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E-book

Verdades,
mentiras e exageros
sobre cloroquina e
COVID-19
Introdução

A urgência na busca por um tratamento para a COVID-19 - síndrome


respiratória grave e potencialmente fatal provocada pelo novo coronavírus
SARS-CoV-2, que se espalha pelo mundo a partir da China desde o fim de
2019 – desafia cientistas e médicos que atuam na linha de frente da
pandemia.
Na pressa para encontrar uma terapia eficaz e salvar vidas, pesquisas são
aceleradas nos laboratórios, e medidas desesperadas experimentadas nos
hospitais.
Esta celeridade, no entanto, traz custos científicos e informacionais.
Estudos mal estruturados, com metodologias falhas e execução deficiente,
produzem resultados enganosos e conclusões equivocadas, que mal
interpretados e precipitadamente publicados são logo divulgados e
saudados como a descoberta de uma “cura” para a doença.
Um caso exemplar disso é o da cloroquina (CQ) e uma substância similar, a
hidroxicloroquina (HCQ). Seu uso emergencial e experimental em
pacientes graves de COVID-19 gerou relatos enganadores de que estes
medicamentos antimaláricos seriam o tão buscado tratamento da doença,
o que permanece sem comprovação.
Confira a seguir o que há de verdade, mentira e exageros nestas alegações
até agora (maio de 2020).

E-book - Verdades, mentiras e exageros sobre


cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 1

Cloroquina e hidroxicloroquina estão sendo


usadas com sucesso no mundo inteiro para
tratamento da COVID-19

Não há nenhuma comprovação de que a CQ e a HCQ estejam salvando


as vidas de pacientes de COVID-19 para além de relatos esparsos ou
bravatas de médicos e políticos que anunciam curas sem apresentar
dados. O "hype" em torno das substâncias teve origem em um
experimento limitado e cheio de furos liderado pelo médico e
pesquisador francês Didier Raoult cujos resultados preliminares foram
divulgados pelo próprio em um vídeo no YouTube em meados de
março.

Inspirado por medidas desesperadas tomadas por médicos chineses


em Wuhan, origem da pandemia, em janeiro e reportados em fevereiro,
Raoult experimentou protocolo similar envolvendo a administração de
hidroxicloroquina, combinada ou não com o antibiótico azitromicina,
em 26 pacientes no hospital onde atua em Marselha e outra
instituição francesa. No artigo que relata seu experimento, Raoult e
colegas afirmam que em apenas seis dias alcançaram "100% de cura"
dos seis pacientes que receberam a combinação de HCQ e
azitromicina, e de oito dos 14 que receberam apenas HCQ.

(continua)

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 1

Cloroquina e hidroxicloroquina estão sendo


usadas com sucesso no mundo inteiro para
tratamento da COVID-19

Entre os defeitos do estudo, porém, o que Raoult e colegas não


mencionam na sua conclusão do artigo é que, dos seis faltantes do
grupo original de 26 pacientes, três foram parar na UTI, um morreu,
um abandonou o tratamento devido aos efeitos colaterais e o último
os exames mostraram que não estava com COVID-19. Análises mais
minuciosas do estudo encontraram outras falhas e agora o artigo,
apontado como de má qualidade pela comunidade científica, está sob
revisão para possível remoção dos anais pelo periódico que o publicou,
o "International Journal of Antimicrobial Agents".

Por outro lado, são cada vez mais numerosas as evidências de que a
cloroquina e a HCQ não apenas não trazem qualquer benefício para os
pacientes de COVID-19 como aumentam o risco de eles morrerem. Só
entre o começo e meados de maio de 2020, três dos principais
periódicos médico-científicos do mundo - The New England Journal
of Medicine (NEJM), Journal of the American Medical Association
(JAMA) e The British Medical Journal (BMJ) - publicaram quatro
estudos relativos à questão.

(continua)

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 1

Cloroquina e hidroxicloroquina estão sendo


usadas com sucesso no mundo inteiro para
tratamento da COVID-19

No NEJM, um estudo observacional envolvendo 1.446 pessoas


internadas com COVID-19 em um hospital de Nova York não encontrou
diferenças nas taxas de entubação ou morte no grupo de 811 que
recebeu hidroxicloroquina comparado ao dos pacientes que não foram
tratados com a droga, com os cálculos ainda apontando um pequeno,
mas não estatisticamente relevante, risco maior de complicações ou
morte entre os que foram prescritos HCQ.

No JAMA, por sua vez, um estudo retrospectivo de 1.438 pacientes


hospitalizados na região metropolitana de Nova York mostrou que a
administração de hidroxicloroquina - associada ou não à azitromicina
- não teve qualquer efeito sobre a taxa de mortalidade, e novamente
revelou um risco maior, mas não estatisticamente relevante, de morte
nos grupos tratados com as drogas, especialmente entre as pessoas
que receberam a associação de ambas.

(continua)

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 1

Cloroquina e hidroxicloroquina estão sendo


usadas com sucesso no mundo inteiro para
tratamento da COVID-19

Já no BMJ, um estudo observacional de 181 pessoas internadas em


quatro hospitais franceses com pneumonia devido à COVID-19 e
precisando de oxigenação extra, mas sem necessidade de entubação
ou transferência para unidades de terapia intensiva (UTI), mostrou que
o tratamento com HCQ não teve qualquer influência nas taxas de
sobrevivência ou tempo para retirada da oxigenação extra ou alta
hospitalar, com oito pacientes no grupo que recebeu a droga tendo
que suspender o tratamento devido a alterações perigosas no
funcionamento do coração.

Ainda no BMJ, um quarto trabalho, um ensaio clínico randomizado e


controlado com 150 pacientes atendidos em hospitais chineses com
sintomas leves a moderados de COVID-19 não encontrou benefícios da
HCQ na sua recuperação, sendo que dois dos que receberam a droga
tiveram reações adversas consideradas severas.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 2

A combinação de HCQ e azitromicina funciona


porque, além do efeito antiviral da HCQ, o
antimalárico atua numa estrutura interna da
célula, o ribossomo, impedindo a produção de
proteínas de que o vírus precisa, e a azitromicina
na mitocôndria, deixando o vírus sem energia para
se multiplicar

Estas afirmações não só são falsas como absurdamente erradas, e


deveriam matar de vergonha qualquer segundanista de faculdade
de Biologia. Elas foram apresentadas ao público brasileiro pelo
virologista Paolo Zanotto, e depois propagados pela médica Nise
Yamaguchi. Os proponentes mostram total ignorância de biologia
celular.

A HCQ não atua no ribossomo da célula. A azitromicina, como


outros antibióticos do mesmo tipo, atua em ribossomos de
bactérias, mas não de células do corpo humano. A mitocôndria
apresenta, de fato, ribossomos similares aos de uma bactéria, mas
está bem protegida dentro da célula. E caso o antibiótico realmente
conseguisse fazer estrago dentro de células humanas, quando
usado nas mesmas concentrações em que é receitado para matar
bactérias, não seria um antibiótico, e sim um veneno potente.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 3

Mas esses remédios já foram usados com


sucesso para tratamento de outras viroses, e
experimentos em laboratório mostram que
podem matar o coronavírus

Primeiro, uma coisa é testar uma substância in vitro, na bancada do


laboratório, em culturas de células, e outra in vivo, em organismos,
como animais e pessoas. Na grande maioria das vezes, a ação
observada nos experimentos in vitro não se repete in vivo. Além
disso, cloroquina e hidroxicloroquina já foram testadas in vivo – e
fracassaram fragorosamente — no tratamento de HIV/Aids, dengue,
influenza, chicungunha, ebola e SARS.

Nos casos de chicungunha e ebola, experimentos com animais


mostraram que esses medicamentos podem fazer até mais mal,
aumentando o número de vírus no organismo e agravando os
sintomas de ambas doenças.

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cloroquina e COVID-19
EXAGERADA
ALEGAÇÃO 4

Acontece que os experimentos em laboratório


também mostram que a cloroquina e a
hidroxicloroquina atuam impedindo a entrada
de vírus na célula, alterando o pH do
endossomo, que é o veículo usado pela partícula
viral. Por isso, as substâncias devem funcionar
para a COVID-19.

O caminho de invasão da célula via endossomo existe, mas não é o


único. Existe outra entrada por fusão de membrana – em que o
vírus dispensa a “carona” do endossomo – para a qual o pH é
irrelevante. Estudos mostram inclusive que este caminho de
entrada nas células é o mais utilizado pelo SARS-CoV2. Isso
também pode ajudar a explicar por que os testes com CQ e HCQ dão
certo in vitro, em cultura de células, mas não em animais e
humanos.

As células do trato respiratório têm características de membrana


que facilitam a fusão, enquanto as células usadas para os testes de
laboratório só oferecem ao vírus a via de endossomo.

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cloroquina e COVID-19
EXAGERADA
ALEGAÇÃO 5

Mas CQ e HCQ apresentam ação


imunomodulatória e, portanto, podem ser úteis
na fase grave da doença, quando temos uma
reação descontrolada do sistema imune.

O mecanismo imunomodulatório de fato existe, e é o que torna esses


medicamentos úteis em doenças autoimunes. Mas a aplicabilidade
disso à COVID-19 é, na melhor das hipóteses, um chute. O uso de CQ
e HCQ em pacientes graves, até agora, não parece ter apresentado
resultados favoráveis. O efeito imunomodulador pode demorar
semanas para se manifestar.

Os protocolos para pacientes graves de COVID-19 que estão sendo


aplicados utilizam HCQ por cinco dias. Pode ser que este prazo não
seja suficiente para que o efeito imunomodulador faça diferença. Por
outro lado, esse efeito pode ser indesejado nas fases iniciais da
doença, exatamente por deprimir o sistema imune, e acabar por
favorecer a replicação do vírus.

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cloroquina e COVID-19
VERDADEIRA
ALEGAÇÃO 6

Outra vantagem da CQ e HCQ é que


apresentam ação anti-inflamatória, o que
também pode ser útil na fase grave da
COVID-19.

CQ e HCQ de fato têm ação anti-inflamatória, e isso pode ser útil no


tratamento da COVID-19, mas isso é irrelevante no momento. Isso
porque existem diversos outros medicamentos no mercado com a
mesma ação, e menos riscos e efeitos colaterais.

Assim, não há necessidade de usar cloroquina e hidroxicloroquina


como anti-inflamatórios no tratamento da doença, pois temos
numerosas alternativas melhores para isso.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 7
Estes remédios são usados há anos e nunca houve
este temor dos efeitos colaterais. Por que todo esse
medo agora?

Para começar, como já mostramos, não há qualquer comprovação de


que a cloroquina ou a hidroxicloroquina tragam benefícios para o
tratamento da COVID-19. Além disso, estes medicamentos têm sua
relação risco-benefício considerada aceitável para pacientes de
malária, lúpus e artrite reumatoide justamente porque passaram por
testes clínicos para estas doenças. Sabemos a dose adequada, a
frequência de uso e quais efeitos colaterais adversos esperar e
monitorar.

Entre os efeitos adversos comuns de CQ e HCQ estão arritmia


cardíaca, perda de visão, perda de audição e problemas no fígado.
Pacientes que fazem uso contínuo são acompanhados de perto, e se
houver qualquer alteração crítica, a medicação é trocada.

No caso de pacientes autoimunes, por sua vez, a dose utilizada é bem


menor do que a empregada nos protocolos que estão sendo
experimentados para o tratamento da COVID-19.

(continua)

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 7
Estes remédios são usados há anos e nunca houve
este temor dos efeitos colaterais. Por que todo esse
medo agora?

Já os efeitos desses remédios em pessoas acometidas por uma


doença infecciosa grave nunca foram estudados. O organismo de
uma pessoa em estado grave de COVID-19 não é o mesmo de
alguém infectado por malária, ou em tratamento para lúpus. A
interação com outros medicamentos comuns no tratamento de
suporte da COVID-19 nunca foi investigada. Diabéticos, por exemplo,
são grupo de risco para COVID-19, e podem estar fazendo uso de
metformina. Estudos em camundongos mostraram que administrar
CQ com metformina matou 30% dos animais.

A administração conjunta da CQ e HCQ com azitromicina também


nunca foi testada antes desta pandemia. A azitromicina também
provoca arritmia cardíaca, além de diarreia, que por sua vez leva à
desidratação. Assim, estaríamos dando dois medicamentos que
atacam o coração para pacientes com o órgão já fragilizado, uma vez
que o próprio vírus é um terceiro agente causador de arritmia.
Estamos empilhando fatores de risco ao combinar essas medicações
nesses pacientes.

(continua)

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 7
Estes remédios são usados há anos e nunca houve
este temor dos efeitos colaterais. Por que todo esse
medo agora?

Por fim, já há relatos bem embasados e estudos que demonstram


efeitos colaterais graves, como paradas cardíacas e arritmias, no uso
destes medicamentos em pacientes severos de COVID-19.

Só um hospital da França, por exemplo, contabilizou 56 eventos


cardíacos graves, com sete paradas cardíacas, quatro mortes e trinta
e sete casos de prolongamento de QT (uma falha no ritmo do
coração), além de casos de arritmia com síncope. Como esta
instituição francesa, hospitais ao redor do mundo que começaram a
administrar CQ ou HCQ para tratar a COVID-19 com base nos relatos
espúrios de supostos benefícios já pararam de usar esses
medicamentos em razão destes efeitos colaterais sérios.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 8

Ah, então CQ e HCQ só não estão funcionando


contra a COVID-19 porque estão dando para
pacientes graves, e o certo é dar no começo da
doença.

Nas respostas anteriores já discorremos sobre o que esperar da ação


dos remédios. Eles até poderiam funcionar na fase grave da doença
pela ação imunomodulatória e anti-inflamatória, mas esses efeitos não
foram realmente observados e nem estudados contra a COVID-19, são
só possibilidades teóricas.

Já para serem benéficos na fase inicial da doença, os medicamentos


teriam que ter ação antiviral e impedir a replicação do vírus. Isso é
pouco provável: CQ e HCQ já foram testadas para outras viroses como
HIV/Aids, SARS, chicungunha, ebola, dengue e influenza e nunca
funcionaram. Para ebola e chicungunha, pioraram a doença em
animais, aumentando a replicação do vírus.

De resto, ficar mudando a alegação cada vez que os fatos contradizem


o que se deseja provar – uma hora a HCQ é a salvação dos doentes
graves; quando isso não funciona, passamos para os moderados; e
quando isso não funciona de novo, vamos para quem está nos
estágios iniciais da doença – soa mais como aglomeração desesperada
de desculpas esfarrapadas do que pesquisa científica séria.

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cloroquina e COVID-19
EXAGERADA
ALEGAÇÃO 9
Mas um estudo de médicos da Prevent Senior curou
centenas de pessoas com o protocolo de uso precoce de
cloroquina associada com azitromicina nas fases iniciais
da COVID-19

A única fonte dessa informação é um rascunho preliminar de artigo,


ainda não devidamente revisado por pares, aceito e publicado em um
periódico científico, e sem qualquer menção ao conflito de interesses de
seus autores, todos funcionários da Prevent Senior e estimulados a
provar a eficácia da HCQ e do serviço de telemedicina da empresa.

Além disso, este suposto estudo é uma verdadeira aula de como não se
deve testar um medicamento, numa sequência de falhas metodológicas
e problemas estruturais. Para começar, nenhum dos pacientes
envolvidos teve diagnóstico confirmado de COVID-19 por exames, só
“suspeita” de que estavam com a doença via relato de sintomas – que
poderiam ser muito bem de uma gripe, resfriado comum ou mesmo
asmas – por meio de um sistema de telemedicina.

Assim, não sabemos se um paciente que tomou o remédio e melhorou


estava realmente com COVID-19. E, mesmo que estivesse, como a taxa
de recuperação da doença sem tratamento nenhum é muito alta, não
podemos afirmar que a HCQ contribuiu de qualquer forma para a
melhora dos pacientes sem uma comparação sistematizada com um
grupo de controle/placebo.

(continua)

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cloroquina e COVID-19
EXAGERADA
ALEGAÇÃO 9
Mas um estudo de médicos da Prevent Senior curou
centenas de pessoas com o protocolo de uso precoce de
cloroquina associada com azitromicina nas fases iniciais
da COVID-19

A isto se somam outras falhas metodológicas do estudo. Os próprios


participantes escolheram se tomariam ou não o remédio. Então, tanto
pacientes quanto médicos sabiam quem estava recebendo ou não a
medicação, rompendo o padrão duplo-cego que deve guiar este tipo de
investigação ao criar vieses de expectativa dos resultados. Este
fenômeno piora o já ruim critério de “sucesso” do tratamento escolhido
no estudo, a posterior hospitalização ou não dos pacientes. Sabendo
quem estava em qual grupo, os médicos, mesmo inconscientemente,
podem ter sido mais cautelosos com os que não recebiam a HCQ,
inflando o número de internações entre estes pacientes.

Da mesma forma, os médicos, querendo provar que a HCQ funciona,


podem ter hesitado em pedir a internação dos pacientes do grupo
medicado, reduzindo artificialmente seu número. Além disso, os próprios
pacientes, por acreditarem que o remédio funciona, também hesitariam
em pedir ajuda diante de um agravamento dos sintomas. Por fim, este
tipo de separação não randomizada dos grupos também impede que a
distribuição dos pacientes neles seja a mais homogênea possível em
critérios como idade, gênero, forma e severidade dos sintomas e fatores
de risco de agravamento da doença, como diabetes e problemas
pulmonares ou cardíacos.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 10

Mas eu conheço pessoas com COVID-19 que


tomaram e melhoraram por causa da cloroquina.

Você pode até conhecer pessoas que foram diagnosticadas com a


COVID-19, tomaram cloroquina e depois se recuperaram da doença.
Mas, desta forma, é insustentável atribuir a recuperação ao remédio.
Lembre-se: 90% dos casos são leves, então a cloroquina pode muito
bem não ter feito a menor diferença, e a pessoa teria se recuperado
de qualquer maneira.

Já em casos graves, os pacientes internados recebem diversos


outros medicamentos, como corticoides, anti-inflamatórios e
anticoagulantes. Novamente, neste cenário, não há razão para achar
que a cloroquina tenha feito alguma diferença crucial na resolução do
caso. Pelo contrário, pode até ter atrapalhado. A única maneira de
saber se a CQ ou a HCQ, associadas ou não à azitromicina, tiveram
algum efeito é comparar de forma sistemática e científica um grupo
de pessoas que usou os medicamentos com um grupo que não.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 11

Ah, ciência não é tudo! A intuição e a experiência


pessoal dos médicos é mais Importante neste
momento.

Médicos são seres humanos, tão vulneráveis a vieses e a embarcar


em falsas esperanças quanto o restante das pessoas. O método
científico é, exatamente, a ferramenta que temos para reunir uma
grande quantidade de experiências de modo lógico e ver, uma vez
eliminados os vieses a as ilusões, o que resta.

Ele nem sempre funciona como deveria, mas descartá-lo é como


optar por um tapete voador só porque aviões, às vezes, caem. E, de
qualquer modo, há cada vez mais médicos relatando que a HCQ não
deu certo nas suas tentativas de lutar contra a COVID-19.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 12

Esta campanha contra a cloroquina tem como


objetivo esconder que ela é a cura da COVID-19
por motivações políticas (ou econômicas, ou
conspiração de alguma sociedade secreta, ou
um plano de alienígenas para a dominação do
planeta...)

Em uma pandemia global como esta, não haveria como “esconder a


cura”, seja em escala nacional, para, por exemplo, prejudicar o
presidente Jair Bolsonaro, seja internacional. Se algum remédio –
cloroquina, ou qualquer outro – realmente já estivesse em posição
de fazer uma diferença para o bem na evolução da doença em suas
vítimas, ele estaria sendo usado em larga escala em alguma parte
do mundo.

Pelo contrário, mesmo países que, de início, abraçaram a cloroquina


como possível tratamento, como EUA e França, não viram qualquer
benefício e já abandonaram a ideia.

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cloroquina e COVID-19
FALSA
ALEGAÇÃO 13

Estamos em guerra, então vale tudo!


Precisamos usar de tudo!

Se estamos em guerra, o que menos precisamos é de fogo amigo. Se


um remédio não tem nenhum benefício comprovado, e pode até
acelerar a morte, não administrá-lo não é deixar morrer, é evitar que
o paciente seja jogado numa roleta russa. Usá-lo não ajuda em nada,
e na verdade pode até atrapalhar.

Já vimos este erro na epidemia de ebola que atingiu o Oeste da


África entre 2013 e 2016, matando mais de 11 mil pessoas. Os
médicos usaram de tudo, os cientistas não testaram nada direito.
Com isso, não ajudamos ninguém, e até hoje é impossível afirmar se
os remédios usados no desespero funcionam ou não contra a
doença.

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cloroquina e COVID-19
VERDADEIRA
ALEGAÇÃO 14

Mas eu quero mesmo assim e, se estiver


doente, eu tomo o que quiser!

Sim, seu médico pode prescrever cloroquina e você pode tomar.


Isso se chama uso off-label de medicação, a utilização para uma
finalidade diferente daquela para qual o remédio foi aprovado. Isso
é uma decisão do médico com o paciente. Mas quando se fala em
incluir um novo medicamento num guia de procedimentos
médicos sancionado e recomendado pelo governo, ou de uso no
SUS, aí já não se trata mais de uma decisão individual. Estamos
falando de produção em massa, gasto de dinheiro público e
pressão legal e institucional sobre os profissionais de saúde.

Sem esquecer que também estamos falando de dar um remédio


que pode ser perigoso, e não trazer nenhum benefício, para
milhões de pessoas, das quais muitas podem morrer em razão da
medicação. O hospital que detectou problemas cardíacos na
França e parou de receitar a cloroquina, por exemplo, tinha
capacidade para fazer eletrocardiogramas em todos os pacientes
mais de uma vez ao dia. O Brasil não tem condições de fazer isso
na rede pública de saúde.

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FALSA
ALEGAÇÃO 15
Ah, mas quando provarem que a
cloroquina funciona contra a COVID-19,
vocês vão ficar com a cara no chão.

Afirmações extraordinárias - como a descoberta da cura para uma


pandemia global de uma doença potencialmente grave como a
COVID-19 em um remédio comum e barato como a cloroquina -
requerem evidências extraordinárias, diria Carl Sagan. Mas não é
isto que estamos vendo agora e na verdade, como exposto, muito
pelo contrário.

Se evidências robustas mostrarem que o medicamento funciona, e


que o benefício que a cloroquina traz para os pacientes é maior que
os riscos, porém, todos ficaremos muito felizes e aliviados. A
ciência não é uma disputa entre artigos de fé, presa a dogmas e os
conhecimentos do momento.

Sua evolução também é muitas vezes fruto da contestação de


dogmas por meio de investigações sistemáticas, refletindo
justamente a habilidade humana de mudar de ideia diante da
evolução das evidências e do conhecimento.

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With In-Hospital Mortality in Patients With COVID-19 in New York State

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cloroquina e COVID-19
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mentiras e exageros
sobre cloroquina e
COVID-19

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