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Esta resenha irá falar sobre a tese de doutoramento do Prof. Mauro Cezar Coelho, “Do
Sertão para o Mar – um estudo sobre a experiência portuguesa na América, a partir da
colônia: o caso do Diretório dos Índios (1751 – 1798)”, que confronta a historiografia que fala
sobre as Reformas Pombalinas, pelo menos no que rege as políticas indigenistas, como
resultado das experiências de Sebastião José de Carvalho e Melo como diplomata. A tese
defende que estas políticas foram reflexos não só das iniciativas da Metrópole, mas também
dos conflitos e “... das concessões que a administração pombalina teve de fazer diante das
manifestações contrárias...” (p.92)
No seu primeiro capitulo, a tese trata sobre a visão do imaginário que foi construído
em cima do índio desde o final do séc. XIX até meados da década de 30 do século passado, e
como esta visão se apresentou na construção historiográfica que tratava das questões
indígenas. Na tese, este tema é tratado para dar suporte ao entendimento acerca da
historiografia que tratava do índio e de como essa escrita relegou os indígenas a meros
coadjuvantes na história colonial brasileira. O autor faz um grande passeio por vários autores,
desde o séc. XIX até aos mais contemporâneos, para tratar da evolução do papel que foi dado
ao índio, pois de herói a serviço do branco até ser visto como tendo a sua própria maneira de
ver a colonização e o trato que eles davam a ela, eles tiveram sua história contada de vários
ângulos. O que mais chama atenção no capitulo é a variabilidade de trabalhos, usando
inclusive trabalhos de historiadores estrangeiros, que foram usados para tratar do tema e
culminar no trato que foi dado pela historiografia brasileira ao tema do Diretório dos Índios.
Assim, este capitulo nos mostra as tensões que Mendonça Furtado teve que enfrentar,
tendo até mesmo a sua autoridade confrontada e desrespeitada. É visível que Mendonça
Furtado pretendia desde o começo retirar o poder dos missionários sobre os índios, pois ele
via que isso estava atrasando e impedindo o desenvolvimento do Vale e do poder da coroa,
que naquele contexto de demarcação de fronteira entre as coroas ibéricas, não poderia estar
enfraquecido.
Podemos também inserir a noção de trabalho como um ponto importante, pois a visão
agora era que o trabalho é enobrecedor em detrimento à noção do que era indigno. E a
agricultura fora posta como o pilar de sustentação desta noção, pois era vista também como
um instrumento pedagógico de inserção do indígena na civilização. Outra questão de inserção
dá-se também pela legitimação dos casamentos interétnicos.
O que devemos analisar de certo no decorrer do capitulo, é que muitas das políticas
indigenistas eram benquistas por parte dos índios, que tinham a sua própria maneira de ver e
aproveitar essas políticas para si. Tinham certa autonomia para decidir com quem fazer as
suas relações políticas e como tirar proveito, como liberdade para plantar, defesa contra
inimigos. Alguns conseguiam ter uma mobilidade social. O capitulo deixa bem claro como era
a visão dos indígenas e como eles não estavam à mercê completa das decisões da Metrópole.
Sendo assim, podemos concluir que a tese defende, em oposição a boa parte da
historiografia que trata do assunto, a lei do Diretório dos Índios como uma lei colonial, não
por ser uma lei construída na colônia, mas, sim, por ter sido uma lei construída através dos
conflitos que estavam armados nela. Por isso, ao analisarmos as transgressões da lei, não
podemos tomar como ponto de vista o da Metrópole, mas sim devemos olhar que essas
transgressões também foram frutos destes mesmos conflitos.
Não podemos também perder de vista como a tese dá uma grande importância ao
papel indígena em todo esse processo. Não sendo visto como uma mera vitima das ações
metropolitanas ou como somente um resistente a elas, mas sim, também, como um agente
histórico importantíssimo, que mantinha as suas relações políticas, os seus jogos e seus
interesses bem definidos e os protegiam e agiam de acordo com eles.