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Concreto reforçado com fibras de polipropileno: estudo comparativo da aplicação em

paredes de concreto com as dosagens 300g/m³ e 600g/m³.

OLIVEIRA, Ítalo de Almeida


Engenheiro Civil, Fundação de engenharia e Arquitetura da Universidade Fumec
italo@construtoravoce.com.br

RESUMO

O sistema construtivo mais adotado nas construções de moradias populares, conforme


dados da Caixa Econômica Federal, sistema em paredes de concreto proporcionam
agilidade, redução de mão de obra e menos desperdícios para a obra, visto que não
demandam fôrmas de madeira, geralmente são concretagem que ocorrem todos os dias
logo demandam uma perfeita logística entre a execução na Obra e concretos que
possibilitem a desforma todos os dias, atinjam uma resistência mínima de 3MPa em
menos de 14h e que não sofram fissuras sem passarem por um processo de cura. Para
que atendam a estes critérios mínimos os concretos são reforçados com fibras que
combatem o processo de tração, sendo a fibra de polipropileno a mais utilizada
atualmente e neste artigo será analisada a dosagem de 300g e 600g em 1m³ de
concreto. O artigo retrata o uso dessas duas dosagens em obras de Parede de
Concreto, com mesma tipologia, mesmo traço fornecido pela concreteira tendo como
única diferença a dosagem das fibras de polipropileno. Serão analisados os efeitos de
combate às fissuras observando a homogeneidade das fibras no concreto, a
trabalhabilidade e resistência a compressão do concreto e o custo.

Abstract

The construction system most adopted in the construction of popular housing, according
to data from Caixa Econômica Federal, a system in concrete walls provides agility,
reduction of labor and less waste for the work, since they do not require wooden forms,
they are generally concreting that they take place every day so they demand a perfect
logistics between the execution in the Work and concrete that allow the deformation
every day, reach a minimum resistance of 3MPa in less than 14h and that do not suffer
cracks without going through a curing process. In order to meet these minimum criteria,
concretes are reinforced with fibers that fight the traction process, with polypropylene
fiber being the most used today and in this article the dosage of 300g and 600g in 1m³
of concrete will be analyzed. The article portrays the use of these two dosages in
Concrete Wall works, with the same typology, the same line provided by the concrete
company, with the only difference being the dosage of polypropylene fibers. The crack-
fighting effects will be analyzed, observing the homogeneity of the fibers in the concrete,
the workability and compressive strength of the concrete.
INTRODUÇÃO

Uma das maiores patologias do sistema construtivo em paredes de concreto certamente


são as fissuras. A NBR 16055 cita a presença de microfissuras neste sistema construtivo
e as classifica como aceitáveis considerando a habitabilidade do usuário, tolerância esta
superada pelas construtoras que tentam diminuir esta patologia com a incorporação de
fibras para auxiliar o concreto no combate as fissuras geradas pelas retrações
mecânicas do concreto. Neste contexto vale citar as fibras de polipropileno.

As fibras de polipropileno são filamentos muito finos, fibrilados e alongados, produzido


por sistema de extrusão (processo mecânico de produção onde um material é forçado
através de uma matriz, adquirindo uma forma pré-determinada) e representam um
grande avanço tecnológico que buscam aumentar a segurança das estruturas de
concreto.

Existem dois tipos de fibras de polipropileno:

a. Microfibras: Monofilamentos onde os fios são cortados em comprimento padrão,


de baixo diâmetro, conforme figura 01 e se misturam facilmente no concreto. As
microfibras não possuem função estrutural e trabalham a retração plástica no
processo das primeiras idades do concreto (cura).

Figura 1 - Microfibras sem função estrutural

b. Macrofibras: Fibriladas são malhas de finos filamentos de seção retangular,


possuem telas que se abrem no decorrer da mistura com o compósito, agindo
intertravadas no concreto, conforme figura 02. As Macrofibras são fibras para concreto
incorporadas como elementos estruturais substituindo a tela metálica eletrosoldada e
fibras de aço na construção de pisos e paredes estruturais.
Figura 2 - Macrofibras com função estrutural

O reforço de fibras de polipropileno em concretos se torna necessário em concretos que


não passam por processo de cura úmida nem química, onde a retração hidráulica
acarreta esforço de tração que são combatidos também pelas fibras que suportam os
mesmos e impedem que as fissuras continuem a propagação causando as fissuras
maiores, incomodando os vários usuários da habitação.

A dosagem das fibras de polipropileno se torna especialmente importante tanto na


questão econômica quanto na questão da eficiência no seu combate as fissuras do
concreto. Seguindo esta linha, o setor da construção civil tenta encontrar a resposta
para a dosagem que atenda a estes dois critérios, ou seja, possua a melhor relação
custo-benefício.

METODOLOGIA

Foi analisado a aplicação do concreto reforçado com fibras de polipropileno, conforme


as figuras 03 e 04, em duas dosagens, de 300g/m³ e 600g/m³ em duas Obras.

Figura 3 - Embalagem com fibra de polipropileno


Figura 4 - Aspecto da Fibra de polipropileno

Uma das Obras é o Residencial Barcelona, localizado na região de Betim, com 368
unidades e a outra em Lagoa santa com 644 unidades. As duas Obras são edifícios
residenciais, com 4 pavimentos, cada pavimento com 4 apartamentos, todos com
mesma tipologia arquitetônica, conforme a figura 05 e 06. Foram adotados o mesmo
traço do concreto sendo a dosagem de fibras a única diferença entre eles, conforme as
tabelas 01 e 02. Para tal análise considerou-se a influência na resistência e eficiência
no combate as fissuras observando a trabalhabilidade, homogeneidade na mistura do
concreto e o custo.

Figura 5 – Residencial Barcelona com 368 unidades habitacionais em Betim


Figura 6 - Residencial Lisboa com 544 unidades em Lagoa Santa

As cartas traço abaixo evidenciam o mesmo traço com a diferença apenas na dosagem
de fibras de polipropileno:

Tabela 1- Carta Traço Residencial Lisboa

Fck Slump Restrição Fator Cimento Adit.1 Adit.2 Adição Brita Areia Pó de Água
(mm) A/C (Kg) 1 (Kg) 0 Nat. pedra (L)
(Kg) (Kg) (Kg)
25 650 FC 12H 0.603 340 1.361 2.892 0.3 723 693 300 205
+/- 50 3,0 Mpa;
ECI 28
Gpa

Tabela 2 - Carta traço Residencial Barcelona

Fck Slump Restrição Fator Cimento Adit.1 Adit.2 Adição Brita Areia Pó de Água
(mm) A/C (Kg) 1 (Kg) 0 Nat. pedra (L)
(Kg) (Kg) (Kg)
25 650 FC 12H 0.603 340 1.361 2.892 0.6 723 693 300 205
+/- 50 3,0 Mpa;
ECI 28
Gpa
ANÁLISE CRÍTICA

TRABALHABILIDADE

No quesito trabalhabilidade não houve diferença perceptível entre as diferentes


dosagens, visto que a adição do superplastificante, em Obra, permite o melhor
espalhamento do concreto que preenchem as forma de alumínio sem a necessidade do
uso de vibradores, logo como o traço dos dois concretos possuem o mesmo aditivo e
na mesma quantidade, a diferença da dosagem de fibras não influenciou na
trabalhabilidade do concreto.

HOMOGENEIDADE

A homogeneidade apresentou diferenças significativas com relação as dosagens. O


Concreto foi dosado na Central da Concreteira para as duas Obras. O concreto com
300g/m³ apresentou uma homogeneidade com relação ao concreto, ou seja, não se via
segregações das fibras.

A dosagem de 600g/m³ apresentou alguns inconvenientes no momento da


concretagem. Notou-se uma concentração de fibras no formato de uma bola de
aproximadamente 10cm de diâmetro, formalmente conhecido no mundo acadêmico
como ouriços, conforme figura 07. Esse formato originou-se pelo emaranhado de fibras
que não conseguiram se homogeneizar na mistura do concreto. A mistura mecânica
promovida pelo caminhão Betoneira desde a Central até a Obra, não foi suficiente para
realizar a homogeneização das fibras nesta dosagem o que indica que o tempo de
mistura para dosagens diferentes ou o processo da mistura deve ser analisado com
maior profundidade.

Figura 7 - Aglomerado de fibras de polipropileno que não se homogeneizaram ao concreto, conhecido como
"ouriços"
INFLUÊNCIA DA RESISTÊNCIA DO CONCRETO

O resultado da resistência a compressão do concreto usado em parede de concreto é


controlado nas seguintes idades: 14h, 7dias, 28dias e deixa-se um corpo de prova para
testar a resistência aos 63 dias caso não seja atingida a resistência de projeto aos 28
dias. Para as duas dosagens não se registraram diferenças na resistência a compressão
do concreto.

EFICIÊNCIA DE CADA DOSAGEM NA MINIMIZAÇÃO DAS FISSURAS

As fissuras foram mapeadas considerando um prédio, escolhido aleatoriamente, em


cada Obra, cada um contendo 16 apartamentos. A Obra 01, construída em Betim, teve
predominância de fissuras em quinas inferiores das janelas de quartos e, em alguns
casos, do banheiro. A tipologia e o projeto arquitetônico são idênticos para as duas
obras e nesta pesquisa observou-se que as fissuras se concentraram em pontos
semelhantes nas duas Obras, como podemos ver pela figura 08 e 09 e distribuídos nos
gráfico 01 e 02 abaixo, representados pelas figuras 10 e 11:

Figura 8 - Incidência de fissuras nas quinas inferiores das janelas na Obra 01;
Figura 9 - Fissura no eixo da parede abaixo da janela

Após 1 ano da entrega dos 2 residenciais, o Setor de Assistência Técnica da Construtora


relatou em um gráfico, para cada Obra, a incidência de fissuras encontradas conforme
a região. O intuito desse diagnóstico retroalimenta o corpo técnico dos Engenheiros para
saber a efetividade da inclusão de fibras de polipropileno na mistura do concreto. Como
a diferença de preço de 1m³ de concreto entre as duas dosagens foi de 15%, esperou-
se através de um estudo mais detalhado se era viável manter essa dosagem, reduzir ou
aumentar. Lembrando que se trata de um custo médio, visto que o valor do concreto
muda conforme Concreteira, negociação, marca da fibra de polipropileno.
Concentração de Fissuras x Local
Residencial Barcelona
50%
50% 40%
40%

30%

20%
5% 5%
10%

0%
Eixo da parede 1 Eixo da parede 6 Quina inferior Quina superior
da janela do da porta de
quarto entrada

Figura 10 – Mapeamento de fissuras no Residencial Barcelona, dosagem da fibra de polipropileno de 600g/m³.

Concentração de Fissuras x Local


Residencial Lisboa

63%
70%
60%
50%
40% 31%
30%
20% 5%
10% 1%
0%
Eixo da Parede Eixo abaixo da Quina inferior Quina superior
da Sala janela do quarto da janela do da porta de
quarto entrada

Figura 11 - Mapeamento de fissuras no Residencial Lisboa, dosagem da fibra de polipropileno de 300g/m³.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para as duas dosagens a proporção e o padrão de fissuras se mostrou semelhante às


duas Obras conforme os locais apresentados e sua comparação pelos gráficos. Os
resultados mostram-se coerentes com a teoria, visto que as quinas são pontos de
concentração de tensões, representando 90% dos locais com fissuras, que estão mais
ligados a taxa de armadura nesta região, conforme figura 12, à posição da armadura,
ou seja, diagonal à quina, portanto, neste caso houve falhas quanto ao reforço de
armaduras ortogonais às quinas.
Figura 12 - Posição dos reforços de armaduras nas janelas e fissura no canto superior do vão de porta. Residencial
Lisboa

Conforme a análise das duas dosagens de fibras no concreto não foi possível afirmar
que a concentração de 600g/m³ obteve melhores resultados no combate a fissuras, visto
que a causa das mesmas se concentrou em pontos que a prevenção depende da taxa
e posicionamento da armadura. No quesito trabalhabilidade, não houve diferença pois
o concreto sendo autoadensável, com o aditivo suplerplastificante sendo aplicado na
Obra, o concreto apresentava-se fluido, preenchendo todos os espaços entre a forma,
portanto sem maiores diferenças. A resistência à compressão do concreto não obteve
alterações, com estas duas concentrações de fibras não foi possível observar aumento
na resistência do concreto. A dosagem de 600g/m³ apresentou menos microfissuras por
retração hidráulica nos primeiros dias (até o 3° dia), neste ponto, a dosagem contribuir
para impedir a propagação das microfissuras pela perda de água interrompendo-as, a
figura 13 mostra o processo didaticamente.

Figura 13 - Fibra impedindo a propagação de uma microfissura causada pela retração hidráulica ( DANTAS,1988).
No quesito homogeneidade, a dosagem de 600g/m³ apresentou alguns problemas,
como a incidência maior de concentração de fibra em alguns pontos, onde foi possível
observar ouriços de fibras durante a concretagem da laje e paredes. Acredita-se em
falha na mistura seja pelo tempo seja pelo processo da mistura pela concreteira. O custo
de 600g/m³ aumenta 15% o valor do M³ do concreto sem ter apresentado resultados
que o justifiquem. Este estudo teve como objetivo fazer uma comparação, entre duas
dosagens de fibra de polipropileno no concreto, sendo uma dosagem de 300g/m³ e outra
de 600g/m³ considerando a patologia principal no sistema paredes de concreto, as
microfissuras, considerando para enriquecimento do trabalho, os efeitos em outros
quesitos do concreto, como trabalhabilidade, homogeneidade, resistência do concreto
e finalmente e não menos importante, o custo. Estas dosagens são as principais
adotadas no mercado, por isso a importância do estudo.
REFERÊNCIAS

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 16055: Paredes de


Concreto Moldada no Local. Rio de Janeiro, p. 24. 2012.

Empreendimentos Minha Casa Minha Vida. CEF, 2020. Disponível em: <
http://www.caixa.gov.br/voce/habitacao/minha-casa-minha-
vida/urbana/Paginas/default.aspx>. Acesso em: 22 de Abril de 2020.

DANTAS, F. A. S., AGOPYAN, V. Análise da fissuração devida à retração. Boletim


Técnico da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1988,

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