera-
ção de pesquisas empíricas com ênfase em emoções positivas, bem-estar, qualidade
de vida, forças, virtudes etc. Uma avalanche de estudos traz evidências quanto aos
aspectos ignorados socialmente até então. A ciência se põe em movimento, propondo
quase que diariamente novas teorias, que buscam comprovação em mais pesquisas
e trazem elementos claros de que os aspectos bons dos seres humanos e a “vida
boa” é possível, mas não de forma passiva ou mágica: necessita comprometimento
individual, pactos coletivos e sociais em prol do florescimento.

Isto é demonstrado neste capítulo pelas teorias propostas por Seligman, Fredri-
ckson e Lyubomirsky, que em suas diferenças e semelhanças trazem a complexidade
do que é “ser feliz”, passando pela necessidade do engajamento em ações intencio-
nais. Ser feliz requer trabalho!

Até aqui observamos o “lado bom” da vida, negligenciado pela ciência que de-
veria estudá-lo. Isso não significa, porém, que se deve negligenciar os aspectos ne-
gativos que acontecem ao nosso redor. Nessa direção, podemos recair ao que vem
sendo chamado de Positividade Tóxica, uma imposição em ser positivo sempre. Não
é disso que se trata a Psicologia Positiva. A Psicologia Positiva se trata de reconhecer
emoções positivas, nossas forças e virtudes, relacionamentos positivos, ter um propó-
sito, engajar-se em atividades significativas etc., aspectos esses que são formas de
desenvolvermos nossos recursos internos para aprender a lidar com as adversidades
e desfrutar também os bons momentos da vida.

41
Psicologia Positiva

REFERÊNCIAS
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(Org.). Psicologia Positiva aplicada à Psicologia Clínica. São Paulo: Leader,
2018.

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42
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43
Psicologia Positiva

44
C APÍTULO 2
CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Identificar fatores protetivos e aspectos facilitadores de mudanças nos sujeitos,


instituições e comunidades.

 Identificar suas forças de caráter e compreender como desenvolver suas poten-


cialidades.

 Identificar e cultivar emoções positivas.

 Elaborar diário da gratidão.


Psicologia Positiva

46
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
“A felicidade se espalha. Quando nós escolhemos a felicidade, fica mais fácil
para os outros também escolhê-la” (ARCHOR, s.d., s.p.).

Vimos no primeiro capítulo as origens e consolidação da Psicologia Positiva


enquanto campo científico, por meio de teorias e conceitos que foram investiga-
dos e comprovados rigorosamente. No entanto, a Psicologia Positiva tem como
missão fazer as pessoas “florescerem”, isto é, fomentar maiores índices de bem-
-estar, realização e significado entre os seres humanos, reconhecendo suas po-
tencialidades individuais.

Objetivando cumprir sua missão máxima, os psicólogos e pesquisadores


em Psicologia Positiva formaram uma rede de colaboração para não somente in-
vestigar e divulgar para a comunidade científica os resultados levantados pela
ciência do bem-estar, mas também para espalhar essas informações ao maior
número possível de pessoas: educadores, coaches, consultores, empresários,
profissionais do desenvolvimento humano, enfim, todos interessados em desco-
brir e colocar em prática os benefícios apresentados por intervenções positivas.
Essas iniciativas visaram contribuir para o bem-estar das pessoas, desbravando
os muros acadêmicos, com o intuito de estimular uma cultura saudável, a partir do
reconhecimento das forças e virtudes dos seres humanos e caminhos possíveis
para elevarmos nossa felicidade.

Nesse sentido, muito foi alcançado desde o manifesto inicial do movimento


da Psicologia Positiva, quando Seligman assumiu a presidência da APA. Dessa
forma, esforços e parcerias foram realizados para que a mudança de paradigma
não fosse apenas um discurso, mas sobretudo práticas e fundamentos que levas-
sem as pessoas a uma vida mais plena.

Neste capítulo, mostraremos grandes contribuições da Psicologia Positiva de


ordem prática, identificando quais intervenções são eficazes para o aumento do
bem-estar e saúde dos indivíduos. Iniciaremos com uma abordagem inovadora,
em que pesquisadores conseguiram organizar uma grande classificação de forças
e virtudes humanas, universais, definindo assim potenciais de nossa espécie em
todas as culturas, configurando um embate direto às classificações psiquiátricas
da época (DSM). Posteriormente, serão abordados caminhos para o bem-estar,
como flow e mindfulness, perdão e gratidão, intervenções em gentileza, savoring,
autorrealização e sentido de vida. Tomados em conjunto, esses temas trazem as
práticas mais atuais em Psicologia Positiva, com efeitos benéficos tanto para indi-
víduos quanto para organizações.

47
Psicologia Positiva

2 FORÇAS DE CARÁTER E VIRTUDES


No artigo seminal da Psicologia Positiva, Csikszentmihalyi e Seligman (2000),
além de começarem a trazer a importância do viés do bem-estar como uma mu-
dança de paradigma na Psicologia contemporânea, começam a pontuar o que
vem a ser uma ambição daquele campo científico: estudar e compreender os tra-
ços pessoais positivos. Uma série de artigos são apresentados naquele momento
com o que havia de mais atual sobre como as características pessoais estavam
interligadas com o bem-estar.

Ainda não era o suficiente, de fato, foi apenas o princípio do desenvolvimento


de uma cultura das potencialidades humanas. Seligman se aproximou do pesqui-
sador Cristopher Peterson (1950-2012) com o intuito de realizar uma ambiciosa
tarefa: criar um manual ou guia de forças e virtudes humanas. Esse manual seria
um compêndio universal das potencialidades humanas, se constituindo em uma
clara crítica ao Código Internacional de Doenças (CID) e do Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais (DSM).

QUADRO 5 - 12 AÇÕES INTENCIONAIS PARA O BEM-ESTAR

QUADRO 5 - 12 AÇÕES INTENCIONAIS PARA O BEM-ESTAR

O Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais


está em sua 5ª edição. O DSM-5 é um manual diagnóstico e es-
tatístico feito pela Associação Americana de Psiquiatria para defi-
nir como é feito o diagnóstico de transtornos mentais. Usado por
psicólogos, fonoaudiólogos, médicos e terapeutas ocupacionais.
A versão atualizada saiu em maio de 2013 e substitui o DSM-IV
criado em 1994 e revisado em 2000. Desde o DSM-I, criado em
1952, esse manual tem sido uma das bases de diagnósticos de
saúde mental mais usados no mundo.

FONTE: <https://telemedicinamorsch.com.br/blog/dsm-5>. Aces-


so em: 17 mar. 22.

48
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

Para realizar tal empreitada, Seligman e Peterson dirigiram uma equipe de


50 psicólogos e pesquisadores com o objetivo de levantar e catalogar as forças de
caráter e virtudes universais na história da humanidade (KAMEI, 2014).

Inicialmente foram feitos estudos em literaturas tradicionais religiosas e filo-


sóficas, para buscar o que havia de comum e constante entre elas (SELIGMAN,
2004). O objetivo dessa fase do estudo era descobrir que virtudes eram comuns
nas diversas tradições, ocidentais e orientais, sem privilegiar nenhuma em espe-
cífico. Assim, encontrou-se seis virtudes humanas presentes em diversas cultu-
ras, a saber: 1) sabedoria e conhecimento; 2) coragem; 3) humanidade; 4) justiça;
5) temperança (ou moderação); e 6) transcendência.

As virtudes atuam como características humanas universais, ou seja,


padrões morais positivos que podem levar a uma vida significativa e car-
regada de bem-estar. Para a Psicologia, contudo, tais conceitos parecem muito
vagos quando se fala em características pessoais. Como diz o próprio Seligman
(2004, p. 154): “[...] para cada virtude podemos pensar em várias maneiras de al-
cançá-las, e o objetivo de desenvolver e medir nos leva a enfocar esses caminhos
específicos”.

Esses caminhos específicos para alcançar as virtudes foram descritos como


forças pessoais ou forças de caráter. Niemiec (2019, p. 32) traz uma definição
mais detalhada dessas forças:

As forças de caráter são características/capacidades positivas


que são pessoalmente enriquecedoras, não diminuem os ou-
tros, são universais e valorizadas em todas as culturas, e alinha-
das com diversos resultados positivos para si mesmo e outros.

Assim, Seligman e Peterson conseguiram por meio da colaboração de uma


equipe de 55 acadêmicos fazer uma pesquisa que resultou na obra intitulada Cha-
racter Strengths and Virtues: A Handbook and Classification (Forças de caráter e
virtudes: um manual e classificação). Nascia assim, no ano de 2004, um compên-
dio de 24 forças de caráter, conectadas as seis virtudes elencadas anteriormente.

FIGURA 2 - LIVRO CHARACTER STRENGTHS AND


VIRTUES: A HANDBOOK AND CLASSIFICATION

FONTE: <https://www.apa.org/pubs/books/4317046>. Acesso em: 14 jun. 2022.

49
Psicologia Positiva

O projeto culminou ainda a criação de um instrumento gratuito, o VIA Inven-


tory of Strengths (Inventário de Forças), um questionário que ranqueia as suas 24
forças pessoais.

Você pode realizar de maneira gratuita a sua avaliação de forças


e virtudes pelo site do Via Institute. Lembre-se que as cinco pri-
meiras forças são sua assinatura pessoal.
Acesse no link: https://www.viacharacter.org/survey/account/re-
gister

Na imagem a seguir, veremos quais são as forças pessoais e a que virtudes


elas estão ligadas:

FIGURA 3 - FORÇAS DE CARÁTER E VIRTUDES

FONTE: <https://canaldafelicidade.com.br/tabela-periodica-das-
24-forcas-de-carater/>. Acesso em: 17 mar. 2022.

No entanto, o que caracterizam as nossas forças pessoais? Seligman (2004,


p. 155) diz que as forças não devem ser confundidas com talentos, embora estes
últimos também sejam de interesse da Psicologia Positiva:

Talentos são mais inatos. Em sua maior parte, ou você tem


talento ou não tem; se não nasceu com um bom ouvido para
a música ou com os pulmões para ser um corredor de longa
distância, infelizmente existem limites severos em relação a
quanto pode ser adquirido. O que você consegue adquirir será
apenas um mero simulacro do talento. Isso não se aplica à

50
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

vontade de aprender, à prudência, à humildade ou ao otimis-


mo. Quando você adquire essas forças, elas se tornam reais.

Dessa forma, as forças de caráter podem ser desenvolvidas mais facilmente,


embora cada um de nós as tenha desenvolvido muito particularmente, de acordo
com a nossa história de vida pessoal. A seguir, observaremos no quadro a descri-
ção das forças, para compreender como elas estão presentes em nosso dia a dia
e em nossa maneira de ser individual.

QUADRO 1 - CLASSIFICAÇÃO VIA DAS FORÇAS DE CARÁTER E VIRTUDES

Sabedoria e conhecimento:
Forças cognitivas que envolvem a aquisição e utilização de conhecimento
Criatividade: pensar em maneiras inovadoras e produtivas de fazer as coisas.
Curiosidade: ter interesse por toda experiência em curso.
Senso crítico: pensar a respeito das coisas e examiná-las em todos os ângulos.
Amor ao aprendizado: dominar novas habilidades, tópicos e áreas do conhecimento.
Perspectiva: ser capaz de oferecer conselho sábio a outros.
Coragem:
Forças emocionais que envolvem o exercício da vontade para alcançar metas perante a
oposição, externa e interna
Honestidade/integridade: falar a verdade e apresentar-se de maneira genuína.
Bravura: não recuar perante ameaça, desafio, dificuldade ou dor.
Perseverança: terminar o que se começa.
Entusiasmo: abordar a vida com animação e energia.
Humanidade:
Forças interpessoais que envolvem ajudar e aproximar-se de outros
Bondade/generosidade: fazer favor e boas ações a outros.
Amor: valorizar relacionamentos próximos com outros.
Inteligência social: estar consciente dos motivos e sentimentos próprios e de outros.
Justiça:
Forças cívicas que fundamentam a vida comunitária saudável
Imparcialidade/justiça: tratar todas as pessoas da mesma maneira, de acordo com noções de
igualdade e justiça.
Liderança: organizar atividades em grupo e fazer com que aconteçam.
Trabalho em equipe: trabalhar bem como membro de um grupo e equipe.
Temperança/Moderação:
Forças que protegem contra o excesso
Perdão: perdoar aqueles que erraram.
Humildade: deixar as próprias realizações falarem por si.
Prudência: ser cuidadoso com as próprias escolhas; não dizer ou fazer coisas que poderão trazer
arrependimento mais tarde.
Autocontrole: regular o que se sente e o que se faz.
Transcendência:
Forças que estabelecem conexões com o universo maior e fornecem significado.
Apreciação da beleza e excelência: notar e apreciar a beleza, a excelência e/ou o desempenho
habilidoso em todos os domínios da vida.
Gratidão: ser consciente e grato pelas coisas que acontecem.
Esperança: esperar o melhor e trabalhar para alcançar o melhor.
Humor: gosta de rir e provocar; fazer outras pessoas rirem.
Espiritualidade: ter crenças coerentes acerca de um propósito maior e significado na vida.

FONTE: Adaptado de NIEMIEC (2019).

51
Psicologia Positiva

Assim, a Psicologia Positiva, por meio de pesquisa em diversos países e


culturas, observou a presença dessas forças de caráter e virtudes, sendo mis-
são desse novo campo científico ampliar a consciência das pessoas e institui-
ções quanto aos impactos positivos da aplicação das forças dos indivíduos para si
mesmos e para seus grupos sociais.

Um novo paradigma estava em questão: não somente olhar para as minhas


“fraquezas” ou “pontos de melhoria”, mas antes compreender o que eu tenho
como recurso pessoal (minha força de caráter) que, se potencializada, pode me
levar a caminhos mais prósperos. Como bem explica Rashid e Seligman (2019, p.
99): “Consertar os pontos fracos é remediação, enquanto cultivar as forças produz
crescimento e mais bem-estar”.

Desse modo, ao (re)conhecer as suas forças pessoais, o indivíduo pode bus-


car utilizá-las de modo a ampliar o seu bem-estar e contribuição social. Para isso,
veremos na seção seguinte o que são as forças de assinatura.

A ciência das forças de caráter


Neste vídeo curto, você poderá compreender de maneira objetiva
uma síntese sobre a importância da consciência de nossas forças
e virtudes, assim como o seu impacto em nosso meio social: ht-
tps://www.youtube.com/watch?v=3uhfNjahPAc&t=19s

2.1 AS FORÇAS DE ASSINATURA


Ao realizar o formulário VIA, na versão gratuita, você receberá um ranquea-
mento de suas forças pessoais, sendo as cinco primeiras as com maior amplitude
em seu jeito de ser. Tais forças foram chamadas pelos pesquisadores de “forças
de assinatura”, ou seja, com maior potencial para o seu florescimento.

Para validar o resultado de seu inventário, considerando as suas cinco pri-


meiras forças pessoais, Seligman (2004, p. 180) sugere ver se os seguintes crité-
rios se aplicam:

52
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

QUADRO 2 - CRITÉRIOS PARA IDENTIFICAR/VALIDAR SUA FORÇA DE ASSINATURA

Quando penso nesta força sinto:


• Um senso de participação e autenticidade (“Este sou eu”).
• Uma sensação de entusiasmo quando uma força está em ação, principalmente no início.
• Uma rápida curva de aprendizagem quando uma força é exercida em especial se for a primeira vez.
• Contínua aprendizagem de novas maneiras de pôr a força em prática.
• Vontade de encontrar meios de usar determinada força.
• Sentimento de inevitabilidade, quando empregando uma força.
• Fortalecimento em vez de exaustão, ao usar uma força.
• Criação e busca de realização de projetos pessoais que girem em torno de determinada força.
• Alegria, animação, entusiasmo e até mesmo êxtase quando do emprego de determinada força.

FONTE: Adaptado de Seligman (2004, p. 180-181).

Vamos para um exemplo prático? Vamos supor que as minhas forças de as-
sinatura sejam as seguintes:

1. Generosidade
2. Integridade/honestidade
3. Gratidão
4. Imparcialidade/justiça
5. Trabalho em equipe

A minha primeira força identificada foi a generosidade (ou bondade, em algu-


mas traduções), significando que sou uma pessoa que naturalmente gosto de aju-
dar e fazer favores a outras pessoas. Quando sinto que estou ajudando me sinto
entusiasmada, de forma natural, acabo sempre me oferecendo para resolver algo
ou ajudar (inevitabilidade do uso da força). Isto significa que, ao utilizar tal força pes-
soal, me sinto energizada e entro em estado natural de engajamento na atividade
ou situação em que estiver envolvida no momento. Tomando consciência disso, se
estou em um trabalho burocrático, por exemplo, com pouco contato com a equipe,
posso propor ajudar colegas com funções semelhantes. Outra saída para preen-
cher a minha vida com essa força seria buscar serviços voluntários, que vão me
fazer sentir mais entusiasmada, trazendo mais significado à minha vida.

Colocando em prática

Agora é a sua vez: após realizar o VIA, elenque as cinco primei-


ras forças e realize o exercício a seguir:

53
Psicologia Positiva

Pergunta-chave Força 1 Força 2 Força 3 Força 4 Força 5


Em que contexto você mais usa
essa força?
Em que contexto você menos
usa essa força?
Como você poderia usar essa
força em um novo contexto e de
forma diferente?

Identificar e compreender as nossas forças de caráter são, portanto, o ponta-


pé inicial para caminharmos rumo ao florescimento.

Forças de caráter: quais são e como elas contribuem para a sua


felicidade
[...]
O médico psiquiatra Leonardo Machado, professor da UFPE (Uni-
versidade Federal de Pernambuco), explica que as forças são tra-
ços universais que variam de intensidade de pessoa para pessoa
e que, quando colocadas em prática, elevam as emoções positivas
e contribuem para a satisfação com a vida. “Quando as ativamos,
tendemos a nos sentir bem pelo próprio fato de a força estar sen-
do acionada, e não apenas pelos resultados concretos que elas
podem trazer”, diz. Embora as forças sejam algo instintivo em nós,
podemos saber quais são as nossas principais e quais não temos
com tanta intensidade. Isso pode ser um fator fundamental para to-
mada de decisões, como escolher qual carreira seguir, ou mesmo
ser um divisor de águas em nossa vida pessoal.

A advogada e mediadora paranaense Vanessa Cristina Veit


Aguiar, 43, passou por uma mudança de rota profissional tendo
a aplicação de suas forças de caráter como guia. Atuando por
quase duas décadas com processos e litígios, ela não se sentia
realizada com a profissão. Com quadro clínico de estresse e um
diagnóstico de infertilidade na tentativa de engravidar do segundo
filho, ela decidiu deixar a advocacia, chegando a pedir exonera-
ção de um concurso público. Passou, então, a se dedicar ao tra-
tamento para engravidar e hoje tem uma filha de 2 anos e meio,
além de seu mais velho, de 9 anos.

54
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

Após a bem-sucedida decisão de investir no tratamento da gravi-


dez, Vanessa desejou voltar ao mercado de trabalho. Para tanto,
ingressou num curso de especialização em Psicologia Positiva,
quando teve a oportunidade de conhecer a ferramenta das forças
de caráter. “Descobri que as minhas forças de assinatura são in-
teligência social, perspectiva e integridade – o que me fez enten-
der o motivo pelo qual não me sentia motivada advogando com a
área litigiosa. Em um ambiente litigioso e competitivo, a força de
inteligência social não é eficiente. Pelo contrário, pode até atrapa-
lhar”, considera ela.

Com o conhecimento de suas forças, Vanessa elaborou um plano


de transição de carreira, sem precisar mudar de profissão. Atual-
mente, após se especializar em métodos consensuais para so-
lução de conflitos, ela abriu seu próprio escritório, onde atua na
área de direito das famílias, de forma colaborativa e extrajudicial.
“Nesse novo contexto, as minhas forças são grandes aliadas e
potencializam os meus atendimentos. Redescobri a advocacia e
agora posso dizer que sou apaixonada pela minha profissão”.
[...]

FONTE: <//www.uol.com.br/vivabem/noticias/reda-
cao/2022/02/14/forcas-de-carater-quais-sao-e-como-elas-contri-
buem-para-a-sua-felicidade.htm>. Acesso em: 18 mar. 2022.

1 Sobre o estudo das forças de caráter e virtudes, assinale a alterna-


tiva CORRETA:

a) Para se conhecer as virtudes humanas universais, os pesquisa-


dores investigaram inicialmente a literatura norte-americana, pois
ela é a fonte da Psicologia Positiva.
b) Ao total, foram classificadas seis virtudes universais humanas, si-
milares em diversas culturas: 1) amor e perdão; 2) coragem; 3)
humanidade; 4) bravura; 5) temperança; 6) transcendência.
c) Ao total, foram classificadas seis virtudes universais humanas, simi-
lares em diversas culturas: 1) sabedoria e conhecimento; 2) cora-
gem; 3) humanidade; 4) justiça; 5) temperança; 6) transcendência.
d) No estudo das forças de caráter, aprendemos a olhar as “fraquezas”
ou “pontos de melhoria”, para transformá-las em recurso pessoal.

55
Psicologia Positiva

3 FLOW E MINDFULNESS
3.1 FLOW: A PSICOLOGIA DO ALTO
DESEMPENHO
O conceito de Flow, vinculado a uma experiência psicológica ótima, foi de-
senvolvido e pesquisado majoritariamente pelo psicólogo Mihaly Csikszentmihalyi
(1934-2021) que, como vimos no Capítulo 1, é considerado o cofundador da Psi-
cologia Positiva. Quando criança, esse autor presenciou a Segunda Guerra Mun-
dial, sendo que essa experiência marcante e a possibilidade de estudar a psico-
logia de C. G. Jung, ainda vivo na época, foram fundamentais para a escolha da
Psicologia enquanto profissão e da pesquisa do bem-estar como foco central em
sua carreira acadêmica.

Ao investigar a felicidade e o bem-estar, Csikszentmihalyi traz o conceito de


Flow, ou estado de fluxo, uma experiência psicológica em que o homem se sente
em seu melhor desempenho, capaz de encarar até mesmo atividades rotineiras
como fonte de realização. Segundo o pesquisador, “Flow é um estado subjetivo
em que as pessoas relatam estar completamente envoltas em algo a ponto de es-
quecer o tempo, o cansaço e tudo mais, menos a atividade em si” (CSIKSZENT-
MIHALYI, 2014, s.p.).

Portanto, o estado de Flow, fluxo ou fruição, diz respeito ao nosso engaja-


mento em atividades, de tal forma que nossa consciência esteja totalmente fo-
cada naquela tarefa, nos dando a sensação de absorção e assim não vemos o
tempo passar. Esse estado é observado mais claramente em atletas e artistas,
que passam horas treinando ou executando uma obra, sem perder o foco, isto
é, a consciência está presente no momento da realização, não se perdendo em
nossos pensamentos.

O estado de Flow possibilita uma satisfação diferente do usufruto dos praze-


res ou emoções positivas, isto é, na experiência do prazer buscamos sentir uma
sensação boa já experimentada. No Flow, ao contrário, somos deparados com
algo desafiador, nunca realizado ou ainda tarefas antigas com novos obstáculos.
O desafio e a sensação de novidade podem trazer a um estado de satisfação com
a realização da tarefa.

Um artista que fica mais de 12 horas concentrado na pintura de um quadro,


um atleta desafiado a dar o seu melhor em uma partida com um adversário difícil,
conversas que nos levam a uma nova visão de mundo, tudo isso pode ser consi-
derado estado de fluxo, trazendo um novo sentido para a vida e suas dificuldades.

56
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

Foi isto que Csikszentmihaly percebeu ao analisar os reflexos da Segunda Guer-


ra nas pessoas: algumas, apesar das mazelas, seguiam a sua vida com certa satisfa-
ção, por encontrarem em suas atividades um sentido para continuar em frente.

E quando ocorre o Flow? Basta desempenhar alguma atividade? As pesqui-


sas apontaram certas condições para que nos sintamos completamente envolvi-
dos e absortos em alguma tarefa, descritas no quadro a seguir:

QUADRO 3 - ELEMENTOS DO ESTADO DE FLUXO (FLOW)

1. Alinhamento entre habilidades/ As atividades são desafiadoras, mas o indivíduo deve


capacidades e tarefa ser capaz de realizá-las.
2. A fusão entre a ação e consciência Porque somos capazes de realizar determinada tarefa,
conseguimos permanecer extremamente absortos em
sua realização, sem preocupações. A atividade se torna
espontânea, automática.
3. Metas claras e feedback A pessoa que está realizando a tarefa sabe quais
os seus objetivos, onde quer chegar e a cada passo
realizado tem um feedback (retorno) imediato, sabendo
se está indo bem ou não.
4. Concentração na tarefa do Foco completo na tarefa do momento, distrações e
momento (absorção) problemas externos não fazem parte deste estado ótimo.
5. Sensação de controle Como temos a clareza de nossas habilidades em
determinada tarefa, sentimos que temos o controle e
não temos medos ou preocupações.
6. Perda da autoconsciência Perdemos a noção de “eu” separada do ambiente,
não pensamos sobre nós separadamente: estou
completamente fusionado com a tarefa.
7. Transformação do tempo As horas parecem passar em minutos: tempo objetivo
é diferente do que eu experencio ao realizar algo com
muito envolvimento e espontaneidade.

FONTE: Adaptado de Csikszentmihalyi (2020).

Nesse sentido, o estado de Flow é uma experiência ótima porque ela é um


fim em si (CSIKSZENTMIHALYI, 2020). Eu realizo uma determinada atividade não
porque existirá uma compensação futura, mas porque o ato de realizá-la já me
traz satisfação.

O Flow é considerado um estado dinâmico e de descoberta: um movimen-


to constante entre nossas percepções acerca dos desafios e nossas habilidades
para as atividades, como mostra a Figura 4.

57
Psicologia Positiva

FIGURA 4 - O ESTADO DE FLUXO

FONTE: <https://www.researchgate.net/figure/Figura-3-Grafico-da-teoria-do-fluxo-Fonte-
Adaptado-de-Csikszentmihalyi-1990_fig3_301425521>. Acesso em: 22 mar. 2022.

Nesse diagrama, é possível perceber que, quando uma atividade é altamente


desafiadora e o indivíduo possui baixas habilidades, ele pode entrar em ansieda-
de. Em outra direção, quando as habilidades são altas, mas a atividade é pouco
desafiadora, podemos entrar em estado de tédio. Por fim, quando a atividade está
equilibrada, isto é, as habilidades são proporcionais aos desafios, é possível en-
trar em estado de Flow.

Essas relações não são estáticas, vejamos isto em um exemplo: vamos pen-
sar no A, como André, que iniciará o treino de corrida de rua. Ele começa ainda
com pouco preparo e treino, a atividade é desafiadora e ele tem poucas habili-
dades. No entanto, seu treinador pede que ele comece correndo uma volta de
300 metros e caminhando em seguida. Ele começa a entrar em estado de fluxo
nessa breve corrida. Podemos dizer que aqui ele está no nível A1 da figura. Com
o tempo, esse exercício fica fácil para ele e ele pode vir a se entediar, entrando
no estado A2 (tédio). No entanto, seu treinador vai aumentando progressivamente
as metas, de modo que ele pode oscilar inicialmente entre o A3 (ansiedade) e o
A1. Ao longo do ano de treinamento, André evolui e já consegue realizar corridas
de longa distância facilmente, estando no estado A4, que requer altas habilidades
e altos desafios. Percebe-se que mesmo alcançado este estado de fluxo, André
pode voltar a transitar nos demais estados quando a situação requerer mais habi-
lidades do seu desempenho.

Nesse sentido, as experiências de Flow estão vinculadas a um senso de des-


coberta, crescimento e desenvolvimento, comportando em um modelo dinâmico,
gerador de um senso de sentido e realização.

58
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

Flow - Estado de Fluxo - Mihaly Csikszentmihalyi - TED

Neste TED, você terá a oportunidade de ouvir Mihaly Csikszent-


mihalyi contando um pouco da sua história e de seu interesse
pela pesquisa sobre Flow. Acesse no link a seguir:
https://www.youtube.com/watch?v=BAljbVf-HXA

A partir da compreensão do estado de flow, suas características e dinâmica,


é possível pensar que essa condição de fruição pode estar vinculada a diversas
tarefas de nosso dia a dia, inclusive em nosso trabalho. Alinhar os desafios às
nossas habilidades pode ser a chave para acessarmos um estado de absorção
capaz de elevar nossa produtividade e bem-estar.

5 dicas para atingir o estado de flow, o ápice da produtividade

1. Mente e corpo saudáveis e descansados


Para que o estado de flow ocorra é importante que o corpo esteja
descansado e devidamente nutrido para garantir um bom funcio-
namento cerebral. Manter a concentração por longos períodos de
tempo é algo que exige energia do cérebro, portanto, noites mal
dormidas, excesso de trabalho e ausência de intervalos entre as
atividades não favorecem o ápice da produtividade. Além disso,
distrações internas, como preocupações, estresse e ansiedade,
também acabam “ocupando” o cérebro e ativando circuitos que
dificultam os momentos de flow.

2. Ambiente livre de distrações


Como o flow se caracteriza como um estado mental de atenção ple-
na, um ambiente com muitas distrações e interrupções vai dificultar
que ele ocorra em sua plenitude. Por isso, é importante ter janelas
de trabalho no qual seja possível manter-se focado na atividade, li-
vre de notificações, ruídos, pop-ups, telefonemas, mensagens ins-
tantâneas e conversas de terceiros. Técnicas de meditação e mind-
fulness também são válidas para potencializar o processo.

3. Evitar o multitasking
O cérebro só é capaz de focar em uma atividade por vez, por

59
Psicologia Positiva

isso, o ideal é evitar fazer várias coisas ao mesmo tempo. Esse


tipo de prática acaba gerando fadiga mental e aumentando a im-
produtividade. Além disso, é mais difícil entrar em um estado de
subconsciência enquanto a mente é alvo de estímulos diferentes.

4. Objetivos claros e feedback imediato


Uma característica importante do flow é a necessidade de moni-
toramento do sucesso e do progresso da atividade que está sen-
do realizada. Por isso, é importante ter clareza sobre qual é o
objetivo final da tarefa que está sendo executada. Assim, ficará
mais fácil identificar se as coisas estão progredindo na direção
certa, bem como realizar um autofeedback.

5. Desafio na medida certa e interesse na atividade


Só é possível entrar no estado de flow se o desafio em questão for
compatível com as habilidades do indivíduo. Ou seja, a meta deve
ser viável, caso contrário, a frustração e o medo tomarão conta da
mente, impedindo a concentração. Além disso, o flow só acontece
quando existe motivação e interesse na tarefa, seja ela qual for.
Fazer algo por obrigação dificilmente levará ao estado de fluxo.

FONTE: <https://forbes.com.br/carreira/2021/08/5-dicas-para-a-
tingir-o-estado-de-flow-o-apice-da-produtividade/>. Acesso em:
22 mar. 2022.

Agora que você já conhece o estado de flow, tente lembrar das


atividades que fazem com que você entre nesse estado e como
você pode usufruir delas em seu dia a dia. A seguir, algumas
questões que podem lhe ajudar:

• Quando você se sente motivado e energizado?


• Quando você fica tão concentrado, ao ponto de perder a noção
do tempo, “esquecendo-se da vida”?
• Quando você está em seu melhor desempenho?

60
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

3.2 MINDFULNESS: O ESTADO DE


ATENÇÃO PLENA
Uma prática que está sendo muito disseminada no século XXI é o mindful-
ness, termo da língua inglesa que significa “atenção plena”. Muitos estudos têm
sido realizados sobre esse estado de consciência, que resultou das tradições
orientais de meditação. Precisamos entender, no entanto, que um conceito, quan-
do transposto de uma cultura para outra, pode ser distorcido e distanciado do que
inicialmente lhe foi proposto.

Souza Filho e Pacheco (2018, p. 135) explicam que o termo mindfulness foi
ocidentalizado a partir da tradução para o inglês da linguagem budista Pali Sati,
significando consciência, atenção e lembrança. Segundo os autores, consciência
e atenção andam interligadas, na medida em que a atenção tira “fotografias” da
consciência, focalizando certas experiências por um dado momento de tempo. Já
a lembrança significa o fato de se lembrar de prestar atenção, demonstrando o
aspecto intencional do mindfulness.

A prática de atenção plena vem chamando a atenção do mundo ocidental


por ser uma perspectiva diferente de experimentar a realidade, trazendo vários
benefícios para ansiedade, estresse e outras mazelas de nossa sociedade. Di-
versas definições foram construídas a fim de aproximar a cultura do oriente para
o ocidente, a partir de seu conceito original, na linguagem budista Pali Sati. De
modo sintético, essas conceituações têm em comum a ideia de que mindfulness
é a consciência da experiência do momento a momento, sem julgamento e
com aceitação.

Essa consciência requer do praticante processos de aceitação tanto das expe-


riências positivas quanto das experiências negativas, à medida que que surgem no
campo atencional. O que pesquisadores têm notado é a sua capacidade terapêuti-
ca, ligada à aceitação e exploração com equanimidade, discernimento e gentileza,
tanto nos pensamentos quanto emoções, sensações corporais, narrativas pessoais,
independentemente de sua valência (SOUZA FILHO; PACHECO, 2018).

O objetivo da prática do mindfulness no contexto da psicologia positiva


é abandonar o piloto automático da mente (conceitualizações e julgamentos
com referências em experiências passadas ou expectativas futuras). Para
isso, devemos nos atentar a três características do mindfulness: 1) intenção, 2)
atenção e 3) atitude (SOUZA FILHO; PACHECO, 2018). A figura a seguir demons-
tra a relação e define essas características.

61
Psicologia Positiva

FIGURA 5 - CARACTERÍSTICAS CENTRAIS DE MINDFULNESS

FONTE: A autora.

Dessa forma, o estado de mindfulness, ou atenção plena, nos permite estar


atentos no momento presente, sabendo o porquê estamos fazendo algo, obser-
vando a experiência com atitude curiosa, questionando-a e abrindo-se em uma
atitude de aceitação e amor com relação ao momento presente.

Podemos nos perguntar o que isso traz como efeito em nossas vidas e qual
interesse na Psicologia nesse tipo de prática. Estar presente em nossas experiên-
cias nos permite estar conscientes de nossas emoções, muitas vezes emaranha-
das em nossos pensamentos e situações, aceitando o que podemos e o que não
podemos mudar. Vejamos o exemplo proposto por Rashid e Seligman (2019, p.
263) sobre desenvolver consciência sem julgamento:

estar consciente de uma interação negativa com um amigo


pode nos ajudar a ver a perspectiva mais ampla. Talvez a in-
teração negativa não tenha sido causada por alguma coisa
que fizemos. Em vez disso, pode ser que nosso amigo tenha
ficado perturbado com alguma coisa que absolutamente não
está relacionado a nós. Estando conscientes, separamos uma
experiência complexa em partes, possibilitando que fiquemos
abertos para ampliar nossa perspectiva. Mindfulness pode for-
talecer nossa abertura, autorregulação e inteligência social.

As práticas de mindfulness estão sendo investigadas e inseridas tanto em


práticas clínicas quanto em organizações. Seus benefícios já são reconhecidos e
sedimentados na Psicologia Positiva. No entanto, apesar de orientações simples
e de fácil prática para os indivíduos, necessita-se de acompanhamento profissio-
nal, especialmente se a pessoa que quiser utilizar os benefícios dos exercícios de
atenção já estiver em adoecimento emocional.

62
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

FIGURA 6 - COMO INICIAR A PRÁTICA DE MINDFULNESS

FONTE: <http://www.professoresinquietos.com.br/mindfulness/>. Acesso em: 17 mar. 2022.

Estudo reforça que mindfulness ajuda a aplacar conflitos internos

A partir de um teste feito com 121 voluntários, estudiosos da Uni-


versidade de Quebec viram que o grupo adepto da prática se saiu
melhor em situações de crise.

No último dia 14 de março, um estudo sobre como a meditação


mindfulness auxilia momentos de crises pessoais foi publicado
no periódico Social Psychological Bulletin. Feito por três alunos

63
Psicologia Positiva

do departamento de psicologia da Universidade de Quebec, no


Canadá. O trabalho reforça que a meditação é uma ferramenta
importante para lidar com empecilhos emocionais.
[...]
Em outro momento, os participantes foram separados em dois gru-
pos, que fizeram atividades durante 15 minutos. Uma turma passou
esse tempo fazendo um exercício de meditação chamado mindful-
ness body scan, em que a pessoa foca no presente e em sensações
de cada parte do corpo por vez. A outra parte leu revistas.

Na sequência, foram apresentados a ambos os grupos cenários


imaginários que os colocariam em crise interna ao ameaçar seus
objetivos. Eles então responderam a um questionário sobre como
se sentiam sobre isso.

Os estudiosos constataram que o grupo que lidou significativa-


mente melhor com os empecilhos foi aquele que praticou a medi-
tação. “Este estudo fornece a primeira evidência de que mindful-
ness não é apenas um preditor de crises de ação, mas também
pode influenciar como as pessoas lidam com elas”, explicam os
autores no estudo.

Fonte: <https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/Comporta-
mento/noticia/2022/03/estudo-reforca-que-mindfulness-ajuda-
-aplacar-conflitos-internos.html>. Acesso em: 24 mar. 2022.

1 Sobre flow e mindfulness, classifique V para as sentenças verda-


deiras e F para as falsas:

( ) Uma das características do mindfulness é a lembrança, visto


que precisamos estar atentos ao nosso passado para trazê-lo ao
presente.
( ) O estado de flow é uma experiência ótima porque possibilita um
planejamento para uma experiência futura.
( ) Mindfulness é a consciência da experiência do momento a mo-
mento, sem julgamento e com aceitação.
( ) O estado de flow diz respeito ao nosso engajamento em ativida-
des, de tal forma que nossa consciência esteja totalmente focada
naquela tarefa.

64
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:


a) F - F - V - V.
b) V - F - F - V.
c) F - V - V - F.
d) V - V - F - F.

4 GRATIDÃO E PERDÃO
Gratidão e perdão são forças pessoais vinculadas às virtudes transcendência
e temperança, respectivamente. Apesar de estarem conectadas às características
pessoais, as pesquisas pontam como processos cognitivos e afetivos que podem
ser realizados por meio de práticas terapêuticas. A Psicologia Positiva percebeu
o potencial dessas forças e obteve resultados satisfatórios das intervenções de
gratidão e perdão no bem-estar dos indivíduos.

Dentre todas as intervenções positivas, podemos afirmar que a gratidão é


uma das quais produz efeitos de bem-estar mais duradouros nos indivíduos. Mas
como se define uma pessoa grata? Igualmente a outros conceitos, o termo “gra-
tidão” tem se popularizado em grande proporção, podendo ser simplificado ou
ainda aliado à “positividade tóxica”.

Vamos ver aqui o que a Psicologia Positiva entende por gratidão e como as
suas intervenções têm sido eficazes.

QUADRO 4 - DEFINIÇÕES DE GRATIDÃO NA PSICOLOGIA POSITIVA

“Gratidão é um estado mental positivo de agradecimento por experiências de vida, adversas ou


de risco, vinculadas à memória das lembranças afetivas que aumentam o bem-estar subjetivo”
(VAZQUEZ et al., 2019, p. 392).
“Gratidão é uma experiência de agradecimento, que envolve notar e valorizar coisas positivas na
vida” (RASHID; SELIGMAN, 2019, s.p.).
“Gratidão faz parte de uma orientação de vida mais ampla para perceber e apreciar o positivo no
mundo” (WOOD; FROH; GERAGHTY, 2010, p. 890).
“Ser consciente e grato pelas coisas que acontecem” (NIEMIEC, 2019 apud HSM, 2022, s.p.).

FONTE: A autora.

As definições apresentadas demonstram que a gratidão tem aspectos cogni-


tivos, pois está vinculada à forma de significação e reconhecimento da realidade
tal qual ela se apresenta ao indivíduo. Um estado de disposição com relação à
vida. Ao mesmo tempo, possui aspectos afetivos, por se tratar de um estado men-
tal positivo.

65
Psicologia Positiva

O que se tem observado nas pesquisas é que a gratidão amplia a perspecti-


va mediante as adversidades, desenvolve emoções positivas, cognição, além de
oferecer aspectos protetivos para saúde mental (NIEMIEC, 2019, p. 184).

Diante dessas observações, a gratidão se torna um elemento promissor nas


pesquisas sobre bem-estar, e os estudiosos começam a investir também em inter-
venções clínicas para compreender se a gratidão é passível de ser desenvolvida
e se dessa forma pode elevar o bem-estar crônico das pessoas.

Duas são as intervenções mais reconhecidas para elevar a gratidão: 1) a car-


ta de gratidão e 2) o diário de gratidão.

A carta de gratidão consiste em uma carta a ser escrita de próprio punho a al-
guém significativo em sua história e a qual você não agradeceu deliberadamente.
Nessa carta você deve definir em termos específicos as razões pelas quais você
se sente grato por essa pessoa, como está sua vida agora e como você se lembra
dela. Após a escrita, é recomendado que agende uma visita e leve até a pessoa
e, em momento oportuno, faça a leitura da carta para ela. Essa intervenção é
bastante utilizada na proposta da “psicoterapia positiva” e possui efeitos benéficos
para pessoas em sofrimento psiquiátrico, pacientes cardíacos, depressão, ansie-
dade, diminuição de índices de cortisol (hormônio liberado em situações estres-
soras), conforme os artigos elencados por Rashid e Seligman (2019, p. 11-19). É
importante frisar que essa intervenção se reverbera em emoções positivas tanto
no momento da confecção da carta quanto na leitura dela, trazendo elevação de
bem-estar imediato.

A segunda intervenção muito recomendada e investigada por pesquisadores


é o diário de gratidão, ou diário de bençãos. Existem várias maneiras de realizar
esta prática, mas a mais conhecida e estudada é o registro de três coisas pelas
quais o indivíduo se sente grato, ao final do dia. Diferente da intervenção anterior,
os efeitos no bem-estar não são imediatos, no entanto, ao se tornar uma rotina,
leva a efeitos mais duradouros de bem-estar, pois envolve uma mudança cogni-
tiva ao longo do tempo. Na sequência, apresentamos um quadro com um mode-
lo de diário recomendado pelos pesquisadores da Psicologia Positiva, que você
pode utilizar e adaptar em um caderno próprio.

66
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

QUADRO 5 - MODELO DE DIÁRIO DE GRATIDÃO

Diário de Gratidão
Escreva três dádivas (coisas boas) todas as noites antes de dormir. Ao lado de cada dádiva,
escreva pelo menos uma coisa boa sobre:
• Por que essa coisa boa aconteceu hoje? O que isso significa para você?
• O que você aprendeu ao dedicar algum tempo para nomear essa dádiva ou coisa boa?
• Em que aspectos você ou outras pessoas contribuíram para essa dádiva ou coisa boa?
Data: ___/___/___
1ª Dádiva: Reflexão:

2ª Dádiva: Reflexão:

3ª Dádiva: Reflexão:

FONTE: Adaptado de Rashid e Seligman (2019, p. 269).

Que tal fazer uma experiencia científica na Psicologia Positiva?


1) Anote como você observa sua vida hoje: o que precisa melhorar,
como se sente, como estão seus relacionamentos e suas condições.
2) Reserve seu caderno e realize o diário de gratidão por um período
de 30 dias consecutivos, sempre antes de dormir. Se esquecer
algum dia, retome assim que lembrar.
3) Após esse período, observe o que mudou em você e em sua vida,
especialmente suas percepções. Como no passo 1, anote como
está sua vida após os 30 dias. Compare a escrita e veja as mu-
danças que ocorreram. Lembre-se que até mesmo as pequenas
transformações contam.
Continue a experiência como um propósito para elevar seu bem-estar

Falamos até aqui da gratidão como um fator de alto potencial para o bem-
-estar. Outra força nesse sentido é o Perdão, considerado por muitos uma virtude
inalcançável, tratando-se de um processo de mudança cognitiva que impacta nas
emoções, libertando o indivíduo de rancores e prisões emocionais geradoras de
hostilidade, raiva, medo, dentre outras emoções negativas que levam ao adoeci-
mento psíquico.

Deve-se ter claro que o perdão não se trata de esquecer a situação ocorrida,
nem justificar o que o agressor fez, mas modificar sua visão sobre o evento em
si, comprometendo-se com a responsabilidade sobre seu bem-estar. Conforme
explica Nunes (2018, p. 114):

67
Psicologia Positiva

É importante lembrar que perdoar não é esquecer, quando


você decide perdoar não irá somente esquecer a ofensa prati-
cada, mas não se sentirá mais ferido ou magoado a cada vez
que pensar no evento, e perdoar não é se reconciliar com o
ofensor, pois nem sempre será possível voltar a ter a mesma
convivência e confiança anterior à agressão.

Como se trata também de um conceito muito difundido em nossa sociedade,


considerando a cultura religiosa na qual estamos inseridos, vamos também pontu-
ar aqui como a Psicologia Positiva tem definido o perdão.

QUADRO 6 - DEFINIÇÕES DE PERDÃO NA PSICOLOGIA POSITIVA

“Como resposta, o perdão pode ser entendido como uma mudança pró-social nos pensamentos,
emoções e/ou comportamentos da vítima com relação a um transgressor censurável”
(MCCULLOUGH; WITVLIET, 2002, p. 446).
“O perdão é um processo de mudança, e não um evento” (RASHID; SELIGMAN, 2019, p. 269).
“Ação de perdoar aqueles que erraram” (NIEMIEC, 2019, s.p.).

FONTE: A autora.

A sabedoria popular diz “Errar é humano, perdoar é divino”. Essa


crença pode trazer certa estranheza ao se falar de perdoar, no
entanto, encará-lo como um processo de mudança de nossos
pensamentos, emoções e comportamentos com o intuito de libe-
rar emoções negativas e potencializar aspectos positivos da vida
é essencial para o bem-estar. Para algumas pessoas esse pro-
cesso pode ser mais fácil, para outras é mais árduo: isto aponta a
importância das características pessoais como variável mediado-
ra do perdão. Apesar da relevância dos traços individuais, todos
somos capazes de perdoar ou pedir perdão. É importante sempre
uma ajuda profissional, especialmente nos casos que envolvem
situações morais difíceis.

Não consegue perdoar? Coloque em prática essas 6 dicas e re-


solva o problema.

Aceitar um pedido de desculpas por algo ruim que alguém fez é


uma provação para muita gente. Alguns até querem passar uma
borracha por cima da questão, mas não sabem muito bem como.
Outros resistem a perdoar enquanto vão acumulando mágoa e

68
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

ressentimento, o que afeta relacionamentos amorosos e familia-


res e até mesmo a qualidade de vida. Para se ter ideia do impacto
até mesmo na saúde, as mágoas e os ressentimentos são ge-
radores de estresse, que causam respostas fisiológicas de de-
fesa, com adrenalina e noradrenalina. Tais substâncias, quando
produzidas em quantidades excessivas, podem provocar reações
adversas no organismo, como elevação na pressão arterial, alte-
ração nos processos.

De fato, perdoar não é um processo fácil, mas pode fazer bem ao


seu corpo. Para facilitar as desculpas, veja a seguir seis dicas:

1. Não encare como fraqueza. Esqueça a ideia de que pedir perdão


é uma atitude de fraqueza. Pelo contrário, revela firmeza de ca-
ráter, maturidade emocional, resiliência e disposição para evoluir.

2. Entenda que toda história tem dois lados. Cada pessoa é única,
com as próprias deficiências e dificuldades, e carrega uma visão
particular de mundo. Por isso, antes de julgar o outro, é preciso
exercer a empatia e compreender que um ato que lhe pareceu
cruel ou ofensivo pode não ser resultado de uma intenção nociva.

3. Tente ver lado humano. Busque enxergar o lado humano de quem


quer suas desculpas. Nem sempre uma relação é calcada na re-
ciprocidade, no respeito, na flexibilidade e na empatia. Todo mun-
do é capaz de errar – se você parar para refletir, talvez também
tenha magoado alguém ao longo da vida. O que importa é pro-
curar sempre aprimoramento pessoal e relacional. Todos somos
passíveis de mudanças, sendo assim, se precisar perdoar, com-
prometa-se a dar uma segunda chance para a pessoa modificar
o comportamento.

4. Em um grupo de amigos, a falta de perdão pode prejudicar comple-


tamente a dinâmica de interações, dificultando a espontaneidade
e a manifestação de afetos. Numa família, a falta de perdão é
algo que pode se estender às próximas gerações, afetando rela-
ções futuras. Se recusar a perdoar leva à perda da possibilidade
de aprendizado, de conhecer mais a si e o outro. Entrar em con-
tato com a própria humanidade pode ser um primeiro passo que
vai ajudar a identificar mais facilmente como enfrentar a situação.

5. Dê uma chance para explicações. Ainda que tenha a ideia fixa de


não aceitar nenhum pedido de desculpas, não custa nada ouvir o

69
Psicologia Positiva

que o outro tem a falar. Com a escuta, a percepção do ocorrido


pode ser muito diferente. Inclusive, por meio do diálogo, vocês
podem juntar os dois lados e as duas experiências e pensar em
estratégias mais efetivas para resolver o problema. Atenção: é
fundamental organizar as emoções antes da conversa, pois isso
reduz o risco de projetar questões que são apenas suas no outro.

6. Perdoe-se primeiro. Se você não conseguir desculpar a si mesmo


por certas atitudes que tomou – como xingar ou ofender –, conti-
nuará com dificuldade de perdoar outra pessoa.

FONTE: <https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/reda-
cao/2020/11/21/nao-consegue-perdoar-coloque-em-pratica-es-
sas-6-dicas-e-resolva-o-problema.htm?next=0001H249U11N>.
Acesso em: 26 mar. 2022.

1 Sobre a gratidão e o perdão, a partir da psicologia positiva, classifi-


que V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) O perdão pode ser definido como um processo, e não um evento.


( ) A gratidão é uma força inata, não sendo possível o seu desenvol-
vimento, por isso existem pessoas mais gratas que outras.
( ) O perdão é uma forma de se esquecer o que se passou, anulan-
do o evento negativo.
( ) A gratidão pode ser considerada um fator protetivo para o adoe-
cimento mental.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) F - F - V - V.
b) V - F - F - V.
c) F - V - V - F.
d) V - V - F - F.

70
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

5 INTERVENÇÕES EM GENTILEZA E
SAVORING
FIGURA 7 - GENTILEZA

FONTE: <https://br.pinterest.com/pin/671106781950533859/>. Acesso em: 27 mar. 2022.

A gentileza se tornou um importante alvo de investigação dentro da Psico-


logia Positiva, devido a seu efeito benéfico para o bem-estar dos indivíduos, es-
pecialmente por gerar efeitos positivos tanto em quem é gentil quanto naquele
que recebe o ato de gentileza. Podemos definir gentileza como “uma virtude, uma
força, profundamente ligada a uma orientação do eu para o outro” (CAZASSA et
al., 2018, p. 102).

Confira no link https://www.youtube.com/watch?v=eLuZsK0ewF4


o vídeo: A Gentileza é um propósito que transforma. Neste ví-
deo, você verá a história de Luiz Gabriel e o papel da gentileza
em sua história inspiradora, que se tornou mais significativa após
o encontro com o profeta Gentileza, no Rio de Janeiro.

A gentileza também pode ser compreendida como bondade, que vimos no


início deste capítulo, sendo considerada uma força de caráter que envolve o com-
portamento de realizar ações positivas em favor do outro. Por esse lado, a gentile-

71
Psicologia Positiva

za pode ser entendida também como uma postura altruísta, conectada à empatia,
inteligência social e, ainda, um senso de coletivismo muitas vezes esquecido em
nossa rotina moderna.

As pesquisas sobre os efeitos da gentileza, para além dos benefícios relata-


dos pelos indivíduos, conseguiu constatar também mudanças nos mecanismos
neurais a partir de práticas de gentileza em nosso cotidiano, ativando regiões do
cérebro e realizando interações que traduzem a gentileza como felicidade (CA-
ZASSA et al., 2018, p. 106-109).

Na Psicologia Positiva, algumas estratégias podem auxiliar a produção de


mais gentileza em nosso dia a dia, como a meditação da gentileza amorosa, um
desdobramento de mindfulness em que se contempla o presente e medita em pa-
lavras que emanam bondade e amor às pessoas.

Meditação Gentileza Amorosa


Assista ao vídeo e experimente a meditação da gentileza amo-
rosa, depois registre como se sentiu. Faça durante alguns dias e
perceba como se sente ao longo do processo.
Acesse no link: https://www.youtube.com/watch?v=TzMXTJlCX6E

A meditação da gentileza amorosa propõe uma mudança cognitiva e afetiva,


interna, para mudarmos nossa visão e fomentar a empatia com as pessoas ao nos-
so redor. Outras intervenções seriam ações intencionais de ajudar os outros em
nossa casa, trabalho, além de altruísmo/voluntariado em situações diferentes das
quais nos encontramos, promovendo uma transformação em nossa perspectiva.

72
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

FIGURA 8 - COMO SER GENTIL

FONTE: <https://extra.globo.com/noticias/saude-e-ciencia/gentileza-
pesquisa-mostra-que-ser-bondoso-ativa-sistema-de-recompensas-
do-cerebro-24071912.html>. Acesso em: 27 mar. 22.

Outra intervenção proposta pela Psicologia Positiva é o Savoring, termo em


inglês que pode ser traduzido como “Saborear”, que significa “[...] um processo
consciente de atenção e apreciação das experiências positivas em nossas vidas”
(BRYANT, 2003 apud RASHID; SELIGMAN, 2019, p. 212).

A experiência de “Saborear” ou “Sorver” pode acontecer de diversas manei-


ras: quando compartilhamos com outros nossas experiências, focalizar os aspectos
positivos dos eventos de nossa vida, relaxando e celebrando o que deu certo, nos

73
Psicologia Positiva

maravilhando e admirando a beleza ao nosso redor, as virtudes de outras pessoas


que possuem qualidades admiráveis.

De modo prático, ao apreciar o presente, em cada particularidade apresenta-


da, exercendo a gratidão, recordando eventos que nos traz orgulho ou bem-estar,
realizaremos técnicas de savoring.

Para utilizar o savoring para o nosso bem-estar, é necessário um engajamento


ativo, intenção e autoconhecimento, como toda intervenção em Psicologia Positiva.

Pensando em “saborear” mais a sua vida, apresentamos algumas


questões para você colocar em prática essa técnica:
• Quais momentos você poderia compartilhar com amigos/familiares?
• Quais pessoas você admira e por quê?
• Quais conquistas você gostaria de compartilhar com outros?

1 Sobre a gentileza e savoring, classifique V para as sentenças ver-


dadeiras e F para as falsas:

( ) Savoring é o ato de buscar prazer em experiências imediatas.


( ) A gentileza pode ser considerada como bondade direcionada aos
outros.
( ) A gentileza deve ser entendida como ações para o bem-estar,
porém faltam pesquisas para comprovar sua eficácia.
( ) Savoring ou saborear, pode ser realizado ao compartilhar bons
momentos com pessoas próximas.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) F - F - V - V.
b) V - F - F - V.
c) F - V - F - V.
d) V - V - F - F.

74
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

6 AUTORREALIZAÇÃO, PROPÓSITO
E SENTIDO DE VIDA
A perspectiva eudaimônica de bem-estar pode ser reconhecida ao falarmos
sobre uma vida próspera, permeada de propósito e significado, ou seja, um senso
de realização e apreciação da sua própria vida. Essa perspectiva está proposta
no modelo do PERMA, representado pelo M (Meaning), traduzido por significado
ou sentido.

A “Vida Significativa” emerge na Psicologia Positiva como um pilar estru-


tural, pois o sentido atribuído à existência possui um aspecto de transcendên-
cia que permite aos indivíduos lidar com adversidades de maneira resiliente
e positiva.

Portanto, a abordagem proposta pela Psicologia Positiva coloca o sentido de


vida como um caminho para a autorrealização, por meio da transcendência, o olhar
para fora de si em prol de um objetivo maior. Essa perspectiva assemelha-se aos
fundamentos da Logoterapia, terapia do sentido de vida, proposta pelo psiquiatra
Viktor Frankl (1905-1997), a partir da sua experiência em um campo de concentra-
ção nazista, na ocasião da Segunda Guerra Mundial.

FIGURA 9 - VIKTOR FRANKL

FONTE: <https://www.pensador.com/frase/MTY3Njk5Mg/>. Acesso em: 28 mar. 2022.

A partir de sua experiência traumática, Frankl transcende a si mesmo nos cam-


pos em que (sobre)viveu e começa a observar as estratégias de seus pares para a
sobrevivência, assim como a desistência de muitos, antes mesmo da morte chegar,
pela exaustão diante de condições hostis. O que ele percebe é que dar um sen-
tido ao sofrimento ali apresentado foi determinante para sua sobrevivência, mas,

75
Psicologia Positiva

sobretudo, para manter sua dignidade enquanto ainda permanecia vivo e resistia.
Ficou muito popular a frase “Quem tem um porquê, enfrenta qualquer como”, de
Nietzsche, utilizada por Frankl como lema da logoterapia, corrente psicológica de-
senvolvida por ele.

Logoterapia e Análise Existencial é uma abordagem psicotera-


pêutica reconhecida internacionalmente e que se fundamenta
empiricamente no sentido da vida. Também é considerada como
a terceira escola vienense de psicoterapia – ao lado da Psicanáli-
se de Freud e da Psicologia Individual de Adler. Essa abordagem
foi fundada pelo médico austríaco Viktor Frankl e amplamente di-
vulgada depois que seu fundador sobreviveu a quatro campos de
concentração nazistas.

Para a Logoterapia, a necessidade mais profunda do ser humano


é de ter sentido na vida. Isso faz com que a “vontade de sentido”
seja a maior força motivadora do ser humano.

FONTE: <https://www.jucieliaraujo.com.br/post/logoterapia-e-
-an%C3%A1lise-existencial>. Acesso em: 27 mar. 2022.

Frankl reforça que a busca por um sentido de vida é uma vontade presente em
todos nós, nem sempre atendida pelas condições e por nossa história. O objetivo
da Psicologia seria, portanto, auxiliar as pessoas a desvendarem seus sentidos pró-
prios para a vida.

Para saber mais sobre a logoterapia, leia sua principal obra:


FRANKL, V. E. Em busca de sentido. Petrópolis: Vozes, 1991.

Na Psicologia Positiva, a vida com significado pode estar ligada não só ao sen-
tido em seu aspecto de transcendência para algo maior de si mesmo, mas também
está ligada à ideia de propósito, como explicam Rashid e Seligman (2019, p. 252):

Propósito não precisa ser um grande conceito que abrange a


vida como um todo. Também há o significado situacional; isto
é, significado em relação a eventos em menor escala. Por

76
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

exemplo, vencer um jogo de cartas, videogame ou uma partida


esportiva proporciona muita empolgação devido ao propósito
de curto prazo fornecido pelo jogo e seu valor relacionado. No
entanto, isso não significa necessariamente que o jogo teve
importância para nossa vida em geral.

Portanto, o propósito está ligado a objetivos mais específicos, enquanto


dar um sentido à vida parece ter um cunho mais cognitivo, isto é, enquanto no
primeiro eu busco alcançar/realizar metas com propósito específico, no segundo
eu dou um significado diferente a minha realidade. Encontrar propósito em nossas
ações pode levar a um sentido maior para a nossa existência. Vejamos um exem-
plo: começo a reciclar materiais que usualmente iriam para o lixo em minha casa,
com o propósito de melhorar o meio ambiente, ainda de forma mecânica, envolven-
do todos os moradores. Percebo que esse material pode ser trocado por dinheiro e
consigo mobilizar alguns vizinhos para, com o dinheiro levantado em várias residên-
cias, castrarmos animais de rua. Um propósito individual se tornou um propósito co-
letivo, trazendo bem-estar e contribuição social para toda uma comunidade. Parece
impossível? Veja o exemplo na notícia a seguir.

Projeto recolhe tampinhas plásticas para vender e custear castra-


ções de animais de rua na Grande Cuiabá

Podem ser doadas desde tampinhas de garrafas pet, passando


por tampas de produtos de limpeza, de xampu, de creme dental,
de hidratantes, de óleo de cozinha, de requeijão, de margarina,
de sucos, de maionese, de molhos prontos e de condicionador de
cabelo, por exemplo.

Um projeto criado por voluntários está arrecadando tampinhas


plásticas há cerca de dois meses para vender e custear castra-
ções em animais de rua abandonados e que são vítimas de maus
tratos. O “Tampatinhas” já conta com 50 unidades coletoras espa-
lhadas por diversos pontos em Cuiabá e Várzea Grande.

A idealizadora do projeto, Kelly Rondon, explicou que o “Tampati-


nhas” tem preocupação com a causa animal e ambiental. Segun-
do ela, para castrar um gato são necessários 200 quilos de tampi-
nhas para atingir o valor de uma castração. Já para um cachorro
são 400 quilos. A única orientação é de que antes do descarte
nos pontos de coleta, as tampinhas sejam lavadas para evitar a
proliferação de odores e bactérias. “O projeto ainda visa retirar do
meio ambientes quilos e mais quilos de materiais que podem ser

77
Psicologia Positiva

reciclados, que se acumulam com facilidade nos leitos e margens


de rio, córregos e nascentes e gerar renda”, explicou.

FONTE: <https://g1.globo.com/mt/mato-grosso/noti-
cia/2020/10/04/projeto-recolhe-tampinhas-plasticas-para-vender-
-e-custear-castracoes-de-animais-de-rua-na-grande-cuiaba.ght-
ml>. Acesso em: 27 mar. 22.

Até aqui vimos como o sentido de vida e o propósito de vida podem ser co-
nectados ao nosso bem-estar pessoal e social. No entanto, como começar a refletir
sobre ele? Uma ideia interessante é pensar sobre os momentos em nossa história
em que mais apresentamos resiliência. Reconhecer que em algum momento de
sua história você encarou uma adversidade e extrair daí o que a resiliência nesta
situação pode dizer sobre seu sentido de vida. Após reconhecer sua história, validar
os momentos de força e sentido, é interessante pensar onde você quer chegar:
projetar o futuro vai ligar você a um senso de propósito, ampliando forças pessoais
como otimismo e esperança.

FIGURA 10 - A FORÇA DO OBJETIVO

FONTE: <https://zenfy.com.br/motivacao-pessoal/>. Acesso em: 27 mar. 2022.

78
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

Dessa forma, ao reconhecer suas forças pessoais e perceber suas vitórias


pessoais (mesmo as mais singelas, lembre-se que a vida é feita das ações cotidia-
nas), você estará imbuído dos principais recursos necessários para desvendar seu
sentido de vida e estabelecer um propósito gratificante para si e seu entorno. Veja a
seguir um exercício para pensar sobre o seu propósito:

QUADRO 7 - SEU LEGADO POSITIVO

Pense em como gostaria de ser lembrado pelas pessoas mais próximas. Que realizações e forças
pessoais elas falariam sobre você? Qual legado gostaria de deixar? Escreva no espaço a seguir,
sem modéstia, respeitando e reconhecendo o que há de melhor em você e sua história.

FONTE: Adaptado de Rashid e Seligman (2019, p. 257).

Pensar sobre seu legado não é tarefa fácil, mas é um bom exercício para co-
meçar a estabelecer planos e projetos que revelem um propósito pessoal. Agora é
a sua vez de delinear um plano de ação concreto que pode te auxiliar a alcançar o
legado almejado.

PARA REFLETIR

A seguir, algumas questões que conversam sobre o uso de suas for-


ças pessoais, o estado de engajamento pessoal (flow) e a bus-
ca por um sentido de vida. Veja que as dimensões do bem-estar
podem conversar e, assim, a vida de fato pode tornar-se mais
significativa ao utilizar seus recursos pessoais para um sentido
coletivo maior.

79
Psicologia Positiva

1. Pense um pouco a respeito de sua vida, fazendo uma linha do


tempo desde o seu nascimento até aqui.

2. Considerando a sua trajetória, elenque as suas forças e potencia-


lidades pessoais. Faça uma lista de tudo que lhe vier à mente,
mesmo as coisas mais simples. Caso tenha dificuldades, peça a
uma pessoa de confiança relatar dois comportamentos que consi-
dera positivo em você.

3. Com sua lista em mãos, pense em que situações você melhor apli-
ca tais forças. Caso não consiga identificar, pense onde poderia
aplicá-las hoje. Anote-as.

4. Agora, imagine-se aplicando as forças pessoais que o fazem sen-


tir-se energizado. O que lhe vem à mente?

5. Projete-se ao final de sua vida. Qual o legado lhe deixaria orgulho-


so? Como gostaria que as pessoas lembrassem de você?

FONTE: SILVA, B. L. Em busca de sentido: Contribuições da lo-


goterapia à vida contemporânea. In: DONATO, J.; SILVA, B. L.
Pessoas e Psicologias. Cuiabá: Umanos Editora, 2018.

Refletimos nesta seção sobre o sentido de vida e propósito como poderosos


aliados para nossa autorrealização e bem-estar. Um ponto a se ressaltar é que tais
questionamentos podem ser geradores de angústia em um primeiro momento, mas
se forem tomados em conjuntos com nossas forças pessoais serão caminhos profí-
cuos para o nosso autoconhecimento e crescimento pessoal.

1 Sobre propósito e sentido de vida, assinale a alternativa CORRE-


TA:

a) O sentido de vida é uma questão filosófica inalcançável para os


seres humanos.
b) Estabelecer um propósito pessoal é uma estratégia puramente
egocêntrica.
c) O sentido de vida é único, individual e deve ser desvendado ao
longo da vida. Possui como característica básica a autotranscen-
dência.

80
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

d) O sentido de vida é um tópico da Psicologia Positiva que ainda


necessita de investigação, pois não há consenso de sua eficácia
entre os pesquisadores.

81
Psicologia Positiva

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste capítulo, desenvolvemos algumas intervenções para o bem-estar e os
resultados levantados pela Psicologia Positiva. Iniciamos trazendo a construção te-
órica das forças e virtudes humanas, consideradas elementos-chave para as de-
mais intervenções em Psicologia Positiva, hoje realizadas por psicólogos em clíni-
cas e por profissionais diversos em escolas e organizações.

Falamos sobre os caminhos do PERMA para o bem-estar anteriormente e aqui


destacamos algumas estratégias propostas pela Psicologia Positiva dentro desse
caminho. Pensamos nas emoções positivas (P): podemos encontrar esse viés do
bem-estar em múltiplas intervenções arroladas neste capítulo, como o exercício da
gratidão, o savoring, as intervenções em gentileza, o perdão, o mindfulness e o pro-
pósito e significado. É possível perceber claramente que todas essas intervenções
resultam em emoções positivas para as pessoas, ainda que outros elementos do
PERMA estejam envolvidos.

Na letra E do PERMA, está o caminho do Engajamento: estar completamente


envolvido e absorto por uma atividade. Vimos em que consiste o estado de flow,
suas características e condições. Um estado fluido que colabora para o bem-es-
tar a partir de sua dinâmica de aprendizagem, desenvolvimento de habilidades e
aumento de desafios. Diferentemente das outras intervenções, as emoções posi-
tivas são percebidas após a finalização da atividade, pois o indivíduo em flow en-
contra-se fusionado com a tarefa, sua atenção não está deslocada para a busca
do prazer imediato.

Podemos dizer que o R, Relacionamentos Positivos, foi contemplado com in-


tervenções com perdão, o exercício da carta de gratidão, as intervenções em gen-
tileza, o ato de compartilhar proposto pelo savoring e nas atividades que reforcem
o caráter altruísta e pró-social na busca por sentido na vida. Por fim o M, de Sig-
nificado (Meaning), e o A, de realização (Accomplishment), foram destacados nas
reflexões sobre sentido e propósito.

Observamos que, embora a teoria PERMA tenha sido bem didática nas expli-
cações sobre os caminhos para o bem-estar, na prática, as intervenções se atraves-
sam e conseguem trazer benefícios e estratégias múltiplas. Resta agora colocar-
mos em prática cada um dos caminhos propostos, pesquisar, se envolver e adaptar
as sugestões a cada realidade e contexto. Lembre-se que o conhecimento só é
válido quando é vivo!

82
Capítulo 2 CAMINHOS PARA O BEM-ESTAR

REFERÊNCIAS
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com/frase/MjQ5ODMwNA/. Acesso em: 21 jun. 2022.

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T. Intervenções em Psicologia Positiva na área de saúde. São Paulo: Leader,
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CSIKSZENTMIHALYI, M.; SELIGMAN, M. Positive psychology. American


Psychologist, v. 55, n. 1, p. 5-14, 2000.

CSIKSZENTMIHALYI, M. Flow and the foundations of positive psychology:


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CUNHA, L. F., PELLANDA, L. C.; REPPOLD, C. T. Intervenções em Gratidão. In:


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revistahsm.com.br/post/o-que-sao-forcas-de-carater. Acesso em: 20 jun. 2022.

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83
Psicologia Positiva

psicologia clínica. São Paulo, Leader, 2018.

RASHID, T.; SELIGMAN, M. Psicoterapia positiva: manual do terapeuta. São


Paulo: Artmed Editora, 2019.

SELIGMAN, M. E. P. Felicidade autêntica: usando a nova psicologia positiva


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contemporânea. In: DONATO, J.; SILVA, B. L. Pessoas e Psicologias. Cuiabá:
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SOUZA FILHO, P. G.; PACHECO, J. T. B. Mindfulness e Psicologia Clínica


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VAZQUEZ, A. C. S. et al. Evidência de Validade da Escala Brasileira de Gratidão


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WOOD, A. M.; FROH, J. J.; GERAGHTY, A. W. A. Gratitude and well-being: a


review and theoretical integration. Clinical psychology review, v. 30, n. 7, p.
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84
C APÍTULO 3
CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA
POSITIVA ÀS ORGANIZAÇÕES

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Compreender como a psicologia positiva tem


influenciado as novas práticas organizacionais.

 Aprender sobre o equilíbrio entre recursos individuais e


organizacionais na saúde e bem-estar do trabalhador.

 Construir estratégias para potencializar o engajamento no trabalho.

 Aprender a redesenhar o seu trabalho.


Psicologia Positiva

86
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
“Não posso imaginar que uma vida sem trabalho seja capaz de trazer qual-
quer espécie de conforto. A imaginação criadora e o trabalho para mim andam de
mãos dadas; não retiro prazer de nenhuma outra coisa” (FREUD, s.d., s.p.).

Até aqui navegamos pelo surgimento da Psicologia Positiva, suas bases teó-
ricas e principais avanços enquanto campo científico.

Com relação ao âmbito do trabalho, pode-se dizer que a Psicologia Positiva se


desenvolveu em grande parte por conta desse contexto. Pesquisadores como Ed
Diener (1946-2021) já estudavam o bem-estar subjetivo no âmbito laboral, por exem-
plo, desde antes da formalização da Psicologia Positiva como campo científico.

O trabalho, ainda que para muitos possa ser fonte de sofrimento, é uma di-
mensão fundamental da vida humana, tal qual fomos organizando-a socialmen-
te. Nesse sentido, compreendê-lo nas dinâmicas individuais e contextuais se faz
imprescindível, ainda mais quando estamos discutindo e fomentando ações de
bem-estar em nossa sociedade.

Já falamos sobre o que a Psicologia traz de conteúdo teórico e prático em in-


tervenções positivas. Neste capítulo, detalharemos temas relevantes e atuais que
podem contribuir para um trabalho significativo e saudável. Inicialmente, faremos
uma breve contextualização histórica acerca da Psicologia no campo organizacio-
nal, seguida da inserção dos Estudos Organizacionais Positivos. Posteriormente,
desenvolveremos conceitos, como o capital psicológico positivo e o engajamento
no trabalho, demarcando importantes motivadores intrínsecos para o trabalho. Na
sequência delineamos fatores contextuais, como a liderança positiva e a segurança
psicológica, demonstrando importante papel das organizações no bem-estar dos
trabalhadores. Por fim, é apresentado o conceito de redesenho do trabalho como
alternativa para gerirmos nossas atividades laborais em contextos desfavoráveis ou
ainda para potencializar a criatividade e a motivação. Encerramos o capítulo sinteti-
zando e relembrando possíveis caminhos para o florescimento no trabalho.

87
Psicologia Positiva

2 PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL
POSITIVA: UMA NOVA FORMA DE
LIDAR COM O TRABALHO
FIGURA 1 - CHARGE MAFALDA

FONTE: <https://imagohistoria.blogspot.com/2017/09/charges-
mundo-do-trabalho.html>. Acesso em: 15 abr. 2022.

Quando pensamos em trabalho, é possível uma associação imediata com a ne-


cessidade de prover o sustento pessoal e de sua família. Sem essa atividade cen-
tral na forma como estamos organizados socialmente, o homem perde sua dignidade
moral, atingindo seu brio como cidadão, pois é relegado a uma marginalidade que
põe em risco sua sobrevivência.

Ao longo da história, o trabalho foi se transformando, tanto em termos de sua


organização quanto a sentidos atribuídos a ele. Se pensarmos, desde a Grécia Antiga
havia a separação entre o trabalho “manual” (leia-se escravo) e o trabalho dos intelec-
tuais. Na sociedade medieval, ele se organizava em torno do sustento e da produção
em troca da moradia. Com o avanço da sociedade capitalista e da ciência, chegamos
à era industrial e com ela um grande marco sobre o trabalho, seus potenciais de cres-
cimento e adoecimento, acompanhados por sua nova estruturação.

Assim, o trabalhador migrou para as indústrias, para as cidades e suas funções


foram divididas de modo a tornar o trabalho mais produtivo e lucrativo para os proprie-
tários dos bens de produção. Não demorou muito para que logo viessem os danos
psicológicos e físicos dessas mudanças, como o desenvolvimento da fadiga no tra-
balho. A partir desses novos desafios alocados no trabalho, a Psicologia é acionada e
pesquisadores começam a investigar e tentar propor soluções para reduzir o adoeci-
mento e manter a produtividade no trabalho.

88
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

FIGURA 2 - FILME TEMPOS MODERNOS

FONTE: <https://radiopeaobrasil.com.br/tempos-modernos-e-uma-critica-
pungente-da-modernidade-capitalista-filme/>. Acesso em: 15 abr. 2022.

As mudanças ocorridas na ocasião da revolução industrial e os des-


dobramentos na saúde do trabalhador são muito bem retratados no
filme Tempos Modernos de 1936 de Charles Chaplin. Um clássico
que pode ajudar você a pensar sobre o significado do trabalho.

Você pode facilmente encontrá-lo em plataformas de vídeo ou


ainda no link a seguir: https://www.youtube.com/watch?v=fCkFjl-
R7-JQ

Nesse contexto, é inaugurado o campo da Psicologia das Organizações e do


Trabalho (POT), ao final do século XIX, com o advento da fadiga em trabalhadores,
buscando a adaptação do trabalhador às condições laborais. A POT se aliou à enge-
nharia e à administração na tentativa de aumentar a eficiência organizacional, acom-
panhando a perspectiva taylorista da época (ZANELLI; BASTOS, 2004). Pode-se
dizer ainda que a tônica da POT, na época, estava muito mais próxima de uma psico-
logia industrial, ligada ao controle por meio dos testes psicológicos e melhor desem-
penho do trabalhador, acompanhando o padrão das ciências naturais a que a ciência
psicológica também se propunha (LEÃO, 2012).

O Taylorismo é um sistema de gestão do trabalho baseado em


diversas técnicas para o aproveitamento ótimo da mão de obra
contratada. Foi desenvolvido no início do século XIX, a partir de

89
Psicologia Positiva

estudos sobre os movimentos do homem e da máquina nos pro-


cessos produtivos fabris.

O Taylorismo enfatiza a eficiência operacional das tarefas reali-


zadas, nas quais se busca extrair o melhor rendimento de cada
funcionário. Portanto, é um sistema de racionalização do trabalho
concebido em moldes científicos. Dessa maneira, cada aspecto
do trabalho deve ser estudado e desenvolvido cientificamente.
Assim, com a análise dos processos produtivos, foi possível aper-
feiçoar a capacidade de trabalho do operariado. O foco era eco-
nomizar o máximo em termos de esforço produtivo.

FONTE: <https://www.todamateria.com.br/taylorismo/>. Acesso


em: 15 abr. 2022.

A POT foi se desenvolvendo e, com pesquisas e evolução tecnológica, os fato-


res motivacionais ingressaram no mundo do trabalho como protagonistas para a saú-
de e bem-estar do trabalhador. A lógica dentro da Psicologia e do trabalho começa a
se transformar na medida em que não ocupa mais um lugar de controle para a produ-
tividade do trabalhador, mas sim que seu desempenho é consequência de sua satis-
fação e bem-estar no trabalho, que envolve tanto fatores extrínsecos (remuneração,
empregabilidade e oportunidades na carreira) como fatores intrínsecos (experiência
de afetos positivos, engajamento, sentimento de realização e bem-estar no trabalho).

FIGURA 2 - FILME TEMPOS MODERNOS

FONTE: A autora.

Com o advento da Psicologia Positiva como um campo de estudo, há o cresci-


mento das investigações sobre o mundo do trabalho e as possibilidades em se pen-
sar em um ambiente laboral capaz de propiciar o florescimento humano. Muito havia
se desenvolvido em termos de pesquisas sobre stress e burnout no trabalho, mas

90
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

pouco se conhecia sobre os aspectos positivos no trabalho. Surge então a Psicologia


Positiva Organizacional e do Trabalho (PPOT), objetivando pensar em alternativas
protetivas para a saúde do trabalhador, aliada aos propósitos organizacionais, isto é,
seria possível ser feliz no trabalho?

Com isso, se fundou o campo de Estudos Organizacionais Positivos (EOP), tra-


dução do inglês para o termo Positive Organizational Scholarship, considerado um
conceito amplo para englobar uma variedade de perspectivas científicas positivas,
incluindo tanto aspectos individuais do trabalhador quanto dinâmicas e resultados
dentro das organizações (LUTHANS; YOUSSEF, 2017). A vertente EOP fundamen-
ta-se essencialmente na teoria do Ampliar e Construir de Fredrickson, compreenden-
do a existência de processos motivacionais e estressores no trabalho, apresentando
também que os aspectos positivos que levam ao bem-estar no trabalho podem estar
relacionados às características do trabalho (VAZQUEZ; HUTZ, 2018).

De acordo com Luthans e Youssef (2017), os pesquisadores dos Estudos Orga-


nizacionais Positivos (EOP) concentram suas investigações nas seguintes áreas:

• Atributos individuais positivos.


• Emoções positivas.
• Forças e virtudes.
• Relacionamentos positivos.
• Práticas positivas de recursos humanos.
• Práticas organizacionais positivas.
• Liderança positiva e mudança.
• Visão positiva dos problemas e desafios.

Dentro dos Estudos Organizacionais Positivos está inserido o campo das inves-
tigações sobre Comportamentos Organizacionais Positivos (COP), definido por Lu-
thans (2002, p. 59) como “o estudo e aplicação de recursos humanos positivamente
orientados, pontos fortes e capacidades psicológicas que podem ser medidos, de-
senvolvidos e efetivamente gerenciados para melhorar o desempenho no local de
trabalho”. Dessa forma, as pesquisas em COP focam especificamente no trabalhador,
suas ações e potencialidades, enquanto nos Estudos Organizacionais Positivos tam-
bém se encontram a análise das características organizacionais. A Psicologia Positiva
no mundo do trabalho desenvolve suas pesquisas nesses campos.

91
Psicologia Positiva

FIGURA 4 - O CAMPO DA PSICOLOGIA POSITIVA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO

FONTE: A autora.

Conhecemos até aqui como se configurou os estudos positivos no âmbito do


trabalho em uma breve reconstituição da história laboral. Nas seções seguintes, nos
aprofundaremos nos principais resultados destes estudos e suas implicações práticas
para o universo do trabalho.

O peso da felicidade no trabalho


A satisfação dos funcionários está se tornando tão relevante nas
empresas que algumas já adotaram a função de chief happiness
officer (CHO)

Muitas empresas ainda têm a crença de que a felicidade é a re-


compensa do resultado. Trabalhe duro e você terá sucesso. Na
última década, no entanto, diversas pesquisas têm mostrado que
a ordem da equação é inversa. Se priorizarmos nossa saúde e
bem-estar, teremos consequentemente um alto desempenho pro-
fissional. De acordo com um estudo da Gallup, empresas com
funcionários felizes têm 50% menos acidentes laborais. Já uma
pesquisa da Harvard Business Review revelou que colaboradores
satisfeitos são 31% mais produtivos, 85% mais eficientes e 300%
mais inovadores.

A felicidade no trabalho está se tornando tão relevante que algu-


mas empresas têm criado uma função especificamente dedicada
a isso. A missão de um diretor de felicidade, ou chief happiness
officer (CHO), é garantir que os funcionários sejam felizes. O con-

92
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

ceito surgiu na Dinamarca em 2003, quando a empresa Woohoo


Partnership criou uma metodologia voltada para promover mu-
danças positivas e duradouras no ambiente corporativo.

Assim nasceu a certificação em CHO, na qual o profissional é


treinado para elaborar estratégias e ações que elevem a felici-
dade dos colaboradores, aumentando índices de produtividade e
engajamento da equipe. Amazon, Google e Airbnb são algumas
das organizações que instituíram o cargo de CHO no expediente.
O primeiro trabalho formal que o príncipe Harry aceitou depois
de deixar a família real também é algo nessa linha. Ele tornou-se
chief impact officer, ou diretor de impacto, na BetterUp, uma star-
tup do Vale do Silício, com o intuito de ajudar os clientes em seu
desenvolvimento pessoal.

No Brasil, o conceito chegou há cerca de cinco anos, com motivos


de sobra para ser levado a sério. Somos o país mais ansioso do
mundo, segundo um estudo anterior à pandemia realizado em 24
países e publicado no prestigioso periódico científico PLoS One.
Ocupamos o quinto lugar no ranking mundial da depressão, de
acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), e o segun-
do em Burnout, conforme uma pesquisa da International Stress
Management Association (Isma-BR).

Apesar dos dados alarmantes até mesmo anteriores a 2020, o


tema do bem-estar corporativo expandiu-se por aqui – e no mun-
do – com a chegada do novo coronavírus. “Antes da pandemia, a
gente gastava muito mais tempo para convencer as empresas so-
bre a importância de falar sobre felicidade. Hoje, a demanda dos
clientes é orgânica. A pandemia botou na mesa de uma maneira
sem precedentes a questão da saúde mental. Todo mundo está
sofrendo, inclusive os CEOs, o RH e os membros dos boards.
Caiu o tabu”, afirma Carla Furtado, diretora do Instituto Feliciên-
cia, pesquisadora e professora de pós-graduação de psicologia
na PUC-RS.

FONTE: <https://vocerh.abril.com.br/saude-mental/o-peso-da-fe-
licidade-no-trabalho/>. Acesso em: 15 abr. 2022.

93
Psicologia Positiva

1 Sobre o campo da Psicologia Organizacional Positiva, classifique V


para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Os fatores motivacionais ingressaram no mundo do trabalho


como protagonistas para a saúde e bem-estar do trabalhador, a
partir da inserção das pesquisas em Psicologia Organizacional e
do Trabalho.
( ) Dentro dos Estudos Organizacionais Positivos estão inseridos
o campo das investigações sobre Comportamentos Organizacio-
nais Positivos – COP.
( ) Os Estudos Organizacionais Positivos incluem tanto aspectos
individuais do trabalhador quanto dinâmicos e resultados dentro
das organizações.
( ) Os Estudos Organizacionais Positivos incluem somente as dinâ-
micas e variáveis organizacionais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) V - V - V - F.
b) F - V - V - V.
c) V - F - F - F.
d) F - F - F - V.

3 CAPITAL PSICOLÓGICO POSITIVO


Dentro dos estudos dos comportamentos organizacionais positivos, pes-
quisadores buscam demonstrar que a investigação acerca dos comportamentos
positivos possui maior valor agregado para as organizações, comparada aos
comportamentos contraproducentes, que levam a efeitos negativos para as orga-
nizações (VAZQUEZ; HUTZ, 2018).

Nessa perspectiva, pesquisadores sistematizaram alguns comportamen-


tos individuais positivos como um capital único, de grande valor para as organi-
zações: o capital psicológico positivo (LUTHANS, 2002; LUTHANS; YOUSSEF,
2004; LUTHANS; YOUSSEF, 2017).

94
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

Assim, de acordo com Geremias (2021), o Capital Psicológico Positivo é con-


siderado por esses autores como um estado psicológico individual que compreen-
de as seguintes características:

1. Autoeficácia: ter confiança para assumir tarefas desafiadoras e fazer o


esforço necessário.
2. Otimismo: fazer uma abordagem positiva sobre o sucesso, agora e no
futuro.
3. Esperança: ser persistente para atingir objetivos e, quando necessário,
redirecionar os caminhos para alcançar o sucesso.
4. Resiliência: ser capaz de ultrapassar os obstáculos e as adversidades,
sem nunca desistir.

O indivíduo com esses atributos é capaz de avaliar as circunstâncias de


modo positivo, assim como as suas probabilidades de sucesso, pois considera
sua própria capacidade e esforço como variáveis importantes para atingir bons
resultados. Quando acredita em sua própria capacidade, é otimista e tem espe-
rança com relação ao futuro, tende a se engajar em maiores desafios e ser mais
resiliente diante das adversidades.

FIGURA 5 - CAPITAL PSICOLÓGICO POSITIVO

FONTE: Lima, Nassif e Garçon (2020, p. 321).

Assim, pesquisas têm sido realizadas com o intuito de observar os efeitos do


capital psicológico dos indivíduos em nível individual, bem como seus impactos
nas organizações. Dessa maneira, é nitidamente perceptível os ganhos do de-
senvolvimento desse quarteto para o bem-estar dos trabalhadores, para um clima
organizacional positivo, trabalho em equipe, comportamentos, atitudes positivas
etc. Esses efeitos são observados no quadro a seguir:

95
Psicologia Positiva

QUADRO 1 - EFEITOS DO CAPITAL PSICOLÓGICO POSITIVO NOS INDIVÍDUOS

Atitudes Reforço de: comprometimento organizacional, satisfação


com o trabalho, intensão de permanecer no trabalho e
expectativas positivas com relação ao futuro.
Diminuição de: intenção de saída, estresse laboral, ansiedade
e cinismo.
Comportamentos Cidadania organizacional.
Diminuição de: comportamentos desviantes ou
contraprodutivos, absentismo e procura de outro emprego.
Performance Produtividade,
mais recursos para prosseguir nos objetivos, melhor
performance financeira e de gestão, criatividade, resolução
de problemas e inovação.
Bem-estar Bem-estar psicológico, qualidade de vida e do trabalho e
redução do estresse.
Saúde Índice de massa corporal, níveis de colesterol e satisfação
com a própria saúde.
Relações Satisfação com as relações pessoais e investimento nas
relações.

FONTE: Adaptado de Luthans e Youssef (2017).

A grande questão é que, apesar de serem mais facilmente encontradas em


alguns indivíduos do que em outros, essas características podem ser desenvolvi-
das, o que traz um novo olhar da organização em termos de treinamento voltado
ao desenvolvimento, fomentando uma cultura de empoderamento do trabalhador
e um clima positivo da empresa.

Empresas têm buscado fomentar a cultura do capital psicológico, desenvol-


vendo seus trabalhadores por meio de treinamentos, workshops, entre outras me-
todologias. O que vale é saber o que faz sentido para cada organização, com
muita criatividade e entusiasmo.

96
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

QUADRO 1 - EFEITOS DO CAPITAL PSICOLÓGICO POSITIVO NOS INDIVÍDUOS

FONTE: <http://www.unesc.net/portal/nupac-st/blog/47957-orientacoes-
sobre-o-capital-psicologico>. Acesso em: 21 abr. 2022.

COLOCANDO EM PRÁTICA

Como está seu capital psicológico positivo? De 0 a 10, como ava-


lia sua autoeficácia, resiliência, otimismo e esperança?
____________________________________________________
____________________________________________________
_________________________________________________

Agora, pense em ações práticas ou mudanças em seu modo de


ver as coisas que poderiam lhe ajudar a ampliar o seu capital psi-
cológico em cada uma de suas dimensões e descreva-as. De-
pois, realize um plano detalhado para cada uma dessas ações:

DIMENSÃO DO CAPITAL AÇÃO DE MELHORIA


PSICOLÓGICO
1. AUTOEFICÁCIA
2. RESILIÊNCIA
3. OTIMISMO
4. ESPERANÇA

97
Psicologia Positiva

Por fim, pense agora enquanto um consultor ou gestor de recur-


sos humanos. Que ações dentro de uma empresa você poderia
organizar para fomentar o capital psicológico positivo dos traba-
lhadores?
____________________________________________________
___ _________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
_________________________________________________

Conhecemos até aqui o potencial do capital psicológico para as organiza-


ções e indivíduos. Nesse sentido, convidamos você a colocar em prática o seu
desenvolvimento pessoal para estimular as dimensões apresentadas nesta seção
(autoeficácia, resiliência, otimismo e esperança). A partir da sua experiência, a
prática e orientação com clientes futuros se tornarão mais consistentes e com
melhores resultados.

1 Sobre o capital psicológico positivo, classifique V para as senten-


ças verdadeiras e F para as falsas:

( ) O indivíduo com capital psicológico positivo desenvolvido é ca-


paz de avaliar as circunstâncias de modo positivo, assim como as
suas probabilidades de sucesso, pois considera sua própria ca-
pacidade e esforço como variáveis importantes para atingir bons
resultados.
( ) O indivíduo com capital psicológico positivo desenvolvido é ca-
paz de avaliar as circunstâncias de modo positivo, assim como as
suas probabilidades de sucesso, pois é humilde o suficiente para
não considerar sua própria capacidade e esforço como variáveis
importantes para atingir bons resultados.
( ) O capital psicológico é composto por quatro elementos: resiliên-
cia, otimismo, autoeficácia e esperança.
( ) O capital psicológico é composto por quatro elementos: otimis-
mo, autoeficácia, gratidão e esperança.

98
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) V - F - V - F.
b) F - F - V - F.
c) V - V - F - F.
d) F - V - V - V.

4 ENGAJAMENTO NO TRABALHO
Outro tema investigado pela Psicologia Positiva é o engajamento no trabalho.
Compreender como os trabalhadores se engajam no trabalho tornou-se essencial,
tendo como objetivo obter e reter os melhores talentos na organização. Mas o que
seria o engajamento no trabalho?

O engajamento no trabalho é um estado mental relacionado ao trabalho po-


sitivo e gratificante, que é caracterizado pelo vigor, dedicação e absorção. Vigor
é a dimensão definida por altos níveis de energia mental e resiliência. Dedicação
refere-se a estar fortemente envolvido no trabalho, experimentando um senso de
significado, entusiasmo, inspiração, orgulho e desafio. A absorção é caracterizada
por estar totalmente concentrado e feliz, em que o tempo passa rapidamente e se
tem dificuldade de se desapegar do trabalho (SCHAUFELI et al., 2002). Assim,
quando estamos engajados em nossas atividades laborais, tendemos a perder
a noção do tempo, nos dedicando e experimentando um senso de significado no
trabalho, o que nos leva a um alto nível de energia e entusiasmo.

FIGURA 7 - DIMENSÕES DO ENGAJAMENTO NO TRABALHO

FONTE: A autora.

O engajamento passa a ser um ativo psicológico muito requerido pelas orga-


nizações, visto que é associado a muitos indicadores de saúde e produtividade.
Estudos apontam que o engajamento torna os trabalhadores mais colaborativos,

99
Psicologia Positiva

sendo que esse estado mental positivo se caracteriza como um amortecedor das
altas demandas geradas pelo trabalho (VAZQUEZ; HUTZ, 2018; CARNEIRO, 2021).

Na figura a seguir podemos refletir sobre a relação entre o engajamento e


a pirâmide das necessidades de Maslow, ilustrando como o desenvolvimento do
alto engajamento está associado à autorrealização, que é um indicador de bem-
-estar eudaimônico.

FIGURA 8 - ENGAJAMENTO E PIRÂMIDE DAS NECESSIDADES DE MASLOW

FONTE: <https://www.linkedin.com/pulse/import%C3%A2ncia-de-engajar-
ronaldo-paes-leme/?originalSubdomain=pt>. Acesso em: 21 abr. 2022.

Como desenvolver então o engajamento no trabalho? É possível desenvol-


ver esse estado mental positivo nos trabalhadores? Um modelo teórico chamado
Recursos e Demandas no Trabalho (Job - Demands Resources Model) propõe
que o engajamento no trabalho ocorre quando, diante de altas demandas no tra-
balho (pressão do tempo, sobrecarga, tarefas desafiadoras etc.), o trabalhador
emprega suficientes recursos pessoais (por exemplo, capital psicológico positivo)
ou organizacionais (autonomia, gestão participativa, liderança positiva).

100
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

FIGURA 9 – MODELO TEÓRICO: RECURSOS E DEMANDAS NO TRABALHO

FONTE: Silva e Neto (2019) apud Bakker, A. B., & Demerouti, E. (2013).

Na figura, podemos observar claramente que diante de recursos pessoais


e organizacionais as demandas são minimizadas e absorvidas pelo trabalhador
como desafiadoras, o que pode levar mais facilmente ao engajamento e conse-
quentemente a uma maior performance no trabalho. Por outro lado, se os recur-
sos pessoais ou organizacionais são escassos, diante de altas demandas no tra-
balho, o colaborador pode desenvolver Burnout e uma baixa performance.

As pesquisas com diversas organizações ao redor do mundo corroboram


esse modelo (CARNEIRO, 2021), o que nos leva a inferir que o trabalhador pode
desenvolver seus recursos pessoais. Além disso, a organização precisa investigar
quais são os recursos organizacionais que podem favorecer um trabalho saudável
e produtivo diante da natureza do trabalho desenvolvido.

Agora, vamos praticar? Primeiro vamos olhar para o nosso pró-


prio engajamento. Vamos identificar em que momentos você se
sente engajado no trabalho. Vale pensar em experiências anterio-
res ou mesmo em atividades além do trabalho:

Quando me sinto engajado, de estou fazendo a seguinte a


modo que: atividade:
1. Sinto-me com alto nível de energia
e entusiasmo (VIGOR).

101
Psicologia Positiva

2. Sinto-me fortemente envolvido no


trabalho, experimentando um senso
de significado, entusiasmo, inspiração,
orgulho e desafio (DEDICAÇÃO).
3. Estou totalmente concentrado
e feliz, em que o tempo passa
rapidamente e tenho dificuldade de
desapegar do trabalho (ABSORÇÃO).

Reflita sobre esse exercício e pense de que modo você pode ex-
pandir essa sensação no seu trabalho. Quais recursos internos
você pode desenvolver? Quais recursos organizacionais pode-
riam ser oferecidos?
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Dicas para sua equipe engajar melhor os colaboradores


Existem fórmulas que aumentam o envolvimen-
to dos times com suas lideranças.

Colaboradores engajados são mais produtivos e comprometidos


com a empresa. São aqueles que “vestem a camisa” do negócio,
que procuram sempre as melhores soluções e que estão dispos-
tos a crescer junto com a instituição. No entanto, fazer com que
as equipes sejam participativas é um desafio atualmente.

Para Gabriel Leite, CMO e co-fundador da Feedz, a participação


dos times nas empresas é um resultado que vem do sentimento
de pertencimento.

“O engajamento é a sensação de pertencer a algum lugar, e isso


só é possível se as expectativas condizem com a realidade. Um
colaborador que foi contratado para cuidar das redes sociais, mas
na prática cuida do blog, dos leads e dos fluxos de e-mail, por

102
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

exemplo, dificilmente estará feliz em sua tarefa e com a organiza-


ção”, diz.

A Feedz realizou em 2021 uma pesquisa sobre engajamento de


colaboradores e constatou que, empresas que realizam feedba-
cks 1:1, mensais ou semanais, contam com equipes mais com-
prometidas do que os que não adotam essa prática, e o enga-
jamento é 2,5 vezes maior. Para o estudo, foram entrevistados
1129 trabalhadores de 800 empresas de todo o país, dos setores
de tecnologia, serviços, indústria, varejo, finanças, comunicação
e outros.

Além disso, segundo o CMO da HRtech, problemas com os líde-


res são um dos principais fatores de desmotivação dentro de uma
empresa.

“Mesmo que sejam democráticos ou situacionais, líderes que não


inspiram pela sua forma de resolver problemas, capacidade téc-
nica, atenção com os colaboradores e postura profissional, por
exemplo, dificilmente terão uma equipe envolvida”, diz ele.

Engajamento, portanto, é algo pessoal, mas que traz benefícios


coletivos. Outras questões que também impactam diretamente
essa questão são: fazer com que os times tenham que desenhar
um processo de entrega novo toda vez que surge uma nova de-
manda; não definir da forma correta um plano de carreira que
mostra crescimento pessoal e profissional; e, principalmente, não
reconhecer as boas entregas.

“Outra forma das empresas conseguirem engajar o colaborador


é estimular a integração entre as pessoas. Trabalho em equipe,
fóruns de assuntos não relacionados ao trabalho, mas que se-
jam de interesse das pessoas, e momentos de descontração, por
exemplo, são essenciais para despertar a sensação de pertenci-
mento e, consequentemente, o compromisso profissional”, finali-
za Gabriel Leite.

FONTE: <https://www.terra.com.br/economia/dicas-para-sua-e-
quipe-engajar-melhor-os-colaboradores,16e5fbbae344971bc-
89969159f6ddf12zdy2d15h.html>. Acesso em: 25 abr. 2022.

103
Psicologia Positiva

1 Sobre engajamento no trabalho, classifique V para as sentenças


verdadeiras e F para as falsas:

( ) É um estado mental relacionado ao trabalho positivo e gratifican-


te que é caracterizado pelo vigor, dedicação e absorção.
( ) Quando estamos engajados em nossas atividades laborais, ten-
demos a perder a noção do tempo, nos dedicando e experimen-
tando um senso de significado no trabalho, o que nos leva a um
alto nível de energia e entusiasmo.
( ) Ainda que os recursos pessoais ou organizacionais sejam es-
cassos, diante de altas demandas no trabalho, o colaborador tem
altas probabilidades de desenvolver engajamento.
( ) As organizações não podem desenvolver o engajamento no tra-
balho, visto ser um estado mental influenciado exclusivamente
por recursos externos do trabalhador.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) V - V - F - F.
b) F - V - V - V.
c) V - F - F - F.
d) F - F - F - V.

5 LIDERANÇA POSITIVA E
SEGURANÇA PSICOLÓGICA
Um dos recursos mais importantes para a organização garantir um bom de-
sempenho da equipe é a figura da liderança. Não é de hoje que pesquisas aca-
dêmicas, consultorias e todos os envolvidos no mundo do trabalho batem na tecla
da liderança como um dos carros-chefes para manter equipes motivadas e saudá-
veis no meio laboral.

Grande parte das pesquisas em liderança traz três modelos clássicos: o líder
autocrático, democrático e liberal (laissez-faire), como podem ser observados na
figura a seguir:

104
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

FIGURA 10 - ESTILOS DE LIDERANÇA CLÁSSICOS

FONTE: <https://www.tjce.jus.br/wp-content/uploads/2016/09/Pesquisa-de-
Clima-2015-Relat%C3%B3rio-Final.pdf>. Acesso em: 25 abr. 2022.

As teorias sobre estilos de liderança foram se desenvolvendo e sendo trans-


formadas à medida que as próprias organizações evoluíram juntamente à socie-
dade. Para muitas organizações atuais já não é admissível um líder autoritário. Os
valores sociais e culturais mudaram e, com eles, a percepção de que é possível
um líder que realmente potencialize sua equipe.

Nos estudos organizacionais positivos, a liderança também evoluiu, e o es-


perado para o líder acompanha as exigências feitas aos trabalhadores. Se o tra-
balhador precisa desenvolver o seu capital psicológico positivo e aumentar seu
engajamento, o líder também necessita ser alguém mobilizador do melhor das
pessoas, muito além de simplesmente alcançar metas. O clima estabelecido pelo
líder dá o tom à equipe: para que ela se mantenha engajada e colaborativa, é ne-
cessário que o representante seja o primeiro exemplo.

105
Psicologia Positiva

FIGURA 11 - LIDERANÇA POSITIVA

FONTE: <https://psicologiapositiva.com.br/para-uma-
lideranca-positiva/>. Acesso em: 21 abr. 2022.

Como nos mostra a figura, a liderança positiva deve permear quatro polos
importantes nas organizações: 1) clima positivo, em que seja estabelecida uma
relação de confiança permeada por emoções positivas; 2) comunicação positiva,
na qual ainda que haja aspectos negativos a serem comunicados, estes devem
ser ditos de maneira respeitosa e clara; 3) significado positivo, alinhamento dos
valores organizacionais que levem ao senso de propósito e visão sistêmica do tra-
balhador com relação a sua organização; 4) relações positivas, nas quais o líder
fomentará as potencialidades de sua equipe.

Diversos estilos de liderança vêm sendo analisados nos estudos organizacio-


nais positivos, como a liderança empoderadora, liderança ética, liderança autênti-
ca, liderança engajadora etc. De modo geral, todas produzem efeitos positivos nos
trabalhadores. Vamos destacar nos estudos de lideranças positivas o conceito de
Liderança Transformacional, tendo em vista as pesquisas já consolidadas na área.

A liderança transformacional consiste no “desenvolvimento de forças e virtu-


des do trabalhador” (GODOY, 2018, p. 66). Pode-se considerá-la como habilidade
inata ou adquirida, usada no exercício da motivação e da influência para mover
os outros a contribuírem na conquista das metas estabelecidas nas organizações
(CALAÇA; VIZEU, 2015; GODOY, 2018).

106
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

FIGURA 12 - ELEMENTOS DA LIDERANÇA TRANSFORMACIONAL

FONTE: <https://leads2b.com/blog/lideranca-transformacional-
na-area-comercial/>. Acesso em: 21 abr. 2022.

A partir da figura sobre os elementos desse estilo de liderança, observa-se o


motivo desse tipo de líder ressaltar elementos positivos e bons resultados em sua
equipe: ele considera individualmente seus liderados, observando as potenciali-
dades de cada um. Além disso, inspira seu time ao trazer uma visão e significado
sobre o seu trabalho, apresentando a ética como princípio norteador, o que gera
respeito de seus liderados, além de desafiá-los a pensar sobre o desenvolvimento
do seu trabalho de forma inovadora. Se pensarmos nas teorias vistas no Capítulo
1, um líder com essas características pode, a partir de suas ações positivas, am-
pliar e construir repertórios positivos de comportamentos da sua equipe (teoria do
ampliar e construir), fomentando elementos do bem-estar, tal como proposto por
Seligman – emoções positivas, engajamento, relacionamentos positivos, significa-
do e realização.

Para aprofundar mais sobre esse assunto, recomendamos o TED


Talk disponível no link a seguir: https://www.youtube.com/watch?-
v=qp0HIF3SfI4

Neste TED Talk, Simon Sinek tem um modelo simples, mas po-
deroso, para uma liderança inspiradora, na qual todas começam
com um círculo dourado e a questão “Por quê?”. Seus exemplos
incluem a Apple, Martin Luther King e os irmãos Wright. Aqui ve-
mos como uma liderança pode se tornar inspiradora a partir da
simples pergunta.

107
Psicologia Positiva

Uma liderança positiva é, portanto, um recurso organizacional fundamental


para fomentar uma cultura de “segurança psicológica” nas organizações. Estamos
numa era do trabalho em que não apenas a segurança física é necessária, tendo
em vista a complexidade e as exigências do trabalho. Mas o que seria segurança
psicológica?

O conceito de segurança psicológica no trabalho foi desenvolvido incialmen-


te pela professora da Harvard Business School Amy Edmondson (1999). A pes-
quisadora entende segurança psicológica como o conjunto de percepções das
consequências de assumir riscos interpessoais em um contexto específico, como
um local de trabalho. Assim, se um ambiente é considerado psicologicamente se-
guro, o trabalhador sente-se confortável para se expressar, da forma como verda-
deiramente é, sendo autêntico e confiante em seus relacionamentos.

FIGURA 13 - ASPECTOS DA SEGURANÇA PSICOLÓGICA

FONTE: <https://fractos.co/blog/seguranca-psicologica-o-principal-fator-
das-equipes-de-sucesso/>. Acesso em: 21 de abril de 2022.

Edmondson e Lei (2014) conseguiram identificar consequências positivas


sobre a segurança psicológica em uma revisão de pesquisas da área, em nível
individual, organizacional e de relacionamentos interpessoais no trabalho. A se-
gurança psicológica deve ser algo valorizado nas organizações, a fim de angariar
trabalhadores engajados, equipes assertivas e de alta performance. Para isso, as
autoras sugerem as seguintes estratégias:

• Os gestores devem criar um clima de segurança psicológica para mitigar


os riscos interpessoais e tornar a colaboração mais provável, particular-
mente em face da incerteza, complexidade e interdependência.
• Os gestores não devem subestimar a importância da comunicação con-
gruente e intervenções deliberadas para construir e manter a segurança
psicológica, devendo permitir que isso facilite o desempenho.

108
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

• Os trabalhadores podem ajudar por meio de sua vontade de falar e desa-


fiar o status quo. Ao mesmo tempo, os gestores devem aprender a valo-
rizar os funcionários que se envolvem em tais comportamentos, mesmo
que possam instintivamente preferir o silêncio dos trabalhadores e a con-
cordância com o status quo. Um clima interpessoal de segurança, combi-
nado com outros ingredientes essenciais (por exemplo, estratégia, visão,
objetivos, liderança apoiadora, e assim por diante), permite o aprendiza-
do e o desempenho.

Que tal ouvir da própria Amy Edmondson sobre Segurança Psico-


lógica no trabalho? Neste vídeo curto ela fala em uma entrevista
sobre o tema:

https://www.youtube.com/watch?v=bXnZuQtqSWQ

Observamos nesta seção como a figura do líder é indispensável para o bem-


-estar no trabalho. O líder transformacional é capaz de favorecer um ambiente de
trabalho com segurança psicológica, confiança, em que o trabalhador seja capaz
de emitir sua voz e produzir com maior inovação e desempenho.

Empatia e acolhimento são importantes para criar ambiente de


trabalho saudável e reduzir o desenvolvimento de Burnout

Desde o início deste ano, a Organização Mundial da Saúde


(OMS) incorporou a síndrome de Burnout à lista das doenças
ocupacionais, assim, os indivíduos diagnosticados passam a ter
as mesmas garantias trabalhistas e previdenciárias previstas
para as demais doenças do trabalho.

No Brasil, cerca de 30% dos trabalhadores sofrem com a síndro-


me do Burnout, representada por uma sensação de esgotamento,
cinismo ou sentimentos negativos relacionados ao trabalho e efi-
cácia profissional reduzida.

De acordo Cintia Suplicy, psicóloga, especialista em Psicologia


Positiva e Designer de Organizações Positivas, as pessoas com

109
Psicologia Positiva

Burnout geralmente estão expostas a ambientes inadequados e


de conflitos, sobrecarga de trabalho, liderança tóxica, falta de se-
gurança psicológica e estrutura para apoiar o colaborador emo-
cionalmente.

“Portanto, as empresas, mais do que nunca, precisam olhar para


isso de uma forma genuína”, destaca, mas “infelizmente, para a
grande maioria das organizações, somente quando impacta nos
resultados financeiros, as atitudes são tomadas”, completa.

Cintia afirma que é preciso ir além deste olhar voltado somen-


te para os resultados. “Precisamos pensar no indivíduo e ado-
tar medidas para tentar diminuir os riscos. Isso é uma questão
cultural que precisa ser transformada. Apesar do ambiente, das
condições de trabalho e da sobrecarga de trabalho contribuírem
muito para um possível quadro de Burnout, prefiro ver como uma
corresponsabilidade”, pontua.

Para ela, o ponto mais importante é um olhar cirúrgico para a cultura


da empresa, pensando em transformação. “Não podemos esquecer
os líderes, que estão à frente dos colaboradores e têm o papel de
inspirar, motivar, escutar e apoiar seu colaborador”, acentua.

A psicóloga observa que muitas vezes o trabalhador se vê sem


opção, submetendo-se a qualquer coisa para manter seu empre-
go, mas em tantas outras vezes, ele tem uma escolha. E indaga:
“vale a pena continuar nesta empresa submetendo-me a este es-
tresse diário para ter sucesso ou pagar suas contas? É sempre
uma escolha. Mesmo para quem não vê solução. E podemos es-
colher nos afastar se daquilo que afeta nossa saúde física, men-
tal e emocional”.

“As empresas precisam ser um lugar seguro para se trabalhar,


construindo um ambiente de bem-estar e segurança psicológica,
onde cada colaborador sinta que é valorizado pelo que ele é e
não se sinta cobrado a ser o que querem que ele seja”, destaca
Cintia. “É preciso que as organizações entendam que as pessoas
querem se sentir parte das decisões e dos resultados e que de-
vem se preocupar de verdade com as pessoas, com a jornada de
trabalho e com o salário de cada membro das equipes”. Segundo
a psicóloga, além de treinar os líderes, disponibilizar programas
de autoconhecimento, criar um ambiente colaborativo e promover
o bem-estar e a felicidade do colaborador.

110
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

Cintia Suplicy explica que toda a estratégia que promova o bem-


-estar leva um tempo para colher os resultados em uma cultu-
ra tóxica, além de ser um desafio mensurar. “No entanto, dados
de pesquisas que vêm sendo realizadas no mundo mostram que
apostar no bem-estar aumenta a saúde física, mental e emocio-
nal, a produtividade, o comprometimento e a motivação do cola-
borador, o que impacta diretamente nos resultados”, acentua. E
frisa: “quem trabalha feliz e têm boas condições de trabalho em
um bom ambiente, trabalha melhor. E, às vezes, até menos”.

A consultora e mentora de felicidade e autenticidade que está à


frente da Wiegrow, empresa que oferece soluções que transfor-
mam a vida das pessoas e a cultura das organizações, afirma
que o que gera resultado é envolver o colaborador nas diretrizes
de uma possível mudança. “As pessoas são resistentes quando
se fala em mudança. E, muitas vezes, têm mais a contribuir do
que a empresa pensa. Afinal, são elas que estão na linha de fren-
te e que sabem o que acontece e o que pode ser melhorado. Por-
tanto, apostar na colaboração e na co-construção é um caminho
não só viável como necessário”, ressalta.

Para Cintia, a falta de uma cultura na organização voltada para


a empatia e acolhimento pode contribuir para um quadro de Bur-
nout. “Mas devemos ficar atentos que não é o único fator”.

FONTE: <https://www.tvuai.com.br/portal/empatia-e-acolhimento-
-sao-importantes-para-criar-ambiente-de-trabalho-saudavel-e-re-
duzir-o-desenvolvimento-de-burnout/> Acesso em: 21 abr. 2022.

1 Sobre liderança positiva e segurança psicológica, classifique V


para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) A liderança transformacional consiste na habilidade inata ou


adquirida, usada no exercício da motivação e da influência para
mover os outros a contribuírem na conquista das metas estabele-
cidas nas organizações.
( ) Os gestores devem criar um clima de segurança psicológica
para mitigar os riscos interpessoais e tornar a colaboração mais
provável, particularmente em face da incerteza, complexidade e
interdependência.

111
Psicologia Positiva

( ) Uma liderança positiva é um recurso organizacional fundamental


para fomentar uma cultura de “segurança psicológica” nas orga-
nizações.
( ) Os trabalhadores não devem arriscar o status quo, sob pena de
destruírem o ambiente de segurança psicológica.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) F - V - V - F.
b) V - V - V - F.
c) V - F - F - F.
d) F - F - F - V.

6 COMO TRANSFORMAR O SEU


TRABALHO (JOB CRAFTING)
Vimos até aqui aspectos individuais (capital psicológico positivo e engaja-
mento) e organizacionais (liderança positiva e segurança psicológica) como ativos
fundamentais para a manutenção da saúde e bem-estar no trabalho e seu conse-
quente desempenho.

Muitas vezes, no entanto, temos poucos desses recursos a nossa disposi-


ção, especialmente os organizacionais. Nem sempre o ambiente laboral é o ideal
e as condições financeiras e econômicas podem nos colocar em uma posição
desconfortável no trabalho: ele não é o que você sonhava, aparentemente não lhe
traz realização pessoal e lá no fundo de sua consciência uma voz fica perguntan-
do: e aí, o que tudo isso aqui tem a ver com você?

Vamos dizer que esse é o seu caso hoje. O que você pode fazer para trans-
formar seu trabalho de modo a torná-lo mais significativo e inspirador? Seria pos-
sível algo de diferente acontecer? E mais: você conhece alguém que intencional-
mente faz mudanças em seu trabalho?

As teorias tradicionais do design do trabalho sempre colocaram essa tarefa na


mão das organizações, objetivando realizar o melhor desempenho dos trabalha-
dores e um fluxo entre as tarefas. Além disso, as mudanças no trabalho foram in-
seridas como processos motivacionais: as organizações começaram a perceber, a
partir de Herzberg, Mausner e Synderman (1959), em sua teoria motivacional, que

112
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

os trabalhos deveriam ser enriquecidos, isto é, ao invés de simplificadas, as tarefas


deveriam ter complexidade ou variedade de modo a motivarem o trabalhador por
meio de seus desafios, evitando assim a fadiga das tarefas simples e repetitivas.

Diferentemente da década de 1960 em que se buscava variar tarefas inten-


cionalmente para motivar o trabalhador, o mundo atual apresenta relações de tra-
balho variadas, complexas, com tecnologias mudando a todo instante, em que
podemos perceber que há exigências de um trabalhador mais flexível e dinâmico.
Nesse contexto, são inseridos os estudos dos comportamentos proativos no tra-
balho: já não se pode esperar as mudanças do desenho de cargos ou estrutura a
partir das organizações. É esperado que o próprio trabalhador passe a gerir o seu
trabalho e proponha soluções inovadoras; ele é parte essencial e dinâmica para a
melhoria das empresas.

Sobre a complexidade das relações de trabalho atual, já ouviu


falar do mundo BANI? E do mundo VUCA? Vamos ver o que
texto a seguir nos mostra sobre nosso contexto social atual:
Com o Mundo VUCA se tornando cada vez mais distante da nos-
sa realidade, Jamais Cascio, professor e futurista da Califórnia,
apresentou a definição de Mundo BANI e a Era do Caos. Vamos
discriminar esse acrônimo.

Brittle (frágil): sem raízes sólidas, tudo pode mudar rapidamente.


Um vírus pode se espalhar pelo mundo (com as facilidades da
globalização e interconexão), um concorrente pode mudar a lógi-
ca do mercado e por aí vai. Então, empregos não são sinônimos
de segurança, posições não garantem estabilidade e mudan-
ças na carreira são normais. E isso é óbvio. Assim, precisamos
aprender a trabalhar com a instabilidade sempre por perto.

Anxious (ansioso): toda essa fragilidade gera medo, que resulta


em ansiedade (uma das doenças mais comuns do nosso tempo).
Parece que vivemos no limite, que as decisões precisam ser to-
madas rapidamente, que os segundos perdidos nos deixam para
trás. Isso nos causa um senso de urgência.

Nonlinear (não linear): o distanciamento social de 2020 nos dei-


xou com a sensação de estar em um mundo com eventos des-
conectados e desproporcionais. Isso muda completamente o
sistema de causa e efeito a que estávamos habituados, já que
a aceleração dos acontecimentos significa que os altos e baixos

113
Psicologia Positiva

não são proporcionais e nada é certo. Assim, planos a longo pra-


zo, por exemplo, podem não ser os mais indicados para o Mundo
BANI e devem ser adaptáveis às circunstâncias.

Incomprehensible (incompreensível): a incompreensibilidade é o


estágio final da nossa sobrecarga de informações. Temos muitos
dados, mas a lógica parece não fazer mais sentido. Buscamos
mais informações para ter mais controle, mas esse exagero pode
ser apenas uma farsa em vez de uma solução. Nossa capacidade
cognitiva de processar não mudou e o excesso de dados pode
nos deixar sem respostas. Cada vez parece que entendemos me-
nos, mesmo com o aumento do número de informações.

No Mundo BANI, as situações deixam de ser apenas instáveis e


passam a ser caóticas. Os resultados não são simplesmente difí-
ceis de prever, mas são completamente imprevisíveis.

Parece que tudo que falamos até aqui é negativo e desesperador,


certo? Mas calma que nem tudo são espinhos. Criado para orien-
tar empresas, o Mundo BANI também pode direcionar decisões
da vida pessoal e profissional de cada pessoa. Isso porque o con-
ceito foi criado para gerar oportunidades.

Como isso é possível? Basta pensarmos que a definição do Mun-


do BANI veio para abrir nossas mentes e estimular nosso cérebro
a pensar de forma criativa e já prevendo os obstáculos. Quer ver
como é simples de entender?

Para enfrentar a fragilidade, busque por resiliência e liberdade.


Para enfrentar a ansiedade, precisamos de empatia e atenção
plena.
Para enfrentar a não linearidade, devemos pensar no contexto e
agir com flexibilidade e adaptabilidade.
E para enfrentar a incompreensibilidade, necessitamos de trans-
parência e intuição.

FONTE: <https://blog.mbauspesalq.com/2021/03/16/mun-
do-bani-o-mundo-vuca-ja-nao-da-mais-conta/?gclid=CjwKCA-
jwsJ6TBhAIEiwAfl4TWP1yC0VnmChJ_aljvp9oxfu0BaFkzzg0v-
57jjICHNMI74hTTArudmhoCMs0QAvD_BwE>. Acesso em: 26
abr. 22.

114
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

Vamos voltar aos estudos sobre o desenho do trabalho e dos comportamentos


proativos. Eis que os pesquisadores começaram a observar que muitos trabalhado-
res realizavam mudanças intencionais no âmbito de seu trabalho (em suas tarefas,
relacionamentos etc.), sem a provocação da organização, isto é, um comportamen-
to proativo que poderia lhe gerar bem-estar.

As pioneiras dessas pesquisas foram Amy Wrzesniewski, da Universidade de


Yale, e Jane E. Dutton, da Universidade de Michigan. As pesquisadoras observa-
ram e colheram entrevistas de trabalhadores de um hospital e descobriram que os
trabalhadores realizam mudanças para tornar o seu trabalho mais significativo e
realizador. Denominaram este tipo de comportamento como job crafting, adaptado
para o Brasil como redesenho do trabalho.

Segundo as autoras, o redesenho do trabalho pode ser entendido por compor-


tamento de mudança cognitiva ou física que indivíduos realizam nos limites de suas
tarefas ou relacionamentos, de modo que sua identidade e significado no trabalho
sejam alterados (WRZESNIEWSKI; DUTTON, 2001).

FIGURA 14 - FORMAS DE REDESENHO DO TRABALHO

FONTE: A autora.

Assim, o redesenho do trabalho é realizado por meio desses três tipos de mu-
danças:

1. Mudanças físicas (tarefas): quando ocorrem modificações nas minhas ta-


refas, na forma como eu as executo, de modo a torná-las mais alinhadas
a meu modo de trabalhar.
2. Mudanças relacionais: intencionalmente procuro ampliar meus relaciona-
mentos no trabalho. Esse tipo de redesenho pode dar sentido tanto pelo
viés afetivo quanto pelo fato de criar oportunidades para melhorar meu
trabalho por meio das trocas sociais (networking).

115
Psicologia Positiva

3. Mudanças cognitivas: quando busco compreender ou trazer uma visão


sistêmica sobre meu trabalho, isto é, dou um novo significado/propósito
para minhas atividades.

Vejamos no quadro a seguir alguns exemplos de redesenho no trabalho:

QUADRO 2 - EXEMPLOS DE REDESENHOS DO TRABALHO

Redesenho das tarefas • Adicionar novas tarefas, desafios, projetos


que se alinhem a seus valores e motivações
(flow).
• Alterar a forma de realizar as tarefas.
• Diminuir tarefas grandes em tarefas
menores.
• Diminuir/eliminar tarefas obstáculos.
Redesenho das relações • Criar oportunidades para compartilhar
conhecimento e aprender com os colegas.
• Expandir rede de relacionamento.
• Manter conexões dentro e fora da
organização.
• Escolher ser o mentor de novos funcionários
ou de pessoas que estão começando ou buscar
um mentor para ampliar o seu trabalho.
• Oferecer suporte a seus colegas.
Redesenho do olhar sobre o trabalho • Refletir sobre o papel do seu trabalho para o
sucesso da organização.
• Pensar no seu trabalho integrado ao todo
(visão sistêmica).
• Lembrar da importância do seu trabalho para
clientes internos e externos.
• Qual o papel do meu trabalho no meu bem-
estar geral e na minha identidade?

FONTE: A autora.

É claro que um conceito como esse trouxe muito interesse aos pesquisadores
em Psicologia, especialmente a partir dos estudos organizacionais positivos, muitas
perguntas surgiram a partir daí: o que pode levar o trabalhador a transformar seu
trabalho? É possível estimular esse tipo de comportamento? Quais os benefícios
para ambos, trabalhador e organização?

Outro grupo de pesquisadores que desenvolveu o modelo de recursos e de-


mandas no trabalho, citado no início deste capítulo, começou a se interessar pelo
redesenho do trabalho e percebeu que esse tipo de comportamento poderia, dentre
outras possibilidades, levar ao engajamento no trabalho, por meio do alinhamento
entre as habilidades do trabalhador com o seu contexto.

Esse grupo modificou a definição de redesenho do trabalho, o conceituando


como: “[...] a ação realizada pelo indivíduo com o intuito de ampliar recursos e de-
safios do trabalho ou diminuir demandas, especialmente aquelas de obstáculo, de

116
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

modo que demandas e recursos sejam alinhados a suas preferências e habilidades”


(TIMS; BAKKER; DERKS, 2012, p. 173).

Para esses teóricos, o redesenho pode acontecer, portanto, a partir das se-
guintes formas:

1. Ampliar recursos: reflito sobre meus recursos atuais e busco desenvolvê-


-los ou ampliá-los (pessoais, de relacionamento, minhas tarefas).
2. Ampliar desafios: busco ampliar a complexidade das minhas tarefas, me-
tas ou projetos.
3. Diminuir demandas: diminuo ou minimizo aspectos estressantes do meu
local de trabalho.

FIGURA 15 - FORMAS DE REDESENHO DO TRABALHO SEGUNDO


O MODELO DE RECURSOS E DEMANDAS DO TRABALHO

FONTE: A autora.

Apesar de diferentes formas de redesenho do trabalho serem elencadas nos


distintos modelos teóricos, a essência é que o trabalhador pode personalizar seu tra-
balho, trazer mais “a sua cara” a suas tarefas, melhorar seus relacionamentos e sua
visão sobre seu trabalho, sendo que tais ações o levarão a ampliar seus recursos,
diminuir demandas, gerando maior probabilidade de sentir bem-estar no trabalho.

Colocando em prática

Pense nas suas atividades atuais. O que posso fazer para:

Redesenhar minhas tarefas


(ampliando meus recursos
e desafios, diminuindo
demandas).

117
Psicologia Positiva

Redesenhar meus
relacionamentos
(ampliando meus recursos
e desafios, diminuindo
demandas).

Redesenhar minha visão de


mundo
(ampliando meus recursos
e desafios, diminuindo
demandas).

A partir dos estudos iniciais de redesenho do trabalho, inúmeras pesquisas fo-


ram realizadas a fim de investigar os benefícios trazidos ao trabalhador, para além
do desempenho. Uma busca na internet sobre o termo Job Crafting leva a mais de
208.000 registros. Isso mostra o crescente interesse pelo fato desse tipo de com-
portamento trazer aumento do bem-estar, desempenho, além de outros desfechos
positivos, como sintetizado na figura subsequente.

FIGURA 16 - BENEFÍCIOS DO REDESENHO DO TRABALHO

FONTE: A autora.

Portanto, quando o trabalhador intencionalmente toma a frente de seu tra-


balho naquilo que é possível em um dado momento, assume o protagonismo de
suas ações, mesmo em situações limitadas. Isso gera um efeito motivador que
amplia sua consciência, possibilitando a inovação e criatividade para criar estraté-
gias de enfrentamento a situações de estresse. Como efeito “colateral” de gover-
nar seu trabalho, a pessoa se identifica mais com ele, o que o torna mais significa-
tivo e recompensador.

118
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

FIGURA 17 - O CICLO DE GANHOS DO REDESENHO DO TRABALHO

FONTE: A autora.

Observamos, portanto, que há um ciclo de ganhos possíveis com o investi-


mento do trabalhador em ações de redesenho do trabalho. Estudos apontam as-
sociação direta entre esse tipo de comportamento e o estado mental positivo, o
engajamento no trabalho. Ao redesenhar o trabalho, entramos em estado de enga-
jamento que, por sua vez, está associado positivamente ao bem-estar no trabalho e
saúde. Já vimos e reiteramos em todo este capítulo que emoções positivas traduzi-
das pelo engajamento neste ciclo são capazes de elevar nosso bem-estar, ampliar
nossa consciência, criatividade e inovação. Todo esse circuito traz um estado de
alta performance para o trabalhador.

Vale ressaltar que o redesenho do trabalho, apesar de ser um comportamento


proativo, tem sido alvo de investimento das organizações em termos de treinamen-
to e desenvolvimento. Intervenções focadas em redesenho estão cada vez mais
presentes em empresas que vislumbram produtividade e sustentabilidade aliados à
potencialização de seu maior ativo: as pessoas.

Cinco habilidades essenciais ao profissional do futuro

Em meio a tantas transformações, assumir a responsabilidade


por desenhar os passos da própria carreira aumenta as possibili-
dades de conquistar um futuro bem-sucedido e cheio de significa-
do. Uma das melhores formas de fazer isso é levando em consi-
deração o job crafting, abordagem que convida os profissionais a
terem uma relação mais afetiva e criativa com o trabalho, a fim de
se tornarem mais livres e proativos. Para criar e executar o seu
futuro profissional por meio de um bom job crafting, você precisa
desenvolver estas cinco características:

119
Psicologia Positiva

1. Capacidade de reinventar-se
Em um cenário cada vez mais complexo e de mudanças cons-
tantes, saber reinventar-se é uma habilidade cada vez mais ne-
cessária. Disrupção pede inovação. Isso vale para os mercados e
também para você. Atualize-se para manter-se relevante.

2. Cuidar da energia e da saúde mental


Pesquisa realizada pela International Stress Management As-
sociation no Brasil (ISMA-BR), em 2018, mostrou que 32% da
população brasileira sofrem de síndrome de Burnout, distúrbio
emocional cujos sintomas são: exaustão extrema, estresse e es-
gotamento físico, resultados de uma rotina de trabalho extenu-
ante. Para que a energia e a felicidade não sejam sugadas pelo
estresse do trabalho, é preciso modificar hábitos, alternando perí-
odos de produtividade e descanso.

3. Autenticidade
Distinguir-se e destacar-se pode ser a diferença entre o desenvol-
vimento e o sucesso, a estagnação e o fracasso, em um merca-
do de trabalho cada vez mais competitivo. E para ser percebido
dessa forma, a autenticidade é uma característica imprescindível.
Ser autêntico é viver de acordo com seus valores e com a sua
visão de futuro. Além de causar diferenciação, a autenticidade
aumenta a satisfação pessoal e dá sentido à vida.

4. Accountability
Accountability pode ser definido como a capacidade de compro-
meter-se, cumprir com a sua palavra e conseguir que os outros
façam o mesmo. É essencial para a carreira de qualquer profis-
sional desenvolver essa característica, pois ser uma pessoa con-
fiável é a base de uma boa reputação. São características funda-
mentais para a accountability a autodisciplina e a integridade.

5. Paixão
Ser apaixonado pelo que faz é uma condição importante para o
profissional ser produtivo, gerar bons resultados e consequen-
temente progredir na carreira. A paixão é a energia positiva que
permite seguir em frente nos dias bons e especialmente nos dias
ruins. Ela traz garra para vencer os desafios e aumenta a criati-
vidade para encontrar soluções nos momentos mais complicados
da rotina profissional.

FONTE: <https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/gazzconec-

120
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

ta-colab/cinco-habilidades-essenciais-profissional-do-futuro/>.
Acesso em: 26 abr. 2022.

1 Sobre o redesenho do trabalho, classifique V para as sentenças


verdadeiras e F para as falsas:

( ) O redesenho do trabalho é uma forma de desenvolvimento pro-


jetado pelas organizações, a fim de tornar os trabalhadores mais
proativos.
( ) O redesenho do trabalho é um comportamento gerado pelo pró-
prio trabalhador, a fim de tornar seu trabalho mais significativo.
( ) O redesenho do trabalho pode ser realizado ao mudar tarefas,
relacionamentos ou a forma com que enxergamos o trabalho.
( ) O redesenho do trabalho pode levar o trabalhador a inovar no
trabalho, pois ele é capaz de criar novas formas de fazer suas
atividades e de enfrentar as adversidades laborais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) V - V - V - F.
b) F - V - V - V.
c) V - F - F - F.
d) F - F - F - V.

7 FLORESCIMENTO NO TRABALHO
Ao final deste capítulo, encerraremos com o objetivo maior dos estudos organi-
zacionais positivos: o bem-estar no trabalho. Se a Psicologia Positiva, de modo geral,
tem por objetivo potencializar o florescimento humano, não seria diferente no âmbito
do trabalho. No entanto, o que se pode compreender por florescimento no trabalho?

Segundo Bedin e Zamarchi (2019, p. 550):

No contexto de trabalho, o florescimento está relacionado a


uma condição de prosperidade, felicidade, engajamento, auto-
motivação, satisfação e bem-estar, surgindo no momento em
que afetos positivos superam o número de afetos negativos,
promovendo um ajuste emocional positivo.

121
Psicologia Positiva

Assim, podemos dizer que o florescimento no trabalho está relacionado à ex-


periência de bem-estar vivida pelos indivíduos, ligada à autorrealização, ao propósi-
to no trabalho e aos relacionamentos positivos.

Como podemos alcançar esse estado psicológico? Seria ele um estado per-
manente? É possível viver sem adversidades no trabalho?

Na figura a seguir, elaborada por Sgarbossa e Mozzato (2021), é possível visu-


alizar uma síntese das variáveis potencializadoras de florescimento no trabalho. As
autoras levantaram, por meio de estudos empíricos já realizados, dados científicos
do que levam indivíduos a florescerem no trabalho.

FIGURA 18 - AÇÕES POTENCIALIZADORAS DO


FLORESCIMENTO NAS ORGANIZAÇÕES

FONTE: <https://www.researchgate.net/figure/Figura-1-Acoes-da-GP-como-motivadoras-
do-florescimento-no-trabalho_fig1_351495919>. Acesso em: 26 abr. 2022.

No círculo interno, encontramos fatores motivadores internos, como autocon-


fiança, autodisciplina, otimismo, além de fatores externos, como clareza de papéis e
lócus de controle. Já no círculo externo, observa-se uma variedade de ações em ges-
tão de pessoas que podem e devem ser desenvolvidas para o bem-estar no trabalho.

Portanto, observa-se que há uma série de ações possíveis de serem realiza-


das tanto no âmbito organizacional quanto individual, quando falamos sobre bem-

122
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

-estar no trabalho. As pesquisas apontam caminhos para um trabalho mais saudá-


vel e capaz de despertar o florescimento humano, que passa sobre uma mudança
de valores nas organizações.

88% preferem qualidade de vida a um salário mais alto, mos-


tra enquete

Se você tivesse que optar entre ter uma alta carga horária e ga-
nhar mais ou ter mais flexibilidade no trabalho e ganhar menos,
qual seria sua escolha? De acordo com uma enquete feita com
mais de 30 mil respondentes, para 88% o que vale mais é ganhar
menos e ter qualidade de vida.

Questionados sobre a preocupação da empresa com relação à


saúde dos funcionários, 49% não acham que seus empregado-
res são empáticos com relação ao bem-estar dos colaboradores.
Para 56%, o home office contribuiu para a saúde mental, mas
55% alegam que a empresa não respeita o horário de trabalho
estipulado. Outros 72% consideram suas rotinas de trabalho
exaustivas. De acordo com a enquete, feita pelo @FestadaFirma,
perfil de memes corporativos no Instagram, 67% dos entrevista-
dos já pensaram em fazer ou fazem terapia devido à pressão no
ambiente corporativo.

Nas startups, trabalho afeta saúde mental

Outra pesquisa feita com mais de 4 mil pessoas que trabalham


em startups mostra que 67% sentem que sua saúde mental está
sendo afetada por conta do trabalho. Questionados sobre as ini-
ciativas das empresas nesse sentido, 55% disseram que a star-
tup não tinha ações voltadas à saúde mental e 85% gostariam
que ela desse mais atenção a essa área.

Entre as respostas recebidas sobre o clima corporativo, foram


mencionados aspectos como pressão, foco em resultados, falta
de organização devido ao rápido crescimento e agressividade
das metas.

Entretanto, culturalmente, as startups também estão mais pro-


pensas a pensar nesse tipo de política interna por atuarem em
um mercado competitivo e, por isso, precisam cuidar de questões

123
Psicologia Positiva

de marca empregadora para sustentar a expansão por meio do


capital humano.

Portanto, os respondentes também mencionaram que essas em-


presas estão muito à frente das tradicionais quando se fala em
iniciativas para saúde mental.

FONTE: <https://g1.globo.com/trabalho-e-carreira/noti-
cia/2022/04/27/88percent-preferem-qualidade-de-vida-a-
-um-salario-mais-alto-mostra-enquete.ghtml>. Acesso em: 27 abr. 2022.

124
Capítulo 3 CONTRIBUIÇÕESDAPSICOLOGIAPOSITIVAÀSORGANIZAÇÕES

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste último capítulo vimos como a Psicologia Positiva chegou até as organiza-
ções e trouxe sua contribuição tanto a respeito de aspectos individuais dos trabalha-
dores quanto nas condições ambientais que os rodeiam.

Desde o surgimento das pesquisas da Psicologia nas organizações, esse cam-


po científico veio respondendo a diversos interesses, o que requer um olhar crítico
em sua historicidade. Vimos que as pesquisas iniciais no âmbito laboral vieram lidar
com a questão da fadiga no trabalho, a fim de melhorar a produtividade e diminuir os
prejuízos para as indústrias.

Com a evolução moral da sociedade, a emancipação dos trabalhadores em seus


direitos e os estudos sobre os fatores motivadores, a Psicologia muda seu paradigma
de pesquisa e passa a considerar a saúde do trabalhador em um âmbito mais com-
plexo: o trabalho precisa ser significativo e valoroso. Não somente o trabalhador deve
contribuir para a organização, mas esta deve dar o seu retorno social a todos aqueles
que a fazem produzir.

Nos anos 2000, com o advento da Psicologia Positiva, essa cobrança se torna
ainda mais evidente, dada a relevância e veracidade apresentada pelas pesquisas.
Seligman, ao postular a missão da Psicologia Positiva, sabia disso, considerando a
missão maior desse campo contribuir para o florescimento dos indivíduos, comunida-
des e instituições. Todos os pioneiros sabiam da importância da dimensão laboral no
florescimento humano e por isso a Psicologia Positiva se desenvolveu juntamente às
pesquisas sobre o trabalho.

Muito se descobriu por meio de evidências empíricas do que faz um trabalho ser
saudável e um trabalhador feliz. Neste capítulo, revisitamos os temas mais atuais e
urgentes em termos de discussões e intervenções. Cabe salientar que, em razão do
mundo do trabalho estar cada vez mais dinâmico, as pesquisas também acompa-
nham essas transformações, a fim de responder a tais demandas. Cabe a nós, en-
quanto profissionais da área, nos mantermos atentos e atualizados, a fim de oferecer
o melhor para organizações e trabalhadores.

125
Psicologia Positiva

REFERÊNCIAS
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literatura. Revista psicologia organizações e trabalho, Brasília, v. 19, n. 1, p.
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qual é a ideia por trás do conceito de liderança transformacional? Cadernos
Ebape, v. 13, p. 121-135, 2015.

CARNEIRO, L. L. Contribuições da teoria de demandas e recursos do trabalho


para compreensão de fenômenos positivos da relação indivíduo-trabalho-
organização. In: VAZQUEZ, A. C. S.; HUTZ, C. S. Psicologia positiva
organizacional e do trabalho na prática. São Paulo: Hogrefe, 2021.

FREUD, S. Frases, citações e pensamentos. Disponível em: https://bityli.com/


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GEREMIAS, R. H. L. Psychological capital as a learning facilitator. 2021.


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