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Os autores e a editora empenharam­se para citar adequadamente e dar o devido crédito a todos os detentores dos direitos autorais de
qualquer material utilizado neste livro, dispondo­se a possíveis acertos caso, inadvertidamente, a identificação de algum deles tenha
sido omitida.
Não é responsabilidade da editora nem do autor a ocorrência de eventuais perdas ou danos a pessoas ou bens que tenham origem no
uso desta publicação.

 Apesar dos melhores esforços do autor, das tradutoras, do editor e dos revisores, é inevitável que surjam erros no texto. Assim, são
bem­vindas as comunicações de usuários sobre correções ou sugestões referentes ao conteúdo ou ao nível pedagógico que auxiliem
o aprimoramento de edições futuras. Os comentários dos leitores podem ser encaminhados à Editora Roca.

 The Merck Veterinary Manual, tenth edition First published in the United States by Merck & CO., INC,.
Copyright 2010 by Merck & Co., Inc. All rights reserved.

 Manual Merck de Veterinária – 10a Edição
ISBN 978­85­412­0154­4
Direitos exclusivos para a língua portuguesa
Copyright © 2013 da 10a Edição pela Editora Roca Ltda.
Uma editora integrante do GEN | Grupo Editorial Nacional
Rua Dona Brígida, 701 – CEP: 04111­081 – São Paulo – SP
Tel.: 55(11) 5080­0770
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 Reservados todos os direitos. É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por
quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na internet ou outros), sem permissão expressa da editora.

Assistente Editorial: Sarita Borelli
Coordenador de Revisão: Queni Winters
Capa: Rosangela Bego
Imagens: Rosangela Bego
Produção: Freitas Bastos

 CIP­BRASIL. CATALOGAÇÃO­NA­FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.
M251
10 .ed.

Manual Merck de veterinária / [editor Cynthia M. Khan; editor associado Scott line]; [tradução José Jurandir … [et al.]. ­ 10. ed. ­ São
Paulo : Roca, 2013.

Tradução de : The Meck veterinary manual, 10th ed
Inclui bibliografia
ISBN 978­85­4120­310­4

1. Medicina veterinária ­ Manuais, guias, etc. 2. Patologia clínica veterinária. 3. Animais ­ Doenças. I. Kahn, Cynthia M. II. Line,
Scott.

12­8936.
CDD: 636.089
CDU: 619:616
MANUAL MERCK DE VETERINÁRIA

Edições Anteriores
1a Edição – 1955
2a Edição – 1961

3a Edição – 1967
4a Edição – 1973

5a Edição – 1979
6a Edição – 1986

7a Edição – 1991
8a Edição – 1998

9a Edição – 2005

Edições em Outros Idiomas
Croata/Eslovaca – Komora Vetarinarnich Lekarov, Brno
Espanhol – Editorial Oceano, Barcelona
Francês – Editions d’Apres, Paris
Inglês – Merck & Co., Inc., New Jersey
Italiano – Cristiano Giraldi Editore, Bologne
Japonês – Gakusosha, Tokyo
OUTROS
LIVROS DA MERCK

The Merck Index
Primeira Edição, 1889

Manual Merck – Diagnóstico e Tratamento
Primeira Edição, 1899

The Merck Manual of Medical Information
Home Edition
Primeira Edição, 1997

The Merck Manual of Health and Aging
Primeira Edição, 2004

Manual Merck – Saúde Animal
Primeira Edição, 2007

Manual Merck de Diagnósticos Médicos
Primeira Edição, 2008

Os livros da Merck são publicados como um serviço para a comunidade científica e o público em geral.
PREFÁCIO

Vivemos  em  uma  época  de  novidades  e  melhoria,  onde  a  “novidade”  é  sempre  o  mais  importante.  Quase  que
diariamente  nos  é  disponibilizada  ampla  gama  de  mensagens  que  tenta  nos  convencer  de  que  algum  produto  é
melhor,  tem  ação  mais  rápida  ou  é  mais  efetivo.  Assim,  é  muito  gratificante  que  o  Manual  Merck  de
Veterinária, inicialmente  publicado  no  ano  de  1955  como  um  livro  pequeno  e  relativamente  compacto,  continue
sendo  a  melhor  referência  veterinária  disponível  no  mercado,  em  seu  gênero.  A  cada  edição  que  o  sucede,
o  Manual  cresce  –  tanto  na  quantidade  de  páginas  quanto  no  escopo  –,  mas  o  objetivo  permanece  o  mesmo
declarado pelos editores da primeira edição: “…propiciar ao veterinário informação concisa, confiável e facilmente
disponível sobre o diagnóstico e tratamento das doenças dos animais criados pelo homem com intuito de consumo
ou como animal de estimação”.
Embora  o  objetivo  continue  o  mesmo  e  a  organização  do  livro  seja  muito  familiar  aos  usuários  prévios,  esta
nova edição do Manual contém modificações significativas. As páginas estão totalmente reformatadas para tornar
mais fácil a leitura do texto e para auxiliar os leitores a localizarem a informação mais rapidamente na página. As
tabelas  também  foram  reformuladas  para  facilitar  o  uso.  Mais  notadamente,  pela  primeira  vez  o  Manual  foi
impresso  em  cores,  permitindo  o  acréscimo  de  imagens  –  inclusive  ilustrações  originais;  imagens  obtidas  por
radiografia, ultrassonografia e endoscopia; microfotografias; e muito mais – para realçar o texto. Ao todo, o livro
contém cerca de 250 imagens, quantidade que esperamos aumentar na próxima edição.
Cada  seção  do  livro  foi  cuidadosamente  revisada  e  atualizada.  Para  atender  a  crescente  popularidade  –  e  o
conhecimento básico a respeito – de animais exóticos e de laboratório, a seção foi ampliada, inclusive com textos
mais abrangentes sobre aves de estimação, peixes, ratitas, répteis e roedores, bem como um novo capítulo sobre
ouriço africano. Nesta nova edição, o capítulo sobre animais de laboratório inclui discussão a respeito de normas
reguladoras. As seções sobre imunologia e comportamento foram amplamente revisadas, de modo a torná­las mais
úteis ao clínico. A seção sobre toxicologia foi reorganizada para facilitar a informação e nela foi incluído um novo
capítulo  a  respeito  de  cogumelos  venenosos.  A  extensa  tabela  de  referência  de  zoonoses  também  foi  atualizada
com  novo  material  introdutório,  zoonoses  recentes  e  cruzamento  de  referências,  para  uma  discussão  mais
completa. Além disso, o risco zoonótico de doenças veterinárias foi destacado em todo o Manual.
Foram adicionados novos capítulos para propiciar informações básicas sobre tópicos emergentes de importância
aos  veterinários,  inclusive  clonagem  de  animais  domésticos  e  medicina  veterinária  alternativa  e  complementar.
Foram  acrescentados  novos  capítulos  sobre  doenças  e  anormalidades,  como  síndrome  metabólica  de  equinos,
anormalidades do metabolismo de potássio, inflamação da vesícula seminal em touros e pseudoprenhez em cabras.
Vários outros capítulos foram consideravelmente revisados ou novamente escritos, como claudicação em equinos,
cardiopatia ou insuficiência cardíaca e doenças de estômago e intestinos em pequenos animais, dentre outros.
Para utilizar o Manual de forma mais eficientemente, os leitores são estimulados a se familiarizar com o Guia do
Leitor e a utilizar o Sumário de cada seção, indicado pela respectiva reentrância colorida no corpo do exemplar. A
ampla Lista de Capítulos pode ser um importante primeiro passo para a localização da informação de um tópico
específico.  Para  manter  o  tipo  de  manual,  que  é  a  característica  deste  livro,  os  editores  solicitaram  limitação  do
espaço de nossos colaboradores e não há inclusão das referências.
A extensão e profundidade do conteúdo do Manual Merck de Veterinária se devem, em grande parte, aos quase
400  autores  que  participaram  desta  edição,  incluídos  na  Lista  de  Colaboradores.  Ademais,  vários  revisores
propiciaram comentários e sugestões relevantes que melhoraram adicionalmente o conteúdo. Sem o seu tempo e
habilidade,  uma  referência  deste  tipo  não  seria  possível.  O  foco  global  do  livro  é  evidenciado  pela  publicação
contínua de edições em línguas estrangeiras, bem como pelas contribuições oriundas de autores de 19 países, em
todo o mundo.
Também  agradecemos  os  membros  do  corpo  editorial  que  revisaram  os  capítulos  das  suas  áreas  de
especialização, fornecendo inestimáveis sugestões para novos conteúdos e autores. Seus conhecimentos coletivos
continuam a moldar o escopo deste livro. Nos bastidores, a equipe editorial da Merial e o grupo editorial do Merck
tornaram possível a conclusão desta tarefa gigantesca. Agradecimentos especiais a Odilia Achu, que praticamente
gerenciou todas as etapas do desenvolvimento deste trabalho, sem perder de vista um único detalhe; a Scott Line,
que revisou vários milhares de imagens, selecionou as mais úteis e coordenou suas inclusões, além de atuar como
editor  associado;  por  fim  a  Susan  Aiello,  que  continua  a  contribuir  para  a  excelência  editorial  desta  publicação.
Também  os  agradecimentos  a  Gary  Zelko  e  Pamela  Barnes­Paul,  da  Merck,  por  propiciarem  orientação
especializada e entusiasmo para a tarefa de produzir e promover cada edição.
A publicação de um novo livro é uma satisfação, ainda que saibamos que as informações nele contidas devam
ser  disponibilizadas  de  outras  formas,  de  modo  a  aumentar  sua  utilidade  aos  estudantes  e  clínicos.  O  Manual
Merck de Veterinária já  se  encontra  disponível  em  vários  formatos  eletrônicos  e  continuamos  a  pesquisar  novas
opções  para  disponibilizar  informações  durante  o  período  desta  edição.  Como  sempre,  aguardamos  feedback  e
sugestões para melhorar cada vez mais este trabalho.

Cynthia M. Kahn
Editora
GUIA AOS LEITORES

 O índice contém o título de cada seção do Manual e a correspondente reentrância no corpo do livro.
 Cada seção tem seu próprio sumário, que contempla os títulos dos capítulos e subcapítulos da seção.
 Há vários números de páginas com cruzamento de referências por todo o texto, permitindo que o leitor encontre
rapidamente discussão sobre o material relacionado em outras partes do livro.
  Diversas  abreviações  utilizadas  rotineiramente  no  texto  estão  listadas  na  página  XIII.  Outras  abreviações
utilizadas são definidas quando citadas pela primeira vez.
 Na maioria das vezes, são utilizados nomes genéricos (não comerciais) de medicamentos.
 Os cabeçalhos das páginas pares correspondem ao título do capítulo do texto que aparece na parte superior dessa
página.  Os  cabeçalhos  das  páginas  ímpares  correspondem  ao  título  do  capítulo  do  texto  que  aparece  na  parte
inferior dessa página. Em outras palavras, os cabeçalhos são utilizados como em um dicionário padrão.
 O índice é a melhor forma de localizar discussões específicas sobre determinada doença, condição ou síndrome
pelos nomes as quais são conhecidas.
 A primeira metade deste Manual está organizada de acordo com os sistemas anatômicos e as doenças específicas
estão  localizadas  no  principal  sistema  acometido.  Enfermidades  que  podem  afetar  mais  de  um  sistema  são
descritas  na  seção  sobre  Infecções  Generalizadas  (INF).  A  segunda  metade  deste  Manual  abrange  tópicos  ou
disciplinas especiais.
  Autores,  revisores,  redatores  e  o  editor  se  esforçaram  para  assegurar  que  tratamentos,  fármacos,  dosagens  e
períodos de carência dos medicamentos fossem confiáveis e de acordo com os padrões aceitos por ocasião desta
publicação.  Entretanto,  constantes  alterações  nas  informações  resultantes  de  pesquisas  contínuas  e
experiência  clínica,  diferenças  de  opiniões  racionais  entre  as  autoridades,  aspectos  particulares  de
situações  clínicas  individuais  e  a  possibilidade  de  erro  humano  na  elaboração  de  um  texto  tão  extenso
requerem que o leitor faça julgamento individual ao tomar uma decisão clínica e, caso necessário, consulte
e compare informações de outras fontes. Em particular, aconselha­se que o leitor verifique a bula do produto,
fornecida pelo fabricante do medicamento, antes de prescrevê­lo ou administrá­lo, especialmente se não lhe for
familiar  ou  se  raramente  utilizado.  Várias  doses  de  medicamentos  administrados  não  são  indicadas  na  bula
(uso extralabel), fato que requer uma relação veterinário­cliente­paciente incontestável.
Dedicado aos veterinários de todo o mundo,
e aos seus colegas em ciência veterinária.
ÍNDICE

CIR Sistema Circulatório

DIG Sistema Digestório

OO Olho e Ouvido
END Sistema Endócrino

INF Infecções Generalizadas

IMU Sistema Imunológico

TEG Sistema Tegumentar
MET Doenças Metabólicas

MUS Sistema Musculoesquelético
NER Sistema Nervoso

REP Sistema Reprodutivo
RES Sistema Respiratório

URN Sistema Urinário
COM Comportamento
PAT Patologia Clínica e Procedimentos

EME Medicina Emergencial e Cuidados Críticos
EXL Animais Exóticos e de Laboratório
MAN Manejo e Nutrição

FAR Farmacologia
DOM Aves Domésticas

TOX Toxicologia
ZNS Zoonoses
REF Guias de Referência
IR Índice Remissivo
ABREVIAÇÕES

AA = amiloide A
AAALAC = Association for Assessment and Accreditation of Laboratory Animal Care International
AAFCO = Association of American Feed Control Officials
AAr = ácido araquidônico
ABTS = ácidos biliares totais
ACh = acetilcolina
AChE = acetilcolinesterase
AcM = anticorpos monoclonais
ACTH = hormônio adrenocorticotrófico
ADH = hormônio antidiurético
ADP = difosfato de adenosina
AEC = artrite­encefalite caprina
AEH = aplasia específica de hemácia
AEO = abortamento enzoótico dos ovinos
AESP = atividade elétrica sem pulso
AG = anion gap
AGCC = ácidos graxos de cadeia curta
AGE = ácidos graxos essenciais
AGID = imunodifusão em ágar­gel
AGNE = ácidos graxos não esterificados
AGP = α1­glicoproteína ácida
AGPI = ácidos graxos poli­insaturados
AGV = ácidos graxos voláteis
AHAI = anemia hemolítica autoimune
AHIM = anemia hemolítica imunomediada
AIE = anemia infecciosa equina
AINE = anti­inflamatório não esteroide
ALP = fosfatase alcalina
ALT = alanina aminotransferase
AMDUCA = Animal Medicinal Drug Use Clarification Act
aMPV = metapneumovírus aviário
ANA = anticorpos antinucleares
ANTU = α­naftiltioureia
AP = alta patogenicidade
APDT = Association of Pet Dog Trainers
APHIS = Animal and Plant Health Inspection Service
APR = atrofia progressiva da retina
ASAR = acidose subaguda do rúmen
ASC = área sob a curva
ASR = arritmia sinusal respiratória
AST = aspartato aminotransferase
AT = alcalinidade total / antitrombina
ATP = trifosfato de adenosina
ATT = antitoxina tetânica
AV = atrioventricular
AVC = acidente vascular cerebral
AVE = arterite viral equina / vírus da arterite equina
AVIC = área veterinária
AVPS = anomalias vasculares portossistêmicas
AWA = Animal Welfare Act
AZT = azidotimidina
BCG = bacilo de Calmette­Guérin
BE = benzoato de estradiol
BER = necessidade de energia basal
BHB = beta­hidroxibutirato
BHC = hexacloreto de benzeno
BLV = vírus da leucemia bovina
BP = baixa patogenicidade
BPC = bifenilas policloradas
bpm = batimentos por minuto
BPV = papilomavírus bovino
BSP = sulfobromoftaleína
BUN = nitrogênio ureico sanguíneo
BVD = diarreia viral bovina / vírus da diarreia bovina
CADP = membrana de nitrocelulose revestida com colágeno e difosfato de adenosina
CAE = síndrome artrite­encefalite caprina
CAM = concentração antibiótica mínima
cAMP = monofosfato de adenosina cíclico
CAR = cilia­associated respiratory bacillus
CAV = adenovírus canino
CB = canabinoide
CCFT = capacidade de conjugação de ferro total
CCS = ceratoconjuntivite seca / contagem de células somáticas
CCV = doença do vírus do peixe­gato­do­canal
CDC = Centers for Disease Control and Prevention
CDV = vírus da cinomose canina
CEA = controle de exposição automático
CEM = gasto energético mínimo
CEME = gasto energético mínimo específico
CEPI = membrana de nitrocelulose revestida com colágeno e epinefrina
CHCM = concentração de hemoglobina corpuscular média
CHOP = ciclofosfamida, hidroxidaunorrubicina, Oncovin e prednisona
CIB = ceratoconjuntivite infecciosa bovina
CID = coagulação intravascular disseminada
CIDR = dispositivos intravaginais de liberação controlada de drogas
CIF = cistite idiopática felina / coronavírus intestinal felino
CIM = concentração inibitória média / concentração inibitória mínima
CJD = doença de Creutzfeldt­Jakob
CJDv = variante da doença de Creutzfeldt­Jakob
CK = creatinoquinase
CL = corpos lúteos
CLLFe = complexo leucemia­linfossarcoma felino
CLSI = Clinical and Laboratory Standards Institute
CMS = consumo de matéria seca
CMT = California Mastitis Test
CNE = carboidrato não estrutural
CNF = carboidratos não fibrosos
COP = doxorrubicina
COX = ciclo­oxigenase
CP = coronavírus dos perus
CPDA = adenina­dextrose­fosfato­citrato
CPE = C. perfringens enterotoxigênico
CVB = coronavírus bovino
CVF = calicivírus felino
CVS = circovírus suíno
DA = dermatite atópica
DAA = derivados aminoacetonitrílicos
DAD = deslocamento do abomaso à direita / doença articular degenerativa
DAE = deslocamento do abomaso à esquerda
DAG = diacilglicerol
DAP = dermatite alérgica a pulgas
DAS = diacetoxiscirpenol
DBPP = doença do bico e das penas dos psitacídeos
DCAD = diferença cátion­ânion dietética
DCI = doença do corpúsculo de inclusão
DCVS = doenças causadas por circovírus suíno
DDC = doença debilitante crônica
DDCA = dieta com diferença cátion­ânion
DDD = diclorodifeniletano
DDE = diclorodifenildicloroetano
DDP = doença da dilatação proventricular
DDPM = deslocamento dorsal do palato mole
DDT = diclorodifeniltricloroetano
DE = densidade específica
DEC = dietilcarbamazina
DEEM = doença epiteliotrópica eosinofílica multissistêmica
DEET = N,N­dietil­3­metilbenzamida
DEP = diferenças esperadas na progênie
DEPP = drenagem elevada ou postural do parênquima pulmonar
DERG = deficiência da enzima ramificadora do glicogênio
DES = dietilestilbestrol
DGR = diagnóstico de gestação do rebanho
DGV = dilatação gástrica­vólvulo
DHA = ácido docosa­hexaenoico
DHAI = doença hepática aguda idiopática
DIB = doença infecciosa da bursa de Fabricius
DICOM = Digital Imaging and Communication in Medicine
DII = doença intestinal inflamatória
DILC = dispositivos internos de liberação controlada de medicamento
DIVR = doença inflamatória das vias respiratórias
DLIP = dispositivos de liberação intravaginal de progesterona
DM = diabetes melito
DMAP = dimetilaminofenol
DMNA = dimetilnitrosamina
DMPS = 2,3­dimercaptopropano­1­sulfonato
DMSA = ácido dimercaptossuccínico
DMSO = dimetilsulfóxido
DMV = displasias microvasculares
DNA = ácido desoxirribonucleico
DNVV = doença de Newcastle velogênica viscerotrópica
DOCP = pivalato de desoxicorticosterona
DON = doença dos ovinos de Nairóbi
DP = doença de Pacheco
DPE = difenil­éter
DPIH = disfunção da parte intermediária da hipófise
DPIP = disfunção da parte intermediária da pituitária
DPR = doença proliferativa renal
DPS = desvio portossistêmico
DPSA = desvios portossistêmicos adquiridos
DRA = diarreia responsiva a antibióticos
DRAS = degeneração de retina adquirida súbita
DRB = doença respiratória bovina
DRC = doença respiratória crônica
DSA = dermatite semelhante à atopia
DSMA = metanoarsonato de dissódio
DSP = dual­specificity protein
DSS = sulfossuccinato sódico de dioctila
DT = dureza total
DTM = Dermatophyte Test Medium
DTUIF = doença do trato urinário inferior de felinos
DUCS = doença ulcerativa cutânea septicêmica
DUMP = deficiência de monofosfato sintetase
DVB = diarreia viral bovina
DVG = dilatação­vólvulo gástrico
DVS = doença vesicular suína
EBS = encefalomielite bovina esporádica
EC = escore corporal
ECC = escore de condição corporal
eCG = gonadotrofina coriônica equina
ECG = eletrocardiograma
ECI = encefalite do cão idoso
ED = energia digestível
EDG = enzima ramificadora de glicogênio
EDS = egg drop syndrome
EDTA = ácido etilenodiaminotetracético
EDTACa = etilenodiaminotetracético dissódico de cálcio
EEB = encefalopatia espongiforme bovina
EEFI = enterocolite eosinofílica focal idiopática
EEG = eletroencefalograma
EEL = encefalomielite equina do leste
EEO = encefalomielite equina do oeste
EEPAB = edema e enfisema pulmonar agudo em bovinos
EET = encefalopatia espongiforme transmissível
EEV = encefalomielite equina venezuelana
EG = enterite granulomatosa / etilenoglicol
EGF = fator de crescimento epidermal
EGH = erliquiose granulocítica humana
EH = encefalopatia hepática
EHHA = eixo hipotálamo­hipófise­adrenal
EHI = encefalopatia hipóxica isquêmica
EHV = herpesvírus equino
EL = energia líquida
ELISA = ensaio imunossorvente ligado à enzima
ELP = enterocolite linfocítica plasmocitária
EM = energia metabolizável
EMC = encefalomiocardite
EMG = eletromiograma
EMV = energia metabolizável verdadeira
ENO = encefalite do Nilo Ocidental
ENG = episcleroqueratite nodular granulomatosa
EODES = síndrome do ovo defeituoso e da oviposição errática
EPA = ácido eicosapentaenoico / Agência de Proteção Ambiental dos EUA
EPF = estomatite posterior felina
EPN = etil 4­nitrofenil fenilfosforotioato
EPO = eritropoetina
EPS = edema pulmonar suíno
ERG = enzima ramificadora do glicogênio
EROD = etoxiresorufina­O­desetilase
ERP = eritropoetina humana
EUA = Estados Unidos da América
EVP = enterite viral dos patos
EVS = enterovírus suínos / exantema vesicular dos suínos
FA = febre aftosa
FAO = Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura
FARAD = Food Animal Residue Avoidance Databank
FAST = ultrassonografia abdominal focada para o trauma
FB = fumonisinas B
FC = fixação do complemento
FCE = fluido cerebroespinal
FCI = fator de crescimento semelhante à insulina
FCM = febre catarral maligna
FCoV = coronavírus felino
FDA = fibra em detergente ácido / Food and Drug Administration
FDN = fibra em detergente neutro
FE = fator extracelular
FeLV = vírus da leucemia felina
FEP = febre equina de Potomac
FHCC = febre hemorrágica da Crimeia­Congo
FHM = fat­head minnow
FIP = peritonite infecciosa felina
FIV = vírus da imunodeficiência felina
FMMR = febre maculosa das Montanhas Rochosas
FOA = força oncótica da albumina
FOD = febre de origem desconhecida
FOS = fruto­oligossacarídios
FPA = fenilpropanolamina
FPV = vírus da panleucopenia felina
FSH = hormônio foliculoestimulante
FT = fator tecidual
FTP = falha na transferência passiva
FU = fluoruracila
FVR = febre do Vale Rift
g = grama
GAGPS = glicosaminoglicanos polissulfatados
GDH = glutamato desidrogenase
GEH = gastrenterite hemorrágica
GET = gastrenterite transmissível
GGT = gamaglutamiltransferase
GH = hormônio do crescimento
GI = gastrointestinal
GLC = globulina ligadora de corticosteroides
GM = glucomanan
Gn­RH = hormônio liberador de gonadotrofinas
GSDS = grãos secos de destilaria com solúveis
GT = glutamiltransferase
GUNA = gengivite ulcerativa necrosante aguda
H2S = sulfeto de hidrogênio
HACCP = Hazard Analysis and Critical Control Point
HaPV = poliomavírus do hamster
Hb = hemoglobina
HCA = hepatozoonose canina americana
hCG = gonadotrofina coriônica humana
HCH = hexaclorociclo­hexano
HCI = hepatite por corpúsculos de inclusão
HEA = hidroxietilamido
HEM = hormônio estimulante de melanócitos
HETE = hidroxieicosatetranoato
HHD = hiperadrenocorticismo hipófise­dependente
HIC = hepatite infecciosa canina
HIV = vírus da imunodeficiência humana
HM = hipertermia maligna
HMP = hexose monofosfato
hMPV = metapneumovírus humano
HPB = hipertrofia prostática benigna
HPIE = hemorragia pulmonar induzida por exercício
HPLC = cromatografia líquida de alta performance
HSCAS = aluminiosilicato de cálcio e sódio hidratado
HTP = hidroxitriptofano
HVB = herpesvírus bovino
HVC = herpesvírus canino
HVF = herpesvírus felino
HVP = hepatite viral dos patos
IA = influenza aviária / inseminação artificial
IACUC = Institutional Animal Care and Use Committee
IAPP = polipeptídio associado às ilhotas
IATF = inseminação artificial em tempo fixo
IBR = rinotraqueíte bovina infecciosa
IC = imunodeficiência combinada
ICC = insuficiência cardíaca congestiva
ICV = índice de conforto da vaca
IDA = ingestão diária aceitável
IDAG = imunodifusão em ágar­gel
IDG = inaladores de dose graduada
IDH = iditol desidrogenase
IDR = imunodifusão radial
IFN = interferona
IFTA = inibidor da fibrinólise trombina ativável
Ig = imunoglobulina
IHC = imunoistoquímica
IHQ = teste imunoistoquímico
IL = interleucina
ILP = imunorreatividade da lipase pancreática
IM = intramuscular
iMg2+ = magnésio ionizado
IMP = monofosfato de inosina
IN = isoeritrólise neonatal
IO = intraósseos
IP = intraperitoneal
IPE = insuficiência pancreática exócrina
IPO = implante de pérolas de ouro
IRF = identificação por radiofrequência
ISCOMS = complexos estimulantes de imunidade
IST = imunorreatividade semelhante à tripsina
ITU = infecção do trato urinário
IV = intravenoso
IVD = insuficiência ventricular direita
KBr = brometo de potássio
Kcal = quilocalorias
KCl = cloreto de potássio
kDNA = DNA cinetoplástico
Kel = constante da taxa de eliminação
Kg = quilo
KHV = herpesvírus da carpa
KIT = tirosinoquinase
kV = quilovolts
kVp = potencial de quilovoltagem
ℓ = litro
LBA = lavado broncoalveolar
LC = linfadenite caseosa
LCE = linfossarcoma cutâneo epiteliotrópico
LCNE = linfossarcoma cutâneo não epiteliotrópico
LDH = lactato desidrogenase
LES = lúpus eritematoso sistêmico
LH = hormônio luteinizante / lipidose hepática
LLA = leucemia linfoblástica aguda
LMR = limite máximo de resíduos
loVDN = VDN de baixa virulência
LOX = lipo­oxigenase
LPS = lipopolissacarídio
LTB4 = leucotrieno B4
LTI = laringotraqueíte infecciosa
mA = miliampere
MAC = medicina alternativa e complementar
MAPS = miopatia por acúmulo de polissacarídios
mAs = miliampere­segundo
Mcal = megacalorias
MCE = metrite contagiosa equina
MDMA = 3,4­metilenodioximetanfetamina
MDN = miodegeneração nutricional
ME = mercaptoetanol
MEDPB = mieloencefalopatia degenerativa progressiva bovina
MEG = meningoencefalomielite granulomatosa
mg = miligrama
MG = miastenia gravis
MGA = acetato de melengestrol
MGK­264 = N­octil biciclo­hepteno dicarboximida
MHC = complexo principal de histocompatibilidade
MHz = mega­hertz
MI = metilimidazol
MIFT = fator tecidual do mecanismo inibidor
MIP = manejo integrado de pestes
MJ = megajoules
mℓ = mililitro
MMA = complexo mastite­metrite­agalactia
MMCE = microrganismo da metrite contagiosa equina
MMM = mistura mineral contendo microelementos
MMP = matriz metaloproteinase
MNE = menor teor efetivo
MNTD = dose não tóxica máxima
MOS = mananoligossacarídios
MP = mercaptopurina
MPE = mieloencefalite protozoária equina
MRS = estafilococos resistentes à meticilina
MSMA = metanoarsonato de monossódio
MTC = medicina tradicional chinesa / menor temperatura crítica
MTD = dose tóxica mínima / meio de teste dermatofítico
MVAC = medicina veterinária alternativa e complementar
MVC = morbilivírus dos cetáceos
NAC = N­acetilcisteína
NADPH = fosfato de dinucleotídio de nicotinamida­adenina
NAT = nitrogênio amoníaco total
NC = nervo craniano
NDP = nervo digital palmar
NDT = nutrientes digeríveis totais
NEE = necrose eritropoiética epizoótica
NEM = necessidade de energia para manutenção
NER = necessidade energética em repouso
NK = células exterminadoras naturais
NK1 = neuroquinina 1
NMA = novo medicamento para uso em animais
NMDA = N­metil­D­aspartato
NMI = neurônios motores inferiores
NMS = neurônios motores superiores
NNP = nitrogênio não proteico
NO = óxido nítrico
NOEL = dose não tóxica
NPN = nitrogênio não proteico
NPP = nutrição parenteral parcial
NPT = nutrição parenteral total
NRC = National Research Council
NSP = proteínas não estruturais
NUS = nitrogênio ureico sanguíneo
OCD = osteocondrite dissecante
OCT = ornitina carbamoiltransferase
OD = oxigênio dissolvido
OEHDB = obstrução extra­hepática aguda de ductos biliares
OF = organofosforados
OIE = Office International des Epizooties / World Organization for Animal Health
OMS = Organização Mundial da Saúde
OP = organofosforados
OPA = ortoftaldeído
OPG = ovos por grama
ORVR = obstrução recidivante das vias respiratórias
OVC = oficial veterinário chefe
PABA = ácido paraminobenzoico
PAF = fator ativador de plaquetas
PAFG = proteínas ácidas fibrilares gliais
PAFI = pesquisa de anticorpo por fluorescência indireta
PAM = pralidoxima
PAS = ácido periódico de Schiff
PAT = peptídio de ativação de tripsinogênio
PBB = difenil polibromado
PBDE = éteres de difenil polibromado
PBO = butóxido de piperonila
PC = peso corporal
PCB = difenil policlorado
PCDD = dibenzo­p­dioxinas policloradas
PCDF = dibenzofuranos policlorados
PCMX = paraclorometaxilenol
PCP = parada cardiopulmonar
PCR = reação em cadeia de polimerase
PCV = circovírus suíno
PD = polidipsia
PDE = fosfodiesterase
PDF = produtos de degradação do fibrinogênio
PDR = proteína degradada no rúmen
PEM = polioencefalomalacia
PEOS = sistema opioide endógeno periférico
PET = tomografia por emissão de pósitron
PFK = deficiência de fosfofrutoquinase
PG = propilenoglicol / prostaglandina
PGEPB = Programa Global de Erradicação da Peste Bovina
PGF2α = prostaglandina F2α
PGI1 = prostaciclina
PHA = hidrocarbonetos halogenados persistentes / peróxido de hidrogênio acelerado
PhHV = herpesvírus focídeo
PHS = Public Health Service
Pi = fósforo inorgânico insolúvel
PI = parainfluenza
PIF = peritonite infecciosa felina
PIFV = vírus da peritonite infecciosa felina
PIO = pressão intraocular
PK/PD = farmacocinético/farmacodinâmico
PLA2 = fosfolipase A2
PLDO = opioides periféricos derivados de leucócitos
PLM = proteína liberadora de muramidase
PLP = proteínas ligadoras de penicilinas
PM = proteína metabolizável
PMMA = polimetilmetacrilato
PMSG = gonadotrofina sérica de égua gestante
PMT = proteína microssomal de transferência de triglicerídios
PNA = peptídio natriurético atrial
PNC = peptídio natriurético cerebral
PND = proteínas não degradadas
PNR = proteína não degradada no rúmen
PO4 = fosfato inorgânico estável
POC = pressão oncótica coloidal capilar
POR = receptores opioides periféricos
PPA = fenilpropanolamina
PPCB = pleuropneumonia contagiosa bovina
PPD = derivados de proteína purificada
PPH = paralisia periódica hiperpotassêmica
ppm = partes por milhão
PPR = peste dos pequenos ruminantes
PRRSV = vírus da síndrome reprodutiva e respiratória suína
PS = piretroides sintéticos
PSA = peste suína africana
PSC = peste suína clássica
PSGAG = glicosaminoglicanos polissulfatados
PSI = equinos puro sangue inglês
PT = proteína total / protrombina
PTH = paratormônio
PTHrP = peptídio relacionado com o paratormônio
PU = poliúria
PV = porcos vietnamitas
PVA = poliomavírus aviário
PVB = papilomavírus bovino
PVC = parvovírus canino / Program of Veterinary Care
RAL = lactonas ácidas resorcíclicas
RC = radiografia computadorizada
RCI = reguladores do crescimento de insetos
RCCP = reanimação cérebro­cardiopulmonar
RCCU = relação creatina/cortisol urinário
rcG­CSF = fatores estimuladores de colônia granulocítica recombinantes caninos
RD = radiografia digital
REATC = resposta evocada auditiva do tronco cerebral
RF = radiofrequência
RFLP = polimorfismos de comprimento de fragmentos de restrição
rhG­CSF = fatores estimuladores de colônia granulocítica recombinantes humanos
RIB = rinotraqueíte infecciosa bovina
RJO = retrovírus jaagsiekte de ovinos
RM = ressonância magnética
RMT = ração de mistura total
RN = rendement Napole
RNA = ácido ribonucleico
RNAr = ácido ribonucleico ribossômico
RNAt = ácido ribonucleico de transferência
RNDR = ribonucleosídio difosfato redutase
RT = transcriptase reversa
RTM = rações totalmente misturadas
RT­PCR = reação em cadeia de polimerase transcriptase reversa
RVF = rinotraqueíte viral felina
SA = sinoatrial
SAA = amiloide A sérica
SAAG = gradiente de albumina sorofluido ascítico
SADD = supressão com alta dose de dexametasona
SAMe = s­adenosilmetionina
SARA = acidose ruminal subaguda
SC = subcutâneo
SCAV = suporte cardíaco avançado da vida
SCBID = supercrescimento bacteriano no intestino delgado
SCBV = suporte cardíaco básico da vida
SDC = síndrome de disfunção cognitiva
SDH = sorbitol desidrogenase
SDPP = síndrome da disgalactia pós­parto
SDT = sólidos dissolvidos totais
SEB = soluções eletrolíticas balanceadas
SH = sepse hemorrágica
SHP = síndrome da hipertensão pulmonar / síndrome hemorrágica perirrenal
SIM = síndrome intermediária induzida pelos organofosforados
SIV = inspeção veterinária
SL = substituto de leite
SMD = síndrome mielodisplásica
SME = síndrome metabólica equina
SNC = sistema nervoso central
SNP = sistema nervoso periférico
SPECT = tomografia computadorizada por emissão de fótons isolados
SPF = estado livre de patógeno específico / suíno livre de patógenos
SPRE = síndrome da perda reprodutiva da égua
SPUC = síndrome paradentária ulcerativa crônica
SRIS = síndrome da resposta inflamatória sistêmica
SRRS = síndrome respiratória e reprodutiva suína
STD = sólidos totais dissolvidos
SUGE = síndrome da úlcera gástrica equina
TALB = teste do anel em leite para brucelose
TAMV = teste de aglutinação com muco vaginal
TB = tuberculose
TBA = acetato de trembolona
TBBPA = tetrabromobisfenol­A
TC = tomografia computadorizada
TCA = tempo de coagulação ativada
TCVM = medicina veterinária tradicional chinesa
TE = tubo endotraqueal
TEG = tromboelastografia
TEP = tromboembolia pulmonar
TEPP = toxicidade do pirofosfato de tetraetil
TFG = taxa de filtração glomerular
TG = tioguanina
THC = delta­9­tetraidrocanabinol
TIC = taxa de infusão constante
TIU = teste intradérmico único
TLR = receptores do tipo toll
TMB = taxa metabólica basal
TMBNP = tumores malignos de bainha nervosa periférica
tMg = magnésio total
TNM = sistema tumor­nódulo­metástase
TOC = transtorno obsessivo­compulsivo
ton = tonelada
TP = tempo de protrombina
TPA = ativador de plasminogênio tecidual
TPC = tempo de preenchimento capilar
TRAL = teste rápido de aglutinação em lâmina
TRH = hormônio liberador da tireotropina
TSH = hormônio estimulante da tireoide
TSI = triple sugar iron
TT = tempo de trombina
TTPA = tempo de tromboplastina parcial ativada
TUAT = técnica ultrassonográfica para avaliação do tórax
TVS = teschovírus suíno
TVT = tumor venéreo transmissível
UEA = ultrassonográfico específico do abdome
UFC = unidades formadoras de colônias
UGT = glucuronosiltransferase
UI = unidades internacionais
UNP = unidades de nitrogênio proteico
URE = uveíte recidivante equina
USDA = United States Department of Agriculture
UV = ultravioleta
VA = vólvulo do abomaso
VAE = vírus da arterite equina
VAG = vírus da anemia das galinhas
VAIE = vírus da anemia infecciosa equina
VBI = vírus da bronquite infecciosa
VCF = vírus da cinomose focina
VCM = volume corpuscular médio
Vd = volume aparente de distribuição
VDD = vômito e doença debilitante
VDEH = vírus da doença epizoótica hemorrágica
VDIB = vírus da doença infecciosa da bursa de Fabricius
VDN = vírus da doença de Newcastle
VDS = vírus da diarreia epidêmica suína
VDVB = vírus da diarreia viral bovina
VENO = vírus da encefalite do Nilo Ocidental
VEVS = vírus do exantema vesicular suíno
VFD = Veterinary Feed Directive
VG = volume globular
VGM = volume globular médio
VHP = vírus da hepatite dos patos
VIS = vírus da imunodeficiência de símios
VLA = vírus da língua azul
VLB = vírus da leucemia bovina
VLMSM = vírus dos leões­marinhos de San Miguel
VNA = vírus da nefrite aviária
VO = via oral
VP = proteínas virais
VPC = viremia primaveril das carpas / vírus da parvovirose canina
VPI = vulvovaginite pustular infecciosa
VR = via retal
VSF = vírus do sarcoma felino
VSRB = vírus do sincício respiratório bovino
VSRH = vírus do sincício respiratório humano
vVDN = vírus da doença de Newcastle virulento
VVM = vírus vivo modificado
VVVM = vacinas de vírus vivo modificado
WNV = vírus do Oeste do Nilo
ZDQ = zona desencadeadora de quimiorreceptores
ZTOA = zona térmica ótima de atividade
ZTOP = zona térmica ótima preferida
CONSELHO EDITORIAL

Dana G. Allen, DVM, MSc, DACVIM
Professor and Chair, Department of Clinical Studies, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Ontario,
Canada

Peter D. Constable, BVSc (Hons), MS, PhD, DACVIM
Professor  and  Head,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  Purdue
University, West Lafayette, IN

Peter R. Davies, BVSc, PhD
Allen  D.  Leman  Chair  in  Swine  Health  and  Productivity,  Department  of  Veterinary  Population  Medicine,
University of Minnesota, St. Paul, MN

Katherine E. Quesenberry, DVM, MPH, DABVP (Avian)
The Animal Medical Center, New York, NY

Philip T. Reeves, BVSc, PhD, FACVSc
Principal Scientist, Australian Pesticides and Veterinary Medicines Authority, Symonston, Australia

Jagdev M. Sharma, BVSc, MS, PhD
Research  Professor,  The  Biodesign  Institute,  Visiting  Professor,  School  of  Life  Sciences,  Arizona  State
University, Tempe, AZ; Professor and Endowed Chair in Avian Health Emeritus, University of Minnesota, St.
Paul, MN

Roger K. W. Smith, MA, VetMB, PhD, DEO, DECVS, MRCVS
Professor of Equine Orthopaedics, Department of Veterinary Clinical Sciences, The Royal Veterinary College,
Herts, UK

Tracee Treadwell, DVM, MPH, CAPT USPHS
Associate  Director  for  Epidemiological  Science,  National  Center  for  Emerging  and  Zoonotic  Infectious
Diseases, Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, GA
COLABORADORES

Stephen B. Adams, DVM, MS, DACVS
Professor  of  Surgery,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  Purdue
University, West Lafayette, IN

Claudicação em Equinos: Artroscopia, Introdução, Exame da Claudicação

Robin W. Allison, DVM, PhD, DACVP (Clinical Pathology)
Associate Professor, Clinical Pathology, Oklahoma State University, Oklahoma State University, Stillwater OK

Hemoparasitas: Micoplasmas Hemotrópicos

Gary C. Althouse, BS, DVM, MS, PhD, DACT
Professor  and  Chairman,  Department  of  Clinical  Studies­New  Bolton  Center,  School  of  Veterinary  Medicine,
University of Pennsylvania, Kennett Square, PA

Manejo Reprodutivo: Suínos

Frank M. Andrews, DVM, MS, DACVIM
LVMA  Equine  Committee  Professor  and  Director,  Equine  Health  Studies  Program,  Department  of  Veterinary
Clinical Sciences, School of Veterinary Medicine, Louisiana State University, Baton Rouge, LA

Úlcera Gastrintestinal em Grandes Animais: Equinos

John A. Angelos, DVM, PhD, DACVIM
Associate  Professor,  Department  of  Medicine  and  Epidemiology,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of
California, Davis, CA

Ceratoconjuntivite Infecciosa

David A. Ashford, DVM, MPH, DSc
Assistant Area Director, International Services, APHIS, USDA, Amcogen Sao Paulo, APO, AA

Antraz

Rick Atwell, BVSc, PhD, FACVSc
Professor, Brisbane, Australia

Paralisia por Carrapato

Joerg A. Auer, DrMedVet, Dr h c, MS, DACVS, DECVS
Professor and Director, Equine Department, Vetsuisse Faculty, University of Zürich, Switzerland

Claudicação em Equinos: Anormalidades de Tarso e Metatarso

David G. Baker, DVM, MS, PhD, DACLAM
Director and Professor, Division of Laboratory Animal Medicine, School of Veterinary Medicine, Louisiana State
University, Baton Rouge, LA

Telazíase (Doença do Verme Ocular)

Alejandro Banda, DVM, MSc, PhD, DACPV, DACVM
Associate Clinical Professor of Avian Virology, Poultry Research and Diagnostic Laboratory, College of Veterinary
Medicine, Mississippi State University, Pearl, MS

Enterite Viral de Patos

Gad Baneth, DVM, PhD, DECVCP
Professor of Veterinary Medicine, School of Veterinary Medicine, Hebrew University, Rehovot, Israel

Leishmaniose

Lisa G. Barber, DVM, DACVIM (Oncology)
Assistant Professor, Cummings School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton, MA

Medicamentos Antineoplásicos

Thomas Barrett, MSc, PhD, Deceased
Professor, Institute for Animal Health, Pirbright Laboratory, Surrey, UK

Peste dos Pequenos Ruminantes, Peste Bovina

George M. Barrington, DVM, PhD, DACVIM
Associate  Professor,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Washington
State University, Pullman, WA

Introdução de Doenças Metabólicas, Paresia da Vaca Parturiente, Fotossensibilização, Tetania do Transporte em
Ruminantes

P.A. Barrow, PhD, DSc, FRCPath
Professor  of  Veterinary  Infectious  Diseases,  School  of  Veterinary  Medicine  and  Science,  University  of
Nottingham, Leicestershire, UK

Salmonelose

Joseph W. Bartges, DVM, PhD, DACVIM, DACVN
Professor of Medicine and Nutrition, The Acree Endowed Chair of Small Animal Research, Department of Small
Animal Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, University of Tennessee, Knoxville, TN

Procedimentos Diagnósticos para Laboratório Particular: Urinálise
Daniela Bedenice, DrVetMed, DACVIM, DACVECC
Assistant Professor, Cummings School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton, MA

Sepse em Potros

Sylvia J. Bedford­Guaus, DVM, PhD, DACT
Assistant Professor in Theriogenology, Department of Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Cornell
University, Ithaca, NY

Exame da Sanidade Reprodutiva de Machos

James K. Belknap, DVM, PhD, DACVS
Professor  of  Equine  Surgery,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Ohio
State University, Columbus, OH

Claudicação em Equinos: Afecção da Pata

Joachim Berchtold, DrVetMed, DECBHM
Bad Endorf, Germany

Síndrome da Vaca Caída

Alex J. Bermudez, DVM, MS, DACPV
Associate  Professor,  Department  of  Veterinary  Pathobiology,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Missouri, Columbia, MO

Práticas de Manejo e Alimentação (Aves Domésticas), Intoxicações (Aves Domésticas)

Simon Bewg, BVSc
Principal  Veterinary  Officer,  Biosecurity  Queensland,  Primary  Industries  and  Fisheries,  Department  of
Employment, Economic Development and Innovation, Brisbane, Australia

Infecção pelo Vírus Hendra

J. Dürr Bezuidenhout, DVSc
Sinoville, South Africa

Síndrome da Sudorese

William G. Bickert, BS, MS, PhD
Professor Emeritus, Biosystems and Agricultural Engineering, Michigan State University, East Lansing, MI

Ventilação

Rob Bildfell, DVM, MSc, DACVP
Associate  Professor,  Department  of  Biomedical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Oregon  State
University, Corvallis, OR

Coleta e Envio de Amostras ao Laboratório, Alcaloidose Pirrolizidina
William D. Black, MSc, DVM, PhD
Professor,  Department  of  Biomedical  Sciences,  Ontario  Veterinary  College,  University  of  Guelph,  Guelph,
Ontario, Canada

Intoxicação por Pentaclorofenol

Pat Blackall, BSc, PhD
Senior  Principal  Research  Scientist,  Department  of  Primary  Industries  and  Fisheries,  Animal  Research  Institute,
Yeerongpilly, Australia

Coriza Infecciosa

Barry R. Blakley, DVM, PhD
Professor, Department of Veterinary Biomedical Sciences, Western College of Veterinary Medicine, University of
Saskatchewan, Saskatoon, Canada

Intoxicação por Cobre, Chumbo, Quercus e Sorgo

Shauna L. Blois, DVM, DVSc, DACVIM
Assistant Professor, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Ontario, Canada

Doenças  do  Estômago  e  dos  Intestinos:  Vólvulo  e  Dilatação  Gástrica,  Neoplasia  Gastrintestinal,  Obstrução
Gastrintestinal, e Úlcera Gastrintestinal em Pequenos Animais e Infecção por Helicobacter em Cães e Gatos

Herman J. Boermans, DVM, MSc, PhD
Professor of Toxicology, Director Toxicology Program, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Ontario,
Canada

Intoxicação por Flúor, Mercúrio, Metaldeído e Molibdênio

Carole Bolin, DVM, PhD
Director,  Diagnostic  Center  for  Population  and  Animal  Health,  College  of  Veterinary  Medicine,  Michigan  State
University, Lansing, MI

Leptospirose

Steven R. Bolin, DVM, MS, PhD
Professor, Diagnostic Center for Population and Animal Health, College of Veterinary Medicine, Michigan State
University, Lansing, MI

Diarreia Viral Bovina e Complexo Doença da Mucosa

Rosemary J. Booth, BVSc
Principal  Conservation  Officer,  Department  of  Environment  and  Resource  Management,  Queensland  Parks  and
Wildlife Services, Queensland, Australia

Pentauro do Açúcar

Dawn Merton Boothe, DVM, PhD, DACVIM, DACVCP
Professor,  Department  of  Anatomy,  Physiology,  and  Pharmacology,  College  of  Veterinary  Medicine,  Auburn
University, Auburn, AL

Medicamentos  Antibacterianos,  Antifúngicos,  Antivirais  e  Modificadores  da  Resposta  Biológica,  Introdução  de


Quimioterapia, Introdução de Farmacologia

Davin J. Borde, DVM, DACVIM
(Cardiology)
Staff Cardiologist, Veterinary Heart Institute, Gainesville, FL

Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Cardiovascular

Jane C. Boswell, MA, VetMB, CertVA, CertES (Orth), DECVS, MRCVS
The Liphook Equine Hospital, Liphook, Hampshire, UK

Claudicação em Equinos: Anormalidades do Joelho

Joan S. Bowen, DVM
Bowen Mobile Veterinary Practice, Wellington, CO

Manejo da Reprodução: Cabras

R. Keith Bramwell, BS, MS, PhD
Associate  Professor,  Extension  Breeder/Hatchery  Management,  Department  of  Poultry  Science,  University  of
Arkansas, Fayetteville, AR

Inseminação Artificial

Joseph M. Bricker, MS, PhD
Associate Director, Vaccine Design Group, Pfizer Animal Health, Kalamazoo, MI

Erisipela (Aves Domésticas)

Steven P. Brinsko, DVM, MS, PhD, DACT
Associate  Professor  and  Chief  of  Theriogenology,  Department  of  Large  Animal  Clinical  Sciences,  College  of
Veterinary Medicine and Biomedical Sciences, Texas A&M University, College Station, TX

Controle Hormonal do Estro

Scott A. Brown, VMD, PhD, DACVIM
Josiah Meigs Distinguished Professor and Head, Department of Small Animal Medicine and Surgery, College of
Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, GA

Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário de Pequenos Animais

Cecil F. Brownie, DVM, PhD, DABVT, DABT, DABFE, DABFM, FACFEI
Professor,  Physiology  and  Pharmacology,  School  of  Veterinary  Medicine,  St.  George’s  University;  Director,
Veterinary  Toxicology  Laboratory,  St.  George’s  University;  Professor  Emeritus,  College  of  Veterinary  Medicine,
North Carolina State University, Raleigh, NC
Plantas Tóxicas aos Animais, Cogumelos Tóxicos

David Bruyette, DVM, DACVIM
Medical Director, VCA West Los Angeles Animal Hospital, Los Angeles, CA

Glândulas Adrenais e Pâncreas

Marie S. Bulgin, DVM, MBA, DACVM
WI  Program,  Canine  Veterinary  Teaching  Center,  Department  of  Animal  and  Veterinary  Science,  University  of
Idaho, Caldwell, ID

Claudicação em Ovinos, Scrapie

Kristine E. Burgess, MS, DVM, DACVIM (Oncology)
Assistant Professor, Cummings School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton, MA

Medicamentos Antineoplásicos

Ray Cahill, MS, DVM
Gloucester, MA

Intoxicação por Zinco

Robert J. Callan, DVM, MS, PhD, DACVIM
Professor,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine  and  Biomedical  Sciences,  Colorado
State University, Fort Collins, Co

Febre Catarral Maligna, Encefalomielite Bovina Esporádica

Ranald D. A. Cameron, BVSc, MVSc, PhD
Retired Associate Professor, School of Veterinary Sciences, University of Queensland, Brisbane, Australia

Epidermite Exsudativa, Paraqueratose, Pitiríase Rósea em Suínos

John Campbell, DVM, DVSc
Professor, Large Animal Clinical Sciences, Western College of Veterinary Medicine, University of Saskatchewan,
Saskatoon, Canada

Doenças Respiratórias de Bovinos

Wayne W. Carmichael, PhD
Professor Emeritus, Seaside, OR

Intoxicação por Algas

James W. Carpenter, MS, DVM, DACZM
Professor,  Zoological  Medicine,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Kansas  State
University, Manhattan, KS
Peste Suína Africana

Christopher K. Cebra, VMD, MA, MS, DACVIM
Professor, Large Animal Medicine, College of Veterinary Medicine, Oregon State University, Corvallis, OR

Toxemia da Prenhez em Vacas

Sharon A. Center, DVM, DACVIM
Professor, Department of Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, NY

Doença Hepática em Pequenos Animais

M. M. Chengappa, DVM, PhD, DACVM
Department  Head,  University  Distinguished  Professor,  College  of  Veterinary  Medicine,  Kansas  State  University,
Manhattan, KS

Sepse Hemorrágica

Jens Peter Christensen, DVM, PhD
Associate  Professor,  Department  of  Veterinary  Disease  Biology,  Faculty  of  Life  Sciences,  University  of
Copenhagen, Frederiksberg, Denmark

Cólera Aviária, Riemerella Anatipestifer

Edwin Claerebout, DVM, PhD, DEVPC
Professor,  Department  of  Virology,  Parasitology  and  Immunology,  Faculty  of  Veterinary  Medicine,  Ghent
University, Merelbeke, Belgium

Anti­helmínticos, Giardíase

Keith A. Clark, DVM, PhD
Retired Director, Zoonosis Control Division, Texas Department of Health, Austin, TX

Intoxicação por Sapo

Peter Clegg, MA, VetMB, PhD, CertEO, DECVS, MRCVS
Professor  of  Equine  Surgery,  Veterinary  Teaching  Hospital,  School  of  Veterinary  Sciences,  University  of
Liverpool, Neston, UK

Claudicação em Equinos: Anormalidades Coxofemorais

Johann (Hans) Coetzee, BVSc, CertCHP, PhD, DACVCP
Assistant Professor, Veterinary Clinical Sciences, Kansas State University, Manhattan, KS

Farmacoterapia Sistêmica do Sistema Digestório de Ruminantes

Stephen R. Collett, BSc, BVSc, MMedVet
Assistant  Professor,  Poultry  Diagnostic  and  Research  Center,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Georgia, Athens, GA
Síndrome da Morte Súbita em Frangos

Michael T. Collins, DVM, PhD, DACVM
Professor  of  Microbiology,  Department  Pathobiological  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Wisconsin­Madison, Madison, WI

Paratuberculose

Peter D. Constable, BVSc (Hons), MS, PhD, DACVIM
Professor and Head, Department of Veterinary Clinical Sciences, Purdue University, West Lafayette, IN

Necrose da Gordura Abdominal, Obstrução Intestinal Aguda em Grandes Animais, Cistite e Pielonefrite Bovina,
Coccidiose,  Criptosporidiose,  Doenças  do  Abomaso,  Anormalidades  do  Metabolismo  de  Potássio,  Sobrecarga
Alimentar  por  Grãos,  Paresia  de  Ovelhas  e  Cabras  Parturientes,  Indigestão  Simples,  Reticuloperitonite
Traumática, Indigestão Vagal

Robert W. Coppock, BS, DVM, MS, PhD, DABVT, DABT
President and CEO, Robert W. Coppock, DVM, Toxicologist and Associate Ltd., Vegreville, Alberta, Canada

Intoxicação Persistente por Aromáticos Halogenados

Susan M. Cotter, DVM, DACVIM (Small Animal, Oncology)
Distinguished Professor of Clinical Sciences Emerita, Cummings School of Veterinary Medicine, Tufts University,
North Grafton, MA

Grupos Sanguíneos e Transfusão de Sangue, Introdução do Sistema Hematopoético

Laurent M. Couetil, DVM, PhD, DACVIM (Large Animal)
Professor, Large Animal Medicine, School of Veterinary Medicine, Purdue University, West Lafayette, IN

Enfisema Pulmonar

Andrew L. Crawford, BVetMed, CertES (Orth), MRCVS
Equine Referral Hospital, Royal Veterinary College, Hawkshead Campus, Herts, UK

Claudicação em Equinos: Anormalidades de Boleto e Quartela

Kate E. Creevy, DVM, MS, DACVIM
Assistant  Professor,  Small  Animal  Internal  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of  Georgia,
Athens, GA

Cinomose Canina, Infecção por Herpesvírus Canina, Hepatite Canina Infecciosa

Rocio Crespo, DVM, MSc, DVSc, DACPV
Associate  Professor,  Avian  Health  and  Food  Safety  Laboratory,  Washington  Animal  Disease  Diagnostic
Laboratory, Washington State University, Puyallup, WA

Deposição de Urato (Gota)

Gary L. Cromwell, PhD
Professor, Department of Animal and Food Sciences, University of Kentucky, Lexington, KY

Intoxicação de Leitões Neonatos por Ferro, Nutrição: Suínos

Suzanne M. Cunningham, DVM, DACVIM (Cardiology)
Assistant  Professor  of  Cardiology,  Department  of  Clinical  Sciences,  Cummings  School  of  Veterinary  Medicine,
Tufts University, North Grafton, MA

Doença Cardíaca e Insuficiência Cardíaca

Autumn P. Davidson, DVM, MS, DACVIM
Clinical Professor, Department of Medicine and Epidemiology, VMTH Small Animal Clinic, School of Veterinary
Medicine, University of California, Davis, CA

Manejo da Reprodução: Pequenos Animais

Sherrill Davison, VMD, MS, MBA, DACPV
Associate  Professor,  Avian  Medicine  and  Pathology,  New  Bolton  Center,  University  of  Pennsylvania,  Kennett
Square, PA

Salmonelose (Aves Domésticas)

Scott A. Dee, DVM, MS, PhD, DACVM
Professor, College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul, MN

Interação  Manejo­Sanidade:  Suínos,  Síndrome  da  Orelha  Necrosada  em  Suínos,  Complexo  Cistite­Pielonefrite
Suíno, Síndrome Respiratória e Reprodutiva Suína, Pseudorraiva, Doenças Respiratórias de Suínos

John Deen, DVM, MSc, PhD, DABVP
Associate Professor, College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul, MN

Úlceras Gastrintestinais em Grandes Animais: Suínos

Alice Defarges, DVM, MSc, DACVIM
Assistant Professor in Internal Medicine, Ontario Veterinary College, University of Guelph, Ontario, Canada

Doenças do Estômago e Intestinos: Colite, Constipação Intestinal e Obstipação, Doença Intestinal Inflamatória

Fabio Del Piero, DVM, DACVP, PhD
Associate  Professor  of  Pathology,  Department  of  Pathobiology  and  Department  of  Clinical  Studies,  School  of
Veterinary Medicine, New Bolton Center, University of Pennsylvania, Kennett Square, PA

Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Respiratório

Sagi Denenberg, DVM
North Toronto Animal Clinic, Thornhill, Ontario, Canada

Comportamento Social Normal e Problemas de Comportamento em Animais Domésticos

Jean­Marie Denoix, DVM, PhD, Agregé
CIRALE­ENVA, Goustranville, France

Claudicação em Equinos: Anormalidades do Dorso e da Pelve

R. Page Dinsmore, DVM, DABVP (Food Animal)
Associate  Professor,  College  of  Veterinary  Medicine  and  Biomedical  Sciences,  Colorado  State  University,  Fort
Collins, CO

Interação Manejo­Sanidade: Rebanhos Leiteiros

Stephen J. Divers, BVetMed, DZooMed, DACZM, DECZM (Herpetology), FRCVS
Professor  of  Zoological  Medicine,  Department  of  Small  Animal  Medicine  and  Surgery,  College  of  Veterinary
Medicine, University of Georgia, Athens, GA

Répteis

Thomas J. Divers, DVM, DACVIM, DACVECC
Professor of Medicine, College of Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, NY

Doenças Não Infecciosas do Sistema Urinário de Grandes Animais

John E. Dohms, PhD
Professor, Department of Animal and Food Sciences, University of Delaware, Newark, DE

Botulismo (Aves Domésticas)

Thomas M. Donnelly, BVSc, DACLAM
The Kenneth S. Warren Institute, Ossining, NY

Roedores

Patricia M. Dowling, DVM,MSc, DACVIM, DACVCP
Professor,  Veterinary  Clinical  Pharmacology,  Western  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Saskatchewan, Saskatoon, Canada

Farmacoterapia  Sistêmica  do  Sistema  Digestório  de  Monogástricos,  Farmacoterapia  Sistêmica  do  Sistema
Muscular, Farmacoterapia Sistêmica do Sistema Respiratório, Farmacoterapia Sistêmica do Sistema Urinário

Michael W. Dryden, DVM, PhD
E.  J.  Frick  Professor  of  Veterinary  Medicine,  Department  of  Diagnostic  Medicine/Pathobiology,  Kansas  State
University, Manhattan, KS

Quimioterápicos para Ectoparasitas Utilizados em Pequenos Animais

J. P. Dubey, MVSc, PhD
Microbiologist, Animal Parasitic Diseases Laboratory, Animal and Natural Resources Institute, USDA, Beltsville,
MD

Toxoplasmose
Rebecca S. Duerr, DVM, MPVM
Staff Veterinarian, International Bird Rescue Research Center, Cordelia, CA

Manejo do Neonato: Cuidados com Mamíferos e Pássaros Nativos Órfãos

Gregg A. DuPont, DVM, Fellow AVD, DAVDC
Co­owner, Shoreline Veterinary Dental Clinic, Seattle, WA

Odontologia em Pequenos Animais, Doenças da Boca em Pequenos Animais

Neil W. Dyer, DVM, MS, DACVP
Director and Pathologist, Veterinary Diagnostic Laboratory, North Dakota State University, Fargo, ND

Pneumonia por Aspiração, Pneumonia Micótica

Jack Easley, DVM, MS, DABVP (Equine)
Equine Veterinary Practice, LLC, Shelbyville KY

Odontologia em Grandes Animais

Mahmoud El­Begearmi, PhD
Extension Professor of Nutrition and Food Safety, Cooperative Extension, University of Maine, Orono, ME

Necessidades Nutricionais de Aves Domésticas

Steve Ensley, DVM, PhD
Veterinary Toxicologist, Iowa State University, Ames, IA

Introdução à Toxicologia

R. J. Erskine, DVM, PhD
Professor,  Department  of  Large  Animal  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Michigan  State
University, East Lansing, MI

Mastite em Grandes Animais

Paul Ettestad, DVM, MS
State Public Health Veterinarian, Epidemiology and Response Division, New Mexico Department of Health, Santa
Fe, NM

Peste

S. A. Ewing, DVM, PhD
Wendell  H.  and  Nellie  G.  Krull  Professor  Emeritus  of  Veterinary  Parasitology,  Department  of  Veterinary
Pathobiology, Oklahoma State University, Stillwater, OK

Hemoparasitas: Hepatozoonose e Hepatozoonose Canina Americana

Aly M. Fadly, DVM, PhD, DACPV
Research Leader and Laboratory Director, Avian Disease Oncology Laboratory, USDA­ARS, East Lansing, MI

Neoplasias (Aves Domésticas)

Timothy M. Fan, DVM, PhD, DACVIM
Assistant Professor, Department of Veterinary Clinical Medicine, University of Illinois, Urbana, IL

Linfoma Maligno Canino

Hume Field, BVSc, MSc, PhD, MACVS
Principal  Veterinary  Epidemiologist,  Biosecurity  Queensland,  Department  of  Employment,  Economic
Development and Innovation, Brisbane, Australia

Infecção Pelo Vírus Hendra

Margaret Finlay, BVMS, MRCVS
Faculty of Veterinary Medicine, Department of Veterinary Pathology, University of Glasgow, Scotland, UK

Tumores da Pele e de Tecido Mole: Sarcoide Equino

Scott D. Fitzgerald, DVM, PhD, DACVP, DACPV
Professor,  Department  of  Pathobiology  and  Diagnostic  Investigation,  College  of  Veterinary  Medicine,  Michigan
State University, East Lansing, MI

Anomalias  Congênitas  e  Hereditárias  do  Sistema  Urinário,  Infecção  pelo  Vírus  do  Oeste  do  Nilo  em  Aves
Domésticas

James A. Flanders, DVM, DACVS
Associate Professor, College of Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, NY

Doenças de Próstata

Sherrill A. Fleming, DVM, DACVIM, DABVP
Associate  Professor,  Food  and  Animal  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,  Mississippi  State  University,
Mississippi State, MS

Pasteurelose em Ovinos e Caprinos

Mark T. Fox, BVetMed, PhD, FHEA, DEVPC, MRCVS
Senior  Lecturer  in  Veterinary  Parasitology,  Department  of  Pathology  and  Infectious  Diseases,  Royal  Veterinary
College, University of London, UK

Parasitos Gastrintestinais de Ruminantes

Ruth Francis­Floyd, DVM, MS, DACZM
Professor, Department of Large Animal Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, University of Florida,
Gainesville, FL

Peixes
Don A. Franco, DVM, MPH, DACVPM
Retired President, Center for Biosecurity Food Safety and Public Health, Lake Worth, FL

Porfiria Eritropoética Congênita

Laurie J. Gage, DVM, DACZM
Large Cat Specialist, USDA APHIS Animal Care, Napa, CA

Manejo do Neonato: Cuidados com Mamíferos e Aves Nativas Órfãs

Maricarmen Garcia, BS, MS, PhD
Associate  Professor,  Poultry  Diagnostic  and  Research  Center,  Department  of  Population  and  Health,  College  of
Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, GA

Laringotraqueíte Infecciosa

Tam Garland, DVM, PhD, DABVT
Garland, Bailey & Associates, College Station, TX

Intoxicação por Arsênio

Jack M. Gaskin, DVM, PhD, DACVM
Associate Professor Emeritus, Department of Infectious Disease and Pathology, College of Veterinary Medicine,
University of Florida, Gainesville, FL

Encefalomiocardite Viral

Clive C. Gay, DVM, MVSc, DVSc (Hons), FACVSc, DACIM (Hons)
Professor Emeritus, Department of Veterinary Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Washington State
University, Pullman, WA

Timpanismo  em  Ruminante,  Colisepticemia,  Doenças  Intestinais  em  Ruminantes,  Síndrome  do  Jejuno
Hemorrágico, Interação Manejo­Sanidade: Ovinos, Abscesso Hepático em Bovinos

Kirk N. Gelatt, VMD
Distinguished  Professor,  Department  of  Small  Animal  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,
University of Florida, Gainesville, FL

Neoplasia do Olho e Estruturas Associadas, Emergências Oftálmicas, Oftalmologia

Gertruida H. Gerdes, BVSc
Acting Head, Department of Virology, ARC­Onderstepoort Veterinary Institute, Onderstepoort, South Africa

Febre do Vale Rift, Doença de Wesselsbron

Thomas Geurden, DVM, PhD, DEVPC

Department  of  Virology,  Parasitology  and  Immunology,  Faculty  of  Veterinary  Medicine,  Ghent  University,
Merelbeke, Belgium
Giardíase

Paul Gibbs, BVSc, PhD, FRCVS
Professor  of  Virology,  Department  of  Infectious  Diseases  and  Pathology,  College  of  Veterinary  Medicine,
University of Florida, Gainesville, FL

Doenças Tipo Varíola

Thomas W. G. Gibson, BSc, BEd, DVM, DACVS
Assistant  Professor,  Department  of  Clinical  Studies,  Ontario  Veterinary  College,  University  of  Guelph,  Ontario
Canada

Doenças de Estômago e Intestino: Vólvulo e Dilatação Gástrica, Obstrução Gastrintestinal

Robert O. Gilbert, BVSc, MMedVet, DACT, MRCVS
Professor,  Reproductive  Medicine,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Cornell
University, Ithaca, NY

Metrite em Grandes Animais, Retenção de Membranas Fetais em Grandes Animais, Farmacoterapia Sistêmica do
Sistema Reprodutor, Vulvite e Postite Ulcerativa, Eversão e Prolapso Uterino, Prolapso Cervical e Vaginal, Vulvite
e Vaginite

Alan Glazer, DVM, DACVIM
New England Animal Medical Center, West Bridgewater, MA

Doenças do Esôfago de Pequenos Animais

Eric Gonder, DVM, MS, PhD, DACPV
Veterinarian, Goldsboro Milling Company, Goldsboro, NC

Papo Penduloso

John R. Gorham, DVM, PhD
Professor, College of Veterinary Medicine, Washington State University, Pullman, WA

Vison

Louis Norman Gotthelf, DVM
Animal Hospital of Montgomery, Montgomery Pet Skin and Ear Clinic, Montgomery, AL

Tumores do Canal Auricular

Richard E. Gough, FIMLS, CBiol, MIBiol
Consultant in Avian Virology, Central Veterinary Laboratory, New Haw, Weybridge, Surrey, UK

Parvovirose em Gansos

Daniel H. Gould, DVM, PhD, DACVP
Professor Emeritus of Pathology, Department of Microbiology, Immunology and Pathology, College of Veterinary
Medicine and Biomedical Sciences, Colorado State University, Fort Collins, CO

Polioencefalomalácia

Gregory F. Grauer, DVM, MS, DACVIM
Professor and Jarvis Chair of Medicine, Department of Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Kansas
State University, Manhattan, KS

Intoxicação por Etilenoglicol

Deborah S. Greco, DVM, PhD, DACVIM
Senior Research Scientist, Nestle Purina PetCare, New York, NY

Glândula Pituitária

Paul R. Greenough, FRCVS
Professor Emeritus of Veterinary Surgery, Western College of Veterinary Medicine, University of Saskatchewan,
Saskatoon, Canada

Claudicação em Bovinos

Irene Greiser­Wilke, Dr rer nat
Professor,  Department  of  Infectious  Diseases,  EU  Reference  Laboratory  for  Clasical  Swine  Fever,  Institute  of
Virology, University of Veterinary Medicine, Hannover, Germany

Febre Suína Clássica

Walter Gruenberg, DrMedVet, MS, PhD, DECAR, DECBHM
Assistant Professor, Department of Farm Animal Health, Utrecht University, Utrecht, The Netherlands

Anormalidades do Metabolismo de Fósforo, Distrofias Associadas ao Cálcio, Fósforo e Vitamina D, Doença do
Fígado Gorduroso em Bovinos

Jorge Guerrero, DVM, PhD, DEVPC (Ret)
Adjunct  Professor  of  Parasitology,  Department  of  Pathobiology,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Pennsylvania, Philadelphia, PA

Dirofilariose

P.  K.  Gupta,  BVSc,  MSc,  VM  &AH  (Gold  Medalist),  PhD,  Post  Doc,  PGDCA,  FNA,  VS,  FASc,  AW,  FST,
FAEB, FACVT
Director,  Toxicology  Consulting  Services,  Inc.;  and  Former  Chief,  Division  of  Pharmacology  &  Toxicology,
(IVRI) and Advisor to WHO, Bareilly, India

Intoxicação por Herbicida

Ramesh C. Gupta, DVM, MVSc, PhD, DABT, FACT, FATS
Professor and Head, Toxicology Department, Breathitt Veterinary Center, Murray State University, Kopkinsville,
KY

Intoxicação por Inseticida e Acaricida (Orgânico)

James S. Guy, DVM, PhD
Professor,  Department  of  Population  Health  and  Pathobiology,  College  of  Veterinary  Medicine,  North  Carolina
State University, Raleigh, NC

Enterite por Coronavírus em Perus, Encefalite Viral

Sharon M. Gwaltney­Brant, DVM, PhD, DABVT, DABT
Vice President and Medical Director, A.S.P.C.A. Animal Poison Control Center, Urbana, IL

Riscos Alimentares, Riscos Domiciliares, Acidente Ofídico

Carlton L. Gyles, DVM, PhD, FCAHS
Professor  Emeritus,  Department  of  Pathobiology,  Ontario  Veterinary  College,  University  of  Guelph,  Ontario,
Canada

Doença do Edema

Caroline N. Hahn, DVM, MSc, PhD, DECEIM, DECVN, MRCVS
Senior  Lecturer  in  Veterinary  Clinical  Neuroscience,  Royal  (Dick)  School  of  Veterinary  Studies,  University  of
Edinburgh, Midlothian, UK

Disautonomia

Daniel J. Hall, VMD
Cardiology Resident, Tufts Cummings School of Veterinary Medicine, North Grafton, MA

Doença Cardíaca e Insuficiência Cardíaca

Edward J. Hall, MA, VetMB, PhD, DECVIM­CA
Professor  of  Small  Animal  Internal  Medicine,  Department  of  Clinical  Veterinary  Science,  University  of  Bristol,
Bristol, UK

Síndrome da Má Absorção em Pequenos Animais

Jean A. Hall, DVM, PhD, DACVIM
Professor,  Department  of  Biomedical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Oregon  State  University,
Corvallis, OR

Hipocalcemia Puerperal em Pequenos Animais

Jeffery O. Hall, DVM, PhD, DABVT
Professor and Head of Diagnostic Toxicology, Utah State University, Logan, UT

Intoxicação por Selênio
Christopher Hamblin, CBiol, MSB
Hampshire, UK

Febre Efêmera

Reid Hanson, DVM, DACVS, DACVECC
Professor  of  Surgery,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Auburn  University,
Auburn AL

Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Musculoesquelético

Joseph Harari, MS, DVM, DACVS
Staff Surgeon, Veterinary Surgical Specialists, Spokane, WA

Artropatias e Distúrbios Relacionados em Pequenos Animais, Claudicação em Pequenos Animais, Miopatias em
Pequenos Animais, Osteopatias em Pequenos Animais

Billy M. Hargis, DVM, PhD, DACPV
Professor  and  Director,  JKS  Poultry  Health  Research  Laboratory,  University  of  Arkansas;  Tyson  Sustainable
Poultry Health Chair, Department of Poultry Science, University of Arkansas, Fayetteville, AR

Síndrome Ascite, Doença do Coração Redondo em Perus

D. L. Hank Harris, DVM, PhD
Professor,  Department  of  Animal  Science,  Department  of  Veterinary  Diagnostics  and  Production  Animal
Medicine, Iowa State University, Ames, IA

Doença Intestinal em Suínos

Lynette A. Hart, PhD
Professor, School of Veterinary Medicine, University of California, Davis, CA

Relação Homem­Animal

Katrin Hartmann, DECVIM­CA, DrMedVet, DrMedVetHabil
Professor, Clinic of Small Animal Medicine, LMU University of Munich, Germany

Pleurite e Peritonite Infecciosa Felina

Joe Hauptman, DVM, MS, DACVS
Professor of Surgery, Veterinary Teaching Hospital, Michigan State University, East Lansing, MI

Hérnia Diafragmática

Jan F. Hawkins, DVM, DACVS
Associate  Professor,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  Purdue
University, West Lafayette, IN

Doenças do Esôfago em Grandes Animais, Doença da Boca em Grandes Animais, Paralisia de Faringe, Faringite
Marcus J. Head, BVetMed, MRCVS
Rossdales Diagnostic Centre, NewMarket, UK

Claudicação em Equinos: Anormalidades do Ombro e Cotovelo

Peter W. Hellyer, DVM, MS, DACVA
Associate Dean for the Professional Veterinary Medical Program, College of Veterinary Medicine & Biomedical
Sciences, Colorado State University, Fort Collins, CO

Controle da Dor

Charles M. Hendrix, DVM, PhD
Professor, Department of Pathobiology, College of Veterinary Medicine, Auburn University, Auburn, AL

Doenças  do  Sistema  Nervoso  Central  Causadas  por  Helmintos  e  Artrópodes,  Procedimentos  Diagnósticos  para
Laboratórios Particulares: Parasitologia, Pulgas, Artrópodes Venenosos

Thomas H. Herdt, DVM, MS, DACVN, DACVIM
Professor,  Department  of  Large  Animal  Clinical  Sciences  and  Diagnostic  Center  for  Population  and  Animal
Health, Michigan State University, Lansing, MI

Cetose em Bovinos, Nutrição: Bovinos Leiteiros

Karen Hicks­Alldredge, DVM
Sweetwater Veterinary Hospital, Sweetwater, TX

Ratitas

Michael A. Hill, BVetMed, MS, PhD, MRCVS
Associate Professor of Swine Production Medicine, Veterinary Clinical Sciences, School of Veterinary Medicine,
Purdue University, West Lafayette, IN

Claudicação em Suínos

W. Mark Hilton, DVM, DABVP
Clinical Associate Professor, Veterinary Clinical Sciences, School of Veterinary Medicine, Purdue University, West
Lafayette, IN

Interação Manejo­Sanidade: Bovinos de Corte

Katrin Hinrichs, DVM, PhD, DACT
Professor and Patsy Link Chair in Mare Reproduction, Department of Veterinary Physiology and Pharmacology,
College of Veterinary Medicine and Biomedical Sciences, Texas A&M University, College Station, TX

Clonagem de Animais Domésticos

J. Christopher Hodgson, BSc, PhD, MBA
Principal Research Scientist, Moredun Research Institute, Penicuik, UK
Doença da Boca Úmida em Cordeiros

Frederic J. Hoerr, DVM, PhD, DACVP, DACPV
Laboratory Director, Thompson Bishop Sparks State Diagnostic Laboratory, Auburn, AL

Vesículas de Peito, Canibalismo (Aves Domésticas), Micotoxicose (Aves Domésticas)

Charles L. Hofacre, DVM, MAM, PhD, DACPV
Professor  of  Population  Health,  Director  of  Clinical  Services,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Georgia, Athens, GA

Encefalomielite Aviária, Enterite Necrótica

Daniel F. Hogan, DVM, DACVIM (Cardiology)
Associate  Professor,  Chief,  Comparative  Cardiovascular  Medicine  and  Interventional  Cardiology,  School  of
Veterinary Medicine, Purdue University, West Lafayette, IN

Introdução  do  Sistema  Cardiovascular,  Doença  Cardíaca  e  Insuficiência  Cardíaca:  Diagnóstico,  Trombose,
Embolia e Aneurisma

Steven R. Hollingsworth, DVM, DACVO
Associate  Professor  of  Clinical  Ophthalmology,  Department  of  Surgical  and  Radiological  Sciences,  School  of
Veterinary Medicine, University of California, Davis, CA

Uveíte Recidivante Equina

Peter H. Holmes, BVMS, PhD, Dr HC, FRCVS, FRSE, OBE
Emeritus Professor and Former Vice­Principal, Faculty of Veterinary Medicine, University of Glasgow, Scotland,
UK

Tripanossomíase

Timothy N. Holt, DVM
Assistant Professor, Clinical Sciences, Food Animal Department, College of Veterinary Medicine and Biomedical
Sciences, Colorado State University, Fort Collins, CO

Doença de Altitude Elevada

Michael J. Huerkamp, DVM, DACLAM
Director, Division of Animal Resources, Emory University; Professor, Pathology and Laboratory Medicine, Emory
University, Atlanta, GA

Animais de Laboratório

Basil O. Ikede, BVetMed, DVM, PhD, FCVSN
Retired Professor and Chair, Department of Pathology and Microbiology, Atlantic Veterinary College, University
of Prince Edward Island, Prince Edward Island, Canada

Febre Petequial Bovina
Tadao Imada, DVM, PhD
Retired  Research  Manager,  Kyusyu  Research  Station,  National  Institute  of  Animal  Health,  Chuzan  Kagoshima,
Japan

Nefrite Viral Aviária

Walter Ingwersen, DVM, DVSc, DACVIM
Specialist, Companion Animals, Boehringer Ingelheim (Canada) Ltd, Vetmedica, Burlington, Ontario, Canada

Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Digestório

Evelyn S. Ivey, DVM, DABVP
Staff Veterinarian, Four Corners Veterinary Hospital, Concord, CA

Peste Suína Africana

Peter G. G. Jackson, MA, BVM&S, DVM&S, FRCVS
St. Edmund’s College, University of Cambridge, Cambridge, UK

Gestação Prolongada em Vacas e Ovelhas

Mark W. Jackwood, PhD
Professor, Department of Population Health, College of Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, GA

Bordetelose (Aves Domésticas)

Eugene D. Janzen, DVM, MVS
Assistant Dean, Clinical Practice, Community Partnerships, Faculty of Veterinary Medicine, University of Calgary,
Alberta, Canada

Histofilose, Eletrocussão e Choque por Raio, Tricomoníase

Cheri A. Johnson, DVM, MS, DACVIM (Small Animal)
Professor,  Department  of  Small  Animal  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  Michigan  State
University, East Lansing, MI

Tumor Venéreo Transmissível em Cães, Doenças Reprodutivas de Machos em Pequenos Animais

LaRue W. Johnson, DVM, PhD
Professor Emeritus, Colorado State University, Fort Collins, CO

Lhamas e Alpacas

Richard C. Jones, BSc, PhD, DSc, FRCPath
Emeritus Professor, School of Veterinary Science, University of Liverpool, Leahurst, Neston, Wirral, UK

Síndrome da Má Absorção (Aves Domésticas), Artrite Viral

Wayne K. Jorgensen, BSc, PhD
Senior  Principal  Research  Scientist  (Parasitology),  Department  of  Primary  Industries  and  Fisheries,  Queensland,
Australia

Babesiose

Maureen H. Kemp, BVMS, MVM, PhD, DCHP, DECBHM, MRCVS
Upper Mulben, Mulben, Keith, Banffshire

Doenças da Laringe

Robert J. Kemppainen, DVM, PhD
Professor,  Department  of  Anatomy,  Physiology  &  Pharmacology,  College  of  Veterinary  Medicine,  Auburn
University, Auburn, AL

Introdução do Sistema Endócrino

Morag G. Kerr, BVMS, BSc, PhD, Cbiol, FIBiol, MRCVS
SAC Veterinary Services, Midlothian, Scotland, UK

Procedimentos Diagnósticos Para Laboratório Particular: Hematologia e Bioquímica Clínica

Safdar A. Khan, DVM, MS, PhD, DABVT
Director of Toxicology Research, ASPCA Animal Poison Control Center, Urbana, IL

Intoxicação  por  Estricnina,  Intoxicação  por  Drogas  Ilícitas  e  que  Provocam  Dependência,  Intoxicação  por
Medicamentos Vendidos sem Prescrição, Intoxicação por Medicamentos com Prescrição

Daniel J. King, DVM, PhD
Veterinary Medical Officer (retired), USDA­ARS, Southeast Poultry Research Laboratory, Athens, GA

Doença de Newcastle

Rebecca Kirby, DVM, DACVIM,
DACVECC
Executive Director, Animal Emergency Center, Glendale, WI

Introdução  de  Medicina  Emergencial,  Avaliação  e  Tratamento  Inicial  do  Paciente  Emergencial,  Fluidoterapia,
Procedimentos de Monitoramento Para Animal Gravemente Enfermo, Terapia e Diagnóstico Específico

Peter D. Kirkland, BVSc, PhD
Senior  Principal  Research  Scientist,  OIC,  Virology  Laboratory,  Elizabeth  Macarthur  Agriculture  Institute,
Menangle, NSW, Australia

Infecção Pelo Vírus Akabane

Mark D. Kittleson, DVM, PhD, DACVIM (Cardiology)
Professor,  Department  of  Medicine  and  Epidemiology,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of  California,
Davis, CA
Doença Cardíaca e Insuficiência Cardíaca: Doenças Específicas

Kirk C. Klasing, BS, MS, PhD
Professor of Animal Biology, Department of Animal Science, University of California, Davis, CA

Necessidades Nutricionais (Aves Domésticas)

Thomas R. Klei, PhD
Boyd  Professor  and  Associate  Dean  for  Research  and  Advanced  Studies,  School  of  Veterinary  Medicine  and
Louisiana Agriculture Experiment Station, Louisiana State University, Baton Rouge, LA

Parasitos Gastrintestinais de Equinos, Helmintos da Pele

Nick J. Knowles, MPhil
Institute for Animal Health, Pirbright Laboratory, Woking, Surrey, UK

Doença Vesicular Suína, Encefalomielite por Teschovírus, Exantema Vesicular em Suínos

Deborah T. Kochevar, DVM, PhD, DACVCP
Dean, Cummings School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton, MA

Medicamentos Antineoplásicos

Michelle Kopcha, DVM, MS
Associate  Professor,  Food  Animal  Medicine  and  Surgery,  College  of  Veterinary  Medicine,  Michigan  State
University, East Lansing, MI

Doenças Respiratórias de Ovinos e Caprinos

Sarah E. Kraiza, DVM, DACVIM
(Oncology)
Travelers Rest, SC

Anemia

Annemarie T. Kristensen, DVM, PhD, DACVIM (Small Animal), DECVIM­CA & Oncology
Professor  of  Small  Animal  Clinical  Oncology,  Department  of  Small  Animal  Clinical  Sciences,  Faculty  of  Life
Sciences, University of Copenhagen, Frederiksberg, Denmark

Anormalidades Hemostáticas

T. G. Ksiazek, DVM, PhD
Professor,  Galveston  National  Laboratory,  Department  of  Pathology,  and  Department  of  Microbiology  and
Immunology, University of Texas Medical Branch, Galveston, TX

Febre Hemorrágica de Crimean­Congo, Infecção Pelo Vírus Nipah

Ned F. Kuehn, DVM, MS, DACVIM
Section Chief, Internal Medicine, Michigan Veterinary Specialists, Southfield, MI
Introdução do Sistema Respiratório, Doenças Respiratórias de Pequenos Animais

Mahesh C. Kumar, BVSc, MS, PhD, DACPV
Consultant, Poultry Health & Food Safety, St. Cloud, MN

Aneurisma Dissecante

Nina Yu­Hsin Kung, BVM, BVSc, MSc, PhD
Senior  Veterinary  Officer,  Department  of  Employment,  Economic  Development  and  Innovation,  Biosecurity
Queensland, Brisbane, Australia

Infecção pelo Vírus Hendra

Robert A. Kunkle, DVM, PhD
Veterinary Medical Officer, National Animal Disease Center, USDA­ARS, Ames, IA

Aspergilose (Aves Domésticas)

Gary Landsberg, BSc, DVM, MRCVS, DACVB, DECVBM­CA
Veterinary Behaviorist, North Toronto Animal Clinic, Thornhill, Ontario, Canada

Introdução  Sobre  Comportamento,  Comportamento  Social  Normal  e  Problemas  de  Comportamento  em  Animais
Domésticos

Jimmy C. Lattimer, DVM, MS, DACVR, DACVRO
Associate  Professor,  Veterinary  Medicine  and  Surgery,  Veterinary  Medical  Teaching  Hospital,  University  of
Missouri, Columbia, MO

Diagnóstico por Imagem, Radioterapia

D. Bruce Lawhorn, DVM, MS
Visiting  Professor,  Swine  Practice,  Food  Animal  Section,  Department  of  Veterinary  Large  Animal  Clinical
Sciences, College of Veterinary Medicine and Biomedical Sciences, Texas A&M University, College Station, TX

Porco Vietnamita (Potbellied)

Dennis F. Lawler, DVM
O’Fallon, IL

Manejo do Neonato em Pequenos Animais

Margie D. Lee, DVM, PhD
Professor  of  Population  Health,  Poultry  Diagnostic  and  Research  Center,  College  of  Veterinary  Medicine,
University of Georgia, Athens, GA

Campilobacteriose Aviária, Colibacilose (Aves Domésticas)

Steven Leeson, PhD
Professor, Department of Animal and Poultry Science, University of Guelph, Ontario, Canada
Síndrome do Fígado Gorduroso, Deficiências Nutricionais (Aves Domésticas)

Nicholas W. Lerche, DVM, MPVM
Professor,  Department  of  Medicine  and  Epidemiology,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of  California;
Associate  Director  for  Primate  Services,  California  National  Primate  Research  Center,  University  of  California,
Davis, CA

Primatas Não Humanos

Michael L. Levin, PhD
Rickettsial Zoonoses Branch, Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, GA

Carrapatos

Alicja E. Lew­Tabor, BSc (Hons), PhD
Principal  Research  Scientist  (Molecular  Biology),  Agri­Science  QLD,  Department  of  Employment,  Economic
Development and Innovation, Brisbane, Queensland, Australia

Anaplasmose

David H. Ley, DVM, PhD, DACVM, DACPV
Professor,  Department  of  Population  Health  and  Pathobiology,  College  of  Veterinary  Medicine,  North  Carolina
State University, Raleigh, NC

Micoplasmose

Teresa L. Lightfoot, DVM, DABVP (Avian)
Chair, Avian and Exotics Department, Florida Veterinary Specialists, Tampa, FL

Pássaros de Estimação, Nutrição: Pássaros

Andrew Linklater, DVM, DACVECC
Clinical Instructor, Animal Emergency Center and Specialty Services, Milwaukee, WI

Introdução à Medicina Emergencial, Avaliação e Tratamento Inicial do Paciente em Emergência, Fluidoterapia,
Procedimentos de Monitoramento do Animal Gravemente Enfermo, Terapia e Diagnóstico Específico

John E. Lloyd, BS, PhD
Professor Emeritus of Entomology, University of Wyoming, Laramie, WY

Berne e Piolhos em Bovinos

Jeanne Lofstedt, BVSc, MS, DACVIM (Large Animal)
Professor  of  Large  Animal  Internal  Medicine,  Department  of  Health  Management,  Atlantic  Veterinary  College,
University of Prince Edward Island, Charlottetown, Prince Edward Island, Canda

Síndrome Artrite­Encefalite Caprina, Laringite Necrótica, Disenteria de Inverno

Maureen T. Long, DVM, PhD, DACVIM
Associate Professor, Department of Infectious Diseases and Pathology, College of Veterinary Medicine, University
of Florida, Gainesville, FL

Encefalomielite Equina, Meningite e Encefalite

Michael R. Loomis, DVM, MA, DACZM
Chief Veterinarian, North Carolina Zoological Park, Asheboro, NC

Animais de Zoológico

Ingrid Lorenz, DrMedVet, DrMedVetHabil, DECBHM
Lecturer in Bovine Medicine, School of Agriculture, Food Science and Veterinary Medicine, University College
Dublin, Ireland

Goteira Ruminal, Paracetose Ruminal

Bertrand J. Losson, DVM, PhD, DEVPC
Professor, Department of Parasitology and Parasitic Diseases, Faculty of Veterinary Medicine, University of Liege,
Belgium

Sarna em Grandes Animais

Jodie Low Choy, BVMS
Veterinary, Palmerston, Northern, Territory, Australia

Melioidose

Katharine F. Lunn, BVMS, MS, PhD, MRCVS, DACVIM
Assistant  Professor,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine  and  Biomedical  Sciences,
Colorado State University, Fort Collins, CO

Febre de Origem Desconhecida

Robert J. Mackay, BVSc, PhD
Professor,  Large  Animal  Medicine,  Department  of  Large  Animal  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary
Medicine, University of Florida, Gainesville, FL

Mieloencefalite Protozoária Equina

Charles Mackenzie, BVSc, BSc, PhD, FRCVS, FRCPath, DEd
Professor,  Department  of  Pathobiology  and  Diagnostic  Investigation,  Michigan  State  University,  East  Listening,
MI

Besnoitiose

Kenneth S. Macklin, PhD
Associate Professor and Extension Specialist, Department of Poultry Science, Auburn University, Auburn, AL

Helmintíase
John E. Madigan, DVM, MS
Professor,  Department  of  Medicine  and  Epidemiology,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of  California,
Davis, CA

Erliquiose Granulocítica Equina, Febre do Cavalo Potomac

Brian W. J. Mahy, BSc, MA, PhD, ScD, DSc
Senior  Scientific  Advisor,  National  Center  for  Emerging  and  Zoonotic  Infectious  Diseases,  Centers  for  Disease
Control and Prevention, Atlanta, GA

Febre Aftosa

Linda S. Mansfield, MS, VMD, PhD
Professor of Microbiology, Department of Microbiology and Molecular Genetics, Michigan State University, East
Lansing, MI

Campilobacteriose

Richard A. Mansmann, VMD, PhD
Equine Podiatry & Rehabilitation Mobile Practice, Chapel Hill, NC

Exame de Equinos para Compra

Steven L. Marks, BVSc, MS, MRCVS, DACVIM
Clinical  Associate  Professor,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,  North  Carolina
State University, Raleigh, NC

Ácaros Nasais em Cães, Interação Manejo–Sanidade: Pequenos Animais

Bret D. Marsh, DVM
Indiana State Veterinarian, Indiana State Board of Animal Health, Indianapolis, IN

Exame de Ruminantes e Suínos para Compra

Guy­Pierre Martineau, DVM, DECPHM
Professor  in  Swine  Medicine,  Department  of  Animal  Health,  Production  and  Economics,  National  Veterinary
School, Toulouse, France

Síndrome da Disgalaxia Pós­Parto e Mastite em Porcas

Herris S. Maxwell, DVM, DACT
College of Veterinary Medicine, Auburn University, Auburn, AL

Anomalias Congênitas e Hereditárias de Condições Generalizadas

Milton McAllister, DVM, PhD, DACVP
School of Animal and Veterinary Sciences, University of Adelaide, Roseworthy, Australia

Neosporose
Dudley L. McCaw, DVM, DACVIM (Small Animal, Oncology)
Professor, Department of Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Kansas State University, Manhattan,
KS

Leucemia Viral Felina e Doenças Relacionadas

Diane McClure, DVM, PhD, DACLAM
Veterinarian, Animal Resource Center Veterinary Services, Goleta, CA

Coelhos

Larry R. McDougald, PhD
Professor,  Department  of  Poultry  Science,  College  of  Agriculture  and  Environmental  Sciences,  University  of
Georgia, Athens, GA

Espiroquetose  Aviária,  Coccidiose  (Aves  Domésticas),  Criptosporidiose  (Aves  Domésticas),  Infecção  por
Cestódeos, Hexamitíase, Histomoníase, Tricomoníase (Aves Domésticas)

Catherine McGowan, BVSc, MACVSc, DEIM, DECEIM, PhD, FHEA, MRCVS
Faculty of Health and Life Sciences, School of Veterinary Science, University of Liverpool, Leahurst, UK

Fadiga e Exercício

C. Wayne McIlwraith, BVSc, PhD, DSc, FRCVS, DACVS
Professor  of  Surgery,  College  of  Veterinary  Medicine  and  Biomedical  Sciences,  Colorado  State  University;
Barbara  Cox  Anthony  Endowed  University  Chair  in  Equine  Orthopaedic  Research,  Colorado  State  University;
Director, Orthopaedic Research Center, Colorado State University, Fort Collins, CO

Artropatias em Grandes Animais, Claudicação em Equinos: Anormalidades de Carpo e Metacarpo

Erica C. McKenzie, BSc, BVMS, PhD, DACVIM
Assistant Professor, Large Animal Medicine, College of Veterinary Medicine, Oregon State University, Corvallis,
OR

Manejo do Neonato de Grandes Animais

Jennifer H. McQuiston, DVM, MS
Epidemiology  Team  Leader,  Rickettsial  Zoonoses  Branch,  Centers  for  Disease  Control  and  Prevention,  Atlanta,
GA

Riquetsioses

Phillip S. Mellor, OBE, DSc, FRES, FHEA
Professor, Head of Vector­borne Diseases Programme, Pirbright Laboratory, Institute for Animal Health, Pirbright,
Woking, Surrey, UK

Doença do Cavalo Africano, Língua Azul

Mushtaq A. Memon, BVSc, MS, PhD, DACT
Theriogenologist, Department of Veterinary Clinical Sciences, Washington State University, Pullman, WA

Doenças Reprodutivas da Fêmea de Pequenos Animais

Paula I. Menzies, DVM, MPVM, DECS­RHM
Associate  Professor,  Ruminant  Health  Management  Group,  Department  of  Population  Medicine,  Ontario
Veterinary College, University of Guelph, Ontario, Canada

Toxemia da Prenhez em Ovelhas, Manejo Reprodutivo: Ovinos

Sandra R. Merchant, DVM, DACVD
Professor of Dermatology, Department of Veterinary Clinical Sciences, School of Veterinary Medicine, Louisiana
State University, Baton Rouge, LA

Dermatofitose (Tinha)

Samia A. Metwally, DVM, PhD
Head,  Diagnostic  Services  Section,  Foreign  Animal  Disease  Diagnostic  Laboratory,  USDA,  APHIS,  Greenport,
NY

Doença do Ovino de Nairóbi

Patrice M. Mich, DVM, MS, DABVP (Canine/Feline), DACVA
OrthoPets Center for Animal Pain Management and Mobility Solutions, Denver, CO

Controle da Dor

Bernard Mignon, DVM, PhD, DEVPC
Assistant Professor, Faculty of Veterinary Medicine, Department of Infectious and Parasitic Diseases, Parasitology
and Parasitic Diseases, University of Liège, Belgium

Sarna em Cães e Gatos

Kelly D. Mitchell, DVM, DVSc, DACVIM (SAIM)
Toronto Veterinary Emergency Clinic, Scarborough, Ontario, Canada

Doenças  de  Estômago  e  Intestino:  Parvovirose  Canina,  Coronavirose  Intestinal  Felina,  Gastrite,  Gastrenterite
Hemorrágica

Harry Momont, DVM, PhD, DACT
Clinical  Associate  Professor,  Department  of  Medical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Wisconsin­Madison, Madison, WI

Introdução do Sistema Reprodutivo

Donald R. Monke, DVM, MBA
Vice President, Production Operations, Select Sires, Inc, Plain City, OH

Vesiculite Seminal em Touros
James N. Moore, DVM, PhD
Distinguished  Research  Professor,  Department  of  Large  Animal  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,
University of Georgia, Athens, GA

Cólica Equina

Gastón A. Moré, MV, DVM
Investigador asistente  CONICET,  Laboratorio  de  Inmunoparasitología,  Cátedra de Parasitología y Enfermedades
Parasitarias, Facultad de Ciencias Veterinarias, Universidad Nacional de La Plata, Buenos Aires, Argentina

Sarcocistose

Karen A. Moriello, DVM, DACVD
Clinical  Professor  of  Dermatology,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of  Wisconsin­Madison,  Madison,
WI

Acantose Nigricans, Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Tegumentar, Infestação por Cuterebra em
Pequenos  Animais,  Dermatofilose,  Higroma,  Introdução  do  Sistema  Tegumentar,  Furunculose  Interdigital,
Piodermite

Dawn E. Morin, DVM, MS, DACVIM
Professor,  Assistant  Dean  for  Academic  Affairs  and  Curriculum,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Illinois, Urbana, IL

Otite Média e Interna

Teresa Y. Morishita, DVM, MPVM, MS, PhD, DACPV
Associate  Dean  for  Academic  Affairs  and  Professor,  Poultry  Medicine  and  Food  Safety,  College  of  Veterinary
Medicine, Western University of Health Sciences, Pomona, CA

Enterococose, Dermatite Gangrenosa, Listeriose, Estafilococose, Estriptococose

James K. Morrisey, DVM, DABVP (Avian)
Service  Chief,  Companion  Exotic  Animal  Medicine  Service,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of
Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, NY

Furões

W. Ivan Morrison, PhD, BVMS, FRSE
Professor, The Roslin Institute, Royal (Dick) School of Veterinary Studies, University of Edinburgh, Scotland, UK

Teileriose

Sofie Muylle, DVM, PhD
Faculty of Veterinary Medicine, Department of Morphology, Ghent University, Salisburylaan, Merelbeke, Belgium

Desenvolvimento Dentário

Dusty W. Nagy, DVM, MS, PhD, DACVIM
Assistant  Teaching  Professor,  Food  Animal  Medicine  &  Surgery,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Missouri, Columbia, MO

Leucose Bovina

T. Mark Neer, DVM, DACVIM
Professor  of  Medicine  and  Director,  Boren  Veterinary  Medical  Teaching  Hospital,  Department  of  Clinical
Sciences, Center for Veterinary Health Sciences, Oklahoma State University, Stillwater, OK

Anormalidades Desmielinizantes, Indisposição durante Viagens

Peter Nettleton, BVMS, MSc, PhD, MRCVS
Moredun Research Institute, Scotland, UK

Doença da Fronteira

Robin A. J. Nicholas, MSc, PhD, FRCPath
Head of Mycoplasma Group, Veterinary Laboratories Agency­Weybridge, Addlestone, Surrey, UK

Agalaxia Contagiosa e Outras Infecções Mamárias por Micoplasmas em Pequenos Ruminantes

Paul Nicoletti, DVM, MS
Professor Emeritus, College of Veterinary Medicine, University of Florida, Gainesville, FL

Bruscelose em Grandes Animais, Brucelose em Cães

Jerome C. Nietfield, DVM, PhD, DACVP
Professor,  Department  of  Diagnostic  Medicine/Pathobiology,  College  of  Veterinary  Medicine,  Kansas  State
University, Manhattan, KS

Aborto em Grandes de Animais, Clamidiose Intestinal

Joeke Nijboer, PhD
Nutritionist, Rotterdam Zoo, Rotterdam, The Netherlands

Nutrição: Animais Exóticos e de Zoológico

Robert A. Norton, MS, PhD
Professor, Department of Poultry Science, Auburn University, Auburn, AL

Helmintíase (Aves Domésticas)

Mark J. Novotny, DVM, MS, PhD, DACVCP
Senior Principal Scientist, Metabolism and Safety, Veterinary Medicine Research and Development, Pfizer Animal
Health, Kalamazoo, MI

Farmacoterapia Sistêmica do Sistema Cardiovascular

Frederick W. Oehme, DVM, PhD
Professor of Toxicology,  Pathobiology, Medicine  and  Physiology,  Comparative Toxicology Laboratories, Kansas
State University, Manhattan, KS

Intoxicação por Rodenticidas

Garrett R. Oetzel, DVM, MS
Associate  Professor,  Department  of  Medical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of  Wisconsin­
Madison, Madison, WI

Acidose Ruminal Subaguda em Vacas Leiteiras

Gary D. Osweiler, DVM, MS, PhD, DABVT
Professor,  Veterinary  Diagnostic  and  Production  Animal  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,  Iowa  State
University, Ames, IA

Intoxicação por Alcatrão de Hulha, Micotoxicose, Intoxicação por Derivados de Petróleo

Raul E. Otalora, DVM
Production Manager/Veterinarian, Quail International, Inc., Greensboro, GA

Enterite Ulcerativa (Doença da Codorniz)

Chris Oura, MSc, PhD, MRCVS
Head  of  the  Non­Vesicular  Reference  Laboratories,  Pirbright  Laboratory,  Institute  for  Animal  Health,  Pirbright,
Woking, Surrey, UK

Peste Suína Africana

Rebecca A. Packer, MS, DVM, DACVIM (Neurology)
Assistant  Professor,  Neurology/Neurosurgery,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  and  Department  of
Basic Medical Sciences, School of Veterinary Medicine, Purdue University, West Lafayette, IN

Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Nervoso

David J. Paton, MA, VetMB, PhD,
MRCVS
Director of Science, Pirbright Laboratory, Institute for Animal Health, Pirbright, Surrey, UK

Doença Vesicular Suína, Exantema Vesicular de Suíno

Sharon Patton, MS, PhD
Professor  of  Parasitology,  Department  of  Comparative  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Tennessee, Knoxville, TN

Amebíase

Maurice B. Pensaert, DVM, MS, PhD
Emeritus Professor of Animal Virology, Faculty of Veterinary Medicine, Ghent University, Merelbeke, Belgium
Encefalomielite Hemaglutinante

Andrew S. Peregrine, BVMS, PhD, DVM, DEVPC
Associate  Professor,  Department  of  Pathobiology,  Ontario  Veterinary  College,  University  of  Guelph,  Ontario,
Canada

Parasitos Gastrintestinais de Pequenos Animais

Tilden Wayne Perry, BEd, BS, MS, PhD
Emeritus Professor of Animal Nutrition, Purdue University, West Lafayette, IN

Nutrição: Bovinos de Corte

Donald Peter, DVM, MS, DACT
Veterinarian/Owner, Frontier Genetics, Frontier Genetics, Hermiston, OR

Campilobacteriose Genital Bovina, Exantema do Coito em Equinos

Mark E. Peterson, DVM, DACVIM
Director, Animal Endocrine Clinic, New York, NY

Glândulas Paratireoides e Anormalidades do Metabolismo de Cálcio, Glândula Tireoide

James R. Philips, PhD
Associate Professor of Science, Math/Science Division, Babson College, Babson Park, MA

Ácaro de Saco Aéreo, Ectoparasitas (Aves Domésticas)

Carlos R. F. Pinto, MedVet, PhD, DACT
Associate  Professor,  Theriogenology  and  Reproductive  Medicine,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,
College of Veterinary Medicine, Ohio State University, Columbus, OH

Transferência de Embrião em Animais Pecuários

Robert E. Porter, DVM, PhD, DACVP, DACPV
Clinical Professor, Veterinary Population Medicine, College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St.
Paul, MN

Síndrome da Hemorragia Perirrenal em Perus

Karen W. Post, DVM, MS, DACVM
Director  of  Laboratories,  North  Carolina  Veterinary  Diagnostic  Laboratory  System,  Consumer  Services,  Rollins
Animal Disease, Diagnostic Laboratory, Raleigh, NC

Procedimentos Diagnósticos Para Laboratório Particular: Microbiologia Clínica

D. G. Pugh, DVM, MS, DACT, DACVN
Veterinarian, Waverly, AL
Nutrição: Caprinos, Nutrição: Ovinos

Darryl Ragland, DVM, PhD
Associate  Professor,  Veterinary  Clinical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  Purdue  University,  West
Lafayette, IN

Biossegurança, Erisipela, Infecções Estafilocócicas em Suínos, Linfadenite e Linfangite: Linfadenite em Suínos

Sarah L. Ralston, VMD, PhD, DACVN
Associate Professor, Department of Animal Sciences, School of Environmental and Biological Sciences, Rutgers
University, New Brunswick, NJ

Nutrição: Equinos

John F. Randolph, DVM, DACVIM
Professor of Veterinary Medicine, College of Veterinary Medicine, Cornell University, Ithaca, NY

Eritrocitose e Policitemia

Silke Rautenschlein, DVM, PhD
Professor, Clinic for Poultry, University of Veterinary Medicine­Hannover, Hannover, Germany

Metapneumovírus Aviário

Willie M. Reed, DVM, PhD
Dean, School of Veterinary Medicine, Purdue University, West Lafayette, IN

Bronquite de Codorniz, Hepatite Viral em Perus

Philip T. Reeves, BVSc, PhD, FACVSc
Principal Scientist, Residues and Veterinary Medicines, Australian Pesticides and Veterinary Medicines Authority,
Canberra, Australia

Resíduos  Químicos  em  Alimentos  e  Fibras,  Ação  de  Medicamento  e  Farmacodinâmica,  Dosagens  e  Sistema  de
Administração

Hugh W. Reid, MBE, BVM&S, DTVM, PhD, MRCVS
Moredun Research Institute, Pentlands, Science Park, Penicuik, UK

Encefalomielite Ovina

Douglas J. Reinemann, PhD
Professor, Department of Biological Systems Engineering, College of Agricultural & Life Sciences, University of
Wisconsin­Madison, Madison, WI

Stray Voltage em Animais Estabulados

Christopher D. Reinhardt, MS, PhD
Assistant  Professor,  Extension  Feedlot  Specialist,  Animal  Sciences  and  Industry,  Kansas  State  University,
Manhattan, KS

Promotores de Crescimento e Estimulantes de Produção

Petra Reinhold, DVM, PhD
Friedrich­Loeffler­Institute, Federal Research Institute for Animal Health, Jena, Germany

Pneumonia por Clamídia

Márcio Garcio Ribeiro, DVM, PhD
Associate  Professor,  Infectious  Diseases  of  Domestic  Animals,  Department  of  Veterinary  Hygiene  and  Public
Health,  School  of  Veterinary  Medicine  and  Animal  Science,  Sao  Paulo  State  University­UNESP,  Botucatu,  SP,
Brazil

Nocardiose

Franklin Riet­Correa, MSc, PhD
Professor, Veterinary Hospital, Federal University of Campina Grande, Patos, Paraíba, Brazil

Lechiguana

Carlos A. Risco, DVM, DACT
Professor, Large Animal Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, University of Florida, Gainesville, FL

Doença do Ovário Cístico, Manejo da Reprodução: Bovinos

Narda G. Robinson, DO, DVM, MS,
FAAMA
Director, Center for Comparative and Integrative Pain Medicine, Department of Clinical Sciences, Colorado State
University, Fort Collins, CO

Medicina Veterinária Alternativa e Complementar

Allan Roepstorff, DSc, PhD, MSc
Associate Professor, Department of Disease Biology, Danish Centre for Experimental Parasitology, Faculty of Life
Sciences, University of Copenhagen, Frederiksberg, Denmark

Parasitos Gastrintestinais de Suínos

Barton W. Rohrbach, VMD, MPH, DACVPM
Associate  Professor,  Department  of  Comparative  Medicine,  Veterinary  Teaching  Hospital,  University  of
Tennessee, Knoxville, TN

Febre Q, Tularemia

A. Gregorio Rosales, DVM, MS, PhD, DACPV
Vice President of Veterinary Services, Aviagen Inc., Huntsville, AL
Doenças do Sistema Reprodutor (Aves Domésticas)

Robert C. Rosenthal, DVM, PhD,
DACVIM (Small Animal, Oncology), DACVR (Radiation Oncology)
SouthPaws Veterinary Referral Center, Springfield, VA

Tumores Mamários, Neoplasias de Tecido Neuroendócrino

James A. Roth, DVM, PhD, DACVM
Distinguished Professor and Director, Center for Food Security and Public Health, College of Veterinary Medicine,
Iowa State University, Ames, IA

Zoonoses

Stanley I. Rubin, DVM, MS, DACVIM
Staff Internist, Southern Arizona Veterinary Specialty and Emergency Center, Tucson, AZ

Introdução do Sistema Digestório, Doenças do Reto e do Ânus

Pamela L. Ruegg, DVM, MPVM, DABVP (Dairy)
Professor,  Department  of  Dairy  Science,  College  of  Agricultural  and  Life  Sciences,  University  of  Wisconsin­
Madison, Madison, WI

Doenças da Glândula Mamária

Charles E. Rupprecht, VMD, MS, PhD
Chief, Rabies Program, Centers for Disease Control and Prevention, Atlanta, GA

Raiva

Bonnie R. Rush, DVM, MS, DACVIM
Professor, Equine Internal Medicine, College of Veterinary Medicine, Kansas State University, Manhattan, KS

Doenças Respiratórias de Equinos

Y. M. Saif, DVM, PhD
Professor and Head, Food Animal Health Research Program, Ohio Agricultural Research and Development Center,
Ohio State University, Wooster, OH

Doença Infecciosa da Bursa, Rotavirose em Frangos, Perus e Faisão

Jean E. Sander, DVM, MAM, DACPV
Associate  Dean  for  Academic  and  Student  Affairs,  College  of  Veterinary  Medicine,  Ohio  State  University,
Columbus, OH

Candidíase (Aves Domésticas), Descarte de Carcaças e Desinfecção de Equipamentos, Onfalite

Sherry Lynn Sanderson, BS, DVM, PhD, DACVIM, DACVN
Associate Professor, Department of Physiology and Pharmacology, College of Veterinary Medicine, University of
Georgia, Athens, GA

Nutrição: Pequenos Animais, Introdução do Sistema Urinário

Donald C. Sawyer, DVM, PhD
Professor Emeritus, Michigan State University, Okemos, MI

Hipertermia Maligna

Charles M. Scanlan, DVM, PhD
Professor,  Department  of  Veterinary  Pathobiology,  College  of  Veterinary  Medicine  and  Biomedical  Sciences,
Texas A&M University, College Station, TX

Inspeção de Carne

K. A. Schat, DVM, PHD
Professor,  Department  of  Microbiology  and  Immunology,  College  of  Veterinary  Medicine,  Cornell  University,
Ithaca, NY

Anemia Viral em Frangos

David G. Schmitz, DVM, MS, DACVIM
Associate  Professor,  Department  of  Veterinary  Large  Animal  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine
and Biomedical Sciences, Texas A&M University, College Station, TX

Intoxicação por Cantaridina (Blister Beetle)

Norman R. Schneider, DVM, MSc,
DABVT
Veterinary Toxicologist, Ceresco, NE

Intoxicação por Cianeto, Gossipol, Nitrato, Nitrito e Nitrogênio Não Proteico

Thomas Schubert, DVM, DACVIM, DABVP
Clinical  Professor  and  Chief  of  Neurology  Service,  Small  Animal  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary
Medicine, University of Florida, Gainesville, FL

Paralisia Facial e de Membros, Introdução do Sistema Nervoso

James Schumacher, DVM, MS, DACVS, MRCVS
Professor, Department of Large Animal Clinical Sciences, University of Tennessee, Knoxville, TN

Claudicação em Equinos: Anestesia Regional

John Schumacher, DVM, MS, DACVS, MRCVS
Professor, Department of Clinical Sciences, College of Veterinary Medicine, Auburn University, AL

Claudicação em Equinos: Anestesia Regional
Philip R. Scott, BVM&S, MPhil, DVM&S, DSHP, DECBHM, FHEA, FRCVS
Royal School of Veterinary Studies, University of Edinburgh, Midlothian, UK

Ectima Contagioso (Orf), Listeriose, Dermatose Ulcerativa de Ovinos

Joaquim Segalés, DVM, PhD, DECVP, DECPHM
Facultat de Veterinària, Departament de Sanitat i d’ Anatomia Animals and Centre de Recerca en Sanitat Animals
(CReSA), Universitat Autònoma de Barcelona, Bellaterra, Barcelona, Spain

Doença de Gläcer, Circovirose Suína

Debra C. Sellon, DVM, PhD, DACVIM
Professor,  Equine  Medicine,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine,
Washington State University, Pullman, WA

Anemia Infecciosa Equina

Susan D. Semrad, VMD, PhD, DACVIM
Associate  Professor,  Department  of  Medical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of  Wisconsin,
Madison, WI

Doença Hepática em Grandes Animais, Síndrome da Má Assimilação em Grandes Animais

Patricia L. Sertich, MS, VMD, DACT
Associate  Professor­Clinical  Educator,  School  of  Veterinary  Medicine,  New  Bolton  Center,  University  of
Pennsylvania, Kennett Square, PA

Manejo da Reprodução: Equinos

Linda Shell, DVM, DACVIM­Neurology
Pilot, VA

Farmacoterapia Sistêmica do Sistema Nervoso

David M. Sherman, DVM, MS, DACVIM
Clinical Associate Professor, Cummings School of Veterinary Medicine, Tufts University, North Grafton, MA

Interação Manejo­Sanidade: Caprinos, Claudicação em Caprinos

Michael Shipstone, BVSc, FACVSc, DACVD
Queensland Veterinary Specialists, Herston, Australia

Farmacoterapia Sistêmica do Sistema Tegumentar

H. L. Shivaprasad, BVSc, MS, PhD, DACPV
Professor, California Animal Health and Food Safety Laboratory System­Tulare, University of California, Davis,
CA

Enterite Hemorrágica de Perus e Doença do Baço Marmorizado de Faisão
Elizabeth A. Shull, DVM, DACVIM (Neurology), DACVB
Owner, Appalachian Veterinary Specialists, Knoxville, TN

Eutanásia

Wayne Simpson, MSc (Microbiology), Bhort Sc, Dhort
Research Associate, Endophyte Mycology, Forage Improvement Section, AgResearch Limited, Palmerston North,
New Zealand

Intoxicação por Azevém

Geof W. Smith, DVM, MS, PhD, DACVIM
Associate  Professor  of  Ruminant  Medicine,  Department  of  Population  Health  and  Pathobiology,  College  of
Veterinary Medicine, North Carolina State University, Raleigh, NC

Actinobacilose, Actinomicose

Roger K. W. Smith, MA, VetMB, PhD, DEO, DECVS, MRCVS
Professor of Equine Orthopaedics, Department of Veterinary Clinical Sciences, Royal Veterinary College, Hatfield,
Herts, UK

Claudicação em Equinos: Anormalidades do Boleto e da Quartela

Stephen A. Smith, DVM, PhD
Professor  of  Aquatic,  Wildlife  and  Exotic  Animal  Medicine,  Department  of  Biomedical  Sciences  and
Pathobiology, Virginia­Maryland Regional College of Veterinary Medicine, Virginia Tech, Blacksburg, VA

Interação Manejo­Sanidade: Sistemas de Aquicultura

Janice E. Sojka, VMD, MS, DACVIM
Professor,  Department  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  Purdue  University,  West
Lafayette, IN

Síndrome  Metabólica  Equina,  Glândula  Pituitária:  Hisurtismo  Associado  a  Adenoma  da  Parte  Intermediária,
Aumento da Glândula Tireoide Não Neoplásico

Anna Rovid Spickler, DVM, PhD
Veterinary  Specialist,  Center  for  Food  Security  and  Public  Health,  College  of  Veterinary  Medicine,  Iowa  State
University, Ames, IA

Zoonoses

Sharon J. Spier, DVM, PhD, DACVIM
Professor,  Department  of  Medicine  and  Epidemiology,  School  of  Veterinary  Medicine,  University  of  California,
Davis, CA

Tetania Hipocalcêmica em Equinos, Linfadenite e Linfagite: Infecção por Corynebacterium Pseudotuberculosis

Richard A. Squires, BVSc (Hons), PhD, DVR, DACVIM, DECVIM­CA, MRCVS
Head  of  Veterinary  Clinical  Sciences,  School  of  Veterinary  and  Biomedical  Sciences,  James  Cook  University,
Townsville, Australia

Panleucopenia Felina

Henry R. Stämpfli, DVM, DrMedVet, DACVIM
Professor,  Large  Animal  Medicine,  Department  of  Clinical  Studies,  Ontario  Veterinary  College,  University  of
Guelph, Ontario, Canada

Clostridioses

Bryan L. Stegelmeier, DVM, PhD, DACVP
Veterinary Pathologist, Poisonous Plant Research Laboratory, USDA­ARS, Logan, UT

Intoxicação por Samambaia, Intoxicação por Trevo Doce

Jörg M. Steiner, DrMedVet, PhD, DACVIM, DECVIM­CA
Associate Professor and Director, Gastrointestinal Laboratory, Texas A&M University, College Station, TX

Testes para Doenças Pancreáticas, Pâncreas Exócrinos em Pequenos Animais

Allison A. Stewart, DVM, MS, DACVS
Assistant  Professor  of  Equine  Surgery,  Department  of  Veterinary  Clinical  Medicine,  College  of  Veterinary
Medicine, University of Illinois, Urbana, IL

Introdução do Sistema Musculoesquelético

Allison J. Stewart, BVSC (Hons), MS, DACVIM­LA, DACVECC
Associate Professor of Equine Internal Medicine, Department of Clinical Sciences, John Thomas Vaughan Large
Animal Teaching Hospital, College of Veterinary Medicine, Auburn University, Auburn, AL

Anormalidades do Metabolismo do Magnésio, Doenças Intestinais em Equinos e Potros

Michael K. Stoskopf, DVM, PhD, DACZM
Professor  of  Wildlife  and  Aquatic  Health,  Director  of  the  Environmental  Medicine  Consortium,  College  of
Veterinary Medicine, North Carolina State University, Raleigh, NC

Mamíferos Marinhos

George M. Strain, PhD
Professor  of  Neuroscience,  Comparative  Biomedical  Sciences,  School  of  Veterinary  Medicine,  Louisiana  State
University, Baton Rouge, LA

Cegueira

Reinhard K. Straubinger, DrMedVetHabil, PhD
Professor and Head for Bacteriology and Mycology, Institute for Infectious Diseases and Zoonoses, Department of
Veterinary Sciences, Faculty of Veterinary Medicine, LMU Munich, Germany

Borreliose de Lyme
Bert E. Stromberg, PhD
Professor, Veterinary and Biomedical Sciences, College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul,
MN

Infecção Renal Parasitária de Suínos, Triquinelose

David E. Swayne, DVM, PhD, DACVP, DACPV
Laboratory Director, USDA­ARS, Southeast Poultry Research Laboratory, Athens, GA

Influenza Aviária, Infecção por Paramyxovirus Aviário

Thomas W. Swerczek, DVM, PhD
Professor, Department of Veterinary Science, University of Kentucky, Lexington, KY

Doença de Tyzzer

Jane E. Sykes, BVSc (Hons), PhD, DACVIM
Professor of Small Animal Medicine, Department of Medicine and Epidemiology, School of Veterinary Medicine,
University of California, Davis, CA

Conjuntivite por Clamídia, Hemoparasitas: Anemia Infecciosa Felina

Joseph Taboada, DVM, DACVIM
Professor and Associate Dean, Office of Student and Academic Affairs, School of Veterinary Medicine, Louisiana
State University, Baton Rouge, LA

Infecções Fúngicas

Jaime Tarigo, DVM, DACVP
Center  for  Comparative  Medicine  and  Translational  Research,  College  of  Veterinary  Medicine,  North  Carolina
State University, Raleigh, NC

Citauxzoonose

Marcel Taverne, PhD
Emeritus  Professor  of  Fœtal  and  Perinatal  Biology,  Department  of  Farm  Animal  Health,  Faculty  of  Veterinary
Medicine, Utrecht University, Utrecht, The Netherlands

Pseudoprenhez em Cabras

Mike A. Taylor, BVMS, PhD, MRCVS, DEVPC, DECSRHM, CBiol, MSB
Veterinary Consultant, Wildlife and Emerging Disease Programme, Food and Environment Research Agency, Sand
Hutton, York, UK

Quimioterápicos Ectoparasiticidas para Grandes Animais

Stuart M. Taylor, PhD, BVMS, MRCVS, DECVP
VetPar Services, Bangor, UK
Infecção de Ruminantes por Cestódeos, Infecção por Verme Pulmonar

William Taylor,
Consultant, Angmering, Littlehampton, UK

Peste de Pequenos Ruminantes, Peste Bovina

Brett Tennent­Brown, BVSc, MS, DACVIM, DACVECC
Assistant Professor, Large Animal Medicine, College of Veterinary Medicine, University of Georgia, Athens, GA

Encefalopatia Isquêmica Hipóxica

Charles O. Thoen, DVM, PhD
Professor,  Veterinary  Microbiology  and  Preventive  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,  Iowa  State
University, Ames, IA

Tuberculose (Aves Domésticas), Tuberculose e Outras Micobacterioses

William B. Thomas, DVM, MS, DACVIM (Neurology)
Professor, Neurology and Neurosurgery, Department of Small Animal Clinical Sciences, University of Tennessee,
Knoxville, TN

Doenças de Nervo Periférico e Junção Neuromuscular, Doenças da Coluna Vertebral e Medula Espinal

Larry J. Thompson, DVM, PhD, DABVT
Senior Research Scientist, Nestlé Purina PetCare Company, St. Louis, MO

Intoxicação por Sal

Barry H. Thorp, BVMS, PhD, MRCVS
Midlothian, UK

Anormalidades do Sistema Esquelético (Aves Domésticas)

John F. Timoney, MVB, PhD, Dsc,
MRCVS
Keeneland  Chair  of  Infectious  Diseases,  Gluck  Equine  Research  Center,  Department  of  Veterinary  Science,
University of Kentucky, Lexington, KY

Mormo

Peter J. Timoney, MVB, MS, PhD,
FRCVS
Frederick  Van  Lennep  Chair  in  Equine  Veterinary  Science,  Gluck  Equine  Research  Center,  Department  of
Veterinary Science, College of Agriculture, University of Kentucky, Lexington, KY

Arterite Viral Equina

Ian Tizard, BVMS, PhD, DACVM
Professor  of  Immunology  and  Richard  M.  Schubot  Professor  of  Exotic  Bird  Health,  Department  of  Veterinary
Pathobiology, College of Veterinary Medicine and Biomedical Sciences, Texas A&M University, College Station,
TX

Amiloidose,  Vacinação  de  Mamíferos  Exóticos,  Vacinas  e  Imunoterapia,  Biologia  do  Sistema  Imune,  Doenças
Imunológicas

Susan J. Tornquist, DVM, PhD, DACVP
Professor  and  Associate  Dean  for  Student  and  Academic  Affairs,  College  of  Veterinary  Medicine,  Oregon  State
University, Corvallis, OR

Procedimentos Diagnósticos para Laboratório Particular: Sorologia

Sheila Torres, DVM, PhD, DACVD
Associate Professor, Dermatology, College of Veterinary Medicine, University of Minnesota, St. Paul, MN

Doenças do Pavilhão Auricular

Pierre­Louis Toutain, DVM, PhD,
DECVPT
Professor, Ecole Nationale Veterinaire de Toulouse, Toulouse, France

Anti­inflamatórios

Josie L. Traub­Dargatz, DVM, MS,
DACVIM
Professor,  Population  Health,  Department  of  Clinical  Sciences,  College  of  Veterinary  Medicine  and  Biomedical
Sciences and the Animal Population Health Institute, Colorado State University, Fort Collins, CO

Estomatite Vesicular

Robert Tremblay, DVM, DVSc, DACVIM
Bovine/Equine Specialist, Boehringer Ingelheim (Canada) Ltd, Burlington, Ontario, Canada

Introdução de Manejo e Nutrição

Deoki N. Tripathy, DVM, MS, PhD, DACVM, DACPV
Professor Emeritus, Department of Veterinary Pathobiology, College of Veterinary Medicine, University of Illinois,
Urbana, IL

Varíola Aviária

Jeffrey W. Tyler, DVM, MPVM, PhD,
Deceased
Concentration  Area  Director,  Veterinary  Public  Health,  Department  of  Veterinary  Medicine  and  Surgery,
University of Missouri, Columbia, MO

Encefalopatia Espongiforme Bovina, Doença do Definhamento Crônica
Wendy E. Vaala, VMD, DACVIM
Senior Equine Technical Service Veterinarian, Merck Animal Health, Alma, WI

Interação Manejo­Sanidade: Equinos

Stephanie J. Valberg, DVM, PhD, DACVIM
Professor,  Department  of  Veterinary  Population  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of
Minnesota, St. Paul, MN

Miopatias em Equinos, Miopatias em Ruminantes e Suínos

Arnaud J. Van Wettere, DVM, MS,
DACVP
Department  of  Population  Health  and  Pathobiology,  College  of  Veterinary  Medicine,  North  Carolina  State
University, Raleigh, NC

Clamidiose Aviária, Microrganismos Transmitidos pelo Sangue, Miopatias (Aves Domésticas)

Jozef Vercruysse, DVM, DEVPC
Professor, Faculty of Veterinary Medicine, Ghent University, Merelbeke, Belgium

Anti­helmínticos, Esquistossomose

Alice Villalobos, DVM, DPNAP
Director, Animal Oncology Consultation Service; Director, Pawspice, Hermosa Beach, CA

Tumores de Pele e Tecidos Mole

Pedro Villegas, DVM, MS, PhD, DACVM, DACPV
Professor  Emeritus,  Department  of  Population  Health,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of  Georgia,
Athens, GA

Síndrome  da  Queda  de  Postura  de  Ovos,  Síndrome  Hepatite/Hidropericárdio  por  Corpúsculo  de  Inclusão,
Bronquite Infecciosa

Stephan W. Vogel, BVSc (Hons)
Ridge Animal Hospital, Pretoria, South Africa

Cowdriose

Melissa S. Wallace, DVM, DACVIM
Regional Medical Director (MN, WI, IL, MO), VCA Animal Hospitals, Los Angeles, CA

Doenças Infeciosas do Sistema Urinário de Pequenos Animais

Patricia Walters, VMD, DACVIM, DACVECC
New England Animal Medical Center, West Bridgewater, MA

Doenças do Esôfago de Pequenos Animais
Craig B. Webb, PhD, DVM, DACVIM
Associate  Professor,  Department  of  Clinical  Sciences,  Veterinary  Teaching  Hospital,  Colorado  State  University,
Fort Collins, CO

Vômito

Glade Weiser, DVM, DACVP
Clinical  Pathologist,  Heska  Corporation;  Professor,  Department  of  MIP,  College  of  Veterinary  Medicine  and
Biomedical Sciences, Colorado State University, Fort Collins, CO

Distúrbios Leucocitários

Nick Whelan, BSc, BVSc, MVSc, MACVSc, DACVCP, DACVO
Associate  Professor,  Department  of  Clinical  Studies,  Ontario  Veterinary  College,  University  of  Guelph,  Ontario,
Canada

Farmacoterapia Sistêmica do Olho

Brent R. Whitaker, MS, DVM
Deputy Executive Director of Biological Programs, National Aquarium, Baltimore, MD

Anfíbios

Trevor J. Whitbread, BSc, BVSc, MRCVS, DECVP
Abbey Veterinary Services, Devon, UK

Procedimentos Diagnósticos para Laboratório Particular: Citologia

Patricia D. White, DVM, MS, DACVD
Atlanta Veterinary Skin & Allergy Clinic, Atlanta, GA

Dermatite Atópica, Otite Externa

Stephen D. White, DVM, DACVD
Professor, School of Veterinary Medicine, University of California, Davis, CA

Alergia  Alimentar,  Complexo  Granuloma  Eosinofílico,  Dermatoses  Sistêmicas  Diversas,  Dermatose  Nasal  de
Cães, Ferimentos de Cela, Seborreia, Urticária

Chris Whitton, BVSc, FACVSc, PhD
Associate Professor, Equine Centre, University of Melbourne, Victoria, Australia

Claudicação em Equinos: Desenvolvimento de Doença Ortopédica

Mark L. Wickstrom, DVM, MS, PhD
Associate  Professor,  Department  of  Veterinary  Biomedical  Sciences,  Western  College  of  Veterinary  Medicine,
University of Saskatchewan, Saskatoon, Canada

Antissépticos e Desinfetantes
Bo Wiinberg, DVM, PhD
Assistant Professor, Internal Medicine, Department of Small Animal Clinical Sciences, Faculty of Life Sciences,
University of Copenhagen, Frederiksberg, Denmark

Distúrbios Hemostáticos

Pamela Anne Wilkins, DVM, MS, PhD, DACVIM­LA, DACVECC
Professor  of  Equine  Internal  Medicine  and  Emergency/Critical  Care,  Section  Head,  Chief  of  Service  Equine
Medicine and Surgery, Department of Veterinary Clinical Medicine, College of Veterinary Medicine, University of
Illinois, Urbana, IL

Medicina Emergencial Equina

Lisa H. Williamson, DVM, MS, DACVIM
Associate  Professor  of  Large  Animal  Medicine,  College  of  Veterinary  Medicine,  University  of  Georgia,  Athens,
GA

Linfadenite e Linfangite: Linfadenite Caseosa

Kevin P. Winkler, DVM, DACVS
Surgeon, Georgia Veterinary Specialists, Atlanta, GA

Tratamento de Feridas

Thomas Wittek, PD DrMedVetHabil, DECBHM, MRCVS
Faculty  of  Veterinary  Medicine,  Scottish  Centre  for  Production  Animal  Health  and  Food  Safety,  University  of
Glasgow, Scotland, UK

Peritonite

Zerai Woldehiwet, DVM, PhD, DAgric, MRCVS
Reader in Infectious Diseases, Department of Veterinary Pathology, University of Liverpool, Wirral, UK

Febre Transmitida por Carrapato, Piemia do Carrapato

Peter R. Woolcock, BSc, MSc, PhD
Professor Clinical Diagnostic Virology, California Animal Health and Food Safety Laboratory System, School of
Veterinary Medicine, University of California, Davis, CA

Hepatite Viral de Pato
TRADUTORES

Adriana Érica Wilkes Burton Meirelles
Médica  Veterinária.  Aluna  do  Programa  de  Pós­Graduação  da  Faculdade  de  Ciências  Agrárias  e  Veterinárias  da
Universidade Estadual Paulista (FCAV­UNESP) – Campus de Jaboticabal.

Zoonoses

Carla de Freitas Campos
Médica Veterinária da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ).
Olho e Ouvido, Sistema Respiratório

Caroline Peters Pigatto De Nardi
Médica  Veterinária.  Docente  do  Instituto  Federal  de  Educação,  Ciência  e  Tecnologia  de  São  Paulo  (IFSP)  –
Campus de Matão.

Infecções Generalizadas

Clarisse Simões Coelho
Médica Veterinária. Docente da Universidade Vila Velha (UVV).

Manejo e Nutrição, Sistema Reprodutivo

Daniel Guimarães Gerardi
Médico Veterinário. Docente da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Toxicologia

Daniela Gomes da Silva
Médica  Veterinária.  Jovem  Pesquisadora  da  Faculdade  de  Ciências  Agrárias  e  Veterinárias  da  Universidade
Estadual Paulista (FCAV­UNESP) – Campus de Jaboticabal.

Infecções Generalizadas

João Guilherme Padilha Filho
Médico  Veterinário.  Docente  Aposentado  da  Faculdade  de  Ciências  Agrárias  e  Veterinárias  da  Universidade
Estadual Paulista (FCAV­UNESP) – Campus de Jaboticabal.

Sistema Musculoesquelético

José Jurandir Fagliari
Médico Veterinário. Docente da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista
(FCAV­UNESP) – Campus de Jaboticabal.

Abreviações,  Lista  de  Colaboradores,  Prefácio,  Doenças  Metabólicas,  Guias  de  Referência,  Manejo  e  Nutrição,
Patologia Clínica e Procedimentos, Sistema Circulatório, Sistema Urinário

Lucia Jamli Abel
Biomédica. Docente da Universidade Paulista (UNIP).

Comportamento, Sistema Imunológico

Marcio Antonio Brunetto
Médico  Veterinário.  Docente  da  Faculdade  de  Medicina  Veterinária  e  Zootecnia  da  Universidade  de  São  Paulo
(FMVZ/USP) – Campus de Pirassununga.

Manejo e Nutrição

Marlos Gonçalves Sousa
Médico Veterinário. Docente da Universidade Federal do Tocantins (UFT) – Campus de Araguaína.

Medicina Emergencial e Cuidados Críticos, Toxicologia

Reinaldo Juan Garrido Palacios Junior
Médico  Veterinário.  Aluno  do  Programa  de  Pós­Graduação  da  Faculdade  de  Ciências  Agrárias  e  Veterinárias  da
Universidade Estadual Paulista (FCAV­UNESP) – Campus de Jaboticabal.

Sistema Endócrino

Sabrina dos Santos Costa
Médica Veterinária. Docente da União Pioneira de Integração Social (UPIS).

Sistema Digestivo

Tânia de Freitas Raso
Médica  Veterinária.  Docente  da  Faculdade  de  Medicina  Veterinária  e  Zootecnia  da  Universidade  de  São  Paulo
(FMVZ/USP) – Campus de São Paulo.

Animais Exóticos e de Laboratório, Aves Domésticas

Tatiana Champion
Médica Veterinária. Docente da Universidade Vila Velha (UVV).

Sistema Tegumentar

Thais Gomes Rocha
Médica  Veterinária.  Aluna  do  Programa  de  Pós­Graduação  da  Faculdade  de  Ciências  Agrárias  e  Veterinárias  da
Universidade Estadual Paulista (FCAV­UNESP) – Campus de Jaboticabal.

Farmacologia, Sistema Musculoesquelético, Sistema Nervoso, Sistema Tegumentar
Thiago DeMarchi Munhoz
Médico  Veterinário.  Aluno  do  Programa  de  Pós­Graduação  da  Faculdade  de  Ciências  Agrárias  e  Veterinárias  da
Universidade Estadual Paulista (FCAV­UNESP) – Campus de Jaboticabal.

Sistema Digestivo

Vivian Lindmayer Ferreira
Médica Veterinária. Aluna do Programa de Pós­Graduação da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da
Universidade de São Paulo (FMVZ/USP).

Animais Exóticos e de Laboratório, Aves Domésticas
REVISÃO CIENTÍFICA

Prof. Dr. José Jurandir Fagliari
Professor  Titular  da  Faculdade  de  Ciências  Agrárias  e  Veterinárias  da  Universidade  Estadual  Paulista  (FCAV­
UNESP) – Campus de Jaboticabal. Membro da American Society for Veterinary Clinical Pathology e do National
Mastitis Council – USA.
SISTEMA CIRCULATÓRIO

SANGUE E LINFÁTICOS

 SISTEMA HEMATOPOÉTICO – INTRODUÇÃO
Hemácias
Leucócitos
Plaquetas
 ANEMIA
Anemias Não Regenerativas
Anemia Decorrente de Doença Crônica
Deficiências Nutricionais
Doenças Primárias da Medula Óssea
Doença Renal
Anemias Regenerativas
Anemia Hemolítica
Anemia por Perda de Sangue
 ANEMIA INFECCIOSA EQUINA (GEN)
 ANORMALIDADES HEMOSTÁTICAS
Diátese Hemorrágica
Anormalidades de Coagulação
Anormalidades de Proteínas de Coagulação
Anormalidades Plaquetárias
Anormalidades Vasculares
Trombose Patológica
 ANORMALIDADES LEUCOCITÁRIAS
Fisiologia e Fisiopatologia
Sistema Vascular Sanguíneo
Granulócitos
Linfócitos
Monócitos
Anormalidades do Leucograma
Padrões de Interpretação do Leucograma
 ERITROCITOSE E POLICITEMIA
 GRUPOS SANGUÍNEOS E TRANSFUSÕES
Tipagem Sanguínea
Reação Cruzada
Transfusão Sanguínea
Substitutos do Sangue: Soluções Carreadoras de Oxigênio que Contêm Hemoglobina
 HEMOPARASITOS
Anaplasmose
Babesiose
Outras Espécies de Babesia Importantes em Animais Domésticos
Citauxzoonose
Erliquiose Granulocítica Equina
Hepatozoonose do Velho Mundo e Hepatozoonose Canina Americana
Esquistossomose
Micoplasmas Hemotrópicos
Anemia Infeciosa Felina
Riquetsioses (GEN)
Teileriose
Febre da Costa Oriental
Teileriose Tropical
Outras Teilerioses de Bovinos
Teileriose em Ovinos e Caprinos
Tripanossomíase
Tripanossomíase Transmitida pela Mosca Tsé­tsé
Surra
Durina
Doença de Chagas
Tripanossomos Não Patogênicos
 LEUCOSE BOVINA (GEN)
 LINFADENITE E LINFANGITE
Garrotilho (RES)
Infecção de Equinos e Bovinos por Corynebacterium pseudotuberculosis
Linfadenite Caseosa
Linfadenite Estreptocócica de Suínos
Linfangite Epizoótica (GEN)
Melioidose (GEN)
 LINFOMA MALIGNO CANINO
 VÍRUS DA LEUCEMIA FELINA E DOENÇAS RELACIONADAS (GEN)

CORAÇÃO E VASOS SANGUÍNEOS

 SISTEMA CARDIOVASCULAR – INTRODUÇÃO
Anormalidades do Sistema Cardiovascular
Características Comuns da Doença Cardíaca
Insuficiência Cardíaca, Insuficiência Cardíaca Congestiva e Fraqueza Cardíaca
Diagnóstico de Doença Cardiovascular
Princípios Terapêuticos
Medicamentos Comuns
 ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SISTEMA CARDIOVASCULAR
Anomalias de Ramificações dos Arcos Aórticos
Persistência de Ducto Arterioso
Persistência de Arco Aórtico Direito
Coração Ectópico
Septo
Defeito do Septo Atrial
Defeito do Septo Ventricular
Displasia da Tricúspide
Displasia da Valva Mitral
Estenose Mitral
Hérnia Diafragmática Peritoniopericárdica
Obstrução do Fluxo Sanguíneo
Estenose Aórtica
Estenose Pulmonar
Coarctação da Aorta
Tetralogia de Fallot
Miscelânea de Anormalidades Cardíacas Congênitas
 DIROFILARIOSE
 DOENÇA DE ALTITUDE ELEVADA EM BOVINOS
 DOENÇA E INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
Diagnóstico
Cateterização Cardíaca
Ecocardiografia
Eletrocardiograma
Exame Físico
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Outras Causas de Insuficiência do Miocárdio
Endocardite Infecciosa
Insuficiência Cardíaca
Biomarcadores Cardíacos
Insuficiência Cardíaca Sistólica
Insuficiência Diastólica
Manifestações Clínicas
Mecanismos de Compensação
Tratamento
 TROMBOSE, EMBOLIA E ANEURISMA
SISTEMA HEMATOPOÉTICO – INTRODUÇÃO

O sangue  supre  as  células  com  água,  eletrólitos,  nutrientes  e  hormônios  e  remove  seus  catabólitos.  Os  elementos  celulares  do  sangue  suprem  o  organismo  com  oxigênio  (hemácias),  protegem  contra  organismos  estranhos  e  antígenos
(leucócitos) e iniciam a coagulação (plaquetas). Em razão da diversidade do sistema hematopoético, as doenças que o envolvem são mais bem discutidas a partir de uma perspectiva funcional. A função do sangue pode ser classificada como
resposta normal a situações anormais (p.ex., leucocitose e desvio à esquerda em resposta à inflamação) ou anormalidades primárias do sistema hematopoético (p. ex., pancitopenia decorrente de depleção de medula óssea). Além disso, as
anormalidades podem ser quantitativas (ou seja, contagem celular muito alta ou muito baixa) ou qualitativas (ou seja, alterações funcionais). (Ver Sistema Imunológico, p. 859).

 HEMÁCIAS
A função das hemácias é transportar oxigênio aos tecidos com pressão suficiente para permitir sua rápida difusão. Esse transporte depende de uma molécula transportadora, a hemoglobina (Hb); um veículo (hemácia) capaz de levar a
hemoglobina intacta até a célula e um mecanismo que protege tanto a hemácia quanto a Hb de condições adversas. Qualquer interferência na síntese ou na liberação de Hb, na produção ou na sobrevida das hemácias ou no mecanismo
metabólico induz doenças.
A Hb é uma molécula complexa, formada por quatro radicais heme ligados a quatro globinas (duas a­globinas e duas β­globinas). O ferro é agregado no último estágio, pela ação da enzima ferroquelatase. Anormalidades na produção de
heme ou de globina ocasionam anemia. Dentre as anormalidades, incluem­se deficiência de cobre ou de ferro e intoxicação por chumbo. As hemoglobinopatias, como talassemia e anemia falciforme, doenças genéticas importantes do
homem, ainda não foram diagnosticadas em animais. Nessas doenças, a produção de globinas (a ou β, ou ambas) não é proporcional à síntese de heme, de modo que há comprometimento da função da Hb. A única hemoglobinopatia
conhecida nos animais é a porfiria. Embora descrita em várias espécies, é mais importante como causa de fotossensibilização em bovinos (ver p. 1044).
No animal sadio, a massa eritrocitária e, consequentemente, a capacidade de transportar oxigênio permanecem constantes ao longo do tempo. A meia­vida das hemácias maduras é limitada; suas taxas de produção e destruição devem ser
muito equilibradas, caso contrário há manifestação de doença.
A eritropoese é controlada pela eritropoetina, cujo teor aumenta na hipoxia, controlando a produção de hemácias. Na maioria das espécies, o rim atua como órgão sensor e como principal local de síntese de eritropoetina, de forma que a
insuficiência renal crônica está associada à ocorrência de anemia. A eritropoetina atua na medula, juntamente com outros mediadores humorais, aumentando a quantidade de células­tronco envolvidas na produção de hemácias, de modo a
reduzir o período de maturação e causar liberação precoce de reticulócitos. Outros fatores que influenciam a eritropoese incluem suprimento de nutrientes (como ferro, folato ou vitamina B12) e interação célula­célula entre precursores
eritroides,  células  linfoides  e  outros  componentes  do  microambiente  hematopoético.  Os  fatores  que  podem  suprimir  a  eritropoese  incluem  doenças  debilitantes  crônicas  e  anormalidades  endócrinas  (p.  ex.,  hipotireoidismo,
hiperestrogenismo).
Há dois mecanismos de remoção de hemácias senescentes; ambos conservam os principais constituintes da célula para reutilização. Normalmente a remoção das hemácias envelhecidas envolve fagocitose pelos macrófagos do baço. À
medida que a hemácia envelhece, pode ocorrer alteração de suas características antigênicas, adquirindo antígenos senescentes, e perda de sua flexibilidade decorrente do prejuízo na síntese de trifosfato de adenosina (ATP). Ambas as
alterações aumentam a possibilidade de sequestro celular no baço e de remoção por macrófagos. Após fagocitose e subsequente lesão da membrana celular, a Hb é desdobrada nas porções heme e globina. O ferro é liberado da porção heme,
sendo armazenado no macrófago, na forma de ferritina ou hemossiderina, ou liberado na circulação para transporte de volta à medula. O radical heme remanescente dá origem à bilirrubina, que é liberada pelos macrófagos na circulação
sistêmica, onde se liga à albumina para ser transportada aos hepatócitos; no fígado, é conjugada e excretada na bile. Nas anemias hemolíticas extravasculares, a meia­vida das hemácias é mais curta; ocorrem os mesmos mecanismos, porém,
em maior intensidade.
Cerca  de  1%  das  hemácias  envelhecidas  normalmente  é  hemolisada  na  circulação,  liberando  Hb  livre.  Esta  é  rapidamente  transformada  em  dímeros  de  Hb  que  se  ligam  à  haptoglobina  e  são  transportados  ao  fígado,  onde  são
metabolizados da mesma maneira que os produtos oriundos de hemácias removidas por fagocitose. Na anemia hemolítica intravascular, ocorre maior destruição de hemácias na circulação (hemoglobinemia), superando a capacidade de
ligação à haptoglobina. O excesso de Hb e, portanto, de ferro, é excretado na urina (hemoglobinúria).
A principal via metabólica das hemácias é a glicólise, e a principal fonte de energia na maioria das espécies é a glicose. A glicose penetra nas hemácias por um mecanismo independente da insulina, sendo a maior parte metabolizada para
produzir ATP e a forma reduzida do dinucleotídio de nicotinamida­adenina (NADH). A energia oriunda do ATP é utilizada para manter as bombas da membrana da hemácia, a fim de preservar sua forma e flexibilidade. O potencial de
redução do NADH é utilizado na via da metemoglobina redutase para manter o ferro da Hb em sua forma reduzida (Fe2+).
A glicose não utilizada no processo de glicólise é metabolizada em uma via metabólica secundária, a da hexose monofosfato (HMP). Não há produção de energia nessa segunda via metabólica; sua principal função é manter o potencial
de redução na forma reduzida de fosfato de dinucleotídio de nicotinamida­adenina (NADPH). Juntamente com o sistema glutationa redutase/peroxidase, o NADPH mantém os grupos sulfidrilas da globina em seu estado reduzido.
Algumas  anormalidades  são  consequências  diretas  da  alteração  do  metabolismo  eritrocitário  e  da  interferência  na  glicólise.  A  deficiência  hereditária  de  piruvato  quinase,  uma  enzima­chave  na  glicólise,  causa  carência  de  ATP  e
consequente diminuição da meia­vida da hemácia, bem como anemia hemolítica. O estresse oxidativo excessivo pode sobrecarregar as vias hexose monofosfato ou metemoglobina redutase, causando anemia hemolítica por corpúsculos de
Heinz ou formação de metemoglobina, respectivamente. A anemia hemolítica provocada por medicamentos, como o paracetamol em gatos, é um exemplo desse mecanismo (ver, p. 9).
Hematopoese normal. Cortesia de Teton NewMedia. BFU­E = BFU de eritrócito. CFU­Baso = UFC de basófilo; CFU­E = UFC de hemácia; CFU­EO = UFC de eosinófilo; CFU­G = UFC de granulócito; CFU­GEM M = UFC de granulócito, hemácia, monócito e megacariócito; CFU­GM = UFC de granulócito,
hemácia e monócito; CFU­L = UFC de linfócito; CFU­M = UFC de monócito; CFU­MK = UFC de megacariócito; CFU­S = UFC de célula do baço.

A diminuição da massa eritrocitária (anemia) pode ser causada por perda de sangue, hemólise ou diminuição na produção de hemácias. Na anemia por hemorragia aguda, ocorre perda de hemácias, mas a morte geralmente está mais
relacionada com a hipovolemia do que com a perda eritrocitária. O ferro é o fator limitante na hemorragia crônica. A hemólise pode ser causada por toxinas, microrganismos infecciosos, anomalias congênitas ou anticorpos contra antígenos
eritrocitários de membrana. A diminuição na produção de hemácias pode ser decorrência de doenças primárias da medula (p. ex., anemia aplásica, neoplasia hematopoética maligna ou mielofibrose) ou de outras causas, como insuficiência
renal,  medicamentos,  toxinas  ou  anticorpos  contra  precursores  eritrocitários.  A  malignidade  que  acomete  hemácias  ou  seus  precursores  pode  ser  aguda  (p.  ex.,  eritroleucemia)  ou  crônica  (p.  ex.,  policitemia  vera).  Os  animais  com
eritroleucemia tornam­se anêmicos, apesar de terem a medula preenchida com rubriblastos; os animais com policitemia vera apresentam eritrocitose.

 LEUCÓCITOS
FAGÓCITOS:  A principal função dos fagócitos é defender o organismo contra microrganismos invasores, por meio de fagocitose e destruição, consequentemente, contribuindo para a resposta inflamatória celular. Há dois tipos de fagócitos:
os fagócitos mononucleares e os granulócitos. Os fagócitos mononucleares originam­se, principalmente, da medula e são liberados no sangue como monócitos. Podem circular por horas ou até alguns dias antes de alcançarem os tecidos e se
diferenciarem em macrófagos. Os granulócitos apresentam núcleo segmentado e são classificados como neutrófilos, eosinófilos ou basófilos, de acordo com suas características de coloração. Os neutrófilos permanecem na circulação apenas
algumas horas antes de alcançarem os tecidos.
No mecanismo de fagocitose, foram identificados cinco estágios distintos: (1) atração dos fagócitos (quimiotaxia) por microrganismos, complexos antígeno­anticorpo e outros mediadores inflamatórios; (2) aderência ao microrganismo;
(3)  ingestão;  (4)  fusão  dos  lisossomos  celulares  com  os  microrganismos  fagocitados  e  morte  bacteriana  e  (5)  digestão.  Além  disso,  vários  fagócitos  têm  outras  funções  especializadas.  Os  monócitos  participam  de  um  sistema  imune
específico, preparando o antígeno para apresentação aos linfócitos e sintetizando substâncias semelhantes à interleucina­1, que induzem febre e ativação linfocitária, bem como estimulam os precursores hematopoéticos.
Os  eosinófilos,  embora  possam  atuar  como  fagócitos,  também  têm  funções  mais  específicas  que  incluem  defesa  contra  metazoários  e  modulação  do  processo  inflamatório.  Eles  respondem  quimiotaticamente  à  histamina,  aos
imunocomplexos e ao fator quimiotático eosinofílico de anafilaxia, substância liberada durante a degranulação de mastócitos. Os basófilos não são fagócitos verdadeiros, mas contêm alto teor de histamina, bem como de outros mediadores
inflamatórios. Podem­se constatar eosinofilia e basofilia em resposta às reações alérgicas sistêmicas e à invasão tecidual por parasitos.
À semelhança do que acontece com as hemácias, a produção e a população de fagócitos circulantes são rigorosamente controladas por vários fatores humorais, inclusive fatores estimulantes de colônia e interleucinas. Diferentemente das
hemácias,  que  permanecem  na  circulação  sanguínea,  os  fagócitos  utilizam  o  compartimento  vascular  como  via  de  acesso  aos  tecidos.  Consequentemente,  a  quantidade  de  fagócitos  no  sangue  reflete  anormalidades  teciduais  (p.  ex.,
inflamação), bem como a função proliferativa da medula óssea. A intensidade com que os fagócitos refletem essas condições varia em função da espécie. Uma resposta anormal, como neutropenia decorrente de depleção medular, infecções,
medicamentos ou toxinas, provavelmente resulta em infecção bacteriana secundária. Alguns casos de neutropenia “idiopática” em cães podem ter causa imunomediada. Finalmente, os precursores fagocitários podem sofrer transformação
maligna, originando leucemia mielógena aguda ou crônica.
LINFÓCITOS:  São responsáveis pelas imunidades humoral e celular. Não se consegue diferenciar morfologicamente os dois tipos de células do sistema imune, mas há diferença em sua dinâmica de produção e circulação. Nos mamíferos, os
linfócitos  são  produzidos  na  medula  óssea.  Alguns  dos  linfócitos  envolvidos  na  imunidade  celular  migram  para  o  timo  e  sofrem  diferenciação  por  influência  de  hormônios  tímicos.  Esses  linfócitos  tornam­se  os  linfócitos  T  e  são
responsáveis por várias funções imunológicas auxiliares ou citotóxicas. A maior parte dos linfócitos circulantes é tipo T, porém muitos deles também estão presentes no baço e nos linfonodos. Os linfócitos B migram diretamente para os
órgãos, sem sofrer modificação no timo, e são responsáveis pela imunidade humoral (produção de anticorpos).
Portanto, os órgãos linfoides apresentam populações de linfócitos B e T. Nos linfonodos, os centros foliculares apresentam, principalmente, linfócitos B, ao passo que as zonas parafoliculares contêm, especialmente, linfócitos T. No baço,
a maior parte dos linfócitos da polpa vermelha é tipo B, ao passo que aqueles das bainhas linfoides periarteriolares são linfócitos T. Para a função imune efetiva, é fundamental uma estreita relação entre linfócitos T e B nos órgãos linfoides.
A função linfocitária no sistema imune celular envolve tanto componentes aferentes (receptores) quanto eferentes (efetores). Os linfócitos T, de vida longa no sangue periférico, são os receptores. Em resposta aos antígenos aos quais
foram previamente sensibilizados, eles saem da circulação e sofrem transformação blástica para originar linfócitos T ativados que, por sua vez, fazem que outros linfócitos T sofram transformação blástica, tanto local quanto sistemicamente.
Os linfócitos T estimulados produzem linfocinas que desempenham várias funções, como atração e ativação de neutrófilos, macrófagos e linfócitos.
O sistema imune humoral é representado por linfócitos B, que produzem várias classes de anticorpos. Quando os linfócitos B sensibilizados se encontram com o antígeno, eles se diferenciam em plasmócitos, que produzem anticorpos.
Por conseguinte, todo linfócito B inicialmente estimulado produz um clone de plasmócitos, os quais sintetizam um anticorpo específico.
As  moléculas  de  anticorpos  (imunoglobulinas  [Ig])  são  agrupadas  em  várias  classes,  com  características  funcionais  próprias.  Por  exemplo,  a  IgA  é  o  principal  anticorpo  das  secreções  respiratória  e  intestinal;  a  IgM  é  o  anticorpo
inicialmente sintetizado em resposta a um antígeno recém­reconhecido; a IgG é o principal anticorpo do sangue circulante e a IgE, o principal anticorpo envolvido nas reações alérgicas.
Os anticorpos desempenham sua função por se ligarem aos antígenos específicos que estimularam sua produção. Os complexos antígeno­anticorpo podem ser quimiotáticos para fagócitos ou podem ativar o complemento, um mecanismo
que induz tanto lise celular quanto liberação de substâncias quimiotáticas para neutrófilos e macrófagos. Dessa maneira, o sistema imune humoral relaciona­se e interage com o sistema imune inespecífico.
O sistema imune humoral também está relacionado com o sistema imune inespecífico e com o sistema imune celular por meio de outros mecanismos. Os linfócitos T são denominados “auxiliares” (CD4) e “citotóxicos” (CD8). Os
linfócitos T auxiliares reconhecem o antígeno processado e ativam a resposta imune humoral. Os linfócitos T citotóxicos, após sensibilização pelo antígeno, tornam­se células efetoras, especialmente importantes na atividade antiviral. Os
linfócitos  matadores  naturais,  que  representam  uma  classe  de  linfócitos  distinta  dos  linfócitos  T  e  B,  destroem  células  estranhas  (p.  ex.,  células  neoplásicas),  mesmo  sem  sensibilização  prévia.  O  processamento  de  antígenos  pelos
macrófagos precede o reconhecimento de um antígeno pelos linfócitos. Esses processos complexos estão envolvidos na vigilância rotineira contra células neoplásicas e no reconhecimento do “próprio” organismo.
Em caso de doença, a resposta linfocitária pode ser apropriada (ativação do sistema imune) ou inapropriada (doença imunomediada e neoplasia maligna linfoproliferativa). (Ver Sistema Imunológico, p. 859) A doença imunomediada
resulta da falha do sistema imune em reconhecer os tecidos do hospedeiro como próprios. Por exemplo, na anemia hemolítica imunomediada são produzidos anticorpos contra as hemácias do próprio hospedeiro. A alergia é outra resposta
inapropriada  do  sistema  imune.  Nos  indivíduos  alérgicos,  os  anticorpos  IgE,  contra  alergênios,  ligam­se  à  superfície  de  basófilos  e  mastócitos.  Quando  ocorre  exposição  ao  alergênio,  formam­se  complexos  antígeno­anticorpo  e  a
degranulação de mastócitos e basófilos induz a liberação de aminas vasoativas. A reação a essas aminas pode ser discreta (como na urticária ou na atopia) ou grave, com risco à vida (como na anafilaxia).
Em algumas espécies, particularmente em gatos, ocorre linfocitose como resposta à secreção de epinefrina. Notam­se linfócitos atípicos no sangue em resposta à estimulação antigênica (p. ex., vacinação). A linfocitose persistente em
bovinos infectados por vírus da leucemia bovina representa o aumento policlonal benigno da população de linfócitos. Doenças linfoproliferativas malignas incluem linfomas, leucemia linfocítica crônica e leucemia linfoblástica aguda. Pode
ocorrer linfopenia, principalmente em resposta à secreção de glicocorticoide.

 PLAQUETAS
Sempre que há hemorragia, as plaquetas formam o tampão hemostático inicial. Também representam a fonte de fosfolipídios necessários para a interação dos fatores de coagulação, a fim de formar o coágulo de fibrina. As plaquetas são
produzidas na medula óssea, a partir dos megacariócitos, sob a influência da trombopoetina. A produção de plaquetas inicia­se com a invaginação da membrana celular do megacariócito e a formação de ilhas e canais citoplasmáticos. As
ilhas citoplasmáticas produzem plaquetas a partir da fragmentação do megacariócito.
As plaquetas circulantes maduras apresentam grânulos densos que contêm ATP, difosfato de adenosina (ADP) e cálcio, bem como serotonina, lisossomos, glicogênio, mitocôndria e um sistema canalicular intracelular. A mitocôndria e o
glicogênio estão envolvidos na produção de energia, e o sistema canalicular atua como meio de transporte para os componentes granulares e como fonte de fosfolipídios, por sua alta concentração na membrana do revestimento canalicular.
Quando há lesão das paredes do vaso, ocorre exposição de colágeno e de fator tecidual; as plaquetas circulantes aderem­se ao local da lesão por meio do fator de von Willebrand e sua forma se altera, liberando ADP. A agregação
plaquetária  local  é  estimulada  pelo  ADP,  formando­se  o  tampão  plaquetário  primário.  O  acúmulo  local  de  fibrina  e  plaquetas  é  denominado  tampão  hemostático.  O  coágulo  de  fibrina  que  se  forma  é  consolidado  pela  ação  de
proteínas plaquetárias contráteis.
As anormalidades plaquetárias são quantitativas (trombocitopenia ou trombocitose) ou qualitativas (trombocitopatia). A trombocitopenia é um dos distúrbios hemorrágicos mais comuns em animais. Em geral, há risco de hemorragia
quando o número de plaquetas diminui para menos de 30.000/ μL. Consumo, destruição ou sequestro de plaquetas causam trombocitopenia, juntamente com aumento de sua produção na medula óssea. A trombocitopenia por consumo
excessivo  está  relacionada  com  hemorragia  grave  ou  coagulação  intravascular  disseminada  (CID),  subsequente  a  várias  doenças.  Na  trombocitopenia  imunomediada,  condição  na  qual  as  plaquetas  são  recobertas  por  anticorpos
antiplaquetários e removidas da circulação pelo sistema fagocitário, ocorre destruição plaquetária. Pode ocorrer sequestro excessivo de plaquetas pelo aumento de volume do baço (esplenomegalia) em decorrência de enfermidades, como as
doenças mieloproliferativas.
A  diminuição  da  produção  de  plaquetas  na  medula  óssea  pode  ser  causada  por  medicamentos,  toxinas  ou  anormalidades  medulares  primárias,  como  aplasia,  fibrose  ou  doença  hematopoética  maligna.  Com  frequência,  nas  doenças
medulares primárias ocorre diminuição de mais de uma linhagem celular hematopoética, resultando em pancitopenia.
Trombocitose  é  um  achado  raro,  quase  sempre  de  origem  idiopática.  Pode  estar  associada  a  doença  medular  primária,  como  leucemia  megacariocítica.  Com  frequência,  a  trombocitose  está  relacionada  com  deficiência  de  ferro  e
hemorragia crônica, em razão da maior produção de plaquetas na medula em resposta ao consumo e à perda contínuos.
As trombocitopatias compreendem um grupo de doenças pouco definidas, nas quais o número de plaquetas permanece normal, mas sua função encontra­se prejudicada. A doença de von Willebrand caracteriza­se, principalmente, por
distúrbio na aderência de plaquetas ao endotélio. As plaquetas são normais. Há relato de outros distúrbios hereditários da função plaquetária, mas de ocorrência relativamente rara. Provavelmente, a disfunção plaquetária mais comum é a
inibição irreversível do tromboxano (necessário para a agregação plaquetária), causada pela administração de ácido acetilsalicílico.

ANEMIA

É definida como a diminuição absoluta da população de hemácias, detectada por meio de contagem eritrocitária e da determinação da concentração de hemoglobina e do volume globular (VG) ou hematócrito. Pode­se instalar em razão de
perda, destruição ou falha na produção de hemácias. As anemias podem ser classificadas como regenerativas ou não regenerativas. Na anemia regenerativa, a medula óssea responde apropriadamente à diminuição da massa eritrocitária,
aumentando a produção de hemácias e liberando reticulócitos. Na anemia não regenerativa, a medula óssea responde inadequadamente à maior necessidade de hemácias. Em geral, a anemia decorrente de hemorragia ou hemólise é do tipo
regenerativo. Anemia causada por diminuição do teor de eritropoetina ou por anormalidade na medula óssea é do tipo não regenerativo.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em animais, os sintomas de anemia dependem da gravidade, da duração (aguda ou crônica) e da causa primária do distúrbio. A anemia aguda pode resultar em choque, com risco à vida, caso ocorra perda súbita
superior a 1/3 do volume de sangue, sem reposição. Na hemorragia aguda, geralmente o animal apresenta taquicardia, palidez de membranas mucosas, pulso fraco ou irregular e hipotensão. A causa da perda de sangue pode ser óbvia, por
exemplo, traumatismo. Caso não haja evidência de hemorragia externa, deve­se considerar a possibilidade de hemorragia oculta ou interna, por exemplo, ruptura de tumor esplênico, outras neoplasias, coagulopatia, úlcera gastrintestinal ou
parasitose. Quando há hemólise, o paciente pode manifestar icterícia. Animais com anemia crônica podem ter tempo suficiente para adaptação ao distúrbio, sendo o quadro clínico deles, em geral, mais indolente, com discretos sinais de
letargia, fraqueza e anorexia. Esses pacientes apresentam achados semelhantes ao exame físico, como palidez de membranas mucosas, taquicardia e, possivelmente, esplenomegalia e sopro cardíaco, ou ambos.
DIAGNÓSTICO:  Anamnese minuciosa é uma parte importante da avaliação de um animal anêmico. Podem­se questionar a duração dos sintomas, o histórico de exposição a toxinas (p. ex., rodenticidas, metais pesados, plantas tóxicas), o uso
de medicamentos e vacinas, bem como obter informação sobre viagem e qualquer doença anterior.
O hemograma, inclusive com contagem de plaquetas e de reticulócitos, fornece informação sobre a gravidade da anemia e o grau de resposta da medula óssea; ademais, possibilita a avaliação de outras linhagens celulares. Deve­se
examinar  o  esfregaço  sanguíneo,  verificando­se  alterações  na  morfologia  ou  no  tamanho  das  hemácias,  além  da  presença  de  hemoparasitos.  Os  índices  hematimétricos  (mensuração  do  tamanho  das  hemácias  e  da  concentração  de
hemoglobina)  são  calculados  por  aparelhos  automáticos  calibrados  para  a  espécie  em  questão.  O  tamanho  da  hemácia  é  expresso  pelo  volume  corpuscular  médio  (VCM),  em  fentolitros,  e  geralmente  reflete  o  grau  de  regeneração.
Macrocitose (aumento do VCM) geralmente está associada a anemia regenerativa. Macrocitose pode ser um distúrbio hereditário em cães da raça Poodle, sem anemia, e pode ser notada em gatos anêmicos infectados por vírus da leucemia
felina (FeLV). Microcitose indica anemia por deficiência de ferro. A concentração de hemoglobina da hemácia, expressa em g/dL, é definida pela concentração de hemoglobina corpuscular média. Anormalidades morfológicas de hemácias,
como pontilhado basofílico, podem indicar intoxicação por chumbo. A presença de corpúsculos de Heinz indica lesão oxidativa da hemácia, secundária à exposição a toxinas (ver Tabela 1). Os gatos são mais suscetíveis à formação de
corpúsculos de Heinz do que outras espécies; mesmo os gatos sem anemia podem ter pequena quantidade desses corpúsculos.
Em geral, a contagem de reticulócitos é expressa como porcentagem da população de hemácias. Esse valor deve ser corrigido em função do grau de anemia, a fim de se avaliar o grau de regeneração. Contagem absoluta de ret iculócitos
(hemácias/μL × % de reticulócitos) inferior a 50.000/μL ou 60.000/μL, em gatos e cães, respectivamente, indica anemia regenerativa. Para corrigir o percentual de reticulócitos, pode­se aplicar a fórmula mostrada à frente. Em cães e gatos,
uma porcentagem de reticulócitos corrigida > 1% indica regeneração. Em geral, após crise hemolítica ou hemorragia aguda, a reticulocitose demora 3 a 4 dias para se tornar evidente.
O perfil bioquímico sérico e a urinálise permitem avaliar as funções orgânicas. Na suspeita de hemorragia gastrintestinal, pode ser útil o exame de fezes, com intuito de pesquisar sangue oculto e presença de parasitos. Radiografias podem
auxiliar na detecção de doenças ocultas, como a presença de uma moeda (intoxicação por zinco) no estômago de um filhote de cão com anemia hemolítica. Hematoma ou sangramento pode ser sinal de coagulopatia e indica a necessidade
de avaliar os parâmetros de coagulação. Na suspeita de doença hemolítica, pode­se avaliar autoaglutinação do sangue e indicar o teste de Coombs direto. Pode­se realizar o teste de autoaglutinação mediante a deposição de uma gota de
solução salina em uma lâmina, juntamente com uma gota de sangue fresco do paciente; para misturar as gotas, a lâmina deve ser movimentada cuidadosamente; em seguida, fazem­se avaliações macro e microscópicas, investigando­se
macro e microaglutinações. Sorologia para microrganismos infecciosos, como vírus da leucemia felina, Ehrlichia, vírus da anemia infecciosa equina e Babesia, também pode ser útil para definir a causa da anemia (ver Tabela 2).

Tabela 1 – Causas tóxicas de anemia

Mecanismo Medicamentos Plantas, alimentos Toxinas, Metais


patogênico substâncias pesados
químicas

Oxidação Paracetamol, benzocaína, dapsona, nitrofuranos, primaquina, propofol, quinacrina Vicia faba, carvalho, cebolas, Óleo cru, Cobre,


propileno glicol, bordo vermelho naftaleno zinco
Hemorragia Ácido acetilsalicílico, naproxeno Samambaia, trevo­doce Dicumarol
Hemólise Cefalosporinas, levamisol, penicilina, propiltiouracila, sulfonamidas Pirimicarb
imunomediada
Hemólise Fembendazol, heparina Indol Chumbo,
selênio
Diminuição da Anfotericina, azidotimidina, cefalosporinas, cloranfenicol, estrógeno, fembendazol, griseofulvina, ácido meclofenâmico, fenobarbital, fenotiazina, Samambaia Benzeno, Chumbo
produção medular fenilbutazona, propiltiouracila, quinidina, eritropoetina humana recombinante, sulfonamidas, tiacetarsamida tricloroetileno

Indica­se  exame  da  medula  óssea  a  partir  de  amostras  obtidas  por  aspiração  e/ou  biopsia,  em  qualquer  animal  com  anemia  não  regenerativa  inexplicável.  Caso  o  hemograma  revele  diminuição  em  mais  de  uma  linhagem  celular,
possivelmente há hipoplasia de medula, sendo indicada biopsia juntamente com o aspirado. Biopsias e aspirado completam–se: as biopsias são melhores para avaliar a arquitetura e o grau de celularidade da medula óssea, ao passo que o
aspirado  permite  melhor  avaliação  da  morfologia  celular.  O  aspirado  também  possibilita  a  avaliação  da  maturação  das  linhagens  de  hemácias  e  leucócitos,  da  proporção  de  precursores  de hemácias  e  leucócitos  (proporção  M:E)  e  da
quantidade de precursores de plaquetas. Ademais, pode­se avaliar a reserva de ferro utilizando­se o corante azul da Prússia. Proporção M:E < 1 indica que a produção de hemácias é superior à de leucócitos; no caso de proporção M:E > 1,
ocorre  o  oposto.  A  proporção  M:E  sempre  deve  ser  interpretada  juntamente  com  os  resultados  de  um  hemograma  recente,  pois  as  alterações  nessa  proporção  também  podem  ser  decorrentes  da  supressão  de  uma  linhagem  celular,
comparativamente a outra.
Tabela 2 – Causas infecciosas de anemia

Microrganismos Espécies acometidas Hemolíticos Lesão de medula

Bactéria

Clostridium perfringens A Bovinos, ovinos Sim Não


Clostridium haemolyticum Bovinos, ovinos Sim Não
Leptospira interrogans Bovinos, suínos, ovinos Sim Não

Mycoplasma spp Gatos ± Raramente


Haemobartonella spp Bovinos, gatos ± Não

Vírus

Vírus da anemia infecciosa equina Equinos ± Raramente

Vírus da leucemia felina Gatos ± Sim


Vírus da imunodeficiência felina Gatos Não Sim

Riquétsia

Mycoplasma spp Bovinos, caprinos, lhamas, suínos, ovinos a Sim (apenas leitões) Não

Anaplasma spp Bovinos, caprinos, ovinos Sim Não


Ehrlichia spp Cães Sim Sim

Protozoários

Babesia spp Bovinos, gatos, cães, equinos, ovinos Sim Não

Theileria sppb Bovinos, caprinos, ovinos ± Não

Cytauxzoon spp Gatos Não Sim


Trypanosoma spp Bovinos, equinos, suínos Sim Não
Sarcocystis cruzi Bovinos Sim Não
a  Nos adultos, é clinicamente importante apenas em pacientes gravemente enfermos ou submetidos a esplenectomia.

b  Espécies patogênicas de Theileria ocorrem na África, no Mediterrâneo, no Oriente Médio, na Ásia e na Europa. As espécies observadas na América do Norte não são patogênicas.

ANEMIAS NÃO REGENERATIVAS

 ANEMIA DECORRENTE DE DOENÇA CRÔNICA
A anemia associada a doença crônica pode ser caracterizada como anemia normocítica normocrômica não regenerativa, discreta a moderada. É a forma mais comum de anemia em animais. A anemia pode ser secundária a infecção ou
inflamação crônica, neoplasia, hepatopatia, hiper ou hipoadrenocorticismo e hipotireoidismo. A anemia é mediada pelas citocinas produzidas por células inflamatórias, as quais reduzem a disponibilidade de ferro, o tempo de sobrevida das
hemácias e a capacidade de regeneração da medula. O tratamento da doença primária resulta na cura da anemia. A anemia pode ser minimizada com o tratamento com eritropoetina humana recombinante, mas o risco de formação de
anticorpos contra eritropoetina endógena provavelmente é maior do que qualquer possível benefício.

 DEFICIÊNCIAS NUTRICIONAIS
As anemias causadas por deficiência nutricional instalam­se quando não há quantidade adequada de micronutrientes para produção de hemácias. A anemia desenvolve­se gradativamente e, no início, pode ser regenerativa; posteriormente,
torna­se não regenerativa. A inanição causa anemia pela combinação de deficiências de vitaminas e minerais, bem como balanços proteico e energético negativos. As causas mais prováveis de anemia nutricional incluem deficiências de
ferro, cobre, cobalamina (vitamina B12), vitamina B6, riboflavina, niacina, vitamina E e vitamina C (importante apenas em primatas e porquinhos­da­índia).
A carência de ferro em cães e leitões é a deficiência mais comum; é menos frequente em equinos, gatos e ruminantes. A deficiência de ferro raramente é de origem nutricional – mais comumente, é secundária à perda de sangue (ver p.
16). Animais jovens têm reservas mínimas de ferro; ademais, o leite contém baixo teor de ferro. Isso pode ser especialmente importante para leitões em fase de rápido crescimento, criados em ambientes que não permitem acesso à fonte de
ferro. A suplementação oral desse mineral é indicada como tratamento desse estado carencial; qualquer perda de sangue deve ser controlada.
A deficiência de cobre pode se desenvolver em ruminantes alimentados com forragem cultivada em solo com carência desse mineral. O cobre é necessário para o metabolismo do ferro. Em bovinos, a deficiência de cobre pode ser
secundária à dieta com alto teor de molibdênio ou de sulfatos; também pode acometer suínos alimentados com dieta à base de soro lácteo. Baixas concentrações de cobre no sangue e baixo teor do mineral em amostras de fígado obtidas por
biopsia (mais confiável) são indicadores diagnósticos. O tratamento consiste na suplementação oral ou injetável de cobre.
Deficiências de vitamina B são raras. Alguns medicamentos (anticonvulsivantes, medicamentos que interferem no metabolismo de folato) são incriminados como causa de deficiência de folato ou de cobalamina, ocasionando anemia
normocítica normocrômica não regenerativa. Há relato de má absorção de cobalamina em cães da raça Giant Schnauzer (seus enterócitos não são capazes de absorver essa vitamina). Esses cães respondem à suplementação parenteral com
cobalamina. Os ruminantes também desenvolvem deficiência secundária de cobalamina quando mantidos em pastagens carentes de cobalto. Indica­se o tratamento oral com cobalto ou terapia parenteral com cobalamina.

 DOENÇAS PRIMÁRIAS DA MEDULA ÓSSEA
Doença primária ou insuficiência da medula óssea de qualquer natureza pode ocasionar anemia não regenerativa e pancitopenia. No caso de envolvimento difuso da medula, os granulócitos são primeiramente acometidos, seguidos das
plaquetas e, finalmente, das hemácias.
Há relato de anemia aplásica em cães, gatos, ruminantes, equinos e suínos com pancitopenia e medula hipoplásica substituída por tecido gorduroso. Na maioria dos casos, a doença é idiopática; porém, dentre as causas conhecidas,
incluem­se infecções (FeLV, Ehrlichia), medicamentos, ingestão de toxinas e radiação corporal total (ver Tabelas 1 e 2). O tratamento consiste em eliminar a causa primária e propiciar medidas de suporte, como antibióticos de amplo
espectro (20 mg de amoxicilina/ácido clavulânico/kg, 2 vezes/dia) e transfusão de sangue. Podem­se utilizar eritropoetina humana recombinante e fator estimulante de colônia de granulócitos (5 μg/kg, VO, 1 vez/dia) até que a medula se
recupere. Quando a doença é idiopática ou é improvável a recuperação da medula (p. ex., intoxicação de cães por fenilbutazona), o transplante de medula óssea é benéfico, caso haja disponibilidade de um doador apropriado.
Na aplasia específica de hemácia (AEH), apenas a linhagem eritroide é acometida. O distúrbio caracteriza­se por anemia não regenerativa com depleção grave dos precursores de hemácias na medula óssea. Há relato em cães e gatos;
pode ser primária ou secundária. Em geral, os casos primários são imunomediados e frequentemente respondem à terapia imunossupressora. Os gatos positivos à leucemia felina podem apresentar esse tipo de aplasia. Há relato de AEH
causada pelo uso de eritropoetina humana recombinante, em cães e equinos. Em alguns animais, a interrupção do tratamento pode, eventualmente, propiciar recuperação das hemácias.
A ocorrência de leucemias primárias é  incomum  ou  rara  nas  espécies  domésticas,  porém  há  relato  em  cães,  gatos,  bovinos,  caprinos,  ovinos,  suínos  e  equinos.  Retrovírus  é  a  causa  em  alguns  bovinos,  gatos,  primatas  e  aves.  As
leucemias podem acometer as linhagens de células mieloides e linfoides; adicionalmente são classificadas como agudas ou crônicas. A maior parte dos animais acometidos apresenta anemia não regenerativa, neutropenia e trombocitopenia,
geralmente com presença de bastonetes na circulação sanguínea. Leucemias agudas, caracterizadas por infiltração da medula com bastonetes, geralmente não respondem bem à quimioterapia. Em animais que respondem ao tratamento, o
tempo de remissão geralmente é curto. Na leucemia linfoblástica aguda (LLA), em cães, a taxa de resposta à quimioterapia é cerca de 30%, com sobrevida média de 4 meses. Leucemias mielobásticas agudas são menos comuns e menos
responsivas  ao  tratamento,  em  comparação  com  a  LLA.  Com  frequência,  nas  leucemias  agudas  é  difícil  identificar  morfologicamente  a  linhagem  celular,  de  modo  que  pode  ser  necessário  o  uso  de  corantes  citoquímicos  ou  de  testes
imunológicos  com  marcadores  de  superfície  celular  para  a  definição  do  diagnóstico.  Leucemias  crônicas,  caracterizadas  pela  produção  excessiva  de  uma  linhagem  de  célula  hematopoética,  são  causas  menos  prováveis  de  anemia  e
respondem melhor ao tratamento.
Mielodisplasia (síndrome mielodisplásica [SMD]) é considerada uma síndrome pré­leucêmica caracterizada por hematopoese inefetiva, resultando em anemia não regenerativa ou outras citopenias. Há relato de SMD em cães, gatos e
pessoas. A doença pode ser primária ou secundária e comumente é constatada em gatos com leucemia felina. As síndromes primárias provavelmente se originam de mutações em células­tronco. As síndromes secundárias são causadas por
outras neoplasias ou pelo uso de medicamentos. Alguns gatos e cães respondem ao tratamento com eritropoetina humana recombinante e prednisona. Terapia de suporte, com transfusão de sangue, pode ser útil. A sobrevida é variável
porque a SMD pode evoluir para leucemia; vários animais são submetidos à eutanásia ou morrem de sepse, hemorragia ou anemia.
A mielofibrose causa deficiência de medula óssea em razão da substituição de componentes normais da medula por tecido fibroso. Foi diagnosticada em cães, gatos, pessoas e caprinos. Pode ser um distúrbio primário ou secundário a
neoplasia maligna, anemia hemolítica imunomediada, radiação de todo o corpo e anemias congênitas (p. ex., deficiência de PK). O diagnóstico pode ser definido por meio de biopsia de medula óssea. O tratamento varia de acordo com a
causa primária, porém costuma consistir em terapia imunossupressora.

 DOENÇA RENAL
Doença renal crônica é causa comum de anemia não regenerativa em animais. Normalmente a eritropoetina é produzida pelas células do endotélio peritubular do córtex renal. Animais com doença renal sintetizam menor quantidade de
eritropoetina, instalando­se anemia. Como tratamento, tem­se utilizado eritropoetina humana recombinante (44 a 132 U/kg, 3 vezes/semana, iniciando, na maior parte dos animais, com 88 U/kg). O VG é monitorado semanalmente até que
se  obtenha  a  melhora  desejada  (o  que  varia  em  função  da  gravidade  da  anemia);  em  seguida,  reduz­se  a  dose.  Os  animais  que  recebem  eritropoetina  humana  recombinante  necessitam  de  ferro  suplementar  para  manter  a  produção  de
hemácias. (Ver, p. 2560)

ANEMIAS REGENERATIVAS

 ANEMIA HEMOLÍTICA
Tipicamente, as anemias hemolíticas são regenerativas e decorrentes da lise de hemácias nos compartimentos intra e extravascular. A hemólise intravascular resulta em hemoglobinemia e hemoglobinúria, ocorrências não verificadas na
hemólise extravascular. Ambos os tipos de hemólise podem ocasionar icterícia. Em cães, a causa mais comum de anemia hemolítica é doença imunomediada (60 a 75%), embora toxinas, dano eritrocitário, infecções e defeitos na membrana
de hemácias também possam causar hemólise.
ANEMIA HEMOLÍTICA IMUNOMEDIADA:  A anemia hemolítica imunomediada (AHIM, ver p. 42) pode ser primária ou secundária a neoplasia, infecção, uso de medicamento ou vacinação. Na AHIM, o organismo não reconhece suas próprias
hemácias e desenvolve anticorpos contra as hemácias circulantes, que são destruídas por macrófagos e pelo sistema complemento. Em alguns casos, os anticorpos são direcionados contra precursores de hemácias na medula, resultando em
aplasia  eritrocitária  específica  e  anemia  não  regenerativa.  Animais  com  AHIM  geralmente  apresentam  icterícia;  às  vezes  têm  febre  e  podem  desenvolver  esplenomegalia.  Como  características  hematológicas  da  AHIM,  notam­se
esferocitose, autoaglutinação e teste de Coombs positivo.
Um método mais recente para avaliação da presença de anticorpos anti­hemácias de cães é a citometria de fluxo. Essa técnica permite a detecção e a quantificação de IgG e IgM ligadas à superfície das hemácias. Constatou­se que a
especificidade da citometria de fluxo no diagnóstico de cães com anticorpos anti­hemácias varia de 88 a 100%. Um artigo sugere o emprego de citometria de fluxo na avaliação da resposta dos cães ao tratamento, porque ocorre diminuição
do teor de anticorpos anti­hemácia antes de se constatar reticulocitose ou aumento da contagem de hemácias.
Os animais com AHIM podem manifestar sintomas discretos ou crise aguda. É importante instituir o tratamento com base nos sinais clínicos apresentados pelo animal. Toda infecção primária deve ser tratada de acordo com a gravidade
dos  sintomas.  Caso  não  haja  disponibilidade  de  sangue  compatível,  podem­se  administrar  soluções  de  hemoglobina  bovina  (Oxyglobin®).  O  objetivo  da  terapia  é  interromper  a  hemólise  mediante  a  administração  de  medicamento
imunossupressor. Considera­se tratamento de primeira escolha a administração de 2 mg de prednisona ou de prednisolona/kg, juntamente com 2 mg de azatioprina/kg/dia (o uso de azatioprina é contraindicado aos gatos). Estudo recente
relatou que baixa dose de ácido acetilsalicílico, 0,5 mg/kg, 1 vez/dia, aumentou a sobrevida de cães tratados com azatioprina e prednisona.
Na  crise  hemolítica  aguda,  a  administração  de  ciclosporina  (10  mg/kg,  inicialmente  1  vez/dia)  ou  de  imunoglobulina  humana  IV,  na  dose  única  de  0,5  a  1,5  g/kg,  também  pode  ser  benéfica.  Para  a  administração  intravenosa  de
imunoglobulina humana, o medicamento deve ser diluído em solução salina estéril e administrado lentamente ao longo de 6 h. Durante a infusão, o cão deve ser monitorado quanto à ocorrência de reações alérgicas. A imunoglobulina
humana IV é utilizada apenas uma vez, por causa do risco de reações alérgicas quando se utilizam múltiplas aplicações. O composto é altamente osmótico e deve ser utilizado com cautela em cães com doença cardíaca. Atualmente não é
considerado o tratamento de primeira escolha para AHIM. Ainda não há relato de acompanhamento a longo prazo.
Em cães com AHIM, há risco de tromboembolia pulmonar. A causa primária é desconhecida, mas o risco pode ser minimizado com tratamento de suporte à base de fluidoterapia e transfusão de sangue. Os fluidos são importantes para
manter a perfusão renal e proteger os rins da alta concentração de bilirrubina circulante. Na suspeita de tromboembolia ou de seu risco iminente, pode­se utilizar heparina (100 a 200 UI/kg SC, 4 vezes/dia). No caso de aumento dos tempos
de protrombina (TP) e de tromboplastina parcial ativada (TTPA) ou de sinais de coagulação intravascular disseminada (CID), devem ser administrados 10 mL de plasma congelado fresco/kg 2 vezes/dia, até que os sinais clínicos ou os
parâmetros de coagulação melhorem.
As taxas de mortalidade da AHIM variam de 20 a 75%, dependendo da gravidade dos sintomas iniciais. Os indicadores de prognóstico negativo incluem diminuição brusca do VG, aumento da concentração de bilirrubina, leucocitose
moderada a marcante (28.000 a > 40.000 leucócitos/μL), elevação do BUN, petéquias, hemólise intravascular, autoaglutinação e complicações tromboembólicas. Relata­se que a leucocitose moderada a intensa está associada a necrose
tecidual, provavelmente secundária a hipoxia tecidual ou doença tromboembólica. O encaminhamento do animal a um hospital de referência, para tratamento de suporte, pode aumentar a sobrevida.
HEMÓLISE ALOIMUNE:  Isoeritrólise neonatal (IN) é uma doença hemolítica imunomediada que acomete equinos, mulas, bovinos, suínos, gatos e, raramente, cães recém­nascidos. É causada pela ingestão de colostro materno que contém
anticorpos contra um dos antígenos do grupo sanguíneo do neonato. Formam–se anticorpos maternos contra antígenos de grupos sanguíneos estranhos específicos durante gestações anteriores, transfusões incompatíveis e vacinação de
bovinos contra Babesia e Anaplasma. No caso específico de gatos, os animais com sangue tipo B apresentam naturalmente anticorpos anti­A, sem exposição prévia, e seus filhotes com sangue tipo A desenvolvem hemólise após a ingestão
do colostro. Em geral, os antígenos envolvidos em equinos são os tipos A, C e Q; IN é mais comumente constatada em equinos puro­sangue e em mulas. Recém­nascidos com IN são normais ao nascimento, porém desenvolvem anemia
hemolítica  grave  dentro  de  2  a  3  dias  e  tornam­se  fracos  e  ictéricos.  O  diagnóstico  é  confirmado  pelo  exame  de  soro,  plasma  ou  colostro  maternos  perante  as  hemácias  do  pai  ou  do  neonato.  O  tratamento  consiste  na  interrupção  do
fornecimento de colostro e no tratamento de suporte por meio de transfusão sanguínea. Caso necessário, os neonatos podem receber transfusão com hemácias maternas submetidas a tripla lavagem. A doença pode ser evitada impedindo­se a
ingestão de colostro materno e fornecendo­se colostro de uma mãe livre de anticorpos. As hemácias do recém­nascido podem ser misturadas com o soro materno para verificar a ocorrência de aglutinação, antes que se permita ao recém­
nascido ingerir o colostro materno.
HEMÓLISE MICROANGIOPÁTICA:  É decorrente do dano de hemácias secundário ao fluxo turbulento em vasos sanguíneos anormais. Em cães, pode ser consequência de dirofilariose grave, tumores vasculares (hemangiossarcoma), torções
esplênicas e CID. Em outras espécies, relatam­se como causas síndrome urêmica hemolítica em bezerros, anemia infecciosa equina, peste suína africana e peste suína clássica crônica. Nos esfregaços sanguíneos desses pacientes, é comum
notar esquistócitos. O tratamento envolve o controle da doença primária.
CAUSAS METABÓLICAS DE HEMÓLISE:  Hipofosfatemia (p. 1066) ocasiona hemólise e hemoglobinúria pós­parto em vacas, ovelhas e cabras. Pode ser constatada 2 a 6 semanas após a parição. Hipofosfatemia com hemólise secundária é
constatada em cães e gatos com diabetes melito, lipidose hepática e síndrome da realimentação. Indica­se administração de fósforo VO ou IV, dependendo do grau de hipofosfatemia. Bovinos que ingerem quantidade exagerada de água
(intoxicação por água) apresentam risco de hemólise por conta da hipotonicidade do plasma. Tal ocorrência é constatada em bezerros com 2 a 10 meses de idade e causa angústia respiratória e hemoglobinúria. Os sinais clínicos podem
evoluir para convulsões e coma. Suspeita­se de intoxicação por água quando o bezerro apresenta anemia hemolítica, hiponatremia, hipocloremia, diminuição da osmolalidade  sérica  e  baixa  densidade  específica  da  urina.  O  tratamento
consiste na administração de fluido hipertônico (solução salina a 2,5%) e diurético (p. ex., manitol).
TOXINAS:  Toxinas e medicamentos podem causar anemia por vários mecanismos. Os tipos de anemia mais comuns em animais e seus mecanismos fisiopatogênicos são mostrados na Tabela 1.

INFECÇÕES:   Vários  microrganismos  infecciosos  –  bactérias,  vírus,  riquétsias  e  protozoários  –  podem  provocar  anemia  por  lesão  direta  às  hemácias,  ocasionando  hemólise,  ou  por  efeitos  diretos  em  seus  precursores  na  medula  óssea
(ver Tabela 2).
DOENÇAS HEREDITÁRIAS:  Vários distúrbios hereditários que afetam as hemácias causam anemia. As deficiências de piruvato quinase (PK) são constatadas em cães das raças Basenji, Beagle, West Highland White Terrier, Cairn Terrier, além
de outras, bem como em gatos das raças Abissínio e Somali. Deficiência de fosfofrutoquinase (PFK) é constatada em cães da raça English Springer Spaniel. As deficiências dessas enzimas reduzem a meia­vida eritrocitária e causam anemia
regenerativa. Nos cães com deficiência de PFK, as crises hemolíticas são induzidas por alcalose secundária a excitação ou a exercício físico excessivo. Caso tais situações sejam minimizadas, esses cães podem ter vida normal. Não há
tratamento para deficiência de PK; as hemácias de cães acometidos têm meia­vida menor em decorrência da mielofibrose e da osteosclerose da medula óssea. Os gatos acometidos apresentam anemia hemolítica crônica intermitente, que, às
vezes, é exacerbada por esplenectomia e uso de esteroides. Diferentemente dos cães, não há relato de osteosclerose em gatos. Porfiria (ver p. 1098), uma hemoglobinopatia hereditária, provoca acúmulo de porfirinas no organismo; há relato
da doença em bovinos, gatos e suínos. É mais prevalente em bovinos da raça Holandesa; pode causar crise hemolítica. Os bezerros acometidos não se desenvolvem adequadamente e manifestam fotossensibilização. O diagnóstico baseia­se
na constatação de alto teor de porfirinas na medula óssea, na urina ou no plasma. Os dentes dos animais enfermos exibem fluorescência quando irradiados com luz ultravioleta.

 ANEMIA POR PERDA DE SANGUE
A perda de sangue ou hemorragia aguda pode induzir ao choque, e até mesmo à morte, quando representa 30 a 40% do volume de sangue e quando a hipovolemia resultante não é tratada de modo agressivo com fluido intravenoso (IV) e/ou
com sangue compatível (ver p. 42). As causas de hemorragia aguda podem ser evidentes (p. ex., traumatismo, cirurgia) ou inaparentes. Devem­se excluir causas como coagulopatias, tumores hemorrágicos, úlcera gástrica e parasitoses
internas ou externas. Parasitos gastrintestinais, como Haemonchus em ruminantes e ancilóstomo em cães, podem provocar grave perda de sangue, especialmente em animais jovens. Hemorragia crônica discreta às vezes resulta em anemia
com deficiência de ferro, embora possa persistir algum grau de reticulocitose, mesmo após a depleção da reserva de ferro. Tipicamente, a anemia por deficiência de ferro é do tipo microcítica hipocrômica. Em animais jovens, essa perda de
sangue crônica pode ser decorrente de parasitismo (pulgas, piolhos, parasitos intestinais); porém, em animais mais velhos, a causa mais comum é hemorragia oriunda de tumores ou úlceras gastrintestinais.

ANORMALIDADES HEMOSTÁTICAS

A hemostasia efetiva depende de quantidade adequada de plaquetas funcionais, de teor e atividade plasmática adequados de proteínas de coagulação e fibrinolíticas e de vasos sanguíneos normalmente responsivos. É difícil o diagnóstico, o
tratamento e o monitoramento de animais com hipo e hipercoagulação, considerando ambos, a progressão da doença e o monitoramento dos componentes sanguíneos e/ou da terapia anticoagulante. Em medicina veterinária, frequentemente
são utilizadas amostras de plasma com citrato para determinar a concentração de fibrinogênio, o tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA), o tempo de protrombina (TP) e a concentração de D­dímero ou de produtos de degradação
do  fibrinogênio  (PDF).  A  introdução  do  modelo  de  hemostasia  dependente  de  fator  tecidual  (FT)/fator  VII,  com  base  celular,  aumentou  a  compreensão  do  complexo  bioquímico  fisiológico  da  hemostasia,  induzindo  à  reavaliação  do
mecanismo convencional de hemostasia fisiológica, classificado em vias de coagulação intrínseca e extrínseca. Embora o plasma com citrato contenha vários fatores envolvidos na coagulação, o sangue total contém fatores solúveis e
células intravasculares que atuam na hemostasia fisiológica e patológica, incorporando FT e células que possuem fosfolipídios, como plaquetas e leucócitos.

Compreensão Fisiológica da Hemostasia
Introduziu­se um modelo de hemostasia com base celular que explica a hemostasia fisiológica por meio de um mecanismo complexo em que a interação de tônus vascular, fluxo sanguíneo, células endoteliais, plaquetas, leucócitos, fatores
de coagulação e fatores fibrinolíticos e seus cofatores e inibidores resultam em hemostasia equilibrada e formação de coágulo no local da lesão. Esse modelo dinâmico envolve a regulação celular da coagulação em três fases: iniciação,
amplificação e propagação. Células que possuem FT iniciam a hemostasia. O FT é um receptor de glicoproteína transmembrana verificado em tecidos extravasculares, inclusive nas cápsulas de órgãos e na camada adventícia das paredes
dos vasos sanguíneos. É fundamentalmente expresso nos fibroblastos e, na ativação celular, nas células do músculo liso vascular, nos monócitos e nos neutrófilos. As células que contêm FT e as superfícies das plaquetas atuam como
principais superfícies celulares para agregação dos complexos procoagulantes. Qualquer lesão vascular ocasiona exposição do FT. A ligação do fator VII ao FT resulta em ativação do fator VIIa. O fator VIIa liga­se ao FT na superfície da
célula e ativa o fator IX para o fator IXa e o fator X para o fator Xa. Inicialmente, o fator Xa formado é limitado à célula que contém FT, porque o fator Xa que se difunde para distante das células é rapidamente inibido pelo FT do
mecanismo inibidor (MIFT) ou pela antitrombina.
Juntamente com o fator Va formado, o fator Xa é agregado ao complexo protrombinase na superfície da célula que contém FT. Produz­se uma pequena quantidade inicial de trombina próximo à célula independente da presença de
plaquetas, sendo responsável pela ativação de plaquetas, pela liberação do fator V de plaquetas, pela ativação dos fatores V e VIII e pela liberação do fator VIII pelo fator de von Willebrand e ativação do fator XI. As plaquetas também são
ativadas por outros mecanismos, inclusive por colágeno da parede vascular e fator de von Willebrand, promovendo aderência e agregação no local da lesão.
Como parte essencial do mecanismo de ativação plaquetária, o fosfolipídio procoagulante fosfatidil­serina torna­se disponível. O fator IXa inicialmente produzido liga­se às superfícies das plaquetas ativadas, promovendo a formação do
complexo  “tenase”;  isso  resulta  na  formação  do  fator  Xa  principal  e  na  amplificação  do  mecanismo  de  coagulação.  O  fator  IXa  formado  difunde­se  para  as  plaquetas,  pois  não  é  inibido  pelo  MIFT,  sendo  inibido  lentamente  pela
antitrombina. Os complexos formados pelos fatores Xa e Va na superfície de plaquetas ativadas originam o complexo “protrombinase”, que induz a clivagem da protrombina e o principal estímulo subsequente da trombina responsável pela
clivagem do fibrinogênio, formando o tampão hemostático. O fator IXa adicional é fornecido pelo fator XIa da superfície da plaqueta. O fator XIa ativa as vias antifibrinolíticas.
A  segunda  elevação  da  trombina  ativa  a  plasmina,  iniciando  a  fibrinólise.  Isso  mantém  o  controle  do  coágulo  no  local  da  lesão.  Para  controlar  a  fibrinólise,  a  via  antifibrinólitica  é  ativada  pela  ativação  da  trombina  do  inibidor  da
fibrinólise trombina ativável (IFTA). O IFTA reduz o processo fibrinolítico mediante inibição da atividade da plasmina; isso impede a lise prematura do coágulo e permite a propagação do coágulo. O equilíbrio entre formação de fibrina e
fibrinólise regula o tamanho e a qualidade do tampão de fibrina e fixa­o no local da lesão. A qualidade do coágulo é extremamente importante na eficiência da hemostasia.

Abordagem Clínica da Hemostasia
Embora a classificação convencional de hemostasia primária e secundária não seja biologicamente exata, ainda é uma abordagem diagnóstica útil na hemostasia de animais com anormalidades hemostáticas hereditárias ou adquiridas. A
hemostasia primária envolve a interação de plaquetas com a superfície subendotelial exposta. Simultaneamente, as proteínas plasmáticas de coagulação são ativadas em cascata sequencial que depende do fosfolipídio oriundo das plaquetas
ativadas e de íons cálcio do plasma para formar um coágulo estável (hemostasia secundária). As circunstâncias que ativam as plaquetas e as proteínas de coagulação também ativam as proteínas fibrinolíticas plasmáticas, que asseguram a
fixação do coágulo e sua adequada dissolução.
As atividades hemostáticas são tradicionalmente avaliadas por meio de testes de hemostasia primária (contagem de plaquetas e tempo de sangramento da mucosa bucal) e de hemostasia secundária com o uso de testes em amostra de
plasma com o intuito de detectar anormalidades adicionais, como TTPA (vias comum e intrínseca) e TP (vias comum e extrínseca). O sistema fibrinolítico normalmente é avaliado mediante mensuração de produtos de degradação, como
PDF e D­dímero, e da capacidade anticoagulante endógena pela dosagem de antitrombina, proteínas C e S. Testes de fatores de coagulação individuais específicos adicionais podem auxiliar na detecção de defeitos congênitos. Desse modo,
testes de triagem de coagulação no plasma podem auxiliar na identificação de proteína de coagulação deficiente ou defeituosa. Embora essa abordagem tradicional possibilite a detecção efetiva e sistemática da causa do sangramento, pode
ser difícil a avaliação da capacidade hemostática geral a partir de uma perspectiva clínica para o prognóstico ou o monitoramento do efeito do tratamento com anticoagulante ou procoagulante. Isso pode ser, em parte, pelo fato de os testes
realizados no plasma para avaliação dos sistemas fibrinolítico e secundário visarem elementos específicos­alvo do sistema hemostático, ignorando assim outros fatores que podem contribuir significativamente na avaliação da capacidade
hemostática geral em anormalidades adquiridas. Uma outra razão plausível é a baixa sensibilidade dos testes TTPA e TP; geralmente, a atividade de uma proteína de coagulação deve ser < 30% e, às vezes, < 10% do valor normal, antes de
se detectar uma anormalidade.
Os  testes  para  avaliação  de  maior  risco  ou  de  tendência  à  trombose  geralmente  estão  disponíveis  apenas  em  alguns  laboratórios  de  pesquisa.  A  determinação  da  atividade  de  antitrombina  está  sendo  disponibilizada  por  um  número
crescente  de  laboratórios.  Testes  para  mensuração  das  atividades  de  plasminogênio,  proteína  C,  a2­antiplasmina,  ativador  de  plasminogênio  tecidual  e  inibidor  do  ativador  de  plasminogênio  têm  sido  estabelecidos  para  alguns  animais
domésticos.

Avaliação da Função Hemostática no Sangue Total
Como o sangue total contém todos os fatores intravasculares e as células envolvidas na hemostasia fisiológica e patológica, incorporando o FT e células que contêm fosfolipídios, os testes em sangue total podem propiciar uma reflexão mais
acurada de um teste de hemostasia in vivo, em comparação com os testes de hemostasia tradicionais realizados em amostras de plasma. No entanto, até o momento têm­se realizado poucos testes em sangue total para avaliar hemostasias
primária e secundária em pesquisas veterinárias.
PFA­100:  O analisador de função plaquetária PFA­100 é um aparelho relativamente novo que permite determinação quantitativa in vitro, simples e rápida, de hemostasia primária relacionada com a plaqueta em condição de alto stress shear*.
O teste exige pequeno volume (0,8 mL) de sangue total citratado, que é obtido sob vácuo em tubo capilar de aço inoxidável de 200 μm de diâmetro e abertura com orifício de 150 μm em uma membrana de nitrocelulose revestida com
colágeno e epinefrina (CEPI) ou colágeno e ADP (CADP). Em resposta à alta velocidade das plaquetas circulantes e aos agonistas, forma­se um agregado plaquetário que bloqueia o fluxo de sangue através do orifício; o tempo gasto para
obstruir o orifício é denominado tempo de fechamento. Verifica­se tempo de fechamento prolongado em apenas um cartucho CEPI em anormalidades discretas da função plaquetária hereditária (p. ex., alteração no estoque) e no caso de
ingestão de ácido acetilsalicílico, ao passo que tempo de fechamento prolongado em ambos os cartuchos, CEPI e CADP, é constatado na disfunção plaquetária hereditária mais grave e na doença de von Willebrand. O PFA­100 também é
capaz de monitorar a resposta ao tratamento com ambos os antagonistas, DDAVP e GPIIb/IIIa. Pode­se avaliar a qualidade do concentrado de plaquetas do banco de sangue destinado à transfusão, bem como as respostas à transfusão de
plaquetas.  O  PFA­100  permite  um  bom  teste  de  triagem  para  detecção  de  anomalias  da  função  plaquetária.  Mais  recentemente,  o  PFA­100  foi  avaliado  em  vários  outros  estudos  por  sua  utilidade  na  determinação  dos  efeitos  de
medicamentos ou para avaliação geral da hemostasia primária em várias condições clínicas ou durante procedimentos cirúrgicos.
TROMBOELASTOGRAFIA:  A tromboelastografia (TEG) permite rápida avaliação da função hemostática em amostra de sangue total. Avalia todas as fases da hemostasia – início, amplificação e propagação –, bem como fibrinólise, inclusive
interação de plaquetas e leucócitos com as proteínas de cascata de coagulação. Assim, a TEG permite avaliação dos componentes de coagulação convencionais do plasma com os componentes celulares. A TEG é realizada em amostra de
sangue total fresco não estabilizado, dentro de 4 a 6 min após a obtenção da amostra. Isso geralmente não é uma prática de rotina na clínica. Tem­se proposto o uso de sangue total estabilizado citratado (com recalcificação imediatamente
antes da análise), com o intuito de aumentar o tempo de vida para análise da amostra. A TEG com FT ativado em amostra de sangue total citratado foi validada para cães e notou­se baixa variação analítica e boa correlação com os sinais
clínicos de hemorragia, em comparação com vários testes de coagulação convencionais realizados em amostras de plasma.
Tem­se utilizado a TEG para avaliar a hipercoagulabilidade em cães portadores de coagulação intravascular disseminada (CID), neoplasia e parvovirose e naqueles com hipotermia, com o intuito de avaliar a disfunção plaquetária. A TEG
permite auxiliar o perfil diagnóstico de animais com anormalidade hemostática e de testes suplementares convencionais de coagulação, como TP, TTPA, D­dímero e fibrinogênio.

DIÁTESE HEMORRÁGICA

 ANORMALIDADES DE COAGULAÇÃO
Diátese  hemorrágica  pode  ser  decorrência  de  defeitos  congênitos  ou  adquiridos  relacionados  com  as  proteínas  de  coagulação,  as  plaquetas  ou  os  vasos  sanguíneos.  Em  geral,  as  deficiências  de  plaquetas,  congênitas  ou  adquiridas,
manifestam­se  como  hemorragias  petequiais  e  equimoses  superficiais  (especialmente  em  membranas  mucosas),  epistaxe,  melena  ou  sangramento  prolongado  nos  locais  de  injeção  e  incisão,  ao  passo  que  as  deficiências  congênitas  ou
adquiridas de proteínas de coagulação geralmente se manifestam clinicamente como formação de hematoma e hemorragia de tecido profundo tardia.
A  trombose  patológica  pode  ser  decorrência  de  anormalidades  de  fatores  de  proteínas  anticoagulantes  primárias,  ou  hereditárias,  e  secundárias,  ou  adquiridas.  Tais  anormalidades  frequentemente  são  denominadas  estados  de
hipercoagulação. Doenças sistêmicas como CID, que exacerbam a resposta das plaquetas aos agonistas, alteram o equilíbrio entre as proteínas anticoagulantes e procoagulantes ou aumentam a reatividade do endotélio, são mais comuns nos
animais do que as anormalidades hereditárias.

 ANORMALIDADES DE PROTEÍNAS DE COAGULAÇÃO

Anormalidades de Proteínas de Coagulação Congênitas
Nas deficiências ou disfunções graves de proteínas de coagulação, os sinais clínicos surgem em idade precoce. Geralmente, as reduções acentuadas nas atividades das proteínas de coagulação essenciais à hemostasia são fatais. Os animais
podem nascer mortos quando há < 1% da atividade normal ou podem morrer logo depois do nascimento, em razão de hemorragia grave. Produção insuficiente de proteínas de coagulação ou quantidade limitada de vitamina K no fígado
imaturo do neonato pode exacerbar um distúrbio de coagulação. Caso a atividade de qualquer proteína de coagulação corresponda a 5 a 10% do valor normal, o recém­nascido pode sobreviver, mas, em geral, os sintomas surgem antes dos 6
meses  de  idade.  É  durante  esse  período,  quando  se  realizam  vários  procedimentos  de  rotina  (p.  ex.,  vacinação,  corte  de  unhas,  caudectomia,  remoção  de  dígitos  rudimentares,  corte  de  orelhas  e  castração  ou  ovarioisterectomia),  que  a
tendência de sangramento pode tornar­se aparente.
A maioria das anormalidades congênitas das proteínas de coagulação relatadas em animais domésticos envolve deficiências ou anormalidades de um único fator. Os defeitos duplos ou múltiplos são raros.
Afibrinogenemia congênita (deficiência do fator I) foi relatada em uma família de cabras leiteiras da raça Saanen, mas não em cães ou gatos. Hipofibrinogenemia, acompanhada de hemorragia grave, foi relatada em cães das raças São
Bernardo e Vizsla; notou­se aumento de TCA, TTPA, TP e do tempo de trombina (TT). Há relato de disfibrinogenemia em uma família de cães da raça Russian Wolfhound (Borzoi). Constatou–se aumento de TCA, TTPA, TP e TT, mas,
em  um  teste  quantitativo,  notou­se  fibrinogênio.  Os  cães  afetados  apresentavam  episódios  hemorrágicos  discretos,  com  epistaxe  e  claudicação,  mas  traumatismo  ou  cirurgia  resultava  em  hemorragia  com  risco  à  vida  do  animal.  A
administração IV de plasma fresco congelado ou de crioprecipitado é o melhor tratamento para conter a hemorragia.
Anormalidades do fator II (protrombina) são raras. Em cães da raça Boxer, há relato de disfunção da protrombina, porém com teor normal desse componente; o defeito é herdado como característica recessiva autossômica. Também,
há relato de distúrbio do fator II em cães da raça English Cocker Spaniel; os sinais clínicos nos filhotes acometidos (epistaxe e sangramento gengival) diminuem com o avançar da idade; adultos desenvolvem facilmente equimoses ou
apresentam dermatite. Nos filhotes afetados, o TT permanece normal, e nota­se aumento de TCA, TTPA e TP. O tratamento baseia­se na transfusão de plasma fresco congelado ou sangue total fresco quando há necessidade de hemácias.
Deficiência do fator VII foi relatada em cães das raças Beagle, English Bulldog, Alaskan Malamute, Alaskan Klee Kai, Schnauzer miniatura e Boxer, bem como em mestiços. É uma doença hereditária autossômica com dominância
incompleta. Geralmente não está associada a hemorragia clínica espontânea, mas os cães afetados podem apresentar equimose ou sangramento prolongado após cirurgia. Há relato de hemorragia pós­parto prolongada. A deficiência de fator
VII é mais frequentemente diagnosticada quando se realizam testes de coagulação de triagem; ocorre aumento do TP, mas os valores de TTPA e de outros testes permanecem normais.
Deficiência do fator VIII (hemofilia A) é o distúrbio hemorrágico hereditário mais comum em cães e gatos; também é relatada em várias raças de equinos, inclusive Árabe, Standardbred, Quarto­de­Milha e Puro–Sangue inglês. Há um
padrão de herança ligado ao cromossomo X, de forma que usualmente as fêmeas são portadoras assintomáticas e os machos são acometidos. Nas famílias altamente endogâmicas, raramente uma fêmea portadora acasalada com um macho
acometido origina fêmea com sintomas da doença.
Nos filhotes de cães comprometidos, nota­se sangramento prolongado em vasos umbilicais depois do nascimento; na gengiva, na época da erupção dentária; e depois de uma cirurgia como caudectomia, remoção de dígito rudimentar ou
corte de orelha. Hemartrose acompanhada de claudicação intermitente, formação espontânea de hematoma e derrame hemorrágico em cavidades corporais também são achados clínicos comuns nos cães com < 5% da atividade normal do
fator VIII. Com frequência, os animais com 5 a 10% de atividade normal não apresentam hemorragia espontânea, mas exibem sangramento prolongado depois de cirurgia ou traumatismo. Gatos afetados e, às vezes, cães pequenos podem
apresentar sangramento prolongado após cirurgia ou traumatismo, mas raramente ocorre hemorragia espontânea, provavelmente em razão de sua agilidade e menor peso. Os animais acometidos geralmente apresentam concentração muito
baixa do fator VIII (< 10%) e TCA e TTPA prolongados. A concentração do fator de von Willebrand (antígeno relacionado com o fator VIII) permanece normal ou maior que o normal. Os animais portadores apresentam concentração
intermediária de fator VIII (40 a 60%), e os resultados dos testes de coagulação de triagem, em geral, permanecem normais. Em animais < 6 meses de idade, deve­se ter cuidado no diagnóstico, por conta da possível baixa produção de
fatores de coagulação pelo fígado imaturo. Em geral, os resultados dos testes de coagulação de triagem permanecem normais em animais portadores.
O tratamento de diátese hemorrágica exige transfusões repetidas de crioprecipitado ou plasma fresco congelado (10 mL/kg), 2 a 3 vezes/dia, até que se controle o sangramento. Prefere­se plasma fresco congelado ou crioprecipitado a
sangue total, em razão da possível sensibilização do animal aos antígenos eritrocitários quando da realização de repetidas transfusões.
A deficiência do fator IX (hemofilia B) é menos frequentemente diagnosticada do que a deficiência do fator VIII. Ela foi relatada em várias raças de cães, em um cão mestiço, em gatos da raça Himalaia, em uma família de gatos
mestiços da raça Siamês e em uma família de gatos da raça British Shorthaired. O defeito é ligado ao cromossomo X; as fêmeas são portadoras e os machos, acometidos pela disfunção, embora as fêmeas também possam ser afetadas em
famílias com alto grau de endogamia. A manifestação clínica é semelhante àquela verificada em animais com deficiência do fator VIII. Os animais com atividade do fator IX extremamente baixa (< 1%) geralmente morrem ao nascimento
ou logo depois. Os animais com atividade do fator IX entre 5% e 10% do valor normal podem apresentar hematoma espontâneo, hemartrose, efusão hemorrágica em cavidades corporais ou hemorragia em órgãos. Pode ocorrer sangramento
gengival durante a erupção dentária ou hemorragia prolongada após caudectomia ou remoção de dígito rudimentar. Alguns animais são assintomáticos até que ocorra traumatismo ou cirurgia. TCA e TTPA estão prolongados. Os animais
portadores com 40 a 60% da atividade normal do fator IX geralmente são assintomáticos, e os resultados dos testes de coagulação de triagem permanecem normais. O tratamento exige transfusão com plasma fresco congelado (10 mL/kg),
em intervalos de 12 h, até que a hemorragia cesse. Frequentemente, nota­se hemorragia interna no abdome, no tórax, no SNC ou entre os planos fasciais musculares, o que pode não ser detectado até que ocorra uma crise.
A deficiência do fator X foi relatada em uma única família de cães da raça American Cocker Spaniel e em um cão mestiço. No primeiro caso, o padrão de herança era dominante autossômico, com penetrância variável. Os homozigotos
quase sempre morriam ao nascimento ou precocemente, em decorrência da hemorragia interna grave. Os heterozigotos apresentavam distúrbios hemorrágicos discretos a graves. Usualmente notou–se aumento de TCA, TTPA e TP quando
os animais apresentavam < 30% da atividade normal do fator X. Para controlar a hemorragia, foram necessárias transfusões com plasma fresco ou fresco congelado.
A  deficiência  do  fator  XI  foi  diagnosticada  em  cães  da  raça  Kerry  Blue  Terrier,  em  uma  cadela  English  Springer  Spaniel,  em  um  cão  Great  Pyrenee,  em  cães  da  raça  Weimaraner  e  em  bovinos  da  raça  Holandesa.  Em  geral,  as
deficiências discretas não são detectadas. Nas deficiências graves, nas quais a atividade do fator XI situa­se entre 30% e 40% do valor normal, ou menos, pode ocorrer discreto sangramento prolongado após traumatismo ou cirurgia. As
tendências hemorrágicas geralmente não são imediatas, podendo surgir após 3 a 4 dias. Em geral, nota­se aumento de TCA e TTPA. Transfusão com plasma fresco ou fresco congelado (10 mL/kg) é suficiente para interromper a hemorragia
por até 3 dias. A herança é autossômica, mas ainda não se determinou se o gene é dominante ou recessivo. Relata­se um único caso em gato adulto que apresentava epistaxe e foi diagnosticado com lúpus eritematoso sistêmico, atribuído à
presença de um inibidor circulante do fator XI.
A deficiência do fator XII (Hageman) foi relatada em um cão da raça German Shorthaired Pointer, em um cão da raça Poodle padrão, em uma família de cães da raça Poodle miniatura e em gatos. Os animais afetados não apresentavam
manifestação clínica de hemorragia. Em geral, a deficiência é diagnosticada coincidentemente quando se realizam testes de coagulação de triagem e nota­se aumento de TTPA. As pessoas com deficiência do fator XII não apresentam
problemas hemorrágicos, mas são predispostas a trombose ou infecções, atribuídas à função normal do fator XII na fibrinólise e na ativação do complemento. Ainda não se relatou tendência de trombose ou infecção em animais. Descobriu­
se que a deficiência do fator XII coexistia com a doença de von Willebrand, em um cão, e com deficiência do fator IX, em um gato, mas as tendências hemorrágicas não foram exacerbadas. O fator XII não está presente no plasma de aves,
mamíferos marinhos e répteis, sem qualquer efeito prejudicial.
A deficiência de precalicreína foi relatada em um cão da raça Poodle, em uma família de pôneis e em uma família de equinos da raça Belga. Geralmente não há manifestação clínica aparente de hemorragias. Um equino apresentou
sangramento excessivo depois da castração. O diagnóstico normalmente é definido durante a realização de testes de coagulação de triagem. Nota­se aumento de TCA e TTPA.

Anormalidades de Proteínas de Coagulação Adquiridas
DOENÇA  HEPÁTICA:   A  maior  parte  das  proteínas  de  coagulação  é  sintetizada  principalmente  no  fígado.  Portanto,  uma  hepatopatia  caracterizada  por  necrose,  inflamação,  neoplasia  ou  cirrose  está,  com  frequência,  associada  a  menor
produção de proteínas de coagulação, fatores anticoagulantes e proteínas fibrinolíticas. Como as várias proteínas de coagulação apresentam meia­vida relativamente curta (4 h a 2 dias), deficiências discretas a graves dessas proteínas podem
ser  secundárias  a  doenças  hepáticas  graves.  Constatam­se  aumentos  de  TTPA  e/ou  TP  em  50  a  85%  dos  cães  portadores  de  doença  hepática  grave,  indicando  que  a  atividade  do  fator  corresponde  a  <  30%  do  normal.  Todavia,  <  2%
realmente desenvolvem hemorragia e, quando não ocorre sangramento, geralmente está associado a doença concomitante. Com frequência, realizam­se, antes da biopsia hepática, testes de coagulação.
As hepatopatias graves também podem causar CID. Os teores de fibrinogênio, uma proteína de fase aguda, e do fator de von Willebrand, produzido em sítio extra­hepático, podem aumentar na doença hepática.
DEFICIÊNCIA  DE  VITAMINA  K:  A  vitamina  K  é  solúvel  em  micelos  mistos  antes  da  difusão  passiva  através  da  borda  em  escova.  Má  absorção  de  gordura  decorrente  de  quantidade  inadequada  de  sais  biliares  (p.  ex.,  obstrução  biliar),
linfangiectasia ou grave atrofia de vilosidades podem resultar em deficiência da vitamina e coagulopatia decorrente da falha na síntese dos fatores II, VII, IX e X, que dependem da vitamina K.
INGESTÃO DE RODENTICIDAS ANTICOAGULANTES:  A ingestão de certos rodenticidas por cães e gatos causa coagulopatia por produção insuficiente de fatores de coagulação dependentes de vitamina K (ver p. 3236). Precursores inativos dos
fatores de coagulação II, VII, IX e X também são sintetizados no fígado, porém não ocorre ?­carboxilação desses precursores porque os rodenticidas inibem a enzima epóxido­redutase, necessária para a reciclagem da vitamina K ativa. Há
duas classes gerais de anticoagulantes rodenticidas: os compostos cumarínicos (varfarina, cumafuril, brodifacum e bromadiolona) e os compostos indanedionas (difacinona, pindona, valona e clorofacinona). Os rodenticidas anticoagulantes
são  ainda  classificados  como  de  primeira  e  segunda  gerações,  com  base  na  toxicidade  e  na  meia­vida.  Em  geral,  a  meia­vida  dos  cumarínicos  (até  55  h)  é  muito  mais  curta  que  a  de  compostos  indanedionas  (15  a  20  dias).  Vários
medicamentos administrados simultaneamente e enfermidades concomitantes podem exacerbar a toxicidade do anticoagulante ingerido.
Os animais afetados podem desenvolver hematomas (especialmente em pontos de pressão) e equimoses em tecidos superficiais e profundos. Frequentemente, os animais não apresentam hemorragia nas primeiras 24 h após a ingestão da
toxina. Em geral, constata­se aumento de TTPA, TP e TCA. O fator VII apresenta meia­vida mais curta dentre as proteínas de coagulação dependentes de vitamina K; portanto, com frequência, o TP apresenta­se anormal antes de outros
testes e pode ser utilizado para monitorar a resposta ao tratamento. No caso de ingestão aguda, são utilizados eméticos, adsorventes e catárticos com o intuito de minimizar a absorção. Mesmo em animais assintomáticos, institui–se terapia
com vitamina K. Para o tratamento de intoxicação por cumarina, recomendam–se 2,5 a 5 mg de vitamina K1/kg SC, injetada em vários locais, seguida de 1,25 a 2,5 mg/kg VO, 2 vezes/dia, durante 4 a 6 dias, caso se acredite que a ingestão
seja mínima. Deve­se mensurar o TP 48 h após a cessação do tratamento; no caso de TP prolongado, continua­se o tratamento por mais 14 dias. Se o TP inicial está normal, deve­se determinar novamente o TP depois de 48 h. Se o teste for
normal, pode­se interromper o tratamento. No tratamento de intoxicação por indanedionas, podem ser necessárias altas doses de vitamina K1, como 5 mg/kg VO, durante 3 a 6 semanas; contudo, essas altas doses devem ser administradas
cuidadosamente porque há relato de anemia por corpúsculos de Heinz em cães tratados com 4 mg/kg, durante 5 dias. Não se recomenda a administração por via intravenosa de vitamina K1 porque pode ocorrer reação anafilática. O uso de
vitamina K3 não é efetivo.

CID:  Não  é  uma  doença  primária,  mas  sim  uma  disfunção  secundária  a  várias  anormalidades  ativadoras  de  coagulação,  como  doenças  causadas  por  bactérias,  vírus,  riquétsias,  protozoários  ou  parasitos;  choque  térmico;  queimaduras;
neoplasias ou traumatismos graves. A doença primária induz resposta inflamatória sistêmica incontrolável caracterizada por ativação e consumo maciços de proteínas de coagulação, inibidores endógenos, proteínas fibrinolíticas e plaquetas.
No estágio inicial da CID, o animal apresenta hipercoagulação decorrente dos mediadores inflamatórios circulantes, que provocam ativação da hemóstase pela maior exposição de FT e consumo de inibidor. Com o tempo, o consumo de
fatores de coagulação, se não compensado pelo aumento da produção, pode ocasionar a condição de hipercoagulação com sintomas evidentes. Em virtude da natureza progressiva da CID, os achados clínicos variam consideravelmente,
desde ausência de sintoma evidente da doença, sem alterações, ou às vezes alterações apenas discretas, nos testes convencionais de hemostasia (TTPA, TP, D­dímero, fibrinogênio e contagem de plaquetas), até sinais clínicos de falência
orgânica associada a trombose microvascular em órgãos vitais, culminando, por fim, em hemorragias evidentes. Acredita–se que as últimas manifestações sejam tradicionalmente características de pacientes com CID, nos quais há também
alterações marcantes nos testes de hemostasia e diminuição na contagem de plaquetas.
A TEG pode diferenciar o estágio de CID em cães. Os cães diagnosticados na fase de hipercoagulação apresentam chance muito maior de sobreviver do que aqueles diagnosticados na fase de hipocoagulação. Isso provavelmente se deve
à intervenção precoce e agressiva por meio de terapia de suporte e/ou antitrombótica, enquanto se trata a causa primária. O tratamento agressivo provavelmente minimiza as complicações tromboembólicas e retarda, ou mesmo impede, o
desenvolvimento de sintomas evidentes.
Em medicina veterinária, o diagnóstico laboratorial de CID não está padronizado e os testes de função hemostática utilizados não são compatíveis; todavia, frequentemente, o diagnóstico de CID baseia­se em três parâmetros hemostáticos
anormais, ou mais, como TTPA, TP, fibrinogênio, D­dímero, contagem de plaquetas e morfologia das hemácias, juntamente com predisposição à doença, que é uma condição sensível, porém inespecífica. A fibrinólise pós­morte torna a
necropsia um procedimento diagnóstico insensível.
Com  frequência,  o  tratamento  é  direcionado  de  modo  empírico  à  correção  do  desequilíbrio  do  sistema  hemostático,  enquanto  se  trata  a  doença  primária  de  modo  intensivo.  É  fundamental  a  administração  de  soluções  de  eletrólitos
balanceadas e de expansores de plasma com o intuito de manter um volume circulante efetivo. A resposta ao tratamento com plasma fresco congelado e heparina é imprevisível, e seu uso é controverso.

 ANORMALIDADES PLAQUETÁRIAS
Podem ser classificadas em trombocitopenias adquiridas ou congênitas ou disfunções funcionais congênitas (trombocitopatias)

Trombocitopenia Congênita
MACROTROMBOCITOPENIA HEREDITÁRIA EM CÃES DA RAÇA CAVALIER KING CHARLES SPANIEL:  Esse distúrbio de plaquetas gigantes hereditário benigno acomete cerca de 50% dos cães dessa raça. Caracteriza­se por trombocitopenia com
macrotrombócitos em 30% dos casos e agregação plaquetária variável em resposta à adenosina difosfato, dependendo da quantidade de plaquetas. Não se constatou correlação entre a ocorrência de macrotrombocitopenia e idade, sexo,
castração ou não, cor da pelagem, peso ou presença de sopro cardíaco. Essa anormalidade é detectada no hemograma de rotina. Os animais acometidos apresentam atividade normal das proteínas de coagulação.
HEMATOPOESE  CÍCLICA  EM  CÃES  DA  RAÇA  GRAY  COLLIE:   Esse  distúrbio  autossômico  recessivo  (p.  31)  caracteriza­se  por  ciclos  de  citopenia  de  12  dias.  Todas  as  células­tronco  da  medula  são  afetadas,  mas  os  neutrófilos  são  mais
comprometidos em razão de sua meia­vida curta (geralmente < 24 h). Pode­se constatar trombocitopenia discreta a grave; sangramento excessivo é uma complicação potencial. Esse distúrbio autossômico recessivo é fatal e, em geral, os
cães acometidos morrem em decorrência de infecções fulminantes antes dos 6 meses de idade. Mesmo os cães submetidos à terapia antimicrobiana intensiva morrem até os 3 anos de idade, em razão da amiloidose (p. 631) secundária ao
estímulo  antigênico  crônico  induzido  por  infecções  recorrentes.  O  tratamento  com  fator  estimulante  de  colônia  de  granulócitos  recombinante  mostrou  efeito  temporário  no  alívio  de  ciclos  neutropênicos,  até  que  fossem  produzidos
anticorpos contra proteínas não caninas.
TROMBOCITOPENIA ALOIMUNE FETAL E NEONATAL:  Esse distúrbio ocorre quando anticorpos maternos são produzidos contra um antígeno paterno presente nas plaquetas do feto. Há relato da doença em um potro de equino Quarto­de­Milha
com 1 dia de idade. Imunoglobulinas ligadas às plaquetas de potros foram detectadas no plasma, no soro e no leite da égua, por meio de testes indiretos. Constatou­se que as imunoglobulinas reconheceram as plaquetas do irmão do potro,
filho dos mesmos pais, nascido 1 ano antes. Esse diagnóstico deve ser considerado em potros com trombocitopenia grave, quando outras causas puderem ser excluídas.
Um grupo de cordeiros artificialmente criados e alimentados com colostro bovino apresentou sangramento prolongado após ferimentos por punção para colocação de brincos de identificação, bem como equimose subcutânea, fraqueza e
palidez  de  membranas  mucosas.  Todos  os  cordeiros  acometidos  morreram  dentro  de  48  h  após  o  nascimento.  Constataram­se  trombocitopenia  em  amostra  de  sangue  total  e  diminuição  nítida  da  contagem  de  plaquetas  no  esfregaço
sanguíneo. Suspeitou­se da presença de anticorpos contra plaquetas porque as vacas doadoras de colostro foram utilizadas em um experimento anterior, no qual foram imunizadas contra sangue ovino.

Trombocitopenia Adquirida
As  trombocitopenias  adquiridas  são  relatadas  com  frequência  em  cães  e  gatos,  menos  comumente  nos  equinos  e  raramente  nas  outras  espécies.  Foram  identificadas  várias  causas,  a  maioria  delas  envolvendo  destruição  plaquetária
imunológica ou direta.
TROMBOCITOPENIA IMUNOMEDIADA PRIMÁRIA:   Essa  condição  (também  denominada  trombocitopenia  idiopática  ou  púrpura  trombocitopênica  idiopática)  é  caracterizada  por  destruição  imunomediada  de  plaquetas  circulantes  ou,  menos
comumente, de megacariócitos da medula. Foi relatada em cães e equinos. Os sinais clínicos incluem petéquias na gengiva ou na pele, equimose, melena ou epistaxe. A contagem de ?plaqueta é, em geral, < 50.000/μL e frequentemente <
10.000 μL no momento do diagnóstico. O exame dos megacariócitos (por meio de aspiração de medula óssea) auxilia no esclarecimento sobre a ação de anticorpos em plaquetas circulantes ou em megacariócitos da medula. Um teste para
detectar o fator 3 plaquetário, liberado por plaquetas lesionadas, não é confiável ou não está facilmente disponível para compra. Tem­se utilizado um teste de imunofluorescência para megacariócito, a fim de detectar anticorpos nesse tipo
celular; contudo, deve–se obter uma amostra adequada por meio de aspiração da medula óssea. Relata­se que um teste direto para detecção de anticorpos antiplaquetários – teste ELISA, que detecta anticorpos ligados a plaquetas – tem boa
sensibilidade (94%), mas não é muito específico para trombocitopenia imunomediada primária. Um resultado negativo provavelmente descarta esse tipo de trombocitopenia como causa de redução na quantidade de plaquetas; no entanto,
um resultado positivo pode indicar se a trombocitopenia imunomediada é primária ou secundária (p. ex., trombocitopenia associada a anemia hemolítica autoimune, doenças linfoproliferativas e lúpus eritematoso sistêmico).
Os animais acometidos devem ser mantidos em repouso. Além disso, recomenda­se a administração de corticosteroides, iniciando­se com alta dose e, em seguida, diminuindo­a (como no tratamento de anemia hemolítica imunomediada,
p. 14). Deve­se realizar transfusão de sangue total fresco em animais com VG < 15%; no entanto, transfusão de sangue total para suprir as plaquetas frequentemente é inútil para a normalização da hemostasia primária, porque as plaquetas
são removidas da circulação em poucas horas. A esplenectomia deve ser limitada ao tratamento de animais que apresentam episódios recorrentes de trombocitopenia. Tem­se utilizado vincristina para estimular a liberação de plaquetas pelos
megacariócitos da medula, mas sua eficácia é questionável no controle da destruição plaquetária imunomediada.
RIQUETSIOSES:  Infecções por Anaplasma platys,A. phagocytophilum ou Ehrlichia canis provocam trombocitopenia discreta a grave em cães. A infecção por E. platys (ver p. 824) geralmente é caracterizada por discreta trombocitopenia e
geralmente cíclica nos estágios agudos da doença. Com frequência, as infecções crônicas são acompanhadas de trombocitopenia discreta a moderada, normalmente cíclicas. Às vezes, podem­se identificar mórulas (inclusões basofílicas
arredondadas  a  ovais,  únicas  ou  múltiplas)  em  plaquetas  de  cães  infectados.  A  trombocitopenia  raramente  é  grave  o  suficiente  para  causar  hemorragia  clinicamente  evidente.  Provavelmente  os  carrapatos  são  os  vetores.  As  infecções
causadas por E. canis são caracterizadas por alterações variáveis no leucograma, no VG e na contagem de plaquetas. Nas infecções agudas, é comum trombocitopenia e, possivelmente, anemia ou leucopenia. Nas infecções crônicas, pode
ou  não  haver  trombocitopenia  ou  anemia;  no  entanto,  nota­se,  com  frequência,  leucocitose  e,  às  vezes,  hiperglobulinemia  (monoclonal  ou  policlonal).  Os  cães  infectados  podem  apresentar  epistaxe,  melena,  sangramento  gengival,
hemorragia de retina, hematoma e sangramento prolongado após venopuntura ou cirurgia.
Infecção  por  A.  phagocytophilum  está  documentada  em  ampla  variedade  de  animais  domésticos  e  silvestres.  É  caracterizada  por  febre,  letargia  e  relutância  para  se  movimentar.  As  alterações  nos  parâmetros  sanguíneos  incluem
trombocitopenia e linfopenia acompanhada de elevação da atividade sérica de fosfatase alcalina e hipoalbuminemia.
NEOPLASIA:  Hemangiossarcoma,  linfoma  e  adenocarcinoma  podem  estar  associados  a  trombocitopenia  por  alto  consumo  decorrente  da  CID.  Mecanismos  inflamatórios  e  imunológicos  ocasionam  aumento  do  consumo  de  plaquetas  e
diminuição da sobrevida da plaqueta. No entanto, ocasionalmente nota­se tendência de sangramento sem trombocitopenia. A alteração na função plaquetária, em razão de defeito de membrana adquirido, está associada a hiperglobulinemia.
Vasculite também pode contribuir na instalação de distúrbio hemostático.
TROMBOCITOPENIA INDUZIDA POR VACINA:  Cães que recebem doses repetidas de vacinas vivas modificadas contra paramixovírus e adenovírus podem desenvolver trombocitopenia. Notou­se trombocitopenia 3 a 10 dias após a repetição da
vacina, geralmente transitória e leve, não ocasionando tendência hemorrágica evidente, a menos que haja, simultaneamente, outro distúrbio de coagulação ou plaquetário. A trombocitopenia pode se instalar em consequência da produção de
anticorpos contra antígenos virais aderidos à superfície plaquetária ou a complexos antígeno­anticorpo inespecíficos presentes nas superfícies das plaquetas.
TROMBOCITOPENIA INDUZIDA POR MEDICAMENTOS:  Relata­se trombocitopenia associada à administração de certos medicamentos em cães, gatos e equinos. Um mecanismo envolvido é a supressão medular que envolve megacariócitos ou
supressão generalizada de células­tronco da medula óssea (após administração de estrógeno, cloranfenicol, fenilbutazona, difenil­hidantoína e sulfonamidas). Outro mecanismo envolve o aumento da destruição de plaquetas e (após uso de
sulfisoxazol, ácido acetilsalicílico, difenil­hidantoína, paracetamol, ristocetina, levamisol, meticilina e penicilina). As reações medicamentosas são idiossincráticas e, portanto, imprevisíveis. Normalmente a contagem de plaquetas retorna ao
normal imediatamente após a interrupção do tratamento. A supressão de medula óssea induzida por medicamento pode ser prolongada.
OUTRAS:  Há  relato de anormalidades  plaquetárias  quantitativas  em  hepatopatias,  com  ou sem deficiência de proteínas de coagulação. Em dois estudos que envolveram gatos  com  trombocitopenia,  29  a  50%  dos  animais  apresentavam
doença infecciosa, inclusive leucemia felina, peritonite infecciosa felina, panleucopenia ou toxoplasmose. O mecanismo de ocorrência da trombocitopenia não foi esclarecido em vários desses casos. O vírus da leucemia felina replica e se
acumula em megacariócitos e plaquetas; nesse caso, aplasia ou hipoplasia de células­tronco da medula, destruição imunomediada de plaquetas infectadas ou sequestro extravascular de plaquetas nos tecidos linfoides podem contribuir no
desenvolvimento de trombocitopenia.

Anormalidades da Função Plaquetária Congênitas
Influenciam a aderência, a agregação ou a produção de plaquetas. Tais anormalidades podem ser intrínsecas ou extrínsecas às plaquetas. A avaliação da função plaquetária intrínseca necessita de manipulação cuidadosa de amostras e
equipamento  especializado,  não  disponível  na  rotina  de  laboratórios  de  diagnóstico;  portanto,  não  se  conhece  precisamente  a  prevalência  dos  defeitos  funcionais  intrínsecos  das  plaquetas.  Contudo,  caso  haja  distúrbio  hemorrágico
(especialmente sangramento de mucosa ou petéquias superficiais) em animal que não tenha recebido qualquer medicação e cujos resultados dos testes de coagulação de triagem, da contagem de plaquetas e da concentração do fator de von
Willebrand sejam normais, deve­se suspeitar de anormalidade plaquetária intrínseca.
Não há tratamento específico para qualquer distúrbio intrínseco da função plaquetária. Na hemorragia intensa, pode­se administrar plasma fresco rico em plaquetas. O sangue total pode ser utilizado se o animal acometido apresenta
anemia.
DOENÇA DE VON WILLEBRAND:  Esse distúrbio, causado por um defeito ou deficiência do fator de von Willebrand (vWF, também denominado antígeno relacionado com o fator VIII), é a anormalidade hemorrágica hereditária mais comum
em cães (relatada em praticamente todas as raças e em animais mestiços). Também foi relatada em gatos, coelhos, bovinos, equinos e suínos. Em cães, a doença de von Willebrand é classificada em três subtipos, com base na gravidade dos
sintomas, na concentração plasmática de vWF e na composição do multímero do vWF. O tipo 1 é a forma mais comum, caracterizada por sinais clínicos discretos a moderados, baixa concentração de vWF e distribuição do multímero
normal.  O  tipo  2  é  caracterizado  por  sintomas  moderados  a  graves,  baixa  concentração  de  vWF  e  perda  de  multímeros  de  alto  peso  molecular.  O  tipo  3  é  um  distúrbio  grave  caracterizado  pela  ausência  total  de  vWF.  A  doença  é
relativamente frequente (taxa de prevalência de 10 a 70%) em várias raças de cães: Doberman Pinscher, Pastor Alemão, Golden Retriever, Schnauzer miniatura, Welsh Corgi Pembroke, Shetland Sheepdog, Basset Hound, Scottish Terrier,
Poodle padrão e Manchester Terrier padrão. São conhecidos dois modos de herança. No padrão de herança autossômica recessiva, menos comum, a homozigose geralmente é fatal, e a heterozigose resulta em portadores assintomáticos. No
padrão de herança de dominância autossômica com penetrância incompleta, mais comum, os homozigotos e os heterozigotos podem apresentar tendências hemorrágicas variáveis. Os animais acometidos podem manifestar sangramento
gengival, epistaxe e hematúria. Alguns filhotes de cães podem sangrar excessivamente apenas após injeção, venopunção ou cirurgia, como caudectomia, corte de orelha e remoção de dígito rudimentar.
O vWF circula como um complexo associado ao fator de coagulação VIII (também denominado fator coagulante VIII) e controla a adesão plaquetária à superfície subendotelial – a primeira fase da formação do coágulo. Defeito ou
deficiência  do  vWF  mimetiza  disfunções  decorrentes  de  trombocitopenia  ou  de  anormalidades  plaquetárias  intrínsecas.  Deve­se  suspeitar  de  doença  de  von  Willebrand  em  animais  com  sinais  clínicos  de  distúrbios  hemorrágicos  que
apresentam  testes  de  coagulação  de  triagem  normais  (TTPA  e  TP)  e  contagem  de  plaquetas  adequada,  longo  tempo  de  sangramento  da  mucosa  bucal  e  tempo  de  fechamento  de  análise  de  função  plaquetária  prolongado.  Os  testes
quantitativos do vWF têm valor diagnóstico. O diagnóstico é confirmado pela detecção de baixa concentração plasmática de vWF ou mediante o teste de DNA. Ocasionalmente, os animais enfermos podem apresentar menor teor do fator de
coagulação  VIII  e,  portanto,  aumento  de  TTPA  e  do  tempo  de  coagulação  ativada  (TCA).  Em  animais  com  suspeita  da  doença,  devem  ser  evitados  medicamentos  que  interfiram  na  função  normal  das  plaquetas.  A  transfusão  de
crioprecipitado, plasma fresco ou sangue total fresco é efetiva para amenizar um episódio hemorrágico. Animal com doença de von Willebrand tipo 1 pode responder ao tratamento com acetato de desmopressina, que provoca liberação de
multímeros de Weibel­Palade (multímeros de alto peso molecular) do endotélio, por um mecanismo desconhecido.
Anormalidades hemostáticas concomitantes podem agravar a doença de von Willebrand. Antigamente acreditava­se que o hipotireoidismo (p. 593) estava associado a doença de von Willebrand; ambas as enfermidades são prevalentes em
várias das mesmas raças de cães, como Doberman Pinscher e Golden Retriever. Em um estudo, notou­se que a administração de hormônio tireoidiano suplementar a cães com hipotireoidismo, sem deficiência do vWF, não aumentou a
atividade desse fator; na verdade, na maioria dos cães testados a atividade do vWF diminuiu. Portanto, não se pode recomendar a administração de levotiroxina como tratamento de doença de von Willebrand, procedimento que pode,
inclusive, agravar a doença.
SÍNDROME DE CHÉDIAK­HIGASHI:  Essa anomalia autossômica recessiva é caracterizada por formação granular anormal em leucócitos, melanócitos e plaquetas (p. 30). O defeito parece surgir durante a formação do microtúbulo; portanto,
grânulos anormalmente grandes, mas em pequena quantidade, são evidentes em vários tipos de células. O defeito nos melanócitos resulta em clareamento da cor do pelame. Os leucócitos podem apresentar menor capacidade funcional de
fagocitose e destruição de microrganismos (um achado inconsistente em animais), e as plaquetas apresentam menor capacidade de agregação e liberação. As plaquetas quase não possuem grânulos densos e exibem diminuição acentuada no
armazenamento de difosfato de adenosina e serotonina. Nos gatos da raça Persa azul­fumaça acometidos, nota­se sangramento prolongado após venopunção ou cirurgia. A síndrome já foi diagnosticada em martas, bovinos e camundongos
beges, com tendências hemorrágicas semelhantes.
TROMBOPATIA CANINA:  Há relato de trombopatia em cães da raça Basset Hound. Os cães acometidos apresentam epistaxe, petéquias e sangramento gengival. Estudos sugerem que a herança é autossômica, com penetrância variável. As
plaquetas apresentam exposição inapropriada ao receptor de fibrinogênio e distúrbio na liberação de grânulos densos. Deve­se suspeitar de trombopatia quando cães da raça Basset Hound apresentam petéquias e hemorragia de membranas
mucosas, com contagem de plaquetas e concentração do vWF normais. O diagnóstico específico desse distúrbio exige testes especializados de avaliação da função plaquetária. Em geral, o resultado do teste de retração de coágulo é normal.
TROMBOPATIA  BOVINA:   Essa  disfunção  plaquetária  hereditária  autossômica  acomete  bovinos  da  raça  Simmental.  Os  animais  enfermos  podem  manifestar  hemorragia  discreta  a  moderada,  exacerbada  por  traumatismo  ou  cirurgia.  As
plaquetas apresentam menor capacidade de agregação. O agente da diarreia viral bovina (p. 319) pode provocar trombocitopenia em bovinos.
TROMBASTENIA DE GLANZMANN:  É uma doença genética autossômica, antigamente denominada trombopatia trombastênica, diagnosticada em cães da raça Otterhound e Great Pyrenees, em equinos mestiços de Puro­Sangue, cavalos Quarto­
de­Milha  e  em  potrancas  da  raça  Oldenburg.  Em  animais  acometidos,  notam­se  aumento  do  tempo  de  sangramento  e  formação  de  hematomas  no  local  de  venopunção  ou  lesão.  No  esfregaço  sanguíneo,  constatam­se  várias  plaquetas
gigantes bizarras (30 a 80% da população plaquetária). Em razão da menor síntese de glicoproteína IIb ou IIIa, nota­se diminuição, ou ausência, da glicoproteína receptora de membrana IIb­IIIa na superfície das plaquetas. Até o momento,
todos os animais acometidos apresentavam anormalidade na síntese de IIb.
O sangue dos animais enfermos não mostra retração normal do coágulo, e as plaquetas não se agregam normalmente após estímulo com adenosina difosfato, colágeno ou trombina.

Disfunção Plaquetária Adquirida
Os  cães  com  trombocitopenia  imunomediada  também  podem  apresentar  disfunção  plaquetária  adquirida.  Eles  podem  manifestar  tendência  hemorrágica  excessiva,  sem  diminuição  marcante  na  quantidade  de  plaquetas.  Em  cães  com
trombocitopenia imunomediada, a disfunção plaquetária, juntamente com a menor quantidade de plaquetas, pode contribuir para a tendência hemorrágica.
Várias  doenças  estão  associadas  a  disfunção  plaquetária  adquirida.  Hiperglobulinemia  associada  a  mieloma  múltiplo  induz  alteração  na  membrana  da  plaqueta,  resultando  em  prejuízo  da  função  hemostática.  Na  uremia  associada  a
qualquer forma de doença renal, constata­se menor capacidade de adesão e de agregação das plaquetas.
Vários  medicamentos  podem  prejudicar  a  função  das  plaquetas.  Dentre  os  medicamentos  incriminados  no  bloqueio  de  receptores  plaquetários  ou  na  alteração  da  permeabilidade  ou  da  carga  da  membrana  das  plaquetas,  incluem­se
furosemida,  penicilina,  carbenicilina,  lidocaína,  fentolamina  e  clorpromazina.  Os  medicamentos  que  inibem  a  transdução  de  mensagens  recebidas  na  superfície  das  plaquetas  incluem  cafeína,  teofilina,  dipiridamol  e  papaverina.  Os
medicamentos que inibem a resposta plaquetária (agregação, secreção ou síntese de tromboxano) são ácido acetilsalicílico, indometacina, paracetamol, fenilbutazona, ticlopidina, pentobarbital e sulfimpirazona. Hemorragias de relevância
clínica podem não ser causadas por prejuízo da função plaquetária induzido por medicamentos, a menos que, simultaneamente, haja outro distúrbio associado a disfunção hemostática.

 ANORMALIDADES VASCULARES

Anomalia Vascular Congênita
Astenia cutânea (síndrome  de  Ehlers­Danlos,  “doença  do  filhote  de  borracha”)  é  causada  por  um  distúrbio  na  maturação  do  colágeno  tipo  1.  Isso  causa  enfraquecimento  do  suporte  estrutural  de  vasos  sanguíneos  e  pode  resultar  em
hematomas  e  equimoses.  Essa  anomalia  foi  diagnosticada  em  cães,  gatos,  martas,  equinos,  bovinos,  ovinos  e  humanos,  contudo  é  rara  em  animais  domésticos.  O  sinal  clínico  mais  evidente  é  pele  solta  e  hiperextensível  que  se  lacera
facilmente. Não há tratamento disponível.

Anormalidades Vasculares Adquiridas
Várias doenças provocam vasculite generalizada caracterizada por distúrbios hemorrágicos frequentemente graves.
Febre maculosa das montanhas rochosas (p. 827) é causada por Rickettsia rickettsii, transmitida pelos carrapatos Dermacentor variabilis e D. andersoni. As riquétsias invadem as células endoteliais e causam morte celular, resultando
em edema perivascular e hemorragia. Juntamente com trombocitopenia, podem ocorrer graus variáveis de ativação da cascata de coagulação. Os cães infectados podem apresentar epistaxe, hemorragias petequiais e equimoses, hematúria,
melena ou hemorragia de retina. Nos cães gravemente enfermos, pode ocorrer coagulação intravascular disseminada.
Herpes­vírus canino geralmente acomete filhotes com 7 a 21 dias de idade. Vasculite necrosante generalizada é acompanhada de hemorragia perivascular. Em geral, a doença é rapidamente fatal e a maioria dos filhotes morre dentro de
24 h após o início dos sintomas.

TROMBOSE PATOLÓGICA

Anormalidades Anticoagulantes Primárias ou Hereditárias
Ainda não se identificou deficiência congênita de qualquer proteína anticoagulante em animais domésticos. Se tal condição existe, provavelmente é incompatível com a vida.

Anormalidades Procoagulantes Secundárias ou Adquiridas
É difícil avaliar a presença de hipercoagulabilidade antemorte em cães; ademais, a importância da hipercoagulabilidade e da doença tromboembólica não foi bem definida em medicina veterinária. Há necessidade de testes refinados para
avaliar as alterações hemostáticas, inclusive hipercoagulabilidade e condição hemostática geral dos cães. A TEG (p. 19) possibilita um exame global da função hemostática em amostra de sangue total. As vantagens da TEG incluem a
avaliação de propriedades viscoelásticas do desenvolvimento do coágulo sanguíneo (inclusive formação, cinética, resistência, estabilidade e resolução do coágulo) e a detecção imediata da condição de hiper ou hipocoagulabilidade.
Em animais, algumas doenças estão associadas a maior risco de trombose. Os gatos com cardiomiopatia, principalmente a forma dilatada, mas também a hipertrófica e a restritiva, podem formar grandes trombos e tromboembolia  na
artéria  aorta  ou  braquial.  Tem­se  constatado  trombose  em  cães  que  apresentam  nefropatia  com  perda  de  proteínas,  hiperadrenocorticismo,  neoplasia,  hipotireoidismo  crônico  acompanhado  de  aterosclerose  e,  mais  raramente,  anemia
hemolítica autoimune. Há relato de trombos e tromboembolia em equinos com doenças inflamatórias sistêmicas (como cólica, laminite ou colite causada por erlíquia), bem como nos casos de uso prolongado de cateter na veia jugular e de
aplicação intravenosa de medicamentos irritantes aos vasos sanguíneos.
Neoplasia é um fator de risco de hipercoagulabilidade e possivelmente de complicações associadas, como doença tromboembólica. Várias células e proteínas envolvidas na manutenção da hemostasia também participam dos mecanismos
de angiogênese, metástase, invasão e desenvolvimento de câncer. Trombose venosa profunda é uma complicação clínica importante em pessoas com câncer, mas não se sabe se isso é verdadeiro para cães com câncer.
Nas nefropatias com perda de proteínas (p. ex., glomerulopatias, síndrome nefrótica e amiloidose renal), a deficiência de antitrombina III é bem documentada. O peso molecular da antitrombina III é 57.000 dáltons (D), semelhante ao da
albumina (60.000 D); portanto, as lesões glomerulares que resultam em perda de albumina também causam perda de antitrombina III. Outras anormalidades detectadas nas nefropatias incluem aumento da responsividade das plaquetas aos
agonistas, aumento da atividade procoagulante e diminuição da atividade da antiplasmina. Atualmente, considera­se a trombose um distúrbio de etiologia multifatorial.
Tem­se associado hipercolesterolemia com maior risco de tromboembolia. Considera­se que ocorre alteração no teor de fosfolipídio das membranas endoteliais e plaquetárias, a qual provoca lesão vascular e aumento da resposta das
plaquetas  aos  agonistas,  respectivamente.  Relata­se  aumento  da  síntese  plaquetária  de  tromboxano  pela  via  ciclo­oxigenase.  As  doenças  caracterizadas  por  hipercolesterolemia  incluem  hiperadrenocorticismo,  diabetes  melito,  síndrome
nefrótica, hipotireoidismo e pancreatite. Todas elas estão associadas a maior risco de formação de trombo, frequentemente trombose pulmonar.
Os gatos com cardiomiopatia apresentam maior risco de tromboembolia. Acredita­se que as lesões endomiocárdicas e o fluxo sanguíneo turbulento nas câmaras e valvas cardíacas, secundários à alteração na função do miocárdio, iniciam
a formação de trombos. Ainda não se notou deficiência específica de proteínas anticoagulantes ou fibrinolíticas. É interessante que o teor de antitrombina III eleva­se acentuadamente, mas não propicia proteção. Gatos com doença cardíaca
secundária  a  hipertireoidismo  frequentemente  recebem  medicamentos  (p.  ex.,  propranolol,  atenolol  ou  diltiazem)  que  minimizam  os  sinais  clínicos  da  disfunção  cardíaca.  Esses  medicamentos  parecem  proteger  contra  risco  maior  de
trombose, por alterar a resposta plaquetária aos agonistas.
Os equinos com cólica associada à endotoxemia apresentam diminuição na atividade do plasminogênio e da concentração do antígeno da proteína C. Esses equinos são mais sujeitos à morte e à formação de trombos. Acredita­se que a
laminite seja o resultado final de anormalidades sistêmicas diversas. Os microtrombos nos vasos da lâmina do casco já foram detectados nos estágios iniciais da laminite. Uma teoria é que a endotoxina atua diretamente nos vasos e ativa
fatores de contato da cascata de coagulação. Isquemia da lâmina secundária a edema, compressão vascular e possível desvio sanguíneo na altura da coroa do casco também lesionam o endotélio. Quando a circulação é restabelecida, ocorre
lesão por reperfusão e a exposição do colágeno subendotelial induz à trombose.
O  manejo  mais  apropriado  de  um  animal  com  trombose  ou  tromboembolia  é  o  diagnóstico  e  o  tratamento  da  doença  primária,  juntamente  com  terapia  de  suporte  adequada.  É  fundamental  a  manutenção  de  uma  perfusão  tecidual
adequada. A dissolução de coágulos e a prevenção de recidiva pela administração de anticoagulantes (p. ex., heparina e cumarina) mostram eficiência variável. A heparina facilita a ação da antitrombina, mas, para ser efetiva, deve haver
teor adequado de antitrombina. Nos cães que apresentam nefropatias com perda de proteína e nos equinos com endotoxemia, pode ser necessária a transfusão de plasma antes da terapia com heparina. A cumarina é mais útil no controle ou
na prevenção do que no tratamento. Têm­se administrado compostos fibrinolíticos para maximizar a dissolução de coágulos. O ativador de plasminogênio tecidual tem mais especificidade à fibrina do que a estreptoquinase ou a uroquinase
e, portanto, propicia efeitos fibrinolíticos mais localizados (embora não totalmente). O principal impedimento ao uso do ativador de plasminogênio tecidual é seu alto custo. A estreptoquinase está mais facilmente disponível e de menor
custo,  mas  é  difícil  determinar  sua  dose  terapêutica.  Vários  animais  naturalmente  apresentam  anticorpos  contra  estreptoquinase,  em  razão  de  infecções  estreptocócicas  anteriores.  A  dose  de  estreptoquinase  deve  ser  suficiente  para
neutralizar todos os anticorpos, porém não deve ocasionar fibrinólise sistêmica e, consequentemente, diátese hemorrágica.

ANORMALIDADES LEUCOCITÁRIAS

No sangue dos mamíferos normais, os leucócitos compreendem neutrófilos segmentados, neutrófilos bastonetes, linfócitos, monócitos, eosinófilos e basófilos. Leucócitos anormais incluem neutrófilos menos desenvolvidos do que o estágio
de bastonetes (p. ex., metamielócitos, mielócitos, progranulócitos), blastócitos de qualquer linhagem, mastócitos e células neoplásicas de origem tecidual. Os leucócitos são diferentes quanto a local de produção, tempo de permanência na
circulação e estímulos que influenciam sua liberação e migração para o leito vascular. As contagens diferenciais também variam entre as espécies. As diferenças na fisiologia dos leucócitos são responsáveis pelas diferentes contagens
normais no sangue e pelas respostas ante as doenças, nas espécies animais (ver Tabela 6, p. 3346).
O leucograma, um componente do hemograma, é uma tabulação organizada da contagem de leucócitos totais, juntamente com as contagens dos tipos específicos de leucócitos presentes na amostra, também conhecida como contagem
diferencial. O conhecimento da fisiologia de leucócitos e a influência nos mecanismos de doenças representam a base para a interpretação de anormalidades do leucograma, para fins de diagnóstico. A interpretação do leucograma varia em
função da especificidade diagnóstica. A maioria das interpretações define mais uma condição de doença do que um diagnóstico específico. A interpretação geralmente envolve quatro grupos de ocorrências: 1) respostas fisiológicas que
alteram a hemodinâmica vascular; 2) respostas inflamatórias, infecciosas e imunológicas; 3) respostas da medula à lesão e 4) neoplasias de célula hematopoética (ver p. 1780).

 FISIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA

Sistema Vascular Sanguíneo
Em termos conceituais, o sistema vascular sanguíneo é dividido em dois compartimentos: o central e o marginal. O compartimento marginal compreende a microcirculação, ou seja, a interface capilar­tecido. O compartimento central
consiste em vasos maiores. As amostras de sangue obtidas por venopunção representam o compartimento central. A taxa de fluxo, o movimento de fluido para o espaço extravascular e a adesão seletiva dos leucócitos ao endotélio são
fatores que podem contribuir para diferenças marcantes na quantidade de células contidas nos dois compartimentos. Ademais, esses compartimentos estão em equilíbrio hemodinâmico mútuo e com o espaço extravascular. Portanto, a
quantidade de leucócitos pode se alterar apreciavelmente por conta do movimento de células e/ou fluido de um compartimento a outro, em decorrência de alteração no equilíbrio. Grosso modo, na maioria das espécies, os leucócitos são
distribuídos igualmente entre os dois compartimentos. Os gatos apresentam uma população maior de leucócitos no compartimento marginal. Pode ocorrer aumento da quantidade de leucócitos no compartimento circulante induzido por
alguns mecanismos: a epinefrina pode redistribuir os leucócitos do compartimento marginal para o compartimento circulante; os corticosteroides podem inibir a adesão de neutrófilos ao endotélio e a migração tecidual.

Granulócitos
Compreendem  neutrófilos,  eosinófilos  e  basófilos  produzidos  na  medula  óssea,  a  partir  de  um  subsistema  de  célula­tronco  comum.  Os  elementos  proliferativos  (mitóticos)  consistem  em  mieloblastos,  pró­mielócitos  e  mielócitos.
Inicialmente os pró­mielócitos formam grânulos primários azurofílicos (lisossomos) que, posteriormente, desaparecem. O compartimento de armazenamento (maturação) compreende metamielócitos, neutrófilos bastonetes e neutrófilos
segmentados, que são funcionalmente maduros. Grânulos específicos, que definem os tipos celulares finais, são produzidos inicialmente no estágio de mielócito. Os tipos de células são identificados pela afinidade por corantes específicos;
por exemplo, grânulos basofílicos em basófilos, grânulos eosinofílicos em eosinófilos e grânulos não corados ou neutros no caso de neutrófilos.
NEUTRÓFILOS:  No sangue, normalmente observam­se neutrófilos maduros (segmentados), com raras formas de bastonetes imaturos. Os neutrófilos oriundos da medula óssea alcançam o sangue periférico e aí permanecem, em média, 8 h.
Eles tendem a se aderirem ao endotélio da microcirculação e, em seguida, migram aos tecidos de modo unidirecional, onde podem participar da defesa do hospedeiro. Em razão do rápido turnover dos neutrófilos no sangue, a manutenção
da quantidade dessas células no sangue depende da liberação estável e relativamente alta pela medula óssea. Esse equilíbrio pode se alterar drasticamente quando há aumento do consumo tecidual em razão de inflamação tecidual ou no caso
de dano à célula­tronco que reduz a taxa de produção da medula. No início da reação inflamatória, fator(es) estimulante(s) de colônia liberados por células mononucleares locais estimula(m) rapidamente a medula óssea para liberar a
reserva de neutrófilos e acelerar a granulopoese. Quando a demanda é intensa, aceleram­se a produção e a liberação da medula, resultando em desvio à esquerda e alteração tóxica.
Neutrofilia extrema, excedendo os valores máximos verificados na inflamação, pode estar associada a leucemia mielomonocítica, infecções por Hepatozoon canis e, raramente, neoplasias que produzem fatores estimulantes de colônia.
Deficiência de aderência de leucócitos em bovinos é um distúrbio autossômico recessivo letal notado em animais da raça Holandesa. Está associada a neutrofilia marcante, e os neutrófilos apresentam deficiência de glicoproteínas
(integrinas) fundamentais para adesão e emigração normais dos leucócitos. Infecções bacterianas recorrentes, neutrofilia persistente (frequentemente > 100.000/μL), linfocitose e morte (geralmente entre 2 semanas e 8 meses de idade) são
achados característicos. Com frequência, nota­se retardo no crescimento, e os bezerros manifestam pneumonia recidivante, estomatite ulcerativa, enterite e periodontite. No exame histológico, nota­se pequena quantidade de neutrófilos,
exceto no lúmen vascular, porque eles permanecem na circulação e são incapazes de migrar para os tecidos. Há disponibilidade de exames para detectar animais portadores.
Neutropenia pode ser decorrente de excessiva demanda tecidual por neutrófilos ou por granulopoese reduzida. Pode ser notada no caso de infecção bacteriana fulminante, especialmente sepse gram­negativa ou endotoxemia, em todas as
espécies. A destruição imunomediada de neutrófilos é diagnosticada pela exclusão de outras possíveis doenças que consumem essas células. Pode haver lesão de célula­tronco de diversas causas, como certas infecções virais, lesão química
e reações idiossincráticas a medicamentos, por exemplo, sulfonamidas, penicilinas, cefalosporinas e cloranfenicol, em gatos. Essas reações tipicamente influenciam todas as linhagens celulares da medula, porém inicialmente detecta­se
neutropenia por conta do turnover relativamente alto dos neutrófilos.
Neutropenia é observada em uma condição rara e recente denominada síndrome da hematopoese cíclica de cães da raça Gray Collie, também conhecida como neutropenia cíclica canina. É uma anormalidade hereditária autossômica
recessiva  caracterizada  por  neutropenia  cíclica  intensa,  infecção  bacteriana  grave  recorrente,  hemorragia  e  despigmentação  do  pelame.  Acredita­se  que  sua  base  molecular  seja  um  defeito  cíclico  na  maturação  das  células­tronco
hematopoéticas pluripotentes na medula óssea. Cessa­se a maturação neutrofílica em ciclos regulares de 11 a 14 dias; a neutropenia periférica dura 3 a 4 dias, sendo seguida de neutrofilia. Todas as outras células hematopoéticas, inclusive
os linfócitos, também têm produção cíclica, que é minimamente evidente por causa do tempo de circulação relativamente longo dessas células. Os filhotes de cães afetados geralmente morrem ao nascimento ou nas primeiras semanas de
vida e raramente vivem > 1 ano. Os cães sobreviventes podem apresentar retardo no desenvolvimento e fraqueza e desenvolvem graves infecções bacterianas recorrentes durante os períodos de neutropenia.
EOSINÓFILOS:  Os eosinófilos atuam matando parasitos e também contêm enzimas que modulam os produtos de mastócitos e basófilos liberados em resposta ao estímulo induzido pela destruição do receptor de mastócito para o complexo
antígeno­IgE, na doença alérgica. Por exemplo, a histamina liberada por mastócitos é modulada pela histaminase dos eosinófilos. Eosinofilia é induzida principalmente por substâncias que provocam respostas inflamatórias alérgicas e por
infestações de parasitos que invadem tecidos. Há relato de síndrome hipereosinofílica em gatos. Essa síndrome pouco compreendida é caracterizada por eosinofilia marcante consistente e infiltração tecidual de eosinófilos com disfunção
orgânica associada. Menos comumente, neoplasia pode estar associada a indução paraneoplásica de eosinofilia. Lesões teciduais eosinofílicas localizadas não necessariamente ocasionam eosinofilia periférica, por exemplo, dermatopatias
com granuloma eosinofílico e lesões bucais em gatos. Eosinopenia é um componente de leucograma induzido por corticosteroides (estresse).
BASÓFILOS:  São raros em todos os animais domésticos comuns. Os grânulos basofílicos contêm histamina, heparina e mucopolissacarídios sulfatados; a compreensão de sua função é limitada. Como resultado, não há interpretação clara para
basofilia.  Basofilia  é  incomum,  porém  ocasionalmente  acompanha  eosinofilia,  sendo  o  último  parâmetro  a  ser  interpretado.  Diferentemente  do  que  se  alega  a  respeito  de  equipamentos  utilizados  em  hematologia,  não  há  dados  ou
documentação que comprovem que esses aparelhos sejam capazes de identificar os basófilos de animais. Embora os basófilos no sangue e os mastócitos no tecido apresentem funções e conteúdos enzimáticos semelhantes, os basófilos não
se tornam mastócitos. Eles parecem se originar de diferentes sistemas da ramificação medular.
Linfócitos
Originam­se de uma célula­tronco da medula e amadurecem nos linfonodos, no baço e nos tecidos linfoides subepiteliais. Os linfócitos maduros compreendem duas importantes subpopulações: linfócitos B e linfócitos T. Os linfócitos B (B
de  bone  marrow  ou  bursa)  são  precursores  potenciais  dos  plasmócitos  e  produzem  anticorpos  para  a  imunidade  humoral.  Os  linfócitos  T  (T  de  timo)  estão  relacionados  com  a  imunidade  celular  (p.  ex.,  histocompatibilidade  e
hipersensibilidade do tipo retardada). Os linfócitos no tecido podem retornar ao leito vascular e recircular. Alguns linfócitos têm vida longa quando comparados com outros tipos de leucócitos.
LINFOCITOSE:  Causas comuns de linfocitose são resposta à excitação (epinefrina) e leucemia linfocítica. A estimulação imune (antigênica) associada a inflamação crônica não causa linfocitose, mas pode resultar em expansão de células
linfoides responsivas nos tecidos linfoides. A estimulação imune também pode resultar em linfócitos reativos (imunologicamente estimulados) notados no exame do esfregaço sanguíneo. Os linfócitos reativos podem ser verificados em
qualquer doença que causa estímulo imune sistêmico moderado a intenso. Grandes linfócitos reativos são normais em animais jovens. Pequena quantidade de linfócitos granulares grandes é normal. Há relato de contagens de linfócitos de
até 17.000/μL, com linfócitos granulares grandes frequentes, em cães com infecção crônica por Ehrlichia canis. Em bovinos, linfocitose persistente é definida pela contagem linfocitária consistentemente > 7.500 células/μL. Isso se deve à
proliferação de linfócitos B que acontece em um subconjunto de animais infectados por vírus da leucemia bovina (BLV). Em geral, os bovinos acometidos são assintomáticos. Linfocitose persistente é considerada indicação positiva de
infecção por BLV. Um subconjunto menor de bovinos infectados por BLV, com ou sem linfocitose, pode desenvolver linfoma ou leucemia linfocítica.
LINFOPENIA:  É uma anormalidade comum no leucograma. Está mais comumente associada a ação de corticosteroides endógenos (estresse) ou exógenos. Possivelmente a causa mais comum seja apoptose de linfócitos induzida por esteroide.
Também, raramente nota­se linfopenia em decorrência de outras causas, como extravasamento de linfa (p. ex., linfangiectasia e efusão quilosa), algumas infecções virais com tropismo por células de rápida divisão e imunodeficiência
hereditária (p. ex., imunodeficiência combinada de potros da raça Árabe).

Monócitos
São produzidos na medula óssea e se desenvolvem a partir de monoblastos em pró­monócitos e, em seguida, em monócitos. Os monócitos permanecem no sangue periférico por cerca de 24 a 36 h, migram para os tecidos e se transformam
em macrófagos teciduais fixos. Monócitos e macrófagos fagocitam microrganismos e restos celulares no sítio inflamatório ou na lesão tecidual. Podem originar células gigantes multinucleadas nos tecidos, particularmente em resposta a
corpos estranhos ou a microrganismos complexos que estimulam a formação de granuloma. Monócitos e macrófagos são as principais fontes de fatores estimulantes de colônia e citocinas que controlam a resposta inflamatória, bem como
atuam como células processadoras de antígenos. Monocitose pode estar associada a inflamação, particularmente crônica. Monocitose também é um componente da resposta aos esteroides, mais notadamente em cães.

 ANORMALIDADES DO LEUCOGRAMA
Incluem alterações na contagem quantitativa ou numérica, bem como morfológicas de leucócitos.
ANORMALIDADES DA QUANTIDADE:  As contagens de leucócitos são interpretadas por meio de comparação com valores de referência espécie­específica. Para a interpretação adequada, devem ser considerados apenas os valores absolutos.
Ver Tabela 6 (p. 3346) para valores de referência das contagens de leucócitos totais e diferenciais em contagens absolutas dos animais domésticos comuns. Nos neonatos, a contagem total de leucócitos é mais variável e frequentemente
maior do que a de adultos. Para interpretação do hemograma de animais jovens, devem­se utilizar valores de referência próprios para a idade, particularmente em espécies nas quais a população de linfócitos é maior (e a quantidade de
neutrófilos é menor) em adultos, tipicamente em ruminantes. Em geral, o padrão da contagem diferencial dos leucócitos de adultos é obtido aproximadamente na idade de maturidade sexual.
A alteração na contagem total de leucócitos é útil somente para alertar o clínico no sentido de pesquisar e interpretar anormalidades na contagem diferencial dos diferentes tipos celulares. Quando a contagem total de leucócitos é anormal,
é provável que haja uma ou mais anormalidades na contagem diferencial. Mesmo quando a contagem total de leucócitos é normal, é possível que haja uma ou mais anormalidades na contagem diferencial. Como consequência, a avaliação
dos dados da contagem diferencial é o componente mais importante do leucograma.
Leucocitose corresponde ao aumento da quantidade de leucócitos circulantes; leucopenia indica sua diminuição. Para fins de interpretação clínica, a alteração na contagem dos tipos específicos de leucócitos é mais importante.
Neutrofilia ou leucocitose neutrofílica é o aumento da contagem de neutrófilos. Linfocitose é o aumento da contagem de linfócitos. Monocitose é o aumento na contagem de monócitos. Eosinofilia e basofilia referem–se aos aumentos nas
contagens de eosinófilos e basófilos, respectivamente. Metarrubricitose é o aumento da quantidade de hemácias nucleadas (nHe) no sangue. Mastocitose é o aumento do número de mastócitos no sangue.
A diminuição na contagem de um tipo celular é indicada pelo sufixo “penia”. Isso se aplica apenas aos tipos celulares passíveis de diminuição, mas não àqueles de leucócitos cujas contagens possam ser 0, como monócitos, basófilos, nHe
e qualquer outro tipo de célula anormal. Assim, neutropenia é a diminuição na contagem de neutrófilos, linfopenia é a diminuição na contagem de linfócitos e eosinopenia é a diminuição na contagem de eosinófilos. Citopenia é um termo
inespecífico que indica diminuição na contagem celular, porém sem especificação do tipo celular. Pancitopenia refere­se à diminuição de todos os tipos de leucócitos, geralmente uma redução intensa.
Os termos utilizados para descrever ou qualificar as anormalidades mais comumente associadas a respostas inflamatórias incluem vários graus de desvio à esquerda e resposta leucemoide. Desvio à esquerda é o aumento na quantidade
de neutrófilos não segmentados imaturos, tipicamente bastonetes, mas também pode incluir metamielócitos ou até mesmo outras formas imaturas. Desvio à esquerda regenerativo corresponde à leucocitose caracterizada pela combinação de
neutrofilia e desvio à esquerda. Nessa situação, a contagem de neutrófilos segmentados é maior do que a de bastonetes e de outras células mais imaturas. Desvio à esquerda degenerativo compreende um padrão de neutrófilos caracterizado
por contagem total de neutrófilos normal ou diminuída, mas com desvio à esquerda no qual a contagem de bastonetes e de formas mais imaturas é maior do que o número de neutrófilos segmentados. Isso indica liberação máxima pela
medula óssea em resposta à inflamação. Resposta leucemoide corresponde à neutrofilia marcante de magnitude suficiente para indicar a cronicidade de uma resposta inflamatória. Essa magnitude é tal que a leucemia mieloide torna­se uma
possibilidade diagnóstica. Referências para leucocitose neutrofílica consideram resposta leucemoide quando há > 70.000 leucócitos/μL, para cães, > 50.000/ μL para gatos, > 30.000/μL para equinos e > 20.000/μL para ruminantes.
ANORMALIDADES MORFOLÓGICAS:  Podem estar associadas a doença hereditária ou adquirida. Várias destas são incomuns.
Alteração tóxica é identificada apenas em neutrófilos. O termo origina­se de observações históricas de que algumas características celulares geralmente estão associadas a condições tóxicas graves, como infecções bacterianas sistêmicas
e  lesões  inflamatórias  agudas  graves.  É  um  erro  considerar  que  isso  implica  dano  ao  neutrófilo.  As  células  não  são  comprometidas  e  a  função  delas  é  normal.  A  alteração  tóxica  é  mais  bem  definida  como  um  conjunto  de  alterações
morfológicas verificadas no esfregaço sanguíneo, decorrentes da produção acelerada de neutrófilos na medula. A rápida produção é uma resposta à condição inflamatória relativamente grave que induz estímulo máximo à medula óssea. As
alterações morfológicas incluem (em ordem de frequência) basofilia citoplasmática difusa, corpúsculos de Döhle e vacuolização citoplasmática fina. Alterações mais raras incluem grânulos azurofílicos citoplasmáticos mais proeminentes,
gigantismo celular e binucleação. A alteração tóxica quase sempre está associada a desvio à esquerda concomitante. Ela é classificada como discreta, moderada ou grave, por meio de avaliação subjetiva das alterações mais comuns. Os
corpúsculos  de  Döhle  apresentam–se  como  inclusões  intracitoplasmáticas  azul­acinzentada,  agregadas  ao  retículo  endoplasmático.  Eles  são  particulares,  pois  podem  ser  notados  em  gatos  clinicamente  sadios  e,  portanto,  não  são
considerados alteração tóxica, a menos que acompanhada de outras anormalidades.
Linfócitos reativos apresentam citoplasma basofílico distintamente maior e podem ter núcleo irregular ou fendido. Seu diâmetro pode variar consideravelmente. Apresentam cromatina condensada e, portanto, não são blastócitos. São
considerados linfócitos B imunologicamente estimulados.
Linfócitos granulares apresentam cromatina condensada e aumento do citoplasma azul­acinzentado claro que contém vários grânulos pequenos róseos ou azurofílicos. O núcleo pode ser arredondado ou fendido. São grandes linfócitos
granulares e podem ser linfócitos matadores naturais (NK; natural killer), ou linfócitos T.
Blastócitos  geralmente  são  indicativos  de  neoplasia  de  célula  hematopoética,  se  reproduzíveis  ou  presentes  em  grande  quantidade.  Pode­se  tentar  a  identificação  de  sua  linhagem  com  base  em  critérios  morfológicos,  porem  há
necessidade de exame citométrico para identificar a linhagem.
Um  distúrbio  autossômico  recessivo  em  gatos  da  raça  Birman  resulta  em  finos  grânulos  eosinofílicos  intracitoplasmáticos  nos  neutrófilos,  os  quais  podem  ser  confundidos  com  granulação  tóxica.  Esses  gatos  apresentam  função
neutrofílica normal, e considera–se que essa anomalia seja um achado casual.
Síndrome de Chédiak­Higashi (p. 27) é uma anomalia autossômica recessiva que envolve grânulos lisossomais, descrita em gatos da raça Persa, pessoas, martas, raposas, bovinos das raças Hereford e Brangus, camundongos e orcas. Há
hiperfusão  de  grânulos,  resultando  em  grandes  inclusões  citoplasmáticas  eosinofílicas.  Notam­se  maior  suscetibilidade  a  infecções  bacterianas  e  maior  predisposição  a  hemorragia  decorrente  de  defeitos  na  função  dos  neutrófilos  e
das plaquetas e albinismo oculocutâneo parcial por conta da distribuição anormal de melanina. No entanto, os gatos podem manter saúde razoável.
Mucopolissacaridioses são  um  grupo  de  anormalidades  de  armazenamento  lisossômico  no  qual  há  defeito  na  degradação  de  glicosaminoglicanos.  Os  neutrófilos  e  os  linfócitos  contêm  acúmulo  de  mucopolissacarídio  na  forma  de
grânulos intracitoplasmáticos de cor púrpura ou metacromáticos. Os linfócitos também podem apresentar vacúolos. Esses distúrbios estão associados a diversas anormalidades clínicas sistêmicas e são vistos em cães e gatos.
Outro grupo de anormalidades de armazenamento lisossômico detectado em cães e gatos pode resultar em vacúolos citoplasmáticos, predominantemente nos linfócitos e, ocasionalmente, nos neutrófilos. Essas anormalidades incluem
gangliosidoses, a­manosidose, variantes da doença de Niemann­Pick, deficiência de lipase ácida e fucosidose. A maioria desses distúrbios ocasiona graves anormalidades neurológicas progressivas decorrentes do acúmulo de produtos no
tecido neuronal.
Em grandes animais, a intoxicação por astrágalo é considerada uma forma de defeito de armazenamento lisossômico adquirido. Ela deve­se ao princípio tóxico da planta que inibe uma ou mais enzimas que participam do metabolismo
de oligossacarídios. Isso pode resultar na vacuolização de linfócitos.
Anomalia de Pelger­Huët é um defeito na hipossegmentação nuclear de granulócitos que acomete pessoas, gatos, coelhos e cães heterozigotos para a anomalia. Os neutrófilos apresentam função normal e quase não se nota segmentação
nuclear. A maioria ou todos os neutrófilos assemelham­se a bastonetes e metamielócitos. Assim, no leucograma normal, pode parecer que há marcante desvio à esquerda. Os animais heterozigotos acometidos são clinicamente normais; a
transmissão da característica de homozigoto é letal.
Hipersegmentação é um grau maior de segmentação nuclear, resultando em múltiplos lobos conectados por filamentos nucleares. É uma indicação inespecífica de maior permanência da célula no sangue; representa o envelhecimento
normal das células. Isso pode ser notado em leucogramas de animais tratados com esteroides.
A  aglutinação  leucocitária  pode  afetar  neutrófilos  ou  linfócitos.  No  exame  microscópico  em  baixo  aumento,  ela  é  visualizada  como  agregados  de  5  a  15  leucócitos  firmemente  agrupados.  Aglutinação  marcante  pode  resultar  em
diminuição acentuadamente falsa da contagem total de leucócitos em alguns citômetros. Isso possivelmente se deve à presença de uma aglutinina fria de ocorrência natural eficiente apenas in vitro, em temperatura de laboratório. Não há
relevância clínica conhecida.
Ocasionalmente, notam­se inclusões de agentes infecciosos. Inclusões do vírus da cinomose canina podem ser verificadas em neutrófilos, monócitos e linfócitos, bem como em hemácias recentemente produzidas. Na erliquiose, em
várias espécies animais, e na hepatozoonose canina, é possível notar inclusões citoplasmáticas dos respectivos microrganismos causadores dessas enfermidades transmitidas por carrapatos.

Padrões de Interpretação do Leucograma
O leucograma anormal é tipicamente interpretado em um dos vários padrões, cada um dos quais podendo consistir em mais de uma anormalidade na contagem diferencial. Alguns padrões também podem estar associados a alterações
concomitantes nas hemácias e nas plaquetas. A seguir, são descritas importantes diferenças nas respostas leucocitárias das espécies.
RESPOSTA AO ESTRESSE OU INDUZIDA POR CORTICOSTEROIDES:  Essa provavelmente seja a resposta leucocitária mais comum. O tratamento com corticosteroide exógeno ou sua liberação endógena resulta em leucograma com múltiplas
alterações. Linfopenia é a alteração mais consistente e geralmente é acompanhada de neutrofilia madura. Esperam­se alterações como monocitose e eosinofilia, porém são mais variáveis. Neutrofilia deve­se à menor adesão da célula ao
endotélio  vascular,  fato  que  inibe  sua  marginação  e  prolonga  o  tempo  de  circulação.  Como  resultado,  os  neutrófilos  podem  se  tornar  hipersegmentados.  Também,  pode  haver  maior  liberação  de  neutrófilos  pela  medula  óssea.  Com
frequência, essa resposta é erroneamente interpretada como inflamatória.
EXCITAÇÃO OU REAÇÃO À EPINEFRINA:  Leucocitose pode ser decorrência de exercício ou de excitação; essa resposta é induzida pelo aumento do teor de epinefrina, que provoca a transferência de leucócitos marginais para o compartimento
circulante. O efeito da excitação pode duplicar a contagem de leucócitos em minutos. Além disso, a contração esplênica libera leucócitos e hemácias na circulação periférica. Em geral, a leucocitose deve­se à neutrofilia madura, sem desvio
à  esquerda.  Também,  pode  ocorrer  linfocitose,  especialmente  em  equinos  e  gatos  jovens.  O  efeito  em  gatos  é  frequentemente  detectado  na  forma  de  linfocitose  evidente  –  tão  elevada  quanto  o  dobro  do  limite  superior  da  faixa  de
normalidade. A resposta à excitação é relativamente rara em cães.
REAÇÃO INFLAMATÓRIA:  A resposta dos neutrófilos sanguíneos à doença inflamatória é altamente variável e dinâmica. É melhor considerada como um equilíbrio entre o consumo tecidual e a produção de neutrófilos na medula óssea, em
todas as fases da resposta. Entre as espécies, há importantes diferenças nesse equilíbrio, as quais estão relacionadas com a reserva orgânica de neutrófilos e com a capacidade proliferativa da medula.
No início da resposta inflamatória, a medula óssea reage mediante a liberação de sua reserva de neutrófilos em estágio final de maturação ao sangue, inclusive as células mais jovens que acompanham o desvio à esquerda. Se, na fase
aguda, o consumo de neutrófilos exceder a liberação da medula, ocorre neutropenia com marcante desvio à esquerda. Em cães e gatos, isso indica lesão inflamatória bastante intensa que, historicamente, é denominada desvio à esquerda
degenerativo. No entanto, classificação absoluta de “degenerativo” não deve ser enfatizada na interpretação. O mais importante é que a neutropenia com desvio à esquerda deve ser prontamente considerada uma grave doença inflamatória
em cães e gatos.
Subsequentemente, demora 2 a 4 dias para a medula acelerar a produção de neutrófilos mediante maior ingresso de células–tronco e expansão de estágios proliferativos que suprem os estágios de maturação e aumentam a liberação de
neutrófilos no sangue. Em cães, espera­se neutrofilia discreta a moderada na fase aguda da resposta inflamatória, com desvio à esquerda proporcional à intensidade da demanda.
Após alguns dias, verifica­se produção acelerada de neutrófilos. A neutrofilia pode aumentar e ser acompanhada de desvio à esquerda e alteração tóxica. À medida que a inflamação se torna crônica, o equilíbrio entre maior produção
medular e consumo de células pode favorecer o desenvolvimento de neutrofilia de maior magnitude. A forma mais crônica, instalada há semanas ou meses, é considerada uma reação inflamatória de “cavidade fechada”. A lesão torna­se um
tanto encapsulada e, assim, consome menos neutrófilos, ainda que estimule a produção máxima da medula. Bons exemplos de inflamação de cavidade fechada são piometra, em cadelas, e reticuloperitonite traumática (doença do corpo
estranho metálico), em vacas. Nesses casos, a magnitude da contagem total de leucócitos pode ser tão elevada quanto 100.00 células/μL de sangue, em cães, decorrente de neutrofilia.
Ao contrário da resposta inflamatória em cães, nos bovinos e na maioria dos outros ruminantes há uma reserva relativamente baixa de neutrófilos na medula e menor capacidade para acelerar a granulopoese. Isso se reflete em uma
contagem  relativamente  baixa  de  neutrófilos  no  sangue  de  ruminantes.  Como  resultado,  a  inflamação  aguda  em  vacas  caracteriza­se  por  neutropenia,  que  pode  ser  marcante.  Portanto,  em  bovinos  a  neutropenia  não  revela  o  grau  de
gravidade da inflamação. Após vários dias, a resposta da medula pode estabelecer o retorno de neutrófilos ao sangue, em quantidade moderada, caracterizada por marcante desvio à esquerda e alteração tóxica. Isso pode permitir a definição
de desvio à esquerda degenerativo, mas não é possível definir a gravidade da inflamação em bovinos. Lesões inflamatórias crônicas de cavidade fechada estão associadas a neutrofilia que raramente excede 25.000 neutrófilos/μL de sangue.
Gatos e equinos apresentam resposta intermediária; quanto à resposta inflamatória, os gatos parecem­se mais aos cães, e os equinos parecem­se mais com os bovinos. Os suínos manifestam resposta inflamatória semelhante àquela de
cães.
No padrão inflamatório, é possível haver monocitose em qualquer estágio de sua evolução. Monocitose é mais provável e de maior magnitude quando a doença se torna crônica.
PADRÕES INFLAMATÓRIO E ESTEROIDE COMBINADOS:  Doenças inflamatórias comumente induzem uma resposta esteroide endógena concomitante, identificada pela presença de linfopenia associada a um padrão inflamatório neutrofílico.
A resposta neutrofílica à inflamação predomina e pode ser aditiva à influência dos esteroides nos neutrófilos.
LINFOCITOSE:  Linfocitose moderada, na faixa de 7.000 a 20.000/μL, deve ser prontamente considerada possível resposta à excitação, particularmente em gatos. Caso tal condição seja excluída, deve­se considerar a possibilidade de distúrbio
linfoproliferativo. Se o exame morfológico dos linfócitos revelar prolinfócitos e/ou blastócitos, deve­se considerar leucemia linfocítica na interpretação. Quando as células se apresentam pequenas e com cromatina de aparência normal, a
possibilidade  de  leucemia  linfocítica  crônica  deve  ser  considerada  na  lista  de  diagnósticos.  A  erliquiose  crônica  pode  resultar  em  linfocitose  de  tal  magnitude  em  cães.  Em  valor  mais  elevado,  a  linfocitose  pode  ser  considerada  como
evidência conclusiva de leucemia.
PADRÃO DE DANO À CÉLULA­TRONCO E PANCITOPENIA:  Vários fatores podem provocar dano reversível ou irreversível à célula­tronco. Essas anormalidades interferem na produção de células eritroides, plaquetas, linfócitos e granulócitos.
Neutropenia  frequentemente  é  a  primeira  anormalidade  observada  em  razão  de  seu  breve  tempo  na  circulação.  Quando  crônico  ou  irreversível,  esse  dano  resulta  na  diminuição  das  três  principais  linhagens  de  células  do  sangue,  e  o
hemograma revela leucopenia, anemia não regenerativa e trombocitopenia. Os fatores etiológicos incluem: 1) sobredose de radiação e de medicamentos antineoplásicos; 2) intoxicação por medicamentos ou plantas (p. ex., intoxicação por
estrógenos em cães, intoxicação por broto de samambaia em bovinos, intoxicação por fenilbutazona, exceto em equinos); 3) neoplasia de célula hematopoética envolvendo a medula óssea (mieloftise) e 4) infecções virais que lesionam
células capazes de se multiplicar rapidamente e que podem causar neutropenia transitória (Tabela 3).
EOSINOFILIA E BASOFILIA:  Eosinofilia ou a combinação de eosinofilia e basofilia prontamente faz pensar nas seguintes possibilidades, na abordagem e na interpretação do caso: inflamação secundária à reação alérgica, infestação parasitária,
inflamação subepitelial (pele, tratos respiratório e gastrintestinal), possivelmente de natureza alérgica e indução paraneoplásica, quando se excluem as causas comuns. A maioria dos cães com dirofilariose pode apresentar eosinofilia, bem
como cães e gatos infestados por pulgas.
METARRUBRICITOSE MARCANTE:  Ocasionalmente, o metarrubrícito torna­se componente importante na fração total de células nucleadas. A magnitude pode corresponder a 10 a 50% da população de células nucleadas, ou mais, com números
absolutos de 5.000 a 10.000/μL. Isso pode ocorrer raramente nas fases iniciais de uma resposta regenerativa intensa. Também, pode estar associada a lesão endotelial (p. ex., termoplegia), resultando em taxa de liberação anormal de nHe
pela medula. Nos hemocitômetros que fornecem contagem diferencial das células, a maior parte das hemácias é contada como se fossem linfócitos. Isso pode ocasionar um resultado preliminar de linfocitose, que é esclarecido apenas no
exame da população de linfócitos no esfregaço sanguíneo.
Tabela 3 – Infecções virais que podem causar neutropenia transitória

Espécie Infecção

Cães Parvovírus
Cinomose canina (fase aguda)
Gatos Parvovírus (panleucopenia do gato)
Vírus da leucemia felina
Equinos Influenza equina
Arterite viral equina (fase aguda)
Herpes­vírus equino
Gado Diarreia viral bovina
Suínos Vírus dxa febre suína clássica
Vírus da febre suína africana

NEOPLASIA DE CÉLULA HEMATOPOÉTICA E LEUCEMIA:  A maioria dos casos de neoplasia de célula hematopoética de origem linfoide ou da medula óssea é acompanhada de alguma quantidade de células anormais no sangue. Às vezes, nota­se
pequena quantidade de células neoplásicas detectadas somente no exame microscópico do esfregaço sanguíneo em pequeno aumento. Achados anormais de pequena quantidade de células hematopoéticas precursoras no sangue induzem ao
exame da medula e/ou de outros tecidos hematoipoéticos para avaliação de possível envolvimento de doença neoplásica.
O extremo oposto é leucocitose marcante com predominância de população celular anormal (neoplásica). Nessa situação, o exame de sangue tem valor diagnóstico para leucemia. Quando pouco diferenciadas, as células são classificadas
como blastócitos, com possível linhagem celular, com base nas suas características morfológicas. Quando bem diferenciadas, geralmente os aspectos morfológicos das linhagens celulares são mais definidos.
Tem­se obtido progresso considerável no uso de anticorpos monoclonais marcados e exame citométrico para melhor estabelecer a linhagem celular, particularmente quando a morfologia não é definida. Isso é especialmente útil nas
leucemias pouco diferenciadas, nas quais apenas a análise morfológica não é confiável. Pode ser difícil a distinção entre leucemia mielógena crônica ou bem diferenciada e leucocitose neutrofílica extrema.

ERITROCITOSE E POLICITEMIA

Eritrocitose é o aumento relativo ou absoluto da quantidade de hemácias circulantes, resultando em aumento do VG acima da faixa de variação normal. Policitemia é um termo frequentemente utilizado como sinônimo de eritrocitose;
contudo, policitemia pode implicar leucocitose e trombocitose, bem como eritrocitose.

ERITROCITOSE RELATIVA
É o aumento da quantidade de hemácias, sem aumento da massa eritrocitária total. Em geral, é decorrente da perda de volume plasmático e consequente hemoconcentração, como acontece na desidratação grave que ocorre em casos de
vômito e diarreia. Pode­se notar também uma forma transitória de eritrocitose relativa discreta não assintomática em cães quando reações ao medo ou excitação provocam contração esplênica com liberação de hemácias na circulação
sanguínea.

ERITROCITOSE ABSOLUTA
É  definida  como  o  aumento  da  quantidade  de  hemácias  por  conta  do  aumento  da  massa  eritrocitária;  a  causa  pode  ser  primária  ou  secundária.  Eritrocitose  primária  (policitemia  vera)  é  uma  doença  mieloproliferativa  de  causa
desconhecida relatada em cães, gatos, bovinos e equinos. A produção de hemácias aumenta acentuadamente, enquanto a atividade sérica de eritropoetina (EPO) tipicamente é baixa ou no menor valor da faixa de normalidade. Eritrocitose
secundária, ao contrário, deve­se, em geral, à produção excessiva de EPO. Quando a EPO é secretada por causa da hipoxia sistêmica, a eritrocitose resultante é uma resposta compensatória adequada. Isso pode ser notado no caso de doença
pulmonar  grave  ou  anomalia  cardíaca,  resultando  em  desvio  (shunt)  de  sangue  do  lado  direito  para  o  esquerdo,  com  passagem  secundária  aos  pulmões  (p.  ex.,  persistência  do  ducto  arterioso  reverso,  tetralogia  de  Fallot).  Caso  ocorra
aumento da produção de EPO sem hipoxia sistêmica, então a resposta é inadequada. Tumores secretores de EPO, nos rins ou em outros órgãos, ou lesões renais não neoplásicas que resultam em hipoxia local com produção de EPO podem
provocar  eritrocitose  inapropriada.  Outro  tipo  de  eritrocitose  secundária,  denominada eritrocitose  associada  à  endocrinopatia,  não  é  causada  pela  EPO,  e  sim  por  outros  hormônios  (p.  ex.,  cortisol,  andrógeno,  tiroxina,  hormônio  do
crescimento) que estimulam a eritropoese. A discreta eritrocitose verificada em cães com hiperatividade adrenocortical ou em gatos com hipertireoidismo ou acromegalia não é suficiente para ocasionar sinais clínicos.

ACHADOS CLÍNICOS
Os sintomas de eritrocitose absoluta incluem membranas mucosas avermelhadas, tendências a sangramento, poliúria, polidipsia e anormalidades neurológicas (ataxia, fraqueza, convulsões, cegueira, alterações de comportamento). Podem­
se visualizar, mediante exame de retina, vasos tortuosos dilatados. Esses achados clínicos são atribuídos à hiperviscosidade decorrente do aumento da massa eritrocitária.
DIAGNÓSTICO
Na  eritrocitose  relativa,  a  desidratação  e  a  hemoconcentração  podem  ser  detectadas  com  base  nos  achados  clínicos  (perda  da  umidade  das  membranas  mucosas,  ausência  de  turgor  cutâneo),  nos  resultados  de  exames  laboratoriais
(hiperproteinemia, azotemia pré­renal) e na resposta à reidratação. Os cães indóceis com eritrocitose discreta atribuída à contração esplênica costumam apresentar VG normal nas amostras de sangue coletadas subsequentemente em situação
de menos estresse. Animais de raças Sighthound (p. ex., Greyhound) normalmente apresentam ligeira eritrocitose, com base na faixa de variação normal de referência para cães.
Na eritrocitose absoluta, recomenda­se a determinação da concentração sérica de EPO para verificar se a causa é primária ou secundária. Infelizmente, há considerável sobreposição dos valores de EPO em animais normais e naqueles
com eritrocitose primária e secundária. Ademais, atualmente há disponibilidade limitada de testes validados para EPO para animais de companhia. Exame de rotina de medula óssea não tem valor na diferenciação de eritrocitose primária de
secundária, pois ambas as condições são acompanhadas de hiperplasia eritroide. Em consequência disso, em geral a eritrocitose primária é diagnosticada mediante a exclusão de causas secundárias.
A determinação da oxigenação tecidual pode ser útil na pesquisa dos tipos de eritrocitose secundária. Valor de pO2 do sangue arterial < 80 mmHg e saturação de oxigênio verificada na oximetria de pulso < 90 a 95% são compatíveis com
hipoxemia e hipoxia tecidual decorrente de eritrocitose secundária apropriada. Exame de coração e pulmões por meio de auscultação, radiografias, eletrocardiografia e ecocardiografia pode revelar a causa primária. Pode ser necessário
angiografia seletiva ou ecoaortrografia contrastada a fim de confirmar desvio (shunt) cardíaco da direita para a esquerda. Não havendo hipoxia sistêmica, a localização da fonte potencial de produção inapropriada de EPO é facilitada por
exames físico e neurológico, ultrassonografia abdominal, urografia IV e tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM).

TRATAMENTO
Na eritrocitose relativa decorrente de desidratação, a terapia consiste em reidratação com fluidos IV e tratamento da causa primária.
O tratamento inicial para policitemia vera c?onsiste em flebotomia (5 a 20 mL/kg para reduzir o VG para cerca de 50 a 60%), com reposição de fluido simultânea. Tem­se recomendado flebotomia periódica, com ou sem administração de
hidroxiureia (30 mg/kg/dia VO, por 7 a 10 dias, seguida de ajuste para 15 mg/kg/dia VO), aos cães e aos gatos acometidos. Durante o tratamento com hidroxiureia, devem ser monitoradas as contagens de hemácias, leucócitos e plaquetas.
Na eritrocitose secundária inapropriada, os tumores secretores de EPO devem ser tratados por meio de cirurgia, quimioterapia ou radioterapia. A flebotomia, para normalizar o VG, ajuda a reduzir a hiperviscosidade.
Na eritrocitose secundária apropriada, a causa primária deve ser tratada. Caso o tratamento corretivo da enfermidade não seja exequível, podem­se aliviar os sinais clínicos associados à hiperviscosidade mediante flebotomia criteriosa (5
a 10 μL/kg) e terapia com hidroxiureia. No entanto, como esse tipo de eritrocitose é uma resposta compensatória à hipoxia, o VG deve ser mantido em valor acima da faixa de variação normal.

GRUPOS SANGUÍNEOS E TRANSFUSÕES

Os grupos sanguíneos são determinados por componentes antigênicos polimórficos da membrana da hemácia, geneticamente controlados. Os produtos de alelos de um locus genético particular são classificados como sistemas de grupo
sanguíneo. Alguns desses sistemas são muito complexos, com vários alelos definidos em um locus; outros consistem em um único antígeno. Os sistemas de grupos sanguíneos, em geral, são independentes entre si, e sua herança considera a
dominância mendeliana. No caso dos sistemas de grupos sanguíneos polimórficos, geralmente o animal herda um alelo de cada pai e, consequentemente, expressa não mais que dois antígenos de grupos sanguíneos de um determinado
sistema. Uma exceção ocorre em bovinos, que herdam alelos múltiplos ou “fenogrupos”. Normalmente, um indivíduo não possui anticorpos contra qualquer um dos antígenos presentes em suas próprias hemácias ou contra outros antígenos
de grupo sanguíneo dos sistemas dessa espécie, a menos que tenham sido induzidos por transfusão, prenhez ou imunização. Em pessoas e em alguns animais (ovinos, vacas, suínos, equinos, gatos e cães), é possível verificar isoanticorpos
considerados “de ocorrência natural”, não induzidos por transfusão ou prenhez, com títulos variáveis, porém detectáveis. Por exemplo, gatos do grupo B com anticorpos anti­A de ocorrência natural. Também, os anticorpos circulantes
contra antígenos de grupos sanguíneos de animais podem ser induzidos por transfusão. Nas transfusões sanguíneas aleatórias em cães, o risco de sensibilização do receptor é de 30 a 40%, principalmente ao grupo sanguíneo DEA 1. Nos
equinos, pode ocorrer imunização transplacentária da égua por um antígeno fetal incompatível herdado do pai. A imunização também pode ocorrer quando se utilizam alguns produtos sanguíneos homólogos, como vacinas (p. ex., contra
anaplasmose, em bovinos).
O número dos principais sistemas de grupos sanguíneos reconhecidos (Tabela 4) varia entre as espécies de animais domésticos, sendo os bovinos os mais complexos e os gatos os mais simples. Em animais, deve­se realizar a tipagem dos
grupos sanguíneos a fim de auxiliar na comparação de doadores e receptores e identificar os pares de reprodutores com risco potencial de transmitir doença hemolítica a suas crias. Como a expressão de antígenos de grupos sanguíneos é
geneticamente  controlada  e  os  modos  de  herança  são  conhecidos,  esses  sistemas  também  podem  ser  utilizados  para  comprovar  a  qualidade  racial  da  prole  de  bovinos  e  equinos;  no  entanto,  na  maioria  dos  casos,  o  teste  de  ácido
desoxirribonucleico (DNA) substitui a tipagem sanguínea como teste de paternidade.

Tipagem Sanguínea
Os antissoros utilizados para identificar os grupos sanguíneos (reagentes de tipagem) geralmente são produzidos como soros isoimunes. Suas características sorológicas in vitro variam com a espécie. Muitos reagentes são hemaglutininas;
outros são hemolíticos e requerem um complemento para completar a reação sorológica, como no caso dos bovinos (porque as hemácias não se aglutinam facilmente) e equinos (nos quais o empilhamento de hemácias é um problema).
Outros  reagentes  de  tipagem,  não  hemaglutinantes  ou  hemolíticos,  combinam­se  com  os  antígenos  das  hemácias  em  uma  reação  “incompleta”,  porque  necessitam  de  sítios  de  combinação  adicionais  para  aglutinar  outras  hemácias;  é
necessária a adição de antiglobulinas espécie­específicas para a aglutinação.
Tabela 4 – Principais grupos sanguíneos de interesse clínico

Espécies Grupo sanguíneo

Canina DEA 1.1 e 7
Felina A, B, mic
Equina A, C, Q

Bovina B, J
Ovina B, R

A diversidade de grupos sanguíneos nos animais e a falta de reagentes para tipagem sanguínea disponíveis no mercado dificultam a realização de testes completos de tipagem e de reação cruzada, mas não devem impedir o uso clínico das
transfusões. Em equinos e cães, os antígenos de grupos sanguíneos mais comumente envolvidos na ocorrência de incompatibilidade à transfusão são conhecidos. A seleção de animais doadores que não apresentam esses grupos ou que são
semelhantes àquele do receptor pode minimizar o risco de sensibilização do receptor aos principais antígenos.

Reação Cruzada
A possibilidade de identificação dos antígenos de grupos sanguíneos em um receptor potencial de transfusão é limitada pela disponibilidade de reagentes para cada antígeno, para cada espécie. Apenas há disponibilidade de reagentes para
alguns antígenos, geralmente aqueles que muito provavelmente sensibilizam um receptor, ou aqueles para os quais pode haver anticorpos de ocorrência natural. Por exemplo, os cães apresentam mais de 12 sistemas de grupos sanguíneos,
mas, em geral, faz­se a tipagem apenas de um (DEA 1.1). Recentemente, descobriu­se um antígeno de grupo sanguíneo adicional (dal) quando uma cão da raça Dálmata dal­negativo reagiu a vários doadores potenciais, sendo apenas alguns
animais da raça Dálmata compatíveis. É um antígeno comum à maioria dos cães, mas não observado em alguns cães da raça Dálmata. Como há múltiplos antígenos de grupos sanguíneos, é provável que um animal que receba transfusão
seja exposto a alguns antígenos não presentes em suas hemácias.
Receptores  previamente  sensibilizados  podem  ser  identificados  por  meio  do  teste  de  reação  cruzada,  realizado  com  o  intuito  de  evitar  a  administração  de  sangue  incompatível.  Nos  EUA,  mais  de  99%  dos  gatos  apresentam  grupo
sanguíneo tipo A; assim, é baixo o risco de transfusão incompatível. No entanto, algumas raças, incluindo Abissínio, Birman, Bristish Shorthair, Devon Rex, Himalaia, Persa, Scottish Fold e Somali, apresentam maior frequência de grupo
sanguíneo  tipo  B.  Qualquer  transfusão  incompatível  em  gatos  ocasiona  rápida  destruição  das  células  transfundidas;  desse  modo,  antes  de  qualquer  transfusão,  devem  ser  realizadas  tipagem  e  teste  de  reação  cruzada.  Um  antígeno
recentemente identificado em gatos (mic) está presente em alguns deles; em gatos que não apresentam o antígeno mic, notam­se anticorpos de ocorrência natural. Por essa razão, antes da primeira transfusão em gatos, deve­se realizar o teste
de reação cruzada, mesmo que recebam sangue compatível A ou B.
O teste de reação cruzada direta, com controle apropriado, é efetivo em todas as espécies. A reação cruzada principal ou maior detecta anticorpos já presentes no plasma do receptor que podem induzir reação hemolítica quando se faz
transfusão de hemácias do doador; não detecta o risco de ocorrência de sensibilização. Adiciona­se um anticoagulante (citrato ou edetato de cálcio dissódico) nas amostras de sangue do doador e do receptor; as hemácias do doador devem
ser lavadas com solução salina a 0,9%, por três vezes, obtendo­se uma suspensão de hemácias a 4% em solução salina, com as células lavadas. A reação cruzada principal consiste na combinação de iguais volumes (0,1 mL) de suspensão de
hemácias do doador e plasma do receptor. O tubocontrole contém hemácias e plasma do receptor. As amostras são incubadas, centrifugadas e avaliadas quanto à hemólise ou à aglutinação. A hemólise é avaliada comparando­se a cor do
sobrenadante  da  amostra­teste  com  aquela  da  amostra­controle.  Em  seguida,  cada  amostra  é  agitada  cuidadosamente  até  que  todas  as  células  precipitadas  misturem­se  novamente  à  suspensão.  Novamente,  deve­se  comparar  o  grau  de
aglutinação celular da amostra­teste com aquele da amostra­controle. O teste é considerado negativo, ou compatível, quando o plasma apresenta­se claro e as hemácias são suspensas rapidamente. O teste positivo, ou incompatível, pode
mostrar hemólise e/ou hemaglutinação. Todos os testes considerados macroscopicamente negativos para hemaglutinação devem ser confirmados no exame microscópico, em pequeno aumento. Há disponibilidade de alguns sistemas de
reação cruzada mais modernos que utilizam técnica com gel. Isso é particularmente importante em equinos, pois suas hemácias tendem a se empilhar.
A reação cruzada menor é  o  inverso  da  reação  cruzada  principal,  ou  seja,  as  células  do  receptor  combinam­se  com  o  plasma  do  doador.  A  reação  cruzada  menor  é  importante  apenas  nas  espécies  que  apresentam  isoanticorpos  de
ocorrência natural ou quando o doador recebeu transfusão prévia ou em éguas com prenhez anterior.

Transfusões Sanguíneas
Com frequência, a necessidade de transfusão sanguínea é emergencial, como no caso de hemorragia ou hemólise aguda; as transfusões também são indicadas para o tratamento de anemias agudas ou crônicas. Geralmente os animais com
distúrbios hemostáticos necessitam de repetidas transfusões de sangue total, hemácias, plasma ou plaquetas. A transfusão sanguínea deve ser realizada com cuidado por conta do risco de reações adversas no receptor.
Com frequência, o sangue total não é o produto ideal a ser administrado. Quando há necessidade de restabelecer a capacidade de transporte de oxigênio do sangue, a transfusão de hemácias é mais apropriada; caso haja necessidade de
reposição da volemia, podem–se utilizar soluções cristaloides ou coloides, adicionando­se solução de hemácias, quando indicado. A quantidade de plaquetas aumenta rapidamente após hemorragia, sendo raramente necessária sua reposição.
As concentrações de proteínas plasmáticas equilibram­se com aquelas do espaço intersticial, não sendo necessário o uso de plasma, exceto no caso de hemorragia grave (> 1 volume do sangue em 24 h). Os animais que necessitam de fatores
de coagulação beneficiam­se mais com a administração de plasma congelado fresco ou crioprecipitado, se a necessidade for especificamente do fator VIII, do fator de von Willebrand ou de fibrinogênio. Os concentrados de plaquetas ou o
plasma rico em plaquetas podem ser úteis no caso de trombocitopenia, embora a trombocitopenia imunomediada geralmente não responda à administração de plaquetas, porque essas células são rapidamente removidas pelo baço.
A  decisão  sobre  a  realização  de  transfusão  de  hemácias  baseia­se  nos  sinais  clínicos  manifestados  pelo  paciente,  não  pelo  volume  globular  (VG)  pré­estabelecido.  Os  animais  com  anemia  aguda  apresentam  fraqueza,  taquicardia  e
taquipneia em VG mais elevado do que aquele de animais com anemia crônica. A quantidade de hemácias necessária para melhorar os sinais clínicos geralmente aumenta o VG em mais de 20%. O volume de sangue em animais domésticos
corresponde a 7 a 9% de seu peso corporal; em gatos, o volume é ligeiramente menor, ao redor de 6,5%. Pode­se calcular o volume de reposição de hemácias necessário por meio da determinação do volume sanguíneo do receptor e do
conhecimento do VG do animal. Por exemplo, o volume de sangue total de um cão de 25 kg é cerca de 2.000 ?mL; com VG de 15%, o volume de hemácias é 300 mL; caso o VG aumente em 20%, tem­se um volume de hemácias de 400
mL. Portanto, são necessários 100 mLde hemácias ou 200 mLde sangue total (com VG de 50%) para aumentar o VG do receptor para um percentual desejado. Esses cálculos não consideram nenhuma perda simultânea de hemácias por
hemorragia ou hemólise. Não se recomenda coletar mais que 25% do sangue de um animal doador, em cada vez.
Coleta, armazenamento e transfusão de sangue devem ser procedimentos assépticos. O anticoagulante de escolha é adenina­dextrose­fosfato­citrato (CPDA­1). No mercado, há disponibilidade de bolsas de sangue que contêm quantidade
apropriada de anticoagulante para uma “unidade” (500 mL). Não se deve utilizar heparina como anticoagulante, pois sua meia­vida é mais longa no receptor e causa ativação plaquetária; ademais, o sangue heparinizado não pode ser
armazenado.
O  sangue  coletado  em  CPDA­1,  com  a  solução  de  nutriente  Adsol,  pode  ser  armazenado  seguramente  em  temperatura  de  4°C,  durante  4  semanas.  Caso  esse  sangue  não  seja  utilizado  imediatamente,  o  plasma  pode  ser  removido  e
congelado para uso posterior como fonte de fatores de coagulação ou de albumina, nos casos de hipoalbuminemia aguda reversível. O plasma deve ser congelado a –20 a –30°C, dentro de 6 h após a coleta, a fim de assegurar que o teor do
fator de coagulação VIII permaneça adequado durante 1 ano. A hipoproteinemia crônica não melhora com a administração de plasma, pois o déficit corporal total de albumina é tão grande que pode não se alterar com a pequena quantidade
da proteína presente no plasma. Soluções coloides, como hetamilo, são mais efetivas no tratamento de hipoalbuminemia. Albumina humana foi utilizada em cães; no entanto, o risco de reação alérgica ou de sensibilização é significante.
RISCOS DA TRANSFUSÃO:  O risco mais sério da transfusão é hemólise aguda. Felizmente, isso é raro em animais domésticos. Os cães raramente apresentam teor de anticorpos pré­formados clinicamente relevantes, de forma que somente os
que receberam repetidas transfusões apresentam risco. A reação hemolítica mais comum nos cães que receberam transfusões múltiplas é hemólise retardada, clinicamente notada como menor sobrevida das hemácias transfundidas e teste de
Coombs positivo. Mesmo as hemácias consideradas compatíveis no teste de reação cruzada, administradas a equinos ou bovinos, permanecem viáveis por apenas 2 a 4 dias. Transfusões repetidas podem causar hemólise aguda. Dentre as
causas não imunes de hemólise, incluem­se coleta ou separação inapropriada do sangue, congelamento ou superaquecimento das hemácias e infusão sob pressão com agulha de pequeno calibre.
Outras  complicações  incluem  sepse  decorrente  da  transfusão  de  sangue  contaminado,  hipocalcemia  causada  por  excesso  de  citrato  e  hipervolemia  (especialmente  em  animais  com  doença  cardíaca  preexistente  ou  naqueles  muito
pequenos). Ocasionalmente, notam­se urticária, febre ou vômito. Por meio de transfusão, também se pode transmitir doença do doador para o receptor, como hemoparasitos (p. ex., Mycoplasma em gatos ou Babesia em cães) e vírus (p. ex.,
retrovírus em gatos, equinos ou bovinos). Outras doenças, como aquelas causadas por riquétsias ou outras bactérias, também podem ser transferidas quando o doador apresenta bacteriemia.

Substitutos do Sangue: Soluções Carreadoras de Oxigênio que Contêm Hemoglobina
Em razão dos problemas associados à dificuldade de encontrar doadores compatíveis e com a transmissão de doença durante a transfusão, continuamente têm­se realizado pesquisas relacionadas com a obtenção de substituto de hemácias há
mais de 50 anos. Um substituto do sangue deve transportar e liberar oxigênio à semelhança das hemácias, ser facilmente produzido em grande quantidade, não ter efeito antigênico e permanecer na circulação por tempo suficiente para a
renovação.
Recentemente foi aprovado um carreador de oxigênio que contém hemoglobina de origem bovina para uso em cães (Oxyglobin®). A hemoglobina é coletada assepticamente, filtrada de modo a remover todos os elementos do estroma das
hemácias  e  polimerizada  para  possibilitar  que  o  produto  permaneça  na  circulação  sanguínea  por  uma  meia­vida  aproximada  de  36  h.  Esse  produto  mostrou–se  eficiente  no  transporte  e  na  liberação  de  oxigênio,  pode  ser  utilizado
imediatamente sem necessidade de tipagem ou teste de reação cruzada e tem vida útil de 3 anos em temperatura ambiente. Como a estrutura da molécula da hemoglobina é similar entre as espécies, o efeito antigênico da hemoglobina
bovina é mínimo. Embora atualmente aprovado apenas para uso em cães, tem sido utilizado em gatos, equinos, lhamas, aves e pessoas. Seu efeito coloidal é especialmente útil na reanimação após traumatismo com hemorragia aguda.
Em animais sadios, a hemoglobina das hemácias capta oxigênio dos pulmões e o deposita nos tecidos por meio da microcirculação capilar. Apenas uma pequena quantidade de oxigênio pode ser transportada dissolvida no plasma. No
animal anêmico, a hemoglobina contida na hemácia torna­se completamente saturada de oxigênio, mas a oxigenação tecidual é inadequada simplesmente porque há menor quantidade de hemácias. No caso de hipotensão, hipovolemia ou
isquemia tecidual localizada, a liberação de oxigênio pode ser adicionalmente prejudicada pela constrição ou diminuição da perfusão capilar. Caso se administre a solução de hemoglobina, o conteúdo de oxigênio do plasma melhora e a
distribuição de oxigênio é facilitada porque o oxigênio já está em contato com o endotélio e apenas tem que se difundir aos tecidos. Como a viscosidade do sangue é menor após a transfusão de hemoglobina, em comparação com o mesmo
volume  de  sangue,  a  perfusão  nos  pequenos  capilares  é  melhor.  Uma  preocupação  com  as  soluções  de  hemoglobina  é  que  o  óxido  nítrico  é  sequestrado  e  removido  pelo  produto.  Paradoxalmente,  isso  pode  provocar  vasoconstrição  e
diminuir a liberação de oxigênio aos tecidos isquêmicos.

HEMOPARASITOS

 ANAPLASMOSE
A  anaplasmose,  anteriormente  conhecida  como  doença  da  bile,  refere­se  tradicionalmente  a  uma  doença  de  ruminantes,  causada  por  uma  bactéria  intraeritrocitária  obrigatória  da  ordem  Rickettsiales,  família  Anaplasmataceae,
gênero Anaplasma. Bovinos, ovinos, caprinos, búfalos e alguns ruminantes selvagens podem ser infectados por Anaplasma eritrocítico. A anaplasmose ocorre em regiões tropicais e subtropicais (cerca de 40°N a 32°S), incluindo Américas
do Sul e Central, EUA, Sul da Europa, África, Ásia e Austrália.
O  gênero  Anaplasma  também  inclui  Anaplasma  phagocytophilum  (compilado  de  espécies  anteriormente  conhecidas  como  Ehrlichia  phagocytophila,E.  equi  e  agente  da  erliquiose  granulocítica  humana,  ver  p.  824),  A.
bovis (anteriormente E. bovis) e A. platys (anteriormente E. platys), os quais invadem as células do sangue de seus respectivos hospedeiros mamíferos. A anaplasmose bovina é de importância econômica na criação industrial de bovinos.
ETIOLOGIA:  A anaplasmose bovina clínica geralmente é causada por A. marginale. A. marginale com apêndice é denominado A. caudatum, mas não é considerada uma espécie diferente. Os bovinos também são infectados por A. centrale,
que geralmente resulta em uma doença discreta. A. ovis pode causar doença discreta a grave em ovinos, cervídeos e caprinos. Há relato recente de infecção de bovino por A. phagocytophilum; no entanto, a infecção natural é rara e não
provoca doença clínica.
TRANSMISSÃO E EPIDEMIOLOGIA:  Relata­se a existência de até 19 espécies de carrapatos (incluindo Boophilus, Dermacentor, Rhipicephalus, Ixodes, Hyalomma e Ornithodoros) que atuam como vetores na transmissão de Anaplasma spp.
Provavelmente, nem todas essas espécies são vetores importantes no campo; ademais, tem­se mostrado que cepas de A. marginale também  se  desenvolvem,  em  parte,  em  cepas  específicas  de  carrapatos.  As  espécies  de Boophilus  são
vetores importantes na Austrália e na África. Já as de Dermacentor são consideradas vetores importantes nos EUA. Depois de se alimentar de um animal infectado, pode ocorrer transmissão intra ou transestadial. Também pode haver
transmissão transovariana, embora raramente, mesmo nas espécies de Boophilus de um único hospedeiro. Há um ciclo de replicação no carrapato infectado. Em algumas regiões, ocorre transmissão mecânica pela picada de dípteros. Há
relato de transmissão transplacentária, geralmente associada a infecção aguda da mãe no segundo ou no terceiro trimestre de prenhez. A anaplasmose também pode se disseminar mediante o uso de agulhas ou de material de descorna ou
outros instrumentos cirúrgicos contaminados.
Há uma forte relação entre a idade dos bovinos e a gravidade da doença. Os bezerros são muito mais resistentes à doença (embora não à infecção) do que os bovinos mais velhos. Essa resistência não se deve a anticorpos colostrais
provenientes de mães imunes. Em áreas endêmicas, onde os bovinos primeiramente se infectam com A. marginale no início da vida, as perdas ocasionadas por anaplasmose são mínimas. Depois da recuperação da fase aguda da infecção, os
bovinos permanecem cronicamente infectados e portadores do parasito, mas, em geral, ficam imunes a uma doença clínica posterior. No entanto, esses bovinos cronicamente infectados podem manifestar recidiva de anaplasmose quando
imunodeprimidos (p. ex., pelo uso de corticosteroides), quando infectados por outros parasitos ou após esplenectomia. Os portadores atuam como reservatórios para transmissão posterior. Ocorrem perdas sérias quando os bovinos adultos,
não expostos previamente, são transferidos para áreas endêmicas ou para regiões endêmicas instáveis, quando as taxas de transmissão são insuficientes para infectar todos os bovinos antes que alcancem a idade adulta mais suscetível.
ACHADOS CLÍNICOS:  A  anaplasmose  geralmente  é  subclínica  em  animais  <  1  ano  de  idade,  sendo  moderadamente  grave  naqueles  com  1  a  2  anos  de  idade.  Já  em  animais  mais  velhos,  é  grave  e  frequentemente  fatal.  A  anaplasmose
caracteriza­se por anemia progressiva decorrente da destruição extravascular de hemácias infectadas ou não. O período pré­patente de A. marginale está relacionado diretamente com a dose infectante e, tipicamente, varia de 15 a 36 dias
(embora possa ser tão longo quanto 100 dias). Após o período pré­patente, pode ocorrer anaplasmose hiperaguda (mais grave, porém rara), aguda ou crônica. A riquetsemia duplica­se em intervalos de cerca de 24 h durante a fase de
crescimento exponencial. Geralmente, 10 a 30% das hemácias estão infectadas no pico da parasitemia, embora esse valor possa chegar a 65% ou mais. Os valores da contagem de hemácias, do VG e dos teores de hemoglobina diminuem
acentuadamente. Pode­se instalar anemia macrocítica com reticulócitos circulantes no estágio final da doença.
Os animais com infecção hiperaguda sucumbem dentro de algumas horas após o início dos sinais clínicos. Animais com infecção aguda depauperam­se rapidamente. A produção de leite diminui. Inapetência, incoordenação, insuficiência
respiratória quando submetidos a exercício e pulso rápido costumam tornar­se evidentes nos estágios finais. A urina pode tornar­se amarronzada; mas, diferentemente do que acontece na babesiose, não há hemoglobinúria. Próximo ao pico
de  parasitemia,  ocorre  resposta  febril  transitória,  com  temperatura  corporal  que  raramente  excede  41°C.  As  membranas  mucosas  tornam­se  pálidas  e  depois  amareladas.  As  vacas  prenhes  podem  abortar.  Os  bovinos  sobreviventes
convalescem por várias semanas, período no qual os parâmetros hematológicos retornam gradativamente ao normal.
As  raças  Bos  indicus  parecem  mais  resistentes  à  infecção  por  A.  marginale  do  que  as  raças  B.  taurus,  mas  se  nota  variação  da  resistência  entre  indivíduos  da  mesma  raça,  nas  duas  espécies.  Diferenças  na  virulência  entre  cepas
de Anaplasma e grau e duração da riquetsemia também estão envolvidos na gravidade das manifestações clínicas.
Lesões  São  típicas  daquelas  que  ocorrem  em  animais  com  anemia  causada  por  eritrofagocitose.  As  carcaças  de  bovinos  que  morrem  em  razão  de  anaplasmose  geralmente  apresentam  icterícia  e  palidez  acentuadas.  O  sangue  perde  a
viscosidade e torna­se aquoso. Tipicamente, há aumento e amolecimento do baço, com folículos proeminentes. O fígado pode apresentar aparência mosqueada e amarelo­alaranjada. Com frequência, a vesícula biliar distende­se e contém
bile espessa amarronzada ou verde. Os linfonodos hepáticos e mediastínicos tornam­se amarronzados. Notam­se efusões serosas nas cavidades corporais, edema pulmonar, hemorragias petequiais em epi e endocárdio e, com frequência,
evidência de estase gastrintestinal grave. No exame microscópico de órgãos reticuloendoteliais, nota­se fagocitose ampla e evidente de hemácias. Em geral, há uma quantidade significativa de hemácias parasitadas depois da morte causada
por infecção aguda.
DIAGNÓSTICO:  A. marginale, juntamente com os hemoprotozoários Babesia bovis e B. bigemina, é o microrganismo causador da febre do carrapato em bovinos. Essas três espécies de parasitos apresentam distribuição geográfica semelhante,
exceto nos EUA, onde se verifica anaplasmose na ausência de babesiose. O exame microscópico de esfregaços sanguíneos finos e grossos corados pelo Giemsa é fundamental para diferenciar anaplasmose de babesiose (ver a seguir) e de
outras enfermidades que resultam em anemia e icterícia, como leptospirose (p. 695) e teileriose (p. 60). Devem ser obtidas também amostras de sangue com anticoagulante para exames hematológicos. Nos esfregaços sanguíneos finos
corados pelo Giemsa, Anaplasma spp  aparece  como  corpúsculo  de  inclusão  denso  com  0,3  a  1μm  de  diâmetro,  corado  uniformemente  de  azul­púrpura.  O  corpúsculo  de  inclusão  de A. marginale geralmente  se  localiza  na  margem  da
hemácia infectada, ao passo que o corpúsculo de inclusão de A. centrale situa­se mais ao centro. Não é possível distinguir A. caudatum de A. marginale em  esfregaços  corados  pelo  Giemsa.  Devem  ser  utilizadas  técnicas  de  coloração
especiais para identificar essa espécie, com base na presença dos apêndices característicos do microrganismo. Há relato de A. caudatum apenas na América do Norte e, possivelmente, deve ser uma forma de A. marginale, e não uma outra
espécie. Os corpúsculos de inclusão contêm 1 a 8 corpúsculos iniciais, com 0,3 a 0,4μm de diâmetro, os quais correspondem às riquétsias individuais.
Os portadores de infecção crônica podem ser identificados com grau razoável de segurança por meio de testes sorológicos que utilizam ELISA msp5, fixação de complemento ou teste de aglutinação em placa. Relata­se que os métodos
de detecção baseados no DNA são mais úteis como testes de diferenciação de espécies e cepas.
No momento da necropsia, devem ser preparados esfregaços sanguíneos de fígado, rins, baço, pulmões e sangue periférico para exame microscópico.
TRATAMENTO:  Para o tratamento, atualmente utilizam­se tetraciclinas e imidocarbe. Bovinos podem se tornar livres da infecção com esses medicamentos e permanecerem resistentes à anaplasmose grave durante, no mínimo, 8 meses.
A  administração  imediata  de  tetraciclinas  (tetraciclina,  clortetraciclina,  oxitetraciclina,  rolitetraciclina,  doxiciclina,  minociclina)  nos  estágios  iniciais  da  doença  aguda  (p.  ex.,  VG  >  15%)  geralmente  assegura  sobrevivência.  Um
tratamento comumente utilizado consiste em uma única injeção intramuscular (IM) de oxitetraciclina de longa duração, na dose de 20 mg/kg. Transfusão de sangue com intuito de restabelecer parcialmente o VG aumenta muito a sobrevida
dos bovinos mais gravemente enfermos. O estado de portador pode ser eliminado pela administração de oxitetraciclina de longa duração (20 mg/kg IM, no mínimo 2 injeções com intervalo de 1 semana). Na maioria dos países, deve­se
obedecer a um período de carência para a tetraciclina. Prefere­se a aplicação da injeção no músculo do pescoço, em vez do músculo da região da garupa.
O imidocarbe também é muito efetivo contra A. marginale, com uma única injeção (como sal di­hidrocloreto, na dose de 1,5 mg/kg, SC, ou de 3 mg de dipropionato de imidocarbe/kg). A eliminação do estado de portador exige o uso de
doses mais altas e repetidas de imidocarbe (p. ex., 5 mg/kg IM ou SC, em 2 aplicações do sal de di­hidrocloreto, com intervalo de 2 semanas). Suspeita­se que o imidocarbe é carcinogênico; ademais, exige longo período de carência e não
está aprovado para uso nos EUA ou na Europa.
PREVENÇÃO:  Na África do Sul, Austrália, Israel e América do Sul, a indução de infecção com A. centrale vivo (oriundo da África do Sul) é utilizada como vacina, com intuito de propiciar aos bovinos proteção parcial contra a doença
causada por A. marginale. A vacina de A. centrale (dose única) ocasiona reações graves em alguns bovinos. Nos EUA, país onde não é permitido o uso de vacinas vivas, as vacinas purificadas que contêm A. marginale inativado, produzidas
a partir de hemácias de bovinos infectados associadas a adjuvante, foram utilizadas no passado, mas atualmente não estão disponíveis. A imunidade induzida pelo uso de várias doses de vacina inativada protege bovinos da doença grave,
mas esses animais ainda podem ser suscetíveis às cepas heterólogas de A. marginale. Ocorrem casos de isoeritrólise em bezerros lactentes por conta da vacinação prévia das mães com essa vacina preparada com material de hemácias de
bovinos. A imunidade de longa duração contra A. marginale é conferida pela pré–imunização com riquétsia viva, combinada com quimioterapia para controlar reações graves. Há relato de uso de cepas atenuadas de A. marginale  como
vacina  viva,  com  ocorrência,  também,  de  reações  graves.  Como  alternativa  à  vacina  viva,  têm­se  pesquisado  cepas  de A. marginale cultivadas  em  células  de  carrapato.  Também,  há  pesquisa  de  vacina  com  subunidades  para  controlar
anaplasmose bovina. Em algumas áreas, a eliminação ou o controle rigoroso e prolongado de artrópodes vetores pode ser uma estratégia preventiva viável; contudo, em outras regiões, recomenda­se imunização.

 BABESIOSE
É causada por protozoários intraeritrocitários do gênero Babesia. A doença, transmitida por carrapatos, acomete ampla variedade de animais domésticos e selvagens e, ocasionalmente, as pessoas. Embora o principal impacto econômico da
babesiose ocorra na indústria bovina, a infecção de outros animais domésticos, inclusive equinos, ovinos, caprinos, suínos e cães, assume grau variável de importância em todos os países.
Duas espécies importantes em bovinos – B. bigemina e B. bovis – estão disseminadas em países tropicais e subtropicais e constituem o foco desta discussão. No entanto, como há muitas características comuns às doenças causadas por
diferentes cepas de Babesia, várias dessas informações podem ser aplicadas às outras espécies.
TRANSMISSÃO E EPIDEMIOLOGIA:  Os principais vetores de Babesia bigemina e de B. bovis são carrapatos Rhipicephalus (Boophilus) spp, hospedeiro 1, nos quais a transmissão ocorre por via transovariana. Embora os parasitos possam ser
facilmente  transmitidos  experimentalmente  por  meio  de  inoculação  de  sangue,  na  prática  a  transmissão  mecânica  por  insetos  ou  durante  procedimentos  cirúrgicos  não  é  relevante.  Também,  há  relato  de  infecção  intrauterina,  mas  a
ocorrência é rara.
Nos carrapatos Rhipicephalus spp, os estágios sanguíneos do parasito são ingeridos durante o repasto, com a ocorrência de multiplicação sexuada e assexuada na fêmea de carrapato ingurgitada, nos ovos infectados e nos subsequentes
estágios parasitários. A transmissão ao hospedeiro ocorre quando as larvas (no caso de B. bovis) ou as ninfas e os adultos (no caso de B. bigemina) se alimentam. A porcentagem de larvas infectadas pode variar de 0 a 50%, ou mais,
dependendo, principalmente, do grau de parasitemia do hospedeiro no momento do repasto das fêmeas. Em condições de campo, a taxa de transmissão de B. bigemina por carrapato geralmente é maior do que aquela de B. bovis.
Nas áreas endêmicas, três características são importantes na determinação do risco de doença clínica: (1) os bezerros apresentam grau de imunidade (relacionado com o teor de anticorpos colostrais e fatores específicos da idade) que
persiste por cerca de 6 meses; (2) os animais que se recuperam de infecção por Babesia geralmente se tornam imunes por toda a vida comercial (4 anos) e (3) algumas raças de bovinos, p. ex., Bos indicus, são inerentemente mais resistentes
aos  carrapatos  e  aos  efeitos  clínicos  da  infecção  por  Babesia.  Desse  modo,  em  situação  de  alta  taxa  de  transmissão  por  carrapatos,  praticamente  todos  os  bezerros  recém­nascidos  infectam­se  com  Babesia  até  os  6  meses  de  idade,
apresentando sintomas discretos, caso os tenham, e subsequentemente tornam­se resistentes à infecção. Essa situação pode ser influenciada por redução natural (p. ex., climática) ou artificial (p. ex., tratamento com acaricidas ou mudança
da composição de raças do rebanho) na população de carrapatos para taxas nas quais a transmissão de Babesia por carrapatos aos bezerros é insuficiente para infectar todos eles durante esse período crítico inicial. As outras circunstâncias
que podem ocasionar surtos de infecção clínica incluem a introdução de bovinos suscetíveis em áreas endêmicas e a presença de carrapatos infectados com Babesia em áreas anteriormente livres desses vetores. Notou­se variação do grau de
imunidade em função da cepa, mas provavelmente sem importância no campo.
ACHADOS CLÍNICOS E PATOGÊNESE:  Em geral, a doença aguda dura cerca de 1 semana. O primeiro sinal é febre (com frequência, 41°C ou mais), que persiste por todo o curso da doença; posteriormente, notam­se inapetência, taquipneia,
tremores musculares, anemia, icterícia e perda de peso. No estágio terminal, notam­se hemoglobinemia e hemoglobinúria. Na infecção por B. bovis, pode haver envolvimento do sistema nervoso central (SNC) em razão da aderência de
hemácias parasitadas nos capilares cerebrais. Pode­se constatar constipação intestinal ou diarreia. As vacas em final de prenhez podem abortar, e os touros podem apresentar infertilidade temporária decorrente da febre transitória.
Na infecção por cepas virulentas de B. bovis, a síndrome de choque hipotensivo, combinada com inflamação inespecífica generalizada, coagulopatias e estase de hemácias nos capilares, contribui na patogênese. Na maioria das infecções
por cepas de B. bigemina, os efeitos patogênicos relacionam–se mais diretamente à hemólise.
Animais que se recuperam de doença aguda permanecem infectados por vários anos, no caso de B. bovis, e durante alguns meses, no caso de B. bigemina. Não há sintomas aparentes durante essa fase de portador.
A suscetibilidade das raças de bovinos à infecção por Babesia é variável; por exemplo, animais Bos indicus tendem a ser mais resistentes à infecção por B. bovis e B. bigemina do que aqueles de raças europeias.
Lesões Notam­se baço volumoso e friável, fígado edemaciado com aumento da vesícula biliar que contém bile granular espessa, rins congestos e escurecidos e anemia e icterícia generalizadas. Com frequência, mas não invariavelmente, a
urina se apresenta avermelhada. Outros órgãos (inclusive cérebro e coração) podem apresentar congestão ou hemorragias petequiais.
DIAGNÓSTICO:  Clinicamente, a babesiose pode ser confundida com outras doenças que causam febre, anemia, hemólise, icterícia ou urina avermelhada. Portanto, é fundamental a confirmação do diagnóstico por exame microscópico de
esfregaço sanguíneo ou de órgãos corado por Giemsa. Devem ser preparados esfregaços sanguíneos espessos e delgados do animal vivo, de preferência dos capilares auriculares ou da extremidade da cauda.
Durante a necropsia, devem­se preparar esfregaços de músculo cardíaco, rins, fígado, pulmões, cérebro e de vaso sanguíneo de uma extremidade (p. ex., do membro inferior).
Microscopicamente, as espécies de Babesia envolvidas podem ser identificadas com base em sua morfologia, mas há necessidade de alguma experiência, especialmente nas infecções por B. bovis nas quais há poucos microrganismos. B.
bovis é pequena, e os parasitos apresentam­se pareados, com ângulo obtuso entre si, e medem cerca de 1 a 1,5 × 0,5 a 1 mm. B. bigemina é maior (3 a 3,5 × 1 a 1,5 mm), estando os parasitos pareados em ângulo agudo entre si.
Há relatos de diversos testes sorológicos para detecção de anticorpos contra Babesia em animais portadores. Os mais comumente utilizados são pesquisa de anticorpos por fluorescência indireta e ELISA; no mercado, há disponibilidade
de ELISA para B. bovis e B. bigemina. Um procedimento que, às vezes, pode ser justificado para confirmar a infecção em animais portadores suspeitos é a inoculação de sangue (cerca de 500 mL) em um animal totalmente suscetível, de
preferência um bezerro esplenectomizado, e subsequente monitoramento do receptor quanto à infecção. Há disponibilidade, mas não para uso de rotina, de testes de reação em cadeia de polimerase (PCR) e PCR em tempo real, capazes de
detectar parasitemia extremamente baixa, como ocorre em animais portadores, e diferenciar os isolados.
Diagrama de várias formas de hemácias infectadas por Babesia bovis, coloradas por Giemsa. Cortesia de State of Queensland, Department of Primary Industries & Fisheries.

TRATAMENTO E CONTROLE:  No passado, foram utilizados vários medicamentos no tratamento de babesiose, mas apenas o aceturato de diminazeno e o dipropionato de imidocarbe ainda continuam sendo utilizados. Esses medicamentos
não estão disponíveis em todos os países onde a doença é endêmica ou o seu uso pode ser controlado. Devem ser obedecidas as recomendações de uso indicadas pelo fabricante. Administram­se 3 a 5 mg de diminazeno/kg IM. A dose
terapêutica de imidocarbe é 1,2 mg/kg SC. Na dose de 3 mg/kg, o imidocarbe confere proteção contra babesiose por cerca de 4 semanas; também, elimina B. bovis e B. bigemina de animais portadores. A tetraciclina de longa ação (20
mg/kg) pode minimizar a gravidade da babesiose quando se institui o tratamento antes ou logo após o início da infecção.
Recomenda­se tratamento de suporte, particularmente no caso de animais de alto valor, que pode incluir anti­inflamatórios, antioxidantes e corticosteroides. A transfusão de sangue pode salvar a vida de animais que apresentam anemia
grave.
Diagrama de várias formas de hemácias infectadas por Babesia bigemina, coradas por Giemsa. Notar o grande tamanho dos parasitos, raramente visto nas infecções por B. bovis. Cortesia de State of Queensland, Department of Primary Industries & Fisheries.

Em vários países, tem­se utilizado, com sucesso, uma vacina que contém cepa viva atenuada do parasito, inclusive na Argentina, na Austrália, no Brasil, em Israel, na África do Sul e no Uruguai. A vacina está disponível na forma
resfriada ou congelada. Ela induz imunidade adequada por toda a vida comercial do animal; no entanto, há relato de acidente vacinal. Experimentalmente, vários antígenos recombinantes induzem imunidade, mas não há disponibilidade de
vacinas comerciais.
Embora o ciclo de transmissão possa ser interrompido pelo controle do carrapato vetor, esse procedimento (exceto a erradicação completa) raramente é possível a longo prazo e pode tornar suscetível grande população de animais em
áreas endêmicas, com consequente risco de ocorrência de surto da doença.
RISCO ZOONÓTICO:  Há relato de alguns casos de babesiose humana, mas ainda não se identificou com certeza a espécie envolvida. Têm­se incriminado Babesia divergens, B. canis e B. microti e uma espécie não nominada (WA­1). Os
casos relatados em indivíduos esplenectomizados ou imunocomprometidos por outros fatores costumam ser fatais.
Vários casos, cuja gravidade da infecção varia de subclínica até doença aguda, são documentados tanto em pessoas esplenectomizadas como não esplenectomizadas, na América do Norte. Essas infecções foram causadas pelo parasito de
roedores B. microti ou pela espécie não nominada (WA­1), cujos hospedeiros parecem ser ovinos da raça Bighorn. Em pessoas, a infecção por Babesia é transmitida por picada de carrapatos infectados ou por transfusão de sangue de um
doador infectado.

Outras Espécies de Babesia Importantes em Animais Domésticos
BOVINOS:  Babesia divergens e B.  major  são  duas  espécies  observadas  em  regiões  temperadas,  com  características  comparáveis  àquelas  de  B.  bovis  e  B.  bigemina,  respectivamente.  B.  divergens  é  uma  babésia  patogênica  pequena,  de
importância considerável nas ilhas Britânicas e no Noroeste da Europa, ao passo que a B. major é uma babésia grande de baixa patogenicidade. B. divergens é transmitida pelo Ixodes ricinus, já a B. major, por Haemaphysalis punctata.
EQUINOS:  A  babesiose equina  é  causada  por Theileria (antigamente Babesia) equi ou B. caballi. T. equi  é  um  pequeno  parasito,  mais  patogênico  que  B.  caballi.  Em  1998,  T.  equi  foi  reclassificada  como  uma  Theileria  (ver  p.  60).  A
babesiose equina ocorre na África, na Europa, na Ásia, nas Américas do Sul e Central e no Sul dos EUA. É transmitida por carrapatos dos gêneros Rhipicephalus, Dermacentor e Hyalomma. A infecção intrauterina, particularmente por T.
equi, também é relativamente comum.
OVINOS E CAPRINOS:  Embora os pequenos ruminantes possam ser infectados por várias cepas de Babesia, as duas espécies mais importantes são B. ovis e B. motasi. Destas, B. motasi é a mais patogênica. A infecção é comum no Oriente
Médio e no Sul da Europa e China, bem como em regiões tropicais e subtropicais. Os carrapatos dos gêneros Rhipicephalus, Haemaphysalis, Hyalomma, Dermacentor e Ixodes são considerados vetores.
SUÍNOS:  Há relato de doença grave em suínos causada por Babesia trautmanni. Esse parasito foi identificado na Europa e na África. Outra espécie, B. perroncitoi, apresenta patogenicidade semelhante, mas, aparentemente, sua distribuição é
limitada nas regiões anteriormente mencionadas. Os vetores dessa babésia ainda não foram identificados, embora já se tenha demonstrado que Rhipicephalus spp transmite B. trautmanni.
CÃES E GATOS:  Na maioria dos países, há relato de infecção de cães por Babesia canis, que compreende as subespécies B. canis canis, B. canis vogeli e B. canis rossi. B. canis canis é transmitida por Dermacentor reticularis, na Europa; B.
canis vogeli, pelo Rhipicephalus sanguineus,  nos  países  tropicais  e  subtropicais;  e  B.  canis  rossi,  pelo  Haemaphysalis  leachi,  na  África  do  Sul.  Os  sinais  clínicos  da  infecção  por  B.  canis  variam  desde  discreta  doença  transitória  até
doença aguda rapidamente fatal. Na Europa, há disponibilidade de uma vacina que contém um exoantígeno de B. canis canis, porém não protege contra as outras subespécies.
Outra babésia importante em cães é B. gibsoni, que é um parasito muito menor. Ela apresenta uma distribuição mais limitada e tipicamente causa doença crônica cujo principal sintoma é anemia progressiva grave não facilmente tratada
com os babesicidas convencionais.
Há relato de enfermidade de gravidade variável causada por B. felis em gatos domésticos na África e na Índia. Uma característica incomum é a não resposta aos babesicidas comumente utilizados. No entanto, já se constatou que o fosfato
de primaquina (duas doses de 0,5 mg/kg IM, com intervalo de 24 h) é efetivo.

 CITAUXZOONOSE
Citauxzoonose, causada por Cytauxzoon felis, foi inicialmente relatada nos EUA, no ano de 1976; desde então, se tornou uma importante doença infecciosa emergente em gatos domésticos. As espécies de Cytauxzoon são  protozoários
parasitos da família Theileriidae, juntamente com Theileria spp e Gonderia spp. A caracterização molecular mais recente desses microrganismos resultou em certa controvérsia quanto à taxonomia de Cytauxzoon spp, mas a multiplicação
desse parasito por esquizogonia em fagócitos mononucleares (macrófagos), em vez de linfócitos, como acontece com Theileria spp, é um forte argumento para sua classificação com um gênero à parte.
ETIOLOGIA  E  TRANSMISSÃO:  Há  relato  de  infecção  por  Cytauxzoon  felis  em  gatos  domésticos  nos  estados  americanos  de  Missouri,  Arkansas,  Flórida,  Geórgia,  Louisiana,  Mississipi,  Oklahoma,  Kansas,  Texas,  Kentuchy,  Tennessee,
Carolinas do Norte e do Sul e Virgínia. Considera­se que o gato doméstico seja hospedeiro aberrante ou final em razão do curso agudo e mortal da doença; no entanto, há relatos de gatos domésticos que sobreviveram à infecção natural,
com ou sem tratamento. O lince (Lynx rufus) é o hospedeiro natural; apresenta tipicamente infecção subclínica e mantém parasitemia crônica. Relata­se infecção por C. felis em vários outros felídeos selvagens, como suçuarana ou onça­
parda, na ausência de doença evidente; no entanto, há relatos de que alguns leões e tigres sucumbem à doença.
Estudos recentes mostram que C. felis pode ser transmitido por um único carrapato­estrela, Amblyomma americanum. A distribuição desse carrapato assemelha­se muito mais à distribuição da citauxzoonose em gatos domésticos do que a
de outro vetor admissível, o carrapato de cão americano, Dermacentor variabilis. Tipicamente, a citauxzoonose é diagnosticada nos meses de abril a setembro, condição relacionada com a atividade sazonal clima­dependente do carrapato.
Os  gatos  que  vivem  próximos  a  áreas  intensamente  arborizadas  com  poucas  residências,  especialmente  aquelas  mais  próximas  de habitats  naturais  ou  mal  cuidados,  onde  ambos,  carrapatos  e  linces,  podem  ter  contato  muito  estreito,
apresentam maior risco de infecção. Tem­se induzido infecção experimental mediante injeção parenteral (subcutânea, intraperitoneal ou intravenosa) de homogenato de tecido de gatos com infecção aguda. No entanto, não se constatou
infecção quando esse tecido foi administrado por via intragástrica ou quando gatos não infectados foram mantidos com gatos infectados, na ausência de artrópodes vetores.
Após  a  transmissão  ao  gato  doméstico  pelo  carrapato,  o  parasito  submete­se  a  dois  estágios  importantes:  esquizogonia  (reprodução  assexuada)  e  merogonia.  Primeiramente,  os  esporozoitos  infectam  os  leucócitos  (fagócitos
mononucleares) e passam por esquizogonia para formar esquizontes. Detectaram­se leucócitos infectados por esquizontes cerca de 12 dias após infecção experimental, com aumento do diâmetro de 15 μm para 250 μm. São mais comumente
detectados em linfonodos, baço, fígado, pulmão e medula óssea, mas foram documentados em vários órgãos e, ocasionalmente, são verificados em esfregaços sanguíneos. Leucócitos infectados por esquizontes são as principais causas de
doença e morte; são vistos predominantemente no revestimento vascular, com frequência ocluindo os vasos sanguíneos. Esses “trombos de parasitos” ocasionam isquemia e necrose tecidual.
Em seguida, os leucócitos infectados por esquizontes rompem­se e liberam piroplasmas (merozoitos), que infectam as hemácias. Nas hemácias, os piroplasmas são relativamente inócuos, notando­se taxa de parasitemia média de 1 a 4%;
no entanto, há relato de maior taxa de parasitemia (> 10%). Na infecção aguda, a detecção de hemácias infectadas por merozoitos é variável, sendo tal achado relacionado com aumento da temperatura corporal e diminuição do número de
leucócitos. Os animais sobreviventes tipicamente permanecem com parasitemia crônica, e pelo menos um gato mostrou experimentalmente ser solidamente imune a infecções subsequentes. Em gatos, obteve­se parasitemia crônica mediante
a inoculação de hemácias infectadas por merozoitos. Esses gatos com parasitemia crônica não desenvolveram doença clínica evidente, mas não ficaram imunes à infecção em desafio subsequente com esporozoitos/esquizontes, sugerindo
que é necessária a fase tecidual de esquizontes para o estabelecimento de imunidade em gatos domésticos.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Em geral, nota­se início dos sinais clínicos em gatos infectados por C. felis 5 a 14 dias (em média, cerca de 10 dias) após a infecção transmitida por carrapatos. Sintomas inespecíficos incluem depressão,
letargia  e  anorexia.  Febre  e  desidratação  são  os  achados  mais  comuns  ao  exame  físico;  a  temperatura  corporal  aumenta  gradativamente  e  pode  ser  tão  alta  quanto  41°C.  Outros  achados  incluem  icterícia,  linfadenomegalia  e
hepatoesplenomegalia. No extremo, os gatos costumam apresentar hipotermia, dispneia e vocalização quando estão com dor. Sem tratamento, tipicamente o paciente morre 2 a 3 dias após o pico febril.
À necropsia, geralmente notam­se esplenomegalia, hepatomegalia, aumento de linfonodos e edema renal. Os pulmões apresentam edema e congestão extensos, com hemorragias petequiais na superfície serosa e por todo o interstício.
Ocorre dilatação venosa progressiva, especialmente em veias mesentéricas e renais e na veia cava posterior. Com frequência, notam­se hidropericárdio e hemorragias petequiais no epicárdio.
Quando inicialmente descrita, a taxa de mortalidade decorrente da infecção por C. felis era próxima a 100%. Um estudo com C. felis na região Noroeste de Arkansas e no Nordeste de Oklahoma menciona que 18 gatos sobreviveram à
infecção natural, com ou sem tratamento. No início, esses gatos pareciam menos doentes, não apresentavam temperatura acima de 41°C e jamais desenvolveram hipotermia. Há relatos esporádicos similares em outras regiões. Algumas
hipóteses para a sobrevivência desses gatos incluem via atípica de infecção, imunidade inata em alguns animais, maior detecção de portadores, diminuição da virulência com atenuação de cepas ou ocorrência de nova cepa, dose do inóculo
infeccioso e controle do tempo e do tipo de tratamento.
DIAGNÓSTICO:  As anormalidades mais comumente constatadas no hemograma incluem leucopenia com neutrófilos tóxicos e trombocitopenia. Nos estágios posteriores, anemia normocítica normocrômica. As alterações bioquímicas mais
comuns  são  hiperbilirrubinemia  e  hipoalbuminemia,  que  podem  variar,  dependendo  dos  sistemas  orgânicos  acometidos  por  trombose  parasitária  e  isquemia,  com  necrose  tecidual.  Outras  anormalidades  detectadas  menos  consistentes
incluem aumento de atividade de enzimas hepáticas e azotemia.
O diagnóstico precoce exige a detecção microscópica de piroplasmas ou esquizontes. A presença de piroplasmas nos esfregaços sanguíneos é variável; eles são notados com aumento da temperatura corporal e tipicamente são evidentes
cerca de 1 a 3 dias antes da morte. Há relatos casuais de que a sensibilidade do exame é maior quando o sangue para preparação de esfregaço é coletado de vasos pequenos (p. ex., punção de veia auricular). Quando há merozoitos em um
esfregaço sanguíneo bem preparado e adequadamente corado (p. ex., Wright’s Giemsa, Giemsa, Diff­Quik) é possível notar taxa de 1 a 4%, em média; há relato de porcentagens extremamente altas (> 10%) de merozoitos. Essas estruturas
são pleomórficas e podem ser redondas, ovais, anaplasmoides, bipolares (binucleados) ou em forma de bastonetes; no entanto, as formas de piroplasmas arredondadas (1 a 2,2 μm de diâmetro) e as formas ovais (0,8 a 1 μm × 1,5 a 2 μm)
são mais comuns. Apresentam­se descorados na região central e contêm um pequeno núcleo de cor magenta arredondado a um núcleo em formato de lua crescente em um lado. Quando a parasitemia é superior a 0,5%, notam­se formas em
cruz de malta e piriformes pareadas. É necessário exame cuidadoso para excluir a possibilidade de Mycoplasma haemofelis, corpúsculos de Howell­Jolly, precipitados de corante e artefatos de água.
O estágio tecidual de esquizonte precede a fase eritrocitária. Ocasionalmente, é possível notar esquizontes em esfregaços de sangue periférico, especialmente em sua margem, e em menor aumento podem ser confundidos com grandes
aglomerados de plaquetas. Na ausência de piroplasmas ou esquizontes em hemácias do esfregaço sanguíneo, deve­se obter um rápido diagnóstico, obtendo­se aspirado com agulha fina de linfonodo periférico, baço ou fígado, a fim de
detectar esquizontes no exame citológico. Esses fagócitos apresentam 15 a 250 μm de diâmetro, contêm um núcleo ovoide com grande nucléolo escuro proeminente característico. O citoplasma costuma se encontrar muito distendido com
várias partículas basofílicas pequenas e profundas, que correspondem ao desenvolvimento de merozoitos.
Na ausência dessas estruturas, deve­se fazer o diagnóstico por meio de PCR, mais sensível e específico do que a microscopia, disponível no Vector Borne Disease Diagnostic Laboratory da North Carolina State University. Esse teste é
recomendado a casos suspeitos, nos quais não se detectaram parasitos, bem como para confirmação após a detecção de piroplasmas ou esquizontes.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Historicamente, as tentativas de tratamento dessa doença com vários antiparasitários (parvaquona, buparvaquona, trimetoprima/sulfadiazina, tiacetarsamida sódica) são pouco efetivas. Seis gatos de um grupo
de sete foram tratados com sucesso com aceturato de diminazeno (não aprovado nos EUA) ou com dipropionato de imidocarbe (duas doses de 2 mg/kg IM, com intervalo de 3 a 7 dias). Mais recentemente, em uma série de casos (n = 22),
relatou­se a sobrevivência de 64% dos gatos tratados com a combinação de atovaquona (15 mg/kg VO, 3 vezes/dia, por 10 dias) e azitromicina (10 mg/kg VO, 1 vezes/dia, durante 10 dias), além de tratamento de suporte.
Em todos os casos, deve­se instituir tratamento de suporte com aplicação IV de fluido e heparina (100 a 200 U/kg SC, 3 vezes/dia). Recomenda­se suporte nutricional por meio de tubo para alimentação, esofágico ou nasoesofágico, o
qual também facilita a administração de medicamentos orais (atovaquona e azitromicina). Devem­se propiciar oxigenoterapia e transfusão de sangue, quando necessário. No caso de febre incessante, justifica­se o uso de anti­inflamatório;
no  entanto,  é  contraindicado  o  uso  de  anti­inflamatório  não  esteroide  (AINE)  a  gatos  com  azotemia  ou  desidratação.  Uma  vez  definido  o  diagnóstico  e  iniciado  o  tratamento,  recomenda­se  mínimo  estresse  e  manuseio  do  paciente.  A
recuperação, inclusive a resolução da febre, frequentemente é lenta e pode demorar até 5 a 7 dias. Os animais que sobrevivem apresentam recuperação clínica completa, inclusive das anormalidades hematológicas e bioquímicas, em 2 a 3
semanas. Alguns sobreviventes permanecem persistentemente infectados com piroplasmas e podem representar uma fonte de infecção.
Recomenda­se a aplicação rotineira de medicamento para controle de carrapatos; no entanto, gatos foram infectados mesmo com esse tratamento. A retirada dos gatos de áreas possivelmente infestadas por carrapatos vetores (ou seja,
mantê­los apenas em ambientes fechados) é considerada o melhor método de prevenção da enfermidade.

 HEPATOZOONOSE DO VELHO MUNDO E HEPATOZOONOSE CANINA AMERICANA
ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  A hepatozoonose do Velho Mundo é uma doença que acomete animais carnívoros, selvagens e domésticos, transmitida por carrapatos e causada pelo protozoário Hepatozoon canis. Não se
sabe se a infecção de felídeos selvagens e domésticos é causada por H. canis ou por outras espécies de Hepatozoon. Esse microrganismo é transmitido pelo carrapato marrom de cães, Rhipicephalus sanguineus. No final da década de 1990,
as características clínicas particulares em cães da América do Norte sugeriam que alguma espécie ou cepa diferente de Hepatozoon poderia ser responsável pela doença na América do Norte, diferentemente de outros países; em 1997, essa
suspeita foi confirmada. Sabe­se atualmente que, na América do Norte, a doença é causada pelo protozoário H. americanum, transmitido pelo carrapato da Costa do Golfo, Amblyomma maculatum, e não pelo carrapato marrom de cães.
Assim, na América do Norte, a doença é denominada hepatozoonose canina americana (HCA), uma enfermidade diferente.
O modo de transmissão de hepatozoonose não é típico no sentido clássico de uma doença transmitida por carrapato; à semelhança de outras espécies do gênero, as infecções por H. canis e H. americanum ocorrem quando um carrapato
infectado, o hospedeiro definitivo, é ingerido pelo cão (ou outro hospedeiro intermediário vertebrado). Esporozoitos liberados de oocistos maduros na hemocele do carrapato penetram no hospedeiro vertebrado através do intestino. Os cães
também podem adquirir HCA pela ingestão de hospedeiros paratênicos (transporte) que contêm cistozoítos, um estágio latente de H. americanum encistados em seus tecidos. Experimentalmente, a infecção por cistozoíto resulta nas mesmas
manifestações de doença observadas em cães que ingerem oocistos esporulados. Até o momento não se sabe se há uma via de transmissão semelhante na infecção por H. canis.
Em várias partes do mundo (Índia, África, Sudeste Asiático, Oriente Médio, Sul da Europa e Ilhas dos Oceanos Pacífico e Índico), a maioria dos cães com hepatozoonose geralmente apresenta infecção subclínica ou apenas sintomas
discretos. Nessas regiões, a imunossupressão causada por doença concomitante ou por outros fatores parece ter papel importante na ocorrência de sinais clínicos mais graves. Nos EUA, parece não haver necessidade de imunossupressão ou
de doença concomitante para induzir sintomas mais graves do que aqueles normalmente constatados na HCA.
HCA é uma doença emergente inicialmente disseminada ao Norte e ao Leste da Costa do Golfo, no Texas, onde foi primeiramente detectada, em 1978. A distribuição desse parasito é semelhante àquela do carrapato da Costa do Golfo.
Nos EUA, a maior parte dos casos foi diagnosticada no Texas (principalmente ao longo da Costa do Golfo), Oklahoma e Louisiana; contudo, há relato de vários casos no Alabama e casos tão distantes, como no Leste do Tennessee, Geórgia
e Flórida. Há relato de casos esporádicos em locais geográficos díspares, como Califórnia, Washington e Vermont; supõe­se que esses cães tenham sido transferidos de áreas endêmicas, pois o carrapato da Costa do Golfo não se estabeleceu
em locais tão distantes. H. americanum, bem como A. maculatum, também pode ser observado nas Américas do Sul e Central. Identificou­se Amblyomma ovale como vetor de H. canis na América do Sul. Evidências em testes de genética
molecular sugerem que a infecção por H. canis pode ser mais comum na América do Norte do que se acreditava anteriormente, mas a HCA continua sendo a forma mais grave e mais comum de hepatozoonose no Novo Mundo.
Experimentalmente,  cães  com  >  4  a  6  meses  de  idade  são  resistentes  à  infecção  por  H.  canis.  No  entanto,  H.  americanum  provoca  sinais  clínicos  graves,  mesmo  em  cães  adultos.  Como  a  doença  causada  por  H.  americanum  é
clinicamente muito mais importante do que aquela induzida por H. canis, as considerações que constam do restante deste capítulo referem­se, principalmente, à HCA.
ACHADOS CLÍNICOS:  As fases teciduais dos microrganismos causadores de hepatozoonose, especialmente aquelas de H. americanum, induzem inflamação piogranulomatosa, que resulta em sinais clínicos. Esses sintomas, que podem ser
intermitentes,  incluem  febre,  depressão,  perda  de  peso,  baixo  escore  corporal,  atrofia  muscular,  sintomas  de  dor,  rigidez  e  fraqueza;  secreção  ocular  mucopurulenta  é  comum  e,  ocasionalmente,  nota­se  diarreia  sanguinolenta.
Surpreendentemente, vários cães manifestam apetite normal quando o alimento é colocado diretamente na frente deles, porém eles não se movem para consumi­lo, aparentemente por conta da dor intensa. Dor ou hiperestesia grave na região
paraespinal é um achado comum ao exame físico; constata­se, também, dor cervical, articular ou generalizada. A hiperestesia manifesta­se como andar rígido e relutância para se movimentar, bem como rigidez cervical e/ou de tronco. A
febre pode oscilar em função da gravidade dos sintomas e variar de 39,3 a 41°C, não diminuindo com o uso de antibióticos. Dentre as sequelas de ocorrência retardada, incluem­se glomerulonefrite e amiloidose.
DIAGNÓSTICO:  A anormalidade laboratorial mais consistente é a leucocitose com neutrofilia, cuja contagem varia de 20.000 a 200.000 células/μL. Tipicamente, é uma neutrofilia madura marcante, embora possa haver desvio à esquerda.
Anemia normocítica normocrômica não regenerativa discreta a moderada é outro achado comum. Tipicamente, a contagem de plaquetas está normal ou elevada. Também, pode­se constatar leve aumento da atividade de fosfatase alcalina
(ALP), hipoalbuminemia e elevação da atividade de creatinoquinase (CK). Embora haja relato de hipoglicemia marcante, acredita­se que tal achado seja um artefato in vitro decorrente do maior metabolismo de glicose, em razão do grande
número de leucócitos. Nas radiografias, reações periosteais podem ser visualizadas em qualquer osso (inclusive crânio e vértebras). Essas reações periosteais assemelham–se àquelas de osteoartropatia hipertrófica, exceto que, na HCA, as
lesões tendem a ser mais proximais do que distais, com frequência notadamente evidentes nos ossos longos. O mecanismo fisiopatológico das lesões ósseas não foi esclarecido.
O diagnóstico definitivo de hepatozoonose baseia­se no achado de gamontes nos leucócitos do sangue periférico (utilizando–se corantes do tipo Romanowsky); identificação de cistos típicos, merontes ou piogranulomas em amostras de
músculos obtidas por biopsia ou detecção de anticorpos séricos contra esporozoítos de H. americanum. Em alguns cães, podem ser necessárias biopsias musculares múltiplas ou sequenciais, a fim de detectar os microrganismos. Embora
tenha  sido  desenvolvido  um  método  de  diagnóstico  sorológico  experimental  (ELISA,  que  detecta  anticorpos  contra  esporozoítos  de H. americanum),  ele  não  está  disponível  para  diagnóstico  de  rotina.  A  Auburn  University  e  a  North
Carolina  State  University  disponibilizam  testes  diagnósticos  para  hepatozoonose  baseados  em  PCR.  Esses  testes  mostraram  que  a  hepatozoonose  clássica  causada  por H. canis  é  mais  comum  na  América  do  Norte  do  que  se  pensava
anteriormente. Ademais, a variação detectada na sequência do rDNA 18S de cães infectados originou novas questões sobre hepatozoonose canina. Ainda, pode ser que mais espécies (ou cepas) com padrão de patogenicidade e/ou com ciclo
biológico diferentes provoquem a doença em cães.
TRATAMENTO:  A hepatozoonose é uma infecção que persiste no cão pelo resto da vida. Nenhum procedimento terapêutico elimina totalmente o microrganismo do animal. No passado, o tratamento era frustrante porque a maioria dos cães
apresentava apenas melhora temporária, com recidivas frequentes dentro de 3 a 6 meses, e morria dentro de 2 anos após o diagnóstico. Atualmente, em geral, é possível obter a remissão dos sinais clínicos mediante terapia combinada,
denominada  TCP,  que  inclui:  trimetoprima­sulfadiazina  (15  mg/kg  VO,  2  vezes/dia),  clindamicina  (10  mg/kg  VO,  3  vezes/dia)  e  pirimetamina  (0,25  mg/kg  VO,  1  vez/dia);  essa  medicação  deve  ser  administrada  durante  14  dias.
Infelizmente, a remissão clínica com essa terapia costuma ser de curta duração e, em geral, os cães manifestam recidiva dentro de 2 a 6 meses. No entanto, há relatos de um tratamento adjuvante relativamente recente que utiliza decoquinato
(um anticoccídio utilizado para grandes animais). O decoquinato não é efetivo na doença clínica ativa, mas pode prevenir recidivas clínicas; é administrado após a resolução dos sinais clínicos, como adjuvante ao tratamento TCP. A dose
recomendada é de 10 a 20 mg de decoquinato/kg VO, 2 vezes/dia, continuamente ao longo de 2 anos. Terapia TCP combinada com uso diário de decoquinato tem resultado em melhora acentuada no prognóstico de cães com hepatozoonose.
Outros tratamentos mais antigos incluem dipropionato de imidocarbe (dose única de 5 mg/kg SC); associação de dipropionato de imidocarbe (6 mg/kg, SC, em intervalos de 14 dias) com tetraciclina (22 mg/kg VO, 3 vezes/dia, durante
14 dias) ou o coccidiostático toltrazurila (5 a 10 mg/kg SC ou VO, 1 vez/dia, durante 3 a 5 dias, ou 5 mg/kg VO, 2 vezes/dia, por 4 dias). A eficácia do tratamento com imidocarbe tem sido inconsistente e pode depender da gravidade dos
sintomas e da região, os quais podem estar associados à cepa de microrganismo causador da doença. De modo semelhante, embora haja relato de resposta clínica inicial excelente à toltrazurila, ocorrem recidivas e não há evidência de
eliminação das formas císticas do tecido muscular.
O uso de AINE pode ser o melhor procedimento terapêutico para o controle de febre e dor, especialmente nos primeiros dias da terapia TCP. Deve­se evitar a administração de glicocorticoide, porque, embora os esteroides possam
propiciar alívio temporário, seu uso prolongado pode exacerbar a doença.
A prevenção de acesso a locais que contenham carrapatos e o desencorajamento de predação são as formas mais efetivas de controle de hepatozoonose. A predação implica risco duplo de HCA: a pelagem da presa capturada/ingerida
pelos cães pode ter carrapato infectado, o que pode ser uma fonte de esporozoítos; além disso, a presa pode conter cistozoítos (pelo menos no caso de H. americanum), que também causam infecção.
Não há risco zoonótico conhecido para hepatozoonose.

 ESQUISTOSSOMOSE
É  uma  infecção  parasitária  comum  em  bovinos  e,  raramente,  em  outros  animais  domésticos  na  África  e  na  Ásia.  Embora  os  esquistossomos  possam  atuar  como  importantes  patógenos  em  raras  condições,  favorecendo  a  transmissão
intensiva, a maioria das infecções em regiões endêmicas é subclínica. No entanto, altas taxas de prevalência de infecções subclínicas provocam perda significativa por conta dos efeitos a longo prazo no crescimento e na produtividade e da
maior suscetibilidade a outras doenças parasitárias ou bacterianas.
Esquistossomos são membros do gênero Schistosoma, família Schistosomatidae. Os vermes adultos são parasitos obrigatórios do sistema vascular de vertebrados. Os esquistossomos são dioicos. A fêmea adulta é mais delgada do que o
macho e normalmente é transportada em um sulco ventral, o canal ginecofórico, formado pelas protuberâncias laterais dobradas ventralmente no corpo do macho.
Das 19 espécies relatadas em animais com infecção natural, 7 – todas parasitos de ruminantes – recebem atenção especial, principalmente por causa de sua reconhecida importância veterinária: S.  mattheei,  S.  bovis,  S.  curassoni,  S.
spindale, S. indicum, S. nasale e S. japonicum. A espécie S. mattheei é  verifcada  no  Sudeste  da  África,  desde  a  Província  do  Cabo,  na  África  do  Sul,  em  direção  ao  Norte  até  a  Tanzânia  e  Zâmbia. S.  bovis  é  observado  na  região  do
Mediterrâneo e no Oriente Médio, sendo comum nas regiões Norte, Oeste e Leste da África (exceto no Egito), estendendo­se do Sul ao centro de Angola, Sul do Congo e, possivelmente, Norte da Zâmbia. S. curassoni foi detectado em
ruminantes no Senegal, Mauritânia, Mali, Níger e Nigéria. Há relato de S. spindale na Índia, Sri Lanka, Indonésia, Malásia, Tailândia e Vietnã. A distribuição de S. indicum parece limitada ao subcontinente indiano. S. nasale é observado na
Índia, Sri Lanka, Bangladesh e Mianmar. S. incognitum foi relatado na Índia, Tailândia e Indonésia. S. japonicum é endêmico em vários países da Ásia Oriental.
A  diferenciação  das  espécies  de  Schistosoma  pode  basear­se  na  morfologia  do  ovo  (tamanho,  forma).  As  espécies  também  podem  ser  diferenciadas  pelos  aspectos  taxonômicos  e  morfológicos  (vermes  adultos),  ciclo  biológico  ou
características comportamentais; cromossomos; especificidade do hospedeiro ou estudos com enzima e DNA. Algumas dessas espécies são conhecidas por interagir em áreas onde coexistem, havendo relato de hibridização interespecífica.
O parasito bovino S. mattheei, por exemplo, ocasionalmente pode infectar pessoas, nas quais pode ocorrer hibridização com a espécie humana S. haematobium.
CICLO BIOLÓGICO, TRANSMISSÃO E EPIDEMIOLOGIA:  Esquistossomos vivem nas veias mesentéricas e hepáticas do hospedeiro (exceto S. nasale, que se instala nas veias nasais), onde se alimentam de sangue e produzem ovos com uma
espinha lateral ou terminal característica. Os ovos eliminados nas fezes devem ser depositados na água, a fim de eclodirem e liberarem os miracídios, que invadem caramujos aquáticos específicos e se desenvolvem como esporocistos
primários e secundários e se tornam cercárias. Quando completamente maduras, as cercárias saem do caramujo e nadam livremente na água, onde permanecem viáveis por várias horas. Em geral, os ruminantes infectam­se com cercárias
que penetram na pele, embora tenha sido mostrado que a infecção pode ser adquirida VO, quando os animais bebem água contaminada. Durante a penetração, as cercárias transformam­se em esquistossômulas e são transportadas pela linfa
e pelo sangue aos locais de predileção. O período pré­patente varia de acordo com as espécies, mas geralmente é de 45 a 70 dias.
A ocorrência de esquistossomose bovina é descontínua, dependendo da presença do hospedeiro intermediário, o caramujo, do grau de infecção e da frequência de contato com a água. Nas regiões onde as condições são favoráveis, a taxa
de prevalência de infecção em bovinos pode variar de 40 a 70%, sendo comumente maior que esse valor.
Há forte evidência de imunidade adquirida à infecção por esquistossomo em bovinos. Essa imunidade atua principalmente por meio da supressão da fecundidade dos parasitos. O exame de animais naturalmente infectados mostrou que
também há proteção parcial contra reinfecção, e a resistência adquirida aos esquistossomos é mais importante no controle da intensidade da infecção no campo.

ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES
Esquistossomose visceral: Na grande maioria dos casos, nas regiões endêmicas a esquistossomose visceral é subclínica e caracterizada por alta prevalência de carga parasitária baixa a moderada na população bovina. Embora, a curto prazo,
possam  ser  detectados  poucos  sinais  clínicos  evidentes  ou  nenhum,  altas  taxas  de  prevalência  de  infecções  crônicas  por  esquistossomos  provocam  perda  econômica  significativa  no  rebanho.  Essas  perdas  devem­se  aos  efeitos  menos
facilmente reconhecíveis no crescimento e na produtividade, bem como à maior suscetibilidade a outras doenças parasitárias e bacterianas.
Há relato de surtos ocasionais de esquistossomose intestinal clínica causados por S. mattheei, S. bovis ou S. spindale. Em geral, eles limitam­se aos rebanhos jovens e animais adultos acometidos por infecção primária relativamente
intensa em condições de transmissão intensiva. A doença é caracterizada por diarreia, perda de peso, anemia, hipoalbuminemia, hiperglobulinemia e eosinofilia marcante que se desenvolve após o início da excreção de ovos. O quadro
clínico de animais gravemente enfermos piora rapidamente e, em geral, esses pacientes morrem dentro de alguns meses de infecção, embora aqueles menos intensamente infectados desenvolvam doença crônica, acompanhada de retardo de
crescimento.
Nas formas intestinal e hepática, observam­se trematódeos adultos nas submucosas porta, mesentérica e intestinal e nas veias subserosas. No entanto, os principais efeitos patológicos devem­se aos ovos. Na forma intestinal, a passagem
de ovos através da parede intestinal provoca lesão, ao passo que na forma hepática formam­se granulomas ao redor dos ovos que são aprisionados nos tecidos. Outras alterações hepáticas incluem hiperplasia e hipertrofia medial das veias
porta, desenvolvimento de folículos e nódulos linfoides por todo o órgão e fibrose periporta nos casos mais crônicos. No intestino, nota­se também a formação de extenso granuloma. Nos casos graves, notam­se várias áreas de petéquias e
hemorragias difusas na mucosa, podendo–se verificar grande quantidade de sangue descorado no lúmen intestinal. Frequentemente, os vasos sanguíneos parasitados estão dilatados e tortuosos. As lesões vasculares também são verificadas
nos pulmões, no pâncreas e na bexiga de animais seriamente infectados.
Esquistossomose Nasal: Essa enfermidade está associada a crescimentos teciduais de formato semelhante a couve­flor na mucosa nasal, provocando obstrução parcial do orifício nasal e ruídos de ronco durante a respiração. Secreção nasal
hemorrágica  e/ou  mucopurulenta  é  um  sintoma  comum.  Na  esquistossomose  nasal,  observam­se  trematódeos  adultos  nos  vasos  sanguíneos  da  mucosa  nasal,  mas,  novamente,  os  principais  sintomas  devem­se  aos  ovos,  que  originam
abscessos  na  mucosa.  Esses  abscessos  se  rompem  e  liberam  ovos  e  pus  na  cavidade  nasal,  culminando  com  extensa  área  de  fibrose.  Além  disso,  são  comuns  grandes  protuberâncias  granulomatosas  na  mucosa  nasal,  que  ocasionam
obstrução das vias nasais e dispneia.
DIAGNÓSTICO:  Como os sintomas e a história clínica, exclusivamente, não são suficientes para distinguir esquistossomose visceral de outras doenças debilitantes, o diagnóstico deve ser confirmado mediante a constatação e a identificação
de ovos nas fezes do animal infectado. À necropsia, o exame macroscópico das veias mesentéricas, verificando­se a presença de vermes adultos, ou o exame microscópico de raspados de mucosa intestinal ou de tecido hepático esmagado
(ambos para pesquisa de ovos) pode comprovar o diagnóstico mais facilmente.
Os ovos de S. bovis e S. mattheei apresentam o formato fusiforme; aqueles de S. spindale são mais alongados e achatados em um dos lados e os ovos de S. nasale têm formato de bumerangue. Os ovos elípticos de S. japonicum  são
relativamente pequenos, com uma espinha rudimentar.
Comumente  nota­se  excreção  fecal  de  pequena  quantidade  de  ovos  nas  infecções  crônicas,  de  modo  que  pode  ser  preferível  o  emprego  de  técnicas  quantitativas  de  eclosão  de  miracídio,  as  quais,  além  de  mais  sensíveis,  também
propiciam informação sobre a viabilidade dos ovos excretados nas fezes.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   O  praziquantel  (25  mg/kg)  é  muito  efetivo,  embora  possam  ser  necessárias  duas  doses  com  intervalo  de  3  a  5  semanas.  No  entanto,  por  motivos  práticos  e  econômicos,  a  esquistossomose  em  criações
domésticas raramente é tratada. Somente na China, onde os animais pecuários infectados atuam como importantes fontes de infecção humana, tem­se praticado amplamente o tratamento em massa com praziquantel.
O modo mais efetivo de controle de esquistossomose bovina nas áreas endêmicas é a construção de cercas, o que impede o contato dos animais com o parasito, não permitindo acesso às áreas alagadiças contaminadas, e o fornecimento
de  água  de  boa  qualidade.  Infelizmente,  isso  nem  sempre  é  possível  em  regiões  do  globo  onde  prevalecem  condições  de  manejo  nômade.  Outros  métodos  de  controle  incluem  destruição  da  população  de  caramujos,  os  hospedeiros
intermediários, em áreas de transmissão, utilizando–se métodos químicos ou biológicos, ou a remoção deles mediante a colocação de barreiras mecânicas ou aprisionamento dos caramujos. Medidas ecológicas contra os caramujos, com
intuito de propiciar um habitat impróprio para sobrevivência, como drenagem, remoção de ervas daninhas aquáticas e aumento do fluxo de água, mostraram–se valiosas. Essas medidas auxiliam não apenas na redução da transmissão de
esquistossomose, mas também no controle de outros trematódeos parasíticos, como Fasciola gigantica e Paramphistomum spp, os quais têm os caramujos aquáticos como hospedeiros intermediários e quase sempre estão nas mesmas áreas
habitadas pelos esquistossomos.

 MICOPLASMAS HEMOTRÓPICOS
(HEMOPLASMAS)
Parasitos eperitrocíticos, anteriormente denominados Haemobartonella e Eperythrozoon e antigamente classificados como riquétsias, foram reclassificados após a análise da sequência do gene RNA ribossômico 16S, a qual revelou que são
filogeneticamente mais relacionados com os membros do gênero Mycoplasma. Assim, foram renomeados com a designação Candidatus adicionada aos microrganismos descritos de modo incompleto. Esses hemoplasmas infectam diversos
vertebrados em todo o mundo e compartilham características e aspectos morfológicos similares. São bactérias gram­negativas pleomórficas sem parede celular que não foram submetidas a cultura microbiológica fora de seus hospedeiros.
Os hemoplasmas instalam–se na superfície das hemácias, mas não penetram nas células.
Há vários hemoplasmas de importância veterinária (Tabela 5). A capacidade desses microrganismos em provocar anemia hemolítica clinicamente relevante é variável, mas os animais infectados permanecem portadores mesmo após
terapia antimicrobiana. Caso o animal seja submetido a estresse ou apresente imunossupressão, a parasitemia pode reaparecer.
TRANSMISSÃO:  Os hemoplasmas podem ser transmitidos por meio da transferência direta de sangue infectado (transfusão de sangue ou uso de agulhas, instrumentos cirúrgicos e material de lida do rebanho ou tropa contaminados) ou por
artrópodes vetores, como piolhos, moscas, carrapatos e mosquitos. Há relato de transmissão vertical da mãe para as crias em gatas, porcas e camelídeos. Em gatos, suspeita­se de transmissão direta associada a brigas, sustentada por estudos
que relataram a presença de DNA de hemoplasma em saliva, gengiva e leito ungueal de gatos infectados.
ACHADOS  CLÍNICOS:   Os  hemoplasmas  são  capazes  de  causar  anemia  hemolítica,  porém  a  gravidade  é  muito  variável.  Em  geral,  tende  a  ocorrer  infecção  assintomática  em  animais  adultos  sadios;  anemias  agudas  mais  graves  estão
associadas  a  esplenectomia,  imunossupressão,  doenças  concomitantes  (como  vírus  da  leucemia  felina  ou  vírus  da  imunodeficiência  felina,  em  gatos)  ou  coinfecção  com  diversas  espécies  de  hemoplasma.  A  principal  exceção  é  M.
haemofelis, que provoca anemia hemolítica aguda em gatos hígidos. A anemia pode ser grave e, ocasionalmente, fatal. Os sinais clínicos típicos incluem letargia, anorexia e febre, com menor ocorrência de esplenomegalia e icterícia.

Tabela 5 – Hemoplasma de importância veterinária

Espécie Hemoplasma

Cães Mycoplasma haemocanis (antigamente Haemobartonella canis)
‘Candidatus Mycoplasma haematoparvum’
Gatos Mycoplasma haemofelis (antigamente Haemobartonella felis)
‘Candidatus Mycoplasma haemominutum’
‘Candidatus Mycoplasma turicensis’

Suínos Mycoplasma (Eperythrozoon) suis
Eperythrozoon parvum (ainda não renomeada)
Bovinos Mycoplasma (Eperythrozoon) wenyonii

Ovinos e caprinos Mycoplasma (Eperythrozoon) ovis
Lhamas e alpacas ‘Candidatus Mycoplasma haemolamae’

M. haemocanis provoca hemólise aguda em cães submetidos a esplenectomia, porém geralmente a infecção é assintomática em cães hígidos. M. suis provoca anemia hemolítica acompanhada de icterícia em leitões neonatos, porcos
suínos de engorda e porcas prenhes. A infecção crônica ocasiona baixa taxa de crescimento, diminuição da taxa de concepção, deficiência reprodutiva e menor produção de leite. A infecção por M. wenyonii em  bovinos  geralmente  é
assintomática, porém é relatada a ocorrência de uma síndrome que envolve edema de glândula mamária e membros pélvicos, menor produção de leite, febre e linfadenopatia em novilhas primíparas, sem anemia. Em ovinos e caprinos, a
infecção  por  M.  ovis  costuma  ser  assintomática,  mas  a  anemia  hemolítica  pode  ocorrer  em  animais  jovens,  especialmente  naqueles  com  alta  carga  de  parasitos  intestinais.  A  infecção  crônica  pode  resultar  em  menor  ganho  de  peso,
intolerância ao exercício, diminuição da produção de lã e anemia discreta. Em camelídeos, a infecção por hemoplasma pode provocar anemia hemolítica grave em animais jovens.
A hemólise provocada por infecções por hemoplasma é tipicamente extravascular e resulta em anemia regenerativa. Pode haver aglutinação de hemácias, e o resultado do teste de Coombs frequentemente é positivo em gatos infectados
por M. haemofelis. Cães esplenectomizados com hemólise aguda em razão da infecção por M. haemocanis podem apresentar aglutinação, esferocitose e teste de Coombs positivo. Há relato de hipoglicemia secundária ao consumo de glicose
pela bactéria em suínos, ovinos, lhamas e bezerros intensamente parasitados; no entanto, rápida glicólise bacteriana in vitro também pode ocasionar falsa diminuição da concentração sanguínea de glicose.
DIAGNÓSTICO:  Historicamente, o diagnóstico é realizado com base na detecção de microrganismos em exames de rotina de esfregaços sanguíneos corados pela técnica de Wright. Neles, notam­se bastonetes basofílicos arredondados muito
pequenos (0,5 a 3 μm) ou estruturas em forma de anel nas hemácias, individualmente ou em cadeias, ou, às vezes, livremente ao fundo da lâmina. No entanto, nas infecções crônicas a parasitemia pode ser cíclica, e os microrganismos
desaparecem da circulação tão rapidamente quanto em 2 h. Além disso, na presença de ácido etilenodiaminotetracético (EDTA), os hemoplasmas soltam­se das hemácias e morrem após um período variável, dificultando a detecção de
microrganismos  em  amostras  obtidas  há  algum  tempo.  O  desenvolvimento  recente  de  testes  de  PCR  sensíveis,  capazes  de  distinguir  vários  hemoplasmas, aumentou  muito  o  diagnóstico  de  infecções  por  esses  parasitos  e  propiciou  a
identificação de várias novas espécies de Mycoplasma.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:  Nas  infecções  agudas,  as  tetraciclinas  (doxiciclina,  oxitetraciclina)  são  os  principais  medicamentos  utilizados  como  tratamento;  enrofloxacino  e  marbofloxacino  também  são  efetivos  contra M.  haemofelis.
Glicocorticoides podem ser úteis para minimizar a eritrofagocitose nos casos de hemólise grave; alguns animais podem necessitar de transfusão sanguínea. Os animais tratados permanecem portadores e podem manifestar recidivas clínicas
periódicas. Doadores de sangue devem ser submetidos a teste de PCR baseado no DNA, a fim de prevenir a transmissão do microrganismo ao receptor durante a transfusão. Pode­se evitar a transmissão iatrogênica mediante o uso de
agulhas e equipamentos adequadamente esterilizados. Recomenda­se o controle de artrópodes vetores, bem como o evitamento de situações de estresse aos rebanhos e às tropas.
RISCO ZOONÓTICO:  As infecções por hemoplasma geralmente são espécie­específicas, com exceção de M. ovis, que infecta ovinos e caprinos, e de ‘Candidatus M. haemolamae’, que infecta lhamas e alpacas. Há relatos de eperitrozoonose
humana na Mongólia e na China, mas não há evidência clara para sustentar tal afirmação. No entanto, há raros relatos de infecções por hemoplasma em pessoas imunocomprometidas, as quais foram submetidas a exames moleculares para
confirmação.  Um  relato  recente  documenta  um  paciente  humano  HIV­positivo  infectado  simultaneamente  por  Bartonella  henselae  e  um  hemoplasma  geneticamente  semelhante  a  M.  haemofelis.  Esse  indivíduo  possuía  cinco  gatos  e
apresentava várias lesões por arranhaduras e mordidas. Os cinco gatos apresentaram resultado positivo em PCR para Bartonella spp e dois eram positivos para M. haemofelis, sugerindo a possibilidade de transmissão zoonótica.

Anemia Infecciosa Felina (Hemoplasmose)
Em gatos, a micoplasmose hemotrópica pode causar uma doença denominada anemia infecciosa felina (AIF), antigamente denominada hemobartolenose. A maioria das infecções é verificada em gatos machos que vivem em ambiente
externo.  M.  haemofelis  (antigamente  conhecido  cepa  Ohio  ou  forma  grande  de  Haemobartonella  felis)  é  o  agente  etiológico  de  AIF  mais  patogênico;  pode  causar  anemia  hemolítica  em  gatos  imunocompetentes.  ‘Candidatus  M.
haemominutum’ (antigamente conhecido como cepa Califórnia ou forma pequena de H. felis) é o hemoplasma mais comum na população mundial de gatos, porém não está claramente associado à doença em gatos imunocompetentes.
‘Candidatus M. turicensis’ nunca foi visto em esfregaço sanguíneo, e sua patogenicidade não é bem compreendida. Ambas as espécies podem causar anemia em gatos com doença imunossupressora primária, como acontece na infecção por
vírus da leucemia felina.

Esfregaço sanguíneo de um cão infectado por Mycoplasma haemocanis. Os microrganismos parecem pequenos cocos basofílicos individuais e em cadeias na superfície das hemácias. O aumento da policromasia indica anemia regenerativa (corante de Romanowsky em solução aquosa). Cortesia do Dr.
Robin Allison.
Esfregaço sanguíneo de uma cria de camelídeo infectada por ‘Candidatus Mycoplasma haemolamae’. Grande quantidade de microrganismos na forma de pequenos cocos basofílicos e de anéis adere­se à superfície das hemácias, com poucos organismos livres ao fundo da lâmina (corante de Romanowsky
em solução aquosa). Cortesia do Dr. Robin Allison.

No caso de infecção por M. haemofelis, um período de incubação de 2 a 30 dias é seguido de anemia, e alguns gatos desenvolvem alterações cíclicas no VG que coincidem com o aparecimento de grande quantidade de microrganismos no
esfregaço  sanguíneo.  Em  gatos  não  tratados,  essa  fase  aguda  dura  3  a  4  semanas,  após  a  qual  alguns  animais  podem  permanecer  cronicamente  infectados,  apesar  do  valor  de  VG  normal  ou  quase  normal.  Sugere­se  que  pode  haver
agravamento da anemia quando esses gatos com infecção crônica apresentam doença debilitante ou são submetidos a estresse ou terapia imunossupressora.
Suspeita­se que todo gato com anemia é portador de AIF. A gravidade dos sinais clínicos está relacionada com a rapidez de início da anemia. Os achados clínicos incluem fraqueza, palidez de membranas mucosas, taquipneia, taquicardia
e, ocasionalmente, colapso. Gatos com doença aguda podem manifestar febre, ao passo que os agonizantes podem apresentar hipotermia. Outras anormalidades ao exame físico podem incluir sopro cardíaco, esplenomegalia e icterícia. Nos
casos crônicos ou de progressão lenta, é possível constatar temperatura corporal normal ou subnormal, fraqueza, depressão e perda de peso ou emaciação.
As alterações laboratoriais esperadas incluem anemia regenerativa moderada a grave, aumento da quantidade de hemácias nucleadas, policromasia, anisocitose, corpúsculos de Howell­Jolly e reticulocitose. Os testes de Coombs podem
ser positivos 7 a 14 dias após o aparecimento do microrganismo no sangue e permanecem positivos durante toda a fase aguda, tornando­se negativos em gatos portadores cronicamente infectados.
Tradicionalmente, a confirmação laboratorial da infecção baseia­se na identificação do microrganismos em amostra de sangue periférico examinado em microscopia óptica, embora M. haemofelis seja visto em menos de 50% dos gatos
com infecção aguda. Alguns laboratórios disponibilizam testes PCR consideravelmente mais sensíveis e específicos do que o exame do esfregaço sanguíneo. A detecção de M. haemofelis pela técnica PCR é mais significante do que a
detecção de outras espécies de hemoplasma (‘Candidatus M. turicensis’ e ‘Candidatus M. haemominutum’), as quais não estão estreitamente relacionadas com a ocorrência de anemia.
Sem tratamento, 1/3 dos gatos com infecção aguda pode morrer. O tratamento envolve terapia de suporte, oxigenoterapia e transfusão sanguínea, bem como tratamento específico com doxiciclina (10 mg/kg VO, sid, durante, pelo menos,
2 semanas). Em razão do risco de esofagite e estenose de esôfago, a administração de hiclato de doxiciclina deve ser seguida de fornecimento de um bolus de vários mililitros de água. O enrofloxacino (5 mg/kg/dia VO) é uma alternativa
apropriada à doxiciclina. Atualmente não se recomenda o tratamento de gatos sadios com resultado positivo no teste PCR, pois ainda não se conhece um protocolo terapêutico que elimine completamente o microrganismo. O uso de doses
imunossupressoras de glicocorticoides para suprimir o dano imunomediado de hemácias é controverso, mas pode ser uma opção aos gatos que não respondem à terapia antimicrobiana, exclusivamente, ou quando a possível causa seja
anemia hemolítica imunomediada.

 TEILERIOSE
Representa um grupo de doenças transmitidas por carrapatos e causadas por Theileria spp. Grande quantidade de Theileria spp é observada nos animais domésticos e selvagens em áreas infestadas por carrapatos do Velho Mundo. As
espécies mais importantes são T. parva e T. annulata, responsáveis por alta taxa de mortalidade em bovinos que vivem em regiões tropicais e subtropicais do Velho Mundo. T. lestoquardi, T. lowenshuni e T. uilenbergi  são  importantes
causas de morte em ovinos.
Tanto a Theileria quanto a Babesia são membros da subordem Piroplasmorina. Enquanto a Babesia são parasitos, principalmente, das hemácias, a Theileria utiliza sucessivamente leucócitos e hemácias para completar seu ciclo biológico
no mamífero hospedeiro. O estágio de esporozoíto infectante do parasito é transmitido pela saliva dos carrapatos infectados por ocasião do repasto. Os esporozoítos invadem os leucócitos e, dentro de poucos dias, se transformam em
esquizontes. Na maioria das espécies patogênicas de Theileria (p. ex., T. parva e T. annulata),  ocorre  multiplicação  dos  parasitos,  principalmente  nos  leucócitos  do  hospedeiro,  ao  passo  que  espécies  menos  patogênicas  se  multiplicam
especialmente  nas  hemácias.  O  desenvolvimento  do  estágio  de  esquizonte  da  Theileria  patogênica  causa  divisão  de  leucócitos  do  hospedeiro;  em  cada  divisão  celular,  o  parasito  também  se  multiplica.  Logo,  a  população  de  células
parasitadas  aumenta  e,  por  migração,  se  dissemina  por  todo  o  sistema  linfoide.  Posteriormente,  parte  dos  esquizontes  sofre  merogonia;  os  merozoítos  resultantes  infectam  as  hemácias,  dando  origem  aos  piroplasmas.  A  ingestão  das
hemácias  infectadas  com  piroplasmas  pelos  carrapatos  vetores  representa  o  início  de  um  ciclo  biológico  complexo,  culminando  na  transmissão  da  infecção  por  carrapatos  que  se  alimentam  em  seu  próximo  estágio  (transmissão
transestadial). Não há transmissão transovariana, como acontece no caso de Babesia. A ocorrência da doença limita­se à distribuição geográfica dos carrapatos vetores específicos. Em algumas áreas endêmicas, bovinos nativos apresentam
resistência inata. A mortalidade em tais rebanhos é relativamente baixa, mas bovinos nele introduzidos são particularmente vulneráveis.

Febre da Costa Oriental
É uma doença aguda de bovinos, geralmente caracterizada por febre alta, aumento de linfonodos, dispneia e alta taxa de mortalidade. Causada por Theileria parva, é um problema sério no Leste e no centro do continente africano.
ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  Os esporozoítos de T. parva são inoculados nos bovinos pelo carrapato vetor infectado, Rhipicephalus appendiculatus, durante o repasto. Com base em parâmetros clínicos e epidemiológicos, são identificados
três subtipos de T. parva, mas provavelmente não são subespécies verdadeiras. T. parva parva e T. parva bovis são mantidas pela transmissão entre os bovinos. T. parva parva é altamente patogênica e pode causar alta taxa de mortalidade,
ao passo que T. parva bovis é menos patogênica. T. parva lawrencei é verificada em búfalos, sendo altamente patogênica quando transmitida aos bovinos, mas não desenvolve o estágio de piroplasma e não pode ser transmitida entre animais
infectados.
PATOGÊNESE,  ACHADOS  CLÍNICOS  E  DIAGNÓSTICO:  Ocorre uma fase oculta de 5 a 10 dias antes que os linfócitos infectados possam ser detectados em esfregaços de células aspiradas do linfonodo infectado, corados por Giemsa. Em
seguida,  a  quantidade  de  células  parasitadas  aumenta  rapidamente  por  todo  o  sistema  linfoide;  aproximadamente  a  partir  do  14o dia,  são  verificadas  células  em  fase  de  merogonia.  Tal  ocorrência  está  associada  a  lise  disseminada  de
linfócitos, depleção linfoide acentuada e leucopenia. Nas hemácias infectadas pelos merozoítos resultantes, os piroplasmas assumem várias formas, mas tipicamente são pequenos e ovais ou em forma de bastonetes.
Os sinais clínicos variam de acordo com o grau de desafio, de inaparentes ou discretos a graves e fatais. Tipicamente, surge febre 7 a 10 dias após a inoculação dos parasitos pelos carrapatos infectados; a febre continua durante todo o
curso  da  infecção  e  pode  ser  superior  a  42°C.  O  aumento  de  linfonodos  torna­se  acentuado  e  generalizado.  Nos  esfregaços  de  amostras  de  linfonodos  obtidas  por  biopsia  e  corados  por  Giemsa,  notam­se  linfoblastos  com  esquizontes
multinucleares. O animal manifesta anorexia e rapidamente piora o seu escore corporal; pode haver lacrimejamento e secreção nasal. No estágio terminal, é frequente a ocorrência de dispneia. Imediatamente antes da morte, é comum a
queda acentuada na temperatura corporal e excreção de exsudato pulmonar pelas narinas. Geralmente o animal morre 18 a 24 dias após a infecção. As lesões mais notáveis constatadas à necropsia são aumento de volume de linfonodos e
edema e hiperemia pulmonar marcantes. É comum a ocorrência de hemorragia nas superfícies serosa e mucosa de vários órgãos, às vezes associada a áreas de necrose evidente nos linfonodos e no timo. A anemia não é um sinal diagnóstico
importante (como acontece na babesiose), pois há mínima multiplicação dos parasitos nas hemácias e, consequentemente, não há hemólise intensa.
Os animais que se recuperam ficam imunes à nova infecção pela mesma cepa, mas podem ser suscetíveis a algumas cepas heterólogas. A maior parte dos animais recuperados ou imunizados permanece como portador da infecção.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   O  tratamento  com  parvaquona  e  seu  derivado  buparvaquona  é  muito  efetivo  quando  instituído  no  estágio  inicial  da  doença  clínica,  porém  sua  eficácia  é  menor  nas  fases  avançadas  nas  quais  há  extensa
destruição de tecidos linfoide e hematopoético. A imunização de bovino contra T. parva utilizando um procedimento de infecção­e­tratamento é prática e está sendo aceita em algumas regiões. Para tal procedimento, utiliza­se um inóculo de
amostra  de  esporozoítos  criopreservados  da(s)  cepa(s)  apropriada(s)  de  Theileria  oriunda  de  carrapatos  infectados  e,  simultaneamente,  uma  única  dose  de  oxitetraciclina  de  longa  duração;  embora  a  oxitetraciclina  tenha  pouco  efeito
terapêutico quando aplicada após a instalação de uma infecção, ela impede o desenvolvimento do parasito quando administrada no início da infecção. Os bovinos devem ser imunizados 3 a 4 semanas antes de serem introduzidos em
pastagem infectada. As células de bovinos parasitadas contendo o estágio esquizonte de T. parva e T. annulata podem ser cultivadas in vitro como linhagens celulares de crescimento contínuo. No caso de T. annulata, os bovinos podem ser
infectados com alguns milhares de células cultivadas. As cepas atenuadas produzidas por passagens seriadas de culturas semelhantes representam a base da vacina viva em vários países, inclusive Israel, Irã, Índia e antiga União Soviética.
A ocorrência de febre da costa oriental pode ser minimizada por meio de rígido controle de carrapatos; porém não é possível em várias regiões, por conta do custo e da alta frequência necessária do tratamento com acaricida.

Teileriose Tropical
T. annulata, microrganismo causador de teileriose tropical, está amplamente distribuída na África do Norte, região costeira do Mediterrâneo, Oriente Médio, Índia, antiga União Soviética e Ásia. Ela é transmitida por várias espécies de
carrapatos do gênero Hyalomma. A T. annulata pode provocar taxa de mortalidade de até 90%, porém a patogenicidade das cepas é variável. A cinética da infecção e os principais achados clínicos são semelhantes àqueles ocasionados
por T. parva; porém, diferentemente da febre da costa leste, com frequência a anemia é uma característica da doença. Os sinais típicos incluem febre e aumento dos linfonodos superficiais. Se a doença progride, os bovinos emagrecem
rapidamente. Os esquizontes e piroplasmas são morfologicamente semelhantes àqueles de T. parva. Os animais que se recuperam da infecção ficam imunes a infecções subsequentes. O tratamento e o controle são semelhantes àqueles da
febre da costa leste (ver a seguir).

Outras Teilerioses de Bovinos
O grupo de T. orientalis, que consiste em parasitos estreitamente relacionados com T. orientalis, T. buffeli e T. sergenti, apresenta distribuição cosmopolita. Esses parasitos são transmitidos por carrapatos do gênero Haemaphysalis.  Os
piroplasmas são maiores do que aqueles de T. parva e T. annulata e se multiplicam principalmente por divisão intraeritrocitária. A ocorrência de morte, particularmente em bovinos nativos, é rara, mas a infecção pode resultar em anemia
crônica progressiva.
T. mutans e T. velifera são verificadas na África, onde são transmitidas por carrapatos do gênero Amblyomma. Ocorre multiplicação, principalmente por divisão intraeritrocitária. Os piroplasmas são morfologicamente indistinguíveis
daqueles de T. orientalis e T. taurotragi (um  parasito  de  elã  [espécie  de  antílope  africano]  e  de  bovinos  criados  na  África),  porém  os  parasitos  podem  ser  diferenciados  por  meio  de  testes  sorológicos,  como  pesquisa  de  anticorpos  por
fluorescência indireta e pela tipagem do DNA. Algumas cepas de T. mutans também são patogênicas. Além disso, uma infecção concomitante pode exacerbar a patogenicidade de T. parva.

Teileriose em Ovinos e Caprinos
T.  lestoquardi  (antigamente  denominada  T.  hirci)  causa  doença  em  ovinos  e  caprinos  semelhante  àquela  de  bovinos  ocasionada  por  T.  annulata,  com  a  qual  é  estreitamente  relacionada.  T.  lestoquardi  é  transmitida  por  carrapatos  do
gênero Hyalomma e apresenta distribuição geográfica semelhante àquela de T. annulata. A taxa de mortalidade pode se aproximar de 100%. Os esquizontes podem ser facilmente vistos em esfregaços de amostras de linfonodos superficiais
aumentados obtidas por biopsia e coradas por Giemsa.
Recentemente, foram  identificadas  duas  espécies  de Theileria, T. lewenshuni e T. uilenbergi,  como  causa  de  enfermidade  grave  em  ovinos  criados  na  China.  Essas  espécies  são  morfologicamente  indistinguíveis  e  provocam  doença
semelhante, porém podem ser diferenciadas por meio de tipificação do DNA. Elas são transmitidas por carrapatos do gênero Haemaphysalis. Esquizontes são detectados em diversos tecidos, porém mais tardiamente e em quantidade menor
do que em outras espécies patogênicas de Theileria. Piroplasmas são claramente vistos nas hemácias. Notaram­se taxas de morbidade e de mortalidade de até 65% (T. lewenshuni) e 75% (T. uilenbergi) em animais suscetíveis, introduzidos
em áreas endêmicas. Os animais acometidos manifestaram febre e anemia.
Várias outras espécies de Theileria não patogênicas (p. ex., T. ovis) também estão amplamente distribuídas. Os piroplasmas dessas espécies são polimórficos.
Babesia equi foi reclassificada como T. equi no ano de 1998, com base na análise do DNA e de outros dados biológicos (ver p. 46).

 TRIPANOSSOMÍASE

Tripanossomíase Transmitida pela Mosca Tsé­tsé
Esse grupo de doenças causadas por protozoários do gênero Trypanosoma acomete todos os animais domésticos. As principais espécies são T. congolense, T. vivax, T. brucei brucei e T. simiae. Na Tabela 6, estão listadas as espécies animais
mais suscetíveis à tripanossomíase transmitida pela mosca tsé­tsé e as regiões geográficas onde ocorre esse tipo de tripanossomíase.
Bovinos, ovinos e caprinos são infectados, em ordem de importância, por T. congolense, T. vivax e T. brucei brucei. Nos suínos, T. simiae é a espécie mais importante. Em cães e gatos, T. brucei é, provavelmente, o mais importante. É
difícil designar uma ordem de importância para equinos e camelídeos. T. vivax não se restringe à região subsaariana da África infestada com mosca tsé­tsé.
Os tripanossomos que causam a tripanossomíase transmitida pela mosca tsé­tsé (ou doença do sono) em pessoas, T. brucei rhodesiense e T. brucei gambiense são muito semelhantes a T. brucei brucei detectado em animais, devendo­se
adotar cuidados especiais ao se manusear tais isolados. Os animais domésticos podem atuar como fonte de infecção humana.
TRANSMISSÃO E EPIDEMIOLOGIA:  A maior parte dos casos de transmissão pela mosca tsé­tsé é cíclica e se inicia quando o sangue de um animal infectado com tripanossomo é ingerido pela mosca. O tripanossomo perde o seu revestimento
superficial  e  se  multiplica  na  mosca;  em  seguida,  readquire  um  revestimento  superficial  e  torna­se  infectante. T. brucei migra  do  intestino  para  o  pró­ventrículo,  daí  para  a  faringe  e,  por  fim,  para  as  glândulas  salivares;  o  ciclo  de T.
congolense cessa na hipofaringe, e as glândulas salivares não são invadidas; o ciclo completo do T. vivax ocorre na probóscida. A forma infectante presente na glândula salivar da mosca tsé­tsé é considerada como forma metacíclica. O ciclo
biológico dessa mosca pode ser inferior a 1 semana, como no caso de T. vivax, ou se estender até algumas semanas, como no caso de T. brucei spp.

Tabela 6 – Tripanossomos de animais transmitidos pela mosca Tsé­Tsé

Trypanosoma spp Animais mais suscetíveis Principal distribuição geográfica

T. congolense Bovinos, ovinos, caprinos, cães, suínos, camelos, equinos, a maioria dos animais selvagens Região da África infestada por mosca Tsé­Tsé


T. vivax Bovinos, ovinos, caprinos, camelos, equinos, vários animais selvagens África, Américas Central e do Sul, Oeste da Índiaa

T. brucei brucei Todos os animais domésticos e vários selvagens; mais grave em cães, equinos e gatos Região da África infestada por mosca Tsé­Tsé


T. simiae Suínos domésticos e selvagens, camelos Região da África infestada por mosca Tsé­Tsé
a  Em regiões não infestadas pela mosca Tsé­Tsé, a transmissão ocorre por meio de picada de outras moscas.

O habitat da mosca tsé­tsé (gênero Glossina) restringe­se à África, na latitude 15°N a 29°S. As três principais espécies habitam ambientes relativamente distintos – G. morsitans quase sempre é observada em savanas; G. palpalis prefere
áreas ao redor de rios e lagos e G. fusca vive em florestas altas. As três espécies transmitem tripanossomos e se alimentam de vários mamíferos.
A transmissão mecânica pode ocorrer por picada da mosca tsé­tsé ou de outras moscas. No caso de T. vivax, parece que Tabanus spp e outras moscas picadoras são os principais vetores mecânicos em regiões onde não há mosca tsé­tsé,
como nas Américas Central e do Sul. A transmissão mecânica necessita apenas da transferência de sangue contaminado com tripanossomos infectantes de um animal para outro.
PATOGÊNESE:  As moscas tsé­tsé infectadas inoculam os tripanossomos metacíclicos na pele dos animais, onde o protozoário cresce por alguns dias e causa tumefações localizadas (cancros). Os tripanossomos alcançam os linfonodos e, em
seguida, a corrente sanguínea, onde se multiplicam rapidamente por meio de fissão binária. Na infecção por T. congolense, os microrganismos se aderem às células endoteliais e se instalam em capilares e pequenos vasos sanguíneos. T.
brucei e T. vivax invadem os tecidos e provocam lesões teciduais em vários órgãos.
A resposta imune é vigorosa, e os imunocomplexos causam inflamação, que contribui na manifestação clínica e no desenvolvimento de lesões da doença. Os anticorpos contra as glicoproteínas de superfície destroem os tripanossomos.
No entanto, os tripanossomos possuem diversos genes que codificam diferentes glicoproteínas de superfície, as quais não são vulneráveis à resposta imune; essa variação antigênica resulta na persistência do protozoário. Não é conhecido o
total de tipos antigênicos de glicoproteínas que podem ser sintetizados, mas excede várias centenas. A variação antigênica tem impedido o desenvolvimento de uma vacina, permitindo reinfecções quando os animais são expostos a um novo
tipo antigênico.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A gravidade da doença varia em função da espécie e da idade do animal infectado, bem como da espécie de tripanossomo envolvida. O período de incubação geralmente varia de 1 a 4 semanas. Os principais
sintomas incluem febre intermitente, anemia e perda de peso. Os bovinos apresentam curso crônico com alta taxa de mortalidade, especialmente quando há deficiência nutricional ou influência de outros fatores estressantes. Os ruminantes
podem recuperar­se gradativamente quando o número de moscas tsé­tsé infectadas é baixo; no entanto, o estresse resulta em recidiva.
Os achados de necropsia são variados e inespecíficos. Nos casos agudos e fatais, pode haver extensas áreas de petéquias nas membranas serosas, em especial na cavidade peritoneal. Também é frequente o aumento de linfonodos e do
baço. Nos casos crônicos, constatam­se aumento de linfonodo, atrofia serosa da gordura e anemia.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo baseia­se na constatação de um animal anêmico com baixo escore corporal em uma área endêmica. A confirmação depende da identificação de tripanossomos em esfregaços sanguíneos corados ou
em  preparações  úmidas.  O  método  rápido  mais  sensível  consiste  no  exame  de  preparação  úmida  da  camada  leucocitária  de  um  tubo  de  VG,  após  centrifugação.  Outras  infecções  que  causam  anemia  e  perda  de  peso,  como  babesiose,
anaplasmose e teileriose, devem ser excluídas pelo exame de esfregaço sanguíneo corado.
Vários testes sorológicos detectam anticorpos contra tripanossomos, mas o seu uso é mais adequado para triagem de rebanho do que para diagnóstico individual; no entanto, os testes para pesquisa de antígenos espécie–específicos de
tripanossomos circulantes no sangue periférico estão se tornando disponíveis para diagnóstico tanto individual quanto de rebanho, embora sua eficiência ainda não tenha sido comprovada. Técnicas moleculares para detecção e diferenciação
de tripanossomos foram desenvolvidas, mas geralmente não estão disponíveis para uso de rotina.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Vários medicamentos podem ser utilizados (ver Tabela 7). A maioria deles tem um estreito índice terapêutico, o que torna importante a administração da dose correta. Ocorre resistência aos medicamentos, o
que deve ser considerado nos casos refratários.
Para o controle, podem ser empregados vários procedimentos, inclusive erradicação de moscas tsé­tsé e uso de medicação profilática. Essas moscas podem ser controladas parcialmente mediante aspersão e imersão frequentes de animais,
aspersão de inseticidas em áreas de procriação de moscas, uso de telas impregnadas com inseticidas e limpeza, além de outros métodos. Tem­se utilizado, com êxito, a SIT na região do Zanzibar e espera­se utilizar em outras ações de
controle em amplas áreas, após a redução das populações de moscas tsé­tsé por inseticidas. Há renovado interesse internacional na erradicação da mosca tsé­tsé em grande escala por meio da PAT­TEC, sustentada pela União Africana. Nas
regiões com alta população de moscas tsé­tsé infectadas com tripanossomos, os animais podem receber medicação profilática. A resistência a medicamentos deve ser cuidadosamente monitorada por meio de exames de sangue frequentes
para pesquisa de tripanossomos nos animais tratados.
No Oeste da África, já foram identificadas várias raças de bovinos com resistência inata à tripanossomíase, e elas têm importante papel na redução do impacto da doença nessa região. No entanto, essa resistência pode se perder quando há
deficiência nutricional ou alta infestação de moscas tsé­tsé.

Tabela 7 – Medicamentos comumente utilizados no tratamento de tripanossomíase em animais domésticos

Medicamento Animal Trypanosoma Efeito principal

Aceturato de diminazeno Bovinos vivax, congolense, brucei Curativo


Brometo de homídio Bovinos vivax, congolense, brucei Curativo, algum efeito profilático

Equídeos vivax

Cloreto de homídio Como indicado para o brometo de homídio

Cloreto de isometamídeo Bovinos vivax, congolense Curativo e profilático

Sulfato de quinapiramina Equinos, camelos, suínos, cães vivax, congolense, brucei, evansi, equiperdum, simiae Curativo


Dimetilsulfato de quinapiramina Equinos, camelos, suínos, cães vivax, congolense, brucei, evansi, equiperdum, simiae Profilático

Suramina Equinos, camelos, cães brucei, evansi Curativo, algum efeito profilático

Dicloridrato de melarsomina Camelos evansi Curativo

O melhor procedimento de controle é a combinação de métodos que reduzem a infestação de moscas tsé­tsé e que aumentam a resistência do hospedeiro mediante o uso de medicação profilática.

Surra (Infecção por Trypanosoma evansi)
A surra é distinta das doenças transmitidas pela mosca tsé­tsé, porque geralmente é transmitida por picadas de outras moscas observadas dentro e fora das áreas infestadas por moscas tsé­tsé. Ela ocorre no Norte da África, no Oriente
Médio, na Ásia, no Extremo Oriente e nas Américas Central e do Sul. Na África, a distribuição de T. evansi estende–se para as áreas infestadas por moscas tsé­tsé, onde sua diferenciação do T. brucei torna­se difícil. É, essencialmente, uma
doença de camelos e equinos, mas todos os animais domésticos são suscetíveis. A doença pode ser fatal, particularmente em camelos, equinos e cães. Em outros animais T. evansi parece não ser patogênico, e esses animais atuam como
reservatórios do microrganismo.
A transmissão ocorre, principalmente, por moscas que picam, provavelmente resultando de alimentações interrompidas. Alguns animais selvagens são suscetíveis à infecção e podem atuar como reservatórios.
Patogênese, achados clínicos, lesões, diagnóstico e tratamento são semelhantes àqueles descritos para a infecção de tripanossomos transmitidos pela mosca tsé­tsé (p. 63).

Durina
É uma doença venérea crônica frequentemente constatada em equinos, transmitida durante o coito e causada por T. equiperdum. A doença foi diagnosticada na costa mediterrânea da África, Oriente Médio, Sul da África e América do Sul; é
provável que sua distribuição seja mais ampla.
Os sintomas podem se desenvolver em semanas ou meses. Os sinais clínicos iniciais incluem secreção uretral mucopurulenta, em garanhões, e secreção vaginal, em éguas, seguida de edema evidente da genitália. Posteriormente, surgem
placas cutâneas características de 2 a 10 cm de diâmetro, e o equino emagrece progressivamente. A taxa de mortalidade de casos não tratados varia de 50 a 70%.
A identificação dos tripanossomos na secreção uretral ou vaginal, nas placas cutâneas ou no sangue periférico é difícil, a menos que o material seja centrifugado. Os equinos infectados podem ser identificados pelo teste de fixação de
complemento, mas somente nas áreas livres de T. evansi ou T. brucei, pois possuem antígenos comuns. Pode haver disponibilidade de um teste ELISA para o diagnóstico.
Nas áreas endêmicas, os equinos podem ser tratados (Tabela 7). Quando há necessidade de erradicação, o controle rigoroso do acasalamento e a eliminação de equinos­problema são procedimentos efetivos. Como alternativa, os equinos
infectados podem ser identificados pelo teste de fixação de complemento; a eutanásia dos animais positivos torna­se obrigatória.

Doença de Chagas (Infecção por Trypanosoma cruzi)
O ciclo de transmissão comum da doença de Chagas envolve gambás, tatus, roedores e carnívoros selvagens; insetos da família Reduviidae atuam como vetores. Sua distribuição envolve Américas Central e do Sul e áreas situadas ao Sul
dos  EUA.  A  doença  de  Chagas  é  importante  na  América  do  Sul.  Os  animais  domésticos  podem  se  infectar  e  introduzir  o  tripanossomo  em  ambientes  onde  vivem  pessoas,  nos  quais  há  insetos  vetores;  o  homem  então  se  infecta  por
contaminação de lesões oculares ou ingestão de alimentos contaminados com as fezes dos insetos que albergam tripanossomos. O tripanossomo é patogênico para o homem e, ocasionalmente, para cães e gatos jovens; os outros animais
domésticos atuam como reservatórios. Deve–se suspeitar de infecção por T. cruzi em áreas endêmicas nas quais os cães manifestam morte súbita ou miocardite.

Tripanossomos Não Patogênicos
Têm­se isolado Trypanosoma theileri e outros tripanossomos muito semelhantes em culturas de sangue periférico de bovinos, em todos os continentes. Também já foram isolados tripanossomos semelhantes em bubalinos domésticos e
selvagens e em várias outras espécies de animais ungulados selvagens. Nas poucas regiões estudadas, a transmissão ocorreu por contaminação, depois de um ciclo de desenvolvimento em espécies de moscas tabanídeas. Embora a maior
parte  das  parasitemias  seja  subclínica,  pode­se  notar  tripanossomo  em  esfregaço  sanguíneo  destinado  ao  exame  de  protozoários  patogênicos  ou  em  uma  câmara  de  hemocitometria.  Ainda  não  se  comprovou,  experimentalmente,  sua
patogenicidade.
T. melophagium, que acomete ovinos, é cosmopolita e transmitido pelo ectoparasita Melophagus ovis. T. theodori, isolado em caprinos, pode ser um sinônimo desse tripanossomo.

LINFADENITE E LINFANGITE

 INFECÇÃO DE EQUINOS E BOVINOS POR CORYNEBACTERIUM PSEUDOTUBERCULOSIS (Pigeon fever, linfangite ulcerativa ou garrotilho de região seca)
Em equinos, o C. pseudotuberculosis causa linfangite ulcerativa (infecção que se instala na parte baixa dos membros), abscessos na região peitoral e no abdome ventral, bem como abscessos internos. Na Califórnia, é uma das doenças
infecciosas mais comuns e economicamente importantes de equinos; sua prevalência está aumentando em outros estados do Oeste e do Meio­Oeste dos EUA. Há relatos de surtos esporádicos em bovinos criados no Oeste dos EUA. Nos
bovinos,  a  bactéria  ocasiona,  principalmente,  granulomas  cutâneos  com  escoriações.  Amplas  lesões  cutâneas  ulceradas  semelhantes  a  tecido  de  granulação  infectado  e  linfangite  podem  acometer  2  a  5%  das  vacas.  No  animal,  sua
localização é variável, mas frequentemente está associada a traumatismo cutâneo. Com frequência, há cura sem tratamento ou apenas com tratamento tópico por 2 a 4 semanas. Também, podem ocorrer aborto e mastite. Nos bovinos, há
raros relatos de envolvimento visceral.
PATOGÊNESE  E  ACHADOS  CLÍNICOS:   Em  equinos,  o  início  da  linfangite  ulcerativa  é  variável  e  pode  se  manifestar  na  forma  de  inflamação  dolorida,  pústulas  e  úlceras,  especialmente  na  parte  inferior  dos  membros,  ou  claudicação  e
tumefação  edematosa  que  pode  se  estender  por  todo  o  membro.  O  exsudato  é  inodoro,  espesso,  marrom­claro  e  manchado  de  sangue.  Em  geral,  apenas  um  membro  é  acometido.  Caso  não  sejam  tratados  de  modo  agressivo  com
antimicrobianos, as lesões e o edema progridem e a infecção pode se tornar crônica, com recidivas.
No Sudoeste dos EUA, a infecção por C. pseudotuberculosis nos equinos é sazonal, com ocorrência máxima no final do verão e no outono. A infecção resulta em formação de abscesso na região peitoral ou na parede abdominal ventral,
com disseminação secundária aos órgãos internos. Os sinais clínicos incluem tumefações difusas ou localizadas, edema ventral com sinal do cacifo ou de Godet, dermatite na linha média ventral, claudicação, abscessos ou fístulas, febre,
perda  de  peso  e  depressão.  Podem­se  constatar  leucocitose  e  neutrofilia,  hiperfibrinogenemia  e  hiperproteinemia.  Febre  alta  ou  prolongada,  anorexia  ou  perda  de  peso  indicam  sequelas  indesejáveis  como  abscessos  profundos  ou
recidivantes, abscesso interno ou infecção sistêmica, com aborto. Os abscessos podem aumentar de tamanho, alcançando até 20 cm de diâmetro, antes de se romperem; a cura pode demorar de semanas a meses. Perda de peso, cólica,
abdome com partes em depressão ou letargia podem ser indicativos de abscessos internos.
Provavelmente, as bactérias penetram no organismo através de feridas cutâneas por meio de artrópodes vetores, como moscas de estábulo, mosca do chifre e moscas domésticas, ou pelo contato com fômite ou solo contaminado.
DIAGNÓSTICO:  Para  confirmar  a  infecção,  é  necessário  o  isolamento  de C.  pseudotuberculosis  das  lesões.  Em  todas  as  formas  de  linfangite  em  equinos,  as  amostras  para  cultura  incluem  aspirados  de  abscessos,  swabs  com  exsudato
purulento obtidos abaixo das crostas associado a foliculite e biopsia com perfurador (punch). No diagnóstico diferencial, devem­se incluir piodermatite, abscessos, linfangite causada por outras bactérias (p. ex., Staphylococcus aureus,
Rhodococcus equi, Streptococcus spp ou Dermatophilus spp), dermatofitose, esporotricose, criptococose equina, blastomicose norte­americana e oncocercose.
Ultrassonografia de abdome é útil para detectar infecção interna de fígado, baço ou rins. Também, a ultrassonografia é importante para detecção e drenagem de abscessos profundos que provocam claudicação, especialmente no músculo
tríceps. É necessária a obtenção de aspirado transtraqueal para confirmar se a pneumonia é causada por C. pseudotuberculosis. O teste sorológico por meio do teste de inibição da hemólise sinérgica, que detecta IgG contra a exotoxina
fosfolipase D, é um exame auxiliar valioso no diagnóstico de infecção interna.
TRATAMENTO:  Linfangite e infecções internas devem ser tratadas por longo tempo com antimicrobianos (durante 1 mês ou com base no exame ultrassonográfico de acompanhamento). O microrganismo é sensível aos antimicrobianos mais
comumente utilizados; no entanto, o tratamento antimicrobiano de abscessos externos não complicados pode prolongar a doença, por retardar a maturação dessas estruturas. O abscesso externo é tratado mediante aplicação de compressa
quente, cataplasma ou hidroterapia, até sua ruptura ou drenagem cirúrgica. Os abscessos são lancetados e lavados com solução antisséptica à base de iodo. Para colocação de dreno de demora em abscessos profundos da região do tríceps ou
do quadríceps, é necessário um procedimento guiado por ultrassonografia. A fenilbutazona alivia a dor e o edema. Indicam­se terapia de suporte e cuidados gerais de enfermagem.
Caso o tratamento seja efetivo, a tumefação regride gradativamente ao longo de dias ou semanas. A infecção interna é responsável por taxa de mortalidade de 30 a 40%, mesmo com tratamento apropriado. Os casos graves ou não tratados
de linfangite frequentemente tornam­se crônicos, ocorrendo fibrose e rigidez do membro. Para a prevenção da doença, recomendam­se isolamento dos equinos infectados, controle de moscas e boas práticas sanitárias.
 LINFADENITE CASEOSA
A linfadenite caseosa (LC) é uma doença contagiosa crônica causada pela bactéria Corynebacterium pseudotuberculosis. A LC é de ocorrência cosmopolita. É uma doença de maior preocupação para produtores de pequenos ruminantes, na
América  do  Norte.  A  enfermidade  é  caracterizada  pela  formação  de  abscessos  em  linfonodos,  ou  próximo  a  eles  (forma  externa),  ou  no  tórax  e  no  abdome  (forma  interna).  A  forma  interna  de  LC  pode  provocar  definhamento  e
comprometimento respiratório, sendo importante para a exclusão da síndrome da “ovelha magra”. Com frequência, a doença torna­se uma infecção endêmica nas propriedades, porque é difícil eliminar os animais acometidos; ademais, os
portadores subclínicos mantêm a contaminação do ambiente. As perdas econômicas devem­se, principalmente, à condenação de carcaças infectadas, à desvalorização de couro e lã, ao descarte de animais infectados, à perda de vendas de
reprodutores e a mortes decorrentes da forma interna da doença. Embora seja, principalmente, uma infecção de ovinos e caprinos, esporadicamente pode acometer equinos, bovinos, camelídeos, suínos, búfalos, ruminantes selvagens, aves e
ouriços. Raramente ocorre LC em pessoas, de modo que se deve ter cuidado apropriado ao manipular animais infectados e exsudato purulento das lesões.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  C. pseudotuberculosis é um cocobacilo gram­positivo intracelular facultativo. Foram identificados dois biotipos com base na capacidade da bactéria em reduzir o nitrato: grupo nitrato­negativo, que infecta ovinos
e caprinos, e grupo nitrato­positivo, que infecta equinos. Os isolados de bovinos representam um grupo heterogêneo. Todas as cepas produzem uma exotoxina denominada fosfolipase D, capaz de exacerbar a disseminação da bactéria pelas
células endoteliais e aumentar a permeabilidade vascular. A bactéria tem um segundo fator de virulência, um revestimento lipídico externo que propicia proteção ante as enzimas hidrolíticas dos fagócitos dos hospedeiros. A replicação da
bactéria ocorre nos fagócitos que, em seguida, se rompem e liberam as bactérias. O processo contínuo de replicação bacteriana, seguido de atração e morte subsequente de células inflamatórias, origina os abscessos característicos da LC.
A  infecção  instala­se  após  a  penetração  de C.  pseudotuberculosis  na  pele  íntegra  ou  lesionada  ou  através  das  membranas  mucosas.  A  maioria  das  infecções  instala­se  a  partir  de  feridas  contaminadas  com  exsudato  purulento  e  de
abscessos pulmonares ou externos que se rompem. As lesões de pele decorrentes de tosquia, brincos de identificação, caudectomia, castração e fatores ambientais (p. ex., lascas de madeira, extremidades de metais, pregos salientes, arame)
predispõem à instalação da infecção. Em ovinos, o uso de tanques para banho de imersão comuns pode disseminar a doença porque C. pseudotuberculosis pode sobreviver nas soluções de imersão por até 24 h. A realização de tosquia
imediatamente antes do banho de imersão aumenta o risco de infecção porque costuma causar escoriação cutânea. C. pseudotuberculosis não se multiplica no ambiente, mas pode sobreviver em feno, palha e madeira durante 2 meses e no
solo por 8 meses. Sombra e umidade prolongam a permanência do microrganismo no ambiente.
ACHADOS CLÍNICOS:  A LC é uma doença recorrente crônica. Pode se desenvolver na forma de abscesso encapsulado de crescimento lento, 1 a 3 meses após inoculação da bactéria, no local de penetração cutânea ou no linfonodo regional. A
infecção pode se disseminar por via sanguínea ou linfática e causar abscessos em linfonodos ou órgãos internos, como pulmões, rins, fígado, útero e cérebro. Os locais de envolvimento menos comuns são glândula mamária, escroto e
articulações. Em alguns animais, a infecção inicial é subclínica, mas pode ser acompanhada de febre, anorexia e celulite no local da infecção. Os abscessos superficiais eventualmente se rompem e eliminam secreção purulenta contaminada
no ambiente. As feridas cutâneas se curam e deixam cicatrizes. Pode ocorrer recidiva de abscessos meses a anos depois.
Há diferença entre ovinos e caprinos quanto à distribuição dos abscessos, possivelmente como resultado de diferentes manejos. Em caprinos, os abscessos superficiais desenvolvem­se, principalmente, nas regiões de cabeça e pescoço, ao
passo que a forma visceral é mais comum em ovinos. Os abscessos internos devem ser potencialmente considerados no diagnóstico da síndrome “da ovelha magra”, na qual um pequeno ruminante adulto perde sua condição corporal,
mesmo  com  dieta  adequada.  A  transmissão  aumenta  quando  o  rebanho  é  reunido  em  grupos,  como  acontece  na  época  da  tosquia,  principalmente  por  meio  de  secreção  expelida  durante  a  tosse  de  ovinos  com  infecções  pulmonares.
Adicionalmente, lâminas de máquinas de tosquia contaminadas com material purulento podem infectar outros ovinos durante a tosquia.
A ocorrência de abscessos aumenta constantemente com o avanço da idade; a doença clínica é mais prevalente em adultos, e até 40% dos animais de um rebanho podem apresentar abscessos superficiais.
Lesões: Em ovinos, os abscessos costumam se apresentar classicamente como “anéis de cebola” laminados, em corte transversal, com camadas fibrosas concêntricas separadas por exsudato caseoso condensado. Em caprinos, os abscessos
são menos organizados, e normalmente o exsudato é mole e pastoso.
DIAGNÓSTICO:  Em pequenos ruminantes, a constatação de um abscesso externo é altamente sugestiva de LC, especialmente em um rebanho no qual a doença é endêmica; porém, para um diagnóstico definitivo, deve–se enviar uma amostra
de  aspirado  de  abscesso  intacto  para  exame  bacteriológico.  Outros  microrganismos  piogênicos,  como  Arcanobacter  pyogenes,  Staphylococcus  aureus,  Pasteurella  multocida,  e  anaeróbios,  como  Fusobacterium  necrophorum,  também
podem causar abscesso. Os pacientes infectados devem ser mantidos isolados até que se obtenha o resultado da cultura microbiológica. Em animais com abscessos viscerais, o diagnóstico é um desafio maior. Radiografia e ultrassonografia
podem ser úteis na detecção de lesões internas. A realização de cultura de aspirado transtraqueal obtido de um animal com pneumonia pode auxiliar a esclarecer se a causa é LC.
No Davis Diagnostic Laboratory, da Universidade da Califórnia, há disponibilidade do teste de inibição da hemolisina sinérgica. Esse teste detecta anticorpos contra a exotoxina fosfolipase D. Devem­se avaliar os resultados da titulação,
considerando histórico do rebanho, presença ou ausência de doença clínica e histórico de vacinação contra LC. Considera­se título 1:8 ou mais indicativo de infecção; título de 1:256 ou maior está relacionado com abscesso interno. No
entanto, os testes sorológicos não diferenciam um animal vacinado daquele naturalmente infectado. Pode haver resultado falso­negativo se o teste for realizado nas primeiras 2 semanas após a exposição, antes de ocorrer soroconversão.
Também, os animais com abscessos crônicos encapsulados podem apresentar resultado falso­negativo. Quando há dúvida quanto à condição de um animal com título positivo, deve­se repetir a titulação após 2 a 4 semanas. Caso o título
aumente e se constatem abscessos, pode­se considerar LC como a causa. Os títulos colostrais geralmente deixam de ser detectados com 3 a 6 meses de idade, de forma que o teste sorológico de cordeiros ou cabritos com menos de 6 meses
de idade deve ser interpretado com cuidado.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Uma vez definido o diagnóstico de LC, é necessário orientação do proprietário, enfatizando a natureza persistente e recidivante da doença. A abordagem mais prática para animais comerciais que apresentam
LC é o descarte deles do rebanho. No entanto, os pacientes com abscessos supurados não devem ser introduzidos em lotes de animais para venda, até que tenha cessado a secreção e a ferida, cicatrizado. Deve­se tentar o tratamento dos
animais, individualmente, estando­se ciente de que a LC não é considerada uma doença “curável”. Os animais com valor afetivo ou econômico são tratados, principalmente, por motivo estético e para evitar a contaminação do resto do
rebanho. Sempre que possível, deve­se remover o abscesso intacto mediante excisão cirúrgica. Como alternativa, os abscessos externos podem ser lancetados e drenados, e a cavidade do abscesso lavada com solução de iodo. O material
purulento deve ser coletado em recipiente descartável e incinerado. O cirurgião deve utilizar luvas descartáveis a fim de evitar autoinoculação acidental. O animal tratado deve ser isolado de outros pequenos ruminantes até que o ferimento
tenha cicatrizado.
A eficácia da terapia antimicrobiana sistêmica é controversa. Como o uso da maioria dos medicamentos não é indicado na bula (uso extralabel), é necessária uma relação cliente­paciente­veterinário. Embora o C. pseudotuberculosis seja
sensível à penicilina in vitro, o tratamento nem sempre é efetivo in vivo, porque o antibiótico não consegue penetrar adequadamente nos abscessos. Como tratamento da forma interna de LC, tem­se empregado terapia de longa duração (4 a
6  semanas)  com  penicilina  (22.000  UI/kg  IM,  2  vezes/dia)  e  rifampicina  (10  a  20  mg/kg  VO,  1  vez/dia),  com  eficácia  limitada.  Não  se  recomenda  a  prática  de  injeção  de  formalina  nos  abscessos,  pois  a  FDA  tem  tolerância  zero  ao
uso extralabel de um potente agente carcinogênico como este em animais destinados ao consumo humano.
Atualmente são aprovadas vacinas comerciais contra LC para uso em ovinos. A vacinação de animais jovens de reposição do rebanho reduz a ocorrência e a prevalência de LC no rebanho, mas não evita totalmente que ocorram novas
infecções, tampouco cura os animais já infectados. Atualmente, todas as vacinas contêm o toxoide fosfolipase D; algumas contêm, ainda, bactérias mortas. A vacina está disponível na forma de bacterina monovalente e como preparação
polivalente contendo Clostridium tetani e C. perfringens tipo D. A dose inicial é administrada por via SC na região axilar, após a diminuição da imunidade colostral (cerca de 3 meses de idade), e deve ser repetida após 4 semanas. Pode­se
melhorar a imunidade colostral pela administração de uma dose de reforço às ovelhas e às cabras prenhes 1 mês antes da parição. Recomenda­se reforço vacinal anualmente. Evidências sugerem que o aumento de frequência de vacinação,
em intervalos de 4 a 6 meses, pode ser benéfico a rebanhos sujeitos a alto risco de contaminação (p. ex., animais estabulados durante, ao menos, parte do ano). Essas vacinas devem ser utilizadas com cuidado em ovinos potencialmente
infectados, pois há relato de possíveis reações adversas (p. ex., claudicação, letargia).
O uso extralabel da vacina em caprinos está associado a menor eficácia e maior ocorrência de reações adversas (p. ex., redução da produção de leite, febre, indisposição, ataxia, edema ventral e, ocasionalmente, morte). No entanto,
relata­se algum êxito no uso de vacina comercial contra LC em caprinos. Há relato casual de sucesso com o uso de vacinas autógenas contra LC em ovinos e caprinos.
Confirmada a presença de LC no rebanho, é necessário um programa de controle efetivo para reduzir a ocorrência da doença. Os animais infectados devem ser imediatamente excluídos do grupo ou, como alternativa, isolados dos animais
não infectados, em um local separado. A presença de animais infectados assintomáticos no rebanho “limpo” limita o sucesso desse procedimento, sendo um dos motivos da difícil erradicação de LC. Cordeiros e cabritos de mães infectadas
podem ser criados com leite e colostro pasteurizados, longe de animais infectados. Devem­se vacinar os animais jovens de reposição do rebanho; os animais mais velhos devem ser gradativamente descartados à medida que a atividade
econômica permita. Quando a prevalência da doença é baixa, a vacinação deve ser interrompida e todos os animais soropositivos não vacinados descartados. Sempre que possível, devem­se adquirir animais de reposição de criadores que
adotam  programas  com  boas  práticas  de  prevenção  de  LC.  A  compra  de  animais  de  criatórios  com  histórico  desconhecido  é  fortemente  desestimulada.  Em  um  rebanho  livre  de  LC,  deve­se  permitir  somente  a  inclusão  de  animais
soronegativos e aqueles sem evidências ou cicatrizes ou abscessos próximos aos linfonodos.
Os criadores devem remover itens perigosos (arame farpado, pregos expostos, alimentadores grosseiros) do ambiente, a fim de diminuir o risco de lesão e a transmissão potencial de LC. Os criadores também devem comprar seu próprio
equipamento de tosquia e sua solução de imersão, não compartilhando esses itens com outros rebanhos. Animais adultos e aqueles com abscessos devem ser tosquiados no final, e o equipamento deve ser desinfetado, se contaminado com
exsudato. Os tosquiadores devem estar com as mãos limpas e vestir roupas e botas limpas. Todos os itens que entram em contato com os animais de diferentes rebanhos devem ser esterilizados, substituídos ou totalmente limpos antes do
uso em novo rebanho.

 LINFADENITE ESTREPTOCÓCICA DE SUÍNOS (Abscesso de mandíbula, abscesso cervical)
A linfadenite estreptocócica é uma doença contagiosa caracterizada por formação de abscessos em linfonodos cervicais, mandibulares e cefálicos. Em geral, os suínos acometidos permanecem saudáveis e se desenvolvem bem. A doença
pode influenciar negativamente a eficiência do trabalho em abatedouros em razão da condenação das cabeças infectadas, da necessidade de maior tempo para limpeza do abatedouro quando ocorre ruptura acidental de um abscesso e do
exame das carcaças afetadas pelos fiscais, a fim de verificar se estão apropriadas para consumo.
Embora tenha sido um importante problema na indústria suína, atualmente a relevância de Streptococcus porcinus e da doença resultante é insignificante. Mais recentemente, aumentou­se o interesse por S. porcinus por  conta  de  sua
participação na ocorrência de infecção urogenital em pacientes humanos. A real importância de S. porcinus na saúde humana é incerta; relata­se que, comumente, é mal identificado nos exames laboratoriais em decorrência das reações
cruzadas com S. agalactiae, indicado como causa de infecções urogenitais em pessoas. Há relato de pelo menos oito sorotipos, e identificaram­se fatores antifagocitários e estreptoquinase como fatores potenciais de virulência.
TRANSMISSÃO, EPIDEMIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A linfadenite estreptocócica é endêmica; quando ocorre em uma propriedade, grupos sucessivos de suínos desenvolvem abscessos durante o período de crescimento e terminação. Os suínos
podem se infectar pela ingestão de S. porcinus presente na secreção de abscessos rompidos que contaminam alimento e água; no entanto, os suínos portadores que se recuperaram da doença representam a mais comum e importante fonte de
infecção. Esses animais albergam S. porcinus nas tonsilas e facilmente transmitem a bactéria aos animais suscetíveis por contato direto e pela contaminação da água e dos alimentos. Os suínos são resistentes à infecção nas primeiras 3 a 4
semanas de vida, provavelmente em decorrência da imunidade passiva.
Os abscessos miliares disseminados desenvolvem­se nos linfonodos mandibulares, parotídeos ou retrofaringianos dentro de 7 dias após a infecção. Após cerca de 21 dias, é comum a constatação de abscessos com 5 a 8 cm de diâmetro;
essas lesões destroem a estrutura interna dos linfonodos acometidos e podem envolver os tecidos adjacentes. Os abscessos em desenvolvimento podem atingir a pele, com supuração, dentro de 7 a 10 semanas. As lesões drenadas cicatrizam
por meio de granulação, permanecendo uma fístula subcutânea fibrosa e densa que se cura após várias semanas. Os abscessos localizados profundamente podem não ser detectados até o abate; eles tendem a não drenar para o lúmen da
faringe. Em um lote de suínos comerciais, a taxa de prevalência pode variar de 50 a 100%.
ACHADOS CLÍNICOS, LESÕES E DIAGNÓSTICO:  Geralmente, os abscessos são os únicos sinais da infecção. São mais comuns nos linfonodos mandibulares e retrofaringianos, sendo incomuns em outros linfonodos. Raramente, a doença pode
causar meningite, poliartrite ou sepse. O diagnóstico baseia­se na cultura e no isolamento de S. porcinus na secreção do abscesso.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Nos rebanhos acometidos, os leitões devem ser desmamados com 21 dias de idade e criados em um ambiente onde não se pratica fluxo contínuo de animais nas instalações, a fim de reduzir a transferência de
bactérias de suínos mais velhos para aqueles mais jovens. Historicamente, reporta­se que o tratamento com penicilina era efetivo na cura de infecções detectadas antes da formação de abscessos. Relata­se o uso de medicamento com
alimento, na dose de 400 g de tetraciclina/tonelada, como um método efetivo na redução da quantidade de abscessos. No entanto, o tratamento, após a instalação da infecção, não é efetivo na eliminação da bactéria. A vacinação (autógena)
é possível, mas não é amplamente utilizada porque os abscessos cervicais não são considerados um problema disseminado.
LINFOMA MALIGNO CANINO

É  uma  doença  progressiva  e  fatal  causada  pela  expansão  clonal  maligna  de  células  linfoides  de  imunofenótipo  de  célula  B  ou  T.  Embora  a  transformação  neoplásica  de  célula  linfoide  não  se  restrinja  aos  compartimentos  anatômicos
específicos, o linfoma origina–se mais comumente de tecidos linfoides organizados, inclusive medula óssea, timo, linfonodos e baço. Além desses órgãos linfoides primários e secundários, incluem­se sítios extranodais como pele, trato
intestinal, fígado, olho, SNC e osso. Relata­se que o linfoma é a neoplasia hematopoética mais comum em cães, com taxa de incidência ao redor de 0,1% em cães mais velhos suscetíveis. Apesar da prevalência de linfoma maligno, sua
etiologia  continua  pouco  caracterizada.  Dentre  as  hipóteses  etiológicas  aventadas,  incluem­se  infecção  por  retrovírus,  contaminação  ambiental  com  herbicidas  à  base  de  ácido  fenoxiacético,  exposição  a  campo  magnético,  anomalias
cromossômicas e disfunção imune. Com a determinação completa do genoma do cão, espera­se que os genes específicos envolvidos na gênese e no desenvolvimento do linfoma sejam identificados e caracterizados.
ACHADOS CLÍNICOS:  O linfoma canino é um câncer heterogêneo com sinais clínicos, resposta à terapia e tempo de sobrevida variados. A heterogeneidade associada ao linfoma canino é influenciada, em parte, por vários fatores tumorais e
do  hospedeiro,  inclusive  envolvimento  anatômico,  extensão  da  doença,  subtipo  morfológico,  constituição  do  hospedeiro  e  imunocompetência.  Em  cães,  há  relato  de  quatro  formas  anatômicas  de  linfomas  bem  definidas:  multicêntrica,
alimentar, mediastinal e extranodal (renal, SNC, cutânea, ocular, óssea etc.). O linfoma multicêntrico é a forma anatômica mais comum, respondendo por cerca de 80 a 85% dos casos diagnosticados. A manifestação clínica inicial mais
comum e evidente de linfoma multicêntrico é o rápido desenvolvimento de linfadenopatia generalizada indolor. Além de linfadenopatia periférica, a maioria dos pacientes caninos apresentará linfócitos malignos detectáveis por meio de
testes diagnósticos sensíveis e que envolvem órgãos internos, inclusive baço, fígado, medula óssea e outros sítios extranodais. Ao final do curso da doença, quando há massa tumoral significativa, o paciente pode manifestar sintomas como
letargia, fraqueza, febre, anorexia e desidratação.
O linfoma alimentar responde por < 10% de todos os linfomas caninos. Os cães com lesões intestinais focais podem exibir sinais clínicos compatíveis com obstrução total ou parcial do lúmen intestinal (p. ex., vômito, constipação
intestinal, dor abdominal). No caso de envolvimento difuso do trato intestinal, os cães com linfoma alimentar podem manifestar sintomas gastrintestinais importantes e debilitantes, incluindo anorexia, vômito, diarreia e perda de peso
marcante secundária a má absorção e má digestão.
O envolvimento exclusivo do mediastino cranial pelo linfoma representa apenas uma pequena fração dos casos diagnosticados; no entanto, frequentemente nota­se aumento de linfonodo superficial em cães com doença multicêntrica.
Linfoma de mediastino é tipicamente caracterizado por aumento de linfonodos mediastinais craniais e/ou timo. Linfoma mediastinal oriundo do timo é predominantemente composto de linfócitos T malignos; no caso de doença avançada,
os sinais clínicos podem incluir angústia respiratória associada a acúmulo de fluido pleural, compressão direta de lobos pulmonares adjacentes ou síndrome da veia cava superior. Além dos sintomas respiratórios, alguns cães com linfoma
mediastinal podem manifestar poliúria e polidipsia secundárias ao desenvolvimento de hipercalcemia de malignidade, uma síndrome paraneoplásica constatada em 10 a 40% dos cães com linfoma.
Os achados clínicos associados a vários linfomas extranodais (que podem envolver pele, pulmões, rins, olhos, SNC etc.) podem ser muito variáveis e são induzidos pela lesão do órgão acometido. A forma de linfoma extranodal mais
comum envolve a pele, sendo denominada linfoma cutâneo. Os linfomas cutâneos (epiteliotróficos e não epiteliotróficos) podem se apresentar como nódulos ulcerativos aumentados solitários ou lesões escamosas difusas generalizadas. É
frequente o envolvimento de linfonodos periféricos e junções mucocutâneas. Os sinais clínicos de linfoma em outros sítios extranodais incluem angústia respiratória (pulmões), insuficiência renal (rins), cegueira (olhos), convulsões (SNC) e
dor musculoesquelética ou fratura patológica (ossos).
Lesões: Em geral, o tamanho de todos os linfonodos superficiais e vários linfonodos internos é 3 a 10 vezes maior do que o normal (forma multicêntrica). Os linfonodos acometidos apresentam­se livremente móveis, firmes e de cor marrom­
acinzentada; ocorre abaulamento da superfície de corte e não há demarcação cortical­medular. Com frequência, notam­se hepatomegalia e esplenomegalia, com aumento de volume difuso, ou vários nódulos pálidos de tamanhos variáveis
distribuídos pelo parênquima. Na forma alimentar, qualquer parte do trato gastrintestinal ou do linfonodo mesentérico pode ser acometida. Pode­se constatar envolvimento de medula óssea, SNC, rins, coração, tonsilas, pâncreas e olhos,
porém isso é menos comum.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico definitivo de linfoma frequentemente não é complicado e pode ser obtido mediante exame citológico ou histopatológico dos órgãos envolvidos. Em geral, o aspirado de linfonodos periféricos aumentados ou
órgãos viscerais afetados, com agulha fina, propicia amostras de conteúdo celular adequado e detalhes suficientes para a definição do diagnóstico. Citologicamente, os aspirados de linfonodos ou tecidos podem permitir a identificação de
populações monomórficas de células linfoides grandes (linfoblásticas), intermediárias ou pequenas. Apesar da facilidade de diagnóstico, o exame citológico não permite diferenciar ou classificar a ampla variedade de linfomas quanto ao
padrão morfológico (difuso versus folicular, clivado versus não clivado) e grau histológico (alto versus baixo). O exame citológico especializado utilizando anticorpos de linhagem específica pode diferenciar linfomas de célula B daqueles
de células T e propiciar alguma informação quanto ao prognóstico com base no imunofenótipo. No entanto, em razão das limitações inerentes associadas à citologia, o exame histopatológico do tecido continua a ser o método padrão ouro
de diagnóstico de linfoma, fornecendo informação morfológica adicional necessária para a classificação definitiva, bem como orientações para a decisão terapêutica.
Em raras condições nas quais os exames citológico e histológico não permitirem a confirmação do diagnóstico de linfoma, há disponibilidade de técnicas moleculares mais avançadas para o diagnóstico definitivo. O uso de PCR permite a
amplificação de sequências de DNA que confirmam, ou não, a presença de linfócitos de origem clonal, oligoclonal ou policlonal. Como a maioria das protuberâncias neoplásicas origina­se de expansão clonal de uma célula malignamente
transformada, as técnicas PCR podem diferenciar expansão de linfócito como consequência de câncer (linfoma) versus inflamação (linfocitose reativa ou hiperplásica). Embora as técnicas de PCR sejam altamente sensíveis, a metodologia
deve ser reservada para os casos nos quais as técnicas citológicas e histológicas não permitirem o diagnóstico ou quando os resultados não forem compatíveis com os sinais clínicos e a progressão da doença.
TRATAMENTO:  Com frequência, o tratamento de linfoma canino multicêntrico com protocolos quimioterápicos agressivos que utilizam uma combinação de medicamentos é benéfico: > 90% de todos os cães mostram redução da massa
tumoral em > 50%. Os quimioterápicos mais comumente utilizados em protocolos de combinação incluem vincristina, adriamicina, ciclofosfamida, ­asparaginase e prednisona. Os protocolos de tratamento individual variam quanto a dose,
frequência e duração do tratamento; vantagens e desvantagens de cada protocolo terapêutico podem ser vistas em livros sobre oncologia. No caso de combinação de quimioterápicos, a sobrevida esperada para cães com linfoma de linfócito
B é cerca de 12 meses, ao passo que, para cães com linfoma de linfócito T, a sobrevida costuma a se situar em torno de 6 meses. Embora o imunofenótipo (linfócito B versus linfócito T) forneça uma orientação geral para o prognóstico do
tratamento, múltiplos fatores (tumor e hospedeiro) contribuem para a duração da resposta geral e para a sobrevida de cães diagnosticados com linfoma. Para os cães que não respondem à combinação de quimioterápicos convencionais ou
que manifestam recidivas, é possível obter remissão da doença e/ou tempo de sobrevida adicional com emprego de vários protocolos de salvamento (p. ex., lomustina, MOPP, ADIC, DMAC).
Embora a quimioterapia sistêmica continue a ser a base para o tratamento de linfoma, atualmente o conceito de que fases de indução e manutenção de quimioterapia são necessárias para conseguir tempo de remissão duradouro tem se
modificado.  Protocolos  quimioterápicos  curtos,  mas  com  alta  dose  (p.  ex.,  protocolo  de  Madison  Wisconsin),  sem  manutenção,  propiciam  intervalos  livres  de  doença  e  sobrevida  equivalentes  aos  protocolos  que  incluem  terapia  de
manutenção prolongada. Além disso, o uso de radiação de metade do corpo, em substituição à quimioterapia de manutenção, mostra eficácia clínica e representa outra opção para manter períodos de remissão longos, sem necessidade de
quimioterapia prolongada.
Apesar dos resultados favoráveis esperados no tratamento de linfoma multicêntrico, a eficácia do tratamento de outras formas anatômicas de linfoma frequentemente é menor e a terapia, menos compensadora. O linfoma alimentar, se
focal, pode ser tratado efetivamente com ressecção cirúrgica e combinação de quimioterápicos. No entanto, quando há envolvimento difuso do trato intestinal, baixa reserva corporal, má absorção de nutrientes e perda de proteínas grave,
ocorrem resposta clínica discreta e sobrevida curta (ou seja, < 3 meses). A combinação de quimioterápicos, com ou sem radioterapia paliativa, pode proporcionar, aos cães com linfoma mediastinal, aumento considerável da sobrevida e
melhora  na  qualidade  de  vida.  Os  linfomas  que  envolvem  outros  sítios  extranodais  (como  a  pele)  podem  ser  tratados  com  quimioterapia,  somente  com  lomustina  ou  por  meio  de  combinação  sistêmica  (p.  ex.,  CHOP);  no  entanto,  o
desenvolvimento de doença refratária e progressiva é comum e, por fim, limitante à vida.

SISTEMA CARDIOVASCULAR – INTRODUÇÃO

O sistema cardiovascular compreende coração, veias e artérias. As valvas atrioventriculares (mitral e tricúspide) e semilunares (aórtica e pulmonar) mantêm o fluxo sanguíneo em determinada direção, a partir do coração; as valvas das
grandes veias mantêm o fluxo sanguíneo por meio delas mesmas. A frequência e a força de contração cardíaca e o grau de vasoconstrição e vasodilatação são determinados pelo sistema nervoso autônomo e pelos hormônios sintetizados no
coração e nos vasos sanguíneos (ou seja, parácrinos ou autócrinos) ou fora dessas estruturas (i. e., endócrinos).
Pouco  >  10%  dos  animais  domésticos  examinados  por  um  veterinário  apresentam  alguma  forma  de  doença  cardiovascular.  À  semelhança  de  várias  enfermidades  crônicas  de  outros  sistemas  orgânicos,  as  doenças  cardiovasculares
geralmente não regridem; quase sempre se tornam progressivamente limitantes e podem levar à morte. O exame do coração baseia­se em verificação de ruídos e sopros cardíacos, pressão de pulso e batimentos apicais, eletrocardiograma
(ECG), radiografia e ecocardiograma.

Frequência Cardíaca e Eletrocardiograma
O batimento cardíaco deve­se a uma onda de despolarização que se origina no nodo sinoatrial (SA), localizado na junção da veia cava cranial e no átrio direito. Em repouso, o nodo SA descarrega cerca de 15 vezes/min, em equinos; > 120
vezes/min, em gatos, e 60 a 120 vezes/min, em cães. Em geral, quanto maior o tamanho da espécie animal, menor a frequência de descarga do nodo SA e menor a frequência cardíaca.
Quando a norepinefrina é liberada pelos nervos simpáticos e se liga aos β1­adrenorreceptores do nodo SA, a frequência de descarga desse nodo aumenta. Essa aceleração cardíaca pode ser inibida por bloqueadores beta­adrenérgicos (p.
ex., propranolol, atenolol, metoprolol, esmolol). A frequência de descarga do nodo SA diminui quando a acetilcolina, liberada no sistema nervoso parassimpático (vago), se liga aos receptores colinérgicos do nodo SA. Essa desaceleração
cardíaca mediada pelo nervo vago pode ser bloqueada por substâncias parassimpaticolíticas (vagolíticas) (p. ex., atropina e glicopirrolato). Quando a descarga do nodo SA e a onda de despolarização atravessam os átrios, origina­se a onda P
no ECG. Subsequentemente, os átrios se contraem, ejetando pequeno volume de sangue para os respectivos ventrículos.
Em cães, mesmo os saudáveis e tranquilos, a variação da frequência cardíaca com a respiração é denominada arritmia sinusal respiratória (ASR); ela deve­se à diminuição da atividade vagal durante a inspiração e seu aumento durante
a expiração. Portanto, as substâncias vagolíticas, bem como excitação, dor, febre e insuficiência cardíaca congestiva, normalmente inibem ou minimizam a ASR. Essa variação de frequência cardíaca em sincronismo com a respiração é um
bom indicador da saúde cardíaca. É raro observar um animal cardiopata com ASR.
A frequência cardíaca também é inversamente proporcional à pressão sanguínea arterial sistêmica. Quando a pressão sanguínea aumenta, a frequência cardíaca diminui; quando a pressão sanguínea diminui, a frequência cardíaca aumenta.
Essa relação é conhecida como reflexo de Marey e  se  deve  aos  mecanismos  a  seguir  descritos.  Quando  os  barorreceptores  arteriais  de  alta  pressão  dos  seios  aórticos  e  carotídeos  detectam  aumento  da  pressão  sanguínea,  eles  enviam
impulsos aferentes mais vigorosos para o bulbo, ocorrendo aumento do estímulo eferente vagal ao nodo SA e diminuição da frequência cardíaca. Na insuficiência cardíaca, os barorreceptores (com alta atividade da Na+/K+­ATPase) entram
em fadiga, condição que reduz os sinais aferentes para o bulbo. Isso resulta em menor sinalização vagal eferente.
Quando a onda de despolarização atinge o nodo atrioventricular (AV) do átrio direito, ela atravessa lentamente esse nodo, propiciando tempo para que ocorra contração dos átrios e ejeção de pequeno volume de sangue aos ventrículos.
Em seguida, a despolarização atravessa rapidamente o subendocárdio dos ventrículos e o septo ventricular. A partir daí, passa lentamente pelo miocárdio ventricular, originando o complexo QRS do ECG, à medida que os ventrículos se
contraem. Em raras condições, pode ocorrer despolarização sem contração; a isso se denomina dissociação eletromecânica.
No ECG, o intervalo entre o início da onda P e o início do complexo QRS é denominado intervalo PQ ou PR. Trata­se do tempo necessário para a onda elétrica de despolarização começar no nodo SA e atingir o ventrículo (e, finalmente,
alcançar  o  nodo  AV).  Tudo  aquilo  que  acelera  ou  retarda  a  taxa  de  descarga  do  nodo  SA  (cronotropia)  também  acelera  ou  retarda  a  condução  através  do  nodo  AV  (dromotropia).  Consequentemente,  quando  há  aumento  da  frequência
cardíaca, ocorre diminuição do intervalo PR; quando há diminuição da frequência cardíaca, nota­se aumento do intervalo PR.
A onda T do ECG corresponde à repolarização dos ventrículos. Ela é influenciada por desequilíbrio eletrolítico, lesão miocárdica e aumento de volume ventricular. Raramente nota­se a repolarização dos átrios (onda Ta), pois ocorre
simultaneamente a um complexo QRS muito maior. Ocasionalmente, é possível notar doença de nodo AV (bloqueio AV), manifestada como uma “rede para dormir” após a onda P.

Força de Contração Ventricular
É determinada por vários fatores, incluindo volume diastólico final (pré­carga), que corresponde ao volume de sangue no interior dos ventrículos imediatamente antes de sua contração, e a contratilidade do miocárdio (estado inotrópico),
que corresponde à taxa de ciclos das unidades contráteis microscópicas do miocárdio.
A pré­carga é determinada pela diferença da pressão diastólica final entre o ventrículo e o espaço pleural, dividida pela resistência do miocárdio ventricular. A pressão diastólica final do ventrículo é determinada pela proporção entre o
volume sanguíneo e a complacência do miocárdio. A pré­carga é regulada, predominantemente, por receptores de volume de baixa pressão do coração e das grandes veias. Quando esses receptores são estimulados pelo aumento do volume
sanguíneo ou pela distensão das estruturas que os contêm, o organismo responde com a produção de maior volume de urina e dilatação das veias – na tentativa de reduzir o volume sanguíneo e a pressão nas veias responsáveis pela dilatação
venosa. O estiramento de receptores dos átrios e ventrículos induz liberação de proteínas natriuréticas, peptídio natriurético cerebral (PNC), pelos ventrículos, e peptídio natriurético atrial (PNA), pelos átrios. Essas proteínas natriuréticas,
também denominadas atriopeptinas, relaxam os músculos lisos e geralmente se contrapõem aos efeitos da vasopressina e da angiotensina II.

Coração normal de bovino. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

A  contratilidade  miocárdica  é  determinada  pela  disponibilidade  de  ATP  e  cálcio,  que  possibilita  a  formação  da  ponte  cruzada  miosina­actina.  A  taxa  de  liberação  de  energia  pelo  ATP  é  determinada,  em  parte,  pela  quantidade  de
norepinefrina ligada aos receptores β1­adrenérgicos do miocárdio. Um dos principais fatores envolvidos na insuficiência cardíaca é o baixo controle (quantidade reduzida) de β1­receptores.

Oxigênio e Miocárdio
O  oxigênio  é  essencial  para  a  produção  da  energia  necessária  às  funções  orgânicas.  A  quantidade  de  oxigênio  disponível  para  produção  dessa  energia  é  denominada  teor  de  oxigênio  tecidual.  O  conteúdo  de  oxigênio  do  miocárdio
corresponde ao equilíbrio entre a quantidade de oxigênio liberada no coração, subtraindo­se a quantidade de oxigênio consumida pelo órgão.
O volume de oxigênio liberado no coração depende da função pulmonar, do teor de Hb disponível e do fluxo sanguíneo no músculo cardíaco propiciado pelas artérias coronárias. Presumindo­se que os pulmões estejam funcionando bem
e que haja Hb suficiente, o fluxo sanguíneo coronariano determina o conteúdo de oxigênio liberado no miocárdio. O fluxo sanguíneo coronariano é determinado pela diferença da pressão entre a artéria aorta (normalmente 100 mmHg)* e o
átrio direito (em geral, 5 mmHg), o qual recebe a maior parte do sangue das artérias coronárias. Como o fluxo coronariano é maior durante a diástole, frequências cardíacas menores (as quais, preferencialmente, aumentam o tempo de
diástole) estão associadas a maior liberação de oxigênio no miocárdio.
A quantidade de oxigênio consumido pelo coração é denominada consumo de oxigênio miocárdico. É determinada, principalmente, pela tensão da parede e pela frequência cardíaca. A tensão da parede é expressa pela lei de LaPlace, na
qual a tensão aumenta com o aumento da pressão ou do diâmetro ventricular, e a tensão diminui com o aumento da espessura da parede do ventrículo. A tensão aumenta em condições que aumentam a pós–carga (pressão), como estenose
pulmonar, estenose subaórtica, hipertensão sistêmica ou pulmonar ou pré­carga (volume), incluindo insuficiência da valva mitral e cardiomiopatia dilatada. Na ausência de lesão estenótica, a pré­carga é determinada pela rigidez relativa das
artérias e pelo grau de constrição das arteríolas. O tônus do músculo liso vascular depende de vários fatores; alguns contraem o músculo (p. ex., agonistas adrenérgicos, angiotensina II, vasopressina e endotelina), outros relaxam­no (p. ex.,
norepinefrina, atriopeptina, bradicinina, adenosina, óxido nítrico). Com frequência, há aumento da pós­carga na insuficiência cardíaca, e comumente a terapia tende a diminuí­lo.
Aumento  da  frequência  cardíaca  resulta  em  maior  consumo  de  oxigênio  pelo  miocárdio,  ao  passo  que  a  duração  da  diástole  diminui  quando  o  fluxo  sanguíneo  coronariano  é  maior.  A  combinação  pode  induzir  o  estágio  para  um
desequilíbrio na demanda e no fornecimento de oxigênio ao miocárdio, ocasionando isquemia miocárdica. Insuficiência cardíaca é caracterizada por aumento do tônus simpático e aumento relativo na frequência cardíaca; o impacto final é
um miocárdio ineficiente que pode resultar em remodelação prejudicial.
O oxigênio é responsável pela produção da maior parte de ATP, que atua como combustível para contração e relaxamento do miocárdio. O cálcio deve ser rapidamente liberado das reservas intracelulares (retículo sarcoplasmático),
permitindo a contração, embora seja necessária a remoção igualmente rápida do cálcio de volta ao retículo sarcoplasmático para o relaxamento. Ambos os mecanismos envolvidos no ciclo do cálcio dependem de energia.
Na insuficiência cardíaca, o controle inapropriado do cálcio pode ser o principal fator de redução da força de contração e da taxa de relaxamento (ou seja, redução das funções sistólica e diastólica).

Resistência ao Fluxo Sanguíneo
O fluxo sanguíneo do coração, denominado débito cardíaco,  é  oriundo de ambos  os  ventrículos,  esquerdo  e  direito.  O  sangue  flui  pelos  ramos arteriais sistêmicos (ventrículo esquerdo) ou pelos ramos da artéria pulmonar (ventrículo
direito), sendo fundamental na manutenção de função cardíaca apropriada e, consequentemente, na perfusão dos órgãos com quantidade adequada de sangue e oxigênio. A maior parte (> 90%) da resistência ao fluxo sanguíneo deve­se ao
grau de constrição das arteríolas, denominado resistência vascular; no entanto, parte se deve à rigidez da porção das grandes artérias próxima aos ventrículos, denominada impedância. Os ventrículos ejetam o volume sistólico à porção
proximal das grandes artérias, que se expandem para acomodar esse volume de sangue; quando os ventrículos se relaxam, as grandes artérias distendidas se contraem e mantêm o fluxo de sangue, por meio das arteríolas, para capilares. As
valvas aórtica e pulmonar se fecham e impedem o retorno do volume sistólico aos ventrículos que o ejetam.
Um dos principais fatores relacionados com a insuficiência cardíaca que causa morbidade é o aumento da resistência dos músculos lisos de artérias, arteríolas e veias, em razão do aumento dos teores de angiotensina II, vasopressina e
endotelina.  Se  o  ventrículo  esquerdo  é  incapaz  de  ejetar  um  volume  sistólico  normal,  ou  débito  cardíaco,  é  razoável  que  a  função  ventricular  possa  ser  melhorada  pela  diminuição  da  resistência  vascular.  Diminuição  da  pós­carga
(vasodilatação arterial) é um objetivo terapêutico no tratamento de insuficiência cardíaca.

 ANORMALIDADES DO SISTEMA CARDIOVASCULAR
Os seguintes mecanismos podem resultar em anormalidades do sistema cardiovascular: (1) falha no fechamento ou abertura inadequada das valvas cardíacas (doença valvular); (2) baixa capacidade de bombeamento do músculo cardíaco ou
seu relaxamento inadequado (doença do miocárdio); (3) batimentos cardíacos muito lentos, muito rápidos ou muito irregulares (arritmias); (4) alta resistência dos vasos sistêmicos ao fluxo sanguíneo (doença vascular); (5) presença de
orifício entre as câmaras dos lados esquerdo e direito do coração (shunts cardíacos); (6) excesso ou escassez de sangue em comparação com a capacidade do compartimento vascular e (7) parasitismo no sistema cardiovascular (p. ex.,
dirofilariose). As doenças de maior importância, em razão da maior prevalência, incluem regurgitação mitral em cães, cardiomiopatia hipertrófica em gatos, cardiomiopatia dilatada em cães, cardiomiopatia arrítmica em cães da raça Boxer e
dirofilariose.
DOENÇA VALVULAR:  O  fechamento  inadequado  das  valvas  cardíacas  ocasiona  regurgitação,  que  ocorre  mais  comumente  como  regurgitação  mitral  ou  como  regurgitação  tricúspide  e  mitral.  Regurgitação  de  valva  mitral  e/ou  tricúspide
representa > 75% de todas as doenças cardíacas de cães. À medida que o sangue regurgita pelas valvas AV, ouve­se um sopro sistólico típico entre a primeira e a segunda bulhas cardíacas. Quando o sangue regurgita através da valva mitral
ou tricúspide, grande quantidade de sangue se movimenta para a frente e para trás entre o ventrículo e o átrio. Consequentemente, na regurgitação mitral é comum notar aumento de volume do átrio esquerdo e do ventrículo esquerdo. O
grau de dilatação do átrio esquerdo, documentado por radiografia ou ecocardiografia, pode indicar a gravidade da doença. A regurgitação mitral ou tricúspide é mais comum nos cães de raças pequenas e em equinos idosos, animais que
possuem cúspides valvulares espessadas e rugosas pela infiltração de glicosaminoglicanos. A regurgitação mitral é mais prevalente em cães da raça Cavalier King Charles Spaniel jovens do que em qualquer outra raça.
A regurgitação aórtica é mais frequente em cães de raças grandes e em equinos idosos, após infecção (cães) ou degeneração não inflamatória da valva aórtica. Ocorre dilatação do ventrículo esquerdo por conta da regurgitação da aorta,
proporcional ao grau de regurgitação. O sopro provocado pela regurgitação do sangue da valva aórtica para o ventrículo esquerdo é sempre do tipo diastólico, ouvido imediatamente após a segunda bulha cardíaca. Nos equinos, o ruído
decorrente de regurgitação aórtica pode ser descrito como “assopro”, por causa do fluxo de sangue regurgitante, ou como “zumbido”, por conta da vibração de folhetos aórticos à medida que passa o fluxo de sangue. O sopro na forma de
“zumbido” quase sempre está associado a quantidade relativamente pequena de fluxo regurgitante. Uma relação semelhante pode ser notada em cães com regurgitação mitral.
A abertura inadequada das valvas é denominada estenose. Estenose pulmonar é mais prevalente, ao passo que estenose de valva aórtica é incomum; estenose mitral ou tricúspide é rara. No entanto, a ocorrência de estenose subaórtica,
causada por uma faixa de tecido fibroso ou fibromuscular localizada logo abaixo da valva aórtica, é predominante, especialmente, em algumas raças de cães (p. ex., Newfoundland, Golden Retriever, Boxer, Rottweiler e Pastor Alemão).
Caso a valva se abra inadequadamente, maior pressão deve ser gerada para manter o volume normal de sangue que flui através dela. O ventrículo responsável pelo bombeamento de sangue através da valva estenosada sofre hipertrofia
(torna­se espesso), proporcionalmente ao grau de estreitamento da estenose. O sopro sistólico provocado por estenose pulmonar ou subaórtica é ouvido entre a primeira e a segunda bulhas cardíacas; tipicamente, sua duração é mais breve do
que o sopro sistólico da regurgitação mitral, sendo mais audível na base da parte esquerda do coração. A gravidade da estenose geralmente pode ser estimada pela intensidade do sopro. Em geral, quanto mais intenso o ruído do sopro, maior
o grau de estenose. A velocidade do fluxo sanguíneo através da abertura estenosada está associada à gravidade da lesão e pode ser avaliada seguramente por meio de ecocardiografia Doppler espectral.
DOENÇA DO MIOCÁRDIO:  O prejuízo à força de contração é denominado redução da função sistólica, ocorrendo mais comumente na cardiomiopatia dilatada (em gatos e cães de raças grandes que recebem tipicamente dieta com baixo teor
de  taurina)  e  na  regurgitação  mitral  de  longa  duração.  Quando  isso  acontece,  diz­se  que  o  músculo  cardíaco  está  em  estado  inotrópico  negativo  ou  apresenta  redução  da  contratilidade.  Geralmente,  em  cães  de  raças  grandes,  isso  é
denominado cardiomiopatia dilatada idiopática, porque a origem é desconhecida.
O prejuízo ao relaxamento ventricular é denominado redução da função diastólica, condição que ocorre mais frequentemente quando há déficit de oxigênio no músculo cardíaco e consequente carência de energia para seu relaxamento. Os
músculos ventriculares também relaxam deficientemente no caso cardiomiopatia hipertrófica (ou seja, quando o músculo fica demasiadamente espesso) ou no caso de doença de pericárdio, quando o pericárdio espessado ou o fluido contido
no saco pericárdico interfere no relaxamento. A cardiomiopatia hipertrófica é mais comum em gatos. Provavelmente, > 85% dos gatos com doença cardíaca apresentam cardiomiopatia hipertrófica. Um menor número de gatos desenvolve
cardiomiopatia restritiva, na qual há preenchimento cardíaco deficiente porque as paredes são mais rígidas que o normal. A doença de pericárdio é mais prevalente em cães de raças grandes, idosos, com tumores que sangram no interior do
saco pericárdico.
ARRITMIAS:  Todo  ritmo  cardíaco  diferente  do  ritmo  sinusal  normal  é  denominado  arritmia.  Arritmia  muito  rápida,  muito  lenta  ou  muito  irregular  pode  resultar  em  menor  débito  cardíaco,  provocando  sinais  clínicos  que  podem  incluir
intolerância ao exercício, síncope ou exacerbação de insuficiência cardíaca congestiva (ICC). As arritmias mais frequentes incluem fibrilação atrial (comumente notada em equinos e cães de raças grandes com dilatação de átrio esquerdo),
despolarizações ventriculares prematuras (mais comumente notadas em cães das raças Boxer e Doberman Pinscher), síndrome do seio doente (constatada, principalmente, em cães idosos da raça Schnauzer miniatura) e bloqueio AV de
terceiro grau.
Na  fibrilação  atrial,  a  despolarização  atrial  não  é  sincrônica,  a  estimulação  do  nódulo  AV  é  frequente,  porém  aleatória,  e  a  frequência  cardíaca  torna­se  rápida  e  irregular.  As  despolarizações  ventriculares  prematuras  (também
denominadas batimentos ou complexos ventriculares prematuros) são oriundas de regiões ventriculares irritadas. Em geral, tais estímulos são decorrentes do estiramento crônico das fibras, bem como do déficit de oxigênio ou do efeito de
medicamentos.  Um  batimento  prematuro  único  não  causa  problema,  mas  vários  batimentos  prematuros  podem  progredir  para  estímulos  longos  ou  curtos  que  prejudicam  a  hemodinâmica  e  causam  síncope,  ou  até  mesmo  espasmo
ventricular grave (fibrilação ventricular), que ocasiona morte súbita. Isso comumente ocorre em cães da raça Boxer que apresentam cardiomiopatia ventricular direita arritmogênica (anteriormente denominada cardiomiopatia do Boxer).
Tanto na síndrome do seio doente (ou seja, interrupção transitória da descarga do nodo SA) como no bloqueio cardíaco total (no qual nenhuma despolarização atrial se propaga aos ventrículos), a frequência ventricular torna­se intensamente
baixa e pode ocasionar prejuízo à hemodinâmica, intolerância a exercício e síncope.
DOENÇA VASCULAR:  O prejuízo ao fluxo sanguíneo através das arteríolas com frequência provoca hipertensão, especialmente em animais idosos, com insuficiência renal (cães e gatos), hiperadrenocorticismo (cães) ou hipertireoidismo
(gatos). A causa primária exata geralmente é desconhecida, mas se suspeita de outras etiologias, como retenção de sódio e expansão do volume plasmático, hiperaldosteronismo, aumento do tônus simpático e, possivelmente, angiotensina
II. Independentemente da causa, a perda da complacência arteriolar pode permanecer mesmo com tratamento adequado da condição clínica associada. Vasodilatadores arteriais representam o principal suporte no tratamento de hipertensão.
SHUNTS (DESVIOS) CARDÍACOS:  As comunicações anormais entre as câmaras cardíacas dos lados esquerdo e direito são denominadas shunts intracardíacos. Eles se devem (em prevalência decrescente) à persistência do ducto arterioso (entre a
aorta e o tronco pulmonar), ao defeito de septo ventricular (entre os ventrículos esquerdo e direito) ou ao defeito do septo atrial (entre os átrios esquerdo e direito). Quando o sangue passa por esses defeitos, do lado esquerdo do coração para
o lado direito, que é a situação mais comum, denomina­se shunt esquerdo­direito. Ele resulta em excessiva circulação pulmonar e dilatação das câmaras cardíacas, necessária para bombear ou transportar o sangue desviado. Por fim, a
dilatação crônica ocasiona insuficiência miocárdica.
Tetralogia  de  Fallot  (p.  94)  é  uma  anomalia  congênita  complexa  que  consiste  em  fluxo  ventricular  direito  hipoplásico  e/ou  tronco  pulmonar,  uma  artéria  aorta  que  atravessa  o  septo  interventricular  (portanto,  surge  de  ambos  os
ventrículos),  defeito  de  septo  ventricular  e  hipertrofia  ventricular  direita.  O  sangue  deficientemente  oxigenado  entra  na  circulação  sistêmica  e  ocasiona  membranas  mucosas  azuladas  (cianose)  e  aumento  na  quantidade  de  hemácias
(policitemia). A tetralogia de Fallot é a forma mais comum de shunt direito­esquerdo.
DIROFILARIOSE:   A  dirofilariose  (p.96)  é  outra  importante  doença  cardíaca  constatada,  principalmente,  em  cães,  mas  também  em  gatos,  transmitida  por  mosquitos.  Na  dirofilariose,  os  vermes  adultos  presentes  nos  vasos  pulmonares
impedem o fluxo sanguíneo aos pulmões e o sangue se acumula no lado direito do coração e nas veias sistêmicas. Em cães, a progressão da doença é variável; em gatos, geralmente é < 2 anos. Tanto os cães quanto os gatos morrem por
conta da hipertensão pulmonar causada pela obstrução parcial do fluxo de sangue nos vasos pulmonares parasitados.

Características Comuns da Doença Cardíaca
Os sinais clínicos associados a qualquer das doenças anteriormente mencionadas devem­se à perfusão inadequada do órgão (p. ex., intolerância a exercício, fraqueza e síncope) ou ao acúmulo de sangue em órgãos nos quais há drenagem
inapropriada de sangue venoso (p. ex., edema pulmonar, ascite, edema com sinal de cacifo, efusões). Um animal que apresenta sinais clínicos decorrentes de insuficiência relativa do sistema cardiovascular em propiciar volume suficiente de
sangue para manter as funções normais é considerado portador de insuficiência cardíaca. Um animal que manifesta sintomas causados por acúmulo de sangue em órgãos deficientemente drenados é considerado portador de ICC. Quando o
sangue arterial sistêmico apresenta teor inadequado de oxigênio, com grande quantidade de Hb não oxigenada, as membranas mucosas tornam­se cianóticas e, com frequência, nota­se policitemia.
A condição orgânica dos animais com doença cardíaca pode se agravar gradativamente, em razão, principalmente, de edema pulmonar, ou eles podem morrer subitamente em decorrência de arritmias e ruptura de cordas tendíneas ou de
átrio esquerdo.

Insuficiência Cardíaca, Insuficiência Cardíaca Congestiva e Fraqueza Cardíaca
Insuficiência cardíaca é definida como menor contratilidade do miocárdio, a qual pode ser determinada por uma menor força de contração qualquer que seja a pré­carga. Mais objetivamente, pode­se considerar fraqueza cardíaca quando há
menor taxa de liberação de energia oriunda do metabolismo do ATP ou menor velocidade de encurtamento de fibras quando o coração se contrai, em uma situação imaginária de contração ante a ausência de carregamento. É difícil mensurar
diretamente a contratilidade do miocárdio e identificar insuficiência do miocárdio. Quase todos os animais com doença cardíaca que ocasionam dilatação de câmara cardíaca ou aumento da espessura de suas paredes apresentam fraqueza
cardíaca, mas, em geral, apresentam­se compensados e não manifestam sintomas; portanto, eles apresentam insuficiência cardíaca ou ICC.
Insuficiência  cardíaca  e  ICC  (p.  108)  são  síndromes  clínicas  nas  quais  o  animal  manifesta  sinais  decorrentes  de  uma  complexa  interação  entre  fraqueza  cardíaca  e  vasos  sanguíneos.  Na  insuficiência  cardíaca,  o  débito  cardíaco  é
insuficiente para a perfusão dos órgãos com volume de sangue oxigenado suficiente para a função orgânica apropriada durante repouso (denominada insuficiência cardíaca funcional classe IV), durante leve esforço (classe III), durante
exercício moderado (classe II) ou durante exercício extremo (classe I). Na ICC, o sangue acumula­se nos órgãos – em geral, nos pulmões e, ocasionalmente, nos órgãos sistêmicos – e faz que os órgãos com congestão sanguínea funcionem
anormalmente e/ou se tornem edematosos. A classificação funcional da insuficiência cardíaca é expressa quando, durante exercícios graduados, o animal manifesta sinais clínicos de doença cardíaca (p. ex., dispneia, tosse, colapso).

 DIAGNÓSTICO DE DOENÇA CARDIOVASCULAR
Os procedimentos mencionados a seguir são importantes no diagnóstico de doença cardiovascular: resenha, anamnese, exame físico (p. ex., inspeção, auscultação, palpação), radiografia, ECG e ecocardiografia. Devem–se obter imagens
radiográficas,  eletrocardiográficas  e  ecocardiográficas  de  qualidade,  caso  contrário  não  é  possível  uma  interpretação  confiável.  A  maioria  das  doenças  cardiovasculares  (p.  ex.,  regurgitação  mitral,  cardiomiopatia  dilatada)  pode  ser
diagnosticada  por  meio  de  exame  físico  e  radiografia.  O  ECG  é  específico  para  o  diagnóstico  de  arritmias  (p.  ex.,  fibrilação  atrial,  síndrome  do  seio  doente).  A  ecocardiografia  é  excelente  para  confirmação  de  diagnóstico,  para
caracterização da forma de cardiomiopatia felina, para detecção de neoplasias cardíacas ou de doença do pericárdio e para determinar a gravidade das lesões estenóticas. O diagnóstico de dirofilariose é mais confiável pela detecção de
antígenos ou anticorpos contra fêmeas de Dirofilaria adultas no sangue (cães) ou por meio de radiografias do tórax (gatos).
Várias doenças cardíacas acometem especificamente determinadas raças. Qualquer cão da raça Cocker Spaniel macho e idoso, com tosse, respiração laboriosa e intolerância a exercício, ou qualquer cão da raça Cavalier King Charles
Spaniel  é  mais  propenso  a  regurgitação  mitral;  no  entanto,  a  doença  pulmonar  obstrutiva  crônica  com  fibrose  pode  ocasionar  sintomas  bem  parecidos.  Qualquer  cão  da  raça  Doberman  Pinscher  de  meia–idade,  deprimido,  com  tosse,
intolerante a exercício e com frequência cardíaca rápida e irregular provavelmente apresenta cardiomiopatia dilatada. Qualquer fêmea canina da raça Schnauzer miniatura de meia­idade a idosa que tem crises de desmaio possivelmente
apresenta síndrome do seio doente. Qualquer cão da raça Boxer que manifesta episódios intermitentes de desmaio provavelmente é portador de cardiomiopatia ventricular direita arritmogênica ou cardiomiopatia dilatada. Um gato de meia­
idade com respiração laboriosa e relutância em se deitar possivelmente apresenta doença de miocárdio (mais comumente cardiomiopatia hipertrófica). Um gato idoso provavelmente tem hipertireoidismo.
Deve­se  considerar  a  possibilidade  de  doença  cardíaca  ao  identificar  qualquer  dos  seguintes  achados  no  exame  físico:  (1)  frequência  cardíaca  rápida,  lenta  ou  irregular  (não  associada  a  arritmia  sinusal  respiratória);  (2)  ausência  de
arritmia sinusal respiratória, mesmo com o animal em repouso (isso também ocorre em decorrência de dor, febre ou excitação); (3) auscultação de mais que duas bulhas cardíacas (p. ex., ritmo de “galope”) em qualquer animal, exceto em
equinos (mais comum em gatos com cardiomiopatia); (4) auscultação de sopro forte; (5) abafamento de bulhas cardíacas na ausência de obesidade (pode indicar efusão pericárdica ou pleural); (6) pulso arterial rápido, fraco ou irregular,
com maior frequência cardíaca do que pulsações arteriais (déficit de pulso); (7) desmaio ou menor tolerância do animal ao exercício, na ausência de doença musculoesquelética ou obesidade; (8) cianose de membranas mucosas aguda na
ausência de doença pulmonar primária.
A ecocardiografia é mais confiável do que a radiografia – que, por sua vez, é mais efetiva que o ECG – na detecção de aumento de volume das câmaras cardíacas e dos grandes vasos. Em geral, o grau de dilatação das câmaras cardíacas
está relacionado com a gravidade da doença. O grau de ingurgitamento das veias pulmonares, detectado radiograficamente, ou o grau de prejuízo à movimentação da parede do ventrículo esquerdo ou de estreitamento da parede livre do
ventrículo esquerdo pode estimar a gravidade da insuficiência cardíaca. Infelizmente, nem sempre há boa correlação entre as medições hemodinâmicas ou ecocardiográficas, assim como entre os sintomas ou a probabilidade de morte.
Parece haver melhor correlação entre o aumento das frequências cardíaca e respiratória e incapacidade ao exercício e a gravidade da doença cardíaca.
O diagnóstico de doenças cardiovasculares específicas é abordado em seus respectivos capítulos.

PRINCÍPIOS TERAPÊUTICOS
Ver farmacoterapia sistêmica do sistema cardiovascular, p. 2550.
Embora o tratamento seja específico da doença, há alguns objetivos gerais da terapia de doença cardíaca: (1) minimizar o estiramento crônico das fibras miocárdicas, pois isso lesiona e irrita as fibras, faz com que consumam quantidade
exagerada  de  oxigênio  e  as  leva  à  morte  e  à  substituição  por  tecido  conjuntivo  fibroso  (remodelagem);  (2)  remover  o  fluido  de  edema,  o  que  deixa  os  pulmões  congestionados  com  fluidos,  pesados  e  rígidos,  causa  desequilíbrio  na
ventilação­perfusão e provoca fadiga dos músculos ventilatórios; (3) melhorar a circulação e diminuir o grau de regurgitação (mais frequentemente de regurgitação mitral). A melhora da circulação aumenta o fluxo sanguíneo aos órgãos
importantes, ao passo que a redução na regurgitação mitral minimiza o estiramento do átrio esquerdo e das veias pulmonares e diminui a pressão capilar pulmonar e a formação de edema; (4) controlar a frequência e o ritmo cardíacos.
Coração que bate demasiadamente lento não ejeta volume de sangue suficiente; por outro lado, coração que bate demasiadamente rápido não permite tempo de preenchimento adequado e consome muito mais oxigênio quando há fluxo
sanguíneo coronariano muito baixo. Quando o coração bate muito irregularmente, pode ocorrer fibrilação ventricular e morte súbita; (5) melhorar a oxigenação sanguínea. Oxigenação inadequada propicia energia insuficiente para contração
e relaxamento do miocárdio. Oxigenação miocárdica inadequada também pode ocasionar arritmia; (6) manter os receptores β1­adrenérgicos bem ajustados. A função inadequada dos receptores β1­adrenérgicos interfere na capacidade de
controlar doenças de outros sistemas orgânicos; (7) minimizar o risco de tromboembolia. Gatos com cardiomiopatia hipertrófica podem eliminar êmbolos do átrio esquerdo dilatado, com risco de bloqueio dos principais ramos arteriais e de
ocasionar isquemia e morte; (8) eliminar as dirofilárias adultas e as microfilárias. Esses parasitos adultos podem provocar graves alterações nas artérias pulmonares e, por fim, impedir o fluxo sanguíneo aos pulmões.
Os objetivos básicos do tratamento de doença cardiovascular são alcançados quando é possível considerar a doença do animal como classe funcional I após o tratamento, quando as frequências respiratória e cardíaca não aumentam em
repouso e quando há arritmia sinusal respiratória.

Medicamentos Comuns
A furosemida é um diurético de alça que diminui a reabsorção de sódio, cloreto e potássio na alça ascendente de Henle. Ela também atua como venodilatador quando utilizada por via IV. É o procedimento mais importante e efetivo para
remoção de fluido de edema em animais com doença cardíaca e, frequentemente, é um procedimento que impede a morte do animal em situação de emergência. A diurese com furosemida pode ser exacerbada pelo uso de diuréticos tiazidas
(p. ex., cloridrato de tiazida). As tiazidas impedem a reabsorção de sódio e água nos túbulos renais distais. Quando se utiliza diurético de alça associado a diurético que atua nos túbulos distais, reduz­se intensamente a capacidade dos rins
em reter água, podendo ocorrer desidratação e hipocalemia. Isso pode ser indicado pelo agravamento da azotemia.
A espironolactona, um diurético que poupa potássio, inibe a aldosterona. À semelhança das tiazidas, exerce seu efeito diurético, principalmente, no túbulo contorcido distal. Embora a espironolactona mantenha efetivamente os teores de
potássio, dados recentes sugerem que não induz a um efeito diurético significativo. A espironolactona minimiza a remodelagem dos vasos sanguíneos e do coração; à semelhança dos inibidores da enzima conversora de angiotensina (ECA)
e dos betabloqueadores, melhora os sintomas e prolonga o tempo de vida de pessoas com insuficiência cardíaca. A amilorida e o triantereno também são diuréticos poupadores de potássio.
Os glicosídios digitálicos inibem a Na+/K+­ATPase da membrana. Isso aumenta o teor intracelular de sódio, a qual ativa a bomba de sódio­cálcio, que, por sua vez, aumenta a concentração intracelular de cálcio. A digoxina aumenta a
força de contração do miocárdio, diminui a frequência cardíaca e melhora a função do barorreceptor.
Enalapril, benazepril e ramipril são inibidores de ECA comumente utilizados no controle de insuficiência cardíaca em cães. São igualmente efetivos como bloqueadores da conversão de angiotensina I em angiotensina II. Minimizam a
remodelagem dos vasos sanguíneos e do miocárdio.
Anrinona e milrinona, análogos da teofilina que impedem a ação de outras formas de fosfodiesterase, são potentes inodilatadores IV; ou seja, têm efeitos vasodilatador e inotrópico positivos. Piomendan, que é um sensibilizante de cálcio
e inibidor da fosfodiesterase, também é um inodilatador que melhora a qualidade de vida e a sobrevida de cães com ICC.
Procainamida e quinidina, antiarrítmicos classe IA antigamente utilizados no tratamento de arritmias ventriculares, têm sido substituídas pelo betabloqueador sotalol e pelo antiarrítmico classe IB mexiletina. São mais frequentemente
utilizados para arritmias ventriculares que não representam risco à vida. Lidocaína, um antiarrítmico classe IB, é administrada nos casos de arritmias ventriculares emergenciais, apenas por via IV.
Atenolol, propranolol e metoprolol são betabloqueadores de uso oral, e o esmolol é um betabloqueador IV; reduzem a frequência cardíaca, suprimem arritmias e controlam os receptores adrenérgicos. Carvedilol é um bloqueador beta e
alfa­adrenérgico que inativa radicais livres. Carvedilol, à semelhança dos inibidores da ECA e da espironolactona, prolonga a vida e minimiza os sintomas de insuficiência cardíaca.
Diltiazem  é  um  bloqueador  de  canal  de  cálcio  utilizado  para  diminuir  a  frequência  ventricular  em  animais  com  fibrilação  atrial.  Também  é  utilizado  para  diminuir  a  rigidez  miocárdica  em  gatos  com  cardiomiopatia  hipertrófica.
Amiodarona é útil no controle de todas as formas de arritmia, mas há experiência clínica relativamente escassa a seu respeito. No entanto, durante o tratamento, os cães comumente apresentam aumento das atividades de enzimas hepáticas.
Atropina e glicopirrolato inibem a ação do nervo vago no nodo SA. Como o nervo vago reduz a descarga do nodo SA e a frequência cardíaca, esses compostos aumentam a frequência cardíaca e podem ser úteis quando há bradicardia
mais evidente. A nitroglicerina é um venodilatador geralmente aplicado em forma de pasta cutânea na parte interna do pavilhão auricular ou da coxa; o sangue se acumula nas veias periféricas dilatadas, diminuindo a pré­carga do ventrículo
esquerdo e reduzindo o edema pulmonar. Ácido acetilsalicílico, clopidogrel, dalteparina, enoxaparina e cumadina são anticoagulantes que podem evitar tromboembolia em gatos com cardiomiopatia. Taurina e L­carnitina são aminoácidos
úteis na prevenção de cardiomiopatia dilatada em gatos e em alguns cães, respectivamente. A melarsomina é utilizada no tratamento de infecção por dirofilárias adultas; ivermectina, milbemicina e selamectina destroem microfilárias.
Pimobendana  e  os  inibidores  da  ECA  são  comprovadamente  seguros  e  efetivos  no  tratamento  de  cães  com  arritmias  ou  com  insuficiência  cardíaca.  Furosemida  e  digoxina  são  aprovadas,  porém  não  há  dados  que  comprovem  sua
segurança ou eficácia. O uso de outros medicamentos no tratamento de insuficiência cardíaca ou de arritmias baseia–se em dados não publicados ou em estudos não controlados.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SISTEMA CARDIOVASCULAR

As anomalias congênitas do sistema cardiovascular estão presentes ao nascimento e podem ser induzidas por fatores genéticos, ambientais, infecciosos, tóxicos, medicamentosos, nutricionais ou outros fatores, ou pela associação de fatores.
Em várias anomalias suspeita­se de etiologia hereditária baseada na predisposição racial e em estudos de acasalamento. As anomalias cardíacas congênitas são importantes não apenas devido suas consequências, mas também pelo potencial
de transmitir à prole e, consequentemente, acometer toda a ninhada. Além das doenças cardíacas congênitas, várias outras anomalias cardiovasculares têm origem genética ou, ao menos, se suspeita disso. Doenças como cardiomiopatia
hipertrófica, cardiomiopatia dilatada e doença valvular degenerativa de cães de raças pequenas podem ter importante componente hereditário.
Em um amplo estudo sobre doença cardíaca congênita em cães notou­se taxa de prevalência de 0,68%; anomalias comuns incluíram persistência de ducto arterioso – PDA (28%), estenose pulmonar (20%), estenose subaórtica (14%),
persistência do arco aórtico direito (8%) e defeito de septo ventricular (7%). As doenças cardíacas congênitas menos comuns (< 5% dos casos) incluíam tetralogia de Fallot, defeito de septo atrial, persistência de veia cava cranial esquerda,
displasia  mitral,  displasia  tricúspide  e  cor  triatriatum  dexter.  Estudos  mais  recentes  mostram  aumento  da  prevalência  de  estenose  subaórtica,  que  atualmente  supera  a  de  estenose  pulmonar,  e  a  considera  o  segundo  defeito  cardíaco
congênito mais comum em cães. No entanto, em razão das diferenças regionais as anomalias cardíacas congênitas mais comuns em cães criados nos EUA diferem daquelas relatadas no Reino Unido e, possivelmente, daquelas detectadas na
Europa e em outras regiões.
Nos gatos, estima­se que a prevalência de doença cardíaca congênita seja 0,2 a 1% e inclui defeitos do septo atrioventricular (inclusive defeito do septo ventricular, defeito do septo atrial e defeito do coxim endocárdico), displasia da
valva atrioventricular, fibroelastose endocárdica, PDA, estenose aórtica e tetralogia de Fallot. Os defeitos mais comuns em outras espécies incluem: bovinos – defeito do septo ventricular, ectopia cardíaca e hipoplasia ventricular; ovinos –
defeito do septo ventricular; suínos – displasia da valva tricúspide, defeito do septo atrial e estenose subaórtica; equinos – defeito do septo ventricular, PDA, tetralogia de Fallot e atresia da tricúspide. Equinos da raça Árabe apresentam
incidência relativamente maior de anomalias congênitas do que aqueles de outras raças; várias anomalias foram relatadas nessa raça.

Detecção, Diagnóstico e Importância Clínica
A detecção precoce de anomalia cardíaca congênita é fundamental por várias razões. Algumas doenças cardíacas são corrigidas por meio de cirurgia e o tratamento deve ser realizado antes do início da ICC ou do desenvolvimento de lesão
cardíaca irreversível; os animais recém­adquiridos podem ser devolvidos para evitar prejuízo econômico; o mais provável é que animais de estimação com doença cardíaca congênita morram prematuramente, causando estresse emocional;
animais adquiridos para trabalho apresentam desempenho limitado, talvez insatisfatório. A detecção precoce também evita a introdução de anomalias genéticas em seus ascendentes.
A  avaliação  da  maior  parte  dos  animais  com  doença  cardíaca  congênita  geralmente  consiste  em  exame  físico,  ECG,  radiografia  e  ecocardiografia.  Isso  permite  um  diagnóstico  definitivo  e  avaliação  da  gravidade  da  anomalia.  A
ecocardiografia  Doppler  suplantou  o  uso  invasivo  da  cateterização  cardíaca  na  avaliação  da  maior  parte  dos  defeitos  cardíacos.  Após  a  definição  do  diagnóstico  e  da  gravidade  da  doença  pode­se  optar  pelo  tratamento  e  estabelecer  o
prognóstico.
A importância clínica da doença cardíaca congênita depende do defeito em questão e de sua gravidade. Animais com anomalia discreta podem não exibir sintomas da doença e ter vida normal. Enfermidades que causam disfunção
circulatória significante provavelmente ocasionam morte neonatal. Tais anomalias, muitas delas incompatíveis com a vida, também causam morte fetal e ninhada de menor tamanho. É mais provável que o tratamento clínico ou cirúrgico
beneficie animais com doença cardíaca congênita de gravidade moderada. A PDA com shunt esquerdo­direito é uma notável exceção; indica­se correção cirúrgica na maioria dos animais acometidos tão logo se consiga controlar doenças ou
anormalidades concomitantes que possam apresentar risco à anestesia ou à cirurgia.

Fisiopatologia
Doenças  cardíacas  congênitas  induzem  sinais  clínicos  de  insuficiência  cardíaca  por  vários  mecanismos  fisiopatológicos.  Anomalias  como  estenoses  pulmonar  e  subaórtica  causam  obstrução  do  fluxo  ventricular  e  podem  resultar  em
insuficiência dos lados direito e esquerdo do coração, respectivamente. A persistência de ducto arterioso (PDA) e os defeitos de septo são exemplos de comunicações anormais entre os sistemas circulatórios sistêmico e pulmonar e, na
maioria dos casos, resultam em shunt esquerdo­direito. A recirculação do sangue na circulação pulmonar e no interior das câmaras do lado esquerdo frequentemente ocasiona sintomas de ICC esquerda (p. ex., edema pulmonar, tosse e
fadiga). Tipicamente, as anomalias mais graves resultam em maior volume de sangue circulante nas câmaras cardíacas esquerdas. A PDA é uma possível exceção, com anomalias muito extensas, às vezes contribuindo para hipertensão
pulmonar e shunt direito­esquerdo (ver a seguir), também denominada PDA reversa. Animais com shunt direito­esquerdo (tetralogia de Fallot, PDA reversa) podem desenvolver insuficiência cardíaca direita, porém mais frequentemente
manifestam sinais clínicos associados à policitemia (p. 38), que se instala subsequentemente à perfusão renal com sangue deficiente em oxigênio. Isso resulta em aumento da síntese renal de eritropoetina e, consequentemente, policitemia.

Sopros Inocentes
É importante lembrar que a constatação de sopro cardíaco em animal jovem não é patognomônica de doença cardíaca congênita. Vários animais jovens apresentam sopro sistólico de baixo grau, decorrente de leve turbulência não associada
a doença cardíaca congênita. Em cães e gatos, geralmente esses sopros desaparecem até os 6 meses de idade. Os sopros inocentes são constatados na ausência de qualquer outra evidência de doença cardiovascular. Os sopros sistólicos de
alto grau (grau IV/VI, ou mais) e os sopros diastólicos indicam doença cardíaca e devem suscitar investigação adicional.

 ANOMALIAS DE RAMIFICAÇÕES DOS ARCOS AÓRTICOS
Os arcos aórticos embrionários originam artérias carótidas (terceiro par de arcos), arco aórtico (quarto arco esquerdo) e artérias pulmonares e ducto arterioso (sexto par de arcos). O restante dos arcos regride, embora os primeiros arcos
aórticos também se tornem parte das artérias maxilares. Caso haja interrupção do desenvolvimento ou da regressão dos arcos aórticos podem surgir defeitos congênitos.

Persistência de Ducto Arterioso
Durante a vida fetal, o sangue oxigenado da artéria pulmonar principal é desviado para a artéria aorta descendente através do ducto arterioso, desviando dos pulmões não funcionais. Ao nascimento, vários fatores controlam o fechamento do
ducto, havendo a separação dos sistemas circulatórios sistêmico e pulmonar. A expansão pulmonar permite que a circulação pulmonar funcione como um sistema de baixa pressão e o fechamento do ducto evita o desvio de sangue do
sistema circulatório sistêmico de alta pressão, para a artéria pulmonar.
FISIOPATOLOGIA:  A persistência ou patência do ducto com sistemas circulatórios pulmonar e sistêmico normais resulta em importante desvio de sangue da câmara cardíaca esquerda para a direita, ou seja, da circulação sistêmica para a
pulmonar. Como a resistência vascular sistêmica é sempre maior do que a da circulação pulmonar, o desvio de sangue é contínuo. Como consequência, tem­se uma sobrecarga de volume nas artérias e veias pulmonares no átrio e no
ventrículo esquerdos. A dilatação dessas duas câmaras cardíacas pode ocasionar arritmias cardíacas. A sobrecarga de volume crônica e a dilatação das câmaras cardíacas do lado esquerdo geralmente originam sintomas de ICC do lado
esquerdo.  Portanto,  a  maioria  dos  pacientes  não  tratados  desenvolve  ICC  refratária.  Animais  com  pequeno  ducto  podem  se  tornar  adultos  sem  manifestar  sinais  de  insuficiência  cardíaca,  porém  são  mais  predispostos  à  endocardite
infecciosa. Em alguns animais com PDA grave o aumento do fluxo sanguíneo pulmonar pode induzir vasoconstrição e hipertensão pulmonares, com várias e importantes implicações: o desvio de sangue através do ducto se reduz e se
reverte, desaparecendo o sopro e a cianose caudal (cianose diferencial); o ventrículo direito se dilata e hipertrofia como resultado da hipertensão pulmonar; a perfusão renal com sangue deficiente em oxigênio causa liberação excessiva de
eritropoetina e subsequente policitemia. Portanto, caso ocorra shunt direito­esquerdo no ducto nota­se predomínio de sinais clínicos de policitemia.
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  Nos animais com PDA que apresentam shunt esquerdo­direito nota­se sopro tipo maquinaria contínuo e evidente. Com frequência, o sopro é mais audível durante a segunda bulha cardíaca e na região
da valva aórtica, geralmente associado a frêmito precordial. O componente diastólico é mais brando e melhor ouvido na região da valva pulmonar e, ocasionalmente, ainda melhor na região axilar (em alguns casos, o ducto permanece
aberto vários dias após o nascimento; portanto, pode­se detectar um sopro contínuo durante o exame do neonato). Ocasionalmente, o componente diastólico pode não ser audível no final da diástole. Tipicamente, o pulso femoral torna­se
evidente. A maioria dos animais jovens não apresenta sinais clínicos. Aqueles com grande shunt e animais mais velhos frequentemente apresentam sintomas de ICC esquerda. Com frequência, o ECG revela ondas R altas na derivação II,
indicando dilatação do ventrículo esquerdo. Também, pode ser notado um espectro de arritmias cardíacas, inclusive complexos atriais e ventriculares prematuros. As anormalidades radiográficas dependem do tamanho e do diâmetro do
ducto  e  da  presença  de  PDA;  na  PDA  com shunt esquerdo­direito  é  possível  constatar  dilatação  de  ventrículo  e  átrio  esquerdos,  vasos  pulmonares  proeminentes,  dilatações  por  aneurismas  aórtico  e  pulmonar  e  vários  graus  de  edema
pulmonar.  A  ecocardiografia  é  importante  para  a  exclusão  de  doença  cardíaca  congênita  concomitante,  bem  como  para  documentar  a  ocorrência  de  PDA.  Turbulência  contínua  na  artéria  pulmonar  principal  é  característica  de  PDA
com shunt esquerdo­direito. Tipicamente, nota­se dilatação de átrio e ventrículos esquerdos, podendo ser constatada discreta regurgitação mitral.
Geralmente, a ligadura cirúrgica do ducto em pacientes portadores de PDA com shunt esquerdo­direito é curativa e quase sempre indicada. Quando presente, a ICC deve ser tratada (com diuréticos, vasodilatadores etc.) antes da anestesia
e cirurgia. O fechamento do ducto é uma alternativa à ligadura cirúrgica. Isso pode ser feito por oclusão transcateter mediante a colocação de um dispositivo (p. ex., espiral de Gianturco, dispositivo de oclusão vascular Gianturco­Grifka) no
local da PDA, o qual resulta na formação de coágulo ou oclusão física do ducto.
Na PDA com shunt direito­esquerdo geralmente há histórico de letargia, intolerância a exercício e colapso. O exame minucioso pode revelar cianose diferencial. Podem ser notados desdobramento da segunda bulha cardíaca e discreto
sopro diastólico secundário à insuficiência pulmonar. Não se constata sopro contínuo, tampouco o pulso femoral é evidente. A constatação de policitemia em um animal jovem com tais sinais clínicos implica avaliação diagnóstica adicional
imediata do coração. O ECG mostra grave dilatação do ventrículo direito e arritmias ocasionais. Na PDA reversa é possível constatar aumento do ventrículo direito e dilatação da artéria aorta descendente por aneurisma. Nesse caso indica­
se ecocardiografia, que revela dilatação e hipertrofia do ventrículo direito. O fluxo do ventrículo direito apresenta­se aumentado. Pode­se realizar ecocardiografia contrastada para confirmar o diagnóstico. Após a injeção de solução salina
em veia periférica constatam­se microbolhas na aorta abdominal, mas não no coração. A ligadura do ducto é contraindicada porque exacerba a hipertensão pulmonar (por causar aumento no fluxo, já com resistência vascular pulmonar alta)
e tipicamente causa morte. Nesses casos o tratamento envolve o controle da policitemia por meio de flebotomias periódicas. O prognóstico quanto à sobrevida a longo prazo é desfavorável.

Persistência de Arco Aórtico Direito
Nessa  anomalia  vascular  anelar  há  persistência  do  arco  aórtico  direito,  distúrbio  que  causa  obstrução  esofágica  na  altura  da  base  cardíaca.  O  esôfago  é  envolvido  pelo  arco  persistente  à  direita,  pelo  ligamento  arterioso  à  esquerda  e
dorsalmente e pela base do coração ventralmente.

Ducto arterioso patente; cão. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Há relato de persistência de arco aórtico direito (PAAD) em bovinos, equinos, gatos e cães (especialmente das raças Pastor Alemão e Irish Setter).
Outras anormalidades do anel vascular têm sido descritas; elas resultam em achados semelhantes àqueles da PAAD. Essas anomalias congênitas não causam qualquer sintoma relacionado com o sistema cardiovascular – predominam os
sinais de regurgitação e pneumonia por aspiração.

 CORAÇÃO ECTÓPICO
Coração ectópico é uma anomalia na qual o órgão se localiza fora da cavidade torácica, geralmente na região cervical ventral. É mais comumente constatado em bovinos. O deslocamento por um esterno defeituoso ou pelas costelas costuma
resultar em morte neonatal, embora seja possível sobrevida por longo tempo no caso de outros tipos de deslocamento.

 DEFEITOS DO SEPTO

Defeito do Septo Atrial
Uma comunicação entre os átrios pode ser o resultado de persistência de forame oval ou um verdadeiro defeito do septo atrial. Durante a vida fetal o forame oval, abertura oval do septo interatrial, permite o desvio de sangue do átrio direito
para o esquerdo, a fim de evitar a passagem pelos pulmões não funcionais. Esta abertura oval se desenvolve entre dois septos: o septum primum e o septum secundum, que compõem o septo interatrial. Ao nascimento, a queda na pressão do
átrio direito permite que o forame oval se feche, interrompendo o desvio do fluxo sanguíneo. O aumento da pressão no átrio direito pode reabrir o forame oval onde não houve vedação do septo, permitindo o retorno do desvio. Isso não
representa um defeito de septo atrial verdadeiro porque houve a formação normal do septo. Um verdadeiro defeito de septo atrial corresponde a uma abertura consistente do septo interatrial, a qual permite o desvio de sangue do átrio com
maior pressão. Os defeitos do septum secundum se desenvolvem na parte superior do septo interatrial, próximo ao forame oval, sendo o tipo mais comum. Os defeitos do septum primum situam­se na porção mais inferior do septo interatrial,
próximo à junção atrioventricular.
FISIOPATOLOGIA:  Na maioria dos casos, o sangue desvia do átrio esquerdo para o direito, ocasionando sobrecarga de volume nas câmaras cardíacas direitas. A magnitude do desvio depende do tamanho do defeito e do gradiente de pressão
através desse defeito. O fluxo sanguíneo excessivo através das câmaras cardíacas direitas resulta em sua dilatação e hipertrofia. Pode ocorrer vasoconstrição pulmonar em razão do excessivo fluxo sanguíneo pulmonar e isso pode predispor
à ICC direita. Em situações nas quais há aumento da pressão no átrio direito (p. ex., estenose pulmonar) pode haver desvio de sangue do lado direito para o esquerdo, através do forame oval ou do defeito de septo atrial, causando cianose e,
potencialmente, policitemia.
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  É possível constatar sintomas de ICC direita (p. ex., ascite, edema e cianose). Geralmente nota­se sopro sistólico de ejeção na região da valva pulmonar, refletindo aumento do fluxo sanguíneo através
da valva pulmonar. O sangue que flui pelo próprio defeito não produz sopro. O tempo de ejeção prolongado do ventrículo direito pode resultar em desdobramento da segunda bulha cardíaca. Eletrocardiografia pode revelar evidência de
aumento de átrio ou ventrículo direito (desvio do eixo direito, ondas S profundas, ondas P altas). Bloqueio do ramo do feixe direito e arritmias também podem ser constatadas. Radiograficamente, notam­se vários graus de aumento de
ventrículo direito e vasos pulmonares mais evidentes, indicando excesso de fluxo sanguíneo pulmonar. Para esses animais indica­se ecocardiografia, pois esse exame mostra graus variáveis de dilatação de ventrículo e átrio direitos, bem
como identifica o defeito como uma perda de ecogenicidade no septo interatrial. A perda normal da ecogenicidade da fossa oval não deve ser interpretada como um defeito de septo atrial. A ecocardiografia Doppler confirma o desvio do
fluxo  sanguíneo  através  da  lesão  e  a  maior  velocidade  de  ejeção  na  valva  pulmonar.  Pode­se  tentar  correção  cirúrgica,  mas  tal  procedimento  está  associado  a  alta  taxa  de  mortalidade  e  alto  custo.  Animais  com  defeitos  no  septum
secundum  podem  tolerar  bem  tais  anomalias  e  vários  destes  defeitos  são  achados  acidentais  em  animais  mais  velhos.  Os  defeitos  maiores,  como  constatados  nas  anomalias  de  septum  primum  ou  em  defeitos  de  coxim  endocárdico,
predispõem mais à ICC direita; também, pode­se constatar hipertensão pulmonar em razão do maior fluxo sanguíneo no pulmão. Nesse caso o prognóstico é reservado a desfavorável.

Defeito do Septo Ventricular
Os  defeitos  do  septo  ventricular  situam­se  mais  comumente  na  porção  perimembranosa  do  septo,  na  parte  superior  do  septo  ventricular  logo  abaixo  das  cúspides  da  valva  aórtica  não  coronária  e  direita,  à  esquerda,  e  logo  abaixo  da
comissura craniosseptal da valva tricúspide, à direita. Apresentam tamanho e importância hemodinâmica variáveis. Também, podem ocorrer defeitos no septo muscular. Pode haver anomalia de septo ventricular juntamente com outras
cardiopatias congênitas. Esse defeito é hereditário em suínos miniaturas.
FISIOPATOLOGIA:  Na maioria dos animais ocorre desvio de sangue do ventrículo esquerdo para o ventrículo direito e fluxo ventricular direito, em razão da maior pressão no ventrículo esquerdo. A magnitude do desvio depende do tamanho
do defeito e do gradiente de pressão entre os ventrículos. Ocorre recirculação do sangue desviado para o ventrículo direito através dos vasos pulmonares e das câmaras cardíacas esquerdas, ocasionando dilatação dessas estruturas.
O ventrículo direito também pode se dilatar, especialmente em animais com graves defeitos de septo ventricular não resistentes ou anomalias menores no septo ventricular (de ocorrência rara). Pequenos defeitos (anomalias de septo
ventricular altamente resistente) limitam o volume de sangue desviado e minimizam os efeitos hemodinâmicos, enquanto os grandes defeitos geralmente resultam em graves transtornos circulatórios e sinais clínicos. Um desvio de sangue
significativo  através  das  artérias  pulmonares  pode  induzir  vasoconstrição  desses  vasos.  À  medida  que  a  resistência  aumenta,  o  desvio  pode  se  reverter  (ou  seja,  a  resistência  ao  fluxo  ventricular  direito  excede  a  resistência  ao  fluxo
ventricular  esquerdo,  com  desvio  de  sangue  da  direita  para  a  esquerda),  resultando  em  cianose  e  policitemia.  O  desvio  de  sangue  da  direita  para  a  esquerda  através  do  defeito  de  septo,  como  consequência  de  hipertensão  pulmonar,  é
denominado complexo de Eisenmenger.

Defeito do septo ventricular (seta); suíno miniatura. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  Os achados clínicos dependem da gravidade do defeito e da direção do desvio. Um pequeno defeito geralmente não ocasiona sintoma ou causa sinais clínicos mínimos. Os defeitos maiores podem
resultar em ICC esquerda aguda. Bovinos são predispostos aos sintomas de ICC direita. No desenvolvimento do complexo de Eisenmenger nota­se cianose, fadiga e intolerância a exercício. A maioria dos animais afetados apresenta sopro
sistólico alto que se irradia amplamente, com frêmito no lado esquerdo. Nota­se ausência ou discreto sinal de sopro quando há defeito muito grande ou quando ocorre shunt direito­esquerdo.  Às  vezes,  desenvolve­se  secundariamente
insuficiência  valvular  aórtica,  pois  um  defeito  subaórtico  pode  interferir  na  justaposição  da  valva  aórtica.  Nesse  caso,  nota­se  sopro  diastólico  concomitante  e  a  combinação  de  sopro  sistólico/diastólico  (sopro  de  vaivém)  pode  ser
confundida com aquele verificado na PDA. A turbulência prolongada no local do defeito pode causar erosão do endotélio e predispor à endocardite infecciosa. Radiografias do tórax podem revelar cardiomegalia generalizada, com aumento
do fluxo sanguíneo nos vasos pulmonares. Em geral, o defeito pode ser visualizado no exame ecocardiográfico, embora pequenos defeitos possam passar despercebidos. A ecocardiografia Doppler ou os exames contrastados confirmam a
presença de desvio do fluxo sanguíneo.
A terapia depende do uso do animal, da gravidade dos sinais clínicos e da direção do desvio. Animais com pequenas anomalias de septo ventricular tipicamente não necessitam tratamento e o prognóstico é bom. Animais com anomalia
de septo ventricular moderada a grave mais comumente desenvolvem sinais clínicos, devendo­se instituir tratamento. Correção cirúrgica da anomalia; bandagem da artéria pulmonar para aumentar a resistência ao fluxo do ventrículo direito
e, consequentemente, minimizar o desvio de sangue da esquerda para a direita; ou uso de terapia para reduzir a resistência vascular sistêmica (p. ex., vasodilatador, como hidralazina) podem ser empregados no tratamento de animais com
grande defeito de septo ventricular e shunt esquerdo­direito. No caso de shunt direito­esquerdo, geralmente o fechamento cirúrgico do defeito é contraindicado. Pode­se realizar flebotomia para aliviar os efeitos da policitemia ou utilizar
hidroxiureia para minimizar os sinais clínicos; no entanto, o prognóstico é reservado a desfavorável. Os animais diagnosticados com defeito de septo ventricular não devem ser acasalados; mostrou­se que em pelo menos uma raça (English
Springer Spaniel) o defeito é hereditário.

 DISPLASIA DA TRICÚSPIDE
Ocasionalmente, nota­se malformação congênita do complexo da valva tricúspide em cães e gatos. As raças predispostas são Labrador Retriever e Pastor Alemão. A displasia da tricúspide resulta em insuficiência valvular e regurgitação
sistólica  do  sangue  para  o  interior  do  átrio  direito.  Mais  raramente  pode–se  constatar  estenose  da  valva  tricúspide.  As  cordas  tendíneas  comumente  encontram­se  encurtadas  ou  ausentes  e  as  cúspides  da  valva  tricúspide  podem  estar
espessadas  ou  aderidas  à  parede  ventricular  ou  do  septo  intraventricular.  Simultaneamente,  é  possível  notar  outras  anomalias  congênitas  como  displasia  da  valva  mitral,  defeitos  de  septo, estenose  subaórtica  e  estenose  pulmonar.  Na
anomalia de Ebstein, uma variante da displasia de tricúspide, a valva é deslocada em direção ao ápice cardíaco.

Displasia da valva tricúspide; cão. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.
FISIOPATOLOGIA:  A malformação da valva tricúspide resulta em importante insuficiência valvular. A regurgitação tricúspide prolongada ocasiona sobrecarga de volume no coração direito, causando dilatação de ventrículo e átrio direitos. O
fluxo sanguíneo pulmonar pode diminuir e ocasionar fadiga e taquipneia. À medida que a pressão no átrio direito aumenta ocorre prejuízo ao retorno venoso, resultando em ascite.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  TRATAMENTO:   Os  sinais  clínicos  estão  relacionados  com  a  gravidade  do  defeito.  Os  animais  acometidos  geralmente  manifestam  sintomas  de  ICC  direita.  Sopro  holossistólico  grave  decorrente  de  regurgitação
tricúspide torna–se evidente no ápice cardíaco direito. Arritmias atriais, especialmente taquicardia atrial paroxística, são comuns e podem causar morte. Tipicamente, eletrocardiografia e radiografia revelam aumento de átrio e ventrículo
direitos. A veia cava caudal pode aumentar significativamente de volume. A ecocardiografia mostra malformação da valva tricúspide e, geralmente, dilatação grave de átrio e ventrículo direitos. A ecocardiografia Doppler revela grave
regurgitação na valva tricúspide.
Em animais com sinais clínicos o prognóstico é reservado. Pode ser necessária abdominocentese periódica para controlar a efusão peritoneal. Também, pode­se indicar o uso de diuréticos, vasodilatadores e digoxina.

 DISPLASIA DA VALVA MITRAL
A malformação congênita do complexo da valva mitral (displasia da valva mitral) é um defeito cardíaco congênito comum em gatos.
As raças de cães predispostas são Bull Terrier, Pastor Alemão e Great Dane. A displasia da valva mitral resulta em insuficiência mitral e regurgitação sistólica de sangue ao átrio esquerdo. Qualquer componente do complexo da valva
mitral (cúspides valvulares, cordas tendíneas, músculos papilares) pode apresentar malformação e frequentemente há envolvimento de mais de um componente.

Displasia da valva mitral; cão. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

FISIOPATOLOGIA:  A malformação do complexo da valva mitral provoca insuficiência valvular significativa. A regurgitação mitral prolongada causa sobrecarga de volume no coração esquerdo que resulta em dilatação de ventrículo e átrio
esquerdos. Quando a regurgitação mitral é grave, o débito cardíaco diminui, acarretando sintomas de insuficiência cardíaca. A regurgitação mitral grave também pode causar congestão venosa pulmonar e ICC esquerda. A dilatação das
câmaras cardíacas esquerdas predispõe os animais acometidos a arritmias. Em alguns casos, a malformação do complexo da valva mitral causa certo grau de estenose valvular, bem como insuficiência (ver estenose mitral, a seguir).
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  Os sinais clínicos estão relacionados com a gravidade da lesão. Os animais acometidos geralmente manifestam sintomas de ICC esquerda. Sopro holossistólico de regurgitação mitral é proeminente no
ápice  cardíaco  esquerdo.  Em  alguns  casos  nota­se  ruído  cardíaco  diastólico  (ritmo  de  galope).  Os  animais  enfermos  podem  apresentar  frêmito  precordial  no  ápice  cardíaco  esquerdo.  As  arritmias  atriais  (complexos  atriais  prematuros,
fibrilação atrial) podem ser notadas no eletrocardiograma, especialmente de animais gravemente afetados. Também, pode haver aumento de ventrículo e átrio (alargamento de ondas P) esquerdos. Nas radiografias torácicas é possível notar
aumento  acentuado  do  átrio  esquerdo.  Ademais,  pode­se  constatar  aumento  do  ventrículo  esquerdo  e  congestão  venosa  pulmonar.  A  ecocardiografia  revela  malformação  do  complexo  da  valva  mitral  (fusão  de  cordas  tendíneas  e
espessamento  e  imobilidade  das  cúspides  valvulares,  aparência  anormal  dos  músculos  papilares)  e  dilatação  de  ventrículo  e  átrio  esquerdos.  A  ecocardiografia  Doppler  mostra  regurgitação  mitral  grave.  Quando  presente  é  possível
identificar estenose mitral (ver a seguir).
O prognóstico para os animais com sinais clínicos de doença grave é desfavorável. Pacientes discretamente acometidos podem permanecer assintomáticos por vários anos. Para tratamento de ICC esquerda progressiva ver p. 135.
 ESTENOSE MITRAL
Estenose mitral corresponde ao estreitamento do orifício da valva mitral provocado por anormalidades na valva e resulta em obstrução do fluxo sanguíneo ao ventrículo esquerdo. Esse defeito congênito é raro em cães e gatos e pode ser
concomitante a outras anomalias congênitas, como estenose subaórtica, displasia da valva mitral e estenose pulmonar.
FISIOPATOLOGIA:  A doença resulta em aumento da resistência ao fluxo atrial esquerdo, originando um gradiente de pressão entre o átrio e o ventrículo esquerdos. Isso ocasiona aumento do átrio esquerdo e da pressão venosa pulmonar e na
pressão em cunha nos capilares. Como consequência, pode ocorrer edema pulmonar e, em alguns casos, síncope.
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  A  estenose  mitral,  por  si  só,  pode  resultar  em  sopro  cardíaco  diastólico  tipicamente  de  baixo  grau  (I­II/VI).  Caso  haja  displasia  da  valva  mitral,  simultaneamente,  pode  ser  audível  um  sopro  com
intensidade  máxima  no  ápice  cardíaco  esquerdo.  As  radiografias  mostram  graus  variáveis  de  aumento  do  átrio  esquerdo  e  edema  pulmonar  em  animais  com  ICC  esquerda.  A  eletrocardiografia  pode  revelar  alargamento  das  ondas  P
(indicando aumento do átrio esquerdo) e arritmias supraventriculares. A ecocardiografia permite o diagnóstico definitivo. É possível notar abaulamento das cúspides da valva mitral em direção ao ventrículo esquerdo durante a diástole,
aumento do átrio esquerdo e espessamento das cúspides da valva mitral. A ecocardiografia Doppler revela fluxo diastólico turbulento através da valva mitral, iniciando nesta valva e se estendendo ao interior do ventrículo esquerdo. No
início da diástole é detectado gradiente de pressão entre o átrio e o ventrículo esquerdos.
O tratamento medicamentoso de animais com estenose da valva mitral envolve o uso de diurético e restrição de sódio na dieta. Deve­se evitar diurese excessiva porque pode ocorrer grave redução do débito cardíaco. Terapia cirúrgica ou
intervencional pode incluir comissurotomia fechada (correção da estenose, sem desvio), comissurotomia aberta, substituição da valva mitral ou valvuloplastia com balão (relatada em um animal com estenose de valva tricúspide). Esses
procedimentos raramente são realizados em cães e gatos e envolvem risco e custo consideráveis.

 HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA PERITONIOPERICÁRDICA (HDPP)
A hérnia diafragmática peritoniopericárdica (HDPP) é a doença de pericárdio congênita mais comum em cães e gatos. Deve­se ao desenvolvimento anormal do septo dorsolateral transverso ou de falha na união das dobras pleuroperitoneal
lateral e porção ventromedial esternal. Isso resulta em herniação de víscera abdominal no saco pericárdico. O fígado é mais comumente herniado, seguido de intestino delgado, baço e estômago. Os sintomas são muito variáveis; diversos
pacientes permanecem assintomáticos e a anomalia é constatada durante a necropsia. As radiografias de tórax podem mostrar alças do intestino delgado ou fígado atravessando o diafragma, no sentido do saco pericárdico. Uma avaliação
com radiografia contrastada utilizando bário VO também pode identificar alças de intestino delgado ou estômago no saco pericárdico. Ainda, o diagnóstico pode ser definido pela constatação de víscera abdominal no saco pericárdico
durante o exame ecocardiográfico. Pacientes que apresentam vômito, sinais de encefalopatia hepática ou outras condições adversas resultantes de HDPP devem ser submetidos à correção cirúrgica da hérnia.

 OBSTRUÇÃO DO FLUXO SANGUÍNEO
Neste grupo de doenças cardíacas congênitas incluem­se estenose aórtica, estenose pulmonar e coarctação da aorta. Todas envolvem obstrução do fluxo (ou débito) sanguíneo do ventrículo direito ou esquerdo.

Estenose Aórtica
O esvaziamento do ventrículo esquerdo pode ser obstruído em três locais: (1) subvalvular, também denominado subaórtico, constituído de uma crista de tecido fibroso no percurso do fluxo sanguíneo do ventrículo esquerdo; (2) valvular; (3)
supravalvular ou obstrução distal à valva aórtica. A forma mais comum no cão é a estenose subaórtica. Há relato de predisposição em cães das raças Boxer, Golden Retriever, Rottweiler, Pastor Alemão e Newfoundland.
FISIOPATOLOGIA:  A estenose aórtica provoca hipertrofia do ventrículo esquerdo, cujo grau depende da gravidade da estenose. Nos casos graves pode haver diminuição do fluxo do ventrículo esquerdo, especialmente durante exercício. A
principal ramificação da hipertrofia ventricular esquerda é a criação de áreas do miocárdio com perfusão deficiente. A isquemia miocárdica é um fator importante no desenvolvimento de arritmias ventriculares, com sério risco à vida.
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  Os sinais clínicos não são consistentemente relacionados com a gravidade da estenose. Pode haver história de síncope e intolerância a exercício. Os animais sem histórico de enfermidade podem morrer
subitamente e a anomalia é detectada apenas durante a necropsia. Constata­se sopro sistólico do tipo ejeção, mais audível na região da valva aórtica. A intensidade do sopro está razoavelmente correlacionada com o grau de estenose e pode
aumentar à medida que o animal se torna adulto, refletindo uma estenose progressiva. Os filhotes de cães sem sopros detectáveis não devem ser considerados livres da doença até completarem 6 meses de idade, pois o sopro pode ser muito
discreto  nos  primeiros  meses  de  vida.  Em  casos  moderados  a  graves,  a  força  do  pulso  femoral  diminui.  A  eletrocardiografia  pode  revelar  aumento  do  ventrículo  esquerdo  (ondas  R  altas  na  derivação  II)  e  complexos  ventriculares
prematuros, cuja frequência aumenta com a prática de exercício. Deve­se utilizar monitoramento com Holter em animais com síncope ou em pacientes com doença grave, a fim de comprovar a presença de quaisquer arritmias, avaliar a
gravidade  da  arritmia  e  evitar  o  risco  de  morte  súbita.  Pode­se  proceder  à  reavaliação  com  Holter  após  o  início  de  terapia  antiarrítmica,  de  modo  a  verificar  sua  eficácia.  Radiograficamente,  notam­se  aumento  variável  de  volume  do
ventrículo esquerdo e dilatação pós­estenose da artéria aorta. Recomenda–se ecocardiografia Doppler para confirmar o diagnóstico e excluir outras anormalidades cardíacas. O grau de hipertrofia do ventrículo esquerdo e a velocidade
máxima sistólica do fluxo através da anomalia podem auxiliar na determinação da gravidade da estenose.
Estenose aórtica (estenose subaórtica), cão. Ilustração de Dr. Gheoghe Constantinescu.

As opções terapêuticas incluem tratamento médico das arritmias a fim de minimizar a ocorrência de sinais clínicos de intolerância ao exercício ou síncope, valvuloplastia com balão (tipicamente não muito efetiva) e ressecção cirúrgica
(altas taxas de morbidade e mortalidade, alto custo, pouca redução do gradiente de pressão). Tem­se defendido o uso de betabloqueadores, como atenolol, para controlar arritmias ventriculares em pacientes com estenose subaórtica e,
possivelmente, reduzir o risco de morte súbita. Em geral, os animais levemente acometidos não necessitam tratamento e em vários pacientes o prognóstico pode ser reservado a bom. Os animais acometidos não devem ser utilizados para
procriação.

Estenose Pulmonar
Estenose pulmonar é um achado comum em cães e infrequente em gatos. Resulta em obstrução do fluxo do ventrículo direito principalmente em razão da displasia das cúspides da valva pulmonar. Também, pode–se constatar estenose no
infundíbulo, na região subvalvular ou na porção supravalvular.
FISIOPATOLOGIA:  O ventrículo direito deve gerar aumento de pressão durante a sístole para superar a estenose, fato que nos casos moderados a graves pode ocasionar dilatação e hipertrofia marcantes do ventrículo direito. À medida que o
ventrículo direito hipertrofia a sua complacência diminui, acarretando aumento na pressão do átrio direito e congestão venosa. O aumento da velocidade do fluxo deforma a parede da artéria pulmonar principal, resultando em dilatação pós­
estenose. Nos casos graves pode­se notar insuficiência congestiva direita. Estenose pulmonar supravalvular é incomum e pode ser mais comumente constatada em animais da raça Schnauzer gigante. Displasia da valva tricúspide simultânea
é, às vezes, verificada em animais com estenose pulmonar. Desenvolvimento anômalo da artéria coronária tem sido documentado em alguns animais com estenose pulmonar, como cães das raças Boxer e Bulldog Inglês. Tipicamente, a
artéria coronária principal esquerda se origina de uma única artéria coronária direita e circunda o trajeto de fluxo do ventrículo direito.
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  Os animais afetados podem ter histórico de subdesenvolvimento e de intolerância a exercício. Pode­se notar ICC direita, caracterizada por ascite ou edema periférico. Constata­se sopro sistólico do tipo
ejeção evidente, melhor audível na região da valva pulmonar. Geralmente, nota­se um frêmito precordial correspondente. Também, pode haver dilatação e pulsação de veias jugulares. Em vários casos, a ecocardiografia mostra evidência de
aumento do ventrículo direito. As anormalidades radiográficas incluem aumento do ventrículo direito, dilatação da artéria pulmonar principal por aneurisma e diminuição da perfusão pulmonar. Nesses casos, indica–se ecocardiografia e este
exame pode mostrar dilatação e hipertrofia do ventrículo direito, aplanamento do septo interventricular e cúspides valvulares pulmonares espessadas e relativamente imóveis. Em alguns casos pode­se notar estenose subvalvular discreta ou
supravalvular. Às vezes, pode­se notar insuficiência pulmonar em cães com estenose pulmonar. A ecocardiografia Doppler é valiosa na determinação da gravidade da estenose. Com base na gravidade (descrita como o gradiente de pressão
na valva) pode­se avaliar a necessidade de intervenção. Os animais com estenose pulmonar moderada ou grave podem se beneficiar de valvuloplastia com balão ou de intervenção cirúrgica (valvulotomia, enxerto, valvulectomia parcial
ou stent). A escolha do procedimento cirúrgico depende, em parte, da presença e do grau de hipertrofia muscular subvalvular. Na presença de ICC direita deve­se iniciar terapia paliativa com medicamentos de uso oral, como diuréticos e
vasodilatadores. Tipicamente, o prognóstico é desfavorável quando há fibrilação atrial ou ICC direita. Caso se constate fibrilação atrial o uso de digitálico pode ser justificável.

Coarctação da Aorta
Esta anomalia rara em cães e gatos envolve o estreitamento da artéria aorta distal à artéria subclaviana, tipicamente na região do ducto arterioso. Outras anormalidades congênitas incomuns da aorta incluem hipoplasia tubular da aorta
ascendente e interrupção aórtica. Há relato de correção cirúrgica.

 TETRALOGIA DE FALLOT
A tetralogia de Fallot é a principal anomalia causadora de cianose. Compreende uma combinação de estenose pulmonar, um típico defeito de septo ventricular grande na parte superior do septo, hipertrofia do ventrículo direito e graus
variáveis de dextroposição da artéria aorta. Acredita­se que uma única malformação conotroncular (formação cranialmente deslocada da porção superior do septo interventricular) resulta em estreitamento ao fluxo sanguíneo do ventrículo
direito (estenose pulmonar), sobreposição da aorta e defeito de septo ventricular. A hipertrofia do ventrículo direito é simplesmente uma consequência dessas anormalidades. A estenose pulmonar pode ser valvular e/ou infundibular. As
raças de cães predispostas à tetralogia de Fallot são Keeshond, Bulldog Inglês, Poodle miniatura, Schnauzer miniatura e Wirehaired Fox Terrier. A doença é hereditária em animais da raça Keeshond e, possivelmente, em outras raças. Há
relato dessa anomalia em outras raças de cães e gatos.
FISIOPATOLOGIA:  As consequências hemodinâmicas da tetralogia de Fallot dependem principalmente da gravidade da estenose pulmonar, da extensão do defeito de septo ventricular (tipicamente grande e não resistente) e da resistência
vascular  sistêmica.  A  direção  e  a  magnitude  do  desvio  de  sangue  através  do  defeito  de  septo  dependem,  em  grande  parte,  da  resistência  relativa  ao  fluxo  entre  a  circulação  pulmonar  (obstruída  pela  estenose  pulmonar)  e  a  circulação
sistêmica. As consequências incluem menor fluxo sanguíneo pulmonar (resultando em fadiga, respiração superficial) e cianose generalizada (resultando em policitemia, fraqueza) causados pela mistura de sangue deficiente em oxigênio do
lado direito com o sangue oxigenado do ventrículo esquerdo no fluxo aórtico.
Em  razão  do  desvio  de  sangue  venoso  para  a  aorta  e  da  consequente  hipoxia,  os  rins  liberam  eritropoetina,  resultando  em  policitemia  (p.  38).  O  aumento  da  viscosidade  do  sangue  associado  à  policitemia  pode  causar  efeitos
hemodinâmicos importantes, como prejuízo à circulação sanguínea e deficiente perfusão capilar. Os animais com policitemia grave frequentemente apresentam histórico de convulsões.
ACHADOS CLÍNICOS E TRATAMENTO:  As informações típicas obtidas durante a anamnese incluem retardo do crescimento, intolerância a exercício, cianose, colapso e convulsões. Pode­se constatar um frêmito precordial na região da valva
pulmonar e, na maioria dos casos, nota­se sopro decorrente da estenose pulmonar. A intensidade do sopro é atenuada quando há policitemia grave e, em alguns animais acometidos, não há sopro cardíaco. No exame eletrocardiográfico
geralmente  nota–se  um  padrão  com  aumento  do  ventrículo  direito  (ondas  S  profundas  na  derivação  torácica  esquerda,  desvio  do  eixo  direito),  sendo  infrequente  a  ocorrência  de  arritmia.  As  radiografias  mostram  aumento  variável  do
coração direito, bem como vasos pulmonares menores que o normal, frequentemente incluindo a artéria pulmonar principal. A ecocardiografia confirma o diagnóstico. Há evidência de sobreposição da raiz aórtica (deslocamento à direita),
hipertrofia do ventrículo direito e defeito de septo ventricular. As câmaras cardíacas esquerdas podem ser pequenas em razão do menor retorno venoso pulmonar. A ecocardiografia contrastada de rotina revela desvio do fluxo sanguíneo da
direita para a esquerda no local do defeito do septo ventricular. O fluxo sanguíneo através do defeito também pode ser detectado por ecocardiografia Doppler.
Tetralogia de Fallot; gato. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Tem­se utilizado bloqueadores beta–adrenérgicos para reduzir o componente dinâmico da obstrução do fluxo do ventrículo direito e atenuar a menor resistência vascular sistêmica mediada por beta­adrenérgicos. O aumento da resistência
vascular sistêmica minimiza a magnitude do desvio. A policitemia deve ser controlada por meio de flebotomias periódicas quando o volume globular (VG) excede 65%. O prognóstico é reservado, mas os animais com desvio discreto a
moderado podem atingir a idade adulta.
As opções terapêuticas incluem tratamento cirúrgico e medicamentoso. Há relato de cirurgia corretiva em cães, porém, raramente é realizada. As técnicas cirúrgicas paliativas para aliviar os sinais clínicos associados à tetralogia de Fallot
também raramente são empregadas e incluem procedimentos que produzem anastomoses sistêmico­pulmonares. Tais procedimentos podem minimizar os sintomas de hipoperfusão pulmonar e hipoxia sistêmica. Em alguns casos, a redução
da estenose pulmonar é paliativa. Outras opções para estenose pulmonar são valvuloplastia cirúrgica e valvuloplastia com balão.

 MISCELÂNEA DE ANORMALIDADES CARDÍACAS CONGÊNITAS
Conexão de veia pulmonar anômala é um defeito congênito no qual quantidade variável de veias pulmonares (apenas uma ou até todas) se aderem ao átrio direito ou a uma veia sistêmica.
Defeitos do coxim endocárdico (defeito  do  canal  atrioventricular  [AV],  persistência  de  óstio  AV,  defeito  de  septo  AV)  envolvem  distúrbios  de  desenvolvimento  do  coxim  endocárdico  que  podem  ocasionar  anormalidade  do  septum
primum, da valva AV e do septo ventricular.
Cor triatriatum esquerdo e direito se  origina  a  partir  de  uma  membrana  fibrosa  que  divide  o  átrio  esquerdo  e  direito,  respectivamente.  Há  relato  de cor  triatriatum  esquerdo  em  gatos  e  de  cor  triatriatum  direito  em  cães.  O  átrio
envolvido é dividido em duas câmaras. Comumente há uma ou mais perfurações na membrana de separação, permitindo a comunicação entre as duas partes do átrio. Como tratamento dessa doença, há relato de valvuloplastia bem­sucedida
com balão.
Dextrocardia, localização do coração no hemitórax direito, pode ser um defeito cardíaco congênito benigno. Também, pode estar associado a situs inversus (posicionamento anormal dos órgãos corporais). Tipicamente, nota­se uma
combinação desses defeitos em animais com outras anormalidades simultâneas, como sinusite, bronquite e bronquiectasia.
Além dessas anomalias, várias outras são relatadas, inclusive dupla abertura de ventrículo direito (toda parte de uma grande artéria e a maior parte de outra grande artéria que se origina no ventrículo direito), interrupção do arco aórtico,
persistência da veia cava cranial esquerda, atresia pulmonar e transposição de grandes artérias.
DIROFILARIOSE

A dirofilariose é causada pelo microrganismo Dirofilaria immitis, uma filária. No mínimo, 70 espécies de mosquitos podem atuar como hospedeiro intermediário; Aedes, Anopheles e Culex são os principais gêneros de vetores. É possível a
ocorrência  de  infecção  persistente  em  várias  espécies  de  animais  selvagens  e  de  companhia.  Dentre  os  reservatórios  selvagens  incluem­se  lobos,  coiotes,  raposas,  focas­cinza  da  Califórnia,  leão­marinho  e  guaxinins.  Em  animais  de
companhia a dirofilariose é diagnosticada principalmente em cães e menos comumente em gatos e furões, devido às diferenças de técnica diagnóstica e ao ciclo de vida do parasita nestes animais. Há relatos de dirofilariose na maioria dos
países de clima temperado, semitropical e tropical, inclusive EUA, Canadá, Austrália, América Latina e sul da Europa. Em animais de companhia, o risco de ocorrência de dirofilariose é maior em cães e gatos criados em ambiente externo.
Embora qualquer cão ou gato seja suscetível à dirofilariose, criado ou não em ambiente interno, a maioria dos casos é diagnosticada em animais de tamanho médio a grande, com 3 a 8 anos de idade.
Os mosquitos infectados podem transmitir dirofilariose às pessoas, porém, não há relato de infecção persistente. A maturação das larvas infectantes pode progredir a ponto de alcançarem os pulmões, se encapsularem e morrerem. A larva
morta estimula reações granulomatosas denominadas “lesões de moeda”, clinicamente importantes porque ao exame radiográfico são semelhantes às metástases de câncer pulmonar.
A taxa de prevalência de dirofilariose em outros animais de companhia, como furão e gato, tende a ser proporcional àquela de cães criados nesta mesma região. Não há relato de predileção por idade em furões e gatos; contudo, relata­se
que gatos machos são mais suscetíveis do que as fêmeas. Furões e gatos criados em ambientes interno e externo podem se infectar. Em gatos, outras infecções, como aquela causada por FeLV ou pelo vírus da imunodeficiência felina, não
são fatores predisponentes.
CICLO BIOLÓGICO:  As espécies de mosquitos vetores adquirem microfilárias (um estágio larvário neonatal) quando se alimentam no hospedeiro infectado. Uma vez ingeridas pelo mosquito, as microfilárias se desenvolvem em larvas de
primeiro estágio (L1). Em seguida, ativamente mudam para larvas de segundo estágio (L2) e, novamente, para larvas de terceiro estágio infectante (L3), no mosquito, em cerca de 1 a 4 semanas, dependendo da temperatura ambiente. Essa
fase de desenvolvimento é mais curta (10 a 14 dias) quando a temperatura ambiente é > 27°C e a umidade relativa do ar é de 80%. Quando maduras, as larvas infectantes migram para o lábio do mosquito. Quando o mosquito se alimenta as
larvas  infectantes  saem  da  extremidade  labial  juntamente  com  pequena  hemolinfa  e  se  deposita  na  pele  do  hospedeiro.  A  larva  migra  para  o  local  da  picada,  iniciando  a  fase  do  ciclo  biológico  no  mamífero.  Um  típico
mosquito Aedes somente é capaz de sobreviver à fase de desenvolvimento completa de pequena quantidade de larvas de dirofilária, geralmente menos de 10 larvas por mosquito.
Em canídeos e em outros hospedeiros suscetíveis, a larva infectante (L3) se transforma em larva de quarto estágio (L4) dentro de 3 a 12 dias. Após permanecer no tecido subcutâneo, abdome e tórax durante cerca de 2 meses, a larva L4 e
transforma em parasita adulto jovem e migra pelo tecido do hospedeiro e, após 50 a 70 dias, chega à artéria pulmonar cerca de 70 a 120 dias após a infecção inicial. Neste momento os parasitas medem 2,5 a 4 cm, crescem rapidamente no
vaso pulmonar e se torna verme adulto maduro (machos com cerca de 15 cm de comprimento; fêmeas com cerca de 25 cm). Quando os parasitas jovens inicialmente chegam aos pulmões, a pressão sanguínea os força para as pequenas
artérias pulmonares mais distais do lobo pulmonar caudal; à medida que crescem ocupam artérias pulmonares maiores, indo para o ventrículo direito e o átrio direito, quando a carga parasitária é alta. As microfilárias são produzidas pelas
fêmeas grávidas tão precocemente quanto 6 meses, porém mais tipicamente aos 7 a 9 meses, após a infecção.
As microfilárias são detectadas na maioria dos canídeos infectados (cerca de 80%) não submetidos à profilaxia com macrolídeos e, ocasionalmente, naqueles cães tratados com macrolídeos preventivos quando já havia infecção por
dirofilária. Portanto, o número de microfilárias circulantes não necessariamente está relacionado com a quantidade de fêmeas adultas de D. immitis. Tipicamente, os adultos vivem 3 a 5 anos; as microfilárias podem sobreviver por até 2
anos, enquanto aguardam um mosquito hospedeiro intermediário.

Microfilaria de Dirofilaria immitis; esfregaço sanguíneo de cão. Cortesia de Merial Limited.

A maior parte dos cães é muito sensível à infecção por D. immitis e a maioria (56%, em média) das larvas infectantes (L3) se transformam em adultos. Furões e gatos são hospedeiros suscetíveis; mas a taxa de desenvolvimento de larvas
infectantes em adultos é baixa (em média, 6% em gatos e 40% em furões). Em gatos, com frequência a carga parasitária é de 1 a 3 vermes. Parece que a morte precoce de vermes jovens na chegada ao sistema respiratório é basicamente
responsável pela doença respiratória associada à síndrome dirofilariose em gatos. A sobrevida do verme adulto em gatos tipicamente não é superior a 2 a 3 anos. Em todos os animais suscetíveis à infecção há relato de migração aberrante
em diferentes órgãos, resultando em lesões no cérebro, sistema vascular sistêmico e nas vísceras e tecido subcutâneo.
PATOGÊNESE:  Em cães, a gravidade da lesão cardiopulmonar é determinada pela quantidade de parasitas, pela resposta imune do hospedeiro, pela duração da infecção e pelo grau de atividade do hospedeiro. A forma adulta viva de D.
immitis provoca irritação mecânica direta na camada íntima e na parede da artéria pulmonar, ocasionando um manguito perivascular com células inflamatórias, inclusive com infiltração de grande quantidade de eosinófilos. Os parasitas
vivos parecem ter um efeito imunossupressor; contudo, os parasitas mortos induzem reações imunes e subsequente lesão pulmonar em áreas não diretamente relacionada com a presença do parasita morto. Infecções de longa duração, em
razão dos fatores já mencionados (ou seja, irritação direta, morte do parasita e resposta imune), resultam em lesões crônicas e subsequentes cicatrizações. Cães ativos tendem a desenvolver mais lesões àqueles inativos, qualquer que seja a
carga parasitária. Esforços frequentes aumentam a lesão da artéria pulmonar e podem predispor a sinais clínicos evidentes, inclusive insuficiência cardíaca congestiva (ICC). Com frequência, a alta carga parasitária se deve às infecções
adquiridas durante exposição a vários mosquitos. Alta exposição de cães jovens ainda não infectados que vivem em clima temperado pode resultar em infecção grave, causando a síndrome da veia cava no ano seguinte à infecção. Em geral,
devido ao tamanho do parasita e da menor dimensão dos vasos pulmonares, os cães pequenos não toleram tanto a infecção e o tratamento, quanto os cães grandes.
A participação da bactéria endossimbiótica Wolbachia pipiens, presente nos vermes, ainda está sendo pesquisadas. No entanto, estas bactérias estão envolvidas na patogênese de filarioses, possivelmente pela ação de endotoxinas. Estudos
recentes mostraram que uma proteína de superfície primária de Wolbachia (WSP) induz uma resposta com IgG específica em hospedeiros infectados por D. immitis.
Os mediadores inflamatórios associados à infecção por D. immitis que induzem resposta imune no pulmão e nos rins (glomerulonefrite por deposição de complexo imune) causam vasoconstrição e, possivelmente, broncoconstrição. O
extravasamento  de  plasma  e  de  mediadores  inflamatórios  de  vasos  de  pequeno  calibre  e  de  capilares  ocasiona  inflamação  e  edema  de  parênquima  pulmonar.  A  constrição  da  artéria  pulmonar  provoca  aumento  da  velocidade  do  fluxo
sanguíneo, especialmente durante esforço, resultando em lesão adicional ao endotélio. A ocorrência de lesão endotelial, vasoconstrição, aumento  da  velocidade  do  fluxo  sanguíneo  e  isquemia  local  é  um  ciclo  vicioso.  Inflamação  com
isquemia pode causar fibrose intersticial irreversível.
Em gatos e furões, a lesão da artéria pulmonar é semelhante àquela de cães, embora as pequenas artérias desenvolvam hipertrofia muscular mais grave. Alguns gatos podem nunca manifestar sinais clínicos. Trombose arterial é causada
por coágulos sanguíneos e alojamento dos parasitas no estreito lúmen das arteríolas. Em gatos, as alterações do parênquima associadas ao parasita morto diferem daquelas constatadas em cães e furões. Além de lesão e edema celular tipo I,
como verificados em cães, os gatos apresentam hiperplasia celular tipo II, que é uma importante barreira à oxigenação. Furões e gatos são muito mais sujeitos à morte pela infecção por D. immitis, em razão da restrita capacidade vascular
pulmonar e das consequentes lesões.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em cães, a infecção deve ser detectada por teste sorológico antes do início dos sinais clínicos; contudo, é preciso ter em mente que a antigenemia e a microfilaremia, na dirofilariose, não surgem antes de cerca de 5 e
6,5 meses após a infecção, respectivamente. Cães não submetidos a tratamento preventivo e aos testes apropriados podem ser infectados. Os sinais clínicos de dirofilariose incluem tosse, intolerância ao exercício, depauperamento, dispneia,
cianose, hemoptise, síncope, epistaxe e ascite (ICC direita). A frequência e a gravidade dos sintomas estão relacionadas com o grau de lesão pulmonar e com o tipo de atividade do paciente. Com frequência, não se constata sintoma em cães
sedentários,  mesmo  quando  se  imagina  que  a  carga  parasitária  possa  ser  relativamente  alta.  Os  cães  infectados  submetidos  a  aumento  marcante  de  atividade,  como  ocorre  durante  a  estação  de  caça,  podem  manifestar  sinais  clínicos
evidentes.

Imagem radiográfica de discretas lesões de dirofilariose em um cão da raça German Shepherd, macho, de 5 anos de idade. Cortesia da University of Florida.
Dirofilariose felina, imagem lateral. Cortesia da Merial Limited.

Clinicamente, os cães podem ser considerados como pacientes de baixo ou de alto risco, com base na avaliação clínica da carga parasitária potencial, na saúde do animal e no seu estilo de vida. Isto substitui um sistema mais complexo no
qual os cães eram classificados de I a IV. Cães com 5 a 7 anos de idade são mais sujeitos à carga intensa de parasitas. Outras enfermidades concomitantes (p. ex., doença de sistemas orgânicos ou pulmonar) influenciam a avaliação do risco.
O grau de restrição de exercício durante o período de recuperação é outro fator importante a ser considerado.
Gatos infectados podem ser assintomáticos ou manifestarem tosse intermitente, dispneia, vômito, letargia, anorexia e perda de peso. Quando evidentes, geralmente os sintomas se desenvolvem durante dois estágios da infecção: 1) na
chegada dos parasitas jovens aos vasos pulmonares, cerca de 3 a 4 meses após a infecção, e 2) na morte dos parasitas adultos. Os sintomas iniciais estão associados a uma resposta vascular e inflamatória aguda do parênquima aos vermes
jovens recém­chegados e à subsequente morte de vários destes parasitas jovens. Esta fase inicial frequentemente é diagnosticada erroneamente como asma ou bronquite alérgica. No entanto, atualmente esta condição é considerada como
parte de uma síndrome recentemente identificada e denominada doença respiratória associada à dirofilariose. Em gatos, o teste sorológico para pesquisa de antígeno é negativo no início da síndrome de pneumonite eosinofílica, embora o
teste de pesquisa de anticorpos possa ser positivo. Com frequência os sinais clínicos regridem e podem não reaparecer durante meses. Gatos que albergam parasitas adultos podem manifestar vômito intermitente, letargia, tosse e episódios
de dispneia. A morte, mesmo de um parasita adulto, pode ocasionar angústia respiratória aguda e choque, que pode ser fatal, e parece ser consequência de trombose pulmonar e/ou choque anafilático.
DIAGNÓSTICO:  O  teste  para  detecção  de  antígeno  é  o  método  de  diagnóstico  preferido  para  cães  assintomáticos  ou  quando  o  objetivo  é  investigar  a  suspeita  de  infecção  por D.  immitis.  O  teste  para  detecção  de  antígeno  é  o  método
diagnóstico mais sensível e específico disponível ao clínico veterinário. Mesmo em regiões onde a prevalência de dirofilariose é alta, cerca de 20% dos cães infectados podem não apresentar microfilaremia. Esta taxa é maior em cães
infectados por dirofilárias adultas consistentemente submetidos à profilaxia mensal com macrolídeos, pois tal procedimento induz estase embrionária em fêmeas adultas de dirofilária.
O  momento  do  teste  para  pesquisa  de  antígeno  é  fundamental.  Deve­se  considerar  um  período  de  pré­detecção  (estes  testes  detectam  apenas  vermes  adultos),  considerando  a  data  aproximada  na  qual  a  infecção  tenha  ocorrido.  Um
intervalo de 7 meses é razoável. Geralmente não há necessidade do teste antigênico ou de pesquisa de microfilárias em cães antes de aproximadamente 7 meses de idade. Para assegurar que não há infecção previamente adquirida, cães
jovens ou cães que não receberam previamente tratamento profilático para dirofilariose devem ser submetidos ao teste 6 a 7 meses após o início da profilaxia para dirofilariose. Subsequentemente, recomendam­se testes anuais de pesquisa
de antígeno.
O grau de antigenemia está diretamente relacionado com a quantidade de fêmeas adultas do parasita. No mínimo, 90% dos cães que albergam = 2 fêmeas adultas são positivos à maioria dos testes disponíveis. Na suspeita de baixa
infestação parasitária os testes laboratoriais comerciais com base na titulação em micropoços são os mais sensíveis.
Em cães, a importância da ecocardiografia é relativamente pequena como método diagnóstico. A constatação de parasitas no coração direito e na veia cava está associada à alta carga parasitária, com ou sem síndrome da veia cava.
Hipertensão pulmonar crônica grave ocasiona hipertrofia do ventrículo direito, achatamento do septo, subcarga do coração esquerdo e regurgitação de alta velocidade nas valvas pulmonar e tricúspide. Geralmente o ECG de cães infectados
é normal. Nota­se hipertrofia do ventrículo direito quando há hipertensão pulmonar crônica grave, que está associada a ICC direita iminente ou evidente (ascite). Em geral, arritmias cardíacas são discretas ou ausentes, porém, fibrilação
atrial é uma complicação ocasional em cães com dirofilariose.
O diagnóstico de dirofilariose em gatos baseia­se nas informações obtidas na anamnese e nos achados clínicos, no grau de suspeita, em radiografias do tórax, na ecocardiografia e na sorologia. Os gatos podem apresentar teste antigênico
positivo 8 meses após a inoculação de L3. No entanto, os testes antigênicos são considerados muito pouco confiáveis como método de triagem inicial para gatos, pois nesta espécie são comuns infecções por parasitas machos e fêmeas.
Ademais, pode haver infecções brandas com quantidade de fêmeas adultas insuficiente para serem detectadas; alguns gatos podem adoecer e serem examinados antes que se desenvolva antigenemia detectável.
Anticorpos contra dirofilária, produzido por 90% dos gatos infectados, podem surgir 2 a 3 meses após a infecção por L3 e geralmente são constatados até 5 meses depois. No entanto, os anticorpos podem persistir durante vários meses
após a morte do parasita. Além disso, os anticorpos induzidos por larvas podem persistir após o uso profilático de macrolídeos, que são capazes de destruir as formas larvárias iniciais. Portanto, um teste de pesquisa de anticorpo positivo
indica infecção pelo parasita e sugere doença respiratória associada à dirofilariose, mas não necessariamente infecção persistente ou contínua. Em associação com outros achados, o teste sorológico para pesquisa de anticorpo positivo pode
ser útil no diagnóstico de dirofilariose felina. Não há relato de resultado falso­positivo decorrente de reação cruzada. O resultado negativo na pesquisa de anticorpo indica probabilidade de ausência de infecção = 90%. Microfilárias são
raramente detectadas pelo teste de Knott ou de filtração (< 10%). Recomenda­se triagem anual utilizando­se testes de pesquisa de antígeno e de anticorpo em gatos criados em áreas nas quais a dirofilariose é endêmica.
Em gatos, os parasitas geralmente podem ser vistos no exame ecocardiográfico. Linhas hiperecoicas paralelas, que representam a imagem da cutícula da D. immitis, podem ser notadas no coração direito e na artéria pulmonar. Alta carga
parasitária  pode  estar  associada  a  parasitas  no  coração  direito.  Quando  realizada  por  profissional  competente,  a  ecocardiografia  é  mais  importante  em  gatos  do  que  em  cães,  em  razão  da  maior  dificuldade  de  diagnóstico  e  da  alta
sensibilidade do exame.
Além dos testes de diagnósticos específicos para cães e gatos indicam­se hemograma, perfil bioquímico sérico, urinálise e, particularmente, radiografias do tórax. Com frequência, os resultados de exames laboratoriais são normais.
Eosinofilia e basofilia são achados comuns e, juntas, sugerem dirofilariose subclínica ou doença pulmonar alérgica. O grau de eosinofilia aumenta quando a L5 alcança a artéria pulmonar. Em seguida, a contagem de eosinófilos torna­se
variável, mas geralmente alta, em cães com infecção subclínica imunomediada, especialmente quando há pneumonite eosinofílica (< 10% do total de infecções).
Em cães e gatos é possível constatar hiperglobulinemia decorrente do estímulo antigênico. Em cães, a hipoalbuminemia está associada a ICC direita ou glomerulonefrite por deposição de complexo imune grave. Ocasionalmente, nota­se
aumento de atividade sérica de ALT e fosfatase alcalina, mas não há boa correlação deste achado com disfunção hepática, eficácia do tratamento adulticida ou risco de intoxicação medicamentosa. A urinálise pode revelar proteinúria, a qual
pode ser determinada por método semiquantitativo calculando­se a proporção proteína:creatinina da urina. Às vezes, amiloidose ou glomerulonefrite grave pode ocasionar hipoalbuminemia e síndrome nefrótica. Cães com hipoalbuminemia
secundária à doença glomerular também perdem antitrombina III e tornam­se predispostos à doença tromboembólica. Hemoglobinúria está associada ao caso clínico de alto risco e ocorre quando as hemácias são lisadas na circulação porta
pela deposição de fibrina. Indica­se tratamento com heparina (75­100U/kg, SC, 3 vezes/dia). Hemoglobinúria também é um sintoma clássico da síndrome da veia cava.
Em cães, a radiografia do tórax propicia melhor informação sobre a gravidade da doença, sendo considerada bom teste de triagem para cães com sinais clínicos compatíveis com dirofilariose. Infecções de alto risco são caracterizadas por
grande segmento da artéria pulmonar principal e tortuosidade e dilatação das artérias pulmonares do lobo caudal. ?Caso estas últimas apresentem diâmetro = 1,5 vez àquele da nona costela, no ponto de superposição, pode­se considerar
lesão grave. Também, pode­se notar aumento do ventrículo direito. Ademais, na doença avançada frequentemente é possível constatar infiltrado parenquimal não delimitado, disperso e de extensão variável ao redor da artéria lobar caudal,
geralmente mais grave no lobo caudal direito. O infiltrado pode melhorar com o confinamento em gaiola, com ou sem o uso de dose anti­inflamatória de corticosteroides.
Em gatos, as alterações cardíacas são menos comuns. Em geral, a artéria lobar caudal se apresenta relativamente maior, porém é ainda maior no caso de dirofilariose. Também, é possível constatar infiltrados parenquimais irregulares em
gatos com sintomas respiratórios. Geralmente o segmento da artéria pulmonar principal não é visível em razão de sua localização próxima à linha média.
TRATAMENTO EM CÃES:  A avaliação do uso de medicamento pré­adulticida varia em função do estado clínico do paciente e da probabilidade de coexistência de doenças que podem influenciar na eficácia do tratamento. Devem­se obter
informações laboratoriais, seletivamente, para complementar as informações obtidas na anamnese, no exame físico, na pesquisa de antígeno e, geralmente, na radiografia do tórax.
Duas importantes variáveis que sabidamente têm influência direta na ocorrência de complicações tromboembólicas após o uso de droga adulticida e na eficácia do tratamento são a extensão da doença vascular pulmonar concomitante e a
gravidade da infecção. A avaliação da função cardiopulmonar é indispensável para a definição do prognóstico. As complicações tromboembólicas pulmonares pós­adulticida são mais prováveis em cães infectados com alta carga parasitária,
que já exibem sinais clínicos e radiográficos de obstrução da artéria pulmonar grave, especialmente na presença de ICC.
Antes  de  iniciar  a  terapia  adulticida  os  cães  com  dirofilariose  devem  ser  avaliados  e  deve­se  calcular  o  risco  de  tromboembolia  pós­adulticida.  Os  pacientes  podem  ser  classificados  como  se  segue:  1)  baixo  risco  de  complicações
tromboembólicas, baixa carga parasitária e sem evidência de lesão de parênquima e/ou de vaso pulmonar; ou 2) alto risco de complicações tromboembólicas. Cães da primeira categoria devem satisfazer as seguintes condições: nenhum
sinal clínico, radiografia do tórax normal, baixa concentração de antígeno circulante ou teste de pesquisa de antígeno negativo com microfilárias circulantes, ausência de verme no exame ecocardiográfico, ausência de doença concomitante e
capacidade  do  proprietário  de  restringir  totalmente  o  exercício  do  animal.  Cães  com  risco  de  complicações  tromboembólicas  são  aqueles  com  sintomas  relacionados  com  a  dirofilariose  (p.  ex.,  tosse,  lipotimia,  tumefação  abdominal),
anormalidades em radiografias do tórax, alto teor de antígenos circulantes, visualização de parasita na ecocardiografia, doença concomitante e baixa ou nenhuma possibilidade de os proprietários limitarem o exercício.
O único medicamento adulticida disponível para tratamento de dirofilariose é o di­hidrocloreto de melarsomina, efetivo contra parasitas maduros (adultos) e jovens, machos e fêmeas. Faz­se administração de 2,5 mg de melarsomina/kg,
por via IM profunda, no músculo epaxial (lombar), na altura das vértebras L3­L5, utilizando­se uma agulha calibre 22 (1 polegada de comprimento, para cães < 10 kg, ou de 1,5 polegada para cães > 10 kg). Aplica­se pressão durante a
injeção, mantendo­a 1 min após a retirada da agulha, a fim de evitar extravasamento subcutâneo. Repete­se o procedimento no lado oposto 24 h depois. Cerca de 1/3 dos cães apresenta, no local da injeção, dor, tumefação, sensibilidade
durante  o  movimento  ou  abscesso  estéril.  Não  é  incomum  a  ocorrência  de  fibrose  no  sítio  de  aplicação  (sendo  esta  a  razão  para  indicar  a  parte  ventral  da  musculatura  epaxial).  Para  reduzir  o  risco  de  tromboembolia  é  altamente
recomendado o tratamento em duas etapas (protocolo com doses alternadas). Neste protocolo, administra­se uma única injeção de melarsomina, seguida de duas injeções em intervalo de 24 h, após um período de, pelo menos, 30 dias. Este
protocolo de doses alternadas é recomendado pela American Heartworm Society, independente do estágio da doença ou da categoria de risco.
Cães com alta carga parasitária são predispostos à tromboembolia pulmonar grave, vários dias a 6 semanas após a aplicação do medicamento adulticida. A administração de uma única dose inicial resulta em morte gradativa dos parasitas
(cerca  de  50%)  e  menor  risco  de  complicações  pulmonares.  Pode­se  reduzir  o  risco  cumulativo  de  êmbolos  parasitários  nos  pulmões  e  artérias  pulmonares  gravemente  lesionadas,  induzindo  inicialmente  a  morte  de  alguns  parasitas  e
completando o tratamento em duas etapas.
Outros  protocolos  de  tratamento  recomendam  a  administração  de  doses  profiláticas  de  macrolídeos  durante  3  meses,  antes  da  aplicação  de  melarsomina.  O  objetivo  dessa  abordagem  é  eliminar  as  larvas  de  D.  immitis  migrantes
suscetíveis e permitir que larvas não suscetíveis de 2 a 4 meses de idade se desenvolvam até uma idade em que sejam mais suscetíveis à melarsomina.
Após a injeção de melarsomina deve­se restringir drasticamente a atividade física durante 4 a 6 semanas, com intuito de reduzir o risco de complicações tromboembólicas pulmonares. Deve­se manter baixo débito cardíaco, a fim de
reduzir a ocorrência de trombose e de lesão endotelial e de facilitar a cicatrização pulmonar. Os efeitos colaterais do uso de melarsomina se limitam à inflamação local, febre baixa transitória e salivação. Raramente se constata intoxicação
hepática e renal.
Pacientes com alto risco devem ter o quadro clínico estabilizado antes da administração de melarsomina. O tratamento de estabilização é variável e inclui confinamento em gaiola, fornecimento de oxigênio, corticosteroides e heparina
(75 a 100U/kg, SC, 3 vezes/dia), 1 semana antes do protocolo de tratamento com doses alternadas de melarsomina.
Pacientes com ICC direita devem ser tratados com furosemida (1 a 2 mg/kg, 2 vezes/dia), baixa dose de inibidor da enzima conversora da angiotensina (ECA), como enalapril (0,25 mg/kg, 2 vezes/dia), possivelmente aumentada para 0,5
mg/kg, 2 vezes/dia, após 1 semana, dependendo dos resultados do teste de função renal) e dieta com baixo teor de sódio. Digoxina, digitoxina e dilatadores arteriolares, como hidralazina e anlodipino, não devem ser administrados. A
digoxina não é efetiva no tratamento de cor pulmonale; dilatadores arteriolares e, ocasionalmente, inibidores da ECA podem causar hipotensão sistêmica.
É possível a ocorrência de complicações tromboembólicas 2 a 30 dias após o tratamento com droga adulticida, sendo mais provável a manifestação de sintomas 14 a 21 dias após a terapia. Dentre os sinais clínicos incluem­se tosse,
hemoptise, dispneia, taquipneia, letargia, anorexia e febre. Os achados laboratoriais podem incluir leucograma indicativo de inflamação, trombocitopenia e aumento do tempo de coagulação ativada ou do tempo de protrombina ativada.
Após a injeção pode­se notar aumento da atividade sérica de CK. É possível a ocorrência de coagulação intravascular local ou disseminada quando a contagem de plaquetas é L < 100.000/μl. O tratamento para tromboembolia grave deve
incluir oxigênio, confinamento em gaiola, dose anti­inflamatória de corticosteroide (p. ex., 1 mg de prednisona/kg VO, 1 vez/dia) e baixa dose de heparina (75 a 100U/kg SC, 3 vezes/dia), durante vários dias a 1 semana. A maior parte dos
cães responde ao tratamento dentro de 24 h. É provável que exista lesão pulmonar grave quando não se constata melhora e a pressão de oxigênio permaneça < 70 mmHg 24 h após a oxigenoterapia.
O protocolo terapêutico padrão com melarsomina e o protocolo de tratamento com esta droga em duas fases/alternado elimina a maioria dos parasitas adultos em 50 a 85% dos cães. Em estudo de eficácia controlado contra vermes mais
jovens (4 meses) a taxa foi menor, resultando em apenas 20% dos cães efetivamente livres da infecção. Realiza–se teste de pesquisa de antígeno 6 meses após as duas primeiras doses do protocolo padrão e 6 meses após a terceira dose do
protocolo com doses alternadas. No caso de resultado fortemente positivo ao teste deve­se realizar novo tratamento (duas injeções com intervalo de 24 h).
O uso prolongado de macrolídeos raramente é uma alternativa ao tratamento com melarsomina porque a morte lenta pode possibilitar que a lesão pulmonar progrida nesse ínterim.
Na síndrome da veia cava é necessária a remoção cirúrgica dos parasitas do átrio direito e do orifício da valva tricúspide, a fim de evitar a morte do cão. Isso pode ser realizado utilizando­se anestesia local e sedação leve e uma pinça tipo
jacaré rígida ou flexível ou uma alça de recuperação intravascular introduzida preferencialmente na veia jugular externa direita. Quando há disponibilidade de um fluoroscópio como guia, o instrumento deve ser utilizado até que os parasitas
não possam mais ser recuperados. Imediatamente após um procedimento bem­sucedido os sinais clínicos melhoram ou desaparecem. Nos casos críticos pode ser necessária fluidoterapia, permitindo que os cães hipovolêmicos restabeleçam
a hemodinâmica e a função renal. Algumas semanas após a recuperação da cirurgia recomenda­se quimioterapia adulticida para eliminar possíveis parasitas remanescentes. Deve­se ter cuidado quando vários deles ainda são vistos no exame
ecocardiográfico.
Tratamento com Microfilaricida: Em doses preventivas específicas os macrolídeos têm ação microfilaricida efetiva, embora não aprovados pela FDA (Food and Drug Administration)  para  tal  propósito.  Dependendo  do  tipo  de  macrolídeo
utilizado podem ocorrer reações adversas em cães com alta contagem de microfilárias (> 40.000/ml). No entanto, geralmente a contagem de microfilária é baixa e cerca de 10% dos cães manifestam reações adversas discretas. A maior parte
dos  efeitos  colaterais  se  limita  à  defecação  e  salivação  transitória,  que  iniciam  dentro  de  algumas  horas  e  duram  várias  horas  após  a  medicação.  Cães,  especialmente  animais  pequenos  (<  10  kg),  que  apresentam  alta  contagem  de
microfilárias (> 40.000/ml), podem manifestar taquicardia, taquipneia, palidez de membranas mucosas, letargia, ânsia de vômito, diarreia e até mesmo choque. O tratamento inclui o uso de um corticosteroide solúvel e de solução eletrolítica
balanceada  IV.  Geralmente  a  recuperação  é  rápida  quando  se  institui  tratamento  imediato.  A  contagem  de  microfilárias  não  é  um  exame  de  rotina,  sendo  raramente  esperadas  reações  graves.  O  tratamento  visa  especificamente  as
microfilárias circulantes e pode ser iniciado 3 a 4 semanas após a administração do medicamento adulticida. Mais comumente, as microfilárias são eliminadas mesmo em cães não tratados com adulticida, após vários meses de tratamento
com dose profilática de lactonas macrocíclicas. Atualmente não há medicamento microfilaricida aprovado pela FDA; contudo, veterinários licenciados são autorizados a utilizar alguns medicamentos não indicados especificamente para
animais, caso haja uma relação apropriada entre veterinário­proprietário­paciente. O uso mensal profilático de quimioterápicos para dirofilariose, como microfilaricidas, deve seguir esta regulamentação. As lactonas macrocíclicas são os
microfilaricidas mais seguros e efetivos atualmente disponíveis. Preparações dessas drogas destinadas aos animais pecuários não devem ser utilizadas para se obter doses maiores com o intuito de obter resultados mais rápidos. Recomenda­
se um teste para microfilária por ocasião da realização do teste de pesquisa de antígeno (6 meses após o tratamento com medicamento adulticida).
TRATAMENTO EM GATOS:  Atualmente não há tratamento satisfatório para infecção por D. immitis em gatos. Com frequência, a infecção é letal e ainda não há um protocolo efetivo e seguro com melarsomina. Desse modo, todos os gatos
criados em regiões endêmicas para dirofilariose canina devem receber medicamento profilático. Nessa espécie animal, provavelmente o ciclo biológico da dirofilária adulta é = 2 anos, sendo possível recuperação espontânea. Os gatos
podem  permanecer  assintomáticos,  manifestar  episódios  de  vômito  e/ou  crises  de  dispneia  (que  lembra  asma),  morrer  subitamente  por  tromboembolia  pulmonar  ou,  raramente,  desenvolver  ICC.  Cada  parasita  que  morre  pode  causar
complicações. Não parece haver associação entre presença, ausência ou gravidade de sinais clínicos e a probabilidade de complicações agudas.
Vários gatos são submetidos ao tratamento conservativo com restrição de atividade física e terapia com corticosteroides, como prednisolona (1 a 2 mg/kg VO, em intervalos de 24 a 48 h). Os esteroides reduzem a gravidade do vômito e
dos sinais respiratórios. A esperança é que episódios de complicações pulmonares não se tornem fatais com a morte dos parasitas. Não havendo superinfecção, 25 a 50% dos gatos podem sobreviver com este procedimento terapêutico.
Podem ser realizados testes de pesquisa de antígenos e de anticorpos seriados (com intervalos de 6 meses) com intuito de monitorar o quadro clínico.
Pode­se  tentar  a  retirada  cirúrgica  de  parasitas  do  átrio  direito,  do  ventrículo  direito  e  da  veia  cava,  por  meio  de  venotomia  jugular,  em  pacientes  com  alta  carga  de  parasitas  detectada  por  ecocardiografia.  O  endoscópico  pode  ser
introduzido na veia jugular, guiado por fluoroscopia.
PREVENÇÃO:  É perfeitamente possível prevenir a infecção por D. immitis mediante o uso profilático de macrolídeos. Aconselha­se a prevenção durante o ano todo. Recomenda­se o início da terapia preventiva em cães com 6 a 8 semanas de
idade. Nessa idade não há necessidade de realização de testes de diagnóstico. Quando é iniciada após 7 meses de idade, recomenda­se teste de pesquisa de antígeno e teste de pesquisa de microfilaria, seguidos por novo teste para pesquisa
de antígeno 6 a 7 meses depois. Esta série de testes auxilia a evitar demora desnecessária na detecção de infecções subclínicas, bem como confusão potencial quanto à eficácia do programa de prevenção, uma vez que antes do segundo teste
não é possível determinar se a infecção existia antes de iniciar a quimioprofilaxia.
Os  macrolídeos  de  uso  preventivo,  ivermectina,  oxima  milbemicina,  moxidectina  e  selamectina,  são  seguros  e  efetivos  em  todas  as  raças  de  cães.  Ivermectina/pamoato  de  pirantel  (ancilóstomos  e  nematelmintos)  e  milbemicina
(ancilóstomos, nematelmintos e nematoides) também propiciam controle de nematoides intestinais. Na dose aprovada, a milbemicina mata rapidamente as microfilárias e caso haja alta população destas formas parasitárias pode ocorrer
choque. Portanto, não se deve administrar milbemicina como um método preventivo em cães infectados com grande quantidade de microfilárias, sem rigoroso monitoramento. A forma injetável da moxidectina é efetiva por, pelo menos, 6
meses após uma injeção; contudo, não é aconselhável o uso em cães com microfilaremia.
Indica­se a adoção de medidas preventivas de dirofilariose a todos os gatos que vivem em regiões endêmicas, independente se criados em ambiente interno ou não, em razão do risco de consequências graves. A aplicação de uma dose
mensal de 24 μg de ivermectina/kg VO é segura e efetiva para gatos. Nessa dose, o medicamento também é eficaz contra Ancylostoma tubaeforme e A. braziliense. O tratamento preventivo deve ser iniciado em todos os filhotes com 6
semanas de idade e continuar por toda a vida.
As formulações de selamectina e uma combinação de imidacloprid/moxidectina são indicadas para ambos, cães e gatos. A aplicação de selamectina é tópica, com dose mensal de 6 mg/kg; também mata pulgas adultas e impede a eclosão
de ovos de pulgas por 1 mês. Ademais, é indicada no tratamento e controle de Otodectes cynotis em cães e gatos, sarna sarcóptica, infestações por Dermacentor variabilis, em cães, e por Ancylostoma tubaeforme e Toxocara cati, em gatos.
Uma formulação de uso tópico que combina imidacloprid e moxidectina, na dose de 10 mg de imidacloprid/kg e 1 mg de moxidectina/kg, também é efetiva contra vários ecto e endoparasitas.
Anualmente, recomenda­se o teste de pesquisa de antígeno, em todos os casos.

DOENÇA DE ALTITUDE ELEVADA EM BOVINOS (“Doença do peito inchado”, “Doença do peito grande”, Hidropisia, Hipertensão pulmonar,
Insuficiência cardíaca congestiva direita)

A doença de altitude elevada em bovinos (DAEB) é caracterizada por tumefação edematosa não contagiosa nos músculos ventral paraesternais (região do peito) em bovinos criados em regiões de altitude elevada (> 1.524 m), nos estados
americanos do Colorado, Wyoming, New Mexico e Utah. Também, acomete bovinos criados em regiões montanhosas em todos os países, mais comumente em altitudes > 1.981 m, no oeste do Canadá e na América do Sul. A DAEB
acomete bovinos de todas as idades e raças, mas não necessariamente de modo equitativo.
A  DAEB  se  deve  à  hipertensão  arterial  pulmonar  induzida  pela  hipoxia  pulmonar  que  ocorre  em  altitudes  elevadas.  Vasoconstrição  arterial  pulmonar  e  hiperplasia  pulmonar  induzidas  por  hipoxia  reduz  o  diâmetro  das  arteríolas
pulmonares, resultando em hipertensão pulmonar e subsequente hipertrofia do ventrículo direito (VD). Sem intervenção para reduzir a hipertensão pulmonar induzida por hipoxia a doença eventualmente progride para insuficiência cardíaca
congestiva direita. Raramente, relata­se enfermidade semelhante em ovinos e veados submetidos a estresse intenso e acometidos por parasitismo grave. Etiologicamente, relata­se semelhante insuficiência cardíaca associada à hipoxia em
aves domésticas criadas em regiões montanhosas dos Andes e em pessoas residentes em altitudes extremamente altas. A taxa de prevalência em bovinos criados em pastagens, em altitude elevada, é cerca de 3%, variando de 0,5 a 5%;
porém, há relato de taxa tão elevada quanto 65% em um grupo de bezerros geneticamente suscetíveis.
Embora a doença seja estreitamente relacionada com altitude elevada, outros fatores genéticos, fisiológicos, ambientais e tóxicos têm importante papel no desenvolvimento e na progressão da desta enfermidade. Toda doença pulmonar,
aguda ou crônica, que prejudica a função pulmonar pode resultar em hipoxia semelhante àquela verificada na DAEB.
ETIOLOGIA:  Embora vários fatores possam contribuir na ocorrência de DAEB, a patogênese está diretamente relacionada com a hipoxia decorrente de altitude elevada. Desvio (shunt) vascular pulmonar é a resposta fisiológica à hipoxia,
sendo notado em todos os animais. Reações marcantes são notadas em bovinos, equinos e suínos; pessoas, cães, porquinhos­da­índia e lhamas respondem com menor intensidade. Tais achados, associados à alta incidência de doença em
bovinos, indicam que são particularmente suscetíveis. O mecanismo de vasoconstrição do shunt é um meio de desviar sangue não oxigenado para áreas dos pulmões ricas em oxigênio e distantes de regiões pouco oxigenadas. O desvio
exagerado em resposta à hipoxia, o padrão anatômico lobulado do pulmão de bovinos e a baixa proporção tamanho do pulmão:peso corporal contribuem para uma grave perda da capacidade funcional dos pulmões.
Inicialmente, o desvio vascular pulmonar é mediado pela constrição de arteríolas pulmonares, na fase aguda da hipoxia. Com exposição prolongada à hipoxia (> 3 semanas), nota­se hipertrofia e espessamento das camadas adventícia e
média (hipertrofia da camada média) das arteríolas pulmonares. A remodelagem vascular induz à perda de artérias pulmonares periféricas que também contribuem para aumento da resistência pulmonar. Esta combinação de eventos provoca
hipertensão pulmonar importante que ocasiona progressão da doença cardíaca: hipertrofia de ventrículo direito, seguida de sua dilatação e, por fim, ICC direita.
Esta patogênese de shunt vasoconstritivo  exagerado,  hipertrofia  das  camadas  média  e  adventícia  das  artérias  e  obliteração  vascular,  resultando  em  hipertensão  pulmonar  parece  ser  característica  de  alguns  bovinos,  sendo  altamente
hereditária. Alguns bovinos parecem naturalmente mais resistentes a esta enfermidade, dependendo da raça e do próprio indivíduo. Há marcante variação individual e entre espécies quanto ao aumento da resistência vascular pulmonar
induzida por hipoxia. A base genética implicada na ocorrência de DAEB é sustentada pela alta incidência familiar, com acentuada variação na suscetibilidade entre os animais, em relação à raça, espécie e ao próprio indivíduo. Há forte
evidência de que a suscetibilidade de bovinos à hipertensão pulmonar induzida por hipoxia é hereditária.
Além da predisposição genética primária, também pode haver alteração na atividade de quimioceptores ou no metabolismo miocárdico. Doença respiratória bacteriana ou viral aguda pode exacerbar a hipoxia pulmonar em altitudes
elevadas, resultando em início rápido de insuficiência do ventrículo direito.
Vários tipos de pastagens, com e sem brotos, foram associados a aumento da prevalência de DAEB, mas apenas o astrágalo foi experimentalmente comprovado como indutor da enfermidade. Quando consumido por bovinos criados em
altitude elevada, o astrágalo (algumas espécies de Oxytropis e de Astragalus spp que contêm o alcaloide swainsonina) aumenta drasticamente a prevalência e a gravidade da ICC, que se desenvolve de modo relativamente rápido (dentro de
1 ou 2 semanas), podendo a taxa de prevalência chegar a 100%. A swainsonina, a toxina do astrágalo, é excretada no leite, predispondo também os bezerros lactentes à ICC. Com frequência, as vacas intoxicadas por astrágalo abortam e
várias desenvolvem hidropisia de envoltórios fetais, além dos sintomas de DAEB. É provável que a intoxicação por astrágalo contribua diretamente no aumento da hipertensão e da resistência vascular pulmonar; estudos imunoistoquímicos
em microscopia eletrônica revelaram que a intoxicação causa grave edema e vacuolização citoplasmática de macrófagos pulmonares intravasculares e de células endoteliais. O miocárdio também é lesionado pelo astrágalo em razão da
extensa vacuolização das células intersticiais miocárdicas. Por fim, a swainsonina tem efeitos endócrinos e parácrinos sistêmicos devido à alteração do metabolismo de glicoproteína, condição que também podem contribuir na patogênese
da DAEB.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em geral, os sinais clínicos de ICC do VD relacionados com DAEB se desenvolvem lentamente, ao longo de várias semanas, comumente nas primeiras 3 a 4 semanas após a transferência de bovinos de altitude mais
baixa para altitude elevada. Nestas regiões da América do Norte, onde os bovinos passam o verão e o outono pastejando em altitude elevada e posteriormente retornam para altitude menor no outono, a doença geralmente se manifesta no
final  do  verão.  Em  regiões  onde  os  bovinos  vivem  o  ano  todo  em  altitude  elevada,  a  prevalência  da  doença  é  maior  no  final  do  outono,  no  inverno  e  no  início  da  primavera.  Períodos  de  frio  intenso  ou  a  influência  de  outros  fatores
fisiológicos ou ambientais (p. ex., prenhez, mudança na alimentação) parecem precipitar o início dos sintomas. No princípio, os animais acometidos manifestam depressão e se mostram relutantes em caminhar. À medida que a doença
progride se desenvolve edema subagudo na região da ponta do peito e este se estende, cranialmente, até o espaço intermandibular e, caudalmente, à parede abdominal ventral. Efusão pleural e ascite geralmente são abundantes. Às vezes,
notam­se evidentes dilatação e pulsação da veia jugular. Pode haver diminuição do apetite. É possível notar diarreia fluida profusa em decorrência de hipertensão venosa intestinal. A respiração é laboriosa e os animais podem manifestar
cianose. À medida que a doença avança, os bovinos acometidos tornam­se mais relutantes em caminhar e podem adotar posição de decúbito. Quando submetidos a exercício forçado, os animais mais gravemente enfermos podem apresentar
colapso e morrer. Nos estágios terminais, o animal frequentemente apresenta anorexia e decúbito, sendo incapaz de se levantar.
Lesões: Geralmente nota­se edema generalizado grave, particularmente no tecido subcutâneo ventral, nos músculos esqueléticos, nos tecidos perirrenais, no mesentério e na parede do trato gastrintestinal. Ascite, hidrotórax e hidropericárdio
são achados consistentes. Os fluidos apresentam, como características, baixa celularidade e teor proteico baixo a normal, compatível com transudato secundário à insuficiência cardíaca. As lesões hepáticas, secundárias à congestão passiva
crônica, variam desde a aparência inicial de “noz­moscada” até fibrose vascular e lobular grave. Os pulmões podem apresentar graus variáveis de atelectasia, enfisema intersticial, edema e pneumonia. Notam­se acentuadas dilatação e
hipertrofia do ventrículo direito; o deslocamento do ápice cardíaco para a esquerda confere ao coração um contorno aumentado e arredondado. É comum a ocorrência de trombose de artéria pulmonar. Microscopicamente, constata­se
hipertrofia da camada média de pequenas artérias e de arteríolas pulmonares.
DIAGNÓSTICO:  Não há teste diagnóstico definitivo para DAEB. O diagnóstico pode se basear nos achados clínicos relacionados com a ICC, em bovinos mantidos em altitude elevada. Em geral, a temperatura corporal e o hemograma são
normais, a menos que haja doença inflamatória primária concomitante. No caso de efusão pleural a auscultação torácica pode revelar diminuição da intensidade dos ruídos respiratórios na parte ventral do tórax e abafamento das bulhas
cardíacas. As frequências respiratória e cardíaca geralmente se apresentam aumentadas e pode­se auscultar um sopro cardíaco sistólico se o aumento do VD resultou em insuficiência de valva atrioventricular direita ou da valva pulmonar.
No estágio final da ICC, frequentemente se detecta ritmo de galope. Embora a dilatação da veia jugular seja um sinal clínico característico, pode ou não ser constatado pulso jugular anormal. As alterações comuns verificadas nos exames
laboratoriais  incluem  elevação  das  atividades  das  enzimas  hepáticas,  especialmente  AST  e  l­iditol  desidrogenase.  Os  animais  clinicamente  acometidos  podem  apresentar  azotemia  devido  à  diminuição  da  perfusão  renal  decorrente  da
insuficiência cardíaca e à desidratação/hipovolemia.
Deve­se  diferenciar  a  DAEB  de  outras  causas  de  ICC,  inclusive  pericardite,  reticulopericardite  traumática,  linfossarcoma  cardíaco,  endocardite  valvular,  miocardite  viral  ou  bacteriana,  cardiomiopatia  (nutricional,  hereditária  ou
idiopática), obstrução da artéria pulmonar decorrente de embolia pulmonar, ou hipoxia crônica e cor pulmonale devido à doença pulmonar primária concomitante. Nem sempre se constata edema de peito nos animais com insuficiência
cardíaca congestiva do VD hiperaguda; isto pode resultar em DAEB em bezerros, confundida com pneumonia viral ou bacteriana aguda.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Os animais acometidos devem ser transferidos para um local de altitude mais baixa, com contenção, estresse e excitação mínimos. O tratamento de suporte, incluindo diuréticos, toracocentese, antibióticos e
estimulantes  de  apetite  tal  como  vitaminas  do  complexo  B,  pode  ser  benéfico.  Toracocentese  é  o  único  tratamento  que  melhora  acentuadamente  a  chance  de  sobrevivência  do  animal.  Em  regiões  de  altitude  elevada  pode­se  empregar
oxigenoterapia ou câmara hiperbárica aos pacientes de alto valor. Como pode ocorrer recidiva da doença, os animais enfermos não devem retornar à altitude elevada.
Os  bovinos  acometidos  não  devem  ser  mantidos  como  reprodutores  devido  à  suscetibilidade  hereditária.  Devem­se  tratar  as  enfermidades  concomitantes,  incluindo  doença  respiratória/cardíaca,  doença  gastrintestinal,  parasitose  e
intoxicação por plantas. Como a intoxicação por astrágalo tem sido diretamente relacionada com o desenvolvimento de ICC em bovinos, deve­se minimizar a exposição dos animais suscetíveis a esta planta tóxica, assegurando aos bovinos
forrageiras de boa qualidade. Os animais devem ser transferidos para uma pastagem livre de astrágalo assim que se nota a intoxicação, de modo a prevenir lesão grave e irreversível.
O tratamento de DAEB pode ser oneroso e não compensador; assim, o melhor procedimento é a prevenção. A seleção genética mediante mensurações da pressão arterial pulmonar (PAP) com intuito de selecionar bovinos resistentes aos
efeitos da hipoxia é a maneira mais efetiva de controle de DAEB. Identificação de animais altamente suscetíveis aos efeitos da hipoxia decorrente da altitude (aqueles com mensurações de PAP altas) e a retirada destes bovinos do grupo de
reprodutores são procedimentos práticos para reduzir a prevalência de DAEB no rebanho. A mensuração de PAP envolve a introdução de um cateter de polietileno flexível (diâmetro interno de 1,19 mm e diâmetro externo de 1,7 mm)
através de uma agulha de grande calibre (calibre 12 ou 13, de 3,5 polegadas) introduzida na veia jugular. O cateter é avançado através da veia jugular até o átrio direito, ventrículo direito e, por fim, artéria pulmonar.
Em altitudes de 1.524 m a 2.133 m a PAP média normal deve ser 34 a 41 mmHg. Em bovinos que manifestam sintomas de hipertensão de artéria pulmonar a PAP pode variar de 48 a 213 mmHg. A PAP e a pressão no ventrículo direito
podem  ser  normais  ou  subnormais  em  bovinos  em  estágio  terminal  de  ICC,  em  razão  da  insuficiência  do  miocárdio.  Bovinos  com  defeito  de  septo  ventricular  ou  de  septo  atrial  frequentemente  apresentam  mensurações  diastólicas  e
sistólicas médias na casa das centenas. Todo animal com PAP > 48 mmHg é considerado suscetível ao desenvolvimento de DAEB e pode ser um carreador genético potencial e não deve ser mantido ou utilizado como reprodutor em regiões
de altitude elevada. Estes animais também devem ser auscultados para verificar se há sopro cardíaco e avaliados quanto à possibilidade de apresentarem defeitos cardíacos congênitos. Em geral, bovinos com mais de 1 ano de idade têm PAP
<  41  mmHg  em  altitude  >  1.524  m  e  provavelmente  mantêm  uma  PAP  aceitável  em  altitude  elevada,  sendo  bom  candidato  para  ser  incluído  no  grupo  de  reprodutores,  em  rebanhos  criados  nesta  altitude.  É  difícil  uma  interpretação
consistente de valores de PAP situados entre 41 e 49 mmHg; estes animais devem ser utilizados com cuidado em regiões de altitude elevada.
Vários fatores contribuem para a variação da PAP em bovinos, incluindo raça, sexo, idade, condição corporal, doença concomitante, condições ambientais, altitude e característica genética. Com base em estudo com mais de 200.000
bovinos, parece que nenhum rebanho é resistente aos efeitos da hipoxia decorrente de altitude elevada, embora algumas raças, e linhagens dentro de uma raça, pareçam naturalmente mais resistentes. Não é comum verificar diferença entre
as mensurações de PAP de novilhas e touros em decorrência das práticas de manejo. Com frequência, os touros são estimulados nutricionalmente a crescimento e desenvolvimento muscular mais rápido, fato que pode influenciar a função
pulmonar e originar hipertensão pulmonar. Tem­se constatado que vacas prenhes apresentam PAP maior do que vacas não prenhes. Sempre deve ser considerada a idade do animal por ocasião da mensuração da PAP, pois há ampla variação
e menor previsibilidade em bovinos com = 1 ano de idade. O exame dos animais aos 16 meses de idade parece mais consistente e confiável na previsão de suscetibilidade à hipertensão pulmonar induzida por altitude elevada. Toda doença
concomitante, em especial enfermidade respiratória, ou qualquer causa de hipoxia pulmonar temporária ou permanente pode influenciar a PAP.
Alguns bovinos parecem mais propensos ao desenvolvimento de ICC direita, enquanto outros são criados em altitude elevada, com PAP elevada e nunca apresentam problema clínico. Embora estes animais não desenvolvam DAEB
clínica,  eles  podem  transmitir  a  predisposição  genética  a  sua  prole.  Esta  manifestação  variável  de  doença  clínica,  bem  como  a  variável  penetrância  do  gene,  torna  a  mensuração  de  PAP  um  desafio  em  todas  as  altitudes  e  representa
um grande problema em altitudes acima 1.524 m, onde as condições de hipoxia necessárias para estimular uma resposta pulmonar não são suficientes. Não se deve empregar as mensurações de PAP em baixa altitude < 1.524 m como
procedimento de seleção positivo, mas apenas para identificar animais altamente suscetíveis a condições de hipoxia e que apresentam hipertensão mesmo em altitude < 1.524 m. Os bovinos transferidos de um local de baixa altitude para
uma área de altitude elevada deve permanecer nesta altitude por = 3 semanas, antes da mensuração da PAP.
DOENÇA E INSUFICIÊNCIA CARDÍACA

Doença cardíaca é definida como qualquer anormalidade do coração. Envolve ampla variação de anormalidades, inclusive anomalias congênitas (ver p. 83), bem como alterações fisiológicas e anatômicas de etiologias variadas. Pode ser
classificada  com  base  em  vários  parâmetros,  inclusive  constatação  ou  não  da  doença  ao  nascimento  (p.  ex.,  congênita  ou  adquirida),  etiologia  (p.  ex.,  infecciosa,  degenerativa),  duração  (p.  ex.,  crônica,  aguda),  quadro  clínico  (p.
ex., insuficiência cardíaca esquerda, insuficiência cardíaca direita, insuficiência biventricular) e malformação anatômica (p. ex., defeito de septo ventricular).
Insuficiência  cardíaca  corresponde  a  qualquer  anormalidade  cardíaca  que  resulta  na  perda  da  capacidade  do  coração  em  bombear  sangue  em  quantidade  necessária  ao  metabolismo  tecidual.  É  uma  síndrome  clínica  na  qual  ocorre
congestão ou diminuição da perfusão periférica como consequência final da doença cardíaca grave. Pode haver doença do coração sem que haja insuficiência cardíaca. No entanto, nota­se insuficiência cardíaca apenas quando há doença
cardíaca, pois ela é uma consequência da doença do coração.

DIAGNÓSTICO
Tipicamente, o diagnóstico das doenças cardíacas envolve resenha, anamnese e achados ao exame físico, bem como resultados de exames auxiliares de diagnóstico, como radiografia, eletrocardiografia e ecocardiografia. Ocasionalmente,
são necessários testes mais especializados, como cateterização cardíaca ou estudos nucleares.

Cateterização Cardíaca
A cateterização cardíaca envolve a colocação de cateter especial no coração e nos grandes vasos sanguíneos vizinhos. As indicações para tal procedimento incluem avaliação diagnóstica, por exemplo, quando outros testes diagnósticos não
são capazes de identificar anormalidades cardíacas específicas ou a gravidade de uma lesão, bem como avaliação pré­cirúrgica, intervenção terapêutica e pesquisa clínica. No entanto, a cateterização cardíaca pré­cirúrgica e diagnóstica têm
sido amplamente substituída pela ecocardiografia.

Ecocardiografia
A ecocardiografia, na qual emprega­se ultrassonografia para avaliar o coração e os grandes vasos proximais, complementa outros procedimentos diagnósticos por quantificar os eventos dinâmicos do ciclo cardíaco. Pode­se determinar a
dimensão das câmaras cardíacas e das paredes; é possível visualizar a anatomia e a movimentação das valvas; pode­se calcular o gradiente de pressão, o volume do fluxo sanguíneo, bem como vários parâmetros da função cardíaca. A
ecocardiografia também pode revelar alterações na estrutura do tecido miocárdico indicativa de isquemia e fibrose, bem como delinear tumores, vegetações valvulares, efusão pericárdica e várias outras alterações antigamente vistas apenas
com cateterização cardíaca ou durante a necropsia.
Há três tipos principais de ecocardiografia: bidimensional, modo M e Doppler. A ecocardiografia bidimensional propicia imagens bidimensionais cuneiformes do coração em movimento, em tempo real. Têm­se desenvolvido vários
padrões de imagens de eixo longo e de eixo curto, a partir de janelas de padrão de imagem do tórax de cães, gatos, equinos e vacas. A ecocardiografia modo M é obtida por um feixe de ultrassom monodimensional que penetra o coração,
propiciando uma imagem de “gelo picado”. As interfaces teciduais encontradas pelo feixe são registradas no monitor. Tipicamente, esse modo de avaliação é utilizado para determinar as dimensões das câmaras, o espessamento de paredes,
os movimentos valvulares e as dimensões de grandes vasos. Na ecocardiografia Doppler emprega­se uma técnica que altera a frequência do feixe de ultrassom assim que ele localiza uma hemácia em movimento, com intuito de medir a
velocidade do fluxo e, então, detectar turbulência ou alta velocidade do fluxo sanguíneo. Tal procedimento permite localizar sopros cardíacos.

Eletrocardiograma
Eletrocardiograma é o registro da atividade elétrica do coração a partir da superfície corporal. Pode ser utilizado não apenas para identificar arritmias cardíacas e anormalidades de condução, mas também para verificar aumento da câmara
cardíaca. No entanto, pequenos animais diferem de grandes animais, pois estes últimos têm um coração categoria B (em pequenos animais é categoria A), o qual tem uma população de células de Purkinje intensamente penetrantes. Isto
resulta na redução de complexos na superfície do ECG, prejudicando a capacidade do ECG em detectar com segurança alterações do tamanho do coração. Portanto, a forma de ECG mais comumente empregada em grandes animais é uma
análise do ritmo com base no ápice, na qual as deflexões registradas são muito maiores e o foco do exame é a avaliação do ritmo.
ANORMALIDADES DAS FORMAS DAS ONDAS:  Pode­se detectar aumento da câmara cardíaca pela análise das alterações das formas das ondas. Em cães e gatos, na derivação II o alargamento ou a chanfradura da onda P sugere aumento do átrio
esquerdo, enquanto onda P alta sugere aumento do átrio direito. Ondas R altas nas derivações que tem eletrodo positivo no lado esquerdo do coração (derivações I, II, aVF, CV6LL e CV6LU) são evidências de aumento do ventrículo
esquerdo. Aumento de ventrículo direito é sugerido pela presença de onda S profunda nas mesmas derivações nas quais o eletrodo positivo encontra­se posicionado no lado esquerdo do coração ou pela presença de um desvio do eixo à
direita. Alargamento do complexo QRS pode ser notado em pacientes com aumento de ventrículo direito ou esquerdo; no entanto, também pode ser decorrência de anormalidades de condução (ver a seguir). Embora o ECG possa sugerir
aumento da câmara cardíaca, a radiografia torácica e o exame ecocardiográfico são mais sensíveis.
RITMO SINUSAL:  No animal normal o nodo sinusal inicia a contração cardíaca, controla a frequência e o ritmo normal do coração, sendo denominado marca­passo cardíaco. O ritmo sinusal normal é um ritmo regular e se origina no nodo
sinusal, indicado no ECG por uma onda P que precede cada complexo QRS normal. A bradicardia sinusal é um ritmo sinusal regular com menor frequência que a esperada para a espécie. Pode­se notar bradicardia sinusal em pacientes que
recebem dose excessiva de anestesia ou de medicamentos que resultam em aumento do tônus vagal ou redução do tônus simpático (p. ex., xilazina, digoxina), pacientes com hipotermia, hipotireoidismo, síndrome do seio doente ou aumento
do tônus vagal secundário à doença sistêmica, como acontece nas doenças respiratórias, neurológicas, oculares, gastrintestinais ou urinárias. Tipicamente, não é necessário tratamento para bradicardia sinusal, a menos que se constatem
sinais  clínicos  associados  à  bradicardia,  como  fraqueza  e  colapso.  Em  cães  e  gatos  pode­se  utilizar  atropina  (0,04  mg/kg,  IV,  IM  ou  SC)  para  tratamento  de  bradicardia.  Também,  deve­se  tratar  a  causa  primária.  Taquicardia  sinusal
corresponde a um ritmo sinusal regular, com aumento exagerado da frequência. Dentre as causas incluem­se estresse (resultando em maior condução simpática), hipertireoidismo, febre, hipovolemia, tamponamento cardíaco, insuficiência
cardíaca ou administração de medicamentos que aumentam a frequência de descarga do nodo sinusal (p. ex., catecolaminas). O tratamento envolve o controle da causa primária.
Arritmia sinusal ocorre como resultado de uma descarga irregular do nodo sinusal associada ao ciclo respiratório. O sítio de formação do impulso continua sendo o nodo sinusal; no entanto, a frequência de estímulo é variável. Arritmia
sinusal é um achado normal em cães e equinos; é anormal em gatos em ambiente hospitalar, embora pareça comum em gatos em seu ambiente domiciliar. Arritmia sinusal é caracterizada por aumento da frequência cardíaca durante a
inspiração  e  diminuição  durante  a  expiração.  A  variação  no  ritmo  cardíaco  está  associada  à  oscilação  da  intensidade  do  tônus  vagal.  É  inibida  pela  diminuição  do  tônus  vagal  resultante  de  excitação,  exercício  ou  administração  de
vagolíticos, como a atropina. Pode estar associada a marca­passo migratório que, no ECG, é caracterizado por ondas P mais altas durante frequências mais rápidas e ondas P mais curtas ou achatadas durante frequências mais lentas.
Ocorre bloqueio sinoatrial quando o impulso do nodo SA não é capaz de se propagar aos tecidos circunvizinhos aos átrios e aos ventrículos. Desse modo, no ECG não se constata onda P ou complexo QRS e o intervalo P­P próximo ao
bloqueio do ritmo sinusal é um múltiplo exato do intervalo P­P normal. Frequentemente o diagnóstico desta condição é difícil em cães porque nestes animais é comum notar arritmia sinusal, resultando em um intervalo P­P variável.
Parada sinusal é provocada pelo retardo na descarga do nodo SA. Isto resulta em bloqueio do ritmo sinusal no qual o intervalo P­P próximo ao bloqueio não é múltiplo exato do intervalo P­P normal.
Parada sinusal é a ausência de ondas P no ECG por um curto período de tempo (tipicamente é aceito como um bloqueio que excede em duas vezes o intervalo P­P normal). A parada sinusal pode ser provocada por pausa ou repouso
prolongado do nodo SA.
Parada atrial é caracterizada pela ausência total de ondas P no ECG e ocorre porque o átrio é incapaz de ser despolarizado pela descarga do nodo SA. Mesmo não tendo onda P, os complexos QRS são mais frequentemente estimulados
pela onda de despolarização que se origina do nodo SA, resultando em um ritmo sinoventricular. Em alguns casos, o ritmo ventricular pode ser variável devido à presença de uma arritmia sinusal concomitante. A frequência cardíaca é
tipicamente  baixa  (40  a  80  bpm)  em  cães  acometidos,  dependendo  da  causa  específica.  A  etiologia  inclui  hiperpotassemia  (parada  atrial  transitória),  pois  a  elevação  do  teor  de  potássio  impede  a  despolarização  do  miocárdio  atrial;
miocardite; e formas específicas de cardiomiopatia (cardiomiopatia atrioventricular), nas quais o miocárdio atrial é substituído por tecido fibroso (parada atrial persistente). A resolução da hiperpotassemia reverte a parada atrial para um
ritmo sinusal normal.
A  síndrome  do  seio  doente  é  um  conjunto  de  sinais  clínicos,  inclusive  alterações  no  ECG  (parada  ou  bloqueio  sinusal,  parada  sinusal,  complexos  de  escape  juncional  ou  ventricular  e,  possivelmente,  taquicardia  supraventricular)  e
fraqueza  ou  síncope  decorrente  de  bradicardia  (mais  comum)  ou  taquicardia  (menos  comum).  Nesta  síndrome  clínica,  o  principal  problema  envolve  o  nodo  SA  ou  o  tecido  perinodal;  no  entanto,  outras  partes  do  tecido  de  condução
especializado do miocárdio, inclusive o nodo AV, podem ser acometidas. Portanto, também é possível notar evidência de bloqueio AV (ver a seguir). É comumente verificada em cães geriátricos, como aqueles das raças Schnauzer miniatura
e Cocker Spaniel. Em geral, para aumentar a frequência cardíaca pode­se tentar como tratamento inicial o uso de parassimpaticomiméticos (p. ex., 0,25 a 0,5 mg de brometo de propantelina/kg VO, 2 a 3 vezes/dia) ou simpatomiméticos (p.
ex., 10mg, 2 a 3 vezes/dia) ou simpaticomiméticos (p. ex., 10 mg de teofilina de liberação lenta/kg VO, 0,14mg, 2 vezes/dia; 0,14 mg de terbutalina/kg VO, 2 a 3 vezes/dia, em cães), mas frequentemente não são efetivos ou são eficazes
apenas por tempo relativamente curto ou ocasionam reações adversas inaceitáveis. Estes medicamentos também podem agravar as taquiarritmias supraventriculares que podem ser notas na síndrome do seio doente. O tratamento mais
efetivo para bradicardia continua sendo a implantação de marca­passo.
ANORMALIDADES  DE  CONDUÇÃO:   Bloqueio  atrioventricular  (AV)  refere­se  à  alteração  da  condução  do  impulso  dos  átrios  aos  ventrículos.  No  bloqueio  AV  de  primeiro  grau  (condução  prolongada),  o  tempo  de  condução  encontra­se
aumentado, sendo detectado no ECG como um aumento do intervalo PR. No bloqueio AV de segundo grau (condução intermitente), impulsos ocasionais falham na condução através da junção AV; é caracterizado por ondas P ocasionais não
acompanhadas de complexos QRS. Durante o bloqueio não se constata S1 ou S2, tampouco pulso arterial. Em equinos, a bulha cardíaca associada a contração atrial (S4) é comumente audível e a ocorrência de S4 não seguida de outros ruídos
cardíacos é indicador diagnóstico de bloqueio cardíaco de segundo ou terceiro grau. A bulha S4 também pode ser audível em cães com bloqueio AV de segundo grau, porém isto é muito menos comum. Quando os intervalos PR precedem a
diminuição do batimento progressivamente aumentado, denomina­se tal condição como bloqueio AV de segundo grau Mobitz tipo I ou fenômeno de Wenckbach. Caso os intervalos PR não se alterem, tal condição é denominada bloqueio
AV de segundo grau Mobitz tipo II.
No bloqueio AV de terceiro grau ou bloqueio cardíaco completo nenhum impulso é conduzido dos átrios para os ventrículos. O ritmo atrial (ondas P) ocorre mais rapidamente e independe do ritmo ventricular (complexos QRS), o qual se
origina em marca­passos auxiliares nos ventrículos. As frequências cardíaca e de pulso são regulares, mas há bradicardia acentuada relativamente irresponsiva aos fatores que normalmente ocasionam aumento da frequência cardíaca (p. ex.,
exercício, excitação, atropina). A diferença entre a duração das contrações atriais e ventriculares resulta em alteração no preenchimento ventricular e consequente alteração na intensidade de S1 (Bruit de Canon) e, possivelmente, na pressão
do pulso arterial. Periodicamente os átrios se contraem, quando o ventrículo encontra­se em sístole, resultando em pulsações evidentes das veias jugular (ondas A em canhão).
A  importância  do  bloqueio  AV  varia  entre  as  espécies.  Pode­se  constatar  bloqueio  AV  de  primeiro  e  segundo  graus,  sem  evidência  marcante  de  doença  cardíaca.  O  bloqueio  AV  de  primeiro  grau  pode  ser  causado  por  tônus  vagal
excessivo e, geralmente, não é considerado importante em cães e equinos, a menos que haja outras evidências de doença cardíaca ou uma causa patológica de aumento do tônus vagal (p. ex., doença pulmonar ou de SNC). Em todas as
espécies animais o bloqueio AV de segundo grau pode ser indicativo de cardiopatia. No entanto, em equinos o bloqueio Mobitz tipo I é comum, sendo uma resposta fisiológica normal resultante do aumento do tônus vagal. Bloqueio AV de
segundo e terceiro grau (completo) Mobitz tipo II sempre é anormal, em todas as espécies.
O bloqueio AV de segundo e terceiro grau pode ser causado por fibrose, neoplasia, outras lesões de nodo AV, hipoxia, substâncias que aumentam o tônus vagal ou anormalidades eletrolíticas. O principal objetivo do tratamento é corrigir a
causa primária, embora geralmente não seja possível. Com frequência, bloqueio AV de segundo grau de alto grau (várias ondas P não conduzidas) e bloqueio AV de terceiro grau estão associados à intolerância ao exercício ou síncope. O
tratamento com administração oral de teofilina de liberação lenta (10 mg/kg VO, 2 vezes/dia), terbutalina (0,14 mg/kg VO, 2 a 3 vezes/dia, em cães) ou brometo de propantelina (0,25 a 0,5 mg/kg VO, 2 a 3 vezes/dia) às vezes pode ser útil
em animais com bloqueio AV de segundo grau, porém em animais sintomáticos geralmente indica­se terapia mais agressiva (implantação de marca­passo). Em geral, bloqueio cardíaco de terceiro grau está associado a lesões irreversíveis; o
único tratamento efetivo é a implantação de marca­passo.
ARRITMIAS:  Arritmias podem ser classificadas em bradiarritmias, nas quais a frequência cardíaca é demasiadamente lenta, e taquiarritmias, nas quais a frequência cardíaca é excessivamente rápida. O primeiro tipo inclui bradicardia sinusal,
parada sinusal, bloqueio SA, bloqueio atrioventricular e parada atrial (ver texto anterior). As taquiarritmias podem ser classificadas em supraventriculares e ventriculares, com base no local de origem. Despolarizações supraventriculares
prematuras são despolarizações prematuras que se originam acima dos ventrículos. Também são denominadas despolarizações/complexos atriais prematuros. Os possíveis locais de despolarização ectópica incluem nodo SA, miocárdio atrial
e junção nodal AV supraventricular. No ECG as despolarizações supraventriculares prematuras incluem um complexo QRS que parece relativamente normal, mas que ocorre mais prematuramente do que o próximo complexo QRS normal
esperado. É possível notar onda P de morfologia variável antes ou depois da despolarização supraventricular prematura ou essa onda pode estar oculta no complexo sinusal precedente. Despolarizações supraventriculares prematuras são
mais  comumente  resultantes  de  aumento  atrial,  estresse  ou  outras  causas  de  aumento  da  atividade  simpática.  Taquicardia  supraventricular  corresponde  a  uma  série  de  despolarizações  supraventriculares  prematuras  que  ocorrem
consecutivamente em um período relativamente longo. Vias acessórias são anormalidades congênitas que permitem uma conexão elétrica entre os átrios e os ventrículos, diferentemente da conexão normal (nodo AV/feixe de His). Essas
vias ou desvios foram detectados em cães e gatos e podem resultar em taquiarritmias supraventriculares. O tratamento pode envolver ablação do desvio por meio de cateter de radiofrequência ou administração oral de medicamentos, como
procainamida, sotalol ou diltiazem.
Flúter atrial é uma arritmia de ocorrência rara, geralmente transitória, que se reverte ao ritmo sinusal ou progride para fibrilação atrial. É causada por uma grande alça circular reentrante no átrio e no ECG caracteriza­se por um traçado
“denteado” com complexos QRS relativamente normais, que podem aparecer em um ritmo regular ou irregular. A frequência de descarga atrial é tão rápida (geralmente > 400 bpm) que apenas impulsos intermitentes são conduzidos através
do nodo AV devido à capacidade de refração do nodo AV.
Fibrilação atrial corresponde a um ritmo irregular tipicamente rápido e provocado pela despolarização desordenada dos átrios. Como acontece no flúter atrial, o nodo AV é bombardeado por frequentes despolarizações que resultam em
prolongada capacidade refração do nodo AV e não condução da maioria destas despolarizações atriais. No ECG a fibrilação atrial se caracteriza pela ausência de ondas P, uma linha basal ondulosa que pode parecer quase plana (fina) ou
muito  irregular  (grosseira)  e  complexos  QRS  relativamente  normais  que  ocorrem  com  padrão  não  identificável  (irregularmente  irregular).  A  irregularidade  resulta  em  variação  no  tempo  de  preenchimento  diastólico  dos  ventrículos.
Juntamente com a perda  da  contribuição  atrial  ao  preenchimento,  isto  causa  variação na intensidade das bulhas cardíacas e na amplitude do pulso arterial. Em cães e gatos, a fibrilação atrial quase sempre está associada a cardiopatia
primária. Há exceções notáveis em alguns cães de raças gigantes, como Irish Wolfhound, Scottish Deerhound, Great Dane e outras nas quais o ritmo pode ser notado sem anormalidade do coração (fibrilação atrial primária ou solitária).
O objetivo do tratamento da fibrilação atrial em cães e gatos é o controle da taxa de resposta ventricular (ou seja, a frequência em que os complexo QRS são produzidos pelas ondas de despolarização fibrilatórias) e não a conversão para
ritmo sinusal, pois este ritmo geralmente está associado a doença cardíaca primária. Isto geralmente é realizado com digoxina associada a diltiazem ou um betabloqueador, como o atenolol. Estes medicamentos reduzem a condução no nodo
AV, resultando em menor número de despolarizações atriais que atravessam o nodo AV a chegam ao ventrículo. Também, tem­se utilizado amiodarona para controlar a taxa de resposta ventricular, porém suas reações adversas (toxicidade
hepática e tireoidiana) limitam seu uso a um tratamento de segunda escolha em animais refratários ao protocolo com digoxina e diltiazem/atenolol. Pode­se tentar a conversão para ritmo sinusal em cães com fibrilação atrial primária ou
fibrilação atrial recente causada por doença cardíaca. Escolhas farmacológicas atuais incluem quinidina e amiodarona, embora em hospitais–escola a cardioversão de corrente direta tem obtido alguma popularidade.
Em ruminantes a fibrilação atrial é, às vezes, paroxística e em associação com distúrbios gastrintestinais (p. ex., indigestão vagal); também, pode ser persistente e surgir como sequela de cor pulmonale ou de doença cardíaca.
Em  equinos,  a  fibrilação  atrial  pode  ocorrer  mais  comumente  na  ausência  de  cardiopatia  primária  aparente  (fibrilação  atrial  primária  ou  solitária)  e  está  associada  a  alto  tônus  vagal,  normalmente  constatado  em  equinos  que  mais
provavelmente  apresenta  alguma  predisposição  à  arritmia.  No  entanto,  também  pode  ser  decorrência  de  doença  cardíaca,  como  insuficiência  mitral,  insuficiência  aórtica,  miocardite,  pericardite  ou  anomalias  cardíacas  congênitas  não
tratadas. Em geral, a frequência cardíaca em repouso situa­se na faixa normal de variação quando não há doença cardíaca primária, embora tipicamente seja elevada pela doença primária; isto pode auxiliar na identificação da causa da
arritmia durante o exame físico. A maioria dos equinos com fibrilação atrial primária não exibe sinais clínicos em repouso ou após exercício/trabalho moderado; no entanto, exercício ou trabalho mais vigoroso pode resultar em evidência de
débito cardíaco reduzido. Isto pode ser constatado em equinos de corrida que são submetidos à avaliação devido à redução súbita no desempenho durante a corrida. Nesta situação, os sintomas também podem ser decorrências da fibrilação
atrial paroxística, a qual pode ser detectada somente durante o período de exercício. Atualmente, em equinos com fibrilação atrial primária a conversão ao ritmo sinusal com 22 mg de quinidina/kg VO, a cada 2 h, é o tratamento de escolha.
A taxa de êxito para a conversão é maior em equinos com fibrilação atrial de duração mais curta. A chance de sucesso é excelente quando a duração é < 4 meses e relativamente boa se > 4 meses, embora a conversão possa demorar mais e a
ocorrência de intoxicação por quinidina seja mais provável. A maioria dos equinos pode retornar às corridas com êxito após a conversão. Não se indica a conversão para ritmo sinusal em equinos com doença cardíaca primária, em razão da
possibilidade de conversão ou manutenção de ritmo sinusal se a conversão é muito lenta.
Despolarizações ventriculares prematuras se originam de um sítio localizado no miocárdio ventricular ou sistema de condução especializado. No ECG, o complexo QRS geralmente tem aparência ampla e bizarra em comparação com os
complexos QRS normalmente oriundos do seio, ocorrem mais cedo do que o próximo complexo QRS oriundo do seio e não há onda P precedente associada. Mais comumente, estes complexos são decorrências de causas extracardíacas,
como  distúrbio  eletrolítico,  intoxicação  aguda,  neoplasia  (p.  ex.,  hemangiossarcoma  esplênico  em  cães),  distensão  gástrica  (como  a  verificada  na  síndrome  vólvulo/dilatação  gástrica,  em  cães)  ou  traumatismo.  Também,  podem  estar
associadas a doenças de miocárdio ventricular como cardiomiopatia dilatada, cardiomiopatia ventricular arritmogênica direita (cardiomiopatia de cães da raça Boxer) e miocardite.
Taquicardia ventricular é a ocorrência de despolarizações ventriculares prematuras sequenciais durante um período de tempo. Podem ser paroxísticas, não sustentadas (4 a 10) ou sustentadas. Fibrilação ventricular se deve à presença de
circuitos microreentrantes no miocárdio ventricular, resultando na ausência de contração ventricular efetiva e, portanto, em ritmo terminal. O ritmo idioventricular acelerado comumente é notado em cães em unidade de terapia intensiva,
secundário  à  enfermidade  ou  traumatismo.  No  ECG,  é  caracterizada  pela  presença  de  ritmo  ventricular  relativamente  baixo  (em  geral  <  120  bpm)  associado  a  dissociação  atrioventricular,  enquanto  o  ritmo  sinusal  é  notado  quando  a
frequência sinusal é mais rápida do que o ritmo ventricular. Na maioria dos animais é considerada uma arritmia benigna. Embora se deva tratar a causa primária, quando necessário, tipicamente a arritmia, por si só, não provoca sinais
clínicos, tampouco necessita terapia específica e se resolve assim que se trata a doença/traumatismo primário.

Exame Físico
Deve­se realizar exame físico minucioso em qualquer animal com suspeita de doença cardíaca ou que apresentam sintomas que podem ser atribuíveis à cardiopatia. Além da auscultação do tórax, deve­se realizar palpação para avaliar a
presença de frêmitos (vibrações de baixa frequência que podem ser percebidas com as pontas dos dedos), bem como alterações na intensidade ou localização dos batimentos cardíacos. Auscultação e palpação de pulso, simultaneamente,
também devem ser realizadas. Recomenda­se inspecionar a cor das membranas mucosas e verificar o tempo de preenchimento capilar, bem como dilatação excessiva e de pulso da veia jugular. Deve­se verificar se há edema de membros; do
mesmo modo deve­se pesquisar a presença de ascite. Como há várias causas de ascite, é fundamental o exame das veias jugular toda vez que se constata ascite. Se a causa de ascite é uma cardiopatia necessariamente há dilatação das veias
jugulares porque a efusão abdominal cardiogênica se deve ao aumento da pressão no lado direito do coração. Se há ascite sem dilatação das veias jugulares, deve­se pesquisar causas extracardíacas.
RUÍDOS CARDÍACOS:  Os ruídos cardíacos se devem à rápida aceleração e desaceleração do sangue e das vibrações secundárias no sistema cardiovascular. Quatro ruídos cardíacos podem ser potencialmente auscultados. A primeira bulha
cardíaca (S1) está associada ao fechamento das valvas atrioventriculares (AV) e a segunda bulha (S2) está relacionada com o fechamento das valvas semilunares (aórtica e pulmonar). A terceira bulha (S3) ocorre na diástole e se deve ao
rápido preenchimento ventricular; a quarta bulha (S4) está associada à sístole atrial (contração atrial ou kick atrial). Em equinos, as quatro bulhas podem ser audíveis. Em bovinos, tipicamente apenas S1 e S2 são audíveis embora, às vezes,
seja possível ouvir S3 ou S4. A administração por via intravenosa de fluido em bovinos pode ocasionar reforço de terceira e/ou quarta bulha cardíaca. Em cães, gatos e furões, normalmente S1 e S2 são as únicas bulhas audíveis. Pouco se
conhece sobre isso em caprinos, ovinos e suínos; no entanto, acredita­se que apenas S1 e S2 sejam audíveis nessas espécies.

Ritmo de Galope:  Ritmo de galope caracteriza­se pela constatação de S1 e S2 seguidas de um ruído que corresponde à S3 e/ou S4. Este ruído é considerado protodiastólico (S3), pré­sistólico (S4) ou a soma dos ruídos de galope (fusão de S3 e S4).

O ritmo de galope mais comum em cães deve­se ao reforço de S3 e tipicamente é secundário à dilatação ventricular por doença cardíaca, como cardiomiopatia dilatada, doença valvular degenerativa ou shunt esquerdo­direito, como acontece
no caso de persistência de ducto arterioso. Um ruído de galope S4 (pré­sistólico)  é  causado  pela  contração  atrial  empurrando  o  sangue  para  um  ventrículo  com  pressão  relativamente  alta.  É  notado  com  mais  frequência  em  gatos  com
cardiomiopatia, especialmente cardiomiopatia hipertrófica. Como em gatos a frequência cardíaca comumente excede 160 a 180 batimentos por minuto (bpm), no exame físico é difícil determinar se o ritmo de galope se deve a um ruído de
S3 ou S4. No entanto, o ritmo de galope S3 em um gato é muito menos comum do que o ritmo de galope S4 devido às doenças cardíacas comuns nesta espécie. Estalido (click) sistólico é um ruído agudo curto, frequentemente transitório, que
pode ser notado desde a metade até o final da sístole. Esses estalidos são incomuns em cães e, provavelmente, em outros animais domésticos. No entanto, quando presentes, os estalidos sistólicos são mais comumente notados em cães no
estágio  inicial  de  degeneração  mixomatosa  da  valva  mitral  com  prolapso  de  uma  das  cúspides  da  mitral.  Geralmente  são  únicos,  mas  podem  ser  múltiplos  e  sua  intensidade  é  variável  (ou  mesmo  podem  desaparecer  completamente),
dependendo da carga cardíaca.
Desdobramento de S1 ou S2:  O desdobramento de S1 é causado pelo fechamento desigual das valvas mitral e tricúspide, condição que pode ocorrer quando há contração assincrônica dos ventrículos, como acontece no bloqueio de um ramo do

feixe de His, esquerdo ou direito, no caso de marca­passo cardíaco e de alguns batimentos ventriculares ectópicos. O desdobramento de S1 também pode ser verificado em cães de raças de grande porte saudáveis. O fechamento retardado da
valva pulmonar (em relação à valva aórtica) resulta no desdobramento de S2. Isto pode ser notado em cães (especialmente de raças de grande porte) durante a inspiração; à medida que aumenta a pressão intratorácica negativa aumenta o
preenchimento do ventrículo direito. O desdobramento de S2 é  um  achado  normal  em  equinos  durante  a  inspiração  ou  a  expiração.  O  desdobramento  anormal  de  S2 está  associado  à  hipertensão  pulmonar,  como  acontece  no  enfisema
pulmonar de equinos  e  na  dirofilariose canina.  Outras  possíveis  causas  em  cães (e possivelmente em outras espécies) são defeito de septo atrial, estenose pulmonar, bloqueio do ramo direito ou esquerdo do feixe de His e batimentos
ventriculares ectópicos originados no ventrículo esquerdo. O fechamento retardado da valva aórtica (desdobramento paradoxal de S2) pode ser notado no bloqueio do ramo esquerdo do feixe de His ou no caso de batimentos ventriculares
ectópicos oriundos do ventrículo direito.
Flúter Diafragmático Sincrônico:  O diafragma pode contrair sincronicamente com o coração, originando ruídos de “pancada” altos à auscultação, geralmente, acompanhados de contração evidente do flanco. Essa síndrome se deve ao estímulo do
nervo frênico decorrente de despolarização atrial, sendo notada principalmente quando há grave anormalidade eletrolítica ou ácido­base, em especial hipocalcemia. É mais comum em equinos e cães, sendo frequentemente notado durante
episódios de eclampsia. Nos cães, surge comumente em associação com anormalidades eletrolíticas induzidas por doenças gastrintestinais.
SOPROS:  Sopros cardíacos são vibrações audíveis oriundas do coração ou dos grandes vasos sanguíneos, geralmente em decorrência de fluxo sanguíneo turbulento ou de vibrações das estruturas cardíacas como, por exemplo, parte de uma
cúspide valvular ou corda tendínea. Tipicamente, os sopros são classificados de acordo com sua duração, intensidade e localização, mas também podem ser classificados em função da frequência (tonalidade), qualidade (p. ex., musical) e
configuração (p. ex., crescendo­decrescendo).
O sopro sistólico ocorre durante a sístole e tipicamente é de ejeção (crescendo­decrescendo) ou regurgitante (holossistólico, em platô). O sopro sistólico de ejeção apresenta maior intensidade no meio da sístole e tem formato de diamante
na fonocardiografia. Pode ser decorrência de lesões estenóticas de valvas semilunares (p. ex., estenose pulmonar ou estenose subaórtica). Sopros sistólicos regurgitantes apresentam intensidade constante durante toda a sístole e podem ser
causados por regurgitação mitral ou tricúspide (p. ex., degeneração mixomatosa da valva mitral) ou defeito de septo ventricular. Sopros diastólicos são tipicamente do tipo decrescendo (sua intensidade diminui durante a diástole) e se deve à
insuficiência pulmonar ou aórtica (como aquela causada por endocardite infecciosa da valva aórtica, em cães, ou doença degenerativa, em equinos). Sopros contínuos são mais comumente notados no caso de persistência de ducto arterioso
(uma anomalia cardíaca congênita), sendo constatado durante a sístole e a diástole. Os sopros contínuos variam em intensidade ao longo do tempo, sendo mais intensos no final da ejeção ventricular, diminuindo de intensidade durante
diástole. Um sopro em vaivém é notado em pacientes que têm tanto sopro sistólico quanto sopro diastólico e pode ser constatado em animais com estenose subaórtica e insuficiência aórtica.
Em equinos sem doença cardíaca ou anemia é possível constatar sopro no início da sístole e da diástole. O ponto de intensidade máxima tipicamente situa­se na base esquerda do coração. Às vezes, equinos jovens saudáveis apresentam
sopro cardíaco curto alto e agudo no início da diástole. Ocasionalmente, nota­se sopro sistólico em alguns gatos em decorrência do aumento da velocidade do fluxo medioventricular direito, sem doença cardíaca estrutural importante. Sopro
cardíaco inocente também é notado comumente em cães e gatos jovens (< 6 meses de idade) devido ao maior volume de ejeção.
Os  sopros  cardíacos  são  classificados  da  seguinte  maneira:  grau  I  –  sopro  de  menor  intensidade  que  pode  ser  audível  apenas  durante  a  auscultação  em  ambiente  silencioso;  grau  II  –  sopro  débil,  facilmente  audível,  restrito  a  um
determinado local; grau III – sopro imediatamente audível no início da auscultação; grau IV – sopro alto imediatamente audível no início da auscultação, mas não é acompanhado de frêmito; grau V – sopro muito alto com frêmito palpável;
ou grau VI – sopro extremamente alto que pode ser ouvido mesmo quando se afasta o estetoscópio da parede torácica.
ARRITMIAS:   As  arritmias  são  anormalidades  de  frequência,  regularidade  ou  local  de  formação  do  impulso  cardíaco  e  são  audíveis  durante  a  auscultação.  Outros  termos  como  disritmia  e  ritmo  ectópico  também  são  empregados  para
descrever as arritmias. A presença de arritmia cardíaca não indica necessariamente que há doença cardíaca; várias arritmias cardíacas não têm importância clínica, tampouco necessitam tratamento específico. Contudo, algumas arritmias
podem causar sintomas graves, como síncope e morte súbita. Vários distúrbios sistêmicos podem estar associados a ritmo cardíaco anormal (ver p. 111).
PULSO:  O pulso corresponde a uma expansão rítmica de uma artéria que pode ser palpada (ou visualizada) durante o exame físico. Fisiologicamente, a pressão do pulso é a diferença entre as pressões sistólica e diastólica sistêmicas. Em cães
e gatos, o pulso é tipicamente palpado na artéria femoral. Déficit de pulso significa ausência de pulso, embora na auscultação note­se batimento cardíaco; é detectado durante auscultação e palpação de pulso, simultaneamente. Ocorrem em
decorrência de contrações ventriculares ectópicas (arritmias) que surgem tão prematuramente que não é possível o preenchimento suficiente dos ventrículos, resultando em menor ejeção de sangue e consequente pulso fraco ou ausência de
pulso. Pulso forte (aumento da pressão do pulso) geralmente está associado à diminuição da pressão do pulso e pode ser constatado em pacientes com insuficiência aórtica ou persistência de ducto arterioso. Pulso fraco (diminuição da
pressão do pulso) geralmente se deve à diminuição da pressão sistólica e pode ser detectado em caso de disfunção sistólica, tamponamento pericárdico ou estenose subaórtica.
Cães com estenose subaórtica grave podem ter aumento lento da pressão do pulso durante a sístole ventricular, com pressão máxima no final da sístole; a esta condição denomina­se pulsus parvus et tardus. Pulso paradoxo corresponde à
diminuição da pressão do pulso durante a inspiração e aumento durante a expiração. É um achado normal em animais, mas geralmente é muito sutil para ser constatado no exame físico. Contudo, em pacientes com efusão pericárdica e
tamponamento cardíaco essa ocorrência é mais evidente. Pulso alternante é um pulso que se alterna entre forte e fraco quando o paciente apresenta ritmo sinusal; pode ser notado (ainda que raramente) em pacientes com insuficiência
miocárdica ou taquiarritmias. Pulso bigeminal é um pulso que se alterna em forte e fraco, causado por uma arritmia, como bigeminia ventricular. Tipicamente, o pulso mais fraco (durante contração ventricular prematura) é mais breve do
que o pulso mais forte.
Pode­se notar pulso na veia jugular em animais normais. Normalmente, esse pulso não se estende além de um terço da distância até o pescoço, em um animal em pé.
RUÍDOS RESPIRATÓRIOS:  Edema pulmonar pode ser secundário à ICC. No exame físico se manifesta na forma de crepitações ou estertores e sibilos respiratórios. Pacientes em tal situação também podem manifestar dispneia e taquipneia.
Comumente  há  diminuição  no  movimento  de  ar  durante  a  auscultação  torácica  em  pacientes  que  desenvolveram  efusão  pleural  em  decorrência  de  doença  cardíaca.  Isto  resulta  em  diminuição  dos  ruídos  respiratórios,  em  especial
ventralmente. No entanto, doenças respiratórias ou efusão pleural secundária a outra doença também pode induzir esses sinais clínicos.
ASCITE:  A distensão abdominal pode ser decorrente da presença de gás, tecido mole ou acúmulo de fluido. Pacientes com doença cardíaca e insuficiência cardíaca direita (p. ex., aquela causada por dirofilariose, displasia da valva tricúspide,
tamponamento cardíaco) podem desenvolver ascite. Nestas circunstâncias, a ascite está associada à distensão da veia jugular.

Histórico Clínico e Resenha
Em pacientes com suspeita de doença cardíaca, a resenha (idade, raça, sexo) auxilia na elaboração de uma lista de diagnóstico diferencial. A resenha influencia a importância relativa de possíveis cardiopatias (p. ex., endocardite é rara em
gatos, mas é comum em vacas e equinos), bem como algumas anormalidades específicas (p. ex., predisposição racial a determinadas anomalias congênitas).
Os animais que apresentam doença cardíaca podem ser assintomáticos ou ter um histórico de intolerância a exercício, fraqueza, dispneia, taquipneia, distensão abdominal (devido à ascite), síncope (desmaio), cianose ou anorexia e perda
de peso. Outras informações do histórico clínico são mais espécie­específicos, como edema periférico ou ventral (equinos e vacas). Gatos cardiopatas raramente apresentam tosse e, mais comumente, tem histórico de dispneia (que pode ser
discreta e passar despercebida pelo proprietário) e anorexia. Ao contrário, cães com ICC comumente manifestam tosse e dispneia como queixas no momento da consulta.

Radiografia
Radiografias do tórax frequentemente fornecem informações valiosas para avaliação de pacientes com suspeita de doença cardíaca. No entanto, raramente se realiza radiografia torácica em equinos e vacas devido ao seu grande tamanho e
conformação corporal, que prejudica a qualidade da imagem. A constatação de cardiomegalia generalizada ou aumento de câmara cardíaca específica torna mais provável o diagnóstico de doença cardíaca podendo fornecer, adicionalmente,
informações  sobre  a  presença  de  uma  doença  específica.  Edema  pulmonar  cardiogênico  é  um  achado  comum  em  pacientes  com  ICC  e  está  associado  à  congestão  venosa  pulmonar;  efusão  pleural  também  pode  ser  notada,  mas  isto
tipicamente  indica  insuficiência  biventricular,  exceto  em  gatos,  nos  quais  é  possível  notar  ICC  esquerda.  A  constatação  de  resolução  dessas  anormalidades  na  reavaliação  de  radiografias  torácicas  pode  ser  indicativa  de  eficácia  do
tratamento. A presença de edema pulmonar não confirma definitivamente sua origem cardiogênica, tampouco exclui outra causa, como doença pulmonar. Ademais, o tamanho do coração pode ser avaliado utilizando a escala ou escore
vertebral. Isto é mais comumente feito utilizando a imagem lateral do tórax. O diâmetro máximo do contorno cardíaco é medido da posição cranial a caudal, bem como a distância da carina até o ápice do contorno cardíaco (dorsal a
ventral). Estas medidas são juntadas e mensuradas com base nos corpos vertebrais torácicos e, assim, são normalizados para o tamanho do animal. Os corpos vertebrais são mensurados a partir da quarta vértebra torácica, em sentido caudal.
A variação normal é de 8,5 a 10,5 corpos vertebrais, em cães, e 6,9 a 8,1 em gatos.

DOENÇAS ESPECÍFICAS

Cardiomiopatias
Cardiomiopatia é definida como qualquer doença que envolve primária e predominantemente o músculo cardíaco. A maioria das cardiomiopatias que acometem animais são doenças idiopáticas, não resultantes de qualquer doença cardíaca
sistêmica ou primária. Em animais (especialmente em cães e gatos) são classificadas como cardiomiopatia dilatada, hipertrófica, arritmogênica do ventrículo direito e restritiva, ou não classificada. Caso seja identificada uma doença como
causa de disfunção do miocárdio a enfermidade é mais corretamente denominada doença miocárdica secundária ou um termo descritivo acompanha a palavra cardiomiopatia (p. ex., cardiomiopatia dilatada responsiva à taurina).
CARDIOMIOPATIA DILATADA (CMD):  Essa doença adquirida de causa desconhecida caracteriza­se por perda progressiva da contratilidade cardíaca; em medicina humana esta definição está sendo modificada, pois mutações genéticas estão
sendo identificadas como causa de CMD. Há várias formas de cardiomiopatia dilatada secundária (p. ex., deficiência de taurina, em gatos; induzida por doxorrubicina ou parvovírus, em cães). Em cães, a cardiomiopatia dilatada apresenta
uma  fase  subclínica  prolongada,  com  sintomas  evidentes  por  um  período  relativamente  curto.  Durante  a  fase  subclínica  os  mecanismos  de  compensação,  principalmente  hipertrofia  excêntrica  ou  sobrecarga  de  volume,  mantêm  a
hemodinâmica normal. Com a perda progressiva da função contrátil do coração, o débito cardíaco e, então, o fluxo sanguíneo renal diminui e novamente se normaliza quando a retenção renal de sódio e água aumenta o volume de sangue e
o retorno venoso e o ventrículo acometido é estimulado a aumentar. Após um benefício inicial, a maior ativação do sistema nervoso simpático e do SRAA causa efeitos prejudiciais no estágio final da doença (ver p. 134). O estímulo
excessivo do miocárdio pelo sistema nervoso simpático pode predispor a ocorrência de arritmias ventriculares e morte de miócitos, enquanto a ativação excessiva do SRAA ocasiona vasoconstrição excessiva e retenção de sódio e água.
A  cardiomiopatia  dilatada  é  uma  das  mais  prevalentes  doenças  cardíacas  adquiridas  em  cães,  somente  superada  pela  doença  valvular  degenerativa;  em  alguns  países  a  dirofilariose  é  a  principal  causa  cardiovascular  de  morbidade  e
mortalidade. Os cães de raças grandes são mais comumente acometidos, sendo os de raças pequenas menos afetados (com raras exceções, como os cães das raças American Cocker Spaniel, Springer Spaniel e English Cocker Spaniel).
Dentre os cães de raças grandes os mais suscetíveis são Dobermann Pinscher, Boxer, Great Dane, Pastor Alemão, Irish Wolfhound, Scottish Deerhound, Newfoundland Retriever, São Bernardo e Labrador Retriever. Tipicamente, a doença
acomete cães de meia­idade ou mais velhos; os machos são mais suscetíveis ou mais gravemente acometidos do que as fêmeas. Em gatos, a prevalência diminuiu drasticamente a partir de 1987, quando se constatou que a deficiência de
taurina era responsável pela maioria dos casos (cardiomiopatia responsiva à taurina). Desde então, em todas as rações comerciais para gatos adiciona­se taurina. Atualmente, a maioria dos casos não é responsiva à taurina e envolve doença
primária (ou idiopática), embora ocasionalmente a doença seja notada em gatos alimentados com dietas não comerciais (p. ex., vegetariana, alimento infantil, alimento caseiro).
Cães  da  raça  Dobermann  Pinscher  desenvolvem  arritmias  ventriculares  progressivas  e  simultâneas,  juntamente  com  disfunção  sistólica.  Pode  ocorrer  colapso  e  morte  súbita  em  até  20%  dos  cães  da  raça  Dobermann  Pinscher  e,
eventualmente, notam­se sintomas de insuficiência cardíaca esquerda. A maioria dos cães Dobermann Pinscher apresenta evidência de insuficiência miocárdica por ocasião dos episódios de síncope. Em outras raças, como Great Dane e
Newfoundland,  é  menos  provável  a  ocorrência  de  morte  súbita  e  colapso.  Os  sintomas  de  insuficiência  cardíaca  esquerda,  inclusive  taquipneia  e  dispneia  devido  ao  edema  pulmonar,  fraqueza  e  intolerância  ao  exercício,  geralmente
predominam, mas com frequência também há sintomas de insuficiência cardíaca direita (ascite). É possível notar efusão pleural, mais comumente em cães com ambas, insuficiência cardíaca direita e esquerda. Em um estudo notou­se ascite
em 35% dos cães da raça Newfoundland com cardiomiopatia dilatada. Gatos com cardiomiopatia dilatada tipicamente são levados à consulta com sintomas respiratórios graves devido ao edema pulmonar ou efusão pleural e os sinais
clínicos frequentemente são de rápida progressão e refratários ao tratamento.
Normalmente, nota­se sopro sistólico de baixo grau, melhor audível no ápice cardíaco esquerdo. Com frequência, nota­se também terceira bulha cardíaca ou ritmo de galope, especialmente em gatos. Este achado é discreto em cães, mas
frequentemente evidente em gatos. É possível constatar pulso femoral fraco e arritmia associada a déficit de pulso. A arritmia é mais comumente causada por ectopia ventricular, em animais da raça Dobermann Pinscher, e fibrilação atrial,
em cães de raças gigantes. Dependendo do tipo da insuficiência cardíaca pode­se notar ascite, dispneia ou tosse.
O  perfil  sanguíneo  pode  indicar  azotemia  pré­renal  (aumento  dos  valores  de  BUN,  creatinina).  As  radiografias  de  tórax  tipicamente  revelam  cardiomegalia  moderada  a  marcante.  Quando  há  insuficiência  cardíaca  notam­se  edema
pulmonar evidente e aumento moderado a evidente do átrio esquerdo. A ecocardiografia é o exame ideal para definição do diagnóstico de cardiomiopatia dilatada. Em cães com cardiomiopatia dilatada grave e insuficiência cardíaca ocorre
drástica diminuição da fração de encurtamento do ventrículo esquerdo provocada pelo aumento do diâmetro sistólico final do ventrículo esquerdo. As câmaras cardíacas, especialmente átrio e ventrículo esquerdos, apresentam­se dilatados.
Tipicamente, instala­se insuficiência da mitral, pois a progressiva dilatação da câmara cardíaca do ventrículo esquerdo resulta em separação das cúspides valvulares. Os achados anormais do ECG podem incluir complexos ventriculares
prematuros e taquicardia ventricular (especialmente em cães das raças Dobermann Pinscher e Boxer), fibrilação atrial (geralmente em raças gigantes). Pode haver evidência eletrocardiográfica de aumento de átrio esquerdo (alargamento de
ondas P e P mitral) e aumento de ventrículo esquerdo (ondas R altas e largas). A ocorrência de complexos ventriculares prematuros no ECG de rotina em cães das raças Dobermann Pinscher e Boxer aparentemente saudáveis é altamente
sugestiva de cardiomiopatia.
O tratamento objetiva controlar a insuficiência cardíaca congestiva (p. ex., com diuréticos), melhorar a contratilidade (p. ex., com pimobendana) e minimizar os efeitos colaterais da angiotensina II e outras alterações neuro­hormonais (p.
ex., inibidores da ECA). Insuficiência miocárdica responsiva à taurina acomete algumas raças de cães, particularmente American Cocker Spaniel, e há relato casual em alguns cães das raças Golden Retriever, Dálmata, Welsh Corgis,
Tibetan Terrier e em outras raças. Em várias dessas raças é possível detectar deficiência de taurina por meios da constatação de baixo teor plasmático ou sanguíneo dessa substância. A resposta à suplementação com taurina (que pode
demorar 2 a 4 meses) pode ser dramática, muitas vezes sendo desnecessário o uso de outros medicamentos para doença cardíaca. Cardiomiopatia responsiva à carnitina, embora relatada, é rara. A suplementação com coenzima Q10 é uma
tentativa não comprovada e alguns clínicos consideram tal procedimento irracional. Em pacientes com cardiomiopatia dilatada o fornecimento de óleo de peixe pode reduzir a gravidade da caquexia cardíaca.
A ICC, que pode ser grave, deve ser tratada conforme mencionado em insuficiência cardíaca, (ver p. 131). À medida que o edema pulmonar regride pode­se administrar furosemida VO, mantendo­se oxigênio até que ocorra estabilização
do quadro clínico. Deve–se iniciar o uso de pimobendana e de um inibidor da ECA (p. ex., enalapril, benazepril). Com frequência, indica­se terapia antiarrítmica, especialmente para cães Dobermann Pinscher que apresentam arritmias
ventriculares graves. O monitoramento com Holter é o procedimento ideal para avaliar a gravidade das arritmias e a eficácia terapêutica. A mexiletina também é útil em pacientes com arritmias ventriculares simultâneas à insuficiência
cardíaca, pois seu efeito inotrópico negativo é menor do que aquele do sotalol (1 a 3 mg/kg, 2 vezes/dia). Amiodarona pode ser um medicamento mais efetivo do que a mexiletina na prevenção de morte súbita em cães da raça Dobermann
Pinscher, mas seu uso está associado a ocorrência relativamente alta de hepatotoxicidade nesta raça.
Em gatos com cardiomiopatia dilatada (não responsiva à taurina) o prognóstico é ruim, com sobrevida média de 2 semanas. Gatos que apresentam cardiomiopatia responsiva à taurina também apresentam alto risco de morte. Entretanto,
pacientes que se mantêm vivos em tempo suficiente para a ação da suplementação com taurina (2 a 3 semanas) têm prognóstico excelente. Cães que respondem à suplementação com taurina ou carnitina também têm prognóstico reservado a
bom, assim que os sintomas de ICC cessam. O prognóstico é desfavorável na maioria dos cães Dobermann Pinscher; cerca de 25% dos animais morrem dentro de 2 semanas após a manifestação clínica de insuficiência cardíaca; 65%
morrem dentro de 8 semanas. Aparentemente, o uso de pimobendana prolonga a sobrevida, às vezes, de modo significativo (meses). Em outras raças o prognóstico é melhor, mas continua sendo reservado; 75% morrem dentro de 6 meses
após  o  diagnóstico.  Como  esperado,  em  cães  com  insuficiência  cardíaca  grave,  particularmente  ICC  esquerda,  o  prognóstico  é  pior  do  que  naqueles  que  manifestam  sintomas  mais  brandos  ou  sintomas  de  ICC  direita,  por  ocasião  da
consulta.
CARDIOMIOPATIA DO  VENTRÍCULO  DIREITO  ARRITMOGÊNICA  (CVDA):  Este  tipo  de  cardiomiopatia  é  verificada  em  cães  da  raça  Boxer;  também  é  denominada  cardiomiopatia  do  Boxer.  Raramente  acomete  gatos.  A  cardiomiopatia  do
ventrículo direito arritmogênica é caracterizada por infiltrado gorduroso ou fibrogorduroso no miocárdio do ventrículo direito. Em cães da raça Boxer a manifestação mais comum da doença é síncope, ocasionada por taquicardia ventricular
muito rápida (> 400 bpm) não sustentada. Para o animal tornar­se inconsciente deve haver 6 a 8 segundos sem fluxo sanguíneo ao cérebro; assim, a taquicardia deve durar este tempo para que ocorra síncope. O diagnóstico se baseia na
quantidade de complexos ventriculares prematuros (CVP) no monitoramento com Holter (valor > 100 CVP em 24 h geralmente é considerado diagnóstico para CVDA). Os complexos QRS do CVP geralmente são perpendiculares nas
derivações  onde  os  complexos  QRS  geralmente  também  são  perpendiculares,  o  que  significa  que  se  originam  do  ventrículo  direito.  A  maioria  dos  cães  da  raça  Boxer  com  CVDA  parece  ter  coração  normal,  no  ECG,  embora  alguns
desenvolvam uma verdadeira cardiomiopatia dilatada e manifestam insuficiência cardíaca. Cães da raça Boxer levados à consulta por apresentarem síncope sem cardiomiopatia dilatada são tratados com sotalol (1 a 3 mg/kg, 2 ou com a
combinação  de  mexiletina  (5  a  10  mg/kg,  3  vezes/dia)  e  atenolol  (12,5  a  25  mg/cães,  2  vezes/dia).  Em  cães  refratários  ao  sotalol  pode­se  adicionar  mexiletina  ao  tratamento.  O  prognóstico  em  cães  com  CVDA  que  não  apresentam
cardiomiopatia dilatada frequentemente é bom; muitos deles vivem vários anos sob terapia antiarritmogênica. O prognóstico a longo prazo para cães com cardiomiopatia dilatada com insuficiência cardíaca congestiva é desfavorável. A
maioria deles vive apenas alguns meses.
Nos gatos a doença geralmente se manifesta como aumento do ventrículo e do átrio direito e insuficiência cardíaca direita, juntamente com taquiarritmias supraventricular e ventricular. Em gatos acometidos há relato de dispneia e
taquipneia, além de sintomas inespecíficos, como anorexia e letargia. O tratamento é semelhante àquele mencionado para cardiomiopatia dilatada. Em geral, o prognóstico é desfavorável.
CARDIOMIOPATIA HIPERTRÓFICA:  A cardiomiopatia hipertrófica caracteriza­se por hipertrofia (ou seja, espessamento das paredes) concêntrica primária do ventrículo esquerdo causada mais por uma anormalidade inata do miocárdio do que
por  sobrecarga  de  pressão  (como  aquela  induzida  por  estenose  aórtica),  estímulo  hormonal  (como  o  causado  por  hipertireoidismo  ou  acromegalia)  ou  outras  doenças  extracardíacas.  Aumento  do  músculo  papilar  é  uma  característica
consistente da doença em gatos. Nas pessoas, a cardiomiopatia hipertrófica é causada por mutações de vários genes sarcoméricos. Foram detectadas mutações em um gene sarcomérico, a miosina cardíaca ligada o gene C, em gatos das
raças Maine Coon e Ragdoll. Acredita­se que estas mutações resultem na produção de sarcômeros anormais nos miócitos. O miocárdio, então, produz novos sarcômeros para auxiliar àqueles anormais, resultando em hipertrofia, que pode
ser discreta a grave. Hipertrofia grave frequentemente é acompanhada de necrose celular e resultante fibrose de reposição (cicatriz miocárdica).
O aumento da fibrose associada a grave espessamento da parede origina um ventrículo esquerdo com mais rigidez que o normal durante a diástole, o que aumenta a pressão diastólica em qualquer volume diastólico. O aumento da pressão
é transmitido de volta ao átrio esquerdo na diástole, resultando em aumento do átrio esquerdo e, se grave o suficiente, em insuficiência cardíaca esquerda. Em gatos, a insuficiência cardíaca esquerda se manifesta como edema pulmonar e
efusão pleural. A contratilidade miocárdica é normal, mas o diâmetro sistólico final do ventrículo esquerdo geralmente é menor do que o normal, às vezes, zero (obliteração da cavidade ao final da sístole) devido ao aumento do parede
espessada, resultando em diminuição da força sistólica da parede (ou seja, pós­carga). Pode ocorrer grave aumento do átrio esquerdo, tornando o fluxo estagnado. Isto pode induzir à formação de trombo no átrio esquerdo, com risco de
tromboembolia sistêmica.
Deslocamento cranial da cúspide da valva mitral anterior durante a sístole ventricular, uma condição denominada movimento sistólico anterior da valva mitral é um achado comum em gatos com cardiomiopatia hipertrófica e se deve ao
aumento acentuado dos músculos papilares, que arrasta a cúspide da valva mitral no fluxo do ventrículo esquerdo, durante a sístole. Isso produz dois jatos turbulentos – um da estenose subaórtica dinâmica e outro da regurgitação da mitral.
Movimento  sistólico  anterior  é  a  causa  mais  comum  de  sopro  cardíaco  em  gato  com  cardiomiopatia  hipertrófica.  No  exame  patológico  macroscópico  nota­se  aumento  do  peso  do  coração  (>  20  g),  maior  espessamento  da  parede  do
ventrículo esquerdo, hipertrofia do músculo papilar e, frequentemente, aumento do átrio esquerdo.
A cardiomiopatia hipertrófica é a doença cardíaca primária mais comumente diagnosticada em gatos; é rara em cães. É uma doença familiar em algumas raças de gatos, inclusive Persa, Sphynx, Norwegian Forest Cat, Bengal, Turkish
Van e American e British Shorthair. Acredita­se que o modo de herança nas raças Maine Coon e Ragdoll é autossômico dominante. A doença acomete gatos com 3 meses a 17 anos de idade, com maior prevalência em animais de meia­
idade. Não está presente ao nascimento, mas se desenvolve ao longo do tempo. Em geral, a penetrância é < 100%. Gatos machos e fêmeas são igualmente predispostos, mas os machos tendem a desenvolver doença mais grave em uma
idade mais precoce. Nas raças Maine Coon e Ragdoll, os gatos homozigotos para a mutação frequentemente desenvolvem cardiomiopatia hipertrófica mais cedo (comumente antes de 1 ano de idade) e com frequência manifestam uma
forma mais grave da doença.
Vários gatos acometidos podem ser assintomáticos, especialmente aqueles com doença discreta a moderada. Os gatos portadores de doença grave também podem não manifestar sinais clínicos, mas geralmente desenvolvem insuficiência
cardíaca esquerda, tromboembolia sistêmica ou morte súbita. Gatos com insuficiência cardíaca podem exibir taquipneia e dispneia secundária a edema pulmonar ou efusão pleural. Pacientes com tromboembolia sistêmica mais comumente
apresentam início agudo de paresia/paralisia de membros pélvicos associada à dor aguda, ausência de pulso e poiquilotermia. É incomum a ocorrência de tosse em gatos com insuficiência cardíaca.
Com frequência, o exame físico revela ruídos cardíacos anormais, inclusive sopros cardíacos sistólicos discretos a evidentes e ritmo de galope. Geralmente o sopro é dinâmico e sua intensidade aumenta com a excitação. Pelo menos um
terço dos gatos com cardiomiopatia hipertrófica não apresentam sopro. A exacerbação dos ruídos respiratórios pode sugerir edema pulmonar, enquanto sua diminuição pode indicar efusão pleural. Na tromboembolia aórtica distal o pulso
pode ser normal, fraco ou ausente. No exame radiográfico pode­se constatar aumento evidente do átrio esquerdo e aumento variável do ventrículo esquerdo. Com frequência, o contorno cardíaco parece relativamente normal, mesmo quando
há  hipertrofia  moderada  do  ventrículo  esquerdo.  A  ecocardiografia  permite  confirmar  o  diagnóstico  e  avaliar  a  necessidade  de  tratamento  adicional  (p.  ex.,  anticoagulantes  são  mais  benéficos  aos  gatos  com  grave  aumento  de  átrio
esquerdo). Nota­se espessamento (generalizado ou local) da parede do ventrículo esquerdo, juntamente com hipertrofia do músculo papilar. Pode­se constatar movimento sistólico anterior da valva mitral. Dentre as anormalidades do ECG
podem­se incluir complexos supraventriculares prematuros, complexos ventriculares prematuros e taquicardia ventricular. No caso de aumento significativo do átrio pode ocorre fibrilação atrial. É possível notar desvio do eixo elétrico. No
entanto, vários gatos com cardiomiopatia hipertrófica apresentam ECG normal. Nota­se aumento da concentração plasmática de NT­proBNP (um produto da clivagem da proteína precursora do peptídio natriurético tipo B, utilizado no
diagnóstico de insuficiência cardíaca) em gatos com doença grave e, especialmente, naqueles com insuficiência cardíaca, porém não naqueles com doença discreta a moderada (ver p. 132).
O tratamento objetiva controlar os sintomas de ICC, melhorar a função diastólica e minimizar o risco de tromboembolia sistêmica. Na ICC aguda deve­se administrar furosemida e oxigênio. Na insuficiência cardíaca crônica indica­se
furosemida e um inibidor da ECA, por exemplo, enalapril (0,5 mg/kg VO, 1 vez/dia). Para gatos que não apresentam insuficiência cardíaca, nenhuma estratégia medicamentosa se mostrou capaz de modificar a progressão natural da doença.
Diltiazem (7,5 mg VO, 3 vezes/dia), um bloqueador de canal de cálcio, pode melhorar a função diastólica, mas seus efeitos geralmente são insignificantes e está em desuso. Também, podem ser utilizados betabloqueadores, como atenolol
(6,25 a 12,5 mg VO, 1 a 2 vezes/dia) ou propranolol. Em pacientes humanos com cardiomiopatia hipertrófica nota­se melhora nas crises de angina, na dispneia e na intolerância ao exercício, quando tratados com betabloqueadores. Os gatos
raramente se exercitam e, assim, estas indicações não se aplicam a eles. No entanto, o betabloqueador reduz o movimento sistólico anterior da valva mitral e deve ser empregado quando esta anormalidade é grave (gradiente de pressão
através da estenose subaórtica dinâmica é > 80 mmHg). Os inibidores da ECA não são benéficos antes do início da insuficiência cardíaca.
A prevenção de formação de trombos e de tromboembolia sistêmica comumente é o objetivo, porém a eficácia dos medicamento não foi bem documentada. O ácido acetilsalicílico (80 mg VO, em intervalos de 3 dias) não é efetiva.
Varfarina  (0,2  a  0,5  mg  VO,  1  vez/dia)  provavelmente  também  não  é  efetiva  e  induz  algum  sangramento  em  gatos.  Clopidogrel  (18,75  mg/gato/dia)  ainda  está  sendo  pesquisada.  Clopidogrel  associado  ao  ácido  acetilsalicílico  é  uma
estratégia terapêutica comum em pacientes humanos. Heparina de baixo peso molecular, como enoxaparina (1 mg/kg, 2 vezes/dia), pode ser efetiva, mas seu custo é alto e deve ser administrada por via parenteral.
O prognóstico de gatos com cardiomiopatia hipertrófica é muito variável. Vários gatos discretamente acometidos apresentam prognóstico bom. O prognóstico de gatos com ICC é desfavorável, com sobrevida média de 3 meses. No
entanto, até 20% dos animais que apresentam ICC sobrevivem por um período mais longo.
CARDIOMIOPATIA RESTRITIVA/NÃO CLASSIFICADA:  Em  gatos, é uma forma  menos  comum  de  cardiomiopatia,  na  qual  nota­se  ventrículo esquerdo com aparência relativamente normal e aumento do átrio esquerdo. Embora seja lógico
pensar que estes gatos apresentem disfunção diastólica, muitos deles não têm tal anormalidade. Aqueles que não apresentam disfunção diastólica têm alguma forma de cardiomiopatia restritiva. No entanto, como o diagnóstico não pode ser
realizado por meio de ecocardiografia bidimensional padrão é melhor denominar este tipo de doença como cardiomiopatia não classificada, a menos que seja possível documentar disfunção diastólica, geralmente na ecocardiografia Doppler
tecidual.  A  cardiomiopatia  restritiva  se  caracteriza  por  um  ventrículo  esquerdo  não  complacente  rígido,  geralmente  devido  a  maior  formação  de  colágeno  (ou  seja,  cicatriz)  nesta  câmara  cardíaca.  A  maior  rigidez  aumenta  a  pressão
diastólica  em  qualquer  volume  diastólico.  Assim  como  na  cardiomiopatia  hipertrófica,  isto  resulta  em  aumento  do  tamanho  do  átrio  esquerdo  e  insuficiência  cardíaca  esquerda.  Em  alguns  gatos  com  espessamento  endomiocárdico  ou
obliteração parcial da cavidade o diagnóstico de cardiomiopatia restritiva pode ser facilmente obtido por meio de ecocardiografia bidimensional. Pode ser evidente a presença de trombos no átrio esquerdo. Geralmente a função sistólica é
preservada. A ecocardiografia Doppler pode revelar regurgitação mitral.
Os sinais clínicos e o tratamento de insuficiência cardíaca são semelhantes àqueles recomendados para cardiomiopatia hipertrófica (ver texto anterior); contudo, o prognóstico parece menos favorável, especialmente em gatos com ICC.
As causas de cardiomiopatia restritiva e cardiomiopatia não classificada são desconhecidas.

Doença do Pericárdio
A doença do pericárdio provoca mais comumente acúmulo de fluido no saco pericárdico (ou seja, efusão pericárdica). Este acúmulo pode ser agudo ou crônico, porém o crônico é muito mais comum em medicina veterinária. Quando o
acúmulo de fluido é grave o suficiente para aumentar acentuadamente a pressão intrapericárdica ocorre tamponamento cardíaco. O tamponamento cardíaco agudo (p. ex., devido à ruptura do átrio esquerdo ou a traumatismo torácico) resulta
principalmente na diminuição do preenchimento cardíaco e na redução abrupta do débito cardíaco. O tamponamento cardíaco crônico aumenta principalmente a pressão intraventricular diastólica. Isto provoca sintomas de ICC. A pressão
diastólica do lado direito – e, assim, a pressão venosa sistêmica e capilar – necessita aumentar apenas de um valor normal de 5 mmHg para 10 a 15 mmHg para causar sintomas de insuficiência cardíaca direita, embora a pressão do lado
esquerdo deva aumentar de um valor normal de < 10 mmHg para > 20 mmHg para provocar insuficiência cardíaca esquerda. Assim, predominam os sintomas de insuficiência cardíaca direita.
A efusão pericárdica é uma forma relativamente comum de doença cardiovascular adquirida em cães, é incomum em bovinos e rara em equinos e gatos. Em cães, A maioria dos casos envolve animais de meia­idade, predominantemente
machos de raças grandes. Pericardite idiopática e neoplasia cardíaca é a principal causa de efusão pericárdica em cães. Hemangiossarcoma e tumores da base do coração são os tumores cardíacos mais prevalentes. Mesotelioma é uma forma
menos comum de neoplasia pericárdica. Em cães, por meio de ecocardiografia, mais frequentemente identifica­se hemangiossarcoma na aurícula direita, no sulco AV direito e na câmara do átrio direito. Os tumores da base do coração (mais
comumente quemodectoma ou carcinoma de tireoide ectópico) geralmente são detectados entre a artéria aorta e a artéria pulmonar principal. Em gatos, a neoplasia cardíaca mais comum é o linfoma, porém a causa mais comum de efusão
pericárdica é insuficiência cardíaca. Nesta espécie, a maioria dos casos de efusão pericárdica não é grave o suficiente para provocar tamponamento cardíaco. Em cães, causas menos frequentes de efusão pericárdica incluem infecções (p.
ex., coccidioidomicose), traumatismo, ruptura do átrio esquerdo e ICC. Em bovinos, é mais comum a ocorrência de efusão pericárdica secundária à reticulopericardite traumática (p. 291) ou neoplasia cardíaca (linfoma). Nessa espécie o
linfoma também resulta em insuficiência valvular. Em equinos, pericardite séptica e pericardite idiopática são as formas mais frequentemente relatadas.
A gravidade dos sintomas depende do volume de fluido pericárdico acumulado. Em cães, ascite é, de longe, a manifestação clínica mais comum. Em equinos, é frequente um histórico de infecção de trato respiratório, febre, anorexia e
depressão. Os achados ao exame físico, além da distensão abdominal, incluem fraqueza generalizada, distensão da veia jugular, abafamento de bulhas cardíacas e, ocasionalmente, ruídos de roçar pericárdico. Quando o acúmulo de fluido
pericárdico é gradativo o saco pericárdico é capaz de se distender ou aumentar e os sinais clínicos de ICC direita podem não ser notados até que haja efusão pericárdica grave.
Os resultados do hemograma, do perfil bioquímico sérico e da urinálise geralmente são normais. É possível constatar anemia discreta, leucocitose devido à neutrofilia, hiperfibrinogenemia e hiperproteinemia em equinos com efusão e
pericardite séptica. Deve­se realizar cultura e antibiograma de amostras de fluido obtidas de equinos com suspeita de pericardite séptica. Nessa forma de pericardite há grande quantidade de neutrófilos, alguns degenerados. O teor de
proteínas no fluido é alto e nele podem existir bactérias. Em equinos, nota­se variação nas características citológicas da efusão pericárdica idiopática, com quantidades variáveis de neutrófilos, eosinófilos e macrófagos. Geralmente, o exame
citológico do fluido pericárdico de cães não auxilia na definição da causa da efusão pericárdica, a menos que haja infecção, o que é raro.
O exame radiográfico frequentemente revela aumento de tamanho do contorno do coração, que assume uma forma arredondada (globoide). Quando a causa é um tumor cardíaco, especialmente de base do coração, o contorno cardíaco
pode se apresentar excentricamente aumentado, se não há efusão ou se está for discreta. No caso de tamponamento cardíaco a veia cava caudal pode estar dilatada. É possível haver efusão pleural, mais comumente quando a causa da efusão
pericárdica é um mesotelioma. Na maioria dos casos o ECG revela desde ritmo sinusal normal até taquicardia sinusal. Podem ser constatados complexos ventriculares e atriais prematuros ocasionais. Com frequência, nota­se diminuição da
altura das ondas R (< 1 mV, em cães) e pode haver um padrão de alternância de variação na amplitude das ondas R, denominado alternância elétrica, quando há grande quantidade de efusão. Isso se deve aos movimentos de oscilação do
coração  no  saco  pericárdico  preenchido  com  fluido.  A  ecocardiografia  é  o  procedimento  mais  sensível  e  específico  para  detecção  de  efusão  pericárdica.  Em  vários  casos  de  efusão  neoplásica  pode­se  visualizar  um  tumor.  Quando  há
tamponamento cardíaco as paredes de átrio e ventrículo direitos parecem se colapsar na sístole e diástole.
Os animais com tamponamento cardíaco necessitam drenagem mecânica do espaço pericárdico (pericardiocentese) com auxílio de um cateter. Tipicamente, a terapia medicamentosa não é efetiva na redução da efusão pericárdica. Em
geral, os diuréticos são contraindicados no caso de tamponamento cardíaco agudo porque reduzem o volume sanguíneo e provocam diminuição adicional do débito cardíaco. Deve­se realizar pericardiocentese, com introdução de um cateter
no lado direito da parede torácica, logo acima da junção costocondral, entre o quarto e o quinto espaço intercostal. Pode­se utilizar ecocardiografia para orientar a introdução do cateter no ponto onde o saco pericárdico encontra­se mais
próximo da parede torácica e no local mais distendido por fluido, porém este procedimento não é imprescindível. Uma seringa ou um equipo com válvula reguladora e seringa (preferível) é acoplada ao cateter. O sistema deve estar livre de
ar durante a penetração da parede torácica, a fim de evitar a instalação de pneumotórax. À medida que o cateter é introduzido em direção ao coração faz­se aspiração intermitente. Quando o saco pericárdico é perfurado o fluido (geralmente
muito sanguinolento) flui livremente para a seringa. O cateter deve ser introduzido cuidadosamente no saco pericárdico. O fluido retirado deve ser colocado em um tubo de vidro ou em um tubo contendo trombina para provocar coágulos
caso se aspire sangue do coração; se não coagula, o cateter deve ser removido da câmara cardíaca onde se encontra. Deve­se remover o maior volume possível de fluido do saco pericárdico; uma amostra deve ser submetida à análise. Em
equinos, a pericardiocentese deve ser realizada no quinto espaço intercostal esquerdo, a fim de evitar perfuração de átrios, artérias coronárias e ventrículo direito. Com frequência faz­se a lavagem pericárdica, com ou sem antibiótico, após
pericardiocentese,  em  equinos.  Esse  procedimento  é  relativamente  fácil  e  livre  de  complicações  sérias.  Contudo,  recomenda­se  a  confirmação  da  presença  de  efusão  pericárdica  por  meio  de  ecocardiografia  antes  da  realização  de
pericardiocentese.
Podem  ser  administrados  antibióticos  de  amplo  espectro  e  fluido,  por  via  parenteral,  imediatamente  antes  e  após  pericardiocentese.  Não  há  relato  de  benefício  do  uso  de  corticosteroides  na  pericardite  idiopática  (efusão  pericárdica
benigna), em cães, embora tenham sido utilizados com eficácia em equinos. A maioria dos tumores que causam efusão neoplásica não responde à quimioterapia.
Quando há suspeita de pericardite idiopática (ou seja, ausência de massa visível na ecocardiografia), o proprietário deve ser instruído a monitorar cuidadosamente o animal, verificando qualquer sinal de recidiva. Caso ocorra recidiva
indica­se nova pericardiocentese. Em geral, recomenda­se pericardiectomia parcial após a terceira pericardiocentese. Em cães, os tumores de base do coração apenas raramente originam metástase, embora possam se tornar muito grandes e
comprometer  a  função  das  estruturas  vizinhas.  Caso  seja  diagnosticada  efusão  pericárdica  recorrente  secundária  a  um  tumor  de  base  cardíaca  deve­se  realizar  pericardiectomia  parcial.  Os  cães  podem  sobreviver  até  2  anos  após
pericardiectomia parcial bem­sucedida. O prognóstico de hemangiossarcoma do átrio direito é desfavorável a grave. Vários cães apresentam metástase ou micrometástase (mais comumente nos pulmões e não vistas nas radiografias), por
ocasião do diagnóstico.

Doença Valvular Degenerativa (Doença de válvula AV degenerativa mixomatosa, Endocardiose)
Essa cardiopatia é caracterizada por espessamento nodular das cúspides das valvas cardíacas, mais marcante em suas extremidades. Degeneração mixomatosa comumente acomete as valvas mitral e tricúspide, em cães; também ocorre
prolapso ou hooding (protrusão do corpo da cúspide valvular no átrio) das cúspides. As cordas tendíneas também são afetadas pela degeneração, tornando­se propensas à ruptura. A etiologia exata é desconhecida; contudo em cães das raças
Cavalier King Charles Spaniel e Dachshund é uma característica hereditária. A doença valvular degenerativa mixomatosa é a enfermidade cardíaca mais comum em cães, sendo responsável por cerca de 75% das doenças cardiovasculares
nessa espécie. Cerca de 60% dos cães acometidos apresentam apenas degeneração mixomatosa da valva mitral acometida, 30% apresentam lesões nas valvas tricúspide e mitral e 10% manifestam apenas doença de valva tricúspide. Em
cães, a enfermidade está relacionada com idade e raça do animal; a taxa de prevalência é maior em cães mais velhos e naqueles de raças pequenas. Equinos e gatos também são acometidos pela doença (envolvendo mais comumente as
cúspides da valva mitral); no entanto, é incomum nestas espécies. Em equinos, a doença valvular degenerativa frequentemente acomete a valva aórtica e consiste em nódulos valvulares ou faixas fibrosas nas margens livres da valva. Essa
enfermidade é mais comum em equinos de meia­idade e em animais mais velhos. Sinais clínicos (p. ex., insuficiência cardíaca) podem não ser notados porque é incomum regurgitação aórtica importante.
A insuficiência das valvas atrioventriculares (AV) resulta em fluxo sistólico (ou seja, fluxo durante a contração ventricular) turbulento na valva afetada. Essa regurgitação de sangue para o átrio resulta em aumento no volume no interior
do átrio e, desse modo, aumento do tamanho da câmara atrial. Quando a regurgitação é grave, também pode aumentar a pressão atrial. Caso haja acometimento da valva mitral o aumento da pressão no átrio esquerdo ocasiona aumento da
pressão dos capilares pulmonares e, se for alta o suficiente (ou seja, > 20 mmHg), ocasiona edema pulmonar cardiogênico (ou seja, insuficiência cardíaca esquerda). Caso a doença se instale na valva tricúspide, a regurgitação intensa pode
resultar em aumento da pressão venosa sistêmica e sinais de insuficiência cardíaca direita (mais comumente ascite, em cães). O fluxo de sangue regurgitado, constante e em alta velocidade, na valva mitral acometida, ocasiona lesão física
no  endocárdio  do  átrio  esquerdo,  resultando  em  lesões  decorrentes  do  fluxo.  Na  regurgitação  grave,  o  aumento  do  tamanho  e  da  pressão  do  átrio  esquerdo  por  longo  tempo  também  pode  provocar  ruptura  desta  câmara  cardíaca  e
tamponamento cardíaco agudo que, frequentemente, resulta em morte.
Em termos fisiopatológicos, o organismo compensa a regurgitação valvular principalmente pela retenção renal de sódio e água, provocando aumento do volume de sangue e no retorno venoso ao coração. Isto resulta em aumento do
tamanho  da  câmara  ventricular.  Há  vários  mecanismos  de  retenção  de  sódio  e  água,  mas  o  sistema  renina­angiotensina­aldosterona  (SRAA,  p.  134)  é  um  dos  mais  ativos  e  melhor  estudado.  A  liberação  de  renina  pelo  aparato
justaglomerular renal ocasiona a clivagem de angiotensina em angiotensina I e, em seguida, a enzima conversora de angiotensina transforma a angiotensina I em angiotensina II. Um das principais ações da angiotensina II é estimular a
liberação de aldosterona pelas glândulas adrenais. A aldosterona estimula as células dos túbulos renais distais a transferir o sódio de volta ao espaço vascular e a água acompanha o sódio. O aumento do volume sanguíneo e do retorno
venoso ao coração ocasiona estiramento crônico dos miócitos cardíacos, resultando na replicação do sarcômero nos miócitos e crescimento de miócitos mais longos. Isto permite o desenvolvimento de uma câmara maior no ventrículo
acometido (ou seja, hipertrofia excêntrica ou por sobrecarga de volume). Este é um mecanismo compensatório primário na regurgitação valvar. É altamente eficiente e possibilita ao coração compensar não apenas um vazamento valvular
por anos, mas também um alto volume de regurgitação. Por exemplo, um cão pequeno pode compensar totalmente a regurgitação na qual até 75% do fluxo de sangue do ventrículo esquerdo passa para o átrio esquerdo, embora apenas 25%
do volume sanguíneo alcance a artéria aorta.
A ativação do SRAA e de outros mecanismos de compensação é comumente vista como disfunção e elevação de vários neuro–hormônios prejudiciais porque elevações evidentes frequentemente são notadas em cães com insuficiência
cardíaca, quando os mecanismos de compensação são superados. No entanto, estes mecanismos somente são prejudiciais por alguns meses no estágio final da doença.
Em cães, os estágios inicial e intermediário da doença não são acompanhados de sinais clínicos, embora possa ser notado sopro sistólico (grau I­V/VI), com intensidade máxima audível no ápice esquerdo. A intensidade do sopro cardíaco
nem  sempre  está  relacionada  com  a  gravidade  da  doença.  À  medida  que  a  enfermidade  progride  e  se  agrava  e  torna  marcante  a  insuficiência  cardíaca,  mais  comumente  é  evidenciada  por  edema  pulmonar  que  ocasiona  aumento  da
frequência respiratória e do esforço respiratório, além de tosse. Também, é possível notar episódios de síncope. Morte súbita é rara, mas pode ocorrer em decorrência da ruptura do átrio esquerdo. Nos pacientes com insuficiência cardíaca
esquerda  os  achados  do  exame  físico  incluem  sibilos  e  crepitações  ou  estertores  respiratórios;  no  entanto,  estes  sintomas  são  mais  comuns  e  evidentes  em  cães  com  bronquite;  vários  cães  com  edema  pulmonar  não  apresentam  ruídos
pulmonares anormais audíveis. Podem ser notados sintomas de insuficiência cardíaca direita (p. ex., ascite, pulso jugular) quando a degeneração da valva tricúspide é significante.
Hemograma, perfil bioquímico sérico e urinálise geralmente evidenciam valores na faixa de normalidade. O aumento do átrio esquerdo é um achado característico em radiografias de tórax de um paciente com degeneração mixomatosa da
valva mitral; ademais, em cães pequenos o tamanho do átrio esquerdo está diretamente relacionado com a gravidade da regurgitação. Outras alterações incluem aumento do ventrículo esquerdo e das veias pulmonares. À medida que a
insuficiência cardíaca progride ocorre aumento da densidade intersticial do parênquima pulmonar e à medida que o quadro se agrava nota­se um padrão alveolar com surgimento de broncograma aéreo (ou seja, edema pulmonar grave).
A ecocardiografia revela cúspides valvulares aumentadas, espessas e irregulares, com ecogenicidade normal. Pode haver ruptura de cordas tendíneas, fazendo com que as cúspides AV tremulem (ou seja, protrusão das extremidades das
cúspides) no átrio durante a contração ventricular. Também, ocorre aumento da câmara do ventrículo esquerdo (ou seja, hipertrofia excêntrica ou por sobrecarga de volume) em relação direta com a gravidade da doença. Em cães pequenos,
a contratilidade ou função miocárdica do ventrículo esquerdo geralmente é normal, evidenciada pelo volume ou diâmetro sistólico final normal. O aumento no diâmetro diastólico final juntamente com diâmetro sistólico final normal resulta
no  encurtamento  fracional  do  ventrículo  esquerdo  (ou  seja,  o  grau  de  aumento  da  contração  [não  da  contratilidade]).  Em  alguns  cães  pequenos  e  em  vários  cães  grandes  nota­se  diminuição  da  contratilidade  miocárdica  no  início  da
insuficiência cardíaca e pode estar diminuída em cães de pequeno porte durante o tratamento de insuficiência cardíaca.
No ECG de pacientes com doença valvular degenerativa discreta a moderada nota–se arritmia sinusal normal ou ritmo sinusal normal. Quando desenvolve ICC, o aumento no tônus simpático frequentemente resulta em aumento da
frequência cardíaca (ou seja, taquicardia sinusal). O aumento do átrio esquerdo favorece o desenvolvimento de arritmia atrial, como complexos prematuros atriais e fibrilação atrial. É rara a ocorrência de taquiarritmia ventricular. No ECG
pode haver evidência de aumento do átrio esquerdo (onda P mitral ou alargamento de onda P) e aumento do ventrículo esquerdo (onda R alta e distendida), porém estas alterações não são indicadores seguros de aumento de câmara cardíaca.
Estudo recente com cães portadores de doença degenerativa da valva mitral que ainda não desenvolveram insuficiência cardíaca revelou que não há redução do tempo de início de ICC com o emprego de inibidores da ECA. Portanto, em
cães de raças pequenas o tratamento deve ser reservado aos pacientes sintomáticos, isto é, àqueles cujas radiografias de tórax exibem edema pulmonar cardiogênico e que manifestam taquipneia em repouso, na ausência de outra doença
pulmonar grave. O tratamento de ICC inclui administração de diurético (geralmente furosemida) e de inibidor da ECA como adjuvante do diurético. O edema pulmonar cardiogênico não deve ser tratado exclusivamente com inibidor da
ECA. Indica­se pimobendana (0,25 a 0,3 mg/kg, 2 vezes/dia) aos cães refratários à dose máxima de furosemida (4 mg/kg, 3 vezes/dia) e parece ser indicado mesmo no início da insuficiência cardíaca. Não é indicado a cães que ainda não
apresentam  insuficiência  cardíaca.  Espironolactona  pode  propiciar  benefícios  por  longo  tempo  em  cães  com  insuficiência  cardíaca  decorrente  de  degeneração  mixomatosa  da  valva  mitral,  porém  não  é  capaz  de  induzir  diurese  clínica
relevante. Anlodipino e hidralazina reduzem a regurgitação e melhoram a perfusão, porém são mais comumente utilizados em cães refratários à terapia convencional. Um diurético tiazida associado a furosemida é outro procedimento
terapêutico efetivo no tratamento de cães com insuficiência cardíaca refratária.
Quando presentes, arritmias anormais como fibrilação atrial e/ou outras arritmias supraventriculares graves e persistentes devem ser tratadas ou controladas com digitálicos e diltiazem ou betabloqueador (p. ex., atenolol), com intuito de
prevenir taquicardia induzida pela insuficiência miocárdica. Terapia adequada deve ser planejada para cada estágio da doença. Na ICC aguda e grave justifica­se o fornecimento de oxigênio juntamente com terapia parenteral agressiva com
furosemida. O uso de nitroprussiato também pode ser benéfico.
Os cães enfermos podem viver mais de 1 ano, quando tratados adequadamente. No entanto, a sobrevida é muito variável e não é possível fornecer um período seguro.

Hematomas ou Cistos Sanguíneos Valvulares
Essas lesões valvulares benignas acometem até 75% dos bezerros com menos de 3 semanas de idade. Localizam­se principalmente nas valvas atrioventriculares (AV).

Hipertensão Sistêmica e Pulmonar
Hipertensão sistêmica corresponde ao aumento da pressão sanguínea sistêmica. Há 2 tipos principais de hipertensão sistêmica. A hipertensão essencial, ou hipertensão idiopática (primária), é rara em cães e gatos, mas é comum em pacientes
humanos.  A  hipertensão  secundária  é  decorrente  de  uma  doença  primária  específica.  Em  cães,  a  principal  causa  de  hipertensão  é  doença/insuficiência  renal;  em  gatos  as  causas  mais  frequentes  incluem  doença/insuficiência  renal  e
hipertireoidismo. Hiperadrenocorticismo, diabetes melito e feocromocitoma são outras causas de hipertensão em cães.
O diagnóstico de hipertensão sistêmica baseia­se na mensuração da pressão arterial sanguínea. O método de avaliação mais confiável é a aferição direta por meio de punção arterial, procedimento que é impraticável na maioria dos casos.
O segundo método mais confiável (embora ainda frequentemente não confiável) é a medida indireta da pressão com emprego de um transdutor Doppler, a fim de avaliar o fluxo sanguíneo em uma artéria (tipicamente o ramo da artéria
radial, na superfície plantar) distal ao local da colocação do manguito (normalmente no membro torácico). A largura do manguito deve corresponder a 30% da circunferência do membro, em gatos, e 40% da circunferência em cães. Deve­se
realizar  tricotomia  da  região  imediatamente  proximal  ao  coxim  metacarpiano  palmar,  para  aplicação  do  transdutor  Doppler,  de  modo  a  se  obter  um  resultado  mais  confiável.  O  membro  pélvico  também  pode  ser  utilizado;  nesse  caso
examina­se o ramo da artéria tibial caudal na superfície plantar. A desvantagem da aferição da pressão sanguínea pela técnica Doppler é que apenas a pressão sanguínea sistólica é medida com segurança. Outros métodos de mensuração da
pressão sanguínea sistêmica, como método oscilométrico, são menos confiáveis do que o método Doppler, especialmente em cães de pequeno porte e em gatos. Embora a medição da pressão sanguínea indireta seja um método menos
confiável do que a mensuração direta, ela pode detectar indício de alteração aguda de pressão sanguínea durante anestesia. Os valores normais variam em função do estresse do paciente; valores maiores que os esperados para um animal
normal  frequentemente  são  decorrentes  de  estresse  decorrentes  do  exame.  Salvo  algumas  exceções,  pressão  sistólica  >  180  mmHg  é  considerada  alta  em  um  animal  que  aparenta  calmo;  valores  >  200  mmHg  devem  ser  considerados
seguramente como evidência de hipertensão sistêmica.
Cães e gatos com hipertensão sistêmica grave podem ser assintomáticos. Cegueira aguda é o sinal clínico mais comum. Em um estudo foram verificadas lesões de retina (p. ex., hemorragia, descolamento, tortuosidade arterial e edema
focal ou difuso) em 80% dos gatos hipertensos. O exame de sangue pode revelar anormalidades compatíveis com a causa da hipertensão (aumento do teor de T4 em gatos com hipertireoidismo, altas concentrações de nitrogênio ureico
sanguíneo (BUN) e de creatinina em pacientes com insuficiência renal). Deve­se instituir o tratamento em pacientes com hipertensão confiavelmente aferida e com histórico de doença primária, como insuficiência renal. Em gatos e cães a
hipertensão  sistêmica  parece  ser  decorrência  da  constrição  de  arteríolas  sistêmicas,  pois  somente  potentes  dilatadores  de  arteríolas  sistêmicas  são  razoavelmente  efetivos  na  diminuição  da  pressão  sanguínea  sistêmica,  até  um  valor
clinicamente  relevante.  Em  gatos,  o  tratamento  inclui  anlodipino  (0,625  a  1,25  mg  VO,  1  vez/dia).  Outros  medicamentos,  como  enalapril,  diltiazem,  betabloqueadores  como  atenolol,  e  diuréticos  como  a  furosemida,  geralmente  são
ineficazes. Em cães, os únicos medicamentos consistentemente efetivos são anlodipino (0,2 a 0,7 mg/kg VO, 1 vez/dia) e hidralazina (1 a 3 mg/kg VO, 2 vezes/dia).
Hipertensão pulmonar corresponde ao aumento da pressão sanguínea na circulação pulmonar. Dentre as possíveis etiologias incluem­se aumento da viscosidade sanguínea (p. ex., policitemia), aumento do fluxo sanguíneo pulmonar (p.
ex., defeito de septo ventricular, persistência de ducto arterioso) e aumento da resistência vascular pulmonar devido à diminuição da área transversal total do leito vascular pulmonar (como acontece nos casos de hipertrofia de parede da
artéria  pulmonar,  tromboembolia  pulmonar  e  vasoconstrição  pulmonar).  Hipertensão  pulmonar  primária  é  rara  em  toda  espécies,  exceto  em  pessoas.  Em  bovinos  a  principal  causa  é  vasoconstrição  pulmonar  induzida  por  hipoxia  em
decorrência de permanência em locais de altitude elevada (ver p. 104). Ingestão crônica de astrágalo (Oxytropis e Astragalus spp) ou doença pulmonar crônica causada por broncopneumonia ou pela infestação por vermes pulmonares
também pode resultar em hipertensão pulmonar grave o suficiente para causar insuficiência cardíaca direita. Em equinos, a hipertensão pulmonar pode ser secundária à ICC esquerda. Em cães, a hipertensão pulmonar mais comumente
ocorre em decorrência de dirofilariose, tromboembolia pulmonar, hipoxemia grave devido à doença pulmonar primária e insuficiência cardíaca esquerda. Tipicamente, os sinais clínicos são os mesmos verificados na ICC direita (ascite,
intolerância ao exercício, colapso) e síncope). Os achados do exame físico podem incluir evidência de ascite, em cães, e edema ventral em bovinos e equinos, juntamente com dilatação e pulso da veia jugular. O diagnóstico definitivo requer
a medição direta da pressão arterial pulmonar (raramente realizada) ou a estimativa da pressão pulmonar por meio de ecocardiografia Doppler. O exame ecocardiográfico pode mostrar achatamento de septo, hipertrofia concêntrica e/ou
dilatação do ventrículo direito e aumento do átrio direito. Dependendo da etiologia, normalmente não se justifica o tratamento e o prognóstico é desfavorável. Na dirofilariose, a eliminação efetiva dos vermes adultos da artéria pulmonar
frequentemente resulta em redução da pressão na artéria pulmonar e resolução da insuficiência cardíaca direita. Os cães com PDA e shunt direito­esquerda podem viver vários anos, apesar da hipertensão pulmonar grave, desde que a
policitemia seja adequadamente controlada.  Sildenafila  (1  mg/kg,  2  a  3  vezes/dia)  provavelmente  é  o  medicamento  mais  efetivo  para  reduzir  a  pressão  na  artéria  pulmonar  de  cães.  A  melhor  chance  de  sucesso  para  uma  recuperação
prolongada é notada quando é possível identificar e tratar a causa primária da doença.

Miocardite
Miocardite é a inflamação focal ou difusa do miocárdio, com degeneração ou necrose de miócitos, que origina infiltrado inflamatório adjacente. Há várias causas, inclusive vírus e bactérias. Vírus da parvovirose canina (p. 423), vírus da
encefalomiocardite (p. 806) e vírus da anemia infecciosa equina (p. 732) tendem a causar miocardite. Nota­se degeneração miocárdica em cordeiros, bezerros e potros que apresentam doença do músculo branco e em suínos com doença do
coração “de amora” ou hepatose dietética. Streptococcus spp é a principal causa de miocardite bacteriana em equinos. Salmonella, Clostridium, vírus da influenza equina, Borrelia burgdorferi e estrôngilos são outras causas conhecidas.
Deficiências minerais (p. ex., ferro, selênio, cobre) podem resultar em degeneração miocárdica. Deficiência de vitamina E ou de selênio pode causar necrose do miocárdio. Toxinas cardíacas incluem antibióticos ionóforos, como monensina
e salinomicina, cantaridina (intoxicação pelo besouro Epicauta vittata, p. 3136), Cryptostegia grandiflora (boca­de­leão) e Eupatorium rugusum (serpentária branca). Tais condições causam sintomas típicos de ICC. Em equinos, é comum a
ocorrência de sinais clínicos de insuficiência cardíaca direita, incluindo ascite, congestão venosa e pulso jugular. Geralmente à auscultação nota­se sopro de mitral ou regurgitação da tricúspide, bem como ritmo irregular. Fibrilação atrial é
um  achado  comum;  também,  podem­se  constatar  complexos  ventriculares  ou  atriais  prematuros.  A  ecocardiografia  revela  dilatação  da  câmara  cardíaca  e  menor  contratilidade,  com  valvas  normais.  Leucocitose  devido  à  neutrofilia  e
hiperfibrinogenemia são achados laboratoriais comuns. Com frequência nota­se aumento da atividade de isoenzimas cardíacas (CK, troponina e lactato desidrogenase).
O tratamento objetiva melhorar a contratilidade cardíaca, aliviar a congestão e minimizar a vasoconstrição. Digoxina e dobutamina são utilizadas mais comumente com intuito de melhorar a contratilidade. A furosemida é indicada para
controlar o edema pulmonar. Com frequência, administram­se corticosteroides ao se constatar aumento de atividade das enzimas cardíacas e quando é improvável uma infecção viral.
MIOCARDITE CHAGÁSICA:  Trypanosoma cruzi, um protozoário, causa doença de Chagas (p. 66). Na doença aguda notam–se anormalidades no ECG, como bloqueio AV de primeiro, segundo ou terceiro grau, bloqueio do ramo direito do
feixe de His, taquicardia sinusal e menor amplitude da onda R. Geralmente não há alteração ecocardiográfica durante a fase aguda; contudo, o risco de morte súbita é um problema. Em seguida, instala­se uma fase latente assintomática que
dura 27 a 120 dias, em cães, seguida de um estágio crônico no qual se constata disfunção sistólica indistinguível daquela da cardiomiopatia dilatada. Na fase crônica o tratamento é o mesmo daquele recomendado para cardiomiopatia
dilatada, mas tipicamente não é efetivo no controle dos sintomas de insuficiência miocárdica progressiva.
MIOCARDITE DE LYME:  A doença de Lyme (p. 650) é causada pela espiroqueta Borrelia burgdorferi; a infecção induzida por este microrganismo raramente resulta em doença do miocárdio. Pacientes que desenvolvem miocardite secundária
à doença de Lyme podem apresentar anormalidades no ECG, como arritmias ventriculares ou anormalidades de condução com bloqueio AV de primeiro, segundo ou terceiro grau transitório. Também, pode ocorrer insuficiência miocárdica
semelhante àquela verificada na cardiomiopatia dilatada. Em pacientes com bloqueio AV total pode ser justificável a implantação de marca­passo cardíaco.

Outras Causas de Insuficiência do Miocárdio
Além das doenças listadas a seguir, a histofilose bovina (p. 769) pode resultar em abscessos e infarto do miocárdio.
PARADA ATRIAL:  Uma  forma  de  cardiomiopatia  que  resulta  em  destruição  do  miocárdio  atrial  (e,  ocasionalmente,  do miocárdio  ventricular)  foi  relatada  em  cães,  especialmente  naqueles  da  raça  English  Springer  Spaniel.  Outras  raças
acometidas  são  Old  English  Sheepdog,  Shih  Tzu,  German  Shorthaired  Pointer,  além  de  cães  mestiços.  A  doença  também  foi  diagnosticada  em  alguns  gatos  que  apresentavam  cardiomiopatia  dilatada  concomitante.  No  início,  nota­se
destruição do miocárdio atrial, que causa parada SA e ritmo de escape em nodo AV. A regurgitação da mitral, que pode ser grave, frequentemente é notada neste estágio. Por fim, instala­se insuficiência do miocárdio. Os sinais clínicos são
semelhantes àqueles da cardiomiopatia dilatada, sendo notada insuficiência cardíaca direita ou esquerda. A implantação de marca­passo pode melhorar a frequência cardíaca e o débito cardíaco. Tipicamente, o tratamento não é efetivo; é
semelhante aquele recomendado para outros tipos de insuficiência miocárdica.
INSUFICIÊNCIA DO MIOCÁRDIO INDUZIDA POR DOXORRUBICINA:  A doxorrubicina é um quimioterápico comumente utilizado, sabidamente cardiotóxico. A cardiotoxicidade tende a ser dose­dependente, mas alguns pacientes manifestam sinais
de intoxicação com doses mais baixas que outros. Dentre as anormalidades incluem­se complexos ventriculares prematuros isolados (notados em 80% dos cães que receberam 80 mg/m2/dia, por 2 dias, ou 25 mg/m2/semana, durante 4 a 11
semanas)  e  períodos  de  taquicardia  ventricular.  Também,  pode  ocorrer  insuficiência  miocárdica,  documentada  em  todos  os  cães  que  receberam  tratamento  experimental  com  25  mg/m2/semana,  durante  20  semanas  (Morte  súbita  e
insuficiência cardíaca foram notadas em 65% dos cães, após cerca de 17 semanas de tratamento). Os efeitos cardiotóxicos são irreversíveis. Com os protocolos quimioterápicos atuais é rara a ocorrência de cardiotoxicidade grave.
FIBROELASTOSE ENDOCÁRDICA:  Essa doença de etiologia desconhecida é caracterizada por espessamento focal de átrio esquerdo, ventrículo esquerdo e/ou endocárdio da valva mitral. É causa rara de insuficiência miocárdica em cães e gatos
jovens. Em geral, os animais acometidos têm < 6 meses de idade e manifestam sinais clínicos de insuficiência cardíaca esquerda. Dentre os animais suscetíveis incluem­se cães das raças Labrador Retriever, Great Dane, Bulldog Inglês,
Springer Spaniel, Boxer, Pit Bull e gatos das raças Siamês e Burmesa (nos quais acredita­se que a doença seja hereditária). Na ecocardiografia nota­se dilatação de ventrículo e átrio esquerdos, diminuição da fração de encurtamento do
ventrículo  esquerdo  e  aumento  do  diâmetro  sistólico  final  do  ventrículo  esquerdo;  pode­se  notar  espessamento  endocárdico  difuso.  Sinais  clínicos,  tratamento  e  prognóstico  são  semelhantes  aqueles  mencionados  para  cardiomiopatia
dilatada.
CARDIOMIOPATIA DE DUCHENNE:  Esse distúrbio neuromuscular hereditário ligado ao cromossomo X foi relatado em cães, particularmente naqueles da raça Golden Retriever. Uma doença similar denominada distrofia muscular ligada ao
cromossomo X foi relatada em cães das raças Irish Terrier, Samoyed e Rottweiler. Estas enfermidades podem causar doença miocárdica e neuromuscular. As anormalidades do ECG incluem ondas Q estreitas e profundas, encurtamento dos
intervalos PR, parada sinusal e taquiarritmias ventriculares. O exame ecocardiográfico pode mostrar lesões hiperecoicas principalmente no miocárdio do ventrículo esquerdo e no músculo papilar. Geralmente se desenvolve aos 6 a 7 meses
de idade, com redução do tamanho das lesões ao longo dos próximos 2 anos. Essas lesões são decorrentes de calcificação e fibrose. Pacientes que sobrevivem à doença podem manifestar insuficiência do miocárdio.

Endocardite Infecciosa
Tipicamente,  a  infecção  endocárdica  envolve  uma  das  valvas  cardíacas,  embora  possa  ocorrer  endocardite  mural.  Lesão  endotelial  é  um  fator  predisponente  à  instalação  de  endocardite  infecciosa,  embora  em  cães  é  mais  comum  o
desenvolvimento de endocardite em uma valva normal. Quando há erosão parcial do endotélio e o colágeno subjacente é exposto as plaquetas aí se aderem e originam um microtrombo. Bactérias transportadas pelo sangue podem se aderir a
esse trombo, resultando em infecção localizada, que causa destruição progressiva da valva e insuficiência valvular. As lesões vegetativas são os achados mais comuns nas valvas cardíacas e podem causar estenose e insuficiência valvular.
Em cães, equinos e gatos as valvas aórtica e mitral são as mais comumente infectadas. A valva tricúspide raramente é acometida e a endocardite infecciosa da valva pulmonar é muito rara. Por outro lado, a valva tricúspide é a mais
comumente infectada em bovinos. Endocardite infecciosa é rara em gatos e não há predileção por raças. Os cães de meia­idade de raças grandes são mais predispostos; < 10% dos cães com endocardite infecciosa pesam < 15 kg. A maioria
dos cães doentes tem > 4 anos de idade; os machos são mais suscetíveis do que as fêmeas. Cães com estenose subaórtica são mais sujeitos à endocardite infecciosa.
Trombos contaminados liberados da valva mitral ou aórtica infectada alcançam a circulação e podem colonizar outros órgãos; portanto, a endocardite infecciosa pode provocar um amplo espectro de sinais clínicos, inclusive sintomas
cardiovasculares primários ou sinais clínicos relacionados com os sistemas nervoso, gastrintestinal e urogenital, bem como às articulações. Geralmente constata­se febre crônica intermitente ou contínua. Em alguns animais pode­se notar
claudicação com desvio de membro; em quase todos os pacientes nota­se perda de peso e letargia. Regurgitação da valva aórtica ou mitral aguda ou subaguda pode ocasionar insuficiência cardíaca esquerda (ou seja, edema pulmonar) e os
sinais clínicos incluem taquipneia, dispneia e tosse. Quando a valva tricúspide está acometida é possível verificar ascite e pulso jugular. Vacas infectadas podem apresentar mastite e diminuição na produção de leite. Hematúria e piúria
também podem ser notadas. Na maioria dos casos, constata­se sopro cardíaco; o tipo de sopro depende da valva envolvida. Quando há acometimento da valva aórtica nota­se sopro diastólico de baixo grau, com intensidade máxima na base
cardíaca esquerda. Também, é possível auscultar um sopro sistólico causado pelo aumento do volume de ejeção. Nesse caso, o pulso arterial é cheio (ou seja, aumento da pressão de pulso) devido ao fluxo diastólico e aumento do volume de
ejeção. Endocardite da valva mitral resulta em sopro semelhante ao causado por doença valvular degenerativa – sopro sistólico de baixo a alto grau (a intensidade depende principalmente do grau de insuficiência mitral) – mais audível no
ápice cardíaco esquerdo.
As  bactérias  mais  frequentemente  isoladas  de  pequenos  animais  incluem Streptococcus, Staphylococcus, Klebsiella  spp  e  Escherichia  coli,  embora  um  hospedeiro  de  outras  espécies  de  bactérias  também  possa  estar  envolvido.  Em
pessoas, 60 a 80% dos pacientes com endocardite infecciosa apresentam lesão cardíaca que facilitam a adesão das bactérias. No entanto, em cães a infecção parece se desenvolver comumente em pacientes sem evidência de anormalidades
valvulares. Streptococcus spp e Actinobacillus spp são as bactérias mais frequentemente isoladas em equinos, enquanto Arcanobacterium pyogenes é o mais comumente identificado em bovinos.
Com frequência, o hemograma indica leucocitose devido à neutrofilia. A infecção ativa pode estar associada à presença de neutrófilos bastonetes, enquanto a infecção crônica com monocitose (90% dos casos, em uma pesquisa). Com
frequência, nota­se anemia característica de doença crônica. As anormalidades do perfil bioquímico sérico refletem o envolvimento de órgãos secundário ao êmbolo infeccioso e podem incluir aumento de atividade das enzimas hepáticas,
BUN e creatinina. Em pacientes que desenvolvem glomerulonefrite imunomediada pode ocorrer importante perda urinária de proteínas e hipoalbuminemia. Os animais acometidos devem ser submetidos à hemocultura e antibiograma.
Recomenda­se a obtenção de 2 ou 3 amostras de sangue em intervalos de 1 a 2 h, durante um período de 24 h. Devem ser adotadas rigorosas técnicas de assepsia. No entanto, os resultados da hemocultura frequentemente são negativos (e
são positivos em outros tipos de sepse) e este teste não pode ser utilizado isoladamente no diagnóstico de endocardite.
Dependendo da localização e do grau de insuficiência da valva envolvida o exame radiográfico pode revelar aumento da câmara cardíaca. Se a valva mitral ou aórtica encontra­se gravemente acometida ocorre dilatação de ventrículo e
átrio esquerdos. Evidências de insuficiência cardíaca esquerda podem ser notadas como aumento da densidade intersticial ou, na ICC grave, como um padrão alveolar no parênquima pulmonar. Espera­se notar aumento de câmara direita
quando há infecção da valva tricúspide ou pulmonar. Ecocardiografia é o método de diagnóstico de escolha, pois os resultados da hemocultura são positivos apenas em 50 a 90% dos cães. A valva afetada é facilmente detectada: a área
envolvida apresenta­se hiperecoica (clara), espessada e, com frequência há vegetações (ou seja, aparência de couve­flor). Em alguns animais, pode haver predomínio de lesões erosivas. O ECG pode mostrar complexos ventriculares e atriais
prematuros. Menos comumente, é possível notar outras arritmias, como fibrilação atrial ou distúrbio de condução. A altura da onda R pode estar aumentada (sugerindo aumento do ventrículo esquerdo); também, a largura da onda P pode
estar aumentada (sugerindo aumento do átrio esquerdo).
O tratamento objetiva controlar os sinais clínicos de ICC e qualquer arritmia relevante, eliminar a contaminação da lesão e impedir a disseminação da infecção. Caso haja envolvimento significativo da valva aórtica, a insuficiência
cardíaca pode ser extrema e intratável; nesses casos o prognóstico é desfavorável. O prognóstico é muito mais favorável quando a infecção é discreta e se limita a uma das valvas AV. O controle da insuficiência cardíaca requer o uso de
diuréticos,  como  furosemida,  inibidores  da  ECA  e,  no  caso  de  insuficiência  miocárdica,  pimobendana.  Inicialmente,  indica­se  aplicação  parenteral  de  antibióticos  durante  1  a  2  semanas  (procedimento  cujo  custo  pode  ser  proibitivo),
seguida da administração oral de antibióticos durante 6 a 8 semanas. No início devem ser utilizados antibióticos bactericidas de amplo espectro (ampicilina e gentamicina ou enrofloxacino, ou cefalotina e gentamicina) e, se necessário,
devem ser substituídos com base no resultado do antibiograma. Quando se utiliza gentamicina deve­se monitorar a função renal, pois este antimicrobiano é nefrotóxico. Na maioria dos cães o prognóstico é desfavorável. Os animais que
respondem ao tratamento provavelmente necessitam uso prolongado de medicamentos cardíacos (p. ex., diuréticos, vasodilatadores, pimobendana) e reavaliações frequentes. Em grandes animais, a rifampicina (5 mg/kg VO, 2 vezes/dia)
associada a outro antibiótico de amplo espectro aumenta a chance de cura a curto prazo. Ácido acetilsalicílico (100 mg/kg, 1 vez/dia, para ruminantes, e 17 mg/kg, em dias alternados, para equinos) ou heparina (30U/kg SC, 2 vezes/dia,
para ruminantes e equinos) pode prevenir a formação de trombos e crescimento bacteriano vegetativo em grandes animais.
Em cães com estenose subaórtica indica­se profilaxia antibiótica quando qualquer procedimento realizado pode resultar em bacteriemia significante. A profilaxia dentária de rotina não se justifica em outros tipos de doença cardíaca e,
especialmente, em cães com degeneração mixomatosa da valva mitral, porque não há evidência de que estes cães apresentam maior risco de endocardite infecciosa.

INSUFICIÊNCIA CARDÍACA
Nota­se insuficiência cardíaca quando o sistema cardiovascular não é capaz de satisfazer as demandas metabólicas do corpo ou quando pode satisfazer estas demandas apenas em alta pressão de preenchimento e, em consequência, ocorre
descompensação induzida por um ou mais mecanismos. Assim, a insuficiência cardíaca não é uma doença específica, tampouco um diagnóstico. É uma condição progressiva iniciada pela diminuição do desempenho cardíaco que estimulam
mecanismos compensatórios destinados a preservar a perfusão tecidual e o metabolismo celular. Estes mecanismos ocasionam alterações de má adaptação que adicionalmente reduzem o desempenho cardíaco, iniciando um ciclo vicioso que
provoca falha do coração em funcionar como uma bomba. Em consequência, a perfusão periférica normal apenas pode ser mantida em alta pressão de preenchimento. Pode haver insuficiência cardíaca em decorrência de disfunção sistólica,
disfunção diastólica, ou de ambas. Comumente, há disfunção sistólica e diastólica, especialmente nas doenças em estágio avançado. Os sintomas que podem se desenvolver em decorrência destas condições podem ser considerados em
termos de baixo débito cardíaco (anterógrada) ou insuficiência cardíaca congestiva (retrógrada).
As alterações iniciais na dimensão da câmara cardíaca (volume) ou do espessamento da parede são melhor compreendidas em relação à pré­carga (tensão imposta pelo retorno venoso nas paredes ventriculares no final da diástole) e na
pós­carga  (tensão  imposta  nas  paredes  ventriculares  no  final  da  sístole).  As  alterações  na  pré­carga  e  na  pós­carga  podem  ser  causadas  por  anormalidades  cardíacas  estruturais,  mecanismos  compensatórios  sistêmicos,  ou  ambos.  A
sobrecarga  de  volume,  como  acontece  na  doença  valvular/insuficiência  valvular  crônica,  persistência  de  ducto  arterioso,  defeito  do  septo  atrial  ou  ventricular, shunts  esquerdo­direito  periféricos  e  anemia  ou  hipertireoidismo,  provoca
aumento da pré­carga que ocasiona possível aumento da câmara ventricular (dilatação) pela hipertrofia excêntrica dos miócitos. Sobrecarga de pressão, como aquela que ocorre na hipertensão pulmonar ou sistêmica, estenose pulmonar ou
aórtica e coarctação aórtica, provocam aumento na pós­carga, o qual ocasiona espessamento da parede do ventrículo devido à hipertrofia concêntrica. Sobrecarga de volume, tampouco de pressão, não é sinônimo de insuficiência cardíaca;
estas condições podem causar insuficiência cardíaca, dependendo da gravidade da sobrecarga e do grau de compensação.

Biomarcadores Cardíacos
Biomarcador é um parâmetro objetivamente mensurado que pode servir como indicador de função normal do órgão, de doenças ou da resposta à intervenção médica. Os biomarcadores podem propiciar informação quanto à presença e
gravidade  da  doença,  bem  como  quanto  ao  prognóstico.  Estudos  recentes  em  cães  e  gatos  mostram  que  aumentos  dos  teores  sanguíneos  de  PNB,  PNA  e  endotelina  1  são  indicadores  sensíveis  de  cardiopatia,  os  quais  se  elevam
proporcionalmente com a progressão da doença cardíaca e da ICC. Troponina cardíaca I (cTnI), liberada após lesão de cardiomiócito, também foi avaliada como um biomarcador de ICC, mas constatou–se que é menos sensível do que os
três  biomarcadores  citados  anteriormente.  Também,  PNA,  PNB  e  cTnI  foram  avaliados  como  testes  de  triagem  para  CMD  oculta  (antes  do  início  de  ICC),  em  cães.  Constatou­se  que  os  aumentos  dos  teores  de  PNB  foram  altamente
sensíveis para detecção de CDM oculta, enquanto PNA e cTnI foram relativamente menos sensíveis. O peptídio natriurético pró–tipo B N terminal (NT­proBNP) é liberado proporcionalmente à liberação de PNB em resposta à alta pressão
de preenchimento cardíaco ou à disfunção de miocárdio e sua maior estabilidade e meia­vida mais longa o tornam mais apropriado para uso como biomarcador diagnóstico. Vários estudos mostraram a importância do NT­proBNP na
diferenciação entre as causas respiratórias primárias e cardíacas de dispneia em cães. Também o NT­proBNP mostrou­se útil no diagnóstico de ICC em gatos e pode ser útil como teste de triagem para identificação de gatos com possível
cardiomiopatia, que pode ser comprovada por ecocardiograma.

Insuficiência Cardíaca Sistólica
A insuficiência cardíaca sistólica ocorre quando o preenchimento ventricular normal é acompanhado de diminuição do volume sistólico anterógrado, refletindo inerente redução da capacidade de contração do miocárdio. Por fim, isto pode
ocasionar sinais de redução do débito cardíaco, como fraqueza, hipotensão e diminuição da perfusão orgânica. É possível detectar insuficiência miocárdica em exame ecocardiográfico, no qual se constata redução da fração de ejeção ou
porcentagem de encurtamento fracional, causada por aumento do diâmetro sistólico final, com diâmetro diastólico final normal ou aumentado. No entanto, estes índices de função sistólica são muito influenciados pela pré­carga ventricular e
podem  ser  necessárias  opções  de  imagens  mais  avançadas  (como  strain  cardíaco  ou  Doppler  tissular)  para  caracterizar  a  função  de  contratilidade  em  virtude  da  pré­carga  de  volume  concomitante.  Adicionalmente,  pode­se  verificar
adelgaçamento da parede regional ou difuso e diminuição da movimentação da parede, que pode ser quantificada pelo emprego destas opções de imagens mais avançadas.
Insuficiência miocárdica primária ou cardiomiopatia dilatada idiopática (CMD) é um diagnóstico de exclusão. Esta doença pode ser notada em várias raças de cães, porém é mais comumente verificada em animais da raça Dobermann
Pinscher; atualmente há pesquisa que auxilia a definir uma base genética para esta condição. Também, CMD raramente é notada em gatos. Alguns clínicos consideram que a CMD idiopática pode ser decorrência de infecções virais não
identificadas crônica ou miocardite. Embora tradicionalmente acredita­se em uma relação da CMD com disfunção sistólica, atualmente sabe­se que a disfunção diastólica também ocorre em um estágio relativamente precoce da doença.
Insuficiência  miocárdica  secundária  frequentemente  resulta  de  um  ou  mais  insultos  que  induzem  a  lesão  ao  cardiomiócito  com  subsequente  remodelação  e  fibrose  cardíaca.  As  etiologias  incluem  taquicardia  prolongada  (taquicardia
supraventricular ou ventricular), doença infiltrativa (neoplasia), infarto do miocárdio, deficiência nutricional (taurina, carnitina, selênio [como notada na doença muscular]), miocardite (causada por vírus, riquétsias, espiroquetas, parasitos e
fungos),  sepse,  medicamentos  (doxorrubicina),  toxinas  (chumbo,  cobalto,  gossipol)  e,  raramente,  doença  endócrina  (hipotireoidismo  grave).  Adicionalmente,  sobrecarga  de  volume  ou  de  pressão  crônica  pode  ocasionar  remodelação  e
subsequente insuficiência miocárdica.

Insuficiência Diastólica
Nota­se insuficiência diastólica quando há aumento da pressão de preenchimento ventricular acompanhada de função sistólica normal ou compensada. Elevações na pressão de preenchimento cardíaco se estendem à circulação pulmonar ou
sistêmica,  resultando  por  fim  em  transudação  de  fluidos  e  sinais  de  congestão  (edema  ou  efusão).  Na  ausência  de  doença  pericárdica  ou  extracardíaca  que  causam  compressão  ou  restrição  ventricular,  a  disfunção  diastólica  reflete
anormalidade inerente do relaxamento ventricular, que pode ser detectada em estágio relativamente precoce da doença cardíaca por meio de ecocardiografia Doppler. Nas doenças, pode haver disfunção diastólica que resulta em compressão
cardíaca (efusão pericárdica, pericardite, neoplasia), rigidez ou falta de complacência ventricular (cardiomiopatia hipertrófica, cardiomiopatia restritiva), infiltração miocárdica (neoplasia) ou remodelação secundária à sobrecarga de pressão
e de volume crônica.
Também, é possível notar ICC funcional quando um tumor ou outra obstrução anatômica impede o retorno venoso para um ou ambos os átrios. Acredita­se que doença ou efusão pericárdica que ocasiona diminuição do preenchimento
ventricular  também  pode  ser  causa  extracardíaca  de  insuficiência  cardíaca congestiva  e  subsequente  redução  do  débito  cardíaco.  Sobrecarga  de  volume  iatrogênica  (ou  seja,  com  diurese  agressiva)  pode  ocasionar  ICC  na  ausência  de
disfunção miocárdica sistólica ou diastólica primária; no entanto, pode­se pensar nesta situação como “disfunção pseudodiastólica” porque o ventrículo não é capaz de aumentar sua complacência o suficiente para evitar aumento da pressão
de preenchimento.

Manifestações Clínicas
As alterações hemodinâmicas que ocorrem na insuficiência cardíaca são relativamente limitadas, pois são as síndromes clínicas resultantes destas alterações. Dependem muito do(s) local(is) da insuficiência da câmara cardíaca, bem como
das diferenças entre as espécies.
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA ESQUERDA:  As veias pulmonares drenam o sangue para o átrio esquerdo. Com o tempo, pode haver aumento da pressão do átrio esquerdo em resposta à sobrecarga de volume (devido ao fluxo
sanguíneo regurgitante ou ao maior volume de sangue circulante), estenose de valva mitral ou aumento da pressão de preenchimento do ventrículo esquerdo. Elevação da pressão do átrio esquerdo se estende para as veias pulmonares e, por
fim, aos capilares pulmonares responsáveis pela perfusão alveolar. À medida que a pressão hidrostática no capilar pulmonar continua a aumentar, as forças de Starling favorecem a transudação de fluido e instala­se edema pulmonar. Em
cães, tal condição pode se manifestar como intolerância ao exercício, dispneia geral ou noturna, tosse e taquipneia. Também, é possível notar sincope, especialmente em cães de raças de pequeno porte com doença valvular crônica. Pode
estar associada à tosse (síncope tussígena) ou a uma resposta do tipo vasovagal para estimulação de mecanorreceptores do ventrículo esquerdo. A tosse também pode ser estimulada na ausência de edema pulmonar, por compressão do
brônquio principal ocasionada pela dilatação do átrio esquerdo ou pela maior responsividade das vias respiratórias (denominada “asma cardíaca”).
Em  gatos,  o  átrio  esquerdo  também  recebe  drenagem  venosa  parcial  dos  espaços  pleural  e  pericárdico.  Desse  modo,  os  sinais  clínicos  adicionais  de  insuficiência  cardíaca  esquerda  nestes  animais  podem  incluir  efusão  pleural  ou
pericárdica;  contudo,  isso  parece  mais  frequente  na  insuficiência  biventricular. Pequeno  volume  de  efusão  pericárdica  é  comum  em  gatos  com  insuficiência  cardíaca  e  geralmente  não  influenciam  a  hemodinâmica  (geralmente  não  há
necessidade de pericardiocentese). É menos provável que os gatos com insuficiência cardíaca manifestem tosse evidente do que os cães, sendo rara a ocorrência de síncope, a menos que associada à arritmia. Em gatos, pode ser difícil
estabelecer  a  intolerância  ao  exercício  porque  são  sedentários.  Os  sinais  clínicos  mais  comuns  incluem  inapetência,  alteração  de  comportamento,  dispneia  e  taquipneia,  os  quais  não  são  detectados  por  muitos  proprietários  até  que  a
insuficiência cardíaca seja avançada.
INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CONGESTIVA DIREITA:  O átrio direito recebe linfa e sangue venoso oriundos da veia cava caudal e do seio coronário. Com o tempo, a pressão do átrio direito pode aumentar devido à sobrecarga de volume (p. ex.,
insuficiência da valva tricúspide), estenose da tricúspide ou aumento da pressão de preenchimento do ventrículo direito. Manifestações clínicas de insuficiência cardíaca direita incluem dilatação das veias jugular, hepatomegalia, efusão
pleural, efusão pericárdica e ascite. É mais provável que os cães desenvolvam ascite, enquanto em gatos é mais comum efusões pleural e pericárdica. Embora as efusões resultantes da insuficiência geralmente sejam transudato modificado,
os gatos podem desenvolver efusão pleural quilosa.
ALTERAÇÕES HEMOSTÁTICAS NA INSUFICIÊNCIA CARDÍACA:  Estudos recentes em cães e gatos com insuficiência cardíaca congestiva mostraram alterações na função plaquetária, bem como de biomarcadores da hemóstase, como fibrinogênio,
d­dímero, antitrombina, fator de von Willebrand e proteína C. Não se sabe se uma condição de hipercoagulação está associada a pior prognóstico em cães e gatos, embora tenha se constatado microêmbolo no miocárdio e em outros órgãos
de cães e gatos com cardiomiopatia, submetidos à necropsia. Tromboembolia arterial é uma grave complicação em gatos com cardiomiopatia, porém ainda não se sabe se o desenvolvimento de trombos nesta doença está relacionado com a
condição de hipercoagulação intracardíaca sistêmica ou apenas local.
A formação de trombo é notada com um aumento nos componentes da tríade de Virchow: alteração do fluxo sanguíneo, lesão endotelial e estado de hipercoagulação. Na ICC pode haver alteração do fluxo sanguíneo, com redução do
débito  cardíaco,  aumento  do  volume  de  plasma  circulante,  vasoconstrição  e  disfunção  endotelial.  Adicionalmente,  relata­se  lesão  de  pequenos  vasos  (arteriosclerose)  do  miocárdio  de  gatos  e  cães  com  cardiopatia.  Pode  haver  lesão
endotelial devido à dilatação ou cisão de câmara cardíaca (mais comumente do átrio esquerdo), forças de cisalhamento decorrente da alta velocidade do fluxo sanguíneo (como pode ocorrer ao redor da estenose) e efeitos de remodelação
vascular dos neuro­hormônios circulantes. Há relato de um estado de hipercoagulação que pode ser exacerbado pelo aumento dos teores de catecolaminas circulantes.

Mecanismos de Compensação
A  distribuição  do  fluxo  sanguíneo  sistêmico  e  de  oxigênio  aos  tecidos  periféricos  e  aos  órgãos  é  rigorosamente  controlado  por  mecanismo  neuroendócrino.  Os  mecanismos  compensatórios  atuam  rapidamente  para  corrigir  qualquer
diminuição  do  fluxo  ou  da  pressão  sanguínea.  Estes  mecanismos  propiciam  benefício  imediato  às  células  metabolicamente  ativas;  também,  quando  ativados  por  tempo  prolongado  pode  ser  benéfico  na  lesão  crônica  ao  sistema
cardiovascular e, por fim, aos sistemas corporais. Independente do mecanismo da doença cardíaca, a cascata de eventos que induzem insuficiência cardíaca é iniciada por uma diminuição do débito cardíaco percebida pelos barorreceptores,
mecanorreceptores ou quimiorreceptores do sistema cardiovascular e de tecidos periféricos. Isto pode ocorrer no caso de doença valvular crônica, CMD ou qualquer distúrbio cardíaco primário ou secundário anteriormente mencionado.
Mesmo alto débito, como acontece na anemia ou no hipertireoidismo, pode preencher este modelo, pois os tecidos periféricos percebem um déficit metabólico e tentam corrigir aumentando o débito cardíaco.
Quando há redução do volume de ejeção secundária à disfunção cardíaca ocorre diminuição do débito cardíaco. A resposta aguda envolve aumento do tônus simpático induzindo vasoconstrição periférica, aumento da frequência cardíaca
e maior contratilidade cardíaca, que atuam restabelecendo o débito cardíaco e mantendo a pressão sanguínea sistêmica. Adicionalmente, o sistema renina­angiotensina­aldosterona (SRAA) é ativado por uma ou mais condições: diminuição
da  perfusão  renal,  menor  liberação  de  sódio  para  a  mácula  densa  (no  aparato  justaglomerular)  e  aumento  do  tônus  simpático.  As  células  justaglomerulares  liberam  renina,  que  converte  angiotensinogênio  (sintetizado  no  fígado)  em
angiotensina I. A enzima conversora de angiotensina (ECA) transforma angiotensina I em angiotensina II, principalmente nos pulmões. Há outro SRAA no cérebro, nos vasos sanguíneos e nos tecidos do miocárdio que podem originar
angiotensina II, independentemente do SRAA renal ou sistêmico.
A angiotensina II tem ampla variedade de ações, incluindo retenção de sódio e água por ação direta nos túbulos renais, bem como estímulo à síntese de aldosterona, aumento da sede mediante estimulação para liberação de hormônio
antidiurético (ADH), maior liberação de norepinefrina e endotelina e estímulo para remodelação e hipertrofia cardíaca. Estas ações podem provocar aumento do volume de sangue circulante (pré–carga) e da resistência periférica (pós­carga)
e têm efeitos cardiotóxicos diretos. Adicionalmente, a ação circulante prolongada de angiotensina II, aldosterona, endotelina, ADH e catecolaminas ocasionam efeitos nocivos ao coração e aos vasos periféricos pelo efeito de remodelação
direta, bem como pela suprarregulação de citocinas inflamatórias, componentes da matriz extracelular e proto–oncogenes.
Em resposta aos mecanismos de compensação, atuam sistemas contrarreguladores, a saber, liberação de peptídio natriurético atrial (PNA), dos átrios, e peptídio natriurético tipo B (PNB), dos ventrículos. PNA e PNB são liberados em
resposta ao estiramento das câmaras atriais e ventriculares, respectivamente. Ambos os hormônios atuam aumentando a natriurese (com subsequente diurese) e diminuindo a resistência vascular sistêmica, neutralizando as ações do SRAA.
Infelizmente, os efeitos de PNA e PNB são muito mais potentes do que aqueles do SRAA, especialmente no estágio avançado de ICC. No entanto, há benefício clínico potencial na mensuração de PNA e PNB circulantes como parâmetros
de diagnóstico de cardiopatia (ver a seguir).
À  medida  o  volume  sanguíneo  circulante  aumenta  devido  à  retenção  de  água  e  sódio,  aumenta  a  pré­carga  e  o  volume  sistólico,  auxiliando  no  restabelecimento  do  débito  cardíaco.  O  volume  de  sangue  circulante  invariavelmente
encontra­se aumentado em animais com insuficiência cardíaca e ativação prolongada do SRAA, frequentemente até 30% nos estados avançados. No entanto, isso ocorre à custa do aumento da pressão do preenchimento diastólico; por fim,
desenvolvem­se sinais de congestão (edema e efusão). Adicionalmente, o aumento da pós­carga devido à vasoconstrição periférica, como mencionado anteriormente, diminui o débito cardíaco e perpetua o ciclo.

Tratamento
O objetivo do tratamento de insuficiência cardíaca é controlar os sintomas relacionados com a congestão (edema pulmonar, efusão pleural ou pericárdica, ascite), à redução do débito cardíaco e às adaptações neuro­hormonais crônicas. Isto
é conseguido pela redução da pré­carga e/ou da pós­carga (diuréticos e vasodilatadores), melhora da função miocárdica (inotropos positivos, lusitropos, simpaticomiméticos, antiarrítmicos) e emprego de moduladores neuro­hormonais
(inibidores da ECA e potencialmente betabloqueadores, antagonistas da aldosterona e bloqueadores da angiotensina II).
DIURÉTICOS:  Os diuréticos de alça são os medicamentos disponíveis mais efetivos para diminuir o volume de sangue circulante e reduzir os sintomas de congestão. Os diuréticos de alça inibem o cotransportador Na+/K+/2Cl­ na alça de
Henle  ascendente  espessa.  Isso  induz  a  maior  excreção  renal  de  sódio  e  cloreto,  com  subsequente  perda  de  água  livre.  A  furosemida  é  o  diurético  de  alça  mais  amplamente  utilizado.  Quando  administrada  por  via  IV  também  reduz
diretamente a pressão em cunha do capilar pulmonar (antes do início da diurese) mediante a síntese de prostaglandina, que tem efeito vasodilatador. Após administração por via intravenosa a ação inicia dentro de 5 min, com efeito máximo
aos 30 min e diminuição em cerca de 2 h. Após administração oral tem­se início da ação em 60 min, com efeito máximo em 1 a 2 h e duração de cerca de 6 h.
Terapia emergencial de edema pulmonar frequentemente requer altas doses de furosemida (2 a 8 mg/kg para cães; 2 a 4 mg/kg para gatos), em intervalos de 30 a 60 min, até que se controlem os sinais clínicos de congestão. Em razão da
preocupação quanto à ocorrência de hipotensão, azotemia e anormalidades eletrolíticas importantes com a administração de furosemida, assim que o quadro clínico do animal se estabiliza recomenda­se a redução da dose até a menor dose
capaz de controlar os sintomas de ICC. Azotemia discreta e anormalidades eletrolíticas e ácido­base (hiponatremia, hipopotassemia e alcalose metabólica hipoclorêmica) não são raras e geralmente são toleradas, desde que o animal se
alimente e beba água. A dose oral utilizada no tratamento de ICC crônica pode variar significativamente entre os animais; deve­se utilizar a menor dose possível. Com frequência, a ICC em cães é inicialmente controlada com dose de 1 a 2
mg/kg, 1 a 2 vezes/dia; os gatos são mais predispostos às reações adversas e geralmente requerem dose menor (0,5 a 2 mg/kg, a cada 12 a 48 h). O uso de furosemida ou de outro diurético como terapia exclusiva no tratamento de longa
duração de ICC aumenta a ativação do SRAA; desse modo, recomenda­se a combinação com um inibidor da ECA.
Na ICC avançada pode ocorrer resistência à furosemida, tipicamente verificada pelos sintomas persistentes de congestão, apesar da dose de 2 a 4 mg/kg VO, 3 vezes/dia. Há várias causas, inclusive menor liberação do medicamento no
néfron, ativação do SRAA (que neutraliza os efeitos de diurese) e hipertrofia das células dos túbulos contorcidos distais e consequente aumento no transporte de íons nesta região do néfron. O edema gastrintestinal secundário à ICC direita
pode prejudicar a absorção de diuréticos administrados por via oral e contribuir para a resistência ao diurético. Animais com resistência ao tratamento oral prolongado com altas doses de furosemida podem apresentar melhor resposta
diurética com a aplicação SC do medicamento ou pela adição de outros diuréticos (“carregamento diurético”).
Os efeitos colaterais decorrentes da administração de furosemida geralmente estão relacionados com a desidratação por depleção de volume e às anormalidades eletrolíticas e ácido­base. As reações adversas menos comuns incluem
vômito, pancreatite e surdez idiossincrática associadas à administração por via intravenosa rápida. Os animais com doença renal preexistente são mais predispostos às reações adversas e a terapia com furosemida pode ser reduzida ou
temporariamente suspensa. Ao iniciar a terapia diurética os indicadores de função renal devem ser monitorados frequentemente (no início e pelo menos 1 semana depois), com reavaliação a cada 3 a 6 meses quando se utiliza tratamento
prolongado. Alguns animais podem permanecer com azotemia discreta a moderada, geralmente tolerada desde que se alimentem e bebam água adequadamente.
Outros diuréticos de alça são torsemida e bumetanida. Embora haja menor experiência com estes medicamentos, podem ser úteis no tratamento de insuficiência cardíaca refratária em que se documentou resistência à furosemida ou
quando o paciente é tolerante à furosemida. A ação da torsemida é mais longa do que aquela da furosemida; ademais auxilia na inibição da aldosterona. Torsemida e bumetanida são significativamente mais potentes do que a furosemida
oral, mas não foram avaliadas em medicina veterinária. Há relatos casuais de que a dose inicial de ambos os medicamentos é, aproximadamente, um décimo daquela da furosemida.
Diuréticos tiazidas (p. ex., hidroclorotiazida, clorotiazida) diminuem a reabsorção de sódio pela inibição do cotransportador Na+/Cl­ no túbulo contorcido distal. Isto resulta em maior liberação de sódio e água nos ductos coletores e
subsequente  aumento  da  excreção  de  hidrogênio  e  potássio.  Embora  as  tiazidas  sejam  diuréticos  relativamente  fracos,  têm  efeito  sinérgico  quando  administradas  com  diuréticos  de  alça  e  podem  provocar  importantes  anormalidades
eletrolíticas (especialmente hipopotassemia) e desidratação, quando não utilizados criteriosamente. A hidroclorotiazida é mais comumente utilizada; a dose recomendada é 1 a 4 mg/kg VO, 1 a 2 vezes/dia. É associado a espironolactona, um
diurético que poupa potássio (ver a seguir), contido no produto aldactazida, que também pode ser administrado na dose de 1 a 4 mg/kg VO, 1 a 2 vezes/dia. Vários animais não toleram a maior dose da faixa desta variação; deve­se utilizar a
menor dose efetiva. Clorotiazida é administrada na dose de 20 a 40 mg/kg VO, 1 a 3 vezes/dia. Os diuréticos tiazidas geralmente são reservados àqueles casos nos quais ocorreu resistência à furosemida.
Diuréticos que poupam potássio representam a classe de diuréticos mais fracos, exibindo discreta ação diurética, às vezes indetectáveis na dose padrão, especialmente quando utilizados isoladamente. Esta classe de medicamentos
incluem  aldosterona,  inibidores  da  espironolactona  e  eplerenona  e  aqueles  que  inibem  a  reabsorção  de  sódio  nos  túbulos  distais,  triantereno  e  amilarida.  Alguns  cardiologistas  recomendam  dose  subdiurética  de  0,3  a  1  mg  de
espirolactona/kg, 1 vez/dia, para cães com CMD subclínica ou insuficiência miocárdica em estágio inicial por seu teórico benefício na remodelação e fibrose do miocárdio e dos vasos sanguíneos mediadas por aldosterona. Um estudo de
triagem clínica em grande escala em pessoas com insuficiência cardíaca mostrou melhora significativa nas taxas de morbidade e de mortalidade em pacientes tratados com espironolactana, em comparação com aqueles que receberam
placebo, além da terapia de insuficiência cardíaca padrão. Eplerenona mostrou um efeito protetor no miocárdio de cães com insuficiência cardíaca experimentalmente induzida, embora não se tenha comprovado benefício clínico da inibição
da aldosterona em pacientes veterinários com cardiopatia de ocorrência natural. Um experimento clínico no qual utilizou­se espironolactona em gatos com cardiomiopatia hipertrófica (CMH) mostrou que não houve redução da remodelação
cardíaca,  tampouco  melhora  na  função  diastólica  após  4  meses.  Ademais,  ocorreu  grave  dermatite  ulcerativa  facial  em  cerca  de  um  terço  dos  gatos  tratados  com  espironolactona.  Consequentemente,  não  se  recomenda  o  uso  de
espironolactona como antirremodelação profilática em gatos.
Em geral, a espironolactona é reservada a cães e gatos refratários à dose diurética padrão, àqueles com ascite ou àqueles que desenvolveram hipopotassemia clínica importante. É administrada na dose de 1 a 3 mg/kg VO, 1 a 2 vezes/dia.
Estudos futuros podem validar seu uso em algumas cardiopatias. Eplenerona, triantereno e amilorida não são rotineiramente utilizados no tratamento de doença cardíaca em medicina veterinária.
INOTROPOS POSITIVOS:  Pimobendana é um novo inodilator aprovado pela FDA em 2007 para uso em cães com ICC relacionada com a insuficiência da valva atrioventricular ou CMD. É considerado um inibidor da fosfodiesterase (PDE)
III, capaz de causar sensibilização ao cálcio. O aumento do efeito inotrópico se deve principalmente pela sensibilização do aparato cardiomiócito contrátil (principalmente troponina C) ao cálcio, com aumento mínimo do cálcio intracelular.
Isto  é  diferente  do  que  acontece  com  outros  inotropos  positivos  (ver  a  seguir)  que  atuam  predominantemente  no  cálcio  intracelular,  podendo  ocasionar  arritmia,  taquicardia  e  maior  consumo  de  oxigênio  pelo  miocárdico.  Ocorre
vasodilatação equilibrada por meio da inibição da PDE III, ocasionando relaxamento do músculo liso do endotélio e efluxo de cálcio. Benefícios adicionais podem incluir melhora do relaxamento miocárdico e da função diastólica, ação
anti­inflamatória e anticitocinas e modulação neuro­humoral.
A combinação de aumento da inotropia com redução da pós­carga resulta em melhora significativa do débito cardíaco e redução marcante da pressão de preenchimento cardíaco. As melhoras clínicas notadas com o uso de pimobendana
podem ser marcantes e podem incluir melhora na qualidade de vida, melhora do quadro clínico e maior sobrevida. Até o momento não há pesquisa sobre os efeitos da combinação de pimobendana com um inibidor da ECA, porém a maioria
dos cardiologistas relata que esta combinação propicia benefícios clínicos adicionais. O efeito inotrópico do pimobendana é significativamente maior do que aquele verificado com o uso de digoxina; o pimobendana tem superado a digoxina
como droga de primeira escolha como suporte inotrópico de ICC em cães.
Há certa controvérsia quanto ao uso de pimobendana em gatos e até o momento não há estudo publicado sobre seu emprego nesta espécie. O uso de pimobendana não é aprovado em gatos e vários cardiologistas entendem que este
medicamento é contraindicado aos gatos com CMH sem disfunção sistólica documentada, especialmente quando há obstrução do fluxo do ventrículo esquerdo (como acontece na movimentação anterior sistólica da valva mitral ou na
hipertrofia de septo basal). Relatos casuais indicam que o pimobendana é bem tolerado por gatos com ICC refratária de qualquer origem e pode beneficiar especialmente os gatos com função sistólica reduzida, como pode acontecer na
cardiomiopatia dilatada restritiva não classificada ou em estágio final.
Em  cães  e  gatos,  administra­se  0,2  a  0,3  mg  de  pimobendana/kg  VO,  2  vezes/dia.  À  medida  que  a  insuficiência  cardíaca  progride,  vários  cardiologistas  aumentam  a  frequência  de  administração  para  3  vezes/dia,  em  cães.  É  rara  a
ocorrência  de  reações  adversas  e,  em  geral,  ocorrem  quando  se  administram  altas  doses;  podem  incluir  distúrbio  gastrintestinal  (GI)  ou,  possivelmente,  maior  risco  de  arritmia.  Não  há  evidência  clínica  que  comprove  risco
significativamente maior de arritmia em pacientes tratados com pimobendana; embora alguns estudos tenham revelado tal tendência, outros contestaram isto. O uso de pimobendana não é aprovado para uso antes do início de insuficiência
cardíaca; um estudo com animais da raça Beagle pré­sintomáticos, com regurgitação da mitral experimentalmente induzida, revelou aumento de lesões valvulares em cães tratados com pimobendana, em comparação com cães submetidos
ao tratamento com benazepril.
As  aminas  simpaticomiméticas  (dobutamina,  dopamina)  melhoram  a  contratilidade  e  o  débito  cardíaco  pelos  efeitos  agonistas  beta­adrenérgicos  e  podem  ser  inestimáveis  no  tratamento  imediato  de  choque  cardiogênico  ou  ICC
secundária  à  insuficiência  miocárdica.  O  estímulo  de  receptores  β  ligados  à  membrana  ativa  a  adenilciclase,  induzindo  a  produção  de  cAMP  e  subsequente  fosforilação  de  canais  de  cálcio  ligado  à  membrana  em  ambos,  sarcolema
(membrana do miócito) e retículo sarcoplasmático. Estas ações celulares aumentam a contratilidade e o relaxamento do miocárdio, bem como o consumo de oxigênio. Os efeitos nos canais iônicos das células do marca­passo cardíaco e nas
fibras de condução induzem a menor limiar de despolarização, aumento da frequência cardíaca e maior velocidade de condução; todos eles predispõem à arritmia cardíaca. Nos vasos sanguíneos periféricos, a estimulação mista de β1 e
β2 tem efeito irrelevante na resistência vascular, embora o estímulo alfa­adrenérgico (como ocorre com a dopamina em dose maior) pode ocasionar vasoconstrição.
A dobutamina é administrada por via IV, na forma de infusão de 2,5 a 20 μg/kg/min diluída em solução de dextrose 5%. Dose > 15 μg/kg/min raramente é necessária e pode estar associada a maior risco de taquiarritmia. Recomenda­se
iniciar com a menor dose, aumentando a cada 15 a 30 min, se necessário. Monitoramento concomitante com ECG é fortemente recomendado; indica­se redução ou suspensão da dobutamina caso ocorra agravamento da arritmia. Como no
caso  de  fibrilação  atrial  a  dobutamina  aumenta  a  condução  através  do  nodo  AV,  recomenda­se  cuidado  adicional.  A  dobutamina  pode  aumentar  preferencialmente  o  fluxo  ao  miocárdio,  quando  comparada  à  dopamina,  a  qual  tende  a
aumentar o fluxo renal e mesentérico. Também, a dobutamina é menos propensa a induzir taquicardia do que a dopamina. A dopamina é administrada como infusão contínua na dose de 2 a 8 μg/kg/min; doses maiores (> 10 μg/kg/min)
estão associadas a ocorrência de hipertensão e taquicardia. Recomenda­se aumento gradativo da dose, como mencionado para dobutamina. Ambas, dopamina e dobutamina, podem provocar distúrbio gastrintestinal. Estes medicamentos são
menos comumente utilizados em gatos, embora possa seguir a mesma estratégia de tratamento geral, porém iniciando com dose de infusão mais conservadora (cerca de 1 μg/kg/min) para ambas, dobutamina e dopamina.
Os compostos bipiridina (milrinona, anrinona) são inibidores da PDE III. A inibição da PDE III reduz a degradação de cAMP, com efeitos subsequentes similares àqueles verificados com o uso de aminas simpaticomiméticas. Estes
medicamentos geralmente são reservados aos pacientes com insuficiência miocárdica refratária grave porque seu uso está associado a maior risco de morte do que aquele notado com o uso de aminas simpaticomiméticas. Em razão da não
dependência de estimulação do receptor β, os inibidores da PDE III não são influenciados pela infrarregulação ou separação do receptor β, que pode ocorrer na doença cardíaca progressiva; ademais, pode ser útil em situações clínicas em
que os benefícios da terapia simpaticomimética são menores do que os esperados. Adicionalmente, a inibição da PDE III vascular e a não dependência de estimulação alfa­adrenérgica resulta em vasodilatação. As reações adversas notadas
com o uso de inibidores da PDE III incluem taquicardia, taquiarritmia, trombocitopenia, distúrbio GI e hipotensão em doses maiores. A anrinona é administrada na dose de 1 a 3 mg/kg IV ou como infusão contínua na dose de 10 a 80
μg/kg/min. A milrinona é significativamente mais potente do que a anrinona, mas seu uso em medicina veterinária é restrito devido ao custo e à experiência limitada.
GLICOSÍDIOS CARDÍACOS:  Os glicosídios digitálicos (digoxina, digitoxina) são medicamentos inotrópicos relativamente fracos, apresentam estreita variação terapêutica e estão associados a ocorrência de reações adversas significativamente
maior, em comparação com o pimobendana. A digitoxina não está mais disponível no mercado. Embora cada vez menos utilizada por seus efeitos inotrópicos desde a introdução de pimobendana, a digoxina ainda tem importante função na
doença cardíaca, especialmente no caso de fibrilação atrial ou taquicardia supraventricular simultaneamente à ICC, pois é o único fármaco disponível que reduz a condução no nodo AV, sem efeito inotrópico negativo concomitante (ver
glicosídios cardíacos, p. 2550, para mais informações).
Rápida digitalização (IV) comumente resulta em intoxicação, não sendo recomendada. A digoxina pode ser administrada de modo conservador, iniciando com dose de 0,003 a 0,005 mg/kg, VO, 2 vezes/dia. Não se obtém teor sérico
adequado antes de 3 a 4 dias e a concentração de digoxina deve ser mensurada 5 a 7 dias após o início do tratamento, 8 h após a administração da última dose. Ajustes adicionais de doses devem ser conservadores e, por fim, com base no
teor sérico de digoxina e na resposta clínica do animal. Caso utilize digoxina em gatos, pode ser iniciada com um quarto de comprimido de 0,125 mg a cada 3 dias, para gatos com < 5 kg, e em dias alternados para gatos com > 5 kg. Alguns
gatos maiores podem tolerar dose tão alta quanto um quarto de comprimido de 0,125 mg, 1 vez/dia. Encontra­se disponível na forma de elixir, mas os gatos geralmente não apreciam o paladar.
A ocorrência de reações adversas está aumentando, possivelmente quando o teor sérico é maior e, em geral, notam­se distúrbios GI, cardíacos e de SNC. Em razão de sua capacidade de reduzir a condução elétrica, bem como aumentar o
cálcio intracelular, a digoxina pode provocar quase todos os tipos de arritmia cardíaca, sendo contraindicada no bloqueio AV, bradicardia relevante e taquicardia ventricular marcante. Caso ocorram reações adversas o medicamento deve ser
temporariamente suspenso (geralmente por 1 a 2 dias) e a dose subsequente reduzida em cerca de 30%.
INIBIDORES DA ENZIMA CONVERSORA DE ANGIOTENSINA (ECA):  Os inibidores da ECA impedem competitivamente a atividade dessa enzima, que converte angiotensina I em angiotensina II. Isto atenua o aumento da resistência vascular
sistêmica, as reações adversas da hipertrofia e remodelação cardíaca e a liberação de aldosterona induzidos pela angiotensina II. Os inibidores da ECA são moderados vasodilatadores equilibrados. Podem reduzir a resistência vascular
sistêmica em até 25%, melhorando o débito cardíaco e reduzindo a fração regurgitante, no caso de regurgitação mitral. Além disso, os benefícios incluem diminuição da pressão de preenchimento do ventrículo esquerdo e, desse modo, a
congestão venosa pulmonar. Acredita­se que os efeitos benéficos dos inibidores da ECA se devam principalmente à modulação neuro­hormonal, além dos benefícios hemodinâmicos. Estudos em cães com ICC mostraram melhora clínica
quando se adicionou um inibidor da ECA à terapia padrão (diurético com ou sem glicosídio digitálico), sendo verificada melhora mais evidente em cães com CMD do que naqueles com doença cardiovascular (DCV). Também, em alguns
estudos notou­se tendência de prolongamento da sobrevida.
Em geral, os cardiologistas concordam que no caso de ICC é indicado um inibidor da ECA. O benefício da terapia com inibidor da ECA antes do início da ICC é mais controverso e o uso deve se basear no paciente, individualmente, e na
doença primária. Pode ser adequado iniciar o tratamento em qualquer cão com função sistólica claramente deprimida (isto é, CMD oculta) na esperança de retardar a remodelação, ou em cães com DCV e hipertensão documentada (pressão
sanguínea sistêmica > 160 mmHg), porém não há estudo bem controlado para sustentar esta afirmação. Em gatos, os estudos sobre a inibição da ECA são limitados e nenhum mostrou real benefício estatístico da inibição desta enzima, além
daquele obtido com a terapia diurética padrão em gatos com ICC. Ademais, não houve benefício algum no retardamento da progressão da CMH oculta. No entanto, estes estudos envolveram pequeno número de pacientes; a maioria dos
cardiologistas prescreve um inibidor da ECA, além do tratamento padrão, aos gatos com ICC.
As reações adversas à inibição da ECA geralmente estão relacionadas com a menor taxa de filtração glomerular (TFG) em caso de hipovolemia ou insuficiência renal preexistente, pois a angiotensina II favorece a constrição da arteríola
eferente renal em razão da menor perfusão sanguínea aos rins. Mais comumente, as reações adversas são constatadas em animais com azotemia relacionada com o deficiente débito cardíaco, à administração de diuréticos ou à insuficiência
renal preexistente. É possível notar anorexia, vômito e letargia. Não se constata tosse em cães e gatos, embora tal sintoma seja um efeito adverso comum em pessoas tratadas com inibidor da ECA. Alguns animais podem desenvolver
hiperpotassemia ou azotemia transitória após o início da terapia com inibidor da ECA. Por esta razão, recomenda­se a avaliação da função renal e a dosagem de eletrólitos antes de instituir o tratamento com inibidor da ECA e 5 a 7 dias
depois.
Nos EUA, o enalapril é o único inibidor da ECA aprovado para uso em cães com ICC. Em geral, a dose inicial é 0,5 mg/kg VO, 1 vez/dia, ou 0,25 mg/kg, 2 vezes/dia, em cães com insuficiência cardíaca discreta; em seguida a dose pode
ser aumentada para 0,5 mg/kg 2 vezes/dia, em cães com insuficiência cardíaca modera a grave. Em gatos, para tratamento de longa duração recomenda­se a dose de 0,5 mg/kg VO, 1 vez/dia. Em geral, os benefícios clínicos não são
constatados antes de 2 a 3 semanas. Durante o tratamento prolongado com inibidor da ECA os parâmetros da função renal devem ser periodicamente monitorados (pelo menos, a cada 6 meses).
Outros  inibidores  da  ECA  utilizados  no  tratamento  de  insuficiência  cardíaca  incluem  benazepril  (0,25  a  0,5  mg/kg  VO,  1  a  2  vezes/dia),  captopril  (0,5  a  2  mg/kg  VO,  2  a  3  vezes/dia)  e  lisinopril  (0,5  mg/kg  VO,  1  a  2  vezes/dia).
Diferentemente do enalapril e de outros inibidores da ECA excretados pelos rins, o benazepril passa por importante excreção hepatobiliar (até 50%, em cães, e 85% em gatos). Não se sabe se o benazepril é mais seguro ou mais efetivo em
pacientes com insuficiência renal.
VASODILATADORES:  Os vasodilatadores têm efeito positivo na ICC devido à redução da pré­carga ou da pós­carga. Os nitratos (nitroprussiato de sódio, unguento de nitroglicerina, dinitrato de isossorbida) atuam por meio de uma via final
comum, que produz maior quantidade de óxido nítrico, com subsequente ativação da monofosfato de guanosina cíclica (cGMP) e relaxamento do musculo liso do endotélio. O nitroprussiato de sódio é um potente vasodilatador que atua em
ambos os sistemas, arterial e venoso. A combinação de nitroprussiato de sódio com dobutamina pode ser especialmente útil nos casos de choque cardiogênico e edema pulmonar grave. Embora o nitroprussiato de sódio reduza a pré­carga e
a pós­carga, de modo marcante e agudo, seu uso é limitado pela necessidade de rigoroso monitoramento e pela necessidade de administração na forma de infusão contínua. A principal reação adversa é hipotensão sistêmica (com ou sem
fraqueza, taquicardia ou vômito); desse modo, recomenda­se o monitoramento simultâneo da pressão sanguínea. O nitroprussiato de sódio é diluído em solução de dextrose 5% e a administração é iniciada com 1 μg/kg/min, com cuidado,
aumentando a dose a cada 5 a 10 min, até obter o efeito desejado. Em geral, a dose de 5 a 7 μg/kg/min é suficiente para controlar os sinais clínicos e, raramente, há necessidade de > 10 μg/kg/min. A administração prolongada (> 16 h)
aumenta o risco de intoxicação por cianeto.
Caso a terapia com nitroprussiato não está disponível ou não é desejável, o unguento de nitroglicerina e o dinitrato de isossorbida são redutores efetivos da pré­carga, embora os efeitos clínicos geralmente sejam menos previsíveis. As
reações  adversas  também  são  menos  comuns,  embora  igualmente  associadas  à  hipotensão.  Pode­se  notar  depressão  em  alguns  cães  e  gatos.  A  nitroglicerina  é  absorvida  por  via  transcutânea;  devem  ser  utilizadas  luvas  por  ocasião  da
administração. Aplica­se aproximadamente 1/4 de polegada para cada 4,5 kg (cães e gatos), a cada 6 a 8 h, em um local sem pelos, como o pavilhão auricular ou a região inguinal. Este último local pode ser o preferível em animais com
deficiente perfusão periférica, em que o pavilhão auricular e as extremidades podem se apresentar frias ao toque. Deve­se limpar ou retirar o medicamento depois de 8 a 12 h ou antes de aplicar a dose seguinte. O dinitrato de isossorbida é
menos comumente utilizado. Em geral é indicado aos pacientes refratários à terapia com inibidores da ECA. É administrado na dose de 0,2 a 1,0 mg/kg VO, 3 vezes/dia. Em modelos experimentais com cães notou­se tolerância aos nitratos.
Hidralazina é um potente vasodilatador arterial tipicamente reservado aos animais refratários à terapia com inibidores da ECA ou no caso de ICC aguda, quando não há disponibilidade de nitroprussiato. Seu suposto mecanismo de ação
envolve a produção de prostaglandinas vasodilatadoras. A hidralazina pode reduzir a resistência vascular sistêmica em até 40%. Frequentemente, recomenda­se monitoramento hospitalar no início da ação devido ao maior risco de reações
adversas relacionadas com a hipotensão (taquicardia, fraqueza, vômito, diarreia). A dose inicial recomendada é 0,5 mg/kg VO, 2 vezes/dia, com aumento gradativo, tão alta quanto 2,0 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, até obter o efeito desejado. Em
gatos, pode­se administrar 2,5 mg/animal VO, 1 a 2 vezes/dia.
Anlodipino é um bloqueador de canal de cálcio com seletividade vascular periférica e efeito vasodilatador moderado. Ação cardíaca direta (redução de inotropia e condução) é incomum nas doses padrões. O anlodipino tem um início de
ação relativamente demorado e tipicamente é reservado aos animais refratários ou que não toleram a terapia com inibidor da ECA ou para aqueles com hipertensão sistêmica grave. As reações adversas geralmente estão relacionadas com a
hipotensão e são incomuns quando se realiza aumento gradativo da dose. Em cães, inicia–se o tratamento com 0,1 mg/kg VO, 2 vezes/dia, aumentando semanalmente até a dose almejada de 0,2 mg/kg, 1 a 2 vezes/dia. Em gatos, geralmente
inicia­se com 0,625 mg (um quarto de comprimido de 2,5 mg), 1 vez/dia, aumentando gradativamente a dose até obter o efeito desejado, até 1,25 mg, 2 vezes/dia, em alguns casos.
Inibidores da fosfodiesterase tipo V (PDE­V) (sildenafila, tadalafila) são vasodilatadores mistos com seletividade pulmonar. Seu mecanismo de ação é semelhante àquele dos nitratos, com aumento comum no segundo mensageiro
cGMP. Os inibidores PDE­V são utilizados no tratamento de hipertensão arterial pulmonar moderada a grave. Estudos em cães revelaram moderada melhora clínica, com redução mínima da pressão da artéria pulmonar. Há relatos casuais
de que os inibidores PDE­V parecem propiciar benefícios clínicos mais evidentes aos animais com síncope decorrente de hipertensão pulmonar. As reações adversas são incomuns, mas é possível notar distúrbio GI e sintomas relacionados
com a hipotensão (especialmente quando associados a outros nitratos, o que é contraindicado). O custo é uma limitação importante ao uso de inibidores PDE­V, especialmente em pacientes maiores. Em cães e gatos, administra­se 1 a 2 mg
de sildenafila/kg VO, 2 a 3 vezes/dia. A dose de tadalafila é 1 mg/kg VO, 1 a 2 vezes/dia.
ANTIARRÍTMICOS:   Uma  discussão  detalhada  do  tratamento  antiarrítmico  encontra­se  em  outra  parte  (ver  p.  2556).  Vários  antiarrítmicos  apresentam  efeitos  inotrópicos  negativos,  com  risco  de  agravar  a  ICC  ativa.  No  tratamento  de
taquiarritmia supraventricular isto ocorre mais provavelmente com o uso de bloqueadores de canal de cálcio ou betabloqueadores. A decisão terapêutica pode ser um desafio quando se suspeita que uma taquiarritmia está agravando a ICC
em razão da redução do tempo de preenchimento ventricular durante a diástole. Adicionalmente, isto é confuso pelo fato de que os animais com insuficiência cardíaca geralmente apresentam aumento do tônus simpático, o que pode agravar
a  taquiarritmia. Desse  modo,  há  certa  controvérsia  quanto  se  a  taquiarritmia discreta  a  moderada  (frequência  cardíaca  de  até  180  bpm)  deve  ser  tratada  ou  simplesmente  monitorada,  enquanto  se  espera  melhor  controle  terapêutico  da
insuficiência cardíaca.
Há pouca discussão sobre se a taquiarritmia contínua grave (> 180 a 220 bpm) deve ser tratada. Como mencionado anteriormente, a digoxina é o tratamento de escolha da maioria dos pacientes com fibrilação atrial ou taquiarritmia
supraventricular, na ICC. No entanto, os efeitos da digoxina geralmente não são notados antes de 3 a 5 dias e, em vários casos, o medicamento é apenas moderadamente efetivo na redução da taxa da resposta ventricular à fibrilação atrial.
Diltiazen ou betabloqueadores, como atenolol, frequentemente são acrescentados ao uso de digoxina por favorecerem gradativa condução no nodo AV e reduzirem a taxa de resposta ventricular (betabloqueadores não devem ser utilizados
quando  há  ICC  ativa).  Se  a  adição  de  diltiazen  ou  de  betabloqueadores  resulta  em  piora  dos  sintomas  de  congestão,  eles  devem  ser  suspensos  até  que  o  animal  se  livre  da  ICC.  Outras  opções  para  o  tratamento  de  fibrilação  atrial  ou
taquicardia supraventricular, na ICC, incluem procainamida ou amiodarona (ver p. 2556).
Geralmente tenta­se o tratamento de arritmia ventricular importante (batimentos ventriculares sucessivos revelando a condição R­sobre­T) ou taquicardia (> 160 a 180 bpm), na presença de ICC, com antiarrítmicos classe IB (lidocaína ou
mexilitina) ou amiodarona. Todas estas drogas apresentam mínimo a discreto efeito inotrópico negativo. Sotalol, uma classe de antiarrítmico III com propriedades betabloqueadoras, também pode ser útil, embora apresente mais efeitos
inotrópicos negativos e possa não ser tolerado quando há importante disfunção miocárdica ou ICC.
Bradiarritmia crônica, como aquela constatada no bloqueio AV (segundo grau alto ou terceiro grau) ou na síndrome do seio doente, também pode induzir à ICC e nestes animais o tratamento de escolha é implante de marca­passo. Caso
esta  não  seja  uma  opção  viável  pode­se  administrar  anticolinérgicos  ou  simpaticomiméticos.  Propantelina  é  um  anticolinérgico  de  uso  oral  administrado  na  dose  de  0,25  a  0,5  mg/kg  VO,  2  a  3  vezes/dia.  As  reações  adversas  incluem
taquicardia e distúrbio GI. Teofilina é um inibidor não seletivo da PDE, com moderado efeito cronotrópico, administrada na dose de 9 mg/kg VO, 3 a 4 vezes/dia, em cães, e de 4 mg/kg VO, 2 a 3 vezes/dia, em gatos. Também, está
disponível como preparação de liberação prolongada, administrada na dose de 10 a 15 mg/kg VO, 2 mg/kg VO, a cada 24 a 48 h, em gatos. As reações adversas podem incluir inquietação, excitabilidade, taquicardia ou distúrbio GI.
Terbutalina é um beta­agonista que também possui moderado efeito cronotrópico e induz reações adversas similares àquelas notadas com o uso de teofilina. É administrada na dose de 1,25 a 5 mg VO, 3 vezes/dia, em cães, e de 0,625 mg, 2
vezes/dia em gatos. Tentativas para controlar bradiarritmias clinicamente importantes com terapia oral frequentemente são pouco compensadoras, embora em alguns pacientes o quadro clínico geral possa melhorar.
BLOQUEADORES BETA­ADRENÉRGICOS  COMO  CARDIOPROTETORES:  Ainda  não  se  sabe  se  os  betabloqueadores  melhoram  as  taxas  de  morbidade  e  mortalidade  em  animais  cardiopatas,  porém  estudos  em  pessoas  indicam  que  há  base
teórica e experimental para sustentar sua eficácia. Testes clínicos em cães com CMD ou DCV não mostraram benefícios clínicos ou neuro­hormonais significantes com a administração de carvedilol, um bloqueador beta­adrenérgico de
terceira geração. Os cães com insuficiência cardíaca experimentalmente induzida mostraram melhora mensurável no desempenho cardíaco após a administração de metropolol, porém estes eram modelos de cardiomiopatia isquêmica, que é
uma causa incomum de CMD nesta espécie.
Vários  cardiologistas  utilizam  bloqueadores  beta­adrenérgicos  em  cães  com  disfunção  sistólica  ou  diastólica  confirmada  e  acredita­se  que  é  possível  obter  melhores  resultados  clínicos  caso  estes  medicamentos  sejam  iniciados  mais
precocemente, no início da doença, e com aumento gradativo da dose. Em animais com doença oculta ou insuficiência cardíaca compensada parecem ser bem tolerados quando se aumenta a dose cuidadosamente, cessando quando se atinge
a maior dose tolerada, que não provoca fraqueza, letargia ou outros sinais clínicos associados à hipotensão ou redução do débito cardíaco. Carvedilol e metoprolol são os medicamentos mais comumente utilizados nesta situação. Em geral,
inicia­se a administração com dose de 0,2 a 0,4 mg de carvedilol/kg VO, 2 vezes/dia, em cães, aumentando gradativamente a cada 1 a 2 semanas, até dose máxima de 1,5 mg/kg, 2 vezes/dia. Metoprolol é iniciado com 0,5 mg/kg VO, 2 a 3
vezes/dia,  em  cães,  aumentando  até  1  mg/kg  VO,  2  a  3  vezes/dia.  Em  gatos,  a  dose  recomendada  de  metoprolol  é  2  a  15  mg  VO,  3  vezes/dia.  Também,  pode–se  recomendar  atenolol  (6,25  a  12,5  mg/gato,  2  vezes/dia)  para  proteção
miocárdica, em gatos. Há alguns dados associando o uso de atenolol em gatos com CMH e ICC, com recuperação menos eficiente; caso desenvolva ICC deve­se propiciar reduzir a dose ou suspender o uso do medicamento.
CONSIDERAÇÕES NUTRICIONAIS:  Podem ocorrer alterações metabólicas importantes nos animais com insuficiência cardíaca. A suprarregulação do SRAA ocasiona aumento do volume plasmático, basicamente mediado pela maior retenção
de sódio. Maior produção de citocinas inflamatórias, como fator de necrose tumoral e interleucina 1, pode favorecer o aumento da demanda metabólica e contribuir para anorexia, desse modo, agravando a condição de “caquexia cardíaca”.
Estudos em pessoas e um estudo recente em cães mostra que pacientes com ICC que perderam peso ao longo destes estudos apresentaram prognóstico ruim. Em alguns pacientes, deficiências nutricionais (de taurina, carnitina, coenzima
Q10) estão associadas a redução do desempenho miocárdico. Documentou­se diminuição dos teores de ácidos graxos circulantes em pessoas e cães com insuficiência cardíaca. Portanto, o manejo nutricional geral no tratamento de animais
com insuficiência cardíaca inclui suplementação adequada de calorias, modulando a síntese de citocinas proinflamatórias, controlando o equilíbrio de sódio e propiciando nutrientes possivelmente deficientes.
O conceito de que a restrição de sódio reduz o volume plasmático circulante e, assim, a pré­carga, está bem estabelecida. No entanto, sabidamente a restrição de sódio ativa o SRAA, mas há certa controvérsia quanto à importância da
restrição de sódio em animais com doença cardíaca assintomática ou ICC discreta ou moderada. Por outro lado, há quase que unanimidade universal de que a restrição de sódio moderada a grave é indicada aos animais com ICC avançada.
Recomenda­se apenas discreta restrição de sódio (< 80 a 90 mg/100kcal) a pacientes com remodelação cardíaca moderada a intensa, ainda sem ICC (International Small Animal Cardiac Health Council [ISACHC] Classe IB). Também, é
importante orientar os proprietários no sentido de evitar o fornecimento de alimentos e guloseimas com alto teor de sódio, pois alta carga de sódio aguda (como pode acontecer em animais alimentados com sobras de alimentos ou petiscos
para pessoas) pode precipitar ICC em animais com doença cardíaca compensada. Para animais com insuficiência cardíaca discreta a moderada (ISACHC Classe II) recomenda­se restrição de sódio moderada (50 a 80 mg/kcal). Em alguns
animais que no momento apresentam caquexia cardíaca, pois alimentos com menor teor de sódio podem ser menos palatável, isto representa um desafio terapêutico.
A suplementação com ácidos graxos n­3 mostrou vários benefícios em pacientes humanos com ICC e um estudo recente em cães sugeriu também benefícios antiarrítmicos. Estes ácidos graxos podem reduzir os teores de citocinas
inflamatórias circulantes e parece melhorar o apetite de alguns cães com caquexia cardíaca. Recomendam­se doses diárias de 40 mg de ácido eicosapentaenoico (EPA)/kg e 25 mg de ácido docosa­hexaenoico (DHA)/kg.
Indica­se suplementação com taurina aos animais com deficiência deste nutriente e CMD documentada. Em gatos, a ocorrência de CMD diminuiu muito assim que se identificou a deficiência de taurina como causa primária da doença
no final dos anos da década de 1980. A deficiência de taurina também foi documentada em alguns gatos com CMD alimentados com dieta não comercial. Em gatos, pode­se iniciar a suplementação com dose de 250 mg, 1 a 2 vezes/dia,
enquanto se aguarda os resultados dos teores de taurina no plasma e no sangue total. Os cães são capazes de sintetizar taurina endógena; assim, a deficiência é menos comum nesta espécie. No entanto, cães das raças American Cocker
Spaniel, Golden Retriever e Newfoundland são relativamente predispostas à deficiência de taurina, especialmente quando alimentados com carne de cordeiro e arroz ou com dieta rica em fibras e com baixo teor de proteína/taurina. Deve–se
obter os teores de taurina no sangue total e no plasma de todos os cães com suspeita de cardiomiopatia por deficiência de taurina e a suplementação pode ser iniciada na dose de 500 a 1.000 mg VO, 2 a 3 vezes/dia, enquanto se aguarda os
resultados dos exames laboratoriais.
l­carnitina tem importante função no metabolismo de ácidos graxos e produção de energia. Deficiência de carnitina foi documentada em uma família de cães da raça Boxer; há relato casual de que a suplementação de carnitina em cães
de outras raças com CMD mostrou alguma eficácia. Nestes cães, não se sabe se esta deficiência é a causa ou a consequência da cardiomiopatia. O diagnóstico de deficiência de carnitina é difícil e requer biopsia do endomiocárdio. Também,
o custo da suplementação é alto; não é recomendada rotineiramente em razão do conhecimento limitado sobre a participação da carnitina na cardiomiopatia, em cães. Todavia, pode­se propor suplementação com 50 a 100 mg/kg VO, 2 a 3
vezes/dia, aos cães com CMD, especialmente da raça Boxer.
A coenzima Q10 está envolvida na produção de energia mitocondrial e possui propriedades antioxidantes gerais. Há relatos casuais de benefícios da suplementação em pessoas e cães com CMD, porém estudos bem controlados são falhos
e alguns relatos são contraditórios. Atualmente a dose recomendada para cães é 30 a 90 mg VO, 2 vezes/dia.
OXIGENOTERAPIA:  A presença de edema pulmonar em animais com ICC aumenta a distância de difusão alveolar­arterial do oxigênio aos capilares pulmonares. O fornecimento de oxigênio suplementar aumenta o gradiente de difusão
alveolar­arterial e, desse modo, aumenta o conteúdo de oxigênio arterial. O oxigênio pode ser administrado em uma cabine apropriada, bem como por meio de fluxo, cânula nasal ou colar de oxigênio (construído mediante o revestimento de
50  a  75%  da  parte  ventral  de  um  colar  Elisabetano  com  plástico  aderente  e  fixando  o  tubo  de  oxigênio  ao  longo  da  parte  ventral  do  colar).  A  cabine  de  oxigênio  pode  ser  menos  estressante  ao  paciente,  mas  o  custo  é  alto  porque  há
necessidade de alto fluxo de oxigênio para obter a concentração terapêutica (> 40% de oxigênio inspirado). O colar de oxigênio permite obter concentração muito alta de oxigênio inspirado (até 80%), mas pode necessitar ligeira sedação
para aumentar a complacência do paciente.
TORACOCENTESE:  A efusão pleural reduz a área disponível para a ventilação alveolar e, consequentemente, a oxigenação arterial. Toracocentese é o tratamento mais efetivo em animais com volume significativo de efusão ou com angústia
respiratória. No entanto, deve­se ter cautela em pacientes particularmente estressados, os quais podem necessitar pré­tratamento com oxigênio, dose moderada de furosemida e ligeira sedação. A terapia diurética é relativamente ineficaz na
resolução de grande volume de efusão pleural aguda, sendo provável o desenvolvimento de hipovolemia com azotemia quando se utiliza esta estratégia de tratamento (ou seja, administração de doses de diurético altas o suficiente para
reduzir significativamente a efusão pleural).
ABDOMINOCENTESE:  A ascite pode causar desconforto abdominal e agravar a dispneia devido à redução da capacidade pulmonar disponível. Nos animais com ascite continuada, nos quais o aumento da dose de diurético não é uma opção,
pode­se realizar abdominocentese a cada 2 a 4 semanas com intuito de melhorar o conforto e a qualidade de vida do paciente.
TERAPIAS AUXILIARES:  Geralmente o tratamento com broncodilatadores (teofilina, terbutalina) é reservado aos pacientes com doença de vias respiratórias crônica, que não é incomum em cães de raças pequenas mais velhos. Deve­se ter
cuidado com animais com ICC, especialmente com taquiarritmia, devido aos efeitos simpaticomiméticos destes medicamentos. Tem­se utilizado teofilina com algum sucesso em cães com DCV e síncope, em razão de sua ação vagolítica.
As doses de teofilina e de terbutalina são aquelas indicadas no tratamento de bradiarritmias (ver texto anteriormente).
Supressores de tosse podem auxiliar no alívio da tosse relacionada com a compressão do brônquio principal pelo aumento do átrio esquerdo. Também, nota­se tosse associada à doença de vias respiratórias reativas (asma cardíaca). No
entanto,  deve­se  ter  cuidado  com  pacientes  portadores  de  ICC  porque  a  supressão  da  tosse  pode  mascarar  o  agravamento  de  edema  pulmonar.  Terapia  antitussígena  comum  utilizada  em  cães  com  cardiopatia  inclui  0,05  a  0,3  mg  de
butorfanol/kg VO, 3 a 4 vezes/dia, ou 0,22 mg de hidroclorona/kg VO, 2 a 3 vezes/dia.
Pode ser necessária terapia ansiolítica para animais com angústia respiratória grave decorrente de ICC. Tradicionalmente, tem se recomendado o uso de morfina para aliviar a ansiedade em cães e pessoas com ICC, em razão de suas
propriedades sedativas e venodilatadores concomitantes (e, assim, reduz a pré­carga). Recomenda­se 0,1 a 0,25 mg de morfina/kg SC. As reações adversas mais comuns incluem depressão respiratória e náuseas ou vômito. Em geral, evita­
se o uso de morfina em gatos porque pode induzir agitação e disforia. Butorfanol é um agonista/antagonista opiáceo parcial, com efeitos cardiovasculares mínimos. Em cães e gatos pode­se utilizar uma dose sedativa de 0,2 a 0,5 mg/kg, por
via IM ou IV. O butorfanol também pode ser associado a uma benzodiazepina (midazolam ou diazepam), sendo a dose do último também de 0,2 a 0,5 mg/kg IM ou IV. Os tranquilizantes fenotiazínicos (p. ex., acepromazina) podem ser
utilizados  para  minimizar  ansiedade  grave;  no  entanto,  induzem  vasodilatação  devido  ao  efeito  bloqueador  e  deve  ser  utilizado  com  cautela,  se  realmente  necessário,  em  animais  com  hipotensão  sistêmica  ou  comprometimento
hemodinâmico grave. Quando há necessidade de ansiólise potente pode­se utilizar baixa dose, de 0,01 a 0,1 mg/kg IM ou IV.

TROMBOSE, EMBOLIA E ANEURISMA

Trombo é uma agregação de plaquetas e fibrina que se forma sob determinadas condições. Historicamente, estas condições incluem uma combinação de estase sanguínea (redução do fluxo), lesão endotelial e estado de hipercoagulação. O
trombo pode se desenvolver em uma câmara cardíaca e nela se aderir (mural) ou menos provavelmente pode permanecer livre (massa arredondada) ou no interior do vaso sanguíneo onde pode causar obstrução parcial ou total. O trombo
pode  ser  classificado  com  base  em  sua  localização  e  na  síndrome  clínica  que  ocasiona  (p.  ex.,  trombose  de  veia  jugular  em  grandes  animais  associada  à  cateterização  venosa  prolongada,  trombose  da  artéria  pulmonar  associada  à
dirofilariose, em cães).
O  trombo  pode  se  partir  totalmente  ou  parte  dele  e  ser  transportado  na  corrente  sanguínea  na  forma  de  um  êmbolo  que  se  instala  distalmente  em  um  ponto  no  qual  o  tamanho  do  êmbolo  excede  o  diâmetro  vascular.  Técnicas  de
cateterização e de injeção inadequadas e cateter de má qualidade podem resultar em trombose vascular. No entanto, com mais frequência nota­se trombose vascular clinicamente relevante em pacientes com doença primária que induz uma
condição de hipercoagulação, como acontece na inflamação sistêmica e endotoxemia ou deficiência de antitrombina. Caso não se institua tratamento ou controle, a condição trombótica sistêmica pode resultar em diátese hemorrágica ou
coagulação intravascular disseminada (CID), um distúrbio hemostático com risco à vida do animal associado à deposição de microtrombos e consumo de fatores de coagulação, que resultam em hemorragia concomitante.
O trombo pode ser formado em artérias e veias, tanto de pequeno quanto de grande calibre. Equinos e bovinos são mais suscetíveis à ocorrência de trombos venosos, enquanto em cães e gatos os trombos arteriais têm maior importância
clínica.
Embolização ou trombose arterial resulta em isquemia dos tecidos irrigados pelo vaso infartado. Os êmbolos decorrentes de doenças infecciosas, como endocardite, são classificados como sépticos (êmbolo com bactérias). Êmbolos
sépticos podem resultar em disseminação de bactérias e infecção aos leitos capilares distais. Embora a tromboembolia arterial seja clinicamente relevante em animais domésticos, a doença obstrutiva arterial primária (trombose arterial) é
uma rara exceção. Relata­se trombose de artérias de membro, com claudicação e gangrena, em equinos adultos e potros. Esta ocorrência é secundária à hipercoagulação e inflamação sistêmica (p. ex., sepse em potros).
Aneurisma é uma dilatação vascular causada pelo enfraquecimento da túnica média dos vasos sanguíneos. Esse enfraquecimento pode ser primário ou secundário a alterações degenerativas ou inflamatórias progressivas a partir de uma
lesão na camada íntima. Falso aneurisma é causado por lesão das três camadas da parede arterial e resulta em acúmulo extravascular de sangue. A lesão endotelial associada ao aneurisma verdadeiro pode predispor à formação de um trombo
e, consequentemente, embolização; portanto, aneurisma, trombo e êmbolo podem ser detectados simultaneamente. No entanto, aneurismas são raros ou incomuns em animais dométicos.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Com frequência, a dispneia de início agudo está associada a trombose/embolia pulmonar, embora alguns pacientes possam manifestar hemoptise; este último achado é mais comumente associado a
doença arterial pulmonar, como dirofilariose (p. 96). Trombos cardíacos sépticos estão associados a endocardite; trombos cardíacos assépticos estão relacionados com doença do miocárdio, principalmente em gatos. Infarto no sistema
urogenital pode se manifestar na forma de hematúria, dor abdominal e rigidez. Infarto esplâncnico geralmente resulta em dor abdominal e, em pequenos animais, vômito.
Aneurismas não causam sinais clínicos, a menos que haja hemorragia ou desenvolvimento de trombo associado. Exceto nos casos de aneurisma dissecante em perus (p. 2890), ruptura aórtica ou do seio de Valsalva na morte súbita em
equinos, hemorragia associada a micose da bolsa gutural em equinos (p. 1556) ou com aneurisma de artéria pulmonar em bovinos, raramente nota–se hemorragia espontânea do aneurisma; geralmente os sinais clínicos são relacionados com
a  trombose.  Em  grandes  animais,  o  aneurisma  da  artéria  aorta  abdominal  e  de  seus  ramos  pode  ser  palpado  por  VR,  notando­se  uma  tumefação  firme  fixa  com  superfície  irregular  e  rugosa,  que  apresenta  pulsos  concomitantes  aos
batimentos cardíacos. É possível notar frêmito. No caso de formação excessiva de trombos o pulso pode ser retardado distalmente e apresentar uma lenta taxa de aumento de pressão, ou pode estar ausente. Outros exames auxiliares de
diagnósticos úteis são ultrassonografia e angiografia.
Bovinos: Trombose da veia cava caudal é notada juntamente com abscesso hepático e erosão vascular do abscesso. Pneumonia embólica com abscedação pulmonar secundária, tromboembolia e aneurisma da artéria pulmonar são sequelas
comuns. Os animais acometidos podem apresentar tosse, taquipneia, dispneia e ruídos pulmonares anormais. Aneurisma de artéria pulmonar que contém êmbolo séptico pode se romper e causar hemorragia intrapulmonar ou o abscesso
pulmonar pode se romper para interior dos brônquios, resultando em hemorragia em vias respiratórias. Dentre as sequelas dessas anormalidades incluem­se epistaxe, hemoptise e morte. Geralmente os resultados de exames laboratoriais
indicam síndrome da veia cava, porém são inespecíficos. Hiperfibrinogenemia, anemia e, em alguns casos, abscessos ativos podem aumentar a atividade de enzimas hepáticas. Embolia arterial pulmonar e pneumonia embólica também são
complicações  frequentes  de  endocardite  de  valva  pulmonar  ou  tricúspide  em  bovinos,  mas  raramente  se  desenvolve  aneurisma.  Com  frequência  nota–se  febre  intermitente  e  anorexia  em  razão  da  bacteriemia,  quando  há  manifestação
embólica, e o animal tipicamente tem histórico de infecção crônica ativa (p. ex., abscesso de pata, abscesso reticular). A maioria dos casos de endocardite de câmara cardíaca direita em bovinos é de origem bacteriana e comumente está
associada a sopro cardíaco de intensidade máxima no sítio de auscultação da valva tricúspide. Ecocardiografia e hemocultura são úteis na identificação de lesões vegetativas do coração direito e da bactéria causadora, respectivamente. Em
bovinos, a trombose da veia cava cranial causa dilatação bilateral da jugular, edema de cabeça, submandibular e da região peitoral e hiperemia evidente de membrana mucosa oral. Entretanto, sintomas semelhantes são verificados na
insuficiência cardíaca congestiva direita, que pode ser uma sequela de endocardite da valva tricúspide. Pode haver importante edema de língua, de faringe ou de laringe, resultando em disfagia e dispneia.
Equinos:  Trombose da veia cava cranial pode ser decorrente da extensão de um trombo jugular. Em equinos, trombose da veia jugular frequentemente está associada a flebite secundária à cateterização ou extravasamento da solução injetável,
causando edema, hipertermia e dor no local acometido. Trombose bilateral das veias jugular pode causar edema e tumefação de cabeça e pescoço, mimetizando sinais de trombose da veia cava cranial. O exame ultrassonográfico da veia
acometida pode determinar a extensão do trombo e o grau de oclusão. A ultrassonografia Doppler é um método mais sofisticado de determinação do fluxo sanguíneo e da patência vascular. Na suspeita de tromboflebite associada a uso de
cateter  podem­se  realizar  hemocultura  e  cultura  microbiológica  da  extremidade  do  cateter.  Equinos  que  apresentam  colite  e  outras  anormalidades  gastrintestinais  são  mais  predispostos  à  trombose  jugular;  ruminantes  são  muito  menos
sujeitos à trombose jugular, em comparação com os equinos.
Larvas  de  Strongylus  vulgaris  migrantes  (p.  360)  podem  causar  arterite,  com  desenvolvimento  de  trombo  e  aneurisma  verminótico  na  artéria  aorta,  mesentérica  cranial  ou  ilíaca.  Em  alguns  equinos  os  êmbolos  ocluem  parcial  ou
totalmente  os  ramos  terminais  das  artérias  mesentéricas.  Os  segmentos  intestinais  afetados  apresentam  alterações  que  variam  desde  isquemia  até  infarto  hemorrágico.  Os  sinais  clínicos  são  os  mesmos  notados  nos  casos  de  cólica,
constipação intestinal ou diarreia. Com frequência, há recidiva de sintomas de cólica e os episódios podem ser graves e duradouros. A recente disponibilização de novos anti­helmínticos e de melhores protocolos terapêuticos tem tornado a
arterite verminótica uma doença incomum.
Trombose, com ou sem aneurisma das artérias aorta terminal e ilíaca proximal, causam uma síndrome característica em equinos. Embora associada a parasitismo, é possível que haja outras causas envolvidas. Os equinos acometidos
parecem normais quando em repouso; entretanto, exercícios gradativos resultam no agravamento da fraqueza dos membros e em claudicação uni ou bilateral, tremor muscular e sudorese. Os animais gravemente afetados podem manifestar
sinais de intolerância a exercício, fraqueza e claudicação atípica, sinais que regridem após um curto período de descanso. Pode­se detectar temperatura subnormal nos membros afetados, juntamente com diminuição ou ausência de pulso
arterial e retardo e diminuição no tempo de preenchimento capilar. A palpação retal pode mostrar variação na amplitude do pulso da artéria ilíaca interna ou externa (ou de ambas) e vasos assimétricos. Nos casos graves os músculos dos
membros pélvicos se atrofiam, com possível claudicação quando o animal é submetido a exercício leve. Em equinos, a oclusão embólica ou trombótica completa da aorta distal pode causar paralisia bilateral aguda dos membros pélvicos,
bem  como  decúbito.  Os  animais  afetados  tornam­se  ansiosos,  manifestam  sinais  de  dor  e  rapidamente  desenvolvem  choque.  Os  membros  pélvicos  apresentam­se  frios  e  a  palpação  retal  revela  ausência  de  pulso  na  artéria  ilíaca.  A
ultrassonografia transrretal pode ser útil na avaliação do fluxo sanguíneo das artérias aorta e ilíaca.
Cães e Gatos: Em cães, e menos comumente em gatos, a dirofilariose pode causar trombose de artéria pulmonar que comumente resulta em dispneia e taquipenia. Os animais acometidos frequentemente apresentam­se normais até que ocorra
início abrupto de tosse, angústia respiratória ou morte súbita. As radiografias do tórax podem ser normais ou indicar subperfusão do lobo pulmonar acometido, infiltrado alveolar intersticial ou efusão pleural. A hemogasometria tipicamente
indica hipoxemia com concentração sanguínea de CO2baixa  ou  normal.  A  avaliação  por  meio  de  varredura  da  ventilação/perfusão  com  gases  e  macroagregado  de  albumina  marcada  com  radionuclídio  ou  a  angiografia  pulmonar  pode
confirmar o diagnóstico. Em cães e gatos, outras doenças associadas a embolia pulmonar incluem glomerulopatia, hiperadrenocorticismo, anemia hemolítica imunomediada e neoplasia.
Em gatos, a embolia cardiogênica (tromboembolia arterial) é uma grave complicação de cardiomiopatias, inclusive das formas hipertrófica, dilatada, restritiva e aquela não classificada (p. 117). Trombos intracavitários geralmente se
formam  no  átrio  esquerdo  dilatado,  onde  há  estase  do  fluxo,  ou  menos  comumente,  em  áreas  anormais  do  ventrículo  esquerdo.  Embora  esta  condição  seja  pouco  compreendida,  estes  animais  mais  provavelmente  apresentam  algum
distúrbio de hipercoagulação primário porque os gatos com cardiomiopatia não desenvolvem embolia cardiogênica. Partes destes trombos intracavitários podem se desprender e originar êmbolos que ocasionam infarto de ramos arteriais,
mais  comumente  na  bifurcação  aórtica  (êmbolo  em  sela).  Os  sinais  clínicos  incluem  dor  e  paresia  ou  paralisia  de  membros  pélvicos  decorrente  de  lesão  de  neurônio  motor  inferior.  O  pulso  arterial  (ou  femoral  ou  podal)  encontra­se
diminuído  ou  ausente  nos  membros  acometidos,  os  quais  apresentam  temperatura  abaixo  do  normal  e  tumefação  firme  na  parte  ventral  do  músculo.  Esses  sintomas  podem  ser  unilaterais,  bilaterais  ou  bilaterais,  mas  assimétricos.  Os
êmbolos também podem causar infarto de outros leitos arteriais, inclusive do membro torácico direito, renal e esplâncnico, cerebral e miocárdico. A descompensação da doença miocárdica primária não é incomum e pode resultar em
insuficiência cardíaca congestiva (edema pulmonar ou efusão pleural). Isquemia e necrose de músculo de membro pélvico infartado resultam em elevação das atividades séricas de CK e AST. A ecocardiografia é a modalidade de obtenção
de imagem preferida para avaliar a função e as estruturas cardíacas, bem como a presença de um trombo intracardíaco. Estudos da perfusão nucleares, utilizando radioisótopo 99mTc, pode propiciar informação confiável a respeito do grau de
perfusão dos membros pélvicos e da área que pode necessitar amputação.
TRATAMENTO:  O tratamento de endocardite inclui o uso prolongado de antibióticos (várias semanas) e, em alguns casos, administração intermitente de medicação antipirética e anti­inflamatória. A escolha do antibiótico deve se basear nos
resultados da hemocultura e do antibiograma. O prognóstico quanto à recuperação, na melhor das hipóteses, é ruim a reservado; é comum doença cardíaca debilitante persistente mesmo quando a infecção ativa pode ser controlada.
Em equinos e bovinos, o tratamento de trombose venosa geralmente se limita à terapia de suporte, incluindo fluidoterapia, anti­inflamatórios e antimicrobianos sistêmicos, a fim de controlar a sepse secundária. Em equinos, tem­se
realizado com sucesso a remoção cirúrgica da veia jugular acometida por trombose; contudo, a menos que ambas as veias estejam gravemente acometidas, a inflamação regride com o tratamento medicamentoso e a formação de vasos
colaterais geralmente resulta em circulação venosa suficiente. Trombose da veia cava caudal ou cranial resulta em sinais clínicos mais graves, os quais necessitam terapia mais agressiva, inclusive medicamentos trombolíticos ou remoção
intravascular/cirúrgica. A resposta à terapia oral prolongada geralmente é inadequada, resultando em prognóstico desfavorável.
Procedimentos que minimizam traumatismos à veia e contaminação bacteriana continuam sendo o melhor meio de prevenção de trombose venosa. Deve­se ter muito cuidado durante a introdução de cateter ou a aplicação de injeção IV. É
desconhecida a eficácia da terapia antiplaquetária (100 mg de ácido acetilsalicílico/kg, 1 vez/dia), terapia anticoagulante (40 a 80 UI de heparina não fracionada/kg, SC, 2 a 3 vezes/dia) e heparina de baixo peso molecular, com intuito de
facilitar a resolução intrínseca do trombo, mas pelo menos previne a formação adicional de trombo.
Em equinos, os aneurismas causados por Strongylus vulgaris raramente se rompem; a principal preocupação é a ocorrência de tromboembolia em vasos intestinais e, em consequência, cólica. Geralmente, a parede arterial encontra­se
suficientemente envolvida, de forma que é inviável a remoção do trombo. O tratamento antibacteriano e anti­helmíntico com intuito de destruir as larvas migrantes tem valor considerável. Nos equinos, a abordagem mais racional para
trombose mesentérica cranial e aórtico­ilíaca é a prevenção e o controle da estrongilose (p. 360).
Em gatos, o controle agudo de êmbolo aórtico pode ser obtido de várias maneiras. Mais de 50% dos gatos que sobrevivem ao evento cardioembólico recuperam parte da função dos membros pélvicos após 4 a 6 semanas, sem uso de
terapia específica. O tratamento mais agressivo direcionado à dissolução do trombo, com uso de droga tromboembólica ou intervenção reolítica, resulta em melhor recuperação funcional, porém a taxa de sobrevivência não é melhor do que
aquela obtida com terapia conservadora. Em geral, o tratamento conservador consiste em controle da dor (0,08 a 0,03 mg de hidromorfona/kg SC IM ou IV a cada 2 a 6 h; ou 0,005 a 0,01 mg de cloridrato de buprepernofina/kg SC, IM ou
IV, 2 a 4 vezes/dia) e terapia anticoagulante (250 a 375 UI de heparina/kg IV, seguida de 150 a 250 UI/kg, SC, 3 a 4 vezes/dia). O tempo de tromboplastina parcial ativada pode ser utilizado para monitorar a terapia com heparina, cujo
objetivo é obter o valor de 1,5 a 1,7× o valor pré­tratamento. Deve­se utilizar terapia antiplaquetária (75 mg de clopidogrel, VO, uma vez, seguida de 18,75 mg, VO, 1 vez/dia), com intuito de reduzir adicionalmente o risco de trombose;
além disso, pode ser benéfica na formação de circulação colateral. Na terapia trombolítica pode­se incluir estreptoquinase (90.000 UI/gato/IV, ao longo de 20 min, seguida de 45.000 UI na forma de infusão contínua, durante 2 a 24 h),
ativador de plasminogênio tipo tecidual recombinante (tPA, 0,25 a 1 mg/kg/h IV, até dose total de 1 a 10 mg/kg) ou uroquinase (4.400 UI/kg IV ao longo de 10 min, seguida de 4.400 UI/kg/h por 12 h). Esses medicamentos ocasionam
trombólise por transformarem o plasminogênio em plasmina que, subsequentemente, se quebra em bandas de fibrina. A estreptoquinase é considerada um ativador inespecífico do plasminogênio porque ela ativa a fibrina circulante, bem
como a fibrina contida no trombo/êmbolo, a qual pode induzir um estado proteolítico sistêmico, bem como hemorragia. Embora a uroquinase e o tPA sejam mais específicos para fibrina do que a estreptoquinase, também é possível notar
hemorragia com o uso destas drogas. Tem­se mostrado que o emprego de fármacos antiplaquetários, como clopidogrel, acelera a dissolução do trombo e reduz a instalação de nova trombose arterial aguda, em estudos experimentais e em
testes clínicos em pessoas, respectivamente. Todavia, em estudo in vitro com felinos não se constatou diferença significativa na taxa de trombólise. Não se sabe se estes resultados podem ser aplicados à doença clínica natural. Terapia
trombolítica parece dar melhor resultado em gatos com infarto incompleto ou unilateral. Entretanto, estes gatos podem responder bem à terapia conservadora, sem risco de lesão de reperfusão ou custo destes medicamentos. Embora seja
mais provável que um infarto total grave desenvolva lesão de reperfusão com a terapia trombolítica é muito improvável que estes gatos se recuperem apenas com tratamento conservador, de modo que esta pode ser a melhor opção para a
sobrevivência do animal.
A taxa de sobrevivência relatada para infarto aórtico inicial é semelhante quando se compara o uso de terapia conservadora (35 a 39%) e tratamento trombolítico (33%). Gatos com infarto de apenas um membro pélvico respondem muito
melhor (68 a 93%) do que aqueles com infarto bilateral destes membros (15 a 36%), independente do tratamento empregado.
Historicamente, o ácido acetilsalicílico (25 mg/kg, VO, em intervalos de 48 a 72 h, ou 5 mg/gatos, VO, cada 48 a 72 h) tem sido a terapia preventiva mais amplamente utilizada na prevenção de doença cardioembólica de gatos. Inibe de
modo irreversível a agregação plaquetária por meio do impedimento à produção de tromboxano A2. No entanto, atualmente não há evidência de que o ácido acetilsalicílico (ou qualquer droga antitrombótica) previne caso inicial, tampouco
recidiva de cardioembolia. O ácido acetilsalicílico parece relativamente segura em gatos (até 20% dos animais manifestam reações gastrintestinais adversas) e de baixo custo, a menos que manipulada.
O clopidogrel (18,75 mg/gato VO, 1 vez/dia) inibe ambas, a agregação primária e a secundária. Estes efeitos são mais potentes do que aqueles induzidos pelo ácido acetilsalicílico. Também, o clopidogrel prejudica o mecanismo de
liberação de plaquetas, diminuindo a liberação de agentes pró­agregação e vasoconstritores. Reações adversas são raras, mas pode incluir vômito em até 10% de gatos; isso parece ser melhorado administrando o medicamento junto com
alimento. Assim como acontece com o ácido acetilsalicílico, não há evidência clínica objetiva de que o clopidogrel previne eventos cardioembólicos primários ou secundários. Previamente foi utilizado um protocolo com a combinação de
ácido acetilsalicílico e clopidogrel. Embora este protocolo não tenha sido pesquisado objetivamente, parece bem tolerado, apesar do risco hipotético de hemorragia.
A varfarina (0,25 a 0,5 mg/gato, 1 vez/dia) também tem sido utilizada na prevenção de cardioembolia primária ou secundária. A dose é ajustada de modo a prolongar o tempo de protrombina em 1,5 a 1,7× o valor pré­tratamento. Como a
varfarina ocasiona diminuição das proteínas anticoagulantes C e S antes de reduzir os fatores II, VII, IX e X, recomenda­se o tratamento associado à heparina nos primeiros 5 a 7 dias de terapia com varfarina. Problemas relacionados com o
uso de varfarina incluem amplas variações inter e intraindividuais, dificuldade de dosagem devido ao tamanho do comprimido e sangramento, inclusive hemorragia fatal. Em razão destas limitações e da falta de dados clínicos objetivos que
demonstrem sua eficácia a varfarina geralmente é um antitrombótico de segunda escolha para prevenção de evento cardioembólico em gatos.
O tamanho das heparinas de baixo peso molecular (HBPM) é menor do que aquele da heparina não fracionada, mas elas mantêm a capacidade de inibir o fator Xa, com uma marcante redução do fator IIa. A reduzida atividade anti­IIa
propicia  efeito  negligenciável  no  tempo  de  tromboplastina  parcial  ativada.  De  modo  que  é  possível  utilizar  a  mensuração  da  atividade  anti­Xa.  Em  gatos,  tem­se  empregado  a  enoxaparina  (1,0  a  1,5  mg/kg,  SC,  1  a  2  vezes/dia)  e  a
dalteparina  (100  UI/kg,  SC,  1  a  2  vezes/dia).  Estas  drogas  têm  sido  bem  toleradas,  ocorrendo  apenas  hemorragias  raras,  mas  não  foram  realizados  estudos  clínicos  objetivos  para  avaliar  sua  eficácia.  Com  pouca  frequência  esses
medicamentos têm sido combinados com ácido acetilsalicílico ou clopidogrel na tentativa de um efeito antitrombótico mais completo. Esse protocolo parece bem tolerado embora tenha se constatado algum sangramento mínimo.
A taxa de recidiva relatada para gatos submetidos a alguma forma de prevenção antitrombótica varia de 17 a 75%, com uma taxa de recidiva após 1 ano de 25 a 50%. O tempo de sobrevivência média de longa duração após um evento
cardioembólico inicial varia de 51 a 376 dias. Embora esses números possam parecer desanimadores vários destes gatos podem permanecer bem. Eutanásia durante a fase aguda do evento deve­se limitar àqueles animais com infarto grave e
somente após 48 a 72 h de tratamento na ausência de ICC grave ou lesão por reperfusão.
Em  cães,  a  tromboembolia  arterial  é  mais  comumente  associada  a  neoplasia  e  nefropatia  com  perda  de  proteínas.  Há  escassa  experiência  clínica  com  tromboembolia  arterial  em  cães,  mas  há  relato  de  terapia  tromboembólica  com
estreptoquinase, uroquinase e tPA em casos isolados, com sucesso variável. Não há testes clínicos avaliando a eficácia da terapia antitrombótica na prevenção de tromboembolia arterial em cães, mas há relato de protocolos de doses para
ácido acetilsalicílico (0,5 mg/kg, VO, 2 vezes/dia), clopidrogel (1 a 3 mg/kg, VO, 1 vez/dia), varfarina (0,22 mg/kg, VO, 1 vez/dia), dalteparina (100 UI/kg, SC, 1 a 2 vezes/dia) e enoxaparina (1,0 a 1,5 mg/kg, SC, 1 a 2 vezes/dia).
As recomendações terapêuticas para embolia pulmonar em cães são semelhantes àquelas mencionadas para doenças cardioembólicas em gatos. Todavia, não há relato de terapia trombolítica em cães. Relata­se que a administração de
ácido acetilsalicílico (0,5 mg/kg, VO, 1 vez/dia) aumenta a sobrevida de cães com anemia hemolítica imunomediada, quando adicionada à terapia imunossupressora padrão.

* N. do T.: Representa a força de colisão das plaquetas entre si e da plaqueta com uma superfície.
* N. do T.: Vaso a partir do qual todo o sangue coronariano se origina.
SISTEMA DIGESTÓRIO

 INTRODUÇÃO
Achados Clínicos na Doença Gastrintestinal
Exame do Trato Gastrintestinal
Fisiopatologia
Doenças Infecciosas
Controle das Doenças Infecciosas
Tratamento das Doenças Infecciosas
Visão Geral sobre Parasitismo Gastrintestinal
Doenças Não Infecciosas
Princípios Terapêuticos
 ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS
Boca
Cistos e Seios de Cabeça e Pescoço
Dentes
Esôfago
Estômago
Fígado
Hérnias
Intestinos Delgado e Grosso
 DESENVOLVIMENTO DOS DENTES
Estimativa da Idade pelo Exame dos Dentes
 DOENÇAS DO RETO E DO ÂNUS
Doença do Saco Anal
Estenoses Retal e Anorretal
Fístula Perianal
Hérnia Perineal
Lacerações Retais
Neoplasias Retais
Pólipos Retais
Prolapso Retal
Tumores Perianais
 ODONTOLOGIA
Grandes Animais
Anomalias Congênitas e de Desenvolvimento
Anormalidade na Erupção dos Dentes
Cáries Dentárias
Desgaste Irregular dos Dentes
Doença Periodontal
Pequenos Animais
Anormalidades do Desenvolvimento
Cáries Dentárias
Doença Endodôntica
Doença Periodontal
Reabsorção Dentária
Traumatismo Maxilofacial
 PARALISIA DE FARINGE

DOENÇAS BACTERIANAS

 CAMPILOBACTERIOSE INTESTINAL
 CLAMIDIOSES INTESTINAIS
 DOENÇA DE TYZZER
 SALMONELOSE

DOENÇAS PROTOZOÁRIAS

 AMEBÍASE
 COCCIDIOSE
Bovinos
Cães e Gatos
Caprinos
Ovinos
Suínos
 CRIPTOSPORIDIOSE
 GIARDÍASE

GRANDES ANIMAIS

 CÓLICA EM EQUINOS
Doenças Associadas à Cólica devido à Localização Anatômica
Estômago
Intestino Delgado
Intestino Grosso e Ceco
 DOENÇAS HEPÁTICAS EM GRANDES ANIMAIS
Abscessos Hepáticos em Bovinos
Atresia Biliar
Atrofia do Lobo Hepático Direito em Equinos
Colangite
Fibrose Hepática Congênita
Hemocromatose
Hiperamonemia em Potros da Raça Morgan Desmamados
Hiperamonemia Primária em Equinos Adultos
Insuficiência Hepática em Potros
Shunt (Desvio) Portossistêmico
Torção de Lobo Hepático
Hepatite Aguda
Doença Hepática Aguda Idiopática
Necrose Hepática Aguda em Bovinos
Hepatite Infecciosa e Abscessos Hepáticos
Abscessos Hepáticos
Colangioepatite
Doença de Tyzzer
Hemoglobinúria Bacilar
Hepatite Necrótica Infecciosa
Rinopneumonite Equina
Hepatite Crônica Ativa
Hepatotoxinas
Causas Químicas e Medicamentosas de Hepatopatia Tóxica
Intoxicação por Algas Verde­azuladas
Micotoxicoses
Plantas Hepatotóxicas
Hiperlipemia e Lipidose Hepática
Neoplasia Hepática
Síndromes Hiperbilirrubinêmicas
Síndrome de Dubin­Johnson
Síndrome de Gilbert
 DOENÇAS DA CAVIDADE BUCAL EM GRANDES ANIMAIS
 DOENÇAS DO ABOMASO EM GRANDES ANIMAIS
Deslocamento do Abomaso à Esquerda ou à Direita e Vólvulo de Abomaso
Impactação Alimentar no Abomaso
Úlceras de Abomaso
 DOENÇAS DO ESÔFAGO EM GRANDES ANIMAIS
Estenose Esofágica
Neoplasia Esofágica
Obstrução Esofágica
 DOENÇAS DOS PRÉ­ESTÔMAGOS DE RUMINANTES
Acidose Ruminal Subaguda
Fechamento Incompleto da Goteira Esofágica
Indigestão Simples
Paraqueratose Ruminal
Reticuloperitonite Traumática
Síndrome da Indigestão Vagal
Sobrecarga por Grãos
Timpanismo
 DOENÇAS INTESTINAIS EM EQUINOS E POTROS
Doença Diarreica
Colite X
Colopatia Infiltrativa
Diarreia Recidivante
Enterocolite por Clostrídios
Enterocolopatia por Areia
Febre Equina de Potomac
Parasitismo
Salmonelose
Causas Variadas de Diarreia
Doença Diarreica em Potros
Diarreia Bacteriana em Potros
Diarreia do Cio em Potros
Diarreia Viral em Potros
Miscelânea de Causas de Diarreia em Potros
Perda de Peso e Hipoproteinemia
Doença Intestinal Inflamatória
Fibrose de Intestino Delgado
Neoplasia Gastrintestinal
Toxicidade de Anti­inflamatórios Não Esterórides
 DOENÇAS INTESTINAIS EM RUMINANTES
Bovinos
Diarreia Viral Bovina e Complexo da Doença das Mucosas
Disenteria de Inverno
Síndrome do Jejuno Hemorrágico
Outras Doenças Intestinais em Bovinos
Ovinos e Caprinos
Doença da Boca Úmida em Cordeiros
Diarreia em Ruminantes Neonatos
 DOENÇAS INTESTINAIS EM SUÍNOS
Colibacilose Intestinal
Diarreia Epidêmica Suína
Disenteria Suína
Doença do Edema
Enterite por Clostridium difficile
Enterite por Clostridium perfringens Tipo A
Enterite por Clostridium perfringens Tipo C 338
Enterite por Rotavírus
Enterite por Streptococcus dispar
Enterite Proliferativa Suína
Espiroquetose Intestinal
Estenose Retal
Gastrenterite Transmissível
Parasitismo
Salmonelose Intestinal
Síndrome do Intestino Hemorrágico
Outras Viroses Intestinais em Suínos
 INFECÇÕES POR TREMATÓDEOS EM RUMINANTES
Dicrocoelium dendriticum
Eurytrema spp
Fasciola hepatica
Fasciola gigantica
Fascioloides magna
Paranfístomos
 NECROSE DE GORDURA ABDOMINAL
 OBSTRUÇÕES INTESTINAIS AGUDAS EM GRANDES ANIMAIS
 PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE EQUINOS
Cestóideos
Gasterophilus
Grandes Estrôngilos
Habronema
Oxyuris
Parascaris sp
Pequenos Estrôngilos
Strongyloides sp
Trichostrongylus sp
 PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE RUMINANTES
Bovinos
Bunostomum sp
Cestóideos
Chabertia sp
Cooperia sp
Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus spp
Nematodirus spp
Oesophagostomum sp
Strongyloides sp
Toxocara sp
Trichuris spp
Ovinos e Caprinos
Bunostomum e Gaigeria spp
Cestóideos
Chabertia sp
Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus spp
Nematodirus spp
Oesophagostomum sp
Strongyloides sp
Trichuris spp
Tricostrongilose Intestinal
 PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE SUÍNOS
Ascaris sp
Macracanthorhynchus sp
Oesophagostomum spp
Strongyloides sp
Trichuris sp
Vermes de Estômago
 SÍNDROMES DA MÁ ASSIMILAÇÃO
 ÚLCERAS GASTRINTESTINAIS
Equinos
Suínos

PEQUENOS ANIMAIS

 DOENÇAS DA CAVIDADE BUCAL
Distúrbios Salivares
Fístula Salivar
Hipersialose Responsiva ao Fenobarbital
Mucocele salivar
Necrose da Glândula Salivar em Cães
Ptialismo
Sialoadenite
Sialometaplasia Necrosante
Tumores de Glândulas Salivares
Xerostomia
Doenças Inflamatórias e Ulcerativas da Cavidade Bucal
Complexo Granuloma Eosinofílico
Dermatite da Dobra Labial e Queilite
Estomatite Micótica
Estomatite Posterior Felina
Estomatite Ulcerativa Crônica
Gengivite Ulcerativa Necrosante Aguda
Glossite
Traumatismo de Tecidos Moles
Verrugas Virais e Papilomas
Tumores Bucais
 DOENÇAS DE ESTÔMAGO E INTESTINOS DE PEQUENOS
Colite
Constipação Intestinal e Obstipação
Coronavirose Intestinal Felina
Dilatação Gástrica e Vólvulo
Doença Intestinal Inflamatória
Gastrenterite Hemorrágica
Gastrite
Infecção por Helicobacter
Neoplasias Gastrintestinais
Obstrução Gastrintestinal
Parvovirose Canina
Síndromes de Má Absorção
Úlceras Gastrintestinais
 DOENÇAS DO ESÔFAGO
Acalasia Cricofaringiana
Alteração da Motilidade Esofágica
Corpos Estranhos Esofágicos
Dilatação Esofágica
Divertículos Esofágicos
Esofagite
Estenose Esofágica
Fístula Broncoesofágica
 DOENÇAS HEPÁTICAS
Colecistite
Colelitíase
Infecção Hepatobiliar por Fascíola
Mucocele da Vesícula Biliar em Cães
Obstrução do Ducto Biliar Extra­hepático
Outras Anormalidades dos Ductos Biliares
Outros Distúrbios da Vesícula Biliar
Síndrome Colangioepatite/Colangite Felina
Ruptura de Trato Biliar e Peritonite Biliar
Doenças da Vesícula Biliar e do Sistema Biliar Extra­hepático
Cirrose Biliar
Colangioepatite Canina
Desvios (Shunts)
Doenças Hepáticas Infecciosas
Doenças Hepáticas Variadas
Amiloidose Hepática
Doença do Armazenamento de Glicogênio
Doenças Metabólicas que Acometem o Fígado
Encefalopatia Hepática
Hepatite Crônica Canina
Hepatite Crônica Específica de Raça
Hepatite Crônica Idiopática
Hepatopatia Associada ao Cobre
Hepatite Dissecante Lobular
Hepatopatia Vacuolar Canina
Hepatotoxinas
Hiperplasia Nodular
Hipertensão Portal e Ascite
Insuficiência Hepática Fulminante
Lipidose Hepática Felina
Malformações Vasculares Portossistêmicas
Neoplasias Hepáticas
Outras Anomalias Vasculares Hepáticas
Fístula Arteriovenosa Hepática
Obstrução do Fluxo Venoso Hepático
Síndrome Hepatocutânea
Exames Laboratoriais e por Imagem
Alterações Patológicas na Bile
Atividade Enzimática
Biopsia Hepática
Citologia Hepática
Colecistocentese
Hematologia
Imagens
Outros Testes Bioquímicos Séricos
Testes de Coagulação
Testes de Função Hepática
 PÂNCREAS EXÓCRINO
Abscessos Pancreáticos
Insuficiência Pancreática Exócrina
Neoplasias Pancreáticas
Pancreatite
Pseudocisto Pancreático
 PARASITOS GASTRINTESTINAIS
Acantocéfalos
Macracanthorhynchus sp
Oncicola sp
Ancilóstomos
Fascíolas
Fascíolas Hepáticas
Fascíolas Intestinais
Nematoides
Ollulanus sp
Physaloptera spp
Spirocerca lupi
Strongyloides sp
Tênias
Vermes Redondos
 VÔMITO

SISTEMA DIGESTÓRIO – INTRODUÇÃO

O trato digestório inclui a cavidade bucal e órgãos associados (lábios, dentes, língua e glândulas salivares), esôfago, pré­estômagos (retículo, rúmen, omaso) em ruminantes, estômago verdadeiro em todas as espécies, intestino delgado, fígado, pâncreas
exócrino, intestino grosso, reto e ânus. O tecido linfoide associado ao intestino (tonsilas, placas de Peyer, tecido linfoide difuso) está presente ao longo de todo trato GI. O peritônio recobre as vísceras abdominais e está envolvido em várias doenças GI.
Medidas fundamentais no manejo de doenças GI devem ser sempre direcionadas para localizar o segmento acometido e determinar a causa. Dessa forma, um protocolo terapêutico pode ser estabelecido.

Achados Clínicos na Doença Gastrintestinal
Os achados clínicos incluem salivação excessiva, diarreia, constipação intestinal ou fezes escassas, vômito, regurgitação, hemorragia de trato GI, distensão e dor abdominal, tenesmo, choque, desidratação e prejuízo ao desenvolvimento. A localização e a
origem das lesões que causam disfunção geralmente podem ser determinadas por meio do reconhecimento e da interpretação dos sintomas clínicos. Além disso, anormalidades de preensão, mastigação e deglutição na maioria das vezes estão associadas a
doenças de mucosa bucal, dentes, mandíbula ou outras estruturas ósseas da cabeça ou esôfago. O vômito é mais comum em animais monogástricos e comumente ocorre devido à gastrenterite ou doenças não alimentares (p. ex., uremia, piometra, doenças
endócrinas). A regurgitação pode ser indicativa de doença de orofaringe ou esôfago e não é acompanhada de náuseas, observada no vômito.
Diarreia  aquosa  em  grande  quantidade  geralmente  está  associada  à  hipersecreção  (colibacilose  enterotoxigênica  em  bezerros  recém­nascidos)  ou  à  má  absorção  (osmótica).  A  presença  de  sangue  e  fibrina  nas  fezes  indica  enterite  hemorrágica
fibrinonecrótica do intestino delgado ou intestino grosso, por exemplo, diarreia viral bovina, coccidiose, salmonelose ou disenteria suína. Fezes escuras (melena) indicam hemorragia gástrica ou da parte inicial do intestino delgado. Tenesmo de origem
gastrintestinal geralmente está associado à doença inflamatória de reto ou ânus.
Fezes amolecidas e em pequena quantidade podem indicar obstrução intestinal parcial. Distensão abdominal pode resultar de acúmulo de gás, fluido ou ingesta, geralmente devido à hipomotilidade (obstrução funcional, íleo adinâmico) ou à obstrução
física (p. ex., corpo estranho ou intussuscepção). Ingestão excessiva também pode causar distensão. Um som de “ping” percebido durante a auscultação e percussão do abdome indica uma víscera preenchida por gás. O início súbito de distensão abdominal
grave em ruminantes adultos geralmente é decorrente de timpanismo ruminal. Balotamento e sucussão podem revelar ruídos que lembram “balanço de líquido” quando o rúmen ou intestino estão repletos de fluidos. Graus variáveis de desidratação e de
desequilíbrio eletrolítico e ácido­base, que podem levar ao choque, são observados quando há perda de grande quantidade de líquido (p. ex., diarreia ou sequestro em caso de obstrução intestinal) ou em vólvulo de abomaso ou estômago.
Dor abdominal é decorrente de estiramento ou inflamação da superfície serosa de vísceras abdominais ou do peritônio; pode ser aguda ou subaguda e sua manifestação varia de acordo com a espécie. Em equinos é comum dor abdominal aguda (ver p.
226). Dor subaguda é mais comum em bovinos e caracteriza­se por relutância ao movimento ou à palpação abdominal profunda, bem como ronco durante a respiração. Dor abdominal em cães e gatos pode ser aguda e subaguda e caracteriza­se por ganido,
miado e posturas anormais (membros torácicos esticados, esterno apoiado ao chão e membros pélvicos elevados).
Tabela 1 – Diferenciação entre diarreia de intestino delgado e diarreia de intestino grosso

Sinal clínico Intestino delgado Intestino grosso

Frequência de defecação Normal ou ligeiramente aumentada Bastante frequente


Volume fecal Grande quantidade; fezes volumosas Pequena quantidade
ou fezes aquosas frequentes
Urgência Ausente Geralmente presente
Tenesmo Ausente Geralmente presente
Muco nas fezes Geralmente ausente Frequente

Sangue nas fezes Escurecidas (melena) Avermelhadas (fresco)


Perda de peso Pode ser notada Rara

Exame do Trato Gastrintestinal
Anamnese completa e acurada e exame clínico de rotina geralmente permitem definir o diagnóstico. Ao surgimento de doença do trato GI em animais de produção, a anamnese e os achados epidemiológicos são de suma importância. Se a anamnese e os
achados clínicos e epidemiológicos forem compatíveis com doença GI deve­se localizar a porção acometida e identificar o tipo de lesão e sua causa.
Por meio de anamnese, exame físico e características das fezes é possível determinar se a alteração se localiza no intestino grosso ou intestino delgado (Tabela 1). Esta distinção é importante, pois restringe a lista de diagnósticos diferenciais e norteia a
investigação adicional sobre a doença.
As técnicas de exame clínico e de exames laboratoriais e suas aplicações incluem: 1) inspeção visual da cavidade bucal e da conformação abdominal quanto à distensão e contração; 2) palpação da parede abdominal ou palpação retal para avaliar forma,
tamanho e posição de víscera abdominal; 3) percussão abdominal para detectar ruído de “ping”, que sugerem vísceras preenchidas por gás; 4) auscultação para determinar a intensidade, frequência e duração dos movimentos GI, bem como ruído que lembra
“balançar de fluido” associado a estômago e intestinos preenchidos por líquido e ruídos de acúmulo de líquido relacionado com doenças diarreicas; 5) sucussão para revelar ruído indicativo de presença de líquido; 6) balotamento para avaliar densidade e
tamanho de órgãos abdominais, mediante movimento de “ir e vir” aplicado à parede abdominal; e 7) avaliação macroscópica das fezes para estimar seu volume, consistência, cor e presença de muco, sangue ou partículas de alimento não digerido.
O exame microscópico inclui pesquisa de parasitos. Citologia de esfregaço da mucosa retal ou do cólon corada com novo azul de metileno ou com corante de Wright para leucócitos fecais é útil na detecção de doença intestinal inflamatória. Os seguintes
exames podem ser úteis (ou necessários): 1) cultura bacteriana e isolamento viral; 2) endoscopia para visualizar a superfície mucosa de esôfago, estômago, duodeno, cólon e reto; 3) abdominocentese, para coleta de fluido de uma víscera distendida ou da
cavidade peritoneal, para avaliação; 4) radiografia (contrastada) para diagnosticar doença obstrutiva; 5) ultrassonografia abdominal a fim de detectar massas abdominais, intussuscepção e linfadenopatia mesentérica em pequenos animais e para a pesquisa de
doenças  abdominais  em  cavalos  e  vacas;  6)  biopsia  (endoscópica,  laparoscópica,  guiada  por  ultrassom,  cirúrgica)  para  obtenção  de  amostras  para  exame  microscópico  (amostras  de  intestinos  e  fígado  são  úteis  no  diagnóstico  de  enterite  crônica  e
hepatopatia); e 7) testes das funções digestivas e de absorção para estimar e diferenciar má absorção e má digestão. Testes comuns de absorção incluem mensurações das concentrações séricas de cobalamina (vitamina B12) e folato. Além disso, em pequenos
animais, concentração sérica elevada de folato juntamente com redução do teor de cobalamina é compatível com supercrescimento bacteriano no intestino delgado. A função pancreática pode ser avaliada pela determinação da imunorreatividade semelhante
à tripsina sérica e da concentração sérica de lipase canina específica do pâncreas; laparotomia e biopsia podem ser indicadas quando o diagnóstico não foi elucidado ou quando pode ser necessária correção cirúrgica.

Fisiopatologia
A função motora anormal geralmente se manifesta como diminuição da motilidade. A resistência segmentar está normalmente reduzida e o trânsito gastrintestinal aumentado. A motilidade depende de estimulação pelo sistema nervoso simpático e sistema
nervoso parassimpático (e dessa forma das atividades central e periférica destes sistemas) e da musculatura GI e de seus plexos nervosos intrínsecos. A debilidade, acompanhada de fraqueza da musculatura, peritonite aguda e hipopotassemia, causam atonia
da parede intestinal (íleo adinâmico). O intestino distende­se com fluido e gás e a evacuação fecal é reduzida. Além disso, a estase crônica do intestino delgado pode predispor à proliferação anormal da microflora. Este supercrescimento bacteriano pode
causar má absorção por lesão das células mucosas, por competição por nutrientes e por desconjugação de sais biliares e hidroxilação dos ácidos graxos.
O vômito (p. 519) é um ato reflexo neural que resulta na ejeção de alimento e fluido do estômago através da cavidade bucal. Está sempre associado a eventos antecedentes, como náuseas, salivação e tremores e é acompanhado de contrações repetidas dos
músculos abdominais.
Tabela 2 – Patógenos do trato gastrintestinal comuns

  Bovinos, Ovinos e Caprinos Suínos Equinos Cães e Gatos

Vírus Diarreia viral bovina, rotavírus, coronavírus, peste Gastrenterite transmissível, circovírus suíno tipo Rotavírus, estomatite vesicular Parvovirose canina, coronavirose canina, vírus da panleucopenia felina, coronavirose intestinal felina,


bovina, febre catarral maligna, língua azul, febre II, vírus da diarreia epidêmica suína, rotavírus, rotavirose canina e felina, astrovirose canina e felina
aftosa febre aftosa, estomatite e exantema vesicular
Riquétsias Neorickettsia risticii (febre equina de Potomac Neorickettsia helminthoeca (intoxicação de cães por salmão)
[erliquiose monocítica equina])
Bactérias E. E. E. Salmonella spp, Yersinia enterocolitica, Campylobacter jejuni, Bacillus piliformis,
coli enterotoxigênica, Salmonella spp, Mycobacterium coli enterotoxigênica, Salmonella spp, Brachyspira coli enterotoxigênica, Salmonella spp, Rhodococcus Clostridium spp, Mycobacterium spp, Shigella spp
paratuberculosis, Fusobacterium necrophorum, hyodysenteriae e Clostridium perfringens tipos B e equi, Actinobacillus equuli, Clostridium
Clostridium perfringens (tipos B, C e C, Lawsonia intracellularis, Clostridium difficile perfringens tipos B e C
D), Actinobacillus lignieresii, Yersinia
enterocolitica e Campylobacter jejuni
Protozoários Eimeria spp e Cryptosporidium spp Eimeria spp e Isospora suis Eimeria spp Isospora spp, Sarcocystis spp, Besnoitia spp, Hammondia sp, Toxoplasma sp, Giardia sp, Trichomonas spp,
Entamoeba histolytica, Balantidium coli, Cryptosporidium spp

Fungos Candida spp (bovinos) Candida spp Aspergillus fumigatus Histoplasma capsulatum, Aspergillus spp, Candida albicans, ficomicetos


Algas Prototheca spp Prototheca spp Prototheca spp Prototheca spp
Parasitos Ver parasitas gastrointestinais de ruminantes, p. 362 Ver parasitas gastrointestinais de suínos, p. 375 Ver parasitas gastrointestinais de equinos, p. 356 Ver parasitas gastrintestinais de pequenos animais, p. 498
(helmintos)

A regurgitação caracteriza­se por refluxo retrógrado e passivo de material previamente ingerido, proveniente do esôfago, estômago ou rúmen. Em doenças esofágicas, o material ingerido pode não atingir o estômago.
Uma das principais consequências da motilidade alterada é a distensão por fluido e gás. A maior parte do fluido acumulado constitui­se de saliva e sucos gástrico e intestinal secretados durante a digestão normal. Distensão causa dor e espasmo reflexo dos
segmentos intestinais adjacentes. Além disso, provoca secreção adicional de fluido no lúmen intestinal, o que exacerba a situação. Quando a distensão excede um ponto crítico, a habilidade de resposta da musculatura da parede é reduzida, a dor inicial
desaparece e se desenvolve íleo adinâmico, no qual se perde todo o tônus muscular GI.
Desidratação, desequilíbrio ácido­base e eletrolítico e insuficiência circulatória são as principais consequências da distensão GI. O acúmulo de fluidos intestinais estimula a secreção adicional de fluidos e eletrólitos no segmento anterior do intestino, o que
pode agravar as anormalidades e ocasionar choque.
Dor abdominal associada à doença GI normalmente é causada por distensão da parede intestinal. Contração intestinal causa dor por distensão reflexa e direta dos segmentos adjacentes. Espasmo, uma contração segmentar exagerada de uma porção do
intestino, resulta em distensão da região imediatamente anterior, quando surge uma onda peristáltica. Outros fatores que podem causar dor abdominal incluem edema e falha no suprimento sanguíneo local, como embolia local e torção mesentérica.
Doenças específicas causam diarreia por mecanismos característicos e variados, e o reconhecimento destes é útil na compreensão, no diagnóstico e no tratamento dos distúrbios GI. Os principais mecanismos de diarreia são aumento da permeabilidade,
hipersecreção e osmose. Os distúrbios de motilidade geralmente são secundários. Em animais saudáveis, água e eletrólitos são constantemente transportados através da mucosa intestinal. A secreção (do sangue para o intestino) e absorção (do intestino para o
sangue) ocorrem simultaneamente. Em animais clinicamente normais, a absorção excede a secreção, isto é, há maior absorção. A inflamação intestinal pode ser acompanhada de aumento do “tamanho do poro” da mucosa, o que permite maior fluxo através
da membrana (“vazamento”), abaixo do gradiente de pressão do sangue, para o lúmen intestinal. Ocorre diarreia se a quantidade de exsudato excede a capacidade de absorção do intestino. O tamanho da partícula que atravessa a mucosa varia de acordo com
a magnitude do aumento do tamanho do poro. Um aumento significativo no tamanho do poro permite exsudação de proteína plasmática, o que resulta em enteropatia com perda proteica (p. ex., linfangiectasia em cães, paratuberculose em bovinos, infestação
por nematódeos). Maiores aumentos da permeabilidade resultam em perda de hemácias, causando diarreia hemorrágica (p. ex., gastrenterite hemorrágica, infecção por parvovírus, intensa infestação de ancilóstomos).
A hipersecreção é uma perda intestinal final de fluidos e eletrólitos independente de alterações na permeabilidade, na capacidade de absorção, ou no gradiente osmótico induzido por fatores exógenos. Colibacilose enterotóxica é um exemplo de doença
diarreica devido à hipersecreção intestinal; Escherichia coli enterotoxigênica produz enterotoxina que estimula o epitélio das criptas intestinais a secretar fluido além da capacidade de absorção dos intestinos. As vilosidades intestinais, juntamente com suas
capacidades digestiva e de absorção, permanecem intactas. O fluido secretado é isotônico, alcalino e livre de exsudatos. A integridade das vilosidades intestinais é benéfica, pois ocorre absorção de um fluido (administrado por via oral) que contenha glicose,
aminoácidos e sódio, mesmo havendo hipersecreção.
Nota­se diarreia osmótica quando a absorção inadequada resulta em acúmulo de solutos no lúmen intestinal, o que causa retenção de água por sua atividade osmótica. Isto ocorre em qualquer condição que resulte em má digestão e má absorção de
nutrientes.
Má absorção (ver p. 379 e p. 426) é uma falha na digestão e absorção devido a algum defeito nas células digestivas e de absorção das vilosidades, as quais são células maduras que recobrem as estas vilosidades intestinais. Diversas viroses epiteliotrópicas,
por exemplo, coronavírus, vírus da gastrenterite transmissível suína e rotavírus em bezerros, atingem e destroem as células epiteliais de absorção das vilosidades ou seus precursores. O vírus da panleucopenia felina e o parvovírus canino destroem o epitélio
da cripta intestinal, o que resulta em falha da renovação das células de absorção das vilosidades e colapso destas vilosidades; a regeneração é um processo mais longo após infecção por parvovírus do que após a infecção viral das extremidades do epitélio das
vilosidades (p. ex., coronavírus, rotavírus). A má absorção intestinal também pode ser causada por qualquer evento que prejudique a capacidade de absorção, como doenças inflamatórias difusas (p. ex., enterite linfocítica­plasmocítica, enterite eosinofílica)
ou neoplasia (p. ex., linfossarcoma).
Outros exemplos de má absorção incluem alteração da secreção pancreática que resultam em má digestão. Raramente, devido à falha na digestão de lactose (a qual, em grande quantidade tem efeito hiperosmótico), crias neonatas de animais de produção
ou filhotes podem desenvolver diarreia quando alimentados com leite. Secreção reduzida de enzimas digestivas na superfície das células das vilosidades é característica de infecção viral epiteliotrópica observada em animais de produção.
A capacidade do trato GI em digerir o alimento depende de funções motoras e secretoras e, em herbívoros, da atividade da microflora dos pré­estômagos, em ruminantes, ou do ceco e cólon, em equinos e suínos. A flora dos ruminantes pode digerir
celulose,  fermentar  carboidratos  em  ácidos  graxos  voláteis  e  converter  substâncias  nitrogenadas  em  amônia,  aminoácidos  e  proteínas.  Em  algumas  circunstâncias,  a  atividade  da  flora  pode  ser  suprimida  ao  ponto  de  alterar  ou  cessar  a  digestão.  Dieta
inadequada, jejum prolongado ou inapetência e hiperacidez (como ocorre na ingestão aumentada de grãos) prejudicam a digestão microbiana. Bactérias, leveduras e protozoários também podem ser negativamente acometidos pela administração bucal de
drogas antimicrobianas ou que alteram significativamente o pH do conteúdo ruminal.
Função
As principais funções do trato GI incluem preensão de alimento e água, mastigação, salivação e deglutição do alimento; digestão do alimento e absorção de nutrientes; manutenção do equilíbrio hídrico e eletrolítico; e evacuação dos produtos residuais. Há
quatro funções principais – digestão, absorção, motilidade e defecação – e quatro modalidades principais de disfunções correspondentes.
A motilidade normal do trato GI envolve peristalse – atividade muscular que move a ingesta do esôfago ao reto; movimentos de segmentação que revolvem e misturam a ingesta; resistência segmentar e tônus do esfíncter, que retardam a progressão aboral
do conteúdo intestinal. Em ruminantes, esses movimentos são de grande importância no funcionamento normal dos pré­estômagos.

DOENÇAS INFECCIOSAS
O trato GI está sujeito a infecções por vários patógenos, que representam a principal causa de perda econômica devido a enfermidades, prejuízo ao desenvolvimento e óbito (ver Tabela 2). Estas infecções disseminam­se por contato direto ou pela via fecal­
bucal. Muitos dos patógenos são parte da flora intestinal normal e as doenças se instalam somente após um evento estressante, por exemplo, salmonelose em equinos após transporte, anestesia prolongada ou cirurgia. A flora intestinal se estabelece poucas
horas após o nascimento, o que enfatiza a importância da ingestão precoce de colostro para propiciar proteção contra sepse e infecção intestinal.
O diagnóstico etiológico definitivo de doença infecciosa do sistema digestório depende da identificação do microrganismo no trato GI ou nas fezes do animal doente. Nas epidemias de rebanho, como um surto de diarreia aguda de origem indeterminada
em bezerros recém­nascidos ou em leitões, o melhor momento para estabelecer um diagnóstico é a fase inicial da doença mediante a escolha de animais não tratados e envio destes para necropsia e exame microbiológico detalhado da flora intestinal. Quando
a necropsia seletiva não é uma opção, uma série de amostras de fezes coletadas diariamente deve ser enviada para o laboratório de diagnóstico, com a requisição de técnicas especiais de cultura, de acordo com a doença infecciosa da qual se suspeita. Testes
ELISA foram desenvolvidos para demonstrar a presença de antígeno viral, bacteriano ou protozoário nas fezes, o que pode propiciar um diagnóstico definitivo (p. ex., parvovirose canino, salmonelose, criptosporidiose).

Controle das Doenças Infecciosas
O controle efetivo das doenças infecciosas comuns do trato GI depende da prática de boas medidas sanitárias e de higiene, assegurando o desenvolvimento e a manutenção da resistência inespecífica do animal e, em certos casos, propiciar imunidade
específica por meio de vacinação das fêmeas prenhes ou de animais suscetíveis.
Medidas  sanitárias  e  de  higiene  efetivas  são  obtidas  principalmente  pela  disponibilização  de  espaço  adequado  aos  animais,  limpeza  regular  de  currais  e  remoção  adequada  do  esterco  do  ambiente.  O  desenvolvimento  e  manutenção  de  resistência
inespecífica dependem de uma seleção genética de animais com grau razoável de resistência inerente, bem como de provisão de nutrientes e abrigos adequados, que minimizam o estresse e permitam que os animais cresçam e se comportem normalmente.
Animais  infectados,  mas  clinicamente  normais,  que  podem  eliminar  patógenos  por  semanas  ou  meses,  é  o  maior  problema  relacionado  com  algumas  doenças  infecciosas  do  trato  GI,  como  por  exemplo,  salmonelose.  Preferivelmente,  esses  animais
portadores devem ser identificados por meio de testes microbiológicos e isolados do restante do rebanho, até ficarem livres da infecção, ou serem descartados.
Algumas doenças (p. ex., colibacilose enterotoxigênica em bezerros e leitões) podem ser controladas por vacinação das fêmeas prenhes algumas semanas antes do parto. Este método depende dos níveis de anticorpos protetores obtidos no colostro. Há
exceções, mas em muitos casos a imunidade sistêmica propicia baixa proteção contra enterites infecciosas; a imunidade efetiva contra doenças GI depende da estimulação da imunidade intestinal local no período neonatal. Durante esse período, a proteção
pode ser propiciada pela ação local de anticorpos de origem materna. Por exemplo, a secreção de IgA aumenta progressivamente no leite de porcas, desde o momento do parto até o desmame, propiciando ao leitão proteção diária durante o período de
aleitamento.

Tratamento das Doenças Infecciosas
Medicamentos antimicrobianos são utilizados no tratamento de doenças bacterianas e anti–helmínticos são empregados para doenças parasitárias. Não há terapia específica para infecções virais. Antimicrobianos são geralmente administrados diariamente
por VO, durante vários dias, até a recuperação aparente, porém, há poucas evidências relevantes de sua eficácia. Há relatos de que sobredose ou tratamento bucal prolongado pode ser prejudicial (supercrescimento bacteriano, atrofia de vilosidades). A
administração parenteral de antimicrobianos é indicada quando há risco de sepse ou essa já se instalou. A escolha do antimicrobiano depende da suspeita clínica, de resultados prévios e do custo. Nas epidemias em rebanhos os antimicrobianos podem ser
adicionados ao alimento ou água, em dose terapêutica, por vários dias, seguida de dose preventiva por um período longo, dependendo da pressão de infecção na população. O medicamento deve ser adicionado também ao alimento e à água fornecidos aos
animais que têm contato com os doentes, como tentativa de evitar a ocorrência de novos casos. (Ver p. 2565).

Visão Geral sobre Parasitismo Gastrintestinal
O trato GI pode ser habitado por várias espécies de parasitos. Seus ciclos podem ser diretos, nos quais ovos e larvas são eliminados nas fezes e os estágios de desenvolvimento ocorrem até a fase infectante, quando é ingerida pelo hospedeiro final. Por outro
lado, a forma imatura pode ser ingerida por um hospedeiro intermediário (geralmente um invertebrado), no qual posteriormente ocorre o desenvolvimento; adquire­se a infecção quando o hospedeiro final ingere o hospedeiro intermediário ou a larva de vida
livre.  Às  vezes,  não  há  desenvolvimento  no  hospedeiro  intermediário  e  neste  caso  tem­se  o  hospedeiro  paratênico  ou  de  transporte,  dependendo  se  as  larvas  encontram­se  encapsuladas  ou  nos  tecidos.  O  parasitismo  clínico  depende  do  número  e  da
patogenicidade dos parasitos, que varia em função do potencial biótico destes agentes ou, em alguns casos, de seus hospedeiros intermediários, do clima e das práticas de manejo. No hospedeiro, resistência, idade, nutrição e doença concomitante também
influenciam o curso de uma infecção parasitária. A importância econômica do parasitismo subclínico em animais de produção é também determinada pelos fatores acima citados e sabe­se que animais levemente parasitados e que não mostram evidências
clínicas da doença têm menor desempenho nos lotes de engorda, ordenha e abate.
No  parasitismo  leve  a  moderado,  a  conversão  alimentar  é  influenciada  negativamente  e  em  especial  devido  à  redução  do  apetite  e  mau  aproveitamento  de  fontes  de  proteínas  e  energia  absorvidas.  A  qualidade  e  o  tamanho  da  carcaça  também  são
acometidos, o que diminui o retorno financeiro. Endoparasitas em animais de companhia podem causar doença grave ou emagrecimento esteticamente indesejável. Além disso, alguns desses parasitos também infectam as pessoas.
Como as parasitoses são facilmente confundidas com outras condições debilitantes, o diagnóstico depende muito do caráter sazonal das infecções parasitárias, da anamnese prévia do rebanho e de exames de fezes para pesquisa de oocistos, de ovos de
vermes ou de larvas. Aumento do teor sérico de pepsinogênio pode sustentar o diagnóstico de infecção do abomaso, assim como a elevação das atividades séricas das enzimas hepáticas pode sugerir infecção por Fasciola hepatica. ELISA e outras técnicas
sorológicas  (inclusive  anticorpos  monoclonais)  estão  sendo  desenvolvidas.  O  sorodiagnóstico  provavelmente  será  cada  vez  mais  utilizado  à  medida  que  melhora  a  especificidade  dos  testes.  Estes  testes  devem  ser  especialmente  úteis  em  animais  de
companhia que abrigam parasitos que causam zoonoses.
Os avanços na epidemiologia (particularmente em relação aos fatores que influenciam o desenvolvimento sazonal dos estágios parasitários de vida livre e sua sobrevivência), juntamente com a descoberta de anti­helmínticos de amplo espectro altamente
eficientes, tornaram possível e prático o tratamento e o controle bem­sucedidos dos parasitos GI. A resposta à terapia geralmente é rápida e os tratamentos em dose única costumam ser eficientes, a menos que ocorra reinfecção ou as lesões sejam graves. O
controle preventivo em grandes animais na maioria das vezes é obtido pela combinação de manejo da pastagem e uso de anti­helmínticos. A melhora nos métodos de administração de anti­helmínticos (p. ex., método pour on ou droga de longa ação ou de
liberação em pulso) também tem sido útil. As estratégias para evitar o parasitismo e as perdas de produção relacionadas fazem parte de qualquer programa moderno de saúde de rebanho, de plantel ou de haras. Programas preventivos semelhantes também
são importantes no controle de parasitoses em animais de estimação. O controle por meio de vacinação se limita aos vermes pulmonares; a vacina para bovinos encontra­se disponível em diversos países europeus e vacinas para ovinos em partes da Europa
Oriental e Oriente Médio.
Para estimar a carga parasitária, ver p. 1785.

DOENÇAS NÃO INFECCIOSAS
As principais causas de doenças não infecciosas do trato GI incluem sobrecarga alimentar ou indigestão alimentar, agentes químicos ou físicos, obstrução de estômago e intestinos causada por ingestão de corpo estranho ou por qualquer deslocamento ou
lesão no trato GI que interfira no fluxo da ingesta, deficiências enzimáticas, anormalidades na mucosa que alteram a função normal (p. ex., úlcera gástrica, doença intestinal inflamatória, atrofia de vilosidades, neoplasias) e defeitos congênitos. Sintomas GI,
como vômito e diarreia, podem ser secundários a doenças sistêmicas ou metabólicas, como uremia, hepatopatia e hipoadrenocorticismo. Há desconhecimento das causas de diversas doenças, como úlcera de abomaso em bovinos, úlcera gástrica em suínos e
potros, torção gástrica em cães e obstrução intestinal aguda e deslocamento de abomaso em bovinos. Nas doenças não infecciosas do trato GI normalmente apenas um animal é acometido por vez; as exceções são doenças associadas à ingestão excessiva de
alimento ou intoxicação, e nestes casos, são comuns surtos no rebanho.

PRINCÍPIOS TERAPÊUTICOS
Ver farmacoterapia sistêmica do sistema digestório de monogástricos e ruminantes, p. 2565 e p. 2582.
Embora o objetivo principal seja eliminar a causa da doença, a maioria dos tratamentos é de suporte e sintomático, com intuito de aliviar a dor, corrigir anormalidades e propiciar a cura.
A eliminação da causa primária pode envolver o uso de antimicrobianos, coccidiostáticos, antifúngicos, anti­helmínticos, antídotos contra substância tóxicas ou correção cirúrgica de deslocamentos.
A  correção  da  motilidade,  aumentada  ou  diminuída,  parece  racional,  mas  frequentemente  a  origem  e  o  grau  da  alteração  da  motilidade  são  desconhecidos;  além  disso,  os  fármacos  disponíveis  podem  não  mostrar  resultados  consistentes.  Há  pouca
evidência  clínica  para  recomendação  de  uso  rotineiro  de  fármacos  anticolinérgicos  ou  opiáceos  para  diminuir  o  trânsito  intestinal.  Esse,  se  reduzido,  pode  se  contrapor  ao  mecanismo  de  defesa  da  diarreia,  que  promove  eliminação  de  microrganismos
prejudiciais e de suas toxinas. Em geral, o uso de anticolinérgicos justifica­se apenas para alívio sintomático breve de dor e tenesmo associados a doenças inflamatórias de cólon e reto. Em alguns distúrbios da motilidade gástrica ou do cólon, os fármacos
procinéticos (p. ex., metoclopramida, eritromicina) podem ser úteis.
A  reposição  de  fluido  e  eletrólitos  é  necessária  quando  há  desidratação  e  desequilíbrio  eletrolítico  e  ácido­base,  como  acontece  na  diarreia,  no  vômito  persistente,  na  obstrução  intestinal  ou  na  torção  de  estômago(s),  em  que  há  sequestro  de  grande
quantidade de fluido e eletrólitos.
Pode ser necessário o alívio da distensão por meio de sonda gástrica (como no timpanismo, em ruminantes) ou de cirurgia (como na obstrução intestinal aguda, na torção de abomaso em ruminantes ou do estômago em animais monogástricos). O trato GI
pode se distender com gás, fluido ou ingesta, em qualquer parte, devido à obstrução física ou funcional do sistema digestório.
O alívio da dor abdominal mediante administração de analgésicos deve ser feito quando a dor causa consequências a outros sistemas corporais (p. ex., colapso cardiovascular) ou quando o animal se automutila por rolar, escoicear ou lançar­se ao chão.
Animais tratados com analgésicos devem ser monitorados regularmente para assegurar que o alívio da dor não proporcione falsa sensação de segurança; a lesão pode piorar progressivamente enquanto o animal está sob influência do analgésico.
A reconstituição da flora ruminal deve ser feita em situações em que ela se apresenta seriamente esgotada (p. ex., na anorexia prolongada ou na indigestão aguda). A transfaunação (transferência de fluido ruminal; p. 2382) envolve a administração bucal
de conteúdo ruminal de um animal sadios que alberga bactérias e protozoários ruminais, além de ácidos graxos voláteis.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SISTEMA DIGESTÓRIO

 BOCA
COMPLEXO DO LÁBIO FENDIDO (LÁBIO LEPORINO) OU FENDA PALATINA:  Isso se deve a uma anomalia na formação de maxila e face durante o desenvolvimento embrionário. Fenda de lábio inferior é rara e geralmente ocorre na linha média. Fenda no lábio
superior, comumente na junção entre pré­maxila e maxila, pode ser uni ou bilateral, completa ou parcial e frequentemente está associada à fenda no processo alveolar e no palato. O defeito também pode envolver apenas o palato, afetando os componentes
moles e/ou duros do palato. Anomalias do desenvolvimento de outros órgãos são notadas em cerca de 8% dos cães e gatos com fenda palatina ou labial. Da mesma forma, em grandes animais, fenda palatina ou labial geralmente é verificada juntamente com
outros  defeitos,  como  artrogripose,  a  qual  tem  herança  autossômica  recessiva  simples  em  bovinos  da  raça  Charolês.  Em  ovinos  da  raça  Texel,  a  síndrome  da  fenda  labial  bilateral  acompanhada  de  defeitos  na  maxila  foi  observada  como  uma  herança
autossômica recessiva. Em pequenos animais, a prevalência é maior em cães das raças Beagle, Cocker Spaniel, Dachshund, Pastor Alemão, Labrador Retriever, Schnauzer, Shetland Sheepdog e em gatos Siameses. Em cães da raça Brittany Spaniel, acredita­
se que tenha característica autossômica recessiva, enquanto em animais das raças Bulldog (Francês e Inglês), Shih Tzu e Pointer suspeita­se de herança autossômica dominante com penetrância incompleta. Raças braquicefálicas apresentam risco até 30%
maior de manifestar a doença. Em animais de grande e médio porte, a fenda palatina/labial foi descrita em bovinos, ovinos, caprinos e equinos. A principal causa é hereditária, embora deficiência nutricional materna, exposição a substâncias químicas ou a
fármacos,  interferência  mecânica  no  feto  e  algumas  infecções  virais  durante  a  prenhez  também  possam  estar  envolvidas.  A  ingestão  de  agentes  tóxicos  também  pode  ser  incriminada  na  etiologia;  por  exemplo,  consumo  de  tremoço  (Lupinus
sericeus e L. caudatus) por vacas no segundo e terceiro mês de prenhez pode causar a “doença do bezerro arqueado”, na qual a fenda palatina/labial pode ser um componente.
Os sintomas iniciais refletem a extensão da malformação, mas podem incluir dificuldade de sucção, disfagia e evidência de gotejamento de leite nas narinas quando o recém–nascido tenta mamar. Infecção respiratória por aspiração de alimento é comum e
representa uma grave consequência da anomalia, com prognóstico ruim. Em geral, pelo exame da cavidade bucal se nota facilmente o defeito, exceto em potros que apresentem apenas fenda de palato mole, cuja visualização pode ser de difícil.
O manejo inicial requer cuidado intensivo durante a amamentação, inclusive com alimentação manual ou por meio de sonda, a fim de assegurar as necessidades nutricionais e calóricas diárias, bem como eventual necessidade de terapia antimicrobiana
apropriada para tratar infecções secundárias do trato respiratório inferior ou das narinas. A correção cirúrgica é efetiva somente quando o defeito é pequeno e geralmente é realizada em pequenos animais, ao redor de 8 a 12 semanas de idade, antes do
comprometimento de seu estado geral. Diversas técnicas cirúrgicas são utilizadas, desde um simples fechamento até enxertos móveis ou implantes de próteses, dependendo da gravidade e da localização do defeito. Casos mais graves podem necessitar várias
cirurgias para uma correção adequada. Historicamente, a correção cirúrgica é associada à alta taxa de insucesso, porém, novas técnicas, como o reparo com flap pediculado bilateral sobrepondo as membranas mucosas, para defeitos de palato mole, têm
aumentado a taxa de sucesso em cães. O envolvimento extenso do palato mole é considerado um sinal de prognóstico ruim. A reparação cirúrgica deve ser feita apenas após discussão de questões éticas; o animal acometido deve ser castrado ou não utilizado
como reprodutor, a fim de evitar a ocorrência da anomalia em suas crias.
ANOMALIAS DE OCLUSÃO:  Nota­se braquignatia (retrognatia, maxilar inferior curto ou “boca de papagaio” em equinos) quando a mandíbula é mais curta que a maxila. Pode ser notada em todas as espécies animais, com prevalência e gravidade variáveis.
Em bovinos, é herdada como um fator poligenético e pode estar associada a outras anormalidades, como impactação de dentes molares e osteopetrose (p. 1120) em bezerros da raça Angus e bovinos da raça Simental, ou com aberrações cromossômicas,
como trissomia, que é letal. Em potros, a braquignatia pode ser um componente dos vários efeitos teratogênicos decorrentes do uso de griseofulvina em éguas prenhes. Em pequenos animais, formas leves podem não ter relevância clínica, porém formas mais
graves  podem  resultar  em  traumatismo  ao  palato  duro  ou  restrição  do  crescimento  normal  da  mandíbula  secundária  à  erupção  dos  dentes  caninos  mandibulares  em  adultos.  O  diagnóstico  é  obtido  por  meio  de  exame  cuidadoso  da  cavidade  bucal.  O
tratamento varia de diversos a nenhum procedimento endodôntico ou ortodôntico, dependendo da gravidade. Em pequenos animais, os dentes caninos são frequentemente removidos ou faz­se a redução da coroa, com concomitante pulpotomia ou tratamento
do  canal  da  raiz.  Caso  necessário,  recomenda­se  a  colocação  inicial  de  aparelhos  ortodônticos  que  melhora  ambos,  o  resultado  a  curto  e  a  longo  prazo.  Nos  ovinos,  vários  defeitos  de  oclusão,  desde  braquignatia  a  aplasia  mandibular  e  agnatia,  são
sabidamente herdados como uma característica autossômica recessiva simples. Displasia craniofacial em bovinos da raça Limousin caracteriza­se por contorno convexo do focinho, mandíbula curta, ossificação deficiente nas junções dos  ossos  frontais,
exoftalmia e língua grande; acredita­se que seja decorrência de homozigose de um gene recessivo autossômico simples.
Prognatia (prognatismo, “boca de macaco” ou “boca de porca” em equinos) é constatada quando a mandíbula é mais longa do que a maxila. Esta alteração é detectada no exame da cavidade bucal devido à presença de dentes incisivos mandibulares em
contato com, ou rostrais, aos dentes incisivos maxilares. Nos gatos da raça Persa e em cães braquicefálicos é considerada uma característica racial normal. Apesar de ocorrer em graus variáveis, o prognatismo raramente requer tratamento específico. Se um
potro  é  muito  acometido,  a  sucção  pode  ser  impossível;  o  tratamento,  se  viável,  consiste  em  lixamento  ou  cisalhamento  das  pontas  e  projeções  dos  dentes.  Em  ruminantes  é  frequentemente  observado,  em  menor  grau,  ao  nascimento  e  se  corrige
espontaneamente à medida que o animal se desenvolve. Anomalias mais graves podem prejudicar a capacidade de pastar e mastigar; portanto, com repercussões mais sérias.
Nos bezerros da raça Angus, um defeito facial caracterizado por face ampla e curta é acompanhado por doença articular degenerativa e tem transmissão genética complexa.
ANOMALIAS DE LÍNGUA:  Anquiloglossia ou microglossia refere­se ao desenvolvimento incompleto ou anormal da língua. Nos cães, é frequentemente denominada “língua de pássaro” e pode ser componente da síndrome da debilidade dos filhotes de cães. Os
filhotes acometidos apresentam dificuldade para mamar e o fazem de forma deficiente. O exame da cavidade bucal revela perda ou subdesenvolvimento das porções finas lateral e rostral da língua, o que resulta em distúrbios de preensão e de motilidade.
Geralmente é fatal. Macroglossia ou língua grande é observada em bovinos da raça Galloway, mas normaliza com a idade e raramente tem relevância clínica.
Epiteliogênese  imperfeita  ou  “língua  lisa”  é  uma  condição  de  desenvolvimento  incompleto  das  papilas  filiformes  da  língua,  transmitida  como  característica  recessiva  autossômica  em  bovinos  das  raças  Holandesa,  Friesian  e  Pardo  Suíço.  As
consequências são salivação excessiva e definhamento.
SÍNDROME DO LÁBIO APERTADO EM CÃES DA RAÇA SHAR­PEI:  Alguns cães da raça Shar­Pei apresentam o vestíbulo anterior do lábio inferior pequeno ou ausente. O lábio inferior recobre os dentes inferiores e envolve os incisivos inferiores até próximo à
língua. O contato entre a superfície do palato dos incisivos superiores e o lábio inferior compromete a posição do lábio e pode contribuir para o deslocamento dos dentes incisivos inferiores no sentido da língua. A correção cirúrgica requer a criação de um
vestíbulo mediante incisão de relaxamento horizontal, dissecção da mucosa livre e sutura desse enxerto de mucosa sobre o tecido conjuntivo exposto, a fim de evitar a cicatrização das bordas, o que implicaria em recidiva.

 CISTOS E SEIOS DE CABEÇA E PESCOÇO
É importante diferenciar anomalias do desenvolvimento fetal e infecções, como abscesso. O cisto do ducto tiroglossal é consequência da persistência pós­natal do ducto tiroglossal embrionário prematuro. Este cisto raro é sempre único e situado no meio do
pescoço, geralmente na altura do osso hioide e laringe. É arredondado, de superfície lisa, com borda bem delimitada e ancorado no osso hioide e em tecidos profundos. A não ser que se instale infecção, raramente se adere à pele. Não é dolorido e contém
fluido.
Um cisto branquial (ou cervical lateral) desenvolve­se a partir de malformação do aparato branquial, normalmente da segunda fenda branquial. Cistos branquiais, unilaterais ou bilaterais, ocupam uma posição lateral da parte superior do pescoço e, em
geral, são ligeiramente móveis. O tamanho é variado e um cisto, individual, pode mudar de tamanho periodicamente à medida que seu conteúdo se extravasa através de pequena abertura no pescoço ou de pequena fístula cutânea (fístula cervical lateral ou
branquial). Estudo retrospectivo recente em equinos identificou duas faixas etárias de manifestação: < 6 meses de idade, com sintomas clínicos relacionados, principalmente, à doença do trato respiratório superior e > 8 anos de idade, predominância de sinal
clínico de doença esofágica obstrutiva.
Em equinos, é possível constatar cisto esofágico intramural ou duplicação cística do esôfago, geralmente de manifestação precoce. O tratamento de escolha é remoção cirúrgica ou omentalização. Duplicações tubulares  também  foram  descritas  e
clinicamente se manifestam como disfagia recorrente ou falta de ar; geralmente a remoção cirúrgica é curativa.
Cistos dentígeros têm origem epitelial e surgem com o desenvolvimento anormal do dente. Frequentemente, contêm fragmentos de dente e envolvem a maxila e a mandíbula, em graus variáveis. Esses cistos são observados em equinos jovens (< 3 anos)
ou em ruminantes (principalmente ovinos). Em equinos jovens pode ser difícil diferenciá­los de seios císticos (osteíte fibrosa cística) que também tipicamente resultam em distorção facial ou mandibular.
Há necessidade de remoção cirúrgica do(s) cisto(s) seguida de definição do diagnóstico com base em exame histopatológico subsequente.

 DENTES
QUANTIDADE ANORMAL:  Na maioria das espécies, um número reduzido de dentes (conhecido como anodontia) é raro, embora em cães é possível notar desenvolvimento ou erupção de dentes molares e pré­molares. Em equinos, ocasionalmente, notam­se
dentes supranumerários na região incisiva ou molar; nos cães, estes dentes geralmente são unilaterais e mais frequentes na maxila. Ainda nos cães, embora seja rara, uma germinação inadequada da arcada dentária permanente pode causar a ruptura do germe
dentário com a formação de dois dentes. O resultado pode ser aglomeração e rotação subsequente dos dentes, o que requer extração para evitar ou corrigir alterações de oclusão. Em equinos, os dentes supranumerários são removidos ou periodicamente
grosados, principalmente quando interferem na mastigação ou na colocação do freio.
ANORMALIDADES DE TROCA DE DENTES:  Em ruminantes, nos dentes pré­molares, a raiz do dente temporário pode ser absorvida, mas a coroa pode persistir como uma cobertura ou “tampa” para o dente permanente que irá surgir. Essas coberturas são
facilmente removidas com auxílio de pinça, caso não se desprendam espontaneamente. Nos cães, a demora na troca dos dentes decíduos é comum e se deve à falha na separação do ligamento periodontal do dente decíduo, com erupção rostral dos dentes
caninos permanentes. Isso pode causar deslocamento do dente permanente, em 2 a 3 semanas, e resultar em má oclusão ou preensão de alimento e posterior doença periodontal. Portanto, os dentes decíduos retidos devem ser removidos assim que possível,
com especial cuidado para não danificar o germe dental permanente primário.
ANORMALIDADES DE POSIÇÃO, FORMA E DIREÇÃO:  Nos equinos, essas alterações podem acometer os dentes incisivos e resultar em rotação do eixo longitudinal ou sobreposição dos dentes adjacentes. Em cães braquicefálicos, o terceiro pré­molar superior
e, ocasionalmente, outros dentes pré­molares ou molares podem apresentar rotação. Geralmente, isso não tem relevância clínica, mas pode requerer extração de alguns dentes envolvidos, caso ocorra aglomeração ou anormalidades de oclusão. Alterações de
forma, inclusive dente invaginado, são observadas em várias espécies e raças. A importância clínica é variável e depende da gravidade, sendo na maioria dos casos um achado acidental.
LESÕES NO ESMALTE:  Hipoplasia ou lesão na formação do esmalte pode ser constatado em animais de grande e de pequeno porte. As causas mais comuns incluem febre, traumatismo, desnutrição, intoxicação (p. ex., fluorose em bovinos) e infecções (p. ex.,
vírus da cinomose em cães). As lesões podem variar, de acordo com a gravidade e duração da agressão, de perfuração à ausência de esmalte com desenvolvimento incompleto do dente. Os dentes acometidos ficam propensos à formação de placa e ao
acúmulo de tártaro, com subsequente penetração bacteriana e formação de cáries. Em pequenos animais, tem­se utilizada restauração com resina para reparar os defeitos; mesmo assim, é fundamental higiene dentária cuidadosa e cuidados domiciliares com
a fim de reduzir a ocorrência de complicações. Também, é possível notar manchas no esmalte. Em pequenos animais, a administração de tetraciclinas a fêmeas prenhes ou a filhotes < 6 meses de idade pode causar mancha amarelo­amarronzada permanente
nos dentes. Em ruminantes, o esmalte de alguns dentes pode exibir manchas de várias colorações. Acredita­se que essa alteração tenha etiologia genética, mas geralmente não tem relevância clínica; no entanto, alguns clínicos acreditam que os dentes
acometidos podem ficar predispostos a desgaste mais rápido.

 ESÔFAGO
As anomalias esofágicas  clinicamente  importantes  em  geral  se  manifestam  como  distúrbios  de  deglutição  e  regurgitação,  em  especial  com  a  introdução  de  alimento  sólido.  Essas  afecções,  notadas  predominantemente  em  pequenos  animais,  podem  ser
classificadas como megaesôfago congênito, anomalias com aprisionamento do anel vascular e acalasia. Megaesôfago congênito resulta de anomalias do desenvolvimento neuromuscular esofágico. A prevalência é maior em cães das raças Shar­Pei Chinês,
Fox Terrier, Pastor Alemão, Dogue Alemão, Setter Irlandês, Labrador Retriever, Schnauzer miniatura e Newfoundland e nos gatos da raça Siamês. Nos cães Fox Terrier é uma característica autossômica recessiva, enquanto naqueles Schnauzer miniatura é
autossômica dominante. O megaesôfago pode também ser um componente de neuropatia difusa congênita. O complexo polineuropatia­paralisia de laringe, que comumente inclui megaesôfago, foi descrito em cães jovens da raça Dálmata. Além disso, cães
de raças predispostas a hipotireoidismo e hipoadrenocorticismo podem apresentar polineuropatia concomitante que se manifesta como megaesôfago. Esta afecção também pode ser detectada como síndrome paraneoplásica em cães jovens com timoma (p.
1347). Anomalias com persistência do anel vascular na maioria dos casos é consequência da persistência do quarto arco aórtico direito durante o desenvolvimento embrionário, resultando em estenose esofágica na altura da base cardíaca do quarto arco
aórtico direito, átrio esquerdo, artéria pulmonar e ligamento arterioso. Isto obstrui a passagem de alimento, causa retenção alimentar e subsequente dilatação esofágica anterior à anomalia. Há maior prevalência em cães das raças Boston Terrier, Pastor
Alemão e Setter Irlandês. Embora rara, esta afecção foi descrita em gatos e equinos. Acalasia cricofaringiana é uma falha ou assincronia no relaxamento do músculo cricofaríngeo durante a deglutição, o que prejudica a passagem normal do bolo alimentar
da porção caudal da faringe até o esôfago cranial. É identificada principalmente em cães de raças toy, Cocker Springer Spaniel e, raramente, em gatos. A acalasia de esfíncter esofágico inferior atualmente é considerada um componente de distúrbio motor
esofágico generalizado (p. ex., megaesôfago) e não mais como uma afecção.
Geralmente,  o  diagnóstico  de  uma  doença  esofágica  baseia­se  em  sintomas  clínicos  característicos  (p.  ex.,  regurgitação)  e  radiografia  contrastada  ou  fluoroscopia  do  reflexo  de  deglutição.  O  diagnóstico  da  etiologia  específica  pode  exigir  exames
adicionais, como endoscopia, teste de função endócrina e exclusão da possibilidade de miastenia gravis. O tratamento deve ser direcionado à causa primária. Alguns cães discretamente acometidos melhoram com o tempo, o prognóstico a longo prazo não é
ruim.  Pneumonia  por  aspiração  é  uma  complicação  comum,  várias  vezes  fatal.  Alimentações  frequentes  com  o  animal  em  posição  elevada,  com  pequenas  quantidades  de  alimentos  altamente  digestíveis,  de  consistência  pastosa,  podem  ser  úteis.  O
comprometimento  do  proprietário  é  essencial  para  o  sucesso  do  tratamento.  A  correção  cirúrgica  das  anomalias  de  anel  vascular,  geralmente  por  transecção  do  ligamento  arterioso  (por  meio  de  toracotomia  ou  via  toracoscopia),  é  efetiva,  se  realizada
precocemente; caso contrário, o lesão esofágico secundário à dilatação do esôfago devido à retenção de alimento pode resultar em distúrbio permanente da motilidade esofágica.
Divertículos esofágicos podem envolver o esôfago cervical, imediatamente cranial à entrada torácica, ou serem epifrênicos (imediatamente craniais ao diafragma). Os sintomas clínicos dependem da gravidade da enfermidade e são verificados em apenas
10 a 15% dos casos, mas podem incluir impactação, esofagite e, raramente, ruptura ou formação de fístula traqueoesofágica. O tratamento (se necessário) implica remoção cirúrgica. A ocorrência periódica de divertículo esofágico imediatamente cranial à
entrada torácica pode ser um normal em cães da raça Bulldog Inglês.

 ESTÔMAGO
Além de hérnia de hiato (anteriormente mencionada), a doença de estômago mais comum de etiologia possivelmente hereditária é estenose de piloro. Estenose ou hipertrofia pilórica se deve ao espessamento muscular do esfíncter pilórico, que obstrui a
drenagem do piloro. As raças de cães acometidas incluem aquelas braquicefálicas e pequenas, principalmente Boxer e Boston Terrier, bem como gatos Siameses. Os sintomas clínicos envolvem retardo no esvaziamento gástrico e geralmente se manifestam
como vômito várias horas após a refeição. O tratamento baseia­se na modificação da dieta e uso de modificadores de motilidade, como metoclopramida ou cisaprida. Nos casos mais graves a piloromiotomia pode ser benéfica.

 FÍGADO
A anomalia hepática congênita mais comum é desvio (ou shunt) portossistêmico (DPS). (Ver malformações vasculares portossistêmicas, p. 413, para informação completa). Embora essa anomalia possa acometer cães de qualquer raça, é mais prevalente nas
raças Yorkshire Terrier, Cairn Terrier, Maltês, Pug, Wolfhound Terrier, Labrador e Golden Retriever e Schnauzer miniatura. Há relato também em gatos da raça Himalaia e Persa. O DPS resulta no desvio de sangue portal do fígado com acesso direto à
circulação sistêmica. Os desvios podem ser únicos e intra–hepáticos (na maioria das vezes secundários à persistência de ducto venoso fetal), únicos e extra­hepáticos (com várias vias vasculares possíveis entre as veias porta e pós­cava ou ázigos), ou
múltiplos e secundários a fístulas arterioportais intra­hepáticas. Geralmente, os sintomas clínicos se manifestam como distúrbios neurológicos metabólicos (encefalopatia hepática) e são constatados em animais jovens, após dieta rica em proteínas. Em
estágios posteriores, pode­se desenvolver ascite secundariamente à hipertensão portal. Outros achados clínicos concomitantes incluem aumento de volume dos rins e cálculo de urato. Ultrassonografia abdominal é 100% sensível para DPS intra­hepático
(embora um pouco menos sensível para DPS extra­hepático), porém a sensibilidade depende da habilidade do profissional que realiza a ultrassonografia. O diagnóstico definitivo por meio de portografia com contraste positivo pode identificar tanto o local
do desvio, quanto se este é único ou múltiplo. Esse procedimento também permite avaliar a possibilidade de correção cirúrgica. Os desvios múltiplos tem prognóstico ruim, pois frequentemente são secundários à doença progressiva primária do parênquima
hepático (p. ex., cirrose).
Displasia microvascular hepatoportal é uma enfermidade circulatória intra­hepática que resulta em desvio do sangue portal para a circulação sistêmica. A síndrome está bem estabelecida em cães das raças Cairn Terrier e Yorkshire Terrier, embora
também observada nas raças Maltês, Dachshund, Poodle toy e miniatura, Bichon Frisé, Pequinês, Shih Tzu, Norfolk e Norwich Terrier, Tibetan Spaniel, Havanês e Lhasa Apso. Esta doença geralmente é assintomática e sua importância clínica é que deve ser
diferenciada de DPS. Como a concentração de ácidos biliares encontra­se alterada nos dois casos, a diferenciação pode ser feita apenas pela exclusão de desvio(s) vascular(es) macroscópico(s) delimitado(s). Cães que progridem para doença clínica são
submetidos ao tratamento medicamentoso, como descrito para DPS; na ausência de desvio vascular macroscópico delimitado, a cirurgia não é uma opção terapêutica.
Hepatopatia associada ao cobre é um distúrbio metabólico que envolve o armazenamento deste mineral no fígado, resultando em acúmulo hepatocelular progressivo de cobre e desenvolvimento subsequente de hepatite crônica e cirrose hepática. Esta
afecção é bem descrita em cães da raça Bedlington Terrier, nos quais são relatadas três variações clínicas: necrose hepática aguda em cães jovens (< 6 anos); insuficiência hepática progressiva crônica em animais idosos; e doença assintomática (portador).
Altos teores de cobre também foram detectados em casos de hepatopatia familiar em cães das raças Dálmata, West Highland White Terrier, Sky Terrier e Dobermann Pinscher, embora uma relação causal não tenha sido definida, como demonstrada em cães
Bedlington Terrier. Há aparentes variações raciais geográficas, com teores hepáticos de cobre mais graves nas raças Bedlington e West Highland White Terrier criados na América do Norte. O tratamento envolve o fornecimento de quelantes de cobre, dieta
com baixo teor de cobre e outras medidas de suporte direcionadas aos animais com hepatopatia clínica.
Anomalias de desenvolvimento hepático adicionais incluem cisto hepático, geralmente assintomático e importância clínica apenas quando devem ser diferenciados de abscesso hepático. Quando um cisto hepático é encontrado deve­se avaliar, também, a
arquitetura renal (especialmente em gatos), uma vez que pode haver doença renal policística concomitante.
Há relato de hiperlipidemia primária ou familiar tanto em cães quanto em gatos. Cães das raças Colly, Shetland Sheepdog e Briard são predispostos à hipercolesterolemia. Até 33% dos cães da raça Schnauzer miniatura apresentam hipertrigliceridemia,
com  base  em  exames  bioquímicos.  Em  geral,  os  sintomas  clínicos  em  cães  acometidos  são  vagos  e  incluem  desconforto  abdominal,  alteração  de  comportamento,  convulsões,  afecções  oculares  associadas  ao  depósito  de  lipídios  e  aumento  do  risco  de
pancreatite.
Hiperquilomicronemia é descrita em gatos domésticos na Nova Zelândia, cujos sintomas clínicos incluem neuropatias periféricas e xantomas cutâneos que, em geral, surgem antes de 9 meses de idade. O tratamento de hiperlipidemia primária baseia­se
no uso de dieta com baixo teor de gordura; suplementação com ácidos graxos ômega 3, em casos mais graves; e fármacos que reduzem a concentração de lipídios, embora haja pouca informação quanto à segurança e eficácia destes medicamentos em
animais.

 HÉRNIAS
Hérnias  que  comprometem  o  abdome  ocorrem  quando  o  conteúdo  abdominal  penetra  uma  abertura  natural  ou  anormal  na  parede  corporal.  Podem  ser  congênitas  ou  adquiridas.  Nas  hérnias  adquiridas  geralmente  há  história  de  traumatismo.  Hérnias
congênitas podem envolver diafragma ou parede abdominal. Pode haver 3 tipos principais de hérnias que envolvem o diafragma: peritônio­pericárdica, na qual o conteúdo abdominal estende­se para o interior do saco pericárdico; pleuroperitoneal, quando
o conteúdo abdominal encontra­se no interior da cavidade pleural; e de hiato, na qual o esôfago abdominal, a junção gastresofágica e/ou porção gástrica penetram o hiato esofágico diafragmático, alcançando a cavidade torácica. Os sintomas clínicos variam
de assintomáticos a graves e dependem da quantidade de tecido herniado e de suas consequências ao órgão deslocado. As hérnias de hiato podem ser “deslizantes” e resultar em sintomas clínicos de esofagite por refluxo (anorexia, salivação e/ou vômito),
que podem ser intermitentes. Para a confirmação do diagnóstico há necessidade de exame radiográfico, frequentemente, com técnicas contrastadas. Fluoroscopia ou endoscopia é útil no diagnóstico de hérnia de hiato deslizante. A correção destas hérnias é
mais efetiva por meio de cirurgia. No caso de hérnia de hiato, o tratamento medicamentoso, com uso de antiácidos e alterações na dieta, pode controlar sintomas discretos.
As hérnias que envolvem a parede abdominal podem ser umbilicais, inguinais ou escrotais. As hérnias umbilicais são secundárias à falha no fechamento normal do anel umbilical e resultam em protrusão do conteúdo abdominal para o tecido subcutâneo.
O tamanho varia de acordo com a extensão do defeito umbilical e da quantidade de conteúdo abdominal presente. Em grandes e pequenos animais a etiologia tem provável componente genético; no entanto, tração excessiva do feto de tamanho exagerado ou
corte do cordão umbilical muito próximo à parede abdominal são outras possíveis causas. Geralmente, o diagnóstico é direto, principalmente quando é possível a redução manual da hérnia. Se não for possível a redução da hérnia, deve­se fazer diagnóstico
diferencial de abscesso umbilical, comum em crias de grandes animais. Hérnia umbilical e abscesso umbilical quase sempre são concomitantes, principalmente em bovinos e suínos. Para a confirmação pode ser necessária punção exploratória por meio de
biopsia com agulha fina, seguida de exame citopatológico. O tratamento é cirúrgico. Em pequenos animais, se a hérnia for pequena, realiza­se correção cirúrgica concomitante à castração. Em bezerros, há casos bem­sucedidos com a aplicação de uma
bandagem adesiva larga (10 cm de largura), por 3 a 4 semanas. Em equinos, hérnias pequenas (< que 1 a 3 cm) podem regredir espontaneamente; entretanto, se persistem por mais de 6 meses, provavelmente é necessária correção cirúrgica. O proprietário
deve ser informado que essa doença pode ser hereditária.

Hérnia na parede abdominal de um potro. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.Estenose de piloro; local da piloromiotomia. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Hérnias inguinais são comuns em cachaços e geralmente se estendem para o interior do escroto. O diagnóstico pode ser confirmado pela suspensão dos membros torácicos do leitão seguida de movimentos de balançar, procedimento que permite que a
saliência herniária pequena seja visível. Em porcas, essa afecção sempre é acompanhada de prejuízo ao desenvolvimento genital; estes animais são estéreis e indica­se cirurgia apenas se o tamanho da lesão representa risco ao crescimento do suíno até o peso
de abate. Geralmente, em potros as hérnias inguinais regridem espontaneamente no primeiro ano de vida, às vezes após repetidas vezes de redução manual. Por essa razão, não se indica cirurgia corretiva precoce, exceto se ocorre estrangulamento do
conteúdo da hérnia ou se for grave o bastante para interferir na marcha. Hérnia inguinal estrangulada é frequente em garanhões e se caracteriza por sintomas de dor abdominal intensa contínua. É facilmente detectada por meio de palpação retal e pode ser
reduzida, sob anestesia geral, por meio de manipulação retal. Caso este procedimento falhe há necessidade de cirurgia imediata. Hérnia inguinal em bovinos é rara, embora às vezes é notada em touros. Quando se realiza correção cirúrgica para preservar o
potencial reprodutivo do touro nem sempre se obtém sucesso.

 INTESTINOS DELGADO E GROSSO
Os distúrbios de má digestão ou má absorção geralmente se manifestam como sintomas GI persistentes e crônicos e incluem vômito, perda de peso ou diarreia de intestino grosso e/ou delgado, ou uma combinação destes. Há várias possíveis etiologias,
hereditárias e adquiridas, e a maioria está associada à doença intestinal inflamatória (DII). As anomalias congênitas podem ter predileções raciais específicas.
Em  cães  da  raça  Wheaten  Terrier  de  pelos  macios  há  maior  prevalência  de nefropatia  e  enteropatia  com  perda  de  proteína concomitante.  Tanto  DII  quanto  alergia  alimentar  são  consideradas  componentes  dessa  síndrome.  A  constatação  de  alta
concentração  do  inibidor  a1­protease  fecal  pode  auxiliar  na  confirmação  de  perda  intestinal  anormal  de  proteína,  embora  o  diagnóstico  definitivo  se  baseie  na  histopatologia  renal  e  intestinal.  Apesar  do  uso  de  dieta  hipoalergênica  e  de  terapia
imunossupressora direcionada tanto para DII quanto para glomerulonefrite, o prognóstico é ruim.
Há relatos de que cães da raça Setter Irlandês têm predisposição familiar para enteropatia sensível ao glúten, com início dos sintomas clínicos em torno de 6 meses de idade. A sensibilidade ao trigo é confirmada e tratada mediante o uso de dieta
semanas glúten.
Cães  da  raça  Basenji  são  predispostos  à  enteropatia  imunoproliferativa  de  causa  hereditária  desconhecida;  a  enterite  linfocítica­plasmocítica  grave  é  um  componente  e  a  afecção  pode  progredir  para  linfoma.  O  diagnóstico  baseia­se  no  exame
histopatológico de amostras de tecido obtidas por meio de biopsia GI, geralmente guiada por endoscopia. As tentativas de tratamento com fármacos imunossupressores e dieta hipoalergênica geralmente não são bem­sucedidas, exceto se iniciadas de forma
agressiva nos estágios iniciais da doença.
A linfangiectasia é uma malformação do sistema linfático intestinal que causa enteropatia com perda de proteínas; pode ser congênita ou adquirida, com maior prevalência em cães das raças Norwegian Lundehund, Basenji, Wheaten Terrier de pelos
macios e Yorkshire Terrier. O prejuízo à drenagem linfática causa dilatação dos vasos quilíferos e linfáticos da parede intestinal. O diagnóstico baseia­se na exclusão de outras doenças acompanhadas de perda proteica e pode ser confirmado por exame
histopatológico da parede do intestino delgado. A maioria dos animais acometidos responde à combinação de modificação da dieta e dose anti­inflamatória de glicocorticoides. A dieta deve conter pouca gordura e alto teor de proteínas de alta qualidade e
pode ser suplementada com triglicerídios de cadeia média. Medidas terapêuticas adicionais incluem o uso de rutina, uma droga efetiva também no tratamento de quilotórax e linfedema. Alguns animais não respondem e não resistem à grave desnutrição
proteica e calórica.
A insuficiência pancreática exócrina (IPE) é mais prevalente em cães das raças Pastor Alemão, Colly e Setter Inglês e se deve à atrofia de ácinos pancreáticos; em felinos é uma doença adquirida (secundária à pancreatite). A ausência de enzimas
pancreáticas  causa  diarreia  osmótica,  na  qual  esteatorreia  é  um  achado  evidente.  Os  animais  acometidos  não  ganham  peso  ou  se  a  IPE  é  adquirida  posteriormente  apresentam  perda  de  peso  relevante.  O  diagnóstico  baseia­se  na  mensuração  da
imunorreatividade semelhante à tripsina sérica (IST); Há testes validados tanto para cães quanto para gatos. Testes mais recentes incluem imunorreatividade à lipase pancreática canina, que pode ser mais sensível no diagnóstico de pancreatite, mas não tem
vantagem em relação ao IST. O tratamento compreende reposição exógena de enzimas pancreáticas e dieta facilmente digestível.
Colite ulcerativa histiocítica é uma doença inflamatória secundária a um distúrbio imunológico que acomete os histiócitos do cólon. A afecção é semelhante à doença de Crohn em pessoas. Cães das raças Boxer e Bulldog Francês são predispostos e o
início dos sintomas clínicos de diarreia de intestino grosso crônica acontece no primeiro ano de vida. O diagnóstico baseia­se em análise de biopsia do cólon e resposta à terapia, que inclui modificação na dieta e uso de fármacos imunossupressores e/ou anti­
inflamatórios.
Agangliose ileocolônica é descrita em potros brancos obtidos de acasalamentos entre equinos da raça Overo. Embora os potros pareçam normais ao nascimento, logo desenvolvem cólicas e morrem no segundo dia. Os equinos acometidos são brancos e
possuem íris azuis. O diagnóstico pode ser confirmado pela constatação de ausência de gânglios no cólon. Os defeitos congênitos de reto e ânus geralmente resultam de uma falha no desenvolvimento embrionário.
As atresias hereditárias do intestino grosso ou delgado são relativamente comuns em grandes animais. Há relato de atresia de cólon em equinos Percheron, envolvendo o cólon ascendente na flexura pélvica. Tem­se observado atresia ilíaca em bovinos
da raça Swedich Highland e atresia de intestino delgado em cordeiros. Estas afecções sempre são fatais. Palpação retal no início da gestação (< 45 dias) foi incriminada como causa, embora a recente redução na prevalência por meio de acasalamentos
seletivos também indique possível predisposição genética.
Atresia de cólon em bezerro. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Atresia anal é observada em ovinos, suínos e bovinos e ocorre quando a membrana dorsal que separa o reto e o ânus não se rompe. Os sintomas clínicos são evidentes ao nascimento e incluem tenesmo, dor e distensão abdominal, retenção de fezes e
ausência de orifício anal. Recomenda­se remoção cirúrgica dessa membrana. Essa afecção é rara em cães, mas foi descrita em diversas raças, como Poodle toy e  Boston  Terrier,  com  maior  prevalência  em  fêmeas.  Indica­se  cirurgia,  mas  pode  ocorrer
complicação devido à incontinência fecal pós­operatória.
Aplasia segmentar (agenesia retal) ocorre quando o reto termina em um fundo cego, antes de atingir o ânus. A correção cirúrgica é difícil, pois a localização da porção final é variável e pode ocorrer lesão iatrogênico aos nervos da região.
Duplicações  de  cólon  e  reto  são  raras  e  os  animais  acometidos  geralmente  manifestam  sintomas  de  doença  de  intestino  grosso.  O  diagnóstico  é  definido  por  meio  de  colonografia  contrastada.  Obtém­se  a  correção  mediante  remoção  cirúrgica  da
duplicação, embora alguns casos apresentem múltiplas anomalias de desenvolvimento abdominal concomitantes que impedem a correção cirúrgica completa.
Fístula retouretral foi descrita em cães da raça Bulldog Inglês, gatos e equinos; clinicamente é caracterizada por micção simultânea, tanto pelo orifício urogenital quanto pelo orifício, além de histórico de infecção crônica do trato urinário. O diagnóstico
baseia­se na uretrografia excretora contrastada ou colonografia retrógrada contrastada. A correção cirúrgica é curativa.
Estenose de piloro; local da piloromiotomia. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Fístula retovaginal é um trato fistuloso que conecta a vagina e o reto; em geral, é observada em combinação com ausência de abertura anal. A eliminação de fezes pela vulva ou sinal de obstrução de cólon é sugestivo da anomalia. O diagnóstico pode ser
confirmado por enema com bário, o qual delimita a extensão do problema no interior da vagina. A identificação da fístula, sua correção cirúrgica e a restauração das estruturas anatômicas normais são procedimentos essenciais. Em geral, o prognóstico é
reservado. As complicações são comuns e incluem incontinência fecal e urinária. Estas alterações são frequentemente observadas em gatos da raça Manx como sequela de espinha bífida hereditária.

DESENVOLVIMENTO DOS DENTES

Todos os animais domésticos apresentam dentição difiodonte, ou seja, um conjunto de dentes decíduos e outro de dentes permanentes. Tanto a morfologia quanto a fórmula dentária (Tabela 3) são variáveis e intimamente relacionadas com a alimentação da
espécie. Antigamente, a identificação dos dentes baseava­se em um sistema anatômico no qual os dentes incisivos eram identificados como I, caninos como C, pré­molares como P e molares como M. Atualmente os dentistas veterinários empregam o
sistema Triadan modificado, que utiliza um número de três dígitos para um dente específico. A cabeça dos animais é dividida em quatro quadrantes, sendo o quadrante superior direito designado como “1” e os demais quadrantes numerados no sentido anti­
horário. Os números 1 a 4 são usados para identificar o quadrante de dentes permanentes, e os números 5 a 8, para os dentes temporários. O segundo e o terceiro dígitos identificam o número do dente específico. Por exemplo, em equinos, o segundo pré­
molar inferior esquerdo é o dente “306” e o último molar da mandíbula direita é o “411”.

Estimativa da Idade pelo Exame dos Dentes
Em equinos, que possuem dentição hipsodonte, a idade pode ser estimada pelo tempo de erupção e aparência geral dos dentes (incisivo inferior). Em outras espécies com incisivos braquidontes, como bovinos e cães, a determinação da idade é menos acurada
e se baseia principalmente no tempo de erupção dentária.
Tabela 3 – Fórmulas dentárias

BOVINOS:  As idades de erupção dos incisivos representam o achado mais confiável para a determinação da idade em bovinos (Tabela 4). Embora esteja relacionado com a raça, o tempo de erupção é mais preciso para determinar a idade do que os sintomas
de desgaste, pois os achados dentários macroscópicos relacionados com a idade são escassos (estrelas dentárias) ou ausentes (depressões e marcas), além do fato da taxa de desgaste ser amplamente influenciada pela dieta.
Dentição de equino. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.
Tabela 4 – Erupção dos dentes a

Equinos Vacas Ovinos e caprinos Suínos Cães Gatos

Di 1 0 – 1 semana Antes do nascimento 0 – 1 semana 3 – 4 semanas 4 – 5 semanas 2 – 3 semanas

Di 2 4 – 6 semanas Antes do nascimento 1 – 2 semanas 2 – 3 meses 4 – 5 semanas 3 – 4 semanas


Di 3 6 – 9 meses 0 – 1 semana 2 – 3 semanas Antes do nascimento 3 – 4 semanas 3 – 4 semanas

I 1 2,5 anos 2 anos 1 – 1,5 ano 12 – 15 meses 4 meses 4 – 7 meses

I 2 3,5 anos 2,5 anos 1,5 – 2 anos 16 – 20 meses 4,5 meses 4 – 7 meses


I 3 4,5 anos 3,5 anos 2 – 2,5 anos b 8 – 10 meses 5 meses 4 – 7 meses

Dc Não há erupção 0 – 2 semanas 3 – 4 semanas Antes do nascimento 3 – 4 semanas 3 – 4 semanas

C 4 – 5 anos 3,5 – 4 anos 2,5 – 4 anos c 6 – 10 meses 5 – 6 meses 4 – 7 meses

Dp 2 0 – 2 semanas 0 – 3 semanas 0 – 4 semanas 4 – 6 semanas 4 – 6 semanas 5 – 6 semanas (somente superior)

Dp 3 0 – 2 semanas 0 – 3 semanas 0 – 4 semanas 1,5 mês 4 – 6 semanas 5 – 6 semanas

Dp 4 0 – 2 semanas 0 – 3 semanas 0 – 4 semanas 1 – 5 semanas 4 – 6 semanas 5 – 6 semanas


P 1 5 a 6 meses (dente­de­lobo) – – 5 meses 4 – 5 meses –

P 2 2,5 anos 2 – 2,5 anos 1,5 – 2 anos 12 – 15 meses 5 – 6 meses 4 – 7 meses (somente superior)


P 3 3 anos 2 – 2,5 anos 1,5 – 2 anos 12 – 15 meses 5 – 6 meses 4 – 7 meses

P 4 4 anos 2,5 – 3 anos 1,5 – 2 anos 12 – 15 meses 5 – 6 meses 4 – 7 meses

M 1 9 – 12 meses 5 – 6 meses 3 – 6 meses d 4 – 6 meses 4 – 5 meses 4 – 7 meses

M 2 2 anos 1 – 1,5 ano 9 – 12 meses 8 – 12 meses 5 – 6 meses –

M 3 4 anos 2 – 2,5 anos 1,5 – 2 anos 18 – 20 meses 6 – 7 meses –


a  Dados médios, sujeitos à variação considerável.

b  2 anos, em caprinos.

c 2,5 a 3 anos, em caprinos.

d  3 a 4 meses, em ovinos.

Nascimento até 5 anos de idade: Ver Tabela 4.
5 anos de idade: Todos os incisivos apresentam desgaste. A superfície de oclusão dos incisivos centrais começa a ficar plana.
6 a 7 anos de idade: Os incisivos centrais se apresentam nivelados e o colo é visível.
8 anos de idade: Os incisivos médios se apresentam nivelados e o colo é visível.
9 anos de idade: Os incisivos laterais se apresentam nivelados e o colo é visível. C pode estar nivelado.
10 anos de idade: C está nivelado e o colo é visível.
À medida que os bovinos envelhecem, os dentes se tornam mais curtos e os seus colos mais visíveis; se afrouxam nos alvéolos dentários e, por fim, caem.
CÃES:  Os dados a seguir foram considerados confiáveis em cerca de 90% dos cães de grande porte. Há mais variação em cães pequenos (especialmente nas raças toy) e nos cães com maxilar braquignata ou prognata. Mordeduras uniformes ou niveladas
geralmente resultam em desgaste excessivo.
1,5 ano de idade: Incisivos centrais inferiores com cúspides desgastadas.
1,5 a 2 anos e meio de idade: Incisivos médios inferiores com cúspides desgastadas.
3,5 anos de idade: Incisivos centrais superiores com cúspides desgastadas.
4,5 anos de idade: Incisivos médios superiores com cúspides desgastadas.
5 anos de idade: Incisivos laterais inferiores com cúspides pouco desgastadas. A superfície de oclusão dos incisivos inferiores centrais e médios é retangular. Desgaste discreto dos dentes caninos.
6 anos de idade: Incisivos laterais inferiores com cúspides desgastadas. Caninos desgastados e rombos. O canino inferior mostra impressão do incisivo lateral superior.
7 anos de idade: A superfície de oclusão do incisivo central inferior torna­se elíptica, com eixo sagital longo.
8 anos de idade: A superfície de oclusão do incisivo central inferior se apresenta inclinada para a frente.
10 anos de idade: Os incisivos centrais superior e médio inferior apresentam superfícies de oclusão elípticas.
12 anos de idade: Os dentes incisivos começam a cair (exceto quando há cuidado para manterem saudáveis os tecidos periodontais e gengivais).
EQUINOS:  Em equinos, os dentes incisivos (inferiores) são os mais adequados para estimar a idade. Entretanto, deve­se lembrar que as aparências dos dentes estão sujeitas a variações individuais e raciais e há diferenças relacionadas com as condições
ambientais. Os incisivos decíduos são menores que os dentes permanentes, a superfície de suas coroas são mais brancas e têm várias cristas e sulcos pequenos longitudinais. As idades de erupção estão listadas na Tabela 4. Os incisivos permanentes são
maiores  e  sua  forma  é  mais  retangular.  As  superfícies  de  suas  coroas  são  amplamente  cobertas  por  cemento  e  têm  aparência  amarelada.  Os  incisivos  superiores  apresentam  dois  sulcos  longitudinais  distintos  na  superfície  labial,  enquanto  os  incisivos
inferiores possuem apenas um.
Os dentes incisivos dos equinos desenvolvem características macroscópicas relacionadas com o desgaste dental, as quais tradicionalmente são utilizadas para estimar a idade. A estrela dentária consiste em uma dentina secundária amarelo­amarronzada
que preenche a cavidade pulpar e surge na superfície de oclusão como dente desgastado. Sua forma e posição, bem como o aparecimento de uma “mancha branca” no centro, estão relacionadas com a idade. A forma, o tamanho e o tempo de desaparecimento
tanto do infundíbulo ou “cálice” (semelhante a um funil envolvendo a superfície de oclusão) quanto das “marcas” (esmalte da superfície inferior infundibular) são características adicionais, porém, são indicadores mais variáveis da idade. O desgaste dentário
progressivo causa alteração na forma de oclusão dos incisivos. As superfícies de oclusão dos incisivos recém­irrompidos são elípticas, mas com a idade tornam­se trapezoides, arredondadas e, em seguida, triangulares, com o ápice em direção à face lingual.
A curvatura do arco dentário formada pelos incisivos inferiores também está relacionada com a idade. Em equinos jovens, este arco é semicircular, enquanto em animais mais velhos ele forma uma linha reta. Além disso, o arco formado pelos incisivos dos
maxilares opostos (quando se encontram) muda à medida que os dentes avançam de seus alvéolos e se desgastam. Em equinos jovens, os incisivos superiores e inferiores estão situados em linha reta. Com o avançar da idade, o ângulo entre os incisivos
inferiores e superiores torna­se mais agudo. O sulco de Galvayne e o “arco dos sete anos”, tradicionalmente utilizados como indicadores da idade, são variáveis, inconsistentes e têm pouco valor para determinação da idade em equinos. Os sintomas mais
utilizados estão cronologicamente ordenados, a seguir:

Dentição do cão. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.
Figura esquerda: vista da oclusão dos incisivos inferiores de uma égua de 6 anos de idade. Estrelas dentárias são notadas em I1 e I2 (setas), “taças” dentárias são vistas como grandes depressões elípticas (pontas das setas). As superfícies de oclusão dos incisivos são ovais e a curvatura da arcada dentária é semicircular.
Figura direita: vista da oclusão dos incisivos inferiores de uma égua de 12 anos de idade. Uma mancha branca é muito nítida no centro das estrelas dentárias (setas). As “taças” são menores e mais rasas. As superfícies de oclusão são mais triangulares. Cortesia da Dra. Sofie Muylle.

Nascimento até 5 anos de idade: Ver Tabela 4.
5 anos de idade: Início de erupção dos incisivos laterais. Estrela dentária nos incisivos centrais.
6 anos de idade: Estrela dentária nos incisivos médios. Desaparecimento da depressão (“taças”) dos incisivos centrais.
7 anos de idade: Estrela dentária nos dentes laterais.
8 anos de idade: Os incisivos centrais se apresentam trapezoides e têm uma mancha branca na estrela dentária.
9 anos de idade: Os incisivos médios são trapezoides e têm uma mancha branca na estrela dentária.
10 anos de idade: Desaparecimento da depressão dos incisivos médios. As marcas dos incisivos centrais são ovais­triangulares.
11 anos de idade: Mancha branca na estrela dentária dos dentes laterais. Tanto os incisivos centrais quanto os médios têm ápice lingual. Os incisivos laterais são triangulares com um ápice labial.
12 anos de idade: Desaparecimento da depressão de todos os incisivos inferiores.
14 anos de idade: As marcas dos incisivos centrais e médios são pequenas e arredondadas
18 anos de idade: Desaparecimento das marcas dos incisivos centrais.
20 de idade: Desaparecimento das marcas dos incisivos médios e laterais.

DOENÇAS DO RETO E DO ÂNUS

 DOENÇA DO SACO ANAL
A doença do saco anal é a afecção mais comum da região anal, em cães. As raças pequenas são predispostas; raramente as raças grandes ou gigantes são acometidas. Em gatos, a forma mais comum de doença do saco anal é a impactação.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Podem ocorrer impactação, infecção, abscesso ou neoplasia nos sacos anais. A deficiente compressão dos sacos anais durante a defecação, fraco tônus muscular em cães obesos e seborreia generalizada (na qual há hipersecreção
glandular) ocasionam retenção do conteúdo do saco anal. Esta retenção pode predispor ao supercrescimento bacteriano, infecção e inflamação.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sintomas estão relacionados com a dor e desconforto, associados ao ato de sentar. Podem­se observar, também, corridas em disparada, lambeduras e mordeduras na região anal e dor à defecação, além de tenesmo. É comum
ocorrer endurecimento, abscesso e fistula na região. No caso de impactação, massas firmes são palpáveis e os sacos ficam preenchidos com uma secreção amarronzada, pastosa e espessa, que pode ser eliminada mediante compressão aplicando­se forte
pressão com uma faixa fina. Quando há infecção ou abscesso é possível notar dor intensa e, com frequência, alteração da cor no local. A fístula cutânea se origina da abscedação do saco anal; esta deve ser diferenciada de fístula perianal. As neoplasias do
saco anal geralmente não causam dor e estão associadas a edema perineal, eritema, endurecimento ou formação de fístula. Os adenocarcinomas de glândulas apócrinas do saco anal são constatados principalmente em cadelas idosas. Estes animais são levados
à consulta devido aos sintomas secundários à hipercalcemia, como poliúria e polidipsia, ou aos problemas relacionados com o tumor perineal.
O  diagnóstico  de  impactação,  infecção  ou  abscesso  é  confirmado  por  meio  de  palpação  retal  digital,  durante  a  qual  pode­se  comprimir  o  saco  anoal.  O  exame  microscópico  do  conteúdo  dos  sacos  infectados  revela  grande  quantidade  de  leucócitos
polimorfonucleares e bactérias. Deve­se suspeitar de tumor (adenocarcinoma apócrino do saco anal) quando se nota saco anal firme, aumentado de volume e não comprimível, mesmo após a drenagem. Nestes casos, deve­se confirmar o diagnóstico por
biopsia. Deve­se investigar a presença de metástases regionais e sistêmicas, além de mensurar a concentração sérica de cálcio.
TRATAMENTO:  Deve­se realizar compressão manual cuidadosa do saco anal que se apresenta impactado. Se o conteúdo for muito ressecado de forma que não possa ser eliminado com a compressão pode­se infundir solução salina, agente ceruminolítico ou
amolecedor no seu interior. Os sacos infeccionados devem ser higienizados com antisséptico, seguido de terapia antimicrobiana local e sistêmica. Compressas quentes, aplicadas a cada 8 a 12 h por 15 a 20 min, são benéficas em casos de abscessos. Pode­
se precisar de lavagens semanais frequentes associadas à infusão de pomada contendo esteroide e antibiótico. A adição de suplemento rico em fibra à dieta pode aumentar o bolo fecal, o que facilita a compressão e o esvaziamento do saco anal. Se o
tratamento medicamentoso for ineficaz, ou existir neoplasia, a excisão cirúrgica do saco é indicada. A técnica fechada para excisão é preconizada, pois há menor prevalência de complicação. No entanto, a incontinência fecal, que é uma complicação comum
da cirurgia de saco anal, pode resultar de lesões no ramo retal caudal do nervo pudendo e pode ser completa, se a lesão for bilateral. Quando a remoção do saco for incompleta ou há ruptura, pode­se observar formação de fístula crônica. Uma cicatriz no
esfíncter anal externo pode derivar de trauma cirúrgico e causar tenesmo (Ver p. 953).

Sacos perianais no cão. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

 ESTENOSES RETAL E ANORRETAL
As estenoses caracterizam­se por estreitamento do lúmen devido à presença de tecido cicatricial. A lesão pode ser decorrência de corpos estranhos, traumas (p. ex., ferimentos por mordeduras e acidentes) ou de complicação de doença inflamatória (p. ex.,
fístula perianal, histoplasmose, doença intestinal inflamatória, saculite anal).
Neoplasias, aumento do volume prostático e tecido cicatricial oriundo de fístula perianal ou de abscessos de saco anal podem predispor à constrição extraluminal. Em pequenos animais, a estenose anorretal é mais comum que a estenose retal, mas
nenhuma delas é frequente. As estenoses são mais comuns nos cães das raças Pastor Alemão, Beagle e Poodle.
A estenose retal em bovino pode ser decorrência de trauma, neoplasia ou necrose gordurosa, que comprimem ou invadem o lúmen ou, ainda, de defeitos associados à estenose retal ou vaginal. Em suínos, a estenose retal é secundária à enterocolite,
correção de prolapso retal e como sequela de proctite ulcerativa induzida por salmonelas. Em pequenos animais, o tratamento inclui anestesia geral seguida de dilatação da estenose com auxílio de balão e aplicações intralesionais de esteroides de longa ação
(triancinolona). Em grandes animais, o tratamento pode implicar na ressecção da região estenosada ou em anoplastia.

 FÍSTULA PERIANAL
A  fístula  perianal  caracteriza­se  por  trato  fistular  crônico,  purulento,  fétido  e  ulcerado  em  tecido  perianal.  É  mais  comum  nos  cães  da  raça  Pastor  Alemão,  mas  também  é  observada  em  cães  Setter  e  Retriever.  Cães  com  >  7  anos  de  idade  são  mais
predispostos.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A causa é desconhecida, embora existam várias teorias. A contaminação dos folículos pilosos e das glândulas da região anal por material fecal e secreções pode ocasionar necrose, ulceração e inflamação crônica nos tecidos e
pele perianais. Os animais acometidos podem ser predispostos a dermatopatia generalizada. Hipotireoidismo, defeito imunológico ou qualquer componente imunomediado pode contribuir para a suscetibilidade. O risco de contaminação é maior nos cães
com cauda de base larga e as dobras anais profundas podem causar retenção de fezes nas glândulas retais, o que pode ter um papel importante. Os tratos fistulares são revestidos por tecido inflamatório crônico e, frequentemente, se estendem até o lúmen do
reto e ânus. A infecção pode se disseminar para estruturas mais profundas envolvendo o esfíncter anal externo e, portanto, deve ser tratada imediatamente.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em cães, os sintomas são mudança de comportamento, tenesmo, disquezia, anorexia, letargia, diarreia e tentativas de morder e lamber a região anal. Os sintomas em gatos são semelhantes aos que ocorrem nos cães, mas podem incluir
pelame emaranhado e permanência do animal na caixa de areia.
TRATAMENTO:  Até recentemente, o tratamento de fístula perianal era frustrante tanto para veterinários quanto para os proprietários. Tradicionalmente, o tratamento cirúrgico inclui saculectomia anal, além de eliminação dos tecidos acometidos. Esta técnica
implica  excisão  cirúrgica,  desbridamento,  fulguração  e  criocirurgia.  A  amputação  da  cauda  em  sua  base  pode  ser  realizada  isoladamente,  ou  junto  com  outra  modalidade  terapêutica.  A  cirurgia,  atualmente,  é  recomendada  apenas  para  fístulas  que  não
respondem à terapia medicamentosa. As sequelas da cirurgia incluem incontinência fecal, estenose retal e recidiva.
A ciclosporina é considerada um tratamento efetivo; geralmente é administrada por 16 semanas e por período adicional de 4 semanas, após cicatrização completa da fístula. A administração concomitante de cetoconazol permite redução da dose e do custo
da terapia com ciclosporina. O tratamento imediato com ciclosporina associada ao cetoconazol é recomendado logo no início da doença para reduzir o risco de recidiva. Uma alternativa mais barata do que a ciclosporina é a administração de azatioprina e
metronidazol por aproximadamente 4 a 8 semanas, seguida de excisão cirúrgica da lesão residual e manutenção do tratamento medicamentoso por 3 a 6 semanas adicionais. O uso tópico de tacrolimo (pomada 0,1%, 1 ou 2 vezes/dia) também é efetivo em
alguns cães. Outros aspectos do tratamento medicamentoso incluem uso de enema para aliviar a disquezia. A limpeza perianal e o uso de antibióticos podem diminuir a inflamação.

 HÉRNIA PERINEAL
A hérnia perineal é uma protrusão lateral de um saco herniário revestido pelo peritônio, entre o músculo elevador anal e o músculo do esfíncter anal externo ou o músculo coccígeo. A prevalência é desproporcionalmente maior nos cães machos de 6 a 8 anos
de idade, não castrados; animais das raças Welsh Corgi, Boston Terrier, Boxer, Collie, Kelpie e seus mestiços, Dachshund e seus mestiços, Old English Sheepdog e Pequinês são predispostos.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Muitos fatores estão envolvidos, dentre eles predisposição racial, desequilíbrios hormonais, doenças da próstata, constipação intestinal crônica e fraqueza no diafragma pélvico devido ao esforço crônico. A maior prevalência em
machos não castrados é uma evidência de que as influências hormonais, provavelmente, exerçam um papel fundamental. Acredita­se que a hipertrofia prostática contribua para o desequilíbrio de hormônios sexuais. Tanto os estrógenos como os andrógenos
são citados como agentes causais.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Os sintomas clínicos comuns são constipação intestinal e obstipação, tenesmo e disquezia. Pode ocorrer estrangúria e obstrução urinária secundária à retroflexão da bexiga e da próstata. Pode ocorrer estrangulamento
visceral. Há evidente aumento do volume perineal ventrolateral ao ânus. A herniação pode ser bilateral, mas em 2/3 dos casos são unilaterais e > 80% destes são do lado direito.
A consistência do aumento de volume é macia, flutuante e ele pode ser reduzido manualmente. A tumefação dolorosa e firme pode ser compatível com retropulsão da bexiga e da próstata. Geralmente, a determinação do seu conteúdo é feita por meio de
exame retal e centese perineal (para determinar se há urina). Mais de 90% das hérnias perineais apresentam desvio retal, que é uma saculação retal no interior do saco herniário, onde as camadas da parede retal permanecem intactas.
TRATAMENTO:  Raramente, a hérnia perineal é uma emergência, exceto quando a bexiga é estrangulada e o animal não consegue urinar. Se não for possível realizar cateterização, a urina deve ser removida por meio de cistocentese e deve­se tentar reduzir a
hérnia. Pode ser necessário um cateter urinário fixo para assegurar a patência uretral e evitar recidiva da obstrução.
A correção cirúrgica é sempre indicada e a castração concomitante é recomendada para reduzir o risco de recidiva. O prognóstico é reservado devido à alta prevalência de recidiva (10 a 46%) e às complicações pós­operatórias, como infecções, fístulas
retocutâneas, fístulas de saco anal, compressão dos nervos ciático e pudendo e prolapso retal.

 LACERAÇÕES RETAIS
Separação, ruptura ou laceração da mucosa retal ou anal ocorre como resultado de laceração ocorrida no lúmen. Há envolvimento de corpos estranhos (p. ex., ossos afiados, agulhas e outros materiais grosseiros). Ferimentos por mordedura e, nos grandes
animais, trauma decorrente de palpação retal são causas comuns. A ruptura pode envolver somente as camadas superficiais do reto (ruptura parcial) ou atingir todas as camadas (ruptura completa).
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Constipação intestinal e relutância em defecar geralmente se devem à dor. O diagnóstico baseia­se na constatação de tenesmo e hemorragia, alteração de coloração da região perineal, inspeção do reto e ânus; a presença
de sangue fresco na luva ou nas fezes, após exame retal, é sugestiva de laceração retal. Pode haver edema quando a lesão persiste. Deve­se avaliar cuidadosamente a integridade do esfíncter anal externo.
TRATAMENTO:  Em todas as espécies, o tratamento deve ser realizado imediatamente. A região anorretal deve ser higienizada por completo e antibióticos sistêmicos de amplo espectro devem ser utilizados. Podem–se aplicar fluidos IV e flunixino meglumina
para evitar ou tratar choque séptico e endotóxico. Em pequenos animais, as lacerações devem ser desbridadas e suturadas através do orifício anal, por meio de laparotomia ou pela combinação de ambas, de acordo com a localização e extensão da ruptura.
Devem­se administrar antibióticos e amolecedores fecais no pós­operatório.
Em bovinos e equinos, a perfuração acidental do reto durante o exame retal requer tratamento imediato para reduzir o risco de peritonite e morte. A exploração abdominal ampla deve ser lenta, cuidadosa e delicada. Deve­se evitar o uso das pontas dos
dedos excessivamente, bem como introduzir o braço em um local que oferece resistência. Em equinos, as rupturas de reto são classificadas de acordo com as camadas teciduais acometidas. A laceração grau I envolve a mucosa ou a submucosa. A laceração
grau II implica ruptura somente das camadas musculares. A laceração grau III compromete as camadas mucosa, submucosa e muscular, inclusive se estendem para o interior do mesorreto. Na laceração grau IV ocorre perfuração de todas as camadas do reto
e extensão para o interior da cavidade peritoneal.
Pode­se realizar tratamento conservativo da laceração grau I com antibióticos de amplo espectro e fluidos IV. O uso de flunixino meglumina é indicado para evitar ou tratar choque endotóxico. Deve­se administrar óleo mineral por meio de sonda gástrica
para amolecer as fezes e a dieta deve consistir de forragem de pastagem ou alfafa. As lacerações graus II e III requerem cirurgia imediata e mais ampla. O prognóstico da laceração grau IV é ruim; só deve ser corrigida se for pequena e se o tratamento é
iniciado antes que a cavidade peritoneal seja muito contaminada.

 NEOPLASIAS RETAIS
Geralmente,  as  neoplasias  retais  malignas  são  adenocarcinomas,  nos  cães,  e  linfossarcomas,  nos  gatos.  Os  adenocarcinomas  têm  crescimento  lento  e  são  infiltrativos.  Pode  surgir  metástase  local  ou  sistêmica  antes  de  se  observar  tenesmo,  disquezia,
hematoquezia ou diarreia. Cirurgia é o tratamento de escolha no caso dos adenocarcinomas, mas pode não ser gratificante, pois em geral já há metástase previamente ao diagnóstico. Os gatos com linfossarcoma retal devem ser tratados clinicamente com
fármacos antineoplásicos.

 PÓLIPOS RETAIS
Os pólipos adenomatosos retais são pouco frequentes e geralmente benignos, principalmente em pequenos animais. Quanto maior o pólipo, maior é o risco de malignidade. Os sintomas incluem tenesmo, hematoquezia e diarreia. Geralmente, o pólipo é
palpável pelo reto, sangra facilmente e há ulceração superficial. Periodicamente, o pólipo pode prolapsar através do orifício anal. A excisão cirúrgica com frequência é acompanhada de rápida recuperação clínica e um longo período de sobrevida. Podem
ocorrer novos pólipos após a cirurgia. Deve­se enviar, sempre, uma amostra de tecido obtida por biopsia para diagnóstico histopatológico.

 PROLAPSO RETAL
No prolapso retal, ocorre protrusão de uma ou mais camadas do reto através do ânus, devido ao tenesmo persistente associado a doença intestinal, anorretal ou urogenital. O prolapso pode ser classificado como incompleto, no qual apenas a mucosa retal está
evertida ou completo, quando há protrusão de todas as camadas do reto.
ETIOLOGIA:  O prolapso retal é comum em animais jovens com diarreia grave e tenesmo. Os fatores causais incluem enterite grave, endoparasitismo, anormalidades no reto (p. ex., corpos estranhos, lacerações, divertículos ou saculações), neoplasias retais
ou do cólon distal, urolitíase, obstrução uretral, cistite, distocia, colite e doença de próstata. Hérnia perineal ou outra causa de interrupção da inervação normal do esfíncter anal externo também pode causar prolapso.
Animais de qualquer idade, raça ou sexo podem ser acometidos. Provavelmente, o prolapso retal é a gastroenteropatia mais comum em suínos, devido à diarreia ou fraqueza do tecido de sustentação retal dentro da pelve. Em bovinos, pode estar associado
à coccidiose, raiva, prolapso vaginal ou uterino; ocasionalmente, acasalamentos excessivos e lesão traumática associada podem ser a causa em touros jovens. Prolapso retal é comum em ovinos com corte de cauda curto e, especialmente, em cordeiros de
lotes de engorda, nos quais rações ricas em concentrado podem ser os agentes causais. O uso de estrógenos como promotores de crescimento ou a exposição acidental á micotoxinas estrogênicas também podem predispor os grandes animais ao prolapso
retal.
ACHADOS CLÍNICOS, LESÕES E DIAGNÓSTICO:  A presença de uma massa cilíndrica e alongada que protrai através do orifício anal geralmente define o diagnóstico. No entanto, ela deve ser diferenciada de intussuscepção ileocólica prolapsada por meio de
introdução de sonda, de instrumento rombo ou do dedo entre a massa prolapsada e a parede interna do reto. No prolapso retal não se consegue introduzir o instrumento devido à presença de um fórnix.
Ulceração, inflamação e congestão da mucosa retal são achados comuns. No início, há um segmento inflamado, não ulcerado e curto; posteriormente, a superfície mucosa escurece e pode tornar­se congesta e necrosada.
TRATAMENTO:  Em todos os animais, é muito importante identificar e eliminar a causa do prolapso.
Em pequenos animais, o tratamento inclui reposicionamento imediato do tecido prolapsado viável em sua localização anatômica apropriada, ou amputação se o segmento estiver necrosado. Os prolapsos pequenos ou incompletos podem ser reduzidos
manualmente, sob anestesia, com um dedo ou supositório. Lavagem com solução salina morna e lubrificação com gel solúvel em água do tecido prolapsado devem ser previamente realizadas. Como alternativa, uma solução de glicose hipertônica (glicose
50% ou manitol 70%) aplicada topicamente pode ser usada para aliviar o edema de mucosa. Indica­se sutura em bolsa­de­fumo anal, frouxa, por 5 a 7 dias. Pode­se evitar a tensão por meio da aplicação tópica de um anestésico (pomada de dibucaína 1%) ou
administração de narcótico por via epidural, antes ou após a redução ou correção. No pós­operatório, recomenda­se dieta úmida e amolecedor fecal (p. ex., o sulfossuccinato sódico de dioctila). A diarreia, após a cirurgia, pode necessitar tratamento.
Quando há dúvida quanto à viabilidade tecidual e esta impede a redução manual, há necessidade de ressecção e anastomose do reto. Quando o tecido retal estiver viável, mas não for tratável por meio de redução manual, indica­se celiotomia seguida de
colopexia para evitar recidivas. Como indicado no tratamento medicamentoso, pode­se utilizar anestesia epidural para reduzir a tensão.
Em  grandes  animais  sugere­se  anestesia  epidural  caudal  para  reduzir  a  tensão,  facilitar  o  reposicionamento  do  prolapso  e  permitir  manipulações  cirúrgicas.  Recomenda­se  redução  e  retenção  com  sutura  em  bolsa­de–fumo.  A  sutura  deve  ser
suficientemente frouxa para deixar abertura de um dedo no interior do reto, em suínos e ovinos, e uma abertura ligeiramente maior em bovinos e equinos. O prolapso retal em éguas, se negligenciado, pode levar ao prolapso do cólon menor. O suprimento
sanguíneo para o cólon menor é facilmente interrompido. O reposicionamento de um prolapso retal com prolapso do cólon menor, seguido por sutura em bolsa­de­fumo anal tem prognóstico desfavorável. Um tratamento mais agressivo do prolapso deve se
basear na condição do reto. Em geral, o prolapso pode ser resolvido com medidas conservadoras, exceto quando há necrose ou trauma profundo evidente no tecido, ou caso o tecido evertido se encontre firme, endurecido e irredutível. Neste caso deve­se
realizar ressecção ou amputação do tecido da submucosa. A amputação retal deve ser reservada aos casos graves. A amputação completa implica maior prevalência de estenose retal, especialmente em suínos. Pode­se utilizar anel de prolapso, êmbolo de
seringa ou tubo plástico, como alternativa à amputação cirúrgica, em suínos e ovinos. No pós­operatório, o animal deve receber antibióticos. Em equinos, pode­se utilizar amolecedores fecais. Em geral, a correção de prolapso retal em cordeiros em idade de
abate não é economicamente viável.

 TUMORES PERIANAIS
Ver tumores de glândula hepatoide, p. 953 e tumores de glândula apócrina oriundos do saco anal, p. 953.

ODONTOLOGIA

GRANDES ANIMAIS
A maior parte dos grandes animais é herbívora e o funcionamento dentário eficiente é fundamental para o consumo alimentar e para a manutenção de condição corporal normal. Os dentes dos herbívoros evoluíram para se ajustar aos atritos entre os dentes
decorrentes do pastejo ou pela ruminação praticamente contínua.
As  forças  de  desgaste  são  compensadas  pelo  desenvolvimento  de  dente  hipsodonte  (coroa  alta)  com  erupção  contínua  da  coroa  de  reserva.  As  arcadas  dentárias  (6  dentes  na  região  malar,  em  equinos)  possuem  dentição  regular  que  expõem  bordas
esmaltadas afiadas, para cortar e prensar alimentos com alto teor de celulose. Ao mesmo tempo, a fragilidade do esmalte dentário é protegida pela dentina ao seu redor e ao cemento periférico.
Dentre os grandes animais domésticos comuns, geralmente os equinos exigem maior cuidado dentário. Na suinocultura, o corte ou amputação de dentes caninos decíduos nos leitões e a amputação de presas nos varrões podem ser parte do manejo destes
animais. Nos camelídeos do Novo Mundo (lhamas etc.), faz­se o desgaste dos dentes de briga (ou seja, incisivos e caninos superiores e os caninos inferiores) para reduzir o risco e as consequências da briga. (Ver, lhamas e alpacas, p. 1954, para cuidados
dentários adicionais). As espécies exóticas também podem apresentar várias alterações dentárias, como compressão de presas em elefantes jovens ou periostite dental maxilar e actinomicose em cangurus e cangurus­mirins.

Exame dos Dentes
Na maioria dos casos há correlação entre os achados de anamnese, a idade e os sintomas clínicos. Sempre, deve­se realizar exame físico completo, seguido de exame minucioso dos dentes e da cavidade bucal. Na maioria dos grandes animais, inclusive em
equinos, este procedimento pode exigir sedação; alguns animais podem necessitar anestesia geral. O exame completo da cavidade bucal pode ser facilitado quando a boca é lavada com água morna e o profissional utiliza um foco de luz, juntamente com um
espéculo bucal. O uso de um espelho dentário ou de câmara de endoscopia melhora muito a qualidade do exame.

Profilaxia e Extração Dentária de Rotina
A profilaxia dentária de rotina é importante nos cuidados da saúde dos equinos. As bordas do esmalte devem ser removidas duas vezes por ano, ao longo do período de erupção dos dentes permanentes e, posteriormente, conforme necessário, de acordo com
o manejo do animal. Os equinos com acesso livre à pastagem em geral requerem profilaxia dentária anualmente; equinos estabulados e alimentados apenas com feno e grãos podem necessitar profilaxia dentária e exame bucal duas vezes por ano.
O  objetivo  da  profilaxia  dentária  é  remover  as  bordas  afiadas  dos  dentes  da  região  malar,  as  quais  podem  causar  lesão  de  tecido  mole  e  alongamento  da  superfície  de  oclusão.  Impede­se  o  desenvolvimento  de  irregularidades  de  desgastes  das
arcadas dentárias por meio da manutenção da superfície de oclusão normal. Geralmente, é possível realizar profilaxia dentária mediante contenção simples e/ou uso de sedativos e analgésicos. Atualmente são utilizados com maior frequência equipamentos
elétricos para limar, nivelar e realinhar as superfícies de oclusão dos dentes incisivos e da região malar. Estes instrumentos devem ser usados com cautela, de modo a evitar traumatismo térmico e de pressão na dentina e na polpa. Isso implica no emprego de
esmeril de baixa velocidade, com curto período de contato e pouca pressão, além da remoção de no máximo 3 a 5 mm da superfície de oclusão, a cada 3 a 6 meses.
A maioria dos procedimentos dentários pode ser realizada com o equino em pé, sob sedação com ou semanas anestesia regional; todavia, alguns procedimentos (p. ex., reparo de fratura e extração) geralmente requerem anestesia geral. Na maioria dos
casos há necessidade de exame radiográfico e proteção das vias respiratórias contra os restos teciduais. Alguns dentes deteriorados podem ser extraídos utilizando­se afastador molar, pinça de extração e aparador. No entanto, em alguns casos é preferível
realizar exposição cirúrgica e remoção do dente. A preservação do dente por ressecção da extremidade da raiz e tratamento endodôntico tem mostrado que a extração não é necessária em todos os casos de deterioração de dentes em equinos.

Sintomas de Doença Dental
As doenças dentais (p. ex., fratura de dente e arcada dentária irregular) são causas primárias comuns de definhamento, perda da condição corpórea ou mau desempenho reprodutivo ou de aleitamento. Em equinos, os sintomas clássicos de doença dental
incluem dificuldade ou demora em se alimentar e relutância em beber água fria. Durante a mastigação o equino pode parar por alguns momentos e depois começar novamente. Às vezes, a cabeça é mantida para um lado, como se o animal sentisse dor.
Ocasionalmente, o equino pode “cuspir”, ou seja, preender o alimento, transformá­lo em um bolo, mas deixá­lo cair da boca após mastigação parcial. Em alguns casos, o conteúdo alimentar semimastigado pode se alojar entre os dentes e a bochecha. Para
evitar o uso do dente dolorido ou uma lesão de boca o equino pode engolir rapidamente o alimento e, em seguida, manifestar indigestão, obstrução ou cólica. Pode evitar a ingestão de grãos duros e, juntamente, notam­se grãos não mastigados nas fezes.
Outros sintomas de doença dental em equinos incluem salivação excessiva e muco sanguinolento na boca, bem como hálito fétido decorrente de deterioração dental. Deterioração extensa de dentes acompanhada de periostite e abscesso radicular pode
provocar empiema em seios paranasais e secreção nasal unilateral intermitente. Pode haver tumefação facial ou mandibular e desenvolvimento de fístulas mandibulares por infecções apicais nos dentes da região malar.
Os equinos podem relutar durante a colocação do freio na boca, chacoalhar a cabeça quando montados ou resistir a técnicas de treinamento devido ao desgaste irregular dos dentes da região malar e às bordas afiadas nos dentes maxilares acompanhadas de
laceração da mucosa bucal. Nos equinos, a presença de dentes­de­lobo pode ou não estar associada à resistência à colocação do freio.

 ANOMALIAS CONGÊNITAS E DE DESENVOLVIMENTO
Nos equinos, a deformidade bucal congênita mais comumente diagnosticada é a “boca de papagaio”, na qual a maxila é maior que a mandíbula. Em equídeos e bovinos, podem ocorrer várias anomalias de desenvolvimento dental em consequência da
exposição a toxinas teratogênicas. Entretanto, deve­se sempre considerar um fator genético como causa primária.
Em bovinos e ovinos, notam­se irregularidades dentárias acompanhadas de fluorose sistêmica. Nas formas mais discretas de fluorose pode haver envolvimento apenas dos dentes. Em casos extremos de fluorose (p. ex., 40 ppm na dieta, por vários anos),
podem–se observar outras anormalidades esqueléticas (fraturas de falange) (Ver p. 3119).
Ocasionalmente, notam­se dentes supranumerários (poliodontia). Tanto nos equinos quanto nos bovinos, é possível notar fileiras duplas de dentes incisivos ou dentes malares extras. O tratamento é determinado individualmente e pode exigir extração dos
dentes extras.
Ver dentes, p. 168.

 ANORMALIDADE NA ERUPÇÃO DOS DENTES
A erupção anormal de dentes permanentes é uma sequela comum de trauma mandibular ou maxilar como, por exemplo, fratura por avulsão dos dentes incisivos em bovinos e equinos, nas quais há lesão da papila dental em desenvolvimento do dente
permanente pela própria fratura ou pelo mecanismo de reparação. Em equinos, o retardo na erupção ou a compactação dos dentes molares é causa comum de osteíte apical e subsequente deterioração do dente. Isso acomete particularmente o terceiro dente
molar (4o pré­molar [108, 208, 308 e 408, do sistema de numeração Triadan]), tanto na arcada superior quanto na inferior, sendo uma sequela de discreta sobreposição dos dentes. O deslocamento medial do terceiro dente molar é outra forma de erupção
anormal devido à sobreposição de dentes.

 CÁRIES DENTÁRIAS
A infecção pode ser introduzida na cavidade pulpar de diversas maneiras, como por exemplo, por via hematógena, periodontal ou por lesão direta à coroa dental. Nos equinos, a hipoplasia do cemento na camada de esmalte (infundíbulo) dos dentes malares
superiores pode predispor à cárie no infundíbulo, seguida de pulpite e osteíte apical. Dependendo da localização do dente acometido, podem ocorrer sintomas de sinusite maxilar, celulite local, periostite, periodontite alveolar e formação de fístulas. As
características patológicas da deterioração dentária são inespecíficas. Consequentemente, a etiologia da infecção apical no caso de fístula dentária mandibular com secreção em uma lhama ou em um equino pode ser indefinida. Muitos animais não são
examinados até que a infecção esteja avançada e, em vez de primárias, as fraturas de dentes podem ser também secundárias. Em algumas espécies (p. ex., equina) sugere­se que o fator predisponente de osteíte apical e pulpite é a ocorrência de compactação
anormal dos dentes. A etiologia da osteíte apical em camelídeos do Novo Mundo e nos bovinos também pode igualmente influenciada.
Quando a deterioração dentária é grave, recomenda­se a extração do dente acometido. Em equinos, geralmente é feita mediante exposição cirúrgica do dente acometido e posterior extração. Dados recentes mostram que a extração bucal é possível, por
meio de técnicas cuidadosas, sedação e bloqueio nervoso; desta forma é possível evitar complicações graves associadas à extração, bem como o emprego de anestesia geral. O alvéolo dentário deve ser higienizado cuidadosamente a fim de remover todos os
fragmentos  de  osso  e  dente  acometidos.  Devem­se  utilizar  acrílicos  dentários,  massas  odontológicas  e  envoltórios  para  garantir  que  o  alvéolo  dentário  cicatrize  adequadamente,  protegendo­o  de  restos  de  alimentos.  Após  extrações  dentárias,  os  dentes
adjacentes se movem gradualmente para preencher o espaço na arcada dentária. No entanto, esse processo nunca se completa e a arcada de oclusão formará um declive no lado oposto ao dente extraído, bem como encurvamento nas extremidades das arcadas
opostas (tanto rostral quanto caudal). Nos equinos estas irregularidades podem ser corrigidas por meio de polimento e realinhamento das arcadas a cada 6 a 12 meses.
Devido a estas complicações, especialmente em equinos, devem­se empregar técnicas cirúrgicas que preservem os dentes. Em grandes animais, antes da ressecção da extremidade da raiz e do tratamento endodôntico deve­se considerar a idade e as
características específicas da doença local.

 DESGASTE IRREGULAR DOS DENTES
Exceto no caso dos suínos, a maioria dos grandes animais possui um espaço intermandibular mais estreito que o espaço intermaxilar; ou seja, são anisognáticos. Em equinos, tal condição, juntamente com o movimento natural limitado da mandíbula, resulta
no desenvolvimento de pontos de esmalte nas bordas bucais da arcada superior e nas bordas linguais da arcada inferior. Em bovinos e ovinos, como a articulação temporomandibular propicia maior movimentação lateral da mandíbula, estas irregularidades
não ocorrem com tanta frequência. No entanto, formas mais graves da doença são observadas em todas as espécies e podem ser influenciadas por outras deformidades esqueléticas faciais ou infecções associadas (p. ex., Actinomyces sp). Boca com aspecto
de tesoura pode ser decorrência da obliquidade exagerada das superfícies molares. Pode acometer equinos idosos e geralmente o tratamento não é satisfatório. O cuidado com os dentes deve ser complementado por dietas especiais.
Nos  equinos,  os  pontos  de  esmalte  são  melhor  tratados  por  meio  de  profilaxia  dentária  regular  (ou  seja,  polimento).  Isso  deve  ser  feito  duas  vezes  ao  ano,  até  que  a  dentição  permanente  esteja  completa;  ao  mesmo  tempo,  devem  ser  removidos  os
revestimentos dentais quando há ulceração ou desconforto bucal.
Mandíbula  em  onda,  mandíbula  em  degrau  e  curvas  rostral  e  caudal  são  irregularidades  causadas  pelo  desgaste  desigual  dos  dentes  e  são  decorrências  de  dor  local,  mau  alinhamento  da  mandíbula  ou  dos  dentes  ou  dente  ausente  ou  danificado.
Eventualmente, pode ocorrer doença gengival e alveolar secundária (i. e., periodontite). Estas afecções são prevenidas mediante profilaxia dentária regular de rotina. Quando as alterações decorrentes de desgaste dental são graves, o resultado final dos
procedimentos dentários geralmente não é completo. Embora as superfícies de oclusão possam ser realinhadas, os cuidados com os dentes devem ser complementados com o uso de dietas especiais.

 DOENÇA PERIODONTAL
Em todos os animais, há certo grau de inflamação durante a erupção dos dentes, tanto decíduos quanto permanentes. No entanto, caso ocorra má oclusão, uma doença periodontal grave é inevitável. Em equinos, isso é uma sequela comum de formação de
diastema, lesão bucal, compactação e fratura de dente, geralmente acompanhada de desgaste irregular.
Em ovinos, a doença periodontal de dentes mandibulares rostrais (incisivos) geralmente é conhecida como “boca quebrada”. Em alguns casos, a capacidade do pastejo do ovino é gravemente acometida. Geralmente, a vida produtiva de muitos ovinos
alimentados em sistema de confinamento é dois anos mais longa do que a dos animais com acesso livre à pastagem. Poucas medidas podem ser empregadas para alterar a progressão da doença, embora se recomende profilaxia dentária e restauração da
regularidade de oclusão dos dentes incisivos. Isso pode ser feito com auxílio de esmeril dentário ou bastão dental com lâmina fina.

PEQUENOS ANIMAIS

 ANORMALIDADES DO DESENVOLVIMENTO
Crescimento  e  desenvolvimento  adequado  da  cavidade  bucal  dependem  de  uma  série  de  eventos  que  devem  acontecer  em  uma  sequência  correta.  Alterações  genéticas  ou  traumas  que  alteram  o  desenvolvimento  dos  tecidos  ou  o  tempo  de  seu
desenvolvimento podem ocasionar anormalidades. Os defeitos que causam prejuízo ao bem­estar, à saúde ou à atividade do paciente devem ser tratados, mas aqueles que envolvem apenas uma condição estética não devem. Problemas de desenvolvimento
comuns incluem persistência de dentes decíduos, retenção de dentes, malformação dentária, má oclusão e maxilas mal formadas.

Persistência de Dentes Decíduos
Em filhotes de cães e gatos, os dentes decíduos auxiliam na funcionalidade da cavidade bucal de pequeno tamanho (dentes em menor número e tamanho), por um determinado período de tempo. O trauma dentário durante a fase de exploração bucal ativa
geralmente é compensado pela esfoliação dos dentes lesionados à medida que os permanentes surgem. Os dentes permanentes são maiores em tamanho e número e irrompem à medida que as maxilas se desenvolvem para acomodá­los.
A esfoliação dos dentes decíduos é um mecanismo complexo e envolve a pressão exercida pela coroa do dente permanente subjacente contra a raiz do dente decíduo. Se a erupção do dente permanente não ocorre na posição correta o dente decíduo pode
permanecer  em  sua  posição.  Isso  pode  ser  devido  à  hipodontia  acompanhada  de  ausência  de  dente  permanente  sucedâneo,  leito  do  dente  permanente  geneticamente  mal  posicionado  ou  deslocamento  traumático  do  leito  dental.  A  persistência  do  dente
decíduo em local com muito espaço não causa problema. Entretanto, se há compactação com o dente permanente (geralmente, é o que ocorre com o dente canino), este local torna–se predisposto à periodontite. Além disso, o dente permanente deslocado
pode causar oclusão traumática, que deve ser tratada. O tempo de esfoliação do dente decíduo e a substituição deste pelo dente permanente são geneticamente determinados. Em casos raros, o trauma ocorrido durante o desenvolvimento dentário pode causar
deslocamento do leito dentário, o que interfere na esfoliação.
É comum notar dois dentes caninos ao mesmo tempo. A erupção do dente canino permanente superior é medial (“rostral”) ao dente decíduo, com aspecto de um dente canino mais largo e rombudo, rostral a um dente mais estreito e com cúspide afilada. A
erupção do dente canino permanente inferior é em direção lingual (medial) ao dente decíduo, com aspecto de um dente canino mais largo e rombudo em direção à língua, próximo a um dente mais estreito e cúspide afilada, localizado próximo ao lábio. Na
região  dos  dentes  pré­molares  é  comum  verificar  um  dente  decíduo  semanas  o  dente  permanente  correspondente.  Um  dente  pré­molar  menor  do  que  o  normal  deve  ser  radiografado  para  que  sua  anatomia  e  estrutura  radicular  sejam  avaliadas,  o  que
determina se este é um dente decíduo.
Deve­se realizar a extração de um dente decíduo que permanece fixo (semanas mobilidade) após a erupção do dente permanente que o sucede. Os dentes decíduos persistentes, semanas um dente permanente substituto, devem ser mantidos, desde que as
raízes estejam preservadas. Entretanto, deve–se realizar avaliação radiográfica para confirmar que não há dentes permanentes retidos e que as raízes não estão sendo reabsorvidas.
Sabendo­se que a maioria dos casos de persistência de dentes decíduos tem origem genética, os animais acometidos não devem ser utilizados como reprodutores, exceto se a causa for traumática.

Dentes Retidos
A erupção dentária é geneticamente programada. Algumas raças, especialmente as pequenas (p. ex., Maltês), são predispostas à erupção incompleta ou retardada. Algumas raças braquicefálicas são predispostas a alterações nos primeiros dentes pré­molares,
que ficam retidos devido sua má posição. O trauma também pode mover o leito dentário para uma posição que impede a erupção devido ao contato contra outras estruturas.
Em algumas raças (principalmente Terrier), a ausência de alguns pré­molares é considerada um achado normal. Entretanto, na maioria dos animais deve­se indicar o exame radiográfico quando se nota um local semanas dentes, onde deveria existir. O
dente retido é facilmente identificado.
Os dentes parcialmente retidos por uma porção de gengiva persistente podem ser tratados mediante gengivectomia, a fim de para moldar o tecido à arquitetura normal. Os dentes que completamente retidos, após o desenvolvimento, podem permanecer
imóveis e devem apenas ser monitorados. Entretanto, podem também originar cistos dentígeros que podem lesionar uma porção extensa das maxilas. Os primeiros pré­molares são mais predispostos à formação de cistos, principalmente em cães de raças
braquicefálicas. Por este motivo, deve­se investigar radiograficamente a ausência do primeiro dente pré­molar; se estiver exposto, deve ser extraído ou monitorado periodicamente com auxílio de radiografias. Outros dentes retidos associados a alterações
devem ser extraídos. A excisão cirúrgica de dentes caninos mandibulares fixados em pontos profundos é um desafio.
Animais com dentes retidos não devem ser utilizados como reprodutores, exceto se a causa for um trauma.

Dentes Malformados
Durante a formação dos dentes, qualquer interrupção neste processo pode originar um dente malformado. A causa pode ser traumática, metabólica, infecciosa ou, raramente, genética. As lesões à epiteliogênese (p. ex., causados por parvovírus, vírus da
cinomose e febre alta), que ocorrem durante a amelogênese, causam hipoplasia de esmalte ou hipomineralização. A ocorrência de lesão durante a formação da dentina pode ocasionar ausência ou malformação das raízes dentais.
As anormalidades no esmalte podem ser regionais, com linhas circulares delimitando uma região com ausência de esmalte (superfície irregular e manchada), ou generalizadas, com perda completa do esmalte. A disgenesia radicular pode resultar em coroa
de aparência relativamente normal, porém móveis. A ausência de raiz dental é facilmente identificada no exame radiográfico. A convergência das raízes dentárias do primeiro dente molar inferior é uma alteração individual interessante e possivelmente sua
origem é genética. Raramente, esta afecção é notada em outros dentes. A coroa pode parecer normal ou ter um pequeno sulco oriundo do desenvolvimento na superfície bucal que se estende até a margem da gengiva. A radiografia revela que as raízes
convergem em seu ápice, em vez de manter o posicionamento divergente normal. Em alguns casos, a coroa é bem maior do que a raiz. A convergência causa arqueamento dorsal da região ventral da câmara pulpar, para o interior de sua parte central, o que
resulta em imagem radiográfica de “dens­in­dente” ou “dens invaginatum”. Estes dentes comumente têm uma comunicação do ligamento periodontal à câmara da polpa, na região da bifurcação, o que resulta em alta prevalência de doenças endodônticas.
Geralmente, várias outras anormalidades dentárias podem ser constatadas, como dentes supranumerários, dentes duplicados (dente supranumerário ocupando o mesmo lugar de outro dente), dentes unidos parcialmente (dentes supranumerários fundidos),
raízes supranumerárias e dentes “em pino” (dentes cilíndricos e pequenos).
Hipoplasia de esmalte ou hipomineralização deve ser tratada por meio de selamento precoce da dentina para evitar a penetração de bactérias na polpa. O uso de verniz dental contendo resina também pode proteger a dentina mais delicada frente à abrasão e
mantém uma superfície lisa, na qual é menos provável a formação de placa; entretanto, pode ocorrer desgaste ou fragmentação. O prognóstico a longo prazo para disgenesia de raiz é ruim. Os dentes podem ser preservados durante anos mediante higiene
bucal cuidadosa e prevenção de uso excessivo ou trauma dental. Dentes anômalos devem ser investigados com o intuito de detectar uma doença associada; muitos não causam problemas e não requerem tratamento.
Dentes malformados podem ser consequências de traumas, infecções ou anormalidades genéticas. Em geral, a prevenção e os cuidados de rotina durante a fase de desenvolvimento dental evitam que isso ocorra.

Má Oclusão e Maxilas Malformadas
Na maioria dos casos a má oclusão é de origem genética; entretanto, trauma durante o desenvolvimento dental pode interferir no crescimento normal dos dentes. Por meio de manejo reprodutivo, é mais fácil manipular o comprimento maxilar do que o
mandibular. Logo, a seleção por cabeça e focinho mais longos acidentalmente origina animais para distoclusão mandibular (ou seja, mordida profunda, braquignatismo, boca de papagaio), enquanto a seleção de animais com cabeça “bloqueada” e focinho
menor resulta em mesioclusão mandibular (ou seja, braquicefalia, prognatismo). Os maxilares, inferior e superior, se desenvolvem em velocidades diferentes, fazendo com que o momento da erupção dos dentes seja muito importante. Se os maxilares têm
uma relação anormal entre si no momento que os dentes permanentes têm tamanho suficiente para a oclusão, a dentição se fecha de forma anormal. Se isso ocorre apenas em um lado pode ocorrer crescimento contínuo em um lado, não ocorrendo no outro
lado, resultando em desencontro da linha média dos incisivos centrais (ou seja, mordida “torta”).
A discrepância mandíbula­maxila mais comum é horizontal, resultando em mesioclusão ou distoclusão mandibular. Geralmente, a distoclusão ocasiona oclusão traumática quando os dentes caninos mandibulares tocam o palato. Esta afecção, na maioria
das vezes, é acompanhada de linguoversão dos dentes caninos mandibulares, pois à medida que irrompem os dentes podem ser direcionados ao palato. O mau posicionamento dental também pode ser de origem genética, como a mesioversão dos dentes
caninos (ou seja, “dente em lança”), em cães das raças Dachshund e Shetland Sheepdog.
Durante o período de dentição decídua pode­se realizar intervenção ortodôntica por meio da extração seletiva de dentes decíduos. Caso haja dentes entrelaçados, a extração destes pode permitir que a maxila e/ou mandíbula cresçam de acordo com o seu
potencial genético. A mordida cruzada rostral pode ser corrigida pela extração dos dentes incisivos maxilares decíduos. Além de aliviar o problema, isto permite que os incisivos permanentes surjam em um ângulo mais labial (geralmente, estes surgem na
face palatal dos incisivos decíduos), o que auxilia na correção da má oclusão. Da mesma forma, a distoclusão mandibular de dentes decíduos pode ser tratada pela extração dos dentes caninos inferiores decíduos. Conforme mencionado anteriormente, além
de aliviar o problema, isto permite que os caninos permanentes inferiores surjam em um ângulo mais labial (geralmente, estes surgem na porção lingual dos caninos decíduos), o que auxilia na correção da má oclusão. Sempre que se faz extração de dentes
decíduos deve­se evitar o contato com o germe do dente permanente subjacente em desenvolvimento, de modo a evitar lesão ao órgão formador de esmalte e ao próprio esmalte em desenvolvimento. Este lesão pode provocar manchas amarronzadas nos
dentes permanentes devido ao defeito de esmalte. Deve­se evitar o uso de instrumentos na porção palatal dos dentes incisivos superiores decíduos ou na porção lingual dos dentes caninos inferiores decíduos. Pode ocorrer lesão ao esmalte, mesmo com o uso
de técnicas adequadas, pois o epitélio do esmalte pode ser removido quando o dente decíduo é retirado do alvéolo.
A mesioclusão dos dentes permanentes pode ser um achado normal em várias raças braquicefálicas e não deve ser tratada, exceto se resultar em má oclusão. Se há atrito entre os dentes caninos inferiores e a face palatal do segundo e terceiro incisivos
superiores, a extração destes origina um amplo diastema, no qual o canino pode se encaixar, resolvendo o problema. A mordida cruzada rostral (ou seja, incisivos superiores localizados na face lingual dos incisivos inferiores) raramente causa desconforto ou
problemas de saúde. Por outro lado, a distoclusão mandibular geralmente requer intervenção ortodôntica ou cirúrgica. Os dentes caninos podem ser movidos para uma posição atraumática (nem sempre normal), confortável e funcional. Além disso, o dente
pode ser reduzido e a polpa tratada com um enxerto pulpar. Esta abordagem requer acompanhamento radiográfico ao longo da vida, a fim de monitorar a necessidade de tratamento endodôntico definitivo.

 CÁRIES DENTÁRIAS
As cáries dentarias (“deterioração”) são infecções bacterianas dos dentes. São muito comuns em pessoas, mas pouco frequentes em cães e extremamente raras ou inexistentes em gatos. Isto pode estar relacionado com o fato da saliva de cães e gatos ser mais
alcalina do que a de pessoas; a lesão inicial da cárie é a desmineralização ácida do esmalte. Outros fatores também podem estar envolvidos, como alteração na flora bucal e na dieta que possui menor quantidade de carboidratos prontamente fermentáveis.
Em cães, geralmente a cárie se instala na superfície de oclusão dos dentes molares. A aparência é de uma lesão cavitária amarronzada, com superfície macia, na qual a extremidade de uma pinça de exame pode penetrar, cravando­a.
A parte do dente cariado deve ser removida com auxílio de pinças ou brocas dentais específicas. Devem ser realizadas radiografias para determinar se a infecção atingiu a polpa e, neste caso, o dente deve ser também submetido a tratamento de canal da
raiz. A estrutura dentária removida deve ser restaurada com amálgama ou resina sintética.
Cães que apresentam cáries dentais são predispostos a lesões adicionais; o tratamento com produto tópico à base de fluoreto de estanho, a cada duas semanas, pode ajudar na prevenção de cáries nestes animais. Como os cães não cospem, eles ingerem
qualquer medicamento utilizado. Logo, deve­se empregar apenas pequena quantidade do produto na superfície de oclusão dentária. O fluoreto pode causar gastrite, além de nefrotoxicidade, se ingerido em grande quantidade.

 DOENÇA ENDODÔNTICA
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A doença endodôntica se instala quando ocorre infecção ou inflamação da polpa dentária (tecido conectivo, vasos sanguíneos e nervos no centro do dente). A polpa é protegida das bactérias por um esmalte impenetrável que
recobre a dentina da coroa. O lesão ao esmalte, seja por trauma ou por anormalidades de desenvolvimento, resulta em pulpite e possível necrose pulpar. Trauma brusco também pode lesionar a polpa, além de sua capacidade de cicatrização. O dente com
exposição direta da polpa em um ponto de fratura requer tratamento endodôntico ou extração. Os dentes são fraturados por trauma externo (p. ex., pedras, acidente automobilístico, brincadeiras agressivas) ou por mordida em objetos inapropriados (ossos,
unhas, brinquedos duros, pedras, cercas ou gaiolas). A polpa inflamada ou necrosada libera mediadores inflamatórios nos tecidos perirradiculares, os quais saem do dente infectado através do delta apical, na extremidade da raiz ou através de canais laterais.
Nos tecidos envolvidos, surgem granulomas, cistos ou abscessos. As cáries são infecções bacterianas dos dentes (ver p. 186). Apesar de raras em cães, quando presentes, rapidamente infectam a polpa.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A alteração de coloração dos dentes indica trauma prévio e hemorragia oriunda da polpa à dentina. Após lesão discreta a polpa inflamada pode cicatrizar. Entretanto, traumatismo mais grave ocasiona pulpite irreversível e até
mesmo necrose. Em razão da ausência de circulação colateral da polpa dental, a cicatrização das lesões é mais demorada e o sangue extravasado permanece na dentina, onde se deteriora em vez de ser removido. O principal sinal de doença endodôntica é um
dente fraturado com exposição da câmara pulpar. A polpa sangra apenas por breve período. Após a lesão inicial, pode surgir uma mancha vermelha no local exposto, se a polpa estiver viva, ou um ponto preto, se ocorreu necrose. De qualquer forma, há
necessidade de tratamento. Mais frequentemente, ocorre drenagem no local da fratura. Entretanto, pode se formar um abscesso apical, quando o ponto de fratura é ocluído. A pele ventral ao canto do olho é um local comum de edema e drenagem purulenta
oriunda de uma fístula decorrente de infecção do quarto dente pré­molar superior. Também, é possível notar parúlide intraoral, ou seja, uma fístula eritematosa que drena acima ou na junção mucocutânea adjacente ao dente. Em cães, abscesso do dente
canino superior pode causar tumefação ao longo da lateral do nariz; geralmente em gatos a tumefação é rostral ao olho. Os animais raramente manifestam desconforto, mesmo nas síndromes que causam dor odontofacial intensa em pessoas.
No exame radiográfico de um dente acometido por doença endodôntica o achado típico é um brilho periapical, ou seja, uma lesão circular irregular com redução da radiopacidade ao redor da extremidade da raiz. Ao longo da vida, a polpa produz dentina
no interior da cavidade pulpar, o que resulta em redução constante do tamanho da polpa. A polpa necrosada deixa de produzir normalmente a dentina e fica menos desenvolvida do que a polpa do dente adjacente ou contralateral. Por outro lado, uma polpa
inflamada produz dentina em maior quantidade. Caso haja pulpite generalizada o dente pode ter envelhecimento acelerado evidente, com câmara pulpar e espaço do canal radicular muito estreitos.
TRATAMENTO:  Os dentes com pulpite irreversível ou necrose pulpar necessitam tratamento endodôntico (tratamento do canal da raiz) ou extração. Exceto em pacientes muito jovens, uma dessas opções deve ser indicada nos casos de fratura de dente com
exposição da câmara pulpar. Os dentes caninos, em cães e gatos, e o dente carniceiro (quarto pré­molar superior e primeiro molar inferior), em cães, são considerados estratégicos. O tratamento do canal da raiz é mais confortável ao paciente do que a
extração, além de preservar a função do dente. Cães de trabalho, como aqueles militares, da polícia, ou de desempenho podem necessitar restauração completa da coroa. Em alguns casos, perdas extensas de dentes pré­molares ou molares podem requerer
restauração da coroa para restabelecer a estrutura cervical e manter a higidez periodontal.

 DOENÇA PERIODONTAL
Doença periodontal é um termo amplo que caracteriza infecção e/ou inflamação do tecido que sustenta e circunda os dentes. Gengivite é a inflamação da gengiva. É uma resposta normal aos antígenos da placa bacteriana que se desenvolve em grande parte
dos cães e gatos adultos. A periodontite é uma doença mais grave, que envolve a inflamação do ligamento periodontal e do osso alveolar. A periodontite é mais comum em algumas raças, mas pode acometer qualquer animal.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Geralmente a cavidade bucal contém uma microflora bacteriana abundante, a qual dá origem à placa na superfície dentária. A placa bacteriana expõe antígenos constantemente à gengiva adjacente, condição que estimula a reação
inflamatória e causa gengivite. As bactérias presentes na placa são principalmente aeróbicas gram­positivas imóveis, como Staphylococcus spp e Streptococcus spp, mas também podem haver várias outras. Embora esta flora estimule a resposta imune, as
bactérias presentes na boca saudável mantêm relativa harmonia comensal com o hospedeiro, inclusive podendo ser benéficas por ajudarem a limitar o número de bactérias mais patogênicas. Se a placa é muito espessa devido à má higiene bucal, a população
bacteriana  pode  se  tornar  mais  patogênica,  com  maior  porcentagem  de  bacilos  anaeróbicos  imóveis.  As  bactérias  encontradas  quando  há  inflamação  incluem  Bacteroides  fragilis,  Peptostreptococcus,  Porphyromonas  gulae,  Porphyromonas  salivosa,
Porphyromonas  denticanis,  Prevotella  intermedia,  Treponema  spp,  Bacteroides  splanchnicus,  possivelmente  Odoribacter  denticanis  e  várias  outras.  Curiosamente,  alguns  dos  principais  patógenos  periodontais  verificados  em  pessoas,
como  Aggregatibacter  (Actinobacillus)  actinomycetemcomitans  não  estão  presentes  em  animais.  A  placa  subgengival  (placa  na  superfície  da  raiz  abaixo  da  margem  gengival)  com  frequência  também  é  habitada  por  estas  espécies  de  bactérias  mais
patogênicas. A periodontite é causada pela resposta do hospedeiro à placa subgengival. Os mediadores inflamatórios produzidos pelo hospedeiro causam lesão ao tecido e osso, ao redor da raiz. As próprias bactérias e seus metabólicos também contribuem
com a lesão óssea. O desenvolvimento de periodontite também é influenciado por outros fatores intrínsecos (características genéticas, aglomerado de dentes, osso alveolar fino, idade) e extrínsecos (dieta, estresse, doença concomitante, higiene bucal).
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A gengivite discreta (grau 1) caracteriza­se por hiperemia decorrente dos vasos sanguíneos gengivais marginais. Na gengivite moderada (grau 2) nota­se edema da margem gengival que se caracteriza por bordas espessas, em
razão do espessamento dos tecidos adjacentes aos dentes. Na gengivite de grau 3 (grave) verifica­se ulceração na superfície epitelial. A gengivite não causa dor e os únicos sintomas mais evidentes são eritema e halitose. Uma forma de gengivite juvenil
acomete alguns felinos com 6 a 8 meses de idade. Geralmente, esses gatos apresentam gengivite moderada a grave, condição rara em animais jovens.
A periodontite discreta (grau 1) caracteriza­se pela formação precoce de bolsas periodontais, à medida que o tecido de sustentação é lesionado. Estas bolsas podem acometer até um terço do comprimento da raiz. Na periodontite moderada (grau 2), a
perda de aderência da raiz acomete um a dois terços do comprimento da raiz. A perda de aderência ao longo de dois terços da raiz é considerada grave (grau 3) e geralmente é acompanhada de movimentação dos dentes e desconforto. A periodontite não
causa desconforto, exceto quando há mobilidade dental ou abscesso periodontal. Também, pode ocorrer retração de gengiva, exposição da bifurcação da raiz e perda do osso alveolar. As radiografias da cavidade bucal fornecem informações valiosas quanto
à gravidade e padrão de perda do osso alveolar.
TRATAMENTO:  A remoção da placa bacteriana que causa gengivite propicia resolução da inflamação e o tecido retorna à normalidade. Limpeza, raspagem e polimento dos dentes por profissionais são realizados sob anestesia geral. A limpeza dentária
realizada em paciente acordado melhora a aparência da coroa dos dentes, mas não a higidez periodontal. Caso não se obtenha cura da gengivite, devem­se realizar exames adicionais para identificar outros fatores complicadores, como cálculo e placa
subgengival  ou  causa(s)  predisponente(s).  Outras  causas  menos  frequentes  de  gengivite  são  as  doenças  sistêmicas  (p.  ex.,  estomatite  urêmica),  doenças  autoimunes,  gengivite  juvenil,  entre  outras,  que  requerem  outros  procedimentos  além  da  simples
remoção da placa.
A periodontite necessita tratamento mais agressivo. Deve­se realizar raspagem da raiz do dente (para remover o cálculo), polimento da raiz e remoção do cemento acometido. As bolsas periodontais não profundas são tratadas clinicamente, mas quando
sua  profundidade  é  >  6  mm  deve­se  realizar  cirurgia  para  expor  a  superfície  da  raiz,  de  modo  a  permitir  tratamento  adequado.  A  aplicação  local  de  antibióticos,  no  interior  das  bolsas,  pode  ser  útil.  Geralmente,  em  casos  de  dentes  com  aumento  da
mobilidade, cujo prognóstico é reservado a ruim, a extração é o melhor tratamento. A periodontite não é facilmente tratada como a gengivite, requerendo cirurgia óssea e colocação de implantes ósseos e membranas biológicas para regeneração tecidual e
óssea. Isto não é uma boa opção para bolsas periodontais em dentes caninos maxilares próximos ao palato, que tenham causado fístula oronasal; nestes casos o tratamento baseia­se na extração do dente canino e correção cirúrgica da fístula. Os defeitos
ósseos profundos, caracterizados por perda óssea que enfraquecem a bifurcação radicular podem ocasionar infecção da polpa por meio de canal lateral ou pela bifurcação, o que resulta em doença endodôntica secundária. A preservação destes dentes também
requer tratamento endodôntico (ver a seguir); o prognóstico varia de acordo com a doença periodontal.
Os dentes que se tornaram móveis devido à perda de aderência de suporte ósseo devem ser extraídos. Em alguns casos eles podem ser preservados por meio de enxertos ósseos, cirurgia periodontal aberta e ligadura dentária, mas ocorre recidiva quando
não se adotam mudanças efetivas na higiene bucal, no domicílio. A extração permite que o tecido cicatrize. Um cão ou gato pode viver muito melhor e com mais conforto, semanas um dente do que com um dente infectado e móvel.
PREVENÇÃO:  A prevenção de gengivite baseia­se nas mesmas medidasmencionadas no tratamento: controle e remoção da placa. A placa é um biofilme típico composto por vários microrganismos que diferem quanto suas formas planctônicas. Em um
biofilme, os microrganismos são mais resistentes aos antibióticos, desinfetantes e outros antimicrobianos. Entretanto, os biofilmes são fácil e efetivamente removidos com auxílio de uma escova de dente; mesmo quando há grande quantidade de placa
supragengival. Os dentes devem ser escovados diariamente, evitando­se acúmulo de cálculo (tártaro). Os gatos raramente aceitam escovação regular, logo a placa deve ser removida com auxílio de uma gaze, a cada dois ou três dias. Na maioria dos cães e
gatos, apenas a superfície externa (bucal/labial) dos dentes maxilares precisa ser escovada. A placa que permanece na superfície por > 3 dias se mineraliza para formar o cálculo, que não é removido com a escovação. O cálculo contribui pouco para a
ocorrência de doença periodontal, apesar de dar uma aparência de dentição não saudável.
Textura  dos  alimentos,  brinquedos  e  petiscos  podem  interferir  nos  mecanismos  de  autodefesa  dos  dentes.  Objetos  fibrosos  firmes  que  permitem  a  penetração  do  dente  podem  auxiliar  na  limpeza  da  placa  presente  na  superfície  dentária,  durante  a
mastigação. Além da textura, alguns alimentos são formulados com ingredientes que ajudam a reduzir a carga bacteriana bucal ou a retardar a mineralização da placa.
Os produtos que evitam a ligação das películas ou adesão da placa bacteriana precursora podem ser úteis.
A prevenção da periodontite é mais complicada. A higiene bucal regular a fim de remover as placas supragengivais propicia proteção, evitando o desenvolvimento de placa subgengival, além de reduzir o número de patógenos periodontais. É essencial que
os fatores predisponentes sejam identificados e eliminados. Os fatores que devem ser modificados incluem agregação grave, que pode ser corrigida por meio de extração dentária seletiva; predisposição anatômica, que podem ser modificadas; diabetes ou
insuficiência renal, que pode ser tratada e controlada; e comportamentos inapropriados ou hábitos parafuncionais, que lesionam os tecidos, possíveis de serem tratados.

 REABSORÇÃO DENTÁRIA (Lesão por Reabsorção, Lesão Cervical, Lesão de Colo, Lesão por Reabsorção Odontoclástica Felina [LROF]).
A reabsorção de estruturas dentais se deve à ação de odontoclastos – células praticamente semelhantes aos osteoclastos. Isso pode ocorrer na superfície externa da raiz ou na superfície de revestimento interno da cavidade pulpar (câmara pulpar e canal
radicular). A atividade odontoclástica pode ser estimulada por inflamação e pela pressão de estruturas adjacentes, com resultado de mecanismos normais como a esfoliação de dentes decíduos, ou até mesmo na ausência destes mecanismos. A reabsorção
dentária idiopática pode ser esporádica em diversas espécies (inclusive humana), mas é a lesão dental mais frequente em felinos domésticos.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A reabsorção dentária começa com lesão focal ao cemento que recobre a superfície da raiz. Em geral, áreas microscópicas de reabsorção radicular são reparadas rotineiramente, em felinos. A reabsorção dental de qualquer
etiologia se deve à ativação dos osteoclastos, que removem a estrutura dentária e criam uma lacuna de reabsorção. Em várias lesões, mas não em todas, a atividade concomitante dos osteoblastos propicia substituição do dente perdido por tecido ósseo. Além
disso, a reabsorção atinge a dentina e pode enfraquecer o esmalte dentário, fato que ocasiona defeito clínico evidente na superfície do dente. Sabe­se que a inflamação decorrente de periodontite causa reabsorção externa e é mais provavelmente responsável
pela reabsorção dentária em áreas de doença periodontal. Entretanto, a etiologia da reabsorção dentária idiopática ainda não foi comprovada. As principais teorias incluem abfração (ou seja, forças horizontais anormais no dente durante a mastigação, o que
causa microflexão e trauma na região cervical) e causas nutricionais (p. ex., dieta rica em vitamina D), entre outras.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   As  características  clínicas  são  variáveis.  Em  felinos,  geralmente  o  terceiro  pré­molar  inferior  (o  primeiro  pré­molar  atrás  do  canino)  é  o  primeiro  dente  acometido.  Em  cães,  os  dentes  pré­molares  e  molares  são  mais
frequentemente acometidos. Em geral, pequenas lesões de esmalte da coroa dental (lesões “intraorais”) iniciam na margem gengival e parecem inflamação da borda da gengiva ou crescimento excessivo da gengiva em direção à coroa dental. Lesões maiores
caracterizam­se por defeitos dentários evidentes que são substituídos por tecido de granulação. A margem do defeito apresenta uma borda afilada de esmalte. Neste estágio, a lesão visível representa “a ponta de um iceberg” e a maioria das alterações
acomete as raízes ou os tecidos dentais mais profundos. A reabsorção dentária é caracterizada em termos de gravidade (estágio) e achados radiográficos (tipo). As lesões em estágio 1 acometem o cemento, mas não a dentina. As lesões em estágio 2 afetam a
dentina, mas não a polpa. As lesões em estágio 3 acometem a polpa. As lesões em estágio 4 mostram lesão evidente de coroa ou raiz, seguida de perda da integridade dental. Nas lesões em estágio 5 há perda total da coroa e a gengiva sobre o local acometido
encontra–se intacta.
As lesões são radiograficamente classificadas como tipo 1, quando a raiz do dente acometido mantém a radiopacidade normal em quase toda sua totalidade, exceto nos pontos da própria reabsorção focal; ou como tipo 2, quando há perda completa da
radiopacidade da raiz acometida quando comparada à raiz dos dentes adjacentes. Em casos graves, as raízes “desaparecem” radiograficamente, ou parecem “imagens fantasmas” da sua anatomia normal. Esta alteração é compatível com a substituição da raiz
por tecido ósseo ou semelhante à cemento.
As lesões por reabsorção expostas na cavidade bucal podem causar desconforto. As lesões restritas à superfície da raiz geralmente não causam incômodo ou outros sintomas clínicos. A reabsorção causada por inflamação decorrente de doença periodontal
ou endodôntica está associada a sintomas típicos desta afecção. Nos dois casos há inflamação e infecção e aqueles causados por doença endodôntica também podem causar dor.
DIAGNÓSTICO:  Gengivite marginal de alguns dentes isolados, na ausência de periodontite, pode indicar lesão subgengival inicial. As lesões sob a borda gengival podem ser diagnosticadas por meio de exame cuidadoso dos dentes. Lesões maiores são
identificadas pela sua característica típica na superfície dentária. Lesões extraorais, que acometem a raiz ou a parte interna da coroa, são observadas apenas com auxílio de radiografia e notam­se áreas com redução da radiopacidade.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO:  A maioria dos dentes que sofreu reabsorção deve ser extraída. A excisão cirúrgica da coroa pode ser realizada nos dentes cuja lesão é classificada radiograficamente como do tipo 2 e apenas nos pacientes que não apresentam
doença endodôntica, periodontite ou evidência de estomatite caudal (ver p. 389). A higiene bucal evita lesões inflamatórias causadas por periodontite marginal, enquanto o tratamento do canal da raiz ou a extração de dentes com lesões endodônticas evita a
reabsorção causada por periodontite apical. As lesões idiopáticas não podem ser prevenidas, pois sua etiologia é desconhecida. Caso haja envolvimento de abfração, é útil o fornecimento de uma dieta de consistência semelhante àquela oferecida a pássaros
ou a pequenos roedores, a fim de evitar essas lesões; mas a eficácia deste procedimento não foi comprovada.

 TRAUMATISMO MAXILOFACIAL
Os dentes, a maxila e a mandíbula são resistentes e têm papel importante na interação entre o animal e seu ambiente. Isto faz com que estes sejam predispostos a lesões traumáticas, principalmente durante briga com outros animais, acidente automobilístico,
lesão em grades ou queda em superfície dura. A mandíbula também pode sofrer fratura patológica espontânea devido à periodontite grave na região dos primeiros molares inferiores ou em razão de neoplasia mandibular.
Um dente fraturado com mancha avermelhada ou enegrecida no centro do local fraturado indica exposição da polpa. A ausência de um dente após o trauma pode indicar que este caiu ou tenha sido fraturado, mas fragmentos radiculares podem estar
presentes. Isto pode ser detectado por meio de radiografias. A mandíbula fraturada causa má oclusão aguda e incapacidade de se alimentar. Geralmente, a linha média da mandíbula é deslocada para o lado fraturado. A boca pode permanecer aberta.
Os dentes fraturados são tratados conforme mencionado anteriormente (ver p. 190). Os dentes que sofrem avulsão podem ser reposicionados, se tratados imediatamente. O proprietário deve condicionar o dente o mais rápido possível em um meio de
transporte específico ou no leite, semanas tocar na raiz. O alvéolo e a superfície radicular devem ser lavados cuidadosamente com solução salina estéril para remover as sujidades; em seguida o dente é colocado no espaço alveolar e fixado com fio metálico
interdental, por um mês. A fixação rígida com acrílico ou prótese não é tão útil na reparação do ligamento periodontal (favorece a ancilose), mas pode ser uma boa opção para evitar o uso excessivo do dente recém­implantado. O tratamento do canal da raiz
é realizado por ocasião da remoção do fio.
O traumatismo a tecidos moles é tratado utilizando­se sutura primária com fio absorvível. Os tecidos moles da cavidade bucal são vascularizados e cicatrizam rapidamente. A lavagem bucal com solução de clorexidina 0,12%, a cada 2 dias, auxilia na
redução da população de bactérias bucais durante a cicatrização.
As fraturas maxilares podem ser fixadas com auxílio de fios metálicos e suturas. As fraturas mandibulares podem ser mais complicadas; sempre que possível devem ser imobilizadas com uma combinação de fio interdental e revestimento com resina ou
acrílico, como um fixador externo, para sustentar os dentes. Posiciona­se o fixador no lado fraturado do osso, evitando­se lesão às raízes dentais, comum em casos de estabilização com parafusos ou placas metálicas. É muito importante a preservação da
oclusão normal. Em geral, os cães submetidos à fixação rígida ingerem alimento pastoso facilmente, até que o implante é retirado depois de 6 a 8 semanas.
As fraturas caudais da mandíbula, atrás dos molares, são mais graves devido à ausência de dentes em ambos os lados da fratura e à fina espessura do osso caudal ao corpo da mandíbula. Podem­se utilizar placas, mas o prognóstico é reservado. O uso de
aparelhos dentários (ou seja, fios que unem a arcada dentária superior à arcada inferior) pode propiciar bom resultado, mas há risco de aspiração durante o período de uso dos fios, caso o animal vomite. Devem–se utilizar tubos de alimentação até que os fios
sejam retirados.

PARALISIA DE FARINGE

A paralisia de faringe pode ser resultado de um distúrbio nervoso periférico ou central, ou ocorre secundariamente à doença local grave que causa colapso, obstrução ou mau funcionamento da faringe. Dentre os distúrbios do SNC, a raiva (p. 1422) é a causa
viral de encefalomielite mais importante, embora talvez não a mais frequente. Toxicidade ao SNC, intoxicação por chumbo, traumatismo craniano, abscesso intracraniano e neoplasia também podem causar paralisia de faringe em várias espécies.
As causas periféricas de paralisia de faringe incluem traumatismo faringiano e anormalidades dos anexos da faringe, especialmente aquelas que envolvem a bolsa gutural em equinos. As afecções da bolsa gutural que causam paralisia faringiana incluem
micose, empiema e neoplasia, além de osteoartropatia da articulação temporo–hioide. A mieloencefalite protozoária equina também pode causar paralisia de faringe em alguns equinos. O grau de paralisia varia de parcial a total, dependendo se a alteração é
uni ou bilateral, e central ou periférica. As lesões unilaterais provocam disfunção parcial da faringe. Por exemplo, equinos com doença de bolsa gutural podem deglutir, mas podem manifestar sintomas de disfagia (p. ex., secreção nasal contendo alimento ou
água, tosse).
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   Os  sintomas  clínicos  de  paralisia  de  faringe  incluem  disfagia  com  refluxo  nasal  ou  bucal  contendo  alimento,  água  ou  saliva.  Outros  sintomas  clínicos  são  tosse,  dispneia,  ptialismo  e  bruxismo.  Os  animais  acometidos
apresentam risco de pneumonia por aspiração, desidratação e colapso cardiovascular e respiratório. Em geral, os animais enfermos manifestam um ou mais sintomas, como febre, tosse, náuseas e sintomas compatíveis com obstrução esofágica. Os animais
gravemente acometidos podem morrer ou são candidatos à eutanásia. Pacientes com dispneia podem necessitar traqueostomia emergencial antes de qualquer exame complementar.
DIAGNÓSTICO:  As informações obtidas na anamnese e os sintomas clínicos geralmente sugerem paralisia de faringe. Deve–se realizar o hemograma e o perfil bioquímico. Os animais acometidos apresentam hemoconcentração, anormalidades eletrolíticas e
ácido­base e pode haver azotemia pré­renal. Há procedimentos úteis para determinar se a etiologia é central ou periférica, como exame sorológico, radiografias de crânio, radiografias torácicas para investigar se há pneumonia por aspiração, endoscopia,
ultrassonografia, tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM), se disponível. O uso de TC e RM é particularmente útil na avaliação das causas neurológicas centrais de paralisia de faringe em pequenos animais. Animais com suspeita de
raiva devem ser manipulados adequadamente (ver p. 1422).
TRATAMENTO:  Os protocolos de tratamento para paralisia de faringe variam de acordo com a causa primária. Em geral, o tratamento inclui administração de anti­inflamatórios e antibióticos. Deve­se preferir a via IV, devido à incapacidade dos animais
deglutirem normalmente. Animais com hemoconcentração devem receber fluidoterapia IV. Deve­se realizar nutrição parenteral ou extrabucal em animais incapazes de se alimentar, evitando­se aspiração de alimentos e água. A alimentação extrabucal, por
meio de faringostomia, esofagostomia, uso de tubo nasogástrico ou rumenostomia temporária em ruminantes, pode ser um método barato e efetivo de fornecimento de suporte nutricional. Além disso, deve­se fazer tratamento local de abscessos de faringe.
O prognóstico de paralisia de faringe varia de acordo com a causa. O prognóstico de abscesso faringiano é bom, entretanto, se há doença da bolsa gutural ele é reservado. Se os animais acometidos não melhoram após 4 a 6 semanas de tratamento
sintomático, o prognóstico é desfavorável e deve­se considerar a eutanásia.

CAMPILOBACTERIOSE INTESTINAL

Campylobacter spp  é  uma  bactéria  gram­negativa  microaeróbica  espiral  que  causa  gastrenterite  em  pessoas  e  animais.  Várias  espécies  de Campylobacter  causam  zoonoses.  Diversos  animais  domésticos  desenvolvem  gastrenterite  aguda  após  ingestão
de C. jejuni, como cães, gatos, bezerros, ovinos, suínos, furões, marta, primatas e várias espécies de animais de laboratório, bem como pessoas (Ver p. 1464). Em todo o mundo, a infecção por C. jejuni é uma das causas mais comuns de gastrenterite em
pessoas.
ETIOLOGIA:  Campylobacter spp é um bacilo em forma de bastão curvo que exibe motilidade do tipo espiralada característica, provocada por um flagelo polar único. Tem crescimento lento, com tempo de multiplicação de aproximadamente 90 min; é uma
bactéria fastidiosa que requer meio enriquecido e condições microaeróbicas com alta concentração de CO2 (3 a 15% O2, 3 a 10% CO2, 85% N2) para o seu crescimento.
A família Campylobacteraceae envolve dois gêneros: Campylobacter e Arcobacter. Atualmente, o gênero Campylobacter possui 14 espécies. A maior prevalência e o maior impacto da doença são observados nos casos que envolvem Campylobacter spp
termofílico, C. jejuni ou C. coli. Entretanto, outras 12 espécies de Campylobacter também podem ser patogênicas para pessoas e animais: C. fetus fetus, C. fetus venerealis, C. hyointestinalis, C. lari, C. upsaliensis, C. helveticus, C. concisus, C. curvus, C.
showae, C. gracilis, C. sputorum, C. rectus e C. mucosalis. Ao menos duas dessas espécies, incluindo C. fetus fetus e C. upsaliensis, penetram pelo trato GI, mas em geral estão associadas a infecções extraintestinais. Além disso, várias espécies C. concisus,
C. curvus, C. showae, C. gracilis e C. rectus podem causar doença periodontal. Algumas espécies intimamente relacionadas foram excluídas deste gênero, como os microrganismos semelhantes ao Campylobacter (OSC) (Helicobacter cinaedi [OSCIA] e H.
fennelliae  [OSC2])  e  H.  pilori.  O  simbionte  do  íleo,  Heliobacter  intracelulares,  originalmente  denominado  “semelhante  ao  Campylobacter”,  foram  reclassificados  como  Arcobacter;  C.  nitrofragilis  como  A.  nitrofragilis  e  C.  cryaerophilus  como  A.
cryaerophilus. Finalmente, existem as subespécies de C. jejuni, C. jejuni jejuni e C. jejuni doylei.
TRANSMISSÃO E EPIDEMIOLOGIA:  A transmissão ocorre por meio de alimento, água ou pela disseminação fecal­bucal. Os animais atuam como hospedeiros reservatórios da infecção por Campylobacter spp tanto em animais, como em pessoas, em todo o
mundo. O habitat predominante do Campylobacter é  o  trato  GI  de  vários  vertebrados  domésticos  e  selvagens  e  a  transmissão  zoonótica  de  animais  para  pessoas,  por  meio  da  ingestão  de  carne  de  animal,  principalmente  de  frango,  é  um  problema  de
segurança alimentar. As espécies de Campylobacter também são comumente isoladas em pássaros de vida livre, inclusive aves migratórias e aquáticas, corvos, gaivotas e pombos domésticos, que podem contaminar o ambiente de animais em pastejo.
Roedores selvagens e insetos, como moscas, também abrigam e transmitem C. jejuni. A contaminação do ambiente por fezes implica ocorrência destes microrganismos por toda parte, em condições apropriadas para sua sobrevivência. Campylobacter spp
pode persistir por longo período nas fezes, leite, água e urina, principalmente em temperaturas próximas a 4°C. Em condições adversas, o C. jejuni se transforma em uma forma viável, mas não cultivável, que pode ser ativada quando ingerida.
Dentre os alimentos de consumo humano contaminados por Campylobacter pode­se incluir carne de frango, peru, bovina, suína, peixes e leite. O reservatório mais importante de C. jejuni para as pessoas são as aves domésticas, que causam 50 a 70% dos
casos de infecção em pessoas; a carne de frango é a principal fonte. Cães e gatos são infectados de forma semelhante aos seus proprietários ao ingerirem carne de frango crua.
PATOGÊNESE:  Dentre os mecanismos envolvidos na virulência do C. jejuni incluem­se motilidade bacteriana, colonização do muco, produção de toxinas, aderências, internalização e translocação. A infecção inicia com a contaminação de alimento ou água
por C. jejuni. O suco gástrico atua como uma barreira e, desta forma, a bactéria deve atingir o intestino delgado e o intestino grosso para se multiplicar; C. jejuni invade tanto as células epiteliais como as células da lâmina própria.
ACHADOS CLÍNICOS:  A manifestação de dor abdominal, febre, diarreia e sangue vivo nas fezes, bem como a presença de células inflamatórias nas fezes mostram a origem inflamatória da infecção. Há relatos de infecção natural por C.  jejuni  causando
enterite em macacos jovens, furões, cães, gatos e suínos, em idade de desmame. Aves, roedores, furões, cães, primatas, coelhos e suínos foram inoculados experimentalmente com C. jejuni, por várias vias, e desenvolveram subsequente enterite. Os relatos
descrevem infecção primária com disseminação sistêmica, infecção acompanhada de lesão de mucosa, infecção semanas lesão, mas com persistência da bactéria por breve período e infecção com resistência semanas persistência da bactéria. Estes relatos
sustentam a possibilidade de C. jejuni produzir vários tipos de doença, de acordo com o estado imunológico do hospedeiro, a virulência bacteriana, a expressão gênica e outros fatores.
C.jejuni, C. coli, C. upsalienis e C. helveticus são as espécies associadas à doença intestinal em animais de companhia. C. jejuni causa diarreia em cães e gatos e estes são considerados importante fonte da bactéria para a população humana. Geralmente,
a diarreia é aguda, mas pode ser recorrente. A infecção de cães por C. jejuni causa diarreia moderada, seguida de bacteriemia. A infecção é mais comum em filhotes de cães e gatos, mas Campylobacter spp também pode ser isolado de cães e gatos adultos
clinicamente normais (até 30%). C. jejuni foi isolado de fezes de três, dentre 206 (1,5%), gatos em um estudo realizado na região oeste dos EUA com intuito de identificar microrganismos entéricos zoonóticos. A bactéria foi detectada em amostras de fezes
de gatos com ou semanas diarreia. Além disso, o C. jejuni foi isolado em cultura simples de secreção vaginal coletada de 3 cadelas da raça Pastor Alemão após aborto em gestação avançada; o principal sinal clínico era secreção vaginal hemorrágica, fétida e
profusa.
Geralmente, cães e gatos exibem sintomas após a infecção por C. jejuni. O sinal clínico mais frequente em cães com < 6 meses de idade é diarreia durante 5 a 15 dias. Esta pode ser líquida a hemorrágica, com muco e em alguns casos, com coloração de
bile. Ocasionalmente, a diarreia torna­se crônica e pode ser acompanhada de febre e aumento na contagem de leucócitos. Gatos com < 6 meses de idade com frequência tem diarreia que, inclusive, pode ser hemorrágica. A maioria dos gatos alberga outros
agentes infecciosos, como por exemplo, Toxoplasma ou Giardia. Alguns gatos infectados são assintomáticos.
Em  bovinos  e  ovinos,  C.  jejuni  pode  causar  enterite  e  aborto.  Entretanto,  em  estudos  que  compararam  a  prevalência  de  C.  jejuni  em  bovinos  saudáveis  e  em  bovinos  acometidos  de  diarreia  não  se  constatou  diferença  significativa  na  frequência
de Campylobacter spp. Porém, em estudos sobre a taxa de aborto, 3,2% das vacas e 21,7% das ovelhas que abortaram devido à infecção por Campylobacter spp, tal ocorrência foi atribuída a C. jejuni. Tanto bovinos de leite quanto gado de corte podem ter
maior taxa de prevalência de Campylobacter, de 2,5 a 60%. Em vários estudos, bovinos confinados para abate apresentaram Campylobacter na bexiga, intestino grosso, delgado e fígado. A eliminação fecal em bovinos causa contaminação de leite e carne.
Em  ovinos,  C.  jejuni  foi  associado  a  abortamento.  Nos  casos  de  aborto  em  ovelhas,  a  presença  da  bactéria  foi  investigada  e  esta  foi  classificada  em  função  da  diferenciação  bioquímica,  antigênica  e  genética;  os  resultados  revelaram  15  casos
de Campylobacter spp. (14 C. jejuni e 1 C. fetus fetus) em uma única estação de monta.
As espécies de Campylobacter podem contribuir com a ocorrência de colite em leitões em idade de desmame. Geralmente, os suínos carreiam C. coli e C. jejuni como microrganismos intestinais comensais; estudos realizados nos EUA, Holanda, Grã–
Bretanha e Alemanha revelaram que mais da metade dos suínos criados para fins comercias excretam o microrganismo. A principal cepa isolada em suínos foi C. coli. Leitões gnotobióticos ou que não ingeriram colostro desenvolveram enterite aguda após
inoculação VO, de cepas patogênicas de C. jejuni. Os suínos apresentaram anorexia, febre e diarreia durante 1 a 5 dias, seguida de remissão dos sintomas, mas com eliminação persistente de C. jejuni nas fezes. Entretanto, suínos imunocompetentes com
carga completa de bactérias intestinais, quando expostos precocemente, foram resistentes à reinfecção por C. jejuni. A presença de infecções concomitantes causadas por vírus, bactérias e parasitos agrava a doença causada pelo C. jejuni em suínos.
As aves parecem ter maior taxa de infecção, além de carrearem Campylobacter spp, principalmente C. jejuni, do que outros animais. Em frangos, a bactéria pode colonizar o tecido linfoide palatino e o papo, o que provoca transmissão extremamente
rápida pela água de bebedouros e pela disseminação fecal­bucal. Entretanto, o microrganismo foi isolado do intestino delgado de aves clinicamente doentes, principalmente psitacídeos (papagaio) e passariformes (tentilhão e canários) com hepatite, letargia,
perda  de  apetite,  perda  de  peso  e  diarreia  amarelhada.  A  taxa  de  mortalidade  pode  ser  elevada.  Campylobacter  spp  também  foi  isolado  de  aves  de  vida  livre,  inclusive  aves  migratórias  e  aquáticas,  corvos,  gaivotas  e  pombos  domésticos.  Em  aves
naturalmente infectadas, a doença causada por C. jejuni é rara, apesar da alta taxa de colonização bacteriana.
A doença GI causada por Campylobacter foi descrita em animais exóticos (furões, martas, primatas, hamsters, cobaias, camundongos e ratos). Embora os sintomas variem de acordo com a espécie, em geral incluem diarreia aquosa, mucoide, com estrias
de  bile  (às  vezes,  com  sangue),  anorexia,  vômito  e  febre.  Apesar  de  rara,  pode  ocorrer  infecção  prolongada;  a  maior  parte  das  infecções  é  autolimitante,  com  sintomas  discretos.  Os  furões  desenvolvem  doença  diarreica  induzida
por Campylobacter semelhante  a  que  ocorre  em  pessoas.  Várias  espécies  de  camundongos  também  manifestam  a  doença  após  ingestão  oral  de C.  jejuni,  com  alterações  específicas  nos  componentes  do  sistema  imune,  seguidas  de  diarreia  aquosa  ou
sanguinolenta e tiflocolite.
Lesões:  C. jejuni pode colonizar o intestino delgado e o intestino grosso de forma estável, embora a maioria dos animais apresente lesões de cólon e ceco compatíveis com tiflocolite. Em suínos e camundongos, as lesões macroscópicas observadas em casos
de enterite por C.  jejuni  incluem  ceco  aumentado  e  preenchido  por  líquido,  além  de  cólon  proximal  com  paredes  espessas.  Há  aumento  de  volume  de  linfonodos  (ileocecocólico  e  mesentérico)  que  drenam  os  locais  infectados.  A  infecção  por  cepas
específicas de C. jejuni produz exsudato sanguinolento com muco. Os achados histopatológicos incluem inflamação marcante da lâmina própria com predomínio de neutrófilos polimorfonucleares e células mononucleares que, em alguns casos, atingem a
submucosa. Células imunes, como plasmócitos, macrófagos e células mononucleares, são encontradas em pequenas quantidades na lâmina própria. Na maioria das espécies acometidas também foi observado edema, além de perda, descamação e ulceração
da superfície epitelial. Em suínos e camundongos, a lesão à superfície epitelial está associada à presença de C. jejuni na superfície basolateral do epitélio, nas junções paracelulares do epitélio e às lesões erosivas e ulcerativas do epitélio. Geralmente, há
exsudato neutrofílico mucopurulento com lise e desprendimento de células epiteliais e lesões erosivas ou ulcerativas quando C. jejuni infecta a porção basolateral das extremidades das células das vilosidades do cólon, que se desprendem. Abscessos e lesões
ao epitélio da cripta também são achados comuns.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico de C.  jejuni  baseia­se  no  isolamento  do  microrganismo  em  meio  seletivo,  sob  condição  de  microaerobiose.  Devem­se  coletar  amostras  de  fezes  frescas;  se  há  demora  no  envio  ao  laboratório,  os  meios  de  transporte  e  o
armazenamento a 4°C propiciam melhores resultados. Campylobacter spp é sensível a pH baixo (< 5); ressecamento, exceto sob refrigeração; concentração de NaCl > 2%; e período prolongado em temperatura de 10 a 30°C. Em condições desfavoráveis ao
crescimento, os bacilos em forma de espiral se transformam em forma cocoide. Campylobacter spp termofílico, C. jejuni, C. coli e C. lari crescem melhor a 42°C, embora sejam capazes de fazê­lo a 37°C. O enriquecimento do meio é necessário para
maioria das amostras clínicas, exceto se o material é transportado imediatamente ao laboratório.
As técnicas de PCR são efetivas na identificação da infecção, especialmente, se o cultivo for difícil ou se a amostra foi mal manipulada. Entretanto, um teste positivo não é evidência suficiente para determinar a causa e o resultado deve ser interpretado
juntamente com o quadro clínico.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Clindamicina,  gentamicina,  tetraciclinas,  eritromicina  e  fluoroquinolonas  são  efetivas  contra  Campylobacter  spp.  Geralmente,  as  penicilinas,  as  cefalosporinas  e  o  trimetoprima  não  são  efetivas.  Há  relatos  de  resistência
de Campylobacter spp às fluoroquinolonas, tetraciclinas, canamicina e outros antibióticos, decorrente tanto de mecanismos cromossômicos quanto de plasmídios. As amostras para diagnóstico com base na cultura microbiológica podem permitir a obtenção
do antibiograma. Porém, alguns animais continuam infectados e excretam a bactéria de forma persistente, apesar do tratamento antimicrobiano. Se o objetivo do tratamento é reduzir o risco de transmissão zoonótica para um membro da família suscetível, a
terapia  apenas  com  antibiótico  pode  ser  inadequada.  O  controle  envolve  tratamento,  remoção  do  paciente  para  um  ambiente  higienizado  e  exames  de  fezes  sequenciais  para  averiguar  a  situação  de  excreção  da  bactéria;  ainda  assim,  o  microrganismo
encontra­se por toda a parte e dose infectante baixa representa um importante desafio.

CLAMIDIOSES INTESTINAIS

Clamídias foram isoladas de amostras de fezes de bovinos, caprinos, ovinos e suínos clinicamente normais em diversas partes do mundo. Os animais com infecções intestinais clinicamente inaparentes podem excretar clamídias nas fezes por meses e,
possivelmente, anos. Assim sendo, o trato GI atua como reservatório e importante fonte de transmissão desses organismos. Clamídia, que pode causar abortamento (p. 1225) e pneumonia (p. 1304), pode ser facilmente isolada de fezes de ovinos ou bovinos
normais.  São  encontradas  também  em  amostras  de  intestino  de  animais  com  poliartrite  (p.  967),  encefalomielite  (p.  1198)  e  conjuntivite  (p.  464).  A  principal  espécie  isolada  nas  fezes  de  ruminantes  é  Chlamydophila  (Chlamydia)  pecorum,
mas Chlamydophila abortus também pode ser detectada. Chlamydia suis e Chlamydophila psittaci são as espécies mais comumente isoladas em fezes de suínos e aves, respectivamente. A infecção intestinal exerce papel importante como evento inicial na
patogênese de várias doenças graves induzidas por clamídias, inclusive a clamidiose aviária (p. 2411).
Embora a maior parte das clamidioses intestinais seja clinicamente quiescente, tem­se observado enterite primária induzida por clamídia em bezerros recém­nascidos, em condições de campo. Estas infecções também podem causar alteração na população
de Escherichia coli no trato GI, com número acentuadamente elevado no abomaso e na porção superior do intestino delgado. Os sintomas são mais graves em bezerros que não ingeriram colostro ou naqueles que receberam apenas transferência parcial da
imunidade passiva. Os bezerros recém­nascidos acometidos podem apresentar diarreia transitória aquosa a mucoide, com febre discreta e secreção nasal. Raros casos naturais de diarreia em leitões lactentes infectados por Chlamydia suis foram descritos e
reproduzidos experimentalmente em suínos livres de patógenos, mas tanto estudos experimentais quanto estudos a campo sugerem que a infecção em leitões em idade de desmame é tipicamente assintomática. Muitos laboratórios de diagnóstico veterinário
não realizam rotineiramente cultura de clamídia em amostras de fezes diarreicas; portanto, este exame deve ser especificamente solicitado. Os protocolos de tratamentos incluem altas doses de tetraciclinas, administradas por via parenteral, oral, ou por
ambas as vias.

DOENÇA DE TYZZER

A doença de Tyzzer é uma síndrome entero–hepática cosmopolita que acomete várias espécies animais (ver p. 1936). Uma infecção esporádica fatal em potros é comum; ocorre surto epidêmico agudo fatal em animais de laboratório. A doença é rara em
cães,  gatos,  bezerros  e  outros  animais.  Acomete  principalmente  animais  estressados  e  jovens;  no  entanto,  algumas  espécies  parecem  resistentes,  exceto  quando  há  estresse  ou  imunossupressão,  enquanto  outras  são  suscetíveis  mesmo  semanas
imunossupressão. Fatores alimentares, inclusive dieta rica em nitrogênio, aparentemente tornam os potros mais suscetíveis à doença. O excesso de compostos nitrogenados pode causar imunossupressão. Fármacos imunossupressores e alguns antibióticos,
especialmente as sulfonamidas, predispõem os animais à doença.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  O agente etiológico é Clostridium piliforme, uma bactéria obrigatoriamente  intracelular,  móvel,  filamentosa,  flagelada  e  formadora de esporos. Não cresce em meio livre de células, mas pode ser cultivada no saco vitelino de
embriões de pintinho ou em células de culturas teciduais. A forma vegetativa é bastante lábil; os esporos podem sobreviver em camas sujas, em temperatura ambiente, por > 1 ano; também, podem sobreviver a cerca de 60°C, por 1 h. Os endósporos são
resistentes à exposição ao etanol 70%, cresol 3% ou clorexidina 4%; entretanto, são sensíveis ao ácido peracético 0,4%, hipoclorito de sódio 0,015%, iodofor 1% e fenol 5%.
A patogênese é pouco compreendida. A infecção resulta, provavelmente, da infecção oral, por exemplo, ingestão de esporos eliminados nas fezes de animais infectados. As possíveis fontes incluem esporos infectantes oriundos do ambiente, contato com
animais portadores e, em potros neonatos, ingestão de fezes da égua.
Algumas cepas de C. piliforme produzem toxinas, outras não. O papel destas toxinas na patogênese do C. piliforme é desconhecido, mas as cepas tóxicas geralmente são mais virulentas do que as não tóxicas. Há maior chance de as cepas mais toxigênicas
induzirem lesões hepáticas em camundongos do que as não toxigênicas.
A doença de Tizzer pode ser grave em diversas espécies animais, mas geralmente as infecções são subclínicas ou assintomáticas. Pode ocorrer diferença quanto à suscetibilidade entre as espécies animais. Os linfócitos B, os linfócitos T e as células natural
killer podem influenciar a suscetibilidade da cepa. A sorologia pelo método de ELISA de competição inibitória utilizando anticorpo monoclonal sugere que a doença de Tizzer é relativamente comum em equinos, os quais são suscetíveis a, no mínimo, duas
cepas distintas.
O local primário de infecção é o trato intestinal inferior, com disseminação subsequente pela circulação sanguínea ou linfática. A bactéria possui afinidade pelo intestino (células epiteliais e do músculo liso), hepatócitos e miócitos cardíacos. Fatores
estressantes, como captura, superpopulação, transporte e higiene deficiente, parecem ser predisponentes. A administração de sulfonamidas predispõe os coelhos à doença. A taxa de mortalidade é maior na idade de desmame, exceto em potros, nos quais a
doença ocorre com 1 a 6 semanas de idade, com a maioria dos casos entre 1 e 2 semanas. Em algumas espécies, a doença foi detectada com outras doenças concomitantes, por exemplo, peritonite infecciosa felina, em gatos, cinomose e pneumonia micótica,
em cães, e enterite por criptosporidiose e coronavírus, em bezerros.
Em geral, a doença acomete com maior frequência os animais bem nutridos, especialmente alimentados com dietas ricas em proteínas, durante períodos de estresse. Em condições laboratoriais, o estresse é induzido por fármacos imunossupressores ou
outros fatores que possam ser facilmente identificados. Em vários experimentos, o estresse é parte do protocolo e, quando a doença ocorre, esta é devastadora.
ACHADOS CLÍNICOS:  Após infecção experimental, o período de incubação nos potros é de 3 a 7 dias; em condições naturais, desconhece­se esse período. A maioria dos potros é encontrada em coma, ou mortos. Os sinais clínicos, se presentes, têm curta
duração (poucas horas a 2 dias). Os sintomas são variáveis, mas podem incluir depressão, anorexia, pirexia, icterícia, diarreia e decúbito. Em estágios terminais, ocorrem convulsões e coma. Os sintomas variam ligeiramente entre as espécies. Os animais de
laboratório podem mostrar depressão, pelos eriçados e graus variáveis de diarreia aquosa; no início de um surto, frequentemente são encontrados animais mortos.
Os testes clinicopatológicos têm pouco valor em animais de laboratório, pois estes morrem rapidamente. Em potros, nota­se aumento das enzimas séricas sorbitol desidrogenase, AST, fosfatase alcalina, lactato desidrogenase e ?­glutamiltransferase. Nota­
se, também, hiperbilirrubinemia, leucopenia, hemoconcentração e hipoglicemia grave.
Lesões:  As lesões características são verificadas no fígado, miocárdio e trato intestinal. No fígado, há focos de necrose brancos, acinzentados ou amarelados, com 2 mm de diâmetro, em pequena quantidade ou disseminados. A necrose hepática é mais
acentuada e disseminada em potros, nos quais os focos necróticos múltiplos, com centros hemorrágicos e discreta depressão, parecem infectar quase todo o lóbulo hepático. Além disso, ocorre hepatomegalia acentuada e os linfonodos hepáticos apresentam
hiperplasia. Em coelhos, há lesões graves nos intestinos e no coração. O íleo terminal, o ceco e o cólon proximal ficam difusamente eritematosos. Com frequência, nota­se hemorragia difusa (“em pincel”) na serosa do ceco. Há áreas focais de necrose na
mucosa do ceco e cólon, além de edema intenso na parede do ceco. Os linfonodos mesentéricos podem estar aumentados e edemaciados. É possível constatar linhas brancas no miocárdio, principalmente próximo ao ápice. As lesões intestinais e cardíacas
geralmente são mais brandas, ou ausentes em outros animais.
Microscopicamente, os focos necróticos do fígado aleatoriamente distribuídos e coalescentes se associam a uma infiltração escassa a moderada de neutrófilos e macrófagos. As bactérias causadoras são encontradas em um padrão cruzado em hepatócitos
viáveis, na periferia dos focos de necrose. No ceco e no cólon de coelhos, as áreas focais de necrose se estendem tão profundamente como até a camada muscular externa, associados a infiltrados neutrofílicos na mucosa e submucosa. Os microrganismos
podem ser encontrados no epitélio, na camada muscular da mucosa e na camada muscular externa do intestino acometido. Quando há lesões cardíacas, estas consistem em focos de fragmentação de fibras, vacuolização, perda de estriações cruzadas e
infiltração celular inflamatória discreta.
DIAGNÓSTICO:  Clinicamente,  pode­se  realizar  sorologia  e  PCR  para  investigar  a  ocorrência  da  doença.  Entretanto,  os  sintomas  e  os  resultados  dos  testes  diagnósticos  comumente  disponíveis  devem  ser  juntamente  interpretados  para
estabelecer  um  diagnóstico  clínico  presuntivo.  O  diagnóstico  clínico  definitivo  não  é  possível  devido  à  ausência  de  testes  específicos.  O  diagnóstico  baseia­se  na  constatação  dos  microrganismos  em  cortes  de  tecidos  submetidos  a
colorações especiais. O microrganismo cora­se pouco nas técnicas de hematoxilina­eosina (H&E) e de Gram. Com o corante de Giemsa, o bacilo se cora bem no fígado e no epitélio intestinal e em esfregaços de órgãos infectados, mas se
cora pouco nas células musculares lisas e cardíacas. As colorações de Warthin­Starry ou de prata de Levaditi são preferíveis às outras, pois o bacilo se cora bem no citoplasma de todas as células infectadas.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Sabe­se  pouco  sobre  a  efetividade  dos  antimicrobianos  no  tratamento;  alguns  antibióticos  agravam  a  doença.  C.  piliforme  é  sensível  à  tetraciclina  e  parcialmente  sensível  a  estreptomicina,  eritromicina,
penicilina e clortetraciclina; é resistente às sulfonamidas e ao cloranfenicol. Em potros neonatos, a doença parece fatal em quase 100% dos casos, embora seja possível a sobrevivência de alguns potros com quadros menos graves. Quando a
doença ocorre em uma propriedade, pode ser esporádica, ano após ano. Animais com suspeita de infecção podem ser tratados por via IV, inicialmente com solução de glicose 50%, seguida de glicose 10% (lentamente), outros fluidos e
antibióticos. A maioria dos potros responde à terapia com glicose, mas entram em coma e morrem dentro de poucas horas. Raramente, parece que um potro ocasional parece sobreviver à doença após tratamento prolongado com glicose, por
via IV lenta, com antibióticos.
Como a doença nos potros é esporádica e não é altamente contagiosa, em geral não se indicam medidas preventivas específicas. Em áreas com endosporos presentes no ambiente, muitos potros podem ser expostos; contudo, apenas os
poucos que apresentam imunossupressão manifestam um quadro agudo. Nas propriedades onde a doença é prevalente, a superalimentação de éguas, especialmente com dietas ricas em proteínas, parece aumentar a suscetibilidade de potros
neonatos. A redução de dieta nitrogenada capaz de induzir imunossupressão em potros neonatos pode reduzir a prevalência da doença. Em geral, devem­se reduzir os fatores que causam estresse e imunossupressão. Quando a doença ocorre
em uma colônia de animais de laboratório, o tratamento não é recomendado, pois este prolonga a doença e, possivelmente, dá origem a animais portadores. É melhor eliminar todos os animais da colônia, descontaminar o ambiente e formar
um novo lote, com animais livres da doença.

SALMONELOSE

Salmonelose é causada por diversos sorotipos de Salmonella enterica enterica e caracteriza–se clinicamente por duas principais síndromes – sepse/febre tifoide sistêmica e enterite – embora, semanas dúvida, ocorra infecção assintomática.
Um  pequeno  número  de  sorotipos  é  caracterizado  de  acordo  com  a  capacidade  de  causar  febre  tifoide  em  indivíduos  adultos  saudáveis,  em  uma  pequena  parcela  de  espécies  de  hospedeiros.  Desta  forma,  Salmonella
enterica sorovariantes Typhi (S. Typhi) e S. Paratyphi causam febre tifoide em pessoas, S. Gallinarum causa doença semelhante em aves e S. Abortusovis, em ovinos, S. Choleraesuis, em suínos, e S. Dublin, em bovinos etc. Nesta infecção,
geralmente a transmissão é VO. A bactéria não coloniza amplamente o intestino, mas penetra na parede intestinal, sendo fagocitada pelas células da linhagem monocítica­macrofágica no baço e fígado, onde se multiplica. Em estágios mais
avançados da doença, as bactérias penetram novamente no intestino e são excretadas. Alguns sorotipos também estão presentes no trato reprodutivo.
Os demais sorotipos raramente provocam doença sistêmica em animais adultos saudáveis e que não estão prenhes. Entretanto, estes sorotipos colonizam o intestino de diversas espécies animais, contaminam a cadeia de alimentos de
consumo humano e causam gastrenterite em pessoas (intoxicação alimentar). S. Typhimurium e o S. Enteritidis são os principais agentes etiológicos de enterite em pessoas e, de maneira interessante, também são capazes de provocar febre
tifoide em camundongos, por um mecanismo fisiopatogênico desconhecido. As cepas deste último grupo também podem causar doença mais grave, com envolvimento sistêmico, semelhante à febre tifoide em animais muito jovens, casos
tenham  recebido  quantidade  insuficiente  de  anticorpos  protetores  de  sua  mãe  ou  quando  se  encontram  particularmente  suscetíveis,  como  por  exemplo,  animais  muito  idosos  ou  prenhes.  O  fato  de  um  sorotipo  ser  isolado  com  maior
frequência em determinada espécie não significa que esta seja a única capaz de atuar como hospedeiro; logo, os fatores epidemiológicos são importantes na determinação da prevalência.
Enterite é observada em todos os animais e ocorre mundialmente. A prevalência aumentou com a intensificação da produção de animais de criação. Bezerros, leitões, cordeiros e potros podem desenvolver tanto enterite quanto a forma
septicêmica (ver diarreia em ruminantes neonatos, p. 329, doença diarreica em potros, p. 314 e salmonelose intestinal, p. 319). Bovinos, ovinos e equinos adultos com frequência desenvolvem enterite aguda; enterite crônica pode ser
observada em suínos em crescimento e, ocasionalmente, em bovinos (ver capítulos sobre doenças intestinais nas principais espécies domésticas, p. 319 e outros). As fêmeas prenhes podem abortar. O animal portador clinicamente normal é
um problema sério em todas as espécies de hospedeiros. Salmonelose é rara em cães e gatos e caracteriza­se por diarreia aguda, com ou semanas sepse.
ETIOLOGIA  E  PATOGÊNESE:   Embora  outras  várias  Salmonella  spp  possam  causar  enteropatia,  as  mais  comuns  (em  alguns  casos  há  variação  de  acordo  com  a  localização  geográfica)  nas  diferentes  espécies  são:  Bovinos
–  S.  Typhimurium,  S.  Dublin  e  S.  Newport;  Ovinos  e  Caprinos  –  S.  Typhimurium,  S.  Dublin,  S.  Abortusovis,  S.  Anatum  e  S.  Montevideo;  Suínos  –  S.  Typhimurium  e  S.  Choleraesuis;  Equinos
– S. Typhimurium, S. Anatum, S. Newport, S. Enteritidis e Salmonella sorovariante IIIa 18:z4z23; e Aves Domésticas – S. Enteritidis, S. Typhimurium, S. Gallinarum e S. Pullorum.
Embora o quadro clínico resultante não seja distinto, as diferentes espécies de salmonelas tendem a diferir em sua epidemiologia. O perfil de plasmídios e os padrões de resistência a fármacos em alguns casos são marcadores úteis para
estudos epidemiológicos. As fezes dos animais infectados podem contaminar alimentos e água, leite, carne fresca e processada oriunda de abatedouros, produtos vegetais e animais utilizados como fertilizantes ou ingredientes alimentares,
pastagens e piquetes e vários materiais inertes. Os microrganismos podem sobreviver por meses em locais úmidos e quentes, como estábulos de suínos de engorda, galinheiros ou bebedouro, mas sobrevivem < 1 semana em esterco bovino
composto. Os roedores e as aves silvestres também são fontes de infecção para os animais domésticos. A peletização dos alimentos reduz o nível de contaminação por salmonelas, principalmente devido ao tratamento térmico utilizado.
A prevalência da infecção varia entre as espécies de hospedeiros e os países, sendo muito maior do que a prevalência da doença clínica, que comumente é precedida por situações estressantes em animais de produção, como privação
súbita de alimentos, transporte, seca, superpopulação, parto, cirurgia e administração de alguns fármacos, como antibióticos VO com finalidade terapêutica, profilática ou como estimulante do crescimento.
Na enterite, a via de infecção normal é oral; após a infecção o microrganismo multiplica­se no intestino e causa enterite. A suscetibilidade maior de animais jovens pode ser consequência do alto pH gástrico, ausência de flora intestinal
estável  e  imunidade  limitada.  A  penetração  de  bactérias  na  lâmina  própria  contribui  para  as  lesões  intestinais  e  diarreia.  O  mecanismo  complexo  envolve  adesão  por  meio  de  apêndices  das  fímbrias  e  introdução  de  proteínas
por Salmonella aderida às células epiteliais, o que induz alterações no citoesqueleto da actina, causando irritação da superfície celular. Isto aprisiona Salmonella e provoca secreção de fluido e sua ingestão pela célula. A infecção celular
resulta em ativação de um mecanismo de defesa do hospedeiro que envolve moléculas sinalizadoras, devido à detecção de proteínas da superfície da bactéria, que induzem reação inflamatória intensa geralmente capaz de confinar a bactéria
no intestino. Os sorotipos capazes de causar febre tifoide podem modular a resposta inicial do hospedeiro e suprimir a reação inflamatória. Ocorre destruição celular e a bactéria é fagocitada por células fagocíticas, como macrófagos e
neutrófilos. Embora os neutrófilos, em geral, sejam capazes de destruir Salmonella, a bactéria pode sobreviver e se proliferar no interior de macrófagos, que é o principal tipo celular do hospedeiro durante a infecção.
À  medida  que  a  infecção  progride  pode  ocorrer  sepse  e  subsequente  instalação  no  cérebro  e  meninges,  útero  prenhe,  porção  distal  dos  membros  e  extremidades  de  orelhas  e  cauda,  que  pode  resultar,  respectivamente,  em
meningoencefalite, aborto, osteíte e gangrena seca de patas, orelhas ou cauda. O microrganismo também se instala com frequência na vesícula biliar e nos linfonodos mesentéricos; os animais sobreviventes excretam a bactéria nas fezes, de
forma intermitente.
Os bezerros raramente tornam­se portadores, mas praticamente todos os adultos o fazem por período variável – até 10 semanas, em ovinos e bovinos, e até 14 meses, em equinos. Bovinos adultos infectados por S. Dublin excretam o
microrganismo durante anos. A infecção também pode persistir nos linfonodos ou nas tonsilas, semanas nenhuma salmonela nas fezes. Os portadores latentes podem iniciar excreção do microrganismo ou, até mesmo, desenvolver doença
clínica quando submetido a estresse. Um portador passivo adquire a infecção do ambiente, mas não é infectado, de forma que se for removido do ambiente deixa de ser um portador.

EPIDEMIOLOGIA:
Bovinos e Ovinos: Em bezerros e cordeiros, S. Dublin geralmente é endêmica em determinada fazenda, enquanto S. Typhimurim frequentemente está associada à introdução de bezerros oriundos de fazendas contaminadas e pode causar surtos
explosivos esporádicos. Em bovinos adultos, pode ocorrer infecção subclínica com surtos ocasionais no rebanho. Os fatores estressantes que precipitam a doença clínica incluem privação de alimento e água, aporte nutricional mínimo,
longo período de transporte, parto, uso profilático de antibióticos e mistura e superpopulação em lotes de engorda.
Suínos: Os  surtos  de  salmonelose  septicêmica  em  suínos  são  raros  e  geralmente  podem  ser  rastreados  até  um  suíno  adquirido  infectado.  A  aquisição  de  suínos  de  engorda  de  rebanhos  livres  de Salmonella  e  adoção  do  sistema  “todos
dentro/todos fora” nas unidades de terminação minimizam o risco de infecção. O aumento do sistema de criação extensiva ao ar livre eleva o risco de exposição a fontes de infecção ambientais.
Equinos: Nos adultos, a maioria dos casos ocorre após estresse decorrente de cirurgia, transporte para exposição e privação de alimento e água seguida de superalimentação no destino final. As éguas podem ser portadoras assintomáticas e
excretar a bactéria durante o parto, podendo infectar o potro recém­nascido. Salmonelose septicêmica pode acometer potros; pode ser endêmica em algumas propriedades ou ocorrer em forma de surto (Ver p. 305).
Cães e Gatos: Muitos cães e gatos são portadores assintomáticos de salmonela. A doença clínica é rara, mas quando ocorre, geralmente está associada à hospitalização, outra infecção ou doença debilitante em adultos ou exposição a grande
número de bactérias presentes nos filhotes, nos quais enterite é uma ocorrência comum.
ACHADOS CLÍNICOS:  Enterite com sepse é a síndrome mais comum em bezerros, cordeiros, potros, frangos e leitões recém–nascidos e pode ocorrer surto em suínos com até 6 meses de idade. Quando se instala doença sistêmica com
enterite, como resultado de imunidade comprometida, a enfermidade pode ser aguda, com depressão, febre (40,5 a 41,5°C) e óbito em 24 a 48 h. Em bezerros e suínos, podem ocorrer sintomas nervosos e pneumonia. A taxa de mortalidade
pode atingir 100%, dependendo da carga genética do hospedeiro e da virulência da cepa.
Enterite aguda semanas importante envolvimento sistêmico é a forma mais comum em adultos, bem como em animais jovens com = 1 semana de idade. Inicialmente, nota­se febre (40,5 a 41,5°C), seguida de diarreia aquosa grave, às
vezes disenteria e, frequentemente, tenesmo. Em um surto no rebanho podem­se passar várias horas antes do início da diarreia, momento em que a febre pode desaparecer. As fezes, que variam consideravelmente quanto à consistência,
podem ter odor pútrido e conter muco, cilindros fibrinosos, estrias de membrana mucosa e, às vezes, sangue. O exame retal causa intenso desconforto e tenesmo. A produção de leite geralmente diminui acentuadamente em vacas leiteiras.
Dor abdominal é comum e pode ser grave (cólica) em equinos. A taxa de mortalidade é variável, mas pode atingir 100%, dependendo da virulência da cepa. Leucopenia e neutropenia acentuadas são características da doença aguda em
equinos. Em cães e gatos, a doença clínica assume a forma de diarreia aguda com sepse e acomete ocasionalmente filhotes ou adultos estressados por doença concomitante. Pneumonia pode ser evidente. Quando a enterite se torna crônica,
pode ocorrer abortamento em cadelas, gatas, vacas, éguas e ovelhas e as crias também podem apresentar enterite. Em alguns casos, nota­se conjuntivite em gatos acometidos.
Os carnívoros de zoológico e àqueles de peleteria podem ser acometidos. Geralmente, o alimento contaminado é a fonte de infecção. Várias espécies de roedores (p. ex., cobaias, hamsters, ratos e camundongos) e coelhos são suscetíveis.
Os roedores comumente atuam como fonte de infecção nas fazendas nas quais a doença é endêmica. Tartarugas de estimação eram fontes de infecção comuns para as pessoas, mas a redução do tráfico de tartarugas praticamente acabou com
este problema.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico se baseia nos sintomas e no isolamento do patógeno nas fezes ou nos tecidos de animais infectados. A presença do microrganismo também pode ser investigada em alimentos, fontes de água e em fezes de
roedores e aves silvestres que possam habitar as instalações.
As síndromes clínicas geralmente são características, mas devem ser diferenciadas de várias doenças semelhantes, nas diferentes espécies, como mencionado a seguir: Bovinos – diarreia por Escherichia coli enterotoxigênica, disenteria
por E. coli verotoxigênica, coccidiose, criptosporidiose, forma digestiva de rinotraqueíte infecciosa bovina, diarreia viral bovina, enterite hemorrágica por Clostridium perfringens tipos B e C, intoxicação por arsênico, deficiência secundária
de cobre (molibdenose), disenteria de inverno, paratuberculose, ostertagiose e diarreia alimentar; Ovinos – colibacilose intestinal, sepse por Haemophilus spp ou por Pasteurella e coccidiose;  Suínos  –  colibacilose  e  infecção  intestinal
por Clostridium difficile em suínos recém­nascidos e em idade de desmame, disenteria suína (Brachyspira hyodysenteriae), campilobacteriose e sepse do suíno em fase de crescimento (que incluem erisipela, Lawsonia intracellulare, peste
suína clássica e pasteurelose); Equinos – sepse (por E. coli, Actinobacillus equuli ou estreptococos); Aves – enterite por coliformes e Yersinia pseudotuberculosis.
Lesões: As lesões são mais graves no íleo inferior e no intestino grosso e variam desde o encurtamento de vilosidades, com desprendimento do epitélio, até perda completa da arquitetura intestinal. Ocorre reação neutrofílica na lâmina
própria e podem ser observados trombos em vasos sanguíneos dessa região. Comumente, há hemorragia e estrias de fibrina. Geralmente, são necessárias técnicas de cultura que envolvem supressão de E. coli fecal e várias culturas de fezes
diárias para isolar o microrganismo. Pode ser necessário um meio de cultura não seletivo enriquecido para amostras nas quais as bactérias possam estar em menor número, como em gêneros alimentícios. Posteriormente, para melhorar o
cultivo pode­se utilizar caldo seletivo e semear as colônias em diversos tipos de ágar seletivo que suprimem o crescimento de outras bactérias entéricas que provavelmente estão presentes no intestino. Em animais com sepse a hemocultura
pode ser útil, mas são onerosas.
Geralmente, as bactérias são identificadas por meio de vários testes bioquímicos. Pode–se identificar o sorotipo, seguido de subdivisão adicional, com base na suscetibilidade a bacteriófagos específicos (tipificação de fagos).
É difícil interpretar o teste sorológico em animais. Utiliza­se amplamente a técnica ELISA para monitorar granjas avícolas quanto à presença de infecção por sorotipos como S. Enteritidis, S. Typhimurium e S. Gallinarum/S. Pullorum e
para detectar anticorpos no sangue de suínos em abatedouros.
TRATAMENTO:  Na salmonelose septicêmica é essencial o tratamento precoce, mas há controvérsia quanto ao uso de antimicrobianos na salmonelose intestinal. Os antibióticos de uso oral podem não ser efetivos e alterar negativamente a
microflora intestinal, interferir no antagonismo competitivo e prolongar a excreção do microrganismo. Também, há preocupação quanto a cepas de salmonelas resistentes a antibióticos devido ao fornecimento oral de antimicrobianos que,
posteriormente,  podem  infectar  as  pessoas.  Os  antibióticos  podem  também  promover  a  transferência  de  resistência  a  esses  fármacos  de  cepas  resistentes  de  E.  coli  para  Salmonella,  devido  a  redução  da  sensibilidade  antibiótica  dos
componentes da flora normal. Por esta razão, o uso de antibióticos com o objetivo de estimular o crescimento foi proibido em diversos países.
Os antibióticos de amplo espectro podem ser utilizados por via parenteral para tratamento de sepse. A terapia antimicrobiana inicial deve se basear no conhecimento do padrão de resistência a fármacos dos organismos previamente
encontrados na região. As infecções hospitalares envolvem organismos altamente resistentes a medicamentos. A combinação de trimetoprima­sulfonamida pode ser eficaz. As alternativas são ampicilina, fluoroquinolonas ou cefalosporinas
de  terceira  geração.  Geralmente,  a  resistência  à  ampicilina,  trimetoprima,  sulfonamidas,  tetraciclinas  e  aminoglicosídios  é  mediada  por  plasmídios  e  transferida  facilmente  entre  as  diferentes  bactérias.  A  resistência  às  quinolonas  é
mutacional, mas mutações aleatórias podem ser selecionadas pelo uso de antibióticos e transferidas aos bacteriófagos. O tratamento deve ser feito diariamente, por até 6 dias.
O tratamento oral deve ser administrado na água, pois os animais acometidos apresentam sede devido à desidratação; ademais, geralmente há redução do apetite. Pode ser necessária fluidoterapia para corrigir os desequilíbrios ácido­base
e a desidratação. Bezerros, bovinos adultos e equinos precisam grande quantidade de fluidos. Antibióticos, como ampicilina ou cefalosporinas, causam lise das bactérias e liberação de endotoxina; pode­se utilizar anti­inflamatório não
esteroide, como flunixino meglumina, para minimizar os efeitos da endotoxemia. Os animais podem apresentar acidose e hiponatremia e requerem tratamento adequado.
A forma intestinal é difícil de ser efetivamente tratada, em todas as espécies. Embora possa ser obtida cura clínica, é difícil conseguir cura bacteriológica, pois os organismos tornam­se estáveis no sistema biliar e são eliminados de forma
intermitente no lúmen intestinal ou porque os animais são reinfectados no ambiente quando a flora intestinal está normal, o que causa inibição da colonização por patógeno e é eliminado pelo tratamento antimicrobiano. O ideal é que após a
terapia faça a administração oral de uma cultura de bactérias intestinais espécie­específicas, livre de patógenos.
CONTROLE E PREVENÇÃO:  Esses são os principais problemas porque envolvem animais portadores, ambiente e alimentos contaminados. Pode­se fazer a cultura de suabes de drenos ou de filtros de leite para monitorar a população de
salmonelas no rebanho. O princípio de controle é prevenir a introdução e limitar a disseminação da infecção no rebanho. Em diversos países, inclusive na União Europeia, programas governamentais foram instituídos para controlar e
reduzir o nível de infecção nos animais de produção, principalmente em aves e suínos.
Prevenção da Introdução: Todo esforço deve ser feito para evitar a introdução de um portador; os animais devem ser adquiridos somente de fazendas sabidamente livres da doença e devem ser isolados por = 1 semana, período no qual se
monitora o seu estado de saúde. A garantia de que os suprimentos alimentares se encontram livres de salmonelas depende da integridade da fonte. Além disso, alguns países testam a contaminação e regulam a importação e a produção
caseira de gêneros e componentes alimentícios.
Limitação da Disseminação no Rebanho: Em um surto, devem ser adotados os seguintes procedimentos: 1) Os animais portadores devem ser identificados e separados ou isolados e tratados de forma intensiva. Os pacientes tratados devem ser
reavaliados  várias  vezes  antes  de  se  assegurar  que  não  são  portadores;  2)  Pode­se  fazer  uso  profilático  de  antibióticos  nos  suprimentos  alimentares  ou  na  água  (os  riscos  já  foram  mencionados  anteriormente);  3)  Deve–se  restringir  a
movimentação dos animais pela fazenda a fim de limitar a infecção a um grupo menor. Deve­se evitar mistura aleatória de animais; 4) Os suprimentos alimentares e a água devem ser protegidos de contaminação fecal; 5) As instalações
contaminadas devem ser rigorosamente higienizadas e desinfetadas; 6) O material contaminado deve ser descartado cuidadosamente; 7) Todas as pessoas devem estar cientes dos riscos de trabalhar com animais infectados e da importância
da higiene pessoal. Deve­se introduzir um programa de manejo rigoroso na fazenda; 8) Deve­se praticar vacinação, especialmente quando o surto envolve vacas e marrãs prenhes ou aves de postura. Podem­se utilizar bacterinas mortas
comerciais ou autógenas. As vacinas vivas atenuadas são promissoras, mas poucas estão comercialmente disponíveis (ver a seguir); 9) Deve­se minimizar o estresse.
Vacinas contra Salmonella:  As salmonelas são parasitos intracelulares; portanto, uma vacina viva é necessária para se obter máxima proteção imune contra a doença. Entretanto, há evidência de que bacterinas inativadas podem induzir baixo
nível de proteção. Diversos estudos com vacinas vivas atenuadas contra Salmonella em suínos, bovinos e aves mostraram estimulação significativa da resposta imune celular e proteção de animais contra doença sistêmica e colonização
intestinal. Uma vacina viva atenuada contra S. Choleraesuis aprovada para uso em suínos parece ser efetiva na redução da colonização de tecidos e na proteção contra a doença, após desafio com microrganismos virulentos, em condições de
campo. Esta vacina também protegeu bezerros em desafio experimental com S. Dublin e com salmonelas do sorogrupo C1, após administração por via subcutânea ou intranasal. A vacina viva contra S. Gallinarum mostrou ser efetiva não
apenas contra esta bactéria, mas também reduziu significativamente a infecção em aves de postura desafiadas com S.Enteritidis.
RISCO ZOONÓTICO:  A  prevalência  de  salmonelose  entérica  em  pessoas  aumentou  nos  últimos  anos  e  os  animais  são  considerados  os  principais  reservatórios.  A  transmissão  às  pessoas  ocorre  pela  contaminação  de  água,  leite,  carne,
alimentos processados e seus ingredientes; carne de frango e ovos (p. 2877) são fontes de infecção particularmente importantes. Além disso, o consumo de frutas e vegetais contaminados por água também pode ser uma fonte de infecção.

AMEBÍASE (Amebiose)

A amebíase é uma colite aguda ou crônica, caracterizada por diarreia ou disenteria persistente e prevalente nas áreas tropicais e subtropicais do mundo. Houve redução de sua prevalência nos EUA ao longo das décadas, mas a doença ainda
é  importante  em  várias  regiões  tropicais,  especialmente  em  situações  de  calamidade.  É  comum  nas  pessoas  e  demais  primatas;  às  vezes,  é  observada  em  cães  e  gatos,  sendo  rara  em  outros  mamíferos.  Várias  espécies  de  amebas  são
encontradas em mamíferos, mas o único patógeno conhecido é Entamoeba histolytica. O homem é o hospedeiro natural dessa espécie e representa a fonte normal de infecção para os animais domésticos. Os mamíferos se infectam pela
ingestão  de  alimento  ou  água  contaminada  com  fezes  que  contêm  os  cistos  infectantes. E.  dispar  é  uma  ameba  não  patogênica,  não  invasiva  com  características  moleculares  distintas,  mas  morfologicamente  indistinguível  da  espécie
patogênica E. histolytica. E. invadens de répteis é também morfologicamente idêntica a E. histolytica, mas não é transmitida aos mamíferos.
ACHADOS CLÍNICOS:  E. histolytica é  um  patógeno  de  virulência  variável.  Habita  o  lúmen  do  intestino  grosso,  inclusive  do  ceco, e  pode  provocar  sinais  clínicos  inespecíficos  ou  penetrar  na  mucosa  intestinal  e  causar  colite  ulcerativa
hemorrágica moderada a grave. Na doença aguda, pode ocorrer disenteria fulminante, que pode ser fatal, progredir para cronicidade ou se curar espontaneamente. Nos casos crônicos, pode ocorrer perda de peso, anorexia, tenesmo e diarreia
ou disenteria crônica, contínua ou intermitente. Além do cólon e do ceco, amebas podem invadir a pele perianal, genitália, fígado, cérebro, pulmões, rins e outros órgãos. Os sintomas podem lembrar os de outras colonopatias (p. ex.,
tricuríase e balantidíase). A amebíase invasiva é exacerbada pela imunossupressão muscular.

Cisto de Entamoeba histolytica; hematoxilina; aumento de 1.000×, com óleo de imersão. Cortesia do Dr. Roger Klingenberg.

DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico definitivo depende da detecção de trofozoítos ou cistos de E. histolytica nas fezes. Trofozoítos são mais facilmente identificados em esfregaços diretos em solução salina ou em cortes de amostras do cólon
infectado coradas. É difícil encontrar os parasitos, pois muitos animais com amebíase extraintestinal não apresentam qualquer infecção intestinal concomitante. No diagnóstico de colite por ameba, a colonoscopia com biopsia ou raspado de
ulcerações é mais efetiva do que o exame de fezes. Nas infecções intestinais, podem ser necessários exames repetidos, pois os microrganismos podem ser eliminados periodicamente nas fezes.
O tamanho dos trofozoítos varia de 10 a 60 μm, mas geralmente seu diâmetro é > 20 μm, apresentam único núcleo vesicular (geralmente com um cariossomo central), são móveis e podem conter hemácias ingeridas. As fezes devem ser
examinadas imediatamente, pois os trofozoítos morrem rapidamente fora do corpo. Os leucócitos fecais podem ser confundidos com amebas, de forma que podem ser necessários esfregaços fecais fixados e corados (iodo, tricromo, ferro,
hematoxilina ou reação de ácido periódico de Schiff) para sua identificação.
Os cistos têm, em geral, 10 a 20 μm de diâmetro; sendo comum tamanho de 12 a 15 μm. Os cistos maduros têm quatro núcleos, enquanto os imaturos podem ter 1 ou 2. Em primatas, os cistos podem ser encontrados e identificados por
meio de exame de flotação em sulfato de zinco ou em preparações fixadas e coradas (iodo, tricromo ou hematoxilina férrica); no entanto, os cistos de E. histolytica raramente são excretados por cães ou gatos. Um teste ELISA baseado em
antígeno, disponível para diagnóstico em pessoas, também pode auxiliar no diagnóstico em outros mamíferos. A imunocoloração também pode ser útil.
TRATAMENTO:  Há poucas informações disponíveis sobre o tratamento em animais. As opções incluem metronidazol (10 a 25 mg/kg VO, 2 vezes/dia, por 1 semana) ou a furazolidona (2 a 4 mg/kg VO, 3 vezes/dia, por 1 semana). Os cães
podem continuar a eliminar trofozoítos após a terapia.

COCCIDIOSE

Geralmente, a coccidiose caracteriza­se por invasão aguda e destruição da mucosa intestinal por protozoários dos gêneros Eimeria e Isospora. Os sintomas incluem diarreia, febre, inapetência, perda de peso, emaciação e, em casos graves,
morte. Entretanto, muitos casos são subclínicos. É uma doença economicamente importante em bovinos, ovinos, caprinos, suínos, aves domésticas (p. 2901) e, também, em coelhos, nos quais tanto o fígado quanto o intestino podem ser
infectados  (p.  1944).  Em  cães,  gatos  e  equinos  a  coccidiose  geralmente  é  menos  diagnosticada,  mas  pode  resultar  em  enfermidade  clínica.  Outros  gêneros,  tanto  de  hospedeiros  quanto  de  protozoários  podem  estar  envolvidos  (ver
criptospori­diose, p. 216; sarcocistose, p. 1296 e toxoplasmose, p. 724).
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  Eimeria e Isospora tipicamente necessitam apenas um hospedeiro, no qual completam seu ciclo biológico. Algumas espécies de Isospora possuem hospedeiros intermediários facultativos (paratênicos ou de
transferência). Foi proposto novo nome de gênero, Cystoisospora, para estas espécies de Isospora. Os coccídios são hospedeiros específicos e não há imunidade cruzada entre as espécies.
A coccidiose é cosmopolita, e infecta principalmente animais domésticos jovens ou confinados em pequeno espaço contaminado com oocistos. Os coccídios são patógenos oportunistas; se forem patogênicos, a sua virulência pode ser
influenciada por vários fatores estressantes. Portanto, coccidiose clínica é mais prevalente em condições de desnutrição, má higiene ou superpopulação, ou após estresse decorrente de desmame, transporte, modificações súbitas na dieta ou
de clima desfavorável.
Em geral, na maioria das espécies de animais pecuários, a taxa de infecção é alta e a de doença clínica é baixa (5 a 10%), embora até 80% dos animais de um grupo de alto risco possam manifestar sintomas. Muitos animais adquirem
infecção por Eimeria ou Isospora, com gravidade variável, entre 1 mês e 1 ano de idade. Geralmente, animais idosos são resistentes à doença clínica, mas podem ter infecções inaparentes esporádicas. Os animais mais velhos, clinicamente
saudáveis, podem ser fontes de infecção para animais jovens suscetíveis.
PATOGÊNESE:  A  infecção  resulta  da  ingestão  de  oocistos  infectantes.  Os  oocistos  chegam  ao  ambiente  junto  com  as  fezes  de  um  hospedeiro  infectado,  mas  os  oocistos  de Eimeria e Isospora  não  são  esporulados  e,  portanto,  não  são
infectantes  quando  eliminados  nas  fezes.  Em  condições  favoráveis  de  oxigênio,  umidade  e  temperatura,  os  oocistos  esporulam  e  tornam­se  infectantes  por  vários  dias.  Durante  a  esporulação,  o  protoplasma  amorfo  se  desenvolve  em
pequenos corpos (esporozoítos), dentro de cistos secundários (esporocistos), no interior do oocisto. O oocisto esporulado de Eimeria spp possui 4 esporocistos, cada um contendo 2 esporozoítos; o oocisto esporulado de Isospora spp tem 2
esporocistos, cada um contendo 4 esporozoítos.
Quando um animal suscetível ingere o oocisto esporulado, os esporozoítos saem do oocisto, invadem a mucosa intestinal ou as células epiteliais em outros locais e se desenvolvem no meio intracelular em esquizontes multinucleados
(também denominados merontes). Cada núcleo se desenvolve em um corpo infectante, denominado merozoíto; os merozoítos entram em novas células e o processo se repete. Após número variável de gerações assexuadas, os merozoítos se
desenvolvem em macrogametócitos (feminino) ou microgametócitos (masculino). Esses gametócitos originam um único macrogameta ou vários microgametas na célula hospedeira. Após a fertilização pelo microgameta, o macrogameta se
desenvolve em um oocisto. Os oocistos possuem paredes resistentes e são eliminados na forma não esporulada nas fezes. Os oocistos não sobrevivem bem em temperaturas abaixo de cerca de 30°C ou acima de 40°C; dentro dessa variação,
podem sobreviver = 1 ano.
Dentre as várias espécies de Eimeria ou Isospora que podem infectar determinado hospedeiro, nem todas são patogênicas. Infecções concomitantes com duas ou mais espécies, algumas das quais não normalmente patogênicas, também
influenciam a doença clínica. A virulência das cepas de determinada espécie patogênica pode ser variável.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os  sinais  clínicos  de  coccidiose  são  decorrentes  da  destruição  do  epitélio  intestinal  e,  com  frequência,  do  tecido  conjuntivo  subjacente  da  mucosa.  Isso  pode  ser  acompanhado  de  hemorragia  no  lúmen  intestinal,
inflamação catarral e diarreia. Os sintomas podem incluir eliminação de sangue ou de restos de tecidos, tenesmo e desidratação. As concentrações séricas de proteínas e eletrólitos (tipicamente hiponatremia) podem estar notadamente
alteradas, mas só se constata alteração no teor de Hb ou no valor do VG em animais gravemente infectados.
DIAGNÓSTICO:  Os oocistos podem ser identificados nas fezes por métodos de flotação em solução com sal ou açúcar. O achado de número apreciável de oocistos de espécies patogênicas nas fezes é diagnóstico (> 100.000 oocistos/g de
fezes, nos surtos graves); todavia, como a diarreia pode preceder a intensa eliminação de oocistos em 1 ou 2 dias, e pode persistir depois que a excreção de oocistos retorna a níveis baixos, nem sempre é possível encontrar oocistos em uma
única amostra de fezes; podem ser necessários vários exames de fezes de um animal ou uma única amostra de vários animais oriundos de um mesmo ambiente. O número de oocistos presentes nas fezes é influenciado pelo potencial
reprodutivo  geneticamente  determinado  da  espécie,  pelo  número  de  oocistos  infectantes  ingeridos,  pelo  estágio  da  infecção,  pela  idade  e  estado  imunológico  do  animal,  pela  exposição  prévia,  pela  consistência  da  amostra  de  fezes
(quantidade de água livre) e pelo método de exame. Portanto, os resultados dos exames de fezes devem estar relacionados com os sintomas e as lesões intestinais (macro e microscópicas). Além disso, as espécies devem ser patogênicas para
este hospedeiro. O achado de muitos oocistos de uma espécie não patogênica, com diarreia concomitante, não define o diagnóstico de coccidiose clínica.
TRATAMENTO:  Os ciclos biológicos de Eimeria e Isospora são  autolimitantes  e  terminam,  espontaneamente,  em  poucas  semanas,  exceto  se  há  reinfecção.  O  tratamento  imediato  pode  retardar  ou  inibir  o  desenvolvimento  dos  estágios
resultantes de uma reinfecção e, consequentemente, abreviar a duração da enfermidade, reduzir a eliminação de oocistos, amenizar a hemorragia e a diarreia e diminuir o risco de infecções secundárias e óbito. Os animais doentes devem ser
isolados e tratados individualmente, sempre que possível, para garantir a administração de concentração terapêutica do fármaco e evitar a exposição de outros animais. Entretanto, a eficácia do tratamento para coccidiose clínica não foi
demonstrada com uso de nenhum fármaco, embora seja amplamente aceito que o tratamento é efetivo contra a reinfecção e, desta forma, auxilia na recuperação.

Oocistos de Eimeria zuernii em esfregaço de fezes de bezerro. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

A maioria dos coccidiostáticos tem efeito depressor nos esquizontes de primeira geração e, assim, o seu uso é mais adequado para o controle do que para o tratamento. As sulfonamidas solúveis são comumente administradas por via oral
em bezerros com coccidiose clínica e são mais efetivas do que as formulações de sulfonamidas intestinais (bolus). O amprólio também é administrado por via oral em bezerros, ovinos e caprinos com coccidiose clínica. O tratamento
preventivo de animais saudáveis expostos como proteção contra morbidade adicional é um procedimento importante durante a terapia de animais com sinais clínicos.
PREVENÇÃO:  A prevenção baseia­se em limitar o consumo de oocistos esporulados por animais jovens, de forma a estabelecer uma infecção para induzir imunidade, mas não um quadro sintomático. As boas práticas de alimentação e
manejo, incluindo medidas sanitárias, contribuem para esse objetivo. Os neonatos devem receber colostro. Os animais jovens suscetíveis devem ser mantidos em alojamentos limpos e secos. Os comedouros e bebedouros devem ser limpos
e protegidos de contaminação fecal; geralmente, isso implica no fornecimento de alimentos em cochos acima do chão e posicionados de forma que seja difícil a contaminação do alimento por fezes. O estresse (p. ex., desmame, alterações
súbitas da dieta e transporte) deve ser minimizado.
Recomenda­se  administração  preventiva  de  coccidiostáticos,  quando  é  possível  prever  que  os  animais  em  diversos  sistemas  de  manejo  desenvolverão  coccidiose.  Em  todos  os  casos, Eimeria spp  está  envolvida.  O  decoquinato  e  os
ionóforos são amplamente utilizados com este objetivo, em ruminantes jovens. Há relato de que uma alimentação contínua com baixo teor de amprólio, decoquinato, lasalocida ou monensina no primeiro mês de confinamento de um lote de
engorda, tem valor preventivo. O amprólio e os ionóforos são efetivos em cabritos, assim como sulfas e amprólio são eficazes em suínos.

 COCCIDIOSE EM BOVINOS
Foram identificadas 12 espécies de Eimeria spp nas fezes de bovinos, em todo o mundo, mas apenas três (E. zuernii, E. bovis e E. auburnensis) são mais frequentemente associadas à doença clínica. Experimentalmente, outras espécies
mostraram ser discreta ou moderadamente patogênicas, mas não são considerados patógenos importantes.
Geralmente,  a  coccidiose  é  uma  doença  de  bovinos  jovens  (1  a  2  meses  a  1  ano),  sendo  esporádica  nas  estações  úmidas  do  ano.  A  “coccidiose  de  verão”  e  a  “coccidiose  de  inverno”  em  bovinos  submetidos  à  criação  extensiva
provavelmente resultam de estresse térmico grave e de superpopulação ao redor de uma fonte limitada de água, o que concentra hospedeiros e parasitos em uma área restrita. Embora haja relato de epidemias particularmente graves em
bovinos de lote de engorda durante clima extremamente frio, os bovinos confinados em lotes de engorda são suscetíveis à coccidiose durante todo o ano. Geralmente, os surtos ocorrem no primeiro mês de confinamento. As vacas podem
contribuir para a contaminação do ambiente com oocistos de E. bovis devido ao maior número de oocistos fecais no periparto. O tempo para início da diarreia após a infecção é de 16 a 23 dias, para E. bovis e E. zeurnii e de 3 a 4 dias
para E. alabamensis; a infecção clínica causada por coccidiose geralmente não ocorre nas primeiras 3 semanas de vida. Desta forma, a coccidiose não é considerada parte do complexo diarreico em bezerros neonatos.
A síndrome mais típica é uma doença crônica ou subclínica em grupos de animais em crescimento. Os bezerros podem apresentar definhamento e região perineal sujas de fezes. Nas infecções brandas os bovinos parecem saudáveis e os
oocistos  estão  presentes  em  fezes  normalmente  formadas,  mas  a  conversão  alimentar  está  reduzida.  O  sinal  mais  característico  de  coccidiose  clínica  são  fezes  aquosas,  com  pouco  ou  nenhum  sangue,  e  os  animais  mostram  somente
desconforto  discreto  por  poucos  dias.  Infecções  graves  são  raras.  Os  bovinos  gravemente  acometidos  desenvolvem  diarreia  líquida  sanguinolenta,  que  pode  persistir  >  1  semana,  ou  fezes  líquidas  com  estrias  ou  coágulos  de  sangue,
fragmentos de epitélio e muco. Pode se constatar febre, anorexia, depressão, desidratação e perda de peso. Tenesmo é comum, pois os casos mais graves de enterite acometem o intestino grosso, embora o coccídeo patogênico de bovinos
possa  lesionar  a  mucosa  da  porção  inferior  do  intestino  delgado,  ceco  e  cólon.  Alguns  bovinos  morrem  durante  o  período  agudo;  outros  morrem  posteriormente  por  complicações  secundárias  (p.  ex.,  pneumonia).  Os  bezerros  que
sobrevivem à enfermidade grave podem apresentar perda de peso significativa, que não é rapidamente recuperada, ou podem permanecer caquéticos. Os bezerros com infecção intestinal concomitante (p. ex., Giardia) podem apresentar
quadro clínico mais grave do que os bezerros apenas com coccidiose. Além disso, os fatores de manejo, como clima, abrigo, práticas alimentares e agrupamento dos animais são importantes na determinação da manifestação da coccidiose
clínica em bovinos.
Sintomas neurológicos (tremores musculares, hiperestesia, convulsões tônico­clônicas, com ventroflexão de cabeça e pescoço, nistagmo) e alta taxa de mortalidade (80 a 90%) são observados em alguns bezerros com coccidiose clínica
aguda. Os surtos dessa “forma nervosa” são notados com maior frequência durante ou após clima muito frio, no inverno do Canadá e do norte dos EUA; não há relato da “forma nervosa” fora desta região geográfica. Bezerros acometidos
podem morrer < 24 h após o início de disenteria ou de sintomas nervosos ou podem viver por muitos dias em posição de decúbito lateral, com leve grau de opistótono. Os sintomas neurológicos não foram observados em coccidiose clínica
experimental em bezerros, sugerindo que os sintomas nervosos podem não estar relacionados com a disenteria ou, na verdade, nem mesmo à coccidiose.
O diagnóstico é feito pelo achado dos oocistos em teste de flotação fecal, esfregaço direto ou técnica de McMaster. O exame quantitativo de oocistos em amostras de fezes da ampola retal de, no mínimo, 5 bezerros de um piquete são
úteis na confirmação da coccidiose como causa da doença clínica. Os diagnósticos diferenciais incluem salmonelose, diarreia viral bovina, desnutrição, toxinas ou outros parasitos intestinais.
Coccidiose é uma doença autolimitante e a recuperação espontânea semanas tratamento específico é comum quando o estágio de multiplicação dos coccídios se finda.
Os fármacos que podem ser utilizados na terapia de animais clinicamente acometidos são amprólio (10 mg/kg/dia, por 5 dias) e sulfaquinoxalina (13 mg/kg/dia, por 3 a 5 dias). A sulfaquinoxalina é particularmente útil para bezerros
desmamados que desenvolvem diarreia sanguinolenta após a chegada em lotes de engorda. Como prevenção, pode­se utilizar amprólio (5 mg/kg/dia, por 21 dias), decoquinato (22,7 mg/45 kg/dia, por 28 dias) e lasalocida (1 mg/kg/dia, até
o máximo de 360 mg/animal/dia) ou monensina (100 a 360 mg/animal/dia). O principal benefício dos coccidiostáticos é a melhora da conversão alimentar e da taxa de ganho de peso.
Em um surto, os animais com infecção clínica devem ser isolados e tratados com fluidoterapia de suporte parenteral ou oral, conforme necessário. Deve­se reduzir a densidade populacional nos criadouros infectados. O fornecimento de
alimento e água deve ser distante do solo, o bastante para evitar contaminação por fezes. A medicação em massa do alimento e da água pode ser indicada na tentativa de evitar novos casos e minimizar os efeitos de uma epidemia. Bovinos
com  coccidiose  e  sintomas  nervosos  devem  ser  confinados  em  ambiente  interno,  mantidos  bem  aquecidos  e  acomodados,  e  receber  fluidoterapia  oral  e  parenteral.  Porém,  a  taxa  de  casos  fatais  em  bezerros  com  coccidiose  e  sintomas
nervosos é alta, apesar da terapia de suporte intensiva. O uso de sulfonamida parenteral pode ser indicado para controlar o desenvolvimento de enterite ou pneumonia bacteriana secundárias, possíveis em bezerros com coccidiose durante
clima muito frio. Os corticosteroides são contraindicados, pois aumentam a excreção de oocistos e há relato de que induzem doença clínica em bezerros com infecção subclínica.
O  controle  efetivo  de  coccidiose  é  difícil.  Deve­se  evitar  aglomeração  de  animais  enquanto  desenvolvem  imunidade  às  espécies  de  coccídios  presentes  no  ambiente.  O  piso  deve  ser  drenado  adequadamente  e  mantido  o  mais  seco
possível. Deve­se realizar tosquia regularmente, bem como adotar todas as medidas possíveis para minimizar a contaminação fecal dos pelos. O cocho de alimentos e o bebedouro devem ser altos o suficiente para evitar contaminação fecal
intensa. O controle da coccidiose bezerros introduzidos em um lote de engorda depende do manejo da densidade populacional, da disponibilidade de cocho apropriado ou do uso de quimioterápicos para controlar a quantidade de oocistos
ingeridos pelos animais enquanto se desenvolve a imunidade efetiva.
Os coccidiostáticos são utilizados para o controle de coccidiose de ocorrência natural. O coccidiostático ideal suprime todo o desenvolvimento do ciclo biológico do coccídio, permite o desenvolvimento de imunidade e não interfere no
desempenho produtivo. O uso de sulfonamidas no alimento, na dose de 25 a 35 mg/kg, por = 15 dias, é efetivo no controle de coccidiose em bezerros. Monensina é coccidiostático e promotor de crescimento eficiente em bezerros. A
coccidiose pós­desmame em bezerros de corte tem sido controlada com administração de monensina intraluminal de liberação contínua. A lasalocida é um composto relacionado com a monensina, sendo também um coccidiostático efetivo
para ruminantes. A lasalocida misturada ao sucedâneo do leite de bezerros aos 2 a 4 dias de idade é um método de controle de coccidiose efetivo. A lasalocida também é efetiva como coccidiostático, quando fornecido à vontade no sal, com
0,75% do total de sal da mistura. A dose de 1 mg/kg é a mais efetiva e de resultado mais rápido, sendo recomendada quando há iminência de surto de coccidiose. O decoquinato no alimento, na dose de 0,5 a 1 mg/kg, suprime a produção de
oocistos na coccidiose induzida experimentalmente em bezerros. O decoquinato é mais efetivo na prevenção de infecção por coccídios, quando fornecido continuamente em alimento seco, na dose de 0,5 mg/kg. Monensina, lasalocida e
decoquinato,  nas  doses  recomendadas  pelo  fabricante,  são  igualmente  efetivos.  A  administração  oral  de  dose  única  de  15  mg  de  toltrazurila/kg,  14  dias  após  a  introdução  dos  animais  no  pasto,  é  efetiva  para  evitar  diarreia  devido  à
coccidiose. O diclazurila (5 mg/kg) está sendo pesquisado como anticoccídeo de uso oral em bezerros.
O controle da infecção deve incluir modificação nas condições de manejo que contribuem para o desenvolvimento da doença clínica. Devem­se corrigir as deficiências de abrigo e ventilação, adotar práticas de alimentação que evitem
contaminação fecal dos alimentos, agrupar os bezerros por tamanho e adotar um método de “todos dentro todos fora” na transferência de bezerros de um piquete para outro.

 COCCIDIOSE EM GATOS E CÃES
Várias espécies de coccídios infectam o trato intestinal de gatos e cães. Todas as espécies parecem ser hospedeiro­específicas. Os gatos são infectados por espécies de Isospora, Besnoitia, Toxoplasma, Hammondia e Sarcocystis. Os cães são
infectados por espécies de Isospora, Hammondia e Sarcocystis. Cães e gatos não são infectados por Eimeria.
Hammondia tem um ciclo biológico obrigatório em dois hospedeiros; gatos e cães atuam como hospedeiros finais e os roedores e os ruminantes atuam como hospedeiros intermediários, respectivamente. Os oocistos de Hammondia são
indistinguíveis daqueles de Toxoplasma e de Besnoitia, mas não infectam nenhum hospedeiro (ver besnoitiose p. 547, sarcocistose, p. 1296 e toxoplasmose, p. 619).
Os coccídios mais comuns em gatos e cães são espécies de Isospora. Algumas espécies de Isospora de gatos e cães podem infectar facultativamente outros mamíferos e induzir uma forma encistada em vários órgãos, que é infectante para
gatos e cães. Duas espécies infectam os gatos: I. felis e I. rivolta; ambas podem ser identificadas facilmente pelo tamanho e forma do oocisto. Quase todos os gatos eventualmente são infectados por I. felis. Quatro espécies infectam os
cães: I. canis, I. ohioensis, I. burrowsi e I. neorivolta. Em cães, apenas I. canis pode ser identificada com base na estrutura do oocisto; as outras 3 espécies de Isospora se sobrepõem pelo tamanho e podem ser diferenciadas apenas pelas
características de desenvolvimento endógenas.
A coccidiose clínica, embora não seja comum, foi descrita em filhotes de cães e gatos. Nos filhotes de gatos, ocorre principalmente durante o estresse do desmame. Os sintomas mais comuns nos casos graves incluem diarreia (às vezes
sanguinolenta), perda de peso e desidratação. Geralmente, a coccidiose está associada a outros microrganismos infecciosos, imunossupressão ou estresse.
O tratamento pode ser desnecessário em gatos, pois em geral eles eliminam espontaneamente a infecção. Em gatos clinicamente infectados pode­se utilizar sulfonamida­trimetoprima (30 a 60 mg/kg/dia, durante 6 dias).
Em canis, quando pode­se prever a necessidade de profilaxia, acredita­se que o amprólio seja eficaz, embora não seja aprovado para uso em cães. Em casos graves, além da fluidoterapia de suporte, podem­se utilizar sulfonamidas, como
sulfadimetoxina (50 mg/kg, no primeiro dia, seguida de 25 mg/kg/dia, durante 2 a 3 semanas). As medidas sanitárias são importantes, especialmente nos gatis e canis, ou quando se abriga um grande número de animais. As fezes devem ser
removidas frequentemente. Deve­se evitar contaminação fecal dos alimentos e da água. Os cercados, as gaiolas e os utensílios devem ser desinfetados diariamente. Não se deve fornecer carne crua. Deve­se estabelecer um programa de
controle de insetos.

 COCCIDIOSE EM CAPRINOS
Há várias espécies de Eimeria em caprinos na América do Norte e em outras regiões. Eimeria spp é hospedeiro­específica e não é transmitida de ovinos para caprinos.
E. arloingi, E. christenseni e E. ovinoidalis são altamente patogênicas aos cabritos. Os sinais clínicos incluem diarreia com ou semanas muco ou sangue, desidratação, emaciação, fraqueza, anorexia e morte. Alguns caprinos apresentam
constipação intestinal e morrem subitamente semanas diarreia. Geralmente, os estágios e as lesões se restringem ao intestino delgado, que pode parecer congesto, hemorrágico ou ulcerado e apresentar placas macroscópicas amarelas ou
brancas,  pálidas  e  disseminadas  na  mucosa.  Histologicamente,  o  epitélio  das  vilosidades  se  desprende  e  notam­se  células  inflamatórias  na  lâmina  própria  e  na  submucosa.  Além  disso,  há  vários  relatos  de  coccidiose  hepatobiliar  com
insuficiência hepática em caprinos leiteiros. O diagnóstico de coccidiose intestinal baseia­se no achado de oocistos de uma espécie patogênica em fezes diarreicas, geralmente dezenas de milhares a milhões por grama de fezes. Não é raro
encontrar contagem de 70.000 oocistos em cabritos semanas uma doença evidente, mas o ganho de peso pode estar prejudicado.
Caprinos da raça Angorá e leiteiros criados sob práticas de manejo diferentes podem apresentar padrão semelhante de exposição dos cabritos. Imediatamente após o parto, os piquetes de parição e as áreas circundantes podem estar
altamente contaminados com oocistos originários das cabras. A resistência à infecção diminui imediatamente após transporte, mudança de ração, introdução de animais novos ou mistura de animais jovens com idosos. Pode­se administrar
coccidiostático a um rebanho imediatamente após o diagnóstico ou como medida preventiva em situações previsíveis, como as mencionadas anteriormente.
Os procedimentos de diagnóstico e tratamento são semelhantes àqueles de bovinos e ovinos. A adição de 55 g de sulfadimidina/tonelada também é efetiva no controle de coccidiose em caprinos. A adição de monensina ao alimento (18
g/tonelada) é uma medida preventiva para caprinos não lactantes.

 COCCIDIOSE EM OVINOS
A infecção por Eimeria é uma das doenças economicamente mais importantes em ovinos. Historicamente, acreditava­se que algumas espécies de Eimeria eram infectantes e transmissíveis entre ovinos e caprinos, mas atualmente esses
parasitos  são  considerados  hospedeiro­específicos.  Os  nomes  de  algumas  espécies  de  coccídios  de  caprinos  ainda  são  aplicados  erroneamente  a  espécies  de  aparência  semelhante  encontradas  nos  ovinos.  E.  crandallis  e  E.
ovinoidalis  (ninakohlyakimovae)  são  patógenos  de  cordeiros,  geralmente  com  1  a  6  meses  de  idade;  E.  ovina  parece  ser  um  pouco  menos  patogênico.  Os  ovinos  mais  velhos  atuam  como  fonte  de  infecção  para  os  jovens.  Todas  as
demais Eimeria de ovinos essencialmente não são patogênicas, mesmo quando há grande número de oocistos nas fezes.
Os sintomas incluem diarreia (às vezes contendo sangue ou muco), desidratação, febre, inapetência, perda de peso, anemia, lã quebradiça e morte. O íleo, o ceco e o cólon superior são, em geral, os mais acometidos e podem se tornar
espessados, edemaciados e inflamados; às vezes, ocorre hemorragia de mucosa. Podem­se desenvolver placas opacas brancas e espessas com grande número de oocistos de E. ovina no intestino delgado. Como os oocistos são frequentes nas
fezes de ovinos de todas as idades, a coccidiose não pode ser diagnosticada com base apenas no achado de oocistos. Tem­se descrito uma contagem de oocistos máxima > 100.000/g de fezes em cordeiros com 8 a 12 semanas de idade,
aparentemente saudáveis. No entanto, diarreia com contagem de oocistos de uma espécie patogênica > 20.000/g é característica de coccidiose em ovinos. A glomerulonefrite por deposição de imunocomplexos tem sido também atribuída à
coccidiose. Ataque de moscas e infecções intestinais bacterianas secundárias podem acompanhar a coccidiose em cordeiros.
Cordeiros  com  1  a  6  meses  de  idade  mantidos  em  piquete  de  parição,  em  áreas  de  pastejo  intensivo  e  em  áreas  de  confinamento  encontram­se  em  maior  risco,  quando  submetidos  à  transporte,  modificação  da  dieta,  estresse  por
superpopulação, clima desfavorável e contaminação ambiental com oocistos oriundos de ovelhas ou outros cordeiros. Como a ocorrência de coccidiose em animais submetidos a esses sistemas de manejo frequentemente é muito previsível
devem­se administrar coccidiostáticos profilaticamente por 28 dias consecutivos, começando poucos dias depois dos cordeiros serem introduzidos no ambiente. Uma ração concentrada que contenha 15 g de monensina/tonelada pode ser
fornecida a ovelhas a partir de 4 semanas antes do parto até o desmame e a cordeiros com 4 a 20 semanas de idade. O teor tóxico de monensina para cordeiros é 4 mg/kg. A lasalocida (15 a 70 mg/animal/dia, de acordo com o peso corporal)
pode ser efetiva. A combinação de monensina e lasalocida, na dose de 22 e 100 mg/kg de alimento, respectivamente, é uma medida profilática efetiva contra coccidiose de ocorrência natural em cordeiros recém­desmamados em lotes de
engorda.
O  tratamento  dos  ovinos  acometidos,  uma  vez  diagnosticada  a  coccidiose,  não  é  efetivo,  mas  pode  diminuir  a  gravidade  da  parasitose,  se  o  tratamento  começar  cedo.  A  administração  única  de  toltrazurila  (20  mg/kg)  pode  reduzir
significativamente a produção de oocistos em ovinos infectados naturalmente cerca de 3 semanas após a administração. O diclazurila (1 mg/kg) é um anticoccídio de uso oral efetivo em cordeiros, sendo administrado uma vez por volta de 6
a 8 semanas de idade (mais comum) ou duas vezes com 3 a 4 semanas de idade e novamente depois de 3 semanas. Pode­se adicionar sulfaquinoxalina na água de beber, na concentração de 0,015%, por 3 a 5 dias, para tratamento dos
cordeiros acometidos. Em grupos de ovinos em pastejo, a frequente rotação de pastagem para o controle de parasitos também auxilia no controle de infecção por coccídios. Porém, quando os ovinos são expostos aos coccídios no início da
vida, como resultado de infecção oriunda da ovelha e do solo da maternidade contaminado, geralmente se estabelece uma imunidade sólida ocorrendo infecção apenas quando a densidade animal é extremamente alta.

 COCCIDIOSE EM SUÍNOS
Oito espécies de Eimeria e uma de Isospora infectam suínos na América do Norte. Leitões com 5 a 15 dias de idade se infectam caracteristicamente apenas com I. suis, que causa enterite e diarreia. Esses agentes devem ser diferenciados de
vírus, bactérias e helmintos que também causam diarreia em suínos neonatos.
I. suis é prevalente em suínos neonatos. A infecção caracteriza­se por diarreia aquosa ou gordurosa, geralmente amarelada a branca e de odor fétido. Os leitões podem parecer fracos, desidratados e com tamanho reduzido, menor ganho
de peso e, às vezes, morrem. Um fator que contribui para a morte é a cobertura de leitões com fezes diarreicas, que permanecem úmidos. Os oocistos geralmente são eliminados nas fezes e podem ser identificados pelo tamanho, pela forma
e pelas características de esporulação; no entanto, nas infecções hiperagudas, o diagnóstico deve se basear na constatação de estágios do parasito em esfregaços por impressão ou cortes histológicos do intestino delgado, pois os suínos
podem morrer antes que os oocistos se formem. Nos leitões gravemente infectados, as lesões histológicas restritas ao jejuno e ao íleo se caracterizam por atrofia de vilosidades, úlcera focal e enterite fibronecrótica com estágios parasitários
nas células epiteliais.
Há relato de controle preventivo por meio do fornecimento de anticoccídios no alimento de porcas, desde duas semanas antes do parto até o final do período da lactação, ou de suínos neonatos, desde o nascimento até o desmame. No
entanto, ainda não se confirmou se tal procedimento é efetivo. Embora a porca seja uma fonte de infecção lógica para os suínos, isto ainda não foi comprovado. A remoção completa das fezes e a desinfecção dos locais de parição no período
entre as leitegadas diminuem muito a ocorrência de infecções. Os leitões que se recuperam de uma infecção ficam muito resistentes à reinfecção.
Embora menos comumente associada à coccidiose clínica, E. debliecki, E. neodebliecki, E. scabra e E. spinosa são encontradas em suínos cerca de 1 a 3 meses de idade, com diarreia. A enfermidade pode durar 7 a 10 dias, e os suínos
permanecem definhados.
O tratamento de coccidiose pode incluir o uso da sulfametazina na água de beber. O controle de coccidiose em leitões recém–nascidos infectados por I. suis não tem se mostrado efetivo. A adição de coccidiostáticos no alimento de porcas
por  diversos dias ou  poucas  semanas  antes  e  após  o  parto  tem  sido  recomendada e utilizada no campo, mas os resultados são variáveis. Amprólio e monensina não foram eficazes na prevenção de coccidiose experimental em leitões.
Recomenda­se um programa de controle visando reduzir o número de oocistos, que consiste em limpeza apropriada, desinfecção e limpeza a vapor das instalações de parição. Recomenda­se amprólio (25% do teor de alimento) na dose de
10 kg/tonelada de alimento das porcas, iniciando 1 semana antes do parto e continuando até que os leitões tenham 3 semanas de idade; mas os resultados são insatisfatórios. Dose única de toltrazurila (20 mg/kg VO) reduziu a excreção de
oocistos, a ocorrência de diarreia e o prejuízo ao ganho de peso em leitões com coccidiose induzida experimentalmente. O diclazurila (5 mg/kg) está sendo pesquisado como anticoccídio de uso oral em leitões.

CRIPTOSPORIDIOSE

A criptosporidiose é cosmopolita, e acomete principalmente bezerros neonatos, mas também cordeiros, cabritos, potros e leitões. Criptosporídios causam graus variados de diarreia de ocorrência natural em animais pecuários neonatos.
Geralmente, os parasitos atuam em conjunto com outros enteropatógenos para provocar lesão intestinal e diarreia.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  A infecção por Cryptosporidium parvum é comum em ruminantes jovens e verificada em várias espécies de mamíferos, inclusive em pessoas. A infecção é comum em bezerros. Criptosporídios têm sido
encontrados em 70% dos bezerros leiteiros com 1 a 3 semanas de idade. A infecção pode ser notada aos 5 dias de idade, com a maior parte dos bezerros eliminando os microrganismos entre o 9° e 14° dia. Diversos relatos associam a
infecção em bezerros com diarreia que ocorre por volta de 5 a 15 dias de idade. C. parvum também causa infecção entérica comum em cordeiros e caprinos jovens. A diarreia pode decorrência de uma única infecção, porém está associada a
maior frequência de infecções mistas. A infecção pode estar relacionada com surtos graves de diarreia, com alta taxa de mortalidade em cordeiros de 4 a 10 dias de idade e em cabritos de 5 a 21 dias de idade. A infecção por criptosporídios
em suínos é constatada em uma faixa de idade mais ampla do que aquela de ruminantes e tem sido observada em suínos com 1 semana até a idade de abate. A maioria das infecções é assintomática e o microrganismo não parece ser um
patógeno intestinal importante em suínos, embora possa contribuir para ocorrência de diarreia por má absorção após o desmame. As infecções por criptosporídios em potros são menos prevalentes e ocorrem em idades mais avançadas que
em ruminantes, com taxa de eliminação máxima ao redor de 5 a 8 semanas de idade. Geralmente, a doença não é observada em animais de 1 ano de idade ou naqueles adultos. A maioria dos estudos indica que a criptosporidiose não é uma
doença comum em potros; em geral, em animais imunocompetentes as infecções são subclínicas. Infecções clínicas persistentes são verificadas em cavalos da raça Árabe com imunodeficiência herdada. Criptosporidiose é também notada
em cervídeos jovens e pode ser uma causa de diarreia em crias órfãs.
TRANSMISSÃO:  As fontes de infecção são os oocistos, totalmente esporulados e infectantes quando eliminados nas fezes. Grande quantidade é eliminada durante o período patente, o que resulta em contaminação intensa do ambiente. A
transmissão pode ocorrer diretamente de bezerro para bezerro, indiretamente por meio de fômites ou de transmissão humana, a partir da contaminação ambiental ou por contaminação fecal de alimento e água. Pode ocorrer aumento da
excreção de oocistos no período periparto, em ovelhas. C. parvum não é hospedeiro específico e a infecção oriunda de outras espécies (roedores, gatos que vivem em fazendas), via contaminação alimentar, também é possível.
Os oocistos são resistentes à maioria dos desinfetantes e podem persistir por vários meses em ambiente frio e úmido. A infectividade do oocisto pode ser inibida por amônia, formalina, gelo seco e exposição à temperatura < 0°C ou >
65°C. Hidróxido de amônio, peróxido de hidrogênio, dióxido de cloro, formol 10% e amônia 5% são efetivos na eliminação de oocistos. A contagiosidade das fezes dos bezerros diminui 1 a 4 dias após o desmame.
Infecções concomitantes com outros patógenos entéricos, especialmente rotavírus e coronavírus, são comuns e estudos epidemiológicos sugerem que a diarreia é mais grave nas infecções mistas. Animais imunocomprometidos são mais
suscetíveis à doença clínica do que os imunocompetentes, mas a relação entre doença e falha na transferência passiva de imunoglobulinas colostrais não está clara. Em cordeiros, mas não em bezerros, nota­se resistência idade­dependente
não relacionada com a exposição prévia. A infecção resulta em produção de anticorpos específicos contra o parasito, mas tanto a imunidade celular quanto a humoral são importantes na proteção, bem como os anticorpos presentes no
intestino do neonato.
Geralmente, a taxa de mortalidade decorrente de criptosporidiose é baixa, exceto quando há complicação por outros fatores (p. ex., infecções concomitantes, déficit energético por ingestão inadequada de colostro e leite e estresse por
condições climáticas adversas).
PATOGÊNESE:  O  ciclo  biológico  de Cryptosporidium baseia­se  em  6  principais  eventos  de  desenvolvimento.  Após  a  ingestão  do  oocisto  ocorre  rompimento  da  estrutura  (liberação  de  esporozoítos  infectantes),  merogonia  (reprodução
assexuada), gametogonia (formação de gametas), fertilização, formação da parede do oocisto e esporogonia (formação do esporozoíto). Os oocistos de Cryptosporidium spp podem esporular no interior das células do hospedeiro e são
infectantes quando eliminados nas fezes. A infecção persiste até que a resposta imune do hospedeiro elimine o parasito. Os criptosporídios são mais numerosos na porção inferior do intestino delgado e são menos frequentes no ceco e no
cólon, em casos naturais e experimentais em bezerros. O período pré­patente é de 2 a 7 dias, em bezerros, e de 2 a 5 dias, em cordeiros. Geralmente, os oocistos são eliminados nas fezes de bezerros durante 3 a 12 dias.
ACHADOS CLÍNICOS:  Geralmente os bezerros apresentam diarreia discreta a moderada que persiste por diversos dias, semanas tratamento. O início da doença é notado em idade avançada e a diarreia tende a durar alguns dias, período mais
longo  do  aquele  da  diarreia  causada  por  rotavírus,  coronavírus  ou Escherichia coli enterotoxigênica.  As  fezes  são  amareladas  ou  pálidas,  aquosas  e  contêm  muco.  A  diarreia  persistente  pode  resultar  em  perda  de  peso  significativa  e
emaciação. Na maioria dos casos, a diarreia é autolimitante, após vários dias. Notam­se graus variáveis de apatia, anorexia e desidratação. Raramente há desidratação grave, fraqueza e colapso, ao contrário de outras causas de diarreia aguda
em bezerros neonatos. A taxa de mortalidade pode ser alta em rebanhos com criptosporidiose, quando o bezerro recusa leite e ingere apenas soluções eletrolíticas durante o episódio de diarreia. O padrão persistente de diarreia ocasiona
déficit energético significativo nestas condições e os bezerros morrem por inanição com 3 a 4 semanas de idade.
Lesões: Os bezerros com diarreia persistente apresentam atrofia de vilosidades do intestino delgado. Histologicamente, nota­se grande número de parasitos nas microvilosidades dos enterócitos de absorção. Em infecções de baixo grau,
apenas poucos parasitos estão presentes, semanas alteração histológica aparente no intestino. As vilosidades intestinais são menores que o normal, com hiperplasia de criptas e infiltrado celular inflamatório misto.
DIAGNÓSTICO:  Baseia­se na detecção de oocistos em esfregaços de fezes corados pela técnica Ziehl­Neelson, em exame de flotação fecal ou por métodos imunológicos auxiliares. Sugere­se que se a diarreia é causada por criptosporídios
deve­se encontrar 105 a 107oocistos/ml de fezes. Os oocistos são pequenos (5 a 6 mm de diâmetro) e relativamente não refrativos. Dificilmente são detectados por microscopia óptica normal, mas são facilmente vistos em microscopia de
contraste.
TRATAMENTO:  Atualmente  não  há  medicamento  aprovado  disponível  nos  EUA  para  tratamento  de  infecções  por C. parvum em  animais  de  produção.  Relatos  anedóticos  de  sucesso  com  uso  extrabula  de  vários  compostos  não  foram
confirmados em testes controlados. Tratamentos experimentais mostraram que a maioria destes fármacos é tóxica ou ineficaz. Relata­se que a halofuginona reduz significativamente a produção de oocistos em cordeiros experimentalmente
infectados e em bezerros com infecção experimental e natural; também, foi indicada para evitar diarreia. O sulfato de paromomicina (100 mg/kg VO, 1 vez/dia, por 11 dias a partir do segundo dia de idade) mostrou­se efetivo na prevenção
de doença natural em um teste clínico de campo controlado, em cabritos.
Os bezerros acometidos devem receber tratamento de suporte com fluidos e eletrólitos, tanto VO quanto por via parenteral, conforme necessário, até a recuperação. Leite integral de vacas deve ser fornecido em pequenas quantidades,
várias vezes ao dia (até completar a necessidade), para otimizar a digestão e minimizar a perda de peso. Vários dias de cuidados intensivos e alimentação podem ser necessários antes da recuperação evidente. Nutrição parenteral pode ser
instituída em bezerros de alto valor.
CONTROLE:  O controle da doença é difícil. A redução da quantidade de oocistos ingeridos pode diminuir a gravidade da infecção e permitir que a imunidade se desenvolva. Os bezerros devem nascer em um ambiente limpo e ingerir
quantidade  adequada  de  colostro  logo  após  o  nascimento.  Os  bezerros  devem  ser  mantidos  separados,  semanas  contato  com  outros  animais,  no  mínimo  nas  duas  primeiras  semanas  de  vida,  com  alimentação  rigorosamente  higiênica.
Animais com diarreia devem ser isolados dos saudáveis durante o curso de diarreia e vários dias após a recuperação. Um cuidado maior deve haver para evitar a transmissão mecânica da infecção. Os bezerreiros devem ser desocupados e
higienizados  seguindo  um  protocolo  adequado;  deve­se  empregar  o  sistema  de  manejo  “todos  dentro  todos  fora”,  com  limpeza  completa  e  várias  semanas  de  “vazio  sanitário”  entre  as  acomodações  dos  grupos  de  bezerros.  Ratos,
camundongos e moscas devem ser controladas, quando possível, e roedores e animais de estimação não devem ter acesso a áreas de armazenamento de grãos e leite.
O colostro bovino hiperimune reduziu a gravidade da diarreia e o período de eliminação de oocistos em bezerros experimentalmente infectados. A proteção não está relacionada com o teor circulante de anticorpo específico, mas requer
alto título de anticorpo contra C. parvum no lúmen intestinal por longo período. A vacina com C. parvum liofilizado, administrada por via oral logo após o nascimento, propiciou proteção parcial em bezerros desafiados experimentalmente
na  primeira  semana  de  vida.  Não  foi  efetiva  na  proteção  contra  desafio  natural  em  teste  de  campo,  provavelmente  porque  a  infecção  natural  ocorre  muito  cedo,  antes  do  desenvolvimento  de  imunidade.  No  mesmo  teste,  probióticos
produtores de ácido láctico não tiveram efeito protetor.
RISCO ZOONÓTICO:  Infecções em animais domésticos podem ser fonte de infecção para pessoas suscetíveis. Cryptosporidium é considerado causa não viral relativamente comum de diarreia autolimitante em pessoas imunocompetentes,
principalmente crianças. Nos pacientes imunocomprometidos, a doença clínica pode ser grave. A infecção é transmitida predominantemente de pessoa a pessoa, mas a infecção direta de animais e a infecção carreada pela água devido à
contaminação da água de beber por animais domésticos ou selvagens podem também ser importantes. Tratadores de animais de uma fazenda de criação de bezerros podem estar altamente sujeitos a desenvolver diarreia por criptosporidiose
transmitida por animais infectados. Pessoas imunocomprometidas devem ter acesso restrito a animais jovens e, provavelmente, também às fazendas.
GIARDÍASE (Giardose, Lamblíase, Lambliose)

Giardíase é uma infecção intestinal crônica cosmopolita causada por protozoários que acomete a maioria dos mamíferos domésticos e silvestres, diversas aves e pessoas. A infecção é comum em cães, gatos, ruminantes e suínos. Giardia spp
foi encontrada em 1 a 39% das amostras de fezes de cães e gatos, tanto de estimação quanto de abrigos, 1 a 53% de pequenos ruminantes, 9 a 73% de bovinos, 1 a 38% de suínos e 0,5 a 20% de equinos, com alta taxa de infecção em
animais jovens. A prevalência em animais de produção varia de 10 a 100%. A prevalência cumulativa em uma propriedade na qual se diagnosticou Giardia é de 100%, em bovinos e caprinos, e próxima a esse valor em ovinos.
Foram descritos três grupos distintos ou espécies de Giardia, incluindo G. duodenalis (sinonímia: G. intestinalis, G. lamblia), com ampla variedade de mamíferos hospedeiros. A caracterização molecular mostrou que, na verdade, G.
duodenalis é um complexo de espécies, que compreende 7 grupos (A a G), dos quais alguns tem preferência por hospedeiros distintos (p. ex., grupo C/D, em cães, grupo F, em gatos) ou um número limitado de hospedeiros (p. ex., grupo E,
em bovinos confinados), enquanto outros infectam vários animais, inclusive o homem (grupos A e B). Há maior evidência de que alguns grupos (A e B) que infectam animais domésticos também podem contaminar pessoas, embora o
mecanismo de transmissão seja mais complicado do que se pensa.
CICLO BIOLÓGICO E TRANSMISSÃO:  Os protozoários flagelados (trofozoítos) do gênero Giardia habitam as superfícies mucosas do intestino delgado, onde infectam a borda em escova, absorvem nutrientes e se replicam por divisão binária.
Os trofozoítos encistam no intestino delgado ou grosso e os cistos recentemente formados são eliminados nas fezes. Geralmente, o período pré­patente é de 3 a 10 dias. A eliminação de cistos pode ser contínua por vários dias e semanas,
mas com frequência é intermitente, principalmente na fase crônica da infecção. O cisto é o estágio infectante e pode sobreviver por várias semanas no ambiente, ao contrário dos trofozoítos.
A transmissão ocorre por via fecal­oral, por contato direto com hospedeiro ou com ambiente contaminado. As características que facilitam a infecção incluem excreção de grande quantidade de cistos por animais infectados e baixa dose
necessária para que ocorra infecção. Além disso, os cistos de Giardia são infectantes imediatamente após a excreção e muito resistentes, o que resulta em aumento gradual da pressão de contaminação do ambiente. Alto teor de umidade
facilita a sobrevivência do cisto no ambiente e a superpopulação favorece a transmissão.
PATOGÊNESE:   As  infecções  por  Giardia  causam  aumento  da  permeabilidade  epitelial,  elevação  do  número  de  linfócitos  intraepiteliais  e  ativação  de  linfócitos  T.  As  toxinas  dos  trofozoítos  e  a  ativação  de  linfócitos  T  iniciam  um
encurtamento difuso da borda em escova das microvilosidades e redução da atividade das enzimas presentes na borda em escova do intestino delgado, principalmente lipase, algumas proteases e dissacaridases. O encurtamento difuso das
microvilosidades ocasiona redução generalizada da área de absorção do intestino delgado e prejudica a absorção de água, eletrólitos e nutrientes. O efeito combinado da redução de reabsorção e deficiências das enzimas da borda em escova
ocasiona diarreia por má absorção e diminuição do ganho de peso. A atividade reduzida da lipase e o aumento da produção de mucina pelas células caliciformes podem justificar a ocorrência de esteatorreia e diarreia mucosa, relatadas em
hospedeiros contaminados por Giardia.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  As infecções por Giardia em cães e gatos podem ser inaparentes ou causar perda de peso e diarreia crônica ou esteatorreia, que podem ser contínuas ou intermitentes, principalmente em filhotes. Geralmente,
as fezes moles, mal formadas, pálidas, fétidas, com muco e aparência gordurosa. Diarreia aquosa é incomum nos casos não complicados e, em geral, não há sangue nas fezes. Vômitos ocorrem ocasionalmente. Deve­se diferenciar giardíase
de outras causas de má absorção de nutrientes (p. ex., insuficiência pancreática exócrina [p. 493], má absorção intestinal [p. 426]). Os achados laboratoriais geralmente são normais.
Em bezerros, e em menor proporção em outros animais de produção, a giardíase pode causar diarreia não responsiva ao tratamento com antibióticos ou coccidiostáticos. A eliminação de fezes líquidas a pastosas, com aparência mucoide,
pode sugerir giardíase, principalmente quando a diarreia ocorre em animais jovens (1 a 6 meses). Além de diarreia, há prejuízo à produção devido à giardíase em animais pecuários. A infecção experimental em cabritos, cordeiros e bezerros
provoca redução da conversão alimentar e consequente diminuição do ganho de peso.
As lesões intestinais macroscópicas raramente são evidentes, embora possam ser detectadas lesões microscópicas, que consistem em atrofia de vilosidades e enterócitos cuboides.
DIAGNÓSTICO:  Trofozoítos móveis e piriformes (12 a 15 × 6 a 10 μm) ocasionalmente são observados em esfregaços de fezes aquosas em solução salina. Não devem ser confundidos com tricomonas, que têm núcleos simples ou duplos,
membrana ondulada e sem concavidade na superfície ventral. Cistos ovais (9 a 15 × 7 a 10 μm) podem ser detectados em fezes concentradas pela técnica de centrifugação–flotação com sulfato de zinco (densidade específica de 1,180). Os
meios de flotação com cloreto de sódio, sacarose ou nitrato de sódio são muito hipertônicos e distorcem os cistos. A coloração dos cistos com iodo auxilia sua identificação. Como os cistos de Giardia são excretados de forma intermitente,
devem­se realizar vários exames de fezes em caso de suspeita de giardíase; por exemplo, 3 amostras coletadas ao longo de 3 a 5 dias.
Técnicas de imunofluorescência e ELISA estão no mercado disponíveis para detecção do antígeno do parasito. Em bezerros, ambas as técnicas foram sensíveis e específicas para o diagnóstico da infecção, quando comparadas ao exame
microscópico. Atualmente há disponibilidade de técnicas de imunocromatografia qualitativa em fase sólida rápida, o que torna possível o diagnóstico de giardíase on­site. Um teste ELISA está disponível no mercado para uso em cães,
recentemente  comprovou­se  que  é  um  procedimento  útil  no  diagnóstico  clínico.  A  técnica dipstick também  está  disponível  para  o  diagnóstico  de  giardíase  em  bezerros,  mas  o  teste  parece  ter  pouca  sensibilidade.  Em  suma,  os  testes
laboratoriais baseados nas técnicas de imunofluorescência e ELISA foram considerados mais sensíveis para o diagnóstico clínico de Giardia quando comparados às técnicas imunocromatográficas.
Cistos de Giardia spp oriundos de cobra ratsnake asiática; aumento de 1.000×, em óleo de imersão. Cortesia do Dr. Roger Klingenberg.

TRATAMENTO:  O  fembendazol  (50  mg/kg/dia,  durante  3  dias)  elimina  efetivamente  os  cistos  de Giardia das  fezes  dos  cães;  não  há  relato  de  efeito  colateral  e  o  medicamento  é  seguro  em  fêmeas  prenhes  e  lactantes.  Na  Europa,  essa
dosagem é aprovada para tratamento de infecções por Giardia em cães. O fembendazol não é aprovado para gatos, mas pode reduzir os sinais clínicos e a eliminação de cistos, na dose de 50 mg/kg/dia, durante 3 a 5 dias. O oxfendazol é
efetivo na dose de 11,3 mg/kg, por 3 dias, em cães, mas não é aprovado para tratamento de giardíase. O albendazol é efetivo na dose de 25 mg/kg, 2 vezes/dia, por 4 dias, em cães, e durante 5 dias em gatos, mas não deve ser usado nestes
animais, pois tem causado supressão da medula óssea e não é aprovado para essas espécies. A combinação de praziquantel (5,4 a 7 mg/kg), pirantel (26,8 a 35,2 mg/kg) e febantel (26,8 a 35,2 mg/kg) também reduz de forma efetiva a
eliminação de cistos em cães infectados. O efeito sinérgico entre pirantel e febantel foi demonstrado em animais de pesquisa, sugerindo que a combinação dos produtos é preferível em relação ao uso de febantel isoladamente.
O metronidazol (25 mg/kg, 2 vezes/dia, por 5 a 7 dias) é efetivo na eliminação da Giardia spp em cerca de 65% de cães infectados, mas pode induzir episódio agudo de anorexia e vômito; ocasionalmente, pode progredir para ataxia
generalizada e nistagmo posicional vertical acentuado. O metronidazol pode ser administrado aos gatos, na dose de 10 a 25 mg/kg, 2 vezes/dia, por 5 dias. A furazolidona, na dose de 4 mg/kg VO, 2 vezes/dia, por 7 dias, também é eficaz
em gatos e cães pequenos, embora diarreia e vômitos sejam efeitos colaterais possíveis; também, suspeita­se que seja teratogênica. Uma vacina morta está disponível nos EUA para cães e gatos, mas a vacinação preventiva ou curativa
mostrou eficácia variável na redução dos sinais clínicos e do número e duração de cistos eliminados no ambiente.
Atualmente, não há fármacos aprovados para o tratamento de giardíase em ruminantes. Fembendazol e albendazol (5 a 20 mg/kg/dia, durante 3 dias) reduzem significativamente o pico e a duração da eliminação de cistos e resulta em
melhora clínica em bezerros. Relata­se que a paromomicina (50 a 75 mg/kg, VO, por 5 dias) é muito efetiva em bezerros.
O uso oral de fembendazol pode ser uma opção de tratamento para alguns pássaros.
CONTROLE:   Os  cistos  de  Giardia  são  prontamente  infectantes  quando  eliminados  nas  fezes  e  sobrevivem  no  ambiente.  Os  cistos  representam  uma  fonte  de  infecção  e  reinfecção  aos  animais,  especialmente  àqueles  criados  em
superpopulação (p. ex., canis, gatis ou sistemas de criação intensiva para animais de produção). A remoção imediata e frequente das fezes limita a contaminação ambiental, bem como a consequente infecção. Os cistos são inativados pela
maioria dos compostos à base de amônio quaternário, vapor e água fervente.
Para aumentar a eficácia dos desinfetantes, as soluções devem ser deixadas em contato com os cistos por 5 a 20 min, antes de en xaguar as superfícies contaminadas. A desinfecção de jardins e corredores é impossível e essas áreas devem
ser consideradas contaminadas por, no mínimo, um mês após os cães infectados terem deixado o local. Os cistos são suscetíveis ao ressecamento e deve­se deixar que essas áreas sequem completamente após a limpeza.

CÓLICA EM EQUINOS

Em sua definição mais correta, o termo “cólica” significa dor abdominal. Com o passar dos anos tornou­se um termo abrangente para várias enfermidades que são acompanhadas de sinais clínicos de dor abdominal. Consequentemente, é
utilizado  para  se  referir  a  doenças  de  etiologia  e  gravidade  amplamente  variáveis.  Para  compreender  essas  etiologias,  obter  o  diagnóstico  e  iniciar  tratamentos  apropriados,  o  veterinário  deve  inicialmente  compreender  os  aspectos
clinicamente  relevantes  da  anatomia  gastrintestinal  dos  equinos,  os  mecanismos  fisiológicos  envolvidos  na  movimentação  da  ingesta  e  do  líquido  ao  longo  do  trato  GI  e  a  sensibilidade  extrema  do  equino  aos  efeitos  deletérios  das
endotoxinas bacterianas normalmente presentes no lúmen intestinal.

Anatomia do Trato Gastrintestinal
O equino é um animal monogástrico, com estômago relativamente pequeno (capacidade de 8 a 10 L), localizado no lado esquerdo do abdome, abaixo do gradil costal. A junção do esôfago distal com o cárdia representa uma válvula
funcional via única, que permite que gases e fluidos entrem no estômago, mas não saiam. Como consequência, as enfermidades que impedem o deslocamento aboral normal de gases e fluidos através do intestino delgado podem resultar em
grave dilatação e ruptura gástrica. Devido sua posição, é difícil visualizar o estômago em radiografia ou ultrassonografia, em equinos adultos grandes. No entanto, em potros, pelo tamanho menor do órgão, é possível avaliar o esvaziamento
gástrico por meio de radiografia contrastada.
O intestino delgado compreende duodeno, jejuno e íleo, com a última parte se juntando ao ceco, em uma junção ileocecal específica. O duodeno localiza­se principalmente na porção dorsal, no lado direito do animal, onde fica suspenso
na parede corporal dorsal por meio de um pequeno mesentério de 3 a 5 cm. Consequentemente, o duodeno não se envolve nos deslocamentos de intestino delgado que acometem o mesentério (vólvulo). Na base do ceco, na região da fossa
paralombar direita, o duodeno volta­se para a linha média. É nesse ponto que é possível sentir o duodeno, quando distendido por gases ou líquido (p. ex., nos equinos com enterite proximal), na palpação retal.
À medida que o intestino delgado alcança a linha média dorsal, torna­se jejuno. O mesentério longo característico possibilita que as alças jejunais apoiem­se sobre o conteúdo da porção ventral abdominal. O jejuno tem cerca de 19,5 m de
comprimento; este comprimento, juntamente com seu longo mesentério, permite que ele se envolva em vólvulos e encarceramentos do intestino delgado. No final do jejuno a parede intestinal torna­se mais muscular, o lúmen se estreita e a
ligação mesentérica adicional torna­se aparente. Os últimos 45 cm do intestino delgado, o íleo, juntam­se com o ceco em sua face medial dorsal. Essa junção é identificada pela ligação da prega ileocecal do íleo à faixa dorsal do ceco. A
prega ileocecal é utilizada como ponto de referência para localizar o íleo em uma cirurgia.

Intestino grosso de equino. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.
Vista medial esquerda do ceco e do cólon direito de equino. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Através do íleo, a ingesta alcança o ceco, um grande reservatório de fermentação de fundo cego, situado essencialmente no lado direito do equino e se estende da região da fossa paralombar até a cartilagem xifoide, na linha média
ventral. O ceco tem 1,2 a 1,5 m de comprimento e pode conter 27 a 30 L de alimento e fluido. Sob a influência do músculo cecal, no interior do ceco a ingesta é amolecida, misturada com microrganismos capazes de digerir celulose e,
finalmente, passa pela abertura cecocólica para o interior do cólon ventral direito. A ligação do ceco na parede corporal dorsal é larga, minimizando o risco de deslocamento ou rotação sobre seu próprio eixo.
O cólon ventral direito é dividido em saculações que ajudam a misturar e reter as fibras vegetais, até que sejam digeridas. Localiza­se na porção ventral do abdome, desde a região do flanco até o gradil costal. O cólon ventral, então, se
desvia para a esquerda, torna­se a flexura esternal e, depois, o cólon ventral esquerdo. O cólon ventral esquerdo, que também é grande e apresenta saculações, passa caudalmente para a área do flanco esquerdo. Próximo da região pélvica, o
diâmetro do cólon diminui acentuadamente e ele se dobra sobre si mesmo. Essa região, denominada flexura pélvica, corresponde à porção inicial do cólon dorsal esquerdo não saculado. Possivelmente, pela diminuição abrupta do diâmetro,
a junção entre o cólon ventral esquerdo e a flexura pélvica é o local mais comum de impactação.
O diâmetro do cólon dorsal é máximo na sua flexura diafragmática ou no cólon dorsal direito. Não há saculação nas porções direita e esquerda do cólon dorsal. O cólon dorsal direito está intimamente ligado ao cólon ventral direito por
meio de uma pequena dobra intercólica e, à parede corporal, por uma resistente ligação mesentérica comum com a base do ceco. Contrariamente, nem o cólon ventral nem o cólon dorsal esquerdos se prendem diretamente à parede corporal,
o que permite que essas porções do cólon apresentem deslocamento ou rotação.
A ingesta se desloca do cólon dorsal direito maior para o cólon transverso menor, que possui diâmetro de cerca de 10 cm e está firmemente fixo na face mais dorsal da cavidade abdominal, por meio de um mesentério fibroso, curto e
forte. O cólon transverso situa­se cranialmente à artéria mesentérica cranial. Finalmente, a ingesta alcança o cólon descendente saculado, que tem 3 a 3,6 m de comprimento.

Suprimento Sanguíneo ao Trato Gastrintestinal
As artérias celíaca e mesentérica cranial (ramos da aorta abdominal) fornecem o suprimento sanguíneo ao trato gastrintestinal (GI). A artéria celíaca fornece sangue arterial ao estômago, pâncreas, fígado, baço e porção inicial do duodeno.
A artéria mesentérica cranial fornece sangue arterial para o restante do duodeno, para todo o jejuno, íleo, ceco, cólon maior e cólon transverso e porção inicial do cólon descendente. Como o cólon maior se prende à parede corporal apenas
na região próxima à artéria mesentérica cranial, o sangue que supre todas as partes do cólon deve atravessar toda sua extensão. A flexura pélvica recebe sangue de dois ramos da artéria mesentérica cranial; um ramo supre o cólon dorsal,
direito e esquerdo, antes de atingir a flexura pélvica, e o outro supre o cólon ventral direito e esquerdo, antes de atingir a flexura pélvica. Logo, um vólvulo no cólon maior, próximo à junção cólon­ceco, pode impedir o fluxo sanguíneo para
todo o cólon esquerdo.
Os principais ramos da artéria mesentérica cranial podem ser lesionados por formas migratórias do parasito Strongylus vulgaris (ver p. 358).

Aberturas Naturais no Abdome
Há várias aberturas ou espaços naturais na cavidade abdominal que podem ser importantes nas enfermidades que causam cólica. O canal inguinal é uma abertura pela qual o intestino pode passar e ficar retido. Embora as hérnias inguinais
sejam comuns em potros jovens, raramente causam problemas clínicos; a situação é consideravelmente diferente em garanhões. De modo semelhante, se a parede abdominal ventral não se fecha corretamente ao redor do umbigo, permanece
uma abertura, com risco de problemas intestinais secundários à hérnia umbilical. O forame epiploico, uma abertura natural entre a veia porta, a veia cava caudal e o lobo hepático caudato, pode ser um local de encarceramento intestinal.
Finalmente, há um espaço natural entre a face dorsal esplênica e o rim esquerdo. Esse espaço é limitado pelo ligamento nefroesplênico, uma faixa tecidual forte que liga a face dorsomedial esplênica à cápsula fibrosa do rim esquerdo. Esse
ligamento propicia uma “saliência” sobre a qual o cólon maior pode se deslocar.

Padrões de Motilidade do Cólon
O peristaltismo normal no cólon ventral esquerdo desloca a ingesta em direção ao cólon dorsal esquerdo e os músculos da parede do cólon dorsal esquerdo se contraem para movimentar a ingesta em direção à flexura diafragmática. No
entanto, há evidências de que os músculos do cólon ventral esquerdo se contraem de maneira retrógrada, da flexura pélvica em direção à flexura esternal. Além disso, essas contrações se originam de um marca­passo presente na flexura
pélvica. Há hipótese de que esse marca­passo percebe tanto o tamanho quanto a consistência das partículas de alimentos da ingesta e, então, inicia o padrão de motilidade apropriado. Se a ingesta for digerida o suficiente, ela será movida em
direção normal; se for necessária uma digestão adicional, a ingesta será direcionada em sentido retrógrado, sendo retida no cólon ventral. Esta teoria justifica a ocorrência clínica comum de obstrução na flexura pélvica, ou próxima a ela.

Achados Clínicos
Vários sinais clínicos estão associados à cólica. Os mais comuns incluem repetidas batidas de patas no solo com o membro torácico, olhar para a região do flanco, movimentação do lábio superior e arqueamento do pescoço, levantamentos
repetidos de membro pélvico ou coices no abdome, decúbito, rolamento de um lado para o outro, sudorese, posição de micção, esforço para defecar, distensão abdominal, perda de apetite, depressão e diminuição da motilidade intestinal. É
raro que um equino com cólica exiba todos esses sinais. Embora estes sejam indicadores confiáveis de dor abdominal, os sinais particulares não indicam qual parte do trato GI se encontra comprometida ou se será necessária cirurgia.

Diagnóstico
Obtém­se o diagnóstico e institui­se tratamento apropriado apenas após realização de um exame completo do equino, considerando o histórico de quaisquer problemas ou tratamentos anteriores, definindo a parte do trato intestinal envolvida
e  identificando  a  causa  do  episódio  específico  de  cólica.  Na  maioria  das  vezes,  a  cólica  se  deve  uma  das  seguintes  razões:  1)  A  parede  intestinal  encontra­se  excessivamente  distendida  por  gás,  líquido  ou  ingesta.  Isso  estimula  as
terminações  nervosas  sensíveis  a  estiramentos  da  parede  intestinal  e  os  estímulos  de  dor  são  transmitidos  ao  cérebro.  2)  Há  dor  devido  tensão  excessiva  no  mesentério.  3)  Na  maioria  das  vezes,  ocorre  isquemia,  como  resultado  de
encarceramento ou grave torção intestinal. 4) Ocorre inflamação, que pode envolver toda a parede intestinal (enterite) ou o revestimento intestinal (peritonite). Nestes casos, os mediadores pró­inflamatórios da parede intestinal reduzem o
limiar para estímulos de dor.
A lista de possíveis enfermidades que causam cólica é longa, sendo razoável primeiramente determinar o tipo de doença mais provável e iniciar tratamento apropriado e, depois, obter o diagnóstico mais específico, se possível. Os tipos
gerais de doenças que causam cólica incluem excesso de gás no lúmen intestinal (cólica gasosa), obstrução simples do lúmen intestinal, obstrução do lúmen intestinal e do suprimento sanguíneo para o intestino (obstrução estrangulante),
interrupção do suprimento sanguíneo apenas para o intestino (infarto não estrangulante), inflamação intestinal (enterite), inflamação do revestimento da cavidade abdominal (peritonite), erosão da mucosa intestinal (úlcera) e “cólica de
causa inexplicável”. Em geral, equinos com obstruções estrangulantes e obstruções completas necessitam cirurgia abdominal de emergência, enquanto equinos com outros tipos de doença podem ser tratados clinicamente.
Deve­se investigar a história do episódio atual de cólica e dos episódios anteriores, se houver, para determinar se o equino apresenta problemas repetitivos ou semelhantes ou se o episódio é um evento isolado. Duração do evento, grau de
comprometimento  cardiovascular,  intensidade  da  dor,  defecação  e  resposta  ao  tratamento  são  informações  importantes.  Também,  é  importante  investigar  o  controle  de  parasitos  intestinais  em  equinos  (esquema,  datas  de  tratamento  e
fármacos utilizados), há quanto tempo fez­se a limpeza dos dentes, as mudanças no fornecimento ou na quantidade de alimentos ou água e se o equino se encontrava em repouso ou se exercitando quando a cólica começou.
O exame físico deve incluir avaliação dos sistemas cardiopulmonar e GI. Deve­se examinar as membranas mucosas bucais quanto à coloração, umidade e tempo de preenchimento capilar. As membranas mucosas podem se apresentar
cianóticas ou pálidas quando há comprometimento cardiovascular agudo e, por fim, hiperêmicas ou congestas, à medida que se instala vasodilatação periférica posteriormente ao choque. O tempo de preenchimento capilar (o normal é cerca
de 1,5 segundos) pode estar diminuído no início, mas geralmente torna­se prolongado à medida que ocorre estase vascular (congestão venosa). As membranas mucosas tornam­se secas à medida que o equino se desidrata. A frequência
cardíaca  aumenta  devido  à  dor,  hemoconcentração  e  hipotensão;  portanto,  a  frequência  cardíaca  mais  elevada  está  associada  a  problemas  intestinais  mais  graves  (obstrução  estrangulante).  No  entanto,  nem  todas  as  enfermidades  que
necessitam cirurgia são acompanhadas de alta frequência cardíaca.
Um aspecto importante no exame físico é a introdução de sonda nasogástrica. Como os equinos não podem regurgitar, tampouco vomitar, a ocorrência de íleo adinâmico, obstruções que envolvem o intestino delgado ou distensão gástrica
com gás ou líquido podem resultar em ruptura do estômago. Portanto, a introdução de uma sonda gástrica pode salvar a vida do equino e auxiliar no diagnóstico dessas enfermidades. Caso ocorra refluxo de líquido devem­se avaliar o
volume e sua coloração.
Devem­se auscultar o abdome e o tórax e percutir o abdome. Este deve ser auscultado em vários locais (ceco à direita, intestino delgado na porção esquerda superior e cólon na parte esquerda inferior). Os sons intestinais associados a
episódios de dor podem indicar obstrução intraluminal (p. ex., impactação e enterólito). Ruído de gás pode indicar íleo adinâmico ou distensão visceral. Ruído de líquido pode indicar diarreia iminente associada à colite. A ausência total de
ruídos geralmente está associada a íleo adinâmico ou isquemia. A percussão auxilia na identificação do segmento do intestino totalmente distendido (ceco à direita e cólon à esquerda), que pode necessitar esvaziamento. Pode­se notar
aumento da frequência respiratória devido à febre, dor, acidose ou doença respiratória primária. Hérnia diafragmática também é uma possível causa de cólica.
A parte mais importante do exame é a palpação retal. O veterinário deve desenvolver um método de palpação consistente das seguintes estruturas: artéria aorta, artéria mesentérica cranial, base do ceco e sua porção ventral, duodeno,
bexiga, superfície peritoneal, anel inguinal em garanhões e nos cavalos castrados, bem como ovários e útero em éguas, flexura pélvica, baço e rim esquerdo. Deve­se palpar o intestino, verificando­se tamanho, consistência do conteúdo
(gasoso, líquido ou impactado), distensão, edema de parede e dor.
Com frequência, uma amostra de fluido peritoneal (coletada por meio de paracentese asséptica na linha média) reflete o grau de lesão intestinal. Devem­se avaliar coloração, contagem celular total e diferencial e concentração de proteína
total. O líquido peritoneal normal apresenta­se claro a cor­de­palha, contém < 5.000 leucócitos/μl, sendo a maioria deles células mononucleares e < 2,5 g de proteína/dl.
A idade do equino é importante, pois várias enfermidades relacionadas com a idade causam cólica. As mais comuns são: potros – atresia de cólon, retenção de mecônio, uroperitônio e úlcera gastroduodenal; equinos com cerca de 1 ano
de idade – impactação por ascarídeos; equinos jovens – intussuscepção de intestino delgado, infarto não estrangulante e obstrução por corpo estranho; equinos de meia­idade – impactação de ceco, enterólitos e vólvulo de cólon maior; em
equinos idosos – lipoma pedunculado e ruptura mesocólica.
A avaliação ultrassonográfica do abdome pode auxiliar na diferenciação entre doenças que podem ser tratadas clinicamente e aquelas que necessitam cirurgia. Ultrassonografia transrretal também pode ser realizada para elucidar as
alterações notadas durante a palpação retal. Em potros, as imagens do cólon maior e do intestino delgado são comumente vistas através da parede abdominal ventral, enquanto apenas a imagem do cólon maior é frequentemente notada em
equinos adultos. O cólon maior pode ser visualizado por sua aparência sacular. O duodeno pode ser visto na altura do décimo espaço intercostal e delimitado ao redor da porção caudal do rim direito. O jejuno raramente é identificado no
exame ultrassonográfico transabdominal de um equino adulto normal, enquanto o íleo com parede espessada pode ser notado no exame transrretal.
As anormalidades mais comumente identificadas no exame ultrassonográfico incluem hérnia, encarceramento nefroesplênico do cólon maior, cólica com conteúdo arenoso, intussuscepção, enterocolite, colite dorsal direita e peritonite.
Garanhões com hérnia inguinal apresentam intestino encarcerado no lado acometido; é possível identificar o intestino e obter informações acerca da espessura de sua parede, assim como a presença ou ausência de peristaltismo. Em equinos
com  encarceramento  nefroesplênico  do  cólon  maior,  a  extremidade  do  baço  ou  o  rim  esquerdo  não  podem  ser  observados,  ou  o  cólon  maior  preenchido  por  gás  está  presente  na  porção  caudodorsal  do  abdome,  na  região  do  espaço
nefroesplênico. Equinos com cólica por conteúdo arenoso apresentam uma imagem hiperecoica granular da porção acometida do cólon. O achado característico em equinos com intussuscepção é a aparência de “olho de touro” da porção do
intestino delgado envolvida. Frequentemente, a região do intestino proximal à intussuscepção encontra­se distendida e há espessamento da região estrangulada. Equinos com enterocolite comumente exibem evidências de hiperperistaltismo,
parede intestinal com áreas espessadas e distensão do intestino por líquido. Entretanto, equinos com colite dorsal direita com frequência apresentam espessamento acentuado da parede do cólon dorsal direito. Em cavalos com peritonite, o
fluido peritoneal pode ser anecoico ou indicar evidência de material flocoso e fibrina entre as superfícies serosas das vísceras.

Tratamento
Os equinos com cólica podem necessitar tanto tratamento clínico quanto cirúrgico. Quase todos requerem alguma forma de tratamento clínico, mas apenas os equinos com algumas obstruções intestinais mecânicas necessitam cirurgia. O
tipo de tratamento clínico é definido em função da causa da cólica e da gravidade da doença. Em alguns casos, no início o equino pode ser submetido ao tratamento clínico e ter a resposta avaliada; isso é particularmente adequado quando
há dor leve e as funções do sistema cardiovascular estão normais. Ultrassonografia pode ser utilizada para avaliar a eficácia do tratamento medicamentoso. Se necessário, pode–se utilizar um procedimento cirúrgico como diagnóstico, bem
como para tratamento.
Havendo evidências de obstrução intestinal por ingesta seca, durante palpação retal, o objetivo principal do tratamento é hidratar e retirar o conteúdo intestinal. Se o equino apresenta dor intensa e sinais clínicos de hemoconcentração por
perda de água (frequência cardíaca elevada, tempo de preenchimento capilar prolongado e alteração da cor das membranas mucosas), os objetivos iniciais do tratamento são: aliviar a dor, restabelecer a perfusão tecidual e corrigir quaisquer
anormalidades na composição do sangue e dos fluidos corporais (ver Tabela 5). Na suspeita de lesão de parede intestinal (em decorrência de inflamação grave ou de deslocamento ou obstrução estrangulante), devem ser adotadas medidas
para evitar ou tratar os efeitos nocivos das endotoxinas bacterianas que saem do intestino e alcançam a corrente sanguínea. Finalmente, se há evidência de que o episódio de cólica foi causado por parasitos, o objetivo do tratamento é
eliminá­los.
ALÍVIO DA DOR:  Na maioria dos casos de cólica, a dor é leve, sendo suficiente a analgesia. Nesses casos, presume­se que a causa da cólica seja espasmo do músculo intestinal ou excesso de gás em uma porção do intestino. No entanto, se a
dor se deve à torção ou deslocamento intestinal, alguns analgésicos mais potentes podem mascarar os sinais clínicos úteis para a definição do diagnóstico. Por isso, deve­se finalizar o exame físico completo antes de administrar qualquer
medicamento. No entanto, como os equinos com cólica ou com dor intensa podem se lesionar e se tornar agressivos às pessoas próximas, com frequência deve­se administrar analgésico previamente. Além disso,  muitos  animais  com
problemas menos graves podem necessitar alívio da dor até que outros tratamentos tornem­se efetivos. Deve­se escolher um analgésico que ocasione poucos efeitos colaterais e que cause alteração mínima no comportamento do equino.

Tabela 5 – Considerações gerais sobre a necessidade de fluido em equinos desidratados a

Fator determinante Fórmula utilizada Volume para um equino de 500 kg

Déficit de fluido % desidratação × peso (kg) 4­10% × 500 = 20 a 50 l


Manutenção 50 ml/kg/24 h 50 × 500 = 25 l/24 h

Perdas de fluido Refluxo estimado ou volume de fezes na diarreia
Taxa de administração 50% em 1 a 2 h; 50% no resto do dia 20 a 35 l nas primeiras 1 a 2 h; o restante distribuído nas outras 22 a 23 h
a  Adaptado, com autorização, de: Zimmel D.N., Management of pain and dehydration in horses with colic. In Current Therapy in Equine Medicine, 5, 2003, Robinson N.E., (ed.), Elsevier.

Os medicamentos comumente utilizados no alívio de dor abdominal são AINE, que reduzem a produção de prostaglandinas. Quando esses fármacos são utilizados conforme recomendado, os seus efeitos tóxicos nos rins e no trato GI são
raros. Pesquisas clínicas mostraram que a flunixino meglumina pode mascarar os sintomas iniciais de enfermidades que requerem cirurgia; portanto, deve ser utilizado com critério em equinos com cólica.
O sedativo mais comumente usado para cólica é a xilazina, um a2­agonista. Poucos minutos após sua administração, o equino permanece quieto e menos responsivo à dor. Infelizmente, os efeitos da xilazina têm curta duração e inibe os
músculos intestinais; também, diminui o débito cardíaco e, consequentemente, reduz o fluxo sanguíneo aos tecidos. A detomidina, um a2­agonista mais potente e que possui ação muito mais longa, está sendo utilizada com sucesso, em
condições semelhantes.
Dentre os analgésicos narcóticos, o butorfanol é utilizado com maior frequência em equinos com cólica. Ocasiona poucas reações adversos no trato GI ou no coração. No entanto, quando administrado em altas doses, os narcóticos podem
causar excitação e o equino pode ficar inquieto. O butorfanol geralmente é combinado com um a2­agonista, para induzir um período de analgesia mais prolongado.
Embora geralmente o alívio da dor é obtido com o uso de analgésicos, há outras maneiras importantes de reduzir a intensidade da dor. Por exemplo, a introdução de uma sonda nasogástrica (também parte importante na elaboração do
plano diagnóstico) pode remover qualquer líquido acumulado no estômago, em razão de uma obstrução de intestino delgado. A remoção desse líquido não só alivia a dor decorrente da distensão gástrica como também evita a ruptura do
estômago.
FLUIDOTERAPIA:  Muitos equinos com cólica se beneficiam da fluidoterapia, que evita desidratação e mantém o suprimento sanguíneo aos rins e outros órgãos vitais. Os fluidos podem ser administrados por meio de sonda nasogástrica ou
por via IV, dependendo da doença intestinal específica (ver Tabela 5). Equinos com obstrução estrangulante ou enterite devem receber fluido IV, pois a absorção de fluido no intestino acometido fica reduzida e o fluido pode ser secretado no
interior do lúmen intestinal. Isso causa acúmulo de líquido no intestino, e no estômago, cuja remoção estomacal pode ser feita com auxílio de sonda nasogástrica. Essa transferência anormal de fluidos corporais ao intestino contribui para o
desenvolvimento de choque circulatório, que geralmente é a causa definitiva de morte.
A maior parte do fluido da ingesta é reabsorvida no ceco e no cólon. Na verdade, cerca de 95% do líquido que normalmente passa pelo intestino grosso retornam à corrente sanguínea. Portanto, equinos com obstrução intestinal próxima à
flexura pélvica, em geral, requerem quantidade relativamente pequena de fluido IV, enquanto equinos com obstrução do intestino delgado precisam de um volume extremamente grande.
O  volume  e  o  tipo  de  fluido  a  ser  administrado  são  determinados  pela  gravidade  e  pela  causa  da  enfermidade.  Os  testes  laboratoriais  para  avaliar  o  grau  de  hemoconcentração  e  as  anormalidades  eletrolíticas  são  essenciais  para  o
tratamento apropriado do equino com cólica grave. O equilíbrio dos fluidos corporais pode ser restabelecido pela administração por via intravenosa de fluidos formulados para repor a(s) deficiência(s) de eletrólito(s). No entanto, na maioria
dos casos, a fluidoterapia deve começar antes que os resultados laboratoriais estejam disponíveis, particularmente quando o equino exibe sinais clínicos de choque circulatório.
Quando há necessidade de fluidoterapia IV, mas os sinais clínicos são discretos a moderados, o equino deve receber 8 a 10L de fluido de reposição estéril que contenha eletrólitos nas concentrações normalmente presentes no sangue. Esse
volume  deve  ser  administrado  ao  longo  de  1  a  2  h  e  o  equino  deve  ser  reavaliado  para  determinar  a  necessidade  adicional  de  fluido.  Os  equinos  em  choque  circulatório  requerem  volume  muito  maior  de  fluido  IV,  que  deve  ser
administrado o mais rapidamente possível; pode ser necessários até 20L em 1 h, para restabelecer a perfusão tecidual. Em casos graves, solução salina hipertônica (NaCl 7%) deve ser administrada para aumentar rapidamente o volume
plasmático. Dependendo da causa da cólica pode ser preciso fluido IV por vários dias, até que a função intestinal retorne ao normal, as concentrações de eletrólitos se equilibrem e o equino consiga manter as sua necessidade hídrica por
meio da ingestão de água. Nestas condições, a necessidade diária de fluido IV pode variar de 30 a 100L.
Em alguns casos, os fluidos são administrados por meio de sonda nasogástrica, como parte do tratamento de impactação de cólon. Muitos clínicos acreditam que o mesmo resultado pode ser obtido pela administração por via intravenosa
de grande volume de fluido. Se o equino não bebe espontaneamente e não há obstrução de intestino delgado, a hidratação mediante administração de fluidos por sonda pode ser mantida. Caso haja refluxo de fluido ao estômago, não se deve
administrar fluidos ou medicamentos por sonda nasogástrica, pois isso indica que tanto o esvaziamento do estômago quanto do intestino delgado não foi adequado.
PROTEÇÃO CONTRA ENDOTOXINAS BACTERIANAS:  Endotoxina, uma parte da membrana externa de bactérias gram–negativas intestinais, é liberada quando a bactéria morre ou se multiplica rapidamente. Normalmente, as endotoxinas se
restringem ao lúmen intestinal, mas se a mucosa intestinal é lesionada devido à isquemia, elas passam para a cavidade peritoneal ou a corrente sanguínea. Em seguida, elas interagem com fagócitos mononucleares e induzem uma resposta
inflamatória que pode incluir febre, depressão, hipotensão, distúrbios de coagulação e, por fim, morte. A minimização das respostas inflamatórias à endotoxemia é parte fundamental no tratamento de cólica.
As prostaglandinas estão envolvidas em muitos dos efeitos patológicos iniciais das endotoxinas. O flunixino meglumina reduz a produção celular de prostaglandinas e pode ajudar a evitar alguns de seus efeitos. Como o flunixino pode
evitar alguns efeitos iniciais da endotoxemia em dose menor do que aquela recomendada (1,1 mg/kg), é possível administrar doses menores (0,25 mg/kg) sem mascarar os sintomas associados à enfermidade que requer cirurgia.
Há considerável controvérsia quanto à eficácia do uso de plasma ou soro que contém anticorpos neutralizantes de endotoxina. Esses anticorpos atuam contra os componentes das endotoxinas, que são semelhantes nas diferentes bactérias
gram­negativas. Resultados de estudos clínicos que utilizaram tais anticorpos são conflitantes, com evidência de proteção em alguns estudos e nenhum efeito positivo em outros. Como as endotoxinas estimulam, por si só, a geração de
ampla variedade de substâncias inflamatórias que produzem efeitos fisiopatológicos, devem­se empregar os anticorpos neutralizantes o mais cedo possível, no curso da doença.
Como  alternativa,  a  polimixina  B  é  utilizada  para  evitar  a  interação  da  endotoxina  com  as  células  inflamatórias  do  animal.  A  polimixina  B  possui  nefrotoxicidade  bem  descrita;  entretanto,  a  dose  de  polimixina  B  para  atuar  nas
endotoxinas é menor que aquela que causa toxicidade. A polimixina B foi avaliada em vários estudos experimentais de endotoxemia e rotineiramente á utilizada na dose de 1.000 a 5.000U/kg, 2 a 3 vezes/dia. Esta forma de terapia deve ser
iniciada o mais cedo possível. Além disso, fluidoterapia de reposição deve ser administrada em animais hipovolêmicos e a concentração sérica de creatinina deve ser monitorada criteriosamente. Isto é especialmente relevante em potros
neonatos azotêmicos, pois eles parecem mais suscetíveis aos efeitos nefrotóxicos da polimixina B.
LUBRIFICANTES INTESTINAIS E LAXANTES:  Uma causa comum de cólica em equinos é a obstrução simples do intestino grosso com ingesta seca, às vezes misturada com areia. Essas impactações do intestino grosso geralmente ocorrem
próximas à flexura pélvica ou no cólon dorsal direito, mas podem envolver qualquer porção do cólon maior, do cólon descendente ou do ceco. Na maioria dos casos, os lubrificantes ou agentes amolecedores de fezes administrados por
sonda nasogástrica amolecem a ingesta impactada, permitindo que seja eliminada. Essa forma de terapia pode ser auxiliada pela administração simultânea de fluido IV. Aconselha­se manter o equino amordaçado para evitar impactação
adicional por alimento, enquanto se tenta amolecer o conteúdo da obstrução.
O óleo mineral é o medicamento mais utilizado no tratamento de impactação do cólon maior. Ele reveste a parte interno do intestino e auxilia no movimento normal da ingesta ao longo do trato GI. Deve ser administrado por sonda
nasogástrica, até 4L, 1 a 2 vezes/dia, até que se resolva a impactação. Embora o óleo mineral seja seguro, não é muito efetivo no tratamento de impactação grave ou por areia, pois pode simplesmente passar pela obstrução sem amolecê­la.
O sulfosuccinato sódico de dioctila (SSD) é um composto semelhante à sabão que atua sequestrando água para o interior da ingesta seca. É mais efetivo que o óleo mineral no amolecimento de impactação. No entanto, pode interferir na
absorção normal de água no cólon e pode ser tóxico. Logo, o SSD só pode ser administrado, com segurança, em pequena quantidade, por 2 vezes, com intervalo de 48 h.
Um composto seguro e útil no tratamento de impactações, especialmente aquelas que contêm areia, é o muciloide hidrofílico psílio. Quando misturado à água, forma uma massa gelatinosa que provoca movimentação da ingesta ao longo
do trato GI. Embora geralmente administrado por sonda nasogástrica em equinos com impactação, o psílio também pode ser utilizado como preventivo, misturando­o, como pó seco, no alimento. Os equinos que vivem em ambiente arenoso
ou que persistentemente desenvolvem impactação podem receber psílio em pó, na dose de 400 g/500 kg, 1 vez/dia, junto com alimento, por 7 dias. Este tratamento é repetido 2 a 3 vezes ao ano, na tentativa de se evitar a ocorrência de
impactação por areia.
Os laxantes potentes que estimulam as contrações intestinais não são frequentemente utilizados no tratamento de impactação e, na verdade, podem agravar o problema. Ocasionalmente, os equinos com impactação dura são tratados com
sulfato de magnésio, que transferem fluidos corporais para o trato GI. Os efeitos colaterais incluem desidratação e maior risco de diarreia.
A fluidoterapia, com administração de fluidos por sonda nasogástrica ou por via IV, é uma parte importante e efetiva do tratamento dos equinos com impactação de cólon ou ceco. Se uma impactação não começa a se desfazer dentro de 3
a 5 dias, é necessária cirurgia para esvaziar o intestino e auxiliar no restabelecimento da motilidade normal.
VERMÍFUGOS LARVICIDAS:  A  migração  normal  das  larvas  dos  grandes  vermes  hematófagos,  particularmente Strongylus vulgaris, está  envolvida  em  muitos  casos  de  cólica.  Em  resposta  à  migração  e  à  maturação  das  larvas  na  artéria
mesentérica cranial, a parede arterial torna­se espessa e forma placas frouxas de tecido inflamatório. Tem se proposto que essas placas ativam a coagulação, o que resulta em tromboembolia. O suprimento sanguíneo ao intestino pode ser
reduzido, o que provoca alteração na motilidade intestinal e na absorção de nutrientes no intestino ou necrose intestinal. Logo, presume­se que a tromboembolia seja uma causa de episódios recidivantes de cólica e perda de peso.
Vermífugos recentes, como ivermectina e moxidectina, atuam em larvas migratórias de S. vulgaris. O fembendazol elimina os estrôngilos migratórios se administrado o equivalente a 2 vezes a dose recomendada, diariamente, por 5 dias, ou
a 10 vezes a dose recomendada, diariamente, durante 3 dias. Como resultado do uso frequente destes anti­helmínticos, os casos de cólica intermitente crônica, cujas causas acreditavam ser tromboembolia ou migração de larvas parasitárias,
diminuíram amplamente na prática equina.
Há considerável evidência de que a lesão causada por ciatostomos provoca cólica, diarreia e perda da condição corporal, particularmente em equinos jovens. Estes sintomas são sazonais e simultâneo ao surgimento de grande número de
larvas encistadas no lúmen do cólon maior. Em áreas temperadas do hemisfério norte, a larva permanece encistada nos meses de inverno e emergem no final do inverno e na primavera, causando úlcera, edema e inflamação da mucosa do
cólon maior. Isto pode resultar em diarreia, perda proteica, perda de peso, cólica e febre discreta intermitente. Equinos com ciatostomíase requerem tratamento com doses larvicidas de anti­helmínticos, como ivermectina, moxidectina e
fembendazol. Alguns equinos necessitam analgésicos, tratamento suporte e manejo nutricional adequado.
Ver p. 356, para uma discussão detalhada sobre o tratamento de pequenos e grandes estrôngilos.
CIRURGIA:  Geralmente há necessidade de cirurgia quando ocorre obstrução mecânica do fluxo de ingesta normal, que não pode ser corrigido clinicamente ou se a obstrução também interfere no suprimento sanguíneo intestinal. A última
situação causa a morte do equino, exceto se a cirurgia é realizada rapidamente. Em alguns casos indica­se cirurgia como procedimento diagnóstico exploratório para equinos com cólica crônica que não respondem à terapia medicamentosa
de rotina.
Nestes  casos,  os  equinos  que  exibem  sinais  de  dor  abdominal  grave  que  não  respondem  à  terapia  analgésica  necessitam  cirurgia  abdominal  de  emergência.  Geralmente,  o  lúmen  intestinal  encontra­se  completamente  obstruído,  como
acontece na obstrução estrangulante ou no deslocamento grave. Da mesma forma, os equinos com intestino anormalmente distendido à palpação retal e com aumento da concentração de proteína total e do número de hemácias no fluido
peritoneal provavelmente apresentam lesão estrangulante que requer correção cirúrgica. Esses achados clássicos que caracterizam os equinos que necessitam cirurgia emergencial, em geral, são exceção, não a regra. Alguns equinos com dor
leve ou moderada também podem necessitar intervenção cirúrgica e a decisão deve se basear em no exame físico completo e em outros métodos de avaliação. Algumas indicações mais comumente utilizadas para decidir pela intervenção
cirúrgica  em  equinos  com  cólica  são:  dor  incontrolável;  >  4  L  de  refluxo  de  fluido  estomacal;  ausência  de  borborigmo  à  auscultação;  aumento  de  proteína,  eritrócitos  e  neutrófilos  tóxicos  no  fluido  peritoneal;  intestino  firmemente
distendido, cólon deslocado ou enterólito ou corpo estranho detectado mediante palpação retal.
A realização precoce de cirurgia (se indicada) é fundamental para o sucesso e melhora do prognóstico quanto à sobrevivência. Portanto, é mais importante decidir se o equino deve ser encaminhado para uma clínica onde a cirurgia poderá
ser realizada se necessária, do que tentar determinar se, definitivamente, há necessidade de cirurgia emergencial. Geralmente, é prudente encaminhar os seguintes casos: 1) equino que responde inicialmente ao analgésico, mas requer terapia
analgésica  adicional  poucas  horas  depois,  2)  equino  que  continua  a  exibir  sinais  de  dor,  apesar  da  administração  de  analgésicos,  3)  equino  que  permanece  com  dor,  mas  apresenta  fluido  peritoneal  normal,  4)  equino  com  distensão  de
intestino delgado à palpação retal, mas que não apresenta refluxo, ou 5) equino com grande quantidade de líquido removido do estômago, mas que não apresenta distensão de intestino delgado palpável ao exame retal.
Quando há necessidade de cirurgia, na maioria das vezes, o equino é anestesiado e posicionado em decúbito dorsal e a incisão é feita na linha média ventral. Ao ter acesso à cavidade peritoneal devem­se examinar as porções intestinais
para  determinar  a  causa  definitiva  da  cólica.  A  correção  pode  envolver  reposicionamento  da  porção  intestinal  deslocada,  remoção  de  obstrução  ou  ressecção  de  intestino  desvitalizado.  Quando  os  segmentos  intestinais  desvitalizados
precisam ser removidos ou quando se realiza enterotomia, os cuidados pós­operatórios devem incluir o uso de antibióticos, fluidos IV, polimixina B, anticorpos contra endotoxinas e AINE para evitar endotoxemia. Quando o segmento do
intestino deslocado é facilmente reposicionado em sua posição normal, os cuidados pós­operatórios são muito menos rígidos. Cada equino deve ser manejado individualmente; a necessidade de tratamento baseia­se na resposta à cirurgia e
na ocorrência de complicações.

Prognóstico
Um amplo estudo retrospectivo, nos EUA, revelou taxa de sobrevivência total de 60%, em equinos com cólica, e de 50% em equinos submetidos à cirurgia abdominal, incluindo aqueles submetidos à eutanásia na mesa de cirurgia em razão
de doenças inoperáveis. As taxas de sobrevivência em equinos com obstrução estrangulante e naqueles com doença inflamatória foram de apenas 24 e 42%, respectivamente. Por outro lado, equinos com causa indefinida do episódio de
cólica apresentaram taxa de sobrevivência de 94%. Quando se considerou o segmento do trato GI, a taxa de sobrevivência de enfermidades de intestino delgado e estômago foram menores do que daquelas que acometem o cólon maior.
Além disso, as doenças que interferem na passagem da ingesta e no suprimento sanguíneo intestinal diminuíram drasticamente a chance de sobrevivência. Resultados de estudos mais recentes são muito mais promissores, com taxa de
sobrevivência de equinos submetidos à cirurgia abdominal de emergência > 80%. Além disso, há relatos de taxa de sobrevivência de 70% em equinos que necessitaram ressecção de intestino delgado estrangulado ou correção de vólvulo em
cólon maior. Em estudos retrospectivos iniciais, estas condições estavam associadas à taxa de sobrevivência = 30%. Embora a obtenção de dados quanto à sobrevivência a longo prazo (p. ex., equino que retorna ao seu uso pretendido) seja
mais difícil, achados recentes indicam que quando a maior parte dos cavalos morrem ou são submetidos à eutanásia devido à doença grave, isso ocorre dentro de 3 meses após a cirurgia.
Frequentemente, combinam­se valores obtidos de diversas variáveis para prever a sobrevivência de equinos com cólica. Os indicadores de prognóstico envolvem avaliação da dor, distensão intestinal, cor das membranas mucosas e
função do sistema cardiovascular. As taxas de sobrevivência são mais altas em equinos com dor abdominal leve e são mais baixas em animais com dor intensa. Equinos com distensão intestinal palpável apresentam taxa de sobrevivência
menor do que aqueles que não manifestam evidência de distensão intestinal; a taxa de sobrevivência é ainda menor se nenhum som intestinal for audível na auscultação abdominal. Membranas mucosas congestas frequentemente estão
associadas a endotoxemia bacteriana, o que reduz a taxa de sobrevivência. A função do sistema cardiovascular reflete o grau de choque e, portanto, está relacionada com o prognóstico quanto à sobrevivência. Por exemplo, equinos com
pressão arterial sistólica baixa ou frequência cardíaca alta têm menor chance de sobreviverem.
Dentre as análises laboratoriais utilizadas para prever a sobrevivência, a concentração sanguínea de lactato e o valor de anion gap são  utilizados  com  mais  frequência.  A  dosagem  de  lactato  sanguíneo  é  utilizada  como  indicador  de
perfusão  tecidual;  aumento  da  concentração  de  ácido  láctico  indica  perfusão  tecidual  deficiente.  De  modo  semelhante,  o  anion  gap  (cálculo  da  diferença  entre  cátions  e  ânions  mensuráveis)  reflete  a  geração  de  ânions  orgânicos,
principalmente de ácido láctico, decorrente de menor perfusão tecidual. A concentração de proteínas no fluido peritoneal também é utilizada para prever a sobrevivência; concentrações mais altas estão associadas a pior prognóstico.
DOENÇAS ASSOCIADAS À CÓLICA DEVIDO À LOCALIZAÇÃO ANATÔMICA

Estômago
DILATAÇÃO E RUPTURA DE ESTÔMAGO:  A  causa  mais  comum  de  dilatação  gástrica  em  equinos  é  excesso  de  gás  ou  obstrução  intestinal.  A  dilatação  gástrica  pode  estar  associada  com  ingestão  exagerada  de  ingredientes  alimentares
fermentáveis,  como  grãos,  capim  viçoso  e  polpa  de  beterraba.  Possivelmente,  o  grande  aumento  na  produção  de  ácidos  graxos  voláteis  inibe  o  esvaziamento  gástrico.  Se  não  for  tratada,  a  dilatação  gástrica  associada  a  este  consumo
excessivo pode ocasionar brusca ruptura do estômago. Caso a causa seja obstrução intestinal, esta envolve mais frequentemente o intestino delgado. O líquido do intestino delgado obstruído acumula­se no lúmen do estômago, causando
dilatação gástrica e recuperação do refluxo pela introdução de sonda nasogástrica. Dilatação gástrica também pode ocorrer em alguns equinos com alguns tipos de deslocamentos de cólon, principalmente com deslocamento do cólon dorsal
direito, ao redor do ceco (ver p. 239). Presume­se que o cólon deslocado obstrua o fluxo duodenal. A dilatação gástrica por líquido também é característica de enterite­jejunite proximal.
A ruptura de estômago é uma complicação fatal da dilatação gástrica. Geralmente é notada na curvatura maior do estômago. Cerca de 2/3 de todos os casos de ruptura gástrica são secundários à obstrução mecânica, íleo adinâmico e
traumatismo; o restante se deve à sobrecarga ou a causas idiopáticas.
Os sinais clínicos associados a dilatação gástrica incluem dor abdominal intensa, taquicardia e ânsia de vômito. As membranas mucosas podem ficar pálidas. Classicamente, esses sinais agudos são substituídos por alívio, depressão e
toxemia após a ruptura do estômago. O prognóstico quanto à sobrevivência pode ser excelente na maioria dos casos de dilatação, mas a ruptura gástrica é fatal.
IMPACTAÇÃO GÁSTRICA:  A impactação gástrica é causa incomum de cólica. Embora possa estar associada à ingestão de determinados ingredientes alimentares (polpa de beterraba, alimentos peletizados, sementes de caqui, palha e cevada)
também devem ser considerados os fatores contribuintes (p. ex., lesões dentárias, consumo inadequado de água e ingestão rápida de alimentos). Como a incidência dessa enfermidade é baixa, é difícil determinar quais fatores podem ser
mais importantes. O sinal clínico mais evidente na impactação gástrica é dor abdominal intensa. Devido à ausência de outros achados característicos, mais frequentemente o diagnóstico é definido por meio de cirurgia; a decisão sobre a
realização de cirurgia para controlar o problema se baseia em dor incessante.
O  tratamento  envolve  a  administração  intragástrica  de  solução  salina  ou  de  água,  por  meio  de  uma  agulha  introduzida  na  massa  impactada.  Depois  da  injeção  deve­se  massagear  o  estômago  e  desfazer  a  obstrução.  Se  uma  sonda
nasogástrica  está  posicionada  no  momento  da  cirurgia  pode­se  bombear  água  para  o  interior  do  estômago  e  massagear  a  massa.  Deve­se  continuar  a  lavagem  após  a  cirurgia,  na  tentativa  de  remover  parte  do  material  impactado.  O
prognóstico é favorável se a decisão de realizar uma cirurgia exploratória é tomada precocemente e a impactação possa ser desfeita manualmente, durante a cirurgia.

Intestino Delgado
Os sinais clínicos de cólica podem surgir após obstrução, inflamação ou obstrução estrangulante no intestino delgado. O prognóstico das enfermidades que acometem o intestino delgado geralmente é reservado. Com isso, diagnóstico
precoce e tratamento adequado são fundamentais.
IMPACTAÇÃO DE ÍLEO:  A enfermidade mais comum que provoca obstrução simples do intestino delgado é impactação de íleo. É mais comum na região sudeste dos EUA, na Alemanha e nos Países Baixos. Embora os fenos que contêm alto
teor  de  fibras  possam  ser  importantes  na  patogênese,  a  relação  causa­efeito  ainda  não  foi  comprovada.  Resultados  de  uma  pesquisa  clínica  recente  no  Reino  Unido  indicaram  que  há  estreita  relação  entre  infecção  pela  tênia
intestinal Anoplocephala perfoliata e impactação de íleo. Em estudo similar realizado nos EUA, dois fatores de risco de impactação de íleo foram identificados – não administração de pamoato de pirantel, um anti­helmíntico com alguma
eficácia contra A. perfoliata, por 3 meses; e alimentação com feno de capim Bermudas. Adicionalmente, tem­se sugerido que a impactação se desenvolve secundariamente a contrações espásticas do músculo íleo contra a direção da ingesta.
Os sinais clínicos incluem início com dor abdominal leve a intensa, seguida de redução nos ruídos intestinais, refluxo gástrico e taquicardia. Embora a palpação retal precoce possa permitir a detecção de impactação do íleo na parte
inferior do quadrante abdominal caudal direito, uma distensão de jejuno subsequente pode dificultar ou impossibilitar esse achado. O diagnóstico diferencial mais comum é jejunite proximal; a distinção entre as duas enfermidades pode ser,
com frequência, difícil. Como o quadro clínico do equino pode permanecer inicialmente estável e o grau de dor abdominal pode ser discreto, muitos equinos com esta enfermidade não são encaminhados para terapia intensiva ou cirurgia
antes de 18 h. A concentração de proteínas no fluido peritoneal pode aumentar se a impactação persiste por todo esse tempo.
O  tratamento  requer,  com  mais  frequência,  cirurgia,  embora  tenha  sido  relatado  que  a  enfermidade  responde  ao  tratamento  com  fluido  e  óleo  mineral,  se  diagnosticada  precocemente.  Se  indicada  cirurgia,  pode­se  misturar  a  massa
impactada com solução salina ou carboximetilcelulose e massageá­la no interior do ceco ou realizar enterotomia no jejuno distal e remover a ingesta por essa incisão. Pode­se se instalar íleo adinâmico após a cirurgia. De acordo com o grau
de lesão na superfície serosa do intestino delgado no momento da cirurgia podem ocorrer complicações várias semanas após, devido às aderências intra­abdominais (ver a seguir).
ADERÊNCIAS:  As aderências intra­abdominais acometem geralmente o intestino delgado e causam obstrução intestinal; também, podem causar obstrução estrangulante. Essas aderências se desenvolvem em resposta à lesão peritoneal e,
mais frequentemente, resultam de cirurgia prévia no intestino delgado, distensão crônica do intestino delgado, peritonite ou migração de larvas de parasitos. Resposta tecidual à isquemia, manipulação de tecido lesionado, corpos estranhos,
hemorragia ou desidratação resulta na formação de aderências fibrinosas (e, em seguida, fibrosas). Os sinais clínicos são notados quando a aderência causa torção, compressão ou estenose intestinal.
Deve­se considerar a possibilidade de aderência quando o equino foi submetido anteriormente à cirurgia abdominal e apresenta histórico recente de dor abdominal recidivante. Os sinais clínicos associados às aderências intra­abdominais
podem  variar  desde  uma  cólica  discreta  recidivante  até  uma  dor  intensa  incessante.  Mais  comumente,  as  aderências  intra­abdominais  causam  problemas  clínicos  dentro  de  90  dias  após  a  cirurgia,  quando  representam  um  problema
importante para o equino.
O  tratamento  cirúrgico  envolve  transecção  da  aderência,  ressecção  do  intestino  acometido  e  sua  anastomose,  de  modo  a  propiciar  um  fluxo  de  ingesta  normal.  São  utilizados  agentes  terapêuticos  destinados  a  reduzir  a  formação
subsequente de novas aderências. Isso inclui a administração sistêmica de antimicrobianos e de AINE e da instilação de carboximetilcelulose estéril no interior do abdome, no momento da sutura. O proprietário deve ser informado de que as
aderências provavelmente são recidivantes e que o prognóstico quanto à sobrevivência de equinos com amplas aderências, a longo prazo, é desfavorável.
IMPACTAÇÃO POR ASCARÍDEOS:  Equinos jovens, particularmente aqueles criados em haras que adota programa de controle parasitário inadequado, podem desenvolver impactação de intestino delgado por ascarídeos. Essas impactações
ocorrem após administração de anti­helmíntico altamente efetivo contra Parascaris equorum. Os anti­helmínticos mais comumente associados a essa enfermidade são ivermectina, piperazina e organofosforados. Esses fármacos paralisam
os ascarídeos, resultando em acúmulo de massa de vermes no lúmen do intestino delgado. Tem­se sugerido que a destruição da superfície do ascarídeo libera fluidos antigênicos que inibem a atividade do músculo intestinal e, assim,
aumenta o risco de obstrução intestinal.
Os sinais clínicos variam de dor abdominal discreta a intensa, evidências de toxemia e refluxo gástrico que pode conter ascarídeos. Deve­se suspeitar de impactação por ascarídeos se o equino acometido encontra­se em fase de desmame
ou com cerca de 1 ano de idade, com condição corporal ruim e histórico de uso recente de vermífugo. O tratamento clínico com fluidos e lubrificantes intestinais pode ser bem­sucedido em alguns casos. Outros equinos podem necessitar
intervenção cirúrgica e remoção dos ascarídeos por meio de várias enterotomias. O prognóstico é reservado, se há necessidade de cirurgia. O proprietário deve ser avisado de que outros equinos jovens da propriedade devem receber anti­
helmínticos com eficácia mais baixa contra ascarídeos, como o fembendazol. Esse tratamento inicial pode ser seguido do uso de compostos mais eficazes.
ENTERITE­JEJUNITE PROXIMAL:  Essa doença pouco compreendida acomete a porção proximal do intestino delgado e tem vários nomes, inclusive enterite­jejunite proximal, enterite anterior e duodenite­jejunite. A enfermidade foi relatada
no sudeste e no nordeste dos EUA, na Inglaterra e na Europa. A causa é desconhecida. O intestino acometido contém lesões que variam de hiperemia à necrose e infiltração da submucosa por células inflamatórias. Comumente, nota­se
edema e hemorragia em diversas camadas da parede intestinal.
Graus variáveis de dor abdominal, de leve a intensa, são característicos. Quando a prevalência da enfermidade atingiu seu pico na década de 1980, foi caracterizada por grande quantidade de refluxo gástrico, progressão de dor para
depressão e distensão moderada a grave do intestino delgado, na palpação retal. Além disso, em muitos casos o duodeno distendido pode ser palpado à medida que percorre a base do ceco. Frequentemente o fluido peritoneal contém maior
concentração proteica  (>  3  g/dl),  com número  normal  de  leucócitos,  mas  esse  achado  não  distingue  consistentemente  a  enfermidade  de  outras  causas  de  doença  de  intestino  delgado.  Com  base  em  relatos  informais,  a  prevalência  e  a
gravidade clínica da enfermidade diminuíram na última década, ao menos em regiões do país onde a enfermidade teve um curso mais grave e foi acompanhada de alta prevalência de laminite.
O  tratamento  pode  ser  tanto  clínico  quanto  cirúrgico.  O  tratamento  clínico  inclui  descompressão  gástrica  contínua  até  que  o  refluxo  gástrico  diminua,  fluido  IV  e  analgésicos,  conforme  a  necessidade.  Muitos  clínicos  administram
penicilina e baixas doses de flunixino meglumina; alguns clínicos também administram neostigmina, lidocaína ou metoclopramida, para estimular a motilidade do intestino delgado. Alguns cirurgiões, particularmente no Reino Unido,
acreditam que a laparotomia exploratória com descompressão intestinal resulta em recuperação mais rápida. Na enterite­jejunite proximal a taxa de sobrevivência é de 44%.
Os membros devem receber uma atenção particular, pois há relato de laminite aguda como uma complicação comum, com prevalência de cerca de 25%.
INTUSSUSCEPÇÃO:   A  maior  parte  das  intussuscepções  que  ocorrem  nos  equinos  é  jejuno­jejunal,  ileoileal  ou  ileocecal.  A  extensão  do  intestino  que  se  invagina  (o  intussuscepto)  no  interior  do  segmento  intestinal  mais  distal  (o
intussuscepiente) pode variar de poucos centímetros a 1 m. Embora haja dúvida quanto à causa exata da maioria das intussuscepções, na melhor das hipóteses, têm­se sugerido alterações do peristaltismo devido à enterite, traumatismos
cirúrgicos, lesão por parasitos, anti­helmínticos e infecção por Anaplocephala perfoliata. Equinos com < 3 anos de idade são mais predispostos.
A dor abdominal pode ser aguda, quando há obstrução total do lúmen intestinal, ou crônica, na obstrução parcial do lúmen. Se a oclusão do lúmen intestinal for completa, o equino manifesta dor aguda e apresenta refluxo gástrico e as
alças do intestino delgado distendidas são palpáveis através do reto. Pode ser possível palpar a intussuscepção túrgida, especialmente se o íleo estiver comprometido. Como o intussuscepto estrangulado fica contido no intussuscepiente, a
contagem de leucócitos no líquido peritoneal pode não refletir o grau de lesão intestinal.
O tratamento requer cirurgia para redução da intussuscepção, se possível, seguida de ressecção e anastomose. Devido ao edema e à hemorragia na parede do intestino acometido pode ser difícil avaliar a viabilidade do tecido intestinal.
Além disso, as lesões no intussuscepto podem resultar no desenvolvimento de aderências. Se o jejuno estiver envolvido deve­se realizar anastomose jejuno­jenunal. Se a intussuscepção envolve apenas o íleo, deve­se resseccionar o intestino
acometido e realizar uma anastomose jejuno­cecal. Caso o íleo se invagine no interior do ceco deve­se transeccionar a porção terminal do íleo próxima ao ceco e realizar uma anastomose jejuno­cecal. O prognóstico quanto à sobrevivência
é favorável se a cirurgia for realizada antes que seja impossível a redução da intussuscepção. No último caso o prognóstico é reservado a desfavorável devido ao desenvolvimento de peritonite, íleo adinâmico, aderências e formação de
abscessos.
VÓLVULO:  Vólvulo no intestino delgado se instala quando ele gira > 180° sobre seu eixo mesentérico. À medida que o grau de rotação aumenta, perde­se o suprimento vascular ao intestino. Na maioria dos casos, a face distal do vólvulo é o
íleo, possivelmente pela sua ligação com o ceco.
Os  equinos  com  vólvulo  no  intestino  delgado  apresentam  dor  aguda  e  aumento  da  frequência  cardíaca,  prolongamento  do  tempo  de  preenchimento  capilar  e  refluxo  gástrico.  Devido  à  perda  de  líquido  no  interior  do  intestino  e  do
estômago, esses equinos se desidratam e apresentam aumento do VG e da concentração plasmática de proteínas. O quadro clínico pode se agravar rapidamente devido à hipovolemia e endotoxemia. A palpação retal geralmente revela alças
de intestino delgado distendidas e túrgidas e o líquido peritoneal contém maior número de leucócitos e aumento do teor de proteínas.
Anoplocephala perfoliata e impactação de íleo em equino. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

O tratamento compreende correção cirúrgica do vólvulo mediante celiotomia na linha média ventral. Se o intestino se apresenta inviável deve ser resseccionado, realizando–se anastomose. O prognóstico quanto à sobrevivência depende
da duração da doença e da parte do intestino que foi removida. O prognóstico é favorável quando se estabelece diagnóstico precoce e cirurgia. Equinos com longo período de doença antes da cirurgia ou com íleo adinâmico e peritonite no
pós­operatório são mais sujeitos à formação de aderências. Tem­se sugerido que a eutanásia é justificável quando > 50% da extensão do intestino delgado necessita remoção. Entretanto, resultados de um estudo experimental em pôneis
indicou que a remoção de 70% do intestino delgado não resultou em má absorção, quando os animais foram alimentados com várias refeições (8) com ração com pequenos peletes, diariamente.
LIPOMAS PEDUNCULADOS:  Cólica  causada  por  lipomas  pedunculados  acomete  equinos  >  10  anos  de  idade.  Os  lipomas  pedunculados  ficam  aderidos  ao  mesentério  por  uma  base,  ou  pedículo,  que  se  enrola  ao  redor  de  um  segmento
intestinal, ocluindo o lúmen e interferindo com seu suprimento sanguíneo. Frequentemente o lipoma forma um nó com o pedículo.
Os sinais clínicos variam de depressão a dor abdominal intensa, refluxo gástrico e rápida deterioração da condição metabólica. As alças do intestino delgado distendidas são palpáveis ao exame retal; em casos especiais o lipoma também
pode ser notado através do reto. O número de leucócitos e de hemácias e a concentração de proteínas no fluido peritoneal encontram­se aumentados.
O tratamento requer transecção do pedículo e, se necessário, ressecção do intestino desvitalizado. O prognóstico depende do tempo decorrido entre o início dos sinais clínicos e a cirurgia. Se esta for realizada precocemente, o prognóstico
é favorável; no entanto, se não for efetuada até se notem sinais de comprometimento cardiovascular o prognóstico quanto à sobrevivência é reservado a desfavorável.
ENCARCERAMENTO INTERNO:  Os locais mais comuns de encarceramento interno são as fendas mesentéricas e o forame epiploico. As fendas mesentéricas são defeitos no mesentério do intestino delgado. O problema surge quando um
segmento do intestino delgado passa através do defeito mesentérico e o intestino fica encarcerado. Como o intestino se distende com fluido e sangue, com frequência instala­se vólvulo no segmento acometido. As fendas mesentéricas são
verificadas em equinos de todas as idades.
O forame epiploico é uma abertura natural limitada pelo lobo caudal do fígado, pela veia porta e pela veia cava caudal. O jejuno distal e o íleo são as porções intestinais mais comumente encarceradas através do forame epiploico.
Embora geralmente o intestino passe da direita para a esquerda, para entrar na bursa do omento, ele pode passar em direção oposta, empurrando o omento para sua frente. Embora haja relato de que equinos com > 7 anos de idade sejam
acometidos com maior frequência, a enfermidade também se desenvolve em equinos com < 7 anos.
Os sinais clínicos podem ser vagos e semelhantes àqueles de equinos com enterite proximal ou lipoma pedunculado. O diagnóstico pode ser obtido durante a cirurgia. Além disso, em alguns casos, devido à posição do intestino acometido
dentro da bursa do omento, o líquido peritoneal disponível para análise pode permanecer normal.
O tratamento de equinos com fenda mesentérica ou encarceramento no forame epiploico é cirúrgico. Deve­se exteriorizar o segmento acometido, avaliar sua viabilidade e, se necessário, realizar ressecção e anastomose. O prognóstico
quanto à sobrevivência depende do tempo decorrido entre o início da enfermidade e a cirurgia. Se a cirurgia for realizada precocemente, o prognóstico é favorável. No entanto, como os sinais clínicos podem ser vagos, a decisão pela
cirurgia pode ser retardada, piorando o prognóstico.
HÉRNIA INGUINAL:  Hérnias inguinais geralmente se desenvolvem em garanhões, após acasalamento, traumatismo ou exercício intenso. As hérnias parecem mais comuns em equinos das raças Marchador do Tennessee, Americano de sela e
Standardbred. Na maioria dos casos, a hérnia resulta em cólica aguda. Na maioria dos casos o intestino passa através do anel inguinal e se instala próximo ao testículo e epidídimo. O exame físico revela testículo edemaciado, firme e frio à
palpação. Se a hérnia se instalou há horas, o intestino pode ser palpado no canal inguinal. Nesse caso, pode­se tentar reduzir a hérnia tracionando o testículo para baixo para apertar as bordas do canal inguinal e, depois, forçar o intestino
para cima, em direção ao anel inguinal. Uma vez encarcerado, o intestino, frequentemente incluindo o íleo, torna­se edemaciado e não é possível reduzir a hérnia manualmente. A palpação retal revela alças do intestino delgado distendidas,
uma delas seguindo para o anel inguinal, no lado acometido. Ocorre refluxo gástrico e a condição do equino se agrava rapidamente. O líquido peritoneal geralmente reflete o grau de isquemia.
A  cirurgia  envolve  celiotomia  na  linha  média  ventral  e  acesso  ao  anel  inguinal  para  reduzir  a  hérnia.  Frequentemente,  deve­se  remover  o  testículo  do  lado  acometido  e  seccionar  o  intestino  comprometido.  O  prognóstico  quanto  à
sobrevivência parece depender da raça, sendo melhor em equinos Standardbred e reservado a desfavorável em cavalos Marchadores do Tennessee. Possivelmente, isso reflete o fato de que muitos garanhões Marchadores do Tennessee com
hérnia inguinal manifesta discretos sinais de dor.

Intestino Grosso e Ceco
IMPACTAÇÃO:  Os  locais  mais  comuns  de  impactação  são  flexura  pélvica  do  cólon  esquerdo,  junção  do  cólon  dorsal  direito  com  o  cólon  transverso  e  base  e  corpo  do  ceco.  A  flexura  pélvica  e  o  cólon  transverso  são  anatomicamente
predispostos à obstrução devido às diferenças marcantes de tamanho. Não se conhece a causa primária de impactação do ceco, mas aventa­se a possibilidade de que a atividade muscular do ceco é anormal nos equinos acometidos. Outros
fatores predisponentes incluem alimentos demasiadamente grosseiros, dentes lesionados ou mal cuidados e consumo insuficiente de água. Em uma pesquisa clínica, dentre os equinos com impactação de ceco, os animais das raças Apaloosa,
Árabe  e  Morgan  apresentaram  maior  prevalência;  ademais,  tem­se  proposto  que  a  enfermidade  se  instala  secundariamente  à  infestação  pela  tênia  Anaplocephala  perfoliata.  As  impactações  também  podem  ser  secundárias  a  outras
enteropatias e podem estar associadas a internação prolongada. Em consequência, deve­se avaliar a produção de fezes de equinos que estão sendo tratados para outras anormalidades, em protocolos de rotina. Isto é especialmente importante
em equinos tratados diariamente com AINE.
Equinos com impactação simples de ceco ou cólon maior exibem sinais de cólica intermitentes e discretos e há mínima evidência de comprometimento sistêmico, exceto quando a impactação tem um curso prolongado. Em geral, a
frequência cardíaca aumenta apenas ligeiramente. Os ruídos intestinais são comumente audíveis à auscultação abdominal e podem estar associados ao início da dor à medida que a porção acometida do intestino contrai devido à obstrução.
O diagnóstico se baseia na palpação retal. Embora se considere a flexura pélvica do cólon maior como o local mais comum de obstrução, a ingesta impactada, na verdade, preenche boa parte ou todo o cólon ventral esquerdo. A massa
impactada pode ser sentida estendendo a palpação cranialmente no abdome e o segmento intestinal acometido é notado pela palpação das faixas longitudinais na superfície do cólon ventral. A detecção de impactação de ceco é relativamente
fácil, pois a massa instala­se na região paralombar direita. O ceco pode ser detectado definitivamente mediante palpação da faixa cecal ventral tensa e da gordura e dos vasos sanguíneos que recobrem a faixa cecal medial. A análise do
fluido peritoneal pode ser normal ou a concentração de proteína total pode aumentar à medida que o curso da doença se prolonga.
Impactação  de  ceco  tende  a  ser  a  principal  causa  de  cólica  em  equinos  com  >  8  anos  de  idade.  Alternativamente,  pode­se  observar  impactação  em  equinos  internados  por  outras  razões  e  nesses  casos  estas  estão,  com  frequência,
associadas  a  ruptura  abrupta  do  ceco.  Consequentemente  há  certa  controvérsia quanto  ao  melhor  método  de  tratamento.  Como  em  alguns  estudos  o  tratamento  medicamentoso  não  foi  bem­sucedido  em  50%  dos  casos,  recomenda­se,
principalmente, a remoção cirúrgica da massa da impactação, seguida de ileocolostomia. Outros veterinários relatam bons resultados com tratamento clínico agressivo, particularmente se a dor abdominal associada à impactação do ceco é a
principal razão que o equino foi levado à consulta veterinária.

Locais mais comuns de impactação em equinos: ceco e intestino grosso (os pontos maiores indicam os locais de impactação mais frequentes nesta região). Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

O tratamento clínico de equinos com impactação de ceco ou de cólon maior envolve a administração de analgésicos, quando necessários, grande volume de fluido IV balanceado e administração intragástrica de óleo mineral ou de
sulfossuccinato  sódico  de  dioctila  e  água.  Devem­se  restringir  os  alimentos  até  que  a  impactação  seja  desfeita.  Muitos  veterinários  consideram  a  fluidoterapia  agressiva  como  principal  parte  do  tratamento.  São  administradas  soluções
eletrolíticas balanceadas para induzir a transferência de fluido do plasma para o lúmen intestinal. Essa forma de tratamento pode requerer > 50L de fluido/dia, para um equino de 450 kg, até que a impactação se resolva. Recentemente,
aumentou­se  o  emprego  de  fluidoterapia  enteral  no  tratamento  de  equinos  com  impactação,  principalmente  porque  é  significativamente  mais  barata  do  que  a  fluidoterapia  IV.  Os  resultados  clínicos  com  fluidoterapia  enteral  têm  sido
benéficos e dados de trabalhos experimentais em equinos saudáveis têm mostrado que é mais efetiva do que a fluidoterapia IV em promover hidratação do conteúdo do cólon.
Se a impactação de cólon maior não se resolve com o tratamento clínico, pode­se realizar cirurgia. Geralmente, a impactação envolve celiotomia na linha média ventral, com a porção do cólon acometida suavemente exteriorizada e
posicionada em uma bandeja estéril. Deve­se, então, efetuar enterotomia na flexura pélvica e remover o conteúdo do cólon.
A cirurgia para tratamento de impactação de ceco requer anestesia geral, celiotomia na linha média ventral, isolamento do ceco no local da celiotomia e remoção do conteúdo cecal por meio de enterotomia. Como ocorre recidiva da
impactação após o simples esvaziamento, o ceco é desviado mediante ileocolostomia.
O prognóstico de impactação que envolve o cólon maior é excelente, com taxa de sobrevivência > 95%. Ao contrário, na impactação de ceco a taxa de sobrevivência situa­se ao redor de 50 a 55%, o que pode refletir o prognóstico
desfavorável das impactações de ceco que se desenvolvem em equinos hospitalizados.
Em algumas áreas geográficas, o material envolvido pode ser areia, especialmente quando há quantidade insuficiente de capim no pasto e os equinos ingerem solo. A areia se acumula no cólon dorsal direito e no cólon transverso. Podem
ocorrer sinais intermitentes de dor abdominal devido ao peso da areia no intestino. Há sinais de dor mais intensa quando a impactação oclui o cólon transverso. Neste caso, o cólon proximal à obstrução se distende com gás e o equino pode
sentir dor extrema. Pode não ser possível distinguir essa enfermidade de deslocamento ou vólvulo intestinal. A areia também pode ser notada nas fezes, misturando o material fecal com água em uma luva de borracha utilizada em palpação
retal.
O tratamento de impactação por areia pode ser tanto clínico quanto cirúrgico. O tratamento clínico geralmente envolve a administração intragástrica de psílio (400 g/500 kg de peso corporal, diariamente, por 7 dias) para eliminar a areia
do lúmen. Os flocos de psílio são adicionados a 7,5 L de água morna e bombeados rapidamente para o interior do estômago. Esse tratamento é acompanhado da administração de analgésicos, quando necessários, e fluido IV para estimular a
transferência do fluido para o interior do lúmen intestinal.
Se a areia causa obstrução completa do cólon transverso, é preciso cirurgia, mediante celiotomia na linha média ventral. O cólon esquerdo é exteriorizado em uma bandeja estéril e a areia é removida por enterotomia. Geralmente o
prognóstico é favorável. Às vezes, ocorrem problemas durante a cirurgia se o cólon foi lesionado devido ao peso da areia ou durante a remoção da areia do intestino ver p. 309).
ENTEROLITÍASE:   Os  enterólitos  são  concreções  compostas  por  cristais  de  fosfato  de  amônio­magnésio  ao  redor  de  um  núcleo  (p.  ex.,  arame,  pedra  ou  prego).  Os  enterólitos  podem  ser  individuais  ou  em  grupos  e  são  encontrados
comumente  em  equinos  em  algumas  regiões  dos  EUA,  incluindo  o  sudoeste  e  os  estados  da  Califórnia,  Indiana  e  Flórida.  Enterolitíase  afeta  equinos  da  raça  Árabe,  mas  o  fato  destes  equinos  serem  extremamente  populares  nas  áreas
mencionadas causa confusão quanto à predileção racial. A maioria dos equinos com enterólitos tem cerca de 10 anos de idade; a enterolitíase ocorre raramente em equinos < 4 anos de idade. Embora nem todos os fatores que contribuam
para a formação de enterólitos tenham sido identificados, resultados de estudos clínicos indicam que o conteúdo do cólon maior de equinos com enterólitos possui concentrações de minerais (magnésio, cálcio e fósforo) e pH mais elevados
do que o conteúdo em equinos com cólica não decorrente de enterólitos. O fator comum associado à enterolitíase é consumo de feno de alfafa, que resulta em pH mais elevado e aumento nas concentrações de cálcio, magnésio e enxofre no
cólon maior.
Muitos  equinos  com  enterolitíase  têm  histórico  de  cólicas  recidivantes,  possivelmente  indicando  que  o(s)  enterólito(s)  causou(aram)  obstrução  parcial  ou  temporária  do  lúmen  do  cólon.  Se  o  enterólito  se  aloja  no  início  do  cólon
transverso, o cólon proximal à obstrução se distende com gás e a dor é intensa. A distensão abdominal pode ser acentuada. As frequências cardíaca e respiratória aumentam e as membranas mucosas podem se tornar pálidas ou róseas. Em
geral, é evidente a distensão de cólon e ceco à palpação retal, mas a massa raramente é palpável porque o cólon transverso é cranial à artéria mesentérica cranial. A análise do líquido peritoneal geralmente indica resultados dentro dos
limites normais, a menos que tenha havido isquemia de parede do cólon no local de alojamento do enterólito. Nas áreas onde o problema é endêmico pode­se utilizar radiografia para identificar os enterólitos.
O tratamento envolve cirurgia, mediante celiotomia na linha média ventral, para descomprimir o cólon e o ceco e, em seguida, para remover o(s) enterólito(s). Deve­se exteriorizar a porção esquerda do cólon maior e posicioná­la em uma
bandeja estéril; remove­se a ingesta por meio de enterotomia e depois faz­se a remoção do(s) enterólito(s). Se o cálculo apresenta um lado achatado ou em forma poliédrica deve­se investigar o restante do cólon maior e do cólon menor
verificando se há outros cálculos. O prognóstico é excelente; clínicos que atuam em áreas endêmicas relatam taxa de sobrevivência de 95%.
DESLOCAMENTO DORSAL À ESQUERDA:  O deslocamento dorsal esquerdo do cólon ocorre quando a flexura pélvica ou todo o cólon esquerdo se desloca sobre o ligamento nefroesplênico. Como esse ligamento é livre na face mais dorsal do
baço, há uma fenda natural entre o baço e o rim esquerdo. Embora equinos de todas as faixas etárias, machos ou fêmeas, sejam acometidos igualmente, resultados de um estudo clínico indicaram que o deslocamento é comum em equinos
jovens.
Deslocamento dorsal do cólon à esquerda (encarceramento nefroesplênico) em equino; vista dorsal. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Como o deslocamento dorsal esquerdo resulta em obstrução simples do cólon no local em que cruza o ligamento, a enfermidade geralmente está associada a dor abdominal moderada ou curso prolongado de episódios intermitentes de
dor. As membranas mucosas permanecem normais e a frequência cardíaca aumenta ligeiramente. Normalmente o diagnóstico se baseia no exame retal (palpação da flexura pélvica sobre o ligamento, palpação das faixas do cólon ventral
esquerdo que correm dorsocranialmente até o rim esquerdo e detecção de que o baço se encontra deslocado em direção ao meio do abdome). A enfermidade também pode ser detectada utilizando­se ultrassonografia. Paracentese poderá
revelar sangue na amostra, se o baço se encontra deslocado para a linha média.
Utilizam­se quatro formas de tratamento: 1) suspensão do alimento para determinar se o esvaziamento do conteúdo intestinal permite que o cólon retorne à posição normal, 2) rolamento do equino para desalojar o cólon do ligamento, 3)
administração de fenilefrina e/ou submeter o animal ao trote para induzir contração esplênica e correção do deslocamento, ou 4) realização de cirurgia para retornar o cólon à sua posição correta. O procedimento de rolamento envolve
anestesia  de  curta  duração  (geralmente  xilazina  ou  detomidina  e  cetamina),  elevação  dos  membros  pélvicos  e  rolamento  do  equino  em  360°.  A  intervenção  cirúrgica  deve  envolver  celiotomia  na  linha  média  ventral.  A  vantagem  do
procedimento cirúrgico é que se consegue avaliar a viabilidade do cólon. Em geral, o prognóstico é favorável; a maioria dos estudos relata taxa de sobrevivência > 80%.
DESLOCAMENTO DORSAL À DIREITA:  O cólon esquerdo se desloca lateralmente ao redor da base do ceco e situa­se entre o ceco e a parede corporal direita. Na forma mais comum desse deslocamento, a flexura pélvica termina posicionada
próxima ao diafragma. Em muitos casos, o deslocamento pode ser complicado pela torção do cólon próximo à base do ceco. Embora possa haver certa interferência na drenagem venosa do cólon acometido, geralmente o suprimento arterial
permanece normal.
A maioria dos equinos com deslocamento dorsal direito exibe graus moderados de dor e lento desenvolvimento de comprometimento sistêmico. No entanto, em alguns casos, a dor pode ser intensa. A palpação retal pode revelar que a
tênia do cólon passa transversalmente pela entrada pélvica. Pode não ser possível palpar a faixa do ceco ventral no exame retal. Alguns equinos com esta enfermidade apresentam refluxo gástrico, possivelmente devido à obstrução do
duodeno.
Deslocamento dorsal do cólon à direita, com flexão e torção, em equino; vista dorsal. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Alguns equinos acometidos parecem ser estáveis e podem manifestar sintomas intermitentes compatíveis com dor abdominal leve. O tratamento pode ser conservador, envolvendo atenção às necessidades de fluido e administração de
analgésicos leves. Entretanto, em equinos com dor deve­se realizada cirurgia para localizar a flexura pélvica, exteriorizar e descomprimir a porção esquerda do cólon, se possível, e depois reposicionar o cólon na sua posição normal por
meio da sua rotação ao redor da base do ceco. Deve­se identificar e corrigir a torção do cólon. O prognóstico quanto à sobrevivência é favorável, desde que não ocorra lesão da parede do órgão durante a cirurgia.
COLITE DORSAL DIREITA:  A colite dorsal direita tem sido relatada com frequência cada vez maior nos últimos anos, particularmente, mas não restrita, em equinos que recebem altas doses AINE. Como a enfermidade tem sido diagnosticada
em equinos que recebem doses recomendadas destes fármacos, parece que alguns animais são particularmente sensíveis aos seus efeitos tóxicos. O fármaco mais comumente associado à colite dorsal direita é a fenilbutazona, mas isto pode
refletir o uso comum e muitas vezes prolongado deste fármaco. As lesões mais frequentemente observadas em equinos com colite dorsal direita são úlcera e espessamento e/ou fibrose da parede do cólon dorsal direito.
Equinos geralmente apresentam dor abdominal, anorexia e letargia. Em muitos casos os sinais são compatíveis com dor abdominal intensa, febre, endotoxemia e diarreia. Equinos com a forma mais crônica da doença apresentam dor
abdominal intermitente, perda de peso, letargia e anorexia. Em muitos casos, hipoproteinemia é um achado laboratorial comum e pode causar edema ventral em alguns animais com a forma crônica da doença. O diagnóstico geralmente
baseia­se na anamnese, nos sinais clínicos e nos achados hematológicos. Em alguns casos a avaliação ultrassonográfica do cólon, entre o 12o e o 15o espaço intercostal, pode evidenciar espessamento marcante da parede do cólon.
O tratamento dos equinos acometidos envolve a suspensão do uso de AINE, repouso e mudança da dieta para uma ração completa peletizada que contenha = 30% de fibra. Alguns veterinários recomendam fornecimento de diversas
refeições, em pequenas quantidades, ao longo do dia; outros indicam o uso de psílio para promover a cicatrização da mucosa; alguns administram sucralfato ou metronidazol. Equinos com dor incontrolável podem necessitar cirurgia para
resseccionar ou deslocar a porção acometida do cólon dorsal direito. O prognóstico para equinos com colite dorsal direita é reservado.
VÓLVULO DO CÓLON MAIOR:  Embora o termo “torção” seja utilizado há anos para indicar que o cólon torceu em si mesmo, o envolvimento do mesentério, entre os cólons ventral e dorsal, indica que a enfermidade trata­se de vólvulo.
Quando  se  instala  no  local  mais  comum  de  ocorrência  de  vólvulo  (a  junção  entre  o  cólon  ventral  direito  e  o  ceco),  o  vólvulo  se  desenvolve  mais  frequentemente  no  sentido  horário;  o  ceco  pode  ou  não  estar  envolvido.  Se  o  vólvulo
apresentar < 270° pode ocorrer obstrução intestinal, sem isquemia. Se for > 360°, ocorre obstrução estrangulante de todo o cólon esquerdo.
O início da cólica é súbito e o grau de dor pode ser leve a moderado, se o vólvulo resultar apenas em obstrução intestinal. Quando a torção é mais extensa, a dor é intensa e o equino pode não responder aos analgésicos. O cólon aumenta
de volume em demasia e o mesentério, entre os cólons dorsal e ventral, se mostra edemaciado ao exame retal. A frequência cardíaca aumenta, a condição clínica do equino se agrava rapidamente e instala­se perfusão periférica deficiente. A
distensão abdominal é marcante. Geralmente há uma baixa relação entre os resultados da análise do líquido peritoneal e o grau de envolvimento do cólon.
Embora a causa do vólvulo de cólon permaneça desconhecida, presume­se que está associado a uma quantidade desproporcional de gás no órgão. Em haras de éguas reprodutoras, a enfermidade está frequentemente associada a parição
recente (dentro de 90 dias) ou iminente e dieta com capim ou alimentos altamente fermentáveis. A presença de um potro ao lado da égua (história recente de parto) é um fator de risco adicional.
O tratamento de vólvulo de cólon requer cirurgia para sua correção e para a remoção do intestino acometido, se necessário. Embora a técnica de remoção de 90% do cólon tenha sido aperfeiçoada em equinos saudáveis, pode­se encontrar
dificuldade extrema  se  o  cólon  estiver  edemaciado.  Como  em  alguns  estudos clínicos a taxa de recidiva foi estimada como sendo tão alta quanto 20%, têm­se instituído procedimentos de colopexia para reduzir o risco de recidiva da
enfermidade em éguas reprodutoras. Embora os resultados de um estudo envolvendo vários hospitais universitários tenham mencionado taxa de sobrevivência de 27%, clínicas localizadas próximas a haras de éguas reprodutoras indicam
que é comum taxa de sobrevivência > 85%.
IMPACTAÇÃO E OBSTRUÇÃO POR CORPO ESTRANHO DO CÓLON DESCENDENTE:  As anormalidades que comprometem o cólon descendente (menor) são raras e, em um estudo, representaram < 5% das enfermidades caracterizadas por cólica. As
causas mais comuns incluem retenção de mecônio, impactação e obstrução por corpo estranho. A retenção de mecônio é observada em potros machos recém­nascidos, nas primeiras 24 h de vida. Os potros acometidos balançam a cauda
para os lados, se esforçam para defecar e rolam pelo chão. O diagnóstico é obtido por meio de toque retal cuidadoso. O tratamento envolve a administração lenta de enema com água morna e sabão. O prognóstico é excelente.
A impactação do cólon descendente acomete pôneis, equinos anões e equinos adultos com acesso restrito à água ou com outras causas de estase intestinal. Mais recentemente, a enfermidade foi associada a salmonelose, embora ainda não
se tenha comprovado uma relação de causa e efeito. A dor pode ser intensa na obstrução completa. Em tais casos ocorre, secundariamente, timpanismo do cólon, que resulta em íleo adinâmico. Nos equinos adultos, o diagnóstico se baseia
na palpação da massa obstrutiva na porção ventral do abdome, no exame retal. Deve­se considerar obstrução por corpo estranho no cólon descendente se o equino tiver < 3 anos de idade; o material da obstrução pode ser de cerca de
borracha  ou  fibras  de  náilon  de  cabrestos  ou  de  rédeas,  redes  de  feno  ou  sacos  de  alimentos.  Os  equinos  com  impactação  podem  ser  tratados  clinicamente  com  analgésicos,  fluido  IV  e  enemas  leves.  No  entanto,  frequentemente,  há
necessidade de cirurgia para esvaziar o cólon devido à intensidade da dor e da distensão por gás. O prognóstico de impactação do cólon descendente é reservado, a menos que seja complicada por colite grave após remoção da obstrução. O
prognóstico de obstrução por corpo estranho é favorável.

DOENÇAS HEPÁTICAS EM GRANDES ANIMAIS

A doença hepática é comum em grandes animais. Os aumentos nas atividades séricas das enzimas hepáticas e da concentração total de ácidos biliares podem indicar disfunção, lesão, doença ou insuficiência hepáticas. Embora a doença
hepática seja especialmente comum em equinos e potros, sua progressão para insuficiência hepática é incomum.
As  doenças  que  resultam,  frequentemente,  em  insuficiência  hepática  nos  equinos  incluem  doença  de  Theiler,  doença  de  Tyzzer  (nos  potros),  intoxicação  por  alcaloide  pirrolizidínico,  lipidose  hepática,  colangite  supurativa  ou
colangioepatite,  colelitíase  e  hepatite  ativa  crônica.  Doenças  obstrutivas  (cálculos  biliares,  deslocamento  do  cólon  dorsal  direito,  neoplasia,  úlcera  e  estenose  duodenais,  torsão  hepática,  trombose  da  veia  porta),  aflatoxicose,
leucoencefalomalacia, doença pancreática, intoxicação por capim macaricam ou trevo híbrido, shunt portocaval, abscesso hepático, neoplasia hepática e infecção perinatal por herpesvírus tipo I resultam, esporadicamente, em insuficiência
hepática. Menos frequentemente, a insuficiência hepática está associada à endotoxemia, administração de esteroides, anestesia inalante, doença granulomatosa sistêmica, amiloidose induzida por medicamento, hiperamonemia em potros
Morgan, lesão parasitária, intoxicação por ferro ou isoeritrólise neonatal.
Nos  ruminantes,  a  doença  hepatobiliar  está  associada  à  lipidose  hepática,  abscessos  hepáticos,  endotoxemia,  alcaloide  pirrolizidínico  e  outras  plantas  tóxicas,  determinadas  doenças  clostridiais,  fascíolas  hepáticas,  micotoxicose  e
intoxicação por minerais (cobre, ferro e zinco) ou deficiência de minerais (cobalto). Deficiência de vitamina E ou de selênio (hepatose dietética), aflatoxicose, migração de ascarídeos, hepatite bacteriana e ingestão de substâncias tóxicas (p.
ex., alcatrão de hulha, cianamida, algas verde­azuladas, plantas e gossipol) estão associadas à lesão hepática em suínos.
Embora a exata prevalência de doença hepática em camelídeos (lhamas, alpacas) seja desconhecida, parece ser comum na América do Norte. Lipidose hepática (sendo a forma secundária mais frequente que a primária) é relatada como a
doença hepática mais comum em lhamas e alpacas, ocorrendo tanto em crias quanto em adultos. Colangioepatite bacteriana (Salmonella spp, Escherichia coli, Listeria ssp, Clostridium ssp), hepatite e pneumonia por adenovírus, hepatite
fúngica  (coccidioidomicose),  hepatopatia  tóxica  (cobre),  necrose  hepática  induzida  por  halotano,  neoplasia  hepática  (linfossarcoma,  hemangiossarcoma,  adenoma)  e  infestação  por  fascíola  hepática  também  foram  observadas  em
camelídeos.
O fígado pode responder a um insulto apenas em número limitado de casos. A infiltração gordurosa no fígado pode ser uma alteração inicial e frequentemente reversível. A hiperplasia biliar também é reversível, se o insulto é logo
removido.  A  necrose  de  hepatócitos  indica  lesões  mais  recentes.  As  células  mortas  são  removidas  por  um  processo  inflamatório  e  substituídas  por  hepatócitos  novos  ou  fibrose.  A  menos  que  a  disfunção  seja  aguda  e  a  regeneração
hepatocelular torne­se evidente, o prognóstico dos animais com insuficiência hepática é desfavorável. A fibrose hepática inicial pode ser reversível, se há reconhecimento e intervenção imediatos. A doença crônica com extensa perda de
parênquima hepático e fibrose, especialmente com desvios portais, justificam um pobre prognóstico.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos de doença hepática podem não se tornar evidentes até > 60 a 80% do parênquima hepático se encontrar afuncional ou quando a disfunção hepática é secundária a uma doença em outro sistema
orgânico. Os sinais clínicos podem variar com o curso da doença (agudo ou crônico), sítio primário da lesão (hepatocelular, biliar), e etiologia específica. O aparecimento dos sinais de encefalopatia hepática e insuficiência hepática é,
frequentemente, agudo independente de a doença hepática ser aguda ou crônica. Os sinais clínicos e a gravidade da enfermidade hepática refletem o grau de comprometimento de uma ou mais funções vitais do fígado, inclusive regulação da
glicemia, metabolismo de gorduras, produção de fatores de coagulação, de albumina, de fibrinogênio, de aminoácidos não essenciais e de proteínas plasmáticas, formação e excreção de bile, metabolismo da bilirrubina e de colesterol,
conversão de amônia em ureia, metabolismo de polipeptídios e de hormônios esteroides, síntese de 25­hidroxicolecalciferol e metabolismo e/ou desintoxicação de várias drogas e toxinas.
Icterícia, perda de peso ou comportamento anormal são comuns em equinos com doença ou insuficiência hepática. Muitas vezes, os sinais neurológicos são iniciais e predominantes em equinos com insuficiência hepática aguda, enquanto
perda de peso é um sinal predominante em muitos, mas não em todos, equinos com doença ou insuficiência hepática crônica. Fotossensibilização, e menos comumente, paralisia bilateral da faringe causando estridor inspiratório, diarreia ou
constipação intestinal podem estar presentes. Os bovinos acometidos geralmente manifestam inapetência, diminuição na produção de leite e perda de peso. Tenesmo e ascite são observados em bovinos, mas não são comumente notados nos
equinos acometidos. Perda de peso pode ser o único sinal associado aos abscessos hepáticos. A icterícia, embora mais marcante quando o sistema biliar está doente, é também comum em equinos com insuficiência hepática aguda. Encontra­
se mais variavelmente presente em equinos com insuficiência hepática crônica ou nos ruminantes. A hiperbilirrubinemia por jejum é a causa de icterícia mais comum nos equinos e não está associada à doença hepática. Ocasionalmente,
pode­se observar uma hiperbilirrubinemia persistente (principalmente bilirrubina indireta ou não conjugada) nos equinos saudáveis (especialmente em animais Puro­Sangue), sem evidência de hemólise ou hepatopatia. Nos ruminantes,
a icterícia ocorre mais comumente por hemólise e envolve, principalmente, aumentos na bilirrubina indireta. A hiperbilirrubinemia causada por afecções biliares obstrutivas é rara nos caprinos e ovinos.
A encefalopatia hepática está associada a alterações comportamentais em equinos, ruminantes e suínos. A gravidade da encefalopatia hepática frequentemente reflete o grau de insuficiência hepática, mas não diferencia a insuficiência
hepática aguda da crônica. Os sinais de encefalopatia hepática variam de depressão e letargia inespecíficas ao ato de pressionar a cabeça contra um obstáculo, andar em círculos, marcha errante, disfagia, ataxia, dismetria, bocejo persistente,
afabilidade  aumentada,  agressividade,  estupor,  convulsões  e  coma.  Há  colapso  de  faringe  ou  de  laringe  com  estertores  inspiratórios  ruidosos  e  a  dispneia  ocorre  em  alguns  casos  de  insuficiência  hepática,  especialmente  nos  pôneis.
Desconhece­se a patogênese da encefalopatia hepática, mas as teorias propostas incluem a amônia como uma neurotoxina, alterações na neurotransmissão monoamínica (serotonina e triptofano) ou nos neurotransmissores catecolamínicos,
desequilíbrio entre os aminoácidos aromáticos e os de cadeia curta ramificada resultando no aumento de neurotransmissores inibitórios (ácido ?­aminobutírico e L­glutamato), neuroinibição pelo aumento nos teores cerebrais de substâncias
semelhantes  às  benzodiazepinas  endógenas,  aumento  da  permeabilidade  da  barreira  hematencefálica  e  prejuízos  ao  metabolismo  energético  do  SNC.  Embora  os  sinais  possam  ser  dramáticos,  a  encefalopatia  hepática  é  potencialmente
reversível se a doença hepática primária puder ser resolvida.
A fotossensibilização, que pode ocorrer na insuficiência hepática aguda ou crônica, deve ser diferenciada da fotossensibilização primária (p. 1044). A fotossensibilização hepatógena acontece quando a função hepática comprometida
resulta em acúmulo de filoeritrina, um metabólito fotodinâmico da clorofila, na pele. A filoeritrina na pele é ativada pela luz ultravioleta e libera energia, causando inflamação e lesão cutânea. Os sinais de fotossensibilização são variados,
mas  incluem  inquietação,  dor,  prurido,  dermatite  discreta  a  grave  com  eritema,  edema  subcutâneo  extenso,  úlcera  e  desprendimento  cutâneo  e  oftalmia  com  lacrimejamento,  fotofobia  e  opacidade  de  córnea.  Dermatite  e  edema  são
particularmente evidentes nas áreas corporais não pigmentadas, de coloração clara ou sem pelos e nos locais expostos ao sol. As áreas de junções mucocutâneas e de pelos brancos são os locais mais comuns de fotossensibilização em
bovinos. Ocasionalmente, a parte inferior da língua pode ser acometida. Cegueira, piodermatite, perda da condição corporal e, às vezes, morte são sequelas possíveis. O prurido pode resultar da fotossensibilização ou da deposição de sais
biliares na pele, secundária a alterações na excreção hepática.
Diarreia ou constipação intestinal podem ser observadas nos animais com doença hepática. A diarreia é mais observada em bovinos do que nos equinos com hepatopatia crônica ou em animais com fasciolose crônica e intoxicação por
plantas hepatotóxicas. Pôneis e equinos com hiperlipemia e insuficiência hepática podem desenvolver diarreia, laminite e edema ventral. Alguns animais com doença hepática apresentam diarreia e constipação intestinal intercaladas. Os
equinos com insuficiência hepática e encefalopatia hepática desenvolvem, frequentemente, impactação do cólon devido ao menor consumo de água. A constipação intestinal é característica da intoxicação por Lantana em caprinos e outros
ruminantes.
Cólica recidivante, febre intermitente, icterícia, perda de peso e encefalopatia hepática podem ser observadas nos equinos com colelitíases que obstruem o ducto biliar comum. As hepatopatias infecciosas ou inflamatórias ou a falha do
fígado em evitar que uma endotoxina entre na circulação sistêmica também podem resultar em febre intermitente e cólica. A dor abdominal pode advir de uma pressão na cápsula hepática decorrente de edema no parênquima, observada em
animais com hepatite difusa aguda ou traumatismo na própria cápsula. Os animais acometidos podem ficar com o dorso arqueado, relutar em se mover ou exibir sinais de cólica. Nos ruminantes, a dor pode ser localizada, no fígado, pela
palpação acima da face ventrolateral anterior do abdome ou nas últimas costelas no lado direito. Em alguns ruminantes com hepatopatia, observa­se tenesmo seguido de prolapso retal. Este pode estar associado à diarreia, encefalopatia
hepática ou edema intestinal decorrente de hipertensão portal.
A hipoalbuminemia não está frequentemente associada à hepatopatia, nos equinos, tal como se pensava anteriormente. Devido à longa meia­vida (cerca de 19 a 20 dias nos equinos, cerca de 16 dias em bovinos) e reserva hepática de
albumina produzida, a hipoalbuminemia é, em geral, um evento muito tardio no processo da doença. Concentrações séricas de proteína total podem estar normais ou elevadas por um aumento nas β­globulinas em equinos com hepatopatia.
Hipoalbuminemia e hipoproteinemia ocorrem mais na hepatopatia crônica, e são achados comuns em lhamas com doença hepática. Podem acarretar ascite generalizada ou edema­dependente. A ascite está relacionada com hipertensão
portal causada por um bloqueio venoso e aumento na pressão hidrostática e por derrame proteico na cavidade peritoneal. O fluido abdominal presente em hepatopatias é, geralmente, um transudato modificado. A hipoalbuminemia pode
agravar a ascite, mas se ocorre sozinha, provavelmente causa edema submandibular, na região peitoral ou na região ventral. A ascite é difícil de ser percebida em equinos e bovinos adultos, a menos que seja extensa. Ascite é um achado
comum em bezerros com cirrose hepática.
Anemia pode ser observada nos animais com disfunção hepática devido a doenças parasitárias, intoxicação crônica por cobre (em ruminantes), algumas intoxicações por plantas ou doença inflamatória crônica. A anemia na fasciolose
aguda provém de intensa hemorragia na cavidade peritoneal, à medida que as larvas penetram na cápsula hepática. O traumatismo e a atividade alimentar das fascíolas adultas dentro dos ductos biliares causam anemia e hipoproteinemia nos
animais com fasciolose crônica. Doença inflamatória crônica (p. ex., abscesso hepático e neoplasia) pode causar anemia sem hipoproteinemia concomitante.
Os sinais clínicos de insuficiência hepática grave ou terminal incluem coagulopatias e hemorragias por diminuição da produção dos fatores de coagulação, pelo fígado, e possivelmente maior demanda na sepse ou inflamação. Um tempo
de protrombina prolongado é, geralmente, observado inicialmente, pois o fator VII apresenta meia­vida plasmática mais curta. Os equinos podem desenvolver uma crise hemolítica terminal causada por aumento na fragilidade eritrocitária.
Isso ainda não foi descrito nos ruminantes.
A coloração das fezes raramente se altera nos herbívoros adultos com hepatopatias. Nos ruminantes jovens e nos animais monogástricos, a colestase pode resultar em evacuação de fezes mais claras, em virtude da perda de estercobilina,
um metabólito da bilirrubina.
Doença hepática deve sempre ser considerada quando se encontram presentes sinais clínicos inespecíficos como depressão, perda de peso, febre intermitente e cólica recidivante, sem uma causa aparente. A diferenciação entre hepatite
aguda e crônica ou insuficiência hepática, baseada na duração dos sinais clínicos antes da sua apresentação, pode ser enganosa, pois o processo patológico geralmente está avançado antes mesmo dos sinais clínicos ficarem evidentes. Sinais
vagos iniciais de depressão e diminuição do apetite podem ser negligenciados. É necessária biopsia hepática para determinar o tipo de doença, o grau de fibrose hepática e a capacidade de regeneração do parênquima hepático, a fim de
estabelecer um plano terapêutico e definir um prognóstico acurado.
ANÁLISES  LABORATORIAIS:   Os  testes  laboratoriais  frequentemente  detectam  doença  ou  disfunção  hepática  antes  de  se  instalar  a  insuficiência  hepática.  Os  testes  bioquímicos  rotineiros,  como  atividades  séricas  enzimas  hepáticas,  são
indicadores sensíveis de doença hepática, mas não avaliam a função hepática. Os testes bioquímicos dinâmicos que determinam a depuração hepática fornecem informações quantitativas sobre a função hepática. Os testes de função hepática
são úteis no diagnóstico e no prognóstico e como guia para a modificação do protocolo terapêutico.
Atividades Séricas de Enzimas Hepáticas:  As atividades séricas de enzimas hepáticas específicas são, em geral, mais elevadas na hepatopatia aguda do que na doença hepática crônica. Podem estar dentro dos limites normais nos estágios tardios da
hepatopatia subaguda ou crônica. A magnitude dos aumentos das enzimas hepáticas (especialmente de gamaglutamiltransferase) não deve ser utilizada para determinar o prognóstico. As enzimas hepáticas são úteis para indicar a presença
da doença, mas não do grau de disfunção hepática. É fundamental uma interpretação cuidadosa dos valores laboratoriais, juntamente com os achados clínicos.
Mensurações séricas sequenciais de gamaglutamiltransferase (GGT), sorbitol desidrogenase (SDH; também conhecida como iditol desidrogenase, IDH), AST, bilirrubina e ácidos biliares são comumente utilizadas para avaliar disfunção
ou doença hepática em grandes animais. As concentrações séricas de GGT, bilirrubina e ácidos biliares totais e a depuração de sulfobromoftaleína (BSP®) não são indicadores sensíveis de hepatopatia em bezerros jovens. Embora a enzima
GGT esteja principalmente associada a membranas microssomais do epitélio biliar, também está presente nas superfícies dos canalículos dos hepatócitos, pâncreas, rins e úbere. Devido a excreção de GGT pela urina e pelo leite e pela rara
ocorrência de pancreatite em grandes animais, um aumento na atividade sérica de GGT indica, mais comumente, doença hepática ou de ducto biliar. Alguns clínicos consideram a GGT o único teste de maior sensibilidade para diagnóstico
de hepatopatia em grandes animais adultos. O aumento de GGT é mais evidente na doença biliar obstrutiva. Nos equinos com doença hepática aguda, a GGT pode continuar a aumentar por 7 a 14 dias, apesar da melhora clínica e do retorno
dos outros testes laboratoriais aos valores normais. Declaradamente, a atividade sérica de GGT se eleva poucos dias após a lesão hepática e permanece alta até a fase terminal. Fibrose hepática crônica é a única hepatopatia na qual um
aumento anormal de GGT pode não ser notado. Os potros neonatos e os equinos jovens, especialmente aqueles que estavam sob treinamento, podem exibir aumento inespecífico de GGT, não associado à hepatopatia, ou outros aumentos de
enzimas hepáticas ou da concentração sérica de ácidos biliares. GGT tem pouco valor no diagnóstico de doenças hepáticas em bezerros ou cordeiros neonatos, pois está presente no colostro e no leite. A atividade de GGT também pode
aumentar no caso de deslocamento do cólon ou administração de medicamentos (p. ex., corticosteroides, rifampicina, benzimidazóis e anti­helmínticos). As atividades de algumas enzimas oriundas do fígado se elevam em bezerros (GGT,
fosfatase alcalina [ALP], glutamato desidrogenase, lactato desidrogenase) e em potros jovens (ALP, GGT, SDH, AST) porque estão transitoriamente elevadas ou provêm de outras fontes extrahepáticas. Em caprinos, as atividades séricas
das enzimas hepáticas também variam em função de idade, raça e sexo. Os valores de referência devem ser compatíveis com a espécie e a faixa etária em questão.
SDH, arginase, ornitina carbamoiltransferase (OCT), AST, isoenzima 5­lactato–desidrogenase (LDH­5), glutamato­desidrogenase (GLDH) e ALP também são utilizadas para avaliar disfunção e doenças do fígado. Arginase, SDH e OCT
são enzimas hepatoespecíficas em equinos, na maioria dos ruminantes e em suínos. SDH é mais utilizada na doença hepatocelular ativa, com aumentos marcantes na atividade enzimática após lesão hepatocelular. Discretos aumentos de
SDH também podem ocorrer nos casos de lesões gastrintestinais obstrutivas, endotoxemia, anoxia decorrente de choque, anemia aguda, hipertermia e anestesia. SDH e LDH­5, devido à meia­vida curta, são mais úteis para avaliação da
progressão ou da resolução de uma lesão hepática. Ambas as enzimas geralmente retornam a valores próximos ao normal 4 dias após a lesão hepática, e nenhuma delas aumenta nas doenças hepáticas crônicas. Raramente, nos casos graves
de insuficiência hepática, a SDH pode retornar ao normal, apesar da condição fatal. Arginase e GLDH são consideradas específicas para doença hepática aguda, pois ambas apresentam altas concentrações no tecido hepático e meia­vida
curta no sangue. AST é altamente sensível para hepatopatias, mas carece de especificidade, pois altas concentrações provêm tanto do fígado quanto do músculo esquelético. Outras fontes de AST incluem músculo cardíaco, eritrócitos,
células intestinais e rins. Quando se mensura, simultaneamente, CK para descartar a possibilidade de miopatia e o soro não se encontra hemolisado, os aumentos de AST e LDH­5 são decorrentes de doença hepatocelular. A AST pode
permanecer aumentada 10 a 14 dias, ou mais, após lesão hepático transitória aguda. Em geral, os valores de AST encontram­se normais na hepatopatia crônica. SDH e AST podem aumentar acentuadamente na colestase intra­hepática e
discretamente na colestase extra­hepática. Os aumentos de ALP e GGT estão associados à irritação ou destruição do epitélio biliar e com obstrução biliar. A ALP provém da placenta, ossos, macrófagos, epitélio intestinal e fígado. Nos
bezerros e nos potros muito jovens, a ALP aumenta, provavelmente, devido à fonte placentária ou óssea. Nos bezerros jovens, atividades de ALP de até 1.000 UI/l, ao nascimento, e 500 UI/l, com várias semanas de idade, são consideradas
normais. Valores de ALP de 152 a 2.835 UI/l são descritos em potros (< 12 h de vida) e a atividade de ALP pode permanecer elevada por 1 a 2 meses, comparada com sua atividade em adultos. Em bezerros (< 6 semanas de idade), nenhum
dos  testes  de  rotina  (bilirrubina,  GGT,  GLDH,  ALP,  LDH,  AST  ou  alanina  aminotransaminase  [ALP])  para  diagnóstico  de  lesão  hepática  ou  avaliação  de  função  hepática  são  clinicamente  úteis  no  diagnóstico  de  hepatopatia,  quando
utilizados sozinhos. AST e GLDH são as enzimas mais sensíveis para lesão hepática, mas a AST também aumenta quando há lesão muscular. A atividade de AST em potros pode estar elevada, se comparada com seu valor em adultos, por
vários meses. Essa elevação é também observada durante o desenvolvimento muscular. Aumentos discretos e passageiros na atividade de SDH podem ser notados em alguns potros com < 2 meses de idade.
Concentração  Sérica  de  Ácidos  Biliares  Totais:  A  concentração  sérica  de  ácidos  biliares  é  extremamente  específica  para  disfunção  hepática,  mas  não  define  o  tipo  de  lesão  ou  doença  presente.  Aumenta  na  lesão  hepatocelular,  colestase
ou shunts (desvios) do sistema porta para a veia cava. Estas elevações são mais evidentes na obstrução biliar e no shunt portossistêmico. A concentração sérica de ácidos biliares aumenta precocemente na doença hepática e frequentemente
permanecem elevadas nos estágios posteriores.
A concentração de ácidos biliares totais permanece elevada em equinos com doença hepática crônica. Nesta espécie não há variação diurna, elevação pós­prandial e variação significativa de hora em hora nas concentrações de ácidos
biliares. A concentração sérica de ácidos biliares totais na maioria dos equinos saudáveis é < 10 μmol/l. Teores séricos ou plasmáticos de ácidos biliares > 20 μmol/l apresentam alta sensibilidade e valor preditivo positivo para diagnóstico
de doenças hepáticas em equinos, mas não em ruminantes. Embora concentrações de ácidos biliares > 30 μmol/l possam ser indicadores precoces de insuficiência hepática, deve­se ter cautela na interpretação de elevações discretas porque
concentrações de ácidos biliares acima de 20 μmol/l podem ser constatadas em equinos com anorexia. Jejum prolongado (< 14 h), mas não de curta duração, pode causar aumento do teor sérico de ácidos biliares em equinos.
A interpretação da concentração de ácidos biliares totais é difícil em potros < 1 semana de idade. Comparada com aquela de equinos adultos saudáveis, a concentração séricas de ácidos biliares em potros saudáveis é consideravelmente
maior nas seis primeiras semanas de vida. Quando se mensura a concentração sérica de ácidos biliares em potros doentes é particularmente importante ter controles de animais sadios, pareados por idade, ou valores de testes laboratoriais de
referência para a idade.
Em bovinos leiteiros, a mensuração de ácidos biliares séricos é de pouco valor no diagnóstico de esteatose hepática e doença ou insuficiência hepática devido às variações significativas que ocorrem a cada hora. A concentração de ácidos
biliares totais em vacas recém­paridas é significativamente maior do que em vacas na metade da lactação ou em bezerras com 6 meses de idade.
A concentração de ácidos biliares totais pode ser o melhor teste para diagnóstico de hepatopatia em bezerros jovens. Nos bezerros, concentrações > 35 μmol/l podem indicar doença hepática, obstrução biliar ou shunt portossistêmico.
Os intervalos de referência relatados para a concentração sérica de ácidos biliares são 1,1 a 22,9 μmol/l, para lhamas >  1  ano  de  idade,  e  1,8  a  49,8  μmol/l,  para  as  lhamas  <  1  ano.  As  concentrações  de  ácidos  biliares  em  lhamas,
individualmente, podem variar em função da alimentação ou do momento da coleta de amostra durante o dia, permanecendo no intervalo de referência.
Concentração Sérica de Pigmentos Biliares: A avaliação da concentração sérica de bilirrubina (direta e indireta) é útil no diagnóstico de disfunção hepática em equinos e ruminantes. Aumento do teor de bilirrubina se deve à hemólise, doença
hepatocelular, colestase ou causas fisiológicas. Nos equinos, a anorexia causa aumento fisiológico no teor sérico de bilirrubina total < 6 a 8 mg/dl e, raramente, tão alto quanto 10,5 a 12 mg/dl. A concentração de bilirrubina indireta aumenta
2 a 3 vezes, enquanto a bilirrubina direta permanece na faixa de normalidade. Nos potros, a bilirrubina indireta, mais que a direta, pode estar elevada em casos de prematuridade, isoeritrólise neonatal, sepse ou shunt portocaval. Enterite,
infecção umbilical, obstrução intestinal e alguns medicamentos (corticosteroides, heparina, halotano) também podem causar hiperbilirrubinemia. Hiperbilirrubinemia fisiológica transitória discreta e icterícia podem ser observadas em potros
e bezerros recém­nascidos. Embora o(s) mecanismo(s) não seja(m) completamente conhecido(s), as causas propostas incluem “sobrecarga” pré­natal dos hepatócitos, destruição naturalmente alta de eritrócitos ao nascimento ou próximo
dele, excreção ineficaz de bilirrubina ou baixa concentração de ligandina hepatocelular em potros neonatos, em comparação com equinos adultos. Nos bezerros normais < 72 h de idade, a bilirrubina total pode elevar­se até 1,5 mg/dl e até
0,8 mg/dl nos bezerros com 1 semana de idade. A bilirrubina direta encontra­se, geralmente, < 0,3 mg/dl nos bezerros jovens. Em potros saudáveis (< 2dias de idade) a concentração de bilirrubina total pode variar de 0,9 a 4,5 mg/dl, sendo
a maior parte bilirrubina não conjugada (0,8 a 3,8 mg/dl). Prematuridade ou enfermidade (sem doença hepática) pode aumentar a fração de bilirrubina não conjugada (indireta) em potros jovens. Em potros saudáveis a concentração de
bilirrubina deve situar­se na faixa dos valores de referência para adultos, quando alcançam 2 semanas de idade. Os valores normais de bilirrubina total em caprinos variam de 0 a 0,1 mg/dl.
Equinos com doença ou insuficiência hepática apresentam, com mais frequência, aumentos significativos das bilirrubinas indireta e direta. Na lesão hepática, em equinos ou em ruminantes, a maior parte da bilirrubina retida é indireta
(não conjugada) e a proporção bilirrubina direta:bilirrubina total é, em geral, < 0,3. Insuficiência hepática aguda causada por necrose hepática resulta em aumento das bilirrubinas indireta e direta. Em equinos com insuficiência hepática
aguda, o aumento de bilirrubina se deve, principalmente, ao aumento na fração de bilirrubina indireta. Doença hepatocelular deve ser considerada quando o teor de bilirrubina indireta é > 25% do valor da bilirrubina total. A bilirrubina
direta raramente excede 25 a 35% da bilirrubina total, em equinos. Aumento desta magnitude sugere doença ou obstrução biliar. Na obstrução biliar ou colestase intra­hepática, a proporção bilirrubina direta:bilirrubina total pode ser > 0,3,
em equinos, ou 0,5, em vacas. Elevação do teor de bilirrubina direta pode ser verificada em potros com sepse e íleo adinâmico, com evidência mínima de disfunção hepatocelular.
Nas hepatopatias crônicas, as concentrações de bilirrubina encontram­se na faixa de valores normais. Bovinos adultos e bezerros podem apresentar doença hepática grave sem aumento do teor sérico de bilirrubina. Em bovinos, caprinos e
ovinos, os teores circulantes de bilirrubina podem aumentar apenas moderadamente na doença hepática grave generalizada. Os aumentos mais evidentes na concentração sérica ou plasmática de bilirrubina se deve à crise hemolítica, mais
do que disfunção hepática. Na ausência de hemólise, concentração sérica de bilirrubina total > 2 mg/dl indica prejuízo à função hepática em ruminantes.
Urobilinogênio: O urobilinogênio pode ser detectado por meio de fita reagente de imersão, em equinos normais. Teor elevado de urobilinogênio na urina, sem hemólise, é sugestivo de disfunção hepática, shunt portos–sistêmico ou maior
produção pelas bactérias intestinais. Urobilinogênio na urina indica patência de ducto biliar. Ausência de urobilinogênio pode indicar obstrução biliar completa, hepatopatia ou falha na excreção de bilirrubina para o intestino, conversão
ineficiente por bactérias intestinais ou baixa absorção no íleo. A correlação entre urobilinogênio e doença hepatocelular, nos animais, é baixa. O urobilinogênio é instável na urina; consequentemente, deve ser mensurado dentro de 1 a 2 h,
ou estará diminuído ou indetectável.
Concentração Sérica ou Plasmática de Proteínas:  Em equinos e bovinos com doença hepática as concentrações séricas de albumina e de proteína são variáveis. A hipoproteinemia não é comum nos equinos com hepatopatia aguda. É mais provável
notar redução da albumina sérica na doença hepática crônica devido à redução do parênquima hepático funcional. Em um estudo com 84 equinos, notou­se que 13% apresentavam hipoproteinemia. A concentração  de  albumina  estava
abaixo do menor valor da faixa de normalidade em 18% dos animais com doença crônica do fígado e 6% com hepatopatia aguda. A concentração de globulina estava elevada em 64% dos animais. Hiperproteinemia por hiperglobulinemia
(gamopatia policlonal ou aumento de β­globulinas) pode ser verificada em equinos com doença hepática aguda ou crônica grave. A concentração plasmática de proteína total geralmente é normal, mas a proporção albumina:globulina pode
estar diminuída.
A concentração plasmática de fibrinogênio pode não ser um teste sensível em equinos com insuficiência hepática. Baixa concentração de fibrinogênio pode ser decorrência de parênquima insuficiente ou de coagulação intravascular
disseminada. Alta concentração de fibrinogênio está associada a resposta inflamatória em equinos com colangioepatite.
Tempo de Protrombina:  Anormalidade no tempo de protrombina (TP) é a primeira alteração detectada porque o fator VII, um fator de coagulação dependente de vitamina K sintetizado no fígado, apresenta meia­vida curta. O TP sérico pode ser
rapidamente  prolongado  no  caso  de  insuficiência  hepática,  sendo  um  dos  primeiros  testes  funcionais  a  retornar  ao  normal  na  recuperação  de  hepatopatia  aguda.  No  entanto,  a  determinação  do  TP  normal  não  exclui  a  possibilidade  de
coagulopatia causada por deficiência de vitamina K. Tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA) prolongado ou outros indicadores de coagulopatia podem ser verificados em animais com doença hepática grave. Como vários fatores
podem influenciar a mensuração dos valores de TP ou TTPA em equinos, a proporção entre o tempo de coagulação do animal com suspeita de hepatopatia e este valor em animais normais deve ser > 1,3 para que o teste seja interpretado
como anormal.
Ureia, Glicose, Amônia e Outras Alterações: A concentração sérica de ureia pode estar diminuída tanto na insuficiência hepática aguda quanto na crônica. Hipoglicemia é comum em potros com insuficiência hepática. A glicemia em equinos
adultos com disfunção hepática está, frequentemente, normal ou aumentada. Hipoglicemia, embora menos comum em equinos adultos e ruminantes com disfunção hepática, é mais provável na doença hepática crônica. A concentração
plasmática de triglicerídios aumenta acentuadamente em pôneis, em equinos miniatura, nos asininos e em equinos adultos com lipidose hepática. A magnitude do aumento pode estar relacionada com o prognóstico, em equinos. Alterações
nos  teores  de  triglicerídios,  lipoproteínas  de  densidade  muito  baixa  e  colesterol  esterificado  são  mais  comuns  em  ruminantes  do  que  em  equinos  com  insuficiência  hepática.  Potros  neonatos  apresentam  concentrações  de  colesterol  e
triglicerídios maiores do que os animais adultos.
A concentração plasmática de amônia pode se elevar em casos de insuficiência hepática, mas não há boa correlação com a gravidade de encefalopatia hepática, exceto quando há shunt portocaval. Alta concentração de amônia e sinais
clínicos  de  encefalopatia  hepática,  sem  insuficiência  hepática,  foram  relatados  em  equinos  da  raça  Morgan  desmamados  que  apresentam  a  síndrome  hiperornitinemia,  hiperamonemia  e  normocitrulinúria,  e  em  equinos  adultos  com
hiperamonemia primária ou idiopática. A ingestão de ureia ou de sais de amônio mais provavelmente causa aumento da concentração sanguínea de amônia e encefalopatia em bovinos, do que em equinos.
O volume globular (VG), ou hematócrito, e o teor sérico de ferro se elevam em equinos com doença hepática grave. O hematócrito elevado pode persistir, apesar da fluidoterapia e hidratação normal, até que a doença hepática primária
seja resolvida. Eritrocitose secundária (com ou sem aumento da concentração de eritropoetina) foi observada em alguns equinos com neoplasia hepática. Alta concentração sérica de ferro é comumente observada em equinos com doença
hepática e/ou doença hemolítica.
Testes de Depuração e Excreção de Corante: Os corantes sulfobromoftaleína (BSP®) e verde de indocianina podem ser utilizados para avaliar o transporte hepatobiliar. A meia­vida da BSP se prolonga quando > 50% da função hepática é perdida.
A meia­vida normal de depuração da BSP nos equinos é < 3,7 min; nos caprinos é 2,13± 0,19 min e nos ovinos é = 4 min. A depuração de BSP é mais demorada nos bezerros (5 a 15 min) do que em bovinos adultos (= 5 min). Embora os
testes de excreção de corante fiquem, geralmente, prolongados no caso de disfunção hepática, eles ainda podem permanecer dentro da variação normal. Hiperbilirrubinemia, fluxo sanguíneo hepático reduzido e colestase significativa podem
prolongar falsamente a depuração de BSP; a hipoalbuminemia também pode encurtá­la falsamente. A depuração de BSP em caprinos é mais demorada na lipidose hepática generalizada secundária à toxemia da prenhez. A determinação do
tempo de depuração de BSP, em vez da meia­vida, é mais utilizada na detecção de hepatopatia. O tempo de depuração de BSP em animais saudáveis alimentando­se normalmente e em equinos com 3 dias de jejum é, respectivamente, 10
ml/min/kg e 6 ml/min/kg. Esses testes, no entanto, são de uso limitado na prática clínica devido à falta de produtos farmacêuticos no mercado disponíveis. Custo, limitações de procedimento e equipamentos necessários para quantificação
da depuração de verde de indocianina limitam seu uso como teste diagnóstico.
Cintigrafia:  Função dos hepatócitos e patência biliar, estrutura e fluxo sanguíneo podem ser avaliados por cintigrafia hepatobiliar. Mapeamento de radionucleotídios hepáticos e mapeamento biliar podem detectar alterações no fluxo sanguíneo
ou massas hepáticas e obstrução biliar (atresia, colangite, colelitíase), respectivamente. A cintigrafia é utilizada em suínos, potros e cordeiros para diferenciar obstrução biliar de outras causas de hiperbilirrubinemia.
Ultrassonografia:  A ultrassonografia pode ser utilizada para avaliar tamanho, aparência (forma, textura) e localização do fígado, em equinos e ruminantes, para o diagnóstico de hepatomegalia, hepatolitíase, dilatação biliar, colelitíase ou lesões
focais. Também podem–se observar tumores, cistos, abscessos e granulomas. Doenças difusas são mais difíceis de se detectar do que os processos focais, pois aquelas causam menor distorção da arquitetura hepática normal. O diagnóstico
de uma hepatopatia difusa deve ser comprovado por biopsia e histopatologia. O ultrassom pode ser utilizado para guiar a coleta de amostras hepáticas por biopsia e também a execução de colecistocentese e aspiração de abscessos, massas e
amostras de bile (ovos de fascíola, ácidos biliares, cultura). A ultrassonografia é um meio não invasivo e preciso para o monitoramento da progressão e resolução de uma doença. Nos equinos, imagens hepáticas devem ser obtidas tanto do
lado esquerdo quanto do lado direito do animal.
Biopsia Hepática:  A biopsia hepática percutânea é o meio definitivo para o diagnóstico de hepatopatia. A avaliação histológica do fígado propicia informações valiosas com relação à etiologia e à gravidade do processo patológico. A maioria
das hepatopatias é difusa, de modo que a amostra é representativa para a doença. As amostras podem ser obtidas às cegas, mas a orientação por ultrassonografia diminui os riscos de complicações (peritonite por extravasamento de bile ou
perfuração intestinal, hemorragia ou pneumotórax). As biopsias hepáticas também podem ser obtidas durante uma laparoscopia, que oferece a vantagem adicional de se visualizar a superfície hepática e outros órgãos abdominais para
evidência de doenças.
As amostras devem ser colocadas em meios para cultura bacteriana e antibiograma e em formalina, para avaliação histológica. Antes de uma biopsia hepática, podem­se efetuar perfis de coagulação (tempo de protrombina, tempo de
tromboplastina parcial, contagem plaquetária, fibrinogênio, produtos da degradação da fibrina e contagem de plaquetas opcional) para redução dos riscos de hemorragia. Não se aconselha uma biopsia hepática em um animal com evidência
clínica ou clinicopatológica de coagulopatia ou abscesso hepático, devido à hemorragia ou à contaminação da cavidade peritoneal.
Radiografia: A  radiografia  abdominal  contrastada  nos  potros  é  útil  no  diagnóstico  de  obstruções  gastroduodenais  e  de  colangioepatite  secundária.  Os  desvios  portossistêmicos  nos  potros  ou  bezerros  jovens  podem  ser  identificados  por
portovenografia mesentérica por meio de administração de solução de contraste radiopaco na veia mesentérica jejunal seguida de fluoroscopia ou pesquisas radiográficas sequenciais para monitorar o fluxo sanguíneo hepático.
TRATAMENTO E MANEJO:  O tratamento inicial dos animais com sinais de doença ou insuficiência hepática é, geralmente, de suporte e costuma ser iniciado antes de se conhecer a causa primária e a extensão das lesões hepáticos. Anamnese,
sinais clínicos e dados laboratoriais podem fornecer algum indício quanto à natureza do processo de doença hepática, mas a biopsia hepática é geralmente necessária para elaborar o diagnóstico definitivo e determinar o grau da lesão
hepática. Terapias específicas para a doença hepática dependem da etiologia, presença de insuficiência hepática, cronicidade, grau de fibrose hepática ou obstrução biliar e espécies afetadas. Aumentos nas enzimas hepáticas sem doença
hepática podem não exigir uma terapia específica para o fígado, mas sim para a doença primária.
A terapia obtém mais sucesso quando a intervenção é precoce, a fibrose hepática é mínima e existem evidências de regeneração hepática. Equinos com fibrose grave ou difusa respondem pobremente, devido ao inadequado potencial de
regeneração hepática. Os objetivos do tratamento de grandes animais com doença ou insuficiência hepática são o controle da encefalopatia hepática, tratar o processo patológico primária, propiciar terapia de suporte que permita tempo para
regeneração do fígado, e, mais importante, evitar lesões no animal e nas pessoas que trabalham com ele. Os animais com encefalopatia hepática frequentemente exibem comportamento agressivo e imprevisível, o que pode acarretar lesão a
eles mesmos ou aos tratadores.
Encefalopatia  Hepática  e  Insuficiência  Hepática: Equinos  com  encefalopatia  hepática  podem  ser  agressivos  ou  demonstrar  comportamentos  repetitivos  que  dificultam  a  contenção.  Para  garantir  a  segurança  dos  animais  e  tratadores,  exige­se
sedação. Como a maioria dos sedativos e tranquilizantes é metabolizada pelo fígado, a sua meia­vida de eliminação pode estar prolongada nos animais com insuficiência hepática; portanto, as dosagens devem ser minimizadas. Uma dose
reduzida da droga é inicialmente determinada para avaliar seu efeito. Xilazina ou detomidina administradas em pequenas doses podem ser utilizadas para controlar os equinos que exibem comportamento anormal. Deve­se evitar o diazepam
em animais com encefalopatia hepática, pois pode potencializar o efeito do ácido ?­aminobutírico nos neurônios inibitórios e piorar os sinais neurológicos. Também se deve evitar a acepromazina, pois pode diminuir o limiar de convulsões.
Desidratação, desequilíbrio ácido­básico e eletrolítico e hipoglicemia devem ser corrigidos com fluidoterapia apropriada. Inicialmente, uma solução poliônica balanceada (preferencialmente sem lactato) é administrada para reidratação.
Caso o animal se apresente hipopotassêmico ou hipofágico, realiza­se suplementação com potássio (10 a 40 mEq/l, dependendo da velocidade de infusão). Se infusão IV não é possível em ruminantes, pode­se tentar a reidratação por meio
da administração oral de fluidos, se a motilidade ruminal está normal. Alguns equinos com doença hepática apresentam policitemia, dificultando a avaliação do estado de hidratação pelo VG. Acidose grave pode estar presente. Como uma
rápida correção da acidose pode exacerbar os sinais neurológicos, ela deverá ser corrigida, gradualmente, com a administração por via intravenosa de fluidos com uma alta concentração de eletrólitos. Se isso falhar ou se o pH sanguíneo
permanecer < 7,1 (bicarbonato < 14 mEq/l) o bicarbonato deverá ser administrado cautelosamente. A suplementação com vitaminas é opcional. Água fresca em quantidade adequada deve estar disponível se o animal conseguir degluti­la
normalmente.
Os fatores que podem contribuir para a encefalopatia hepática devem ser eliminados. Solução de glicose a 5 a 10% é administrada para corrigir hipoglicemia, se presente. Adicionalmente, a suplementação de glicose ajuda a diminuir as
concentrações sanguíneas de amônia e reduz a gliconeogênese catabólica, o catabolismo proteico e a necessidade de gliconeogênese hepática. A menos que esteja hiperglicêmico, deve­se administrar, na forma de infusão contínua IV,
solução de glicose (2 ml de solução 5%/kg/h ou 1 ml de solução 10%/kg/h), até mesmo aos animais que não apresentam hipoglicemia. A velocidade deve ser ajustada de modo que a euglicemia seja mantida. Indução de hiperglicemia
moderada a grave, alteração brusca na concentração de glicose e glicosúria devem ser evitadas. A glicose IV deve ser utilizada em combinação com uma solução eletrolítica balanceada e não como fonte única de fluido.
As terapias direcionadas à diminuição na produção de amônia ou na sua absorção pelo intestino incluem administração de óleo mineral, neomicina, lactulose e metronidazol. A administração de óleo mineral diminui a absorção e facilita a
remoção de amônia. A passagem de sonda nasogástrica em um animal com encefalopatia hepática deve ser feita com cuidado, pois o sangramento nasal pode ser de difícil controle devido à diminuição nos fatores de coagulação. Além
disso, o sangue deglutido pode exacerbar os sinais neurológicos. A administração oral de neomicina (10 a 30 mg/kg, 2 a 4 vezes/dia, por 1 a 2 dias) é utilizada para diminuir a população de bactérias produtoras de amônia no intestino. A
lactulose (0,2 ml/kg, 2 vezes/dia; 0,3 ml/kg, VO, 4 vezes/dia; ou 90 a 120 ml/450 kg, 3 a 4 vezes/dia) é metabolizada em ácidos orgânicos por bactérias no íleo e no cólon. A redução do pH do cólon promove maior assimilação bacteriana
de amônia, menor produção de amônia, retenção de amônia no intestino, mudanças na microflora intestinal e catarse osmótica. Declaradamente, a administração oral de vinagre (ácido acético) tem o mesmo efeito no pH do cólon e na
concentração de amônia no intestino. O metronidazol (10 a 15 mg/kg VO, 2 a 4 vezes/dia) diminui a população de microrganismos produtores de amônia nos equinos, mas não é utilizado nos animais de corte. Se o animal conseguir
deglutir, drogas orais poderão ser misturadas ao xarope Karo ou melaço e administrá­las por intermédio de uma seringa, para evitar traumatismos e riscos de se induzir hemorragia durante a passagem de uma sonda nasogástrica. Neomicina,
lactulose e metronidazol podem induzir, potencialmente, uma diarreia discreta a grave (salmonelose) devido à destruição da flora gastrintestinal. O uso de combinação de drogas é mais passível de induzir diarreia do que o uso isolado dos
fármacos. Pelo fato do metronidazol ser metabolizado no fígado, cautela deve ser tomada quando administrar o fármaco aos equinos com insuficiência hepática. Sinais neurológicos por intoxicação pelo metronidazol podem mimetizar uma
encefalopatia hepática.
Até que se conheça a natureza da hepatopatia primária, justifica­se tratamento com antimicrobianos de amplo espectro, caso se suspeite de hepatite infecciosa. A combinação de sulfa­trimetoprima é uma boa escolha empírica, devido sua
atividade contra bactérias Gram­negativas e a alta concentração na bile. A penicilina, em combinação com um aminoglicosídio, possui amplo espectro de ação e pode ser benéfica ao se suspeitar de Streptococcus sp ou de um coliforme
anaeróbico ou Gram­negativo. Enrofloxacino também é recomendada. Têm­se utilizado as cefalosporinas de primeira e segunda gerações nos potros e em outras espécies. O metronidazol pode ser administrado quando se suspeitar de
infecção anaeróbica nos equinos. Uma terapia antimicrobiana específica, com base na cultura e no antibiograma de uma biopsia hepática, é ideal.
A  dor  pode  ser  controlada  com  baixas  doses  de  AINE  (p.  ex.,  0,5  mg  de  flunixino  meglumina/kg,  IV  ou  IM,  2  a  3  vezes/dia).  Nos  potros,  pode­se  preferir  o  butorfanol  (0,01  a  0,05  mg/kg,  IV;  0,04  a  0,07  mg/kg,  IM).  Quando  se
desenvolvem coagulopatias ou quando ocorrer hipoalbuminemia, pode­se administrar vitamina K1 (até 1 mg/kg, SC; 40 a 50 mg/450 kg, SC) e realizar transfusões de plasma (1 a 2 l/100 kg). Em alguns equinos com doença ou insuficiência
hepática  aguda,  tratamentos  com  antioxidantes  (dimetil  sulfóxido,  acetilcisteína,  vitamina  E,  S­adenosilmetionina  [SAMe])  e  anti­inflamatórios  (flunixino  meglumina,  pentoxifilina)  podem  ser  úteis.  O  manitol  é  recomendado  para  o
tratamento de suspeita de edema cerebral na encefalopatia hepática fulminante. Equinos com doença hepática devem ser protegidos da luz solar.
Manejo Alimentar: O manejo alimentar é essencial para o tratamento de animais com encefalopatia hepática ou hepatopatias aguda ou crônica. Os animais acometidos devem ser alimentados com cuidado, pois a disfagia pode constituir um
problema. A dieta deve ser oferecida com frequência, em quantidades relativamente pequenas. Deve satisfazer as exigências energéticas com carboidratos facilmente digeríveis, propiciar proteína adequada, mas não excessiva, apresentar
alta proporção de aminoácidos de cadeia ramificada com relação a aminoácidos aromáticos e ser moderada a rica em amido, para diminuir a necessidade de síntese de glicose hepática. Não se deve acrescentar gordura e sal na dieta. Os
alimentos utilizados com sucesso para equinos incluem capim e feno de aveia, milho e sorgo. Uma quantidade pequena de melaço pode ser adicionada para melhorar a palatabilidade e acrescentar energia. Grandes quantidades de melaço
podem tornar o alimento menos palatável e induzir diarreia. O farelo de linhaça e o farelo de soja apresentam excelente proporção entre aminoácidos de cadeia ramificada e aminoácidos aromáticos e podem ser utilizados como suplemento
proteico, em pequenas quantidades. A polpa de beterraba pode ser substituída por feno de aveia ou de capim. A polpa de beterraba deve ser embebida, primeiramente, para permitir expansão total antes de ser oferecida. O engasgo pode ser
um problema em alguns animais que ingerem polpa de beterraba.
A alimentação com feno de alfafa, alimentos que contenham alfafa ou outros fenos de leguminosas para equinos com hepatopatias é controversa. Embora o feno de alfafa possua melhor proporção entre aminoácidos de cadeia ramificada
e aminoácidos aromáticos do que o feno de capim, o primeiro pode apresentar conteúdo proteico muito alto. Prefere­se alimentação com feno de capim, no caso dos animais com hiperamonemia ou sinais de encefalopatia hepática. Pode­se
oferecer uma mistura de feno de capim/alfafa aos equinos sem sinais neurológicos centrais, se a perda de peso constituir um problema e há tolerância a proteínas adicionadas. O acesso a pastagens de capim é permitido, contanto que os
sinais de encefalopatia hepática estejam controlados e se evite exposição à luz solar.
Outros alimentos ricos em aminoácidos de cadeia ramificada incluem sorgo, farelo ou milo. Suplemento parenteral ou enteral com aminoácidos de cadeia ramificada ajuda a restaurar a proporção normal entre aminoácidos de cadeia
ramificada  e  aminoácidos  aromáticos.  Pode­se  indicar  suplementação  de  vitaminas  A,  D,  B1 e  ácido  fólico,  possivelmente  também  com  as  vitaminas  C  e  E.  A  vitamina  K1 pode  ser  indicada  para  animais  com  coagulopatias.  Grandes
quantidades de gordura não devem ser utilizadas para o fornecimento de energia; alimentos contendo este excesso podem levar à lipidose hepática.
Transfaunação (p. 2583) com fluido ruminal oriundo de uma vaca saudável pode auxiliar a restabelecer a flora ruminal normal e aumentar o apetite dos bovinos acometidos. Os animais que não comerem voluntariamente devem ser
alimentados à força. Pode­se administrar uma mistura com cereais, por sonda nasogástrica, aos equinos e aos suínos ou por sonda orogástrica ou por uma fístula ruminal, aos ruminantes. Nos ruminantes, recomenda­se uma alimentação
forçada com farelo de alfafa (15% de proteínas) e grãos de cervejaria ou polpa de beterraba secos, com cloreto de potássio e fluido ruminal normal. O feno de alfafa e os alimentos que contêm alfafa podem ser mais bem tolerados pelos
bovinos do que pelos equinos com hepatopatias. Também são necessários fluidos poliônicos IV com dextrose 5%, cloreto de potássio e vitaminas do complexo B nos animais que não estiverem consumindo uma quantidade adequada de
alimento.

 ABSCESSOS HEPÁTICOS EM BOVINOS
Os abscessos hepáticos podem ocorrer em todas as idades e raças de bovinos, em qualquer lugar em que se criem bovinos. São mais comuns nos bovinos em engorda e leiteiros alimentados com rações que predispõem à ruminite. Os
bovinos com abscessos hepáticos apresentam redução na eficiência de produção. Os fígados comprometidos são condenados no abate e aderências em órgãos vizinhos ou no diafragma podem implicar em limpeza da carcaça. Os abscessos
hepáticos também podem ocasionar síndromes associadas a trombose de veia cava caudal.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Fusobacterium necrophorum, uma bactéria Gram­negativa e anaeróbica obrigatória componente da microflora ruminal normal, é o principal agente etiológico. A infecção hepática geralmente se origina a partir de
uma ruminite necrobacilar. Há relato de 2 biovares. O biovar A (F. necrophorum necrophorum), o mais virulento, é o biovar predominante na microflora ruminal e geralmente é isolado em cultura pura, em muitos casos de abscedação
hepática. O biovar B (F. necrophorum funduliforme) é comumente isolado de microabscessos na parede ruminal, sendo isolado menos comumente de abscessos hepáticos, onde é sempre encontrado em uma cultura mista com o biovar A ou
outras espécies de bactérias. Arcanobacterium pyogenes, estreptococos, estafilococos e Bacteroides spp são recuperados mais frequentemente em culturas mistas.
A ruminite geralmente resulta de fermentação intrarruminal rápida de carboidratos da dieta, com produção subsequente de ácido láctico e aumento na acidez do fluido ruminal. As rações com alto teor de carboidratos representam a causa
principal em bovinos leiteiros e em engorda, mas a textura do alimento e o método de alimentação podem ser agentes modificadores. A incidência de ruminite nos bovinos em confinamento torna–se significativamente maior quando são
transferidos diretamente de uma ração volumosa para uma ração de terminação e quando há pobre manejo alimentar. F. necrophorum, sozinho ou com outras bactérias, coloniza­se pela área de necrose superficial produzida pelo conteúdo
ruminal ácido. As leucotoxinas podem facilitar a resistência à fagocitose. Êmbolos bacterianos oriundos das lesões invadem o sistema venoso porta–hepático e são transportados para o fígado, onde podem estabelecer focos infecciosos de
necrobacilose que eventualmente se desenvolvam em abscessos.
As outras fontes de infecção nos abscessos hepáticos incluem penetração por corpo estranho a partir do retículo, extensão direta de uma infecção decorrente de onfaloflebite nos bezerros neonatos e doenças bacterianas.
ACHADOS CLÍNICOS, LESÕES E DIAGNÓSTICO:  Os bovinos com abscessos hepáticos raramente exibem sinais clínicos. Um exame clínico detalhado pode evidenciar febre periódica, inapetência e evidências de dor quando se aplica uma
pressão no xifesterno e gradil costal posterior, no lado direito. Grunhido e outros sinais de dor podem ocorrer quando o animal se movimenta ou se deita. Uma queda transitória na produção de leite é notada em vacas leiteiras. Sinais
clínicos de onfaloflebite estão presentes quando há abscedação hepática resultante de extensão de onfaloflebite. As proteínas de fase aguda aumentam no início do curso da doença e a concentração sérica de ácido siálico tem sido utilizada
para o diagnóstico antemorte. Quando ocorrem vários abscessos ou um abscesso grande, pode ocorrer leucocitose com neutrofilia e aumento nos teores de fibrinogênio, podendo haver um aumento nas concentrações séricas de globulina. A
ultrassonografia serve como auxílio ao diagnóstico, mas os abscessos no lado esquerdo do fígado podem não ser visualizados. Os bovinos em confinamento, com abscessos hepáticos, apresentam redução na eficiência alimentar, e aqueles
com processo de maior gravidade perdem 5 a 15% do ganho diário em relação aos bovinos sem abscessos. A maioria dos abscessos corresponde a lesões ocultas que regridem para uma cicatriz estéril. As sequelas inconvenientes incluem
peritonite após ruptura do abscesso no interior da cavidade peritoneal e morte súbita decorrente de uma reação anafilática ou tóxica quando ocorre uma ruptura de um abscesso no interior dos vasos sanguíneos hepáticos. A ruptura nas veias
hepáticas também pode levar a tromboflebite da veia cava caudal com doença tromboembólica, endocardite, tromboembolia pulmonar, abscessos pulmonares múltiplos e pneumonia supurativa crônica. Os aneurismas da artéria pulmonar
consequentes  ao  tromboembolia  pulmonar  podem  se  romper  no  interior  de  vias  respiratórias,  resultando  em  hemoptise,  epistaxe  e  morte.  A  trombose  da  veia  cava  caudal  também  pode  levar  à  hipertensão  portal  com  uma  síndrome
caracterizada por hepatomegalia, ascite e diarreia.
As lesões ruminais caracterizam­se por reação inflamatória acentuada e necrose. Ocasionalmente, encontram­se abscessos nas camadas mais profundas da parede ruminal. As lesões de necrobacilose hepática de < 6 dias de duração são
amarelo­pálidas  e  esféricas,  com  contornos  irregulares.  Caracterizam­se  por  necrose  de  coagulação  dos  hepatócitos  com  uma  zona  de  hiperemia  e  inflamação  intensa  circundantes.  Os  abscessos  mais  velhos  possuem  um  núcleo  que  é
progressivamente encapsulado por tecido conjuntivo fibroso. Os abscessos têm geralmente 4 a 6 cm de diâmetro. Os fígados acometidos geralmente apresentam de 3 a 10 abscessos, mas podem ter até 100 deles.
Há  relato  de  taxa  de  condenação  do  fígado  tão  alta  quanto  40%,  em  uma  ampla  pesquisa  com  bovinos  abatidos  nos  EUA.  Raramente  se  realiza  cultura  para  confirmar  o  diagnóstico.  Ocasionalmente,  os  abscessos  hepáticos  por  F.
necrophorum devem ser distinguidos daqueles resultantes de reticuloperitonite traumática (p. 291).
TRATAMENTO E CONTROLE:  Fosfato de tilosina fornecido na dose de 10 g/tonelada de alimento reduz significativamente o número de abscessos hepáticos e aumenta a eficiência alimentar e o ganho de peso, mas tem, se muito, pequeno
efeito na prevalência de lesões ruminais. Virginiamicina fornecida na dose de 16 g/tonelada de alimento ou fornecimento contínuo de clortetraciclina na dose de 70 mg/animal/dia, durante o período de terminação, também são utilizadas.
Em bovinos de leite, pode­se tentar drenagem percutânea e terapia por longo tempo com penicilina G procaína (22.000 UI/kg), mas o prognóstico é ruim. Uma vacina composta de leucotoxoide de F. necrophorum, combinado com uma
bacterina de A. pyogenes, administrada quando os bovinos são transferidos ao confinamento, reduz a prevalência e a gravidade dos abscessos.
A principal medida profilática é o controle da acidose ruminal por meio da alimentação, composição da dieta, manejo alimentar adequado e uso de tampões na dieta. Desenvolvem­se bem menos lesões ruminais quando a proporção de
concentrado  em  relação  ao  volumoso  diminui  e  quando  o  período  de  transição  de  volumoso  para  uma  ração  de  terminação  se  prolonga.  O  aumento  no  volumoso  na  ração  e  as  alimentações  diárias  múltiplas  aumentam  o  período  de
mastigação e o fluxo salivar; isso aumenta o tampão ruminal e propicia fermentação contínua e uniforme que reduz a acidez intrarruminal, que, por sua vez, abaixa o número de lesões ruminais e indiretamente o número de abscessos
hepáticos.

 COLELITÍASE, COLEDOCOLITÍASE E HEPATOLITÍASE
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  A colelitíase nos equinos pode causar obstrução biliar e hepatopatia concomitante ou pode ser um achado acidental na necropsia. Afeta mais comumente equinos de meia­idade (6 a 15 anos), sem predileção
sexual ou racial. Cálculos solitários ou múltiplos podem estar presentes no ducto biliar comum (coledocolitíase), nos ductos biliares intra­hepáticos (hepatolitíase) ou no ducto biliar ou na vesícula biliar, nos ruminantes (colelitíase). Em
grandes animais, a coledocolitíase é a causa mais comum de obstrução biliar, sendo os equinos mais frequentemente acometidos. Não se conhece a causa de formação dos cálculos biliares em equinos. Tem­se proposto infecção no trato
biliar ascendente (colangioepatite), infecção bacteriana intestinal resultando em estase biliar e alterações na composição biliar ou concentração de colesterol. Os cálculos biliares formados ao redor de um corpo estranho ou parasitos podem
ocluir o ducto biliar comum. Colelitíase e hepatolitíase, notadamente, não são reconhecidas como um problema clínico em ovinos e caprinos. A incidência em camelídeos é desconhecida.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos comumente observados nos equinos com cálculos biliares ou colangioepatite incluem perda de peso, dor abdominal, icterícia, depressão e febre intermitente. Sinais de insuficiência hepática, inclusive
encefalopatia,  fotossensibilidade  e  coagulopatias  ocorrem  em  menor  frequência.  Os  sinais  clínicos  são,  muitas  vezes,  intermitentes.  Obstrução  completa  do  ducto  biliar  comum  é  acompanhada  de  dor  abdominal  persistente.  As
anormalidades laboratoriais incluem hiperbilirrubinemia com aumento na bilirrubina direta (conjugada), aumento acentuado na atividade sérica de GGT e aumento na concentração sérica de ácidos biliares totais. As atividades de SDH e
AST aumentam, mas em menor grau. As concentrações séricas de BUN, glicose e potássio podem diminuir. Os testes metabólicos indicam redução na função hepática. Tempo de tromboplastina parcial ativada e tempo de protrombina de
em  um estágio podem  ficar  prolongados.  Ocorrem,  muitas  vezes,  leucocitose, anemia por doença crônica, hiperproteinemia, hiperglobulinemia e hiperfibrinogenemia, devido à inflamação. As alterações histológicas englobam fibroses
periporta e intralobular, moderadas dilatação e proliferação do ducto biliar e colestase. A cultura hepática pode revelar uma infecção bacteriana.
Lesões: À necropsia, o fígado pode estar aumentado ou reduzido quanto ao volume. O fígado fica vermelho a marrom­esverdeado e mais firme que o normal. Os ductos hepáticos e o ducto biliar comum ficam dilatados e podem conter um
ou mais cálculos.
DIAGNÓSTICO:  Colelitíase deve ser considerada em equinos com histórico de febre, icterícia e dor abdominal recidivante. Outros sinais de insuficiência hepática (encefalopatia, fotodermatite, perda de peso) são menos consistentemente
observados na colelitíase. Um aumento marcante em GGT sérica com hiperbilirrubinemia (bilirrubina direta > 25%) é esperado. Elevações em SDH, AST e fosfatase alcalina também estão presentes, com frequência. Nota­se leucocitose
neutrofílica e elevação inconsistente das concentrações de globulina e de fibrinogênio. O exame ultrassonográfico pode revelar hepatomegalia com aumento na ecogenicidade do fígado, ductos biliares distendidos e espessos e regiões
hiperecoicas sugestivas de cálculos biliares. Estes, nos equinos, são mais visualizados na porção cranioventral do lobo hepático direito, especialmente do 6o ao 8o espaços intercostais. Os cálculos biliares podem ser hiperecoicos, projetando
uma sombra acústica ou sonolucentes. Os cálculos podem ser observados como cálculos discretos ou depósitos de sedimentos menos discretos, dentro do trato biliar. Os ductos biliares distendidos podem aparecer como canais dilatados
adjacentes à veia porta. Devido ao grande campo pulmonar dos equinos, os cálculos biliares podem não ser encontrados em um exame ultrassonográfico.
TRATAMENTO:  Embora a obstrução biliar, nos equinos, muitas vezes seja fatal, a coledocolitotripsia e a coledocolitotomia são realizadas com sucesso. O prognóstico, nos casos que exigem coledocolitotomia, depende da gravidade da
colangioepatite concomitante e do tamanho do animal. O procedimento é difícil, em virtude da exposição limitada e da má visibilidade do ducto hepático comum. As complicações incluem contaminação biliar, peritonite biliar, deiscência,
estenose do ducto biliar, recidiva dos cálculos biliares e enterite (p. ex., induzida por estresse ou salmonelose). O prognóstico é melhor se a obstrução é corrigida por coledocolitotripsia.
Quando cálculos pequenos ou depósitos de sedimentos menos distintos estão presentes, a resolução clínica pode ser bem­sucedida. Adicionalmente, a dissolução de cálculos de bilirrubina, que são comuns nos equinos, pode ser facilitada
pela administração simultânea de dimetil sulfóxido IV (solução < 20%, na dose de 0,5 a 1 mg/kg). O dimetil sulfóxido deve ser utilizado criteriosamente ou evitado em animais com coagulopatia ou sinais de hemólise. Agentes anti­
inflamatórios  são  administrados  para  reduzirem  a  inflamação  e  promoverem  analgesia.  Como  a  colangioepatite  está,  muitas  vezes,  presente,  a  terapia  antimicrobiana  de  amplo  espectro  é  indicada.  A  escolha  do  antibiótico  é  melhor
sustentada por cultura e antibiograma de bactérias colhidas por biopsia hepática, aspirado do ducto biliar ou do cálculo biliar. Cuidados de suporte são necessários para orientar medidas no acompanhamento da insuficiência hepática.

 HEPATITE AGUDA
Etiologias infecciosas, tóxicas e indefinidas podem causar hepatite aguda. Os sinais clínicos podem aparecer subitamente nos equinos apresentando letargia, anorexia e icterícia. Fotossensibilização, diarreia e anormalidades na coagulação
também  podem  ser  observadas.  Os  sinais  neurológicos  resultantes  de  encefalopatia  hepática  e/ou  hipoglicemia  podem  ser  mais  graves  nos  animais  com  hepatopatia  fulminante  aguda.  Sinais  de  endotoxemia  podem  estar  presentes,
dependendo da etiologia primária e da capacidade das células de Kupffer em remover endotoxinas da circulação sistêmica. Elevações nas atividades séricas de SDH e AST indicam uma lesão hepatocelular aguda. A GGT aumenta na
colestase secundária ao edema de hepatócitos. A colestase resulta em hiperbilirrubinemia, com a fração direta (conjugada) variando de 15 a 35% do total nos equinos. Aumento da concentração sérica de ácidos biliares totais, diminuição das
concentrações de glicose e de BUN e tempo de coagulação prolongado tornam­se evidentes à medida que a função hepática se agrava progressivamente. Anorexia pode levar à hipopotassemia. Os resultados do hemograma é variável, pois
pode refletir resposta inflamatória com neutrofilia ou endotoxemia com neutropenia, aumento de neutrófilos bastonetes e alterações tóxicas.

Doença Hepática Aguda Idiopática (Doença de Theiler, Hepatite sérica, Hepatite pós­vacinal)
A doença hepática aguda idiopática (DHAI) é a causa mais comum de hepatite aguda em equinos. É, principalmente, uma doença de equinos adultos.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  Frequentemente, equinos com DHAI exibem sinais clínicos de insuficiência hepática 4 a 10 semanas após receberem um produto biológico de origem equina, como a antitoxina tetânica (ATT). Em alguns
casos, o equino afetado pode não ter recebido a ATT, mas esteve em contato com outro equino que a recebeu. Declaradamente, DHAI pode ocorrer como uma complicação potencial da administração de qualquer produto de plasma ou soro
equino, inclusive de plasma equino comercial. Outros equinos acometidos não apresentam histórico anterior de exposição a tal produto. DHAI subclínica pode­se desenvolver após administração de ATT. Mais comumente, apenas um
equino da propriedade está acometido, embora possam ocorrer surtos ou outros equinos no haras possam apresentar evidências de hepatopatia (aumento das atividades enzimáticas), sem sinais clínicos. A ocorrência da doença em grupos de
equinos adultos, durante o final do verão ou no início do outono (agosto a novembro), sugere uma etiologia infecciosa (viral) ou espalhada por vetores, apesar de faltarem evidências. A ocorrência sazonal poderia refletir o fato de várias
éguas parturientes receberem ATT na primavera do mesmo ano, junto com seus potros recém­nascidos. Éguas lactantes que recebem ATT ao parto parecem ser mais suscetíveis. Também já se propôs uma reação de hipersensibilidade tipo
III (mediada por imunocomplexos).
ACHADOS CLÍNICOS:  O início dos sinais clínicos é agudo. A taxa de mortalidade da doença aguda pode ser 50 a 60%, podendo chegar a 88%. Os equinos com DHAI apresentam­se tipicamente com anorexia, encefalopatia hepática e
icterícia. Os sinais clínicos de SNC são diversos, variando de letargia à agressão ou comportamento maníaco, cegueira central e ataxia. fotossensibilidade e urina corada por alta concentração de bilirrubina. Há febre em cerca de 50% dos
casos. Perda de peso (incomum), edema ventral, pulsos jugulares, íleo adinâmico e desconforto respiratório agudo foram observados em alguns equinos com DHAI. Esses achados sugerem há uma fase subclínica antes do desenvolvimento
da insuficiência hepática evidente. Hemólise intravascular com hemoglobinúria pode ser relatada em alguns casos terminais. Muitos casos são esporádicos, mas são reportados surtos envolvendo muitos animais. O reconhecimento da DHAI
em um animal sugere uma observação cuidadosa dos equinos da mesma propriedade, quanto a sinais clínicos ou bioquímicos séricos de hepatopatia.
As concentrações séricas de GGT, AST e SDH aumentam. A GGT encontra­se frequentemente aumentada durante os primeiros dias de doença, apesar da melhora clínica e de eventual recuperação de um equino acometido. Animais com
valores de AST > 4.000 UI/l possuem pobre prognóstico. A AST diminui dentro de 3 a 5 dias nos equinos que melhoram e a SDH diminui ainda mais rapidamente. A concentração sérica de bilirrubina total costuma ficar mais alta nos
equinos com DHAI do que naqueles com anorexia. A hiperbilirrubinemia é comum, com a forma não conjugada correspondendo a > 70% do total. Concentrações séricas de ácidos biliares totais também estarão aumentadas. Acidose
moderada a grave, hipopotassemia, policitemia, aminoácidos aromáticos plasmáticos aumentados, e hiperamonemia podem estar presentes.
Lesões: Na necropsia, há icterícia e graus variáveis de ascite. O fígado geralmente apresenta tamanho reduzido a normal, mas pode estar aumentado (casos hiperagudos), com uma superfície com aspecto de noz­moscada e corada com bile.
Histologicamente, há necrose hepatocelular acentuada da zona centrolobular à zona média e infiltrado mononuclear discreta a moderado. Proliferação discreta a moderada de ductos biliares podem ser observados em alguns animais com
uma doença mais crônica.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  baseia­se  na  anamnese,  início  abrupto  dos  sinais  clínicos  e  alterações  laboratoriais  sugestivas  de  insuficiência  hepática.  Em  alguns  casos,  o  fígado  fica  reduzido  e  difícil  de  ser  visualizado  no  exame
ultrassonográfico. Só se pode fazer um diagnóstico definitivo por biopsia hepática. Os diagnósticos diferenciais incluem intoxicação aguda por pirrolizidina, hepatotoxinas, hepatite infecciosa aguda, micotoxicose aguda, doença cerebral e
doença hemolítica.
TRATAMENTO  E  PROGNÓSTICO:   Não  há  terapia  específica  para  DHAI.  A  terapia  de  suporte  (fluidos  cristaloides  IV  com  adição  de  glicose  e  potássio)  e  o  tratamento  da  encefalopatia  hepática  podem  ser  bem­sucedidos.  Situações
estressantes tais como transporte do animal ou desmame do potro podem exacerbar os sinais clínicos de encefalopatia hepática e devem ser evitadas. Só se deve utilizar sedação para controlar o comportamento, para evitar uma lesão no
animal e permitir os procedimentos terapêuticos.
A recuperação depende do grau de necrose hepatocelular. Os equinos acometidos que permanecem estáveis por 3 a 5 dias e que continuam a se alimentar frequentemente se recuperam. Diminuições na SDH e no tempo de protrombina,
junto  com  melhora  do  apetite,  são  os  melhores  indicadores  prognósticos  positivos  de  recuperação.  Animais  com  progressão  rápida  dos  sinais  clínicos,  encefalopatia  incontrolável  ou  hemólise  possuem  pobre  prognóstico.  No  caso  dos
equinos comprometidos que se recuperam, o prognóstico a longo prazo é excelente. Em alguns animais, perda de peso progressiva e morte podem ocorrer durante os meses após os primeiros sinais clínicos.
PREVENÇÃO:  O uso de ATT não deixa de ter riscos. A administração rotineira de ATT em éguas parturientes é fortemente desestimulada. O uso da ATT deve ser restrito a situações que necessitam profilaxia para tétano e nas quais esteja
ausente ou se desconheça um histórico de imunização ativa com toxoide tetânico.

Necrose Hepática Aguda em Bovinos
EPIDEMIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Doença e insuficiência hepáticas agudas em bovinos resultam, mais comumente, de lesão tóxica. Necrose hepatocelular com evidências clínicas e laboratoriais de insuficiência hepática pode se desenvolver
nos bovinos após mastite ou metrite, com sinais clínicos de endotoxemia. A endotoxina induz à necrose hepatocelular por efeitos diretos ou indiretos no fígado. A endotoxina pode fazer com que as células de Kupffer liberem enzimas
lisossomais, prostaglandinas e colagenase que danificam os hepatócitos, ou pode interagir diretamente com os hepatócitos, causando lesões lisossomais, diminuição na função mitocondrial e necrose. A necrose hepatocelular relacionada
com endotoxinas pode ocorrer, em parte, à diminuição no fluxo sanguíneo hepático e hipoxia hepática.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sinais clínicos incluem perda de peso, anorexia e interrupção da produção de leite. Fotossensibilização e icterícia discreta são variáveis. As concentrações séricas de SDH, GGT e AST estão discreta a
gravemente aumentadas. Lipidose hepática ou cetose não são característicos. O fígado pode permanecer com tamanho normal ou aumentar levemente. Histologicamente, ocorre uma alteração hidrópica acentuada, junto com graus variáveis
de necrose hepática.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico baseia­se no histórico de sinais relacionados com o fígado, que se desenvolvem simultaneamente ou após uma doença primária e endotoxemia. Os aumentos nas enzimas hepáticas e biliares e a ausência de
cetose  sustentam  o  diagnóstico.  O  diagnóstico  definitivo  baseia­se  na  biopsia  hepática  e  no  descarte  de  outras  causas  infecciosas,  tóxicas  e  inflamatórias  de  disfunção  hepática.  Os  diagnósticos  diferenciais  incluem  outras  causas  de
hepatopatia subaguda ou crônica (p. ex., hepatotoxinas, lipidose hepática) e afecções que causam perda de peso e hipofagia.
TRATAMENTO:  O fornecimento de suporte nutricional e de fluidos, muitas vezes são procedimentos bem­sucedidos em vacas com necrose hepática aguda secundária a lesões transitórias. Recomenda­se alimentação forçada com farelo de
alfafa (15% de proteínas) e grãos de cervejaria ou polpa de beterraba secos com cloreto de potássio e fluido ruminal normal. Também são necessários fluidos poliônicos IV, com dextrose a 5%, cloreto de potássio e vitaminas do complexo
B. O controle da endotoxemia e o tratamento da afecção patológica primária tornam­se essenciais.

 HEPATITE INFECCIOSA E ABSCESSOS HEPÁTICOS

Abscessos Hepáticos
Os abscessos hepáticos são causados, geralmente, por infecções polimicrobianas; anaeróbios são comuns. O principal agente etiológico dos abscessos hepáticos nos bovinos é Fusobacterium necrophorum.  Nos  caprinos,  a  maioria  dos
abscessos se deve ao Corynebacterium pseudotuberculosis, Arcanobacterium pyogenes e Escherichia coli. Os microrganismos isolados em menor frequência incluem Proteus sp, Mannheimia haemolytica, Staphylococcus epidermidis, S.
aureus,  Rhodococcus  equi,  Erysipelothrix  rhusiopathiae  e  a  levedura  Candida  krusei.  Nos  equinos,  os  abscessos  hepáticos  muitas  vezes  contêm  Streptococcus  spp  (S.  equi  equi,  S.  equi  zooepidemicus),  C.  pseudotuberculosis  ou
enterobactérias após colangioepatite ascendente ou enteropatia, e anaeróbios. Nos suínos, os abscessos hepáticos desenvolvem­se após migração de ascarídeos para o interior dos ductos biliares.
O fígado é particularmente suscetível à formação de abscessos, pois recebe sangue da artéria hepática, do sistema portal e da veia umbilical no feto e no recém­nascido. Os abscessos hepáticos são mais prevalentes nos ruminantes e
incomuns nos equinos. Os abscessos estão associados à ruminite (complexo ruminite­abscesso hepático), bacteriemia, trombose séptica da veia porta, migração parasitária ou uma extensão de doença intestinal. Também pode ocorrer como
uma sequela de cirurgia abdominal. Nos neonatos e nos animais jovens, os abscessos podem se desenvolver secundariamente à migração de ascarídeos, sepse bacteriana ou infecção ascendente da veia umbilical. Nos equinos e nos bovinos,
os sinais podem ser semelhantes aos observados em casos de abscessos abdominais e incluem cólica e febre intermitentes e perda de peso. Muitas vezes, os abscessos hepáticos são subclínicos nos bovinos. O prognóstico é, geralmente,
pobre pela falta de resposta à terapia antimicrobiana ou resolução incompleta. (Ver p. 252).

Colangioepatite
Colangioepatite  é  uma  inflamação  grave  dos  ductos  biliares  e  do  tecido  hepático  adjacente  que  esporadicamente  causa  insuficiência  hepática  em  equinos  e  ruminantes.  Ocasionalmente,  ocorre  secundariamente  a  colelitíase,  duodenite,
obstrução intestinal, neoplasia, parasitismo e certas toxinas em equinos. A micotoxina esporodesmina, produzida por Pithomyces chartarum, pode causar colangioepatite em ovinos e bovinos.
ETIOLOGIA:  Bacteremia devido a um organismo (p. ex., Salmonella spp) eliminado na bile, uma infecção ascendente no trato biliar após um distúrbio intestinal ou íleo adinâmico, relacionam­se com o desenvolvimento de colangioepatite.
Nos potros, a úlcera duodenal e a duodenite podem resultar em estase biliar, obstrução no ducto hepático e colangioepatite. A migração de parasitos pelo fígado pode predispor à colangioepatite em alguns animais. Microrganismos Gram­
negativos, inclusive Salmonella spp, Escherichia coli, Pseudomonas spp e Actinobacillus equuli, são frequentemente isolados no fígado. Clostridium spp, Pasteurella spp e Streptococcus spp são recuperados com menor frequência.
ACHADOS CLÍNICOS:  Dependendo da gravidade da infecção e virulência do microrganismo, os sinais clínicos podem ser agudos com toxemia grave, subagudos ou crônicos. Tipicamente, a colangioepatite é uma doença subaguda ou crônica
que ocorre em animais comprometidos exibindo sinais de perda de peso, anorexia, febre intermitente ou persistente ou cólica. Icterícia, fotossensibilidade e sinais de encefalopatia hepática hiperamonêmica são variáveis. As concentrações
de SDH, AST, GGT, bilirrubina conjugada e ácidos biliares totais geralmente se elevam. A contagem leucocitária periférica torna­se variável, dependendo do grau de inflamação e de endotoxemia presentes. A colangioepatite supurativa
aguda pode resultar, ocasionalmente, em sepse grave e morte.
Lesões:  Nos casos agudos, o fígado fica edemaciado, macio e pálido. Focos supurativos podem ficar visíveis abaixo da cápsula ou na superfície de corte. As lesões nos outros sistemas podem refletir sepse e icterícia. Microscopicamente, nos
casos agudos, encontram­se neutrófilos nas tríades portais e parênquima degenerado. Exsudato purulento torna­se evidente nos ductos. Na colangioepatite subaguda ou crônica, a inflamação é mais proliferativa e a proliferação dos ductos
biliares é mais marcante. Podem ficar evidentes áreas de atrofia, hiperplasia regenerativa e fibrose periporta.
DIAGNÓSTICO:  Deve­se realizar uma biopsia hepática para confirmar o diagnóstico e para se obter amostra para cultura aeróbica e anaeróbica e antibiograma. Os diagnósticos diferenciais incluem as outras causas de hepatopatias agudas a
crônicas, perda de peso, cólica ou sepse. Havendo sinais neurológicos, doenças cerebrais devem ser consideradas. Como a colangioepatite está associada, frequentemente, à colelitíase nos equinos, deve­se descartar a presença de um ou
mais cálculos.
TRATAMENTO:  O tratamento baseado nos resultados de cultura e de antibiograma muitas vezes fornece resultados favoráveis. A terapia consiste na administração, a longo prazo, de antimicrobianos (= 4 a 6 semanas), terapia de suporte com
fluidoterapia  IV  e  manejo  da  encefalopatia  hepática,  quando  presente.  Inicialmente,  os  antimicrobianos  de  amplo  espectro  efetivos  contra  organismos  gram­negativos,  gram–positivos  e  anaeróbicos  devem  ser  administrados.  Uma
combinação de penicilina com sulfa­trimetoprima ou com um aminoglicosídio ou com enrofloxacino pode ser utilizada. Ampicilina ou uma cefalosporina podem ser utilizadas no lugar da penicilina. O metronidazol pode ser utilizado em
equinos para combater as bactérias anaeróbicas. A terapia antimicrobiana pode ser alterada, dependendo dos resultados de cultura do tecido obtido via biopsia hepática. O prognóstico é bom se a fibrose não é grave, mas é pobre nos casos
de fibrose periporta grave ou fibrose septal.

Doença de Tyzzer
A doença de Tyzzer, causada por Clostridium piliforme, ocasiona hepatite necrosante aguda, miocardite e colite em potros com 8 a 42 dias de idade (ver p. 200). Há relato em dois bezerros – um macho da raça Jersey com 1 semana de idade
com enterite e hepatite necrosante aguda e outro com criptosporidiose concomitante e enterite por coronavírus. No último animal, C. piliforme foi identificado em hepatócitos e epitélio e células de músculos lisa do íleo e do ceco. Os sinais
clínicos incluem hipofagia, fraqueza generalizada, apatia e diminuição da eliminação fecal.

Hemoglobinúria Bacilar (Doença da água vermelha, Icteroemoglobinúria)
Clostridium novyi tipo D (C. haemolyticum) é o microrganismo anaeróbico que causa a hemoglobinúria bacilar nos bovinos, nos outros ruminantes e, raramente, nos equinos. Ver p. 660 quanto a achados clínicos, diagnóstico e controle.

Hepatite Necrótica Infecciosa (Doença negra)
A hepatite necrótica infecciosa, causada pelo Clostridium novyi tipo B, afeta principalmente os ovinos, mas também bovinos, equinos e suínos. Ver p. 661 quanto a achados clínicos, lesões e controle.

Rinopneumonite Equina
A  rinopneumonite  equina  causada  pelo  herpesvírus  equino  1  é  uma  causa  esporádica  de  pneumonia  intersticial,  hepatopatias  e,  habitualmente,  morte  nos  potros  recém­nascidos.  Ver  p.  1574  quanto  a  achados  clínicos,  diagnóstico  e
tratamento.

 HEPATITE CRÔNICA ATIVA
O termo hepatite crônica ativa descreve qualquer processo inflamatório progressivo no fígado. Trata­se de um diagnóstico histopatológico no qual há evidências de hepatopatia crônica, agressiva e prolongada. O diagnóstico histológico é,
geralmente, colangioepatite, pois a resposta inflamatória ocorre, principalmente, na área periporta.
ETIOLOGIA:  A exata etiologia é desconhecida. Acredita­se que se envolvam processos infecciosos, imunomediados ou tóxicos. Os estágios iniciais associam­se com inflamação dos ductos biliares e de áreas portais hepáticas. A extensão de
uma infecção bacteriana via ductos biliares ou veias portais drenantes podem ser responsáveis pelas lesões nos animais com colangioepatite supurativa. Quando os linfócitos e os plasmócitos predominam no infiltrado celular, torna­se mais
provável um processo imunomediado. Várias causas de insuficiência hepática aguda podem progredir para hepatite crônica ativa.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos predominantes são perda de peso, anorexia, depressão e letargia. Icterícia, alterações comportamentais, diarreia, fotossensibilização e hemorragia encontram­se variavelmente presentes. A febre pode
ser persistente ou intermitente, dependendo do grau da colangioepatite e da fibrose existentes. Pode ocorrer dermatite na banda coronária do casco, com descolamento cutâneo regional. Doença abdominal recente ou concomitante é, muitas
vezes,  relatada.  A  duração  dos  sinais  clínicos  varia,  estendendo­se  por  dias  a  meses.  Sinais  neurológicos  podem  aparecem  abruptamente  embora  haja  evidências  histológicas  de  doença  crônica.  A  GGT  e  a  AP  ficam  moderadamente
aumentadas,  assim  como  a  SDH  e  a  glutamato­desidrogenase,  o  que  indica  lesões  contínuos  nos  hepatócitos.  Nos  casos  de  fibrose  hepática  acentuada,  a  atividade  enzimática  pode  permanecer  normal  e  as  concentrações  de  BUN  e  de
albumina podem diminuir. A proteína total sérica pode estar aumentada ou normal. As globulinas, em geral, elevam–se. A concentração sérica de ácidos biliares totais aumenta e a depuração de BSP® fica prolongada. A colestase pode
causar hiperbilirrubinemia, com > 25% da bilirrubina total sendo a direta. Com a diminuição da função hepática, a glicemia e os fatores de coagulação diminuem e os tempos de protrombina em um estágio e de tromboplastina parcial
ativado prolongam­se. As concentrações de amônia podem estar elevadas. Pode haver uma neutrofilia ou neutropenia com desvio à esquerda se ocorrer endotoxemia. A anorexia pode levar à hipopotassemia. A ultrassonografia geralmente
revela aumento na ecogenicidade hepática, indicando fibrose hepática. O fígado pode estar menor que o normal.
Lesões:  Macroscopicamente,  o  fígado  torna­se  firme,  com  coloração  marrom­pálida  a  verde  e,  com  frequência,  pequeno.  Podem­se  observar  marcações  irregulares  na  superfície  de  corte.  As  lesões  histológicas  predominam  nas  áreas
periportais. A infiltração de células inflamatórias pode consistir, primariamente, de células mononucleares, neutrófilos com bactérias (muitas vezes coliformes) ou linfócitos e plasmócitos. O tipo do infiltrado pode indicar a natureza do
processo patológico primário. A hiperplasia biliar pode ser acentuada, na presença de colangioepatite. Há graus variados de necrose e fibrose.
DIAGNÓSTICO:  Necessita­se exame histológico de amostra obtida por biopsia hepática para o diagnóstico definitivo. O tecido também deve ser cultivado embora, em muitos casos, não se identifiquem isolados significativos.

TRATAMENTO:   Deve­se  propiciar  terapia  de  suporte,  inclusive  fluidoterapia  com  cloreto  de  potássio,  glicose  e  suplementação  vitamínica;  manejo  alimentar  (dieta  pobre  em  proteínas,  rica  em  aminoácidos  de  cadeia  ramificada  e  em
carboidratos) e prevenção de exposição ao sol, estando presente uma fotodermatite.
Corticoterapia foi utilizada com sucesso em equinos com infiltrado linfoplasmocitário na amostra de biopsia hepática. Sabidamente, os esteroides agem aumentando o apetite, estabilizam as membranas celulares e reduzem a inflamação e
formação de tecido conjuntivo. Protocolos terapêuticos diferentes, que utilizam prednisolona e dexametasona, são recomendados. Um protocolo recomendado envolve a administração inicial de 0,04 a 0,08 mg de dexametasona/kg por 4 a 7
dias, seguida de redução gradual da dose em até 2 a 3 semanas, dependendo da resposta à terapia. A prednisolona (0,5 a 1 mg/kg, VO, 1 vez/dia) pode ser necessária por 2 a 4 semanas adicionais. O risco de se induzir laminite ou aborto em
animais prenhes, com os corticosteroides, deve ser discutido com o proprietário, antes de se iniciar a terapia. Alternativamente, recomenda­se um agente antifibrótico, a colchicina (0,03 mg/kg/dia, VO), mas ainda não se comprovou sua
eficácia em insuficiência hepática e segurança em animais prenhes. As reações adversas possíveis à colchicina, nos equinos, incluem laminite, diarreia e, raramente, supressão da medula óssea afetando todas as linhagens celulares. Mal­
estar, vômitos, diarreia, dor abdominal, miopatia, alopecia e supressão de medula óssea já foram descritos em humanos e outras espécies. Outros fármacos recomendados para deter ou reduzir a fibrose são pentoxifilina (7,5 mg/kg, VO, 2
vezes/dia)  e  SAMe  (5  g,  VO,  1  vez/dia).  Nos  casos  complicados,  com  colangioepatite  séptica,  antimicrobianos  de  amplo  espectro  são  recomendados.  Idealmente,  uma  terapia  antimicrobiana  deve­se  basear  em  cultura  bacteriana  e
antibiograma da amostra coletada por biopsia.
PROGNÓSTICO:  O prognóstico é variável e melhor baseado na biopsia hepática e na resposta à terapia. O prognóstico é reservado a bom nos animais com lesões menos graves, especialmente nos animais com infiltrado celular linfocítico­
plasmocitário que respondam bem a uma terapia com corticosteroides; contudo, o prognóstico é ruim em equinos com insuficiência hepática, fibrose disseminada e perda do parênquima hepático normal.

 HEPATOTOXINAS
As hepatotoxinas induzem toxicidade por um ou mais mecanismos: necrose periacinar (centrolobular), necrose na zona média, necrose periporta, colestase, hiperplasia biliar, alteração gordurosa ou hidrópica próxima de zonas necróticas ou
obstrução venosa. Insuficiência hepática fatal pode ocorrer se a lesão inicial é aguda e grave. Mais comumente, a lesão hepática por toxinas é subaguda ou crônica. Nos processos crônicos, o resultado a longo prazo poderá ser uma cirrose.
Várias hepatotoxinas, especialmente as vegetais, exercem efeitos tóxicos em vários órgãos, particularmente nos rins, nos pulmões e no trato gastrintestinal.
O  diagnóstico  definitivo  pode  ser  difícil.  Pode  ser  necessária  anamnese  cuidadosa,  inspeção  do  ambiente,  exames  laboratoriais,  biopsia  hepática  ou  necropsia  para  determinar  o  agente  ofensor.  Em  intoxicações  agudas  por  plantas,
evidências de plantas hepatotóxicas no conteúdo gástrico ou no rúmen podem ser observadas.
Os antídotos específicos contra as hepatotoxinas são limitados. A remoção dos animais da fonte de hepatotoxinas torna­se essencial para diminuir uma exposição adicional. A administração de absorbantes (p. ex., carvão ativado) ou
laxantes (p. ex., óleo mineral e sulfato de magnésio) ou uma ruminotomia podem diminuir a absorção de elementos tóxicos nas intoxicações agudas. Essas substâncias podem não ser úteis em intoxicações crônicas (ou seja, a intoxicação
pelo alcaloide pirrolizidínico), nas quais o agente tóxico é ingerido por semanas a meses antes dos sinais da doença se tornarem evidentes. A terapia de suporte inclui a correção dos distúrbios eletrolíticos, metabólicos e de glicose via
fluidoterapia e manejo alimentar. A encefalopatia hepática deve ser controlada. Se há fotossensibilização, a luz solar deve ser evitada. Podem­se considerar antimicrobianos para evitar uma piodermite secundária. O prognóstico é reservado
e depende da hepatotoxina em particular.

Causas Químicas e Medicamentosas de Hepatopatia Tóxica
Quanto à intoxicação por alcatrão de hulha, ver p. 3118.
INTOXICAÇÃO  POR  FERRO:   Os  potros  recém–nascidos  (<  3  dias  de  idade)  são  especialmente  sensíveis  ao  ferro,  devido  às  elevadas  concentrações  séricas  de  ferro,  ao  aumento  na  capacidade  de  absorver  ferro  e  à  supersaturação  de
transferrina ao nascimento. Nos equinos adultos, o ferro injetável aumenta a concentração de ferro corporal mais substancialmente que a maioria dos suplementos orais. A intoxicação por ferro foi relatada em bezerros e touros jovens
tratados com citrato de amônio férrico, sozinho ou em combinação com gliconato ferroso.
Os potros que recebem ferro ao nascimento, especialmente antes de ingerirem o colostro, podem desenvolver intoxicação aguda com sinais clínicos de encefalopatia hepática em 2 a 5 dias, e um desfecho fatal. As concentrações séricas
de bilirrubina e de amônia se elevam e o tempo de protrombina se prolonga. As alterações nas enzimas hepáticas séricas são variáveis. Nos equinos adultos, a intoxicação aguda, embora menos comum, pode causar irritação intestinal e
colapso cardiovascular com morte súbita. Sinais de insuficiência hepática mais crônica, inclusive perda de peso, icterícia e depressão podem ser observados com administrações orais repetidas de ferro. As fontes possíveis de excesso de
ferro incluem suplementação inapropriada, forragens ricas em ferro, ferro injetável e lixiviação de ferro na água ou nos alimentos. Os bezerros intoxicados por ferro apresentam tremores, vocalização, bruxismo, cólicas e convulsões.
As  lesões  hepáticas  são  variáveis.  Muitos  fígados  tornam­se  friáveis  e  edemaciados  ou  contraídos.  O  fígado  fica  com  uma  coloração  castanho­pálida  ou  mosqueada  de  marrom–avermelhado.  Podem­se  encontrar  hemorragias  no
estômago, intestinos e bexiga.
O diagnóstico baseia­se no histórico de suplementação com ferro, nos sinais clínicos e nas lesões observadas durante a necropsia. As concentrações séricas e hepáticas de ferro podem permanecer normais ou elevadas. Nos equinos, as
concentrações normais de ferro no soro e no tecido hepático são 66 a 204 μg/dl e 100 a 300ppm, respectivamente. Como a concentração sérica de ferro tem pouca relação com o depósito de ferro total, as concentrações séricas de ferritina
são melhor utilizadas como estimativa do ferro total.
O tratamento é, geralmente, de suporte, com suplementações hídrica e nutricional. É improvável que uma terapia queladora com deferoxamina obtenha sucesso, tanto na intoxicação aguda por ferro como na hemocromatose crônica.
Flebotomias repetidas foram tentadas em casos de hemocromatose. O prognóstico é pobre.
INTOXICAÇÃO POR COBRE:  A intoxicação por cobre aguda com necrose hepática grave e morte pode ser observada em bovinos 1 a 4 dias após a administração de sais de cobre. A intoxicação por cobre ocorre em ovinos e bezerros jovens,
após excessivo consumo dietético de cobre e nos cabritos jovens alimentados com sucedâneo lácteo de bezerro contendo cobre. A anormalidade primária associada à intoxicação por cobre é anemia hemolítica, bem como lesões hepáticas.
Nos camelídeos, a ingestão de concentrações inapropriadas de ferro na dieta resulta em morte aguda com poucos sinais antemorte e sem evidência de crise hemolítica (Ver p. 3116).
DIVERSOS PRODUTOS QUÍMICOS E MEDICAMENTOS ASSOCIADOS À HEPATOTOXICIDADE:  A exposição a tetracloreto de carbono, hidrocarbonetos clorados, hexacloretano, dissulfeto de carbono, arsênico, monensina, pentaclorofenóis, fenol,
paraquat, halotano (caprinos, lhamas), isoflurano, fenobarbital, ácido tânico, edetato dissódico de cobre e altas doses de ivermectina podem causar necrose centrolobular e insuficiência hepática. O fósforo causa, principalmente, alterações
periportais.  Nos  grandes  animais,  pode  surgir  hepatite  ativa  tendendo  a  cirrose  após  o  uso  de  isoniazida,  nitrofurano,  halotano,  ácido  acetilsalicílico  ou  dantroleno.  Eritromicina,  rifampicina,  esteroides  anabolizantes,  tranquilizantes
fenotiazinas, alguns diuréticos, sulfato de quinidina e diazepam estão associados à colestase e icterícia.

Intoxicação por Algas Verde­azuladas
Hepatotoxicose aguda pode ser observada após ingestão de cianobactérias hepatotóxicas. (Ver p. 3002).

Micotoxicoses
As aflatoxinas e as fumonisinas podem causar lesão e insuficiência hepáticas em ruminantes, suínos e equinos. A intoxicação por Fusarium é a micotoxicose que mais comumente ocasiona insuficiência hepática nos equinos, enquanto as
aflatoxinas só provocam, esporadicamente, insuficiência hepática nessa espécie (Ver p. 3062).

Plantas Hepatotóxicas
INTOXICAÇÃO POR ALCALOIDE PIRROLIZIDÍNICO:  A intoxicação por alcaloide pirrolizidínico é mais uma hepatopatia progressiva crônica, mas também pode ocorrer intoxicação aguda (Ver p. 3140).

INTOXICAÇÃO PELO CAPIM MACARICAM:  O capim macaricam (Panicum coloratum) pode provocar intoxicação em equinos e ruminantes. Essa intoxicação é um problema no sudoeste dos EUA, desde o final da primavera até o início do
outono. As plantas jovens em crescimento são mais perigosas, devido ao seu teor mais elevado de sapogenina, acreditando ser este o princípio tóxico. Observa­se uma síndrome semelhante nos equinos do leste dos EUA, que pastejam ou
são alimentados com fenos contendo altas concentrações de capim do gênero Panicum.
Os  sinais  clínicos  incluem  icterícia,  fotossensibilidade,  cólica  e  febre  intermitentes,  perda  de  peso  e  encefalopatia  hepática.  A  fotossensibilidade  pode  ocorrer  ao  redor  da  banda  coronária  do  casco  e  causar  claudicação.  As  lesões
compreendem fibrose hepática e portal e hiperplasia biliar. As concentrações de GGT, bilirrubina e amônia aumentam. Os ovinos com fotossensibilidade causada por ingestão de capim macaricam apresentam, comumente, um material
cristalino nos ductos e canalículos biliares e nos macrófagos.
O diagnóstico presuntivo de hepatopatia induzida por plantas baseia­se no histórico de exposição a plantas e vários animais acometidos em uma fazenda ou em uma área. Os animais acometidos devem ser removidos da fonte de capim
macaricam, alimentados com feno de boa qualidade e protegidos da luz solar. Nos casos graves, pode­se precisar de um tratamento local da fotodermatite, com cremes antimicrobianos ou hidratantes.
INTOXICAÇÃO POR TREVO HÍBRIDO:  O trevo híbrido (Trifolium hybridium) provoca duas síndromes em equinos criados nos EUA e Canadá: fotossensibilização (trifobíase) e intoxicação por trevo híbrido (“doença do fígado grande”). O
trevo híbrido cresce bem em solo argiloso e há relato de maior prevalência de intoxicação nas estações úmidas. A doença é mais observada quando se ingere o broto da planta e a forragem oferecida predominante é o trevo híbrido. O
princípio tóxico é uma fototoxina não identificada. A fotossensibilidade já foi descrita em equinos, ovinos, bovinos e suínos.
A  fotossensibilidade  pelo  trevo  também  é  conhecida  como  “envenenamento  pelo  orvalho”,  pois  ocorre,  na  maioria  das  vezes,  quando  as  pastagens  de  trevo  e  a  pele  do  equino  se  encontram  úmidos.  Caracteriza­se  por  uma  pele
avermelhada após exposição ao sol, seguida de necrose seca da pele ou edema e secreção serosa. Muitas vezes, o focinho, a língua e os pés estão acometidos. Se a estomatite é grave, nota­se anorexia e perda de peso.
A  intoxicação  por  trevo  híbrido  pode  ser  fatal,  com  perda  progressiva  da  condição  corporal  e  sinais  de  insuficiência  hepática  e  distúrbios  neurológicos.  Observam­se  cólica,  diarreia  e  outros  sinais  de  distúrbios  GI.  Os  equinos
comprometidos podem ficar acentuadamente deprimidos ou excitados. Em geral, há necessidade de exposição prolongada antes que os sinais de insuficiência hepática se tornem evidentes. As alterações no perfil bioquímico sérico incluem
aumento das atividades de GGT e AST e hiperbilirrubinemia; a bilirrubina direta, frequentemente, corresponde a = 25% da bilirrubina total.
O diagnóstico presuntivo de hepatopatia induzida por plantas baseia­se no histórico de exposição a plantas e de vários animais acometidos em uma fazenda ou área. Os equinos nos quais a fotossensibilização é o achado principal, podem
se recuperar rapidamente, após transferidos para uma pastagem livre de trevo híbrido. Os equinos com estomatite ou dermatite grave necessitam terapia suporte e tratamento local das lesões, até que cicatrizem.
LUPINOSE MICOTÓXICA:  A lupinose micotóxica é uma doença muito difundida em ovinos e bovinos que consomem tremoços contendo uma micotoxina hepatotóxica produzida pelo fungo Phomopsis leptostromiformis. Ver p. 3081 quanto
aos achados clínicos, diagnóstico e controle.
INTOXICAÇÃO POR XANTHIUM (CARDO):  Os cardos, inclusive Xanthium strumarium, podem ser encontrados em todo o mundo. A intoxicação é mais frequente após ingestão do palatável estágio de sementeira com duas folhas ou de sementes
do chão. Os carrapichos são altamente tóxicos, mas raramente ingeridos. A planta adulta é menos tóxica e não palatável. O princípio tóxico é a carboxiatractilosida, que afeta diretamente o fígado.
Horas após a ingestão da toxina, suínos, bovinos e equinos desenvolvem sinais de depressão, náuseas, fraqueza, ataxia e temperatura abaixo do normal. Podem ocorrer espasmos nos músculos cervical, vômitos, dispneia e convulsões.
Pode ocorrer morte dentro de horas do início dos sinais. Os animais que sobrevivem ao envenenamento agudo inicial frequentemente desenvolvem hepatopatia crônica.
Os animais intoxicados requerem terapia de suporte intensiva. Podem ser administrados, por via VO, óleo mineral ou carvão ativado para retardar a absorção do princípio tóxico. Também se recomenda fisostigmina (5 a 30 mg IM).
HEPATOTOXICOSE CAUSADA POR DIVERSAS PLANTAS:  As hepatotoxinas são encontradas em várias plantas, inclusive Nolina texana, Agave lecheguilla, Phyllanthus abnormis e Lantana camara. (Ver plantas de pastagem da América do
Norte temperada, p. 3162).

 HIPERLIPEMIA E LIPIDOSE HEPÁTICA
EPIDEMIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A baixa qualidade dos alimentos ou a diminuição no consumo alimentar, particularmente durante um período de alta demanda energética (p. ex., prenhez e doença sistêmica), pode resultar em síndrome
hiperlipêmica. A hiperlipemia é mais comum em pôneis, equinos miniatura e asininos e menos frequente nos equinos adultos de tamanho padrão. A patogênese da hiperlipidemia é complexa, com o balanço energético negativo disparando
uma mobilização excessiva de ácidos graxos do tecido adiposo, acarretando aumento na síntese hepática de triglicerídios e na secreção de lipoproteínas de densidade muito baixa, hipertrigliceridemia concomitante e infiltração de gordura
no fígado. A etiologia bioquímica da hiperlipidemia baseia­se na superprodução de triglicerídios, em vez de falha no catabolismo dos triglicerídios.
O  início  da  doença  está  associado  a  estresse,  diminuição  no  consumo  alimentar,  mobilização  e  deposição  de  gordura  no  fígado  e  superprodução  de  triglicerídios,  que  pode  ser  precipitada  por  resistência  à  insulina.  Nos  pôneis,  a
hiperlipemia geralmente é um processo patológico primário associado à obesidade, prenhez, lactação, estresse ou transporte. A hiperlipemia pode ocorrer secundariamente a qualquer doença sistêmica que resulte em anorexia e balanço
energético negativo. A hiperlipemia secundária é mais comum que a primária, nas raças miniatura. A hiperlipemia secundária a uma doença sistêmica pode ser observada em equinos de qualquer idade e em qualquer condição. As mulas
estressadas e obesas encontram­se em maior risco de desenvolvimento de hiperlipemia, independentemente do estado de prenhez. A hiperlipemia é observada mais no inverno e na primavera.
Alpacas e lhamas podem desenvolver hiperlipemia e cetonúria nos estágios finais da gestação ou secundariamente a processos patológicos. Os camelídeos adultos e mesmo as crias jovens são suscetíveis à lipidose hepática durante
estados de doença.
Esteatose hepática é uma doença metabólica complexa constatada principalmente em vacas leiteiras. Há ampla discussão do assunto em outra parte deste livro (ver p. 1090).
Nos caprinos, a lipidose hepática foi associada à deficiência de cobalto. As lesões histológicas são compatíveis com aquelas características de doença do fígado branco dos ovinos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos são inespecíficos, variados e podem não indicar perda da função hepática. Incluem letargia, fraqueza, inapetência, diminuição no consumo hídrico e diarreia. Muitas vezes há histórico de anorexia
prolongada, perda de peso rápida e obesidade anterior. Emaciação, edema ventral, cólica e tremores podem ser observados. Os exames bioquímicos séricos e os testes de coagulação nos equinos miniatura e nos pôneis com hiperlipemia
indicam  que  o  prejuízo  na  função  hepática  é  comum.  Os  animais  acometidos  apresentam  o  sangue  grosseiramente  leitoso  e  plasma  lipêmico.  As  concentrações  sanguíneas  de  todos  os  lipídios  estão  aumentadas,  especialmente  os
triglicerídios, ácidos graxos não esterificados e lipoproteínas de densidade muito baixa. Os asininos apresentam concentrações plasmáticas de triglicerídios mais altas que os outros equídeos. A hipoglicemia é um achado comum nos pôneis,
mas não nos equinos miniatura com hiperlipemia. A concentração de ácidos biliares totais e a depuração de BSP® frequentemente permanecem normais, mas a depuração de BSP® pode ficar prolongada em alguns animais. O tempo de
tromboplastina parcial ativada e o tempo de protrombina em um estágio podem estar prolongados. AST e SDH podem permanecer normais ou ficarem aumentadas. Aumento na creatinina, isostenúria e acidose metabólica podem ocorrer
secundariamente a uma doença renal. Os valores de BUN e de creatinina tornam­se variáveis. A anorexia pode levar à hipopotassemia. Os animais podem ficar neutropênicos, com aumento de neutrófilos bastonetes. Há relato de pancreatite
concomitante.
O aumento prolongado nas concentrações séricas de triglicerídios está associada ao acúmulo de lipídios no fígado, nos rins, no miocárdio e na músculos esquelética, prejudicando a função desses órgãos. O fígado e os rins tornam­se
friáveis e morte pode resultar de uma ruptura hepática aguda.
Alpacas  e  lhamas  podem  desenvolver  hiperlipemia  e  cetonúria  nos  estágios  finais  de  gestação  ou  secundárias  a  estados  patológicos.  Os  sinais  clínicos  inespecíficos  incluem  letargia,  anorexia  e  decúbito.  Hipertrigliceridemia,
hipercolesterolemia, aumento na atividade de SDH, acidose metabólica, azotemia e cetonúria podem ser observados. Pode­se desenvolver insuficiência renal secundária. Os camelídeos parecem ser semelhantes aos equinos (hiperlipemia) e
aos bovinos (cetose), em sua resposta a um desequilíbrio energético grave no final da gestação. Lipidose hepática é a doença hepática mais comum encontrada em lhamas e alpacas. Camelídeos de várias idades e necessidades energéticas
são  suscetíveis,  e  a  patogênese  é  multifatorial.  Achados  clínicos  comuns  incluem  anorexia,  perda  de  peso,  altas  concentrações  de  ácidos  biliares,  ácidos  graxos  não  esterificados,  e  β­hidroxibutirato,  aumento  de  GGT  e  AST  e
hipoproteinemia.
Lesões: O fígado e os rins se apresentam, muitas vezes, pálidos, edemaciados e friáveis, com textura gordurosa. Microscopicamente, ocorrem graus variados de deposição gordurosa dentro dos hepatócitos e do epitélio dos ductos biliares. Os
sinusoides hepáticos podem parecer comprimidos e anêmicos, com grave infiltração gordurosa. As lesões macro e microscópicas do processo patológico primário podem predominar nos pôneis e nos equinos.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  clínico  baseia–se,  muitas  vezes,  na  anamnese,  nos  sinais  clínicos  e  na  observação  macroscópica  de  uma  coloração  branca  a  amarelada  do  plasma,  em  equídeos.  Concentração  plasmática  ou  sérica  de
triglicerídios > 500 mg/dl confirma o diagnóstico. O colesterol também pode estar elevado, indicando aumento de lipoproteínas. Ácidos graxos não esterificados, lipoproteínas de densidade muito baixa e β­hidroxibutirato também podem
estar elevados. As evidências laboratoriais de disfunção hepática sustentam o diagnóstico.
TRATAMENTO:  Correção da doença primária, fluidoterapia IV e suporte nutricional são fundamentais no tratamento de hiperlipemia. O suporte nutricional reverte o equilíbrio energético negativo, aumenta a concentração sérica de glicose,
promove  a  liberação  de  insulina  endógena  e  inibe  a  mobilização  do  tecido  adiposo  periférico.  Solução  eletrolítica  poliônica  contendo  glicose  suplementar  (50  g/h/450  kg)  e  potássio  (20  a  40  mEq  de  cloreto  de  potássio/l)  deve  ser
administrada, por via intravenosa, aos animais hipoglicêmicos e hipopotassêmicos. A administração de glicose pode causar hiperglicemia refratária nos animais com resistência à insulina. As concentrações de glicose, a função renal, débito
urinário e as concentrações séricas eletrolíticas devem ser monitorados rigorosamente. Fluidoterapia IV e glicose devem ser administradas, cuidadosamente, em camelídeos com lipidose hepática, pois muitos já apresentam hipoproteinemia
e a regulação de glicose em camelídeos, muitas vezes, é desafiadora. Administração em bolus de fluidos IV em vez de infusão contínua pode ser mais efetiva para manutenção da hidratação sem exacerbar a hipoproteinemia existente.
Prefere­se dieta enteral  voluntária  se  o animal  consume  quantidade  adequada de alimentos nutricionalmente adequados; no entanto, muitos não o fazem. Preferem­se refeições frequentes, com dieta rica em carboidratos e pobre em
gorduras. Nos animais com um consumo inadequado, torna­se necessária a alimentação suplementar por sonda. As formulações enterais ricas em calorias, no mercado disponíveis, proporcionam um adequado suporte nutricional a curto
prazo. Também se encontram disponíveis receitas caseiras com líquidos para alimentação por sonda em equinos. Alimentações frequentes e em pequenas quantidades não necessárias para preencher as exigências calóricas sem sobrecarga
do trato gastrintestinal. Os animais devem ser observados após cada alimentação quanto a sinais de desconforto abdominal. Peso corporal, consumo hídrico total e consistência fecal devem ser monitorados, diariamente. Nos animais que
sobrevivem, a hiperlipemia geralmente se resolve em 5 a 10 dias, mas a alimentação enteral deve continuar até que o consumo alimentar voluntário seja adequado. A suplementação nutricional enteral e o tratamento da doença primária,
muitas vezes é bem­sucedida na reversão da hiperlipemia em equinos miniatura e asininos, mas não nos pôneis.
Hiperlipemia, equino. Plasma lipêmico (direita). Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Para  os  equinos  totalmente  anoréticos,  pode­se  utilizar  dieta  parenteral.  Deve­se  preterir  a  porção  lipídica  da  solução.  A  glicemia  deve  ser  monitorada  2  vezes/dia,  para  se  assegurar  que  a  euglicemia  seja  mantida  e  se  evitar  uma
hiperglicemia substancial (= mg/dl).
Em  camelídeos,  a  dieta  parenteral  parcial  com  suplementação  enteral  pode  ser  utilizada  para  manutenção  de  ingestão  energética  adequada  e  minimizar  a  mobilização  adicional  de  gordura.  Devido  ao  diferente  metabolismo  dos
camelídeos, os produtos da dieta parenteral devem conter quantidades de aminoácidos (relativos a calorias não proteicas) mais altas que as formulações tradicionais utilizadas em outras espécies. As concentrações de glicose devem ser
cuidadosamente monitoradas, como nos animais que não assimilam de maneira satisfatória a glicose exógena.
Recomenda­se administração de insulina exógena para o tratamento de hiperglicemia e hiperlipemia iatrogênicas. A insulina diminui a mobilização do tecido adiposo periférico por estimulação da atividade da lipoproteína lipase e pela
inibição da atividade da lipase hormônio­sensível dos adipócitos. Ainda não se estabeleceu bem a dose apropriada de insulina a ser utilizada nos equinos. Quando se utiliza insulina, deve­se monitorar, com rigor, a resposta à terapia e ajustar
a dose de insulina de acordo com a necessidade. A administração de insulina pode falhar em abaixar os triglicerídios séricos ou as concentrações de glicose nos animais hiperlipêmicos, na presença de um estado resistente à insulina. A
insulinoterapia não está bem documentada em camelídeos, mas foi efetiva no tratamento de lhamas com lipidose hepática.
A  heparina  é  utilizada  no  tratamento  de  hiperlipemia,  porque  promove  a  utilização  periférica  de  triglicerídios  e  potencializa  a  lipogênese  por  intermédio  da  estimulação  da  atividade  da  lipoproteína  lipase.  A  heparina  pode  ser
administrada por via intravenosa ou SC, com dosagens recomendadas de 40 a 100 UI/kg, 2 vezes/dia. O uso da heparina é questionável em animais comprometidos com aumento na produção hepática de triglicerídios e nenhum prejuízo na
sua remoção periférica. A administração de heparina pode potencializar as complicações hemorrágicas e é contraindicada para animais com coagulopatias decorrentes de disfunção hepática.
Indica­se suplementação nutricional para evitar hiperlipemia nos equinos miniaturas e asininos, pôneis, equinos e camelídeos com doença sistêmica associada à hipofagia e altas demandas metabólicas.
PROGNÓSTICO:   Os  parâmetros  bioquímicos  clínicos  não  são  indicadores  prognósticos  úteis  de  sobrevivência  em  pôneis  com  hiperlipemia.  A  morte  decorrente  de  hiperlipemia  é  rara  em  raças  miniaturas.  Na  maioria  dos  casos,  a
sobrevivência depende da capacidade de se tratar a doença primária de forma bem sucedida. O prognóstico é, muitas vezes, pobre para pôneis, equinos de tamanho padrão e camelídeos.

 NEOPLASIA HEPÁTICA
Os  tumores  hepáticos  primários  são  incomuns  em  equinos  e  ruminantes.  Incluem  carcinoma  hepatocelular,  colangiocarcinoma  e,  raramente,  linfoma,  hepatoblastoma  (potros,  equinos  jovens  e  crias  de  alpacas)  e  hamartoma  misto.  O
colangiocarcinoma  é  o  mais  comum  e  principalmente  encontrado  em  equinos  de  meia­idade  ou  mais  velhos.  Os  carcinomas  hepáticos  surgem  a  partir  dos  hepatócitos,  ductos  biliares  ou  de  metástases.  Os  carcinomas  hepatocelulares,
geralmente, são encontrados nos equinos de 1 ano até adultos jovens e também já foram descritos em lhamas e caprinos. Os adenomas ou os adenocarcinomas hepáticos foram descritos nos bovinos. O fibrossarcoma hepático e o carcinoma
de ducto biliar com metástase nos pulmões foram relatados nos caprinos. Eritrocitose, extensas áreas de hematopoese extramedular e metástases na cavidade torácica foram descritas em equinos com hepatoblastoma.
O linfossarcoma corresponde à neoplasia mais comum do sistema hematopoético dos equinos. Cerca de 37% dos equinos com linfossarcoma possuem envolvimento neoplásico esplênico, e 41%, envolvimento neoplásico hepático. Já se
descreveu metástase de linfossarcoma hepático em bovinos, lhamas, alpacas e caprinos.
Os  achados  clínicos  predominantes  em  casos  de  carcinoma  hepático  são  letargia  e  perda  de  peso.  Também  pode  haver  aumento  progressivo  do  abdome,  eritrocitose,  hipoglicemia  persistente,  icterícia  e  insuficiência  hepática.  O
colangiocarcinoma causa perda de peso acentuada antes do início da insuficiência hepática. As enzimas hepatocelulares e biliares podem aumentar nos casos de carcinoma hepático ou de colangiocarcinoma. A atividade sérica de GGT, nos
equinos acometidos, costuma ficar bastante alta. Os carcinomas hepatocelulares são caracteristicamente uniformes em sua aparência, no exame ultrassonográfico.
As manifestações clínicas de linfossarcoma nos equinos são variáveis. No início da doença, observam­se sinais inespecíficos, tais como perda de peso, anorexia e letargia. O linfoma pode, ocasionalmente, infiltrar­se difusamente no
fígado e provocar sinais de insuficiência hepática, icterícia e depressão grave. Os achados laboratoriais incluem hipoglicemia, aumentos leves a moderados nas enzimas hepáticas, hiperbilirrubinemia e concentrações anormalmente baixas
de IgM. O exame ultrassonográfico ajuda a detectar neoplasias esplênicas e hepáticas. Nos ruminantes, os sinais decorrentes do crescimento tumoral em outros órgãos (linfonodos, abomaso, coração, útero, medula espinal) são, muitas
vezes, mais predominantes.
A presença e o tipo da neoplasia hepática podem ser confirmados por uma biopsia hepática e exame microscópico do tecido. Podem­se observar linfócitos atípicos ou linfoblastos no fluido peritoneal e no sangue periférico de alguns
animais  acometidos.  Aumento  na  concentração  sérica  de  a­fetoproteína  pode  sustentar  o  diagnóstico  de  hepatoblastoma;  contudo,  não  é  conclusivo,  pois  concentrações  mais  elevadas  também  podem  ser  observadas  no  carcinoma
hepatocelular.

 SÍNDROMES HIPERBILIRRUBINÊMICAS

Síndrome de Dubin­Johnson
A síndrome de Dubin­Johnson é observada esporadicamente em pessoas e em ovinos da raça Corriedale. Trata­se de uma falha da bilirrubina conjugada em adentrar os canalículos biliares. A excreção de bilirrubina e de outros ânions
orgânicos conjugados pode se tornar prejudicada. Os ovinos podem ficar ictéricos ou mostrar hiperbilirrubinemia. Nos ovinos corriedale acometidos, as concentrações séricas de bilirrubina conjugada e não conjugada aumentam, podendo a
depuração de BSP® e a excreção de ácidos biliares ficarem atrasadas. Histologicamente, os hepatócitos contêm um pigmento escuro semelhante à melanina.

Síndrome de Gilbert
A síndrome de Gilbert trata­se de uma hiperbilirrubinemia congênita observada em humanos, herdada como um gene autossômico dominante, e em ovinos da raça Southdown. Compreende uma hiperbilirrubinemia não conjugada, com
meia­vida eritrocitária normal. Suspeita­se de um defeito nas proteínas transportadoras ou na enzima de conjugação. Ovinos da raça Southdown acometidos apresentam aumento das concentrações plasmáticas de bilirrubina conjugada e não
conjugada. A depuração hepática da bilirrubina é incompleta e os ovinos comprometidos não conseguem excretar a BSP® na bile. A icterícia é variável. Não há lesão histopatológica, exceto pigmento nos hepatócitos.

 DOENÇAS HEPÁTICAS DIVERSAS

Amiloidose Hepática
A amiloidose refere­se a uma doença caracterizada pelo depósito extracelular de amiloide, uma substância fibrilar proteinácea, no tecido. O depósito de amiloide dentro de um órgão distorce a arquitetura normal do tecido e, possivelmente,
sua  função.  Nos  equinos,  o  fígado  e  o  baço  são  os  órgãos  mais  comumente  acometidos  pela  amiloidose  sistêmica.  Amiloidose  sistêmica  reativa  ou  secundária  com  deposição  de  fibrilas  de  amiloide  A  (AA)  no  fígado  foi  associada  a
parasitismo grave e infecção ou inflamação crônicas em equinos.
Atresia Biliar
Atresia biliar (extra­hepática) foi descrita em potros e em um cordeiro neonato. Com 1 mês de idade, os potros acometidos apresentaram anorexia, depressão, letargia, crescimento deficiente, cólica, polidipsia, poliúria, pirexia e icterícia.
GGT e bilirrubina séricas notadamente aumentadas e SDH levemente elevada sustentaram o diagnóstico de obstrução biliar. O diagnóstico de atresia biliar foi confirmado durante a necropsia.

Atrofia do Lobo Hepático Direito em Equinos
O lobo direito do fígado dos equinos corresponde ao maior lobo nos animais jovens, mas com frequência sofre atrofia nos animais idosos e se torna fibroso. A atrofia do lobo hepático direito era, antigamente, considerada um achado post­
mortem acidental, mas alguns autores a consideram uma condição patológica.
Tem­se  proposto  que  a  atrofia  do  lobo  hepático  direito  resulta  de  compressão  crônica  nessa  porção  hepática  pelo  cólon  dorsal  direito  e  base  do  ceco.  Alimentar  os  equinos  com  dietas  ricas  em  concentrado  e  pobres  em  fibras  pode
contribuir para atonia do cólon dorsal direito, com consequente distensão; essa distensão comprime o lobo hepático direito contra a superfície visceral do diafragma. Embora não ocorra nenhuma evidência morfológica de prejuízo vascular
direto no lobo hepático direito, um comprometimento vascular pode se dar secundariamente à compressão. Em caso de cronicidade, prejudica­se a circulação portal para o lobo direito, resultando em anoxia hepática, privação de nutrientes e
atrofia gradual do lobo direito hepático. Nenhuma evidência de doença do trato biliar foi notada. Cólica pode ser observada. Alguns equinos podem apresentar sinais não relacionados com o trato gastrintestinal.

Colangite
Doenças da vesícula biliar são raras em ruminantes. A obstrução pode estar associada à fasciolose hepática, corpos estranhos, abscessos, neoplasia, colecistite supurativa ou necrose da gordura abdominal. Ruptura da vesícula biliar foi
relatada em uma vaca. Colangite (inflamação do sistema biliar) foi descrita em equinos com hepatite crônica ativa. Alterações comportamentais discretas, perda de peso, cólica variada, icterícia e alterações nas enzimas hepáticas podem ser
observadas em equinos acometidos. O tratamento consiste no uso prolongado de antimicrobianos e terapia de suporte, quando indicada.

Fibrose Hepática Congênita
Um estudo retrospectivo de arquivos da Universidade de Berne, Instituto de Patologia Animal, identificou 30 potros freiberger suíços com lesões patológicas compatíveis com fibrose hepática congênita. Os potros acometidos apresentavam
de 1 a 12 meses de idade (média de 3,7 meses). A maioria mostrava sinais e alterações clinicopatológicas refletindo lesão hepático grave. Análises dos pedigrees demonstraram a afecção voltada a um garanhão. Os resultados sugeriram que
a fibrose hepática congênita em equinos freiberger suíços está recessivamente relacionada com um defeito genético autossômico. Uma condição semelhante foi relatada em um bezerro.

Hemocromatose
A hemocromatose é uma doença de armazenamento de ferro, na qual se deposita hemossiderina nas células parenquimais, causando lesões e disfunção ao fígado e em outros tecidos. A doença é tanto primária (idiopática) quanto secundária.
É descrita no homem, nos mainás, nos bovinos da raça Salers e nos equinos.
ETIOLOGIA:  Nos bovinos da raça Saler, a afecção parece ser uma condição de homozigose recessiva com absorção intestinal de ferro inadequada, armazenamento hepático excessivo e perda eventual da função hepática. Nos equinos, não há
evidência de tendência familiar ou de excesso de ferro consumido na dieta. Preferivelmente, parece haver cirrose hepática com sobrecarga de ferro secundária. Em ambos, equinos e bovinos, o ferro em excesso deposita­se no fígado.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Nos equinos, os sinais clínicos principais englobam perda de peso, letargia e anorexia intermitente. Nos bovinos, os sinais são diminuição no ganho de peso, má condição corporal, pelame opaco e diarreia.
Em  ambas  as  espécies,  as  enzimas  hepáticas  estão  elevadas,  inclusive  GGT,  fosfatase  alcalina,  AST  e  SDH.  As  concentrações  séricas  de  ácidos  biliares  totais  aumentam  nos  equinos  e  a  concentração  sérica  de  ferro,  a  capacidade  de
conjugação de ferro total (CCFT) e a saturação porcentual da CCFT permanecem, em geral, normais. Em alguns casos, ferro e ferritina séricos podem estar aumentados, mas a CCFT não está saturada. Nos bovinos, o ferro sérico total, a
CCFT e a saturação de transferrina aumentam. O teor de ferro no tecido hepático aumenta demasiadamente nos equinos (normal de 100 a 300 ppm) e nos bovinos (normal de 84 a 100 ppm). Hepatomegalia e acúmulo de hemossiderina no
fígado, nos linfonodos, pâncreas, baço, tireoide, rins, cérebro e tecido glandular estão tipicamente presentes.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  baseia­se  na  anamnese,  sinais  clínicos  e  achados  laboratoriais.  O  achado  de  hemossiderina  abundante  nos  hepatócitos,  no  exame  histopatológico  de  uma  biopsia  hepática,  sustenta  o  diagnóstico.  Altas
concentrações de ferro no tecido hepático em animais sem histórico de excessivo consumo de ferro ajudam a confirmar o diagnóstico. Os diagnósticos diferenciais incluem intoxicação por ferro decorrente de fontes exógenas e doenças que
causam perda de peso crônica e disfunção ou doença hepática.
TRATAMENTO:  As flebotomias para remover sangue e reduzir os depósitos de ferro são utilizadas no tratamento de pessoas com hemocromatose. Tratamento semelhante em equinos e bovinos não foi efetivo. A deferoxamina também é
empregada em pessoas para induzir equilíbrio iônico negativo e reduzir a velocidade na qual o ferro se acumula. Ainda não se avaliou o seu efeito em bovinos e equinos.

Hiperamonemia em Potros da Raça Morgan Desmamados
Uma  síndrome  de  depressão,  deficiência  no  desenvolvimento  e  de  hiperamonemia,  com  grau  variado  de  envolvimento  hepático  é  descrita  em  potros  da  raça  Morgan.  Têm­se  descrito  potros  acometidos,  mas  a  causa  da  síndrome  é
indeterminada. Os sinais clínicos são, em geral, observados pela primeira vez próximo ao desmame. A encefalopatia pode melhorar, temporariamente, mas recidiva após a interrupção do tratamento. As enzimas hepáticas e as concentrações
de amônia aumentam. A concentração de bilirrubina permanece, habitualmente, normal. Lesões hepáticas incluem fibrose portal e septal, hiperplasia do ducto biliar, cardiomegalia e citomegalia. A doença é fatal.

Hiperamonemia Primária em Equinos Adultos
Nesta  síndrome  de  hiperamonemia,  notam­se  cegueira  e  sinais  neurológicos  graves  em  equinos  adultos.  A  etiologia  é  desconhecida, mas  suspeita­se  de  um  problema  intestinal  primário  acompanhado  de  supercrescimento  de  bactérias
produtoras de urease no intestino.
A  síndrome  quase  sempre  está  associada  a  enteropatia,  diarreia  ou  cólica.  Diarreia  e,  em  alguns  casos,  enteropatia  perdedora  de  proteína  podem  persistir  por  vários  dias.  Na  maioria  das  vezes,  diarreia  ou  cólica  precedem  os  sinais
neurológicos em 24 a 48 h. As anormalidades laboratoriais incluem aumento nas concentrações sanguíneos de amônia (200 a 400 μm/l, acidose metabólica grave, baixa concentração plasmática de bicarbonato (= 12 mEq/l) e hiperglicemia
profunda (250 a 400 mg/dl). As concentrações séricas de enzimas hepáticas, de ácidos biliares totais e de bilirrubina permanecem normais.
Na maioria dos equinos, os sinais neurológicos resolvem­se dentro de 2 a 3 dias com um tratamento de suporte (fluidoterapia IV, cloreto de potássio, glicose e bicarbonato de sódio) e administração de drogas para reduzir a absorção de
amônia (lactulose, neomicina).

Insuficiência Hepática em Potros
A insuficiência hepática em potros neonatos pode ser decorrente de sepse (especialmente causada por Actinobacillus equuli), endotoxemia, asfixia perinatal, infecção por Leptospira pomona, herpesvírus equino tipo 1, obstrução do ducto
hepático secundária a obstrução gastroduodenal, atresia biliar e intoxicação por ferro. Úlceras gástricas e duodenite em potros podem causar estenoses duodenais e subsequente colangioepatite por estase biliar. A isoeritrólise neonatal e
hemólise podem causar hepatopatia por hipoxia e por colestase. A administração de dieta parenteral total pode causar colestase e hepatopatia concomitante.

Shunt (Desvio) Portossistêmico
Shunt portossistêmico é observado em potros e bezerros. Hiperamonemia e sinais neurológicos resultam de disfunção hepática com poucas evidências laboratoriais ou microscópicas de hepatopatia.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sinais clínicos são vistos pela primeira vez quando os potros acometidos apresentam cerca de 2 meses de idade e começam a ingerir grandes quantidades de grãos e forragem. Os sinais neurológicos
incluem andar cambaleante e errante, cegueira, andar em círculos e convulsões. Crescimento deficiente e sinais neurológicos intermitentes (ataxia, fraqueza, depressão, bruxismo e tenesmo) foram relatados em bezerros com 2 a 3 meses de
idade. As concentrações séricas de enzimas hepáticas costumam permanecer normais. As concentrações de amônia e de ácidos biliares totais aumentam e a depuração de BSP® fica prolongada.
O fígado encontra­se, muitas vezes, pequeno, com superfície lisa, coloração e consistência normais. Microscopicamente, os hepatócitos se apresentam pequenos. As veias portas nas tríades portais podem ser pequenas ou ausentes. As
artérias hepáticas se tornam proeminentes e múltiplas.
DIAGNÓSTICO:  Deve­se suspeitar de shunt portossistêmico  em  potros  ou  bezerros  que  exibam  episódios  repetidos  de  sinais  cerebrais  sem  razões  óbvias.  Os  sinais  clínicos  podem  ser  mais  acentuados  e  estão  associados  à  alimentação.
Cateterização da veia mesentérica e realização de portograma ou de cintigrafia nuclear pode confirmar o local do shunt. Em alguns casos, o desvio pode ser notado durante o exame ultrassonográfico do fígado.
TRATAMENTO:  A correção cirúrgica pode ser realizada em animais nos quais o local do shunt possa ser identificado, mas o prognóstico é reservado. Em alguns potros, os sinais clínicos podem ser controlados por meio de restrição do
consumo proteico e de cuidadoso manejo dietético. Pode–se administrar, oralmente, neomicina ou lactulose para diminuir a produção de amônia dentro do intestino. Terapia de suporte com fluidos poliônicos, potássio e dextrose pode ser
necessária para auxiliar a diminuir os sinais neurológicos.

Torção do Lobo Hepático
A torção do lobo hepático pode causar cólica nos equinos. As enzimas hepáticas e o fibrinogênio aumentam, mas a análise do fluido abdominal torna­se variável. Bactérias, inclusive Clostridium spp, podem ser encontradas na porção
necrótica do fígado. Uma celiotomia exploratória pode ser necessária para o diagnóstico.

DOENÇAS DA CAVIDADE BUCAL EM GRANDES ANIMAIS

Estomatite
Estomatite é um sinal clínico de muitas doenças, em grandes animais. Traumatismo bucal ou contato com produtos químicos irritantes (p. ex., equinos que lambem os membros após contato com substâncias cáusticas) pode resultar em
estomatite transitória. Lesão traumática por ingestão de haste de cevada, capim rabo­de­raposa, capim porco­espinho e capim lanciforme, bem como ingestão de plantas infestadas com taturanas, também provocam estomatite em equinos e
bovinos.
Geralmente, os sinais clínicos associados à estomatite ativa aguda incluem ptialismo, disfagia ou relutância à realização do exame bucal. O animal deve ser sedado para facilitar a inspeção da cavidade bucal, a qual deve ser examinada,
cuidadosamente, com um espéculo e uma fonte de luz. As úlceras devem ser inspecionadas e palpadas para verificar se há corpo estranho (p. ex., capim). Se a causa é a ingestão de material estranho, a alteração da qualidade e da quantidade
do feno ou a remoção do animal de um pasto com capim pode resultar em recuperação.
Os diagnósticos diferenciais incluem actinobacilose, febre aftosa, febre catarral maligna e diarreia viral bovina. As doenças epidêmicas, como doença da língua azul em ruminantes, doença vesicular suína e estomatite vesicular nos
equinos, precisam ser diferenciadas das outras formas agudas de estomatite não infecciosa ou contagiosa.

Estomatite Papilar
Papilomas  virais  são  notados  ao  redor  dos  lábios  e  da  boca  em  animais  jovens,  especialmente  em  bovinos  com  1  mês  a  2  anos  de  idade.  Em  alguns  rebanhos,  a  taxa  de  prevalência  pode  ser  de  100%.  As  lesões  são  tipicamente
esbranquiçadas ou róseas, elevadas e de aspecto proliferativo. A maioria dos papilomas se cura espontaneamente. No entanto, em alguns casos, as lesões podem se unir e formar massas esteticamente desagradáveis e os proprietários podem
requisitar seu tratamento.
A excisão cirúrgica de massas maiores pode ser cosmeticamente aceitável; ademais, reduz o tempo de recuperação. Lesões pequenas também podem ser desbridadas ou curetadas manualmente para estimular o sistema imune. Outras
modalidades terapêuticas, incluindo criocirurgia e uso de vacinas autógenas, podem ser efetivas. A maioria dos papilomas desaparece ao longo do tempo.

Glossoplegia (Paralisia da Língua)
A  glossoplegia  ou  paralisia  da  língua  é  rara.  Em  equinos,  as  causas  incluem  posicionamento  incorreto  das  pinças  obstétricas  em  neonatos  durante  parto  distócico,  estrangulamento,  infecções  do  trato  respiratório  inferior,  meningite,
botulismo, encefalomielite, leucoencefalomalácia, encefalomielite protozoária equina e abscessos cerebrais. Qualquer enfermidade que lesione o nervo hipoglosso (XII nervo craniano), que é o principal nervo motor dos músculos da língua,
pode ocasionar glossoplegia. Os neonatos com glossoplegia precisam ser monitorados cuidadosamente para assegurar que sejam capazes de se alimentar. Caso necessário, em potros acometidos deve­se introduzir uma sonda nasogástrica
para administração de colostro ou aplicação IV de plasma para evitar falha na imunidade passiva. Os potros incapazes de manter a hidratação podem necessitar fluidoterapia IV e medicação anti­inflamatória (p. ex., fenilbutazona, flunixino
meglumina ou dexametasona). A profilaxia contra úlcera gástrica também é indicada. Se a enfermidade persiste > 10 dias após o nascimento, o prognóstico quanto à recuperação da função normal é reservado. Doenças inflamatórias e
traumatismos  também  podem  resultar  em  glossoplegia  transitória.  Ocasionalmente,  os  equinos  submetidos  a  procedimentos  dentários  prolongados  envolvendo  tração  excessiva  da  língua  podem  predispor  à  glossoplegia  temporária.  O
prognóstico de glossoplegia depende da resposta do animal ao tratamento da doença primária.

Estomatite papilar bovina. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Nos bovinos, a glossoplegia pode acompanhar actinobacilose grave (p. 628). Pode ocorrer paralisia total da língua acompanhada de necrose da ponta da língua. Tais enfermidades são ocasionalmente observadas em surtos em lotes de
bovinos de engorda e podem ser decorrências de estomatite viral primária.

Intoxicação por Eslaframina
Esta  intoxicação  é  causada  pela  ingestão  de  forragens,  principalmente  de  trevo,  infectadas  pelo  fungo Rhizoctonia leguminicola,  que  produz  o  alcaloide  tóxico  eslaframina.  Geralmente,  o  único  sinal  clínico  é  ptialismo  abundante.  Os
animais  acometidos  não  manifestam  evidência  de  úlcera  ou  de  outras  lesões  bucais.  Há  resolução  do  ptialismo  quando  o  animal  é  afastado  das  forragens  envolvidas.  Os  diagnósticos  diferenciais  em  grandes  animais  (em  especial  nos
ruminantes) incluem doença da língua azul, estomatite vesicular, exantema vesicular e febre aftosa.

Lacerações Labiais
Ferimentos nos lábios e nas bochechas são frequentes em equinos. As causas mais comuns são trauma externo ou secundário ao uso de freios ou dispositivos de contenção. As lacerações labiais podem ser acompanhadas de fraturas ósseas
na região dos dentes incisivos ou mandíbula, com ou sem fraturas e avulsões dentárias. Isso ocorre quando um equino apanha um objeto com a boca e puxa para trás quando se assustam. As lacerações labiais sem envolvimento ósseo ou
dentário podem ser suturadas e, geralmente, com bom resultado. Devido à vascularização da região, a cicatrização é rápida. As lacerações que cicatrizam por segunda intenção podem resultar em fístula orocutânea, que pode necessitar
ressecção ou sutura da ferida primária. Raramente, pode ser necessário enxerto cutâneo ou mucoso para tratar fístula orocutânea.

Neoplasias
Neoplasias bucais e labiais, além de papilomas virais, são incomuns e incluem melanomas, sarcoides e carcinoma de célula escamosa. Equino tordilho pode desenvolver melanoma, os quais podem se infiltrar nas comissuras bucais e
originar placas tumorais rígidas e espessas que podem não ser detectadas até se encontrem em estágio bem avançado. As formas verrucosas, fibroblásticas e sésseis ou planas do sarcoide equino podem acometer a cavidade bucal e os lábios.
Deve­se empregar laser com dióxido de carbono para remover melanomas de cavidade bucal e lábios. Não é necessária a remoção completa dos melanomas bucais ou labiais para uma recuperação bem­sucedida. Além disso, alguns
equinos  podem  responder  à  terapia  oral  com  cimetidina.  A  excisão  cirúrgica  de  sarcoides  pode  ser  realizada  com  sucesso  utilizando­se  laser  com  dióxido  de  carbono.  Além  da  ressecção  com  laser,  pode–se  administrar  cisplatina
intratumoral para reduzir o risco de recidiva. Criocirurgia é outra modalidade terapêutica aceita. O carcinoma de célula escamosa pode ser de difícil tratamento devido ao seu caráter invasivo. A remoção cirúrgica com laser com dióxido de
carbono, seguida da aplicação intratumoral de cisplatina, pode ser efetiva em alguns casos. Independente do tratamento, o prognóstico quanto à resolução completa do carcinoma de célula escamosa bucal é de reservado a ruim (ver p. 926).

DOENÇAS DO ABOMASO EM GRANDES ANIMAIS

As doenças do abomaso incluem deslocamento do abomaso à esquerda (DAE), deslocamento do abomaso à direita (DAD), vólvulo do abomaso (VA), úlcera e impactação. Deslocamento e vólvulo ocorrem comumente em vacas leiteiras,
mas também em bezerros e touros de raças leiteiras. Ao contrário de VA, o deslocamento do abomaso é raro em bovinos de corte e praticamente não é diagnosticado em pequenos ruminantes. As úlceras são observadas em bovinos de leite e
de corte e em bezerros e cordeiros; raramente são notadas em pequenos ruminantes. A impactação pode ser primária, mais frequente em bovinos de corte, ou secundária, mais comum em vacas leiteiras, como forma de indigestão vagal. Em
alguns ovinos de cara preta, a causa da impactação pode ser hereditária.

 DESLOCAMENTO DO ABOMASO À ESQUERDA OU À DIREITA E VÓLVULO DE ABOMASO
Como  o  abomaso  é  sustentado  frouxamente  pelos  omentos  maior  e  menor,  ele  pode  se  deslocar  de  sua  posição  normal,  na  parte  ventral  direita  abdominal,  para  o  lado  esquerdo  ou  direito  (DAE  ou  DAD)  ou  pode  girar  em  seu  eixo
mesentérico durante o deslocamento à direita ou lateralmente ao fígado (VA). O abomaso pode se desviar de sua posição normal, deslocando­se para à esquerda ou à direita, em um período relativamente curto. O VA pode se desenvolver
rápida ou lentamente, a partir de um DAD não corrigido.
ETIOLOGIA:  Embora DAE, DAD e VA (também denominado torção direita do abomaso) sejam frequentemente considerados separadamente, há evidência de etiologia comum; podem ser manifestações diferentes da mesma doença ou um
quadro clínico semelhante.
A  etiologia  é  multifatorial,  mas  acredita–se  que  a  hipomotilidade  do  abomaso  e  a  disfunção  do  sistema  nervoso  intrínseco  tenham  participação  importante  no  desenvolvimento  de  deslocamento  ou  vólvulo.  Os  fatores  contribuintes
importantes incluem hipomotilidade do abomaso associada à hipocalcemia e doenças concomitantes (mastite, metrite) associadas à endotoxemia e redução do preenchimento ruminal, alterações na posição dos órgãos intra­abdominais no
periparto  e  predisposição  genética,  particularmente  em  vacas  robustas.  A  predisposição  genética  está  relacionada  com  a  produção  de  leite,  indicando  que  as  técnicas  atuais  de  seleção  para  produção  leiteira  aumentam  a  prevalência  de
deslocamento de abomaso. A hipomotilidade também está relacionada com o consumo de dieta com alto teor de concentrado e baixa quantidade de volumoso, que reduz a motilidade do abomaso por um mecanismo pouco conhecido, que
pode envolver hiperinsulinemia ou aumento da concentração de ácidos graxos voláteis. Além disso, dieta rica em concentrado provoca aumento linear da produção gasosa (predominantemente dióxido de carbono, metano e nitrogênio).
Dessa forma, cetose clínica e subclínica aumentam o risco de deslocamento do abomaso por um mecanismo não conhecido, que pode estar associado à redução do preenchimento ruminal.
Cerca de 80% dos casos de deslocamento ocorrem um mês após o parto; no entanto, podem ocorrer em qualquer momento. DAE é muito mais comum do que DAD (30:1); casos de VA são também mais comuns do que DAD (10 DAE
para 1 VA). VA é precedido de DAD.
PATOGÊNESE:  No DAE, em razão da hipomotilidade do abomaso e da produção de gases, o abomaso parcialmente distendido com gás se desloca dorsalmente, ao longo da parede abdominal esquerda, lateral ao rúmen. O fundo e a curvatura
maior do abomaso se deslocam primeiramente que, por sua vez, causa deslocamento de piloro e duodeno. Omaso, retículo e fígado também giram em graus variáveis. A obstrução do abomaso é parcial e embora o segmento contenha gás ou
líquido, alguma quantidade de ingesta pode sair e a distensão raramente é grave. Pelo fato de haver interferência mínima no suprimento sanguíneo, exceto quando há distensão gasosa acentuada, os efeitos do deslocamento se devem apenas
à interferência na digestão e na passagem do alimento, o que causa diminuição do apetite e desidratação.
Alcalose metabólica discreta com hipocloremia e hipopotassemia é comum. Alcalose metabólica hipoclorêmica ocorre devido à hipomotilidade do abomaso, secreção contínua de ácido clorídrico no interior do abomaso e obstrução
parcial  do  fluxo  do  abomaso,  com  sequestro  de  cloreto  no  abomaso  e  refluxo  ao  rúmen.  Ocorre  hipopotassemia  devido  à  ingestão  diminuída  de  alimentos  ricos  em  potássio,  sequestro  de  potássio  no  abomaso  e  desidratação.  Cetose
secundária é comum e pode ser complicada pelo desenvolvimento de esteatose hepática (lipidose hepática; p. 1090).
A) Topografia normal dos órgãos do abdome esquerdo, em vaca. B) Deslocamento do abomaso à esquerda. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu. Adaptado, com autorização, de DeLahunta e Habel, Anatomia Veterinária Aplicada, W.B. Saunders, 1986.

No DAD, notam­se hipomotilidade, produção de gases e deslocamento do abomaso parcialmente preenchido com gás, como acontece no DAE. Também, instala­se discreta alcalose metabólica hipoclorêmica e hipopotassêmica. Após
essa fase de dilatação, a rotação do abomaso em seu eixo mesentérico resulta em vólvulo, prejuízo à circulação e isquemia local (obstrução estrangulante hemorrágica). Geralmente, o vólvulo ocorre em sentido anti­horário, quando o animal
é visto por trás e pelo lado direito. O omaso desloca­se medialmente e pode estar envolvido no desenvolvimento de vólvulo, com obstrução do suprimento sanguíneo (denominado vólvulo omaso­abomasal) e deslocamento de fígado e
retículo.  Em  casos  raros,  o  retículo  pode  estar  envolvido  (denomina­se  vólvulo  retículo­omaso­abomasal).  Há  acúmulo  de  grande  quantidade  de  líquido  com  alto  teor  de  cloro  (até  50  L)  no  abomaso  e  instala­se  alcalose  metabólica
hipopotassêmica  e  hipoclorêmica.  O  suprimento  sanguíneo  ao  abomaso  é  comprometido,  assim  como  ao  duodeno  proximal  e  ao  omaso;  por  fim,  resulta  em  necrose  isquêmica  do  abomaso,  bem  como  desidratação  e  insuficiência
circulatória. À medida que a enfermidade progride, a acidose metabólica devido à elevada concentração sanguínea de L­lactato e a azotemia se sobrepõem à alcalose metabólica preexistente.
ACHADOS CLÍNICOS:  O histórico típico de deslocamento inclui anorexia (mais comum a falta de apetite por grãos com apetite diminuído ou até normal para volumoso) e diminuição na produção leite (em geral significativa, mas não tão
drástica  quanto  na  reticuloperitonite  traumática  ou  em  outras  causas  de  peritonite).  No  VA  nota­se  anorexia,  redução  progressiva  marcante  da  produção  de  leite  e  rápido  agravamento  do  quadro  clínico.  No  deslocamento  de  abomaso,
geralmente a temperatura e as frequências cardíaca e respiratória são normais. A parte posterior do gradil costal, no lado do deslocamento, pode parecer “saltada”. No deslocamento a hidratação parece subjetivamente normal, exceto em
alguns casos crônicos. A motilidade ruminal pode permanecer normal, mas geralmente há redução na frequência e na força de contração. A quantidade de fezes diminui e são mais líquidas que o normal.
O achado físico diagnóstico mais importante é um som de “ping” na auscultação e percussão simultâneas do abdome, que devem ser realizadas na área delimitada por uma linha que une a tuberosidade isquiática ao cotovelo e deste em
direção ao joelho. O “ping” característico de DAE localiza­se com maior frequência na área entre a 9a e a 13a costela, no terço médio a superior abdominal esquerdo; no entanto, esse “ping” pode ser mais ventral ou mais caudal, ou ambos.
O  “ping”  associado  a  acúmulo  de  gás  no  rúmen  geralmente  é  mais  dorsal,  menos  ressonante  e  se  estende  mais  caudalmente  à  fossa  paralombar  esquerda.  A  palpação  retal  pode  confirmar  a  presença  de  rúmen  preenchido  por  gás  ou
extremamente  vazio,  que  está  relacionado  com  o  “ping”  ruminal,  nesses  casos.  Os  “pings”  associados  a  pneumoperitônio  são  menos  ressonantes,  são  notados  em  ambos  os  lados  do  abdome  e  sua  localização  é  variável  em  repetidas
avaliações. Frequentemente, desenvolve­se cetose secundária e nota­se cetona na urina e no leite. Cetose associada a deslocamento do abomaso responde apenas transitoriamente ao tratamento e ocorre recidiva (diferentemente da cetose
primária, que se desenvolve no início da lactação em vacas de alta produção e a resposta à terapia é permanente, se instituída precocemente) (ver cetose, p. 1075).
O “ping” associado a DAD também se localiza mais comumente na área entre a 10a e a 13a costela. Em alguns casos, a diferenciação entre as várias causas de “ping” no lado direito é difícil, embora um som de “ping” cranial à 10a costela
geralmente indica VA devido ao deslocamento do fígado medialmente pelo órgão distendido. Um “ping” discreto no lado direito subjacente à 12a ou 13a costela e que se estende para frente, até a 10a costela, é comum nas vacas com íleo
funcional, decorrente de várias causas. Este “ping” geralmente está mais associado à presença de gás no cólon ascendente e se resolve com a correção da doença primária. Dilatação e rotação de ceco caracterizam­se por um “ping” no lado
direito. Este som estende­se pela fossa paralombar dorsal, no caso de dilatação cecal e geralmente localiza­se mais caudalmente (exatamente na fossa paralombar), no caso de rotação do ceco, em comparação com o “ping” notado no DAD.
Palpação retal é útil na diferenciação entre DAD e dilatação ou rotação do ceco. Outros sons no lado direito são produzidos por pneumoperitônio ou gás no reto, cólon descendente, duodeno ou útero.
É  possível  ouvir  ruídos  de  movimentação  de  líquidos  ou  ruído  metálico  de  gases,  espontâneos,  à  auscultação  da  área  do  “ping”  ou  com  balotamento  e  auscultação  simultâneos  do  abdome  (sucussão).  Na  palpação  retal,  os  achados
característicos de DAE incluem deslocamento medial do rúmen e do rim esquerdo. Raramente o abomaso é palpável no DAE e apenas ocasionalmente no DAD.
Os sinais clínicos associados a vólvulo do abomaso são mais graves do que os associados a deslocamento simples, em razão do comprometimento vascular. No entanto, pode ser difícil diferenciar vólvulo do abomaso inicial de um DAD,
exceto pela presença de um “ping” do lado direito, cranial à 10a costela (indicando deslocamento medial do fígado por vólvulo do abomaso) e posição anatômica verificada em uma cirurgia. Ao contrário dos casos de deslocamento, um
animal com VA apresenta taquicardia proporcional à gravidade da enfermidade. A área de “ping” geralmente é maior (estende­se para frente, até a 8a costela) e a quantidade de líquido notado pela aplicação de sucussão é maior. O animal
fica mais deprimido e se desenvolvem sinais de fraqueza, toxemia e desidratação, à medida que a doença progride. A extensão caudal do abomaso geralmente encontra­se palpável por VR. Sem terapia, o animal geralmente deita dentro de
48 a 72 h após o desenvolvimento do vólvulo. A morte ocorre por choque e desidratação, sendo súbita se o abomaso isquêmico se rompe.
DIAGNÓSTICO:  No deslocamento ou vólvulo, o diagnóstico baseia­se na constatação de “ping” característico à auscultação e percussão simultâneas e na exclusão de outras causas desses sons no lado esquerdo ou direito. Ultrassonografia
pode ser útil para confirmar o diagnóstico de DAE, DAD ou VA, mas não permite diferenciar seguramente DAD de VA. Parto recente, anorexia parcial e diminuição da produção de leite sugerem deslocamento. Cetose, que responde apenas
temporariamente  ao  tratamento,  é  compatível  com  deslocamento  de  abomaso,  que  pode  ser  intermitente.  Os  sintomas  típicos  notados  no  exame  físico  (além  do  “ping”),  palpação  retal  e  avaliação  laboratorial  também  sustentam  o
diagnóstico. Melena ou sinais de peritonite (p. ex., febre, taquicardia, dor abdominal localizada e pneumoperitônio) com DAE podem indicar sangramento ou úlcera de abomaso perfurada, respectivamente.
TRATAMENTO:  Podem­se utilizar técnicas fechadas (percutâneas) e abertas (cirúrgicas) para corrigir os deslocamentos. Rolar a vaca em um arco de 70° após deitá­la com o lado direito para baixo corrige a maioria dos DAE; no entanto,
recidiva  é  muito  provável.  DAE  pode  ser  corrigido  cirurgicamente  utilizando­se  omentopexia  pilórica  no  flanco  direito,  abomasopexia  paramediana  direita,  abomasopexia  paralombar  esquerda,  laparoscopia  paramediana  nos  flancos
esquerdo e direito associadas (procedimento em dois momentos) ou laparoscopia no flanco esquerdo (procedimento em um momento). As técnicas de sutura às cegas (técnica de fixação toggle pin ou de “agulha comprida” [laço de fio
cego]) realizadas na região paramediana direita, são métodos percutâneos de correção de DAE; entretanto, não se sabe onde é a localização exata da sutura. Podem ocorrer complicações potencialmente fatais após a técnica de sutura às
cegas e a taxa de sucesso relatada é menor do que a da correção cirúrgica por omentopexia pilórica no flanco direito. No caso de fixação toggle pin pode­se mensurar o pH para confirmar se o pino encontra­se dentro do abomaso, o que
reduz o risco de se fixar rúmen, intestino delgado ou omento à parede corporal, em vez do abomaso. DAD e VA são corrigidos cirurgicamente (utilizando­se omentopexia na fossa paralombar direita), quando economicamente viável. A
abomasopexia paramediana direita deve ser usada apenas para correção de DAD e VA em bovinos incapazes de ficar em pé.
O tratamento auxiliar de animais com deslocamento inclui terapia de qualquer doença concomitante (p. ex., metrite, mastite e cetose). Em muitos casos, borogliconato de cálcio, por via SC, ou gel de cálcio VO, ajudam a restabelecer a
motilidade  normal  do  abomaso.  A  administração  de  eritromicina  (10  mg/kg,  IM)  no  momento  da  cirurgia  aumenta  a  taxa  de  esvaziamento  abomasal  e  a  produção  de  leite  no  pós–operatório  imediato.  Como  a  correção  cirúrgica  de
deslocamento ou vólvulo do abomaso frequentemente é realizada na fazenda, o efeito procinético da eritromicina sugere que seu uso seja preferível quando há necessidade de antibiótico para controlar infecção intraoperatória.
No deslocamento simples, as anormalidades hidreletrolíticas se corrigem espontaneamente com o acesso à água e a um bloco de sal mineral. O fornecimento de água com eletrólitos (60 g de cloreto de sódio e 30 g de cloreto de potássio
em 19L de água), via sonda gástrica, é útil nos casos crônicos. Os animais com desidratação e desequilíbrio metabólico significativos requerem terapia IV, sendo tipicamente administrada solução salina hipertônica (5 ml de NaCl 7,2%/kg
IV, ao longo de 5 min).
Ocasionalmente, os animais com deslocamento ou vólvulo do abomaso apresentam fibrilação atrial, que se acredita ter origem metabólica. A correção do deslocamento ou do vólvulo quase sempre resulta em melhora da fibrilação atrial
em 1 semana.
O tratamento agressivo de cetose tem importante papel no sucesso do tratamento do deslocamento do abomaso, uma vez que a maioria das mortes de bovinos após correção cirúrgica de DAD e DAE se deve às consequências metabólicas
da anorexia prolongada.
O prognóstico após correção de DAE ou DAD simples é favorável, com taxa de sobrevivência de 95%. O prognóstico de VA é variável e menos favorável (taxa de sobrevivência média de 70%); alta frequência cardíaca, desidratação
moderada a grave, período prolongado de doença, grande quantidade de líquido no abomaso e presença de vólvulo omaso­abomasal ou retículo­omaso­abomasal, estão associados a prognóstico ruim.
PREVENÇÃO:  A prevalência de deslocamento pode ser reduzida propiciando rápido aumento do volume ruminal após o parto; fornecendo ração mista completa, em vez de grãos, 2 vezes/dia (“dieta leve”); evitando alterações bruscas na
dieta; mantendo quantidade adequada de volumoso na dieta; evitando hipocalcemia pós­parto; e minimizando e tratando imediatamente as doenças concomitantes, inclusive cetose.

 IMPACTAÇÃO ALIMENTAR NO ABOMASO
Impactação do abomaso ocorre em vacas de corte prenhes, nos meses de inverno, quando o animal diminui a ingestão de água e recebe volumoso de baixa qualidade. Também acomete bovinos em lote de engorda alimentados com várias
rações mistas que contêm volumosos picados ou triturados (palha e feno) e grãos de cereais, bem como em vacas leiteiras em final de gestação alimentadas da mesma forma. A impactação do antro pilórico é uma enfermidade pouco
diagnosticada em vacas leiteiras, em início de gestação.
ETIOLOGIA:  A causa não é conhecida, mas considera­se ser o consumo excessivo de volumoso com baixo teor de proteínas digestíveis e de energia. Pode ocorrer impactação por areia, se os bovinos são alimentados com feno ou silagem em
solos arenosos, ou com cereais com raiz, arenosos ou sujos. Os surtos podem envolver até 15% das vacas prenhes da fazenda, quando a temperatura atinge ­26°C, ou menos, por vários dias. Provavelmente, a causa em vacas após o parto
está relacionada com a hipomotilidade do abomaso.
PATOGÊNESE:  A patogênese não é conhecida, mas está relacionada com a alimentação. Uma vez que ocorre impactação do abomaso, há obstrução subaguda do trato GI superior. Íons de hidrogênio e cloro são secretados continuamente no
interior do abomaso, apesar da impactação e, assim, instala­se atonia e alcalose com hipocloremia. Ocorrem graus variáveis de desidratação, pois os líquidos não passam do abomaso para o duodeno, para a absorção. O sequestro de íons
potássio  no  abomaso  resulta  em  hipopotassemia.  Também  ocorrem  desidratação,  alcalose,  desequilíbrio  eletrolítico  e  inanição  progressiva.  A  impactação  do  abomaso  pode  ser  suficientemente  grave  para  causar  atonia  irreversível  do
abomaso.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Anorexia, fezes escassas, distensão abdominal moderada, perda de peso e fraqueza geralmente são os sinais iniciais. A temperatura corporal em geral permanece normal, mas pode estar abaixo do normal em
clima frio. Uma secreção nasal mucoide tende a se acumular na parte externa das narinas e no focinho; geralmente, o focinho fica seco e com fissuras devido à impossibilidade do animal lamber suas narinas e ao efeito da desidratação. A
frequência cardíaca pode aumentar e discreta desidratação é comum.
Na maioria das vezes, o rúmen apresenta­se com atonia e distendido, com conteúdo seco, mas pode conter excesso de líquido se a vaca recebe alimentos finamente triturados. O pH do fluido ruminal geralmente permanece normal (6,5 a
7). A atividade e a quantidade de protozoários no rúmen variam de normais a acentuadamente reduzidas (no exame microscópico, em pequeno aumento). O abomaso impactado situa­se geralmente no quadrante inferior direito, no assoalho
abdominal. Palpação profunda e percussão forte no flanco direito podem indicar uma massa firme e extensa (abomaso impactado) e estimular um mugido (como acontece na reticuloperitonite traumática aguda), provavelmente devido à
distensão do abomaso e ao estiramento de sua serosa.
Os bovinos gravemente acometidos morrem 3 a 6 dias após o início dos sintomas. Em alguns casos, o abomaso se rompe e ocorre morte súbita devido à peritonite difusa aguda e ao choque, em poucas horas. Na impactação com areia,
nota­se perda de peso considerável, diarreia crônica com areia nas fezes, fraqueza, decúbito e morte em poucas semanas.
Alcalose metabólica, hipocloremia, hipopotassemia, hemoconcentração e contagens total e diferencial de leucócitos dentro da faixa de variação normal são comuns. À necropsia, o abomaso geralmente encontra­se aumentado de volume
(até 8 vezes o tamanho normal) e impactado, com um conteúdo seco semelhante ao do rúmen. O omaso pode se encontrar da mesma forma, aumentado de volume e impactado. O rúmen geralmente encontra­se muito aumentado de volume
e preenchido com conteúdo seco ou líquido. A parte do trato GI além do piloro está tipicamente vazia, com aparência ressecada. Também, há graus variáveis de desidratação e emaciação. No caso de ruptura de abomaso notam­se lesões de
peritonite difusa aguda. Nas vacas leiteiras em início de lactação ocorre apenas impactação do antro pilórico.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico clínico baseia–se no histórico alimentar, nas evidências clínicas de impactação e nos resultados de exames laboratoriais. A doença deve ser diferenciada de impactação secundária do abomaso, como uma forma
de indigestão vagal.
A impactação do abomaso como complicação de reticuloperitonite traumática geralmente é notada no final da prenhez, sendo comum em apenas um animal. Pode­se constatar, ou não, febre discreta e mugido durante palpação profunda
da cartilagem xifoide. O rúmen apresenta aumento de volume, sendo possível verificar aumento de motilidade (no início) ou atonia (no final). Em muitos casos, é impossível distinguir as duas causas de impactação do abomaso, sendo
necessária laparotomia pelo flanco direito para explorar o abdome quanto à presença de lesões peritoneais.
TRATAMENTO:  O desafio é identificar os casos que respondem ao tratamento e aqueles que não, ou seja, definir os animais que devem ser submetidos à eutanásia imediatamente. O prognóstico em vacas fracas, com abomaso gravemente
impactado  e  com  taquicardia  acentuada  (100  a  120  bpm)  é  ruim.  O  tratamento  medicamentoso  geralmente  requer  a  confirmação  do  diagnóstico  por  meio  de  laparotomia  no  lado  direito.  Nas  vacas  tratadas,  deve­se  corrigir  alcalose
metabólica, hipocloremia, hipopotassemia e desidratação. Podem­se utilizar lubrificantes na tentativa de movimentar o material impactado; é necessário esvaziar o abomaso cirurgicamente apenas em bovinos com impactação grave. Deve­
se infundir continuamente, por via IV, solução eletrolítica balanceada por até 72 h, na dose diária de 80 a 120 ml/kg. Algumas vacas respondem bem a essa terapia e começam a ruminar e defecar em 48 h.
O óleo mineral deve ser administrado na dose de 4 L/dia, por 3 dias. Com alternativa, o sulfossuccinato sódico de dioctila (SSD) pode ser administrado no interior do abomaso durante a laparotomia pelo flanco direito, com o animal de
pé, na forma de 60 a 100 ml de solução 25%/450 kg de peso corporal. Esta dose não deve ser administrada por via oral, pois o SSD destrói os protozoários do rúmen. Não se pode esperar uma resposta benéfica em < 24 h; nos bovinos que
respondem, geralmente nota­se no final do terceiro dia de tratamento. Eritromicina (10 mg/kg, IM, 1 a 2 vezes/dia) pode ser administrada como procinético em bovinos que não melhoram após a cirurgia, sabendo­se que o óleo mineral foi
fornecido e que não há obstrução física detectada durante a cirurgia.
Pode­se realizar cirurgia, mas os resultados geralmente não são bons, provavelmente pela atonia do abomaso, que parece piorar após a cirurgia. A alternativa pode ser rumenotomia com intuito de esvaziar o rúmen e infundir óleo mineral
diretamente no abomaso, através do orifício retículo­omasal, na tentativa de amolecer e estimular a evacuação do conteúdo do abomaso. Bovinos com impactação secundária que se desenvolve como sequela de reticuloperitonite traumática
ou VA geralmente manifestam sinais de indigestão vagal e a impactação do abomaso pode ser diagnosticada no momento da cirurgia exploratória.
A  indução  do  parto  com  dexametasona  (20  mg  IM)  pode  ser  indicada  em  vacas  acometidas  duas  semanas  antes  do  final  da  gestação,  nas  quais  não  se  obteve  sucesso  com  o  tratamento  por  poucos  dias.  A  parição  pode  auxiliar  na
recuperação, devido à redução do volume intra­abdominal. Na impactação com areia, os bovinos acometidos devem ser retirados da área de solo arenoso e receberem feno de boa qualidade e uma mistura de capim que contenha melaço e
minerais. Os bovinos gravemente acometidos devem ser tratados com óleo mineral (4 L/dia, por 3 dias).
PREVENÇÃO  E  CONTROLE:  A prevenção é possível pelo fornecimento dos nutrientes necessários às vacas de corte prenhes durante o inverno. Quando um volumoso de baixa qualidade é utilizado, deve­se analisá­lo quanto  ao  teor  de
proteína bruta e de energia digerível. Com base nessa análise, geralmente acrescentam­se grãos à ração para suprir as necessidades calóricas e proteicas.
As necessidades nutricionais de bovinos de corte (p. 2266) são parâmetros médios; podem ser necessários teores de nutrientes mais altos do que os indicados, particularmente nos períodos de estresse grave decorrente do frio. Água fresca
adequada deve ser fornecida à vontade; é perigosa a prática de forçar as vacas criadas em pastagem durante o inverno a suprirem suas necessidades de água por ingestão de neve, enquanto se alimentam de volumoso de baixa qualidade.

 ÚLCERAS DE ABOMASO
Nota­se úlcera de abomaso em bovinos adultos e em bezerros; induz vários tipos de manifestações.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Com exceção do linfossarcoma de abomaso e erosão da mucosa abomasal, que acompanham doenças virais como diarreia viral bovina, peste bovina e febre catarral maligna, as causas de ulcerações abomasais
não são bem compreendidas. Têm­se sugerido várias causas. Embora as úlceras de abomaso possam ocorrer em qualquer momento durante a lactação, são comuns em vacas leiteiras adultas de alta produção, nas primeiras 6 semanas após o
parto. A causa mais provável é a inapetência prolongada que resulta em baixo pH no abomaso por longo tempo, o que dá origem à afirmação “sem ácido, sem úlcera”.
As úlceras do abomaso podem surgir em associação com linfossarcoma, enfermidades do abomaso (deslocamento ou vólvulo) ou pressão luminal elevada que causa isquemia da mucosa do abomaso; também podem surgir sem relação
com outras doenças.
As úlceras de abomaso são muito frequentes em bezerros após o consumo de leite ou de substituto de leite por 4 a 12 semanas. A maioria dessas úlceras é subclínica e não hemorrágica. Ocasionalmente, bezerros < 2 semanas de idade,
alimentados com leite, desenvolvem úlceras abomasais hemorrágicas agudas, que podem perfurar e causar morte súbita. Bezerros de corte lactentes, bem nutridos, com 2 a 4 meses de idade, podem apresentar úlcera de abomaso aguda.
Nesses bezerros são comuns tricobezoares no abomaso, mas não parecem aumentar o risco de úlcera.
ACHADOS CLÍNICOS:  A síndrome varia, dependendo se a úlcera é complicada por hemorragia ou perfuração e da gravidade desta hemorragia ou peritonite.
Um sistema de classificação baseia­se na profundidade da úlcera ou no grau da hemorragia ou de peritonite causada pela úlcera: o tipo I é uma erosão ou úlcera sem hemorragia; o tipo II é hemorrágico; o tipo III indica úlcera perfurada,
com peritonite aguda localizada, o tipo IV indica úlcera perfurada, com peritonite difusa aguda, e no tipo V há úlcera perfurada, com peritonite que se instala até o omento. Pode haver uma única úlcera ou várias úlceras agudas e crônicas.
Bovinos com úlcera de abomaso hemorrágica podem ser assintomáticos, apresentando apenas sangue oculto intermitente nas fezes, ou pode morrer de forma súbita devido à hemorragia intensa. Os sinais clínicos comuns incluem dor
abdominal leve, bruxismo, início súbito de anorexia, taquicardia (90 a 100 bpm) e sangue oculto nas fezes ou melena, que podem ser intermitentes. Ocorrem sinais de perda sanguínea junto com hemorragia importante e estes podem incluir
taquicardia (100 a 140 bpm), membranas mucosas pálidas, pulso fraco, extremidades frias, respiração superficial, taquipneia e melena. Os sintomas mais graves incluem estase ruminal aguda, dor abdominal generalizada com relutância em
se movimentar e ronco ou gemido audíveis em cada movimento respiratório, fraqueza e desidratação. Nos casos hiperagudos pode não haver melena, pois são necessárias, no mínimo, 8 h para que o sangue do abomaso seja detectado nas
fezes. À medida que a doença progride a temperatura corporal diminui e o animal se posiciona em decúbito e morre em 6 a 8 h.
Em geral, as úlceras hemorrágicas não perfuram e as úlceras perfurantes não sangram suficientemente no lúmen do trato GI a ponto de provocar melena. No entanto, às vezes observam­se hemorragia e perfuração simultâneas, geralmente
em casos crônicos ou associados a deslocamento do abomaso.
Bezerros com úlcera de abomaso e tricobezoares podem apresentar o órgão preenchido com gás e líquido, palpável atrás do arco costal direito. Uma palpação profunda pode revelar dor abdominal associada a peritonite local devido à
úlcera perfurada. Nos bezerros, as úlceras perfurantes são mais comuns do que as úlceras hemorrágicas.
Lesões: A úlcera é mais comum na região fúndica, em bovinos adultos, e no antro pilórico, em bezerros lactentes. As úlceras únicas ou múltiplas medem desde alguns milímetros até 5 cm de diâmetro. A artéria acometida geralmente é
visível após remoção da ingesta e do tecido necrosado, em uma área ulcerada hemorrágica. A maioria das úlceras perfuradas é protegida pelo omento, originando uma cavidade de 12 a 15 cm de diâmetro, contendo sangue degenerado e
restos de material necrosado. O material oriundo dessa cavidade pode se infiltrar amplamente pela gordura do omento. Pode ocorrer aderência da úlcera com os órgãos circundantes ou com a parede abdominal.
DIAGNÓSTICO:  Nos casos com apenas sangramento brando e sinais clínicos discretos, o diagnóstico é difícil e pode requerer exames de fezes seriados para pesquisa de sangue oculto. A possibilidade de haver outras enfermidades que
podem causar anorexia parcial e diminuição da produção de leite deve ser excluída por meio de exames físicos e laboratoriais, inclusive abdominocentese. Em casos de melena, o diagnóstico pode se basear apenas no exame físico. O
volume globular (VG) pode auxiliar na determinação do grau de hemorragia, embora sejam necessárias, no mínimo, 4 h após a hemorragia aguda para a verificação de redução do VG. A pesquisa de sangue oculto nas fezes pode confirmar
ocorrência de melena. As outras enfermidades que resultam em sangue nas fezes devem ser descartadas. No teste para pesquisa de sangue oculto nas fezes ocorre reação do sangue oriundo de porções do trato GI distais ao abomaso;
geralmente  é  vermelho­brilhante,  se  proveniente  do  intestino  grosso,  ou  cor  de  framboesa,  se  oriundo  do  intestino  delgado.  Animais  com  linfossarcoma  de  abomaso  podem  manifestar  uma  síndrome  hemorrágica  semelhante  àquela
associada a úlcera de abomaso, mas não respondem à terapia. Ocasionalmente, lesões orais, faringianas e laringianas sangram e o sangue ingerido surge nas fezes. Da mesma forma, abscessos pulmonares que se formam como sequela de
ruminite, por embolia pulmonar e hepática, podem causar erosão de vasos sanguíneos e resultar em hemoptise; se o sangue for deglutido, também pode resultar em melena. A presença de sangue oculto nas fezes também pode ser devido a
VA ou, raramente, a helmintos hematófagos.
O diagnóstico de úlcera de abomaso perfurada baseia­se no exame físico e na exclusão de outras causas de peritonite. Úlcera de abomaso perfurada, com peritonite local, pode ser indistinguível de reticuloperitonite traumática crônica. A
introdução de um ímã no retículo (confirmado pelo uso de uma bússola) ou a informação confiável sobre a introdução de um ímã à vaca antes do início dos sintomas reduz a probabilidade de reticuloperitonite traumática. As radiografias de
retículo podem confirmar ou descartar a presença de corpos estranhos radiopacos. Em alguns casos, ocorre neutrofilia, possivelmente com desvio à esquerda. A avaliação do líquido peritoneal confirma a peritonite se há aumento no teor de
proteína  total  e  na  quantidade  de  células  nucleadas.  Raramente  observam­se  bactérias  intracelulares  ou  neutrófilos  degenerados,  pois  na  maioria  dos  casos  a  infecção  é  rapidamente  isolada.  O  diagnóstico  de  peritonite  difusa  devido  à
perfuração  baseia­se  no  exame  físico  e  na  exclusão  de  outras  causas.  Ruptura  de  uma  víscera  distendida,  como  pode  ocorrer  no  VA  ou  na  torção  de  ceco,  provoca  sintomas  semelhantes.  Na  peritonite  difusa,  independente  da  causa  o
prognóstico é desfavorável devido à infecção generalizada e ao comprometimento cardiovascular. Nota­se neutrofilia com desvio à esquerda acentuado e hemoconcentração. A coleta de grande quantidade de fluido abdominal é facilitada e
o teor de proteínas aumenta; a contagem de células nucleadas pode estar elevada ou permanecer normal devido à diluição ou seu uso no foco infeccioso.
Úlcera de abomaso. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

TRATAMENTO:  Muitos casos de úlceras de abomaso não são diagnosticados e, consequentemente, não são tratados. Ocasionalmente, faz­se um diagnóstico presuntivo e institui­se o tratamento clínico. O tratamento mais importante é a
reintrodução  da  alimentação,  pois  o  alimento  é  um  excelente  tampão  e  o  fluxo  contínuo  do  conteúdo  dos  pré­estômagos  (pH  6  a  7)  para  o  abomaso  ajuda  a  elevar  o  pH  deste  órgão.  A  terapia  com  antibióticos  de  amplo  espectro
(administrados por = 5 dias ou até a temperatura retal permanecer normal por 48 h) é indicada para úlcera perfurada. Antiácidos são efetivos no aumento do pH do abomaso em bezerros lactentes, quando administrados em intervalos de 4 a
6 h, de modo a induzir o fechamento do sulco esofágico; entretanto, sua eficácia é muito questionável em ruminantes adultos, devido à diluição ruminal. Os antagonistas de receptores H2 são efetivos no aumento do pH do abomaso em
bezerros lactentes; no entanto, as doses orais necessárias para cimetidina (100 mg/kg, 3 vezes/dia) e ranitidina (50 mg/kg, 3 vezes/dia) são altas, o que torna o tratamento oneroso. Os inibidores da bomba de prótons, como o omeprazol (2
mg/kg, IV), são efetivos em aumentar o pH luminal, mas o tratamento também é caro. A eficácia do omeprazol oral (4 mg/kg) em ruminantes adultos é desconhecida, mas pode ser benéfico em bezerros lactentes. Como os AINE podem
favorecer a ocorrência de úlcera, seu uso é contraindicado. O prognóstico de peritonite localizada, associada à úlcera de abomaso perfurada, é favorável quando acompanhado de terapia medicamentosa e alteração da dieta. A recuperação
geralmente demora 1 a 2 semanas e os animais totalmente recuperados nesse período geralmente não apresentam recidiva. No caso de úlcera de abomaso perfurada, indica­se cirurgia apenas quando há deslocamento do abomaso; entretanto,
pode ocorrer importante contaminação do abomaso quando há desprendimento das aderências e ressecção ou sutura da úlcera.
Os animais com peritonite difusa após perfuração da úlcera de abomaso raramente respondem à terapia e o prognóstico é desfavorável. O tratamento consiste em fluidoterapia IV rápida e continuada (com base na condição metabólica
atual) e uso de antibióticos de largo espectro IV. Os poucos animais que se recuperam de peritonite difusa geralmente apresentam extensas aderências abdominais.
No caso de úlceras hemorrágicas, podem ser necessárias transfusões sanguíneas e fluidoterapia, além de manejo alimentar, confinamento em baia e uso de antiácidos orais. Se a hemorragia é aguda, o VG pode não refletir a gravidade
devido ao equilíbrio entre os fluidos dos compartimentos intra e extravascular quando há perda de sangue de, no mínimo, 4 h. Geralmente, transfusão sanguínea é necessária quando há fraqueza e letargia; a decisão em se fazer transfusão
deve se basear nos sinais clínicos, além do valor do VG. Geralmente, não há necessidade de reação cruzada; é necessária apenas uma transfusão de 4 a 6L de sangue. Alguns bovinos necessitam mais de uma transfusão ao longo de vários
dias. Uma recuperação completa geralmente demora 1 a 2 semanas. O prognóstico é favorável, desde que não haja fraqueza e letargia antes do início do tratamento.
PREVENÇÃO:  Os animais devem ser estimulados a se alimentar para evitar longo período de inapetência e baixo pH no abomaso.

DOENÇAS DO ESÔFAGO EM GRANDES ANIMAIS

 ESTENOSE ESOFÁGICA
Pode­se notar estenose esofágica idiopática em potros. O diagnóstico inicial baseado nos sinais clínicos pode ser retardado devido a outras causas mais frequentes de disfagia, incluindo deslocamento dorsal idiopático do palato mole ou
refluxo nasal de leite, fenda palatina ou cisto faringiano. Em todos os casos de secreção nasal de leite em potros deve­se realizar exame endoscópico. A estenose esofágica em equinos ou ruminantes idosos tipicamente se deve à úlcera de
mucosa secundária à obstrução do esôfago. O tratamento adequado depende do tipo de estenose, se é de mucosa ou mural (envolvendo a parede muscular). A estenose de mucosa pode ser submetida a tratamento conservador mediante
manejo alimentar (ver obstrução esofágica, no texto anterior), dilatação com sonda endotraqueal com manguito ou cirurgia. A estenose mural é melhor tratada com miotomia esofágica. O tratamento cirúrgico da estenose de mucosa pode
envolver esofagotomia ao longo da área estenosada, com colocação de tubo nasogástrico, o que resulta em um divertículo de tração, ressecção e anastomose da mucosa ou ressecção esofágica e anastomose de toda a área espessada.

 NEOPLASIA ESOFÁGICA
A neoplasia esofágica mais comum em equinos é o carcinoma de célula escamosa, cujo prognóstico é reservado. As neoplasias focais podem ser tratadas por meio de ressecção e anastomose esofágica. Infelizmente, na maioria dos casos de
carcinoma de célula escamosa não é possível tratamento cirúrgico e deve­se realizar eutanásia.
Em ruminantes, o papiloma viral bovino (ou seja, verruga), ocasionalmente se instala no esôfago cranial e na faringe e, na presença de outros agentes, pode resultar no desenvolvimento de carcinoma de esôfago. Em algumas áreas do
mundo (p. ex., Escócia e América do Sul) esta doença pode ser decorrência da ingestão de toxinas naturais de samambaia. Há, também, uma relação entre a ingestão de samambaia e a ocorrência de câncer de bexiga, em bovinos (ver p.
3159).

 OBSTRUÇÃO ESOFÁGICA (ENGASGAMENTO)
A obstrução esofágica (engasgamento) ocorre quando o esôfago é obstruído por alimentos ou objetos estranhos. Esta é a doença esofágica mais comum em grandes animais. Em equinos é mais frequente a obstrução por grãos, polpa de
beterraba  ou  feno.  A  obstrução  esofágica  também  pode  ocorrer  após  recuperação  de  contenção  química  em  estação  ou  de  anestesia  geral.  Em  bovinos  a  obstrução  tende  a  ser  causada  por  um  único  objeto  sólido,  por  exemplo,  maçã,
beterraba, batata, nabo, sabugo ou palha de milho.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em equinos, os sinais clínicos associados à obstrução esofágica incluem secreção nasal com alimento ou saliva, disfagia, tosse ou ptialismo. O equino pode parecer ansioso e com ânsia de vômito, esticando e arqueando
o pescoço. Os equinos acometidos podem continuar a se alimentar ou beber, o que agrava os sinais clínicos.
Em bovinos, os sintomas incluem timpanismo, ptialismo ou secreção nasal com alimento e água. Os ruminantes podem manifestar timpanismo e desconforto ou decúbito, ou pode exibir protrusão da língua, extensão da cabeça, bruxismo
e ptialismo. A obstrução esofágica aguda total é uma emergência, pois impede a eructação de gases ruminais, instalando­se timpanismo. O timpanismo grave pode causar asfixia à medida que o rúmen expandido pressiona o diafragma e
diminui o retorno de sangue venoso ao coração.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos de obstrução esofágica geralmente são sugestivos. Achados de exame físico compatíveis com obstrução esofágica incluem secreção nasal com alimento e água, bruxismo, ptialismo e aumento palpável do
esôfago; em alguns casos, objetos estranhos alojados no esôfago cervical podem ser localizados por palpação. Enfisema subcutâneo, celulite cervical e febre podem estar associados a ruptura de esôfago. A impossibilidade de introdução de
sonda gástrica (ruminantes) ou nasogástrica (equinos) também pode confirmar o diagnóstico.
O exame endoscópico é útil para localizar o sítio da obstrução, o tipo de material que causa a obstrução e a extensão da úlcera esofágica. Devido ao risco de pneumonia por aspiração deve­se examinar cuidadosamente o trato respiratório,
incluindo auscultação cardíaca e pulmonar e radiografias torácicas. Em casos crônicos ou complicados deve­se obter hemograma e perfil bioquímico sérico. As alterações no hemograma incluem leucocitose, desvio à esquerda e neutrófilos
tóxicos; também, nota­se hiperfibrinogenemia. As alterações bioquímicas incluem hiponatremia, hipocloremia e hipopotassemia secundárias à perda excessiva de saliva.
TRATAMENTO:
Equinos: Vários casos de obstrução de esôfago podem se resolver espontaneamente, se há restrição de alimento e água. A cura espontânea pode ser auxiliada pela administração de sedativos (como xilazina e detomidina). A ocitocina (0,11 a
0,22 mg/kg, IV) mostrou­se útil como relaxante do músculo liso do esôfago. Para garantir que a obstrução esofágica seja completamente resolvida, todos os equinos com suspeita de obstrução devem ser submetidos à introdução de sonda
nasogástrica até o estômago ou ao exame endoscópico.
Não se deve esperar > 4 a 6 h para introduzir a sonda nasogástrica devido ao risco de úlcera da mucosa esofágica e à pneumonia por aspiração. Os equinos que não respondem ao tratamento conservador (restrição de água e alimento,
sedação IV ou uso de ocitocina) devem ser inicialmente tratados mediante lavagem esofágica da seguinte maneira: após sedação IV, introduz­se um tubo nasogástrico até o local da obstrução. Neste local, infunde­se água por meio de uma
sonda gástrica, o tubo é vagarosamente introduzido, com liberação de água para lavar o esôfago. A cabeça deve ficar mais baixa do que o tronco, de modo a minimizar o risco de aspiração de água aos pulmões. A lavagem via nasogástrica é
bem­sucedida em, no mínimo, 90% dos casos.
Para equinos que não respondem à lavagem esofágica em estação, sob anestesia geral, deve se realizar o procedimento com o animal em decúbito lateral e com tubo orotraqueal. Novamente, a cabeça deve permanecer abaixo do tronco
para evitar a passagem de líquido aos pulmões. Uma sonda endotraqueal com manguito (18 a 22 mm) é introduzida no esôfago, o mais longe possível, ou na altura da obstrução, e o manguito é inflado. Introduz­se uma sonda nasogástrica
dentro  da  sonda  nasotraqueal  e  o  esôfago  é  lavado,  conforme  descrito  anteriormente.  Novamente,  deve­se  confirmar  se  houve  resolução  da  obstrução  por  meio  de  endoscopia  ou  pela  introdução  de  sonda  nasogástrica  até  o  estômago.
Raramente há casos que requerem esofagotomia para a correção da obstrução do esôfago.
Imagem endoscópica de obstrução de esôfago pós­faringiana. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Todos os casos crônicos de obstrução esofágica devem ser avaliados por meio de endoscopia, após resolução bem­sucedida. Estes equinos geralmente apresentam úlcera esofágica circular. Úlcera grave da mucosa pode ocasionar estenose
de esôfago e recidiva da obstrução. A endoscopia também é útil para excluir a possibilidade de divertículo esofágico, que pode predispor à obstrução do órgão. Os divertículos esofágicos também podem ser diagnosticados por meio de
esofagograma contrastado.
Os equinos sem úlcera de mucosa devem ser alimentados com ração peletizada úmida durante, no mínimo, 7 a 14 dias, para minimizar o risco de recidiva da obstrução esofágica. Equinos com úlcera de mucosa devem ser alimentados
com esta mesma dieta durante 60 dias e depois desse período deve­se repetir a endoscopia para verificar se houve cura da úlcera de mucosa e se há estenose de esôfago. Equinos com úlcera de mucosa crônica e estenose podem necessitar
tratamento cirúrgico.
A  pneumonia  por  aspiração  deve  ser  tratada  com  antimicrobiano  e  anti­inflamatório  VO  ou  IV.  Os  antimicrobianos  comumente  utilizados  são  penicilina  G  potássica  ou  procaína  (22.000U/kg  IV  [potássica]  ou  IM  [procaína],  2  a  4
vezes/dia),  sulfametoxazol­trimetoprima  (30  mg/kg,  VO,  2  vezes/dia)  e  sulfato  de  gentamicina  (6,6  mg/kg,  IV  ou  IM,  1  vez/dia).  Metronidazol  (15  mg/kg,  VO,  4  vezes/dia)  é  útil  no  tratamento  de  infecções  por  anaeróbios.  Os  anti­
inflamatórios mais comumente utilizados são fenilbutazona (2,2 a 4,4 mg/kg VO ou IV, 2 vezes/dia) e flunexina meglumina (1,1 mg/kg IV, 2 vezes/dia).
Bovinos: A obstrução esofágica acompanhada de timpanismo ruminal é uma emergência; se os sinais clínicos indicam angústia deve­se aliviar o timpanismo (p. 301) com introdução de trocarte na fossa sublombar esquerda. Aliviado o
timpanismo,  os  objetos  sólidos  (p.  ex.,  batata)  geralmente  podem  ser  massageados  ou  até  desalojados  espontaneamente  à  medida  que  sua  superfície  externa  é  amolecida  pela  saliva.  Deve­se  ter  cuidado  ao  fazer  qualquer  tentativa  de
empurrar um objeto traumatizante ao longo do esôfago por meio de sonda esofágica; pode ocorrer ruptura de esôfago e mediastinite séptica fatal.
A obstrução esofágica em ruminantes pode ser tratada mediante lavagem esofágica com o animal em estação, via sonda orogástrica, ou sob anestesia geral (ver texto anterior). Geralmente, um corpo estranho grande pode ser empurrado
para o rúmen sem complicações adicionais. Raramente, casos de obstrução esofágica por corpo estranho necessitar ser tratados com esofagostomia.
Complicações da Obstrução Esofágica
Em equinos e bovinos, pneumonia por aspiração (p. 1620) e pleuropneumonia séptica podem ser complicações de obstrução esofágica, principalmente em casos crônicos. Obstrução esofágica crônica (> 24 h) pode estar associar à necrose
por pressão na mucosa do esôfago devido ao contato prolongado com o corpo estranho. A lesão de mucosa em circunferência pode contribuir para o desenvolvimento de estenose esofágica.
Ruptura  de  esôfago  é  uma  complicação  geralmente  fatal  da  obstrução  crônica  do  órgão.  A  ruptura  esofágica  cervical  pode  ocasionar  celulite  cervical  localizada,  mediastinite  ou  pleuropneumonia  séptica.  A  ruptura  intratorácica
geralmente é fatal. A ruptura esofágica cervical pode ser tratada mediante drenagem local, lavagem da ferida e introdução de sonda nasogástrica no local da ruptura. Permite­se a formação de um divertículo por tração e a sonda nasogástrica
é retirada. A ruptura esofágica tratada com alimentação extrabucal raramente resulta em estenose de esôfago. Em casos de mediastinite ou pleuropneumonia séptica deve se considerar a realização de eutanásia devido à dificuldade em
controlar a infecção bacteriana.

Obstrução Esofágica Secundária à Doença Extraesofágica
Traumatismo cervical e pré­torácico podem resultar em fibrosamento periesofágico ou esofágico envolvendo a camada muscular. Isso pode causar estenose de esôfago e obstrução intermitente ou recidivante do órgão. Em alguns casos não
há evidência externa de trauma cervical ou pré­torácico. Na suspeita de trauma extraesofágico, o exame endoscópico do esôfago e o esofagograma contrastado podem ser úteis na definição do diagnóstico. Uma vez identificado o local de
estenose esofágica, alguns casos de estenose muscular podem ser tratados por meio de miotomia esofágica ou remoção do tecido conectivo fibroso ao redor do esôfago.

DOENÇAS DOS PRÉ­ESTÔMAGOS DE RUMINANTES

 ACIDOSE RUMINAL SUBAGUDA (acidose ruminal crônica, acidose ruminal subclínica)
Os ruminantes são adaptados para digestão e metabolização predominantemente de dietas à base de forrageiras, porém, a taxa de crescimento e a produção de leite aumentam substancialmente quando consomem dietas ricas em grãos. Uma
consequência da dieta com quantidade excessiva de carboidratos facilmente fermentáveis, juntamente com fibras inadequadas para ruminantes, é a acidose ruminal subaguda, caracterizada por períodos de baixo pH ruminal, menor ingestão
de alimento e subsequentes problemas de saúde. Doenças crônicas secundárias à acidose ruminal subaguda podem anular o ganho na produção decorrente de dieta rica em grãos. Bovinos leiteiros e de corte e ovinos de engorda apresentam
alto  risco  de  desenvolver  esta  enfermidade.  Embora  tipicamente  os  bovinos  leiteiros  sejam  alimentados  com  dietas  mais  ricas  em  forragens  e  fibras,  quando  comparadas  com  animais  de  engorda,  esta  vantagem  é  compensada  por  sua
ingestão muito maior de matéria seca.
ETIOLOGIA:  O pH ruminal varia consideravelmente no período de 24 h (tipicamente, 0,5 a 1 unidade de pH), sendo determinado pelo equilíbrio dinâmico entre a ingestão de carboidratos fermentáveis, a capacidade de tamponamento do
rúmen  e  a  taxa  de  absorção  de  ácidos  pelo  rúmen.  Se  o  pH  ruminal  se  mantém  abaixo  de  cerca  de  5,5  (o  menor  pH  fisiológico  normal)  por  mais  de  algumas  horas  ao  longo  do  dia  considera­se  que  há  acidose  ruminal  subaguda.  Por
convenção, a acidose ruminal é considerada subaguda quando o baixo pH do rúmen se deve ao acúmulo excessivo de ácidos graxos voláteis (AGV), sem excesso persistente de ácido láctico e quando o pH ruminal volta ao normal pela ação
das respostas fisiológicas do próprio animal.
A  capacidade  do  rúmen  em  absorver  rapidamente  ácidos  orgânicos  contribui  significativamente  para  a  estabilidade  do  pH  ruminal.  É  difícil  e  muito  raro  que  os  tecidos  periféricos  utilizem  AGV  prontamente  absorvidos  pelo  rúmen;
entretanto, a absorção destes AGV no rúmen pode ter importante efeito tampão.
AGV ruminais são absorvidos passivamente através da parede ruminal. Essa absorção passiva é exacerbada pelas papilas das vilosidades, que se projetam para fora da parede do rúmen e atuam como área de superfície importante para a
absorção. As papilas ruminais aumentam de tamanho quando os bovinos são alimentados com dietas ricas em grãos; isto possivelmente aumenta a área de superfície ruminal e a capacidade de absorção, protegendo o animal de acúmulo de
ácido no rúmen. Se a capacidade de absorção destas células for prejudicada (p. ex., ruminite crônica com fibrose) torna­se difícil o animal manter o pH estável após a alimentação.
Um mecanismo pelo qual os animais acometidos corrigem a acidose ruminal e restabelecem o pH ruminal normal é a escolha de partículas de forrageiras longas, quer seja pelo consumo preferencialmente de feno seco longo ou de rações
misturadas que contêm partículas de forragens maiores. Outro mecanismo é a redução do consumo de alimento. A menor ingestão de matéria seca é especialmente evidente quando o pH ruminal situa­se abaixo de cerca de 5,5. A redução
do consumo pode ser mediada por receptores de pH e/ou receptores de osmolalidade, no rúmen. Inflamação do epitélio ruminal (rumenite) pode causar dor e, também, contribuir para a menor ingestão durante acidose ruminal subaguda.
À medida que o pH ruminal diminui ocorre aumento inerente da absorção de AGV. Estes ácidos são absorvidos apenas na forma ionizada. A proporção de ácidos dissociados aumenta drasticamente à medida que há redução do pH
ruminal abaixo de 5,5, pois eles têm pKa em torno de 4,8. Em pH ruminal baixo, infelizmente há desvio da fermentação ruminal de carboidratos para a produção de lactato (principalmente devido à proliferação de Streptococcus bovis e
desvio para a produção de lactato, em vez de AVG), o que pode compensar o ganho na absorção de AGV. A produção ruminal de lactato é indesejável, uma vez que o lactato tem pKa muito mais baixo do que os AGV (3,9 versus 4,8). Por
exemplo, o lactato é 5,2 vezes menos dissociado do que os AGV em pH 5. Como resultado, o lactato permanece no rúmen por mais tempo e contribui para a redução do pH ruminal.
Ocorrem respostas de adaptação adicionais quando inicia a produção de lactato. Bactérias que utilizam lactato, como Megasphaera elsdenii e Selenomonas ruminantium, proliferam­se. Estas bactérias benéficas convertem o lactato em
outros AGV que, então, são facilmente ionizados e absorvidos. Entretanto, o turnover de utilizadores de lactato é muito mais lento do que o de sintetizadores de lactato. Logo, este mecanismo pode não ser estimulado rápido o suficiente
para estabilizar completamente o pH ruminal. Períodos de pH ruminal muito alto, como acontece durante a privação de alimento, podem inibir a população de utilizadores de lactato (que são sensíveis a pH ruminal elevado) e torná­los mais
suscetíveis à acidose ruminal grave.
Além  do  desequilíbrio  microbiano,  a  privação  alimentar  induz  superalimentação  quando  o  alimento  é  reintroduzido  aos  bovinos.  Isto  cria  um  duplo  efeito  na  redução  do  pH  ruminal.  Ciclos  de  privação  alimentar  seguidos  de
superalimentação aumentam significativamente o risco de acidose ruminal subaguda.
O  pH  ruminal  baixo  durante  acidose  ruminal  subaguda  também  reduz  o  número  de  espécies  de  bactérias  no  rúmen,  embora  a  atividade  metabólica  das  bactérias  que  permanecem  seja  muito  alta.  As  populações  de  protozoários  são
particularmente limitadas em pH ruminal baixo; geralmente, nota­se ausência de protozoários flagelados no fluido ruminal nos episódios de acidose ruminal subaguda. Quando há poucas espécies de bactérias e protozoários a microflora
ruminal  é  menos  estável  e  menos  capaz  de  manter  o  pH  do  rúmen  normal  durante  períodos  de  súbita  mudança  alimentar.  Assim,  períodos  de  acidose  ruminal  subaguda  tornam  os  animais  mais  suscetíveis  a  episódios  futuros  desta
anormalidade.
PATOGÊNESE:  O baixo pH ruminal pode ocasionar ruminite, erosão e úlcera do epitélio do rúmen. Uma vez instalada inflamação no epitélio ruminal, as bactérias podem colonizar as papilas e penetrar na circulação portal. Essas bactérias
podem ocasionar abscessos hepáticos, o que pode causar, por fim, peritonite na região próxima ao abscesso. Caso as bactérias ruminais passem pelo fígado (ou as bactérias de infecções hepáticas são liberadas para a circulação), elas podem
colonizar pulmões, válvulas cardíacas, rins ou articulações. Em geral, pneumonia, endocardite, pielonefrite e artrite resultantes dificilmente são diagnosticadas antes da morte. O exame pós­morte dessas enfermidades em animais que são
abatidos, que são refugos ou que morrem na fazenda pode ser muito útil.
A síndrome da veia cava caudal é causada pela liberação de um embolo séptico oriundo de abscessos hepáticos; este material séptico atinge os pulmões via veia cava caudal. Estas bactérias se proliferam no tecido pulmonar e podem
invadir vasos pulmonares, causando sua ruptura. Isto é observado clinicamente como hemoptise e morte súbita devido à hemorragia pulmonar intensa.
Acidose  ruminal  subaguda  também  está  associada  a  laminite  e  consequente  supercrescimento  de  casco  e  abscesso  e  úlcera  de  sola.  A  gravidade  da  laminite  depende  da  duração  e  da  frequência  da  anormalidade  metabólica.  Essas
enfermidades podais geralmente não surgem antes de semanas ou meses após o evento inicial. O mecanismo pelo qual a acidose ruminal subaguda aumenta o risco de laminite não é bem conhecido.
ACHADOS CLÍNICOS:  A principal manifestação clínica de acidose ruminal subaguda é redução ou ingestão alimentar cíclica, ou ambos. Outros sinais associados incluem diminuição da produção de leite, redução do teste de gordura, baixo
escore  de  condição  corporal  apesar  de  adequada  ingestão  calórica,  diarreia  de  causa  desconhecida  e  episódios  de  laminite.  Podem  ocorrer  altas  taxas  de  animais–refugo  ou  de  mortes  não  esclarecidas  no  rebanho.  Sangramentos  nasais
esporádicos devido à síndrome da veia cava caudal também podem ser observados. Os sinais clínicos são tardios e insidiosos. Episódios recentes de baixo pH ruminal não são detectados; na verdade, no momento em que o animal está em
jejum, seu pH ruminal provavelmente retorna ao normal. Pode ocorrer diarreia após períodos de pH ruminal baixo; no entanto, este achado é inconsistente e também pode estar relacionado com outros fatores alimentares.
DIAGNÓSTICO:  Acidose  ruminal  subaguda  é  melhor  diagnosticada  em  um  grupo  do  que  em  um  indivíduo.  A  avaliação  do  pH  no  fluido  ruminal  de  um  número  representativo  de  animais  aparentemente  saudáveis  em  um  grupo  é  um
procedimento utilizado para auxiliar no diagnóstico de acidose ruminal subaguda em rebanhos leiteiros. A seleção dos animais deve ser em grupos de alto risco: vacas com cerca de 15 a 30 dias de lactação, em rebanhos alimentados com
dieta à base de um componente, e vacas com cerca de 50 a 150 dias de lactação, em rebanhos alimentados com ração mista completa. O fluido ruminal é coletado por meio de punção do rúmen e seu pH é mensurado em aparelho medidor
de pH. Tipicamente, doze ou mais animais são avaliados cerca de 2 a 4 h após alimentação com grãos (ingrediente­base da dieta do rebanho) ou 6 a 10 h após a primeira alimentação diária com ração total misturada. Caso > 25% dos
animais testados apresentem pH ruminal < 5,5 o grupo é considerado sob alto risco de acidose ruminal subaguda. Esse tipo de teste diagnóstico deve ser usado juntamente com outros fatores, como exame da ração, avaliação das práticas de
manejo e identificação de problemas de saúde no rebanho.
A redução do teor de gordura do leite é um indicador ruim e pouco sensível de acidose ruminal subaguda em rebanhos leiteiros. Vacas e rebanhos com acidose ruminal subaguda grave podem apresentar teor normal de gordura no leite.
Logo, é importante não excluir o diagnóstico de acidose ruminal subaguda em rebanhos leiteiros que tenham teste de gordura no leite normal.
TRATAMENTO:  Pelo fato de a acidose ruminal subaguda não ser detectada no momento da diminuição do pH do rúmen, não há tratamento específico. As doenças secundárias podem ser tratadas conforme necessário.

PREVENÇÃO:  O fator principal na prevenção é a redução da quantidade de carboidratos facilmente fermentáveis consumidos em cada refeição. Requer tanto boa formulação da dieta (balanço adequado entre carboidratos não fibrosos e
fibrosos) e excelente manejo do cocho de alimentos. Animais que consomem dietas bem formuladas permanecem sob alto risco desta enfermidade quando tendem a ingerir grande quantidade de alimento devido à excessiva competição por
espaço no cocho ou após período de privação alimentar.
As recomendações de campo para dieta à base de concentrado para bovinos leiteiros nas 3 primeiras semanas de lactação geralmente são excessivas. O consumo de volume exagerado de concentrado e insuficiente de forragem resulta em
dieta deficiente em fibra, com risco de causar acidose ruminal subaguda. A mesma situação pode ocorrer nos últimos dias que antecedem ao parto, se a dieta é fornecida em componentes separados; à medida que a ingestão de matéria seca
diminui antes do parto, as vacas secas consomem preferencialmente concentrado, em vez de forragem, e desenvolvem acidose.
Acidose ruminal subaguda pode ser causada também por erros na distribuição da ração ou pela formulação de ração que contém quantidade excessiva de carboidratos facilmente fermentáveis ou deficiência em fibras. Recomendações
quanto à exigência de fibras em rações de bovinos leiteiros estão disponíveis no relatório do National Research Council, Exigência Nutricional de Bovinos Leiteiros (ver p. 2390). Os erros no conteúdo de matéria seca em rações misturadas
completas geralmente estão associados à falha no ajuste do teor de umidade das forragens.
A inclusão de partículas de fibras longas na dieta reduz o risco de acidose ruminal subaguda por estimular a produção de saliva durante a mastigação e por aumentar a ruminação após a alimentação. O fornecimento de partículas de fibras
longas reduz o risco de acidose ruminal, mas não o elimina. Caso seja utilizada uma dieta mista completa, é importante que as partículas de fibras longas não sejam facilmente separadas do resto da dieta; isto pode retardar seu consumo até
o fim do dia ou causar sua total rejeição. A separação pode ser evitada pelo fornecimento de partículas de fibras longas < 5 cm de comprimento, por umidade adequada (50 a 55%) na ração mista e pela inclusão de ingredientes, como
melaço, que ajudam na aderência dos componentes da ração.
As dietas de ruminantes também devem ser formuladas para fornecer tamponamento adequado. Isto pode ser alcançado por meio da seleção da matéria­prima e/ou pela adição de tampões alimentares, como bicarbonato de sódio ou
carbonato de potássio. Dieta com diferença cátion­ânion (DDCA) é usada para quantificar a capacidade de tamponamento do alimento; as rações para animais com alto risco de acidose ruminal devem ser formuladas de modo a fornecer
DDCA com > 250 mEq/kg de matéria seca, utilizando­se a fórmula (Na + K) – (CI + S), para calcular a DDCA. A suplementação da dieta com microrganismos, que exacerbam os utilizadores de lactato no rúmen, pode reduzir o risco de
acidose ruminal subaguda. Têm­se utilizado leveduras, propionobactérias, lactobacilos e enterococos com esse objetivo. A suplementação com ionóforos (p. ex., monensina sódica) também pode reduzir o risco por inibir seletivamente os
produtores de lactato ruminal e reduzir o tamanho do alimento.
 FECHAMENTO INCOMPLETO DA GOTEIRA ESOFÁGICA
O fechamento incompleto da goteira esofágica se deve à falha no reflexo do esfíncter reticular e resulta em acidose ruminal, em bezerros lactentes. A enfermidade apresenta–se como uma doença primária crônica (síndrome do fechamento
incompleto  da  goteira  esofágica)  em  vitelos,  e  na  sua  forma  aguda,  como  complicação  secundária  de  diversas  doenças  neonatais,  principalmente  diarreia  do  neonato.  A  enfermidade  também  foi  relatada  em  ovinos  alimentados
artificialmente.
O esfíncter reticular é uma estrutura muscular que se estende do cárdia ao orifício retículo­omasal. O seu fechamento adequado é essencial para a passagem correta do leite ou de substituto de leite ingerido ao abomaso. Quando há falha
total ou parcial no fechamento do esfíncter reticular, o leite vai para o rúmen e retículo, onde é fermentado e origina ácidos graxos de cadeia curta e/ou ácido láctico. A subsequente diminuição do pH do conteúdo ruminal a valor às vezes
inferior a 4 causa graus variáveis de inflamação na mucosa dos pré­estômagos e do abomaso. Em casos crônicos, hiperqueratose ou paraqueratose da mucosa ruminal pode resultar em motilidade ruminal prejudicada, com timpanismo
crônico ou recidivante. Além disso, ocorre atrofia de vilosidades intestinais e redução da atividade das enzimas da borda em escova, com má digestão e má absorção.
A consequência sistêmica do fechamento incompleto da goteira esofágica que causa indigestão láctea aguda se deve principalmente à absorção de ácidos orgânicos do trato digestório. Especificamente, isômeros L e D do ácido láctico
podem causar acidose metabólica, com acúmulo de D­lactato, devido à deficiência de uma enzima específica para seu metabolismo, em mamíferos. Recentemente, o acúmulo de D­lactato foi incriminado como causa de sinais clínicos,
como depressão, ataxia e fraqueza generalizada.
A disfunção primária do esfíncter reticular se deve a condições de estresse (transporte por tempo prolongado, aglomeração, mudanças no manejo alimentar), principalmente em vitelos alimentados em balde. Geralmente, os sinais clínicos
surgem algumas semanas após a chegada de bezerros para a engorda e se caracterizam por inapetência, depressão, crescimento retardado, perda de pelos, timpanismo recidivante, distensão do abdome ventral e excreção de fezes pastosas.
Sons indicativos de movimentação de líquido podem ser audíveis ao se fazer balotamento do flanco esquerdo. A obtenção de conteúdo ruminal fermentado por meio de sonda gástrica esclarece o diagnóstico. O prognóstico é desfavorável
em casos crônicos e avançados. Se a doença for diagnosticada precocemente, o fornecimento de pequenas quantidades de leite com auxílio de mamadeira ou balde pode ser útil. Além disso, o fechamento do esfíncter esofágico pode ocorrer
quando o bezerro é estimulado a sugar um dedo antes o fornecimento de leite.
Acidose ruminal aguda secundária a outras enfermidades é observada em maior frequência em bezerros com diarreia neonatal, mas também quando há doenças que causam dor ou fraqueza. Nestes casos, geralmente o quadro clínico
predominante é o da doença primária. Na ruminite grave, os bezerros podem apresentar ranger de dentes, dorso arqueado e distensão abdominal discreta. A alimentação forçada dos bezerros inapetentes ou com anorexia também pode
causar acidose ruminal ou agravar a situação, por fornecer substrato para fermentação adicional.
O prognóstico de indigestão láctea secundária varia principalmente em função da resposta ao tratamento da doença primária. Bezerros com acidose metabólica e desidratação devido à diarreia neonatal geralmente apresentam melhora
espontânea da indigestão láctea após tratamento adequado e, em geral, a doença não é detectada. Em bezerros submetidos à alimentação forçada ou que não respondem ao tratamento como se esperava deve­se suspeitar de indigestão láctea
e  deve­se  realizar  exame  do  fluido  ruminal.  A  remoção  do  conteúdo  e  a  lavagem  com  água  morna  com  auxílio  de  sonda  gástrica  podem  ser  úteis,  principalmente  após  alimentação  forçada  por  longo  tempo.  A  profilaxia  consiste  em
tratamento precoce dos bezerros doentes, manejo alimentar adequado e minimização do estresse em bezerros adquiridos.

 INDIGESTÃO SIMPLES (INDIGESTÃO ALIMENTAR DISCRETA)
A indigestão simples é um distúrbio menor da função gastrintestinal de ruminantes, que ocorre com maior frequência em bovinos e, raramente, em ovinos e caprinos. A indigestão simples é diagnosticada por exclusão e tipicamente está
relacionada com alteração abrupta na qualidade ou quantidade da dieta.
ETIOLOGIA:  Quase todos os fatores alimentares que podem alterar o ambiente intraruminal podem causar indigestão simples. A doença é comum em bovinos leiteiros e de corte alimentados manualmente, devido à variação na qualidade e
quantidade de seus alimentos. Os bovinos leiteiros podem ingerir subitamente uma quantidade excessiva de alimentos altamente palatáveis, como milho ou silagem de capim; os bovinos de corte podem consumir quantidade excessiva de
volumoso de má qualidade e relativamente indigerível durante o inverno. No decorrer da seca, bovinos e ovinos podem ser forçados a ingerir grande quantidade de palha, cama ou arbustos de má qualidade. A indigestão simples pode ser
decorrência de mudança alimentar súbita, uso de alimentos estragados ou congelados, introdução de ureia na ração, mudança dos bovinos para uma pastagem de cereais viçosa ou fornecimento de ração com alto teor de grãos para bovinos
de lote de engorda.
Geralmente, a indigestão simples está associada a mudança súbita do pH do conteúdo ruminal, como redução do pH ruminal devido à fermentação excessiva ou aumento do pH ruminal por putrefação de alimentos ingeridos. Isto também
pode ocorrer em consequência do acúmulo excessivo de alimentos relativamente indigeríveis que podem prejudicar fisicamente a função ruminal. Em geral, vários animais são acometidos simultaneamente devido à origem alimentar da
indigestão simples, embora a gravidade dos sinais clínicos possa variar entre eles.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos dependem do tipo de animal acometido e da causa da doença. A superalimentação com silagem provoca anorexia e diminuição moderada da produção de vacas leiteiras. Geralmente, o rúmen torna­se
repleto, firme e distendido; as contrações primárias estão ausentes ou em menor frequência, mas as contrações secundárias podem estar presentes, embora, em geral, menos vigorosas. A temperatura, o pulso e a respiração permanecem
normais. As fezes apresentam consistência normal ou firme, mas em quantidade reduzida. Geralmente ocorre recuperação espontânea em 24 a 48 h.
A indigestão simples causada pela ingestão excessiva de grãos resulta em anorexia e hipomotilidade ou atonia (estase) ruminal. O rúmen não se apresenta necessariamente repleto e pode conter excesso de líquido. Geralmente, as fezes
são moles ou aquosas e fétidas. O animal acometido permanece alerta e com frequência volta a se alimentar em 24 h. Relata­se um distúrbio digestivo mais grave devido à ingestão excessiva de grãos, quando ocorre sobrecarga de grãos (ver
a seguir).
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico de indigestão simples baseia­se no histórico de mudança abrupta no tipo e na quantidade de alimento, com acometimento de vários animais, e na exclusão de outras causas de disfunção de pré­estômagos. O
diagnóstico é confirmado pela coleta e exame do fluido ruminal, que pode indicar pH normal (< 6 ou > 7), redução do número e do tamanho dos protozoários ou tempo de redução do azul de metileno prolongado (uma estimativa da
atividade bacteriana).
Não há sinais sistêmicos, tampouco respostas doloridas à palpação profunda da cartilagem xifoide, notadas na reticuloperitonite traumática. As informações obtidas na anamnese e a ausência de cetonúria auxiliam a excluir a possibilidade
de cetose. Geralmente, a ocorrência de deslocamento do abomaso à esquerda pode ser excluída mediante auscultação e percussão simultâneas.
Indigestão vagal, vólvulo abomasal e vólvulo cecocólico são mais facilmente detectados com a progressão da doença. Sobrecarga por grãos é diferenciada de indigestão simples por sua maior gravidade e diminuição acentuada do pH do
conteúdo ruminal para < 5,5.
TRATAMENTO:  O tratamento visa corrigir os fatores alimentares suspeitos. Ocorre recuperação espontânea quando os animais são alimentados com alimentos típicos para ruminantes. A administração de cerca de 20 L de água ou de solução
salina morna com auxílio de sonda gástrica, seguida de massagem ruminal vigorosa, pode ajudar no restabelecimento da função ruminal em bovinos adultos. A administração oral de hidróxido de magnésio pode ser útil quando ocorre
ingestão excessiva de grãos, mas o hidróxido de magnésio deve ser administrado apenas aos bovinos com pH ruminal baixo (< 6); caso contrário, pode ocorrer alcalinização excessiva sistêmica e dos pré­estômagos. Fármacos rumenatóricos
(p. ex., noz­vômica, gengibre, tártaro emético, parassimpaticomiméticos) não são recomendados como tratamentos auxiliares. Se ocorre consumo de quantidade demasiada de ureia (ver p. 3092) ou de proteínas pode­se administrar vinagre
(ácido acético) por via oral, para retornar o pH ruminal à faixa de normalidade. Se o número ou a atividade dos microrganismos ruminais estiverem reduzidos, é útil a administração de 4 a 8L de fluido ruminal oriundo de uma vaca saudável
(ver p. 2582). Podem ser necessárias soluções eletrolíticas por via oral ou intravenosa, para corrigir os desequilíbrios eletrolíticos e ácido­base, particularmente em bovinos desidratados.

 PARAQUERATOSE RUMINAL
Paraqueratose  ruminal  é  uma  doença  que  acomete  bovinos  e  ovinos,  caracterizada  por  rigidez  e  aumento  de  volume  das  papilas  ruminais.  É  mais  comum  em  animais  alimentados  com  ração  rica  em  concentrado  durante  o  período  de
terminação.  Também  acomete  bovinos  alimentados  com  ração  peletizada  de  alfafa  submetida  à  tratamento  térmico,  bem  como  em  bezerros  com  acidose  ruminal  crônica  devido  à  indigestão  láctea.  Não  parece  estar  relacionada  com  o
fornecimento de antibiótico ou concentrado proteico. A prevalência em um grupo pode ser tão alta quanto 40%. Acredita­se que as lesões sejam causadas pela redução do pH e pelo aumento da concentração de ácidos graxos voláteis
(AGV) no fluido ruminal e geralmente não ocorre em bovinos alimentados com grãos inteiros não processados (em que os animais ganham peso rapidamente). Isto pode estar relacionado com o aumento do pH e da concentração de ácido
acético, em comparação com o teor de AGV de cadeia longa no fluido ruminal.
Várias papilas apresentam aumento de volume e rigidez e muitas delas podem se aderir formando agregados. Comumente, as papilas do saco ventral anterior são acometidas. Nos bovinos, o teto do saco dorsal pode exibir focos múltiplos
(cada um com 2 a 3 cm2) de paraqueratose. Nos ovinos, as papilas anormais podem ser visíveis e palpáveis na parede ruminal intacta. As papilas acometidas contêm camadas excessivas de células epiteliais ceratinizadas, partículas de
alimentos e bactérias. Durante a preparação do rúmen dos bovinos para o consumo humano, sua limpeza é difícil. O epitélio anormal, por interferir na absorção, pode reduzir a eficiência alimentar e o ganho de peso, embora existam poucas
evidências que sustentem essa teoria.
Paraqueratose ruminal pode ser evitada mediante a alimentação de animais de terminação com ração que contenha 1 parte de volumoso para 3 partes de concentrado. Não estão bem estabelecidos a necessidade e o impacto econômico da
prevenção.

 RETICULOPERITONITE TRAUMÁTICA (Doença de metais, Gastrite traumática)
A  reticuloperitonite  traumática  surge  como  consequência  da  perfuração  do  retículo.  É  importante  inclui­la  no  diagnóstico  diferencial  de  outras  doenças  caracterizadas  por  estase  do  trato  GI,  pois  causa  sintomas  semelhantes.
Reticuloperitonite traumática é mais comum em bovinos leiteiros adultos, ocasionalmente é observada em bovinos de corte e raramente em outros ruminantes.
Os bovinos costumam ingerir objetos estranhos, pois não distinguem materiais metálicos nos alimentos e não mastigam completamente os alimentos antes de engoli­los. A doença é comum quando se preparam forrageira, silagem e feno
de pastos que contêm cercas ou fios de arame farpado enferrujados e velhos, ou quando os pastos se encontram em áreas ou locais nos quais se tenham construído, queimado ou demolido prédios, recentemente. A ração de grãos também
pode ser uma fonte devido à adição acidental de metais.
ETIOLOGIA:  Os objetos metálicos engolidos, como pregos ou pedaços de arame, vão diretamente ao retículo ou passam para o interior do rúmen e são, subsequentemente, transportados para a dobra ruminorreticular, na parte cranioventral
do retículo, pelas contrações ruminais. O orifício retículo­omasal situa­se acima do assoalho deste pré­estômago, o que tende a reter objetos pesados no retículo, e a mucosa do retículo, semelhante a um favo de mel, aprisiona objetos
pontiagudos. As contrações do retículo fazem com que o objeto estranho penetre na parede. A compressão do rúmen e retículo, pelo útero, no final da prenhez e o esforço durante o parto aumentam a probabilidade de uma penetração inicial
no retículo; também, podem eliminar aderências causadas por uma penetração anterior.
A perfuração da parede do retículo permite extravasamento de ingesta e bactérias, que contaminam a cavidade peritoneal. A peritonite resultante geralmente é localizada e causa aderências. Menos comumente, desenvolve­se peritonite
difusa mais grave. O objeto pode penetrar no diafragma e na cavidade torácica (causando pleurite e, às vezes, abscesso pulmonar) e no saco pericárdico (causando pericardite, às vezes seguida de miocardite). Ocasionalmente, o fígado ou o
baço podem ser perfurados e se tornarem infectados, o que causa abscesso ou pode ocasionar sepse.
Relação entre retículo, diafragma e coração/pericárdio em grandes ruminantes. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

ACHADOS CLÍNICOS:  A lesão inicial no retículo caracteriza­se por início agudo de atonia ruminorreticular e queda acentuada na produção de leite. A defecação diminui. Geralmente, a temperatura retal encontra­se discretamente elevada. A
frequência cardíaca permanece normal ou ligeiramente aumentada e a respiração é superficial e rápida. Inicialmente, a vaca apresenta dorso arqueado, expressão ansiosa, relutância em se mover e marcha difícil e cuidadosa. Os movimentos
súbitos  forçados,  bem  como  defecação,  micção,  ato  de  deitar  e  de  levantar  e  o  pisar  sobre  barreiras,  podem  ser  acompanhados  de  gemidos.  Pode­se  estimular  a  emissão  de  ronco  por  meio  de  pressão  na  cartilagem  xifoide  ou  pelo
beliscamento firme da cernelha, que causa extensão do tórax e do abdome inferior. O ronco pode ser detectado por um estetoscópio colocado sobre a traqueia e aplicação de pressão ou beliscamento da cernelha ao final da inspiração.
Podem­se observar tremores no músculo tríceps e abdução do cotovelo.
Nos casos crônicos, há redução do apetite e da defecação e a produção de leite é baixa. Os sinais de dor abdominal cranial tornam­se menos aparentes e a temperatura retal geralmente retorna ao normal à medida que a inflamação aguda
diminui e a contaminação peritoneal é isolada. Alguns bovinos desenvolvem síndrome da indigestão vagal (ver a seguir), devido às aderências que se formam após perfuração por corpo estranho, particularmente uma perfuração no retículo
ventromedial.
As vacas com pleurite ou pericardite decorrente de perfuração por corpo estranho geralmente apresentam depressão, taquicardia (> 90 bpm) e febre (40°C). A pleurite manifesta­se por respiração rápida e superficial, abafamento dos sons
pulmonares e, possivelmente, atrito pleural. Toracocentese pode mostrar vários litros de fluido séptico. A pericardite traumática é caracterizada, com maior frequência, por abafamento das bulhas cardíacas; entretanto, na fase inicial da
doença, atrito pericárdico e sons de gases e fluidos (ruído de máquina de lavar roupa) podem ser notados à auscultação. Ocorre distensão da veia jugular e insuficiência cardíaca congestiva, com edema submandibular e peitoral acentuados
como sequelas frequentes de reticulopericardite traumática. O prognóstico é desfavorável quando há essas complicações. Uma penetração do pericárdio até o miocárdio geralmente causa extensa hemorragia no saco pericárdico ou arritmia
ventricular e morte súbita.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico pode se basear nas informações da anamnese (quando disponíveis) e nos achados clínicos, desde que a vaca seja examinada ao início dos sinais iniciais. Sem uma anamnese minuciosa e no caso de enfermidade
presente  há  vários  dias  o  diagnóstico  é  mais  difícil.  Outras  causas  de  peritonite,  particularmente  úlcera  abomasal  perfurada,  podem  ser  difíceis  de  distinguir  de  reticuloperitonite  traumática.  Os  diagnósticos  diferenciais  devem  incluir
enfermidades  que  possam  causar  sintomas  GI  variáveis  ou  inespecíficos,  por  exemplo,  indigestão,  linfossarcoma  ou  obstrução  intestinal.  Devem­se  descartar  deslocamento  do  abomaso  ou  vólvulo  por  meio  de  auscultação  e  percussão
simultâneas. Pleurite ou pericardite de origem não traumática causam sinais semelhantes àqueles associados a perfuração por corpo estranho.
Embora nem sempre sejam necessários, os exames laboratoriais podem ser úteis. Em vários casos, há neutrofilia com desvio à esquerda. As concentrações séricas de haptoglobina e de amiloide A, bem como de proteína total plasmática e
de fibrinogênio podem estar elevadas. Os animais acometidos podem apresentar distúrbios de coagulação, como tempo de protrombina, tempo de trombina e tempo de tromboplastina parcial ativada prolongados. O estado ácido­base e os
teores séricos de eletrólitos tipicamente são normais, pois a absorção no abomaso e no intestino delgado pode permanecer inalterada. No entanto, pode haver alcalose metabólica hipoclorêmica e hipopotassêmica marcante, possivelmente
devido  ao  íleo  adinâmico  decorrente  de  peritonite,  podendo  afetar  a  motilidade  GI,  inclusive  do  abomaso,  e  a  reabsorção  das  secreções  abomasais.  A  alcalose  metabólica  pode  ser  induzida  ou  exacerbada  por  tratamento  com  agentes
alcalinizantes, como hidróxido de magnésio, utilizados como laxantes. A análise do líquido peritoneal pode ser útil para avaliar se há peritonite, principalmente a mensuração da concentração de D­dímero e a porcentagem de neutrófilos no
líquido peritoneal. Entretanto, a peritonite geralmente é mascarada e, nesse caso, os valores dos exames do fluido peritoneal situam­se na faixa de normalidade, exceto quando o material é coletado exatamente no local da lesão. A presença
de um imã no retículo pode ser detectada pelo movimento de uma bússola posicionada no abdome cranioventral; a presença de um imã no retículo faz com que seja pouco provável a existência de reticuloperitonite traumática, exceto se o
objeto perfurante não for magnético.
O  método  diagnóstico  mais  confiável  para  peritonite  localizada  próximo  ao  retículo  e  para  caracterizar  o  número  de  contrações  reticulares  é  a  ultrassonografia  do  abdome  ventral.  Isso  raramente  detecta  a  presença  de  um  objeto
penetrante. A ultrassonografia de coração e tórax é muito útil no diagnóstico de pleurite e pericardite como sequelas de reticulopericardite traumática.
As radiografias laterais do abdome cranioventral podem revelar um material metálico no retículo, mas devem ser realizadas apenas após a administração de um imã por VO. Para determinar se o retículo foi perfurado, o corpo estranho
deve ser visível além da borda do retículo, não aderido ao imã localizado neste ou posicionado fora do assoalho reticular. Uma depressão na face cranioventral do retículo ou a identificação de abscesso (por acúmulo de gás fora de uma
víscera), de massas de tecido mole ou de uma linha de fluido no abdome cranial também são achados radiográficos confiáveis sugestivos de material penetrante. Os aparelhos de radiografia portáteis não conseguem penetrar na área reticular
de  bovinos  adultos  em  pé  e  o  animal  pode  precisar  ser  transportado  para  um  local  onde  exista  equipamento  com  capacidade  suficiente  para  isso.  Vaca  não  deve  ser  colocada  em  decúbito  dorsal  para  obter  as  radiografias,  pois  esta
manipulação altera a aderência no foco da lesão e pode causar peritonite localizada, que se torna difusa devido à disseminação da infecção por gravidade.
Os detectores de metal eletrônicos podem identificar material metálico no retículo, mas não distinguem corpos estranhos perfurantes daqueles não perfurantes.
TRATAMENTO:  O tratamento de um caso típico diagnosticado no início de seu curso pode ser cirúrgico ou clínico. Qualquer uma das abordagens melhora as chances de recuperação, de cerca de 60%, nos casos não tratados, para 80 a 90%.
A cirurgia envolve rumenotomia com remoção manual do(s) objeto(s) do retículo; se um abscesso se encontra aderido ao retículo, esse deve ser aspirado (para confirmar que se trata de um abscesso) e depois drenado no interior do retículo.
Deve­se administrar antimicrobiano no pré­operatório. O tratamento clínico envolve a administração de antibacterianos, para controlar a peritonite, e de um ímã, para evitar recidiva. Devido à flora bacteriana mista na lesão deve­se utilizar
um  antimicrobiano  de  amplo  espectro,  como  oxitetraciclina  (16  mg/kg  IV,  1  vez/dia).  A  penicilina  (22.000  UI/kg  IM,  2  vezes/dia)  é  utilizada  amplamente,  sendo  efetiva  em  muitos  casos,  apesar  do  seu  espectro  limitado.  As  vacas
acometidas devem ser confinadas por 1 a 2 semanas; acredita­se que a colocação destes animais em aclive pode limitar a penetração adicional do objeto estranho, mas não há comprovação científica. Deve–se administrar terapia de suporte,
como fluido oral ou, ocasionalmente, IV e borogliconato de cálcio SC, conforme necessário. A inoculação ruminal é benéfica em alguns casos de estase ruminal prolongada e perda da flora normal.
Os casos mais graves, com complicações secundárias evidentes, ou aqueles que não respondem à terapia medicamentosa ou cirúrgica inicial devem ser avaliados sob uma perspectiva econômica; se a vaca tiver baixo valor, o abate deverá
ser considerado, desde que a carcaça passe por uma inspeção.
PREVENÇÃO:  As medidas preventivas incluem evitar o uso de arame farpado, passar os alimentos sobre ímãs para remover objetos metálicos, não manter os bovinos em locais de construções novas e remover completamente construções e
cercas antigas. Além disso, pode­se administrar ímãs em barra, VO, preferivelmente depois de jejum de 18 a 24 h. Em geral, o ímã permanece no retículo e aprisiona quaisquer objetos ferromagnéticos em sua superfície. Há boas evidências
de que a administração de ímã a todas as novilhas e aos touros de reposição com cerca de 1 ano de idade minimiza a ocorrência de reticuloperitonite traumática.

 SÍNDROME DA INDIGESTÃO VAGAL (Indigestão crônica)
A síndrome da indigestão vagal caracteriza–se por desenvolvimento gradual de distensão abdominal secundária à distensão de rúmen e retículo. Originalmente, acreditava­se que a distensão resultava de lesões que afetavam o nervo vago
ventral. A síndrome da indigestão vagal ocorre com maior frequência em bovinos, mas já foi relatada em ovinos.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  As doenças que causam lesão, inflamação ou compressão do nervo vago podem resultar em sinais clínicos de síndrome da indigestão vagal. No entanto, na maioria dos casos de indigestão vagal não há lesão do
nervo vago e a causa mais comum é reticuloperitonite traumática (ver p. 291). As enfermidades que resultam em obstrução mecânica do cárdia ou do orifício retículo­omasal (p. ex., papiloma ou ingestão de placenta) também podem causar
indigestão vagal se ocorre distensão de rúmen e retículo e se a doença for subaguda ou crônica.
Historicamente, há relato de 4 tipos de indigestão vagal com base no local da obstrução funcional. O tipo I envolve falha de eructação ou timpanismo com gás livre; o tipo II implica falha no transporte do omaso; o tipo III envolve
impactação secundária do abomaso e o tipo IV indigestão em gestação avançada. Os tipos I e IV são raros.
A indigestão vagal tipo I, ou falha na eructação, resulta em timpanismo com gás livre, e deve­se a lesão inflamatória próxima ao nervo vago, como peritonite localizada, aderências (geralmente após um episódio de reticuloperitonite
traumática), ou pneumonia crônica com mediastinite anterior. Outras possíveis causas de indigestão vagal tipo I incluem traumatismo faringiano, que afeta uma parte mais proximal do nervo vago, e compressão esofágica por abscessos ou
neoplasias, como linfossarcoma. A indigestão vagal pode se instalar em bovinos, após vólvulo de abomaso sem impactação. Estes casos devem ser incluídos na categoria de indigestão vagal tipo I com lesão do nervo vago próximo ao
retículo e omaso.
A indigestão vagal tipo II, melhor definida como falha no transporte do omaso, desenvolve­se como resultado de qualquer enfermidade que impeça que a ingesta passe do canal do omaso ao abomaso. As aderências e os abscessos
(abscessos reticular ou hepático único) são as causas mais comuns de falha no transporte do omaso e, em geral, localizam­se na parede reticular direita ou medial, próximo ao trajeto do nervo vago. Os abscessos e as aderências reticulares se
devem,  quase  que  invariavelmente,  à  reticuloperitonite  traumática.  A  obstrução  mecânica  do  canal  do  omaso  por  material  ingerido  (p.  ex.,  sacolas  plásticas,  cordas,  placenta)  ou  por  massas  (p.  ex.,  linfossarcoma,  carcinoma  de  célula
escamosa, granulomas ou papilomas) também pode causar distensão ruminal e reticular crônica decorrente de falha no transporte do omaso.
A indigestão vagal tipo III envolve uma impactação secundária do abomaso. Impactação primária do abomaso se desenvolve em razão de alimentação com volumoso seco e grosseiro, como palha, picado ou triturado, com acesso restrito
à água e, em geral, durante temperaturas extremamente baixas (ver p. 277). A impactação secundária do abomaso ocorre com maior frequência após um episódio de reticuloperitonite traumática ou, ocasionalmente, como sequela de vólvulo
do abomaso. A fixação mecânica do retículo ao assoalho do abdome ventral em bovinos com reticuloperitonite altera a capacidade de filtração normal do retículo, com a passagem de fibras maiores (> 2 mm de comprimento) ao abomaso. O
abomaso tem dificuldade em eliminar partículas de alimentos maiores, devido ao aumento da viscosidade e, dessa forma, estas se acumulam no abomaso e resultam em impactação.
A  indigestão  vagal  tipo  IV,  ou  obstrução  parcial  dos  pré­estômagos,  é  pouco  definida.  Tipicamente  acomete  vacas  prenhes,  sendo  melhor  relatada  como  indigestão  em  gestação  avançada.  Acredita­se  que  esta  enfermidade  esteja
relacionada com o aumento do volume uterino, que desvia o abomaso para uma posição mais cranial, impedindo seu esvaziamento normal.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos variam de acordo com a localização da obstrução. Em todos os casos, ocorre desenvolvimento gradual (ao longo de dias a semanas) de distensão abdominal secundária à distensão de rúmen e retículo.
A distensão dos  sacos  dorsal  e  ventral  do  rúmen  resulta  em  um  rúmen  “em  forma  de  L”,  ao  exame  retal.  A  distensão  dorsal  esquerda  e  ventral  esquerda  e  direita  do  abdome  estabelece  uma  forma  de  “pera­maçã”  quando  o  animal  é
inspecionado por trás.
Os bovinos com síndrome da indigestão vagal apresentam diminuição do apetite que melhora, temporariamente, se a distensão for aliviada. A produção de leite diminui gradualmente, a defecação fica reduzida e o rúmen desenvolve uma
consistência  de  líquido  com  som  de  fluido.  Tipicamente  as  fezes  são  bastante  escassas  e  viscosas  e  podem  conter  partículas  maiores  do  que  o  normal.  A  força  das  contrações  ruminais  diminui;  no  entanto,  a  motilidade  do  rúmen
frequentemente aumenta (3 a 4 contrações por minuto). Comumente é possível observar movimentos da parede abdominal esquerda que reflete os movimentos da hiperatividade ruminal. No entanto, os sons de contração do rúmen não são
audíveis, pois o conteúdo torna­se espumoso devido às contrações prolongadas e à falha no esvaziamento do órgão.
Temperatura e frequência respiratória geralmente são normais; contudo, essas variáveis podem aumentar, dependendo da causa. Bradicardia está presente em 25 a 40% dos casos e ocorre devido à diminuição da ingestão de alimento e
não pela estimulação direta do nervo vago. Taquicardia desenvolve­se à medida que a doença progride e o animal pode apresentar desidratação. Com o tempo, o bovino desenvolve pelame áspero, perde sua condição corporal, enfraquece
(em alguns casos, chega ao decúbito) e manifesta sinais clínicos evidentes de desidratação.
Na palpação retal, o rúmen se apresenta distendido por gás ou espuma, ocupando todo o abdome esquerdo e pressionando o rim esquerdo para a direita da linha média. O saco ventral ruminal aumenta de volume e torna­se palpável
também à direita da linha média (o característico rúmen em “forma de L”). É importante saber que o diagnóstico de síndrome da indigestão vagal requer a constatação de aumento de volume marcante de rúmen e retículo. A palpação da
metade inferior do lado direito do abdome, abaixo da junção costocondral, pode detectar abomaso impactado que parece frouxo. Os achados hematológicos são variáveis. O VG pode estar aumentado devido à desidratação ou diminuído por
depressão da medula óssea (anemia por doença crônica). O número de leucócitos pode estar normal, aumentado ou diminuído. Se há enfermidade inflamatória, como peritonite, a proporção neutrófilos:linfócitos tipicamente se inverte e
pode ocorrer neutrofilia. Linfocitose pode ser um achado na indigestão vagal decorrente de linfossarcoma. Leucopenia pode ser notada em caso de peritonite difusa. Quando há abscesso pode ocorrer aumento das concentrações séricas de
globulinas e de proteína total.
O estado metabólico permanece normal ou pode ocorrer alcalose metabólica. A concentração sérica de cloro varia de acordo com o local da obstrução. Geralmente, permanece normal se a lesão for proximal ao abomaso. Baixo teor sérico
de cloro indica refluxo de cloreto do abomaso para o rúmen (vômito interno) e obstrução na altura do abomaso (tipo III). Se a concentração sérica de cloro está diminuída, tipicamente ocorre alcalose metabólica. A concentração de cloro no
rúmen aumenta na indigestão vagal tipo III, sendo uma maneira útil de diferenciar indigestão vagal tipo II daquela tipo III. A concentração sérica de potássio geralmente diminui devido à redução na ingestão de alimento. A concentração
sérica de cálcio encontra­se, com frequência, moderadamente diminuída devido à produção contínua de leite; no entanto, pode estar baixa o bastante para causar decúbito. As concentrações séricas de ureia e creatinina aumentam com a
desidratação, em razão da azotemia pré­renal.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico baseia­se na constatação de distensão abdominal e de rúmen e retículo subaguda ou crônica. Como a indigestão vagal é, por definição, uma doença subaguda ou crônica, esse diagnóstico não deve ser feito em
bovinos que não estejam doentes durante, pelo menos, vários dias, o que exclui a possibilidade de timpanismo ruminal aguda e timpanismo espumoso agudo. Outras causas de distensão abdominal, como ascite e aumento de volume uterino,
incluem–se no diagnóstico diferencial e podem, quase que invariavelmente, ser excluídas por meio de palpação retal, devido à ausência de distensão de rúmen e retículo. Casos esporádicos de obstrução crônica de ceco ou intestino delgado
podem causar distensão abdominal e de rúmen e retículo grave; no entanto, uma distensão palpável no ceco ou no intestino delgado também é palpável por VR. Além disso, o rúmen fica distendido, mas não em “forma de L” e há um ruído
característico no caso de vólvulo cecocólico.
O diagnóstico da causa específica de indigestão vagal é mais difícil, mas é importante devido às diferenças no tratamento e no prognóstico. Exame físico, exame retal, hemograma, condição ácido­base do sangue e perfil bioquímico
sérico frequentemente são úteis. O exame do fluido peritoneal pode sustentar o diagnóstico de peritonite se há aumento da concentração de proteína total ou da quantidade de células nucleadas. Devem–se obter radiografias laterais do
retículo para detectar corpo estranho linear radiopaco (p. ex., um arame) ou abscesso reticular. A ultrassonografia do abdome cranioventral pode indicar peritonite focal e, também, a frequência de contração do retículo. Geralmente, o
diagnóstico definitivo requer cirurgia exploratória (laparotomia com incisão na fossa paralombar esquerda e rumenotomia).
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  Se o valor do animal justifica o tratamento, quase sempre é necessária cirurgia para identificar e corrigir adequadamente a causa primária. O tratamento medicamentoso isoladamente, geralmente é ineficaz.
A laparotomia na fossa paralombar esquerda e rumenotomia propiciam a oportunidade de um tratamento definitivo, em alguns casos. O esvaziamento do rúmen no momento da cirurgia pode ajudar no restabelecimento da motilidade
ruminal normal. Em condições normais, a estimulação dos receptores de tensão de baixo limiar do retículo causa contrações reticulorruminais reflexas. No entanto, uma distensão grave provoca estimulação de receptores de alto limiar, que
têm efeito oposto e inibem as contrações.
Em  todos  os  casos,  deve­se  instituir  terapia  de  suporte  ou  sintomática,  que  envolve  tipicamente  a  correção  da  desidratação,  bem  como  dos  déficits  de  cálcio  e  de  outros  eletrólitos,  comumente  com  uso  de  solução  oral  de  fluidos  e
eletrólitos. Os animais muito desidratados e aqueles com doença de longa duração requerem fluidoterapia IV. Água fresca e alimentação normal devem estar disponíveis. A transfaunação durante a cirurgia e/ou via sonda oroesofágica
podem ajudar no restabelecimento da flora ruminal normal em bovinos com anorexia prolongada. Antibióticos (penicilina procaína ou oxitetraciclina) devem ser administrados se a causa primária é uma infecção ou caso se forme uma
fístula ruminal.
O tratamento da indigestão vagal tipo I (falha na eructação) também envolve tipicamente a criação de uma fístula ruminal para permitir a saída do gás livre. Se a cirurgia não é economicamente viável e a causa primária da indigestão
vagal já tenha sido identificada e tratada, pode­se colocar, temporariamente, um trocarte ruminal. Este trocarte encontra­se disponível no mercado e deve ser seguro e propiciar autorretenção, de modo a evitar possível extravasamento fatal
do conteúdo ruminal no interior da cavidade peritoneal. O trocarte não deve ser removido por pelo menos duas semanas, para permitir que se formem aderências firmes entre o rúmen e a parede corporal.
O prognóstico de animais com indigestão vagal tipo I geralmente é favorável. Após a criação de uma fístula ruminal, os sintomas de indigestão vagal se resolvem em quase todos os casos. No entanto, os animais com doença respiratória
crônica ou traumatismo faringiano podem não se recuperar da doença primária. O extravasamento da ingesta pela fístula pode causar produção de leite com sabor desagradável. Pode ocorrer peritonite a partir de vazamento ao redor da
fístula ou após rumenotomia; no entanto, isso não deve acontecer com uma boa técnica cirúrgica.
O tratamento de indigestão vagal tipo II (falha no transporte do omaso) raramente responde à terapia de suporte ou sintomática, sem uma intervenção cirúrgica. Podem­se utilizar laparotomia na fossa paralombar esquerda e rumenotomia
para detectar aderências próximas ao retículo, abscessos reticulares ou hepáticos ou obstrução do canal do omaso. A remoção de corpos estranhos, fios de arame e alguns tumores durante a cirurgia e a drenagem de abscessos perirreticulares
no interior do retículo propicia prognóstico excelente. O diagnóstico de linfossarcoma durante a cirurgia implica prognóstico ruim. Os abscessos reticulares detectados na cirurgia devem ser drenados cuidadosamente no interior do retículo e
deve­se administrar antibióticos por 10 a 14 dias. Notadamente, 83% dos bovinos com abscessos reticulares respondem favoravelmente ao tratamento. A identificação de aderências próximas ao retículo justifica um prognóstico razoável ou
bom com emprego de cirurgia, terapia antimicrobiana e tratamento de suporte apropriados. Os abscessos hepáticos devem ser drenados em uma segunda cirurgia. As cânulas de grande calibre, colocadas através das aderências da parede
corporal e no interior do abscesso drenam o conteúdo purulento. No entanto, recidiva é um problema maior no caso de abscesso hepático do que de abscesso de retículo.
Animais  com  indigestão  vagal  tipo  III  (impactação  secundária  do  abomaso)  diagnosticados  sem  cirurgia  geralmente  não  recebem  tratamento  adicional  algum  devido  ao  mau  prognóstico,  em  particular  quando  há  histórico  de
reticuloperitonite traumática ou vólvulo do abomaso. Se o diagnóstico é obtido na cirurgia ou presume­se que a impactação do abomaso seja de origem alimentar, pode­se infundir sulfossuccinato sódico de dioctila diretamente no abomaso,
pelo  orifício  retículo­omasal,  após  esvaziamento  do  rúmen.  Pode­se  introduzir  uma  sonda  nasogástrica  no  abomaso  pelo  orifício  retículo­omasal  durante  a  cirurgia  e  deixá­la  nessa  posição  para  um  tratamento  contínuo  (3,8  L  de  óleo
mineral/dia, por 3 a 5 dias). Se possível, deve­se remover manualmente o material impactado através do orifício retículo­omasal. Outras lesões, como abscesso na parede medial do retículo, devem ser identificadas e drenadas. Como último
pode–se realizar abomasotomia e remoção do conteúdo do abomaso, utilizando acesso paracostal direito, com o animal em decúbito lateral esquerdo. No entanto, é comum ocorrer recidiva da impactação. A obstrução pilórica nos bovinos é
rara e se deve mais frequentemente a um corpo estranho que obstrua o lúmen. A piloromiotomia quase nunca é efetiva na resolução de impactação de abomaso.
O prognóstico da indigestão vagal tipo III é ruim, independente da causa ou do tratamento. No entanto, bovinos com impactação primária de abomaso respondem à terapia, o que não acontece com os animais gravemente acometidos (ver
p. 277). Bovinos com impactação secundária à reticuloperitonite traumática ou como sequela de vólvulo do abomaso raramente se recuperam. O prognóstico em animais com corpos estranhos (p. ex., tricobezoares) que obstruem o piloro é
favorável, se a obstrução é removida.
Recomenda­se  aborto  terapêutico  como  tratamento  de  vacas  com  indigestão  vagal  tipo  IV  (indigestão  por  gestação  avançada)  e  algumas  vacas  melhoram  com  esse  tratamento;  no  entanto,  como  a  indigestão  vagal  tipo  IV  é  uma
enfermidade pouco relatada, o prognóstico sempre é reservado. Um prognóstico mais específico baseia­se na resposta à terapia e na identificação de uma lesão específica durante a celiotomia e rumenotomia exploratória.
PREVENÇÃO:  A causa mais comum de síndrome da indigestão vagal é reticuloperitonite traumática, que causa aderências e abscessos que interferem na motilidade do retículo e na estratificação adequada das partículas alimentares que
passam pelo abomaso. Portanto, a prevenção de reticuloperitonite traumática é importante. As boas práticas de manejo podem evitar alguns casos de indigestão vagal associados à pneumonia crônica. O diagnóstico precoce de vólvulo de
abomaso e a correção cirúrgica no dia do diagnóstico podem evitar alguns casos.

 SOBRECARGA POR GRÃOS (Acidose láctica, Ingestão excessiva de carboidratos, Rumenite)
A sobrecarga por grãos é uma doença aguda de ruminantes, caracterizada por hipomotilidade ou atonia ruminal, desidratação, acidose, diarreia, toxemia, incoordenação, colapso e, em casos graves, morte.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A doença é mais comum em bovinos que acidentalmente teve acesso a grande quantidade de carboidratos facilmente digestíveis, especialmente grãos. A sobrecarga por grãos também é comum em bovinos de
lote de engorda, quando são submetidos bruscamente a dietas ricas em grãos. Trigo, cevada e milho são os grãos mais facilmente digestíveis; a digestão de aveia é mais demorada. As causas menos comuns incluem consumo excessivo de
maçãs, uvas, pães, massas de farinha, beterrabas açucareiras e forrageiras, batatas ou grãos de cervejaria molhados e azedos que não foram completamente fermentados na cervejaria. A quantidade de alimento necessária para induzir doença
aguda depende do tipo de grão, da ingestão prévia desses grãos pelo animal, do estado nutricional e da condição do animal e da natureza da microflora ruminal. Bovinos acostumados com dietas ricas em grãos podem consumir 15 a 20 kg
de grãos e desenvolver apenas uma enfermidade moderada, enquanto outros podem manifestar doença aguda e morrer após consumir 10 kg de grãos.
A ingestão de quantidade tóxica de carboidratos altamente fermentáveis é seguida de alteração da população microbiana do rúmen, após 2 a 6 h. O número de bactérias gram­positivas (Streptococcus bovis) aumenta acentuadamente,
resultando em produção de grande quantidade de ácido láctico. O pH ruminal diminui para = 5, condição que destrói os protozoários, microrganismos celulolíticos e que utilizam lactato, além de prejudicar a motilidade ruminal. O pH baixo
permite  que  os  lactobacilos  utilizem  os  carboidratos  e  produzam  quantidade  excessiva  de  ácido  láctico.  A  superposição  de  ácido  láctico  e  de  seus  sais,  L­lactato  e  D­lactato,  nos  solutos  existentes  no  fluido  ruminal  causam  aumento
substancial da pressão osmótica, o que provoca transferência de quantidade excessiva de fluido ao rúmen, causando desidratação.
O  pH  ruminal  baixo  causa  ruminite  química  e  a  absorção  de  lactato,  particularmente  D­lactato,  resulta  em  acidose  láctica  e  acidemia.  Além  de  acidose  metabólica  (íons  fortes)  e  desidratação,  as  consequências  fisiopatológicas  são
hemoconcentração, colapso cardiovascular, insuficiência renal, fraqueza muscular, choque e morte. Os animais que sobrevivem podem desenvolver ruminite micótica em alguns dias e abscessos hepáticos após várias semanas ou meses.
Pode haver evidência de lesão ao epitélio ruminal por ocasião do abate. A relação entre a sobrecarga por grãos e a ocorrência de laminite crônica em bovinos não está bem definida.
ACHADOS CLÍNICOS:  A ingestão excessiva de carboidratos resulta em enfermidades que variam de indigestão simples (p. 289) à acidemia rapidamente fatal e acidose por íons fortes (metabólica). O período entre a ingestão excessiva e o
início dos sinais é menor quando o animal consome alimento triturado do que quando ingere grãos inteiros e a gravidade aumenta de acordo com a quantidade ingerida. Poucas horas após o ingurgitamento a única anormalidade detectável
pode  ser  aumento  de  volume  ruminal  e,  possivelmente,  dor  abdominal  (manifestada  por  coices  no  ventre  ou  ato  de  caminhar  apoiando­se  nos  membros  pélvicos).  Na  forma  discreta,  os  movimentos  ruminais  diminuem,  mas  não  são
completamente ausentes; os bovinos apresentam anorexia, porém permanecem alertas; e diarreia é comum. Em geral, os animais voltam a se alimentar após 3 a 4 dias, sem qualquer tratamento específico.
Após 24 a 48 h do início da sobrecarga grave alguns animais permanecem em decúbito, alguns cambaleiam e outros se mantém de pé, quietos; todos os bovinos ficam distantes dos alimentos. Imediatamente após consumir grande
quantidade de grãos secos, os bovinos podem ingerir água em excesso, mas quando doentes geralmente não bebem de forma alguma.
Comumente, a temperatura corpórea encontra­se abaixo do normal, 36,5 a 38,5°C; no entanto, nos animais expostos ao sol em clima quente ela pode aumentar para 41°C. A respiração tende a ser superficial e rápida, com 60 a 90
movimentos respiratórios/min. Geralmente, a frequência cardíaca aumenta de acordo com a gravidade da acidose; em bovinos com frequência > 120 bpm o prognóstico é ruim. Diarreia é comum, quase sempre abundante e fétida. As fezes
são moles ou líquidas, amarelas ou castanhas e apresentam odor agridoce evidente. As fezes frequentemente contêm grãos não digeridos do alimento que ocasionou a sobrecarga. Nos casos discretos, a desidratação equivale a 4 a 6% do
peso corporal; nos casos graves, é de até 10 a 12%.
Na sobrecarga por grãos grave, as contrações ruminais primárias desaparecem completamente, embora durante a auscultação sejam audíveis borborigmos do gás que sobe através do grande volume de fluido. Balotamento e auscultação
no flanco esquerdo podem estimular ruídos de fluido no rúmen. O conteúdo ruminal, palpado na fossa paralombar esquerda, pode estar firme e pastoso em bovinos que receberam previamente dieta de volumoso e consumiram grande
quantidade de grãos. Em bovinos que adoecem com menor quantidade de grãos não se nota necessariamente o rúmen repleto, mas como um tecido elástico, devido ao excesso de fluido. Os animais gravemente acometidos cambaleiam e
podem trombar com objetos; o reflexo palpebral torna­se lento ou ausente e o reflexo da pupila à luz geralmente está presente, porém mais lento do que o normal. Os animais acometidos comumente deitam­se quietos, em geral com a
cabeça virada para o flanco e sua resposta a qualquer estímulo encontra­se muito diminuída, de forma que lembra um quadro de paresia da parturiente.
Pode­se constatar laminite aguda, sendo mais comum nos animais não gravemente acometidos; pode ocorrer laminite crônica semanas ou meses depois. Anúria é um achado comum nos casos agudos; diurese, após fluidoterapia, é um
sinal de bom prognóstico.
O paciente pode morrer em 24 a 72 h e o desenvolvimento rápido de sinais agudos, particularmente decúbito, indica necessidade de tratamento agressivo. Redução da frequência cardíaca, elevação da temperatura, retorno do movimento
ruminal e eliminação de grande quantidade de fezes amolecidas são sinais mais favoráveis. No entanto, alguns animais parecem melhorar temporariamente, mas adoecem com mais gravidade após 3 a 4 dias, provavelmente devido à grave
ruminite fúngica ou bacteriana; morte por peritonite difusa aguda geralmente ocorre em 2 a 3 dias. Vacas prenhes que sobrevivem à forma grave da doença podem abortar após 10 a 14 dias
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico geralmente é óbvio quando há disponibilidade de informações da anamnese e vários animais são acometidos. O diagnóstico pode ser confirmado pelos achados clínicos, com baixo pH ruminal (< 5 em bovinos
não acostumados à dieta rica em grãos) e exame da microflora ruminal para pesquisa de protozoários vivos. Quando apenas um animal está envolvido e não há histórico de ingestão excessiva, o diagnóstico é menos óbvio, mas os sinais
clínicos – estase ruminal com ruído de fluido, diarreia, ataxia e temperatura normal – são característicos. Nestes animais, é necessário exame do fluido ruminal para confirmar o diagnóstico de sobrecarga por grãos.
Embora a paresia parturiente (p. 1058) possa parecer com sobrecarga ruminal, não há diarreia e desidratação típicas, nota­se menor intensidade das bulhas cardíacas e a resposta a uma injeção de cálcio geralmente é eficiente. Mastite
coliforme hiperaguda e peritonite difusa aguda também podem lembrar sobrecarga por grãos, mas geralmente um exame cuidadoso revela a causa da toxemia.
Para evitar aumento do pH durante exposição ao ar, o pH do fluido ruminal obtido por sonda ororruminal ou paracentese deve ser mensurado imediatamente. Normalmente, o pH em bovinos que recebem dieta com volumoso varia de 6 a
7; em bovinos alimentados com dieta rica em grãos varia de 5,5 a 6. Valores abaixo de 5,5 sugerem fortemente sobrecarga por grãos e pH ruminal < 5 indica acidemia grave e acidose metabólica. Um papel indicador de pH de amplo
espectro (2 a 11) é adequado para uso a campo. O fluido ruminal também deve ser submetido ao exame microscópico, se há disponibilidade de um laboratório. Nos bovinos acometidos o fluido contém número reduzido de protozoários
(especialmente protozoários de tamanhos médio e grande). A coloração do fluido ruminal pela técnica de Gram revela alteração, de bactérias predominantemente gram­negativas (normal) para bactérias predominantemente gram­positivas
na sobrecarga por grãos, com perda concomitante da diversidade bacteriana.
Também, nota­se aumento dos teores sanguíneos de D­lactato e L­lactato e de fosfato inorgânico, hipocalcemia discreta e redução do pH urinário, mas raramente é necessário mensurar tais valores para definir o diagnóstico. O problema
do diagnóstico é avaliar adequadamente quais animais requerem terapia vigorosa (ou abate), quais necessitam terapia de suporte, quais manifestam apenas indigestão leve que se resolve com restrição ao consumo de água e de grãos e
fornecimento de dieta á base de feno e exercícios e quais não precisam de auxílio, além dos cuidados básicos e de ração de rotina. Em um surto de sobrecarga que envolve vários animais é necessário identificar os animais que requerem
terapia mais intensiva e aqueles que se recuperam com uma terapia medicamentosa simples.
Se os bovinos são encontrados ainda enquanto se alimentam, é possível que alguns animais do grupo se enquadrem em algumas dessas categorias, sendo necessário monitoramento rigoroso para minimizar as perdas. Bovinos flagrados se
alimentando em excesso ou imediatamente após esse evento, não devem receber mais concentrado ou água, mas sim bastante feno de boa qualidade por até 24 h e serem estimulados a caminhar periodicamente. Os bovinos que parecerem
normais no final do primeiro dia, provavelmente estão bem; entretanto, se um deles se apresenta doente, todos devem ser monitorados cuidadosamente por 48 h. A maioria dos animais que consomem concentrado suficiente para serem
gravemente acometidos manifestam sintomas em 6 a 8 h.
TRATAMENTO:  Para todos os bovinos sob suspeita de terem ingerido grande quantidade de concentrado, acredita­se que seja útil a restrição ao consumo de água nas primeiras 18 a 24 h, embora isso não tenha sido comprovado. Se a
sobrecarga é grave deve­se considerar o abate; para bovinos de engorda próximo ao final desse período, o abate poderá ser também a opção mais econômica. A taxa de mortalidade é alta em animais gravemente acometidos, exceto se
medidas terapêuticas vigorosas forem adotadas precocemente. Nestes animais, é necessária a remoção do conteúdo ruminal e sua substituição por ingesta coletada do rúmen de animais saudáveis. Em animais que ainda permanecem de pé a
rumenotomia é mais vantajosa do que a lavagem ruminal, pois os animais podem aspirar conteúdo durante o procedimento de lavagem e apenas a rumenotomia garante a remoção de todos os grãos ingeridos. A lavagem ruminal pode ser
realizada com uma sonda gástrica grande, se há água suficiente disponível. Pode ser usada uma sonda de grande calibre (2,5 cm de diâmetro interno e 3 m de comprimento) e deve­se introduzir água em volume suficiente para distender a
fossa paralombar esquerda; em seguida, deve­se permitir um fluxo por gravidade para esvaziar o que for possível. A repetição desse procedimento por 15 a 20 vezes, para esvaziar e lavar o rúmen com um sifão, propicia o mesmo resultado
(e requer aproximadamente o mesmo tempo) daquele obtido com rumenotomia.
O esvaziamento ruminal deve ser acompanhado de inoculação ruminal (p. 2582) e, se não for realizado antes do início dos sinais de intoxicação grave, deve ser seguido de fluidoterapia intensiva, de modo a corrigir a acidose metabólica e
a desidratação e a restabelecer a função renal. Inicialmente, deve­se administrar, por via IV, solução de bicarbonato de sódio 5% (5 L/450 kg) ao longo de cerca de 30 min. Durante as 6 a 12 h seguintes pode­se administrar, por via IV,
solução eletrolítica balanceada ou solução de bicarbonato de sódio 1,3%, em solução salina, até 60 L/450 kg de peso corporal. A micção deve recomeçar durante esse período. Geralmente, é desnecessária, e mesmo indesejável, também a
administração oral (ou intrarruminal) de antiácidos, principalmente se o bicarbonato de sódio é administrado por via IV. A penicilina G procaína deve ser aplicada por via IM em todos os animais acometidos durante, no mínimo, 5 dias, para
minimizar o risco de rumenite bacteriana e abscessos hepáticos. A tiamina deve ser administrada também por via IM para facilitar o metabolismo do L­lactato, via piruvato e fosforilação oxidativa; os animais acometidos por sobrecarga de
grãos também apresentam menor concentração de tiamina no fluido ruminal, devido à maior produção de tiaminase pelas bactérias ruminais. Não há tratamento preventivo eficaz para rumenite micótica.
Nos casos menos graves, o esvaziamento ruminal não é necessário. Nestes bovinos, deve­se acrescentar hidróxido de magnésio (500 g/450 kg de peso corporal) à água morna que é bombeada ao rúmen e misturada por meio de massagem
no flanco. Isso pode ser necessário quando o pH ruminal é > 5 e se o animal ainda se encontra de pé e razoavelmente alerta várias horas após a ingestão excessiva de grãos. Frequência cardíaca de 70 a 85 bpm, contrações ruminais fracas,
temperatura corporal normal e, especialmente, vontade de se alimentar indicam, adicionalmente, que essa terapia será suficiente. Se há qualquer dúvida deve­se administrar fluido adicional. Durante o período de convalescença, que pode
durar 2 a 4 dias, deve­se fornecer feno de boa qualidade e não oferecer grãos, os quais devem ser reintroduzidos gradualmente. Se o apetite retornar dentro de 3 dias o prognóstico é bom. No entanto, se o tratamento não foi iniciado
precocemente, para evitar acidificação do conteúdo ruminal e infecção micótica da parede ruminal, provavelmente ocorre recidiva dentro de 3 a 5 dias e o prognóstico é desfavorável.
PREVENÇÃO:  Deve­se  evitar  o  acesso  acidental  a  concentrados  de  interesse  dos  bovinos,  em  quantidade  em  que  não  estão  acostumados.  Bovinos  de  lote  de  engorda  devem  ser  estimulados  a  consumir,  gradualmente,  ração  à  base  de
concentrado ao longo de 2 a 3 semanas, iniciando com uma mistura com = 50% de concentrado em alimento moído contendo volumoso.

TIMPANISMO (Timpanismo Ruminal)
Timpanismo é a distensão exagerada do rúmen e do retículo por gases oriundos de fermentação, quer seja na forma de espuma persistente misturada ao conteúdo ruminal, denominado timpanismo primário ou espumoso, ou na forma de gás
livre separado da ingesta, conhecido como timpanismo secundário ou de gás livre. A enfermidade acomete predominantemente bovinos, mas também pode se instalar em ovinos. A suscetibilidade do bovino ao timpanismo é variável e
geneticamente determinada. Relata­se taxa de mortalidade de 20% em bovinos mantidos em áreas de pastagem mais propensas ao timpanismo; a taxa de mortalidade anual decorrente de timpanismo em vacas leiteiras mantidas em pastagem
pode atingir 1%. Há, também, perda econômica devido à redução na produção de leite em casos não fatais e pelo menor uso de pastagens mais propensas à doença. Timpanismo pode ser causa importante de morte em bovinos em um lote
de engorda.
ETIOLOGIA  E  PATOGÊNESE:  No timpanismo ruminal primário ou timpanismo espumoso, a causa é a retenção de gases normais da fermentação em uma espuma estável. Inibe­se a coalescência das pequenas bolhas de gás e a pressão
intrarruminal aumenta, pois não ocorre eructação. Vários fatores, tanto animais como vegetais, influenciam a formação de uma espuma estável. Acredita­se que proteínas, saponinas e hemicelulose solúvel das folhas sejam os agentes
espumantes principais e formem uma camada monomolecular ao redor das bolhas gasosas ruminais, que possuem maior estabilidade em pH de aproximadamente 6. A mucina salivar é antiespumante, mas a produção de saliva é reduzida
quando a forragem é suculenta. Pastagens que causam timpanismo são mais rapidamente digeridas e podem liberar maior quantidade de pequenas partículas de cloroplasto, que se aderem às bolhas gasosas e evitam sua coalescência. O
efeito imediato da alimentação é, provavelmente, o suprimento de nutrientes para a atividade da fermentação microbiana. No entanto, o principal fator que determina a instalação de timpanismo é o tipo do conteúdo ruminal. Conteúdo
proteico, taxa de digestão e fluxo ruminal refletem o potencial da forragem em provocar timpanismo. Por um período de 24 h, a forragem causadora de timpanismo e fatores individuais desconhecidos atuam em conjunto para manter uma
concentração elevada de pequenas partículas alimentares e exacerbar a suscetibilidade ao timpanismo.
O timpanismo é mais comum em animais que consomem pastagem de leguminosas, ou com predominância dessas, em particular alfafa, feijão­ladino e trevos vermelho e branco, mas também ocorre em áreas de cultivo de cereais verdes
imaturos, uva, couve, cebola, legumes e verduras. As forragens de leguminosas, como alfafa e trevo, possuem porcentagem maior de proteínas e sua digestão é mais rápida. Outras leguminosas, como sanfeno, Securigera varia, Astragalus e
trevo  pé­de­ave,  são  ricas  em  proteínas,  mas  não  causam  timpanismo,  provavelmente  por  conterem  taninos  condensados,  que  precipitam  as  proteínas  e  são  digeridos  mais  lentamente  do  que  a  alfafa  ou  o  trevo.  O  timpanismo  por
leguminosas é mais comum quando os bovinos são colocados em pastagens suculentas, particularmente onde predominam leguminosas de crescimento rápido nos estágios vegetativo e germinativo, mas também pode ocorrer quando se
oferece feno de alta qualidade.
O timpanismo espumoso também acomete bovinos em lote de engorda e, menos comumente, bovinos leiteiros, que recebem dieta rica em grãos. A origem da espuma no timpanismo em lote de engorda é desconhecida, mas acredita­se
que  seja  devido  à  produção  de  muco  insolúvel  por  certas  espécies  de  bactérias  ruminais  nos  bovinos  alimentados  com  dieta  rica  em  carboidratos,  ou  à  retenção  de  gases  oriundos  da  fermentação  de  pequenas  partículas  de  alimentos
triturados. Um material com partículas reduzidas, como grãos bem triturados, pode interferir acentuadamente na estabilidade da espuma, assim como um baixo consumo de volumoso. O timpanismo em lote de engorda é mais comum em
bovinos que recebem dieta com grãos por 1 a 2 meses. Esse período pode ser devido ao aumento do teor de grãos na dieta ou ao tempo em que as bactérias ruminais produtoras de muco demora para sua intensa proliferação.
No timpanismo ruminal secundário ou timpanismo  com  gás  livre,  a  obstrução  física  da  eructação  é  causada  por  obstrução  esofágica  devido  a  um  corpo  estranho  (p.  ex.,  batata,  maçã,  cebola,  kiwi),  estenose  ou  pressão  devido  a
aumento de volume externo ao esôfago (como linfadenopatia ou, esporadicamente, linfoma de timo juvenil). Interferência na função do sulco esofágico na indigestão vagal e hérnia diafragmática podem causar timpanismo ruminal crônico.
Isso também acontece no tétano. Tumores e outras lesões como aquelas causadas por infecção por Actinomyces bovis, do sulco esofágico ou da parede do retículo, são causas menos comuns de timpanismo obstrutivo. Também, pode haver
alteração nos trajetos nervosos envolvidos no reflexo de eructação. As lesões na parede do retículo (que contém receptores de tensão e receptores que distinguem gás, espuma e líquido) podem interromper o reflexo normal, essencial para a
saída de gás do rúmen.
O timpanismo ruminal também pode ser secundário ao início agudo de atonia ruminal que surge na anafilaxia e na sobrecarga com grãos; isso causa redução do pH ruminal e, possivelmente, esofagite e ruminite, que podem interferir na
eructação. Também, ocorre timpanismo ruminal na hipocalcemia. O timpanismo ruminal crônico é relativamente frequente em bezerros com até 6 meses de idade, sem causa aparente; essa forma costuma se resolver espontaneamente.
As  posturas  anormais,  em  particular  o  decúbito  lateral,  são  comumente  associadas  a  timpanismo  secundário.  Os  ruminantes  podem  morrer  de  timpanismo  quando  se  posicionam  acidentalmente  em  decúbito  dorsal  ou  outra  posição
restritiva, em instalações, veículos de transporte lotados ou fossas de lavagem.
ACHADOS CLÍNICOS:  O  timpanismo  é  uma  causa  comum  de  morte  súbita.  Os  bovinos  não  observados  de  perto,  como  os  de  pastejo  e  de  lote  de  engorda  e  as  vacas  leiteiras  secas,  em  geral  são  encontrados  mortos.  Nas  vacas  leiteiras
lactantes, que são observados regularmente, o timpanismo comumente surge dentro de 1 h após o animal sair de uma pastagem que causa timpanismo. O timpanismo pode ocorrer no primeiro dia depois que o bovino é colocado no pasto,
sendo mais frequente no segundo ou terceiro dia.
No timpanismo primário por pastejo, ocorre distensão ruminal evidente, súbita e o flanco esquerdo pode ficar tão distendido que o contorno da fossa paralombar protrai acima da coluna vertebral; todo o abdome aumenta de volume. À
medida que o timpanismo progride, a pele do flanco esquerdo fica progressivamente mais tensa e, nos casos graves, não é possível perfurá­la. Dispneia e ronco ficam acentuados e são acompanhados de respiração bucal, protrusão da língua,
estiramento da cabeça e micções frequentes. Ocasionalmente, ocorre vômito. A motilidade ruminal não diminui até que o timpanismo seja grave. Se o timpanismo se agravar, o animal entra em colapso e morre. A morte pode ocorrer dentro
de 1 h após o início do pastejo, sendo mais comum cerca de 3 a 4 h depois de surgirem os sinais clínicos. Em um grupo de bovinos acometidos, geralmente há vários deles com timpanismo clínico e alguns com distensão abdominal leve a
moderada.
No timpanismo secundário, o excesso de gás geralmente fica livre na parte superior do conteúdo ruminal sólido e fluido, embora o timpanismo espumoso possa surgir em uma indigestão vagal, quando há aumento na atividade ruminal. O
timpanismo secundário é observado esporadicamente. Ocorre uma ressonância timpânica no abdome dorsal  à  esquerda  da  linha  média.  O  gás  livre  produz  um  som  de  “ping”  mais  alto,  à  percussão,  do  que  o  timpanismo  espumoso.  A
distensão ruminal pode ser detectada por palpação retal. No timpanismo com gás livre, a passagem de sonda gástrica ou o uso de trocarte liberam grande quantidade de gás e aliviam a distensão.
Lesões:  Os  achados  de  necropsia  são  característicos.  Congestão  e  hemorragia  em  linfonodos  de  cabeça  e  pescoço,  epicárdio  e  trato  respiratório  superior  são  marcantes.  Os  pulmões  ficam  comprimidos  e  pode­se  notar  hemorragia
intrabrônquica. O esôfago cervical encontra­se congesto e hemorrágico, mas a porção torácica esofágica fica pálida – demarcação conhecida como “linha de timpanismo” esofágica. O rúmen distende­se, mas o seu conteúdo geralmente é
muito menos espumoso do que antes da morte. O fígado torna­se pálido devido à saída de sangue do órgão.
DIAGNÓSTICO:  Geralmente, o diagnóstico clínico de timpanismo espumoso é fácil. As causas de timpanismo secundário devem ser investigadas, por exame clínico, para determinar a origem da falha de eructação.
TRATAMENTO:  Em  casos de risco à  vida  pode  ser  necessária  rumenotomia  emergencial,  seguida de retirada de grande quantidade de conteúdo ruminal e, consequentemente, de alívio acentuado ao animal. A recuperação geralmente é
tranquila, com complicações ocasionais mínimas.
Podem­se utilizar trocarte e cânula para alívio emergencial, embora o instrumento de tamanho padrão não seja grande o suficiente para permitir que a espuma estável e viscosa, nos casos agudos, saia com rapidez suficiente. É necessário
um instrumento de calibre maior (2,5 cm de diâmetro), mas deve­se fazer uma incisão na pele antes de introduzi­lo nas camadas musculares e no rúmen. Se a cânula falha em reduzir o timpanismo e a vida do animal se encontra ameaçada
deve­se realizar rumenotomia emergencial. Se a cânula proporciona algum alívio pode­se administrar um agente antiespumante pela cânula, que pode permanecer no local até que o animal retorne ao normal, o que geralmente acontece após
várias horas.
Quando não há risco iminente à vida recomenda­se a introdução de uma sonda gástrica com o maior calibre possível. Devem–se fazer algumas tentativas para limpar a sonda, por meio de sopro, e movimentá­la para frente e para trás,
procurando encontrar local onde o gás ruminal esteja armazenado, para que possa ser liberado. No timpanismo espumoso, pode ser impossível reduzir a pressão com a sonda e deve­se administrar um agente antiespumante enquanto a sonda
permanece na posição. Se o timpanismo não for aliviado rapidamente pelo agente antiespumante, deve­se observar cuidadosamente o animal na hora seguinte, para determinar se o tratamento obteve sucesso ou se é necessária uma terapia
alternativa.
Vários agentes antiespumantes são efetivos, incluindo óleos vegetais (p. ex., de amendoim, milho e soja) e minerais (parafinas), na dose de 250 a 500 ml. O sulfossuccinato sódico de dioctila (docusato), um surfactante, é comumente
adicionado aos óleos vendidos como fármacos patenteados para tratamento de timpanismo, os quais são efetivos quando administrados precocemente. O poloxaleno (25 a 50 g VO) é efetivo no tratamento de timpanismo causado por
forragem, mas não naquele causado por sobrecarga de grãos. A colocação de uma fístula ruminal propicia alívio a curto prazo de casos de timpanismo com gás livre associado à obstrução externa ao esôfago.
CONTROLE  E  PREVENÇÃO:   A  prevenção  do  timpanismo  por  pastejo  pode  ser  difícil.  As  práticas  de  manejo  que  têm  sido  utilizadas  para  reduzir  o  risco  de  timpanismo  incluem  alimentação  com  feno,  particularmente  de  Dactylis
glomerata, antes da introdução do bovino na pastagem, manutenção predominantemente de gramínea na pastagem ou emprego de rotação de pastagem, para restringir o consumo, com a transferência de animais para uma nova área, no
período da tarde, mas não na manhã seguinte. Para que o feno seja efetivo na redução do risco de timpanismo ele deve representar pelo menos um terço da dieta. A alimentação com feno ou em sistema de rotação de pastagem pode ser
confiável quando o pasto é apenas moderadamente perigoso, mas esses métodos são menos indicados quando a pastagem se encontra no estágio de pré­florescimento e o risco de timpanismo é alto. Pastagens maduras são menos passíveis
de causar timpanismo do que as imaturas ou em fase de rápido crescimento.

Colocação de cânula no rúmen, em vaca. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.
O único método satisfatório disponível para evitar timpanismo por pastejo é a administração contínua de um agente antiespumante durante o período de risco. Isso é amplamente praticado em países com amplas áreas de pastagens, como
Austrália e Nova Zelândia. O método mais confiável é a administração forçada de um agente antiespumante 2 vezes/dia (p. ex., nos momentos de ordenha). A pulverização do produto na pastagem é igualmente efetiva, contanto que os
animais tenham acesso apenas ao pasto tratado. Esse método é ideal no caso de rotação de pastagem, mas não quando o pastejo não é controlado. O agente antiespumante pode ser adicionado ao alimento ou à água ou incorporado em blocos
de ração, mas o sucesso do método depende do consumo individual adequado. O produto também pode ser “pincelado” nos flancos dos animais, de onde é lambido durante o dia, mas animais que assim não se comportam não estarão
protegidos.
Os agentes antiespumantes disponíveis incluem óleos e gorduras e surfactantes não iônicos sintéticos. Óleos e gorduras são administrados na dose de 60 a 120 ml/animal/dia; indicam­se doses de até 240 ml durante os períodos de risco. O
poloxaleno, um polímero sintético, é um surfactante não iônico altamente efetivo, que pode ser administrado na dose de 10 a 20 g/animal/dia e até 40 g/animal/dia nas situações de alto risco. Seu uso é seguro e econômico e deve ser
administrado diariamente por todo o período suscetível, adicionado à água, à ração mista com grãos ou ao melaço. Um polímero similar (Alfasure®) e uma mistura hidrossolúvel dos detergentes etoxilato de álcool e plurônico (Blocare
4511) também são efetivos, mas não são aprovados pela FDA. Os ionóforos são efetivos na prevenção de timpanismo e uma cápsula de liberação prolongada, administrada no interior do rúmen, e que libera 300 mg de monensina por dia,
por um período de 100 dias, protege contra timpanismo causado por pastejo e melhora a produção de leite quando a vaca encontra­se em pastos que podem causar timpanismo.
O objetivo final do controle é obter uma pastagem que permita alta produção e resulte em baixa ocorrência de timpanismo. O uso de pastagem de trevos e capins em quantidades iguais torna mais fácil atingir o objetivo. A capacidade de
causar timpanismo varia entre os cultivares de alfafa; cultivares de baixa taxa inicial de digestão (BTID), de baixo risco, estão disponíveis no mercado. A adição de leguminosas com bastante tanino condensado à mistura de sementes de
pastagem (10% de sanfeno) pode reduzir o risco de timpanismo onde se pratica rotação de pastagens, assim como a alimentação com sanfeno peletizado.
Para evitar timpanismo em lotes de engorda, as rações devem conter = 10 a 15% de volumoso cortado ou picado, misturado em uma ração completa. De preferência, o volumoso deve ser cereal, palha de grãos, feno de capim ou
equivalente a eles. Os grãos devem ser cortados ou quebrados, mas não finamente triturados. Devem­se evitar rações peletizadas fabricadas com grãos muito triturados. A adição de sebo (3 a 5% da ração total) ocasionalmente pode ser
bem­sucedida, mas não foi efetiva em experimentos controlados. Os surfactantes não iônicos, como poloxaleno, são ineficazes para evitar timpanismo em lote de engorda, mas o ionóforo lasalocida é efetivo no seu controle.

DOENÇAS INTESTINAIS EM EQUINOS E POTROS

A doença intestinal em equinos e potros é sugerida pela ocorrência de diarreia, perda de peso, hipoproteinemia e dor abdominal (ver p. 226).

DOENÇA DIARREICA
Consegue­se  determinar  a  etiologia  definitiva  em  <  50%  dos  casos.  Além  disso,  o  tratamento  de  muitos  equinos  e  potros  com  diarreia  é  semelhante  e,  consequentemente,  permite  tratamento  de  suporte,  apesar  da  falta  de  diagnóstico
definitivo.
Em  equinos  adultos,  a  diarreia  pode  ser  aguda  ou  crônica.  Os  microrganismos  infecciosos  citados  como  causas  potenciais  de  diarreia  aguda  em  equinos  adultos  incluem  diversos  sorovariantes  de  Salmonella,  Neorickettsia  risticii,
Clostridium difficile, C. perfringens e Aeromonas spp., bem como ciatostomíase. Outros diagnósticos diferenciais para diarreia aguda em equinos incluem ingestão de produto(s) tóxico(s), colite induzida por antimicrobianos, intoxicação
por AINE e enterocolopatia por areia. Uma doença diarreica aguda fatal, de etiologia desconhecida, é denominada colite X. A diarreia que persiste > 1 mês é considerada crônica e geralmente é um desafio ao diagnóstico. A diarreia crônica
pode  ser  causada  por  doenças  inflamatórias  ou  neoplásicas  que  envolvem  o  intestino  ou  por  distúrbios  nos  mecanismos  fisiológicos  normais  do  intestino.  Os  diagnósticos  diferenciais  compreendem  enterocolopatia  por  areia  e  lesões
infiltrativas, como aquelas associadas à doença intestinal inflamatória ou linfossarcoma intestinal. A resposta individual a alguns componentes da dieta pode ter um papel na diarreia crônica dos equinos devido à inflamação intestinal, mas
frequentemente não é considerada como uma causa.
As doenças de cólon não inflamatórias também podem resultar em diarreia. Essas incluem alteração da fermentação no cólon maior, que se deve, potencialmente, à alteração da população de microrganismo do intestino secundária ao
tratamento antimicrobiano, alteração da dieta ou a etiologias desconhecidas. As causas não intestinais de diarreia crônica incluem insuficiência cardíaca congestiva e hepatopatia crônica. A abordagem diagnóstica, nesses casos, objetiva
diferenciar enteropatias infiltrativas e causas fisiológicas de diarreia.
Devido ao grande volume do cólon e do ceco de equinos, pode ocorrer perda intensa de fluido em curto período. Por isso, a diarreia em equinos adultos pode ser um evento marcante, com taxas de morbidade e de mortalidade superiores
àquelas associadas a doença diarreica em outros animais e em pessoas.

 COLITE X
Na verdade, a colite X não é uma doença, mas um termo antigo utilizado para descrever causas não conhecidas de enterocolite fatal e superaguda em equinos, caracterizada por início súbito de diarreia aquosa abundante e desenvolvimento
de  choque  hipovolêmico.  Muitos  equinos  acometidos  apresentam  histórico  de  estresse.  O  diagnóstico  diferencial  inclui  salmonelose  hiperaguda,  enterocolite  clostridiana,  colite  por  Aeromonas  spp  e  endotoxemia.  O  cultivo
de Salmonella spp e Clostridium difficile pode ser difícil em fezes líquidas e o diagnóstico de salmonelose ou enterocolite clostridiana não é facilmente obtido. Recomenda­se cultura de amostras de tecido GI e linfonodos mesentéricos,
além do conteúdo intestinal, quando se faz necropsia. Resultados de cultura e teste de toxina negativos para clostrídios não necessariamente excluem essas enfermidades; assim, em todos os casos deve­se fazer desinfecção completa do
local, das instalações hospitalares e do trailer.
Clinicamente, pode ocorrer um curto período febril, mas a temperatura corporal logo retorna ao normal ou ao subnormal. Nota­se taquipneia, taquicardia e depressão acentuada. Ocorre diarreia explosiva, seguida de desidratação grave.
Em alguns casos, o animal morre antes que a diarreia seja evidente, com grave enterocolite observada durante a necropsia. Choque hipovolêmico ou endotóxico se manifesta como aumento do tempo preenchimento capilar, membranas
mucosas azuladas e extremidades frias. O paciente pode morrer dentro de 3 h após o início dos sinais clínicos. Nos casos menos agudos, a morte ocorre em 24 a 48 h. A taxa de mortalidade atinge 100%. Na necropsia, edema e hemorragia
na parede do cólon maior e do ceco são evidentes e o conteúdo intestinal apresenta­se fluido e, com frequência, com sangue.
Tipicamente, o VG é > 65%, mesmo imediatamente após o início dos sintomas. O leucograma varia de normal à neutropenia com desvio à esquerda degenerativo. Também ocorrem acidose metabólica e distúrbios eletrolíticos.
Em geral, o início da doença está intimamente associado a estresse, como cirurgia ou transporte. Os sintomas são semelhantes àqueles de outras doenças diarreicas, inclusive salmonelose hiperaguda, toxemia causada por Clostridium spp,
febre equina de Potomac, choque endotóxico experimental e anafilaxia. Nos equinos, pode­se verificar uma doença semelhante, após uso de lincomicina. Colite X é o termo reservado para os casos em que não se consegue elaborar um
diagnóstico definitivo e o equino morre.
O tratamento de colite X geralmente não é efetivo (por definição), mas seria semelhante ao da salmonelose (ver p. 311). São necessárias grandes quantidades de fluidos IV para corrigir a desidratação grave e a reposição eletrolítica. O uso
de plasma ou coloide sintético é necessário para manter a pressão oncótica plasmática, quando há hipoproteinemia secundária à enteropatia com perda de proteínas. A flunixino meglumina pode reduzir a inflamação e a polimixina B pode
ser útil por se ligar às endotoxinas. Antibióticos de amplo espectro são indicados para tratar os casos de bacteriemia que, em geral, são secundários à transferência de bactérias do trato GI lesionado.

 DIARREIA RECIDIVANTE
Alguns equinos apresentam fezes semiformadas quando recebem, pela primeira vez, pastagem suculenta ou feno de alfafa ou são submetidos temporariamente a uma situação estressante (p. ex., transporte em trailer, corrida, exposição e
visita a hospital veterinário). Essa alteração na consistência de fezes não tem relevância clínica, pois o equino permanece saudável, mas os proprietários podem ficar preocupados. É importante que os animais com diarreia passem por
exames físicos e testes laboratoriais apropriados para excluir as causas infecciosas e para determinar se há necessidade de tratamento. Em geral, a consistência das fezes retorna ao normal quando o equino se adapta à nova dieta ou a
situação estressante se resolve.

 COLOPATIA INFILTRATIVA
Qualquer distúrbio que provoca espessamento da parede do cólon maior pode interferir na absorção de fluidos e resultar em diarreia crônica, perda de peso e, às vezes, hipoproteinemia. O espessamento pode ser decorrência de neoplasia,
células inflamatórias (como linfócitos, plasmócitos, macrófagos ou eosinófilos) ou formação de cicatriz devido uma colite aguda anterior.
A  palpação  retal  pode  auxiliar  na  detecção  de  espessamento  intestinal  e  linfadenopatia  mesentérica.  A  citologia  do  fluido  abdominal  pode  revelar  células  neoplásicas.  Ultrassonografia  pode  ser  utilizada  para  determinar  o  grau  de
espessamento da parede intestinal (se a área acometida do intestino pode ser visualizada) e pode revelar tumores de fígado, baço ou em superfícies peritoneais. Biopsia percutânea pode propiciar diagnóstico histopatológico de neoplasia ou
de infiltrado de células inflamatórias. Biopsia de mucosa retal ou duodeno (endoscópio de 3 m) pode ser útil no diagnóstico de doença intestinal inflamatória e deve­se realizar, também, cultura para Salmonella. Biopsia de cólon, ceco e
jejuno espessos é mais confiável para o diagnóstico de doença intestinal inflamatória (p. 317) e a amostra pode ser coletada cirurgicamente por meio de laparotomia pelo flanco, com o animal em pé, ou celiotomia na linha média, em
decúbito ventral. Laparotomia exploratória pode fornecer informações importantes, mas é um procedimento oneroso e há importante risco de má cicatrização no pós­operatório devido à hipoproteinemia.
O tratamento de neoplasia abdominal ou de doença intestinal inflamatória geralmente não é compensador, mas em alguns casos pode ocorrer remissão dos sinais clínicos com uso de dexametasona, principalmente na doença intestinal
inflamatória. Há relato de melhora dos sinais clínicos e dos parâmetros laboratoriais com tratamento com altas doses de dexametasona (0,1 mg/kg, 1 vez/dia) em 3 equinos com sintomas de linfoma de trato GI, com origem em linfócitos T.
Em dois deles, as altas doses de dexametasona foram seguidas de dose menor (0,01 a 0,95 mg/kg, 1 vez/dia), assim que se constata melhora dos sintomas. Respostas favoráveis persistiram por > 9 meses. O terceiro animal foi mantido com
altas doses por todo o tratamento, pois os sinais clínicos retornavam com a diminuição da dose. Houve recidiva dos sintomas mesmo com altas doses de dexametasona e após dois meses de tratamento o equino foi submetido à eutanásia. O
mecanismo de ação dos esteroides consiste no controle da inflamação associada à doença, ao contrário da apoptose induzida por glicocorticoides.

 ENTEROCOLITE CAUSADA POR CLOSTRÍDIOS
Clostridium difficile e C.perfringens são causas comuns de enterocolite em equinos e potros. A administração de antibióticos foi associada à diarreia por C. difficile. Alguns relatos consideram que 50% dos casos de diarreia em potros são
causados por C. perfringens. C. difficile produz toxina A e/ou B, que causa secreção de fluidos e resulta em inflamação intestinal. Comumente, o trato GI de potros recém­nascidos é rapidamente colonizado por C. difficile, que pode ser
isolado  de  fezes  utilizando­se  técnicas  anaeróbicas  sensíveis.  As  cepas  que  não  produzem  toxinas  são  consideradas  comensais.  Aproximadamente  1/3  das  éguas  e  >  90%  dos  potros  saudáveis,  da  população  em  geral,  excretam  C.
perfringens nas fezes; logo, é importante identificar as cepas produtoras de toxinas.
As cepas de C. perfringens são classificadas de acordo com as toxinas produzidas. Entretanto, tanto as toxinas quanto as cepas de C. perfringens e C. difficile produtoras de toxinas podem ser encontradas em equinos e potros normais e
com diarreia. C. perfringens tipo A é o mais comumente isolado, sendo o tipo C mais raro nas fezes ou no ambiente de éguas saudáveis e seus potros, mas está associado à maior taxa de mortalidade. Sugere­se que o uso de antimicrobianos,
a  privação  de  alimentos  e  outros  fatores  estressantes  podem  predispor  os  equinos  ao  supercrescimento  de  C.  perfringens,  C.  difficile,  ou  ambos,  provocando  doença  GI.  Em  um  relato,  potros  de  fêmeas  tratadas  com  eritromicina
desenvolveram enterocolite fatal associada à C. difficile. Os esporos de clostrídios podem persistir no ambiente e serem resistentes a diversos desinfetantes; logo, podem ocorrer infecções hospitalares em ambientes contaminados.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos incluem morte súbita, diarreia com ou sem sangue, cólica, febre, redução no consumo de alimentos e letargia. A doença pode variar desde enterocolite subclínica a grave até morte aguda antes de se
notar diarreia. Com técnicas de diagnóstico avançadas foi possível verificar que muitas das infecções antigamente diagnosticadas como “colite X” eram infecções por clostrídios. Em razão da perda da integridade da mucosa pode ocorrer
transferência de bactérias ao longo do trato GI, o que resulta em bacteriemia por clostrídios ou por outras espécies de bactérias entéricas. Geralmente notam­se sinais clínicos de sepse ou resposta inflamatória sistêmica compatível com
outras causas de enterocolite. Clinicamente, a clostridiose não pode ser distinguida de salmonelose. Potros com < 3 dias de idade com enterocolite causada por C. perfringens geralmente apresentam diarreia sanguinolenta e cólica. Com
frequência, na ultrassonografia ou radiografia nota­se intestino preenchido por fluido e gás. Em casos graves, ocorre enterocolite necrosante com espessamento intramural e até mesmo acúmulo de gás evidente dentro da parede intestinal.
Em determinado haras, vários potros podem ser acometidos, mas tipicamente a doença é esporádica.
O papel de C. perfringens tipo A na enterocolite de potros neonatos é pouco conhecido; relata­se que > 90% dos potros com 3 dias de idade eliminam a bactéria nas fezes e que C. perfringens tipo A é, provavelmente, uma das primeiras
bactérias a colonizar o trato intestinal de potros recém­nascidos, independente dos protocolos de higiene.
C. difficile está associado à ocorrência de enterocolite em potros recém­nascidos e em equinos adultos. Foi identificado como causa de infecção hospitalar em pessoas, fato notado também em equinos.
A taxa de mortalidade associada à enterocolite por C. difficile e C. perfringens, especialmente tipo C, pode ser alta, mesmo com tratamento clínico intensivo.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico baseia­se no isolamento da bactéria toxigênica em amostras de fezes frescas, refluxo, conteúdo intestinal ou tecido. Hemocultura é indicada em potros e equinos adultos com enterocolite grave. As amostras de
fezes para cultura e detecção de genes produtores ou não de toxinas devem ser entregues diretamente no laboratório, ou enviados durante a noite, resfriadas (não congeladas) em gelo. As amostras para cultura devem ser mantidas em
ambiente  anaeróbico.  O  isolamento  de  clostrídios  requer  condições  anaeróbicas  e,  dependendo  do  microrganismo,  também  meios  especiais  de  crescimento.  O C. difficile é  difícil  de  ser  cultivado,  daí  o  seu  nome.  Deve­se  informar  o
laboratório de que enterocolite clostridiana é um diagnóstico diferencial para o caso, pois muitos laboratórios veterinários não fazem cultivo anaeróbico de amostras de fezes, exceto quando há solicitação específica para tal.
Como os sorovariantes não patogênicos são comuns, uma cultura positiva para C. difficile ou C. perfringens deve ser confirmada pela identificação de toxinas ou de seus genes. A técnica de PCR, disponível em alguns laboratórios,
permite diferenciação de C. perfringens dos tipos A, B, C, D e E, com base na combinação de toxinas a, β, e ou ?, bem como identificação do código genético para toxina β2. Os testes disponíveis no mercado para toxinas clostridianas
incluem ELISA para toxina A de C. difficile e enterotoxina de C. perfringens e um teste de aglutinação em látex para enterotoxina de C. perfringens. Os testes de toxinas são rápidos e podem ser realizados no domicílio; são sensíveis e
específicos para C. difficile. Geralmente, o diagnóstico de enterocolite por clostrídio é realizado durante a necropsia e baseia­se principalmente na constatação de necrose intestinal associada à presença de diversos bacilos gram­positivos em
esfregaços intestinais. Amostras de fezes e tecidos devem ser coletadas imediatamente após o óbito, de modo a evitar degradação de toxinas ou supercrescimento de clostrídios.
TRATAMENTO:  O tratamento com metronidazol (15 a 20 mg/kg, VO, 3 a 4 vezes/dia) parece útil no tratamento de infecções entéricas por clostrídios. Estudos farmacocinéticos não foram realizados em potros, mas o metronidazol por VO e
até mesmo IV, em geral, parece seguro. Em algumas regiões surgiram cepas de C. difficile resistentes ao metronidazol, mas parecem sensíveis à vancomicina; entretanto, o metronidazol deve ser utilizado sempre que possível.
O tratamento de suporte é semelhante ao realizado na enterocolite de equinos de outras causas e geralmente requer grande quantidade de fluido poliônico IV, com suplementação de eletrólitos (potássio, magnésio e cálcio); plasma ou
coloides sintéticos no caso de pressão oncótica baixa; anti­inflamatórios, como flunixino meglumina; e antibióticos de amplo espectro, se o equino apresenta leucopenia e com risco de transferência de bactérias do trato GI comprometido. A
polimixina B pode auxiliar ligando­se às endotoxinas sistêmicas. Dieta parenteral parcial ou total pode ser útil para fornecer suporte nutricional aos potros com restrição ou redução da ingestão de leite, permitindo repouso intestinal. Potros
com cólica ou diarreia profusa geralmente se beneficiam da retirada de leite. A infusão contínua de fluido e o emprego de dieta parenteral IV são ideais, mas muito trabalhosas e exigem separação do potro, de sua mãe. Entretanto, o curso
da diarreia parece reduzido, o que justifica uma abordagem mais intensiva em alguns casos graves.
A levedura Saccharomyces boulardii induziu proteção em casos de diarreia causada por clostrídios, em outras espécies. Ela sintetiza uma protease que degrada especificamente as toxinas A e B do C. difficile. O pó de esmectita DTO
também se liga às toxinas clostridianas e pode ser útil em equinos com diarreia.
A antitoxina específica para C. perfringens tipos C e D também foi utilizada em potros; entretanto, ela não é aprovada para este fim. O benefício da antitoxina tipo C e D na doença associada ao tipo A ou β2 é desconhecido, mas com
base em métodos de produção, as toxinas a e β2 provavelmente não estão presentes em altos níveis neste toxoide.
PREVENÇÃO:  Não há disponibilidade de produtos biológicos comprovadamente eficazes para imunizar equinos ou potros contra enterocolite clostridiana. Quando a doença surge em vários potros de um haras, medidas preventivas são
implementadas, mas a eficácia e segurança destas intervenções ainda não foram avaliadas criticamente. Essas medidas incluem aplicação de duas doses de vacina em éguas prenhes, com intervalo de 2 a 4 semanas, pelo menos um mês antes
do  parto, com um toxoide  contra C. perfringens tipos  C  e  D  (devem­se  evitar  bacterinas  e  óleos  adjuvantes);  uso  profilático  de  antitoxina  contra C. perfringens tipos  C  e  D,  por  via  oral,  em  potros  recém–nascidos;  uso  profilático  de
antimicrobianos (p. ex., metronidazol) em potros nos primeiros 3 a 5 dias de vida. O toxoide contra C. perfringens tipos C e D e a antitoxina não são aprovados para uso em equinos; no entanto, esses produtos são utilizados por alguns
proprietários devido à alta taxa de mortalidade de potros com enterocolite clostridiana nos haras acometidos. Há relato de reações adversas ao uso de toxoide contra C. perfringens tipos C e D em éguas.
A estratégia de prevenção mais importante é a boa higiene na propriedade. Esporos de clostrídios são extremamente resistentes às condições ambientais e a diversos desinfetantes. A manutenção da limpeza da área de parição e da fêmea
durante o período perinatal e a ingestão imediata de colostro na primeira hora de nascimento (por sonda gástrica, se necessário) reduzem a ocorrência da doença em algumas propriedades contaminadas. Os membros pélvicos da égua, a
cauda e o úbere também podem ser higienizados com água e sabão imediatamente após o parto para reduzir a ingestão de matéria fecal pelos potros recém­nascidos. Os animais acometidos devem ser isolados para evitar infecção cruzada e
contaminação de pastagens e baias.

 ENTEROCOLOPATIA POR AREIA
O consumo de grande quantidade de areia, que se acumula no intestino grosso, pode causar diarreia, perda de peso ou cólica. A areia é ingerida quando o equino ou o potro é mantido em pasto arenoso ou alimentado com feno ou grãos em
uma área arenosa (piquete, baia ou pasto). Alguns equinos ou potros ingerem, preferencialmente, cascalho e areia, se estes itens estiverem em seu ambiente. O diagnóstico baseia­se no histórico de ambiente arenoso, na presença de areia nas
fezes, em “ruídos de areia” na auscultação do abdome ventral, e (se disponível) radiografias abdominais, as quais revelam a presença de areia no cólon maior. Para o tratamento, utiliza­se um produto à base de hemicelulose (casca de
semente de psílio) administrado por meio de sonda nasogástrica ou adicionado aos grãos, diariamente. A diarreia, em geral, se resolve em 2 a 3 dias após o início do tratamento. Geralmente, são necessárias 3 a 4 semanas de tratamento para
remover toda a areia; pode ser preciso repetir os procedimentos o equino ou o potro não for retirado da fonte de areia. Tem­se utilizado tratamento preventivo com psílio (diariamente, por 1 semana, a cada mês), onde é comum enterocolite
por areia. Há vários produtos à base de psílio no mercado; muitos animais preferem a forma peletizada, em vez de pó (ver p. 236).

 FEBRE EQUINA DE POTOMAC (ERLIQUIOSE MONOCÍTICA EQUINA, DOENÇA DO RIO SHASTA, COLITE EQUINA CAUSADA POR ERLIQUIA)
A febre equina de Potomac (FEP) é uma síndrome enterocolítica aguda que causa cólica discreta, febre e diarreia em equinos de todas as idades, bem como aborto em éguas. O microrganismo causador é Neorickettsia risticii. A infecção de
enterócitos  de  intestinos  delgado  e  grosso  resulta  em  colite  aguda,  que  é  um  dos  principais  sinais  clínicos  de  FEP.  A  doença  ocorre  na  primavera,  verão  e  no  início  do  outono  e  está  associada  a  pastejo  em  margem  de  riachos  e  rios.
Recentemente, a epidemiologia da FEP mostrou o envolvimento de um vetor trematódeo. Doença esporádica causada por N. risticii foi descrita em cães e gatos; os bovinos parecem resistentes à infecção. Há relato de FEP em diversas
regiões  dos  EUA  e  do  Canadá,  com  base  em  teste  de  pesquisa  de  anticorpo  por  fluorescência  indireta  como  evidência  de  exposição;  entretanto,  estudos  recentes  indicam  alta  taxa  de  títulos  falso­positivos  neste  teste  e  a  real  variação
geográfica da distribuição não é conhecida. Isolamento ou detecção do agente causador em casos clínicos de FEP utilizando cultura celular convencional ou PCR foi descrito apenas nos estados da Califórnia, Illinois, Indiana, Kentucky,
Maryland, Michigan, Nova York, Nova Jersey, Ohio, Oregon, Pensilvânia, Texas e Virgínia.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  N. risticii é uma bactéria gram­negativa intracelular obrigatória com tropismo por monócitos. Estudos morfológicos iniciais deste microrganismo isolado de cultura celular, assim como de respostas sorológicas a
ele, fizeram com que essa bactéria fosse incluída no gênero Ehrlichia. Entretanto, testes de DNA têm apontado que, em muitos casos, N. risticii está  mais  intimamente  relacionado  com N.  helminthoeca,  o  microrganismo  causador  de
intoxicação  por  salmão,  em  cães,  e  Ehrlichia  sennetsu,  uma  doença  humana,  no  Japão.  O  microrganismo  não  é  visto  em  monócitos,  em  esfregaços  sanguíneos  de  casos  clínicos,  ao  contrário  do  que  acontece  com  Anaplasma
phagocytophilum, que é prontamente identificado em granulócitos de equinos infectados.
N. risticii foi  isolado  em  caramujos  de  água  doce  e  em  trematódeos  liberados  de  caramujos.  O  DNA  de N. risticii foi  obtido  em  13  espécies  de  moscas  d’água  jovens  e  adultas  (Trichoptera),  efeméridas  (Ephemeroptera),  libélulas
(Odonata,  Anisoptera,  Zygoptera)  e  perlas  (Plecoptera).  Estudos  sobre  transmissão  utilizando  moscas  d’água  infectadas  com N. risticii reproduziram  a  doença  clínica.  Um  meio  de  exposição  possível  é  a  ingestão  acidental  de  insetos
aquáticos que carreiam N. risticii no estágio de metacercária do trematódeo. O período de incubação é cerca de 10 a 18 dias. O agente causador está presente nas fezes de equinos experimentalmente infectados, mas o significado biológico
disto não é conhecido. Animais clinicamente doentes não são infectantes e podem ser colocados juntos com equinos suscetíveis. São necessários estudos adicionais para determinar o exato papel de vetores e hospedeiros de helmintos no
complexo ciclo de manutenção de N. risticii.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  As características clínicas da FEP inicialmente envolvem depressão discreta e anorexia, seguidas de febre de 38,9 a 41,7°C. Nesse estágio, os ruídos intestinais podem estar diminuídos. Em 24 a 48 h, surge
diarreia  moderada  a  grave,  com  fezes  de  consistência  líquida  semelhantes  às  fezes  de  vacas  normais,  em  cerca  de  60%  dos  equinos  acometidos.  O  início  da  diarreia  é  acompanhado  de  desconforto  abdominal  leve.  Alguns  animais
desenvolvem desidratação e toxemia grave. Laminite pode ser uma complicação grave de FEP em até 40% dos equinos enfermos. Os achados hematológicos na fase inicial da FEP variam de leucopenia (caracterizada por neutropenia e
linfopenia) até um hemograma normal, apesar de evidências de toxemia. Um achado comum na FEP é leucocitose acentuada, normalmente observada poucos dias após o início da doença. A FEP pode se manifestar como todas ou algumas
combinações desses sinais clínicos.
Após vários meses da doença clínica em éguas prenhes pode ocorrer aborto devido à infecção do feto por N. risticii. Experimentalmente, éguas prenhes infectadas aos 100 a 160 dias de gestação abortaram aos 190 a 250 dias. O aborto é
acompanhado de placentite e retenção de placenta. Lesões fetais incluem colite, hepatite periporta e hiperplasia linfoide em linfonodos mesentéricos e baço. Os achados de necropsia em éguas não prenhes com enterocolite são inespecíficos
e mostram inflamação difusa, principalmente no intestino grosso.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo de FEP baseia­se na constatação dos sintomas típicos e na ocorrência sazonal e geográfica da doença. O diagnóstico definitivo de FEP deve­se basear no isolamento ou identificação de N. risticii no
sangue ou nas fezes de equinos infectados, por meio de cultura celular ou PCR. Testes sorológicos têm valor diagnóstico limitado, embora muitos animais infectados apresentem alto título de anticorpos no momento da infecção. Devido à
alta prevalência de títulos falso­positivos, a interpretação do teste de pesquisa de anticorpos por fluorescência indireta, em casos isolados, é difícil. O isolamento do microrganismo em cultura celular, embora possível, é demorado e não está
disponível em muitos laboratórios de diagnóstico. Uma pesquisa desenvolvida recentemente com PCR em tempo real permitiu a detecção de DNA de N. risticii em 2 h, tornando­o um teste muito mais viável para diagnóstico de rotina. Para
aumentar a possibilidade de detecção de N. risticii, a pesquisa deve ser realizada tanto em amostra de sangue quanto em fezes, pois não necessariamente constata­se o agente no sangue e nas fezes, simultaneamente.
TRATAMENTO:  A FEP pode ser tratada, com sucesso, com oxitetraciclina (6,6 mg/kg, IV, 2 vezes/dia), desde que instituída no início da doença. A resposta ao tratamento geralmente é notada dentro de 12 h. Está associada à diminuição da
temperatura retal, seguida de melhora na disposição, apetite e ruídos intestinais. Se a terapia é iniciada precocemente, os sinais clínicos frequentemente regridem no terceiro dia de tratamento. Geralmente, a terapia antimicrobiana dura, no
máximo, 5 dias. Animais com sintomas de enterocolite devem receber fluido e AINE. Laminite, caso ocorra, geralmente é grave e refratária ao tratamento.
PREVENÇÃO:  Várias vacinas inativadas, com célula total, baseadas na mesma cepa de N. risticii, estão disponíveis no mercado. Embora a vacinação tenha propiciado proteção em 78% dos pôneis experimentalmente infectados, a proteção
no campo foi baixa. Falhas vacinais foram atribuídas às heterogeneidades antigênicas e gênicas das > 14 diferentes cepas de N. risticii isoladas em casos de doenças de ocorrência natural. Além disso, podem ser decorrentes da falta de
proteção  por  anticorpos  no  local  da  exposição,  pelo  fato  de  que  o  meio  natural  de  transmissão  é  a  ingestão  oral  do  agente.  Para  diminuir  as  fontes  de  infecção  pode­se  tentar  a  redução  do  número  de  caramujos  em  rios  e  alagados.
Recomenda­se a redução da ingestão de insetos em equinos estabulados, apagando as lâmpadas das baias durante a noite, pois a luz normalmente atrai os insetos.
Não há relato de risco zoonótico.

 PARASITISMO
Têm­se  incriminado  os  grandes  e  os  pequenos  estrôngilos  como  causa  de  diarreia  crônica  em  equinos  e  potros.  A  parasitose  associada  a  pequenos  estrôngilos  em  equinos  é  denominada  ciatomostomíase  e  relata­se  que  causa  cólica
recidivante, diarreia e perda de peso (ver p. 356).
Giardíase (p. 218) foi mencionada, em número restrito de casos, como causa de diarreia intermitente em equinos. Entretanto, Giardia também pode ser encontrada nas fezes de alguns equinos normais e raramente é considerada como
causa de diarreia nestes animais. Criptosporídios (p. 216) foram isolados em fezes de potros saudáveis e naqueles com diarreia. Há evidência de que Cryptosporidium spp possa causar diarreia, e até morte, em potros imunocompetentes;
estes microrganismos foram incriminados como causa de surtos de diarreia em potros, em algumas fazendas.

 SALMONELOSE
Salmonelose (ver p. 203) é uma das causas de diarreia infecciosas mais comumente diagnosticadas em equinos adultos. As manifestações clínicas variam desde ausência de sinal clínico (portador subclínico) até diarreia aguda grave e até
mesmo morte. A doença é esporádica, mas pode tornar­se epidêmica, dependendo da virulência da bactéria, do nível de exposição e dos fatores do hospedeiro. A infecção pode ser decorrente da contaminação do ambiente, do alimento ou
da água ou de contato com animais que estejam eliminando ativamente as bactérias. O estresse parece ter papel importante na patogênese – histórico de cirurgia, transporte ou alteração da dieta; doença concomitante, particularmente
distúrbios GI (cólica); ou tratamento com antimicrobianos de amplo espectro frequentemente precedem a diarreia.
Salmonella enterica sorogrupo B (que inclui S. enterica sorovar Typhimurium e S. enterica Agona) são dois dos principais sorovariantes isolados de equinos com doença clínica. O conhecimento do sorovariante e o antibiograma podem
auxiliar  na  identificação  ou  no  monitoramento  do  sorovariante  de  salmonela  que  está  infectando  um  grupo  ou  população  de  equinos  (p.  ex.,  rastreamento  de  disseminação  hospitalar,  em  um  hospital  veterinário).  O  surgimento  de  S.
enterica resistente a vários fármacos é uma preocupação tanto à conduta nas infecções hospitalares quanto nas zoonoses.
ACHADOS CLÍNICOS:  Há relato de três formas de salmonelose em equinos adultos. Uma delas é a de portador subclínico, que pode ou não excretar ativamente o microrganismo, mas tem o potencial de transmitir a bactéria aos animais
suscetíveis por contato direto ou por contaminação do ambiente, da água ou de fontes de alimentos. Várias culturas de fezes podem ser necessárias para identificar os portadores, pois a bactéria é eliminada nas fezes de modo intermitente e
em número reduzido. Quando estressado, o portador pode desenvolver doença clínica. A prevalência nacional de excreção de S. enterica nas fezes de equinos normais, nos EUA, é estimada em < 2%; entretanto, em animais hospitalizados
esta taxa é muito maior. Os sorovariantes mais comuns identificados em uma população de equinos foram S. enterica Muenchen e S. enterica Newport (ambos do sorogrupo C2).
A segunda forma da doença caracteriza–se por um curso clínico discreto, com sinais de depressão, febre, anorexia e fezes moles, porém não aquosas. Os equinos acometidos podem apresentar neutropenia absoluta. A doença clínica pode
durar 4 a 5 dias e, geralmente, é autolimitante, podendo­se isolar a S. enterica das fezes. Os equinos recuperados podem continuar a excretar a bactéria nas fezes por dias a meses; portanto, recomendam­se isolamento do animal que está
eliminando o microrganismo, limpeza completa e desinfecção subsequente da área contaminada.
A terceira forma é caracterizada por início agudo de depressão grave, anorexia, neutropenia grave e, com frequência, dor abdominal. A diarreia surge 6 a 24 h após o início da febre; as fezes se tornam líquidas e fétidas. Os equinos
infectados desidratam–se rapidamente e há acidose metabólica e perda de eletrólitos à medida que o quadro clínico do paciente se agrava. Os sintomas de endotoxemia e choque hipovolêmico podem progredir rapidamente. É possível notar
sinais de desconforto abdominal, tensão ou cólica intensa secundária ao íleo adinâmico, distensão por gás, inflamação e, possivelmente, infarto no cólon. Pode ocorrer enterocolopatia com perda de proteínas, com concentração plasmática
de proteínas perigosamente baixa (albumina < 2 g/dl), após poucos dias de diarreia. Os equinos podem apresentar bacteriemia devido à transferência de microrganismos intestinais e podem ocorrer distúrbios de coagulação que resultam em
coagulação intravascular disseminada. Se não tratada, essa forma de salmonelose geralmente é fatal.
Bacteriemia por Salmonella pode ser notada em potros neonatos, principalmente em fazendas onde a ocorrência de salmonelose é endêmica (ver p. 314).
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico baseia­se nos sinais clínicos, neutropenia grave e isolamento de salmonela em amostras de fezes, sangue ou tecidos. O envio de 10 a 30 g de fezes para cultura é mais efetivo na identificação de salmonelas do
que a cultura de suabes com fezes. É importante coletar e enviar as amostras de fezes de acordo com as recomendações do laboratório responsável pela cultura. É recomendável trabalhar com um laboratório de diagnóstico que utiliza meios
enriquecidos, com ágar especificamente selecionados, a fim de facilitar o isolamento de S. enterica. Como as salmonelas não podem ser cultivadas consistentemente a partir das fezes, devem ser coletadas várias amostras (em geral, 3 a 5),
diariamente, de cada animal. A cultura de amostra de mucosa retal obtida por biopsia aumenta a probabilidade de isolamento do microrganismo; no entanto, a técnica não deixa de ser arriscada para o equino. As amostras de fezes que são
enviadas pelo correio devem ser colocadas em meios de transporte adequados para patógenos intestinais, no momento da coleta, e mantidas em gelo. Há disponibilidade de um teste PCR e, dependendo do primer utilizado, parece ser mais
sensível do que a cultura bacteriana de rotina na detecção de salmonelas.
TRATAMENTO:  O tratamento da forma grave da salmonelose baseia­se em reposição de fluidos e eletrólitos, por via IV, e tentativas de controle das respostas do hospedeiro induzidas por endotoxemia. Para a reposição de volume utiliza­se
fluido isotônico poliônico. Devido à secreção ativa de fluido e eletrólitos no lúmen intestinal, pode ser necessário volume de fluido IV de 40 a 80 L/dia. As deficiências eletrolíticas e ácido­básicas são comuns e corrigidas pelo uso de fluido
oral  e/ou  IV  suplementado  com  eletrólitos.  É  difícil  predizer  o  estado  eletrolítico  dos  animais  acometidos.  Os  déficits  devem  ser  determinados  por  análise  bioquímica  sérica;  suplementações  com  cloreto  de  sódio,  cloreto  de  potássio,
gliconato de cálcio, sulfato de magnésio e, ocasionalmente, bicarbonato de sódio podem ser indicadas.
O  tratamento  antimicrobiano  em  equinos  adultos  com  salmonelose  é  controverso  e  parece  não  alterar  o  curso  da  colite,  tampouco  diminuir  a  eliminação  de  salmonelas;  no  entanto,  pode  reduzir  o  risco  de  sepse.  A  escolha  de  um
antimicrobiano não é simples e deve se basear na sensibilidade do microrganismo isolado. Os padrões de resistência variam entre as amostras de Salmonella e podem mudar com o curso de um surto. Em equinos com depleção de volume há
risco potencial de nefrotoxicose quando se utilizam antibióticos aminoglicosídios; portanto, o estado de hidratação de um animal deve ser considerado quando se escolhe um antimicrobiano. O antibiótico ideal também deve ser lipossolúvel.
O  uso  de  protetores  GI  (p.  ex.,  bioesponja,  subsalicilato  de  bismuto  e  carvão  ativado)  pode  ser  benéfico.  Essas  substâncias  podem  se  ligar  às  toxinas  bacterianas.  AINE,  como  flunixino  meglumina,  ajudam  a  impedir  o  efeito  das
endotoxinas, controlar a dor e, possivelmente, evitar laminite. A dose de AINE utilizada é bastante variável. Terapia com AINE pode resultar em efeitos colaterais graves, como úlceras gástricas e de cólon e nefrotoxicose, de modo que
deve­se  utilizar  a  menor  dose  efetiva.  Pode–se  administrar  plasma  de  equino  para  corrigir  a  hipoproteinemia  e  suprir  fatores  de  coagulação  e,  dependendo  da  fonte  do  plasma,  anticorpos  específicos  contra  endotoxinas  e  Salmonella.
Substitutos de plasma coloidal, como hidroxietilamido, podem ser necessários para manutenção da pressão oncótica em equinos com perda importante de proteínas pelo trato GI. Estas substâncias podem ser menos dispendiosas e mais bem
toleradas do que o plasma equino, em alguns animais. Com frequência, plasma equino e substitutos de plasma coloidal são utilizados em equinos com hipoproteinemia decorrente de colite.
Utiliza­se  baixa  dose  de  polimixina  B  (6.000  U/kg,  2  vezes/dia),  a  qual  se  liga  a  endotoxinas  circulantes.  Em  testes  controlados,  a  polimixina  B  propiciou  melhora  em  alguns  efeitos  conhecidos  da  endotoxemia  em  equinos.  Doses
antimicrobianas de polimixina B são substancialmente maiores do que as utilizadas como quelantes de endotoxinas e podem ser nefrotóxicas. A terapia com baixa dose de polimixina B provavelmente não causa nefrotoxicidade aos equinos
adequadamente hidratados e que recebem fluido IV.
PREVENÇÃO:  A prevenção de salmonelose é difícil, pois o microrganismo encontra­se no ambiente e nas fezes de alguns animais saudáveis. Em um ambiente hospitalar onde os equinos ficam estressados, não se alimentam e recebem, com
frequência, tratamento antimicrobiano, indica­se identificação segura e isolamento rigoroso dos equinos infectados por salmonelas. Práticas de biossegurança para minimizar a contaminação cruzada entre os animais hospitalizados também
são aconselháveis.
Os proprietários devem estar cientes do risco zoonótico da infecção por S. enterica. As pessoas que lidam com animais infectados devem realizar higiene rigorosa.

 VARIADAS CAUSAS DE DIARREIA
As  outras  causas  de  diarreia  ou  de  fezes  semiformadas  a  aquosas  em  equinos  incluem  sobrecarga  de  grãos,  doença  de  cólon  tromboembólica,  peritonite,  terapia  antimicrobiana,  insuficiência  renal,  várias  toxicoses  (p.  ex.,  ingestão  de
besouros [cantaridina] e intoxicação por sal, eslaframina, amitraz, propilenoglicol, fósforo, selênio, nicotina, reserpina, arsênico, mercúrio, monensina, organofosforados, espirradeira, teixo japonês, mamona, abacate, estramônio, batatas,
charneca, algas, frutos do carvalho, Hypericum, agrostema e cavalinha [ou junco residual]), bem como micotoxicoses, hiperlipidose e resolução de impactação de intestino grosso.

DOENÇA DIARREICA EM POTROS

 DIARREIA BACTERIANA EM POTROS
Enterocolite bacteriana em potros neonatos pode ser um componente da sepse neonatal e pode ocorrer diarreia nos casos de bacteriemia de qualquer etiologia. Os microrganismos que podem estar envolvidos na bacteriemia neonatal e na
diarreia associada, em potros neonatos, incluem Salmonella spp, Escherichia coli, Klebsiella spp e Clostridium spp. Embora E. coli seja o principal mediador da sepse sistêmica em potros neonatos, não é causa primária comum de diarreia
em potros, como acontece em bezerros e leitões.
Há necessidade de terapia antimicrobiana intensiva, reposição da perda de água e das alterações eletrolíticas, além de cuidados de suporte. Os potros devem ser avaliados para determinar se houve adequada transferência passiva de
anticorpos colostrais; se isso não ocorreu, indica­se transfusão de plasma (ver p. 748). Potros com hipoproteinemia grave beneficiam­se da transfusão de plasma e/ou da administração de um substituto de plasma, como o hidroxietilamido,
para aumentar a pressão oncótica. Fluidoterapia IV sem correção da hipoproteinemia grave pode induzir edema pulmonar ou periférico.
Síndrome diarreica hemorrágica aguda fulminante, com alta taxa de mortalidade em potros com < 10 dias de idade, em geral com < 3 dias de idade, está associada à infecção por C. perfringens tipo C (p. 307). Enterocolite também foi
associada à C. perfringens tipo A, com ou sem gene da toxina β2. O significado desta associação é menos entendido do que com o tipo C, uma vez que o tipo A foi isolado nas fezes de > 90% dos potros neonatos saudáveis, em estudo em
um haras. É possível que o número de bactérias e a fase de crescimento predisponham à doença pelo tipo A. As infecções podem ser esporádicas ou na forma de surtos envolvendo vários potros de um haras. Na maioria dos casos, letargia
grave e rápido comprometimento da função cardiovascular são seguidos de morte dentro de 24 a 48 h. Na necropsia, verificam­se hemorragia intraluminal e necrose extensa da mucosa do intestino delgado e, em alguns casos, também do
cólon.
As outras bactérias associadas à diarreia em potros são Bacteroides fragilis, C. difficile (p. 307), Aeromonas hydrophila e Rhodococcus equi. Embora R. equi cause, principalmente, doença respiratória (p. 1576), tanto a enterite aguda
quanto a crônica podem causar diarreia em potros com 1 a 4 meses de idade. O diagnóstico é mais evidente quando há, também, pneumonia. Quando isolado em fluido de lavado traqueal, R. equi é considerado um patógeno; no entanto,
cultura fecal positiva não é tão confiável, pois R. equi pode ser encontrado nas fezes de potros saudáveis. Claritromicina combinada com rifampicina é o tratamento de escolha para infecção por R. equi em potros. Outros macrolídeos, como
azitromicina e eritromicina, podem ser utilizados, mas a eritromicina pode predispor à diarreia e hipertermia.

Infecção por Lawsonia intracellularis
A  infecção  intestinal  por  Lawsonia  intracellularis  causa  enteropatia  proliferativa  e  resulta  em  surtos  de  diarreia,  rápida  perda  de  peso,  cólica,  letargia,  edema  subcutâneo  e  enteropatia  com  perda  de  proteínas,  em  potros  recém–
desmamados. Lawsonia é cosmopolita e pode infectar várias outras espécies, como suínos, roedores e ratitas; pode sobreviver no ambiente por 2 semanas e acredita­se que a infecção ocorra por via fezes­oral. L. intracellularis penetra no
enterócito  e  impede  a  destruição  lisossomal.  A  multiplicação  das  células  infectadas  continua,  originando  células  epiteliais  imaturas  nas  criptas  hiperplásicas,  com  borda  em  escova  pouco  desenvolvida,  o  que  culmina  em  redução  da
atividade enzimática e da função de absorção. A redução da atividade das dissacaridases resulta em má digestão e consequente sobrecarga de carboidratos no cólon maior, bem como diarreia osmótica. Hipoproteinemia se instala pela
combinação de má absorção de aminoácidos e aumento da permeabilidade do intestino delgado; ocasiona diminuição da pressão oncótica plasmática e subsequente edema ventral. Má absorção e má digestão de nutrientes e a enteropatia
com perda de proteínas causam perda de peso e retardo do desenvolvimento.
Os potros acometidos apresentam 3 a 12 meses de idade, mas os mais suscetíveis são aqueles com 4 e 6 meses de idade. O estresse pode ser um fator predisponente. Devido à debilidade, os potros infectados são predispostos a infecções
secundárias nos sistemas GI, respiratório e tegumentar. As taxas de mortalidade e de morbidade são baixas, desde que os animais sejam tratados adequadamente, embora haja relato de morte súbita.
Os principais achados laboratoriais são hipoproteinemia marcante (< 4,0 mg/dl), com hipoalbuminemia (< 1,5 g/dl). A contagem de leucócitos e a concentração de fibrinogênio tendem a ser normais ou discretamente aumentadas. Pode
ocorrer anemia, hiponatremia, hipocloremia e hipocalcemia. Geralmente, a atividade de CK encontra­se um pouco aumentada.
O  diagnóstico  pode  ser  confirmado  na  necropsia,  quando  a  bactéria  intracelular  característica  é  observada  em  tecidos  corados  com  prata.  Pode­se  confirmar  a  presença  de  L.  intracellularis  utilizando­se  teste  PCR  e  exame
imunoistoquímico de tecidos coletados durante a necropsia. Como Lawsonia é um microrganismo intracelular, não cresce em meio de cultura microbiológica padrão e há necessidade de linhagem celular suscetível para seu isolamento. PCR
pode ser utilizado para detectar DNA de L. intracellularis nas fezes, mas é possível resultado falso­negativo. O exame sorológico é mais sensível do que PCR de fezes para detectar anticorpos contra L. intracellularis, mas a diferenciação
entre potros infectados e potros expostos pode ser difícil. Atualmente, os melhores testes sorológicos disponíveis são o teste de pesquisa de anticorpos em fluorescência indireta e o teste de pesquisa de anticorpos por imunoperoxidase.
ELISA também está disponível. Assim, recomenda­se tanto PCR de fezes quanto os testes sorológicos. O tratamento é indicado quando o teste é positivo, na presença de hipoproteinemia. Os potros podem permanecer soropositivos por 6
meses após a cura dos sinais clínicos. Frequentemente, ultrassonografia transabdominal revela espessamento acentuado da parede do intestino delgado.
O  diagnóstico diferencial  de  enteropatia  proliferativa  inclui  salmonelose,  clostridiose, infecções por Neorickettsia risticii e R. equi, doenças  parasitárias  e  qualquer  causa  de  doença  intestinal  inflamatória/infiltrativa.  O  diagnóstico  é
confirmado pela resposta ao tratamento. A ausência de resposta após 7 a 10 dias indica necessidade de reavaliação do diagnóstico.
Lawsonia é um patógeno intracelular; logo, os antimicrobianos devem ser lipofílicos ou anfotéricos para atingirem concentrações adequadas no interior do citoplasma da célula do hospedeiro. O tratamento com oxitetraciclina (6,6 mg/kg,
IV, 2 vezes/dia, por 3 a 7 dias), seguido de doxiciclina (10 mg/kg, 2 vezes/dia, por 14 dias) tem sido efetivo. Casos discretos respondem ao uso apenas de doxiciclina por via oral. Outras opções incluem eritromicina (exclusivamente ou
associada à rifampicina), por 3 a 4 semanas, ou cloranfenicol. Transfusões de plasma são necessárias apenas aos potros gravemente acometidos. Glicocorticoides não são indicados. A resposta ao tratamento pode ser notada pela melhora da
disposição, do apetite e do ganho de peso. A resolução da hipoproteinemia pode demorar 4 a 5 semanas e o espessamento do intestino delgado, 4 a 8 semanas.

 DIARREIA DO CIO EM POTROS
Muitas vezes, 4 a 14 dias após o nascimento os potros manifestam diarreia discreta autolimitante. Nesse período, a égua geralmente apresenta seu primeiro ciclo estral, daí o nome de “diarreia do cio em potros”. No entanto, neste período
também pode­se notar diarreia em potros órfãos; assim, é pouco provável que a atividade hormonal da égua esteja envolvida na patogênese. Embora a causa não seja conhecida, pode estar associada a alteração na flora microbiana do
intestino do potro ou modificação da dieta à medida que o potro começa a ingerir pequena quantidade de feno e grãos. Coprofagia também pode estar envolvida.
O potro permanece ativo e alerta e apresenta apetite normal. Os sinais vitais também permanecem normais. As fezes ficam semiformadas a aquosas e não são fétidas. O monitoramento é importante para garantir que a condição do potro
não se agrave. Geralmente, não é necessário tratamento específico, mas a aplicação de um protetor na pele ao redor do períneo ajuda a evitar assaduras.

 DIARREIA VIRAL EM POTROS
Os  vírus  parecem  causar  diarreia  em  potros,  mas  não  em  equinos  adultos.  Rotavírus  é  a  principal  causa  de  diarreia  viral  em  potros;  no  entanto,  outros  vírus  estão  envolvidos  (p.  ex.,  coronavírus).  A  diarreia  induzida  pelo  rotavírus
caracteriza­se por depressão, anorexia e fezes aquosas abundantes e fétidas. Geralmente acomete potros com < 2 meses de idade; potros mais jovens apresentam, tipicamente, sintomas mais graves. A diarreia normalmente dura 4 a 7 dias,
embora possa persistir por semanas.
O rotavírus destrói enterócitos da extremidade das vilosidades do intestino delgado, resultando em má absorção. A lactase torna–se deficiente, de modo que a lactose alcança o intestino grosso ocasiona diarreia osmótica. O diagnóstico se
baseia na identificação do vírus nas fezes por microscopia eletrônica ou testes imunológicos comerciais fabricados para detecção de rotavírus humano. A solicitação de um teste laboratorial específico para rotavírus, coletando­se fezes no
início da doença de diversos potros, aumenta a chance de detecção viral.
Geralmente institui­se tratamento de suporte. Algumas práticas de manejo e técnicas de desinfecção de haras limitam efetivamente a disseminação do rotavírus, em caso de surto. Os potros doentes são altamente infectantes e devem ser
isolados em uma baia, no estábulo no qual desenvolveram doença ou em uma instalação destinada a isolamento. Os funcionários devem utilizar luvas e botas higienizáveis e lavar as mãos com sabão antes e depois de manipular os potros
com diarreia. Também devem­se utilizar pedilúvios que contenham desinfetantes fenólicos, do lado de fora da baia do potro doente. O equipamento específico de limpeza da baia deve ser destinado apenas à limpeza das instalações dos
potros com diarreia. Quando a baia é desocupada, deve ser limpa, lavada com detergente e, depois, desinfetada com compostos fenólicos que preencham os padrões da EPA (Environmental Protection Agency). Alvejantes, clorexidina e
compostos  quaternários  não  parecem  efetivos  contra  rotavírus.  Não  se  deve  espalhar  o  material  fecal  de  potros  doentes  removido  de  baias,  em  pastos  utilizados  para  equinos  e  potros;  ademais,  deve­se  tomar  cuidado  para  evitar
contaminação dos corredores com fezes. Devem­se desinfetar todos os materiais de limpeza das baias. É difícil limpar e desinfetar adequadamente baias com piso sujo. Pode ser necessária a remoção das camadas superiores de sujeira.
Equinos e potros que chegam no haras, incluindo aqueles que retornam de hospitais veterinários, devem ser isolados por = 7 dias, antes de serem introduzidos na população local. Há disponibilidade de uma vacina para éguas prenhes para
induzir a produção de anticorpos colostrais com o objetivo de reduzir o risco de rotavirose em seus potros.

 MISCELÂNEA DE CAUSAS DE DIARREIA EM POTROS
Diarreia alimentar pode ser decorrência de superalimentação (p. ex., quando se coloca o potro com a égua depois de um período de separação) e de dieta inadequada (p. ex., potros órfãos alimentados com substituto de leite de bezerro ou
sacarose). A intolerância à lactose em potros é rara e pode ser detectada por meio de teste de tolerância à lactose ou pela resposta clínica à suplementação com lactase. Diarreia também pode surgir quando os potros consomem substâncias
indigeríveis, como volumoso, areia, cascalho e pedras. Há relato de que a diarreia dos potros está associada à infecção por Strongyloides westeri, Parascaris equorum e Cryptosporidium spp (ver p. 356).

PERDA DE PESO E HIPOPROTEINEMIA
As causas de perda de peso em equinos são várias e podem envolver diversos sistemas corporais. Este texto se restringe às doenças do trato GI. Perda de proteínas pode ou não estar associada à perda de peso. Os distúrbios comumente
relacionados com qualquer um desses sintomas incluem neoplasias, doença intestinal inflamatória e intoxicação secundária ao tratamento com AINE.

 DOENÇA INTESTINAL INFLAMATÓRIA
Este grupo de doenças inclui enterite granulomatosa (EG), enterocolite linfocítica plasmocitária (ELP), doença epiteliotrópica eosinofílica multissistêmica (DEEM) e enterocolite eosinofílica focal idiopática (EEFI). A doença se caracteriza
pela infiltração de células inflamatórias, inclusive linfócitos, plasmócitos, macrófagos e eosinófilos nos intestinos delgado e grosso. A inflamação pode se limitar a apenas um pequeno segmento do intestino ou ser mais difusa. Ocorre má
absorção e enterocolopatia com perda de proteínas. A diarreia pode ou não ser um achado clínico. A doença intestinal inflamatória deve ser considerada no diagnóstico diferencial em equinos com perda de peso, cólica recidivante ou
hipoproteinemia, bem como em alguns equinos com dermatopatias generalizadas.
O diagnóstico baseia­se nos sinais clínicos, na baixa concentração sérica de proteína, na constatação de espessamento intestinal (detectado por ultrassonografia ou durante palpação retal), nos sinais de má absorção e na biopsia intestinal
ou retal. A má absorção de carboidratos ocorre secundariamente à atrofia grave de vilosidades ao longo do intestino delgado. A falha na absorção de glicose ou D­xilose, administrada por via oral, confirma o diagnóstico de má absorção no
intestino delgado.
O diagnóstico histológico é subjetivo e deve ser realizado por um patologista experiente em leitura de biopsia intestinal de equinos. A biopsia da mucosa retal é útil no diagnóstico de cerca de 50% dos casos de EG e DEEM, mas
raramente auxilia no diagnóstico de ELP e EEFI. Pode­se verificar grande quantidade de eosinófilos e linfócitos na parede intestinal de equinos normais e deve­se evitar erro de interpretação. A presença de granuloma eosinofílico, vasculite
e necrose fibrinoide de vasos intramurais define o diagnóstico de DEEM. Equinos com DEEM podem apresentar dermatite grave, infiltrado eosinofílico no fígado ou no pâncreas e, em alguns casos, eosinofilia acentuada. Equinos com
EEFI  apresentam  infiltrado  eosinofílico  restrito  ao  intestino  e  o  prognóstico  quanto  à  sobrevida  é  melhor.  Pode­se  coletar  amostra  de  tecido  intestinal  espesso  por  meio  de  biopsia,  mediante  laparoscopia  com  incisão  de  flanco  ou  por
celiotomia na linha média ventral. Como a maioria dos equinos apresenta hipoproteinemia grave no momento do diagnóstico, a cicatrização no ponto de incisão pode ser problemática.
A fisiopatologia de várias síndromes não é bem conhecida. Resposta imune alterada a um fator intestinal comum (p. ex., alimentos, parasitos, bactérias) tem sido sugerida. Há semelhanças histopatológicas entre EG em equinos, doença
de Johne em bovinos e doença de Crohn em pessoas. Equinos Standardbred parecem predispostos a EG e DEEM, sugerindo possível predisposição genética.
Têm­se tentado vários tratamentos medicamentosos, com êxito limitado. Têm­se empregado corticosteroides, alteração da dieta, metronidazol e o antimetabólito azatioprina. Geralmente, a síndrome hipereosinofílica humana responde à
hidroxiureia  ou  à  vincristina  e,  em  alguns  casos,  utiliza­se  interferona­a  e  ciclosporina.  A  terapia  nutricional  de  suporte  deve  envolver  refeições  frequentes  com  alimentos  de  boa  qualidade  e  com  alto  teor  de  energia.  O  prognóstico  é
desfavorável. A remoção cirúrgica pode ser bem­sucedida se apenas uma parte restrita e acessível do intestino é acometida. Isto é mais comum na EEFI, na qual os equinos em geral apresentam cólica, em vez de perda de peso. Pode­se
detectar  espessamento  focal,  às  vezes  restrito  a  faixas  murais  circulares,  durante  laparotomia  exploratória  ou  necropsia;  o  diagnostico  pode  ser  estabelecido  com  subsequente  exame  histopatológico.  Equinos  com  EEFI  respondem  à
ressecção cirúrgica do segmento intestinal acometido. O tratamento medicamentoso com corticosteroides e refeições com pequenas porções também propicia regressão dos sintomas após descompressão do intestino delgado, sem ressecção.

 FIBROSE DE INTESTINO DELGADO
Fibrose extensa na submucosa do intestino delgado tem sido associada à perda de peso e cólica recidivante em equinos adultos em pastejo no norte do Colorado. Todos os equinos acometidos morreram ou foram submetidos à eutanásia
devido ao estado geral. A causa é desconhecida.
 NEOPLASIA GASTRINTESTINAL
O carcinoma de célula escamosa do estômago e a forma alimentar de linfossarcoma são as formas mais comuns de neoplasia de trato GI de equinos. Perda de peso crônica pode ser o principal sinal clínico. Quando o linfossarcoma se
infiltra na parede intestinal pode ocorrer diarreia crônica e hipoalbuminemia.
Como a prevalência de neoplasias GI é baixa devem­se investigar, inicialmente, outras causas de perda de peso. O diagnóstico geralmente é feito pela exclusão de outras causas de perda de peso e pelo exame histopatológico de tecido
coletado durante cirurgia exploratória ou durante a necropsia. O carcinoma de célula escamosa do estômago pode ser diagnosticado por meio de gastroscopia. É necessário um endoscópio de 2 a 3 m de comprimento para examinar a
mucosa gástrica de equinos adultos. Nos equinos com linfossarcoma, podem­se detectar linfonodos mesentéricos aumentados ou intestino espessado, por meio de palpação retal ou exame ultrassonográfico. Ocasionalmente, as células
neoplásicas são identificadas no exame citológico do fluido abdominal. A ultrassonografia pode revelar tumor no fígado ou no baço, bem como guiar a biopsia percutânea do tumor. Laparotomia exploratória, com biopsia de tumor de
intestino ou de outros locais, pode permitir o diagnóstico definitivo.
Geralmente, não se realiza tratamento de neoplasias GI; o prognóstico é ruim. Há poucos relatos de remoção cirúrgica do segmento intestinal acometido. Quimioterapia pode ser uma opção para alguns equinos; terapia corticoide pode
prolongar a sobrevida, em alguns casos.

 TOXICIDADE DE ANTI­INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDES
A toxicidade de AINE está relacionada com a seletividade à ciclo­oxigenase (COX) e à dose e duração do tratamento (ver p. 2681). Acredita­se que os inibidores não seletivos de COX têm maior potencial de toxicidade do que aqueles
seletivos à COX. Os inibidores de COX também causam retardo na cicatrização GI. O trato GI e os rins são os órgãos mais comumente afetados pela toxicidade de AINE. A lesão induzida por AINE surgir em qualquer porção do trato GI,
mas o cólon maior (principalmente cólon dorsal direito) e a mucosa gástrica parecem mais sensíveis. A capacidade da fenilbutazona em causar úlcera é maior do que a da flunexina meglumina e a desta é maior do que a do cetoprofeno. As
lesões  ulcerativas  no  cólon  maior  causam  enteropatia  com  perda  de  proteínas,  geralmente  com  sintomas  de  edema  ventral,  anorexia,  letargia,  perda  de  peso,  diarreia  e  cólica.  Pode  ocorrer  cicatrização  no  cólon  dorsal  direito  e  causar
impactação no cólon maior; em alguns casos há necessidade de ressecção do cólon maior.
Nos equinos, a fenilbutazona, administrada em altas doses ou por longo tempo, causa enterocolopatia com perda de proteínas. Entretanto, alguns equinos apresentam sensibilidade individual aos AINE, podendo ocorrer colite dorsal
direita quando se utiliza dose inferior à recomendada. Pode ocorrer toxicidade com a administração oral ou parenteral de AINE. Tem­se notado hipoproteinemia devido à perda de proteínas no lúmen intestinal, que pode ser notada sem
úlcera visível. Pode ocorrer necrose papilar renal. A administração de flunixino meglumina em altas doses ou por longo tempo pode resultar em toxicidade semelhante.
Os sinais clínicos de toxicidade por AINE incluem dificuldade de mastigação devido à úlcera bucal e lingual, hipersalivação e sinais de dor durante a deglutição em razão de úlcera esofágica. Úlcera gástrica pode resultar em decúbito
após alimentação, sinais de cólica e anorexia. Equinos com úlcera de cólon apresentam fezes amolecidas, diarreia e edema ventral. A úlcera intestinal pode ser grave o suficiente para causar transferência de bactérias e endotoxinas, bem
como sinais de inflamação sistêmica e sepse. Em casos graves, pode ocorrer desidratação, febre e taquicardia. Os sinais clínicos podem surgir dias ou meses após a terapia com AINE. Nos casos mais crônicos nota­se cólica recidivante,
perda de peso e fezes amolecidas.
Pode­se obter um diagnóstico por tentativa com base no histórico de administração de AINE, nos sinais clínicos e na constatação de hipoproteinemia. Nos casos graves há hiponatremia, hipocloremia, hipocalcemia e acidose, além de
hipovolemia. Na ultrassonografia pode­se notar espessamento do cólon. Úlcera gástrica pode ser confirmada por meio de gastroscopia, mas há necessidade de endoscópio com 2 a 3 m de comprimento.
O  tratamento  inclui  a  interrupção  do  uso  de  fenilbutazona  ou  de  qualquer  outro  AINE.  Em  casos  agudos,  pode­se  utilizar  3,8  L  de  óleo  mineral,  repetido  duas  horas  após,  para  reduzir  a  absorção  do  medicamento.  Para  auxiliar  na
prevenção de úlcera gástrica pode ser benéfica a redução da produção de ácido gástrico com uso de bloqueadores de receptores de H2 (p. ex., ranitidina) ou inibidor da bomba de prótons (p. ex., omeprazol); também, pode ser benéfico o uso
de sucralfato. Pode­se indicar a administração de misoprostol (um análogo sintético de prostaglandina), mas pode causar sintomas adicionais de diarreia e cólica. No caso de hipovolemia indica­se fluidoterapia IV, principalmente quando há
azotemia concomitante. A transfusão de plasma ou o uso de coloide sintético pode ser utilizado para aumentar a pressão oncótica do plasma.
Recomenda­se o manejo alimentar de longa duração com ração completa peletizada com baixo teor de fibras, fornecida várias vezes ao longo do dia, e a eliminação de volumoso da dieta. Óleo de milho pode ser fornecido para garantir o
aporte de calorias; ademais, pode auxiliar na cicatrização da mucosa intestinal. O muciloide psílio também pode promover cicatrização de cólon por aumentar a concentração de ácidos graxos de cadeia curta. Pode ser necessária cirurgia, se
a cicatrização intestinal ocasiona obstrução parcial do intestino.
A prevenção de toxicidade por AINE consiste na restrição de sua dose e da duração do tratamento, utilização de terapia analgésica alternativa e monitoramento da consistência de fezes e da concentração sérica de albumina.

DOENÇAS INTESTINAIS EM RUMINANTES

 DOENÇAS INTESTINAIS EM BOVINOS
A determinação da causa da doença intestinal em bovinos baseia­se nos achados clínicos, epidemiológicos e laboratoriais. A terapia inespecífica inclui reposição de fluidos e eletrólitos. Uma abordagem é descrita a seguir; terapia específica
e prevenção são detalhadas a seguir, no tópico de cada doença. Doenças intestinais de neonatos são discutidas separadamente, embora algumas das causas também acometam animais mais velhos.

Diarreia Viral Bovina e Complexo da Doença das Mucosas
Diarreia viral bovina (DVB) é mais comum em bovinos jovens (6 a 24 meses de idade); os achados clínicos podem incluir febre, inapetência, diarreia e lesões típicas na mucosa. A DVB deve ser distinguida de outras doenças virais que
causam diarreia e lesões de mucosa. Dentre elas incluem­se febre catarral maligna (p. 758), que geralmente é uma doença esporádica de bovinos adultos, e peste bovina (p. 783), que pode se manifestar na forma de surtos, mas é exótica em
muitos países.
O vírus da diarreia viral bovina (VDVB), o agente causador da DVB e do complexo da doença das mucosas, pertence ao gênero Pestivirus, família Flaviviridae. Embora os bovinos sejam os principais hospedeiros do VDVB, vários
relatos sugerem que a maioria dos animais biungulados também é suscetível. Classicamente, as estirpes de VDVB são separadas em biotipos não citopáticos e citopáticos, com base nos efeitos citopáticos observados em culturas de células
infectadas. Um terceiro biotipo proposto inclui VDVB não citopático em cultura de células não linfoides, porém citopático em linhagem celular linfoide. VDVB não citopático em células não linfoides é o biotipo viral predominante na
natureza. VDVB citopático é relativamente raro e isolado de bovinos que são persistentemente infectados com VDVB não citopático. A mudança no biotipo viral é causada por mutações que frequentemente envolvem recombinação de
RNA viral não citopático com ele mesmo, com RNA viral heterólogo ou com RNA da célula hospedeira.
Baseando­se na comparação da sequência de nucleotídios do RNA viral há, no mínimo, dois genótipos virais (grupo genéticos distintos) do VDVB que podem ser considerados subgenótipos ou genogrupos. Os genótipos virais são
denominados VDVB tipo 1 e VDVB tipo 2 e ambos, VDVB citopático e não citopático, estão representados em cada genótipo viral. Os subgenótipos são aglomerados de vírus no interior do genótipo viral, que são muito semelhantes à
sequência de nucleotídios do vírus RNA (subgenótipos são indicados por letras minúsculas; logo os subgenótipos do genótipo VDVB 1 seriam representados por 1a, 1b, 1c etc.) Atualmente, desconhece­se o número de subgenótipos virais.
Baseando­se na sequência de várias centenas de nucleotídios de algumas regiões do RNA viral, notou­se que o VDVB tipo 1 possui, no mínimo, 12 a 15 subgenótipos e o VDVB tem pelo menos dois subgenótipos.
A distribuição de VDVB tipo 1 e tipo 2 parece ser cosmopolita; no entanto, a prevalência de cada tipo de vírus varia consideravelmente de acordo com a região. A distribuição dos subgenótipos virais é mais restrita e vários subgenótipos
virais são encontrados apenas em algumas partes do mundo e, em alguns casos, apenas em determinadas regiões de um país. Todos VDVB, considerando­se o genótipo ou subgenótipo, são antigenicamente relacionados. No entanto, o
exame sorológico em que se utiliza soro coletado de bovino convalescente pode diferenciar VDVB tipo 1 e VDVB tipo 2. O grau de variação antigênica entre VDVB de diferentes genótipos e subgenótipos não são conhecidos, mas há
consenso de que as diferenças antigênicas entre os VDVB podem ser suficientes para interferir na proteção oriunda de vacinação.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  Pesquisas sorológicas indicam que o VDVB tem distribuição cosmopolita. A prevalência do anticorpo antiviral em bovinos varia entre os países e pode variar entre regiões geográficas dentro de um mesmo
país. A prevalência do anticorpo antiviral pode ser > 90% se a vacinação é praticada com frequência em determinada região. Embora bovinos de todas as idades sejam suscetíveis, a maioria dos casos de doença clínica evidente são notados
em bovinos com 6 meses a 2 anos de idade.
Bovinos persistentemente infectados por VDVB não citopático atuam como reservatório natural do vírus. Infecção persistente se desenvolve quando o VDVB não citopático é transmitido por via placentária, nos primeiros 4 meses de
desenvolvimento fetal. O bezerro nasce infectado com o vírus e assim se mantém ao longo da vida; geralmente é imunotolerante ao vírus não citopático presente. A infecção transplacentária que ocorre tardiamente na gestação resulta em
aborto,  malformações  congênitas  ou  nascimento  de  bezerros  normais  que  possuam  anticorpos  contra  VDVB.  A  prevalência  da  infecção  persistente  varia  entre  os  países  e  entre  as  regiões  de  um  país.  Relatos  recentes  indicam  que  a
prevalência da infecção persistente em bezerros introduzidos em lotes de engorda na região central dos EUA varia de 0,1 a 0,3%. A prevalência da infecção persistente em bezerros recém­nascidos provavelmente é maior e de acordo com
relatos pode atingir 4% em fazendas de bovinos leiteiros onde há infecção endêmica por VDVB. Em determinada fazenda, os bovinos persistentemente infectados, com frequência, fazem parte de grupos de animais de idades semelhantes.
Bovinos persistentemente infectados podem excretar grande quantidade de VDVB em suas secreções e excreções e transmitir o vírus facilmente para o rebanho de matrizes suscetíveis. Doença clínica e disfunções reprodutivas geralmente
são  notadas  depois  que  um  bovino  saudável  teve  contato  com  um  animal  persistentemente  infectado.  Apesar  dos  bovinos  infectados  de  forma  persistente  ser  importantes  na  transmissão  do  VDVB,  insetos  picadores,  fômites,  sêmen,
produtos biológicos e outros animais, como suínos, ovinos, caprinos, camelídeos e, possivelmente, ruminantes selvagens, também podem disseminar VDVB.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  As doenças induzidas por VDVB variam em gravidade, duração e sistema orgânico envolvido. A doença aguda resulta de infecção de bovinos suscetíveis tanto por VDVB não citopático quanto citopático. A
DVB aguda, também denominada DVB transitória, frequentemente é uma doença inaparente ou discreta cuja taxa de morbidade é alta e a taxa de mortalidade é baixa. Febre bifásica (cerca de 40°C), depressão, diminuição na produção de
leite e inapetência transitória, aumento da frequência respiratória, secreção nasal e lacrimejamento excessivos e diarreia são sintomas típicos de DVB aguda. Os sinais clínicos da doença geralmente surgem 6 a 12 dias após a infecção e
duram 1 a 3 dias. Leucopenia transitória pode ser notada no início dos sinais da doença. A recuperação é rápida e coincide com a produção de anticorpos neutralizantes virais. Lesões macroscópicas são raramente observadas nas formas
discretas da doença. O tecido linfoide é o principal sítio de replicação do VDVB, que pode ocasionar imunossupressão e exacerbar a gravidade de infecções concomitantes.
Algumas  cepas  de  VDVB  causam  doença  clínica  grave  que  se  manifesta  com  febre  alta  (cerca  de  41  a  42°C),  úlceras  bucais,  lesões  erosivas  na  faixa  coronária  e  na  fenda  interdigital  do  casco,  diarreia,  desidratação,  leucopenia  e
trombocitopenia.  Nos  bovinos  com  trombocitopenia  podem­se  observar  petéquias  na  conjuntiva,  esclera,  membrana  nictante  ocular  e  na  superfície  mucosa  da  boca  e  da  vulva.  Nota­se,  também,  sangramento  prolongado  nos  locais  de
injeção. Linfonodos aumentados, erosões e úlceras de trato GI, petéquias e equimoses nas superfícies serosas das vísceras e depleção linfoide marcante são achados associados à forma grave de DVB aguda. O curso da doença pode ser de 3
a 7 dias. Alta taxa de morbidade e moderada taxa de mortalidade são comuns. A gravidade da DVB aguda está relacionada com virulência da cepa viral infectante ao animal e não depende do biotipo ou genótipo viral.
O VDVB pode atravessar a placenta e infectar o feto, em vacas prenhes. As consequências da infecção fetal geralmente são observadas várias semanas a meses após a infecção da fêmea e depende do estágio do desenvolvimento fetal e
da cepa de VDVB. Infecção da fêmea próximo ao período de fertilização pode resultar em baixa taxa de concepção. Infecção nos primeiros 4 meses de desenvolvimento fetal pode causar reabsorção embrionária, abortamento, crescimento
retardado ou infecção persistente. As malformações congênitas oculares e do SNC resultam de infecções fetais que surgem entre o 4o e o 6o mês de desenvolvimento. Também ocorre mumificação fetal, nascimento prematuro, natimortos e
nascimento de bezerros fracos, após a infecção fetal.
Infecção persistente é sequela importante de infecção fetal por VDVB não citopático. Os bezerros persistentemente infectados podem parecer saudáveis e de tamanho normal ou podem apresentar baixo crescimento e predisposição a
enfermidades respiratórias e intestinais. Frequentemente têm baixa expectativa de vida, sendo comum morte antes de 2 anos de idade. As vacas com infecção persistente parem bezerros também persistentemente infectados, mas muitos
bezerros gerados por um touro com infecção persistente não são infectados pelo vírus, no útero. Com frequência, as lesões atribuídas ao VDVB não são constatadas na necropsia de bovinos persistentemente infectados. Anticorpo contra
DVB raramente é detectado em bovinos com infecção persistente na ausência de vacinação ou superinfecção com VDVB antigenicamente heterólogo. Um bovino persistentemente infectado exposto a um VDVB antigenicamente diferente
do  vírus  não  citopático  que  alberga  pode  provocar  anticorpo  antiviral.  Logo,  a  triagem  de  infecção  persistente  utilizando  teste  de  neutralização  viral  para  identificar  animais  deficientes  em  anticorpo  antiviral  pode  não  detectar  alguns
bovinos persistentemente infectados.
Doença das mucosas é uma forma de DVB altamente fatal, aguda ou crônica, notada com pouca frequência em bovinos com infecção persistente. A doença das mucosas se instala quando os bovinos persistentemente infectados são
superinfectados por VDVB citopático. A origem do VDVB citopático geralmente é interna, decorrendo de mutação do VDVB não citopático persistente. Nestes casos, o vírus citopático é antigenicamente similar ao vírus não citopático em
questão. As origens externas do VDVB citopático são outros bovinos e vacinas de vírus vivos modificados. Bovinos que desenvolvem doença das mucosas devido à exposição ao vírus citopático de origem externa geralmente produzem
anticorpo antiviral. A prevalência de infecção persistente geralmente é baixa e muitos bovinos persistentemente infectados não desenvolvem doença das mucosas, mesmo se expostos ao microrganismo. A doença das mucosas aguda se
caracteriza por febre, leucopenia, diarreia, inapetência, desidratação, lesões erosivas nas narinas e na boca e morte poucos dias após o início dos sintomas. Na necropsia, podem­se encontrar erosões e úlceras ao longo do trato GI. A mucosa
que recobre as placas de Peyer pode apresentar hemorragia e necrose. No exame microscópico, observa­se extensa necrose de tecidos linfoides, especialmente aqueles relacionados com os intestinos.
Os sinais clínicos da doença das mucosas crônica podem durar várias semanas a meses e são menos graves do que aqueles da doença aguda. São comuns diarreia intermitente e definhamento gradual. Em alguns bovinos, coronite e lesões
erosivas na pele da fenda interdigital causam claudicação. As lesões verificadas na necropsia são menos evidentes, mas semelhantes àquelas observadas na doença das mucosas aguda. Frequentemente, as lesões macroscópicas notadas são
apenas úlceras focais na mucosa do ceco, cólon proximal ou reto; a mucosa que reveste as placas de Peyer do intestino delgado pode se mostrar retraída.
DIAGNÓSTICO:  A DVB pode ser diagnosticada, por tentativa, a partir da anamnese, dos sinais clínicos e das lesões macro e microscópicas. Quando os sinais clínicos e as lesões macroscópicas forem discretos, há necessidade de exames
laboratoriais. Estes também são essenciais em alguns surtos de doença das mucosas ou de DVB aguda clinicamente grave, que podem ser semelhantes à peste bovina (p. 698) e à febre catarral maligna (p. 687).
Os exames laboratoriais para VDVB incluem isolamento viral e sorologia para pesquisa de anticorpos, bem como de antígenos virais ou RNA viral em amostras clínicas e de tecidos. Como os anticorpos contra VDVB são constatados na
maior parte das populações bovinas, um único teste sorológico raramente é suficiente para o diagnóstico de infecção recente. É necessário um aumento > 4 vezes no título de anticorpos em amostras séricas pareadas, obtidas com intervalo =
2 semanas, para detectar uma infecção recente. A infecção ativa é confirmada pelo isolamento de VDVB em amostras de sangue, suabe nasal ou de tecidos. A identificação de infecção persistente requer detecção do vírus em amostras
clínicas obtidas em intervalos de, no mínimo 3 semanas. Na necropsia, os tecidos de escolha para o isolamento viral incluem baço, linfonodos e segmentos ulcerados do trato GI.
As  alternativas  ao  isolamento  viral  são  testes  ELISA  para  detectar  o  vírus  em  amostras  de  sangue,  soro  ou  tecido;  imunoistoquímica  para  detectar  proteína  viral  em  tecidos  congelados  ou  fixados;  PCR  para  detectar  RNA  viral  em
amostras clínicas; e PCR ou hibridização in situ para detectar RNA viral em tecidos frescos ou fixados. A diferenciação dos genótipos e subgenótipos virais pode ser feita apenas por PCR ou por PCR seguida da sequência de nucleotídios,
análise de fragmento de restrição ou análise de substituição do nucleotídio palindrômico. Os testes de conjugação de anticorpos monoclonais e de neutralização viral também diferenciam genótipos virais.
Tratamento  e  Controle:  O  tratamento  de  DVB  limita­se  principalmente  à  terapia  de  suporte.  O  controle  baseia­se  em  práticas  corretas  de  manejo  que  incluem  uso  de  medidas  de  biossegurança,  descarte  de  bovinos  com  infecção
persistente e vacinação. Os bovinos adquiridos devem ser testados quanto à infecção persistente antes de serem introduzidos no rebanho. Deve­se adotar quarentena ou separação física de bovinos adquiridos dos demais animais do rebanho,
por 2 a 4 semanas; a vacinação dos animais adquiridos contra DVB deve ser feita antes de serem misturados ao rebanho inicial. Doadoras e receptoras de embriões também devem ser testadas quanto à infecção persistente. Se a vacinação
de doadoras e receptoras de embriões for atestada, ela deve ser feita no mínimo um ciclo estral antes da transferência de embriões. Como VDVB é excretado no sêmen, touros reprodutores devem ser testados quanto à infecção persistente
antes do acasalamento. A inseminação artificial deve ser feita apenas com sêmen obtido de touros livres de infecção persistente.
A triagem de rebanhos bovinos quanto à infecção persistente frequentemente é realizada por PCR em amostras de pele obtidas por biopsia ou amostras de sangue; por métodos clássicos de isolamento viral do soro ou pele; por ELISA do
soro ou pele, ou detecção de antígeno utilizando métodos imunoistoquímicos em tecidos ou amostras de pele obtidas por biopsia. Há disponibilidade de diversas estratégias para avaliar os rebanhos quanto à infecção persistente, com base
no tamanho e tipo do rebanho, nas limitações financeiras do proprietário e na sensibilidade do teste laboratorial de diagnóstico utilizado. Quando identificado, o bovino persistentemente infectado deve ser removido do rebanho o quanto
antes.
Estão disponíveis vacinas de vírus vivos modificados ou inativados. Elas contêm uma variedade de cepas de VDVB, que envolvem ambos, biotipos virais e genótipos virais 1 e 2. A diversidade antigênica entre VDVB pode interferir na
eficácia de uma vacina utilizada se o(s) vírus vacinal(is) é muito diferente do vírus do desafio. Para imunização apropriada e segura dos bovinos, tanto com vacinas de vírus vivos modificados quanto com vírus inativados, é importante
seguir as instruções do fabricante. Como o VDVB é fetotrópico e pode ser imunossupressor, o uso de vacinas com vírus vivo modificado não é recomendado às vacas prenhes ou que manifestam sinais de doença. As vacinas inativadas
podem  ser  aplicadas  em  vacas  prenhes.  A  proteção  conferida  por  uma  vacina  inativada  pode  ter  curta  duração  e  pode  ser  necessária  vacinação  frequente  para  evitar  a  doença  ou  disfunção  reprodutiva.  Anticorpos  colostrais  conferem
proteção  parcial  ou  total  contra  doença,  na  maioria  dos  bezerros,  3  a  6  meses  após  o  nascimento.  A  vacinação  dos  bovinos  neonatos  que  adquiriram  anticorpo  colostral  pode  não  estimular  uma  resposta  imune  protetora,  podendo  ser
necessária revacinação aos 5 a 9 meses de idade. Uma dose de reforço de vacina geralmente é administrada antes do primeiro acasalamento; uma dose de reforço pode ser administrada nos anos subsequentes, antes do acasalamento.

Disenteria de Inverno
A disenteria de inverno é uma gastroenteropatia aguda altamente contagiosa que acomete vacas leiteiras, principalmente no inverno. Os achados clínicos incluem diarreia explosiva (às vezes acompanhada de disenteria), queda acentuada na
produção de leite, depressão e anorexia variável e sintomas respiratórios discretos, como tosse. A doença tem alta taxa de morbidade, mas baixa taxa de mortalidade; é comum cura espontânea em poucos dias.
ETIOLOGIA:  A etiologia exata da disenteria de inverno não foi esclarecida. Nos últimos anos tem­se incriminado como agente etiológico um coronavírus bovino (CVB) estreitamente relacionado com o vírus que causa diarreia neonatal em
bezerros. As evidências de que o CVB é a causa da diarreia de inverno incluem: 1) os sinais clínicos e os achados patológicos são compatíveis com a doença causada pelo CVB, 2) demonstrou­se soroconversão com relação ao CVB em
bovinos acometidos, 3) o vírus é frequentemente isolado de fezes diarreicas de bovinos que apresentam sinais clínicos de disenteria de inverno, e 4) a doença tem sido reproduzida mediante breve exposição de vacas lactantes soronegativas
para CVB a um bezerro experimentalmente infectado com fezes de vacas com diarreia de inverno. Apesar dessas evidências, ainda não foi possível induzir consistentemente disenteria de inverno por meio da inoculação oral de CVB em
bovinos adultos. Podem ser necessários fatores de risco concomitantes, como alteração da dieta, temperatura fria e presença de outros microrganismos, antes que o CVB cause doença clínica em bovinos adultos. Os agentes anteriormente
sugeridos como causas de disenteria de inverno incluem Campylobacter jejuni, parvovírus bovino, enterovírus, vírus da rinotraqueíte infecciosa bovina e vírus da diarreia viral bovina.
TRANSMISSÃO, EPIDEMIOLOGIA E PATOGÊNESE:  CVB é transmitido por via de fezes­oral, mediante ingestão de alimento ou água contaminada por fezes de bovinos doentes ou de portadores clinicamente normais. Partículas virais presentes
em secreções respiratórias de animais acometidos podem favorecer a transmissão. A transmissão da doença é exacerbada por confinamento fechado. A disenteria de inverno é altamente contagiosa e facilmente introduzida em estábulos por
visitantes, animais portadores e fômites. É comum em clima boreal, onde os animais são criados em ambiente interno por longo período durante os meses de inverno. Isto é visto frequentemente no norte dos EUA, Canadá, Reino Unido,
Europa, Austrália, Nova Zelândia, Israel e Japão. Os coronavírus sobrevivem melhor em baixa temperatura e baixa intensidade de luz ultravioleta, o que pode manter o vírus no ambiente durante os meses mais frios. Vacas lactantes recém­
paridas são mais gravemente infectadas, mas a doença pode acometer animais mais jovens ou mais velhos, além de machos. A taxa de mortalidade associada à disenteria de inverno geralmente é baixa (1 a 2%), mas a taxa de morbidade nas
fazendas acometidas é alta, com 20 a 50% dos animais do rebanho exibindo sinais clínicos dentro de poucos dias; quase 100% dos animais do rebanho exibem sinais clínicos em 1 semana. Algum grau de imunidade à disenteria de inverno
parece desenvolver, pois notam­se recidivas no mesmo rebanho em intervalos de 1 a 5 anos.
Acredita­se que os mediadores inflamatórios que causam hipersecreção no intestino delgado e no cólon podem contribuir para a diarreia volumosa observada nos bovinos acometidos. Além disso, a destruição de células epiteliais das
criptas do cólon resulta em transudação de fluido extracelular e sangue, explicando a natureza hemorrágica da diarreia, em alguns casos.
ACHADOS CLÍNICOS:  A síndrome clínica caracteriza­se por início agudo de diarreia fluida e queda acentuada na produção de leite (perda de produção de 25 a 95%). As fezes são líquidas e homogêneas, verde­escuras a pretas, com discreto
odor; podem conter sangue (tipicamente em novilhas de primeira lactação) ou muco. Há odor desagradável, bolorento e doce nos estábulos com grande número de bovinos acometidos. Secreção nasolacrimal ou tosse podem acompanhar ou
preceder a diarreia. Outros sinais incluem cólica leve, desidratação, depressão, breve período de anorexia e algum prejuízo da condição corporal. Ocasionalmente, os animais exibem sintomas mais graves, como fezes com quantidades
variáveis de sangue, desidratação grave e fraqueza. Casos fatais são raros. Em casos isolados o curso da diarreia é breve e as fezes retornam ao normal em 2 a 3 dias, na maioria dos animais. No rebanho os casos da doença tipicamente
diminuem em 1 a 2 semanas, mas a produção de leite pode demorar semanas a meses para retornar ao normal.
Lesões:  O  intestino  delgado  pode  apresentar  dilatação  e  flacidez.  As  lesões  são  vistas  principalmente  no  intestino  grosso  e  consistem  de  hiperemia  da  mucosa  do  ceco  e  do  cólon,  hemorragias  em  faixas  lineares  ou  puntiformes,
predominantemente ao longo das criptas da mucosa do cólon, e sangue no lúmen do intestino grosso. Os achados histológicos podem incluir ampla degeneração e necrose do epitélio glandular do cólon.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico pode ser confirmado pela constatação de partículas do coronavírus em amostras de fezes, em ELISA ou microscopia eletrônica. Na infecção por coronavírus, a soroconversão em amostras de soro de animais
com a doença aguda e daqueles convalescentes, obtidas em intervalos de 8 semanas, também auxilia na confirmação do diagnóstico de disenteria de inverno.
Os diagnósticos diferenciais para diarreia aguda em bovinos adultos incluem diarreia viral bovina (DVB), coccidiose e salmonelose entérica. Essas doenças podem ser excluídas devido à ausência de lesões nas mucosas (DVB), culturas
de fezes negativas (Salmonella spp), teste de flotação fecal negativo (coccidiose), assim como pela manifestação clínica característica da disenteria de inverno (início súbito de diarreia de curta duração em um rebanho, com alta taxa de
morbidade e baixa taxa de mortalidade).
TRATAMENTO  E  CONTROLE:  A  maioria  dos  bovinos  acometidos  recupera­se  espontaneamente.  Devem  ser  disponibilizados  água  fresca,  alimentos  palatáveis  e  sal  à  vontade,  a  qualquer  momento.  O  uso  de  adstringentes,  protetores  e
adsorventes é controverso. Pode ser necessária fluidoterapia IV ou transfusões sanguíneas em bovinos gravemente infectados.
Não há vacina contra disenteria de inverno. Recomendam­se isolamento de um bovino adquirido recentemente por duas semanas e separação de qualquer vaca com diarreia, a fim de diminuir o risco de introdução da doença no rebanho.
Em um surto, deve­se restringir o acesso às instalações e assegurar que todas as pessoas em contato com os bovinos acometidos limpem seus sapatos e suas roupas antes de sair da fazenda onde a doença ocorre.

Síndrome do Jejuno Hemorrágico (Síndrome do intestino hemorrágico em bovinos)
A síndrome do jejuno hemorrágico é uma doença esporádica de bovinos que surgiu nos últimos anos. É caracterizada por início súbito de dor abdominal, que progride para decúbito esternal, choque e morte.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A etiologia é incerta, mas Clostridium perfringens tipo A e o gene da toxina β2 foi isolada do intestino de casos de ocorrência natural, com maior frequência do que em bovinos com outras doenças intestinais. A
principal lesão é semelhante àquela causada por C. perfringens em animais jovens em fase de rápido crescimento e consiste em enterite hemorrágica necrosante aguda localizada no intestino delgado, que resulta no desenvolvimento de
coágulo sanguíneo intraluminal. O coágulo causa obstrução física e acúmulo proximal de fluido e gás intestinal, ocorrendo hipocloremia, hipopotassemia, desidratação e graus variáveis de anemia. A enterite hemorrágica é progressiva.
Isquemia e necrose se estendem pela parede intestinal e em 24 a 48 h instala­se peritonite fibrinosa, desequilíbrio eletrolítico continuado, toxemia grave e morte.
EPIDEMIOLOGIA:  A doença ocorre de forma esporádica, principalmente em vacas leiteiras lactantes, na América do Norte, mas há relatos em bovinos de corte, bem como em rebanhos da Europa. A maioria dos casos em vacas leiteiras
ocorre nos primeiros 3 meses de lactação. Os possíveis fatores de risco para a doença são aqueles associados a práticas de manejo adotadas para obter alta produção de leite, como dieta completa misturada e administração de somatotropina
bovina. Sugere­se que o maior consumo de dieta com alto teor energético seja possível fator de risco por propiciar um ambiente intestinal favorável à proliferação de C. perfringens tipo A e produção de enterotoxinas.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os bovinos acometidos tem histórico de depressão e anorexia súbita, redução acentuada da produção de leite, distensão e dor abdominal com coices no abdome e fraqueza progressiva que progride para decúbito. Os
achados clínicos incluem depressão, desidratação, aumentos das frequências cardíaca e respiratória e membranas mucosas pálidas. O lado direito abdome pode estar moderadamente distendido, com atonia ruminal e ruído de fluido notado
com a sucussão do abdome direito. As fezes ficam sanguinolentas e escurecidas, mas podem ser escassas e ressecadas. Alças intestinais distendidas e firmes podem ser palpadas no exame retal profundo. Na laparotomia, um segmento do
intestino delgado se mostra congesto e distendido, com a superfície serosa recoberta por estrias de fibrina. O intestino delgado proximal à porção acometida e o abomaso torna­se distendido por gás e fluido. A ultrassonografia pode auxiliar
no diagnóstico.
Na maioria dos casos o animal morre em 2 a 4 dias, mesmo com tratamento intensivo com fluidos e eletrólitos. Pode ocorrer morte súbita sem sinais clínicos prévios. O hemograma é variável; o perfil bioquímico reflete obstrução da
porção superior do intestino delgado e sequestro de secreção no abomaso, com hipopotassemia e hipocloremia resultantes.
Lesões:  A  jejunite  hemorrágica  necrosante,  com  sangramento  intraluminal,  é  grave.  O  segmento  intestinal  acometido  fica  congesto  e  distendido,  com  estrias  de  fibrina  na  superfície  serosa.  O  lúmen  contem  coágulos  sanguíneos  firmes
aderidos à mucosa e o segmento intestinal acometido apresenta necrose.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico diferencial inclui outras causas de obstrução física ou funcional do intestino delgado, como intussuscepção (p. 353), dilatação e vólvulo do ceco e peritonite difusa (p. 713), torção do abomaso à direita (p. 273),
torção na base do mesentério, bem como doenças que causam melena, como úlcera de abomaso (p. 279).
TRATAMENTO E CONTROLE:  Terapia com fluidos e eletrólitos e laparotomia com ressecção do segmento intestinal acometido são as opções terapêuticas em animais de valor. Apesar deste tratamento, a taxa de mortalidade é muito alta. Não
há relato de estratégias preventivas.

Outras Doenças Intestinais em Bovinos
A infecção por Salmonella spp (p. 203) pode provocar diarreia em animais de todas as idades, especialmente naqueles estressados, aglomerados ou expostos a alimento ou suprimento de água muito contaminado. Nos animais idosos, a
doença se manifesta como disenteria e toxemia; a taxa de mortalidade pode ser relevante.
Rotavírus e coronavírus causam surtos ocasionais de diarreia em bezerros lactentes com 2 a 3 meses de idade. As fezes são volumosas e podem conter muco. Não há evidência de toxemia e a taxa de mortalidade é insignificante, mas há
retardo do crescimento (ver p. 329).

Síndrome do jejuno hemorrágico. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Enterite necrótica de etiologia desconhecida acomete bovinos de corte com 5 a 12 semanas de idade e, comumente, vários bezerros do rebanho. Nota­se início súbito de febre, depressão e diarreia abundante. Inicialmente as fezes são
verde­escuras, contêm sangue e frequentemente sujam o períneo. É possível notar erosões circulares na mucosa bucal. Parte dos bezerros recupera­se após um curso clínico de 3 a 5 dias. É mais longo nos casos fatais; os animais apresentam
escassas fezes muco­hemorrágicas, eliminadas com tenesmo, e desenvolvem leucopenia não regenerativa grave. Pode haver broncopneumonia fibrinosa secundária. A taxa de mortalidade é alta, apesar da terapia antimicrobiana intensiva.
Na necropsia nota­se necrose ulcerativa no intestino delgado terminal e no intestino grosso.
Coccidiose (p. 208) geralmente acomete bovinos com < 1 ano de idade, especialmente quando há aglomeração de animais e superlotação no pasto. Caracteriza­se por disenteria e tenesmo e pode ser acompanhada de sintomas nervosos.
As helmintíases intestinais, particularmente a ostertagíase (p. 369), infectam bovinos da mesma faixa etária. A ostertagíase tipo I acomete bovinos criados em pastos, mas a ostertagíase tipo II pode ser notada em animais confinados.
Os surtos explosivos de diarreia em bovinos adultos estão associados mais comumente com disenteria de inverno (p. 323), mas também com salmonelose quando há contaminação intensa de alimentos ou água.
Diarreia crônica com definhamento e emaciação, que ocorre como doença esporádica, está associada mais comumente com a paratuberculose (p. 778), mas também pode ser causada por salmonelose e infecção crônica por DVB. Diarreia
com emaciação também pode ser observada em bovinos com insuficiência cardíaca congestiva, uremia ou peritonite crônica. Diarreia persistente com definhamento e, ocasionalmente, emaciação em bovinos com 1 ano de idade e em
adultos pode estar associada a deficiência de cobre secundária ao excesso de molibdênio nas pastagens. Nos bovinos em crescimento, a diarreia também pode acompanhar síndromes de definhamento patológico responsivas ao selênio.
Casos isolados ou surtos de diarreia podem estar associados à negligência alimentar. Diarreia pode acompanhar casos de indigestão simples, sendo comum em casos de sobrecarga por grãos (p. 297). Também acompanha ingestão de
quantidade tóxica de produtos químicos (p. ex., arsênico, cobre, zinco e molibdênio) ou de algumas plantas tóxicas e micotoxicoses; a intoxicação por dipiridila e organofosforado também pode causar diarreia.
Os  bovinos  também  podem  abrigar  microrganismos,  como  Escherichia  coli  O157:H7,  Yersinia  enterocolitica  e  Campylobacter  jejuni,  no  intestino;  embora  esses  microrganismos  raramente  causem  doença  clínica  nas  vacas,  a
contaminação do leite com fezes pode ocasionar surtos de gastrenterite em pessoas que consomem leite não pasteurizado ou queijos. Os produtos derivados de carne vendidos no varejo também podem ser contaminados quando ocorre
contaminação da carcaça com fezes, por ocasião do abate.
Adenocarcinoma intestinal é observado comumente em associação com hematúria enzoótica bovina e acredita­se que resulte da interação de um carcinógeno (ptaquilosida) da samambaia (Pteridium spp, p. 3159) e com o papilomavírus.
Obstruções intestinais são esporádicas (ver p. 353). Vólvulo e dilatação de ceco ocorrem predominantemente em bovinos adultos, no período pós­parto. Intussuscepção de jejuno distal ou íleo proximal é a causa mais comum de obstrução
total,  tanto  em  bovinos  adultos  quanto  em  bezerros.  Intussuscepções  ileocecocólica,  cecocólica  e  de  cólon  são  menos  frequentes  em  bezerros  e  não  ocorrem,  em  absoluto,  em  bovinos  adultos,  devido  à  maior  resistência  do  ligamento
ileocecal e à presença de gordura mesentérica, que estabiliza essa região intestinal em bovinos idosos. Vólvulos intestinais e ao redor da base mesentérica ocorrem esporadicamente em todas as idades. Raramente, a obstrução intestinal é
causada por encarceramento e aprisionamento de intestino delgado por persistência de úraco ou resquícios umbilicais, por obstrução de intestino delgado ou cólon descendente por fitobezoares e enterólitos, ou por compressão devido à
necrose gordurosa ou lipoma. A obstrução intestinal também pode ser causada por doença congênita (p. 172), mais comumente por atresia de cólon (que ocorre tanto esporadicamente quanto em grupos de uma fazenda e pode ser provocada
por palpação retal da vesícula amniótica aos 35 a 41 dias de prenhez), mas também por atresia anal (que pode ser acompanhada de defeitos urogenitais e da cauda).

 DOENÇAS INTESTINAIS DE OVINOS E CAPRINOS
As  causas  e  circunstâncias  de  diarreia  em  cordeiros  e  cabritos  neonatos  são  semelhantes  àquelas  verificadas  em  bezerros  recém–nascidos.  As  práticas  de  parição  e  desmame  intensivas  aumentam  o  risco  de  doenças  e  o  acúmulo  de
microrganismos infecciosos e podem estar associadas a importantes surtos de diarreia. Os sorotipos de Escherichia coli enteropatogênica que causam diarreia secretória em bezerros também o fazem em cordeiros e as abordagens para
diagnóstico,  tratamento  e  controle  são  semelhantes.  Da  mesma  forma,  rotavírus,  coronavírus  e  criptosporídios  (p.  216)  também  causam  surtos  de  diarreia  em  cordeiros  (ver  p.  329).  A  disenteria  dos  cordeiros  causada  por  Clostridium
perfringens tipo B (p. 658) é uma enteropatia distinta que acomete cordeiros na primeira semana de vida. Infecta principalmente raças montanhesas de ovinos no Reino Unido e se caracteriza por morte súbita ou diarreia, disenteria e
toxemia. Nos EUA, C. perfringens tipo C causa síndrome semelhante. A síndrome da boca úmida ou “crepitação abdominal” (ver a seguir), doença de etiologia desconhecida associada a baixa concentração de imunoglobulinas circulantes,
ocorre predominantemente no Reino Unido. Acomete também cordeiros jovens, mas se manifesta como estase GI. A coccidiose (p. 208) e as helmintíases GI (p. 369), exceto hemoncose, são causas importantes de diarreia em ovinos
lactentes mais velhos e desmamados. Ileíte terminal e atrofia de vilosidades, ambas de etiologia desconhecida, são achados frequentes no intestino de cordeiros descartados devido ao retardo no crescimento.
A helmintíase GI é a causa mais comum de diarreia em ovinos criados em pasto. Coccidiose está associada à superpopulação ou confinamento intensivo e condição sanitária precária. Salmonelose (p. 203) pode causar diarreia em animais
de todas as idades; as condições em cordeiros jovens são semelhantes àquelas mencionadas para bezerros. Também, pode causar surtos de diarreia no final da prenhez, frequentemente acompanhados de abortamento. Salmonelose é mais
comum quando ovinos ou caprinos são reunidos intensivamente ou ficam estressados, particularmente devido ao transporte. Yersinia pseudotuberculosis e Y. enterocolitica estão associadas a enterocolite e diarreia em ovinos jovens criados
em pasto, que se encontram debilitados devido a fatores como inanição e clima frio. Diarreia pode ser notada na doença “língua azul” de ovinos (p. 775), acompanhada de lesões mucosas típicas. Nos caprinos, a diarreia é frequentemente
evidente na enterotoxemia associada a C. perfringens tipo D (p. 659). Isso não é uma característica da doença clínica em ovinos, mas pode ser notadas em animais do rebanho de ovinos acometidos. Nos ovinos em engorda, a diarreia está
associada mais comumente com sobrecarga de grãos, salmonelose ou coccidiose.
Outras enteropatias dos ovinos adultos podem se manifestar com diarreia. A infecção por C. perfringens tipo C (p. 658) se apresenta como dor abdominal, tenesmo e morte súbita. Obstrução intestinal devido a traumatismos intestinais é
esporádica, mas em geral não é observada clinicamente. Ovinos com paratuberculose (p. 778) geralmente exibem emaciação progressiva sem diarreia. Depauperamento progressivo também é o principal sintoma em ovinos adultos com
adenocarcinoma intestinal, que pode ser prevalente em algumas regiões, associado a ingestão de samambaia (ver p. 3159).

Doença da Boca Úmida em Cordeiros (Boca com baba, Salivação, Crepitação Abdominal)
Doença da boca úmida não ocorre em rebanhos submetidos à criação extensiva, mas corresponde a cerca de 25% dos óbitos de cordeiros recém­nascidos no Reino Unido em sistemas de criação intensiva em ambiente interno. A taxa de
morbidade em um rebanho pode ser tão alta quanto 30% e, se não for tratada, a maioria dos cordeiros acometidos morre. Há relato de síndrome semelhante em cordeiros na Espanha e em cabritos na França e Canadá.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Os cordeiros com 12 a 72 h de vida privados de colostro, ou com acesso inadequado a ele, em razão de competição entre irmãos, fraqueza, castração precoce e cuidado ou suprimento materno inadequado são
mais sujeitos à enfermidade. A pouca transferência de anticorpos maternos e a fisiologia digestiva específica de cordeiros recém­nascidos permite que bactérias gram­negativas, particularmente Escherichia coli, presentes na lã ou na cama,
sejam  ingeridas  acidentalmente,  sobrevivam  e  passem  do  intestino  para  a  corrente  sanguínea.  As  cepas  envolvidas  não  possuem  o  antígeno  K99  e  normalmente  não  são  consideradas  enteropatogênicas,  tampouco  enterotoxigênicas.  A
bacteriemia resultante pode ser tolerada pelo cordeiro; no entanto, as bacteriemias com > 104unidades formadoras de colônia/ml está associada à liberação de endotoxinas, instalando­se choque endotóxico agudo.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os cordeiros acometidos apresentam hipotermia, apatia, param de se alimentar e, classicamente, apresentam longos filamentos de saliva que saem pela boca. Nos casos menos evidentes é possível notar focinho úmido;
outros animais podem não exibir qualquer sinal externo de salivação excessiva, mas a boca pode estar fria ao toque e conter saliva espumosa. Também, pode ocorrer lacrimejamento. O abomaso pode estar distendido com gás e fluido e
conferir a aparência enganosa de um cordeiro bem alimentado, mas se esses cordeiros são erguidos e movimentados gentilmente, pode­se perceber um ruído associado à denominação alternativa de “crepitação abdominal”. Raramente
ocorre diarreia.
Lesões: A necropsia pode revelar trato GI inflamado e distendido, retenção de mecônio, palidez renal e muscular, desidratação e linfonodos mesentéricos aumentados de volume e reativos.

DIAGNÓSTICO:  As alterações bioquímicas e hematológicas e os achados de necropsia em  cordeiros  acometidos  são  compatíveis  com  endotoxemia  e  choque  endotóxico.  Finalmente,  os  cordeiros  desenvolvem  endotoxemia,  leucopenia,
hipoglicemia grave, acidemia láctica e acidose metabólica. Os diagnósticos diferenciais incluem artropatia ou onfalopatia, hipotermia, inanição primária e enterite infecciosa.
TRATAMENTO:  Não há tratamento específico. Pode ser útil a aplicação parenteral de antibióticos e AINE e a administração de 50 a 200 ml de solução de glicose 10% com eletrólitos, contendo antibiótico hidrossolúvel (neomicina e/ou
estreptomicina), com auxílio de sonda gástrica 3 vezes/dia; todavia, a terapia antimicrobiana deve ser fornecida antes que os cordeiros apresentem bacteriemia, dentro de 4 a 8 h após o nascimento, para reduzir o risco de lise de bactérias
presentes no sangue e a ocorrência de choque endotóxico. Purgantes de uso oral ou enemas podem auxiliar a sanar a estase intestinal e facilitar a excreção de bactérias infecciosas. O tratamento deve ser mantido até que os sintomas se
resolvam e o cordeiro volte a mamar. Também, pode ser necessário aumento da temperatura corporal por meio de aquecimento externo. No entanto, tais cuidados requerem tempo, são onerosos e não garantem qualquer de sucesso.
PREVENÇÃO:  A prevenção é a melhor opção. As ovelhas devem ser bem nutridas para assegurar um suprimento abundante de colostro. Currais, cercados, ovelhas e equipamento devem ser mantidos o mais limpo possível por ocasião da
parição, de modo a evitar o acúmulo de E. coli e  manter  baixa  a  prevalência  da  doença.  A  suplementação  alimentar  dos  cordeiros  com  colostro  armazenado  (de  ovelha,  vaca  ou  cabra)  ou  com  substituto  de  colostro  comercial  devem
propiciar no mínimo 50 ml/kg de peso corporal, dentro de 6 h após o nascimento. Os cordeiros não devem ser castrados nas primeiras 24 h, pois isso reduz o consumo de colostro.
Em experimentos controlados, notou­se que uma única dose oral de antibiótico administrada dentro de 2 h após o nascimento, aos cordeiros privados de colostro e nascidos em ambiente confinado contaminado, foi tão efetiva quanto o
colostro de ovelha na prevenção de doença neonatal e de morte em todos os cordeiros com até 3 dias de idade, apesar da ausência de anticorpos maternos. Logo, o tratamento com antibióticos pode propiciar uma proteção simples, rápida e
barata contra doença da boca úmida, sendo uma opção atrativa para o criador de ovinos. No entanto, é importante que este tratamento seja indicado aos cordeiros incluídos nas categorias de alto risco especificadas anteriormente, pois o uso
indiscriminado pode estimular a resistência aos antibióticos.

 DIARREIA EM RUMINANTES NEONATOS (Disenteria)
Diarreia é comum em bezerros, cordeiros e cabritos recém­nascidos. A doença aguda caracteriza­se por desidratação progressiva e morte, às vezes em menos de 12 h. Na forma subaguda, a diarreia pode persistir por vários dias e resultar
em desnutrição e emaciação. Este texto aborda a doença em bezerros, mas os princípios fisiopatológicos e terapêuticos se aplicam também aos cordeiros e cabritos.
ETIOLOGIA:  Vários enteropatógenos estão associados à diarreia neonatal. A sua prevalência relativa varia geograficamente, mas as infecções mais prevalentes na maioria das regiões são causadas por Escherichia coli, rotavírus, coronavírus
e Cryptosporidium parvum. Os casos de diarreia neonatal comumente estão associados a mais de um desses microrganismos e a causa da maioria dos surtos é multifatorial. Pode ser importante identificar os microrganismos específicos
causadores do surto de diarreia porque para alguns deles há terapia específica. Além disso, alguns agentes representam risco zoonótico. Diarreia também é notada na colibacilose septicêmica.
Bactérias:  E. coli é a causa de diarreia bacteriana mais importante em bezerros; as diferentes cepas desse microrganismo produzem pelo menos 2 tipos de doença diarreica. Um tipo está associado a E. coli enterotoxigênica, que possui 2
fatores de virulência associados à ocorrência de diarreia. Os antígenos das fímbrias permitem que ela se prenda às vilosidades do intestino delgado e as colonize. Nos bezerros, as cepas possuem mais comumente os antígenos fimbriais K99
(F5),  F41,  ou  ambos.  Esses  antígenos  representam  o  foco  de  proteção  imunológica. E. coli enterotoxigênica  também  elabora  uma  enterotoxina  não  antigênica  termoestável  (Sta),  que  influencia  a  secreção  de  íons  e  fluidos  intestinais,
provocando diarreia secretória não inflamatória. Diarreia de bezerros e cordeiros também está associada a E. coli enteropatogênica, que se adere ao intestino e provoca lesão por fixação e destruição, com dissolução da borda em escova e
perda da estrutura das microvilosidades no local de fixação; diminuição da atividade enzimática; e alterações no transporte de íons no intestino. Esses enteropatógenos também são denominados “E. coli de fixação e destruição”. Alguns
deles produzem verotoxina, que pode causar diarreia hemorrágica mais grave. A infecção se instala mais frequentemente no ceco e no cólon, mas também pode acometer o intestino delgado distal. Nas infecções graves as lesões podem
resultar em edema, erosões e úlceras de mucosa, ocasionando hemorragia no lúmen intestinal.
Salmonella spp, especialmente S. Typhimurium e S. Dublin,  e  ocasionalmente  outros  sorovariantes,  causam  diarreia  em  bezerros  com  2  a  12  semanas  de  idade.  As  salmonelas  produzem  enterotoxinas,  mas  também  são  invasoras  e
induzem alterações inflamatórias no intestino. Nos bezerros, comumente a infecção progride para bacteriemia (ver p. 203).
Clostridium perfringens tipos A, B, C e E produzem várias toxinas necrosantes e causam enterite hemorrágica rapidamente fatal em bezerros. Nestes, a doença é rara e geralmente esporádica. A infecção pelo tipo B ou C é uma causa
comum de enterite e disenteria em cordeiros (ver p. 662). Campylobacter jejuni e Yersinia enterocolitica podem ser encontradas nas fezes de bezerros e cordeiros com diarreia, mas também podem estar presentes nas fezes de animais
saudáveis.
Vírus: Rotavírus é a causa mais comum de diarreia viral em bezerros e cordeiros. Rotavírus grupos A e B estão envolvidos, mas o grupo A é mais prevalente e clinicamente importante e contém vários sorotipos com diferentes virulências. O
rotavírus se replica nos enterócitos de absorção maduros e produtores de enzimas, nas vilosidades do intestino delgado, ocasionando ruptura e perda dos enterócitos com liberação de vírus que infectam as células adjacentes. O rotavírus não
infecta células imaturas das criptas. No caso de cepas virulentas do rotavírus, a perda de enterócitos excede a capacidade de reposição das criptas intestinais; com isso, reduz­se a altura das vilosidades, com diminuição subsequente da área
de superfície de absorção e da atividade enzimática digestiva no intestino.
Coronavírus  também  está  comumente  associado  a  diarreia  em  bezerros.  Ele  se  replica  no  epitélio  do  trato  respiratório  superior  e  nos  enterócitos  intestinais,  onde  produz  lesões  semelhantes  ao  rotavírus;  também,  infecta  as  células
epiteliais do intestino grosso e ocasiona atrofia das saliências do cólon.
Outros vírus, inclusive vírus de Breda (torovírus), um vírus semelhante ao calicivírus, astrovírus e parvovírus, já foram isolados nas fezes de bezerros com diarreia e podem provocar diarreia experimental nesses animais. No entanto,
esses microrganismos também podem ser isolados nas fezes de bezerros saudáveis. Ainda é preciso determinar a importância desses vírus na síndrome da diarreia neonatal. Relata­se que vírus da diarreia viral bovina e da rinotraqueíte
infecciosa bovina causam diarreia em bezerros, mas isso não é uma manifestação comum dessas infecções.
Protozoários:  Cryptosporidium parvum (p. 216) é uma causa comum de diarreia em bezerros e cordeiros. O parasito não invade, mas se adere à superfície apical dos enterócitos no intestino delgado distal e no cólon. Isso resulta em perda de
microvilosidades, diminuição da atividade de enzimas na mucosa, com atrofia e fusão das vilosidades (ocasionando redução da área da superfície de absorção das vilosidades) e inflamação na submucosa. Os criptosporídios de mamíferos
não possuem especificidade ao hospedeiro.
Giardia  duodenalis  é  causa  comum  de  infecção  intestinal  assintomática  em  bezerros  e  cordeiros  jovens.  Foi  isolada  em  fezes  de  bezerros  com  retardo  de  crescimento  e  que  apresentavam  diarreia  mucoide  crônica,  mas  há  poucas
evidências de uma relação causal entre este microrganismo e a ocorrência de diarreia em bezerros ou cordeiros.
Outras Causas:  Bezerros alimentados com grande quantidade de leite ou de substitutos de leite inapropriadamente formulados produzem grande volume de fezes, com maior conteúdo de fluido do que o normal, mas não apresentam diarreia
fluida com perda de peso. Da mesma forma, bezerros que mamam em vacas de corte de alta produção, que se alimentam de pastagem suculenta, podem apresentar fezes líquidas. Os substitutos de leite de má qualidade, com proteínas
desnaturadas pelo calor ou com quantidade excessiva de proteína de soja, peixe ou carboidratos de origem não láctea, apresentam maior risco de diarreia.
Há algumas evidências de que a administração oral de cloranfenicol, neomicina ou tetraciclina em bezerros jovens, por 3 a 5 dias, pode resultar em alteração de vilosidades e consequente má absorção e discreta diarreia. Tratamento
prolongado com altas doses de antibióticos em bezerros pode ocasionar diarreia associada à superinfecção bacteriana intestinal. Colissepticemia (p. 751) e fechamento incompleto da goteira esofágica, que causa indigestão láctea (p. 290),
também podem ser acompanhados de diarreia.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  Os enteropatógenos associados à diarreia são comumente encontrados nas fezes de bezerros saudáveis; a ocorrência de infecção intestinal e diarreia depende de vários fatores determinantes, incluindo
diferenças na virulência das cepas distintas de determinado patógeno e presença de mais de um patógeno. A resistência do bezerro é muito importante, sendo significativamente determinada pela transferência passiva de imunoglobulinas
colostrais bem­sucedida. Os bezerros privados de colostro são altamente suscetíveis à infecção por enteropatógenos e desenvolvem doença grave, frequentemente fatal. A progressão da infecção e a gravidade das lesões e da diarreia podem
ser  moduladas  por  imunoglobulinas  obtidas  pela  ingestão  de  colostro.  As  imunoglobulinas  atuam  diretamente  nos  patógenos  do  lúmen  intestinal  durante  o  período  de  ingestão  de  colostro,  bem  como  depois  disso,  porque  quantidade
significativa de imunoglobulinas circulantes é novamente secretada no intestino, especialmente quando a concentração de imunoglobulinas circulantes é alta. A ausência de anticorpos específicos nas mães não expostas a determinados
patógenos e o uso de vacinas específicas modulam adicionalmente a resistência dos bezerros. O estresse causado por ambiente sanitário deficiente, proteção climática inadequada ou dieta insuficiente ou inapropriada também aumenta o
risco de doença.
Como acontece com todos os enteropatógenos, os bovinos adultos saudáveis podem ser portadores e excretam periodicamente o microrganismo nas fezes. A excreção pode aumentar com o estresse da parição e ser mais frequente em
vacas  primíparas.  Isso  pode  contaminar  áreas  de  parição  e  provocar  infecção  de  úbere  e  períneo  da  mãe.  Outras  fontes  de  infecção  incluem  fezes  de  bezerros  saudáveis  e  de  bezerros  com  diarreia,  que  contêm  grande  quantidade  de
microrganismos no início da infecção. Alguns bezerros com diarreia podem ocasionar contaminação intensa da área de criação de bezerros. A transmissão ocorre por meio de contato fecal–oral, aerossóis de fezes e, no caso de coronavírus,
também por aerossóis respiratórios.
PATOGÊNESE:  A diarreia de ruminantes neonatais geralmente está associada a doença de intestino delgado e pode ser causada por hipersecreção ou má absorção. Diarreia hipersecretora ocorre quando há secreção de quantidade anormal de
fluido no intestino, excedendo a capacidade de reabsorção da mucosa. Na diarreia por má absorção, a capacidade da mucosa em absorver fluidos e nutrientes é prejudicada até que não se consiga compensar a entrada normal de fluidos
ingeridos  e  secretados.  Isso  geralmente  se  deve  à  atrofia  de  vilosidades,  na  qual  a  perda  de  enterócitos  maduros  nas  extremidades  destas  vilosidades  ocasiona  diminuição  na  altura  destas  estruturas  (e  consequente  redução  da  área  da
superfície de absorção) e perda de enzimas digestivas da borda em escova. A extensão e a distribuição da atrofia variam em função dos diferentes patógenos e podem explicar a variação na gravidade da doença clínica. A diarreia por má
absorção pode ser agravada pela fermentação de nutrientes no cólon, que seriam absorvidos no intestino delgado. Os produtos da fermentação, especialmente o ácido láctico, parecem atuar osmoticamente e atrair água para o interior do
cólon, o que contribui para a gravidade da diarreia.
Na maioria das infecções, uma inflamação contribui para a fisiopatologia da diarreia e os mediadores inflamatórios podem interferir no fluxo de íons ao lúmen intestinal. A inflamação também induz lesões vasculares, linfáticas e de
estruturais da unidade cripta­vilosidade. A maioria das diarreias infecciosas envolve componentes hipersecretórios, inflamatórios e de má absorção, embora geralmente predomine apenas um desses tipos. Isso acarreta perda de água, sódio,
potássio e bicarbonato; se essa perda é grave, o bezerro desenvolve hipovolemia, hiponatremia, acidose e azotemia pré­renal.
E. coli enterotoxigênica produz a enterotoxina Sta, que estimula intensa hipersecreção por meio da ativação da guanilatociclase e da indução de secreção de sódio e cloro. O sistema de cotransporte de sódio­glicose ligado à membrana
permanece  normal.  As  salmonelas  também  produzem  enterotoxinas.  Inflamação,  que  causa  necrose  de  enterócitos,  infiltração  inflamatória  submucosa  e  atrofia  de  vilosidades  também  são  componentes  importantes  na  fisiopatologia  da
diarreia causada por salmonelas, bem como da diarreia induzida por E. coli enteropatogênica e Clostridium perfringens toxigênico. As infecções por E. coli enteropatogênica produtora de verotoxina ocasionam em acúmulo de fluido no
intestino grosso e extensas lesões na mucosa, com edema, hemorragia, erosão e úlcera, o que resulta em sangue e muco no lúmen.
Os vírus geralmente causam diarreia por má absorção devido à destruição das células de absorção da mucosa e, consequentemente, encurtando as vilosidades intestinais. O mecanismo pelo qual os criptosporídios provocam diarreia não é
completamente compreendido, mas parece haver implicação de componentes tanto de má absorção quanto inflamatórios.
Os substitutos de leite inapropriadamente formulados provocam diarreia por dois mecanismos, ambos associados à má absorção. Os produtos vegetais (especialmente a soja) são utilizados comumente como fontes proteicas na fabricação
de substitutos de leite. Dependendo do grau de refinamento, esses produtos podem conter carboidratos não digeríveis por bezerros jovens. Tais carboidratos não são absorvidos no intestino delgado e podem contribuir para a ocorrência de
diarreia devido sua fermentação no cólon. Além disso, a maioria dos bezerros com < 3 semanas de idade parece ter alergia às proteínas da soja, o que resulta em atrofia de vilosidades e consequente diarreia, provavelmente por má absorção.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais principais incluem diarreia, desidratação, fraqueza intensa e morte dentro de 1 a vários dias após o início.
A diarreia causada por E. coli enterotoxigênica  (K99)  acomete  bezerros  com  <  3  a  5  dias  de  idade,  raramente  mais  tarde.  No  entanto,  a  idade  de  suscetibilidade  pode  se  estender  na  presença  de  outros  patógenos.  O  início  é  súbito.
Quantidade  abundante  de  fezes  líquidas  é  eliminada  e  os  bezerros  rapidamente  se  tornam  deprimidos  e  se  posicionam  em  decúbito.  Os  bezerros  podem  perder  mais  de  12%  do  peso  corporal  em  fluidos,  podendo  ocorrer  choque
hipovolêmico e morte em 12 a 24 h. A temperatura corporal pode se elevar, mas comumente permanece normal ou subnormal. Caso seja administrada precocemente terapia hidreletrolítica, a resposta geralmente é boa. A doença causada
por E. coli, por fixação e destruição, acomete predominantemente bezerros com 4 dias a 2 meses de idade e pode se manifestar com diarreia ou, principalmente, como disenteria com sangue e muco nas fezes. O curso clínico é curto.
Diarreia por Salmonella spp geralmente não ocorre em bezerros com < 14 dias de idade. Caracteriza­se por fezes fétidas com sangue, fibrina e grande quantidade de muco. Sepse com febre alta e depressão que progride para prostração e
coma, é a manifestação evidente da salmonelose em bezerros e, embora haja diarreia, em geral a morte se deve a choque septicêmico, em vez de hipovolêmico. Os bezerros com salmonelose geralmente perdem peso rapidamente e, com
frequência, morrem mesmo com tratamento intensivo.
A enterotoxemia hemorrágica causada por C. perfringens tipo B ou C se caracteriza por início agudo de depressão, fraqueza, diarreia sanguinolenta, dor abdominal e morte em poucas horas. Geralmente ocorre em bezerros robustos com
apenas poucos dias de idade, apetite voraz e uma fonte de leite prontamente disponível. Os bezerros com C. perfringens geralmente morrem antes que o tratamento seja instituído.
Diarreia  por  rotavírus,  coronavírus  e  outros  vírus  geralmente  acomete  bezerros  com  5  a  15  dias  de  idade,  mas  também  pode  ser  notada  em  bezerros  com  vários  meses  de  idade.  Os  bezerros  acometidos  ficam  apenas  discretamente
deprimidos e geralmente continuam a mamar ou beber leite. As fezes ficam volumosas, moles a líquidas e contêm, com frequência, grande quantidade de muco. A diarreia comumente persiste por três a vários dias e alguns casos de diarreia
por coronavírus tornam­se crônicos. Os casos de diarreia viral não complicados por outros patógenos comumente respondem em poucos dias à terapia hidreletrolítica e ao suporte nutricional adequado.
Criptosporidiose (p. 216) ocorre em bezerros com 5 a 35 dias de idade, mas geralmente na segunda semana de vida. Caracteriza­se por diarreia persistente que não responde à terapia. A diarreia causada apenas por Cryptosporidium spp
frequentemente é discreta e autolimitante, embora a gravidade possa estar relacionada com o estado geral do bezerro e a intensidade do desafio com o microrganismo. As infecções mistas com criptosporídios, rotavírus e coronavírus são
comuns e resultam em diarreia persistente que frequentemente se caracteriza por emaciação e morte. Morte decorrente de hipoglicemia também ocorre como sequela de criptosporidiose em bezerros com 3 a 4 semanas de idade que se
recuperaram de diarreia, mas ainda se encontram emaciados. Geralmente, a morte ocorre durante o período de clima frio, sendo mais provável em fazendas onde o manejo implica a redução da quantidade de leite oferecido aos bezerros
durante o período de diarreia.
As diarreias alimentares acometem bezerros com < 3 semanas de idade e caracterizam­se por fezes volumosas de consistência pastosa a gelatinosa. Inicialmente, os bezerros se mantêm alertas e apresentam bom apetite. No entanto, por
fim, tornam­se fracos e emaciados se a dieta não é corrigida. As diarreias infecciosas são frequentemente complicadas por dietas de má qualidade ou pelo consumo insuficiente de alimentos.
DIAGNÓSTICO:  É difícil estabelecer o diagnóstico etiológico definitivo com base apenas nos achados clínicos. No entanto, anamnese, idade do(s) animal(is) acometido(s) e sinais clínicos podem permitir um diagnóstico presuntivo. As
amostras de fezes podem ser enviadas para isolamento e caracterização dos enteropatógenos comuns. As amostras devem ser coletadas de vários bezerros não tratados, nos estágios iniciais de diarreia. São necessárias técnicas especiais para
a demonstração de vírus, criptosporídios e E. coli que possui K99. A interpretação dos resultados microbiológicos das fezes pode ser difícil devido às infecções mistas e pelo fato de os enteropatógenos estarem presentes nas fezes de
bezerros  saudáveis.  A  melhor  informação  diagnóstica  geralmente  é  obtida  pelo  envio  de  animais  não  tratados  e  agudamente  acometidos  para  necropsia.  Isso  permite  um  exame  da  mucosa  intestinal  quanto  às  evidências  de  lesões
diagnósticas e a presença de enteropatógenos, como criptosporídios. Esta pode ser a única maneira de diagnóstico de doenças como aquelas associadas às cepas de fixação e destruição de E. coli. O valor diagnóstico da necropsia diminui
rapidamente com o tempo após a morte; as lesões importantes podem desaparecer dentro de minutos, devido à autólise.
O exame laboratorial completo pode ser oneroso; também, argumenta­se que é de muito pouco valor frente ao alto gasto no diagnóstico, a menos que possam ser implementados procedimentos específicos de controle com base nas
informações obtidas. Em todos os casos devem­se obter informações sobre o consumo total de leite ou de substituto de leite. Quando se fornece um substituto de leite, deve­se avaliar a composição da dieta. Deve­se avaliar também a
imunidade inespecífica por meio da determinação das concentrações séricas de imunoglobulina e vitamina A.
TRATAMENTO:  Vários fatores envolvidos na resistência às doenças são inespecíficos; consequentemente, devem­se tomar medidas preventivas importantes e iniciar a terapia antes de se estabelecer um diagnóstico etiológico. O tratamento
inclui  reposição  de  fluido  e  eletrólitos,  modificação  da  dieta,  terapia  antimicrobiana  e  com  imunoglobulinas  e  uso  de  antidiarreicos  e  adsorventes.  A  terapia  hidreletrolítica  é  mais  importante  e  deve  ser  instituída  assim  que  possível,
independente se há evidências clínicas de desidratação (os sintomas de desidratação não são aparentes até que o bezerro perca pelo menos 6% do seu peso corporal em fluido). Os bezerros ainda capazes de ficar de pé e mamar podem ser
frequentemente tratados apenas com solução de eletrólitos por via orais. Os fluidos para reidratação oral devem propiciar o cotransporte de sódio com glicose e aminoácidos e devem conter sódio, glicose, glicina ou alanina, potássio,
bicarbonato e citrato ou acetato como precursor de bicarbonato. Encontram­se disponíveis várias preparações comerciais. Podem ser administradas por meio de mamadeira ou, se necessário, por sonda gástrica. As soluções devem ser
oferecidas à vontade, até que o animal se reidrate.
Há controvérsia sobre se o leite deve ou não ser fornecido durante o período de reidratação. O fornecimento de leite pode aumentar o volume de fezes, mas propicia energia ao bezerro e pode promover cicatrização intestinal. Os bezerros
têm alta necessidade energética e pouca reserva de energia. As soluções eletrolíticas não suprem estas necessidades energéticas e não se deve suspender o fornecimento de leite por > 24 a 36 h.
Bezerros fracos em decúbito e exibem evidências de perda hídrica = 8% do seu peso corporal requerem terapia hidreletrolítica IV. Esses bezerros frequentemente apresentam acidose e os déficits de água e de base podem ser corrigidos
inicialmente pela administração de uma solução isotônica (13 g/l) de bicarbonato de sódio, preferencialmente na dose de 100 ml/kg, ao longo de 4 a 6 h. Como os bezerros geralmente desenvolvem hipoglicemia, a adição de 25 a 50 g de
glicose na solução de bicarbonato normalmente é benéfica. A solução de bicarbonato deve ser seguida de fluidoterapia IV contínua com solução eletrolítica fisiologicamente balanceada, na dose de 5 a 8 ml/kg/h, nas 20 h seguintes; pode ser
necessário volume maior, dependendo da gravidade da diarreia. Provavelmente, devem–se utilizar soluções eletrolíticas orais concomitantes à terapia IV.
O  uso  de  antimicrobianos  não  é  sustentado  pela  maioria  dos  experimentos  clínicos  e  não  é  indicado  na  diarreia  causada  por  vírus  ou  protozoários.  Os  antibióticos  podem  ser  úteis  no  tratamento  de  diarreia  associada  a  Escherichia
coli enterotoxigênica ou com a cepa de fixação e destruição. A via de administração deve ser oral e a escolha deve basear­se no antibiograma. Na suspeita de doença septicêmica como uma complicação devido à transferência inadequada de
imunoglobulinas colostrais, a administração parenteral de antibióticos também é indicada. A salmonelose deve ser tratada com antimicrobianos, por via parenteral.
Vários fármacos, como flunixino meglumina, indometacina, loperamida, difenoxato e subsalicilato de bismuto possuem atividades antissecretora e anti­inflamatória e são utilizados no tratamento, mas não há experimento clínico sobre
sua eficácia em bezerros. Géis e adsorventes intestinais, como caulim e pectina, são de uso geral, mas o seu único efeito comprovado é o aumento da consistência das fezes; não reduzem a perda hídrica e iônica.
PREVENÇÃO E CONTROLE:  Devido à natureza complexa da diarreia em neonatos, é irreal se esperar uma prevenção total – o controle econômico é o objetivo principal. A ocorrência de doença clínica e de casos fatais depende do equilíbrio
entre  os  níveis  de  exposição  a  microrganismos  infecciosos  e  a  resistência  do  bezerro.  Diferenças  no  tamanho  dos  rebanhos;  disponibilidade  de  instalações,  área  e  mão  de  obra;  e  os  objetivos  gerais  do  manejo  tornam  impossível  a
recomendação de procedimentos de manejo específicos aplicáveis a todas as situações. No entanto, três princípios amplos se aplicam a todos os rebanhos: 1) o grau de exposição dos neonatos deve ser reduzido por meio de isolamento de
animais doentes ou mudança do local de parição e criação de bezerros para uma área à parte e prática de bom manejo sanitário geral; 2) a resistência inespecífica do animal deve ser maximizada pelo fornecimento de uma boa dieta para a
mãe  e  para  o  neonato  e  pela  garantia  de  que  os  bezerros  recém­nascidos  consumam  colostro  de  alta  qualidade  em  volume  equivalente  a  >  5%  do  seu  peso  corporal,  preferivelmente  dentro  de  2  h  e  seguramente  dentro  de  6  h  após  o
nascimento, seguido de quantidade equivalente em intervalos de 12 h, nas 48 h seguintes; e 3) a resistência específica do recém­nascido deve ser estimulada por meio de vacinação da mãe ou do recém­nascido. Em parte importante dos
bezerros leiteiros lactentes normais e dos bezerros alimentados manualmente com colostro ocorre falha na obtenção de quantidade adequada de imunoglobulina devido à demora na amamentação ou alimentação, à ingestão de volume
inadequado de colostro ou ao consumo de colostro com baixo teor de imunoglobulinas. Quando o tempo é um fator limitante para esta tarefa, impedindo que se assegure a ingestão de colostro por meio de mamadeira, a administração de
3,8L de colostro por sonda esofágica nas primeiras 2 h de vida pode ser a melhor maneira de fornecer este alimento (ver p. 2213).
A imunização dos bezerros contra a colibacilose por meio de vacinação de fêmeas prenhes pode controlar colibacilose enterotoxigênica. A fêmea prenhe é vacinada 6 a 2 semanas antes do parto para estimular a produção de anticorpos
contra cepas de E. coli enterotoxigênica; em seguida, esses anticorpos são transferidos ao recém­nascido por meio do colostro (desde que o animal consuma o colostro). Um reforço único deve ser administrado nos anos subsequentes. Há no
mercado disponibilidade de anticorpo monoclonal contra E. coli K99 para administração oral aos bezerros imediatamente após o nascimento. Trata­se de um substituto efetivo dos anticorpos K99­específicos do colostro de vacas vacinadas,
embora os bezerros que recebem esse produto também devem receber colostro para sua proteção inespecífica.
A vacinação das vacas prenhes contra rotavírus e coronavírus aumenta a quantidade de anticorpos específicos no colostro e no leite, mas a concentração de anticorpos no leite pode ser insuficiente para propiciar anticorpos no lúmen
intestinal durante o período de prevalência máxima de infecção que, nos bezerros, é notada aos 5 a 15 dias de idade. Experimentos controlados com vacinas comerciais apresentam resultados variáveis. A adição de pequena quantidade de
colostro no leite oferecido durante o período de suscetibilidade pode propiciar alguma proteção contra doenças.
RISCO ZOONÓTICO:  Vários microrganismos que causam diarreia nos bezerros também podem provocar doenças diarreicas em pessoas. Cryptosporidium parvum e Salmonella Typhimurium podem causar doença grave, principalmente em
indivíduos  imunocomprometidos.  Esses  microrganismos  são  comumente  isolados  em  infecções  subclínicas  do  intestino  de  bezerros  e  cordeiros;  as  pessoas  imunocomprometidas  devem  evitar  o  contato  com  ruminantes  jovens  e,
possivelmente, com todos os animais de fazenda.
Os bovinos, incluindo os bezerros, são alguns dos reservatórios do sorotipo E. coli verotóxica O157:H7, associado a colite hemorrágica humana e síndrome urêmica hemolítica. Em pessoas, a infecção geralmente é adquirida com o
consumo de alimentos contaminados, mas a dose infectante é baixa, e há risco de infecção por contato direto. Outra E. coli verotóxica associada à doença humana também pode ser isolada em fezes de bovinos saudáveis. A doença em
humanos devido à infeção por patógenos entéricos de bovinos foi relatada após contato em visita a feiras, zoológicos e viagens educacionais a fazendas. Lavagem e desinfecção das mãos deve fazer parte dessas visitas.
DOENÇAS INTESTINAIS EM SUÍNOS

Suínos de todas as idades são suscetíveis a doenças intestinais; diarreia é o sintoma comum em quase todas essas doenças. A transmissão de microrganismos infecciosos que causam enfermidades entéricas é via fezes­oral. Pelo menos 16
diferentes agentes etiológicos, incluindo bactérias, vírus e parasitos, podem causar doença intestinal primária. O circovírus suíno tipo 2 (CVS 2) pode ser isolado do intestino de suínos com diarreia. O CVS 2 é a causa de várias doenças
multissistêmicas  em  suínos,  incluindo  síndrome  do  definhamento  multissistêmico  pós  desmame  que  é  discutida  em  detalhes  a  seguir  (ver  p.  657).  Diarreia  em  um  lote  de  animais  pode  ser  devido  a  um  agente  único,  mas  infecções
concomitantes são comuns. Como algumas doenças ocorrem em determinada idade, o diagnóstico diferencial é melhor definido por faixa etária (Tabela 6).

 COLIBACILOSE INTESTINAL
A colibacilose intestinal é uma doença comum em suínos lactentes e recém­desmamados causada pela colonização do intestino delgado por cepas enterotoxigênicas de Escherichia coli.
ETIOLOGIA  E  PATOGÊNESE:  Algumas cepas de E. coli possuem fímbrias ou  pili  que  permitem  sua  aderência  ou  colonização  nas  células  epiteliais  de  absorção  de  jejuno  e  íleo.  Os  tipos  de  antígenos  comuns  de  fímbrias  associados  a
patogenicidade incluem K88, K99, 987P e F41. As cepas patogênicas produzem enterotoxinas que secretam fluidos e eletrólitos no lúmen intestinal, o que resulta em diarreia, desidratação e acidose. A infecção de neonatos é causada,
comumente, por cepas de K88 e 987P, enquanto a colibacilose pós­desmame se deve quase sempre à cepa K88.
ACHADOS CLÍNICOS:  É comum diarreia aquosa abundante, com rápida desidratação, acidose e morte. Raramente os suínos podem manifestar colapso e morrer antes de surgir diarreia.

Lesões: Desidratação e distensão do intestino delgado por um fluido amarelado e ligeiramente mucoide são características. O cólon contém um fluido semelhante. A região fúndica da mucosa gástrica frequentemente encontra­se eritematosa.
Os suínos que morrem subitamente podem apresentar eritema cutâneo macular. Histologicamente, em geral as vilosidades apresentam comprimento normal e contêm vários bastonetes bacterianos pequenos aderidos aos enterócitos de
absorção.
DIAGNÓSTICO:  A confirmação do diagnóstico baseia­se na constatação histológica de colonização das vilosidades; na constatação dos antígenos de fímbrias K88, K99, 987P ou F41 nos esfregaços intestinais, por imunofluorescência ou
outros testes imunológicos; e no isolamento do microrganismo no intestino delgado. Como E. coli é um agente secundário comum deve­se considerar a possibilidade de envolvimento de outros microrganismos, como vírus ou coccídios.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A terapia inclui administração imediata de antimicrobianos e correção do equilíbrio hidreletrolítico. O antibiograma é útil para a seleção do medicamento efetivo. A prevenção compreende redução dos fatores
predisponentes, como umidade e frio; melhora da higienização, como substituição do piso de concreto sólido ou ripado por piso de tela de arame; e vacinação das porcas prenhes com vacinas específicas de antígenos de fímbrias. Suínos
com deficiência de receptores de K88 são resistentes à doença causada por E. coli que contém a enterotoxina K88.

 DIARREIA EPIDÊMICA SUÍNA
Esta diarreia causada por coronavírus (ainda não diagnosticada no hemisfério ocidental) acomete suínos de todas as idades e em vários aspectos lembra, clinicamente, gastrenterite transmissível (GET) (p. 344).
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O vírus da diarreia epidêmica suína (VDS) não se relaciona com nenhum outro membro da família Coronaviridae. Os suínos são os únicos hospedeiros conhecidos. Ainda não se detectou anticorpo contra o
vírus em suínos silvestres ou em outras espécies animais. Há relato da infecção em vários países europeus e na China. Ocorreram grandes epidemias na Europa, em 1969; não se detectou qualquer anticorpo em amostras de soro coletadas
antes dessa data. Desde então, o vírus se disseminou e se tornou endêmico em vários países europeus, sendo raros os surtos agudos. Nas grandes fazendas de reprodutores, o vírus persiste em leitegadas consecutivas, após o desmame e
depois que os leitões perdem a imunidade propiciada pelos anticorpos do leite. Nessas fazendas, o vírus pode estar associado a diarreia na época do desmame. Na Bélgica, o vírus está associado, mais frequentemente, com diarreia em suínos
de engorda, notada imediatamente após serem adquiridos de outras fazendas de reprodutores e reunidos em grandes unidades de engorda. O vírus foi encontrado nas fezes de 80% desses grupos. Dados epidemiológicos de outros países são
escassos. Na maioria dos casos, a disseminação do vírus é direta, dos suínos infectados e, indireta, por fômites contaminados com vírus e por caminhões de transporte.
PATOGÊNESE:  A patogênese e os mecanismos imunológicos são semelhantes aos descritos para GET. A infecção oral resulta em replicação do vírus nas células epiteliais das vilosidades do intestino delgado. Também, ocorre infecção das
células das vilosidades do cólon. Não se demonstrou nenhum outro tropismo tecidual. O vírus é excretado nas fezes.
ACHADOS CLÍNICOS:  A diarreia é o único sinal clínico direto induzido pelo vírus. Um surto agudo em fazenda de reprodutores suscetíveis lembra um surto de GET e se caracteriza por diarreia aquosa em suínos de todas as idades. No
entanto, em comparação com a GET, o período de incubação é mais longo (3 a 4 dias), nem todas as leitegadas adoecem e a taxa de mortalidade em suínos neonatos é menor (em média, 50%). Além disso, a doença se dissemina mais
lentamente na fazenda. Em todos os surtos, os sintomas são mais evidentes em suínos de engorda, em fase de terminação e em adultos, que parecem mais suscetíveis, pois os surtos em geral iniciam nessas faixas etárias. Suínos idosos
apresentam letargia e depressão, mais evidentes na VES do que na GET. Os suínos infectados parecem ter cólicas.
Surtos agudos em suínos em fase de terminação suscetíveis caracterizam­se por diarreia aquosa, mas pode­se observar um número acentuadamente maior de mortes agudas, em particular de suínos infectados no final do período de
terminação e nas raças sensíveis ao estresse. O animal pode morrer mesmo no período de incubação.
Lesões: As lesões macroscópicas se restringem ao intestino delgado, com encurtamento de vilosidades como característica principal. Essas lesões lembram bem aquelas verificadas na GET. Ainda não há relato de lesão no cólon. Necrose
aguda de músculos das costas é um achado compatível.
DIAGNÓSTICO:  É difícil a diferenciação clínica de GET. Esta, em sua forma epidêmica típica, causa diarreia com rápida disseminação em animais de todas as idades, com alta taxa de mortalidade nos neonatos. Na DES, a disseminação da
diarreia é mais lenta e embora haja diarreia na maioria das leitegadas, algumas podem permanecer saudáveis mesmo na ausência de imunidade. A taxa de morbidade é de 100% nos suínos idosos, que desenvolvem doença grave. Morte
aguda de suínos adultos e em fase de terminação, devido à necrose muscular durante um surto de diarreia, é típica de DES, não sendo observada em qualquer outra diarreia infecciosa.
O diagnóstico laboratorial em neonatos é feito por imunofluorescência direta, em cortes do intestino delgado ou do cólon em criostato. ELISA, para detectar antígenos virais nas fezes ou no conteúdo intestinal, é mais útil no caso dos
suínos idosos. Os anticorpos podem ser detectados em amostras séricas pareadas por meio de teste ELISA de bloqueio.
CONTROLE:  Não há disponibilidade de tratamento específico. As medidas tomadas durante um surto são de natureza geral. Os suínos com diarreia devem ter livre acesso à água e os suínos em fase de terminação devem ser privados de
alimento por 1 a 2 dias.
Nas fazendas de reprodutores, diante de um surto, pode­se evitar temporariamente a disseminação do vírus para o local de parição adotando­se medidas sanitárias e, se realizadas junto com uma infecção deliberada de porcas prenhes, a
perda de neonatos pode ser reduzida. Não há vacina disponível.

 DISENTERIA SUÍNA (Disenteria sanguinolenta)
A disenteria suína é uma doença diarreica muco­hemorrágica comum em suínos; acomete o intestino grosso.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  O principal agente causal é Brachyspira hyodysenteriae, uma espiroqueta anaeróbica que produz hemolisina; entretanto, outros microrganismos podem contribuir para a gravidade das lesões. Ela se prolifera no
intestino grosso e provoca degeneração e inflamação da mucosa, hipersecreção de muco pelo epitélio da mucosa e pontos hemorrágicos multifocais na mucosa. O microrganismo não penetra além da mucosa intestinal. A diminuição da
capacidade da mucosa em reabsorver as secreções endógenas do intestino delgado não acometido resulta em diarreia.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os primeiros sinais são inapetência, eliminação de fezes moles e, possivelmente, febre. O curso da doença é variável. Alguns suínos morrem de forma hiperaguda. É mais comum notar uma diarreia mucoide com estrias
de  sangue  e  muco,  progredindo  para  diarreia  muco­hemorrágica  aquosa.  Depois  de  vários  dias  as  fezes  tornam­se  amarronzadas  e  contêm  estrias  de  fibrina  e  restos  celulares.  Os  suínos  com  diarreia  apresentam  desidratação,  fraqueza
profunda, definhamento e emaciação.
Lesões: As lesões difusas se restringem ao ceco, ao cólon espiral e ao reto. A mucosa acometida é recoberta por uma camada de muco transparente ou cinza, frequentemente com estrias de sangue, nos estágios iniciais, com mistura de
sangue, fibrina e restos necróticos nos casos mais avançados, e restos necróticos amarelados no estágio final da doença.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos e os achados de necropsia geralmente são suficientes para um diagnóstico presuntivo. A confirmação baseia­se na demonstração de lesões histológicas típicas no intestino grosso e no isolamento de  B.
hyodysenteriae em cultura anaeróbica. B. hyodysenteriae deve ser diferenciado de outras espiroquetas anaeróbicas, por meio de cultura. Testes bioquímicos e, preferencialmente, PCR, devem ser utilizados em cepas de Brachyspira para
confirmar a identificação da espécie. Doenças concomitantes não são raras. Os diagnósticos diferenciais incluem espiroquetose intestinal, enterite proliferativa, salmonelose e tricuríase grave.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O uso terapêutico de antimicrobianos é efetivo, se instituído logo no início da doença. Primeiramente, prefere­se a adição do medicamento na água. Como há cepas resistentes a antimicrobianos, é essencial
escolher uma droga a qual o microrganismo é sensível. Utilizam­se bacitracina, carbadox, lincomicina, tilosina, tiamulina e virginiamicina. A doença pode ser erradicada das propriedades infectadas sem necessidade de despovoamento total,
adotando­se um programa persistente e cuidadosamente planejado que inclui o tratamento dos suínos portadores com bactericidas e limpeza e desinfecção completas das propriedades vazias. Roedores são importantes reservatórios de B.
hyodysenteriae  e  qualquer  tentativa  de  erradicação  deve  incluir  eliminação/redução  da  população  dos  roedores  da  propriedade.  Além  disso,  B.  hyodysenteriae  sobrevive  >  60  dias  em  animais  abatidos  mantidos  em  temperatura  de
refrigeração.

 DOENÇA DO EDEMA (Enterotoxemia por Escherichia coli)
Doença do edema é uma enfermidade nervosa aguda e potencialmente fatal que comumente surge 5 dias a 2 semanas depois do desmame, podendo ser acompanhada de diarreia (ver p. 795).

 ENTERITE POR CLOSTRIDIUM DIFFICILE
C. difficile é um importante patógeno emergente que causa diarreia, principalmente, em suínos neonatos. O microrganismo foi inicialmente descrito como causa de diarreia associada ao uso de antibióticos em pessoas. Comumente causa
doença em leitões com 1 a 7 dias de idade e em outros animais domésticos e de laboratório.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  C. difficile é uma bactéria gram­positiva anaeróbia, em forma de bastão, mais sensível ao oxigênio do que C. perfringens. O microrganismo pode ser identificado no intestino, em esfregaços diretos corados pelo
Gram. Acredita­se que a sobrevivência de C. difficile no ambiente e a eliminação por porcas portadoras sejam importantes na transmissão. C. difficile produz as “toxinas clostridianas grandes” A e B; acredita­se que estejam envolvidas no
desenvolvimento de lesão. A toxina A é uma enterotoxina que causa secreção de fluido no lúmen intestinal; a toxina B é uma citotoxina.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os leitões infectados podem apresentar dispneia, distensão abdominal e edema escrotal. Nem todos os suínos acometidos manifestam diarreia.
Tabela 6 – Distribuição das doenças diarreicas de suínos por faixa etária

Faixa etária

Lactente Desmame Fase de crescimento­terminação ou reprodutora

Doenças Bacterianas

Enterite por Clostridium difficile +++ + +
Enterite por C. perfringens tipo A ++ + ­
Enterite por C. perfringens tipo C ++ ­ ­
Colibacilose intestinal +++ +++ ­
Espiroquetose intestinal – ++ +++
Enterite proliferativa suína – ++ +++

Enterite por Salmonella + ++ +++
Disenteria suína + ++ +++

Parasitismo

Cryptosporidium sp + + –

Isospora suis +++ + –
Strongyloides ransomi + + +
Trichuris suis – – ++

Doenças Virais

Diarreia suína por circovírus + ++ +
Diarreia epidêmica suína + ++ +++
Enterite por rotavírus +++ +++ +
Gastrenterite transmissível +++ +++ ++
– = Rara ou não ocorre; + = incomum; ++ = comum; +++ = muito comum.

Lesões: Há relato de ascite, hidrotórax e edema de cólon ascendente. Comumente há urólitos de urato nos rins. Pode­se notar conteúdo de cólon pastoso a aquoso. Microscopicamente, o cólon apresenta principalmente exsudação multifocal
de muco e fibrina, além de edema de submucosa.
DIAGNÓSTICO:  As lesões macroscópicas não são patognomônicas e o diagnóstico deve ser confirmado por meio de cultura ou detecção das toxinas A e B e exame histopatológico. C. difficile pode  ser  cultivado  em  meios  seletivos  que
contêm cefoxitina, cicloserina, taurocolato e frutose, em condição anaeróbica. Os genes das toxinas A e B são facilmente identificados por PCR. As toxinas também podem ser detectadas diretamente em suspensão de conteúdo intestinal
por meio de imunoensaios enzimáticos disponíveis no mercado.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Com base na determinação de concentrações inibitórias mínimas sugeriu­se que eritromicina, tetraciclina e tilosina podem ser úteis no tratamento de leitões lactentes e que a tiamulina e a virginiamicina podem
auxiliar na redução da população de microrganismos em suínos adultos. Não há relato de estudo controlado sobre os efeitos dos antibióticos na doença clínica.

 ENTERITE POR CLOSTRIDIUM PERFRINGENS TIPO A
A infecção do intestino delgado por cepas de C. perfringens tipo A causa uma enfermidade discreta e mais rara, em comparação com a doença causada por C. perfringens tipo C (ver a seguir). Infecta suínos lactentes e, em alguns casos,
recém­desmamados, que apresentam fezes amareladas com muco e estrias de sangue. Há retardo do crescimento, mas com baixa ou nenhuma taxa de mortalidade. As lesões observadas à necropsia são mais discretas e sem sangue, quando
comparadas as verificadas na enterite por C. perfringens tipo C. Diagnóstico, tratamento e controle são semelhantes à enterite causada por C. perfringens tipo C.

 ENTERITE POR CLOSTRIDIUM PERFRINGENS TIPO C
A infecção do intestino delgado por cepas de C. perfringens tipo C provoca enterite necrótica e hemorrágica potencialmente fatal. A doença acomete mais comumente leitões com 1 a 5 dias de idade, mas pode afetar suínos com até 3
semanas de idade (e outras espécies, ver p. 662).
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  O microrganismo penetra entre as células de absorção do jejuno superior e sintetiza toxina β, uma potente exotoxina sensível à tripsina e termolábil, que causa necrose de todos os componentes estruturais das
vilosidades. A inflamação necrosante geralmente se estende até as criptas mucosas. A infecção pode continuar caudalmente e envolver o íleo, mas raramente acomete o cólon. A necrose da mucosa é acompanhada sangramento de parede e
lúmen intestinais.
ACHADOS CLÍNICOS:  Início súbito de diarreia hemorrágica seguida de colapso e morte é característico em leitões de 1 a 3 dias de idade. Nos casos menos agudos, notam­se fezes líquidas amarronzadas em 3 a 5 dias. Raramente os suínos
desenvolvem diarreia com fezes acinzentadas, pastosas e persistentes e se tornam progressivamente emaciados. Nos casos hiperagudos, a região perineal mostra­se suja de sangue.
Lesões: Nota­se intestino delgado vermelho­escuro, hemorrágico e preenchido com fluido hemorrágico. Nos casos menos agudos, com 3 a 5 dias, é possível verificar gás na parede do jejuno e necrose na mucosa de jejuno e íleo. Nos casos
mais crônicos constata­se intestino delgado espessado revestido por uma membrana necrótica amarelo­pálida ou cinza, firmemente aderida à submucosa.
DIAGNÓSTICO:  Geralmente a necropsia é suficiente para estabelecer o diagnóstico da forma hemorrágica hiperaguda e da forma aguda com enfisema de jejuno. Pode­se obter um diagnóstico presuntivo rapidamente pela constatação de
grandes bactérias em forma de bastão em esfregaços de imprint de mucosa corados pela técnica de Gram. A constatação histológica de necrose de vilosidades com colonização da mucosa por vários bastonetes gram­positivos grandes é
suficiente para a confirmação do diagnóstico. As formas subaguda e crônica da doença em suínos com 6 a 14 dias de idade são facilmente confundidas, na necropsia, com enterite por Isospora suis, mas o diagnóstico geralmente é possível
pelo exame histológico de jejuno e íleo ou pela detecção de clostrídios em esfregaços de mucosa corados pela técnica de Gram ou Giemsa. Pode­se obter o genótipo de C. perfringens quanto à presença de genes que codificam a toxina β.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O tratamento de suínos com sinais clínicos é pouco benéfico, pois as lesões frequentemente são irreversíveis ao início da diarreia. Em um surto agudo, a administração profilática de antitoxina tipo C ou de
antibióticos (ou de ambos), por via parenteral ou oral, é efetiva desde que fornecida aos leitões dentro de 2 h após o nascimento. A doença tende a causar recidivas nas propriedades infectadas. A vacinação de porcas prenhes, 6 a 3 semanas
antes do parto, com bacterina­toxoide contra o tipo C confere algum grau de imunidade lactogênica passiva às leitegadas subsequentes, contanto que os leitões consumam o colostro logo após o nascimento. Quando já imunizadas com duas
doses de bacterina­toxoide, as porcas devem receber uma dose cerca de 3 semanas antes de cada parição subsequente.

 ENTERITE POR ROTAVÍRUS
A enterite causada por rotavírus é uma doença comum de intestino delgado de suínos. Animais de todas as idades são suscetíveis, mas uma doença diarreica significativa geralmente acomete suínos lactentes ou após o desmame.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  O rotavírus causa infecção e destruição de enterócitos das vilosidades de todo o intestino delgado, porém as lesões são mais graves no terço médio do intestino. A perda do epitélio das vilosidades resulta em
atrofia parcial destas vilosidades, má absorção e diarreia osmótica. Vários tipos antigênicos de rotavírus infectam os suínos. Disseminam­se facilmente por contato direto. As porcas portadoras saudáveis podem eliminar fezes contaminadas
no periparto e, portanto, expõem suas leitegadas à infecção.
ACHADOS CLÍNICOS:  Se os suínos neonatos não receberem quantidade protetora de anticorpos maternos, provavelmente desenvolvem diarreia aquosa abundante dentro de 12 a 48 h. Geralmente, a infecção é endêmica em um rebanho e as
porcas possuem níveis variados de anticorpos no colostro e no leite, o que propicia graus variáveis de proteção passiva aos leitões lactentes. Geralmente, a diarreia surge em animais com 5 dias a 3 semanas de idade, ou imediatamente após
o desmame. As fezes dos leitões lactentes geralmente são amarelas ou acinzentadas e pastosas, nos estágios iniciais, e se mostram cinzas e pastosas depois de cerca de 2 dias. A diarreia persiste por 2 a 5 dias. Os leitões com diarreia tornam­
se magros e com o pelame áspero, mas a taxa de mortalidade, em geral, é baixa. Os suínos desmamados apresentam fezes aquosas contendo alimento pouco digerido. Os suínos desmamados apresentam inapetência e não buscam por
alimentos, o que resulta em emaciação, definhamento e, provavelmente, predisposição à pneumonia e outras doenças.
Lesões: O intestino delgado se apresenta com parede fina e o ceco e o cólon contêm fezes líquidas.

DIAGNÓSTICO:  Há necessidade de exames laboratoriais. A confirmação baseia­se na demonstração histológica de atrofia de vilosidades do jejuno, na constatação de vírions no conteúdo intestinal por meio de microscopia eletrônica e em
técnicas de imunodiagnóstico para comprovar a presença do antígeno viral na mucosa intestinal ou nas fezes. Os diagnósticos diferenciais incluem gastrenterite transmissível endêmica, enterite por Isospora suis e colibacilose intestinal.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Não há tratamento específico. A minimização da perda de calor e a oferta de quantidade de água adequada para manter a hidratação são medidas úteis. A vacinação das porcas também pode ser útil. Infecção
por Escherichia coli enterotoxigênica concomitante é comum; portanto, a terapia antimicrobiana pode reduzir a taxa de mortalidade. Um ambiente sem correntes de ar, seco e quente, bem como refeições limitadas e frequentes aos suínos
desmamados com diarreia ajudam a evitar inanição, doenças secundárias e atrofia permanente.

 ENTERITE POR STREPTOCOCCUS DISPAR
Essa doença diarreica de leitões lactentes, geralmente com 5 a 10 dias de idade, está associada à colonização do intestino delgado por S. dispar. O diagnóstico pode ser auxiliado pela observação de cocos gram­positivos aderidos às células
epiteliais das vilosidades. Antimicrobianos, como a penicilina, podem ser úteis no tratamento.

 ENTERITE PROLIFERATIVA SUÍNA (Adenomatose intestinal suína, Enteropatia hemorrágica proliferativa, ileíte)
A  enterite  proliferativa  suína  é  uma  doença  diarreica  comum  em  suínos  em  fase  de  crescimento­terminação  e  em  reprodutores  jovens  e  se  caracteriza  por  hiperplasia  e  inflamação  do  íleo  e  do  cólon.  É,  com  frequência,  discreta  e
autolimitante, mas às vezes causa diarreia persistente, enterite necrosante grave ou enterite hemorrágica com alta taxa de mortalidade.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  O agente causal é uma pequena bactéria gram­negativa intracelular, em forma de bastão, denominada Lawsonia intracellularis. O microrganismo tem sido isolado apenas em culturas celulares e tentativas de
reproduzi­lo em meios livres de células têm falhado. Os postulados de Koch foram cumpridos por meio da inoculação de culturas puras de L. intracellularis em suínos criados convencionalmente; produziram­se lesões típicas da doença e L.
intracellularis foi reisolado a partir dessas lesões. A inoculação de L. intracellularis em suínos gnotobióticos não causa doença; portanto, em suínos criados convencionalmente outros fatores podem contribuir para o desenvolvimento das
lesões.
ACHADOS CLÍNICOS:  A  forma  não  hemorrágica  e  mais  comum  da  doença  geralmente  acomete  suínos  com  18  a  36  kg  e  se  caracteriza  por  início  súbito  de  diarreia.  As  fezes  tornam­se  aquosas  a  pastosas,  amarronzadas  ou  fracamente
manchadas de sangue. Depois de cerca de 2 dias, os suínos podem eliminar grumos fibrinonecróticos amarelos que se formam no íleo. A maioria dos suínos acometidos se recupera espontaneamente, mas um número significativo deles
desenvolve enterite necrótica crônica e emaciação progressiva. A forma hemorrágica se caracteriza por palidez cutânea, fraqueza e eliminação de fezes hemorrágicas ou pretas. As marrãs prenhes podem abortar.

Brachyspira (Treponema) hyodysenteriae. Cortesia de Joann Kinyon, Universidade de Iowa.

Lesões: Podem  surgir  em  qualquer  local  da  metade  inferior  do  intestino  delgado,  ceco  ou  cólon,  mas  são  mais  frequentes  e  evidentes  no  íleo.  A  parede  intestinal  torna­se  espessa  e  o  mesentério  pode  ficar  edemaciado.  Os  linfonodos
mesentéricos aumentam de volume. A mucosa intestinal parece espessa e enrugada, pode ser recoberta por uma membrana fibrinonecrótica amarronzada ou amarela e, às vezes, apresenta petéquias. Os grumos necróticos amarelos podem
ser encontrados no íleo ou passarem para o cólon. Necrose de mucosa completa e difusa, nos casos crônicos, causa rigidez intestinal, lembrando uma mangueira de jardim. Frequentemente notam­se lesões proliferativas na mucosa do cólon,
mas apenas detectadas por meio de inspeção cuidadosa durante a necropsia. Na forma hemorrágica profusa, há fezes vermelhas ou pretas no cólon e sangue coagulado no íleo.
DIAGNÓSTICO:  A confirmação do diagnóstico baseia­se na observação histológica de proliferação e inflamação características nas criptas da mucosa. Em geral, L. intracellularis (em forma de vírgula, lembrando Campylobacter) pode ser
demonstrado por colorações com prata. Desenvolveu­se um teste de PCR que pode ser útil para confirmar a presença de L. intracellularis nas lesões. Culturas bacterianas do intestino e linfonodos, para excluir a possibilidade de infecção
por Salmonella, e exame histológico e cultura do ceco e cólon, para excluir disenteria suína, são práticas adicionais importantes. Também, deve­se examinar o cólon quanto à presença de vermes tricurídeos. L. intracellularis está presente
em muitos rebanhos suínos, portanto, a demonstração do microrganismo em fezes por PCR ou a presença de anticorpos em animais clinicamente normais tem pouco valor diagnóstico.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Vários  antibacterianos,  administrados  por  via  parenteral  em  suínos  com  infecção  aguda  e  por  meio  de  alimentos  ou  água  ao  restante  do  grupo,  ajudam  a  minimizar  a  gravidade  da  enterite  e  a  evitar  o
desenvolvimento de enterite necrótica crônica irreversível. A enterite proliferativa suína é uma das primeiras doenças que ocorrem em rebanhos novos, iniciada por uma intervenção cirúrgica. Uma vacina viva não virulenta administrada na
água é altamente eficaz. Deve ser administrada às marrãs e aos varões durante a aclimatização, antes da introdução no rebanho.

 ESPIROQUETOSE INTESTINAL
A espiroquetose intestinal é uma doença do intestino grosso verificada na ausência de Brachyspira hyodysenteriae (ver p. 341). Essa síndrome é observada com frequência no mundo todo.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A principal causa de espiroquetose intestinal é B. pilosicoli. Há relatos de outras espécies de Brachyspira associadas à infecção, mas caracterizações moleculares recentes indicam que B. innocens, B. murdochi e
B. intermedia provavelmente não são patogênicas. B. pilosicoli é um importante patógeno emergente em pessoas, especialmente em populações indígenas, homossexuais e pacientes com imunossupressão. O microrganismo é transmitido
por via oral e sobrevive muito bem no ambiente. B. pilosicoli foi isolado de vários animais, inclusive aves aquáticas, roedores e cães. Foi demonstrado com causa de doença diarreica em suínos, galinhas e pessoas, por meio de inoculação
experimental e em casos de ocorrência natural. A patogênese não é bem estudada, mas parece que a fixação da espiroqueta na mucosa interfere na capacidade de absorção do cólon, resultando em diarreia.
ACHADOS CLÍNICOS:  Inicialmente, os suínos apresentam fezes aderidas à região do períneo. As fezes aparecem como cimento úmido, podendo resultar em diarreia leve. Animais acometidos podem se tornar inapetentes, com crescimento
retardado.
Lesões: As lesões no intestino grosso são mais discretas do que aquelas causadas por B. hyodysenteriae, na disenteria suína. O volume do intestino grosso pode estar aumentado e distendido, com espessamento de mucosa. Alguns suínos
desenvolvem colite muco­hemorrágica juntamente com aumento dos linfonodos mesentéricos. Microscopicamente, as espiroquetas podem ser vistas aderidas à superfície mucosa, com aparência de falsa borda em escova. A superfície
mucosa apresenta erosão focal com discreto exsudato catarral. As criptas do cólon frequentemente estão dilatadas e com várias espiroquetas.
DIAGNÓSTICO:  Diagnósticos  diferenciais  importantes  incluem  salmonelose,  enterite  proliferativa,  disenteria  suína  e  infecção  por  vermes  tricurídeos. B.  pilosicoli  pode  ser  isolada  em  um  ágar  seletivo  que  contém  espectinomicina,  em
condições anaeróbias. Testes bioquímicos, e preferencialmente PCR, devem ser realizados com cepas de Brachyspira para confirmar a identificação da espécie.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Tratamento e prevenção de espiroquetose intestinal são semelhantes aqueles da disenteria suína. Antimicrobianos como tiamulina, lincomicina e carbadox são efetivos. Não se sabe se o microrganismo pode ser
erradicado sem uma despovoação total, como se faz na disenteria suína, mas devido aos hospedeiros reservatórios e à sobrevivência da espiroqueta no ambiente, há dúvida quanto a isso.

 ESTENOSE RETAL
Nos suínos em crescimento, a estenose retal é sequela de prolapso retal gravemente lesionado (p. 183) ou de infecção que prejudica o suprimento sanguíneo ao reto. No primeiro caso a ocorrência é esporádica; no último pode ser epidêmica.
Uma  das  causas  é  infecção  por  Salmonella  Typhimurium  (p.  346),  que  provoca  proctite  ulcerativa  cuja  cicatrização  não  restabelece  a  função  normal.  A  estenose  resulta,  notadamente,  de  fibrose  do  tecido  retal  devido  à  isquemia
persistente causada pela infecção em local de suprimento sanguíneo limitado.
ACHADOS CLÍNICOS:  Geralmente, observam–se vários suínos com timpanismo, em vários estágios de emaciação, em um grupo de animais em crescimento. Outros sinais clínicos, inclusive surtos prévios de diarreia debilitante grave, são
comuns, mas nem sempre descritos. Raramente se consegue introduzir o dedo indicador no interior do reto sem uma resistência considerável.
Lesões: Na necropsia, o cólon se apresenta visivelmente distendido e o intestino preenchido com gás e fezes esverdeadas. A lesão predominante é o estreitamento do canal retal devido a úlceras fibrosadas anulares ou estenoses retais,
localizadas 2 a 5 cm cranialmente ao ânus.
DIAGNÓSTICO:  Uma  epidemia  de  estenose  retal,  sem  prolapso  retal  anterior,  indica  infecção  por S.  Typhimurium.  Na  coprocultura  e  na  cultura  de  linfonodos  regionais  geralmente  isola­se S.  Typhimurium.  No  entanto,  não  é  possível
determinar se ocorreu primeiro a lesão ou a infecção.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Diagnóstico e tratamento precoces de diarreia são imperativos para o controle. Abrigo, manejo e boa higiene, com manejo de suínos no esquema “todos dentro ou todos fora”, são os melhores procedimentos
para evitar surtos adicionais. Não se acredita que a cirurgia seja economicamente viável.

 GASTRENTERITE TRANSMISSÍVEL
A GET é uma doença viral comum de intestino delgado, que causa vômito e diarreia profusa em suínos de todas as idades.
ETIOLOGIA  E  PATOGÊNESE:   O  coronavírus  causador  infecta  e  destrói  células  epiteliais  das  vilosidades  de  jejuno  e  íleo,  o  que  resulta  em  grave  atrofia  destas  vilosidades,  má  absorção,  diarreia  osmótica  e  desidratação.  O  período  de
incubação é cerca de 18 h. A infecção se dissemina rapidamente por meio de aerossóis ou de exposição por contato. Epidemias graves são mais comuns durante o inverno devido à sobrevivência do vírus em temperatura mais baixa.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em  rebanhos  não  imunes,  geralmente  vômito  é  o  sintoma  inicial,  seguido  de  diarreia  aquosa  abundante,  desidratação  e  sede  excessiva.  As  fezes  dos  leitões  lactentes  frequentemente  contêm  coágulos  de  leite  não
digerido. A taxa de mortalidade é cerca de 100%, em leitões com < 1 semana de idade; aqueles com > 1 mês raramente morrem. Porcas gestantes ocasionalmente abortam e porcas lactantes frequentemente manifestam vômito, diarreia e
agalaxia. Em leitões lactentes sobreviventes a diarreia persiste por cerca de cinco dias; suínos mais velhos podem apresentar diarreia por um período mais curto.
Em grandes rebanhos com GET endêmica os sinais clínicos são variáveis, dependendo do grau de imunidade e da magnitude da exposição. A imunidade propiciada por anticorpos do colostro da porca, em geral, é suficiente para proteger
os  leitões  até  que  tenham  4  a  5  dias  de  idade.  À  medida  que  o  teor  de  anticorpos  do  leite  diminui  pode  ocorrer  infecção  e  doença  discreta.  Dependendo  do  grau  de  imunidade  e  de  exposição,  a  diarreia  pode  ser  discreta  em  algumas
leitegadas, mas pode ser grave em outras. Se a proteção passiva é suficiente para proteger os suínos por todo o período de aleitamento, geralmente ocorre diarreia nos primeiros dias após o desmame.
Lesões: Os leitões que morrem em decorrência de GET apresentam desidratação grave e a pele fica manchada com fezes líquidas. Em geral, o estômago contém coágulos de leite, mas pode estar vazio. O intestino delgado apresenta parede
fina e todo o intestino contém um fluido aquoso esverdeado ou amarelado e grumos de leite não digerido. Os suínos mais velhos apresentam lesões pouco evidentes, exceto o cólon com fezes líquidas, em vez de fezes normais. Pode­se
notar atrofia de vilosidades no exame da mucosa do intestino delgado com auxílio de lupa.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos da forma epidêmica de GET geralmente permitem um diagnóstico presuntivo. Na forma endêmica branda são necessários testes laboratoriais. Exame histológico e teste de imunofluorescência do intestino
delgado, para demonstrar as lesões típicas e a presença de antígenos virais da GET, permitem a confirmação do diagnóstico. Em alguns surtos, a encefalomielite hemaglutinante (p. 804) pode causar sintomas semelhantes.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Não há tratamento específico. Aumento da temperatura da sala de parição para minimizar a perda de calor corporal e o fornecimento de solução com eletrólitos para controlar a desidratação são procedimentos
úteis. Há relato de que a administração de imunoglobulina suína é benéfica. O desmame dos leitões lactentes mais velhos, que já estão consumindo alimentos pode reduzir a taxa de mortalidade.
A imunidade protetora depende da presença de anticorpos no intestino delgado. A proteção passiva de leitões é propiciada pela amamentação contínua em porcas imunes. Depois da infecção da mucosa intestinal pelo vírus patogênico da
GET desenvolve­se imunidade protetora ativa. A infecção intestinal ativa pelo vírus patogênico induz imunidade protetora por 6 a 18 meses, devido à resposta da IgA secretora. A vacinação das porcas naturalmente imunes reforça a
imunidade o suficiente para proteger os neonatos, sendo particularmente útil em rebanhos onde a infecção é endêmica. A vacinação de rebanhos de suínos livres de GET pode não ser economicamente vantajosa, pois a vacina não induz
imunidade completa.
A infecção planejada de porcas prenhes em rebanhos sabidamente infectados por vírus patogênicos, pelo menos 2 a 4 semanas antes do parto, geralmente propicia imunidade adequada. Isso pode ser obtido pela mistura de fezes e de
intestino infectado com o vírus da GET triturada com a ração de porcas prenhes. Devido aos riscos óbvios associados a esse procedimento, este deve ser realizado apenas se parece inevitável uma epidemia futura em áreas de parição. O
material  infectado  deve  ser  utilizado  apenas  no  mesmo  rebanho  do  qual  foi  coletado  e  os  tecidos  devem  ser  livres  de  outros  patógenos  de  suínos,  se  possível.  O  vírus  da  GET  pode  ser  eliminado  dos  rebanhos  sem  necessidade  de
despovoamento total, aumentando a imunidade por meio de infecção planejada do lote de porcas, de esquema de manejo “todos dentro todos fora” nas baias de parição, aleitamento e crescimento e de boa higiene.
Em razão de o vírus da GET ser facilmente disseminado às pessoas, animais e fômites durante uma epidemia, devem ser tomados cuidados especiais para evitar a disseminação em grupos de porcos não expostos e em rebanhos vizinhos.

 PARASITISMO
Ver p. 375 e p. 213.
O Ascaris suum é o nematódeo intestinal mais comum em suínos. Os adultos, no intestino, reduzem a eficiência alimentar e as infecções intensas causam emaciação. A migração das larvas provoca inflamação de fígado e pulmões.
Cryptosporidium sp é um coccídio que se fixa no epitélio da mucosa intestinal de suínos com = 10 dias de idade. Causa atrofia de vilosidades do intestino delgado inferior. Pode ocorrer má absorção e diarreia.
Eimeria spp é comum em suínos, mas raramente ocasiona uma doença evidente. Infecções maciças podem causar importante enterocolite em suínos jovens em crescimento.
Hyostrongylus rubidus é um verme de estômago comumente encontrado em suínos criados em pastagem. Geralmente causa poucas lesões.
Isospora suis é uma causa comum e importante de coccidiose em suínos com 6 dias a 3 semanas de idade. A infecção provoca necrose e atrofia de vilosidades de íleo e jejuno. Uma infecção bacteriana secundária da mucosa intestinal
lesionada é comum. A taxa de mortalidade é, com frequência, 20 a 25%; muitos suínos tornam­se raquíticos. O diagnóstico pode se basear na constatação de coccídios imaturos na mucosa intestinal, em esfregaço direto da mucosa corado
pelo Giemsa ou no exame histológico do intestino acometido. Uma prevenção bem­sucedida, na maioria das vezes, depende de limpeza completa das instalações de parição, com intuito de minimizar o número de oocistos. Após a limpeza,
é útil a desinfecção completa com solução alvejante 50%. Às vezes, são administrados, por via oral, coccidiostáticos às porcas duas semanas antes do parto ou aos suínos, desde o nascimento até 3 semanas de idade.
Os vermes adultos nodulares de Oesophagostomum spp no intestino grosso causam poucos danos, mas uma infecção maciça por larvas encistadas, na parede intestinal, pode ocasionar emaciação.
As larvas de Strongyloides ransomi (verme intestinal filiforme) podem ser transmitidas pelo colostro ou adquiridas a partir da pele contaminada da mãe. Os leitões altamente infectados desenvolvem diarreia grave aos 10 a 14 dias de
idade, com alta taxa de mortalidade. O diagnóstico é baseado na constatação microscópica direta de esfregaços da mucosa.
Trichuris suis (verme em forma de chicote) penetra na mucosa do ceco e do cólon e causa inflamação multifocal. As infecções maciças ocasionam diarreia e emaciação. As fezes ficam hemorrágicas; portanto, tricuríase grave pode ser
confundida, clinicamente, com disenteria suína ou enterite proliferativa. O diagnóstico baseia­se na constatação direta dos vermes no intestino grosso ou em exame de flotação das fezes.

 SALMONELOSE INTESTINAL
As salmonelas enteropatogênicas causam inflamação e necrose nos intestinos delgado e grosso, resultando em diarreia que pode ser acompanhada de sepse generalizada. Animais de todas as idades são suscetíveis, mas a doença é mais
comum em suínos desmamados e em fase de crescimento­terminação.
ETIOLOGIA  E  PATOGÊNESE:   Salmonella  choleraesuis  Kuzendorf  (S.  choleraesuis)  é  uma  das  espécies  de  Salmonella  que  mais  comumente  infecta  os  suínos.  Às  vezes,  provoca  enterocolite  necrosante,  mas  uma  doença  septicêmica
caracterizada por hepatite, pneumonia e vasculite cerebral é bem mais comum. A infecção intestinal por S. Typhisuis resulta em inflamação necrosante não supurativa da mucosa e da submucosa do íleo, ceco e cólon; frequentemente, a
mucosa apresenta úlcera. Em geral, estende­se para os linfonodos regionais e, ocasionalmente, ocorre sepse generalizada. As fontes de infecção de S. choleraesuis e S. Typhisuis são principalmente os suínos portadores assintomáticos, mas
também pode incluir roedores, alimentos e propriedades contaminadas (ver p. 203).
Vários outros sorotipos de salmonela são observados em suínos, alguns dos quais foram associados à intoxicação alimentar em pessoas. Os sorotipos comumente encontrados em suínos são S. Typhimurium, S. heidelberg, S. worthington
e S. infantis. Esses sorotipos podem causar diarreia discreta à moderada em suínos e podem ser resistentes a diversos antimicrobianos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os suínos lactentes podem desenvolver diarreia, mas geralmente sucumbem à sepse generalizada. Suínos recém­desmamados ou em fase de crescimento­terminação manifestam febre e apresentam fezes líquidas, que
podem ser amarelas e conter estrias de restos de tecidos necrosados.
Lesões: Os suínos infectados por S. choleraesuis exibem íleo e cólon inflamados e ligeiramente espessados, geralmente com áreas de necrose na superfície da mucosa. Os linfonodos mesentéricos ficam aumentados, edematosos e, às vezes,
eritematosos. Pode ou não ser evidente úlcera na mucosa. Nos casos agudos, pode­se observar hemorragia de pequena extensão. Ocasionalmente, é possível notar estenose de reto (p. 343). Outras salmonelas enteropatogênicas, exceto S.
Typhisuis, causam lesões semelhantes, porém menos graves do que aquelas de S. choleraesuis. Na enterite por S. Typhisuis as lesões são úlceras distintas, tipicamente amarelas e redondas (em botão) no cólon, ceco e, menos comumente,
íleo.
DIAGNÓSTICO:  As culturas de fezes ou da mucosa intestinal em um meio seletivo podem mostrar o microrganismo. No entanto, com frequência (e mais confiavelmente) as salmonelas são isoladas de linfonodos mesentéricos aumentados por
meio de semeadura direta em meio seletivo, como ágar verde­brilhante, ou inoculação em meios enriquecidos. O exame histológico do intestino e do fígado acometidos para diferenciação de salmonelose de enterite proliferativa e disenteria
suína é um procedimento auxiliar valioso.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Vacinas vivas atenuadas administradas por via intranasal ou na água são bastante efetivas na prevenção da doença causada por S. choleraesuis. As vacinas atenuadas também podem ser efetivas na redução da
população de salmonelas nos tecidos de suínos abatidos. A administração parenteral de antibióticos em suínos com doença aguda e a medicação do grupo acometido por meio da água ou do alimento podem diminuir a gravidade do surto.
Neomicina  e  lincomicina­espectinomicina  são  os  antimicrobianos  mais  utilizados  na  água.  Carbodox,  nos  alimentos,  geralmente  é  empregado  como  preventivo.  O  antibiograma  de  um  microrganismo  isolado  é  útil  na  seleção  de  um
antibiótico apropriado. Limpeza e desinfecção completas das instalações contaminadas e eliminação da fonte da bactéria diminuem a probabilidade de repetidas epidemias.

 SÍNDROME DO INTESTINO HEMORRÁGICO (Torção mesentérica do intestino delgado)
A síndrome do intestino hemorrágico acomete rapidamente suínos em crescimento, com 4 a 6 meses de idade. Os animais morrem subitamente, sem evidência de diarreia, mas à necropsia o intestino delgado apresenta parede delgada,
preenchido com sangue coagulado e fresco. O intestino grosso geralmente contém material fecal escuro, porém sem lesão sugestiva de disenteria suína, salmonelose, enterite proliferativa ou espiroquetose intestinal. A doença pode ser
prevenida pela administração de bacitracina ou clortetraciclina junto com alimento. Durante a necropsia, deve­se palpar a base mesentérica antes da abertura do abdome. Na forma hiperaguda de enterite proliferativa é possível notar lesões
macroscópicas, e quadro clínico, semelhante; no entanto, o exame histológico e a cultura do intestino indicam se há ou não proliferação epitelial e Lawsonia intracellularis.
Acredita­se  que  na  maioria  dos  casos  a  causa  seja  vólvulo  intestinal.  Fatores  predisponentes  podem  incluir  exercício  intenso,  manipulação,  brigas,  aglomeração  ou  alimentação  irregular.  Suínos  com  quadril  largo  podem  ser  mais
predispostos à torção mesentérica do que suínos menores. A rotação completa do intestino, incluindo a parte posterior do duodeno e a parte anterior do reto ao redor da base do mesentério, obstrui o fluxo de sangue venoso, causando
acúmulo de sangue no intestino, e consequente infarto. A rotação pode ser apenas parcial e difícil de ser notada durante a necropsia, o que torna o diagnóstico um desafio maior.

 OUTRAS VIROSES INTESTINAIS EM SUÍNOS
Outros vírus foram isolados do intestino de suínos, mas parecem não causar doenças economicamente importantes. Isto inclui adenovírus e enterovírus.

INFECÇÕES POR TREMATÓDEOS EM RUMINANTES

 DICROCOELIUM DENDRITICUM (Fascíola­lanceta, Fascíola hepática menor)
Dicrocoelium dendriticum é mais delgado; tem 6 a 10 mm de comprimento e 1,5 a 2,5 mm de largura. É encontrado em muitos países e infecta ampla variedade de hospedeiros finais, inclusive ruminantes domésticos. Outra espécie, D.
hospes, é comum na África.
O  primeiro  hospedeiro  intermediário  é  um  caracol  terrestre  (Cionella  lubrica,  nos  EUA),  do  qual  as  cercárias  emergem  e  são  agregadas  em  uma  massa  de  muco  pegajoso  (bola  de  muco).  As  cercárias  são  ingeridas  pelo  segundo
hospedeiro intermediário, que é uma formiga (Formica fusca, nos EUA) e se encistam na cavidade abdominal. Uma ou duas metacercárias no gânglio subesofágico da formiga causam um comportamento anormal, no qual as formigas se
prendem nas plantas da pastagem que, por sua vez, aumenta o risco de ingestão pelo hospedeiro final. As fascíolas jovens não migram pelo tecido hepático, mas alcançam os ductos biliares pelo intestino e iniciam ovoposição cerca de 10 a
12 semanas após a infecção.
Parece  não  induzir  imunidade  e  as  infestações  intensas  podem­se  acumular  (até  50.000  fascíolas  em  ovino  adulto).  Desenvolve­se  cirrose  e  os  ductos  biliares  podem  estar  espessados  e  distendidos.  A  perda  econômica  deve­se,
principalmente, à condenação de fígados. Os sinais clínicos não são óbvios, mas podem ser observados em infecções maciças. Os ovos contêm um miracídio e são muito pequenos (40 × 25 μm), assimétricos e marrom­amarelados.
O ciclo biológico complexo torna quase que impossível o controle dos hospedeiros intermediários, e o uso disseminado de substâncias químicas tem efeitos ecológicos nocivos em outros organismos semelhantes. Os tratamentos anti­
helmínticos efetivos nos bovinos incluem o albendazol a 15 mg/kg, em dose única, ou 2 doses de 7,5 mg/kg em dias seguidos, ou a netobimina a 20 mg/kg.

 EURYTREMA SPP (Fascíola pancreática)
Essas fascíolas possuem um corpo espesso e apresentam 8 a 16 mm de comprimento e 6 mm de largura. São parasitos dos ductos pancreáticos e, ocasionalmente, dos ductos biliares dos ovinos, suínos e bovinos no Brasil e na Ásia. Três
espécies  são  reconhecidas:  Eurytrema  pancreaticum,  E.  coelomaticum  e  E.  ovis.  Os  primeiros  hospedeiros  intermediários  são  caracóis  terrestres  (Bradybaena  spp)  e  as  cercárias  se  encistam  em  gafanhotos  (Conocephalus  spp),  que
correspondem ao segundo hospedeiro intermediário. Depois de o animal ingerir um gafanhoto, as fascíolas imaturas são liberadas e migram para o ducto pancreático, onde se tornam maduras e produzem ovos em cerca de 7 a 14 semanas.
Não há qualquer sinal clínico evidente. Os ovos semelhantes aqueles de Dicrocoelium podem ser vistos nas fezes. As infecções brandas causam inflamação proliferativa no ducto pancreático, que se torna aumentado de volume e ocluído.
Nas infecções intensas, ocorrem lesões fibróticas, necróticas e degenerativas. Isto resulta em aumento da atividade plasmática de gamaglutamiltransferase e de AST. Descrevem­se perdas decorrentes da condenação do pâncreas, mas a
patogênese sugere perda de produção adicional.
Tal como nos casos de Dicrocoelium, o controle dos hospedeiros intermediários pode não ser prático. O tratamento com praziquantel (20 mg/kg, por 2 dias) ou albendazol (7,5 mg/kg para ovinos e 10 mg/kg para bovinos) tem sido
considerado efetivo.
Fasciola hepatica, o trematódeo mais importante nos ruminantes domésticos, é a causa mais comum de fasciolose hepática nas áreas temperadas do mundo. Nos EUA, é endêmica ao longo da costa do Golfo, costa ocidental, região das
Montanhas Rochosas e em outras áreas. Também se encontra presente no leste do Canadá, Colúmbia Britânica e América do Sul e tem uma importância econômica particular nas ilhas britânicas, Europa ocidental e oriental, Austrália e
Nova Zelândia. F. gigantica é economicamente importante na África e na Ásia e também é encontrada no Havaí. F. magna já foi descrito em pelo menos 21 estados norte­americanos e na Europa. Na América do Norte, Dicrocoelium
dendriticum encontra­se confinado principalmente nos estados norte­americanos de Nova York, Nova Jérsei e Massachusetts e nas províncias atlânticas do Canadá. Também é encontrado em algumas áreas da Europa e Ásia. Eurytrema spp,
trematódeo pancreático, parasito os ovinos, suínos e bovinos no Brasil e em partes da Ásia. Várias espécies de paranfístomos ou fascíolas ruminais são encontrados em várias partes do mundo.

 FASCIOLA HEPATICA (Fascíola hepática comum)
ETIOLOGIA:  F. hepatica (30 × 2 a 12 mm e com forma de folha) é cosmopolita e possui uma ampla variação de hospedeiros, inclusive as pessoas. As infecções economicamente importantes ocorrem em bovinos e ovinos de três formas:
crônica, raramente fatal nos bovinos, mas frequentemente fatal nos ovinos; subaguda ou aguda, que aparecem principalmente nos ovinos e são frequentemente fatais; e em conjunto com a “doença negra” (hepatite necrótica infecciosa, p.
258), mais comum nos ovinos e comumente fatal.
Os  ovos  eliminados  nas  fezes  se  desenvolvem  em  miracídios  em  cerca  de  2  a  4 semanas,  dependendo  da  temperatura,  e  eclodem  na  água.  Os  miracídios  infectam  os  caramujos  limneídeos,  nos  quais  se  dão  o  desenvolvimento  e  a
multiplicação por estágios de esporocistos, rédias (às vezes, rédias–filhas) e cercárias. Após cerca de 2 meses (ou mais, se as temperaturas são baixas), as cercárias emergem dos caramujos e se encistam na vegetação aquática. Os caramujos
podem estender esse período por hibernarem durante o inverno. As cercárias encistadas (metacercárias) podem permanecer viáveis por muitos meses, a menos que se ressequem.

Fasciola hepatica, adulto, coloração de Corazza. Cortesia do Dr. Raffaele Roncalli.

Após  a  ingestão  pelo  hospedeiro,  em  geral  junto  com  a  pastagem,  as  fascíolas  jovens  são  liberadas  no  duodeno,  penetram  na  parede  intestinal  e  entram  na  cavidade  peritoneal,  por  onde  percorrem  até  atingirem  o  fígado.  O  tempo
necessário para este trânsito pode variar e resulta em atraso nas taxas de desenvolvimento e na eficácia de alguns tratamentos que afetam as fascíolas apenas tardiamente no seu desenvolvimento. As fascíolas jovens penetram na cápsula
hepática e se movem pelo parênquima por várias semanas, crescendo e destruindo tecidos. Entram nos ductos biliares geralmente em 6 a 8 semanas após ingestão, atingem a maturidade e começam a produzir ovos. O período pré­patente é
comumente de 2 a 3 meses, dependendo da carga parasitária. As fascíolas adultas podem viver nos ductos biliares dos ovinos por anos; a maior parte delas é eliminada pelos bovinos dentro de 5 a 6 meses. Têm­se descrito infecções pré­
natais em bovinos.
ACHADOS CLÍNICOS:  A fasciolose varia, em gravidade, de doença devastadora, nos ovinos, a uma infecção assintomática, nos bovinos. O seu curso é determinado pelo número de metacercárias ingeridas em um curto período. Nos ovinos, a
fasciolose aguda ocorre sazonalmente e se manifesta por dor e distensão abdominais, anemia e morte súbita. As mortes ocorrem dentro de 6 semanas pós­infecção. A síndrome aguda deve ser diferenciada da “doença negra”. Na doença
subaguda, a sobrevivência é maior (7 a 10 semanas), mesmo nos casos com lesões hepáticos significativos, mas as mortes se dão por hemorragia e anemia. A fasciolose crônica é observada em todas as estações; os sinais podem englobar
anemia, definhamento, edema submandibular e redução na secreção láctea, mas mesmo os bovinos fortemente infectados podem não mostrar sinais, embora a imunidade a outros patógenos (p. ex., Salmonella spp) possa estar reduzida e as
reações a um teste intradérmico único para tuberculose modificada. A infecção crônica intensa é fatal nos ovinos.
Os ovinos parecem não desenvolver resistência à infecção e as lesões hepáticas crônicas tornam­se cumulativas, em vários anos. Nos bovinos, há evidências de redução na suscetibilidade após fibrose dos tecidos hepáticos e calcificação
dos ductos biliares.
Lesões: As fascíolas errantes e imaturas destroem o tecido hepático e causam hemorragia. Na fasciolose aguda, as lesões são extensas; o fígado aumenta de volume e torna­se friável, com depósitos de fibrina na cápsula. Podem–se observar
tratos  migratórios  e  a  superfície  apresenta  uma  aparência  irregular.  Nos  casos  crônicos,  desenvolve­se  cirrose.  As  fascíolas  adultas  danificam  os  ductos  biliares,  que  aumentam  de  volume,  ou  se  tornam  císticos  e  apresentam  paredes
fibrosadas e espessadas. Nos bovinos, as paredes dos ductos tornam­se muito espessadas e, com frequência, se calcificam. As fascíolas podem ser encontradas em locais aberrantes, como por exemplo, pulmões. Nos bovinos, podem ocorrer
infecções mistas com Fasciola magna.
A destruição tecidual pelas fascíolas errantes pode criar um microambiente favorável para a ativação de esporos de clostrídios.
DIAGNÓSTICO:  Os ovos marrom­dourados, operculados e ovais, com 130 a 150 × 65 a 90 μm, devem ser distinguidos daqueles dos paranfístomos (fascíolas ruminais), que são maiores e claros. Os ovos de F. hepatica não  podem  ser
demonstrados nas fezes durante uma fasciolose aguda. Nos bovinos, em uma doença subaguda ou crônica, o número de ovos varia de 1 dia para o outro e podem ser necessários exames de fezes repetidos. O diagnóstico pode ser auxiliado
por um teste ELISA (no mercado disponível na Europa) que permite o diagnóstico cerca de 2 a 3 semanas após infecção e bem antes do período pré­patente. A atividade plasmática de gamaglutamiltransferase, que aumenta quando há lesão
de ductos biliares, também é útil durante o período de maturação tardia, quando as fascíolas estão nos ductos biliares. Na necropsia, a natureza da lesão hepática tem valor diagnóstico. As fascíolas adultas são facilmente observadas nos
ductos biliares e os estágios imaturos podem ser apertados ou espremidos a partir da superfície de corte.
CONTROLE:  As medidas de controle de F. hepatica devem envolver, de modo ideal, eliminação das fascíolas nos animais infectados, redução na população de caramujos­hospedeiros intermediários e impedimento de acesso dos animais de
produção a pastagens infestadas por caramujos. Na prática, apenas o primeiro desses métodos é utilizado, na maioria dos casos. Embora se possam empregar moluscicidas para reduzir as populações de caramujos limneídeos, todos os
agentes desse tipo disponíveis possuem desvantagens que restringem o seu uso. O sulfato de cobre, se aplicado antes da população de caramujos se multiplicar, todos os anos, é efetivo, mas é tóxico para os ovinos, que devem ser mantidos
fora da pastagem tratada por 6 semanas após a aplicação. Outros produtos químicos geralmente são muito caros e possuem efeitos ecologicamente indesejáveis. Impedir o acesso dos animais à pastagem infestada por caramujos muitas
vezes é impraticável, devido à extensão das áreas envolvidas e ao consequente gasto com a construção de uma cerca adequada.
Há várias drogas disponíveis para tratar ruminantes infectados, inclusive triclabendazol, clorsulona (apenas para bovinos e ovinos), albendazol, netobimina, closantel, rafoxanida e oxiclozanida. Nem todas essas drogas são aprovadas em
alguns países (p. ex., nos EUA, só são aprovados a clorsulona e o albendazol) e a maioria delas requer longo período de carência antes do abate, se utilizadas em animais destinados à produção de carne, e antes do consumo do leite, de
animais pecuários, por pessoas. A época do tratamento também é importante, de maneira que a farmacocinética da droga utilizada possa ser aplicada para resultar na remoção ideal das fascíolas – cada fasciolicida tem eficácia variável
contra as diferentes idades das fascíolas. Tradicionalmente, alguns tratamentos são determinados por fatores epidemiológicos locais e os tratamentos adicionais, por condições incomumente adequadas para a multiplicação de parasitos. Por
exemplo, nos estados americanos da Costa do Golfo, os bovinos devem ser tratados antes da estação chuvosa do outono e, novamente, no final da primavera. No noroeste dos EUA e no norte da Europa, eles devem ser tratados no final da
estação de pastejo e, se não confinados, novamente no final de janeiro ou em fevereiro. Nos países europeus com grandes populações ovinas suscetíveis, usam­se sistemas computadorizados de previsão de pluviosidade e temperatura para
determinar a prevalência provável de infecções por F. hepatica. Nas áreas onde se esperam infecções intensas, os ovinos podem exigir um tratamento em setembro ou outubro, em janeiro ou fevereiro e, novamente, em abril ou maio, para
reduzir as chances de infecções agudas ou crônicas e eliminar ovos de fascíolas para o desenvolvimento de doença futura.

 FASCIOLA GIGANTICA (Fascíola hepática gigante)
Fasciola gigantica possui forma semelhante a de F. hepatica, mas é maior (75 mm), com região anterior menos definida, possuindo 12 mm de largura. É encontrada em climas mais quentes (Ásia e África), nos bovinos e búfalos, nos quais
torna­se responsável por uma fasciolose crônica, e nos ovinos, nos quais a doença costuma ser aguda e fatal. O ciclo biológico é semelhante ao de F. hepatica, exceto quanto às espécies de caramujos hospedeiros intermediários. A patologia
da infecção, os procedimentos diagnósticos e as medidas de controle são semelhantes aos de F. hepatica (ver texto anterior).

 FASCIOLOIDES MAGNA (Grande fascíola hepática americana, Fascíola hepática gigante)
Fascioloides magna tem até 100 mm de comprimento, 2 a 4,5 mm de espessura, 11 a 26 mm de largura, e oval; distingue­se de Fasciola spp pela ausência de um cone protraente anterior. Encontra­se nos ruminantes domésticos e silvestres;
os veados são os hospedeiros normais. O ciclo biológico lembra aquele de Fasciola spp.
O ciclo biológico não se completa nos bovinos. Nesses hospedeiros, a patogenicidade é baixa e as perdas se restringem principalmente às condenações do fígado. Em ovinos e caprinos, poucos parasitos podem causar morte devido à
extensa migração de fascíolas no parênquima hepático. Nos veados, ocorre uma pequena reação tecidual e os parasitos ficam envolvidos por cistos fibrosos e delgados, que se comunicam com os ductos biliares. Nos bovinos, Fascioloides
magna causa reação tecidual intensa, resultando em encapsulamentos de parede espessa que não se comunicam com os ductos biliares. Nos ovinos, não se desenvolvem encapsulamentos, e os parasitos migram no fígado e outros órgãos,
causando lesões enormes. Histologicamente, os fígados infectados dos bovinos, dos ovinos e dos veados exibem tratos escuros e tortuosos formados pelas migrações das fascíolas jovens.
Embora os ovos de Fascioloides magna lembrem aqueles de Fasciola hepatica, isso tem uma utilidade limitada; os seus ovos, geralmente, não são eliminados por bovinos e ovinos. Tornam­se necessárias a recuperação dos parasitos em
necropsias, bem como a diferenciação entre Fasciola hepatica e Fasciola gigantica, para o diagnóstico definitivo. Quando ruminantes domésticos e veados compartilham a mesma pastagem, deve­se pensar na presença de doença provocada
por Fascioloides magna. Nos bovinos, ocorrem infecções mistas por Fasciola hepatica.
Relata­se que a oxiclozanida é efetiva contra Fascioloides magna de veado de cauda branca e que a rafoxanida é utilizada, com sucesso, no tratamento de infecções naturais em bovinos. Albendazol (7,5 mg/kg), clorsulona (15 mg/kg) e
closantel (15 mg/kg) têm­se mostrado eficazes contra essa fascíola em ovinos. Atualmente, nenhum produto é aprovado para o tratamento desta parasitose nos EUA. Os veados são necessários para completar o ciclo biológico; se eles são
excluídos  das  áreas  de  pastagem  de  bovinos  e  ovinos,  o  controle  pode  ser  efetivo.  O  controle  do  hospedeiro  intermediário  (caramujos  limneídeos)  pode  ser  possível  quando  é  identificado  em  uma  região  e  a  natureza  do
seu habitat investigada.

 PARANFÍSTOMOS (Anfístomos, Fascíolas ruminais, Fascíolas cônicas)
Há  várias espécies de  paranfístomos  (Paramphistomum, Calicophoron e Cotylophoron)  em  ruminantes,  no  mundo  todo.  Os  parasitos  adultos  são  piriformes,  de  cor  rosa  ou  vermelha,  têm  até  15  mm  de  comprimento  e  se  prendem  ao
revestimento ruminal. As formas imaturas são encontradas no duodeno e apresentam 1 a 3 mm de comprimento.
Os ovos são eliminados nas fezes, os miracídios são liberados na água e infectam os caramujos planorbídeos ou bulinídeos. O desenvolvimento no caramujo é semelhante aos casos de Fasciola hepatica, eliminando as cercárias que se
encistam na pastagem. No ruminante hospedeiro, as fascíolas jovens se soltam e permanecem no intestino delgado por 3 a 5 semanas antes de migrar através do retículo, até o rúmen. Os ovos são eliminados 7 a 14 semanas após a infecção.
As fascíolas adultas não causam uma doença clara e podem ser encontradas em grande número. As fascíolas imaturas se aderem à mucosa duodenal e, às vezes, à mucosa do íleo, por meio de uma grande ventosa posterior, provocando
grave enterite, possivelmente com necrose e hemorragia. Os animais acometidos exibem anorexia, polidipsia, definhamento e diarreia grave. Pode haver mortalidade extensa, especialmente entre bovinos e ovinos jovens. Os animais mais
velhos podem desenvolver resistência à reinfecção, mas podem continuar a abrigar várias fascíolas adultas.
Paramphistomum cervi. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

Os ovos operculados, claros e grandes são facilmente reconhecidos, mas, na paranfistomose aguda, pode não há ovos nas fezes. A ocorrência conhecida na área e um exame das fezes amolecidas podem revelar fascíolas imaturas, com
várias delas sendo eliminadas nesses casos. O diagnóstico é, comumente, feito por necropsia.
As medidas de controle para reduzir a população de caramujos hospedeiros são as mesmas do controle da fasciolose (p. 348). Os tratamentos com sucesso relatados (eficácia > 90%) incluem oxiclozanida (2 doses com 3 dias de intervalo)
e a combinação de bitional e levamisol.

NECROSE DE GORDURA ABDOMINAL (LIPOMATOSE)

Massas endurecidas de gordura necrosada são relativamente comuns na cavidade peritoneal de bovinos adultos, especialmente das raças Channel Island e Japanese Black e em bovinos de corte que se alimentam com gramínea Festuca por
longo  período.  A  doença  pode  também  ser  observada  em  caprinos  e  em  algumas  espécies  de  cervídeos  mantidos  em  pastagens  que  contêm,  principalmente,  Festuca.  As  massas  são  comumente  confundidas  com  um  feto  em
desenvolvimento, durante a palpação retal, pois são sentidas como “rolhas flutuantes” semelhantes a cotilédones. As massas de gordura necrótica geralmente não causam sinais clínicos, mas, em casos avançados, podem ocasionar obstrução
extraluminal que resulta em episódios de dor abdominal moderada, distensão do intestino próximo à gordura e eliminação de pequena quantidade de fezes.
A composição dos depósitos, nos bovinos com necrose da gordura, é idêntica à gordura de vacas normais. O depósito de gordura anormal fica confinado à gordura abdominal e condiz com o conceito atual de que a gordura abdominal é
controlada  de  forma  diferente  dos  depósitos  de  gordura  de  outros  lugares  do  corpo.  A  necrose  de  gordura  foi  denominada,  historicamente,  de  lipomatose,  mas  este  termo  atualmente  é  considerado  impróprio,  pois  as  massas  não  são
neoplásicas ou hiperplásicas.
A etiologia é desconhecida, mas uma causa proposta seria o consumo de alimentos contendo altas concentrações de ácidos graxos saturados, de cadeia longa. A necrose gordurosa é mais comumente observada em bovinos de corte = 2
anos, depois de um período prolongado de pastejo em áreas de capim Festuca infectado pelo endófito Neotyphodium (Acremonium) coenophialum (ver Intoxicação por Capim Festuca, p. 3076); a necrose gordurosa está associada a taxas de
infecção por endófitos de 65% ou mais. A enfermidade é verificada por todo o sudeste dos EUA, onde o capim Festuca é a principal pastagem.
Massas endurecidas de gordura necrosada formam­se no omento, mesentério e gordura perirrenal. As massas podem causar doença clínica quando comprimem o abomaso, intestino delgado, cólon espiral, obstruem o canal do parto ou,
mais raramente, comprimem os ureteres. A palpação retal é útil para diagnóstico e determinação da prevalência em um rebanho bovino. Em bovinos leiteiros mais velhos, casos avançados podem ser detectados por meio de balotamento
abdominal, com detecção de massas grandes e firmes no abdome. A remoção dos bovinos de pastagens de Festuca ou a diminuição do consumo por suplementação de leguminosas ou de outros capins de pastejo podem promovem lenta
redução no tamanho das massas. Isoprotiolona (50 mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 8 semanas) é eficaz em diminuir a extensão das lesões em bovinos da raça Japanese Black.
Quanto aos cervídeos acometidos, 90% das fêmeas podem ser afetadas. Os sinais clínicos incluem lento desenvolvimento de anorexia, depressão e uremia associada a grandes massas de gordura abdominal necrótica comprimindo os
ureteres, causando hidroureter e hidronefrose.
Uma  segunda  forma,  bem  menos  definida,  parece  estar  relacionada  com  pancreatite.  Embora  não  se  associem  com  uma  síndrome  clínica,  as  lesões  (massas  discretas  ou  confluentes  de  tecido  adiposo  necrosado)  estão  geralmente
confinadas à gordura peripancreática. Contudo, as lesões podem ser encontradas por todo o abdome.
Uma terceira forma, uma necrose focal da gordura abdominal e retroperitoneal (esteatite ou doença da gordura amarela), é observada mais frequentemente nos ovinos, mas também em suínos, equinos, gatos e outras espécies. Pouca
informação encontra–se disponível sobre a afecção nessas espécies, mas a radiografia ou a ultrassonografia abdominais podem ser úteis em identificar a necrose focal em gatos.

OBSTRUÇÕES INTESTINAIS AGUDAS EM GRANDES ANIMAIS

As obstruções intestinais ocorrem em todas as espécies de grandes animais, sendo mais comuns em equinos. Os bovinos são os ruminantes mais acometidos; o diagnóstico em ovinos e caprinos é raro, com exceção do vólvulo intestinal em
cordeiros. Além das hérnias inguinais, as obstruções intestinais raramente são diagnosticadas em suínos.
As  obstruções  interrompem  o  fluxo  da  ingesta  e  podem  ter  origem  mecânica  ou  funcional.  As  obstruções  intestinais  mecânicas  caracterizam­se  por  serem  luminais  ou  extraluminais.  As  obstruções  extraluminais  incluem  obstruções
estrangulantes  hemorrágicas  em  animais  com  vólvulo  ou  torção  do  trato  GI,  ou  compressão  extraluminal  simples  em  animais  com  distensão  abdominal  por  massa  tecidual,  como  linfossarcoma  ou  necrose  gordurosa.  As  obstruções
funcionais  não  apresentam  anormalidade  macroscópica  e  caracterizam­se  por  hipomotilidade  generalizada  ou  íleo  adinâmico.  Em  geral,  as  obstruções  funcionais  ocorrem  com  maior  frequência  do  que  as  obstruções  mecânicas  e  são
comumente detectadas em equinos após cirurgia abdominal.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Geralmente, não se determina a causa de uma obstrução intestinal funcional. As obstruções funcionais estão associadas à alteração na motilidade intestinal, em geral por fatores alimentares ou de manejo, infecção
parasitária, enterite ou peritonite. As obstruções mecânicas (bloqueio físico da ingesta) decorrem de anormalidades no lúmen intestinal, na parede ou fora do trato GI. As obstruções mecânicas incluem as oclusões congênitas (atresia de
jejuno, cólon, reto e ânus, em bezerros, e atresia anal em ovinos e suínos), que resultam na ausência de defecação desde o nascimento.
Em equinos, as obstruções funcionais transitórias são comuns, bem como as impactações alimentares, que geralmente envolvem a flexura pélvica do cólon esquerdo. Geralmente, infecção ou migração parasitária, anormalidades dentárias
e fatores alimentares ou de manejo estão envolvidos no desenvolvimento de obstrução funcional. As impactações e outras obstruções luminais podem resultar de alimentos grosseiros, redução no consumo de água, enterólitos ou ingestão de
materiais estranhos. Os locais de impactação, além da flexura pélvica, incluem cólon menor, cólon transverso, cólon dorsal direito, ceco e íleo. As outras causas de obstrução intestinal em equinos são vólvulos (torção do eixo mesentérico),
torções (rotação ao longo do eixo longitudinal do intestino), deslocamentos do cólon ascendente (maior) e vólvulo parcial ou total do intestino delgado. Alteração na motilidade e, possivelmente, exercício intenso e rolamento podem ser as
causas iniciais. As éguas reprodutoras podem ser predispostas a vólvulo, torção ou deslocamento de cólon ascendente durante a gestação e imediatamente após o parto. A obstrução ocorre devido ao encarceramento intestinal (geralmente do
intestino delgado) pela herniação no canal inguinal, diafragma, defeitos mesentéricos, umbigo ou forame epiploico; ou se deve a faixas fibrosas (aderências, faixas mesodiverticulares ou bases de lipomas pedunculados). Garanhões e potros
anglo­árabes desenvolvem hérnias inguinais e escrotais mais comumente do que as outras raças. As hérnias diafragmáticas e os defeitos mesentéricos podem ser congênitos ou ocasionados por traumatismo. Em equinos, as aderências
frequentemente são sequelas de migração parasitária ou de cirurgia abdominal; no entanto, a maioria das aderências é assintomática. Lipomas pedunculados são comuns em equinos idosos. Também, ocorrem intussuscepções ileocecais,
cecocecais, cecocólicas e de intestino delgado. Linfossarcoma e outras neoplasias abdominais, bem como abscessos no abdome, podem causar obstrução intestinal.
Em  bovinos,  as  causas  específicas  de  obstrução  intestinal  incluem  intussuscepção;  vólvulos  da  junção  jejuno­ileal  do  intestino  delgado  e  na  base  do  mesentério;  oclusão  luminal  devido  a  coágulo  sanguíneo  secundário  à  jejunite
hemorrágica; vólvulo ceco­cólico e atresia de cólon, reto e ânus. Acredita­se que as intussuscepções resultem de movimentos peristálticos irregulares relacionados com a enterite, parasitismo intestinal, distúrbios alimentares e tumores
murais. A alteração na motilidade intestinal por ingestão de substrato facilmente fermentável pode causar vólvulo intestinal. Podem surgir obstruções no intestino delgado devido à presença de várias faixas fibrosas (p. ex., aderências, faixas
paraovarianas, ligamento falciforme, retração do cordão espermático no interior do abdome após castração), espessamento mural (p. ex., adenocarcinoma intestinal), massas extramurais (p. ex., linfossarcoma, necrose gordurosa e abscessos
abdominais), herniação (inguinal ou umbilical) ou jejunite hemorrágica (que resulta em coágulos sanguíneos no lúmen e obstrução). Podem­se formar aderências e abscessos abdominais subsequentes à peritonite, injeções intraperitoniais ou
cirurgia  abdominal  anterior.  Tem­se  sugerido  que  a  motilidade  diminuída  causada  por  acúmulo  de  ácidos  graxos  voláteis,  possivelmente  relacionadas  com  rações  com  alto  teor  de  concentrados  ou  aumento  abrupto  na  proporção
concentrado:volumoso, é uma causa de vólvulo ceco­cólico em bovinos. Também, está associada à prenhez avançada e íleo adinâmico decorrente de doenças concomitantes. Atresia de cólon é mais comum em bezerros Holstein­Friesian,
secundária à isquemia intrauterina durante o desenvolvimento do cólon em espiral.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Em equinos, a obstrução intestinal geralmente se manifesta como dor abdominal, denominada cólica (ver cólica, p. 221). Em bovinos, os sinais de dor abdominal incluem batidas da pata no solo,
estiramento, agitação, coices no abdome e, menos comumente, rolamento e vocalização. Os sinais de obstrução intestinal em bovinos geralmente são mais sutis do que nos equinos e normalmente estão relacionados com a distensão de
intestino delgado, tensão no mesentério intestinal (pelo peso do intestino distendido) ou comprometimento vascular. Os sinais de dor são relativamente consistentes, mas, com frequência, são transitórios nas intussuscepções e notados em
alguns casos de vólvulo cecocólico. Os bovinos com vólvulo de intestino delgado na base do mesentério apresentam quadro clínico grave.
Geralmente, os bovinos com obstrução intestinal manifestam anorexia e eliminam poucas fezes ou param de eliminá­las e a produção de leite em vacas lactantes diminui subitamente. As fezes eliminadas podem estar recobertas de muco
ou misturadas ou recobertas com sangue. Sangue espesso, cor de framboesa, misturado com fezes escassas, é característico de hemorragia de intestino delgado, particularmente associada à intussuscepção ou jejunite hemorrágica. O sangue
oriundo do cólon ou do reto geralmente é vermelho mais brilhante. Melena é típica de sangramento de abomaso. Bezerros com atresia de cólon são normais ao nascimento, mas apresentam distensão abdominal progressiva e redução do
apetite nos primeiros dias de vida (ver p. 165).
Distensão abdominal, geralmente com “ping” à auscultação e percussão simultâneas no quadrante abdominal direito caudal superior, é notada no vólvulo cecocólico. A dilatação de ceco não provoca distensão abdominal, mas verifica­se
um  “ping”  na  fossa  paralombar  dorsal  caudal.  No  vólvulo  cecocólico,  uma  ou  mais  alças  distendidas  do  intestino  delgado  são  identificadas  à  palpação  retal.  A  motilidade  ruminal  geralmente  é  normal  e  as  alterações  metabólicas  e
cardiovasculares tendem a ser discretas, exceto no vólvulo cecocólico de longa duração.
Às vezes nota­se distensão no quadrante abdominal direito inferior, juntamente com distensão de intestino delgado. As alças intestinais distendidas podem ser palpáveis por palpação retal e pode­se perceber líquido ao balotamento e
auscultação simultâneos do lado direito do abdome. Podem­se constatar pequenas áreas de ressonância timpânica à auscultação e percussão simultâneas. Em cerca de 25% dos casos é possível palpar por VR, as intussuscepções e faixas
fibrosas  que  causam  obstrução  do  intestino  delgado.  O  exame  ultrassonográfico  do  abdome  pela  fossa  paralombar  direita  ou  pelo  reto  pode  ser  útil  na  detecção  de  distensão  de  intestino  delgado,  íleo  adinâmico  e  aumento  do  líquido
peritoneal. Ocasionalmente, a ultrassonografia pode detectar intussuscepção.
As  alterações  graves  nos  parâmetros  cardiovasculares,  como  taquicardia,  coloração  anormal  das  membranas  mucosas,  tempo  de  preenchimento  capilar  prolongado  e  desidratação,  estão  mais  comumente  associadas  a  obstruções
estrangulantes hemorrágicas, como vólvulo na junção jejuno­ileal do intestino delgado. Vólvulos na junção jejuno­ileal ou na base do mesentério se caracterizam por início agudo e rápido comprometimento cardiovascular. Isso é diferente
do que ocorre no vólvulo cecocólico ou na intussuscepção em bovinos, que pode durar vários dias.
Os distúrbios metabólicos variam desde alcalose metabólica hipoclorêmica e hipopotassêmica, nas obstruções de intestino delgado e duodeno de longa duração, até acidose metabólica grave, nas obstruções estrangulantes hemorrágicas.
Geralmente,  não  se  constata  alteração  metabólica  em  obstruções  funcionais  leves  e  obstruções  mecânicas  iniciais  (simples),  particularmente  se  há  envolvimento  de  uma  parte  relativamente  distal  do  trato  intestinal.  Pode­se  notar
hipocalcemia, possivelmente devido à diminuição na absorção de cálcio no duodeno.
AS  ALTERAÇÕES  NO  LÍQUIDO  PERITONEAL  REFLETEM  O  GRAU  DE  PERITONITE  E  PODEM  AUXILIAR  NO  DIAGNÓSTICO,  TANTO  EM  BOVINOS  QUANTO  EM  EQUINOS,  EMBORA  OS  RESULTADOS  SEJAM
MAIS  VARIÁVEIS  NOS  BOVINOS.  AS  OBSTRUÇÕES  ESTRANGULANTES  HEMORRÁGICAS  CARACTERIZAM­SE  POR  AUMENTO  NA  CONCENTRAÇÃO  DE  PROTEÍNA  TOTAL  E  DA  CONTAGEM  DE  CÉLULAS
NUCLEADAS  NO  LÍQUIDO  PERITONEAL,  POR  EXTRAVASAMENTO  ATRAVÉS  DA  PAREDE  INTESTINAL.  OS  NEUTRÓFILOS  TORNAM­SE  DEGENERADOS  E  OBSERVAM­SE  BACTÉRIAS  GRAM­POSITIVAS  E
GRAM­NEGATIVAS  INTRACELULARES  À  MEDIDA  QUE  HÁ  PERDA  DA  INTEGRIDADE  DA  PAREDE  INTESTINAL.  UM  MATERIAL  VEGETAL  NO  INTERIOR  DA  CAVIDADE  PERITONEAL  INDICA  RUPTURA
INTESTINAL  OU  ENTEROCENTESE  INCORRETA.  A  ANÁLISE  DO  LÍQUIDO  PERITONEAL  INDICA  NORMALIDADE  NA  MAIORIA  DAS  OBSTRUÇÕES  FUNCIONAIS  E  MECÂNICAS  SIMPLES.  QUANDO  HÁ
NEOPLASIAS E ESTAS CAUSAM OBSTRUÇÃO EXTRALUMINAL, ÀS VEZES SE IDENTIFICAM CÉLULAS NEOPLÁSICAS NO FLUIDO PERITONEAL.
TRATAMENTO:   O  tratamento  da  obstrução  intestinal  em  equinos  é  discutido  em  outra  parte  do  texto  (ver  cólica,  a  seguir).  Nas  obstruções  intestinais  funcionais  de  bovinos  geralmente  o  tratamento  é  sintomático  e  de  suporte,  após
identificação  e  eliminação  da  causa  primária  (p.  ex.,  hipocalcemia,  hipopotassemia,  consumo  excessivo  de  grãos)  e  da  permissão  de  tempo  para  que  retorne  à  motilidade  intestinal  normal.  No  caso  de  desidratação  e  desequilíbrios
eletrolíticos, devem ser corrigidos por meio de fluidoterapia apropriada (VO ou IV). As vacas lactantes frequentemente se beneficiam de gel de cloreto de cálcio, administrado por via oral, ou borogliconato de cálcio aplicado por via SC;
havendo cetose secundária, esta deve ser tratada. Eritromicina (10 mg/kg IM, 2 vezes/dia) é o fármaco mais efetivo para aumentar a taxa de esvaziamento do abomaso em bovinos (e possivelmente aumentar a motilidade intestinal), mas não
há estudo que comprove sua eficácia na obstrução intestinal funcional. Procinéticos não devem ser administrados aos bovinos com obstrução mecânica devido ao maior risco de ruptura intestinal proximal à obstrução. O prognóstico da
maioria dos casos de obstrução funcional é favorável, com tratamento de suporte adequado, especialmente se a causa primária é identificada e eliminada.
As obstruções mecânicas quase sempre requerem cirurgia. Deve­se iniciar terapia antimicrobiana no pré­operatório e tratamento de suporte, como fluidos, eletrólitos e cálcio, conforme necessário.
Em equinos que necessitam laparotomia exploratória para correção da obstrução intestinal a taxa de sobrevivência a longo prazo é de 50%. Esta taxa é menor em equinos com obstruções estrangulantes hemorrágicas e lesões no intestino
delgado do que naqueles com obstruções simples, mas uma intervenção cirúrgica precoce pode melhorar o prognóstico.
Em bovinos, 70 a 80% dos animais com vólvulo cecocólico sobrevivem, embora em 10% dos casos ocorre recidiva. Para as vacas com obstrução de intestino delgado, tratável por ressecção e anastomose, 30 a 40% sobrevivem e têm uma
vida produtiva. Para vacas com vólvulo da junção jejuno­ileal do intestino delgado ou na base do mesentério, cerca de 50% sobrevivem se a correção cirúrgica for realizada poucas horas após a instalação da doença. Menos de 30% dos
bezerros com atresia de cólon sobrevivem até a idade adulta. A correção cirúrgica não é recomendada em bezerros Holstein­Friesian, pois a enfermidade provavelmente é hereditária nesta raça, embora a lesão vascular secundária à palpação
da bolsa amniótica nas primeiras 6 semanas de desenvolvimento embrionário possa, também, ocasionar isquemia intestinal e atresia em bezerros.
PREVENÇÃO:  A prevenção de todos, ou mesmo da maioria dos casos de obstrução intestinal, não é possível. No entanto, deve–se corrigir ou evitar alteração abrupta da dieta e do manejo, consumo de água inadequado, infecção parasitária,
anormalidades dentárias e acesso a alimentos grosseiros e nutrientes altamente fermentáveis e materiais estranhos à dieta.

PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE EQUINOS

 CESTÓIDEOS (Tênias)
Nos equinos, encontram­se três espécies de cestóideos: Anoplocephala magna, A. perfoliata e Paranoplocephala mamillana. Apresentam 8 a 25 cm de comprimento (a primeira delas costuma ser a mais longa e a última, a mais curta). A.
magna e P. mamillana geralmente são encontrados no intestino delgado, mas também podem ocorrer no estômago; A. perfoliata é encontrado predominantemente no ceco, mas também pode se estabelecer no intestino delgado. O ciclo
biológico é semelhante ao de Moniezia spp  nos  ruminantes  (p.  368)  e  envolve  ácaros  oribatídeos  de  vida  livre  como  hospedeiros  intermediários.  O  diagnóstico  é  feito  por  demonstração  dos  ovos  característicos  nas  fezes,  mas  como  a
eliminação  de  proglotes  é  esporádica,  um  único  exame  de  fezes  pode  não  ser  diagnóstico.  Nas  infecções  leves,  não  se  encontram  presentes  sinais  de  doença;  nas  infecções  intensas,  podem  ocorrer  transtornos  GI.  Têm–se  descrito
definhamento  e  anemia.  Úlcera  da  mucosa  é  bastante  comum  na  área  de  fixação  de A. perfoliata  e  foi  sugerido  como  uma  causa  de  intussuscepção.  Perfuração  intestinal,  peritonite  e  cólica  subsequente  estão  associadas  às  infecções
por Anoplocephala. Cólica decorrente de distúrbios localizados na região ileocecal é mais provável nos equinos com infecções por cestóideos do que nos não infectados. A cólica por infecções por cestóideos habitualmente recidiva. O local
de  fixação destes vermes  torna­se,  com  frequência,  secundariamente  infectado ou absceda. Anoplocephala spp  podem  ser  efetivamente  tratados  com  sais  de  pirantel;  as  dosagens  habituais  (6,6  mg/kg)  de  pamoato  de  pirantel  são  87%
eficazes, enquanto o dobro da sua dosagem normal é > 93% efetivo. A administração diária de tartarato de pirantel (2,65 mg/kg) elimina Anoplocephala sp. O praziquantel (0,75 a 1,0 mg/kg) é 89 a 100% efetivo na eliminação de A.
perfoliata. O praziquantel (1 mg/kg) parece ser eficaz na eliminação de P. mamillana; os sais de pirantel não o são. Misturas de lactonas macrocíclicas como ivermectina ou moxidectina com praziquantel estão disponíveis e são altamente
efetivas contra A. perfoliata.
Nas propriedades onde os cestóideos são prevalentes, os sinais clínicos de infecções por estes vermes podem ser evitados por sais de pirantel administrados diariamente, durante a estação de pastejo, ou pela administração de um anti­
helmíntico oral efetivo, no intervalo de um programa de desverminação. O tratamento dos equinos de acordo com o último programa, imediatamente antes do início e ao final da estação de pastejo, talvez seja mais benéfico.

 GASTEROPHILUS SP
Os bernes dos equinos, encontrados no estômago, Gasterophilus sp são as larvas das moscas. As três espécies principais são cosmopolitas e um número pequeno de espécies é encontrado em partes da Europa, África e Ásia. As moscas
adultas não são parasitos e não conseguem se alimentar; elas vivem por um período suficiente para se acasalar e depositar ovos e morrem tão logo os seus nutrientes remanescentes do estágio larval sejam utilizados, geralmente em cerca de
2 semanas. As três espécies importantes podem ser diferenciadas em qualquer estágio do seu desenvolvimento. Os ovos de G. intestinalis (o berne comum) se aderem aos pelos de qualquer parte do corpo, mas especialmente nos membros
torácicos e ombros. As larvas eclodem em cerca de 1 semana quando estimuladas, geralmente por lambedura do animal. Os ovos de G. haemorrhoidalis (o berne nasal ou labial) se prendem aos pelos dos lábios. As larvas emergem em 2 a 3
dias sem estimulação e rastejam para o interior da boca. G. nasalis (o berne da faringe) deposita seus ovos nos pelos da região submaxilar. Eles eclodem em cerca de 1 semana, sem estimulação.
As larvas das três espécies aparentemente permanecem incrustadas na língua ou na mucosa da boca por cerca de 1 mês, depois disso passam para o estômago, onde se prendem nas porções do cárdia ou do piloro e, no caso de G. nasalis,
na mucosa da porção inicial do intestino delgado. Após desenvolvimento de cerca de 8 a 10 meses, elas são eliminadas nas fezes e se transforma em pupas, no solo, por 3 a 5 semanas, de onde os adultos emergem. O efeito patogênico
principal é causado pelas larvas, que se prendem, por meio de ganchos orais, no revestimento gástrico. Isso induz erosões e úlceras no local de aderência e uma reação hiperplásica ao seu redor. No entanto, os estágios orais podem originar
tratos sinusais, nos quais se forma uma secreção mucopurulenta, especialmente ao longo da borda lingual dos dentes malares superiores mais posteriores.

Gasterophilus spp, estômago de equino. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Os bernes causam gastrite discreta, mas é possível encontrar grande número deles sem qualquer sinal clínico. Os primeiros vermes que migram para o interior da boca podem provocar estomatite e dor
durante a alimentação. As moscas adultas podem perturbar os equinos quando depositam seus ovos. O diagnóstico específico da infecção por Gasterophilus é difícil e pode ser feito por constatação das larvas nas fezes à medida que são
eliminadas. Nos EUA, geralmente considera­se que ocorre infecção gástrica durante os meses de inverno. O histórico individual dos equinos, o conhecimento do ciclo sazonal local da mosca e a constatação de ovos dos bernes, amarelos a
branco­creme (1 a 2 mm), nos pelos dos equinos são úteis para a confirmação da presença do parasito em determinado rebanho.
TRATAMENTO:  Nas áreas de clima temperado, considera­se que a maioria dos animais se infectou no final do verão. A ivermectina é efetiva contra os estágios gástrico e oral do parasito e, quando utilizada como parte do programa de
controle parasitário rotineiro, propicia um controle efetivo por toda a estação. Em regiões subtropicais ou tropicais, algumas transmissões podem ocorrer durante o ano. A moxidectina é efetiva nos estágios gástricos. As recomendações
atuais para o controle incluem, no mínimo, 1 tratamento anual, ao final da estação das moscas transmissoras. Em alguns locais onde a estação destes insetos é longa, tratamentos adicionais podem ser necessários. Embora não exista nenhum
método satisfatório para proteger os equinos expostos do ataque das moscas adultas, os programas de controle do parasito, quando aplicados com base regional para todos os equinos, reduzem acentuadamente o número de moscas e de
infecções larvais.

 GRANDES ESTRÔNGILOS
Os grandes estrôngilos de equinos também são conhecidos como vermes sanguíneos, vermes em paliçada, escleróstomos ou vermes vermelhos. As 3 espécies principais são: Strongylus vulgaris (até 25 mm), S. edentatus (até 40 mm) e S.
equinus (até 50 mm). (Ver Triodontophorus spp, a seguir.) Sob condições favoráveis, as larvas se desenvolvem até o estágio infectante dentro de 1 a 2 semanas após eliminação dos ovos. A infecção ocorre por ingestão de larvas infectantes,
que se desembainham no intestino e migram extensivamente antes de alcançar a maturidade no intestino grosso. O período pré­patente é de 6 a 11 meses. As larvas de S. vulgaris migram extensamente para a artéria mesentérica cranial e os
seus ramos, onde podem causar trombose e arterite parasitárias. As larvas das outras duas espécies podem ser encontradas em várias partes do corpo, inclusive fígado, tecidos perirrenais, tecidos retroperitoniais e pâncreas. Essas espécies
não provocam lesões nas artérias mesentéricas. As infecções mistas de grandes e pequenos estrôngilos são a regra.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os grandes estrôngilos adultos possuem cápsulas bucais amplas e são ativos consumidores de sangue; eles ingerem fragmentos da mucosa à medida que se movimentam no intestino. A perda sanguínea associada pode
levar à anemia. Também são comuns fraqueza, emaciação e diarreia. S. vulgaris é  importante  devido  aas  lesões  que  provoca  na  artéria  mesentérica  cranial  e  nos  seus  ramos.  Como  resultado  da  interferência  no  fluxo  sanguíneo  para  o
intestino e tromboembolia, pode­se seguir qualquer uma de várias afecções, inclusive cólica, enterite gangrenosa ou estase intestinal, torção ou intussuscepção e, possivelmente, ruptura. A nematodíase cerebroespinal (p. 1399) pode causar
várias lesões e sinais, dependendo da parte afetada do SNC.
DIAGNÓSTICO  E  TRATAMENTO:  O  diagnóstico  de  infecção  mista  por  estrôngilos  baseia­se  na  demonstração  dos  ovos  nas  fezes.  O  diagnóstico  específico  pode  ser  feito  pela  identificação  das  larvas  infectantes  após  cultura  de  fezes.  O
diagnóstico sorológico com base na elevação das β­globulinas é recomendado, mas não é específico para S. vulgaris. Têm­se mostrado lesões arteriais parasitárias utilizando arteriografia, em pôneis e equinos pequenos.
A cólica decorrente de lesões arteriais tem sido controlada, com sucesso, com tratamentos anti­helmínticos. Ivermectina e moxidectina, em dosagem padrão, são efetivas contra os estágios larvais (L4 e L5) de S. vulgaris; o fembendazol e
o oxfendazol, em dosagens mais altas que as empregadas contra o parasito adulto, também são efetivos contra as infecções larvais. A administração diária de tartarato de pirantel é eficaz na prevenção do estabelecimento dos estágios
arteriais de S. vulgaris. Vários anti­helmínticos, inclusive benzimidazóis, pirantel e ivermectina, são ativos contra grandes estrôngilos adultos. Infecções por grandes estrôngilos foram eliminadas de rebanhos fechados com tratamento à base
de ivermectina.
Os programas de controle parasitário são designados a minimizar o teor de contaminação da pastagem e reduzir os riscos associados às larvas migratórias. Os tratamentos anti­helmínticos de rotina agem evitando a excreção fecal de ovos
de estrôngilos (ver pequenos estrôngilos, a seguir).

 HABRONEMA SP
Os vermes gástricos Habronema muscae, H. microstoma e Draschia megastoma são amplamente distribuídos. Os adultos têm de 6 a 25 mm de comprimento. Draschia é encontrado em aumentos de volume semelhantes a tumores na parede
gástrica. As outras espécies ficam livres na mucosa. Os ovos ou as larvas são ingeridos pelas larvas das moscas domésticas ou dos estábulos, que servem como hospedeiros intermediários. Os equinos são infectados por ingestão de moscas
que contêm larvas infectantes ou por meio de larvas livres que emergem das moscas enquanto estas se alimentam ao redor dos lábios. (Ver habronemose cutânea, p. 826).
Gastrite catarral pode resultar de infecções intensas por vermes adultos. Draschia provoca as lesões mais graves – aumentos de volume análogos a tumores de até 10 cm de diâmetro. Essas lesões ficam preenchidas por material necrótico
e grande número de vermes e são cobertas por um epitélio intacto, exceto quanto a uma pequena abertura através da qual os ovos saem. Raramente, esses nódulos se rompem e causam peritonite fatal. As larvas de Habronema  spp  e
de  Draschia  foram  encontradas  nos  pulmões  dos  potros,  concomitantemente  a  abscessos  causados  por  Rhodococcus  equi  (p.  1576).  Os  sinais  clínicos  geralmente  estão  ausentes,  exceto  quando  os  granulomas  associados  à  infecção
por Draschia levam a uma obstrução mecânica ou ruptura.
O diagnóstico antemorte é difícil, pois os ovos de casca fina ou as larvas são facilmente perdidos nos exames nas fezes. Métodos moleculares foram desenvolvidos recentemente com este propósito, mas não são aplicáveis para uso
rotineiro. Os vermes e os ovos podem ser encontrados por intermédio de lavagem gástrica. A maioria dos anti–helmínticos ainda não foi testada contra Habronema spp ou Draschia sp, embora a ivermectina seja efetiva contra as suas larvas
cutâneas e contra os adultos de H. muscae. A moxidectina é efetiva contra adultos de H. muscae.

 OXYURIS SP
Os oxiúros adultos, Oxyuris equi, são mais comuns nos equinos < 18 meses de idade e encontrados principalmente na porção final do intestino grosso. As fêmeas têm 7,5 a 15 cm de comprimento; os machos são menores e em menor
número. As fêmeas grávidas saem pelo reto para pôr seus ovos, “cimentando­os” no períneo, ao redor do ânus. A mistura de ovos e de “cimento” parece uma massa branca a amarela, crostosa. Os ovos, achatados de um lado, tornam­se
embrionados em poucas horas e ficam infectantes em 4 a 5 dias.
Os oxiúros adultos têm pequena importância no intestino, mas causam uma irritação perineal depois da oviposição. O ato de esfregar a cauda e a região anal, com presença de pelos quebrados e placas sem pelo ao redor da cauda e nas
nádegas, é característico e sugere a presença de oxiúros. O exame de fezes pode ou não revelar a infecção por oxiúros. As amostras coletadas ao redor da região perineal podem conter vermes fêmeas ou ovos ressecados. A aplicação de uma
fita adesiva na pele perineal ou a raspagem dessa área com um abaixador de língua podem recuperar ovos para exame microscópico, mas testes falso­positivos são comuns.
A maior parte das drogas de amplo espectro recomendadas para o tratamento de estrôngilos (ver a seguir) é efetiva contra os oxiúros.

 PARASCARIS SP
Parascaris equorum adultos são vermes esbranquiçados e robustos, com até 30 cm de comprimento e com três lábios proeminentes. O ciclo biológico é semelhante ao do Ascaris suum (a lombriga suína, p. 375), com um período pré­
patente de 10 a 12 semanas. Grande número de ovos infectantes pode permanecer viável, por anos, em solo contaminado. Os animais adultos geralmente abrigam uma quantidade muito pequena de vermes. As principais fontes de infecção
para os potros jovens são pastagens, piquetes ou baias contaminadas com ovos oriundos de potros do ano anterior.
Nas infecções intensas, as larvas migratórias podem provocar sinais respiratórios (“resfriados de verão”). Nas infecções intestinais intensas, os potros exibem definhamento, perda de energia e, ocasionalmente, cólica. Têm­se descrito
obstrução  e  perfuração  intestinais.  Os  estágios  intestinais  competem  pela  absorção  dos  aminoácidos  essenciais.  O  diagnóstico  é  baseado  na  demonstração  dos  ovos  nas  fezes.  Se  há  suspeita  de  doença  por  uma  infecção  pré­patente,  o
diagnóstico pode ser confirmado pela administração de um anti­helmíntico, depois do qual poder­se­á observar grande número de vermes imaturos nas fezes.
Nos haras onde a infecção é comum, a maioria dos potros infecta­se logo depois do nascimento. Como resultado, a maioria dos vermes amadurece quando os potros tiverem cerca de 4 a 5 meses de idade. O tratamento deve começar
quando esses potros tiverem cerca de 8 semanas de idade e ser repetido em intervalos de 6 a 8 semanas, até que tenham 1 ano de idade. Todos os anti­helmínticos equinos de amplo espectro são efetivos contra os vermes adultos e imaturos
no intestino delgado e, portanto, os ascarídeos são facilmente controlados por meio da administração rotineira de anti­helmínticos. Contudo, há relatos de resistência de P. equorum à ivermectina na América do Norte e Europa. A eficácia
em determinada fazenda deve ser monitorada baseando­se na redução na contagem de ovos nas fezes. Nos casos em que ocorrer pneumonia verminótica em virtude da migração de Parascaris, o benefício terapêutico pode ser alcançado
pelo  tratamento  com  ivermectina  ou  fembendazol  (o  último  agente  a  10  mg/kg/dia,  por  5  dias  consecutivos)  em  conjunto  com  uma  terapia  antimicrobiana  adequada.  A  infecção  por  Parascaris  pode  ser  evitada  efetivamente  com  a
administração diária de tartarato de pirantel, quando os potros estiverem consumindo grãos regularmente.

 PEQUENOS ESTRÔNGILOS
Mais de 40 espécies de pequenos estrôngilos, de vários gêneros, são encontradas no ceco e no cólon de equídeos domésticos, cada um com o seu próprio local de preferência. São conhecidos como trichomenas, ciatostomas e, atualmente,
ciatostomíneos.  Pertencem  à  subfamília  Cyathostominae,  da  família  Strongylidae  e  cerca  de  10  espécies  são  particularmente  prevalentes.  A  maior  parte  delas  é  apreciavelmente  menor  que  as  espécies  de  “grandes  estrôngilos”,
mas Triodontophorus spp (às vezes classificado como um grande estrôngilo não migratório) pode ser quase tão grande quanto Strongylus vulgaris.
Ao  contrário  dos  grandes  estrôngilos,  os  pequenos  estrôngilos  não  migram  extraintestinalmente,  pois  o  desenvolvimento  precoce  confina­se  à  parede  do  intestino.  O  terceiro  estágio  larval  pode  progredir  para  o  quarto  estágio  sem
interrupção, ou pode entrar em hipobiose e recomeçar o desenvolvimento após períodos prolongados de inatividade. Quando estes vermes emergem da parede intestinal, eles se alimentam superficialmente na mucosa e podem romper
capilares,  mas  são  menos  patogênicos  que  os  grandes  estrôngilos,  uma  vez  que  sua  cavidade  bucal  é  bem  menor.  Uma  exceção  é  o T. tenuicollis,  que  pode  provocar  úlceras  graves  na  parede  do  cólon.  Geralmente,  porém,  as  erosões
resultantes são discretas e difíceis de serem visualizadas. Consequentemente, é comum recuperar milhares de vermes adultos em equinos aparentemente saudáveis que receberam um tratamento anti­helmíntico limitado. Em infecções mais
intensas, entretanto, a erosão pode ser extensa o bastante para prejudicar a função absorção e digestiva, resultando em perda na condição e até mesmo enterite catarral do intestino grosso.

Larva encistada de ciatostoma no cólon maior de um equino. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.
Ovo de pequeno estrôngilo (esquerda) e ovo de grande estrôngilo (direita). Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

CIATOSTOMÍASE LARVAL:  Uma síndrome aguda de perda de peso abrupta, geralmente com diarreia grave, é vista em áreas temperadas no final do inverno e primavera, particularmente em pôneis e equinos jovens (< 5 anos de idade). Está
associada ao aparecimento de grande número de larvas previamente hipobióticas na parede intestinal e, embora de baixa incidência relativa, é de interesse, uma vez que a resposta ao tratamento é variável e o prognóstico deve ser reservado
mesmo sob terapia intensiva. É vista mais frequentemente na Europa do que nos EUA, sendo relatada em Nova York, Kentucky e Tennessee.
Equinos com ciatostomíase larval geralmente apresentam neutrofilia e hipoalbuminemia. Hiperglobulinemia, especialmente envolvendo a fração β­globulina, descrita como característica em alguns relatos, tem sido um achado menos
consistente. Eosinofilia não é um achado consistente. Geralmente, ovos de estrôngilos não são observados no exame de fezes. No entanto, a observação macroscópica de larvas de quarto ou quinto estágio, que possuem uma coloração
vermelho­brilhante, nas fezes, é útil na elaboração do diagnóstico. Biopsia do intestino grosso, via laparotomia, também pode auxiliar no diagnóstico; biopsia retal é menos confiável. Os achados patológicos macroscópicos incluem tiflite
ou colite, com hiperemia, hemorragia, congestão, úlcera ou necrose da mucosa; nos casos prolongados, pode haver apenas espessamento da mucosa. À necropsia, as larvas de ciatostomídeos podem ser vistas como pontos cinzas e pequenos
(1 a 2 mm) na mucosa, dando uma sensação de areia à palpação. A transiluminação da mucosa em relação à serosa pode auxiliar na visualização da larva.
TRATAMENTO:  Os ciatostomíneos adultos são facilmente removidos do lúmen intestinal por uma ampla gama de anti–helmínticos, contanto que a população de vermes seja suscetível à droga escolhida. Cepas de pequenos estrôngilos
resistentes aos benzimidazóis são comuns em algumas regiões, e a resistência ao pirantel tem sido mostrada em alguns lugares. A resistência às lactonas macrocíclicas também já foi relatada, todavia existem preocupações. A eficácia da
droga e a presença de resistência ao anti­helmíntico podem ser determinadas comparando a contagem de ovos de vermes no início do tratamento e 10 a 14 dias depois. Uma droga efetiva deve reduzir a contagem de ovos para zero ou para
teores muito baixos. Se há resistência, uma classe diferente de anti­helmíntico deve ser utilizada, pois a resistência cruzada ocorre dentro dos grupos químicos.
Larvas de pequenos estrôngilos na mucosa intestinal são mais difíceis de serem efetivamente removidas com uso de anti–helmínticos. A ivermectina tem sido utilizada com resultados mistos; a falta de eficácia foi relatada na dose
recomendada,  bem  como  em  doses  mais  altas.  O  tratamento  com  altas  doses  de  fembendazol  (10  mg/kg  por  5  dias  consecutivos)  ou  com  moxidectina  foi  descrito  como  efetivo  e  pode  ser  utilizado  no  inverno  para  reduzir  o  risco  de
ciatostomíase larval. Equinos que já apresentam a doença podem não responder ao tratamento se a inflamação da submucosa é muito grave. Consequentemente, o tratamento deve ser acrescido de corticosteroides e outras terapias de suporte
apropriadas.
PREVENÇÃO:  Tratamentos de rotina ou intercalados são tradicionais e são pretendidos para minimizar o teor de contaminação das pastagens, deste modo reduzindo os riscos associados ao acúmulo de larvas e vermes adultos na mucosa. De
modo alternativo, a infecção pode ser evitada por meio da administração diária de tartarato de pirantel. Os intervalos entre os tratamentos de rotina dependem da duração que uma droga particular mantém as fezes livres de ovos, e variam de
4 a 13 semanas. A frequência do tratamento é também influenciada pelo valor dos animais e pelo teor de risco observado, que varia conforme o acesso à pastagem, densidade da população e as práticas de manejo. Medidas de controle
devem ser designadas para minimizar o risco de resistência desenvolvida na população de vermes. Isto inclui preservar a população refugia de vermes, isto é, vermes não expostos ao ou acometidos pelo anti­helmíntico, e reduzindo assim a
pressão  de  seleção  dos  fármacos.  Estas  populações  compreendem  as  larvas  encontradas  fixadas  na  mucosa  e  larvas  L3 na  pastagem.  Alguns  poucos  tratamentos  podem  ser  efetivos  se  determinados  estrategicamente,  de  acordo  com  as
considerações epidemiológicas e climáticas locais. Muitos equinos adultos com > 3 a 4 anos desenvolvem certa imunidade à reinfecção; deste modo, apenas uma pequena porção do rebanho abriga a população de vermes adultos e isto é
responsável pela contaminação da pastagem com ovos. O tratamento seletivo de apenas estes equinos infectados também reduzirá a exposição da população de vermes aos anti­helmínticos e a seleção à resistência. A remoção de fezes dos
piquetes e das pastagens auxilia no controle e podem também reduzir o número de tratamentos anti­helmínticos necessários.
Em geral, nos programas de controle parasitários, todos os equinos de um haras devem ser tratados, e aqueles que dividem a mesma pastagem ou piquete precisam ser tratados ao mesmo tempo. Animais vizinhos ou que retornaram após
terem ficado fora da propriedade por um longo período devem passar por quarentena ou ser desverminados antes de admitidos no rebanho. Para a administração do anti­helmíntico, todos os equinos devem receber a dose recomendada,
determinada por uma estimativa de peso acurada. Alternar diferentes classes de anti­helmínticos em um rápido esquema de rotação (durante poucos meses) ou mais lento (anualmente) é amplamente praticado para evitar o desenvolvimento
de grupos de parasitos resistentes, mas há pouca evidência para sustentar a utilidade deste procedimento. Por mais que este programa seja utilizado, amostras nas fezes devem ser examinadas periodicamente para monitorar a eficácia do
programa. O tratamento pode ser restrito naqueles equinos de um grupo com contagem positiva de ovos, se esta informação está disponível.

 STRONGYLOIDES SP
Strongyloides westeri é encontrado no intestino delgado dos potros. Os equinos adultos raramente são passíveis de infecções patentes, mas as éguas apresentam, frequentemente, os estágios larvais nos seus tecidos, estágios estes que são
ativados pelo parto, deslocam–se para o tecido mamário e, subsequentemente, são transmitidos para os potros pelo leite. No entanto, a relação entre infecção por S. westeri e diarreia em potros, a partir de dez dias de idade, ainda não foi
estabelecida claramente. Não se sabe se há diferença significativa entre o ciclo biológico deste verme nos equinos e o ciclo de Strongyloides nos suínos (p. 374). O diagnóstico pode ser feito com base na observação de ovos relativamente
mais ovais, com cerca de um terço do comprimento dos ovos de estrôngilos que contêm larvas. A ivermectina e oxibendazol são efetivos na remoção de S. westeri. A transmissão das larvas para os potros, via leite de uma égua, pode ser
evitada por meio de tratamento rotineiro das éguas com ivermectina, dentro de 24 h pós­parto.

 TRICHOSTRONGYLUS SP
O pequeno verme gástrico dos equinos (verme capilar), Trichostrongylus axei, também é encontrado nos ruminantes (p. 369) e, consequentemente, só é um problema clínico em equinos misturados criados com ruminantes ou em rodízio de
pastejo com eles. T. axei adulto é delgado e mede até 8 mm de comprimento. Os detalhes do ciclo biológico nos equídeos ainda não foram cuidadosamente estudados, mas se sabe que as larvas penetram na mucosa. Esses vermes promovem
uma gastrite catarral crônica, que pode resultar em perda de peso. As lesões compreendem áreas nodulares de mucosa espessada circundada por uma zona de congestão e cobertas com variável quantidade de muco. As lesões podem ser
pequenas e irregularmente circunscritas ou podem coalescer e envolver a maior parte ou toda a porção glandular gástrica, sendo possível observar erosões e úlceras.
O diagnóstico definitivo baseado no exame de fezes é difícil, pois os ovos são semelhantes aos dos estrôngilos. As fezes podem ser cultivadas e, em cerca de 7 dias, as larvas infectantes podem ser identificadas. Alguns dos benzimidazóis
e a ivermectina são efetivos contra T. axei.

PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE RUMINANTES

ACHADOS  CLÍNICOS  E  DIAGNÓSTICO:  Os  sinais  clínicos  associados  a  parasitismo  gastrintestinal  são  comuns  a  várias  doenças  e  condições;  no  entanto,  um  diagnóstico  baseado  em  sinais  clínicos,  histórico  de  pastejo  e  estação  do  ano
frequentemente é válido. A infecção geralmente pode ser confirmada pela presença de ovos de nematoides ou segmentos de trematódeos no exame de fezes. No entanto, na avaliação clínica destes exames, dois aspectos devem ser levados
em consideração: a contagem de ovos por grama (OPG) de fezes nem sempre fornece uma indicação precisa do número de vermes adultos existentes, além disso, a identificação de ovos de determinados nematoides é inviável, exceto em
laboratórios especializados. Os valores de OPG podem ser negativos ou baixos quando há grande número de vermes imaturos. Mesmo quando há muitos parasitos adultos, a contagem pode ser baixa se a produção de ovos está suprimida
por  uma  reação  imune  ou  por  tratamento  anti­helmíntico  recente.  A  variação  na  capacidade  de  produção  de  ovos  de  diferentes  tipos  de  vermes  (significativamente  menor  para  Trichostrongylus,  Ostertagia  e  Nematodirus  do  que
para Haemonchus) também pode mascarar o quadro real. Os ovos de Nematodirus, Bunostomum, Strongyloides e Trichuris são diferentes entre si; no entanto, é difícil fazer uma diferenciação confiável dos ovos das espécies de nematoides
mais comuns em ruminantes. As culturas de fezes podem fornecer larvas de terceiro estágio distintas se a diferenciação antemorte é importante.
O surgimento de anti­helmínticos de amplo espectro seguros e efetivos reduziu significativamente a necessidade de diferenciação dos gêneros e espécies desses parasitos. Nas áreas onde há predomínio de Ostertagia spp, a constatação de
elevação da concentração plasmática de pepsinogênio é útil para fins de diagnóstico. Geralmente, concentração de tirosina > 3 UI, que refletem a atividade do pepsinogênio, está associada a sinais clínicos. Dificuldades podem surgir em
animais imunes, que são assintomáticos, mas pode haver aumento a concentração de pepsinogênio devido à reação de hipersensibilidade na mucosa abomasal. Em áreas com predomínio de Haemonchus spp, a determinação do VG propicia
uma estimativa rápida do grau de anemia. Em alguns países, utiliza­se diagnóstico sorológico (ELISA) para detectar infecções por espécies importantes, como Ostertagia e Cooperia, em bovinos. Até o momento, as informações sobre a
correlação entre os títulos sorológicos e a carga parasitária são insuficientes.
Em várias situações de manejo podem­se esperar altas cargas de infecção, principalmente após condições favoráveis de temperatura e pluviosidade em determinadas estações do ano. Recomenda­se um “diagnóstico terapêutico” quando a
quantidade de ovos é pequena ou inexistente, mas o histórico e os sinais sugerirem infecções. Uma resposta clínica a um anti­helmíntico de amplo espectro permite um diagnóstico retrospectivo; de qualquer modo, os animais devem ser
colocados em pastagens “limpos” após o tratamento, para evitar reinfecção.
O exame pós­morte de rotina pode fornecer dados parasitológicos importantes sobre o estado do rebanho ou do plantel. Na necropsia, podem­se observar facilmente os estágios adultos (ou formas imaturas avançadas) de Haemonchus,
Bunostomum, Oesophagostomum, Trichuris e Chabertia. Ostertagia, Trichostrongylus, Cooperia e Nematodirus são difíceis de serem observados, exceto por seu movimento na ingesta fluida. Infecções clinicamente importantes por esses
parasitos facilmente são negligenciadas. O conteúdo total e todas as lavagens devem ser combinados em um volume conhecido, devendo ser feita a contagem de vermes para avaliar a gravidade da infecção. As amostras obtidas do conteúdo
gastrintestinal e imprint da mucosa devem ser examinadas microscopicamente, em pequeno aumento. Nematoides menores podem ser corados (por 5 min) com solução de iodo forte. Os nematoides pequenos são facilmente vistos depois
que o precipitado da ingesta e os tecidos são descorados com solução de tiossulfato de sódio 5%. A importância do número de vermes existentes varia de acordo com a espécie do parasito e do hospedeiro. Por exemplo, uma concentração de
apenas 100 Haemonchus apresenta importância clínica para cordeiros, enquanto apenas uma concentração de 5.000 a 10.000 Ostertagia é clinicamente relevante. Quando os animais apresentam diarreia há alguns dias, os vermes podem ser
eliminados e o tipo e a gravidade das lesões macroscópicas podem assumir um valor diagnóstico considerável.
Diversas causas devem ser levadas em consideração na avaliação dos achados clínicos e laboratoriais e de necropsia. As infecções parasitárias mistas são a regra.
O diagnóstico de ostertagíase em bovinos durante o período de inibição larval é tecnicamente complicado, particularmente para a indústria de confinamento norte­americana. Neste caso, a contagem de ovos nas fezes e a análise de
pepsinogênio plasmático não fornecem informações úteis, pois a inibição ocorre poucos dias após a ingestão de larvas, antes de se tornarem adultos e eliminarem ovos ou do aumento das concentrações plasmáticas de pepsinogênio. Os
fatores predisponentes para a inibição de larvas incluem idade e origem geográfica dos bovinos, época do ano, histórico e manejo prévio das pastagens, condições climáticas durante o último período de pastejo e prevalência de Ostertagia
ostertagi na região de origem.
As informações sobre esses fatores geralmente não estão disponíveis para bovinos em confinamento. Bovinos que chegam ao confinamento depois de um pastejo no sul dos EUA durante a primavera, ou de um pastejo no norte durante o
outono, pode ter alta carga de larvas inibidas. Os bezerros menos expostos, provenientes de áreas onde há alta prevalência de parasitos também podem apresentar este problema. É amplamente aceito que o parasitismo, em particular a
ostertagíase, é uma importante causa de doença clínica ou de problemas de deficiência alimentar de bovinos em confinamento. Aconselha­se que bovinos oriundos de uma área suspeita, em um período do ano suspeito, sejam tratados
imediatamente com anti­helmíntico efetivo contra larvas inibidas.
TRATAMENTO:  Um controle parasitário efetivo nem sempre pode ser alcançado exclusivamente com o uso de fármacos; no entanto, o uso de anti­helmínticos é importante (ver anti­helmínticos, p 2657). Podem ser utilizados para reduzir a
contaminação  da  pastagem,  principalmente  em  épocas  em  que  a  contaminação  da  pastagem  com  ovos  de  parasitos,  é  um  pré­requisito  para  o  desenvolvimento  de  um  desafio  infeccioso  necessário  para  causar  parasitismo  clínico.  A
combinação  do  uso  de  anti­helmíntico  com  outros  métodos  de  controle  –  como  pastejo  alternado  de  espécies  de  hospedeiros  diferentes,  pastejo  rotativo  de  diferentes  grupos  etários  de  uma  única  espécie  de  hospedeiro  (inclusive  o
sistema creep­grazing) e alternância entre pastejo e cultivo – é uma alternativa para a obtenção de um pastejo seguro.
O anti­helmíntico “ideal” deve ser seguro, altamente efetivo contra vermes importantes adultos e em estágios imaturos (inclusive larvas hipobióticas), disponível em formulações práticas, econômicas e compatíveis com outros compostos
comumente  utilizados.  Vários  fármacos  satisfazem  todas  ou  a  maioria  desses  requisitos.  O  tiabendazol  foi  o  precursor  dos  anti­helmínticos  modernos  e  estabeleceu  um  novo  padrão  em  termos  de  eficácia  e  segurança.  Apesar  de  sua
ineficácia contra as larvas hipobióticas de Ostertagia em bovinos e contra algumas outras espécies de parasitos, ainda é amplamente utilizado. Depois do tiabendazol e do mebendazol, outros benzimidazóis (como fembendazol, oxfendazol
e  albendazol)  e  os  pró­benzimidazóis  (tiofanato,  febantel  e  netobimina)  foram  desenvolvidos;  esses  compostos  são  efetivos  contra  a  maioria  dos  principais  parasitos  GI  de  ruminantes  e  possuem  diversos  teores  de  ação  contra  larvas
hipobióticas. Levamisol, morantel e pirantel também são anti­helmínticos de amplo espectro altamente eficazes e seguros, mas possuem baixa ação contra as larvas hipobióticas em bovinos. As avermectinas e milbemicinas são altamente
eficazes contra adultos e estágios larvais, inclusive larvas hipobióticas de todos os nematoides GI comuns dos ruminantes, e contra alguns ectoparasitas importantes. As avermectinas e milbemicinas podem continuar ativas em algumas
espécies de ruminantes depois da administração subcutânea ou tópica única, conferindo proteção contra reinfecção durante esse período. A moxidectina também continua ativa após administração oral. Alguns anti­helmínticos de espectro
estreito, como salicilanilidas, closantel e rafoxanida, apresentam atividade excelente contra Haemonchus contortus em ovinos e também permanecem no hospedeiro por um período longo, conferindo ação profilática após a administração.
Outras vias de administração, além de drenching ou injeção (p. ex., inclusão no alimento, na água de beber e em blocos minerais ou com componentes energéticos), são utilizadas para reduzir os custos e podem ser úteis para animais em
confinamento ou animais de pastejo recebendo suplementação. A inclusão do fármaco no alimento permite sua administração contínua em baixas doses, contribuindo para a redução da contaminação da pastagem nos períodos ideais para o
desenvolvimento do estágio de vida livre dos paras itos. As desvantagens dessa via de administração incluem consumo irregular de anti­helmínticos, resíduos nos tecidos (requerendo observação dos períodos de carência recomendados) e
possibilidade de resistência à droga por exposição contínua. Uma alternativa de administração com custos reduzidos é o tratamento tópico pour­on, utilizado no caso de alguns organofosforados (p. ex., triclorfon), levamisol e avermectinas.
Várias preparações em bolus (p. ex., morantel, levamisol, ivermectina ou benzimidazóis) liberam o fármaco de maneira prolongada ou em pulsos, em intervalos equivalentes aos períodos pré­patentes dos parasitos GI mais importantes.
Os bolus utilizados  em  bovinos  são  calculados  de  modo  a  propiciar  o  controle  da  pastagem  durante  uma  estação  inteira  em  áreas  temperadas,  se  administrados  aos  rebanhos  transferidos  para  sistemas  de  confinamento.  Também  estão
disponíveis bolus que fornecem tratamento e profilaxia aos animais já expostos a um pastagem contaminado. Pode­se utilizar bolus em ovinos para reduzir a elevação periparturiente da eliminação de ovos nas fezes e, consequentemente, a
contaminação da pastagem na estação de pastejo posterior. Apesar da eficácia, alguns bolus utilizados tanto para bovinos como para ovinos foram retirados do mercado por não serem viáveis no mercado.
Niclosamida, morantel, praziquantel e os benzimidazóis mais novos (albendazol, fembendazol e oxfendazol) são efetivos contra tênias em bovinos e ovinos (Moniezia spp). O tratamento de Thysanosoma actinioides tem  apresentado
problemas; no entanto, há registros de que a niclosamida é efetiva na dose de 250 mg/kg. Tem se utilizado, também, o bitionol (200 mg/kg).
Ao tratar animais clinicamente acometidos, deve­se considerar: (1) forneça uma dieta adequada; (2) trate todos os animais do grupo, como medida preventiva e para reduzir contaminação adicional da pastagem; (3) transferência do
rebanho  para  pastagens  “limpas”  para  minimizar  o  risco  de  reinfecção.  A  definição  de  pastagens  seguras  é  variável  nos  diferentes  climas  e  depende  do  conhecimento  local  sobre  a  mortalidade  sazonal  das  larvas  infectantes.  Algumas
autoridades têm sugerido tratar apenas os animais mais gravemente acometidos de um rebanho ou plantel. Isso pode ser alcançado pela avaliação da gravidade da anemia por meio da observação da coloração da esclera ocular, no caso de
hemoncose em ovinos, isto é, escore “FAMACHA”. Este novo sistema relaciona a palidez ocular com a carga de Haemoncus contortus, como meio de saber se ovinos e caprinos, individualmente, necessitam desverminação. Quanto à
gastrenterite  parasitária,  a  gravidade  da  diarreia  e/ou  a  contagem  de  ovos  nas  fezes  em  bovinos  e  ovinos  também  pode  ser  utilizada  para  determinar  a  necessidade  de  tratamento  individual.  A  lógica  para  esta  estratégia  baseia­se  no
conhecimento de que uma grande proporção de ovos eliminados de parasitos (desta forma, contaminação da pastagem) está associada a uma proporção relativamente pequena da população de animais hospedeiros. O tratamento apenas
destes  animais  reduz  significativamente  a  contaminação  da  pastagem  e  diminui  toda  a  pressão  de  seleção  exercida  pelo  uso  de  um  anti­helmíntico  para  genes  de  resistência  dos  parasitos.  A  preocupação  também  há  com  respeito  ao
tratamento e transferência do rebanho para pastagens limpas. Se alguns parasitos com resistência genética resistem ao tratamento, então a pastagem “limpa” torna­se contaminado por uma população totalmente resistente.
Finalmente,  o  desenvolvimento  de  resistência  a  múltiplas  drogas  por  populações  de  Haemonchus  contortus,  Trichostrongylus  spp  e  Ostertagia  spp  em  ovinos  e  caprinos  em  relação  aos  benzimidazóis,  ao  levamisol  e  a
avermectinas/milbemicina já foi mostrado. Embora tal resistência seja um problema apenas em algumas áreas, atualmente, ela deve ser considerada quando a resposta à terapia e a outros fatores podem ser descartada, por exemplo, dose
inadequada, rápida reinfecção, dieta deficiente ou alguma enfermidade, além de parasitismo. A resistência de parasitos de bovinos às drogas foi mostrada; uso excessivo e tratamento indiscriminado devem ser evitados.
O alto custo para desenvolvimento de novos fármacos anti­helmínticos tem incentivado pesquisadores a procurarem por abordagens alternativas no controle de parasitos GI, tais como desenvolvimento de uma vacina com “antígenos
ocultos” contra Haemonchus, uso de forragens ricas em tanino (como o trevo e a luzerna ou a alfafa), que apresentam alguma ação anti­helmíntica, e fungos nematófagos.

Medidas Gerais de Controle
“Controle”  geralmente  implica  na  supressão  da  carga  parasitária  do  hospedeiro  para  teor  inferior  àquele  que  ocasiona  perda  econômica.  É  necessário  amplo  conhecimento  dos  fatores  epidemiológicos  e  ecológicos  que  norteiam  as
populações de larvas na pastagem e a participação do sistema imune do hospedeiro frente às infecções.
Os objetivos do controle incluem: (1) evitar exposição intensa de hospedeiros suscetíveis (a recuperação de uma infecção maciça é sempre lenta); (2) reduzir o teor total de contaminação da pastagem; (3) minimizar os efeitos das cargas
parasitárias; (4) estimular o desenvolvimento de imunidade nos animais (menos importante em animais de engorda do que naqueles que são mantidos para fins reprodutivos).
O uso estratégico de anti­helmínticos destina­se a reduzir as cargas parasitárias e, portanto, a contaminação das pastagens. A frequência de administração baseia­se no conhecimento das alterações sazonais da infecção e da epidemiologia
regional das várias helmintoses. É essencial o reconhecimento imediato das condições que favorecem o desenvolvimento de doença parasitária, como clima, comportamento de pastejo e perda de peso e da condição corporal.
Por  exemplo,  no  Reino  Unido,  onde  o  padrão  da  doença  provocada  por Nematodirus battus nos  ovinos  está  claramente  definido,  recomenda­se  tratamentos  estratégicos  com  2  ou  3  doses  de  anti­helmínticos  em  intervalos  de  2  a  3
semanas, começando imediatamente antes da manifestação clínica da doença. O sincronismo destes tratamentos visa coincidir com o maior número de larvas de Nematodirus na pastagem, durante a primavera; a época do último tratamento
pode ser definida, de maneira acurada, utilizando uma fórmula simples que inclui as temperaturas do solo a 0,33 cm abaixo da superfície durante o mês de março. De modo semelhante, no norte dos EUA, Canadá ou na Europa ocidental, as
populações de Ostertagia e de outros parasitos na pastagem aumentam substancialmente depois de meados de julho, isto é, o padrão geral de infectividade é mínimo na primavera, mas aumenta rapidamente para teores máximos no final do
verão e no início do outono. As práticas atuais nessas áreas indicam a efetividade de 2 ou mais tratamentos anti­helmínticos (geralmente em intervalos de 3 a 5 semanas), administrados quando os bovinos saem pela primeira vez para
pastejar na primavera. Tratamento com avermectina/milbemicina em um período de 4 a 5 semanas de atividade residual e novamente 7 a 8 semanas depois pode resultar em controle altamente eficaz na eliminação de ovos de vermes e
números mínimos de larvas na pastagem durante o outono. Os tratamentos únicos em pleno verão, com transferência subsequente de animais para pastagem segura, e o tratamento associado a adiamento da transferência de pastagem na
primavera, também são efetivos.
Nos outros países de clima temperado frio ou quente, pode­se utilizar controle semelhante caso se conheça o padrão sazonal da doença, mas na maioria das regiões emprega­se o uso tático de anti­helmínticos, por exemplo, durante
condições úmidas, quentes.

Bovinos – Considerações Especiais
Os  problemas  com  vermes  mais  frequentemente  se  manifestam  em  bovinos  de  corte  jovens,  desde  o  momento  do  desmame  até  vários  meses  depois  e  em  grupos  isolados  de  bezerros  leiteiros  durante  a  primeira  estação  de  pastejo.  A
imunidade aos nematoides GI é lentamente adquirida; podem ser necessárias duas estações de pastejo antes de atingir teor significativo. Nas áreas endêmicas, as vacas podem continuar a abrigar cargas baixas, que podem ser a causa de
produção subideal. O parasitismo GI em animal jovem pode ser controlado com uso de anti­helmínticos de amplo espectro juntamente com o manejo de pastagem para limitar reinfecção; o último procedimento inclui transferência para
pastagens “limpas” (p. ex., áreas de conservação de capim ou silagem ou feno de segunda coleta), pastejo alternado com outras espécies de hospedeiros ou rotação de pastagem integrada, na qual os bezerros suscetíveis são acompanhados
de adultos imunes. O pastejo alternado com outras espécies de hospedeiro pode ser ineficaz em áreas onde as espécies de parasitos (p. ex., Nematodirus) infectam ambos os hospedeiros. A rotação de pastagem simples não é efetiva, pois a
massa fecal bovina pode proteger as larvas de condições ambientais adversas por vários meses e, portanto, os bezerros em rodízio podem ficar sujeitos à reinfecção posteriormente.
Nos rebanhos de bovinos de corte, o tratamento anti­helmíntico no desmame é útil, especialmente quando se mantem os bovinos jovens, por exemplo, como lote de novilhas de reposição ou garrotes para engorda. Os bovinos terminados
com capim devem receber tratamento ao desmame e em intervalos regulares durante os próximos 12 meses e, se possível, devem ser transferidos para pastagens seguras.
Quando os bovinos não podem ser removidos imediatamente para outras pastagens, podem­se instituir tratamentos estratégicos para limitar a contaminação das pastagens e a rápida reinfecção. De modo alternativo, o bolus ruminal pode
ser utilizado em países onde são aprovados. Em regiões de clima quente temperado, como Austrália e Nova Zelândia, sul dos EUA e extensas regiões de criação de bovinos no sul do Brasil, do Uruguai e da Argentina, os bovinos jovens
podem  receber  2  ou  mais  tratamentos  desde  o  final  do  verão  e  no  outono,  para  a  prevenção  de  grande  aumento  na  contaminação  da  pastagem  e  de  infecção  durante  o  inverno  e  a  primavera.  Dois  ou  três  tratamentos  estratégicos,
administrados  em  curto  intervalo,  a  partir  do  desmame,  em  tais  regiões,  podem  ser  tão  efetivos  quanto  tratamentos  na  primavera  nas  regiões  temperadas  frias.  Contudo,  a  sobrevivência  das  larvas  infectantes  na  pastagem,  a  partir  do
desmame no outono, em regiões temperadas quentes, é mais frequentemente persistente e intervalos mais longos entre tratamentos (p. ex., no desmame, durante o inverno e no final da primavera) podem ser mais aplicáveis. Em várias áreas,
os anti­helmínticos são administrados simplesmente em intervalos regulares após desmame. Os intervalos entre os tratamentos devem variar, necessariamente, de acordo com a epidemiologia local e a profilaxia conferida pela persistência
dos anti­helmínticos. Recomenda­se tratamento com anti–helmíntico efetivo contra larvas hipobióticas antes do momento esperado do surto, quando ostertagiose tipo II é problema.

Ovinos – Considerações Especiais
Exige­se um tratamento estratégico especial, na maioria das regiões, para compensar a diminuição da imunidade (maior demanda no periparto etc.) notada em ovelhas após o parto. A frequência exata de tal tratamento varia entre as regiões
e entre as diferentes espécies de parasitos, mas, em geral, um tratamento no mês anterior e outro no mês posterior ao parto parece desejável e pode conferir uma produção vantajosa ao animal. Infelizmente, a alta demanda do periparto pode
durar  até  8  semanas  em  alguns  rebanhos  e  2  tratamentos  com  a  maioria  dos  anti­helmínticos  não  são  efetivos  o  suficiente  para  reduzir  a  contaminação  da  pastagem  e  garantir  um  pastejo  “seguro”  para  os  descendentes,  na  estação.
Encontram­se disponíveis, em alguns países, bolus contendo albendazol ou ivermectina, que são mais eficazes para esse propósito. Além disso, em ovinos a ação da moxidectina dura o suficiente para conferir vantagem epidemiológica no
tratamento contra as espécies parasitárias mais importantes. Um tratamento 2 semanas antes do acasalamento, como parte de um programa de “nivelamento”, é outra aplicação estratégica de anti­helmínticos. A conduta de suporte depois do
tratamento inclui transferência dos ovinos de pastagens contaminadas para pastagens de bovinos, áreas de conservação de capim, áreas de hortaliças ou pastagens não pastejados por ovinos há vários meses. O último período varia conforme
o padrão sazonal da mortalidade das larvas nos diferentes países e pode ser de até 1 ano, em alguns países de clima temperado.
Os ovinos são mais suscetíveis aos efeitos adversos dos vermes do que outros animais de produção e uma doença clínica é mais comum. A imunidade aos parasitos é adquirida lentamente e, em geral, incompleta. Podem ser necessários
tratamentos frequentes, especialmente no primeiro ano de vida.

PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE BOVINOS

Bunostomum sp
O macho adulto de Bunostomum phlebotomum tem cerca de 15 mm de comprimento e a fêmea cerca de 25 mm. Esses ancilóstomos têm cápsulas bucais bem desenvolvidas, no interior da qual a mucosa é sugada; as placas de corte na borda
anterior da cápsula bucal são utilizadas para raspar a mucosa durante a alimentação. O período pré­patente é de cerca de 2 meses. A infecção ocorre por ingestão ou por penetração cutânea; a última forma é mais comum.
A penetração da larva nas patas pode causar inquietação e pisoteio, particularmente em bovinos estabulados. Os vermes adultos provocam anemia e rápida perda de peso. Diarreia e constipação intestinal podem se alternar. Pode haver
edema por hipoproteinemia, porém edema de barbela raramente é tão grave quanto na hemoncose. Durante o período patente, um diagnóstico pode ser realizado através da demonstração dos ovos característicos nas fezes.
Na  necropsia,  a  mucosa  pode  parecer  congesta  e  edemaciada,  com  vários  pequenos  pontos  hemorrágicos,  onde  os  vermes  se  prendem.  Os  parasitos  são  facilmente  observados  nos  primeiros  poucos  metros  do  intestino  delgado,  e  o
conteúdo deste fica quase sempre tingido de sangue. Tão pouco quanto 2.000 vermes podem causar morte de bezerros. Lesões locais, edema e formação de crostas podem resultar da penetração das larvas na pele de bezerros resistentes.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Cestóideos (Tênias)
Os cestóideos Anoplocephalidae Moniezia expansa e M. benedeni são encontrados em bovinos jovens. Os vermes desse grupo caracterizam­se pela ausência de rostelo e de ganchos e os seus segmentos geralmente são mais largos do que
longos. Os ovos são triangulares ou retangulares, os quais são ingeridos por ácaros oribatídeos de vida livre que vivem no solo e no capim. Após 6 a 16 semanas, encontram­se cisticercoides infectantes nos ácaros. A infecção dá­se pela
ingestão dos ácaros; o período pré­patente é de cerca de 5 semanas. Moniezia comumente não são consideradas patogênicas aos bezerros, mas há relato de estase intestinal nestes animais.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Chabertia sp
Os adultos do verme intestinal de boca grande, Chabertia ovina, tem cerca de 12 mm de comprimento e são encurvados ventralmente na extremidade anterior. Há um ciclo biológico direto típico. As larvas penetram na mucosa do intestino
delgado imediatamente após ingestão e depois emergem e passam para o cólon. O período pré­patente é de cerca de 7 semanas. As larvas e os adultos podem causar hemorragias discretas, com edema no cólon e eliminação de fezes
recobertas com muco. A chabertíase clínica é raramente observada, se alguma vez, nos bovinos.

Bunostomum phlebotomum, ovos. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.
Moniezia expansa, proglotes maduras. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Cooperia spp
Várias espécies de Cooperia são encontradas no intestino delgado de bovinos; C. punctata, C. oncophora e C. pectinata são as mais comuns. Estes vermes adultos vermelhos e enrolados têm 5 a 8 mm de comprimento e o macho apresenta
grande bursa. Pode ser difícil a visualização macroscópica. O ciclo biológico é essencialmente o mesmo dos outros tricostrongilídeos. Esses vermes aparentemente não sugam sangue. A maior parte deles é encontrada nos primeiros 3 a 6 m
do intestino delgado. O período pré­patente é de 12 a 15 dias.
De modo geral, os ovos podem ser diferenciados daqueles dos nematoides gastrintestinais comuns por meio de suas paredes corporais praticamente paralelas, porém é necessária cultura larval das fezes para diagnosticar definitivamente
uma infecção por Cooperia, no animal vivo. Nas infecções intensas por C. punctata e C. pectinata ocorrem diarreia abundante, anorexia e emaciação, mas não anemia; a porção anterior do intestino delgado exibe acentuada congestão da
mucosa, com pequenas hemorragias. A mucosa pode exibir necrose superficial em forma de renda e fina. C. oncophora provoca doença mais discreta, mas pode ser responsável por perda de peso e produtividade deficiente. Em geral, é
necessário esfregaços da mucosa para demonstrar Cooperia spp, que deve ser diferenciada de Trichostrongylus spp, de Strongyloides papillosus e de Nematodirus spp imaturo.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus spp
Os parasitos gástricos comuns em bovinos são Haemonchus placei (barber’s pole worm, verme grande do estômago, wire worm), Ostertagia ostertagi (verme do estômago médio ou marrom) e Trichostrongylus axei (verme do estômago
menor, p. 362). Em alguns países tropicais, encontra­se Mecistocirrus digitatus, um grande verme de até 40 mm de comprimento. H. placei é principalmente um parasito de regiões tropicais, enquanto O. ostertagi e, em menor extensão, T.
axei, são encontrados em regiões de clima mais ameno. O macho adulto de Haemonchus tem até 18 mm de comprimento e a fêmea tem até 30 mm. Adultos de Ostertagia tem 6 a 9 mm de comprimento e de Trichostrongylus tem cerca de 5
mm de comprimento.
Os ciclos biológicos pré­parasitários dos três grupos costumam ser semelhantes. As larvas eclodem imediatamente após a eliminação dos ovos nas fezes e atingem o estágio infectante em cerca de 2 semanas, sob temperatura ideal (cerca
de 24°C). O desenvolvimento do estágio infectante é retardado no período de clima frio. Em regiões com estreitas variações de temperatura diurna, os meses com temperatura máxima média de 18°C e índice pluviométrico > 5 cm são
favoráveis para o desenvolvimento dos estágios de vida livre de H. placei mas, nas áreas onde ocorrem amplas flutuações, uma temperatura mínima média de 10°C pode limitar efetivamente o desenvolvimento. As formas pré­parasitárias
de O. ostertagi e T. axei se desenvolvem e sobrevivem melhor em condições mais frescas e seus limites superiores para sobrevivência são menores do que aquele de H. placei. Caso a temperatura seja desfavorável ou o clima é seco, as
larvas infectantes podem permanecer inativas nas fezes por semanas, até que as condições se tornem favoráveis novamente. Após esse período, emerge grande número de larvas infectantes.
Haemonchus placei, fêmea adulta. Cortesia Dr. Dietrich Barth.

O período pré­patente de O. ostertagi normalmente é de 18 a 25 dias. As larvas ingeridas entram no lúmen das glândulas abomasais e sofrem muda no quarto dia. Permanecem neste local durante o período pré­patente, crescem e passam
pela muda final antes de emergir no lúmen do abomaso como adultos jovens. As larvas nas glândulas gástricas causam hiperplasia celular e resultam em nódulos, que podem ser discretos ou confluentes. Pode haver citólise epitelial grave
quando as larvas emergem. Nesse momento, as células parietais são substituídas por células indiferenciadas que rapidamente se dividem em células cuboidais. Como consequência, nas infecções intensas, o pH do abomaso aumenta de 2
para > 6. Em decorrência há gastropatia com perda proteica e, juntamente com anorexia e prejuízo à digestão de proteínas, causam hipoproteinemia e perda de peso. A diarreia é persistente. Na ostertagiose tipo I, decorrente de infecções
recentes, a maioria dos vermes presentes é adulta e a resposta ao tratamento anti­helmíntico é boa. A doença tipo I se manifesta principalmente em bezerros com 7 a 15 meses de idade. É mais comum na época do desmame e nos meses
seguintes, nas regiões de clima quente temperado, e em bovinos jovens durante o verão e o início do outono, nas regiões de clima temperado frio.
Na ostertagiose tipo II, grande quantidade de larvas que estavam inativas ou tiveram o desenvolvimento inibido no início do quarto estágio larval emerge das glândulas. Isso acontece principalmente em bovinos com 12 a 20 meses de
idade. Nas regiões de clima temperado quente, as larvas propensas à inibição são adquiridas na primavera e a doença pode se desenvolver quando grande número de larvas reassumem o desenvolvimento para o estágio adulto no final do
verão, ou no outono. Nas regiões de clima temperado frio, as larvas propensas à inibição são adquiridas durante o final do outono e amadurecem durante o final do inverno ou início da primavera.
Acredita­se que a inibição larval (hipobiose) de O. ostertagi e outros nematoides seja semelhante à diapausa nos insetos. Ela é interpretada como mecanismo de sobrevivência no qual os estágios pré­parasitários, na pastagem, evitam as
condições adversas do inverno nas regiões frias e as condições quentes e secas (ou quentes e alternadamente úmidas e secas) de várias regiões quentes. Os fatores que causam inibição não são totalmente conhecidos, mas constatou­se que o
condicionamento  ao  frio  experimental  de  larvas  infectantes  é  importante  em  região  de  clima  temperado  frio.  Nas  regiões  de  clima  quente  dos  hemisférios  norte  e  sul,  o  condicionamento  dos  estágios  pré­parasitários  à  inibição  ocorre
principalmente durante a primavera, antes das condições quentes e secas do verão. A retomada do desenvolvimento ou da maturação dos parasitos parece ser geneticamente predeterminada e pode ser influenciada por parto, dieta, infecção
concomitante e resposta imune do hospedeiro.
H. placei também pode ficar inativo durante o inverno; em seguida podem reassumir o seu desenvolvimento na primavera e infectar as pastagens com ovos no momento adequado ao seu desenvolvimento. Ambos os estágios, larvais e
adultos, são patogênicos devido sua capacidade de sucção de sangue. T. axei causa gastrite com erosão superficial da mucosa, hiperemia e diarreia. A perda proteica decorrente de lesão da mucosa e anorexia causam hipoproteinemia e perda
de peso. Não há hipobiose no mesmo grau.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os animais jovens são acometidos com mais frequência, mas os adultos não previamente expostos à infecção geralmente exibem sinais clínicos e sucumbem. Infecções por Ostertagia e Trichostrongylus caracterizam­
se por diarreia aquosa abundante e, em geral, persistente. Na hemoncose e na infecção por Mecistocirrus pode ocorrer pouca ou nenhuma diarreia, mas possivelmente há períodos intermitentes de constipação intestinal. Anemia de grau
variável é sinal característico de ambas as infecções.
Concomitante à diarreia causada por infecções por O. ostertagi e T. axei, e com a anemia por infecções intensas por Haemonchus, frequentemente ocorre hipoproteinemia e edema (raros em infecções por O. ostertagi), em particular, na
região submandibular (edema de barbela) e, às vezes, também ao longo da porção ventral do abdome. As infecções maciças podem ocasionar morte antes do aparecimento dos sinais clínicos. Outros sinais variáveis incluem perda de peso
progressiva, fraqueza, pelame áspero e anorexia.
Lesões:  Os  vermes  podem  ser  facilmente  notados  e  identificados  no  abomaso  e  pequenas  petéquias  podem  ser  vistas  no  local  onde  os  vermes  estavam  fixados.  As  lesões  mais  características  da  ostertagiose  são  nódulos  pequenos  e
umbilicados, com 1 a 2 mm de diâmetro, por todo o abomaso. Esses nódulos podem ser discretos, mas nas infecções intensas tendem a coalescer e ter aparência de “pavimentação com pedras” ou “marroquim”. Os nódulos são mais
evidentes na região fúndica, mas podem recobrir toda a mucosa do abomaso. O pH pode se elevar para 6 a 7. O pepsinogênio pode se converter de forma deficiente em pepsina e extravasar pelo epitélio danificado; concentrações elevadas
podem  ser  encontradas  no  plasma.  Também  há  evidência  de  que  Ostertagia  adulta  pode  causar,  diretamente,  hipersecreção  de  pepsinogênio.  O  aumento  do  pH  do  abomaso  também  pode  estimular  a  produção  de  gastrina  e,
consequentemente, causar hipergastrinemia, que está intimamente associada à inapetência que pode acompanhar a infecção. Esta diminuição do apetite associada ao parasito tem se mostrado amplamente responsável pelo baixo ganho de
peso. O edema frequentemente é marcante e, em casos graves, pode­se estender pelo abomaso, intestino delgado e omento.
Nas infecções por T. axei, a mucosa do abomaso pode exibir congestão e erosões superficiais que, às vezes, são recobertas por exsudato fibrinonecrótico.
DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO E CONTROLE:  Ver p. 362 e seguintes.

Nematodirus spp
Nematodirus helvetianus é comumente conhecido como a espécie mais comum em bovinos, embora outras espécies, por exemplo, N. spathiger e N. battus, também possam infectá­los. Os machos adultos de N. helvetianus tem cerca de 12
mm de comprimento e as fêmeas 18 a 25 mm. Os ovos desenvolvem­se lentamente; o terceiro estágio infectante é atingido dentro do ovo em 2 a 4 semanas e pode permanecer nele por vários meses. Os ovos podem acumular­se nas
pastagens e eclodir em grande número após a chuva, provocando infecções intensas em curto período. Os ovos são altamente resistentes e os ovos eliminados pelos bezerros em uma estação podem permanecer viáveis e infectar os bezerros
na estação seguinte. Depois da ingestão de larvas infectantes, atinge­se o estágio adulto em cerca de 3 semanas. Os vermes são muito mais numerosos em uma porção intestinal situada 3 a 6 m do piloro.
Os sinais clínicos, que incluem diarreia e anorexia, geralmente se desenvolvem durante a terceira semana de infecção, antes dos vermes atingirem maturidade sexual; as infecções clínicas podem ser observadas em bezerros leiteiros a
partir  de  6  semanas  de  idade.  O  diagnóstico  é  difícil  durante  o  período  pré­patente,  mas  durante  o  período  patente  é  facilmente  definido  com  base  na  constatação  de  ovos  característicos.  Um  número  relativamente  pequeno  de  ovos  é
produzido. A imunidade à reinfecção desenvolve­se com rapidez. A necropsia pode mostrar apenas uma mucosa espessada e edemaciada.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, veja p. 362 e seguintes.

Oesophagostomum sp
Os adultos de Oesophagostomum radiatum (verme nodular) tem 12 a 15 mm de comprimento e sua cabeça é encurvada dorsalmente. Como os ovos são bastante semelhantes aos de Haemonchus placei, são frequentemente agrupados no
exame de fezes de rotina. O ciclo biológico é direto. Inicialmente as larvas penetram na parede da porção de 3 a 6 m posteriores do intestino delgado, mas também penetram no ceco e no cólon, onde permanecem por 5 a 10 dias e então
retornam ao lúmen como larvas de quarto estágio. O período pré­patente nos animais suscetíveis é de cerca de 6 semanas. No entanto, nas reinfecções subsequentes, as larvas ficam retidas por algum tempo, e várias nunca retornam ao
lúmen (encistamento no hospedeiro).
Os animais jovens sofrem ação dos vermes adultos, enquanto nos animais mais velhos a ação dos nódulos é mais importante. A infecção causa anorexia; grave diarreia persistente com fezes escuras fétidas; perda de peso e morte. Nos
animais mais velhos, resistentes, os nódulos que circundam as larvas tornam­se caseosos e calcificados, reduzindo a motilidade intestinal. Estenose ou intussuscepção ocorrem, ocasionalmente. Os nódulos podem ser palpados por via retal e
os vermes e os nódulos podem ser facilmente observados na necropsia.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, veja p. 362 e seguintes.

Strongyloides sp
O ascarídeo intestinal Strongyloides papillosus possui um ciclo biológico incomum. Apenas as fêmeas são encontradas no intestino. Elas têm 3,5 a 6 mm de comprimento e se incrustam na mucosa da porção superior do intestino delgado.
Os ovos embrionados, pequenos, são eliminados nas fezes, eclodem rapidamente e podem se desenvolver diretamente em larvas infectantes ou em adultos de vida livre. Os descendentes desses adultos de vida livre podem desenvolver­se
em outra geração de larvas infectantes ou adultos de vida livre. O hospedeiro torna­se infectado por meio da penetração na pele ou por ingestão; as larvas infectantes podem ser transmitidas via colostro, como nas outras espécies do gênero.
O período pré­patente é de cerca de 10 dias.
As infecções são mais comuns em bezerros jovens, particularmente em rebanhos leiteiros. Embora os sinais clínicos sejam raros, podem incluir diarreia intermitente, perda de apetite e de peso e, às vezes, sangue e muco nas fezes. Grande
quantidade de vermes no intestino provoca enterite catarral com petéquias e equimoses, especialmente no duodeno e no jejuno.
Oesophagostomum radiatum, ovos. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

Quanto ao diagnóstico, tratamento e controle, veja p. 362 e seguintes.

Toxocara sp
O ascarídeo Toxocara vitulorum é um verme esbranquiçado e robusto (os machos tem 20 a 25 cm de comprimento e as fêmeas 25 a 30 cm), encontrado no intestino delgado de bezerros < 6 meses de idade; os bezerros mais velhos são
resistentes. As larvas que eclodem dos ovos ingeridos passam aos tecidos e, nas vacas prenhes, são mobilizadas posteriormente na prenhez e eliminadas pelo leite, para os bezerros. Os ovos aparecem nas fezes dos bezerros a partir da
terceira semana de idade e são facilmente reconhecidos por seu revestimento espesso e com sulcos. Em alguns países, a infecção é considerada séria, particularmente em bezerros bubalinos.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, veja p. 362 e seguintes.

Trichuris spp
As infecções por Trichuris spp são comuns nos bezerros jovens e nos sobreanos, mas um grande número de Trichuris spp é raro. Os ovos são resistentes e as infecções provavelmente persistem nas propriedades­problema. Os sinais clínicos
são improváveis, mas em infecções intensas ocasionais, fezes escuras, anemia e anorexia podem ser observadas.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE OVINOS E CAPRINOS
Várias espécies de nematoides e cestóideos causam gastrite e enterite parasitárias em ovinos e caprinos. As mais importantes dessas espécies são Haemonchus contortus, Teladorsagia (Ostertagia) circumcincta, Trichostrongylus axei, as
espécies intestinais de Trichostrongylus, Nematodirus spp, Bunostomum trigonocephalum e Oesophagostomum columbianum. Cooperia curticei, Strongyloides papillosus, Trichuris ovis e Chabertia ovina também podem ser patogênicos
nos ovinos; essas espécies e outras relacionadas encontram­se discutidas em parasitos GI dos bovinos (p. 369).

Bunostomum e Gaigeria spp
Bunostomum trigonocephalum adultos (ancilóstomos) são encontrados no jejuno. O ciclo biológico e os achados clínicos são essencialmente os mesmos que nos ancilóstomos bovinos (p. 367). Tão pouco quanto 100 vermes podem causar
sinais clínicos. Gaigeria pachyscelis é encontrado na África e na Ásia e lembra o Bunostomum spp em tamanho e forma (2 a 3 cm). As larvas de G. pachyscelis infectam o hospedeiro apenas mediante a penetração cutânea. G. pachyscelis é
um sugador de sangue voraz e provavelmente é o ancilóstomo mais patogênico.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Cestóideos (Tênias)
A patogenicidade de Moniezia expansa nos ovinos é debatida há muito tempo. Várias observações iniciais, que associaram essa infecção com diarreia, emaciação e perda de peso, não diferenciavam precisamente as infecções por cestóideos
das infecções por alguns pequenos nematoides (p. ex., Trichostrongylus colubriformis). São relativamente não patogênicas, mas as infecções intensas podem resultar em discreto definhamento e distúrbios GI. O diagnóstico pode ser feito
com o achado de proglótides em forma de cinta, amareladas a branco­peroladas nas fezes ou saindo pelo ânus ou ainda pela demonstração dos ovos característicos em exame de fezes. O ciclo biológico envolve um ácaro oribatídeo que vive
nas pastagens. O período pré­patente é de 6 a 7 semanas. Os cordeiros desenvolvem rápida resistência e as infecções são incomuns depois de cerca de 4 a 5 meses de idade.
Thysanosoma actinioides, a “tênia com franjas”, habita o intestino delgado, o ducto biliar e o ducto pancreático. É comumente encontrada em ovinos da área das Montanhas Rochosas dos EUA. Embora não esteja associada à doença
clínica, é de importância econômica porque os fígados tornam­se condenados quando os parasitos são encontrados no ducto biliar.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Chabertia sp
Os vermes adultos causam graves lesões à mucosa do cólon, com consequentes congestão, úlcera e pequenas hemorragias. Os ovinos infectados definham; as fezes ficam moles, contêm muito muco e podem conter estrias de sangue.
Desenvolve­se imunidade rapidamente e os surtos são observados apenas sob condições de estresse intenso.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Haemonchus, Ostertagia e Trichostrongylus spp
Os principais vermes gástricos dos ovinos e dos caprinos são Haemonchus contortus, Teladorsagia (Ostertagia) circumcincta, Ostertagia trifurcata, Trichostrongylus axei (p. 369) e, em algumas regiões tropicais, Mecistocirrus digitatus. A
transmissão cruzada de Haemonchus entre os ovinos e os bovinos pode ocorrer, mas não tão facilmente quanto à transmissão entre espécies homólogas. Os ovinos são mais suscetíveis às espécies bovinas do que os bovinos o são com
relação às espécies ovinas. Quanto às descrições e aos ciclos de vida, ver parasitas gastrointestinais de bovinos, p. 367.
Haemonchus é  mais  comum  nas  áreas  tropicais  ou  subtropicais  ou  nas  áreas  com  chuvas  de  verão,  enquanto Ostertagia e T. axei são  mais  comuns  nas  áreas  com  chuvas  de  inverno.  A  última  espécie  também  predomina  nas  zonas
temperadas.
A hemoncose nos ovinos pode ser classificada como hiperaguda, aguda ou crônica.
Na doença hiperaguda, a morte pode acontecer dentro de 1 semana de infecção intensa, sem sinais significativos. A doença aguda caracteriza­se por anemia grave, acompanhada de edema generalizado. A anemia também é característica
de infecção crônica, frequentemente com cargas verminóticas baixas, e é acompanhada de perda de peso progressiva. A diarreia não é um sinal clínico de hemoncose; as lesões são aquelas associadas à anemia. O abomaso fica edemaciado
e, na fase crônica, o pH gástrico eleva­se, o que provoca uma disfunção abomasal. Os ovinos adultos podem desenvolver infecções intensas, até fatais, particularmente durante a lactação.

Trichostrongylus axei, extremidade anterior. Cortesia da Merial Limited.

As  lesões,  a  patogênese  e  os  sinais  das  infecções  por  Ostertagia  e  T.  axei  são  semelhantes  aos  encontrados  nos  bovinos.  Mesmo  uma  infecção  subclínica  reduz  o  apetite,  prejudica  a  digestão  gástrica  e  diminui  o  uso  de  energia
metabolizável e proteínas. Ostertagia corresponde ao principal gênero envolvido na elevação periparturiente em contagens de ovos nas fezes nos ovinos e infecções intensas por este parasito podem causar diarreia e diminuir a produção
leiteira  nas  ovelhas.  Essa  eliminação  de  ovos  serve  como  a  principal  fonte  de  contaminação  para  os  cordeiros.  O  mesmo  tipo  de  inibição  no  desenvolvimento  (hipobiose)  observado  nos  bovinos  também  é  válido
para Ostertagia e Haemonchus nos ovinos.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Nematodirus spp
As espécies de Nematodirus encontradas no intestino delgado de ovinos são semelhantes, em morfologia e ciclo biológico, ao N. helvetianus (p. 371). Infecções clínicas têm importância considerável no Reino Unido, na Nova Zelândia e na
Austrália, onde já se descreveram perdas por morte de 20% dos cordeiros nos rebanhos acometidos. Os parasitos são endêmicos em algumas partes dos estados das Montanhas Rochosas dos EUA, onde ocasionalmente causam doença
clínica em cordeiros.
Nas áreas onde as infecções clínicas são comuns, a doença frequentemente apresenta um padrão sazonal característico. Muitos dos ovos eliminados pelos cordeiros acometidos permanecem inativos por todo o restante da estação de
pastejo e pelo inverno, com grande número de larvas surgindo durante o início do período de pastejo do ano seguinte. Consequentemente, os cordeiros de uma estação contaminam os pastagens dos cordeiros da estação seguinte, mas o
ciclo biológico pode ser interrompido, caso não se utilize a mesma área para pastagens todos os anos. A maioria das infecções clínicas ocorre em cordeiros de 6 a 12 semanas de idade.
N. battus é encontrado no Reino Unido e em outras partes da Europa e também na América do Norte. Os ovos eclodem após um período de frio e depois de uma elevação da temperatura ambiente para média diurna/noturna de 10°C. Isso
ocorre no final da primavera, nas áreas temperadas. As exigências de eclosão demonstram que há, geralmente, uma geração anual de N. battus, embora no Reino Unido já se descrevera surtos no outono. A doença pode estar associada a
estágios larvais em desenvolvimento e pode ser observada dentro de 2 semanas do desafio. Outros Nematodirus spp são frequentemente encontrados em regiões de baixo índice de chuvas (p. ex., a região do Karroo, na África do Sul, e no
interior da Austrália), onde os outros parasitos raramente são encontrados.
A nematodirose é caracterizada por início súbito, “perda de vigor”, definhamento, diarreia profusa e desidratação acentuada, com morte em 2 a 3 dias após início do surto. A nematodirose restringe­se comumente aos cordeiros ou aos
ovinos em desmame, mas nos países com poucas chuvas, onde os surtos são esporádicos, os ovinos mais velhos podem sofrer infecções intensas. As lesões geralmente consistem em desidratação e enterite catarral discreta, mas pode ocorrer
inflamação aguda no intestino delgado inteiro. As contagens = 10.000 vermes, associadas aos sinais e histórico característicos, indicam infecções clínicas. Os cordeiros acometidos podem eliminar um grande número de ovos, que podem ser
identificados facilmente; no entanto, como o início da doença pode preceder a maturação dos vermes­fêmeas, isso não é um achado constante.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Oesophagostomum sp
O verme nodular de ovinos, Oesophagostomum columbianum, tem morfologia e ciclo biológico semelhantes aos do verme nodular de bovinos (p. 371).
A diarreia geralmente se desenvolve durante a segunda semana de infecção. As fezes podem conter excesso de muco, bem como estrias de sangue. À medida que a diarreia progride, os ovinos tornam­se emaciados e fracos. Esses sinais
costumam diminuir próximo ao final do período pré­patente, mas a presença contínua de vários vermes adultos pode resultar em infecção crônica, na qual os sinais podem não se desenvolver por vários meses. Os ovinos tornam­se fracos,
perdem peso apesar de um bom apetite, e apresentam diarreia intermitente e constipação intestinal.
À medida que a imunidade desenvolve­se, formam­se nódulos ao redor das larvas; esses nódulos podem tornar­se caseosos e calcificados. A formação nodular geralmente é mais acentuada em ovinos do que em bovinos. Os ovinos
acometidos  apresentam  alteração  da  marcha  e,  com  frequência,  dorso  arqueado.  Nos  casos  graves,  pode  haver  estenose  e  intussuscepção.  O  diagnóstico  é  difícil  durante  o  período  pré­patente,  momento  no  qual  ele  deve  basear­se
amplamente nos sinais clínicos.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Strongyloides sp
As infecções intensas por vermes adultos causam uma doença semelhante à tricostrongilose. A infecção ocorre geralmente por penetração cutânea, mas também pode ocorrer pelo leite. As lesões cutâneas, entre as unhas, produzidas pelas
larvas que penetram na pele, lembram os estágios iniciais do foot rot e podem auxiliar na invasão dos agentes causadores dessa doença. A maioria das infecções é transitória e sem maiores consequências.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

Trichuris sp
As infecções intensas por tricurídeos não são comuns, mas podem ocorrer em cordeiros muito jovens ou durante condições de seca, quando os ovinos são alimentados com grãos no solo. Os ovos são bastante resistentes. Congestão e edema
na mucosa do ceco, acompanhados de diarreia e definhamento são observados.
Quanto a diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 280 e seguintes.

Tricostrongilose Intestinal
O ciclo biológico de Trichostrongylus (T. colubriformis, T. vitrinus e T. rugatus) intestinal é direto. As larvas em desenvolvimento escavam superficialmente as criptas da mucosa e se desenvolvem em adultos que põem ovos em 18 a 21
dias.
Anorexia, diarreia persistente e perda de peso são os sinais principais. Atrofia vilosidade resulta em prejuízo na digestão e má absorção; há perda proteica através da mucosa danificada. Não há lesões características; deve­se realizar uma
contagem verminótica total para avaliar a condição.
Quanto ao diagnóstico, tratamento e controle, ver p. 362 e seguintes.

PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE SUÍNOS

Ver coccidiose em suínos, p. 213.
Nos suínos, constantemente são constatados helmintos gastrintestinais; seus principais sinais clínicos são perda de apetite, redução no ganho diário, baixa utilização do alimento e potencialização de outros patógenos. Raramente levam à
morte.
Além  da  boa  higiene  básica  nas  pocilgas,  que  deve  ser  enfatizada,  o  controle  dos  helmintos  gastrintestinais  baseia­se  em  tratamentos  anti­helmínticos  e  medidas  preventivas,  tais  como  evitar  o  contato  dos  suínos  com  hospedeiros
intermediários. Para se reduzir o risco de desenvolvimento de resistência às drogas, o uso de anti­helmíntico deve ser realizado antes da pesquisa dos helmintos em um número representativo de animais, e deve ser iniciado apenas quando se
constatam de ovos do parasito nas fezes do grupo etário examinado. Os produtos administrados no alimento incluem benzimidazóis, ivermectina, levamisol e diclorvós. Um programa anti­helmíntico simples consiste em tratar as porcas e as
marrãs cerca de 10 dias antes do acasalamento e, novamente, antes do parto, enquanto os leitões desmamados e os suínos em engorda antes de entrarem em cercados limpos; os cachaços, em intervalos de 4 a 6 meses. De modo alternativo,
uma administração de ivermectina, também efetiva contra piolhos e sarna, pode ser realizada em um programa semelhante. Uma abordagem diferente é em tratar todos os suínos do rebanho no mesmo dia e repetir a cada 3 a 6 meses ou
menos, com o intervalo de dosagem sendo determinado pelas contagens de ovos nas fezes. Em rebanhos submetidos a um bom manejo, não é possível demonstrar uma diferença entre essas duas estratégias e, pelo fato da transmissão aos
leitões dentro de várias unidades de parto modernas ser desprezível, não há razão em tratar as porcas antes da parição. Todavia, um bom sistema de manejo incorpora práticas que visam à prevenção de infecções e não utiliza o tratamento
anti­helmíntico como único método de controle de parasitos.

 ASCARIS SP
As formas adultas do grande nematelminto, Ascaris suum, são encontradas principalmente no intestino delgado e, transitoriamente, no intestino grosso durante a expulsão dos vermes. Possuem cerca de 15 a 40 cm de comprimento, são
esbranquiçados e bastante grossos. Um número grande de ovos é produzido (tanto quanto 200.000 a 1 milhão/fêmea/dia); podem se desenvolver ao estágio infectante (ovos contendo a larva L3) em 3 a 4 semanas, sob condições ótimas. Nas
regiões temperadas, permanece inativo no inverno (< 15°C) e retoma o desenvolvimento quando a temperatura se eleva na primavera. Os ovos são altamente resistentes a agentes químicos, mas condições com baixa umidade, temperatura
elevada e luz solar direta podem reduzir a sobrevivência significativamente. Sob condições ótimas, os ovos podem sobreviver por 5 a 10 anos. Quando os ovos são ingeridos, as larvas eclodem no intestino, penetram na parede do intestino
grosso e atingem a circulação portal. Depois de um período no fígado, as larvas são transportadas, pela circulação, aos pulmões, de onde elas passam, através dos capilares, para o interior dos espaços alveolares. Cerca de 9 a 10 dias pós–
ingestão, as larvas sobem a árvore brônquica para retornarem ao trato gastrintestinal. Quando chegam no intestino delgado, a maioria das larvas são expelidas; as larvas remanescentes desenvolvem­se em vermes adultos maduros. Os
primeiros ovos são eliminados 6 a 7 semanas pós­infecção.

Ascaris suum, macho e fêmea adultos. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

DISTRIBUIÇÃO E GAMA DE HOSPEDEIROS:  A. suum é encontrado em suínos no mundo todo. Os vermes podem também infectar cordeiros e bezerros neonatos, nos quais os ascarídeos adultos localizam­se no ducto biliar. A. suum apresenta
potencial zoonótico e os adultos são comumente encontrados em crianças pré­escolares que tem contato com rebanhos de suínos. Foi descrita a larva migrans visceral por migração de larvas.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os vermes adultos podem reduzir significativamente a taxa de crescimento dos suínos jovens; em casos raros, podem causar a obstrução mecânica do intestino. A migração das larvas para o fígado causa hemorragia,
fibrose e acúmulo de linfócitos, que se apresentam como “pontos brancos” sob a cápsula, levando a condenação do fígado ao abate. As manchas brancas desaparecem dentro de 1 a 4 semanas; portanto, sua presença indica reinfecção
recente. Nos suínos resistentes, apenas poucas larvas atingem o fígado e o número de manchas brancas é baixo, apesar da reinfecção contínua. Sendo assim, o número de manchas brancas e a taxa de condenação do fígado são medidas
insignificantes do teor de infecção do rebanho. Nas infecções intensas, as larvas podem causar edema e consolidação pulmonares, bem como exacerbar a gripe suína e a pneumonia endêmica. Os animais suscetíveis, muito expostos, exibem
respiração  abdominal  comumente  chamada  de  “golpes”.  Além  dos  sinais  respiratórios,  observam­se  definhamento  acentuado  e  perda  de  peso.  A  infecção  geralmente  induz  o  desenvolvimento  de  resistência  adquirida  à  reinfecção,  e  a
prevalência é mais elevada em suínos jovens em crescimento. Se a taxa de tratamento é muito baixa, o teor de imunidade do rebanho também é baixo, e a prevalência pode ser maior nos animais reprodutores.
DIAGNÓSTICO:  Durante o período patente, o diagnóstico pode ser feito por demonstração dos ovos típicos (marrom­dourado, parede espessa, com saliências externas, 50 a 70 × 40 a 60 μm) durante a análise das fezes ou por observação dos
grandes  vermes  no  material  fecal.  Um  diagnóstico  presuntivo  pode  ser  feito  com  base  na  demonstração  das  manchas  brancas  no  fígado;  no  entanto,  outros  parasitos  migratórios  (p.  ex.,  larvas  de Toxocara canis)  podem  causar  lesões
semelhantes. Os vermes podem ser evidenciados nos pulmões (imaturos pequenos) e no intestino delgado (imaturos grandes, adultos) durante a necropsia.
TRATAMENTO:  Pode­se tornar necessária uma terapia de suporte, inclusive tratamento contra infecções bacterianas secundárias, durante a fase respiratória da afecção. Têm–se utilizado várias drogas para eliminar os ascarídeos adultos. As
preparações de piperazina possuem baixa toxicidade e um preço moderado. Os benzimidazóis e pró­benzimidazóis, diclorvós, ivermectina, levamisol e pirantel são efetivos e possuem um espectro de ação mais amplo que o da piperazina. A
higromicina é ativa contra os ascarídeos quando administrada como um aditivo, em baixa dose, no alimento. Encontram­se disponíveis poucas informações com relação ao controle dos estágios migratórios; o pirantel e o fembendazol
mostram atividade.

 MACRACANTHORHYNCHUS SP
Macracanthorhynchus hirudinaceus (acantocéfalo suíno) adulto geralmente instala­se no intestino delgado. Apresenta 10 cm (machos) a 65 cm (fêmeas) de comprimento e 3 a 9 mm de largura, é levemente rosa e possui um revestimento
externo  transversalmente  enrugado.  A  extremidade  anterior  possui  um  rostelo  ou  uma  probóscide  retraível,  utilizados  para  uma  firme  aderência  na  parede  intestinal.  Os  ovos  (marrom­escuros,  embrionados,  com  3  envoltórios
embrionários, 90 a 110 × 50 a 65 μm) são ingeridos por larvas de vários besouros, que servem como hospedeiros intermediários. Os suínos tornam­se infectados ingerindo larvas ou besouros adultos, e a infecção fica então restrita aos
suínos criados soltos. O período pré­patente é de 2 a 3 meses e as fêmeas colocam cerca de 260.000 ovos/dia, por vários meses.
Os sinais não são específicos; o diagnóstico antemorte é difícil, pois os ovos não flutuam, confiavelmente, em soluções salinas e devem, então, ser examinados no sedimento. O local de fixação pode ter um centro necrótico circundado
por uma zona de inflamação. Essas lesões geralmente podem ser observadas na serosa. O rostelo pode perfurar a parede intestinal e causar peritonite e morte.
Levamisol e ivermectina são efetivos no tratamento. O controle depende de se evitar o uso de recintos ou pastagens contaminadas ou da remoção regular de fezes quando os animais são colocados em baias ou pequenas salas.
 OESOPHAGOSTOMUM SPP
Oesophagostomum spp são cosmopolitas; O. dentatum é a espécie mais comum, enquanto O. quadrispinulatum parece ser um pouco mais patogênico. Todas as espécies de Oesophagostomum são hospedeiro­específicas. Os adultos são
encontrados no lúmen do intestino grosso; têm 8 a 12 mm de comprimento, são delgados e brancos ou cinzas. O ciclo biológico é direto. A infecção resulta da ingestão de larvas L3, que penetram na mucosa do intestino grosso em poucas
horas após a ingestão e retornam para o lúmen em 6 a 20 dias. O período pré­patente é de 17 a 35 dias. Uma elevação periparturiente na eliminação dos ovos foi observada em porcas de 2 semanas antes do parto até o desmame; contudo,
este fenômeno é muito menos constante em suínos do que nos ovinos e sua importância epidemiológica é questionável. A maioria das infecções é assintomática, mas os suínos intensamente infectados podem exibir anorexia, emaciação e
distúrbios GI.
A serosa mostra pequenos nódulos, com o seu tamanho refletindo a espécie e uma exposição anterior. Nos casos graves, a parede intestinal pode estar espessada e necrosada. Infecções maciças podem reduzir a capacidade de lactação das
porcas  e  o  peso  corporal  dos  suínos  em  crescimento.  A  infecção  induz  uma  imunidade  moderada;  por  isso,  a  prevalência  destes  vermes  tende  a  ser  maior  em  grupos  de  animais  mais  velhos  (porca,  varrão).  Nas  infecções  patentes,
encontram­se ovos de estrôngilos típicos (66 a 80 × 38 a 47 μm) nas fezes, frequentemente em grande número. Esses ovos podem ser diferenciados dos do Hyostrongylus por meio de cultura larval (as larvas L3 de Oesophagostomum são
menores, mais espessas e se movem mais lentamente). Na necropsia, os vermes e as lesões são facilmente observados. Os benzimidazóis, levamisol, piperazinas, diclorvós, tartarato de pirantel e ivermectina são efetivos, mas a resistência
anti­helmíntica foi relatada para os benzimidazóis, levamisol e pirantel. Uma dieta composta por carboidratos altamente degradáveis pode auxiliar no controle da verminose por criar condições desfavoráveis, reduzindo o estabelecimento e
a fecundidade dos vermes.

 STRONGYLOIDES SP
O ciclo biológico de Strongyloides ransomi (verme filiforme intestinal) aparentemente é semelhante ao de S. papillosus dos bovinos (p. 371). Os vermes filiformes são únicos entre os helmintos, possuindo tanto as gerações parasitárias
(fêmeas no intestino delgado) quanto às gerações de vida livre (machos e fêmeas no ambiente circundante). A transmissão ocorre por penetração cutânea, enfatizando a importância de uma boa higiene, ou via larvas infectantes no colostro
de porcas lactantes. A transmissão lactogênica é altamente eficaz para leitões recém­nascidos. Mesmo sem a reinfecção das porcas, as larvas inativas no úbere podem ser transmitidas a várias ninhadas consecutivas de leitões. Os vermes
adultos escavam a parede do intestino delgado. O período pré­patente é de 4 a 9 dias, dependendo do modo de infecção. Nas infecções leves e moderadas, os suínos geralmente não exibem sinais clínicos. Nas infecções intensas, podem­se
observar diarreia, anemia e emaciação com morte decorrente. As infecções induzem a uma imunidade duradoura, e, consequentemente, animais mais velhos não são clinicamente acometidos.

Oesophagostomum spp, ovo. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

O diagnóstico é determinado pela demonstração dos ovos embrionados de casca fina e pequenos, característicos (20 a 35 × 40 a 55 μm), nas fezes. É importante que as fezes sejam coletadas do reto, pois os excrementos nas fezes podem
se tornar contaminados por nematoides de vida livre, podendo ter ovos indistinguíveis dos de Strongyloides. Além disso, as fezes devem ser mantidas sob refrigeração imediatamente para evitar a incubação. À necropsia, os adultos podem
ser encontrados em esfregaços da mucosa intestinal e os vermes imaturos podem ser recuperados de tecidos cortados em um aparelho de Baermann.
Benzimidazóis e levamisol são efetivos contra infecções intestinais. Se são administrados no alimento por vários dias antes e depois do parto, reduzirão as transmissões lactogênicas aos leitões lactentes. infecções nos leitões lactentes. A
ivermectina é eficaz contra os adultos e, se é administrada à porca 1 a 2 semanas antes do parto, controla a transmissão aos leitões. Um teor elevado de higiene nas baias é necessário para diminuir o desenvolvimento larval, assim como a
multiplicação de gerações de vida livre no recinto.

 TRICHURIS SP
Trichuris suis é distribuído mundialmente nos suínos. Os vermes adultos têm 5 a 6 cm de comprimento e formato de chicote; a porção delgada anterior se incorpora nas células epiteliais do intestino grosso, especialmente o ceco, com o
terço  posterior  espesso  livre  no  lúmen.  A  infecção  ocorre  por  ingestão  de  ovos  embrionados.  As  infecções  intensas  podem  causar  lesões  inflamatórias  no  ceco  e  no  intestino  grosso  adjacente  e  serem  acompanhadas  de  diarreia  e
definhamento. A afecção é mais frequentemente vista em animais jovens; a resistência é tanto adquirida quanto relacionada com a idade. Os ovos duplamente operculados, amarronzados (50 a 68 × 21 a 31 μm) são diagnósticos, com a
oviposição iniciando­se 6 a 7 semanas após infecção. Entretanto, os tricurídeos são apresentam um curto período de oviposição (2 a 5 semanas) antes dos vermes serem expelidos por reações imunomediadas ovipositores esporádicos, e
pouca importância tem sido administrada ao número de ovos por grama de fezes. Diclorvós, levamisol, alguns benzimidazóis e ivermectina são efetivos contra os vermes adultos. Biologicamente, os ovos são comparáveis aos de Ascaris –
são altamente resistentes aos produtos químicos e podem permanecer infectantes por até 11 anos; consequentemente, o controle consiste na limpeza completa da área contaminada e a remoção dos animais para locais limpos. Os ovos
de Trichuris desenvolvem­se muito lentamente (10 a 12 semanas sob condições ótimas), e por não se desenvolverem em temperaturas < 16°C, há apenas 1 geração/ano, em regiões temperadas.
As larvas de T suis podem eclodir no intestino grosso de pessoas, nas quais as larvas parecem capazes de se instalar transitoriamente. Os adultos raramente são notados.

 VERMES DE ESTÔMAGO
Três  tipos  de  vermes  de  estômago  são  encontrados  em  suínos:  um  verme  fino,  Hyostrongylus  rubidus  (verme  gástrico  vermelho)  e  dois  espessos,  Ascarops  strongylina  e  Physocephalus  sexalatus.  H.  rubidus  tem  cerca  de  6  mm  de
comprimento, é delgado e possui um ciclo biológico direto. Os vermes gástricos espessos têm cerca de 10 a 20 mm de comprimento, são muito mais robustos e têm os besouros coprófagos como hospedeiros intermediários. Todos os 3
vermes gástricos distribuem­se mundialmente mas principalmente em suínos criados livres.
ACHADOS CLÍNICOS:  Quando presentes em grande número ou quando a condição do hospedeiro é desfavorável devido a uma dieta deficiente ou outros fatores, esta verminose pode causar apetite variado, anemia, diarreia ou perda de peso e
pode contribuir para a síndrome da porca magra. H. rubidus é encontrado, caracteristicamente, sob um exsudato catarral ou mucoso intenso e pode provocar lesões na mucosa semelhantes às de Ostertagia spp nos ruminantes, exceto nos
que as hemorragias são mais comuns. O desenvolvimento retardado dos estágios larvais na mucosa é análogo ao da Ostertagia. Nas porcas, as larvas inativas podem retomar o desenvolvimento próximo ao parto e podem causar gastrite
grave e, além disso, contaminar o ambiente dos suínos jovens. A oviposição pelas fêmeas de Hyostrongylus é geralmente baixa quando comparada com a do gênero nematoide.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos, além do definhamento, não são óbvios. Os exames nas fezes podem demonstrar os ovos distintos de Physocephalus e Ascarops – ovos pequenos (35 a 40 × 17 a 20 mm) e com casca grossa, contendo uma
larva ativa. Os ovos de Hyostrongylus lembram os dos outros estrôngilos (p. ex., Oesophagostomum) e exigem­se culturas nas fezes para obter larvas infectantes para um diagnóstico diferencial.
Na necropsia, observam­se facilmente os vermes adultos, em especial Physocephalus e Ascarops. Os esfregaços da mucosa para exame microscópico são essenciais para a detecção de Hyostrongylus imaturo.
TRATAMENTO:   Os  benzimidazóis  mais  recentes,  os  pró­benzimidazóis  e  a  ivermectina  são  bastante  efetivos  contra  os  estágios  adulto  e  imaturo  (inclusive  larvas  hipobióticas)  de  Hyostrongylus.  A  ivermectina  também  é  efetiva
contra Ascarops adulto.

SÍNDROMES DA MÁ ASSIMILAÇÃO EM GRANDES ANIMAIS

A má assimilação é um defeito na capacidade do trato gastrintestinal de incorporar nutrientes ao corpo devido à má absorção ou má digestão. A má absorção corresponde a uma falha no transporte de nutrientes do lúmen intestinal para a
corrente sanguínea, enquanto a má digestão compreende uma falha na degradação intraluminal dos constituintes dietéticos devido ao déficit da função pancreática exócrina, dos ácidos biliares ou das enzimas da borda em escova. A má
digestão,  sozinha,  é  uma  causa  rara  de  má­assimilação  em  grandes  animais.  Síndromes  de  má  digestão  são  incomuns  em  equinos,  quando  comparadas  com  outras  espécies  domésticas.  O  pâncreas  do  equino  secreta  apenas  baixas
concentrações de enzimas digestivas e provavelmente exerce um papel pequeno na digestão dos nutrientes. Alguns processos patológicos envolvem tanto má digestão quanto má absorção, como se observa no caso de animais jovens com
deficiência de lactase. Doenças de má absorção são muito mais comuns nos equinos do que as doenças de má digestão.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Várias doenças, por alterarem os mecanismos absortivos normais do intestino delgado, induzem uma síndrome de má absorção. Nos equinos, essas doenças incluem: (1) distúrbios inflamatórios ou infiltrativos –
linfossarcoma difuso no intestino delgado (linfoma alimentar); enterite por infiltrado eosinofílico, linfocítico­plasmocitário ou basofílico; enterocolite epiteliotrópica eosinofílica multissistêmica; enterite granulomatosa (doença intestinal
inflamatória); Lawsonia intracellularis (potros desmamados, ao sobreano); isquemia e lesões intestinais por migração de larvas de Strongylus vulgaris, pequenos estrôngilos ou infecção por Strongyloides westeri (potros); criptosporídios;
inflamação pós­infarto; gastroenteropatia associada a amiloide A; abscedação múltipla intestinal; tuberculose; histoplasmose; infecção intestinal por Rhodococcus equi; enterocolite invasiva (Salmonella spp); (2) anormalidades bioquímicas
ou  genéticas  –  deficiência  de  lactase  adquirida  ou  congênita  (intolerância  à  lactose);  enteropatia  induzida  por  alimento;  defeito  no  transporte  de  monossacarídios;  insuficiência  pancreática  exócrina;  (3)  doenças  que  causam  uma  área
absorção inadequada – atrofia ou lesão vilosidade por infecção viral (rotavírus, coronavírus) ou enterite bacteriana em potros, criptosporídios, ressecção intestinal; (4) distúrbios cardiovasculares – insuficiência cardíaca congestiva; isquemia
intestinal; (5) obstrução linfática – linfossarcoma, linfadenopatia mesentérica, linfangiectasia intestinal, abscedação, obstrução do ducto torácico; (6) variados – induzidas por drogas, intoxicação por metais pesados, deficiência de zinco.
As síndromes de má absorção nos bovinos são pouco documentadas, mas provavelmente ocorrem mais frequentemente nos bezerros com diarreia. As doenças que causam síndrome de má absorção nos ruminantes e suínos incluem vírus
(rotavírus  e  coronavírus),  criptosporídios,  isquemia  local  ou  generalizada,  dieta  pobre  em  proteínas,  ressecção  do  intestino  delgado  (síndrome  do  intestino  curto),  insuficiência  cardíaca  congestiva,  obstrução  linfática,  parasitismo
(tricostrongilose  dos  ovinos  e  bovinos),  tuberculose  e  doença  de  Johne  nos  ruminantes,  e  enteropatia  proliferativa  (Lawsonia  intracellularis)  nos  suínos.  Os  antibióticos  orais  podem  alterar  a  absorção  das  células  epiteliais  e  causar
desequilíbrio na flora do trato gastrintestinal. O tratamento com doses altas de ampicilina, neomicina ou tetraciclina diminui significativamente e retarda a absorção de glicose durante testes de tolerância com glicose oral em bezerros.
Os camelídeos são acometidos por várias das mesmas condições que causam a síndrome de má absorção em ruminantes. O coronavírus é, particularmente, um problema em crias jovens. Eimeria macusaniensis, durante o período pré­
patente ou fase patente da infecção, pode causar perda de peso, hipoproteinemia e debilitação grave em camelídeos jovens ou adultos, quando acometidos.
As síndromes de má digestão são incomuns e pouco compreendidas em grandes animais. Podem ocorrer por alterações na função gástrica ou atividade da microflora ruminal, proliferação bacteriana anormal no intestino delgado ou
diminuição ou falta de enzimas da borda em escova do intestino delgado (deficiência de lactase). As causas menos prováveis incluem alterações na secreção ou excreção de sais biliares (induzidas por drogas ou hepatopatia ou enteropatia)
ou deficiência ou inativação da lipase pancreática. As alterações na concentração de sais biliares podem não prejudicar a digestão no herbívoro adulto, mas podem exacerbar os estados diarreicos em neonatos alimentados com leite. A
ressecção ou o desvio cirúrgico do intestino delgado distal pode facilitar um supercrescimento bacteriano com anormalidades associadas aos sais biliares.
A lactose é um dissacarídio composto por glicose e galactose. As enzimas da borda em escova do intestino delgado dos potros e bezerros contem lactase, que catalisa a degradação da lactose em seus componentes monossacarídicos, que
são então observados. Nas pessoas, a deficiência primária de lactase é herdada como uma característica autossômica recessiva; porém, a sua ocorrência e o seu modo de herança nos grandes animais são pouco documentados. Deficiência de
lactase adquirida ou secundária é mais comum. Isto também é observado nos potros e bezerros como resultado de alterações na mucosa intestinal induzidas por enterites virais, protozoárias e bacterianas. A perda das células epiteliais do
intestino delgado, extremidades vilosidades e de algumas ou todas as células das criptas resultam em graus variados de deficiência de lactase por perda das células epiteliais secretoras de lactase. As alterações morfológicas podem incluir
atrofia vilosidade parcial, hiperplasia de criptas e infiltração na lâmina própria. A diarreia osmótica resultante, em potros e bezerros lactase­deficientes, ocorre devido ao aumento dos nutrientes não digeridos/não absorvidos no intestino
delgado, fermentação bacteriana aumentada, aumento na concentração de partículas osmoticamente ativas e retenção de água e eletrólitos no intestino.
A má absorção é comumente observada nos animais com gastroenteropatias. Pode surgir a partir de distúrbios estruturais ou funcionais do intestino delgado ou ser multifatorial. Ocorre, muitas vezes, má absorção concorrentemente com
perda proteica intestinal. Ambas podem causar perda de nutrientes nas fezes e perda de peso. A má absorção não é sinônimo de diarreia em todas as espécies, embora a diarreia possa constituir uma característica. A função do intestino
grosso  pode  estar  alterada  secundariamente  devido  a  alterações  no  intestino  delgado.  Pode  ocorrer  uma  diarreia  transitória  quando  uma  quantidade  anormal  de  ácidos  biliares,  ácidos  graxos  e  carboidratos  entra  no  intestino  grosso,  no
efluente ileal. Essas substâncias podem potencializar direta ou indiretamente a secreção ou diminuir as taxas de absorção.
A má absorção de nutrientes pode resultar da área de superfície absorção insuficiente, um defeito intrínseco na morfologia da mucosa ou submucosa da parede intestinal ou obstrução linfática. Infecção por rotavírus em animais mais
jovens pode causar destruição das células epiteliais das vilosidades intestinais, que resulta em má digestão por diminuição na atividade das enzimas dissacaridases da borda em escova e em má absorção por diminuição na área da superfície
absorção. Coronavírus e criptosporídios podem resultar em efeitos semelhantes. A diminuição na área da superfície absorção também pode resultar de ressecção do intestino delgado (síndrome do intestino curto) ou atrofia vilosidade por
enterite  granulomatosa.  Doença  infiltrativa  ou  inflamatória  local,  edema  ou  obstrução  linfática  (enterite  granulomatosa,  linfossarcoma)  secundários  a  causas  locais  ou  sistêmicas  podem  interferir  na  capacidade  da  parede  intestinal  em
absorver nutrientes. Absorção ineficiente também pode ocorrer por um aumento na permeabilidade da mucosa causado por lesões celulares. As anormalidades metabólicas podem alterar as células epiteliais e diminuir a energia disponível
para o transporte ativo e a manutenção das proteínas transportadoras ou enzimas da borda em escova. As deficiências congênitas de enzimas que estão normalmente presentes nos microvilosidades não são bem reconhecidas nos animais
domésticos. Deficiências congênitas de enzimas, que estão normalmente presentes nos microvilosidades, não são muito bem reconhecidas em animais domésticos. No entanto, neonatos e ruminantes possuem teores baixos de maltase, e os
ruminantes não possuem sacarase. Na maioria das espécies, os teores de lactase diminuem com a idade.
ACHADOS  CLÍNICOS:   Os  sinais  clínicos  são  variáveis,  dependendo  da  doença  primária  e  da  presença  ou  ausência  de  enteropatia  com  perda  de  proteína  concomitante.  As  síndromes  de  má­assimilação  caracterizam–se  por  equilíbrio
energético negativo, perda de peso e possivelmente concentrações de proteínas séricas baixas. Perda de peso crônica ou redução na taxa de crescimento são os sinais clínicos predominantes. Muitas vezes, a perda intestinal de proteína
também pode estar presente e se demonstrar mais debilitante que a má absorção.
O apetite dos animais acometidos pode permanecer normal, aumentar ou diminuir. Pode ocorrer polifagia devido à falha dos nutrientes assimilados em estimular os centros de saciedade. Mais comumente no caso de má absorção do
intestino delgado, há hipofagia ou anorexia devido ao processo patológico primário causar perda de apetite. As fezes permanecem, com frequência, normais em consistência e volume. Pode haver diarreia, mas esta não é uma característica
consistente. Nos animais adultos, a doença do intestino delgado pode ser de grande magnitude antes da diarreia se desenvolver, pois o cólon pode compensar e absorver a carga de fluido aumentada. Em equinos e ruminantes adultos, a
diarreia indica uma doença de intestino grosso. Nos animais jovens, nos quais a função do cólon ainda não está completamente desenvolvida, a diarreia é vista como doença de intestino delgado e de intestino grosso.
Os  sinais  clínicos  também  podem  incluir  má  condição,  definhamento  muscular,  intolerância  a  exercícios,  atitude  normal  ou  letárgica  e  sede  variável.  Os  sinais  vitais  geralmente  permanecem  normais  até  o  final  da  doença.  Pode­se
observar pirexia com afecções inflamatórias e neoplásicas. Dor abdominal pode resultar de inflamação intestinal, abscessos mesentéricos ou murais, aderências ou obstrução parcial. Podem ocorrer posteriormente ascite, edema dependente
e fraqueza, no processo patológico, especialmente quando há de perda intestinal de proteínas. Lesões cutâneas e oculares, vasculite, artrite, hepatite e doença renal podem indicar reações imunológicas, particularmente no caso de doença
intestinal inflamatória. As lesões cutâneas observadas em caso de dermatose relacionada com a má absorção incluem pelame escasso, áreas desiguais de alopecia e áreas focais de descamação e formação de crostas que se distribuem de
forma simétrica.
Potros e bezerros com intolerância à lactose apresentam comumente diarreia, taxa de crescimento deficiente e aparência debilitada. Alguns animais podem exibir flatulência, desconforto abdominal discreto ou timpanismo após ingestão
de  leite.  Em  animais  jovens  com  deficiência  de  lactase  adquirida,  os  sinais  clínicos  (diarreia,  desidratação,  perda  de  peso)  e  alterações  clinicopatológicas  (acidose,  hipoglicemia,  anormalidades  eletrolíticas)  podem  ser  indistinguíveis
daqueles de enteropatia primária. A condição do animal pode melhorar rapidamente e a diarreia pode se resolver quando se suspende o leite ou se esse é substituído por leite enzimaticamente tratado.
Lesões: A carcaça torna­se magra a emaciada, dependendo da duração e gravidade da doença de má­assimilação. As lesões específicas dependem da doença primária. Os sinais claros de má absorção nem sempre se correlacionam com
alterações macroscópicas e histopatológicas, destacando a importância dos distúrbios funcionais.
DIAGNÓSTICO:  A má absorção do intestino delgado não pode ser determinada por meio de um exame clínico ou de dados laboratoriais rotineiros. As causas mais comuns de perda de peso devem ser excluídas antes de um diagnóstico de
síndrome de má­assimilação poder ser feito. A determinação da doença primária também é necessária para estabelecer um protocolo terapêutico, bem como um prognóstico apropriado.
Uma anamnese minuciosa deve focar a duração da afecção, fatores precipitantes, histórico nutricional, programa rotineiro de desverminação e de cuidados de saúde, doenças anteriores ou concomitantes, bem como o número, idade e
proximidade com outros animais acometidos. Deve­se realizar um exame físico completo correlacionando os achados do exame físico com os sinais clínicos e anamnese. A palpação retal é realizada para determinar a presença de massas
intra­abdominais, linfonodos aumentados de tamanho, aderências, posicionamento ou espessamento anormais de segmentos intestinais, ou anormalidades na artéria mesentérica cranial. Também se devem avaliar rins, bexiga e estruturas
relacionadas.
Hemograma, fibrinogênio e perfil bioquímico sérico auxiliam na determinação do estado geral de saúde do animal; presença de inflamação ou processo infeccioso; envolvimento de sistemas corporais e estados metabólico, eletrolítico e
de proteínas séricas. Também se deve realizar urinálise, abdominocentese e exame de fezes quanto a ovos de parasitos, larvas, protozoários e sangue oculto. Eletroforese das proteínas plasmáticas, pH fecal, cultura e contagem leucocitária
nas fezes e estudos imunológicos também são indicados. A fermentação intracólon de carboidratos mal absorvidos frequentemente reduzirá o pH fecal em potros e bezerros. Uma enteropatia perdedora de proteína pode ser diagnosticada
presuntivamente mediante o descarte de outras causas de perda proteica, como doença renal ou perda para um terceiro espaço (peritônio ou espaço pleural), e por meio da exclusão da possibilidade de uma diminuição na produção de
albumina (p. ex., como no caso de hepatopatia). Radiografia simples e contrastada do intestino pode ser realizável nos potros e pôneis pequenos. Nos grandes animais, pode­se utilizar ultrassonografia para auxiliar a avaliar a espessura da
parede intestinal, assim como a presença de excesso de líquido, massas, aderências posicionamento anormal do intestino na cavidade abdominal, e anormalidades vasculares na artéria mesentérica cranial.
Quando se suspeita de má­assimilação, um teste de absorção de carboidratos pode ser realizado para avaliar a função do intestino delgado. Para que os testes de absorção sejam diagnósticos, a enteropatia deve ser difusa ou afetar a
distribuição e o trânsito do intestino delgado. Uma curva de absorção anormal ou achatada sugere disfunção do intestino delgado. Deve­se realizar gastroscopia para eliminar a presença de lesões no estômago (granulomas, tumores e
úlceras) e duodeno ou de retenção de ingesta antes da realização de testes de absorção, pois podem causar um atraso ou um achatamento na curva de absorção.
Embora  os  testes  de  absorção  possam  indicar  a  presença  de  má­assimilação,  um  diagnóstico  etiológico  requer  biopsia  da  mucosa  intestinal  e  possivelmente  de  linfonodo.  Em  alguns  casos,  a  biopsia  retal  pode  revelar  infiltração
inflamatória focal ou difusa. A cultura da biopsia e o exame de fezes quanto a leucócitos e células epiteliais podem auxiliar na confirmação da presença de salmonelas ou de outros microrganismos invasores. Em muitos casos, exige­se
laparoscopia  ou  celiotomia  exploratória  para  se  obter  uma  biopsia  intestinal  ou  de  linfonodo.  Uma  cirurgia  pode  não  ser  aconselhável  no  caso  de  um  animal  debilitado,  pois  a  cicatrização do  ferimento  é  deficiente  e  deiscência  é  um
problema potencial. Se realizável, deve­se obter biopsias intestinais e de linfonodos para cultura, histopatologia, enzimologia e imunologia. Devido ao risco e ao custo da obtenção de amostras teciduais apropriadas, a síndrome de má­
assimilação é presuntivamente diagnosticada com o auxílio de testes de absorção.
Os testes de absorção clinicamente aplicáveis incluem aqueles de absorção de D­glicose e D­xilose. Esses testes podem ser úteis na avaliação da função do intestino delgado nos bezerros pré­ruminantes, potros e equinos. Os estudos de
tolerância com carboidratos orais não são úteis nos ruminantes, pois o açúcar é degradado no rúmen. O teste de absorção de D­glicose possui as vantagens de ser fácil e barato, e encontram–se disponíveis métodos para determinar a
glicemia na maioria dos laboratórios clínicos. A principal desvantagem é que os resultados são influenciados pela captação celular e pelo metabolismo de glicose, bem como pela absorção intestinal. O teste de absorção de D­xilose mede
mais diretamente a capacidade absorção intestinal e não é influenciado por fatores endógenos e pela atividade enzimática intestinal. No entanto, a D­xilose é mais cara, e a disponibilidade de xilose e de laboratórios que podem realizar suas
determinações plasmáticas são limitadas.
Glicose ou galactose podem inibir a absorção de D­xilose; portanto, torna­se necessário jejum antes de realizar o teste. Os protocolos de ambos os testes requerem jejum prolongado, que pode ser prejudicial para potros e bezerros jovens
e doentes. Os resultados de ambos os testes também são acometidos pela velocidade de esvaziamento gástrico, tempo de trânsito do intestino delgado e dieta do animal e duração do período de jejum antes do teste. A forma da curva de
absorção da D­xilose é influenciada pelo clearance renal, hipoxia, anemia, infecções bacterianas sistêmicas e concentração de IgG nos potros. A idade do animal que está sendo avaliado também afeta a absorção e a digestão de glicose,
lactose e xilose. Portanto, a diferença de idade entre os animais­controle e os acometidos deve ser pequena se não há valores de referência disponíveis no grupo etário avaliado.
Um pico retardado na curva de absorção dos testes de D­glicose e D­xilose pode resultar de um atraso no esvaziamento gástrico resultante de hipertonicidade da mistura de glicose ou xilose, agitação, dor ou retenção de conteúdo gástrico
ou alterações no tempo de trânsito gastrintestinal e motilidade ou obstrução parcial. Pode­se observar uma curva de absorção achatada em um equino com capacidade absorção normal por diminuição transitória no fluxo sanguíneo intestinal
ou bactérias no lúmen do intestino delgado que metabolizam o açúcar­teste. A xilose rapidamente se equilibra com muitos fluidos corporais (p. ex., ascite), o que diminui a concentração sanguínea de xilose, conferindo uma curva achatada.
As indicações para um teste de absorção de D­xilose oral nos potros ou bezerros incluem diarreia persistente não atribuída a microrganismos infecciosos, crescimento deficiente apesar do consumo normal e outros sinais de má digestão
(episódios repetidos de cólica gasosa, timpanismo e íleo adinâmico).
Teste de Absorção de D­xilose: Esse teste mede a capacidade absorção da mucosa do intestino delgado, pois os enterócitos funcionais transportam ativamente a xilose por meio da mucosa para a corrente sanguínea. Uma absorção subnormal
sustenta o diagnóstico de má absorção. Nos equinos normais, a idade e a dieta também afetam a absorção de xilose. Os potros < 3 meses de idade apresentam um pico de concentração maior de xilose pós­administração que os adultos. Os
equinos adultos mantidos com uma dieta rica em volumoso e pobre em energia apresentam um pico de concentração maior de xilose pós–administração que os equinos alimentados com uma dieta rica em energia. A privação de alimento
pode alterar a absorção de D­xilose nos equinos sem doença evidente do trato gastrintestinal. Esse efeito deve ser considerado quando se interpretam resultados em animais anoréticos independentemente da causa.
D­xilose (0,5 a 1 g/kg de uma solução 10%) é administrada via sonda nasogástrica para um equino em jejum de 18 a 24 h. Amostras heparinizadas de sangue venoso são coletadas antes da administração de xilose (momento 0) e em
intervalos de 30 min por 4 h (± 6 h de amostragem). Os valores máximos esperados (20 a 25 mg/dl) devem ocorrer 60 a 120 min após a administração. A curva normal deve ter forma de sino ou de V invertido, com um pico definível
da concentração de xilose plasmática 1 a 2 h após a administração. Em animais normais, os picos plasmáticos devem ser = 15 mg/dl, acima dos valores basais.
Teste de Absorção de D­glicose: As curvas de absorção de glicose são mais altas em equinos alimentados com pastagem do que naqueles alimentados com ração mais rica em energia. Nos equinos com ração rica em concentrado, observam­se
valores de pico mais baixos. A duração do jejum pré­teste influencia a curva de absorção. O jejum prolongado pode retardar ou diminuir a concentração máxima de glicose, consequentemente conferindo um resultado falso­positivo. Em
dois estudos, > 90% dos equinos adultos com evidência de má absorção “total” de glicose apresentavam lesões infiltrativas graves no intestino delgado. A maioria dos equinos (18/25) classificados com má absorção “parcial” também
possuíam alterações patológicas óbvias no intestino delgado.
O desempenho do teste de absorção de D­glicose é semelhante ao da absorção da D­xilose, exceto quando as amostras são coletadas em tubos com fluoreto de sódio. Nos equinos normais, a glicemia deve atingir seu pico em 90 a 120
min após a administração. Este pico deve ser > 85% dos teores basais de glicose. Declaradamente, a má absorção completa é definida por um pico < 15% das concentrações basais; a má absorção parcial é definida por um pico de 15 a 85%
dos valores basais. Uma das principais desvantagens do teste de absorção de glicose é que, se utilizando o protocolo convencional, a amostragem torna­se superior a 6 h. Um protocolo modificado descrito requer apenas duas amostras para
o teste no tempo 0 e 120 min após administração. Essa modificação não alterou a confiança do resultado do teste.
Teste de Tolerância à Lactose Oral: O diagnóstico de deficiência adquirida de lactase é geralmente presuntivo e baseia­se na anamnese, sinais clínicos e confirmação da presença de patógenos associados. O diagnóstico definitivo pode ser feito
por meio do teste de tolerância à lactose oral. A lactose é hidrolisada no interior da borda em escova dos enterócitos do intestino delgado, por meio da lactase, nos constituintes D­glicose e galactose, antes de ser absorvida. O teste de
tolerância à lactose oral é direcionado especificamente em avaliar se ocorre atividade de lactase ou não. Os equinos adultos (> 3 anos de idade) são intolerantes à lactose, e o teste é inadequado para os ruminantes. O teste de tolerância à
lactose oral tem valor na avaliação dos potros jovens e bezerros pré­ruminantes com diarreia ou crescimento deficiente. A intolerância à lactose já foi registrada em potros, bezerros e crianças.
O teste de tolerância à lactose oral não distingue má digestão de má absorção e requer jejum por várias horas. Pode­se tentar uma alimentação com leite enzimaticamente tratado nos animais suspeitos de serem intolerantes à lactose antes
de submetê­los ao jejum prolongado (12 a 18 h) exigido antes de se realizar esse teste. Antes de se realizar o teste de intolerância a lactose, grãos e feno não devem ser oferecidos a éguas e potros por 18 h. Os potros devem ser impedidos de
mamar (amordaçados) por = 4 h antes da administração de 1 g/kg de uma solução a 20% via sonda nasogástrica; a mordaça deve ser mantida durante o teste. As amostras de sangue devem ser coletadas em tubos com oxalato de flúor para a
determinação da glicemia imediatamente antes da administração, aos 30 min e em intervalos de 30 min, por 3 a 4 h após a administração. As concentrações de glicose sanguínea devem ser o dobro dos valores basais em 60 a 90 min da
administração  da  lactose.  As  concentrações  máximas  de  glicose  devem  ser  =  35  mg/dl  que  os  valores  basais  em  potros  saudáveis.  Resultados  anormais  sugestivos  de  intolerância  à  lactose  incluem  um  atraso  no,  prolongamento  do  ou
ausência de aumento na glicemia, comparada com os valores basais.
A ausência de um aumento apropriado na glicose sanguínea deve ser consequente de má digestão ou má absorção. Portanto, se o teste de tolerância à lactose é anormal, um teste de absorção de D­glicose ou D­xilose deve ser realizado
para determinar se má absorção ou má digestão, sozinha, é o problema. Hipersensibilidade à caseína distingue­se da intolerância à lactose por avaliação da resposta do animal ao leite enzimaticamente tratado ou não. Confirmação definitiva
de deficiência de lactase faz–se por meio da mensuração direta da atividade da lactase na mucosa do tecido intestinal. No entanto, isso é raramente empreendido na situação clínica, pois se exige uma biopsia cirúrgica da mucosa.
Um teste respiratório de hidrogênio foi descrito para a detecção de má absorção de carboidrato em equinos. Em um estudo clínico, os equinos doentes mostraram concentrações maiores de hidrogênio no ar expirado, em jejum, do que os
equinos normais. A utilidade deste teste na prática clínica ainda está para ser determinada.
TRATAMENTO:  A  causa  primária  deve  ser  determinada  antes  de  se  iniciar  a  terapia  específica.  Ainda  não  se  encontra  disponível  uma  terapia  específica  para  a  maioria  das  causas  de  má­assimilação,  exceto  quanto  a  lesões  por  lesões
parasitários. Vermífugos larvicidas com ivermectina, moxidectina ou altas doses de febendazol podem ser empregados. Drogas anti­inflamatórias (p. ex., AINE, corticosteroides) também podem ser úteis para reduzir a resposta inflamatória
no intestino afetado.
Má absorção e perda de peso crônica em equinos podem seguir com enterite viral. A descamação das extremidades vilosidades com perda das células epiteliais intestinais resulta em superfície de absorção intestinal insuficiente para uma
adequada absorção de nutrientes pelo intestino. Cuidados de suporte e facilitação na absorção de nutrientes no intestino devem ser promovidos até que o epitélio intestinal se restabeleça e novas células vilosidades sejam produzidas. A
regeneração e a recuperação da superfície intestinal absorção pode levar semanas a meses em casos mais graves.
Os bezerros e os potros com deficiência adquirida de lactase após doença diarreica frequentemente respondem bem a uma terapia de suporte (correção das anormalidades ácido­básicas, eletrolíticas e glicose) e são alimentados com leite
enzimaticamente tratado até que a mucosa do intestino delgado se regenere. Os potros e os bezerros que tolerarem isso, devem ser alimentados com uma quantidade pequena de volumoso ou grãos de alta qualidade para auxiliar a preencher
as suas exigências energéticas. Embora a nutrição enteral deva ser continuada sempre que possível, potros e bezerros jovens que não tolerarem a alimentação com leite ou leite enzimaticamente tratado podem se beneficiar da interrupção da
alimentação com leite por um curto período (< 24 h). Esses animais necessitam de fontes alternativas de energia e nutrientes tais como alimentações a curto prazo (= 24 h) de soluções eletrolíticas contendo glicose ou, em casos mais graves,
nutrição parenteral parcial ou total. Mudanças na dieta para as baseadas em soja, sucedâneo de leite sem lactose e desmame precoce são prudentes para animais com intolerância à lactose não responsiva.
O tratamento da doença intestinal inflamatória em equinos foi tentado, mas muitas vezes foi mal sucedido, mesmo com a administração agressiva de corticosteroides. Sulfassalazina e isoniazida são recomendadas, mas suas utilidades não
estão comprovadas. De modo semelhante, o uso do dimetilsulfóxido no tratamento da amiloidose intestinal é desconhecido. Os animais com supercrescimento bacteriano anaeróbico ou aeróbico como um problema podem responder a uma
administração antimicrobiana. A penetração adequada de antimicrobianos nas lesões intestinais inflamatórias (p. ex., Rhodococcus equi nos potros e doença de Johne nos ruminantes) é duvidosa. O tratamento bem­sucedido de Lawsonia
intracellularis em  potros  foi  alcançado  com  a  administração  prolongada  de  antimicrobianos  (eritromicina,  azitromicina,  claritromicina,  cloranfenicol,  oxitetraciclina,  doxiciclina)  e  tratamento  de  suporte  agressivo  (fluidos,  plasma)  de
acordo com a condição clínica do animal. As infecções por Eimeria macusaniensis,  nos  camelídeos  acometidos,  podem  ser  tratadas  com  sucesso  se  diagnosticadas  precocemente.  O  tratamento,  atualmente,  envolve  a  administração  de
amprólio e/ou ponazurila juntamente com o tratamento suporte apropriado.
Os equinos com má absorção devido a um processo patológico ou após ressecção do intestino delgado devem ser alimentados com uma dieta que otimize a digestão dos alimentos no intestino grosso. A dieta deve propiciar proteínas,
carboidratos, gorduras e vitaminas hidrossolúveis facilmente absorvidos e manter o equilíbrio mineral. Aumento na proporção de concentrado em relação à forragem diminui a digestão dos alimentos no intestino grosso e deve ser evitado.
Os equinos beneficiam­se de uma dieta a base de fibras. Para potencializar a digestão no intestino grosso, deve­se oferecer volumosos facilmente fermentáveis (p. ex., alfafa). As fibras de alta qualidade, metabolizadas no ceco e cólon em
ácidos graxos voláteis, podem compensar parcialmente as perdas no intestino delgado. Nos animais jovens, a dieta pode ser suplementada com proteínas do leite, se não se encontrar presente deficiência de lactase. Gorduras podem ser
acrescentadas à dieta para potencializar a ingestão de calorias. Pode­se precisar suplementar cálcio, magnésio, fosfato, zinco, cobre e ferro, pois, nos equinos, eles são absorvidos apenas no intestino delgado. As vitaminas hidrossolúveis
(especialmente a vitamina B12) e as lipossolúveis devem ser suplementadas, via parenteral, conforme necessário. Deve­se evitar uma suplementação excessiva, que poderia levar à intoxicação.
Os  animais  que  não  comerem  necessitarão  ser  alimentados  forçosamente  com  dieta  líquida  via  sonda  nasogástrica.  O  equino  deve  ser  alimentado  com  refeições  pequenas  e  frequentes  para  tirar  vantagem  da  capacidade  absorção
remanescente e limitada do intestino delgado sem sobrecarregá­lo. Os bezerros pré­ruminantes que são repetidamente alimentados com sonda podem desenvolver acidose ruminal devido a deposição de material alimentar no interior do
rúmen em vez do abomaso. A alimentação IV, utilizando nutrição parenteral parcial ou total, pode se tornar necessária para os animais que se recusam a comer ou para os que não conseguem tolerar uma alimentação forçada. No entanto, a
nutrição parenteral é cara e difícil de ser continuada, a longo prazo.
PROGNÓSTICO:  Esforços devem ser realizados para determinar um diagnóstico etiológico quando se confirma uma má­assimilação, de forma que se possa conferir um prognóstico preciso e prescrever uma terapia apropriada. A maioria das
afecções que causa má­assimilação em grandes animais adultos justifica um pobre prognóstico, e o tratamento, comumente, é mal sucedido. No entanto, uma infestação parasitária intestinal ou seu suprimento sanguíneo podem responder a
terapia anti­helmíntica. Ocasionalmente, uma infiltração não neoplásica no intestino pode responder ao uso de corticosteroide, mas a resposta pode ser transitória em alguns casos. Bezerros, potros e crianças com deficiência de lactase
geralmente respondem bem a terapia de suporte e manejo dietético. O prognóstico de equinos com má absorção devido a uma doença intestinal inflamatória é pobre; a maioria dos casos relatados foram fatais.
ÚLCERAS GASTRINTESTINAIS EM GRANDES ANIMAIS

As úlceras gástricas são importantes em equinos adultos, potros e suínos. As úlceras de abomaso (p. 289) em bovinos adultos e nos bezerros têm importância crescente.

Úlceras GÁstricas em Equinos (Síndrome da úlcera gástrica em equinos)
As úlceras gástricas (síndrome da úlcera gástrica equina [SUGE]) são comuns em equinos e potros. Esta síndrome está intimamente relacionada com cavalos envolvidos em treinamento atlético, a alterações no alojamento ou de interação
social e a doenças. A prevalência em cavalos de corrida não medicados em treinamento ativo é de, no mínimo, 90%; em animais não atletas, é superior a 60%. Potros neonatos apresentam risco significativo de desenvolvimento de úlceras
pépticas perfurantes até que tenham várias semanas de vida, pois a mucosa gástrica não está completamente desenvolvida ao nascimento. Embora possa ocorrer cicatrização espontânea de úlceras pépticas, caso o cavalo seja mantido em
situações que estimulam SUGE, é pouco provável que as lesões cicatrizem sem tratamento.
A SUGE envolve eventos fisiopatológicos inflamatórios e lesões de mucosa, envolvendo tecidos do esôfago distal, estômago e entrada do duodeno. A casuística em exame endoscópico indica que cerca de 90% destas lesões se instalam
na mucosa escamosa não glandular do estômago, principalmente na curvatura menor, próxima à margem pregueada. Entretanto, porções significativas da mucosa escamosa ao longo da curvatura maior e até o fundo gástrico também podem
estar envolvidas, juntamente com lesões no antro e no piloro. Úlcera duodenal em equinos e potros é considerada parte da SUGE e, desta forma, um distúrbio péptico (induzido por ácido). É possível notar úlcera, perfuração e estenose
duodenal; não se sabe se estes problemas ocorrem apenas como resultado de enterite (duodenite) ou se há participação de fatores pépticos. Entretanto, quando ocorre estenose, geralmente há úlceras gástricas e esofágicas graves secundárias
ao retardamento do esvaziamento estomacal.
ETIOLOGIA:  As úlceras de mucosa escamosa não glandular estão associadas a lesões diretas repetidas causadas por fluido com pH muito baixo, normalmente presente na região glandular do estômago. Ocorre aumento da pressão abdominal
(associado  ao  exercício),  o  que  colapsa  o  estômago  e  pressiona  o  conteúdo  de  suco  gástrico  para  cima.  A  parte  mais  líquida  (e  muito  ácida)  da  porção  inferior  do  estômago  entra  em  contato  com  a  mucosa  escamosa  não  glandular,
provocando inflamação e, possivelmente, erosões em graus variáveis.
As causas de úlceras na mucosa glandular do estômago não estão muito bem definidas. Sabe­se que o uso de AINE não seletivos reduz o fluxo sanguíneo ao trato GI, ocasionando diminuição da produção da matriz mucobicarbonato pela
mucosa glandular gástrica e resultando em úlcera. Entretanto, isso não é um achado consistente. Além disso, foram realizadas tentativas para isolar e/ou correlacionar a presença do microrganismo Helicobacter spp do estômago de equinos,
com e sem gastrite e úlceras. Os resultados destes estudos foram confusos ou negativos, e a participação destes microrganismos na ocorrência de úlceras gástricas glandulares em equinos não foi comprovada.
ACHADOS CLÍNICOS:  A maioria dos potros com úlcera gástrica não apresenta sinais clínicos. Os sintomas se tornam evidentes quando a úlcera é difusa ou grave. Diarreia, bruxismo, amamentação deficiente, decúbito dorsal e ptialismo são
os sinais clássicos de úlcera gástrica em potros. Estes sinais são vagos e inespecíficos para úlcera gástrica. Na verdade, ptialismo é um sintoma de esofagite que, na maioria dos potros, é secundária à obstrução do fluxo gástrico e ao refluxo
gastresofágico.
Outras  causas,  incluindo  obstrução  esofágica  e  infecção  por  Candida,  devem  ser  consideradas.  É  importante  lembrar  que  quando  um  potro  apresenta  sinais  clínicos,  as  úlceras  são  graves  e  devem  ser  diagnosticadas  e  tratadas
imediatamente. Esporadicamente nota­se perfuração gástrica súbita sem sinal prévio, em potros.
Equinos adultos com úlcera manifestam sintomas inespecíficos que podem incluir desconforto abdominal (cólica), diminuição do apetite, perda de peso discreta, condição corporal ruim e mudanças de comportamento. Equinos com dor
abdominal intensa ou com cólica podem apresentar úlcera gástrica, mas é pouco provável que esta seja a causa primária da dor abdominal. Não se constatou correlação significativa entre a extensão da úlcera e a gravidade dos sinais
clínicos.
As  complicações  relacionadas  com  a  úlcera  gástrica  são  mais  frequentes  e  graves  em  potros  e  incluem  perfuração,  retardo  no  esvaziamento  gástrico,  refluxo  gastresofágico  e  esofagite,  além  de  megaesôfago  secundário  a  refluxo
gastresofágico crônico. As úlceras em duodeno proximal ou no piloro podem causar fibrose e estenose. A estenose duodenal e pilórica pode ocasionar retardo no esvaziamento gástrico em potros e equinos adultos. Em casos raros, a úlcera
gástrica grave causa fibrose e estenose do estômago.
DIAGNÓSTICO:   Tanto  sinais  clínicos  quanto  testes  laboratoriais  são  inespecíficos  para  úlcera  gástrica  e  anormalidades  nestes  exames  não  excluem  a  possibilidade  de  existir  outro  distúrbio.  Úlceras  gástricas  podem  se  instalar
secundariamente ao estresse decorrente de doenças em outros órgãos ou de hospitalização e sistema de confinamento. Endoscopia e visualização de úlceras em um estômago vazio é o único método de diagnóstico definitivo. Os endoscópios
com fontes de luz, cujos comprimentos são variáveis, podem ser utilizados para visualizar com maior facilidade os estágios inflamatórios desta doença antes da lesão ao epitélio em decorrência da úlcera. Pode­se inferir um diagnóstico
presuntivo pela melhora dos sinais clínicos vários dias após o tratamento com fármacos que sabidamente causam aumento efetivo do pH gástrico e permitem a cicatrização da mucosa gástrica.
TRATAMENTO:  A  redução  da  acidez  gástrica  e  a  manutenção  do  pH  em  4  a  5  são  os  principais  objetivos  do  tratamento.  Estudos  avaliaram  o  uso  de  protetores  de  mucosa,  antiácidos,  com  antagonistas  de  receptor  de  histamina  tipo  2
(cimetidina  e  ranitidina),  e  o  inibidor  da  bomba  de  prótons,  o  omeprazol,  em  um  marcador,  com  intuito  de  auxiliar  na  passagem  do  conteúdo  do  estômago  para  o  intestino  delgado,  para  absorção.  Destes,  o  omeprazol  foi  o  único
medicamento  que  propiciou  de  forma  consistente  a  cicatrização  de  úlceras  gástricas  em  equinos  que  continuaram  seus  treinamentos  normais.  Este  é  o  único  fármaco  aprovado  pela  FDA  para  tratamento  (4  mg/kg,  VO,  1  vez/dia)  ou
prevenção (1 mg/kg, VO, 1 vez/dia) de úlceras gástricas em equinos. O sucralfato adere­se à mucosa glandular gástrica e pode promover cicatrização, embora não haja dados disponíveis que sustentem sua eficácia no tratamento de úlceras
gástricas  em  equinos  e  potros.  Logo,  seu  uso  é  questionável  nestes  animais.  Os  antiácidos  ainda  não  tiveram  eficácia  comprovada  na  cicatrização,  tampouco  na  prevenção  de  úlceras  gástricas.  Estes  devem  ser  administrados  em  dose
relativamente alta, a cada 2 h, para neutralizar o suco gástrico. A ranitidina (6,6 mg/kg, VO, 3 vezes/dia) é efetiva na cicatrização de úlceras gástricas, quando os equinos são afastados do tratamento. Estudos sugerem que a cimetidina não é
efetiva.

ÚLCERAS GÁSTRICAS EM SUÍNOS
As úlceras acometem a parte esofágica dos suínos e causam episódios esporádicos de hemorragia gástrica aguda, resultando em morte ou crescimento retardado devido à úlcera crônica.
ETIOLOGIA:  As causas específicas não são conhecidas. As úlceras acometem suínos de todas as idades, mas são mais comuns naqueles confinados em fase de crescimento (45 a 90 kg), alimentados com rações peletizadas ou finamente
trituradas  e,  também,  nos  suínos  alimentados  com  grande  quantidade  de  leite  desnatado  ou  soro  lácteo.  Acredita­se  que  promotores  de  hiperacidez  possam  contribuir  para  o  desenvolvimento  de  úlceras.  A  combinação  de  alimentos
finamente triturados, transporte, clima quente, privação de alimento ou água e mistura de suínos não familiares resulta em aumento significativo da ocorrência de úlceras gástricas em suínos em fase de crescimento rápido. A variabilidade
no  consumo  alimentar  diário  devido  à  enfermidade  sistêmica,  particularmente  pneumonia,  também  resulta  em  maior  prevalência  de  úlceras.  Esta  enfermidade  é  especialmente  importante  em  suínos  confinados  destinados  ao  abate  em
frigoríficos, principalmente naqueles transportados por longa distância.
ACHADOS CLÍNICOS:  Na forma hiperaguda, os suínos morrem rapidamente e são encontrados mortos, apresentando palidez como único sinal clínico. Na forma aguda, a hemorragia provoca anorexia, fraqueza, anemia e fezes escurecidas a
negras; o animal pode morrer em horas ou dias. Na forma crônica, são característicos sinais de definhamento, anemia e fezes escurecidas a negras; o suíno pode sobreviver por várias semanas. Os suínos com a forma subclínica podem não
atingir  a  maturidade  no  momento  esperado;  nestes  animais,  geralmente  a  úlcera  cicatriza  e  resta  uma  cicatriz.  Em  alguns  rebanhos,  até  90%  dos  suínos  podem  ser  acometidos;  em  outros,  a  incidência  é  esporádica.  Nos  achados  em
frigoríficos,  a  prevalência  de  úlceras  pode  ser  bastante  alta  em  suínos  que  cresceram  normalmente,  embora  em  alguns  animais  a  lesão  tenha  se  desenvolvido  durante  o  transporte.  A  doença  clínica  aparentemente  ocorre  apenas  após
hemorragia da úlcera.
Lesões: A lesão terminal típica é verificada na mucosa gástrica, próximo à abertura esofágica, em uma área retangular de epitélio escamoso, não glandular, brilhante e branco. É comum notar uma lesão em forma de cratera = 2,5 a 5 cm de
diâmetro, circundando a  entrada  do  esôfago.  A  lesão  se  apresenta  como  uma  área  profunda  amarelo­clara  ou  acinzentada  e  pode  conter  coágulos  de  sangue  ou  restos  celulares.  Na  hemorragia  aguda,  o  estômago  e  o  intestino  delgado
superior contêm sangue escuro. As lesões iniciais caracterizam­se por hiperqueratose e paraqueratose do epitélio escamoso na região da entrada do esôfago, no interior do estômago. Posteriormente, a lesão proliferativa progride para erosão
e origina úlcera. A úlcera cicatrizada se parece com uma cicatriz estrelada.
DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO:  A constatação, em uma baia, de 1 ou 2 suínos com anorexia e apatia, perda de peso, anemia, fezes escura e, às vezes, dispneia, sugere úlcera gástrica, bem como a morte súbita de um animal aparentemente
saudável. Os diagnósticos diferenciais incluem hemorragia intestinal, eperitrozoonose, infecção por Hyostrongylus rubidus e enteropatia suína.
Atualmente não há tratamento economicamente viável disponível. Cuidados paliativos – remoção do suíno enfermo da baia e dieta com alimentos fibrosos e grosseiros – podem ser uma tentativa. Deve­se considerar o abate precoce dos
suínos acometidos. O controle de doença respiratória crônica é importante. O fornecimento de alimentos, preferivelmente peletizados, com tamanho da partícula = 600 a 700 μm de diâmetro, é valioso, mas pode surtir efeito negativo na
conversão alimentar. É útil o oferecimento estratégico destas dietas durante os estágios de produção em que o risco da doença é alto.

DOENÇAS DA CAVIDADE BUCAL DE PEQUENOS ANIMAIS

Para uma discussão sobre doenças do desenvolvimento da cavidade bucal veja p. 165. Para complexo granuloma eosinofílico, ver p. 1040.
A  principal  e  mais  importante  função  da  boca  é  prender  e  introduzir  o  alimento  ao  trato  digestório.  Algumas  das  funções  adicionais  incluem  comunicação  e  interação  social,  vocalização,  proteção,  regulação  da  temperatura
(particularmente nos cães) e pegar objetos. A última é muito importante para os animais atletas (Retriever, cães militares e policiais). À semelhança de outras áreas do trato alimentar, a cavidade bucal, em um estado de saúde normal,
alberga grande e diversa população de bactérias que vivem, principalmente, no biofilme. Ao contrário de outras áreas do corpo, a cavidade bucal também contém superfícies não vitais (esmalte dos dentes) desprovidas de sistema imune de
defesa local, sem habilidade de regeneração de suas superfícies por meio de renovação celular. A gengiva e a mucosa apresentam excelente suprimento vascular e a gengiva intimamente aderida protege o osso adjacente de traumatismo,
lesão térmica e invasão bacteriana.
A preensão de alimentos exige uma interação complexa dos músculos da mastigação, dentes, língua e músculos faringianos. Quando qualquer um desses componentes está comprometido por doença ou traumatismo, podem ocorrer má
nutrição e desidratação.
Um exame completo da cavidade bucal deve ser parte do exame físico, pois doenças bucais são mais efetivamente tratadas quando se faz um diagnóstico precoce. Infelizmente, muitos problemas permanecem ocultos na boca, até que
progridam para um estágio avançado.

 DISTÚRBIOS SALIVARES

Fístula Salivar
A fístula salivar é uma afecção incomum que pode resultar de traumatismo de glândulas salivares mandibular, zigomática ou sublingual. Os ferimentos de glândula parótida, mais provavelmente, desenvolvem uma fístula. Uma lesão no
ducto parotídeo pode resultar de ferimento traumático (p. ex., mordedura), drenagem de abscesso ou cirurgia anterior na área, com ruptura iatrogênica. O fluxo de saliva constante evita a cicatrização e instala–se uma fístula.
Histórico de lesão na região glandular, detecção de fístula e aspecto da secreção são característicos. Uma fístula salivar deve ser diferenciada de um seio drenante (por corpo estranho perfurante ou doença endodôntica de um dente
mandibular) no pescoço ou de seios decorrentes de defeitos congênitos. A ligadura cirúrgica do ducto resulta geralmente em resolução, mas a excisão da glândula associada pode ser necessária.

Hipersialose Responsiva ao Fenobarbital (Epilepsia límbica)
Os  sinais  clínicos  incluem  aumento  da  glândula  salivar,  que  pode  estar  dolorida  à  palpação,  perda  de  peso,  ptialismo,  mímica  de  vômito  e  vômito.  O  exame  das  amostras  dos  aspirados  com  agulha  fina  ou  de  biopsias  não  revelam
anormalidades. O diagnóstico exige a exclusão de outras causas de aumento de volume e resposta ao tratamento com fenobarbital na dose de 5 mg/kg IM, 2 vezes/dia, durante 4 dias, e depois 2 mg/kg, PO, 2 vezes/dia. A terapia com
fenobarbital pode ser suspensa, em alguns animais, dentro de 6 meses. Recidiva pode ocorrer.

Mucocele Salivar
A mucocele salivar (ou sialocele) é um acúmulo de saliva mucoide no tecido subcutâneo após lesões no ducto ou glândula salivares. Trata­se do distúrbio da glândula salivar mais comum em cães. Embora se possa afetar qualquer uma das
glândulas salivares, as glândulas sublingual e mandibular são as mais comumente envolvidas. Geralmente, a saliva acumula­se na área cervical intermandibular ou cranial (mucocele cervical). Ela também pode se acumular nos tecidos
sublinguais no assoalho da boca (rânula). Um local menos comum é na parede faringiana.
A  causa  pode  ser  uma  obstrução  traumática  ou  inflamatória  ou  ruptura  do  ducto  das  glândulas  salivares  sublingual,  mandibular,  parótida  ou  zigomática.  Geralmente,  a  causa  exata  não  é  determinada,  mas  uma  predisposição  de
desenvolvimento foi sugerida nos cães.
Os sinais dependem do local do acúmulo de saliva. Na fase aguda do acúmulo salivar, a resposta inflamatória resulta em inchaço e dor na área acometida. Frequentemente, esse estágio não é observado pelo proprietário, e o primeiro sinal
notado pode ser uma massa flutuante e não dolorida que aumenta de volume lentamente e ocorre quase sempre na região cervical. Uma rânula pode não ser notada, até que ela seja lesionada e sangre. Uma mucocele faringiana pode obstruir
as vias respiratórias e resultar em desconforto respiratório moderado a grave.
Uma mucocele é caracterizada como uma massa macia, flutuante e indolor, que deve ser diferenciada de abscessos, tumores e outros cistos de retenção no pescoço. Dor ou febre podem estar presentes se a mucocele infeccionar. Uma
mucocele salivar geralmente pode ser diagnosticada por meio de palpação e aspiração da saliva viscosa tingida de sangue ou dourada, característica. Geralmente, a palpação cuidadosa, com o animal em decúbito dorsal, pode determinar o
lado afetado; se não conseguir fazê­la, uma sialografia pode ser útil.
Recomenda­se cirurgia para remover a glândula e os ductos salivares danificados. As mucoceles cervicais podem ser tratadas com drenagem periódica se cirurgia não é uma opção. Drenagem, marsupialização ou remoção da glândula são
recomendadas para o tratamento das rânulas. Recomenda­se a remoção completa da glândula ou ducto no caso de mucocele faringiana, para evitar futura obstrução de via respiratória, com risco à vida do animal.

Necrose da Glândula Salivar em Cães
Uma afecção da glândula salivar mais grave que a sialoadenite, a necrose da glândula salivar caracteriza­se por uma glândula firme, aumentada de tamanho e dolorosa. Muitas vezes, é acompanhada de mímica de vômito e regurgitação.
Muitos cães acometidos apresentam patologias esofágicas associadas como megaesôfago, divertículo esofágico ou esofagite. Nesses casos, a resolução do aumento da glândula salivar rapidamente segue o tratamento bem­sucedido das
lesões esofágicas. Uma citologia aspirativa com agulha fina ou exame histopatológico do tecido pode revelar hiperplasia dos ductos, inflamação ou ausência de anormalidades.

Ptialismo
Ptialismo, ou hipersialose, é uma salivação causada pela hipersecreção de saliva. O pseudoptialismo é uma salivação secundária a anormalidades de conformação ou distúrbios na deglutição em animais que produzem quantidade normal de
saliva. Ambos são discutidos conjuntamente, como ptialismo.
O ptialismo pode resultar de: 1) medicamentos, toxinas ou produtos tóxicos, por exemplo, organofosforados; 2) irritação local ou inflamação associada a estomatite, glossite (especialmente nos gatos), corpos estranhos bucais, neoplasias,
lesões ou outros defeitos na mucosa; 3) doenças infecciosas (p. ex., a raiva), a forma neurológica da cinomose ou outros distúrbios convulsivos; 4) cinetose, medo, nervosismo ou excitação; 5) relutância para engolir ou interferência com a
deglutição (irritação do esôfago, obstrução esofágica por patologia regional, ou estimulação dos receptores gastrintestinais causada por gastrite ou enterite; 6) lesões sublinguais (corpo estranho linear ou tumor); 7) tonsilite; 8) administração
de medicamentos (particularmente nos gatos); 9) defeitos de conformação; 10) distúrbios metabólicos (encefalopatia hepática [especialmente em gatos]) ou uremia; 11) abscesso, obstrução inflamatória ou outra patologia da glândula salivar.
A possibilidade de raiva deve ser eliminada antes do exame da cavidade bucal. A causa primária, local ou sistêmica, deve ser determinada e tratada. A dermatite úmida aguda dos lábios e da face pode se desenvolver se a pele não é
mantida seca o suficiente. Limpeza com solução de clorexidine diluída ou peróxido de benzoíla pode ser útil.

Sialoadenite
Sialoadenite ou inflamação a glândula salivar raramente é um problema clínico em cães e gatos. No entanto, frequentemente é um achado incidental em estudos histopatológicos, na necropsia.
A causa pode ser um traumatismo decorrente de ferimentos perfurantes ou infecção sistêmica que compromete a glândula salivar ou tecido circundante. A sialoadenite, como componente de uma doença sistêmica, já foi relatada na raiva,
cinomose e infecção por paramixovírus que causa a caxumba humana.
Os sinais incluem febre, depressão e glândulas salivares doloridas e inchadas. A ruptura de uma glândula abscedada elimina pus no tecido circundante ou na boca. A ruptura, via pele, pode provocar a formação de uma fístula salivar. O
inchaço da glândula parótida torna­se mais proeminente abaixo da orelha; o inchaço da glândula mandibular no ângulo da maxila; e o inchaço da glândula zigomática imediatamente caudal ao olho. O envolvimento da glândula zigomática
pode resultar em inchaço retrobulbar, estrabismo divergente no olho afetado, exoftalmia, lacrimejamento excessivo e relutância em abrir a boca ou comer. Os abscessos das glândulas zigomática e parótida são muito dolorosos; o animal
pode manter a sua cabeça rígida e se ressentir com qualquer manipulação que envolva a cabeça ou o pescoço.
As radiografias e os testes laboratoriais geralmente não são úteis, embora a avaliação do fluido de um abscesso possa levar ao diagnóstico. A histopatologia do tecido da glândula salivar pode revelar alterações inflamatórias agudas ou
crônicas ou necrose.
A sialoadenite discreta não requer tratamento e a recuperação é geralmente rápida e completa. Um abscesso maduro deve ser drenado via pele sobrejacente ou, caso envolva a glândula zigomática, atrás do último molar superior no lado
afetado. Antibióticos sistêmicos devem ser administrados.
A ausência de resolução ou recidiva necessitam de citologia do material aspirado, biopsia ou remoção cirúrgica da glândula afetada.
Sialometaplasia Necrosante
Trata­se de uma doença inflamatória rara, benigna e autolimitante das glândulas salivares menores do palato. Clinicamente, manifesta­se como uma úlcera no palato ou edema da submucosa. Há resolução espontânea, mas a identificação é
importante, pois pode se parecer clinicamente e microscopicamente com o carcinoma de células escamosas ou com o carcinoma mucoepidermoide, resultando em cirurgia desnecessária.

Tumores de Glândulas Salivares
Os tumores de glândulas salivares são raros em cães e gatos, embora os gatos sejam acometidos duas vezes mais frequentemente que os cães. A maior parte deles ocorre nos cães e gatos > 10 anos de idade. Não há uma evidente predileção
racial ou sexual, embora os cães poodle e raças Spaniel possam ser predispostos. A maioria dos tumores de glândulas salivares é maligna, e o carcinoma e o adenocarcinoma ocorrem com maior frequência. Infiltração local e metástase nos
linfonodos regionais e pulmões são comuns, assim como a recidiva local após excisão cirúrgica. Radioterapia, com ou sem cirurgia, propicia melhor prognóstico.

Xerostomia
O hipoptialismo corresponde à diminuição na secreção de saliva que pode resultar em boca seca, ou xerostomia. Pode causar desconforto significativo e dificuldades durante a alimentação. É incomum em cães e gatos, mas é muito comum
em humanos submetidos ao tratamento, via ortorradiação, de tumores da cabeça e pescoço, que resultou em lesões colaterais por radiação nas glândulas salivares. Como o tratamento com radiação está sendo mais utilizado na medicina
veterinária, essa condição pode se tornar mais frequente nos animais. A secreção salivar diminuída pode resultar, também, do uso de determinadas drogas (p. ex., a atropina), desidratação extrema, pirexia ou anestesia. Em alguns cães, é
observada junto com ceratoconjuntivite seca e pode ser imunomediada. Ocasionalmente, se deva a uma afecção da glândula salivar. A determinação e o tratamento da causa primária possuem importância primordial. Os enxagues bucais
fisiologicamente balanceados aliviam o desconforto resultante da xerostomia. Fluidos devem ser administrados se o animal está desidratado. Terapia imunossupressora está indicada caso uma doença imunomediada seja a suspeita.

 DOENÇAS INFLAMATÓRIAS E ULCERATIVAS DA CAVIDADE BUCAL
A inflamação dos tecidos bucais pode ser primária ou secundária. A inflamação da cavidade bucal pode afetar a gengiva (gengivite), periodonto (periodontite), membrana mucosa bucal (estomatite), língua (glossite), tecidos ao longo da rafe
pterigomandibular e arcos glossopalatinos (estomatite caudal), tecidos que se estendem desde a faringe até a garganta (faucite), palato (palatite) ou faringe (faringite). A natureza e a gravidade das lesões variam muito, dependendo da
etiologia e da duração da doença.
Doença periodontal, inclusive gengivite e periodontite, é o problema oral mais comum em pequenos animais. A gengivite é uma resposta inflamatória gengival normal na presença de placas bacterianas na superfície dentária adjacente.
Periodontite (inflamação do ligamento periodontal com perda da coesão) desenvolve­se a partir da combinação de patógenos periodontais bacterianos e da resposta imune de indivíduos suscetíveis que, em conjunto, destroem o osso e
tecidos adjacentes ao dente (ver p. 187).
Uma infecção periapical causada por doença endodôntica é a causa mais comum de um abscesso (furúnculo gengival), que se manifesta com uma área circular elevada de tecido de granulação inflamado na gengiva, com uma fístula
drenante central. Um abscesso periodontal é uma causa menos comum de um furúnculo gengival. A fístula pode ser seguida de lesões periodontais ou periapicais primárias e a etiologia deve ser esclarecida (ver p. 190).
Outras  causas  de  doenças  inflamatórias  bucais  incluem  imunopatia  (p.  ex.,  lesão  autoimune,  deficiência  imunológica),  produtos  químicos,  doença  infecciosa,  traumatismo,  doença  metabólica,  anormalidade  de  desenvolvimento  ou
conformações  anatômicas  que  predispõem  a  irritação  ou  inflamação,  queimaduras,  radioterapia  ou  neoplasia.  Os  microrganismos  infecciosos  associados  a  inflamação  da  cavidade  bucal,  glossite,  estomatite  e  úlceras  orais  incluem
herpesvírus felino, calicivírus felino, vírus da leucemia felina, vírus da imunodeficiência felina, vírus da cinomose, Bartonella henselae, e alguns sorovares de Leptospira. A estomatite traumática pode ocorrer depois de uma exposição oral
ao material vegetal (praganas de plantas) ou fibra de vidro. Quando mastigadas, as plantas da espécie Dieffenbachia podem causar inflamação oral e úlceras. O tálio é o principal metal pesado responsável por lesões bucais; a incidência
dessa intoxicação é baixa. A uremia pode causar estomatite e úlceras orais. Úlceras orais recidivantes também são observadas em cães da raça Colly cinza com hematopoese cíclica.
Os sinais clínicos variam amplamente, de acordo com a causa e a extensão da inflamação. Pode ocorrer anorexia, especialmente nos gatos. Halitose e salivação são comuns na estomatite caudal ou na glossite, e a saliva pode ficar tingida
de sangue. O animal pode esfregar sua boca com as patas e reagir a qualquer tentativa de exame da cavidade bucal, devido à dor. Os linfonodos regionais podem estar aumentados.

Dermatite da Dobra Labial e Queilite
A dermatite da dobra labial é uma dermatite úmida crônica observada em raças que possuem lábios superiores pendulosos e dobras no lábio inferior, em sua porção lateral (p. ex., cães das raças Spaniel, Buldogue inglês e São Bernardo),
permitindo contato prolongado com a saliva. Essas lesões podem estar exacerbadas quando uma higiene oral deficiente resultar em aumento no número de bactérias na saliva. As dobras do lábio inferior podem tornar­se mal cheirosas,
inflamadas, incômodas e edemaciadas.
Abscesso gengival. Um dente canino superior esquerdo fraturado, em um filhote de cão, resultou em doença endodôntica, inflamação periapical e abscesso gengival. Note a lesão circular proliferativa, friável, com uma fístula central drenante acima do primeiro pré­molar. Cortesia do Dr. Gregg A. DuPont.

Os ferimentos labiais, resultantes de brigas ou mastigação de objetos afiados, são comuns e variam amplamente em gravidade. Os espinhos, praganas de plantas, carrapichos e anzóis podem se fixar nos lábios e causar irritação acentuada
ou ferimentos graves. Agentes irritantes como materiais plásticos ou vegetais podem provocar inflamação dos lábios. As infecções labiais podem ocorrer secundariamente a ferimentos ou corpos estranhos, ou podem estar associadas à
inflamação de áreas adjacentes. Uma extensão direta de doença periodontal grave ou estomatite pode provocar queilite. A lambedura das áreas de dermatites bacterianas ou de ferimentos contaminados pode espalhar a infecção para os
lábios e dobras labiais. Outras causas de inflamação dos lábios incluem infecções parasitárias, dermatopatias autoimunes e neoplasias.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  A inflamação dos lábios e das dobras labiais pode ser aguda ou crônica. Os animais com queilite podem arranhar, coçar ou esfregar a boca ou lábios; apresentam odor fétido no hálito; e ocasionalmente
salivam excessivamente ou ficam anoréticos. No caso de infecção crônica nas margens ou dobras labiais, o pelo dessas áreas fica descolorido, úmido e emaranhado com uma descarga fétida, espessa, amarelada ou marrom, por cima de uma
pele hiperêmica e, às vezes, ulcerada.
A queilite por extensão da infecção na boca ou de outra área do corpo é geralmente detectada facilmente devido à lesão primária.
TRATAMENTO:  O manejo clínico da dermatite das dobras labiais inclui tricotomia e limpeza das dobras, 1 ou 2 vezes/dia, com peróxido de benzoíla ou substância suave para limpeza da pele, e manutenção da área seca. Aplicação tópica de
creme para assadura, diariamente, pode ser útil. A correção cirúrgica queiloplastia) das dobras labiais mais pronunciadas é um procedimento mais duradouro.
Queilite  não  relacionada  com  as  dobras  labiais  geralmente  se  resolve  com  limpeza  mínima,  antibióticos  apropriados,  caso  se  encontre  presente  infecção  bacteriana,  e  tratamento  específico  da  etiologia  primária  (p.  ex.,  dermatopatia
autoimune). Os ferimentos labiais devem ser limpos e suturados, caso necessário. Torna­se importante o tratamento da doença periodontal ou da estomatite para evitar recidiva.
A queilite infecciosa que se espalhou a partir de uma lesão em um outro lugar geralmente melhora com tratamento da lesão primária, mas também se torna necessário tratamento local. No caso de infecção grave, deve­se retirar o pelo da
lesão, e a área deve ser gentilmente limpa e seca. Antibióticos são indicados se a infecção é grave ou sistêmica.

Estomatite Micótica
A estomatite micótica, causada pelo supercrescimento do fungo oportunista Candida albicans é uma causa incomum de estomatite em cães e gatos. É caracterizada por estomatite, halitose, ptialismo, anorexia, úlcera na cavidade bucal, e
sangramento do tecido oral. Acredita­se que está associada a outras doenças da cavidade bucal, terapia antimicrobiana de longa duração ou imunossupressão. O diagnóstico é confirmado por cultura do organismo da lesão ou evidências
histológicas de invasão tecidual.
Qualquer doença local ou sistêmica primária que compromete a cavidade bucal deve ser tratada. Cetoconazol ou um benzimidazol relacionado deve ser administrado até que as lesões se resolvam; interrompa a terapia antimicrobiana.
Deve­se manter uma dieta adequada. O prognóstico é reservado, caso não se consiga tratar ou controlar adequadamente as doenças predisponentes.

Estomatite Posterior Felina (Faucite/Estomatite ulceroproliferativa, Palatoglossite, Estomatite plasmocitária, Estomatite linfocítica­plasmocitária)
A estomatite posterior felina (EPF) é uma doença de gatos, relativamente incomum (3% dos problemas dentários em felinos), porém grave. Os animais acometidos apresentam inflamação bucal com piora progressiva e desconforto. De
modo  mais  significativo,  a  área  ao  redor  dos  arcos  glossopalatinos  e  os  tecidos  ao  longo  da  rafe  pterigomandibular  (entre  as  áreas  retromolares  da  maxila  e  da  mandíbula)  se  apresentam  severamente  ulcerados,  friáveis,  inflamados  e
proliferativos. A inflamação ulceroproliferativa grave que envolve esta área, bilateralmente, na parte mais profunda da boca, é patognomônica de EPF. A causa não está comprovada, mas suspeita ser resultado de uma resposta inflamatória
inadequada a um antígeno, ou mais. Alta porcentagem de gatos acometidos (100% em alguns estudos) é portadora crônica de calicivírus felino. Em um indivíduo, a EPF pode ser causada pela soma de sensibilidades múltiplas aos antígenos
da superfície do dente, inclusive das superfícies radiculares e do ligamento periodontal, acima de um limiar.
O  sinal  imediato  é  dor  intensa  ao  abrir  a  boca.  Os  gatos  vocalizam  e  saltam  quando  bocejam  ou  abrem  a  boca  para  a  preensão  do  alimento.  Halitose,  ptialismo  e  disfagia  podem  ser  observados.  Gatos  frequentemente  mostram  um
comportamento de “aproximação­fuga” ao se aproximarem do alimento quando sentem fome, então miam e fogem em antecipação ao desconforto. Se a afecção é grave e tiver uma longa duração, a perda de peso pode ser evidente. A
doença é lentamente progressiva, e pode não ser identificada até que as lesões se tornem graves. Às vezes, nota­se linfadenopatia submandibular. Frequentemente, devido à dor, não se consegue visualizar adequadamente a cavidade bucal
sem que se empregue sedação ou anestesia.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico é feito pela identificação visual de alterações ulceroproliferativas bilaterais nos tecidos ao redor dos arcos glossopalatinos durante o exame da cavidade bucal. Nos casos avançados, o gato reage fortemente para
abrir a boca. Testes adicionais incluem isolamento viral (calicivírus e herpesvírus), testes retrovirais, e pesquisa de doença sistêmica (insuficiência renal). Embora uma associação definitiva com infecção por Bartonella ainda não tenha sido
comprovada,  os  testes  são  recomendados.  Nos  casos  atípicos  (envolvimento  unilateral,  geralmente  uma  lesão  focal  proliferativa),  biopsia  e  avaliação  histopatológica  são  necessárias  para  excluir  neoplasia  de  cavidade  bucal  ou  outras
doenças específicas. A maioria das amostras coletadas por biopsia a partir de lesões crônicas, inflamatórias ou ulceradas, revela predominância de linfócitos e plasmócitos, o que indica a natureza inflamatória crônica da lesão sem elucidar a
etiologia primária.
TRATAMENTO:  A extração de todos os pré–molares e molares de remoção dos ligamentos periodontais associados por meio de curetagem alveolar é o único tratamento que propicia alguma melhora e auxilia no controle a longo prazo. Este
tratamento fornece uma melhora significativa em 80% dos gatos acometidos quando é realizado precocemente no curso da doença, e pontas ou fragmentos de raízes não devem ser deixados para trás. Gatos cronicamente acometidos, que
foram  tratados  medicamentosamente  por  muitos  meses,  apresentam  um  prognóstico  mais  pobre  após  a  cirurgia.  Se  algum  dente  está  faltando,  radiografias  dentárias  são  exigidas  para  localizar  as  raízes  retidas.  Todo  fragmento  de  raiz
persistente  deve  ser  removido,  pois  poderá  prejudicar  a  melhora.  No  pós–operatório,  deve­se  administrar  amoxiciclina­clavulanato  por  1  semana,  seguida  de  clindamicina  por  mais  1  semana  e,  então,  metronidazol,  mais  1  semana.
Raramente se indica cultura e antibiograma das lesões, mesmo no caso de infecções crônicas ou recidivantes. O tratamento sintomático de EPF inclui mudança da dieta (alimentos palatáveis e amolecidos, não alergênicos), antibióticos e
antissépticos  tópicos  (p.  ex.,  solução  ou  gel  de  clorexidina  0,1%).  Os  animais  incapazes  ou  que  não  desejam  comer  e  beber  devem  receber  fluidos  parenterais  ou  subcutâneos  para  evitar  uma  desidratação.  A  colocação  de  sonda
nasoesofágica, faringostomia ou gastrostomia deve ser considerada em gatos debilitados que não respondem à terapia. Alimentações frequentes com líquidos palatáveis e, posteriormente, com alimentos semissólidos estimulam a ingestão
de alimentos. Para as dores que persistem, apesar das extrações, a terapia de manutenção com prednisona ou triancinolona, VO, pode ser útil.
Muitos  outros  tratamentos  para  EPF  foram  descritos,  inclusive  a  manutenção  de  uma  boa  higiene  oral,  tratamento  da  doença  periodontal,  profilaxia  dentária  regular,  clorambucila,  ciclosporina,  laser  terapia,  lactoferrina  bovina,
progestina, sais de ouro, azatioprina, dietas hipoalergênicas, laser de CO2, crioterapia, eletrofulguração e radiocirurgia. Nenhum destes procedimentos propicia resolução a longo prazo do problema. Alguns relatos sobre a resposta à terapia
com interferona­? recombinante felino foram promissores. A administração de glicocorticoides, apenas, geralmente resulta em melhora clínica significativa e imediata devido à modulação da resposta inflamatória excessiva, mas não é
recomendada,  exceto  como  último  recurso.  Sem  cirurgia,  injeções  repetidas  de  metilprednisolona  ou  triancinolona,  ou  terapia  de  manutenção  com  prednisona  ou  prednisolona  são,  muitas  vezes,  necessárias.  Este  tratamento  torna­se
progressivamente menos eficaz e, eventualmente, completamente ineficaz. Além disso, gatos que receberam tratamentos repetidos com glicocorticoides apresentam um pobre prognóstico, logo que os dentes são extraídos. A extração de
todos os pré­molares e molares ou as extrações de todos os dentes geralmente resultam em melhora significativa ou resolução completa da inflamação, se realizadas precocemente no curso da doença e antes dos múltiplos tratamentos com
glicocorticoides.

Estomatite Ulcerativa Crônica
As características da estomatite ulcerativa crônica (também conhecida como síndrome paradentária ulcerativa crônica ou SPUC) incluem inflamação gengival grave, vários locais de retração gengival e deiscência e áreas extensas de mucosa
labial ulcerada adjacente à superfície dos grandes dentes. Este problema comumente afeta cães da raça Greyhound, mas também foi descrito em animais das raças Maltesa, Schnauzer miniatura, Labrador Retriever, entre outras.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico é feito pela observação clínica das lesões da cavidade bucal, após exclusão de outras etiologias como estomatite urêmica, estomatite cáustica ou microrganismos infecciosos específicos. A lesão característica é
uma úlcera de contato que se desenvolve onde a mucosa do lábio ou da bochecha entra em contato com a superfície do dente, mais comumente na superfície interna do lábio superior adjacente aos dentes caninos. Essas lesões também são
denominadas “úlceras de contato”, pois se manifestam quando os lábios “tocam” os dentes. Um perfil imunológico deve ser obtido e uma biopsia realizada para histopatologia.
TRATAMENTO:  A doença primária é uma imunopatologia que resulta em resposta inflamatória local excessiva aos antígenos da placa dentária. A eliminação ou, pelo menos, a minimização da placa, por meio de limpeza profissional, e boa
higiene oral caseira (escovação dos dentes 2 vezes/dia) podem resolver o problema. Contudo, mesmo uma discreta placa residual na superfície do dente perpetua a inflamação e as úlceras. Tratamento antibacteriano complementar com
gliconato  de  clorexidina  tópica,  como  solução  de  enxágue  ou  gel,  e,  às  vezes,  tratamento  antimicrobiano  com  metronidazol  devem  ser  utilizados.  Em  casos  graves,  preparações  tópicas  anti­inflamatórias  para  modularem  a  resposta
inflamatória também promovem conforto. O desconforto causado por úlceras complica o esforço de se escovar os dentes e a administração oral de medicamentos. Em casos piores, nos quais o desconforto é intenso e os proprietários são
incapazes de ou relutantes em escovar os dentes dos animais, a extração de todos os dentes associados às úlceras pode ser necessária para remover a superfície de contato com as placas acumuladas. Apesar de poder auxiliar no controle das
lesões, estas medidas não são curativas, pois as placas se formam na superfície mucosa da boca, inclusive na língua. Em alguns casos com extrações completas, os animais continuam a desenvolver lesões devido à resposta hiperimune à
placa.
Estomatite ulcerativa crônica. Úlceras de contato nas membranas mucosas labial e bucal, onde o lábio e as bochechas tocam a superfície do canino superior e do quarto dente pré­molar superior. Cortesia do Dr. Gregg A. DuPont.

Gengivite Ulcerativa Necrosante Aguda (Guna) (Gengivoestomatite ulcerativa necrosante, Estomatite ulceromembranosa, Estomatite ulcerativa necrosante, Estomatite de Vincent, Trenchmouth)
Esta doença relativamente incomum de cães caracteriza­se por gengivite grave, úlcera e necrose da membrana mucosa bucal. Fusobacterium spp e espiroquetas (Borrelia vincenti), habitantes normais da boca, foram incriminados como
causadores da doença, após algum fator predisponente aumentar suas populações e diminuir a resistência da mucosa bucal. Desconhece­se o papel, se realmente há, desses microrganismos como causa da doença. Em pessoas, Bacteroides
melanogenicus intermedius pode desempenhar um papel muito importante. Outros fatores em potencial incluem estresse, administração excessiva de glicocorticoides em cães suscetíveis e dieta deficiente.
A doença aparece, primeiramente, como hiperemia e inchaço nas margens gengivais e papilas interdentárias, que ficam doloridas, sangram facilmente e podem progredir para retração gengival. A extensão para outras áreas da mucosa
oral é comum, resultando em membranas mucosas necrosadas e ulceradas e exposição ósseas nos casos graves. A halitose é intensa, e o animal pode ficar anorético devido à dor. Às vezes ocorre ptialismo, e a saliva pode ficar tingida de
sangue. O diagnóstico diferencial inclui doença periodontal grave, dermatopatia autoimune, uremia, neoplasia e outra doença sistêmica associada a lesões orais.
O diagnóstico é feito por meio da exclusão das outras etiologias.
Tratamento  da  doença  periodontal,  desbridação  das  lesões,  higiene  oral,  antibióticos  (amoxicilina­clavulanato,  ampicilina,  clindamicina,  metronidazol  e  tetraciclinas)  e  antissépticos  orais  (solução  ou  gel  de  clorexidina  0,1%)  são
indicados.

Glossite
Glossite, uma inflamação aguda ou crônica da língua, é causada por microrganismos infecciosos (calicivírus, herpesvírus, vírus da rinotraqueíte, leptospirose), agentes físicos (irritação pelo excesso de tártaro ou doença periodontal, corpos
estranhos que penetram ou se alojam sob a língua, lesões traumáticas) ou produtos químicos; doenças metabólicas (uremia, hipoparatireoidismo, diabetes); ou outras causas como choque elétrico e picada de inseto. Glossite por corpo
estranho é um problema, especialmente em cães de pelos longos que tentam remover carrapichos de seu pelame.
Salivação e relutância em se alimentar são sinais comuns, mas a causa pode não ser descoberta a menos que se examine a boca cuidadosamente. Periodontite pode resultar em hiperemia, inchaço e, ocasionalmente, úlcera da borda da
língua. Um fio, barbante ou outro corpo estranho linear pode ficar preso sob a língua. Pode não ocorrer inflamação na superfície dorsal da língua, mas a superfície ventral fica dolorida, exibe irritação aguda ou crônica, e frequentemente está
lacerada pelo corpo estranho. Espinhos de porco­espinho, materiais vegetais e outros materiais estranhos podem penetrar tão profundamente que não ficam palpáveis. As picadas de insetos causam inchaço agudo da língua.
Nos casos crônicos de glossite ulcerativa, pode se encontrar presente uma secreção fétida, marrom e espessa (ocasionalmente com sangramento). Muitas vezes, o animal reluta em permitir um exame oral.
Língua fissurada ou pregueada (língua dissecta) apresenta uma variação quanto à textura do dorso da língua, com um sulco central ou lateral longitudinal profundo. A fissura aprofunda­se com a idade e é considerada ser adquirida de
algum fator extrínseco. Entretanto, pode também representar uma anomalia de desenvolvimento. O sulco fica preenchido por pelos que agem como irritantes locais causando inflamação e desconforto.
Todo corpo estranho e pelos devem ser retirados e os dentes comprometidos ou quebrados devem ser removidos ou tratados. A glossite infecciosa bacteriana deve ser tratada com um antibiótico sistêmico apropriado. Em alguns casos,
desbridação e enxágues  orais  com  clorexidina  0,12%  são  úteis.  Pode  ser  necessária curetagem da língua se o material estranho está aderido à língua. São oferecidos dieta amolecida e fluido parenteral, se necessário. Se o animal está
debilitado  e  incapaz  de  se  alimentar  corretamente  por  um  período  prolongado,  deve­se  considerar  uma  sonda  nasoesofágica,  de  faringe  ou  gastrostomia  para  suporte  nutricional.  Glossite  aguda  por  picada  de  insetos  pode  exigir  um
tratamento emergencial.
Se a glossite é secundária a outra afecção, deve­se tratar a doença primária. Os tecidos linguais cicatrizam rapidamente após eliminação da irritação e infecção.

 TRAUMATISMO DE TECIDOS MOLES

Mordedura da Bochecha
Uma lesão proliferativa, verrucosa ao longo do plano da mordida na bochecha pode resultar de um autotraumatismo quando o tecido fica retido entre os dentes durante a mastigação. Isto é semelhante ao morsicato buccarum e morsicato
labiorum em humanos. Pode também afetar o tecido sublingual de cães e gatos, semelhantemente ao morsicato linguarum. A remoção cirúrgica do tecido em excesso evita traumatismos futuros.

Queimaduras Bucais
As queimaduras térmicas, químicas ou elétricas envolvendo a boca não são incomuns. O animal deve ser avaliado e tratado de acordo com o envolvimento sistêmico, o qual pode representar risco de morte. Língua, lábios, mucosa bucal e
palato  são  envolvidos,  muitas  vezes,  em  queimaduras  elétricas.  As  lesões  podem  ser  discretas,  apenas  com  desconforto  temporário,  ou  podem  ser  muito  destrutivas  com  perda  tecidual,  formação  de  cicatriz  e  deformidade  ou  déficits
teciduais subsequentes. A mastigação de um fio elétrico é, muitas vezes, um problema para filhotes de cães. Estes animais apresentam cicatriz linear no dorso da língua, delineando o caminho do fio elétrico. Uma ou ambas as comissuras
labiais podem apresentar uma cicatriz ou ferimento, e os dentes caninos adjacentes podem ficar descoloridos ou exigirem tratamento endodôntico.
O proprietário pode ter observado o incidente mas, mais comumente, isso ocorre na ausência dele. O animal hesita comer ou beber, saliva e ressente a manipulação da sua boca ou sua face. Se a destruição tecidual é acentuada, pode se
desenvolver estomatite ulcerativa ou gangrenosa, com infecções bacterianas secundárias. Caso se observe um contato com substância química corrosiva e essa substância é alcalina, a boca pode ser lavada com soluções suaves de vinagre ou
de sucos cítricos; se a substância é ácida, uma solução de bicarbonato de sódio deve ser utilizada. A lavagem abundante da boca com água ajuda a remover parte da substância química. Mais comumente, o animal é visto muito tempo depois
da exposição para que a neutralização seja efetiva.
Os animais que apresentam uma mucosa oral avermelhada, sem defeitos teciduais, não requerem tratamento específico além de uma dieta amolecida ou líquida até que a lesão cicatrize. Se as lesões teciduais são extensos, o tratamento
inclui lavagem com solução de clorexidine diluída e desbridação tecidual conservativo. Deve­se minimizar o risco de infecção secundária com uso de terapia antimicrobiana sistêmica por vários dias.

 TUMORES BUCAIS

Tumores Bucais Benignos
Fibromas são os tumores bucais benignos mais comuns. Os fibromas inflamatórios podem ser muito grandes, apesar do seu comportamento completamente benigno. Os fibromas odontogênicos periféricos (antigamente conhecidos como
epúlides  fibromatoso  ou  ossificante)  são  massas  firmes  que  envolvem  o  tecido  gengival  adjacente  ao  dente.  Acometem  cães  de  qualquer  idade,  mas  são  mais  comuns  naqueles  >  6  anos.  Alguns  desenvolvem  centros  de  ossificação,
perceptíveis como uma nítida proliferação do osso alveolar que se estende para dentro da massa. Geralmente, são solitários, embora possa haver múltiplas lesões. O tumor não ocasiona metástase, mas pode se tornar muito grande e invadir
o osso regional. Origina­se do ligamento periodontal do dente adjacente e a remoção cirúrgica completa deve incluir os tecidos, inclusive o ligamento periodontal. Em geral, há necessidade de remoção em bloco do dente ou dos dentes
comprometidos. A excisão completa é curativa.
O ameloblastoma acantomatoso canino (antigamente denominado epúlide acantomatoso) é muito mais localmente invasivo e rapidamente invade os tecidos locais, inclusive o osso. Não ocasionam metástase, mas, devido sua natureza
localmente agressiva, a excisão cirúrgica deve incluir uma margem de 1 cm de tecidos clinicamente normais (inclusive as margens ósseas), para evitar recidiva. O tratamento com radiação pode minimizar deformações quando se tratar de
tumores grandes. A remoção cirúrgica adequada é curativa.

Tumores Bucais Malignos
Em cães, os três tumores malignos mais comuns da cavidade bucal são melanoma maligno, carcinoma de célula escamosa e fibrossarcoma. A incidência de tumores bucais malignos é maior em cães > 8 anos de idade.
Os  carcinomas  de  célula  escamosa  são,  de  longe,  as  neoplasias  bucais  malignas  mais  comuns  em  gatos;  geralmente  envolvem  gengiva  e  língua  e  são  muito  invasivos,  localmente.  Os  fibrossarcomas  são,  em  segundo  lugar,  os  mais
comuns; nos gatos, são localmente invasivos e o prognóstico é ruim.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os  sinais  clínicos  variam  dependendo  da  localização  e  da  extensão  da  neoplasia.  Halitose,  relutância  em  se  alimentar  e  hipersalivação  são  achados  comuns.  Caso  a  orofaringe  esteja  envolvida,  disfagia  pode  estar
presente. Os tumores, muitas vezes, ulceram e sangram. A face pode se tornar inchada a medida que o tumor aumenta de volume e invade o tecido vizinho. Os linfonodos regionais, com frequência, aumentam de volume antes dos tumores
bucais e faringianos serem observados.
DIAGNÓSTICO:  Devido ao comportamento variado dos crescimentos gengivais, a caracterização pré­cirúrgica é valiosa para planejar a extensão da cirurgia necessária. A biopsia é o método mais confiável para se obter um diagnóstico
definitivo; contudo, um diagnóstico citológico por esfregaços de aspirados com agulha fina é possível, em alguns casos. Os melanomas malignos variam em aparência, são pigmentados ou não, e devem ser considerados no diagnóstico de
qualquer tumor bucal. Os carcinomas de células escamosas envolvem comumente a gengiva ou as tonsilas, e o linfossarcoma deve constituir um diagnóstico diferencial para um aumento de volume das tonsilas. Os linfonodos regionais e os
pulmões devem ser avaliados quanto à presença de metástases.
TRATAMENTO:  Os melanomas malignos são altamente invasivos e fazem metástase facilmente; consequentemente, o prognóstico é de reservado a pobre. A ressecção cirúrgica pode prolongar o tempo de sobrevida e pode ser curativa,
particularmente nos casos de massas nas áreas rostrais da boca. Entretanto, a recidiva local é comum. Enquanto várias estratégias de imunoterapia contra o melanoma tem apresentado pouco sucesso, novas modalidades como vacinas com
células dendríticas e vacinas de DNA xenogênico podem ser bem­sucedidas. Outras modalidades que combinam terapia do gene suicida como tratamento adjuvante começaram a ser avaliadas. O carcinoma não tonsilar de células escamosas
é localmente invasivo, com taxa de metástase baixa e o prognóstico é bom no caso de ressecção cirúrgica agressiva ou radioterapia ou ambas. Os carcinomas tonsilares de células escamosas são agressivos e possuem um prognóstico pobre.
Os fibrossarcomas apresentam prognóstico reservado devido a sua natureza localmente agressiva. Recidiva do crescimento tumoral após ressecção é comum.
Nos gatos, o carcinoma de células escamosas possui um prognóstico pobre e a sobrevida a longo prazo só é obtida se o problema é diagnosticado e tratado precocemente. A remoção tumoral local, muitas vezes, exige mandibulectomia ou
perda de grandes áreas do osso maxilar e tecidos moles regionais.

 VERRUGAS VIRAIS E PAPILOMAS
Verrugas virais (verrugas comuns) são crescimentos benignos causados por um vírus (ver p. 948). A membrana mucosa bucal e as comissuras labiais estão, muitas vezes, envolvidas, mas os crescimentos (únicos ou, mais frequentemente,
múltiplos)  podem  envolver  o  palato  e  a  orofaringe.  As  verrugas  virais  são  mais  comuns  em  cães  jovens  e  surgem  repentinamente,  com  crescimento  e  difusão  ocorrendo  rapidamente.  Os  sinais  são  observados  quando  os  crescimentos
interferem na apreensão, mastigação ou deglutição. Ocasionalmente, se os crescimentos são numerosos, o cão pode mordê­los durante a mastigação, causando sangramento e infecção. Podem regredir espontaneamente dentro de poucas
semanas e a remoção, geralmente, não se torna necessária. Se preciso, a retirada da lesão exofítica pode ser realizada por eletro ou radiocirurgia, ou por ressecção. A remoção cirúrgica de uma ou mais verrugas pode iniciar a regressão. O
uso de vacinas comerciais ou autógenas é geralmente decepcionante. O caráter autolimitante da doença dificulta a avaliação de qualquer tratamento.
Papilomas (p. 949) são proliferações exofíticas benignas de epitélio escamoso. São clinicamente indistinguíveis das verrugas induzidas por vírus. Diferente das verrugas virais, os papilomas geralmente apresentam crescimento lento e
são solitários. Comumente, permanecem benignos e a remoção cirúrgica é curativa.

DOENÇAS DE ESTÔMAGO E INTESTINOS DE PEQUENOS ANIMAIS

 COLITE
O cólon ajuda a manter o equilíbrio hidreletrolítico e a absorver nutrientes; também, é o principal local de armazenamento de fezes, até sua eliminação, e propicia um ambiente aos microrganismos. Interrupções na função normal do cólon
ocasionam alterações de absorção e motilidade; clinicamente, manifestam­se como diarreia de intestino grosso. Cerca de um terço dos cães com histórico de diarreia crônica apresentam colite. Colite crônica é definida como uma inflamação
do  cólon  presente  por  =  2  semanas.  A  inflamação  do  cólon  reduz  a  quantidade  de  água  e  eletrólitos  absorvidos  e  altera  a  motilidade  de  cólon  por  suprimir  as  contrações  normais  que  misturam  e  amassam  a  ingesta  e  por  estimular  as
contrações migratórias gigantes (contrações muito vigorosas que rapidamente impulsionam o conteúdo intestinal). A colite é classificada em quatro formas: linfocítica–plasmocítica, eosinofílica, neutrofílica e granulomatosa. A linfocítica­
plasmocítica é a forma mais comum em cães e gatos. A maioria dos cães tem meia­idade e não há predileção sexual. Pode haver uma associação entre colite e fístula perianal, principalmente no Pastor Alemão. Gatos com colite tendem a
ser de meia­idade e, de forma mais comum, de raças puras. Tipicamente, há um número aumentado de linfócitos e plasmócitos na lâmina própria (menos frequentemente na submucosa e muscular).
A colite eosinofílica é caracterizada por um número aumentado de eosinófilos na lâmina própria. É menos comum que a colite linfocítica­plasmocítica, os animais tendem a ser mais jovens e é mais difícil de ser tratada. Microrganismos
infecciosos,  parasitos,  alergênios  alimentares  podem  ser  fatores  desencadeadores,  mas  nada  foi  comprovado.  O  hemograma  pode  revelar  eosinofilia.  A  síndrome  hipereosinofílica  em  gatos  é  uma  variante  da  enterite  eosinofílica  com
envolvimento eosinofílico não apenas do intestino, mas também do fígado, baço, linfonodos mesentéricos, rins, glândulas adrenais e coração.
A colite granulomatosa é rara e ocorre em uma porção intestinal segmentada, espessada, parcialmente obstruída (íleo e cólon, na maioria das vezes). É caracterizada pela presença de macrófagos e outras células inflamatórias na lâmina
própria. Esses macrófagos não são positivos ao ácido periódico de schiff. Devido a suas características histológicas, torna­se importante excluir uma inflamação secundária à doença fúngica, parasitos intestinais, peritonite infecciosa felina e
corpo estranho. O tratamento permanece controverso, embora mais frequentemente a cirurgia seja recomendada.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  A inflamação do cólon pode ser aguda ou crônica. Na maioria dos casos, os fatores incitantes não são conhecidos. Já se admitiram causas bacterianas, parasitárias, fúngicas, traumáticas, urêmicas e alérgicas.
A inflamação pode resultar de um defeito na imunorregulação da mucosa. Após uma lesão inicial na mucosa, os linfócitos e os macrófagos da submucosa ficam expostos aos antígenos luminais e subsequentemente disparam a inflamação.
Uma  reação  exagerada  a  fatores  dietéticos  ou  bacterianos  dentro  do  lúmen  intestinal,  predisposição  genética,  patologia  psicológica  que  afeta  os  suprimentos  neurológico  ou  vascular  para  o  cólon,  ou  sequelas  de  infecções  ou  doenças
parasitárias anteriores já foram implicados.
Na colite aguda há infiltração da mucosa por neutrófilos e destruição e úlcera epiteliais. A colite crônica caracteriza­se mais frequentemente por infiltração mucosa de plasmócitos e linfócitos, fibrose e, às vezes, úlcera. As células
caliciformes são estimuladas a secretar uma quantidade excessiva de muco. A absorção de água e eletrólitos torna­se prejudicada, e a motilidade reduzida. A inflamação destrói as firmes junções intracelulares e diminui a diferença de
potencial elétrico transmucoso, interrompendo a capacidade do cólon de absorver sódio. Inibe­se a segmentação normal; as contrações musculares migratórias gigantes procedem na extensão do cólon e o conteúdo luminal é rapidamente
expulso. O intestino inflamado fica mais sensível a um estiramento e o conteúdo que entra no cólon estimula contrações musculares migratórias gigantes fortes, uma vontade de defecar e desconforto abdominal.
Fruto­oligossacarídios (FOS) aumentam a microflora do cólon e auxiliam na prevenção e tratamento da doença. Estes carboidratos complexos não são digeridos no intestino delgado. São fermentados por bactérias específicas do cólon
que utilizam estes compostos como fonte de energia. FOS favorecem o crescimento de bactérias benéficas e inibem o crescimento de bactérias potencialmente prejudiciais. São responsáveis pela produção de ácidos graxos de cadeia curta
(AGCC).
AGCC (acetato, propionato, butirato) são importantes fontes energéticas, essenciais para a manutenção da mucosa normal. Ajudam na manutenção da motilidade intestinal e a melhorar a inflamação intestinal. Alteração dos ácidos graxos
leva a atrofia e lesões na mucosa.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos mais comuns da colite crônica é a diarreia de intestino grosso, caracterizada por muco, hematoquesia, tenesmo e, ocasionalmente, dor ao defecar. Há, muitas vezes, maior urgência e aumento na
frequência de defecação, com diminuição do volume fecal por evacuação. Perda de peso e vômitos podem ocorrer, mas são incomuns; são observados, com mais frequência, quando o intestino delgado está envolvido. Os sinais clínicos
podem se exacerbar ou diminuir. Inicialmente, podem ser esporádicos, mas a progressão geralmente ocorre. O exame físico encontra­se sem alterações na maioria dos casos. Um exame retal minucioso pode revelar a presença de pólipos
retais ou neoplasias malignas que podem mimetizar os sinais de colite crônica.
DIAGNÓSTICO:  A abordagem inicial deve incluir anamnese e exame clínico completo, inclusive palpação retal e exame das fezes. Esfregaços de fezes para pesquisa de Giardia e fungos (Histoplasma  capsulatum,  Pythium  insidiosum),
flotação fecal para identificação de parasitos (Trichuris vulpis, em cães, e Tritrichomonas foetus, em gatos) e cultura bacteriana (Campylobacter, Salmonella, Clostridium) são sugeridos nos casos de colite crônica. A citologia do reto é uma
ferramenta importante para exclusão de outras causas de diarreia de intestino grosso. Pode revelar a presença de células inflamatórias, células neoplásicas e alguns microrganismos infecciosos (p. ex., H. capsulatum). Casos suspeitos de
colite por clostrídios (> 5 endosporos por campo) devem ser confirmados pela identificação de enterotoxinas A e B de Clostridium perfringens nas fezes, utilizando um teste ELISA disponível no mercado após uma cultura bacteriana das
fezes ter sido realizada.
Um teste alimentar é recomendado antes de uma busca por diagnósticos mais avançados. Se os sinais clínicos persistem, deve­se realizar hemograma, perfil bioquímico sérico e urinálise para exclusão de outras doenças; contudo, na
maioria dos casos de colite crônica, os resultados são normais. Nos gatos, testes para o vírus da leucemia felina e da imunodeficiência felina também são recomendados, assim como a avaliação dos hormônios da tireoide, se a idade é
apropriada.  As  radiografias  simples  abdominais  geralmente  estão  normais.  As  radiografias  contrastadas  podem,  ocasionalmente,  demonstrar  uma  diminuição  do  espaço  intraluminal,  o  que  poderia  indicar  uma  doença  infiltrativa  em
progressão. A ultrassonografia permite a visualização da mucosa do cólon, lesões localizadas e tamanho e ecogenicidade dos linfonodos.
A colonoscopia é indicada para inspecionar, visualmente, a superfície da mucosa do cólon e obter amostras para biopsia. A preparação do cólon é essencial para se evitar perder lesões pequenas ou sutis devido ao material fecal residual
na  superfície  da  mucosa.  O  alimento  deve  ser  suspenso  por  24  a  48  h  antes  do  procedimento,  seguido  de  uma  combinação  de  enemas  e  uma  solução  de  lavagem  de  cólon.  Várias  amostras  do  ceco  e  cólon  ascendente,  transverso  e
descendente devem ser obtidas, independentemente da aparência morfológica. Devido a pobre concordância entre a aparência macroscópica e os resultados histopatológicos, os resultados devem ser interpretados em face ao histórico e
exame físico. Uma biopsia com resultado de mucosa normal ou com evidência de uma mucosa hiperplásica, associadas a sinais clínicos de diarreia de intestino grosso são compatíveis com a síndrome do intestino irritável. Eosinofilia
periférica está invariavelmente presente em gatos com a síndrome hipereosinofílica.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Se possível, a causa desencadeante deve ser identificada e eliminada. Os alimentos devem ser suspensos nas primeiras 24 a 48 h nos animais com colite aguda no esforço de “poupar” o intestino.
Pelo fato da eliminação de ovos pelos tricurídeos ser intermitente, a desverminação terapêutica (p. ex., febendazol 50 mg/kg, 1 vez/dia, por 3 dias, repetindo em 3 semanas e, novamente, em 3 meses, se há resposta positiva) deve ser
realizada mesmo se os resultados de exame das fezes são negativos.
A suplementação da dieta com fibras (1 a 6 colheres de chá de muciloide hidrofílico de psílio ou 1 a 4 colheres de sopa de farelo de trigo grosso/refeição) melhora a diarreia em vários animais. As fibras alimentares reduzem a água fecal,
prolongam o tempo de trânsito intestinal (aumentando a oportunidade de se absorver água), absorvem toxinas, aumentam o volume fecal e forçam a músculos lisa do cólon, e melhoram a contratilidade. Contudo, a adição de fibras, sozinha,
raramente resulta em resolução completa dos sinais clínicos de diarreia de intestino grosso em cães, e os efeitos benéficos podem demorar até 6 semanas para se tornarem evidentes. Ao longo do tempo, a dosagem da fibra pode ser reduzida
ou até mesmo suspensa em alguns cães e uma alimentação normal reintroduzida sem causar uma recidiva na diarreia.
Novas fontes proteicas foram eficazes em controlar os sinais clínicos de colite em cães e gatos. A fonte proteica utilizada deve ser uma que o animais não tenha sido exposto previamente. Em um estudo, os sinais clínicos associados à
colite linfocítica­plasmocítica se resolveram em todos os cães em cerca de 2 semanas após a alimentação com dieta hipoalergênica, com baixo teor de resíduos (1 parte de queijo cottage magro e 2 partes de arroz branco cozido). Por
conseguinte, a maioria dos cães permanece sem a recidiva dos sinais clínicos com rações terapêuticas no mercado disponíveis, das quais não tinham se alimentado anteriormente. Atualmente, há inúmeras rações terapêuticas que contem
arroz com carne de carneiro ou cordeiro, veado ou coelho.
Alimentos  hidrolisados  também  foram  considerados  efetivos  no  tratamento  de  colite.  Estas  dietas  especializadas  quebram  a  estrutura  da  proteína  para  remover  quaisquer  alergênios  ou  epítopos  alergênicos  e,  portanto,  evitam  um
reconhecimento imunológico.
Se a alimentação com dietas ricas em fibras ou com uma nova fonte proteica não é bem­sucedida, uma dieta comercial pobre em resíduos pode ser testada, principalmente as que contém fruto­oligossacarídios (FOS).
Gatos com colite linfocítica­plasmocitária podem responder ao manejo alimentar, exclusivamente (p. ex., cordeiro e arroz, carne de equino ou uma ração disponível no mercado). Em um estudo, os gatos foram inicialmente tratados com
fibras alimentares ou fibras alimentares juntamente com tratamento medicamentoso (prednisona, tilosina ou sulfassalazina). A maioria dos gatos foi mantida com dietas ricas em fibras ou com ração facilmente digerível.
O metronidazol é considerado um dos principais medicamentos para tratamento de colite crônica em gatos. Seus efeitos terapêuticos incluem atividade antiprotozoário e antimicrobiana e inibição de alguns aspectos da imunidade mediada
por células. Não é geralmente utilizado como um agente único, mas sim em combinação com o manejo dietético ou outro fármaco. Embora o metronidazol seja bem tolerado por cães e gatos, efeitos adversos podem ocorrer (principalmente
neurológicos como nistagmo, ataxia, sinais vestibulares, convulsões), seja em tratamentos crônicos ou em altas doses. Contudo, a neurotoxicose deve ser reversível dentro de 5 a 7 dias após o tratamento ser interrompido.
Tilosina,  um  antibiótico  macrolídeo  que  é  utilizado  principalmente  no  alimento,  em  grandes  animais,  é  útil  nas  enteropatias  crônicas  porque  interfere  na  adesão  bacteriana  na  mucosa  e  tem  alguns  efeitos  antibacterianos  e
imunomoduladores. Atua, principalmente, contra bactérias gram­positivas anaeróbicas obrigatórias ou facultativas e algumas bactérias gram­negativas. No entanto, Escherichia coli e Salmonella são resistentes à tilosina. A tilosina é bem
tolerada por cães e gatos, com poucos efeitos adversos.
Os sinais clínicos resolvem­se mais rapidamente quando um anti­inflamatório é administrado, junto com a alteração na dieta. Sulfassalazina, prednisona ou prednisolona e azatioprina são as mais comumente utilizadas. A sulfassalazina é,
muitas vezes, utilizada para tratar colite linfocítica­plasmocitária em cães (12,5 mg/kg, 4 vezes/dia, por 14 dias, seguida de 12,5 mg/kg, 2 vezes/dia, por 28 dias). O uso prolongado deve ser evitado, pois predispõe à ceratoconjuntivite seca.
A sulfassalazina é um inibidor da prostaglandina sintetase e tem atividade antileucotrieno. É composta de mesalamina ligada à sulfapiridina, por uma ligação azo; esta ligação impede sua absorção no trato GI superior e permite que a maior
parte do fármaco seja transportada ao intestino grosso. Uma vez no intestino grosso, é metabolizada pelas bactérias do ceco e do cólon, liberando seus componentes. A mesalamina atua localmente reduzindo a inflamação da mucosa do
cólon. A sulfapiridina acredita­se ser absorvida sistemicamente e, portanto, não possui qualquer efeito terapêutico local na colite, mas é responsável pelos efeitos adversos da sulfassalazina. Os salicilatos são metabolizados no fígado pelos
processos enzimáticos hepáticos envolvendo a glucuronil transferase. Pelo fato dos gatos serem deficientes dessa via enzimática, os salicilatos apresentam meia­vida prolongada nesta espécie. Portanto, a sulfassalazina não é utilizada como
a droga de eleição na colite felina devido ao risco de intoxicação por salicilato.
Os glicocorticoides, em combinação com manejo alimentar e metronidazol, são o tratamento de escolha para a colite crônica em gatos. Podem ser introduzidos no plano terapêutico de cães quando as terapias anteriormente discutidas não
foram bem­sucedidas ou se o 5­aminosalicilato induz efeitos adversos. Se utilizada em combinação com sulfassalazina ou metronidazol, a prednisona pode ser administrada em uma dose reduzida. A prednisona deve ser iniciada na dose de
2 mg/kg/dia, VO; 2 semanas após a resolução dos sinais clínicos, a dosagem deve ser reduzida em 25% a cada 2 a 4 semanas, o que geralmente resulta em remissão.
Os gatos normalmente toleram os glicocorticoides muito bem; os efeitos adversos são comuns em cães e incluem poliúria, polidipsia, polifagia, sangramento GI, suscetibilidade aumentada às infecções, hiperadrenocorticismo iatrogênico
e supressão pituitário­adrenocortical.
A budesonida é um glicocorticoide não halogenado que tem sido utilizado no tratamento da doença de Crohn em humanos. A budesonida sofre um metabolismo de primeira passagem significativo, no fígado; teoricamente, isto deve
reduzir os efeitos adversos observados, muitas vezes, com os glicocorticoides tradicionais, pois pouca droga ativa encontra­se sistemicamente disponível. Em um estudo com 10 cães saudáveis, o eixo pituitário­adrenocortical foi suprimido,
mas nenhum outro efeito adverso foi observado.
As drogas imunossupressoras são principalmente utilizadas em combinação com os glicocorticoides quando a resposta não foi satisfatória apenas com os últimos. Azatioprina e clorambucila são os mais comumente utilizados em cães e
gatos. A azatioprina (2 mg/kg, 1 vez/dia e reduzida gradualmente), sozinha ou em combinação com prednisona, foi utilizada para controlar os sinais clínicos associados à colite linfocítica­plasmocítica. A azatioprina pode ser considerada
nos casos pouco responsivos à prednisona ou à prednisona com sulfassalazina. Os sérios efeitos adversos da azatioprina em gatos (mielossupressão e hepatotoxicidade) limitam seu uso na colite felina. Em vez disso, clorambucila (0,1 a 0,2
mg/kg ou 1 mg/gato, 1 vez/dia inicialmente até os sinais clínicos melhorarem acentuadamente, o que pode necessitar de 4 a 8 semanas) é utilizado em gatos em associação com a prednisona, se necessário.
A ciclosporina foi efetiva nos casos de colite refratários aos esteroides, mas isto não foi avaliado em gatos. Os efeitos adversos incluem distúrbios GI, doença gengival e alopecia.
Alguns animais também necessitam do uso, a curto prazo, de modificadores de motilidade até que a inflamação esteja controlada. Loperamida (0,1 a 0,2 mg/kg, 2 a 4 vezes/dia) estimula a atividade segmentar e retarda o trânsito do
conteúdo  fecal.  Também  diminui  a  secreção  do  cólon,  potencializa  a  absorção  de  sal  e  água  e  aumenta  o  tônus  do  esfíncter  anal.  É  contraindicada  em  casos  de  colite  infecciosa  (p.  ex.,  causada  por  Salmonella,
Campylobacter ou Clostridium).
PROGNÓSTICO:  O prognóstico da colite crônica, a curto prazo, é bom, para cães e gatos. Contudo, o prognóstico, a longo prazo, da resolução completa sem recidivas parece ruim. Muitos casos de doença intestinal inflamatória não são
curáveis e alguma forma de tratamento provavelmente é necessária por longo período. Em alguns animais, especialmente gatos, o manejo prolongado da colite crônica pode ser possível apenas com dieta.
Muitos  casos  de  colite  linfocítica­plasmocítica  idiopática  respondem  às  alterações  alimentares  e  clínicas.  A  formação  de  estenose  e  vastas  fibroses  justificam  um  prognóstico  mais  reservado.  A  colite  eosinofílica  em  cães  responde
favoravelmente com dietas controladas e terapia com glicocorticoide. Em gatos, o prognóstico é mais reservado, e o tratamento mais agressivo com agentes imunossupressores é necessário. A síndrome hipereosinofílica é uma doença
progressiva e fatal que não possui tratamento efetivo em pacientes veterinários.
A colite histiocítica do Boxer suporta um pobre prognóstico a menos que o tratamento seja iniciado precocemente no curso da doença. A enteropatia imunoproliferativa dos Basenjis também garantem um prognóstico pobre; a maioria dos
cães morrem em 2 anos do diagnóstico, embora tem­se relatado uma sobrevida de até 5 anos. De modo semelhante, o prognóstico da síndrome diarreica relatada em cães da raça Lundehund também é ruim.

 CONSTIPAÇÃO INTESTINAL E OBSTIPAÇÃO
Constipação intestinal consiste em defecação infrequente ou difícil, de fezes ressecadas e muito duras. A constipação intestinal é um problema clínico comum em pequenos animais. Em muitos casos, o problema é facilmente corrigido;
contudo, em animais mais debilitados, os sinais clínicos acompanhantes podem ser graves. À medida que as fezes permanecem mais tempo no cólon, ficam mais secas, mais duras e mais difíceis de serem eliminadas. A obstipação é a
constipação  intestinal  intratável,  caracterizada  pela  inabilidade  de  eliminar  as  fezes  secas  e  endurecidas;  a  impactarão  que  se  estende  do  reto  à  válvula  ileocólica  pode  ser  consequente.  O  megacólon  é  uma  condição  patológica  de
hipomotilidade e dilatação do intestino grosso que resulta em constipação intestinal e obstipação.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  As ondas peristálticas são responsáveis pelo movimento aboral do material fecal no cólon. As ondas migratórias gigantes, que ocorrem de forma intermitente durante o dia, movem este material para frente e
mais rapidamente. Estas ondas representam o “reflexo gastrocólico” e são comuns após a alimentação. A redução ou perda dessas ondas podem contribuir para a constipação intestinal. De modo semelhante, um aumento na atividade da
onda de segmentação pode predispor a constipação intestinal. Contudo, a dieta é o fator local mais importante que afeta a função do cólon.
A constipação intestinal crônica pode ocorrer por fatores intraluminais, extraluminais ou intrínsecos (ou seja, neuromusculares). A obstrução intraluminal ocorre mais comumente e se deve à incapacidade de eliminar um material pouco
digerível e frequentemente firme (p. ex., pelos, ossos, areia) misturado com material fecal. A falta de consumo hídrico ou a relutância em defecar com regularidade devido a situações ambientais (estresse) ou comportamentais (caixa de
areia suja) ou a doença anorretal dolorosa predispõem à formação de fezes duras e secas. Os tumores intraluminais também podem impedir a eliminação de fezes. A obstrução extraluminal pode ser causada por uma compressão do cólon ou
do  reto  por  estreitamento  da  entrada  da  pelve  após  redução  inapropriada  de  fratura  pélvica  ou  por  meio  de  compressão  de  cólon  ou  retal  por  aumento  de  volume  dos  linfonodos  sublombares  ou  da  próstata.  Estenose  do  cólon  por
traumatismo  ou  neoplasia  também  deve  ser  considerada.  Finalmente,  alguns  animais  (geralmente  gatos)  com  constipação  intestinal  ou  obstipação  crônicas  podem  apresentar  megacólon,  provavelmente  causado  por  uma  lesão  no  leito
neuromuscular do cólon. A etiologia do megacólon permanece desconhecida. Outras doenças que afetam o controle neuromuscular do cólon e reto incluem hipotireoidismo, disautonomia e lesões na medula espinal (deformação da medula
espinal  sacral  do  Manx)  ou  nos  nervos  pélvicos.  A  hipopotassemia  e  a  hipercalcemia  também  influenciam  negativamente  o  controle  muscular.  Alguns  medicamentos  (p.  ex.,  opioides,  diuréticos,  anti­histamínicos,  anticolinérgicos,
sucralfato, hidróxido de alumínio, brometo de potássio e bloqueadores do canal de cálcio) causam constipação intestinal por mecanismos diferentes.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os  sinais  clínicos  clássicos  da  constipação  intestinal  incluem  tenesmo  e  a  eliminação  de  fezes  secas  e  firmes.  Se  a  defecação  está  dificultada  pelo  aumento  da  próstata  ou  linfonodos  sublombares,  as  fezes  podem
assumir uma aparência achatada ou de “fita”. A palpação abdominal e exame retal confirmam a presença de grande volume de material fecal retido. As fezes eliminadas encontram­se frequentemente pútridas. Alguns animais ficam bastante
indispostos e também apresentam letargia, depressão, anorexia, vômitos (principalmente em gatos) e desconforto abdominal.
DIAGNÓSTICO:  Um histórico de imprudência dietética e evidências físicas de retenção de fezes confirmam o diagnóstico. Informação detalhada sobre a duração da constipação intestinal e fatores que a influenciam podem auxiliar a detectar
a causa, assim como um histórico de ingestão de material indigesto que poderia causar aumento do volume fecal ou dor e esta limitando o reflexo de defecação. Outros fatores que podem ser relevantes incluem cirurgia recente, trauma
pélvico anterior e, possivelmente, radioterapia. Um exame neurológico completo com ênfase especial na função da medula espinal caudal deveria ser realizado para identificar causas neurológicas de constipação intestinal, por exemplo,
lesões à medula espinal, trauma no nervo pélvico, deformidade da medula espinal sacral do Manx.
Deve­se realizar palpação abdominal e exame retal, inclusive avaliação de próstata e linfonodos sublombares para se determinar a presença de hérnia perineal, corpo estranho, dor ou tumores. Radiografias abdominais simples podem
auxiliar a estabelecer o(s) fator(es) incitante(s) de retenção fecal e oferecer alguma indicação do que as fezes contêm (p. ex., ossos). Um enema de bário, ultrassonografia ou colonoscopia podem facilitar a demonstração de lesões obstrutivas
ou de causas predisponentes de constipação intestinal crônica.
Hemograma, perfil bioquímico que inclui o teor sérico de T4, urinálise e exame neurológico detalhado devem ser realizados nos casos de constipação intestinal crônica ou recidivante.

TRATAMENTO  E  CONTROLE:  Os  animais  acometidos  devem  ser  hidratados  adequadamente.  A  constipação  intestinal  discreta  pode  ser  tratada,  muitas  vezes,  mediante  um  ajuste  dietético  que  consiste  em  evitar  imprudências  dietéticas,
pronto acesso à água e dietas ricas em fibras, e uso de supositórios laxantes. Deve­se evitar o uso contínuo ou de longa duração de laxantes, a menos que sejam absolutamente essenciais para impedir a constipação intestinal.
Vários supositórios retais pediátricos estão disponíveis para o controle de constipação intestinal discreta. Contêm dioctil sulfosuccinato de sódio (DSS; laxante emoliente), glicerina (laxante lubrificante) e bisacodil (laxante estimulante).
O uso de supositórios requer um animal complacente e um proprietário que colabora. Os supositórios podem ser utilizados sozinhos ou juntamente com laxantes orais.
Constipação intestinal discreta a moderada ou episódios recidivantes de constipação intestinal podem exigir a administração de enemas ou retirada manual das fezes impactadas, ou ambas. Os tipos de enemas incluem água morna (5 a 10
ml/kg), salina isotônica morna (5 a 10 ml/kg) com ou sem detergente neutro para agir como um irritante, DSS (5 a 10 ml/gato), óleo mineral (5 a 10 ml/gato) ou lactulose (5 a 10 ml/gato). As soluções de enema devem ser administradas
lentamente com um tubo de borracha French 10 a 12, ou tubo utilizado para nutrição enteral.
Se os enemas não são efetivos, a extração manual das fezes impactadas pode ser necessária. Após reidratação adequada, o animal deve ser anestesiado e deve ser colocada uma sonda endotraqueal para evitar a aspiração, no caso da
manipulação do cólon induzir vômito. A remoção completa de todas as fezes pode requerer duas a três tentativas, por muitos dias. Anormalidades hídricas e eletrolíticas concomitantes devem também ser corrigidas.
Os laxantes são classificados como formadores de massa, lubrificantes, emolientes, osmóticos ou estimulantes. A maior parte deles atua nos mecanismos de transporte hídrico e na estimulação motora do cólon. Devem ser evitados na
presença de desidratação. Laxantes formadores de massa são adicionados à dieta. Esses produtos são suplementos com fibras alimentares de polissacarídios e celulose pobremente digeríveis derivados, principalmente de grãos de cereais e
psílio.  Eles  absorvem  água,  amolecem  as  fezes,  acrescentam  volume,  estiram  a  músculos  lisa  do  cólon  e  melhoram  a  contratilidade.  Muitos  gatos  constipados  respondem  à  suplementação  dietética  com  um  desses  produtos.  As  fibras
alimentares são preferíveis, pois são bem toleradas, mais eficazes e mais fisiológicas que os outros laxantes. Dietas comerciais suplementadas com fibras estão disponíveis ou o proprietário do animal pode adicionar psílio (1 a 4 colheres de
chá/refeição), farelo de trigo (1 a 2 colheres de sopa/refeição) ou abóbora (1 a 4 colheres de sopa/refeição) ao alimento enlatado. Os animais devem estar bem hidratados antes de se iniciar a suplementação com fibras, para minimizar o risco
de impactação das fibras no cólon constipado.
Laxantes emolientes são detergentes aniônicos que aumentam a miscibilidade da água e lípidios da dieta, reforçando assim a absorção de lipídios e diminuindo a absorção de água. DSS e dioctil sulfosuccinato de cálcio são laxantes
emolientes disponíveis nas formas oral e de enema. O docusato sódico (gatos: 1 cápsula de 50 mg, 1 vez/dia; cães: 1 a 4 cápsulas de 50 mg/dia) e o docusato cálcico (gatos: 1 a 2 cápsulas de 50 mg/dia; cães: 2 a 3 cápsulas de 50 mg/dia) são
outros exemplos de laxantes emolientes.
Óleo mineral e vaselina são laxantes lubrificantes que impedem absorção de água pelo cólon e permitem maior facilidade na eliminação das fezes. Esses efeitos são moderados e os laxantes lubrificantes são úteis apenas nos casos de
constipação intestinal discreta. O uso do óleo mineral deve ser limitado à administração retal devido ao risco de pneumonia por aspiração nos casos de administração oral.
Os  laxantes  osmóticos  são  compostos  de  polissacarídios  pobremente  absorvidos  (p.  ex.,  0,5  ml  de  lactulose/kg  VO,  2  a  3  vezes/dia),  sais  de  magnésio  (p.  ex.,  citrato  de  magnésio,  hidróxido  de  magnésio,  sulfato  de  magnésio)  e
polietilenoglicol. A lactulose é o agente mais eficaz deste grupo. Os ácidos orgânicos produzidos a partir da fermentação da lactulose estimulam a secreção de fluidos pelo cólon e a motilidade propulsora. A lactulose, osmoticamente, retém
água no intestino  para  amolecer  o  material  fecal.  Também  é  útil  no  manejo  da  encefalopatia  hepática  porque  diminui  o  pH  luminal,  reduz  a  produção  bacteriana  de  amônia  e  favorece  a  formação  de  íons  amônio,  que  são  pobremente
absorvidos. Os laxantes estimulantes (p. ex., bisacodil [gatos e cães pequenos: 5 mg; cães de tamanho médio: 10 mg; cães grandes: 15 a 20 mg]) aumentam a atividade propulsora intestinal. Eles são contraindicados quando há obstrução
intestinal.
Os agentes procinéticos que atuam no cólon (p. ex., cisaprida) exacerbam a motilidade propulsora do cólon por ativarem os receptores 5­hidroxitriptamina­2A dos músculos lisos em várias espécies. Evidências anedóticas sugerem que a
cisaprida (0,1 a 0,5 mg/kg VO, 2 a 3 vezes/dia) é eficaz em estimular a motilidade propulsora do cólon em gatos com constipação intestinal discreta a moderada. Altas doses (até 1 mg/kg) podem ser necessárias em gatos com constipação
intestinal moderada a grave. Efeitos adversos insignificantes foram relatados em gatos tratados com 0,1 a 1 mg de cisaprida/kg VO, 2 a 3 vezes/dia. Gatos com constipação intestinal de longa data e megacólon provavelmente não melhoram
com o tratamento com cisaprida.
Relata­se que a ranitidina e a nizatidina, antagonistas de receptores H2, estimulam a motilidade do cólon por inibirem a acetilcolinesterase. Elas estimulam a motilidade por aumentarem a quantidade de acetilcolina disponível para se ligar
aos receptores colinérgicos muscarínicos dos músculos lisos.
Para evitar recidiva, os animais devem ser estimulados a ingerirem dietas ricas em fibras; deve­se manter um acesso fácil a água e permitir oportunidades frequentes de defecação.
Os casos de obstrução intraluminal não complexos, por descuido alimentar, respondem bem à lavagem intestinal e a prevenção deste hábito, futuramente. Constipação intestinal crônica não responsiva ao tratamento clínico (alguns gatos
com  megacólon)  pode  responder  à  colectomia  parcial  ou  total.  Dependendo  do  grau  da  doença,  pode­se  realizar  colectomia  com  anastomose  colo­de  cólon,  íleo­de  cólon  ou  jejuno­de  cólon.  Diarreia  discreta  a  moderada  pode,
ocasionalmente,  persistir  por  semanas  a  meses  após  a  cirurgia,  e  alguns  gatos  podem  ter  constipação  intestinal  recidivante.  Osteotomia  pélvica  sem  colectomia  é  recomendada  para  gatos  com  má  união  de  fratura  pélvica  e  megacólon
hipertrófico com < 6 meses de duração. Em tais casos, a hipertrofia patológica pode ser reversível com osteotomia pélvica precoce. A colectomia subtotal é recomendada para os gatos com fraturas pélvicas se a hipertrofia e os sinais
clínicos têm persistido por > 6 meses. Nesses casos, a hipertrofia é seguida de degeneração muscular e dilatação patológica, e a osteotomia da pelve, sozinha, não irá promover melhora da obstipação.

 CORONAVIROSE INTESTINAL FELINA
O coronavírus intestinal felino (CIF) é um vírus RNA de filamento simples, envelopado, altamente prevalente na população de gatos domésticos, em todo o mundo. A infecção é, muitas vezes, subclínica ou caracterizada por distúrbios GI
leves, transitórios, em filhotes de gatos. A mutação do CIF para um biotipo capaz de infectar e replicar em macrófagos é responsável pelo desenvolvimento de peritonite infecciosa felina (PIF), uma doença multissistêmica altamente fatal
(p. 840).
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  A eliminação fecal do CIF começa dentro de 1 semana após a infecção inicial e persiste, em teores elevados, por pelo menos 2 a 3 meses, seguida de um período prolongado (5 a 24 meses) de teores mais
baixos, potencialmente intermitentes, de eliminação viral. Pelo menos 13% dos gatos infectados eliminam o vírus indefinidamente.
Os gatos se infectam pela ingestão ou inalação dos vírus presentes nas fezes ou pelo contato com fômites contaminados (p. ex., caixas de areia, grooming mútuo, gaiolas, pessoas. CIF é relativamente frágil mas pode sobreviver em
ambientes secos por até 7 semanas. O íntimo contato entre os gatos (p. ex., gatis, abrigos com muitos gatos) facilita a transmissão. A transmissão vertical, das gatas infectadas para os filhotes, ocorre, embora estes geralmente não eliminem
o vírus antes das 9 semanas de idade. Logo após a infecção, o vírus pode replicar no tecido da orofaringe, resultando em eliminação salivar transitória (horas a dias). CIF infecta e se replica nas células epiteliais apicais maduras dos
vilosidades intestinais, causando encurtamento e destruição da borda em escova.
ACHADOS CLÍNICOS:  A maioria das infecções pelo CIF é clinicamente inaparente ou caracterizada por uma gastrenterite discreta autolimitante. Ocasionalmente, vômito e diarreia podem ser agudos graves ou crônicos e irresponsivos ao
tratamento. Embora a diarreia seja o sinal clínico mais comum da infecção em filhotes, sintomas de trato respiratório superior também foram relatados.
DIAGNÓSTICO:  O DNA viral pode ser detectado nas fezes por PCR transcriptase reversa (RT­PCR). Pelo fato dos portadores crônicos de CIF tenderem a ser assintomáticos, CIF pode ser acusado como a causa de diarreia apenas depois que
outras  causas  (p.  ex.,  infecciosas,  alimentares,  doença  intestinal  inflamatória,  neoplasia  etc.)  são  excluídas.  A  utilidade  clínica  da  avaliação  sorológica  por  anticorpos  de  CIF  é  questionável.  Títulos  positivos  de  anticorpos  contra  o
coronavírus são detectados em até 30% dos gatos domiciliados e em até 90% dos gatos criados em gatis. Gatos de abrigos “doentes” não são mais propensos a terem títulos positivos de anticorpos contra coronavírus do que os gatos de
abrigos  “saudáveis”.  Títulos  positivos  indicam  apenas  uma  exposição  ao  vírus  e  não  são  sugestivos  de  etiologia  de  uma  doença  atual,  não  se  correlacionam  com  o  risco  de  desenvolver  FIP  e  não  são  diagnósticos  de  FIP.  As  lesões
histológicas sugestivas de enterite por CIF incluem fusão, atrofia ou desgaste das vilosidades intestinais. Pelo fato dessas lesões serem inespecíficas, o diagnóstico definitivo requer a detecção imuno­histoquímica ou imunofluorescente do
antígeno viral nas células do epitélio intestinal.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Os  sinais  clínicos  leves,  transitórios  provavelmente  não  necessitam  de  terapia.  O  tratamento,  se  exigido,  é  sintomático  e  de  suporte  (i.  e.,  fluidoterapia,  soluções  eletrolíticas  orais,  antieméticos).  Não  há
tratamento antiviral específico. A morte pelo CIF, associada à gastrenterite, é comum.
O controle e a prevenção do CIF são apenas de interesse em gatis de reprodução e abrigos de gatos resgatados. A ingestão das partículas nas fezes contaminadas pelo vírus deve ser evitada tanto quanto possível. A contaminação fecal do
ambiente pode ser minimizada com um número suficiente de caixas de areia, limpeza diária e desinfecção semanal das caixas de areia e tosa/limpeza da pele da região anal dos gatos de pelo longo. CIF pode sobreviver dentro de casa por
até 7 semanas sobre condições secas, mas é prontamente inativado por muitos desinfetantes comerciais.
De forma ideal, os gatos devem ser alojados em grupos pequenos, estritos (3 a 4 gatos). Sala, gaiolas, camas e caixas de areia devem ser desinfetadas com a troca de grupos de animais. Embora impraticável nos abrigos, os gatos devem
ser alojados em grupos de acordo com seus títulos de anticorpos (anticorpo imunofluorescente soropositivo ou soronegativo) e em função de estar ou não eliminando vírus (com base no PCR em amostra de fezes). Os gatos soropositivos
devem ser retestados a cada 3 a 6 meses e removidos para os grupos soronegativos quando seus títulos de anticorpos diminuírem. A identificação de gatos portadores de CIF requer 9 testes de RT­PCR fecal mensais consecutivos, enquanto
a identificação de 1 gato que eliminou a infecção por CIF requer 5 testes consecutivos negativos ao teste RT­PCR fecal.
Os gatos soropositivos devem ser acasalados apenas com fêmeas soropositivas. Filhotes nascidos de pais soropositivos ou de mãe soropositiva estão protegidos da infecção, pela imunidade muscular adquirida da mãe, por cerca de 6
semanas de idade. Filhotes que mamaram em mães soropositivas durante as 6 semanas de idade, provavelmente, não adquirem a infecção da mãe. Testes sorológicos em filhotes devem ser realizados próximo as 10 a 11 semanas de idade,
altura em que a soroconversão é provável.
Novos gatos devem ser sorologicamente testados antes da introdução em um gatil ou programas de reprodução. Apenas gatos soronegativos e livres de vírus (PCR fecal) devem ser introduzidos em um gatil livre de CIF ou em um gatil
tentando eliminar o vírus. Gatos soropositivos menos provavelmente desenvolvem FIP que os gatos soronegativos quando introduzidos em um ambiente CIF­endêmico. A vacinação intranasal com um CIF mutante, sensível à temperatura,
não  é  geralmente  recomendada,  mas  pode  ser  considerada  em  gatos  soronegativos  >  16  semanas  de  idade,  introduzidos  em  um  ambiente  endêmico  para  CIF.  A  vacinação  induz  soroconversão  e  não  protege  completamente  os  gatos
previamente expostos ao CIF, à infecção pelo vírus da peritonite infecciosa felina.

 DILATAÇÃO GÁSTRICA E VÓLVULO (Timpanismo)
A síndrome dilatação gástrica­vólvulo (DGV) é uma condição aguda, potencialmente fatal, que afeta principalmente cães de raças grandes ou gigantes. Intervenções médica e cirúrgica imediatas são necessárias para otimizar a sobrevida.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  A etiologia da DGV é desconhecida, porém vários fenótipos e fatores de risco ambientais foram identificados no desenvolvimento da DGV. As raças em maior risco incluem Great Dane, Pastor Alemão,
Setter Irlandês, Gordon Setter, Weimaraner, São Bernardo, Poodle padrão e Basset Hound. Não há predisposição sexual e o risco parece aumentar com a idade. Outros fatores de predisposição observados incluem: condição magra do corpo,
conformação  torácica  profunda/estreita,  parentes  de  primeiro  grau  com  histórico  de  DGV,  estresse,  comportamento  agressivo  ou  temeroso,  alimentação  diária  única,  dieta  com  alimentação  seca,  doença  esplênica  prévia  e  fraqueza
aumentada dos ligamentos gástricos.
Não está claro se a dilatação ou o vólvulo ocorre primeiro antes do desenvolvimento de DGV, embora seja postulado que o vólvulo ocorra primeiro. A dilatação do estômago resulta do acúmulo de gás ou fluido e o vólvulo impede a
liberação normal desses conteúdos. Durante o vólvulo, o piloro e o duodeno migram ventralmente e cranialmente. Observado de uma direção caudal a cranial, o estômago pode rotacionar 90 a 360° em sentido horário, ao redor do esôfago
distal. Esta rotação desloca o piloro à esquerda da linha média, prendendo o duodeno entre o esôfago distal e o estômago. Dependendo do grau de vólvulo, o baço pode variar em posição de posterodorsal esquerda para anterodorsal direita.
Um vólvulo de > 180° causa oclusão da parte distal do esôfago.
Após  vólvulo  de  estômago,  ocorre  aprisionamento  de  gás  e  aumento  da  pressão  intragástrica.  O  duodeno  pode  ser  comprimido  pelo  estômago  distendido  contra  a  parede  do  corpo,  resultando  em  obstrução  do  fluxo  gástrico.  O
aprisionamento do baço frequentemente acompanha a DGV. O estômago progressivamente distendido compromete o retorno venoso por compressão da veia cava caudal. O sequestramento do sangue nos leitos capilares esplênicos, renais e
músculos­posteriores dilatados resultam em hipotensão portal, isquemia do trato GI, hipovolemia e hipotensão sistêmica. Esses fatores se somam à perda de fluido no estômago obstruído e ausência de ingestão hídrica para provocar choque
hipovolêmico. Cães estão sob risco de endotoxemia, hipoxemia, acidose metabólica e coagulação intravascular disseminada.
ACHADOS CLÍNICOS:  Cães podem apresentar histórico de esforço repetido de vômito não produtivo, salivação excessiva e inquietação. Distensão abdominal aguda ou progressiva pode ser observada ou o cão pode se encontrar deitado e
deprimido com o abdome distendido.
Os  achados  clínicos  incluem  abdome  timpânico  ou  aumentado,  dor  abdominal  e/ou  esplenomegalia.  Progressão  de  dilatação  predispõe  a  choque  hipovolêmico.  Sinais  de  choque  são  comuns  e  podem  incluir  pulso  periférico  fraco,
taquicardia, tempo prolongado de preenchimento capilar, membranas mucosas pálidas e dispneia. Frequência cardíaca irregular e déficits de pulso são achados comuns e indicam a presença de arritmia cardíaca. Adicionalmente, o estômago
expandido pode comprimir a cavidade torácica e inibir o movimento do diafragma, levando a desconforto respiratório.
DIAGNÓSTICO:  Histórico, resenha e sinais clínicos podem levar à forte suspeita de DGV. Radiografias são valiosas para a distinção entre uma dilatação gástrica simples e DGV. As imagens radiográficas preferidas para a identificação de
DGV são em decúbito lateral direito e dorsoventral. Posicionamento ventrodorsal deve ser evitado devido ao potencial de aspiração de conteúdo gástrico e maior compressão da veia cava caudal.
A radiografia lateral direita normalmente revela uma sombra gástrica grande, distendida, preenchida com gás com o piloro localizado dorsal e ligeiramente cranial ao fundo. A sombra gástrica é normalmente compartimentalizada ou
dividida por uma “dobra” de tecido mole entre o piloro e o fundo. Esta “dobra” ou sinal em C invertido é criada pela dobra da parede antral pilórica sobre a parede fúndica. Mal posicionamento ou aumento esplênico pode ser observado.
Gás dentro da parede gástrica é sugestivo de comprometimento tecidual, enquanto gás livre dentro do abdome indica ruptura gástrica.

Dilatação gástrica e vólvulo, em cão. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

Volume  globular,  sólidos  totais,  eletrólitos,  glicose  sanguínea  e  teores  séricos  de  lactato  devem  ser  avaliados,  seguidos  de  hemograma,  perfil  bioquímico  sérico  e  ensaios  de  coagulação.  ECG  contínuo  e  monitoramento  da  pressão
sanguínea são recomendados.
Azotemia pré­renal é um achado comum, secundária à hipotensão sistêmica. Pode­se notar elevada atividade de CK devido à lesão de músculo estriado e alto teor de potássio devido ao lesão hipóxico. Lactato elevado é um achado
comum, secundário à hipotensão sistêmica e inflamação. Hiperlactatemia (> 6,0 mmol/l) está associada a maior risco de necrose gástrica e necessidade de ressecção gástrica parcial.
TRATAMENTO:  Os objetivos imediatos do tratamento são restabelecer o volume sanguíneo circulante e descompressão gástrica. Rápida correção cirúrgica do vólvulo deve ocorrer após a estabilização inicial. Como a duração dos sinais
clínicos é um dos fatores de risco de morte associada à DGV, diagnóstico e correção imediatos são imperativos.
Correção da hipovolemia pela reposição rápida de fluidos com um ou mais cateteres IV (calibre 16 a 18) nas veias jugular ou cefálicas é prioridade no tratamento. Deve­se iniciar imediatamente a terapia com fluidos contendo cristaloides
em velocidade de infusão apropriada para choque (90 ml/kg/h). No choque grave, Fluidoterapia com combinações de cristaloides, coloides (i. e. hetamilo ou pentamilo, na forma de bolus, na taxa de 5 ml/kg, IV; pode ser repetido na dose de
até 20 ml/kg) ou solução salina hipertônica (i. e. solução salina 7% com dextrana 70, na dose de 5 ml/kg, ao longo de 15 min) pode ser considerada. A velocidade de infusão de fluido cristaloide pode ser reduzida em 40% se estes produtos
são  utilizados.  Deve­se  fornecer  oxigênio  durante  a  estabilização.  Anormalidades  eletrolíticas  e  ácido­base  são  geralmente  corrigidas  por  fluidoterapia  adequada  e  descompressão  gástrica.  Devido  ao  risco  potencial  de  endotoxemia  e
translocação GI de bactérias, normalmente são administrados antibióticos (i. e. 22 mg de ampicilina/kg, 4 vezes/dia, continuada por 2 a 3 dias após a cirurgia).

Torção gástrica em cão da raça Great Dane com 3 anos de idade; imagem lateral direita. Cortesia do Dr. Ronald Green.

Faz­se a descompressão gástrica concomitante à fluidoterapia. A tentativa inicial de descompressão deve ser feita com sonda orogástrica, que pode ser realizada após sedação com fentanila (2 a 5 μg/kg IV) ou hidromorfona (0,05 a 0,1
mg/kg, IV), com ou sem diazepam (0,25 a 0,5 mg/kg, IV). Vasodilatadores (i. e. fenotiazinas) devem ser evitados. Mede­se o comprimento da sonda estomacal desde os incisivos até última costela e faz­se uma marcação. A sonda não deve
ultrapassar esta marca. A sonda lubrificada é introduzida pela boca (normalmente mantida aberta com um espéculo bucal, rolo de esparadrapo ou material de bandagem) enquanto o cão é posicionado sentado ou em decúbito esternal.
Normalmente  nota­se  certa  resistência  do  esfíncter  gastresofágico.  Manipulação  suave  e  rotação  anti­horária  da  sonda  podem  ser  necessárias  para  a  passagem  da  sonda  ao  estômago.  Cautela  deve  ser  tomada  para  evitar  perfuração  do
esôfago. Quando a sonda alcança o estômago, o gás gástrico é eliminado facilmente. A introdução bem­sucedida da sonda não descarta um vólvulo gástrico concomitante. Após a liberação de gases e conteúdos via sonda, o estômago deve
ser lavado com água morna para diminuir a velocidade de redilatação do órgão com gás e remover a mistura de ácido gástrico e endotoxinas.
Caso não se consiga passar facilmente a sonda orogástrica, pode­se realizar gastrocentese percutânea para liberar o excesso de gás do estômago. Deve­se realizar tricotomia e preparação asséptica de uma área (10 cm × 10 cm) da parede
abdominal direita, caudalmente à última costela e ventralmente ao processo vertebral transverso. A percussão da área deve revelar timpanismo; isto ajuda a evitar uma punção acidental do baço sobrejacente. Se a estrutura timpânica não é
identificada,  deve­se  acessar  a  região  paracostal  esquerda.  Uma  agulha  de  grande  calibre  ou  um  cateter  “sobre  a  agulha”  (calibre  14  a  16)  deve  ser  introduzida,  através  da  pele  e  parede  corporal,  no  interior  do  estômago,  no  local  de
timpanismo mais evidente. A descompressão gástrica geralmente facilita a passagem subsequente da sonda orogástrica e lavagem estomacal.
A correção cirúrgica da DGV deve ser realizada rapidamente após a estabilização inicial. A assepsia do abdome é realizada antes da cirurgia (aproximação cranioventral da linha média). Antes da correção da torção gástrica deve­se
realizar descompressão do estômago por sonda orogástrica ou gastrocentese. O estômago, então, retorna à posição normal e tanto o estômago quanto o baço são examinados quanto à isquemia. Quaisquer áreas isquêmicas da parede gástrica
são cirurgicamente removidas e deve­se realizar esplenectomia se há comprometimento vascular esplênico. Extensa necrose gástrica e necrose do cárdia, bem como infarto esplênico, são considerados indicadores de prognóstico ruim. O
conteúdo estomacal deve ser removido e uma gastropexia realizada para reduzir o risco de recidiva. Várias técnicas de gastropexia estão descritas e incluem gastropexia incisional, de alça, circuncostal e por sonda.
O monitoramento antes, durante e depois da cirurgia deve incluir ECG contínuo, medida intermitente da pressão sanguínea e avaliação frequente dos parâmetros vitais, volume globular, sólidos totais, eletrólitos, glicose sanguínea e
lactato sérico.
O tratamento pós­operatório consiste em fluidoterapia IV e analgesia. A alimentação deve ser suspensa por 12 a 24 h após a cirurgia. No caso de vômito continuado pode–se administrar antieméticos (0,2 a 0,5 mg de metoclopramida/kg
SC ou 1 a 2 mg/kg/dia em infusão IV em infusão contínua; 1 mg de maropitant/kg, SC, 1 vez/dia). Arritmias cardíacas antes, durante e após a cirurgia são comuns e as arritmias ventriculares são as mais frequentes. Normalmente não se
indica  tratamento  para  as  arritmias,  porém  ele  deve  ser  instituído  se  ocorrer  um  ou  mais  dos  seguintes  critérios:  taquicardia  persistente  (>  140  bpm),  hipotensão  (pressão  sanguínea  sistólica  <  90  mmHg),  hipoperfusão  (tempo  de
preenchimento capilar prolongado, pulso fraco), sobreposição da “onda R em T” (condição que predispõe à fibrilação ventricular) ou contrações ventriculares prematuras multifocais. Lidocaína 2%, na forma de bolus (2 a 4 mg/kg IV,
lentamente), pode ser administrada e repetida 2 vezes durante período de 30 min, se necessário. Infusão IV contínua de lidocaína (30 a 80 μg/kg/min) pode ser indicada para controlar arritmias. Com frequência, é difícil o controle de
arritmias cardíacas associadas a DGV. Se a arritmia é pouco responsiva a essa terapia, deve­se administrar procainamida (6 a 10 mg/kg, IV, ao longo de 15 min). As arritmias com risco à vida do animal podem responder ao sulfato de
magnésio 20% (0,15 a 0,3 mEq/kg ou 12,5 a 35 mg/kg, IV, ao longo de 15 a 60 min). Solotol oral (1 a 2 mg/kg, PO, 2 vezes/dia) são também é utilizado no controle de taquicardias ventricular e supraventricular.
Complicações pós­operatórias menos comuns podem incluir condições de risco à vida, como sepse, peritonite e coagulação intravascular disseminada.
A  taxa  de  mortalidade  média  associada  à  DGV  é,  aproximadamente,  25  a  30%.  Fatores  de  risco  associados  à  morte  súbita  por  DGV  incluem  sinais  clínicos  >  6  h  antes  do  exame,  execução  da  esplenectomia  e  gastrotomia  parcial,
hipotensão a qualquer hora durante hospitalização, peritonite, sepse e coagulação vascular disseminada.
Não  se  sabe  se  gastropexia  profilática  previne  o  desenvolvimento  de  DGV  se  executada  no  momento  da  castração,  mas  tem  se  mostrado  útil  na  prevenção  de  recidivas  se  executada  no  momento  da  primeira  correção  da  DGV.
Proprietários de raças em risco maior de DGV devem ser esclarecidos sobre os fatores de risco e os sinais da DGV e aconselhados a procurar imediatamente cuidado veterinário se sinais clínicos são notados. Precauções adicionais incluem
evitar o estresse, alimentação fracionada em vez de refeições únicas diárias, evitar exercício imediatamente após as refeições e não utilizar pratos de alimento elevados.

 DOENÇA INTESTINAL INFLAMATÓRIA
Doença intestinal inflamatória idiopática (DII) é um grupo de doenças gastrintestinais caracterizadas por sinais clínicos persistentes e evidências histológicas de infiltrado de células inflamatórias de etiologia desconhecida. As várias formas
de  DII  são  classificadas  em  função  da  localização  anatômica  e  do  tipo  celular  predominante.  Enterite  linfocítica­plasmocitária  é  a  forma  mais  comum  em  cães  e  gatos,  seguida  de  inflamação  eosinofílica.  Há  achados  ocasionais  de
inflamação com padrão granulomatoso (enterite regional). Predominância neutrofílica no infiltrado inflamatório é rara. Um padrão misto de infiltrado celular é descrito em várias ocasiões. Certas síndromes específicas de DII ocorrem mais
frequentemente em algumas raças, como o complexo enteropatia/nefropatia com perda de proteínas em animais da raça Wheaten Terrier de pelos macios, enteropatia imunoproliferativa no cão Basenji, DII em cão Norwegian Ludenhund e
colite ulcerativa histiocítica em cães da raça Boxer.
ETIOLOGIA  E  FISIOPATOLOGIA:  A  etiologia  da  DII  não  e  conhecida.  Vários  fatores  podem  estar  envolvidos,  como  defeito  na  imunorregulação  do  tecido  linfoide  associado  ao  intestino  (TLAI);  alteração  da  permeabilidade;  distúrbios
genéticos, isquêmicos, bioquímicos e psicossomáticos; microrganismos infecciosos e parasitários; alergênios alimentares e reações adversas às drogas. DII também pode ser imunomediada. A mucosa intestinal tem função de barreira e
controla  a  exposição  de  antígenos  ao  TLAI.  Estes  últimos  podem  estimular  a  resposta  imune  protetora  contra  patógenos,  enquanto  permanecem  tolerantes  a  antígenos  ambientais  inócuos  (p.  ex.,  bactérias  comensais,  alimentos).
Imunorregulação  defeituosa  do  TLAI  resulta  na  exposição  e  reações  adversas  a  antígenos  que  normalmente  não  desencadeariam  resposta  imune.  Embora  a  alergia  alimentar  seja  uma  causa  improvável  de  DII  (exceto  na  gastrenterite
eosinofílica), ela pode contribuir para aumentar a permeabilidade da mucosa e a sensibilidade aos alimentos.
Evidências  atuais  sustentam  provável  envolvimento  de  reações  de  hipersensibilidade  a  antígenos  (p.  ex.,  alimentos,  bactérias,  muco  e  células  epiteliais)  no  lúmen  ou  mucosa  intestinal.  Na  DII,  mais  de  um  tipo  de  reação  de
hipersensibilidade  está  envolvido.  Por  exemplo,  a  hipersensibilidade  tipo  I  está  envolvida  na  gastrenterite  eosinofílica,  enquanto  a  hipersensibilidade  tipo  IV  está  envolvida,  provavelmente,  na  enterite  granulomatosa.  A  reação  de
hipersensibilidade incita o envolvimento de células inflamatórias, resultando em inflamação da mucosa. A inflamação prejudica a barreira mucosa, facilitando o aumento da permeabilidade intestinal a antígenos adicionais. Inflamação
persistente resulta em fibrose.
ACHADOS CLÍNICOS:  Não há predisposição etária, sexual ou racial aparente associada a DII. No entanto, pode ser mais comum em cães das raças Pastor Alemão, Yorkshire Terrier e Cocker Spaniel e em gatos de raças puras. A idade média
descrita para o desenvolvimento de doença clínica é de 6,3 anos em cães e 6,9 anos em gatos, mas a DII foi observada em cães < 2 anos de idade. Os sinais clínicos são frequentemente crônicos e, às vezes, cíclicos ou intermitentes. Podem­
se observar vômitos, diarreia, alteração do apetite e perda de peso. Em um estudo retrospectivo em gatos com enterocolite linfocítica­plasmocitária, observaram­se mais frequentemente perda de peso, vômito intermitente com progressão
para vômito mais frequente, diariamente, diarreia e anorexia. No caso de úlcera e erosão gastroduodenais, observam­se frequentemente vômitos, melena e dor na parte cranial do abdome. Perda de peso, vômito, diarreia, ascite e edema
periférico podem ser verificados em casos de enteropatia com perda de proteínas. Tromboembolia pulmonar é uma complicação rara; entretanto, pode ocorrer quando há perda grave de proteínas intestinais (perda de antitrombina III). Sinais
clínicos de diarreia de intestino grosso, inclusive anorexia e diarreia aquosa, não são incomuns.
Em cães, também se postulou uma associação entre a síndrome vólvulo­dilatação gástrica (p. 408) e a DII. Nesse caso, a inflamação intestinal pode causar alterações na motilidade e no esvaziamento gástrico e no tempo de trânsito
gastrintestinal, consequentemente predispondo à vólvulo­dilatação gástrica.
Em gatos, relata­se associação entre doença hepática inflamatória, pancreatite e DII, embora ainda não se tenha estabelecido uma etiologia para essa tríade de doenças. No entanto, gatos com colangioepatite também devem ser avaliados
quanto à DII e pancreatite. Nos gatos, embora ainda não comprovada, foi sugerido que a DII grave pode progredir para linfossarcoma.
DIAGNÓSTICO:  Não há anormalidade consistente no hemograma, no perfil bioquímico e em radiografias.
Pode­se notar hipoproteinemia devido à menor ingestão alimentar e má absorção ou maior perda via trato GI. Hipocalcemia e hipocolesterolemia podem ser atribuídas à má absorção. Aumento da amilase sérica como consequência da
DII também foi observado. Podem­se notar hipoproteinemia devido à menor ingestão alimentar e má absorção ou aumento da perda através do trato gastrintestinal. Também é descrito aumento da amilase sérica como consequência da
inflamação intestinal. Hipopotassemia secundária à anorexia, perda de potássio decorrente de vômito e diarreia e baixos teores séricos de folato e cobalamina também foram relatados. Além disso, podem­se esperar aumentos discretos nas
atividades séricas das enzimas hepáticas.
Eosinofilia pode estar associada à enterite eosinofílica; no entanto, não é um parâmetro sensível. É possível notar anemia microcítica com perda de ferro devido à hemorragia crônica. Anemia não responsiva, se presente, provavelmente
reflete anemia decorrente de doença crônica ou inflamatória.
Podem­se observar eritrocitose, associada à perda de fluidos decorrente de vômitos e diarreia, e leucograma de estresse. Alterações radiográficas podem incluir distensão do estômago por gases ou líquido e aumento do diâmetro total das
alças do intestino delgado. Imagens contrastadas podem mostrar irregularidades focais ou difusas da mucosa, sugestivas de doença infiltrativa. Perda de contraste pode estar associada à ascite.
Exame de fezes é importante para excluir outras causas de inflamação da mucosa, como infecção por nematódeos, Giardia e bactérias. Giardia pode ser difícil de ser detectada devido à eliminação fecal intermitente; em todos os casos
recomenda­se tratamento empírico com fembendazol.
Ultrassonografia  abdominal  pode  ser  utilizada  para  avaliar  todos  os  órgãos  abdominais,  examinar  todo  o  trato  intestinal  e  mensurar  a  espessura  da  parede  (embora  a  última  medida  seja  insignificante  no  diagnóstico  de  DII).  Estrias
hiperecoicas da mucosa do intestino delgado estão normalmente associadas à inflamação da mucosa e enteropatia com perda de proteínas. Ultrassonografia é também útil para auxiliar na exclusão de possíveis doenças em outros órgãos,
para localizar a doença e determinar se a endoscopia permite biopsia do local.
A endoscopia permite avaliação de esôfago, estômago, duodeno e, às vezes, jejuno, dependendo do tamanho do animal. A colonoscopia permite exploração do cólon. Em alguns casos, lesões espessas da mucosa podem ser detectadas por
endoscopia, inclusive eritema, friabilidade, granularidade aumentada, erosão e úlcera. Em muitos casos, a aparência endoscópica é normal. Todavia, sempre devem ser obtidas amostras por biopsia, uma vez que há pouca correlação entre a
aparência microscópica e macroscópica da mucosa intestinal. São recomendados pelo menos seis fragmentos de cada segmento do trato gastrintestinal. A endoscopia é o método mais fácil de se obter fragmentos por biopsia, embora tais
amostras sejam superficiais e normalmente podem ser coletadas apenas da porção proximal do intestino delgado. Em alguns casos, celiotomia exploratória e biopsia com espessura total são necessárias.
Pequenas populações de linfócitos, plasmócitos, macrófagos, eosinófilos e neutrófilos são componentes normais do tecido da mucosa intestinal. Na DII, observa­se aumento do número de plasmócitos, linfócitos, eosinófilos e neutrófilos
na lâmina própria. No entanto, essas características morfológicas também podem ser observadas com outras causas de gastroenteropatias (p. ex., infecções por Giardia, Campylobacter e Salmonella, linfangiectasia e linfossarcoma). Embora
o exame das amostras intestinais obtidas por biopsia seja ainda o padrão ouro para o diagnóstico de DII, este exame apresenta várias limitações. A qualidade das amostras pode variar, os diagnósticos patológicos são inconsistentes e a
diferenciação entre uma amostra normal daquela que apresenta DII, e até mesmo linfoma, pode ser um problema. Os resultados da biopsia sempre devem ser interpretados juntamente com os sinais clínicos; ademais, o animal deve ser
tratado adequadamente.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Os  objetivos  da  terapia  são  reduzir  a  diarreia  e  vômito,  promover  apetite  e  ganho  de  peso  e  diminuir  a  inflamação  intestinal.  Caso  se  consiga  identificar  uma  causa  (p.  ex.,  alimentar,  parasitária,
supercrescimento bacteriano, reação a drogas etc.), deve­se eliminá­la.
Mudança alimentar, isoladamente, pode ser efetiva em alguns casos (p. ex., colite crônica); em outros casos, ela potencializa a eficácia da terapia medicamentosa concomitante, permitindo redução da dose do medicamento ou interrupção
da terapia medicamentosa quando os sinais clínicos regridem. Corticosteroides, azatioprina, sulfassalazina, tilosina e metronidazol são as drogas mais frequentemente utilizadas no tratamento de DII.
Exceto quando o animal está debilitado, é melhor instituir modalidades terapêuticas sequenciais. A frequência e natureza dos sinais clínicos devem ser monitoradas e a terapia ajustada, se necessária. O tratamento deve ser iniciado com
medicação anti­helmíntica/antiparasitária (p. ex., 50 mg de fembendazol/kg, VO, 1 vez/dia, por 3 a 5 dias). Isto é seguido de modificação da dieta (preferencialmente com uma dieta com proteínas hidrolisadas ou com teor limitado de
antígenos),  por  3  a  4  semanas,  seguida  de  tratamento  antibacteriano  por  3  a  4  semanas  (normalmente  10  mg  de  tilosina/kg,  VO,  3  vezes/dia  ou  10  mg  de  metronidazol/kg  VO,  2  vezes/dia)  e,  finalmente,  terapia  imunossupressora
(inicialmente com 1 mg de prednisolona/kg VO, 2 vezes/dia).
Uma modificação alimentar geralmente envolve o fornecimento de uma dieta hipoalergênica ou eliminação de uma fonte de proteína à qual o animal não tenha sido exposto anteriormente (p. ex., alimentos caseiros com carne de cordeiro
e arroz, ou carne de veado e arroz ou dietas comerciais). Essa dieta deve ser a única fonte de alimento por um mínimo de 4 a 6 semanas e nenhum tipo de petisco deve ser oferecido. Os cães com diarreia de intestino grosso podem se
beneficiar de dietas com alto teor de fibras insolúveis (ver colite, p. 399). A suplementação com apenas fibras alimentares raramente é efetiva nos casos com grave infiltrado de células inflamatórias.
A sulfassalazina (e fármacos associados) é utilizada no tratamento de colite, em cães, quando a DII se limita ao intestino grosso. No cólon, o medicamento libera o ácido 5­aminossalicílico, que tem atividade anti­inflamatória na mucosa.
Os principais efeitos adversos observados em cães são ceratoconjuntivite seca e vasculite. Devido ao risco de toxicidade por salicilatos em gatos (ver colite, p. 399), a sulfassaliazina não é indicada rotineiramente para coline em felinos.
Encontram­se disponíveis outras drogas aminossalicílicas mais recentes, isentas de alguns dos efeitos adversos da sulfassalazina, por exemplo, olssalazina (10 a 20 mg/kg, VO, 3 vezes/dia em cães) e mesalamina (10 mg/kg, VO, 3 vezes/dia
em cães).
O uso de antibióticos pode ser justificado, em parte, pelo tratamento em potencial de enteropatógenos não diagnosticados. O metronidazol (10 a 20 mg/kg, VO, 2 vezes/dia) é o antibiótico de primeira escolha para o tratamento de várias
formas de DII em pequenos animais. Pode ter efeito imunomodulador. Tilosina (10 mg/kg, VO, 3 vezes/dia) também pode ter este efeito e ser eficaz no tratamento de DII canina. Colite ulcerativa histiocítica em animais da raça Boxer é
responsiva à enrofloxacino, o que sustenta a hipótese de que esta forma particular de DII é consequência de uma infecção por um microrganismo específico.
Os  corticosteroides  podem  ser  úteis  tanto  na  doença  de  intestino  delgado  quanto  de  intestino  grosso.  As  doses  iniciais  recomendadas  são  2  mg  de  prednisona  ou  de  prednisolona/kg/dia  ou  0,25  mg  de  dexametasona/kg/dia.  Efeitos
adversos incluem poliúria, polidipsia, polifagia e distúrbios GI (p. ex., vômito, diarreia, melena). As doses devem ser reduzidas gradualmente a cada 7 a 10 dias, até que se obtenha a menor dose efetiva para controlar os sinais clínicos e, se
é possível, interrupção total da medicação. Uma preparação revestida do glicocorticoide budesonida foi efetiva em manter a remissão de DII em pessoas. Um estudo preliminar mostrou eficácia aparente em cães e gatos, porém informações
sobre o uso deste fármaco são limitadas. A droga sofre eliminação substancial de primeira passagem devido à imediata inativação no fígado, resultando em baixa biodisponibilidade sistêmica e ação reduzida no eixo hipotálamo­hipófise­
adrenal, tornando o hiperadrenocorticismo iatrogênico menos comum do que com outros glicocorticoides. A dosagem ótima para cães é desconhecida. Empiricamente, foram recomendadas doses de 1 mg/m2, VO, 1 vez/dia, para cães, e 1
mg/animal/dia, VO, para gatos.
Em casos refratários, a adição de um fármaco imunossupressor à terapia com glicocorticoides pode ser benéfica. Azatioprina (para cães) e clorambucila (para gatos) podem ser utilizados. A dose de azatioprona é 2,2 mg/kg, VO, 1
vez/dia. Efeitos adversos incluem mielossupressão, pancreatite e hepatotoxicidade. As doses de azatioprina podem ser reduzidas gradualmente após várias semanas. Tipicamente, a prednisona é reduzida primeira (em 25% a cada 2 a 3
semanas). Após a redução da prednisona para 0,5 mg/kg, em dias alternados, sem recidiva, a azatioprina passa a ser administrada em dias alternados.
A azatioprina não é recomendada aos gatos devido sua sensibilidade aos efeitos adversos. Em vez disso, gatos são tratados com uma combinação de prednisona e clorambucila (0,1 a 0,2 mg/kg ou 1 mg/gato). Os sinais clínicos melhoram
em 3 a 5 semanas, embora 4 a 8 semanas de tratamento sejam indicadas. Hemograma deve ser realizado a cada 2 semanas para monitorar evidências de mielossupressão.
Tratamento  adjuvante  pode  incluir  ácido  ursodeoxicólico  em  gatos  (10  a  15  mg/kg/dia,  VO),  suplementação  com  cobalamina  (29  mg/kg,  SC,  cada  7  dias,  por  4  semanas  e,  então,  a  cada  28  dias  por  3  meses)  em  cães  e  gatos,  e,  se
necessário, outras terapias de suporte.
O tempo de resposta ao tratamento de DII é variável. A qualidade de vida tende a ser ruim e o prognóstico é reservado. Hipoalbuminemia é um sinal prognóstico negativo. O prognóstico é ruim em casos com lesões histológicas graves,
fibrose da mucosa, enterite eosinofílica, enteropatia com perda de proteínas ou síndrome hipereosinofílica. Recidivas ocorrem e são mais frequentemente causadas por imprudência alimentar.

 GASTRENTERITE HEMORRÁGICA
A gastrenterite hemorrágica (GEH) é uma síndrome clinicamente reconhecida, porém pouco descrita em cães. Caracteriza­se por diarreia sanguinolenta aguda e hemoconcentração grave. Cães de raças toy e miniatura parecem predispostos.
Não há preferência por sexo ou idade.
ETIOLOGIA  E  FISIOPATOLOGIA:   Desconhece­se  a  etiologia,  porém  suspeita­se  de  hipersensibilidade  intestinal  ou  uma  consequência  da  infecção  por  Clostridium  perfringens  e  produção  de  enterotoxinas.  Hipersensibilidade  a  outras
bactérias, dieta ou antígenos parasitários não pode ser excluída. Ocorre extravasamento de fluidos, de proteínas plasmáticas e hemácia no lúmen intestinal em decorrência do aumento da permeabilidade intestinal.
ACHADOS CLÍNICOS:
Início agudo de diarreia hemorrágica profusa (normalmente que lembra geleia de framboesa) em cães de raças toy ou miniatura é característico de GEH. Vômito, anorexia, letargia e dor abdominal são comuns. Perda de fluido expressiva
e  peraguda  pode  resultar  em  choque  hipovolêmico  antes  da  desidratação  ser  clinicamente  reconhecida.  Outras  informações  nos  históricos  (p.  ex.,  imprudência  dietética,  estado  de  vacinação  etc.)  são  comuns.  GEH  não  é  considerada
contagiosa.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico baseia­se, tipicamente, no início agudo dos sinais clínicos, com hemoconcentração (VG 55%) e concentração plasmática de proteína total normal ou levemente diminuída. Cultura seletiva para patógenos nas
fezes (p. ex., Clostridium spp, Yersinia spp, Campylobacter spp, Escherichia coli enterotoxigênica) e avaliação para enterotoxinas de Clostridium spp por ELISA em amostras de fezes podem ser realizadas. Anormalidades no hemograma
normalmente se limitam à hemoconcentração e leucocitose por eosinofilia. Neutropenia, sepse e/ou enterite por parvovírus podem ser um problema. O perfil bioquímico sérico pode estar normal ou indicar discreta pan­hipoproteinemia,
hipoglicemia (sepse, menor ingestão de alimentos, com reserva limitada de glicogênio hepático) e anormalidades eletrolíticas compatíveis com perda GI e menor ingestão de alimentos (i. e. hipopotassemia, hiponatremia, hipocloremia). Há
relatos anedóticos de tempo de coagulação moderadamente prolongado (< 10%) (tempo de coagulação ativado, tempo de protrombina, tempo de tromboplastina parcial), potencialmente atribuído à inflamação ou à hemoconcentração. Se os
tempos de coagulação são moderadamente ou extensamente prolongados, deve ser investigada coagulopatia ou coagulação intravascular disseminada (CID). Concentração sérica basal de corticosteroide deve estar normal ou aumentada; é
um  teste  de  triagem  apropriado  para  hipoadrenocorticismo.  Anormalidades  radiográficas  e  ultrassonográficas  devem  ser  limitadas  à  imagem  de  íleo  difuso  e  alças  intestinais  preenchidas  com  fluidos.  O  diagnóstico  diferencial  inclui
gastrenterite bacteriana, viral (i. e. parvovírus, coronavírus) e parasitária (i. e. Trichuris vulpis, Ancylostoma spp, Uncinaria spp);  distúrbios  sistêmicos  com  envolvimento  secundário  do  trato  GI  (i.  e.  hipoadrenocorticismo,  pancreatite,
insuficiência renal, doença hepática etc.); coagulopatia (i. e. intoxicação por rodenticida, trombocitopenia, trombocitopatia etc.); úlcera GI grave; neoplasia e perfuração GI de qualquer etiologia.
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  Fluidoterapia IV agressiva é a parte principal do tratamento. A velocidade de administração de fluido isotônico baseia­se na perfusão do paciente, no grau de desidratação e na perda progressiva de fluido. Cães
com hipoproteinemia intensa ou em choque podem se beneficiar de terapia com coloide natural ou sintético (plasma estocado ou congelado recentemente). Indicam­se antibióticos parenterais eficazes contra Clostridium spp (i. e., 22 mg de
ampicilina/kg, IV, 3 a 4 vezes/dia) e para diminuir o risco de sepse secundária à translocação bacteriana. Dependendo da concentração sérica de potássio, os fluidos de manutenção devem ser suplementados com 20 a 40 mEq de cloreto de
potássio/l, a fim de prevenir hipopotassemia. Cães hipoglicêmicos necessitam suplementação de dextrose (2,5 a 5%) na fluidoterapia IV. Tratamento adicional de suporte, inclusive terapia antiemética e controle da dieta, como descrito
anteriormente (ver p. 423 e p. 416).
O prognóstico é bom, desde que o tratamento seja apropriado. Porém, podem ocorrer sérias complicações, inclusive hipoproteinemia grave, CID, sepse, choque hipovolêmico e óbito.

 GASTRITE
Gastrite é um termo geral utilizado para descrever uma síndrome de vômito agudo ou crônico secundário à inflamação da mucosa gástrica. Irritação, infecção, estimulação antigênica ou lesão (i. e. erosão, químico ou úlcera) da mucosa
gástrica estimula a liberação de mediadores inflamatórios e vasoativos com subsequente rompimento das células epiteliais gástricas, aumento da secreção de ácido gástrico e prejuízo da função da barreira gástrica. Receptores viscerais
sensíveis à distensão gástrica, inflamação gástrica e tonicidade dos conteúdos gástricos enviam impulsos via nervos vago e simpáticos para o centro do vômito no bulbo, estimulando, assim, o reflexo do vômito.
GASTRITE  AGUDA:   Na  gastrite  aguda,  o  vômito  de  início  repentino  é  assumido  ou  confirmado  ser  secundário  à  inflamação  da  mucosa  gástrica.  As  causas  incluem  imprudência  ou  intolerância  dietética  (i.  e.  ingestão  de  alimentos
desconhecidos,  estragados  ou  contaminados,  ou  material  estranho),  ingestão  de  drogas  ou  toxinas  (i.  e.  antibióticos,  AINE,  corticosteroides,  plantas,  produtos  químicos),  doenças  sistêmicas  (i.  e.  pancreatite,  gastropatia  urêmica,
hipoadrenocorticismo), endoparasitismo (i. e. Physaloptera sp [cães], Ollulanos sp [gatos]) infecção bacteriana (i. e. doenças associadas a Helicobacter) ou viral (i. e., gastrenterite por parvovírus canino, panleucopenia felina). Vômito de
início súbito é característico. O vômito pode conter bile, alimentos, espuma, sangue (puro ou digerido) ou evidências da substância ingerida (i. e. grama, osso, material estranho etc.). Sinais clínicos adicionais dependem da gravidade e
frequência do vômito assim com das causas de base.
O diagnóstico é baseado normalmente no histórico, achados clínicos e resposta ao tratamento sintomático. Um diagnóstico específico deve ser procurado se o animal teve acesso a objetos estranhos ou toxinas, se sinais clínicos não
desaparecerem dentro de 2 dias da terapia sintomática, se hematêmese ou melena estiverem presentes, se o animal apresenta­se sistemicamente doente ou se anormalidades são percebidas na palpação abdominal. Cães podem sinalizar a
presença  de  desconforto  abdominal  cranial  por  adotarem  uma  posição  de  “prece”  (quartos  traseiros  elevados  e  peito  e  membros  torácicos  mantidos  próximos  ao  solo),  posição  que  aparentemente  confere  alguma  sensação  de  alívio.
Hemograma,  perfil  bioquímico  sérico  e  urinálise  seguidos  de  testes  clinicopatológicos  mais  específicos  (i.  e.  imunorreatividade  da  lipase  pancreática,  concentração  sérica  basal  de  cortisol,  teste  de  estimulação  do  hormônio
adrenocorticotrófico [ACTH], avaliação do conteúdo do vômito para toxinas específicas). Diagnósticos por imagem, inclusive radiografias abdominais simples e/ou com contraste de bário e ultrassonografia abdominal, podem ser indicados.
O tratamento de gastrite aguda normalmente é sintomático e de suporte. Pequenas quantidades de fluidos orais podem ser administradas frequentemente, com o aumento do volume quando o vômito diminui. Gelo (picado ou em cubos)
pode ser utilizados, inicialmente, como fonte única de água. Administração subcutânea de solução isotônica eletrolítica balanceada pode ser o suficiente para corrigir o discreto déficit de fluidos (< 5%). Se a desidratação é moderada ou
grave ou a condição clínica do animal justifica fluidoterapia IV, indica­se avaliação diagnóstica mais ampla. Se o vômito é agudo, a ingestão oral deve ser suspensa por = 24 h. Pequenas quantidades de alimentos leves, com baixo teor de
gordura e facilmente digeríveis (i. e. carne magra cozida, frango ou queijo cottage e arroz ou ração comercial destinadas a tal fim), fornecidas frequentemente, podem ser introduzidas com transição gradual para a dieta normal, ao longo de 3
a 5 dias.
Fármacos antieméticos devem ser utilizados para controlar o vômito apenas após que o diagnóstico etiológico tenha sido estabelecido ou se o vômito é prolongado e grave o bastante para causar desidratação ou desequilíbrio eletrolítico.
Metoclopramida  (0,3  mg/kg,  PO  ou  SC,  3  vezes/dia  ou  2  mg/kg/dia  como  infusão  a  velocidade  constante)  aumenta  a  contração  gástrica,  relaxa  o  esfíncter  pilórico  e  aumenta  o  peristaltismo  gástrico,  duodenal  e  jejunal  proximal.  É
contraindicada na suspeita de obstrução GI, ou em casos confirmados. Antieméticos alternativos incluem ondansetron (0,1 a 1,0 mg/kg VO, 1 a 2 vezes/dia), maropitant (1 mg/kg, SC, 1 vez/dia, ou 1 a 2 mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 5 dias) e
clorpromazina (0,5 mg/kg, IV, IM ou SC, 3 a 4 vezes/dia).
GASTRITE CRÔNICA:  A gastrite crônica deve ser considerada em animais com vômito intermitente ou persistente que se estende por mais de 7 dias e que não pode ser atribuída à imprudência ou intolerância dietética, ingestão de drogas ou
toxinas, doenças sistêmica, endoparasitoses, infecções (bacteriana ou viral) ou neoplasia. O sinal clínico mais comum é o vômito intermitente de alimentos ou bile. Doenças sistêmicas, perda de peso e úlceras GI não são frequentes e devem
levantar a suspeita de uma condição mais séria ou inflamação GI difusa (i. e. doença inflamatória do intestino, pitiose etc.).
Hemograma, perfil bioquímico sérico, urianálise, concentração total de hormônio da tireoide [gatos], concentração sérica basal de cortisol, teste de estimulação do ACTH (para excluir hipoadrenocorticismo canino) e exame de fezes para
endoparasitoses  são  indicadas,  mas  frequentemente  são  normais  em  animais  com  gastrite  crônica.  Exame  histológico  de  amostra  de  biopsia  gástrica  obtida  por  endoscopia  ou  cirúrgica  é  necessário  para  o  diagnóstico  definitivo  e
classificação  da  gastrite  crônica.  Todavia,  antes  de  realizar  um  diagnóstico  histológico,  são  indicados  vermífugos  de  amplo  espectro,  radiografias  abdominais  (simples  e/ou  com  contraste  de  bário)  e  ultrassonografia  abdominal  (para
identificar objetos estranhos, neoplasias, estenose pilórica, hipertrofia da mucosa gástrica antral, anormalidades discreta ou multifocal da mucosa ou mural, linfadenomegalia intra­abdominal ou outras patologias intra­abdominais).
Gastrite linfocítica­plasmacitária e gastrite eosinofílica são caracterizadas por infiltração difusa na mucosa gástrica e lâmina própria por linfócitos e plasmócitos ou eosinófilos, respectivamente. Infiltrados celulares similares podem
ser observados no intestino delgado. Concomitante hiperplasia linfoide, atrofia da mucosa ou fibrose não é frequentemente observada. Intolerância ou alergia à dieta, parasitismo subclínico ou resposta hiperimune a antígenos normais têm
sido propostos como possíveis causas. Gastrite eosinofílica com eosinofilia e/ou lesões de pele devem induzir à suspeita de sensibilidade à dieta ou síndrome eosinofílica (gatos).
Animais com sinais clínicos moderados e lesões histológicas podem responder à alimentação exclusiva com nova dieta proteica ou hipoalergênica (i. e. dieta caseira balanceada ou opções disponíveis no mercado). Além dos tratamentos
sintomáticos e de suporte e modificação da dieta (ver texto anterior), animais com doença moderada a grave geralmente requerem terapia imunossupressora. Prednisona (ou prednisolona em gatos) é iniciada na dose de 2 mg/kg, VO, 1
vez/dia e, então, reduzida para a menor dose efetiva para controlar os sinais clínicos. Assim que ocorre remissão clínica continuada, a terapia com prednisona é suspensa e aderência rígida à terapia dietética, mantida. Se os sinais clínicos
persistem, apesar das modificações na dieta e do tratamento com prednisona, podem ser utilizados imunossupressores adicionais (cães: 2 mg de azatioprina/kg, VO, a cada 24 a 48 h; gatos > 4 kg: 2 mg de clorambucila [dose total] VO, cada
48 h, por 2 a 4 semanas e, então, reduzida para 2 mg a cada 72 a 96 h; gatos < 4 kg: 2 mg de clorambucila [dose total] VO, cada 72 h). Podem também ser indicados gastroprotetores, como antagonistas de receptores H2 (i. e. 2 mg de
ranitidina/kg ou 0,5 a 1 mg de famotidina/kg, VO, SC ou IV, 2 a 3 vezes/di a), inibidores da bomba de prótons (i. e. 0,7 a 2,0 mg de omeprazol/kg, VO, 1 vez/dia) e sucralfato (0,5 a 1 g, VO, 3 vezes/dia).
Gastrite atrófica crônica caracteriza­se por infiltração de células inflamatórias, afinamento da mucosa gástrica e atrofia das glândulas gástricas. Uma forma de gastrite atrófica especial, relacionada com a raça Norwegian Lundehund,
não  está  associada  à  infecção  por  Helicobacter  spp  embora  esteja  associada  a  adenocarcinoma  gástrico.  O  papel,  se  algum,  da  infecção  por  Helicobacter  spp  no  desenvolvimento  de  gastrite  atrófica  é  desconhecido.  Todavia,  se  este
microrganismo é encontrado em amostras de biopsia gástrica, indica­se o tratamento (ver p. 365). Opções adicionais de tratamento incluem controle da dieta e imunossupressão, da mesma maneira mencionada para gastrite linfocítica­
plasmocitária e gastrite eosinofílica (ver texto anterior); todavia, faltam dados a respeito da eficácia do tratamento e do prognóstico.
Gastropatia hipertrófica crônica é caracterizada por hipertrofia difusa ou focal da mucosa gástrica e grandes dobras rugosas ou ambas, com infiltrado inflamatório variável. A lesão é mais frequentemente marcante na região pilórica
com resultante obstrução do fluxo gástrico. Vômito em jato do alimento dentro de algumas horas após as refeições pode ser descrito. Cães mais velhos, machos e de raças pequenas são mais frequentemente acometidos (i. e. Lhasa Apsos,
Shih Tzus, Malteses, Poodles Miniatura). Hipergastrinemia devido à secreção exagerada (i. e. neoplasia secretora de gastrina, gastroenteropatia em basenjis) ou depuração inadequada (i. e. doença renal ou hepática, acloridria) podem iniciar
a hipertrofia da mucosa. Correção cirúrgica via piloroplastia e/ou a remoção de tecido hipertrofiado pode ser necessária para aliviar os sinais clínicos.

 INFECÇÃO POR HELICOBACTER
Helicobacter spp é encontrado normalmente no estômago, tanto de cães e gatos saudáveis quanto doentes (com vômito), porém sua relevância é desconhecida. Embora infecções por H. pylori em pessoas foram associadas à gastrite, úlcera
péptica e alta taxa de neoplasia gástrica, uma relação causal direta entre infecção por Helicobacter e doença GI não foi estabelecida em cães e gatos.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  Helicobacter é um microrganismo espiralado ou curvado, Gram­negativo, móvel e flagelado. H. pylori é a espécie mais comumente encontrada em infecções GI de pessoas, porém microrganismos maiores
semelhantes a Helicobacter (como H felis, H heilmannii e H bizzozeronii) são mais comuns em cães e gatos. Pelo menos 38 espécies de Helicobacter foram identificadas em animais; animais infectados podem hospedar várias espécies.
Helicobacter é  mais  comumente  detectado  no  tecido  gástrico  de  cães  e  gatos,  especialmente  no  fundo  gástrico  e  no  cárdia,  mas  pode  ser  isolado  no  trato  intestinal.  A  colonização  da  mucosa  gástrica  parece  ser  mais  prevalente  na
superfície da camada mucosa, assim como nas glândulas gástricas e nas células parietais. Há relatos esporádicos de Helicobacter no tecido hepático de cães com hepatite necrosante multifocal, bem como em gatos normais e naqueles com
colangioepatite.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Gastrite, vômito e diarreia foram associados à infecção por Helicobacter, embora sem constatação de uma relação causal direta. Úlcera péptica raramente está associada à infecção por Helicobacter em
cães e gatos.
O diagnóstico envolve endoscopia do trato GI superior ou laparotomia exploratória. Amostras de muco superficial de uma grande área do estômago pode ser obtido por meio de endoscopia, com auxilio de pincel apropriado. Caso haja
microrganismos eles são facilmente identificados em microscopia, em aumento de 100 x em óleo de imersão. Como a citologia em pincel permite amostragem de uma grande área do estômago, a sensibilidade deste teste é alta.
Biopsia gástrica deve ser obtida de múltiplas áreas do estômago, uma vez que a distribuição da bactéria pode ser desigual. Coloração hematoxilina­eosina (H&E) de rotina é normalmente suficiente para identificar os microrganismos,
embora seja necessária coloração especial com prata, se a bactéria se localiza na glândula. Inflamação da mucosa, degeneração glandular e hiperplasia folicular linfoide acompanham algumas infecções. Citologia e histopatologia não são
suficientes para identificar algumas espécies. Um teste de urease rápido, no mercado disponível para verificar a produção de urease bacteriana em biopsia gástrica, pode detectar a presença de Helicobacter. Todavia,  como  citologia  e
histopatologia são altamente confiáveis e específicos na identificação de infecções por Helicobater, o teste de urease adiciona muito pouco ao diagnóstico.
Testes não invasivos para detecção de infecções por Helicobacter disponíveis no âmbito da pesquisa incluem teste de ureia no hálito, detecção de antígeno fecal e sorologia.
TRATAMENTO:  A falta de conhecimento sobre a patogenicidade das infecções por Helicobacter em cães e gatos dificultam a tomada de decisão sobre o tratamento. Infecções por H. pylori em pessoas são tratadas com terapia antimicrobiana
dupla ou tripla, associada a um inibidor da secreção gástrica (p. ex., claritromicina, amoxicilina, bismuto e ranitidina), por 2 semanas; estratégias terapêuticas similares têm sido utilizadas em medicina veterinária.
Porém, infecções por Helicobacter em cães e gatos são difíceis de serem erradicadas e recomendações específicas de tratamento não são possíveis. Alguns estudos clínicos citam melhora da gastrite crônica e vômito após tratamento de
cães e gatos infectados com Helicobacter, sugerindo que o tratamento da infecção em cães e gatos que apresentam sinais clínicos deve ser considerado.
RISCO DE ZOONOSE:  A transmissão de Helicobacter entre grupos de cães e gatos não é clara e não foram identificados hospedeiros reservatórios. Devido às altas taxas de morbidade e mortalidade associadas à infecção por H pylori em
pessoas, aumentou­se a preocupação com a transmissão zoonótica. Infecção por H pylori foi relatada em uma colônia de felinos de pesquisa; não foi identificada em cães. Enquanto alguns estudos sugerem um risco maior de infecção
por  Helicobacter  em  pessoas  que  estão  em  contato  com  cães  e  gatos,  outras  pesquisas  refutam  esse  administrado.  Portanto,  a  transmissão  zoonótica  de  Helicobacter  é  considerada  possível,  porém  o  risco  provavelmente  é  baixo.
Independente disso, ótimas práticas de higiene são encorajadas; a identificação da infecção em cães e gatos com gastrite crônica e vômito é bastante prudente.

 NEOPLASIAS GASTRINTESTINAIS
As neoplasias do sistema gastrintestinal são incomuns, onde tumores gástricos representam < 1% e tumores intestinais < 10% de todos os cânceres em cães e gatos. As neoplasias gastrintestinais tendem a ser malignas. A média de idade de
cães com neoplasias GI é de 6 a 9 anos e de gatos de 10 a 12 anos.
ETIOLOGIA  E  FISIOPATOLOGIA:  Agentes  etiológicos  específicos  não  foram  identificados.  O  maior  risco  de  carcinoma  gástrico  em  cães  Pastor  Belga  e  de  adenocarcinoma  intestinal  e  linfoma  em  gatos  siameses  podem  ser  indícios  de
predisposição genética. Leucemia felina é sugerida como fator desencadeante ao desenvolvimento de linfoma GI felino, mesmo em gatos com estado retroviral negativo. Infecções por Helicobacter são associadas à neoplasia gástrica em
pessoas, porém ligações diretas similares não foram estabelecidas em cães e gatos.
Adenocarcinomas são as neoplasias gastrintestinais mais comuns em cães e são mais frequentemente encontradas no duodeno, cólon e reto. Adenocarcinomas gástricos normalmente afetam o terço inferior do estômago (i. e. a última
curvatura e a região pilórica). Em gatos, adenocarcinoma é comumente identificado no jejuno e íleo. Adenocarcinomas são agressivos e frequentemente enviam metástase para linfonodos regionais, fígado e pulmões. No momento do
diagnóstico em cães, até 44% dos adenocarcinomas intestinais e até 95% dos gástricos têm metástase.
Adenomas e carcinomas localizados são incomuns no trato gastrintestinal de cães e raros em gatos. Essas massas semelhantes a pólipos são normalmente isoladas e localizadas no cólon ou reto de cães. São consideradas doenças locais,
embora especula­se que eles podem se transformar em adenocarcinomas agressivos com o passar do tempo.
Linfoma é a neoplasia gastrintestinal mais comum em felinos; é também comum em cães. Linfomas GI normalmente afetam o intestino delgado assim como órgãos extraintestinais, tais como o fígado. Dois tipos de linfomas GI felino
foram reportados: linfoma de pequenas células linfocíticas e de baixo grau e um subtipo pouco diferenciado e agressivo de linfoma. Linfoma GI canino normalmente é pouco diferenciado e agressivo.
Liomiomas e os liomiossarcomas não são comuns em cães e são extremamente raros em gato. Os tumores são de crescimento lento: aproximadamente 80% dos liomiossarcomas não apresentam metástase no momento do diagnóstico.
Esses tumores estromais estão associados à hipoglicemia paraneoplásica que se resolve uma vez que o tumor é extirpado. Outras neoplasias GI não comumente reportadas em cães e gatos incluem fibrossarcomas, tumores de mastócitos e
plasmacitomas.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos dependem da localização e extensão do tumor e das possíveis metástases ou síndromes paraneoplásicas (i. e. hipercalcemia e hipoglicemia). Os sinais clínicos mais comuns associados à neoplasia GI
incluem vômito (com ou sem sangue), anorexia, perda de peso, diarreia e letargia. Sinais de constipação intestinal ou tenesmo podem acompanhar tumores retais ou de cólon. Massa abdominal ou organomegalia podem ser palpáveis. Dor
abdominal e ascite podem refletir peritonite secundária a uma porção rompida do intestino neoplásico.
DIAGNÓSTICO:  Testes rotineiros de laboratório e radiografias simples não mostram alterações específicas associadas a neoplasias GI. Hipoglicemia normalmente está associada a liomiomas/leiomiosarcomas. Hipercolesterolemia e atividade
elevada de fosfatase alcalina foram observadas em algumas neoplasias não linfomatosas. Anemia microcítica com ou sem hipoproteinemia é um achado comum com massas tumorais ulcerativas e hemorragia crônica. Desequilíbrio ácido­
base e de eletrólitos podem refletir vômito e incluir hipocloremia, hipopotassemia e alcalose ou acidose metabólica. Hipercalcemia paraneoplásica foi associada à linfoma e adenocarcinoma intestinal.
Radiografias  abdominais  contrastadas  podem  revelar  massas  no  trato  GI  ou  áreas  de  úlcera.  Ultrassonografia  abdominal  pode  evidenciar  espessamento  do  trato  Gi  e  perda  das  camadas  normais.  Linfonodos  regionais  podem  estar
aumentados e esplenomegalia e/ou hepatomegalia podem ser vistos em alguns casos de linfoma GI. Ultrassonografia pode facilitar a coleta de amostra para análise citológica ou histológica por meio de biopsia com agulha ou aspiração com
agulha fina.
Endoscopia do trato GI superior ou inferior podem auxiliar na identificação e na obtenção de amostra por biopsia de espessamento parcial. O pequeno tamanho e a natureza superficial das amostras de biopsia obtidas durante endoscopia
não permitem diagnóstico definitivo porque alguns tumores situam­se na submucosa. Um falso diagnóstico de gastrite ou enterite pode ser reflexo de inflamação da mucosa que reveste a neoplasia. Biopsias cirúrgicas de espessura completa
coletadas via laparoscopia ou laparotomia são mais adequadas para estabelecer um diagnóstico e permitem uma biopsia de linfonodos regionais e fígado para avaliar metástases.
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  A remoção cirúrgica é recomendada para neoplasias não metastásicas e não linfomatosas; margens = 4 cm são recomendadas, se possível.
O tempo médio de sobrevida de cães com adenocarcinoma GI é de 10 a 15 meses, se o tumor é focal e completamente removido; porém é de apenas 3 meses se há metástase por ocasião do diagnóstico. Não há relato de quimioterapia
eficaz para o tratamento de adenocarcinoma GI.
Linfoma gastrintestinal normalmente é tratado com quimioterapia. Linfoma bem diferenciado, de baixo grau e pequenas células é tratado com prednisona (5 mg, VO, 1 a 2 vezes/dia) e clorambucila (2 mg, VO, em dias alternados, ou 15
mg/m2, 1 vez/dia, por 4 dias, a cada 3 semanas). O prognóstico do linfoma GI de pequenas células é bom, com tempo médio de sobrevida de 765 dias reportados em estudo recente. Linfomas GI não diferenciados em cães e gatos são pouco
responsivos  à  quimioterapia.  Se  o  tratamento  não  é  suficiente,  um  protocolo  quimioterápico  multidrogas  (i.  e.  Wiscosin­Madison)  é  recomendado,  porém  o  tempo  médio  de  sobrevida  é  <  2  meses.  Linfoma  focal  pode  ser  removido
cirurgicamente. Quimioterapia de acompanhamento pode ser recomendada dependendo do tipo e natureza do processo neoplásico.
Neoplasia  GI  maligna  normalmente  tem  prognóstico  ruim  (i.  e.  <  6  meses  sobrevida),  mesmo  com  terapia  medicamentosa  e  cirúrgica.  Lesões  benignas,  como  liomiomas  e  adenomas  colorretais,  têm  bom  prognóstico  após  remoção
cirúrgica.

 OBSTRUÇÃO GASTRINTESTINAL
Obstrução GI normalmente ocasiona vômito não tratável, com consequências que podem induzir risco à vida do animal, incluindo possível aspiração, desequilíbrio ácido­base e de eletrólitos e desidratação. Dependendo das causas da
obstrução, o local pode sofrer lesão tecidual, resultando em perfuração, endotoxemia e choque hipovolêmico. Portanto, obstrução GI deve ser tratada como emergência.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  Obstrução do trato GI pode ser decorrência de várias causas extraluminais, intramurais ou intraluminais. A causa extraluminal mais comum é intussuscepção, no qual um segmento invaginado do trato GI se
torna englobado por um segmento anterógrado ou retrógrado. Intussuscepção pode ser secundária à infecção endoparasítica, infecção parvoviral, ingestão de corpo estranho ou neoplasia, porém normalmente é idiopática. O local mais
comum de intussuscepção é a junção ileocecocólica. Intussuscepção gastresofágica e pilorogástrica são formas de intussuscepção incomuns, agudas e graves, que estão associadas a altas taxas de mortalidade. Pastores alemães podem
apresentar predisposição à intussuscepção gastresofágica. Encarceramento intestinal em hérnias ou no mesentério pode resultar em estrangulamento das alças intestinais e rápido desenvolvimento de choque hipovolêmico.
Obstrução intramural pode ser causada por doenças infiltrantes tais como neoplasias, infecção por fungos (i. e. pitiose) e granulomas (i. e. secundária a peritonite infecciosa felina). Estenose pilórica pode causar obstrução do fluxo
gástrico e foi reportada como uma condição nas raças braquicefálicas.
Obstrução intraluminal normalmente ocorre em cães e gatos após a ingestão de corpo estranho e pode ser parcial ou completa. Corpos estranhos lineares ou pequenos são mais prováveis de causar obstrução parcial, enquanto a ingestão
de objetos grandes e circulares normalmente leva à obstrução completa. Corpos estranhos são, geralmente, objetos que não podem ser digeridos (i. e. plásticos, pedras), que são digeridos lentamente (i. e. ossos) ou são muito grandes para
passar pelo trato GI. Cães, com depravação do apetite consomem tais objetos, enquanto gatos ingerem corpos estranho lineares (i. e. barbantes, fios, fio dental) enquanto brincam com eles.
Independente da etiologia, obstrução GI não tratada leva a distensão da parte mais proximal do trato GI com fluido e gás. Encarceramento das alças intestinais secundárias a hérnias ou rasgos mesentéricos resulta em estrangulamento e
aprisionamento do intestino. O retorno venoso fica prejudicado, levando a congestão venosa, anoxia e necrose. Pode ocorrer desvitalização do tecido GI e translocação de bactérias, como Escherichia coli e clostrídios, do lúmen para o
tecido. Se não tratado, pode ocorrer edema, hemorragia, descolamento da mucosa e, por fim, necrose intestinal.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Intussuscepção é mais comum em cães jovens. Intussuscepção intestinal causa tipicamente sinais de dor abdominal, vômito e diarreia com ou sem sangue. Intussuscepções no trato GI mais proximal (i.
e. gastresofágica e pilorogástrica) causam vômito e regurgitação.
Obstrução por corpo estranho é também mais comum em animais mais jovens. Sinais clínicos variam dependendo da duração, grau e localização do corpo estranho, porém normalmente incluem vômito e anorexia. Vômito é menos
comum na obstrução distal do intestino delgado. Diarreia, perda de peso, letargia e sinais de choque séptico são menos comuns. O quadro clínico pode não ser evidente ou o exame físico pode indicar sinais de dor abdominal ou massa
intestinal palpável. Inspeção da cavidade bucal pode revelar corpos estranhos lineares, possivelmente ancorados na base da língua em gatos.
Sinais de choque hipovolêmico e dor abdominal são normalmente notados em casos de encarceramento intestinal.
Achados laboratoriais associados à ingestão de corpos estranhos incluem leucocitose com discreto desvio à esquerda. Em casos de perfuração GI e peritonite bacteriana secundária ou sepse, nota­se leucocitose ou leucopenia marcante
com desvio à esquerda degenerativo. Obstrução GI proximal está tipicamente associada à hipocloremia, hipopotassemia e alcalose metabólica, enquanto obstrução de trato GI mais distal está associada à acidose metabólica. Estudo recente
realizado em cães mostrou que hipocloremia e alcalose metabólica foram as duas alterações mais comuns, independente do local de obstrução GI. Hiperlactatemia e hemoconcentração (aumento do volume globular e de proteína total)
também são achados frequentes.
Radiografias simples podem auxiliar na localização dos corpos estranhos radiopacos. Obstrução completa pode resultar em alterações radiográficas, como dilatação de alças intestinais e de íleo, com fluidos e/ou gás, enquanto corpos
estranhos lineares podem resultar em pregueamento intestinal. Todavia, esses achados não são específicos para corpos estranhos e podem ser observados em outras causas de obstrução GI, inclusive estenose, aderência, intussuscepção e
neoplasia intestinais. Radiografia abdominal contrastada pode ser útil na detecção de corpos estranhos radiolúcidos, que ocasionam defeitos de preenchimento, e em casos de intussuscepção. Bário é comumente utilizado como contraste
radiográfico, porém se há suspeita de perfuração, deve­se utilizar iodo ou ioexol aquoso.
Ultrassonografia abdominal pode auxiliar na detecção de corpos estranhos GI e dilatação de alças intestinais com fluidos. Imagens sonográficas transversais de intussuscepção intestinal geralmente mostram lesões tipo “alvo”, com anéis
concêntricos hiperecoicos e hipoecoicos. Grande quantidade de gases intestinais pode causar sombras na imagem. Sinais de peritonite e perfuração GI detectável com radiografia ou ultrassonografia podem incluir efusão abdominal ou gás
livre. Efusão abdominal, se presente, deve ser avaliada citologicamente para peritonite séptica. Exame endoscópico pode ser útil para identificar corpos estranhos ou massas e lesões.
TRATAMENTO:  A maioria dos corpos estranhos deve ser removida via recuperação endoscópica ou cirúrgica devido ao potencial de obstrução ou perfuração. Alguns corpos estranhos pequenos e macios podem passar tranquilamente pelo
trato GI; o movimento do corpo estranho pode ser monitorado com radiografia abdominal. Se o corpo estranho não está em movimento e se a obstrução ou a piora dos sinais clínicos é aparente, intervenção é necessária. Corpos estranhos
lineares na cavidade bucal devem ser cortados e nunca puxados na tentativa de recuperar o corpo estranho.
Corpos estranhos de cólon são frequentemente identificados acidentalmente e não necessitam remoção. Caso sejam a causa dos sinais clínicos, a remoção endoscópica é preferida à abertura cirúrgica do cólon. Desequilíbrios de fluidos,
eletrólitos e ácido–base devem ser corrigidos antes da anestesia, se possível.
Recuperação cirúrgica ou endoscópica do corpo estranho está associada à alta taxa de sobrevivência. A utilidade da endoscopia é limitada, tipicamente, a remoção do corpo estranho gástrico. O endoscópio deve passar o intestino delgado
o mais distalmente possível para avaliação e radiografias tiradas enquanto o animal está ainda anestesiado para avaliar corpos estranhos adicionais.
Endoscopia  pode  não  permitir  o  acesso  ao  trato  GI  distal  à  região  pilórica  ou  proximal  do  duodeno.  Se  há  corpos  estranhos  distais  à  região  pilórica,  corpos  estranhos  em  múltiplos  locais  ou  sinais  de  peritonite  séptica,  indica­se
laparotomia exploratória. Laparotomia exploratória é também preferida à endoscopia em casos suspeitos de intussuscepção e obstrução secundária à lesão tumoral. Durante a cirurgia, todo o trato GI deve ser inspecionado quanto à presença
de objetos que podem causar obstrução; avalia­se a vitalidade do trato GI e áreas de perfuração ou isquemia são removidas. Se um corpo estranho linear está presente no estômago e se prolonga para o intestino delgado, manipulação suave
pode liberá­lo de suas ligações distais, permitindo a remoção através de gastrotomia. Caso contrário, múltiplas enterotomias podem ser indicadas. Corpos estranhos devem ser removidos com o mínimo de enterotomia possível, de modo a
reduzir o risco de deiscência pós–operatória. Múltiplos corpos estranhos lisos intestinais podem frequentemente ser “ordenhados” pelo intestino e removidos através de incisão. Corpos estranhos lineares são mais prováveis de causarem
lesões e desvitalização de mucosa e podem afetar grande área do trato GI. Áreas desvitalizadas ou perfuradas devem ser removidas, realizando–se anastomose do trato GI restante. Intussuscepções são manualmente reduzidas ou removidas;
faz­se anastomose do intestino remanescente, se a redução não é possível ou se a alça intestinal está comprometida. Pregueamento intestinal pode auxiliar na redução do risco de recidiva.
Peritonite é tratada com antibióticos e drenagem por sucção fechada ou tratamento com abdome aberto. Alimentos e água podem ser introduzidos 12 h após recuperação, se não há vômito.
PROGNÓSTICO E PREVENÇÃO:  Se a obstrução do trato GI devido a corpos estranhos é diagnosticada e tratada rapidamente, o prognóstico é bom. Animais com peritonite ou sepse apresentam mais complicações pós­operatórias e maior risco
de  deiscência  enterotômica.  Hipoalbuminemia  pré­operatória  está  também  associada  à  uma  taxa  maior  de  deiscência  pós­operatória.  Animais  com  peritonite  ou  que  necessitam  de  remoção  de  uma  grande  parte  do  intestino,  levando  à
síndrome do intestino curto apresentam um prognóstico reservado. Deiscência pós­operatória requer uma segunda cirurgia de emergência e está associada à alta taxa de mortalidade.
Intussuscepções gastresofágica e pilorogástrica estão associadas à taxa de mortalidade e diagnóstico rápido e intervenção cirúrgica são essenciais para maximizar a sobrevida. Obstrução GI secundária à neoplasia é rara; o prognóstico
depende do tipo de neoplasia.

 PARVOVIROSE CANINA
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  O parvovírus canino (PVC) é altamente contagioso e uma causa relativamente comum de doença infecciosa GI aguda, em cães jovens. Embora sua origem exata seja desconhecida, acredita­se ter originado
do vírus da panleucopenia felina ou de um parvovírus relacionado de animais não domésticos. Trata­se de um DNA vírus não envelopado, de cadeia simples, resistente a muitos detergentes e desinfetantes. O PVC infeccioso pode persistir
em ambiente interno, em temperatura ambiente, por até 2 meses; em ambiente externo, se protegido da luz solar e da dessecação, persiste por até 5 meses. Na América do Norte, a doença clínica é amplamente atribuída ao PVC­2b; contudo,
a infecção por uma cepa nova e igualmente virulenta, PVC­2c, está cada vez mais comum.
Cães jovens (6 semanas a 6 meses), não vacinados ou vacinados de forma incompleta, são mais suscetíveis. Cães das raças Rottweiler, Dobermann Pinscher, American Pit Bull Terrier, English Springer Spaniel e German Shepherd são
mais predispostos à doença. Se há ingestão adequada de colostro, filhotes nascidos de fêmeas com anticorpos contra PVC estão protegidos da infecção nas primeiras semanas de vida; contudo, a suscetibilidade à infecção aumenta à medida
que  o  teor  de  anticorpos  maternos  diminui.  Estresse  (p.  ex.,  amamentação,  superlotação,  desnutrição  etc.),  parasitismo  intestinal  concomitante  ou  infecção  por  patógenos  intestinais  (p.
ex., Clostridium spp, Campylobacter spp, Salmonella spp, Giardia spp, coronavírus) foram associados à doença clínica mais grave. Dentre os cães > 6 meses de idade, os machos não castrados estão, de modo mais provável que as fêmeas
não castradas, mais predispostos a desenvolverem enterite por PVC.
O vírus é eliminado nas fezes dos cães infectados dentro de 4 a 5 da exposição (geralmente antes dos sinais clínicos se manifestarem), ao longo do curso da doença, e por cerca de 10 dias após a recuperação clínica. A infecção é adquirida
diretamente por contato com fezes contendo o vírus, ou indiretamente por contato com fômites contaminados pelo vírus (p. ex., ambiente, pessoas, equipamentos). A replicação viral ocorre inicialmente no tecido linfoide da orofaringe, com
sinais sistêmicos resultando da disseminação hematógena subsequente. O PVC preferencialmente infecta e destrói as células que se dividem rapidamente do epitélio das criptas do intestino delgado, tecido linfopoético, e medula óssea. A
destruição do epitélio das criptas intestinais resulta em necrose epitelial, atrofia vilosidade, capacidade absorção prejudicada, e interrupção da função da barreira intestinal, com potencial translocação bacteriana e bacteriemia.
Linfopenia e neutropenia desenvolvem­se secundariamente à destruição das células progenitoras hematopoéticas na medula óssea e tecidos linfopoéticos (p. ex., timo, linfonodos etc.) e são mais exacerbadas por um aumento na demanda
sistêmica por leucócitos. Infecção intrauterina ou em filhotes < 8 semanas ou nos nascidos de fêmeas não vacinadas sem anticorpos naturais podem resultar em infecção, necrose do miocárdio e miocardite. A miocardite, manifestada como
insuficiência  cardiopulmonar  aguda  ou  tardia  e  insuficiência  cardíaca  progressiva,  podem  ocorrer  com  ou  sem  sinais  de  enterite.  Contudo,  a  miocardite  por  PVC­2  é  infrequente,  pois  várias  cadelas  apresentam  anticorpos  contra  PVC
oriundos de imunização ou exposição natural.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos da enterite por parvovírus geralmente se desenvolvem dentro de 3 a 7 dias da infecção. Os sinais clínicos iniciais podem ser inespecíficos (p. ex., letargia, anorexia, febre) com progressão para vômito
e diarreia hemorrágica do intestino delgado em 24 a 48 h. Os achados de exame físico incluem depressão, febre, desidratação, e as alças intestinais que se tornam dilatadas e preenchidas por líquido. Dor abdominal justifica investigação
complementar para excluir complicações potenciais de intussuscepção. Animais severamente acometidos podem apresentar choque, com tempo de preenchimento capilar prolongado, pobre qualidade de pulso, taquicardia e hipotermia –
sinais fortemente consistentes de choque séptico. Embora a leucoencefalomalácia associada ao PVC tenha sido relatada, sinais neurológicos são mais comumente atribuídos à hipoglicemia, sepse ou anormalidades no equilíbrio eletrolítico
ou ácido­base. Infecção inaparente ou subclínica é comum.
Lesões: Lesões macroscópicas, à necropsia, podem incluir parede intestinal espessada e pálida; conteúdo intestinal aquoso, mucoso ou hemorrágico; edema e congestão dos linfonodos abdominais e torácicos; atrofia do timo; e, no caso de
miocardite por PVC, estrias pálidas no miocárdio. Histologicamente, as lesões intestinais são caracterizadas por necrose multifocal do epitélio da cripta, perda da arquitetura da cripta e espessamento e edema das vilosidades. A depleção do
tecido linfoide e de linfócitos corticais (placas de Peyer, linfonodos periféricos, linfonodos mesentéricos, timo, baço) e hipoplasia da medula óssea também são observadas. Edema pulmonar, alveolite e colonização bacteriana dos pulmões e
do fígado também podem ser observados em cães que morreram de complicações da síndrome do desconforto respiratório agudo, síndrome da resposta inflamatória sistêmica, endotoxemia e sepse.
DIAGNÓSTICO:  A enterite por PVC deve ser sustentada em qualquer cão jovem, não vacinado ou vacinado de forma incompleta, com sinais clínicos relevantes. Além do curso da doença, muitos cães desenvolvem uma leucopenia moderada
ou  grave  caracterizada  por  linfopenia  e  neutropenia.  Leucopenia,  linfopenia  e  ausência  de  uma  resposta  de  neutrófilos  bastonetes  dentro  de  24  h  do  início  do  tratamento  foram  associadas  a  um  pobre  prognóstico.  Azotemia  pré­renal,
hipoalbuminemia (perda de proteína GI), hiponatremia, hipopotassemia, hipocloremia e hipoglicemia (estoques inadequados de glicogênio em filhotes jovens, sepse), e enzimas hepáticas aumentadas podem ser notadas no perfil bioquímico
sérico.  ELISA  comercial  para  detecção  de  antígenos  nas  fezes  está  amplamente  disponível.  Muitos  cães  clinicamente  doentes  eliminam  grandes  quantidades  de  vírus  nas  fezes.  Contudo,  resultados  falso­negativos  podem  ocorrer
precocemente no curso da doença (antes do pico de eliminação viral) e após o rápido declínio na eliminação viral que tende a ocorrer dentro de 10 a 12 dias da infecção. Resultados falso­positivos podem ocorrer 4 a 10 dias da vacinação
com vacina de vírus vivo modificado. Métodos alternativos para a detecção de antígenos de PVC nas fezes incluem PCR, microscopia eletrônica e isolamento viral. O sorodiagnóstico da infecção por PVC requer a demonstração de um
aumento de 4 vezes nos títulos séricos de IgG em um período de 14 dias ou a detecção de anticorpos IgM na ausência de vacinação recente (dentro de 4 semanas).
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  Os principais objetivos do tratamento da enterite por PVC incluem restabelecimento das anormalidades hídricas, eletrolíticas e metabólicas e prevenção da infecção bacteriana secundária. Na ausência de
vômito  significativo,  soluções  eletrolíticas  orais  podem  ser  oferecidas.  A  administração  por  via  subcutânea  de  uma  solução  isotônica  balanceada  de  eletrólitos  pode  ser  suficiente  para  corrigir  déficits  hídricos  discretos  (<  5%),  mas  é
insuficiente  para  cães  com  desidratação  moderada  a  grave.  Muitos  cães  se  beneficiam  da  fluidoterapia  IV  com  solução  de  eletrólitos  balanceada.  A  correção  da  desidratação,  a  reposição  contínua  da  perda  de  fluido  e  a  promoção  das
necessidades de fluido de manutenção são essenciais para o tratamento efetivo. Os cães devem ser monitorados quanto ao desenvolvimento de hipopotassemia e hipoglicemia. Se os eletrólitos e a glicemia não podem ser rotineiramente
monitorados, a suplementação empírica de fluidos IV com potássio (cloreto de potássio, 20 a 40 mEq/l) e glicose (2,5 a 5%) torna­se apropriada.
Se a perda gastrintestinal de proteínas é grave (albumina < 20 g/l, proteína total < 40 g/l, evidência de edema periférico, ascite, efusão pleural, etc), a terapia com coloide deve ser instituída. Coloides não proteicos (p. ex., pentamilo,
hetamilo) podem ser administrados na forma de bolus de 5 ml/kg (máximo de 20 ml/kg) ao longo de, no mínimo, 15 min. O restante da dose máxima de 20 ml/kg pode ser administrado em infusão contínua ao longo de 24 h e o volume de
cristaloide administrado reduzido em 40 a 60%. De forma alternativa, a transfusão de plasma fresco congelado pode repor parcialmente a albumina sérica enquanto fornece os inibidores da protease sérica para conter a resposta inflamatória
sistêmica. Não há evidência que sustenta o uso de soro de cães recuperados de uma enterite por VPC (soro convalescente ou hiperimune) como meio de imunização passiva.
Os antibióticos são indicados, pois há risco de translocação bacteriana pelo epitélio intestinal lesionado e neutropenia concomitante. Um antibiótico betalactâmico (p. ex., ampicilina ou cefazolina [22 mg/kg, IV, 3 vezes/dia]) propicia
proteção apropriada contra bactérias Gram­positivas e anaeróbicas. Nos casos de sinais clínicos graves e/ou neutropenia marcante, uma cobertura gram­negativa adicional (p. ex., enrofloxacino [5 mg/kg, IM ou IV, 1 vez/dia] ou gentamicina
[6 mg/kg, IV, 1 vez/dia]) é indicada. Antibióticos aminoglicosídios não devem ser administrados até que a desidratação seja corrigida e a fluidoterapia estabelecida. A enrofloxacino foi associada a lesões à cartilagem articular em cães de 2
a 8 meses de idade, crescendo rapidamente, e deve ser interrompida caso ocorra dor ou edema articular.
A terapia antiemética é indicada se o vômito é prolongado, a desidratação e as anormalidades eletrolíticas se perpetuam ou se há restrição à administração oral de medicamentos e suporte nutricional. Os antagonistas alfa­adrenérgicos (p.
ex., proclorperazina, 0,1 a 0,5 mg/kg, SC, 3 vezes/dia) podem agravar a hipotensão em animais hipovolêmicos, enquanto os agentes procinéticos (p. ex., metoclopramida, 0,3 mg/kg, VO ou SC, 3 vezes/dia ou 1 a 2 mg/kg/dia, em taxa de
infusão contínua) podem aumentar o risco de intussuscepção; o uso e ambos os agentes devem ser restritos aos animais reidratados e monitorados de forma apropriada. A segurança e a eficácia dos novos agentes antieméticos como a
ondansetrona (0,1 a 0,2 mg/kg, administrados lentamente por via IV, 2 a 4 vezes/dia) e maropitan (1 mg/kg, 1 vez/dia, por 5 dias) não foram avaliados em cães com enterite por VPC. O vômito pode persistir, mesmo com a administração de
antieméticos. Os antidiarreicos não são recomendados porque a retenção do conteúdo intestinal no lúmen do intestino comprometido aumenta o risco de translocação bacteriana e complicações sistêmicas.
Recomendações prévias do manejo nutricional da enterite por VPC incluem suspensão do alimento e de água até cessarem os vômitos, mas evidências recentes sugerem que a nutrição enteral antecipada está associada à melhora clínica
mais  rápida,  ganho  de  peso  e  melhora  da  função  da  barreira  intestinal.  Para  cães  com  anorexia,  o  uso  de  uma  sonda  nasoesofágica  ou  nasogástrica  e  o  fornecimento  de  bolus  ou  administração  oral  de  dietas  líquidas  preparadas  (p.
ex., Clinicare, ou ração enlatada úmida, batida) devem ser instituídos dentro de 12 h após a internação do animal. Uma vez cessado o vômito por 12 a 24 h, recomendada a reintrodução gradativa de água e uma ração comercial úmida, pobre
em gordura e facilmente digerível, ou de dieta caseira (p. ex., frango cozido ou queijo cottage com pouca gordura e arroz). Nutrição parenteral parcial ou total é reservada aos cães com > 3 dias de anorexia, que não toleram nutrição enteral.
Evidências recentes sugerem que a administração de interferona­? recombinante felino (2,5 U/kg, IV, 1 vez/dia, por 3 dias consecutivos) melhora os sinais clínicos e taxa de mortalidade por enterite causada pelo VPC. Tratamento com o
antiviral  oseltamivir  (2  mg/kg,  VO,  2  vezes/dia,  durante  5  dias)  pode  ser  considerado;  contudo,  não  há  relato  que  comprovem  sua  eficácia.  O  potencial  para  indução  ou  seleção  de  resistência  ao  vírus  da  gripe  levaram  alguns  a
recomendarem que a terapia com oseltamivir seja evitada na enterite por VPC. Os efeitos adversos potencialmente atribuídos ao oseltamivir após 3 dias de terapia incluem letargia, dor abdominal, dilatação gástrica, diarreia e inquietação.
Outros tratamentos adjuvantes como fator estimulante de colônia de granulócitos recombinante humano e proteína de aumento de permeabilidade/bactericida recombinante não foram benéficos.
Intussuscepção,  colonização  bacteriana  de  cateteres  IV,  trombose,  infecção  do  trato  urinário,  sepse,  endotoxemia,  síndrome  do  desconforto  respiratório  agudo  e  morte  súbita  são  complicações  potenciais  da  enterite  por  VPC.  Muitos
filhotes que sobrevivem após os 3 a 4 dias da doença apresentam recuperação completa, geralmente dentro de 1 semana. Com tratamento suporte apropriado, 68 a 92% dos cães com enterite por VPC sobrevivem. Os cães que se recuperam
desenvolvem imunidade prolongada, possivelmente por toda a vida.
PREVENÇÃO E CONTROLE:  Para restringir a contaminação ambiental e a propagação para outros animais suscetíveis, cães com enterite por VPC confirmada ou suspeita devem ser manipulados com procedimentos de isolamento rigoroso (p.
ex.,  separação  dos  animais,  vestimenta  e  luvas  individuais,  limpeza  frequente  e  completa  etc.).  Todas  as  superfícies  devem  ser  limpas  com  uma  solução  água  sanitária  diluída  (1:30),  peroxigênio,  ou  um  desinfetante  com  peróxido  de
hidrogênio acelerado. As mesmas soluções podem ser utilizadas como pedilúvio para desinfetar os sapatos.
Para evitar e controlar o VPC, a vacinação com vacina de vírus vivo modificado é recomendada nas 6° a 8°, 10° a 12° e 14° a 16° semanas de idade, seguidas por um reforço administrado 1 ano depois e então a cada 3 anos. Devido à
lesão potencial do VPC às células do miocárdio ou cerebelo, vacinas inativadas em vez da viva modificada são indicadas em cadelas prenhes ou filhotes privados de colostro vacinados antes das 6 a 8 semanas de idade. A presença de
anticorpos contra VPC adquiridos via materna podem interferir na eficácia da vacinação em filhotes < 8 a 10 semanas de idade. Vacinas recentes com vírus vivo modificado contra VPC são suficientemente imunogênicas em proteger
filhotes da infecção na presença de baixos teores de anticorpos maternos interferentes. Pelo menos 2 vacinas comerciais promovem proteção contra a variante VPC­2c circulante nos EUA.
Um novo filhote deve ser introduzido em uma casa de um cão recentemente diagnosticado com enterite por VPC não antes de 1 mês após os sinais clínicos terem sido resolvidos. Apenas filhotes completamente vacinados (nas 6, 8 e 12
semanas de vida) devem ser considerados. A introdução de um cão adulto incompletamente vacinado deve ser realizada de maneira semelhante. O reforço vacinal de cães contactantes saudáveis que estão em dia com a vacinação é sensato,
mas potencialmente desnecessário, devido à duração prolongada da imunidade ao VPC.

 SÍNDROMES DE MÁ ABSORÇÃO
Má absorção é a absorção prejudicada de um constituinte alimentar devido à interferência em sua digestão ou absorção, em razão de insuficiência pancreática exócrina (IPE) ou doença de intestino delgado. Má absorção resulta, tipicamente,
em diarreia, alteração de apetite e perda de peso.
As  principais  funções  do  intestino  delgado  são  digestão  e  absorção  de  nutrientes  que  ocorrem  em  fases  sequenciais:  digestão  intraluminal,  digestão  e  absorção  mucosas  e  liberação  de  nutrientes  na  circulação.  Diversas  doenças
gastrintestinais causam má absorção crônica por meio de uma interferência nesses processos. As síndromes de má absorção foram estudadas mais detalhadamente em cães; no entanto, o diagnóstico e os princípios terapêuticos básicos são
similares a outras espécies.
FISIOLOGIA:  Os processos digestivos normais convertem os nutrientes alimentares poliméricos em formas (monômeros) que conseguem atravessar a borda em escova das células epiteliais de absorção intestinal, os enterócitos. A maioria
das enzimas digestivas é secretada pelo pâncreas; logo a IPE é a principal causa de má absorção. Alguns produtos da digestão, antes da absorção, podem ser degradados pelas enzimas da borda em escova.
Os principais carboidratos da dieta são amido, glicogênio, sacarose e lactose. Amido e glicogênio são inicialmente hidrolisados pela amilase pancreática nos oligossacarídios maltose, maltotriose e a­dextrinas­limite. Os oligossacarídios e
dissacarídios ingeridos (sacarose, lactose) são adicionalmente hidrolisados em monossacarídios pelas enzimas da borda em escova dos enterócitos. A atividade da lactase da borda em escova diminui após o desmame, especialmente em
gatos, e os animais podem se tornar intolerantes à lactose, principalmente se a borda em escova foi danificada por outra doença. Os produtos finais da hidrólise na mucosa (glicose, galactose e frutose) são transportados ativamente para o
interior do enterócito, por um processo mediado por proteínas transportadoras. Uma vez no interior da célula, a glicose não é utilizada pela via glicolítica, mas se difunde, por difusão facilitada, no sentido do gradiente de concentração
através da lâmina própria e entram na circulação venosa portal.
A digestão e absorção de proteínas seguem um padrão semelhante. As enzimas proteolíticas originárias do estômago e pâncreas degradam a proteína em oligopeptídios de cadeia curta, dipeptídios e aminoácidos. Os oligopeptídios são
hidrolisados adicionalmente pelas peptidases da borda em escova em dipeptídios e aminoácidos que atravessam a membrana da borda em escova em proteínas transportadoras específicas.
As  moléculas  lipossolúveis  não  necessitam  transportadores  específicos  para  atravessar  a  barreira  fosfolipídica  da  borda  em  escova.  No  entanto,  é  essencial  uma  degradação  intraluminal  dos  lipídios  grandes.  A  gordura  no  duodeno
estimula a liberação de colecistoquinina que, por sua vez, estimula a secreção de lipase pancreática. Após solubilização por micelas de sais de bile, os triglicerídios são digeridos pela lipase pancreática em monoglicerídios e ácidos graxos
livres. Na membrana celular, os monoglicerídios e os ácidos graxos livres se desagregam das micelas e são absorvidos passivamente para o interior da célula. Os ácidos biliares liberados permanecem dentro do lúmen e finalmente são
reabsorvidos pelo íleo e reciclados. Dentro da célula, os monoglicerídios e os ácidos graxos livres são reesterificados em triglicerídios e incorporados em quilomícrons, que subsequentemente entram nos vasos lacteais centrais da vilosidade
e são entregues à circulação venosa, através do ducto torácico. Triglicerídios de cadeia média (C8­C10) podem ser absorvidos diretamente para o sangue portal, proporcionando desta forma uma via alternativa para eliminação de gordura em
caso de obstrução linfática, apesar de alguns entrarem normalmente na circulação via ducto torácico.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  A má absorção é uma consequência da interferência nos mecanismos responsáveis pela degradação ou absorção dos constituintes alimentares (Tabela 7).
As doenças que interrompem a síntese ou secreção das enzimas pancreáticas digestivas causam má digestão com subsequente má absorção. Uma causa importante é a IPE (p. 493), que ocorre quando há perda de cerca de 85 a 90% da
massa pancreática exócrina. A IPE caracteriza­se por má digestão – má absorção grave de amido, proteína e, mais notadamente, gorduras. Nos cães, a IPE deve­se mais comumente à atrofia acinar; pancreatite crônica é menos comum,
sendo mais notada em cães mais velhos; hipoplasia pancreática é uma causa congênita rara. Em cães, a IPE geralmente é complicada por um supercrescimento bacteriano no intestino delgado (SCBID), que interrompe adicionalmente a
digestão e absorção de nutrientes. Nos gatos, a IPE é relativamente incomum e se deve, predominantemente, à pancreatite crônica.
Os efeitos intraluminais da bactéria também podem ter consequências importantes. A desconjugação bacteriana dos sais biliares interfere na formação de micela, que resulta em má absorção de lipídios. Sais biliares desconjugados e
ácidos graxos hidroxilados exacerbam a diarreia pelo estímulo da secreção no cólon. A SCBID verdadeira pode ser secundária ao defeito na secreção de ácido gástrico, interferência na motilidade normal ou obstrução mecânica do intestino,
interferência na função da válvula ileocecal e imunodeficiência local. Em outros casos, não há SCBID definida, porém uma resposta positiva à terapia antimicrobiana e ausência de lesão visível na mucosa indica que a má absorção é
causada por atividade bacteriana. Originalmente denominada SCBID idiopática, esta síndrome é melhor designada diarreia responsiva a antibióticos (DRA).
Má absorção de gorduras também pode ocorrer em caso de deficiência de sais biliares intraluminais devido à doença hepática colestática, obstrução biliar ou doença de íleo, resultando em absorção inadequada de sais biliares conjugados.
Uma doença no intestino delgado pode causar má absorção pela redução no número ou na função dos enterócitos, individuais. As doenças difusas da mucosa podem resultar em redução nas atividades das enzimas da borda em escova,
diminuição na função das proteínas transportadoras, diminuição na área da superfície de absorção da mucosa e interferência no transporte final de nutrientes para a circulação. Pode ocorrer perda de peso devido ao prejuízo à ingestão de
nutrientes e inapetência. Além disso, os nutrientes mal absorvidos têm efeitos osmóticos intraluminais significativos, que reduzem a absorção de água e eletrólitos no intestino e no cólon, resultando em diarreia. Isso pode ser exacerbado se
o lesão à mucosa é acompanhado de inflamação intestinal, que pode causar diarreia secretória e por aumento da permeabilidade.
As causas potenciais de lesões à mucosa incluem doença intestinal inflamatória, patógenos intestinais (p. ex., vírus intestinais, bactérias patogênicas, giardíase, histoplasmose, pitiose), sensibilidade alimentar, SCBID e neoplasia intestinal
(linfossarcoma). Alterações histológicas, como atrofia de vilosidades e infiltrado com células inflamatórias, indicam doença intestinal, mas não identificam a causa primária. Por exemplo, a enterite linfocítica­plasmocitária pode ser uma
resposta comum da mucosa intestinal a mais de um agente provocativo, particularmente antígenos microbianos e alimentares. Foram demonstradas associações claras com parasitos e bactérias patogênicas e sensibilidade alimentar em cães,
mas frequentemente a causa primária não é identificada.

Tabela 7 – Mecanismos de má absorção

Localização Doença Mecanismo

Luminal Insuficiência pancreática exócrina Ausência de enzimas pancreáticas (má digestão)


Supercrescimento bacteriano no intestino delgado Desconjugação de sais biliares, hidroxilação de ácidos graxos, competição por cobalamina e nutrientes

Mucosa Doença intestinal inflamatória, enteropatias infecciosas, sensibilidade alimentar, infiltração Inflamação da mucosa, defeitos na borda em escova, alteração funcional de enterócitos (redução da área da superfície de


neoplásica absorção)
Atrofia de vilosidades Redução da área da superfície de absorção
Deficiência de enzimas da borda em escova do intestino Deficiência de lactase, doença difusa do intestino delgado

Pós­ Linfangiectasia Obstrução linfática


mucosa Vasculite, hipertensão portal Absorção prejudicada
É possível notar lesões de mucosa sem alterações histológicas óbvias. Isto é típico de infecção por Escherichia coli enteropatogênica (que especificamente causa lesões ultraestruturais nas microvilosidades, em uma lesão tipo attaching­
effacing) e, às vezes, também por DRA do intestino delgado proximal (que, nos cães, pode causar dano bioquímico na borda em escova do intestino, interferindo na função enterocítica).
A principal deficiência de enzima da borda em escova é a deficiência relativa de lactase, ocasionando intolerância à lactose em cães e gatos adultos. Defeitos adquiridos da borda em escova também podem ocorrer no decorrer de uma
doença intestinal generalizada.
Obstrução pós­mucosa pode ocorrer em caso de obstrução linfática (especialmente linfangiectasia) e comprometimento vascular (hipertensão portal, vasculite). Linfangiectasia intestinal causa perda intestinal de proteínas, bem como má
absorção grave de gorduras.
Geralmente há má absorção de diversos ingredientes, com subsequente diarreia; má absorção de um único ingrediente sem sinais gastrintestinais é rara (p. ex., má absorção seletiva de cobalamina em cães das raças Schnauzer gigante e
Border Colly). Além disso, a ampla capacidade de absorção do cólon pode evitar diarreia difusa, apesar de significativa má absorção e perda de peso.
ACHADOS  CLÍNICOS:   Os  sinais  clínicos  de  má  absorção  são  principalmente  decorrência  da  falha  de  absorção  de  nutrientes  e  sua  perda  nas  fezes.  Duração,  gravidade  e  causa  primária  determinam  a  gravidade  dos  sinais  clínicos  que,
tipicamente, incluem diarreia crônica, perda de peso e alteração do apetite (anorexia ou polifagia). A ausência de diarreia não exclui a possibilidade de doença gastrintestinal grave. A perda de peso pode ser substancial, apesar de um apetite
voraz, às vezes caracterizado por coprofagia. Tipicamente, os animais com má absorção permanecem sistemicamente bem, a menos que ocorra inflamação grave ou neoplasia. Os sinais inespecíficos podem incluir desidratação, anemia e
ascite ou edema em casos de hipoproteinemia. Alças intestinais espessadas ou linfonodos mesentéricos aumentados de volume podem estar palpáveis, especialmente nos gatos.
DIAGNÓSTICO:  Diarreia  crônica  e  perda  de  peso  são  sinais  inespecíficos  comuns  a  várias  doenças  sistêmicas  e  metabólicas,  assim  como  má  absorção.  Deve­se  fazer  uma  abordagem  diagnóstica  completa  em  cães  e  gatos  com  sinais
sugestivos de má absorção para auxiliar a excluir a associação com possível doença sistêmica ou metabólica primária. Um diagnóstico preciso também é importante para determinar o prognóstico e o tratamento.
Anamnese é especialmente importante, pois pode sugerir intolerância, imprudência ou sensibilidade alimentar específicas. Perda de peso pode indicar má absorção ou enteropatia com perda de proteína, mas também pode ser devido à
anorexia, vômitos ou doença instalada fora do trato gastrintestinal. As diarreias dos intestinos delgado e grosso podem ser distinguidas por meio de várias características (Tabela 1, p. 158). Essa distinção é mais útil em cães do que em gatos,
que raramente apresentam apenas doença de intestino grosso. Nos cães, doença no intestino grosso suspeita pode ser avaliada, adicionalmente, por meio de visualização e realização de biopsia da mucosa mediante exame endoscópico. No
entanto, caso os sinais de doença de intestino grosso sejam acompanhados de perda de peso ou grande volume de fezes, então o intestino delgado provavelmente também está afetado.
Deve­se realizar exame físico completo. A palpação abdominal é essencial para identificar anormalidades, o exame retal é necessário mesmo quando não há suspeita de doença de trato intestinal inferior, para fornecer um banco de
amostras e possivelmente revelar melena não previamente observada. Em gatos mais velhos, a tireoide deve ser palpada cuidadosamente e o T4 sérico dosado, uma vez que os sinais de hipertireoidismo podem mimetizar fortemente aqueles
de má absorção.
A avaliação inicial deve incluir hemograma, perfil bioquímico, urinálise, exame de fezes, ultrassonografia abdominal e, quando indicado pelos sinais clínicos ou por palpação abdominal anormal, radiografia. Os achados hematológicos
das  doenças  intestinais  incluem  anemias  por  hemorragia  crônica  (microcítica,  hipocrômica)  ou  inflamação  crônica  (normocítica,  normocrômica);  neutrofilia  e/ou  monocitose  associada  a  doenças  intestinais  inflamatórias,  enteropatias
infecciosas ou neoplasia; eosinofilia associada a parasitismo, enterite eosinofílica ou hipoadrenocorticismo, e linfopenia que pode estar associada à linfangiectasia intestinal em cães.
Os testes bioquímicos e a urinálise ajudam a excluir as doenças sistêmicas que causam diarreia crônica, principalmente hipoadrenocorticismo, nefropatias com perda de proteínas, insuficiência renal e hepatopatias. A hipoproteinemia
frequentemente é secundária à enteropatia com perda de proteínas; na maioria dos casos, as concentrações séricas de albumina e globulina estão diminuídas, mas apenas um baixo teor de albumina não exclui essa possibilidade. Doença
intestinal inflamatória e neoplasia podem estar associadas à hiperglobulinemia, bem como hipoalbuminemia. Enzimas hepáticas (ALT, AST) podem estar aumentadas como consequência do aumento da permeabilidade intestinal, o que
permite que mais antígenos alcancem o fígado; em tais casos, devem ser realizados teste de estimulação com ácido biliar, assim como ultrassonografia, para excluir a possibilidade de doença hepática primária. Hipocolesterolemia pode ser
decorrente de má absorção de gorduras, sendo observada na linfangiectasia. Urinálise é importante para excluir as causas renais de hipoalbuminemia e/ou doença renal. No entanto, às vezes, ambas podem ser vistas juntas (p. ex., enteropatia
com perda de proteína familiar e nefropatia do cão Wheaten Terrier de pelos macios). Nos gatos, os testes sorológicos para pesquisa de vírus da leucemia e da imunodeficiência felinas devem ser realizados, não apenas por ambas as doenças
estarem associadas à diarreia crônica secundária, mas também por serem fatores prognósticos importantes. Ocasionalmente, relatam­se peritonite infecciosa felina e toxoplasmose como causas de diarreia crônica em gatos. Pode­se excluir a
suspeita de hipertireoidismo por meio da dosagem dos teores séricos de T4.
Devem­se examinar as fezes quanto à presença de parasitos (especialmente ancilóstomos e Giardia) e bactérias potencialmente patogênicas (inclusive Salmonella e Campylobacter). Cepas patogênicas de Escherichia coli estão surgindo
como um problema potencialmente importante em cães, mas se requerem técnicas moleculares sofisticadas para identificar os genes que codificam os seus determinantes de patogenicidade, para o diagnóstico. Giardia pode ser detectada
utilizando­se  testes  de  flotação  fecal  seriados  com  sulfato  de  zinco  ou  com  kits  ELISA  disponíveis  no  mercado,  sendo  o  último  mais  fácil  de  ser  realizado  e  com  sensibilidade  melhor  do  que  o  exame  de  flotação  fecal  realizado  por
funcionários inexperientes. A presença de gorduras, fibras musculares não digeridas ou amido pode propiciar evidências indiretas de má absorção, mas não são confiáveis. A detecção de excesso de leucócitos na citologia fecal pode indicar
doença intestinal inflamatória crônica ou patógenos intestinais como Salmonella ou Campylobacter. A citologia dos esfregaços de cólon pode revelar Histoplasma spp.
Radiografia abdominal é mais útil quando há vômito ou anormalidades palpáveis. A ultrassonografia é parte importante da investigação da maioria das doenças do intestino delgado. Pode ser utilizada para medir a espessura da parede
intestinal, camada e diâmetro luminal e para detectar outras lesões intestinais (massas tumorais, intussuscepção), linfadenopatia mesentérica (neoplasia e doença intestinal inflamatória) e anormalidades em outros órgãos.
Quando se eliminam as causas alimentares, parasitárias e infecciosas de diarreia crônica de intestino delgado, o próximo passo é diferenciar uma IPE de uma má absorção intestinal; o diagnóstico de IPE é relativamente simples, enquanto
o  de  doença  do  intestino  delgado  é  mais  complicado.  Vários  testes  foram  recomendados  para  cães  e  gatos  com  suspeita  de  IPE,  mas  são  demasiadamente  imprecisos  ou  não  práticos  para  serem  recomendados.  Utiliza­se  um  teste  de
imunorreatividade semelhante à tripsina sérica (IST), que é um teste altamente sensível e específico para o diagnóstico da IPE em cães. Esse exame quantifica o tripsinogênio que normalmente extravasa do pâncreas para o sangue e,
portanto, propicia uma avaliação indireta do tecido pancreático funcional. No IPE, o tecido exócrino funcional é gravemente esgotado e as concentrações séricas de IST são extremamente baixas, distinguindo claramente a IPE de outras
causas de má absorção. Esse teste requer uma amostra de soro sanguíneo de animais em jejum. Teste de IST canino e felino espécie­específico estão disponíveis.
O diagnóstico de doença do intestino delgado é difícil devido às limitações dos procedimentos de triagem de rotina, da necessidade de biopsia e, frequentemente, da ausência de alterações histológicas diagnósticas.
Dosagens simultâneas  das  concentrações  séricas  de  folato  e  cobalamina  (vitamina B12) podem ser testes iniciais úteis na avaliação de doença do intestino delgado. O folato é absorvido principalmente no intestino delgado proximal
(jejuno), enquanto a cobalamina é absorvida no intestino delgado distal (íleo). Como resultado disso, a concentração sérica de folato pode diminuir na doença de intestino delgado proximal, o teor sérico de cobalamina pode diminuir na
doença  de  intestino  delgado  distal  e  ambas  podem  diminuir  nas  enteropatias  difusas  graves.  Outros  fatores  como  gravidade,  extensão  e  duração  das  anormalidades  da  mucosa,  ingestão  alimentar  e  suplementação  vitamínica  também
influenciam estas concentrações. Além disso, SCBDI pode afetar as concentrações séricas de folato e cobalamina e as alterações no teor sérico de folato não são confiáveis para o diagnóstico de DRA secundária a SCBDI. A validade das
dosagens séricas de folato e cobalamina para diagnóstico de doença de intestino delgado em gatos é menos conhecida, mas diminuição da concentração sérica de cobalamina pode ser observada tanto na doença de intestino delgado quanto
na IPE felina e são justificativas para suplementação parenteral. Uma estratégia mais indireta de detecção de doença do intestino delgado é avaliação da função e permeabilidade intestinal pela administração oral de substâncias­testes que
são mensuradas subsequentemente no sangue e na urina. Historicamente, o teste de absorção de xilose foi utilizado para avaliar a função intestinal, porém não é sensível, principalmente em gatos. A mensuração da absorção diferencial de
D­xilose/3­O­metil­D­glicose parece ser uma estratégia mais eficiente, embora seja tecnicamente trabalhosa e não adequada na rotina. Similarmente, a mensuração da permeabilidade intestinal, para obter informações sobre a integridade
física e não a capacidade funcional da mucosa, normalmente não é utilizada. Este teste envolve a mensuração das concentrações urinária e sanguínea de sondas administradas por via oral e que cruzam a mucosa intestinal por permeação não
mediada através de duas vias possíveis (intracelular e transcelular).
O cálculo da proporção da excreção urinária de uma mistura de 2 sondas de diferentes tamanhos, como lactulose e ramnose, é utilizado, com sucesso, não apenas para o diagnóstico de uma doença de intestino delgado em cães, mas
também para monitorar a resposta ao tratamento (p. ex., para registrar sensibilidade alimentar ou SCBID). Infelizmente, essa abordagem não parece útil em gatos, pois a permeabilidade intestinal em gatos saudáveis é bastante alta.
A administração por via intravenosa de albumina marcada com Cr51 (ou com Cr51Cl3 para marcar albumina endógena) tem sido historicamente utilizada para documentar enteropatias com perda de proteínas em cães. A dosagem da
excreção fecal desse marcador radioativo por 3 dias fornece uma estimativa da albumina marcada e, com isso, da perda proteica para o interior do lúmen intestinal. Todavia, a sua utilização é restrita a algumas instituições devido ao uso de
marcadores radioativos. Uma abordagem alternativa é a dosagem do inibidor de a1­protease nas fezes. Essa proteína plasmática é perdida junto com a albumina no lúmen intestinal, porém, diferentemente da albumina, esta proteína é uma
antiprotease, se excretada praticamente intacta nas fezes. Teste espécie­específicos foram desenvolvidos. Três amostras de fezes frescas eliminadas por evacuação espontânea são necessárias e qualquer sangramento gastrintestinal invalida o
resultado.
O teste de hidrogênio expirado, após administração oral de açúcares individuais, é utilizado amplamente em pacientes humanos para avaliar a colonização bacteriana no intestino delgado e a má absorção de carboidratos. Esse teste
baseia­se no princípio de que as bactérias intestinais fermentam os carboidratos intraluminais e produzem gás hidrogênio, parte do qual é absorvida no sangue e excretada pelos pulmões. Portanto, um aumento na concentração de hidrogênio
exalado  após  administração  oral  de  carboidratos  pode  refletir  tanto  colonização  bacteriana  no  intestino  delgado  proximal,  onde  a  concentração  de  carboidratos  é  relativamente  elevada,  quanto  má  absorção  de  carboidratos  (que  depois
interfere na flora normalmente presente no intestino grosso). Trata­se de um procedimento simples para detectar má absorção e para avaliar o tempo de trânsito, mas provavelmente só está disponível em centros especializados.
Tentativas de se detectar SCBDI por meio do teste de hidrogênio expirado ou dosagem sérica de ácidos biliares não conjugados não são confiáveis, uma vez que o número de bactérias pode não estar realmente aumentado na DRA.
O diagnóstico definitivo de doença crônica de intestino delgado tipicamente inclui exame histológico de amostras intestinais obtidas por biopsia durante endoscopia ou laparotomia. Endoscopia é um método minimamente invasivo e
permite a visualização da mucosa e coleta de amostras por biopsia. No entanto, as biopsias de mucosa obtidas por endoscopia podem nem sempre fornecer informação adequada da doença primária e estão restritas a partes do intestino
delgado (duodeno e jejuno proximal e íleo [via colonoscopia]) que podem ser visualizadas. Inicialmente, biopsia endoscópica é preferível devido ao risco de deiscência de feridas intestinais, que pode exceder 10% em animais debilitados,
mal nutridos ou com hipoproteinemia. Porém, cirurgia é a opção preferida quando há preocupação com doença extraintestinal primária ou lesão focal. Caso se realize laparotomia, deve­se coletar várias amostras delgadas e longitudinais do
duodeno, jejuno e íleo, por meio de biopsia; os linfonodos mesentéricos devem ser biopsiados e os demais órgãos examinados.
O exame histológico das amostras de biopsias intestinais pode mostrar alterações morfológicas de doenças intestinais inflamatórias, inclusive enterite linfocítica­plasmocitária e eosinofílica, linfangiectasia intestinal, atrofia de vilosidades
e neoplasia intestinal. A descrição das anormalidades morfológicas pode fornecer um parâmetro para avaliar a resposta ao tratamento, se biopsias intestinais sequenciais são possíveis. As anormalidades morfológicas também fornecem
algumas indicações sobre o prognóstico, pois as enteropatias mais graves tendem a ser mais difíceis de tratar. No entanto, em determinadas enfermidades (p. ex., DRA), podem ocorrer anormalidades morfológicas mínimas ou não evidentes,
apesar da interferência considerável na função intestinal. As descrições histológicas, isoladamente, fornecem poucas informações sobre a etiologia ou os mecanismos de lesões primárias possíveis, o que notadamente auxiliaria para um
tratamento efetivo. Além disso, inconsistências na descrição histológica entre patologistas é um problema. Todavia, o World Small Animal Veterinary Association GI Standardization Group publicou um guia descritivo, como guia para
corrigir essas discrepâncias.
A cultura microbiológica do suco duodenal obtido por endoscopia ou laparotomia tem sido utilizada para confirmar o diagnóstico de SCBID. Entretanto, o valor exato que se considera excessivo o número de bactérias no intestino
delgado ainda é motivo de debate, uma vez que valor total > 105 ou > 104 unidades formadoras de colônias (UFC) de anaeróbicos obrigatórios/ml podem ser encontrados em cães com aparência clínica saudável, dependendo de condições,
como ambiente, ingestão de lixo e coprofagia.
TRATAMENTO:  O tratamento de má absorção envolve manejo da dieta e das complicações e tratamento da causa primária (se identificada). O tratamento de IPE em cães é relativamente simples (ver p. 493). Deve incluir o fornecimento de
uma  dieta  pobre  em  fibras,  que  contenha  teor  moderado  de  gordura  ou  gordura  de  fácil  digestão,  carboidratos  altamente  digeríveis  e  proteínas  de  alta  qualidade.  O  tratamento  específico  envolve  suplementação  vitalícia  de  extrato
pancreático a cada refeição. Prefere­se os extratos em pó (1 colher de chá/10 kg de peso corporal) em vez de comprimidos, cápsulas e preparações revestidas para absorção intestinal. Pode­se utilizar pâncreas fresco ou congelado como
alternativa (100 g/refeição para um cão Pastor Alemão adulto). Se a resposta à terapia de reposição pancreática é ineficaz, pode­se suspeitar de SCBID e o animal deve ser tratado com antibiótico. VO, por = 1 mês (ver a seguir). Podem­se
administrar bloqueadores de receptores H2, como cimetidina ou ranitidina, 20 min antes da refeição, para inibir a secreção de ácido e minimizar a degradação de enzimas no extrato pancreático, mas eles são caros e a eficácia é questionável.
Deve­se considerar uma suplementação multivitamínica oral como terapia de suporte, mas a cobalamina (500 a 1.000 μg/semana, até normalização) deve ser administrada por via parenteral. As necessidades nutricionais de gatos com IPE
podem, geralmente, ser supridas por rações comerciais convencionais, mas ainda é necessária a terapia de reposição pancreática, assim como suplementação parenteral de cobalamina em gatos com baixo teor sérico de cobalamina.
O tratamento efetivo de doença de intestino delgado depende da natureza do distúrbio, mas a terapia pode ser empírica quando não é possível estabelecer o diagnóstico específico. Em cães com DRA, uma dieta pobre em gorduras pode
auxiliar reduzindo a diarreia secretória devido ao metabolismo bacteriano de ácidos graxos e sais biliares. Terapia antimicrobiana oral de largo espectro com oxitetraciclina (10 a 20 mg/kg, 3 vezes/dia, por 28 dias) é efetiva. Metronidazol
(10 a 20 mg/kg, 2 vezes/dia) e tilosina (20 mg/kg, 3 vezes/dia) são alternativas efetivas. Pode ser necessário tratamento repetido e prolongado em cães com DRA idiopática. A suplementação vitamínica pode ser útil, particularmente para
animais com deficiência de cobalamina. SCBID secundário geralmente se resolve com o tratamento apropriado da doença primária, mas o SCBID idiopático pode ser de difícil controle, especialmente em cães jovens da raça Pastor Alemão,
que são predispostos à enfermidade.
A alteração da dieta é importante no tratamento de doença do intestino delgado, tanto em cães quanto em gatos. As dietas geralmente contêm teores moderados de fontes proteicas e carboidratos altamente digeríveis (para reduzir a
antigenicidade proteica, diminuir o efeito osmolar e aumentar a disponibilidade de nutrientes), e teores baixos a moderados de gordura. Além disso, são livres de lactose e glúten, podem ser restritas em fibras e podem conter altos teores de
antioxidantes, prebióticos (frutoligossacarídios) ou ácidos graxos ômega 3. Acredita­se que estes aditivos modulam a resposta inflamatória e melhoram a qualidade da flora bacteriana intestinal e os enterócitos. O tratamento com dieta de
exclusão composta por uma fonte proteica única e nova deve ser utilizado como terapia­teste quando há suspeita de sensibilidade alimentar. Também, a inflamação intestinal é, às vezes, manifestação de sensibilidade alimentar e o teste de
exclusão alimentar também é indicado em casos leves de doença intestinal inflamatória. Arroz branco ou batata cozida são fontes de carboidratos adequadas, embora se utiliza, frequentemente, carne de cordeiro ou de frango como fonte
proteica, dependendo do histórico alimentar. O queijo cottage e as carnes de equinos, coelhos, veados e peixes podem ser alternativas aceitáveis. Em geral, as rações de exclusão comerciais podem ser menos adequadas que as dietas caseiras
para o diagnóstico de hipersensibilidade alimentar; entretanto, são preferíveis para manutenção da redução dos desequilíbrios nutricionais. Dietas com proteína hidrolisada podem ser mais efetivas na detecção de sensibilidade alimentar.
Geralmente não é necessário fornecer uma dieta de exclusão por > 3 semanas. A prednisolona oral (1 mg/kg, 2 vezes/dia, por 2 a 4 semanas, seguida de redução da dose) associada à uma dieta de exclusão, pode ser útil em animais com
suspeita de DII idiopática sem, ainda, a exclusão de sensibilidade alimentar.
O tratamento de doença intestinal inflamatória idiopática deve, inicialmente, tentar eliminar ou controlar um estímulo antigênico primário que possa ter um papel primário ou secundário na lesão. O tratamento deve, primeiro, envolver
o uso de uma dieta de exclusão ou com proteínas hidrolisadas para a suspeita sensibilidade alimentar, conforme mencionado anteriormente. A dieta deve conter carboidratos digeríveis, (preferivelmente arroz) e proteína de alta qualidade.
Restrição do teor de gordura também pode ser valiosa e pode minimizar a diarreia secretora, consequência do metabolismo bacteriano dos ácidos graxos e sais biliares. Indica­se a prednisolona oral (1 mg/kg, 2 vezes/dia, durante 1 mês,
seguida de redução da dose) na doença intestinal com componente inflamatório óbvio, como na enterite linfocítica­plasmocitária e eosinofílica. Nos casos mais graves, pode ser necessário associar clorambucila (2 a 6 mg/m2 VO, 1 vez/dia,
até a remissão dos sinais clínicos, seguida de redução da dose), em gatos, ou azatioprina (2 a 2,5 mg/kg, 1 vez/dia), em cães.
Aos gatos, frequentemente, se administra metronidazol (10 mg/kg, 2 vezes/dia) associado; o efeito benéfico do metronidazol pode ser decorrente da inibição da resposta imune mediada por células, bem como atividade antibacteriana
anaeróbia.
Na linfangiectasia, uma dieta altamente digerível, com restrição de gordura e rica em calorias reduz a diarreia, porém tende a exacerbar a perda de peso. Recomenda­se suplementação com vitaminas lipossolúveis; adicionalmente indica­
se triglicerídios de cadeia média como fonte de gordura de fácil absorção que atravessa os vasos linfáticos, embora este mecanismo tenha, recentemente, sido questionado. A terapia com prednisona pode ser benéfica por seus efeitos anti–
inflamatórios e imunossupressores, especialmente se há linfangite e lipograniulomas associados. A resposta ao tratamento é variável; às vezes, os sinais clínicos podem melhorar por meses ou mesmo anos, mas o prognóstico a longo prazo é
desfavorável.
Giardíase pode ser tratada com metronidazol ou fembendazol, e histoplasmose com itraconazol (gatos) ou cetoconazol (cães), com ou sem anfotericina B. Nos casos de linfossarcoma, o tratamento envolve um protocolo quimioterápico
apropriado, porém a resposta é fraca em cães e gatos com formas linfoblásticas. Em gatos, o tratamento do linfoma de pequenas células de vilosidades com prednisona e clorambucila foi associado à remissão da doença por longo tempo.

 ÚLCERAS GASTRINTESTINAIS EM PEQUENOS ANIMAIS
Úlcera com rompimento da barreira mucosa é uma consequência bastante conhecida do uso de várias drogas e doenças em pequenos animais. Como resultado, terapia gastroprotetora é amplamente utilizada.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  A barreira constituída pela mucosa gástrica é um mecanismo de defesa complexo que protege a mucosa normal do ambiente químico inóspito do conteúdo luminal gástrico. Os ácidos, pepsina e enzimas
proteolíticas normalmente presentes no lúmen gástrico têm pH 2. A camada mucosa propicia um tampão fraco, mantendo pH 4 a 6, neutralizando o conteúdo luminal ácido. A barreira gástrica é mantida por uma camada protetora que inclui
células mucosas, junções íntimas e uma camada espessa de muco. O alto fluxo sanguíneo nesta área sustenta o metabolismo celular e a rápida renovação das células danificadas. Prostaglandinas (principalmente E e I) ajudam a manter o
fluxo sanguíneo e integridade da mucosa gástrica, aumentam a secreção de muco e bicarbonato, diminuem a secreção gástrica e estimulam a reciclagem das células epiteliais. As junções íntimas selam a camada celular da mucosa gástrica,
garantindo que o conteúdo luminal não extravase para dentro ou ao redor dessas células. A pequena quantidade de ácido gástrico que se difunde pelas células epiteliais é rapidamente removido pelo alto fluxo sanguíneo nesta área.
Um defeito na barreira constituída pela mucosa gástrica leva a um ciclo de autoperpetuação da lesão da mucosa. Alteração desta barreira permite que ácido clorídrico, ácidos biliares e enzimas proteolíticas degradem as células epiteliais,
rompam  membranas  líquidas  e  induzam  inflamação  e  apoptose.  Retrodifusão  do  conteúdo  luminal  pelas  junções  íntimas  ocasionam  inflamação  das  células  do  trato  GI  e  hemorragia,  com  maior  secreção  ácida  mediada  pelas  células
inflamatórias  e  seus  produtos.  Ocorre  degranulação  dos  mastócitos,  levando  à  liberação  de  histamina  que  perpetua  a  secreção  aumentada  de  ácido  gástrica.  O  ambiente  inflamatório  também  diminui  o  fluxo  sanguíneo  (resultando  em
isquemia), habilidade de reparo celular e secreção de muco e prostaglandinas citoprotetoras. Úlcera da mucosa pode acontecer, expondo a submucosa ou camadas mais profundas do tecido GI ao conteúdo luminal.
A prevalência de úlcera GI em cães e gatos é desconhecida. Administração de AINE, neoplasia e doença hepática são as causas mais comuns, em cães. AINE podem causar lesão tópica direta da mucosa gástrica e acredita­se que a
inibição  da  ciclo–oxigenase  (COX)­1  diminui  a  produção  de  prostaglandinas  protetoras.  Ao  uso  de  AINE  específicos  de  COX­2  credita­se  a  diminuição  da  úlcera  GI,  embora  úlcera  e  perfuração  ainda  ocorram  com  o  uso  desses
medicamentos. Corticosteroides potencializam as lesões na mucosa por diminuírem a renovação celular e a produção de muco e por estimular a produção de gastrina (e ácido).
Doença hepática está associada a maior secreção de ácido gástrico e alteração do fluxo sanguíneo na mucosa, levando, potencialmente, à formação de úlceras. Neoplasia gástrica primária, como linfomas, adenocarcinomas, liomiomas e
leiomiosarcomas podem resultar em úlceras. Adicionalmente, síndromes paraneoplásicas secundárias a tumores de mastócitos e gastrinomas (síndrome de Zollinger­Ellison) foram associadas à produção aumentada de ácido hidrocloridríco
e úlceras em cães.
Outras doenças e condições associadas a úlceras GI em cães incluem doença renal, hipoadrenocorticismo, estresse, doença gástrica primária tais como doença inflamatória do intestino, exercício exaustivo (i. e. trenó canino), choque e
sepse. Helicobacter foram encontrados em cães e gatos saudáveis, todavia, seu papel na ocorrência de ulceração GI é desconhecido.
Úlcera GI é raramente observada em gatos. Neoplasia (i. e. linfoma, adenocarcinoma) foi associada à úlcera GI em gatos, porém a etiologia é desconhecida.
ACHADOS CLÍNICOS:  Sinais clínicos específicos de úlcera GI incluem melena, hematêmese e hematoquezia. Dor abdominal, anorexia e sinais de doenças subjacentes podem estar presentes. Gatos com úlcera GI raramente apresentam sinais
específicos  como  melena  ou  hematêmese,  porém  normalmente  manifestam  hemorragia  grave,  com  risco  de  morte.  Animais  com  úlcera  grave  e/ou  perfuração  GI  podem  apresentar  sinais  de  dor,  fraqueza,  palidez  e  choque.  Podem  ser
observados sinais clínicos relacionados com os fatores etiológicos. Alguns cães e gatos com úlcera GI não apresentam qualquer sinal clínico.
DIAGNÓSTICO:  Hemograma, perfil bioquímico e urinálise podem auxiliar a diferenciar doença GI primária de doença não GI e pode mostrar distúrbios metabólicos resultantes de doenças GI. Exames adicionais, como testes de função
hepática ou teste de estimulação do hormônio adrenocorticotrófico, podem ser justificados, dependendo dos achados clínicos e dos resultados dos testes iniciais.
Radiografias abdominais geralmente não auxiliam no diagnóstico de úlcera GI, porém podem ajudar a excluir obstrução GI, intussuscepções e peritonite. Ultrassonografia abdominal pode indicar anormalidades na espessura da parede
gástrica ou presença de massa, porém sua utilidade primária seja a verificação de lesões não GI. Endoscopia permite a visualização do esôfago, estômago, duodeno e cólon e a identificação de lesões de mucosa e úlceras. Endoscopia
também permite a aspiração com agulha fina de lesões ou a coleta de amostras para biopsia, embora cirurgia para biopsia de espessura completa seja necessária para diagnosticar doenças infiltrantes e tumores. Áreas ulcerosas devem ser
biopsiadas apenas na periferia para evitar perfuração. Fluido gástrico pode ser testado para pH para auxiliar no diagnóstico de estados hipersecretivos.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O principal tratamento de úlcera GI é direcionado à causa. Tratamento de suporte pode ser necessário para corrigir distúrbios metabólicos e podem incluir fluidoterapia. Medicação direcionada à própria úlcera
reduz a acidez gástrica, previne destruição adicional da mucosa gástrica e promove cicatrização da lesão. Em geral, a terapia antiulcerativa deve ser mantida por 6 a 8 semanas.
A  produção  de  ácido  gástrico  é  estimulada  por  histamina  (mais  potente),  gastrina  e  acetilcolina.  Fármacos  que  diminuem  a  secreção  ácida  ajudam  a  proteger  a  mucosa  gástrica  danificada.  Bloqueadores  de  receptores  H2  (p.  ex.,
cimetidina, famotidina) promovem cicatrização da mucosa e alguns deles (p. ex., ranitidina) também atuam como procinéticos. Como não há relato de um fármaco clinicamente mais eficaz que o outro, a famotidina (0,5 a 1 mg/kg, VO, SC
ou IV, 2 vezes/dia) é mais potente em reduzir o pH gástrico do que a cimetidina (10 mg/kg, 3 vezes/dia, VO, IM ou IV, 3 vezes/dia) ou a ranitidina (cães: 2 mg/kg, 3 vezes/dia VO ou IV; gatos: 2,5 mg/kg, 2 vezes/dia IV ou 3,5 mg/kg, 2
vezes/dia, VO). Inibidores da bomba de prótons (p. ex., omeprazol (0,5 a 1 mg/kg, 1 vez/dia, PO) são úteis no tratamento de úlceras mais graves, uma vez que são inibidores mais potentes da secreção de ácido gástrico. Há relato do uso de
pantoprazol (0,5 a 1 mg/kg, IV, 1 vez/dia), um inibidor da bomba de próton, em cães e gatos. O uso profilático de bloqueadores H2 e inibidores da bomba de prótons pode não diminuir o risco de úlcera GI em animais predispostos a elas.
Citoprotetores incluem os antiácidos e o sucralfato. Os antiácidos são bases fracas que neutralizam o ácido gástrico no lúmen estomacal; eles também podem promover produção de prostaglandina gástrica. Antiácidos contendo alumínio
ou  magnésio  são  considerados  mais  eficazes  com  menos  efeitos  adversos,  embora  possam  provocam  constipação  intestinal.  Acidez  gástrica  de  rebote  ocorre  frequentemente  devido  a  curta  meia­vida  desses  agentes.  Por  esta  razão,
antiácidos não são mais utilizados rotineiramente. O sucralfato (cães: 0,5 a 1 g, 2 a 3 vezes/dia, VO; gatos: 0,25 g, 2 a 3 vezes/dia, VO) é um sulfato de sacarose polialumínio que se liga a áreas erodidas ou ulceradas da mucosa gástrica.
Como ele inibe a absorção, não deve ser administrado dentro de 2 h após as refeições ou o uso de outros fármacos. O análogo de prostaglandina E2, misosprostol, é utilizado para auxiliar na prevenção de úlceras associadas ao uso de AINE,
porém não auxiliam na cicatrização da mucosa ou na diminuição da secreção ácida.
O uso profilático de antibióticos pode ser indicado em casos de brusca alteração da barreira constituída pela mucosa gástrica ou de choque, ou quando sinais clinicopatológicos, inclusive febre, hematoquezia, leucopenia e neutrofilia,
sugerem translocação bacteriana. Antibióticos betalactâmicos (p. ex., 22 mg de ampicilina/kg IV, 3 a 4 vezes/dia) são o primeira escolha para a terapia antimicrobiana, com cobertura gram­negativa adicional, se necessários.
PROGNÓSTICO:  O prognóstico para úlcera GI em cães é favorável quando as causas podem ser tratadas ou removidas, a úlcera é moderada ou a condição é rapidamente diagnosticada e tratada. É difícil o controle de úlceras associadas a
doenças graves ou em estágio terminal (p. ex., insuficiência hepática). A taxa de mortalidade associada à perfuração GI alcança até 70%.
Úlcera GI em gatos está frequentemente associada à neoplasia. Tratamento intensivo é, normalmente, necessário devido à alta prevalência de hemorragia intensa. Relata­se que a sobrevida média de gatos com úlcera gástrica submetidos à
cirurgia e cura paliativa variou de 12 a 15 meses. Gatos com úlcera GI secundária à doença não neoplásica manifestam doença clínica menos grave e um bom prognóstico.

DOENÇAS DO ESÔFAGO EM PEQUENOS ANIMAIS

 ACALASIA CRICOFARINGIANA
A acalasia cricofaringiana caracteriza­se pelo relaxamento inadequado do músculo cricofaríngeo, o que leva à incapacidade relativa do animal em engolir alimentos ou líquidos. Ocorre principalmente como um defeito congênito, mas é
ocasionalmente visto em cães adultos. As tentativas repetidas de engolir são seguidas por engasgo e regurgitação. A pneumonia por aspiração é uma complicação comum. Geralmente, não se conhece a causa, mas pode estar associada a
distúrbio neuromuscular adquirido em animais adultos. Um diagnóstico preciso requer avaliação fluoroscópica da deglutição após administração oral de material contrastado, sozinho, ou misturado ao alimento. Função anormal (falta de
relaxamento) do músculo cricofaríngeo resulta em retenção de bário na faringe posterior.
O tratamento consiste em miotomia do cricofaríngeo, ou miectomia do cricofaríngeo e do tirofaríngeo, o que promove a deglutição normal imediatamente após a cirurgia. A taxa de sucesso da cirurgia aproxima­se de 65%. Cães com
distúrbios neuromusculares adquiridos respondem menos à cirurgia, mas podem responder ao tratamento da doença primária. A pneumonia por aspiração, caso presente, deve ser tratada de modo agressivo.

 ALTERAÇÃO DA MOTILIDADE ESOFÁGICA
Estudo recente mostrou que cães jovens podem apresentar alteração da motilidade do esôfago, sem megaesôfago aparente. Os sinais clínicos podem ser semelhantes aos do megaesôfago, embora alguns cães apresentem motilidade anormal
durante um esofagograma, sem sinais clínicos. Em mais da metade dos casos, os casos melhoram ou se resolvem com a idade. Raças terrier foram as mais representativas.

 CORPOS ESTRANHOS ESOFÁGICOS
Os corpos estranhos de esôfago são mais comuns em cães do que em gatos. Ossos são os corpos estranhos mais comuns, mas também podem ser encontradas agulhas, anzóis, madeira, pedaços de couro e de petiscos que auxiliam na
limpeza bucal. Geralmente, o objeto aloja­se nas áreas de menor distensibilidade do esôfago: entrada do tórax, base do coração ou esôfago caudal imediatamente cranial ao diafragma. Ocasionalmente, um objeto pode se alojar em outras
localidades como no esfíncter esofágico superior.
Ptialismo, engasgo, disfagia, regurgitação e repetidas tentativas de deglutição são sinais de corpos estranhos esofágicos. Com frequência, o proprietário pode ver o animal ingerindo o corpo estranho. Os sinais dependem da localização do
corpo estranho e do grau e duração da obstrução. Uma obstrução parcial pode permitir a passagem de líquidos, mas não de alimentos. Nos casos de obstrução crônica, anorexia, perda de peso e letargia são comuns.
A perfuração do esôfago cervical pode resultar em abscedação local ou enfisema subcutâneo; uma perfuração do esôfago torácico pode resultar em pleurite, mediastinite, piotórax, pneumotórax ou formação de fístula broncoesofágica.
Esofagite, laceração mucosa, estenose esofágica e formação de divertículo esofágico são complicações potenciais. A formação de estenose esofágica é a complicação mais comum de um corpo estranho esofágico. Pneumonia por aspiração
pode ser secundária a regurgitação.
Muitos corpos estranhos esofágicos são radiopacos e podem ser observados em radiografias simples. Um esofagograma contrastado ou uma esofagoscopia são necessários para identificar corpos estranhos radioluscentes. Caso se suspeite
de uma perfuração, deve­se utilizar um meio de contraste iodado em vez de suspensões de sulfato de bário. A esofagoscopia permite um exame direto tanto do corpo estranho quanto da parede esofágica e, com frequência, possibilita
intervenção terapêutica.
Uma vez diagnosticado, o corpo estranho esofágico deve ser removido imediatamente. Muitas vezes, o objeto pode ser removido pela boca com endoscópio flexível e pinça. Um endoscópio rígido pode também ser utilizado se um guia
flexível não está disponível, mas cuidados devem ser tomados na manipulação do equipamento no esôfago para evitar lacerações ou perfurações. Se o corpo estranho é liso, pode­se inserir um cateter de Foley e distendê­lo oralmente ao
corpo estranho, e depois removê­lo via boca, trazendo o corpo estranho consigo. Um tubo endotraqueal grande pode ser colocado sobre o endoscópio para remover corpos estranhos afiados, como anzóis, que podem ser relocados para
dentro do tudo endotraqueal e removidos sem lesões no esôfago durante sua retirada. Caso um corpo estranho não possa ser removido pela boca, pode­se empurrá­lo para o interior do estômago, onde ele poderá ser digerido (p. ex., ossos),
eliminado ou removido por gastrostomia. Indica­se cirurgia nos casos de perfuração ou se o corpo estranho não pôde ser removido via endoscopia; em um estudo, a taxa de recuperação foi de 93% após a cirurgia. Contudo, há um potencial
para formação de estenose e complicações secundárias devido a pobre capacidade de cicatrização do esôfago. A esofagite, se presente, deve ser tratada como anteriormente descrita.

 DILATAÇÃO ESOFÁGICA (Megaesôfago)
O megaesôfago pode ocorrer por um defeito congênito ou por um distúrbio adquirido, na idade adulta. Os defeitos congênitos que podem resultar em megaesôfago incluem anomalia no anel vascular, divertículo esofágico e uma forma
idiopática  (ver  anomalias  congênitas  e  adquiridas,  p.  169).  O  megaesôfago  na  idade  adulta  pode  ser  primário  (idiopático)  ou  secundário  a  uma  doença  sistêmica.  O  megaesôfago  secundário  pode  ocorrer  por  miastenia  gravis,  lúpus
eritematoso  sistêmico,  polimiosite,  hipoadrenocorticismo,  intoxicação  por  metais  pesados  (chumbo),  disautonomia,  distúrbios  neurológicos,  inclusive  neoplasia  e,  possivelmente,  hipotireoidismo.  A  dilatação  esofágica  também  pode  se
desenvolver cranialmente a uma lesão esofágica como uma estenose, corpo estranho, neoplasia ou compressão extraesofágica.
O principal sinal é regurgitação. Um filhote de cão com megaesôfago congênito tipicamente começa a regurgitar por ocasião do desmame, quando passa a ingerir alimentos sólidos. Os filhotes acometidos geralmente definham e ficam
menores que os seus companheiros de ninhada. Uma pressão aplicada no abdome pode causar um abaulamento esofágico na entrada torácica. A pneumonia por aspiração é uma complicação comum e os sinais associados incluem tosse,
febre e, às vezes, secreção nasal. Os adultos que desenvolvem megaesôfago começam a regurgitar e, finalmente, perdem peso. Os sinais respiratórios podem predominar, com pouca ou nenhuma regurgitação aparente. As radiografias
torácicas revelam ar, fluidos ou alimentos no esôfago dilatado. O esôfago encontra­se uniformemente dilatado. Um grande desvio ventral pode estar presente cranialmente ao coração. Megaesôfago secundário a estenose, corpo estranho,
neoplasia ou anomalia do anel vascular é visualizado como uma dilatação esofágica cranialmente ao defeito, apenas. Estenoses, corpos estranhos e anomalia do anel vascular devem ser excluídos por esofagograma e/ou esofagoscopia.
Nos cães adultos, as doenças associadas (p. ex., a miastenia gravis) devem ser excluídas e, se diagnosticadas, tratadas. Indica­se uma cirurgia no caso de anomalia do anel vascular. A cirurgia não resolverá, com sucesso, os sinais clínicos
nos casos de uma dilatação esofágica grave, de longa duração, cranial à anomalia. Indica­se um tratamento clínico no caso de megaesôfago idiopático congênito ou adquirido. Megaesôfago congênito pode se resolver com a idade do animal,
geralmente aos 6 meses de idade. A consistência da dieta que melhor evita regurgitação varia de cão para cão; alimento pastoso funciona bem em muitos animais, mas o alimento seco funciona melhor no caso de alguns. Outra possibilidade
é alimento enlatado oferecido no formato de almôndega. Frequentemente, pequenas porções funcionam melhor em muitos cães. A alimentação em posição elevada, ficando os membros torácicos mais altos que os pélvicos, e mantendo esta
posição  por,  no  mínimo,  10  a  15  min  depois  que  o  animal  comeu  permite  que  a  gravidade  auxilie  a  passagem  do  alimento  para  o  estômago.  Nem  cirurgias  nem  medicamentos  melhoram  a  função  esofágica.  Por  fim,  muitos  animais
sucumbem devido à pneumonia por aspiração.

 DIVERTÍCULOS ESOFÁGICOS
Divertículos do esôfago são dilatações semelhantes a bolsas na parede esofágica e podem ser congênitos ou adquiridos. São raros em cães e gatos. Os divertículos adquiridos são de dois tipos: propulsão ou tração. Os divertículos  de
propulsão são causados por aumento na pressão intraluminal ou inflamação esofágica profunda, podendo causar herniação da mucosa. As doenças predisponentes incluem esofagite, estenose esofágica, corpos estranhos, anomalias do anel
vascular, megaesôfago e hérnia de hiato. Esse tipo de divertículo compreende o epitélio esofágico e o tecido conjuntivo. Os divertículos de tração resultam de inflamação da cavidade torácica proximamente relacionada com o esôfago. Um
tecido fibroso é produzido, que então contrai, tracionando a parede do esôfago para fora. Esse divertículo compreende as quatro camadas do esôfago.
Divertículos pequenos podem ser subclínicos. Nos maiores, o alimento fica retido na bolsa, causando dispneia pós­prandial, regurgitação e anorexia. Pesquisas radiográficas podem evidenciar o divertículo se o mesmo está repleto de
ingesta ou ar, mas radiografias contrastadas são melhores para demonstrar a bolsa. A endoscopia permitirá a visualização e pode identificar úlceras ou cicatrizes.
Os divertículos pequenos podem ser tratados com uma dieta branda, amolecida, com o animal em pé. Os divertículos maiores requerem excisão cirúrgica e reconstrução da parede esofágica. O prognóstico após cirurgia é de razoável a
bom.

 ESOFAGITE
A inflamação do esôfago é geralmente causada por corpos estranhos, refluxo gastresofágico e, ocasionalmente, certas drogas (p. ex., doxiciclina). O refluxo gastresofágico está associado à anestesia, medicamentos que reduzem o tônus do
esfíncter esofágico inferior (p. ex., atropina e acepromazina) e vômitos agudos ou crônicos. As outras causas de esofagite incluem ingestão de substâncias irritantes ou cáusticas, neoplasia e infecção por Spirocerca lupi (p. 498). Sondas
alimentares que passam pela junção gastresofágica podem também resultar em refluxo gastresofágico. Nos gatos, a calicivirose pode causar esofagite.
Regurgitação é o sinal clássico de esofagite; outros sinais incluem ptialismo, tentativas repetidas de deglutição, dor, depressão, anorexia, disfagia e extensão da cabeça e pescoço.  Esofagite  discreta  pode  não  estar  associada  a  sinais
clínicos.
A endoscopia é a ferramenta diagnóstica de escolha. Permite a visualização de qualquer problema associado (p. ex., corpos estranhos) e avaliação direta das lesões esofágicos. As radiografias simples têm pouco ou nenhum valor no
diagnóstico de esofagite. Um esofagograma por fluoroscopia mostra quaisquer defeitos na motilidade esofágica associados, secundários a esofagite, e pode evidenciar defeitos na parede esofágica, se são graves.
Esofagite discreta geralmente não requer tratamento. Caso haja sinais clínicos, deve­se iniciar tratamento medicamentoso. A esofagite secundária ao refluxo gastresofágico é tratada por meio da diminuição da acidez gástrica, aumento no
tônus do esfíncter esofágico inferior e na velocidade de esvaziamento gástrico e promover o controle da dor. Em muitos casos, os antagonistas dos receptores H2 (p. ex., ranitidina, famotidina) são capazes de diminuir a produção de ácido
gástrico;  no  entanto,  em  casos  graves  de  esofagite,  os  inibidores  da  bomba  de  prótons  (p.  ex.,  omeprazol)  são  preferidos.  Cisaprida  e  metoclopramida  aumentam  o  tônus  esofágico  inferior  e  a  velocidade  de  esvaziamento  gástrico.  A
cisaprida  é  mais  potente  que  a  metoclopramida.  Pode­se  administrar  sucralfato,  oralmente,  para  uma  citoproteção  esofágica.  Alimentos  amolecidos,  pobres  em  gorduras  e  fibras,  devem  ser  oferecidos  em  porções  pequenas  e  de  modo
frequente. Analgésicos sistêmicos podem ser utilizados para alívio da dor.
Se a esofagite é grave, um tubo de gastrostomia deve ser utilizado para a completa recuperação do esôfago. A administração de corticosteroide é controversa. Antibióticos de amplo espectro devem ser utilizados para pneumonia por
aspiração concomitante e podem ser úteis na esofagite grave, como uma tentativa de se evitar a invasão e infecção bacteriana.

 ESTENOSE ESOFÁGICA
Estenose  esofágica  corresponde  a  um  estreitamento  patológico  do  lúmen  do  esôfago,  após  traumatismo  (p.  ex.,  corpo  estranho),  ingestão  de  substâncias  cáusticas,  exposição  a  certos  medicamentos  (como  doxiciclina  ou  clindamicina),
esofagite, refluxo gastresofágico  ou  invasão  neoplásica.  A  maioria  das  estenoses ocorre na porção torácica do esôfago. Os tumores esofágicos são raros, mas os sarcomas esofágicos podem estar associados a infecções por Spirocerca
lupi (p. 498) e requer consideração nas áreas onde esse parasito é prevalente. A compressão esofágica por anomalias do anel vascular ou tumores extramurais podem mimetizar os sinais de estenose.
Os sinais clínicos são semelhantes aos associados a corpos estranhos e incluem regurgitação, ptialismo, disfagia e dor. Um esofagograma com fluoroscopia é a ferramenta escolhida para o diagnóstico, pois permite a visualização do
número, extensão, localização e gravidade das estenoses. A esofagoscopia pode também ser diagnóstica, mas não permite a visualização além da estenose, a menos que se realize uma dilatação com balão esofágico.
O  tratamento  com  balão  de  dilatação  esofágica  é  bem­sucedido.  A  sondagem  é  outra  técnica,  menos  disponível.  Teoricamente,  causa  uma  maior  lesão  por  trauma  no  esôfago,  mas  não  mostrou  ter  uma  taxa  de  complicação
significativamente diferente da dilatação por balão. A ressecção cirúrgica de uma única estenose é outra opção; entretanto, obtém menos sucesso. Estes tratamentos induzem, provavelmente, a certo grau de esofagite, que deve ser tratada
para diminuir a chance de recidiva da estenose. O uso de corticosteroides, tanto sistêmico quanto intralesionalmente, na tentativa de se evitar uma recidiva de estenose, é controverso. Não há dados sobre o sucesso dessa terapia adjuvante
para estenoses esofágicas em cães e gatos, mas o uso intralesional foi útil em reduzir recidivas em humanos.

 FÍSTULA BRONCOESOFÁGICA
Fístulas broncoesofágicas são raramente observadas em cães e gatos. A maioria desenvolve­se, comumente, secundária à penetração de corpo estranho no esôfago. As fístulas podem se desenvolver entre o esôfago e qualquer parte da
árvore respiratória. Uma forma congênita também foi descrita, e os Cairn Terriers podem ser predispostos. O sinal clínico mais comum é a tosse após ingestão de água ou alimento. Regurgitação também pode ser observada; anorexia, febre
e letargia podem estar relacionadas com a pneumonia.
Avaliações  radiográficas  podem  revelar  um  corpo  estranho  radiopaco  ou  pneumonia.  Esofagogramas  contrastados  mostrarão  a  comunicação  entre  o  esôfago  e  as  vias  respiratórias.  O  uso  de  uma  pequena  quantidade  de  bário  é
recomendada – contrastes iodados são hiperosmolares e podem causar edema pulmonar.
A correção cirúrgica consiste em lobectomia pulmonar e reparação do problema congênito. O prognóstico após cirurgia é bom.

DOENÇAS HEPÁTICAS EM PEQUENOS ANIMAIS

O fígado tem várias funções, que incluem o metabolismo de lipídios, carboidratos e proteínas; armazenamento e metabolismo de vitaminas; armazenamento de minerais, glicogênio e triglicerídios; hematopoese extramedular e homeostasia.
O fígado também possui atividade imunológica, contribui para a digestão por meio de produção de ácidos biliares e é essencial para a desintoxicação de vários compostos endógenos e exógenos. Como o fígado tem grande capacidade de
armazenamento e reserva funcional e é capaz de se regenerar, a lesão hepática deve ser considerável, crônica ou recidivante para causar disfunção ou insuficiência hepática evidente.
A  lesão  é  normalmente  acompanhada  de  aumento  das  atividades  das  enzimas  hepáticas,  com  as  transaminases  citosólicas  (ALT,  AST),  refletindo  alteração  aguda  da  permeabilidade  ou  da  viabilidade  da  membrana,  e  enzimas  de
membrana (fosfatase alcalina [ALP], gamaglutamiltransferase [GGT]), refletindo colestase e indução enzimática. O fígado é predisposto a lesões secundárias, devido sua posição de sentinela entre a circulação sistêmica e o trato GI e,
também,  porque  apresenta  a  maior  quantidade  de  macrófagos  residentes  (células  de  Kupffer)  do  organismo.  A  fagocitose  dos  macrófagos  pode  iniciar  uma  cascata  de  liberação  de  citocinas  inflamatórias/interleucinas,  levando  à  lesão
hepática focal e recrutamento local de células inflamatórias. A considerável atividade metabólica do fígado exacerba sua exposição a produtos nocivos, particularmente na região centrilobular, onde a alta atividade de citocromo p450 produz
produtos tóxicos e onde os hepatócitos são mais facilmente danificados por hipoxia. A capacidade do fígado em armazenar cobre e ferro pode iniciar e exacerbar a lesão por meio de mecanismos oxidativos.
Os sinais clínicos de lesão hepática variam dependendo do tipo, mecanismo e cronicidade da lesão. Características clínicas comuns podem incluir anorexia, vômito, diarreia, perda de peso, febre, icterícia, poliúria (PU) e polidipsia (PD),
anormalidades de coagulação, ascite e alteração na cor das fezes (fezes acólicas na oclusão completa dos ductos biliares; fezes verdes com aumento da excreção intestinal de bilirrubina). Ascite indica hipertensão portal e desvio (shunt)
portossistêmico  adquirido  (DPSA)  ocorre  normalmente  em  associação  à  hipoalbuminemia  concomitante.  Encefalopatia  hepática  se  desenvolve  em  hepatopatias  adquiridas,  apenas  quando  há  fibrose  e  shunt  adquirido,  na  insuficiência
hepática aguda fulminante ou secundária a desvio portossistêmico congênito. Hepatomegalia é observada em distúrbios infiltrativos difusos ou anormalidades de armazenamento, obstrução extra­hepática aguda de ductos biliares (OEHDB)
ou na malformação cística biliar congênita, enquanto a redução da massa hepática normalmente reflete hipoperfusão portal venosa e desvio de fatores hepatotróficos intestinais ou fibrose hepática crônica, em cães.

DIETA
A otimização do suporte nutricional é essencial. Tem influência crucial no tratamento de gatos com LH, sendo um componente importante do tratamento domiciliar de animais com distúrbios lentamente progressivos. Ela também melhora a
qualidade  de  vida  de  animais  com  insuficiência  hepática  sujeitos  à  encefalopatia  hepática  episódica.  Dietas  para  animais  com  doença  hepatobiliar  devem  ser  facilmente  digeríveis,  caloricamente  densa,  altamente  palatável,  fácil  de  ser
preparada e administrada pelo proprietário e dadas frequentemente em pequenas porções. Os objetivos são otimizar a digestão e assimilação do alimento e alcançar seu consumo voluntário.
Se os animais estiverem anoréxicos, alimentação por sonda deve ser considerada. Sondas nasogástricas são baratas, fáceis de serem colocadas e recomendadas como solução a curto prazo. Sondas esofagostômicas são preferíveis em
gatos  com  LH.  O  uso  de  estimulantes  de  apetite  permanece  controverso.  Eles  podem  atrasar  a  instituição  de  um  regime  nutricional  de  suporte.  Além  disso,  alguns  dos  fármacos  comumente  utilizados  são  metabolizados  pelo  fígado.
Diazepam e oxazepam podem levar a uma insuficiência hepática idiopática fulminante em alguns gatos.
A modificação da dieta em um animal com doença hepática depende do estado clínico, diagnóstico definitivo e análise recente da função hepática. As dietas devem ser balanceadas e suplementadas com vitaminas hidrossolúveis. Nos
distúrbios colestáticos graves que impedem o acesso da bile ao intestino (p. ex., OEHDB, colangite esclerosante avançada em gatos), vitaminas lipossolúveis podem estar diminuídas. Vitamina K1 pode ser suplementada com injeções
parenterais: 0,5 a 1,5 mg/kg toda semana (ajustada contra um tromboteste [ensaio de PIVKA]). Se a deficiência de vitamina K1 é confirmada, é provável que vitamina E também precise ser suplementada. Como a vitamina E é lipossolúvel,
uma forma especial solúvel em água pode ser necessária para administração oral: succinato de a­tocoferol em polietilenoglicol (10 UI/kg, VO, 1 vez/dia).
A função hepática também tem influência considerável na homeostase da glicose (glicogenólise ou gliconeogênese de aminoácidos e lactato), desintoxicação de nitrogênio (ciclo da ureia) e cetogênese (de ácidos graxos).
SUPRIMENTO ENERGÉTICO:  A necessidade de energia deve ser estimada com base no peso corpóreo ideal. A mudança de alimentação para uma nova dieta deve ser feita lentamente. Por exemplo, a ingesta deve compreender cerca de 50%
da necessidade energética diária calculada no dia 1, aumentada para 75% no dia 2 e, então, 100% no dia 3. O suprimento energético pode precisar de ajuste após a aceitação da dieta, a estabilização do animal; nova avaliação do peso e da
condição corporal confirmam se há necessidade de aumentar a ingesta. A estimativa da ingestão energética inicial é calculada usando fórmulas que predizem os requerimentos energéticos em repouso. Reavaliação frequente é necessária e a
concessão de energia ajustada à resposta. Fórmulas para a estimativa de suprimento energético inicial para cães são: 30 × peso corporal (kg) + 70 (para cães de 2 a 16 kg); 70 × peso corporal (kg)0,75 (para cães < 2 ou > 16 kg); e 99 × peso
corporal (kg)0,67 (ingesta inicial segura para um cão saudável).
Para gatos, a fórmula estabelecida é: 60 × peso corporal (kg), a menos que o gato seja muito obeso ou suspeita­se de taxa ou atividade metabólica subnormal.
SUPRIMENTO DE PROTEÍNA NA DIETA:  O diagnóstico de doença hepática não deve automaticamente ditar a necessidade de restrição proteica. De fato, a restrição proteica pode ser prejudicial em alguns pacientes como, por exemplo, gatos
com LH ou animais com doença hepática necrosante­inflamatória crônica, porém estável, que não apresentam APSS ou encefalopatia hepática. O suporte nutricional pode estar prejudicado em animais que rejeitam alterações dietéticas e
restrição proteica. A restrição proteica é apropriada quando há suspeita de encefalopatia hepática, cristalúria com biurato de amônio ou na confirmação de desvio portossistêmico (adquirido ou congênito).
O  suprimento  proteico  para  um  animal  com  encefalopatia  hepática  deve  manter  um  balanço  positivo  de  nitrogênio  e  evitar  o  catabolismo.  Como  a  manutenção  da  massa  magra  corporal  (músculo)  fornece  uma  pausa  temporária  na
toxicidade de amônia, o estado de condição corporal deve ser monitorada regularmente para comparar as estimativas.
As proteínas devem ser inicialmente reduzidas a 2,5 g/kg (dietas < 5 g/100 kcal) para cães e 3,5 g/kg (< 7 g/100 kcal) para gatos. Avaliações sequenciais do histórico, condições físicas e clinicopatológicas devem julgar a resposta ao
tratamento.
A maioria das dietas de restrição proteica é utilizada em cães com doença hepática grave e crônica ou com PSVA. Se um cão responde bem à restrição proteica inicial, pode­se adicionar 0,5 g de proteína/kg/dia, usando tofu ou fonte
proteica derivada do leite. Os pacientes devem ser monitorados a cada 1 a 2 semanas quanto a sinais de encefalopatia hepática e alterações na albumina, BUN e o aparecimento de cristalúria por biureto de amônio. Três amostras de urina
devem ser coletadas: assim que acordar, a primeira coisa da manhã, 4 a 8 h após as refeições e mais tarde ao entardecer.
A proteína da dieta não deve ser restrita em gatos com LH porque a restrição compromete a sobrevivência. Proteínas não devem ser restritas em cães e gatos com distúrbio hepático necroinflamatório crônico na época do diagnóstico;
esses animais podem apresentar maior necessidade proteica para reparo tecidual e replicação celular que um animal controle, sadio, de mesma idade e sexo.
Fonte/Qualidade  de  Proteínas Modificadas: A  modificação  do  tipo  e  da  qualidade  da  ingesta  proteica  em  cães  com  encefalopatia  hepática  é  útil.  Uma  alta  proporção  energia:nitrogênio  deve  ser  mantida,  uma  vez  que  isto  otimiza  o  uso  da
proteína na dieta. Em cães, a característica das proteínas de laticínios e vegetais (soja) funcionam melhor. Proteínas do leite (quantidade por 225 g) podem ser encontradas nos seguintes produtos: leite integral (8 g e 157 cal), iogurte (8 g e
139 cal), queijo cottage (57 g e 800 a 900 cal). Alternativamente, em cães, o caseinato de cálcio fornece 88 g proteína, 2 g de gordura e 370 kcal/100 g de porção. Em gatos, são essenciais proteínas da carne, em uma dieta balanceada que
contenha arginina (cerca de 250 mg/100 kcal) e taurina.
GORDURA  NA  DIETA:  Não  há  necessidade  de  restringir  a  gordura  da  dieta  na  maioria  dos  animais  com  doença  hepatobiliar.  Grande  parte  dos  animais  não  apresentam  problemas  com  a  digestão  de  gordura  ou  similares  e  sua  ingestão  é
importante para o provisionamento de ácidos graxos essenciais e vitaminas lipossolúveis. Ocorre uma exceção em animais com OEHDB crônica ou gatos com colangite esclerosante com “ductopenia” sintomática. Estes pacientes tem
circulação enterro­hepática de ácidos biliares reduzida, limitando a emulsificação, digestão e assimilação da gordura ingerida. Outra exceção é cães com mucoceles da vesícula biliar, que apresentam hiperlipidemia idiopática.
Micronutrientes e Vitaminas:
Vitaminas Hidrossolúveis: Estas devem ser suplementadas em animais com doença hepática crônica e em gatos com LH (Tabela 8). Gatos são especialmente suscetíveis a tiamina (B1), cobalamina (B12) e deficiência de vitamina K1 se eles são

cronicamente inapetentes, tratados com antimicrobianos, apresentem doença pancreática ou intestinal grave ou demonstrarem colestase crônica. Gatos hipertireóideos podem desenvolver problemas de má absorção e podem estar mais
sujeitos a essas complicações quando também acometidos por colangioepatite ou LH. Vitamina C não é normalmente reconhecida como micronutriente depletado. Cães com hepatopatia por reserva de cobre e animais com grande estoque
de ferro hepático não devem receber suplementos de vitamina C.

Tabela 8 – Formulação de suplementos com vitaminas hidrossolúveis fortalecidos (2 ml/l de fluido IV) em cães e gatos com hepatopatias

Suplemento Concentração por mL

Cloridrato de tiamina (vitamina B1) 50 mg

Fosfato sódico de riboflavina 5´ (vitamina B2) 2,0 a 2,5 mg

Niacinamida (vitamina B3) 50 a 100 mg

D­pantenol (vitamina B5) 5 a 10 mg

Cloridrato de piridoxina (vitamina B6) 2 a 5 mg

Cianocobalamina (vitamina B12) Variável: 0,4 a 50 μg (valor menor de vitamina B12 requer suplementação adicional SC ou IM, em gatos deficientes

Benzilálcool (conservante) 1,5%

Vitaminas Lipossolúveis:  A suplementação de vitaminas lipossolúveis é importante em animais com má absorção lipídica e obstrução do fluxo biliar. A depleção de vitamina K1 se instala quando o ciclo do ácido biliar enterro­hepático está

interrompido em animais com fezes acólicas (p. ex., OEHDB, colangioepatite ductopênica esclerosante grave em gatos), LH (gatos), insuficiência pancreática exócrina, doença intestinal má absorção grave, após a alimentação com dietas
deficientes em vitamina K, como resultado de administração crônica de antibióticos orais e em hepatopatias graves. Vitamina K deve ser administrada o quanto antes em qualquer animal ictérico com suspeita de hepatopatia. Vitamina
K1 deve ser administrada a 0,5 a 1,5 mg/kg, SC ou IM, 3 vezes em um intervalo de 12 h antes de procedimentos invasivos, inserção de cateteres em veias grandes, cistocentese, inserção de sondas alimentares, amostragem por aspiração ou
biopsia hepática. Na colangioepatite ductopênica esclerosante felina ou OEHDB crônica, os animais necessitam de injeções intermitentes semanais de vitamina K1 (p. ex., a cada 7 a 21 dias), monitorados por testes de coagulação PIVKA ou
PT. Sobredose com vitamina K1 pode induzir a anemia hemolítica por corpúsculos de Heinz em gatos.
Vitamina E é um importante agente antioxidante, anti­inflamatório e antifibrótico utilizado em hepatopatias necrosante­inflamatórias e colestáticas. A dose de acetato de D­alfatocoferol é 10 UI/kg/dia. Doses maiores (100 UI/kg/dia) são
necessárias em animais com OEHDB crônica ou colangioepatite ductopênica esclerosante felina. Alternativamente, succinato de alfatocoferol em polietilenoglicol (vitamina E solúvel) pode ser utilizado, na dose de 10 UI/kg/dia. Doses de
vitamina E não deve exceder as quantidades recomendadas uma vez que muita vitamina E pode interferir na atividade de vitamina K, provocando coagulopatias e também lesões oxidativos (acúmulo de radicais tocoferoxi).

DOENÇAS DA VESÍCULA BILIAR E DO SISTEMA BILIAR EXTRA­HEPÁTICO
A  icterícia  frequentemente  é  o  primeiro  sinal  clínico  evidente  em  animais  com  anormalidades  de  vesícula  biliar  ou  de  estruturas  biliares  extra­hepáticas;  efusão  abdominal  pode  refletir  peritonite  biliar.  Teor  de  bilirrubina  na  efusão
abdominal maior do que no soro sanguíneo (diferença > 10 vezes) confirma o extravasamento de bile na cavidade abdominal, sendo uma emergência cirúrgica.

 COLECISTITE
Na colecistite não necrosante, a inflamação da vesícula biliar pode envolver doenças supurativas e não supurativas; pode estar associada a microrganismos infecciosos, doenças sistêmicas ou neoplasia; ou pode refletir trauma abdominal
embotado ou obstrução da vesícula biliar por oclusão do ducto cístico (p. ex., colelitíase, neoplasia ou coledocite). A oclusão do ducto cístico induz inflamação da vesícula biliar secundária à estase biliar; este processo é exacerbado pela
irritação mecânica de um cálculo biliar. A parede da vesícula biliar se espessa e o lúmen é distendido por bile branca, viscosa e com muita mucina (bile branca).
Colecistite necrosante requer intervenção cirúrgica imediata (colecistectomia e desvio biliar). O início dos sinais clínicos é agudo e incluem dor abdominal, febre e aumento de enzimas hepáticas. Entretanto, os sinais podem permanecer
indefinidos e episódicos e a hiperbilirrubinemia é inconsistente. Cães de meia­idade ou adultos são mais acometidos. Detecção ultrassonográfica de uma parede da vesícula biliar espessada ou ducto biliar cístico e desconforto durante a
obtenção de imagem ou a palpação abdominal profunda pode ser apenas evidência de doença.
Colescistite necrosante pode desenvolver–se secundária à tromboembolia, trauma abdominal contuso, infecção bacteriana, OEHDB, obstrução de ducto cístico (cálculo biliar, neoplasia), ou mucocele de vesícula biliar. Extensão de uma
doença inflamatória ou neoplásica a partir do tecido hepático adjacente também pode ser uma importante causa. Colecistite necrosante pode estar presente com ou sem ruptura da vesícula biliar, ou como uma síndrome crônica associada a
adesões entre a vesícula biliar, omento e a víscera adjacente. Bactérias são comumente cultivadas a partir da parede da vesícula biliar.
O  diagnóstico  se  baseia  nos  sinais  clínicos,  nas  características  clinicopatológicas  e  em  imagens  ultrassonográficas.  Devido  ao  fato  da  colecistite  necrosante  estar  frequentemente  associada  à  mucocele  da  vesícula  biliar  em  cães,
intervenção precoce mediante colecistectomia profilática pode reduzir a necessidade de cirurgia de emergência.
Colecistite enfisematosa/coledocite/coledoquite é uma condição rara associada à presença de gás na parede ou no lúmen da vesícula biliar ou em ramos do trato biliar. Em cães, tem sido associada a diabetes melito, colecistite aguda
com ou sem colecistolitíase, isquemia traumática, formação de mucocele na vesícula biliar e neoplasia. A presença de gás em estruturas biliares indica inflamação séptica grave associada à bactéria formadora de gás, como Escherichia
coli ou Clostridium spp. O tratamento requer colecistectomia e terapia antimicrobiana com base na cultura da bile ou tecido biliar envolvido e no antibiograma. Cobertura antibiótica de amplo espectro deve ser iniciada antes da exploração
cirúrgica. O uso de penicilina resistente à betalactamase, com enrofloxacino e metronidazol, é inicialmente indicado até que os resultados de cultura e antibiograma estejam disponíveis.
ACHADOS CLÍNICOS:  Sinais de colecistite aguda incluem dor abdominal (pode ser apenas pós­prandial), febre, vômito, íleo adinâmico e icterícia discreta a moderada. Alguns animais entram em choque endotóxico. O hemograma revela
leucócitos  variáveis,  com  ou  sem  neutrófilos  tóxicos  ou  desvio  à  esquerda.  Hiperbilirrubinemia  e  icterícia  dependem  da  cronicidade,  envolvimento  de  estruturas  biliares  extra­hepáticas,  presença  ou  extensão  da  oclusão  da  trato  biliar,
peritonite biliar e endotoxemia. A atividade enzimática hepática é variável, porém ALP e GGT estão moderadamente ou acentuadamente aumentadas. A ruptura da vesícula biliar induz a formação de abscesso pericolecístico (no omento)
ou peritonite biliar focal ou generalizada. Radiografia abdominal pode revelar detalhes não distintos no abdome cranial compatível com peritonite focal; uma alça intestinal sentinela pode indicar íleo adinâmico. Raramente, a parede da
vesícula  biliar  pode  se  tornar  radiodensa  devido  à  mineralização  distrófica  secundária  à  inflamação  crônica.  Cálculo  biliar  pode  ser  visto  na  ultrassonografia.  A  detecção  de  gás  no  trato  biliar  ou  na  vesícula  biliar  indica  um  processo
enfisematoso associado à sepse e deve­se administrar antibióticos imediatamente. Em alguns casos, é apropriada triagem para colecistectomia de emergência. Pode­se obter fluido pericolecístico guiado por ultrassonografia para confirmar o
extravasamento de bile e infecção. A comparação da concentração total de bilirrubina na efusão com sua concentração no soro ajuda a confirmar o extravasamento biliar.
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  O tratamento visa restabelecer o equilíbrio hidreletrolítico, instituir terapia antimicrobiana de amplo espectro efetiva contra microrganismos intestinais oportunistas e intervenção cirúrgica imediata. Em
alguns casos, transfusão de plasma e coloide são necessários. Pelo fato da OEHDB ser um diagnóstico diferencial, vitamina K1 deve ser administrada (0,5 a 1,5 mg/kg, IM ou SC, 3 doses, com intervalo de 12 h) antes da cirurgia para
prevenir  complicações  hemorrágicas.  Se  cirurgia  de  emergência  é  necessária,  plasma  congelado  fresco  deve  ser  administrado  cuidadosamente  com  base  nos  testes  de  coagulação  e  do  tempo  de  sangramento  da  mucosa  bucal.  Deve­se
assegurar exploração cuidadosa de todas as estruturas biliares. Deve­se determinar a patência dos ductos biliares comum e cístico e a viabilidade da vesícula biliar.
Colecistectomia é o tratamento de escolha na maioria dos casos. Entretanto, alguns animais se beneficiam de colecistoenterostomia ou coledocoenterostomia para circundar um ducto biliar comum distal permanentemente obstruído.
Colocação de uma endoprótese biliar temporária pode ser apropriada, porém antes deve­se considerar cuidadosamente tal procedimento devido à alta taxa de complicações, especialmente em gatos. Amostras de bile, da parede da vesícula
biliar, de cálculos biliares e tecido hepático devem ser enviadas para cultura aeróbica e anaeróbica. Avaliações citológicas de tecido e bile auxiliam na seleção antimicrobiana inicial (morfologia e coloração de Gram). A combinação de
metronidazol, ampicilina/clavulanato e enrofloxacino propicia ampla proteção frente aos microrganismos intestinais oportunistas comumente encontrados. Se apenas a vesícula biliar está envolvida, colecistectomia simples por ser curativa.
Se o ducto biliar comum, cístico ou hepático está envolvido, o prognóstico é mais reservado e terapia antibiótica a longo prazo é recomendada.
Há poucos efeitos adversos da colecistectomia, embora dor abdominal episódica e diarreia associada à má absorção de gordura têm sido descrita. A colecistectomia resulta em perda de absorção e função reguladora da pressão da vesícula
biliar e reservatório de jejum onde a bile está concentrada. Após colecistectomia, o volume da bile aumenta devido à reabsorção de sódio reduzida que normalmente ocorre na vesícula biliar, o tamanho da quantidade de ácido biliar diminui
e a circulação entero–hepática da bile se torna contínua. A composição da bile muda devido à exposição aumentada dos ácidos biliares à flora intestinal e formação aumentada de ácidos biliares secundários.
Animais  que  suportam  a  descompressão  do  trato  biliar  pelas  anastomoses  intestinais  biliares  são  suscetíveis  à  colangite  séptica  retrógrada  e  coledoquite.  Cães  toleram  este  procedimento  com  menos  sinais  clínicos  do  que  gatos.  Os
animais devem ser monitorados quanto à febre, inapetência, vômito e sinais de doenças cíclicas. A medição da CBC e das enzimas hepáticas devem ser feitas trimestralmente. Administração antimicrobiana crônica ou intermitente pode ser
necessária para controlar infecções que ascendem as estruturas biliares. Contudo, a doença geralmente é transitória e responsiva aos antibióticos. Na ausência de neoplasia espera­se sobrevivência a longo prazo com boa qualidade de vida.

 COLELITÍASE
A maioria dos cálculos biliares em cães e gatos é clinicamente silenciosa. O diagnóstico desta anormalidade tem aumentado subsequente ao uso de ultrassom abdominal como uma modalidade de diagnóstico de rotina. Os cálculos biliares
são mais comuns em animais de meia idade e idosos e a incidência pode ser maior em cães de raça pequenos. A maioria dos cálculos biliares em cães e gatos contém carbonato de cálcio e pigmentos de bilirrubina e são considerados
“cálculos de pigmento”. Contudo, muitos não contêm mineral suficiente para detecção no exame radiográfico. Os pigmentos dos cálculos biliares são divididos em 2 categorias: os cálculos de “pigmento preto”, compostos principalmente
de  polímeros  de  bilirrubina,  e  refletem  hiperbilirrubinemia  prolongada,  enquanto  os  cálculos  de  “pigmento  marrom”,  compostos  predominantemente  de  bilirrubinato  de  cálcio,  estão  associados  a  infecções  bacterianas  e  estase  biliar.
Produção  de  mucina  aumentada  pela  inflamação  local  e  por  prostaglandinas  atrapalha  a  visualização  de  bilirrubinato  de  cálcio  e  de  polímeros  de  bilirrubina  dentro  de  agregados  de  cálculos  biliares.  Isso  é  sustentado  pela  ausência  de
motilidade da vesícula biliar e estase biliar, criando uma condição que se perpetua.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Colelitíase pode estar associada a vômito, anorexia, icterícia, febre e dor abdominal. Entretanto, muito animais permanecem assintomáticos. Características laboratoriais de colelitíase mais comum
refletem a colecistite associada. Em cães com litíase de ducto pequeno, as características clinicopatológicas refletem envolvimento de estruturas biliares (aumento das atividades de ALP e GGT). Icterícia está apenas diretamente relacionada
com a colelitíase associada a OEHDB ou sepse; então, muito animais com colelitíase não apresentam hiperbilirrubinemia. Colelitíase pode ser secundária à infecção, ou os cálculos podem propiciar infecção. Trauma mecânico por cálculos
biliares pode aumentar o risco de infecção do trato biliar. Consequentemente, deve­se assegurar monitoramento rigoroso dos sinais de sepse.
O hemograma pode estar normal ou indicar inflamação ou infecção. Um perfil bioquímico sérico pode ser normal ou revelar atividade aumentada de enzimas colestáticas ou evidência de icterícia obstrutiva. A ultrassonografia pode
detectar cálculos > 2 mm de diâmetro na vesícula biliar; habilidade e sorte são necessárias para detectar os cálculos alojados em segmentos do ducto biliar comum. Para animais com colelitíase de ducto pequeno, biopsia e cultura de tecido
hepático são necessárias para identificar doença importante e infecções bacterianas associadas.
TRATAMENTO:  Tratamento medicamentoso de colelitíase inclui antibióticos de amplo espectro e um protocolo colerético com 15 a 25 mg de ácido ursodeoxicólico/kg, VO, 2 vezes/dia, com alimento, 20 a 40 mg de SAMe/kg/dia VO, em
jejum. A biopsia hepática determina se terapia imunomodulatória é apropriada. Pode­se utilizar 10 UI de vitamina E/kg/dia, por seus efeitos antioxidantes e anti­inflamatórios.
Intervenção cirúrgica é necessária se os cálculos biliares estão associados à colecistite, estão causando obstrução do ducto cístico, ou estão ocluindo o ducto biliar comum. O tratamento bem­sucedido de colecistite e oclusão do ducto
cístico requerem colecistectomia e lavagem do ducto biliar comum. Os fatores causais da formação do cálculo biliar devem ser cuidadosamente considerados; mantendo­se uma menor e imóvel vesícula biliar impõe­se o risco de litíase
recidivante  ou  colecistite  necrosante.  Em  casos  em  que  a  obstrução  do  ducto  biliar  comum  não  pode  ser  resolvida,  uma  colecistoenterectomia  deve  ser  executada  seguida  de  monitoramento  a  longo  prazo  quanto  à  colangite  séptica.
Administração antimicrobiana em pulso prolongada pode ser necessária para controlar infecções retrógradas do trato biliar. Biopsias de estruturas biliares e hepáticas envolvidas são essenciais para determinar se uma importante doença
inflamatória primária, séptica ou neoplásica predispõe à formação de cálculos biliares. Tecidos (fígado, ducto biliar, vesícula biliar), bile e sítio do cálculo biliar devem ser enviados para cultura bacteriana aeróbica e anaeróbica.
Colecistoduodenostomia  e  colecistojejunostomia  são  os  procedimentos  cirúrgicos  colecistéricos  mais  comuns  para  se  contornar  problemas  biliares  em  pequenos  animais.  Anastomoses  cistoentéricas  para  o  duodeno  proximal  é  mais
fisiológico porque isto permite entrar no duodeno em uma posição que mantém próximas as respostas fisiológicas normais no intestino proximal para permitir integração coordenada de ácidos biliares e enzimas pancreáticas necessárias
para digestão e assimilação.

 INFECÇÃO HEPATOBILIAR POR FASCÍOLA
Infecção hepática por fascíolas em regiões endêmicas pode causar colangite aguda e crônica em gatos e menos frequentemente em cães. A infecção mais comum em gatos é por Platynosomum concinnum, na Flórida, Havaí e outras regiões
tropicais. A infestação é adquirida pela ingestão de um hospedeiro intermediário infectado, normalmente lagarto ou sapo; nas áreas endêmicas, cerca de 15 a 85% dos gatos com acesso aos hospedeiros intermediários estão infectados. Após
a infecção, fascíolas jovens emergem no intestino e migram para o ducto biliar, vesícula biliar ou ductos hepáticos, onde amadurecem em 8 a 12 semanas. Os ovos embrionados passam da bile para o trato alimentar, podendo ser detectadas
nas fezes tão precocemente quanto 12 semanas após a infecção.
Os sinais clínicos dependem da gravidade da infecção (a carga parasitária); entretanto, a maioria dos gatos infectados é assintomática. Gatos sintomáticos manifestam doença progressiva e podem se tornar ictéricos e emagrecer devido à
anorexia, vômito e diarreia mucoide. Os gatos podem apresentar letargia e febre, bem como hepatomegalia e distensão abdominal. A infecção crônica por fascíola pode ser fatal em gatos gravemente acometidos. Os primeiros sinais clínicos
da doença ocorrem 7 a 16 semanas após a infecção. Em alguns casos, os sinais clínicos se resolvem, sem tratamento, por volta de 24 semanas após a infecção. Eosinofilia circulante pode se instalar 3 a 14 semanas após a infecção e pode ser
persistente. Em animais intensamente infectados, a atividade de ALT e AST pode aumentar, enquanto a atividade de FA pode permanecer normal ou aumentar apenas discretamente. Hiperbilirrubinemia pode se desenvolver 7 a 16 semanas
após a infecção.
Alterações histológicas hepáticas se desenvolvem após 3 semanas e nas infecções persistentes são progressivas. Inflamação e distensão de ductos biliares maiores estão associadas à inflamação neutrofílica e eosinofílica mista. Em 4
meses, hiperplasia biliar adenomatosa e inflamação peribiliar são notadas. Em 6 meses, a fibrose progressiva se torna óbvia e progride para cirrose biliar. Linfadenopatia regional pode ser notada. A distensão do ducto biliar aumenta com o
crescimento das fascíolas adultas e quando elas se tornam sexualmente maduras os ductos biliares se tornam fibrosados. Durante este período, a atividade sérica de transaminase se normaliza. A ultrassonografia abdominal pode revelar
obstrução biliar envolvendo a vesícula biliar, os ductos biliares comuns e/ou ductos intra­hepáticos. Fragmentos de vesícula biliar associados à fascíolas podem aparecer como estruturas ovais hipoecoicas com centros ecoicos. Uma parede
espessa da vesícula biliar associada a uma sinal de borda dupla pode indicar colecistite. O parênquima hepático hipoecoico, com regiões portais hiperecoicas proeminentes (ductos), reflete colangite e colangioepatite.
Como  gatos  infectados  podem  ser  assintomáticos,  o  diagnóstico  de  infestação  por  fascíolas  pode  ser  difícil.  Os  ovos  podem  não  ser  detectados  no  exame  de  fezes  porque  eles  são  eliminados  apenas  esporadicamente  e  demonstram
morfologia variável (formas imaturas e embrionadas), os ovos são pequenos e os métodos de exame de fezes rotineiramente utilizados são relativamente insensíveis a detecção dos ovos de fascíolas. Além disso, o desenvolvimento de
obstrução do trato biliar e fibrose pode impedir a eliminação dos ovos de fascíolas na bile e fezes.
Se há suspeita de infecção por fascíola, recomenda­se o tratamento com praziquantel (20 mg/kg/dia, SC, por 3 a 5 dias). Os ovos podem ser eliminados nas fezes por até 2 meses após o tratamento efetivo. Prednisolona é utilizada para
reduzir a inflamação eosinofílica associada (2 mg/kg/dia, por 2 a 4 semanas, seguida de redução gradativa com decréscimos de 50% a cada 2 semanas). Ácido ursodeoxicólico é administrado (15 a 20 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, com alimento)
para iniciar a hidrocolerese. Antibióticos de amplo espectro são recomendados para proteger contra infecção retrógrada do trato biliar por bactérias introduzidas por fascíolas migrantes. A infecção também pode estar associada a fascíolas
mortas. Vitamina E (10 UI/kg/dia, VO) e SAMe (20 a 40 mg/kg/dia, VO) são administradas até que as enzimas hepáticas se normalizem. Se necessário, um antiemético pode ser administrado, por exemplo, metoclopramida (0,2 a 0,5
mg/kg/dia, VO ou SC, a cada 6 a 8 h) ou maropitant (1 mg/kg/dia, não mais que 5 dias consecutivos).
O resultado dos tratamentos é variável, porém o prognóstico é favorável para as formas discretas da doença. Outros parasitos raros do trato biliar incluem Amphimerus pseudofelineus, Metorchis conjunctus e Eurytrema procyonis (ver p.
503).

 MUCOCELE DE VESÍCULA BILIAR EM CÃES
Esta enfermidade de cães é caracterizada pelo acúmulo progressivo de bile com alto teor de mucina aderente, que pode se estender para dentro dos ductos biliares comum, hepático e cístico, resultando em graus variáveis de obstrução destes
ductos.  A  expansão  progressiva  de  mucocele  biliar  causa  isquemia  da  vesícula  biliar  e  necrose,  peritonite  biliar  e,  às  vezes,  infecções  oportunistas.  Deve­se  considerar  mucocele  de  vesícula  biliar  quando  exames  ultrassonográficos
sequenciais falham em indicar uma redução no tamanho da vesícula biliar ou no conteúdo após alimentação, e confirma a ausência de movimento do “sedimento” luminal. Estase da vesícula biliar, talvez refletindo ausência de motilidade, e
distensão predispõe à colecistite.
Cães acometidos têm de 3 a 14 anos de idade; não há predisposição por sexo, porém a incidência é maior nas raças Shetland Sheepdog, Schnauzer miniatura e Cocker Spaniel.
Fatores que predispõe à formação de mucocele da vesícula biliar incluem idade média ou avançada, hiperlipidemia ou hipercolesterolemia, ausência de motilidade da vesícula biliar e hiperplasia cística da mucosa da vesícula biliar. A
causa inicial da hipersecreção de muco é desconhecida e pode ser multifatorial. Motilidade diminuída da vesícula biliar conduz a estase biliar luminal e absorção aumentada de eletrólitos e líquido, promovendo formação de sedimento biliar.
Cães com fatores de risco podem rapidamente desenvolver uma mucocele após início da terapia com glicocorticoide ou dieta rica em gordura (p. ex., algumas dietas para doenças renais ou insuficiência hepática). Como é comum VH
concomitante, associada à doenças primárias, tal anormalidade deve ser investigada.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  A doença sintomática dura, em média, 5 dias, embora alguns cães exibam sinais episódicos vagos (p. ex., inapetência, vômito, dor abdominal vaga) durante meses. Em ordem de frequência decrescente,
sinais clínicos incluem vômito, dor abdominal, anorexia, icterícia, taquipneia, taquicardia, PU/PD, febre, diarreia e distensão abdominal. Cães em processo de ruptura da vesícula biliar manifestam dor abdominal, icterícia, taquicardia,
taquipneia e febre. Indicadores clinicopatológicos incluem leucocitose com neutrofilia madura e monocitose; enzimas hepáticas elevadas inclusive ALP, GGT, ALT e AST; e hiperbilirrubinemia. Bactérias aeróbicas podem ser cultivadas a
partir  da  bile  ou  da  parede  da  vesícula  biliar,  com  isolamento  de  vários  microrganismos  intestinais,  inclusive  Escherichia  coli,  Enterobacter  ssp,  Enterococcus  spp,  Staphylococcus  spp,  Micrococcus  spp  e  Streptococcus  spp.
Colecistocentese guiada por ultrassonografia não deve ser feita se há mucocele de vesícula biliar. A ultrassonografia pode detectar hepatomegalia, bem como se o parênquima hepático é heterogêneo ou hiperecoico. “Nódulos” hipoecoicos
correspondem a VH grave com formação de nódulos de reticulina definidos e reparo regenerativo. Após a remoção da vesícula biliar, são necessárias avaliações ultrassonográficas seriadas do fígado para verificar se as lesões do parênquima
regrediram.
Histologicamente, hiperplasia da mucosa cística da parede da vesícula biliar é um achado comum. Todos os cães possuem restos biliares maciços, alguns componentes podem ser profundamente viscosos e carregados de mucina, outros
mais fluidos; alguns são verde­escuro a pretos, outros com bile branca; alguns contêm material escuro arenoso e outros contêm uma matriz gelatinosa organizada firme. Necrose isquêmica transmural pode se desenvolver ocasionando
colecistite necrosante e ruptura da vesícula biliar. Biopsias hepáticas podem revelar VH ou hepatite portal discreta a moderada ou fibrose; a última reflete mudanças alterações associadas à colangite ou oclusão da trato biliar transitória.
Alguns cães carecem de lesões hepáticas.
TRATAMENTO:  Cães sem sinais de extravasamento de mucocele ou obstrução do trato biliar no momento do diagnóstico inicial podem se beneficiar de hidrocolerese induzida por administração de ácido ursodeoxicólico (15 a 25 mg/kg, VO,
2 vezes/dia, administrado com alimento), SAMe (20 a 40 mg/kg/dia, VO, após jejum durante a noite; também, deve­se evitar que animal se alimente por 2 h após a dose) e terapia antimicrobiana. Avaliações bioquímicas e ultrassonográficas
durante  6  semanas  são  úteis  para  monitorar  a  resposta  ao  tratamento  ou  a  progressão  da  síndrome.  Raramente,  uma  mucocele  de  vesícula  biliar  aparente  pode  regredir  apenas  com  tratamento  medicamentoso.  A  progressão  de  algum
parâmetro indica controle inadequado e a necessidade de intervenção cirúrgica.
Colecistectomia  é  o  melhor  tratamento,  sendo  essencial  para  a  maioria  dos  cães  com  sinais  clínicos  e  achados  clinicopatológicos  compatíveis  com  ruptura  ou  inflamação  do  trato  biliar.  Como  a  estase  biliar  predispõe  à  infecção,
antimicrobianos de amplo espectro devem ser iniciados antes da manipulação cirúrgica das estruturas biliares. Exames e coloração de preparações citológicas da bile e de imprints de amostras obtidas por biopsia do trato biliar e do fígado
podem não ter valor quando a terapia antibiótica influencia as amostras enviadas para cultura. Evidências de bactérias nas amostras citológicas ou confirmação histológica de colecistite supurativa ou colangite indica uma necessidade de
terapia antimicrobiana prolongada no pós­operatório. Após a ressecção, a vesícula biliar deve ser enviada para exame histopatológico e, também, faz­se biopsia hepática distante do local da cirurgia. A taxa de mortalidade no perioperatório
é alta em cães sintomáticos com ruptura da vesícula biliar complicada por sepse. Se a peritonite biliar está presente, a cavidade peritoneal deve ser extensivamente lavada com fluido poliônico aquecido estéril, para remoção de fragmentos,
bactérias e sais biliares nocivos. Drenagens abdominais podem ser necessárias. Antibióticos devem ser administrados por 4 a 6 semanas.
Colecistotomia  para  remoção  do  conteúdo  da  vesícula  biliar  sem  colecistectomia  não  é  aconselhada  porque  a  mucocele  da  vesícula  biliar  normalmente  reaparece.  Além  disso,  necrose  da  parede  da  vesícula  biliar  pode  não  ser
grosseiramente evidente na cirurgia, conduzindo a uma ruptura da vesícula biliar pós­operatória. Após a ressecção da vesícula biliar, terapia colerética crônica é recomendada. Causas importantes de hiperlipidemia ou distúrbios endócrinos
devem  ser  identificadas  e  tratadas  apropriadamente.  Anormalidades  clinicopatológicas  (em  geral,  ALP  elevada)  normalizam  após  a  remoção  da  vesícula  biliar,  na  maioria  dos  cães,  exceto  naqueles  com  colangioepatite  supurativa,
endocrinopatias não resolvidas ou hiperlipidemia persistente. Dieta rica em gordura e com restrição de proteína para animais hiperlipidêmicos pode ser prejudicial.

 OBSTRUÇÃO DO DUCTO BILIAR EXTRA­HEPÁTICO
A obstrução do ducto biliar comum está associada a várias condições primárias, inclusive inflamação (p. ex., pancreatite, duodenite etc.), colelitíase, mucocele de vesícula biliar, coledoquite/colecistite, neoplasia, malformações, infecção
parasitária, compressão extrínseca, fibrose e rigidez. Hepatomegalia e distensão do ducto biliar intra­hepático imediatamente se seguem à OEHDB. Se a obstrução é resolvida dentro de poucas semanas, pode ocorrer resolução da fibrose e
da distensão do ducto biliar. Contudo, obstrução > 6 semanas resulta em cirrose biliar, hipertensão portal e APSS.
Obstrução completa pode resultar em bile branca onde pigmentos de bilirrubina não podem alcançar o “ramo estagnado” do sistema de ductos. O aumento de mucina no ducto contribui para a distensão ductal. Em alguns casos, a trato
biliar é colonizado por bactérias que não são removidas devido à falha na expulsão mecânica da bile e penetração inadequada de antibióticos na bile.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  OEHDB completa e aguda ocasiona letargia, febre cíclica e desenvolvimento imediato de icterícia; a concentração de bilirrubina total aumenta dentro de 4 h. Vômito pode ser episódico. Alguns animais
são intermitentemente inapetentes enquanto outros se tornam polifágicos, refletindo má digestão de gordura devido à ausência de ácidos biliares intestinais. Hepatomegalia, fezes acólicas e ausência de urobilinogênio na urina geralmente se
desenvolvem na primeira semana. Tendências a sangramentos podem ser notáveis dentro de 2 a 3 semanas e são mais comuns em gatos. Úlcera GI na junção piloroduodenal é comum e pode causar perda sanguínea considerável. Mesmo
com sangramento intestinal mínimo, pigmentos de bilirrubina alcançam o intestino, permitindo que as fezes se tornem marrons (formação de estercobilina) e com resultado positivo para urobilinogênio no teste de urina.
O hemograma pode revelar anemia não regenerativa, na obstrução crônica, ou anemia fortemente regenerativa, em animais com hemorragia intestinal importante. Leucocitose neutrofílica com ou sem desvio à esquerda é comum. À
medida que a bile se estagna no trato biliar, aumenta ALT e AST no soro. As atividades séricas de ALP e GGT aumentam dentro de 8 a 12 h após a obstrução e se elevam substancialmente em poucos dias. Necrose de parênquima,
inflamação periporta e colastase sustentam a atividade enzimática colestática e transaminase no soro. Em gatos, a magnitude da elevação de ALP e GGT é menos marcante do que em cães, porém são indicadores úteis de obstrução, lesão e
inflamação  do  trato  biliar.  Hipercolesterolemia  desenvolve­se  dentro  de  2  semanas  após  a  obstrução  completa,  refletindo  prejuízo  à  eliminação  de  colesterol  e  maior  biossíntese  hepática  de  colesterol.  Com  obstrução  crônica  e
desenvolvimento de cirrose biliar, o teor sérico de colesterol diminui, refletindo prejuízo à síntese de colesterol e desvio portossistêmico. Coagulopatias associadas à deficiência de vitamina K podem se desenvolver dentro de 2 a 3 semanas.
Resposta à administração de vitamina K1 geralmente é marcante. A confirmação de OEHDB é feito com imagens ultrassonográficas e por laparotomia exploratória.

TRATAMENTO:  Inspeção cirúrgica das estruturas biliares e hepáticas e descompressão biliar apropriada são requisitos para uma ótima terapia. Inspeção grosseira da vesícula biliar e do ducto biliar comum normalmente revela o sítio e a
causa da obstrução; palpação do ducto é essencial para identificar lesão de massa intramural. Compressão delicada da vesícula biliar é utilizada para verificar obstrução e o sítio de fluxo restrito da bile. Um ducto biliar comum tortuoso
distendido  grosseiramente  torna  o  diagnóstico  aparente.  A  maior  dificuldade  para  confirmar  e  resolver  as  obstruções  envolve  os  ductos  hepáticos.  Uma  duodenotomia,  colecistotomia  ou  coledocotomia  podem  ser  necessárias  para  a
passagem de um cateter flexível dentro de um ducto biliar comum para verificar o sítio da obstrução e para permitir a remoção do lobo biliar espessado ou cálculo biliar. O tratamento bem­sucedido da sepse do trato biliar requer remoção
mecânica  de  restos  biliares  e  material  infeccioso  e  correção  cirúrgica  descompressiva.  Animais  tendem  a  se  tornar  hipotensivo  e  são  suscetíveis  ao  choque  endotóxico  durante  a  cirurgia  e  anestesia.  Biopsia  hepática  por  método
laparoscópico ou agulha percutânea não permite a descompressão biliar segura e podem dilacerar os ductos biliares distendidos conduzindo a peritonite biliar.
Há controvérsias quanto à necessidade de descompressão do trato biliar em animais com OEHDB secundária à pancreatite. Na maioria dos cães, a obstrução se resolve espontaneamente dentro de algumas semanas, como uma inflamação.
Em animais na qual a obstrução persiste além de 2 a 3 semanas, descompressão temporária ou permanente do trato biliar deve ser considerada. O risco de morte em cães com pancreatite sujeito à cirurgia biliar extra­hepática pode ser tão
elevada quanto 50%.

 OUTRAS ANORMALIDADES DOS DUCTOS BILIARES
CISTOS  BILIARES  OU  HEPÁTICOS  BENIGNOS:   Estes  cistos  isolados  são  frequentemente  limitados  a  um  lobo  do  fígado,  geralmente  não  causam  nenhuma  lesão  compressiva  substancial  e  são  achados  ocasionais  durante  exame
ultrassonográfico  para  outras  enfermidades,  cirurgia  ou  necropsia.  Não  se  expandem  o  suficiente  para  lesionar  tecidos  adjacentes,  não  estão  associados  à  atividade  aumentada  das  enzimas  hepáticas  e  são  considerados  irrelevantes.
Entretanto, podem ser problemáticos se crescem ou interferem com o fluxo de bile através do ducto biliar comum.
ANORMALIDADES  FIBROPOLICÍSTICAS  HEPÁTICAS:   Estas  doenças  têm  sido  identificadas  na  maioria  dos  animais  de  companhia  e  reflete  malformação  embrionária  envolvendo  o  desenvolvimento  da  placa  ductal  das  estruturas  biliares  e
tubulares renais. As anormalidades foram classificadas em 6 grupos, em humanos, e esta classificação também parece importante em animais: fibrose hepática congênita, síndrome de Caroli, complexos de von Meyenburg, cisto hepático
isolado, doença hepática policística e cistos de colédoco. Estas desordens são complexas. A diversidade de manifestações pode predispor à colangite, causa hipertensão portal ou progride para lesões que ocupam espaço (estruturas císticas).
Uma única mutação genética tem sido identificada em gatos (doença renal policística dominante de origem autossômica), maioria dos quais demonstram malformação renal do que biliar. Em alguns gatos, entretanto, muitos cistos hepáticos
grandes  causam  importante  hepatomegalia  e  requer  repetidas  drenagens,  fenestração,  marsupialização  ou  ressecção  cirúrgica.  Raramente,  estruturas  císticas  podem  se  tornar  mineralizadas.  Gatos  acometidos  gravemente  possuem
parênquima hepático pouco normal. Tecido conectivo extensivo causa hipertensão portal intra­hepática, um fígado grande e firme, desenvolvimento de APSS, sinais de HE e ascite.
Síndromes displásicas biliares raramente ocorrem em cães simultaneamente com malformações císticas renais. Cães acometidos apresentam atividade de ALP aumentada e alta concentração de ABTS. Como acontece em gatos, o extenso
tecido conectivo pode causar hipertensão portal intra­hepática, APSS, EH e ascite.
O  único  tratamento  para  estas  anormalidades  é  minimizar  os  sinais  de  EH,  com  fornecimento  de  dieta  com  restrição  de  proteínas  e  tentativas  para  alterar  o  pH  e  a  flora  microbiana  intestinal  (lactulose,  leite  ou  baixas  doses  de
metronidazol). Diuréticos e restrição de sódio na dieta são indicados para controlar ascite.
CISTOS DE COLÉDOCO:  Esta dilatação cística congênita associada ao segmento distal do ducto biliar comum é encontrada em gatos. Sinais clínicos incluem febre, dor abdominal e icterícia associada à infecção cística. Exploração cirúrgica é
normalmente requerida para diagnóstico definitivo. Extirpação da estrutura cística ou marsupialização dentro do ducto biliar comum tem sido bem­sucedida.
CISTADENOMA BILIAR:  Estas lesões, também chamadas de cistadenomas, adenomas de ducto biliar, adenomas colangiocelular, colangiomas císticos e cistadenoma hepatobiliar são tumores benignos relativamente raros de gatos idosos. Os
tumores isolados bem demarcados podem invadir o parênquima hepático adjacente causando atrofia compressiva. O conteúdo cístico alcança desde fluido aquoso claro a viscoso ou material sólido. O tamanho dos cistos varia, atingindo de
1 mm a 8 cm, com a massa do tumor alcançando de 5 mm a 12,5 cm. Estudos de imagem (ultrassonografia ou TC) são importantes para o diagnóstico.
Excisão cirúrgica é o tratamento de escolha, porém pode não ser possível se as estruturas integram dentro do porta­hepato. O prognóstico após excisão completa é bom. Se a excisão completa não é possível, ressecção parcial pode retarda
as complicações da invasão mecânica do tecido normal. Aspirações repetidas, drenagem do cateter, marsupialização e excisão parcial têm sido utilizadas para manutenção paliativa, porém com risco de infecções e transformação neoplásica
para uma lesão maligna.

 OUTROS DISTÚRBIOS DA VESÍCULA BILIAR
Agênese da vesícula biliar é a ausência congênita da vesícula biliar. Na ausência de malformação congênita de estruturas biliares intra­hepática, esta é uma anormalidade irrelevante.
Atresia biliar é o desenvolvimento anormal congênito das estruturas biliares intra­hepáticas, raramente observada em cães. O cão jovem apresenta­se apático e as membranas mucosas são amarelas. O prognóstico é ruim.
Uma vesícula biliar dividida em duas partes é ocasionalmente identificada em gatos durante a ultrassonografia ou na cirurgia. Esta é uma anormalidade irrelevante.
Hiperplasia cística da mucosa da vesícula biliar é também conhecida como hipertrofia mucinosa cística, hiperplasia mucinosa cística e colecistite mucinosa (embora não seja uma lesão inflamatória). O papel dos hormônios esteroides na
indução da lesão permanece desconhecido. Não há inflamação associada e a superfície serosa da vesícula biliar permanece intacta. Estas lesões hiperplásicas são rotineiramente identificadas em cães com mucocele de vesícula biliar na qual
a parede da vesícula biliar está grosseiramente espessa com uma superfície mucosa proliferativa e um lúmen contendo fragmentos mucoides verdes espessos e viscosos.
A ausência de motilidade da vesícula biliar é proposta como uma síndrome emergente em cães e pode preceder o desenvolvimento de mucocele de vesícula biliar. A síndrome pode estar associada a hormônios esteroides, com base em
recentes observações de uma relação aparente entre desenvolvimento de mucocele e tratamento com compostos progestacionais. Além disso, hormônios sexuais (progestinas, andrógenos) têm sido mostrado experimentalmente (in vitro) que
reduzem a contratibilidade de músculos da vesícula biliar.

 RUPTURA DE TRATO BILIAR E PERITONITE BILIAR
Ruptura  do  ducto  biliar  comum,  ducto  cístico,  ductos  hepáticos  ou  da  vesícula  biliar  está  mais  frequentemente  associada  à  colelitíase,  coledocite  ou  colecistite  necrosante,  trauma  abdominal  contuso  ou  neoplasia.  Em  cães,  colecistite
necrosante ocorre mais frequentemente como resultado de mucocele biliar madura que se estende para a parede da vesícula biliar, causando necrose isquêmica. Sem levar em conta a causa, a ruptura de qualquer porção do trato biliar pode
ocasionar peritonite biliar. Sinais clínicos podem ser mínimos no início da doença, consistindo apenas de inapetência e desconforto abdominal vago. Com a cronicidade, o trato biliar inicia uma reação inflamatória (peritonite química), a
efusão abdominal se acumula e se desenvolve icterícia evidente. A ultrassonografia deve guiar a coleta de efusão abdominal o mais próximo possível do trato biliar, pois isto aumenta a possibilidade de detecção de cristais de bilirrubina
fagocitados ou livres e de bactérias. Com o diagnóstico tardio instala­se aderência abdominal que complica o reparo cirúrgico.
Intervenções cirúrgicas são específicas para a causa das lesões e podem envolver descompressão do trato biliar, colecistectomia, colecistotomia, coledocotomia, anastomose intestinal­biliar ou inserção de uma endoprótese no ducto biliar.
Recomenda­se biopsia hepática para identificar doença hepatobiliar antecedente ou coexistente. Partes das estruturas rompidas, bile e efusão abdominal devem ser obtidas e cultivadas para bactérias aeróbicas e anaeróbicas. A cavidade
abdominal  deve  ser  minuciosamente  lavada  com  solução  salina  estéril  aquecida  para  remover  a  contaminação  biliar.  Recomenda­se  terapia  antibiótica  contra  microrganismos  intestinais  oportunistas  (bactérias  Gram­negativas)  e  flora
anaeróbica, por exemplo, ticarcilina, piperacilina, cefalosporina de terceira geração ou enrofloxacino combinada com metronidazol. A terapia antimicrobiana deve ser iniciada antes da cirurgia e no caso de sepse confirmada, continuar por 4
a 8 semanas. A seleção dos antibióticos deve ser guiada, inicialmente, pelos resultados da citologia e coloração de Gram, e ajustada com base nos resultados de cultura e antibiograma. Animais com icterícia crônica devem receber vitamina
K1 (0,5 a 1,5 mg/kg, IM ou SC, até 3 doses) antes da intervenção cirúrgica. Plasma congelado fresco pode ser necessário para reduzir tendências a sangramento durante cirurgia de emergência. Antieméticos são recomendados se o paciente
manifesta vômito. Antagonistas  de  receptor  H2 são  utilizados  na  presença  de  sangramento  intestinal.  Em  animais  com  colelitíase  e  cães  com  mucocele  de  vesícula  biliar,  hidrocolerese  (ácido  ursodeoxicólico  e  SAMe)  e  antioxidantes
(vitamina E e SAMe) são recomendados no pós­operatório.
 SÍNDROME COLANGIOEPATITE/COLANGITE FELINA
Síndrome colangioepatite/colangite felina (SCHC) é a doença inflamatória adquirida mais comum em gatos domésticos. Tanto colangite como colangioepatite são mais comuns em gatos do que em cães. A diferença anatômica entre os
ductos biliares e pancreáticos de gatos e cães tem sido considerada um grande fator de risco. SCHC felina coexiste com processos inflamatórios no duodeno, pâncreas e rins (nefrite intersticial crônica). Várias condições simultâneas têm
sido  identificadas  em  gatos  com  SCHC,  se  o  infiltrado  inflamatório  é  predominantemente  neutrofílico  (supurativo),  linfocítico  ou  linfoplasmático  (não  supurativo),  ou  se  isto  ativamente  envolve  destruição  de  ducto  biliar.  Desordens
associadas à SCHC felina incluem infecções bacterianas (primárias ou crônicas), sepse, colecistite, colelitíase, OEHDB, infecção por trematódeos, toxoplasmose, doença intestinal inflamatória, colangite primária, pancreatite, neoplasia (p.
ex., adenocarcinoma de vesícula biliar, cistadenoma de ducto biliar) e várias malformações dos ductos (p. ex., cistos de colédoco, doença hepática policística, displasia biliar).
O lobo hepático envolvido na SCHC felina é variável e a extensão e gravidade das lesões histológicas podem não ser completamente certificadas em uma única biopsia hepática ou pequenas biopsias (p. ex., 18 medidas). Algumas
secções da biopsia podem mostrar inflamação modesta à moderada do ducto e hepatite, enquanto outros lobos hepáticos revelam eliminação completa dos ductos biliares e ausência de inflamação ativa. Os gatos com doença em sistemas de
múltiplos órgãos possuem tempo de sobrevivência significantemente menor se não tratados. Contudo, como a SCHC é lentamente progressiva, os gatos podem sobreviver alguns anos depois do diagnóstico, sem intervenção terapêutica.
SCHC supurativa é a doença clínica mais evidente. Nesses gatos a duração da doença é menor, antes da consulta (< 5 anos), com predominância em adultos jovens e de meia­idade (3 meses a 16 anos). Sinais clínicos incluem febre,
letargia,  desidratação,  inapetência,  vômito  e  icterícia  variável.  Muitos  gatos  manifestam  dor  abdominal  e  alguns  têm  hepatomegalia  palpável.  As  características  clinicopatológicas  são  similares  a  outras  formas  de  SCHC,  com  aumento
moderado a acentuado nas transaminases (ALT, AST) e aumento mais moderado nas atividades de ALP e GGT. Alguns gatos não têm anormalidades nas enzimas colestáticas. A maioria dos gatos apresenta hiperbilirrubinemia, alguns têm
azotemia renal concomitante e muitos exibem leucograma com desvio à esquerda e neutrófilos tóxicos. No início, a LH concomitante pode confundir a interpretação. A ultrassonografia abdominal pode revelar OEHDB; anormalidades
compatíveis com colecistite, coledocistite, pancreatite ou doença intestinal inflamatória, e hiperecogenicidade parenquimal hepática difusa compatível com LH pode ser observada. Um padrão de parênquima hepático heterogêneo pode, às
vezes,  ser  reconhecido,  refletindo  inflamação  parenquimal.  Contudo,  em  alguns  gatos,  nenhuma  alteração  ultrassonográfica  é  identificada.  Radiografia  torácica  revela  frequentemente  um  grande  linfonodo  esternal  que  reflete
inflamação/sepse abdominal.
O tratamento medicamentoso é frequentemente fornecido antes da intervenção cirúrgica (cirurgia de descompressão biliar para OEHDB, colecistectomia para colecistite, colecistotomia para colelitíase) e biopsia hepática. Desordens que
causam estase do fluxo biliar devem ser tratadas devido ao aumento no risco de infecção oportunista envolvendo o sistema biliar. Exame citológico de imprints de  material  aspirado  ou  obtido  por  biopsia  de  fígado  e  amostras  de  bile
geralmente revelam bactérias e inflamação supurativa. Coloração pelo Gram de amostras citológicas que contêm bactérias ajudam na seleção de antimicrobianos. As bactérias comumente isoladas incluem Escherichia coli, Streptococcus,
Clostridium, Bacteroides e Actinomyces. Culturas podem ser negativas devido administração prévia de antibióticos ou falha no cultivo de bactérias anaeróbicas.
O tratamento envolve antibióticos de amplo espectro efetivos contra bactérias intestinais oportunistas anaeróbicas Gram–negativas, como ácido ursodeoxicólico, SAMe, vitamina E, vitaminas hidrossolúveis, nutrição enteral com dieta
altamente calórica formulada para felinos e administração ponderada de fluidos para corrigir e manter a hidratação e a condição eletrolítica. Os antioxidantes são fornecidos durante a fase crítica da doença mediante administração de N­
acetilcisteína (dose inicial de 140 mg/kg [solução 10% em NaCl], seguida de 70 mg/kg IV, 2 a 3 vezes/dia, ao longo de 20 min, através de um filtro de 0,25 μm); quando a administração oral é possível, SAMe é administrado por esta oral.
Uma combinação de enrofloxacino, metronidazol e ampicilina/sulbactam normalmente e administrada no início e ajustada com base nos resultados de cultura e antibiograma, a partir de aspirados hepatobiliares ou de bile ou de amostras de
tecido. O tratamento com antimicrobianos deve ser iniciado antes da intervenção cirúrgica porque a sepse compromete a sobrevivência após a cirurgia. O tratamento antimicrobiano continua por 8 a 12 semanas ou até que as atividades das
enzimas hepáticas normalizem. Se as enzimas hepáticas permanecem aumentadas, repete­se a avaliação ultrassonográfica para verificar anormalidades que envolvem estruturas biliares, pâncreas, intestino ou linfadenopatias. Repetição da
aspiração para citologia ou biopsia hepática pode ser necessária.
A hepatite portal linfocítica felina, em si, provavelmente não é uma doença, mas pode refletir a liberação de infiltrados inflamatórios inespecíficos na vasculatura portal. Por outro lado, pode representar lesão evidente de SCHC felina
quando foi obtida apenas mínima amostra da tríade portal de um lobo hepático relativamente pouco envolvido. Biopsia com agulha de campos pequenos em gatos com SCHC não supurativa pode permitir o diagnóstico.
SCHC não supurativa sem lesões destrutivas do ducto é uma síndrome inflamatória mediada por células T que, frequentemente, acomete a maioria dos gatos de meia­idade e idosos. Infecções concomitantes com FeLV ou FIV são
raras, e não há predisposição sexual ou racial. A duração da doença varia de 2 semanas a alguns anos; a maioria dos gatos ficam doentes alguns meses antes da consulta inicial. Sinais clínicos incluem vômito e diarreia intermitentes e
doença episódica que pode estar associada à icterícia que se resolve espontaneamente. Hepatomegalia é comum. Isto é raro na SCHC não supurativa por causar hipertensão portal e efusão abdominal, porque os gatos normalmente morrem
antes de se estabelecer fibrose difusa.
As contagens leucocitárias são variáveis, porém tipicamente não há desvio à esquerda ou neutrófilos tóxicos. Poiquilócitos são comuns e corpúsculos de Heinz podem ser evidentes. Hiperglubulinemia se desenvolve com a cronicidade; a
maioria dos gatos tem aumento moderada à acentuado de ALT e AST. Aumentos nas atividades de ALP e GGT são muito variáveis e dependem da atividade cíclica da doença. Hiperbilirrubinemia é inconsistente e também parece ser
cíclica. Alguns gatos são persistentemente ictéricos devido à obstrução inflamatória de ductos biliares de pequeno e médio calibre (SCHC não supurativa com lesões destrutivas do ducto) e esses desenvolvem coagulopatias sintomáticas
responsivas  à  administração  de  vitamina  K  (0,5  a  1,5  mg/kg,  SC  ou  IM,  3  doses,  em  intervalos  de  12  h,  antes  da  biopsia).  Achados  ultrassonográficos  abdominais  se  sobrepõem  àqueles  de  SCHC  supurativa;  um  padrão  parenquimal
grosseiro ou não uniforme pode ser identificado. Entretanto, gatos com SCHC não supurativa acentuada podem não apresentar anormalidade do sistema biliar ou do parênquima hepático detectável na ultrassonografia. A gravidade das
lesões é altamente variável dentro e entre os lobos hepáticos e entre os gatos.
O tratamento inicial implica no uso de antimicrobianos apropriados, ácido ursodeoxicólico, SAMe, vitamina E, suplementação com vitamina B, nutrição enteral com dieta altamente calórica formulada para gatos, bem como fluidos para
corrigir e manter a hidratação e anormalidades eletrolíticas. Terapia antimicrobiana de amplo espectro (contra bactérias anaeróbicas Gram–negativas intestinais oportunistas) é recomendada, com base nos resultados da biopsia hepática e da
cultura. Tratamentos prolongados requerem imunomodulação. A terapia imunossupressora de primeira linha implica no uso de prednisolona, inicialmente administrada na dose de 2 a 4 mg/kg de peso corporal, VO, 1 vez/dia, ajustando­se a
dose para 5 a 10 mg/dia, 1 vez/dia ou em dias alternados dependendo da resposta ao tratamento. A adição de metronidazol (7,5 mg/kg, VO) pode auxiliar na imunomodulação e no controle da doença intestinal inflamatória associada e pode
permitir a redução da dose de glicocorticoide. Recomenda­se administração continuada de SAMe (40 a 50 mg/kg/dia VO) e vitamina E (10 U/kg/dia).
Como  um  agente  isolado,  SAMe  tem  resolvido  a  inflamação  associada  à  SCHC  em  alguns  gatos.  Clorambucila  é  utilizado  em  gatos  que  não  respondem  ao  tratamento  anti­inflamatório  com  glicocorticoide  e  metronidazol  (dose  de
clorambucila: 2 mg/gato/dia, 1 vez/dia, ajustado para uso em dias alternados ou a cada 3 dias). O tratamento geralmente retorna a concentração de bilirrubina ao normal, porém aumentos cíclicos na atividade enzimática permanecem,
embora em magnitudes menores.
Em gatos com SCHC não supurativa com lesões destrutivas de ducto (colangite esclerosante), por fim, pode ocorrer destruição disseminada de ductos de pequeno calibre, causando hiperbilirrubinemia permanente e fezes acólicas
intermitentes devido à redução progressiva da quantidade de ductos, notada no exame histológico. Este subgrupo de SCHC é identificado pelo uso de coloração imunoistoquímica para citoqueratina em amostras de fígado. Gatos acometidos
mostram atrofia de ducto, dúctulos biliares da tríade portal em localização periférica, células T ductais em alvo e lipogranulomas onde os ductos desaparecem. Aproximadamente 30% destes gatos se tornam diabéticos; o pâncreas pode
abrigar as células T ductuais em alvo.
Os gatos com redução da quantidade de ductos sintomáticos requerem injeções semanais de vitamina K1 (ver p. 442) e forma hidrossolúvel de vitamina E (succinato de a­tocoferol polietilenoglicol, 10 U/kg/dia, VO). Superdosagem de
vitamina K1 pode causar anemia hemolítica grave. Gatos acometidos devem ser investigados quanto à doença intestinal inflamatória grave e adequação de B12. Características hematológicas e bioquímicas do soro são similares àquelas de
gatos com SCHC de ducto não destrutiva. Imunomodulação com prednisolona torna a atividade enzimática discreta à moderada ou hiperbilirrubinemia em SCHC que atingem os ductos. Em vez disso, inicialmente se utiliza metotrexato ou
clorambucila. Metotrexato em pulso é administrado na dose total diária de 0,4 mg/gato, fracionada em 3 doses, em um único dia (0,13 mg/kg, VO por dose), a cada 7 a 10 dias. Como alternativa, o metotrexato pode ser administrado por via
IV ou IM, com redução de 50% da dose. Concomitantemente, administra­se 0,25 mg de ácido fólico/dia, VO, para prevenir hepatotoxicidade associada ao metotrexato. A dose de metotrexato deve ser reduzida em gatos com azotemia renal.
O  metotrexato  induz  imunossupressão  profunda  quando  utilizado  na  dose  recomendada,  sendo  fundamental  monitoramento  cuidadoso  de  infecções  complicadoras.  Alternativamente,  o  tratamento  com  clorambucila,  como  descrito
anteriormente, pode ser utilizado em vez de metotrexato. Recomenda­se tratamento concomitante com SAMe, juntamente com baixas doses de prednisolona e metronidazol. O tratamento para doença intestinal inflamatória concomitante
com dieta hipoalergênica pode ser benéfica. A deficiência de cobalamina deve ser corrigida; os gatos comprovadamente deficientes por teste de laboratório devem ser suplementados por longo tempo. Baixa concentração de cobalamina
representa uma preocupação quanto à má absorção grave de intestino delgado (especialmente no caso de linfoma de célula pequena) ou à doença pancreática grave.
Na doença linfoproliferativa disfarçada, como SCHC linfocítica, as lesões são caracterizadas por densa infiltração de linfócitos portais que penetram nos sinusoides hepáticos. Entretanto, os linfócitos envolvidos perdem os detalhes
microscópicos convincentes para sua classificação como uma população neoplásica. O tratamento com clorambucila tem mostrado benefícios em alguns gatos (2 mg/gato, administrado em dias alternados ou a cada 3 dias), combinado com
tratamentos previamente descritos para SCHC. Gatos acometidos podem sobreviver alguns anos com sinais clínicos mínimos. Coloração imunoistoquímica e outros testes moleculares (pesquisa de clonalidade) podem ser necessários para
diferenciar esta forma de SCHC, de linfoma. Suspeita­se que a doença linfoproliferativa progride para linfoma.
No  linfoma  de  célula  pequena  disfarçado,  como  SCHC  linfocítica,  densos  infiltrados  portais  linfocíticos  penetram  nos  sinusoides  hepáticos.  O  tratamento  com  protocolos  quimioterápicos  para  linfoma  felino  é  recomendado,
juntamente com a administração cuidadosa de suporte nutricional, vitamina e antioxidante. Muitos gatos com linfoma de célula pequena respondem ao clorambucila, como descrito anteriormente, por alguns anos. Gatos acometidos podem
ter envolvimento intestinal concomitante, embora alguns gatos com nítido linfossarcoma hepático tenham doença intestinal inflamatória e outros com linfossarcoma intestinal evidente tenham SCHC não supurativa não neoplásica. Suspeita­
se que a inflamação crônica progride para uma doença neoplásica.

DOENÇAS HEPÁTICAS

 CIRROSE BILIAR
Cirrose biliar refere­se à fibrose periporta associada a uma marcante remodelação da arquitetura hepática e hiperplasia biliar subsequente à OEHDB crônica (vários meses) ou colangioepatite crônica (anos). Porém, é incomum em gatos
com  colangite/colangiepatite,  possivelmente  porque  os  animais  morrem  antes  de  desenvolver  essa  condição.  Os  sinais  clínicos  de  cirrose  biliar  incluem  inapetência  variável,  caquexia,  tamanho  hepático  variado  e  ascite.  As  enzimas
hepáticas podem permanecer normais. Hipoalbuminemia, hiperglobulinemia, hiperbilirrubinemia e coagulopatia são alterações laboratoriais comuns. Nas radiografias, o fígado está aumentado e parece nodular no exame ultrassonográfico.
É necessária biopsia para um diagnóstico definitivo. Frequentemente, nos casos de defeitos de coagulação necessitam­se transfusão de sangue total e suplementação de vitamina K1 antes da realização de biopsia. O tratamento é sintomático,
requerendo tratamento de HE, hipoalbuminemia, OEHDB e ascite. O prognóstico geralmente é ruim.

 COLANGIOEPATITE CANINA
A colangioepatite é rara em cães e está associada à inflamação supurativa e infecção ascendente do trato biliar (Salmonella, Campylobacter jejuni, coccidiose). A colangioepatite canina é mais comumente associada à formação de mucocele
biliar, colelitíase e manipulação cirúrgica do trato biliar. Os sinais clínicos incluem anorexia, vômito, diarreia, letargia, poliúria, polidipsia, febre e dor abdominal.
As alterações laboratoriais são típicas de colestase e incluem hiperbilirrubinemia e aumento de ALP, GGT e transaminases. Ultrassonografia pode ou não revelar anomalias envolvendo a trato biliar e a vesícula. Em alguns casos, nota­se
ecogenicidade hepática grosseira. Achados ultrassonográficos podem indicar a necessidade de intervenção cirúrgica emergencial (p. ex., mucocele de vesícula biliar madura, colelitíase associada a OEHDB). Esfregaços hepáticos ou biliares
por aspiração ou impressão podem revelar inflamação séptica supurativa. Amostras coletadas do fígado, bile e partes do trato biliar devem ser submetidas a culturas aeróbicas e anaeróbicas e antibiogramas, se há suspeita de inflamação
supurativa. O tratamento antibiótico deve se basear nos resultados da cultura; outros tratamentos devem objetivar a cura das doenças subjacentes.

 DESVIOS (SHUNTS) Portossistêmicos Adquiridos
Desvios portossistêmicos adquiridos (DPSA) são causados por hipertensão portal secundária à hepatopatia crônica, devido ao desenvolvimento de uma arquitetura remodelada difusa e grave; fibrose ou cirrose; atresia congênita da veia
porta intra­hepática; fístula arteriovenosa hepática; lesões veno­oclusivas, trombo venoso portal ou doença hepática policística em gatos. O conjunto principal de veias portais não apresenta válvulas e nele normalmente se mantém pressão <
5 mmHg. O fluxo retrógrado de alta pressão na circulação arterial hepática, na tríade portal, leva à formação de DPSA, uma vez que o sangue segue a via de menor resistência. DPSA se desenvolve como múltiplos nichos de veias tortuosas
que unem a vasculatura portal à veia cava abdominal.
Os  locais  mais  comuns  de  DPSA  são  caudais  ao  rim  esquerdo,  na  região  da  vasculatura  colorretal  e  associados  aos  vasos  do  baço.  Emaranhados  de  vasos  pequenos  e  tortuosos  podem  normalmente  serem  identificados  durante
ultrassonografia Doppler de fluxo colorido. Exploração cirúrgica de desvios ligados não devem ser realizados em animais com suspeita de AVPS associada a DPS porque a identificação de DVS confirma a presença de hipertensão portal.
Entretanto, biopsias hepáticas devem ser realizadas nesses pacientes, para determinar as causas primárias.
Os  sinais  clínicos  incluem  EH  episódica,  PU/PD,  vômito,  diarreia  (às  vezes  sanguinolenta)  e  efusão  abdominal.  Podem­se  observar  alterações  laboratoriais  compatíveis  com  a  hepatopatia  primária,  além  dos  marcadores  de  desvio
(microcitose, redução do BUN e creatinina, hipocolesterolemia e cristalúria com biurato de amônio). Hipoerbilirrubinemia pode ou estar presente, dependendo da causa primária. A ligadura de múltiplos desvios adquiridos é contraindicada,
pois são uma resposta compensatória à hipertensão portal. A bandagem da veia cava caudal para reduzir a extensão do desvio não é recomendada. O tratamento medicamentoso para minimizar os sintomas de EH e a restrição de sódio,
combinados com diuréticos, são utilizados para controlar a efusão abdominal. Cães e gatos podem viver vários anos sem intercorrências, com suporte nutricional e médico apropriado.

 DOENÇAS HEPÁTICAS INFECCIOSAS

Doenças Bacterianas
LEPTOSPIROSE:  Infecções por Leptospira interrogans, especialmente os sorotipos Icterohemorrhagiae e Pomona e as infecções crônicas pelo sorotipo Grippotyphosa, estão associadas a doença hepática. Outros sorotipos também podem
acometer o fígado. Nenhuma lesão histológica é patognomônica. Atividades das enzimas hepáticas marcadamente aumentadas e hiperbilirrubinemia indicam envolvimento hepático. Entretanto, esses marcadores podem refletir resposta
hepática a uma síndrome séptica e não de um órgão específico em cães agudamente debilitados. Características clínicas e clinicopatológicas do envolvimento hepático podem piorar inicialmente com o tratamento (febre, enzimas hepáticas,
hiperbilirrubinemia).  O  diagnóstico  depende  da  demonstração  de  aumento  do  título  convalescente  ou  detecção  por  PCR  no  sangue  ou  na  urina.  A  identificação  da  bactéria  em  amostras  de  fígado  coradas  é  difícil.  O  tratamento  inclui
tratamento de suporte e terapia antimicrobiana específica. As penicilinas são as drogas de escolha para a fase aguda (p. ex., ampicilina [22 mg/kg IV, 4 vezes/dia] ou amoxicilina [22 mg/kg, VO, 2 vezes/dia]). Os aminoglicosídios ou a
doxiciclina (5 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, durante 4 semanas) são recomendadas para tratar a fase de portador. Recomendam­se precauções especiais quanto à manipulação de animais suspeitos ou que tenham leptospirose (e suas amostras de
urina), devido ao seu potencial zoonótico (Ver p. 695).
DOENÇA DE TYZZER:  A doença de Tyzzer (p. 200) é uma infecção rara, mas fatal, causada por Clostridium piliformis. A infecção em cães e gatos ocorre mais comumente em hospedeiros imunocomprometidos, tanto recém­nascidos quanto
adultos acometidos por outras condições. Como C. piliforme é um microrganismo comensal nos intestinos de roedores de laboratórios, a infecção é adquirida por contato ou ingestão de fezes contendo esporos bacterianos. Os sinais clínicos
(letargia, anorexia, desconforto abdominal) são agudos no início e progridem rapidamente para morte dentro de 24 a 48 h. Um aumento marcante na atividade de ALT imediatamente precede a morte. Colorações especiais são necessárias
para identificar a bactéria no tecido hepático, que não se multiplica em meios de cultura bacterianos de rotina. Não há tratamento efetivo; uma vacina foi desenvolvida para pesquisa em animais de colônias.
INFECÇÃO POR MYCOBACTERIUM AVIUM:  A infecção hepática com M. avium disseminado foi descrita em gatos jovens das raças Abyssian e Somali com imunodeficiência inata aparente (causa desconhecida). O curso clínico da doença inclui
doença vaga caracterizada por histórico de perda de peso grave mesmo com polifagia. Um evidente infiltrado pulmonar intersticial difuso é verificado em gatos com e sem sinais respiratórios. Hepatomegalia e atividades aumentadas de
ALT e AST são notadas. Amostras hepáticas revelam reação inflamatória granulomatosa. O tratamento, inclusive claritromicina (62,4 mg/gatos, VO) associada tanto com clofazimina (25 mg/gato, VO, 1 vez/dia, ou 50 mg/gato, VO, em
dias  alternados)  ou  rifampicina  (75  mg/gato,  VO)  e  fluoroquinilona  ou  doxiciclina  (50  mg,  VO,  1  vez/dia)  tem  sido  efetivo  na  remissão  dos  sintomas  em  gatos  infectados.  Recidivas  devem  ser  esperadas  devido  ao  estado
imunocomprometido desses pacientes.
INFECÇÕES BACTERIANAS INTRA E EXTRA–HEPÁTICAS E SEPSE:  Infecção extra­hepática  e  sepse  podem  causar  colestase  e  hiperbilirrubinemia.  Aumento  no  teor  sérico  de  bilirrubina  é  moderado  a  marcante,  enquanto  os  aumentos  nas
atividades das enzimas hepáticas podem ser apenas modestos. Este tipo de icterícia foi observado em cães com leptospirose e gatos com sepse não definida. O tratamento apropriado tem como alvo a condição séptica primária. Atividades
aumentadas das enzimas hepáticas na sepse podem também refletir invasão bacteriana no fígado ou lesão hepatocelular causada por febre ou hipoxia.
Animais com insuficiência hepática aguda e doença hepatobiliar crônica são predispostos à infecção bacteriana sistêmica e endotoxemia. Na insuficiência hepática aguda fulminante, sepse pode ser mascarada por febre, hipoglicemia e
leucocitose que podem também ser manifestações clínicas de doenças hepáticas.
Animais com doenças crônicas do trato biliar ou com neoplasia hepática crônica são mais propensos a desenvolver infecções intra–hepáticas. Qualquer doença associada a estase biliar predispõe à endotoxemia sistêmica e esplâncnica.
Fatores de risco associadas a infecção do trato biliar incluem idade avançada, episódios recentes de colangite, colecistite aguda, coledocolitíase e icterícia obstrutiva.
Tratamentos  que  propiciaram  redução  da  suscetibilidade  à  infecção  e  à  lesão  hepática  incluem  administração  de  N­acetilcisteína,  a­tocoferol,  glutamina,  ácidos  biliares  orais  e  antibióticos  sistêmicos  e  intestinais.  Esses  tratamentos
aumentam a perfusão microvascular, reduzem a translocação de bactérias intestinais, aumentam a imunidade inata e protegem contra lesões oxidativas. Enquanto se espera o resultado da cultura e do antibiograma (tecido, efusão abdominal,
bile), antibióticos contra oportunistas intestinais devem ser administrados empiricamente, evitando drogas extensivamente metabolizadas no fígado. A combinação de penicilina resistente a betalactamase com metronidazol (7,5 mg/kg, VO,
2 vezes/dia) e enrofloxacino (2,5 a 5 mg/kg, VO, IM ou IV, 2 vezes/dia) pode ser benéfica durante o tratamento inicial enquanto as causas da infecção primária permanecerem desconhecidas.

Doenças Causadas por Protozoários
TOXOPLASMOSE:  A toxoplasmose (p. 724) pode causar insuficiência hepática aguda associada à necrose hepática. Toxoplasma gondii comumente é mais observado em gatos positivos aos vírus da imunodeficiência felina e FeLV. Há relatos
de icterícia, efusão abdominal, febre, letargia, vômito e diarreia, além de sinais clínicos compatíveis com envolvimento do SNC, ocular ou pulmonar. Em cães, a hepatopatia associada à toxoplasmose geralmente é rara e quando observada é
em hospedeiros imunocomprometidos ou em cães jovens. Cães jovens podem estar infectados concomitantemente com o vírus da cinomose e a doença, de início agudo, é rapidamente fatal. O diagnóstico pode ser difícil, mas um título de
imunoglobulina M (IgM) positivo é indicativo de doença clínica. Clindamicina (12,5 mg/kg, VO ou IM, 2 vezes/dia, durante 4 semanas) é a droga de escolha. Como a clindamicina é metabolizada no fígado, a redução de dose pode ser
necessária na insuficiência hepática grave. Clindamicina oral deve ser seguida de um bolus, na água ou no alimento, para prevenir irritação esofágica. O prognóstico depende do grau de debilidade e estágio da doença no diagnóstico inicial
e distúrbios associados causadores de imunossupressão. Apesar da melhora, os animais devem ser considerados cronicamente infectados.
LEISHMANIOSE:  Leishmaniose canina (p. 834) é uma doença multissistêmica causada por protozoários parasitos do gênero Leishmania em países mediterrâneos, Portugal, Oriente Médio e algumas partes da África, Índia e Américas Central
e do Sul e, ocasionalmente, em cães dos EUA (especialmente da raça Foxhound). Os sinais clínicos em cães com leishmaniose incluem anemia não regenerativa, aumento das atividades ALP, ALT e AST, hipoalbuminemia e concentrações
variáveis de bilirrubina. Necrose hepatocelular multifocal, degeneração vacuolar e infiltração de macrófagos parasitados são comuns. Embora as lesões hepáticas sejam interpretadas como representantes dos estágios sequenciais da função
hepática na leishmaniose visceral durante a doença crônica, nenhuma correlação foi notada entre características histológicas e raça, sexo, idade, sinais clínicos ou carga parasitária hepática.
O tratamento raramente é curativo e o prognóstico para pacientes debilitados é ruim. Devido ao potencial zoonótico da infecção, os proprietários devem ser informados que o protozoário nunca é completamente erradicado e que recidivas
podem requerer tratamentos repetidos. Isto é particularmente importante se o proprietário apresenta imunossupressão. Na ausência de insuficiência renal devido à infecção, recomenda­se uma dieta rica em proteínas. O tratamento específico
mais comumente recomendado nos EUA é o alopurinol (7,0 a 20,0 mg/kg VO, 2 a 3 vezes/dia) administrado por 3 a 24 meses ou indefinidamente.

Doenças Virais
As  doenças  virais  associadas  à  disfunção  hepática  incluem  hepatite  infecciosa  canina,  herpesvírus canino,  injeção  parenteral  acidental  de  vacina  intranasal  de  Bordatella  bronchiseptica  em  cães,  peritonite  infecciosa  felina  e  infecção
sistêmica por calicivírus em gatos. Raramente, parvovírus canino pode induzir lesão hepática como resultado de sepse sistêmica portal
A hepatite infecciosa canina é causada pelo adenovírus canino tipo 1 (CAV­1). Além de necrose hepática aguda, hepatite crônica e fibrose hepática podem ocorrer sequelas se anticorpos neutralizantes não são capazes de eliminar a
infecção durante a fase ativa. Ver p. 831 quanto a achados clínicos, diagnóstico, tratamento e controle.
O herpesvírus canino infecta filhotes recém­nascidos, causando necrose hepática, assim como outras alterações sistêmicas. Normalmente é fatal em filhotes.
A injeção parenteral acidental de vacina intranasal de B bronchiseptica em cães pode causar reação inflamatória no local da injeção e degeneração hepatocelular aguda, asséptica e necrose que progride para hepatite crônica. Não há
tratamento conhecido além da terapia sintomática para hepatopatia inflamatória crônica.
O vírus  da  peritonite  infecciosa  felina é  um  coronavírus  que  causa  inflamação  piogranulomatosa  difusa  e  vasculite.  Icterícia,  efusão  abdominal,  vômito,  diarreia  e  febre  são  sinais  clínicos  comuns.  Ver  p.  840  quanto  aos  achados
clínicos, tratamento e controle.
O calicivírus sistêmico, uma variante surgida recentemente do calicivírus felino, pode induzir taxa de mortalidade de 33 a 60% em gatos adultos. Identificados principalmente em abrigos ou gatis, este vírus causa febre alta, anorexia,
edema subcutâneo marcante (especialmente em membros e face), icterícia, alopecia e úlcera ou crostas em narinas, lábios, orelhas e patas. Gatos adultos são mais severamente acometidos. Necrose dos hepatócitos individuais progredindo
para necrose centrolobular ou mais extensa é associada a focos inflamatórios neutrofílicos e depósitos de fibrina intrasinusoidal.

Infecções Micóticas
As infecções micóticas mais comuns associadas à disfunção hepática são coccidioidomicose (p. 684) e histoplasmose (p. 689). Em animais gravemente acometidos, os sinais clínicos incluem ascite, icterícia e hepatomegalia, além de sinais
associados  a  outros  sistemas  envolvidos.  O  tratamento  antifúngico  é  variável  e  determinado  pela  gravidade  da  infecção  e  resposta  clínica  individual.  Como  na  forma  disseminada  de  histoplasmose  nota­se  comprometimento  hepático,
recomenda­se  quimioterapia  agressiva  (inclusive  a  combinação  de  itraconazol  ou  cetoconazol  e  anfotericina  B).  Dependendo  do  grau  de  debilidade,  o  prognóstico  é  ruim.  A  coccidioidomicose  pode  ser  tratada,  com  sucesso,  com
cetoconazol ou itraconazol, por longo tempo (6 a 12 meses). No entanto, há relatos de recidivas.

 DOENÇAS HEPÁTICAS VARIADAS

Amiloidose Hepática
A amiloidose é uma doença familiar de gatos das raças Abyssinian, Siamesa e Oriental de pelos curtos e cães da raça Shar­Pei. Os cães da raça Shar­Pei têm maior probabilidade de apresentar febre episódica e aumento de volume de jarrete,
com  ou  sem  insuficiência  renal,  mas  o  fígado  também  pode  ser  afetado  pela  deposição  amiloide  difusa.  Os  gatos  da  raça  Abyssinian  acometidos  geralmente  apresentam  sinais  clínicos  relacionados  com  os  rins  ou  com  complicações
associadas  à  amiloidose  hepática  difusa.  Gatos  Oriental  de  pelos  curtos  e  Siameses  geralmente  apresentam  complicações  hepáticas  relacionadas  com  a  amiloidose.  Outras  condições  associadas  à  amiloidose  hepática  incluem  uma
diversidade de infecções crônicas ou exposição a antígenos (p. ex., coccidioidomicose em cães, hematopoese cíclica em Gray Colly, infusão de insulina suína em cães) e hipervitaminose A, em gatos.
Embora alguns animais acometidos possam ser assintomáticos por longos intervalos, os sinais clínicos podem incluir febre, linfadenopatias, vômito, inapetência, perda de peso, PU/PD, icterícia e hepatomegalia. Apresentação aguda de
hemorragia abdominal grave subsequente à ruptura do lobo hepático normalmente conduz a um diagnóstico em gatos orientais e da raça siamês. A ultrassonografia frequentemente pode identificar o desenvolvimento de hematoma no local
de ruptura do lobo hepático. Aspiração da efusão abdominal confirma hemorragia ativa. O diagnóstico pode ser feito por citologia de aspiração se fibrilas amiloides são recuperadas. Do contrário, o diagnóstico é definido pela identificação
de depósito amiloide em amostras obtidas em biopsias hepáticas.
A colchicina e o dimetilsulfóxido têm sido utilizados para retardar a progressão da amiloidose sistêmica em cão Shar­Pei e gatos, com sucesso limitado. De maneira contraditória, amiloide hepático tem regredido em Shar­Pei tratados
com  colchicina  (0,03  mg/kg/dia,  1  vez/dia,  por  muitos  outros  dias).  Como  a  amiloidose  familiar  é  uma  anormalidade  sistêmica  progressiva,  o  prognóstico  é  ruim.  Gatos  que  sobrevivem  à  hemorragia  hepática  aguda  ou  grave  por  uso
agressivo de terapia de componentes sanguíneos subsequentemente sucumbem à amiloidose renal (ver p. 631).

Doença do Armazenamento de Glicogênio
Dentre as quatro doenças de armazenamento de glicogênio descritas nos cães, os tipos I e III afetam diretamente o fígado, causando hepatomegalia marcante em filhotes. Estas anormalidades são caracterizadas pelo acúmulo excessivo de
glicogênio no fígado e em outros órgãos. O glicogênio acumulado não fica disponível para conversão em glicose devido à deficiente atividade da enzima glicolítica.
A doença do armazenamento de glicogênio tipo Ia se deve à deficiência de glicose­6–fosfatase, sendo descrita em cães de raças toy, principalmente maltês. Não há predileção por sexo conhecida e a transmissão é autossômica recessiva.
Sinais clínicos incluem emagrecimento, retardo no crescimento, distensão abdominal devido à hepatomegalia maciça, depressão e fraqueza associado à hipoglicemia grave. Lesões histológicas também são observadas no epitélio tubular
renal. Esses cães desenvolvem acidose láctica, hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia e hiperuricemia. Filhotes acometidos normalmente morrem ou são submetidos à eutanásia aos 60 dias de idade. Um teste genético está disponível para
a doença tipo I em cães Maltês.
A doença do armazenamento do glicogênio tipo III é causado por deficiência de amilo­1,6­glicosidase, sendo descrita em cães da raça Pastor Alemão. Não há predileção por sexo conhecida e há suspeita de transmissão autossômica
recessiva. Os sinais clínicos incluem distensão abdominal devido à hepatomegalia e hipoglicemia discreta. Os estoques de glicogênio são notáveis tanto no fígado quanto no músculo esquelético.
O  diagnóstico  dessas  anormalidades  se  baseia  no  alto  índice  de  suspeita  em  função  da  raça  e  da  hipoglicemia  sintomática.  Radiografia  abdominal  revela  hepatomegalia  e  a  ultrassonografia  exibe  parênquima  hepático  hiperecoico
compatível  com  acúmulo  hepático  de  glicogênio  ou  lipídios.  Diagnóstico  diferencial  inclui  outras  causas  de  hipoglicemia  juvenil  (inclusive  má  nutrição,  endoparasitismo,  hipoglicemia  por  jejum  transitória  em  cães  de  raças  toy  e
malformação vascular portossistêmica) e outras causas de fraqueza muscular (inclusive endocrinopatias, distúrbios mediados pelo sistema imune, doenças infecciosas, hipopotassemia e neuromiopatias). Cuidados assistenciais consistem de
suporte  com  fluidos,  dextrose  IV  nas  crises  de  hipoglicemia  e  controle  da  hipoglicemia  com  refeições  frequentes  com  dieta  rica  em  carboidratos.  O  diagnóstico  é  confirmado  mediante  análise  enzimática  tecidual,  confirmação  do
armazenamento em excesso de glicogênio no tecido hepático ou teste genético. O prognóstico é ruim. Cães acometidos e seus pais devem ser excluídos dos programas de reprodução.

 DOENÇAS METABÓLICAS QUE ACOMETEM O FÍGADO
Diabetes melito, hiperadrenocorticismo, hipotireoidismo e hipertireoidismo podem causar alterações hepáticas.
Lipidose hepática pode ser secundária ao diabetes melito, devido ao aumento do metabolismo e mobilização de lipídios. Observam­se hepatomegalia e aumento de atividade das enzimas hepáticas. Os cães com diabetes melito raramente
apresentam disfunção hepática, a menos que desenvolvam VH progressiva grave e síndrome hepatocutânea (ver a seguir). A maioria desses cães exibe aumento marcante de ALP e menor aumento na atividade das transaminases. Os gatos
diabéticos podem apresentar atividade de ALT e ALP aumentadas, e pode haver hiperbilirrubinemia no início de lipidose hepática. Os animais diabéticos apresentam maior risco de desenvolver pancreatite que pode, progressivamente,
causar OEHDB (obstrução extra­hepática do ducto biliar) e colangite, e são mais suscetíveis a infecções bacterianas que envolvem estruturas biliares (colecistite enfisematosa, colangite).
Gatos  com  hipertireoidismo  geralmente  desenvolvem  aumento  de  ALP  e  ALT  e  raramente,  hiperbilirrubinemia;  a  função  hepática  geralmente  está  normal.  As  causas  das  alterações  nas  enzimas  hepáticas  não  são  completamente
entendidas, mas acredita­se que há envolvimento de efeitos tóxicos do excesso de tiroxina, dieta inapropriada, disfunção cardíaca, fenômeno de indução e metabolismo ósseo aumentado. As enzimas hepáticas retornam ao normal após
tratamento efetivo; no entanto, o tratamento com metimazol pode levar à hepatopatia associada ao medicamento, que resulta na descontinuação do tratamento.?

 ENCEFALOPATIA HEPÁTICA
Encefalopatia hepática (EH) se desenvolve quando há alguns distúrbios hepáticos associados a desvio portossistêmico e insuficiência hepática fulminante. Os sinais clínicos são variáveis, porém envolvem anormalidades sensoriais que
variam de embotamento discreto e incapacidade de responder a comandos básicos até anormalidades visíveis, inclusive círculo propulsivo, pressão da cabeça contra obstáculo imóvel, perambulação sem rumo, fraqueza, ataxia, amaurose
(cegueira inexplicável), ptialismo, demência, alteração de comportamento (p. ex., agressividade), colapso, convulsão e coma. Embora o mecanismo fisiopatológico da EH não sejam completamente entendidos, efeitos sinérgicos entre a
insuficiência do fígado em detoxicificar amônia e outras substâncias endógenas, aumento de citocinas inflamatórias cerebrais, comprometimento da perfusão cerebral, edema cerebral, hipoxia, disfunção mitocondrial, neuroglicopenia e
lesão oxidativa são importantes mecanismos interdependentes. Acredita­se que a maior produção de espécies reativas de oxigênio e nitrogênio desencadeiam modificações em proteínas e no RNA, que influenciam negativamente a função
cerebral. O conceito integrado de EH explica a variabilidade dos episódios e a heterogeneidade de fatores desencadeantes relacionados com diversos quadros clínicos.
Amônia desempenha um papel fundamental na ocorrência de EH; acredita­se que ela sensibiliza o cérebro a inúmeros outros fatores/mediadores desencadeantes. Entretanto, a concentração sanguínea e cerebral de amônia são diferentes,
desqualificando a concentração sanguínea deste composto como uma mensuração simplista de EH. Em animais saudáveis, grande parte da amônia é removida pelos hepatócitos, convertida em aminoácidos ou ureia e excretada pelos rins, na
urina. Na insuficiência hepática e no desvio portossistêmico, as concentrações de amônia no sangue aumentam devido ao prejuízo à desintoxicação hepática. Quando na circulação, a amônia pode também ser excretada pelos rins (secreção
tubular) e utilizadas no músculo esquelético para a síntese de glutamina (desintoxicação temporária de amônia). Este último mecanismo é porque a manutenção da massa corporal magra (músculo) é essencial em pacientes com insuficiência
hepática,  que  são  suscetíveis  à  hiperamonemia  e  EH.  Vários  quadros  clínicos  e  mecanismos  podem  aumentar  a  concentração  sanguínea  de  amônia  e  desencadear  EH,  inclusive  desidratação  (azotemia  pré­renal/renal),  alcalemia,
hipopotassemia, hipoglicemia, catabolismo, infecção, PU/PD, anorexia, constipação intestinal, hemólise, transfusão sanguínea, hemorragia gastrintestinal, alto teor de proteínas na dieta e vários fármacos (benzodiazepinas, tetraciclinas,
anti­histamínicos, metionina, barbitúricos, organofosforados, fenotiazinas, diuréticos [sobredose], metronidazol e alguns anestésicos).
Amônia pode influenciar vários sistemas de neurotransmissores diretamente (influência química) e indiretamente (disponibilidade de substratos alterados para transmissores). Há evidências substanciais de que os astrócitos desempenham
função importante na patogênese da EH. Amônia e outros produtos endógenos, citocinas inflamatórias e hiponatremia (associada à hipertensão portal) induzem edema em astrócitos, que pode ocasionar herniação e edema cerebral, mais
comum na insuficiência hepática aguda e EH aguda grave.
O  objetivo  do  tratamento  de  encefalopatia  hepática  aguda  é  propiciar  terapia  de  suporte  e  rápida  redução  das  neurotoxinas  produzidas  no  trato  GI.  Os  animais  com  encefalopatia  grave  geralmente  apresentam­se  comatosos  ou
semicomatosos. Benzodiazepinas e outros sedativos não devem ser administrados. Deve–se suspender a alimentação até que a condição neurológica do animal melhore. Fluidos devem ser administrados (solução de glicose 2,5% e solução
salina 0,45% acrescidos de cloreto de potássio e vitaminas do complexo B) para corrigir a desidratação e os desequilíbrios ácido­base e eletrolíticos. Deve­se evitar o uso de solução lactato de Ringer porque insuficiência hepática pode
impedir o metabolismo de lactato e provocar acidose láctica. Devem­se realizar enemas com água morna ensaboada, seguidos de enemas de retenção com lactulose (3 partes de lactulose ou lactiol para 7 partes de água, na dose de 20
ml/kg), solução de povidona­iodo 10% (20 ml/kg, enxaguar bem após 15 a 20 min) ou neomicina (22 mg/kg, misturada à água) ou metronidazol diluído (7,5 mg/kg suspensos em água, na dose de 10 a 20 ml/kg), a cada 8 h, até que o animal
responda neurologicamente. Enemas de retenção devem ser mantidos por 15 a 20 min, pelo uso de um cateter de Foley. A administração (oral ou retal) de Lactobacillus e Bifidobacillus vivos (próbioticos ou culturas vivas na forma de
iogurte) também pode auxiliar na eliminação de micro­organismos produtores de amônia. Metronidazol, neomicina e solução povidona–iodo podem alterar a flora bacteriana do cólon, diminuindo a população de organismos produtores de
amônia. Porém, deve se ter cautela com o uso de neomicina na presença de doença intestinal inflamatória concomitante, uma vez que a maior absorção sistêmica pode elevar o risco de nefrotoxicidade e ototoxicidade (coclear). A dose de
metronidazol deve se restringir a = 7,5 mg/kg, a cada 8 h (combinando administrações oral e retal); doses maiores conferem risco de neurotoxicidade iatrogênica (inicialmente com sinais vestibulares).
Quando o animal está estabilizado, o objetivo do tratamento é evitar recidivas. Devem–se oferecer dietas restritas em proteínas (ver p. 440). Iogurtes probióticos e lactulose oral (0,1 a 0,5 ml/kg VO, 2 a 3 vezes/dia, dose inicial) podem
ser utilizados, com dose inicial ajustada para propiciar, diariamente, fezes moles do tipo pudim. Refeições com leite podem ter efeitos similares em alguns animais. O objetivo da administração de carboidratos não digeríveis é promover
fermentação  no  intestino.  Organismos  probióticos  concentrados  podem  prevenir  o  crescimento  e  replicação  de  outras  bactérias  pela  competição  por  substratos  e  inibição  do  crescimento  associado  ao  pH  (ácido)  ou  limpeza  mecânica
(catarse) induzida por produtos de fermentação. Esses efeitos diminuem a absorção de amônia, substratos inflamatórios e oxidativos, lipopolissacarídios e outros produtos tóxicos intestinais que contribuem para a ocorrência de EH.
Na  EH  recalcitrante,  recomenda­se  terapia  antimicrobiana,  preferencialmente  o  metronidazol  (7,5  mg/kg,  VO,  2  vezes/dia)  ou  amoxicilina  (13  a  15  mg/kg,  VO,  2  vezes/dia),  em  vez  de  neomicina.  A  terapia  antimicrobiana  atua
sinergicamente com carboidratos não digeríveis para reduzir as toxinas intestinais.
Os sinais clínicos da EH podem ser exacerbados por hemorragia gastrintestinal, infecção, uso de glicocorticoides (maior catabolismo de proteínas teciduais), hipoglicemia, neoplasia, febre, azotemia ou desidratação (o aumento de BUN
eleva a produção intestinal de amônia), constipação intestinal (maior produção e absorção de toxinas no cólon), alcalose metabólica (favorecendo tanto a produção de amônia pelo rins quanto sua absorção na barreira hematencefálica) e uso
de diazepam e barbitúricos (neuroinibidores sinérgicos). O uso de antagonistas de receptores H2 e sucralfato, o controle de febre e infecção, hidratação adequada e uso mínimo (se algum) de anticonvulsivantes podem auxiliar no alívio das
complicações da EH.

 HEPATITE CRÔNICA CANINA
A hepatite crônica que não envolve as estruturas biliares é mais comum em cães do que em gatos. Várias raças são predispostas, inclusive Bedlington Terrier, Labrador Retriever, Cocker Spaniel, Doberman, Skye Terrier, Poodle Standard e
West Highland White Terrier. Embora se conheça a etiologia de algumas categorias de hepatite crônica, na maioria dos casos a causa é desconhecida. São comuns acúmulo de cobre e de ferro nas células de Kupffer, em cães com hepatite
crônica. A quantidade de metal acumulado e sua localização acinar podem auxiliar a determinar se representam causas da doença ou são secundárias à lesão hepática.
Outras  afecções  associadas  incluem  hepatite  infecciosa  canina,  hepatite  crônica  secundária  a  enfermidades  infecciosas  e  exposição  crônica  a  xenobióticos  (inclusive  algumas  drogas,  toxinas  biológicas  e  químicas).  Prefere­se  uma
terminologia que reflita a etiologia específica ou predileção racial, tal como hepatite crônica induzida por drogas, hepatite infecciosa crônica, hepatite crônica associada a cobre em cães da raça Bedlington Terrier etc. Utiliza­se o termo
hepatite idiopática crônica quando a etiologia não é identificada.
As alterações histopatológicas são semelhantes em todos os casos de hepatite crônica, independente da causa primária, e incluem inflamação linfocítica­plasmocitária, com infiltrados excedendo o parênquima hepático, necrose em partes,
e em muitos casos, necrose em ponte; nos casos avançados, notam–se fibrose e regeneração nodular.

Hepatite Crônica Específica de Raça
LABRADOR RETRIEVER:  Esta raça popular é predisposta à hepatite crônica. Características clínicas ao diagnóstico (em ordem de maior frequência) incluem icterícia, inapetência, vômito, letargia e perda de peso, com alguns cães mostrando
desconforto  abdominal,  PU/PD  ou  ausência  de  sinais  relevantes  de  hepatite.  Características  laboratoriais  comuns  incluem  volume  globular  (VG)  normal,  leucocitose,  aumento  de  ALT  (10  vezes)  e  ALP  (5  vezes),  nenhum  ou  modesto
aumento de AST e GGT, bilirrubina aumentada, TTPA prolongado e glicosúria transitória. Imagens ultrassonográficas normalmente revelam nódulos parenquimais hipo e hiperecoicos, diminuição do tamanho do fígado subjetiva e, menos
frequentemente, bordas hepáticas irregulares e ascite. Em alguns cães, observa­se retenção hepatocelular difusa de cobre associada à inflamação grave difusa.
O tratamento é baseado na interpretação dos resultados verificados em amostras obtidas por biopsia hepática (colorações de rotina e específicas para cobre) e quantificação tecidual da concentração de cobre. Quelação de cobre e restrição
da ingestão desse metal (alimento e água) propicia a remissão completa dos sinais clínicos em cães que não apresentam uma reação inflamatória não supurativa evidente, mas que apresentam alta concentração hepática de cobre (> 800 μg/g
peso seco do tecido). A resposta ao tratamento é rápida e dramática, se a doença é diagnosticada precocemente, porém a hepatopatia associada ao cobre requer manutenção por toda a vida (p. 465). Animais da raça Labrador Retriever que
apresentam hepatite crônica imunomediada não supurativa e não associada a acúmulo de cobre são tratados por toda a vida como acontece na hepatite crônica idiopática (ver texto anterior). A resposta ao tratamento pode ser evidente, sendo
especialmente efetiva quando o diagnóstico é precoce.
DOBERMANN PINSCHER:  A hepatite crônica e cirrose dos cães da raça Dobermann Pinscher é uma doença idiopática. A doença afeta, principalmente, fêmeas de meia­idade. A retenção de cobre parece ter alguma função em alguns cães e
pode ser resultado de diminuição na excreção biliar secundária a colestase induzida por doença e não a um distúrbio primário. Hepatite imunomediada e não supurativa também foi caracterizada.
Em cães com doença avançada, os sinais clínicos incluem doença cíclica envolvendo anorexia, perda de peso, vômito, diarreia, icterícia, poliúria e polidipsia, coagulopatias (melena, epistaxe), esplenomegalia, micro­hepática, ascite e
encefalopatia  hepática.  As  alterações  laboratoriais  incluem  anemia  não  regenerativa,  leucocitose,  trombocitopenia,  aumento  das  atividades  de  ALP  e  ALT,  hiperbilirrubinemia,  hipoalbuminemia,  TTPA  prolongado  e  efusão  abdominal
transudativa pura ou modificada. Ultrassonografia pode indicar lesões nodulares no fígado.
A biopsia hepática é necessária para o diagnóstico definitivo; alguns cães apresentam apenas uma aparente hepatite não supurativa imunomediada, enquanto outros apresentam retenção patológica de cobre com lesão hepática associada.
O tratamento de cães com hepatite não supurativa imunomediada inclui imunomodulação com prednisona (1 a 2 mg/kg/dia, por várias semanas, gradativamente ajustada para 0,5 mg/kg/dia, se possível em dias alternados) e antioxidantes,
com ou sem azatioprina. Em cães com fibrose em desenvolvimento, o uso de fosfatidilcolina polinsaturada é também recomendado (25 a 50 mg/kg VO, com alimento). O suporte nutricional depende da presença de encefalopatia hepática e
da necessidade de restrição de cobre. O prognóstico geralmente é ruim para cães diagnosticados com hepatite não supurativa avançada. Cães diagnosticados precocemente podem alcançar remissão por vários anos. O prognóstico para cães
com hepatopatia aparente associada ao cobre pode ser bom, se a doença é diagnosticada precocemente.
COCKER SPANIEL:  A hepatite crônica em cães da raça Cocker Spaniel está associada à hepatopatia degenerativa vacuolar relacionada com uma inflamação de interface não supurativa. A doença avançada está associada à hiperplasia biliar
marcante e fibrose. Achados clínicos comuns incluem início abrupto de anorexia, perda de peso, letargia, vômito, diarreia variável (com ou sem melena), icterícia, PU/PD e encefalopatia hepática. As alterações laboratoriais mais comuns
são  anemia  discreta,  leucocitose;  atividade  aumentada  de  ALT,  AST  e  FA;  coagulopatia;  redução  do  BUN  e,  em  alguns  cães,  hiperbilirrubinemia.  Cães  sem  icterícia  apresentam  alta  concentração  de  ABTS.  A  efusão  abdominal  é  um
transudato puro ou modificado. Macroscopicamente, o fígado se apresenta pequeno e firme, com vários nódulos regenerativos, grandes e pequenos. Cirrose micro e macronodular e hepatite periporta crônica foram identificadas. Alguns cães
apresentam teor de cobre moderado ou alto (nas colorações específicas para cobre), o que acredita­se representar retenção de cobre secundária à colestase e lesão hepatocelular. Coloração imunoistoquímica positiva para a1­antitripsina, com
hepatócitos vacualizados, é achado comum. Não está claro se um defeito genético específico é a base desta hepatopatia.
O tratamento inclui medidas de suporte e terapia sintomática, e utiliza­se um protocolo balanceado como descrito para a hepatite crônica. Imunomodulação precoce com glicocorticoides (antes de diagnóstico de doença hepática, os
glicocorticoides era prescritos para distúrbios de pele e auditivos) tem, aparentemente, prolongado a sobrevida de animais infectados. Entretanto, em cães com hipoalbuminemia ou ascite, os glicocorticoides são poucos tolerados e podem
causar melena, ascite, encefalopatia hepática etc. Se o tratamento com glicocorticoides seja uma tentativa, deve­se utilizar dexametasona em vez de prednisona para evitar os efeitos mineralocorticoides. Recomenda­se também o uso de
ácido desoxicólico, vitamina E, SAMe, fosfatidilcolina polinsaturada e suporte nutricional ajustado individualmente. Urestotomia permanente pode ser necessária em cães, machos, que desenvolvem cálculo de biurato de amônio. O sucesso
do tratamento em cães gravemente acometidos tem sido possível por vários anos. A necessidade de tratamento para retenção de cobre é baseada nas colorações específicas e quantificação deste mineral.
SKYE TERRIER:  Três relatos de hepatite em cães Skye Terrier, um caracterizando a doença em nove cães relacionados, não mencionaram predileção por idade ou sexo e os sinais clínicos variaram de assintomáticos até insuficiência hepática
em estágio final, por ocasião do diagnóstico. Foram descritos três diferentes estágios de doença hepática: inflamação discreta sem evidência de cirrose ou acúmulo de cobre até cirrose macronodular avançada, colestase e acúmulo marcante
de cobre.

Hepatite Crônica Idiopática
A hepatite crônica idiopática é definida como uma hepatopatia necroinflamatória crônica, autoperpetuante associada a infiltrado inflamatório não supurativo. Para se qualificar como idiopática, uma causa primária deve ter sido arduamente
buscada, porém não ainda definida. A hepatite autoimune se inclui nesta classificação. Deve­se investigar anticorpo antinuclear, título ou antígeno para doenças infecciosas endêmicas, exposição a drogas ou toxinas e histórico familiar,
alimentar e ambiental. A maioria dos animais acometidos tem meia­idade ou mais velhos. Não há predileção por raça ou sexo.
Os sinais clínicos incluem extremos variáveis de anorexia, letargia, vômitos, diarreia, perda de peso, icterícia, poliúria e polidipsia e, em casos graves ou de doença avançada, ascite, coagulopatias e HE. As anormalidades laboratoriais
mais precoces são aumento persistente ou cíclico de ALT, AST, ALP e GGT. Com o avanço da doença, concentrações aumentadas de ABTS são seguidas de hiperbilirrubinemia. Outros achados podem incluir anemia não regenerativa,
leucocitose  e  hiperglobulinemia.  Nos  estágios  mais  tardios  da  doença,  a  hipertensão  portal  causa  desvio  portossistêmico  e  marcadores  laboratoriais  associados  à  microcitose  eritrocitária,  hipocolesterolemia,  hipoalbuminemia,
prolongamento de TTPA e/ou TP e cristalúria com biurato de amônio. Neste estágio, os sinais evidentes de HE podem ser reconhecidos. Nos estágios iniciais, o tamanho do fígado está normal e pode não haver lesões ultrassonográficas
demonstráveis. No estágio final da doença, radiografias podem mostrar um fígado reduzido com lesões nodulares detectadas ao exame ultrassonográfico.
O diagnóstico definitivo é estabelecido por biopsia hepática, com colorações histológicas para detalhar infiltrados inflamatórios, fibrose e remodelamento e acúmulo de ferro e cobre. Aumentos inexplicáveis, persistentes e prolongados,
nas enzimas hepáticas normalmente indicam necessidade de biopsia do fígado. As amostras obtidas por biopsia devem ser enviadas para cultura aeróbica e anaeróbica e quantificação de ferro, zinco e cobre. A coloração para cobre deve ser
confrontada com os teores quantitativos do metal. A biopsia do fígado deve ser ampla o suficiente para obter pelo menos 15 tríades portais contíguas e deve ser coletada de vários lóbulos hepáticos. Amostras coletadas apenas de “massas
lesionadas” podem induzir a diagnóstico errado.
Tratamento  de  suporte  (nutricional  e  suplementação  vitamínica)  e  uso  de  terapia  específica  para  reduzir  a  inflamação  e  fibroplasia  e  restabelecer  o  estado  antioxidante  são  recomendados.  Antibióticos  são  inicialmente  prescritos
empiricamente até que os resultados das culturas histológicas e teciduais estejam disponíveis e são continuados com base nos resultados da cultura. O tratamento adicional inclui ácido ursodesoxicólico (15 a 20 mg/kg, VO, 2 vezes/dia,
administrado com alimentos), fosfatidilcolina polinsaturada como antifibrótico (25 a 50 mg/kg, VO, com alimentos), vitamina E (10 UI/kg, 1 vez/dia, com alimento) e SAMe (20 a 40 mg/kg, VO, em jejum).
O uso de drogas imunossupressoras é indicado apenas depois de considerações cuidadosas sobre as causas infecciosas ou tóxicas, quando o processo ativo da doença é caracterizado pela biopsia hepática. Prednisolona ou prednisona é
normalmente  iniciada  na  dose  de  1  a  4  mg/kg,  por  7  a  10  dias,  seguidas  de  ajuste  para  diminuição,  para  manutenção,  na  dose  de  0,5  a  1  mg/kg,  1  vez/dia  ou  em  dias  alternados,  dependendo  da  resposta  do  paciente.  Uma  droga
imunomoduladora adicional é também administrada para reduzir a dose de glicocorticoides e os efeitos adversos de cada fármaco e para alcançar os efeitos imunossupressores multimodais. Reações adversas dos glicocorticoides na doença
hepatobiliar  crônica  incluem  retenção  de  sódio  e  água  (que  pode  exacerbar  ou  promover  ascite),  efeitos  catabólicos  (que  podem  causar  EH),  úlcera  gastrintestinal  e  sangramento  intestinal  (que  podem  precipitar  EH),  pancreatite,
predisposição a infecções secundárias, intolerância à glicose e hiperadrenocorticismo e HV iatrogênicos.
Azatioprima é mais comumente utilizada na dose de 1 ou 2 mg/kg, 1 vez/dia, por 3 a 5 dias e, em seguida, em dias alternados. Efeitos benéficos não são observados antes de 8 semanas. Como a azatioprima a pode causar supressão da
medula óssea e toxicidade gastroentérica, avaliações frequentes como acompanhamentos são imperativas. Se a azatioprima causa supressão aguda da medula óssea, o tratamento deve ser suspenso e reiniciado após a recuperação, com
redução da dose em 25 a 50%. Se a toxicidade à medula óssea é identificada apenas após a administração crônica, a azatioprima deve ser suspensa permanentemente. Pancreatite e hepatotoxicidade idiopática são efeitos adversos raros que
requerem suspensão do tratamento. Mofetila micoefenolato pode ser utilizado em cães que não toleram a azatioprima. A dose recomendada é 10 a 20 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, por 7 a 10 dias, seguida de 1 vez/dia e, então, faz­se ajuste da
dose com base na resposta do paciente. A suspensão da terapia imunossupressora não é recomendada em cães com hepatite crônica.
Uma remissão completa é difícil de ser avaliada clinicamente e pode exigir biopsia de acompanhamento. O prognóstico é muito variado. Alguns cães vivem = 5 anos após o diagnóstico inicial. Cães com ascite necessitam de uma dieta
restrita em sódio e tratamento com furosemida e espironolactona (ver p. 470). Cães com EH requerem modificação da dieta proteica e podem se beneficiar do uso de lactulose e administração de baixas doses de metronidazol.
Se hepatite imunomediada é considerada o diagnóstico definitivo, considerações cuidadosas devem ser feitas antes da administração rotineira de vacinas. A estimulação imune inespecífica pode influenciar negativamente a hepatite e
causar episódios da doença.

Hepatopatia Associada ao Cobre
A hepatopatia associada ao cobre é melhor caracterizada em animais da raça Belington Terrier. A doença é causada por uma mutação autossômica recessiva; programas de acasalamento cuidadoso orientado por biopsia hepática e teste
genético têm diminuído muito a sua ocorrência. A falha em excretar o cobre através do sistema biliar pode causar, inicialmente, lesões mínimas, mas pode progredir para hepatite crônica ou cirrose. O aumento de cobre acumulado é
detectado, pela primeira vez, em cães jovens com cerca de 1 ano de idade (normal: < 400 μg/g de fígado seco ou 400 ppm). Em cães acometidos, os teores de cobre aumentam progressivamente até cerca de 6 anos de idade, com teores
hepáticos de cobre alcançando até 12.000 μg/g. As lesões hepáticas geralmente são observadas quando o teor de cobre é > 2.000 ppm.
Há três manifestações clínicas distintas. A primeira é uma necrose hepática aguda, observada em cães da raça Bedlington Terrier < 6 anos de idade, com hepatomegalia, vômito, depressão, anorexia, icterícia, anemia hemolítica associada
a cobre e hemoglobinúria. A anemia hemolítica associada ao cobre ocorre na necrose hepática maciça (com rápida liberação de cobre na circulação sistêmica). O animal pode morrer 48 a 72 h após o início dos sinais clínicos. Se o cão
sobrevive, podem ocorrer episódios recidivantes, que podem ser induzidos por situações estressantes (p. ex., parto). A segunda manifestação clínica é uma hepatite crônica. Os sinais clínicos incluem perda de peso crônica, encefalopatia
hepática, ascite e icterícia. A terceira manifestação é observada em cães jovens clinicamente saudáveis, que apresentam elevação das enzimas hepáticas (ALT) e dos teores hepáticos de cobre, em amostras obtidas por biopsia hepática. A
afecção pode progredir para necrose hepática aguda ou hepatite crônica, ou o cão pode permanecer assintomático.
Testes genéticos são recomendados para a seleção de reprodutores da raça Bedlington Terrier. Entretanto, o diagnóstico definitivo de hepatopatia por acúmulo de cobre requer biopsia hepática em cães adultos, com coloração qualitativa
para cobre, associada a mensurações quantitativas do metal. Raramente, alguns cães Bedlington Terrier com hepatopatia aparente causada por acúmulo de cobre apresentam uma mutação genética especial não detectada nos testes genéticos
atuais.
Outros cães de raça pura também são ocasionalmente diagnosticados com hepatopatia aparente primária causada por cobre (especialmente Labrador Retriever, Dobermann, Pinscher, Dálmata), possivelmente associada à suplementação
de cobre na dieta. Uma causa genética não foi identificada nessas raças.
O tratamento de doença hepática causada por acúmulo de cobre requer terapia de quelação e ingestão de alimentos e água com teor limitado de cobre. O cobre da dieta deve ser reduzido a 0,1 mg de cobre/100 kcal da dieta; a água não
deve conter mais que 0,1 ppm (0,1 μg de cobre/l). Evite água de torneira que passa por cano de cobre, a qual pode conter maior quantidade de cobre, no primeiro fluxo de cada dia.
A administração de antioxidantes é importante porque o cobre induz lesões hepáticas por meio de danos oxidativos. A terapia de quelação com D­penicilamina (15 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, administrada 30 min antes das refeições, por = 6
meses) é o padrão­ouro de tratamento. Depois disso, pode­se instituir terapia prolongada, reduzindo a dose de D­penicilamina pela metade ou administrando­a na dose padrão, em dias alternados. A administração concomitante de piridoxina
(25 mg/dia) é aconselhável porque a D­penicilinamina tem efeitos antipiridoxina (vitamina B6). Se a D­penicilamina não é tolerada, pode­se utilizar trientina (5 a 7 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, 30 min antes das refeições), porém deve­se ter
cautela porque a trientina induz insuficiência renal aguda em cães com hepatopatia grave causada por acúmulo de cobre.
Uma abordagem alternativa para o tratamento da hepatopatia causada por acúmulo de cobre é utilizar diariamente suplementação oral com acetato ou sulfato de zinco para inibir a absorção de cobre no trato gastrintestinal. A justificativa
deste tratamento é aumentar as opções alimentares. A zincoterapia não deve ser realizada junto com a terapia de quelação, uma vez que pode haver comprometimento da eficácia dos tratamentos. Informações sobre a eficácia da terapia
prologada  de  suplementação  de  zinco  em  cães  gravemente  acometidos  são  ainda  limitadas.  O  zinco,  administrado  por  via  oral,  pode  não  ser  muito  bem  tolerado,  provocando  vômito,  náuseas  e  inapetência.  Se  a  zincoterapia  é  a  mais
adequada para o tratamento prolongado em um cão específico, uma dose de ataque com zinco elementar de 5 a 10 mg/kg/dia é administrada em duas doses, 30 min antes das refeições. Concentrações plasmáticas de zinco são monitoradas
para garantir que o zinco circulante não está próximo de valores tóxicos (> 800 ppm). Após vários meses, as doses podem ser reduzidas para 2 a 3 mg/kg/dia, 2 vezes/dia.
Vitamina  E  (10  UI/kg/dia,  VO)  e  SAMe  biologicamente  disponível  (20  mg/kg/dia,  VO,  em  jejum)  são  antioxidantes  recomendados  que  também  apresentam  efeitos  anti–inflamatórios.  A  vitamina  C  é  contraindicada  em  casos  de
hepatopatias por acúmulo de cobre porque pode favorecer os efeitos nocivos dos metais de transição.
Após a terapia de quelação, é essencial que o fornecimento de cobre tanto nos alimentos quanto na água seja limitada, por toda a vida do animal. O fornecimento de uma dieta e de fonte de água com restrição de cobre pode evitar a
necessidade de terapia de quelação ou com zinco, contínua. Várias rações disponíveis no mercado formuladas para cães com insuficiência hepática comparativamente apresentam restrição de cobre. Fórmulas com baixo teor de proteínas
podem ser suplementadas como fontes proteicas com baixo conteúdo de cobre para aumentar o consumo proteico. O uso dessas rações como base das refeições preparadas em casa é preferível ao uso de formulações não prescritas que
contêm alto teor de cobre.
HEPATOPATIA  ASSOCIADA  AO  COBRE  EM  CÃES  DA  RAÇA  DÁLMATA:   Doença  hepática  grave  por  acúmulo  de  cobre  foi  observada  em  pequeno  número  de  cães  Dálmata.  Os  animais  acometidos  apresentavam  2  a  10  anos  de  idade  e,
tipicamente, a doença era aguda. Os sinais clínicos variavam de ausência de sintoma até icterícia, ascite, HE e sinais gastrintestinais, inclusive inapetência progressiva e vômito (várias semanas). As características de diagnóstico incluíam
leucocitose variável, maior aumento de ALT e AST em relação a ALP, hiperbilirrubinemia e hipoalbuminemia e concentrações normais de glicose e colesterol. Glicosúria renal foi observada em alguns cães, compatível com lesão tubular
renal (síndrome de Fanconi transitória). Biopsia hepática revelou inflamação linfoplasmática neutrofílica mista e, em alguns casos, remodelamento tecidual extenso e necrose. As lesões teciduais estavam associadas à retenção difusa de
cobre. A gravidade da lesão hepática e o estado avançado da insuficiência hepática limitaram as opções de tratamento e a sobrevivência.
HEPATITE CRÔNICA COM OU SEM COBRE EM CÃES DA RAÇA WEST HIGHLAND WHITE TERRIER:  Embora os cães da raça West Highland White Terrier mostram acúmulo excessivo de cobre, nem todos os animais com alto teor hepático de
cobre desenvolvem hepatite. Alguns cães com concentração de cobre no fígado muito aumentada morrem de velhice, sem qualquer lesão hepática necroinflamatória. Embora os cães da raça West Highland White Terrier com hepatite
crônica  geralmente  apresentam  alta  concentração  de  cobre  tecidual,  há  diferenças  em  cães  da  raça  Bedlington  Terrier  com  hepatopatia  causada  por  acúmulo  de  cobre:  (1)  o  modo  de  herança  ainda  não  foi  determinado;  (2)  observa­se
acúmulo máximo de cobre aos 6 meses de idade e posteriormente pode diminuir; (3) a concentração hepática total de cobre é menor do que em cães da raça Bedlington Terrier; (4) não se observou anemia hemolítica.
No início da doença, ocorre hepatite focal e os cães geralmente permanecem assintomáticos. Hepatite crônica está associada à anorexia, náuseas, vômito, diarreia e, mais tardiamente, ascite. O aumento das enzimas hepáticas ocorre
primeiro com a doença focal, seguido de aumento da concentração de ABTS e hiperbilirrubinemia. As alterações histopatológicas incluem hepatite necroinflamatória, necrose e cirrose multifocal. A terapia objetiva o controle do cobre,
principalmente quando se nota uma associação entre inflamação e acúmulo de cobre (ver p. 462, para recomendações de tratamento).

 HEPATITE DISSECANTE LOBULAR
A hepatite dissecante lobular é uma hepatopatia rara associada a infiltrados inflamatórios não supurativos intrassinusoidais, descrita principalmente em cães da raça Poodle padrão adolescentes a jovens adultos. Perda de peso e ascite, com
ou sem icterícia, são os sinais clínicos mais comuns. As alterações laboratoriais incluem hipoalbuminemia, hipocolesterolemia e aumento de ácidos biliares séricos em animais não ictéricos. As enzimas hepáticas podem estar normais ou
discretamente  aumentadas.  Desvios  portossistêmicos  múltiplos  podem  se  desenvolver  secundariamente  à  insuficiência  hepática  avançada  e  hipertensão  portal.  A  doença  pode  progredir  para  cirrose.  Os  teores  de  cobre  não  estão
consistentemente elevados. Recomenda­se tratamento de suporte para encefalopatia hepática e ascite e controle de fibroplasia e inflamação, como mencionado. Colchicina (0,03 mg/kg, VO, 1 vez/dia ou em dias alternados) foi utilizada para
o controle da fibrose em alguns cães. Alternativamente, fosfatidilcolina polinsaturada (25 a 50 mg/kg/dia) pode ser utilizada como antifibrótico.

 HEPATOPATIA VACUOLAR CANINA
Hepatopatia vacuolar (HV) é comumente diagnosticada em cães. É descrita como um distúrbio no qual os hepatócitos se tornam muito distendidos por glicogênio, com ou sem inclusões discretas de lipídios associados à membrana. HV,
caracterizada  pelo  acúmulo  de  glicogênio  no  citosol,  está  associada  a  hipoadrenocorticismo  típico  ou  atípico  ou  liberação  de  corticosteroides  endógenos  em  resposta  a  estresse,  doença,  inflamação  ou  neoplasia.  Biopsia  hepática  é
normalmente realizada  nesses  pacientes  devido  ao  aumento  inexplicável  da  atividade  sérica  de  fosfatase  alcalina.  As  atividades  das  transaminases  podem  estar  apenas  modestamente  aumentadas;  GGT  pode  estar  ou  não  aumentada.  É
comum observar hematopoese extramedular intra­hepática.
Radiografia abdominal pode revelar hepatomegalia ou alterações associadas à doença primária. Metástases ou vias respiratórias mineralizadas (hiperadrenocorticismo crônico) podem ser vistas na radiografia torácica. Ultrassonografia
revela  hepatomegalia  subjetiva  e  nódulos  hepáticos  hipoecoicos  contra  um  fundo  parenquimal  hiperecoico;  o  então  denominado  “padrão  de  queijo  suíço”  não  pode  ser  diferenciado  de  massas  infiltrativas,  fibrose  hepática,  hiperplasia
nodular, nódulos regenerativos ou cirrose. Em alguns casos, nódulos hepáticos macroscopicamente evidentes não podem ser identificados por ultrassonografia. HV normalmente é a lesão hepática primária em cães com hiperplasia nodular
idiopática  e  também  é  comum  em  cães  com  adenoma  hepático  ou  mucocele  biliar.  HV  progressiva  se  consolida  em  síndrome  hepática  clássica  associada  à  lesão  hepatocutânea  (ver  a  seguir).  A  biopsia  hepática  é  necessária  para  o
diagnóstico definitivo porque hepatócitos com vacúolos de glicogênio são também observados em hepatopatias necroinflamatórias.
O diagnóstico e o tratamento de qualquer doença primária em curso são fundamentais. O exame detalhado e cuidadoso de reações adversas a fármacos é necessário, enfocando–se aqueles fármacos associados a “fenômenos de indução”.
Esses devem ser suspensos e substituídos por tratamentos alternativos. Os clínicos devem investigar qualquer uso de medicamentos holísticos ou fitoterápicos que podem favorecer os efeitos sistêmicos de glicocorticoides ou ACTH.
O suporte nutricional é importante e deve ser individualizado. Na maioria dos casos, ingestão normal de nitrogênio é apropriada. HV em cães com hiperlipidemia requer tratamento com uma dieta pobre em gorduras (< 2 g de gordura/100
kcal de dieta). Uma dieta restrita em proteínas não deve ser administrada, exceto quando indicada (p. ex., constatação de encefalopatia hepática). Na verdade, a restrição proteica pode agravar esta lesão hepática, especialmente se está
associada a hipoaminoacidemia, como na síndrome hepatocutânea. Recomenda­se suplementação de vitaminas hidrossolúveis a todos os cães. Antioxidantes também devem ser fornecidos; ácido ursodeoxicólico é recomendado quando há
aumento da concentração de ABTS.

 HEPATOTOXINAS
Embora várias drogas sejam associadas à disfunção hepática, sua influência nas doenças do fígado varia dependendo da fisiopatologia da lesão hepática e do distúrbio circulatório ou metabólico da zona acinar.
Primidona, fenitoína e fenobarbital podem causar insuficiência hepática fulminante, hepatopatia colestática crônica ou VH degenerativa, progressiva e difusa, levando à necrose metabólica epidérmica (também conhecida como eritema
migratório necrolítico ou efeito fenobarbital). VH (hepatopatia esteroide) normalmente é uma alteração benigna e reversível associada à terapia glicocorticoide de longa duração com altas doses. Entretanto, administração prolongada de
glicocorticoides em doses excessivas podem causar VH degenerativa, difusa e grave, ocasionando icterícia em cães e lipidose hepática (LH) em gatos. Aumento de fosfatase alcalina (ALP) e, em menor grau, de alanina aminotransferase
(ALT) são observados dentro de 2 dias após a administração de glicocorticoides em cães, mas não em gatos.
Lomustina, um quimioterápico utilizado em cães, causa hepatite idiossincrática progressiva e imprevisível, culminando em cirrose.
Danazol, um andrógeno, pode causar icterícia idiossincrática reversível em cães.
Anabolizantes andrógenos podem causar LH em gatos inapetentes ou em gatos que recebem dieta com restrição de proteína.
Tiacetarsamida, previamente utilizada no tratamento de dirofilariose, causa hepatotoxicidade devido seu conteúdo de arsênico.
Toxicidade  está  associada  a  aumento  da  atividade  de  ALT  e,  em  alguns  cães,  icterícia.  Enzimas  hepáticas  elevadas  foram  utilizadas  como  indicadores  de  suspensão  de  tratamento,  após  a  cura  da  lesão  hepática.  Relata­se  que  a
hepatotoxicidade idiossincrática associada ao mebendazol em cães causa necrose hepática aguda e fatal ou hepatite crônica. Administração crônica de oxibendazoldietilcarbamazina em cães causou aumento na atividade de ALT e ALP,
hiperbilirrubinemia, hepatite periporta e fibrose. As lesões progressivas e os sinais clínicos se resolvem com a suspensão dos medicamentos.
Muitos anti­inflamatórios não esteroides (AINE) são tóxicos às mitocondriais e algumas estão associados à toxicidade hepatocelular idiossincrática aguda. Em particular, relata­se que o carprofeno causou necrose hepática idiossincrática
em alguns cães, especialmente da raça Labrador Retriever. Cães podem se recuperar completamente se a toxicidade é detectada precocemente e a administração da droga suspensa. Em cães, a combinação trimetoprima­sulfadiazina também
pode  causar  hepatotoxicidade  idiossincrática,  que  pode  envolver  componentes  imunomediados.  Hepatopatia  colestática  reversível  ou  necrose  maciça  fatal  aguda/subaguda  foi  observada,  às  vezes,  após  alguns  tratamentos  nas  doses
recomendadas.  Halotano  e  metoxiflurano  também  podem  estar  associados  a  reações  de  sensibilização  que  levam  à  necrose  hepática  em  cães.  Xilitol  também  pode  ser  uma  hepatotoxina  intrínseca  em  cães;  a  ingestão  de  pequena  dose
ocasiona hipoglicemia não tratável e insuficiência hepática letal. A intoxicação pode levar a óbito, antes mesmo do aumento das atividades das enzimas hepáticas.
Tetraciclinas raramente induzem necrose idiossincrática em cães e gatos e aumentam o acúmulo lipídico hepatocelular. Itraconazol e cetoconazol em cães e gatos podem causar hepatopatia idiossincrática associada à atividade elevada das
enzimas hepáticas e icterícia. Sinais clínicos se resolvem quando os fármacos são descontinuados.
Paracetamol  causa,  previsivelmente,  necrose  hepática  centrolobular  em  cães  que  recebem  doses  >  200  mg/kg.  Metemoglobinemia  é  também  notada.  A  intoxicação  em  gatos  é  aguda,  em  dose  muito  baixa  (56  mg/kg),  com  sinais
hematológicos predominantes (p. ex., metemoglobinemia e hemólise por corpúsculos de Heinz) (ver p. 3042).
A hepatotoxicidade por metimazol em gatos parece ser idiossincrática, porém pode envolver também mecanismos imunológicos; pode causar necrose e degeneração hepatocelular. Características clínicas incluem inapetência, icterícia e
atividade aumentada das enzimas hepáticas (ALT, AST), que é reversível após suspensão da droga.
Em  gatos,  hiperbilirrubinemia  e  aumento  de  ALT  associados  a  griseofulvina  também  parecem  idiossincráticos.  Os  sinais  clínicos  e  as  lesões  hepáticas  geralmente  são  reversíveis  após  suspensão  da  droga.  Toxicidade  idiopática  por
diazepam  em  gatos  pode  causar  necrose  e  insuficiência  hepática  maciça  aguda  fatal  associada  à  necrose  panlobular;  sinais  de  toxicidade  são  evidentes  após  alguns  dias  do  início  da  administração  da  droga.  A  toxicidade  tem  sido
principalmente observada após a administração oral para induzir modificação do comportamento ou no tratamento de doença do trato urinário inferior de felinos. Hepatotoxicidade idiossincrática por diazepam normalmente é fatal em gatos.
O monitoramento proativo das enzimas hepáticas pode identificar precocemente as reações adversas, permitindo a pronta descontinuação do fármaco. Toxicidade semelhante foi observada com oxazepam.
Xenobióticos específicos tóxicos ao fígado incluem aflatoxinas, toxinas derivadas dos cogumelos do gênero Amanita e as algas azul­esverdeadas (microcistinas) e cicades (palmeiras normalmente vendidas como bonsais). Embora a
toxicidade seja rara, pode causar necrose hepáti ca fatal. Outras substâncias químicas descritas como hepatotóxicas compreendem metais pesados e alguns herbicidas, fungicidas, inseticidas e raticidas (ver p. 2998 e seguintes).
As medidas importantes para minimizar a absorção de toxinas ingeridas ou uma superdosagem de drogas orais incluem descontaminação vigorosa do estômago e intestino por meio de lavagem gástrica, indução de vômito e diminuição da
sua  absorção.  Os  vômitos  podem  ser  induzidos  30  min  a  2  h  após  a  ingestão  da  substância,  por  meio  da  administração  de  peróxido  de  hidrogênio  (5  ml,  VO,  a  cada  15  min)  ou  de  xarope  de  ipeca  (1  a  2  ml/kg)  ou  apormorfina.  A
administração de carvão ativado sem sorbitol (2 g/kg, repetidos a cada 6 a 8 h) pode ser administrada para reduzir a absorção, apenas em animais conscientes. Carvão ativado também pode ser administrado como enema de alta retenção.
Enemas de limpeza de cólon devem também ser realizados usando fluidos poliônicos aquecidos, em animais desidratados. Se não há tratamento específico para a hepatotoxina, deve­se fornecer terapia de suporte.

 HIPERPLASIA NODULAR
A hiperplasia nodular tem sido descrita como uma alteração benigna e relacionada com a idade, em cães. Normalmente está associada a VH e pode ser confundida histologicamente com adenoma hepático. A hiperplasia nodular não causa
doença clínica, mas é frequentemente acompanhada de aumentos das atividades de enzimas hepáticas, principalmente ALP. A menos que o fígado seja difusamente remodelado com lesões nodulares (secundárias à VH degenerativa), a
concentração de ABTS é normal. Na ultrassonografia, a hiperplasia nodular está associada a grupos de nódulos hepáticos hipoecoicos contra um plano de fundo hiperecoico. A citologia de um aspirado pode diferenciar células neoplásicas e
células inflamatórias, mas não é possível excluir nenhuma das anormalidades. Biopsia é necessária para diferenciação entre nódulos de massa regenerativa, cirrose ou neoplasia.

 HIPERTENSÃO PORTAL E ASCITE
Ascite se desenvolve secundária à hipertensão portal e baixa concentração de albumina. Respostas fisiológicas desencadeadas para manter a normovolemia e perfusão esplâncnica induzem sinais sistêmicos para conservação de sódio e
água.
Hipertensão portal representa o impedimento da dinâmica circulatória do fluxo de sangue craniano pelo fígado. Causas pré–hepáticas incluem estenose, restrição ou trombos envolvendo a veia porta extra­hepática. Causas intra­hepáticas
incluem: sequela de hepatite crônica resultando na colagenização e capilarização dos sinusoides hepáticos, acúmulo de tecido conectivo encapsulando tríades portais e vênulas hepáticas (área centrilobular), remodelação da arquitetura do
fígado pela formação de nódulos regenerativos (cirrose), oclusão vascular das veias hepáticas ou portais (p. ex., trombo, neoplasias, vasculite) ou disseminação difusa de células neoplásicas dos sinusoides ou materiais de armazenamento
(amiloide, glicogênio) nos hepatócitos. Arterização do parênquima hepático por fístula intra­hepática arteriovenosa raramente ocasiona hipertensão portal e ascite. Causas pós­hepáticas incluem obstrução do fluxo sanguíneo para fora do
fígado através da veia hepática; isto pode ter início no coração (p. ex., insuficiência cardíaca direita, coração triatriado direito, hemangiossarcoma do átrio direito), pericárdio (p. ex., pericardite restritiva, tamponamento pericárdico) ou veia
cava (p. ex., trombo, dobra congênita, dirofilariose na veia cava).
Em  todos  os  casos  de  hipertensão  portal  hepática,  hipoperfusão  portal  intra­hepática  está  associada  à  arterialização  hepática.  A  perfusão  arterial  hepática  é  compensada  para  manter  a  circulação  nos  órgãos  e  causa  fluxo  sanguíneo
hepatofugal (reverso) na circulação porta e formação de desvios portossistêmicos adquiridos.
(APSS). Desequilíbrio compensatório na homeostase de sódio e água normalmente se torna aparente com o início da hipertensão portal associada a concentrações subnormais de albumina. Efusão ascítica associada a hepatopatias é
normalmente caracterizada por um transudato puro ou modificado (albumina sérica < 1,8 g/dl).
O  primeiro  passo  no  controle  de  ascite  é  restrição  de  sódio  na  dieta.  Recomenda­se  ingestão  de  =  100  mg/100kcal  (25  mg/kg/dia;  <  0,1%,  com  base  na  matéria  seca  do  alimento).  No  entanto,  as  dietas  com  restrição  de  sódio,
isoladamente, com frequência não são suficientes e o início de seu efeito é muito lento para um controle eficiente. Portanto, recomenda­se o uso de diuréticos. A terapia diurética deve ser direcionada para reduzir lentamente a ascite sem
causar desidratação, alcalose metabólica e hipopotassemia. Recomenda­se redução da ascite equivalente a = 1,0 a 1,5% do peso corporal total/dia. Inicialmente se recomenda terapia dupla com furosemida (1 a 2 mg/kg, VO, 2 vezes/dia) e
espironolactona  (dose  de  ataque  de  2  a  4  mg/kg,  2  a  3  doses  e,  então,  1  a  2  mg/kg,  VO,  2  vezes/dia).  Reavaliação  a  cada  7  a  10  dias  permite  um  ajuste  cuidadoso  das  doses  de  diuréticos.  A  associação  de  um  diurético  de  alça  com
espironolactona reduz o risco de hipopotassemia iatrogênica.
Se a ascite demora para se resolver, a mensuração da excreção fracionada urinária de sódio pode auxiliar a determinar se a restrição dietética e as doses de diuréticos são adequadas. Se a ascite causa distensão abdominal, comprometendo
a respiração, o apetite e o conforto do paciente, recomenda–se abdominocentese. A administração de fluidos (hetamilo) reduz o risco de disfunção circulatória pós­diurese que se desenvolve cerca de 12 h após a remoção da efusão, quando
os fluidos são novamente equilibrados (hipotensão, piora da hipoalbuminemia). Entretanto, a infusão de hetamilo aumenta o risco de hemorragia devido à redução da agregação plaquetária. Deve­se remover o mínimo possível de fluido
ascítico, suficiente para manter o animal confortável. A redução da pressão abdominal aumenta a perfusão renal e o débito cardíaco e melhora a resposta do tratamento diurético. Em muitos casos, assim que o fluido é mobilizado, diuréticos
devem ser utilizados intermitentemente, desde que a atenção à restrição de sódio na dieta seja mantida.

 INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA FULMINANTE
Insuficiência hepática fulminante é uma síndrome definida pela perda abrupta da função hepática associada à encefalopatia hepática (HE) e coagulopatia. Tratamento precoce e apropriado é crítico. Na hepatopatia crônica e em estágio final
e na hepatopatia aguda sem causa primária aparente, o tratamento fornece cuidado de suporte e ganho de tempo para regeneração e compensação hepática.
Tratamento específico deve ser administrado se uma causa primária é definida. Descontaminação das superfícies oral, dérmica e intestinal é mandatória se a exposição a toxinas ocorreu dentro de 36 h. Se um efeito adverso de fármaco é
implicado, a administração do fármaco em questão deve ser suspensa e antídotos investigados. Infecção com risco de morte, edema cerebral e coagulopatias são as principais complicações.
Atenção a fluidos, eletrólitos, condição ácido­base, estado glicêmico e suporte nutricional aumentam a chance de sobrevida. Solução de lactato de Ringer deve ser evitada, uma vez que insuficiência hepática pode impedir o metabolismo
de lactose e provocar acidose láctica. Vômito crônico e diarreia podem levar a desidratação, hipopotassemia, hipocloremia e alcalose metabólica. Alcalose e hipopotassemia podem aumentar a produção de amônia renal, potencializando a
HE. Neuroglicopenia pode induzir efeitos neurológicos que contribuem para a HE. Administração de solução de NaCl 0,9% suplementada com vitaminas e glicose normalmente é uma primeira escolha segura. Dextrose (2,5%) e potássio
(escala de potássio) devem ser adicionados cuidadosamente aos fluidos suplementados com vitamina hidrossolúveis de uso IV (vitaminas do complexo B solúvel, na dose de 2 ml/l de fluido).
Em  gatos,  uma  injeção  de  vitamina  B12  (dose  total  de  250  a  1.000  μg  IM  ou  SC)  deve  ser  utilizada  na  suspeita  de  doença  intestinal  grave,  doença  pancreática  ou  inanição.  Deficiência  de  tiamina  pode  provocar  sinais
neurocomportamentais similares aqueles da HE. Enquanto a hiperglicemia deve ser evitada porque ela pode piorar o edema cerebral, euglicemia deve ser estabelecida antes da administração de tiamina; por outro lado, neuroglicopenia pode
agravar os sinais neurológicos e causar lesões neurológicas mais extensas. Tiamina pode ser suplementada por VO ou com fluidos IV, lentamente, (solução de vitamina B solúvel fortificada), em gatos; recomenda­se dose de 25 a 100
mg/dia.
Antibióticos de amplo espectro devem ser administrados empiricamente se HE, insuficiência renal ou componentes da síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SRIS) são identificados.
Na maioria dos casos, N­acetilcisteína é administrada nos dois primeiros dias para fornecer cisteína para a síntese de glutationa, para melhorar a perfusão na microcirculação e para proteger contra o desenvolvimento de SRIS. Uma dose
de ataque (140 mg/kg) é inicialmente administrada através de um filtro de 0,25 μm, ao longo de 20 min; infusão prolongada pode precipitar hiperamonemia. Portanto, 70 mg/kg é administrada por via intravenosa em intervalos de 6 a 8 h,
por 2 dias. Raramente se desenvolve efeitos adversos em cães, na forma de urticária, brotoejas pruriginosas, vômito e, mais gravemente, edema angioneurótico.
Quando medicação oral é tolerada, recomenda­se S­adenosilmetionina biologicamente disponível (SAMe) é recomendada a 20 a 40 mg/kg/dia, VO, administrada em jejum, para manter teor hepático adequado de glutationa.
Vitamina K1 (0,5 a 1,5 mg/kg, IM ou SC) é administrada em 3 doses, em intervalos de 12 h. Também, indica­se a inibição da secreção de ácido gástrico com antagonista de receptor de histamina H2 (p. ex., famotidina) ou inibidores da
bomba de prótons (p. ex., omeprazol). Na constatação de tendência hemorrágica, pode ser necessário plasma recém­congelado ou crioprecipitados (para vWF e fibrinogênio). Acetato de desmopressina (DDAVP, 0,3 μg/kg, IV diluído a em
salina 10%) pode, às vezes, cessar a hemorragia por melhorar a hemostase primária.
O desenvolvimento de edema cerebral é multifatorial, complexo e não completamente entendido. A cabeça e o pescoço devem ser mantidos em posição neutra, evitando a compressão do fluxo sanguíneo da jugular. A elevação da cabeça
e  do  pescoço  pode  reduzir  a  pressão  intracraniana  e  a  pressão  hidrostática  do  fluido  cerebroespinal.  Cateter  venoso  central  aumenta  o  risco  de  hemorragia  iatrogênica  grave,  o  que  pode  necessitar  o  uso  de  bandagem  de  compressão.
Hiperventilação espontânea mantém alcalose respiratória discreta que promove vasoconstrição da artéria cerebral; isto tende a reduzir a pressão intracerebral. Hipoxia deve ser evitada devido ao seu efeito associado à vasodilatação cerebral.
Manitol (0,25 a 0,5 g/kg, administrado como bolus IV) pode auxiliar na redução do edema cerebral; o bolus pode ser repetido se a osmolalidade sérica não está aumentada. Furosemida (0,5 a 1 mg/kg, a cada 6 a 8 h) foi utilizada para
aumentar a eliminação renal de sódio e água. O uso de hipotermia, coma por barbitúricos, salina hipertônica ou infusão de flumazenil não é recomendado.

 LIPIDOSE HEPÁTICA FELINA
A  lipidose  hepática  (LH)  causa  mais  comum  de  doença  hepática  em  felinos  potencialmente  letal,  é  uma  síndrome  multifatorial.  Na  maioria  dos  casos,  uma  doença  primária  causa  anorexia  e  induz  o  estágio  de  LH  em  gatos
sobrecondicionados. A mobilização de gordura periférica que excede a capacidade hepática tanto de redistribuir quanto de utilizar gordura para β­oxidação (produzindo energia) leva a uma expansão marcante dos hepatócitos, pelo acúmulo
de  triglicerídios.  Em  alguns  casos,  a  inapetência  é  causada  por  estresse  ambiental,  como  programas  forçados  de  perda  de  peso  com  mudanças  inaceitáveis  da  dieta,  transferência  para  uma  nova  moradia  com  novos  donos,  perda  ou
introdução de novos animais de estimação ou membros na família, transporte, confinamento acidental (p. ex., ficar trancado na garagem, porão ou sótão) ou gato criado em residência e que se perde, fora de casa. O termo “LH idiopática” é
apropriado quando uma condição ou evento primário que levou à inapetência não pode ser identificado.
A LH não apresenta componente necroinflamatório e a colestase grave é causada por compressão canicular secundária à distensão vacuolar por triglicerídios presentes nos hepatócitos. A síndrome está associada a várias deficiências
metabólicas,  inclusive  baixo  teor  de  glutationa  hepática  ou  eritrocitária  e  baixas  concentrações  plasmáticas  de  taurina,  bem  como  de  vitamina  K1,  causando  coagulopatias  em  alguns  gatos,  deficiência  de  cobalamina  e/ou  tiamina  e
provavelmente depleção de outras vitaminas do complexo B e anormalidades eletrolíticas.
Os sinais clínicos são variáveis, mas podem incluir drástica perda de peso (> 25%, pode incluir deficiências por desidratação), vômitos, letargia, ptialismo, palidez, ventroflexão do pescoço, hepatomegalia, icterícia, gastroparesia e íleo
adinâmico (devido às alterações eletrolíticas) e retenção de gordura omental e falciforme, apesar da diminuição da gordura periférica. Diarreia é comum em gatos com LH e com doença intestinal inflamatória ou linfoma intestinal como
doença  primário.  Sinais  clássicos  de  LH  não  são  observados  e  cristalúria  com  biurato  de  amônio  é  rara,  embora  tendências  a  hemorragia  possam  surgir.  Deficiência  de  vitamina  K1  foi  confirmada  em  vários  casos  de  LH  felina  pela
constatação de tendências a sangramentos e resolução de anormalidades nos testes de coagulação após reposição de vitamina K1.
As  alterações  laboratoriais  refletem  a  síndrome  LH,  assim  como  as  doenças  primárias.  Anemia  não  regenerativa,  poiquilocitose,  aumento  do  número  de  corpúsculos  de  Heinz  eritrocitários,  contagem  variável  de  leucócitos,
hiperbilirrubinemia e bilirrubinúria; aumento discreto a moderado de AST e ALT e aumento significativo de ALP são comuns. Em gatos com doença necroinflamatória primária envolvendo pâncreas, fígado, ductos biliares ou vesícula
biliar, a atividade de GGT se eleva muito, excedendo o aumento normal de ALP. Nas outras condições causadoras de LH, a atividade de GGT é normal ou apenas modestamente aumentada. A relação GGT:ALP é útil na diferenciação de
colangite/colangioepatite  subjacente  e  outras  doenças  que  acometem  os  ductos  biliares.  GGT  elevada  também  prediz  se  há  indicação  para  biopsia  hepática  ou  pancreática.  Dependendo  dos  distúrbios  primários,  pode­se  notar
hipoalbuminemia. Pode­se notar prolongamento do tempo de protrombina (TP) ou do tempo de tromboplastina parcial ativada (TTPA); o tempo de coagulação de PIVKA é mais sensível para a detecção de deficiência de vitamina K1. Nos
estágios iniciais da síndrome LH, o valor de ABTS é anormal, antes do início aparente de icterícia (esta condição é raramente verificada). Efusão peritoneal é rara, porém quando observada representa a doença primária ou sobrecarga de
fluido iatrogência.
Avaliação  ultrassonográfica  revela  parênquima  hepático  homogêneo  e  hiperecoico  e  hepatomegalia  subjetiva.  A  hiperecogenicidade  é  determinada  comparando  o  parênquima  hepático  e  a  gordura  falciforme.  Os  rins  também  podem
aparecer hiperecoicos devido à vacuolização da gordura tubular. O exame ultrassonográfico deve pesquisar cuidadosamente todo o abdome para avaliar evidências de doença primária e inclui a avaliação de trato biliar, vesícula biliar,
pâncreas, espessamento das paredes intestinais, linfonodos hepáticos e intestinais, rins, bexiga e exame detalhado para observar cálculos renais ou urocistólitos.
O diagnóstico definitivo se baseia no histórico, achados de exame físico, características laboratoriais, aparência ultrassonográfica do fígado e citologia hepática por aspiração. Biopsia do fígado não é necessária; entretanto síndrome
colangite/colangioepatite  primária  ou  linfoma  hepático  pode  requerer  biopsia  para  um  diagnóstico  definitivo.  Preparações  citológicas  mostram  distensão  vacuolar  marcante  dos  hepatócitos  envolvendo  >  80%  destas  células.  Colestase
canalicular é comumente observada.
O tratamento de LH tem por objetivo corrigir as deficiências de fluidos e eletrólitos e metabólicas e iniciar o fornecimento de alimentos. Uma vez que gatos com LH podem apresentar altas concentrações de lactato e podem não ser
capazes de metabolizar acetato, a solução de NaCl 0,9% é o fluido de escolha. Fluidos não devem ser suplementados com dextrose, já que isto reduz a utilização dos ácidos graxos intra–hepáticos na β­oxidação. Como os gatos acometidos
são normalmente sobrecondicionados, fluidoterapia deve ser baseada no peso corporal ideal. A sobre­hidratação pode induzir efusão pleural e abdominal e edema pulmonar.
Fluidos devem ser suplementados adequadamente com potássio (usando a escala de potássio), com base na condição eletrolítica. Se a concentração sérica inicial de fósforo é baixa (< 2 mg/dl), deve­se adicionar fosfato de potássio, na
taxa de 0,01 a 0,03 mmol/kg/h). A suplementação com cloreto de potássio deve ser restrita, sendo importante verificar se há administração concomitante de suplemento com fosfato de potássio, para evitar hiperpotassemia iatrogênica.
Uma solução de vitamina hidrossolúvel fortificada (2 ml/l de fluidos, ver Tabela 12) deve ser adicionada. Suplementos de tiamina (50 a 100 mg/dia) são especialmente indicados na LH e fornecidos como suplementos hidrossolúveis em
fluidos ou VO. Raras reações anafilactoides e paralisia neuromuscular foram observadas em alguns gatos tratados com tiamina, por injeção SC ou IM.
Amostras de sangue devem ser coletadas para a determinação de vitamina B12 seguida de administração empírica de B12 (250 a 1.000 μg/gatos, SC). Deficiência de cobalamina é comum em gatos com LH e podem predispor indivíduos a
esta síndrome. Quando presente, a deficiência de vitamina B12 altera o metabolismo intermediário. O tratamento com N­acetilcisteína não deve ser administrado como infusão prolongada em velocidade constante (> 1 h) porque ela pode
induzir hiperamonemia por desviar substratos do ciclo da ureia.
A vitamina K é administrada com uma agulha de pequeno calibre (0,5 a 1,5 mg/kg, SC ou IM, 3 doses em intervalos de 12 h), antes dos procedimentos que possam provocar sangramentos.
A alimentação é iniciada assim que o gato é reidratado com eletrólitos balanceados. Alguns gatos podem desenvolver depleção de potássio renal como resultado de doença renal primária ou acúmulo lipídico nos túbulos renais. Excreção
fracionada de potássio pode ser estimada pela mensuração de potássio e creatinina em amostras de soro e urina coletadas simultaneamente. Excreção fracionada de potássio = ([potássio urina/creatinina urina] × [creatinina soro/potássio
soro]) × 100%. No gato hipopotassêmico, espera­se valor < 1%. Valor > 20% indica depleção de potássio marcante e necessidade de suplementação agressiva de potássio. Gatos com necessidade elevada de potássio devem ter gliconato de
potássio adicionado ao alimento assim que as refeições são estabelecidas. Isto reduz as concentrações de potássio necessárias nos fluidos IV e os riscos associados de hiperpotassemia iatrogênica.
O suporte nutricional é fundamental para a recuperação (ver p. 440). Como os gatos com LH apresentam insuficiência hepática metabólica, estimulantes de apetites são inapropriados; diazepam, oxazepam, cipro–heptadina e mirtazepina
não devem ser utilizados. Ocasionalmente, um estimulante de apetite pode auxiliar no início precoce da alimentação, no desenvolvimento da síndrome.
Alimentos aromatizados e palatáveis devem ser oferecidos inicialmente. Se o gato salivar ou se recisar a ela, todo o alimento deve ser removido devido ao risco de indução da síndrome de aversão ao alimento. Se alimentação oral não é
tolerada, uma dieta líquida (p. ex., CliniCare®) suplementada via sonda nasoesofágica é cuidadosamente iniciada. Um volume de 5 a 10 ml de água morna é primeiramente administrado para verificar a tolerância e resposta do gato. Se
nenhum vômito ou sinais de desconforto são observados, o processo é repetido com alimentos liquefeitos. Após alguns dias de alimentação por sonda nasoesofágica, caso considere que o gato está sob risco anestésico razoável, uma sonda
esofágica (sonda­E) é introduzida, com a porção distal situada 2 a 4 cm cranial à junção esofágica­gástrica. Isto deve ser confirmado por meio de radiografia torácica lateral.
Dieta felina, rica em proteínas, densa em calorias e balanceada é recomendada para alimentação por sonda­E. Apenas raramente se utiliza dieta com restrição de proteínas, uma vez que a restrição proteica pode agravar o acúmulo de
lipídios hepático. Por outro lado, o uso de lactulose e amoxicilina oral ou baixas doses de metronidazol pode otimizar a tolerância ao nitrogênio na dieta normal felina por modificar a flora intestinal, utilizar substrato e propiciar limpeza do
cólon. Relata­se que vários suplementos metabólicos melhoram a recuperação de gatos acometidos: taurina (250 a 500 mg/gato/dia), vitamina E (10 IU/kg/dia), L­carnitina líquida oral de uso médico (250 a 500 mg/gato/dia) e gliconato de
potássio, se a hipopotassemia não responde à reposição.
As refeições iniciais são pequenas e fornecidas frequentemente ou por infusão em taxa constante. No primeiro dia, um terço a metade dos requerimentos energéticos do gato são disponibilizados; a quantidade de alimentos é gradualmente
aumentada nos próximos 2 a 4 dias, até a ingesta ideal. Se ocorre vômito, os eletrólitos devem ser reavaliados, a posição da sonda alimentar verificada e os fatores relacionados com a doença primária considerados. Metoclopramida (0,05 a
0,1 mg/kg, IM, até 3 vezes/dia, ou 0,25 a 0,5 mg/kg fracionada no dia como taxa de infusão constante), ondansetron (0,025 mg/kg IV, até 2 vezes/dia) ou maropitant (1 mg/kg, 1 vez/dia, não mais que 5 dias) podem ser utilizados como
antieméticos. Motilidade intestinal pode ser estimulada por exercícios durante as visitas do proprietário.
Para  evitar  o  desenvolvimento  da  hipofosfatemia  induzida  por  realimentação,  a  qual  pode  causar  fraqueza,  hemólise,  encefalopatia  e  outros  efeitos  adversos,  a  concentração  sérica  de  fósforo  dever  ser  monitorada  periodicamente  e
fornecido de fosfato de potássio suplementar deve ser criterioso. Na suspeita de gastrite, bloqueadores de receptores H2 (p. ex., famotidina ou ranitidina) e carafato VO (e não através de sonda­E) podem ser utilizados. Se o gato tolera
medicação  VO,  administra­se  40  mg  de  SAMe/kg/dia,  entre  as  refeições,  assim  que  se  completar  o  tratamento  com  N­acetilcisteína.  A  suplementação  com  SAMe  deve  ser  acompanhada  de  vitamina  B12,  folato  e  outras  vitaminas
hidrossolúveis suficientes para permitir máximo benefício metabólico (metabolismo da glutationa e doação de grupo metil por reação de transmetilação). O uso de ursodeoxicolato na LH pode ser prejudicial porque o valor de ABTS é
extremamente alto nesses gatos; os perfis de ácidos biliares (por HPLC) parecem aqueles associados ao OEHDB (aumento secundário dos ácidos biliares). Em altas concentrações, todos os ácidos biliares são tóxicos às células; na LH, os
ácidos biliares estão aparentemente aprisionados pela compressão canalicular.
Em uma rara condição onde sinais de EH são notados, lactulose, amoxicilina ou baixa dose de metronidazol (= 7,5 mg/kg, VO, 2 vezes/dia) pode ser útil. Se há pancreatite concomitante e complica a retenção de alimentos, a alimentação
por meio de sonda J pode ser necessária. Faz­se alimentação distal ao pâncreas em taxa de infusão constante de CliniCare® misturado a um suplemento com enzimas pancreáticas através de uma sonda J. Alternativamente, pode­se fornecer
dieta parenteral, embora isto possa retardar a recuperação e provocar acúmulo de triglicerídios no fígado.
Em gatos com LH o prognóstico é bom, se o diagnóstico é estabelecido precocemente, o tratamento iniciado e a doença primária, se há, tratada. O monitoramento das enzimas hepáticas não tem valor na previsão de recuperação. Porém,
um decréscimo na bilirrubina total em 50% nos primeiros 7 a 10 dias aumenta a chance de recuperação completa. Pancreatite concomitante é um mau indicador prognóstico. O monitoramento da ALP de gatos obesos em dieta para redução
de peso pode ser efetiva no diagnóstico de lipidose hepática subclínica, permitindo a suspensão do programa de emagrecimento e o tratamento precoce. Recidiva é rara em gatos recuperados.

 MALFORMAÇÕES VASCULARES PORTOSSISTÊMICAS
As  anomalias  circulatórias  hepáticas  mais  comuns  em  cães  são  displasias  microvasculares  (DMV)  e  anomalias  vasculares  portossistêmicas  (AVPS).  Gatos  também  são  acometidos  por  AVPS.  DMV  e  AVPS  são  distúrbios  congênitos
herdados geneticamente que afetam raças pequenas de cães. Cães de raças grandes podem desenvolver AVPS intra­hepática.

Anomalias Vasculares Portossistêmicas (AVPS)
AVPS  é  uma  conexão  aberrante,  grosseira  e  evidente  entre  a  vasculatura  portal  extra­hepática  e  a  circulação  sistêmica  (normalmente  conectando  um  ramo  da  veia  porta  a  veia  cava)  que  desvia  o  sangue  para  a  circulação  sistêmica,
contornando o fígado. Fluxo portal reduzido para o fígado causa atrofia hepática. Como a circulação portal transporta microrganismos, toxinas, nutrientes e outros materiais do intestino para o fígado, o sangue desviado não é depurado ou
processado antes de sua transferência para a circulação cerebral e sistêmica. Consequentemente, substâncias neurotóxicas que podem provocar efeitos encefalopáticos podem passar diretamente para o cérebro.
AVPS congênita é vista principalmente em cães de raça pura. Há dois tipos de AVPS. AVPS extra­hepática ocorre predominantemente em cães pequenos de raça pura Terrier, por exemplo, Yorkshire Terrier, Maltês, Shih Tzu, Havanese,
Schnauzer miniatura, Pug, Cairn Terrier, Norfolk Terrier, Spaniels tibetanos e outros. AVPS extra­hepática normalmente surgem de veia porta, veia gástrica esquerda ou veia esplênica e se conecta com a veia cava caudal (mais comum),
veia ázigos ou raramente, outro vaso sistêmico. AVPS intra­hepática corresponde à retenção de um vaso embrionário que transporta sangue da placenta para o coração do feto, através do meio do fígado, mas que passa pela circulação
hepática. Esta malformação afeta principalmente cães de raças grandes, inclusive, por exemplo (mas não exclusivamente), Irish Wolfround, Old English Sheepdog, Labrador Retriever e Golden Retriever.
Em gatos, a AVPS congênita é mais frequentemente notada em raças mistas, porém raças puras, como Himalaia e Persa, apresentam alta prevalência. Entretanto, a maior prevalência de hepatopatia policística e hipertensão portal que
acometem essas raças dificulta o diagnóstico de AVPS. Em gatos, a AVPS extra­hepática envolvendo a veia gástrica esquerda é mais comum.
Animais com AVPS normalmente são menores que seus “irmãos de ninhada”, demoram para se desenvolver e pod em ter outras anomalias congênitas (p. ex., criptorquidismo em cães e gatos, sopro cardíaco em gatos). Os sinais clínicos
são muito variáveis e 10 a 20 % dos animais acometidos podem ser assintomáticos. A presença de sinais clínicos depende da gravidade do desvio portossistêmico. Em animais sintomáticos, os sinais clínicos incluem náuseas, vômito,
diarreia,  pica,  anorexia  intermitente,  PU/PD  (cães)  e  hematúria,  polaquiuria,  estrangúria  ou  obstrução  uretral  associada  à  formação  de  urólito  de  biurato  de  amônio. Sinais  decorrentes  de  cálculos  do  trato  urinário  podem  ser  as  únicas
queixas. Hipersalivação é um sinal clínico comum associado a EH em gatos. Gatos com AVPS também apresentam uma íris especial de cor de cobre homogênea que parece estar geneticamente associada; a exceção são gatos de olhos azuis.
Porém, íris cor de cobre é comum em gatos Persas e Russos de olhos azuis que não apresentam AVPS. Cegueira episódica e vocalização excessiva também podem ocorrer.
Anormalidades  laboratoriais  podem  incluir  eritrócitos  microcíticos,  anemia  não  degenerativa  discreta,  poiquilocitose  (gatos),  células–alvo  (cães),  hipoproteinemia  discreta  e  hipoalbuminemia,  hipoglicemia  (especialmente  cães  de
raças toy, podem ser sintomáticos), diminuição de BUN e creatinina, hipocolesterolemia, atividade das enzimas hepáticas (ALT, AST e FA) normal ou levemente aumentadas, bilirrubina normal, urina diluída (hipostenúria ou isotenúria) e
cristalúria de biurato de amônio. ABTS em jejum e pós–prandial normalmente está muito aumentado; entretanto, a mensuração de ABTS ou amônia depois de jejum prolongado pode induzir valores normais de ABTS. Após administração
de NH4Cl notam­se valores muito elevados de ABTS pós­prandial e de amônia. Exames de rotina da coagulação normalmente indicam valores dentro dos limites normais, porém a atividade da proteína C é < 70%.
Radiografias  abdominais  revelam  “nódulos”  micro­hepáticos  e  renais.  Urólito  de  biurato  de  amônio  é  radioluscente  e,  portanto,  não  detectado  nas  imagens  radiográficas.  Ultrassonografia  é  uma  ferramenta  não  invasiva  útil  para
identificação  de  AVPS,  se  realizada  por  um  operador  experiente,  em  aparelho  Doppler  de  fluxo  colorido.  Embora  a  detecção  de  AVPS  intra­hepática  é  relativamente  fácil,  a  identificação  de  AVPS  pode  ser  desafiadora  e  requer  uma
estratégia  sistemática.  A  presença  de  gás  intestinal  e  a  cooperação  do  animal  podem  limitar  a  obtenção  de  imagem  em  regiões  críticas.  Ultrassonografia  pode  detectar  urólitos  radioluscentes  na  pelve  renal  ou  na  bexiga.  Cintigrafia
colorretal, disponível em algumas clínicas especializadas ou hospitais­escola, pode claramente determinar a presença de desvio portossistêmico. Todavia, a cintigrafia colorretal é incapaz de identificar a localização anatômica dos vasos
envolvidos.  A  cintigrafia  esplenoportal  requer  injeção  percutânea  de  isótopos  no  baço,  é  considerada  um  teste  invasivo  e  não  fornece  resolução,  especificidade  ou  sensibilidade  melhor  que  as  cintigrafias  colorretais  de  rotina.  Nas
portografias com contraste radiográfico, um ramo da veia porta é canulado e um “corante” contraste iodado e radiodenso é injetado para evidenciar a anatomia vascular portal. TC em multisseções permite melhor mapeamento anatômico da
vasculatura portal, sendo melhor realizada sob anestesia de curta duração e com a injeção do contraste em um vaso periférico. Esta modalidade de imagem permite uma reconstrução anatômica tridimensional de uma anomalia vascular e de
vísceras adjacentes. Biopsia hepática é sempre indicada em pacientes com AVPS durante cirurgia de correção do desvio ou se múltiplos desvios são observados, para determinar se há doença primária ou hepatopatia adquirida concomitante.

Desvio portossistêmico congênito em cão. Ilustração do Dr. Gheorghe Constantinescu.

O tratamento de escolha para AVPS sintomática é atenuação ou ligadura cirúrgica. A complicação pós­cirúrgica mais comum é efusão abdominal benigna de curta­duração que, tipicamente, se resolve em alguns dias. A complicação pós­
cirúrgica mais grave é hipertensão portal aguda, caracterizada pelo desenvolvimento de efusão abdominal, diarreia sanguinolenta, dor abdominal, obstrução intestinal completa, choque endotóxico e colapso cardiovascular. Esta complicação
requer remoção imediata da ligadura do desvio. Outras complicações incluem convulsões (raras) e formação de coágulos sanguíneos. APSS pode se desenvolver silenciosamente em intervalos variáveis, após cirurgia para corrigir AVPS,
necessitando  retornos  frequentes.  O  local  da  ligadura  também  pode  ser  envolvido  por  ramificações  de  vasos  ou  uma  AVPS  recanalizada  que  restabelece  o  desvio  portossistêmico  vários  anos  após  a  cirurgia  inicial.  O  risco  maior  de
complicações pós­operatórias insidiosas está associado à aplicação de constritores ameroides. Os melhores resultados foram observados com ligadura gradual intraoperatória cuidadosa da AVPS extra­hepática (observação da pressão portal
e resposta visceral).
De maneira geral, o prognóstico após ligadura cirúrgica de uma única AVPS normalmente é bom. O prognóstico é menos favorável em cães com múltiplos desvios adquiridos secundários à atresia da veia porta intra­hepática grave e
naqueles com desvios intra­hepáticos. As cirurgias são mais bem­sucedidas em cães do que em gatos. Gatos são mais propensos a desenvolver APSS múltiplas após ligadura da AVPS. O estadiamento cirúrgico para atenuar gradualmente a
AVPS em gatos não tem melhorado a recuperação. O tratamento cirúrgico de AVPS intra­hepática é mais difícil do que da extra­hepática. Recentemente, a intervenção com colocação de espirais intravasculares foi utilizada para atenuar o
fluxo sanguíneo no AVPS intra­hepático não controlado por atenuação cirúrgica. O resultado (agudo ou crônico) de cães tratados não foi ainda documentado.
Cães  com  AVPS  relativamente  assintomático  normalmente  podem  ser  tratados  com  dietas  especiais  indicadas  para  insuficiência  hepática.  Suporte  dietético  é  necessário  por  toda  a  vida  e  a  expectativa  de  vida  pode  ser  normal.  As
melhores fontes proteicas são soja e proteínas lácteas, iniciando com ingestão de 2,5 g de proteínas/kg/dia. Carne vermelha, peixes e vísceras devem ser evitados. A adição de proteína lácteas, em geral, é bem tolerada e aumenta a ingestão
de proteínas e fosfatos. Petiscos de vegetais crus (p. ex., brócolis, cenoura), queijo, iogurte probiótico, pipoca, quantidade moderado de biscoitos caninos e ossos de couro cru (com supervisão) podem ser oferecidos, sem consequências
adversas. Cães submetidos a tratamento medicamentoso permanecem em risco de desenvolver EH. Esses cães também parecem mais suscetíveis a infecções sistêmicas devido à menor função dos macrófagos.
Displasia Microvascular
DMV  é  muito  mais  comum  que  a  AVPS  em  parentes  de  cães  pequenos  de  raças  Terrier.  Um  diagnóstico  de  DMV  denota  o  desenvolvimento  anormal  de  ramos  delgados  (terciários)  das  veias  portais  intra­hepáticas.  Cães  com  DMV
apresentam alto teor sérico de ácidos biliares totais (ABTS) elevado porém não demonstram doença clínica ou outras anormalidades laboratoriais encontradas em cães com AVPS. Eles não apresentam EH, não desenvolvem cristalúria por
biurato de amônio e têm atividade normal de proteína C. Uma expectativa de vida normal é esperada em cães com DMV; este diagnóstico não requer alimentação com dieta especial ou medicação hepatoespecíficas. Porém, como os cães
com  DMV  podem  ter  problemas  em  metabolizar  drogas  que  requerem  extração  e  liberação  rápida  no  fígado,  cautela  é  necessária  quando  se  prescreve  certas  drogas.  Como  a  DMV  é  geneticamente  associada  a  AVPS,  ABTS  deve  ser
mensurada em todas os filhotes de cães de raças predispostas para problemas futuros associados a saúde e para selecionar cães reprodutores. Uma vez que ácidos biliares elevados são detectados em raças pequenas do tipo Terrier jovens (<
6 mo), sem sinais clínicos de AVPS, mensurações repetidas dos ácidos biliares não são justificadas permanecem aumentadas por toda a vida do paciente. O conhecimento de que um cão apresenta ácidos biliares elevados, provavelmente
devido a DMV, define a utilidade de testes de ABTS em avaliações futuras da saúde do animal.
O diagnóstico definitivo de DMV é possível apenas por biopsia hepática combinada com estudos vasculares. Biopsia hepática mostra lesões similares àquelas associadas a AVPS; de fato, a biopsia normalmente não permite diferenciar os
dois distúrbios. Biopsia hepática pelo método tru­cut é fortemente desencorajada, uma vez que o diagnóstico se baseia na análise de unidades acinares múltiplas para se detectar atrofia lobular, arteriolização da tríade portal e contração
segmental do músculo liso das vênulas hepáticas, que caracterizam estes distúrbios. Como há variação entre os lóbulos hepáticos na extensão da malformação vascular, amostras dos três diferentes lóbulos são recomendadas. Entretanto,
etapas seguintes para obter o diagnóstico definitivo não são recomendadas, na maioria dos cães. Em vez disso, é prudente considerar que um cão com suspeita de malformação vascular hepática apresente DMV como causa primária do alto
valor de ABTS, exceto se exibe características clínicas (EH) ou clinicopatológicas (microcitose eritrocitária, BUN diminuído e baixas concentrações de creatina, colesterol e proteína C), associada a AVPS.

 NEOPLASIAS HEPÁTICAS
As neoplasias hepáticas primárias são menos comuns do que as neoplasias hepáticas metastáticas no fígado e são carcinomas, carcinoides, sarcomas ou de origem hemolinfática. Neoplasia hepática metastática pode se originar de diversas
vísceras e podem incluir linfossarcoma.
Tumores primários são frequentemente observados em animais idosos (> 9 anos de idade) e podem ser tanto malignos quanto benignos. A maioria inclui adenomas e carcinomas hepatocelulares em cães, adenomas e carcinomas biliares
em gatos. Outros tipos de tumores são hemangiossarcomas, carcinoides e sarcomas em cães; cistadenomas, linfomas e doença mieloproliferativa em gatos e, menos frequentemente, liomiossarcomas e mielolipomas.
CARCINOMAS HEPATOCELULARES:  O diagnóstico pode ser inicialmente percebido pela palpação de uma massa abdominal ou constatação de aumento das atividades de ALT, ALP ou GGT, em amostras seriadas. A radiografia pode revelar
grande lesão em massa ou abscesso enfisematoso no núcleo de um tumor necrosado. A ultrassonografia é mais sensível para detecção de lesões tumorais e pode distinguir o envolvimento de múltiplos lobos. Carcinomas hepatocelulares
pequenos podem aparecer hipoecoicos, hiperecoicos ou heteroecoicos. No entanto, o tamanho volumoso de algumas massas na permite a nítida diferenciação de tumor invasivo ou invasão à víscera adjacente e aos vasos. Carcinomas
hepatocelulares  podem  ocorrer  como  uma  única  massa  volumosa  em  um  lobo  hepático,  com  ou  sem  massas  menores  nos  outros  lobos  (maciços),  como  nódulos  discretos  localizados  em  múltiplos  lobos  (nodulares)  ou  como  doença
infiltrativa por todo o fígado, sem a presença de nódulos discretos (difusos). Carcinomas hepatocelulares difuso ou nodular, que somam 29% e 10% de todos os carcinomas hepatocelulares, respectivamente, envolvem múltiplos lobos
hepáticos e não são geralmente tratáveis por remoção cirúrgica. Carcinomas hepatocelulares maciços isolados representam 61% de todos os carcinomas hepatocelulares caninos e são potencialmente operáveis com bons resultados. Tumores
que envolvem os lobos esquerdos do fígado possuem melhor prognóstico.
Sinais clínicos comuns em cães incluem perda de peso, inapetência, letargia; sinais menos comuns incluem vômito, PU/PD e crise epilépticas (hipoglicemina). Entretanto, cães podem ser assintomáticos ainda que o tumor atinja tamanho
maciço  ou  desenvolva  um  núcleo  necrótico.  Na  palpação  abdominal  uma  massa  pode  ser  detectada  e  dor  notável.  Efusão  abdominal  é  rara.  Testes  laboratoriais  podem  indicar  anemia  não  regenerativa,  microcitose  de  eritrócitos,
trombocitose e aumento das atividades plasmáticas de ALP e AST e hipercolesterolemia. Atividades elevadas de ALT e AST podem refletir invasão de tecido normal adjacente ou necrose tumoral central e pode indicar um prognóstico
ruim. Hipoglicemia pode se instalar tanto devido à massa volumosa do tumor quanto a um efeito paraneoplásico. Metástase pulmonar é rara. As margens do tumor devem ser delimitadas para o patologista, nas amostras a ele enviadas para
definir a adequação da massa operável (tumor livre de margem).
ADENOMAS HEPATOCELULARES:  Esses tumores são mais comuns do que carcinomas hepatocelulares em cães e são raros em gatos. Eles podem estar associados a aumento da atividade de enzimas hepáticas, principalmente AP. Cães com
hiperplasia adrenal atípica associada a andrógenos ou progesterona elevados podem ser predispostos a adenomas hepatocelulares. Em vez de lesões em massa soladas, alguns cães desenvolvem adenomas múltiplos em diferentes lobos do
fígado.  Adenomas  hepatocelulares  podem  atingir  tamanho  maciço  e  exceder  sobre  estruturas  normais  por  seu  crescimento  pelo  suplemento  sanguíneo  central  e  desenvolver  um  núcleo  necrótico  que  pode  servir  como  um  ninho  para
formação do abscesso. Eles podem romper causando hemorragia abdominal crítica. A diferença entre adenoma e adenocarcinoma hepático em um paciente pode ser controversa; isto pode ser pedante por causa da grande ressecção ser
curável neste caso. As margens do tumor devem ser demarcadas para o patologista nas amostras submetidas ao patologista para julgar a adequação da massa operável (tumor livre de margem).
ADENOCARCINOMAS BILIARES:  Variáveis classificadas como adenocarcinomas colangiocelulares e adenocarcinomas hepatocelulares esses tumores são o mais comum tumor hepático maligno primário em gatos e podem derivar de ductos
biliares  extra–hepáticos  ou  intra­hepáticos  ou  da  vesícula  biliar.  Adenocarcinomas  pancreáticos,  invasivo  dentro  de  estruturas  hepáticas,  também  são  comuns  em  gatos.  Cistos  biliares  podem  ser  falsos  na  inspeção  grosseira  para
adenocarcinomas biliares primários.
Sinais clínicos geralmente incluem anorexia, letargia e vômito e em alguns gatos apresentam icterícia. Muitos gatos possuem um histórico de doença hepática antecedente baseada nos históricos dos perfis bioquímicos; histologicamente a
doença hepática crônica é colangioepatite não supurativa. Uma massa ou o fígado aumentado pode ser palpável. Aumento das atividades de ALT, AST e ALP e das concentrações de bilirrubina e colesterol são comuns. Entretanto, alguns
gatos com adenocarcinoma biliar não apresentam sinais clínicos ou anormalidades laboratoriais. A obstrução do trato biliar é notada em alguns, mas não em todos os gatos com neoplasia associada ao ducto biliar comum ou à vesícula biliar.
As radiografias abdominais podem revelar lesões em massa associada à silhueta hepática. A ultrassonografia normalmente delimita as lesões em massa, suas dimensões e a localização do lobo. Alguns gatos desenvolvem efusão abdominal
e carcinomatose.
Ressecção  cirúrgica  da  lesão  associada  ao  sistema  biliar  intra­hepático  distal  ao  sistema  porta­hepático  e  associado  à  vesícula  biliar  é  possível.  Neoplasia  envolvendo  o  ducto  comum  pode  ser  paliativa  com  o  deslocamento  de  uma
endoprótese através do esfíncter de Oddi para o duodeno ou criação de um desvio biliar. Alguns gatos sobrevivem por meses com cuidados de suporte paliativos (sem cirurgia), apesar da obstrução total do ducto biliar. No entanto, o
prognóstico a longo prazo é ruim. Lesões metastásicas são notadas em nódulos linfoides, peritônio e pulmões.
LINFOMA:   O  linfoma  é  o  tumor  hemolinfático  mais  comum,  encontrado  no  fígado,  tanto  em  cães  quanto  em  gatos.  O  linfoma  pode  ser  primário  ou  metastático  (a  partir  de  doença  multifocal  ou  intestinal  primária).  Outras  doenças
mieloproliferativas e neoplasia de células mastoide também pode envolver o fígado, especialmente gatos.
MIELOLIPOMAS:  Estes tumores benignos são compostos de células adiposas e elementos hematopoéticos. A composição celular se assemelha a elementos celulares encontrados na medula óssea. Esses tumores são geralmente descobertos ao
acaso durante a ultrassonografia abdominal e aparecem densamente hiperecoicos. A citologia de aspiração pode facilmente caracterizar as características celulares. A menos que grandes vasos e estruturas biliares estejam comprimidos,
essas lesões não necessitam de remoção cirúrgica.
NEOPLASIA METASTÁTICA:  Nos cães, os tumores metastáticos mais comuns são linfoma, carcinoma pancreático, carcinoma mamário, feocromocitoma, carcinoma intestinal, carcinoma tireoidiano, fibrossarcoma, osteossarcoma e carcinoma
de célula de transição. Nos gatos, os tumores metastáticos hepáticos são menos comuns, mas incluem carcinomas pancreático, intestinal e renal. Os tumores metastáticos geralmente são multifocais.
Os  sinais  clínicos  podem  ser  inespecíficos  ou  específicos  para  o  fígado  e  suas  características  associadas  se  assemelham  com  neoplasia  hepatobiliar  primária:  anorexia,  vômito,  perda  de  peso,  PU/PD  e  hiperbilirrubinemia  variável.
Neoplasia hepática metastática é mais provável estar associada a uma efusão abdominal maligna. Sinais neurológicos podem indicar lesões metastáticas dentro do encéfalo, com sinais clínicos falsos associados por HE. Anormalidades nos
parâmetros hematológicos e bioquímicos podem ser mínimos. Anemia não regenerativa pode ocorrer, porém não há alteração consistente na distribuição e na contagem dos leucócitos. Esquisócitos podem ser observados em animais em
animais com neoplasia que invade os sinusoides hepáticos. Eosinofilia pode ser vista com tumores de células mastoides e com linfoma, especialmente em gatos. Enzimas hepáticas podem estar normais ou aumentadas. Hipoglicemia é, às
vezes,  se  deve  tanto  à  massa  tumoral  volumosa  quanto  ao  efeito  paraneoplásico.  Hiperbilirrubinemia  e  aumento  de  AST  são  observados  mais  comumente  em  doença  metastática  canina  do  que  em  tumores  primários.  Os  achados
radiográficos são variáveis. Os achados ultrassonográficos podem confirmar o envolvimento de um único lobo, alterações nodulares múltiplas ou doença difusa. Uma biopsia é necessária para o diagnóstico definitivo.
Recomenda­se a remoção cirúrgica quando há envolvimento de um lobo do fígado. Caso o diagnóstico seja linfoma ou mastocitose, quimioterapia apropriada pode prolongar a vida.

 OUTRAS ANOMALIAS VASCULARES HEPÁTICAS
Outras anomalias vasculares incluem fístulas arteriovenosas hepáticas, obstrução do fluxo venoso hepático (doença veno­oclusiva, síndrome de Budd­Chiari) e tromboembolia venosa portal. São relativamente raras, em comparação com
AVPS e DMV e outras doenças hepáticas adquiridas.

Fístula Arteriovenosa Hepática
Fístula arteriovenosa é uma conexão intra­hepática entre a artéria hepática com alta pressão e a veia porta com baixa pressão. Isso causa um fluxo retrógrado de sangue para os vasos portais, que resulta em hipertensão portal intra e extra­
hepática, ascite e DPS adquirido. Podem ser congênitas ou, menos comumente, adquiridas de trauma ou neoplasias. Os sinais clínicos são observados em animais jovens e incluem EH, efusão abdominal, inapetência, vômito e diarreia
(frequentemente sanguinolenta). Na auscultação abdominal pode­se ouvir um sopro, que representa o fluxo de sangue anômalo através da fístula, no lobo hepático acometido.
As alterações laboratoriais são semelhantes às observadas no DPS. Ascite é o sintoma que diferencia estas duas doenças; cães com atresia portal congênita grave também desenvolvem efusão abdominal. A ultrassonografia abdominal
pode mostrar a fístula AV intra­hepática associada a DPS adquirido. Imagens definitivas requerem angiografia com contraste via artéria celíaca ou mesentérica anterior ou TC em multisseções.
Recomenda­se lobectomia quando apenas um lobo está envolvido. Biopsias hepáticas de locais distantes à malformação (outros lóbulos hepáticos) são imperativas, uma vez que muitos desses cães apresentam malformações vasculares
intra­hepáticas disseminadas. Cirurgias têm prognóstico de cura ruim devido à distribuição espalhada das malformações vasculares microscópicas. A descrição recente de injeção intravascular de acrilamida como alternativa para alívio
também tem alto risco de complicações pós–procedimentos e resultados ruins.

Obstrução do Fluxo Venoso Hepático
A obstrução do fluxo venoso hepático pode ser provocada por cardiopatia ou distúrbio pericárdico que leva à congestão passiva da veia cava caudal (p. ex., insuficiência cardíaca direita, doença pericárdica, defeitos congênitos e tumores
cardíacos), obstrução da veia cava caudal (p. ex., síndrome pós­cava associada à dirofilariose, torção da veia cava caudal, trombose ou neoplasia de veia cava caudal e hérnia diafragmática que comprime a veia cava caudal) ou obstrução no
sistema  venoso  hepático  eferente  (p.  ex.,  torção  de  lobo  hepático,  compressão  por  tumor  hepático,  obstrução  venosa  pós­sinusoidal  idiopática  associada  à  fibrose  extensa,  hematopoese  extramedular  obstrutiva  ou  oclusiva  grave  ou
constrição fisiologicamente aberrante da vênula hepática associada com AVPS e DMV em cães de raças pequenas).
Os sinais clínicos de distúrbios oclusivos incluem hepatomegalia (exceto se a causa está associada a AVPS ou DMV), ascite, DPS adquirido múltiplo e sinais sugestivos de doença primária. Doenças que causam congestão passiva estão
associadas  à  hepatomegalia,  aumento  moderado  nas  atividades  de  enzimas  hepáticas,  concentrações  normais  de  ácidos  biliares  e  formação  de  um  transudato  modificado.  As  alterações  laboratoriais  de  doenças  venoclusivas  (oclusão
inflamatória  da  vênula  hepática)  ou  síndrome  de  Budd­Chiari  (trombose  da  vênula  hepática  ou  veia  cava)  refletem  o  DPS  (p.  ex.,  altas  concentrações  de  ABTS,  hipocolesterolemia,  baixa  atividade  de  proteína  C),  aumento  discreto  a
moderado de transaminases hepáticas e concentrações de bilirrubia total e albumina variáveis. É comum efusão abdominal transudativa modificada.
Radiografias torácicas e abdominais ajudam a distinguir doenças cardíacas de outras causas e podem revelar o dobramento ou choque da região caudal diafragmática da veia cava. Ultrassonografia cardíaca pode auxiliar na identificação
de doenças que provocam congestão passiva (p. ex., diferenciação entre doença pericárdica, tumores cardíacos, doença congênita ou massa intratorácica comprimindo a veia cava caudal). Ultrassonografia abdominal revela distensão das
vênulas hepáticas, na congestão passiva, e tamanho diminuído da vênula hepática em animais com lesão venoclusiva ou do tipo Budd­Chiari. Esses últimos estão associados à disfunção hepática e APSS. O tratamento e o prognóstico
dependem das doenças primárias.

 SÍNDROME HEPATOCUTÂNEA (Dermatite Necrolítica Superficial, Eritema Migratório Necrolítico, Síndrome Glucagonoma)
A  síndrome  hepatocutânea  é  rara,  crônica,  progressiva  e,  frequentemente,  fatal.  Embora  tipicamente  associada  ao  diabetes  melito,  a  lesão  hepática  é  uma  VH  degenerativa  grave  que  também  pode  acompanhar  pancreatite  ou  tumores
neuroendócrinos, VH grave secundária à liberação hormonal esteroidogênica endógena e terapia prolongada com fenobarbital.
Descamações e lesões ulcerativas simétricas bilaterais são notadas nas junções mucocutâneas e regiões cutâneas suscetíveis a lesões por pressão, por exemplo, coxim plantar, orelhas, região periorbitária e pontos de pressão. Lesões de
pele são caracterizadas por epiderme paraceratótica evidente. Espaços edematosos entre as células encontram–se preenchidos por neutrófilos, células necrosadas e fragmentos que criam uma aparência “eosinofílica”. Inflamação perivascular
neutrofílica discreta também é observada. As lesões são comumente referidas como “vermelhas, brancas e azuis” na coloração por H&E (hematoxilina e eosina) (vermelha para paraqueratose, branca para edema e azul para hiperplasia).
Lesões de pele são vistas inicialmente na maioria dos cães acometidos, porém lesões hepáticas podem preceder alterações cutâneas.
Os sinais clínicos incluem anorexia, perda de peso, letargia, PU/PD, anemia não regenerativa discreta, aumento marcante de ALP e elevação moderada de ALT e AST, hiperglicemia, redução plasmática de aminoácidos, hipoalbuminemia
e aumento da concentração de ABTS (ácidos biliares totais séricos). Teor plasmático de glucagon aumentado é um achado inconsistente. O tamanho do fígado é variável. Na ultrassonografia, observam­se múltiplos nódulos hipoecoicos
circundados por parênquima hiperecoico difusamente espalhados por todo o fígado, condição conhecida como padrão de “queijo suíço”. A associação entre as lesões hepáticas e cutâneas não é compreendida. Especula­se que as causas
incluem hipoaminoacidemia ou metabolismo anormal do zinco. As lesões hepáticas não são necroinflamatórias e não estão associadas à fibrose ou cirrose.
O tratamento destina­se à correção da deficiência de aminoácidos e cuidados sintomáticos das lesões cutâneas e VH. Em geral, corticoides são contraindicados para lesões cutâneas. Pode­se utilizar uma ração comercial ou formulada,
com  alto  teor  de  proteínas  para  cães  com  insuficiência  hepática,  com  suplementação  de  aminoácidos  para “crescimento  corporal”.  A  administração  por  via  intravenosa  de  aminoácidos  requer  cateterização  da  veia  jugular.  Solução  de
aminoácido cristalina de aminosina 10% (100 ml contém 100 g de aminoácidos) pode ser administrada por via intravenosa, na dose de 500 ml/cão, durante 8 a 12 h. Sintomas de hiperamonemia podem ser notados em cães suscetíveis
(previamente mencionados na EH), porém devem regredir dentro de 12 h. Infusão de aminoácidos IV é repetida 7 a 10 dias após, se as lesões cutâneas persistem; podem ser administradosc4 ciclos. Se nenhuma resposta é observada, outras
infusões de aminoácidos são inúteis. O tratamento com aminoácidos resulta em regressão das lesões de pele em alguns cães, porém não em outros.
O controle concomitante do diabetes melito pode ser um desafio e a resistência à insulina sugere envolvimento de hormônios contrarreguladores (glucagon, glicocorticoides, outros). Cuidados de suporte requerem uso apropriado de
antifúngico de amplo espectro ou antibióticos para invasores secundários da superfície, metionina­zinco (1,5 a 2 mg/kg, VO, 1 vez/dia), vitaminas hidrossolúveis (duas doses, diariamente), suplementação com ácidos graxos essenciais e
limpeza tópica da lesão. Alguns dermatologistas também recomendam o tratamento com niacinamida (250 a 300 mg/cão, VO, 2 vezes/dia). Ácido ursodesoxicólico (15 a 20 mg/kg, fracionada e administrada, 2 vezes/dia, com alimento) e
antioxidantes (vitamina E e SAMe) são recomendados. A identificação e o tratamento das doenças primárias são fundamentais para o controle. A terapia crônica com fenobarbital tem sido uma causa importante em alguns cães.

EXAMES LABORATORIAIS E POR IMAGENS

 ALTERAÇÕES PATOLÓGICAS NA BILE (Síndrome da bile branca, síndrome da bile espessa, desconjugação de ácido biliar)
Em animais com estase biliar, os constituintes não absorvíveis da bile (sais biliares, fosfolipídios, glicoproteínas e colesterol) podem ser concentrados ou diluídos quando água e eletrólitos inorgânicos (cloreto de sódio, bicarbonato) são
reabsorvidos ou adicionados pelo epitélio biliar. OEHDB pode provocar uma síndrome da “bile branca”, refletindo a ausência de pigmentos de bilirrubina. Estase do fluxo biliar também pode provocar desidratação da bile, promovendo um
espessamento patológico da bile, que se torna verde­escura a preta. A formação de mucocele na vesícula biliar envolve aprisionamento, retenção, desidratação ou sobreprodução local de mucina que concede uma viscosidade elástica à bile.
Colerese (fluxo biliar aumentado) provoca bile “aquosa” e diluída; é um objetivo terapêutico nos distúrbios acompanhados de estase biliar.

 ATIVIDADE ENZIMÁTICA
Frequentemente,  suspeita­se  de  doença  hepática  quando  nota­se  aumento  das  atividades  das  enzimas  do  fígado.  Entretanto,  atividade  enzimática  anormalmente  aumentada  é  considerada  mais  comum  do  que  a  prevalência  de  doenças
hepáticas. Um amplo espectro de doenças extra­hepáticas pode influenciar a atividade enzimática do fígado. A mensuração das atividades das enzimas hepáticas não é um teste de função hepática; elas refletem a integridade da membrana
do hepatócito, necrose de epitélio biliar ou de hepatócitos, colestase ou condições indutoras.
O  padrão  de  anormalidade  das  enzimas  hepáticas,  juntamente  com  dados  detalhados  de  resenha,  histórico,  concentração  de  bilirrubina  total,  teores  séricos  de  ácidos  biliares  e  condições/medicações  das  enfermidades  concomitantes
propiciam  a  primeira  indicação  de  uma  doença  específica  do  fígado.  A  avaliação  completa  de  alterações  nas  enzimas  hepáticas  considera:  1)  o  padrão  predominante  da  alteração  enzimática  (enzimas  que  indicam  extravasamento
hepatocelular × enzimas que indicam colestase); 2) a magnitude do aumento da atividade enzimática acima dos limites normais de referência (discreta: < 5× o limite superior da faixa de normalidade; moderada: 5 a 10×; grave: > 10x); 3) a
taxa de alteração (aumento ou resolução); 4) a natureza do curso da alteração (flutuante × aumento ou diminuição progressiva). Até 2,5% dos indivíduos “normais” podem apresentar valores enzimáticos anormais, na faixa de transição entre
normal e anormal.
O reconhecimento se as anormalidades enzimáticas são persistentes ou cíclicas auxilia a classificar as prováveis causas. A avaliação da função hepática com dosagens séricas pareadas de ácidos biliares totais (ABTS) em jejum e pós­
prandial ou a mensuração de creatinina/ácidos biliares na urina (em amostra de urina coletada 4 a 8 h após a refeição) podem abreviar a decisão de realizar biopsia hepática quando os sinais clínicos permanecerem vagos e as enzimas
encontram­se apenas ligeiramente aumentadas. Estudos de imagem auxiliam na detecção de doenças primárias que influenciam, secundariamente, o fígado, elevando a atividade enzimática.
Escalas  de  referência  das  atividades  das  enzimas  hepáticas  apropriadas  para  cada  idade  são  essenciais  em  filhotes  de  cães  e  gatos.  As  atividades  plasmáticas  das  enzimas  ALP  e  GGT  em  cães  e  gatos  recém­nascidos  são
consideravelmente maiores que aquelas dos adultos. As diferenças refletem adaptações fisiológicas durante a transição do estado fetal para o neonatal, ingestão de colostro, maturação das vias metabólicas, fatores de crescimento, diferenças
no volume de distribuição e na composição corporal e dieta. As atividades séricas de ALP, AST, CK e LDH em neonatos normalmente é muito maior nas primeiras 24 h. Em filhotes de gatos, a atividade sérica de ALP, CK e LDH são
maiores que os valores dos adultos até a 8a semana de idade. A atividade sérica de ALP aumenta muito em filhotes de cães e gatos com 1 dia de vida, após a ingestão de colostro; isso também é observado em bezerros, cordeiros, porcos,
potros e bebês.
AMINOTRANSFERASES:  ALT e AST são normalmente mensuradas para a detecção de lesão hepática; ambas estão presentes em altas concentrações no fígado, mas também em outros tecidos. A atividade de AST é maior nos rins, coração e
músculo esquelético do que no fígado, enquanto a atividade de ALT é maior no fígado. Como a atividade hepática da ALT é 10.000 vezes maior do que a atividade plasmática da enzima em animais sadios, ela é muito útil no diagnóstico de
lesões hepáticas. A localização das transaminases no citosol permite sua liberação imediata, mesmo nas pequenas alterações das membranas hepatocelulares. Infelizmente, o extravasamento indiscriminado limita sua utilidade diagnóstica.
Apesar disso, a duração e a magnitude da atividade das transaminases medidas em série podem predizer a atividade e a gravidade da doença e a quantidade de células envolvidas.
As  transaminases  hepáticas  aumentam  nas  lesões  musculares,  assim  como  atividade  física  vigorosa  em  cães.  A  longa  meia­vida  plasmática  das  transaminases  contribui  para  a  manutenção  de  sua  atividade  aumentada  em  algumas
anormalidades.  Como  o  catabolismo  das  transaminases  ocorre  por  endocitose  absortiva  na  borda  sinusoidal  do  hepatócito,  a  depuração  lenta  da  enzima  pode  manter  sua  atividade  plasmática  elevada  na  insuficiência  hepática
(shunt portossistêmico, regeneração nodular, fibrose hepática).
Alanina Aminotransferase: Os maiores aumentos de ALT ocorrem na necrose hepatocelular e inflamação. Após necrose aguda intensa dos hepatócitos, a atividade sérica de ALT aumenta severamente nas 24 a 48 h, com valores > 100 vezes o
normal, atingindo atividade máxima nos 5 primeiros dias após a lesão. Se o evento nocivo cessa, a atividade de ALT diminui gradualmente até o valor normal em 2 a 3 semanas. Apesar deste padrão ser considerado clássico, algumas
hepatotoxinas potentes não estão associadas à elevação da atividade de ALT devido à inibição da transcrição gênica ou outras interferências na produção de ALT (p. ex., hepatotoxicidade por aflatoxina B1 ou por microcistina). ALT em
queda também pode indicar falta de hepatócitos viáveis no estágio final da hepatite crônica.
Exemplos de hepatotoxinas necrosantes clássicas são tetracloreto de carbono, acetaminofeno (paracetamol) e nitrosamina. Uma única exposição ao tetracloreto de carbono causa aumento brusco marcante de ALT, que se resolve em 1
semana. Hepatotoxicidade induzida por paracetamol causa grande aumento de ALT e AST em 24 h, que pode diminuir para valores próximos ao normal em 72 h. Esta toxina é altamente dose­dependente, em cães e gatos. Gatos são
excessivamente suscetíveis, com sinais hematológicos após doses tão baixas quanto 125 mg. Em cães, a dose de 200 mg/kg pode representar risco à vida do animal. Necrose hepatocelular induzida por nitrosaminas aumenta a atividade
plasmática de ALT, mas não significativamente, até 1 semana após a exposição crônica intermitente. A atividade de ALT persiste por semanas, até que a necrose se resolva. Degeneração hepatocelular de baixo grau, observada em alguns
cães com shunt portossistêmico congênito, reflete retardo da depuração enzimática e baixo grau de redução dos hepatócitos; a maioria desses cães não apresenta características histológicas compatíveis com a liberação de ALT.
Necrose hepática aguda causada por hepatite infecciosa canina aumenta a atividade plasmática de ALT em 30 vezes, com valor máximo em 4 dias. Depois disso, a atividade sustentada e crônica de ALT persiste, uma vez que cães
incapazes de eliminar os vírus desenvolvem hepatite crônica. Doenças hepáticas induzidas por toxinas normalmente causam aumento, valor máximo e retorno ao valor basal da atividade plasmática de ALT mais rápido do que ocorre nas
hepatites virais. Hepatite crônica, uma enfermidade necrótica­inflamatória persistente em cães, está relacionada com a necrose e fibrose de gravidade variável e doença cíclica associada a episódios de elevações da atividade enzimática no
plasma. Às vezes, a atividade plasmática de ALT é > 10 vezes o normal. Flutuações enzimáticas contrastam com perfis associados a eventos nocivos únicos. Em cães com hepatite, a atividade sérica de ALT diminui assim que a lesão se
resolve,  porém  a  atividade  sérica  da  ALP  pode  aumentar  como  resultado  de  doenças  regenerativas.  Cães  tratados  com  glicocorticoides  podem  exibir  atividade  de  ALT  levemente  aumentada,  que  se  resolve  algumas  semanas  após  a
suspensão do hormônio.
Apesar  da  alta  sensibilidade  da  ALT  na  detecção  de  doença  hepática,  sua  baixa  especificidade  para  diferenciar  clinicamente  doenças  hepáticas  importantes,  anormalidades  histológicas  específicas  ou  disfunção  hepática  requer  seja
interpretada juntamente com outros testes diagnósticos.
Aspartato Aminotransferase: AST está presente em concentrações consideráveis em grande variedade de tecidos. Atividade de AST aumentada pode refletir alterações reversíveis ou irreversíveis na permeabilidade da membrana hepatocelular,
necrose celular, inflamação hepática e, em cães, indução de enzimas microssomais. Após necrose hepática aguda grave difusa, a AST sérica aumenta muito nos primeiros 3 dias, com valores 10 a 30 vezes acima do normal, em cães, e até 50
vezes acima do normal, em gatos. Se a necrose se resolve, a atividade de AST diminui gradualmente em 2 a 3 semanas. Na maioria dos casos, alterações na atividade de AST são paralelas àquelas da ALT.
Embora o aumento da atividade de AST na ausência de anormalidade da atividade de ALT implica fonte enzimática extra­hepática (provavelmente, lesão muscular), há exceções clínicas que podem estar relacionadas com a gravidade e à
localização zonal da lesão hepática. Em alguns gatos com doença hepática, AST é um marcador mais sensível de lesão hepática do que ALT (p. ex., necrose hepática, colangioepatite, doença mieloproliferativa, linfoma hepático infiltrativo
e OEHDB). Também se evidencia tendência similar em alguns cães. Cães tratados com glicocorticoides podem apresentar atividade de AST ligeiramente aumentada, que normaliza algumas semanas após a suspensão do hormônio.
FOSFATASE ALCALINA:  O aumento da atividade de fosfatase alcalina (ALP) em cães é a anormalidade bioquímica mais comum verificada nos exames bioquímicos de rotina; sua alta sensibilidade e baixa especificidade podem ser um
desafio à interpretação diagnóstica, sem biopsia hepática. A atividade de ALP em cães tem a menor especificidade dentre as enzimas hepáticas avaliadas na rotina, em razão da complexidade associada à indução de diferentes isoenzimas.
Em cães e gatos, os tecidos que contêm as maiores atividades de ALP (em ordem decrescente) são intestinos, rins (córtex), placenta (apenas em cães), fígado e ossos. Diferentes isoenzimas ALP séricas podem ser extraídas de alguns dos
seguintes tecidos, em cada espécie; por exemplo, osso (B­ALP); fígado (L­ALP) e isoenzinas induzidas por glicocorticoide (G­ALP) no soro de cães. Nesses animais, L­ALP e G­ALP são responsáveis principalmente pelo aumento da
atividade sérica de ALP, enquanto em gatos a L­ALP é a principal responsável. Nota­se elevação da atividade de ALP em até 75% dos gatos com hipertireoidismo, dependendo da cronicidade da doença, com contribuição substancial da B­
ALP.
A pequena magnitude da atividade de ALP em gatos com hepatopatia (2 a 3 vezes o normal) comparativamente aos cães (normalmente 4 a 5 vezes) reflete a menor atividade específica da ALP no fígado de felinos, bem como sua meia­
vida curta. No entanto, a atividade de ALP continua sendo clinicamente útil no diagnóstico de doença hepática em felinos quando se mantém a perspectiva apropriada à espécie.
A utilidade da atividade sérica da ALP como indicador diagnóstico em cães é prejudicada pelo acúmulo, comum, das isoenzimas L­ALP e G­ALP, as quais podem ser induzidas por hormônios esteroidogênicos.
Como a isozima B­ALP aumenta secundariamente à atividade osteoblástica, ela é detectada em animais jovens em fase de crescimento e naqueles com tumor ósseo, hiperparatireoidismo secundário renal e osteomielite. Porém, a pequena
contribuição da B­ALP na atividade sérica total normalmente não ocasiona erro de diagnóstico na doença hepática colestática. Remodelamento ósseo secundário à neoplasia pode não influenciar substancialmente a atividade sérica de ALP
ou apenas causa aumento irrelevante (2 a 3 vezes) em cães. Em gatos jovens em fase de crescimento, a maior atividade de B­ALP pode estimular a atividade da enzima, notada nas doenças hepatobiliares.
ALT é liberada imediatamente do citosol do hepatócito na necrose hepática aguda, o que não acontece com a pequena quantidade de ALP associada à membrana. Demoram vários dias para que indução da enzima de membrana aumente,
com liberação à circulação sistêmica. A elevação da atividade sérica de ALP reflete o aumento de nova síntese hepática, lesão de canalículos biliares, colestase e solubilização de seu fator de fixação às membranas (pelos sais biliares). O
maior  aumento  da  atividade  sérica  da  ALP  (L­ALP  e/ou  G­ALP  =  100  vezes  o  normal)  é  notado  em  cães  com  distúrbio  colestático  focal  ou  difuso,  carcinoma  hepatocelular  extenso,  carcinoma  de  ducto  biliar  e  naqueles  expostos  a
hormônios esterodoigênicos.
Enquanto a atividade sérica de ALP pode estar normal ou ligeiramente aumentada em cães com neoplasia metastática envolvendo o fígado, ela pode estar acentuadamente elevada na neoplasia mamária. Nota­se atividade sérica elevada
de ALP em cerca de 55% dos cães com tumores malignos e 47% daqueles com neoplasia mamária benigna; a maior atividade de ALP é observada em cães com tumores malignos mistos. Contudo, ALP sérica não tem valor como indicador
diagnóstico  ou  prognóstico  de  câncer  mamário;  não  está  claro  se  a  remissão  da  doença  (por  cirurgia,  quimioterapia)  é  seguida  de  diminuição  da  atividade  sérica  de  ALP  ou  se  a  atividade  sérica  desta  enzima  atua  como  um  marcador
paraneoplásico.
Após necrose hepática aguda grave, a atividade de ALP aumenta 2 a 5 vezes, em cães e gatos, se estabiliza e, então, diminui gradualmente em 2 a 3 semanas. Atividade de ALP normal está relacionada com hiperplasia de epitélio biliar.
Em gatos, OEHDB resulta em aumento de 2 vezes na atividade de ALP em 2 dias, bem como aumento de 4x em 1 semana e elevação de até 9x em 2 a 3 semanas. Depois disso, a atividade se estabiliza e diminui gradativamente, mas
normalmente não retorna ao valor basal; a diminuição da atividade enzimática acompanha o desenvolvimento de cirrose biliar. Distúrbios inflamatórios envolvendo estruturas caniculares ou biliares ou anormalidades que comprometem o
fluxo biliar aumenta a atividade sérica de ALP devido à inflamação/ruptura da membrana e acúmulo local de ácidos biliares. Tanto em cães como em gatos, aumentos similares na atividade sérica de ALP são notados na colestase intra–
hepática espontânea ou na obstrução que envolve estruturas biliares extra­hepáticas. Consequentemente, a atividade de ALP não permite diferenciar distúrbios colestáticos intra e extra­hepáticos.
Várias doenças hepáticas primárias e enfermidades extra­hepáticas estão associadas a aumento de L­ALP. Em cães, lipidose hepática (p. 472) está associada a aumento marcante na atividade total de ALP e icterícia intensa. A elevação de
ALP parece refletir disfunção ou compressão canalicular. Embora a ALP em gatos raramente seja influenciada por anticonvulsivantes ou glicocorticoides, ela pode aumentar no diabetes melito, no hipertireoidismo e na pancreatite.
Em  cães,  inflamação  hepática  primária  assim  como  infecção  ou  inflamação  sistêmica  e  exposição  a  hormônios  esterodoigênicos  podem  induzir  hepatopatia  vacuolar  (HV).  Quando  grave,  a  HV  tem  um  efeito  colestático,  causando
compressão canalicular. Embora a HV tenha sido inicialmente caracterizada como uma lesão induzida por glicocorticoides, está agora estabelecido que aproximadamente 50% dos cães com HV não apresentam exposição comprovada a
substâncias  esterodoigênicas.  Cães  cronicamente  enfermos  podem  produzir  a  isoenzima  G­ALP  secundária  à  liberação  de  glicocorticoides  endógenos  induzida  por  estresse.  Cães  cronicamente  doentes,  com  HV  (sem  exposição  a
glicocorticoides exógenos) podem apresentar resposta normal aos testes de supressão da dexametasona e do ACTH. Em alguns cães, a elevação de ALP associada à HV sinalizam a presença de hiperplasia adrenal atípica relacionada com a
produção anormal de hormônios sexuais. Não há relação consistente entre a magnitude da atividade sérica de ALP, o aumento da atividade de G­ALP e lesão histológica. Infelizmente, G­ALP não é útil para a caracterização da síndrome,
uma vez que pode ser a enzima predominante em cães tratados com glicocorticoides e naqueles com hiperadrenocorticismo espontâneo ou iatrogênico, neoplasia hepática ou extra­hepática, inflamação e várias doenças crônicas, inclusive
doenças hepáticas primárias.
A magnitude da atividade de ALP induzida pela administração exógena de glicocorticoides depende do tipo de fármaco e da dose administrada e da resposta do indivíduo. A produção de G­ALP não implica que um cão tratado com
cortisona apresenta hiperadrenocorticismo congênito, supressão do eixo pituitária­adrenal ou HV clinicamente relevante. Comparativamente, o fígado felino é relativamente insensível aos glicocorticoides.
Em cães, a atividade sérica total de ALP e da isozima L­ALP pode também ser induzida pela administração de alguns anticonvulsivantes (fenobarbital, primidona e fenitoína) e outros fármacos; a atividade de ALP normalmente aumenta
2 a 6 vezes. Por outro lado, as atividades séricas de ALP e L­ALP não aumentam em gatos, após administração de fenobarbital (16,25 mg, 2 vezes/dia), durante 30 dias.
GAMAGLUTAMILTRANSFERASE:   Gamaglutamiltransferase  (GGT)  é  uma  glicoproteína  de  membrana  com  função  crítica  na  desintoxicação  celular;  confere  resistência  contra  várias  toxinas  e  medicamentos.  A  concentração  tissular  mais
elevada de GGT em cães e gatos é notada nos rins e no pâncreas, com menores concentrações no fígado, vesícula biliar, intestinos, baço, coração, pulmões, músculo esquelético e eritrócitos. A GGT sérica é oriunda principalmente do
fígado, embora haja variações consideráveis entre espécies quanto sua localização neste órgão.
Necrose aguda difusa grave está associada a nenhum ou aumento apenas discreto (1 a 3 vezes o valor normal) na atividade de GGT, que se resolve em cerca de 10 dias. Em cães com OEHDB, a atividade sérica de GGT se eleva 1 a 4
vezes acima do normal, em 4 dias, e 10 a 50 vezes, em 1 a 2 semanas. Depois disso, os valores podem se estabilizar ou continuar aumentando atingindo valor tão elevado quanto 100 vezes. Em gatos com OEHDB, a atividade sérica de
GGT pode aumentar até 2 vezes, em 3 dias, 2 a 6 vezes, em 5 dias, 3 a 12 vezes, em 1 semana, e 4 a 16 vezes, em 2 semanas. Glicocorticoides e outros indutores de enzimas microssomais podem estimular a produção de GGT em cães, à
semelhança do que acontece com ALP. A administração de dexametasona (3 mg/kg, 1 vez/dia) ou prednisona (4,4, mg/kg, IM, 1 vez/dia) aumenta a atividade de GGT em 4 a 7 vezes acima do normal, em 1 semana, e até 10 vezes, em 2
semanas. Cães tratados com fenitoína ou primidona apresentam apenas um aumento modesto da atividade sérica de GGT (até 2 a 3 vezes), exceto quando desenvolvem hepatotoxicose pela ação de anticonvulsivantes, na qual nota­se
aumento marcante da atividade enzimática.
Gatos com doença hepática necrosante­inflamatória avançada, OEHDB ou colestase inflamatória intra­hepática podem apresentar um aumento maior da atividade de GGT, em comparação com a ALP. Glicocorticoides e outros indutores
enzimáticos em cães não afetam clinicamente a GGT sérica em gatos. A variação normal da atividade de GGT felina é muito mais estreita e menor do que aquela verificada em cães; portanto, os testes devem ser sensíveis o suficiente para
detectar baixa atividade de GGT.
Valores de GGT podem estar muito aumentados em cães e gatos com neoplasia hepática ou pancreática primária. Porém, GGT não parece adequada para a detecção de metástase hepática em cães e gatos.
Assim como ALP, a GGT não apresenta especificidade para diferenciar entre doença parenquimal hepática e doença biliar oclusiva. Não é tão sensível em cães quanto a ALP, embora apresente alta sensibilidade. Em gatos com doença
hepática inflamatória é mais sensível, porém menos específica, do que a ALP e essas duas enzimas devem ser interpretadas simultaneamente. A probabilidade de que LH tenha se desenvolvido secundária à doença hepática necrosante­
inflamatória, OEHDB ou doença pancreática pode ser prevista avaliando o aumento relativo de GGT, comparado com o de ALP. Com a exclusão desses distúrbios primários, gatos com LH normalmente apresentam maior aumento de ALP,
em comparação com GGT; isso tem importante utilidade diagnóstica na diferenciação das causas primárias de LH.
Animais de várias espécies recém­nascidos, inclusive cães, mas não gatos, apresentam alta atividade sérica de GGT secundária à ingestão de colostro.

 BIOPSIA HEPÁTICA
Biopsias coletadas com agulha cortante (especialmente calibre 18) guiada por ultrassonografia podem propiciar amostras muito pequenas ou fragmentadas para o diagnóstico preciso, devido à ausência de unidades acinares representativas
(pelo menos 15 tríades portais devem ser amostradas). Além disso, biopsias por agulha normalmente permite a coleta de amostras apenas dos lobos esquerdos seguramente amostrados, as quais podem não mostrar lesões que afetam os
demais lobos hepáticos (colangioepatite em gatos). Biopsias com agulha romba não guiadas por ultrassonografia são perigosas e não recomendadas. Laparotomia exploratória é mais apropriada em animais com suspeita de linfadenomegalia
hepática hilar ou mesentérica; envolvimento do ducto biliar comum, vesícula biliar, intestino (p. ex., doença inflamatória do intestino, doença infiltrativa) ou pâncreas; ou anormalidades múltiplas nos órgãos. Quando possível, biopsias das
bordas  ou  biopsia  por  laparoscopia  em  concha  são  métodos  de  escolha  porque  amostras  de  tamanhos  adequados  podem  ser  adquiridas,  facilmente  e  de  maneira  segura,  de  lobos  hepáticos  diversos,  garantindo  representação  precisa  da
doença. Métodos laparoscópicos não são recomendados quando doença comum do ducto ou vesícula biliar pode necessitar de um procedimento de descompressão biliar, colecistectomia ou colestotomia. Biopsia hepática deve sempre ser
realizada mesmo se uma anormalidade biliar óbvia é o processo predominante e um distúrbio parenquimal pode ser o processo doentio primário. Para determinar se uma hepatopatia primária há, é importante realizar a biopsia do fígado
normal quando lesões focais são identificadas independentemente da anormalidade focal identificada.
Exame de biopsia de rotina deve incluir a análise de um marcador citológico, coloração de Gram (se é citologicamente identificada inflamação supurativa ou piogranulomatosa), coloração histológica, culturas bacteriológicas aeróbicas e
anaeróbicas do fígado e bile e quantificação das concentrações hepáticas de cobre, ferro e zinco. Uma amostra de tecido deve também ser reservada para outros estudos específicos posteriores, se necessário.
Antes da biopsia, a tendência de sangramento deve ser avaliada por uma revisão cuidadosa do histórico, exame físico, esfregaço sanguíneo (para confirmar plaquetas = 100.000/μl), perfil de coagulação de rotina, atividade do fator de Von
Willebrand (vWF) em espécies propensas e tempo de sangramento da mucosa bucal. Animais suspeitos a apresentar tendência de sangramento adquirida devem ser tratados com vitamina K1 (0,5 a 1,0 mg/kg, SC ou IM) em zero, 12 e 24 h
antes da coleta do tecido. Se o tempo de sangramento da mucosa bucal é > 5 min, indica­se uma transfusão de plasma recém–congelado. Tratamento adicional com acetato de desmopressina (DDAVP, 0,3 a 1 μg/kg diluído em salina)
aumenta o vWF em 2 vezes, em relação ao valor basal, em 1 h, assim como a atividade plasmática do fator III. DDAVP pode iniciar um efeito hemostático em cães com vWF tipo 1 (deficiência quantitativa parcial), porém não naqueles com
doença causada por defeitos qualitativos ou deficiência total de vWF.

 CITOLOGIA HEPÁTICA
Aspirados por agulha fina guiados por ultrassom são utilizados rotineiramente para confirmar o diagnóstico de lipidose hepática (LH) em gatos e para identificar inflamação séptica supurativa e neoplasia. Porém, o diagnóstico definitivo de
hepatopatia é impossível com aspirados hepáticos uma vez que a ausência da arquitetura acinar compromete a orientação anatômica e interpretações corretas. Neoplasia ou sepse pode ser excluída definitivamente por meio de citologia;
também, frequentemente suspeita­se de doença inflamatória. Citologia não deve ser a base para a recomendação de medicamentos imunomoduladores ou antibióticos ou terapia de quelação prolongada para hepatopatia associada ao cobre.

 COLECISTOCENTESE
Colecistocentese é a amostragem por aspiração da bile da vesícula biliar; isto pode ser completado usando uma técnica percutânea guiada por ultrassom, por assistência laparoscópica ou durante cirurgia exploratória abdominal. Amostras de
bile  são  coletadas  para  exame  citológico  e  cultura  bacteriana.  Complicações  da  colecistocentese  incluem  extravasamento  intraperitoneal  de  bile,  hemorragia,  hemobilia,  bacteriemia  e  reação  vasovagal  que  pode  resultar  em  parada
respiratória, bradicardia grave e morte. Se há suspeita de mucocele da vesícula biliar ou OEHDB, colecistocentese é contraindicada.

 HEMATOLOGIA
Dependendo da gravidade da causa primária da doença hepática, pode­se observar anemia regenerativa ou não regenerativa. Anemia grave ou aguda pode interferir na função hepática devido à hipoxia, causando alterações nas membranas
dos hepatócitos, levando à liberação de transaminases e indução de ALP. Alterações morfológicas nas hemácias (poiquilócitos, hemácias irregularmente anormais) são comuns em gatos com colangioepatite e lipidiose hepática (LH). Gatos
com LH, colangioepatite grave e OEHDB também podem desenvolver corpúsculos de Heinz, que causam hemólise. Na LH, a hipofosfatemia grave é secundária à síndrome da realimentação, que pode causar hemólise grave o bastante para
requerer transfusão sanguínea; isto pode ser evitado pela administração de fluidoterapia suplementada com fosfato de potássio. Cães com doença hepática necrosante e inflamatória difusa (perfusão sinusoidal alterada) podem apresentar
hemácias com sinal de rompimento microvascular (esquizócitos). Microcitose é comum no shunt portossistêmico congênito ou adquirido.
Alterações  na  contagem  e  distribuição  de  leucócitos  são  variáveis.  Leucocitose  pode  refletir  lesão  inflamatória,  infecciosa,  necrótica  ou  neoplásica  difusa  infiltrativa  no  fígado,  ou  ação  de  glicocorticoides  endógenos  ou  exógenos.
Leucopenia  pode  indicar  sepse  ou  intoxicação.  Na  doença  hepática  necrosante  inflamatória  difusa,  a  microvasculatura  sinusoidal  danificada  pode  provocar  agregação  plaquetária,  contribuindo  para  a  ocorrência  de  trombocitopenia  e
coagulação intravascular disseminada (CID).

 IMAGENS
RADIOGRAFIA:   Radiografias  abdominais  de  rotina  são  úteis  na  determinação  do  tamanho  do  fígado  e  de  bordas  hepáticas  irregulares.  Densidades  mineralizadas  envolvendo  o  parênquima  ou  a  trato  biliar  pode  indicar  estase  biliar,
mineralização distrófica associada a malformação congênita, “saculação” de ducto adquirido, inflamação crônico de ducto, ou cálculos biliares. Colelitíases com alto conteúdo de bilirubinato de cálcio são radiograficamente visíveis. Um
efeito de massa no quadrante cranial direito, na suspeita de OEHDB, pode representar aumento da vesícula biliar, pancreatite, neoplasia ou peritonite biliar focal. Suspeita radiográfica de efusão abdominal (detalhes abdominais tênues)
podem  levar  ao  diagnóstico  de  peritonite  biliar.  Gás  no  interior  do  parênquima  hepático  ou  em  estruturas  biliares  indica  doença  efisematosa  (p.  ex.,  colecistite,  coledoquite,  cisto  biliar  infectado,  abscessos  hepáticos,  massa  tumoral
necrótica) e justificam terapia antimicrobiana imediata, além de intervenção cirúrgica ou lavagem/aspiração percutânea guiada por ultrassom. Radiografia torácica pode indicar sinais de doenças sistêmicas (p. ex., lesões metastásicas, fluido
pleural). Linfadenopatia esternal é comum em gatos com síndrome colangite/colangioepatite.
Radiografia contrastada do sistema biliar raramente é realizada. Colecistografia pode ser feita com contraste iodado, por via oral ou IV. A distribuição e a concentração de contraste nas estruturas biliares é influenciada por inúmeras
variáveis, inclusive hiperbilirrubinemia e oclusão do ducto principal. Na melhor das hipóteses, esses agentes podem revelar cálculos biliares, pólipos ou bile espessa, porém são insuficientes para confirmar peritonite biliar ou para localizar
o local de extravasamento. Tomografia computadorizada (TC), em várias seções, é mais utilizada.
Radiografias contrastadas dos vasos da circulação porta são o padrão ouro para a confirmação de desvio portossistêmico congênito. Radiografias devem ser obtidas nas posições laterais direita e esquerda e ventrodorsal para melhor
sensibilidade do teste. TC em multisseções propicia imagens excepcionais e está gradualmente substituindo a portografia radiográfica porque permite injeção de contraste no vaso periférico, pode capturar imagens em segundos e permite
reconstrução anatômica tridimensional.
ULTRASSONOGRAFIA:  As  inúmeras  utilidades  diagnósticas  da  ultrassonografia  incluem:  1)  identificar  distensão  e  determinar  a  espessura  das  estruturas  biliares;  2)  verificar  obstruções  de  ducto  biliar  comum;  3)  detectar  mucocelas  na
vesícula biliar e colelitíase; 4) diferenciar entre anormalidades focais e difusas; 5) identificar e determinar dimensões das lesões tumorais; 6) identificar pancreatite, linfadenomegalia mesentérica e peri­hepática; 7) em associação com
estudos vasculares, identificar anomalias vasculares portossistêmicas intra e extra­hepática congênitas, APSS, fístula arteriovenosa e distensão venosa hepática compatível com congestão passiva e 8) detectar efusão abdominal de pequeno
volume.  Entretanto,  embora  a  ultrassonografia  abdominal  tenha  se  tornado  ferramenta  indispensável  de  diagnóstico  para  acessar  os  sistemas  hepático  e  biliar,  seu  uso  dependente  muito  do  operador  e  os  achados  devem  ser  sempre
confrontados com o histórico, achados nos exames físicos e dados clinicopatológicos.
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA:  TC em multisseções, disponível em clínicas especializadas, pode distinguir lesão tumoral, detectar alterações na estrutura do parênquima hepático e sistema biliar, identificar coletite, detectar perfusão
hepática anormal (envolvendo a veia porta, artéria e veia hepática) e trombo portal e pode detalhar a extensão da lesão traumática no sistema hepatobiliar.

 OUTROS TESTES BIOQUÍMICOS SÉRICOS
ALBUMINA:  Albumina é sintetizada exclusivamente pelo fígado e tem uma meia­vida estimada, em cães normais, de cerca de 8 dias. Como estima­se que o fígado normal sintetiza o equivalente a 33% de sua capacidade máxima de produzir
albumina, ele tem uma capacidade de reserva. A função da albumina como uma molécula transportadora é essencial para manter normais as interações fármacos­receptores. Nas doenças hepáticas, as funções de transporte da albumina
podem diminuir, aumentando o risco de reações adversas (há mais fármaco livre ou não ligado). O importante papel da albumina na manutenção da pressão osmótica coloidal reflete seu baixo peso molecular, comparado às outras proteínas
plasmáticas,  e  sua  alta  concentração  intravascular.  Na  inflamação  ou  na  desnutrição,  pode  haver  aumento  da  taxa  de  extravasamento  transcapilar  de  albumina;  isto  aumenta  a  redistribuição  da  albumina  e  inicia  um  quadro  de
hipoalbuminemia em pacientes com doenças hepáticas necrosante­inflamatórias, muito antes de surgir ascite.
A albumina também atua como sequestrador de radicais oxigênio e outros agentes oxidantes. Esses efeitos antioxidantes podem estar comprometidos nas hepatopatias necrosante­inflamatórias e na insuficiência hepática fulminante.
Qualquer processo nocivo que promova um ambiente oxidativo (p. ex., diabetes melito, doença renal, insuficiência hepática) pode danificar irreversivelmente a molécula de albumina, ocasionando aumento do metabolismo dessa proteína
(síntese e catabolismo).
Tendências iniciais de hipoalbuminemia normalmente refletem inflamação sistêmica (efeito de fase aguda negativo). Apenas na insuficiência hepática grave (p. ex., hepatite crônica progressiva) a baixa síntese é o fator desencadeante de
hipoalbuminemia. Doença glomerular ou enteropatia com perda de proteína deve ser excluída como causa de hipoalbuminemia; causas glomerulares estão associadas à proporção urina:creatinina > 3 e hipercolesterolemia.
BILIRRUBINA:  Bilirrubina total > 2,5 a 3,0 mg/dl resulta em icterícia clínica. As concentrações de bilirrubina podem aumentar devido a causas pré­hepáticas (p. ex., hemólise), causas hepáticas (p. ex., absorção prejudicada, transporte
intracelular, conjugação com glicuronídio ou excreção canalicular) ou colestase hepática (OEHDB, ruptura do trato biliar). A concentração de bilirrubina total é muito variável nas diferentes doenças. As concentrações são mais elevadas em
cães com distúrbios hemolíticos e em gatos com lipidose hepática (LH) e OEHDB. Bilirrubinúria pode ser detectada em cães normais, devido sua capacidade de conjugar bilirrubina nos rins (baixo limiar renal). Todavia, bilirrubinúria em
gatos não é normal e sempre deve ser investigada. A mensuração das frações da bilirrubina total, bilirrubina direta (conjugada) e bilirrubina indireta (não conjugada) têm pouca utilidade diagnóstica.
As causas comuns de hiperbilirrubinemia incluem: aumento da liberação de hemoproteínas (p. ex., anemia hemolítica, eritropoese inefetiva, hemorragia em cavidade corporal), oclusão do ducto biliar, ruptura do trato biliar, colestase
intra­hepática, prejuízo ao processamento hepatobiliar de bilirrubina e sepse, entre outros. Cães com icterícia e gatos que apresentam anemia regenerativa devem ser testados quanto a distúrbios hemolíticos, inclusive anemia hemolítica
imunomediada. Hemólise com corpúsculos de Heinz, intoxicação por zinco e eritroparasitas (inclusive Mycoplasma hemotrófico [cães e gatos] e Babesia [cães]). Bilirrubina ligada  à  albumina  por  meio  de  ligação  covalente  (complexo
biliproteico) permanecem na circulação e não são excretadas na urina. Retenção crônica pode ocasionar icterícia tissular na ausência de bilirrubina, muito após a cura do distúrbio colestático.
BUN E CREATININA:  Não há alteração característica nas concentrações de nitrogênio ureico sanguíneo (BUN) ou de creatinina em animais com hepatopatia, exceto valores diminuídos em pacientes com shunt portossistêmico e em cães sob
dietas com restrição de proteínas, formuladas para minimizar os sinais clínicos de encefalopatia hepática. BUN reflete várias condições sistêmicas, inclusive estado de hidratação, suporte nutricional, hemorragia intestinal, catabolismo
tecidual e capacidade hepática de desintoxicação da amônia. Anorexia, dieta com baixo teor proteico ou insuficiência hepática pode resultar em concentração normal ou subnormal de BUN, enquanto valores aumentados em relação à
creatinina podem refletir desidratação ou hemorragia intestinal. Diminuição de BUN e, frequentemente, de creatinina pode estar associada a desvio portossistêmico. O maior turn over de água eleva a taxa de filtração glomerular em até 2
vezes e contribui para ocorrência de poliúria (PU) e polidipsia (PD) nesses pacientes. A menor síntese hepática de creatina também contribui para a diminuição de creatinina em pacientes com insuficiência hepática, considerando que a
creatinina depende da síntese hepática de creatina na via transmetilação. Comparada a BUN, a concentração sérica de creatinina é menos influenciada pelo teor proteico da dieta.
GLICOSE:  Hipoglicemia não é comum na doença hepática adquirida, exceto no estágio final de cirrose ou na insuficiência hepática fulminante. A incapacidade de armazenar glicogênio hepático ou converter glicogênio em glicose é mais
comum  em  cães  de  raças  pequenas  neonatos  e  jovens  com  shunt  portossistêmico  congênito.  Devem  ser  consideradas  outras  causas  de  hipoglicemia,  inclusive  sepse,  insulinoma,  sobredose  iatrogênica  de  insulina,  distúrbios  raros  de
armazenamento de glicose ou efeitos paraneoplásicos em animais com neoplasias hepáticas (carcinoma ou adenoma hepatocelular canino) ou outros tumores.
COLESTEROL:  Todas as células do corpo, exceto os eritrócitos, podem sintetizar colesterol para uso intracelular. O colesterol utilizado em lipoproteínas plasmáticas é sintetizado apenas no fígado e no intestino delgado distal. A bile é a
principal  via  de  excreção  de  colesterol.  Concentração  sérica  de  colesterol  diminuída  pode  refletir  fatores  endócrinos,  metabólicos  e  nutricionais,  assim  como  insuficiência  hepática  e  desvio  portossistêmico.  Doenças  extra­hepáticas
associadas à hipocolesterolemia incluem hipoadrenocorticismo, má digestão/má absorção, inanição grave, caquexia, sepse e hipotireoidismo (gatos); causas hepáticas incluem desvio portossistêmico (congênito ou adquirido) e insuficiência
hepática  grave  (p.  ex.,  na  insuficiência  hepática  fulminante).  Colesterol  elevado  é  mais  comum  em  animais  doentes  e  requer  considerações  cuidadosas  quanto  a  distúrbios  extra­hepáticos  potencialmente  associados,  inclusive
hipertireoidismo, diabetes melito, pancreatite, síndrome nefrótica, dislipidemias idiopáticas e, raramente, efeito pós­prandial. Hipercolesterolemia normalmente é observada na OEHDB e em alguns animais com colestase intra­hepática
difusa e regeneração hepática.

 TESTES DE COAGULAÇÃO
Anormalidades na coagulação podem ocorrer como resultado da menor produção ou ativação dos fatores de coagulação produzidos no fígado (fatores V, VII, IX, X, XI, XII, fibrinogênio, protrombina, antitrombina III, plasminogênio, a2­
macroglobulina e a1­antitripsina). A diminuição na absorção gastrintestinal de vitaminas lipossolúveis pode ocasionar sangramento responsivo à vitamina K em animais com OEHDB ou com ducto biliar lesionado por complexos imunes
(colangite esclerosante felina) ou em gatos com lipidose hepática. Gatos são predispostos a coagulopatias responsivas à vitamina K. Avaliação convencional da coagulação normalmente não evidencia coagulopatias não suspeitas após
exame físico, análise de urina ou fezes ou teste do tempo de sangramento da mucosa. Cães com shunt portossistêmico congênito ou adquirido normalmente apresentam baixa atividade de proteína C (< 70%) que, aparentemente, reflete a
gravidade deste shunt.

 TESTES DE FUNÇÃO HEPÁTICA
ÁCIDOS  BILIARES  TOTAIS  SÉRICOS  (ABTS):   As  concentrações  de  ABTS  podem  detectar  distúrbios  colestáticos  e  condições  associadas  a  desvios  portossistêmicos,  com  sensibilidade.  ABTS  devem  ser  mensurados  antes  e  2  h  após  as
refeições; não é necessário jejum. Massa hepática insuficiente ou desvio da circulação porta para a circulação sistêmica, via shunt portossistêmico extra­hepático (congênito ou adquirido) ou desvios intra­hepáticos microscópicos (displasia
microvascular congênita) ocasionam alta concentração de ABTS, principalmente nas amostras pós­prandiais. Concentrações de ABTS normalmente são menores antes das refeições do que 2 h após, porém cerca de 15 a 20% dos cães e 5%
dos gatos apresentam concentrações de ABTS pré­refeição maiores que aquelas pós­prandiais. Concentrações > 25 μmol/l, em cães, e > 20 μmol/l, em gatos, devem ser consideradas anormais tanto pré quanto pós­prandial. Porém, amostras
aleatórias em jejum e a coleta de apenas amostras pós­prandiais podem mascarar a detecção de valores anormais. Como os ácidos biliares pós­prandiais são indicadores mais sensíveis de colestase do que a bilirrubina total, a mensuração de
ABTS é desnecessária na icterícia não hemolítica. O uso de ABTS como teste de função hepática pode ser indicado quando há necessidade de biopsia do fígado. ABTS pode estar aumentado em distúrbios hepáticos secundários a outras
doenças orgânicas primárias como, por exemplo, doença inflamatória do intestino, pancreatite e hiperadrenocorticismo.
AMÔNIA:  A concentração sanguínea de amônia pode indicar disfunção hepática associada à encefalopatia hepática. A amônia é derivada, predominantemente, da degradação proteica, sendo mais produzida no intestino, a partir de alimentos
consumidos e a ação da urease bacteriana intestinal que cataboliza ureia em amônia e dióxido de carbono. O transporte portal de amônia do intestino para o fígado resulta em desintoxicação direta de 85%, em ureia. Nota­se prejuízo à
depuração  nos  distúrbios  associados  a  desvio  portossistêmico  e  na  insuficiência  hepática  fulminante.  Como  a  amônia  não  é  afetada  pela  colestase,  ela  não  é  influenciada  por  distúrbios  hepáticos  que  não  causam  desvio  da  circulação
portossistêmica.
Embora a amônia seja considerada a principal causa de encefalopatia hepática, animais com sinais evidentes desta enfermidade podem apresentar concentração sanguínea aleatória normal de amônia devido a complexos mecanismos
fisiopatológicos primários desta síndrome. Um único valor de amônia normal não permite excluir encefalopatia hepática em animais com suspeita de doença hepática crônica e mensurações seriadas de amônia podem não se correlacionar a
um quadro clínico progressivo de encefalopatia hepática. Portanto, não se pode confiar na dosagem de amônia no diagnóstico de encefalopatia hepática.
A mensuração da concentração sanguínea de amônia é complexa. Falsos aumentos de amônia podem refletir coleta de sangue lenta, aplicação de torniquete muito apertado, condições que promovem a liberação muscular de amônia
(convulsões ou traumatismos), contaminação das amostras e geração espontânea nas amostras não resfriadas adequadamente após a coleta ou não prontamente examinadas. A amônia é altamente volátil e as amostras não podem enviadas
para análise via correio. Amostras de sangue devem ser coletadas em tubos pré­resfriados e transportadas em gelo derretido ao laboratório onde serão realizadas as análises, dentro de 20 min. A padronização das metodologias enzimáticas é
difícil. Também, existem causas extra­hepáticas de hiperamonemia. A mais comum é a infecção bacteriana do trato urinário por microrganismos produtores de urease, associada com uroabdômen ou doença urinária obstrutiva.
Se uma concentração aleatória de amônia encontra­se dentro dos limites normais, porém há suspeita de insuficiência hepática e shunt, pode­se realizar o teste de tolerância à amônia (TTA). Deve­se administrar, VO, 100 mg de cloreto de
amônia/kg, em uma solução 5% (pode induzir vômito), ou 2 ml/kg de uma solução 5%, VR, 30 min após um enema. A amônia sanguínea é dosada 20, 30, 40 e 60 min após a administração. TTA deve ser realizado com cautela devido ao
risco de encefalopatia hepática (EH) iatrogênica em pacientes suscetíveis.
A presença de cristais de biurato de amônio na urina de animais com ABTS elevado é patognomônico de hiperamonemia e desvio portossistêmico. Um mínimo de três amostras de urina coletadas diariamente, em intervalos, devem ser
analisadas para aumentar a possibilidade de identificação dos cristais. Em animais submetidos à dieta com restrição proteica, com ração formulada especificamente para insuficiência hepática, pode ser difícil identificar biur ato de amônio
devido sua alta eficiência em controlar hiperamonemia.

PÂNCREAS EXÓCRINO

O pâncreas tem funções exócrinas e endócrinas. O pâncreas exócrino é composto de células pancreáticas acinares e um sistema de ductos que alcançam o duodeno proximal. As células pancreáticas acinares sintetizam e secretam enzimas
digestivas,  essenciais  à  digestão  de  componentes  alimentares  complexos,  como  proteínas,  triglicerídios  e  carboidratos.  O  pâncreas  exócrino,  também,  secreta  outras  substâncias  essenciais,  como  grande  quantidade  de  bicarbonato,  que
tampona o ácido gástrico, fatores intrínsecos, necessários para absorção de cobalamina e colipase, para absorção de lipídios.

 ABSCESSOS PANCREÁTICOS
Por  definição,  um  abscesso  pancreático  é  uma  coleção  de  pus,  geralmente  nas  proximidades  do  pâncreas,  com  pouca  ou  nenhuma  necrose  pancreática.  Consideram­se  os  abscessos  pancreáticos  complicações  da  pancreatite.  Infecção
bacteriana pode ou não estar presente, mas quase todos os casos descritos em pequenos animais eram de abscessos estéreis. Os sinais clínicos são inespecíficos e podem incluir vômito, depressão, dor abdominal, anorexia, febre, diarreia e
desidratação. Em alguns animais a palpação abdominal revela uma massa no abdome cranial. Achados clinicopatológicos comuns são neutrofilia com desvio à esquerda, aumento das atividades séricas de amilase, lipase e das enzimas
hepáticas  e  hiperbilirrubinemia.  Concentrações  séricas  elevadas  de  TLI  e  PLI  não  foram  observadas  em  cães  ou  gatos  com  abscesso  pancreático,  porém  relatos  anedóticos  sugerem  que  ambos  os  parâmetros  séricos  aumentam
nesses pacientes.  Drenagem  cirúrgica  e  terapia  antimicrobiana  agressiva  são  as  escolhas  terapêuticas  em  pacientes  humanos  com  abscessos  pancreáticos  infectados.  Cães  e  gatos  também  podem  responder  favoravelmente  à  drenagem
cirúrgica. Entretanto, em um estudo, notou­se que apenas pouco mais de 50% dos animais sobreviveram ao período pós­cirúrgico imediato. Desta forma, devido aos resultados e riscos variáveis, dificuldades e custos associados à anestesia,
cirurgia e cuidados pós­operatórios, o procedimento cirúrgico não deve ser realizado, a menos que exista clara evidência de aumento da massa e/ou sepse durante tratamento medicamentoso do animal.

 INSUFICIÊNCIA PANCREÁTICA EXÓCRINA
IPE é uma síndrome causada por síntese e secreção deficiente de enzimas digestivas pela porção exócrina do pâncreas. IPE é incomum em cães e mais rara ainda em gatos, embora seja o segundo distúrbio pancreático mais comum em
ambas as espécies.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A causa mais comum de IPE em cães é atrofia acinar pancreática, enquanto a causa mais comum em gatos, e a segunda mais comum em cães, é pancreatite crônica. Causas menos comuns de IPE em cães e
gatos incluem massas pancreáticas ou extrapancreáticas que levam à obstrução do ducto pancreático. O pâncreas exócrino tem reserva funcional significativa, e é necessária a perda de 90% desta reserva para que ocorram sinais clínicos de
IPE. As enzimas acinares pancreáticas têm importante papel na assimilação dos principais componentes alimentares e a deficiência de enzimas pancreáticas digestivas causa, principalmente, má digestão. Entretanto, pacientes com IPE
também mostram evidências de má absorção, cuja base patogenia não está bem estabelecida (ver síndromes de má­absorção, p. 370). Os nutrientes restantes no lúmen intestinal ocasionam fezes volumosas e pastosas e esteatorreia. A
deficiência de nutrientes também causa perda de peso e pode provocar deficiências vitamínicas. Em animais com IPE causada por pancreatite crônica, a destruição do tecido pancreático pode não se restringir às células acinares, e pode se
desenvolver diabetes melito concomitante.
ACHADOS CLÍNICOS:  IPE devido à atrofia acinar pancreática é mais frequente em cães jovens da raça Pastor Alemão, embora tenham também sido descrita em animais das raças Colly de pelagem cresta e Eurasier. Cães e gatos com IPE de
outras causas geralmente são de meia–idade a idosos, de qualquer raça. Os sinais clínicos mais frequentemente observados incluem polifagia, perda de peso e diarreia. Vômito e anorexia são observados em alguns animais e podem ser
sinais de doenças concomitantes, em vez de IPE. Em pequena parte dos gatos com IPE, as fezes geralmente são pálidas, pastosas, volumosas e podem ter odor acentuado. Raramente pode­se observar diarreia aquosa. O alto conteúdo de
lipídios nas fezes podem levar à aparência gordurosa dos pelos, especialmente nas regiões da cauda e do períneo.
DIAGNÓSTICO:  A concentração sérica de IST = 2,5 μg/l (cães) ou = 8 μg/l (gatos) é diagnóstico para IPE. Como a digestão de um macronutriente pode ser realizada por mais de uma enzima, a deficiência de secreção exócrina pancreática
não ocasiona, necessariamente, sinais clínicos. Por exemplo, alguns cães da raça Pastor Alemão com IPE subclínica têm concentração sérica de IST muito diminuída, escassez de tecido pancreático exócrino, mas sinais clínicos de IPE
intermitentes ou ausentes.
Recentemente,  foi  desenvolvido  e  validado  um  novo  teste  para  dosagem  de  elastase  fecal  em  cães.  Infelizmente,  alguns  cães  saudáveis  ou  com  doença  crônica  do  intestino  delgado  podem  apresentar  concentração  fecal  de  elastase
reduzida, tornando esse teste menos confiável do que a concentração sérica de IST.
TRATAMENTO:   A  maioria  dos  cães  e  gatos  com  IPE  pode  ser  tratada  com  sucesso  por  meio  de  suplementação  com  enzimas  pancreáticas.  Formulações  em  pó  são  mais  efetivas  que  cápsulas,  comprimidos  e,  especialmente,  produtos
revestidos para absorção intestinal. Inicialmente, deve­se administrar 1 colher de chá/10 kg de peso corporal, para cães, em cada refeição e 1 colher de chá/gato, em cada refeição, para gatos. Quando há remissão total dos sinais clínicos, a
quantidade de enzimas pancreáticas pode ser gradualmente reduzida até obter a menor dose efetiva. Todavia, deve­se considerar que a menor dose efetiva pode variar entre os lotes de enzimas. Sangramento bucal foi observado em 3 de 25
cães com IPE tratados com suplementos de enzima pancreática, o sangramento cessou nos 3 cães após redução da dose. A mistura do alimento com a formulação em pó também pode diminuir a frequência deste efeito colateral.
Pâncreas fresco pode ser uma alternativa viável ao uso de pó; 30 a 90 g de pâncreas cru fatiado pode substituir 1 colher de chá de extrato pancreático. Pâncreas cru pode ser mantido congelado por diversos meses, sem perda da atividade
enzimática. Não é necessária pré­incubação do alimento com as enzimas pancreáticas ou suplementação com ácidos biliares. A terapia concomitante com antiácidos ocasiona poucos efeitos na capacidade digestiva total e não é necessária
em quase todos os pacientes com IPE.
Embora  a  suplementação  de  enzimas  pancreáticas  melhore  os  sinais  clínicos  em  quase  todos  os  animais,  a  absorção  de  nutrientes,  especialmente  lipídios,  não  é  normal.  Foi  sugerido  o  fornecimento  de  dieta  pobre  em  gordura  para
controlar  a  digestão  prejudicada  de  lipídios,  mas  isto  pode  reduzir  adicionalmente  a  absorção  de  lipídios  e  acarretar  deficiência  de  vitaminas  lipossolúveis  e/ou  ácidos  graxos  essenciais.  Alguns  tipos  de  fibra  alimentar  interferem  na
atividade das enzimas pancreáticas e, assim, deve­se fornecer uma dieta pobre em fibras insolúveis ou não fermentáveis.
A suplementação enzimática, isoladamente, pode não propiciar a remissão completa dos sinais clínicos; deve­se considerar a deficiência de cobalamina como possível causa. A absorção de cobalamina depende da síntese e secreção
adequada de fator intrínseco. Em cães e, especialmente em gatos, a maior parte do fator intrínseco é secretado pelo pâncreas exócrino e > 80% dos cães e a maioria dos gatos com IPE apresentam deficiência de cobalamina. Ainda, em um
estudo realizado em cães com IPE a deficiência de cobalamina foi o único fator de risco independente para prognóstico ruim. Dessa forma, as concentrações séricas de cobalamina e folato devem ser rotineiramente avaliadas em pequenos
animais  com  suspeita  de  IPE.  Cães  e  gatos  com  deficiência  de  cobalamina,  supostamente  pela  marcante  redução  na  concentração  sérica  de  cobalamina,  devem  ser  tratados  com  cobalamina,  por  via  parenteral.  Foram  relatadas  outras
hipovitaminoses. Por exemplo, notou–se deficiência de vitamina K e consequente coagulopatia em gatos com IPE.
Alguns  animais  podem  não  responder  à  suplementação  enzimática  e  terapia  com  cobalamina  e  provavelmente  apresentam  doença  de  intestino  delgado  concomitante.  Cães  com  IPE  frequentemente  apresentam  simultaneamente
supercrescimento bacteriano no intestino delgado e podem necessitar terapia antimicrobiana, enquanto gatos com IPE geralmente apresentam doença intestinal inflamatória concomitante.
PROGNÓSTICO:  Na maioria dos casos, a IPE ocorre por perda irreversível de tecido acinar pancreático; a cura é rara. No entanto, com tratamento apropriado e monitoramento, estes animais geralmente ganham peso rapidamente, eliminam
fezes firmes e podem viver normalmente.

 NEOPLASIAS PANCREÁTICAS
As neoplasias do pâncreas exócrino podem ser primárias ou secundárias e podem ser classificadas como benignas ou malignas. A maioria das neoplasias pancreáticas em cães e gatos é secundária.
Adenomas  pancreáticos  são  tumores  benignos  que  geralmente  são  únicos  e  podem  ser  diferenciados  de  hiperplasia  nodular  pancreática  pela  presença  de  cápsula.  Adenocarcinoma  pancreático  é  a  neoplasia  primária  mais  comum  do
pâncreas exócrino em cães e gatos, mas raramente é diagnosticado clinicamente em ambas as espécies.
PATOGÊNESE:  Neoplasias benignas podem causar transposição de órgãos da cavidade abdominal cranial. Entretanto, na maioria dos casos essas alterações são subclínicas e geralmente o diagnóstico é estabelecido como achado acidental na
necropsia. Em casos raros, o crescimento da neoplasia pode obstruir o ducto pancreático e causar atrofia secundária do restante do pâncreas exócrino, levando à IPE. No caso de adenocarcinomas, pode ocorrer necrose do tumor, caso este
cresça além de seu suprimento sanguíneo. A necrose do tumor causa inflamação local, o que pode resultar em sinais clínicos de pancreatite. Neoplasias malignas podem se disseminar para órgãos vizinhos ou distantes.
ACHADOS CLÍNICOS:  O quadro clínico de cães e gatos com neoplasia do pâncreas exócrino é inespecífico e muitos casos permanecem subclínicos até os estágios tardios da doença. Alguns animais demonstram sinais clínicos sugestivos de
pancreatite. Icterícia obstrutiva pode ser observada caso ocorra obstrução do ducto biliar. Também há relatos de sinais clínicos relacionados com lesões metastáticas em alguns casos de adenocarcinoma pancreático e podem incluir fraqueza,
dor óssea ou dispneia. Recentemente, observou­se alopecia paraneoplásica em gatos com adenocarcinoma pancreático.
DIAGNÓSTICO:  Diversos achados inespecíficos, como neutrofilia, anemia, hipopotassemia, hiperbilirrubinemia, azotemia, hiperglicemia e aumento da atividade das enzimas hepáticas foram observados em cães e gatos com adenocarcinoma
pancreático.  Entretanto,  os  resultados  de  exames  de  sangue  de  rotina  podem  ser  irrelevantes.  Aumento  das  atividades  séricas  de  amilase  e  lipase  e  das  concentrações  de  TLI  e  PLI  não  é  comumente  observado  em  cães  e  gatos  com
adenocarcinoma pancreático, mas pode estar aumentado em ambas as espécies.
Os achados radiográficos também são inespecíficos na maioria dos casos. Achados anormais incluem redução do contraste do abdome cranial, sugerindo efusão peritoneal, transposição do baço caudalmente e sombreamento na região
pilórica. Em alguns casos, as radiografias abdominais sugerem uma massa abdominal cranial. Ultrassonografia abdominal geralmente mostra uma massa de tecido mole próxima ao pâncreas, mas em muitos casos, o prolongamento da
massa com o tecido pancreático não pode ser mostrado conclusivamente. As lesões neoplásicas nos órgãos vizinhos também podem ser confundidas com o pâncreas. Finalmente, animais com pancreatite grave podem apresentar imagem
ultrassonográfica de massa na região do pâncreas que não deve ser confundida com neoplasia pancreática.
Se há efusão peritoneal, uma amostra deve ser aspirada e submetida ao exame citológico. Entretanto, na maioria dos casos, células neoplásicas não se desprendem facilmente na efusão peritoneal e estas não são detectadas na citologia.
Aspiração com agulha fina ou biopsia transcutânea guiada por ultrassonografia pode ser uma tentativa quando massas suspeitas são vistas. Biopsia de massa pancreática guiada por ultrassonografia pode permitir o diagnóstico definitivo em
mais de 50% dos casos. Muitas vezes, o diagnóstico é estabelecido por necropsia ou laparotomia exploratória.
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  Adenomas pancreáticos são benignos e teoricamente não requerem tratamento, a menos que causem sinais clínicos. No entanto, uma vez que o diagnóstico final de adenocarcinoma pancreático geralmente é
estabelecido por meio de laparotomia exploratória, uma pancreatectomia parcial deve ser realizada mesmo em casos de suspeita de adenoma pancreático. Nestes casos o prognóstico é excelente. Adenocarcinomas pancreáticos geralmente
aparecem no estágio final da doença, sendo muito comum doença metastática no momento do diagnóstico tanto em cães quanto em gatos. Os locais comuns de metástase incluem fígado, linfonodos torácicos e abdominais, mesentério,
intestino e pulmões, mas também há relato de outros locais de metástase. Nos poucos casos em que lesões metastáticas não são identificadas no momento do diagnóstico, deve­se tentar a remoção cirúrgica do tumor, mas a retirada das
margens  cirúrgicas  quase  nunca  é  possível  e  os  proprietários  devem  ser  comunicados  sobre  isso.  Tanto  a  quimioterapia  quanto  a  radioterapia  têm  mostrado  pouca  eficácia  em  pacientes  humanos  e  veterinários  com  adenocarcinoma
pancreático. Logo, o prognóstico para cães e gatos com esta neoplasia é ruim.

 PANCREATITE
A pancreatite é a doença do pâncreas exócrino mais comum tanto em cães quanto em gatos. Pode ser aguda ou crônica, dependendo se a doença ocasionou ou não alterações permanentes do parênquima pancreático, principalmente atrofia
e/ou fibrose. Tanto a pancreatite aguda quanto crônica pode ser grave e estar associada à necrose pancreática e complicações sistêmicas. Logo, a diferenciação entre as duas formas tem pouco significado clínico.
ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA:  A maioria dos casos de pancreatite em cães e gatos é idiopática. No entanto, acredita­se que imprudência alimentar seja um fator de risco comum em cães. Traumatismo grave, como os que podem ocorrer
durante um acidente de trânsito ou em gatos com síndrome de elevação, pode causar pancreatite. Cirurgia é também considerada um fator de risco para pancreatite, embora agora, acredita­se que a maioria dos casos de pancreatite pós­
cirúrgica seja decorrente de hipoperfusão pancreática durante anestesia. Doenças infecciosas estão envolvidas, mas há pouca evidência de relação entre causa e efeito na maioria dos casos. Em cães, a pancreatite foi associada à infecção
com Babesia canis. Em gatos, Toxoplasma gondii e Amphimerus pseudofelineus e peritonite infecciosa felina são consideradas mais importantes.
Vários medicamentos causam pancreatite em pessoas, mas pouquíssimos foram confirmados em cães e gatos. Em geral, a maioria das drogas deve ser vista como causas potenciais de pancreatite; possivelmente as mais prováveis são
anticolinesterásicos, cálcio, brometo de potássio, fenobarbital, L­asparaginase, estrógeno, salicilatos, azatioprina, diuréticos tiazinas e alcaloides da vinca.
Por fim, diversas lesões podem ocasionar pancreatite por um mecanismo comum. A secreção de suco pancreático diminui durante os estágios iniciais da pancreatite. Em seguida, há acúmulo tanto de grânulos de zimogênio quanto de
lisossomos, levando à ativação do tripsinogênio em tripsina. A tripsina, por sua vez, ativa mais tripsinogênio e também outros zimogênios. As enzimas digestivas ativadas prematuramente causam lesão local do pâncreas exócrino com
edema, sangramento, inflamação e necrose pancreática, além de necrose de gordura peripancreática. O processo inflamatório também provoca recrutamento de leucócitos e produção de citocinas. As enzimas ativadas e, principalmente, as
citocinas  circulam  na  corrente  sanguínea  e  causam  complicações,  como  inflamação  generalizada,  CID,  lipodistrofia  disseminada,  encefalopatia  pancreática,  hipotensão,  insuficiência  renal,  insuficiência  pulmonar,  miocardite  ou  mesmo
insuficiência múltipla de órgãos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos mais comuns observados em cães com pancreatite grave são anorexia (91%), vômito (90%), fraqueza (79%), dor abdominal (58%), desidratação (46%) e diarreia (33%). Os sinais clínicos em gatos
com pancreatite grave são ainda menos específicos; os mais comumente observados incluem anorexia (87%), letargia (81%), desidratação (54%), perda de peso (47%), hipotermia (46%), vômito (46%), icterus (37%), febre (19%) e dor
abdominal (19%). A baixa taxa de dor abdominal observada é notável, uma vez que > 90% dos pacientes humanos com pancreatite relatam tal sintoma.
DIAGNÓSTICO:  Histórico de imprudência alimentar associado a vômitos e dor abdominal pode sugerir pancreatite em cães, mas a maioria dos gatos apresenta histórico e sinais clínicos inespecíficos. Os achados hematológicos e o perfil
bioquímico sérico podem sugerir uma doença inflamatória, mas são inespecíficos. Em cães, é comum trombocitopenia e neutrofilia com desvio à esquerda. Azotemia e aumento do teor de bilirrubina e das enzimas hepáticas são achados
comuns e inespecíficos, tanto em cães quanto em gatos. Radiografias abdominais podem revelar diminuição do detalhe da cavidade abdominal proximal e deslocamento de órgãos abdominais, mas estes achados também são inespecíficos e
um diagnóstico baseado apenas em achados radiográficos não é confiável. Caso utilizem­se vários critérios, a ultrassonografia abdominal é altamente específica para pancreatite, mas o aumento do pâncreas e acúmulo de líquido ao seu
redor,  isoladamente,  não  são  suficientes  para  o  estabelecimento  do  diagnóstico.  A  associação  de  aumento  do  pâncreas,  acúmulo  de  líquido  ao  seu  redor,  alterações  da  ecogenicidade  (redução  da  ecogenicidade  nos  casos  de  necrose
pancreática, aumento de ecogenicidade nos casos de fibrose sugerindo necrose lipídica peripancreática), e/ou massa pancreática são altamente específicos para pancreatite. Deve­se ter cuidado para não superestimar os achados, uma vez que
equipamentos modernos de ultrassonografia têm resolução muito alta e hiperplasia nodular pancreática pode levar a alterações na ecogenicidade sugerindo, falsamente, a presença de pancreatite. Ainda, a sensibilidade da ultrassonografia
abdominal depende muito do operador, alcançando sensibilidade tão elevada quanto 35%, em gatos, e 68%, em cães, nas mãos mais experientes.
Diversos marcadores diagnósticos de pancreatite foram avaliados em cães e gatos. As atividades séricas de amilase e lipase têm utilidade clínica limitada em cães e nenhuma em gatos. Em cães, um teste para análise semiquantitativa da
imunorreatividade da lipase pancreática sérica (SNAP cPL®) está disponível. Resultado negativo neste teste sugere que é pouco provável que haja pancreatite. Resultado positivo sugere pancreatite e deve­se examinar uma amostra de soro
para a mensuração da imunorreatividade da lipase pancreática sérica canina (ILPc, agora mensurada por um teste comercial, Spec cPL®), para confirmar o diagnóstico e determinar a concentração basal. Isto permite o uso da concentração
de ILPc sérica como ferramenta de monitoramento da doença. Tanto em cães quanto em gatos, a concentração sérica de ILP (mensurada em cães pelo Spec cPL® e em gatos pelo Spec fPL®) é extremamente específica quanto à função do
pâncreas exócrino; também, é o teste diagnóstico atualmente disponível mais sensível para pancreatite (sensibilidade > 80%).
Também, pode­se utilizar laparotomia exploratória para o diagnóstico definitivo de pancreatite. No entanto, mesmo que a presença de pancreatite pareça óbvia (p. ex., congestão pancreática pode ser confundida com pancreatite no exame
macroscópico), deve­se coletar uma amostra por biopsia, uma vez que o diagnóstico definitivo de pancreatite requer a identificação de infiltrado inflamatório em exame histopatológico. É difícil excluir a possibilidade de pancreatite durante
a laparotomia exploratória. Em muitos casos, a pancreatite localiza­se apenas em um lobo do pâncreas e isto pode não ser notado quando uma única amostra por biopsia é coletada. Além disso, pacientes com pancreatite grave geralmente
apresentam alto risco anestésico e pode não haver justificativa para realização de laparotomia exploratória.
TRATAMENTO:  A base da terapia da pancreatite grave é o tratamento de suporte com fluidoterapia, monitoramento rigoroso e intervenção precoce para evitar complicações sistêmicas. Nos poucos casos nos quais a etiologia é conhecida, a
terapia específica contra a causa incitante pode ser instituída. O valor dos antibióticos é questionável e não devem ser utilizados rotineiramente. Descanso do pâncreas exócrino é apenas sugerido se o paciente vomitar incontrolavelmente
(ver p. 519). Deve­se presumir que exista dor abdominal e essa deve ser tratada até que ocorra evidência contrária. Meperidina e butorfanol intermitentes podem ser utilizados em pacientes com dor abdominal discreta a moderada. Pacientes
com dor intensa são tratados frequentemente com infusão em taxa de infusão contínua de fentanila, cetamina ou lidocaína. A administração de plasma parece auxiliar em casos graves de pancreatite em cães. Deve ser fornecido diariamente
até que a melhora seja significativa ou efeitos adversos sejam observados. Muitos outros tratamentos têm sido testados em cães, gatos e pessoas, mas infelizmente nenhum se mostrou útil.
Pacientes com formas leves de pancreatite devem ser avaliados cuidadosamente quanto à presença de fatores de risco (p. ex., hipertrigliceridemia, hipercalcemia, histórico de medicação que causa pancreatite) e doenças concomitantes (p.
ex.,  colangite  ou  hepatite,  doença  inflamatória  intestinal  ou  diabetes  melito).  Em  cães,  refeições  à  base  de  ração  com  teor  de  lipídios  muito  baixo  são  cruciais  para  o  sucesso  do  tratamento.  Em  gatos,  uma  dieta  com  teor  lipídico
moderadamente baixo é recomendada. Fármacos antináusea são úteis aos animais que não conseguem se alimentar devido às náuseas.
Se o paciente não responde à terapia, um teste com prednisona ou prednisolona pode ser realizado. Porém, o uso indiscriminado de glicocorticoides nesses pacientes deve ser desaconselhado.
O prognóstico é bom em casos leves de pancreatite, mas é ruim em casos graves, tanto em cães quanto em gatos. O desafio é a identificação precoce de casos graves durante o curso da doença e a prevenção de complicações nesses
animais.

 PSEUDOCISTO PANCREÁTICO
Pseudocisto  pancreático  é  uma  coleção  de  fluido  pancreático  estéril  revestida  por  uma  parede  de  tecido  fibroso  ou  granulomatoso;  também,  estas  estruturas  são  consideradas  como  complicações  da  pancreatite.  Recentemente,  foram
descritos diversos casos de pseudocistos pancreáticos em cães e gatos. Em geral, os sinais clínicos são inespecíficos e semelhantes aos da pancreatite. O sintoma mais consistente em cães e gatos é vômito. Em alguns casos, uma massa pode
ser palpada no abdome cranial. Na ultrassonografia abdominal, pode­se identificar uma estrutura cística bem próxima ao pâncreas. A aspiração do pseudocisto é relativamente segura e deve ser uma tentativa com objetivo diagnóstico e
terapêutico.  O  líquido  oriundo  de  um  pseudocisto  pancreático  deve  conter  poucas  células  e  não  deve  haver  evidência  de  inflamação.  Pseudocistos  pancreáticos  podem  ser  tratados  cirurgicamente  ou  com  medicamentos.  O  tratamento
medicamentoso envolve aspiração percutânea guiada por ultrassonografia e monitoramento do tamanho do pseudocisto. Deve­se indicar um procedimento cirúrgico em animais com sinais clínicos persistentes ou quando os pseudocistos não
regridem ao longo do tempo.

PARASITOS GASTRINTESTINAIS DE PEQUENOS ANIMAIS

 ACANTOCÉFALOS (Vermes de cabeça espinhosa)

Macracanthorhynchus sp
Macracanthorhynchus ingens, um parasito natural de guaxinins, é ocasionalmente encontrado em cães. Geralmente nota­se um verme enrugado, branco e comprido (8 a 12 cm), nas fezes. Nenhum sinal clínico foi associado à infecção. O
ciclo  biológico  requer  um  inseto  diplópodo  como  hospedeiro  intermediário,  mas  outros  animais  podem  servir  como  hospedeiros  paratênicos.  Os  ovos  parecem  aqueles  de Oncicola  canis,  mas  são  maiores  (cerca  de  50  ×  100  μm).  O
diagnóstico de infecções patentes é improvável, pois as infecções experimentalmente induzidas não persistem após 1 a 12 dias de patência. Tratamento não é necessário.

Oncicola sp
Oncicola canis raramente é encontrado no intestino delgado de cães e gatos, no ocidente. São brancos e possuem cerca de 12 mm de comprimento e suas cabeças com espinhos ficam incrustadas na mucosa. As fêmeas põem ovos marrons,
de casca espessa, embrionados, ovais e largos (45 × 65 μm). O ciclo biológico não é completamente conhecido, mas acredita­se que inclua um hospedeiro intermediário artrópode e hospedeiros paratênicos, como perus ou tatus. A maioria
das infecções não causa sinais clínicos.

 ANCILÓSTOMOS
Ancylostoma caninum é a causa principal de ancilostomíase canina na maioria das áreas tropicais e subtropicais do mundo. A. tubaeforme, de gatos, possui distribuição semelhante, porém mais escassa. A. braziliense, de gatos e cães, se
distribui escassamente da Flórida a Carolina do Norte, nos EUA. É também encontrado nas Américas Central e do Sul e na África. Uncinaria stenocephala é o principal ancilóstomo canino nas regiões mais frias; trata­se do ancilóstomo
canino do Canadá e da fronteira norte dos EUA, onde é primariamente um parasito de raposas. U. stenocephala também acomete gatos. Os machos de A. caninum têm cerca de 12 mm de comprimento e as fêmeas, 15 mm; as outras espécies
são um pouco menores. As larvas infectantes dos ancilóstomos caninos, particularmente de A. braziliense, podem penetrar e se mover sob a pele do homem e causar uma condição conhecida como larva migrans cutânea.
Os ovos alongados (> 65 μm) e de parede fina dos ancilóstomos nos estágios de clivagem iniciais (2 a 8 células) são eliminados nas fezes, pela primeira vez, 15 a 20 dias após a infecção; completam a fase de embrião e eclodem em 24 a
72 h, em solo quente e úmido. A transmissão pode resultar da ingestão de larvas infectantes do ambiente ou, no caso de A. caninum, do colostro ou leite de cadelas infectadas. As infecções por A. caninum ou A. braziliense também podem
resultar da invasão larval através da pele, mas essa via tem pouca importância no caso de U. stenocephala. Em filhotes de cães, a penetração cutânea é seguida de migração das larvas, através do sangue, para os pulmões, onde são expelidas
por tosse e engolidas, para se tornar verme adulto no intestino delgado. No entanto, nos animais com > 3 meses de idade, as larvas de A. caninum, após migração através dos pulmões, ficam retidas nos tecidos somáticos. A parada de
desenvolvimento também pode ocorrer na mucosa do intestino delgado. Essas larvas latentes são ativadas após remoção dos vermes adultos do intestino ou durante a prenhez, quando se acumulam nas glândulas mamárias.
ACHADOS  CLÍNICOS:   Em  filhotes  de  cães,  anemia  normocítica  normocrômica  aguda,  seguida  de  anemia  microcítica  hipocrômica,  é  a  manifestação  clínica  característica  e  frequentemente  fatal  de  infecção  por  A.  caninum.  Os  filhotes
sobreviventes desenvolvem baixa imunidade e exibem menos sinais clínicos. Entretanto, os animais debilitados e desnutridos podem continuar a definhar e manter anemia crônica. Os cães adultos e bem nutridos podem abrigar alguns
vermes  sem  exibir  sinais  clínicos;  representam  séria  preocupação  como  fonte  de  infecção  direta  ou  indireta  de  filhotes.  Nas  infecções  graves  nota­se  diarreia  com  fezes  escuras.  Na  doença  crônica,  desenvolvem–se  anemia,  anorexia,
emaciação e fraqueza.
Lesões: A anemia se deve diretamente da sucção de sangue e das úlceras hemorrágicas que ocorrem quando A. caninum muda de locais de alimentação. Estimou­se que a quantidade de perda sanguínea devido a um único verme, em 24 h, é
de até 0,1 ml. Na ancilostomíase não complicada, não há interferência na eritropoese. O fígado e outros órgãos podem parecer isquêmicos, com um grau discreto de infiltração hepática gordurosa. Enterite hemorrágica com mucosa intestinal
edemaciada e úlceras pequenas e vermelhas e com vermes aderidos normalmente é observada em casos agudos e fatais. A. braziliense, A. tubaeforme, tampouco U. stenocephala são hematófagos ávidos e raramente causam anemia. No
entanto, hipoproteinemia é característica e o extravasamento de soro ao redor do local de fixação no intestino pode reduzir o teor sanguíneo de proteínas em > 10%.
Pode ocorrer dermatite devido à invasão cutânea da larva por qualquer ancilóstomo, mas é observada mais frequentemente nos espaços interdigitais no caso de infecção por U. stenocephala. Podem ocorrer pneumonia e consolidação
pulmonar no caso de infecções graves em filhotes.
DIAGNÓSTICO:  Os ovos de casca fina e ovais característicos são facilmente observados no exame de flotação de fezes frescas de cães e gatos infectados (Ancylostoma spp: 52 a 79 × 28 a 58 μm; Uncinaria sp: 71 a 92 × 35 a 58 μm). Podem­
se observar anemia aguda e morte decorrentes de infecções adquiridas pelo leite em filhotes de cães, antes dos ovos serem eliminados nas fezes, ou seja, com até 1 a 2 semanas de idade.
TRATAMENTO E CONTROLE:  As cadelas devem estar livres de ancilóstomos antes do acasalamento e devem ser mantidas fora de áreas contaminadas durante a prenhez. As cadelas devem parir e amamentar os seus filhotes em recintos
higienizados. Em locais de clima quente, são melhores cercados de concreto que podem ser lavados no mínimo 2 vezes/semana. Os cercados de areia ou de argila exposta ao sol podem ser descontaminados com borato de sódio (1 kg/2 m2).
Em cães, as drogas e associações a seguir são aprovadas para o tratamento de infecções por A. caninum e U. stenocephala: fembendazol, moxidecitina, nitroscanato e pirantel. A milbemicina também é aprovada para o tratamento de
infecções por A. caninum (Tabela 9). No caso de anemia grave, pode ser necessário incluir transfusão sanguínea ou suplementação com ferro na terapia, seguida de dieta rica em proteínas até que o teor de Hg esteja normal. A prevenção de
ancilostomíase com milbemicina ou milbemicina/lufenuron também controla A. caninum, enquanto pirantel/ivermectina, ivermectina/pirantel/praziquantel controla A. caninum e U. stenocephala. Medicamentos preventivos de infecções por
ancilóstomos contendo pirantel também são efetivos contra A. braziliense (Tabela 9) e são aprovados para esse propósito. Finalmente, a formulação injetável de moxidectina para prevenção de ancilostomíase em cães também tem eficácia
significativa nas infecções por A. caninum e U. stenocephala por, no mínimo, 3 meses.
Em  gatos,  as  drogas  aprovadas  para  o  tratamento  de  A.  tubaeforme  incluem  emodepsídeo,  fembendazol,  ivermectina,  milbemicina,  moxidectina,  pirantel  e  selamectina  (Tabela  9).  A  prevenção  de  ancilostomíase  com  ivermectina,
milbemicina, milbemicina/praziquantel, moxidectina/imidacloprida ou selamectina controlam A. tubaeforme, enquanto a ivermectina também controla A. braziliense (Tabela 10).
Tabela 9 – Fármacos com ação comprovada contra helmintos intestinais de cães aprovados nos EUA e no Reino Unido (Continuacão)
Tabela 9 – Fármacos com ação comprovada contra helmintos intestinais de cães aprovados nos EUA e no Reino Unido

Fármaco/Combinação Dose (mg/kg) Via de Administração Contra Helminto Ativoa

APROVADOS APENAS NOS EUA

Diclorofeno 220 VO Dipylidium caninum, Taenia pisiforms


Fembendazol 50, 1 vez/dia, por 3 dias VO Toxocara canis, Toxocaris leonina, Ancylostoma caninum, Uncinaria stenocephala, Trichuris vulpis, T pisiformis

Epsiprantel 5,5 VO D caninum, T pisiformis


Milbemicina oxima 0,5 VO T canis, T leonina, A caninum, T vulpis

Moxidectina 0,17 SC A caninum, U stenocephala


Piperazina (vários sais) 47 a 133b VO T canis, T leonina

Praziquantel 5 a 12,5 VO D caninum, T pisiformis, E granulosus C, E multilocularis C


5 a 11,4 SC, IM D caninum, T pisiformis, E granulosus C, E multilocularis C

Palmoato de pirantel 5 (10 para cães < 2,3 kg) VO T canis, T leonina, A caninum, U stenocephala


Ivermectina + palmoato de pirantel 0,006/5 VO T canis, T leonina, A caninum, A braziliense, U stenocephala

Praziquantel + palmoato de pirantel 5/5 VO T canis, T leonina, A caninum, A braziliense, U stenocephala, D caninum, T pisiformis


Praziquantel + palmoato de pirantel + febantel 5/5/25 VO T canis, T leonina, A caninum, U stenocephala, T vulpis, D caninum, T pisiformis, E granulosus, E multilocularis

Praziquantel + palmoato de pirantel + ivermectina 5/5/0,006 VO T canis, T leonina, A caninum, A braziliense, U stenocephala, T vulpis, D caninum, T pisiformis

APROVADOS APENAS NO REINO UNIDO

Fembendazol 100 VO T canis, T leonina, Ancylostoma spp, Uncinaria spp, Trichuris spp, Taenia spp

50, 1 vez/dia, por 3 dias VO T canis, T leonina, Ancylostoma spp, Uncinaria spp, Trichuris spp, Taenia spp
Nitroscanato 50 VO T canis, T leonina, A caninum, U stenocephala, D caninum, T pisiformis, Taenia hydatigena, E granulosus d

Praziquantel 5 VO D caninum, T pisiformis, Taenia multiceps, T hydatigena, T ovis, E granulosus, E multilocularis
3,5 a 7,5 SC IM D caninum, T pisiformis, E granulosus, E multilocularis

Selamectina 6 tópica T canis

Febantel + embonato de pirantel 15/14,4 VO T canis, A caninum, T vulpis


Milbemicina oxima + praziquantel 0,5/5 VO T canis, T leonina, A caninum, T vulpis, D caninum, Taenia spp, E granulosus, E multilocularis, Mesocestódios spp

Praziquantel + palmoato de pirantel + febantel 5/14,4/15 VO T canis, T leonina, A caninum, T vulpis, D caninum, Taenia spp, E granulosus, E multilocularis


Praziquantel + emboato de pirantel + emboato de oxantel 5/5/20 VO T canis, T leonina, A caninum, U stenocephala, T vulpis, D caninum, Taenia spp

APROVADO TANTO NOS EUA E NO REINO UNIDO

Milbemicina oxima + lufenuron 0,5/10 VO T canis, T leonina, A caninum, T vulpis


Moxidectina + imidacloprida 2,5/10 tópica T canis, T leonina, A caninum, U stenocephala, T vulpis
a  Muitos desses fármacos são também aprovados para uso no tratamento de infcções por outros tipos de parasitos (p. ex., pulgas, nematoides) não listados aqui.

b  Repetir após 1 a 20 dias.

c Apenas alguns produtos.

d  Auxilia no controle.
Tabela 10 – Fármacos para helmintos intestinais de gatos aprovados nos EUA e no Reino Unido

Fármaco/Combinação Dose (mg/kg) Via de Administração Contra Helminto Ativoa

APROVADOS APENAS NOS EUA

Epsiprantel 2,75 VO Dipylidium caninum, Taenia taeniaeformis

Ivermectina 0,024 VO Ancylostoma tubaeforme, A braziliense


Milbemicina oxima 2 VO Toxocara cati, A tubaeforme

Piperazina (vários sais) 47 a 103b VO T catic, Toxascaris leonina


Praziquantel 4,6 a 10 VO D caninum, T taenaeformis

5 a 10 SC, IM D caninum, T taenaeformis


Praziquantel + palmoato de pirantel 5/20 VO T cati, A tubaeforme, D caninum, T taeniaeformis

APROVADOS APENAS NO REINO UNIDO

Fembendazol 50, 1 vez/dia, por 3 dias; VO T cati, T leonina, A tubaeforme, A braziliense, Uncinaria stenocephala, Taenia spp


100
Praziquantel 5 VO D caninum, T taeniaeformis, Echinococcus multilocularis c

8 tópica D caninum, Taenia spp, E multilocularis
3,5 a 7,5 SC, IM D caninum, T taeniaeformis, Echinococcus multilocularis c

Milbemicina oxima + Praziquantel 2/5 VO T cati, A tubaeforme, D caninum, Taenia spp, E multilocularis


Praziquantel + palmoato de pirantel 5/57,5 VO T cati, T leonina, D caninum, T taeniaeformis

APROVADO NOS EUA E NO REINO UNIDO

Selamectina 6 tópica T cati, A tubaeforme


Emodepsídeo + praziquantel 3/12 Tópica T cati, A tubaeforme, D caninum, T taeniaeformis, T leoninad, E multilocularis d
Moxidectina + imidacloprida 1/10 tópica T cati, A tubaeforme
a  Muitos desses fármacos são também aprovados para uso no tratamento de infcções por outros tipos de parasitos (p. ex., pulgas, nematoides) não listados aqui.

b  Repetir após 1 a 30 dias.

c Apenas alguns produtos.

d  Apenas no Reino Unido.
Ovos de ancilóstomos. Ancylostoma (esquerda) e Uncinaria (direita). Cortesia do Dr. Andrew Peregrine e do Ontario Veterinary College.

Quando filhotes neonatos morrem devido a infecções por ancilóstomos, as ninhadas subsequentes da cadela devem ser tratadas contra A. caninum semanalmente por cerca de 12 semanas, com início na 2a semana de vida. Além disso, o
fembendazol (25 mg/kg, VO) administrado diariamente em cadelas prenhes, a partir do 40o dia de prenhez até o 2o dia após o parto, reduz significativamente a transmissão transmamária aos filhotes. De forma semelhante, o tratamento de
cadelas com ivermectina (0,5 mg/kg), em 2 aplicações (4 a 9 dias antes do parto e 10 dias após), tem o mesmo efeito (uso extrabula).

 FASCÍOLAS

Fascíolas Hepáticas
Nos  ductos  biliares  e  na  vesícula biliar  as  fascíolas  causam  fibrose  discreta  a  grave.  Foram  descritas  várias  espécies  de  trematódeos  distômicos  do  fígado  de  cães  e  gatos,  na  maior  parte  do  mundo.  As  infecções  leves  podem  passar
despercebidas; no entanto, na infecção grave os cães podem desenvolver fraqueza progressiva, culminando em exaustão completa, coma e morte. A seguir, são apresentados alguns trematódeos mais comumente encontrados.
Opisthorchis felineus é um parasito de ductos biliares e pancreáticos e de intestino delgado de cães e gatos que vivem no leste da Europa e em partes da Ásia. O. viverrini é encontrado em cães, bem como em gatos domésticos e silvestres
no Sudeste Asiático. Essas duas espécies são pequenas (9 × 2 mm) e alongadas. O ciclo biológico inclui alguns caramujos (Bithynia sp) e peixes ciprinídeos como hospedeiros intermediários. Uma espécie relacionada, Clonorchis sinensis, a
fascíola hepática oriental de humanos, também foi encontrada nos ductos biliares e pancreáticos de cães, gatos e outros animais. É maior que Opisthorchis spp. Os ovos operculados desses parasitos podem ser identificados nas fezes de
animais infectados.
A  presença,  a  longo  prazo,  dessas  fascíolas  no  ducto  biliar  causa  hiperplasia  epitelial  e  fibrose  da  parede  do  ducto.  Nos  casos  crônicos  e  graves  foram  observados  carcinoma  hepático  ou  pancreático.  O  tratamento  de  infecções
por Opisthorchis spp em cães pode ser realizado com fembendazol (200 mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 3 dias) ou praziquantel (20 mg/kg, VO, uma vez). O tratamento de infecções por C. sinensis em cães pode ser feito com praziquantel (30
mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 3 dias).
Platynosomum concinnum é uma fascíola pequena (6 × 2 mm) encontrada nos ductos biliares e pancreáticos de felídeos do sudeste dos EUA, Porto Rico e outras ilhas do Caribe, América do Sul, algumas ilhas do Pacífico e partes da
África. O ciclo biológico inclui o caramujo Sublima octona e um crustáceo (piolho­da­madeira), como hospedeiro intermediário, e algumas lagartixas, como hospedeiros paratênicos. Os gatos adquirem o parasito por meio da ingestão de
lagartixas  infectadas.  Em  casos  leves,  podem­se  observar  sinais  crônicos  vagos  de  definhamento.  No  entanto,  as  infecções  graves  podem  causar  a  síndrome  do  “envenenamento  por  lagartixa”,  que  se  caracteriza  por  anorexia,  vômitos
persistentes, diarreia e icterícia, que levam à morte. Têm–se utilizado com sucesso o tratamento com praziquantel (20 mg/kg, SC, uma vez ou 10 mg/kg VO, 1 vez/dia, por 3 dias; idealmente, ambos os protocolos devem ser repetidos 12
semanas depois), fembendazol (50 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, por 5 dias) e nitroscanato (100 mg/kg, uma vez, VO), embora estes medicamentos não sejam aprovados para esse fim. Pode ser necessária cirurgia de ductos biliares.
Metorchis albidus e M. conjunctus são duas fascíolas diminutas (5 × 1,5 mm) encontradas nos ductos biliares e na vesícula biliar de cães, gatos e outros carnívoros da América do Norte, Europa e nos países que compreendiam a União
das  Repúblicas  Socialistas  Soviéticas  (URSS).  Raramente  causam  algum  sinal  clínico  reconhecível.  Os  ovos  são  pequenos  (24  a  30  ×  13  a  16  μm)  e  o  ciclo  biológico  inclui  alguns  caramujos  de  água  doce  e  peixes  ciprinídeos  como
hospedeiros intermediários. O tratamento da infecção por Metorchis spp em cães pode ser feito com praziquantel (20 mg/kg, VO, uma vez).
Eurytrema procyonis é uma fascíola pequena (2,1 × 1 mm) comumente encontrada no ducto pancreático de guaxinins do leste dos EUA e, ocasionalmente, nos ductos pancreáticos e biliares e na vesícula biliar de gatos domésticos. A
infecção pode estar associada à perda de peso e vômito intermitente. Os ovos são de tamanho médio (45 a 53 × 29 a 36 μm) e o ciclo biológico envolve um caramujo terrestre e um segundo hospedeiro intermediário, que se acredita ser um
artrópode. O tratamento pode ser realizado com fembendazol (30 mg/kg VO, 1 vez/dia, por 6 dias) ou praziquantel/pirantel/febantel (5,8 mg de praziquantel e 5,8 mg de pirantel/kg e 28,8 mg de fenbatel/kg, VO, 1 vez/dia, por 5 dias),
embora não seja aprovado para esse fim.

Fascíolas Intestinais
Nanophyetus salmincola, a fascíola da “intoxicação por salmão” é um parasito oval e pequeno (0,5 × 0,3 mm) encontrado no intestino delgado de cães, gatos e muitos carnívoros silvestres do noroeste dos EUA, sudoeste do Canadá e na
Sibéria. Os ovos, que são eliminados nas fezes de hospedeiros infectados, são marrom­claros e indistintamente operculados, com uma formação circular pequena em um polo; medem 72 a 97 × 35 a 45 μm. O ciclo biológico inclui um
período de formação de embrião prolongado (3 meses). Os principais hospedeiros intermediários são caramujos encontrados em regiões endêmicas (p. ex., Oxytrema silicula, nos EUA). As cercárias desses caramujos penetram na pele de
peixes salmonídeos jovens e se encistam como metacercárias nos músculos e nos órgãos. Os cães e outros animais se infectam por meio da ingestão de carne de peixe infectado crua ou inapropriadamente preparada.
Como essas fascíolas se incrustam entre as vilosidades intestinais, a infecção com grande número delas pode causar enterite. No entanto, a maioria das infecções é complicada pela intoxicação por salmão causada por riquétsias, as quais a
fascíola transmite (ver p. 828). Praziquantel (20 a 30 mg/kg, VO, uma vez) e fembendazol (50 mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 10 a 14 dias) são tratamentos efetivos para cães.
Alaria alata, A. canis e outras Alaria spp são fascíolas pequenas (2 a 6 mm) geralmente encontradas no intestino delgado de cães, gatos, raposas, visons e carnívoros selvagens, no hemisfério ocidental, bem como na Europa, Austrália e
Japão. A parte anterior do corpo é achatada e a parte posterior é cônica. Os ovos são marrom­claros e razoavelmente grandes (98 a 134 × 62 a 68 μm). O ciclo biológico inclui caramujos de água doce (p. ex., Helisoma spp) como principais
hospedeiros intermediários. As cercárias saem dos caramujos e penetram em girinos e se tornam mesocercárias. Sapos, cobras e camundongos adquirem a infecção por meio da ingestão de girinos; as mesocercárias se transferem para os
tecidos e permanecem neste estágio do ciclo biológico. Cães e outros hospedeiros definitivos se infectam pela ingestão destes animais. As fascíolas jovens migram através de vários órgãos do hospedeiro definitivo, inclusive diafragma e
pulmões, antes de atingir o intestino delgado. Embora as fascíolas geralmente sejam consideradas não patogênicas, um grande número delas pode causar hemorragias pulmonares durante a migração ou enterite quando amadurecem no
intestino delgado. Essas fascíolas podem infectar as pessoas. As infecções podem ser tratadas com praziquantel, utilizando­se a dose aprovada para cestóideos (ver Tabela 11). No entanto, tal tratamento é extrabula.
As outras espécies de fascíolas, em geral não patogênicas, são encontradas ocasionalmente no intestino de cães, gatos e outros carnívoros. Incluem Heterophyes heterophyes, em alguns países do norte da África e da Ásia; Metagonimus
yokogawai, na Ásia; Cryptocotyle lingua, nos EUA, Canadá, Japão, Sibéria e Europa, e Apophallus donicum, na América do Norte e no leste da Europa. Os ciclos de vida incluem caramujos como principais hospedeiros intermediários e
peixes como segundos hospedeiros intermediários, nos quais as metacercárias se encistam.
Heterobilharzia  americana  é  encontrada  nas  veias  mesentéricas  de  cães  e  animais  silvestres  do  sudeste  dos  EUA.  Os  ovos  passam  através  dos  tecidos  intestinais  para  o  lúmen  e  são  eliminados  nas  fezes.  A  partir  de  caramujos,
hospedeiros intermediários, as cercárias escapam para a água e penetram na pele de cães e outros hospedeiros definitivos, migram para o fígado, amadurecem e se transferem para os vasos mesentéricos. Formam­se granulomas ao redor dos
ovos, na parede do intestino, no fígado e em outras partes do corpo. Nas infecções graves, podem­se desenvolver enterite e emaciação. Às vezes, ocorre “dermatite aquosa” quando as cercárias penetram na pele. Os ovos não flutuam
facilmente e, se colocados na água, eclodem dentro de minutos; portanto, um método de sedimentação utilizando solução salina 0,85% é útil na separação dos ovos da ingesta. Em cães infectados, os ovos são eliminados intermitentemente,
de forma que, em determinado dia, podem não ser encontrados nas fezes. Fembendazol, na dose de 40 mg/kg VO, 1 vez/dia, por 10 dias, é um tratamento efetivo. O praziquantel, em doses preconizadas, também parece ser efetivo. Ambas
as indicações são extrabula.

 NEMATOIDES (Tricuríase)
Trichuris vulpis adultos têm 45 a 75 mm de comprimento e uma porção anterior delgada e longa, com terço posterior espesso. Habita comumente o ceco e o cólon de cães, onde se aderem firmemente à parede, com sua extremidade anterior
incrustada na mucosa. Os ovos de casca espessa com opérculos bipolares são eliminados nas fezes e se tornam infectantes em 1 a 2 meses, em ambiente úmido e quente. Embora os ovos possam permanecer viáveis em um ambiente
apropriado por até 5 anos, eles são suscetíveis à dessecação. O ciclo biológico é direto. Após ingestão dos ovos infectantes, as larvas eclodem e se desenvolvem na parede do íleo distal, ceco e cólon e os adultos amadurecem em cerca de 11
semanas. Eles podem permanecer neste local por até 16 meses.
Em infecções leves, não se observa qualquer sinal, mas à medida que aumenta a carga parasitária e a reação inflamatória (e, ocasionalmente, a hemorragia) no ceco, ficam evidentes perda de peso e diarreia. Pode­se notar sangue vivo nas
fezes de cães intensamente infectados e, às vezes, ocorre anemia.
Raramente observam­se infecções por Trichuris em gatos nas Américas do Norte e do Sul e no Caribe, mas ocasionalmente podem estar associadas a sinais clínicos semelhantes aos descritos em cães.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Os ovos são suscetíveis à dessecação; portanto, por meio da manutenção de limpeza e da eliminação de áreas úmidas, pode­se reduzir consideravelmente o risco de infecção em cães, embora o controle das
infecções por T. vulpis possa ser difícil. Quanto ao tratamento anti­helmíntico em cães, os compostos aprovados incluem febantel, fembendazol, milbemicina, moxidectina (tópica) e oxantel (Tabela 8). O tratamento deve ser repetido 3
vezes, com intervalos de 1 mês, devido ao longo período pré­patente. Finalmente, milbemicina, milbemicina/lufenuron, milbemicina/praziquantel e moxidectina/imidacloprida, quando administradas para a prevenção de ancilostomíase,
também são aprovados para o controle de infecções por T. vulpis.
Não há terapia efetiva contra infecções por Trichuris em gatos. Se necessário, o tratamento deve ser realizado com base em dados experimentais com uso de compostos com ação comprovada contra T. vulpis.

 OLLULANUS SP
Ollulanus tricuspis é um verme pequeno, com = 1 mm de comprimento, que infecta várias espécies animais, tipicamente gatos e outros felídeos e, ocasionalmente, induz gastrite erosiva ou catarral discreta em gatos. Vômito minutos a
poucas horas após alimentação é um sinal comum. As fêmeas são vivíparas; logo, as infecções maciças podem se desenvolver endogenamente. A transmissão é pelo vômito. O diagnóstico é feito por meio de constatação microscópica da
larva (cerca de 500 μm) ou de vermes adultos no vômito ou no conteúdo estomacal. O uso de um aparato de Baermann permite a separação dos vermes da ingesta, sendo mais fácil observá­los. Os parasitos são raramente vistos nas fezes,
uma  vez  que  normalmente  são  digeridos  antes  de  serem  eliminados.  Em  gatos,  há  relato  de  eficácia  terapêutica  com fembendazol  (20  a  50  mg/kg,  VO,  1  vez/dia,  por  3  dias)  e  levamisol  (5  mg/kg,  SC,  uma  única  vez),  embora  estes
medicamentos não sejam aprovados.

PHYSALOPTERA SPP (Verme do estômago)
Há várias espécies desses nematoides gástricos de cães e gatos em todo o mundo. Em geral, encontram­se firmemente aderidos à mucosa gástrica ou duodenal. Os machos têm cerca de 30 mm e as fêmeas cerca de 40 mm de comprimento.
Os ovos têm 42 a 53 × 29 a 35 μm, uma casca espessa, são ovais e contêm larvas.
As larvas infectantes encistadas de Physaloptera spp são encontradas em várias espécies de insetos, inclusive besouros, baratas e grilos. Os camundongos e as rãs podem ser portadores paratênicos. Após o hospedeiro intermediário ou
paratênico ser ingerido pelo cão ou gato, o desenvolvimento da larva em forma adulto é direto. Embora a maioria das infecções sejam subclínicas, esses parasitos podem causar gastrite e, em consequência, vômitos, anorexia e fezes escuras.
Áreas hemorrágicas e ulceradas permanecem na mucosa gástrica quando os parasitos se movem para outros locais; em infecções graves, podem ocorrer anemia e perda de peso. Gastroscopia é o meio de diagnóstico mais eficiente e os
vermes imaturos frequentemente são encontrados no vômito de filhotes de cães e gatos. É difícil encontrar ovos nas fezes, pois eles não flutuam facilmente; os ovos são melhor detectados por sedimentação fecal. Em gatos, podem­se
utilizar pamoato de pirantel (5 mg/kg VO, 2 doses com intervalo de 2 a 3 semanas; 20 mg/kg VO, uma única vez) e ivermectina (0,2 mg/kg SC, ou VO, 2 doses com intervalo de 2 semanas) para infecções por Physaloptera. Em cães,
podem–se utilizar fembendazol (50 mg/kg VO, 1 vez/dia, por 3 dias), pamoato de pirantel (5 mg/kg, VO, 2 doses com intervalo de 2 a 3 semanas; 15 mg/kg, VO, 2 doses com intervalo de 2 a 3 semanas; 20 mg/kg, VO, uma única vez) e
ivermectina (0,2 mg/kg SC ou VO, 2 doses com intervalo de 2 semanas). Nenhum desses medicamentos é aprovado para o tratamento de Physaloptera em cães e gatos.

 SPIROCERCA LUPI (Verme do esôfago)
Spirocerca lupi adulto é um verme vermelho–brilhante, de 40 (macho) a 70 mm (fêmea) de comprimento, que se localiza geralmente em nódulos nas paredes de esôfago, estômago ou aorta. A espirocercose é observada no sul dos EUA,
bem como na maioria das regiões tropicais do mundo. Os cães são infectados por meio da ingestão de um hospedeiro intermediário (geralmente besouro coprofágico) ou de um hospedeiro de transporte (p. ex., galinhas, répteis ou roedores).
As larvas migram através da parede da artéria celíaca para a aorta torácica, onde geralmente permanecem por cerca de 3 meses. Os ovos são eliminados nas fezes cerca de 5 a 6 meses após a infecção.
ACHADOS  CLÍNICOS:   A  maioria  dos  cães  com  espirocercose  não  exibe  sinais  clínicos.  Quando  a  lesão  esofágica  é  bastante  grande  (geralmente  quando  se  torna  neoplásica),  o  cão  apresenta  dificuldade  de  deglutição  e  pode  vomitar
repetidamente após tentar comer algo. Tais cães apresentam salivação abundante e, por fim, emaciação. Além disso, os cães podem apresentar espessamento dos ossos longos, característico de osteopatia hipertrófica. Esses sinais clínicos
são sugestivos de espirocercose com neoplasia associada, em locais onde o parasito é prevalente. Ocasionalmente, o cão morre subitamente como resultado de hemorragia maciça no interior do tórax após ruptura da aorta danificada pelos
vermes em desenvolvimento.
Lesões: As lesões características incluem aneurisma da aorta torácica, granulomas reativos de tamanho variável ao redor dos vermes no esôfago e exostose, que fazem ponte entre as faces ventrais de vértebra torácica. Sarcoma esofágico,
frequentemente  com  metástase,  às  vezes  está  associado  (aparentemente  de  forma  causal)  com  espirocercose,  particularmente  em  cães  de  caça.  Os  cães  com  sarcoma  relacionado  com  S.  lupi  desenvolvem,  frequentemente,  osteopatia
hipertrófica (p. 1295).
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico pode ser realizado mediante a constatação de ovos pequenos (11 a 15 × 30 a 37 μm) e alongados característicos (por meio de flotação em NaNO3 [densidade específica 1,360] ou flotação em açúcar), que

contêm larvas, nas fezes. No entanto, os ovos são eliminados esporadicamente nas fezes e podem ser difícil encontra­los. A gastroscopia ocasionalmente revela um nódulo ou verme adulto. Pode­se estabelecer um diagnóstico presuntivo
por exame radiográfico, quando este revela massas densas no esôfago; um estudo contrastado com bário positivo pode auxiliar na definição da lesão.
A maioria das infecções não é diagnosticada até a necropsia. Os granulomas variam significativamente em tamanho e localização no esôfago, mas geralmente são bem característicos para o diagnóstico, mesmo que já não haja vermes.
Podem­se encontrar vermes e granulomas nos pulmões, traqueia, mediastino, parede gástrica ou outro local anormal. Os aneurismas de aorta cicatrizados persistem por toda a vida do cão e são diagnósticos de infecção anterior. Quando o
sarcoma está associado à infecção, geralmente a lesão esofágica é maior e frequentemente contém cartilagem ou osso; quase sempre há metástases nos pulmões, linfonodos, coração, fígado ou rins.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Nas áreas endêmicas, deve­se evitar que os cães ingiram besouros coprofágicos, rãs, camundongos, lagartos etc.; sobras de carne de frango crua não devem ser oferecidas aos animais. O tratamento geralmente
não é prático. No entanto, há relato de eficácia da doramectina (0,2 mg/kg, SC, 3 doses, com intervalos de 2 semanas; 0,4 mg/kg, SC, 6 doses, com intervalos de 2 semanas; 0,5 mg/kg, SC, 2 doses com intervalo de 2 semanas; 0,8 mg/kg
SC, 2 doses com intervalo de 1 semana; tratamentos adicionais podem ser necessários) e ivermectina (0,6 mg/kg, SC, 2 doses com intervalo de 2 semanas) associadas à prednisolona (0,5 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, durante 2 semanas e, então,
com redução da dose), embora estes protocolos não sejam aprovados. A toxicidade raça­específica verificada para ivermectina em cães da raça Colly ou outros cães pastores também é notada com o uso de doramectina. A remoção cirúrgica
geralmente não é bem­sucedida, devido a amplas áreas do esôfago envolvidas.

 STRONGYLOIDES SP
Strongyloides stercoralis  é  um  nematoide  delgado  e  pequeno  que,  quando  totalmente  maduro,  mede  cerca  de  2  mm  e  localiza­se  na  base  da  vilosidade,  na  metade  anterior  do  intestino  delgado  de  cães  e  gatos.  Os  vermes  são  quase
transparentes e praticamente impossíveis de serem vistos macroscopicamente durante a necropsia. Geralmente, as infecções estão associadas a abrigo não higienizado, lotado, úmido e quente. A espécie mais frequentemente encontrada em
cães é idêntica à encontrada em pessoas.
Todos  os  vermes  infectantes  são  fêmeas.  Os  ovos  se  tornam  embrionados  rapidamente  e  a  maioria  das  larvas  se  desenvolve  antes  de  serem  eliminadas  nas  fezes.  Sob  condições  apropriadas  de  calor  e  umidade,  o  desenvolvimento
extracorporal  é  rápido.  O  terceiro  estágio  larval  pode  ser  atingido  em  pouco  mais  de  um  dia.  Algumas  dessas  larvas  se  desenvolvem  em  larvas  filariformes  infectantes;  outras  se  desenvolvem  em  vermes  de  vida  livre  que  acasalam  e
produzem  descendentes  semelhantes  à  fêmea  infectante.  As  larvas  filariformes  penetram  na  pele,  mas  também  podem  infectar  um  hospedeiro  via  cavidade  bucal.  A  transmissão  transmamária  é  possível.  Os  descendentes  podem  ser
eliminados nas fezes 7 a 10 dias após a infecção. A autoinfecção causada pelas larvas que se desenvolvem até o estágio infectante dentro do trato gastrintestinal pode resultar em infecções nas quais os cães eliminam as larvas por períodos
prolongados.
ACHADOS CLÍNICOS:  A constatação de sinais clínicos indica que uma infecção grave se desenvolveu por algumas semanas. Diarreia mucoide com estrias de sangue, geralmente observada em animais jovens criados em clima úmido e
quente, é característica. Emaciação frequentemente é marcante e a redução na taxa de crescimento pode ser um dos primeiros sinais. O apetite geralmente é bom e o cão permanece normalmente ativo nos estágios iniciais da doença. Na
ausência de infecções secundárias concomitantes, ocorre algum grau, ou nenhum, de febre. Geralmente, em estágios avançados, nota­se respiração rápida e superficial e pirexia e o prognóstico é grave. A autoinfecção pode ser induzida por
corticosteroides  ou  outros  fatores  que  afetam  a  imunocompetência.  Pode  haver  larvas  nos  tecidos  e  esses  cães  têm  maior  probabilidade  de  morrer.  Na  necropsia,  pode  haver  evidência  de  pneumonia  verminótica  com  áreas  amplas  de
consolidação nos pulmões, bem como enterite grave com hemorragia, descamação de mucosa e muita secreção de muco.
DIAGNÓSTICO:  As larvas de primeiro estágio (cerca de 380 μm) são identificadas por meio de exame microscópico direto de pequena quantidade de fezes. Geralmente, utiliza­se a técnica de Baermann para separar as larvas do material
fecal. É importante utilizar amostra de fezes frescas do cão infectado, de forma que as larvas possam ser facilmente diferenciadas das larvas de ancilóstomos ou nematoides de vida livre do solo. Ocasionalmente, os ovos (50 a 60 × 30 a 35
μm) podem ser identificados por exame de flotação de fezes frescas. As fêmeas adultas podem ser identificadas em esfregaço da mucosa do intestino delgado. Têm apenas cerca de 2 mm de comprimento, mas a presença de ovos no seu
útero facilmente as diferencia das larvas dos outros nematoides.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Higiene deficiente e mistura de cães suscetíveis com cães infectados podem ocasionar rápido desenvolvimento de infecção em todos os cães, em um canil ou cercado. Os cães com diarreia devem ser isolados,
imediatamente, dos cães aparentemente saudáveis. Luz solar direta, aumento da temperatura do solo ou da superfície e dessecação são prejudiciais para todos os estágios de larvas livres. Lavagem completa das superfícies de madeira e
impermeáveis com solução salina concentrada ou como vapor ou com solução de cal, seguida de enxágue com água quente, destroem efetivamente o parasito. Como a doença pode ser grave em pessoas, deve­se ter cuidado na manipulação
dos cães infectados. É muito mais provável que a doença no homem (bem como em cães) seja grave, se a pessoa está imunossuprimida.
As infecções em cães podem ser tratadas com ivermectina (0,2 mg/kg, SC ou VO, uma vez, com uma segunda dose após 4 semanas; 0,8 mg/kg, VO, em dose única), fembendazol (50 mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 5 dias, repetida 4 semanas
depois) ou tiabendazol (100 a 150 mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 3 dias, repetida semanalmente até que as larvas não sejam detectadas nas fezes – pode­se notar toxicidade com este protocolo). Em gatos, pode­se utilizar fembendazol (50
mg/kg, VO, 1 vez/dia, por 3 dias). Estes protocolos não são aprovados para cães, tampouco para gatos. Em todos os animais, deve­se examinar as fezes regularmente no mínimo 6 meses após o tratamento, para confirmar a eficácia.

 TÊNIAS (Cestóideos)
A maioria dos cães e gatos urbanos se alimenta de rações preparadas e tem acesso restrito a presas naturais. Tais animais podem adquirir Dipylidium caninum (a tênia canina de poros duplos) de pulgas. Gatos com acesso a camundongos e
ratos domésticos (ou ao ambiente externo) infectados também podem adquirir Taenia taeniaeformis. Os cães suburbanos, rurais e de caça têm mais acesso a vários mamíferos pequenos, além de carne e vísceras cruas oriundas de ungulados
domésticos e selvagens. Podem­se esperar vários cestóideos neste cães (ver Tabela 11). Nas pastagens de ovinos e onde qualquer ungulado e canídeo silvestre sejam comuns, os cães podem adquirir Echinococcus granulosus (a tênia do
cisto hidátido). E. multilocularis silvático (a tênia do cisto hidátido alveolar), antigamente conhecida apenas na região ártica da América do Norte, foi encontrada na vida selvagem do meio­oeste e do oeste dos EUA e do Canadá. O parasito
é também endêmico em várias partes da Europa Oriental, particularmente França, Alemanha e Suíça. Até hoje, as infecções em gatos ou cães são extremamente raras. Spirometra mansonoides é um parasito incomum (mas não raro) de
gatos e, ocasionalmente, de cães criados no leste e em áreas da Costa do Golfo da América do Norte.
O convívio com cães infectados pode resultar em infecção humana por metacestóideos de E. granulosus, E. multilocularis, Taenia multiceps, T. serialis ou T. crassiceps em vários tecidos (por meio da ingestão de ovos eliminados nas
fezes de cães), ou por D. caninum adulto no intestino (pela ingestão de pulgas infectadas). A presença de metacestóideos em animais de produção pode limitar o uso comercial de suas carcaças ou de partes não aproveitadas de uma rês
abatida. Dessa forma, os cestóideos de cães e gatos podem ter tanto importância econômica quanto de saúde pública (ver Tabela 12, p. 516).

Taenia sp em gato. Cortesia do Dr. Andrew Peregrine e do Ontario Veterinary College.
Os cestóideos adultos no intestino de cães e gatos raramente causam doença séria e os sinais clínicos, caso presentes, podem depender do grau de infecção, idade, condição e raça do hospedeiro. Os sinais clínicos variam de definhamento,
mal­estar, irritabilidade, apetite caprichoso e pelame eriçado, até cólica e diarreia discreta; raramente observam­se intussuscepção intestinal, emaciação e convulsões.
Echinococcus granulosus. Cortesia do Dr. Andrew Peregrine e do Ontario Veterinary College.
O diagnóstico baseia­se no achado de proglotes ou ovos nas fezes. Os ovos de Taenia spp e Echinococcus spp não podem ser diferenciados por exame microscópico. O exame microscópico direto das amostras de fezes e de flotação fecal
podem revelar ovos de Spirometra mansonoides que, às vezes, são confundidos com ovos de trematódeos, embora sejam maiores e possuam um opérculo que, frequentemente, é difícil de ver.
O controle das tênias de cães e gatos requer terapia e prevenção. Os animais que perambulam livremente em geral se reinfectam por meio da ingestão de metacestóideos em cadáver em decomposição ou em animais caçados. Dipylidium
caninum é diferente porque realizar seu ciclo em pulgas, que podem estar associadas à infecção de animais confinados.
Portanto, é necessário um diagnóstico preciso para uma medida efetiva que evite reinfecção.
O tratamento efetivo remove escólex aderidos no intestino delgado dos animais infectados (Ver Tabela 11 para tratamentos específicos aprovados). Em cães, fembendazol e praziquantel são aprovados para tratamento de Taenia spp (mais
que apenas T. pisiformis); diclorofeno, epsiprantel, nitroscanato e praziquantel são aprovados para tratamento de D. caninum; praziquantel é aprovado para tratamento de Echinococcus spp (Tabela 9). Em gatos, fembendazol e praziquantel
são aprovados para tratamento de Taenia spp (mais que apenas T. taeniformis); epsiprantel e praziquantel são aprovados para tratamento de D. caninum; praziquantel é aprovado para tratamento de E. multilocularis (Tabela 10).
Tabela 11 – Cestódios de cães e gatos na América do Norte
Cestódio Hospedeiro Hospedeiro Intermediário e Órgãos Infectadosa Características Diagnósticas do Verme Adulto Comentários Tratamento Aprovadob
Definitivo

Dipylidium caninum Cão, gato, Pulgas e mais raramente piolhos; livre nas cavidades corporais Estróbilo de 15 a 70 cm de comprimento e até 3 mm de largura Provavelmente a tênia mais comum Cães e gatos:


coiote, lobo, máxima, 30 a 150 ganchos rostelares em forma de espinho de em cães, menos frequente em diclorofeno, epsiprantel,
raposa, outros rosa, em 3 ou 4 círculos; ganchos grandes 12 a 15 μm; menores gatos; cosmopolita. Ocasionalmente praziquantel
canídeos e com 5 a 6 μm. Segmentos com forma semelhante à semente de infecta pessoas, em particular Apenas cães:
felinos pepino, com um poro próximo ao meio de cada margem lateral crianças nitroscanato, diclorofeno
selvagens

Taenia taeniaeformis Cão, gato, Vários ratos, camundongos e outros roedores; em grandes cistos Estróbilo de 15 a 60 cm de comprimento, 5 a 6 mm de largura Cestódio comum em gatos, raro em Gatos: epsiprantel,


lince, raposa e no fígado máxima, 26 a 52 ganchos rostelares em fileira dupla; ganchos cães; cosmopolita praziquantel,
outros animais grandes de 380 a 420 μm, ganchos pequenos de 250 a 270 μm fembendazol
de comprimento. Ausência de pescoço. Ramos laterais
saculados do útero de difícil contagem
Taenia pisiformis Cão, raposa, Coelhos e lebres, raramente esquilos e outros roedores; nas Estróbilo de 60 cm a 2 m de comprimento, 5 mm de largura Comum particularmente em cães de Cães: epsiprantel,
lobo, coiote e cavidades pélvicas ou peritoneais, aderidas às vísceras máxima, cerca de 34 a 48 ganchos rostelares em fileira dupla; caça, de fazenda e suburbanos que fembendazol,
outros animais ganchos grandes de 225 a 290 μm, ganchos pequenos de 132 a ingerem coelhos e suas vísceras praziquantel,
177 μm de comprimento. Cada lado do útero gravídeo possui 5 a nitroscanato, diclorofeno
10 ramos laterais

Taenia hydatigena Cão, lobo, Artiodáctilos domésticos e silvestres, raramente lebres e Estróbilo de até 5 m de comprimento e 7 mm de largura máxima; Em cães de fazenda, mais Cães: praziquantel,


coiote, furão, roedores; no fígado e na cavidade abdominal cerca de 26 a 44 ganchos rostelares em fileira dupla; ganchos raramente em cães de caça; nitroscanato,
raposa grandes de 170 a 220 μm, ganchos pequenos de 110 a 160 μm cosmopolita fembendazol
de comprimento. Cada lado do útero gravídeo possui 5 a 10
ramos laterais

Spirometra Gato, cão, Copépodos, rãs, roedores e cobras; tecido conjuntivo Estróbilo de 0,5 m de comprimento, 8 mm de largura máxima. Leste e Costa do Golfo, América do Ver texto para


mansonoides guaxinim e Escólex com 2 sulcos e sem ganchos. Poros genitais na linha Norte tratamento extrabula
lince vermelho média ventral do segmento

Diphyllobothrium spp Pessoas, cão, Encistado em vários órgãos ou livre na cavidade corporal de Estróbilo de até 10 m de comprimento, 20 mm de largura Canadá, Alasca e vários estados Ver texto para


gato e outros vários peixes máxima, mas geralmente menores. Escólex com 2 sulcos dos EUA, Sibéria e outras áreas tratamento extrabula
animais (bótrio) e sem ganchos. Poros genitais na linha média ventral do
piscívoros segmento

Echinococcus Cão, lobo, Ovinos, caprinos, bovinos, suínos, equinos, veados, alces, Estróbilo de 2 a 6 mm de comprimento com 3 a 5 segmentos; 28 Focos na América do Norte em Cães: praziquantel,


granulosus coiote, raposa, alguns roedores, ocasionalmente pessoas e outros animais; a 50 (geralmente 30 a 36) ganchos rostelares em fileira dupla; ovinos criados em pastagens e cães nitroscanato
e vários comumente no fígado e nos pulmões e, às vezes, em outros ganchos grandes de 27 a 40 μm, ganchos pequenos de 21 a 25 que convivem com eles; lobos
carnívoros órgãos e tecidos μm de comprimento silvestres ciclam onde esses
silvestres animais são encontrados;
provavelmente cosmopolita

Echinococcus Raposas do Roedores microtíneos e, eventualmente, pessoas; no fígado Estróbilo de 1,2 a 2,7 mm de comprimento com 2 a 4 Centro e Leste europeu, ex­URSS, Cães e gatos:


multilocularis Ártico, segmentos; é uma das menores tênias em cães juntamente com Alasca e centro­oeste dos EUA e praziquantel
vermelha e as espécies acima; 26 a 36 ganchos rostelares em fileira dupla; Canadá; até o momento não se
cinzenta; ganchos grandes de 23 a 29 μm, ganchos pequenos de 19 a 26 reconheceu ciclo significativo em
coiote, gato e μm de comprimento cães e gatos na América do Norte
cão

Mesocestódios spp Muitos Ciclo biológico completo é desconhecido; suspeita­se de Estróbilo de 10 cm de comprimento e 2 a 5 mm de largura. Observado em cães e gatos no Cães: praziquantel


canídeos, artrópodes como hospedeiros intermediários; tetratirídios juvenis Escólex com 4 ventosas, mas sem rostelos ou ganchos. Poro centro­oeste e oeste; em animais
felídeos e na cavidade abdominal e em outros locais, em vários mamíferos, genital ventral na linha média do verme. Segmentos gravídeos silvestres em diversos locais dos
mustelídeos aves e répteis; os tetratirídios provenientes da cavidade corporal com órgão parauterino EUA e Canadá
silvestres; dos cães podem penetrar no intestino através da parede
outros intestinal
animais,
inclusive
cão e gato

Taenia multiceps Cão, coiote, Ovinos, caprinos e outros ruminantes domésticos ou silvestres, Estróbilo de 40 a 100 cm de comprimento e até 5 mm de largura. Raro em carnívoros domésticos no Cães: diclorofeno,


raposa e lobo raramente em pessoas; quase sempre no cérebro e medula Escólex com 4 ventosas e 22 a 32 ganchos em fileira dupla; oeste da América do Norte; mais fembendazol
espinal ganchos grandes de 150 a 170 μm, ganchos pequenos de 90 a comum em animais silvestres
130 μm de comprimento. Vagina com curvatura reflexa próxima
ao canal excretório lateral; 9 a 26 ramos laterais no útero
gravídeo

Taenia serialis Cão, coiote, Coelhos, lebre, esquilo, raramente pessoas; no tecido conjuntivo Estróbilo de 20 a 72 cm de comprimento e 3 a 5 mm de largura; Principalmente em canídeos Semelhante ao


raposa e lobo subcutâneo ou retroperitoneal 26 a 32 ganchos em fileira dupla, ganchos grandes de 110 a 175 silvestres, considerado por alguns recomendado para T.
μm, ganchos pequenos de 68 a 120 μm de comprimento. Vagina como não distinto de T. multiceps multiceps
com curvatura reflexa próxima ao canal excretório lateral; 20 a 25
ramos laterais no útero gravídeo

Taenia crassiceps Cão, coiote, Vários roedores, eventualmente outros animais, poucos relatos Estróbilo de 70 a 170 mm de comprimento e 1 a 2 mm de Observado do Canadá e norte dos Semelhante ao


raposa e lobo em pessoas; subcutâneo e cavidades corporais largura. Escólex com 30 a 36 ganchos em fileira dupla; ganchos EUA, inclusive Alasca recomendado para T.
grandes de 158 a 187 μm, ganchos pequenos de 119 a 141 μm multiceps
de comprimento. Útero possui 16 a 21 ramos laterais, às vezes
tornando­se difuso

Taenia krabbei Cão, coiote, Alce, veado, rena; na músculos estriados Estróbilo cerca de 20 cm de comprimento e até 9 mm de largura. Observado do Canadá ou norte dos Semelhante ao


lobo e lince Escólex pequeno com 26 a 36 ganchos em fileira dupla; ganchos EUA, inclusive Alasca; considerado recomendado para T.
grandes de 146 a 195 μm, ganchos pequenos de 85 a 141 μm de por alguns como uma subespécie multiceps
comprimento. Útero gravídeo possui 18 a 24 ramos laterais de T. ovis
lineares e estreitos
Taenia ovis Cão, canídeos Ovinos e caprinos; nos músculos, raramente em outros locais Estróbilo de 45 a 110 cm de comprimento e até 4 a 8,5 mm de Ocasionalmente em cães de fazenda Para cães: praziquantel
silvestres largura. Escólex com 32 a 38 ganchos em fileira dupla; ganchos no oeste da América do Norte; (5 mg/kg, uma vez VO
grandes de 160 a 202 μm. Útero gravídeo possui 20 a 25 ramos cosmopolita ou SC; extrabula); caso
laterais. A vagina transpõe o ovário no lado do poro de segmento contrário, o mesmo
recomendado para T.
multiceps
a  Em todos os casos em que não se conhece o ciclo biológico, cães e gatos se infectam por meio da ingestão de animais (ou partes deles) que contenham o metacestoide infectante. Esses hospedeiros intermediários se infectam

mediante a ingestão de ovos de cestoides (exceto Mesocestoides spp, Spirometra e Diphyllobothrium spp, que têm um estágio extra no ciclo biológico), eliminados nas fezes do hospedeiro definitivo.
b  Ver Tabelas 9 e 10 para informações sobre dosagens dos medicamentos.

Aglomerado de ovos de Dipylidium. Cortesia do Dr. Andrew Peregrine e do Ontario Veterinary College.

O praziquantel, na dose de 7,5 mg/kg VO, por 2 dias consecutivos, é efetivo contra Diphyllobothrium sp, em cães. Além disso, dose única de 35 mg/kg VO, elimina D. latum de gatos infectados. Ambos os tratamentos são extrabula.
Infecções por Spirometra sp em gatos podem ser tratadas com dose única de 30 mg de praziquantel/kg, SC, IM ou VO. Mebendazol, na dose de 11 mg/kg VO, tem tido efetivo. Todos esses tratamentos são extrabula.

 VERMES REDONDOS
Os grandes vermes redondos (nematoides ascaridoides) de cães e gatos são comuns, especialmente em filhotes de cães e gatos. Das 3 espécies, Toxocara canis, Toxascaris leonina e Toxocara cati, a mais importante é T. canis, não só porque
suas larvas podem migrar no homem (como também fazem as larvas de T. cati), mas também porque podem ocorrer infecções fatais em cães jovens. T. leonina acomete cães adolescentes/adultos e gatos. Essas espécies também infectam
carnívoros selvagens, especialmente aqueles de zoológicos ou de outros tipos de cativeiro.
Em filhotes de cães, o modo de infecção usual por T. canis é a transferência transplacentária. Se filhotes < 3 meses de idade ingerem ovos embrionados infectantes, as larvas liberadas penetram na mucosa intestinal, atingem os pulmões
através da circulação sanguínea, inclusive hepática, sendo expelidas por tosse, engolidas e se desenvolvem em adultos que produzem ovos, no intestino delgado. No entanto, quando cães mais velhos ingerem ovos embrionados infectantes
de T. canis, as larvas são liberadas, penetram na mucosa intestinal e migram para o fígado, pulmões, músculos, tecido conjuntivo, rins e muitos outros tecidos, onde ocorre parada do desenvolvimento. Em cadelas prenhes, essas larvas
dormentes se ativam e migram para o feto em desenvolvimento; podem ser encontradas no intestino de filhotes de cão em até 1 semana após o nascimento. Algumas larvas migram para a glândula mamária, de forma que os filhotes também
podem se infectar pela ingestão de leite. Durante a fase perinatal, a imunidade da cadela à ascaríase é parcialmente suprimida e o animal pode eliminar número considerável de ovos nas fezes. O desenvolvimento destas infecções patentes
parece estar associado à maturação das larvas latentes na fêmea, que migram para o intestino através dos pulmões, e à ingestão e maturação das larvas eliminadas nas fezes de filhotes.
Após a ingestão de ovos infectantes, as larvas dos nematoides ascaridoides podem migrar para os tecidos de muitos animais e, desta forma, representa uma fonte de infecção alternativa, particularmente para gatos e carnívoros selvagens.
Tal migração também ocorre se a pessoa engole os ovos com larvas. A maioria das infecções humanas é assintomática, mas podem ocorrer febre, eosinofilia persistente e hepatomegalia (às vezes com envolvimento pulmonar), resultando
em uma condição conhecida como larva migrans visceral. Raramente, uma larva pode se instalar na retina e prejudicar a visão, resultando em uma condição conhecida como larva migrans ocular.
O  ciclo  biológico  de  T.  cati  é  semelhante  ao  de  T.  canis,  exceto  quando  não  ocorre  infecção  pré­natal.  No  caso  de  T.  leonina,  a  migração  se  restringe  à  parede  intestinal,  de  forma  que  não  ocorre  transmissão  pré­natal,  tampouco
transmamária.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A primeira indicação de infecção nos animais jovens é ausência de crescimento e perda de peso. Os animais infectados apresentam pelame opaco e frequentemente ficam com “barriga de pote”. Os vermes
podem ser eliminados no vômito e são quase sempre eliminados nas fezes. Nos estágios iniciais, as larvas migratórias podem causar pneumonia eosinofílica, que pode estar associada à tosse. Diarreia com muco pode ser evidente.

Tabela 12 – Cestódios com importância em Saúde Públicaa

Cestódio Hospedeiro do Verme Adulto Nome ou Metacestódio Medidas dos Metacestódios Principal Hospedeiro Intermediário Local do Metacestódio


Intermediário

Taenia saginata Apenas pessoas Cisticerco em carne de bovinos 9 × 5 mm Bovinos Músculo esquelético e cardíaco

Taenia solium Apenas pessoas Cisticerco em carne de suínos 6 a 10 × 5 a 10 mm Suinos, raramente cães (pessoasnos podem ser tanto Músculos esquelético e cardíaco,


hospedeiro definitivo quanto intermediário) ocasionalmente sistema nervoso

Diphyllobothrium spp Pessoas, cães, gatos e outros Procercoide em copépodos, 2 a 25 × 2,5 mm Copépodo, então peixe Tecidos mesentéricos, testículos, ovários e


animais psívoros plerocercoide em peixes músculos
Echinococcus Cães, lobos, raposas e vários Cisto hidátido Diâmetro 50 a 100 mm, às Ovinos, bovinos, suínos, equinos, alce, veado; raramente Comumente no fígado e pulmôes,
granulosus outros carnívoros silvestres vezes = 150 mm cães, gatos e pessoas ocasionalmente em outros órgãos e tecidos

Echinococcus Canídeos e gatos domésticos Multilocular ou “cistos” Variável, penetra como Camundongos de campo, arganaz, lêmores, às vezes Vários órgãos e tecidos


multilocularis alveolares ou hidátidos tecido neoplásico mamíferos domésticos e pessoas
a  Infecções em humanos por metacestoides de Taenia crassiceps, T. multiceps, T. serialis, Mesocestoides spp e outros cestoides ocorrem raramente. Crianças podem ser infectadas com a forma adulta de Dipylidium caninum, que

parece não ter relevância médica, mas aspectos importantes quanto à anestesia.

Em filhotes de cães com infecções graves, são comuns pneumonia verminótica, ascite, degeneração hepática gordurosa e enterite mucoide. Em cães jovens, são frequentes granulomas na cortical renal contendo larvas.
DIAGNÓSTICO:  A infecção de cães e gatos é diagnosticada por meio da detecção de ovos nas fezes. É importante distinguir os ovos de casca rugosa e esféricos de Toxocara spp (T. cannis 80 a 90 × 75 μm; T. cati 65 × 75 μm) dos ovos de
casca lisa e ovais de Toxascaris leonina (75 a 85 × 60 a 75 μm), devido à importância dos primeiros em saúde pública.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Em  cães,  os  medicamentos  aprovados  para  o  tratamento  de  infecções  por  vermes  redondos  incluem  fembendazol,  milbemicina,  moxidectina,  nitroscanato,  piperazina  e  pirantel  (Tabela  8).  Na  Europa,  a
selamectina é aprovada para o tratamento de infecções por T. canis, com dose única, enquanto no Canadá, o protocolo aprovado requer 2 doses com intervalo de 1 mês. Programas de prevenção de infecção por nematódeos utilizando
milbemicina, milbemicina/lufenuron, milbemicina/praziquantel, moxidectina/imidacloprida, pirantel/ivermectina ou pirantel/ivermectina/praziquantel, também controlam a ascaridíase intestinal. Além disso, o uso de selamectina é aprovado
para esta indicação em alguns países, mas não nos EUA (Tabela 9).
Os medicamentos aprovados para o tratamento de ascaridíase em gatos incluem emodepsídeo, fembendazol, milbemicina, moxidectina, piperazina e selamectina (Tabela 10). O uso de pirantel também é aprovado no Canadá. Programas
de prevenção contra nematoides que empregam milbemicina, milbemicina/praziquantel, moxidectina/imidacloprida ou selamectina também controlam ascaridíase intestinal em gatos (Tabela 10).
Ovos de nematoides. Toxocara (esquerda) e Toxocaris (direita). Cortesia do Dr. Andrew Peregrine e do Ontario Veterinary College.

Os ovos com larvas, resistentes ao ambiente do solo, e as larvas somáticas nas cadelas são os principais reservatórios de infecção. A transmissão perinatal de uma infecção pode ser reduzida significativamente por meio do tratamento das
cadelas com (1) doses diárias de fembendazol (25 mg/kg, VO) desde o 40o dia de gestação até o 2o dia após o parto (aprovado no Reino Unido); (2) ivermectina (0,3 mg/kg, SC) no 1o, 30o e 60o dia de gestação e no 10o dia após o parto; (3)
ivermectina (0,5 mg/kg) no 38o, 41o, 44o e 47o dia de gestação; (4) ivermectina (1 mg/kg) no 20o e 42o dia de gestação. Essas indicações da ivermectina não são oficiais. Por outro lado, para minimizar a produção de ovos, os filhotes de cães
devem ser tratados o mais cedo possível; o ideal é o tratamento 2 semanas após o nascimento, com repetição em intervalos de 2 semanas, até 2 meses de idade e, então, mensalmente até 6 meses de idade. Fêmeas lactantes devem ser
tratadas no mesmo momento. Filhotes de gatos devem ser tratados nas 3, 5, 7 e 9 semanas de idade e, então, mensalmente até o sexto mês de idade. Fêmeas lactantes devem ser tratadas no mesmo momento.
Uma vez que os vermes se aderem a diversas superfícies e se misturam ao solo e à poeira, as pessoas devem adotar higiene rigorosa, particularmente em crianças expostas a animais ou áreas potencialmente contaminadas.

VÔMITO

O vômito corresponde a uma ejeção forçada e reflexa de parte ou de todo o conteúdo gástrico e do intestino delgado proximal, através da boca. Trata­se de uma série de movimentos espasmódicos involuntários que requerem contrações
musculares visceral, diafragmática e de músculo abdominal. O ato de vomitar normalmente é precedido por vários sinais clínicos estereotípicos e prodromais, inclusive hipersalivação, atos repetidos de deglutição, esforço para vomitar e
contrações forçadas dos músculos abdominais. O vômito deve ser diferenciado de regurgitação, disfagia (dificuldade de deglutição) e várias outras formas de disfunção esofágica. A regurgitação é um processo passivo no qual o alimento
não digerido ou líquido é parcialmente ou completamente liberado do esôfago ou estômago através da boca, sem esforço ou contrações musculares (i. e. por meio da gravidade e da posição corporal do animal). Embora a disfagia envolva
contrações musculares ativas, porém ineficazes, e pode provocar movimentos que muito se assemelham ao esforço do vômito, o processo representa um movimento disfuncional de líquido e/ou alimento para dentro e não fora do trato
gastrintestinal.
ETIOLOGIA, FISIOPATOLOGIA E ACHADOS CLÍNICOS:  O ato reflexo de vomitar é iniciado pelo centro de vômito (ou centro emético) localizado na formação reticular da medula. O centro do vômito responde a estímulos de quatro fontes
principais: 1) receptores aferentes de várias estruturas periféricas (trato gastrintestinal, pâncreas, coração, fígado, trato urogenital e peritônio) conduzidos pelos nervos vago e simpáticos; 2) zona desencadeadora de quimiorreceptores (ZDQ)
da área postrema da medula; 3) córtex cerebral e sistema límbico; e 4) aparato vestibular. Neste sentido, o centro do vômito responde a estímulos neurais, humorais e químicos. Estimulação dos receptores nos canais semicirculares do
sistema vestibular, aumento da pressão intracraniana, distensão do duodeno (p. ex., obstrução por corpo estranho, gás e íleo adinâmico secundários à inflamação) ou cólon (p. ex., constipação intestinal), distensão ou inflamação de cápsulas
de órgãos (p. ex., pielonefrite ou insuficiência hepática aguda), toxinas sanguíneas (p. ex., quimioterápicos exógenos ou toxinas urêmicas endógenas) são exemplos de vários estímulos que podem ativar o reflexo do vômito e mostram
porque a lista de causas potenciais que causam vômito nos pacientes é tão extensa.
Algumas causas adicionais de vômito incluem toxinas (pesticidas, zinco, xilitol, micotoxinas), envenenamento, parasitos (nematoides em gatos, Spirocerca lupi, Physaloptera, Ollulanos tricuspis), infecção (Helycobacter) e inflamação
(pancreatite), medicamentos (aciclovir, cisplatina, piperazina, zolpidem, antibióticos), obstrução (intussuscepção, corpo estranho, obstipação), alergia alimentar, distúrbios de motilidade (síndrome do vômito bilioso, hérnia de hiato), doença
metabólica e eletrolítica, enfermidade neurológica (desautonomia, epilepsia límbica), neoplasia, enterotoxemia e sepse.
Ansiedade, depressão, hipersalivação e deglutições repetidas acompanhadas de relaxamento do esfíncter gastresofágico são seguidos de esforço de vômito. O intestino delgado proximal e o antro do estômago se contraem, propelindo o
seu  conteúdo  do  interior  do  corpo  do  estômago,  onde  o  movimento  é  inibido.  O  esfíncter  gastresofágico  desloca­se  para  o  interior  da  cavidade  torácica,  tornando­se  incompetente  e  facilitando  o  refluxo  gastresofágico.  Reprime­se  a
motilidade dos esfíncteres esofágico e faringoesofágico e a nasofaringe se fecha para evitar regurgitação nasal. Contrações forçadas de músculos abdominais e do diafragma contra a glote fechada, combinados com aumento da pressão
intra­abdominal, forçam a expulsão de alimento, fluidos e resíduos.
DIAGNÓSTICO:  A abordagem diagnóstica se inicia com a identificação completa e acurada do problema. Isto inclui diferenciar vômito de regurgitação ou disfagia e, então, caracterizar a duração e a natureza do vômito. Embora a lista
completa das prováveis causas de vômito seja extensa e relevante para qualquer paciente com vômito, o ranqueamento da lista diferencial é significativamente influenciada por uma variedade de fatores históricos. O problema deve ser
definido como agudo ou crônico, persistente ou intermitente, estático, progressivo ou recidivante. O vômito pode ser melhor definido em termos de frequência e período do dia em que ocorre, natureza do vômito, alterações nas condições
alimentares ou ambientais que precedem o problema e condição geral do paciente (p. ex., atitude, atividade, apetite, aparência), entre os episódios. Tanto o histórico quanto o exame físico podem revelar causas sistêmicas potenciais ou
consequências do problema, tais como depressão, desidratação, febre, halitose, perda de peso, dispneia (aspiração), dor abdominal, tumores, espessamento ou distensão de alças intestinais, borborigmo ou melena.
Após anamnese e exame físico minuciosos, deve­se definir os diagnósticos diferenciais gastrintestinais primários e secundários. Radiografias abdominais simples devem ser parte da abordagem diagnóstica inicial em qualquer paciente
com vômito; um corpo estranho gastrintestinal não diagnosticado em um paciente com vômito agudo ou um tumor esplênico não detectado no paciente com vômito crônico são causas potencialmente fatais de vômito, cuja identificação foi
retardada  por  tratamento  sintomático  na  ausência  de  testes  diagnósticos  apropriados,  em  detrimento  do  paciente.  Uma  base  mínima  de  dados,  inclusive  hemograma,  perfil  bioquímico  sérico,  urinálise  e  exame  de  fezes,  são  também
apropriados para o diagnóstico inicial, embora sejam menos prováveis que permitam a identificação das causas primárias, que necessitam intervenção imediata.
O  vômito  crônico  e  o  vômito  com  manifestações  sistêmicas,  tais  como  hematêmese,  dor  abdominal,  desidratação,  febre  ou  perda  de  peso,  devem  ser  abordados  mais  vigorosamente.  Uma  gama  extensa  de  testes  diagnósticos  está
disponível  para  diagnóstico  de  causas  primárias  e  secundárias  de  vômito.  Modalidade  não  invasiva  de  imagens,  além  de  radiografias  abdominais  simples,  incluem  radiografias  contrastadas,  ultrassonografia  abdominal  e  ressonância
magnética (RM) ou tomografia computadorizada (TC) do abdome. Exame de flotação fecal, esfregaço seco, esfregaço úmido, ELISA para Giardia, PCR, microscopia eletrônica e mensuração dos teores de a­antiprotease (para enteropatias
com perda de proteínas) estão disponíveis para auxiliar no diagnóstico de doença gastrintestinal. A imunorreatividade da lipase pancreática (ILP) substituiu as dosagens de amilase e lipase séricas como testes muito mais sensíveis de
inflamação pancreática. Laparoscopia e endoscopia são ferramentas diagnósticas valiosas para as causas primárias e secundárias de vômito e elas conferem uma morbidade muito menor do que a laparotomia exploratória.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O principal objetivo do tratamento de um paciente com vômito é identificar e tratar as causas primárias do problema. A obtenção de um diagnóstico definitivo antes da instituição de tratamento sintomático é
quase sempre uma abordagem prudente e frequentemente efetiva em qualquer paciente com vômito. A terapia antiemética é um componente essencial do protocolo terapêutico para muitos pacientes, porém com a administração de um
antiemético, o médico perde a capacidade de relacionar a cessação do vômito com qualquer outro parâmetro específico (p. ex., reidratação, resolução de uma obstrução parcial, tratamento efetivo da doença primária em curso e a progressão
natural de uma simples gastrite).
A terapia sintomática para vômito agudo inclui jejum de 24 h. A água nunca deve ser suspensa, exceto se o animal recebe fluidoterapia por via SC ou IV. As consequências previsíveis do vômito incluem desidratação, desequilíbrio
eletrolítico e ácido­base; a suspensão de água sem avaliar adequadamente o estado de hidratação do paciente exacerba e complica essas anormalidades. Alguns animais mostram resposta positiva com essa intervenção por 24 h e pequenos
volumes de fluidos orais e, eventualmente, de alimentos podem ser reintroduzidos lentamente se ocorrem mais episódios de vômito.
Vários animais com episódios de vômito necessitam um período maior de reidratação vigorosa ajustada à progressão ou resolução das anormalidades do estado eletrolítico e ácido­base. Vômito normalmente resulta em azotemia pré­
renal, hipopotassemia, hipocloremia, alcalose metabólica e acidúria paradoxal devido à perda de secreção rica em potássio, cloreto e hidrogênio. Vômito persistente sem reidratação suficiente pode resultar em acidose metabólica e perda de
excesso de base, hipovolemia, baixa perfusão tecidual,  hipoxia  e  acidose  láctica.  Portanto,  é  difícil  predizer  o  estado  ácido­base/eletrolítico  de  um  animal  com  vômito;  a  capacidade  do  clínico  de  tratar  esses  desequilíbrios  depende  de
avaliações repetidas de vários parâmetros.
A decisão de se instituir terapia antiemética é baseada no quadro clínico do animal, na identificação da causa primária, na necessidade de avaliação da progressão natural da condição do animal, da resposta a outros tratamentos e do
impacto geral do vômito no estado emocional, físico e bioquímico do paciente. Há vários antieméticos disponíveis e sua eficácia, frequentemente, depende de que e/ou como muitos dos estímulos previamente descritos atingem o centro do
vômito. Antieméticos particularmente eficazes em animais com doença vestibular podem ser de pouco valor a animais cujo vômito, por exemplo, é secundário à insuficiência renal.
Fármacos que atuam diretamente no centro do vômito incluem os tranquilizantes fenotiazinas, tais como proclorperazina (0,3 mg/kg, VO, 3 vezes/dia; 0,1 mg/kg, IM, 4 vezes/dia; ou 0,1 a 0,5 mg/kg, SC, 3 vezes/dia) e clorpromazina (0,5
mg/kg, VO, 4 vezes/dia; 0,5 mg/kg, IM, 3 vezes/dia; ou 1 mg/kg, VR, 3 vezes/dia). As fenotiazinas também inibem a atividade do ZDQ e tem discreto efeito anticolinérgico, o que as tornam uma escolha valiosa e efetiva em muitos animais.
Embora os efeitos antieméticos sejam observados em doses menores que aquelas necessárias para o efeito tranquilizante, a hipotensão é um efeito adverso em potencial. Portanto, é essencial que os animais sejam adequadamente reidratados
antes de se instituir a terapia com fenotiazinas.
Uma nova classe de antieméticos que parece atuar tanto no centro do vômito quanto na ZDQ é o antagonista do receptor NK­1, maropitant (1 mg/kg SC, 1 vez/dia, por até 5 dias; 2 mg/kg, VO, 1 vez/dia, por até 5 dias; 8 mg/kg, VO, 1
vez/dia, por até 2 dias, para enjoo de transporte). Maropitant foi o primeiro introduzido com profilático em animais com câncer sob tratamento quimioterápico. Seu uso foi estendido para cessar eficazmente o vômito agudo secundário a
uma ampla variedade de causas e para o tratamento do enjoo de transporte. A administração de maropitant inclui um período de eliminação (5 dias de tratamento e 2 dias sem, para o vômito; 2 dias de tratamento e 3 dias sem, para enjoo de
transporte). Pode ocorrer, em alguns animais, desconforto discreto e transitório após a injeção SC. A dose para gatos ainda não foi estabelecida, porém parece ser aproximadamente metade da dose recomendada para cães.
Fármacos utilizados principalmente para enjoo de transporte e/ou doença vestibular incluem hidrocloreto de meclizina (2 a 6 mg/kg, VO, 25 mg/cão, VO, 1 vez/dia; total de 12,5 mg para gatos, 1 vez/dia) e difenidramina (2 a 4 mg/kg,
VO, 3 vezes/dia). Esses anti­histamínicos atuam bloqueando os receptores H1 do  aparato  vestibular  e,  em  menor  grau,  da  ZDQ.  O  antimuscarínico  escopolamina  (0,03  mg/kg  IM  ou  SC,  4  vezes/dia)  também  é  utilizado  para  enjoo  de
transporte. Sonolência e xerostomia são reações adversas potenciais deste fármaco.
Antagonistas dopaminérgicos, como metoclopramida (0,2 a 0,5 mg/kg, VO ou SC, 4 vezes/dia, ou 1 a 3 μg/kg/min em taxa de infusão constante), atuam na ZDQ e em receptores periféricos e são considerados úteis no tratamento de
vômito secundário a uma variedade de causas. A eficácia da metoclopramida como antiemético em gatos está em estudo, uma vez que os gatos podem não ter receptores dopaminérgicos no centro do vômito.
Ondansetron (0,1 a 1 mg/kg, VO, 1 a 3 vezes/dia, ou 30 min antes da quimioterapia; 0,11 a 0,18 mg/kg, IV; evite o uso em cães da raça Colly) é um antiemético que atua com antagonista seletivo do receptor de serotonina 5­HT3, com
ação tanto central quanto periférica. A liberação periférica de serotonina mostrou se importante na resposta do vômito decorrente da administração de quimioterápicos; o ondansetron deve ser utilizado em pacientes com câncer, antes da
terapia, assim como em outros casos que não respondem a outros antieméticos. À semelhança do ondensetron, o dolasetron (0,6 a 1,0 mg/kg, IV ou VO, 1 vez/dia) é um antagonista serotoninérgico 5­HT3 utilizado para aliviar náuseas e
vômito secundário à anestesia, quimioterapia, enterite e hepatopatia.
Além da manipulação farmacológica destinada para prevenir a expulsão do conteúdo gástrico em direção retrógrada, um paciente com vômito pode também responder à intervenção farmacológica dirigida ao movimento dos alimentos na
direção apropriada. Embora qualquer possibilidade de obstrução ou corpo estranho seja uma contraindicação, fármacos promotilidade, como metoclopramida (ver texto anterior), ranitidina (1 a 2 mg/kg, VO, 2 vezes/dia), baixas doses de
eritromicina (0,5 a 1,0 mg/kg, 3 vezes/dia) e cisaprida (0,5 mg/kg, VO, 3 vezes/dia em cães; 2,5 a 5,0 mg/gato, VO, 2 a 3 vezes/dia em gatos) deve ser incluídos no protocolo terapêutico.
OLHO E OUVIDO

OLHO

 CERATOCONJUNTIVITE INFECCIOSA
 CONJUNTIVITE CAUSADA POR CLAMÍDIA
 DOENÇA OCULAR PARASITÁRIA
Vermes Oculares de Grandes Animais
Vermes Oculares de Pequenos Animais
 EMERGÊNCIAS OFTÁLMICAS (EMG)
 NEOPLASIA DO OLHO E DE ESTRUTURAS ASSOCIADAS
Bovinos
Caninos
Equinos
Felinos
 OFTALMOLOGIA
Aparato Lacrimal e Nasolacrimal
Conjuntiva
Córnea
Cristalino
Exame Físico do Olho
Fundo do Olho
Coriorretinite
Descolamentos de Retina
Retinopatias Hereditárias
Glaucoma
Manifestações Oftálmicas de Doenças Sistêmicas
Nervo Óptico
Órbita
Pálpebras
Anormalidades de Conformação
Inflamação
Prolapso do Olho
Úvea Anterior
 UVEÍTE RECIDIVANTE EQUINA

OUVIDO

 DOENÇAS DO PAVILHÃO AURICULAR
Adenite Sebácea
Alergia à Picada de Mosquito
Alopécia de Pavilhão Auricular
Ataque de Moscas
Dermatite de Contato
Dermatite de Pavilhão Auricular
Hematoma Auricular
Infestação por Ácaros
Miscelânea de Doenças
Placas Auriculares em Equinos
Seborreia da Borda Auricular
Síndrome da Necrose Auricular em Suínos
 OTITE EXTERNA
 OTITES MÉDIA E INTERNA
 SURDEZ
 TUMORES DO CANAL AURICULAR
Pólipos Nasofaríngeos
Neoplasias de Glândula Ceruminosa

CERATOCONJUNTIVITE INFECCIOSA (Olho róseo, Oftalmia infecciosa)

Ceratoconjuntivite infecciosa de bovinos, ovinos e caprinos é caracterizada por blefarospasmo, conjuntivite, lacrimejamento e graus variáveis de opacidade e ulceração de córnea.
A ceratoconjuntivite infecciosa bovina  (CIB;  “olho  róseo”)  é  a  doença  ocular  mais  comum  em  bovinos,  sendo  observada  em  rebanhos  por  todo  o  mundo.  O  bastonete  gram­negativo Moraxella  bovis  é  o  único  microrganismo  que,
comprovadamente, causa CIB em bovinos. Atualmente, são conhecidos sete sorogrupos diferentes de M. bovis. A maioria das outras infecções oculares em bovinos é caracterizada por conjuntivite, com queratite mínima ou ausente. O
principal  diagnóstico  diferencial  é  de  rinotraqueíte  infecciosa  bovina  (RIB),  que  causa  conjuntivite  grave  e  edema  de  córnea,  que  se  origina  próximo  ao  limbo,  porém  é  incomum  a  ulceração  de  córnea.  Mycoplasma  spp  pode  causar
conjuntivite em bovinos, tanto isoladamente como em associação com M. bovis. RIB ou infecção por outros microrganismos pode intensificar a gravidade da infecção por M. bovis. Um coco gram­negativo foi descoberto recentemente em
olhos de bovinos acometidos por CIB. Esse microrganismo é uma nova espécie de Moraxella (M. bovoculi), mas sua participação na patogênese da CIB ainda não foi completamente elucidada. M. bovoculi também foi isolado de casos de
ceratoconjuntivite infecciosa em renas.
Ceratoconjuntivite infecciosa bovina, com úlcera de córnea em uma vaca. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

Em ovinos e caprinos, conjuntivite ou ceratoconjuntivite pode estar associada a infecções por Chlamydophila psittasi e C. pecorum. Infecções não clamidianas podem ser causadas por microrganismos semelhantes a riquétsias (Colesiota
conjunctivae), Mycoplasma spp (notavelmente M. conjunctivae) e bactérias aeróbias (principalmente Moraxella ovis). Em caprinos, infecções por micoplasma são as mais comuns, embora bactérias aeróbias também tenham sido isoladas.
Devido aos riscos possíveis de transmissão zoonótica de tais microrganismos, proprietários de pequenos ruminantes que tratam conjuntivite ou ceratoconjuntivite devem calçar luvas para o manuseio de animais infectados.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em geral, a doença é aguda e tende a se disseminar rapidamente. Um ou ambos os olhos podem ser acometidos. Fragmentos de plantas, mosca da face, radiação ultravioleta da luz solar intensa, ambiente seco e com
poeira e estresse de transporte são fatores de risco associados à CIB em rebanhos bovinos. As moscas também podem atuar como vetores de M. bovis. Em todas as espécies, animais jovens são acometidos mais frequentemente, porém
animais de qualquer idade são suscetíveis. Os sinais clínicos mais precoces são fotofobia, blefarospasmo e epífora. Depois, a secreção ocular inicial pode se tornar mucopurulenta. Geralmente há conjuntivite, associada ou não à queratite de
graus variáveis. Em ovinos e caprinos, pode haver poliartrite concomitante. Em caprinos, infecções da glândula mamária e do útero também podem ocorrer simultaneamente à ceratoconjuntivite. O apetite pode estar diminuído devido ao
desconforto ocular ou ao distúrbio visual, que resulta na incapacidade em localizar o alimento. O curso clínico típico varia de poucos dias a algumas semanas. A maioria das úlceras de córnea em bovinos com CIB cicatriza sem perda da
visão; entretanto, em casos mais graves podem ocorrer ruptura de córnea e cegueira permanente.
Lesões: A gravidade das lesões é variável. Em bovinos, uma ou mais úlceras pequenas são notadas próximo ao centro da córnea. Inicialmente, a córnea ao redor da lesão é transparente, mas em poucas horas surge uma opacidade discreta
que  depois  se  torna  mais  densa.  As  lesões  podem  regredir  nos  estágios  iniciais  ou  podem  continuar  a  progredir.  Em  casos  graves,  após  48  a  72  h  toda  a  córnea  pode  apresentar  opacidade,  ocasionando  cegueira  naquele  olho.  Vasos
sanguíneos podem invadir a córnea a partir do limbo e seguirem em direção à úlcera na velocidade de cerca de 1 mm/dia. A opacidade de córnea pode ser decorrência de edema (córnea branco­turva a azulada), que é uma parte da reação
inflamatória, ou de infiltração leucocitária (córnea branco­leitoso a amarelada), que indica infecção grave. Úlcera ativa progressiva pode causar ruptura de córnea. Pode ocorrer recidiva em qualquer estágio da recuperação.
DIAGNÓSTICO:  Em todas as espécies, o diagnóstico presuntivo baseia­se nos sintomas oculares e da doença sistêmica concomitante. É importante reconhecer que as lesões não se devem a corpos estranhos ou parasitos (ver p. 528). Na RIB,
predominam  sintomas  de  trato  respiratório  superior  e  conjuntivite;  queratite  acompanhada  de  úlcera  é  rara.  Na  febre  catarral  maligna  bovina,  são  proeminentes  os  sintomas  respiratórios,  acompanhados  de  uveíte  primária  e  queratite
associada. Cultura microbiana pode ser útil para confirmar os microrganismos causadores. Chlamydophila e Mycoplasma spp requerem meio especial; o laboratório de diagnóstico deve ser consultado antes da coleta da amostra. O exame
citológico de lâminas coradas, preparadas a partir de raspados conjuntivais de ovinos e caprinos, pode revelar a presença de Chlamydophila. Entretanto, pode ser difícil reconhecer corpúsculos de inclusões intracitoplasmáticas. PCR pode
ser utilizada para detectar Chlamydophila e Mycoplasma spp.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  Boas práticas de manejo são de extrema importância na redução ou prevenção da disseminação da infecção em bovinos, ovinos e caprinos. A separação dos animais infectados, quando possível, é benéfica.
Isolamento temporário e tratamento preventivo de animais recem­introduzidos ao rebanho podem ser úteis, pois alguns destes animais podem ser portadores assintomáticos. A radiação ultravioleta da luz solar pode exacerbar a doença
(particularmente em bovinos); portanto, animais acometidos devem ser colocados à sombra. Sacos com inseticida, em pó, ou brincos impregnados com inseticida podem ser utilizados para reduzir a população de moscas da face (Musca
autumnalis), um importante vetor de M. bovis.
Bacterinas de M. bovis estão disponíveis e podem ser administradas antes do início da estação das moscas. Os bovinos devem começar a receber a série de vacinas contra M. bovis 6  a  8  semanas  antes  do  período  estimado  para  os
primeiros casos de CIB, para que haja tempo de desenvolvimento de imunidade adequada. A eficácia das bacterinas de M. bovis atualmente disponíveis no mercado é controversa e parece variar em função das diferenças entre as linhagens
de M. bovis usadas nas vacinas e aquelas envolvidas nos surtos e quanto aos graus variáveis de proteção cruzada propiciada pela vacinação. A vacina pode reduzir a gravidade e a duração da infecção em animais acometidos. A infecção por
RIB pode predispor os bovinos à infecção por M. bovis;  assim,  a  vacinação  dos  rebanhos  contra  RIB  pode  reduzir  os  surtos  de M. bovis.  O  uso  de  vacinas  vivas  modificadas  contra  RIB  foi  associado  a  surtos  de  CIB  em  bovinos.  A
vacinação contra RIB deve ser programada apropriadamente em relação ao transporte dos bovinos, de forma que esses eventos não coincidam. A vacinação de bovinos com vacina viva modificada contra RIB pode exacerbar um surto de
CIB associado a M. bovis e/ou M. bovoculi, devido ao aumento das secreções oculares e nasais, que espalham as bactérias no rebanho, bem como à lesão ao epitélio corneano.
M.  bovis  é  suscetível  a  vários  antibióticos.  Como  a  suscetibilidade  antibiótica  pode  variar  em  diferentes  regiões  geográficas,  é  aconselhável  a  realização  de  cultura  bacteriana  e  antibiograma.  Um  tratamento  comum  é  a  injeção
subconjuntival de penicilina. Oxitetraciclina de longa ação (2 injeções de 20 mg/kg IM ou SC, em intervalo de 48 a 72 h) e tularromicina (2,5 mg/kg SC, aplicação única) são antibióticos atualmente aprovados para tratamento de CIB.
Outros antibióticos efetivos incluem ácido livre cristalino de ceftiofur (6,6 mg/kg SC, na base da orelha) e florfenicol (20 mg/kg IM, 2 doses com intervalo de 2 dias). Injeção única de oxitetraciclina de longa ação (20 mg/kg IM) associada
à oxitetraciclina oral (2 g/bezerro/dia, por 10 dias), junto com alfafa, também se mostrou efetiva na redução da gravidade da CIB durante surto em um rebanho. Aplicações tópicas de preparações oftálmicas devem ser feitas ao menos 3
vezes/dia para que sejam efetivas; assim, frequentemente não são consideradas práticas em condições de rebanho e seu custo­benefício não é favorável. Antibióticos efetivos para uso oftálmico tópico incluem uma pomada antibiótica tripla,
com  gentamicina  e  a  combinação  de  oxitetraciclina/polimixina  B.  Dobra  de  terceira  pálpebra  ou  tarsorrafia  parcial,  que  protege  a  córnea  da  luz  solar,  juntamente  com  injeção  subconjuntival,  pode  reduzir  a  morbidade  em  animais
gravemente acometidos. Um adesivo ocular temporário, colado aos pelos que circundam o olho, é um tratamento de baixo custo e prático. O adesivo ocular protege da luz e previne exposição às moscas, reduzindo a disseminação do
microrganismo.
Para  ovinos  e  caprinos,  nos  quais  se  suspeitam  de  infecções  por  clamídia  e  micoplasma,  respectivamente,  pomadas  tópicas  de  tetraciclina,  oxitetraciclina/polimixina  B  ou  eritromicina  são  os  tratamentos  de  escolha.  Todas  estas
preparações são efetivas contra Chlamydophila ou Mycoplasma e  devem  ser  aplicadas  3  a  4  vezes/dia.  Se  a  terapia  tópica  não  for  prática,  uma  injeção  de  oxitetraciclina  de  longa  ação  (20  mg/kg  IM)  ou  a  adição  de  oxitetraciclina  ao
alimento (80 mg/animal/dia) pode ser benéfica.
Animais com importante uveíte secundária à ceratoconjuntivite, que é particularmente dolorida, podem se beneficiar da aplicação tópica de pomada oftálmica de atropina 1%, 1 a 3 vezes/dia. Isto previne espasmos doloridos do corpo
ciliar e reduz a possibilidade de formação de sinéquia posterior, que ocorre com a miose. Devido à midríase causada pela atropina, os animais tratados devem ser protegidos da luz. Anti­inflamatórios não  esteroides  (AINE)  sistêmicos
podem ser utilizados para aliviar a dor decorrente de uveíte secundária.

CONJUNTIVITE CAUSADA POR CLAMÍDIA

ETIOLOGIA  E  EPIDEMIOLOGIA:   As  clamídias  são  bactérias  intracelulares  obrigatórias  que  originam  inclusões  citoplasmáticas  em  células  epiteliais.  O  ciclo  biológico  das  clamídias  envolve  uma  alternância  entre  o  corpo  reticulado
intracelular  e  o  corpo  elementar  extracelular,  que  é  a  forma  infectante  do  microrganismo.  Diversos  membros  da  família  Chlamydiaceae  têm  sido  associados  à  conjuntivite  no  hospedeiro  que  eles  infectam,  incluindo  Chlamydophila
caviaie (porquinhos da índia), Chlamydophila psittaci (pássaros) e Chlamydophila pecorum (bovinos e ovinos). Apesar da infecção por clamídia ter sido associada à ceratoconjuntivite em ovinos e caprinos, um estudo utilizando técnicas
moleculares para detecção de clamídias em ovinos não constatou uma associação clara entre a infecção e a doença. Em gatos, a conjuntivite por clamídia é causada por Chlamydophila felis. Chlamydophila psittaci foi isolada de cães com
ceratoconjuntivite e dispneia, em uma criação de cães. Tracoma e conjuntivite por inclusão em pessoas são causados por Chlamydydia trachomatis. Recentemente, microrganismo semelhante à clamídia (Parachlamydia acanthamoebae)
que habita e se prolifera em amebas de vida livre foi isolado de olhos de gatos, porquinhos da índia, suínos e ovinos com conjuntivite. A importância patogênica desses microrganismos e das amebas hospedeiras atualmente não está clara,
apesar de um estudo recente em porquinhos da índia ter sugerido uma relação entre a infecção e a doença ocular.
Apesar da doença em gatos ser conhecida como pneumonite felina, as clamídias raramente causam pneumonia em gatos. A infecção sempre envolve o olho, ocasionalmente causando sintomas de rinite, com espirros e secreção nasal.
Apesar dos títulos de anticorpos contra Chlamydophila felis serem comuns em algumas populações de gatos, o microrganismo raramente é isolado em gatos clinicamente sadios. Os gatos com infecção por clamídia geralmente têm menos
de 1 ano de idade e gatos com 2 a 6 meses de idade parecem mais suscetíveis à infecção. É improvável que gatos com mais de 5 anos de idade que apresentam conjuntivite sejam infectados e que gatos com menos de 8 semanas de idade
possam ser menos predispostos à doença devido à presença de anticorpos maternos. A transmissão ocorre como resultado do contato próximo, direto, entre gatos, pois a bactéria sobrevive por pouco tempo no ambiente. Os gatos infectados
também excretam clamídias pelo reto e pela vagina, apesar de não haver comprovação de transmissão durante o acasalamento. Há pouca evidência de que a clamídia pode ser capaz de causar doença reprodutiva e claudicação em gatos,
apesar dessas associações não estarem definitivamente documentadas.
A infecção por clamídia é uma das causas mais comuns de conjuntivite em populações de porquinhos­da­índia, nos quais também é conhecida como conjuntivite de inclusão (ver p. 2130). Assim como os gatos, os porquinhos­da­índia
jovens, especialmente aqueles com 1 a 2 meses de idade, são predispostos. Ademais, é possível a ocorrência de doença subclínica. Rinite, doença do trato respiratório inferior e infecções genitais causando salpingite e cistite, nas fêmeas, e
uretrite nos machos de porquinhos da índia também podem ocorrer.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em gatos, o período de incubação após contato com um gato infectado é de 3 a 10 dias. Os sintomas podem incluir conjuntivite serosa a mucopurulenta, secreção nasal e espirros. Gatos com sintomas de rinite, na
ausência de conjuntivite, provavelmente não estão infectados por Chlamydophila felis. Os sintomas iniciais incluem hiperemia conjuntival uni ou bilateral, quemose e secreção ocular serosa, com folículos proeminentes na face interna da
terceira pálpebra, nos casos mais graves. A doença de córnea é rara e, se presente, pode ser resultado de infecção concomitante por microrganismos como o herpes vírus felino­1. Os sintomas são mais graves 9 a 13 dias após o início e,
então, se tornam brandos em um período de 2 a 3 semanas. Em alguns gatos, os sinais clínicos podem durar semanas, independente do tratamento, e a recidiva não é incomum. Gatos não tratados podem carrear a bactéria durante meses
após a infecção.
Porquinhos­da­índia podem desenvolver conjuntivite discreta a grave, com hiperemia conjuntival, quemose e secreção ocular mucopurulenta.
DIAGNÓSTICO:  Em gatos, a conjuntivite por clamídia deve ser diferenciada da conjuntivite causada por herpes vírus felino­1 e por calicivírus felino e em porquinhos­da–índia da infecção por micoplasma ou outras infecções bacterianas (p.
ex., “olho rosa”). O diagnóstico pode ser confirmado pela constatação de inclusões intracitoplasmáticas por clamídia em preparações citológicas esfoliativas ou pelo isolamento da clamídia em cultivo celular ou por PCR, para DNA de
clamídia, em esfregaços conjuntivais. Os raspados para exame citológico são preparados aplicando­se uma espátula levemente, porém de modo firme, na conjuntiva e espalhando o material colhido sobre uma lâmina de vidro. O preparado é
seco por exposição ao ar e corado.
A citologia conjuntival de porquinhos–da­índia geralmente revela uma resposta inflamatória neutrofílica. As inclusões por clamídia, as quais contêm corpos reticulados, são arredondadas e geralmente se coram de roxo com o corante de
Romanowsky.  As  inclusões  geralmente  são  visíveis  apenas  no  início  da  infecção  e  muitas  vezes  não  são  absolutamente  observadas.  Os  grânulos  de  melanina  e  estruturas  remanescentes  de  algumas  preparações  oftálmicas  podem  ser
confundidos com inclusões, gerando resultado falso­positivo. Assim, outros testes diagnósticos são recomendados para confirmar o diagnóstico. Raspados ou esfregaços conjuntivais podem ser submetidos a isolamento de clamídia em
cultivo celular ou a teste PCR em laboratório de diagnóstico especializado. Apesar da sorologia na fase aguda e na fase convalescente ter sido utilizada para detectar a resposta de anticorpos à infecção por clamídia, geralmente não é
empregada clinicamente para diagnóstico de conjuntivite por clamídia.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  Vacinas contra clamidiose estão disponíveis para gatos, mas não para outras espécies. A vacina contra clamidiose felina não protege completamente os gatos, mas reduz de forma significativa a gravidade e a
taxa de infecção.
Todos os isolados de C. psittaci são suscetíveis às tetraciclinas. O tratamento de escolha é a doxiciclina (10 mg/kg, 1 vez/dia) durante, pelo menos, 4 semanas. O tratamento sistêmico é mais efetivo do que o tratamento tópico, o que é
lógico, uma vez que as bactérias são excretadas de locais que não a conjuntiva. Tem sido necessário tratamento por até 6 semanas para eliminar a infecção, em alguns gatos. Todos os gatos da casa devem ser tratados. Fluorquinolonas, como
enrofloxacino e pradofloxacino, e a combinação de amoxicilina e ácido clavulânico também têm sido empregadas com sucesso no tratamento de clamidiose felina, apesar da possibilidade de menor eficácia do que aquela da doxiciclina. A
azitromicina não parece ser efetiva.
RISCO ZOONÓTICO:  Em casos raros, Chlamydophila felis e Chlamydophila caviae foram  isoladas  de  pessoas  que  conviviam  com  gatos  e  porquinhos­da­índia  infectados.  Um  único  caso  de  conjuntivite  folicular  foi  descrito  em  pessoa
imunocomprometida que estava infectada por C. felis. Há relato de detecção de C. caviae em uma pessoa com secreção ocular e que trabalhava com cerca de 200 porquinhos da índia doentes. C. caviae também foi detectada em esfregaços
conjuntivais do gato e do coelho desta pessoa; o coelho apresentava sintomas discretos de conjuntivite. Práticas de higiene rotineiras, como lavar as mãos antes e depois de manusear animais de estimação doentes, podem reduzir o risco de
transmissão desses microrganismos, de animais infectados para as pessoas.

DOENÇA OCULAR PARASITÁRIA (Telaziose)

 VERMES OCULARES DE GRANDES ANIMAIS
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  Vermes oculares (Thelazia spp) são parasitos comuns de equinos e bovinos em muitos países, inclusive aqueles da América do Norte. Os equinos são infectados principalmente por T. lacrymalis; nos bovinos
a  doença é causada principalmente  por T.  gulosa,  T.  skrjabini e T. rhodesii.  Esta  última  infecção  é  a  mais  comum  e  agressiva  em  bovinos  do  Velho  Mundo,  mas  não  há  relato  recente  em  bovinos  da  América  do  Norte.  A  prevalência
de Thelazia spp no rebanho tem diminuído, pelo menos em algumas áreas onde endectocidas lactonas macrocíclicas, como ivermectina e doramectina, são comumente utilizadas. Thelazia spp também são encontradas em suínos, ovinos,
caprinos, veados, búfalos d’água, dromedários, lebres, cães e gatos, aves e pessoas.
A mosca da face, Musca autumnalis, é o vetor de T. lacrymalis, T. gulosa e T. skrjabini na  América  do  Norte.  Hábitos  alimentares  dessa  mosca  incluem  preferência  por  secreções  oculares,  o  que  é  ideal  para  a  transmissão.  O  ciclo
biológico de Thelazia é o seguinte: fêmeas do parasito são ovovivíparas e depositam larvas nas secreções oculares; as larvas são ingeridas pelas moscas e se tornam infectantes em 2 a 4 semanas. As larvas infectantes de terceiro estágio
emergem das labelas dessas moscas e são depositadas no olho do hospedeiro durante a alimentação destes insetos. O desenvolvimento de vermes sexualmente maduros demora 1 a 4 semanas, em bovinos, dependendo da espécie de parasito,
e 10 a 11 semanas para T. lacrymalis, em equinos. As infecções podem ser detectadas durante todo o ano, mas surtos da doença clínica, particularmente em bovinos, em geral estão associados às atividades das moscas na estação quente.
Durante o inverno, as larvas de Thelazia sp podem permanecer na mosca. As taxas de infecção geralmente tendem a aumentar em hospedeiros mais idosos, embora alguns estudos relatem infestação máxima aos 2 a 3 anos de idade.
PATOGÊNESE:  A glândula lacrimal e seus ductos são locais comumente infectados por Thelazia lacrymalis e T. gulosa, sendo as glândulas da membrana nictitante e os ductos nasolacrimais acometidos em menor frequência. T. skrjabini é
encontrada normalmente nos ductos lacrimais da membrana nictitante. Localizações superficiais na córnea, no saco conjuntival e sob as pálpebras e membrana nictitante são mais típicas de T. rhodesii, mas T. lacrymalis, T. skrjabini e T.
gulosa também podem ser encontradas nesses locais. Esses vermes também podem ser notados nos pelos ou pele periocular durante anestesia ou após a migração em um hospedeiro morto. Irritação e inflamação localizadas provavelmente
se devem à cutícula serrilhada dos vermes, especialmente de T. rhodesii. A invasão da glândula lacrimal e dos ductos excretores pode causar inflamação e exsudação necrótica. A inflamação dos ductos e dos sacos lacrimais também foi
relatada em equinos. Conjuntivite e blefarite brandas a graves são comuns. Também, pode se instalar queratite, inclusive com opacidade, ulceração, perfuração e fibrose permanente em casos graves, particularmente nas infecções por T.
rhodesii em bovinos.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  DIAGNÓSTICO:   As  infecções  assintomáticas,  tanto  em  equinos  como  em  bovinos,  parecem  típicas  de  telaziose,  na  América  do  Norte.  A  infecção  pode  ser  constatada  casualmente  durante  cirurgia  ou  necropsia.
Entretanto,  infecções  por  Thelazia  em  bovinos  na  América  do  Norte  podem  não  ser  sempre  inócuas.  Podem  causar  conjuntivite  discreta,  lacrimejamento  excessivo,  edema  localizado,  opacidade  de  córnea  e,  ocasionalmente,  cistos
subconjuntivais. Na Europa e na Ásia, a telaziose está comumente associada a manifestações clínicas graves, inclusive com conjuntivite, fotofobia e queratite. Tipicamente nota­se conjuntivite crônica, com hiperplasia linfoide e exsudato
seromucoso.
Não há disponibilidade de uma técnica clinicamente acessível para detecção segura de vermes oculares adultos. A inspeção macroscópica dos olhos pode revelar os parasitos, sendo em geral recomendada para T. rhodesii, comumente
encontrada no saco conjuntival. Entretanto, T. gulosa e T. skrjabini, em bovinos, e T. lacrymalis, em equinos, tendem a ser mais invasivas e mais dificilmente observadas. Anestésicos tópicos permitem a manipulação tecidual e, assim, são
úteis na detecção e remoção dos vermes. Pode­se fazer o exame microscópico dos fluidos lacrimais em busca de ovos embrionados ou larvas.
Os sinais clínicos podem ser úteis no diagnóstico diferencial. A telaziose tende a causar conjuntivite crônica. Em bovinos, a ceratoconjuntivite infecciosa (ver p. 470) é uma infecção aguda da córnea, que se dissemina rapidamente. Em
equinos, as larvas infectantes dos parasitos estomacais Draschia e Habronema sp também podem provocar lesões oftálmicas. Estas tendem a ocorrer próximo ao canto medial da pálpebra, na forma de granulomas ulcerativos proeminentes,
frequentemente contendo “grânulos sulfurosos” amarelos característicos, semelhantes a placas, com 1 a 2 mm de diâmetro. Também, microfilárias de Onchocerca sp invadem o olho e podem resultar em manifestações oftálmicas. Pequenos
nódulos (< 1 mm) elevados e brancos na conjuntiva pigmentada adjacente ao limbo temporal são patognomônicos da infecção por Onchocerca. A despigmentação da conjuntiva bulbar nesta área também ocorre frequentemente. Outras
lesões  de  oncocercose  envolvem  a  córnea  e  incluem  edema  e  opacidades  pontilhadas  ou  estriadas  no  estroma,  erosões  superficiais  e  queratite  esclerosante  em  forma  de  cunha,  que  se  estende  a  partir  do  limbo  temporal.  Estruturas
intraoculares também podem ser infectadas por microfilárias de Onchocerca sp (ver p. 827).
TRATAMENTO E CONTROLE:  A remoção mecânica de Thelazia rhodesii com pinça, após instilação de anestésico local, é útil em bovinos. Isto também pode ser empregado para as formas mais invasivas de T. gulosa ou T. skrjabini,  em
bovinos, ou T. lacrymalis, em equinos. Irrigação dos olhos com 50 a 75 ml de solução aquosa de iodo 0,5% e de iodeto de potássio 0,75% foi recomendada para T. gulosa e T. skrjabini. Também pode ser efetiva para T. lacrymalis,  em
equinos. A aplicação tópica de iodeto de ecotiofato 0,03% ou de isoflurofato 0,025% (ambos organofosforados) tem sido bem­sucedida para T. lacrymalis em equinos. Recomenda­se o uso concomitante de pomada contendo esteroide e
antibiótico para inflamação e infecção secundárias por bactérias. Estes agentes tópicos também devem ser úteis para T. gulosa e T. skrjabini, em bovinos. Alguns anti­helmínticos sistêmicos têm mostrado atividade contra vermes oculares.
Em bovinos, tanto a aplicação de 5 mg de levamisol/kg SC, quanto de ivermectina e doramectina, ambas na dose de 0,2 mg/kg SC ou IM, têm sido efetiva contra Thelazia spp. Formulações de ivermectina ou doramectina pour­on, aplicadas
na dose de 0,5 mg/kg, também são muito efetivas. A doramectina foi aprovada nos EUA para o tratamento de parasitos oculares adultos, em bovinos. Para T. lacrymalis em equinos, dose única dos anti­helmínticos comumente utilizados,
inclusive ivermectina, administrada por meio de tubo gástrico, na dose de 0,2 mg/kg, têm apresentado efeito limitado, se apresentam, contra vermes oculares. Por outro lado, o protocolo com multidoses de fembendazol (10 mg/kg, 1
vez/dia, por 5 dias) é eficaz contra T. lacrymalis.
Medidas para controle das moscas, direcionadas especialmente contra a mosca da face, auxiliam no controle de telaziose, tanto em bovinos como em equinos. Bovinos em pastagens abertas e secas apresentam menor população de
moscas da face do que aqueles em pastagens onde há sombra e água.

 VERMES OCULARES DE PEQUENOS ANIMAIS
Thelazia californiensis é encontrada em cães, gatos e veados, no oeste dos EUA. T. callipaeda é constatada em cães, gatos, raposas, lobos e coelhos, na Europa e na Ásia. Adicionalmente, ambas as espécies têm potencial zoonótico. Os
parasitos são esbranquiçados, com 7 a 19 mm de comprimento e se movem rapidamente como uma serpente, pelo olho. Até 100 vermes oculares podem ser encontrados no saco conjuntival, ductos lacrimais e na conjuntiva sob a membrana
nictitante e pálpebras. Moscas do lixo (Musca spp, Fannia spp) atuam como hospedeiros intermediários e depositam larvas infectantes no olho, quando se alimentam de secreções oculares.
Os sintomas incluem lacrimejamento excessivo e epífora, conjuntivite, queratite com opacidade e ulceração de córnea e, raramente, cegueira. Após anestesia local, o diagnóstico e o tratamento são prontamente realizados por meio da
observação e remoção dos parasitos com pinça. Alguns autores relataram a eliminação efetiva de infecções por Thelazia spp de cães com injeção SC de 0,2 mg de ivermectina/kg, administração oral de no mínimo 0,5 mg de milbemicina
oxima/kg (2 aplicações, com intervalo de 1 semana, para maior eficácia) ou tratamento spot­on com solução de moxidectina 2,5%. Soluções oculares (moxidectina 1% ou levamisol 2%) ou pomadas (levamisol 1% ou morantel 4%) também
podem ser efetivas. Foi possível a prevenção da infecção por T. callipaeda em cães durante toda a estação pela aplicação SC de 0,17 mg de moxidectina/kg, na forma de liberação lenta, e pela administração oral de milbemicina oxima, na
dose recomendada para prevenção de dirofilariose.

NEOPLASIA DO OLHO E DE ESTRUTURAS ASSOCIADAS

Os diferentes tecidos do olho e das estruturas associadas podem desenvolver neoplasias primárias ou podem ser um local de neoplasias metastáticas. As neoplasias oftálmicas variam quanto ao tipo histológico, frequência e importância nas
diferentes espécies e representam um importante grupo de doenças em oftalmologia veterinária.

Bovinos
As  neoplasias  oftálmicas  mais  frequentes  em  bovinos  são  carcinoma  de  célula  escamosa  e  infiltração  orbitária  associada  ao  linfossarcoma  (ver  p.  671).  Esta  última,  com  ampla  invasão  das  estruturas  orbitárias,  resulta  em  exoftalmia
progressiva, movimentação ocular reduzida, queratite por exposição e úlceras de córnea, que podem ocasionar perfuração.
O carcinoma de célula escamosa ocular (olho canceroso) é a neoplasia mais comum em bovinos. Resulta em perda econômica significativa devido à condenação da carcaça por ocasião do abate e à menor vida produtiva. Ocorre mais
frequentemente em raças Bos taurus do que em Bos indicus, sendo mais comum na raça Hereford, com menor frequência em bovinos das raças Simental e Holstein­Frísio; raramente acomete outras raças. A idade de maior incidência é aos
8 anos e a prevalência real nos rebanhos varia de 0,8 a 5%. A etiologia é multifatorial, com possível influência hereditária, da incidência de luz solar, da dieta, da pigmentação palpebral e, talvez, de vírus. As regiões límbicas medial e lateral
(junção  corneoescleral)  são  afetadas  com  maior  frequência,  mas  pálpebras,  conjuntivas  e  membranas  nictitantes  também  podem  ser  acometidas.  A  proporção  de  envolvimento  bilateral  varia,  mas  pode  chegar  a  35%.  Pigmentações
palpebrais e conjuntivais são altamente herdáveis, podendo reduzir a frequência de carcinoma de célula escamosa de pálpebra, mas têm efeito limitado no desenvolvimento de tumores de conjuntiva e da membrana nictitante. As lesões
cancerígenas ou pré­cancerígenas são bilaterais ou múltiplas, no mesmo olho, em cerca de 28% dos casos. Radiação ultravioleta e alto nível dietético são fatores contribuintes. Os vírus da rinotraqueíte infecciosa bovina e do papiloma
foram isolados nas neoplasias, mas sua importância é desconhecida.
Em geral, as lesões surgem como placas benignas brancas e lisas nas superfícies conjuntivais, podendo progredir para um papiloma e então para o carcinoma de célula escamosa, ou passar diretamente para o estágio maligno. Em geral, as
lesões palpebrais iniciam tanto como uma lesão ulcerativa quanto como hiperqueratose (corno cutâneo). Enquanto neste estágio benigno, cerca de 30% podem regredir espontaneamente. O tumor pode crescer muito, sem invadir o globo
ocular, mas nos estágios posteriores da doença ocorrem invasão do globo e da órbita e metástase aos linfonodos parotídeo e submandibular. Em geral, o diagnóstico se baseia na aparência clínica, mas pode ser rapidamente confirmado pelo
exame citológico de esfregaços por impressão. A invasão neoplásica intraocular deve ser diferenciada de olhos gravemente desarranjados após traumatismo ou ceratoconjuntivite infecciosa (ver p. 470).

Carcinoma de célula escamosa em bovino, com lesão corneoconjuntival. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

Carcinomas de célula escamosa podem responder à extirpação, crioterapia, hipertermia, radioterapia, quimioterapia local com 5­fluoruracila e imunoterapia, ou, frequentemente, uma combinação destas terapias. A excisão cirúrgica é
indicada  para  lesões  pequenas  ou  para  remoção  de  lesões  maiores,  antes  da  crioterapia  ou  hipertermia.  Placas,  papilomas  e  carcinomas  de  célula  escamosa  podem  ser  extirpados  do  limbo  por  meio  de  ceratectomia  superficial.  Após
ceratectomia superficial e remoção do tumor, crioterapia, hipertermia ou enxerto permanente de conjuntiva bulbar têm propiciado excelente resultado a curto prazo, mas a recidiva no mesmo local ou em um local diferente é cerca de 25%.
Para lesões avançadas restritas ao globo ocular, recomenda­se enucleação. Quando os tecidos adjacentes estão acometidos deve­se remover o globo e todos os componentes orbitários (exenteração). A imunoterapia ainda é procedimento
experimental e a regressão tumoral resultante pode ser temporária. Radioterapia não é prática no campo, mas pode ser uma opção para animais de alto valor.
Proprietários de rebanhos problemáticos devem ser orientados quanto à importância do fator hereditário e animais acometidos e seus descendentes devem ser abatidos para reduzir a incidência de tumores. Touros em função reprodutiva
ativa e com carcinoma de célula escamosa ocular devem ser abatidos.

Caninos
As neoplasias palpebrais representam o grupo de neoplasias oftálmicas mais comum em cães. Adenoma e adenocarcinoma da glândula meibomiana são as neoplasias palpebrais mais frequentes (cerca de 60%) em cães mais velhos. Irritação
e deformidade local requerem extirpação da lesão, que geralmente é efetiva. Adenocarcinoma de glândula de Meibômio (sebáceo) é invasor local e histologicamente maligno, mas sabidamente não causam metástase. Melanomas palpebrais,
que se manifestam como massas pigmentadas expansivas nas margens palpebrais ou como tumores na pálpebra, devem ser extirpados com ampla margem. Outras neoplasias palpebrais frequentes incluem histiocitoma, mastocitoma e
papiloma e podem requerer biópsia para determinar a melhor forma de terapia e o prognóstico.
Neoplasias orbitárias em cães provocam exoftalmia, tumefação conjuntival e palpebral, estrabismo e queratite por exposição. Não é possível fazer a retropulsão do globo ocular. Em geral, não há dor. Como cerca de 90% das neoplasias
são malignas e cerca de 75% se originam na órbita, o prognóstico quanto à sobrevida a longo prazo frequentemente é ruim. Os tumores diagnosticados com maior frequência incluem osteossarcomas, fibrossarcomas e adenocarcinomas
nasais. O tipo neoplásico deve ser determinado histologicamente e a extensão da massa determinada pelo exame físico, radiografias de crânio (inclusive procedimentos com contraste especiais, tomografia computadorizada e ressonância
magnética) e ultrassonografia, antes do tratamento mediante excisão cirúrgica ou radiação. A remoção do tumor de órbita com o globo ocular e todos os tecidos orbitários (inclusive o osso adjacente) pode reduzir a possibilidade de recidiva,
mas  causa  mais  deformidade,  especialmente  em  cães  de  pelos  curtos.  O  prognóstico  é  reservado  ou  ruim;  25  a  40%  dos  cães  enfermos  são  submetidos  à  eutanásia  no  momento  do  diagnóstico.  A  cirurgia,  por  vezes  combinada  à
quimioterapia, prolonga a vida por = 6 meses.
Neoplasias corneanas e límbicas são incomuns em cães e podem ser confundidas com fascite nodular e ceratoconjuntivite proliferativa em cães da raça Collie. Melanomas malignos epibulbares ou límbicos são massas pigmentadas focais,
geralmente superficiais, que se estendem tanto por sobre a córnea como caudalmente, através do equador do globo. Após exame intraocular detalhado, incluindo gonioscopia e ultrassonografia em modo B, para detectar possível penetração
da esclera, a excisão cirúrgica parcial ou completa com enxerto escleral, crioterapia ou fotocoagulação a laser em geral é bem­sucedida. Caso ocorra disseminação intraocular, realiza­se enucleação.
Melanomas são as neoplasias de úvea mais comuns; em geral, são pigmentadas e mais frequentemente envolvem a íris e o corpo ciliar. Os sinais clínicos de melanomas de úvea anterior podem incluir uma massa evidente, iridociclite
persistente, hifema, glaucoma e dor. Esses melanomas são classificados como melanomas melanocíticos (80 a 90%) e melanomas malignos (10 a 15%). Metástase não é frequente (< 5%). Adenoma e adenocarcinoma de corpo ciliar são as
neoplasias epiteliais mais frequentes da úvea anterior. Os sintomas podem incluir hifema, glaucoma e, geralmente, uma neoplasia não pigmentada atrás da íris e na pupila. Neoplasias de origem neuroectodérmica são raras. Em geral, o
tratamento implica enucleação. Estudos recentes de melanomas de íris, especialmente em cães Labrador Retriever jovens, sugerem que a fotocoagulação não invasiva com laser diodo pode ser efetiva e repetida, se necessária, evitando­se
assim a enucleação.

Melanoma iridociliar em cão. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

Adenocarcinomas de úvea secundários são relativamente infrequentes e se originam de vários locais distantes. Outras neoplasias, como tumor venéreo transmissível e hemangiossarcoma, podem causar metástase na úvea anterior. O
linfossarcoma frequentemente envolve a úvea anterior e outras estruturas oculares, podendo se apresentar como uma doença bilateral. A terapia sistêmica para linfoma, associada a tratamento anti–inflamatório tópico e/ou sistêmico para
linfoma intraocular, pode ser tentada empregando­se um dos vários protocolos disponíveis para linfoma (p. ex., Madison, WI ou Animal Medical Center: combinação de ciclofosfamida, prednisolona, vincristina e/ou doxorrubicina), mas
cães com linfoma intraocular apresentam períodos de sobrevida mais curtos.

Equinos
Em equinos, tumores da pele, olhos e sistema genital são os mais frequentes e cerca de 80% das neoplasias oculares são malignas. Neoplasias de pálpebras e conjuntivas são os tumores oftálmicos mais frequentes em equinos; a maioria
deles são carcinomas de célula escamosa ou sarcoides. Neoplasias orbitárias são raras e normalmente são extensões locais de tumores palpebrais, conjuntivais ou dos seios, ou de neoplasias sistêmicas, inclusive linfossarcoma. Neoplasias
intraoculares, em geral melanomas malignos, são raras.
Carcinoma de célula escamosa é mais frequente em equinos com 8 a 10 anos de idade, podendo ocorrer mais comumente naqueles com pálpebras despigmentadas ou pouco pigmentadas. Animais da raça Appaloosa e de raças de tração
são acometidos com maior frequência. A radiação ultravioleta pode ser importante, pois sua incidência na América do Norte é mais alta nas áreas montanhosas do sul e do oeste e em áreas de maior altitude ou de radiação solar média.
Pálpebras, conjuntivas, membrana nictitante e regiões límbicas podem ser afetadas por massas ulcerativas ou proliferativas. O envolvimento bilateral não é uma ocorrência frequente (cerca de 15%). O carcinoma de célula escamosa da
membrana nictitante tende mais a invadir a órbita do que aquelas neoplasias de outros tecidos. O tratamento de carcinoma de célula escamosa oftálmico em equinos é semelhante àquele de bovinos, embora a visita ao veterinário para o
tratamento geralmente seja mais precoce; ademais, dá­se maior ênfase à aparência estética após a terapia. Injeções intratumorais repetidas de cisplatina (dose média de 0,97 mg/cm3 de tecido tumoral) frequentemente causam regressão
efetiva do tumor. Após o tratamento do tumor e perda de quantidade variável de tecido palpebral, com frequência há necessidade de blefaroplastia estética. A importância preventiva de anteparos ou máscaras faciais com o objetivo de
reduzir a exposição das camadas externas do olho à luz ultravioleta é desconhecida, mas seu uso deve ser iniciado em uma idade bastante jovem.
O sarcoide equino (ver p. 869) geralmente acomete animais jovens (em média, 3,8 anos de idade) e representa cerca de 40% de todas as neoplasias em equinos. Como o sarcoide destrói o tecido local e apresenta alta taxa de recidiva após
a  cirurgia,  o  tratamento  efetivo,  quando  há  envolvimento  dos  tecidos  perioculares,  é  um  problema  estético  e  funcional.  Os  sarcoides  são  classificados  como  ocultos,  verrucosos,  nodulares,  fibroblásticos,  mistos  e  malignos.
Histologicamente, são considerados neurofibromas, neurofibrossarcomas, mixossarcomas e fibromixossarcomas. Inicialmente surgem como massas subcutâneas nas pálpebras ou nos cantos; em geral, seu volume aumenta rapidamente e
podem invadir a pele, aparecendo como massas avermelhadas carnudas. O tratamento pode ser feito por meio de cirurgia, hipertermia, crioterapia, quimioterapia, radiação ou por uma combinação destas terapias. Após tentativas de remoção
cirúrgica do sarcoide, a ocorrência de recidiva pode ser rápida e preceder a cicatrização da ferida. Imunoterapia com BCG (bacilo de Calmette­Guérin), como estimulante do sistema imune celular, frequentemente é efetiva (cerca de 70%).
Após a remoção cirúrgica de grandes sarcoides, injeta­se uma preparação de BCG (7,5 mg de extrato de parede celular purificado suspenso em 10 ml de solução salina) diretamente no interior da massa remanescente (2 ml/local). As
injeções devem ser repetidas em intervalos de 2 a 4 semanas, até que o tumor desapareça. Corticosteroides sistêmicos e antiprostaglandinas, antes e após o tratamento, podem reduzir o risco de reação anafilática. Terapia com radiação gama
utilizando irídio192 recoberto por platina é altamente efetiva (cerca de 95%), porém é menos prática e, em geral, requer dose média total de 7.000 a 9.000 rads.

Felinos
As neoplasias oftálmicas são menos frequentes em gatos do que em cães. Cerca de 2% dos pacientes felinos apresentam neoplasia e, destes, 2% são acometidos por tumores oftálmicos. Tumores conjuntivais e palpebrais são as neoplasias
oftálmicas  primárias  mais  frequentes.  Essas  neoplasias  geralmente  são  malignas  e  mais  difíceis  de  serem  tratadas  em  gatos  do  que  em  cães.  Carcinomas  de  célula  escamosa,  mais  comuns  em  gatos  brancos  com  margens  palpebrais
despigmentadas,  podem  envolver  pálpebras,  conjuntivas  e  membrana  nictitante;  são  massas  irregulares  róseas,  ásperas  ou  ulceradas,  espessas.  Outras  neoplasias  menos  frequentes  incluem  adenocarcinomas,  fibrossarcomas,
neurofibrossarcomas e carcinomas de célula basal. O tratamento varia em função do tipo, da localização e do tamanho do tumor; inclui excisão cirúrgica, radioterapia e crioterapia. O prognóstico para esses tumores malignos é ruim, com
sobrevida de apenas 1 a 2 meses.
Complexo leucemia­linfossarcoma felino, com massas evidentes. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

A neoplasia intraocular primária mais comum em gatos é o melanoma difuso de íris, que se apresenta como hiperpigmentação progressiva da íris com uma superfície irregular expansiva. Anormalidades pupilares, glaucoma secundário
devido à obstrução do ângulo iridocorneano e buftalmia ocorrem tardiamente nesta doença. Recomenda­se enucleação de neoplasias que crescem rapidamente ou de massas teciduais que provocam anormalidades pupilares, envolvimento
do ângulo iridocorneano e/ou glaucoma, pois em casos avançados é frequente a ocorrência de metástase.
Sarcoma intraocular pós­traumático ocorre em gatos idosos com histórico de uveíte crônica, lesão intraocular prévia ou injeções intraoculares de gentamicina. Os sinais clínicos são glaucoma, atrofia do bulbo ocular (phthisis bulbi) ou
uveíte crônica. A produção de cartilagem e osteoides intraoculares é comum. Recomenda­se enucleação precoce.
O complexo leucemia­linfossarcoma felino (CLLFe) é a neoplasia ocular secundária mais comum. Gatos com CLLFe ocular apresentam sinais clínicos que variam desde lesões oculares isoladas, afetando um ou ambos os olhos, até
doença sistêmica grave. Anormalidades de córnea podem incluir queratite, edema, neovascularização, infiltrados corneanos e hemorragias no estroma. Pode ocorrer queratite ulcerativa. Massas podem ser encontradas na órbita, globo,
conjuntivas e pálpebras. Anormalidades pupilares, incluindo midríase, anisocoria, síndrome da pupila espástica, pupila em formato de “D” ou “D invertido”, e ausência de reflexos pupilares induzidos pela luz podem se instalar meses antes
dos outros sintomas. Uveíte anterior é o achado clínico mais comum no CLLFe. Outros achados incluem hipotensão ocular, alterações de pigmentação e da coloração da íris, precipitados ceráticos, hifema, sinéquia anterior e posterior,
miose e humor aquoso turvo (flare). As alterações no segmento posterior incluem hemorragia de retina, vasos tortuosos e dilatados, embainhamento perivascular e descolamento ou degeneração retiniana. Há poucos estudos terapêuticos em
gatos com linfoma oftálmico, mas gatos com linfoma e infecção pelo vírus da leucemia felina têm tempo de sobrevida menor.

OFTALMOLOGIA

 APARATO LACRIMAL E NASOLACRIMAL
O sistema de produção e drenagem de lágrimas é vital para a saúde da superfície ocular. As glândulas lacrimais dentro da órbita (glândula lacrimal e, em algumas espécies, glândula de Harder), bem como a glândula lacrimal superficial da
membrana nictitante (terceira pálpebra), produzem fluido pré­ocular coletivo ou filme lacrimal pré­corneano. O filme consiste em três camadas: camada externa lipídica (das glândulas de Meibômio), camada intermediária aquosa (das
glândulas lacrimal e da terceira pálpebra) e camada interna (mucosa) das células caliciformes presentes na conjuntiva.
O sistema de drenagem de lágrimas consiste em dois pontos lacrimais (exceto em coelhos e suínos), 2 canalículos, o saco lacrimal (dentro da fossa lacrimal óssea) e o ducto lacrimal longo e muitas vezes tortuoso (para drenar as lágrimas
para o interior da cavidade nasal).
Hipertrofia e prolapso da glândula da membrana nictitante (olho de cereja) é comum em cães jovens e em determinadas raças (p. ex., Cocker Spaniel Americano, Beagle, Lhasa Apso, Pequinês e Buldogue Inglês). No estágio agudo, a
massa glandular vermelha aumenta de volume, evidenciando­se como uma protrusão acima da margem livre da membrana nictitante, e há uma secreção mucopurulenta. Embora a tumefação possa regredir por curtos períodos, a glândula
frequentemente se mantém prolapsada. Por ser uma glândula lacrimal importante, deve ser preservada sempre que possível. A glândula deve ser reposicionada e ancorada por suturas à rima orbitária ou fáscia periorbitária ou cartilagem
nictitante, ou ser recoberta com mucosa adjacente (técnicas de envelope ou de bolso). A excisão parcial deve ser evitada. A excisão completa pode predispor à ceratoconjuntivite seca em 30 a 40% dos cães no decorrer da vida. A resolução
médica ou cirúrgica do olho de cereja ainda predispõe cerca de 20% desses cães à ceratoconjuntivite seca futuramente.
Dacriocistite (inflamação do saco lacrimal) geralmente é causada pela obstrução do saco nasolacrimal e ducto nasolacrimal proximal por restos inflamatórios, corpos estranhos ou massas que pressionam o ducto. Resulta em epífora,
conjuntivite secundária refratária ao tratamento e, ocasionalmente, uma fístula drenante na pálpebra inferior medial. A irrigação do ducto nasolacrimal revela uma obstrução deste, refluxo de secreção mucopurulenta a partir dos pontos
lacrimais,  ou  ambos.  Radiografias  do  crânio  após  injeção  de  contraste  no  interior  do  ducto  (dacriocistorrinografia)  podem  ser  necessárias  para  estabelecer  o  local,  a  causa  e  o  prognóstico  de  obstruções  crônicas.  A  terapia  consiste  na
manutenção da patência do ducto e na instilação de soluções antibióticas tópicas. A cateterização temporária com tubo (silicone ou polietileno) ou material de náilon para sutura monofilamentar 2­0 pode ser necessária para a manutenção da
patência durante a cicatrização. Quando o aparato nasolacrimal tiver sido irreversivelmente danificado, uma nova via de drenagem pode ser construída cirurgicamente (conjuntivoralorinostomia ou conjuntivoralostomia) para condução da
lágrima até a cavidade nasal, seios ou boca.
Pontos lacrimais imperfurados são causas incomuns de epífora em cães jovens. Em potros, a atresia da extremidade nasal (distal) do ducto nasolacrimal é uma causa comum de epífora e conjuntivite crônica. Em bovinos, aberturas
múltiplas do ducto nasolacrimal podem conduzir a lágrima para a superfície da pálpebra inferior e do canto medial, causando dermatite crônica. O tratamento em cães e potros consiste na abertura cirúrgica do orifício bloqueado e na
manutenção da patência por meio da cateterização por várias semanas durante o processo cicatricial.
Ceratoconjuntivite seca (CCS) se deve a uma deficiência lacrimal aquosa e geralmente resulta em conjuntivite mucopurulenta persistente, ulceração e formação de cicatriz corneana. A CCS ocorre em cães, gatos e equinos. Em cães,
está frequentemente associada à dacrioadenite autoimune, tanto da glândula lacrimal como da membrana nictitante, sendo a causa mais frequente de conjuntivite secundária.
Cinomose, tratamento sistêmico com sulfonamida, hereditariedade e traumatismo são causas menos frequentes de ceratoconjuntivite seca em cães. Essa CCS não é frequente em gatos e tem sido associada a infecção crônica pelo herpes
vírus felino do tipo 1 (HVF­1). Em equinos, a ceratoconjuntivite seca pode ser consequência de traumatismo craniano. A terapia tópica consiste em soluções de lágrimas artificiais, pomadas e, se não há ulceração de córnea, combinação de
corticosteroides e antibióticos. Lacrimogênicos, como a ciclosporina A tópica (0,2 a 2%, 2 vezes/dia), tacrolimo (0,02%, 2 vezes/dia) ou pimecrolimo (1%) podem aumentar a produção de lágrimas em cerca de 80% dos cães com valor no
teste lacrimal de Schirmer de 2 mm/min, ou mais. A pilocarpina oftálmica, misturada ao alimento, pode ser útil para ceratoconjuntivite seca neurogênica (um cão pesando 10 a 15 kg deve receber inicialmente 2 a 4 gotas de pilocarpina 2%,
2 vezes/dia). Agentes mucolíticos (p. ex., acetilcisteína 10%) promovem a lise do muco excessivo e restauram a habilidade de espraiamento de outros agentes tópicos. Na CCS crônica refratária à terapia médica, indica­se a transposição do
ducto parotídeo.

Conjuntivite em um gato, associada ao herpes vírus felino 1. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

 CONJUNTIVA
A conjuntiva é dividida em: 1) a conjuntiva palpebral (recobrindo a face posterior das pálpebras), 2) o fórnix ou saco conjuntival onde as conjuntivas palpebral e bulbar se conectam e 3) conjuntiva bulbar (recobrindo o globo anterior ou
episclera) e membrana nictitante. A conjuntiva desempenha funções importantes na dinâmica da lágrima, proteção imunológica, movimento ocular e cicatrização corneana. Por ser frouxamente aderida à episclera, a conjuntiva bulbar é um
tecido útil para enxerto no caso de córnea ulcerada e enfraquecida.
Hemorragia subconjuntival pode ser decorrência de traumatismo ou discrasia sanguínea, deficiência do fator de Von Willebrand e de algumas doenças infecciosas. Não requer tratamento, mas é necessária inspeção cuidadosa para
determinar se há alterações intraoculares mais importantes. Se não há evidência definitiva ou histórico de traumatismo, indica­se o exame sistêmico para determinar a causa da hemorragia espontânea.
Quemose ou edema conjuntival ocorre em algum grau em associação a todos os casos de conjuntivite, porém é mais evidente em traumatismo, hipoproteinemia, reações alérgicas e picadas de insetos. Estas últimas são tratadas com
corticosteroide tópico e, em geral, se resolvem rapidamente. Indica­se terapia específica para o agente causal.
Conjuntivite é comum em todas as espécies domésticas. Os agentes etiológicos variam de infecciosos a irritantes ambientais. Os sintomas são hiperemia, quemose, secreção ocular, hiperplasia folicular e desconforto ocular brando. A
aparência da conjuntiva em geral não é suficientemente distinta para sugerir o agente etiológico e o diagnóstico específico depende do histórico, exame físico, raspado e cultura conjuntival, teste lacrimal de Schirmer e, ocasionalmente,
biópsia. A conjuntivite unilateral pode resultar de corpo estranho, dacriocistite ou ceratoconjuntivite seca. Em gatos, herpes vírus­1 (HVF­1), Mycoplasma ou Chlamydophila psittaci provocam conjuntivite que se inicia em um olho e se
torna bilateral após cerca de 1 semana. O diagnóstico específico é feito mais rapidamente pela demonstração de inclusões ou do agente em raspado conjuntival. A conjuntivite bilateral é comum em infecções virais, em todas as espécies. As
herpes viroses causam conjuntivite em felinos, bovinos, equinos e suínos. A secreção purulenta indica um componente bacteriano, mas este pode ser oportunista, devido à debilidade da membrana mucosa. Irritantes e alergênios ambientais
são  causas  comuns  de  conjuntivite  em  todas  as  espécies.  Se  um  exsudato  mucopurulento  estiver  presente,  indica­se  terapia  antibiótica  tópica,  mas  pode  não  ser  curativa  se  outros  fatores  predisponentes  estiverem  envolvidos.  Fatores
mecânicos, como corpos estranhos, irritantes ambientais, parasitos e defeitos de conformação palpebral, devem ser removidos ou corrigidos. Tetraciclina tópica é indicada para infecções por clamídias e micoplasmas; preparações antivirais
tópicas (p. ex., idoxuridina 1%, adenina arabinosídeo 3% ou trifluorotimidina 1%) são indicadas para infecção por herpes vírus quando tanto a córnea quanto à conjuntiva estão envolvidas. A suplementação oral diária com 250 a 500 mg de
L­lisina para gatos pode reduzir a gravidade e a frequência de recidiva de conjuntivite e queratite causada pelo HVF­1.

 CÓRNEA
O tamanho aproximado da córnea, circular a oval (vertical/horizontal), varia de acordo com a espécie animal: cão (8,5 × 9,5 mm), gato (8,4 × 8,9 mm), equino (16,6 × 17,9 mm) e boi (15,2 × 16,4 mm). Em animais, a córnea consiste em um
epitélio superficial e membrana basal, estroma grande e relativamente acelular, membrana de Descemet mais profunda e endotélio profundo com uma única camada de células. A córnea mantém uma barreira forte e durável entre o olho e o
ambiente, bem como um meio transparente para permitir a passagem de luz e imagens para o interior do segmento posterior. As doenças corneanas são comuns na maioria das espécies animais e felizmente podem ser tratadas com sucesso
por meio de medicamentos, cirurgia ou uma combinação destes. A acessibilidade à córnea possibilita várias técnicas diagnósticas detalhadas e não invasivas.
Queratite  superficial  é  comum  em  todas  as  espécies,  sendo  caracterizada  por  vascularização  e  opacificação  corneana,  o  que  pode  ser  devido  a  edema,  infiltrados  celulares,  pigmentação  ou  fibroplasia.  Se  há  ulceração,  a  dor  –
manifestada por epífora e blefarospasmo – é um sinal evidente. Queratite unilateral frequentemente tem origem traumática. Fatores mecânicos, como defeitos de conformação palpebral e corpos estranhos, devem ser sempre excluídos como
causas  possíveis,  pois  não  ocorre  melhora  até  que  sejam  resolvidos.  A  queratite  ulcerativa  pode  ser  complicada  pela  invasão  bacteriana  secundária  e,  em  equinos,  por  fungos  saprófitas.  A  queratite  superficial  bilateral  pode  ser
imunomediada ou associada à ausência de lágrima, defeitos de conformação palpebral ou agentes infecciosos.
Pano, ou doença de Uberreiter, é uma queratite superficial crônica específica, bilateral, progressiva e proliferativa que se inicia no limbo lateral e, por fim, se estende a partir de todos os quadrantes para recobrir a córnea. Esta queratite
imunomediada é comum em animais da raça Pastor Alemão, Belgian Tervuren, Border Collie, Greyhound, Husky Siberiano e Pastor Australiano. A terapia específica consiste no uso tópico de antibióticos, antivirais ou antimicóticos,
quando apropriados, remoção de qualquer irritante mecânico, reposição lacrimal quando há deficiência, e corticosteroides ou ciclosporina A (ou ambos), quando de origem imunomediada. Esta última pode requerer uso contínuo indefinido
e a frequência varia de acordo com a resposta clínica.
Ulceração corneana com malácia em equino. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

Queratite intersticial é um envolvimento profundo do estroma corneano, presente em todos os casos crônicos e em vários casos agudos de uveíte anterior. A vascularização corneana é menos ramificada, mais delgada e mais profunda do
que na queratite superficial. Se o endotélio estiver rompido, o edema de córnea é frequentemente acentuado. Doenças sistêmicas, como hepatite infecciosa canina, febre catarral maligna bovina, micoses sistêmicas em diversas espécies e
sepse neonatal que atinge o olho podem causar queratite intersticial uni ou bilateral. O tratamento é direcionado à uveíte anterior, à doença sistêmica, ou a ambas. Queratite estromal específica não ulcerativa e periférica e uveíte anterior
persistente (ceratouveíte) ocorrem em equinos. O prognóstico e a resposta ao tratamento são ruins.
Queratite ulcerativa pode ser superficial, profunda, profunda com descemetocele ou perfurante. Dor, irregularidade, edema e, por fim, vascularização corneana são sintomas de ulceração. Uma densa infiltração branca na margem da
úlcera  indica  intensa  leucotaxia e  envolvimento  bacteriano.  Para  detectar  úlceras  pequenas,  pode  ser  necessária  a  aplicação  tópica  de  fluoresceína.  Em  cães  e  equinos,  a  maioria  das  úlceras  tem  origem  mecânica;  em  bovinos,  ovinos,
caprinos e cervídeos, os agentes infecciosos e as causas mecânicas são importantes; em felinos e equinos, a infecção por herpes vírus é uma causa frequente. Todas as úlceras estão sujeitas à contaminação bacteriana secundária, bem como
malácia estromal (“derretimento”) por proteinase endógena. A terapia de úlceras superficiais geralmente é medicamentosa e consiste no uso de antibiótico(s) tópico(s) de amplo espectro, correção de qualquer fator mecânico e atropina
tópica para iridocicloplegia e redução da dor ocular. Efeitos adversos induzidos pela atropina incluem redução da produção lacrimal em todas as espécies e cólica em equinos, que devem ser considerados. A terapia antiproteinase para
úlceras estromais com malácia inclui aplicação tópica de soro e outros fármacos.
Síndromes  de  ulcerações  superficiais,  recorrentes  e  de  cicatrização  muito  lenta,  ocorrem  em  cães,  gatos  e  equinos.  Em  cães,  podem  ser  decorrências  de  anormalidade  da  membrana  basal,  causando  aderência  deficiente  do
epitélio corneano, enquanto em gatos e equinos deve­se suspeitar de infecção por herpes vírus. A terapia inicial é o desbridamento da úlcera, seguido de uso tópico de antibióticos e atropina. Para casos refratários em cães, múltiplas incisões
em pontos ou em linhas cruzadas (ceratotomias pontilhadas ou em grade) das córneas acometidas com uma agulha calibre 22 estimulam a maioria das úlceras indolentes a cicatrizar dentro de 7 a 10 dias. Relatos recentes sugerem que estas
ceratotomias em gatos podem predispor ao sequestro corneano e devem ser empregadas com muito cuidado. Recobrimentos com a membrana nictitante (ou lentes de contato macias ou adesivos de colágeno) atuam como uma bandagem
compressiva  e,  frequentemente,  são  terapêuticas  para  úlceras  superficiais.  O  tratamento  medicamentoso  de  úlceras  profundas  é  semelhante  àquele  de  úlceras  superficiais,  mas  muitas  úlceras  profundas  também  requerem  enxertos
conjuntivais para reforçar e manter a integridade da córnea.
Queratite e sequestro corneano parecem ocorrer exclusivamente em gatos. Nota­se opacidade marrom a negra, dolorida, central a paracentral, composta de estroma necrosado, vascularização e inflamação circundante. O tratamento
consiste em ceratectomia superficial e, em lesões mais profundas, enxertos conjuntivais.
Abscessos estromais corneanos em equinos podem ser sequelas da cicatrização de defeitos ou úlceras de córnea e aprisionamento de bactérias ou fungos (ou ambos) no estroma, após a reepitelização. Um infiltrado estromal, branco a
amarelo, variável, é circundado por queratite e vascularização estromais intensas e uveíte anterior de intensidade variável, mas muito frequente. O tratamento consiste em terapia antimicrobiana intensiva tópica e, ocasionalmente, sistêmica
(e, se indicados, antifúngicos), iridocicloplégicos, anti­inflamatórios não esteroides (AINE) e, às vezes, a remoção cirúrgica do abscesso com enxerto conjuntival e tectônico da córnea.
Degeneração e distrofias corneanas ocorrem  em  cães,  gatos  e  equinos.  As  degenerações  corneanas  são,  frequentemente,  unilaterais  e  em  geral  secundárias  a  doenças  oculares  ou  sistêmicas.  As  distrofias do  estroma  corneano  são
bilaterais, parecem ser hereditárias ou decorrentes de predisposição racial em cães e, com frequência, consistem em deposição de triglicerídios, colesterol e cálcio no estroma corneano. Geralmente, não há necessidade de tratamento.
A distrofia corneana também pode envolver o endotélio da córnea. Acomete principalmente cães das raças Boston Terrier, Chihuahua e Dachshund. As fêmeas de Boston Terrier são mais acometidas do que os machos, com idade média
de 7,5 anos. Devido ao endotélio distrófico e degenerativo se desenvolve um edema de córnea progressivo, porém indolor. No caso de edema de córnea extenso de toda a espessura podem se desenvolver bolhas no epitélio da córnea, que
são bastante doloridas. O tratamento de casos precocemente diagnosticados, antes do envolvimento total da córnea, consiste em aplicações tópicas frequentes de solução hiperosmótica (cloreto de sódio 2 a 5% ou glicose 40%) e, nos casos
avançados, termoceratoplastia (procedimento de Salaras) ou ceratoplastia de espessura completa (penetrante).
 CRISTALINO
O  cristalino  avascular  e  opticamente  claro  consiste  em  cápsula  anterior  do  cristalino, cortical  anterior,  núcleo,  cortical  posterior  e  cápsula  posterior do  cristalino  muito  fina  (da  região  anterior  para  a  posterior).  O  cristalino  é  formado
precocemente  no  desenvolvimento  do  olho,  sendo  recoberto  por  suas  membranas  basais  (cápsulas  lenticulares  anterior  e  posterior),  as  quais  isolam  as  proteínas  lenticulares  do  sistema  imune  que  se  forma  em  seguida.  Portanto,
posteriormente na vida do animal, se a barreira da cápsula lenticular for comprometida por trauma ou cirurgia, o sistema imune “ataca” o material lenticular estranho. A única função do cristalino é permitir a passagem inalterada de luz e
imagens para a retina. Doenças do cristalino envolvem alterações na sua transparência.
Catarata é a opacificação do cristalino ou de sua cápsula e deve ser diferenciado de imperfeições lenticulares mínimas em cães jovens e do aumento normal da densidade nuclear (esclerose nuclear) que ocorre em animais mais idosos.
As cataratas geralmente são classificadas de acordo com a idade de ocorrência (congênita, juvenil, senil), localização anatômica, causa, grau de opacificação (incipiente, imatura, madura, hipermatura) e forma. A maioria das cataratas pode
ser detectada por meio da dilatação da pupila e de exame da região pupilar contra a retroiluminação do fundo tapetal. A biomicroscopia com lâmpada em fenda permite o exame direto ideal do cristalino. As cataratas (frequentemente
hereditárias) são mais comuns em cães do que em outras espécies (ver Tabela 2). Outras causas incluem diabetes melito, má nutrição, radiação, inflamação e traumatismo. A maioria das cataratas hereditárias relatadas em gatos ocorre em
animais jovens.
Em cães, as cataratas secundárias ao diabetes melito são cada vez mais comuns. A alta concentração sanguínea de glicose faz com que o sorbitol intralenticular se acumule, intensificando as forças osmóticas do cristalino, fazendo com
que ele se torne embebido em água, resultando em tumefação, ruptura e morte das fibras. Tipicamente, essas cataratas se desenvolvem rapidamente e podem causar ruptura da cápsula lenticular. A cirurgia deste tipo de catarata parece
propiciar  a  mesma  taxa  de  sucesso  que  a  obtida  para  cataratas  hereditárias  em  cães.  Outras  sequelas  oculares  de  diabetes  melito  em  cães  são  pequenas  hemorragias  de  retina  ocasionais,  neuropatia  corneana  presumida  e  redução  da
sensibilidade da córnea.

Catarata em cão da raça Cocker Spaniel americano. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

A visão pode ser recuperada em cães, gatos e equinos jovens, quando a catarata sofre reabsorção espontânea suficiente. A catarata nuclear congênita em animais jovens pode sofrer redução de tamanho com o crescimento do cristalino e
permitir o restabelecimento da visão com a maturidade do animal. Animais com catarata imatura e incompleta podem ser beneficiados pelo uso tópico de atropina oftálmica, 2 a 3 vezes/semana, a qual permite visão em torno da catarata
central.  Entretanto,  a  única  terapia  definitiva  para  a  catarata  é  a  remoção  cirúrgica  do  cristalino.  Em  cães,  a  extração  da  catarata,  frequentemente  por  facoemulsificação,  propicia  melhor  resultado  quando  realizada  antes  da  maturação
completa da catarata e do estabelecimento de uveíte induzida pelo cristalino (devido ao extravasamento de material lenticular). A uveíte induzida pelo cristalino é exacerbada pela cirurgia da catarata e contribui muito para complicações
pós­operatórias. Em animais nos quais a cirurgia de catarata não é realizada, o monitoramento clínico contínuo é importante. A uveíte anterior secundária induzida pelo cristalino frequentemente requer monitoramento a longo prazo e
tonometrias repetidas e, ocasionalmente, terapia com corticosteroide e midriático. Glaucoma secundário e atrofia do bulbo ocular (phthisis bulbus) são complicações possíveis.
Deslocamento do cristalino (subluxação, luxação anterior ou posterior) ocorre em todas as espécies, mas é comum como um defeito primário hereditário em cães de várias raças Terrier. O deslocamento completo para o interior da
câmara  anterior  provoca  sintomas  agudos  e  frequentemente  é  acompanhado  de  glaucoma  e  edema  de  córnea.  O  tratamento  consiste  na  remoção  cirúrgica  por  meio  de  facoemulsificação  ou  extração  intracapsular  do  cristalino.  O
deslocamento  posterior  para  o  interior  da  cavidade  vítrea  é  assintomático  ou  associado  a  inflamação  ocular  ou  glaucoma.  Subluxação  de  cristalino  é  reconhecida  por  um  afácico  crescente  e  pela  tremulação  ou  instabilidade  da  íris
(iridodonese) e do cristalino (facodonese). A decisão em remover o cristalino com subluxação se baseia na gravidade da doença ocular que pode ser atribuída ao deslocamento lenticular. Este deslocamento também pode ser ocasionado por
traumatismo, aumento do globo por glaucoma e por alterações zonulares degenerativas com catarata hipermadura. Procedimentos para remoção de cristalino deslocado estão associados a maior risco de complicações pós­operatórias, como
glaucoma e descolamento de retina.

 EXAME FÍSICO DO OLHO
O exame inicial do olho deve avaliar simetria, conformação e lesões macroscópicas. O olho deve ser visualizado a uma distância de cerca de 1 m, sob boa iluminação e com mínima contenção da cabeça. O segmento ocular anterior e os
reflexos pupilares à luz são examinados em detalhe com uma luz forte e sob aumento, em uma sala escura. Testes basais, como o teste lacrimal de Schirmer, coloração por fluoresceína e tonometria (mensuração da pressão intraocular),
podem ser seguidos por testes adicionais, como coleta de amostras para citologia e cultura de amostras de conjuntiva e córnea, eversão de pálpebra para exame e irrigação do sistema nasolacrimal para avaliação de partes externas do olho,
inclusive o segmento anterior. Doenças do vítreo e do fundo de olho são avaliadas por oftalmoscopia direta e indireta (geralmente realizadas após indução de midríase) e pelo teste da visão (reflexo à ameaça, teste do curso com obstáculos,
reflexo de ofuscamento etc.).
O teste lacrimal de Schirmer e as culturas devem ser realizados antes da instilação do anestésico tópico. A coloração com fluoresceína e a eversão das pálpebras não requerem anestesia tópica, mas a tonometria, o exame da superfície
bulbar  da  membrana  nictitante,  a  coleta  de  amostra  para  citologia  conjuntival  e  corneana,  a  gonioscopia  e  a  lavagem  do  sistema  nasolacrimal  geralmente  a  requerem.  Para  prevenir  resultados  falso­positivos,  amostras  para  citologia
conjuntival e corneana que serão analisadas por meio de procedimentos que empregam anticorpos fluorescentes devem ser colhidas antes da coloração com fluoresceína tópica.
Exames especiais, como biomicroscopia com lâmpada em fenda, ultrassonografia, angiografia fluoresceínica e eletrorretinografia, podem requerer sedação ou anestesia local, regional ou geral, dependendo da espécie.

 FUNDO DE OLHO
O  fundo  de  olho  consiste  no  fundo  tapetal  superior,  fundo  não  tapetal  ventral  e  circunjacente,  vascularização  da  retina  e  disco  óptico  (raiz  do  nervo  óptico  ou  papila  óptica).  Histologicamente,  o  segmento  posterior  consiste,  da  parte
superficial para o interior, das seguintes estruturas: 1) esclera posterior; 2) coroide, que contém células pigmentadas, com vasos sanguíneos, para suprir as necessidades metabólicas das camadas mais externas da retina, e o tapete lúcido,
para aumentar a visão em ambiente de pouca luminosidade (tapete celuloso, em carnívoros, e tapete fibroso, em herbívoros); 3) retina, que consiste em 9 camadas de neurorretina e epitélio pigmentado retiniano externo; e 4) disco óptico,
onde os axônios das células ganglionares da retina saem do olho através de uma frágil lâmina cribriforme escleral fenestrada, para fazer sinapse no corpo geniculado lateral (visão) ou no mesencéfalo (reflexo pupilar à luz [núcleo de
Edinger–Westphal] ou reflexo à ameaça [mesencéfalo e colículos rostrais]).
Doenças  do  fundo  do  olho  podem  ser  primárias  ou  secundárias  a  doenças  sistêmicas.  Anormalidades  hereditárias  podem  ser  congênitas  ou  ocorrer  tardiamente,  sendo  importantes  na  patogênese  de  retinopatias  em  cães  e  gatos.
Traumatismo, doenças metabólicas, infecções sistêmicas, neoplasias, discrasia sanguínea, hipertensão e deficiências nutricionais são possíveis causas primárias de retinopatias em todas as espécies.

Coriorretinite
A coriorretinite frequentemente é uma manifestação de doença infecciosa sistêmica; é importante em ambas, na compreensão do diagnóstico e no prognóstico da função visual. Excetuando­se os casos em que as lesões são generalizadas ou
que envolvam o nervo óptico, elas são frequentemente “silenciosas”. As cicatrizes podem ser diferenciadas das lesões ativas, as quais apresentam bordas turvas e mal definidas. Exame oftalmoscópico da rotina de todos os animais com
doenças sistêmicas frequentemente permitem o diagnóstico rápido de várias doenças específicas. A coriorretinite pode ocorrer no caso de cinomose canina, micoses sistêmicas em cães e gatos, prototecose, toxoplasmose felina, tuberculose,
sepse bacteriana em animais jovens, peritonite infecciosa felina, meningoencefalite tromboembólica em bovinos, febre catarral maligna bovina, febre suína clássica, leptospirose e oncocercose em equinos. A terapia é direcionada à doença
sistêmica.

Descolamentos de Retina
Descolamento de retina ocorre na maioria das espécies. Em cães, o descolamento ou a separação da retina entre a retina neurossensitiva e o epitélio pigmentado da retina está associado a anomalias de retina congênitas (displasia de retina e
anomalia do olho do cão Collie), coriorretinite, traumatismo, cirurgia intraocular e neoplasia de segmento posterior. Em gatos, o descolamento de retina ocorre no caso de coriorretinite associada à peritonite infecciosa felina, leucemia viral
felina e hipertensão sistêmica. Em equinos, as causas mais frequentes são traumatismo, cirurgia intraocular e uveíte recidivante.
Os descolamentos de retina são classificados clinicamente como não regmatogênicos (seroso, exsudativo, hemorrágico, secundário à sinerese vítrea) e regmatogênicos (na ruptura de retina [orifícios ou rasgos]). Os sintomas clínicos
incluem midríase, anisocoria, perda visual e hemorragia intraocular. O diagnóstico é feito por oftalmoscopia e, no caso de opacidade de córnea ou cristalino, por ultrassonografia ocular.
Os descolamentos de retina não regmatogênicos geralmente são tratados com medicamentos, com terapia direcionada à causa primária. Ocorre nova aderência da retina com a resolução do exsudato e da hemorragia subrretiniana. Pode
ocorrer degeneração de retina variável nas áreas de descolamento. Geralmente, os descolamentos de retina regmatogênicos com ruptura de retina requerem correção cirúrgica.

Retinopatias hereditárias
Anomalia do olho do cão Collie é um defeito ocular congênito, de característica hereditária recessiva, com expressão variável em cães Collie de pelos lisos e crespos. Ocorre também em animais da raça Shetland Sheepdog, Border Collie,
Australian Sheepdog, Lancashire Heeler e Nova Scotia Duck Tolling Retriever. A lesão básica é uma área de hipoplasia de coroide ou de coroide e retina que, à oftalmoscopia, aparece como uma área focal de tamanho variado, pálida,
lateral ao disco óptico. Cães acometidos mais gravemente (10 a 20%) podem apresentar lesões colobomatosas adicionais da papila óptica ou em região peripapilar e descolamento ocasional da retina (2 a 5%). Pode ocorrer hemorragia
intraocular. A visão não é prejudicada de forma apreciável, a não ser que haja descolamento de retina.
Displasia de retina é um mau desenvolvimento congênito, geográfico, focal ou generalizado da retina, que pode ser decorrência de traumatismo, defeito genético ou lesão intrauterina, como aquelas causadas por infecções virais. A
maior  parte  das  formas  de  displasia  de  retina  em  cães  é  hereditária.  Infecções  virais  maternas,  especialmente  no  início  do  desenvolvimento  fetal,  podem  resultar  em  anomalias  oculares  múltiplas  com  displasia  de  retina  em  gatinhos
(panleucopenia), carneiros (doença da língua azul), filhotes de cães (herpes vírus) e bezerros (diarreia viral bovina). Raças de cães com displasia de retina focal, geográfica e generalizada considerada herdada como uma característica
autossômica recessiva incluem cães das raças Cocker Spaniel Americano, Beagle, Labrador Retriever, Rottweiler e Yorkshire Terrier. As áreas focais de retina mal desenvolvidas podem ser assintomáticas ou interferir com a visão central.
Displasia  de  retina  generalizada  com  descolamento  de  retina,  redução  da  acuidade  visual  ou  cegueira  é  hereditária  em  animais  das  raças  English  Springer  Spaniel,  Bedlington  Terrier,  Sealyham  Terrier,  Labrador  Retriever,  Doberman
Pinscher e Australian Sheepdog. Outras anomalias oculares, incluindo microftalmia e catarata congênita, frequentemente acompanham as formas generalizadas. Em cães das raças Labrador Retriever e Samoyed, a displasia de retina pode
estar associada à displasia esquelética (encurtamento) dos membros torácicos.

Atrofia progressiva da retina em cão e alterações iniciais do fundo do olho. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

Atrofia  progressiva  da  retina  (APR)  é  um  grupo  de  retinopatias  degenerativas,  consistindo  de  degeneração  e  displasia  fotorreceptoras  hereditárias,  que  apresentam  aparências  clínicas  semelhantes.  As  displasias  fotorreceptoras
hereditárias, como característica autossômica recessiva nos quais os sintomas clínicos se desenvolvem no primeiro ano de vida, ocorrem em animais das raças Setter Irlandês, Collie, Elkhound Norueguês, Schnauzer miniatura e Pastor
Belga. As degenerações de fotorreceptores herdadas como características autossômicas recessivas, nas quais os sintomas clínicos se desenvolvem aos 3 a 5 anos de idade, ocorrem em cães Poodle toy e miniatura, Cocker Spaniel Inglês e
Americano, Labrador Retriever, Terrier Tibetano, Dachshund miniatura de pelos longos, Akita e Samoyed. No Husky Siberiano, a APR é herdada como uma característica ligada ao cromossomo X, enquanto em Bull Mastiff, a APR é uma
herança autossômica dominante. Suspeita­se que muitas outras raças de cães também apresentam APR hereditária. Em gatos da raça Abissinia, a APR ocorre tanto como displasia quanto como degeneração de fotorreceptores. Inicialmente
nota­se cegueira noturna, que progride para cegueira total dentro de meses a anos. Lesões oftalmoscópicas incluem aumento simétrico bilateral da refletividade do fundo tapetal, redução da pigmentação do fundo não tapetal, atenuação e
redução do número de vasos da retina e eventual atrofia da papila óptica. A eletrorretinografia é frequentemente utilizada para investigar e diagnosticar esta condição. Cataratas corticais são comuns em estágios tardios da APR em várias
raças e podem mascarar a retinopatia primária. Não há terapia efetiva disponível. Marcador de DNA com base na mucosa bucal e no sangue e testes genéticos específicos foram desenvolvidos para detectar cães portadores e acometidos,
antes do desenvolvimento dos sintomas clínicos em várias raças. A lista de raças afetadas por degenerações retinianas hereditárias e de genes causadores continua a crescer. Para informações atualizadas, consulte literatura recente.
Distrofia do epitélio pigmentado da retina (atrofia progressiva central da retina) ocorre em animais das raças Labrador Retriever, Collie de pelos lisos ou rugosos, Border Collie, Shetland Sheepdog e Briard. A condição é hereditária
em animais da raça Labrador Retriever, como característica dominante de penetrância variável. Os achados oftalmoscópicos iniciais (às vezes, antes de surgirem os sintomas clínicos) são pequenos focos de pigmentação irregular no fundo
tapetal que, por fim, se unem e desaparecem gradualmente conforme aumenta a refletividade do fundo tapetal.
O fundo não tapetal pigmentado se torna manchado, a vascularização da retina gradativamente diminui e o disco óptico se atrofia. A redução da acuidade visual progressiva ocorre de modo gradual ao longo de vários anos. A formação de
catarata ocorre tardiamente na doença. Não há tratamento. Estudos recentes sugerem que deficiência de vitamina E também pode ser importante na patogênese desta doença. Uma doença semelhante em equinos, a doença do neurônio motor
equino (ver p. 1141), é acompanhada de áreas focais amarelo­amarronzadas espalhadas pelo fundo tapetal e também tem sido associada à deficiência de vitamina E.

Início de hemorragia e descolamento de retina desenvolvidos lateralmente ao disco óptico, em filhote de cão com anomalia do olho do Collie. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

 GLAUCOMA
Os glaucomas geralmente estão relacionados com a drenagem diminuída de humor aquoso através da trama trabecular da câmara anterior ou ângulo iridocorneano (drenagem convencional, cerca de 85%) e através da rede uveoescleral
(através do corpo ciliar e espaço subescleral, cerca de 15%). A produção excessiva de humor aquoso em pessoas parece ser uma causa rara de glaucoma e ainda não foi relatada em animais. Alterações na composição do humor aquoso
foram relatadas recentemente em pessoas e animais com glaucoma e parece ser importante na gênese e progressão da doença.
Os glaucomas representam um grupo de doenças caracterizadas pelo aumento da pressão intraocular, com destruição de retina e do disco óptico resultante. O glaucoma de baixa tensão, caracterizado em pessoas por pressão intraocular
normal e lesão progressivo ao disco óptico, não foi documentado em animais domésticos. Em cães, os glaucomas primários (hereditários) e secundários ocorrem em cerca de 1,7% da população da América do Norte. A frequência de
glaucomas  primários  bilaterais  relacionados  com  a  raça,  em  cães  de  raça  pura,  é  maior  que  em  qualquer  espécie  animal,  exceto  em  pessoas  (0,9%).  Em  gatos,  os  glaucomas  são  predominantemente  secundários  à  uveíte  anterior  e  a
neoplasias; entretanto, em gatos da raça Siamesa ocorre glaucoma primário de ângulo aberto. Em equinos, os glaucomas parecem ser pouco diagnosticados, porque a tonometria de aplanação não é realizada rotineiramente. Ocorrem com
maior frequência em animais mais velhos, em animais da raça Appaloosa e naqueles com uveíte anterior concomitante. Em bovinos, os glaucomas têm sido associados a anomalias iridocorneanas congênitas e uveíte anterior.

Glaucoma crônico em cão. Globo ocular com glaucoma crônico frequentemente apresenta luxação de cristalino, com catarata. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

Procedimentos diagnósticos essenciais para o manejo dos glaucomas incluem tonometria, oftalmoscopia (direta e indireta) e gonioscopia (visualização do ângulo iridocorneano e trama ciliar anterior). Técnicas eletrofisiológicas mais
recentes, como eletrorretinograma padrão e potenciais evocados visuais, estimam o lesão às células ganglionares da retina e aos seus axônios e parecem sensíveis indicadores da destruição destas células relacionada com o glaucoma. Novas
técnicas clínicas de imagem de alta resolução, incluindo biomicroscopia ultrassônica para alterações de segmento anterior, e tomografia de coerência óptica, para alterações de retina e de base de nervo óptico, permitem exames intraoculares
detalhados e não invasivos. Em pequenos animais, o tonômetro de indentação de Schiotz foi substituído por tonômetros de aplanação, mais acurados e recentes, utilizados para estimar a pressão intraocular. Em equinos e bovinos, pode ser
utilizado apenas o tonômetro de aplanação.
A pressão intraocular é razoavelmente consistente na maioria das espécies (ver Tabela 1) e variações diurnas foram documentadas em cães, equinos, coelhos e primatas não humanos. A oftalmoscopia permite a detecção da lesão à retina
e ao disco óptico, relacionadas com a pressão intraocular. Gonioscopia é a base para a classificação de todos os glaucomas; ela detecta alterações no fluxo para o exterior do ângulo iridocorneano e na abertura da fenda esclerociliar, de
acordo com a progressão do glaucoma, e auxilia na determinação de tratamentos médicos e cirúrgicos mais apropriados. A biomicroscopia ultrassônica (50 a 100 MHz) permite um melhor exame do ângulo da câmara anterior e de toda a
trama ciliar.
Os sintomas clínicos são tradicionalmente considerados agudos e crônicos. Na realidade, a maioria dos casos de glaucoma agudo é sobreposta por glaucomas crônicos, em vez de ocorrerem como eventos singulares. A maioria dos cães
com glaucoma precoce a moderadamente crônico não é levada ao veterinário, porque os sintomas clínicos iniciais – pupila que demora para se dilatar, congestão venosa conjuntival bulbar branda e aumento de volume inicial do olho
(buftalmia ou megaloglobo) – são muito discretos. Para detectar um glaucoma inicial, a tonometria deve ser realizada rotineiramente em raças de cães de alto risco, como parte do exame físico geral anual. Os sintomas clínicos de aumento
agudo  e,  frequentemente,  marcante  da  pressão  intraocular  são  pupila  dilatada,  fixa  ou  lenta,  congestão  venosa  conjuntival  bulbar,  edema  de  córnea  e  globo  firme.  No  caso  de  aumento  crônico  da  pressão  intraocular,  tem­se  aumento
secundário do globo, deslocamento do cristalino e ruptura da membrana de Descemet da córnea (estrias corneanas). Em geral, a dor se manifesta mais por alterações comportamentais e, ocasionalmente, por dor periorbitária do que por
blefarospasmo.
A  classificação  dos  glaucomas  auxilia  no  planejamento  ideal  para  a  conduta  clínica  e  preservação  da  visão.  A  escolha  por  tratamento  medicamentoso  ou  cirúrgico,  ou  mais  frequentemente  pela  combinação  de  ambos,  se  baseia  no
fechamento progressivo do ângulo iridocorneano, que ocorre na maioria dos casos de glaucoma em cães. Para glaucoma de ângulo aberto em cães, a conduta a curto e longo prazo se baseia em drogas mióticas, inibidores da anidrase
carbônica, tópicos e sistêmicos, prostaglandinas, solução osmótica e bloqueadores beta­adrenérgicos. Estes mesmos tratamentos são utilizados no controle inicial do glaucoma de ângulo estreito e fechado, mas o tratamento a curto e longo
prazos frequentemente requer intervenção cirúrgica como, por exemplo, procedimentos de filtração, shunt de câmara anterior, ciclocrioterapia ou ciclofotocoagulação transescleral a laser.  Em  cães,  o  manejo  a  curto  e  longo  prazos  do
glaucoma em estágio final, com buftalmia e cegueira, também requer procedimento cirúrgico. Por exemplo, prótese intraescleral e enucleação, bem como ciclocriotermia ou gentamicina intravítreo (10 a 25 mg) combinada com 1 mg de
dexametasona. Procedimentos cirúrgicos em cães têm tradicionalmente resultado apenas em cura de curta duração porque as fístulas filtrantes eventualmente são recobertas por cicatriz e perdem sua função. Mais recentemente, o shunt de
câmara anterior, com ou sem válvula, propicia melhor resultado. Drogas antifibróticas, como mitomicina C e 5­fluoruracila, podem retardar ou prevenir a cicatrização dos canais de fluxo alternativo do humor aquoso e prolongar sua função.
Em gatos, a terapia médica geralmente é o fundamento do tratamento e consiste no uso de betabloqueadores adrenérgicos (cuidado com gatos pequenos), inibidor da anidrase carbônica tópico e, para aqueles com glaucoma associado à
uveíte anterior, corticosteroide tópico e/ou sistêmico. Em equinos, a ciclofotocoagulação transescleral a laser, única ou repetida, é o procedimento mais efetivo.
Tabela 1 – Pressão intraocular obtida por tonometria de aplanação

Espécie Tonômetro PIO (mmHg)


Média ± DPa

Cão MacKay­Marg 15,7 ± 4,2

Tono­PenTM 18,7 ± 5,5
12,9 ± 2,7

Tono­Vet® 10,8 ± 3,1

Gato Tono­Pen 19,7 ± 5,6


Coelho Pneumatonografia 19,5 ± 1,8
17,9 ± 2,1

Equino Tono­Pen 29,6 ± 6,2


23,3 ± 6,9
Vaca Tono­Pen 26,9 ± 6,7

Lhama/Alpaca Tono­Pen 16,6 ± 3,6


Macaco (cetamina) Tono­Pen 13,6 ± 3,7

Jacaré Tono­Pen 23,7 ± 2,1


Furão Tono­Pen 22,8 ± 5,5

Rato Tono­Pen 17,3 ± 5,3

Falcão Tono­Pen 20,6 ± 3,4


Coruja Tono­Pen 10,8 ± 3,6
a  Valores duplicados representam relatos diferentes para aquela espécie.
Tabela 2 – Catarata hereditária em animais domésticos

Raça Idade de manifestação Localização inicial Modo de herança

Cães

Afghan Hound 6 a 12 meses Equatorial/cortical posterior Autossômico recessivo

Cocker Spaniel americano 1 a 6 anos Cortical posterior/anterior Autossômico recessivo poligênico

Pastor australiano 2 a 4 anos Cortical posterior Autossômico dominante*

Bichon frisé 2 a 6 anos Cortical posterior/anterior Autossômico recessivo

Boston Terrier Congênita ou juvenil Sutura posterior/nuclear Autossômico recessivo*


Manifestação tardia Equatorial/cortical anterior Autossômico recessivo
Chesapeake Bay Retriever = 1 ano Nuclear/cortical Dominante incompleto

Entelbucher Mountain Dog 1 a 2 anos Cortical posterior Autossômico recessivo


Pastor alemão = 8 semanas Cortical/sutura posterior Dominante incompleto

Golden Retriever = 6 meses Subcapsular posterior (triangular) Dominante incompleto


Labrador Retriever = 6 meses Subcapsular posterior (triangular) Dominante incompleto

Havanese 2 a 6 anos Cortical anterior/posterior Possivelmente autossômico recessivo


Schnauzer miniatura Congênita Cortical posterior/nuclear Autossômico recessivo
= 6 meses Cortical posterior Autossômico recessivo

Buhund norueguês = 1 ano Nuclear/cortical Autossômico dominante


Old English Sheepdog Congênita Nuclear/cortical Autossômico recessivo

Rottweiler = 10 meses Polar posterior/completa Desconhecido


Husky siberiano = 6 meses Sutura posterior/subcapsular posterior Autossômico recessivo

Staffordshire Bull Terrier = 6 meses Sutura posterior/cortical Autossômico recessivo*


Poodle padrão = 1 ano Cortical equatorial Autossômico recessivo

Welsh Springer Spaniel Congênita Cortical posterior/nuclear Autossômico recessivo

West Highland White Terrier Congênita Sutura posterior Autossômico recessivo

Equinos

Belga Congênita Nuclear/cortical Autossômico dominante

Morgan Congênita Nuclear Autossômico dominante

Bovinos

Holstein­frísio Congênita Nuclear/cortical Autossômico recessivo


Jersei Congênita Nuclear Autossômico recessivo

Ovinos

Romney da Nova Zelândia Congênita Cortical posterior/anterior Autossômico dominante


* Associado a mutações no gene HSF4

 MANIFESTAÇÕES OFTÁLMICAS DE DOENÇAS SISTÊMICAS
As  manifestações  oftálmicas  de  doenças  sistêmicas  não  são  incomuns  nas  doenças  hereditárias,  infecciosas,  degenerativas  e  neoplásicas  de  animais.  Com  frequência,  os  exames  oftálmicos  podem  auxiliar  na  identificação  oportuna  da
doença sistêmica. Doenças que afetam os sistemas vascular e nervoso são propensas a exibir manifestações oculares. Animais com doença ocular bilateral devem ser examinados cuidadosamente em busca de doenças sistêmicas.
Em  cães,  doenças  oftálmicas,  como  displasia  de  retina,  microftalmia  e  catarata,  foram  associadas  a  nanismo,  albinismo  e merling.  Frequentemente,  as  doenças  infecciosas  envolvem  o  trato  uveal  e  se  apresentam  como  iridociclite,
coroidite e panuveíte. Podem ser causadas por vírus (cinomose, hepatite infecciosa), riquétsias (erliquiose e febre macular das Montanhas Rochosas), bactérias (Brucella canis e Borrelia burgdorferi), fungos (Blastomyces, Coccidioides,
Histoplasma, Cryptococcus e Aspergillus), protozoários (Toxoplasma, Neospora, Leishmania e Hepatozoon), algas (Prototheca) ou parasitos (Dirofilaria, Toxocara e Diptera spp). Doenças metabólicas associadas a doenças oculares nos
cães incluem diabetes melito (formação de catarata), hipocalcemia (catarata), hiperadrenocorticismo (doença de córnea, catarata e lipemia retiniana) e hipotireoidismo (ceratoconjuntivite seca, hemorragia intraocular decorrente de elevação
da  pressão  sanguínea  sistêmica  e  lipemia  retiniana  [hiperlipidemia]).  Distúrbios  sanguíneos  e  vasculares  podem  se  apresentar  como  hemorragia  intraocular,  descolamento  de  retina,  glaucoma  secundário  e  papiledema.  Neoplasias
metastáticas, como linfossarcoma, afetam mais frequentemente a úvea, manifestando­se como uveíte persistente, massas intraoculares evidentes, hemorragia intraocular, glaucoma secundário ou descolamento de retina.
Em gatos, as doenças sistêmicas frequentemente afetam o sistema oftálmico. Inflamações palpebrais são, com frequência, associadas à infecção sistêmica por Demodex cati e D. gatoi, Notoedres cati (sarna), micose e doenças cutâneas
imunomediadas. Os patógenos que comumente causam doenças infecciosas em gatos, ou seja, herpes vírus felino­1, Chlamydia e Mycoplasma frequentemente ocasionam conjuntivite aguda e recidivante. O herpes vírus felino­1 também
está associado a queratite estromal e ulcerativa, ceratoconjuntivite proliferativa, sequestro corneano, simbléfaro corneano e ceratoconjuntivite seca. Peritonite infecciosa felina, toxoplasmose, imunodeficiência felina e vírus da leucemia
felina, às vezes, são acompanhadas de uveíte anterior e posterior, uveíte crônica, descolamento de retina e glaucoma secundário. A perda aguda de visão com hemorragia intraocular e descolamento de retina em gatos mais idosos pode ser
secundária à hipertensão sistêmica e frequentemente está associada à insuficiência renal crônica ou hipertireoidismo. A resolução da hemorragia intraocular, o reparo do descolamento de retina e a possível recuperação da visão dependem
de uma redução efetiva da pressão sanguínea para valor normal administrando, com frequência, o bloqueador de canal de cálcio anlodipino, na dose de 0,625 mg/dia VO.
Em equinos, doenças infecciosas sistêmicas, como infecção por adenovírus em potros árabes com imunodeficiência, gripe equina, garrotilho (Streptococcus equi), infecção por Rhodococcus equi, leptospirose, doença de Lyme (Borrelia
burgdorferi) e salmonelose, podem ser acompanhados de conjuntivite, uveíte anterior ou uveíte posterior. A ocorrência de oncocercose oftálmica pode ser acentuadamente reduzida pela administração frequente de ivermectina, mas pode
cursar com uveíte anterior e posterior, coriorretinite peripapilar, queratite, ceratoconjuntivite ou vitiligo conjuntival lateral. A habronemose se apresenta como massas conjuntivais inflamatórias na área periocular (especialmente no canto
medial), associadas à migração aberrante de larvas de Habronema muscae, H. microstoma e Draschia megastoma. A terapia geralmente consiste em ivermectina sistêmica.
Em bovinos, microftalmia, catarata, displasia de retina e descolamento de retina estão associados a hidrocefalia e infecção intrauterina de bezerros com diarreia viral bovina. As mesmas anormalidades oftálmicas ocorrem em carneiros
infectados pelo vírus da língua azul na vida intrauterina. A deficiência de vitamina A causa microftalmia em leitões e cegueira e hipoplasia de nervo óptico em bezerros. A deficiência de vitamina A em bovinos adultos ou em fase de
crescimento resulta em cegueira noturna, midríase e, por fim, cegueira completa. Anormalidades oftalmoscópicas incluem papiledema, degeneração de retina e atrofia do nervo óptico. A suplementação com vitamina A pode restabelecer a
visão  apenas  em  animais  com  cegueira  noturna.  O  linfossarcoma  em  bovinos  pode  se  apresentar  como  exoftalmia  progressiva  bilateral.  Muitas  doenças  infecciosas,  como  rinotraqueíte,  febre  catarral  maligna,  meningoencefalite
tromboembólica e sepse pré­natal, podem cursar com conjuntivite ou uveíte anterior ou posterior. Toxicoses, como intoxicação por samambaia de metro (Dryopteris filix), intoxicação por samambaia­do­campo (Pteridium aquilinum) em
ovinos, envenenamento por cumarínico (intoxicação por trevo doce) em bovinos e intoxicação por fenotiazina em bovinos se apresentam com sintomas clínicos de cegueira por degeneração de retina, hemorragia intraocular ou edema de
córnea (ver p. 2541).

 NERVO ÓPTICO
Hipoplasia do nervo óptico pode ser hereditária em cães da raça Poodle miniatura. Em gatinhos e bezerros, pode resultar de infecção intrauterina notada na panleucopenia e na diarreia viral bovina, respectivamente. Em bezerros, a causa
pode ser avitaminose A materna. A condição pode ser uni ou bilateral, podendo ocorrer isoladamente ou em associação a outras anomalias oculares. O envolvimento bilateral se manifesta como cegueira, em neonatos; a doença unilateral
frequentemente é um achado acidental que ocorre mais tarde na vida do animal, ou é notado quando o outro olho desenvolve cegueira.
Papiledema  é  incomum  em  animais  e  às  vezes  é  associada  à  neoplasia  de  órbita.  A  pressão  intracraniana  aumentada  geralmente  não  resulta  em  papiledema  em  animais,  exceto  em  bezerros  com  avitaminose  A.  O  disco  óptico  é
visualizado como um volume acima da superfície da retina adjacente e nota­se congestão venosa. A visão e os reflexos pupilares à luz normalmente não são acometidos, a não ser que ocorra atrofia óptica.
Atrofia óptica pode se instalar após glaucoma, traumatismo, degeneração de retina avançada, hipotensão ocular prolongada ou inflamação. O disco óptico é visualizado como uma depressão e menor do que o normal; frequentemente é
pigmentado, com redução acentuada na vascularização da retina e do nervo óptico. Não se constata reflexo pupilar direto, tampouco visão. Não há tratamento.

 ÓRBITA
Os sintomas de celulite orbitária são dor aguda ao abrir a boca, tumefação palpebral, prolapso unilateral da membrana nictitante, deslocamento do globo para frente e conjuntivite. Pode­se desenvolver queratite devido à lagoftalmia. A
anormalidade  é  observada  predominantemente  em  raças  de  cães  de  grande  porte  e  de  caça,  sendo  rara  em  outras  espécies.  Corpos  estranhos  (p.  ex.,  sementes  migratórias  de  grama)  e  sialoadenite  zigomática  são  causas  adicionais.
Hemorragia e neoplasia de órbita podem mimetizar inflamação, exceto pelo fato de geralmente não haver dor durante a abertura da boca. Em casos agudos, antibióticos sistêmicos de amplo espectro, em geral, são curativos, mas se há
tumefação atrás do último molar, indica­se drenagem desta área. Compressas mornas e lubrificantes tópicos para proteger a córnea também são indicados. Podem ocorrer recidivas; assim, são recomendadas radiografias e ultrassonografia
dos dentes adjacentes, dos seios e da cavidade nasal.

 PÁLPEBRAS
As pálpebras consistem de quatro partes: 1) mais externa, de pele bastante fina e móvel; 2) o forte músculo orbicular ocular, que circunda o olho e se ancora no canto medial; 3) o tarso fibroso, delgado e pouco desenvolvido, que contém
glândulas sebáceas de Meibômio e conecta a pálpebra à rima óssea da órbita; e 4) a conjuntiva palpebral, fina e flexível, contínua ao fórnix conjuntival ou saco conjuntival. Anormalidades palpebrais podem estar associadas a alterações
faciais e orbitárias, características raciais; podem ser parte de doença cutânea, bem como de muitas doenças sistêmicas.

Anormalidades de Conformação
Entrópio é a inversão de toda ou de parte da margem palpebral e pode envolver uma ou ambas as pálpebras e os cantos. É o defeito palpebral hereditário mais frequente em muitas raças de cães e ovinos, podendo também ser consequente à
formação cicatricial e blefarospasmo grave decorrente de dor ocular ou periocular. A inversão dos cílios ou pelos faciais causa desconforto, irritação conjuntival e corneana secundárias e, se perpetuada, formação de cicatriz, pigmentação e,
possivelmente,  ulceração  corneana.  O  entrópio  espástico  inicial  pode  ser  revertido  se  a  causa  for  rapidamente  removida  ou  se  a  dor  for  aliviada  pela  eversão  dos  pelos  palpebrais  com  suturas  em  colchoeiro  na  pálpebra,  por  injeções
subcutâneas (p. ex., penicilina procaína) no interior da pálpebra adjacente ao entrópio, ou por bloqueio do nervo palpebral. O entrópio estabelecido geralmente requer correção cirúrgica.
Olho e pálpebras; corte mediano. Ilustração de Gheorghe Constantinescu.
Aparato lacrimal do cão. Ilustração de Gheorghe Constantinescu.

Ectrópio  é  uma  margem  palpebral  evertida,  estática,  geralmente  acompanhada  de  fissura  palpebral  extensa  e  pálpebras  alongadas.  É  uma  anormalidade  de  conformação  bilateral  comum  em  diversas  raças  de  cães,  incluindo  o
Bloodhound, Bull Mastiff, Great Dane, Newfoundland, Dogue Alemão, São Bernardo e vários cães da raça Spaniel. Cicatrizes causando contração da pálpebra ou paralisia do nervo facial podem provocar ectrópio unilateral em qualquer
espécie. A exposição conjuntival a irritantes ambientais e infecções bacterianas secundárias pode resultar em conjuntivite crônica ou recidivante. Preparações tópicas de associações de antibióticos com corticosteroides podem controlar
temporariamente  as  infecções  intermitentes,  mas  procedimentos  cirúrgicos  para  a  redução  palpebral  são  frequentemente  indicados.  Casos  brandos  podem  ser  controlados  por  meio  de  lavagem  periódica  e  repetida  com  soluções
descongestionantes suaves.
Entrópio em um potro antes (acima) e depois (abaixo) do tratamento. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Lagoftalmia é a incapacidade de fechar completamente as pálpebras e proteger a córnea de ressecamento e traumatismo. Pode resultar de órbitas extremamente rasas (em raças braquicefálicas), exoftalmia devido a lesões orbitárias que
preenchem espaço ou de paralisia do nervo facial. Geralmente resulta em formação de cicatriz, ulceração e pigmentação corneana. A menos que a causa possa ser corrigida, a terapia consiste em lubrificações tópicas frequentes e redução ou
fechamento cirúrgico dos cantos, temporária ou permanentemente. Pregas cutâneas nasais e pelos faciais excessivos podem agravar o lesão causado pela lagoftalmia.
Anormalidades  dos  cílios  incluem  cílios  extras  (distiquíase)  ou  mal  direcionados  na  margem  palpebral.  Epífora,  vascularização  corneana,  ulceração  e  formação  de  cicatriz  corneana  podem  ser  notadas.  Em  vários  casos,  os  cílios
anômalos são muito finos e não ocasionam sintomas clínicos nem lesões. Entretanto, cílios ectópicos que em protrusão através da conjuntiva palpebral dorsal podem causar dor intensa. Se a lesão conjuntival ou corneana for causada pelo
cílio extra, indica–se a excisão ou a criotermia dos folículos ciliares. Anomalias dos cílios são comuns em algumas raças de cães e provavelmente são hereditárias, mas são raras em outras espécies de animais.

Inflamação
Blefarite (inflamação das pálpebras) pode resultar da extensão de dermatite generalizada, conjuntivite ou infecções glandulares locais, ou por irritantes, como óleos vegetais, ou por exposição solar. As pálpebras podem ser o local original
de envolvimento de agentes que progridem para uma dermatite generalizada. Dermatófitos (todas as espécies), Demodex canis (cães), D. cati ou D. gatoi (gatos) e bactérias, como estafilococos, estão frequentemente envolvidos. A junção
mucocutânea  da  pele  e  conjuntiva  pode  ser  o  local  afetado  por  lesões  de  doenças  imunomediadas,  como  o  pênfigo.  Raspados,  culturas  e  biópsias  cutâneas  podem  ser  necessárias  para  um  diagnóstico  preciso.  Infecções  glandulares
localizadas podem ser agudas ou crônicas (hordéolo [glândulas de Zeis e Moll] ou calázio [glândulas de Meibômio]).
Na blefarite generalizada, a terapia sistêmica é frequentemente indicada, além do tratamento tópico. Terapia de suporte, com compressas quentes e limpezas frequentes, está indicada em casos agudos. Preparações não oftálmicas podem
ser utilizadas para tratar as pálpebras, mas deve­se ter cuidado durante a aplicação para evitar o contato com a córnea e conjuntiva e possível irritação.

Glândula da membrana nictitante inflamada e prolapsada (“olho de cereja”) em um cão. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

 PROLAPSO DO OLHO
O prolapso agudo ou proptose do olho se deve a traumatismo. É comum em cães e incomuns em gatos. O prognóstico depende da extensão do traumatismo, da raça do cão, da profundidade da órbita, da duração da proptose, do tamanho da
pupila em repouso, da condição da queratite por exposição e de outras lesões perioculares. Em gatos, a proptose geralmente se deve a traumatismo grave na cabeça e frequentemente outros ossos faciais encontram­se fraturados. O globo
ocular deve ser reposicionado assim que possível, se a condição física do animal permitir a indução de anestesia geral (ver p. 1555). O tratamento consiste no uso de antibióticos sistêmicos e, ocasionalmente, corticosteroides, combinados a
antibióticos tópicos e midriáticos. Embora o prognóstico quanto à preservação da visão seja reservado, geralmente o globo é salvo. Retorno da visão ocorre em cerca de 50% dos cães, sendo raro em gatos.
Celulite de órbita em cão. A expansão dos tecidos orbitários pressiona o globo ocular e a membrana nictitante para frente e prejudica o reflexo de piscar. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

 ÚVEA ANTERIOR
A úvea anterior é constituída de íris, corpo ciliar e ângulo da câmara anterior (ou iridocorneano). A íris é responsável pela maior parte da cor do olho, bem como por uma abertura (pupila) para regular a quantidade de luz que penetra no
olho e no segmento posterior. A forma da pupila varia muito entre as espécies animais, podendo ser circular, em fenda vertical, oval horizontal, quadrada ou mesmo pupilas múltiplas. O corpo ciliar provê a maior parte do humor aquoso,
que nutre o segmento anterior e remove seus resíduos metabólicos, bem como os canais de fluxo para o exterior (ângulo da câmara anterior) para que o humor aquoso retorne ao sistema venoso. O corpo ciliar também regula a curvatura da
cristalino (acomodação), o que é mais limitado em animais do que em pessoas. O corpo ciliar continua posteriormente como a coroide; doenças da íris e do corpo ciliar com frequência também envolvem a coroide. Afecções da úvea
anterior são comuns em animais domésticos.
Membranas pupilares persistentes são restos da rede vascular pré­natal normal, que preenche a região pupilar. A persistência de filamentos pigmentados através da pupila, de uma área da íris para outra, ou para o cristalino ou a córnea,
não é incomum em cães e ocasionalmente ocorre em outras espécies. Em cães da raça Basenji a anormalidade é hereditária.
Atrofia de íris é comum em cães mais velhos e pode envolver a margem pupilar ou o estroma. A atrofia da margem pupilar cria uma margem recortada e o enfraquecimento do músculo do esfíncter, que se manifesta como pupila dilatada
ou pela lentidão do reflexo pupilar à luz. A atrofia estromal resulta em graves orifícios na íris e, frequentemente, deslocamento da pupila. Nenhuma forma de atrofia parece afetar a visão. Animais com esfíncter iridiano não funcional podem
apresentar maior sensibilidade à luz forte.
Cistos de íris são observados em cães, gatos e equinos. Em cães, geralmente são esferas pigmentadas que flutuam livremente no humor aquoso, dentro da pupila e nas câmaras anterior e posterior. Apesar de inócuos na maioria das raças,
cistos uveais anteriores (íris e corpo ciliar) em cães da raça Golden Retriever estão associados à esfoliação de células pigmentadas, uveíte crônica, glaucoma e formação de catarata. Em gatos, os cistos frequentemente estão aderidos à
margem pupilar. Em equinos, estão presentes no estroma da íris e mais frequentemente envolvem íris azul. Terapia raramente é necessária, mas pode­se realizar aspiração ou esvaziamento por laser. A transiluminação geralmente mostra a
sua natureza cística e os diferencia de neoplasia. A corpora nigra dorsal, cística e aumentada de volume, pode prejudicar a visão e mimetizar melanoma de íris em equinos. Pode­se indicar excisão cirúrgica ou aspiração.
Colobomas de íris são raros em animais, mas ocorrem ocasionalmente em cães da raça Pastor australiano. Geralmente estão localizados na porção superior da íris, principalmente em íris heterocromáticas, e causa irregularidade na
pupila. Ao exame próximo, nota­se que o defeito envolve o estroma anterior da íris e aparentemente o músculo do esfíncter, mas a camada de pigmento está presente.
Uveíte anterior ou iridociclite, quando aguda, manifesta­se por miose, aumento do conteúdo proteico e celular na câmara anterior (flare aquoso), pressão intraocular baixa, hiperemia conjuntival bulbar, tumefação de íris, fotofobia e
blefarospasmo. Glaucoma secundário, catarata e opacificação corneana podem ocorrer como complicações. Comumente é acompanhada de uveíte posterior ou coroidite. Causas de uveíte anterior podem ser classificadas em exógenas e
endógenas.  Traumatismo  penetrante  e  não  penetrante  e,  raramente,  neoplasias  intraoculares  ou  helmintos  intraoculares  são  causas  de  uveíte  unilateral.  As  causas  comuns  de  uveíte  bilateral  incluem  doenças  imunomediadas  e  doenças
infecciosas, como hepatite infecciosa canina, peritonite infecciosa felina, leucemia felina, imunodeficiência felina, toxoplasmose felina, micoses sistêmicas em cães e gatos, brucelose canina, leptospirose equina, febre catarral maligna
bovina, rinotraqueíte infecciosa bovina, arterite viral equina, febre suína clássica, erliquiose canina e infecções bacterianas neonatais (articulares, umbilicais e intestinais) em bezerros, carneiros, crianças e potros. A uveíte recidivante, que é,
pelo menos em parte, imunomediada, afeta equinos (oftalmia periódica ou cegueira da lua) e cães (panuveíte com despigmentação dérmica ou síndrome uveodérmica). Histórico completo, exame da córnea quanto à presença de lesões,
exame físico, sorologia sanguínea e centese do humor aquoso para cultura, sorologia e citologia auxiliam no diagnóstico.
A  terapia  inespecífica  consiste  em  uso  tópico  de  midriáticos  para  manutenção  da  dilatação  e  movimentação  pupilares,  corticosteroides  (se  não  for  de  origem  bacteriana),  ambiente  escuro  e  inibidores  de  prostaglandina  (como  ácido
acetilsalicílico, flunixino meglumina ou fenilbutazona). Se a origem for bacteriana, indicam­se antibiótico tópico, sistêmico e, às vezes, intraocular. O tratamento de afecções imunomediadas pode requerer uso sistêmico, subconjuntival e
tópico de corticosteroides e administração oral de azatioprina.
Hifema ou hemorragia na câmara anterior pode ter várias aparências clínicas, inclusive: 1) pequenos coágulos sanguíneos, focais, suspensos na câmara anterior ou aderidos à face posterior da córnea, íris ou cápsula anterior do cristalino;
2) hemorragia difusa, sem coagulação, por toda a câmara anterior, impedindo a visão e o exame de estruturas oculares mais profundas; e 3) múltiplas camadas de hemorragia sem coagulação, recidivante ou crônica (a camada mais antiga é
roxa ou preta, na parte inferior da câmara anterior, e a hemorragia mais recente é a camada vermelha brilhante superior). As causas de hifema incluem uveíte, trauma, neoplasia intraocular, hipertensão sistêmica, anormalidades de fatores de
coagulação, distúrbios plaquetários, hiperviscosidade, anomalias oculares congênitas, neovascularização de segmento anterior e glaucoma. A resolução do hifema requer a saída dos eritrócitos intactos através dos canais de drenagem do
humor aquoso.

Uveíte anterior secundária à peritonite infecciosa felina. Cortesia do Dr. Kirk. N. Gelatt.

O prognóstico de hifema agudo geralmente é bom, desde que a causa seja identificada e tratada. O prognóstico do hifema recidivante e/ou crônico é reservado a ruim, porque há propensão ao glaucoma ou à retração e definhamento do
globo  ocular.  Não  há  comprovação  de  que  algum  fármaco  facilite  a  resolução  do  hifema,  mas  o  ativador  de  plasminogênio  tecidual  (TPA),  por  via  intracâmera,  pode  dissolver  a  fibrina  formada  há  menos  de  10  a  14  dias  e  liberar  os
eritrócitos que estavam retidos na câmara anterior. O TPA não previne a formação de fibrina, mas os corticosteroides tópicos e sistêmicos podem preveni­la.

UVEÍTE RECIDIVANTE EQUINA (Oftalmia periódica, Cegueira da lua, Uveíte equina)

A uveíte recidivante equina (URE) é uma das doenças oculares mais comuns em equinos, classicamente caracterizada por episódios de inflamação ativa seguida de períodos variáveis de quiescência. Durante o período de quiescência, pode
persistir uma discreta inflamação subclínica em alguns equinos. Independente do curso específico, as reações inflamatórias, por fim, ocasionam alterações secundárias. São estas complicações secundárias que tornam esta síndrome a causa
mais comum de cegueira em equinos, em todo o mundo.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  URE é uma doença imunomediada que ocorre após um episódio inicial de uveíte aguda. Nem todos os equinos que apresentam uveíte aguda desenvolvem URE. Entretanto, todos os equinos com histórico de
uveíte permanecem sob risco de desenvolver URE por um tempo de pelo menos 2 anos após o episódio agudo. Agentes ou condições específicas associados ao desenvolvimento de uveíte aguda em equinos incluem traumas oculares
contusos ou penetrantes, leptospirose, brucelose, garrotilho (infecção por Streptococcus equi), oncocercose, gripe equina e abscessos de raiz dentária e de casco. Não há predisposição etária ou racial ao desenvolvimento de uveíte aguda.
Entre os equinos com URE, as raças Appaloosa e de sangue quente e aqueles animais de tração são acometidos mais comumente. Embora os equinos possam manifestar URE inicial em qualquer idade, o diagnóstico aos 4 a 8 anos é
característico.  Os  agentes  infecciosos  associados  à  URE  mais  amplamente  pesquisados  são  Leptospira  spp,  em  particular  L.  interrogans  sorovariante  pomona,  apesar  de  outros  sorogrupos  também  estarem  envolvidos.  Vários  estudos
mostram a persistência de leptospira na URE crônica; entretanto, a relação exata entre leptospirose e URE permanece obscura.
Embora a base imunológica para a natureza recidivante da uveíte tenha sido extensivamente estudada, a compreensão detalhada dos fatores envolvidos permanece desconhecida. Pesquisa recente sugere uma relação autoimune genética
com a ocorrência de URE. Considerada em associação à leptospirose, parece possível que a patogênese subjacente da URE pode envolver tanto componentes infecciosos quanto hereditários.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   Os  sinais  clínicos  associados  à  uveíte  recidivante  equina  incluem  tanto  sintomas  agudos  de  inflamação  ativa  como  efeitos  colaterais  secundários  crônicos.  A  lesão  ao  trato  uveal  acarreta  liberação  de
mediadores inflamatórios, como leucotrienos, prostaglandinas e histamina, os quais aumentam a permeabilidade dos vasos da úvea anterior, dano à barreira sangue­humor aquoso, espasmo do esfíncter da íris e espasmo do músculo do
corpo ciliar. O comprometimento da barreira sangue­humor aquoso permite a entrada de proteínas, fibrina e células ao humor aquoso. Estas respostas colaboram para os sintomas clássicos de uveíte aguda: blefarospasmo, epífora, congestão
episcleral, edema de córnea, humor aquoso turvo (flare), coágulos de fibrina na câmara anterior e miose. Frequentemente, os sintomas no segmento anterior limitam a visibilidade do segmento posterior. Se visíveis, os sinais de episódio
agudo envolvendo o segmento posterior podem incluir infiltrado celular inflamatório na retina e/ou coroide, separação focal ou difusa da retina, hemorragia de retina e humor vítreo turvo, secundária à infiltração por células inflamatórias ou
hemácias. Um ou ambos os olhos podem ser acometidos. Quando bilateral, não é raro que um olho esteja mais gravemente afetado.
Formação de cicatriz na córnea, fibrose na íris, dano da corpora nigra, sinéquia posterior, glaucoma, catarata e acúmulo de pigmento no fundo não tapetal (degeneração de retina) são sintomas compatíveis com URE crônica. Não pode ser
ignorada  a  importância  da  fundoscopia  cuidadosa  como  parte  de  exames  anteriores  à  compra  e  de  sanidade.  Equinos  com  uveíte  crônica  podem  apresentar  poucos  ou  nenhum  sinal  no  segmento  anterior,  mas  podem  manifestar  uveíte
recidivante equina na forma de degeneração de retina. Tais equinos geralmente apresentam resposta pupilar à luz normal ou próximo do normal, podendo não exibir sintomas evidentes de comprometimento visual até estágios tardios da
doença. Entretanto, deve­se suspeitar de URE em qualquer equino com degeneração de retina relevante e, assim, é considerado como possível candidato a comprometimento visual futuro.
DIAGNÓSTICO:  Uma vez que o diagnóstico baseia­se na constatação de sinais clínicos característicos, deve­se tentar identificar a causa primária. Como um episódio agudo de uveíte pode ser o primeiro sinal de doença sistêmica, um exame
físico cuidadoso deve ser sempre realizado, além do exame oftálmico. Hemograma completo e perfil bioquímico sérico são frequentemente incluídos como parte de uma base de dados mínima. Testes específicos podem auxiliar na pesquisa
da causa primária do episódio inicial de uveíte. O teste sorológico para Leptospira spp é frequentemente requisitado, apesar de não haver relação entre a sorologia para Leptospira spp e a presença de anticorpos ou leptospiras no humor
aquoso de equinos com URE. A paracentese da câmara anterior ou da cavidade vítrea oferece a possibilidade de identificação de um agente causal. Entretanto, o procedimento pode causar lesão intraocular grave e é desencorajado.
TRATAMENTO, PREVENÇÃO E CONTROLE:  A terapia é iniciada assim que possível, quando os sintomas da fase aguda são observados. Se uma causa primária específica pode ser identificada, seu tratamento deve ser incluído no protocolo
terapêutico inicial. Adicionalmente ao tratamento da causa primária, ou em ocasiões quando nenhuma causa específica é encontrada inicia­se tratamento agressivo com anti–inflamatório, tanto sistêmico quanto tópico, para minimizar a
lesão  associado  à  inflamação  intraocular.  Anti­inflamatórios  tópicos,  tanto  esteroides  como  não  esteroides,  são  comumente  utilizados.  Têm­se  empregado  com  sucesso  acetato  de  prednisolona  (esteroide,  suspensão  1%),  dexametasona
(esteroide, suspensão ou pomada 0,1%), flurbiprofeno (não esteroide, solução 0,03%) e diclofenaco (não esteroide, solução 0,1%). Ao selecionar um esteroide para uso tópico, prefere­se tanto a prednisolona como a dexametasona em
relação à hidrocortisona, que penetra pouco na córnea e não é potente o suficiente para ser considerada um tratamento efetivo para uveíte anterior. Adicionalmente, a formulação do esteroide tópico influencia sua capacidade de penetração
na córnea e a disponibilidade do fármaco na úvea anterior. Devido a isso, as preparações em forma de acetato e suspensão são preferíveis às formulações de fosfato sódico. A frequência de aplicação depende da gravidade da inflamação,
mas o comum é a administração 4 a 6 vezes/dia. Com a resolução dos sintomas, a frequência pode ser lentamente reduzida. Recomenda­se que a terapia seja mantida por 1 mês após a regressão dos sintomas agudos da inflamação. A
atropina tópica (solução ou pomada 1%) é útil aos pacientes com uveíte anterior aguda em razão da paralisação do esfíncter da íris e do músculo do corpo ciliar. Esses efeitos reduzem o risco de formação de sinéquia posterior e aliviam
acentuadamente a dor associada ao espasmo da musculatura do corpo ciliar. A aplicação de atropina é tópica, 2 a 3 vezes/dia, até que a pupila esteja amplamente dilatada. A seguir, a frequência de aplicações pode ser reduzida para 1 vez/dia
ou em dias alternados, conforme a necessidade para manutenção da midríase. Apesar deste esquema de dosagem ser bem tolerado na maioria dos equinos, a motilidade intestinal deve ser monitorada, uma vez que a atropina aplicada
topicamente tem o potencial de ocasionar íleo adinâmico.
A  aplicação  sistêmica  de  flunixino  meglumina,  particularmente  quando  administrada  por  via  intravenosa  (IV),  pode  ser  o  tratamento  único  mais  efetivo  de  uveíte  anterior  aguda  em  equinos.  A  dose  IV  inicial  usual  é  1,1  mg/kg,
administrada no momento do diagnóstico. Em seguida aplica­se 0,25 a 1,1 mg/kg VO, 2 vezes/dia, durante 5 a 7 dias. Devido ao risco potencial de causar problemas gastrintestinais e renais com o uso prolongado de flunixino meglumina, é
comum que se alterne com fenilbutazona oral (2 a 4 mg/kg, 1 ou 2 vezes/dia) após o período de tratamento inicial. Como alternativa, alguns equinos respondem melhor ao ácido acetilsalicílico (25 mg/kg VO, 1 ou 2 vezes/dia) após o uso da
flunixino meglumina. Esteroides sistêmicos, especialmente prednisolona (100 a 300 mg/dia) e dexametasona (5 a 10 mg/dia), também têm sido utilizados com sucesso no tratamento de episódios de uveíte aguda, mas o seu uso prolongado
tem sido associado à laminite. Com a atenuação da gravidade dos sintomas, a dose e a frequência do uso de anti­inflamatórios orais podem ser reduzidas ao longo de 2 a 3 meses do período terapêutico. Se não for possível o tratamento
tópico frequente, injeções subconjuntivais de triancinolona (10 a 40 mg), acetato de metilprednisolona (10 a 40 mg) ou betametasona (5 a 15 mg) podem propiciar concentração anti­inflamatória intraocular terapêutica. Entretanto, devem
ser utilizadas com cautela, uma vez que não podem ser facilmente removidas após a injeção e podem ocorrer consequências graves se há microrganismo infeccioso ou úlcera de córnea. Exceto nos casos em que há infecção bacteriana, não
se indica antibiótico sistêmico.
Historicamente, equinos com recidivas frequentes ou com uveíte crônica branda eram tratados com doses diárias (ou em dias alternados) de fenilbutazona ou de ácido acetilsalicílico VO. Apesar de a maioria dos equinos tolerar bem essa
terapia,  esses  medicamentos  podem  apresentar  efeitos  colaterais  gastrintestinais  e  hematológicos,  e  a  necessidade  da  administração  diária  pode  dificultar  a  colaboração  do  proprietário.  Além  disso,  esse  tratamento  frequentemente  não
elimina o risco de recidiva.
Na tentativa de se superar os problemas do uso exclusivo de tratamento medicamentoso foram desenvolvidos dois procedimentos cirúrgicos. A vitrectomia nuclear remove praticamente todo o humor vítreo, por meio de uma incisão
posterior  à  face  dorsolateral  do  limbo.  O  vítreo  é  então  substituído  por  solução  salina  ou  por  solução  salina  balanceada.  O  benefício  teórico  deste  procedimento  é  que  os  linfócitos  T  e/ou  microrganismos  presentes  no  humor  vítreo
contribuem significativamente para a inflamação crônica, na URE. Por meio da remoção desses elementos, a gravidade e frequência dos eventos inflamatórios podem ser minimizadas. Outro procedimento cirúrgico para controle da URE é
o implante de ciclosporina supracoroidal. Neste procedimento, um disco de ciclosporina A (cerca de 5 mm de diâmetro) é implantado sob um retalho escleral criado cerca de 8 mm posterior à região dorsolateral do limbo.
Boas práticas de manejo, como controle efetivo de moscas, trocas frequentes das camas, desverminação e vacinações rotineiras, minimização do contato com bovinos ou animais selvagens, drenagem de água parada ou restrição ao acesso
a pastagens pantanosas e melhora da dieta foram relacionadas como formas de reduzir as consequências da URE. Embora essas medidas propiciem benefícios gerais a alguns equinos, a extensão em que influenciam o curso clínico da URE
é controversa.
DOENÇAS DO PAVILHÃO AURICULAR

Várias afecções dermatológicas acometem o pavilhão auricular. Raramente, uma doença afeta apenas o pavilhão auricular ou este é o local inicialmente acometido. Como em todas as enfermidades dermatológicas, a melhor forma de obter o
diagnóstico envolve histórico completo e exame físico e dermatológico minucioso, juntamente com seleção e avaliação cuidadosa de testes diagnósticos específicos.

Adenite Sebácea
Esta doença é incomum em cães e rara em gatos. A causa é desconhecida, mas a forte predisposição racial de certas raças de cães para o desenvolvimento da doença sugere uma influência genética. A patogênese proposta inclui destruição
da  glândula  sebácea  mediada  por  resposta  imune  celular;  anormalidade  de  cornificação  primária  do  ducto  glandular,  resultando  em  obstrução  e  inflamação  secundária  da  glândula;  defeito  anatômico  da  glândula  sebácea,  ocasionando
extravasamento lipídico e reação do tipo corpo estranho; ou disfunção no metabolismo lipídico, levando à destruição glandular. Raças de cães predispostas incluem Poodle padrão, Akita, Samoyed e Vizla. Entretanto, várias outras raças
podem ser acometidas. As lesões tipicamente se instalam nos pavilhões auriculares, testa, face e parte dorsal do tronco e são caracterizadas por alopécia e escamas aderidas nas hastes dos pelos. A gravidade e as características dos sinais
clínicos variam entre as raças. O prurido é variável e geralmente associado à infecção bacteriana secundária. Os achados histopatológicos incluem ausência difusa de glândulas sebáceas, inflamação granulomatosa a piogranulomatosa no
local  anteriormente  das  glândulas  e  queratose  folicular.  Atualmente,  a  terapia  mais  eficaz  para  adenite  sebácea  é  a  administração  oral  de  ciclosporina  (5  mg/kg,  1  vez/dia).  Vitamina  A  ou  retinoides  sintéticos  (p.  ex.,  isotretinoína  ou
acitretina) VO, podem ser efetivos, em alguns casos. A combinação de tetraciclina e niacinamida é uma opção para os casos mais brandos ou quando os proprietários estão preocupados quanto aos custos e/ou efeitos adversos associados ao
uso de ciclosporina ou retinoides. A terapia paliativa para todos os casos inclui xampu ceratolítico, seguido de banho emoliente e ácidos graxos ômega 3 e ômega­6. Para auxiliar no amolecimento das escamas aderidas pode­se borrifar uma
mistura de propilenoglicol e água sobre a pelagem do animal, deixando atuar por 2 a 3 h, antes do banho com xampu com medicamento.

Alergia à Picada de Mosquito
Uma reação alérgica á picada de mosquito pode causar dermatite ulcerativa e crostosa de pavilhão auricular, narina e, raramente, coxins e pálpebras de gatos. As lesões progridem de pápulas e placas a úlceras crostosas, que se unem para
acometer  áreas  extensas.  O  prurido  é  variável;  pode  ocorrer  linfadenopatia  regional.  Histologicamente,  as  lesões  são  caracterizadas  por  dermatite  eosinofílica  perivascular  a  intersticial  grave,  superficial  e  profunda,  frequentemente
associadas a lesões hiperêmicas, como foliculite e furunculose. O diagnóstico diferencial inclui pênfigo foliáceo, dermatite ulcerativa por herpes vírus, outras causas de dermatite eosinofílica (hipersensibilidade alimentar, atopia, idiopática),
sarna notoédrica e dermatofitose. O tratamento inclui a manutenção do animal dentro de casa e o uso de repelente à base de piretrina, quando é possível prever a exposição aos mosquitos. Glicocorticoides sistêmicos podem ser necessários,
em casos graves (ver p. 811).

Alopécia de Pavilhão Auricular
Várias dermatoses de borda auricular, caracterizadas por alopécia, foram descritas em cães. Alopécia periódica do pavilhão auricular em Poodle miniatura é caracterizada por alopécia bilateral progressiva na superfície convexa da orelha. A
perda de pelos é aguda e progride por vários meses, mas pode ocorrer crescimento espontâneo de novos pelos. Não há outros sintomas e o tratamento é desnecessário.
Alopécia do pavilhão auricular foi relatada em animais das raças Dachshund, Chihuahua, Italian Greyhound e Whippet e considera­se que haja predisposição hereditária. A idade por ocasião da manifestação da enfermidade é = 1 ano. As
lesões iniciam como rareamento da cobertura pilosa, podendo ocorrer alopécia total do pavilhão auricular aos 8 a 9 anos de idade. Outras áreas comumente acometidas são as regiões cervical e torácica ventral e a face medial caudal das
coxas. A perda de pelos é assintomática. Os diagnósticos diferenciais para essa condição são endocrinopatias (p. ex., hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo, desequilíbrio de hormônios sexuais). Histologicamente, a pele é normal e o
tamanho dos folículos pilosos diminui, mas com aparência normal. Nenhum tratamento efetivo foi relatado, mas há relatos anedóticos do uso de que pentoxifilina (10 a 15 mg/kg, 2 vezes/dia ou 3 vezes/dia), melatonina (3 mg para raças
pequenas e 6 mg para raças grandes, 2 vezes/dia ou 3 vezes/dia) e minoxidil tópico são úteis.

Ataque de Moscas
Este é um problema cosmopolita, causado pela mosca de estábulo, Stomoxys calcitrans (ver p. 813), e tipicamente acomete cães e equinos. A picada da mosca causa pequenas pápulas que se tornam estrias elevadas com crostas centrais
hemorrágicas pruriginosas. As lesões são notadas nos ápices dos pavilhões auriculares de cães de orelhas eretas ou sobre a superfície dobrada do pavilhão auricular de cães com orelhas pendentes. Em equinos, esta mosca pode causar reação
de hipersensibilidade ou dermatite grave, resultando em lesões no tronco dorsal e/ou ventral e face e, adicionalmente, ao pavilhão auricular. O tratamento inclui repelentes contra moscas, controle da população destes insetos mediante
limpeza do ambiente (esterco, adubo etc.) e aplicação de inseticidas.

Dermatite de Contato
Esta dermatite comumente se instala na face côncava do pavilhão auricular, provavelmente devido à ausência de pelos. Medicamentos de uso tópico na orelha, particularmente aqueles contendo aminoglicosídios e/ou propilenoglicol, são
causas comuns da afecção em animais tratados para otite externa. As lesões podem se instalar 5 a 7 dias após o início do tratamento. A dermatite de contato também pode ser decorrência do uso de pomadas de aplicação transdérmica na
parte côncava das orelhas. Os sinais clínicos incluem eritema, edema e pápulas que podem se unir e formar placas, erosões e/ou ulcerações. O prurido e a dor são variáveis. Raramente se obtém o diagnóstico definitivo, porque o teste de
desafio à droga não é recomendado. A interrupção do uso de todas as medicações tópicas é o procedimento indicado. Não se recomenda a substituição por outro fármaco de uso tópico porque a maioria dos produtos apresenta veículos
semelhantes, que são a causa da maioria dos casos.

Dermatite de Pavilhão Auricular
Insetos e parasitos comumente causam dermatite de pavilhão auricular, seja por lesão direta pela picada do parasito ou como resultado de hipersensibilidade. Carrapatos podem causar irritação no local de aderência; podem ser encontrados
no pavilhão auricular ou no canal auditivo. O carrapato espinhoso do ouvido (Otobius megnini), encontrado no sudoeste dos EUA, nas Américas do Sul e Central, na África do Sul e na Índia, é um carrapato de carapaça delicada, cujas
formas de larva ou ninfa parasitam o canal auditivo externo de equinos, bovinos, ovinos, caprinos, veados, coelhos, gatos e cães. Os sinais clínicos envolvem sacudidela de cabeça, esfregação da cabeça ou ptose de pavilhão auricular. Tanto
o animal quanto o ambiente devem ser tratados. Produtos à base de piretrina/piretroides são efetivos.

Hematoma Auricular
Essas tumefações pequenas a grandes, preenchidas por fluido, se desenvolvem na superfície côncava do pavilhão auricular de cães, gatos e suínos. A patogênese do desenvolvimento das lesões é desconhecida, mas o ato de sacudir a cabeça
ou coçar o ouvido devido ao prurido está quase sempre envolvido. Em cães, a afecção é observada nos casos de atopia e alergia alimentar, nas quais os condutos auditivos representam os principais locais de inflamação alérgica, prurido e
infecção secundária. Em suínos, sarna sarcóptica, pediculose e presença de alimento nas orelhas (proveniente de comedouros instalados acima da cabeça) foram incriminadas como causa de sacudidela de cabeça que ocasiona hematomas
auriculares. Mordidas de outros porcos também podem ser incriminadas (ver síndrome da orelha necrosada, a seguir). O tratamento é cirúrgico, de modo a permitir a drenagem. Após drenagem e irrigação, vários pontos de colchoeiro
podem ser aplicados para eliminar o espaço morto. A adição de um dreno, feito com uma sonda mamária, pedaço de cateter urinário ou de cateter de aplicação intravenosa, aumenta a taxa de sucesso da cirurgia. Drenagem e instilação de
glicocorticoide são eficazes em cerca de 50% dos casos. A drenagem é mais efetivamente obtida pela conexão com um scalp ou cateter IV. Glicocorticoides são instilados para preencher a cavidade, sem necessidade de causar distensão
cutânea. Um período curto de administração oral de glicocorticoide, em dose anti­inflamatória baixa, comumente é associado a este tratamento.

Infestação por Ácaros
Infestação por ácaros Sarcoptes scabiei e Notoedres cati é  comum  em  suínos,  cães  e  gatos  em  todo  o  mundo  (ver  p.  834).  Nos  EUA,  a  sarna  sarcóptica  é  rara  em  equinos,  bovinos  e  ovinos,  sendo  considerada  doença  de  notificação
obrigatória. Erupções papulares progridem para escamas, crostas e escoriações nas bordas das orelhas e em outras partes do corpo. O prurido é intenso. A transmissão ocorre por contato direto com animais infectados ou com fômites
contaminados.  O  diagnóstico  baseia­se  nos  sinais  clínicos,  no  histórico  de  exposição  e  na  detecção  de  ácaros  em  vários  raspados  de  pele.  Raspados  negativos  não  excluem  o  diagnóstico,  pois  os  ácaros  são  frequentemente  difíceis  de
encontrar. Na suspeita de infestação por ácaro deve­se instituir o tratamento. É muito mais fácil encontrar ácaros em raspados de pele de gatos com sarna notoédrica. As opções terapêuticas incluem banhos de imersão em óxido de enxofre
(seguro em todas as espécies), a cada 5 dias, no total de 3 a 5 tratamentos; imersões em inseticidas, como o amitraz (apenas em cães), 2 a 3 banhos, com intervalos de 2 semanas, e 200 a 300 mg de ivermectina/kg VO ou SC, a cada 1 a 2
semanas, no total de 2 a 4 aplicações. A resposta ao tratamento não é consistente quando se utiliza banho de imersão em óxido de enxofre ou amitraz, em pequenos animais. Desta forma, produtos tópicos não são boas opções para a triagem
terapêutica (ou seja, quando não são encontrados ácaros nos raspados de pele).
A ivermectina é amplamente utilizada no tratamento de sarna sarcóptica em cães e tem sido utilizada para tratar sarna notoédrica em gatos; contudo, não é aprovada pela FDA para tal propósito. Assim, deve­se ter muito cuidado e os
clientes  devem  ser  informados  especificamente  sobre  os  riscos  inerentes  ao  uso  dessa  droga.  Raças  de  cães  suscetíveis  à  intoxicação  por  ivermectina  incluem  Collie,  Shetland  Sheepdog,  Australian  Sheepherd,  English  Sheepherd,
Longhaired Whippet, Mcnab, Silken Windhound e Old English Sheepdog. Antes de usar ivermectina em qualquer uma dessas raças deve­se realizar um teste genético para pesquisa de mutação do gene MDR1, que codifica a glicoproteína­
P, um transportador de várias drogas (Atualmente este teste está disponível na Universidade de Washington). O uso oral de milbemicina oxima foi relatado como sendo seguro e eficaz no tratamento da sarna sarcóptica canina, mas não é
aprovado pela FDA para tal fim. O protocolo de tratamento recomendado é de 2 mg/kg, 1 vez/semana, no total de 4 doses. A selamectina também se mostrou eficaz no tratamento de sarna sarcóptica canina. O protocolo recomendado é de 4
aplicações, com intervalos de 2 semanas. Como os ácaros podem sobreviver fora do hospedeiro por um tempo variável, todas as camas, escovas e fômites também devem ser tratados. Recomenda­se que todos os animais contactantes
também sejam tratados, devido à natureza contagiosa das infecções por ácaros.
Ácaros psorópticos que não escavam causam otite externa pruriginosa em equinos. Por ocasião da consulta os equinos podem se apresentar balançando a cabeça e com orelha pendente. O diagnóstico é confirmado pela detecção dos
ácaros em raspados de pele ou no exsudato do ouvido, mas pode ser difícil encontrar ácaros no conduto auditivo. A sarna psoróptica é uma doença de notificação obrigatória em algumas regiões. A ivermectina, na dose de 200 mg/kg VO, a
cada 2 semanas, por 2 tratamentos, tem se mostrado efetiva.

Miscelânea de Doenças
Várias doenças imunomediadas, como pênfigo foliáceo, pênfigo eritematoso, erupção medicamentosa, necrólise epidérmica tóxica e vasculite imunomediada podem acometer o pavilhão auricular e o conduto auditivo (ver p. 751).
Outras  áreas  do  corpo  são  tipicamente  afetadas,  inclusive  coxins  plantares,  membranas  mucosas,  junções  mucocutâneas,  unhas  e  suas  bases  e  extremidade  da  cauda.  As  doenças  imunomediadas  são  confirmadas  por  biópsia  das
lesões primárias (pápulas, vesículas, pústulas, bordas eritematosas de lesões secundárias), com exame histológico por um dermatoistopatologista.
As extremidades auriculares dobradas adquiridas em gatos são mais frequentemente associadas à terapia prolongada com glicocorticoide (p. ex., uso diário de preparações oculares ou auriculares). Também, podem ser causadas por
lesão decorrentes de radiação solar. A dobra auricular pode ser irreversível.
Dermatite solar felina ou dermatite actínica é observada mais comumente em gatos brancos ou em gatos com orelhas brancas que foram cronicamente expostos ao sol. As lesões aparecem primeiramente como eritema e descamação das
extremidades das orelhas, com poucos pelos. Formação de crostas, exsudação e ulceração podem se desenvolver enquanto a queratose actínica se transforma em carcinoma de célula escamosa. Nos estágios iniciais da doença, o tratamento
consiste em limitar a exposição à luz ultravioleta por meio de confinamento no interior da casa no horário de 10 h a 16 h e no uso tópico de protetor solar. O carcinoma de célula escamosa da orelha é tratado mediante excisão cirúrgica,
seguida de radioterapia. Se a cirurgia e a radioterapia não forem uma opção, o tratamento tópico com creme de imiquimod, 2 a 3 vezes/semana, mostrou resultados promissores.
Necrose  trombovascular  proliferativa  do  pavilhão  auricular  é  rara  em  cães.  Não  há  predileção  conhecidas  quanto  à  raça,  sexo  ou  idade  e  a  etiologia  é  desconhecida.  As  lesões,  que  consistem  em  pele  descamada,  espessada  e
hiperpigmentada  ao  redor  de  uma  úlcera  necrosante,  iniciam  no  ápice  da  orelha  e  se  estendem  ao  longo  da  superfície  côncava  do  pavilhão  auricular.  Por  fim,  a  necrose  pode  deformar  a  borda  da  orelha.  Há  relatos  anedóticos  de  que
pentoxifilina (10 a 15 mg/kg, 2 a 3 vezes/dia) e/ou combinação de tetraciclina e niacinamida (250 mg e 500 mg, 3 vezes/dia, para cães < 10 kg e = 10 kg de peso corpóreo, respectivamente) foram eficazes, em alguns casos.
Condrite auricular foi relatada raramente em gatos e cães. Os sintomas incluem dor, tumefação, eritema e deformação do pavilhão auricular. Tipicamente, ambas as orelhas são acometidas. Em alguns casos é possível notar sintomas
sistêmicos. Histologicamente, as lesões consistem de infiltrado linfoplasmocítico, basofilia e perda ou necrose da cartilagem. Tratamento pode não ser necessário se a afecção não for dolorida e não há sintomas sistêmicos. Relata­se que a
administração oral de glicocorticoides foram inefetivos, mas a dapsona (1 mg/kg, 1 vez/dia) induziu remissão dos sinais clínicos, em alguns casos.
Vasculite é uma doença incomum em cães e gatos. As lesões consistem em eritema, úlceras bem delimitadas, crostas e perda de tecido necrótico. Pavilhões auriculares, cauda e coxins tipicamente são acometidos. Geralmente é difícil
determinar a causa desencadeante, que pode ser imunomediada ou induzida por fármaco, neoplasia e infecção concomitante, ou pode ser idiopática. O tratamento implica na identificação e eliminação da causa desencadeante, uso sistêmico
de glicocorticoide, tetraciclina e niacinamida, pentoxifilina, dapsona e ciclosporina ou outros fármacos imunomoduladores.
Ulceração pelo frio pode ser verificada em animais pouco adaptados ao clima frio, sendo mais provável em condições úmidas ou com vento. Se instala tipicamente nas regiões corpóreas pouco revestidas, incluindo extremidades das
orelhas, patas e cauda. A pele pode se apresentar pálida ou eritematosa, edematosa e dolorida. Em casos graves, pode ocorrer necrose e descamação do tecido necrosado das extremidades. O tratamento consiste no aquecimento rápido e
cuidadoso e no tratamento de suporte. A amputação das regiões afetadas pode ser necessária, mas não deve ser realizada até que se determine a extensão de tecido viável.
Celulite juvenil canina é um distúrbio incomum de filhotes de cães, caracterizada por pápulas estéreis, nódulos e pústulas na face e nos pavilhões auriculares, além de linfadenopatia submandibular. Acomete filhotes de cães com 3
semanas a 4 meses de idade e raramente animais mais velhos. Animais das raças Golden Retriever, Gordon Setter e Dachshund parecem mais suscetíveis do que outras raças. Otite externa purulenta é comum, acompanhada de edema e
espessamento das orelhas. Sintomas sistêmicos, como anorexia, letargia e febre podem ser notados em alguns casos. É possível obter o diagnóstico por biópsia, que mostra infiltrado inflamatório piogranulomatoso, sem microrganismos, e
cultura bacteriana negativa. Recomenda­se tratamento precoce para evitar a formação de cicatriz. Prednisona ou prednisolona (2 mg/kg VO, fracionada 2 vezes/dia); a dose deve ser lentamente reduzida após 4 a 6 semanas ou até que a
doença esteja inativa. Antibióticos podem ser necessários para tratar a infecção bacteriana secundária.

Placas Auriculares em Equinos
Essas  placas,  também  conhecidas  como  acantoma  ou  papilomas  de  orelhas,  são  causadas  por  um  papiloma  vírus.  Moscas  negras  (Simulium spp)  representam  o  vetor  mecânico  preferencial.  Essas  moscas  são  ativas  ao  amanhecer  e  ao
anoitecer, quando atacam cabeça, orelhas e abdome ventral de equinos. Clinicamente, as lesões são caracterizadas por pápulas e placas coalescentes, despigmentadas, hiperceratóticas, localizadas na face côncava do pavilhão auricular.
Frequentemente, ambos os pavilhões são acometidos. Lesões semelhantes podem estar presentes raramente ao redor do ânus e genitália externa. Em geral, as lesões são assintomáticas, mas, em alguns casos, o efeito direto da picada da
mosca causa dermatite e desconforto. Histologicamente, as lesões são caracterizadas por hiperplasia epidérmica papilomatosa branda e hiperqueratose acentuada. Grânulos ceratoialínicos grandes, poiquilocitose e hipomelanose também
podem ser notados na epiderme. Partículas virais intranucleares foram observadas em estudos por microscopia eletrônica. Atualmente não há tratamento eficaz documentado. Relatos anedóticos sugerem que creme de imiquimod é efetivo
no tratamento de placas aurais. Entretanto, a inflamação grave induzida pelo fármaco torna o uso deste tratamento difícil, sendo necessária sedação da maioria dos equinos. O protocolo recomendado consiste na aplicação de imiquimod 2 a
3 vezes/semana, com intervalos semanais. Aplicações frequentes de repelentes contra moscas e estabulação dos equinos durante os horários de alimentação das moscas são medidas importantes para reduzir o desconforto e prevenir a
ocorrência de recidiva. Tipicamente, as lesões não regridem espontaneamente.

Seborreia de Borda de Orelha
Esta afecção é comum em animais da raça Dachshund, apesar de outras raças com orelhas pendulosas serem afetadas. As lesões geralmente se instalam no ápice do pavilhão auricular de ambos os lados, mas podem progredir e envolver
toda  a  borda  auricular.  A  causa  é  desconhecida.  As  lesões  surgem  como  escamas  cerosas  acinzentadas  a  amareladas  que  se  aderem  às  hastes  dos  pelos.  Aglomerados  de  pelos  podem  ser  facilmente  depilados,  deixando  no  local  uma
superfície clara na pele. Em casos graves, as bordas auriculares apresentam edema e fissuras. Os achados histológicos incluem hiperqueratose grave e queratose folicular, com folículos dilatados, preenchidos por restos de queratina. Os
diagnósticos diferenciais incluem sarna sarcóptica, alopécia do pavilhão auricular, necrose trombovascular proliferativa, dermatofitose e ulcerações pelo frio. A dermatofitose, em particular, pode causar dermatite descamativa auricular em
cães, gatos e equinos, mas a borda auricular tipicamente não é envolvida; outras áreas do corpo geralmente também são infectadas. O tratamento inclui uso de xampu antisseborreico (p. ex., à base de enxofre, ácido salicílico, peróxido de
benzoíla),  produtos  ceratolíticos,  sulfossuccinato  sódico  de  dioctila  e  medicamentos  sistêmicos  que  podem  auxiliar  na  normalização  do  mecanismo  de  queratinização  (vitamina  A  e  retinoides  sintéticos,  ácidos  graxos  essenciais).
Glicocorticoides, de uso tópico ou oral, e pentoxifilina (10 a 15 mg/kg, 2 a 3 vezes/dia) podem ser benéficos quando há inflamação e fissuras graves.

Síndrome da Necrose Auricular em Suínos (Necrose de orelha, Dermatite auricular necrosante)
Suínos com síndrome da orelha necrosada apresentam necrose de pavilhão auricular, uni ou bilateral, apresentam definhamento e comumente desenvolvem artrite séptica ou morrem de sepse bacteriana secundária. A enfermidade ocorre
esporadicamente em suínos em crescimento e desmamados, submetidos a qualquer sistema de manejo, particularmente quando desafiados por doenças endêmicas que podem influenciar o consumo de alimento.
ETIOLOGIA, TRATAMENTO E PATOGÊNESE:  As causas ainda não foram determinadas, conclusivamente. Evidência circunstancial sugere que a doença se deve a trauma (briga) e subsequente invasão bacteriana do tecido lesionado. Outro
fator potencial que pode contribuir para a ocorrência da doença é um teor inadequado de lisina na dieta, embora não haja dados científicos que comprovem tal afirmação.
Os achados histológicos e microbiológicos sugerem que a lesão é erosiva a ulcerativa agressiva e se deve à infecção bacteriana secundária. Nas fases iniciais da doença, nota­se grande número de Staphylococcus hyicus e quantidade baixa
a moderada de estreptococos beta­hemolíticos no exsudato superficial. Mais tarde, no estágio ulcerativo e necrosante, grande número de estreptococos é encontrado profundamente na lesão. Aventa­se a possibilidade de que S. hyicus forma
colônias e lesiona o tecido, facilitando a penetração de estreptococos altamente invasivos que ocasionam danos que originam ulceração e necrose. Esforços para reproduzir a doença por inoculação experimental desses dois microrganismos
fracassaram.
ACHADOS CLÍNICOS, LESÕES E DIAGNÓSTICO:  A natureza e a extensão dos sintomas dependem da gravidade da lesão local e do desenvolvimento de sepse bacteriana secundária. Assim, pode­se notar uma variedade de sintomas, incluindo
definhamento, anorexia, febre, artrite séptica, colapso e morte.
Lesões discretas consistem de escoriações superficiais recobertas por crostas finas secas amarronzadas. Edema ou eritema brando pode ser verificado próximo às escoriações. Em casos mais graves, crostas marrons, espessas e úmidas
cobrem úlceras profundas. Na maioria dos casos graves ocorre necrose extensa. As lesões progridem de dermatite superficial discreta à inflamação grave, com exsudação, ulceração, trombose e necrose. Nos casos brandos, ocorre cura sem
perda de tecido auricular; em casos graves, as bordas, as extremidades ou mesmo todo o pavilhão auricular podem ser perdidos.
O diagnóstico se baseia na aparência das orelhas acometidas.
MANEJO E CONTROLE:  Aplicação tópica de tintura de iodo, 2 vezes/dia, durante 1 semana, tem reduzido a prevalência e a gravidade da doença. Antibacterianos administrados junto com o alimento são efetivos em alguns rebanhos, mas não
em outros. A ineficácia pode ser decorrência de resistência à droga. Em casos de ineficácia de antibacterianos devem ser coletadas, de modo asséptico, amostras da parte profunda das lesões ulcerativas para cultivo e antibiograma. Eventos
traumáticos  devem  ser  minimizados.  As  práticas  de  manejo  (ventilação,  posicionamento  e  funcionamento  dos  bebedouros,  tipo  das  baias,  tamanho  dos  grupos,  mistura  de  animais)  e  o  teor  apropriado  de  lisina  na  dieta  devem  ser
monitorados e corrigidos, caso se detectem deficiências (ver p. 1906).

OTITE EXTERNA

Otite externa é a inflação aguda ou crônica do epitélio do canal auditivo externo. Pode se desenvolver em qualquer local, entre a membrana timpânica e o pavilhão auricular. Caracteriza­se variavelmente por eritema, edema, exsudato ou
secreção sebácea aumentada e descamação do epitélio. O canal auditivo pode estar dolorido ou pruriginoso, dependendo da causa ou da duração da enfermidade. É a doença do canal auditivo mais comum em cães e gatos, sendo observada
ocasionalmente em coelhos (nos quais, em geral, se deve ao ácaro Psoroptes cuniculi); é incomum em grandes animais. Fatores internos e externos podem induzir diretamente inflamação e prurido no conduto auditivo. A identificação
desses fatores é a chave para o tratamento efetivo.
ETIOLOGIA:   As  causas  de  otite  externa  foram  agrupadas  em  4  condições.  Fatores  primários  são  condições  que  causam  diretamente  a  otite.  Fatores  secundários,  como  infecções  por  leveduras  e  bactérias,  exacerbam  e  complicam  as
condições primárias e as perpetuam. Fatores predisponentes são condições que favorecem a ocorrência de otite em um indivíduo. Fatores perpetuantes tendem a impedir a cura da otite, depois que ela se instala. Frequentemente, os 4 fatores
estão  envolvidos,  mas  cada  categoria  deve  ser  identificada  e  tratada  separadamente.  Dessa  forma,  pode­se  estabelecer  um  prognóstico  mais  apurado,  um  plano  terapêutico  específico  e  seguro  e,  assim,  propiciar  melhor  resultado  do
tratamento.
Fatores primários incluem parasitos (Otodectes, Psoroptes, Sarcoptes, Demodex spp), corpos estranhos (sementes de grama, cerume endurecido, medicamentos), neoplasias (adenoma de glândula ceruminosa, pólipos inflamatórios),
hipersensibilidade (dermatite atópica, sensibilidade alimentar, dermatite de contato), distúrbios de queratinização, hipotireoidismo, doenças autoimunes, celulite juvenil e por irritantes (produtos de limpeza, pelos arrancados etc.).
Fatores predisponentes frequentemente são congênitos ou ambientais e incluem conformação (porte da orelha, canal auditivo estreito, excesso de pelos ou de glândulas ceruminosas), maceração do conduto auditivo por tratamento
excessivo ou orelha de nadador e doença sistêmica. Pequenas alterações no microclima auricular podem alterar o delicado equilíbrio entra as secreções normais e a microflora, resultando em infecções oportunistas. Qualquer doença que
influencia as respostas normais aos patógenos pode predispor o canal auditivo a infecções oportunistas.
Fatores  perpetuantes  incluem  otite  média  e  alterações  patológicas  progressivas.  Uma  vez  alterado  o  ambiente  do  conduto  auditivo  por  uma  combinação  de  fatores  primários  e  predisponentes,  instalam­se  infecções  oportunistas
(um fator secundário) e alterações mórbidas, as quais impedem a cura da doença. Enfermidades auriculares crônicas também podem ocasionar doença cutânea ou sistêmica generalizada. A menos que todas as causas sejam identificadas e
tratadas, pode­se esperar recidiva.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  O quadro clínico e informações detalhadas sobre a história dermatológica fornecem dados sugestivos da doença primária (p. ex., anomalias genéticas, hipersensibilidade e alteração de queratinização).
O histórico indica se a otite é aguda, crônica ou recidivante. Condições agudas tendem a ser parasitárias ou causadas por corpo estranho. Condições crônicas sugerem doença neoplásica, alérgica ou hormonal ou defeito de queratinização.
Um exame físico e dermatológico detalhado fornece dados diagnósticos relacionados com a hipersensibilidade, distúrbios endócrinos, imunomediados e de queratinização que também afetam o ouvido. O tipo e a resposta à terapia auricular
prévia também são importantes. O tratamento inadequado pode induzir à otite crônica.
A parte externa da orelha deve ser examinada, pesquisando­se a presença de eritema, edema, crostas, escamas, úlceras, liquenificação, hiperpigmentação ou exsudato. Adicionalmente ao exame otoscópico, devem ser realizados raspados
de pele, exame citológico do exsudato, exame com lâmpada de Wood e cultura para dermatófitos, em todos os casos.
As orelhas e as regiões periauriculares devem ser inspecionadas quanto à evidência de autotraumatismo, eritema e lesões cutâneas primárias e secundárias. Deformidades auriculares, tecido hiperplásico no canal auditivo e sacudidelas de
cabeça sugerem desconforto auricular crônico.
Em animais com sintomas unilaterais, primeiramente deve­se examinar o ouvido não afetado de modo a impedir a contaminação iatrogênica por microrganismos (p. ex., Pseudomonas aeruginosa ou Proteus mirabilis), que podem estar
presentes no ouvido doente. Na verdade, a orelha que não exibe sintomas pode estar infectada, requerendo um ajuste na lista de diagnóstico diferencial para incluir as causas de otite bilateral.
A doença auricular é tanto dolorida quanto pruriginosa; sendo assim, pode ser necessária sedação profunda ou anestesia geral para um exame otoscópico detalhado. Isto é especialmente verdadeiro se o canal auditivo está obstruído por
exsudato ou tecido inflamatório proliferativo ou se o animal não colabora. O exame otoscópico permite a detecção de corpos estranhos profundos na orelha, restos celulares impactados, infecções de baixa gravidade por Otodectes cynotis e
membranas timpânicas anormais ou rompidas.
O exame otoscópico pode ser realizado utilizando­se otoscópio manual ou um otoscópio com vídeo. O otoscópio manual deve propiciar luz e aumento suficientes para visualização clara do canal externo até a membrana timpânica. Os
cones de otoscopia projetados para uso em cães e gatos estão disponíveis em diversos tamanhos, para se ajustar nas diferenças anatômicas. Dois tipos de cabeças estão disponíveis. Uma cabeça para diagnóstico, que tem uma lente de grande
aumento, através da qual se vê o canal, é utilizada para exame do ouvido. Uma cabeça cirúrgica, com uma lente de aumento muito menor, mas com espaço entre a lente e a conexão com o cone para introdução de um suabe ou outro
instrumento. A cabeça cirúrgica é usada quando se prevê a necessidade de biópsia, de remoção de corpo estranho ou de irrigação profunda do canal.
O otoscópio com vídeo permite um aumento formidável do canal auditivo e da membrana timpânica. Os achados podem ser registrados em gravador de vídeo ou digital. A maioria apresenta um canal de trabalho através do qual podem
ser passados instrumentos de biópsia, cateter para irrigação e remoção de restos celulares do conduto e até ponteiras de laser. Os otoscópios de vídeo permitem visualização através de água ou solução salina e inspeção da integridade da
membrana timpânica e facilitam a coleta de amostras para cultura de material da orelha média.
Durante o exame otoscópico, o canal auditivo deve ser inspecionado quanto a alterações de diâmetro, lesões da pele, quantidade e tipo de exsudato, parasitos, corpos estranhos, neoplasias e alterações na membrana timpânica. Deve­se
examinar a membrana timpânica quanto à evidência de doença ou ruptura. Entretanto, em muitos casos de otite, a membrana timpânica não pode absolutamente ser visualizada até que o exsudato seja delicadamente irrigado e drenado para
fora do canal. Amostras para exame citológico e cultura devem ser obtidas antes da irrigação da orelha. Tenta­se examinar novamente após o ouvido estar seco. Em casos crônicos, o canal frequentemente encontra­se muito estenosado,
tanto por hiperplasia como por edema, para ser examinado. Glicocorticoides sistêmicos, fornecidos diariamente por 1 semana, podem reduzir suficientemente a tumefação para permitir o exame.
O exame citológico do exsudato ou do cerume retirado do conduto auditivo horizontal pode fornecer informação diagnóstica imediata. Os canais auditivos externos da maioria dos cães e gatos abrigam pequeno número de cocos gram­
positivos  comensais.  Esses  microrganismos  podem  se  tornar  patogênicos  se  o  microambiente  for  alterado  de  forma  a  favorecer  seu  crescimento  excessivo.  O  exsudato  obtido  em  um  aplicador  com  extremidade  de  algodão  pode  ser
depositado por rolamento sobre uma lâmina de vidro, fixado pelo calor, corado com um corante rápido em 3 etapas ou com corante de Wright modificado e examinado ao microscópio. Inicialmente os esfregaços devem ser examinados em
pequeno aumento e, em seguida, sob grande aumento (preferencialmente usando óleo de imersão) quanto ao número e a morfologia de ceratinócitos, bactérias, leveduras e leucócitos; evidência de fagocitose de microrganismos; hifas
fúngicas e células acantolíticas ou neoplásicas.
Um esfregaço corado pode indicar rapidamente se há crescimento microbiano exagerado. Bactérias em forma de cocos geralmente são estafilococos e estreptococos. Microrganismos na forma de bastonetes geralmente são Pseudomonas
aeruginosa, Escherichia coli ou  Proteus  mirabilis;  sua  ocorrência  em  grande  número  indica  que  deve  ser  realizada  cultura  bacteriana  e  antibiograma,  devido  sua  conhecida  resistência  a  vários  antimicrobianos.  A  presença  de  muitos
neutrófilos fagocitando bactérias confirma a natureza patogênica desses organismos.
Pequena quantidade da levedura Malassezia pachydermatis é encontrada nos canais auditivos de muitos cães e gatos normais. Como as leveduras colonizam a superfície do canal auditivo, elas são mais facilmente encontradas aderidas a
agregados de células epiteliais escamosas esfoliadas. M. pachydermatis é identificada prontamente ao exame microscópico e sua quantidade é facilmente determinada. Não deve haver mais do que 2 a 3 microrganismos por campo, em
grande aumento, ou qualquer agregado de células em um ouvido sadio. Quando leveduras não identificadas ou são observadas hifas em número significativo em esfregaços citológicos, a espécie deve ser identificada por meio de cultura.
São comuns infecções bacterianas concomitantes, especialmente aquelas causadas por cocos gram­positivos.
Um  exsudato  escuro  no  canal  geralmente  sinaliza  a  presença  de Malassezia spp  ou  de  um  parasito,  mas  pode  também  ser  visto  com  uma  infecção  bacteriana  ou  infecção  mista.  Adicionalmente  à  citologia  em  esfregaço  colorido,  o
exsudato auricular deve ser examinado quanto à presença de ovos, larvas ou do ácaro adulto de ouvido Otodectes cynotis, em cães e gatos, e de Psoroptes cuniculi, em coelhos e caprinos. Os esfregaços são feitos combinando cerume e
secreção auricular à pequena quantidade de óleo mineral, sobre uma lâmina de vidro. Uma lamínula deve ser utilizada e o esfregaço deve ser examinado em pequeno aumento. Raramente, uma otite externa ceruminosa refratária pode estar
associada à proliferação local de Demodex sp nos canais auditivos externos de cães e gatos, podendo ser a única área do corpo afetada.
Amostras para cultura microbiana são colhidas antes de se completar a otoscopia e antes de qualquer limpeza local. As amostras para cultura devem ser colhidas com suabe estéril a partir do canal horizontal (região onde a maioria das
infecções se origina) ou da orelha média em casos de ruptura timpânica. Devem ser realizados cultura bacteriana, antibiograma e estabelecimento da concentração inibitória média (CIM) do antibiótico.
Alterações histopatológicas associadas à otite externa crônica são, frequentemente, inespecíficas. Evidência histopatológica de resposta de hipersensibilidade pode justificar a recomendação de teste alérgico intradérmico ou de um teste
dietético hipoalergênico. Adicionalmente, biópsias de animais com otite externa crônica, obstrutiva e unilateral podem revelar se há alterações neoplásicas.
Radiografia da bulha óssea é indicada quando tecidos proliferativos impedem a visualização adequada da membrana timpânica, quando há suspeita de que a otite média seja causa de recidiva de otite externa bacteriana e quando a otite
externa  é  acompanhada  de  sintomas  nervosos.  Densidades  fluidas  e  proliferativas  ou  alterações  ósseas  líticas  são  evidências  de  envolvimento  da  orelha  média.  Infelizmente,  radiografias  são  normais  em  muitos  casos  de  otite  média.
Tomografia computadorizada ou ressonância magnética, se disponíveis, devem ser realizadas em caso de otite crônica grave.
TRATAMENTO:  As causas primárias e os fatores predisponentes e perpetuantes devem ser identificados e corrigidos. Deve­se fazer tricotomia da área periauricular e os pelos do canal auditivo devem ser removidos para melhorar a ventilação,
facilitar a limpeza e secar os canais, bem como para melhorar a adesão do proprietário às recomendações terapêuticas.
Medicamentos tópicos são inativados por exsudatos e o cerume excessivo pode impedir que eles alcancem o epitélio. As orelhas devem ser delicadamente limpas e secas, antes do início do tratamento. Em animais com dor auricular, a
limpeza apropriada requer anestesia geral. Há diversos produtos disponíveis para uso para otite limitada ao canal externo. As orelhas podem ser irrigadas com solução antibacteriana de limpeza (clorexidina ou iodo­povidona) ou com
solução salina, se o material apresenta consistência fluida. Material espesso, seco, ceroso requer o uso de solução ceruminolítica, como peróxido de carbamida ou sulfossuccinato sódico de dioctila (DSS). O uso deste último deve ser sempre
seguido de irrigação abundante com solução salina morna, após a remoção de todos os restos celulares, para a remoção do agente de limpeza. Se a membrana timpânica estiver rompida, detergentes e DSS são contraindicados. Produtos para
limpeza mais brandos (p. ex., solução salina, salina com iodo­povidona, Tris­EDTA) devem ser usados para lavar a orelha.
O  tratamento  medicamentoso  deve  ser  simples  e  específico.  As  causas  contribuintes  devem  ser  tratadas  especificamente  e  de  modo  intensivo.  No  tratamento  da  otite  externa  bacteriana  aguda,  antibacterianos  em  combinação  com
corticosteroides podem ser utilizados para reduzir exsudação, dor e tumefação, bem como para diminuir as secreções glandulares. Deve­se utilizar o corticosteroide menos potente capaz de reduzir a inflamação (ver p. 2316). Animais com
otite externa bacteriana recidivante e histórico de infecção por Otodectes cynotis devem ser tratados com um produto tópico que contenha drogas antibacterianas e antiparasitárias, a fim de assegurar a eliminação de infecções parasitárias de
baixo grau não detectadas. Os parasitos também podem infectar locais extra­auriculares. Um parasiticida geral tópico ou sistêmico é o medicamente mais efetivo em casos recidivantes confirmados ou suspeitos.
A terapia tópica deve se basear na característica da doença. O medicamento ideal e aplicado apropriadamente recobre o epitélio do canal auditivo externo, como um filme delgado. Soluções ou loções não oclusivas devem ser utilizadas
para otite externa exsudativa aguda ou crônica e em lesões proliferativas. Pomadas oclusivas à base de óleo devem ser reservadas às lesões descamativas e secas no interior dos canais auditivos. Alterações cutâneas dos canais auditivos
durante o tratamento podem indicar reação de irritação por contato a um veículo ou base e o medicamento deve ser substituído.
Medicações irritantes devem ser evitadas. Elas causam edemaciação do revestimento do canal auditivo e aumento das secreções glandulares, que predispõem a infecções oportunistas. Substâncias que geralmente não são irritantes aos
canais  auditivos  normais  podem  causar  irritação  naqueles  já  inflamados.  Isto  é  particularmente  verdadeiro  para  o  propilenoglicol.  Produtos  na  forma  de  pó,  como  aqueles  utilizados  após  a  extração  dos  pelos  do  canal,  podem  formar
concreções irritantes no interior do conduto auditivo e não devem ser utilizados.
A terapia sistêmica deve ser incluída ao regime terapêutico na maioria dos casos de otite crônica e em qualquer caso suspeito de otite média. Em casos de atopia grave ou de seborreia idiopática, podem ser necessários corticosteroides
sistêmicos para controlar a inflamação. Falha em se utilizar terapia antimicrobiana sistêmica é um fator de perpetuação importante de otite crônica em cães. Antibióticos sistêmicos devem ser utilizados quando se constatam neutrófilos ou
bactérias bastonetes no exame citológico, em casos de falha terapêutica de drogas antimicrobianas de uso tópico, de infecções auriculares recidivantes crônicas e em todos os casos de otite média (ver p. 2192).
A duração do tratamento varia de acordo com o caso, mas a terapia deve ser mantida até que a infecção tenha cedido (frequentemente = 12 semanas). Animais com infecções bacterianas e por leveduras devem ser submetidos ao exame
físico e exame citológico semanalmente ou em semanas alternadas, até que não haja mais evidência de infecção. Na maioria dos casos agudos isso demora 2 a 4 semanas. A cura dos casos crônicos podem demorar meses; em alguns casos, o
protocolo  terapêutico  deve  ser  mantido  indefinidamente.  Animais  com Otodectes cynotis ou  Psoroptes  cuniculi  devem  receber  tratamento  parasiticida  apropriado  nos  ouvidos  e  sobre  todo  o  corpo  por,  no  mínimo,  2  a  4  semanas.  As
infestações por Otobius megnini são mais bem tratadas por meio da remoção manual dos carrapatos, seguida da aplicação de uma preparação auricular acaricida/corticosteroide.
Pseudomonas (otite causada por Pseudomonas aeruginosa) e Staphylococcus intermedius resistente à meticilina têm se destacado como causas perpetuantes e frustrantes de otite, devido ao desenvolvimento de resistência aos antibióticos
mais comuns. Essas infecções frequentemente têm curso crônico (> 2 meses) e estão associadas a intensa exsudação supurativa, ulceração epitelial grave, dor e edema do canal auditivo. O tratamento efetivo é multifacetado e deve incluir os
seguintes passos: (1) identificar e tratar a causa primária da otite; (2) remover os exsudatos e secar o canal; (3) identificar e tratar a otite média concomitante; (4) selecionar o antibiótico apropriado a partir dos resultados de cultura e da
concentração inibitória mínima do microrganismo e utilizar dose efetiva por um período apropriado; e (5) instituir tanto aplicação tópica quanto sistêmica, até que haja cura da infecção (semanas a meses).
O melhor tratamento para otite crônica é a prevenção. Adicionalmente à identificação da causa da otite aguda, a escolha de medicamentos tópicos e/ou sistêmicos deve se basear no exame citológico ou na cultura; devem ter espectro
estreito e ser específicos para a infecção em questão. Os antibióticos aminoglicosídios e as fluorquinolonas não devem ser utilizados, a não ser que absolutamente necessários para um tratamento bem­sucedido, mas são os produtos mais
comuns em preparações auriculares de uso tópico. Como vários produtos tópicos contêm uma combinação de glicocorticoide, antibiótico e antifúngico, é imperativo orientar o proprietário sobre o uso apropriado (frequência e duração).
Muitos proprietários interrompem o tratamento quando “o ouvido parece melhor”, antes da cura da infecção. Os antibióticos fluorquinolona e polimixina B têm mostrado melhor taxa de sucesso no controle de infecções por Pseudomonas,
em casos nos quais se verificou resistência no antibiograma. Entretanto, está surgindo resistência às fluorquinolonas.
CUIDADOS DE MANUTENÇÃO:  Os proprietários devem ser orientados sobre como limpar apropriadamente as orelhas. Em geral, a frequência de limpeza diminui com o tempo, desde diariamente até 1 ou 2 vezes/semana, como procedimento
de manutenção preventiva. Os canais auditivos devem ser mantidos secos e bem ventilados. O uso de adstringentes tópicos em cães que nadam frequentemente e a prevenção da entrada de água nos canais auditivos durante o banho devem
minimizar a maceração do canal auditivo. A maceração crônica prejudica a função de barreira da pele, o que predispõe à infecção oportunista. Adstringentes auriculares preventivos podem reduzir a frequência de infecções bacterianas ou
micóticas em canais auditivos úmidos. O corte dos pelos do interior da orelha e ao redor do meato auditivo externo e sua depilação em condutos auriculares com pelos abundantes facilitam a ventilação e reduz a umidade nas orelhas.
Entretanto, os pelos não devem ser rotineiramente removidos do canal auditivo se não estiverem causando problema, pois isso pode induzir uma reação inflamatória aguda.

OTITES MÉDIA E INTERNA

A otite média, inflamação das estruturas da orelha média, acomete pequenos e grandes animais domésticos, inclusive cães, gatos, coelhos, ruminantes, equinos, suínos e camelídeos. Pode ser unilateral ou bilateral e afetar animais de todas
as idades. Apesar de serem tipicamente esporádicos, os surtos são possíveis em animais criados em rebanhos. A otite média geralmente resulta da extensão da infecção do canal auditivo externo através da membrana timpânica ou por
migração  de  microrganismos  da  faringe  através  da  tuba  auditiva.  Ocasionalmente,  a  infecção  se  estende  da  orelha  interna  para  a  orelha  média  por  via  hematógena.  A  otite  média  primária  foi  relatada  em  algumas  raças  de  cães,
particularmente  Cavalier  King  Charles  Spaniel.  A  otite  média  não  tratada  pode  progredir  para  otite  interna  (inflamação  das  estruturas  auriculares  internas)  ou  ruptura  de  membrana  timpânica  intacta,  com  otorreia  ou  otite  externa
subsequente.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Os sintomas de otite média incluem sacudidelas de cabeça, esfregação ou coceira da orelha acometida e inclinação ou rotação da cabeça em direção ao lado afetado; o autotraumatismo pode ocasionar
hematoma auricular. Quando a otite externa (ver p. 482) acompanha otite média, o canal auditivo externo pode parecer inflamado e conter secreção anormal. O pavilhão auricular ou o canal auditivo pode estar dolorido e os pelos ao redor
da base da orelha podem estar úmidos ou emaranhados. Como os nervos faciais (nervo craniano VII) e simpáticos atravessam o orelha média, animais com otite média frequentemente exibem sintomas de paralisia do nervo facial (p. ex.,
ptose de orelha e de lábio, colapso da narina) e/ou síndrome de Horner (p. ex., miose, ptose, enoftalmia e protrusão da membrana nictitante) no mesmo lado da orelha acometida. Podem se desenvolver queratite de exposição e úlcera de
córnea. Com a paralisia facial, o filtro nasal ou o lábio pode ser desviado no sentido oposto ao lado afetado. Esses sintomas auxiliam na distinção entre otite média e otite externa simples.
Na otite interna, a inflamação prejudica a função do nervo vestibulococlear (nervo craniano VIII), resultando em perda auditiva e sintomas de doença vestibular periférica, como desvio e rotação de cabeça, andar em círculos, inclinação
ou  queda  em  direção  ao  lado  afetado,  incoordenação  geral  ou  nistagmo  horizontal  espontâneo  com  a  fase  rápida  no  sentido  oposto  ao  lado  acometido.  A  extensão  da  infecção  do  orelha  interna  ao  cérebro  ocasiona  meningite,
meninoencefalite ou abscesso e os sintomas referentes a tais condições. Em equinos, a otite média/interna grave pode resultar em fusão e fratura da articulação tímpano­hioide. A extensão da linha de fratura para o calvário pode ocasionar
disseminação intracraniana da infecção ou causar hematoma e morte.
Enquanto  os  animais  com  otite  média  e/ou  interna  geralmente  são  alertas,  sem  febre  e  com  bom  apetite,  aqueles  com  meningite  ou  meningoencefalite  geralmente  apresentam  depressão,  febre  e  inapetência.  O  principal  diagnóstico
diferencial para otite média/interna em ruminantes é listeriose. Entretanto, a listeriose pode infectar nervos cranianos, além dos nervos VII e VIII, causando sintomas como disfagia ou perda da sensação facial e os animais infectados
geralmente manifestam depressão.
Otite média e interna são diagnosticadas presuntivamente com base no histórico e nos sintomas. No caso de histórico de aleitamento artificial ou alimentação com leite contaminado a neonatos, doença respiratória prévia ou concomitante,
infecção  crônica  de  ouvido  ou  corpo  estranho  auricular,  juntamente  com  sintomas  típicos  de  otite  média/interna,  deve­se  realizar  prontamente  o  exame  do  canal  auditivo.  A  otite  média  é  confirmada  pela  visualização  de  abaulamento,
descoramento ou membrana timpânica rompida. Embora em muitos casos a membrana timpânica possa ser visualizada utilizando­se um otoscópio simples, a anatomia do canal auditivo impede a visualização em algumas espécies, como em
equinos e lhamas. Endoscopia ou otoscopia com vídeo é uma abordagem alternativa. Os métodos de imagem auxiliam no diagnóstico e na avaliação da gravidade da lesão. A radiografia pode detectar alterações ósseas da bula timpânica e
fluido na cavidade timpânica, desde que sejam utilizados posicionamento e técnica, corretamente. Entretanto, TC e RM são mais sensíveis e são os métodos preferidos, quando possível. Em alguns casos, o diagnóstico é definido apenas
durante a necropsia, usando técnicas especiais para expor a região timpânica. O diagnóstico de otite média/interna clínica em uma orelha deve sempre induzir ao exame da outra orelha para determinar se há otite subclínica.
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  O tratamento de otite média/interna é mais efetivo quando iniciado precocemente. Casos crônicos são frequentemente refratários ao tratamento ou ocasionam recidivas após aparente cura. Quando a otite
externa acompanha otite média/interna, o ouvido deve ser examinado detalhadamente quanto à presença de ácaros e corpos estranhos, como arestas de plantas, e deve­se coletar secreção para cultura bacteriana. Muitas bactérias aeróbicas e
anaeróbicas isoladas de orelhas de animais com otite média/interna e de infecções mistas são comuns. Patógenos que devem ser considerados devido sua frequência de isolamento incluem Malassezia spp e Pseudomonas spp, em pequenos
animais; Streptococcus suis, em suínos; Streptococcus spp, em equinos; Mycoplasma spp, em caprinos, e Mannheimia haemolytica, Pasteurella multocida, Histophilus somni e Mycoplasma bovis, em bovinos. M. bovis é particularmente
problemático  em  bezerros  leiteiros  alimentados  com  leite  de  descarte  não  pasteurizado  de  vacas  com  mastite.  Entretanto,  outros  patógenos,  como  bactérias  coliformes,  Staphylococcus  spp,  Neisseria  spp,  corinebactérias
e Arcanobacteriumpyogenes são isolados frequentemente de orelhas dos animais acometidos. O isolamento de bactéria(s) patogênica(s) ou de ácaros de orelha auxilia no direcionamento inicial, mas não necessariamente indica a causa da
otite média/interna, uma vez que estes mesmos microrganismos podem ser isolados dos canais auditivos externos de animais aparentemente sadios.

(A) Labirinto membranoso, orelha interna, cão. (B) Ouvido externo, cão. Ilustração de Gheorghe Constantinescu.
Estruturas profundas da bulha timpânica e da membrana timpânica em gato. Ilustração de Gheorghe Constantinescu.

Ácaros de orelha, quando presentes, devem ser tratados com antiparasitário sistêmico apropriado (ver p. 2196). Acaricidas de uso tópico podem ser instilados no interior do canal auditivo externo, desde que esteja limpo. A infecção
bacteriana deve ser tratada com antibióticos sistêmicos apropriados (ver p. 2192), com base nos resultados da cultura bacteriana e no antibiograma, se possível. Quando a cultura não é possível porque a membrana timpânica está intacta,
inicia­se tratamento antimicrobiano de amplo espectro, com base nos patógenos causadores mais prováveis para a espécie animal em tratamento. Pode ser necessário tratamento de longa duração, particularmente em casos subagudos ou
crônicos. Nos EUA, não há qualquer antimicrobiano formulado para o tratamento da otite média/interna em animais de produção; assim, deve adotar o uso extra­bula, mas os fármacos proibidos devem ser evitados.
Otite média­interna em equino (radiografia). Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Além do tratamento antimicrobiano e/ou anti­helmíntico, o canal auditivo externo deve ser limpo e irrigado quando há otorreia ou otite externa. Soluções fisiológicas salinas ou antissépticas diluídas, como iodo, clorexidina ou peróxido
de hidrogênio são comumente utilizadas para lavagem. Esteroides ou AINE podem auxiliar na redução da inflamação e da dor associadas à otite média/interna. Úlcera de córnea, oto­hematoma e infecções concomitantes devem ser tratadas
apropriadamente, se presentes, e o animal protegido de novos autotraumatismos.
Se a membrana timpânica estiver intacta e a otite média/interna não responder adequadamente ao tratamento antimicrobiano e anti­inflamatório sistêmico pode­se realizar miringotomia (perfuração da membrana timpânica) para aliviar a
pressão e permitir a cultura e a drenagem do fluido da cavidade timpânica. Entretanto, a miringotomia pode resultar em perda auditiva permanente e sua eficácia não é bem documentada em animais. Em caso de otite média/interna crônica,
recidivante ou não responsiva pode ser necessária osteotomia da bulha, ressecção do canal auditivo lateral ou ablação total do canal auditivo para estabelecer drenagem suficiente e permitir lavagem efetiva. Tubos de timpanostomia podem
ser implantados no interior da membrana timpânica após miringotomia para permitir drenagem contínua em cães da raça Cavalier King Charles Spaniel com otite secretória primária, mas não são efetivos para drenagem de exsudato mais
purulento.
Diagnóstico e tratamento precoces de otite média/interna podem resultar em cura completa da infecção e dos sinais clínicos. Entretanto, em casos graves, crônicos ou não responsivos, os clientes devem ser orientados de que a perda
auditiva e as deficiências neurológicas podem persistir mesmo se a infecção seja debelada.

SURDEZ

Surdez – ausência da percepção do som – e capacidade auditiva diminuída são comuns em cães e gatos e, em menor extensão, em outras espécies. A surdez pode ser hereditária ou adquirida e sensorioneural ou condutiva.
A surdez hereditária, que geralmente ocorre em cães com genes merle ou piebald e em gatos de pelagem branca, acomete um ou ambos os ouvidos e frequentemente está associada a olhos azuis e pelagem branca. A surdez associada à
pigmentação também acomete equinos, bovinos, suínos e outras espécies. Esta é a causa mais comum de surdez em cães e gatos e deve ser o primeiro diagnóstico diferencial considerado em um animal com pigmentação branca. A doença
surge 1 a 3 semanas após o nascimento, devido à degeneração da estria vascular resultante da supressão de melanócitos pelo gene do pigmento, ocasionando degeneração cócleossacular neuronal. Animais com surdez unilateral podem não
ser detectados sem que se faça um teste de resposta evocada auditiva de tronco cerebral (REATC), mas representa maior risco de surdez aos descendentes, caso sejam acasalados. A herança não é autossômica simples.
Surdez congênita (geralmente hereditária) foi relatada em 90 raças de cães, sendo especialmente prevalente nas raças portadoras do gene piebald, como Dálmata, Bull Terrier, Australian Cattle Dog, English Setter, Setter Inglês, Cocker
Spaniel Inglês, Boston Terrier e Parson Russel Terrier e nas diferentes raças Collie e Pastor que carreiam o gene merle. Gatos brancos (gene branco dominante), especialmente aqueles com olhos azuis, apresentam alta prevalência de surdez,
mas gatos de olhos azuis de raças siamesas não parecem acometidos. Um teste para genotipagem de carreadores merle está disponível, mas atualmente não há teste de DNA disponível para identificar portadores de surdez genética em cães
ou gatos; assim, o teste REATC e adequada seleção de animais para reprodução são as únicas opções disponíveis para reduzir a prevalência nestas raças. Não há evidência de surdez genética de manifestação tardia em animais.
Surdez de condução resulta da obstrução ou redução da quantidade de som que atinge a cóclea, geralmente devido à otite média (ver p. 486), otite externa crônica (ver p. 482) ou excesso de cerume e, menos comumente, à ruptura
timpânica ou lesão ao ossículo. A resolução da obstrução ou da lesão tecidual geralmente propicia recuperação da audição. A recuperação após otite média pode requerer semanas, enquanto o corpo fagocita os resíduos da infecção. A otite
média secretora primária (“orelha de cola”), especialmente em cães Cavalier King Charles Spaniel, provoca surdez de condução persistente, que pode ser tratada por meio de miringotomia ou tubos de timpanostomia.
A surdez sensorioneural se deve à perda irreversível de células nervosas cocleares em mamíferos. A surdez sensorioneural adquirida pode ser resultado de infecções ou toxinas intrauterinas, otite interna ou meningite, trauma mecânico
ou ruído, ototoxicidade, anestesia, neoplasias ou senilidade (presbicose). A perda pode ser uni ou bilateral e parcial ou completa. A otite interna (ver p. 486) frequentemente é acompanhada de sintomas vestibulares, como rotação e desvio
da cabeça (head tilt) e andar em círculos. Os cães expostos a sons percussivos altos, como armas de fogo, podem apresentar perda cumulativa, inicialmente despercebidas. Isso é observado com frequência em cães de caça, nos quais a
distância em que um cão treinado responde ao comando diminui pela metade, ou menos.
Vários fármacos e outros produtos químicos são ototóxicos e vestibulotóxicos, especialmente os antibióticos aminoglicosídios (gentamicina, canamicina, neomicina, estreptomicina), silicilatos, diuréticos e antissépticos (clorexidina). A
toxicidade é permanente. A toxicidade dos aminoglicosídios é a mais comum e atua através de espécies reativas ao oxigênio. Estudos em pessoas mostraram que a administração simultânea de ácido acetilsalicílico ou N­acetilcisteína atenua
a toxicidade, mas não se sabe se o tratamento pós­exposição é útil. Sons de altas frequências são afetados primeiro, retardando a detecção da toxicidade, que pode surgir semanas após a interrupção do tratamento. Cães ou gatos submetidos
à anestesia geral para limpeza de orelha ou dentes ocasionalmente “acordam” com surdez bilateral, mas os mecanismos são desconhecidos. Há poucos relatos de procedimentos em outras regiões do corpo, além de boca e orelha, e não há
relato de surdez unilateral decorrente de procedimentos anestésicos.
Muitos animais geriátricos desenvolvem presbicose. Sons de altas frequências são acometidos primeiro, seguidos de perda progressiva de todas as frequências. A perda pode parecer uma manifestação aguda, mas reflete a inabilidade do
animal, por fim, para compensar a perda progressiva que se desenvolveu há algum tempo. Não parece haver diferença na prevalência quanto ao sexo. A manifestação tipicamente ocorre no último terço da expectativa de vida da raça e
progride até surdez completa se o animal vive por tempo suficiente.
Animais com surdez unilateral exibem sintomas insignificantes, primariamente a incapacidade em localizar a origem de sons e de se orientar por meio do ouvido normal, mas muitos rapidamente compensam e não exibem nenhum
sintoma. Os movimentos de orientação das orelhas persistem em animais com surdez unilateral. Animais com surdez bilateral não respondem aos estímulos sonoros, mas se tornam peritos em ter maior atenção a outras sensações, como
visão e vibrações. Filhote de ninhadas também fica alheio ao comportamento dos demais animais da ninhada. Criadores de raças com alta prevalência frequentemente optam por realizar eutanásia de animais com surdez bilateral (e castrar
pacientes  com  surdez  unilateral)  devido  à  frequente  baixa  qualidade  de  vida  e  imposições  de  se  possuir  um  cão  surdo,  como  mordeduras  por  susto.  Cães  com  surdez  bilateral  podem  ser  criados  com  sucesso,  mas  é  necessária  maior
dedicação do que o normal. Proprietários de cães surdos devem ser aconselhados a proteger seus animais de perigos não detectados, como veículos automotivos.
Cães que perdem a audição tardiamente na vida parecem lidar bem com isso, mas ocasionalmente exibem comportamento transitório sugestivo de sensações auditivas semelhantes a zumbido em pessoas. Não há evidência de que animais
surdos apresentem dor ou desconforto devido a tal condição.
A detecção de surdez é mais acurada com o teste REATC em centros de referência, mas tipicamente o teste comportamental é empregado na clínica geral. Observa­se a resposta a um estímulo sonoro fora do campo visual do animal.
Limitações incluem inabilidade em detectar surdez unilateral, detecção do estímulo através de outros sentidos, respostas bruscas em animais estressados e respostas falhas devido à falta de novidade em estímulos repetidos. A falha de um
animal adormecido em acordar por um estímulo auditivo que não ativa outros sentidos é indicador confiável de surdez bilateral.
Exame otoscópico da orelha externa e do tímpano, radiografia da bulha timpânica e exame neurológico podem revelar a causa, especialmente de surdez por condução, que geralmente responde a tratamento medicamentoso ou cirúrgico
apropriado. A intervenção precoce de ototoxicidade pode reduzir ou reverter a perda, mas geralmente não é bem­sucedida. Uma vez desenvolvida, a surdez sensorioneural não pode ser revertida e sua causa não pode ser determinada. Surdez
congênita em raças com pigmentação branca é quase sempre de origem genética.

TUMORES DO CANAL AURICULAR

Os  tumores  do  canal  auricular  podem  se  desenvolver  a  partir  de  qualquer  estrutura  que  recobre  ou  dá  suporte  ao  canal  auricular,  inclusive  epitélio  escamoso,  glândulas  sebáceas  ou  ceruminosas  ou  tecidos  mesenquimais.  Os  tumores
malignos originados do canal auditivo externo e do pavilhão auricular são mais comuns em gatos do que em cães.
Embora  a  causa  precisa  das  neoplasias  do  canal  auditivo  seja  desconhecida,  diversas  teorias  foram  postuladas.  A  inflamação  crônica  do  canal  auditivo  pode  ocasionar  hiperplasia,  seguida  de  displasia  e,  finalmente,  neoplasia.  A
degradação bacteriana de ácidos graxos e outros produtos presentes em secreções apócrinas espessadas originadas em glândulas ceruminosas hiperplásicas durante episódios de otite externa também podem estimular a carcinogênese no
canal  auditivo.  Pólipos  nasofaríngeos  felinos,  que  não  são  um  crescimento  neoplásico,  podem  ser  congênitos  ou  decorrentes  de  infecções  bacterianas  crônicas  da  bula,  resultantes  de  infecções  do  trato  respiratório  superior.  Não  foram
isolados vírus nos tecidos de pólipos, em gatos.
Em cães da raça American Cocker Spaniel há maior prevalência de tumores benignos e malignos de canal auditivo, quando comparados a outras raças. A densidade de tecido glandular no canal auditivo desta raça pode ser a razão. Gatos
de meia­idade ou mais velhos são predispostos a neoplasias benignas e malignas do canal auditivo, enquanto gatos jovens (3 meses a 5 anos) são mais propensos a desenvolver pólipos nasofaríngeos. Os sintomas de tumor do canal auditivo
incluem secreção auricular unilateral crônica (ceruminosa, purulenta, mucoide ou hemorrágica) e odor necrótico, sacudidelas de cabeça e esfregação da orelha. Frequentemente, hematomas auriculares resultam da sacudidela da cabeça
associada ao tumor de canal auricular. Como consequência, podem surgir abscessos drenantes na região parotídea abaixo do ouvido acometido. Se houver envolvimento do orelha média ou interno, é possível notar sintomas nervosos,
inclusive surdez, sintomas vestibulares (p. ex., balanço da cabeça, ataxia, nistagmo), paralisia ou paresia de nervo facial (ptose facial, salivação e ptose labial), síndrome de Horner (ptose palpebral, miose e rotação do globo para dentro) e
protrusão ocasional da terceira pálpebra. Em qualquer caso de otite unilateral refratária ao tratamento deve­se suspeitar de neoplasia de canal auditivo ou de orelha média.
Os tumores de canal auditivo em cães são mais propensos a serem benignos do que malignos. Os gatos apresentam maior incidência de tumores auriculares malignos. As neoplasias auriculares mais comuns em cães são os tumores de
glândula sebácea, histiocitomas e mastocitomas. Em gatos, as neoplasias auriculares comuns incluem carcinomas de célula escamosa, tumores de célula basal, hemangiossarcomas e tumores melanocíticos. Os tumores de canal auditivo
externo mais comumente relatados em cães são adenomas e adenocarcinomas de glândula ceruminosa. Outras neoplasias de canal auditivo externo de cães relatadas incluem pólipos inflamatórios, papilomas, adenomas de glândula sebácea,
histiocitomas,  plasmocitomas,  melanomas,  fibromas,  carcinomas  de  célula  escamosa  e  hemangiossarcomas.  Os  tumores  de  canal  auditivo  externo  mais  comumente  relatados  em  gatos  são  pólipos  nasofaríngeos,  carcinomas  de  célula
escamosa e adenocarcinomas de glândula ceruminosa. Linfomas, fibrossarcomas e carcinomas de célula escamosa são ocasionalmente observados no orelha média ou interno de cães e gatos (ver p. 858)

Neoplasias de Glândula Ceruminosa
(Adenocarcinoma, Adenoma de glândula ceruminosa)
Tumores da glândula ceruminosa são melhor visualizados em uma orelha sem cobertura gordurosa e limpa, utilizando­se um otoscópio com vídeo. Esses tumores podem ser pedunculados ou de base ampla, mas se originam acima da
superfície epitelial. Podem ter aparência lisa ou multilobulada. Em raças diferentes de Cocker Spaniel americano, frequentemente esses tumores são primários no canal auditivo vertical. No American Cocker Spaniel, esses tumores se
instalam principalmente no canal horizontal. As amostras de biópsia do canal auditivo, quando apropriadamente colhidas, podem fornecer informações úteis. Entretanto, biópsias superficiais do canal auditivo frequentemente são relatadas
como pólipos, com tecido de granulação recoberto por epitélio. Biópsias em bloco profunda do mesmo tecido geralmente indicam são relatadas corretamente como tumores. TC ou RM pode ser muito útil na avaliação mais completa da
bulha timpânica e na determinação da extensão da invasão tumoral, especialmente em neoplasias malignas.
A  remoção  cirúrgica  de  tumores  benignos  do  canal  auditivo  pode  ser  realizada  por  meio  da  ressecção  da  face  lateral  do  canal  auditivo  para  acessar  a  massa  tumoral.  A  cirurgia  a laser,  especialmente  quando  usada  com  auxílio  de
otoscópio  com  vídeo,  tornou  a  remoção  intra­auricular  desses  tumores  relativamente  fácil,  sem  necessidade  de  abertura  cirúrgica  do  canal.  A  ablação  total  do  canal  auditivo  e  osteotomia  da  bulha  é  a  única  cirurgia  recomendada  para
remoção de tumores malignos de orelha média. Em neoplasias malignas, a ressecção do canal auditivo lateral está associada à taxa de recidiva > 75%. O tempo médio de sobrevida dos animais com tumores malignos de canal auditivo foi
relatado como sendo > 58 meses, em cães, e > 11,7 meses, em gatos. O prognóstico em cães com envolvimento tumoral extensivo é menos favorável. Radioterapia pode ser utilizada para tratar adenocarcinoma de glândula ceruminosa
extirpado em cães e gatos, sendo relatada sobrevida de 1 ano em 56% dos casos.

Pólipos Nasofaríngeos
Pólipos  nasofaríngeos  são  crescimentos  inflamatórios  de  tecido  conjuntivo,  incomuns,  benignos,  lisos,  de  coloração  rósea,  com  aspecto  carnudo,  pedunculados,  verificados  no  canal  auditivo  externo  de  gatos  jovens.  Se  originam  do
recobrimento  mucoso  da  bulha  timpânica,  mucosa  faríngea  ou  tubo  auditivo.  Esses  pólipos  podem  ser  congênitos  ou  podem  resultar  de  otite  média  bacteriana  crônica,  comumente  detectada  em  gatos  com  doença  respiratória  do  trato
superior. São encontrados raramente em cães.
O diagnóstico envolve sedação e exame otoscópio profundo do canal auditivo horizontal. Pode ser necessária irrigação e aspiração da secreção purulenta da bulha do canal auditivo para a visualização do pólipo. O uso de um otoscópio
com vídeo facilita muito a visualização e o tratamento dos pólipos. Os pólipos originários da tuba de Eustáquio podem ser vistos ao se retrair o palato mole rostralmente. A radiografia das bulhas pode revelar opacidade da bulha acometida.
TC ou RM pode ser útil quando há suspeita de tumor na bula timpânica, que não pode ser observado por meio de otoscopia. O diagnóstico é definido pelo exame histopatológico.
A remoção cirúrgica é curativa, desde que todo o pólipo e sua base sejam extirpados. Isto, com frequência, envolve a realização de osteotomia da bulha, uma vez que a base do pólipo geralmente situa­se na bulha timpânica. A remoção
incompleta da base do pólipo por avulsão mediante tração, isoladamente, ocasiona um novo crescimento rápido e recidiva dos sinais clínicos em 15 a 50% dos gatos. A aplicação tópica de esteroides na bulha, por 30 a 45 dias, parece
retardar este novo crescimento. Tratamento antibiótico sistêmico para otite bacteriana média também é indicado.
SISTEMA ENDÓCRINO

 INTRODUÇÃO
Estrutura Química Geral e Função
Mensuração de Hormônios
Patogênese de Doença Endócrina
Princípios Terapêuticos
Regulação do Sistema Endócrino
 GLÂNDULA HIPÓFISE
Acromegalia Felina
Diabetes Insípido
Hiperadrenocorticismo
Hirsutismo Associado a Adenoma de Hipófise Intermediária
Pan­hipopituitarismo de Início Adulto
Pan­hipopituitarismo de Início Juvenil
Tumores Não Funcionais da Hipófise
 GLÂNDULA TIREOIDE
Aumento Não Neoplásico da Glândula Tireoide
Hipertireoidismo
Hipotireoidismo
 GLÂNDULAS ADRENAIS
Córtex Adrenal
Hiperadrenocorticismo
Hipoadrenocorticismo
Medula Adrenal
 GLÂNDULAS PARATIREOIDES E ANORMALIDADES NO METABOLISMO DE CÁLCIO
Anormalidades Hipocalcêmicas em Equinos
Fisiologia do Cálcio e Hormônios Reguladores de Cálcio
Hipercalcemia em Cães e Gatos
Hipercalcemia Maligna
Hiperparatireoidismo Primário
Hipercalcemia Associada ao Hipoadrenocorticismo
Insuficiência Renal
Hipercalcemia Idiopática dos Gatos
Outras Causas de Hipercalcemia
Testes de Diagnóstico
Tratamento
Hipercalcemia em Equinos
Hipocalcemia em Cães e Gatos
Hipoparatireodismo
Outras Causas de Hipocalcemia
Tratamento
 PÂNCREAS
Diabetes Melito
Tumores das Células de Ilhotas Funcionais
Tumores das Células de Ilhotas Secretores de Gastrina
 TUMORES DE TECIDOS NEUROENDÓCRINOS
Medula Adrenal
Órgãos Quimioceptores
Tumores de Célula C da Tireoide

SISTEMA ENDÓCRINO – INTRODUÇÃO

O sistema endócrino engloba um grupo de tecidos que liberam hormônios na circulação, para alcançar alvos distantes. Um tecido endócrino é tipicamente uma glândula sem ducto (p. ex., hipófise, tireoide) que libera esses hormônios aos
tecidos permeados de capilares. Essas glândulas são ricamente supridas com sangue. Está, no entanto, cada vez mais claro que tecidos endócrinos atípicos também contribuem com importantes hormônios para a circulação, por exemplo,
secreção do peptídio natriurético atrial do coração, eritropoetina pelo rim, fator de crescimento semelhante à insulina pelo fígado e leptina pela gordura. Novos hormônios continuam a ser descobertos. Alguns atuam apenas em um único
tecido, enquanto outros têm efeitos em praticamente todas as células do corpo. Os efeitos dos hormônios em seus alvos são variados – desde melhora na absorção de nutrientes até influência na divisão e diferenciação celular, entre muitos
outros.

 ESTRUTURA QUÍMICA GERAL E FUNÇÃO
Há três principais categorias químicas de hormônios: proteicos/polipeptídicos, esteroides e aqueles compostos de aminoácidos modificados.
HORMÔNIOS PROTEICOS/POLIPEPTÍDICOS:  Exemplos de hormônios proteicos/polipetídicos incluem hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) da hipófise, insulina do pâncreas e paratormônio (PTH) da paratireoide. Esses hormônios variam
em tamanho, desde três aminoácidos (hormônio liberador de tireotrofina) a proteínas consideravelmente grandes com subunidades (p. ex., hormônio luteinizante). São produzidos nos tecidos endócrinos, originados por transcrição/tradução
do código genético para o hormônio e inicialmente sintetizados como grandes hormônios (pró ou pré­formas) que passam por processamento para o hormônio original na célula, antes da secreção. Incorporados no código genético para a
estrutura proteica, estão sequências de aminoácidos (peptídios de sinalização) que comunicam à célula que essas moléculas são destinadas para a via metabólica secretora regulada. Outras modificações pós­tradução podem ocorrer durante
o  processo,  inclusive  dobramento,  glicosilação,  formação  de  pontes  dissulfeto  e  formação  de  subunidades.  O  hormônio  “dobrado”  e  processado  é,  então,  armazenado  nos  grânulos  secretórios  ou  em  vesículas  preparadas  para  liberá­lo
mediante um mecanismo de exocitose. A liberação do hormônio é desencadeada por sinais únicos; por exemplo, a secreção de PTH é estimulada por diminuição da concentração de cálcio livre ou iônico presente no fluido extracelular, ao
redor  das  principais  células  da  paratireoide.  Na  maioria  dos  casos,  as  células  produtoras  de  hormônios  proteicos/polipeptídicos  armazenam  quantidades  significativas  dessas  substâncias  intracelularmente;  portanto,  podem  responder
rapidamente quando grande quantidade é necessária na circulação. Geralmente, a meia­vida dos hormônios proteicos/polipeptídicos no sangue é relativamente curta (minutos) e não são carreados por proteínas plasmáticas específicas (com
algumas exceções, por exemplo, fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1 tem alta afinidade por proteínas do sangue).
Hormônios proteicos/polipeptídicos atuam em suas células­alvo ligando­se a receptores localizados na superfície celular. Esses receptores são proteínas e glicoproteínas incluídas nas membranas das células, que atravessam a membrana
pelo menos uma vez, de tal modo que o receptor é exposto a ambos os meios, extracelular e intracelular. Há várias classes ou tipos de receptores de hormônios na superfície das células que traduzem a mensagem hormonal para o interior de
célula por diferentes meios. Algumas são os tipos acoplados de proteína G (guanosina), com sete rotações transmembranas dominantes. Após a ligação com o hormônio, esses receptores ativam a proteína G que também está localizada na
membrana. Uma ou mais subunidades da proteína G interferem em outras moléculas (conhecidas como efetores), como enzimas (p. ex., adenilato ciclase ou fosfolipase C) ou canais iônicos. A ativação pode resultar na produção de um
segundo mensageiro, como o AMP ciclíco, que pode se ligar à proteinoquinase A, causando ativação e subsequente fosforilação de outras proteínas. Assim, a transdução de sinais é uma cascata e frequentemente aumenta uma série de
eventos ativados quando um hormônio se liga a um receptor. Os efeitos máximos nas células­alvo são múltiplos e inclui estímulo da secreção, aumento da entrada da molécula ou ativação da mitose.
Os receptores de superfície celular são dinâmicos; mudam em número e/ou atividade de acordo com as condições fisiológicas. Em alguns casos, assim como a exposição a quantidades excessivas de hormônios, pode ocorrer uma baixa
regulação pelo próprio receptor. Essa baixa regulação e uma menor resposta do tecido­alvo podem ser decorrentes à internalização dos receptores, após ligação ou dessensibilização do receptor que é quimicamente modificado e se torna
menos ativo. Em contrapartida, uma falta de exposição aos hormônios pode ocasionar um aumento no número de receptores nas células­alvo (autorregulação). As doenças têm sido relacionadas com mutações nos receptores de hormônios,
que podem resultar na inativação ou constituição ou ativação não hormonal da via. Em algumas condições, uma única substituição de aminoácido é responsável por isso.
HORMÔNIOS  ESTEROIDES:   Os  hormônios  esteroides  são  derivados  do  colesterol  e  incluem  produtos  do  córtex  da  adrenal,  ovários  e  testículos,  bem  como  a  molécula  relacionada,  vitamina  D.  Ao  contrário  de  hormônios
proteicos/polipeptídicos, os hormônios esteroides não são armazenados em grande quantidade. Quando necessários são rapidamente sintetizados a partir do colesterol por uma série de reações enzimáticas. A maioria do colesterol necessário
para rápida síntese do hormônio esteroide é armazenada intracelularmente no tecido de origem. Em resposta aos sinais apropriados, o precursor é deslocado para organelas (mitocôndria e retículo endoplasmático liso), onde uma série de
enzimas (p. ex., isomerases, desidrogenases) rapidamente converte a molécula ao hormônio esteroide apropriado. A identificação do produto esteroide final é ditada pela expressão do conjunto de enzimas naquele tecido.
Os hormônios esteroides são hidrofóbicos e atravessam a membrana celular facilmente. No sangue, se ligam principalmente às proteínas transportadoras. A albumina se liga a vários esteroides suficientemente livres; além disso, há várias
globulinas de ligação específicas para vários hormônios esteroides. A maioria dos hormônios esteroides na circulação se liga às proteínas transportadoras e uma pequena fração circula livre ou sem ligação. Essa última fração encontra­se
disponível para penetrar na célula­alvo, ou seja, é a porção biologicamente ativa. No fluido extracelular há um rápido equilíbrio entre esteroides ligados às proteínas e aqueles não ligados. Possíveis funções dos hormônios esteroides ligados
a proteínas incluem auxílio na disponibilização do esteroide no tecido, propiciando uma distribuição uniforme a todas as células do tecido­alvo, protegendo contra grandes flutuações nos hormônios livres, e aumentando a meia­vida dos
esteroides no sangue. Comparando­se aos hormônios proteicos/polipeptídicos, os esteroides normalmente tem meia­vida maior, frequentemente na faixa de vários minutos a horas.
Os hormônios esteroides atuam nas células­alvo via receptores localizados no interior das células. Esses receptores normalmente são encontrados no núcleo, embora alguns parecem residir, quando não ligados, no citoplasma. Há várias
classes de receptores de esteroides – aqueles para glicocorticoides, mineralocorticoides, progestágenos etc. Os receptores de esteroides compreendem uma família de proteínas conhecidas que também mostram homologia aos receptores dos
hormônios da tireoide e da vitamina D. O receptor tem regiões ou domínios que realizam tarefas específicas: uma para reconhecimento e ligação do esteroide, outra para ligação à região específica do DNA cromossômico e uma terceira
para auxiliar a regular o mecanismo de transcrição. Os hormônios esteroides entram nos alvos por meio de difusão através da membrana da célula e, então, se liga ao receptor, causando uma mudança na conformação do novo complexo.
Isso, por sua vez, induz a liberação de proteínas associadas (p. ex., proteínas da termoplegia) e transporte ao núcleo (se necessário), seguida da ligação do complexo à região do DNA próxima de genes específicos regulados por esteroides.
O resultado é uma alteração na taxa de transcrição de genes específicos também aumentando ou diminuindo suas expressões. Assim, os hormônios esteroides tem principalmente a finalidade de interferir nas taxas de produção de proteínas
nos alvos e de RNA mensageiro específico. A ação do esteroide é relativamente lenta no início (horas), mas pode ser duradoura em razão da duração da produção e da meia­vida do RNA mensageiro e das proteínas induzidas nas células­
alvo.  Está  muito  claro  que  alguns  esteroides  também  atuam  por  meio  de  mecanismo  não  genômico.  Por  exemplo,  acredita–se  que  muitos  dos  efeitos  anti­inflamatórios  dos  glicocorticoides  se  devem  aos  complexos  de  receptores  de
glicocorticoides que se ligam e inibem a ação de fatores de transcrição proinflamatórios dentro das células.
Os  esteroides  são  eliminados  do  sangue  mediante  metabolização  hepática.  Formas  reduzidas  são  produzidas  e  subsequentemente  conjugadas  a  ácido  glicorônico  e  sulfato.  Esses  metabólitos  são  livremente  solúveis  no  sangue  e  são
excretos pelos rins e pelo do trato GI. Pequenas quantidades de hormônios esteroides livres são também excretadas diretamente pelos rins.
HORMÔNIOS DE AMINOÁCIDOS MODIFICADOS:  Essa classe de hormônios envolve alteração química de aminoácidos, principalmente da tirosina. Incluem hormônios da tireoide e as catecolaminas epinefrina e norepinefrina. Tiroxina (T4) e

triiodotiroxina (T3) são armazenadas na tireoide como parte da tireoglobulina; a secreção desses hormônios envolve absorção e quebra pelas células da tireoide dessa grande molécula, liberando T4 e T3. Os hormônios tireoidianos atuam nos
alvos, como os esteroides; são relativamente insolúveis em água, carreados por proteínas transportadoras do sangue, e atuam nos alvos via receptores intracelulares. As catecolaminas são produzidas por hidroxilação, descarboxilação e
metilação da tirosina e são secretadas no sangue a partir da medula da adrenal. Possuem meia­vida excessivamente curta (< 5 min), não se ligam a proteínas e atuam nos alvos via receptores de superfície das células (receptores alfa e beta­
adrenérgicos).

 MENSURAÇÃO DE HORMÔNIOS
Como  os  hormônios  circulam  em  baixa  quantidade  no  sangue,  a  mensuração  precisa  dessas  substâncias  requer  testes  sensíveis,  normalmente  na  forma  de  imunoensaio  competitivo.  O  método  original  (ainda  amplamente  utilizado)  é
radioimunoensaio  empregando  anticorpo  diretamente  contra  o  hormônio  e  uma  forma  radioativa  marcada  do  hormônio.  O  hormônio  marcado  compete  com  o  hormônio  não  marcado  por  sítios  de  ligação  do  anticorpo.  Curva  padrão
contendo conhecidas quantidades de hormônios é utilizada com padrão de comparação, para calcular a concentração de hormônio na amostra do paciente. A marcação radioativa permite detecção de baixas concentrações de hormônio, os
quais tipicamente circulam em concentração de picomolar (10­12) ou nanomolar (10­9). Nos anos recentes, marcadores não radioativos, teste “tipo sanduíche” e teste ELISA têm sido desenvolvidos para mensuração de hormônios.
A precisa mensuração em espécies veterinárias apresenta alguns desafios, pois as concentrações normais de determinado hormônio podem variar significantemente entre as espécies. Por exemplo, as concentrações normais de T4 total em
cães e gatos são cerca de 4 vezes menores do que em humanos. A preocupação com a reação cruzada é importante; os hormônios proteicos/polipeptídicos variam quanto à composição de aminoácidos e de outras vias estruturais (p. ex.,
padrões  de  glicosilação)  entre  as  espécies.  Como  consequência,  anticorpos  preparados  contra  um  hormônio  em  particular  podem  não  reconhecer  aquele  material  de  outra  espécie.  Finalmente,  enquanto  hormônios  esteroides  são
estruturalmente  idênticos  entre  as  espécies  (cortisol  no  cão  é  idêntico  àquele  de  pessoas),  as  substâncias  presentes  no  soro  de  determinada  espécie  pode  às  vezes  interferir  no  teste,  levando  a  um  resultado  não  confiável.  Em  geral,  é
importante que o laboratório realize a mensuração de um hormônio em uma espécie particular, comprovando que o teste é válido para aquela espécie e que o laboratório tem valores normais estabelecidos.

 PATOGÊNESE DE DOENÇA ENDÓCRINA
As doenças endócrinas podem ser ocasionadas por diversas causas. Pode haver produção excessiva ou insuficiente de hormônios, os receptores podem não ser ativos e as vias normais de remoção do hormônio podem estar comprometidas.
Os sinais clínicos consistentes com mau funcionamento de determinado tecido endócrino podem ser decorrentes de um problema originado na produção do próprio hormônio ou pode ser devido à alteração em outro local que interfere,
secundariamente, na secreção ou ação hormonal.
Em medicina veterinária, os tipos mais comuns de doenças endócrinas incluem maior produção hormonal associada a tumor ou hiperplasia tecidual, produzindo quantidades excessivas de hormônios, bem como deficiência hormonal
devido à destruição do tecido endócrino. As doenças comumente associadas a maior produção hormonal são hipertireoidismo, em gatos, e hiperadrenocorticismo (doença de Cushing), em cães. Frequentemente o tecido endócrino anormal
não apenas produz mais hormônio; ele também falha ao responder normalmente aos sinais de feedback, contribuindo para uma inapropriada liberação de hormônio. A maior produção hormonal de um tecido endócrino pode também resultar
de uma estimulação decorrente de uma fonte secundária; por exemplo, a doença renal pode resultar em hiperplasia da paratireoide e aumentar a secreção de PTH. Como consequência de alguns tipos de doença renal, ocorre hiperfosfatemia.
Isso ocasiona menor formação da forma ativa da vitamina D, o 1,25­di­hidroxicolecalciferol (calcitriol). Assim, a baixa concentração de calcitriol contribui para diminuição do teor de cálcio no fluido extracelular, condição que atua como
estímulo para secreção de PTH. Tecidos não endócrinos podem produzir e secretar hormônios em quantidade suficiente para causar sinais clínicos; por exemplo, certos tumores (tumor da glândula apócrina do saco anal em cães, linfoma)
podem produzir uma proteína relacionada com o PTH que mimetiza a ação do PTH, resultando em hipercalcemia.
As síndromes associadas à secreção hormonal deficiente ou ausente também possuem múltiplas causas. Acredita­se que a destruição do tecido endócrino secundário à reação autoimune mediado por células, às vezes, é a causa. Exemplos
de  hipofunção  endócrina  resultante  de  perda  de  tecido  primário  incluem  hipotireoidismo  canino,  diabetes  melito  tipo  1,  hipoparatireoidismo  primário  e  hipoadrenocorticismo  primário.  Na  fase  inicial  da  perda  tecidual,  mecanismos
compensatórios envolvendo vias de feedback estimulam a atividade (produção hormonal) do tecido remanescente. Por exemplo, no hipoadrenocorticismo primário (doença de Addison), a secreção de ACTH pela hipófise aumenta à medida
que ocorre atrofia do córtex da adrenal. O maior suporte trófico resulta em ativação plena do tecido remanescente e frequentemente induz secreção hormonal suficiente para retardar os sinais clínicos de deficiência, até que a perda tecidual
simplesmente elimina a fonte hormonal. Também podem ocorrer distúrbios resultando em sinais clínicos de hipoatividade endócrina devido a alterações em tecidos distantes da fonte de hormônio. O hipotireoidismo secundário resulta de
insuficiência de hormônio estimulante da tireoide, na hipófise, que reduz o estímulo necessário para a produção e secreção de T4 e T3 pela tireoide. Pacientes que recebem terapia com glicocorticoide podem apresentar atrofia de áreas
produtoras de cortisol no córtex da adrenal. O esteroide exógeno inicia o feedback negativo na glândula hipófise, suprimindo a secreção de ACTH e ocasionando atrofia da cortical da adrenal. Outra potencial causa de hipofunção endócrina
está relacionada com a perda tecidual secundária à compressão e/ou destruição progressiva de tumores não funcionais.
As doenças endócrinas e enfermidades relacionadas também resultam de alterações na resposta de tecidos a hormônios. Um importante exemplo é o diabetes melito não dependente de insulina, ou tipo 2, no qual é observada relativa
insensibilidade à insulina, frequentemente associada à obesidade. O diabetes insípido nefrogênico se deve à insensibilidade renal à ação da vasopressina (hormônio antidiurético). A insensibilidade renal à vasopressina nessa síndrome pode
estar relacionada com anomalias congênitas do receptor de vasopressina, mas a mais frequente é secundária a outras doenças (p. ex., piometra, hiperadrenocorticismo) ou anormalidades na concentração de íons (p. ex., hipopotassemia,
hipercalcemia).

 PRINCÍPIOS TERAPÊUTICOS
As doenças endócrinas envolvendo hiperatividade podem ser tratadas cirurgicamente (remoção de tumor), por radioterapia (p. ex., 131I para hipertireoidismo), ou com medicamentos (p. ex., metimazol, como um medicamento antitireoide).
Síndromes  de  deficiência  hormonal  são  frequentemente  tratadas  com  sucesso  mediante  a  simples  reposição  do(s)  hormônio(s)  em  falta,  como  no  tratamento  de  diabetes  melito  com insulina  ou  na  terapia  de  reposição  do  hormônio  da
tireoide, no hipotireoidismo. Terapia de reposição para deficiências relacionadas com hormônios proteicos/polipeptídicos podem ser um desafio. Frequentemente a preparação espécie–específica do hormônio não se encontra disponível,
pode ser necessário injetar o medicamento várias vezes ao dia e o risco de formação de anticorpos e anafilaxia deve ser considerada. Os hormônios esteroides e os tireoidianos podem ser administrados normalmente VO. Alguns hormônios
proteicos/polipeptídicos ou análogos são efetivos quando administrados por outras vias além da injetável (p. ex., acetato de desmopressina, análogo do hormônio antidiurético é efetivo quando administrado por diversas vias).
A terapia de reposição hormonal deve ser monitorada mediante avaliação da resposta clínica e de outras medidas adequadas, como monitoramento terapêutica do hormônio no sangue (p. ex., dosagem de T4 após a medicação, mensuração
de sódio e potássio no soro de pacientes com hipoadrenocorticismo primário). Com frequência, a terapia de reposição é necessária por um período após remoção cirúrgica de um tumor de tecido endócrino. No entanto, o tecido remanescente
normal, atrofiado como consequência de uma doença, muitas vezes recupera sua atividade em período de tempo razoavelmente longo e, assim, há necessidade de terapia de reposição por toda a vida. Os animais mostram significante
variação quanto à biodisponibilidade do medicamente; desse modo, uma dose adequada deve ser ajustada para cada paciente.
Os glicocorticoides são comumente utilizados como medicamentos terapêuticas, particularmente devido seus efeitos anti­inflamatórios e sua atividade antialérgica. O uso adequado requer o entendimento dos efeitos colaterais, inclusive
aparecimento de sinais de hiperadrenocorticismo resultantes de uma terapia por um período longo ou do uso de derivados potentes. Tais reações adversas podem ser minimizadas pelo uso oral de glicocorticoide, em dias alternados.

 REGULAÇÃO DO SISTEMA ENDÓCRINO
A  secreção  de  hormônios  é  regulada  por  um  sistema  de  elementos  sensoriais  supridos  de  um  meio  para  detectar  necessidades  para  ambos,  aumento  e  diminuição  da  secreção.  O  sistema  particular  de  sensoriamento,  os  elementos
de feedback e o sistema de controle das respostas são particulares para cada hormônio. As vias hormonais mantêm a homeostasia, e ajustes na secreção normalmente resultam em mudanças que ajudam a manter o status quo. Além disso, a
secreção e a atividade de um hormônio em particular podem ser ajustadas para mais ou para menos em resposta a desafios, como estresse crônico, doença ou alteração no estado nutricional. O conceito de feedback negativo e sua relação no
controle das vias hormonais é importante para o entendimento da regulação da via e avaliação dos testes de função endócrina. Por exemplo, a insulina é liberada em resposta ao aumento da concentração de glicose presente nas células beta
das ilhotas de Langerhans do pâncreas. Uma das ações da insulina é diminuir a concentração de glicose no fluido extracelular por aumentar sua entrada nos tecidos–alvo. Essa diminuição da glicose leva a reduções na secreção da insulina.
Em pacientes suspeitos de ter um tumor secretor de insulina, o achado de uma baixa concentração sanguínea de glicose (hipoglicemia), juntamente com a elevação da concentração de insulina indica feedback inapropriado, característico
desse tumor. Em outro exemplo, pacientes com alta concentração sanguínea de cálcio devem apresentar baixo teor de PTH na circulação. Alta concentração de PTH nestes pacientes indica disfunção da paratireoide, muitas vezes associada a
adenoma nesta glândula.
Os padrões de secreção dos hormônios variam muito. Os hormônios da tireoide tendem a ter menos variabilidade do que os hormônios esteroides e mostram apenas moderada variação diária ou semanal. Por outro lado, o teor sanguíneo
de cortisol da adrenal é muito mais variável, com picos de secreção ocasionais seguidos de períodos de baixa atividade (baixo teor sanguíneos), ao longo do dia.

GLÂNDULA HIPÓFISE

A glândula hipófise (ou pituitária) é composta de adeno­hipófise (lobo anterior) e neuro­hipófise (lobo posterior).
ADENO­HIPÓFISE:  A adeno­hipófise, que circunda a porção nervosa do sistema neuro­hipofisiário em graus variados nas diferentes espécies, consiste em parte distal, parte tuberal e da parte intermediária. A parte distal é a maior e contém
múltiplas populações de células endócrinas. A parte tuberal funciona principalmente como um suporte para uma rede de capilares do sistema porta­hipofisiário. A parte intermediária forma a junção entre a parte distal e a parte nervosa. Essa
contém 2 populações de células em cães, uma das quais sintetiza o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH).
Uma  população  específica  de  células  endócrinas  na  parte  distal  (e  na  parte  intermediária,  para  ACTH,  em  cães)  sintetiza  e  secreta  cada  um  dos  hormônios  tróficos  da  hipófise.  As  células  da  hipófise  têm  um  ciclo  secretor  e  inicia
rapidamente uma fase de síntese em resposta ao aumento da demanda de um hormônio particular. As células secretoras da adeno­hipófise são muitas vezes subdivididas em cromófilas (acidófilas, basófilas) e cromófobas, com base na
interação dos grânulos secretores com corantes histoquímicos dependentes de pH.
As células acidófilas são, além disso, subdivididas em somatotróficas, que secretam o hormônio do crescimento (GH, somatotropina) e em lactotróficas, que secretam prolactina. As células basofílicas incluem células gonadotróficas que
secretam ambos, hormônio luteinizante (LH) e hormônio estimulante de folículo (FSH), e células tireotróficas, que secretam o hormônio tireotrófico (hormônio estimulante da tireoide [TSH]). Os cromófobos incluem células endócrinas
envolvidas na síntese de ACTH e de hormônio estimulante de melanócitos (MSH), células foliculares não secretoras e células precursoras não diferenciadas.
As células endócrinas da adeno­hipófise estão sob o controle de hormônios correspondentes liberados do hipotálamo. Esses hormônios liberados são transmitidos pelo sistema portal hipofisário a células específicas da adeno­hipófise,
onde estimulam a rápida liberação de hormônios tróficos pré–formados.
Separadamente, os hormônios liberados pelo hipotálamo regulam a taxa de secreção de cada hormônio trófico da adeno­hipófise. Para a maioria dos hormônios tróficos da hipófise, o controle mediante feedback negativo é efetuado por
um  circuito  que  envolve  a  concentração  sanguínea  do  hormônio  produzido  pela  glândula  endócrina­alvo  (p.  ex.,  glândula  tireoide,  córtex  da  adrenal,  ovários  e  testículos).  Hormônios  como  prolactina,  GH  e  MSH  têm  mecanismos
de feedback complexos. Por exemplo, a prolactina atua principalmente na glândula mamária e o GH tem seu principal efeito no fígado – ambos os tecidos não são endócrinos. O feedback negativo em tais casos incluem metabólitos e outros
mensageiros (p. ex., fator de crescimento semelhante à insulina tipo I, produzido no fígado). No caso do GH, há reguladores hipotalâmicos para sua inibição (somatostatina), bem como para sua estimulação (hormônio liberador de GH).
NEURO­HIPÓFISE:  A neuro­hipófise (parte nervosa, lobo posterior) tem três subdivisões anatômicas. Os grânulos de secreção que contém os hormônios da neuro­hipófise, isto é, hormônio antidiurético (ADH, vasopressina) e ocitocina, são
sintetizados no hipotálamo, mas liberados na corrente sanguínea pela parte nervosa. O talo pedúnculo infundibular se liga à parte nervosa pela sobreposição do hipotálamo.
O ADH, um octapeptídio sintetizado no hipotálamo, é armazenado em grânulos envolvidos por membrana, com uma correspondente proteína de ligação (neurofisina) e transportado à parte nervosa, de onde é liberado à circulação. O
ADH se liga a receptores específicos na parte distal do néfron e do ducto coletor do rim; isso aumenta a reabsorção tubular renal de água do filtrado glomerular.
A  liberação  de  ADH  é  diretamente  proporcional  ao  grau  de  hidratação  do  corpo.  A  hidratação  orgânica  inibe  a  liberação  de  ADH,  enquanto  a  desidratação  ou  a  injeção  de  solução  eletrolítica  hipertônica  favorece  a liberação  deste
hormônio  que,  por  sua  vez,  aumenta  a  reabsorção  de  água  do  filtrado  glomerular,  resultando  na  diluição  ou  diminuição  da  osmolaridade  dos  fluidos  do  corpo.  Barbitúricos,  além  de  clorofórmio,  morfina,  acetilcolina,  nicotina,  e  dor,
aumentam a liberação de ADH, que ocasiona menor produção de urina. O etanol inibe a liberação de ADH, que causa diurese.
O efeito vasoconstritor do ADH é menos evidente do que o efeito antidiurético. Em uma dose várias centenas de vezes maior do que a dose antidiurética, o ADH tem um potente efeito vasoconstritor, que pode também causar constrição
da coronária. O mecanismo contrátil dos capilares, bem como dos músculos GI e uterino, é estimulado e segue­se uma elevação prolongada da pressão sanguínea.
A ocitocina tem efeitos específicos na musculatura lisa do útero e das células mioepiteliais da glândula mamária. Não foi estabelecida função fisiológica no macho, embora se tem sugerido um efeito no transporte do esperma.

 ACROMEGALIA FELINA
A acromegalia, ou hipersomatotropismo, resulta de uma secreção excessiva crônica do hormônio do crescimento em animal adulto. A acromegalia em gatos é causada por tumor secretor do hormônio do crescimento na hipófise anterior. Em
gatos, esses tumores crescem lentamente e podem estar presentes muito antes de surgirem os sinais clínicos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Acromegalia felina acomete gatos idosos (8 a 14 anos) e parece mais comum em machos. Os sinais clínicos de diabetes melito não controlados são frequentemente o primeiro sinal de acromegalia em gatos; portanto,
polidipsia, poliúria e polifagia são os sintomas mais comumente verificados. Ganho de peso de massa corporal magra em gatos com diabetes melito não controlada é o sintoma–chave de acromegalia. Organomegalia inclui aumento de
volume dos rins e do fígado; também, nota­se hipertrofia de órgãos endócrinos. Alguns gatos exibem aumento de extremidades, do tamanho do corpo, mandíbula/maxila, língua e região frontal da cabeça, característicos de acromegalia em
pessoas. Algumas da manifestações mais marcantes são verificadas no sistema musculoesquelético e inclui aumento na massa muscular e dos segmentos acrais do corpo inclusive patas, queixo e crânio. Anormalidades cardiovasculares,
como cardiomegalia (radiográfica e ecocardiográfica), sopros sistólicos e insuficiência cardíaca congestiva, se instalam tardiamente no curso da doença. Azotemia também se desenvolve tardiamente no curso da doença em cerca de 50%
dos gatos com acromegalia. Sinais neurológicos de acromegalia em pessoas, como neuropatia periférica (parestesia, síndrome do túnel carpal, defeitos sensoriais e motores) e manifestações paraselares (cefaleia e alteração do raio visual),
geralmente não são detectados em gatos com acromegalia.
Em todos os gatos com acromegalia notam­se prejuízo da tolerância à glicose e resistência à insulina, resultando em diabetes melito. A mensuração de insulina endógena revela aumento marcante da concentração sérica de insulina.
Apesar  da  grave  resistência  à  insulina  e  hiperglicemia,  a  ocorrência  de  cetose  é  rara.  Deve­se  suspeitar  de  acromegalia  em  qualquer  gato  diabético  que  tenha  grave  resistência  à  insulina  (necessidade  diária  de  insulina  >  20  U/gato).
Hipercolesterolemia e moderado aumento das enzimas do fígado são atribuídos ao estado diabético. Hiperfosfatemia sem azotemia também é um achado clínico­patológico comum. Os resultados da urinálise não são notáveis, exceto pela
proteinúria persistente.
Lesões:  Achados  macroscópicos  à  necropsia  de  gatos  com  acromegalia  podem  incluir  tumor  grande  e  expansivo  na  hipófise,  cardiomiopatia  hipertrófica  com  marcante  hipertrofia  do  septo  e  do  ventrículo  esquerdo  (no  início)  ou
cardiomiopatia  dilatada  (posteriormente),  aumento  de  volume  de  rins  e  fígado,  artropatia  degenerativa,  espondilose  de  vértebra  lombar,  aumento  moderado  das  glândulas  paratireoides,  hiperplasia  adrenocortical  e  aumento  difuso  do
pâncreas  com  hiperplasia  nodular  multifocal.  O  exame  histopatológico  das  glândulas  endócrinas  revela  adenoma  acidófilo  na  hipófise,  hiperplasia  adenomatosa  da  tireoide  e  hiperplasia  nodular  do  córtex  de  adrenais,  paratireoides  e
pâncreas.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico definitivo requer constatação de aumento da concentração plasmática de hormônio do crescimento ou do fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1 (IGF­1), em casos suspeitos. Infelizmente, não há
disponibilidade de testes para hormônio do crescimento felino. Com frequência, a concentração sérica de IGF­1 aumenta de modo marcante em gatos com acromegalia (como acontece em pessoas). Atualmente, o principal teste para um
diagnóstico  definitivo  é  tomografia  computadorizada  da  região  da  hipófise.  Os  resultados  da  tomografia  computadorizada,  juntamente  com  a  exclusão  de  outras  enfermidades  que  causam  resistência  à  insulina  (hipertireoidismo,
hiperadrenocorticismo) e a constatação de sinais clínicos e laboratoriais anormais, sustentam o diagnóstico de acromegalia.
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  A terapia medicamentosa em pessoas inclui o uso de agonistas de dopamina, como bromocriptina e análogos da somastotatina (octreotida). O tratamento com octreotida não tem sido efetivo em gatos com
acromegalia.  A  ineficácia  dos  análogos  da  somastotatina  de  longa  duração  pode  ser  devido  à  ligação  espécie­específica  ao  tecido.  Provavelmente,  radioterapia  propicia  maior  chance  de  sucesso,  com  baixas  taxas  de  morbidade  e
mortalidade. As desvantagens são a baixa taxa de regressão do tumor (> 3 anos) e a ocorrência de hipopituitarismo, lesão do nervo cranial e óptico e lesão do hipotálamo por radiação.
O prognóstico a curto prazo em gatos com acromegalia não tratada é reservado a bom. A resistência à insulina geralmente é controlada satisfatoriamente pelo uso de altas doses de insulina, fracionada em várias doses, diariamente.
Doenças cardíacas discretas podem ser controladas com diuréticos e vasodilatadores. O prognóstico a longo prazo é relativamente ruim; entretanto, a maioria dos gatos morre de insuficiência cardíaca congestiva, insuficiência renal crônica
ou sintomas decorrentes da expansão de tumor de hipófise. O prognóstico a longo prazo pode ser beneficiado com diagnóstico e tratamento precoces.

 DIABETES INSÍPIDO
Diabetes insípido central é causada pela redução da secreção do hormônio antidiurético (ADH). Quando as células­alvo no rim apresentam falha no mecanismo necessário para responder à secreção normal ou aumentada de teor de ADH na
circulação, tem­se diabetes insípido nefrogênico. Isso ocorre frequentemente em cães, gatos e ratos de laboratório e raramente em outros animais.
ETIOLOGIA:  A forma hipofisária se desenvolve como resultado da compressão e destruição da parte nervosa, pedúnculo infundibular ou núcleo supraóptico do hipotálamo. As lesões responsáveis pela interrupção da síntese ou secreção do
ADH  no  diabetes  insípido  hipofisário  incluem  grandes  neoplasias  de  hipófise  (endocrinologicamente  ativos  ou  inativos),  granuloma  inflamatório  ou  cisto  que  se  expande  dorsalmente  e  lesão  traumática  do  crânio  com  hemorragia  e
proliferação glial no sistema neuro­hipofisário.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os animais acometidos excretam grande volume de urina hipotônica e, igualmente, bebem grande quantidade de água. A osmolalidade urinária é menor do que a osmolidade normal do plasma (cerca de 300 mOsm/kg)
em ambas formas, hipofisária e nefrogênica, mesmo se o animal é privado de água. O aumento da osmolalidade da urina para valor acima daquele do plasma em resposta a ADH exógeno na forma hipofisária, mas não na forma nefrogênica,
é útil na diferenciação clínica das duas manifestações da doença.
Lesões: Lobo posterior, pedúnculo infundibular e hipotálamo são comprimidos ou sofrem ruptura por células neoplásicas. Isso bloqueia os axônios não mielinizados que transportam ADH do local de produção (hipotálamo) ao local de
liberação (parte nervosa).
DIAGNÓSTICO:  Baseia­se na constatação de poliúria crônica que não responde à desidratação e que não se deve à doença renal primária. Para avaliar a habilidade de concentração da urina, deve­se realizar teste de privação de água se o
animal não estiver desidratado e não tenha doença renal. A bexiga é esvaziada e institui­se jejum de água e comida (normalmente por 3 a 8 h) para promover máxima estimulação da secreção do ADH. O animal deve ser monitorado
cuidadosamente para prevenir a perda de > 5% do peso corpóreo e desidratação grave. Devem ser determinadas as osmolalidades de urina e plasma; entretanto, como esse teste não está prontamente disponível à maioria dos clínicos,
frequentemente se obtém a densidade urinária. No final do teste, a densidade da urina é > 1,025 em animais com apenas deficiência parcial de ADH ou antagonismo à ação do ADH causado por hipercortisolismo. Há pequena alteração na
densidade urinária de animais com deficiência total de ADH ou ausência de resposta renal.
Em seguida, deve­se fazer um teste de resposta ao ADH para diferenciar entre enfermidades que podem resultar em grande volume de urina com densidade cronicamente baixa, porém normal. Essas incluem diabetes insípido nefrogênico
(inabilidade dos rins em responder ao ADH), diabetes insípido psicogênico (polidipsia em resposta a alguns distúrbios psicológicos, mas com resposta normal ao ADH), e hipercortisolismo (o qual resulta em deficiência parcial da atividade
do ADH devido aos efeitos antagonistas do cortisol na atividade do ADH nos rins). Esse teste também por ser utilizado para avaliar animais no qual o teste de privação de água não pode ser realizado. A densidade específica da urina é
determinada no início do teste; administra­se acetato de desmopressina (2 a 4 gotas no saco conjuntival). A bexiga é esvaziada em 2 h e a densidade urinária é mensurada 4, 8, 12, 18, e 24 h depois da administração do ADH. Nota­se pico
de densidade > 1,026 em animais com deficiência primária de ADH, significativamente acima do teor induzido por privação de água naqueles pacientes com deficiência parcial da atividade do ADH; nota­se pequena alteração naqueles
animais com diabetes insípido nefrogênico.
Se a osmolalidade é mensurada, a proporção osmolalidade urinária:plasma depois da privação de água é > 3 em animais normais, 1,8 a 3 naqueles com deficiência moderada de ADH e < 1,8 naqueles com deficiência grave. A proporção
da osmolalidade da urina após a administração de ADH, comparada com aquela após privação de água, é > 2 em animais com deficiência primária de ADH, 1,1 a 2 naqueles com inibição da ação do ADH e < 1,1 naqueles que não
respondem ao ADH.
Como  alternativa  ao  teste  de  privação  de  água  ou  em  casos  nos  quais  esse  teste  falha  em  estabelecer  um  diagnóstico  definitivo,  pode­se  realizar  um  teste  terapêutico  com  demospressina  com  rigorosa  monitoramento  (ver  adiante).
Novamente, outras causas de poliúria e polidipsia devem ser inicialmente descartadas, limitando­se a diagnósticos diferenciais de diabetes insípido central, diabetes insípido nefrogênico e polidipsia psicogênica. Para gatos, o proprietário
deve mensurar o consumo de água do animal por 24 h, 2 ou 3 dias antes do teste terapêutico com desmopressina, permitindo ingestão de água à vontade. A preparação intranasal de desmopressina é administrada no saco conjuntival (1 a 4
gotas, 2 vezes/dia), por 3 a 5 dias. Uma redução dramática na redução do consumo de água (> 50%) durante o primeiro dia de tratamento deve ser fortemente sugestiva de deficiência de ADH e de diagnóstico de diabetes insípido central ou
diabetes insípido nefrogênico parcial.
Diabetes insípido também precisa ser diferenciado de outras doenças acompanhadas de poliúria. As mais comuns são diabetes melito com glicosúria e alta densidade urinária e nefrite crônica com urina de densidade normalmente baixa e
com evidências de insuficiência renal (proteína, cilindros etc.).
TRATAMENTO:  A poliúria pode ser controlada utilizando acetato de desmopressina, um análogo sintético do ADH. A dose inicial é 2 gotas aplicadas na mucosa ou conjuntiva nasal; essa é gradualmente aumentada até que se obtém a dose
efetiva mínima. O efeito máximo normalmente ocorre após 2 a 6 h e dura 1 a 12 h. Não deve haver restrição ao consumo de água. O tratamento deve ser contínuo, 1 ou 2 vezes/dia, por toda a vida do animal.

 HIPERADRENOCORTICISMO (DOENÇA DE CUSHING)
O hiperadrenocorticismo pode ser fracionada em duas amplas categorias. Uma categoria, o hiperadrenocorticismo hipófise­dependente, se deve ao aumento adenomatoso da glândula hipófise, resultando em excessiva produção de ACTH. A
outra categoria, a doença adrenal­dependente, é associada a adenomas ou adenocarciomas funcionais da glândula adrenal. A secreção ectópica de ACTH não foi relatada em cães; entretanto, em humanos a secreção ectópica de ACTH está
associada a alguns tumores de pulmão. O hiperadrenocorticismo iatrogênico resulta de administração crônica e excessiva de esteroides exógenos.
ACHADOS CLÍNICOS:  O hiperadrenocorticismo é notado em cães de meia­idade a mais velhos (7 a 12 anos de idade); cerca de 85% apresentam hiperadrenocorticismo hipófise­dependente (HHD) e cerca de 15% tem tumor de adrenal. As
raças nas quais HHD é comumente diagnosticado incluem Poodle miniatura, Dachshund, Boxer, Boston Terrier e Beagle. Os cães de raça de grande porte frequentemente têm tumores de adrenal e há uma distinta predileção por fêmea (3:1).
Os sinais clínicos mais comuns são polidipsia, poliúria, polifagia, intolerância ao calor, letargia, distensão de abdome ou “barriga de barril”, respiração ofegante, obesidade, fraqueza muscular e infecções do trato urinário recidivantes. As
manifestações dermatológicas no hiperadrenocorticismo canino podem incluir alopécia (especialmente no tronco), pele fina, flebectasias, comedões, escoriações, hiperpigmentação cutânea, calcinose cutânea, piodermite, atrofia dérmica
(especialmente ao redor das cicatrizes), demodiciose secundária e seborreia.
Sintomas incomuns são hipertensão, tromboembolia, calcificação brônquica, insuficiência cardíaca congestiva e sinais neurológicos, bem como polineuropatia e miopatia, mudança de comportamento, cegueira ou pseudomiotonia. A
hipercortisolemia pode ser evidenciada como enfraquecimento do colágeno, manifestado como ruptura do ligamento cruzado cranial (pequenos cães) ou úlcera de córnea (que não cicatriza). Sinais reprodutivos do hiperadrenocorticismo
podem incluir adenoma perianal em fêmeas ou machos castrados, hipertrofia de clitóris em fêmeas, atrofia testicular em machos não castrados, ou aumento de próstata em cães castrados.
Em cães, anormalidades no perfil bioquímico sérico associadas à hipercortisolemia incluem aumento das atividades séricas de fosfatase alcalina (ALP) e de alanina aminotransferase (ALT), bem como hipercolesterolemia, hiperglicemia e
diminuição do BUN. O hemograma é caracterizado por evidência de regeneração (eritrocitose, hemácias nucleadas) e leucograma clássico de estresse (eosinopenia, linfopenia e leucocitose com células maduras). Basofilia é um achado
ocasional. Muitos cães com hiperadrenocorticismo mostram evidências de infecção de trato urinário inferior sem piúria (cultura positiva), bacteriúria e proteinúria resultante de glomeruloesclerose.
DIAGNÓSTICO:  Não há um único teste ou uma combinação de exames que totalmente confiável para o diagnóstico de hiperadrenocorticismo. A sensibilidade e a especificidade de um teste individual ou da combinação de exames aumentam
quando são aplicadas a uma população de pacientes com possibilidade de terem hiperadrenocosticismo. O diagnóstico deve se basear nos sinais clínicos característicos, seguido de exames auxiliares mínimos indicadores de anormalidades
comuns  (p.  ex.,  aumento  de  colesterol,  SAP),  e  confirmado  por  um  apropriado  exame  de  triagem  para  hiperadrenocorticismo.  Se  o  resultado  do  exame  de  triagem  for  inconclusivo  ou  se  há  anormalidades  laboratoriais  associadas  à
hiperadrenocorticismo  (p.  ex.,  aumento  de  SAP)  em  um  cão  assintomático,  de  preferência  o  paciente  deve  ser  testado  novamente  3  a  6  meses  depois,  em  vez  de  ser  tratado  sem  que  se  tenha  o  diagnóstico  definitivo.  Em  particular,  o
diagnóstico da doença de Cushing induzido por esteroide sexual pode ser especialmente difícil.
A  relação  creatina/cortisol  urinário  (RCCU)  é  um  teste  altamente  sensível  para  diferenciar  cães  normais  daqueles  com  hiperadrenocorticismo,  mas  não  é  altamente  específico  porque  cães  com  doença  não  adrenal  moderada  a  grave
também exibem o valor desta relação. A RCCU deve ser determinada em amostras de urina obtidas por micção espontânea, na casa pelo proprietário. O estresse do transporte do cão à clínica, o estresse induzido pela cistocentese, ou ambos,
podem ser suficientes para causar RCCU falsamente elevada. Alta RCCU deve ser esclarecida com o teste de estimulação com ACTH e teste de supressão com baixa dose de dexametasona (SBDD) IV, ou teste SBDD oral.
SBDD é o teste de triagem de escolha para hiperadrenocorticismo canino, quando apropriadamente utilizado. Apenas 5 a 8% dos cães com HHD exibe supressão da concentração de cortisol em 8 h (i. e. são falso­negativos). Além disso,
30%  dos  cães  com  HHD  exibem  supressão  em  3  ou  4  h,  seguida  de  “escape”  de  supressão  em  8  h;  esse  padrão  é  diagnóstico  para  HHD,  tornando  desnecessários  outros  testes.  A  principal  desvantagem  do  teste  SBDD  é  a  falta  de
especificidade em cães com doença não adrenal: > 50% dos cães com doença não adrenal tem teste SBDD positivo. Em tais casos, o cão deve se recuperar da doença não adrenal antes de se realizar o teste de SBDD para diagnóstico de
hiperadrenocorticismo.
O  teste  de  estimulação  com  ACTH  é  utilizado  para  diagnosticar  várias  doenças  adrenais,  inclusive  hiperadrenocorcitismo  endógeno  ou  iatrogênico  e  hiperadrenocorticismo  espontâneo.  Como  teste  de  triagem  para  diagnóstico  de
hiperadrenocorticismo de ocorrência natural, a sua sensibilidade quanto ao diagnóstico é cerca de 80 a 85%, com especificidade maior do que o teste SBDD. Em um estudo, notou­se que apenas 15% dos cães com doença não adrenal tem
uma resposta exagerada à estimulação com ACTH. Os tumores de adrenais podem ser particularmente difíceis de diagnosticar por este teste com ACTH.
Cães com excesso de esteroide sexual produzido pela adrenal podem ter resultado negativo nos testes de estimulação com ACTH e no teste SBDD porque sua concentração sérica de cortisol é normal. Isso pode ser decorrência do excesso
de  precursores  de  cortisol.  Aumento  de  progesterona,  17­OH–progesterona,  androstenediona,  testosterona  e  estrógeno  podem  requerer  teste  de  adrenal  dinâmico  utilizando  teste  de  estimulação  com  ACTH  e  mensuração  de  esteroides
sexuais, além de cortisol.
Depois da confirmação do diagnóstico de hiperadrenocorticismo, pode ser necessária a diferenciação entre doença dependente de hipófise × doença dependente de adrenal. Embora muitos dos cães com hiperadrenocorticismo tenham
HHD, em casos atípicos (p. ex., cão anorético com hiperadrenocorticismo) o teste de diferenciação é apropriado. Em particular, a diferenciação de HHD (frequentemente macroadenomas) de tumores de adrenal frequentemente é necessária
em raças grandes.
O princípio do teste de supressão com alta dose de dexametasona (SADD) é que a hipersecreção de ACTH autônoma pela hipófise pode ser suprimida por concentração suprafisiológica de esteroide. Cães com tumor de adrenal produtor
de cortisol autônomo tem maximamente suprimida a produção de ACTH mediante o mecanismo de feedback normal; portanto, administração de dexametasona, não importando quão alta for a dose, pode não suprimir a concentração sérica
de cortisol. Em cães com HHD, entretanto, alta dose de dexametasona é útil para suprimir o ACTH e, assim, a secreção de cortisol. Uma importante preocupação é que cães com macroadenoma de hipófise (15 a 50% dos cães com HHD)
falham em induzir supressão no teste de SADD.
A mensuração da concentração plasmática de ACTH endógeno é o método mais confiável de diferenciação entre HHD e tumor de adrenal. Cães com tumores de adrenal têm concentração de ACTH baixa ou indetectável; por outro lado,
cães com HHD apresentam concentração de ACTH normal ou elevada. Recentemente, pesquisadores verificaram que a adição do inibidor de protease, aprotinina, ao sangue total em tubos com EDTA inibe a degradação de ACTH. As
amostras podem ser coletadas, centrifugadas em uma centrífuga não refrigerada e mantida por até 4 dias a < 4°C.
O  diagnóstico  por  imagem  da  hipófise  e  da  glândula  adrenal  pode  ser  obtido  via  radiografia  abdominal,  ultrassonografia,  tomografia  computadorizada  (TC)  ou  ressonância  magnética  (RM).  As  radiografias  abdominais  devem  ser
realizadas em todos os cães que não mostram supressão no teste SADD; cerca de 30 a 50% dos cães com tumores de adrenal têm uma massa mineralizada na região das glândulas adrenais. A ultrassonografia abdominal é o método mais
sensível de identificação de tumores de adrenal. Além disso, metástase hepática ou invasão na veia cava pode ser notada em cães com carcinoma de adrenal. Tomografia computadorizada ou RM do cérebro ou da cavidade abdominal de
cães que não responderam ao teste SADD podem apresentar aumento unilateral da adrenal (50%), macroadenoma de hipófise (25%), ou microadenoma de hipófise (25%).
TRATAMENTO E PROGNÓSTICO:  Três opções de tratamento estão disponíveis para hiperadrenocorticismo canino. Terapia medicamentosa, cirúrgica e radioativa têm sido utilizados com variados graus de sucesso.
Cães com HHD podem ser tratados utilizando o agente adrenolítico mitotano (o,p’–DDD), iniciando com dose de indução de 25 a 50 mg/kg/dia, durante 7 a 10 dias. Os cães devem ser monitorados quanto ao aparecimento de sinais de
hiperadrenocorticismo, bem como anorexia, vômito e diarreia; caso ocorram tais sintomas, a terapia com mitotano deve ser interrompida e substituída por glicocorticoide. O consumo de água ou o apetite deve ser avaliado,a fim de saber o
momento de finalizar a terapia; o consumo de água deve diminuir para < 60 ml/kg/dia (cães). Depois de 7 a 10 dias de tratamento com mitotano ou da redução do consumo de água ou alimento, deve­se realizar um teste de resposta ao
ACTH  para  determinar  se  a  supressão  do  cortisol  é  adequada.  Ambos  os  valores  de  cortisol,  antes  e  após  o  uso  de  ACTH,  devem  situar­se  na  faixa  normal.  Para  manter  a  supressão  da  secreção  de  cortisol,  administra­se  50  mg  de
mitotano/kg/semana. Os cães que recebem tratamento prolongado com mitotano devem ser examinados e submetidos ao teste de resposta ao ACTH a cada 3 a 4 meses. Gradualmente, há necessidade de aumento das doses do medicamento
para manter adequada remissão dos sintomas.
Efeitos  colaterais  do  mitotano  na  dose  recomendada  incluem  irritação  GI  (vômito  e  anorexia),  distúrbios  do  SNC  (ataxia,  fraqueza,  convulsão),  hipoglicemia  moderada  e  aumento  moderado  da  atividade  sérica  de  fosfatase  alcalina.
Sintomas como depressão e ataxia podem ser aliviados fracionando a dose diária em duas partes iguais, administradas em intervalo de 8 a 12 h. Persistência dos sintomas de SNC após interrupção do uso de mitotano sugere expansão do
macroadenoma de hipófise.
Relatos recentes mostraram eficácia do inibidor da enzima da adrenal, trislostano, no tratamento da HHD em cães. Estudos em cães com hiperadrenocorticismo mostraram que o trilostano é um inibidor de esteroide efetivo, com efeitos
colaterais mínimos. O trilostano deve ser administrado diariamente e, com frequência, 2 vezes/dia, para se obter diminuição na secreção de glicocorticoide pelas glândulas adrenais. A deficiência de mineralocorticoides, que é reversível,
pode também ser observada em pacientes que recebem trilostano; alguns casos de necrose de adrenal com insuficiência persistente da glândula foram observados após a administração de trilostano. Apenas recentemente disponível nos
EUA, o trilostano pode ser uma razoável alternativa à terapia de HHD com mitotano, em cães. Cães com desequilíbrio de esteroide sexual também pode se beneficiar da terapia com trilostano porque o inibidor da enzima afeta precursores
da síntese de cortisol, além de inibir a própria síntese de cortisol.
A remoção cirúrgica de adenoma ou adenocarcinoma de adrenal unilateral pode ser indicada, em alguns casos; contudo, complicações cirúrgicas e anestésicas (p. ex., hipotensão) podem ocorrer secudariamente ao hipoadrenocorticismo,
notados logo após a remoção cirúrgica da neoplasia. O tratamento medicamentoso de tumor de adrenal é difícil porque eles tendem a ser resistentes aos efeitos do mitotano. Finalmente, se o cão exibe sinais neurológicos (p. ex., anorexia,
estupor ou convulsão) e se identifica um tumor grande de hipófise (macroadenoma), indicada radioterapia na glândula hipófise. Entretanto, radioterapia é cara e consome tempo (3 semanas). Os resultados da radioterapia em cães mostram
que esse é um método efetivo de tratamento, com baixa morbidade; contudo, pode demorar vários meses para a regressão dos sintomas de HHD. Esses cães ficam bem a longo prazo; todavia, devido à doença primária (tumor de hipófise)
tem sido tratado.

 HIRSUTISMO ASSOCIADO A ADENOMA DE HIPÓFISE INTERMEDIÁRIA (Hipertricose)
O hirsutismo desenvolve­se em equinos velhos (tipicamente de 18 anos e mais velhos) e está associado a disfunção da parte intermediária da hipófise (DPIH) causada por adenoma de célula da parte intermediária da hipófise. Este adenoma
frequentemente comprime severamente o hipotálamo sobreposto, que é o principal centro de regulação da homeostasia da temperatura corporal, apetite e ciclo de troca de pelos. Ademais, o adenoma da parte intermediária secreta grande
quantidade de hormônio estimulante de melanócitos alfa (HEM), que participa no crescimento de pelos longos de inverno.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sintomas de DPIH incluem poliúria, polidipsia, diminuição do tônus muscular, fraqueza, sonolência, distribuição anormal de tecido adiposo, tumefação da fossa periorbital, laminite, maior suscetibilidade
a doenças, febre intermitente e hiperidrose generalizada. O hirsutismo frequentemente se torna evidente devido à falha no ciclo de troca sazonal de pelos. Antes de se notar hirsutismo generalizado os equinos podem exibir pelos longos nos
membros, no abdome ventral e no pescoço. Por fim, os pelos sobre a maior parte do tronco e extremidades se tornam longos (maior que 10 a 12 cm), anormalmente espessos, ondulantes e frequentemente emaranhados.
Adenomas da parte intermediária são os tumores de hipófise mais comuns em equinos. São amarelos a brancos, multinodulares e incorporam a parte nervosa. Equinos com DPIH podem apresentar hiperglicemia insulinorresistente e
glicosúria, provavelmente devido ao aumento da concentração de cortisol e de outros hormônios antagonistas da insulina.
Os teores plasmáticos de adrenocorticotropina imunorreativa e de alfa­HEM podem apresentar aumento estar moderado a marcante. A concentração sanguínea de cortisol geralmente permanece na faixa de normalidade, mas a falta de um
ritmo diurno normal e a falha na supressão pela administração de dexametasona ocorrem muito mais rapidamente do que em animais normais.
Hirsutismo associado à doença de Cushing. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

DIAGNÓSTICO:  Hiperglicemia  e  insensibilidade  à  insulina  são  sugestivas  de  adenoma  de  hipófise  em  equinos,  mas  como  ocorrem  em  equinos  com  síndrome  metabólica,  não  são  diagnosticados  na  DPIH.  Outros  achados  inespecíficos
incluem eosinopenia, linfopenia e neutrofilia absoluta ou relativa, lipemia, hipercolesterolemia e anemia normocitíca normocrômica discreta. As atividades das enzimas hepáticas podem estar aumentadas. Os teores de eletrólitos geralmente
são normais. Os resultados da urinálise são normais, exceto a ocorrência de glicosúria ocasional e densidade específica baixa ou normal.
O diagnóstico definitivo se baseia em testes evocatórios ou na mensuração da concentração de ACTH endógeno em repouso. Dexametasona (40 μg/kg IM) frequentemente não suprime o teor de cortisol para, no mínimo, 30% do valor
basal ou < 1 μg/dl; como acontece em equinos normais 6 a 15 h após a administração do medicamento. Além disso, a concentração de cortisol retorna para 80% do valor basal, ou mais, 24 h após a administração de dexametasona em
equinos com DPIH. Os equinos normais apresentam supressão do teor de cortisol 24 h após o uso de dexametasona. Equinos com DPIH reagem com uma resposta exagerada à administração de domperidona. O aumento da concentração
plasmática de ACTH endógeno em 200%, ou mais, do valor basal 2 a 4 h após aplicação de 5,0 mg de domperidona/kg VO é compatível com DPIH.
Os diagnósticos diferenciais incluem síndromes que resultam em debilidade crônica, por exemplo, manejo e dieta inadequados, parasitismo e doenças sistêmicas crônicas. Poliúria e polidipsia (PU/PD) devem ser diferenciadas de PU/PD
decorrentes de doença renal crônica ou diabetes insípido. Hiperglicemia, glicosúria e PU/PD devem ser diferenciadas daquelas causadas por diabetes melito primário. Alta concentração de insulina ou aumento na proporção glicose:insulina
deve ser diferenciado de hiperinsulinemia primária (síndrome metabólica equina). Feocromocitoma (ver p. 621) pode causar hiperidrose, hiperglicemia e taquipneia, embora normalmente não sejam funcionais e apenas são encontrados
acidentalmente na necropsia. Diagnósticos diferenciais de hirsutismo inclui informação de que o paciente é da raça Bashkir Curly ou tem uma anomalia congênita com pelame ondulado. Não há outra condição conhecida na qual nota­se
pelame longo e ondulado em equinos adultos. Por essa razão, o hirsutismo pode ser considerado um indicador de diagnóstico positivo para DPIH.
TRATAMENTO:  Equinos com DPIH são relativamente frágeis, com fraca função imune. Assim, requerem mais cuidados em uma criação normal. Pergolida, um agonista dopaminérgico, atualmente é o único agente que se mostra capaz de
reduzir a concentração de ACTH endógeno em equinos com DPIH. A dose inicial é 0,006 a 0,01 mg/kg VO, 1 vez/dia. Isso tipicamente resulta em uma dose de 0,5 a 1 mg/dia. Se essa dose não resulta em melhora dos sinais clínicos e nos
testes endocrinológicos, ela deve ser aumentada gradualmente. Efeitos colaterais relatados com a terapia com pergolida incluem depressão e anorexia. Frequentemente esses sintomas são transitórios e regridem com o tempo. Se não se
curam, a dose pode ser diminuída ou fracionada e administrada 2 vezes/dia. Embora, o uso de cipro­heptadina não tenha sido documentado como capaz de melhor os sinais clínicos, relata­se o emprego de dose de 0,6 a 1,2 mg/kg VO, 1
vez/dia, para tratamento de DPIH. Há relatos anedóticos de que a combinação de cipro­heptadina e pergolida tem efeito sinérgico e que os efeitos são melhores do que aqueles verificados com o uso exclusivo de pergolida. Trilostano, um
inibidor competitivo da 3­beta­hidroxiesteroide desidrogenase, pode ser benéfico em equinos, mas seu custo é proibitivo.

 PAN­HIPOPITUITARISMO DE INÍCIO ADULTO
Tumores de hipófise não funcionais, endocrinologicamente inativos, desenvolvem­se mais comumente em animais adultos a idosos; parece não haver predisposição racial. A causa mais comum é um adenoma cromófobo que surge na parte
distal. Outras causas infrequentes incluem extensa destruição inflamatória do tecido hipofisário, necrose isquêmica da hipófise devido ao infarto decorrente da invasão de células tumorais, embolia séptica ou parasitária, necrose difusa
associada a toxemia, invasão neoplásica oriunda de estruturas adjacentes (p. ex., meninges, osso esfenoide, cavidade nasal etc.), e hemorragia generalizada e cicatrização após lesão traumática. Cães e gatos com adenomas não funcionais
desenvolvem distúrbios clínicos relacionados com a deficiência de secreção de hormônio trófico da hipófise e menor função de órgãos­alvo ou disfunção do SNC.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os animais acometidos frequentemente apresentam depressão e incoordenação e sofrem colapso quando submetidos a exercício. Ocasionalmente, exibem mudança de comportamento, não respondem ao comando de
pessoas e tendem a se esconder à menor provocação. Em casos crônicos, pode haver evidência de cegueira, com pupilas fixas e dilatadas, devido à compressão e ruptura do nervo óptico pela extensão dorsal do tumor de hipófise. Os cães
acometidos frequentemente exibem perda de peso progressiva, com atrofia muscular, em razão do menor efeito anabólico da proteína do hormônio do crescimento. A compressão de células que secretam hormônios gonadotróficos ou o
correspondente hormônio liberador pelo hipotálamo resulta em atrofia das gônadas. Os distúrbios do balanço hídrico se devem à interferência na síntese do hormônio antidiurético ou de sua liberação em capilares da parte nervosa. Lobo
posterior, pedúnculo infundibular e hipotálamo são comprimidos ou invadidos por células neoplásicas.
Animais com hipopituitarismo parecem desidratados, apesar do maior consumo de água. Cães e gatos com grande tumor de hipófise não funcional normalmente excretam grande volume de urina diluída, com baixa densidade específica
(= 1,007). Os sinais clínicos não são muito específicos e podem ser confundidos com outras anormalidades do SNC (p. ex., tumor cerebral ou encefalite) ou doença renal crônica.
O  hipopituitarismo  causado  por  tumor  hipofisiário  deve  ser  incluído  no  diagnóstico diferencial  de  doenças  caracterizadas  por  incoordenação,  depressão,  poliúria,  cegueira  e  mudança  súbita  de  humor,  em  animais  adultos  ou  idosos.
Devido à cegueira de origem central, no exame oftálmico normalmente não se constata lesão significante. A estatura corporal não é influenciada pela compressão da parte distal e pela provável interferência da secreção do hormônio do
crescimento porque normalmente esses tumores surgem em cães já totalmente desenvolvidos. Periquitos com adenoma cromófobo frequentemente desenvolvem exoftalmia devido à disseminação de células neoplásicas ao longo do nervo
óptico.
Lesões: Adenomas de hipófise endocrinologicamente inativos normalmente alcançam tamanho considerável, antes que causem sintomas evidentes ou morte. As células tumorais em proliferação incorporam as estruturas restantes da adeno­
hipófise e do pedúnculo infundibular. Todo o hipotálamo pode ser comprimido e substituído pelo tumor.
Em  cães  e  gatos  com  grande  adenoma  de  hipófise,  as  glândulas  tireoides  frequentemente  são  menores  do  que  o  normal,  embora  em  grau  muito  menor  do  que  o  córtex  da  adrenal.  As  glândulas  adrenais  são  menores  e  consistem
principalmente de tecido medular rodeado por uma estreita camada de córtex. Os túbulos seminíferos são pequenos e mostram pouca evidência de espermatogênese ativa.
Atrofia cutânea e perda de massa muscular podem estar relacionadas com os deficientes efeitos anabólicos da proteína do hormônio do crescimento, em cães ou gatos adultos. A interferência com a secreção de hormônios tróficos de
hipófise frequentemente resulta em atrofia de gônadas, resultando também em diminuição da libido ou anestro.

 PAN­HIPOPITUITARISMO DE INÍCIO JUVENIL (Nanismo Hipofisário)
Nanismo  hipofisário  ocorre  mais  frequentemente  em  cães  da  raça  Pastor  Alemão,  mas  há  relato  em  outras  raças,  como  Spitz,  Pinscher  miniatura  e  Karelian  Bear  Dog.  Essa  anormalidade  é  hereditária,  com  característica  autossômica
recessiva simples.
O nanismo hipofisário normalmente está associado a falha do ectoderma orofaringiano do ducto da faringe cranial (bolsa de Rathke) em se diferenciar em células tróficas do hormônio secretor da parte distal. Em consequência, a adeno­
hipófise não se desenvolve completamente. Uma segunda causa mais comum é o craniofaringioma, um tumor benigno derivado do ectoderma da orofaringe da bolsa de Rathke. Comparado com outros tipos de neoplasias da hipófise, esses
tumores tendem a se desenvolver em cães mais jovens. Os craniofaringiomas causam secreção subnormal do hormônio do crescimento, resultando em nanismo.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os filhotes de cães com nanismo são indistinguíveis dos irmãos de ninhada normais, até que completem 2 meses de idade. Subsequentemente, nota­se evidência gradativa de taxa de crescimento mais lenta, comparada
com os irmãos de ninhada, retenção da pelagem de filhote e falta de pelos de proteção primários. Cães da raça Pastor Alemão com nanismo hipofisário se parecem com coiote ou raposa, devido seu pequeno tamanho e pelame espesso e
macio. Alopécia bilateral simétrica se desenvolve gradualmente e, com frequência, se generaliza, exceto na cabeça e com tufos de pelos nos membros. A dentição permanente é retardada ou completamente ausente. O fechamento das
epífises também é retardado por tanto tempo quanto 4 anos, dependendo da gravidade da insuficiência hormonal; deve­se à deficiência de ambos, hormônio estimulante da tireoide e hormônio do crescimento. Os testículos e o pênis são
pequenos, a calcificação do osso peniano é retardada ou incompleta e o prepúcio peniano é flácido. O córtex do ovário é hipoplásico e o cio é irregular ou ausente. A expectativa de vida é curta devido à disfunção endócrina secundária,
como hipotireoidismo e hipoadrenocorticismo. Filhotes de cães com pan­hipopituirarismo frequentemente tem latido estridente.
Lesões: Os cistos hipofisários são preenchidos com muco e, por fim, ocupam toda a hipófise, resultando em grave compressão da parte nervosa e do pedúnculo infundibular. Craniofaringiomas são massas grandes, sólidas, císticas que se
estendem ao hipotálamo. Podem também crescer ao longo da parte ventral do cérebro, onde a incoorporação de vários nervos craniais resulta em disfunções de nervos específicos.
DIAGNÓSTICO:  Os teores de tiroxina, tri–iodotironina e cortisol encontram­se diminuídos ou no limite inferior de normalidade. Naqueles animais com suspeita de alteração no teor de hormônio basal, a resposta ao desafio com tireotropina
ou adrenocorticotropina exógena é subnormal devido à hipoplasia ou atrofia da tireoide ou do córtex da adrenal. Outros testes auxiliares de diagnóstico úteis incluem: comparação entre as alturas dos irmãos de ninhada, evidência de atraso
no fechamento epifisário ou disgenesia em radiografias do esqueleto e biópsia de pele. Lesões cutâneas incluem hiperqueratose, queratose folicular, hiperpigmentação, atrofia de anexos, perda das fibras elásticas e perda da rede de fibras de
colágeno na derme. Nota­se ausência de eixo piloso e os folículos pilosos se apresentam principalmente na fase telógena do ciclo de crescimento.
A atividade da somatomedina C (fator de crescimento semelhante à insulina 1) é baixa em cães com nanismo. Nota­se atividade da somatomedina C intermediária em progenitores fenotipicamente normais, suspeitos de serem portadores
heterozigotos.  Testes  para  somatomedina  C  propiciam  uma  mensuração  indireta  da  atividade  do  hormônio  do  crescimento  circulante,  em  cães  com  suspeita  de  nanismo  hipofisário.  Relata­se  que,  em  cães,  o  valor  basal  circulante  de
hormônio do crescimento é detectável, porém baixo (faixa normal: 1,75 ± 0,17 mg/ml), em animais com nanismo hipofisário e não se eleva depois de um teste com injeção de clonidina (30μg/kg IV) que provoca secreção, como acontece
em cães normais. Hipersensibilidade à insulina foi demonstrada em cães com nanismo hipofisário, provavelmente devido à alteração na quantidade de receptores de insulina ou da afinidade de ligação em resposta a baixo teor de hormônio
do crescimento.

 TUMORES NÃO FUNCIONAIS DA HIPÓFISE
Esses  tumores  são  incomuns  na  maioria  das  espécies.  Os  adenomas  cromófobos  parecem  endocrinologicamente  inativos,  mas  podem  causar  atrofia  por  compressão  de  porções  adjacentes  à  hipófise  e  estender­se  adjacente  ao  cérebro.
Distúrbios  clínicos  ocorrem,  também,  devido  à  falta  de  secreção  de  hormônios  tróficos  da  hipófise  e  da  menor  função  do  órgão­alvo  (p.  ex.,  córtex  da  adrenal),  ou  disfunção  do  SNC.  Animais  acometidos  frequentemente  apresentam
depressão, incoordenação e fraqueza e podem entrar em colapso quando submetidos a exercícios (ver p. 587).
Os  adenomas  de  hipófise  endocrinologicamente  inativos  com  frequência  atinge  tamanho  considerável  antes  de  causarem  sintomas  óbvios  (ou  óbito).  A  proliferação  de  células  tumorais  incorpora  estruturas  remanescentes  da  adeno­
hipófise e do pedúnculo infundibular. Todo o hipotálamo todo ser comprimido e substituído pelo tumor.

GLÂNDULA TIREOIDE

Todos os vertebrados apresentam glândula tireoide. Em mamíferos, normalmente é bilobada e localiza­se imediatamente caudal à laringe, adjacente à face lateral da traqueia. Os dois lobos podem ser conectados por um istmo fibroso (p. ex.,
em ruminantes, equinos), ou um istmo conector pode ser indistinto (p. ex., cães, gatos). A glândula é altamente vascularizada. Em pássaros, situa­se na cavidade torácica; ambos os lobos se localizam próximo à laringe inferior, adjacente à
artéria carótida, próximo à origem da artéria vertebral.
Tecido tireoidiano ectópico ou acessório é relativamente comum na maioria das espécies, especialmente em cães e gatos. Pode ser encontrado em qualquer parte da laringe até o diafragma e pode ser responsável pela manutenção da
função tireoidiana normal após tireoidectomia. Ademais, no tecido tireoidiano ectópico ocasionalmente é o local de hiperplasia ou neoplasia.
FISIOLOGIA:  Os hormônios da tireoide são os únicos compostos orgânicos iodados do corpo. Tiroxina (T4) é o principal produto secretado pela glândula tireoide normal. Entretanto, a tireoide também secreta 3,5,3´­tri­iodotironina (T3),

T3 reverso e outros metabólitos iodados. T3 é cerca de 3 a 5 vezes mais potente do que T4, enquanto T3 reverso é uma substância que mimetiza a função tireoidiana, porém é inativo.
Contudo, todo T4 é secretado na tireoide e uma quantidade considerável de T3 é derivada do T4; portanto, T4 tem sido considerado um pró­hormônio. Sua ativação em T3, mais potente, é uma etapa regulada individualmente por tecidos
periféricos.
A secreção de hormônio tireoidiano é controlada principalmente por feedback negativo, mediante uma resposta coordenada do eixo hipotálamo­hipófise­tireoidiano: o hormônio liberador da tireotropina (TRH) liga­se à célula tireotrófica
na hipófise e estimula a secreção de tireotropina (hormônio estimulante da tireoide, TSH), que se liga à membrana da célula folicular e estimula a síntese e secreção do hormônio da tireoide.
Os  hormônios  tireoidianos  são  complexos  lipofílicos  insolúveis  em  água,  que  se  ligam  às  proteínas  plasmáticas  (ligação  proteína–tireoxina,  ligação  pré­albumina­tireoxina  [transtiretina]  e  albumina).  A  principal  função  da  ligação
proteína­hormônio da tireoide provavelmente é propiciar uma reserva de hormônio no plasma e distribuir um hormônio “tampão” no tecido. No animal com função de tireoide normal, 0,1% do T4 total sérico encontra­se livre (não ligado à
proteína), ao passo que cerca de 1% do T3 circulante é livre. Evidências atuais sugerem que as frações de T4 livre e T3 livre circulante determinam qual quantidade de hormônio está disponível para absorção pelo tecido.

AÇÃO DOS HORMÔNIOS DA TIREOIDE:  Os hormônios da tireoide atuam em vários mecanismos celulares; entretanto, nenhuma reação ou evento metabólico pode ser equiparado com a ação destes hormônios. Contudo, ambos T4 e T3 têm

atividade metabólica intrínseca; T3é 3 a 5 vezes mais potente quanto à ligação a receptores nucleares e similarmente mais potente na estimulação de consumo de oxigênio.
Efeitos dos hormônios da tireoide geralmente são incluídos em duas categorias: aqueles que se manifestam minutos a horas após ligação com o receptor do hormônio e não requerem síntese de proteína; e aqueles que se manifestam
tardiamente (normalmente > 6 h) e requerem síntese de novas proteínas. Cerca de metade do aumento do consumo de oxigênio induzido por hormônios da tireoide está relacionado com a ativação da Na+/K+ATPase ligada à membrana­
plasma;  hormônios  da  tireoide  também  estimulam  o  consumo  de  oxigênio  pelas  mitocôndrias.  Essas  alterações  são  diretamente  ligadas  ao  efeito  termogênico  dos  hormônios  da  tireoide.  Outros  efeitos  crônicos  invariavelmente  estão
relacionados com a ação celular que requer interação com receptores nucleares de T3, seguida de importante aumento na síntese de proteína para os processos fisiológicos, como crescimento, diferenciação, proliferação e maturação.
Os  hormônios  tireoidianos,  em  concentrações  fisiológicas,  são  anabólicos.  Em  conjunção  com  o  hormônio  do  crescimento  e  a  insulina,  estimula  a  síntese  de  proteína  e  a  reduz  a  excreção  de  nitrogênio.  Entretanto,  em  excesso
(hipertireoidismo), podem ser catabólicos, com aumento da gliconeogênese, quebra de proteínas e perda de nitrogênio.

 AUMENTO NÃO NEOPLÁSICO DA GLÂNDULA TIREOIDE (Bócio)
O aumento da glândula tireoide é, por definição, bócio. Aumento da tireoide não neoplásico e não inflamatório é verificado em todos os mamíferos domésticos, bem como em aves. As principais causas de bócio são deficiência de iodo,
ingestão de substância bociogênicas, excesso de iodo na dieta e defeitos hereditários da enzima que participa na biossíntese de hormônios da tireoide. Muitos animais com bócio parecem que se mantêm eutireóideos, mas sinais clínicos de
hipotireoidismo podem se desenvolver em alguns pacientes, especialmente em recém­nascidos.
DEFICIÊNCIA DE IODO:  Hiperplasia de tireoide devido à deficiência de iodo era comum em muitas regiões bociogênicas, em todo o mundo, antes da suplementação generalizada de sal iodado à dieta dos animais. Embora surtos de bócio por
deficiência de iodo atualmente sejam esporádicos e menos animais são acometidos, a deficiência de iodo é ainda responsável pela ocorrência de bócio não neoplásico em animais domésticos de grande porte.
Os átomos de iodo são componentes dos hormônios tireoidianos tiroxina e tri­iodotironina; assim, a deficiência de iodo reduz a habilidade da tireoide em sintetizar esses hormônios. Com baixa concentração de hormônio tireoidiano
circulante,  a  hipófise  secreta  mais  hormônio  estimulador  da  tireoide  (TSH),  que  atua  como  um  estímulo  para  hiperplasia  da  glândula  tireoide  e  subsequente  desenvolvimento  de  bócio.  A  glândula  hiperplásica  pode  compensar,  e
normalmente faz isso, a menor disponibilidade de iodo; portanto, bócio não é, de modo algum, sinônimo de hipotireoidismo. A tireoide fetal é mais suscetível aos efeitos de alta e baixa ingestão de iodo; animais nascidos de fêmeas que
recebiam dieta deficiente em iodo são mais sujeitos ao desenvolvimento de aumento grave da tireoide e de sinais clínicos de hipotireoidismo.
O bócio causado por deficiência de iodo é mais comum em cordeiros, bezerros e leitões recém­nascidos, em regiões com deficiência de iodo. Os lobos da tireoide do animal jovem normalmente são pelo menos duas vezes maior que o
tamanho normal, macia e vermelho­escura. Em casos graves, é acompanhada de falta de pelos (especialmente em suínos) ou lã (cordeiros). No pescoço normalmente nota­se aumento de volume evidente e a pele e outros tecidos podem
estar espessados, flácidos  e  edematosos.  Em  animais  discretamente  afetados,  o tratamento com sal iodado (contendo > 0,007% de iodo) pode curar o bócio e os sintomas associados, mas muitos animais morrem antes ou logo após o
nascimento. Profilaxia é mais efetiva do que tratamento. O uso de sal iodado estabilizado é recomendado em todas as áreas conhecidas ou suspeitas de serem deficientes em iodo.
TOXICIDADE AO IODO:  Bócio e hipotireoidismo acometem potros que recebem excesso de iodo durante a gestação. Éguas suplementadas com = 35 mg de iodo/dia podem gerar potros acometidos. Os sinais clínicos variam e podem incluir
bócio, fraqueza e anormalidades musculoesqueléticas. Éguas são assintomáticas, invariavelmente. O quadro clínico dos potros pode melhorar ou recuperar assim que o excesso de iodo é removido.
SUBSTÂNCIAS BOCIOGÊNICAS:  Algumas plantas podem ocasionar bócio quando ingeridas em quantidade suficiente, especialmente na ausência de adequada ingestão de iodo. Sojas são as mais notáveis; repolho, couve e nabo são menos
bociogênicos. Cozimento ou aquecimento (e o processamento normal do farelo de soja) destrói a agente bociogênico presente nessas plantas. Todas as substâncias bociogênicas atuam interferindo na produção de hormônio da tireoide.
Como na deficiência de iodo, a hipófise responde a baixo teor de hormônio tireoidiano circulante aumentando a secreção de TSH, o que resulta em aumento da tireoide. Em animais adultos normalmente a doença não é significante, mas em
recém­nascidos pode­se desenvolver intenso aumento da tireoide e hipotireoidismo.
HIPOTIREOIDISMO  CONGÊNITO  E  SÍNDROME  DA  DISFUNÇÃO  DE  MATURIDADE  EM  POTROS:  Essa  síndrome  de  potros  neonatos,  primeiramente  relatada  no  início  da  década  de  1980,  é  caracterizada  por  hiperplasia  da  tireoide,  bócio  e
anormalidades musculoesqueléticas congênitas múltiplas. É mais comum no oeste do Canadá; também, foi observada no noroeste do Pacífico e esporadicamente em outras regiões dos EUA. Não há predileção sexual ou por raça. Potros
com essa síndrome nascem depois de uma gestação prolongada (300 a 400 dias), mas parecem imaturos, com orelhas moles, fraqueza muscular e desenvolvimento esquelético incompleto. Defeitos musculoesqueléticos comuns incluem
deformidades de flexura de membro torácico, ruptura de tendões do músculo extensor do dígito comum, prognatia mandibular e imaturidade dos ossos do carpo e do tarso. Vários casos podem surgir na fazenda, sem recidiva nos anos
subsequentes. A causa primária é desconhecida, mas pode ser decorrência de dieta com alto teor de nitrato (p. ex., alimento verde), juntamente com baixa ingestão de iodo ou consumo de bociogênico não identificado. Muitos potros
acometidos também morrem ou são submetidos à eutanásia na primeira semana de vida.
BÓCIO DISORMONOGENÉTICO FAMILIAR:
Tem sido relatado em ovelhas, bezerros, cabras e suínos; parece ser herdado como uma característica autossômica recessiva. Essencialmente, é um defeito genético da enzima que atua na biossíntese de hormônio da tireoide. Como acontece
na deficiência de iodo, a baixa produção de hormônio tireoidiano ocasiona maior secreção de TSH e, subsequentemente, bócio. Os sinais clínicos podem incluir taxa de crescimento subnormal, ausência de desenvolvimento normal de lã ou
pelame escasso, edema mixedematoso nos tecidos subcutâneos e fraqueza. Muitos animais acometidos morrem logo após o nascimento ou são muito sensíveis às condições adversas do ambiente.

 HIPERTIREOIDISMO
Excessiva secreção dos hormônios da tireoide, T4 e T3, resulta em sintomas que refletem aumento da taxa metabólica e provoca hipertireoidismo clínico. Isso é mais comum em gatos jovens a idosos, mas também pode se desenvolver
raramente em cães.
O adenoma de tireoide funcional (hiperplasia adenomatosa) é a causa mais comum de hipertireoidismo felino; em cerca de 70% dos casos, ambos os lobos da tireoide encontram­se hipertrofiados. O carcinoma de tireoide, causa primária
de hipertireoidismo em cães, é raro em gatos (1 a 2% dos casos de hipertireoidismo).
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Os sinais mais comuns incluem perda de peso, aumento do apetite, hiperexcitabilidade, polidipsia, poliúria e aumento palpável da glândula da tireoide. Sintomas GI também são comuns e podem incluir
vômito, diarreia e maior volume fecal. Os sintomas cardiovasculares incluem taquicardia, sopro cardíaco sistólico, dispneia, cardiomegalia e insuficiência cardíaca congestiva. Raramente, gatos com hipertireoidismo apresentam sinais de
apatia (p. ex., anorexia, letargia e depressão); perda de peso é um sinal comum nesses gatos.
A alta concentração sérica basal de hormônio tireoidiano total é característica de hipertireoidismo e confirma o diagnóstico. Embora na maioria dos gatos com hipertireoidismo a concentração sérica de T4 total seja alta, cerca de 5 a 10%
dos  gatos  têm  valor  normal  de  T4.  Muitos  gatos  com  teor  sérico  de  T4  normal,  também  apresentam  hipertireoidismo  inicial  ou  discreto  ou  hipertireoidismo  com  doença  extratireoidiana  concomitante,  que  causa  supressão  da  alta
concentração de T4  total  para  valor  nos  limites  da  faixa  de  normalidade.  Nesses  gatos,  uma  alta  concentração  de  T4  livre,  juntamente  com  as  informações  obtidas  na  anamnese  e  os  achados  de  exame  físico  consistentes,  é  indicador
diagnóstico de hipertireoidismo.
TRATAMENTO:   Gatos  com  hipertireoidismo  pode  ser  tratado  com  iodo  radioativo,  tireoidectomia  ou  administração  prolongada  de  um  medicamento  antitireoide.  O  iodo  radioativo  é  um  tratamento  simples,  efetivo  e  seguro,  sendo
considerado a terapia de escolha. O iodo radioativo se concentra no tumor de tireoide, onde seletivamente irradia e destrói o tecido tireoidiano hiperfuncional.
Tireoidectomia também é um tratamento efetivo para hipertireoidismo, em gatos. No caso de tumor de tireoide unilateral, a hemitireoidectomia corrige o estado de hipertireoidismo e geralmente não é necessária suplementação com
tireotoxina.  Para  tumores  de  tireoide  bilaterais,  indica­se  tireoidectomia  total,  mas  a  função  da  paratireoide  deve  ser  preservada  para  evitar  hipocalcemia  pós­operatória.  A  suplementação  com  tirotoxina  deve  ser  iniciada  1  a  2  dias
apóstireodectomia total. Caso se desenvolva hipoparatireodismo iatrogênico, também indica­se tratamento com vitamina D e cálcio.
O tratamento com metimazol, um medicamento antitireoide, controla o hipertireoidismo por bloquear a síntese do hormônio da tireoide. Propiltiouracila, outro medicamento antitireoide, não é recomendado para gatos devido à alta taxa
de reações adversas graves (especialmente anemia hemolítica e trombocitopenia). A dose diária inicial de metimazol recomendada é 5 a 10 mg, fracionada em 2 doses. A dose é ajustada para manter a concentração de hormônio da tireoide
circulante dentro da faixa normal; é fornecido diariamente. Reações adversas, sendo as mais graves agranulocitose e trombocitopenia, desenvolvem­se em < 5% dos gatos tratados. Se isso ocorrer, deve­se interromper o uso de metimazol e
instituir terapia de suporte; essas reações adversas devem regredir dentro de 2 semanas. Para manter teor normal de hormônio da tireoide e para monitorar as reações adversas durante nos 3 primeiros meses de tratamento (quando ocorre a
maioria das reações adversas graves associadas à terapia com metimazol), deve­se repetir o hemograma completo e a determinação sérica do hormônio de tireoide em intervalos de 2 a 4 semanas, bem como ajustar a dose do medicamento,
se necessário. Subsequentemente, as concentrações de T4 sérico devem ser mensuradas em intervalos de 3 a 6 meses, para monitorar a dose e a resposta ao tratamento.
No caso de reação adversa, pode ser necessário o emprego de outra terapia medicamentosa, em vez de metimazol. Na maioria dos casos, essas terapias medicamentosas alternativas são para uso a curto prazo e apenas recomendadas antes
de uma opção de tratamento mais permanente.
O propranolol e o atenolol são os bloqueadores de beta­adrenorreceptor mais frequentemente utilizados em gatos com hipertireoidismo. Esses medicamentos não diminuem a concentração de T4 circulante, mas são utilizados no controle
sintomático de taquicardia, taquipneia, hipertensão e hiperexcitabilidade associadas ao hipertireoidismo.
Agentes colecistográficos de uso oral (p. ex., ipodato, ácido iopanoico ou diatrizoato meglumina) inibem bruscamente a conversão periférica de T4 a T3. Em um estudo com gatos com hipertireoidismo, a administração de ipodato de
cálcio normalizou a concentração sérica de T3 total e propiciou melhora clínica em > 60% dos gatos tratados. Atualmente o ipodato (308 mg de iodo/500 mg de ipodato de cálcio) não é mais comercializado, pelo menos nos EUA, mas há
relatos anedóticos de uso de ácido iopânico (333 mg de iodo/500 mg de ácido iopanoico) e diatrizoato meglumina (370 mg de iodo/ml) em gatos com hipertireoidismo, em doses comparáveis. Nenhum desses medicamentos propicia cura
completa dos sinais clínicos ou das características bioquímicas associadas a hipertireoidismo. Ademais, é comum a diminuição dos efeitos na tireoide após 3 meses de terapia com qualquer desses medicamentos.
Em cães, um tumor de tireoide que causa hipertireoidismo sempre deve ser considerado um carcinoma, até que se prove o contrário. Esse é diferente do observado em gatos com hipertireoidismo, nos quais a prevalência de carcinoma de
tireoide é < 5%.
O tratamento de neoplasia de tireoide e de hipertireoidismo, em cães, depende do tamanho do tumor primário, da extensão da invasão do tecido local, da presença de metástase detectável e das opções de tratamentos disponíveis. Pode­se
indicar  cirurgia,  quimioterapia,  radiação  com  cobalto  e  iodo  radioativo,  sozinhos  ou  em  combinações,  dependendo  do  indivíduo.  O  controle  médico  do  estado  de  hipertireoidismo  pode  ser  obtido  pela  administração  diária  de  um
medicamento antitireoide, como metimazol ou carbamazol (5 a 15 mg/cão, 2 vezes/dia), mas este tratamento médico não evita o crescimento do tumor ou a ocorrência de metástase. Como o hipertireoidismo canino quase sempre está
associado a carcinoma de tireoide, o prognóstico a longo prazo para esses cães é ruim.

 HIPOTIREOIDISMO
No hipotireoidismo, o prejuízo à produção e à secreção de hormônios da tireoide resulta em diminuição da taxa metabólica. Este distúrbio é mais comum em cães, mas também raramente é notado em outras espécies, inclusive gatos,
equinos e outros animais domésticos de grande porte.
ETIOLOGIA:  Embora a disfunção em qualquer parte do eixo hipotálamo­hipófise­tireoidiano possa resultar em deficiência de hormônio da tireoide, > 95% dos casos clínicos de hipotireoidismo em cães parecem resultar de destruição da
própria glândula tireoide (hipotireoidismo primário). A segunda causa mais comum de hipotireoidismo primário de início adulto, em cães, incluem tireoidite linfocitária e atrofia idiopática da tireoide. Tireoidite linfocitária, provavelmente
imunomediada, é caracterizada histopatologicamente pela infiltração difusa da glândula por linfócitos, plasmócitos e macrófagos e resulta em progressiva destruição dos folículos e fibrose secundária. Atrofia idiopática da glândula tireoide
é caracterizada histologicamente pela perda do parênquima tireoidiano e sua substituição por tecido adiposo (ver p. 882).
Em cães, a causa mais comum de hipotireoidismo secundário é a destruição da tireotrofos da hipófise pela expansão e ocupação do espaço por tumor. Devido à natureza não seletiva da atrofia compressiva e substituição do tecido da
hipófise por tumor grande; também, normalmente ocorrem deficiências de outros (um ou mais) hormônios da hipófise.
Outras  formas  raras  de  hipotireoidismo  em  cães  incluem  destruição  neoplásica  do  tecido  tireoidiano  e  hipotireoidismo  congênito  (ou  de  início  juvenil).  Hipotireoidismo  primário  congênito  pode  resultar  de  uma  ou  várias  formas  de
disgenesia da tireoide (p. ex., atireose, hipoplasia de tireoide) ou de disfunção na produção de hormônio (normalmente uma inabilidade hereditária em tornar o iodo em sua forma orgânica). Hipotireoidismo secundário congênito (associado
a sinais clínicos de nanismo desproporcional, letargia, anormalidades no andar e constipação intestinal) tem sido relatado em cães das raças Schnauzer gigante, Fox Terrier toy e Scottish Deerhound. Hipotireoidismo secundário congênito
também tem sido relatado no cão Pastor Alemão com nanismo hipofisário associado a bolsa de Rathke cística. Entretanto, o grau de deficiência de TSH nesses cães é variável e os sinais clínicos, em geral, são causados por deficiência de
hormônio do crescimento (em vez de hormônio da tireoide).
Em gatos, hipotireoidismo iatrogênico é a forma mais comum. O hipotireoidismo se desenvolve nesses gatos depois do tratamento de hipertireoidismo com iodo radioativo, tireoidectomia ou uso de um medicamento antitireoide. Embora,
o  hipotireoidismo  de  ocorrência  natural  seja  uma  anormalidade  extremamente  rara  em  gatos  adultos,  estes  animais  também  podem  manifestar  hipotireoidismo  congênito  ou  de  início  juvenil.  As  causas  conhecidas  de  hipotireoidismo
congênito em gatos incluem defeitos na biossíntese de hormônio intratireoidiana (disfunção na produção de hormônio), uma inabilidade da glândula tireoide em responder ao TSH, e disgenesia da tireoide. Todos os gatos diagnosticados
com hipotireoidismo apresentavam a forma primária (tireoidiana). Hipotireoidismo secundário (hipofisário) ou terciário (hipotalâmico) não foi bem descrito em gatos, jovens e adultos, mas há relato da doença após grave traumatismo
craniano.
Em potros, pode­se desenvolver hipotireoidismo congênito quando éguas prenhes consome pastagem que contém substância bociogênicas, ou que são alimentadas com dieta deficientes ou que contém quantidade excessiva de iodo. Mais
comumente,  o  hipotireoidismo  congênito  desenvolve­se  em  associação  com  uma  síndrome  neonatal  específica  do  potro  caracterizada  por  hiperplasia  da  glândula  tireoide,  juntamente  com  anomalias  musculoesqueléticas  congênitas
múltiplas. Essa síndrome, relatada mais comumente no oeste do Canadá, foi denominada como síndrome de deformidades musculoesqueléticas e hiperplasia de tireoide ou síndrome da dismaturidade ou hipotireoidismo congênito e pode
estar  relacionado  o  fornecimento  de  dieta  com  alto  teor  de  nitrato  a  éguas  prenhes  (ver  p.  591).  Em  equinos  adultos,  a  ocorrência  de  hipotireoidismo  parece  muito  rara,  mas,  como  em  outras  espécies,  é  comumente  erroneamente
diagnosticado.
ACHADOS CLÍNICOS:  Embora a idade de início da doença seja variável, o hipotireoidismo é mais comum em cães com 4 a 10 anos de idade. O hipotireoidismo, normalmente acomete raças de porte médio a grande, sendo raro em cães de
raças pequenas e toy. As raças relatadas predispostas incluem Golden Retriever, Doberman Pinscher, Setter Irlandes, Schnauzer miniatura, Dachshund, Cocker Spaniel e Airedale Terrier. Parece não haver predileção sexual, mas fêmeas
castradas parecem mais suscetíveis a hipotireoidismo do que fêmeas não castradas.
A deficiência de hormônio da tireoide interfere na função de todos os sistemas orgânicos; como resultado, os sinais clínicos são difusos, variáveis, frequentemente inespecíficos e raramente patognomônicos. Embora a doença deva ser
altamente suspeita, deve­se evitar valorização excessiva do diagnóstico porque muitas doenças, especialmente aquelas de pele, podem facilmente ser diagnosticadas erroneamente como hipotireoidismo.
Muitos  dos  sinais  clínicos  associados  a  hipotireoidismo  canino  estão  diretamente  relacionados  com  o  retardo  do  metabolismo  celular,  que  resulta  em  embotamento  mental,  letargia,  intolerância  ao  exercício  e  ganho  de  peso,  sem
correspondente aumento do apetite. Em alguns cães, nota­se obesidade moderada ou marcante. A dificuldade de manter a temperatura corpórea pode ocasionar hipotermia evidente; o clássico cão com hipotireoidismo é aquele que procura
uma fonte de calor. Alterações na pele e no pelame são comuns. Pelos secos, queda excessiva e retardo de crescimento, novamente, são as principais alterações cutâneas. Em cerca de 2/3 dos cães com hipotireoidismo, notam­se queda de
pelos sem prurido ou alopécia (normalmente simétrica bilateral) que pode envolver as partes ventral e lateral do tronco, a face posterior das coxas, o dorso da cauda, a região ventral do pescoço e o dorso do nariz. Alopécia, às vezes
associada a hiperpigmentação, frequentemente surge em partes do pelame. Ocasionalmente, nota­se piodermite secundária (que pode causar prurido).
Em  casos  moderados  a  graves,  ocorre  espessamento  da  pele  secundário  ao  acúmulo  de  glicosaminoglicanos  (sobretudo  ácido  hialurônico)  na  derme.  Em  tais  casos,  mixedema  é  mais  comum  na  testa  e  na  face,  resultando  em  uma
aparência inchada nas pregas da pele acima dos olhos. Essas pregas, juntamente com ligeiro dobramento sobre os olhos, dão à alguns cães uma expressão de face “trágica”. Essas alterações também foram relatadas no trato GI, coração e
músculo esquelético.
Em cães não castrados, o hipotireoidismo pode causar vários distúrbios reprodutivos em fêmeas, ausência de cio (anestro) ou cio esporádico, infertilidade, abortamento ou baixa taxa de sobrevivência de fetos. Em machos, nota­se falta de
libido, atrofia testicular, hipospermia ou infertilidade.
Coma  mixedematosa  é  uma  síndrome  rara;  é  a  extrema  manifestação  do  hipotireoidismo  grave.  O  curso  pode  ser  agudo;  letargia  progride  a  estupor  e,  então,  coma.  Os  sinais  comuns  de  hipotireoidismo  (p.  ex.,  perda  de  pelos)
normalmente estão presentes, mas outros sintomas, como hipoventilação, hipotensão, bradicardia e hipotermia profunda também são normalmente vistos.
Durante  o  período  fetal  e  nos  primeiros  meses  de  vida  pós­natal,  os  hormônios  tireoidianos  são  fundamentais  para  o  crescimento  e  desenvolvimento  do  esqueleto  e  do  SNC.  Portanto,  além  dos  sintomas  bem  reconhecidos  de
hipotireoidismo de início adulto, nanismo desproporcional e prejuízo ao desenvolvimento mental (cretinismo) são sinais marcantes de hipotireoidismo congênito de início juvenil. No hipotireoidismo congênito primário, também pode ser
detectado  aumento  da  glândula  tireoide  (bócio),  dependendo  da  causa  do  hipotireoidismo.  Sinais  radiográficos  de  disgenesia  de  epífese  (epífeses  de  ossos  longos  subdesenvolvidas),  encurtamento  de  corpos  vertebrais  e  retardo  no
fechamento das epífeses são achados comuns.
Em  cães  com  hipopituitarismo  congênito  (ver  p.  588)  pode  haver  graus  variáveis  de  deficiência  tireoidiana,  adrenocortical  e  gonádico,  mas  os  sinais  clínicos  estão  relacionados  principalmente  com  a  deficiência  de  hormônio  do
crescimento.  Os  sintomas  incluem  nanismo  proporcional  (em  vez  de  desproporcional,  a  forma  de  nanismo  característico  de  hipotireoidismo  congênito),  perda  dos  principais  pelos  de  proteção  com  retenção  do  pelame  de  filhote,
hiperpigmentação cutânea e alopécia bilateral simétrica no tronco.
Em gatos adultos, os sinais clínicos associados a hipotireoidismo normalmente incluem letargia, retardo mental, seborreia seca não pruriginosa, hipotermia, apetite diminuído e, ocasionalmente, bradicardia. É possível notar obesidade,
especialmente  em  gatos  com  hipotireoidismo  iatrogênico,  mas  isso  não  é  um  sinal  clínico  consistente.  Parece  não  ocorrer  alopécia  bilateral  simétrica,  com  exceção  do  envolvimento  do  pavilhão  auricular,  mas  ocasionalmente  tem­se
observado regiões focais de alopécia nas regiões craniolateral dos carpos, caudal dos jarretes e dorsal e lateral da base da cauda. Em gatos jovens com hipotireoidismo congênito ou de início juvenil, os sinais clínicos incluem nanismo
desproporcional, letargia grave, retardo mental, constipação intestinal, inapetência e bradicardia.
DIAGNÓSTICO DE HIPOTIREOIDISMO:  Em cães, o hipotireoidismo provavelmente é uma das doenças mais excessivamente diagnosticada. Muitas enfermidades e condições podem mimetizar hipotireoidismo e alguns dos sinais clínicos,
mesmo  em  cães  com  função  de  tireoide  normal,  podem  melhorar  após  a  administração  de  hormônio  tireoidiano  exógeno.  Ademais,  vários  fatores  não  tireoidianos  (p.  ex.,  doença  extratireoidianas  e  administração  prévia  de  alguns
medicamentos) podem ocasionar diminuição do teor sérico de hormônio da tireoide em cães, gatos e outras espécies de animais com função tireoidiana normal. O diagnóstico definitivo de hipotireoidismo canino requer atenção especial aos
sinais clínicos e resultados de testes laboratoriais de rotina. Os testes que podem confirmar o diagnóstico incluem mensuração das concentrações séricas de T4 total, T4 livre e TSH; testes de desafio da função da tireoide (p. ex., teste de
estimulação com TSH); imagem da glândula tireoide; e resposta ao uso de hormônio da tireoide suplementar. A escolha e a interpretação dos testes de diagnóstico se baseiam muito no grau de suspeita de hipotireoidismo.
Há anormalidades clínico­patológicas bem reconhecidas associadas a hipotireoidismo, a gravidade que é normalmente relacionada com a gravidade e cronicidade da condição de hipotireoidismo. Essas alterações não são específicas e
podem estar associadas a muitas outras doenças de cães. Entretanto, sua constatação, propicia suporte adicional à evidência de hipotireoidismo em cães com sinais clínicos compatíveis. Os achados hematológicos clássicos associados a
hipotireoidismo,  verificado  em  40  a  50%  dos  casos,  é  anemia  normocítica  normocrômica  não  regenerativa.  A  anormalidade  bioquímica  sérica  clássica  é  hipercolesterolemia,  notado  em  cerca  de  80%  dos  cães  com  hipotireoidismo.  A
importância da determinação do teor sérico de colesterol como teste de triagem para hipotireoidismo não pode ser superenfatizados por ser um marcador bioquímico sensível e barato para essa doença, em cães. Outras anormalidades
clínico­patológicas podem incluir alta concentração sérica de triglicerídios, bem como das atividades de fosfatase alcalina e creatinina quinase.
A concentração de T4 total é a mensuração de hormônio da tireoide estático mais comumente realizado, sendo considerado um bom teste de triagem inicial de hipotireoidismo, com sensibilidade de diagnóstico de cerca de 90%. Um cão
com  uma  concentração  de  T4  na  faixa  de  normalidade  pode  ser  considerado  eutireóideo,  ou  seja,  com  função  normal  da  tireoide.  Entretanto,  teor  de  T4  basal  subnormal  não  é  diagnóstico;  isso  pode  indicar  que  o  animal  é  normal,
hipotireóideo ou que apresenta uma doença extratireoidiana com diminuição secundária da concentração de T4 basal.
Como a fração sérica não ligante de T4 é  biologicamente  ativa,  a  mensuração  de  T4 livre  tem  sido  considerada  mais  útil  na  diferenciação  de  cães  eutireóideos  daqueles  cães  com  hipotireoidismo,  do  que  a  concentração  de  T4  total.
Entretanto, a maioria dos testes comerciais de fase sólida e estágio único (análogo) para T4 livre não parece superior à mensuração de T4 total no cão, provavelmente devido a diferenças nas proteínas de ligação séricas. Um teste de T4 livre
que utiliza uma fase de diálise de equilíbrio (diálise direta) tem maior acerácea do que os métodos análogos. Comparado ao teste de T4 total, o teste de T4 livre por diálise é um indicador diagnóstico mais sensível e específico.
Como  o  T3  é  o  hormônio  tireoidiano  mais  potente  em  nível  celular,  seria  lógico  sua  mensuração  para  fim  de  diagnóstico.  Entretanto,  a  concentração  sérica  de  T3  pode  ser  baixo,  normal  ou  (ocasionalmente)  alto,  em  cães  com
hipotireoidismo  documentado.  O  valor  da  determinação  de  T3  sérico  no  diagnóstico  é  particularmente  baixo  quando  há  insuficiência  tireoidiana  recente  porque  a  “falha”  da  tireoide  tende  a  aumentar  a  síntese  e  secreção  relativa  de
T3 versus T4. Em cão com hipotireoidismo, no qual o teor sérico de T3 é alto, deve­se suspeitar de anticorpo anti–T3, que induz falso resultado na maioria dos testes de radioimunoensaio para T3.
A dosagem de TSH sérico por meio de um teste de TSH espécie­específico válido pode ser um exame auxiliar útil no diagnóstico de hipotireoidismo em cães e equinos. Seria de se esperar que animais com hipotireoidismo primário (de
longe, o tipo mais comum) tivesse baixa concentração sérica de T4 e/ou T4 livre,  com  alta  concentração  de  TSH  endógeno.  Infelizmente,  a  concentração  sérica  de  TSH  permanece  na  faixa  de  normalidade  em  20  a  40%  dos  cães  com
hipotireoidismo confirmado. Embora poucos cães com concentração sérica de TSH normal tenham hipotireoidismo secundário, deficiência de TSH hipofisário é extremamente rara e vários cães com concentração de TSH normal (i. e.,
resultado falso­negativo) apresenta hipotireoidismo primário. Por outro lado, teor sérico de TSH falsamente elevado (i. e., resultado falso­positivo) ocasionalmente é constatado em cães eutireóideos, com doença extratireoidiana. Assim, a
dosagem sérica de TSH nunca deve ser avaliada sozinha, mas sempre juntamente com o histórico do cão, as anormalidades em exames laboratoriais de rotina e as concentrações de T4 total e T4 livre.
O  teste  de  estimulação  de  TSH  avalia  a  resposta  da  glândula  tireoide  ao  TSH  exógeno  administrado;  ademais,  é  um  teste  de  reserva  tireoidiana.  É  um  teste  de  função  da  tireoide  confiável  em  cães,  mas  seu  uso  é  limitado  pela
disponibilidade limitada e alto custo do TSH. O protocolo requer coleta de uma amostra de soro para mensuração de T4 basal, seguido da administração por via intravenosa de 0,1 U de TSH bovino/kg (dose máxima de 5 unidades). Uma
segunda amostra é obtida após 6 h. O TSH recombinante humano encontra­se disponível, embora caro, e pode ser congelado durante, pelo menos, 8 semanas, sem perda da potência. A dose recomendada é 75 μg, IV, com coleta de amostra
antes e 6 h após. Os resultados são similares aos obtidos com o uso do produto bovino. Os resultados podem revelar resposta normal, resposta branda (síndrome do eutireóideo doente) ou ausência de resposta (hipotireoidismo).
Ambas, ultrassonografia e cintigrafia da glândula tireoide têm sido avaliadas como testes de diagnóstico de hipotireoidismo em cães. Com um radiologista experiente, a ultrassonografia da tireoide (i. e., diminuição da ecogenicidade e do
volume da tireoide) pode ser um procedimento auxiliar de diagnóstico efetivo para diferenciar entre hipotireoidismo e síndrome do eutireóideo doente. A melhor técnica de imagem possível de ser utilizada é a absorção de tecnécio 99m
(99mTc) e posterior obtenção da imagem da tireoide. Na mensuração quantitativa da absorção do 99mTc na tireoide há pequena ou nenhuma sobreposição entre cães com hipotireoidismo primário e cães com doença extratireoidiana.
Em  alguns  casos  o  procedimento  mais  prático  para  confirmar  o  diagnóstico  de  hipotireoidismo  é  um  teste  terapêutico  com  emprego  de  normas  apropriadas.  Toda  tentativa  deve  ser  feita  para  descartar  previamente  uma  doença
extratireoidiana para, então, iniciar o teste terapêutico. Não há evidência de que a suplementação com hormônio da tireoide é benéfica aos cães com a síndrome do eutireóideo doente; pode ser prejudicial. A suplementação com tiroxina
deve ser iniciada na dose de 20 μg/kg (administrada sem alimento, com estômago vazio), 1 ou 2 vezes/dia. Um critério objetivo deve ser utilizado para avaliar a resposta ao tratamento. Caso ocorra resposta positiva ao tratamento, o clínico
deve ser preparado para interromper a terapia para confirmar se os sinais clínicos retornam. Isso assegura que cães com doenças responsivas à tireoide (i. e., aquelas nas quais nota­se melhora dos sintomas devido aos efeitos inespecíficos
do  hormônio  tireoidiano  ou  melhora  não  relacionada  com  a  terapia)  não  sejam  submetidos  à  suplementação  com  hormônios  da  tireoide  por  toda  a  vida.  Se  a  terapia  é  má  sucedida,  deve­se  realizar  o  monitoramento  terapêutico  para
identificar a causa de falha do tratamento. Como o diagnóstico incorreto é a causa mais comum de falha de tratamento, o clínico deve estar preparado para suspender a terapia e investigar outro diagnóstico.
DIAGNÓSTICO DE TIREOIDITE:  Anticorpos antitireoglobulina circulantes podem ser detectados em até metade dos cães com hipotireoidismo e acredita­se refletir o estado de tireoidite autoimune. A mensuração desses anticorpos em haras
de  reprodutores  e  em  cadelas  tem  sido  proposta  como  método  de  identificação  de  cães  com  tireoidite  autoimune.  A  determinação  sérica  de  autoanticorpos  contra  tireoglobulina  pode  ser  um  método  auxiliar  útil  para  diagnóstico  de
hipotireoidismo. Entretanto, o teste nunca deve ser utilizado sozinho na confirmação do diagnóstico de hipotireoidismo porque em cães eutireóideos com tireoidite linfocitária recente pode­se notar um título de anticorpo antitireoglobulina
positivo. A identificação desses anticorpos sustenta o diagnóstico, caso os cães apresentem sintomas e outros dados laboratoriais compatíveis com a enfermidade.
Embora  extremamente  raros  em  cães,  ocasionalmente  são  detectados  autoanticorpos  circulantes  contra  hormônio  da  tireoide  (anticorpos  anti­T3 ou anti­T4);  também,  acredita­se  que  reflete  a  condição  de  tireoidite  autoimune.  Esses
anticorpos, os quais podem ser formados contra qualquer T3 e T4 (ou ambas), induzem falso aumento das concentrações de T3 e T4, na faixa de hipertireoidismo, na maioria dos cães. De todos os hormônios da tireoide, apenas a mensuração
de T4 livre (por diálise) não é influenciada por anticorpos contra T4 ou T3 porque os anticorpos séricos são removidos na fase de diálise. Portanto, se há suspeita de hipotireoidismo em um cão com anticorpos circulantes contra hormônio da
tireoide, deve­se determinar a concentração sérica de T4 livre para auxiliar na confirmação do diagnóstico.

FATORES EXTRATIREOIDIANOS QUE INTERFEREM NA INTERPRETAÇÃO DOS TESTES DE FUNÇÃO DA TIREOIDE:  Em algumas raças a faixa de normalidade para hormônios da tireoide difere de muitas outras raças. Há poucos estudos, mas cães
Greyhound apresentam concentrações séricas de T4 total e T4 livre consideravelmente menores do que em outras raças. Cães Scottish Deerhound também têm concentração de T4 total bem abaixo da média verificada em cães em geral;
ademais, em raças Sight Hound podem ser notados achados semelhantes. Cães de trenó do Alasca apresentam concentrações séricas de T4 total, T3 e T4 livre abaixo da faixa de referência de muitos cães domésticos, particularmente nos
períodos de corrida ou de treinamento intenso.
Doenças que não envolvem a glândula tireoide podem alterar os testes de função da tireoide e têm sido denominadas “doença extratireodiana” ou “síndrome do eutireóideo doente”. Qualquer doença pode alterar os testes de função da
tireoide,  causando  diminuição  bastante  consistente  nas  concentrações  de  T4 total e T3 proporcionalmente  à  gravidade  da  doença.  Nota­se  aumento  da  concentração  sérica  de  TSH  em  8  a  10%  dos  cães  com  doença  extratireoidiana.  A
mensuração do teor sérico de T4 livre por diálise em equilíbrio é menos provavelmente influenciada, mas pode estar aumentada ou diminuída. Entretanto, em cães com doença extratireoidiana importante, é provável ocorrer diminuição de
T4 livre. Teste de função da tireoide deve ser adiado até que a doença extratireoidiana seja resolvida. Se isso não for possível, as mensurações de T4, TSH e T4 livre são indicadas.
Glicocorticoides,  fenobrabital,  sulfonamidas,  clomipramina  e  ácido  acetilsalicílico  sabidamente  alteram  os  resultados  de  testes  da  função  da  tireoide.  Glicocorticoide  suprime  as  concentrações  de  T4  total  e,  às  vezes,  de  T4  livre.
Fenobarbital reduz o teor de T4 total e aumenta discretamente o de TSH. Sulfonamidas podem induzir hipotireoidismo primário evidente, com sinais clínicos e testes de função da tireoide que sustentam o diagnóstico. Todas as alterações
são reversíveis quando cessa a medicação. Há dúzias de medicamentos que interferem na função da tireoide e nos testes de função desta glândula em pessoas, e muitas outras igualmente afetam os animais.
TRATAMENTO:  Tiroxina (T4) é o composto de reposição hormonal de escolha para cães. Com poucas exceções, a terapia de reposição é necessária para o restante da vida do cão; diagnóstico inicial criterioso e ajustes no tratamento são

essenciais. A dose total de reposição de T4 relatada varia de 0,02 a 0,04 mg/kg/dia, em dose única ou fracionada 2 vezes/dia, sem alimento (de estômago vazio).
O mais importante indicador de sucesso da terapia é a melhoria clínica. Cessação de mudanças do pelame e o peso corporal devem ser avaliados apenas depois de 1 a 2 meses de terapia. Quando a melhoria clínica é marginal ou os sinais
de  tireotoxicose  são  notados,  as  manifestações  clínicas  podem  ser  sustentadas  mediante  monitoramento  terapêutico  da  concentração  sérica  de  hormônio  da  tireoide  (“teste  pós­pílula”).  No  caso  de  administração  de  T4  1  vez/dia,  a
concentração  sérica  máxima  de  T4  geralmente  deve  ser  ligeiramente  alta  ou  no  limite  superior  de  normalidade  4  a  6  h  após  a  administração  e  deve  ser  no  limite  inferior  de  normalidade  ou  normal  24  h  após  a  dose.  Os  animais  em
administração 2 vezes/dia provavelmente podem ser avaliados a qualquer momento, porém a concentração máxima pode ser esperada no meio do intervalo entre as doses (4 a 6 h), com valor mínimo antes da próxima dose. Quando a dose é
estabilizada, as concentrações séricas de T4 (com ou sem T3) devem ser verificadas 1 a 2 vezes/ano.
Se  os  sinais  clínicos  de  hipotireoidismo  permanecem,  apesar  do  uso  de  doses  razoável  de  hormônio  da  tireoide,  deve­se  considerar:  1)  a  dose  ou  a  frequência  de  administração  é  imprópria;  2)  o  proprietário  não  está  cumprindo  as
instruções ou não tem administrado o produto com sucesso; 3) o animal não está absorvendo bem o medicamento ou está metabolizando e/ou excretando­o muito rapidamente; 4) o produto está vencido; ou 5) o diagnóstico está incorreto.
GLÂNDULAS ADRENAIS

As glândulas adrenais dos mamíferos estão localizadas no polo cranial dos rins. Consistem de duas partes distintas, o córtex mais externo e a medula interna, que se diferem quanto à morfologia, função e origem.

CÓRTEX ADRENAL
O córtex adrenal é subdividido em três camadas ou zonas, embora a delimitação entre as zonas seja indistinta. A zona glomerulosa, a parte mais externa, é responsável pela secreção de hormônios mineralocorticoides. A zona fasciculata, a
porção  intermediária,  corresponde  a  cerca  de  70%  do  córtex  e  é  composta  de  células  que  contêm  abundante  lipídios  citoplasmáticos  e  os  hormônios glicocorticoides.  A  zona  reticulada,  a  mais  interna,  é  responsável  pela  secreção  dos
esteroides sexuais.
Os mineralocorticoides, dos quais o de ocorrência natural mais potente é a aldosterona, são esteroides adrenais que atuam principalmente no transporte iônico pelas células epiteliais, resultando em perda de potássio e retenção de sódio.
As glândulas sudoríparas e as bombas eletrolíticas das células epiteliais do túbulo renal respondem de modo semelhante. No túbulo contorcido distal do néfron dos mamíferos, um mecanismo de troca de cátions reabsorve o sódio do filtrado
glomerular e secreta potássio para o lúmen. Estas reações são aceleradas pelos mineralocorticoides e ocorrem mais lentamente na ausência deles. A falha na secreção de mineralocorticoides (doença de Addison) pode resultar em retenção
letal de potássio e na perda de sódio.
Cortisol  e  corticosterina,  em  menor  quantidade,  são  os  hormônios  glicocorticoides  mais  importantes  secretados  pela  glândula  adrenal  em  muitas  espécies.  Em  geral,  as  ações  dos  glicocorticoides  nos  metabolismos  de  carboidratos,
proteínas e lipídios resultam na economia de glicose e na tendência à hiperglicemia e no aumento da produção de glicose. Ainda, diminuem a lipogênese e aumentam a lipólise no tecido adiposo, que resulta na liberação de glicerol e ácidos
graxos livres.
Glicocorticoides  também  suprimem  as  respostas  inflamatórias  e  imunológicas,  atenuando  a  destruição  tecidual  e  a  fibroplasia  associadas.  Entretanto,  altas  concentrações  de  glicocorticoides  reduzem  a  resistência  a  bactérias,  vírus  e
fungos, favorecendo a disseminação da infecção. Glicocorticoides podem prejudicar as respostas imunológicas em qualquer estágio da interação inicial e processamento dos antígenos pelas células do sistema reticuloendotelial, por meio da
indução e proliferação de linfócitos imunocompetentes e subsequente produção de anticorpos. A inibição de algumas funções dos linfócitos é parte da base para imunossupressão.
Glicocorticoides podem ter um profundo efeito negativo na cicatrização de feridas. Altas doses terapêuticas de corticosteroides adrenais ou a síndrome de hiperadrenocorticismo podem causar deiscência de feridas cirúrgicas. A inibição
da proliferação fibroblástica e da síntese de colágeno ocasiona menor formação de tecido cicatricial.
Progesterona, estrógenos e andrógenos são hormônios adrenais sexuais. O excesso de secreção pode estar associado a neoplasia da zona reticulada. Manifestação de virilismo, desenvolvimento sexual precoce ou feminização depende de
qual esteroide é secretado em excesso, do sexo do indivíduo e da idade ao início da anormalidade. Ainda, há relato da síndrome hiperadrenocorticismo atípico em associação com a excessiva produção de esteroides sexuais adrenais. Os
sintomas são semelhantes àqueles da síndrome de Cushing, apesar de concentração normal ou reduzida de cortisol após o teste de provocação. Cães com esta síndrome têm alta concentração de um dos diversos esteroides adrenais, que
ocasionam os sinais clínicos. As opções de tratamento são semelhantes àquelas utilizadas na síndrome de Cushing.

 HIPERADRENOCORTICISMO (Síndrome de Cushing)
O  hiperadrenocorticismo  pode  ser  a  mais  frequente  endocrinopatia  de  cães  adultos  ou  idosos,  mas  é  infrequente  em  outros  animais  domésticos.  Os  sinais  clínicos  e  as  anormalidades  bioquímicas  resultam  principalmente  da  produção
excessiva crônica de cortisol. Concentrações séricas aumentadas de cortisol em cães podem resultar de diversos mecanismos. O mais comum é adenoma ou hiperplasia de células da hipófise que contêm hormônio adrenocorticotrófico
(ACTH) (parte distal ou parte intermediária), que resulta em hipertrofia ou hiperplasia adrenocortical bilateral. Essa forma da doença é denominada hiperadrenocorticismo hipófise­dependente (doença de Cushing) e ocorre em cerca de 90%
dos casos. Tumores funcionais da adrenal, uma causa muito menos frequente de hiperadrenocorticismo em cães, pode secretar cortisol ou esteroides sexuais, resultando em uma variedade de sinais clínicos. Muitos dos sinais clínicos e
anormalidades bioquímicas notados no hiperadrenocorticismo de ocorrência natural podem ser induzidos por longo período, pela administração diária de altas doses de corticosteroides. Os cães desenvolvem um espectro de sinais clínicos e
anormalidades laboratoriais como resultado da combinação de gliconeogênese, lipólise, catabolismo proteico e efeitos anti­inflamatórios dos hormônios glicocorticoides em muitos sistemas orgânicos. A doença é insidiosa e lentamente
progressiva (ver p. 599, para informações sobre sinais clínicos, anormalidades laboratoriais, diagnóstico e tratamento de hiperadrenocorticismo.)

 HIPOADRENOCORTICISMO (Doença de Addison)
A deficiência de hormônios da adrenocortical é muito comum em cães jovens e de meia­idade e, ocasionalmente, em equinos. A doença pode ser familiar em cães das raças Poodle padrão, West Highland White Terrier, Dogue Alemão,
Bearded  Colly,  cães  D’água  Português  e  em  várias  outras  raças.  A  causa  de  insuficiência  adrenocortical  primária  normalmente  é  desconhecida,  embora  muitos  casos  provavelmente  resultem  de  um  processo  autoimune.  Outras  causas
incluem destruição da glândula adrenal por doença granulomatosa, tumor metastático, hemorragia, infarto, agentes adrenolíticos (mitotano) ou inibidores de enzima da adrenal (trilostano).
ACHADOS CLÍNICOS:  Muitos dos distúrbios funcionais da insuficiência adrenal crônica não são altamente específicos; incluem episódios recidivantes de gastrenterite, perda da condição corporal lentamente progressiva e falha na resposta
apropriada  ao  estresse.  Embora  o  hipoadrenocorticismo  ocorra  em  cães  de  qualquer  raça,  sexo  ou  idade,  a  insuficiência  adrenocortical  idiopática  é  mais  comum  em  fêmeas  adultas  jovens.  Isso  pode  ser  relacionado  com  a  suspeita  de
patogênese imunomediada.
A redução na secreção de aldosterona, o principal mineralocorticoide, resulta em alterações marcantes das concentrações séricas de potássio, sódio e cloro. A excreção renal de potássio diminui e resulta em aumento progressivo da
concentração sérica de potássio. Hiponatremia e hipocloremia se devem à perda tubular renal. Hiperpotassemia grave pode resultar em bradicardia e ritmo cardíaco irregular, com alterações no ECG. Alguns cães desenvolvem intensa
bradicardia (frequência cardíaca (= 50 bpm) que predispõe à fraqueza ou colapso circulatório após mínimo esforço.
Embora  o  desenvolvimento  de  sinais  clínicos  frequentemente  não  seja  relatado,  frequentemente  notam­se  colapso  circulatório  agudo  e  evidência  de  insuficiência  renal.  A  diminuição  progressiva  do  volume  sanguíneo  contribui  para
hipotensão, fraqueza e microcardia. O aumento da excreção renal de água, devido à menor reabsorção de sódio e cloro, resulta em desidratação progressiva e hemoconcentração. Vômito, diarreia e anorexia são comuns e contribuem para o
agravamento do quadro clínico do animal. A perda de peso frequentemente é grave. Sinais clínicos semelhantes são vistos em gatos com hipoadrenocorticismo.
A produção reduzida de glicocorticoide resulta em distúrbios funcionais característicos graves. A menor gliconeogênese e a maior sensibilidade à insulina contribuem para o desenvolvimento de hipoglicemia moderada. Em alguns cães, a
hiperpigmentação da pele se deve à falha no feedback negativo da glândula hipófise e à maior liberação de ACTH. Em cães, há relato de doença de Addison atípica associada a hipocortisolemia e teores de eletrólitos normais. Os sinais
clínicos são similares àqueles notados em cães com insuficiência tanto de glicocorticoide quanto de mineralocorticoide.
Lesões: A anormalidade mais comum em cães é atrofia adrenocortical idiopática bilateral, na qual todas as camadas do córtex apresentam espessura acentuadamente reduzida. O córtex adrenal está reduzido a um décimo ou menos de sua
espessura normal e consiste principalmente da cápsula adrenal. A medula adrenal se encontra relativamente mais proeminente e, com a cápsula, representa a massa remanescente das glândulas adrenais.
Todas as três zonas do córtex adrenal estão envolvidas, inclusive a zona glomerulosa, que não está sob controle do ACTH; entretanto, nenhuma lesão hipofisária tem sido observada em cães com atrofia adrenocortical idiopática.
Uma lesão hipofisária destrutiva que reduz a secreção de ACTH é caracterizada por marcante atrofia das duas camadas corticais mais internas da glândula adrenal; a zona glomerulosa se mantém intacta.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo é baseado no histórico e nas anormalidades laboratoriais de suporte (embora inespecíficas), que incluem hiponatremia, hiperpotassemia, relação sódio:potássio < 25:1, azotemia, acidose discreta e
anemia normocítica normocrômica. Perda sanguínea GI grave também é relatada. Ocasionalmente, nota­se hipoglicemia leve. A hiperpotassemia resulta em alterações no ECG: aumento da onda T (em pico), achatamento ou ausência de
onda P, intervalo PR prolongado e alargamento do complexo QRS. Fibrilação ventricular ou assistolia pode ocorrer quando a concentração de potássio > 11 mEq/l.
O diagnóstico diferencial inclui doença primária do trato GI (especialmente ancilostomíase), insuficiência renal, pancreatite aguda e ingestão de toxinas. Para o diagnóstico definitivo, é necessária avaliação da função adrenal. Após se
obter uma amostra de sangue basal, administra­se ACTH (gel ou sintético). Preparações em gel são administradas por via IM e uma segunda amostra de sangue é obtida 2 h depois. Preparações sintéticas são administradas por via IM ou IV
e uma segunda amostra de sangue é obtida 1 h depois. Concentração de cortisol basal (em repouso) > 2,5 μg/dl efetivamente excluem o diagnóstico de hipoadrenocorticismo, enquanto valores < 2,5 μg/dl requerem a realização do teste de
estimulação com ACTH para confirmar o diagnóstico. Cães acometidos têm concentração basal de cortisol baixa e há discreta resposta à administração de ACTH, nos casos atípicos e clássicos. Este teste pode ser realizado na maioria dos
animais antes que seja instituída terapia de suplementação hormonal.
TRATAMENTO:   Uma  crise  adrenal  é  uma  emergência  médica  aguda.  Deve­se  colocar  um  cateter  IV  e  iniciar  a  aplicação  de  solução  salina  0,9%.  Se  o  cão  apresenta  hipoglicemia,  a  solução  salina  deve  incluir  dextrose  2,5  a  5%.  A
hipovolemia é corrigida rapidamente pela administração de solução salina 0,9% (60 a 70 ml/kg, nas primeiras 1 a 2 h). A produção de urina deve ser monitorado para determinar se o cão está se tornando anúrico. Fluidos devem ser
continuados, na taxa de aplicação apropriada para repor as perdas concomitantes, até que os sinais clínicos e as anormalidades laboratoriais se resolvam.
Succinato sódico de prednisolona (22 a 30 mg/kg) ou fosfato sódico de dexametasona (0,2 a 1,0 mg/kg) podem ser utilizados no controle inicial do choque. A dexametasona não interfere nas mensurações do cortisol durante o teste de
estimulação com ACTH. Prednisolona ou prednisona devem ser administradas na dose de 1 mg/kg, 2 vezes/dia, nos primeiros poucos dias de terapia e, então, 0,25 a 0,5 mg/kg/dia. A terapia de reposição de mineralocorticoides (ver a
seguir) também é iniciada para auxiliar na correção de desequilíbrio eletrolítico e hipovolemia. Teores de eletrólitos, função renal e glicemia devem ser monitorados regularmente para avaliar a resposta à terapia.
Nos casos de hiperpotassemia grave, não responsiva, pode­se administrar solução de glicose 10% em salina 0,9%, por 30 a 60 min, para aumentar a transferência de potássio para as células. A administração por via intramuscular de
insulina regular (0,25 a 1,0 U/kg) aumenta a absorção de glicose e potássio, mas deve ser administrar concomitantemente, por via IV, solução de glicose 10% (20 ml por unidade de insulina), para prevenir hipoglicemia.
Para terapia de manutenção prolongada, o mineralocorticoide pivalato de desoxicorticosterona (DOCP) é administrado na dose de 2,2 mg/kg IM ou SC, a cada 25 a 28 dias. Os eletrólitos devem ser mensurados 3 a 4 semanas após as
primeiras aplicações, para determinar a duração do efeito. Como alternativa, o acetato de fludrocortisona é administrado VO na dose de 10 a 30 μg/kg/dia. Eletrólitos séricos devem ser monitorados semanalmente até que a dose apropriada
seja determinada. Alguns cães (especialmente cães que recebem DOCP) também requerem, diariamente, terapia com glicocorticoide oral para controlar adequadamente os sinais clínicos. Doses de suplementação de prednisona (0,2 a 0,4
mg/kg/dia) são necessárias em cerca de 50% dos cães. Suplementação adicional com glicocorticoide pode ser necessária (2 a 5 vezes a manutenção) durante períodos de doença ou estresse. Cães com doença de Addison atípica apenas
necessitam doses de suplementação de prednisona, embora seja recomendado que os eletrólitos sejam monitorados a cada 3 meses, no primeiro ano após o diagnóstico. Cães com hipoadrenocorticismo crônico devem ser reexaminados a
cada 3 a 6 meses.
O tratamento de equinos com hipoadrenocorticismo é semelhante – reposição agressiva de fluidos, esteroides e glicose, se necessários na crise adrenal. Terapia de suporte e repouso são indicados no caso de doença de Addison crônica.

MEDULA ADRENAL
A medula adrenal, embora aparentemente não essencial à vida, tem importante papel na resposta ao estresse ou à hipoglicemia. Secreta epinefrina e norepinefrina, que aumentam o débito cardíaco, a pressão sanguínea e a glicose sanguínea
e diminuem a atividade do trato GI.
Feocromocitomas podem se desenvolver em animais domésticos, mais frequentemente em bovinos e cães. Eles secretam epinefrina, norepinefrina, ou ambas. Os sinais clínicos estão frequentemente ausentes e tumores podem ser achados
acidentais durante procedimentos para busca de outras condições ou por ocasião da necropsia.
Outros tumores adrenais, como neuroblastomas e ganglioneuromas, podem surgir nas células cromafins do sistema nervoso simpático.

GLÂNDULAS PARATIREOIDES E ANORMALIDADES NO METABOLISMO DE CÁLCIO
A  fisiologia  e  as  anormalidades  no  metabolismo  de  cálcio  e  fosfato,  a  função  da  vitamina  D  (a  qual  atua  mais  como  um  hormônio  do  que  como  uma  vitamina)  e  a  formação  dos  ossos  são  inter­relacionadas  em  um  sistema  comum,
juntamente com dois outros hormônios reguladores – paratormônio (PTH) e calcitonina. Portanto, PTH, calcitonina e vitamina D são discutidos nesse capítulo, juntamente com as anormalidades associadas à homeostase do cálcio.
Como as anormalidades no metabolismo de cálcio e fósforo refletem no sistema esquelético, nessa seção incluem­se síndromes específicas (ver p. 1121).

 ANORMALIDADES HIPOCALCÊMICAS EM EQUINOS
O hipoparatireoidimo primário é uma rara, mas bem documentada anormalidade de equinos. Os animais acometidos manifestam sinais clínicos compatíveis com hipocalcemia (ataxia, convulsões, hiperexcitabilidade, flúter diafragmático
sincrônico, taquicardia, taquipneia, fasciculação muscular e íleo adinâmico). Como em outras espécies, o diagnóstico é baseado na constatação de concentrações séricas baixas de cálcio e PTH, com alta concentração de fósforo. Como
mencionado anteriormente, o tratamento com cálcio intravenoso e posteriormente oral, combinado com altas doses de vitamina D, deve resultar na remissão dos sinais clínicos associados a hipoparatireoidismo.
Sepse é uma das causas mais comuns de hipocalcemia em equinos admitidos em hospitais veterinários. Hipocalcemia total e ionizada são comuns em equinos com doença GI grave e sepse. Hipocalcemia com concentração sérica de PTH
inapropriadamente  baixa  também  tem  sido  relatada  em  potros.  A  causa  primária  de  hipocalcemia  pode  ser  pesquisada  em  restos  mortais  de  potros.  Entretanto,  é  possível  que  esses  potros  tenham  alguma  forma  de  hipoparatireoidismo
associado a sepse.

 FISIOLOGIA DO CÁLCIO E HORMÔNIOS REGULADORES DE CÁLCIO
A concentração de cálcio no sangue de mamíferos é cerca de 10 mg/dl, com algumas variações devido à espécie (p. ex., acima de 13 mg/dl é normal em equinos e coelhos), idade, dieta e método analítico. No plasma ou no soro há três
frações de cálcio: 1) o cálcio ligado à proteína responde por cerca de 1/3 da concentração sérica de cálcio total. O cálcio ligado à proteína não pode se difundir através da membrana e, assim, não pode ser utilizado pelos tecidos; 2) o cálcio
ionizado ou livre é a forma fisiologicamente ativa que responde por 50 a 60% da concentração de cálcio total; e 3) cálcio complexado ou quelado é ligado ao fosfato, bicarbonato, sulfato, citrato e lactato e responde por cerca de 10% da
concentração de cálcio total.
O íon cálcio é um componente estrutural essencial do esqueleto e tem papel fundamental na contração muscular, coagulação do sangue, atividade enzimática, excitabilidade nervosa, mensageiros secundários, liberação de hormônios e
permeabilidade da membrana. O controle acurado do íon cálcio no fluido extracelular é vital à saúde. Três hormônios principais (PTH, vitamina D e calcitonina) interagem para manutenção de constante concentração de cálcio, apesar de
variações na ingestão e excreção. Outros hormônios, bem como corticosteroides da adrenal, estrógenos, tiroxina, somatotropina e glucagon podem, também, contribuir na manutenção da homeostase do cálcio.
PARATORMÔNIO:  O PTH é sintetizado e armazenado nas células principais das glândulas paratireoides. A síntese é regulada por um mecanismo de feedback que envolve o teor de cálcio no sangue (e, em menor grau, de magnésio). Além
disso, aminas biológicas, peptídios, esteroides e várias classes de medicamentos podem influenciar a secreção de PTH.
A principal função do PTH é controlar a concentração de cálcio no fluido extracelular, interferindo na taxa de transferência de cálcio para dentro e para fora do osso, na reabsorção renal e na absorção gastrintestinal do mineral. O efeito
nos  rins  é  o  mais  rápido,  causando  reabsorção  de  cálcio  e  excreção  de  fósforo.  O  principal  efeito  inicial  no  osso  é  mobilizar  o  cálcio  do  osso  para  o  fluido  extracelular;  mais  tarde,  a  formação  óssea  pode  ser  exacerbada.  O  PTH  não
influencia diretamente a absorção intestinal de cálcio. Esse efeito é mediado indiretamente pela regulação da síntese do metabólito ativo da vitamina D.
VITAMINA D:  O segundo principal hormônio envolvido no controle do metabolismo do cálcio e na remodelação óssea é a vitamina D, que inclui colecalciferol (vitamina D3), de origem animal, bem como ergocalciferol (vitamina D2), de

origem vegetal. A vitamina D tem sido, a longo tempo, considerada um ingrediente essencial da dieta, mas em várias espécies, inclusive ovinos, bovinos, equinos, suínos e humanos, a vitamina D pode ser formada na pele, a partir de um
metabólito do colesterol (7­deidrocolesterol), após exposição à luz ultravioleta. Por outro lado, cães e gatos não são capazes de sintetizar adequadamente vitamina D3 na pele e dependem principalmente da ingestão dietética.
A vitamina D deve ser metabolicamente ativada antes que possa atuas fisiologicamente. As ações biológicas da vitamina D dependem da hidroxilação no fígado e no rim para a forma biologicamente ativa 1,25­di–hidroxivitamina D
(calcitriol). Essa conversão nos rins é um passo taxa­limitante no metabolismo da vitamina D, sendo, em parte, responsável pelo atraso entre a administração de vitamina D e a expressão de seus efeitos biológicos. PTH e condições que
estimulam sua secreção, bem como hipofosfatemia, aumentam a formação de metabólito de vitamina D ativo. Alta concentração de fósforo circulante tem efeito oposto. Em certas condições, prolactina, estradiol, lactogênio placentário e,
possivelmente,  somatotropina,  têm  efeitos  similares.  O  aumento  da  secreção  desses  hormônios,  sozinho  ou  em  combinação,  parece  ser  importante  na  eficiente  adaptação  às  principais  demandas  de  cálcio  durante  prenhez,  lactação  e
crescimento.
CALCITONINA:  A calcitonina é um hormônio polipeptídio com 32 aminoácidos secretado pelas células parafoliculares (células C) da glândula tireoide, em mamíferos, e pelo tecido ultimobranquial, em aves e outras espécies não mamíferas.
A concentração do íon cálcio no fluido extracelular é o estimulo principal para secreção de calcitonina pelas células C. Na hipercalcemia, a taxa de secreção de calcitonina é aumentada acentuadamente pela rápida liberação do hormônio
armazenado  pelas  células  C  nos  capilares  interfoliculares.  A  hiperplasia  de  células  C  ocorre  em  resposta  à  hipercalcemia  crônica.  Quando  o  teor  sanguíneo  de  cálcio  está  baixo,  o  estímulo  para  secreção  de  calcitonina  diminui.  O
armazenamento de grande quantidade de hormônios pré­formados nas células C e a rápida liberação em resposta à elevação moderada de cálcio circulante provavelmente reflete a ação fisiológica de calcitonina como um hormônio de
“emergência” para proteger contra o desenvolvimento de hipercalcemia.
A calcitonina exerce seus efeitos pela interação com células­alvo, principalmente nos ossos e nos rins. As ações do PTH e da calcitonia são antagonistas na reabsorção óssea, mas sinérgica na decrescente reabsorção tubular renal de
fósforo. Os efeitos hipocalcêmicos da calcitonina resultam principalmente da menor transferência de cálcio dos ossos para o plasma, resultando em inibição temporária da reabsorção óssea estimulada pelo PTH. Hipofosfatemia se deve à
ação direta da calcitonina, que aumenta a taxa de transferência de fósforo para fora do plasma e para o interior de tecidos moles e ossos e inibe a reabsorção óssea estimulada pelo PTH e por outros fatores. Embora muitos efeitos tenham
sido atribuídos à calcitonina, em doses farmacológicas, há dúvida quanto sua relevância fisiológica. Fisiologicamente, a calcitonina tem, no máximo, uma influência mínima no controle da concentração sanguínea de cálcio. A concentração
de calcitonina circulante, nem cronicamente alta (p. ex., em animais com câncer de medular da tireoide) tampouco cronicamente baixa (p. ex., em animais após remoção cirúrgica da tireoide), resulta em qualquer alteração na concentração
sérica de cálcio.

 HIPERCALCEMIA EM CÃES E GATOS
A hipercalcemia pode ser tóxica para todos os tecidos do corpo, mas os principais efeitos deletérios ocorrem nos rins, no sistema nervoso e no sistema cardiovascular. O desenvolvimento de sinais clínicos de hipercalcemia depende da
magnitude da elevação do cálcio, quão rápido isso ocorre e sua duração. Concentração sérica de cálcio total (= 15 mg/dl pode não estar associada a sinais sistêmicos, mas concentração sérica > 18 mg/dl está frequentemente associada a
enfermidade grave com risco à vida. Polidipsia e poliúria são os sintomas mais comuns de hipercalcemia e resultam de uma habilidade prejudicada em concentrar urina e de estímulo direto do centro da sede. Também pode ocorrer anorexia,
vômito e constipação intestinal, como resultado da menor excitabilidade do músculo liso gastrintestinal. A diminuição da excitabilidade neuromuscular pode ocasionar fraqueza generalizada, depressão, contrações musculares e convulsões.
Há várias causas potenciais de hipercalcemia (Tabela 1). Em cães hipercalcêmicos, neoplasia (linfossarcoma) é a causa mais comum, seguida de hipoadrenocorticismo, hiperparatireoidismo primário e insuficiência renal crônica. Outras
causas de hipercalcemia em cães, em ordem aproximada de incidência na prática, são intoxicação por vitamina D, carcinoma de glândula apócrina de saco anal, mieloma múltiplo, carcinomas (pulmão, mama, nariz, pâncreas, timo, tireoide,
vagina e testículo) e, finalmente, algumas doenças granulomatosas (blastomicose, histoplasmose, esquistossomose). Aproximadamente 70% dos cães hipercalcêmicos também apresentam azotemia. Entretanto, azotemia é incomum em cães
com hiperparatireoidismo.
Em gatos, hipercalcemia idiopática parece ser a causa mais frequente de alta concentração de cálcio total, seguida de insuficiência renal e neoplasia maligna. Alta concentração de cálcio ionizado, juntamente com insuficiência renal
crônica, é mais comum em gatos do que em cães. Os tipos de tumores mais comumente associados a hipercalcemia de malignindade em gatos são linfoma e carcinoma de célula escamosa. Hiperparatireoidismo primário é notado em gatos,
mas não tão frequentemente quanto em cães. Raramente, constata­se hipercalcemia em gatos com hipertireoidismo.

Hipercalcemia Maligna
Neoplasia maligna é a causa mais comum de hipercalcemia persistente em cães; é uma causa comum em gatos. Na hipercalcemia de malignidade, a hipercalcemia se deve, principalmente, à maior reabsorção óssea osteoclástica, mas o
aumento da reabsorção tubular renal e da absorção intestinal também pode contribuir para hipercalcemia. Substâncias que podem ser produzidas pelos tumores e resultar em hipercalcemia humoral de malignidade incluem PTH, proteína
relacionada  com  o  PTH  (PTHrP),  fator  de  crescimento  transformador,  1,25­di­hidroxivitamina  D,  prostaglandina  E2,  fator  ativador  de  osteoclastos  e  outras  citocinas  (interleucina­1,  interleucina­2  e  interferona­gama).  Embora  vários
tumores tenham sido associados com hipercalcemia em pessoas, em cães a hipercalcemia associada à malignidade tem sido mais comumente relacionada com linfoma, adenocarcinoma de glândula apócrina do saco anal e mieloma múltiplo.
Outros tumores (timoma, carcinoma de célula escamosa, carcinoma nasal, hemangiossarcoma e adenocarcinoma indiferenciado) também foram associados a hipercalcemia em cães. Em gatos, hipercalcemia humoral de malignidade ocorre
menos frequentemente do que em cães, mas tem sido relatada com carcinoma de célula escamosa, mieloma múltiplo e doenças mieloproliferativas.
LINFOMA (LINFOSSARCOMA):  Tumor mais comumente associado a hipercalcemia em cães, o linfoma é também uma das neoplasias associadas a hipercalcemia em gatos. A patogênese da hipercalcemia pode envolver dois mecanismos
gerais. Um é a elaboração local de um fator osteolítico que induz reabsorção óssea e mobilização de cálcio, quando a medula óssea é infiltrada por células tumorais. A outra, provavelmente a mais importante, é a hipercalcemia humoral na
qual as células neoplásicas produzem um fator humoral que atua distante do tumor. Tem­se documentada evidência de secreção de uma substância humoral pelas células tumorais, maior reabsorção óssea, fosfatúria e excreção urinária de
adenosina monofosfato cíclica (cAMP) em cães com linfoma. As concentrações séricas de ambos, PTH e 1,25­di­hidroxivitamina D, geralmente são baixas nesses cães, mas um peptídio relacionado com o PTH (PTHrP) tem sido detectado
em cães com linfoma (Tabela 2).
Em cães com linfoma, 10 a 40% apresentam hipercalcemia concomitante e grande número desses casos também tem a forma mediastinal de linfoma. Embora, linfadenopatia detectável seja normalmente notada, hipercalcemia pode ser a
principal anormalidade notada. Pode ser necessário exame físico minucioso, juntamente com radiografias torácicas e abdominais, ultrassonografia abdominal, biópsia ou vários aspirados de linfonodos e múltiplos aspirados de medula óssea
para a definição do diagnóstico. Tratamento com glicocorticoide (p. ex., prednisona) diminui a concentração sérica de cálcio; entretanto, os esteroides são linfolíticos e dificultam a identificação do linfoma.
Tabela 1 – Causas de hipercalcemia em cães e gatos

Acromegalia
Adenocarcinoma de glândula apócrina

Carcinoma (célula escamosa, mamária, broncogênico, próstata, tireoide, cavidade nasal)
Insuficiência renal aguda e crônica

Artificial: lipemia pós­prandial, cão jovem (< 6 meses)
Doença granulomatosa

Neoplasias hematológicas malignas (osteólise de medula óssea)
Hipercalcemia humoral

Hipercalcemia de malignidade
Hipertireoidismo

Hipervitaminose D: iatrogênica, vegetais (Dama­da­noite), rodenticidas, creme contra psoríase

Hipoadrenocorticismo (doença de Addison)
Anormalidades iatrogênicas: excesso de cálcio ou de ligadores de fosfato de uso oral

Hipercalcemia idiopática de gatos
Erro laboratorial

Linfoma (linfossarcoma)
Neoplasia óssea primária ou metastática

Mieloma múltiplo
Doença mieloproliferativa (rara)

Hiperparatireoidismo primário
Lesões ósseas: osteomielite, osteodistrofia hipertrófica

Embora a taxa de remissão em cães com linfoma e hipercalcemia não seja estatisticamente diferente daquela quando não há hipercalcemia, a sobrevida é consideravelmente menor, indicando que o prognóstico de linfoma hipercalcêmico
é pior (ver p. 38 e p. 852).
ADENOCARCINOMA  DE  GLÂNDULA  APÓCRINA  DO  SACO  ANAL:   Esse  tumor  normalmente  ocorre  em  cães  mais  velhos,  machos  ou  fêmeas,  acompanhado  de  hipercalcemia  em  cerca  de  90%  dos  casos.  Mecanismos  humorais  são  os  mais
prováveis responsáveis pela hipercalcemia, pois uma proteína semelhante ao PTH foi identificada em tecido tumoral, em cães. Esse tumor geralmente é maligno e no momento do diagnóstico há metástase em linfonodos regionais. A
ressecção cirúrgica está associada a redução do teor sérico de cálcio. Falha ao remover todo o tumor ou recidiva do tumor normalmente resulta, novamente, em hipercalcemia. Apesar de extirpação cirúrgica, radiação e vários protocolos
quimioterápicos, normalmente ocorre recidiva do tumor dentro de poucos meses e o prognóstico é ruim.
MIELOMA MÚLTIPLO:  Em cães e gatos essa neoplasia maligna tem sido associada a hipercalcemia em 10 a 15% dos casos. É mais provável que a patogênese da hipercalcemia seja multifatorial. Células do mieloma são conhecidas por
produzir fator ativador de osteoclastos em humanos, fato que pode explicar, em parte, a hipercalcemia. A presença de extensa lise óssea pode também contribuir no aumento de cálcio sérico. Embora a concentração sérica de proteína
geralmente esteja elevada no mieloma múltiplo, o aumento do teor de proteína ligada ao cálcio raramente contribui para a hipercalcemia. O tratamento de mieloma múltiplo com quimioterapia tem sido associado a sobrevida prolongada,
mas a presença de hipercalcemia associada, proteinúria de cadeia leve e extensas lesões ósseas estão associadas a sobrevida menor.

Hiperparatireoidismo Primário
O hiperparatireoidismo primário resulta de excessiva secreção de PTH por um ou mais glândulas paratireoides anormais (geralmente neoplásicas). É relativamente raro em cães e gatos. A persistência de hipercalcemia é característica. O
adenoma solitário da glândula paratireoide interna ou externa, é a causa mais comum de hiperparatireoidismo primário, embora o carcinoma de paratireoide tenha sido infrequentemente relatado. Hiperplasia de um ou de todas as quatro
glândulas paratireoides tem sido descrita, mas é muito rara.
ACHADOS CLÍNICOS:  Polidipsia, poliúria, anorexia, letargia e depressão são os sintomas mais comuns, porém muitos animais com grau mais discreto de hipercalcemia podem ser assintomáticos. Constipação intestinal, fraqueza, tremores,
contrações musculares, vômito, andar rígido e edema facial são menos frequentemente relatados.
DIAGNÓSTICO:   Hipercalcemia,  concentração  sérica  de  fósforo  normal  ou  diminuída  e  baixa  densidade  específica  urinária  são  os  achados  mais  consistentes.  Azotemia  comumente  se  desenvolve  como  consequência  de  hipercalcemia
moderada a grave. Em animais hipercalcêmicos com função renal ainda relativamente normal (com concentrações séricas de creatinina e nitrogênio ureico normais), a determinação da concentração sérica de PTH é útil no diagnóstico. A
constatação  de  concentração  sérica  de  PTH  no  limite  superior  de  normalidade  ou  alta  em  animais  hipercalcêmicos  com  função  renal  normal  é  compatível  com  hiperparatireoidismo  primário,  enquanto  concentração  de  PTH  baixa  é
consistente com hipercalcemia de malignidade. Ultrassonografia das glândulas paratireoides é uma técnica de diagnóstico útil, mas requer uma unidade de ultrassom com transdutor de frequência gama alta, na faixa de 7,5 MHz a 10 MHz,
para a resolução necessária. As glândulas da paratireoide normais nem sempre são visualizadas no exame ultrassonográfico, mas a hipertrofia de paratireoide aparecem como estruturas arredondadas hiperecoicas ou anecoicas, associadas à
glândula tireoide. O achado de uma glândula paratireoide solitária no paciente hipercalcêmico sustenta o diagnóstico de hiperparatireoidismo primário, enquanto a constatação de múltiplas glândulas paratireoides hipertrofiadas é compatível
com  hiperparatireoidismo  secundário.  Ultrassonografia  não  permite  distinguir  um  adenoma  de  paratireoide  de  um  adenocarcinoma.  Cirurgia  exploratória  da  região  cervical  é  uma  alternativa  diagnóstica  se  nenhuma  outra  causa  de
hipercalcemia pode ser identificada.
TRATAMENTO:  O procedimento mais efetivo e apropriado no tratamento do paciente é a exploração cirúrgica do pescoço e remoção do tecido de paratireoide anormal. Ablação química (etanol) ou pelo calor da paratireoide guiada por
ultrassonografia percutânea tem sido utilizada e pode ser uma alternativa factível à cirurgia, em alguns casos. Tentativas para diminuir a concentração sérica de cálcio com fluidoterapia IV (com solução salina) e furosemida antes da cirurgia
ou ablação podem ser benéficas (ver p. 610). Não há tratamento medicamentoso para hiperparatireoidismo primário, embora possa ser realizado tratamento para hipercalcemia quando a cirurgia é rejeitada.

Hipercalcemia Associada ao Hipoadrenocorticismo
Hipercalcemia discreta (= 15 mg/dl) tem sido relatada em até 30% dos cães com hipoadrenocorticismo (doença de Addison). Múltiplos fatores podem resultar em hipercalcemia, inclusive o aumento de citrato de cálcio (cálcio complexado),
hemoconcentração (aumento relativo), maior reabsorção renal de cálcio e maior afinidade de proteínas séricas pelo cálcio. Embora a concentração sérica de cálcio total possa estar aumentada, a fração ionizada geralmente é normal. A
hipercalcemia regride rapidamente com o tratamento bem­sucedido do hipoadrenocorticismo.

Insuficiência Renal
Em gatos, insuficiência renal crônica (normalmente associada a nefrite intersticial crônica) parece ser a causa mais comum de hipercalcemia. A patogenia da hipercalcemia é desconhecida, mas a concentração de cálcio ionizado permanece
normal. Em cães, a insuficiência renal causada por doença renal familiar é mais frequentemente associada a hipercalcemia do que outras formas de insuficiência renal crônica. A hipercalcemia pode também estar presente na insuficiência
renal aguda durante a fase poliúrica, mas isso é raro.

Hipercalcemia Idiopática dos Gatos
Uma síndrome em gatos de idade jovem a meia­idade, com primeiro relato no início dos anos 1990, envolve hipercalcemia sem explicação óbvia. O teor sérico de cálcio total se mantém elevado por meses a 1 ano, frequentemente sem
sinais clínicos evidentes. A concentração de cálcio ionizado se eleva, às vezes desproporcionalmente ao aumento do teor sérico de cálcio total. Gatos de pelos longos podem ser mais sujeitos a essa síndrome. Muitos não são azotêmicos no
diagnóstico inicial, mas podem desenvolver azotemia mais tarde. A concentração de PTH situa­se na faixa de normalidade, PTHrP não é detectável e as concentrações de 25­(OH)–D e calcitriol encontram­se dentro dos limites normais.
Raramente indica­se tratamento intensivo da hipercalcemia idiopática, pois a hipercalcemia se instala gradualmente e demora um tempo relativamente longo; ademais, geralmente não se constatam sinais clínicos marcantes. A maioria dos
gatos pode ser tratada no próprio domicílio, mediante mudança da dieta, sozinha ou combinada com terapia medicamentosa.
Alguns relatos indicam que aumento do teor de fibra da dieta está relacionado com a diminuição do cálcio sérico em gatos acometidos. A administração de prednisona resulta em diminuição de longa duração nas concentrações de cálcio
ionizado e total, em alguns gatos.
Quando a modificação da dieta e o uso de prednisolona não são efetivos, deve­se utilizar bisfosfonatos. Alguns gatos foram tratados com sucesso com 10 mg de alendronato VO, 1 vez/semana, por até 1 ano. Esofagite erosiva é um
conhecido efeito colateral do uso oral de bisfosfonatos em pacientes humanos. Embora o risco de desenvolvimento de esofagite em gatos seja desconhecido, o proprietário pode fornecer 5 a 6 ml de água ao gato, por meio de uma seringa
dosadora,  imediatamente  após  a  administração  de  alendronato;  pequena  quantidade  de  manteiga  aplicada  nos  lábios  do  gato  pode  estimular  lambidas  e  salivação,  propiciando  a  passagem  do  comprimido  ao  estômago.  Atualmente  são
desconhecidas a segurança e a eficácia do uso oral de bisfosfonatos por longo tempo, em gatos.
LESÕES OSTEOLÍTICAS
Hipercalcemia decorrente de invasão tumoral ou metástase ao osso é uma ocorrência muito rara em animais. Tumores ósseos primários (p. ex., osteossarcoma) e células neoplásicas na medula óssea (p. ex., mieloma múltipla) podem,
ocasionalmente,  provocar  hipercalcemia.  Os  mecanismos  pelos  quais  a  neoplasia  óssea  pode  ocasionar  hipercalcemia  incluem  destruição  mecânica  por  infiltração  celular  (como  acontece  em  tumores  metastáticos  e  osteossarcoma)  e
produção local do fator ativador de osteoclastos (como ocorre no mieloma múltiplo). Osteomielites bacteriana e micótica podem também, ocasionalmente, causar hipercalcemia. A hipercalcemia pode resultar de lise óssea direta ou pode ser
mediada por fatores de reabsorção óssea (p. ex., prostraglandinas, fator ativador de osteoclastos).

Outras Causas de Hipercalcemia
HIPERVITAMINOSE D:  A  intoxicação  por  vitamina  D  refere­se  aos  efeitos  da  ingestão  excessiva  de  metabólitos  bioativos  de  vitamina  D.  A  intoxicação  causada  por  ergocalciferol  (vitamina  D2)  ou  colecalciferol  (vitamina  D3) pode ser

decorrência  de  suplementação  excessiva  na  dieta  (mais  comum  em  cães  jovens  em  faz  de  crescimento)  para  tratamento  de  hipoparatireoidismo  primário.  Ambas  as  formas  de  vitamina  D  tem  início  lento  de  ação  e  efeito  prolongado,
tornando difícil estabelecer a dose adequada. O tratamento envolve a interrupção do suplemento ou a diminuição da dose de vitamina D. A intoxicação causada por calcitriol (1,25­di­hidroxivitamina D), a forma mais ativa de vitamina D,
mais comumente ocorre após tratamento de hipoparatireoidismo primário. O calcitriol é também o ingrediente ativo em alguns rodenticidas, mas esses produtos não são mais amplamente disponíveis, pelo menos nos EUA.
Em cães, uma causa recente de intoxicação por vitamina D é a ingestão do análogo do calcitriol, calcipotrieno (também denominado tacalcitol), utilizado em preparação tópica para tratamento de psoríase humana. Em cães, a intoxicação
por calcipotrieno pode resultar em calcificação metastática grave no trato GI, rins e outros tecidos; a doença comumente é fatal.
PLANTAS  DOMÉSTICAS:   Algumas  plantas  domésticas  (p.  ex.,  Cestrum  diurnum  [Dama–da­noite],  Solanum  malacoxylon,  Triestum  flavescens)  podem  conter  uma  substância  similar  à  vitamina  D  que,  quando  ingeridas,  podem  causar
hipercalcemia.
DOENÇA  GRANULOMATOSA:   A  hipercalcemia  associada  a  doença  granulomatosa  surge  de  uma  alteração  no  metabolismo  de  vitamina  D  endógena.  Os  macrófagos  ativados  em  resposta  à  inflamação  granulomatosa  por  desenvolver  a
habilidade de transformar precursores de vitamina D em forma ativa de vitamina D (p. ex., calcitriol), de uma forma não controlada. Alteração similar do metabolismo da vitamina D em pessoas pode explicar a hipercalcemia que ocorre no
linfoma não Hodgkin, no linfoma de Hodgkin e na granulomatose linfomatoide.
Em  animais  de  companhia,  hipercalcemia  relacionada  com  a  doença  granulomatosa  tem  sido  relatada  em  casos  de  histoplasmose  disseminada,  blastomicose,  coccidiomicose,  tuberculose  e  esquistossomose.  Em  animais  com
hipercalcemia relacionada com a doença granulomatosa espera­se alta concentração sérica de cálcio ionizado e baixo teor de PTH. Com o tratamento (p. ex., medicamentos antifúngicos e remoção cirúrgica) a concentração sérica de cálcio
retorna ao normal.

Testes de Diagnóstico
O primeiro passo na investigação de hipercalcemia é descartar a possibilidade de teste com resultado falso. O ideal é obter uma amostra após jejum, pois amostras lipêmicas ou hemolisadas podem elevar artificialmente a concentração
sérica de cálcio total, quando se utiliza analisador colorimétrico.
Se a hipercalcemia se repete, deve­se mensurar o cálcio ionizado, pois representa a forma biologicamente ativa do cálcio. Cálcio total ou cálcio total ajustado é uma mensuração confiável do estado de cálcio.
Em alguns animais com hipercalcemia ionizada persistente, a identificação da causa é óbvia após análise das informações do histórico (exposição à vitamina D, medicamentos, ingestão de plantas domésticas) e dos achados de exame
físico (tumor, organomegalia, câncer ou doença granulomatosa). Em outros animais, a causa não é óbvia e podem ser necessárias hematologia, bioquímica sérica, imagem de cavidade corporal, citologia e histopatologia. Em muitos animais,
o uso de exames especializados, inclusive mensuração de PTH, PTHrP e/ou vitamina D, é necessário para confirmar o diagnóstico.
Se há linfadenopatia, deve­se realizar aspirado ou biópsia do linfonodo para pesquisa de linfossarcoma. Se um tumor de saco anal é encontrado, deve­se tentar sua remoção cirúrgica. Qualquer outra neoplasia deve ser tratada por meio de
remoção cirúrgica, quimioterapia ou radioterapia. Problemas podem surgir quando a hipercalcemia é complicada por insuficiência renal ou quando há suspeita de hiperparatireoidismo primário ou neoplasia maligna oculta. Nesses casos, a
causa de hipercalcemia pode não ser óbvia e devem ser realizados exames adicionais para diferenciação entre hiperparatireoidismo primário e tumor oculto que causa hipercalcemia.
CÁLCIO IONIZADO:  Como a fração de cálcio ionizado é a forma biologicamente ativa e o componente que regula a produção de PTH, a mensuração da concentração do cálcio ionizado é o primeiro passo na avaliação de anormalidades do
metabolismo de cálcio. Se o teor de cálcio ionizado está normal, ainda que o cálcio total esteja elevado, não se justifica outros testes diagnósticos. Se o cálcio ionizado é elevado, então devem­se determinar as concentrações de PTH e
PTHrP se não há causa óbvia de hipercalcemia.
Em vários casos de hipercalcemia ou hipocalcemia, as concentrações de cálcio total e cálcio ionizado são altamente correlacionadas (Tabela 2). Entretanto, em alguns casos o teor de cálcio total não reflete a concentração de cálcio
ionizado. Em cães com insuficiência renal, o cálcio total é alto, mas o cálcio ionizado é normal ou surpreendentemente baixo. Nessa situação, elevação do cálcio total parece refletir a maior quantidade de cálcio complexado a ânions, uma
condição não detectada pela determinação da concentração de cálcio ajustada com base no teor de albumina.
Cálcio ionizado é mensurado no soro ou no plasma heparinizado em um analisador que utiliza um eletrodo específico para cálcio. O teor sérico de cálcio ionizado pode estar falsamente elevado quando a amostra é coletada em tubo com
separador de soro. Há mensuração simultânea de pH, o qual influencia a ligação do cálcio à proteína, de modo inversamente proporcional. Aumento do pH é acompanhado de diminuição no teor de cálcio ionizado. As amostras de soro
coletadas e manuseadas em condições anaeróbicas fornecem o melhor resultado na dosagem de cálcio ionizado. As amostras coletadas em tubo com EDTA são inadequadas porque este anticoagulante se liga ao cálcio ionizado disponível.
PARATORMÔNIO:  A dosagem de paratormônio (PTH) é a próxima etapa na avaliação de anormalidades do metabolismo do cálcio, assim que hipercalcemia é confirmada pela mensuração da concentração de cálcio ionizado. A avaliação do
PTH pode revelar se as glândulas paratireoides estão respondendo apropriadamente à alteração da concentração de cálcio ou se uma inapropriada produção de PTH é a causa da enfermidade. Se o metabolismo do cálcio é normal, pequenos
aumentos de cálcio ionizado inibem a secreção de PTH e pequenas diminuições de cálcio ionizado ocasionam imediata liberação de PTH.
As determinações de PTH no plasma e no soro são muito úteis na avaliação da hipercalcemia em cães e gatos. Animais com hiperparatireoidismo primário devem ter concentração de PTH normal/moderada à alta, enquanto aqueles com
outras formas de hipercalcemia apresentam baixa concentração de PTH (Tabela 2).
PROTEÍNA  RELACIONADA  COM  O  PARATORMÔNIO  (PTHRP):   A  hipercalcemia  associada  a  neoplasia,  que  não  seja  da  paratireoide,  é  frequentemente  causada  pela  produção  de  um  fator  humoral,  PTHrP,  que  tem  atividade  semelhante  ao
paratormônio. Desde sua descoberta nos anos 1980, a PTHrP tem sido associada a uma variedade de tumores que causam hipercalcemia de malignidade em pessoas.
O teste de PTHrP pode ser utilizado para confirmar o diagnóstico de hipercalcemia de malignidade (Tabela 2). Há prevalência relativamente alta de resultados positivos em cães com adenocarcinoma de glândula apócrina do saco anal,
linfoma ou outros tumores. Entretanto, hipercalcemia humoral de malignidade sempre permanece como um diagnóstico diferencial em um cão hipercalcêmico com PTH baixo e teste de PTHrP normal ou negativo. Em gatos, PTHrP alto é,
também, compatível com hipercalcemia humoral de malignidade, especialmente em gatos com carcinoma.
METABOLISMO DA VITAMINA D (CALCIDIOL E CALTRIOL):  Como os metabólitos de vitamina D são quimicamente idênticos em todas as espécies, o radioimunoensaio desenvolvido para uso em humanos é satisfatório para a mensuração da
vitamina em animais. A concentração de calcidiol (25­OH­vitamina D) é um bom indicador de ingestão vitamina D e pode ser utilizada no diagnóstico de hipervitmainose D.
Os metabólitos de vitamina D resultantes da ingestão de colecalciferol presente em rodenticidas podem ser mensurados com o teste de calcidiol. A intoxicação pela ingestão de colecalciferol ou ergocalciferol é detectada pela elevação do
teor de calcidiol, que pode persistir semanas após a exposição. Teste de calcidiol também pode ser utilizado para confirmar intoxicação por ingestão de rodenticidas que contêm vitamina D3 como ingrediente ativo.
Calcipotrieno, o análogo da vitamina D encontrado em creme para tratamento de psoríase, não é mensurado pelo teste do calcidiol, mas é detectado no teste de calcitriol. Infelizmente, o teste de calcitriol não está amplamente disponível
para o uso clínico.
Na Tabela 2 há um resumo dos valores esperados para PTH, cálcio ionizado e PTHrP em várias enfermidades que causam hipercalcemia. Geralmente, a concentração de PTH é normal à alta nos casos de hiperparatireoidismo primário,
secundário e terciário. A concentração de PTH é baixa com outras causas de hipercalcemia (p. ex., hipervitaminose D, neoplasia maligna, insuficiência renal, hipoadrenocorticismo).

Tratamento
Um grau discreto de hipercalcemia pode não ser imediatamente perigoso e há tempo para estabelecer um diagnóstico definitivo antes de iniciar o tratamento. Em animais com sinais clínicos graves associados à hipercalcemia, o diagnóstico
e  os  esforços  terapêuticos  podem  ser  instituídos  simultaneamente.  Nenhum  protocolo  de  tratamento  é  consistentemente  efetivo  para  todas  as  causas  de  hipercalcemia;  cada  paciente  deve  ser  tratado  individualmente  e  a  causa  de
hipercalcemia deve ser determinada. O tratamento definitivo da hipercalcemia implica no tratamento ou remoção da causa primária. Infelizmente, a etiologia pode não ser evidente e medidas de suporte dever ser tomadas para diminuir a
concentração sérica de cálcio. O objetivo do tratamento de suporte é aumentar a excreção urinária de cálcio e prevenir a reabsorção de cálcio dos ossos.
TERAPIA COM FLUIDO:  A expansão de volume com solução salina 0,9%, cerca de 100 a 125 ml/kg/dia IV, reduz a hemoconcentração e aumenta a excreção renal de cálcio por elevar a taxa de filtração glomerular e de excreção de sódio, o
que resulta em menor reabsorção de cálcio.
DIURÉTICOS:  Diuréticos de alça, como furosemida (2 a 4 mg/kg, 2 ou 3 vezes/dia), aumenta a excreção renal de cálcio; entretanto, podem ser necessárias altas doses. Se há desidratação, deve­se instituir primeiramente a fluidoterapia porque
a redução de volume e a hemoconcentração adicional podem agravar a hipercalcemia. Diuréticos tiazidas são contraindicados na hipercalcemia porque diminuem a excreção renal de cálcio e agravam a hipercalcemia.
GLICOCORTICOIDES:   Glicocorticoides,  como  prednisona  (1  a  2  mg/kg,  2  vezes/dia)  ou  dexametasona  (0,1  a  0,2  mg,  2  vezes/dia),  representam  uma  segunda  linha  de  tratamento  para  hipercalcemia  que  não  responde  adequadamente  à
aplicação de fluidos IV e furosemida. Reduzem a reabsorção óssea de cálcio e a absorção intestinal de cálcio, aumentam a excreção renal de cálcio e são citotóxicos a linfócitos malignos, ocasionando substancial redução na concentração
sérica de cálcio em animais com hipercalcemia secundária a linfoma, mieloma, hipervitaminose D, doença granulomatosa e hipoadrenocorticismo. Entretanto, a utilização de glicocorticoide pode dificultar o diagnóstico definitivo da causa
primária de hipercalcemia. Isso é especialmente verdadeiro no linfossarcoma porque os esteroides são linfocíticos e podem alterar a arquitetura do linfonodo e o padrão de infiltração de linfócitos na medula óssea.

Tabela 2 – Anormalidades laboratoriais características associadas a causas comuns de hipercalcemia

Diagnóstico Cálcio Total Cálcio Ionizado PTH Intacto 1,25­OH2 Vitamina D Fósforo Proteína relacionada com o PTH

Hiperparatireoidismo primário Aumentado Aumentado Normal ou aumentado Normal Normal ou diminuído Negativo


Hipercalcemia maligna Aumentado Aumentado Diminuído ou no limite inferior de normalidade Diminuído ou normal Normal ou diminuído Positivo (às vezes)

Hipoadrenocorticismo (doença de Addison) Diminuído, normal ou aumentado Normal Normal Normal Normal ou aumentado Negativo

Insuficiência renal crônica Diminuído, normal ou aumentado Normal a baixo Normal a aumentado Diminuído ou normal Aumentado Negativo

Hipervitaminose D (calcitriol ou análogo do calcitriol) Aumentado Aumentado Diminuído ou no limite inferior de normalidade Diminuído ou normal Normal ou aumentado Negativo

Hipervitaminose D (intoxicação por vitamina D2 ou D3) Aumentado Aumentado Diminuído ou no limite inferior de normalidade Aumentado Normal ou aumentado Negativo

Doença granulomatosa Aumentado Aumentado Diminuído ou no limite inferior de normalidade Diminuído ou normal Normal ou aumentado Negativo

Hipercalcemia idiopática dos gatos Aumentado Aumentado Normal Normal Normal Negativo

AGENTES DIVERSOS:  A terceira linha de tratamento é a adição de bisfosfonato, mitramicina ou calcitonina, para melhor controle de hipercalcemia crônica. Bisfosfonatos contribuem na diminuição do teor sérico de cálcio por reduzir o
número e a ação de osteoclastos. Pamidronato é o medicamento de uso parenteral mais comumente utilizado; em cães, a dose recomendada é 1 a 2 mg/kg IV, misturado à solução salina 0,9%, aplicado ao longo de 2 h. Em gatos, alendronato
é o medicamento de uso oral mais comumente utilizado para controlar hipercalcemia idiopática. Hidratação adequada é essencial quando o tratamento com bisfosfonatos em combinação com essas drogas pode causar nefrotoxicidade,
especialmente em altas doses. A dose pode se repetida após 3 a 4 semanas, se necessário.
Mitramicina, um inibidor da síntese de RNA em osteoclastos, é um medicamento efetivo no tratamento de hipercalcemia; a dose é 25 μg/kg, IV, ao longo de 4 a 6 h. Dose única geralmente é efetiva na normalização da concentração
sérica de cálcio; seu efeito dura poucos dias a várias semanas. Reações adversas podem incluir trombocitopenia, nefrotocidade e hepatotoxicidade, mas são improváveis após uma única dose. Entretanto, esse medicamento deve ser utilizado
com extremo cuidado.
Calcitonina impede a reabsorção óssea por inibir a atividade e a formação de osteoclastos. A dose de calcitonia é 4 a 8 U/kg SC, 2 a 3 vezes/dia. A calcitonina é o agente hipocalcêmico de ação mais rápida, causando diminuição do cálcio
sérico dentro de poucas horas após sua administração. Seus efeitos são bastante transitórios, contudo, a redução máxima do teor de cálcio não é tão intensa quanto aquela notada com o uso de bisfosfonato ou mitramicina.
Calcimiméticos, uma nova classe de medicamentos, são agonistas de receptores sensíveis ao cálcio. A droga dessa classe mais comumente utilizada é a cinacalcete. Pela interação com os receptores sensoriais de cálcio nas glândulas
paratireoides,  esses  medicamentos  reduzem  a  secreção  de  PTH  e  podem,  efetivamente,  suprimir  o  PTH  circulante  em  todas  as  formas  de  hiperparatireoidismo.  Têm­se  tornado  a  principal  terapia  para  hiperparatireoidismo  secundário
associado a insuficiência renal, bem como para tratamento de hiperparatireoidismo primário, em alguns pacientes.

 HIPERCALCEMIA EM EQUINOS
Como acontece em cães e gatos, os equinos podem desenvolver hipercalcemia devido a várias anormalidades, inclusive insuficiência renal crônica, intoxicação por vitamina D e hiperparatireoidismo primário. A causa mais comum de
hipercalcemia em equinos é insuficiência renal crônica. Em equinos, os rins são importantes na excreção de cálcio; portanto, uma excreção renal de cálcio comprometida associada à absorção intestinal normal de cálcio pode explicar a
hipercalcemia notada em equinos.
Hipercalcemia humoral de malignidade tem sido relatada em associação com carcinoma de célula escamosa gástrica, carcinoma adrenocortical, carcinoma de célula escamosa da vulva, linfossarcoma e ameloblastoma. Esses equinos têm
hipercalcemia, hipofosfatemia, aumento da concentração sérica de PTHrP e diminuição de concentração sérica de PTH.
Intoxicação por ergocalciferol ou colecalciferol tem sido relatada em equinos. Ingestão de plantas contendo compostos semelhantes a 1,25(OH)2D (Solanun malacoxylon, S. sodomaeum, Cestrum diurnum, Trisetum flavescens) causam
sinais clínicos típicos de intoxicação por vitamina D, inclusive hipercalcemia.
Hiperparatireoidismo primário é uma anormalidade rara em pôneis e equinos. À semelhança do que ocorre em cães e gatos, hipercalcemia, hipofosfatemia e alta concentração sérica de PTH são relatadas em equinos com a enfermidade.
Testes adicionais para excluir outras condições associadas à hipercalcemia podem incluir mensuração de PTHrP e de metabólitos da vitamina D.
Como acontece em outras espécies, o tratamento definitivo do equino hipercalcêmico implica na terapia ou remoção da causa primária. Infelizmente, a etiologia pode não ser facilmente perceptível e, às vezes, devem ser empregadas
medidas de suporte (p. ex., terapia com fluido, diuréticos e/ou glicocorticoides) para melhorar a excreção urinária de cálcio e diminuir a concentração sérica de cálcio.

 HIPOCALCEMIA EM CÃES E GATOS
A hipocalcemia causa as principais manifestações clínicas de hipoparatireoidismo por aumentar a excitabilidade de ambos os sistemas, nervoso central e nervoso periférico. Sintomas neuromusculares periféricos classicamente incluem
tremores musculares, contrações musculares e tetania. Convulsões generalizadas, assemelhando­se àquelas de crise epiléptica idiopática, são as manifestações de SNC predominantes no hipoparatireoidismo.

Hipoparatireoidismo
O hipoparatireoidismo é uma anormalidade metabólica caracterizada por hipocalcemia e hiperfosfatemia, bem como deficiência transitória ou permanente de PTH. A doença espontânea é incomum em cães e raramente relatada em gatos.
Lesão iatrogênica ou remoção das glândulas paratireoides durante tireoidectomia para tratamento de hipertireoidismo é a causa mais comum, em gatos. Pode ocorrer hipoparatireoidismo secundário no pós­operatório de paratireoidectomia
para tratamento de tumor de paratireoide, devido à atrofia das glândulas remanescentes, em cães e gatos.
DIAGNÓSTICO:  O  diagnóstico  é  baseado  no  histórico,  nos  sinais  clínicos,  na  evidência  laboratorial  de  hipocalcemia  e  hiperfosfatemia  e  na  exclusão  de  outras  causas  de  hipocalcemia  (p.  ex.,  hipoproteinemia,  má  absorção,  pancreatite,
insuficiência renal). Na suspeita de hipoparatireoidismo idiopático, esse deve ser confirmado por exame histológico das glândulas paratireoides e documentação de atrofia ou destruição da paratireoide. Como as glândulas paratireoides não
são macroscopicamente evidentes em animais com hipoparatireoidismo, deve­se realizar tireoidectomia unilateral para assegurar que seja examinada amostra adequada de tecido da paratireoide. A determinação da concentração sérica de
PTH pode ser importante no diagnóstico de hipoparatireoidismo idiopático e, assim, é possível eliminar a necessidade de cirurgia exploratória cervical e exame histológico.
TRATAMENTO:  O  tratamento  objetiva  restabelecer  a  concentração  sérica  de  cálcio  ao  limite  inferior  da  faixa  normal.  Esse  deve  incluir  suplementos  de  cálcio  e  vitamina  D  para  ambas  as  formas  de  hipoparatireoidismo,  iatrogênica  e
idiopática. Se há hipocalcemia com tetania ou convulsões, deve­se administrar imediatamente cálcio por via IV. Para manutenção da normocalcemia, deve­se fornecer cálcio oral, juntamente com vitamina D.
A principal complicação associada ao tratamento de hipoparatireoidismo é hipercalcemia, que se instala como consequência de tratamento excessivo com cálcio e vitamina D. Se isso acontece, a terapia com cálcio e vitamina D deve ser
temporariamente  interrompida;  solução  salina  e  furosemia  devem  ser  administradas  se  a  hipercalcemia  é  grave  (ver  p.  610).  No  hipoparatireoidismo  idiopático  é  necessário  tratamento  prolongado  com  vitamina  D  (com  ou  sem
suplementação de cálcio). Por outro lado, no hipoparatireoidismo iatrogênico, pode ocorrer recuperação espontânea da função da paratireoide ou acomodação do mecanismo de regulação do cálcio na ausência de PTH semanas a meses após
a cirurgia.

Outras Causas de Hipocalcemia
DOENÇA RENAL:  A insuficiência renal crônica é, provavelmente, a principal e mais frequente causa de hipocalcemia. Azotemia e hiperfosfatemia resultam da diminuição da taxa de filtração glomerular. Os mecanismos de hipocalcemia
incluem menor reabsorção tubular renal de cálcio, hiperfosfatemia, menor síntese de 1,25­di­hidroxivitamina D, hipoalbuminemia e quelação de cálcio por oxalato. Ocorre hiperplasia da glândula paratireoide para manter o cálcio sérico em
valor  normal.  Alta  concentração  de  PTH  resultam  em  maior  reabsorção  óssea.  Contudo,  hipocalcemia  associada  à  insuficiência  renal  raramente  é  de  relevância  clínica  (p.  ex.,  não  há  tremor  muscular,  contração  muscular,  tetania  ou
convulsão). Além disso, muitos animais com insuficiência renal crônica têm concentração sérica de cálcio normal. O tratamento deve objetivar a redução na concentração sérica de fósforo mediante a restrição do mineral e de ligadores de
fósforo intestinais na dieta (ver p. 1646).
HIPOPROTEINEMIA:  Animais com hipoalbuminemia podem ser hipocalcêmicos devido à diminuição na fração ligante da proteína ao cálcio, mas a fração de cálcio ionizado pode permanecer normal. Geralmente não se constatam sinais
clínicos de hipocalcemia. A magnitude da hipocalcemia comumente é discreta.
PANCREATITE:  Hipocalcemia, quando ocorre em animais com pancreatite (ver p. 495), geralmente é discreta e subclínica. O mecanismo exato é desconhecido, mas uma teoria comumente aceita é que o cálcio é precipitado na forma de
detergente insolúvel pela saponificação de ácidos graxos peripancreáticos subsequentemente formados para liberar a enzima pancreática lipase. Trabalho mais recente sugere que a hipocalcemia pode ser decorrência de um desvio de cálcio
para os tecidos moles, especialmente músculos.
TETANIA PUERPERAL:  A tetania puerperal (ver p. 1056) é uma doença aguda, com risco à vida, causada pela redução extrema na concentração de cálcio circulante em cadelas ou gatas lactantes. Hipocalcemia grave associada a eclâmpsia se
desenvolve durante o período de amamentação (vários dias a várias semanas após o parto). A fisiopatologia ainda é pouco compreendida, mas parece resultar de um desequilíbrio entre a taxa de entrada (p. ex., reabsorção óssea, absorção
GI) e saída (p. ex., glândula mamária) da reserva de cálcio extracelular. O tratamento consiste na administração por via intravenosa lenta de cálcio, juntamente com o desmame da ninhada, se possível.
INTOXICAÇÃO POR ENEMA DE FOSFATO:  Enema com fosfato de sódio hipertônico (p. ex., Fleet®) pode resultar em anormalidades bioquímicas graves, especialmente quando administrado a gatos desidratados, com lesão de mucosa e atonia
do cólon. Hipernatremia e hiperfosfatemia se devem à absorção de sódio e fósforo da solução de enema no cólon, bem como transferência de água intravascular ao lúmen do cólon (em decorrência de enema hipertônico). A hiperfosfatemia
ocasiona  precipitação  de  cálcio  sérico  e  consequente  hipocalcemia.  Os  sinais  clínicos  de  intoxicação  por  enema  de  fosfato,  os  quais  resultam  dessas  alterações  de  eletrólitos  e  fluido,  incluem  choque  e  irritabilidade  neuromuscular.  O
tratamento consiste na aplicação IV de fluido para expansão de volume, com baixo teor de eletrólitos (p. ex., solução aquosa de glicose 5%), bem como tratamento de hipocalcemia.
AGENTES QUELANTES:  EDTA (ácido etilenodiaminotetracético), sangue com citrato e ácido oxálico (um metabólito do etilenoglicol em anticongelante) formam complexos com cálcio e podem causar hipocalcemia. Animais intoxicados por
etilenoglicol (ver p. 3222) também têm acidose metabólica grave, azotemia e hiperfosfatemia por insuficiência renal oligúrica, que resulta em precipitação de cristais de oxalato de cálcio nos túbulos renais.

Tratamento
O tratamento definitivo de hipocalcemia implica na eliminação da causa primária. Medidas de suporte, inclusive restabelecimento da normocalcemia, pode ser adotadas até que se aguarda o diagnóstico.
CÁLCIO PARENTERAL:  Hipocalcemia com tetania ou convulsões são indicações de administração por via intravenosa imediata de gliconato de cálcio 10% (1,0 a 1,5 ml/kg), em infusão lenta ao longo de 10 min. Monitoramento rigoroso é
obrigatório; caso ocorra bradicardia ou encurtamento do intervalo QT, a infusão IV deve ser diminuída ou temporariamente interrompida.
Uma  vez  controlados  os  sintomas  de  hipocalcemia  com  risco  à  vida,  o  cálcio  pode  ser  adicionado  a  fluido  IV  e  administrado  como  infusão  contínua  lenta  (p.  ex.,  gliconato  de  cálcio  10%,  2,5  ml/kg,  a  cada  6  a  8  h).  A  taxa  de
administração de cálcio deve ser ajustada quando necessária, de modo a manter uma concentração sérica de cálcio normal e a infusão deve ser continuada por quanto tempo for necessário para prevenir recidiva de hipocalcemia. Embora
essa infusão contínua de cálcio mantenha normocalcemia, a duração de seu efeito é breve; ocorre recidiva de hipocalcemia horas após cessar a infusão, a menos que seja administrado outro tratamento.
CÁLCIO ORAL:  A suplementação de cálcio VO pode ser benéfica em algumas condições (p. ex., hipoparatireoidismo, tetania puerperal). As necessidades diárias são 1 a 4 g para cães e 0,5 a 1 g para gatos. A dose diária de cálcio deve ser
baseada na quantidade de cálcio elementar no produto, mais do que no peso do sal de cálcio.
VITAMINA D:  Em algumas condições, a suplementação de vitamina D é necessária para aumentar a absorção intestinal de cálcio. Há 3 principais preparações de vitamina D disponíveis – vitamina D2 (ergocalciferol), di­hidrotocoferal e 1,25­

di­hidroxivitamina D (calcitriol). A dosagem e a duração de resposta desses medicamentos dependem da preparação utilizada. Para vitamina D2, a dose inicial necessária geralmente varia de 4.000 a 6.000 UI/kg/dia, enquanto a dose final
requerida para manter a normocalcemia é de 1.000 a 2.000 IU/kg, 1 vez/dia a 1 vez/semana. Para di­hidrotasquiferol, geralmente a dose de carregamento inicial é 0,02 a 0,03 mg/kg/dia, com dose de manutenção de 0,01 a 0,02 mg/kg, a
cada 24 a 48 h. Para 1,25­di­hidroxivitamina D, geralmente necessita­se a dose diária de 0,025 a 0,06 μg/kg (25 a 60 ng/kg/dia). Como o conteúdo das cápsulas disponíveis (250 ng e 500 ng) não são bem apropriadas ao pequeno peso
corporal da maioria dos cães e gatos e essas cápsulas não podem ser facilmente fracionadas, pode ser desejável entrar em contato com um farmacêutico capaz de reformular esses produtos de modo a obter um conteúdo apropriado para um
animal. Com todas as preparações de vitamina D e protocolos de doses o desenvolvimento de hipercalcemia iatrogênica é uma complicação comum do tratamento.

PÂNCREAS

A função endócrina do pâncreas é realizada por pequenos grupos de células, as ilhotas de Langerhans, que são completamente circundadas por células acinares (exócrinas) que produzem enzimas digestivas. As porções endócrina e exócrina
do pâncreas estão intimamente relacionadas durante o desenvolvimento e evidências sugerem que as células das ilhotas, de ácinos e de ductos surgem a partir de uma célula precursora multipotente em comum.
As ilhotas pancreáticas contêm células a, β e d; cada uma delas sintetiza um único hormônio polipeptídio. As células β compreendem 60 a 70% da população das células das ilhotas e secretam insulina, as células a secretam glucagon e as
células d secretam somatostatina.
As  ilhotas  pancreáticas  funcionam  como  órgãos  microendócrinos  discretos.  Estão  distribuídas  pelo  pâncreas  em  um  padrão  característico  de  inter­relação  celular  para  garantir  o  equilíbrio  apropriado  dos  hormônios.  Vasos  e  nervos
aferentes entram na ilhota em uma região tricelular periférica. A íntima relação anatômica entre as células a, β e d nesta região cortical heterogênea permite funcionar como um sensor local de glicose, propiciando a liberação coordenada de
insulina e glucagon, em resposta às flutuações da glicose sanguínea. Junções íntimas especializadas entre as membranas das células endócrinas adjacentes tendem a dividir o espaço intercelular e pode permitir que a somatostatina tenha
efeito inibidor local direto (parácrino) na liberação de insulina e glucagon.
A  insulina  é  formada  inicialmente  por  uma  cadeia  polipeptídica  única  de  81  a  86  resíduos  de  aminoácidos.  Este  pró­hormônio  (proinsulina)  contém  as  cadeias  A  e  B  da  molécula  de  insulina,  além  de  um  peptídio  de  conexão.  A
proinsulina é convertida enzimaticamente à insulina, antes do armazenamento em grânulos secretores limitados por uma membrana.
O principal estímulo fisiológico para liberação de insulina pelas células β é o aumento da concentração de glicose no fluido extracelular. Na membrana plasmática das células β há glicorreceptores específicos que se ligam à glicose. Uma
concentração extracelular apropriada de cálcio é necessária para a secreção de insulina. Em algumas condições hipocalcêmicas p. ex., hipocalcemia puerperal em vacas), a secreção de insulina pode ser inibida pela baixa concentração de
cálcio no fluido extracelular, resultando em hiperglicemia. Outros açúcares (frutose, manose, ribose), aminoácidos (leucina, arginina), hormônios (glucagon, secretina), medicamentos (sulfonilureia), ácidos graxos de cadeia curta e corpos
cetônicos também podem estimular a secreção de insulina, em certas condições. As células β pancreáticas são aptas a responder a estímulos fisiológicos específicos com a liberação de hormônio esteroide, de forma modulada, em vez de
liberar todo o hormônio armazenado de uma vez.
A insulina influencia, direta ou indiretamente, a função de cada órgão do corpo. Tecidos especialmente responsivos à insulina incluem músculo esquelético e cardíaco, tecido adiposo, fibroblastos, fígado, leucócitos, glândula mamária,
cartilagem, osso, pele, artéria aorta, hipófise e nervos periféricos. A principal função da insulina é estimular as reações anabólicas que envolvem carboidratos, lipídios, proteínas e ácidos nucleicos. Fígado, células adiposas e músculo são os
três principais alvo da insulina. A insulina catalisa a formação de macromoléculas utilizadas na estrutura celular e no armazenamento de energia e regula muitas funções celulares. Em geral, a insulina aumenta a transferência de glicose e
outros monossacarídios, alguns aminoácidos e ácidos graxos e íons magnésio e potássio através da membrana das células­alvo. Também, reduz a taxa de lipólise, proteólise, cetogênese e gliconeogênese.
O glucagon é secretado em resposta à redução da glicose sanguínea. Promove a mobilização dos estoques de nutrientes energéticos, aumentando a glicogenólise, a gliconeogênese e a lipose. Em concentrações fisiológicas, o glucagon
aumenta tanto a glicogenólise quanto a gliconeogênese hepática, aumentando a glicose sanguínea.
A insulina e o glucagon atuam em conjunto para manter a concentração de glicose no fluido extracelular dentro de limites relativamente estreitos. Um sensor de glicose nas ilhotas pancreáticas controla as quantidades de insulina e
glucagon secretadas. Glucagon controla a liberação de glicose do fígado para o espaço extracelular e a insulina controla o transporte de glicose do espaço extracelular para os tecidos sensíveis à insulina, como gordura, músculo e fígado.

 DIABETES MELITO
Diabetes melito é uma anormalidade crônica do metabolismo de carboidratos causada por deficiência relativa ou absoluta de insulina. A maioria dos casos de diabetes espontânea ocorre em cães de meia­idade e em gatos de meia­idade ou
idosos. Em cães, as fêmeas são duas vezes mais acometidas do que os machos e a incidência parece maior em algumas raças pequenas, como Poodle miniatura, Dachshund, Schnauzer, Cairn Terrier e Beagle, mas qualquer raça pode ser
afetada. Em um estudo notou­se que gatos machos obesos foram mais comumente acometidos do que as fêmeas; nenhuma predisposição racial foi observada em gatos.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Os mecanismos patogênicos responsáveis pela menor produção e secreção de insulina são múltiplos, mas geralmente estão relacionados com a destruição das células das ilhotas, secundariamente à destruição
imune ou à pancreatite grave (cães) ou amiloidose (gatos). Pancreatite crônica recidivante, com perda progressiva tanto das células endócrinas quanto das células exócrinas e sua substituição por fibras de tecido conjuntivo, resulta em
diabetes melito. O pâncreas se torna firme e multinodular e frequentemente contém áreas dispersas de hemorragia e necrose. Mais tarde no curso da doença, uma camada fina de tecido fibroso próximo ao duodeno e ao estômago podem ser
o que resta do pâncreas. Infiltração seletiva das ilhotas com amiloide, glicogênio e colágeno, com destruição de células das ilhotas, são causas menos frequentes de diabetes melito em cães do que em gatos. Em outros casos, a quantidade de
células  β  está  diminuída  e  as  células  se  tornam  vacuolizadas;  nos  casos  crônicos,  é  difícil  visualizar  as  ilhotas.  Diabetes  melito  resistente  à  insulina  e  secundário  também  são  verificados  em  muitos  cães  com  hiperadrenocorticismo
espontâneo e após a administração crônica contínua de glicocorticoides ou progestágenos. Prenhez e diestro também podem predispor ao diabetes melito. Em cães, mas não em gatos, a progesterona ocasiona liberação do hormônio do
crescimento, resultando em hiperglicemia e resistência à insulina. Obesidade também predispõe à resistência à insulina, tanto em cães como em gatos.
A expressão completa das alterações metabólicas complexas no diabetes melito parece resultado de uma anormalidade bi–hormonal. Embora a deficiência relativa ou absoluta da ação da insulina em resposta ao aumento da concentração
de glicose extracelular tenha sido reconhecida como a principal anormalidade hormonal, recentemente a importância do aumento relativo ou absoluto da secreção de glucagon está sendo pesquisada. No diabetes, a hiperglucagonemia pode
ser decorrência do aumento da secreção de glucagon pancreático, de enteroglucagon ou de ambos. O aumento de glucagon parece contribuir para o desenvolvimento de hiperglicemia grave devido à mobilização da reserva hepática de
glicose e do desenvolvimento de cetoacidose pelo aumento da oxidação dos ácidos graxos no fígado.
Gatos com diabetes melito geralmente apresentam lesões degenerativas específicas localizadas seletivamente nas ilhotas de Langerhans, enquanto o restante do pâncreas parece normal. A deposição seletiva de amiloide nas ilhotas, com
alterações degenerativas das células β, é a lesão pancreática mais comum em muitos gatos com diabetes. O amiloide parece oriundo do polipeptídio associado às ilhotas (IAPP), que é secretado juntamente com a insulina pelas células β.
Gatos parecem incapazes de processar o IAPP normalmente, o que ocasiona acúmulo excessivo e conversão em amiloide. À medida que os gatos envelhecem, uma porcentagem maior de suas ilhotas contém amiloide. Gatos com diabetes
têm porcentagem maior de ilhotas afetadas, com grande quantidade de amiloide, do que gatos da mesma idade, sem diabetes. O amiloide ou IAPP (ou ambos) ocasionam alteração física das células β e resistência à insulina, resultando em
diabetes.
Infecção humana por alguns vírus pode causar dano seletivo às ilhotas ou pancreatite e sugere­se que sejam responsáveis por certos casos de desenvolvimento rápido de diabetes melito. Isto ainda não foi relatado em cães e gatos. A
degeneração seletiva e necrose de células β são acompanhadas de infiltração das ilhotas por linfócitos e macrófagos. Estresse, obesidade e administração de corticosteroides ou progestágenos podem aumentar a gravidade dos sinais clínicos.
ACHADOS CLÍNICOS:  O início do diabetes melito é frequentemente insidioso e o curso clínico é crônico. Sintomas comuns em cães incluem polidipsia, poliúria, polifagia com perda de peso, catarata bilateral e fraqueza. As alterações no
metabolismo hídrico se desenvolvem principalmente devido à diurese osmótica. O limiar renal para glicose é cerca de 180 mg/dl, em cães, e cerca de 280 mg/dl, em gatos.
Animais diabéticos apresentam menor resistência a infecções bacterianas e fúngicas e frequentemente desenvolvem infecções crônicas ou recidivantes, como cistite, prostatite, broncopneumonia e dermatite. Esta maior suscetibilidade às
infecções pode estar relacionada, em parte, à alteração das atividades quimiotáticas, fagocitárias e antimicrobianas associadas à função reduzida dos neutrófilos. Evidência radiográfica de cistite enfisematosa (rara) é sugestiva de diabetes
melito, devido à infecção por microrganismos fermentadores de glicose, como Proteus sp., Aerobacter aerogenes e Escherichia coli, que resulta na formação de gás na parede e no lúmen da bexiga. Enfisema também pode se desenvolver na
parede da vesícula biliar de cães diabéticos.
Hepatomegalia devido ao acúmulo lipídico é comum em cães e gatos diabéticos. O fígado gorduroso se deve à maior mobilização de gordura do tecido adiposo. O tamanho das células hepáticas, individualmente, está muito aumentado
pelo acúmulo de múltiplas gotículas de lipídio neutro. Em gatos, pode ocorrer lipidose hepática juntamente com diabetes melito.
Catarata se desenvolve frequentemente em cães (não em gatos) com diabetes melito mal controlado. A opacidade do cristalino surge inicialmente ao longo de linhas de junção das fibras do cristalino e sua forma é estrelada (“asteroide”).
A formação de catarata em cães está relacionada com a via metabólica única do sorbitol pela qual a glicose é metabolizada no cristalino, a qual ocasiona edema de cristalino e alteração na transmissão normal de luz através dele. Embora a
mesma via do sorbitol pareça presente em gatos, o desenvolvimento de catarata é raro. Outras lesões extrapancreáticas associadas a diabetes melito em pessoas, como nefropatia, retinopatia e angiopatia micro e macrovascular são raras em
cães e gatos.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico de diabetes melito se baseia na constatação de hiperglicemia e glicosúria persistentes, em jejum. A concentração sanguínea normal de glicose em jejum, em cães e gatos, varia de 75 a 120 mg/dl. Em gatos,
hiperglicemia induzida por estresse é um problema frequente e várias amostras de sangue e urina podem ser necessárias para confirmar o diagnóstico. A mensuração de hemoglobina glicosilada ou frutosamina (ou ambas) podem auxiliar na
diferenciação  entre  hiperglicemia  induzida  por  estresse  e  por  diabetes  melito.  Nos  casos  de  hiperglicemia  induzida  por  estresse,  as  concentrações  de  frutosamina  e  hemoglobina  glicosilada  estão  normais.  Em  todos  os  casos,  deve­se
pesquisar a influência de medicamentos ou de doenças que predispõem ao diabetes.
TRATAMENTO:  O sucesso a longo prazo depende da compreensão e cooperação do proprietário. O tratamento envolve a combinação da redução de peso, dieta, insulina e, possivelmente, hipoglicemiante oral. As fêmeas devem ser castradas.
Em gatos, evidência recente tem apoiado o uso de dietas com alto teor de proteína e baixo teor de carboidratos (rações enlatadas para filhotes). Em cães, dietas ricas em fibras e carboidratos complexos são preferidas. Dieta e redução de
peso, exclusivamente, não controlam a doença; assim, é necessário tratamento inicial com insulina. A maioria dos cães necessita de 2 doses de insulina por dia. Em geral, a insulina NPH, ou lenta, é a insulina inicial de escolha, na dose de
0,5 U/kg, 2 vezes/dia. Com duas injeções diárias, são fornecidas duas refeições de igual teor calórico no momento da administração de insulina. Dietas ricas em açúcares simples (rações semiúmidas) devem ser evitadas. Sinais clínicos e
dosagens seriadas de glicose no sangue são os parâmetros utilizados para monitorar a terapia após estabilização inicial no domicílio, por 5 a 7 dias. Geralmente é preferível a mensuração de glicose sanguínea no domicílio, para evitar
mudanças na rotina do animal e o estresse do exame na clínica ou hospital. Em gatos, iniciam­se dietas ricas em proteínas acompanhadas de insulinoterapia e o animal é reavaliado após 5 a 7 dias. Em gatos recentemente diagnosticados, a
insulina glargina é a insulina de escolha. A glargina é uma insulina de longa ação basal. Utilizada juntamente com dieta rica em proteínas e com baixo teor de carboidrato, está associada à remissão de diabetes melito e descontinuação da
insulinoterapia em 80 a 90% dos casos, nos primeiros 3 a 4 meses de tratamento. As insulinas NPH, lenta e PZI também podem ser utilizadas em gatos, com doses iniciais de 1 a 3 unidades, 2 vezes/dia. Entretanto, estas insulinas não estão
associadas a alta taxa de remissão do diabetes.
O uso oral de agentes hipoglicemiantes (glipizida) foi avaliado em gatos diabéticos. Glipizida é uma sulfonilureia que estimula a liberação de insulina pelas células β funcionais. Glipizida não deve ser utilizada em gatos magros ou
cetonúricos, quando é possível a deficiência absoluta de insulina e há necessidade de administração exógena de insulina. Glipizida é administrada na dose inicial de 2,5 mg, 2 vezes/dia VO, juntamente com manejo dietético. A resposta
clínica é notada em 3 a 4 semanas. Sucesso a curto prazo é observado em 50% dos gatos tratados, com taxa de sucesso a longo prazo (> 1 ano) de cerca de 15%. Como alternativa, pode­se administrar glimepirida (outra sulfonilureia) para
gatos, na dose de 2 mg, 1 vez/dia. Arcabose, um inibidor de uso oral da alfa­glicosidade, também tem sido utilizado em gatos, na dose de 12,5 a 25 mg, 2 a 3 vezes/dia, juntamente com dieta e/ou insulina, para controlar a hiperglicemia.
Cetoacidose é uma séria complicação do diabetes melito e deve ser tratada como uma emergência médica. A terapia inclui correção da desidratação mediante aplicação IV de fluidos, como solução de NaCl 0,9% ou solução de lactato de
Ringer; redução da hiperglicemia e da cetose pela administração de insulina de zinco regular; manutenção das concentrações séricas de eletrólitos, especialmente de potássio, por meio da administração suplementar de soluções apropriadas
de eletrólitos; e identificação e tratamento de doenças complicadoras concomitantes, como pancreatite aguda ou infecções.
Vários procedimentos no uso de insulina tem sido utilizados no tratamento de diabetes melito cetoacidótica. No tratamento intermitente com insulina, utiliza­se insulina regular na dose inicial de 0,2 U/kg IM, seguida de administrações a
cada hora de 0,1 U/kg. Assim que a glicemia esteja < 250 mg/dl, a insulina é administrada por via SC, na dose de 0,25 a 0,5 U/kg, a cada 4 a 6 h, com monitoramento cuidadosa da glicemia em intervalos de 1 a 2 h. Durante o tratamento
agressivo com insulina, a concentração sanguínea de glicose pode diminuir rapidamente e pode ser necessária a adição de dextrose 2,5 a 5% ao fluido IV.
Ao instituir insulinoterapia, a glicose sanguínea deve ser avaliada frequentemente, até que se obtenha a dose de manutenção adequada. Assim que o animal inicia terapia de manutenção e a condição se estabiliza, o paciente deve ser
reavaliado a cada 4 a 6 meses.

 TUMORES DE CÉLULAS DAS ILHOTAS FUNCIONAIS
O tumor de ilhotas pancreáticas mais frequente é o carcinoma de células das ilhotas derivados de células β secretoras de insulina. Estas neoplasias frequentemente são ativas, em termos hormonais, e secretam quantidade excessiva de
insulina,  que  provoca  hipoglicemia.  O  tecido  pancreático  endócrino  parece  derivado  de  células  epiteliais  de  ductos  multipotentes,  que  se  diferenciam  em  um  dos  vários  tipos  celulares  presentes  nas  ilhotas.  Gastrina,  somatostatina,
polipeptídios pancreáticos e peptídio vasoativo intestinal também podem ser produzidos em excesso por tumores das células das ilhotas. Neoplasias de células β das ilhotas pancreáticas (insulinomas) são notadas mais frequentemente em
cães com 5 a 12 anos de idade. Também, têm sido menos frequentemente relatadas em gatos e em bovinos mais idosos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos constatados nos insulinomas resultam do excesso de secreção de insulina, que ocasiona maior taxa de transferência de glicose do fluido extracelular para os tecidos corporais e, consequentemente,
hipoglicemia  grave.  Os  sinais  clínicos  são  reflexos  da  hipoglicemia  e  não  são  específicos  para  hiperinsulinismo  associado  à  neoplasia  de  célula  β.  Os  sintomas  iniciais  incluem  fraqueza  posterior,  fadiga  após  exercício,  fraqueza  e
fasciculações musculares generalizadas, ataxia, confusão mental e alterações de comportamento. Os cães se agitam facilmente e há períodos intermitentes de excitabilidade e inquietação. Podem ocorrer convulsões periódicas e também são
relatados episódios de colapso parecidos com síncope.
Os sinais clínicos são tipicamente episódicos e inicialmente ocorrem em intervalos prolongados e se tornam mais frequentes e duradouros à medida que a doença progride. Crises hipoglicêmicas podem ser precipitadas por exercício
físico (maior uso de glicose) ou jejum (menor disponibilidade de glicose), bem como pela ingestão de alimentos (estímulo da secreção de insulina). A administração de glicose rapidamente alivia os sintomas.
A predominância de sinais clínicos relacionados com o SNC mostra a dependência primária do cérebro no metabolismo de glicose para energia. Quando o cérebro não é suprido por glicose, a oxidação cerebral diminui e as manifestações
de anoxia surgem. Como os sinais clínicos são compatíveis com doença primária do SNC, os tumores funcionais de células das ilhotas podem ser diagnosticados erroneamente como epilepsia idiopática, tumores cerebrais ou outras doenças
neurológicas. Episódios repetidos de hipoglicemia grave e prolongada podem resultar em degeneração neuronal irreversível por todo o cérebro. Distúrbios nervosos permanentes provavelmente contribuem para o coma terminal, ausência de
resposta à glicose e, por fim, morte de alguns cães.
Lesões: Os  insulinomas  normalmente  surgem  como  nódulos  pequenos  (1  a  3  cm)  únicos,  amarelos  a  preto­avermelhados,  esféricos  e  visíveis  na  superfície  serosa.  São  nódulos  únicos  ou,  ocasionalmente,  múltiplos  no  mesmo  lobo  do
pâncreas ou em lobos diferentes. Apresentam consistência similar ou ligeiramente mais firmes do que o parênquima pancreático circundante. Uma camada fina de tecido conjuntivo fibroso separa a neoplasia do parênquima adjacente.
Insulinomas frequentemente ocasionam metástase em linfonodos regionais ou no fígado (ou ambos), antes do diagnóstico. Adenomas benignos verdadeiros das células da ilhota são raros.
DIAGNÓSTICO:  Deve­se mensurar a glicose sanguínea em todos os cães idosos com histórico de fraqueza periódica, colapso ou convulsões. Hipoglicemia em jejum (= 60 mg/dl) em um cão de meia­idade a idoso é um forte indício de
insulinoma.  Em  animais  com  insulinoma  a  concentração  sérica  de  insulina  mensurada  no  momento  da  hipoglicemia  encontra­se  normal  ou  aumentada.  Diagnósticos  diferenciais  para  hipoglicemia  incluem  hipoadrenocorticismo,
insuficiência hepática, grandes neoplasias extrapancreáticas, sepse, policitemia, dose excessiva de insulina e erro laboratorial.
TRATAMENTO:  Embora os insulinomas sejam solitários em cães, todo o pâncreas deve ser examinado cuidadosamente, verificando se há tumores múltiplos. A extirpação total do tumor melhora a hipoglicemia e os sinais neurológicos
associados, a menos que haja alterações irreversíveis no SNC. No caso de metástases não visíveis, a hipoglicemia pode persistir após a cirurgia. Mesmo que o potencial de malignidade dos insulinomas seja alto, muitos cães sobrevivem > 1
ano com qualidade de vida aceitável, se todos os tumores visíveis forem removidos na cirurgia. Cães com tumores inoperáveis podem ser bem controlados com várias refeições no dia e administração de glicocorticoides (0,5 a 1 mg/kg/dia).
O diazóxido (20 a 80 mg/kg/dia, 3 vezes/dia) também pode aliviar os sintomas em alguns cães, mas problemas com sua disponibilidade limita seu uso. Recentemente, o quimioterápico estreptozocina tem sido pesquisado no tratamento de
tumores de células das ilhotas em cães e pode ser utilizado após a ressecção cirúrgica.

 TUMORES DE CÉLULAS DAS ILHOTAS SECRETORAS DE GASTRINA
Gastrinomas  pancreáticos  são  relatados  em  pessoas,  cães  e  gatos.  A  hipersecreção  de  gastrina  em  pacientes  humanos  resulta  na  síndrome  de  Zollinger­Ellison,  que  consiste  na  secreção  excessiva  de  ácido  gástrico  e  em  úlcera  péptica
recidivante no trato GI. Os tumores, derivados de célula de absorção e descarboxilação de precursores de amina (célula APUD, do inglês amine precursor uptake and descarboxilation) ectópica do pâncreas produzem excesso do hormônio
gastrina, que normalmente é secretado por células da mucosa do antro gástrico e duodeno.
ACHADOS CLÍNICOS:  Estes tumores são raros; são menos frequentes do que as neoplasias de células β secretoras de insulina. Nos poucos casos documentados relatam­se anorexia, hematêmese, diarreia intermitente (geralmente com sangue
escuro), perda de peso progressiva e desidratação. As alterações funcionais marcantes parecem decorrências de várias úlceras na mucosa do trato GI, que se desenvolvem devido à hipersecreção de gastrina.
Lesões: Relata­se que animais com a síndrome semelhante a de Zollinger­Ellison apresentavam tumores únicos ou múltiplos, de diversos variados, no pâncreas. Os tumores eram firmes à palpação devido ao aumento de tecido conjuntivo
fibroso no estroma e todos tinham evidência de metástase antes do diagnóstico.
DIAGNÓSTICO:  Concentrações séricas de gastrina foram avaliadas em um número limitado de cães com gastrinoma. Em um cão com a síndrome semelhante a de Zollinger­Ellison apresentava concentrações de gastrina que variaram de 155 a
2.780 pg/ml, enquanto o teor sérico médio de gastrina em cães clinicamente normais (controle) era de 70,9 pg/ml. Úlceras gástricas ou duodenais recidivantes em cães sem causa definida requerem cirurgia exploratória e inspeção cuidadosa
do pâncreas.
TRATAMENTO:  Pode­se tentar a extirpação do tumor secretor de gastrina do pâncreas. Entretanto, o estudo dessas neoplasias em cães mostrou evidência de invasão local, ao parênquima adjacente, e metástase nos linfonodos regionais e no
fígado. Os cães apresentavam tanto ulcerações únicas quanto múltiplas na mucosa gástrica ou duodenal, associadas a sangue livre no lúmen. O tratamento medicamentoso com antagonistas de receptores H2 (famotidina ou ranitidina) ou
inibidores da bomba de prótons (omeprazol) podem aliviar temporariamente os sinais clínicos em animais com doença inoperável.

TUMORES DE TECIDOS NEUROENDÓCRINOS

Tecidos neuroendócrinos derivados da crista neural embrionária são amplamente distribuídos pelo corpo. Nos mamíferos, estão no centro das glândulas adrenais e são responsáveis pela síntese e secreção de catecolaminas (epinefrina e
norepinefrina). Células C da glândula tireoide dos mamíferos também são derivadas da crista neural e, durante o desenvolvimento embrionário inicial, são incorporadas à última bolsa faringiana (ultimobranquial) que, subsequentemente, se
fundem com cada lobo tireoidiano. As células C estão envolvidas na biossíntese de calcitonina, um hormônio envolvido na regulação da homeostasia do cálcio e do turn over ósseo.
Os tumores se desenvolvem ocasionalmente nas células neuroendócrinas da medula adrenal, tireoide e corpos carotídeos e aórticos. São clinicamente significantes devido à alteração física dos tecidos normais adjacentes causada pela
massa aumentada e, possivelmente, pela secreção autônoma de excesso de hormônio.

 MEDULA ADRENAL
HIPERPLASIA MEDULAR ADRENAL:  Hiperplasia medular adrenal nodular e difusa parece preceder o desenvolvimento de feocromocitoma em touros com tumor de célula C da tireoide. Esta proliferação difusa das células cromafins não é
encapsulada e comprime o córtex adrenal circundante. Em touros com hiperplasia medular difusa proeminente, com frequência há alguns pequenos focos de proliferação nodular de células medulares.
FEOCROMOCITOMAS:   Estes  tumores  de  células  cromafins  são  quase  sempre  localizados  nas  glândulas  adrenais.  São  os  tumores  mais  comuns  da  medula  adrenal  de  animais;  se  desenvolvem  mais  frequentemente  em  bovinos,  ratos  de
laboratório e cães, sendo infrequentes em outros animais domésticos. Em touros e ratos, os feocromocitomas se desenvolvem concomitantemente a tumor de células C da glândula tireoide que secretam calcitonina, possivelmente como uma
transformação neoplásica de vários tipos de células endócrinas de origem neuroectodérmica no mesmo indivíduo. O feocromocitoma maligno é considerado um tumor medular que invade estruturas adjacentes através da cápsula adrenal (p.
ex., veia cava posterior) ou ocasiona metástase em pontos distantes (ex. fígado, linfonodos regionais ou pulmões), ou ambos. Feocromocitomas funcionais são infrequentemente relatados em animais; entretanto, muitos cães e equinos com
feocromocitoma manifestam taquicardia, edema e hipertrofia cardíaca, atribuídas ao excesso de secreção de catecolaminas. Os sinais clínicos em cães podem incluir poliúria e polidipsia. Parece que equinos apresentam síndrome semelhante
à neoplasia endócrina múltipla observada em pacientes humanos com doença adrenal e tireoidiana concomitantes.
Embora o tamanho seja consideravelmente variável, os feocromocitomas podem ser grandes (= 10 cm de diâmetro) e incorporar a maior parte da adrenal afetada. Uma pequena parte remanescente da glândula adrenal pode ser notada em
um polo. Tumores menores são bem encapsulados por uma fina camada do córtex adrenal. Feocromocitomas grandes são multilobulados e variados e podem pressionar e invadir tecidos adjacentes, particularmente a veia cava e a artéria
aorta. Em cães, cerca de 50% dos feocromocitomas ocasionam metástase no fígado, nos linfonodos regionais, no baço e nos pulmões.
Devido à indisponibilidade de testes de rotina validados para dosagem de catecolaminas em cães e gatos, o diagnóstico frequentemente se baseia nos sinais clínicos e na ultrassonografia. O tratamento envolve cirurgia (se possível) e
controle da hipertensão.

 ÓRGÃOS QUIMIOCEPTORES
Órgãos quimioceptores são barômetros sensíveis às alterações nos teores de dióxido de carbono e de oxigênio e no pH do sangue; auxiliam na regulação da respiração e da circulação. Embora o tecido quimioceptor pareça amplamente
distribuído pelo corpo, os tumores se desenvolvem principalmente nos corpos aórticos (mais frequentes em animais) e carotídeos (mais frequentes em humanos). Estes tumores são notados principalmente em cães e raramente em gatos e
bovinos. Raças braquicefálicas de cães, como Boxer e Boston Terrier são predispostas a tumores de corpo aórtico e carotídeo.
Os tumores do corpo aórtico surgem mais frequentemente como massas únicas ou como nódulos múltiplos no interior do saco pericárdico, próximo à base do coração. Variam consideravelmente em tamanho (0,5 a 12,5 cm), sendo os
carcinomas geralmente maiores do que os adenomas. Solitários, os pequenos adenomas tanto são aderidos às camadas adventícias das artérias pulmonar e aorta ascendente, ou estão incluídos no tecido conjuntivo adiposo presente entre
estes dois troncos vasculares principais. Adenomas maiores podem se ajustar ao átrio ou deslocar a traqueia, são multilobulares e circundam parcialmente os troncos arteriais principais, na base do coração.
Em cães, tumores malignos no corpo aórtico ocorrem menos frequentemente do que os adenomas. Os carcinomas podem se infiltrar na parede da artéria pulmonar e formar projeções papilares no lúmen ou invadir o lúmen do átrio através
da parede. Embora as células tumorais frequentemente invadam vasos sanguíneos, metástases nos pulmões e no fígado são infrequentes em cães com carcinoma de corpo aórtico. Todavia, os efeitos locais e fisiológicos são importantes,
inclusive aqueles dos adenomas.
Tumores no corpo aórtico em animais não são funcionais, p. ex., não secretam excesso de hormônio na circulação) mas, como uma lesão que ocupa espaço, pode resultar em várias alterações funcionais. Incluem­se manifestações de
descompensação cardíaca devido à pressão no átrio ou na veia cava (ou ambas) associada a adenomas e carcinomas maiores no corpo aórtico. Tumores de corpo aórtico tendem a ser mais benignos do que os tumores de corpo carotídeo.
Expandem­se lentamente e comprimem a veia cava e o átrio. Os carcinomas de corpo aórtico podem invadir localmente o átrio, pericárdio e vasos adjacentes maiores de parede fina.
Tumores de corpo carotídeo surgem próximo à bifurcação da artéria carótida comum, geralmente como uma massa unilateral de crescimento lento. Adenomas geralmente apresentam 1 a 4 cm de diâmetro. A bifurcação da artéria
carótida é incorporada à massa e as células tumorais se aderem firmemente à túnica adventícia. Geralmente é difícil excisão completa ou biópsia devido ao alto grau de vascularização e a íntima relação com os troncos arteriais principais do
pescoço.
Tumores de corpo carotídeo malignos são maiores e mais grosseiramente multinodulares do que os adenomas. Embora os carcinomas pareçam encapsulados, as células tumorais invadem a cápsula e penetram nas paredes dos vasos
adjacentes e dos vasos linfáticos. A veia jugular externa e vários nervos cranianos podem ser envolvidos pela neoplasia. Metástases dos tumores de corpo carotídeo ocorrem em cerca de 30% dos casos e tem sido encontrados nos pulmões,
linfonodos bronquiais e mediastínicos, fígado, pâncreas e rins. Transformação neoplásica multicêntrica do tecido quimioceptor ocorre frequentemente em raças de cães braquicefálicas.
As características histológicas dos tumores de quimioceptores (“quimiodectomas”) são essencialmente semelhantes, independente se derivados do corpo aórtico ou carotídeo.
Embora  a  etiologia  dos  tumores  de  corpo  aórtico  e  carotídeo  seja  desconhecida,  sugere­se  que  uma  predisposição  genética  agravada  por  hipoxia  crônica  pode  aumentar  o  risco  em  certas  raças  braquicefálicas.  Corpos  carotídeos  de
diversas espécies mamíferas, inclusive cães, desenvolveram hiperplasia quando submetidos à hipoxia crônica em ambiente de altitude elevada.

 TUMORES DE CÉLULA C DA TIREOIDE
Tumores de célula C (células parafoliculares, ultimobranquiais) da tireoide são mais comuns em touros e equinos adultos ou de mais idade e em certas linhagens de ratos de laboratório. Relata­se que alta porcentagem de touros mais velhos
desenvolvem tumor de célula C (= 30%) ou hiperplasia de célula C e derivados ultimobranquiais (= 15 a 20%). Não têm sido observados em vacas que recebem a mesma dieta. Em touros, a prevalência aumenta com o avançar da idade e
está frequentemente associada ao desenvolvimento de aumento da densidade vertebral. Tumores endócrinos múltiplos, especialmente feocromocitomas bilaterais e, ocasionalmente, adenomas hipofisários, são detectados simultaneamente
em touros com tumor de célula C. Há relato de alta frequência de tumor de células C da tireoide e de feocromocitoma em uma família de touros da raça Guernsey, o que sugere um padrão de herança autossômico dominante. Hiperplasia
difusa ou nodular de células secretoras da medula adrenal frequentemente precede o desenvolvimento de feocromocitoma.
ADENOMAS:  Adenomas de células C surgem em um ou ambos os lobos da tireoide, como nódulos discretos, únicos ou múltiplos, acinzentados a marrons. Os adenomas são menores (cerca de 1 a 3 cm de diâmetro) que os carcinomas e são
separados do parênquima tireoidiano por uma fina cápsula de tecido conjuntivo fibroso. A tireoide adjacente é comprimida, mas não invadida pelo tumor. Em equinos, adenoma de célula C pode resultar em aumento palpável na região
cervical anterior. Adenomas de células C maiores incorporam a maior parte do lobo tireoidiano, mas uma borda de tireoide marrom­vermelho escura frequentemente está presente em um lado.
CARCINOMAS:   Carninomas  de  células  C  da  tireoide  causam  grande  aumento  multinodular  em  um  ou  ambos  os  lobos  tireoidiamos  e  podem  incorporar  toda  a  glândula  tireoide.  Metástases  múltiplas  em  linfonodos  cervicais  anteriores
geralmente são grandes e apresentam áreas de necrose e hemorragia. Metástases pulmonares são infrequentes e surgem como discretos nódulos marrons em todos os lobos pulmonares.
A estimulação crônica das células C pela ingestão excessiva de cálcio na dieta por longo tempo pode estar relacionada com a alta prevalência destes tumores em touros; touros adultos foram alimentados com dieta contendo 3,5 a 6 vezes
mais a quantidade de cálcio normalmente recomendada para manutenção e a ocorrência destes tumores diminuiu significantemente quando a ingestão de cálcio foi reduzida.
Síndromes associadas a anormalidades na secreção de calcitonina são reconhecidas menos frequentemente do que as anormalidades que envolvem o paratormônio (PTH). A hipersecreção de calcitonina é relatada em pessoas, touros e
ratos de laboratório, com neoplasias tireoidianas medulares (ultimobranquial) derivadas de célula C. Alterações osteocleróticas são relatadas em touros com esta síndrome, mas a relação do excesso de secreção de calcitonina por longo
tempo na patogênese das lesões ósseas e sua ocorrência em outras espécies não está clara.
Em cães, o estadiamento histológico do carcinoma de tireoide é importante para o prognóstico, embora o tipo histológico não seja. O volume do tumor tem maior importância, bem como sua relação com a possibilidade de metástase;
também, quanto mais profunda a fixação do tumor às estruturas adjacentes, é menos provável que se consiga ressecção cirúrgica completa. Cirurgia é o tratamento de escolha, mas algumas formas de terapia adjuvante são razoáveis devido
ao risco de metástase e de tecido residual não removido. Em teoria, uma combinação de radioterapia e quimioterapia seria ideal e o interesse nesta terapia combinada está aumentando. Para outros carcinomas de tireoide funcionais raros em
cães, o tratamento com I131 é uma escolha razoável, mas poucas são as instituições onde tal terapia pode ser realizada e são muitos os problemas técnicos (destinação de toda urina e fezes de acordo com as normas de segurança de radiação).
INFECÇÕES GENERALIZADAS

MAIS DE UMA ESPÉCIE

 Actinobacilose
 Actinomicose
 Amiloidose
 Anomalias Congênitas e Hereditárias
Doença da Fronteira
Infecção pelo Vírus Akabane
 Antraz
 Besnoitiose
 Borreliose
Clostridioses
Botulismo
Cabeça Grande
Carbúnculo Sintomático
Edema Maligno
Enterotoxemias
Clostridium perfringens Tipo A
Clostridium perfringens Tipos B e C
Enterotoxemia Tipo D
Hemoglobinúria Bacilar
Hepatite Necrosante Infecciosa
Infecções por Clostridium difficile e C. perfringens
Tétano
Vacinas contra Clostrídios
 Doença exsudativa
 Estomatite Vesicular
 Febre Aftosa
 Febre Q
 Infecção por Erysipelothrix rhusiopathiae
Claudicação Pós­banho de Imersão em Ovinos
Erisipela Suína
Poliartrite Não Supurativa em Cordeiros
 Infecções Fúngicas
Aspergilose
Blastomicose
Candidíase
Coccidioidomicose
Criptococose
Esporotricose
Feoifomicose
Geotricose
Hialoifomicose
Histoplasmose
Linfangite Epizoótica
Micetomas
Oomicose
Pecilomicose
Peniciliose
Rinosporidiose
Zigomicose
 Leptospirose
Bovinos
Cães
Equinos
Suínos
 Listeriose
 Melioidose
 Neosporose
 Nocardiose
 Peritonite
 Peste
 Raios e Eletrocussão
 Toxoplasmose
 Tuberculose e Outras infecções micobacterianas
Animais Exóticos com Cascos em Cativeiro
Bovinos
Cães
Cervos e Alces
Elefantes
Equinos
Gatos
Mamíferos Marinhos
Ovinos e Caprinos
Primatas Não Humanos
Suínos
Outras Infecções Micobacterianas, além de Tuberculose
 Tularemia

EQUINOS
 Anemia Infecciosa Equina
 Arterite Viral Equina
 Erliquiose Granulocítica Equina
 Infecção pelo Vírus Hendra
 Mormo
Peste Equina­Africana
 Sepse em Potros

RUMINANTES

 Colissepticemia
 Caudriose
 Doença de Wesselsbron
 Doença dos Ovinos de Nairóbi
 Febre Catarral Maligna
 Febre do Vale Rift
 Febre Efêmera
 Febre Hemorrágica da Crimeia­congo
 Febre Petequial Bovina
 Febre transmitida por carrapatos
 Histofilose
 Leucose Bovina
 Língua Azul
 Paratuberculose
 Pasteurelose em Ovinos e Caprinos
 Peste Bovina
 Peste dos Pequenos Ruminantes
 Piemia por Carrapatos
 Sepse Hemorrágica
 Síndrome Artrite­Encefalite Caprina

SUÍNOS

 Doença de Glässer
 Doença do Edema
 Doença Vesicular Suína
 Doenças Causadas por Circovírus Suíno
 Encefalomielite Hemaglutinante
 Exantema Vesicular dos Suínos
 infecção pelo vírus da encefalomiocardite
Infecção pelo Vírus Nipah
 Infecções Estreptocócicas em Suínos
Infecção por Streptococcus dysgalactiae
Infecção por Streptococcus porcinus
Infecção por Streptococcus suis
 Peste Suína Africana
 Peste Suína Clássica
 Síndrome Respiratória e Reprodutiva Suína
 Triquinelose

PEQUENOS ANIMAIS

 Cinomose Canina
 Doenças Causadas por Riquétsias
Erliquiose e Infecções Relacionadas
Febre Maculosa das Montanhas Rochosas
Intoxicação por Salmão e Febre Elokomin
Tifo Murino
Hemoplasmose (Anemia Infecciosa Felina) (CIC)
 Hepatite Infecciosa Canina
 Herpesvirose Canina
 Leishmaniose
 Linfoma Maligno Canino (CIC)
 Panleucopenia Felina
 Peritonite Infecciosa Felina
 Vírus da Leucemia Felina e Doenças Relacionadas

ACTINOBACILOSE

A actinobacilose é causada por um cocobacilo Gram­negativo pertencente ao gênero Actinobacillus. Apesar de existir mais de 22 diferentes espécies neste gênero, apenas quatro (A. pleuropneumoniae, A. suis, A. equuli e A. lignieresii) são
frequentemente associadas a doenças nos animais.
A espécie A. pleuropneumoniae causa pleuropneumonia contagiosa suína (p. 1610) e pode manifestar­se de diferentes formas desde aguda grave até infecção subaguda ou crônica com abscessos pleurais e pulmonares. Os danos às células
endoteliais ativam o complexo imune ocorrendo vasculite e trombose, com edema, necrose, infarto e hemorragia. A infecção, geralmente, é restrita a suínos < 5 meses de idade. A. pleuropneumoniae ser parte da flora normal das membranas
mucosas de suínos, bovinos e ovinos. O diagnóstico é realizado por meio do isolamento do microrganismo de amostras de suabe nasal ou tecido pulmonar obtido durante a necropsia. Técnicas moleculares como PCR foram desenvolvidas
para detectar a presença de A. pleuropneumoniae em amostras de tecidos. O tratamento é baseado no uso de antibióticos, inclusive penicilina, tetraciclina, estreptomicina, cefalosporinas ou fluorquinolonas. O controle dos focos é feito
empregando manejo adequado, combinado ao uso de vacinas ou erradicação da infecção do rebanho por meio de despovoamento.
A. suis faz parte da flora normal da cavidade oral de suínos. Esta afecção causa sepse em suínos jovens e artrite, pneumonia e pericardite em animais idosos. Em potros neonatos e recém­nascidos também pode acarretar sepse, artrite,
pneumonia e nefrite purulenta. A doença é desencadeada por uma ruptura na integridade da mucosa bucal ou pode ser associada à imunossupressão. O microrganismo geralmente é suscetível a sulfonamidas e cefalosporinas.
O  hospedeiro  natural  de Actinobacillus equuli é  o  equino;  nestes  animais  são  observadas  infecções  tanto  em  jovens  como  em  adultos.  Nos  potros,  pode  se  manifestar  como  diarreia,  acompanhada  de  meningite,  pneumonia,  nefrite
purulenta ou poliartrite séptica (doença do potro letárgico). A infecção pode ser desencadeada pela contaminação do umbigo, inalação ou ingestão do agente. Portanto, a doença pode ser evitada com a adoção de medidas como: manejo
sanitário adequado no ambiente do potro e o fornecimento de colostro materno contendo anticorpos contra o agente. Nos animais adultos a infecção por A. equuli pode ocasionar abortamento, sepse, endocardite e nefrite. Tantos em potros
como em equinos adultos, diversas doenças podem causar os mesmos sinais clínicos, por isso o diagnóstico definitivo é baseado no isolamento do agente por meio de cultura.
Nesses casos, o tratamento é realizado com a administração de cloranfenicol, gentamicina ou cefalosporinas de terceira geração, dependendo da natureza da infecção e da habilidade das concentrações terapêuticas do fármaco em atingir o
sítio de infecção. Os betalactâmicos e as sulfonamidas têm sido recomendados, porém a ocorrência de resistência a estes antibióticos já foi relatada.
A. arthritidis, antigamente denominada Bisgaard táxon 9, foi isolada de equinos com artrite e sepse.
A. lignieresii causa abscessos tumorais na língua, condição geralmente denominada “língua de pau”. É clássica em bovinos, mas também ocorre em ovinos, equinos, suínos e cães; nas aves, a frequência é baixa. O microrganismo pode
causar, ainda, lesões piogranulomatosas em tecidos moles de cabeça, pescoço e membros e, ocasionalmente, atingir pulmões, pleura, úbere e tecido subcutâneo. O microrganismo faz parte da flora normal do trato gastrintestinal e causa
doença quando, por meio de feridas, atinge os tecidos moles adjacentes. Com isso causa infecções localizadas que pode espalhar, pela via linfática, para outros tecidos. As lesões primárias associadas a A. lignieresii em bovinos são firmes e
com tumefação difusa, além de dores na língua. Isso ocasiona salivação excessiva, incapacidade de preensão normal do alimento e, em alguns casos, nota­se protrusão da língua devido ao seu aumento. Na palpação percebe­se uma língua
excessivamente rígida. O diagnóstico requer cultura e biopsia da lesão. O pus proveniente dos abscessos contém microcolônias cercadas por espículas associadas ao fosfato de cálcio, dando a aparência de grânulos sulfurosos com < 1 mm
de  diâmetro.  Não  há  testes  sorológicos  disponíveis  para  a actinobacilose  e  os  achados  clínicos  e  hematológicos  geralmente  são  normais.  A  necropsia  revela  uma  língua  pálida  e  firme  contendo  nódulos  multifocais.  Estes  nódulos  são
frequentemente preenchidos com pus espesso com coloração branco–amarelada. Histologicamente, a lesão primária é um abscesso granulomatoso.

Rim de um potro infectado por Actinobacillus equuli. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Essa forma da actinobacilose é cosmopolita, mas esporádica e, assim, de difícil prevenção. Os surtos que ocorrem nos rebanhos, geralmente, estão associados ao consumo de capim grosseiro e abrasivo que ocasiona lesões na boca. Iodeto
de sódio é o tratamento de escolha para ruminantes com actinobacilose, aplicado por via IV (70 mg/kg, solução 10 a 20%), repetindo­se 1 ou 2 vezes em intervalos de 7 a 10 dias. Caso ocorram sinais clínicos relacionados com a toxicidade
do iodeto (crostas, diarreia, anorexia, tosse e lacrimejamento excessivo) a administração deve ser descontinuada. A melhora clínica é observada dentro de 48 h do início da terapia e o tratamento geralmente é bem­sucedido quando há
apenas o envolvimento da língua. Antibacterianos sistêmicos, como ceftiofur, penicilina, ampicilina, florfenicol e tetraciclina, podem ser efetivos e são principalmente recomendados para casos graves ou refratários ao tratamento com
iodeto de sódio. O desbridamento cirúrgico, especialmente se há comprometimento respiratório, pode ser utilizado no tratamento, principalmente na presença de grande massa granulomatosa que não responde à terapia. A prevenção de
actinobacilose em ruminantes envolve principalmente a limitação do consumo de alimento grosseiro fibroso e de pastejo em regiões que contêm pontas de capim duras e penetrantes (p. ex., capim rabo­de­raposa, cardo).
Actinobacillus ureae causa infecção de trato respiratório superior em pessoas e abortamento em suínos. Por sua vez, A. actinoides está associado à pneumonia supurativa em bezerros e vesiculite seminal em touros.

ACTINOMICOSE
Os membros do gênero Actinomyces são Gram­positivos, anaeróbios, filamentosos ou ramificados e circundados por uma roseta periférica. Os filamentos têm < 1 μm de diâmetro, diferentemente dos fungos filamentosos que possuem
tamanhos > 1 μm de diâmetro. Actinomyces spp pertence à flora normal das mucosas bucal e nasofaringiana, porém, várias espécies estão relacionadas com doenças em animais.
A.  bovis  é  o  agente  etiológico  da  actinomicose.  Também,  pode  ser  isolado  de  abscessos  nodulares  em  pulmões  dos  bovinos  e  de  infecções  raras  em  ovinos,  suínos,  cães  e  outros  mamíferos,  inclusive  fístula  de  cernelha  crônica  e
inflamação da bursa supra–atlantal, em equinos. Actinomicose envolve um abscesso supurativo crônico, progressivo, fibrótico e granulomatoso, que compromete, com mais frequência, mandíbula, maxila ou outros tecidos ósseos da cabeça.
A doença manifesta­se quando A. bovis é introduzido em tecidos moles adjacentes, penetrando na mucosa bucal através de feridas provocadas por arame, feno grosseiro ou gravetos. O envolvimento do osso adjacente quase sempre resulta
em  distorção  facial,  perda  de  dentes  (dificultando  a  mastigação)  e  dispneia  devido  ao  inchaço  da  cavidade  nasal.  Partes  da  cabeça  podem  ser  afetadas,  entretanto,  os  alvéolos  dentários  que  circundam  a  raiz  do  dente  e  bochechas  são
frequentemente envolvidos. A lesão primária apresenta­se com crescimento lento e massa firme que acomete parte da mandíbula. Em alguns casos formas ulcerativas com ou sem fístulas de drenagem do exsudato purulento podem ocorrer.
O diagnóstico presuntivo baseia­se nos sinais clínicos. Este diagnóstico pode ser confirmado pela cultura do microrganismo de amostras de lesões. Esta cultura requer condições anaeróbias sendo frequentemente negativa. A coloração de
Gram  revela  bastonetes  Gram­positivos  em  “grânulos  sulfurosos”  e  amarelados  no  aspirado  purulento.  O  exame  radiológico  da  cabeça  é  útil,  a  lesão  radiográfica  primária  consiste  em  regiões  de  osteomielite  múltiplas,  radioluscentes
centrais circundadas por ossificação periosteal e tecido fibroso. Como último recurso, uma amostra pode ser obtida por biopsia utilizando a trefina e submetida ao histopatológico.

Vaca com actinomicose. Cortesia do Dr. Geoffrey Smith.

O objetivo do tratamento é eliminar a bactéria e cessar o avanço da lesão. Entretanto, dificilmente ocorre regressão significativa da massa rígida. Iodeto de sódio é o tratamento de eleição para ruminantes com actinomicose. O iodeto de
sódio (70 mg/kg, em solução 10 a 20%, IV) é fornecido uma vez e repetido várias vezes em intervalos de 7 a 10 dias. Caso sejam observados sinais de toxicidade ao iodeto (formação de crostas, diarreia, anorexia, tosse e lacrimejamento
excessivo),  sua  administração  deve  ser  descontinuada  ou  deve  ser  aumentado  o  intervalo  entre  aplicações.  O  iodeto  de  sódio  tem  se  mostrado  seguro  para  uso  em  vacas  prenhes  e  apresenta  baixo  risco  de  aborto.  Recomenda­se
administração de antimicrobianos, inclusive penicilina, florfenicol ou oxitetraciclina. Como A. bovis faz parte da flora normal dos ruminantes, o controle da doença é feito evitando o fornecimento de alimentos grosseiros e rígidos ou
plantas com hastes que podem causar lesão à mucosa bucal. Quando ocorrem vários casos no rebanho, isso não se deve à natureza contagiosa do patógeno, mas sim à exposição a diversos fatores de risco (alimentos grosseiros).
A. actinoides é conhecido como invasor secundário na pneumonia enzoótica de bezerros e vasculite seminal em touros.
A. israelii está principalmente associado a infecções granulomatosas crônicas em pessoas, mas esporadicamente também tem sido isolado de lesões piogranulomatosas de suínos e bovinos. O tratamento envolve desbridação cirúrgica e
administração de penicilina.
A. naeslundii foi isolado de infecções supurativas em várias espécies animais e os casos mais frequentes são de aborto em suínos.
A. suis provoca mastite piogranulomatosa em porcas, sendo caracterizado por pequenos abscessos com vesículas, pus amarelado cercado por uma ampla zona de tecido conjuntivo denso. “Grânulos sulfurosos” amarelados podem estar
dispersos  no  pus,  como  acontece  na  infecção  por A.  bovis  em  bovinos.  Os  abscessos  profundos  e  crônicos  podem  fistular.  Porcas  também  podem  desenvolver  lesões  granulomatosas  subcutâneas  ventrais  e,  ocasionalmente,  infecções
piogranulomatosas nos pulmões, baço, rins e outros órgãos. O diagnóstico baseia­se nos sinais clínicos e no isolamento e identificação do agente etiológico. O tratamento raramente é bem­sucedido, principalmente em razão da incapacidade
do antimicrobiano em penetrar no tecido infectado. O tecido comprometido quase sempre é removido cirurgicamente para salvar as porcas que serão enviadas ao abate.
A. hordeovulneris provoca casos raros de actinomicose em cães, com abscessos localizados e infecções sistêmicas, como pleurite, peritonite, abscessos viscerais e artrite séptica. Um fator predisponente comum é a presença de gravetos de
capim rabo­de­raposa (Hordeum spp) e a principal via de infecção é a inalação da bactéria. Os sinais clínicos e o histórico podem contribuir para o diagnóstico, mas a demonstração do agente causador por coloração de Gram e cultura
bacteriológica  é  necessária  para  confirmar  a  etiologia.  O  tratamento  inclui  desbridação  cirúrgica,  drenagem  e  tratamento  prolongado  com  penicilina,  cefalosporinas  ou  sulfonamidas.  Piotórax  é  frequentemente  observado  em  cães  com
actinomicose e requer repetidas drenagens, juntamente com terapia antimicrobiana.
A. viscosus causa actinomicose cutânea em cães, na forma de abscessos subcutâneos localizados. Geralmente é secundária a lesões perfurantes causadas por feridas de mordedura ou corpo estranho. Os locais mais comuns de abscesso são
cabeça, pescoço, tórax e abdome. A. viscosus também causa pneumonia, piotórax e casos raros de meningoencefalite piogranulomatosa. O diagnóstico se baseia no histórico e nos sinais clínicos, inclusive a presença de grânulos macios e
branco­acinzentados no pus ou no exsudato. A citologia é útil (pus e fluido pleural) e pode revelar organismos filamentosos Gram­positivos. O diagnóstico definitivo é baseado no isolamento e na identificação de A. viscosus. O tratamento
de piotórax com penicilina, sulfonamidas ou cefalosporinas pode ser efetivo quando realizado no início da doença. O sucesso terapêutico é maior nas infecções cutâneas, que também devem ser tratadas com os mesmos antibacterianos.

AMILOIDOSE

Amiloidoses são doenças que se devem a erros no dobramento de proteínas. Quando novas proteínas são produzidas, suas cadeias de peptídios normalmente se dobram automaticamente de forma correta. Às vezes, no entanto, essas cadeias
de  peptídios  se  dobram  erroneamente  e  formam  lâminas  β  altamente  estáveis,  muito  insolúveis  e  resistentes  à  digestão  proteolítica.  Essa  proteína  insolúvel  se  deposita  nos  tecidos,  onde  é  denominada  amiloide.  O  amiloide  pode  ser
depositado em um local ou ser amplamente distribuído pelo corpo. Isso causa lesões pela deslocação de células normais. Quando há envolvimento de órgãos críticos, como rins, fígado ou coração, a doença pode ser fatal. A amiloidose pode
acometer todos os mamíferos domésticos e a deposição assintomática menor de amiloide é comum em animais idosos.
A forma mais comum de amiloide envolve o dobramento errôneo da proteína de fase aguda conhecida como amiloide A sérica (SAA). Os teores de SAA no sangue se elevam significativamente nos animais com inflamação grave. Isto
propicia uma fonte de proteína com dobramento inadequado denominada amiloide AA. Portanto, a amiloidose se desenvolve como uma sequela de doenças inflamatórias crônicas, infecções bacterianas crônicas e tumores malignos. É causa
comum  de  mortes  em  equinos  agressivamente  imunizados  para  produção  de  antissoro.  O  amiloide  AA  comumente  se  deposita  em  órgãos  parenquimatosos  e  pode  não  causar  sinais  clínicos.  O  baço  é  quase  sempre  afetado.  Se  há
comprometimento renal, a presença de amiloide nos glomérulos pode ocasionar proteinúria, resultando, por fim, em insuficiência renal. Não há tratamento para esta forma de amiloidose, embora a remoção da causa primária da inflamação
possa minimizar a progressão da doença.
O dobramento inadequado de imunoglobulinas de cadeia leve gera a segunda forma de amiloide, o amiloide AL. Isso se deve à produção excessiva de cadeias leves monoclonais em animais com mieloma múltiplo. O amiloide AL tende a
se depositar em tecidos mesenquimais, especialmente no tecido nervoso e nas articulações. É rara em animais domésticos.
Sabe­se que pelo menos outras 20 proteínas formam lâminas β inadequadamente dobradas, que se depositam nos tecidos como amiloide. Portanto, há várias formas reconhecidas de amiloidose hereditária, como as descritas em gatos
Abissínios  e  cães  da  raça Chinese  Shar­Pei.  Alguns  amiloides  são  formados  em  todos  os  animais  idosos  (amiloidose  sistêmica  senil);  por  exemplo,  em  cães  idosos,  o  amiloide  é  comumente  depositado  na  camada  média  das  artérias
meníngeas e corticais. Há relato de amiloide subcutâneo e nódulos de amiloide semelhantes a tumor, em equinos.
Algumas formas de amiloides são transmissíveis, destacando­se encefalopatias espongiformes transmissíveis, como encefalopatia espongiforme bovina (p. 1390) e o scrapie (p. 1392), que são causadas por príons. De fato, há evidências
de  que  o  amiloide  A  seja  relativamente  transmissível,  pois  a  administração  experimental  de  pequenas  quantidades  da  proteína  amiloide  a  um  animal  pode  acelerar  seu  desenvolvimento.  Os  guepardos  são  especialmente  propensos  a
amiloidose e apresentam uma forma infecciosa de amiloide nas fezes.
Em razão de sua distribuição difusa e de início insidioso, o diagnóstico clínico da amiloidose é difícil. No entanto, deve­se suspeitar dessa enfermidade em casos de insuficiência renal ou hepática em animais com infecção ou inflamação
crônica. Não há terapia específica que possa prevenir o desenvolvimento da amiloidose ou promover a reabsorção de fibrilas. Os animais com abscessos crônicos ou mieloma múltiplo devem ser tratados para reduzir a disponibilidade das
proteínas precursoras de fibrilas. A amiloidose é rapidamente identificada na necropsia e em cortes histológicos devido à afinidade pela coloração vermelho­congo.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS

O desenvolvimento embrionário e fetal é resultado de uma complexa série de eventos bem conduzidos. Quando propriamente realizado, o resultado é um neonato normal. O desenvolvimento imperfeito também pode ser expresso como
perda embrionária, morte fetal, mumificação, aborto, nascimento de natimorto ou neonato inviável. Quando o desenvolvimento é interrompido resulta em desvios da normalidade que está presente ou aparente no nascimento, este defeito é
dito congênito. Outros defeitos no desenvolvimento podem não se tornar aparentes até certa idade, embora o evento seja revelado principalmente no nascimento, o defeito não é estritamente classificado como congênito. Embora o evento
ou  o  agente  resultem  na  parada  do  desenvolvimento,  o  diagnóstico  pode  permanecer  indefinido  por  várias  razões  reconhecidas  como  condições  congênitas.  Avanços  tecnológicos  na  linha  da  teratologia  foram  identificados  como  um
aumento no número de especificidades genéticas, ambientais e agentes infecciosos como etiologia determinante de certos casos de defeitos no desenvolvimento fetal.
Teratógenos são agentes ou fatores que causam o desenvolvimento de defeitos físicos no embrião ou no feto. O tempo de exposição ao teratógeno influencia o eventual resultado. Enquanto zigotos, as células resultam da união de
gametas, são relativamente resistentes para os efeitos de vários teratógenos, eles podem ser afetados por alterações cromossômicas ou aberrações que ocorrem durante o processo de gametogênese ou fertilização, bem como mutações
genéticas que podem passar de um ou ambos os pais. Assim que ocorre o desenvolvimento do zigoto para embrião e a progressão da organogênese, ocorre a suscetibilidade a teratógenos ambientais e o aumento de agentes infecciosos
teratogênicos. Com a idade do concepto, o feto torna­se mais resistente aos teratógenos ambientais. Estruturas que se diferenciam tardiamente como o palato, cerebelo e sistema urogenital levam a riscos no período fetal.
Semelhantes  e,  talvez,  indistinguíveis,  os  defeitos  podem  ser  induzidos  por  mais  de  um  agente.  A  exposição  a  agentes  tóxicos  ou  infecciosos  na  fase  crítica  do  desenvolvimento  embrionário  ou  fetal  podem  induzir  a  anormalidades
congênitas que se assemelham a condições hereditárias. Com o aumento da consciência sobre a importância das anormalidades por parte dos criadores e das associações de criadores, os profissionais e clínicos devem ser rigorosos na
investigação dos casos, para evitar problemas de hereditabilidade e para evitar o problema nas linhagens das raças.
Os defeitos estruturais e funcionais congênitos devem ser descritos em todas as espécies domésticas. Embora os defeitos congênitos sejam geralmente classificados ou descritos pelo sistema do corpo ou parte principal envolvida, tal
sistema de classificação é complicado, devido ao envolvimento simultâneo frequente de vários sistemas do corpo. Mesmo assim, a classificação descritiva é a base para a comparação e permite estimativas de tempo do rompimento do
relativo evento do desenvolvimento fetal e, às vezes, da etiologia (Tabela 1).

Etiologia
A identificação dos sinais moleculares que guiam o desenvolvimento sequencial dos órgãos e sistema de órgãos, acoplados a ferramentas de diagnóstico molecular e testes genômicos permitem um maior detalhamento para entender várias
anomalias congênitas. É provável que com o avanço dessas tecnologias, a origem de outras condições seja também entendida.
As anormalidades cromossômicas ocorrem durante a gametogênese ou a fertilização e podem resultar em anormalidades embrionárias letais ou, ocasionalmente, anormais. Erros na oogênese podem estar associados ao aumento da idade
materna e em várias espécies resultam em falhas na fertilização, redução na viabilidade embrionária ou em deficiências que são expressas durante o desenvolvimento fetal. Erros cromossômicos como trissomia foram relatadas na medicina
veterinária e tem aumentado a disponibilidade do cariótipo. As análises cromossômicas auxiliares tem aumentado o reconhecimento destes defeitos.

Tabela 1 – Alguns defeitos congênitos comuns em animais domésticos

Amelia Ausência de membro(s)
Artrogripose Flexão persistente ou contratura de articulação(ões)

Atresia Ausência ou fechamento de uma abertura ou passagem corporal normal
Braquignatia Encurtamento anormal da mandíbula
Cifose Convexidade anormalmente aumentada da coluna torácica
Criptorquidismo Falha do testículo em descer ao escroto
Escoliose Desvio lateral do eixo da coluna vertebral
Gastrosquise Desenvolvimento anormal caracterizado por fissura da parede abdominal
Hemimelia Ausência de todo membro ou da parte distal
Hérnia Protrusão anormal de um órgão ou porção do órgão através de um defeito ou abertura natural
Hidranencefalia Ausência de hemisférios cerebrais e substituição por fluido cerebrospinal
Hidrocefalia Fluido anormal na calota craniana acompanhado de aumento da cabeça
Microftalmia Olhos anormalmente pequenos
Palatosquise Fissura do palato (fenda palatina)

Perosomus Desenvolvimento anormal caracterizado por deformação no corpo ou tronco
Polidactilia Dedos supranumerários
Porencefalia Presença de cavidades no cérebro desenvolvidas durante a fase fetal
Prognatia Projeção acentuada da mandíbula
Queilosquise Divisão anormal dos lábios (lábio leporino)
Sindactilia Fusão de dígitos

O envelhecimento dos gametas seguido pelo tempo subnormal de inseminação representa outra fonte de anormalidades cromossômicas levando a erros do desenvolvimento embrionário. Todas as células embrionárias defeituosas podem
ser aneuploides ou vários níveis de mosaicismo podem existir.
Anormalidades cromossômicos e epigenéticas podem ocorrer durante técnicas de reprodução assistida que envolvam coleta de oocistos, cultura e fertilização. Vacas prenhes de células somáticas ou, em menor grau, de fertilização in
vitro aumentam o risco de desenvolvimento da síndrome anormal da prole devido a falhas no mecanismo fisiológico necessário para o desenvolvimento fetal e placentário. Estes erros no desenvolvimento e na fixação da placenta podem
resultar em morte fetal, aborto, várias anormalidades ou baixo peso ao nascimento e, geralmente, associados à distocia.

Defeitos Hereditários
As anomalias hereditárias resultantes de genes mutantes presentes nas linhagens ou nas famílias de animais são observadas em todas as raças. Eles podem ser observados em padrões típicos de herança como padrão recessivo autossômico
simples tipificado por recentes descrições de anomalias artrogripose múltipla de bovinos Angus. Os traços de defeitos dominantes são herdados e, às vezes, selecionados.
Alguns defeitos filogenéticos requerem a inclusão de mais de um gene na interação. A síndrome da cauda de rato, uma forma congênita de hipotricose em bovinos, é controlada por genes que atuam em locus.
Como os animais heterozigotos para características recessivas indesejáveis ou letais muitas vezes não podem ser detectados através de exame visual, e várias vezes exibe um fenótipo que parece ser indesejável, inadvertidamente a seleção
pode auxiliar na disseminação dos defeitos genéticos em algumas criações. Por exemplo, bovinos heterozigotos para hemimelia tibial possuem conformação da parte traseira e características de pelagem que são preferidas para algumas
raças e a seleção do fenótipo de certos touros podem aumentar a frequência de alelos na população. Da mesma forma, o padrão de cor Overo é atrativa para alguns criadores de equinos, animais homozigotos para este padrão de pelagem são
geralmente afetados com anomalias congênitas letais devido a falhas na inervação secundária do trato intestinal para aganglionose ileocólica. É recomendada a inclusão de apenas um padrão overo no acasalamento. A herança dominante da
ausência de chifres em cabras leiteiras está associada a um alelo recessivo que resulta na masculinização de fêmeas homozigotas (também denominada cabra intersexo mocha). Programas de melhoramento restritivos que mantêm pelo
menos um reprodutor com chifre eliminam este defeito.
Os defeitos hereditários na função metabólica podem resultar em morte fetal ou embrionária, nascimento de neonatos não viáveis ou nascimento de prole comprometida que sobrevive. Como os defeitos podem ser letais no útero ou perto
do período pós–natal, ou os animais podem sobreviver, mas com algum comprometimento. A observação cuidadosa e a investigação diagnóstica são requeridas para identificação apropriada destas condições e ligá­las a informação do
pedigree.
A deficiência de monofosfato sintetase (DUMP) é uma característica autossômica recessiva letal antigamente amplamente distribuída em bovinos da raça Holandesa. O acasalamento de dois animais com DUMP resulta em embrião
homozigoto, fertilização aparentemente normal e morte do feto no início da gestação. A seleção de touros destinados à inseminação artificial tem reduzido com sucesso a prevalência de animais com DUMP.
A citrulinemia em bovinos resulta na interrupção do ciclo da ureia devido a deficiência de argininossuccinato sintetase, sendo letal em animais homozigotos. Afeta bezerros aparentemente normais ao nascimento, mas que desenvolvem
elevadas concentrações de amônia e morte dentro de alguns dias.
Os defeitos encontrados no cromossomo X, como um dos fatores responsáveis pela distrofia muscular ligada ao X em cães da raça Golden Retriever, são expressos em machos que carreiam apenas uma única cópia do alelo defeituoso.
Ambos os pais não são afetados, com a mãe carreando uma única cópia de um alelo defeituoso no cromossomo X.
A Tabela 2 contém uma lista parcial de anormalidades com base molecular conhecida.
O uso de linhagens genéticas de elite em espécies domésticas aumenta com a rápida e ampla adoção de tecnologias reprodutivas, particularmente inseminação artificial e a transferência de embriões e, mais recentemente, a fertilização in
vitro. A disseminação de genes recessivos indetectáveis em grande parte da população domesticada, em todo o mundo, foi uma consequência acidental e não intencional.
À medida que aumenta a porcentagem de animais carreadores de características recessivas indesejáveis, aumenta as chances de acasalamentos de indivíduos geneticamente relacionados, segue­se a expressão do fenótipo indesejável. A
malformação  do  complexo  vertebral  em  bovinos  leiteiros  Holstein­Friesian  foi  disseminada  por  todo  o  mundo  devido  principalmente  a  influência  de  um  único  touro  da  raça  holandesa  dos  EUA  e  de  sua  prole.  Semelhante  a  isto,  a
artrogripose múltipla em bovinos Angus recebeu atenção internacional devido à influência de um touro popular, sua prole e descendentes. Em ambos os casos, testes genéticos realizados por associações de criadores após a descrição da
condição permitiram acasalamento apropriados que minimizaram os efeitos ou eliminaram estas ocorrências.
Enquanto há condições genéticas deletérias na população ou na raça, o alelo anormal geralmente se distribui amplamente na população. O reconhecimento e a detecção precoce são importantes para minimizar esta possibilidade. Todas as
anormalidades congênitas devem ser investigadas e quando uma condição parece ter um componente genético, técnicas apropriadas para obter a informação da linhagem e identificar o fenótipo homozigoto mutante devem ser exploradas.
Um sistema estruturado de notificação e registro inicia­se com descrições clínicas e patológicas detalhadas, sendo necessárias para centralizar informações e focar atenção nas alterações físicas e fisiológicas que podem ter origem genética.
A  análise  da  linhagem  e  o  teste  de  acasalamento  de  animais  estreitamente  relacionados,  juntamente  com  exames  de  DNA  recentemente  desenvolvidos,  permitem  identificar  defeitos  genéticos  específicos  e,  em  alguns  casos,  detecção
relativamente rápida. Várias associações de criadores de raças específicas relatam anomalias congênitas a patologistas, geneticistas e biólogos moleculares para identificar defeitos genéticos emergentes.
Uma vez identificadas condições genéticas recessivas, há diversas opções para minimizar sua ocorrência. Para malformação vertebral complexa, testam­se todos os touros da raça Holandesa utilizados em programas de inseminação
artificial.  Touros  foram  identificados  como  carreadores  ou  sem  defeitos.  Os  resultados  diminuíram  o  uso  de  sêmen  de  touros  carreadores,  com  redução  da  ocorrência  da  condição  e  da  frequência  de  alelo  em  determinada  raça.  Outras
condições genéticas recessivas na mesma raça, inclusive deficiência da adesão leucocitária bovina e DUMP foram tratadas da mesma forma e recentemente foi identificada a Síndrome de Brachyspina que, provavelmente, será estudada da
mesma maneira. A ampla utilização de inseminação artificial em bovinos leiteiros permite esta estratégia tenha um rápido impacto.
Em raças ou espécies nas quais pouco se utiliza a inseminação artificial, uma abordagem mais agressiva pode ser necessária. Após a detecção de artrogripose múltipla, a Associação Americana de Criadores de Bovinos da raça Angus
obriga  a  realização  de  testes  de  identificação  de  todos  os  touros  empregados  em  programas  de  inseminação  artificial.  Também,  são  requeridos  testes  genéticos  para  determinar  o  estado  de  carreador  em  todos  os  animais  de  linhagens
suspeitas submetidos a registro. Nenhum certificado será entregue aos proprietários de animais portadores nascidos após a data especificada. Requerimentos semelhantes para animais com linhagens rastreadas e carreadores de hidrocefalia
neurogênica foram colocados em prática por esta Associação de Criadores. Testes extensivos e identificação de carreadores individuais são utilizados pela Associação de Criadores de Cavalos Quarto­de­Milha para minimizar a prevalência
de paralisia hiperpotassêmica periódica.
Uma nova anormalidade genética recessiva foi identificada e caracterizada por testes genéticos para determinar possível estado de carreador. Associações de raças e criadores adotarão testes e estratégias de identificação semelhantes às
mencionadas anteriormente. Entretanto, a implementação de testes estratégicos é mais complicada para defeitos não letais e para condições em que os heterozigotos possuem um fenótipo considerado desejável.
Tabela 2 – Anomalias congênitas com base molecular conhecida

Espécies Anomalias

Bovinos Artrogripose múltipla (raça Angus e seus mestiços)
Síndrome Braquispina (raça Holandesa)
Síndrome Chediak­Higashi
Malformação vertebral complexa (raça Holandesa)
Citrulinemia
Deficiência de uridina monofosfato sintetase (raça Holandesa)
Síndrome Ehlers­Danlos
Doença do armazenamento de glicogênio
Bócio familiar (raça Holandesa)
Deficiência de adesão leucocitária
a­Manosidose
β­Manosidose
Doença da urina parecida com xarope de bordo
Hipertrofia muscular (raças Shorthorn, Maine­Anjou)
Hipoplasia muscular com anasarca (raça Shorthorn)
Mioencefalopatia degenerativa progressiva (raça Pardo­Suíça)
Protoporfiria
Atrofia muscular espinal (raça Pardo­Suíça)
Sindactilia (raças Holandesa, Angus)
Hemimelia tibial (raças Shorthorn, Maine­Anjou)
Cães Deficiência de C3
a­fucosidose
Doença do armazenamento de glicogênio (I, VII)
Hemofilia B
Doença de Krabbe
Deficiência de adesão leucocitária
Mucopolissacaridose (I, VII)
Distrofia muscular (Becker, Duchenne [ligada ao X])
Miotonia
Narcolepsia
Nefrite ligada ao cromossomo X
Deficiência de piruvato quinase em hemácias
Displasia do bastonete­cone
Imunodeficiência grave combinada
Tremor ligado ao cromossomo X
Doença de Von Willebrand III
Caprinos Bócio familiar
β­manosidose
Mucopolissacaridose III
Redução da concentração de caseína
Síndrome da reversão do sexo
Equinos Paralisia hipercalcêmica periódica (raça Quarto­de­Milha, outras)
Megacólon
Imunodeficiência combinada grave (raça Árabe)
Gatos Gangliosidose (GM1, GM2)
Mucopolissacaridose (I, VI, VII)
Distrofia muscular (Duchenne, Becker)
a­manosidose
Ovinos Lipofucscinose ceroide
Condrodisplasia
Doença do armazenamento de glicogênio IV
Suínos Hipercolesterolemia
Hipertermia maligna
Teratógenos Ambientais
Os  teratógenos  ambientais  incluem  plantas tóxicas,  viroses,  medicamentos,  oligoelementos,  deficiências  nutricionais  e  agentes  físicos,  tal  como  radiação,  hipertermia,  posição  uterina  e,  às  vezes,  pressão  durante  a  palpação  retal  para
detecção de prenhez. Embora os defeitos ocasionados ao neonato possam assemelhar ou imitar defeitos hereditários, eles não seguem um padrão familiar. Causas específicas podem dificultar a identificação, mas geralmente seguem um
padrão associado a características de crescimento de plantas tóxicas ou disponibilidade de vetores apropriados suscetíveis a vírus transmitidos por artrópodes. Embora as anomalias congênitas podem ser decorrentes de doença materna
devido à intoxicação por plantas ou por infecção viral, às vezes os efeitos teratogênicos ocorrem na ausência de sinais clínicos na fêmea.
Produtos  biológicos  ativos  produzidos  por  várias  plantas  são  conhecidos  por  serem  teratogênicos  (ver  plantas  tóxicas  para  animais,  p.  3162).  A  ingestão  pode  resultar  em  aborto,  nascimento  de  neonatos  não  viáveis  ou  geração  de
neonatos  anormais  ao  nascimento.  A  perda  na  produção  pode  ser  significativa  se  o  número  de  animais  que  acessam  as  plantas  afetadas  em  período  crítico  do  desenvolvimento  embrionário  ou  fetal  for  considerável.  Veratrucum
califormicum (repolho­gambá) foi implicado como causa de gigantismo fetal, gestação prolongada e deformidades craniofaciais em ovinos criados em pastagem contendo plantas. A ciclopamina, um composto alcaloide esteroide produzido
por algumas plantas é um agente teratogênico. Doses experimentais desta toxina em ovelhas com 13 a 15 dias de gestação pode causar uma variedade de anomalias congênitas. A ingestão no 14o dia, especificamente, induz à sinoftalmia ou
defeito ciclopiano. Ovelhas expostas na fase final da gestação podem parir cordeiros normais, mostrando a interação crítica entre o tempo de exposição e o período de gestação.
Em bovinos, a ingestão de várias espécies de tremoço (Lupinus laxiflorus, L. caudatus, L. sericeus ou L. nootkatensis) resulta em “doença do bezerro torto”, caracterizada por contraturas articulares, torcicolo, escoliose ou cifose, fenda
palatina, ou combinações destes defeitos. A anagirina, um alcaloide quinolizidina, foi identificada como teratogênica e o período crítico de exposição é 40 a 70 dias de gestação. A ingestão de L. formosus causa  anomalias  esqueléticas
similares e fenda palatina em bovinos e caprinos; o teratógeno é o alcaloide piperidina. O desenvolvimento fetal está exposto a risco máximo quando as vacas prenhes pastejam tremoço em fase inicial de crescimento ou durante a formação
de sementes. As perdas periódicas devido à “doença do bezerro torto” no oeste dos EUA ocorrem após a ingestão da planta pelos bovinos em pastejo.
Conium maculatum (cicuta tóxica) causa anomalias tipo contratura e ocasionalmente fenda palatina em bovinos, ovinos, caprinos e suínos. Tanto a planta como a semente são tóxicas e teratogênicas.
A ingestão de Nicotiana tabacum provoca anomalias esqueléticas em suínos, semelhantes àquelas induzidas em bovinos e suínos por Lupinus e Conium maculatum. Notam­se amelia e hemimelia congênitas em leitões quando a porca
prenhe tem acesso ao caule do tabaco. Atualmente esta ocorrência é rara devido às mudanças que ocorreram no manejo dos suínos. Nicotiana glauca (árvore do tabaco) também induz anomalias tipo contratura e fenda palatina em bovinos,
ovinos e caprinos.
Outras plantas suspeitas de causar anomalias similares em bovinos incluem Senecio, Cycadales, Blighia, Papaveraceae, Colchicum, Vinca spp e Indigofera spicata e plantas relacionadas. O capim Sudão (Sorghum vulgare) é incriminado
como causa de contraturas congênitas em articulações de equinos e S. sudanese pode ocasionar artrogripose em bezerros.
Éguas prenhes que se alimentam de pastagem de capim festuca ou de feno de festuca contaminado com o fungo endófito Neotyphodium coenophialum apresentam risco de aborto, gestação prolongada, hipogalactia e geração de potros
fracos ou imaturos (ver intoxicação por festuca, p. 3076). A ergovalina e outros alcaloides do ergot produzidos pelo endófito são causas da intoxicação por festuca. A festuca livre do endófito e a festuca infectada por cepas atóxicas do
endófito mencionado podem ser seguramente pastejadas por fêmeas prenhes.
No oeste do Canadá, o hipotireoidismo congênito em potros está relacionado com alta concentração de nitrato na dieta das fêmeas prenhes e a exposição na fase final da gestação ao Neotyphodium coenophialum – presente na festuca.
Pesticidas, herbicidas, medicamentos e outros produtos químicos foram incriminados como agentes teratogênicos. Atualmente, drogas e produtos químicos não aprovados nos EUA, Canadá e outros países devem ser testados previamente
quanto ao potencial teratogênico, para obter a licença comercial. Os produtos podem ser rotulados com instruções especificando a permissão do seu uso em animais que estão ou podem estar prenhes. Outros produtos podem ser rotulados
como  seguros  para  animais  gestantes  dependendo  do  período  de  gestação.  Quando  se  utilizam  alguns  herbicidas,  pode  ser  necessário  manter  os  animais  fora  da  pastagem  em  períodos  específicos  após  a  aplicação.  O  uso  extrabula  de
medicamentos em animais prenhes e a exposição acidental a pesticidas e outras substâncias químicas é acompanhado de riscos inerentes, inclusive efeitos adversos no desenvolvimento do feto. Técnicos e produtores devem saber do risco
potencial de perda da gestação ou de desenvolvimento de anomalias congênitas após a administração terapêutica ou a exposição a pesticidas e produtos químicos e devem sempre ter cuidado quando utiliza estes produtos.

Agentes Infecciosos
Infecções virais pré­natais são teratogênicas em vacas, ovelhas, cabras, porcas, cadelas e gatas, mas raramente são incriminadas como causas de anomalias congênitas em éguas. O estágio de desenvolvimento fetal ou embrionário em
relação ao tempo de exposição a determinados vírus determina o tipo e a extensão da anomalia observada. A infecção viral no final da gestação pode resultar em infecção fetal e soroconversão, sem sinais clínicos, enquanto a exposição
durante os estágios iniciais da gestação podem ocasionar aborto ou defeitos congênitos.
A gestação de neonatos com anomalias congênitas após infecção uterina pode se manifestar com sinais clínicos na fêmea; entretanto, anomalias também são observadas em animais sem histórico da doença durante a gestação. Em alguns
casos, o uso de vacinas com vírus vivo modificado em fêmeas prenhes podem provocar defeitos congênitos. Por isto tal uso é desaconselhado.
Infecções por pestivírus são teratogênicas em várias espécies. O vírus da diarreia bovina (BVD) está entre as infecções mais relevantes do ponto de vista econômico, infectando bovinos em todo o mundo. Por outro lado, a infecção
prenatal pode causar vários defeitos congênitos nos sobreviventes, inclusive hipoplasia cerebelar, braquignatia, alopecia, anomalias oculares, hidrocefalia e prejuízo à imunocompetência. A imunotolerância persiste em animais infectados e
pode resultar em infecção fetal com presença prévia de BVD não citopático no 120o dia de gestação. Estes animais são os principais reservatórios da infecção.
As  infecções  por  pestivírus  em  outras  espécies  também  resultam  em  defeitos  congênitos.  A  infecção  de  ovelhas  prenhes  pelo  vírus  da  doença  da  fronteira  (p.  640)  pode  se  manifestar  como  morte  embrionária  ou  fetal  ou  defeitos
congênitos envolvendo os sistemas tegumentar, nervoso, esquelético, endócrino e imune. Os defeitos incluem tremores, ataxia, pelagem anormal, baixo peso ao nascimento, anormalidades faciais e oculares, resposta imune deprimida e
nascimento de neonatos pequenos, cordeiros fracos com deficiente crescimento e viabilidade. A infecção de ovelhas prenhes por BVD provoca anomalias congênitas semelhantes.
A peste suína clássica (p. 815), uma infecção por pestivírus em suínos, antigamente era denominada cólera suína. O vírus foi erradicado nos EUA, mas algumas regiões permanece como a principal causa de doença em suínos. A infecção
prenatal pode resultar em defeitos congênitos semelhantes aos observados em bovinos infectados pelo BVD.
A infecção pelo vírus Cache Valley em ovelhas prenhes resulta em anomalias em seus cordeiros, incluindo artrogripose, torcicolo, escoliose, lordose, hidranencefalia, microcefalia, porencefalia e hipoplasia cerebelar e muscular. Este
buniavírus dissemina–se por meio de mosquitos, sendo encontrado por todo EUA, Canadá e México. Outras espécies de ruminantes podem ser afetadas e outras buniaviroses foram relatadas como causas de defeitos congênitos similares.
O vírus da língua azul, é um orbivírus endêmico em várias regiões da América do Norte, América do Sul, África e partes da Ásia e recentemente expandiu­se para a Europa. A infecção uterina pode induzir hidranencefalia, porencefalia e
artrogripose em ovinos; ademais, pode resultar em aborto, natimorto, artrogripose, campilognatia, prognatismo, hidranencefalia e síndrome do “bezerro apático”, em bovinos. Outras arboviroses, como a infecção pelo vírus de Chuzan e,
possivelmente, doença hemorrágica epizoótica, podem causar aborto, anomalias congênitas e perdas neonatais semelhantes àquelas provocadas pelo vírus da língua azul.
O vírus Akabane (p. 642), um orbivírus presente em várias regiões tropicais e subtropicais, é disseminado pelo Culicoides spp. A infecção de animais nascidos em cativeiro pode ser seguida de infecção transplacentária do feto e pode
provocar deformidades semelhantes àquelas observadas em animais com viroses, tais como língua azul e infecção pelo vírus Cache Valley.
A hipoplasia cerebelar congênita em gatinhos foi considerada resultado da infecção de fêmeas prenhes pelo vírus da panleucopenia felina. A infecção de fêmeas de furão prenhes pelo vírus da panleucopenia felina também pode resultar
em hipoplasia cerebelar congênita.

Fatores Nutricionais
A deficiência de um ou mais nutrientes durante a prenhez pode causar anomalias congênitas no recém­nascido. Microminerais e vitaminas são implicados em vários defeitos de desenvolvimento. As deficiências graves podem interromper a
prenhez ou resultar em filhotes fracos ou inviáveis.
A deficiência de iodo causa ataxia enzoótica em cordeiros; a deficiência de manganês causa deformidades nos membros de bezerros. A deficiência de vitamina D pode provocar raquitismo em neonatos e a deficiência de vitamina A pode
acarretar anomalias oculares ou lábio leporino. Experimentalmente, os efeitos teratogênicos são induzidos por deficiências de colina, riboflavina, ácido pantotênico, cobalamina, ácido fólico e hipervitaminose A.

Agentes Físicos
A contratura congênita articular seguida de nascimento de bezerros e potros relativamente grandes, ou associados a casos de gestação gemelar nestas espécies é um resultado de movimento restrito, devido a lotação uterina. Vários casos são
brandos e podem regredir espontaneamente após o nascimento.
Torcicolo, escoliose e, frequentemente, uma ou mais anomalias nos membros dos potros são associados à posição fetal intrauterina, em especial a apresentação caudal e transversa. O úraco pérvio nos potros tem sido associado à torção do
cordão umbilical.
Em  bovinos,  a  palpação  transretal  agressiva  da  vesícula  amniótica  nos  primeiros  42  dias  de  gestação  (ex.  durante  o  diagnóstico  de  prenhez)  pode  romper  o  suprimento  vascular  para  o  trato  intestinal  e  induzir  a  atresia  coli.  Vacas
holandesas somam os principais casos da malformação e a predisposição genética pode existir. Pelo menos um relato sugere um padrão hereditário autossômico recessivo para atresia coli.

Acidentes Gestacionais de Etiologia Desconhecida
Em  vários  casos  de  anomalias  congênitas  a  etiologia  e  os  fatores  predisponentes  podem  ser  desconhecidos.  Algumas  anomalias  são  específicas  e  de  etiologia  desconhecida  ocorrem  com  frequência  suficiente  para  ser  rapidamente
reconhecida por médicos veterinários de campo.
Perosomus elumbis é uma anomalia congênita que ocorre principalmente em bovinos, mas também em pequenos ruminantes e suínos. Bovinos afetados apresentam agenesia no segmento da medula lombossacra e coluna vertebral e,
secundariamente, hipoplasia, artrogripose e ancilose em membros pélvicos. Outras anomalias associadas ao desenvolvimento dos sistemas GI e urogenital acompanham estas condições. A parte do corpo, os membros e os órgãos craniais ao
defeito de desenvolvimento de medula espinal parecem normais. A condição é fatal, resultando em natimortos ou necessidade de eutanásia em condições humanitárias. Distocia é uma complicação frequente. Embora existam indícios de
herança genética, nenhuma causa foi definitivamente reconhecida. As aberrações na família de genes homeobox, responsáveis por padrões craniais a caudais que podem estar envolvidos.
Schistosomus reflexus é uma anomalia fatal observada em ruminantes, caracterizada por grave retroflexão da coluna espinal, resultando em posicionamento dos membros pélvicos ao lado do crânio, ancilose das articulações apendiculares
e falha no fechamento da parede abdominal com consequente presença de vísceras abdominais fora do corpo. Outras anomalias, como toracosquise, pode acompanhar esta condição. A presença de um feto comprometido resulta em distocia,
requerendo com frequência intervenção cirúrgica ou fetotomia. Alguns relatos com base na análise da linhagem sugerem uma etiologia genética, mas nenhum defeito ou herança foram verificados. Interessante é o caso relatado em bezerros
gêmeos, sendo um afetado e outro normal.
Anasarca fetal é uma anomalia fetal letal observada em várias raças de cães. A causa permanece desconhecida e pode ser variável entre as raças. Esta condição frequentemente resulta em distocia devido ao tamanho desproporcionalmente
grande do feto por ocasião do parto. Um ou múltiplos filhotes de uma ninhada podem ser afetados.

DOENÇA DA FRONTEIRA
(Hairy shaker disease)

A doença da fronteira (Grã­Bretanha) ou hairy shaker disease (Austrália e Nova Zelândia) é um distúrbio congênito dos cordeiros, caracterizado por baixo peso e baixa viabilidade ao nascimento, má conformação, tremores e pelagem
excessivamente espessa em raças de pelame normalmente uniforme. Os cabritos também podem ser afetados de modo semelhante aos bezerros. A doença é reconhecida na maioria das regiões criadoras de ovinos do mundo, inclusive no
oeste dos EUA.
ETIOLOGIA, PATOGENIA E EPIDEMIOLOGIA:  A doença da fronteira é causada pela infecção do feto no início da prenhez por um pestivírus (Flaviviridae) intimamente relacionado com aquele da peste suína clássica (p. 815), da diarreia viral
bovina (BVD) e da doença das mucosas (p. 319). Os cordeiros sobreviventes são persistentemente virêmicos e o vírus está presente em suas excreções e secreções, inclusive no sêmen. Os ruminantes, e possivelmente os suínos, podem se
infectar facilmente pelo contato com esses excretas persistentes ou com ovinos agudamente infectados. As infecções agudas em animais imunocomprometidos são geralmente transitórias e subclínicas e resultam em imunidade ao desafio
com cepas homólogas, mas não heterólogas do vírus.
O vírus adquirido no início da prenhez por animais não expostos anteriormente, atravessa a placenta e invade o feto. Ocorre placentite 10 a 30 dias após a infecção e pode acarretar morte fetal com expulsão, reabsorção ou mumificação.
Pode ocorrer aborto em qualquer estágio da gestação e pode ser imperceptível já que há pouco mal­estar materno.
Em gestações que se mantêm, o vírus se dissemina amplamente nos tecidos fetais, mas as lesões são mais evidentes na pele, no esqueleto e no SNC. Cordeiros afetados podem nascer 2 a 3 dias antes da data prevista e vários morrem antes
ou durante o desmame. Em sobreviventes, os sinais clínicos regridem gradualmente, mas esses animais permanecem infectados e excretam o vírus pelo resto de suas vidas, expondo sua progênie e seus companheiros de rebanho. A morte
proveniente de uma síndrome similar à doença das mucosas do bovino pode suceder nesses ovinos de pelo arrepiado “recuperados” em qualquer momento.
Em rebanhos na primeira temporada de uma nova infecção, até 50% ou mais dos cordeiros nascidos podem ser acometidos pela doença da fronteira. Depois disso, a prevalência diminui, embora a doença possa se tornar endêmica quando
se mantêm os animais “recuperados” para acasalamento. O vírus é mais comumente introduzido nos rebanhos suscetíveis pelo acréscimo de animais persistentemente infectados. Entretanto, isto não é incomum para ovelhas que adquirem a
infecção de bovinos com infecção persistente. Para finalidades práticas, deve­se assumir que ovinos e bovinos são igualmente suscetíveis a todas as cepas do vírus da doença da fronteira e do vírus da BVD, mesmo sabendo que pelo menos
três grupos antigênicos de pestivírus tenham sido identificados em ruminantes.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os rebanhos afetados são provavelmente reconhecidos inicialmente no momento do parto devido ao aumento do número de ovelhas estéreis e no nascimento de cordeiros anões com um pelame excessivamente espesso
e, às vezes, demasiadamente pigmentado. Alguns cordeiros exibem tremores musculares involuntários, em particular no tronco e nos membros pélvicos. Os tremores diminuem durante o repouso e se exacerbam no caso de movimento
intencional. Em outros, podem predominar anomalias esqueléticas, como quartelas caídas e braquignatia mandibular. Os cordeiros afetados tem sobrevida curta. Em sobreviventes, os sinais nervosos desaparecem gradualmente dentro de 3 a
4 meses. Mesmo na ausência dos cordeiros com pelos tipicamente arrepiados, os surtos de baixa fertilidade nas ovelhas e de fraca viabilidade e mau rendimento nos cordeiros estão associados mais frequentemente com a infecção pelo vírus
da doença da fronteira.
Lesões:  Em  casos  graves,  pode­se  observar,  à  necropsia,  cavitação  cerebral.  Por  outro  lado,  as  lesões  características  são  microscópicas  e  envolvem  a  substância  branca  do  SNC.  Há  deficiência  de  mielina  e  aumento  de  células  gliais
interfasciculares, nas quais pode haver acúmulo de gotículas lipídicas semelhantes à mielina. Essas alterações são mais óbvias no recém­nascido e regridem gradativamente.
DIAGNÓSTICO:  Os achados clínicos geralmente permitem um diagnóstico, embora nas raças de ovinos com pelagem áspera, o excesso de pelo anormal ao nascimento possa não ser aparente. O diagnóstico pode ser confirmado pelo exame
histológico  das  lesões  patognomônicas  do  SNC,  mediante  coloração  imunocitoquímica  do  vírus.  Em  cordeiros  com  a  doença  típica,  o  vírus  pode  ser  facilmente  detectado  no  sangue  e  tecidos.  O  sangue  pré­colostral  é  ideal  porque  o
anticorpo colostral pode mascarar a presença do vírus por até 2 meses. O vírus pode ser isolado do soro ou de células da papa leucocitária de culturas celulares, mas há um teste ELISA para detecção de antígeno viral utilizando amostra de
sangue em heparina ou em ácido etilenodiaminotetracético (EDTA). PCR com transcriptase reversa (RT) também pode ser utilizada para detecção do RNA viral em amostras clínicas e para a tipagem de pestiviroses em ruminantes.
No diagnóstico diferencial, devem ser consideradas outras causas de aborto ovino (p. ex., Chlamydia,  Salmonella,  Campylobacter,  Rickettsia spp e Toxoplasma gondii).  Em  cordeiros  nascidos  vivos,  devem­se  diferenciar  doença  da
fronteira de curvatura espinal (ataxia enzoótica), meningoencefalite bacteriana, encefalomalacia simétrica focal e doença do “cordeiro demente”.
CONTROLE:  Não há tratamento efetivo. Sorologia deve ser realizada nas mães dos cordeiros afetados. A maioria deve ter alto teor de anticorpos e ser imune à estimulação adicional com a mesma cepa do vírus nas gestações subsequentes.
Naquelas que não têm títulos de anticorpo deve­se realizar triagem quanto à presença de vírus para identificar aquelas persistentemente infectadas. Os cordeiros recuperados não devem ser mantidos como reprodutores, mas podem ser
misturados ao lote de reposição imediatamente antes da estação de acasalamento para maximizar as oportunidades do último lote se infectar e desenvolver imunidade antes dos acasalamentos subsequentes. Não há vacina eficaz. A vacina
contra o vírus da BVD, para bovinos, não pode ser recomendada aos ovinos, pois o vírus da doença da fronteira mais comumente isolado de ovelhas é antigenicamente distinto daquele da BVD mais comumente encontrado em bovinos.

INFECÇÃO PELO VÍRUS AKABANE
O  vírus  Akabane  é  vírus  transmitido  por  insetos;  causa  anormalidades  congênitas  do  SNC  em  ruminantes.  A  doença  decorrente  do  vírus  Akabane  foi  reconhecida  na  Austrália,  Israel,  Japão  e  Coreia;  têm­se  encontrado  anticorpos  em
inúmeros países no Sudeste Asiático, no Oriente Médio e na África. A doença acomete fetos de bovinos, ovinos e caprinos. A infecção assintomática é demonstrada sorologicamente em equinos, búfalos e cervos (mas não em humanos ou
suínos) nas regiões endêmicas.
ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  O agente causador, o vírus Akabane, é um membro do sorogrupo Simbu da família Bunyaviridae. Dissemina­se pelo mosquito Culicoides spp na Austrália, Japão e Quênia.
O vírus Akabane é comum em várias regiões tropicais e subtropicais entre cerca de 35°N e 35°S. Nessas regiões endêmicas, os herbívoros são picados pelos vetores, tornam­se infectados em idade precoce e desenvolvem imunidade
duradoura pelo tempo da reprodução; por conseguinte, raramente são observadas anormalidades congênitas. No entanto, sob condições ambientais favoráveis como verão úmido e extenso, o vetor (e, portanto, o vírus) pode se alastrar para
novas  regiões  e  surtos  de  infecção  congênita  podem  ser  esperados.  Esses  surtos  geralmente  ocorrem  nos  limites  norte  ou  sul  da  distribuição  do  vetor  ou  em  regiões  de  maior  altitude.  De  modo  semelhante,  os  ruminantes  prenhes
provenientes de regiões livres de vetores e vírus, que foram transportados para regiões infectadas pelos vírus, estão em risco.
A prevalência da doença causada pelo vírus Akabane é influenciada pelo tempo de gestação em que a infecção ocorre e também pela cepa do vírus. Infecções nos últimos 3 meses de gestação resultam em prevalência relativamente baixa
da  doença  (5  a  10%  dos  bezerros  são  infectados).  Observa­se  prevalência  máxima  no  3o e 4o meses,  condição  em  que  até  40%  dos  bezerros  podem  nascer  com  anomalias.  Algumas  cepas  do  vírus  Akabane  provocam  prevalência  de
anormalidades muito baixa (< 20%), mesmo em estágios de gestação mais suscetíveis, visto que as mais patogênicas podem causar doença em até 80% dos animais infectados.
Em  ovinos  e  caprinos,  a  doença  é  observada,  mas  a  manifestação  sequencial  das  diferentes  anormalidades  vistas  em  bovinos  não  ocorre  em  razão  do  período  de  gestação  mais  curto  e  da  suscetibilidade.  Várias  anormalidades  se
desenvolvem após infecções entre o 28o e o 56o dias de gestação. Poucas anormalidades são observadas quando a infecção ocorre em outros períodos. Contudo, não se sabe se a infecção em grandes ou pequenos ruminantes, no início da
gestação, resulta em infecção letal, com abortamento.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os achados patológicos e os sinais clínicos dependem da espécie animal e do momento da infecção. Em um rebanho bovino com período de parição prolongado ou ao redor de 1 ano, todas as anormalidades
podem ser observadas. As anomalias mais graves são notadas após as vacas suscetíveis terem sido infectadas entre cerca de 80 e 150 dias de gestação; no entanto, os bezerros podem ser infectados, na maioria das vezes, após os primeiros 2
meses de gestação. Bezerros infectados no final da prenhez podem nascer vivos, mas incapazes de ficar em pé e podem apresentar paralisia flácida dos membros, ou podem estar incoordenados e à necropsia evidenciam encefalomielite
disseminada. Os animais infectados precocemente (durante o segundo trimestre de gestação) apresentam fixação rígida dos membros, quase sempre em flexão (artrogripose) e às vezes torcicolo, cifose e escoliose com atrofia muscular
neurogênica associada, devido à perda dos neurônios motores espinais. Essas anormalidades geralmente causam distocia e podem resultar em complicações obstétricas graves, resultando, às vezes, em infertilidade e até morte das vacas. Os
primeiros bezerros que nascem com artrogripose são afetados com menos gravidade do que aqueles que nascem nas próximas 4 a 6 semanas. Inicialmente apenas 1 ou 2 articulações podem ser afetadas em um único membro, mas casos
tardios podem ter fixação grave de múltiplas articulações em vários ou todos os membros. Os bezerros afetados no final do primeiro trimestre de gestação comumente nascem vivos e, se forem capazes de se levantar, andam mal, e estão
deprimidos  e  cegos.  Esses  bezerros  apresentam  graus  variáveis  de  cavitação  dos  hemisférios  cerebrais,  variando  de  porencefalia  a  hidranencefalia  grave.  A  última  é  comum,  especialmente  entre  os  infectados  precocemente  durante  a
gestação. Alguns bezerros podem ser afetados tanto com artrogripose quanto com hidranencefalia.
Pode ocorrer aborto de bezerros com hidranencefalia grave no meio da gestação. Uma característica útil no diagnóstico diferencial é a ausência virtual de lesões macroscópicas e histológicas no cerebelo, o que distingue a infecção do
vírus Akabane de outras viroses teratogênicas como aquela provocada pelo vírus da BVD.
Em pequenos ruminantes, as lesões de artrogripose e hidranencefalia são quase sempre observadas simultaneamente e são comuns nos mesmos animais. Em carneiros e filhotes, uma variação de outras anomalias pode ocorrer, inclusive
hipoplasia pulmonar e da medula espinal. A maioria dos cordeiros ou filhotes infectados com o vírus Akabane nasce ou morre logo após o nascimento. Os abortos também são observados.
Em equinos, suspeita­se de anormalidades congênitas induzidas pelo vírus Akabane (especialmente artrogripose e hidranencefalia), mas a confirmação laboratorial é inconclusiva.
DIAGNÓSTICO:  Pode­se realizar um diagnóstico presuntivo com base nas lesões macroscópicas do SNC, porém deve­se diferenciar a doença de outras infecções e anomalias genéticas. Pode­se confirmar a infecção por meio de exame do
soro ou de fluidos corporais (p. ex., fluido pericárdico ou pleural) da cria infectada não lactente e de suas mães mediante pesquisa de anticorpos soroneutralizantes contra o vírus Akabane. Embora a detecção do anticorpo no soro materno
não confirme o vírus Akabane como agente etiológico, sua ausência é definitiva para sua exclusão como causa.
Outros vírus carreados por vetores (e também vírus não carreados, como o da BVD) podem causar anomalias congênitas idênticas ao vírus Akabane. O vírus de Aino, um parente do Akabane, é encontrado na Austrália, Japão e vários
outros  países  onde  há  o  vírus  Akabane  e  tem  sido  causa  infrequente  de  doença  em bovinos.  No  Japão,  o  vírus  Chuzan,  um  reovírus,  é  transmitido  por Culicoides oxystoma  e  ocasiona  infecção  congênita  em  bezerros  similar  ao  vírus
Akabane. Nos EUA, o vírus Cache Valley, outro bunyavírus carreado por vetor não relacionado com o vírus Akabane, tem sido associado a anomalias congênitas em ovinos e, às vezes, em bovinos, em alguns estados americanos.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Não há tratamento específico para os animais infectados. Medidas devem ser direcionadas à prevenção da infecção pelo vírus Akabane nos animais suscetíveis durante a prenhez. A introdução de um rebanho
oriundo de região não endêmica em regiões endêmicas deve ser feita bem antes do primeiro acasalamento. Vacinas efetivas estão disponíveis no Japão.

ANTRAZ (Febre esplênica, Úlcera da Sibéria, Carbúnculo, Pústula maligna)

O antraz é uma zoonose causada pela bactéria formadora de esporos denominada Bacillus anthracis. Essa doença é mais comum em herbívoros domésticos e selvagens (p. ex., bovinos, ovinos, caprinos, camelos e antílopes), mas também
pode acometer pessoas expostos a tecidos de animais infectados, produtos de origem animal contaminados ou diretamente a esporos de B. anthracis sob condições especiais. Dependendo da via de infecção, do hospedeiro e dos fatores
específicos de cada cepa, o carbúnculo pode ter diferentes apresentações clínicas. Nos herbívoros, quase sempre se apresenta como sepse aguda com alta taxa de mortalidade, frequentemente acompanhada de linfadenite hemorrágica. Já nos
cães, pessoas, equinos e suínos, o quadro é, em geral, menos agudo.
Os esporos de B. anthracis podem permanecer infectantes no solo por vários anos. Durante esse período, são potenciais fontes de infecção para animais criados a pasto, mas geralmente não representam risco de infecção direta aos
pessoas. Os animais a pasto podem se infectar ao ingerirem quantidades suficientes desses esporos do solo. Além da transmissão direta, moscas picadoras podem transmitir mecanicamente esporos de B. anthracis e causar a doença. Além
disso, pode ocorrer a transmissão direta de um animal a outro. A importância relativa desse tipo de transmissão durante epizootias ou epidemias ainda precisa ser quantificada, mas é frequentemente considerada. As rações contaminadas
com ossos ou outros alimentos provenientes de animais infectados podem atuar como fonte de infecção nas criações extensivas, assim como o feno altamente contaminado por meio do solo. Carne contaminada crua ou mal cozida é uma
fonte de infecção para carnívoros e onívoros; carbúnculo resultante do consumo de carne contaminada foi em suínos, cães, gatos, visons, carnívoros selvagens e pessoas.
EPIDEMIOLOGIA:  Subdiagnósticos e relatos incertos dificultam a estimativa da real prevalência da doença no mundo. Entretanto, o carbúnculo foi relatado em quase todos os continentes, sendo mais frequente em regiões agrícolas com
solos do tipo calcário neutros ou alcalinos. Nessas regiões, a enfermidade aparece periodicamente como epizootias em animais domésticos e selvagens suscetíveis. Essas epizootias estão associadas à seca, inundações ou solos mal cuidados
e vários anos podem se passar entre os surtos. Durante os períodos entre uma epidemia e outra, casos esporádicos podem ajudar a manter a contaminação do solo.
Casos humanos podem resultar do contato com animais ou produtos de origem animal contaminados. O risco da doença às pessoas é comparativamente pequeno em países desenvolvidos, em parte porque são relativamente resistentes à
infecção e porque é menos provável de serem expostos aos esporos patogênicos. No entanto, em países em desenvolvimento cada vaca afetada pode resultar em até 10 casos humanos, por motivos culturais, econômicas e epidemiológicas.
Na transmissão natural, o paciente humano exibe principalmente doença cutânea (> 95% dos casos). O carbúnculo gastrintestinal (inclusive o carbúnculo faríngeo) pode ser observado em pessoas após consumo de carne contaminada crua
ou  mal  cozida.  Sob  certas  condições  artificiais  (p.  ex.,  laboratórios,  instalações  para  processamento  de  pelos  de  animal  e  exposição  a  produtos  contendo  esporos),  os  pessoas  podem  desenvolver  uma  forma  da  doença  altamente  fatal
conhecida como carbúnculo inalatório ou doença dos selecionadores de lã. O carbúnculo inalatório é uma linfadenite hemorrágica aguda em linfonodos mediastinais, geralmente acompanhada de efusões pleurais hemorrágicas, sepse grave,
meningite e alta taxa de mortalidade.
Nos EUA, a prevalência exata de antraz em animais não é conhecida. Nos últimos 100 anos, as infecções animais têm ocorrido em quase todos os estados, com frequência mais elevada nas regiões meio­oeste e oeste. Atualmente, o
carbúnculo é enzoótico no oeste do Texas e no noroeste de Minnesota; é esporádico no sul do Texas, Nevada, leste de Dakota do Sul e Dakota do Norte; apenas ocasionalmente é observado em outras regiões. A prevalência anual de
carbúnculo humano nos EUA diminuiu de cerca de 130 casos no começo do século passado para nenhum caso em 2007.
Além de ocorrer infecção natural, tem­se produzido B. anthracis como agente de guerra biológica. Em 2001, foi utilizado com sucesso como arma terrorista, matando 5 pessoas e causando doença em 22. Provavelmente devido ao método
que  foi  utilizado  (via  correspondência),  não  se  sabe  se  houve  doença  animal  resultante  desse  ataque.  Os  esporos  utilizados  em  guerra  biológica  representam  ameaça  tanto  para  populações  humanas  como  para  animais.  A
Organização Mundial da Saúde estima que 50 kg de B. anthracis distribuídos a uma população de 500.000 pessoas podem resultar em 95.000 mortes e 125.000 hospitalizações. O efeito em animais não foi estimado, mas como os animais
de criação são mais suscetíveis à infecção por B. anthracis do que os primatas, o resultado de um ataque com esporos de B. anthracis contra esses animais resultaria em taxas de mortalidade e morbidade mais altas e mais precoces em
comparação à população humana.
PATOGENIA:  Após inoculação em ferida, ingestão ou inalação, os esporos infectam os macrófagos, germinam e se proliferam. Em infecções cutâneas e gastrintestinais, a proliferação pode ocorrer no local de infecção e nos linfonodos que
drenam esse local. Toxinas letais e toxinas causadoras de edema são produzidas por B. anthracis e causam, respectivamente, necrose local e edema extenso, os quais são características frequentes da doença. À medida que as bactérias se
multiplicam nos linfonodos, a toxemia progride e pode ocorrer bacteriemia. Com o aumento da produção de toxina, o potencial para destruição tecidual disseminada e falência dos órgãos aumenta. Depois de os bacilos vegetativos serem
liberados  de  um  animal  após  sua  morte  (por  inchaço  da  carcaça,  animais  que  se  alimentam  de  carniça  ou  exame  pós­morte),  o  oxigênio  da  atmosfera  induz  sua  esporulação.  Os  esporos  são  relativamente  resistentes  aos  extremos  de
temperatura, à desinfecção química e ao ressecamento. A necropsia não é recomendada em razão do risco de células vegetativas serem expostas ao ar, resultando em produção de grande quantidade de esporos. Em razão da rápida mudança
de pH após a morte e decomposição, as células vegetativas em uma carcaça fechada morrem prontamente sem que ocorra esporulação.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em geral, o período de incubação é de 3 a 7 dias (com variação de 1 a 14 dias). O curso clínico varia de hiperagudo a crônico. A forma hiperaguda, comum em bovinos e ovinos, é caracterizada por início súbito e curso
rápido e fatal. Cambaleio, dispneia, tremores, colapso, alguns movimentos convulsivos e morte podem ocorrer em bovinos, ovinos ou caprinos com apenas uma leve evolução da doença.
Na fase aguda, bovinos e ovinos apresentam febre abrupta e um período de excitação seguido por depressão, estupor, dificuldade respiratória ou cardíaca, cambaleio, convulsões e morte. Geralmente, o curso da doença é tão rápido que
não é percebido e os animais são encontrados mortos. A temperatura corporal pode atingir 41,5°C, a ruminação cessa, a produção de leite diminui significativamente; as fêmeas podem abortar. Podem ocorrer sangramentos de aberturas
corporais naturais. Algumas infecções caracterizam­se por inchaço edematoso subcutâneo e localizado, que pode ser bastante extenso. As regiões mais envolvidas são a parte ventral do pescoço, o tórax e a região das paletas.
Nos equinos, a doença pode ser aguda. Os animais podem apresentar febre, calafrios, cólica intensa, anorexia, depressão, fraqueza, diarreia sanguinolenta e inchaço de pescoço, esterno, abdome inferior e genitália externa. Quase sempre
o animal morre em 2 a 3 dias após o início dos sintomas.
Embora relativamente resistentes, os suínos podem desenvolver sepse aguda após a ingestão de B. anthracis, caracterizada por morte súbita, além de orofaringite ou, mais comumente, uma forma crônica branda. O carbúnculo orofaríngeo
manifesta­se  por  inchaço  rápido  e  progressivo  da  garganta,  que  pode  causar  morte  por  asfixia.  Na  forma  crônica,  os  suínos  apresentam  sinais  sistêmicos  que  regridem  gradualmente  com  o  tratamento.  Alguns,  mais  tarde,  evidenciam
infecção pelo carbúnculo nos linfonodos cervicais e tonsilas, quando abatidos (como se aparentemente fossem animais saudáveis). O envolvimento intestinal é raramente diagnosticado, pois apresenta sinais não específicos de anorexia,
vômito, diarreia (às vezes, com sangue) ou constipação intestinal.
Em cães, gatos e carnívoros selvagens, a doença assemelha­se à observada em suínos. Em herbívoros selvagens, o curso esperado da doença e as lesões variam de espécie para espécie, mas se assemelham, na maioria das vezes, aos que
ocorrem em bovinos.
Lesões:  O  rigor  mortis  é  quase  sempre  ausente  ou  incompleto.  Sangue  escuro  pode  gotejar  da  boca,  narinas  e  ânus,  com  timpanismo  acentuado  e  rápida  decomposição  corporal.  Caso  a  carcaça  seja  aberta  inadvertidamente,  lesões
septicêmicas são observadas. O sangue é escuro, espesso e não coagula com facilidade. As hemorragias de tamanhos variáveis são comuns nas superfícies serosas do abdome e tórax, bem como do epicárdio e do endocárdio. Efusões
edematosas e sanguinolentas são habitualmente encontradas abaixo da serosa de vários órgãos, entre os músculos esqueléticos e sob a pele. Com frequência, ocorrem hemorragias na mucosa gastrintestinal, e úlceras, principalmente nas
placas de Peyer. É comum o baço se apresentar aumentado, vermelho­escuro ou negro, amolecido e semifluido. Rins, fígado e linfonodos ficam congestos e aumentados. Meningites podem ser observadas ao abrir o cérebro.
Em  suínos  com  carbúnculo  crônico,  as  lesões  geralmente  ficam  restritas  a  tonsilas,  linfonodos  cervicais  e  tecidos  adjacentes.  Os  tecidos  linfáticos  da  região  apresentam­se  aumentados  e  com  pontos  cor  salmão  a  vermelho­tijolo  na
superfície  de  corte.  Pode  haver  membranas  diftéricas  ou  úlceras  sobre  a  superfície  das  tonsilas.  A  região  ao  redor  dos  tecidos  linfáticos  quase  sempre  é  gelatinosa  e  edematosa.  A  forma  intestinal  crônica  envolvendo  os  linfonodos
mesentéricos também é descrita.
DIAGNÓSTICO:  O  diagnóstico  com  base  apenas  nos  sinais  clínicos  é  difícil.  Deve­se  obter  exame  laboratorial  confirmatório  caso  se  suspeite  de  carbúnculo.  Como  a  célula  vegetativa  não  é  resistente  e  não  sobrevive  3  dias  no  trânsito
intestinal, a amostra ideal é um suabe mergulhado em sangue e submetido à secagem. Essa técnica resulta em esporulação e morte de outras bactérias e contaminantes. Em razão de os suínos com lesões localizadas raramente apresentarem
bacteriemia, um pequeno pedaço de tecido linfático acometido, coletado assepticamente, deve ser analisado. Antes do envio da amostra, deve­se contatar o laboratório para receber informações precisas de como identificar, manusear e
transportar esse tipo de material.
O diagnóstico específico inclui cultura bacteriana, teste de reação em cadeia de polimerase (PCR) e corantes com anticorpos fluorescentes para mostrar a bactéria no sangue ou nos tecidos. Os testes Western blot e imunoensaio (ELISA)
estão disponíveis em alguns laboratórios de referência. Na indisponibilidade de outros testes, esfregaços de sangue corados com corantes de Loeffler ou MacFadean, podem ser utilizados para visualização da cápsula; no entanto, podem
resultar em cerca de 20% de falso­positivos.
Em animais domésticos, o carbúnculo deve ser diferenciado de outras doenças que provocam morte súbita. Em bovinos e ovinos, clostridiose, timpanismo e apoplexia por raios (ou qualquer outra causa de morte súbita) podem ser
confundidos com carbúnculo. Devem­se considerar, em bovinos, leptospirose aguda, hemoglobinúria bacilar, anaplasmose e intoxicação grave por samambaia, trevo­doce e chumbo. Em equinos, anemia infecciosa aguda, púrpura, cólicas,
intoxicação por chumbo, apoplexia por raios e insolação podem assemelhar­se ao carbúnculo. Em suínos, peste suína clássica aguda, peste suína africana e edema maligno faringiano são considerações diagnósticas. Em cães, devem­se
considerar infecções sistêmicas agudas e edema de faringe decorrentes de outras causas.
TRATAMENTO,  CONTROLE  E  PREVENÇÃO:  O  carbúnculo  é  controlado  por  meio  de  programas  de  vacinação,  detecção  rápida  e  notificação,  quarentena,  tratamento  de  animais  assintomáticos  (profilaxia  pós–exposição)  e  incineração  ou
sepultamento dos casos suspeitos e confirmados. Nos animais de criação, o carbúnculo pode ser amplamente controlado pela vacinação anual de todos os animais que pastam em regiões endêmicas e pela implementação de medidas de
controle durante epizootias. A vacina não encapsulada da cepa Sterne é utilizada universalmente para imunização dos animais de criação. A vacinação deve ser feita 2 a 4 semanas antes da estação em que os surtos podem ser esperados.
Como essa é uma vacina viva, os antibióticos não devem ser administrados no período de 1 semana da vacinação. Antes da vacinação do gado leiteiro durante um surto, devem­se revisar e observar todos os procedimentos exigidos pelas
leis locais. As vacinas utilizadas em pessoas, atualmente liberadas e utilizadas nos EUA e na Europa, baseiam–se em filtrados de B. anthracis artificialmente cultivados.
O tratamento precoce e a implementação rigorosa de um programa de prevenção são essenciais para reduzir as perdas nos rebanhos. Os rebanhos em risco devem ser imediatamente tratados com antibióticos de longa duração para cessar
todas as infecções em incubação. Essas medidas devem ser seguidas de vacinação cerca de 7 a 10 dias após o tratamento com antibióticos. Os animais que adoecerem após o início do tratamento e/ou após a vacinação devem ser novamente
tratados e revacinados 1 mês depois. A administração simultânea de antibióticos e vacina é inapropriada, pois a vacina Sterne é viva. Os animais devem ser removidos da pastagem onde há animal doentes e de onde há possibilidade de solo
contaminado. Deve­se retirar imediatamente o alimento suspeito do local. Nos estágios iniciais da doença o rebanho responde bem ao tratamento com penicilina. A oxitetraciclina administrada diariamente em doses fracionadas também é
eficaz. Outros antibacterianos, inclusive amoxicilina, cloranfenicol, ciprofloxacino, doxiciclina, eritromicina, gentamicina, estreptomicina e sulfonamidas também podem ser utilizados, porém sua efetividade em comparação à penicilina e
às tetraciclinas não foi avaliada a campo.
Além de terapia e imunização, os procedimentos de controle específicos são necessários para conter a doença e evitar que ela se dissemine. Esses procedimentos incluem: (1) notificação aos órgãos oficiais; (2) cumprimento rigoroso do
tempo de quarentena (após a vacinação, 2 semanas antes de sair da fazenda, 6 semanas antes de ser encaminhado ao abate); (3) imediata eliminação de animais mortos, esterco ou outro material contaminado, por meio de incineração
(preferível)  ou  enterrando  em  vala  profunda;  (4)  isolamento  dos  animais  doentes  e  remoção  dos  animais  sadios  das  regiões  contaminadas;  (5)  limpeza  e  desinfecção  de  estábulos,  currais,  salas  de  ordenha  e  fômites;  (6)  utilização  de
repelentes de insetos; (7) controle dos animais que se alimentaram de animais que morreram em decorrência da doença; (8) observação dos procedimentos sanitários gerais por pessoas que manipulam animais doentes, tanto para a própria
segurança quanto para prevenir que a moléstia se espalhe. Solos contaminados são muito difíceis de serem descontaminados completamente, mas a utilização de formaldeído pode ser satisfatória se o nível de contaminação não for muito
alto. O processo geralmente envolve a remoção do solo.
A infecção humana é controlada por redução da infecção nos animais de criação, supervisão do médico veterinário na produção animal e no abatedouro para reduzir o contato humano com animais de criação potencialmente infectados ou
produtos de origem animal e, em alguns casos, tanto pela profilaxia pré e pós­exposição. A restrição do comércio de couro e lã proveniente de países que notoriamente têm carbúnculo reduz o risco público. Nos países onde o carbúnculo é
comum e a cobertura vacinal é baixa, as pessoas devem evitar o contato com rebanhos e produtos de origem animal que não foram inspecionados antes e depois do abate. Em geral, deve­se evitar o consumo de carne de animais que
apresentaram morte súbita, carne obtida por abate em situação crítica e carne de origem desconhecida. A vacinação de rotina contra o carbúnculo é indicada para indivíduos comprometidos em trabalho que envolve grandes quantidades ou
concentrações de culturas de B. anthracis ou atividades com alto potencial de produção de aerossol. Os técnicos de laboratório que trabalham com Práticas de Biossegurança nível 2 na rotina de processamento das amostras clínicas não
estão sujeitos a risco maior de exposição aos esporos de B. anthracis. O risco para trabalhadores que entram em contato com couros, pele, ossos, lã ou pelos de animais importados tem sido reduzido devido a melhorias nos padrões da
indústria e restrições de importação. A vacinação pré­exposição é recomendada para pessoas nesse grupo apenas quando esses padrões e restrições não forem suficientes para evitar a exposição aos esporos do carbúnculo. A vacinação de
rotina de veterinários nos EUA não é recomendada em razão da baixa prevalência de casos em animais. No entanto, em regiões onde a prevalência da doença é alta, a vacinação pode ser indicada para veterinários e outras pessoas em alto
risco que manipulam animais potencialmente infectados.
O Centers for Disease Control and Prevention (CDC) recomenda vacinação daqueles pacientes em risco de exposições repetidas aos esporos de B. anthracis em resposta a ataque bioterrorista. Esses grupos incluem profissionais que
atuam inicialmente em ações emergenciais, ações das autoridades federais e funcionários de laboratórios. A vacinação preventiva antes da suspeita de ataques terroristas não é recomendada para outras populações.
Em humanos, recomenda­se profilaxia pós­exposição contra esporos de B. anthracis após exposição a aerossol contendo esporos de B. anthracis.  A  profilaxia  pode  consistir  apenas  em  terapia  antibiótica  ou  na  associação  de  terapia
antimicrobiana e vacinação, se a vacina estiver disponível, pois a maioria das vacinas humanas não é viva. Mesmo não existindo uma norma aprovada, o CDC sugere que antibióticos podem ser interrompidos após a administração de 3
doses da vacina, de acordo com o esquema padrão (0, 2 e 4 semanas). Em decorrência da eficácia e da facilidade de administração, doxiciclina ou ciprofloxacino pode ser escolhida inicialmente na quimioprofilaxia antimicrobiana, até que a
suscetibilidade do microrganismo infectante seja determinada. A penicilina e a doxiciclina foram aprovadas pela Food and Drug Administration (FDA) para o tratamento humano e têm sido tradicionalmente as drogas de eleição. Tanto o
ciprofloxacino quanto o ofloxacino têm demonstrado atividade in vitro contra o B. anthracis. Embora a ocorrência natural de resistência à penicilina seja rara, já foi relatada; observou­se resistência a outros antibióticos. Os antibióticos são
efetivos contra a forma germinada, mas não contra a forma esporulada. Os esporos podem sobreviver nos linfonodos mediastinais e no pulmão durante meses sem germinar em primatas não humanos.
Não há atualmente esquemas de vacinação aprovados para a profilaxia pós­exposição ao B. anthracis. Apesar de a quimioprofilaxia pós­exposição utilizando antibióticos isoladamente ter sido provada eficaz em modelos animais, a
duração definitiva do tratamento permanece incerta. A quimioprofilaxia antibiótica pode ser alterada para penicilina VK ou amoxicilina em crianças ou mulheres grávidas, uma vez conhecida a sensibilidade ao antibiótico e se o organismo
for  sensível  à  penicilina.  A  segurança  e  a  eficácia  da  vacina  contra  o  antraz  em  crianças  ou  mulheres  grávidas  não  foram  estudadas;  dessa  forma,  não  se  pode  recomendar  o  uso  da  vacina  para  esses  grupos.  Apesar  de  o  esquema  de
vacinação reduzido ter se mostrado eficaz quando utilizado em esquema pós–exposição que inclui antibióticos, não se sabe a duração da proteção da vacina. Evidências sugerem que a proteção da vacina é eficaz por 12 meses. Se ocorrer
exposição subsequente, vacinações adicionais podem ser necessárias.
Há  poucas  publicações  que  possam  orientar  as  recomendações  para  a  profilaxia  pós–exposição  após  contato  cutâneo  ou  gastrintestinal  de  pessoas  ao B. anthracis.  Entretanto,  com  base  na  progressão  lenta  da  doença,  baixa  taxa  de
mortalidade  e  fácil  tratamento  com  antibióticos  do  carbúnculo  cutâneo,  além  do  baixo  risco  geral  de  doenças  cutâneas  após  exposição  natural,  a  profilaxia  pós­exposição  não  é  recomendada  após  exposição  cutânea  direta  a  animais
contaminados ou produtos de origem animal. Contudo, a lavagem imediata da região exposta é aconselhável. Aqueles que foram expostos devem ser avisados quanto aos possíveis sinais cutâneos de antraz (i. e., uma região inflamada, mas
não  dolorosa,  com  ou  sem  pequenas  vesículas  circunferenciais  e  aumento  dos  linfonodos  regionais),  e  que  devem  procurar  assistência  médica  se  a  doença  se  desenvolver.  Devido  à  alta  taxa  de  mortalidade  e  a  rápida  progressão  do
carbúnculo gastrintestinal, deve­se considerar o início imediato da profilaxia pós­exposição naqueles que consumiram carne crua ou mal cozida. Não há indicação atual para vacinação após exposição cutânea ou ingestão.

BESNOITIOSE

É uma enfermidade transmitida por protozoários. O estágio cístico causa alterações clínicas na pele, tecido subcutâneo, vasos sanguíneos, membranas mucosas e outros tecidos mais profundos.
ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  O parasito é praticamente hospedeiro específico. O agente causador da doença cutânea primária em bovinos é Besnoitia besnoiti; B. bennetti causa sintomas semelhantes em equinos e asininos. B. besnoiti foi
relatada no sul da Europa, África, Ásia e América do Sul. Já B. bennetti foi descrita na África, sul da França, México e EUA. B. jellisoni e B. wallacei foram descritas em roedores; B. tarandi, em renas ou caribus; B. darlingi, em lagartos,
gambás e cobras; e B. sauriana, em lagartos. B. caprae foi relatada em cabras, em diversos países, inclusive Irã, Nova Zelândia e Quênia. Os roedores e outros animais selvagens na Austrália e os pequenos antílopes azul africano, impala e
gnu azul na África foram afetados.
Estes microrganismos, que são semelhantes a Toxoplasma, multiplicam­se em macrófagos, células endoteliais e outras, produzindo grandes cistos característicos, com parede espessa repletos de bradizoítos que se desenvolvem e invadem
os traquizoítos.
A transmissão cíclica experimental com estágios sexuais intestinais em hospedeiro definitivo (gato) foi relatada para as espécies B. besnoiti, B. wallacei e B. darlingi. A transmissão de outras espécies como a B. besnoiti em hospedeiros
definitivos  não  está  esclarecida.  Moscas  picadoras  ou  carrapatos  podem  transmitir  a  B.  besnoiti  mecanicamente  a  partir  de  bovinos  cronicamente  infectados,  mas  este  modo  de  transmissão  não  foi  provado  para  Besnoitia  spp.
As  Besnoitia  spp  podem  ser  transmitidas  artificialmente  para  hospedeiros  apropriados  por  meio  de  inoculação  com  agulha  de  tecidos  que  contenham  cistos.  Entretanto,  a  principal  via  de  transmissão  para  várias  espécies  ainda  está
indefinido. Isolados individuais parecem ser bastante específicos para os hospedeiros intermediários.
ACHADOS CLÍNICOS:   Os  bovinos  infectados,  geralmente,  não  apresentam  sinais  clínicos  além  de  alguns  cistos  na  conjuntiva  escleral.  A  enfermidade  inicia­se  com  febre  seguida  de  inchaços  quentes  e  dolorosos  ventrais  que  levam  a
esclerodermatite.  Observam­se  também  tumefação  de  linfonodos,  diarreia,  inapetência,  fotofobia,  rinite  e  orquite.  A  pele  torna­se  endurecida,  espessa  e  enrugada  com  desenvolvimento  de  rachaduras  que  permitem  infecção  bacteriana
secundária  e  miíase.  Há  perda  de  pelos  e  da  epiderme.  Além  das  lesões  cutâneas,  pode  haver  envolvimento  do  sistema  musculoesquelético  e,  em  alguns  casos,  drenagem  de  linfonodos  e  órgãos  como  os  testículos.  As  lesões  císticas
observadas em tecidos infectados estão geralmente associadas a alterações vasculares. Os animais gravemente afetados tornam­se edemaciados. Em geral, uma apresentação semelhante pode ser observada em equídeos infectados com B.
bennetti.
Um  achado diagnóstico  útil  é  o  aparecimento  de  cistos  na  conjuntiva  escleral  e na mucosa nasal em bovinos e equinos, estas “pérolas” são facilmente observadas quando o animal levanta a cabeça. O diagnóstico também pode ser
realizado pelo achado de bradizoítos semilunares em raspados cutâneos, biopsias ou raspados de conjuntiva.
Embora a mortalidade seja baixa, a recuperação é lenta nos casos graves. Os touros gravemente enfermos podem tornar­se permanentemente estéreis. Os animais afetados continuam portadores por toda a vida.
A doença em caprinos é similar à dos bovinos. Em equinos, os sinais clínicos são semelhantes, mas tendem a ser menos graves ou invasivos. As manifestações clínicas são mais comuns em animais mais jovens.
PREVENÇÃO  E  TRATAMENTO:  As infecções por B. besnoiti são  economicamente  importantes  para  criadores  de  bovinos  em  regiões  endêmicas  em  decorrência  de  mortalidade  (embora  quase  sempre  <  10%),  esterilidade  (que  pode  ser
temporária ou permanente), perda da condição e valor de mercado mais baixo, e defeitos no couro. O tratamento é difícil, mas alguns obtêm sucesso utilizando oxitetraciclina em bovinos no início da infecção. Entretanto, não se obteve
sucesso com nenhum tratamento em equídeos. Os animais devem ser isolados e submetidos a tratamento sintomático.
Em alguns países, os bovinos são imunizados com uma vacina viva adaptada de cultura de tecidos. A redução de insetos picadores e de carrapatos também pode diminuir a transmissão.

BORRELIOSE (Doença de Lyme)

Borreliose,  ou  doença  de  Lyme,  é  uma  enfermidade  bacteriana  transmitida  por  carrapatos,  que  acomete  animais  (cães,  equinos  e  provavelmente  gatos)  e  pessoas.  Muitos  mamíferos  e  espécies  de  aves  podem  infectar­se,  mas  não
desenvolvem sinais clínicos. As áreas de maior prevalência nos EUA são as regiões do Nordeste (particularmente no Estado de New England), Centro­Oeste superior e costa do Pacífico. A borreliose também ocorre em regiões de clima
temperado da Europa e da Ásia. A importância da borreliose como enfermidade zoonótica está aumentando.
ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  Atualmente, com base na análise de reassociação de DNA­DNA, 12 espécies diferentes pertencem ao complexo Borrelia burgdorferi lato sensu. Neste complexo, as espécies de espiroquetas mais importantes
são B. burgdorferi stricto sensu (América do Norte, Europa), B. afzelii (Europa, Ásia) e B. garinii (Europa, Ásia); todas são patogênicas às pessoas. Somente B. burgdorferi stricto sensu é patogênica aos animais domésticos, em condições
experimentais. Os carrapatos vetores de B. burgdorferi lato sensu são Ixodes de revestimento duro. Nos EUA, são praticamente Ixodes pacificus, verificados na costa do Pacífico, e I. scapularis, no Centro­Oeste e Nordeste. I. ricinus e I.
persulcatus são vetores verificados principalmente na Europa e na Ásia.
Os  ovos  dos  ixóideos  transformam­se  em  larvas  não  infectantes.  Tanto  as  larvas  como  as  ninfas  podem  adquirir  as  espiroquetas  da  Borrelia  carreada  pelos  hospedeiros.  Os  pequenos  mamíferos,  especialmente  roedores  têm  papel
importante como hospedeiro reservatório. Aves e lagartos também podem abrigar certas espécies de Borrelia e atuam como hospedeiros reservatórios. As taxas de infecção dos vetores variam de acordo com a região e a estação do ano e
pode ser superior a 50% em carrapatos adultos. Após a fixação do carrapato, demora > 24 h antes da transmissão da primeira B. burgdorferi lato sensu à pele do hospedeiro. A estabilização da infecção ocorre após > 53 h no sangue. Assim,
quanto  mais  cedo  faz­se  a  remoção  do  carrapato,  maior  a  chance  de  reduzir  o  risco  de  transmissão  da  espiroqueta.  B.  burgddorferi  lato  sensu  não  é  transmitida  por  insetos,  fluidos  corporais  (urina,  saliva,  sêmen)  ou  ferimentos  por
mordedura. Estudos experimentais mostram que fêmeas infectadas antes da gestação podem transmitir as espiroquetas ao feto, no útero.
ACHADOS CLÍNICOS:  Várias síndromes clínicas em animais domésticos são atribuídas à borreliose, inclusive alterações nos membros e articulações e enfermidades renais, neurológicas e cardíacas. Nos cães, claudicação intermitente e
recidivante, febre, anorexia, letargia e linfadenopatia com ou sem tumefação e dores articulares são os sinais clínicos mais comumente observados. A segunda síndrome mais comum associada à borreliose é representada por insuficiência
renal,  geralmente  fatal.  Este  quadro  é  caracterizado  por  uremia,  hiperfosfatemia  e  nefropatia  com  perda  grave  de  proteína,  geralmente  acompanhada  de  edema  periférico.  As  raças  de  cães  Bernese  e  Labrador  Retriever  geralmente
apresentam altos títulos de anticorpos específicos de Borrelia; imunocomplexos  nos  rins  acarretam  inflamação  grave.  Na  medicina  humana,  casos  isolados  foram  relatados  com  descrição  de  anormalidades  como  bradicardia,  na  forma
cardíaca de borreliose, enquanto paralisia facial e convulsões são sinais da forma neurológica.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico é baseado no histórico, sinais clínicos, exclusão de outras doenças, exames laboratoriais, considerações epidemiológicas e resposta à terapia antibiótica. Painel de doença autoimune, hemograma completo,
bioquímica  sanguínea,  radiografia  e  outras  informações  laboratoriais  geralmente  são  normais,  exceto  resultados  relacionados  diretamente  ao  sistema  acometido  (p.  ex.,  tecidos  moles  dos  membros,  acúmulo  de  neutrófilos  nos  fluidos
sinoviais ou articulações afetadas, uremia na doença renal).
Testes sorológicos para anticorpos específicos contra B. burgdorferi lato sensu auxiliam o diagnóstico clínico. Os anticorpos podem ser detectados por ELISA (inclusive sistema de teste rápido) e imunoeletroforese proteica (Western
blot). Devido à baixa especificidade, não se recomendam teste de imunofluorescência indireta para pesquisa de anticorpos. O procedimento padrão para detecção de anticorpos é uma dupla abordagem, utilizando dois testes. As amostras são
submetidas a triagem com um teste sensível, o ELISA, e somente amostras positivas são testadas com um ensaio Western blot específico. O teste Western blot auxilia na diferenciação da resposta imune ocasionada pela infecção daquela
resposta induzida por vacinação.
Como alternativa, amostras de soro ou sangue podem ser testadas com o ensaio baseado em peptídio (peptídio C6), o qual é específico para infecções induzidas por anticorpos. Entretanto, a demonstração de anticorpos específicos indica
apenas exposição ao antígeno bacteriano e não corresponde à doença clínica. Cerca de 5 a 10% dos cães na Europa Central carreiam anticorpos contra Borrelia sem sinais clínicos. Além disso, resultados falso­negativos podem ocorrer em
testes com peptídio C6 logo após a infecção. Longos períodos de incubação, persistência de anticorpos por meses a anos e dissociação entre resposta de anticorpos e o estágio clínico da doença tornam difícil o diagnóstico pelo exame de
sangue.
O isolamento de B.  burgdorferi  lato  sensu em  cultura  ou  a  detecção  específica  de  DNA  por  PCR  de  amostras  de  articulações,  de  tecido  cutâneo  ou  de  outras  fontes  podem  auxiliar  no  diagnóstico.  Entretanto,  a  detecção  direta  do
microrganismo é difícil, é demorada (mais de 6 semanas para a cultura) e em muitos casos exibe resultado negativo. Somente um resultado positivo é significativo. Amostras de sangue geralmente são negativas, pois o microrganismo se
instala nos tecidos e não na circulação.
Os sinais clínicos da borreliose são inespecíficos. Além de outras alterações ortopédicas (p. ex., trauma, osteocondrite dissecante, doenças imunomediadas), outros agentes podem ser considerados. Anaplasma phagocytophilum também
pode ocasionar claudicação recidivante e intermitente. A. phagocytophilum é transmitido por alguns carrapatos e estudos epidemiológicos têm revelado que mais de 30% de todos os cães da Europa Central carreiam anticorpos específicos
para este agente. Infecções mistas devem ser consideradas quando os sinais clínicos são aparentes.
TRATAMENTO:  A terapia antimicrobiana é indicada em todos os casos com sinais clínicos atribuídos à borreliose. Antibióticos da classe das tetraciclinas (p. ex., 10 mg de doxiciclina/kg, VO, 2 vezes/dia) e das penicilinas (p. ex., 20 mg de
amoxicilina/kg, VO, 3 vezes/dia) são efetivos e a resposta rápida é observada em muitos casos de doenças de membros e articulações, embora a cura incompleta ou transitória dos sintomas ocorra em um número significativo de animais
afetados. O uso de doxiciclina é melhor em relação às penicilinas, pois infecções mistas com outros patógenos transmitidos por carrapatos geralmente são verificados em pacientes com sinais clínicos. Dados clínicos e de pesquisa indicam
que  a  infecção  em  animais,  inclusive  em  pessoas,  podem  persistir  mesmo  com  terapia  antimicrobiana.  Em  cães,  a  dose  padrão  de  antibiótico  para  o  tratamento  por  4  semanas  tem  demonstrado  eficácia.  Devido  à  persistência  de  B.
burgdorferi sensu lato, podem ocorrer recidivas. Nestes casos, os antibióticos anteriormente mencionados podem ser utilizados novamente, pois a infecção persistente não se deve à resistência ao antibiótico. A terapia antibiótica prolongada
(> 4 semanas) pode ser benéfica para pacientes com sinais continuados da doença.
A terapia sintomática direcionada ao órgão afetado e às anormalidades também é importante, especialmente quando há envolvimento renal. Nos casos que envolvem membros e articulações, o uso de anti­inflamatórios não esteroides,
juntamente com terapia antimicrobiana, pode levar à confusão sobre a melhora clínica e dificulta o diagnóstico com base na resposta terapêutica.
PREVENÇÃO E CONTROLE:  O controle de carrapatos é uma importante estratégia de controle da doença. Embora haja disponibilidade de produtos altamente efetivos (permetrina, amitraz e fipronil) para o uso em cães, poucos proprietários
preocupam­se em aplicar com a frequência necessária, de modo a propiciar uma barreira efetiva para evitar carrapatos, a longo prazo.
Bacterinas mortas com todas as estruturas celulares têm sido utilizadas em cães desde os anos de 1990 na prevenção de borreliose. As vacinas que contêm somente estruturas recombinantes como a proteína A da superfície externa
(rOspA) foram aprovadas para uso em cães. As vacinas estão disponíveis na Europa e contêm diferentes espécies do complexo B. burgdorferi lato sensu. Todas as vacinas atuais induzem à intensa resposta de anticorpos predominantemente
para OspA (vacinas lisadas) ou apenas contra OspA (vacinas recombinantes). Os anticorpos contra OspA previnem a transmissão da espiroqueta dos carrapatos para o hospedeiro. Mostrou­se que quando um carrapato ataca um animal de
sangue quente a B. burgdorferi lato sensu, naquele carrapato, deixa de provocar OspA e inicia a produção de novas proteínas, a OspC e outras, antes da transmissão. Estão sendo realizadas pesquisas para o desenvolvimento de vacinas que
contêm múltiplos antígenos contra B. burgdorferi, fato que pode contribuir para uma melhor proteção.
Em áreas endêmicas, cães jovens devem ser vacinados antes da exposição natural a carrapatos para atingir um alto nível de proteção. Os cães que são expostos a carrapatos são testados sorologicamente para estabelecer infecção prévia à
vacinação. A vacinação após a infecção tem pouco ou nenhum efeito terapêutico em infecções estabelecidas. Duas doses da vacina devem ser administradas por via subcutânea em cães com 9 a 12 semanas de idade, em intervalo de 3
semanas, ou de acordo com as recomendações do fabricante. O teor de anticorpos geralmente diminui rapidamente após as duas vacinações iniciais; duas doses de reforço no ano seguinte devem ser administradas, preferencialmente em
intervalo de 6 meses (como sugestão: primavera, outono, primavera), seguidas de vacinações anuais.
RISCO ZOONÓTICO:  A borreliose é considerada uma zoonose. Animais e pessoas são infectadas quando carrapatos de revestimento duro (Ixodes spp) sugam o sangue. Os animais de estimação e pecuários não são a fonte de infecção às
pessoas. Os animais de estimação podem carrear carrapatos para a habitação e este vetor pode passar de outros animais para as pessoas, durante o contato.

CLOSTRIDIOSE

Os clostrídios são organismos relativamente grandes, anaeróbios e formadores de esporos, em forma de bastonetes Gram­positivos. São encontrados na forma viva (célula vegetativa) ou dormente como esporos. Os habitats naturais desses
microrganismos são o solo e o trato intestinal de animais, incluindo humanos. Os esporos são encontrados em tecidos musculares de equinos e vacas. Os endosporos são ovais, às vezes esféricos e situam­se em posição central, subterminal
ou  terminal.  As  formas  vegetativas  dos  clostrídios  nos  fluidos  teciduais  de  animais  infectados  ocorrem  isoladamente,  em  pares  ou,  raramente,  em  cadeias.  A  diferenciação  das  várias  espécies  patogênicas  relacionadas  baseia­se  em
características culturais, forma e posição do esporo, reações bioquímicas e especificidade antigênica de toxinas ou antígenos de superfície. O genoma de vários clostrídios foi sequenciado e está disponível na internet. As cepas patogênicas
podem ser adquiridas por animais suscetíveis tanto por ferida contaminada quanto por ingestão. As doenças que podem ser produzidas são constantes ameaças à produção bem­sucedida de animais de criação em várias partes do mundo.
As clostridioses podem ser agrupadas em 2 categorias: (1) aquelas nas quais os microrganismos invadem ativamente e se reproduzem nos tecidos do hospedeiro, com a produção de toxinas que aumentam a disseminação da infecção e são
responsáveis  pela  morte  (às  vezes  referidas  como  o  grupo  produtor  de  gangrena  gasosa);  (2)  aquelas  caracterizadas  por  toxemia  resultante  da  absorção  das  toxinas  produzidas  pelos  microrganismos  dentro  do  sistema  digestório
(enterotoxemias), em tecido desvitalizado (tétano), ou no alimento ou recipientes fora do organismo (botulismo). As clostridioses não são transmitidas de animal para animal.

 BOTULISMO (LAMZIEKTE)
Esta enfermidade caracteriza­se por paralisia motora rapidamente fatal causada pela ingestão da toxina de Clostridium botulinum tipo A­G. O microrganismo anaeróbio formador de esporos se prolifera em tecidos animais em decomposição
e às vezes em material vegetal.
ETIOLOGIA:  O botulismo é uma intoxicação, e não uma infecção, e resulta da ingestão da toxina presente nos alimentos. Há sete tipos de C. botulinum, que se diferenciam quanto à especificidade antigênica das toxinas: A, B, C1, D, E, F e

G. Os tipos A, B e E são mais importantes no botulismo humano; C1, na maioria dos animais, especialmente em patos selvagens, faisões, galinhas, visons, bovinos e equinos; e o D, em bovinos. Apenas dois surtos, ambos em humanos,
foram identificados como provocados pelo tipo F. O tipo G, que foi isolado de solo na Argentina, não foi envolvido em qualquer surto de botulismo tanto no homem quanto nos animais. As fontes mais comuns da toxina são carcaças em
decomposição ou materiais vegetais, como grãos, feno, capim em decomposição ou silagem estragada. Toxinas de todos os tipos possuem a mesma ação farmacológica. Da mesma forma que a toxina do tétano, a toxina botulínica é uma
metaloprotease ligada ao zinco que cliva proteínas específicas em vesículas sinápticas. Os receptores da superfície do neurônio motor variam de acordo com as diferentes toxinas botulínicas. Este fato justifica a diferença na suscetibilidade
das diversas espécies animais a estas toxinas.
A prevalência de botulismo em animais não é conhecida com exatidão, mas é relativamente baixa em bovinos e equinos, provavelmente mais frequente em galinhas e alta em aves aquáticas selvagens. Estima­se perda de 10.000 a 50.000
aves todos os anos, chegando a 1.000.000 ou mais durante grandes surtos no oeste dos EUA. A maioria das aves afetadas é patos, embora mergulhões, mergansos, gansos e gaivotas também sejam suscetíveis (ver botulismo em aves, p.
2486). Cães, gatos e suínos são comparativamente resistentes a todos os tipos de toxina quando administrada por via oral.
A  maior  parte  de  casos  de  botulismo  em  bovinos  ocorre  na  África  do  Sul,  onde  há  uma  combinação  de  agricultura  extensiva,  deficiência  de  fósforo  no  solo  e  C.  botulinum  tipo  D  em  animais  criados  em  condições  propícias  ao
desenvolvimento da doença. Os bovinos deficientes em fósforo mastigam quaisquer ossos acompanhados de boa quantidade de carne que encontram no pasto; quando esses ossos são provenientes de animal carreador de cepa tipo D de C.
botulinum, é provável que resulte em intoxicação. Qualquer animal que ingerir essa substância também ingere esporos, os quais germinam no intestino e, após a morte do hospedeiro, invadem a musculatura, a qual, por sua vez, torna­se
tóxica para outros bovinos. As cepas tipo C também causam botulismo de modo semelhante em bovinos. Esse tipo de botulismo em bovinos é raro nos EUA, apesar de relatos de casos no Texas com o nome de loin disease e alguns casos
no Estado de Montana, nos EUA. O feno ou a silagem contaminados com carcaças de pássaros ou mamíferos contendo toxina e bovinos que se alimentam de ração de aves domésticas também têm sido fontes de toxinas tipo C ou D
(botulismo de Forragem). Silagem e grandes fardos de feno parecem desencadear botulismo, pois ocorre falha na fermentação e o pH se mantém < 4,5. Relatou­se botulismo em ovinos na Austrália, sem associação com a deficiência de
fósforo como nos bovinos, mas com deficiência de proteína e carboidrato, resultando em ovinos que ingerem carcaças de coelhos e de outros pequenos animais encontrados no pasto. Em equinos, a doença quase sempre é resultante de
forragem contaminada com a toxina tipo C ou D.
Botulismo toxinfeccioso é o nome dado à enfermidade na qual C. botulinum se multiplica nos tecidos de um animal vivo e produz toxinas. As toxinas são liberadas a partir de lesões e provocam o botulismo típico. Tem­se sugerido que
isso ocasiona a síndrome do potro trêmulo. Úlceras gástricas, focos de necrose no fígado, abscessos no umbigo e nos pulmões, ferimentos de pele e músculos, bem como lesões necróticas do trato gastrintestinal são locais predisponentes
para o desenvolvimento do botulismo toxinfeccioso. Essa doença de potros e equinos adultos parece assemelhar­se ao “botulismo de ferimento” em pessoas. A toxina tipo B está comumente envolvida no botulismo de equinos e potros no
leste dos EUA. A toxinfecção também é conhecida como causa da disautonomia equina (p. 1332).
Em geral, o botulismo nos visons é causado por cepa tipo C, que produzem a toxina na carne ou no peixe cru picado. As cepas dos tipos A e E estão ocasionalmente envolvidas. O botulismo não foi relatado em gatos, mas ocorre
esporadicamente em cães. A toxina tipo C é, com frequência, responsável, porém há relatos envolvendo o tipo D.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sinais de botulismo são causados pela paralisia muscular e incluem paralisia motora progressiva, distúrbios da visão, dificuldades na mastigação e na deglutição e fraqueza progressiva generalizada. A
morte muitas vezes decorre de paralisia respiratória ou cardíaca. A toxina impede a liberação de acetilcolina nas placas motoras finais (junção neuromuscular). A passagem dos impulsos pelos nervos motores e a contratilidade dos músculos
não são muito impedidas; apenas a passagem de impulsos dos nervos para as placas motoras finais é afetada. Não se observam lesões características e as alterações patológicas podem ser designadas à ação paralítica geral da toxina, em
especial nos músculos do sistema respiratório, em vez de ao efeito específico da toxina em qualquer órgão em particular.
Ocorreram epidemias em rebanhos leiteiros nos quais até 65% das vacas adultas desenvolveram botulismo clínico e morreram 6 a 72 h após o início do decúbito. Os principais achados clínicos incluíram salivação, incapacidade de urinar,
disfagia e decúbito esternal que progrediu para decúbito lateral imediatamente antes da morte. A sensibilidade cutânea é geralmente normal e os reflexos de retirada dos membros estão fracos. Inicialmente, os sinais clínicos assemelham­se
ao segundo estágio da febre do leite (p. 1058), porém as vacas não respondem à terapia com cálcio.
Na síndrome do potro trêmulo, os potros costumam ter < 4 semanas de idade. Eles podem ser encontrados mortos sem sinais aparentes; quase sempre apresentam sinais de paralisia motora simétrica progressiva. A manqueira, tremores
musculares e dificuldade para suportar > 4 a 5 min parados são características marcantes. Outros sinais clínicos incluem disfagia, constipação intestinal, midríase e micção frequente. À medida que a doença progride, ocorrem dispneia com
extensão da cabeça e pescoço, taquicardia e parada respiratória. Em geral, ocorre morte em 24 a 72 h após o início dos sinais clínicos. Os achados mais consistentes à necropsia são edema pulmonar, congestão e fluido pericárdico excessivo,
o qual contém filamentos livres flutuantes de fibrina.
DIAGNÓSTICO:  Embora em geral se suspeite de casos esporádicos de botulismo em razão da paralisia motora característica, às vezes é difícil estabelecer o diagnóstico por demonstração da toxina em tecidos ou soros de animais ou em
alimentos  suspeitos.  Comumente,  o  diagnóstico  é  feito  por  eliminação  das  outras  causas  da  paralisia  motora.  Filtrados  dos  conteúdos  estomacal  e  intestinal  devem  ser  testados  quanto  à  toxicidade  em  camundongos,  mas  uma  resposta
negativa  não  é  confiável.  A  primeira  evidência  comprobatória  é  obtida  alimentando­se  animais  suscetíveis  com  o  material  suspeito.  Em  casos  hiperagudos,  a  toxina  pode  ser  detectada  no  sangue  por  meio  de  testes  de  inoculação  em
camundongos, mas geralmente não é detectada no campo em animais de criação. A utilização da metodologia ELISA para detecção da toxina permite a avaliação de várias amostras, aumentando as chances de confirmação do diagnóstico.
No botulismo toxinfeccioso, pode­se cultivar o microrganismo a partir de tecidos de animais afetados.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Quaisquer deficiências dietéticas devem ser corrigidas e as carcaças eliminadas. O capim em decomposição ou a silagem estragada devem ser retirados da dieta. A imunização de bovinos com toxoides tipos C e
D obteve sucesso na África do Sul e na Austrália. O toxoide também é eficaz na imunização dos visons e tem sido utilizado em faisões.
Tem­se utilizado antitoxina botulínica no tratamento com graus variáveis de sucesso, dependendo do tipo de toxina envolvido e da espécie do hospedeiro. Com frequência, o tratamento de patos e visons com antitoxina tipo C é bem­
sucedido; no entanto, este é raramente utilizado em bovinos. A administração não tardia da antitoxina (tipo B) específica ou polivalente aos potros antes da recorrência (30.000 UI; IV) foi relatada como bem­sucedida. O tratamento de
suporte em animais de valor é essencial; o prognóstico é pobre em pacientes recorrentes. Em regiões endêmicas (p. ex., Kentucky), a vacinação com o toxoide tipo B parece ser efetivo.

 CABEÇA GRANDE (Cabeça Inchada)
A doença denominada cabeça grande é uma infecção aguda causada por Clostridium novyi, C. sordellii ou, raramente, C. chauvoei, caracterizada por tumefação não enfisematosa, não hemorrágica e edematosa de cabeça, face e pescoço de
carneiros jovens. Essa infecção é desencadeada pelas cabeçadas contínuas que os carneiros jovens dão entre si. Os tecidos subcutâneos golpeados e machucados ficam feridos e propiciam condições favoráveis ao crescimento de clostrídios
patogênicos e as aberturas na pele oferecem oportunidade para a sua entrada. O tratamento consiste na administração de penicilina ou antibióticos de amplo espectro.

 CARBÚNCULO SINTOMÁTICO (Blackleg)
O carbúnculo sintomático é uma doença aguda febril que acomete bovinos e ovinos, causada por Clostridium chauvoei e caracterizada por tumefação enfisematosa, geralmente em grandes massas musculares (miosite clostridiana). Esta
enfermidade é cosmopolita.
ETIOLOGIA:  C. chauvoei é  encontrado  naturalmente  no  trato  intestinal  de  animais.  Os  esporos  permanecem  viáveis  no  solo  por  vários  anos  e  são  considerados  como  fonte  de  infecção.  Os  surtos  de  carbúnculo  sintomático  ocorrem  em
bovinos nas fazendas em que foram realizadas escavações recentes, sugerindo que o revolvimento do solo pode ativar esporos latentes. Os microrganismos provavelmente são ingeridos, passam através da parede do trato gastrintestinal e,
após acessarem a corrente sanguínea, são depositados nos músculos e em outros tecidos (baço, fígado e trato alimentar) e podem permanecer dormentes.
Em bovinos, a infecção do carbúnculo sintomático é endógena, diferente do edema maligno (p. 656). As lesões desenvolvem­se sem qualquer histórico de feridas, embora equimoses ou excesso de exercício precipitem alguns casos.
Comumente, os animais que contraem essa doença são das raças de corte, com excelente saúde, ganho de peso e geralmente são os melhores animais do rebanho. Os surtos se dão com o aparecimento de alguns novos casos a cada dia
durante vários dias. A maioria dos casos é observada em bovinos com 6 a 24 meses de idade, mas pode afetar bezerros tão jovens quanto aqueles com 6 semanas de idade ou animais com 10 a 12 anos. A doença quase sempre ocorre no
verão e no outono, sendo incomum durante o inverno. Em ovinos, a doença não é restrita a animais jovens e na maioria dos casos sucede alguma forma de lesão como cortes na tosquia, corte da cauda, descorna ou castração. A taxa de
mortalidade é de aproximadamente 100%. Na Nova Zelândia onde o carbúnculo sintomático é observado com mais frequência em ovinos do que em bovinos.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Geralmente, o início é súbito e alguns bovinos podem ser encontrados mortos, sem sintomas premonitórios. Claudicação aguda e depressão acentuada são comuns. Inicialmente, há febre, porém, quando os
sinais clínicos se tornam evidentes, a temperatura pode estar normal ou subnormal. As tumefações edematosas e crepitantes características se desenvolvem no quadril, ombro, tórax, dorso, pescoço ou em outra parte. No início, a tumefação
é pequena, quente e dolorida. À medida que a doença progride rapidamente, a região de tumefação aumenta, nota­se crepitação à palpação e a pele torna­se fria e insensível, pois o suprimento sanguíneo diminui neste local. Os sintomas
gerais incluem prostração e tremores. O animal morre em 12 a 48 h. Em alguns bovinos, as lesões se limitam ao miocárdio e ao diafragma.
DIAGNÓSTICO:  Um quadro febril e rapidamente fatal em bovinos jovens, bem nutridos, em particular das raças de corte, com tumefações crepitantes em músculos volumosos é sugestivo de carbúnculo sintomático. O músculo afetado
apresenta  coloração  vermelho­escura  a  negra,  seco  e  esponjoso;  possui  odor  adocicado  e  é  infiltrado  com  pequenas  bolhas,  mas  com  pouco  edema.  As  lesões  podem  ser  observadas  em  qualquer  músculo,  até  mesmo  na  língua  ou  no
diafragma.  Em  ovinos,  como  as  lesões  de  ocorrência  espontânea  são,  muitas  vezes,  pequenas  e  profundas,  podem  passar  despercebidas.  Ocasionalmente,  as  alterações  teciduais  provocadas  por C.  septicum,  C.  novyi,  C.  sordellii  e  C.
perfringens podem se assemelhar àquelas do carbúnculo sintomático. Às vezes, tanto C. chauvoei quanto C. septicum podem ser isolados a partir das lesões do carbúnculo sintomático, em particular, quando se examina a carcaça = 24 h
após a morte, o que permite um tempo para invasão pós­morte dos tecidos por C. septicum. O diagnóstico é confirmado pela constatação laboratorial de C. chauvoei nos músculos afetados. As amostras de músculo devem ser obtidas o mais
breve possível, após a morte do animal. O teste de imunofluorescência para C. chauvoei é rápido e confiável.
CONTROLE:  Uma vacina polivalente contendo C. chauvoei e C. septicum e, em regiões onde há necessidade, antígenos de C. novyi, é segura e confiável tanto para bovinos quanto para ovinos. Os bezerros de 3 a 6 semanas devem ser
vacinados duas vezes, com intervalo de 4 semanas; em regiões de alto risco, a revacinação pode ser necessária após 1 ano (geralmente na primavera ou no início do verão). Quando ocorrem surtos, todos os bovinos suscetíveis devem ser
vacinados e tratados profilaticamente com penicilina (10.000 UI/kg, IM) para evitar novos casos, que podem ocorrer até 14 dias após o surto. Os bovinos devem ser transferidos para pastos não contaminados. Falhas vacinais podem ser
observadas em alguns locais e atribuídas a um espectro deficiente de antígenos presentes na vacina. Nestes casos uma bacterina deve ser produzida com cepas de C. chauvoei do próprio local.
As  ovelhas  não  expostos  previamente  ao  antígeno  devem  ser  vacinadas  1  mês  antes  do  parto  e,  em  seguida,  anualmente.  Em  surtos  nos  rebanhos  de  ovelhas,  o  tratamento  profilático  com  penicilina  e  a  aplicação  de  antissoro  são
recomendados.  Os  ovinos  jovens  devem  ser  vacinados  antes  do  acesso  à  pastagem.  A  imunidade  dos  ovinos  jovens  é  relativamente  baixa.  As  vacinas  clostridianas  são  conhecidas  por  estimular  uma  fraca  resposta  imune  em  ovinos  e
caprinos em relação aos bovinos. As carcaças devem ser cremadas ou enterradas em valas profundas, em região fechada, a fim de limitar a contaminação do solo por esporos.

 EDEMA MALIGNO
É uma toxemia aguda, geralmente fatal, que acomete bovinos, equinos, ovinos, caprinos e suínos quase sempre causada por Clostridium septicum, muitas vezes acompanhada de outras espécies de clostrídios. Outros clostrídios podem estar
envolvidos em infecções mistas de feridas, inclusive C. chauvoei, C. perfringens, C. novyi e C. sordellii. Essa doença é cosmopolita.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  C. septicum é encontrado no solo e no conteúdo intestinal de animais em todo o mundo. A infecção geralmente ocorre por meio de contaminação de ferimentos que contenham tecido desvitalizado, terra ou algum
outro  debilitante  tecidual.  Os  ferimentos  causados  por  acidente,  castração,  corte  de  cauda,  vacinação  sem  condições  de  higiene  e  parto  podem  tornar­se  infectados.  As  potentes  toxinas  clostridiais  causam  sinais  locais  e  sistêmicos,
geralmente resultando em morte. As exotoxinas locais causam inflamação excessiva, resultando em edema grave, necrose e gangrena. Os fatores de risco incluem injeções IM em equinos, cortes, parto em ovinos, partos traumáticos e
castração em bovinos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais gerais, como anorexia, intoxicação e febre alta, bem como lesões locais, desenvolvem­se em 6 a 48 h após a lesão predisponente. As lesões locais são inchaços macios que deixam marcas quando pressionadas
e  se  expandem  rapidamente  em  razão  da  formação  de  muita  quantidade  de  exsudatos  que  infiltram  o  tecido  conjuntivo  subcutâneo  e  intramuscular  das  regiões  afetadas.  Nessas  regiões,  os  músculos  estão  marrom­escuros  a  negros.
Acúmulos  de  gases  no  tecido  subcutâneo  e  ao  longo  das  fáscias  musculares  podem  ou  não  estar  presentes.  Em  carneiros,  desenvolve­se  edema  grave  da  cabeça  após  a  infecção  dos  ferimentos  infligidos  por  brigas.  O  edema  maligno
associado a lacerações da vulva no parto é caracterizado por edema acentuado da vulva, toxemia grave e morte em 24 a 48 h.
DIAGNÓSTICO:  A semelhança com o carbúnculo sintomático (p. 655) é marcante e a diferenciação feita durante a necropsia não é confiável; a confirmação laboratorial é o único procedimento seguro. Equinos e suínos são suscetíveis ao
edema maligno, mas não ao carbúnculo sintomático. Um importante diagnóstico diferencial nestas espécies é o antraz.
C.  septicum  também  causa  braxy  em  ovinos,  uma  infecção  altamente  fatal  caracterizada  por  toxemia  e  inflamação  da  parede  do  abomaso.  Essa  doença  parece  ser  restrita  principalmente  a  ovinos  europeus  alimentados  com  pasto
“congelado”.
O diagnóstico pode ser confirmado rapidamente com base em coloração com anticorpos fluorescentes de C. septicum a partir de um esfregaço tecidual. Entretanto, C. septicum é um invasor pós­morte/post­mortem extremamente ativo do
intestino e sua presença em amostra coletada de um animal que esteja morto há = 24 h não é significativa. Um teste PCR pode ser utilizado na identificação direta do clostrídio associado a edema maligno. A presença de equinócitos tipo III
e esferócitos no esfregaço sanguíneo pode ajudar no diagnóstico de anemia hemolítica autoimune associada a infecções por clostrídios em equinos.
CONTROLE:  As bacterinas são utilizadas para imunização. Na vacina contra edema maligno e carbúnculo sintomático geralmente combinam­se C. septicum e C. chauvoei; está disponível na forma de vacinas com multicomponentes. Em
regiões endêmicas, os animais devem ser vacinados antes da castração, descorna ou corte de cauda. Os bezerros devem ser vacinados com cerca de 2 meses de idade. Duas doses com intervalo de 2 a 3 semanas quase sempre propiciam
proteção. Em regiões de alto risco, indica­se a vacinação anual, bem como a revacinação após traumatismo grave.
O tratamento com altas doses de penicilina ou antibióticos de amplo espectro é indicado no início da doença. Embora a injeção de penicilina diretamente na periferia da lesão possa minimizar seu alastramento, quase sempre os tecidos
afetados continuam a se desprender. A terapia de suporte com flumixina meglumina (AINE) para bovinos e equinos é recomendada. O tratamento local inclui incisão cirúrgica da pele e fáscia para permitir a drenagem.

 ENTEROTOXEMIAS
(Infecção por Clostridium Perfringens)

Enterotoxemia Causada por Clostridium perfringens Tipo A
As  cepas  tipo  A  de  C.  perfringens  são  comumente  encontradas  como  parte  da  flora  intestinal  normal  de  animais  e  carecem  de  algumas  das  potentes  toxinas  produzidas  pelas  cepas  de  outros  tipos  para  causar  doença.  C.
perfringens enterotoxigênico (CPE) é o principal patógeno envolvido em doenças de origem alimentar causadas por C. perfringens e está relacionado com doenças diarreicas não associadas a alimentos, em diferentes animais. Entretanto,
produzem a toxina A, que é necrosante e letal, e são considerados agentes de enterite necrótica em aves domésticas (p. 2909) e cães, colite em equinos e diarreia em suínos. C. perfringens tipo  A  está  claramente  envolvido  na  diarreia
hemorrágica de cães e está associado à diarreia nosocomial e diarreia aguda e crônica adquirida em cães. A doença é caracterizada por enterite necrótica, na qual há destruição maciça das vilosidades e necrose de coagulação do intestino
delgado. Tipicamente, quantidades abundantes de grandes bacilos Gram­positivos são visíveis em esfregaços de fezes e vários C. perfringens tipo A são isolados em cultura anaeróbica de fezes de cães com diarreia aguda. Exames de fezes
não são úteis na determinação da causa da diarreia devido a um elevado número de resultados falso­positivos. Um teste de ELISA para a toxina de CPE em cães é muito específico. Teste PCR, para detectar a expressão do gene CPE em
cães, está em fase de avaliação. Cepas do Tipo A oriundas de suínos com diarreia produziram enterotoxina in vitro; anticorpos antienterotoxina indicam que esta enterotoxina é produzida in vivo. A enterotoxina também é encontrada em
fezes de suínos com diarreia, mas não em fezes de animais saudáveis. Embora estudos recentes tenham revelado que C. perfringens isolado de suínos com diarreia não é enterotoxigênico e que produz a citotoxina β­2, a qual pode estar
envolvida no mecanismo da enfermidade. Doenças experimentais são produzidas em suínos mediante inoculação oral de C. perfringens tipo A.

Enterotoxemia Causada por Clostridium perfringens Tipos B e C
A infecção por C. perfringens tipos B e C causa enterite grave, disenteria, toxemia e alta mortalidade em cordeiros, bezerros, suínos e potros jovens (Tabela 3).  Os tipos B e C produzem  a  toxina  β  letal  e  altamente  necrosante,  que  é
responsável por graves danos ao intestino. Essa toxina é sensível a enzimas proteolíticas e as doenças estão associadas à inibição de proteólise no intestino. Sugere­se que o colostro de porcas, o qual contém um inibidor da tripsina, é um
fator de aumento da suscetibilidade de suínos jovens. O tipo C também provoca enterotoxemia em bovinos, ovinos e caprinos adultos.
ACHADOS CLÍNICOS:  A disenteria dos cordeiros é uma doença aguda que afeta aqueles < 3 semanas de idade. Vários animais podem morrer antes que se observem sinais, mas alguns recém­nascidos param de mamar, ficam apáticos e
permanecem deitados. É comum ocorrer diarreia fétida e tingida de sangue e a morte acontece, em geral, dentro de poucos dias. Em bezerros, há diarreia aguda, disenteria, dor abdominal, convulsões e opistótono. Morte pode ocorrer em
algumas horas, mas casos menos graves sobrevivem por alguns dias, e a recuperação no decurso de vários dias é possível. Os suínos ficam agudamente doentes poucos dias após o nascimento e ocorrem diarreia, disenteria, hiperemia anal e
alta taxa de mortalidade; a maioria dos leitões afetados morre dentro de 12 h. Em potros, há disenteria aguda, toxemia e morte rápida. O ataque em ovinos adultos caracteriza­se por morte sem sinais premonitórios.
Lesões: A enterite hemorrágica com ulceração da mucosa é a principal lesão em todas as espécies. Macroscopicamente, a porção afetada do intestino é roxo­azulada e, à primeira vista, parece ser um infarto associado à torção mesentérica.
Esfregaços dos conteúdos intestinais podem ser examinados quanto à presença de bastonetes Gram­positivos. Filtrados para detecção da toxina e subsequente identificação por meio da neutralização com antissoro específico também são
recomendados.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O tratamento geralmente é ineficaz em decorrência da gravidade da doença, mas se disponível, indica­se soro hiperimune específico, e a administração oral de antibióticos pode ser útil. A doença é mais bem
controlada pela vacinação da fêmea prenhe durante o último trimestre de gestação: inicialmente, 2 vacinações com intervalo de 1 mês e, depois, anualmente. Nos casos de surtos em animais recém­nascidos de fêmeas não vacinadas, deve­se
administrar o antissoro imediatamente após o nascimento.

Tabela 3 – Enterotoxemia causada por Clostridium perfringens Tipos B e C

Doença C. perfringens Hospedeiro

Disenteria de cordeiros Tipo B Cordeiros = 3 semanas de idade

Enterotoxemia de bezerros Tipo B e C Bezerros bem alimentados = 1 mês de idade


Enterotoxemia de suínos Tipo C Leitões nos primeiros dias de vida

Enterotoxemia de potros Tipo B Potros nas primeiras semanas de vida

Struck (doença do Romney Marsh) Tipo C Ovinos adultos

Enterotoxemia de caprinos Tipo C Caprinos adultos

Enterotoxemia Tipo D (Doença do rim pulposo, Doença da superalimentação)
Essa enterotoxemia clássica de ovinos é observada com menos frequência em caprinos e raramente em bovinos. A distribuição é mundial e pode acometer animais de todas as idades. É mais comum em cordeiros tanto < 2 semanas de idade
quanto recém­desmamados em rebanhos de engorda com dieta rica em carboidratos ou, menos frequente, com pastagem de capim viçoso. Há suspeitas da doença em bezerros de corte bem nutridos que estejam mamando em vacas de alta
produção, que se alimentam de boa pastagem e na síndrome da morte súbita em bovinos de engorda; contudo, falta evidência laboratorial comprovando a última suspeita.
ETIOLOGIA:  O agente causador é C. perfringens tipo D. No entanto, fatores predisponentes são essenciais; o mais comum desses é a ingestão de quantidades excessivas de alimento ou leite em cordeiros muito jovens e de grãos nos de
rebanhos de engorda. Em cordeiros jovens, a doença quase sempre é restrita a cordeiros únicos, pois raramente uma ovelha com gêmeos fornece leite suficiente para possibilitar o desenvolvimento de enterotoxemia. No rebanho de engorda,
a doença em geral é observada em cordeiros que mudaram rapidamente para dietas ricas em grãos. À medida que o consumo de amido aumenta, propicia um meio adequado para o crescimento da bactéria causadora, a qual produz a toxina
β. O principal efeito da toxina é causar dano vascular, particularmente de capilares no cérebro. Vários ovinos carreiam cepas de C. perfringens tipo D como parte da flora normal do intestino e atuam como fonte de microrganismos para
infectar recém­nascidos. A maioria dos portadores tem títulos de antitoxina não vacinal.
ACHADOS CLÍNICOS:  Geralmente, mortes súbitas em cordeiros em melhores condições físicas são as primeiras indicações de enterotoxemia. Em alguns casos, excitação, incoordenação e convulsões ocorrem antes da morte. Opistótono,
andar em círculos e investir a cabeça contra objetos fixos são sinais comuns de envolvimento do sistema nervoso central; observa­se quase sempre hiperglicemia ou glicosúria. A diarreia pode ou não se desenvolver. Ocasionalmente, ovinos
adultos são afetados; eles apresentam fraqueza, incoordenação, convulsões e morrem dentro de 24 h. Em caprinos, o curso da doença varia de hiperagudo a crônico, com que vão de morte súbita a diarreia aquosa com ou sem sangue. Os
bezerros agudamente afetados, que não morreram, exibem manias, convulsões, cegueira e morte em poucas horas. Os bezerros afetados de forma subaguda ficam letárgicos por alguns dias e podem se recuperar. Em caprinos são observados
diarreia e sinais nervosos, ocorrendo morte em algumas semanas. Às vezes, a enterotoxemia tipo D é verificada em equinos jovens que comem em demasia.
Lesões:  A  necropsia  pode  revelar  apenas  algumas  regiões  hiperêmicas  no  intestino  e  um  saco  pericárdico  preenchido  com  fluido.  Esse  é  particularmente  o  caso  dos  cordeiros  jovens.  Em  animais  idosos,  podem­se  encontrar  regiões
hemorrágicas no miocárdio, bem como petéquias e equimoses nos músculos abdominais e serosa do intestino. Com frequência, ocorrem edema pulmonar bilateral e congestão, mas habitualmente não em cordeiros jovens. O rúmen e o
abomaso contêm abundância de alimento e nota­se no íleo, quase sempre, alimento não digerido. Edema e malacia podem ser observados microscopicamente nos gânglios basais e no cerebelo de cordeiros. A rápida autólise pós­morte dos
rins resulta no nome popular de doença do rim pulposo; contudo, não se nota rim pulposo em cordeiros jovens afetados e raramente é observado em caprinos ou bovinos afetados. Enterocolite necrótica ou hemorragia pode ser verificada em
caprinos.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo de enterotoxemia baseia­se na constatação de convulsões e morte súbita em cordeiros alimentados com alto teor de carboidratos. Os esfregaços do conteúdo intestinal revelam vários bastonetes
Gram­positivos grossos e curtos. A confirmação requer demonstração da toxina β no fluido do intestino delgado. Algumas horas após a morte deve­se coletar, assepticamente, fluido e ingesta em um recipiente e enviá–lo sob refrigeração a
um laboratório para identificação da toxina. A adição de 1 gota de clorofórmio para cada 10 ml de fluido intestinal estabiliza qualquer toxina presente. Embora se tenham desenvolvido testes imunológicos para substituir o tradicional teste
em camundongos para a detecção da toxina, eles são menos sensíveis que este. O protocolo de PCR para detecção do gene da toxina β é eficaz na identificação de isolados, como o tipo B ou D.
CONTROLE:  O método de controle depende da idade dos cordeiros, da frequência com que a doença aparece em uma propriedade e do manejo na criação. Caso a doença ocorra, de forma constante, em cordeiros jovens de uma propriedade,
a imunização das ovelhas provavelmente será o método de controle mais satisfatório. As fêmeas reprodutoras devem receber duas injeções do toxoide tipo D em seu primeiro ano e 1 injeção 4 a 6 semanas antes do parto e a cada ano depois
disso.
O controle da enterotoxemia nos cordeiros de engorda pode ser feito pela redução da quantidade de concentrado na dieta. No entanto, isso pode não ser econômico, embora, nesse caso, a imunização de todos os cordeiros com toxoide
quando entram pela primeira vez no rebanho provavelmente reduzirá as perdas a um nível aceitável. Duas injeções, com intervalo de 2 semanas, protegerão os cordeiros durante todo o período de engorda. Quando se utilizam bacterinas ou
toxoides precipitados em alumínio, a injeção deve ser administrada em um local em que os abscessos frios, os quais comumente se desenvolvem no local da injeção, possam ser removidos com facilidade durante o tratamento normal e não
danifiquem a carcaça.
 HEMOGLOBINÚRIA BACILAR (Red Water Disease)
A hemoglobinúria bacilar é uma doença toxêmica, aguda e infecciosa causada por Clostridium haemolyticum (C. novyi tipo D). Afeta principalmente bovinos, mas também tem sido encontrada em ovinos e raramente em cães. Ocorre na
parte oriental dos EUA, ao longo do Golfo do México, na América do Sul, na Grã­Bretanha, Oriente Médio, Índia e em outras partes do mundo.
ETIOLOGIA:  C. haemolyticum é um microrganismo originário do solo que pode ser encontrado naturalmente no trato gastrintestinal de alguns bovinos. Pode sobreviver por longos períodos no solo contaminado ou em ossos oriundos de
carcaças de animais infectados. Após a ingestão, os esporos latentes se alojam no fígado. O período de incubação é extremamente variável e o início depende de um local de anaerobiose no fígado. O estímulo à germinação geralmente é a
infecção  por  trematódeo.  Com  menos  frequência  se  deve  ao  elevado  teor  de  nitrato  na  dieta,  perfuração  acidental  do  fígado,  biopsia  hepática  ou  qualquer  outra  causa  de  necrose  localizada.  Quando  as  condições  de  anaerobiose  são
favoráveis, os esporos germinam e resultam na multiplicação das células vegetativas e produção de toxina (fosfolipase C), a qual provoca hemólise intravascular e suas sequelas, inclusive anemia hemolítica e hemoglobinúria.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os bovinos podem ser encontrados mortos sem sinais aparentes. Em geral, há início súbito de depressão grave, febre, dor abdominal, dispneia, disenteria e hemoglobinúria. Há anemia e icterícia em vários graus. Edema
de peito pode ocorrer. Os níveis de hemoglobina (Hb) e hemácias são muito baixos. A duração dos sinais clínicos varia de cerca de 12 h em vacas prenhes a cerca de 3 a 4 dias nos demais bovinos. A mortalidade em animais não tratados é
de cerca de 95%. Alguns bovinos sofrem de ataques subclínicos da doença e consequentemente desempenham o papel de portadores imunes.
Lesões:  Manifestam­se  desidratação,  anemia  e,  às  vezes,  edema  subcutâneo.  Há  fluido  sanguinolento  nas  cavidades  torácica  e  abdominal.  Os  pulmões  não  são  grosseiramente  afetados  e  a  traqueia  contém  espuma  sanguinolenta  com
hemorragias na mucosa. O intestino delgado e, ocasionalmente, o intestino grosso apresentam­se hemorrágicos; seu conteúdo quase sempre possui sangue livre ou coagulado. Um infarto isquêmico no fígado é característico, este órgão
permanece  ligeiramente  elevado,  com  coloração  mais  clara  do  que  o  tecido  circundante,  além  de  apresentar­se  delimitado  por  uma  zona  de  congestão  vermelho­azulada.  Os  rins  tornam­se  escuros,  friáveis  e,  em  geral,  salpicados  de
petéquias. A bexiga contém urina vermelho­púrpura. Após o óbito, o rigor mortis se inicia mais rapidamente do que o usual.
DIAGNÓSTICO:  O quadro clínico geral e os achados pós­morte comumente possibilitam um diagnóstico. O sinal mais notável é a coloração típica da urina, que lembra aquela de vinho do Porto, e a formação de espuma livre durante a
micção ou após agitação. O infarto hepático típico é suficiente para o diagnóstico presuntivo. O tamanho e a consistência normais do baço atuam para excluir carbúnculo e anaplasmose. Intoxicação por samambaia­de­metro e leptospirose
também  devem  ser  considerados.  O  diagnóstico  pode  ser  confirmado  pelo  isolamento  de C. haemolyticum a  partir  do  infarto  hepático,  mas  a  cultura  do  microrganismo  é  difícil.  O  diagnóstico  rápido  e  preciso  pode  ser  realizado  pela
demonstração do microrganismo no tecido hepático por meio de teste anticorpo fluorescente ou de imuno­histoquímica ou, ainda, pela detecção da toxina no fluido da cavidade peritoneal ou em extrato de salina do órgão infartado.
CONTROLE:  O  tratamento  inicial  com  penicilina  ou  tetraciclina  em  altas  doses  é  essencial.  Transfusões  de  sangue  total  e  fluidoterapia  também  são  úteis.  Bacterina  de C. haemolyticum preparada  a  partir  de  culturas  completas  confere
imunidade por cerca de 6 meses. Nos locais em que a doença é sazonal, uma dose pré­sazonal é geralmente suficiente; onde a doença ocorre ao longo do ano, é necessária a vacinação semianual. Os bovinos que estiverem em contato com
animais de regiões endêmicas devem ser vacinados, já que estes podem ser portadores.

 HEPATITE NECROSANTE INFECCIOSA (Infecção por Clostridium novyi, Doença Negra)
É uma doença infecciosa aguda que acomete ovinos e, às vezes, bovinos; raramente afeta suínos e equinos.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  O agente etiológico, Clostridium novyi tipo B, é proveniente do solo e quase sempre presente nos intestinos e no fígado de herbívoros; pode estar presente nas superfícies da pele, sendo fonte potente de infecções
por ferimentos. A mais importante fonte de infecção é a contaminação do pasto por fezes de animais portadores. O microrganismo se multiplica em regiões de necrose hepática, ocasionada pela migração dos trematódeos hepáticos, e produz
uma potente toxina necrosante (toxina a). A doença possui distribuição mundial, onde quer que trematódeos hepáticos e ovinos sejam encontrados.
Suspeita­se que C. novy seja  a  causa  da  morte  súbita  em  bovinos  e  suínos  alimentados  com  dietas  de  alto  teor  de  grãos  e  nos  quais  lesões  hepáticas  preexistentes  não  foram  detectadas.  As  toxinas  letais  e  necrosantes  danificam  o
parênquima hepático, permitindo, assim, que a bactéria se multiplique e produza uma quantidade letal de toxina.
ACHADOS CLÍNICOS:  Frequentemente, ocorre morte súbita sem sinais bem definidos. Os animais afetados geralmente possuem de 2 a 4 anos e tendem a ficar atrás do rebanho, assumem um decúbito esternal e morrem em poucas horas. A
maioria dos casos ocorre no verão e no início do outono quando há o pico da infecção por trematódeos hepáticos. A doença é mais prevalente em ovinos adultos bem nutridos e limitada em animais infectados com trematódeos hepáticos. A
diferenciação da fasciolose aguda pode ser difícil, porém mortes hiperagudas de animais que exibem lesões típicas à necropsia devem incitar suspeita de hepatite necrótica infecciosa.
Lesões: As lesões macroscópicas mais características são focos necróticos amarelo–acinzentados no fígado que quase sempre seguem as trilhas migratórias dos trematódeos jovens. Histologicamente, as lesões do fígado incluem inflamação
eosinofílica central (indução parasitária) circundada por necrose coagulativa com uma borda externa de neutrófilos. A lesão apresenta microrganismos em forma de bastonete Gram­positivos. Outros achados comuns incluem aumento do
saco pericárdico preenchido com fluido cor de palha e excesso de fluido nas cavidades peritoneal e torácica. Em geral, há ruptura extensa dos capilares no tecido subcutâneo, o que faz com que a pele adjacente torne­se enegrecida (daí o
nome comum de doença negra).
CONTROLE:  Pode­se reduzir a prevalência da doença diminuindo­se a quantidade de caramujos, geralmente Lymnaea spp, que atuam como hospedeiros intermediários dos trematódeos hepáticos ou reduzindo a infecção de trematódeos nos
ovinos. No entanto, esses procedimentos não são sempre praticados e a imunização ativa com toxoide contra C. novyi é mais eficaz. A vacinação propicia imunidade de longa duração. Depois disso, apenas novos animais introduzidos ao
rebanho (cordeiros e ovinos trazidos de outras regiões) precisam ser vacinados. Este procedimento é mais indicado antes do final do verão. A contaminação da pastagem pode ser minimizada descartando adequadamente os cadáveres
(incineração).

 INFECÇÕES POR CLOSTRIDIUM DIFFICILE E C. PERFRINGENS
Clostridium difficile é um bastonete Gram­positivo grande, anaeróbio, formador de esporos e móvel, sendo a principal causa de colite relacionada com o uso de antibióticos em pessoas. C. difficile está associado à diarreia e doenças de
desenvolvimento espontâneas em uma variedade de espécies, inclusive equinos, suínos, bovinos, cães, gatos, hamsters, porquinhos­da­índia, ratos e coelhos. C. difficile produz toxinas A, B e/ou a toxina binária CDT no intestino. A toxina
A é uma enterotoxina que causa hipersecreção de fluido no lúmen intestinal; também causa lesões teciduais. A toxina B é uma potente citotoxina que induz inflamação e necrose. O mecanismo de ação da CDT não é conhecido. A alteração
da flora do cólon, com a presença de cepas toxigênicas de C. difficile que se multiplicam excessivamente no intestino, é pré­requisito para a enfermidade. Os testes diagnósticos para toxina de C. difficile incluem teste de citotoxicidade e
prova de ELISA em amostras fezes, cultura em anaerobiose e PCR para diferenciar cepas toxigênicas daquelas não toxigênicas. C. perfringens está amplamente distribuído no solo e no trato gastrintestinal dos animais, sendo caracterizado
pela habilidade de produzir potentes exotoxinas, algumas delas responsáveis por enterotoxemias específicas. Cinco tipos de toxinas (A, B, C, D e E) foram identificadas e produzem uma ou mais das quatro toxinas (alfa, beta, epsilon e
iota). C. perfringens tipo A é o mais comum, possuindo a cepa mais variável em relação às propriedades toxigênicas. A produção da toxina alfa está associada à gangrena gasosa, infecções traumáticas, enterite necrótica canina e aviária,
colite em equinos e diarreia em suínos. C. perfringens tipos B e C causam enterite grave, disenteria, toxemia e alta taxa de mortalidade em cordeiros jovens, bezerros, suínos e potros (toxina beta). Já o tipo C causa enterotoxemia em
bovinos adultos, ovinos e caprinos. As enfermidades listadas a seguir estão classificadas segundo a causa e o hospedeiro.

Clostridium difficile em Bezerros
Clostridium difficile foi identificado como causa potencial de diarreia em bezerros jovens. Não foi possível reproduzir a doença em bezerros neonatos privados de colostro, com esporos ou células vegetativas.

Clostridium difficile em Cães
Clostridium difficile não foi considerado como patógeno primário em cães. Entretanto, cepas toxigênicas são frequentemente isoladas de suabe retal de cães que visitam pacientes humanos em hospitais. O teste ELISA humano para toxinas
de C. difficile não é tão eficaz para cães com diarreia e possui pouca sensibilidade e especificidade. Aproximadamente 10% dos cães assintomáticos liberam C. difficile toxigênico nas fezes.

Clostridium difficile em Suínos
Clostridium difficile surgiu recentemente como importante causa de diarreia em suínos neonatos. Em alguns estudos, foi identificado como o segundo mais frequente causador de diarreia em suínos com 1 a 7 dias de idade. O edema do
mesocólon é um aspecto característico da doença observado em quase todos os suínos afetados, porém essa lesão não é patognomônica. O diagnóstico depende da detecção das toxinas como foi descrito para a doença em equinos. Suínos,
equinos, bovinos e cães nos quais se isolou C. difficile podem apresentar um perfil de sensibilidade antimicrobiana que se sobrepõe aquele de isolados de pacientes humanos, aumentando a possibilidade de transmissão interespécies do
patógeno. Esporos dormentes de C. difficile podem ser encontrados na carne de suínos e bovinos. Alguns ribotipos isolados foram similares ou idênticos a cepas patogênicas de humanos.

Clostridium perfringens em Bovinos Adultos
Nos últimos anos, hemorragia intestinal ou síndrome hemorrágica jejunal emergem esporadicamente e individualmente em vacas leiteiras de alta produção em início de lactação. Enquanto nenhuma etiologia específica for estabelecida,
assume­se que o C. perfringens tipo A está envolvido, pois inúmeros clostrídios podem ocorrer nestes casos. O curso clínico é hiperagudo e o paciente apresenta anorexia, cólica, redução na produção do leite, hemorragia intestinal e morte
súbita,  apesar  da  terapia  de  apoio  agressiva  e  do  tratamento  cirúrgico.  Achados  macroscópicos  pós­morte  incluem  hemorragia  intensa  e  necrose  intestinal.  A  prevenção  consiste  em  melhorar  a  dieta  e  evitar  mudanças  repentinas  de
alimentação. As vacinas autógenas em rebanhos infectados foram testadas com pouco sucesso.

Enterocolites Associadas a Clostrídio em Equinos
C. difficile e C. perfringens têm sido implicados como causas de doenças agudas e esporádicas em equinos, caracterizadas por diarreia e cólica. Como a etiologia é incerta, a condição também tem sido referida como colite idiopática, mas
atualmente há boas evidências de que esses microrganismos sejam os responsáveis pelas enterocolites em equinos, em 20 a 30% dos casos de diarreia aguda (ver p. 305).
ETIOLOGIA:  C. difficile e C. perfringens são observados em baixas concentrações nas fezes de equinos saudáveis. Ambos os microrganismos podem estar no solo ou no ambiente e ser ingeridos pelos equinos. Os fatores que desencadeiam a
doença não estão bem esclarecidos, mas supõe­se que alguma alteração na flora normal permita a multiplicação excessiva da bactéria, a qual produz toxinas capazes de causar danos intestinais e efeitos sistêmicos.
Os fatores predisponentes sugeridos incluem mudança da dieta e terapia antimicrobiana. Outros fatores relacionados com o hospedeiro que podem determinar se a doença se desenvolve são: idade, imunidade e presença ou ausência de
receptores  intestinais  para  as  toxinas  do  clostrídio.  A  terapia  antimicrobiana  recente  é  uma  característica  comum  do  histórico  de  equinos  com  diarreia  induzida  por  C.  difficile.  Alguns  antibióticos,  particularmente  os  macrolídeos  e
especialmente eritromicina, betalactâmicos e trimetoprima­sulfonamida, são mais prováveis que outros de estarem associados à colite por C. difficile. Éguas com potros que estão sendo tratadas com etilsuccinato de eritromicina parecem ser
de alto risco. A eliminação de forragem da dieta, antes da cirurgia, também é relatada como predisponente à colite por C. difficile. Diarreia aguda foi reproduzida em potros neonatos saudáveis, utilizando esporos e células vegetativas de C.
difficile. Enterite aguda anterior (jejunite duodenites, p. 305) também está associada a C. difficile em estudos de casos controle.
C. perfringens tipo A é causa de diarreia devido à produção de uma enterotoxina (enterotoxina do Clostridium perfringens [CPE]), a qual é liberada durante a esporulação e estimula as células epiteliais do intestino a secretar excesso de
fluido no lúmen. Uma nova toxina necrosante, denominada β­2, produzida por algumas cepas de C. perfringens, foi há pouco tempo associada estreitamente à colite em equinos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Potros  e  equinos  adultos  podem  ser  afetados.  Caracteristicamente,  há  sinais  de  dor  abdominal  e  diarreia  com  ou  sem  sangue.  Pode  haver  distensão  abdominal,  especialmente  em  casos  de  diarreia  induzida  por C.
difficile. Pode ocorrer desidratação, toxemia e choque; a taxa de mortalidade é variável. Um ou vários animais de uma mesma fazenda podem ser afetados.
Lesões:  A lesão característica é enterocolite necrosante. Há importante perda de células epiteliais da mucosa cecal e do cólon, colite e tiflite hemorrágicas e trombose nos capilares da mucosa intestinal.

DIAGNÓSTICO:  As características clínicas da doença são similares às da salmonelose aguda (p. 311), febre do cavalo Potomac (p. 310) ou erliquiose monocítica. A identificação de C. perfringens como causa de diarreia em equinos depende
da detecção da enterotoxina ou do gene para CPE nas fezes ou no fluido intestinal, além da ausência de outros agentes provavelmente etiológicos. A maioria das cepas de C. perfringens encontradas no intestino de equinos não tem o gene
para CPE. A demonstração de inúmeros esporos bacterianos ou a alta concentração de C. perfringens nas fezes também ajuda no diagnóstico. Sugere­se o diagnóstico de diarreia por C. difficile pelo histórico de tratamento recente com
antibióticos, sendo confirmado pela presença de C. difficile e toxinas A e/ou B em amostras de fezes frescas ou congeladas encaminhadas ao laboratório, utilizando teste ELISA humano validado para equinos, com boa sensibilidade e
especificidade. A toxina pode ser identificada por ribotipagem em PCR.
CONTROLE:  Medidas devem ser tomadas para reduzir o risco de infecções por C. difficile em equinos. Procedimentos apropriados de isolamento e controle de doenças infecciosas devem ser aplicados em animais de alto risco que recebem
antibióticos. As fontes de esporos de C. difficile podem ser controladas mediante desinfecção da superfície com produto esporicida e a disseminação pode ser reduzida lavando­se as mãos e isolando­se potros e equinos infectados. Não há
medidas de controle para prevenção de diarreia induzida por C. perfringens. Recomenda­se metronidazol (15 mg/kg, VO, 3 vezes/dia) para o tratamento de quaisquer dessas infecções por clostrídios. O metronidazol pode ser teratogênico,
por isso não devem ser administrados às éguas prenhes.

 TÉTANO (Trismo Maxilar)
No tétano, a toxemia é causada por uma neurotoxina específica produzida por Clostridium tetani no tecido necrótico. Quase todos os mamíferos são suscetíveis a essa doença, embora os cães sejam relativamente  resistentes  e  os  gatos
pareçam muito mais resistentes que qualquer outro mamífero doméstico ou de laboratório. As aves são muito resistentes; a dose letal para pombos e galinhas é 10.000 a 300.000 vezes maior (com base no peso corporal) do que para os
equinos. Estes são os mais sensíveis de todas as espécies, com a possível exceção do ser humano. Posto que o tétano é cosmopolita em sua distribuição, há algumas regiões, como a parte setentrional das Montanhas Rochosas nos EUA, nas
quais  esse  agente  é  raramente  encontrado  no  solo  e  o  tétano  é  praticamente  desconhecido.  Em  geral,  a  ocorrência  de C. tetani no  solo  e  a  prevalência  de  tétano  no  homem  e  nos  equinos  são  mais  altas  nas  regiões  quentes  dos  vários
continentes.
ETIOLOGIA  E  PATOGENIA:  C.  tetani,  um  anaeróbio  com  esporos  terminais  e  esféricos,  encontrado  no  solo  e  no  trato  intestinal.  Na  maioria  dos  casos,  é  introduzido  nos  tecidos  através  de  ferimentos,  particularmente  nos  profundos  por
perfuração, que propiciam um ambiente anaeróbio adequado. Entretanto, em ovinos, e às vezes em outras espécies, quase sempre ocorre após o corte da cauda ou a castração. Em alguns casos, não é possível visualizar o ponto de entrada, já
que o próprio ferimento pode ser pequeno ou estar cicatrizado.
Os esporos de C. tetani são incapazes de crescer em tecido normal ou mesmo em ferimentos se o tecido permanecer no potencial de oxidorredução do sangue circulante. As condições adequadas para a multiplicação se dão quando uma
pequena quantidade de terra ou um corpo estranho causa necrose tecidual. A bactéria permanece localizada no tecido necrótico no local original da infecção e se multiplica. À medida que as células bacterianas sofrem autólise, a potente
neurotoxina é liberada. A neurotoxina é uma protease que se liga ao zinco, a qual cliva a transmissão sináptica, uma vesícula associada à membrana proteica. Geralmente, os nervos motores absorvem a toxina na região e a deixam passar
pelo trato nervoso da medula espinal, onde causa tétano ascendente.
A toxina acarreta contrações tônicas e espasmódicas dos músculos voluntários por meio da interferência na liberação de neurotransmissores provenientes das terminações do nervo pré­sináptico. Caso mais toxina seja liberada no local da
infecção do que os nervos circundantes possam absorver, a toxina é levada pela linfa para a corrente sanguínea e consequentemente para o SNC, onde ocasiona tétano descendente. Mesmo uma pequena estimulação do animal afetado pode
provocar os espasmos musculares característicos. Os espasmos podem ser tão graves a ponto de causar fraturas ósseas. Afetam a laringe, o diafragma e os músculos intercostais resultando em insuficiência respiratória. O envolvimento do
sistema nervoso autônomo resulta em arritmias cardíacas, taquicardia e hipertensão.
ACHADOS CLÍNICOS:  O período de incubação varia de uma a algumas semanas, mas a média, em geral, é de 10 a 14 dias. Observa­se inicialmente rigidez localizada, envolvendo os músculos masseter e do pescoço, os membros posteriores e
a região do ferimento infectado; a rigidez geral se torna pronunciada cerca de 1 dia depois e espasmos tônicos e hiperestesia tornam­se evidentes. Devido a sua alta resistência à toxina tetânica, cães e gatos muitas vezes possuem longo
período de incubação e frequentemente desenvolvem tétano localizado. Nessas espécies também ocorre tétano generalizado.
Os reflexos aumentam em intensidade e o animal se excita facilmente em espasmos gerais e mais violentos por meio de um movimento súbito ou um ruído. Os espasmos dos músculos da cabeça causam dificuldade na apreensão e na
mastigação do alimento, daí a denominação comum de mandíbula travada. Em equinos, as orelhas ficam eretas, a cauda rígida e estendida, as narinas dilatadas e a terceira pálpebra prolapsada. Andar, fazer curvas e recuar são atitudes
difíceis.  Os  espasmos  dos  músculos  do  pescoço  e  do  dorso  causam  extensão  da  cabeça  e  do  pescoço,  enquanto  a  rigidez  dos  músculos  dos  membros  faz  com  que  o  animal  assuma  uma  postura  em  “cavalete”.  Sudorese  é  comum.  Os
espasmos gerais alteram a circulação e a respiração, o que resulta em aumento da frequência cardíaca, respiração rápida e congestão das membranas mucosas. Ovinos, caprinos e suínos frequentemente caem no solo e apresentam opistótono
quando  assustados.  A  consciência  não  é  afetada.  Em  cães  e  gatos,  o  tétano  localizado,  habitualmente  manifesta­se  como  rigidez  em  um  membro  com  uma  ferida.  A  rigidez  progride  para  envolver  o  membro  oposto  e  pode  avançar
anteriormente. A aparência no tétano generalizado é similar à descrita para equinos, exceto que a boca permanece parcialmente aberta com os lábios retraídos (como é visto em humanos).
Em geral, a temperatura permanece ligeiramente acima do normal, mas pode chegar a 42 a 43°C, culminando em uma crise fatal. Em episódios leves, o pulso e a temperatura continuam próximos do normal. A taxa de mortalidade é cerca
de 80%. Em animais que se recuperam, o período de convalescença é de 2 a 6 semanas; a imunidade protetora comumente não se desenvolve após a recuperação.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos e o histórico de traumatismo recente são, em geral, adequados para um diagnóstico de tétano. A confirmação do diagnóstico é possível pela comprovação da toxina tetânica no soro do animal afetado. Nos
casos em que a ferida é aparente, pode­se tentar a identificação da bactéria em esfregaços corados pelo Gram e em cultura em meios anaeróbicos.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Quando administrados nos estágios iniciais da doença, agentes curariformes, tranquilizantes ou sedativos barbitúricos, juntamente com 300.000 UI de antitoxina tetânica 2 vezes/dia, são efetivos no tratamento
de equinos. Têm­se obtido bons resultados em equinos com a injeção de 50.000 UI de antitoxina tetânica diretamente no espaço subaracnóideo, através da cisterna magna. Tal terapia deve ser mantida por drenagem e limpeza dos ferimentos
e a administração de penicilina ou antibióticos de amplo espectro. Boa assistência é inestimável durante o período agudo de espasmos. O equino deve ser colocado em uma baia escura e sem barulho, com recipientes para alimento e água
altos o suficiente para permitir seu uso sem abaixar a cabeça. Cintas suspensoras podem ser úteis para equinos com dificuldade para ficar em pé ou se levantar.
A mesma abordagem descrita para equinos é utilizada para cães e gatos, salvo que se deve ter cuidado na administração por via intravenosa da antitoxina, pois a toxina equina pode induzir anafilaxia. Em um estudo, a antitoxina foi
fornecida a cães com tétano apenas após o teste intradérmico para detectar reações de hipersensibilidade. Além disso, todos os cães receberam penicilina IV e alguns também receberam metronidazol VO. A combinação de clorpromazina,
fenobarbital ou diazepan pode ser utilizada para reduzir reações de hiperestesia e convulsões.
A  imunidade  ativa  pode  ser  ativada  com  o toxoide  tetânico,  quando  administradas  nos  estágios  iniciais  da  doença.  Caso  ocorra  um  ferimento  perigoso  após  a  imunização,  deve­se  administrar  outra  injeção  de  toxoide  para  elevar  o
anticorpo circulante. Em situações em que o animal não foi imunizado previamente, deve­se tratá­lo com 1.500 a 3.000 UI ou mais de antitoxina tetânica, a qual geralmente propicia proteção passiva por até 2 semanas. A administração do
toxoide deve ser feita simultaneamente com a antitoxina e repetida em 30 dias. Injeções de reforço anual são recomendáveis, em humanos o toxoide é administrado a cada 10 anos. As éguas devem ser vacinadas durante as últimas 6
semanas de gestação e os potros, nas 5 a 8 semanas de idade. Nas regiões de alto risco, pode­se administrar a antitoxina tetânica em potros imediatamente após o nascimento e a cada 2 a 3 semanas até estarem com 3 meses de idade,
momento em que podem receber o toxoide. A decisão de vacinar cordeiros ou bezerros depende da prevalência da doença na região.
Todos os procedimentos cirúrgicos devem ser conduzidos com as melhores técnicas possíveis. Após a cirurgia, os animais devem ser transferidos para solo limpo, de preferência pastagens com grama. Apenas desinfetantes oxidantes
como iodo ou cloro eliminam seguramente os esporos.

 VACINAS CONTRA CLOSTRÍDIOS
A vacinação é praticada com frequência para proteção de animais contra as clostridioses. Uma ampla variedade de vacinas está disponível no mercado, individuais ou em combinações que consistem de bacterinas, toxoides ou misturas de
bacterinas e toxoides. A vacinação apenas com vários tipos de clostrídios não propicia adequado grau de imunidade; deve­se aplicar dose de reforço após 3 a 6 semanas. A vacinação de animais jovens não induz proteção imunológica
adequada até pelo menos 1 a 2 meses de idade. Portanto, várias estratégias de vacinação para fêmeas prenhes levam a imunidade máxima ao neonato pela transferência dos anticorpos pelo colostro. Muitas vacinas comerciais são inativadas
e geralmente contém 2, 4, 7 ou 8 combinações de clostrídios/toxoides. As aplicações devem ser realizadas de forma que a proteção máxima ocorra na idade mais suscetível.
O  toxoide  tetânico  é  comumente  utilizado  como  única  vacina  em  equinos,  mas  quase  sempre  em  combinação  em  ovinos,  caprinos  e  bovinos.  Em  ovinos  e  caprinos,  uma  combinação  comum  é  aquele  de  toxoide  tetânico
com Clostridium perfringens tipos C e D. Em bovinos, uma combinação habitualmente utilizada nos rebanhos é a vacina quádrupla, que consiste em culturas mortas de C. chouvoei, C. septicum, C. novyi e C. sordellii, para proteger contra
carbúnculo sintomático e edema maligno. Uma vacina contra clostrídios mais complexa que contém C. perfringens tipos  C  e  D,  além  dos  componentes  da  vacina  quadrupla,  também  pode  ser  utilizada  para  proteger  os  bovinos  contra
enterotoxemias. A adição de C. haemolyticum aumenta a proteção, pois evita a hepatite necrótica infecciosa. As vacinas clostridianas, em geral, causam reação e tumefação nos tecidos; portanto, em bovinos devem ser administradas na
região do pescoço, por via SC em vez de via IM.

DOENÇA EXSUDATIVA (Sweating Sickness)

A  doença  exsudativa  é  uma  intoxicação  aguda  febril,  veiculada  por  carrapatos,  caracterizada  principalmente  por  eczema  úmido  e  profuso  e  hiperemia  da  pele  e  das  membranas  mucosas  visíveis.  É  essencialmente  uma  doença  de
bezerros jovens, embora adultos também sejam suscetíveis. Foram infectados experimentalmente ovinos, suínos, caprinos e um cão. Essa doença ocorre nas regiões oriental, central e meridional da África e, provavelmente, no Sri Lanka e
no sul da Índia.
ETIOLOGIA:  A causa é uma toxina epiteliotrópica produzida por fêmeas de algumas linhagens de Hyalomma truncatum. A toxina é produzida no carrapato, mas não no vertebrado hospedeiro. O potencial de produção de toxina se limita a
até 20 gerações do carrapato ou, possivelmente, mais. As tentativas de transmissão experimental de animais afetados aos animais sadios, por contato ou inoculação de sangue, não obtiveram sucesso.
Os períodos graduais de infestação de um hospedeiro suscetível por carrapatos “infectados” têm efeitos diferentes no hospedeiro. Um período muito curto não tem qualquer efeito; o animal permanece suscetível. Um período longo o
suficiente para induzir uma reação pode conferir imunidade, mas se a exposição for > 5 dias pode resultar em sinais clínicos graves e morte. A recuperação confere imunidade duradoura, que pode persistir por = 4 anos. Também, foram
descritas outras formas de intoxicação por H. truncatum estreitamente relacionadas.
ACHADOS CLÍNICOS:  Após um período de incubação de 4 a 11 dias, os sintomas surgem subitamente e incluem hipertermia, anorexia, apatia, lacrimejamento e corrimento nasal, hiperemia de membranas mucosas visíveis, salivação, necrose
de mucosa bucal e hiperestesia. Mais tarde, as pálpebras se grudam. Nota­se a pele quente e logo se desenvolve dermatite úmida, começando na base de orelhas, axilas, virilha e períneo, estendendo­se pelo corpo inteiro. Os pelos ficam
emaranhados e neles é possível notar gotas de umidade. A pele se torna extremamente sensível e exala odor ácido. Posteriormente, é possível arrancar facilmente os pelos e a epiderme, expondo ferimentos úmidos e cruentos. As pontas das
orelhas e da cauda podem necrosar e se desprender. Por fim, a pele se torna dura e rachada, predisposta a infecções secundárias ou infestações por larvas de Cochliomyia hominivorax. O animal acometido fica sensível à manipulação, exibe
dor quando se movimenta e procura sombra.
Muitas vezes, o curso é rápido e o animal pode morrer em poucos dias. Nos casos menos agudos, o curso é mais prolongado e pode ocorrer recuperação do paciente. A taxa de mortalidade em bezerros afetados é de 30 a 70%, em
condições naturais. A taxa de morbidade nas áreas endêmicas é cerca de 10%. A gravidade da infecção é influenciada pelo número de carrapatos e pelo período em que permanecem no hospedeiro.
Lesões: Além das lesões cutâneas descritas notam­se emaciação, desidratação, estomatite difteroide, faringite, laringite, esofagite, vaginite ou postite, edema e hiperemia pulmonar, atrofia de baço e congestão de fígado, rins e meninges.

DIAGNÓSTICO:   Para  o  diagnóstico,  é  fundamental  a  constatação  da  presença  do  vetor.  Ocorre,  tipicamente,  hiperemia  generalizada  e  consequente  descamação  das  camadas  superficiais  das  membranas  mucosas  dos  tratos  respiratório
superior, gastrintestinal e genital externo, bem como dermatite úmida profusa, seguida de descamação superficial da pele.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  O controle da infestação de carrapatos é a única medida profilática efetiva. Indicam­se remoção dos carrapatos, tratamento sintomático e terapia de suporte adequada. Antibióticos não nefrotóxicos e anti­
inflamatórios são úteis na prevenção de infecção secundária. Soro imune pode ser um tratamento específico efetivo.

ESTOMATITE VESICULAR

A estomatite vesicular é uma enfermidade viral causada por dois sorotipos distintos do vírus da estomatite vesicular – Nova Jersey e Indiana. Nos casos clínicos, podem ser observadas vesículas, ulceração e erosão das mucosas nasal e oral,
bem como na superfície epitelial da língua, bandas coronárias e tetos; estas lesões são tipicamente observadas nos casos clínicos, além de lesões crostosas no focinho, abdome ventral e prepúcio. A doença clínica pode ser observada em
bovinos, equinos e suínos e muito raramente é verificada em ovinos, caprinos e lhamas. A evidência sorológica de exposição é notada em várias espécies de cervídeos, primatas não humanos, roedores, pássaros, cães, antílopes e morcegos.
ETIOLOGIA:  Esses vírus pertencem à família Rhabdoviridae e gênero Vesiculovirus. O vírus da estomatite vesicular é o protótipo do gênero Vesiculovirus. Têm formato de um projétil e geralmente medem 180nm de comprimento e 75nm de
largura. A estrutura genômica é constituída RNA com filamento único de sentido negativo composto por 5 genes (N, P, M, G e L, representando a proteína do nucleocapsídio, fosfoproteína, proteína matricial, glicoproteína e proteína
grande, que é um componente da RNA polimerase viral). Embora existam muitos membros do gênero Vesiculovirus, os sorotipos Nova Jersey e Indiana são, particularmente, os mais importantes no hemisfério oeste. Esses dois vírus têm
tamanho e morfologia semelhantes, mas geralmente distintos na neutralização de anticorpos dos animais infectados. Ambos foram isolados em surtos recentes nos EUA.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  A estomatite vesicular é esporádica nos EUA. Historicamente, os surtos ocorreram em todas as regiões do país, mas desde os anos de 1980 estão limitados aos Estados do sul. Surtos ocorreram em 1995,
1997, 1998, 2004, 2005, 2006 e 2009. O maior surto ocorreu em 2005, em 9 estados. O vírus da estomatite vesicular é endêmico nas Américas do Sul e Central e em regiões do México, não sendo observado naturalmente fora do hemisfério
oeste. O vírus pode ser transmitido por contato direto com animais infectados e com sinais clínicos (com lesão) ou por picada de insetos hematófagos. Na região sudoeste dos EUA, os mosquitos pretos (Simulidae) são os vetores biológicos
mais prováveis. Nas áreas endêmicas, o mosquito­pólvora (Lutzomyia) são os principais vetores biológicos. Outros insetos podem atuar como vetores mecânicos. A prevalência de casos clínicos em um rebanho geralmente é baixa (10 a
20%), porém, a soroprevalência no rebanho pode chegar a 100%. Não foi detectada viremia em animais pecuários com sinais clínicos de estomatite vesicular. Várias espécies de vertebrados apresentam evidências sorológicas de exposição e
podem atuar como reservatórios da infecção. Não foi identificado qualquer hospedeiro como reservatório definitivo ou amplificador do vírus da estomatite vesicular nos EUA.
ACHADOS CLÍNICOS:  O período de incubação varia de 2 a 8 dias sendo, tipicamente, seguido de febre. Com o passar do tempo, surgem outros sintomas e os animais examinados raramente se apresentam febris. Ptialismo é, geralmente, o
primeiro sinal da doença. Vesículas da cavidade bucal são raramente observadas nos casos de ocorrência natural porque se rompem logo após a formação; portanto, as úlceras são as lesões mais comuns verificadas no primeiro exame.
Úlceras e erosões da mucosa bucal, desprendimento de epitélio da língua e lesões nas junções mucocutâneas dos lábios são comumente observadas em bovinos e equinos. Úlceras e erosões em tetos são comuns e podem resultar em mastite
secundária em vacas leiteiras. Coronite com erosões da banda coronária é observada em bovinos, equinos e suínos, com desenvolvimento subsequente de claudicação. As lesões crostosas de focinho, úbere, abdome ventral e prepúcio de
equinos foram achados típicos em surtos no sudoeste dos EUA. A inapetência devido às lesões da cavidade bucal e a claudicação decorrente das lesões de cascos normalmente são de curta duração, uma vez que a doença geralmente é
autolimitante, com completa resolução dentro de 10 a 14 dias. Os anticorpos neutralizantes dos dois sorotipos do vírus persistem por = 5 anos, mas pode ocorrer reinfecção logo após uma segunda exposição.
DIAGNÓSTICO:  Em muitas regiões, inclusive nos EUA, a estomatite vesicular é uma doença de notificação obrigatória. As amostras para fins diagnóstico geralmente são obtidas por médicos veterinários oficiais e os testes são realizados em
laboratórios do governo. O diagnóstico é baseado na presença de sinais clínicos típicos e na detecção de anticorpos com o uso de testes sorológicos, detecção viral por meio do isolamento, e/ou detecção viral de material genético por meio
de técnicas moleculares. As amostras para isolamento viral podem ser fluido vesicular, fragmentos de epitélio ou suabes de lesões. O vírus da estomatite vesicular se propaga facilmente em cultura de células. Os três testes sorológicos
rotineiramente utilizados são ELISA de competição, neutralização viral e fixação de complemento. O teste PCR pode ser utilizado para a identificação do vírus. De importância fundamental no diagnóstico é a diferenciação entre as doenças
virais, inclusive febre aftosa em ruminantes e suínos, doença vesicular suína e exantema vesicular em suínos. Os equinos não são suscetíveis à febre aftosa. Tanto as causas infecciosas quanto não infecciosas causam lesões bucais e devem
ser consideradas.
TRATAMENTO,  CONTROLE  E  PREVENÇÃO:  Não  há  tratamento  disponível  ou  seguro.  A  caquexia  pode  ser  evitada  mediante  o  fornecimento  de  alimentos  moles.  A  limpeza  das  lesões  com  antissépticos  brandos  ajuda  a  evitar  infecção
bacteriana secundária. Fatores relacionados com o manejo podem reduzir a exposição ao vírus e incluem tempo limitado na pastagem, abrigos para reduzir a picada de insetos e implementação de outros procedimentos para reduzir o contato
dos animais com os insetos, inclusive aplicação de inseticidas. Isto deve incluir a aplicação na superfície interna do pavilhão auricular onde os borrachudos se alimentam. Quando os animais infectados são identificados, devem ser isolados
do rebanho, restringindo­se a movimentação de outros animais das instalações afetadas. A estomatite vesicular é uma doença de notificação obrigatória em vários países, inclusive nos EUA; assim, os agentes de saúde devem ser notificados
quando há suspeita da doença. Vacinas produzidas comercialmente não estão disponíveis nos EUA, ao contrário de alguns países da América Latina onde há disponibilidade.
A  vigilância  do  vírus  da  estomatite  vesicular  nos  EUA  é  principalmente  responsabilidade  do  Departamento  de  Agricultura  do  Estado,  que  reporta  os  resultados  ao  USDA.  Os  veterinários  atuam  como  parte  da  rede  de  vigilância,
examinando os animais envolvidos em feiras, exposições, corridas e transporte internacional e interestadual, preenchendo o certificado de inspeção sanitária (mais comumente conhecido como certificado de saúde). Suabes de membrana
mucosa e amostras de soro dos animais suspeitos são enviados para exames em laboratório de diagnóstico veterinário. Durante os anos de surto, as informações laboratoriais confirmam os casos de estomatite vesicular, juntamente com o
número de casos suspeitos e são postados na página: http://www.aphis.usda.gov/vc/nahrs/equine/vsv/.
RISCO ZOONÓTICO:  O vírus da estomatite vesicular causa doença zoonótica e pode provocar doença tipo influenza autolimitante (cefaleia, febre, mialgia, e fraqueza), que dura 3 a 5 dias, em pessoas que trabalham diretamente em contato
com o vírus (p. ex., exposição laboratorial, contato direto com lesões de animais infectados). Raramente, as pessoas podem desenvolver vesículas na mucosa bucal e faringiana, boca e narinas. Sinais mais graves incluem encefalite, que é
rara.
FEBRE AFTOSA

A febre aftosa (FA) é uma doença viral altamente contagiosa que acomete bovinos, suínos, ovinos, caprinos, bubalinos e espécies selvagens que apresentam cascos fendidos. Caracteriza­se por febre e vesículas na boca e no focinho, úbere e
patas. Em uma população suscetível, a morbidade chega a 100%. A doença raramente é fatal, exceto em animais jovens.
Os bovinos são mais suscetíveis. Os suínos domésticos são hospedeiros importantes, principalmente na propagação da doença. Em ovinos e caprinos, a manifestação clínica da infecção geralmente é menos grave que em bovinos e suínos.
Todas as espécies de cervos, antílopes, elefantes e girafas são suscetíveis à febre aftosa, mas os camelos do Velho Mundo são resistentes à infecção natural. Na África, a infecção em búfalos Cape é assintomática. Na América do Sul, os
camelídeos, como alpacas e lhamas, embora suscetíveis, provavelmente não têm importância epidemiológica. Camundongos, cobaias e hamsters podem ser infectados experimentalmente.
A febre aftosa é endêmica no Oriente Médio, Irã, nos países do sul da antiga União Soviética, Índia e sudoeste da Ásia. Surtos esporádicos ocorreram no sul da Coreia, em 2000 e 2002, no Japão em 2000 e na península da Malásia. Está
restrita à ilha Luzon, nas Filipinas. Australásia e Indonésia são livres da doença, bem como as Américas Central e do Norte. América do Sul, Chile, sudeste da Argentina, Guiana, Suriname e regiões da Colômbia em divisa com Panamá são
livres; grandes surtos de febre aftosa ocorreram no Uruguai e na região central da Argentina em 2001, onde a doença está sob controle e essas regiões, juntamente com o Paraguai e grande parte do Brasil, são agora consideradas regiões
livres nas quais ainda se utiliza vacinação. A maioria da região subsaariana da África é endêmica, bem como Egito, Etiópia e Eritreia. A febre aftosa retornou ao Zimbábue associada a mudanças econômicas e sociais, e surtos esporádicos
também têm acontecido em locais no sul da África considerados livres, como Namíbia e Botsuana.
Na Europa, houve um surto na Grécia, na divisa com a Turquia, em 2000, que foi rapidamente controlado, mas em 2001, a febre aftosa foi introduzida no Reino Unido, onde se espalhou para Irlanda, Países Baixos e França. A cepa
causadora do surto foi a mesma encontrada na Ásia e estava sob controle no Reino Unido, após o abate de mais de 4 milhões de animais, sem o uso de vacina. A vacinação foi utilizada nos Países Baixos e todos os animais vacinados foram
subsequentemente abatidos.
ETIOLOGIA:  A febre aftosa é causada por um aftovírus da família Picornaviridae. Há 7 sorotipos imunologicamente distintos: A, O, C, Ásia 1 e territórios sul­africanos (TSA) 1, 2 e 3. Dentro de cada sorotipo, há grande quantidade de cepas
que exibem um espectro de características antigênicas; por essa razão, mais de 1 cepa vacinal para cada sorotipo, particularmente O e A, é requerida para cobrir a diversidade antigênica. As cepas são caracterizadas por suas relações
genômicas e suas similaridades antigênicas com cepas vacinais estabelecidas (a classificação prévia em sorotipos torna­se insustentável à medida que o número de subtipos aumenta com rapidez). O desenvolvimento da análise da sequência
de nucleotídios permite a definição dos topotipos, com base nos genes da proteína do capsídio. Por exemplo, o vírus da febre aftosa tipo O pode ser dividido em 8 topotipos cada um contém diferentes sequencias virais do gene VP1 pelo
menos 15% e são geograficamente distintos.
O vírus é rapidamente inativado em pH 6 a 9 e por dessecação e temperaturas > 56°C, embora o vírus residual possa sobreviver por tempo considerável quando associado a proteínas animais (p. ex., uma proporção de vírus da febre aftosa
em leite contaminado sobreviverá à pasteurização a 72°C por 15s). O vírus da febre aftosa é resistente a solventes lipídicos como o éter e o clorofórmio. Devido à sensibilidade do vírus ao pH ácido e alcalino, hidróxido de sódio, carbonato
de sódio, ácido cítrico ou acético são desinfetantes eficazes.
TRANSMISSÃO, EPIDEMIOLOGIA E PATOGENIA:  A transmissão da febre aftosa geralmente se dá por contato entre animais suscetíveis e infectados. Os animais infectados possuem grande quantidade de vírus no ar que exalam, na forma de
aerossol, o qual pode infectar outros animais por via respiratória ou oral. Todas as excreções e secreções do animal infectado contêm o vírus e este pode ainda estar no leite e no sêmen por até 4 dias antes dos sinais clínicos aparecerem. O
vírus da febre aftosa aerossolizado pode se espalhar por uma considerável distância como uma pluma, dependendo das condições do tempo, particularmente quando a umidade relativa é > 60% e a topografia é favorável à dispersão do vírus.
O leite contaminado tem transmitido febre aftosa para bovinos e caminhões­tanque que carregam o leite contaminado estão envolvidos na disseminação da doença entre as fazendas. A forragem pode se tornar contaminada após contato com
animais infectados e há relatos de disseminação iatrogênica de febre aftosa.
Embora equinos, cães e gatos não sejam acometidos por febre aftosa, eles podem atuar como vetores mecânicos, assim como as pessoas. As aves também não são suscetíveis à infecção, mas podem carrear o vírus em seus pés e penas e
excretar o vírus após ingerir material infectado. Por conseguinte, os pássaros podem carrear o vírus, apesar de seu papel na disseminação não estar claro.
Um cenário típico para a introdução da febre aftosa em região previamente livre ocorre com a importação de alimentos derivados de animais infectados (como carne, vísceras ou leite) para alimentação de suínos; o vírus, então, se espalha
por meio de aerossol de suínos infectados para os bovinos, os quais representam a espécie mais provavelmente infectada por via respiratória devido ao grande volume de ar inspirado. O vírus da febre aftosa pode sobreviver em material
fecal seco por 14 dias, no verão, em material pastoso por até 6 meses, no inverno, na urina por 39 dias e no solo por 3 dias (no verão) a 28 dias (no inverno).
Os ruminantes que se recuperaram de infecção e os ruminantes vacinados que têm contato com o vírus vivo da febre aftosa podem atuar como focos de infecção e carrear o vírus na região faringiana por até 3,5 anos, em bovinos, 9 meses
em  ovinos  e  =  5  anos  em  búfalos  africanos.  Experimentalmente,  não  é  possível  comprovar  a  transmissão  de  um  animal  carreador  para  um  animal  suscetível  contactante,  mas  há  evidências  que  sob  condições  adversas  esses  animais
carreadores iniciem novos surtos de doença. O vírus da febre aftosa pode ser isolado de animais portadores por meio de cultura de amostras de células superficiais e muco da faringe (coletadas utilizando­se uma sonda especial) em tecidos
suscetíveis, como as células principais da tireoide de bovinos. Contudo, a técnica é provavelmente apenas 50% confiável na identificação do portador, com a utilização de uma única amostra, pois a quantidade de vírus encontrada na faringe
é variável em diferentes ocasiões.
O local primário de infecção e replicação geralmente é a mucosa da faringe, embora o vírus possa penetrar através de lesões de pele ou no trato gastrintestinal. O vírus se dissemina pelo sistema linfático para locais de replicação, como
epitélio de boca, focinho, patas e úbere, além de áreas cutâneas lesionadas (p. ex., joelhos e jarrete de suínos mantidos em piso de concreto). As vesículas se desenvolvem nesses locais e se rompem quase sempre em 48 h. A viremia persiste
por 4 a 5 dias.
A produção de anticorpos pode ser detectada 3 a 4 dias após os primeiros sinais clínicos e são suficientes para eliminar o vírus.
ACHADOS CLÍNICOS:  O período de incubação da febre aftosa varia de 2 a 14 dias, dependendo da dose infectante, da suscetibilidade do hospedeiro e da cepa viral – em suínos, em algumas cepas de vírus da febre aftosa pode ser tão curto
quanto 18 h. Os sinais clínicos são mais graves em bovinos e em suínos submetidos à criação intensiva do que em ovinos e caprinos. A febre aftosa tem sido ignorada ou subdiagnosticada em pequenos ruminantes.
Em bovinos e suínos, após o período de incubação, podem se desenvolver anorexia e febre de até 41°C. Os bovinos salivam e batem as patas à medida que se desenvolvem vesículas na língua, no coxim dental, na gengiva, nos lábios e na
banda coronária da fenda interdigital podal. As vesículas também podem surgir nos tetos e úbere, particularmente em vacas e porcas lactantes, e nas áreas da pele submetidas à pressão e traumatismo, como os membros das porcas. Bezerros,
cordeiros e suínos jovens podem morrer antes de apresentar qualquer vesícula, em decorrência da lesão de células em desenvolvimento do miocárdio induzida pelo vírus. A produção de leite diminui drasticamente em fêmeas leiteiras e
todos os animais exibem perda da condição corporal e da taxa de crescimento. Ovinos e caprinos podem desenvolver apenas algumas vesículas na banda coronária e na boca. As vesículas bucais, mesmo quando graves, cicatrizam­se, em
geral, em 7 dias, embora a recuperação das papilas da língua demore mais tempo. As lesões de glândula mamária e patas frequentemente sofrem infecções secundárias, resultando em mastite, lesão de sola e claudicação crônica. Em suínos,
pode ocorrer perda de todo o estojo córneo dos dedos. Bovinos e cervos também podem perder 1 ou ambos os estojos córneos das patas; ademais, em cervos pode ocorrer desprendimento dos chifres.
DIAGNÓSTICO:  Em bovinos e suínos, os sinais clínicos da febre aftosa são indistinguíveis daqueles de estomatite vesicular (p. 668) e nos suínos daqueles da doença vesicular suína (p. 797) e do exantema vesicular (p. 805). As amostras de
epitélio vesicular ou de fluido vesicular devem ser enviadas em solução salina tamponada com fosfato (pH 7,4) ao laboratório nacional oficial responsável pelo diagnóstico de febre aftosa ou ao World Reference Laboratory do Office
International  des  Epizooties  (OIE)/Food  and  Agricultural  Organization  (FAO),  em  Pirbright,  Reino  Unido,  por  acordo  prévio.  As  amostras  devem  ser  mantidas  hermeticamente  fechadas  o  máximo  possível,  em  pH  7,4,  para  evitar  a
destruição do vírus da febre aftosa e do antígeno. Devem ser seguramente acondicionadas em recipientes duplos à prova de vazamento, cumprindo o regulamento nacional e, quando apropriado, as normas internacionais de envio de material
biológico infectante.
As amostras são preparadas como uma suspensão 10%, inoculada em cultura de tecido suscetível e tipagem direta por ELISA. O vírus isolado da febre aftosa é caracterizado por comparação antigênica com as cepas vacinais de febre
aftosa existentes e a sequência do nucleotídio de um segmento do gene 1D é determinado por comparação com outras cepas do mesmo sorotipo para identificar a possível origem do surto. Há disponibilidade de um teste ELISA para
determinar  a  evidência  sorológica  de  vacinação  contra  febre  aftosa  ou  a  recuperação  da  infecção:  bloqueio  em  fase  líquida  do  ELISA  ou  pela  competição  de  fase  sólida  do  ELISA,  introduzida  mais  recentemente,  a  qual  é  igualmente
sensível, porém mais específica.
Os testes de anticorpos contra proteínas não estruturais (NSP) do vírus podem ser utilizados para distinguir um animal infectado daquele que foi vacinado, pois apenas o animal infectado sustenta a replicação do vírus da febre aftosa vivo,
o qual expressa NSP como parte de seu ciclo de replicação. O vírus vacinal é morto e, consequentemente, não há expressão de NSP; dessa forma, no hospedeiro não há anticorpos contra essas proteínas. Entretanto, em algumas vacinas pode
haver contaminação por NSP suficiente para induzir a produção de anticorpo, particularmente a proteína 3D, em alguns animais que receberam múltiplas vacinações. Por outro lado, animais vacinados que tiveram contato com o vírus vivo
da febre aftosa e se tornaram portadores podem falhar em produzir anticorpo contra NSP, pois a imunidade propiciada pela vacinação suprime a replicação viral.
Os kits de diagnóstico rápido estão se tornando disponíveis para realização do exame na própria fazenda, mas há necessidade de validação acurada. Um teste PCR também está sendo cada vez mais utilizado para diagnóstico rápido;
embora sua total validação seja difícil, esse teste será, provavelmente, o mais utilizado no futuro.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A ocorrência da febre aftosa em países anteriormente livres da doença pode acarretar importantes efeitos no comércio nacional e internacional. Em vários países livres da doença há uma política de abater todos
os animais infectados e os suscetíveis que tiveram contato com eles e de restrições rigorosas na movimentação de animais e veículos perto de locais infectados. Após o abate, as carcaças são incineradas ou enterradas nesses locais, ou perto
deles, e as instalações são completamente lavadas e desinfetadas com ácido fraco ou álcali e por fumigação. Faz­se rastreamento para identificar a fonte do surto e os locais nos quais o vírus da febre aftosa já pode ter sido transmitido por
animais infectados ou produtos de origem animal, por veículos ou pessoas, ou por meio de aerossol.
Em regiões ou países livres da febre aftosa nos quais isso não é possível, o controle envolve restrição de movimentação, quarentena nos locais infectados e vacinação ao redor desses locais (e possivelmente neles). Essas medidas têm a
desvantagem de que vários animais portadores podem sobreviver após o surto e a quarentena pode não ser suficientemente longa para prevenir a movimentação subsequente deles.
Nos países em que a febre aftosa é endêmica, a proteção, particularmente de vacas leiteiras de alta produção, é realizada pela combinação de vacinação e prevenção da entrada do vírus nas propriedades leiteiras. Isso pode ser difícil,
quando a prevalência da doença na população não vacinada é alta e as condições climáticas facilitam a transmissão do vírus por meio de aerossol.
A vacina contra febre aftosa é produzida com vírus morto e, na melhor das hipóteses, propicia boa proteção contra a doença por 4 a 6 meses. Contudo, a diversidade antigênica das cepas do vírus dentro de cada um dos sorotipos é mais
uma complicação; assim, é necessário assegurar que as vacinas contenham cepas antigenicamente similares às cepas do surto potencial. Por outro lado, a duração da imunidade induzida pelas vacinas que contêm diferentes cepas pode ser
muito breve. As vacinas contra febre aftosa para suínos requerem um óleo adjuvante, ao passo que as vacinas para ruminantes podem conter um óleo ou hidróxido de alumínio/saponina, como adjuvante. Atualmente, não há alternativa
recomendada à vacina com antígenos oriundos de vírus total que cresce em cultura de tecidos e, então, quimicamente inativadas com uma azidirina, geralmente um binário da etilenoimina.

FEBRE Q

Febre Q é uma infecção bacteriana zoonótica associada principalmente a vacas parturientes, embora animais domésticos, como gatos e alguns animais selvagens, também sejam incriminados na ocorrência de infecções humanas. A bactéria
causadora de febre Q é considerada um agente potencial de bioterrorismo em razão de sua alta taxa de contagiosidade, estabilidade no ambiente e risco de disseminação por aerossol.
ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  A febre Q é causada por um cocobacilo Gram­negativo, Coxiella burnetii. Embora seja considerada classicamente uma riquétsia, análises filogenéticas recentes sugerem que C. burnetii está
mais relacionada com Legionella e Francisella do que ao gênero Rickettsia. É encontrada e reproduz­se em fagolisossomos de monócitos e macrófagos dos hospedeiros. Há duas formas – a variante de célula grande, que é uma forma
vegetativa encontrada em células infectadas, e a variante de célula pequena, que é a forma extracelular infecciosa excretada no leite, urina e fezes e encontrada em alta concentração (109ID50/g) em tecidos placentários e fluido amniótico. A
variante  pequena  é  resistente  ao  calor,  ressecamento  e  a  muitos  desinfetantes  comuns  e  permanece  viável  por  semanas  a  meses  no  ambiente.  Quando  um  ruminante  doméstico  é  infectado,  C.  burnetii  pode  localizar­se  nas  glândulas
mamárias, nos linfonodos supramamários, na placenta e no útero, dos quais pode se disseminar nos partos e lactações subsequentes.
A  epidemiologia  de  C.  burnetii  é  complexa,  pois  há  dois  padrões  principais  de  transmissão:  em  um,  o  microrganismo  circula  entre  animais  selvagens  e  seus  ectoparasitas,  principalmente  carrapatos;  o  outro  ocorre  em  ruminantes
domésticos independentemente do ciclo em animais selvagens. Os carrapatos ixodídeos e argasídeos podem atuar como reservatórios desse microrganismo. A distribuição é mundial (exceto na Nova Zelândia) e os hospedeiros incluem
mamíferos selvagens e domésticos, artrópodes e aves. A doença é enzoótica na maioria das áreas onde bovinos, ovinos e caprinos são mantidos. Nos EUA, estudos de soroprevalência mostraram anticorpos contra C. burnetii em 41,6% dos
ovinos, em 16,5% dos caprinos e em 3,4% dos bovinos.
O maior risco de transmissão ocorre no parto, por meio de inalação, ingestão ou contato direto com fluido de parto ou com a placenta. O microrganismo também é excretado no leite, urina e fezes. A pasteurização em alta temperatura
mata eficientemente o agente. Os carrapatos podem transmitir a doença aos ruminantes domésticos, mas não tem papel epidemiológico importante na transmissão da doença às pessoas.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  A infecção nos ruminantes geralmente é subclínica, mas pode causar anorexia e aborto tardio. Relatos sugerem C. burnetii como causa de infertilidade e abortos esporádicos com placentite necrosante
em ruminantes. As infecções experimentais em gatos causam febre transitória e anorexia com duração de vários dias.
Nos ruminantes domésticos, as lesões macroscópicas são inespecíficas e o diagnóstico diferencial deve incluir agentes infecciosos e não infecciosos que causam aborto. Pode­se realizar teste de imunofluorescência em amostras de soro
pareadas, com intervalo de = 2 semanas, para detectar infecções recentes; todavia, pode ocorrer excreção de C. burnetii na ausência de título de anticorpos mensuráveis no soro. Cultura, imunoistoquímica e PCR podem ser utilizadas na
identificação do microrganismo nos tecidos.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A febre Q humana é de notificação obrigatória nos EUA, principalmente por sua condição de possível agente de bioterrorismo. A notificação dos animais geralmente não é exigida, a menos que esteja associada
à infecção humana. Foram desenvolvidas vacinas para pessoas e animais, mas não estão comercialmente disponíveis nos EUA. A vacina preveniu a infecção quando administrada em bezerros não infectados, melhorou a fertilidade e reduziu
a excreção do microrganismo em animais anteriormente infectados.
Para  o  tratamento  oral  dos  ruminantes,  a  dose  terapêutica  de  tetraciclina  deve  ser  administrada  por  2  a  4  semanas.  Nos  rebanhos  com  infecção  reconhecida,  a  separação  de  fêmeas  prenhes,  a  cremação  ou  enterramento  dos  restos
placentários do parto ou a administração de tetraciclina (8 mg/kg/dia) na água de beber da parturiente pode reduzir a propagação do microrganismo.
RISCO ZOONÓTICO:  A febre Q ocorre com mais frequência em pessoas que têm contato ocupacional com as espécies de alto risco. A doença tem uma apresentação clínica muito variável em pessoas, desde uma doença autolimitante, como a
gripe, até pneumonia, hepatite e endocardite. É altamente contagiosa e apenas um microrganismo pode causar a infecção, por via respiratória, em pessoas.
A maioria dos surtos em pessoas está associada à disseminação pelo vento e por produtos secos oriundos da reprodução, contaminados com C. burnetii em locais onde ovinos, caprinos ou bovinos são mantidos. Criadores e veterinários
estão  em  risco  quando  acompanham  partos.  Em  abatedouros,  os  magarefes  também  correm  risco  devido  ao  contato  com  carcaças,  lã  e  pelos  infectados.  A  transmissão  também  pode  ocorrer  pelo  consumo  de  leite  não  pasteurizado.  A
manipulação de tecidos infectados representa uma ameaça aos funcionários de laboratório. Febre Q foi observada em pessoas e pacientes de hospitais onde ovinos com infecção latente são utilizados em pesquisas. Instituições médicas que
utilizam fêmeas ruminantes prenhes em pesquisas devem adquirir os animais de propriedades livres de Febre Q, quando possível. Além disso, os trabalhadores devem usar equipamentos protetores adequados contra exposição a gotículas e
aerossóis durante procedimentos médicos de alto risco.

INFECÇÃO POR ERYSIPELOTHRIX RHUSIOPATHIAE (Erisipela, Poliartrite não supurativa, Claudicação pós­imersão)

Erysipelothrix rhusiopathiae é  um  patógeno  bacteriano  relevante  em suínos, perus e ovelhas.  É  cosmopolita  e  pode  ser  isolado  também  em  bovinos,  equinos,  cães,  gatos,  aves  domésticas,  animais  selvagens  e  aves.  Erisipeloide,  uma
condição caracterizada por infecção localizada da pele, pode ser notada em pessoas que trabalham diretamente com animais infectados, carcaças contaminadas ou produtos de origem animal contaminados.
A bactéria pode sobreviver em solo por mais de 5 semanas, entretanto, o solo não é um adequado meio de cultura e o organismo torna­se inapto a sobreviver por longos períodos no ambiente. O solo e a superfície da água contaminada
representam vias de exposição. Portadores assintomáticos são as fontes comuns de infecção por este organismo, mas a bactéria também pode ser introduzida na criação animal pelo escoamento de águas superficiais, mamíferos selvagens,
aves selvagens, animais de estimação e insetos picadores. A E. rhusiopathiae leva a implicações em segurança alimentar, pois pode sobreviver por vários meses no tecido animal como carne suína congelada ou resfriada, pernil curado ou
defumado e subprodutos como farinha de sangue.
E. rhusiopathiae é um bastonete anaeróbio facultativo imóvel Gram­positivo. É catalase negativa, coagulase positiva, oxidase negativa, resistente a altas concentrações de sal e produz H2S no meio TSI (triple sugar iron). A colônia
produz  bactérias  pleomórficas,  dependendo  do  estado  crônico  ou  agudo  da  doença.  Em  infecções  agudas,  forma  colônias  lisas  em  meio  de  cultura,  enquanto  colônias  rugosas  são  isolados  típicos  de  infecções  crônicas  nos  animais.
Esfregaços preparados com colônias lisas apresentam cocos delgados, Gram­positivos e esfregaços de colônias rugosas apresentam uma mistura de cocos e filamentos.
Este microrganismo é muito resistente e pode sobreviver e desenvolver em ampla margem de pH e temperatura ambiental. E. rhusiopathiae tem mostrado habilidade para resistir a ação de várias classes de desinfetantes utilizados na
criação animal, inclusive álcool, aldeídos, agentes oxidantes e fenóis. Classes e/ou compostos de desinfetantes considerados efetivos na destruição de E. rhusiopathiae incluem hipoclorito (alvejante) e soda cáustica (detergente; NaOH). O
organismo é sensível aos antibióticos betalactâmicos (penicilina e ampicilina), cefalosporinas (ceftiofur) e tetraciclinas, sendo resistente às sulfonamidas.

 CLAUDICAÇÃO PÓS­BANHO DE IMERSÃO EM OVINOS
A claudicação após banho de imersão é notada em cordeiros e ovinos adultos. É caracterizada por claudicação intensa que resulta da infecção causada pela penetração de Erysipelothrix rhusiopathiae através de pequenas abrasões cutâneas
na região do casco. A claudicação após banho de imersão ocorre normalmente em surtos, descritos em vários países onde há criações de ovinos.
ETIOLOGIA:  Com o tempo e o uso repetido, as soluções de banho de imersão ou as suspensões de agentes inseticidas, que têm pouca ou nenhuma atividade bacteriostática, são intensamente contaminadas com várias espécies de bactérias. E.
rhusiopathiae é um contaminante comum e sua presença no tanque, às vezes em altas concentrações, provoca infecção dos ferimentos cutâneos durante o banho de imersão. As pequenas abrasões cutâneas na região do casco e da articulação
da quartela correspondem às portas comuns de entrada. As lesões que se estendem desses ferimentos na perna para as lâminas do casco causam a claudicação pós­banho de imersão aguda. Também podem ocorrer surtos quando os ovinos
precisam caminhar por regiões lamacentas altamente contaminadas com o microrganismo.
ACHADOS CLÍNICOS:  2 a 4 dias após o banho de imersão, quantidade variável (até 90%, geralmente 25%) de ovinos no rebanho pode estar deficiente em 1 ou mais patas. As patas afetadas parecem normais, exceto pelas regiões do casco e
da quartela que ficam quentes e dolorosas. Mais tarde, há um grau variável de queda de pelos, às vezes se estendendo até o carpo ou o tarso. A maioria dos ovinos se recupera espontaneamente em 2 a 4 semanas sem sinais mais sérios, além
de leve perda de peso corporal. Em alguns surtos, entretanto, a mortalidade pode atingir 5% e, particularmente em ovinos jovens, pode­se perder muito da condição corporal. Artrite crônica e aguda são sequelas raras.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  O descarte de soluções de banho de imersão muito contaminadas é o melhor método de prevenção de infecções por E rhusiopathiae, que estão associadas à claudicação. A utilização de um bacteriostático
apropriado nas soluções de imersão reduz a prevalência desta condição.

 ERISIPELA SUÍNA
É uma doença infecciosa causada por Erysipelothrix rhusiopathiae, considerada uma das enfermidades mais antigas conhecidas que afetam o crescimento de suínos adultos. Mais de 50% dos suínos em regiões de produção intensiva são
considerados infectados por E. rhusiopathiae. O microrganismo habita o tecido tonsilar; espécies não patogênicas (E. tonsillarum) são descritas como residentes do tecido tonsilar.
Os  surtos  da  doença  podem  ser  agudos  ou  crônicos;  pode  ocorrer  infecção  subclínica.  Os  surtos  agudos  são  caracterizados  por  morte  inesperada  súbita,  episódios  de  febre,  dor  articular  e  lesões  cutâneas  que  variam  de  cianose
generalizada  até  lesões  de  pele  frequentemente  descritas  como  “diamantes”  (urticária  romboide).  A  erisipela  crônica  tende  a  seguir  os  surtos  agudos  e  são  caracterizadas  por  baixa  mortalidade,  aumento  das  articulações,  laminite  e
evidências post mortem de endocardites vegetativas. Suínos com lesões valvulares podem exibir poucos sinais clínicos, entretanto, quando enxertados eles podem apresentar estresse respiratório e possibilidade de sucumbir à infecção.
ETIOLOGIA:  O crescimento de E. rhusiopathiae em meios neutros é notado como colônias cinzentas, translúcidas e não hemolíticas, lisas ou rugosas, após 24 h de incubação. Depois de 48 h de incubação uma zona de hemólise incompleta
torna­se evidente ao redor das colônias. Há pelo menos 28 diferentes sorovariantes e os suínos são considerados suscetíveis a cerca de 15 deles.
Nas propriedades onde o microrganismo é endêmico, os suínos são naturalmente expostos a E. rhusiopathiae quando jovens; seus anticorpos maternos propiciam um grau de imunidade ativa sem desencadear a doença. Os suínos mais
velhos tendem a desenvolver imunidade ativa como resultado da exposição a sorovariantes que não induzem a doença clínica. O microrganismo é eliminado por suínos infectados nas fezes e/ou secreções oronasais e sobrevivem por curtos
períodos no solo e na água, onde ocorre efetivamente a contaminação do ambiente. O microrganismo pode sobreviver a passagem por ambientes hostis como o estômago e intestino e mantém­se viável nas fezes por vários meses. Os suínos
recuperados e os cronicamente infectados podem ser portadores do microrganismo. Suínos sadios podem ser carreadores assintomáticos. As infecções ocorrem pela ingestão de alimentos contaminados, água ou fezes e menos comum
através de abrasões na pele. Após a ingestão, o microrganismo provavelmente entra no corpo pelas tonsilas ou tecido linfoide do trato gastrintestinal.
ACHADOS CLÍNICOS:  As  formas  agudas  e  crônicas  da  erisipela  suína  podem  ocorrer  em  sequência  ou  separadamente.  Os  suínos  com  a  forma  septicêmica  aguda  podem  morrer  subitamente  sem  sinais  prévios.  Isso  acontece  com  mais
frequência  nos  suínos  em  fase  de  terminação.  Os  suínos  com  infecção  aguda  apresentam  febre  (40  a  42°C),  andar  rígido  sobre  os  dedos,  decúbito  esternal,  se  separam  do  grupo,  e  não  se  amontoam  a  outros  animais  e  relutam  em  se
movimentar.  Emitem  grunhidos  de  lamento  quando  manipulados  e  podem  transferir  seu  peso  de  um  membro  para  o  outro  ao  se  levantarem.  Anorexia  e  sede  são  comuns.  As  manchas  de  pele  podem  variar  desde  eritema  amplamente
disseminado e coloração arroxeada de orelhas, focinho e abdome, até lesões cutâneas em “forma de diamante” por quase todas as partes do corpo, particularmente nas regiões laterais e dorsais. As lesões podem se manifestar como áreas
róseas ou roxo­claras de tamanhos variáveis, que se tornam elevadas e firmes ao toque após 2 ou 3 dias de doença. Podem desaparecer ou progredir para um tipo mais crônico de lesão, como doença cutânea em forma de diamante. Caso não
seja tratada, ocorre necrose e desprendimento da pele em amplas regiões, porém mais comumente ocorre necrose e desprendimento das pontas de orelhas e cauda.
A doença clínica geralmente é esporádica e afeta indivíduos ou pequenos grupos, mas, às vezes, surtos maiores ocorrem. A mortalidade é de 0 a 100% e pode suceder morte até 6 dias após os primeiros sinais da enfermidade. As porcas
grávidas agudamente afetadas podem abortar, possivelmente devido à febre, e as fêmeas em aleitamento podem apresentar agalactia. Os suínos não tratados podem desenvolver a forma crônica, comumente caracterizada por artrite crônica,
endocardite valvular vegetativa ou ambas; tais lesões também podem ser observadas em suínos sem sinais prévios de sepse. A endocardite valvular é mais frequente em suínos adultos ou jovens e se manifesta quase sempre por morte,
geralmente em decorrência de embolismo ou insuficiência cardíaca. Na artrite crônica, a forma mais comum da infecção crônica, provoca claudicação leve a grave; as articulações afetadas podem ser de difícil detecção, mas tendem a se
tornar quentes e doloridas ao toque e, depois, visivelmente aumentadas e firmes, resultando em claudicação. Podem ser observadas lesões cutâneas necróticas roxo­escuras, que costumam descamar. A mortalidade em casos crônicos é baixa,
mas a velocidade de crescimento fica retardada.
Lesões: Durante a necropsia, na infecção aguda, pode­se notar lesões cutâneas, linfonodos geralmente aumentados e congestos, pulmões edematosos e congestos, além de esplenomegalia e hepatomegalia. Podem ser verificadas petéquias nos
rins e no coração.
Na erisipela crônica, a endocardite valvular é verificada como proliferativa, com crescimento granular nas válvulas cardíacas e embolismo; infarto pode se desenvolver. A artrite pode acometer as articulações de uma ou mais pernas ou as
articulações  intervertebrais;  a  ampliação  da  articulação  é  proliferativa,  mas  não  supurativa  e  são  formados  pontos  de  granulação  no  tecido  provenientes  da  cavidade  articular.  Em  casos  crônicos,  pode  haver  proliferação  e  erosão  da
cartilagem articular; isso pode ser seguido por fibrose e ancilose da articulação.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico de erisipela é baseado nos sinais clínicos, nas lesões macroscópicas e na resposta à terapia antimicrobiana. O diagnóstico de erisipela aguda é difícil em suínos, as quais apresentam apenas febre, inapetência e
apatia; no entanto, em surtos envolvendo vários animais, lesões de pele e claudicações são provavelmente observadas em pelo menos alguns casos e confirma­se o diagnóstico clínico. Quando presente, diagnostica­se urticária romboide ou
lesões  em  forma  de  diamante.  O  isolamento  de  E.  rhusiopathiae  do  sangue  de  suínos  afetados  é  possível  em  casos  agudos  e  auxilia  no  diagnóstico.  A  erisipela  responde  extremamente  bem  à  penicilina,  devido  à  sensibilidade  deste
microrganismo a este antimicrobiano. O teste PCR, se disponível, auxilia no diagnóstico da erisipela aguda.
As erisipelas crônicas podem ser de difícil diagnóstico. No exame pós­morte, artrite e laminite, juntamente com endocardite valvular vegetativa, podem auxiliar no diagnóstico presuntivo de erisipela crônica. Entretanto, estas lesões
podem  ser  causadas  por  outros  agentes  infecciosos.  Uma  cultura  positiva  de  vegetação  valvular  define  o  diagnóstico  de  erisipela  crônica.  Os  testes  sorológicos  não  são  efetivos  para  o  diagnóstico  de  erisipela.  O  teste  de  fixação  de
complemento é considerado promissor para o diagnóstico da doença, pois apresentam acurácia e confiança comparadas a outros testes.
Doenças  que  devem  ser  consideradas  como  parte  do  diagnóstico  diferencial  incluem  condições  que  podem  desencadear  lesões  macroscópicas  sugestivas  de  sepse  aguda.  Salmonelose  septicêmica  devido  à  infecção  por  Salmonella
Choleraesuis, peste suína clássica causada por pestivírus e sepse e endocardite por Streptococcus suis devem  ser  consideradas  devido  à  semelhança  das  lesões.  A  doença de  Glasser,  provocada  por Haemophilus  parasuis,  e  a  infecção
por Mycoplasma hyosynoviae podem desencadear alterações semelhantes nos tecidos sinoviais e nas articulações de suínos infectados.

Lesões cutâneas de erisipela. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

TRATAMENTO:  E. rhusiopathiae é sensível à penicilina. Deve ser administrada em intervalos de 12 h durante, no mínimo, 3 dias; como alternativa, pode­se utilizar uma formulação de longa duração no tratamento de infecções graves. No
aspecto econômico, a penicilina é a melhor escolha de tratamento, mas a ampicilina e o ceftiofur também apresentam resultados satisfatórios em casos agudos. As tetraciclinas adicionadas à ração ou à água podem ser úteis quando há vários
suínos infectados. A febre associada à infecção aguda pode ser controlada pela administração de AINE, como a flumixina meglumina, ou mediante adição de ácido acetilsalicílico na água. O antissoro para erisipela, quando disponível, é
considerado um complemento efetivo ao tratamento antimicrobiano em casos de surtos agudos. O tratamento de infecções crônicas geralmente não é efetivo e não é economicamente viável. Os suínos com infecções crônicas devem ser
abatidos, pois podem contaminar o ambiente e atuam como fonte de infecção, desencadeando novos surtos.
PREVENÇÃO:  A vacinação contra E. rhusiopathiae é efetiva no controle de surtos da doença em granjas de suínos e devem ser incentivadas. A interrupção da vacinação em algumas granjas está ligada aos casos de surtos. As bacterinas
injetáveis e atenuadas, vacinas vivas aplicadas através da água estão disponíveis e propiciam um aumento da duração da imunidade. A época ideal da vacinação pode variar de granja para granja. Quando E. rhusiopathiae é endêmica no
ambiente, a vacinação deve ser realizada antecipadamente aos surtos. Os suínos suscetíveis podem ser vacinados prioritariamente à desmama, durante ou semanas após essa etapa. Machos e fêmeas selecionados para entrar na criação devem
ser vacinados, com reforço dentro de 3 a 5 semanas. Posteriormente, os reprodutores devem ser vacinados duas vezes ao ano. As vacinas não devem ser administradas nos animais sob tratamento com antimicrobianos, pois os antibióticos
podem interferir com a resposta imune subsequente à vacina.
As falhas vacinais podem ocorrer em alguns rebanhos devido ao manejo estressante que afeta o sistema imune dos suínos vacinados. Diferenças antigênicas entre os sorotipos vacinais e os circulantes nas granjas também podem resultar
em uma imunidade incompleta e surtos da doença.
Além disso, durante a vacinação, a atenção para a desinfecção e a higiene, bem como a eliminação de suínos com sinais clínicos sugestivos de infecção por erisipela representam medidas viáveis que auxiliam no controle da doença nas
granjas de suínos.

 POLIARTRITE NÃO SUPURATIVA EM CORDEIROS
A poliartrite não supurativa é uma infecção de cordeiros em crescimento mais velhos (6 semanas a 4 meses de idade). É caracterizada por alta taxa de mortalidade e claudicação moderada a grave com aumento das articulações infectadas.
ETIOLOGIA:  O agente causador, Erysipelothrix rhusiopathiae, quase sempre penetra no organismo através de ferimentos, às vezes através do umbigo, porém mais habitualmente após o corte da cauda e a castração. Entretanto, surtos podem
ocorrer após procedimentos cruentos, particularmente durante extensos períodos de tempo úmido, que aumenta o nível de estresse e melhora a sobrevivência do microrganismo no ambiente. E. rhusiopathiae localiza­se nas articulações após
disseminação hematógena e infecta a membrana sinovial. A progressão da infecção sinovial resulta em sinovite e lesões às cartilagens articulares e ao osso subcondral adjacente.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Morte súbita e claudicação grave a moderada em inúmeros cordeiros em crescimento é sugestivo da poliartrite não supurativa. A claudicação ocorre tipicamente em 2 ou mais membros e nas articulações
geralmente afeta o carpo e o jarrete. Os cordeiros afetados são relutantes a movimentação e passam longos períodos em decúbito esternal. O crescimento geralmente é comprometido. A progressão das condições leva a proliferação da
membrana sinovial e espessamento da cápsula articular sem efusão articular significativa e eventual erosão da cartilagem articular.
DIAGNÓSTICO:  O início súbito da claudicação em inúmeros cordeiros em fase de desenvolvimento é sugestivo de poliartrite por E. rhusiopathiae. Devido ao mínimo derrame articular, a tentativa de obtenção de uma amostra de fluido da
articulação afetada para cultura e outros exames diagnósticos pode ser infrutífera.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  A vacinação deve ser considerada uma premissa onde a doença é um problema recidivante. São recomendadas técnicas antissépticas rigorosas e manutenção de condições higiênicas durante o corte de cauda e
a castração, mas não se pode contar apenas com isso para a prevenção. O uso de métodos denominados “incruentos” para ambas as operações pode reduzir o risco de contaminação do ferimento, mas sabe–se que os surtos se seguem a todos
os métodos comuns. Recomenda­se tratamento da poliartrite não supurativa com penicilina, durante 5 dias. A administração de AINE melhora a claudicação.

INFECÇÕES FÚNGICAS (Micoses)

As micoses sistêmicas são infecções causadas por agentes fúngicos presentes no ambiente e que penetram no hospedeiro por uma única porta de entrada e se disseminam para vários órgãos. O solo, considerado reservatório, é a principal
fonte da maioria das infecções, as quais podem ser adquiridas por inalação, ingestão ou introdução traumática de fungos (ver dermatofilose, p. 913).
Os fungos patogênicos  causam  infecção  em  hospedeiros  aparentemente  normais;  doenças  como  histoplasmose,  coccidioidomicose,  blastomicose  e  criptococose  são  consideradas  micoses  sistêmicas  primárias.  Os  fungos  oportunistas
geralmente exigem um hospedeiro debilitado ou imunossuprimido (p. ex., submetido a estresse em cativeiro ou com acidose metabólica, desnutrição, infecções virais ou neoplasia) para ocasionar infecção. A administração prolongada de
antimicrobianos ou agentes imunossupressores parece aumentar a probabilidade de infecção por fungos oportunistas que causam doenças como aspergilose e candidíase, as quais podem ser focais ou sistêmicas.
Os achados clínicos e as lesões macroscópicas não são diagnósticos definitivos de micoses sistêmicas; é necessária identificação microscópica, cultura do microrganismo ou PCR. A identificação do fungo e a reação tecidual por análise
microscópica  de  exsudatos  e  o  material  da  biopsia  são  adequados  para  o  diagnóstico  de  histoplasmose,  criptococose,  blastomicose,  coccidioidomicose  e  rinosporidiose.  Outras  doenças,  como  candidíase,  aspergilose,  zigomicose,
feoifomicose, hialoifomicose e oomicose (pitiose e lagenidiose), exigem mais do que avaliação microscópica para um diagnóstico definitivo. Alguns desses fungos também são contaminantes comuns de culturas; dessa forma, a invasão
tecidual e a reação devem ser demonstradas por isolamento em cultura para ser considerado significativo. A sorologia pode ser útil para o diagnóstico (e prognóstico) de algumas doenças micóticas, como criptococose, coccidioidomicose,
pitiose e lagenidiose. A titulação dos antígenos é útil para criptococose, histoplasmose e blastomicose. Um recente ensaio imunoenzimático desenvolvido para este antígeno é utilizado tanto em amostras de urina como de soro para detectar
o antígeno galactomanana na parede celular que é imunologicamente indistinto na histoplasmose e blastomicose. Enquanto o título geralmente não é útil na diferenciação entre as duas infecções, é útil no diagnóstico da presença da micose
sistêmica.
Para o tratamento, ver discussão sobre micoses sistêmicas específicas (a seguir) e farmacoterapia do sistema tegumentar, p. 2620.

 ASPERGILOSE
É causada por diversas espécies de Aspergillus, especialmente A. fumigatus e A. terreus. É encontrada mundialmente e em quase todos os animais domésticos e aves, assim como em várias espécies selvagens. É principalmente uma infecção
respiratória  que  pode  se  tornar  generalizada;  no  entanto,  a  predileção  tecidual  varia  entre  as  espécies.  As  formas  mais  comuns  são  infecções  pulmonares  em  aves  domésticas  e  outras  aves,  aborto  micótico  em  bovinos,  micose  da
bolsa gutural em equinos e infecções dos tecidos nasais e paranasais, locais intervertebrais e rins de cães. Em gatos domésticos, têm­se descrito formas pulmonares e intestinais.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   Em  aves,  a  aspergilose  (p.  2939)  é  principalmente  broncopulmonar,  com  dispneia,  respiração  ofegante  e  polipneia,  acompanhadas  de  sonolência,  anorexia  e  emaciação.  Também  há  relato  de  traqueíte
micótica. Notam­se torcicolo e distúrbios de equilíbrio quando a infecção se dissemina ao cérebro. Nódulos amarelados de tamanho e consistência variáveis ou lesões em placa foram encontrados nas vias respiratórias, pulmões, sacos
aéreos ou membranas das cavidades corporais. Pode­se encontrar fungo de crescimento semelhante à pelos nas paredes espessadas dos sacos aéreos. Outras espécies com aspergilose broncopulmonar podem apresentar lesões nodulares nos
pulmões, ou pneumonia aguda acompanhada de fluido serossanguinolento na cavidade pleural e pleurite fibrinosa.
Em ruminantes, a aspergilose pode ser assintomática, ocorrer em uma forma broncopulmonar, causar mastite, ou provocar placentite e aborto. A pneumonia micótica pode ser rapidamente fatal. Os sinais incluem pirexia; respiração
estertorosa, superficial e rápida; secreção nasal e tosse úmida. Os pulmões ficam firmes, pesados e mosqueados, mas não colapsados. Na pneumonia micótica aguda a crônica, os pulmões contêm múltiplos granulomas discretos e a doença
macroscopicamente se assemelha à tuberculose (p. 726).
Na ausência de pneumonia, as vacas infectadas geralmente não apresentam sinais, exceto o aborto; o feto morto é abortado entre o 6o e o 9o mês de gestação e as membranas fetais são retidas. As lesões são encontradas no útero, nas
membranas  fetais  e  quase  sempre  na  pele  fetal.  No  útero,  macroscopicamente  as  áreas  intercarunculares  tornam­se  espessadas,  coriáceas  e  vermelho­escuras  a  castanhas,  contendo  focos  elevados  ou  com  erosão  recobertos  por  uma
pseudomembrana aderente cinza­amarelada. As carúnculas maternas ficam vermelho­escuras a castanhas, e os cotilédones fetais aderentes ficam acentuadamente espessados. As lesões cutâneas nos fetos abortados consistem em focos
discretos, macios, elevados e avermelhados a cinzentos, que lembram lesões de tinha.
Em  equinos,  epistaxe  e  disfagia  são  complicações  comuns  de  micose  da  bolsa  gutural  (ver  p.  1227).  A  bolsa  gutural  infectada  caracteriza­se  por  inflamação  necrosante  e  se  torna  espessada,  hemorrágica  e  recoberta  por  uma
pseudomembrana  friável.  Rinite  micótica  caracterizada  por  dispneia  e  secreções  nasais  também  foi  relatada.  Aspergilose  pode  ser  uma  doença  rapidamente  fatal  associada  à  invasão  pulmonar  difusa.  Nesses  casos,  a  enterite  aguda  é
geralmente um fator predisponente. Acredita­se que a colite é resultante de uma neutropenia intensa que diminui a imunocompetência do hospedeiro, seguida de invasão de Aspergillus a partir da ruptura da mucosa intestinal. Quando a
infecção se espalha para o cérebro e o nervo óptico podem ocorrer distúrbios locomotores e visuais, inclusive cegueira.
Em cães,  a  aspergilose  localiza­se  caracteristicamente  nos  seios  paranasais  ou  na  cavidade  nasal  e  é  causada  por  infecção  por A. fumigatus.  A  aspergilose  nasal  é  observada  principalmente  em  raças  dolicocefálicas;  inicia  na  região
posterior  do  maxiloturbinado  ventral  com  sinais  de  letargia,  dor  nasal,  ulceração  de  narinas,  espirros,  secreção  nasal  hemorrágico­purulenta  uni  ou  bilateral,  osteomielite  de  seio  frontal  e  epistaxe.  As  lesões  macroscópicas  variam
consideravelmente  com  o  local  de  infecção,  mas  a  mucosa  dos  seios  nasais  e  paranasais  pode  ser  recoberta  por  uma  camada  de  material  necrótico  preto–acinzentado  e  crescimento  fúngico.  A  mucosa  e  o  osso  subjacente  podem  estar
necróticos com a perda da definição óssea nas radiografias.

Hifas de Aspergillus spp no exame citológico de raspado ocular de um equino com queratite micótica. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

A doença disseminada em cães é verificada, com mais frequência, em cães da raça pastor alemão e quase sempre envolve A. terreus e A. deflectus.  Os  sinais  clínicos  da  aspergilose  disseminada  podem  incluir  letargia,  claudicação,
anorexia, perda de peso, pirexia, hematúria, incontinência urinária, linfadenopatia generalizada e déficits neurológicos. Em geral, as lesões são encontradas em rins, baço e vértebras. A discoespondilite é comum.
DIAGNÓSTICO:  Radiografias em cães com aspergilose nasal podem apresentar radioluscência generalizada das câmaras nasais secundárias à destruição do tecido turbinado. Osteomielite dos seios frontais é observada em até 80% dos cães.
Muitas  vezes  realiza­se  um  diagnóstico  por  visualização  dos  fungos  nas  placas  por  meio  de  rinoscopia,  juntamente  com  sorologia  e  evidência  micológica  ou  radiográfica  da  doença.  O  diagnóstico  com  base  apenas  na  cultura  não  é
apropriado, pois os aspergilos são onipresentes e podem ser isolados das cavidades nasais de cães saudáveis. O resultado positivo da cultura deve ser confirmado pela demonstração de hifas ramificadas, septadas, hialinas e estreitas em
lesões pelos testes sorológicos. O teste de dupla difusão em ágar–gel para os anticorpos séricos é uma técnica confiável para o diagnóstico; sensibilidade melhorada pode ser possível com técnicas como ELISA. Os procedimentos de
imunofluorescência podem ser utilizados para identificar hifas nas secções teciduais.
TRATAMENTO:  Em cães, o tratamento tópico é considerado o tratamento de escolha para a aspergilose nasal e paranasal. Várias técnicas cirúrgicas e esquemas de medicamentos têm sido utilizados com sucesso variável. O clotrimazol é
geralmente considerado o tratamento de primeira escolha. Pode­se administrá­lo através de tubos de demora com orifícios nos seios frontais ou via narinas na forma de infusão simples. Caso seja realizada a infusão via narinas, utilizam­se
cateteres de Foley para instilar 0,5 g em cada lado da cavidade nasal. A solução infundida é mantida no local por 1 h, durante a qual a posição do cão é mudada periodicamente para maximizar a penetração. Há taxa de sucesso de cerca de
80%, utilizando­se infusões locais dessa maneira. Doses de 10 mg de enilconazol/kg, 2 vezes/dia, por 7 a 14 dias, instiladas através dos tubos implantados cirurgicamente nos seios frontais, também tem sido utilizadas com taxa de sucesso
similar. Os medicamentos administrados por via sistêmática incluem cetoconazol, itraconazol, fluconazol, voriconazol e posaconazol. Cetoconazol (5 a 10 mg/kg, 2 vezes/dia, por 6 a 8 semanas) não é tão eficaz como o fluconazol (2,5 a 10
mg/kg, 2 vezes/dia) e o itraconazol (5 a 10 mg/kg, 1 vez/dia). Voriconazol (3 a 6 mg/kg, 1 vez/dia), é, provavelmente, o mais efetivo dos antifúngicos da classe azol para o tratamento de aspergilose, porém o custo é alto em comparação com
as outras drogas.
Em equinos, são realizadas exposição cirúrgica e curetagem para o tratamento da micose da bolsa gutural. O uso tópico de natamicina e a administração oral de iodeto de potássio são eficazes nos casos de infecção por Aspergillus. O
itraconazol (3 mg/kg, 2 vezes/dia, durante 84 a 120 dias), foi relatado como eficaz no tratamento de equinos com rinite por Aspergillus.
O tratamento de mastite bovina tem sido efetivo com a combinação de injeção intra­arterial e aplicação intramamária de miconazol.

 BLASTOMICOSE
A  blastomicose,  causada  pelo  fungo  dimórfico  Blastomyces  dermatitidis,  é  caracterizada  por  lesões  piogranulomatosas  em  vários  tecidos.  É  mais  comum  em  pessoas,  cães  e  gatos,  mas  também  foi  relatada  em  diversas  espécies,
como equinos, furões, cervos, lobos e leões africanos, golfinhos nariz de garrafa e leões marinhos. Parece que não acomete bovinos, ovinos e suínos. A blastomicose é limitada geralmente a América do Norte, e vários casos têm ocorrido
nos Estados de Mississippi, Missouri, Tennessee e na bacia do Rio Ohio e ao longo dos Grandes Lagos e St. Lawrence Seaway. Mesmo nestas bacias, o microrganismo é encontrado em regiões geograficamente restritas. Castores e outros
habitantes de vegetação em solo úmido, ácido e rico em vegetais em decomposição podem atuar como nicho ecológico para o microrganismo, mas geralmente é difícil encontrá­lo no ambiente. O fungo também é isolado em fezes de
pombos  e  morcegos.  Orvalho,  chuva  ou  neblina  pode  ter  um  papel  crítico  na  liberação  de  conídios  do  local  infectado,  os  quais  se  apresentam  na  forma  de  aerossol  e  são  inalados.  Quando  as  defesas  do  trato  respiratório  são
imunossuprimidas, a doença é disseminada por via hematógena para os pulmões. As lesões cutâneas podem resultar de penetração primária da pele ou, mais comumente, pela disseminação do foco pulmonar. As lesões por espetada de
agulha ao pessoal veterinário, após aspiração de lesões cutâneas de animais infectados podem resultar em infecções cutâneas primárias. As lesões oculares tendem a se desenvolver primeiro no segmento posterior, ocasionando coriorretinite
granulomatosa e descolamento de retina. Geralmente há envolvimento do segmento anterior, resultando em uveíte e panoftalmia.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos variam de acordo com o órgão envolvido e não são específicos. Perda de peso pode ser acompanhada de tosse, anorexia, linfadenopatia, dispneia, doença ocular, claudicação, lesões cutâneas e febre.
Sons pulmonares secos e ásperos são extremamente comuns em cães com blastomicose. Os sinais pulmonares são observados em mais de 85% dos casos de cães afetados. O envolvimento pulmonar grave resulta em hipoxemia, que indica
um  prognóstico  reservado.  O  envolvimento  dos  linfonodos  é  observados  em  metade  dos  cães  afetados,  cuja  proporção  de  cães  afetados  é  semelhante  aquela  de  animais  com  envolvimento  cutâneo.  As  lesões  cutâneas  podem  incluir
granulomas proliferativos e abscessos subcutâneos que ulceram e drenam uma descarga serossanguinolenta. As lesões de pele geralmente são muito pequenas e multifocais em cães, mas amplos abscessos são ocasionalmente observados,
especialmente em gatos. Plano nasal, face e unhas geralmente são envolvidos. Os sinais de blastomicose ocular são notados em 30 a 50% dos cães afetados e incluem cegueira, uveíte, glaucoma e descolamento de retina. A claudicação
associada à osteomielite fúngica ou paroníquia grave ocorre em aproximadamente um quarto dos cães afetados. Os sinais do SNC são raros, ocorrendo em < de 5% dos cães, e podem ser mais comuns em gatos. O padrão de envolvimento
sistêmico é semelhante em gatos, mas esta espécie é menos afetada que os cães. Hematúria, noctúria e disúria com tenesmo podem ser verificadas na blastomicose urogenital.
Lesões: As lesões macroscópicas consistem de áreas raras a numerosas de tamanhos variados, irregulares, firmes, cinzas a amarelas no pulmão e nódulos pulmonares e nos linfonodos torácicos. A disseminação pode resultar em lesões
nodulares em vários órgãos, especificamente na pele, nos olhos e nos ossos. As lesões cutâneas são representadas por pápulas únicas ou múltiplas, ou nódulos piogranulomatosos crônicos supurativos.
DIAGNÓSTICO:  A blastomicose pode ser diagnosticada em cães com nódulos cutâneos supurativos e sinais de doença respiratória. Em gatos, o envolvimento do trato respiratório é observado com frequência, seguido de envolvimento do
SNC, linfonodos regionais, pele, olhos e tratos GI e urinário. Os achados radiográficos nos pulmões incluem nódulos não calcificados ou  consolidados  e  aumento  dos  linfonodos  bronquiais  e  mediastinais.  O  padrão  predominante  nas
radiografias torácicas são os nódulos intersticiais difusos e densidade peribrônquica. Comumente, os linfonodos bronquiais são muito aumentados e apresentam massas densas na radiografia. O diagnóstico pode ser realizado por biopsia
tecidual ou amostras aspiradas de lesões de pele ou de outros órgãos envolvidos, pela presença de fungos de parede espessa que, frequentemente, têm células­filha oriundas por brotamento com base ampla. Estes blastosporos redondos ou
ovoides, rosa­pálidos (H&E) medem cerca de 8 a 25 μm, têm parede refrátil e parede dupla. Podem ser vazios ou conter material nuclear basofílico e ter um único broto com base ampla. Geralmente ocorre uma resposta ao anticorpo,
detectada em imunodifusão em ágar gel, mas esta resposta não é sensível, tampouco específica, para o diagnóstico definitivo.
TRATAMENTO:  O itraconazol (5 mg/kg/dia) é o tratamento de eleição para cães e gatos com blastomicose. Um mínimo de 2 meses são necessários para o tratamento e este fármaco pode ser administrado até que a doença ativa não seja mais
aparente. A cura clínica é esperada em cerca de 70% dos cães, com recidiva em cerca de 20% dos cães tratados, meses ou anos após o tratamento. Vários cães respondem ao novo tratamento com itraconazol. Outros antifungos azóis, como
fluconazol e cetoconazol, não são tão efetivos como o itraconazol. Em casos fulminantes de blastomicose, especialmente aqueles com evidência de hipoxemia, recomenda­se a combinação de terapia com anfotericina B e itraconazol.
Pequenos cursos de doses anti­inflamatórias de glicocorticoides devem ser administrados nos primeiros dias de tratamento, mas o uso dos esteroides é controverso e pode piorar o prognóstico. O prognóstico é melhor em cães sem o quadro
pulmonar ou com o comprometimento parcial dos pulmões. O prognóstico é reservado a moderado em doenças pulmonares e mais grave quando há envolvimento do SNC.

 CANDIDÍASE
É uma doença mucocutânea localizada, causada por espécies do fungo semelhante à levedura, Candida spp, mais comumente C. albicans. Está distribuído em todo o mundo em vários animais. Este microrganismo é um habitante normal de
nasofaringe,  trato  gastrintestinal  e  genitália  externa  de  várias  espécies  de  animais  e  é  oportunista  em  causar  doença.  Os  fatores  associados  à  candidíase  incluem  dano  à  integridade  da  mucosa;  uso  de  cateter  de  demora  intravenoso  ou
urinário; administração de antibióticos; e doenças ou fármacos imunossupressores. O microrganismo afeta, com mais frequência, as aves (p. 2901), nas quais infecta mucosa bucal, esôfago e papo. Em suínos e potros, têm­se descritas
infecções superficiais limitadas à membrana mucosa do trato intestinal. A candidíase sistêmica também foi descrita em bovinos, bezerros, ovinos e potros secundariamente a terapia antimicrobiana ou corticoterapia prolongadas. Em gatos, a
candidíase é rara, mas está associada a doenças oral e respiratória superior, piotórax, lesões oculares, doença intestinal e urocistite. As infecções são raras em cães e equinos. No entanto, considera­se Candida spp como causa de artrite em
equinos e mastite e abortos em vacas.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sinais clínicos são variáveis e inespecíficos e podem estar associados mais a fatores primários ou predisponentes do que à própria candidíase. Os bezerros com candidíase de pré­estômago apresentam
diarreia aquosa, anorexia e desidratação, com progressão gradual para prostração e morte. Os pintinhos infectados ficam apáticos e apresentam redução do consumo alimentar e da taxa de crescimento. A candidíase suína afeta as mucosas
bucal, esofágica e gástrica, sendo os sinais mais consistentes diarreia e emaciação.
As lesões macroscópicas da pele e das mucosas incluem, geralmente, tumefações esbranquiçadas recobertas por crostas, únicas ou múltiplas, elevadas e circulares. O microrganismo pode penetrar no epitélio ceratinizado e ocasionar
espessamento  ceratinoso  acentuado  das  mucosas  de  língua,  esôfago  e  rúmen.  Em  aves,  as  lesões  esofágicas  e  do  papo  são  úlceras  circulares  e  brancas  com  crostas  superficiais  elevadas  que  produzem  o  espessamento  da  mucosa;
pseudomembrana facilmente removida é comum.
DIAGNÓSTICO:  Microrganismos fúngicos se proliferam em grande quantidade no tecido epitelial e o diagnóstico pode ser feito mediante exame de raspado ou de amostras de lesões mucocutâneas obtidas por biopsia. C. albicans são células
ovoides, leveduriformes (2 a 4 μm de diâmetro) com paredes finas ou ocorrem na forma de cadeias que produzem pseudo­hifas quando os blastosporos permanecem unidos após a divisão por brotamento. Hifas verdadeiras, regulares e
filamentosas também podem ser visualizadas. As células fúngicas quase sempre são limitadas ao tecido epitelial e raramente são profundas.
TRATAMENTO:  A pomada de nistatina ou a aplicação tópica de anfotericina B ou de solução de iodo 1% pode ser útil no tratamento de candidíase oral ou cutânea. Utiliza­se com sucesso 500 g de anfotericina B em 1 l de solução de glicose
5%, administrada por via IV, a cada 48 h, durante 24 dias e, depois, a cada 72 h por 15 dias, para tratamento de artrite causada por C. fumata em equinos. Também foi utilizado com êxito 5 mg de fluconazol/kg, VO, 1 vez/dia, por 4 a 6
semanas, no tratamento de candidíase disseminada em potros. Itraconazol e complexo lipídico de anfotericina B são considerados tratamento eletivos em cães, porém poucos casos foram tratados.

 COCCIDIOIDOMICOSE
É uma infecção não contagiosa oriunda de poeira causada pelo fungo dimórfico Coccidioides immitis. As infecções limitam­se às regiões áridas e semiáridas do sudoeste dos EUA e às regiões semelhantes do México e das Américas Central
e do Sul. Embora várias espécies animais, inclusive as pessoas, sejam suscetíveis, apenas os cães são significativamente afetados. Em equinos, relata­se infecção placentária induzindo aborto e osteomielite. Ruminantes e suínos podem
apresentar infecções subclínicas com lesões restritas aos focos nos pulmões e aos linfonodos torácicos. A inalação de esporos fúngicos é o único modo de infecção estabelecido, e os esporos podem ser transmitidos em partículas de pó.
Epidemias podem ocorrer quando períodos chuvosos são seguidos de estiagem, resultando em tempestades de poeira. A maioria das infecções bovinas é contraída nos rebanhos de engorda onde há muita poeira.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A doença varia de inaparente (bovinos, ovinos, suínos, cães e gatos) a progressiva, disseminada e fatal (cães, primatas não humanos, gatos e pessoas). A coccidioidomicose é principalmente uma doença
respiratória crônica, mas as infecções caninas se disseminam a vários tecidos, em especial os olhos e os ossos. Os sinais clínicos podem variar muito, dependendo do envolvimento do órgão e da gravidade da infecção. Os cães com doença
disseminada podem apresentar tosse crônica, anorexia, caquexia, claudicação, articulações dilatadas, febre e diarreia intermitente. Pode ocorrer disseminação para a pele com ulceração drenante, mas a infecção primária através da pele é
rara. Os gatos infectados por C. immitis apresentam, com mais frequência, problemas dermatológicos (lesões cutâneas drenantes, massas granulomatosas subcutâneas, abscessos), febre, inapetência e perda de peso. Em gatos, os sinais
clínicos menos comuns incluem anormalidades respiratórias (dispneia), musculoesqueléticas (claudicação), neurológicas e oftalmológicas.
As lesões macroscópicas podem se limitar a pulmões, mediastino e linfonodos torácicos, ou ser disseminadas para vários órgãos. As lesões são representadas por nódulos discretos e de tamanho variável, com uma superfície de corte
branco­acinzentada e firme, e se assemelham às da tuberculose (p. 726). Os nódulos são piogranulomas compostos de células gigantes e epitelioides, e o centro de alguns focos pode conter exsudato purulento e microrganismos fúngicos.
Algumas lesões podem exibir focos mineralizados.

Coccidiomicose em um cão da raça Poodle com 7 anos de idade; imagem lateral. Cortesia do Dr. Ronald Green.

DIAGNÓSTICO:  Em regiões endêmicas, deve­se considerar a coccidioidomicose em cães com doença broncopulmonar crônica e quando nódulos pulmonares e linfonodos aumentados são encontrados nas radiografias torácicas. As lesões
representam piogranulomas que contêm C. immitis livre no exsudato e em células gigantes multinucleadas e epitelioides. Os microrganismos variam em tamanho e aparecem como esférulas relativamente grandes (20 a 80 μm, até 200 μm)
com uma parede de contorno duplo. As esférulas maduras (esporângios) contêm endósporos (esporangiósporos) de 2 a 5 μm de diâmetro. Estabelece­se o diagnóstico pela demonstração de esférulas nos tecidos. O soro também pode ser
testado por imunodifusão em ágar­gel (AGID) para detecção de precipitina e anticorpos que fixam o complemento. Atualmente, a maioria dos laboratórios comerciais realizam AGID para os anticorpos IgG e IgM; os resultados destes testes
são específicos, porém relativamente carente de sensibilidade. O diagnóstico presuntivo pode ser realizado quando a sorologia é positiva em um animal com sinais clínicos consistentes. As tentativas de cultura do fungo devem se restringir
aos laboratórios equipados para manipular tais culturas, com alto risco de infecção.
TRATAMENTO:  A doença é muitas vezes autolimitante, mas se há sintomas respiratórios crônicos ou doença multissistêmica, é necessária terapia antifúngica por longo tempo. Na infecção disseminada, o tratamento de, ao menos 6 a 12
meses, é típico. O fluconazol (2,5 a 10 mg/kg/dia) é o fármaco normalmente utilizado no tratamento de infecções respiratórias crônicas. Cetoconazol (10 a 30 mg/kg/dia) ou itraconazol (10 mg/kg/dia) é comumente utilizado no tratamento
de cães com coccidioidomicose. Pode­se indicar anfotericina B para animais que não melhoram ou não toleram os antifúngicos azóis, porém é altamente nefrotóxica.

 CRIPTOCOCOSE
É uma doença fúngica sistêmica que pode afetar o trato respiratório (especialmente a cavidade nasal), o SNC, os olhos e a pele (em particular, da face e do pescoço dos gatos). Os fungos causadores, Cryptococcus neoformans e C. gatti,
estão no ambiente e nos tecidos na forma de leveduras. A infecção é cosmopolita. O fungo é encontrado no solo e no estrume de aves domésticas, especialmente em dejetos de pombos. A transmissão se dá por inalação dos esporos ou
contaminação de ferimentos. Nos dejetos aviários, pode ocorrer em uma forma não encapsulada tão pequena quanto 1 μm, que pode ser inalada nas porções mais profundas dos pulmões. A criptococose é mais comum em gatos, mas
também é observada em cães, bovinos, equinos, ovinos, caprinos, aves e animais selvagens. Em pessoas, vários casos são associados a uma resposta imunocelular deficiente.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   A  criptococose  bovina  está  associada  apenas  com  casos  de  mastite  e  muitas  vacas  de  um  rebanho  podem  estar  infectadas.  As  vacas  acometidas  manifestam  anorexia,  diminuição  na  produção  leiteira,
tumefação e consistência firme nos quartos mamários infectados e aumento dos linfonodos supramamários. O leite torna­se viscoso, mucoide e branco­acinzentado, ou pode se tornar aguado e com grumos. A doença em equinos quase
invariavelmente é uma enfermidade respiratória com crescimentos teciduais obstrutivos nas cavidades nasais.

Cripotococose, caracterizada por neurorretinite e descolamento focal da retina, em gato. Cortesia do Dr. Kirk N. Gelatt.

Em  gatos,  os  sintomas  de  trato  respiratório  superior  secundários  à  infecção  da  cavidade  nasal  são  mais  frequentes  e  incluem  espirros;  secreções  nasais  crônicas  mucopurulentas,  serosas  ou  hemorrágicas  uni  ou  bilateral;  massa(s)
semelhante(s) a pólipo na narina; e/ou inchaço subcutâneo sobre a ponte do nariz. As lesões cutâneas também são comuns e se caracterizam por pápulas e nódulos flutuantes a firmes. As lesões mais extensas tendem a ulcerar, deixando uma
superfície exposta com exsudato seroso. Os sinais neurológicos associados à criptococose do SNC podem incluir depressão, alterações no comportamento, convulsões, movimento em círculo, paresia e cegueira. As anormalidades oculares
também podem se desenvolver, compreendendo pupilas dilatadas não responsivas e cegueira decorrente de descolamento de retina exsudativo, coriorretinite granulomatosa, panoftalmia e neurite óptica.
Diferentemente  dos  gatos,  os  cães  quase  sempre  apresentam  doença  disseminada,  com  envolvimento  ocular  ou  do  SNC.  Os  sinais  clínicos  geralmente  estão  relacionados  com  meningoencefalite,  neurite  óptica  e  coriorretinite
granulomatosa. Foram relatadas lesões de cavidade nasal em vários cães, mas geralmente não são os achados principais ou o motivo da consulta. Cerca de 50% dos cães exibem lesões no trato respiratório, em geral nos pulmões, e vários
apresentam granulomas em múltiplos sistemas. As estruturas comumente envolvidas em ordem decrescente de frequência incluem rins, linfonodos, baço, fígado, tireoide, adrenais, pâncreas, ossos, trato gastrintestinal, músculo, miocárdio,
próstata, válvulas cardíacas e tonsilas.
As lesões associadas à criptococose variam desde uma massa gelatinosa, constituída por numerosos microrganismos e com inflamação mínima, até lesão granulomatosa. A lesão geralmente é composta de agregados de microrganismos
encapsulados em tecido conjuntivo reticular. A resposta celular é principalmente de macrófagos e células gigantes com algumas plasmócitos e linfócitos. As células gigantes epitelioides e as áreas de necrose caseosa são menos comuns do
que em outras micoses sistêmicas.
DIAGNÓSTICO:  O método diagnóstico mais rápido é a avaliação citológica de exsudato nasal, exsudato da pele, liquor ou amostras obtidas por paracentese das câmaras vítreas ou aquosas do olho ou por esfregaços por impressão (imprints)
das massas nasais ou cutâneas. A coloração de Gram é a mais útil; o microrganismo retém o cristal violeta enquanto as colorações da cápsula ficam levemente avermelhadas com safranina. O corante da Índia também é utilizado para
visualizar o microrganismo, o qual se mostra claro e delineado contra um fundo preto. Esta técnica não pode ser considerada definitiva como a coloração de Gram, a menos que seja observado um broto, pois linfócitos, gotículas de gordura
e  partículas  agregadas  de  corante  da  Índia  podem  ser  confundidos  com  o  microrganismo.  A  coloração  de  Wright  é  utilizada  com  mais  frequência  no  diagnóstico  de  casos  em  cães  e  gatos,  porém  essa  coloração  pode  encolher  o
microrganismo e a cápsula torna­se distorcida. Por esse motivo, colorações com novo azul de metileno e ácido periódico de Schiff (PAS) são consideradas melhores que a coloração de Wright. Em razão da rapidez da avaliação citológica,
devem­se realizar imprints ou preparações de hidróxido de potássio em lesões suspeitas de criptococose.
Se nenhum microrganismo é observado, pode­se realizar biopsia da lesão, com parte da amostra utilizada para cultura e o resto processado para exame histológico de rotina. O microrganismo pode ser corado com hematoxilina e eosina
(H&E), mas a cápsula não se cora. Ele é mais facilmente visualizado nas colorações com PAS e prata metenamina de Gomori, porém a cápsula não se cora com estas. O melhor corante de Cryptococcus é a mucicarmina de Mayer, devido à
capacidade de corar a cápsula. Corante imunofluorescente também pode ser utilizado. A extensa cápsula e a fina parede celular de Cryptococcus o diferencia de Blastomyces. Cryptococcus, por seu brotamento e falta de endosporos, pode
ser diferenciado de Coccidioides immitis.
A detecção de antígeno capsular de criptococos em soro, urina ou liquor é um método rápido e útil de diagnóstico nos casos suspeitos nos quais o microrganismo não é identificado. O teste de aglutinação em látex está comercialmente
disponível na forma de kits. A titulação do antígeno também pode ser utilizada para auxiliar na determinação da resposta à terapia.
O microrganismo pode ser cultivado regularmente, com facilidade, a partir de exsudato, liquor, urina, fluido articular e amostras de tecido, se há volume de amostra suficiente. Utiliza­se ágar Sabouraud com antibiótico quando é provável
a contaminação bacteriana.
TRATAMENTO:  Considera­se como tratamento de escolha o fluconazol (2,5 a 10 mg/kg/dia) ou o itraconazol (10 mg/kg/dia). A anfotericina B pode ser administrada por via SC (0,5 a 0,8 mg/kg, diluída em solução salina 0,45% contendo
glicose  2,5%;  400  ml  para  gatos,  500  ml  para  cães  <  20  kg,  1.000  ml  para  cães  >  20  kg)  2  a  3  vezes/semana.  O  complexo  lipídico  de  anfotericina  B  também  pode  ser  utilizado  (1  a  2  mg/kg  para  gatos  ou  2  a  3  mg/kg  para  cães),  3
vezes/semana, no total de 12 a 15 doses. A flucitosina pode ser utilizada sozinha; no entanto, como pode desenvolver resistência ao medicamento, recomenda­se sua combinação com anfotericina.

 ESPOROTRICOSE
É  uma  doença  granulomatosa  crônica  e  esporádica  que  acomete  pessoas  e  vários  animais domésticos e de  laboratório,  sendo  causada  por  Sporothrix  schenckii.  O  microrganismo  é  dimórfico  e  forma  micélios  na  vegetação  e  em  ágar
Sabouraud­dextrose a 25 a 30°C, mas é semelhante à levedura no tecido e no meio de cultura a 37°C. É onipresente em solo, vegetação e árvores; é cosmopolita. Nos EUA é mais comumente encontrado nas regiões costeiras e nos vales dos
rios. A infecção quase sempre resulta de inoculação direta do microrganismo nos ferimentos cutâneos por contatos com plantas ou solos, ou penetração de corpos estranhos. A doença disseminada causada por inalação de esporos é rara.
A esporotricose foi relatada em cães, gatos, equinos, vacas, camelos, golfinhos, cabras, mulas, pássaros, suínos, ratos, tatus e pessoas. Infecções zoonóticas podem ocorrer. O gato pode ser a espécie com maior potencial zoonótico e a
transmissão deste aos humanos foi relatada, sem evidência de traumatismos. Por outro lado, a transmissão de outras espécies infectadas parece necessitar da inoculação de pele previamente traumatizada. Inúmeros microrganismos vertem
dos ferimentos e nas fezes dos gatos infectados acredita­se que sejam responsáveis pelo aumento do potencial zoonótico da esporotricose felina. Epidemias de esporotricose foram recentemente relatadas no Brasil. Os dados destes estudos
apontam para a importância do gato na transmissão zoonótica deste microrganismo. Os tratadores de gatos infectados foram 4 vezes mais infectados que outras pessoas que viviam no mesmo local.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A esporotricose pode ser agrupada em 3 formas: linfocutânea, cutânea e disseminada. A forma linfocutânea é a mais comum. Há desenvolvimento no local da inoculação de nódulos dérmicos a subcutâneos
firmes e pequenos, com 1 a 3 cm de diâmetro. Como as infecções ascendem ao longo dos vasos linfáticos, há desenvolvimento de cadeias e de nódulos novos. As lesões ulceram e descarregam exsudato sero–hemorrágico. Apesar de a
doença  sistêmica  não  ser  observada  inicialmente,  a  doença  crônica  pode  resultar  em  febre,  indiferença  e  depressão.  A  forma  cutânea  se  restringe  ao  local  da  inoculação,  embora  as  lesões  possam  ser  multicêntricas.  A  esporotricose
disseminada é rara, mas potencialmente fatal e pode se desenvolver com a negligência das formas cutâneas e linfocutâneas. O desenvolvimento da infecção ocorre por disseminação hematógena ou tecidual do local inicial de inoculação
para os ossos, pulmões, fígado, baço, testículos, trato gastrintestinal ou SNC. Em pessoas, a prevalência de esporotricose sistêmica parece estar aumentando, principalmente em decorrência da infecção de pessoas imunocomprometidas.
DIAGNÓSTICO:  Pode ser obtido mediante cultura (amostras obtidas de lesões fechadas) ou exame microscópico de exsudato ou amostras de biopsia. Em tecidos e exsudato, o microrganismo apresenta­se como poucas a numerosas células
únicas  em  forma  de  charuto,  no  interior  de  macrófagos.  As  células  fúngicas  são  pleomórficas  e  pequenas  (2  a  10  ×  1  a  3  μm);  pode  haver  brotamentos  com  aparência  de  uma  raquete  de  pingue­pongue.  Tem­se  utilizado  técnica  de
imunofluorescência para identificar as células semelhantes a leveduras nos tecidos. Nas amostras, exceto em gatos, os microrganismos Sporothrix são quase sempre esparsos no exsudato e no tecido infectado, de modo que o diagnóstico
geralmente requer a cultura do fungo. Nas culturas, há produção de um micélio verdadeiro, com hifas septadas, ramificadas e finas, que sustentam conídios piriformes em conidióforos delgados.
TRATAMENTO:  Itraconazol (10 mg/kg/dia) é considerado o tratamento de escolha. O tratamento é continuado 3 a 4 semanas além da cura clínica aparente. Como alternativa, utilizou­se com algum êxito uma solução saturada de iodeto de
potássio, administrada VO; a terapia é continuada 30 dias além da cura clínica aparente. Durante o tratamento, o animal deve ser monitorado quanto aos sinais de toxicidade do iodeto – anorexia, vômitos, depressão, contrações musculares,
hipotermia, cardiomiopatia, colapso cardiovascular e morte. Os gatos são especialmente sensíveis aos iodetos e o desenvolvimento de iodismo.
RISCO ZOONÓTICO:  A esporotricose  deve  ser  considerada  zoonose,  pois  casos  de  transmissão  animal­humano  são  bem  documentados.  Higiene  rigorosa  deve  ser  adotada  quando  se  manipulam  animais  com  suspeita  ou  diagnóstico  de
esporotricose. As pessoas em contato com animais infectados devem ser informadas da natureza contagiosa da doença quando se discutem as opções terapêuticas.

 FEOIFOMICOSE
Feoifomicose é uma designação clínico­patológica geral referente à infecçtão crônica cutânea, subcutânea ou da mucosa causada por um dos vários gêneros e espécies de fungos pigmentados da família Dematiaceae. Vários fungos desse
gênero  têm  sido  relatados  por  infectar  pessoas  e  outros  animais,  incluindo  Alternaria,  Bipolaris,  Cladophialophora  (Xylohypha,  Cladosporium),  Curvularia,  Exophiala,  Fonsecaea,  Moniliella,  Phialophora,
Ramichloridium e Scolecobasidium. Os fungos dessa categoria são saprófitas, amplamente distribuídos, sendo encontrados em solo, água e material vegetal em decomposição. A infecção pode resultar da penetração fúngica no tecido do
local da lesão.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   Feoifomicose  foi  relatada  em  vacas,  gatos,  equinos  e  cães.  Os  sinais  clínicos  mais  comuns  incluem  nódulos  cutâneos  ulcerados,  sintomas  de  trato  respiratório  superior  e  tumefações  nasais/paranasais.
Tumefações  subcutâneas  ou  submucosas  de  aumento  lento  são  notadas  ao  redor  da  cabeça,  mucosa  nasal,  membros  e  tórax.  Os  nódulos  podem  ulcerar  e  apresentar  fístulas  com  secreção.  Esses  piogranulomas  contêm  hifas  septadas  e
pigmentadas, com dilatações irregulares e formas semelhantes à ramificação de levedura, com parede espessada.
DIAGNÓSTICO:  A feoifomicose pode ser diagnosticada por meio de exame microscópico de exsudatos e amostras obtidas por biopsia, os quais revelam hifas filamentosas pigmentadas ou hialinas (2 a 6 μm de diâmetro), com dilatações
terminais intercaladas (6 a 12 μm) e esporos. Os diversos fungos causadores não podem ser identificados por suas características histológicas no tecido; há necessidade de isolamento em cultura e/ou PCR. O diagnóstico diferencial deve
incluir neoplasia, outros granulomas e cistos epidermoides.
TRATAMENTO:  Na  maioria  dos  casos,  a  infecção  se  limita  à  pele  e  ao  tecido  subcutâneo.  Em  um  local  favorável,  a  cura  pode  ser  obtida  mediante  ampla  extirpação  da  lesão.  Quimioterapia  com  anfotericina  B  ou  itraconazol  pode  ser
empregada nos casos em que não é possível a cirurgia.

 GEOTRICOSE
É  uma  micose  rara  causada  por Geotrichum  candidum,  um  fungo  saprófita  onipresente  de  solo,  matéria  orgânica  em  decomposição  e  alimento  contaminado.  G.  candidum  faz  parte  da  microflora  normal  da  boca  e  trato  intestinal  em
humanos. O microrganismo causa doença sistêmica em cães, aborto e mastite em bovinos e nódulos caseosos nos linfonodos de suínos. Tem sido isolado de fezes de cães, jaguatirica e macacos com enterite; lesões cutâneas em serpentes e
flamingos; e sistema respiratório de equinos, pinguins, galinhas e pessoas.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sinais clínicos variam dependendo do órgão envolvido; podem ser inespecíficos. Em cães com geotricose disseminada, os sintomas podem incluir tosse induzida por palpação traqueal, febre, anorexia,
anorexia, polidipsia, dispneia progressiva, vômito e icterícia. Os achados radiográficos incluem densidades nodulares com confluência em algumas regiões dos pulmões. A doença disseminada progride rapidamente. As lesões, encontradas
em vários órgãos, surgem como nódulos corpulentos, firmes, múltiplos e amarelo­acinzentados, os quais, microscopicamente, são granulomas bem definidos.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico definitivo baseia­se nas características de cultura e exame microscópico. Os elementos fúngicos podem ser abundantes, tanto livres como no interior dos macrófagos e das células gigantes multinucleadas, na
forma de células ovoides semelhantes a leveduras (3 a 7 μm de diâmetro) e como cadeias curtas e unidas de células de leveduras redondas formando as pseudo­hifas. Nos cortes histológicos dos tecidos corados com H&E, G. candidum se
parece com Candida albicans e Histoplasma capsulatum.
TRATAMENTO:   A  nistatina  administrada  como  suspensão  oral  foi  eficaz  no  tratamento  de  gorilas  com  diarreia  aquosa  associada  ao  isolamento  de  G.  candidum  em  amostras  de  fezes  úmidas.  Não  há  relato  de  uso  de  medicamentos
antifúngicos para o tratamento de geotricose disseminada em animais.

 HIALOIFOMICOSE
É a infecção causada por fungos não pigmentados (exceto o gênero Aspergillus ou Penicillium ou a classe dos Zigomicetos) que formam hifas de paredes claras ou hialinas nos tecidos. Exemplos de gênero que causam hialoifomicose em
pessoas e outros animais incluem Acremonium, Fusarium, Geotrichum, Paecilomyces, Pseudallescheria e Scedosporium. A hialoifomicose ocorre com menos frequência do que a feoifomicose.
ACHADOS CLÍNICOS:  As lesões variam de dano cutâneo local, subcutâneo e corneal ou doença da mucosa nasal até doença disseminada envolvendo os pulmões e vários outros sistemas orgânicos.

DIAGNÓSTICO:  Os diversos fungos causadores da doença não podem ser identificados por suas características histológicas nos tecidos; há necessidade de isolamento em cultura e/ou PCR.

TRATAMENTO:  A remoção cirúrgica, com ou sem terapia antifúngica tópica, é o tratamento de escolha para a doença local. O prognóstico da doença disseminada é tipicamente ruim. Pode­se tentar tratamento com novos antifúngicos azóis
e/ou complexo lipídico de anfotericina B.

 HISTOPLASMOSE
É uma doença granulomatosa disseminada, não contagiosa e crônica, que acomete pessoas e outros animais, causada pelo fungo dimórfico Histoplasma capsulatum. Esse microrganismo é comumente encontrado no solo que contém fezes
de aves e de morcegos. Ele produz crescimento de micélios no solo e em culturas à temperatura ambiente; cresce em forma de levedura nos tecidos e nas culturas a 37°C.
A histoplasmose é cosmopolita. As regiões endêmicas nos EUA incluem os vales dos rios Mississippi e Ohio. A infecção foi descrita em várias espécies animais, mas a doença é incomum a rara em quase todos os cães e gatos. A infecção
costuma ocorrer por contaminação, via aerossol, do trato respiratório; pulmões e linfonodos torácicos são os locais de infecção primária, embora o trato gastrintestinal possa ser um local primário de infecção, em especial em cães. Os
microrganismos alcançam a circulação sanguínea a partir de um foco primário e se disseminam por todo o organismo; podem se localizar na medula óssea ou nos olhos onde causam coriorretinite ou endoftalmite.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos são variáveis e inespecíficos, refletindo o envolvimento de vários órgãos. Muitos cães apresentam um curso prolongado, com perda de peso até emaciação, tosse crônica, diarreia persistente, febre,
anemia, hepatomegalia, esplenomegalia, linfadenopatia e ulceração gastrintestinal e nasofaringiana. Também, em cães há relato de dificuldade respiratória obstrutiva decorrente de linfadenopatia traqueobrônquica. A disseminação pode
envolver a pele, na qual se desenvolvem lesões nodulares exsudativas e ulceradas. Poliartropatia, coriorretinite e deslocamento de retina também foram relatados em um cão com histoplasmose disseminada. A histoplasmose aguda pode ser
fatal  após  2  a  5  semanas.  Em  gatos,  a  infecção  disseminada  é  comum.  Os  sinais  clínicos  podem  ser  inespecíficos,  mas  frequentemente  incluem  dificuldade  respiratória,  febre,  depressão,  anorexia  e  perda  de  peso.  Linfadenopatia,
hepatomegalia, doenças oculares (conjuntivite, coriorretinite granulomatosa, descolamento da retina, neurite óptica), claudicação e nódulos cutâneos ou ulcerados também podem ser observados.
Lesões: As lesões macroscópicas incluem aumento de fígado, baço e linfonodos mesentéricos; ascite; nódulos amarelo­esbranquiçados de tamanhos variados nos pulmões; e aumento dos linfonodos brônquicos. O fígado aumentado pode
apresentar focos de inflamação granulomatosa dispersos, múltiplos, amarelo­claros e de forma irregular. Os focos claros podem estar no miocárdio e o intestino delgado pode apresentar paredes acinzentadas, espessadas e ulceração da
mucosa.
DIAGNÓSTICO:   A  histoplasmose  e  outras  infecções  fúngicas  devem  ser  consideradas  quando  os  sinais  clínicos  compreenderem  desconforto  respiratório,  diarreia,  aumento  dos  linfonodos  brônquicos  e  nódulos  pulmonares.  Os
microrganismos Histoplasma geralmente são numerosos nos tecidos afetados e o diagnóstico definitivo pode ser realizado, muitas vezes, com aspiração com agulha fina e citologia esfoliativa. A biopsia tecidual pode ser solicitada caso a
citologia não seja diagnóstica. Esses microrganismos são difíceis de detectar com a coloração de rotina com H&E, mas coram bem com os corantes PAS, prata metenamina de Gomori e corante de Gridley. As formas de levedura em
macrófagos e células gigantes são estruturas redondas a ovoides (1 a 4 μm) com uma fina parede celular e uma zona clara e fina entre a parede e o citoplasma celulares. Também se pode cultivar H. capsulatum a partir de amostras teciduais,
de aspirado com agulha fina e de fluidos corporais.
TRATAMENTO:  Itraconazol (10 mg/kg/dia) é o tratamento de eleição para histoplasmose disseminada em cães e gatos, embora o fluconazol também seja efetivo. Cetoconazol, na dose de 10 a 15 mg/kg, 2 vezes/dia, por 4 a 6 meses, pode ser
efetivo no início ou nos casos brandos de histoplasmose em cães. Para os casos graves, sugere­se o tratamento concomitante com anfotericina B ou complexo lipídico da anfotericina B.

 LINFANGITE EPIZOÓTICA
A linfangite epizoótica é uma doença granulomatosa crônica de pele, vasos linfáticos e linfonodos dos membros e pescoço dos equídeos, causada pelo fungo dimórfico Histoplasma farciminosum. Essa enfermidade é observada em regiões
da  Ásia  e  Mediterrâneo,  mas  não  nos  EUA.  O  fungo  forma  micélios  na  natureza  e  leveduras  nos  tecidos,  com  fase  saprofítica  no  solo.  A  infecção  provavelmente  é  adquirida  por  infecção  do  ferimento  ou  transmissão  por  insetos
hematófagos.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Clinicamente, a doença se caracteriza por nódulos cutâneos livremente móveis, os quais são originados de vasos e nódulos linfáticos superficiais infectados e tendem a ulcerar e passar por períodos alternados
de descarga e fechamento. Os linfonodos afetados estão aumentados e endurecidos. A pele que recobre os nódulos pode se tornar espessa, endurecida e fundida com os tecidos subjacentes. As lesões também podem estar em pulmões,
conjuntiva, córnea, mucosa nasal e outros órgãos. Os nódulos representam piogranulomas que apresentam uma cápsula fibrosa e espessa e contêm exsudato cremoso e espesso, além dos microrganismos causadores.
DIAGNÓSTICO:  As características clínicas são altamente sugestivas. O diagnóstico pode ser confirmado por exame microscópico dos exsudatos e das amostras obtidas por biopsia. As formas de levedura dos microrganismos distendem o
citoplasma dos macrófagos e aparecem nos cortes corados por H&E como corpúsculos ovais ou globosos (3 a 4 μm), com um corpúsculo basofílico central circundado por uma zona não corada. O microrganismo parece muito com H.
capsulatum.
TRATAMENTO:  Não se conhece tratamento completamente satisfatório. Pode­se realizar extirpação cirúrgica das lesões combinada com medicamentos antifúngicos (anfotericina B).

 MICETOMAS
São  nódulos  granulomatosos  dos  tecidos  subcutâneos  que  contêm  grãos  ou  grânulos  teciduais.  No  interior  os  grãos  representam  colônias  densas  do  microrganismo.  Quando  tais  lesões  são  causadas  por  fungos,  são  conhecidas  como
micetomas eumicóticos. Os agentes causais dos micetomas eumicóticos incluem uma variedade de fungos geofílicos saprofíticos. Os micetomas eumicóticos causados por fungos pigmentados como Curvularia spp e Madurella spp  são
denominados micetomas de grão preto ou escuro. Os micetomas de grão branco são causados por fungos não pigmentados como Acremonium spp e Scedosporium apiospermum (o estágio assexuado de Pseudallescheria boydii).
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Vários micetomas eumicóticos são limitados ao tecido subcutâneo, mas os micetomas de grão branco podem ser extensões de doença da cavidade abdominal. Peritonite ou massas abdominais são tipicamente
observadas  em  micetomas  de  grão  branco.  Os  micetomas  de  grão  preto  são  quase  sempre  caracterizados  por  nódulos  cutâneos  relativamente  mal  circunscritos  nas  extremidades  ou  na  face.  As  lesões  podem  ulcerar  ou  formar  fístulas.
Quando pés ou membros estão envolvidos, a infecção pode se estender aos ossos subjacentes.
Os micélios fúngicos se proliferam nas lesões e se organizam em agregados conhecidos como grânulos ou grãos. Nesses grânulos, o micélio é compacto e frequentemente bizarro e com formas distorcidas. Os clamidósporos são comuns,
em especial na periferia, e o micélio pode ou não estar encaixado em uma substância amorfa semelhante ao cimento. Histologicamente, os grânulos são, com frequência, envolvidos por depósitos eosinofílicos. Os grânulos podem variar de
cor e tamanho, dependendo da espécie de fungo envolvida.
DIAGNÓSTICO:  Pode­se obter um diagnóstico presuntivo caso existam grãos no exsudato de fístulas. Na citologia, os grãos devem ser examinados quanto aos elementos fúngicos. Se nenhum grão tecidual for encontrado no exsudato, deve­
se realizar biopsia da lesão para exame histopatológico. Culturas devem ser realizadas para confirmar os achados citológicos e identificar o agente causal. Grãos encontrados no tecido ou amostra obtida por biopsia devem ser submetidas à
cultura.
TRATAMENTO:  O prognóstico de micetomas abdominais é reservado, pois geralmente há extenso envolvimento tecidual. Os micetomas cutâneos, embora não ameaçam a vida do animal, são muitas vezes difíceis de resolver. Em alguns
casos  de  micetomas  cutâneos,  a  extirpação  cirúrgica  radical,  inclusive  amputação  de  membros,  pode  ser  eficaz.  A  efetividade  da  quimioterapia  antifúngica  foi  relatada  apenas  em  alguns  casos.  Em  um  relato  utilizou­se  50  mg  de
fluconazol/dia, durante 6 semanas, com sucesso, no tratamento de um cão com maduromicose intra­abdominal. Em outro relato, o tratamento prolongado com 5 a 10 mg de itraconazol/kg/dia não foi efetivo na cura de infecção disseminada
por Acremonium em um cão.

 OOMICOSE (PITIOSE, LAGENIDIOSE)
É causada por patógenos da classe Oomycetes. Esses microrganismos não são fungos verdadeiros, mas são patógenos aquáticos do reino Stramenopila. Eles estão mais estreitamente relacionados com algas do que fungos, porém causam
doença que se assemelha à zigomicose (p. 695). Os microrganismos importantes em medicina veterinária incluem várias espécies de Saprolegnia e Achyla (p. ex., S. diclina), que são causas comuns de doença cutânea em peixes; Pythium
insidiosum, que causa micose cutânea e subcutânea em equinos (bursatti, câncer do pântano e sanguessuga); doença cutânea, subcutânea e gastrintestinal em cães, e doença cutânea e paranasal em gatos; e Lagenidium spp, que provoca
lesões cutâneas e sistêmicas e aneurismas de grandes vasos em cães. A pitiose é uma doença comum que acomete animais domésticos em algumas regiões tropicais e subtropicais do mundo. Em cães, a pitiose é mais frequentemente
encontrada no Sudeste Asiático, costa oriental da Austrália, América do Sul e nos EUA, especialmente ao longo da costa do Golfo. Nos EUA, a prevalência é maior nos meses de outono e inverno.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Em equinos, as lesões incluem nódulos grandes, grosseiramente circulares, granulomatosos, ulcerados e fistulados, ou tumefações subcutâneas com massas ou núcleos necróticos amarelo­acinzentados. As
lesões são mais comuns nos membros (em particular na parte inferior), abdome, tórax e genitália. A distribuição das lesões é atribuível à natureza aquática do microrganismo. As lesões são pruriginosas, liberam exsudato mucossanguíneo e
geralmente induzem automutilação. Os granulomas contêm massas firmes e colariformes amareladas de tecido necrótico, conhecidos como kunkers (popularmente denominados pedras), que podem ser removidos intactos. Kunkers  são
focos de necrose coagulativa em vasos que se isolaram do tecido circundante; contêm ramificação de hifas asseptadas extensas e possuem 1 a 10 μm de diâmetro. O envolvimento ósseo pode ser característica de pitiose crônica. A pitiose
entérica em equinos é caracterizada por lesões gastrintestinais fibrosantes e estenóticas contendo focos intralesionais de material caseoso e hifas.
As  amostras  removidas  durante  cirurgia  ou  necropsia  consistem  de  tecido  fibroso  com  áreas  de  necrose  focal  firmes  e  irregularmente  espaçadas  que  variam  em  tamanho  e  cor.  Microscopicamente,  as  alterações  variam  de  focos  de
inflamação exsudativa aguda com eosinófilos numerosos até uma reação granulomatosa com áreas isoladas de necrose e hifas com paredes espessas, ramificações e ligeiramente irregulares quanto à largura.
As formas cutâneas e gastrintestinais de pitiose são observadas e caracterizadas por inflamações granulomatosas graves e eosinofílicas. A infecção por P. insidiosum é observada, com mais frequência, no trato gastrintestinal de cães
adultos jovens, especialmente da raça Labrador Retriever. Estômago, intestino delgado proximal e junção ileocecal são mais comumente afetados, mas partes do intestino, esôfago e cólon podem ser acometidas. Os sinais clínicos incluem
vômito,  perda  de  peso  e  anorexia.  A  perda  de  peso  pode  ser  grave,  porém  cães  afetados  quase  sempre  não  aparentam  a  doença  sistematicamente  a  não  ser  em  etapas  mais  tardias  da  evolução  da  doença.  As  lesões  são  tipicamente
caracterizadas por grave espessamento transmural da parede gástrica ou intestinal, com linfadenopatia mesentérica, na qual os linfonodos são incrustados em uma massa granulomatosa firme e grande envolvendo o mesentério circundante.
Isquemia intestinal, infarto ou hemorragia abdominal aguda pode se desenvolver em decorrência da disseminação da doença nos vasos mesentéricos. Os piogranulomas entéricos consistem tipicamente de focos necróticos, infiltrados e
circundados  por  neutrófilos,  eosinófilos,  macrófagos  epitelioides,  plasmócitos  e  células  gigantes  multinucleadas.  Os  agentes  etiológicos  podem  não  ser  notados  em  cortes  teciduais  corados  com  H&E.  As  amostras  coradas  com  prata
metenamina de Gomori apresentam ramificações, raramente hifas septadas.
A pitiose cutânea é caracterizada por ferimentos que não cicatrizam, massas invasivas e nódulos ulcerados com fístulas. Extremidades, base da cauda, região ventral do pescoço ou períneo são mais comumente acometidos. A pitiose em
gatos é rara e caracteriza­se por lesões cutâneas ou nasofaringianas.
A lagenidiose foi descrita recentemente como infecção oomicótica de cães, caracterizada por lesões cutâneas multifocais e linfadenopatia regional. Em contraste com o curso clínico da pitiose cutânea, os cães com lagenidiose geralmente
envolvem locais distantes. A disseminação hematógena é provavelmente como a infecção causa vasculite. Linfonodos, pulmões e especialmente grandes vasos podem ser afetados. Aneurismas nos grandes vasos podem romper agudamente,
resultando em morte súbita.
DIAGNÓSTICO:  Em equinos, as lesões da pitiose são similares às da zigomicose (p. 695) e podem ser confundidas com habronemose cutânea (p. 979), granulação tissular excessiva e algumas neoplasias de equinos. Na pitiose, núcleos
necróticos são separados do tecido circundante e há intensa secreção seropurulenta em fístulas sinusais. As lesões contêm hifas raramente septadas, ramificadas (em ângulos retos) e irregulares, com 4 a 8 μm de diâmetro.
Em cães, o diagnóstico pode ser feito por isolamento de P. insidiosum de tecidos infectados. Tem­se utilizado identificação do microrganismo em cultura ou PCR. ELISA para detecção de anticorpos contra P. insidiosum está disponível e
parece ser sensível e específico. As características histológicas da lagenidiose são semelhantes às da pitiose e da zigomicose. No entanto, as hifas de Lagenidium são, em geral, muito maiores e visíveis nos tecidos corados com H&E. A
sorologia pode ser utilizada para diagnóstico presuntivo, mas o diagnóstico definitivo da lagenidiose é mais bem realizado por cultura e PCR.
TRATAMENTO:  Em cães com pitiose gastrintestinal, o prognóstico é ruim. A extirpação cirúrgica completa é o tratamento de eleição, mas a doença quase sempre está muito extensa no momento do diagnóstico para possibilitar ressecção
completa. A terapia medicamentosa para pitiose deve incluir itraconazol (10 mg/kg/dia) e terbinafina (5 a 10 mg/kg/dia). O tratamento com complexo lipídico de anfotericina B também pode ser tentado. Cerca de 20% dos cães respondem a
terapia prolongada. Não há relato de tratamento medicamentoso para lagenidiose. Em equinos, o prognóstico é reservado e o diagnóstico e tratamento precoces são essenciais para um controle bem­sucedido. Os fatores que influenciam o
prognóstico  incluem  tamanho  e  local  da  lesão,  bem  como  duração  da  infecção.  Lesões  pequenas  de  curta  duração  que  não  comprometem  estruturas  importantes,  geralmente,  respondem  melhor  ao  tratamento.  Extirpação  cirúrgica,
imunoterapia ou combinação de ambas pode ser eficaz. A imunoterapia consiste em uma série de injeções intradérmicas ou SC de antígenos hifais de célula total, sônicos e mortos ou antígenos solúveis precipitados do fungo causador. Os
abscessos subcutâneos nos locais de injeção, osteíte ou laminite de localização profunda podem ser complicações dessa terapia. A remoção cirúrgica mais a administração local ou sistêmica de anfotericina B podem ser um tratamento
satisfatório, caso a doença seja localizada.

 PECILOMICOSE
É uma micose sistêmica (principalmente pulmonar), causada por Paecilomyces spp e descrita em pessoas e em vários animais, especialmente naqueles com temperatura corporal mais baixa. A infecção em répteis e anfíbios de cativeiro é
provável e razoavelmente comum; outros hospedeiros incluem cães, equinos, gatos (granuloma nasal) e caprinos (mastite). Os fungos causadores mais importantes são P. lilacinus e P. variotii. Os fungos, normalmente considerados não
patogênicos, são amplamente distribuídos no solo e na matéria orgânica em decomposição. A infecção quase sempre é secundária a debilidade, imunossupressão e/ou alteração da flora microbiana normal pela administração prolongada de
antibióticos.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   Os  sinais  variam  e  são  inespecíficos,  mas  podem  refletir  o  envolvimento  tecidual  ou  de  órgãos.  Os  órgãos  envolvidos  ficam  aumentados,  com  nódulos  branco­acinzentados  proeminentes.  Em  casos
disseminados, as lesões granulomatosas (focos múltiplos e claros) que contêm pseudo­hifas septadas (2 a 3 μm de diâmetro), conídios ovais e esporos de paredes finas, esféricos a ovais (3 a 6 μm) são encontradas em vários tecidos (p. ex.,
pulmões), e estão intimamente associadas a arteríolas de tamanhos pequeno e médio.
DIAGNÓSTICO:  As lesões macroscópicas podem ser confundidas com as provocadas por outras micoses sistêmicas. Entretanto, hifas septadas, conídios e esporos desse fungo diferem dos fungos patogênicos comuns, como Aspergillus spp e
os fungos da mucormicose. O diagnóstico pode ser realizado por isolamento em cultura dos fungos de múltiplas amostras de lesões. Em relação à maioria das espécies, o crescimento pode estar ausente ou restrito a 37°C, mas pode ser bom
entre 5 e 30°C.
TRATAMENTO:  Nenhum esquema de tratamento foi descrito. Paecilomyces spp varia muito quanto à sensibilidade aos agentes antifúngicos; P. lilacinus apresenta alta resistência à anfotericina B e flucitosina, mas é sensível ao cetoconazol,
enquanto P. variotii é sensível aos 2 primeiros medicamentos.

 PENICILIOSE
As infecções por Penicillium spp são raras em animais domésticos. Contudo, o fungo foi isolado de um caso de dermatose felina; de celulite orbital e de sinusite com pneumonia em outro gato; de uma doença destrutiva invasiva dos tecidos
nasais em cães; e de lesões invasivas em pulmões, sacos aéreos, fígado e outros tecidos em pequenos tucanos de cativeiro (P. griseofulvum); e de doença sistêmica nos ratos do bambu (P. marneffei) no sudoeste da Ásia. Penicillium spp são
amplamente distribuídos na natureza, sendo encontrados em solos, grãos e vários alimentos e rações.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:  Os  cães  com  peniciliose nasal  apresentam  espirros  crônicos  e  secreção  nasal  aguda  a  crônica,  que  varia  de  hemorrágica  intermitente  a  mucopurulenta  ou  mucoide  intermitente  ou  contínua.  Os  achados
radiográficos incluem áreas de destruição dos ossos turbinados, com aumento da radiotransparência. Macroscopicamente, a mucosa nasal apresenta focos de necrose e ulceração; microscopicamente, as hifas podem formar um emaranhado
espesso sobre uma mucosa intacta adjacente a esses focos.
DIAGNÓSTICO:  Baseia­se na cultura fúngica, na caracterização das lesões e presença das hifas fúngicas e um teste positivo de difusão dupla em ágar­gel. O isolamento em cultura de Penicillium sp deve ser acompanhado da demonstração da
invasão tecidual pelos fungos, para confirmação do diagnóstico. Nos tecidos, P. marneffei se assemelha muito à fase de levedura de Histoplasma capsulatum.
TRATAMENTO:  Turbinectomia cirúrgica com curetagem tem sido combinada com lavagem da cavidade nasal com tintura de iodo 1% ou povidona­iodo (10:1) e tiabendazol oral. Fluconazol, na dose de 2,5 a 5 mg/kg/dia, por 2 meses, foi
efetivo no tratamento de alguns cães com peniciliose nasal.

 RINOSPORIDIOSE
É uma infecção piogranulomatosa crônica, não fatal, principalmente de mucosa nasal e, às vezes, da pele de equinos, bovinos, cães e aves aquáticas, causada pelo fungo Rhinosporidium seeberi. Na América do Norte é incomum, sendo
mais frequente na Índia, África e América do Sul. Tem­se realizado cultura no microrganismo e seu habitat natural é desconhecido. Traumatismo pode predispor à infecção, a qual não é considerada transmissível.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A infecção da mucosa nasal caracteriza­se por crescimentos polipoides que podem ser macios, róseos, friáveis, lobulados com superfícies ásperas e grandes o suficiente para obstruir as vias nasais. As lesões
cutâneas podem ser únicas ou múltiplas, sésseis ou pedunculadas. Os pólipos nasais e as lesões cutâneas têm um componente inflamatório fibromixoide granulomatoso e contêm o fungo.
DIAGNÓSTICO:  Pode­se confundir a rinosporidiose com outras lesões granulomatosas da mucosa nasal e da pele, inclusive aspergilose, entomoftoromicose, “granuloma nasal” e criptococose. A demonstração microscópica das esférulas
(esporângios) de R. seeberi nas amostras de biopsia confirma o diagnóstico. As esférulas podem ser numerosas, variar em tamanho (até 300 μm), apresentar paredes espessas e ácido­periódicas positivas para a coloração de Schiff e conter
endósporos de 4 a 19 μm de diâmetro. Os estágios de desenvolvimento de tamanho variável e sem esporos se distribuem por toda a lesão.
TRATAMENTO:  A extirpação cirúrgica das lesões é considerada padrão, mas recidiva é comum. Anfotericina B e itraconazol são relatados como tratamento, mas geralmente não são tão efetivos como a cirurgia.

 ZIGOMICOSE (BASIDIOBOLOMICOSE, CONIDIOBOLOMICOSE, ENTOMOFTOROMICOSE)
Zigomicose  é  um  termo  empregado  para  descrever  a  infecção  por  fungos  da  classe  Zygomycetes  e  os  dois  gêneros  da  ordem  Entomophthorales,  Basidiobolus  e  Conidiobolus.  Infecções  por  zigomicetos  verdadeiros  são  raras,  porém
conidiobolomicose e basidiobolomicose são mais comuns e causam lesões piogranulomatosas que são macroscópica e histologicamente similares às da pitiose e da lagenidiose. Assim, é principalmente uma infecção da mucosa nasal e do
tecido subcutâneo de equinos e raramente de outros animais (lhamas e ovinos) causada por Conidiobolus coronatus, C. incongruus, C. lamprauges ou B. ranarum.  Esses  fungos  onipresentes  estão  presentes  no  solo  e  na  vegetação  em
decomposição e, no caso dos basidiobolos, acomete o trato gastrintestinal de anfíbios, répteis e macrópodos. C. coronatus infecta quase exclusivamente a mucosa do nariz e da boca. Basidiobolus infecta as faces laterais de cabeça, pescoço
e corpo. C. coronatus também é um importante patógeno de insetos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os piogranulomas ulcerativos da membrana mucosa das narinas ou da boca, ou crescimentos nodulares da mucosa nasal e dos lábios causados por C. coronatus podem  provocar  obstrução  mecânica,  resultando  em
dispneia e secreção nasal. As lesões causadas por B. ranarum são nódulos da pele da parte superior do corpo, pruriginosos, grandes, comumente únicos, circulares e ulcerativos. As fístulas das lesões liberam fluido serossanguinolento, as
quais frequentemente são traumatizadas. A extensão aos linfonodos regionais resulta em tumefação dos nódulos e desenvolvimento de focos necróticos amarelados. As lesões podem conter um núcleo central de tecido necrótico amarelo e
cremoso. Basidiobolomicose disseminada é rara, mas foi relatada em cães e em um mandril.
Lesões: Em amostras de tecidos extirpados ou de necropsia, a derme fibrosada espessada apresenta áreas branco­cremosas ou vermelhas, espalhadas. As lesões, as quais contêm hifas, amplo infiltrado de eosinófilos e áreas separadas de
necrose, apresentam características histológicas de granulomas infecciosos.
DIAGNÓSTICO:  Clinicamente, a zigomicose pode ser confundida com habronemose cutânea (p. 979) e oomicose (p. 691), mas pode ser diferenciada pelo exame microscópico dos tecidos. Em cortes teciduais corados com H&E, o fungo se
apresenta como orifícios e canais alongados, e várias hifas possuem bainha eosinofílica. Nas partes coradas por fungos, o microrganismo consiste em hifas de 4 a 20 μm, grandes, ramificadas e, às vezes, septadas. Há necessidade de cultura
para identificar o fungo causador.
TRATAMENTO:   Extirpação  cirúrgica  ou  imunoterapia,  ou  ambas,  resultam  cura.  A  imunoterapia  consiste  em  injeções  intradérmicas  de  0,02  a  0,1  ml  de  material  fúngico  particulado.  Tem­se  tratado  a  doença  micótica  localizada  com
anfotericina B, administrada por via sistêmica ou local, ou ambas. O tratamento ideal inclui remoção cirúrgica precoce da lesão, seguida de administração de anfotericina B.

LEPTOSPIROSE

É uma zoonose cosmopolita, tanto em animais domésticos como nos selvagens. É causada por uma bactéria espiroqueta classificada como Leptospira, que possui diversos sorovariantes. A doença pode acometer praticamente todos os
mamíferos e possui ampla gama de efeitos clínicos, desde infecção branda subclínica até falha múltipla de órgãos e morte.
ETIOLOGIA:  Leptospira é  espiroqueta Gram­negativa  aeróbia,  fastidiosa,  de crescimento  lento  e  com  motilidade  característica  semelhante  a  um  saca­rolhas.  A  taxonomia  do  gênero  é  complexa  e  pode  ser  confusa.  Tradicionalmente,  as
leptospiras são divididas em dois grupos: as patogênicas, classificadas como membros de L. interrogans e as saprófitas, classificadas como L. biflexa. Em cada uma destas espécies, há descrição de cerca de 220 sorovariantes de leptospiras
patogênicas identificadas (com base nos antígenos de superfície) em todo o mundo. Com a difusão da informação genômica para a classificação das bactérias, o gênero Leptospira foi  reorganizado  e,  atualmente,  possui  7  espécies  de
leptospiras  patogênicas.  Algumas  das  leptospiras  patogênicas  aos  animais  domésticos,  atualmente  possuem  diferentes  nomes  de  espécies.  Por  exemplo,  L.  interrogans  sorovariante  grippotyphosa,  agora  é  L.  kirschneri  sorovariante
Grippotyphosa.  Os  dois  tipos  de  sorovariantes  Hardjo  foram  formalmente  divididos  em  duas  espécies:  sorovariante  Hardjo  tipo  hardjo­bovis  (encontrado  nos  EUA  e  várias  outras  partes  do  mundo)  e  atualmente  L.
borgpetersenii sorovariante Hardjo e a sorovariante Hardjo tipo hardjo­prajitno (isolada inicialmente no Reino Unido) e atualmente L. interrogans sorovariante Hardjo. A revisão da nomenclatura é oriunda da literatura científica, não sendo
observada em medicamentos e vacinas. Os nomes das sorovariantes continuam e são úteis na discussão sobre epidemiologia, características clínicas, tratamento e prevenção de leptospirose.
HOSPEDEIROS SUSCETÍVEIS, EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  Praticamente todos os mamíferos são suscetíveis às infecções por leptospiras, embora algumas espécies sejam mais resistentes à doença. Entre os animais de companhia e de
produção, a leptospirose é diagnosticada com mais frequência em bovinos, suínos, cães e equinos. Os gatos parecem relativamente resistentes à doença. A leptospirose em animais selvagens é comum, embora a doença seja mais relatada
apenas quando os animais selvagens atuam como fonte de infecção aos animais domésticos ou às pessoas.
A leptospirose é cosmopolita. A infecção e a doença são mais prevalentes em climas quentes e úmidos, sendo endêmicas nos trópicos. Em climas temperados, a doença é mais sazonal, com alta prevalência nos períodos de chuva.
Embora > 220 sorovariantes de leptospiras patogênicas sejam reconhecidas, um subconjunto é prevalente em uma região ou ecossistema e são associadas a 1 ou mais hospedeiros, que atuam como reservatórios da infecção (Tabela 4) Os
hospedeiros  são,  geralmente,  espécies  selvagens  e,  às  vezes,  animais  domésticos  e  de  produção.  Cada  sorovariante  comporta­se  de  forma  diferente  nas  espécies  hospedeiras,  em  relação  a  outras  espécies  de  hospedeiros  casuais.  Nos
hospedeiros, a leptospirose geralmente é caracterizada por uma alta prevalência de infecção, com sinais discretos da forma clínica aguda e a infecção persiste nos rins e, às vezes, no trato genital.
O diagnóstico da infecção nos hospedeiros é difícil devido à baixa resposta humoral e à presença de poucos microrganismos nos tecidos dos animais infectados. Exemplos deste tipo de infecção são sorovariante Bratislava, em suínos, e
sorovariante Hardjo, em bovinos. Em hospedeiros incidentais, a leptospirose é caracterizada pela baixa prevalência da infecção, sinais clínicos graves e fase renal da infecção curta. O diagnóstico de infecções dos hospedeiros casuais é
menos  problemático,  pois  a  resposta  de  anticorpos  é  maior  e  nota­se  grande  número  de  bactérias  nos  tecidos  dos  animais  infectados.  Exemplos  deste  tipo  de  infecção  são  sorovariante  Grippotyphosa,  em  cães,  ou  sorovariante
Icterohaemorrhagiae, em bovinos e suínos.

Tabela 4 – Hospedeiros de manutenção mais comuns de leptospiras patogênicas associadas a doenças em animais domésticos, nos EUA e no Canadá

Sorovariante de Leptospira Hospedeiro de manutenção

Canicola Cães

Pomona Suínos, bovinos, gambás
Grippotyphosa Guaxinim, rato­almiscarado

Hardjo Bovinos
Icterohaemorrhagiae Ratos

Bratislava Suínos, camundongo (?), equinos (?)

A caracterização de uma interação hospedeiro/sorovariante como um hospedeiro de manutenção da infecção ou um hospedeiro casual não é absoluta. P. exemplo, suínos e bovinos infectados pela sorovariante Pomona comportam­se
como hospedeiro intermediário às duas formas, com a bactéria persistindo nos rins, mas o hospedeiro apresenta resposta de anticorpos à infecção.
A transmissão entre hospedeiros de manutenção, geralmente, é direta e envolve contato com urina contaminada, fluidos placentários ou leite. Além disso, a infecção pode ser transmitida por via venérea ou transplacentária com algumas
combinações  hospedeiro/sorovariante.  A  infecção  dos  hospedeiros  casuais  normalmente  é  indireta,  por  meio  do  contato  com  locais  contaminados  com  urina  dos  hospedeiros  de  manutenção  assintomáticos  que  excretam  a  bactéria.  As
condições  ambientais  são  importantes  na  determinação  da  frequência  da  transmissão  indireta.  A  sobrevivência  das  leptospiroses  é  favorecida  por  clima  úmido  e  moderadamente  quente;  a  sobrevivência  é  breve  em  solos  secos  ou  em
temperatura < 10°C ou > 34°C.
PATOGENIA:  Embora haja diversas sorovariantes de Leptospira e de espécies hospedeiras, as etapas­chave na patogenia da doença são semelhantes em todas as combinações hospedeiro/sorovariante. As leptospiras invadem o corpo após
penetração de membrana mucosa ou pele lesionada. Após período de incubação variável (4 a 20 dias), as leptospiras circulantes no sangue replicam­se em vários tecidos, inclusive fígado, rins, pulmões, trato genital e SNC, por 7 a 10 dias.
Durante  a  bacteriemia  e  a  colonização  tecidual,  os  sinais  clínicos  da  leptospirose  aguda  podem  variar  dependendo  da  sorovariante  e  do  hospedeiro.  Os  anticorpos  aglutinantes  podem  ser  detectados  em  amostras  de  soro  logo  após  a
leptospiremia e coincidem com a passagem das lesptospiras do sangue aos vários órgãos. À medida que os microrganismos se propagam, os sinais clínicos de leptospirose aguda começam a regredir, embora as lesões dos órgãos possam
retardar por algum tempo o restabelecimento da função normal.
Neste ponto, a enfermidade nos hospedeiros de manutenção e nos hospedeiros casuais é diferente. As leptospiras permanecem nos túbulos renais dos hospedeiros casuais por um curto período de tempo e são excretadas na urina durante
poucos dias a várias semanas. Em hospedeiros de manutenção, entretanto, as leptospiras geralmente permanecem no túbulo renal, trato genital e, menos comumente, nos olhos, apesar da presença de alto teor de anticorpos no soro. As
leptospiras são liberadas na urina e secreções genitais de animais persistentemente infectados durante meses a anos após o início da infecção e estes animais tornam­se um importante reservatório da infecção.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos de leptospirose dependem da espécie hospedeira, da patogenicidade da estirpe e da sorovariante de Leptospira, além da idade e do estado fisiológico do animal. As infecções subclínicas são comuns,
particularmente, nos hospedeiros de manutenção. Nos hospedeiros casuais a leptospirose é uma doença aguda, sistêmica e, geralmente, febril, caracterizada por alteração na função renal e/ou hepática. Além disso, pode acometer outros
sistemas corporais, resultando em sinais clínicos (p. ex., vômito, uveíte, pancreatite, anemia hemolítica).
Tanto nos hospedeiros casuais como nos hospedeiros de manutenção gestantes por ocasião da infecção, a localização e a persistência da bactéria no útero podem resultar em infecção fetal com subsequente aborto, natimorto, fetos com
anomalias ou o feto nasce saudável, porém infectado. Em geral, hospedeiros casuais abortam de forma aguda; outros apresentam sequelas reprodutivas que podem se prolongar por várias semanas a meses.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  de  leptospirose  depende  do  histórico  clínico  e  vacinal  e  de  testes  laboratoriais.  Os  exames  diagnósticos  incluem  detecção  de  anticorpos  contra  a  bactéria  em  amostras  de  tecidos  e  de  fluidos  corporais.
Recomenda­se teste sorológico, juntamente com uma ou mais técnicas de identificação do microrganismo nos tecidos ou nos fluidos corporais.
Os testes sorológicos são as técnicas mais comumente utilizadas no diagnóstico de leptospirose em animais. A aglutinação microscópica é o teste utilizado com mais frequência. Este método envolve a mistura de diluições adequadas do
soro com as sorovariantes de leptospiras mais prevalentes em cada região. A presença de anticorpos é indicada para aglutinação de leptospiras. Ensaios imunoenzimáticos foram desenvolvidos utilizando várias preparações antigênicas e
diferentes protocolos. Um teste que mensura IgM é útil para detectar infecção recente em animais de produção e em cães. O uso destes testes é complicado em regiões do mundo onde a vacinação é comum; não estão comercialmente
disponíveis na América do Norte.
A interpretação dos resultados dos testes sorológicos é complicado por vários fatores, incluindo reação cruzada de anticorpos, título de anticorpos induzido por vacinação e falta de consenso sobre qual título de anticorpos indica infecção.
Os anticorpos produzidos pelo animal em resposta à infecção por determinada sorovariante de Lesptospira geralmente exibem reação cruzada com anticorpos de outras sorovariantes. Em alguns casos, este padrão de reação cruzada é
preditivo, com base na relação antigênica das várias sorovariantes de Leptospira, mas os padrões de reação cruzada dos anticorpos variam entre as espécies de hospedeiros. Entretanto, em geral, a sorovariante infectante é considerada como
a sorovariante a qual o animal desenvolve título mais alto. Reações paradoxais podem ocorrer com o teste de aglutinação precoce durante a fase aguda da infecção, com marcante resposta de anticorpos aglutinantes contra uma sorovariante
diferente daquela sorovariante infectante.
A ampla vacinação dos cães e animais de produção contra Leptospira também complica a interpretação da sorologia para leptospirose. Em geral, animais vacinados desenvolvem título de anticorpos aglutinantes baixo (1:100 a 1:400) em
resposta à vacinação e este título persiste por 1 a 3 meses após a vacinação. Entretanto alguns animais desenvolvem alto título após a vacinação, que persiste por 6 meses ou mais.
Não há consenso quanto qual título é diagnóstico para a infecção por leptospira. Um baixo título de anticorpos não necessariamente exclui um diagnóstico de leptospirose, pois o título é, geralmente, baixo na doença aguda e na infecção
em hospedeiro de manutenção. Na leptospirose aguda, um aumento de 4 vezes pode ser observado no título de anticorpos em amostras de soro pareadas colhidas em intervalos de 7 a 10 dias. O diagnóstico de leptospirose baseado apenas
em uma única amostra de soro deve ser realizado com cautela e deve­se considerar o quadro clínico e o histórico de vacinação do animal. Em geral, com histórico clínico compatível e vacinação há mais de 3 meses, um título 1:800 a
1:1.600 é uma boa evidência presuntiva de infecção por leptospira. A consulta ao laboratório de diagnóstico auxilia na interpretação do título. O título de anticorpos pode persistir por meses após a infecção e recuperação do paciente,
embora geralmente ocorra um declínio gradual com o tempo.
A imunofluorescência pode ser utilizada para identificar leptospiras nos tecidos, sangue ou sedimento urinário. O teste é rápido e tem boa sensibilidade, mas a interpretação requer técnicos de laboratório qualificados. Imunoistoquímica é
útil na identificação de leptospiras em tecidos fixados com formol, mas devido ao pequeno número de microrganismos nos tecidos, a sensibilidade da técnica é variável. Vários protocolos de PCR estão disponíveis e cada laboratório deve
selecionar um procedimento diferenciado. Estas técnicas permitem a detecção de leptospiras, mas não determina a sorovariante infectante. A cultura de sangue, urina ou tecido é o único método que identifica definitivamente a sorovariante
infectante. O sangue pode ser cultivado no início do curso clínico; a urina geralmente apresenta positividade após 7 a 10 dias após o aparecimento dos sinais clínicos. A cultura raramente é positiva após o início da terapia antimicrobiana. A
cultura de leptospiras requer meios específicos e os laboratórios de diagnóstico raramente cultivam amostras para isolamento de leptospiras.
PREVENÇÃO:  Evitar a exposição a animais selvagens e domésticos que podem ser hospedeiros de manutenção para Leptospira é difícil, pois roedores, guaxinins e gambás são frequentemente encontrados no ambiente rural e urbano. O
segredo  para  prevenção  da  leptospirose  é  a  vacinação  com  vacinas  polivalentes  inativadas.  A  imunidade  contra  leptospirose  é  específica  para  a  sorovariante;  ademais,  as  vacinas  são  formuladas  com  várias  sorovariantes  presentes  no
ambiente do animal suscetível. No momento não há vacina contra leptospira para equinos. As vacinas são, geralmente, designadas e avaliadas quanto à habilidade de prevenir sinais clínicos da doença e não se deve esperar completa
prevenção da infecção e excreção das bactérias.
RISCO ZOONÓTICO:  As pessoas são suscetíveis à infecção por várias sorovariantes de leptospira, mas são hospedeiros casuais e, ainda, não são reservatórios importantes da infecção. A exposição ocupacional é um fator de risco e médicos
veterinários, auxiliares de veterinários, criadores e vaqueiros são mais suscetíveis à infecção. Além disso, a exposição recreacional a águas contaminadas com urina de animais domésticos ou selvagens apresenta risco. Proprietários de
animais podem contrair a doença pelo contato com seus animais de companhia e de produção.
A principal via de infecção é o contato com fluidos corporais contaminados (sangue, em casos agudos, ou urina) ou via membrana mucosa. Nas pessoas, a manifestação da doença varia de subclínica a grave e pode ser fatal quando ocorre
insuficiência renal ou hepática. Os sinais clínicos mais comuns são febre, cefaleia, erupção cutânea, dor ocular, mialgia e indisposição. Há relato de infecção transplacentária, aborto e infecção de lactentes pela amamentação, concluindo–se
que a exposição de mulheres gestantes é um problema sério. Exames laboratoriais são necessários para o diagnóstico definitivo, pois o diagnóstico de leptospirose em animais com base nos sinais clínicos é difícil. Os médicos veterinários
devem implantar um programa de controle de infecções, onde os fluidos corporais dos animais devem ser manipulados com luvas e lavagem de mão, rotineiramente.

Leptospirose em Bovinos
As  sorovariantes de  Leptospira  mais  importantes em  bovinos  são  Hardjo  e  Pomona,  na  América  do  Norte;  as  sorovariantes  Grippotyphosa,  Bratislava,  Icterohaemorrhagiae  e  Canicola  são,  ocasionalmente,  implicadas  como  causas  de
leptospirose bovina. Os casos de leptospirose mais comuns em bovinos nos EUA e no mundo envolvem a sorovariante Hardjo, para a qual os estes animais são considerados hospedeiros de manutenção.
Várias infecções por leptospira em bovinos são subclínicas, particularmente em vacas não prenhes e não lactantes. A leptospirose aguda ou subaguda é comumente associada a infecções de hospedeiros casuais e ocorrem durante a fase
leptospirêmica da infecção. Os sinais clínicos associados a infecções crônicas geralmente estão relacionados com a falha reprodutiva, aborto e natimortos. A colonização persistente de útero e ovidutos com a sorovariante Hardjo pode estar
associada à infertilidade, caracterizada por aumento do número de acasalamento/inseminação para a concepção e do intervalo entre partos.
Raramente, a leptospirose  aguda  pode  ser  grave  em  bezerros.  A  sorovariante  Pomona resulta em doença mais grave, embora outras sorovariantes possam causar doença semelhante. Os bezerros podem apresentar febre alta, anemia
hemolítica, hemoglobinúria, icterícia, congestão pulmonar e, ocasionalmente, meningite e morte. Em vacas lactantes, a infecção casual pode estar associada à agalactia e pequena quantidade de sangue no leite. Uma forma menos grave
desta “síndrome da redução da quantidade de leite” pode acometer vacas lactantes infectadas com L. Hardjo, na ausência de outras evidências clínicas da infecção.
A forma crônica da doença está associada à infecção fetal em vacas prenhes que abortam ou parem natimortos ou prematuros e bezerros fracos infectados. Também é possível o nascimento de bezerros saudáveis, porém infectados.
Abortos e natimortos comumente são os únicos sinais de manifestação da infecção, mas às vezes podem estar relacionados com um episódio da doença de até 6 semanas (Pomona) ou 12 semanas (Hardjo). Os abortos associados à infecção
de hospedeiros casuais tendem a ocorrer ao final da gestação e em grupos; são conhecidos como “surtos de abortos”. Por outro lado, os abortos que ocorrem após a infecção por sorovariante Hardjo tendem a ser mais esporádicos e podem
ocorrer na metade ou no final da gestação.
O diagnóstico de infecção de hospedeiros casuais em bovinos é relativamente simples. Em geral, animais infectados desenvolvem altos títulos diante do sorovariante infectante; um título de anticorpos > 1:800 no momento do aborto é
considerado evidência de leptospirose. Em alguns casos, as leptospiras podem ser notadas na placenta e no feto, por imunofluorescência, PCR e imunoistoquímica. O diagnóstico de infecção pela sorovariante Hardjo é mais difícil e requer
uma combinação de abordagens. Apenas a sorologia falha na identificação de animais infectados com a sorovariante Hardjo, pois amostras soronegativas são comuns em rebanhos bovinos infectados. O teste diagnóstico e a estratégia
recomendada incluem, principalmente, o uso de teste (imunofluorescência ou PCR) para detectar a bactéria na amostra de urina de um bovino do rebanho, seguido de teste sorológico, para obter informações sobre a provável sorovariante
de Leptospira infectante.
Os bovinos com leptospirose aguda podem ser tratados com tetraciclina, oxitetraciclina, ceftiofur, tilmicosina ou tulatromicina. As leptospiras também são muito sensíveis à eritromicina, tiamulina e tilosina, embora estes antibióticos não
possam eliminar o estado de carreador renal. A oxitetraciclina injetável de longa ação (20 mg/kg) e o ceftiofur de liberação prolongada têm se mostrado efetivos em controlar a disseminação de bovinos infectados pela sorovariante Hardjo.
Em um surto de leptospirose a vacinação pode ser combinada com tratamento antibiótico, pois apenas a vacinação não reduz a excreção da bactéria na urina. Devem ser respeitados os períodos de carência, após a medicação.
As vacinas contra leptospirose bovina disponíveis nos EUA e no Canadá são pentavalentes e contêm as sorovariantes Pomona, Grippotyphosa, Canicola, Icterohaemorrhagiae e Hardjo. Estas vacinas propiciam boa proteção contra a
doença causada por estas sorovariantes, com possível exceção à sorovariante Hardjo. Pesquisas e evidências indicam que algumas vacinas tradicionais contra leptospirose, com cinco tipos, não fornecem boa proteção contra a infecção pela
sorovariante Hardjo. Novas vacinas vêm sendo introduzidas para resolver este problema. Quando o principal objetivo do programa de vacinação é proteger os bovinos contra a infecção por Hardjo, deve­se tomar cuidado na escolha da
vacina. Em geral, a vacinação anual de todos os bovinos do rebanho ou de uma pequena área de prevalência ou a vacinação duas vezes ao ano para rebanhos abertos ou em área de alta prevalência é a forma mais efetiva de controle.

Leptospirose em Cães
Os cães são considerados hospedeiros reservatórios da sorovariante Canicola e antes da disseminação de programas de vacinação, as sorovariantes Canicola e Icterohaemorrhagiae eram as mais prevalentes em cães, nos EUA. A prevalência
das sorovariantes em cães mudou significativamente nos últimos 15 anos. Atualmente, as sorovariantes mais prevalentes são Grippotyphosa, Pomona e Bratislava – com diferenças relativas na proporção destas sorovariantes em diferentes
regiões geográficas. A sorovariante Canicola ainda circula na população canina, particularmente em cães errantes. A sorovariante Icterohaemorrhagiae é a mais comumente identificada em cães expostos a roedores, particularmente em áreas
urbanas. A detecção de anticorpos reativos à sorovariante Autumnalis no soro de cães, nos EUA e no Canadá, gerou especulações de que este microrganismo seja causa da doença. Entretanto, a sorovariante Autumnalis não foi isolada em
cães nos EUA ou no Canadá e há evidência de que o uso de vacinas contendo as sorovariantes Grippotyphosa e Pomona pode induzir alto título de anticorpos de reação cruzada contra a sorovariante Autumnalis. Por isso, a participação da
sorovariante Autumnalis na doença canina ainda depende de evidências microbiológicas.
O período de incubação varia de 4 a 12 dias. Há poucas diferenças clínicas entre a doença causada pelas diversas sorovariantes. Há variações significativas na patogenicidade entre as sorovariantes. Por isso, cães com leptospirose podem
apresentar um amplo espectro de sinais clínicos que dificultam o diagnóstico clínico. Sinais iniciais são inespecíficos e incluem febre, depressão, letargia, anorexia, artralgia ou mialgia. Horas ou dias após, sintomas renais e/ou hepáticos são
observados, com aumento discreto a moderado de nitrogênio ureico sanguíneo (BUN), creatinina e bilirrubina, para icterícia intensa, insuficiência renal oligúrica, hiperfosfatemia, trombocitopenia e morte. Com menor frequência nota­se
uveíte, pancreatite, hemorragia pulmonar e hepatite crônica.
A  anormalidade  hematológica  mais  comum  é  leucocitose  com  neutrofilia  discreta  a  moderada,  sem  desvio  à  esquerda,  embora  possa  se  constatar  contagem  de  hemácias  normal.  Nota­se  anemia  discreta  em  25  a  35%  dos  casos,
geralmente como resultado de hemólise subclínica. Trombocitopenia ocorre em apenas 10 a 20% dos cães, mas raramente é grave o suficiente para causar hemorragia. Vasculite é a causa típica de hemorragia associada à leptospirose.
Azotemia é o achado mais comum no perfil bioquímico sérico. Quando há anormalidade nos testes de função hepática, o aumento da atividade de fosfatase alcalina (ALP) é mais evidente do que o de alanina aminotransferase (ALT) e de
aspartato aminotransferase (AST). A concentração sérica de bilirrubina encontra­se elevada em cerca de 20% dos casos. Na urinálise nota­se isostenúria e hipostenúria; hematúria, proteinúria e cilindros granulares são verificados em cerca
de 30% dos casos.
Os achados macroscópicos podem incluir hemorragias petequiais ou equimóticas em qualquer órgão ou na superfície pleural ou peritoneal, hepatomegalia e aumento de volume dos rins. O fígado é quase sempre friável, com acentuado
padrão lobular; pode apresentar manchas marrom­amareladas. Os rins podem conter focos esbranquiçados na superfície subcapsular. Os achados microscópicos no fígado podem incluir necrose hepatocística, hepatite não supurativa e estase
biliar intra­hepática, enquanto nos rins é possível notar edema de células epiteliais tubulares, necrose tubular e reação inflamatória mista. Hepatite crônica e nefrite intersticial crônica são descritas em casos menos graves.
Em cães, a sorologia é o teste diagnóstico mais prático e frequentemente utilizado. A obtenção de títulos na fase aguda e no período de convalescença pode ser necessária para confirmar o diagnóstico. Outros testes diagnósticos, como
imunofluorescência, PCR e cultura, são úteis, mas a amostra deve ser obtida antes da administração de antibióticos, a fim de obter máxima sensibilidade.
A insuficiência renal e a doença hepática são tratadas com fluidoterapia e outras medidas de suporte para manter normal o equilíbrio de fluidos, eletrólitos e da condição ácido­base. A terapia antimicrobiana é indicada. O tratamento
sistêmico com penicilina ou seus derivados é particularmente útil na doença aguda, em cães. Estes antibióticos são indicados para eliminar a leptospiremia. Em caso de doença branda e tolerância do cão à terapia oral, pode­se utilizar
doxiciclina ou fluoroquinilona. A terapia primária deve ser seguida de 2 a 4 semanas de doxiciclina para eliminar os microrganismos presentes nos rins e para evitar a disseminação destas bactérias. As cefalosporinas de primeira e de
segunda geração não são recomendadas. Os cães que foram recentemente expostos à leptospirose podem ser tratados profilaticamente com amoxicilina ou doxiciclina durante 7 a 10 dias, com intuito de prevenir a infecção.
As  bacterinas  comerciais  disponíveis  para  cães  contêm  as  sorovariantes  Canicola,  Icterohaemorrhagiae,  Grippotyphosa  e  Pomona.  A  imunidade  cruzada  entre  as  sorovariantes  parece  não  ser  boa  e  cães  vacinados  podem  ainda  ser
suscetíveis à infecção por outras sorovariantes. Em geral, as vacinas propiciam proteção à doença clínica, mas não protegem todos os cães de infecção renal ou disseminação renal.
Há preocupação quanto à reação de hipersensibilidade após a vacinação de cães. Esta reação raramente é fatal e há tratamento clínico. A vacinação é recomendada em intervalos anuais e pode ser recomendada em intervalo menor nas
regiões enzoóticas.

Leptospirose em Equinos
Nos EUA e no Canadá, as sorovariantes Pomona e Grippotyphosa são as mais comumente envolvidas na leptospirose equina. A prevalência de leptospirose em equinos é desconhecida, mas evidências sorológicas indicam prevalência maior
do que se apresenta clinicamente. Anticorpos contra a sorovariante Bratislava são frequentemente relatados nos EUA; na Europa, os equinos são hospedeiros de manutenção deste microrganismo. A leptospirose clínica em equinos está
associada a aborto, doença sistêmica em potros e uveíte recidivante.
A leptospirose é responsável pela ocorrência de 2 a 4% de todos os abortamentos de éguas, anualmente, embora períodos de chuva e inundações possam resultar em surtos de abortamentos. Os abortos ocorrem tipicamente 1 a 3 semanas
após doença branda, com as fêmeas exibindo sinais clínicos inespecíficos caracterizados por febre, anorexia, depressão e, em casos raros, icterícia. As lesões em potros abortados não são específicas e muitas vezes é comprometida pela
autólise. Leptospiras podem ser detectadas na placenta e nos órgãos fetais por imunoistoquímica, imunofluorescência, PCR e cultura. As fêmeas que abortaram geralmente possuem alto título de anticorpos contra leptospiras por ocasião do
aborto.
Em  potros,  é  típica  leptospirose  aguda  grave,  inclusive  com  hemólise  e  vasculite  com  hemorragias  petequiais  nas  superfícies  mucosas,  hemoglobinúria,  anemia,  icterícia,  sufusão  conjuntival,  depressão  e  fraqueza.  Há  relato  de
insuficiência renal em potros.
A real participação da leptospirose no desenvolvimento de uveíte recidivante (ver p. 553) parece controversa, embora esta condição possa ser reproduzida experimentalmente em equinos infectados com a sorovariante Pomona. A uveíte
recidivante se desenvolve a qualquer momento a partir de 2 a 8 meses após o início da infecção. As leptospiras foram identificadas no humor aquoso em mais de 50% dos equinos com uveíte recidivante, em vários estudos, mas não foram
detectadas em casos semelhantes por outros pesquisadores. Não está claro se a uveíte se deve à persistência ou à infecção intraocular repetida ou imunomediada. A uveíte é tratada sintomaticamente com intuito de reduzir a inflamação e
prevenir sinéquias, embora em casos crônicos graves, possam ser utilizados antibióticos intraoculares ou vitrectomia.
Equinos infectados com a sorovariante Pomona podem disseminar a bactéria pela urina por 3 a 4 meses após a infecção. Os antibióticos não parecem diminuir significativamente o tempo de disseminação. Na doença aguda, antibióticos
sistêmicos são úteis e os antibióticos também são utilizados para prevenir aborto em éguas que convivem ou são expostas às fêmeas infectadas. Não há vacina contra leptospira para equinos.

Leptospirose em Suínos
As sorovariantes de Leptospira Pomona e Bratislava são as comumente consideradas como causas de leptospirose suína nos EUA; as sorovariantes Grippotyphosa, Icterohaemorrhagiae e Canicola são, ocasionalmente, implicadas. Os suínos
são hospedeiros de manutenção da sorovariante Bratislava. Esta sorovariante pode infectar suínos, mas raramente induzem sinais típicos de leptospirose aguda – preferencialmente, falhas reprodutivas na forma de infertilidade e abortos
esporádicos  são  os  sinais  clínicos  mais  comuns  e  pode  ocorrer  transmissão  venérea.  A  sorovariante  Pomona,  ao  contrário,  tem  patogenicidade  intermediária  aos  suínos,  com  sintomas  agudos  observados  em  suínos  jovens  e  abortos
(geralmente em grupos) em fêmeas. Embora a infecção pela sorovariante Pomona esteja associada à doença aguda, às vezes com sinais clínicos sugestivos de infecção de hospedeiro casual, os suínos permanecem infectados e disseminam a
sorovariante Pomona por semanas a alguns meses após a infecção. Esta característica da infecção por L. Pomona pode estar associada à alta taxa de transmissão suíno­suíno, em animais criados sob confinamento.
Aborto  2  a  4  semanas  antes  da  data  prevista  de  parto  é  a  manifestação  mais  comum  de  leptospirose  em  suínos.  Os  leitões  que  completam  o  período  gestacional  podem  nascer  mortos  ou  fracos  e  morrer  logo  após  o  nascimento.  O
diagnóstico diferencial inclui síndrome reprodutiva e respiratória suína (p. 818), embora brucelose, parvovírus e NMMI (natimortos, mumificação, morte embrionária e infertilidade)  tenham  características  semelhantes  à  leptospirose.  A
leptospirose aguda, como descrita em bezerros, tem sido relatada em leitões, mas é rara. O tratamento e o controle são similares aos mencionados para bovinos.

LISTERIOSE (Listerelose, Doença do andar em círculo)

Listeriose  é  uma  doença  bacteriana  esporádica  que  acomete  grande  variedade  de  animais,  inclusive  pessoas  e  aves.  Sua  distribuição  é  mundial,  sendo  mais  frequente  em  climas  temperados  e  frios.  Há  alta  prevalência  de  portadores
intestinais. Encefalite ou meningoencefalite nos ruminantes adultos é a forma mais diagnosticada.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  Listeria monocytogenes é um pequeno cocobacilo, difteroide, móvel, Gram­positivo, não formador de esporos e extremamente resistente, que cresce a temperaturas de 4 a 44°C. Sua habilidade de crescer a 4°C
é um importante auxílio diagnóstico (método de “enriquecimento pelo frio”) para isolamento desse microrganismo do tecido cerebral, mas não de tecidos placentários ou fetais. O isolamento primário é potencializado sob condições de
microaerofilia. A Listeria é um saprófita comum que vive em ambientes como solo e plantas, sendo isolada em cerca de 42 espécies de mamíferos domésticos e selvagens e 22 espécies de pássaros, assim como de peixes, crustáceos,
insetos, dejetos de esgoto, água, silagem, mecônio, fezes e solo e também em alimentos como leite e queijo.
Os reservatórios naturais de L. monocytogenes parecem ser o solo e o trato gastrintestinal de mamíferos, que contaminam a vegetação. Animais a pasto ingerem o microrganismo e posteriormente contaminam a vegetação e o solo. A
transmissão de animal para animal ocorre pela via fezes­oral.
A listeriose é predominantemente uma doença de inverno­primavera, em ruminantes confinados ou em lotes de engorda. O pH menos ácido da silagem leva à deterioração e multiplicação exagerada de L. monocytogenes. Podem ocorrer
surtos = 10 dias após a alimentação com silagem de má qualidade. A remoção ou substituição da silagem frequentemente contém a disseminação da listeriose. A alimentação dos animais com a mesma silagem, após alguns meses, poderá
resultar no aparecimento de novos casos.
PATOGENIA:  Listeria, ingerida ou inalada, pode causar sepse, aborto e infecção latente. Os microrganismos que penetram nos tecidos têm predileção por parede intestinal, bulbo e placenta, ou causa encefalite através da penetração em
minúsculas feridas da mucosa bucal.
As  várias  manifestações  da  infecção  ocorrem  em  todas  as  espécies  suscetíveis  e  estão  associadas  a  síndromes  clínicas  características,  como  aborto  e  mortalidade  perinatal,  em  todas  as  espécies,  encefalite  ou  meningoencefalite  em
ruminantes adultos, sepse em ruminantes neonatos e animais monogástricos e sepse com necrose de miocárdio e/ou do fígado em aves domésticas (ver p. 2853).
A encefalite causada por Listeria acomete ovinos, bovinos, caprinos e ocasionalmente suínos. Ocorre essencialmente uma infecção localizada no tronco cerebral que progride quando L. monocytogenes ascende ao nervo trigêmeo. Os
sinais  clínicos  variam  de  acordo  com  a  função  dos  neurônios  afetados,  mas  geralmente  são  unilaterais  e  incluem  depressão  (sistema  de  ativação  reticular  ascendente),  fraqueza  ipsilateral  (tratos  longos),  paralisia  do  nervo  facial  e  do
trigêmeo e, esporadicamente, andar em círculos (núcleo vestibular). Os sinais neurológicos indicam déficit bilateral do nervo cranial e são ocasionalmente observados em cordeiros com < 4 meses de idade.
A listeriose septicêmica ou visceral é mais comum em animais monogástricos, como suínos, cães, gatos, coelhos domésticos e selvagens e outros pequenos mamíferos. Esses animais podem participar da transmissão de L. monocytogenes.
Essa forma também é encontrada em ruminantes jovens, antes que o rúmen se torne funcional. Mesmo rara, a sepse já foi relatada em ruminantes domésticos idosos e em cervos. A forma septicêmica afeta outros órgãos além do cérebro,
sendo a principal lesão uma necrose hepática focal.
O útero de todas as fêmeas domésticas, especialmente ruminantes, é suscetível à infecção por L. monocytogenes em todos os estágios da prenhez, podendo resultar em placentite, metrite, infecção e morte fetal, abortos, natimortos, mortes
neonatais e, possivelmente, portadores viáveis. A metrite tem pouco ou nenhum efeito sobre a reprodução subsequente; contudo, a Listeria pode ser eliminada = 1 mês por via vaginal e pelo leite.
As infecções adquiridas via ingestão tendem a se localizar na parede intestinal, resultando em infecção inaparente e prolongada excreção fezes. Postula­se que a silagem contaminada resulte em numerosas infecções latentes, muitas vezes
chegando a 100% do rebanho ou lote exposto; no entanto, a listeriose clínica só ocorre em alguns animais.
ACHADOS CLÍNICOS:  A encefalite é a forma de listeriose identificada mais prontamente em ruminantes. Acomete machos e fêmeas de todas as idades; às vezes tornam­se epidemias em bovinos ou ovinos em lotes de engorda. O curso da
doença em ovinos e caprinos é rápido e a morte pode ocorrer entre 24 e 48 h após o início dos sinais clínicos. A taxa de recuperação pode ser de até 30% quando é instituída uma terapia imediata e agressiva. Em bovinos, o curso da doença
é menos agudo e a taxa de recuperação é de aproximadamente 50%. As lesões são localizadas no tronco cerebral e os sinais indicam disfunções do terceiro ao sétimo pares de nervos cranianos.
Inicialmente, os animais afetados ficam anoréxicos, deprimidos e desorientados. Tendem a se agrupar nos cantos, se apoiar em objetos parados ou andar em círculos no sentido do lado afetado. Ocorre paralisia facial com queda da orelha
e desvio do focinho, lábios flácidos, ptose palpebral do lado afetado, assim como diminuição da resposta à ameaça e uma profusa e quase contínua sialorreia; o alimento geralmente permanece impactado antes da deglutição devido à
paralisia dos músculos mastigatórios. Os animais em estado terminal caem e não são capazes de se levantar, permanecem deitados do mesmo lado sendo comum realizarem movimentação involuntária de corrida.
A encefalite por listeria pode ocorrer nas mesmas instalações nos anos seguintes. O número de animais clinicamente envolvidos em um surto é geralmente < 2%, mas em circunstâncias excepcionais pode variar entre 10 e 30% em um
rebanho de ovinos.
O aborto provocado por listeria geralmente ocorre no último trimestre de gestação, sem sinais premonitórios. Os fetos geralmente morrem dentro do útero, podendo haver natimortos e mortes neonatais. A taxa de abortos é variável e
chega a 20% em rebanhos de ovinos. É rara a sepse fatal materna secundária à metrite. Encefalite e aborto geralmente não ocorrem simultaneamente no mesmo rebanho. No entanto, no Reino Unido estão ocorrendo alterações dos padrões
clínicos em ovinos, ou seja, aumento no número de abortos, encefalites e diarreias. Além disso, surtos de aborto e encefalite acontecem concomitantemente no mesmo rebanho.
A listeriose é rara em suínos, ocorrendo sepse em animais com < 1ano de idade, enquanto encefalite acomete suínos idosos. A doença tem curso rápido e fatal, que dura 3 a 4 dias.
Lesões: Na encefalite por listeria há poucas lesões macroscópicas, exceto algum grau de congestão das meninges. As lesões microscópicas se limitam principalmente na ponte, bulbo e medula espinal anterior.
Na  listeriose  septicêmica  podem  ser  verificados  pequenos  focos  necróticos  em  qualquer  órgão,  especialmente  no  fígado.  Nos  bezerros  que  morrem  com  <  3  semanas  de  idade,  além  da  necrose  hepática  focal,  ocorrem  gastrenterites
hemorrágicas focais.
Nos fetos abortados ocorrem sinais discretos a marcantes de autólise, fluido claro a sanguinolento nas cavidades serosas e focos pequenos e numerosos de necrose no fígado, especialmente em sua porção direita. Focos de necrose também
podem ser verificados em outras vísceras, como pulmão e baço. Erosões rasas de 1 a 3 mm podem ser notadas na mucosa do abomaso. Alterações autolíticas podem mascarar essas lesões. Esfregaços do conteúdo do abomaso, corados com
Gram, revelam numerosos cocobacilos pleomórficos Gram­positivos.
DIAGNÓSTICO:  Amostras de fluido cerebroespinal (FCE) podem ser colhidas na região lombossacra, após anestesia local. Na listeriose, verifica­se aumento da concentração de proteína no fluido cerebroespinal (FCE) (0,6 a 2 g/l; [o normal
é 0,3 g/l]) e discreta pleocitose com predomínio de células mononucleares.
A listeriose só é confirmada com isolamento e identificação de L. monocytogenes. As amostras de escolha são: cérebro dos animais com comprometimento do SNC, placenta e fetos oriundos de abortos. Se há falhas na tentativa de
isolamento primário deve­se manter o tecido cerebral triturado a 4°C, por várias semanas, e fazer nova cultura depois de 1 semana. Ocasionalmente, L. monocytogenes é  isolada  de  fluido  espinal,  secreção  nasal,  urina,  fezes  e  leite  de
ruminantes clinicamente enfermos. A sorologia não é utilizada para diagnóstico de rotina, pois muitos animais saudáveis apresentam altos títulos para Listeria. A imunofluorescência é efetiva na identificação rápida de L. monocytogenes em
esfregaços obtidos de animais mortos ou abortados em decorrência de listeriose, e do leite, carne e outras fontes.
A listeriose pode ser diferenciada da toxemia da prenhez em ovelhas (p. 1093) ou da cetose bovina (p. 1075) por meio de exame clínico cuidadoso, alterações no FCE e na concentração de 3­OH butirato bem abaixo de 3 mmol/l. Além
disso, paralisias facial e auricular estão ausentes na toxemia da prenhez ou na cetose. Em bovinos, os sinais unilaterais de paralisia dos nervos trigêmeo e facial auxiliam na diferenciação entre listeriose e encefalopatia espongiforme (p.
1390), encefalite tromboembólica (p. 769), polioencefalomalacia (p. 1383), encefalomielite bovina esporádica (p. 1386) e intoxicação por chumbo (p. 3114). A raiva (p. 1422) sempre deve ser considerada no diagnóstico diferencial de
listeriose. Os animais com abscessos cerebrais e cenurose (p. 1398) apresentam andar em círculos, cegueira contralateral e déficit proprioceptivo, mas não apresentam déficits do nervo craniano. A doença vestibular é comum em ruminantes
em crescimento; estes animais apresentam, tipicamente, nistagmo ipsilateral espontâneo ou estrabismo e permanecem vivos e alertas sem disfunção do nervo trigêmeo.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A recuperação depende do início e da agressividade do tratamento antibiótico. Caso os sinais e a encefalite sejam graves, geralmente o animal morre, mesmo com o tratamento. A L. monocytogenes é suscetível
à penicilina (droga de escolha), ceftiofur, eritromicina e trimetoprima­sulfonamida. Altas doses são necessárias em razão da dificuldade em obter concentrações bactericidas mínimas no cérebro.
Deve­se administrar 44.000 U de penicilina G/kg de peso corporal, IM, diariamente, durante 1 a 2 semanas; a primeira injeção deve ser seguida de mesma dose IV. A terapia de suporte, inclusive fluidos e eletrólitos, é necessária para
animais com dificuldade de se alimentar e ingerir líquidos. Alta dose de dexametasona (1 mg/kg IV) por ocasião da primeira consulta é considerada benéfica por alguns, mas há controvérsia.
Os resultados da vacinação são questionáveis e juntamente com a natureza esporádica da doença leva a considerações sobre o custo­benefício da vacinação. Nos surtos, os animais infectados devem ser separados do rebanho. Caso a
silagem seja a alimentação oferecida, o fornecimento de um determinado tipo de silagem deve ser interrompido com base em triagem. Silagem deteriorada deve ser evitada. A silagem de milho antes de muito madura e a silagem de capim,
que contêm aditivos, provavelmente têm pH mais ácido, o que inibe a multiplicação de L. monocytogenes.
RISCO ZOONÓTICO:  Pode­se questionar se os animais atuam como reservatórios da infecção para o homem, já que Listeria foi isolada de fezes de várias pessoas aparentemente saudáveis, bem como de outros animais. No entanto, apesar
disso  e  do  caráter  invasivo  aparentemente  baixo  de  L.  monocytogenes,  deve­se  manipular  com  cuidado  todo  material  suspeito.  Os  fetos  abortados  e  a  necropsia  dos  animais  septicêmicos  representam  um  grande  risco.  Nos  casos  de
encefalite, L. monocytogenes geralmente se limita ao cérebro e representa um risco menor de transmissão, a menos que se remova o cérebro. Há relato de pessoas que desenvolveram meningite fatal, sepse e exantema papular nos braços
após a manipulação de material abortado. Devem­se proteger as fêmeas prenhes (inclusive mulheres) contra a infecção, devido ao risco ao feto, com possibilidade de aborto, natimortos e infecção de neonatos. Ainda que a listeriose seja rara
em pessoas (estimativa anual de 12 casos/1 milhão de habitantes); a taxa de mortalidade pode chegar a 50%. A maioria dos casos envolve pacientes idosos, mulheres grávidas e pessoas imunocomprometidas.
Pode­se isolar Listeria monocytogenes do leite de vacas com mastite, vacas que abortaram e daquelas aparentemente normais. A excreção no leite geralmente é intermitente, mas pode persistir por vários meses. O leite contaminado é um
risco, pois o microrganismo sobrevive a algumas formas de pasteurização. Também se tem isolado Listeria do leite de ovelhas, cabras e mulheres.

MELIOIDOSE (Pseudomormo, Doença de Whitmore)

É uma infecção bacteriana que acomete pessoas e animais. Está geralmente associada a lesões caseosas ou supurativas, que compreende uma resposta mista purulenta e granulomatosa, capaz de afetar qualquer órgão do corpo.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O agente etiológico é Burkholderia pseudomallei, um bacilo oval, móvel, Gram­negativo, anaeróbio facultativo com coloração bipolar. Os microrganismos estão disseminados por todo o Sudeste Asiático,
norte  da  Austrália  e  sul  do  Pacífico.  Sua  distribuição  é  predominantemente  tropical  ou  subtropical  com  “hiperendemicidade”  na  extremidade  superior  do  território  norte  da  Austrália  e  nordeste  da  Tailândia.  Os  limites  reais  de  sua
endemicidade  são  ambíguos,  tendo  em  vista  o  movimento  do  microrganismo  e  sua  habilidade  para  se  deslocar  e  existir  em  regiões  temperadas  (sudeste  da  Austrália  e  França),  onde  pode  causar  doença  esporádica  e  surtos.  B.
pseudomallei foi introduzida em um novo ambiente com a exportação de animais e a remessa de solo e água contaminados tem potencial para provocar os mesmos resultados. Relatos de possíveis casos autóctones de melioidiose vieram da
Índia, Ilhas do Pacífico, Américas do Sul e Central, Caribe, África e Oriente Médio.
B. pseudomallei é  um  saprófita  disseminado  e  foi  isolado  de  muitos  tipos  de  solo  e  águas  de  superfície  de  várias  profundidades.  Surtos  de  melioidose  coincidem  com  períodos  de  chuva  e  inundações  associados  a  alta  umidade  ou
temperatura. Grandes escavações bem como problemas em encanamentos que resultaram em contaminação de suprimentos de água provocaram surtos.
A  melioidose  é  diagnosticada  mais  comumente  em  ovinos,  caprinos,  suínos,  bovinos,  equinos,  veados,  camelos,  alpaca,  cães,  gatos,  golfinhos,  cangurus,  coalas,  primatas,  pássaros,  peixes  tropicais,  répteis  e  pessoas.  Os  animais  de
laboratório  afetados  pela  doença  incluem  hamsters,  porquinhos­da–índia,  coelhos,  camundongos  e  ratos.  A  suscetibilidade  dos  hospedeiros  e  as  manifestações  da  doença  são  variáveis  entre  as  espécies.  A  introdução  de  animais  sem
imunidade nos rebanhos de regiões endêmicas os predispõe à doença, como se nota em ovinos, caprinos, suínos e camelídeos. Outras espécies (p. ex., cães e gatos) podem sucumbir à infecção devido às condições de imunossupressão.
TRANSMISSÃO:  Acredita­se que a infecção seja oportunista e primária e resulta da transmissão do ambiente ao animal e não de animal para animal. As vias mais comuns de infecção são inoculação percutânea, contaminação de feridas,
ingestão do solo, carcaças contaminadas ou inalação. A infecção transplacentária resultando em aborto foi relatada em caprinos. A transmissão sexual e outros tipos de transmissão hospedeiro a hospedeiro são possíveis, mas não foram
descritas. Foram relatadas infecções laboratoriais e iatrogênicas por meio de antissépticos, injeções ou outros equipamentos hospitalares ou cirúrgicos contaminados.
PATOGENIA:  A virulência de B. pseudomallei parece apresentar muitas variações, mas os fatores de virulência não são bem compreendidos. Clones originários de surtos são produzidos em diferentes graus de manifestações clínicas, o que
indica que os fatores do hospedeiro e a dose infectante podem ser igualmente importantes na determinação da gravidade da doença. B. pseudomallei é um patógeno intracelular facultativo que pode permanecer latente por muitos anos antes
de emergir como infecção ativa.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais podem ser bastante diversificados entre as espécies, dependendo do local da infecção e variação entre crônica e aguda. A infecção subclínica é comum. A infecção pode estar associada a nódulos e abscessos
isolados  ou  múltiplos,  supurativos  ou  caseosos,  que  podem  estar  localizados  em  qualquer  tecido  orgânico  com  efeitos  variáveis.  A  doença  provavelmente  origina­se  da  inoculação  percutânea  que  geralmente  se  desenvolve  em  locais
distantes sem evidências de infecção ativa no local da inoculação. Em sua maioria, os órgãos comumente afetados são pulmões, baço, fígado e linfonodos associados.
As cabras geralmente desenvolvem mastite, sendo um achado comum o aneurisma de aorta. O sistema respiratório é preferencialmente envolvido em ovinos; os sintomas podem incluir febre, tosse intensa, angústia respiratória e secreção
nasal mucopurulenta e ocular. A doença do SNC inclui andar em círculos, incoordenação, cegueira, nistagmo e espasmos e pode ser observada em bovinos, equinos, ovinos e caprinos. Os suínos são geralmente assintomáticos, ocorrendo
lesões no baço, que são achados acidentais de abatedouro. A claudicação por artrite séptica e osteomielite pode ocorrer. Em geral, ocorrem fatalidades em associação com infecção aguda fulminante ou quando os órgãos vitais são afetados.
Várias formas de meliodiose são relatadas em equinos os sinais incluem fraqueza, edema e linfangite nos membros, cólica leve, diarreia, tosse ou secreção nasal. Infecções de pele podem, inicialmente, se assemelhar a eczema fúngico,
progredir e se tornar papular. Em cães, a doença pode ser aguda, subaguda ou crônica. Em casos agudos, sepse com febre, diarreia intensa e pneumonia fulminante são comuns. Casos subagudos podem estar presentes como lesões cutâneas
com linfangite e linfadenite, casos não tratados podem progredir para sepse. Casos crônicos podem ocorrer em qualquer órgão com sinais clínicos que incluem anorexia, mialgia, edema de membros e abscesso de pele.
Lesões: Múltiplos  abscessos  com  material  denso,  caseoso  branco  a  amarelo  são  observados  na  necropsia.  Os  órgãos  comumente  envolvidos  são  pulmões,  baço,  linfonodos,  fígado  e  tecido  subcutâneo.  A  broncopneumonia  exsudativa,
consolidação  e  abscessos  podem  ser  verificados  nos  pulmões  dos  animais  com  doença  respiratória.  Nódulos  e  úlceras  podem  ser  verificados  na  mucosa  nasal  e  septo  e  nos  cornetos,  estes  podem  coalescer  em  placas  irregulares.
Meningoencefalite, enterite grave, poliartrite supurativa e outras síndromes também foram relatadas.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos de melioidose têm valor diagnosticado devido à natureza multiforme da doença. Para o diagnóstico definitivo é necessário isolamento e identificação do microrganismo. O agente pode ser isolado de lesões
e secreções. É rapidamente cultivado nos meios diagnósticos de rotina e têm uma forma de colônia e odor característicos (especialmente em meio Ashdown). Esfregaços de exsudatos ou pus corados pelo Gram às vezes permitem identificar
bastonetes Gram­negativos bipolares em forma de “alfinete”. Os testes sorológicos, como fixação de complemento e hemaglutinação indireta, são efetivos como ferramentas de vigilância do rebanho. Mais recentemente, sondas de ácido
desoxirribonucleico (DNA) e testes de PCR foram desenvolvidos.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO:  O tratamento pode ser caro, prolongado e geralmente não obtém sucesso, e com o risco de recrudescência se descontinuado. A possibilidade de condições de imunossupressão subjacentes deve ser investigada
em espécies menos suscetíveis. Os regimes de tratamento que utilizam diretrizes para melioidose humana incluem inicialmente uma terapia inicial intensiva com betalactâmicos (ceftazidima e carbapenens), possivelmente em combinação
com cotrimoxazol por até 2 meses. Isso pode ser seguido de erradicação subsequente de terapia de no mínimo 3 meses com altas doses de cotrimoxazol ou combinação de terapia convencional com cloranfenicol, cotrimoxazol e doxiciclina
ou amoxicilina/clavulanato. As medidas de prevenção são mais práticas e econômicas nas fazendas de criação intensiva e no ambiente, envolvendo elevação dos animais acima do solo e provisão da água de bebida limpa por meio de
cloração ou filtração. A minimização da contaminação ambiental por parte de animais enfermos também é considerada uma importante medida de controle. Não há vacina efetiva.
RISCO ZOONÓTICO:  A melioidose tem potencial zoonótico. A mastite em cabras é uma manifestação comum e B. pseudomallei foi isolada do leite, resultando na necessidade de pasteurização do leite de cabra comercializado nos trópicos.
A carcaça de animais infectados deve ser condenada no abatedouro.

NEOSPOROSE

Neospora caninum é um protozoário microscópico com distribuição cosmopolita. Muitos animais domésticos (p. ex., cães, bovinos, ovinos, caprinos, equinos e aves) e selvagens (veado, roedores, coelhos, coiotes, lobos e raposas) podem
ser infectados. A neosporose é um dos casos mais comuns de aborto em bovinos, especialmente em fazendas com criação intensiva. O aborto pode ocorrer também em ovinos, caprinos, búfalos da água e camelídeos da América do Sul,
embora eles sejam menos suscetíveis que os bovinos.
Uma outra espécie de Neospora, N. hughesi, causa mielite em equinos e compartilha características clínicas com a mielite equina protozoária que, na América do Norte e do Sul, geralmente é causada por Sarcocystis neurona.  O  ciclo
biológico de N. hughesi é desconhecido. A discussão neste capítulo foca somente a infecção por N. caninum.
EPIDEMIOLOGIA:  A neosporose em rebanhos bovinos manifesta­se tanto como aborto endêmico quanto epidêmico, mas é possível que um rebanho tenha alta prevalência da doença sem ocorrência de aborto. Tanto o padrão de transmissão
endêmico quanto o epidêmico em bovinos está associado à presença de cães na fazenda. O aborto endêmico está relacionado principalmente com transmissão transplacentária endógena, embora a transmissão ocasional de cães ou outros
canídeos possa responder pelo problema. O aborto epidêmico é uma possível consequência de uma transmissão súbita em larga escala em vacas prenhes, presumivelmente pela ingestão de uma mistura de ração ou água contaminada com
fezes de cães infectados. O uso de ração misturada em rebanhos leiteiros provavelmente contribui para a maior prevalência de neosporose em bovinos leiteiros do que em bovinos de corte criados extensivamente a pasto.
TRANSMISSÃO:  Os cães são os hospedeiros definitivos de N. caninum e são capazes de excretar oocistos nas fezes após ingerir tecidos de animais infectados. Os canídeos selvagens também são suspeitos e os coiotes são confirmados como
hospedeiros definitivos. Neospora oocysts tem uma camada impermeável que permite sua sobrevivência no solo e na água por longos períodos após a decomposição das fezes dos caninos. Os hospedeiros intermediários, como o gado,
infectam­se pela ingestão de oocistos. Os bovinos não produzem oocistos e, desta forma, não há transmissão horizontal da infecção horizontal para outros bovinos, mas a infecção latente perdura permanentemente em seus tecidos e são
transmitidos aos canídeos pela ingestão de carne contaminada.
Nos bovinos, a transmissão de N. caninum pode ser transplacentária, de uma vaca infectada para o feto em desenvolvimento, um evento que pode ocorrer em múltiplas gestações da mesma vaca. Como a maioria das infecções congênitas
é subclínica, bezerras com infecção congênita podem permanecer no plantel e causar infecções transplacentárias para sua própria prole. Esta transmissão transplacentária endógena permite a manutenção do parasito às próximas gerações
mesmo que o rebanho não tenha contato frequente com cães. Pode ocorrer transmissão transplacentária exógena quando uma vaca não infectada ingere oocistos de Neospora durante a gestação e o feto torna­se infectado.
Os cães se infectam ao consumir produtos de bovinos infectados (inclusive placenta) e os veados são, presumivelmente, infectados ao consumir dieta à base de carne crua, frangos criados perto do curral e uma variedade de animais
selvagens.
ACHADOS CLÍNICOS:  O  aborto  pode  ocorrer  durante  toda  a  gestação.  A  inflamação  não  supurativa  é  a  principal  lesão  em  tecidos  fetais  abortados.  Bezerros  infectados  congenitamente  podem  nascer  fracos  ou  com  déficit  neurológico.
Entretanto, muitas infecções congênitas são subclínicas.
Nos  cães  normalmente  ocorrem  infecções  subclínicas,  embora  existam  várias  exceções.  Ninhadas  ou  filhotes  individuais  podem  desenvolver  paresia  progressiva  de  membros  pélvicos  associada  à  polirradiculoneurite,  miosite  e  atrofia
muscular. Cães adultos podem apresentar encefalomielite, nódulos focais ou úlceras cutâneas, pneumonia, peritonite ou miocardite.
DIAGNÓSTICO DE ABORTO BOVINO:  Como a neosporose é apenas uma das muitas causas de aborto, o diagnóstico deve focar as possíveis etiologias. O feto abortado deve ser enviado ao laboratório de diagnóstico veterinário, juntamente
com a placenta e uma amostra de soro da fêmea que abortou. A análise de múltiplos fetos aumenta as chances de diagnóstico acurado. Se for impraticável o envio de todo o feto, remeta parte das seguintes amostras para melhor definir a
causa  de  aborto:  coleta  asséptica  de  pulmão,  fígado,  baço  e  fluido  abomasal;  um  globo  ocular  para  o  teste  do  nitrato,  amostras  de  cérebro  fixada  em  formalina  (mesmo  se  mole),  pulmões,  timo,  rins,  baço,  glândula  adrenal,  músculo
esquelético (p. ex., língua e diafragma) e cotilédones placentários; soro da fêmea que abortou e fluido toracoabdominal do feto para sorologia.
O diagnóstico do aborto por neosporose pode ser feito com boa confiabilidade com base nos seguintes achados: 1) Ausência de outros agentes etiológicos; 2) Inflamação não supurativa em múltiplos órgãos fetais, especialmente cérebro,
coração e músculo esquelético; 3) Imunoistoquímica ou detecção do Neospora em tecidos fetais por meio de PCR; e 4) Soropositividade para Neospora da fêmea e do feto. Entretanto, tais informações nem sempre estão disponíveis. Uma
lesão muito específica de aborto por neosporose em vacas é a necrose multifocal cerebral circundada por reação leucocitária não supurativa. A confiabilidade no diagnóstico aumenta com a constatação de alto teor de anticorpos na fêmea
que abortou; forte reação soropositiva no momento do aborto tem bom valor preditivo em relação às reações de baixa soropositividade. Geralmente exclui­se a possibilidade de neosporose em fêmeas soronegativas.
A toxoplasmose, comum em ovinos, mas rara ou inexistente em bovinos, causa aborto com lesões fetais idênticas.
O teste sorológico de várias vacas ou novilhas pode ser utilizado como alternativa ou como método complementar para diagnosticar neosporose na maioria dos rebanhos com problemas reprodutivos. Esta estratégia pode auxiliar quando
os rebanhos são investigados por problemas de aborto. Amostras de soro devem ser colhidas de fêmeas que abortaram e de número igual de fêmeas com gestação normal (geralmente 10 ou mais por grupo). O soro deve ser testado e
classificado para anticorpos contra Neospora. Se muitas vacas no grupo abortado são soropositivas e no grupo normal poucas são soropositivas, deve­se suspeitar de neosporose como causa de aborto no rebanho; isto deve ser confirmado
por comparação estatística. Se muitas vacas que abortaram são soronegativas, então neosporose não é o principal problema.
DIAGNÓSTICO DA NEOSPOROSE CANINA:  Cães afetados clinicamente, em geral têm teor de anticorpos contra Neospora muito mais alto que aquele verificado em infecções subclínicas individuais. A biopsia de tecidos clinicamente afetados
mostra inflamação não supurativa e deve revelar a presença do protozoário, mas deve­se realizar imunoistoquímica ou PCR para detectar o microrganismo ou para diferenciá­lo de outros protozoários.
Cães  com  neosporose  sintomática  geralmente  não  disseminam  oocistos  pelas  fezes.  Os  cães  disseminam  oocistos  somente  por  períodos  de  dias  ou  semanas  após  ingestão  de  tecido  de  um  animal  infectado;  por  isso  a  presença
de Neospora no exame de fezes por flutuação é ocasional. Os pequenos oocistos são redondos ou ligeiramente ovalados e têm 10 a 11 mícrons de diâmetro. Um contorno externo liso auxilia na diferenciação de grãos de pólen de mesmo
tamanho. Os oocistos de Neospora são praticamente idênticos aos oocistos de Hammondia heydorni, um parasito intimamente relacionado e que não está associado a enfermidades sistêmicas em cães ou com abortos em ruminantes. PCR
pode ser necessária para distinguir entre os oocistos de Neospora e de H. heydorni.
TRATAMENTO:  Não há tratamento aprovado para neosporose em bovinos. A neosporose clínica em cães é tratada mediante administração prolongada de clindamicina ou de sulfas. O prognóstico é negativamente associado à gravidade da
apresentação dos sinais clínicos e com a falha do tratamento. O prognóstico é reservado em filhotes, se a doença é progressiva, com paresia de membros pélvicos, atrofia e membros rígidos.
CONTROLE:  O grau de eficácia da eliminação de N. caninum pela vacina em bovinos, comercialmente disponível nos EUA desde 1998, não é claro. Atualmente, não há outras vacinas disponíveis contra Neospora.
A maioria dos rebanhos de leite e de corte tem uma pequena porcentagem de bovinos infectados por Neospora. Embora a redução do risco de transmissão de Neospora seja um objetivo apropriado, a completa erradicação em um rebanho
é impraticável. A contaminação dos alimentos misturados às rações por fezes caninas deve ser evitada. Grandes laticínios podem considerar a colocação de cercas a prova de entrada de cães ao redor da área onde os alimentos são estocados
e portões automáticos podem ser instalados para facilitar o tráfico cotidiano do maquinário pesado. Fazendas menores podem proteger os alimentos em construções tradicionais como celeiros e silos.
Além da proteção dos alimentos, rebanhos com abortos por neosporose endêmica devem considerar não manter novilhas que nasceram de vacas soropositivas, assim reduzem o número de infecções congênitas em novilhas que entram no
rebanho. Se esta técnica for utilizada em vacas soropositivas, estas podem ser criadas por sêmen bovino. Para vacas soropositivas com genética apurada, o uso de transferência de embriões para substitutas soronegativas, é uma técnica que
bloqueia a transmissão endógena e deve ser considerada.
Animais mortos, miúdos de abatedouro e placentas devem ser descartados de forma a prevenir o acesso de cães a este material para reduzir o risco de mais cães infectados e de disseminação de oocistos de Neospora nas fazendas. Os cães
soropositivos para Neospora têm pouca probabilidade de disseminação de oocistos, comparados com cães soronegativos; portanto, os testes sorológicos em cães de fazenda raramente são úteis.
RISCO ZOONÓTICO:  Apesar da semelhança com a infecção por Toxoplasma, a infecção por Neospora não está claramente associada à doença em pessoas. Os profissionais de laboratório devem se proteger de inoculações, o que causou
lesões fatais em primatas inoculados por via parenteral.

NOCARDIOSE

A nocardiose é uma enfermidade crônica, não contagiosa, piogranulomatosa, não supurativa e refratária à terapia antimicrobiana convencional. Nocardia ssp são bactérias pleomórficas, Gram­positivas, aeróbias estritas e intracelulares
facultativas. Estes microrganismos são parcialmente ácido­resistentes e na coloração de Gram apresentam­se como bastonetes, cocos, cocobacilos ou forma longa característica ou filamentos ramificados e hifas finas.
ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA E PATOGENIA:  Recentemente, o gênero Nocardia foi reclassificado com base nas propriedades bioquímicas, suscetibilidade antimicrobiana e métodos moleculares (sequência do gene RNA 16S). Mais de 70
espécies de Nocardia são atualmente identificadas. Destas, > 25 foram reconhecidas como causa de infecção humana e > 30 são responsáveis por doenças em animais. A espécie patogênica mais importante para pessoas e animais são as do
complexo N. asteroides, N. brasiliensis, N. pseudobrasiliensis, N. otitidiscaviarum e N. transvalesis. O complexo N. asteroides incluem tipos I­VI. O tipo III é denominado N. nova e o tipo V é N. farcinica.
Embora a nocardiose seja considerada incomum nos animais e nas pessoas, a doença foi relatada em todo o mundo. Nocardia são organismos onipresentes e saprófitas do solo. São comumente verificados no solo, material orgânico, água,
vegetais em decomposição e outras fontes ambientais.
Nocardia spp. é considerada um agente causador de mastite ambiental em vacas e fêmeas de pequenos ruminantes. N. asteroides, N. nova, N. otitidiscaviarum e N. farcinica são as espécies mais comumente identificadas nas infecções
mamárias. A mastite por nocardia geralmente é observada em rebanhos leiteiros submetidos a manejo inadequado e/ou a condições higiênicas inadequadas antes e depois da ordenha. As infecções mamárias são predominantemente causadas
por contaminação de tetos, úbere e equipamento de ordenha por contato com o solo durante os procedimentos de lavagem e infusão intramamária. Os rebanhos bovinos acometidos por mastite por nocardia geralmente têm histórico de uso
de concentração inadequada de antisséptico nos tetos.
Em animais de companhia as espécies comumente encontradas são N. asteroides, N. brasiliensis, N. otitidiscaviarum e N. nova. A transmissão da doença em cães e gatos está relacionada com a inoculação do microrganismo em feridas
perfurantes ou corpos estranhos e secundariamente a mordidas ou arranhões de gatos após brigas. Esporadicamente, a nocardiose canina está relacionada com a inalação da bactéria. A ocorrência da doença em cães e gatos está associada a
condições de imunossupressão, particularmente em cães infectados pelo vírus da cinomose e gatos infectados pelo vírus da leucemia ou da imunodeficiência. A nocardiose canina afeta igualmente machos e fêmeas e acomete principalmente
animais de 1 a 2 anos de idade.
A patogenicidade de Nocardia em animais domésticos está relacionada com a virulência das cepas, estrutura da parede celular, hospedeiro suscetível, via de transmissão, infecção concomitante à doença imunossupressora e indução de
lesões piogranulomatosas. A resposta imune contra infecções por nocardia é principalmente mediada por células. Estes organismos intracelulares são capazes de inibir a fusão lisossomo­fagossomo em neutrófilos e macrófagos devido à
presença de ácidos micólicos na parede celular bacteriana e são resistentes ao ácido, enzimas oxidativas (catalase e superoxidase) e outros mecanismos enzimáticos das células fagocitárias.
ACHADOS CLÍNICOS:  Mastite bovina, abscessos subcutâneos­cutâneos e pneumonia em animais de companhia são as manifestações clínicas mais comuns de nocardiose.
A mastite por nocardia geralmente é caracterizada por histórico de evolução crônica. Classicamente, os casos clínicos de infecção mamária são observados em 1 ou 2 animais do rebanho durante a lactação ou no período seco. O exame
clínico  do  úbere  mostra  aumento,  edema,  fibrose  e,  ocasionalmente,  drenagem  de  fluido.  O  teste  da  caneca  revela  secreção  láctea  serosa  a  purulenta  com  partículas  brancas  a  amareladas  (“grânulos  de  enxofre”).  Animais  infectados
apresentam alta contagem de células somáticas. Ocasionalmente, o microrganismo pode se disseminar da glândula mamária para outros órgãos, causando linfadenite regional e lesões piogranulomatosas.
Em animais de companhia, a nocardiose pulmonar é caracterizada por secreção oculonasal mucopurulenta, anorexia, hipertermia, perda de peso, tosse, dispneia e hemoptise. Os abscessos cutâneos­subcutâneos, micetomas e linfadenite
regional são frequentes nas nocardioses associadas a lesões de pele em cães, particularmente em animais coinfectados por vírus da cinomose. Outras formas sistêmicas ou disseminadas da doença em cães e gatos são representadas por
desenvolvimento  de  abscessos  nos  rins,  fígado,  baço  e  linfonodos  abdominais,  bem  como  peritonite,  pleurite  e  piotorax.  Infecções  grastrointestinais  podem  ocasionar  gengivite,  ulceração  da  cavidade  bucal  e  halitose.  O  organismo  é
raramente observado no sistema nervoso central, trato urinário, coração, ossos e articulações. Os sinais clínicos de nocardiose felina são semelhantes aos descritos para os cães. Abscessos cutâneos­subcutâneos e micetomas são as formas
clínicas mais comuns de nocardiose felina.
Infecções bucais secundárias, em bovinos e equinos, devido ao consumo de alimento fibroso podem levar ao desenvolvimento de lesões piogranulomatosas na mandíbula. N. otitidiscaviarum foi identificada em equinos com pleurite e
pneumonia.  Aborto  por  nocardia  pode  ser  notado  em  suínos  e  equinos.  Linfadenite  submandibular  e  mesentérica  foi  observada  em  suínos.  O  farcino  bovino  ocasionado  pela  N.  farcinica  é  uma  causa  incomum  de  linfangite  crônica,
linfadenite e nódulos cutâneos.
A nocardiose em animais selvagens e peixes é geralmente representada pelo desenvolvimento de abscessos nos órgãos e pneumonia.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico de rotina se baseia nos achados clínicos e epidemiológicos e nos exames microbiológicos. As amostras de abscessos, pele, lavado traqueobrônquico, leite, órgãos ou outros tecidos devem ser cultivadas em
ágar­sangue ou ágar Sabouraud e incubadas em aerobiose por 3 a 7 dias, em temperatura de 37°C e 25°C, respectivamente. As colônias são circulares, convexas, lisas ou rugosas, firmemente aderidas à superfície do ágar com vários
pigmentos (creme, branco, alaranjado ou vermelho) e com a presença de hifas finas, de pó característico e superfície seca, semelhante a fungos. A confirmação do diagnóstico depende da caracterização bioquímica baseada na hidrólise de
diferentes substratos (caseína, xantina, hipoxantina, tirosina) e assimilação de carboidratos (glicose, glicerol, galactose, glicosamina, inositol, adonitol, trealose). Mais recentemente, o diagnóstico é confirmado por identificação molecular
por meio de sequenciamento do gene RNA 16S.
Microscopicamente, os organismos são Gram­positivos e filamentosos, com tendência à fragmentação. A coloração de Ziehl­Neelsen modificada mostra microrganismos parcialmente ácido­resistentes. A aspiração com agulha fina é
utilizada no diagnóstico de nocardiose cutânea em cães e gatos. As colorações de Gram, Giemsa e Panótico mostram organismos filamentosos no material aspirado por biopsia. O leucograma geralmente indica leucocitose com neutrofilia e
monocitose; o eritrograma revela anemia moderada.
As imagens radiográficas das lesões nos cães e gatos com nocardiose pulmonar revelam inflamação difusa, nódulos, abscessos e consolidação lobar. Os achados patológicos de nocardiose são caracterizados por lesões piogranulomatosas,
necrose  supurativa  e  abscessos  em  vários  órgãos  e  tecidos.  No  exame  histológico  notam­se  centros  necróticos  e  supurativos  com  microrganismos  envoltos  por  macrófagos,  linfócitos  e  plasmócitos.  Microcolônias  do  organismo,
denominadas “grânulos de enxofre”, podem ser observadas no exame histológico.
O diagnóstico diferencial em cães e gatos deve incluir a infecção pelo gênero Actinomyces devido  à  similaridade  da  aparência  microbiológica  e  dos  sinais  clínicos.  O  diagnóstico  diferencial  de  aumento  de  face  e  da  mandíbula,  em
bovinos e equinos, causado por nocardiose bucal deve incluir infecção por Actinomyces bovis (actinomicose), Actinobacillus lignieresii (actinobacilose) e Staphylococcus aureus (botriomicose).
TRATAMENTO:  A  nocardiose  é,  geralmente,  refratária  à  terapia  antimicrobiana  convencional  devido  sua  localização  intracelular,  ao  desenvolvimento  de  lesões  piogranulomatosas  e  aos  padrões  de  resistência.  Sulfonamida­trimetropin,
amicacina, linezolida e betalactâmicos (cefotaxima, imipeném, ceftriaxona) são consideradas drogas de escolha para tratamento de pessoas e animais. Entretanto, o sucesso da terapia antimicrobiana ocorre em somente 30 a 50% dos casos
de mastite em vacas e cabras e de infecções pulmonares e extrapulmonares (disseminadas ou sistêmicas) em animais de companhia. A terapia de longa duração é necessária (1 a 6 meses, em muitos animais; 6­12 meses, em pessoas).
Recidivas podem ocorrer quando se utiliza protocolo de curta duração. Infusões intramamárias de sulfonamida­trimetropin, cefalosporinas ou aminoglicosídios podem ser utilizadas por 5 a 7 dias, no tratamento de mastite clínica, em vacas
e cabras. Em animais de companhia indicam­se procedimentos cirúrgicos (desbridação, drenagem, retirada de corpos estranhos e lavagem de lesões com soluções antissépticas) nas lesões cutâneas­subcutâneas e na osteomielite.
CONTROLE  E  PREVENÇÃO:   Não  há  medidas  específicas  ou  efetivas  no  controle  de  nocardiose  devido  à  ampla  distribuição  do  microrganismo  no  ambiente.  Em  animais  de  companhia,  patógenos  imunossupressores  ou  condições
debilitantes devem ser investigadas como fatores predispondentes ao desenvolvimento da nocardiose. Controle e prevenção de mastite por nocardia se baseiam em medidas indicadas para microrganismos ambientais. Assim, o diagnóstico
precoce de mastite, a adoção de medidas higiênicas adequadas e limpeza apropriada do ambiente durante a ordenha, a concentração correta de antisséptico, de solução de imersão de teto utilizada antes e após a ordenha e procedimentos
adequados  de  terapia  intramamária  são  as  melhores  medidas  de  controle  e/ou  prevenção  de  mastite  por  nocardia.  Devido  à  baixa  taxa  de  sucesso  no  tratamento  de  infecções  mamárias,  recomenda­se  cauterização  química  de  quartos
infectados ou abate de animais acometidos como medidas de controle de mastite por nocardia em rebanhos leiteiros.
RISCO  ZOONÓTICO:   A  nocardiose  em  pessoas  é  considerada  uma  doença  oportunista.  Relatos  de  nocardiose  humana  tornam­se  mais  frequentes  em  todo  o  mundo.  Esta  doença  é  observada  em  pessoas  imunocompetentes  e
imunocomprometidas, com predomínio de manifestações pulmonares, lesões cutâneas­subcutâneas, micetomas e sinais neurológicos. Os casos clínicos de nocardiose humana são frequentemente associados à doença imunossupressora ou
debilitante, como AIDS, transplante de órgãos, cirrose, diabetes, alcoolismo, doença maligna (linfossarcoma, linfoma) ou uso prolongado de corticosteroides.
Muitos casos de transmissão humana ocorrem provavelmente por inalação de microrganismos em regiões de clima seco e quente. Traumatismos com inoculação cutânea é outra forma de transmissão. Muitos casos de nocardiose humana
cutânea­subcutânea foram descritos como secundários a mordidas ou arranhaduras de cães e gatos com doença clínica. Entretanto, a nocardiose humana provavelmente não é transmitida diretamente de pessoa a pessoa ou adquirida em
nosocômios.  Estudos  experimentais  de  resistência  à  temperatura  utilizando  N.  asteroides  e  N.  brasiliensis  isolados  de  leite  de  vaca  em  condições  de  tempo  e  temperatura  empregadas  na  pasteurização  indicam  um  risco  potencial  de
transmissão pelo leite.
Precauções  devem  ser  tomadas  por  pessoas  imunocomprometidas,  com  atenção  especial  ao  contato  com  solo  ou  material  orgânico  do  ambiente  contaminado  por  animais  domésticos  ou  por  contato  direto  ou  indireto  como  animais
suspeitos de ter a nocardiose.
PERITONITE

Peritonite é a inflamação das membranas serosas da cavidade peritoneal. Pode ser uma doença primária ou secundária, provocada por outras enfermidades. As manifestações clínicas (p. ex., aguda ou crônica, séptica ou não séptica, local ou
difusa, com aderência ou exsudativa), a progressão e os sintomas variam de acordo com a etiologia.
ETIOLOGIA:  A peritonite primária pode ser infecciosa ou idiopática. Na peritonite primária, agentes específicos de infecção disseminam­se da corrente sanguínea para a cavidade peritoneal dos animais, geralmente imunocomprometidos. A
peritonite  primária  é  menos  comum  que  a  secundária  e  pode  ser  ocasionada  por  agentes  infecciosos  como  o  vírus  da  peritonite  infecciosa  felina, Nocardia  spp  ou  Mycobacterium  spp,  Haemophilus  parasuis  e  outros  microrganismos
infecciosos. A progressão da peritonite primária tende a tornar­se crônica.
A peritonite secundária pode ser resultado da exposição da cavidade peritoneal a infecções específicas ou inespecíficas. Geralmente é uma doença aguda, abrupta, progressiva e sistêmica.
A peritonite séptica  secundária  comumente  está  associada  à  perfuração  e  extravasamento  de  trato  gastrintestinal  (p.  ex.,  úlcera  gástrica  ou  abomasal  perfurada;  reticuloperitonite  traumática  em  bovinos)  ou  do  útero  em  animais  com
laceração uterina resultante do parto. A peritonite também pode resultar de perfuração ou migração transmural (p. ex., neoplasia, isquemia intestinal), ruptura ou extravasamento de outras vísceras infectadas (p. ex., abscesso de fígado, baço
ou omento; cistite, endometrite e piometra). Além disso, a migração de parasitos pela cavidade abdominal também pode resultar em extravasamento de quimo e subsequente peritonite séptica. Feridas que perfuram a parede abdominal (p.
ex., mordidas de cães) ou deiscência de feridas podem resultar em laceração de vísceras e penetração de material estranho e de microrganismos na cavidade peritoneal.
Os  microrganismos  associados  à  peritonite  séptica  refletem  a  fonte  de  contaminação.  Uma  população  mista  de  bactérias  é  observada  nas  perfurações  gastrintestinais  (coliformes  e  anaeróbios),  enquanto  a  perfuração  de  vísceras  não
gástricas  (p.  ex.,  vesícula  biliar,  útero,  próstata)  pode  esta  associada  a  microrganismos  aeróbios,  como  Escherichia  coli,  Staphylococcus,  Streptococcus  zooepidemicus  equi,  Proteus,  Rhodococcus,  Enterobacter,  Pseudomonas  e
Corynebacterium.
Peritonite asséptica secundária ocorre após a contaminação da cavidade abdominal com irritantes químicos (p. ex., bile, urina, medicamentos) ou isquemia intestinal. As condições comuns são urolitíase e ruptura da bexiga ou vesícula
biliar; estas condições nem sempre são assépticas. Uma inflamação peritoneal asséptica pode se tornar séptica.
Em grandes animais, a peritonite é mais comumente observada em bovinos e menos frequente em equinos e raramente em suínos, ovinos e caprinos. A peritonite é uma doença grave e fatal em gatos. Há na Tabela 5, um resumo das
causas mais comuns de peritonite nos animais.
PATOGENIA:   A  patogenia  da  peritonite  é  espécie­dependente  (p.  ex.,  resposta  inflamatória  peritoneal  em  bovinos  caracterizada  por  formação  extensa  de  fibrina;  equinos  tendem  a  desenvolver  peritonite  exsudativa)  e  influenciada
principalmente pela etiologia (p. ex., primária e secundária, séptica ou não séptica). Devido à liberação de mediadores inflamatórios após contato com agentes mecânicos, químicos ou infecciosos, a permeabilidade dos capilares da serosa
aumenta, resultando no extravasamento de solutos, água e proteínas do plasma para a cavidade peritoneal. A exsudação do fluido proteico pode resultar em hipoproteinemia e favorecer a proliferação bacteriana. O efeito combinado da
grande perda de fluidos na cavidade peritoneal e os efeitos vasodilatadores das toxinas absorvidas pode levar à hipotensão e hipovolemia.

Tabela 5 – Causas frequentes de peritonite em bovinos, equinos, pequenos ruminantes, suínos, cães e gatos

Espécie Causa

Bovinos Reticuloperitonite traumática, ruminite, úlcera de abomaso (perfuração), vólvulo de abomaso, vólvulo cecocólico, distocia (torção uterina, cesariana), metrite ou piometra, cirurgia abdominal, intestinal, retal ou ruptura de
útero, ruptura de abscesso hepático ou abdominal, onfalite (bezerros); necrose gordurosa, injeção intraperitoneal, neoplasia (p. ex., mesotelioma)
Cães e Peritonite infecciosa felina, ingestão de corpo estranho, ruptura gástrica, intestinal, retal ou uterina, neoplasia abdominal, pancreatite, necrose gordurosa, vólvulo­dilatação gástrica (cães), trauma penetrante na parede
gatos abdominal

Equinos Migração parasitária (larval), lesão intestinal ou isquemia (cólica), ruptura de abscesso abdominal (Rhodocoddus, Streptococcus), cirurgia abdominal (cólica e castração), ruptura gástrica, intestinal ou uterina,
gastroduodenoenterite, colite, onfalite, úraco persistente, ruptura de bexiga (potros), úlcera gástrica (perfuração), injeção intraperitoneal, neoplasia (p. ex., carcinoma colangiocelular), traumatismo penetrante na parede
abdominal, iatrogênica (perfuração de reto)
Pequenos Peritonite primária (Mycoplasma spp), migração parasitária (larval), ruptura de abscesso abdominal, neoplasia (p. ex., mesotelioma)
ruminantes
Suínos Doença de Glasser (Haemophilus parasuis) perfuração intestinal (íleo), distocia, sequela de infecção septicêmica (Salmonella Choleraesuis)

Ruptura ou perfuração de cavidade abdominal, estômago ou intestino, com liberação de grande volume de conteúdo gástrico ou intestinal, e ruptura ou perfuração do útero causa peritonite séptica aguda. As toxinas produzidas pelas
bactérias e pela degradação dos tecidos são rapidamente absorvidas pelo peritônio e ocasiona efeitos sistêmicos graves, como hipotensão, choque, síndrome da resposta inflamatória sistêmica e coagulação intravascular disseminada (CID).
Endotoxinas e anormalidades eletrolíticas e do equilíbrio ácido­base atuam diretamente na função cardíaca levando a déficit cardíaco e insuficiência circulatória. A hipomotilidade gastrintestinal ou do íleo é uma consequência frequente de
peritonite  aguda  e  pode  causar  obstrução  funcional  e  aumento  da  taxa  de  mortalidade.  Grande  quantidade  de  volume  de  exsudato  inflamatório  pode  ser  secretado  na  cavidade  peritoneal  durante  a  peritonite;  também,  pode  levar  ao
comprometimento respiratório por interferir no diafragma.
Peritonite  crônica  geralmente  é  caracterizada  por  secreção  extensa  de  fibrinogênio  e  subsequente  formação  aderência  fibrinosa  ou  fibrosa.  As  aderências  auxiliam  na  limitação  da  inflamação  (p.  ex.,  reticuloperitonite  traumática
em bovinos), mas pode causar obstrução mecânica ou funcional do trato GI. A peritonite crônica em equinos geralmente resulta em cólica recidivante.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais não são específicos e variam dependendo do tipo de peritonite e da etiologia. Os animais afetados podem desenvolver toxemia e sepse, choque, hemorragia, dor abdominal, íleo adinâmico, acúmulo de fluidos
e vários graus de aderências.
Choque,  hipotensão,  anormalidade  ácido­base  e  colapso  respiratório  após  peritonite  séptica  aguda  associada  à  ruptura  de  intestino  ou  útero  causam  morte  súbita.  Os  animais  afetados  normalmente  apresentam  apenas  sinais  clínicos
limitados. Em casos menos graves, dor abdominal e febre são sinais comuns. Hipotermia também pode ser observada como resultado de desidratação, hipovolemia e sepse. A dor abdominal pode ser contínua, intensa e caracterizada por
uma postura rígida de proteção do abdome ou o animal permanece em decúbito. Em todas as espécies a resposta à dor é mais evidente nos estágios iniciais da doença. A distensão abdominal, que pode ser inaparente, geralmente se deve ao
acúmulo de exsudato peritoneal, hipomotilidade GI, inclusive do íleo, ou aderência peritoneal. A produção de fezes geralmente diminui, embora um aumento da frequência da defecação possa ser observado nos estágios iniciais. Os animais
com peritonite secundária também podem apresentar sinais clínicos associados à doença primária.
Palpação retal é uma técnica de diagnóstico útil para avaliação do peritônio e para ter acesso aos órgãos abdominais, em grandes animais. Radiografia abdominal pode ser utilizada em pequenos animais. Geralmente, a ultrassonografia é a
forma mais efetiva de exame da cavidade abdominal e verificação de tamanho, extensão, localização e característica do peritônio. Além disso, a ultrassonografia permite guiar a abdominocentese. Abdominocentese deve ser realizada em
grandes  e  pequenos  animais,  com  intuito  de  obter  fluido  para  citologia,  exames  bioquímicos  e  cultura  bacteriológica.  A  análise  do  lavado  peritoneal  pode  ser  útil  se  não  é  possível  obter  o  fluido  por  abdominocentese.  Diagnóstico
laparoscópico ou laparotomia pode ser empregada para definir o diagnóstico. Estes procedimentos primários de diagnóstico podem ser combinados com medidas terapêuticas.
Bovinos: Os sinais clínicos de peritonite em bovinos geralmente são inespecíficos e caracterizados pela redução no consumo da ração, redução súbita da produção de leite e diminuição da ruminação. Nos casos crônicos, a contração ruminal
pode estar presente com menos intensidade. A percussão abdominal pode revelar timpanismo ruminal ou pneumoperitônio. Febre moderada é típica em bovinos com peritonite e uma temperatura subnormal sugere peritonite difusa aguda
terminal. Os sinais clínicos mais comuns em bovinos com peritonite são incoordenação, andar rígido, dorso arqueado e berros ao caminhar ou defecar. A palpação profunda da parede abdominal provoca dor. A peritonite crônica está
associada ao desenvolvimento de aderências fibrosas. Dependendo da localização, a palpação retal pode revelar aderências entre alças intestinais e peritônio. Os bovinos podem desenvolver sintomas de indigestão vagal ou toxemia, com
períodos de sinais agudos graves causados por obstrução intestinal parcial. A maioria dos bovinos desenvolve peritonite localizada, com extensa formação de fibrina; entretanto, em alguns casos a cavidade abdominal contém grande volume
de fluido turvo infectado.
Cães e Gatos: Em pequenos animais, anorexia e depressão são sinais inespecíficos de peritonite; geralmente acompanhados de vômito e diminuição da defecação. O abdome pode se apresentar distendido. A palpação abdominal pode ser
dolorosa e uma massa abdominal pode ser detectada. É possível notar icterícia na peritonite biliar generalizada, em pequenos animais. A radiografia pode revelar obstrução GI, dilatação intestinal, ar livre no abdome, ascite ou material
estranho radiodenso. A perda dos detalhes da serosa na radiografia indica fluido abdominal.
Equinos: Os  sinais  incluem  cólica,  torção  intestinal,  distensão  intestinal  notada  à  palpação  retal,  refluxo  gástrico  e,  ocasionalmente,  diarreia.  A  palpação  retal  pode  revelar  mucosa  seca,  pegajosa  e,  em  alguns  casos,  aderência  de  alças
intestinais e outros órgãos abdominais por fibirna. Os ruídos de borborigmos intestinais estão diminuídos. Taquicardia, pulso fraco, má perfusão periférica e febre são comuns. Perda de peso e dor abdominal intermitente (cólica) podem ser
observadas em equinos com peritonite crônica.
Pequenos Ruminantes e Suínos:  Geralmente, os sinais clínicos em pequenos ruminantes e suínos são semelhantes aos verificados em outros animais; entretanto, peritonite raramente é diagnosticada em suínos, ovinos e caprinos.

DIAGNÓSTICO:  As análises laboratoriais para confirmar o diagnóstico clínico e a determinação da gravidade da peritonite devem incluir contagem de leucócitos e hemácias e alguns parâmetros bioquímicos do sangue e do fluido peritoneal.
A  peritonite  aguda  e  difusa,  com  toxemia,  geralmente  é  acompanhada  de  leucopenia,  neutropenia  e  aumento  de  neutrófilos  imaturos  (desvio  degenerativo  à  esquerda).  Em  casos  menos  graves  de  peritonite,  a  leucocitose  pode  ser
decorrência da maior produção de neutrófilos. A peritonite aguda e localizada revela uma contagem normal de leucócitos com desvio regenerativo à esquerda. Na peritonite crônica a contagem total de leucócitos pode ser normal, com
aumento ocasional da população de linfócitos e monócitos. A anemia pode ser devido à hemorragia na cavidade peritoneal, mas também é comumente associada à inflamação crônica. Anormalidades nos parâmetros bioquímicos do soro (p.
ex.,  proteína  total,  albumina,  fibrinogênio,  bilirrubina,  lactato  desidrogenase  [LDH],  fosfatase  alcalina  [ALP],  creatinoquinase  [CK])  podem  acompanhar  a  peritonite.  Com  frequência,  nota­se  hipoalbuminemia,  hiperglobulinemia  e
hiperbilirrubinemia. Geralmente, as alterações nos parâmetros hematológicos e bioquímicos indicam inflamação e lesões teciduais, mas não são patognomônicos de peritonite.
O fluido peritoneal é um plasma dialisado, com propriedades físicas e químicas específicas, que resultam da permeabilidade da membrana, concentrações e cargas elétricas de íons e pressão osmótica. O fluido contém células oriundas do
mesotélio e dos vasos sanguíneos e linfáticos. Em condições fisiológicas o fluido peritoneal é um transudato, enquanto a peritonite resulta em um fluido que pode ser normalmente caracterizado como exsudato. Fluido peritoneal com
características de transudato e exsudato é denominado transudato modificado. A análise do fluido peritoneal é útil como método diagnóstico em gastrenterologia, pois o fluido geralmente reflete enfermidades abdominais. O volume de
fluido peritoneal está frequentemente aumentado quando há peritonite. Em casos de peritonite séptica, amostras de fluido peritoneal devem ser utilizadas para cultura microbiológica e caracterização do patógeno envolvido na infecção.
Os parâmetros clássicos para definição de transudato e exsudato são apresentados na Tabela 6. O emprego de um sistema de escore permite a classificação de peritonite discreta, moderada ou grave. Na prática, entretanto, a análise do
fluido peritoneal pode ser inconsistente, levando a resultados inconclusivos. Portanto, o valor diagnóstico com base neste conceito tradicional é limitado. Para aumentar a sensibilidade da diferenciação entre exsudato e transudato de efusão
pleural e peritoneal em medicina humana utilizam­se os critérios de Light (proporção entre o teor de proteína no fluido e o teor sérico de proteínas > 0,5; proporção entre a LDH no fluido e a LDH sérica > 0,6; ou atividade de LDH no
fluido > 200U/l), em que os valores de corte para as proporções entre fluido peritoneal e plasma ou soro de vários componentes (p. ex., lactato, glicose, enzimas) e o gradiente de albumina sorofluido ascítico (SAAG) deve ser estabelecido.
Estes conceitos devem ser aplicados para algumas espécies animais (p. ex., equinos e pequenos animais).
Tabela 6 – Características de transudatos e exsudatos em bovinos, equinos, cães e gatos

Parâmetros Espécie Transudato Exsudato

Proteína total (g/dl) Todas < 2,5 > 3


Densidade específica Todas < 1,020 > 1,025

Contagem celular (109/l) Bovinos 0,5 a 5 > 8

Equinos 0,5 a 5 > 8


Cães, gatos < 3 > 5
Cor Todas Incolor a amarelo Variável
Turbidez Todas Claro a moderado Moderado a opaco
Bactéria Todas Ausente Pode haver

Sob  condições  fisiológicas,  a  proporção  linfócitos:neutrófilos  é  1:1.  Peritonite  aguda  geralmente  resulta  em  aumento  do  número  de  leucócitos  e  a  porcentagem  de  neutrófilos  situa­se  em  torno  de  60  a  90%.  Entretanto,  em  casos  de
inflamação séptica hiperaguda o número de leucócitos pode diminuir devido à necrose e dano às células. Histologicamente, pode­se notar alta taxa de leucócitos degenerados (citólise, cariorrexe ou cariólise). Na inflamação peritoneal
crônica, a quantidade de neutrófilos diminui e a de monócitos aumenta. A presença de bactérias, intra ou extracelular, confirma o diagnóstico de peritonite séptica. A coloração pelo Gram permite a diferenciação entre bactérias Gram–
positivas e Gram­negativas e facilita o tratamento precoce com antibiótico.
A concentração de proteína total fisiológica no fluido peritoneal varia de 20 a 25 g/l. A proporção normal de proteína no fluido peritoneal e no soro é inferior a 1:2. A SAAG é calculada pela subtração do teor de albumina no fluido
peritoneal da concentração de albumina no soro. O valor de corte de 11 g/l para pessoas parece adequado para animais monogástricos. Entretanto, os valores de referência da relação entre o teor de proteína e o SAAG não é aplicável a
bovinos de leite, principalmente devido sua alta concentração de proteína e albumina no soro, em comparação com animais monogástricos e pessoas.
Em animais saudáveis, a concentração de glicose é a mesma no soro e no fluido peritoneal. A infecção bacteriana da cavidade peritoneal resulta em maior redução da concentração de glicose no fluido peritoneal. Proporção entre glicose
no fluido peritoneal e no plasma inferior a 0,5 é uma condição altamente sensível e específica de peritonite séptica.
A isquemia intestinal resulta em aumento da concentração de L­lactato no plasma e no fluido peritoneal. Embora exista uma associação entre a concentração de L­lactato no fluido peritoneal e no plasma, o L­lactato no fluido peritoneal é
considerado  mais  intimamente  relacionado  com  a  gravidade  da  isquemia  intestinal.  Fisiologicamente,  a  concentração  de  L­lactato  no  fluido  peritoneal  é  menor  do  que  no  plasma  (em  equinos  saudáveis  é,  aproximadamente,  1:2).  Esta
relação  inverte­se  em  equinos  com  cólica  e  isquemia  intestinal,  em  vacas  com  vólvulo  abomasal  e  em  cães  com  dilatação  gástrica.  O  lactato  também  é  um  metabólito  bacteriano  (principalmente  o  D­lactato);  portanto,  o  aumento  da
concentração de lactato no fluido peritoneal também pode indicar peritonite séptica. A acurácia da concentração peritoneal de lactato na diferenciação de peritonite séptica e não séptica varia entre as espécies (p. ex., 90 a 95% em cães e 65
a 70% em gatos).
A inflamação pode ser monitorada mediante dosagem de proteínas de fase aguda, como a proteína C reativa ou a haptoglobina em bovinos, como marcadores. A concentração de proteína de fase aguda aumenta no sangue periférico e no
fluido peritoneal em animais com peritonite. Entretanto, estes parâmetros geralmente são indicadores de inflamação e não são específicos para peritonite.
A concentração de fibrinogênio no fluido peritoneal pode aumentar em animais com peritonite. Entretanto, a dosagem de fibrinogênio tem valor diagnóstico limitado devido à baixa relação entre as concentrações de fibrinogênio no
sangue e no fluido peritoneal. O aumento da concentração do produto da degradação de fibrina, D­dímero, indica isquemia intestinal e inflamação, com alta sensibilidade e especificidade. O valor normal no plasma pessoa é < 0,3 mg/l. Os
valores de referência para animais não são completamente conhecidos, mas parecem semelhantes aos de pessoas.
Inflamação, isquemia intestinal e reperfusão interferem na atividade de várias enzimas (ALP, AST, CK, LDH) do fluido peritoneal e do sangue periférico. Na isquemia intestinal a atividade de CK aumenta principalmente no soro e no
fluido peritoneal. A origem da CK pode ser a camada muscular do intestino estrangulado e isquêmico. Entretanto, outros tecidos (p. ex., músculo estriado após episódios de cólica, em equinos) podem ser a fonte de alta atividade de CK.
Entretanto, a sensibilidade e a especificidade de CK é baixa.
A atividade de LDH é um indicador de resposta inflamatória que tem sido utilizado para diferenciar exsudato de transudato (proporção LDH no fluido peritoneal:LDH no soro é > 0,6; atividade de LDH no fluido peritoneal é > 200U/l).
Os valores de referência para animais monogástricos, mas não para bovinos, são semelhantes aos de pessoas.
Aumento de ALP durante isquemia e reperfusão intestinal é notada no fluido peritoneal de equinos com cólica e de vacas com deslocamento de abomaso. Entretanto a origem de ALP não é exclusiva de alterações de estômago ou
intestino. Outras fontes de aumento da atividade de ALP nestes casos incluem hepatócitos e granulócitos. Normalmente, a atividade sérica de ALP não apresenta maiores alterações durante a isquemia intestinal.
Aumentos das concentrações de proteínas, inclusive de globulinas, no soro e no fluido peritoneal geralmente observados em gatos com peritonite infecciosa felina. Entretanto, nenhum parâmetro é acurado o suficiente para o diagnóstico,
especialmente no caso de mensuração no soro. O cálculo da proporção albumina:globulina pode ter maior valor diagnóstico. O tradicional teste de Rivalta diferencia transudato de exsudato. Embora ocorra resultado falso­positivo em gatos
com peritonite bacteriana séptica, ainda assim é útil no diagnóstico de peritonite infecciosa felina (PIF). Um parâmetro amplamente utilizado é a a1­glicoproteína ácida, um indicador de inflamação, mas não é específica para PIF. O título de
anticorpos anticoronavírus felino (FCoV) devem ser interpretados criticamente, pois muitos gatos saudáveis são positivos ao teste de pesquisa de anticorpos anti­FCoV. O valor diagnóstico de títulos de anticorpos anti­FCoV no fluido
peritoneal ainda está em discussão. Vários métodos avançados de diagnóstico (p. ex., coloração imunofluorescente do antígeno FCoV em macrófagos peritoneais, ELISA para detecção de complexo antígeno­anticorpo no soro, transcriptase
reversa­PCR) são utilizados como técnicas de diagnóstico para melhorar a confiabilidade no diagnóstico de PIF. Geralmente, os testes laboratoriais realizados no fluido peritoneal são superiores àqueles do soro.
PROGNÓSTICO:  Geralmente, a peritonite é uma doença grave, com risco à vida, com prognóstico reservado. Entretanto, o prognóstico depende muito das características e da gravidade da doença e deve ser determinado individualmente. A
taxa de sobrevivência relatada varia de 50 a 70%, com baixa probabilidade de retorno à produtividade em animais pecuários. Apesar do desenvolvimento de novas terapias nos últimos anos, a PIF ainda é uma doença letal, sem tratamento
efetivo, e o prognóstico de PIF em gatos é reservado.
TRATAMENTO:  A terapia adequada depende do diagnóstico e dos resultados do exame físico e das análises laboratoriais. Em casos graves de peritonite séptica, o tratamento inicial deve ser direcionado para salvar a vida e estabilizar a
circulação e as funções dos órgãos. A terapia deve incluir tratamento da hipovolemia ou do choque toxêmico, terapia anti­inflamatória agressiva e tratamento de alterações metabólicas e distúrbios reológicos (p. ex., desequilíbrio ácido­
base, coagulopatias). A reposição de fluidos, eletrólitos, plasma ou sangue pode ser necessário para manter a função cardíaca e melhorar a circulação.
A terapia antimicrobiana apropriada deve ser iniciada assim que há suspeita ou confirmação de peritonite séptica. Amostras de fluido peritoneal devem ser obtidas para cultura microbiológica e antibiograma. Inicialmente deve­se instituir
terapia antimicrobiana parenteral de amplo espectro. Aminoglicosídios ou fluoroquinolonas são efetivos contra microrganismos Gram­negativos; penicilinas e cefalosporinas são efetivas contra bactérias Gram­positivas. O antimicrobiano
pode ser substituído com base nos resultados do exame citológico, da cultura e antibiograma. O tratamento antimicrobiano e anti­inflamatório deve ser continuado após a recuperação clínica.
Se possível, deve­se utilizar terapia específica para a causa da peritonite. Em animais com suspeita de ruptura de órgãos, a cirurgia deve ser imediatamente realizada para explorar o abdome e reparar qualquer problema. Após a cirurgia
deve ser realizada lavagem peritoneal com solução isotônica isotérmica, com equilíbrio de eletrólitos. Embora frequentemente realizados, não há prova clínica dos benefícios de se adicionar antimicrobianos na solução de lavagem. Não há
evidência de que as soluções que contêm antissépticos (p. ex., iodo­povidona) sejam benéficas; ademais, atuam como irritantes químicos que exacerbam a inflamação. O tratamento com heparina pode ser empregado em casos de CID e
pode prevenir a extensa formação de fibrina na cavidade peritoneal.
A  aplicação  de  drenos  abdominais  e  subsequente  lavagem,  em  pequenos  e  grandes  animais,  pode  auxiliar  no  tratamento  de  peritonite  grave  por  remover  o  material  infectado  e  proinflamatório  da  cavidade  abdominal.  A  decisão  de
drenagem peritoneal depende da gravidade da doença, da experiência do veterinário, de cuidados intensivos e de material apropriado. A manutenção do dreno pode ser difícil, principalmente em bovinos, devido à extensa formação de
fibrina. Em animais submetidos à drenagem peritoneal, as concentrações séricas de proteínas e de eletrólitos devem ser monitoradas periodicamente, porque há perda de ambos com a drenagem do exsudato.
O  suporte  nutricional  deve  ser  instituído,  pois  muitos  animais  com  peritonite  não  se  alimentam.  A  nutrição  enteral  ajuda  a  manter  a  higidez  da  mucosa  intestinal;  entretanto,  vômito  (em  cães  e  gatos)  ou  anorexia  podem  requerer  o
emprego de outras alternativas. Em alguns pacientes, a nutrição parenteral ou total pode ser necessária para fornecer as necessidades nutricionais até que a nutrição enteral é iniciada. Antioxidantes e vitaminas devem ser administrados. O
vômito é, às vezes, causado por peritonite em pequenos animais; o tratamento antiemético é indicado em alguns casos.
A infecção por coronavírus felino pode causar peritonite infecciosa primária em gatos, que pode ser fatal. O tratamento é paliativo (p. ex., interferona, glicocorticoides, cuidados de suporte) e objetiva reduzir a inflamação. Não há terapia
efetiva a longo prazo. Vacinas comerciais estão disponíveis para profilaxia, em alguns países; entretanto, não há relato comprovando sua eficiência. As vacinas não são efetivas quando administradas em animais que já foram expostos ao
coronavírus felino, mas pode oferecer alguma proteção quando administrada em animais soronegativos.
Na peritonite crônica com aderência deve–se realizar laparoscopia ou laparotomia para eliminar as aderências que impedem a motilidade intestinal ou para remover ou drenar abscessos.

PESTE

A peste, enfermidade causada por Yersinia pestis, é uma zoonose bacteriana às vezes fatal, transmitida principalmente por pulgas de ratos ou de outros roedores. Há relatos de focos enzoóticos no oeste dos EUA e em todo o mundo,
inclusive Eurásia, África e Américas do Norte e Sul. Além dos roedores, outras espécies de mamíferos são naturalmente infectadas por Y. pestis,  inclusive  lagomorfos,  felídeos,  canídeos,  mustelídeos  e  alguns ungulados.  Gatos  e  cães
domésticos também desenvolvem peste pela exposição da mucosa bucal a tecidos de roedores infectados quando esses animais perambulam e caçam em áreas enzoóticas. Aves e alguns mamíferos vertebrados parecem resistentes à peste.
Em média, 10 casos de peste são relatados em pessoas a cada ano nos EUA, sendo em sua maioria no Novo México, Califórnia, Colorado e Arizona. Muitos casos humanos resultam da picada de pulgas infectadas, embora o contato direto
com coelhos selvagens infectados, roedores e, ocasionalmente, outros animais selvagens e a gatos domésticos também possam ser fatores de risco.
ETIOLOGIA:  Yersinia pestis é um microrganismo Gram­negativo, imóvel, cocobacilo, pertencente à família Enterobacteriaceae. Essa bactéria exibe coloração bipolar, com aparência de um “alfinete”, quando corada com Wright, Giemsa ou
Wayson. Y. pestis cresce lentamente em temperatura ótima de 28°C e necessita = 48 h para provocar colônias. Vários tipos de meios de cultura podem ser utilizados para seu crescimento, entre eles ágar–sangue, caldo nutriente e ágar não
enriquecido. As colônias são pequenas (1 a 2 mm), acinzentadas, não mucoides e com aparência de “cobre martelado”. Diversos fatores de virulência são expressos pelo microrganismo em diferentes temperaturas e ambientes, permitindo­
lhe a sobrevivência em vetores, como pulgas, sendo então transmitidos e multiplicados em mamíferos hospedeiros. Este patógeno não sobrevive muito tempo em alta temperatura ou em ambiente seco.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  Y. pestis mantém seu ciclo natural no ambiente entre espécies de roedores suscetíveis e suas pulgas. Em geral, as espécies de roedores afetadas incluem esquilos terrestres (Spermophilus spp) e ratos­de­
floresta (Neotoma spp). Cães e gatos geralmente são expostos a Y. pestis por contato de membrana mucosa a secreções ou tecidos de um roedor ou coelho infectado, ou ainda pela picada de pulga infectada. As pessoas geralmente são
expostas a picadas de pulgas infectadas; às vezes, pelo contato com animais infectados ou mediante transmissão por aerossol de via respiratória em casos de pneumonia. Os fatores de risco para gatos são: caça e ingestão de roedores e
coelhos, visita a áreas em que a peste é enzoótica e nas quais se há roedores mortos pelos jardins ou áreas frequentadas pelo animal e exposição a pulgas infectadas. A peste epizoótica causa quase 100% de mortalidade na população de
roedores selvagens e coelhos. Depois da morte de seu hospedeiro, a pulga de roedores e coelhos infectadas por Y. pestis sai à procura de outros hospedeiros, inclusive cães e gatos, com risco potencial de transporte entre os domicílios. As
espécies de pulgas de roedores e coelhos são diferentes das encontradas em cães e gatos (Ctenocephalides spp), embora a maioria dos veterinários e dos proprietários não é capaz de distinguir visualmente as diferentes espécies. As pulgas
de cães e gatos são raras na maioria das áreas enzoóticas do oeste dos EUA; portanto, nessa região é mais provável que as pulgas de animais de estimação sejam oriundas de animais selvagens, entre eles os roedores ou coelhos.
PATOGENIA:   As  pulgas  se  infectam  com  Y.  pestis  quando  se  alimentam  de  mamíferos  com  bacteriemia.  As  bactérias  multiplicam­se  e  causam  obstrução  do  trato  digestivo  das  pulgas,  impedindo­as  de  digerir  o  sangue.  Assim,  elas
regurgitam Y. pestis, inoculando­a no hospedeiro, no qual tentam se alimentar. Nos hospedeiros mamíferos, a peste bubônica apresenta­se clinicamente em três formas: bubônica, septicêmica ou pneumônica. Após a inoculação na pele
mediante picada de pulga ou na membrana mucosa pelo contato com secreção tecidual contaminada, a bactéria passa, via linfática, aos linfonodos regionais. Os linfonodos infectados são denominados “ínguas”, sendo a lesão típica da peste
bubônica.
A peste septicêmica secundária pode desenvolver­se quando o microrganismo dissemina­se dos linfonodos secundários para a corrente sanguínea, mas pode também ocorrer sem linfadenopatia prévia (peste septicêmica primária), que
afeta vários órgãos, inclusive baço, fígado, coração e pulmões. A peste pneumônica pode desenvolver­se a partir de um tratamento inadequado da peste séptica (peste pneumônica secundária) ou por aerossol oriundo do trato respiratório
(peste pneumônica primária), tipicamente por tosse de um paciente infectado com a forma pneumônica.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   A  apresentação  clínica  da  peste  nos  gatos  geralmente  é  a  peste  bubônica.  O  período  de  incubação  é  de  1  a  4  dias.  Os  gatos  com  peste  bubônica  apresentam  febre,  anorexia,  letargia  e  hiperplasia  dos
linfonodos, que podem apresentar abscesso ou supuração. Foram relatadas úlceras bucais e linguais, abscessos de pele, secreção ocular, diarreia, vômito e celulite. Revisão retrospectiva de 119 gatos com infecção natural indicou que 53%
apresentavam peste bubônica e, destes, 75% tinham linfadenopatia submandibular com aumento bilateral em ~1/3 dos casos. Os linfonodos afetados apresentam inflamação necrossupurativa, edema e hemorragias e contêm numerosos
microrganismos. Em gatos experimentalmente infectados, notou­se febre tão alta quanto 41°C, com pico cerca de 3 dias após a infecção; a taxa de mortalidade em gatos não tratados alcança 60%. Dez animais, de um grupo de 16 gatos
(62,5%) expostos por VO, desenvolveram hiperplasia de linfonodos nas regiões retrofaringiana medial, submandibular, sublingual e tonsilar, palpáveis 4 a 6 dias após a exposição. Y. pestis foi isolada da garganta desses gatos após 15 dias.
Nos seis gatos expostos por via SC (simulando picada de pulga), nenhum linfonodo na região da cabeça e pescoço apresentou hiperplasia, mas quatro abscessos subcutâneos foram notados no local da inoculação.
Gatos com peste septicêmica primária não apresentam linfadenopatia evidente, mas sim febre, letargia e anorexia. Os sinais sistêmicos incluem diarreia, vômito, taquicardia, pulso fraco, tempo de preenchimento capilar prolongado,
coagulação intravascular disseminada e angústia respiratória. A peste pneumônica primária não foi documentada em gatos. Os gatos com peste pneumônica secundária podem apresentar todos os sinais da peste septicêmica, acompanhados
de tosse e outros ruídos pulmonares anormais. Os achados característicos na necropsia podem incluir fígado pálido com nódulos necróticos mais claros, esplenomegalia com nódulos necróticos e pulmões com pneumonia intersticial difusa,
congestão focal, hemorragia e focos necróticos.
Cães infectados têm menor probabilidade de desenvolver a doença clínica do que os gatos. A infecção da peste sintomática foi documentada em três cães com infecção natural; os sinais clínicos incluem febre, letargia, linfadenopatia
submandibular e lesão intermandibular purulenta, lesões da cavidade bucal e tosse.
Em bovinos, equinos, ovinos e suínos não há relato de sintomas relacionados com essa enfermidade, enquanto em caprinos, camelos, cervos, antílopes, primatas não humanos e uma lhama foram documentados sinais clínicos. Leões­da­
montanha e linces infectados apresentam sintomas e taxa de mortalidade semelhantes a de gatos domésticos.
DIAGNÓSTICO:  A peste deve ser diferenciada de outras infecções bacterianas, inclusive de tularemia (p. 731), abscesso por feridas (mordida de gatos em brigas) e infecções estafilocócicas e estreptocócicas. Na doença aguda, as amostras
obtidas antes da morte mais adequadas para isolamento são sangue total, aspirados de linfonodos, suabes de lesões supurativas e suabes orofaríngeos de gatos com lesões bucais ou pneumonia. As amostras diagnósticas devem ser colhidas
antes da administração de antibióticos. O crescimento das culturas de Yersinia pestis pode ser visto em 48 h. Um esfregaço de aspirado de íngua, em lâmina de vidro seco ao ar, pode ser utilizado no teste de imunofluorescência para
pesquisa de antígeno F1 de Y. pestis. Esse teste pode ser realizado dentro de horas em um laboratório especializado, sendo bastante sensível e específico.
Amostras obtidas após a morte podem ser fragmentos de fígado, baço e pulmão (nos casos pneumônicos), bem como de linfonodos infectados. Os testes sorológicos para pesquisa de anticorpos podem ser confirmatórios, mas requerem
que as coletas de amostras da fase aguda e da fase convalescente sejam obtidas com intervalo de 2 a 3 semanas, demonstrando elevação de 4 vezes no título de anticorpos. O soro apenas da fase aguda geralmente é negativo ou pode ser
problemático em uma região enzoótica, onde os animais podem manter títulos de anticorpos decorrentes de infecções prévias.
TRATAMENTO:   Devido  à  progressão  rápida  dessa  doença,  o  tratamento  de  casos  suspeitos  de  peste  (e  as  práticas  de  controle  da  infecção)  deve  ser  iniciado  antes  mesmo  de  se  definir  o  diagnóstico.  Estreptomicina  foi  considerada  o
medicamento de escolha em casos humanos, mas é difícil de ser obtida e atualmente seu uso para tal fim é raro. A gentamicina é amplamente utilizada no tratamento de peste em pessoas e deve ser o medicamento de escolha em medicina
veterinária para pacientes com comprometimento sério, embora não seja aprovada para este fim. Os animais com insuficiência renal necessitam ajuste de dose.
A doxiciclina é apropriada para tratamento de casos menos complicados e para completar o tratamento de pacientes gravemente enfermos após a melhora clínica. Tetraciclina e cloranfenicol também são boas opções. As penicilinas não
são efetivas no tratamento de peste. Em estudos sobre tratamento de camundongos experimentalmente infectados, a eficácia das fluoroquinolonas foi tão boa quanto da estreptomicina. Em medicina veterinária, nenhum teste clínico foi
realizado com fluoriquinolonas, mas há evidência crescente, com base em seu uso em regiões enzooticas, que são efetivas no tratamento de peste em cães e gatos. A duração do tratamento recomendada é de 10 a 21 dias, esperando­se
melhora clínica (inclusive desaparecimento da febre) alguns dias após o início da terapia.
Não se conhece ao certo a duração da infecciosidade em gatos tratados, mas acredita­se que os gatos não sejam infectantes 72 h depois de terapia antimicrobiana apropriada. Durante esse período infectante, os gatos devem permanecer
internados, especialmente se apresentam sinais de pneumonia. Os casos humanos são relatados em proprietários de gatos que tentam administrar medicamentos por VO no próprio domicílio, expondo­se ao contato com a cavidade bucal e
com secreção contaminada.
PREVENÇÃO E RISCO ZOONÓTICO:  Juntamente com o tratamento e as considerações diagnósticas, a proteção das pessoas e de outros animais, bem como o início das intervenções de saúde pública, é crítica quando um animal é considerado
suspeito de ter contraído peste. Os animais com sinais sugestivos de peste devem ser isolados, implementando­se medidas de controle da infecção para proteção dos profissionais e outros animais, até o diagnóstico definitivo. A utilização de
luvas, máscaras cirúrgicas e óculos protetores (caso já estejam ocorrendo espirros), isolamento dos pacientes e procedimentos padrão de higiene e desinfecção são fundamentais. De 23 pacientes que desenvolveram peste associada a gatos
nos EUA, entre 1977 e 1998, seis eram profissionais da área veterinária, sendo o resto proprietários ou outros manipuladores desses animais. Após descartar a possibilidade de pneumonia e constatar evidência de melhora clínica após 72 h
de terapia apropriada, os procedimentos de isolamento podem ser abrandados, mas os procedimentos padrão de desinfecção e higiene devem continuar.
Funcionários  de  saúde  pública,  locais  ou  estaduais,  devem  ser  notificados  rapidamente  quando  há  suspeita  de  peste,  para  auxiliar  na  condução  apropriada  de  testes  diagnósticos,  dando  início  à  investigação  ambiental  e  avaliação  da
necessidade de monitorar a febre ou o uso profilático de antibióticos em pessoas potencialmente expostas. Para diminuir o risco aos animais de estimação e às pessoas em áreas enzoóticas os proprietários devem impedir que seus animais
perambulem e pratiquem caça, mantendo­os longe do contato com carcaças de coelhos e ratos, além de realizar o controle apropriado das pulgas.
RAIOS E ELETROCUSSÃO

Lesões ou mortes de um animal provocadas por correntes elétricas de alta voltagem podem ser resultantes de raios, queda de fios de transmissão, defeito no circuito elétrico ou mastigação dos fios de alta tensão. Os raios são sazonais e
tendem a ser geograficamente restritos. A investigação de possível eletrocussão deve sempre ser cuidadosa, ainda pode haver, por exemplo, eletrificação resultante da quebra de fios de transmissão. Uma vez indubitável que o local seja
seguro, a investigação deve incluir localização dos animais mortos, exame de todos os animais afetados e necropsia daqueles que morreram.
Certos tipos de árvores, especialmente árvores rijas como os carvalhos e aquelas altas, que expandem suas raízes bem abaixo da superfície do solo, tendem a ser atingidas por raios com mais frequência do que outras. A eletrificação
dessas raízes carrega ampla região de superfície, em particular quando a terra já está úmida; a passagem de raízes carregadas abaixo de um poço raso torna­o eletrificado. Calhas podem espalhar a carga elétrica pelo seu curso. Fios de
transmissão caídos ou pendentes também podem eletrificar um poço de água, cercas ou construções, e um animal pode entrar em contato direto com esses fios. Há diferenças na condutividade do solo; lama, areia, argila, mármore e giz são
bons condutores (em ordem decrescente), enquanto solos rochosos não o são.
A eletrocussão acidental de animais de fazenda, em estábulo ou cercado de confinamento adjacente geralmente ocorre como resultado de fiação defeituosa. A eletrificação de um pilar com canos de água ou leite, de um cocho ou de um
corrimão metálicos pode resultar na distribuição disseminada de corrente elétrica por todo o estábulo (ver voltagem de dispersão em abrigos de animais, p. 2209), o que pode ocasionar sinais de privação da água ou recusa de alimentos.
A morte oriunda de choque elétrico geralmente resulta de parada cardíaca ou respiratória. A passagem da corrente através do coração quase sempre acarreta fibrilação ventricular e o envolvimento do SNC pode afetar o trato respiratório
ou outros centros vitais.
ACHADOS CLÍNICOS:  Pode haver variação no grau de choque elétrico. Em vários casos de raios, a morte é instantânea e o animal cai sem reação. Ocasionalmente, o animal fica inconsciente, mas pode se recuperar em poucos minutos a
algumas horas; sinais nervosos residuais (p. ex., depressão, paraplegia e hiperestesia cutânea) podem persistir por dias, semanas ou permanentemente. Marcas de chamuscamento ou danos na carcaça, danos imediatos ao ambiente, ou
ambos,  ocorrem  em  cerca  de  90%  dos  casos  de  raios,  porém  são  menos  prováveis  de  serem  encontrados  se  o  animal  foi  eletrocutado  por  permanecer  no  solo  eletrificado.  As  marcas  de  chamuscamento  tendem  a  ser  lineares  e  mais
comumente encontradas nos lados mediais das pernas, embora raramente o muito do corpo possa ser afetado. Abaixo das marcas de chamuscamento, congestão capilar é comum; a característica padrão arbórea do raio pode ser visualizada
melhor a partir do lado dérmico da pele por extravasamentos subcutâneos de sangue. As marcas de chamuscamento raramente são observadas em animais recuperados. Animais menores, como suínos, que entram em contato com bacias de
água  eletrificadas  podem  morrer  instantaneamente  ou  ser  arremessados  a  certa  distância  pela  força  do  choque.  Suínos  eletrocutados  várias  vezes  estão  deitados  e  sustentados  por  fraturas  da  espinha,  pelve  ou  membros,  resultando  de
contrações musculares graves.
DIAGNÓSTICO:  É quase sempre realizado com evidência circunstancial, isto é, localização do(s) cadáver(es) e ausência de qualquer enfermidade durante a necropsia. Animais mortos embaixo de uma árvore, pendurados ou próximos a uma
cerca elétrica, ou aglomerados ao redor de um poste de luz é forte evidência de raios mesmo na ausência de evidência física como queima recente de casca de árvore ou divisão de polos ou beiras em uma cerca.
O rigor mortis se instala e rapidamente desaparece. Nota­se distensão do rúmen logo após a morte e deve ser diferenciada de timpanismo ruminal antemorte (ver timpanismo, p. 301); em ambas as condições, o sangue tende a coagular
lentamente ou não coagula. As mucosas do trato respiratório superior, inclusive dos turbinados e dos seios nasais, encontram­se congestionadas e hemorrágicas. Hemorragias lineares da traqueia são comuns e grandes coágulos de sangue
são ocasionalmente encontrados na traqueia, mas os pulmões não são comprimidos como acontece no timpanismo. Todas as outras vísceras se mostram congestas e podem ser encontradas petéquias e equimoses em vários órgãos. Devido à
distensão ruminal pós­morte, o sangue pouco coagulável alcança passivamente a periferia do corpo, resultando em extravasamento sanguíneo pós­morte em músculos e linfonodos superficiais de cabeça, pescoço e membros torácicos e, em
menor grau, aos membros pélvicos. Provavelmente, a melhor indicação de morte instantânea é a presença de feno ou outro alimento na boca do animal; evidência comprobatória inclui ingesta normal (especialmente no rúmen), ausência de
ingesta espumosa (timpanismo espumante), fezes normais no trato intestinal posterior e, ocasionalmente, na terra ao redor do animal. Poucas situações que afetam animais de criação provocam morte hiperaguda de animais aglomerados em
uma pequena área.
Geralmente  há  seguro  dos  animais  pecuários  contra  raios  e  a  seguradora  solicita  ao  representante  ou  ao  médico  veterinário  requisitado  para  assinar  um  formulário  da  seguradora  que  observe  atentamente  a  situação  que  ocasionou  a
reclamação.  O  investigador  deve  averiguar  se  o  animal  realmente  morreu  no  local  de  alto  risco,  e  não  foi  transferido  para  este  local  após  a  morte.  Isso  pode  ser  feito  meramente  para  limpeza  ou  para  deliberadamente  confundir  a
investigação. A descrição bem documentada do local da morte do(s) animal(is) e o resultado do exame à necropsia são aceitáveis para sustentar a solicitação de seguro por morte decorrente de raios.
TRATAMENTO:  Os animais que sobrevivem podem necessitar terapia de suporte e sintomática. A eutanásia é indicada aos animais deitados com fraturas ou lesões musculares graves.

TOXOPLASMOSE

Toxoplasma gondii é um protozoário que infecta a maioria das espécies de animais de sangue quente, inclusive as aves (ver p. 1979) e as pessoas, em todo o mundo, do Alasca à Austrália.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  Os felídeos, tanto os gatos selvagens quanto os domésticos, são os únicos hospedeiros definitivos de T. gondii e atuam como importantes reservatórios da infecção. Há três estágios de T. gondii: taquizoítos (forma
que se multiplica rapidamente), bradizoítos (forma que permanece encistada no tecido) e esporozoítos (em oocistos).
Toxoplasma gondii é transmitido por ingestão de oocistos presentes nas fezes de gatos, consumo de produtos cárneos contendo cistos e por transferência transplacentária dos taquizoítos da mãe para o feto. T. gondii inicia sua replicação
enteroepitelial em gatos não expostos após a ingestão de carne mal cozida contendo cistos teciduais. Os bradizoítos são liberados do cisto presente nos tecidos pela digestão no estômago e no intestino delgado, invadindo o epitélio intestinal,
resultando em replicação sexual e culminando na liberação dos oocistos (10 μm de diâmetro) nas fezes. Os oocistos são primeiramente observados nas fezes 3 dias após a infecção, podendo ser excretados por até 20 dias. Os oocistos
esporulam (tornando­se infectantes) fora do gato, dentro de 1 a 5 dias, dependendo da aeração e temperatura, permanecendo viáveis no ambiente por vários meses. Os gatos geralmente desenvolvem imunidade contra T. gondii após o início
da infecção e, portanto, eliminam oocistos apenas uma vez durante toda a sua vida.
Após o consumo de carne mal cozida contendo cistos (carnívoros), ou alimentos ou água contaminada com fezes de gatos contendo oocistos (todos os animais de sangue quente), T. gondii inicia a replicação extraintestinal. Bradizoítos e
esporozoítos, respectivamente, são eliminados e infectam o epitélio intestinal. Após vários ciclos de replicação epitelial, os taquizoítos emergem e se disseminam pelas correntes sanguínea e linfática. Os taquizoítos infectam os tecidos de
todo o corpo e replicam­se de forma intracelular até a ruptura das células, causando necrose tecidual. Os taquizoítos medem 4 a 6 × 2 a 4 μm de diâmetro e coram­se com a técnica de Giemsa. Os animais novos e imunocomprometidos
podem sucumbir a uma toxoplasmose generalizada nesse estágio. Os animais idosos criam uma poderosa resposta celular imunomediada (mediada por citocinas) para os taquizoítos e controlam a infecção, impelindo os taquizoítos para
dentro do tecido ou ao estágio de bradizoíto. Os cistos teciduais são geralmente observados nos neurônios, mas também ocorrem em outros tecidos. Os cistos individuais são microscópicos, com até 70 μm de diâmetro, e podem envolver os
bradizoítos em uma fina e elástica parede cística. Os tecidos com cistos no hospedeiro permanecem viáveis por muitos anos e possivelmente durante toda a vida do hospedeiro.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os taquizoítos  compreendem  o  estágio  responsável  por  lesões  teciduais;  portanto,  os  sinais  clínicos  dependem  do  número  de  taquizoítos  envolvidos,  da  capacidade  do  sistema  imune  do  hospedeiro  de  limitar  sua
propagação e dos órgãos lesionados. Como os animais adultos imunocomprometidos controlam com eficiência a disseminação dos taquizoítos, em geral a toxoplasmose é subclínica. Contudo, em animais jovens, particularmente filhotes (de
cães,  gatos  e  suínos),  os  taquizoítos  disseminam­se  por  via  sistêmica,  causando  pneumonia,  miocardite,  hepatite  necrótica,  meningoencefalite,  coriorretinite,  linfadenopatia  e  miosite.  Os  sinais  clínicos  correspondentes  incluem  febre,
diarreia, tosse, dispneia, icterícia, convulsões e morte. Toxoplasma gondii também é uma importante causa de aborto e natimortos em ovelhas e cabras e, às vezes, porcas. Após a infecção da ovelha prenhe, os taquizoítos propagam–se via
corrente sanguínea até os cotilédones placentários, causando necrose. Os taquizoítos podem atingir o feto e causar necrose em múltiplos órgãos. Por fim, os animais adultos imunocomprometidos (p. ex., gatos infectados pelo vírus da
imunodeficiência felina) são extremamente suscetíveis ao desenvolvimento de toxoplasmose aguda generalizada.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico pode ser realizado com o uso de métodos biológicos, sorológicos ou histológicos, ou por uma combinação desses. Os sinais clínicos da toxoplasmose são inespecíficos e não são suficientes para chegar a um
diagnóstico definitivo. O diagnóstico antemorte pode ser acompanhado de testes de hemaglutinação indireta, imunofluorescência indireta, aglutinação em látex ou ELISA. Os anticorpos IgM surgem mais cedo que os IgG, mas geralmente
não persistem por mais de 3 meses após a infecção. O aumento do título de IgM (> 1:256) é compatível com infecção recente. Por outro lado, os anticorpos IgG surgem por volta da quarta semana após a infecção, podendo seu título
continuar elevado por anos, durante a infecção subclínica. Para que auxiliem no diagnóstico, os títulos de IgG devem ser mensurados em amostras de soro pareadas, obtidas na fase aguda e no período de convalescência (em intervalo de 3 a
4 semanas) e devem apresentar aumento de título de, no mínimo, 4 vezes. Além disso, o FCE e o humor aquoso podem ser analisados quanto à presença de taquizoítos ou anticorpos anti­T. gondii. No exame pós­morte, os taquizoítos
podem  ser  observados  em  esfregaços  por  impressão  de  tecidos  (imprints).  Ademais,  o  exame  microscópico  de  cortes  teciduais  pode  revelar  a  presença  de  taquizoítos  ou  bradizoítos.  T.  gondii  é  morfologicamente  similar  a  outros
protozoários parasitos e devem ser diferenciados de Sarcocystis spp (nos bovinos), S. neurona (nos equinos) e Neospora caninum (nos cães).
TRATAMENTO:  Nos animais, raramente indica­se tratamento. Sulfadiazina (15 a 25 mg/kg) e a pirimetamina (0,44 mg/kg) atuam sinergicamente são amplamente utilizadas no tratamento de toxoplasmose. Ainda que esses fármacos sejam
benéficos se administrados no estágio agudo da doença, durante a multiplicação ativa do parasito geralmente não erradicam a infecção. Acredita­se que esses medicamentos tenham pouco efeito no estágio de bradizoíto. Outros fármacos,
como diaminodifenilsulfona, atovaquona e espiramicina também podem ser utilizados no tratamento de casos mais complicados de toxoplasmose. A clindamicina é o tratamento de escolha para cães e gatos, nas doses de 10 a 40 mg/kg e de
25 a 50 mg/kg, respectivamente, durante 14 a 21 dias.
PREVENÇÃO E RISCO ZOONÓTICO:  T. gondii é um importante agente zoonótico. Em algumas partes do mundo, até 60% da população humana tem títulos de IgG contra T. gondii e, provavelmente, há infecção persistente. Toxoplasmose é a
principal preocupação em pessoas com disfunção do sistema imune (p. ex., pessoas infectadas pelo vírus da imunodeficiência humana). Nesses casos especiais, a toxoplasmose geralmente se apresenta como meningoencefalite e resulta da
emergência de T. gondii de  cistos  dos  tecido  localizados  no  cérebro,  mais  como  consequência  de  imunodeficiência  do  que  de  infecção  primária.  Toxoplasmose  também  é  uma  importante  preocupação  para  mulheres  gestantes,  pois  os
taquizoítos podem migrar via transplacentária e causar anomalias fetais. A infecção de mulheres por T. gondii pode ocorrer após ingestão de carne mal cozida ou ingestão acidental de oocistos presentes nas fezes de gatos. A prevenção da
infecção deve ser realizada pela cuidadosa lavagem das mãos de pessoas que manipulam a carne, com sabão e água, após o contato, além da higienização dos utensílios utilizados, como tábuas de carne, pias e facas etc. Os estágios de T.
gondii na carne são eliminados pelo contato com sabão e água. Na carne, esse parasito pode ser eliminado pela exposição à temperatura extremamente fria ou quente. Os cistos presentes nos tecidos são destruídos por cozimento a 67°C ou
congelamento a ­13°C. Toxoplasma encistado  morre  quando  exposto  a  0,5  quilorad  de  radiação  gama.  Toda  carne  deve  ser  cozida  a  67°C  antes  do  consumo,  evitando­se  experimentações  durante  o  cozimento  ou  o  tempero.  Mulheres
gestantes  devem  evitar  contato  com  fezes  de  gatos,  terra  ou  carne  crua.  Os  filhotes  de  gatos  só  devem  ser  alimentados  com  produtos  secos,  enlatados  ou  cozidos.  Deve  ser  efetuada  a  limpeza  diária  da  caixa  de  excretas  dos  gatos,
preferencialmente por uma mulher que não esteja grávida. Durante serviços de jardinagem devem­se calçar luvas. Os vegetais devem ser bem lavados antes do consumo.
Até o momento não foram desenvolvidas vacinas para prevenção de toxoplasmose em pessoas.

TUBERCULOSE E OUTRAS INFECÇÕES MICOBACTERIANAS

A tuberculose (TB) é uma doença infecciosa granulomatosa, causada por bacilos ácido–resistentes do gênero Micobacterium. Embora comumente definida como uma doença crônica e debilitante, a TB às vezes tem um curso agudo e
rapidamente progressivo. A doença afeta praticamente todas as espécies de vertebrados e antes de se adotar medidas de controle, era uma doença importante de pessoas e animais domésticos. TB bovina é uma zoonose importante em muitas
partes do mundo. Os sinais e lesões geralmente são semelhantes nas várias espécies.
ETIOLOGIA:  Os principais tipos do complexo M. tuberculosis (bacilo tuberculoso de mamíferos) reconhecidos são M. tuberculosis, M. bovis, M. caprae, M. pinnipedii, M. microti e M. africanum. O complexo M avium incluem M. avium
avium  (bacilos  aviários),  M.  avium  hominisuis  (isolado  de  pessoas  e  outros  mamíferos)  e  M.  intracellulare.  Os  tipos  diferem  em  suas  características  relativas  à  cultura  e  patogenicidade.  Os  tipos  mamíferos  são  mais  estreitamente
relacionados entre si do que o tipo aviário. Muitas sorovariantes do complexo M. avium são reconhecidas; no entanto, apenas os sorotipos 1, 2 e 3 são patogênicos às aves. M. bovis pode sobreviver na pastagem por 2 meses ou mais e M
avium pode sobreviver no solo por = 4 anos.
Todos os tipos podem provocar infecção em espécies hospedeiras, além de sua própria. M. tuberculosis é a espécie mais específica e raramente causa doença progressiva em outros animais, além de primatas não humanos, ocasionalmente
em cães e suínos e raramente em pássaros. M. bovis pode causar doença progressiva em muitos vertebrados de sangue quente, inclusive em pessoas. M. caprae é isolado em bovinos e em várias outras espécies, na Europa. M. avium avium é
a única espécie de consequência nas aves, mas também é patogênico para suínos, bovinos, ovinos, cervos, martas, cães, gatos e alguns animais exóticos de sangue frio. M. intracellulare causa doença em animais de sangue frio. As outras
micobactérias, além do bacilo da tuberculose (p. 730), são raramente isoladas de animais domésticos e exóticos.
PATOGENIA:  A inalação de gotículas contaminadas expelidas dos pulmões é a via comum de infecção, embora também ocorra por ingestão, particularmente de leite contaminado. A via intrauterina e o coito são menos comuns. Após a
inalação, o bacilo é fagocitado por macrófagos alveolares, que podem eliminar a infecção ou permitir a proliferação do agente. Neste último caso, ocorre a formação do foco primário de infecção, mediado por citocinas associadas à reação
de hipersensibilidade, que consiste em degeneração e morte dos macrófagos envolvidos por células epitelioides, granulócitos, linfócitos e, mais tarde, por células gigantes. O centro necrótico, purulento a caseoso, pode calcificar e a lesão
pode ser envolvida por tecido de granulação e uma cápsula fibrosa, formando o clássico “tubérculo”. O foco primário mais as lesões similares formadas pelos linfonodos regionais são conhecidos como “complexo primário”. Na forma
digestiva da doença, o foco primário pode ser encontrado na faringe ou nos linfonodos mesentéricos ou, menos comumente, nas tonsilas ou no intestino. A composição celular e a presença de bacilo ácido­resistente nas lesões tuberculosas
diferem entre e dentro das espécies hospedeiras.
Nos animais, o complexo primário raramente cicatriza, podendo progredir de forma lenta ou rápida. A disseminação por canais vasculares e linfáticos pode ser generalizada e rapidamente fatal, como na TB miliar aguda. As lesões
nodulares  podem  ser  encontradas  em  muitos  órgãos,  inclusive  pleura,  peritônio,  fígado,  rins,  ossos,  glândula  mamária,  trato  reprodutivo  e  SNC.  É  possível  um  curso  prolongado  e  crônico,  geralmente  com  um  padrão  de  lesões  mais
localizadas.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos refletem a extensão e a localização das lesões. Os sintomas generalizados incluem emaciação progressiva, letargia, fraqueza, anorexia e febre flutuante de baixo grau. A broncopneumonia, na forma
respiratória da doença, causa tosse crônica, intermitente e úmida com sinais tardios de dispneia e taquipneia. As lesões destrutivas da broncopneumonia granulomatosa podem ser detectadas por auscultação e percussão. A hiperplasia dos
linfonodos superficiais pode auxiliar no diagnóstico, quando presente. Os linfonodos mais profundos afetados não podem ser palpados, mas podem causar obstrução de vias respiratórias, faringe e intestinos, levando à dispneia e timpanismo
ruminal.
Nos suínos, as lesões causadas por M. avium avium geralmente afetam os linfonodos associados ao trato gastrintestinal e não ocorre doença generalizada.
DIAGNÓSTICO:  O teste diagnóstico mais importante para TB é a prova da tuberculina intradérmica; podem ser utilizados derivados de proteína purificada (PPD) preparados a partir de cultura filtrada de M. bovis ou M avium. O diagnóstico
baseado apenas nos sinais clínicos é muito difícil, mesmo nos casos avançados. A radiografia auxilia no diagnóstico em primatas não humanos e pequenos animais. Às vezes, faz­se exame microscópico do escarro e de outras secreções. O
achado na necropsia dos clássicos granulomas dos “tubérculos” é, com frequência, muito sugestivo da doença. A confirmação do diagnóstico é feita por isolamento e identificação da bactéria na cultura, onde cresce em 4 a 8 semanas, ou
por PCR, que requer apenas alguns dias. As técnicas moleculares, como o polimorfismo dos comprimentos dos fragmentos de restrição e espoligotipagem propiciam informações importantes na condução das investigações epidemiológicas.
A resposta de hipersensibilidade do hospedeiro, do tipo retardada, é responsável por várias lesões da TB, sendo fundamental para a prova de tuberculina intradérmica, amplamente utilizada no diagnóstico da doença em grandes animais.
O  teste  intradérmico  único  (TIU)  envolve  a  inoculação  de  PPD.  No  animal  reagente,  o  antígeno  estimula  o  local  infiltrado  de  células  inflamatórias  e  causa  tumefação  cutânea,  que  pode  ser  detectada  por  palpação  e  mensurada  com
paquímero. A leitura da reação é feita após 48 a 72 h, para a máxima sensibilidade, e após 96 h, para a máxima especificidade. Os locais do teste variam em sensibilidade e entre os países e incluem pescoço, região anal, dobra da base da
cauda e lábio vulvar. Uma desvantagem do teste TIU para M. bovis é que ocorre reação cruzada em animais infectados por M. avium avium, M. tuberculosis ou M. avium paratuberculosis.
Nas áreas com alta prevalência de TB aviária, micobacteriose atípica ou paratuberculose, pode ser utilizado o teste comparativo, com tuberculina DPP M. bovis e M. avium biologicamente equilibradas, inoculadas simultaneamente, mas
em locais diferentes do pescoço. O agente causador de sensibilização provoca a maior reação cutânea. Outro teste diagnóstico utilizado para TB é o teste térmico, o qual pode detectar o pico de pirexia (> 40°C) dentro de 6 a 8 h após a
inoculação SC de tuberculina. O teste de Stormont envolve a inoculação intradérmica de PPD seguida de uma segunda inoculação no mesmo local após 7 dias. A leitura do teste quanto à tumefação deve ser realizada 24 h depois.
Resultado falso­negativo pode ser notado em animais com imunidade baixa, como acontece nos estágios iniciais da infecção e nos casos avançados da doença em animais idosos. As vacas recém­paridas podem apresentar resultado falso­
negativo. Pesquisas atuais são focadas na identificação de antígenos, como as proteínas secretórias e proteínas produzidas por meio de engenharia genética de M. bovis para melhorar os testes diagnósticos. Testes sorológicos, como ELISA,
parecem de uso diagnóstico limitado, consistente com o papel menos importante do anticorpo, comparado com a resposta imune celular na TB. Testes celulares in vitro (ou seja, teste com ?­interferona) estão sendo desenvolvidos utilizando
leucócitos estimulados com antígeno de M. bovis e se mostram promissores como alternativa ao teste intradérmico único, amplamente utilizado; no entanto, seu uso não é amplamente difundido.
CONTROLE:  Os principais reservatórios da infecção são as pessoas e os bovinos. No entanto, em alguns países outros animais também são reservatórios, inclusive texugos e veados­vermelhos (Inglaterra, Irlanda), gambás e furões (Nova
Zelândia), veados de cauda branca, alces e bisões (América do Norte), búfalo (África do Sul); búfalo da água (Austrália). A prevalência da doença em tais reservatórios influencia a doença em outras espécies. Os carnívoros adquirem M.
bovis pelo consumo de carcaça contaminada. Estas espécies incluem leões, coiotes, lobos, hienas, leopardo, lince e leopardos. Também há relato de infecção por M. bovis em javalis, furões, guaxinins, gambás e suínos selvagens.
Os três principais métodos de controle de TB são teste e abate, teste e segregação e quimioterapia. O teste e a política de abate são os únicos a assegurar a erradicação da TB, pois envolvem o abate de animais reagentes ao teste de
tuberculina. Nos rebanhos infectados é recomendável o teste a cada 3 meses, de modo a eliminar do rebanho os animais que estão disseminando a infecção. Também são úteis as medidas de higiene de rotina que objetivam limpeza e
desinfecção de alimentos contaminados, bebedouros etc. O procedimento de teste e abate têm sido amplamente utilizado no Reino Unido, EUA, Canadá, Nova Zelândia e Austrália. Na maioria dos países europeus, onde este procedimento é
impraticável, as formas de teste e segregação são variáveis, sendo o teste e abate utilizado somente nos estágios finais da erradicação.
Fez­se experiência, no tratamento de TB em elefantes e primatas não humanos, do uso de fármacos efetivos em pessoas (p. ex., isoniazida, etambutol e rifampicina). A eficácia foi limitada e há argumentos contra a terapia, com base na
remoção de animais infectados, risco zoonótico e estímulo à resistência a drogas. O tratamento é ilegal em alguns países. A vacina BCG (bacilo Calmette­Guérin), às vezes é utilizada para controlar TB em pessoas, mas comprovou­se baixa
proteção em muitas espécies animais e a inoculação geralmente provoca reação granulomatosa local grave.

Animais Exóticos com Cascos em Cativeiro
Várias espécies, inclusive impala, gazela da África do Sul, elã, veado­áxis, gamo, pequeno cervo da Ásia e Europa, cervo híbrido, cervo sika, alce, rinoceronte branco e preto e girafa são suscetíveis à infecção por M. bovis. A consistência
das lesões da tuberculose varia de purulentas a caseosas e geralmente envolvem pulmões e linfonodos regionais; outros locais potenciais são fígado, baço e superfície serosa. Os testes cutâneos de tuberculina auxiliam no diagnóstico.

Bovinos
Em sua maioria, as discussões sobre TB referem­se aos bovinos. A introdução da pasteurização do leite foi o principal passo na luta contra a tuberculose humana e continua sendo um importante procedimento de controle em muitos países.

Cães
Os cães podem ser infectados por M. tuberculosis, M. bovis e, ocasionalmente, M. avium ou M. fortuitum,  em  geral  de  origem  humana  ou  bovina.  As lesões  tuberculosas  geralmente  são  encontradas  nos  pulmões,  fígado,  rins,  pleura  e
peritônio; têm aparência acinzentada, não calcificada e com centros necróticos. Em geral, as lesões são exsudativas e podem provocar grande quantidade de fluido cor­de–palha no tórax. Teste de tuberculina falso–negativo é comum nos
cães. Radiografias e histórico auxiliam no diagnóstico. Os animais infectados devem ser submetidos à eutanásia devido às preocupações relacionadas com a saúde pública.

Cervos e Alces
A tuberculose causada por M. bovis é  um  problema  importante  em  várias  espécies  de  cervídeos  domésticos  e  selvagens.  Os  cervos  parecem  ter  suscetibilidade  incomum  à  infecção  micobacteriana;  as  infecções  por M.  avium  parecem
provocar lesões semelhantes. A infecção por M. tuberculosis aparentemente é incomum. As lesões da tuberculose podem ser confinadas a um único linfonodo ou ser encontradas amplamente em linfonodos e órgãos após um curso rápido e
fulminante da doença. Em cervos, abscessos podem ser in­dicativos de TB. O diagnóstico pode ser auxiliado pela prova de tuberculina intradérmica, teste celular in vitro (ex. teste de estimulação de linfócitos do sangue ou ensaio com ?­
interferona), sorologia (ELISA) ou uma combinação desses. A infecção deve ser confirmada por testes baseados no isolamento da bactéria.

Elefantes
A  tuberculose  provocada  por M. tuberculosis foi  relatada  em  elefantes  em  cativeiro.  As  lesões  geralmente  envolvem  os  pulmões  e  os  linfonodos  associados.  Respostas  inespecíficas  são  observadas  nos  testes  imunológicos,  embora  o
diagnóstico  deva  ser  feito  com  base  no  isolamento  do  microrganismo  em  lavado  da  tromba.  Institui­se  o  protocolo  com  múltiplas  drogas  para  impedir  a  disseminação  de  M.  tuberculosis  por  meio  de  secreções  e  para  minimizar  o
desenvolvimento de cepas resistentes a drogas.

Equinos
Os equinos são relativamente resistentes à TB causada pelo complexo M. tuberculosis. Quando a doença se desenvolve, tubérculos e lesões não calcificadas geralmente são verificados no fígado, linfonodos mesentéricos, pulmões e outros
locais. O teste de tuberculina auxilia na erradicação da doença.

Gatos
Os  gatos  são  resistentes  à  infecção  por M. tuberculosis,  mas  são  suscetíveis  a  M.  bovis,  complexo  M.  avium  ou  bacilo  M.  microti.  Algumas  formas  bacilares  não  classificadas  foram  isoladas.  Leite  contaminado  causa  lesões  no  trato
gastrintestinal, tipicamente nos linfonodos mesentéricos, sendo esta a condição mais comum e historicamente responsável pela alta porcentagem de gatos tuberculosos na Europa. Pode ocorrer rápida disseminação hematógena para outros
órgãos, entre eles os pulmões e os linfonodos regionais. Pele infectada ou ferida mais profunda às vezes dá origem a seios tuberculosos. As lesões apresentam área de necrose central, geralmente sem calcificação. O teste de tuberculina
cutâneo não é considerado confiável em gatos. O diagnóstico pode ser auxiliado por radiografia, ELISA ou cultura da bactéria. Os gatos infectados devem ser submetidos à eutanásia devido à preocupação com a saúde pública.

Mamíferos Marinhos
M. pinnipedii (uma variante de M. bovis adaptada à foca) causa lesões tuberculosas em focas e leões marinhos. Em vários países, a bactéria foi isolada em quatro espécies de focas e duas espécies de leões marinhos, bem como de outros
animais. Em focas, o microrganismo provoca lesões nos linfonodos peritoneais, baço, peritônio e pulmões. A presença de bactérias ácido­resistentes varia nas lesões granulomatosas é variável. Aerossóis são considerados a principal via de
transmissão. Em razão do risco zoonótico, precauções devem ser tomadas quando se manipula estes animais (ver p. 1973).

Ovinos e Caprinos
As lesões causadas por M. bovis nos pulmões e linfonodos de ovinos e caprinos são similares àquelas de bovinos e o microrganismo pode, às vezes, disseminar­se para outros órgãos. Ovinos e caprinos são completamente resistentes  à
infecção por M. tuberculosis. O teste intradérmico único é comumente utilizado no diagnóstico.

Primatas Não Humanos
Os macacos e os grandes antropoides são suscetíveis a M. bovis, M. tuberculosis e M. avium, que causam doenças graves nos pulmões e em outros órgãos. As epidemias em colônias de primatas podem ser ocasionadas pelo contato com
cuidadores humanos infectados. A transmissão geralmente ocorre por meio de aerossol, na infecção respiratória, sendo também possível contaminação por VO. O bacilo também pode ser excretado na urina. O teste cutâneo com tuberculina
utilizando PPD preparado para animais é superior ao PPD preparado para pessoas, no diagnóstico da doença.
Suínos
Os suínos são suscetíveis a M. tuberculosis, M. bovis e complexo M. avium. M. avium avium é o mais frequentemente isolado e a identificação sorológica auxilia na investigação epidemiológica. As lesões granulomatosas geralmente são
encontradas nos linfonodos cervicais, submandibulares e mesentéricos, mas também podem ser encontradas por toda parte. Tipicamente, ocorre hiperplasia dos linfonodos contendo focos caseosos, brancos ou amarelados, geralmente sem
evidência  de  mineralização.  Os  suínos  com  a  doença  provocada  por  M.  tuberculosis  podem  apresentar  lesões  semelhantes  regionalizadas.  Os  suínos  são  particularmente  suscetíveis  à  infecção  por  M.  bovis,  geralmente  adquirida  em
pastagens compartilhadas ou pela ingestão de produtos lácteos. Isso pode causar rápida progressão da doença disseminada, com lesões caseosas e liquefeitas. O teste intradérmico único, realizado na face dorsal das orelhas, auxilia no
diagnóstico.

 OUTRAS INFECÇÕES MICOBACTERIANAS, ALÉM DE TUBERCULOSE
Micobactérias encontradas no solo e na água foram isoladas em tecidos animais. M. fortuitum, um microrganismo de crescimento rápido altamente resistente à penicilina G, estreptomicina, ampicilina, sulfametoxazol e cloranfenicol foi
associado  à  mastite  em  vacas,  infecções  pulmonares  em  cães,  lesões  de  linfonodos  em  suínos  e  em  alguns  animais  exóticos,  bem  como  com  lesões  cutâneas  em  gatos  e  cães.  Os  testes  de  suscetibilidade  a  fármacos  indicam  que  o
microrganismo é inibido por capreomicina e etionamida. M. chelonae, outra micobactéria de crescimento rápido e semelhante a M. fortuitum nas reações bioquímicas, foi isolado de ferimentos e abscessos causados por injeção contaminada.
Devem­se distinguir esses microrganismos de M. phlei, M. smegmatis e M. vaccae que raramente, ou nunca, são patogênicos.
Peixes e outros animais de sangue frio podem ser infectados por M. avium intracellulare ou M. marinum, reconhecidos como patógenos humanos. Um microrganismo fotocromogênico, M. kansasii,  foi  isolado  em  suínos,  bovinos  e
primatas não humanos. Podem­se diferenciar esses microrganismos por meio de testes bioquímicos e soroaglutinação.
M. avium paratuberculosis, que causa a doença de Johne, foi isolado de ruminantes domésticos e selvagens (ver paratuberculose, p. 778). É uma doença diarreica insidiosa e progressiva que resulta em perda de peso e emaciação. As
lesões são observadas com mais frequência na válvula ileocecal e são associadas aos linfonodos. O diagnóstico deve se basear no isolamento da bactéria. Não há tratamento disponível.
Mycobacterium scrofulaceum, um escotocromógeno, também é isolado de lesões de linfonodos em suínos, bovinos e alguns primatas não humanos. Isolou­se M. xenopi, um escotocromógeno de crescimento lento, em suínos, anfíbios e
aves aquáticas. Devem­se diferenciar esses microrganismos de M. gordonae e M. flavescens e de outras micobactérias escotocromogênicas de crescimento lento, que são contaminantes comuns da água.
Podem ser isoladas da água e do solo várias micobactérias não fotocromogênicas e não patogênicas, que lembram muito patógenos em potencial; M. nonchromogenicum, M. gastri, M. triviale e M. terrae podem ser isolados e lembram
estreitamente cepas do complexo M. avium, em exames laboratoriais in vitro, inclusive em PCR.
Embora as micobactérias oportunistas geralmente não consigam provocar doença progressiva, podem ser importantes na indução de sensibilidade cutânea transitória à tuberculina, em animais. A aplicação de testes cutâneos comparativos
utilizando tuberculinas PPD biologicamente balanceadas preparadas a partir de filtrados de culturas de M. bovis e M. avium, propicia informações úteis acerca da possível causa de sensibilidade cutânea à tuberculina. Devem ser utilizadas
tuberculinas preparadas para uso veterinário, que contêm cerca de 5.000 unidades de tuberculina por dose, nos testes cutâneos em animais domésticos, selvagens e exóticos.
M. lepraemurium,  um  bacilo  ácido­resistente  de  crescimento  lento  e  não  fotocromogênico,  causa  doença  em  gatos  e  ratos  semelhante  em,  alguns  aspectos,  à  hanseníase  humana.  Pode  crescer  em  meios  contendo  citocromo  C  e  a­
cetoglutarato. M. lepra, a causa da hanseníase humana, foi isolado em doenças de ocorrência espontânea em tatus. Esse microrganismo não cresce em meio de cultura artificial, entretanto o DNA do M. leprae pode ser identificado por PCR.

TULAREMIA

A tularemia é uma sepse bacteriana que acomete > 250 espécies de mamíferos domésticos e selvagens, répteis, pássaros, peixes e pessoas. É considerada agente de bioterrorismo categoria A devido seu potencial de disseminação pelo ar.
ETIOLOGIA:  O microrganismo causador, Francisella tularensis,  é  um  cocobacilo  Gram­negativo,  não  formador  de  esporos,  que  se  relaciona  antigenicamente  com Brucella spp.  É  um  parasito  intracelular  facultativo  que  é  rapidamente
destruído pelo calor e por desinfecção apropriada, mas sobrevive por semanas ou meses em ambiente úmido. É de crescimento fastidioso, mas pode ser cultivado facilmente. Há dois tipos de microrganismos, com base em sua bioquímica e
virulência. Na América do Norte encontra­se predominantemente o tipo A, que é mais virulento; no homem, a taxa de mortalidade pode ser de 5 a 7%, se a doença não for tratada. O tipo A, adicionalmente, é subdividido em subpopulações
distintas, A1 e A2, que se diferem quanto à gravidade clínica. O tipo B é menos virulento e mais comumente isolado de animais aquáticos e de infecções associadas à água, na América do Norte e Eurásia. Os dois tipos foram isolados de
artrópodes vetores.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  Em animais domésticos, os ovinos são os principais hospedeiros, mas a infecção clínica foi relatada em cães, suínos e equinos. Os gatos estão em risco maior devido ao seu comportamento de predador e
parecem ter maior suscetibilidade, enquanto os bovinos parecem resistentes. Pouco se sabe sobre a verdadeira prevalência e o espectro dos sinais clínicos nos animais domésticos. São hospedeiros selvagens importantes: lebre, coelho­
americano, castor, rato almiscarado, rato­da–campina e ovinos, na América do Norte, e outros roedores, camundongos­do­campo e lemingues, na Europa e Ásia.
Há focos naturais da infecção na América do Norte e Eurásia, onde o micro­organismo circula entre os artrópodes vetores e vários mamíferos, pássaros, répteis e peixes. Embora seja encontrado também em todos os Estados, exceto no
Havaí, a tularemia é geralmente reportada no centro­sul e no leste dos EUA (p. ex., Missouri, Oklahoma, Dakota do Sul e Montana).
A tularemia é uma zoonose clássica, passível de ser transmitida por meio de aerossol, contato direto, ingestão ou pelos artrópodes. A inalação de aerossóis infectantes (como no laboratório ou como agente aerógeno em atos bioterroristas)
pode provocar uma forma pulmonar da doença. O contato direto com carcaças infectadas de animais selvagens (p. ex., lebre), ou sua ingestão, pode causar uma forma ulceroglandular, oculoglandular ou orofaringiana (lesão local com
linfadenite regional) ou uma forma tifoide da enfermidade. A imersão ou ingestão de água contaminada pode provocar infecção nos animais aquáticos. Os carrapatos podem manter a infecção pelas vias transestadial e transovariana, o que
os torna reservatórios eficientes, bem como vetores. Os vetores reconhecidos nos EUA incluem Dermacentor andersoni (carrapato­do­mato), Amblyomma americanum (carrapato­estrela solitário), Dermacentor variabillis (carrapato­dos­
cães) e Chysops discalis (mosca­dos­veados).
A fonte de infecção mais comum para o homem e herbívoros é a picada de um carrapato infectado, mas as pessoas que depenam caça e preparam ou consomem carne de caça mal cozida também estão em maior risco de infecção. Cães,
gatos e outros carnívoros podem adquirir a infecção pela ingestão de carcaça infectada. Há poucos casos reportando gatos como fonte de infecção em pessoas.
ACHADOS CLÍNICOS:  O período de incubação da tularemia é de 1 a 10 dias. Nos ovinos e na maioria dos mamíferos, caracteriza­se por início súbito de febre alta, letargia, anorexia, rigidez, redução da mobilidade ou outros sinais associados
à  doença  septicêmica.  As  frequências  respiratórias  e  de  pulso  aumentam  e  pode  haver  tosse,  diarreia  e  polaciúria.  É  possível  prostração  e  morte  em  poucas  horas  ou  dias.  Em  qualquer  espécie,  os  casos  esporádicos  são  mais  bem
reconhecidos por meio dos sinais de sepse. A taxa de mortalidade pode ser de até 15% nos surtos em cordeiros não tratados. Casos subclínicos são comuns.
Lesões:  As  lesões  mais  consistentes  são  focos  de  necrose  miliar  de  coloração  branca  a  branco­sujo  no  fígado  e,  às  vezes,  no  baço  e  linfonodos.  É  comum  hiperplasia  de  fígado,  baço  e  linfonodos.  Podem­se  isolar  facilmente  os
microrganismos em amostras obtidas durante a necropsia, em meios de cultura especiais. O risco de infecção durante a necropsia ou para o pessoal de laboratório é significativo; tornam­se essenciais instalações e procedimentos especiais.
DIAGNÓSTICO:  A tularemia deve ser diferenciada de outras doenças septicêmicas (especialmente de peste bubônica) ou de pneumonia aguda. Quando grande número de ovinos exibem os sinais típicos durante os períodos de alta infestação
de carrapatos deve­se suspeitar de tularemia ou de paralisia causada por carrapato (p. 1401). A tularemia deve ser considerada em gatos com sinais agudos de linfadenopatia, mal­estar, úlceras bucais e história recente de ingestão de caças
selvagens.
O diagnóstico de infecção aguda é confirmado por meio de cultura e identificação da bactéria, pelo teste de imunofluorescência indireta ou indireta ou pelo aumento de 4 vezes no título de anticorpos, comparando­se a amostra de soro
obtida na fase aguda e com aquela do período de convalescência. Um único título = 1:80 no teste de aglutinação em tubo é evidência presuntiva de infecção anterior. Quando se suspeita de tularemia, o pessoal do laboratório deve ser
alertado, de modo a minimizar o risco de infecção adquirida no laboratório.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Estreptomicina,  gentamicina,  cloranfenicol  e  tetraciclinas  são  eficazes  nas  doses  recomendadas.  O  tratamento  com  gentamicina  deve  se  estender  por  10  dias.  Como  a  tetraciclina  e  o  cloranfenicol  são
bacteriostáticos, a terapia deve ser continuada por 14 dias, a fim de reduzir o risco de recidiva. O tratamento precoce deve impedir o prejuízo por morte. O controle é difícil e se limita à redução da infestação de carrapatos e ao diagnóstico e
tratamento  precoces.  Pode  ser  necessário  um  tratamento  prolongado,  já  que  muitos  microrganismos  são  intracelulares.  Atualmente  empenha­se  no  desenvolvimento  de  vacina  segura  e  efetiva.  A  recuperação  confere  uma  imunidade
prolongada.

ANEMIA INFECCIOSA EQUINA

A anemia infecciosa equina (AIE) acomete equídeos; é causada por um lentivírus específico de equinos, da família dos retrovírus, denominado vírus da anemia infecciosa equina (VAIE). Embora a maioria das infecções persistentes tenha
consequências clínicas mínimas, a forma epizoótica da doença apresenta altas taxas de morbidade e de mortalidade. A infecção pode ser seguramente diagnosticada mediante testes laboratoriais. Em vista da falta de vacinas seguras e
eficazes, muitos países estabeleceram um programa de controle baseado em testes sorológicos. As infecções pelo VAIE parece persistir por toda a vida do animal.
TRANSMISSÃO E PATOGENIA:  AIE é uma infecção hematógena e o vírus pode estar livre no plasma ou associado a células, principalmente monócitos, macrófagos e células endoteliais. Na natureza, os insetos hematófagos iniciam a maioria
das infecções por meio da transferência mecânica do sangue infectado entre equinos que convivem na proximidade. Mutuca, mosca­amarela (deer fly) e, ocasionalmente, mosca­do­estábulo parecem ser os vetores mais eficientes porque a
dor de suas picadas inicia um comportamento de defesa do hospedeiro, interrompendo a alimentação e resultando em comportamento de busca por hospedeiro. Como o VAIE não se multiplica nos insetos, os equídeos infectados parecem
ser seu único reservatório. A transmissão iatrogênica tem alto potencial epizoótico, que pode ser evitado mediante medidas preventivas, como descarte ou descontaminação dos equipamentos e não utilização de materiais contaminados de
um animal para o outro. Um surto recente de AIE na Irlanda provocou sérias preocupações quanto ao potencial de transmissão viral, direta ou indireta, de equino para equino.
ACHADOS CLÍNICOS:  Equídeos expostos geralmente sustentam a replicação viral por dias a semanas antes da detecção de anticorpos contra VAIE. O período de incubação varia de 10 a = 45 dias; geralmente situa­se ao redor de 21 a 42 dias
após a transmissão natural. Em geral, o pico da viremia é notado durante o episódio febril, antes que o equino torna­se positivo no teste laboratorial. Esses sinais agudos geralmente não são verificados nos equinos que permanecem no pasto
e podem ser acompanhados de discreta redução da contagem de plaquetas, além de inapetência transitória. Geralmente, a infecção só é notada após o teste de rotina para detecção de AIE ou quando o animal desenvolve sinais recidivantes
de febre acompanhados de redução da contagem de plaquetas, petéquias hemorrágicas, anemia, depressão, perda de peso, caquexia e edema dependente (característica da forma crônica de AIE). A infecção pelo VAIE pode ser inaparente ou
apresentar­se na forma aguda ou crônica.
As manifestações clínicas são determinadas, em parte, pela cepa viral e pela quantidade de vírus, além da linhagem genética e da condição imune dos equinos. Por exemplo, cepas de VAIE adaptadas por rápidas passagens seriadas em
equinos podem matar esses animais dentro de 14 dias após a infecção, porém não causam sintomas em asininos. Por outro lado, cepas que produzem ou não sinais clínicos discretos nos adultos podem matar os fetos imunologicamente
imaturos ou os potros imunodeficientes. Frequentemente, o VAIE infecta determinado grupo e se dissemina silenciosamente até que a forma crônica da doença seja notada. Assim, uma alta porcentagem de animais do grupo pode estar
infectada. No entanto, um surto recente na Irlanda foi associado a altas taxas de morbidade e de mortalidade, inesperadas.
Lesões: Nos casos agudos, o baço e os linfonodos esplênicos ficam aumentados. Na doença crônica, a necropsia revela emaciação, membranas mucosas pálidas, petéquias hemorrágicas, edema subcutâneo dependente, esplenomegalia e
aumento dos linfonodos abdominais.
Microscopicamente,  nota­se  proliferação  de  células  reticuloendoteliais  em  vários  órgãos,  aglomerados  de  células  redondas  no  sistema  periporta  e  perissinusoidal  do  fígado  com  acúmulo  de  hemossiderina  nas  células  de  Kupffer.
Acúmulos linfoides perivasculares podem ser observados também em outros órgãos. Em muitos equinos, ocorre glomerulite proliferativa com deposição de IgG e complementos nos glomérulos.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico clínico deve ser confirmado por sorologia. O teste de imunodifusão em ágar gel (AGID, Coggins) é internacionalmente aceito; as fontes antigênicas incluem cultura celular com propagação do vírus e proteínas
recombinantes. Uma variedade de testes ELISA para detecção de anticorpos contra VAIE são aceitos em muitos países e ajuda no diagnóstico prático da infecção pelo VAIE. O teste ELISA pode ser realizado em minutos (em comparação, a
duração do teste AGID, cujo resultado demora 1 a 2 dias). Em todos os casos, o resultado positivo no teste ELISA deve ser confirmado pelo teste AGID antes de se adotar ações reguladoras, devido à alta taxa de resultados falso­positivos.
Quando são utilizados os 2 testes combinados, obtém­se alto nível de sensibilidade e especificidade.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Não há tratamento específico, tampouco vacina disponível. Os equinos infectados pelo VAIE são a única fonte conhecida de infecção e os animais positivos ao teste de anticorpo devem ser mantidos a uma
distância segura (cerca de 200 m) dos outros equídeos. A única exceção conhecida a essa regra é a cria de éguas soropositivas, que podem ter anticorpos maternos contra VAIE após ingerir colostro. Na maioria dos casos, os anticorpos
passivos contra VAIE diminuem até serem negativos no teste AGID, aos 6 a 8 meses de idade; no entanto, anticorpos detectáveis podem persistir por até 12 meses, especialmente quando se utiliza o teste ELISA.
O risco associado à manutenção de grupo de reprodutores infectados é variável. Estudos a campo indicaram grande sucesso no aumento da taxa de potros negativos ao teste AGID, oriundos de animais portadores de AIE inaparente. O
risco de infecção intrauterina aumenta drasticamente, se os sinais clínicos de AIE são verificados na fêmea antes do parto. Infelizmente, não é possível determinar com segurança o risco em qualquer animal infectado pelo VAIE. Equinos
portadores inaparentes mantêm baixo teor de anticorpos e graus de viremia variáveis, que podem aumentar em condições de estresse. Quando comparados com equinos soronegativos saudáveis, os carreadores inaparentes exibem aumento
da concentração sérica de globulinas e alteração na população de linfócitos, que são compatíveis com estímulo imune ou inflamação crônica. Como os animais positivos permanecem infectados a vida toda, muitas agências de controle
consideram que todos os animais positivos para AIE são de alto risco.
Nos EUA, equinos soropositivos devem ser mantidos em quarentena por até 24 h após o conhecimento do resultado positivo ao teste. O local de quarentena deve permitir distância de pelo menos 180 metros dos outros equinos. Após a
confirmação do teste, os equinos soropositivos devem ser permanentemente identificados utilizando o número do código oficial registrado no USDA para o estado no qual o animal foi testado seguido da letra A. Esta identificação pode ser
feita por meio de ferro quente, marca química, marca por congelamento ou tatuagem de lábio e deve ser realizada por um representante do USDA. Equinos reagentes devem ser removidos do lote e colocados em quarentena nas instalações
de origem ou ser submetidos à eutanásia ou abate. Podem ser transportados entre os Estados apenas sob permissão oficial, para abatedouro inspecionado pelo governo federal, um centro de diagnóstico ou pesquisa federal credenciado ou
para retornar ao local de origem. Após o diagnóstico positivo do animal do lote, todos os equinos do local devem ser submetidos a teste de AIE, repetido até que se constatem apenas equinos negativos. Os equinos devem ser novamente
testados intervalos de 30 a 60 dias, até que nenhum caso positivo seja detectado. A quarentena das instalações é liberada quando os testes de todo o lote são negativos pelo menos 60 dias após a remoção do equino positivo.
Todos os equinos que transitam nas divisas estaduais, nos EUA, devem ser testados para AIE e com resultado negativo nos 12 meses que antecedem o transporte. Todos os equinos que participam de leilões ou são negociados ou doados
entre Estados devem ser negativos ao teste para AIE antes da venda ou o animal deve ser mantido em quarentena dentro do Estado, até que o resultado do teste seja conhecido.
Também, recomenda­se que os donos de equinos implementem um plano de controle de AIE nas suas propriedades. Todos os equinos devem ser testados pelo menos a cada 12 meses, como parte do programa de controle. Testes mais
frequentes são indicados em áreas com alta prevalência de AIE. Os proprietários de equinos que participam de exposições ou competições devem comprovar teste negativo para AIE. Novos equinos introduzidos no rebanho devem ter teste
negativo para AIE antes de entrar na propriedade ou devem ficar isolados enquanto se realiza o teste. O controle prático dos vetores inclui a aplicação de inseticidas e repelentes e o controle no ambiente. Princípios de boa higiene e
desinfecção devem ser mantidos para prevenir infecções iatrogênicas dos equinos com agulhas, seringas ou equipamentos contaminados.

ARTERITE VIRAL EQUINA (Celulite­conjuntivite epizoótica, Tifo equino, Rotlaufseuche)

A arterite viral equina (AVE) é uma doença viral aguda contagiosa de equídeos, causada pelo vírus da arterite equina (VAE). A enfermidade é caracterizada por febre, depressão, anorexia, leucopenia, edema dependente (especialmente na
porção distal dos membros, escroto e prepúcio em garanhões), conjuntivite, edema supra ou periorbital, secreção nasal, aborto e, raramente, doença e morte de potros jovens.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  O vírus da arterite equina é um RNA­vírus pequeno e envelopado; é o vírus protótipo do gênero Arterivirus, família Arteriviridae, ordem Nidovirales. É um dos 3 mais importantes vírus patogênicos do trato
respiratório  de  equinos.  O  vírus  não  resistente  no  ambiente  fora  do  corpo  e  a  sobrevivência  em  temperaturas  =  37°C  é  breve.  No  entanto,  o  VAE  pode  manter  a  infectividade  em  amostras  de  tecidos  e  fluidos  por  longo  tempo,  se
armazenadas em temperatura igual ou abaixo da temperatura de congelamento. Pode permanecer viável em sêmen congelado por vários anos.
Embora apenas um sorotipo do vírus tenha sido bem identificado, a cepa­protótipo Bucyrus, há evidências de amplas variações genômicas e antigênicas, em razão de diferenças temporais e geográficas dos diversos isolados. A variação
na patogenicidade também ocorre entre as cepas virais, algumas sendo capaz de causar sintomas graves da doença, enquanto outras só ocasionam febre.
Após a exposição ao aerossol, o vírus da arterite equina invade o epitélio respiratório e multiplica­se nos macrófagos bronquiais e alveolares. Estas células transportam o vírus para os linfonodos regionais, onde ele passa por novo ciclo
de replicação antes de ser liberado na corrente sanguínea. A viremia associada a células, assegura a disseminação do VAE por todo o corpo. Após 6 a 8 dias o vírus se instala no endotélio vascular e em miócitos mediais de pequenos vasos
sanguíneos, especialmente nas arteríolas, causando panvasculiste. Ele também pode ser encontrado no epitélio de certos tecidos, particularmente adrenais, túbulos seminíferos, tireoide e fígado. As lesões vasculares características incluem
edema e degeneração endotelial, infiltração neutrofílica e necrose da túnica média dos vasos infectados. As lesões vasculares causam edema e hemorragia que, acredita­se ser resultado da ativação de citocinas proinflamatórias. A lesão
vascular máxima ocorre até cerca de 10 dias; após este período as lesões melhoram.
Infecções experimentais de éguas prenhes com cepas Bucyrus altamente virulenta resultaram em aborto decorrente de miometra, redução da circulação placentária e morte do feto. No entanto, isto pode não representar a patogenia do
aborto nas infecções por VAE adquiridas, a qual ainda não está bem determinada.
Arterite viral equina; edema ocular. Cortesia do Dr. Peter J. Timoney.

Arterite viral equina; edema escrotal. Cortesia do Dr. Peter J. Timoney.

Exceto para alguns garanhões, a infecção viral não é mais detectável em vários tecidos ou fluidos corporais, além de 28 dias após a infecção. Garanhões que permanecem persistentemente infectados, por sua vez, abrigam o vírus nas
glândulas  sexuais  acessórias,  especialmente  na  ampola  do  canal  deferente,  onde  podem  permanecer  por  muitos  anos.  Alguns  garanhões  carreadores  podem  disseminar  o  VAVE  a  partir  do  trato  reprodutivo,  mesmo  após  um  período
prolongado.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  Embora a variação dos hospedeiros naturais e experimentais do vírus da AVE permaneça restrita aos equídeos, há informações limitadas sugerindo que o vírus também pode infectar alpacas e lhamas. Não
há evidência de que o VAE possa ser transmitido às pessoas. Com base nos achados sorológicos de pesquisas e nos relatos de surtos de AVE, o vírus está presente na população equina em muitos países em todo o mundo, com exceção do
Japão e Islândia. A prevalência das infecções varia severamente entre os países e algumas raças no mesmo país. O vírus é altamente frequente em raças tradicionais e de sangue quente. Apesar da ampla distribuição global do VAE surtos
confirmados pelo laboratório de arterite viral equina são relativamente incomuns. Esta situação parece ter mudado nos últimos anos com um aumento do número de ocorrências da doença que está sendo relatado. O maior fator que tem
contribuído para esta mudança é o contínuo crescimento do volume internacional de negócios de equinos e sêmen desta espécie.
A epidemiologia de arterite viral equina (AVE) envolve fatores como vírus, hospedeiro e ambiente, inclusive a variabilidade da patogenicidade entre as cepas de vírus, vias de transmissão, existência de garanhões portadores e natureza da
imunidade contra a infecção. Os surtos de AVE são geralmente ligados à transferência de animais e da remessa de sêmen. Frequentemente, a transmissão viral é mínima se algum sinal clínico for detectado em equídeos com infecção aguda.
A  transmissão  da  infecção  AVE  pode  ocorrer  pela  via  respiratória,  venérea,  congênita  ou  indireta.  A  transmissão  por  aerossol  é  o  principal  modo  de  propagação  entre  os  equinos.  A  transmissão  por  aerossol  é  a  principal  via  de
disseminação do vírus durante a fase aguda da infecção. Isto é principalmente responsável pela transmissão do VAE entre equinos sem infecção prévia mantidos em contato próximo (p. ex., provas hipismo ou de corrida, exposições, leilões,
clínicas veterinárias e fazendas de criação). O vírus também pode ser transmitido por via venérea, mediante infecção aguda das fêmeas ou infecção aguda ou crônica dos garanhões. As éguas podem ser infectadas pela via venérea após
monta natural ou inseminação artificial com sêmen infectado. Há evidências de que o VAE pode ser disseminado através de transferência de embriões. O vírus também pode ser transmitido indiretamente com o uso de fômites contaminados
(p. ex., ferramentas, material de contenção) e pelas mãos ou roupas dos tratadores.
A condição de portador pode ser confirmada em machos não castrados, especialmente em potros após a puberdade e garanhões, mas não em éguas, animais castrados, potros ou potrancas sexualmente imaturas. O estabelecimento e a
persistência do VAE no trato reprodutivo de garanhões é dependente de testosterona. O garanhão portador é um reservatório natural do VAE, sendo responsável por sua disseminação e persistência. Frequentemente, a taxa de condição de
portador pode ser < 10% até > 70%. Garanhões infectados podem disseminar o VAE constantemente em frações ricas em esperma e no sêmen, mas não em outro tipo de secreção ou excreção. A duração da condição de portador pode variar
de semanas a vários anos. A porcentagem de cura espontânea dos portadores é variável, quanto à persistência de garanhões infectados, sem evidência de subsequente risco de disseminação do microrganismo. O estado de portador não
parece prejudicar a fertilidade dos garanhões infectados, tampouco sua condição clínica. Garanhões portadores também atuam como principal meio de indução de diversificação genética do vírus.
Comparado com outros vírus respiratórios equinos, o VAE estimula fortemente e de forma duradoura a imunidade, que protege contra o desenvolvimento da doença clínica e o estabelecimento da condição de portadores em garanhões.
Altos teores de anticorpos neutralizantes, que persistem pelo menos 2 a 3 anos, podem ser estimulados pela exposição viral ou mediante vacinação.
ACHADOS CLÍNICOS:  A exposição ao vírus da arterite equina pode resultar em infecção clínica ou inaparente, dependendo da cepa de vírus envolvida, da carga viral, da idade e das condições físicas do animal, bem como de vários fatores
ambientais. Estudos revelam que muitos casos de infecção natural são subclínicos. O início dos sinais clínicos é precedido por período de incubação de 3 a 14 dias, que varia principalmente com relação à via de exposição. Os sinais clínicos
variam amplamente em extensão e gravidade entre os surtos de AVE e entre os casos de indivíduos infectados em um mesmo surto. Tipicamente pode ocorrer qualquer combinação dos seguintes sintomas: febre com duração de 2 a 9 dias,
leucopenia,  depressão,  anorexia,  edema  de  membros  (especialmente  de  pélvicos)  e  edema  de  prepúcio  e  escroto.  Sinais  menos  consistentes  incluem  conjuntivite,  lacrimejamento  e  fotofobia,  edema  periorbital  ou  supraorbital,  rinite  e
secreção nasal, edema da parede ventral do corpo (inclusive da glândula mamária, em fêmeas), reação cutânea de urticária, frequentemente localizada nos lados do pescoço ou na cabeça (embora possa ser generalizada), andar rígido,
dispneia, diarreia, icterícia e ataxia.
Cepas de VAE podem causar aborto ao longo da gestação (dos 3 meses até mais 10 meses). O aborto pode ocorrer tardiamente, na fase aguda ou na fase de convalescença da doença, com ou sem sinais clínicos prévios de arterite viral
equina. Nos surtos naturais, a taxa de aborto pode ser < 10% e chegar a mais de 60%. Não há evidência comprobatória de que éguas inseminadas com sêmen infectado por VAE abortarão no final da gestação. As fêmeas que abortam já
estavam prenhes antes da exposição e a disseminação do vírus é rápida, principalmente por via respiratória, pela proximidade com outro animal anteriormente infectado. O aborto ocorre 1 a 4 semanas após o contato. As fêmeas infectadas
no final da prenhez podem não abortar, mas os potros nascem com infecção congênita. Não há prova de que éguas que abortam em razão do VAE são menos férteis.
Os garanhões infectados com VAE podem passar por um curto período de subfertilidade. Isso foi observado em indivíduos que desenvolveram febre alta e prolongada e edema extenso de escroto. Garanhões afetados podem apresentam
redução da libido associado à diminuição da motilidade espermática e de percentual da morfologia normal dos espermatozoides. As alterações qualitativas do sêmen se devem ao aumento da temperatura intratesticular e não ao efeito direto
do VAE na espermatogênese e na função testicular. As alterações do sêmen podem durar 14 a 16 semanas, antes de retornar ao normal. Não é observado efeito adverso duradouro na fertilidade de garanhões que apresentam cura completa.
A frequência e a gravidade dos sinais clínicos associados à infecção por AVE tendem a ser mais evidentes em animais jovens, velhos ou debilitados. Independente da gravidade do quadro clínico, os equinos infectados invariavelmente
têm cura completa, mesmo quando não se faz tratamento sintomático. Morte de animais mais velhos é muito rara em surtos naturais. No entanto, potros jovens com poucos meses de idade podem morrer em decorrência de pneumoenterite
ou pneumonia fulminante.
Lesões: As lesões macro e microscópicas em casos fatais refletem a extensa e considerável lesão vascular causada pelo vírus. Estas descrições são principalmente baseadas em infecções experimentais com uma cepa Bucyrus altamente
patogênica  do  VAE.  Os  achados  macroscópicos  mais  evidentes  são  edema,  congestão  e  hemorragia,  especialmente  no  tecido  subcutâneo  dos  membros  e  do  abdome,  bem  como  excesso  de  fluidos  peritoneal,  pleural  e  pericárdico.  Os
linfonodos torácicos e intra­abdominais, bem como dos intestinos, especialmente o ceco e o cólon, podem apresentar edema e hemorragia. Edema pulmonar, enfisema, pneumonia intersticial, enterite e infarto no baço foram descritos em
casos fatais da doença nos potros.
Com frequência, os fetos abortados encontram­se parcialmente autolisados. Em geral, não há lesões macroscópicas; se presentes, podem se limitar a um excesso de fluidos em cavidades corporais e grau variável de edema pulmonar
interlobular. O dano vascular e as lesões imunomediadas em animais mais velhos raramente são notadas em fetos infectados.
A lesão microscópica característica é vasculite, que envolve principalmente as arteríolas e as pequenas veias. Histologicamente as alterações variam desde edema vascular e perivascular, com infiltração linfocítica ocasional e hipertrofia
das células endoteliais, nos casos brandos, até a necrose fibrinoide de túnica média, infiltração linfocítica extensa, necrose e perda do endotélio, bem como formação de trombos, em casos graves. As lesões microscópicas não são uma
característica constante em abortos. A vasculite, se presente, é observada na placenta, cérebro, fígado, baço e pulmões dos fetos.
Os casos fatais da infecção em potros novos são caracterizados por edema interlobular, congestão e infiltração de células mononucleares nos pulmões, depleção linfoide e hemorragia no tecido linforreticular. Hemorragias focais e necrose
da mucosa intestinal foram descritas em associação com enterites.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos de arterite viral equina podem mimetizar sinais que ocorrem em outras doenças respiratórias e não respiratórias da espécie equina. Portanto, a confirmação laboratorial é fundamental para estabelecer o
diagnóstico. Influenza equina, rinopneumonite equina, infecções pelos vírus da rinite equina tipos A e B e adenovírus equino, bem como púrpura hemorrágica, são as doenças mais comuns que clinicamente se assemelham a AVE. Esta
última  deve  ser  diferenciada  de  casos  esporádicos  de  anemia  infecciosa  equina  (AIE),  intoxicação  por  flor­de­mel  branca  (Berteroa  incana)  e  urticária  induzida  por  alergia.  Algumas  doenças  exóticas  que  devem  ser  consideradas  no
diagnóstico diferencial de AVE incluem infecção pelo vírus Getah, tripanossomíase e peste equina africana (p. 746).
O aborto causado pelo vírus da arterite equina deve ser diferenciado daquele causado por herpesvírus equino tipo 1 e 4. Esta diferenciação é útil, mas não é característica confirmatória de distinção, pois éguas que abortam em decorrência
de AVE podem manifestar evidência clínica prévia de arterite viral equina, enquanto éguas que abortam devido à infecção por herpesvírus raramente exibem sinais premonitórios. Além disso, os fetos infectados pelo VAVE geralmente
apresentam autólise no momento da expulsão e frequentemente são desprovidos de qualquer lesão macroscópica. Por outro lado, os fetos abortados em razão da infecção herpesvírus são invariavelmente “frescos” e em geral exibem lesões
macro e microscópicas.
Na suspeita de surto, a confirmação laboratorial de AVE deve ser realizada o mais rápido possível. O diagnóstico pode se basear no isolamento viral, na detecção do ácido nucleico ou antígeno viral ou na demonstração de resposta de
anticorpo humoral recente em testes pareados (fases aguda e de convalescência), sendo as amostras de soro obtidas em intervalo de 3 a 4 semanas.
As amostras apropriadas para o isolamento viral e/ou detecção de ácido nucleico por transcriptase reversa­PCR incluem lavado ou suabe de nasofaringe e amostras de sangue com anticoagulante (EDTA ou citrato). Para aumentar a
chance de isolamento ou detecção, as amostras devem ser obtidas o mais rápido possível após a constatação dos sinais clínicos. Após a coleta, os suabes devem ser transferidos diretamente para o meio de transporte para vírus e enviados
refrigerados  ou  congelados  em  recipiente  hermeticamente  fechado  e  encaminhado  por  meio  de  um  serviço  de  entrega  rápida  para  um  laboratório  habilitado  para  realizar  o  exame.  A  amostra  de  sangue  com  anticoagulante  deve  ser
transportada refrigerada, mas não congelada.
Nos casos suspeitos de aborto por AVE, os fluidos e tecidos placentários, juntamente com tecido linforreticular e outros tecidos fetais, além do fluido pleural ou peritoneal, podem ser fontes produtivas do vírus. Quando ocorre morte de
potros jovens ou de equinos idosos e há suspeita da infecção pelo vírus, amostras de fluidos das cavidades abdominal e torácica e de órgãos relacionados devem ser colhidas e submetidas a exame laboratorial, inclusive testes histológicos e
imunoistoquímicos.
A detecção da condição de carreador em um garanhão é baseada na confirmação inicial do estado de soropositivo do paciente. Na ausência de histórico vacinal certificado, os garanhões com título de anticorpos neutralizantes = 1:4
devem ser considerados potenciais carreadores do vírus até prova ao contrário, com base na ausência do vírus no sêmen. A confirmação do estado de carreador é baseada na demonstração do vírus na amostra de sêmen contendo fração rica
em esperma do ejaculado. Este material é utilizado tanto para o isolamento viral quanto para a realização de transcriptase reversa–PCR. Também pode ser realizado pelo teste de acasalamento de um garanhão possivelmente carreador com 2
éguas soronegativas, avaliando­as quando à soroconversão 28 dias após a monta.
Dentre  os  testes  sorológicos  para  detecção  de  anticorpos  contra  AVE,  o  teste  de  neutralização  viral  intensificado  pelo  complemento  continua  sendo  o  mais  utilizado  na  identificação  de  infecções  agudas  por  AVE  e  para  estudos  de
soroprevalência. Alguns testes ELISA foram desenvolvidos e não apresentam sensibilidade e especificidade equivalentes. Nenhum dos testes disponíveis pode diferenciar títulos de anticorpos resultantes de infecção natural e de resposta
vacinal.
TRATAMENTO,  PREVENÇÃO  E  CONTROLE:   Não  há  tratamento  específico  para  o  vírus  da  AVE.  Praticamente  todos  os  animais  recuperam­se  completamente  e  indica­se  tratamento  sintomático  (p.  ex.,  antipiréticos,  anti­inflamatórios  e
diuréticos) somente nos casos graves, especialmente para garanhões com febre prolongada e edema escrotal extenso, o que resulta em subfertilidade, a curto prazo. Bons cuidados de enfermagem e repouso auxiliam no retorno normal do
animal às atividades desejáveis. Não há tratamento efetivo para AVE concomitante a pneumonia ou pneumoenterite, em potros. Embora haja alguma evidência de que a infrarregulação temporária de testosterona circulante por imunização
por GnRH ou pelo uso de um antagonista de GnRH promova eliminação do vírus da AVE do trato reprodutivo dos garanhões carreadores, ainda não há qualquer estratégia adequadamente validada.
Arterite viral equina é uma doença de fácil prevenção, que pode ser controlada com boas práticas de manejo e com a adoção de um adequado programa de vacinação. Apenas uma vacina comercial, com vírus vivo modificado, está
disponível na América do Norte. A vacina protege contra AVE e induz estado de carreador do garanhão. A vacina é segura e imunogênica para reprodutores e fêmeas não gestantes; não é recomendada para gestantes, especialmente nos
últimos  2  meses  de  gestação,  ou  em  potros  com  <  6  semanas  de  idade,  a  menos  que  haja  alto  risco  de  exposição  natural  à  infecção.  Minimizar  ou  eliminar  o  contato  direto  ou  indireto  de  equinos  desprotegidos  com  aqueles  animais
infectados ou com sêmen contendo o vírus é o ponto crítico para o sucesso de qualquer programa de prevenção.
O principal foco de programas de controle atuais é restringir a disseminação de AVE na população de reprodutores e reduzir o risco de surtos de aborto devido ao vírus, morte de potros jovens e o estado de portador em garanhões e potros
na fase de pós­puberdade. Embora ocasionalmente a AVE tenha sido incriminada como responsável por extensos surtos de doenças em animais de corrida, exposição, leilão e em hospitais veterinários, atualmente a doença tem sido tão
esporádica que programas de controles inespecíficos têm sido desenvolvidos para prevenir novas ocorrências.
Os  programas  efetivos  de  controle  envolvem  adoção  de  práticas  de  manejo  semelhantes  às  recomendadas  para  outras  infecções  respiratórias.  Neste  manejo  incluem  a  separação  de  fêmeas  prenhes,  identificação  de  reprodutores
carreadores, imunização anual dos reprodutores não carreadores e vacinação de potros com 6 a 12 meses de idade para minimizar o risco de se tornarem carreadores. Os garanhões carreadores devem ser manejados separadamente e devem
acasalar  apenas  fêmeas  naturalmente  soropositivas  ou  fêmeas  vacinadas  contra  arterite  viral  equina.  Como  o  sêmen  fresco  resfriado  ou  congelado  também  é  importante  fonte  da  infecção,  ele  deve  ser  testado  por  um  laboratório  bem
conceituado para garantir sua segurança. No caso de acasalamento artificial de uma fêmea com sêmen infectado pelo vírus, aplicam­se as mesmas medidas de controle daquelas de acasalamento por cobertura natural por um garanhão
carreador.
Em caso de eventos com suspeita de surto de AVE, as autoridades veterinárias devem ser rapidamente notificadas e os animais infectados e não infectados devem ser isolados, com restrições imediatas quanto à movimentação dos animais
acometidos. A confirmação laboratorial do diagnóstico deve ser o mais rápido possível. Atividades reprodutivas devem ser suspensas nas fazendas para minimizar a disseminação da infecção. As instalações e equipamentos que entraram
em contato com o animal infectado devem ser desinfetados. A vacinação da população equina de alto risco deve ser realizada rigorosamente, a fim de restringir a transmissão de AVE e evitar surto, o mais rápido possível. A restrição ao
transporte dos animais deve ser mantida até pelo menos 3 semanas após o último caso clínico de AVE ou depois da confirmação laboratorial da infecção pelo vírus da AVE.
ERLIQUIOSE GRANULOCÍTICA EQUINA

A erliquiose granulocítica equina é uma infecção não contagiosa, sazonal, observada principalmente nos EUA, no nordeste da Califórnia, mas também é relatada em vários outros Estados. Também ocorre na Europa e na América do Sul
(ver p. 310).
ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  O microrganismo causador foi inicialmente denominado Ehrlichia equi, mas com base nas relações da sequência de DNA, atualmente é denominado Anaplasma phagocytophilum. Ele tem
uma  ampla  gama  de  hospedeiros  e  foram  relatadas  infecções  naturais  em  equinos,  asininos,  cães,  lhamas  e  roedores.  Uma  riquetsia  muito  semelhante  a  A.  phagocytophilum,  o  agente  da  erliquiose  granulocítica  humana  (EGH)  foi
recentemente incriminada como causa de doenças humanas nos Estados do meio–oeste e no nordeste dos EUA.
A.  phagocytophilum  frequentemente  infecta  equinos  nas  montanhas  do  nordeste  da  Califórnia.  Outros  Estados  em  que  a  infecção  clínica  foi  confirmada  incluem  Connecticut,  Illinois,  Arkansas,  Washington,  Pensilvânia,  Colorado,
Minnesota e Flórida. Também foi diagnosticada na Columbia Britânica, Suécia, Grã­Bretanha e América do Sul.
A. phagocytophilum assemelha­se aos agentes etiológicos da febre transmitida por carrapatos, da febre petequial bovina e da EGH quanto à morfologia, tropismo celular e sequência genética do 16S do ácido ribonucleico ribossômico
(RNAr). Está presente nos vacúolos citoplasmáticos dos neutrófilos e, ocasionalmente, nos eosinófilos, durante a fase aguda. Esfregaços de sangue corados pelo Giemsa ou Wright­Leishman revelam um ou mais agregados livres (mórula ou
corpúsculos de inclusão, com 1,5 a 5 μm de diâmetro) cocoides, cocobacilos ou microrganismos pleomórficos azul­acinzentados a azul­escuros no citoplasma dos neutrófilos.
A infecção pode ser transmitida experimentalmente para equinos suscetíveis por meio de sangue contaminado de animais infectados ou de pessoas com EGH. O período de incubação varia de 1 a 2 semanas. Ixodes pacificus (carrapato­
de­pernas­pretas do leste) pode transmitir A. phagocytophilum aos equinos.
Atualmente o risco zoonótico é desconhecido. No entanto, equinos e pessoas aparentemente saudáveis podem ser infectadas por cepas do mesmo agente. Acredita­se que a exposição humana ocorra por picada de carrapato e não por
transmissão direta dos equinos para as pessoas.
ACHADOS CLÍNICOS:  A gravidade dos sintomas varia em função da idade do animal e da duração da doença. Os sinais clínicos podem ser discretos. Equinos < 1 ano de idade podem ter apenas febre; equinos com 1 a 3 anos de idade
desenvolvem febre, depressão, discreto edema de membros e ataxia. Os adultos exibem sinais característicos, como febre, inapetência, depressão, relutância ao movimento, edema de membros, petéquias e icterícia. A febre, que é mais
intensa nos primeiros 1 a 3 dias da infecção (39,5 a 40°C), persiste em 39 a 40°C por 6 a 12 dias. Os sintomas se agravam depois de alguns dias. Raramente, a vasculite miocárdica pode causar arritmia ventricular transitória. Outras
manifestações clínicas da infecção aguda incluem decúbito e miopatia grave. Qualquer infecção recidivante (p. ex., ferida de membro ou infecção respiratória) pode ser exacerbada. Os corpúsculos de inclusão citoplasmáticos são poucos
nas primeiras 48 h e aumentam até 30 a 40% em neutrófilos circulantes, após 3 a 5 dias de infecção. A doença é sazonal na Califórnia, ocorrendo no final do outono, inverno e primavera.
Lesões: Petéquias macroscópicas, equimoses e edema se desenvolvem no tecido subcutâneo e fáscia. A vasculite é regional, afetando predominantemente o subcutâneo e a fáscia dos membros.

Dois neutrófilos, cada um contendo uma mórula de Ehrlichia equi, em sangue de equino, Wright­Giemsa, 100X em óleo de imersão. Eritrócitos exibindo formação rouleau, um achado normal nestas espécies. Cortesia do Dr. John W. Harvey.
DIAGNÓSTICO:  A demonstração de corpúsculos de inclusão em esfregaços de sangue padrão é diagnóstica. O teste PCR pode detectar o DNA de A. phagocytophilum em esfregações de sangue não coagulado ou de papa leucocitária. O teste
de imunofluorescência indireta pode detectar elevação do títulos de anticorpos contra A. phagocytophilum. O diagnóstico diferencial inclui encefalite viral, doença hepática primária, anemia infecciosa equina, púrpura hemorrágica e arterite
viral.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A oxitetraciclina é extremamente efetiva contra A. phagocytophilum; dose de 7 mg de tetraciclina/kg IV, 1 vez/dia, durante 8 dias, elimina a infecção. Penicilina, cloranfenicol e estreptomicina não são efetivos.
Os equinos com edema e ataxia grave podem ser beneficiados do tratamento a curto prazo com corticosteroides (20 mg de dexametasona, 1 vez/dia, por 2 ou 3 dias). Equinos que se recuperam tornam­se solidamente imunes por = 2 anos e,
acredita–se, não portadores. Achados recentes sugerem infecção persistente em algumas estirpes na Europa, mas há necessidade de estudos mais profundos. O controle dos carrapatos é uma medida obrigatória para o controle da doença.
Não há vacina.

INFECÇÃO PELO VÍRUS HENDRA

O vírus Hendra foi descrito pela primeira vez em 1994, após um surto de doença respiratória aguda em um estábulo de treinamento de cavalos Puro­Sangue na Austrália, em que equinos e uma pessoa foram fatalmente infectados. Casos
esporádicos continuam a ocorrer na Austrália, tipicamente como uma febre aguda que rapidamente progride para envolvimento de múltiplos órgãos, mas notavelmente desencadeia uma enfermidade respiratória aguda e/ou neurológica. Os
morcegos frutívoros (subordem Megachiroptera) são reservatórios naturais do vírus. O vírus Hendra é classificado como um agente de biossegurança nível 4 (considerado agente de alto risco de doença potencialmente fatal em pessoas).
Portanto, o uso de práticas seguras e equipamentos de proteção individual são essenciais no manejo de material que oferece risco da doença às pessoas.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  O vírus Hendra é um RNA­vírus envelopado, grande e pleomórfico. Embora inicialmente tenha sido mais estreitamente relacionado com microrganismos do gênero Morbillivirus do que a outros gêneros da
família Paramyxoviridae, estudos subsequentes mostraram baixa homologia sequencial com respirovírus, morbilivírus e rubulovírus e reações imunológicas cruzadas irrelevantes com outros paramixovírus. O vírus Hendra é genética e
antigenicamente relacionado com o vírus Nipah (p. 807), com o qual compartilha cerca de 90% de homologia entre os aminoácidos. Ambos os vírus foram classificados em um novo gênero, Henipavírus, subfamília Paramyxovirinae.
Há evidências crescentes de que ocorre variação mínima de estirpes do vírus Hendra e que a apresentação clínica e as lesões mais provavelmente variam em função da via de infecção. Historicamente, pneumonia intersticial de gravidade
variável é o principal achado em casos naturais e experimentais da infecção de equinos expostos. O vírus Hendra tem tropismo específico por tecidos vasculares, independentemente da via de transmissão. Nas infecções recentes, as lesões
se apresentam desde como edema e hemorragia nas paredes dos vasos, degeneração fibrinoide com núcleos picnóticos nas células endoteliais e da túnica média até a presença de várias células gigantes (sincício) no endotélio e, às vezes, na
túnica  média  dos  vasos  afetados  (tanto  vênulas  quanto  arteríolas).  Há  evidência  de  que  o  vírus  se  dissemina  amplamente  em  vários  tecidos  corporais,  em  consequência  da  viremia  relacionada  com  leucócitos.  O  vírus  é  encontrado  no
endotélio vascular dos vasos subaracnoides e cerebrais, além de infectar vasos dos glomérulos renais e pélvicos, lâmina própria do estômago, baço, vários linfonodos e miocárdio. Quando há enfermidade respiratória ocorre destruição
progressiva das paredes alveolares, com a presença de macrófagos. Além do tropismo vascular, o vírus Hendra pode também ser neurotrópico, causando necrose neuronal e glioide focal. Uma característica constatada em um surto na
Austrália, em 2008, foi uma doença neurológica grave e ausência de doença respiratória. Portanto, o vírus Hendra não pode mais ser considerado como causador de doença predominantemente respiratória em equinos.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  A doença de ocorrência natural causada pelo vírus Hendra é relatada apenas em equinos e pessoas. Experimentalmente, a doença é induzida em gatos, porquinhos­da­índia, hamsters, furões, macacos e
suínos, mas não em camundongos, roedores, coelhos, galinhas e cães. A resposta clínica e os achados patológicos nos gatos são muito semelhantes aos observados nos equinos. As infecções pelo vírus Hendra foram relatadas somente na
Austrália, em eventos esporádicos, com 13 casos entre 1994 e 2009. A maioria destes era ocorrência pontual em equinos. Portanto, o vírus Hendra apresenta infectividade limitada e em condições de campo a transmissão entre equinos
infectados e não infectados é esporádica.
Experimentalmente,  a  transmissão  por  aerossol  de  equinos  infectados  para  equinos  ou  gatos  não  foi  bem­sucedida.  Porém,  a  possibilidade  da  transmissão  respiratória  não  pode  ser  completamente  descartada.  As  secreções  nasais
(originárias dos pulmões) são comumente observadas em equinos com infecção natural, podendo ser uma fonte da transmissão potencial do vírus, por aerossol. O vírus Hendra é encontrado na urina, sangue e secreção nasal e oral de
equinos e gatos infectados naturalmente. Baseado nos conceitos de viabilidade de campo e laboratório, a infecção humana ou animal necessita contato direto com secreção contaminada com o vírus (exsudato pulmonar), excreções (urina),
fluidos corporais ou tecidos. Embora o vírus Hendra apresenta infectividade limitada, a taxa de casos fatais individuais é alta – 75% em equinos e 50% em pessoas.
As evidências epidemiológicas, sorológicas e virológicas sugerem que os morcegos frutívoros são os reservatórios naturais do vírus Hendra. Pesquisas sorológicas revelaram alta prevalência de anticorpos neutralizantes em morcegos
frutívoros selvagens (Pteropus spp) na Austrália e na Papua­Nova Guiné. Infecções em morcegos (tanto experimentais como naturais) causam doença assintomática. Há estudos experimentais e de campo sobre transmissão vertical, com
isolamento de vírus na urina e em tecidos fetais de morcego­de­cabeça­cinzenta (Pteropus poliocephalus) e morcego­preto (P. alecto). A ocorrência rara e a natureza esporádica dos surtos sugerem que a exposição dos equinos ao vírus
Hendra seja um acontecimento eventual. O modo de transmissão entre morcegos e de morcegos para equinos são incertos, pois há fatores que facilitam a disseminação. O vírus Hendra foi identificado em fluidos oriundo de parto, placenta e
fetos abortados, além da urina de morcegos natural ou experimentalmente infectados. Vírus Nipah relacionado foi detectado em urina de morcego e em fruta parcialmente consumida pelo morcego. Os equinos podem ser hipoteticamente
infectados pelo contato com alimento ou água contaminada com material de morcegos infectados, porém o mecanismo definitivo não foi estabelecido.
ACHADOS CLÍNICOS:  Devido à afinidade com as células endoteliais, o vírus Hendra pode ser a causa dos sinais clínicos em equinos. A apresentação clínica predominante pode depender do órgão mais severamente comprometido ou com
lesão endotelial mais extensa.
Deve­se considerar infecção pelo vírus Hendra quando há febre inicial aguda e progressão rápida para morte, possivelmente associada a sinais respiratórios graves ou sinais neurológicos. Entretanto, a ausência destes sinais não exclui a
possibilidade de infecção pelo vírus Hendra. A doença nem sempre é fatal; em cerca de 25% dos casos é possível a recuperação clínica do animal.
Os sinais clínicos que prontamente fazem o veterinário considerar infecção por vírus Hendra incluem início agudo da enfermidade, febre (40°C) e rápida perda da condição corporal. Os sintomas respiratórios incluem edema e congestão,
angústia respiratória (aumento da frequência respiratória) e secreção nasal terminal que, inicialmente é clara e progride para um aspecto branco ou sanguinolento espumoso. Os sintomas neurológicos incluem “andar cambaleante” que
progride para ataxia e alteração da consciência (perda aparente da visão em um ou ambos os olhos, andar sem rumo e confusão mental), inclinação e desvio da cabeça, andar em círculos, espasmos musculares (espasmos mioclônicos foram
observados em equinos com enfermidade aguda ou recuperados da doença), incontinência urinária, decúbito com incapacidade de levantar, fraqueza terminal, ataxia e colapso. Outros sinais clínicos incluem depressão, taquicardia, edema
facial, tremor muscular, anorexia, congestão de membrana mucosa bucal e sinais semelhantes à cólica (geralmente ruídos abdominais fracos à auscultação do abdome, em casos pré­terminais). A proximidade de ambientes e alimentos de
morcegos frutívoros pode aumentar a suspeita.
Quando os equinos são mantidos em baias, é mais provável a ocorrência de infecção pelo vírus Hendra como doença em um único paciente doente, ou morto, do que em vários animais. A maioria das infecções em animais mantidos em
baias envolve um único equino fatalmente infectado, sem transmissão aos equinos do recinto. No entanto, em várias ocasiões, um ou mais equinos contactantes se infectaram após estreito contato com um animal doente ou morto. Em locais
onde os equinos são mantidos estabulados, parece que o vírus Hendra tem potencial para se disseminar por meio de contato direto com fluidos corporais contaminados ou por transmissão direta através de fômites contaminados e, inclusive,
a transferência acidental do microrganismo pelas pessoas. Até o momento, todos os surtos em estábulos resultaram na infecção de vários equinos. Estes eventos parecem ter se originado a partir de um equino infectado em uma baia ou
mantido em área externa e levado ao estábulo.
Lesões: A presença de grandes células sinciciais endoteliais no exame histopatológico é característica de infecção pelo vírus Hendra. Embora mais evidentes em arteríolas e capilares pulmonares, estas células são observadas em outros
órgãos (linfonodos, baço, coração, estômago, rins e cérebro). A propagação da degeneração fibrinoide dos pequenos vasos sanguíneos é constatada em vários órgãos, inclusive pulmões, coração, rins, baço, linfonodos, meninges, trato
alimentar,  músculo  esquelético  e  bexiga.  O  antígeno  específico  para  o  vírus  Hendra  pode  ser  demonstrado  a  partir  das  lesões  vasculares  e  de  parede  alveolar  por  coloração  imunoistoquímica.  Corpúsculos  de  inclusão  virais
intracitoplasmáticos podem ser observados em células endoteliais infectadas ao exame em microscópio eletrônico, mas não em microscopia comum. Quando a doença respiratória é predominante, as principais lesões macroscópicas são
edema intenso e congestão pulmonar e aumento marcante dos linfonodos subpleurais. As vias respiratórias são preenchidas por espuma, geralmente com traços de sangue. Lesões adicionais são observadas em alguns equinos e incluem
aumento de fluidos pleural e pericárdico, congestão de linfonodos, hemorragias em vários órgãos e discreta icterícia.
Microscopicamente, as principais lesões são decorrentes da pneumonia intersticial aguda. Lesões vasculares graves, com edema alveolar serofibrinoso, hemorragia, trombose dos capilares, necrose das paredes alveolares e macrófagos
alveolares, são evidentes nos pulmões.
Se a doença neurológica é predominante, notam­se lesões de meningite não supurativa, inclusive manguito perivascular, degeneração neuronal e gliose focal.
DIAGNÓSTICO:  Deve­se  considerar  infecção  pelo  vírus  Hendra  quando  há  febre  inicial  aguda  e  progressão  rápida  para  morte,  mas  um  caso  não  fatal  não  pode  excluir  a  possibilidade  da  infecção  pelo  vírus  Hendra.  A  confirmação  do
diagnóstico é baseada na análise laboratorial de amostras apropriadas, para detecção do vírus, de antígeno viral, de ácido nucleico viral ou de anticorpos específicos. O procedimento de coleta de amostras deve considerar o sério risco
zoonótico do vírus Hendra, sendo necessário a adoção de medidas apropriadas para evitar a exposição humana. As amostras mínimas recomendadas incluem amostra de sangue (sem e/ou com EDTA) e suabe nasal ou bucal (da superfície da
língua). Podem ser obtidas de equinos vivos ou mortos. Amostras colhidas durante a necropsia, tanto fresca quanto fixada em formol 10%, de pulmão, rins, urina, baço, fígado, linfonodos e cérebro aumentam a probabilidade de definição
do diagnóstico, mas aumentam também o risco de exposição humana. A segurança durante a coleta das amostras deve seguir os cuidados de acordo com a análise de risco e deve ser realizada pelo veterinário para evitar exposição humana.
Caso exista preocupação quanto à segurança pessoal, deve­se obter apenas um conjunto mínimo de amostras (sangue, suabes). Procedimentos recomendados para necropsia segura em casos suspeitos do vírus Hendra estão disponíveis na
página da internet Biosecurity Queensland, http://www.dpi.qld.gov.au/documents/Biossecurity_GeneralAnimalHealthPestsAndDiseases/Hendra­WorkGuidelinesForVets.pdf.
O vírus pode ser isolado em inúmeras linhagens de células; as células Vero são as preferidas. O efeito citopático viral, que se desenvolve em cerca de 3 dias, caracteriza­se por formações sinciciais nas células infectadas. Isolamento do
vírus e outros testes diagnósticos que envolvem vírus vivo somente devem ser realizados sob condições de biossegurança nível 4. A confirmação sorológica da infecção é baseada em exames de amostras de soro obtidas nas fases aguda e de
convalescência, coletadas em intervalo de 3 a 4 semanas, submetidas ao teste de neutralização. A presença das lesões vasculares características é altamente sugestiva da infecção; a especificidade das lesões pode ser confirmada por testes
imunoistoquímicos utilizando antissoro de referência para o vírus Hendra.
A doença equina africana pode se parecer clinicamente com a infecção por vírus Hendra e deve ser incluída no diagnóstico diferencial. A possibilidade de outros casos de morte súbita deve ser excluída, como antraz, botulismo, algumas
infecções bacterianas (p. ex., pasteurelose), influenza equina, infecção hiperaguda equina por herpesvírus equino tipo 1, e plantas ou produtos químicos tóxicos.
TRATAMENTO, PREVENÇÃO E CONTROLE:  Não  há  tratamento  antiviral  específico,  tampouco  vacina  contra  a  doença  causada  pelo  vírus  Hendra.  Casos  confirmados  devem  ser  submetidos  à  eutanásia,  limitando  o  risco  de  exposição  às
pessoas. Na Austrália, também se recomenda a prática de eutanásia de equinos soropositivos recuperados, pois atualmente há evidências de que não é possível excluir a possibilidade de recrudescência da infecção nestes equinos.
Deve­se prevenir a instalação de focos, minimizando o contato entre equinos e fluidos e urina de morcegos. Incluem­se práticas simples, como redução da população de morcegos nas árvores onde os equinos são mantidos ou retirando os
animais destes locais. O controle se baseia na eutanásia e enterramento profundo das carcaças, monitoramento, isolamento e restrição de deslocamento de animais, além da desinfecção de superfícies potencialmente contaminadas.
RISCO ZOONÓTICO:  O vírus Hendra é transmissível às pessoas, com 50% de casos fatais. Todas as infecções humanas estão relacionadas com a doença em equinos (tanto vivos quanto mortos, durante a necropsia), de modo que as pessoas
que entram em contato com casos suspeitos ou confirmados da infecção em equinos devem ter cautela. Não há relato de transmissão da doença de morcego para pessoa, tampouco de pessoa para pessoa.
Devem  ser  implementados  protocolos  para  minimizar  o  risco  de  exposição  humana  em  casos  suspeitos  de  infecção  pelo  vírus  Hendra  em  equino,  sob  confirmação.  Um  sumário  para  abordagem,  com  intuito  de  minimizar  risco  de
contágio,  foi  elaborado  pela  Biosecurity  Queensland  e  inclui  os  seguintes  passos.  Primeiramente,  deve­se  preparar  de  modo  antecipado  um  plano  que  resume  como  os  riscos  do  vírus  Hendra  são  tratados  na  prática  pelos  clínicos  e
veterinários, individualmente. Isso inclui 1) ter cautela mesmo em casos suspeitos de infecção pelo vírus Hendra, antes mesmo da confirmação da doença; 2) isolar os equinos doentes e mortos de pessoas e outros animais, inclusive animais
de estimação; 3) limitar, ao máximo, o contato de pessoas com os equinos; 4) as pessoas que tiverem contato com os equinos devem realizar rigorosa higiene pessoal (especialmente lavar as mãos e tomar banho); 5) identificação de riscos e
tomada de medidas que reduzam estes riscos (p. ex., se for descontaminar uma área, evite aerossóis formados por água sob alta pressão); 6) orientar as pessoas com alto risco de exposição, como proprietários, tratadores e demais (inclusive
outros veterinários e assistentes) e 7) notificar os casos às autoridades de saúde animal.
A  adequada  proteção  individual  envolve:  1)  evitar  contato  da  pele,  membranas  mucosas  e  olhos  com  material  suspeito;  2)  evitar  inalação  de  partículas;  3)  lavagem  frequente  das  mãos  e  da  pele  exposta,  com  detergente  4)  cortes  e
abrasões devem ser recobertos com curativos resistentes à água, quando necessário.
Em particular, sangue e outros fluidos corporais (especialmente, secreções respiratórias, nasais e urina), bem como tecidos devem ser considerados como materiais potencialmente infectantes e devem ser tomadas precauções apropriadas
para evitar contato direto com aerossóis ou inoculação acidental destes fluidos.

MORMO (Farcino)

Mormo é uma doença contagiosa, crônica ou aguda, geralmente fatal que acomete os equídeos. É causada por Burkholderia mallei sendo caracterizada pelo desenvolvimento em série de úlceras nodulares geralmente no trato respiratório
superior, pulmões e pele. Os felídeos e outras espécies são suscetíveis e a infecção geralmente é fatal. Este microrganismo infecta pessoas, sendo considerado um potencial agente de bioterrorismo. O mormo é uma das mais antigas doenças
conhecidas  e  já  foi  cosmopolita.  Foi  erradicada  ou  é  efetivamente  controlada  em  muitos  países,  inclusive  nos  EUA.  Recentemente,  a  doença  foi  relatada  no  Iraque,  Paquistão,  Índia,  Mongólia,  China,  Brasil  e  Emirados  Árabes.  Esta
enfermidade é de notificação obrigatória, segundo a lista da OIE.
ETIOLOGIA:  Burkholderia mallei, um patógeno clonal, está presente em exsudatos nasais e ulcerações da pele dos animais infectados. A doença é comumente contraída pela ingestão de alimentos ou água contaminada com secreção nasal
dos animais infectados. O microrganismo é suscetível ao calor, à luz e a desinfetantes; sobrevive em locais contaminados por 1 a 2 meses. Ambientes úmidos e molhados oferecem condições de sobrevivência ao agente. A presença de uma
cápsula polissacarídica é um importante fator de virulência e aumenta a sobrevivência da bactéria no ambiente.
ACHADOS CLÍNICOS:  Após período de incubação de aproximadamente 2 semanas, os animais infectados geralmente apresentam sepse e febre alta (41°C) e, subsequentemente, secreção nasal mucopurulenta espessa e sintomas respiratórios.
O  animal  morre  em  alguns  dias.  A  doença  crônica  é  comum  nos  equinos  e  se  manifesta  como  uma  doença  debilitante  com  lesões  nasais  e  cutâneas,  ulcerativas  ou  nodulares.  Os  animais  infectados  podem  viver  anos  disseminando  o
microrganismo. Em alguns casos a infecção pode ser latente e persistir por longo tempo.
Reconhecem­se as formas nasal, pulmonar e cutânea do mormo, e um animal pode se infectar com mais de uma forma ao mesmo tempo. Na forma nasal, desenvolvem–se nódulos na mucosa do septo nasal e partes inferiores dos ossos
turbinados.  Os  nódulos  degeneram­se  originando  úlceras  profundas  com  margens  irregulares  e  elevadas.  As  cicatrizes  características  em  forma  de  estrela  permanecem  após  a  cicatrização  das  úlceras.  No  estágio  inicial,  os  linfonodos
submaxilares ficam aumentados e edematosos; mais tarde aderem­se à pele ou aos tecidos mais profundos.
Na forma pulmonar, pequenos nódulos semelhantes a tubérculos, com centros caseosos ou calcificados circundados por zonas inflamatórias, são verificados nos pulmões. Se a lesão é extensa, é possível notar consolidação do tecido
pulmonar e pneumonia. Os nódulos tendem a se romper e podem drenar seu conteúdo para os bronquíolos, resultando na extensão da infecção para o trato respiratório superior.
Na forma cutânea (“farcino”), os nódulos aparecem ao longo dos vasos linfáticos, particularmente nas extremidades. Esses nódulos se degeneram e originam úlceras que drenam um pus pegajoso altamente infeccioso. O fígado e o baço
também podem exibir lesões nodulares típicas. No exame histológico é possível verificar vasculite, trombose e infiltração de células inflamatórias em degeneração.
DIAGNÓSTICO:  Nódulos típicos, úlceras, formação de escaras e condição debilitante podem ser evidências suficientes para o diagnóstico clínico. No entanto, como esses sintomas geralmente só aparecem quando a doença está em estágio
bem  avançado,  é  fundamental  a  realização  de  testes  diagnósticos  específicos  o  mais  breve  possível.  A  cultura  de B. mallei a  partir  de  lesões  confirma  o  diagnóstico.  Recomenda­se  um  teste  de  hipersensibilidade  retardada  mediante  a
inoculação intraperitoneal de maleína, uma glicoproteína secretada por B. mallei, presente no sobrenadante da cultura. Equinos hipersensíveis infectados desenvolvem conjuntivite purulenta dentro de 24 h, além de tumefação de pálpebras.
O teste de fixação de complemento também é utilizado no diagnóstico da infecção. O teste ELISA se mostra bem mais sensível do que a fixação de complemento, mas não tem um uso amplo. A PCR é baseada nas sequências genéticas 16S
e 23S do RNAr e pode auxiliar em uma identificação mais específica.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  Não há vacina disponível. A profilaxia e o controle dependem da detecção precoce e da eliminação dos animais infectados, bem como de quarentena completa e desinfecção rigorosa da área contaminada. O
tratamento é administrado somente em áreas endêmicas, mas a cura bacteriológica não é confiável. Doxiciclina, ceftazidima, gentamicina, estreptomicina e as combinações de sulfadiazina ou sulfamonometoxina com trimetoprima parecem
ser eficientes na prevenção e tratamento de mormo experimental.

PESTE EQUINA AFRICANA

A  peste  equina  africana  (PEA)  é  uma  virose  aguda  ou  subaguda,  carreada  por  insetos,  que  acomete  os equídeos,  sendo  endêmica  na  África.  É  caracterizada  por  sinais  clínicos  e  lesões  associadas  a  comprometimentos  respiratórios  e
circulatórios.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  A PEA é causada por um orbivírus, de 55 a 70nm de diâmetro, da família Reoviridae. Há nove tipos imunologicamente distintos. O vírus é inativado em pH < 6 ou = 12, ou por formalina, β­propiolactona,
derivados do acetiletilenoimino ou radiação.
O aparecimento da PEA é precedido por estações de chuvas fortes, que se alternam com condições climáticas quentes e secas, condições que favorecem a transmissão. Os surtos na África Central e Oriental se estenderam ao Egito,
Oriente Médio e sul da Arábia. De 1959 a 1961, uma epidemia importante causada pelo sorotipo 9 se estendeu da África até o Oriente Próximo, Paquistão e Índia, causando a morte de cerca de 300.000 equídeos. Uma epidemia causada
pelo mesmo sorotipo em 1965­66 ocorreu no noroeste da África (Marrocos, Argélia e Tunísia), mas também se estendeu rapidamente até o Sul da Espanha. Este surto na Espanha foi controlado por meio de rigorosa campanha de vacinação
e abate. Em julho de 1987, a PEA causada pelo sorotipo 4 foi relatada no centro da Espanha, devido a importação de zebras infectadas da Namíbia. Os surtos duraram até o início do clima frio, em outubro de 1987; entretanto, o vírus
sobreviveu ao inverno e causou doença no sul da Espanha em 1988. Novamente o surto cessou com a chegada do frio, mas retornou em 1989 e 1990. O vírus também chegou a Portugal e ao Marrocos em 1989; embora rapidamente
eliminado de Portugal, continuou no Marrocos até 1991. Mais recentemente, surtos de PEA foram relatados em várias regiões da África Subsaariana, inclusive oeste de Botswana (1999­2001), Namíbia (2000 e 2001), África do Sul (2006) e
Suazilândia (2006). Em 2007, pela primeira vez, o sorotipo 2 do vírus da PEA foi relatado no oeste da África (Nigéria e Senegal) e o sorotipo 7 no Senegal. O sorotipo 4 também foi isolado de equídeos no Quênia. Em 2008, um surto grave
causado pelo sorotipo 2 foi registrado no sudeste da Etiópia.
TRANSMISSÃO:  Culicoides spp  são  os  principais  vetores  na  transmissão  de  todos  os  9  sorotipos  do  vírus  da  PEA,  sendo C. imicola  o  mais  importante.  Consequentemente,  a  PEA  é  observada  durante  estações  quentes  e  chuvosas,  que
favorecem  a  propagação  de  vetores;  clima  frio  faz  a  doença  desaparecer  e  reduz  significativamente  a  atividade  do  vetor.  O  vírus  também  pode  ser  isolado  de  carrapatos  de  cães, Rhipicephalus  sanguineus  sanguineus,  e  carrapatos  de
camelos, Hyalomma dromedarii, durante o inverno no sul do Egito, onde a doença é endêmica. O vírus da PEA foi experimentalmente transmitido entre cães infectados por mosquitos. Entretanto, estes estudos não foram confirmados e
muitas autoridades acreditam que cães, carrapatos e mosquitos podem ter uma pequena contribuição na epidemiologia da PEA.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A  taxa  de  mortalidade  depende  da  virulência  do  isolado  e  da  suscetibilidade  do  hospedeiro.  A  taxa  de  mortalidade  nas  populações  de  equinos  sem  contato  prévio  com  o  vírus,  que  são  os  animais  mais
suscetíveis, pode atingir 90%, em epidemias. A forma respiratória aguda caracteriza­se por um período de incubação de 3 a 5 dias, edema interlobular e hidropericárdio; o animal pode morrer em cerca de 1 semana. Febre de 40 a 40,5°C por
1 a 2 dias é seguida de dispneia, tosse espasmódica e dilatação das narinas; o animal fica em pé com as pernas afastadas e a cabeça estendida. A conjuntiva fica congesta e a fossa supraorbital pode inchar. A recuperação é rara e o animal
morre de anoxia. À necropsia, nota­se edema pulmonar, especialmente visível nos espaços intralobulares. Os pulmões se distendem e ficam pesados; é possível encontrar um fluido espumoso na traqueia, brônquios e bronquíolos. Pode
haver derrame pleural. Os linfonodos torácicos podem ficar edematosos e o fundo gástrico pode estar congesto. São verificadas petéquias no pericárdio e ocorre aumento do fluido pericárdico; entretanto, as lesões cardíacas geralmente não
são  relevantes.  As  vísceras  abdominais  podem  ficar  congestas.  Pode  haver  extravasamento  de  um  exsudato  espumoso  pelas  narinas.  A  forma  pulmonar  é  a  mais  comum  em  cães,  que  geralmente  se  infectam  pela  ingestão  de  carne
contaminada com o vírus.
A forma cardíaca é subaguda, com um período de incubação de 1 a 2 semanas. A reação febril que dura < 1 semana é seguida de inchaço da fossa supraorbital. O inchaço geralmente se estende para as pálpebras, tecidos faciais, pescoço,
tórax, peito e ombros. Geralmente o animal morre dentro de 1 semana, e pode ser precedida de cólica. A taxa de mortalidade é cerca de 50%. As petéquias e equimoses de epicárdio e endocárdio tornam–se proeminentes. Os pulmões
geralmente se apresentam flácidos ou ligeiramente edematosos. Ocorrem infiltrações amareladas e gelatinosas nos tecidos subcutâneo e intramuscular, especialmente ao longo das veias jugulares e dos ligamentos da nuca. Outras lesões
incluem hidropericárdio, miocardite, gastrite hemorrágica e petéquias na superfície ventral da língua e no peritônio. Uma mistura das formas cardíaca e pulmonar é comumente observada em surtos, com taxa de mortalidade de equinos de
cerca de 80%.
DIAGNÓSTICO:  Nas regiões endêmicas, os sinais clínicos e as lesões podem levar a um diagnóstico presuntivo. Entretanto, a confirmação laboratorial é essencial para o diagnóstico definitivo e para a determinação do sorotipo; o último item
torna­se importante para adoção de medidas de controle. Amostras de sangue devem ser obtidas no pico da febre, preservadas em solução OCG (glicerol 50%, oxalato de potássio 0,5%, fenol 0,5%) e transportadas (a 4°C) ao laboratório. As
amostras de baço coletadas de animais recentemente mortos devem ser preservadas em glicerina tamponada 10%, a 4°C. Para o isolamento do vírus é melhor realizar inoculação intracerebral de camundongos lactentes; também podem ser
utilizadas culturas de células de insetos ou mamíferos. Quanto maior o número de sistemas de isolamento empregados, maior a probabilidade de sucesso. Os camundongos infectados podem desenvolver sinais nervosos ou paralisia e devem
ser observados por 3 semanas; a cultura de tecidos de mamíferos devem mostrar efeito citopático dentro de 3 a 7 dias.
O vírus da PEA pode ser isolado no sangue, em outros tecidos e no sobrenadante de cultura de células infectadas pelo emprego de sondas moleculares e transcriptase reversa­PCR com primers grupo­específico. O ELISA sanduíche
indireto também é útil para a rápida detecção do vírus da PEA em tecidos sólidos obtidos de animais que morreram com a infecção. Além disso, o isolamento do vírus pode ser feito por testes específicos, como fixação de complemento
(FC) e imunofluorescência direta ou indireta.
A  sorotipagem  do  vírus  da  PEA  anteriormente  envolvia  teste  de  neutralização  utilizando  antissoros  específicos,  que  demorava  mais  de  5  dias.  O  recente  desenvolvimento  de  um  tipo  específico  de  transcriptase  reversa­PCR  tem
funcionado como método confirmatório do sorotipo do vírus da PEA dentro de 24 h.
PREVENÇÃO E CONTROLE:  Não há tratamento específico para animais com PEA, além de repouso e bom manejo. As complicações e as infecções secundárias devem ser tratadas apropriadamente durante a recuperação. O vírus da PEA não
é contagioso e pode ser disseminado somente pela picada de Culicoides spp infectado. Vários métodos de controle podem ser empregados, como a restrição da movimentação dos animais para evitar início de surtos e a modificação do
manejo para evitar ou reduzir o acesso de vetores aos animais suscetíveis ou aos animais infectados (ex. estábulos a prova de entrada do vetor); em certas condições (p. ex., por motivo de bem­estar ou no início de uma epidemia) o abate de
animais virêmicos pode impedi­los de atuar como uma fonte do vírus aos insetos. É muito difícil eliminar completamente as populações de Culicoides; entretanto pode ser possível reduzir o número de insetos infectados que picam animais
suscetíveis que mantêm um nível de epidemia insustentável.
Vacinas de vírus vivos estão disponíveis para todos os 9 sorotipos. Geralmente são produzidas a partir de cultura de vírus atenuados e aparentemente propicia boa proteção, embora a revacinação anual seja recomendada. Entretanto,
algumas  autoridades  podem  relutar  em  utilizar  vacinas  com  vírus  vivo  devido  sua  possível  reversão  em  vírus  patogênico,  à  transmissão  pelo  vetor  Culicoides  e  aos  rearranjos  com  estirpes  do  vírus  de  campo.  Vacinas  compostas  de
subunidades e inativadas sem este inconveniente estão em desenvolvimento, mas ainda não estão disponíveis no mercado.
O transporte de equídeos de países onde há o vírus da PAE para áreas livres do patógeno é sujeito a rígidos protocolos de exames e quarentena, embora os requisitos possam variar de país para país. A presença de anticorpos, apenas, não
deve impedir esta movimentação de animais contanto que o vírus infectante não esteja presente.
SEPSE EM POTROS

A sepse é uma síndrome clínica definida pelo desenvolvimento de uma condição inflamatória sistêmica em resposta à suspeita de infecção. Esta condição implica extenso comprometimento orgânico, seguido de invasão bacteriana nos
tecidos e fluidos ou cavidades corporais. A presença de bactérias viáveis no sangue é denominada bacteriemia. A infecção bacteriana é responsável por aproximadamente um terço das mortes de potros. A sepse é um dos problemas mais
comuns de equinos neonatos, devido à inadequada transferência de anticorpos maternos.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  Escherichia coli é a bactéria predominantemente isolada de potros com sepse ou bacteriemia, independente da técnica de isolamento ou localização geográfica do paciente. Outros microrganismos Gram­negativos
comuns incluem Klebsiella spp, Enterobacter spp, Actinobacillus spp, Salmonella spp e Pseudomonas spp. Cerca de 30 a 50% das infecções envolvem também bactérias Gram­positivas, como Streptococcus spp, sendo estas geralmente as
primeiras isoladas. Nos últimos anos foi documentado um aumento do número de Gram­positivos em potros admitidos em instalações de cuidado intensivo de neonatos, com redução de ocorrência de bactérias Gram­negativas intestinais
(ou  seja,  63%  para  42%  nos  últimos  25  anos).  Os  patógenos  anaeróbios,  especialmente Clostridium spp,  estão  envolvidos  em  cerca  de  10%  dos  casos  de  infecções  neonatais  sistêmicas.  As  portas  de  entrada  dessas  bactérias  incluem
placenta, umbigo, pulmão e tratos respiratório e gastrintestinal.
Todas  as  síndromes  septicêmicas  (p.  ex.,  sepse,  sepse  grave,  choque  septicêmico,  disfunção  de  múltiplos  órgãos)  têm  uma  patogenia  em  comum  que  também  inclui  endotoxemia  relacionada  com  infecções  Gram­negativas.  As
endotoxinas  estimulam  os  macrófagos  a  liberarem  várias  citocinas  (p.  ex.,  IL­6,  IL­1  e  TNF­a)  e  ativarem  enzimas  proinflamatórias  (p.  ex.,  fosfolipase  A2).  A  atuação  conjunta  desses  fatores  ocasionam  sinais  da  inflamação  (febre,
vasodilatação, hipoglicemia, depressão do miocárdio, atividade procoagulante e, por fim, coagulação intravascular disseminada [CID]). Várias outras moléculas derivadas do patógeno podem induzir respostas semelhantes no hospedeiro.
Assim, a síndrome do choque tóxico resultante de infecção estreptocócica ou por Staphylococcus aureus é uma síndrome séptica hiperinflamatória muito parecida com doenças caracterizadas por endotoxemia.
Uma variedade de fatores imunológicos e de manejo predispõe os potros à sepse. Embora possam responder imunologicamente às infecções bacterianas e virais no útero, a habilidade dos potros é menor que dos adultos. A deficiente
resposta fisiológica dos neonatos aos agentes infecciosos está relacionada com a menor capacidade de quimiotaxia e de destruição dos neutrófilos de neonatos, à presença de células T antigenicamente imaturas e à menor população e à
deficiente função dos monócitos. Entretanto, o principal fator de risco de sepse nos potros é a falha quantitativa e qualitativa na transferência de anticorpos colostrais. Se a ingestão de colostro é insuficiente, tem­se baixo teor de IgG, o
potro não adquire proteção específica e a função dos neutrófilos é seriamente prejudicada. Outros fatores que influenciam a prevalência da doença nos potros incluem condições ambientais insatisfatórias, idade gestacional (prematuridade),
saúde e condições adequadas da futura mãe, parto distócico e presença de novos patógenos no ambiente, contra os quais a fêmea não tem anticorpos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos dependem, em grande parte, do estágio da enfermidade, da integridade do sistema imune do hospedeiro, dos sistemas corporais acometidos e da gravidade e via de infecção. Geralmente, os sistemas
orgânicos envolvidos são SNC, tratos respiratório, cardiovascular, musculoesquelético, renal, oftálmico, hepatobiliar e gastrintestinal, bem como resquícios do cordão umbilical, No estágio inicial da sepse os potros apresentam sinais vagos
e inespecíficos, inclusive certo grau de depressão e letargia. Os proprietários relatam que os animais parecem ficar deitados mais do que o normal. O úbere das fêmeas geralmente apresenta­se distendido com leite, indicando que o potro não
está mamando com a frequência adequada.
Os  sinais  clínicos  da  doença  progridem  para  uma  completa  perda  do  reflexo  de  sucção,  hiperemia  de  membranas  mucosas  com  rápido  tempo  de  preenchimento  capilar  devido  à  vasodilatação  periférica,  taquicardia  e  petéquias
relacionadas com extravasamento de capilares. No estágio avançado da doença, quando a infecção deprime o sistema imune do hospedeiro e a resposta compensatória, pode ocorrer choque septicêmico. Os potros permanecem gravemente
deprimidos,  deitados  e  com  hipovolemia,  manifestada  como  extremidades  frias,  pulso  filiforme  e  tempo  de  preenchimento  capilar  prolongado.  Os  potros  podem  apresentar  hiper  ou  hipotermia,  taquicardia  ou  bradicardia.  Na  sepse,  as
bactérias se disseminam por via hematógena para vários órgãos, ocasionando angústia respiratória, pneumonia, diarreia, uveíte, meningite, osteomielite ou artrite séptica. A disfunção de dois ou mais órgãos leva a síndrome de disfunção de
múltiplos órgãos.
DIAGNÓSTICO:  Atualmente não há indicador ideal para diagnóstico precoce de sepse. Entretanto, foi desenvolvido um sistema de escore para potros neonatos, a fim de estabelecer o risco de infecção neonatal e auxiliar na identificação da
sepse em um estágio tratável. Este “escore de sepse” inclui uma combinação de histórico clínico e de parâmetros laboratoriais; podem também servir como indicador de comprometimento do todo o organismo ou de múltiplos órgãos.
Os potros com sepse geralmente apresentam neutropenia  com  alta  proporção  neutrófilos  bastonetes  (imaturos)  em  relação  aos  neutrófilos  segmentados.  Os  neutrófilos  podem  exibir  alterações  tóxicas,  altamente  sugestivas  de  sepse.
Comumente hipoglicemia acompanha uma infecção sistêmica e está associada a consumo de glicose pelas bactérias e diminuição da reserva de glicogênio. Teor de fibrinogênio > 600 mg/dl em um potro com < 24 h de vida indica que
houve  infecção  intrauterina.  Outras  anormalidades  no  perfil  bioquímico  evidentes  nesses  casos  são:  azotemia,  decorrente  de  perfusão  renal  inadequada  ou  asfixia  perinatal  e  aumento  secundária  da  bilirrubina,  devido  a  lesão  hepática
induzida por endotoxina. Na hemogasometria arterial é possível verificar aumento do ânion gap (> 20 mEq/l), hiperlactatemia, hipoxemia, hipercapnia e acidose metabólica e respiratória mista.
Dependendo  dos  sistemas  orgânicos  específicos  envolvidos,  indicam­se  ultrassonografia  umbilical,  abdominal  e  sinovial,  hemogasometria  arterial,  artrocentese,  centese  cerebroespinal  e  radiografias  de  tórax,  abdome  e  de  membros
distais. Imagens de diagnóstico avançado (p. ex., tomografia computadorizada de membros distais em potros com artrite séptica) podem auxiliar no prognóstico.
O teor sérico de IgG deve ser mensurado em todos os potros neonatos supostamente enfermo, a fim de excluir a possibilidade de transferência inadequada de imunidade passiva como fator de risco para sepse. Concentração de IgG < 200
mg/dl indica falha total na transferência passiva de anticorpos maternos. Teores de IgG > 800 mg/dl são considerados ótimos.
Hemocultura positiva também está relacionada com a sepse, porém cultura negativa não exclui a possibilidade de infecção. Os diagnósticos diferenciais incluem encefalopatia neonatal (p. 1348), hipoglicemia, hipotermia, isoeritrólise
neonatal (p. 15), doença do músculo branco (p. 1170), prematuridade, pneumonia neonatal e uroperitônio (p. 1640).
TRATAMENTO:  Os potros com suspeita de sepse devem ser submetidos a tratamento com antibióticos de amplo espectro contra bactérias Gram­negativas e Gram–positivas. Penicilina (22.000 UI/kg, IV, 4 vezes/dia) em combinação com
sulfato de amicacina (20 a 25 mg/kg, IV, 1 vez/dia) propicia boa cobertura inicial, até que o resultado da cultura esteja disponível. Metronidazol (10 a 15 mg/kg, VO ou IV, 3 vezes/dia) pode ser necessário em casos suspeitos de infecção
anaeróbica (p. ex., Clostridium). Cefalosporinas de terceira geração (p. ex., 4,4 a 6 mg de ceftiofur/kg, IV, 2 a 4 vezes/dia) podem auxiliar como medicamento de amplo espectro em pacientes com comprometimento da função renal. A
cefpodoxima  proxetila  (10  mg/kg,  2  a  4  vezes/dia)  é  recomendada  como  tratamento  de  infecções  bacterianas  em  equinos  neonatos.  A  cefepima  (11  mg/kg,  IV,  3  vezes/dia)  é  uma  nova  cefalosporina  de  quarta  geração  com  atividade
antibacteriana melhorada.
Fluidoterapia intravenosa precoce é necessária para restabelecer a perfusão tecidual, atenuando a resposta das citocinas e revertendo lesões celulares. A expansão do volume deve ser obtida com o emprego de soluções que propiciam
balanço eletrolítico (cristaloides) ou de plasma (coloide). O suporte imunológico na forma de transfusão de plasma IV (1 a 2 l) é muito importante e aumenta o teor de IgG para > 800 mg/dl. Fluidoterapia IV efetiva é necessária para
normalizar  os  parâmetros  cardiovasculares  específicos  (pressão  venosa  central,  pressão  arterial,  produção  de  urina  e  saturação  do  oxigênio  venoso  central),  enquanto  melhora  os  parâmetros  clínicos.  O  choque  septicêmico  grave  pode
requerer taxas iniciais de fluido de 40 a 80 ml/kg/h. Devido à ocorrência de hipoglicemia em muitos potros, deve­se administrar infusão lenta e contínua de solução de dextrose 2,5 a 5%, simultaneamente aos fluidos de reidratação.
O  tratamento  com  soro  hiperimune  com  antiendotoxina  deve  ser  considerado  em  pacientes  com  endotoxemia.  Fármacos  antiprostaglandina  minimizam  as  alterações  clínicas  e  hemodinâmicas  associadas  à  endotoxemia  e  ao  choque
séptico. Baixas doses de flunixino meglumina (0,25 mg/kg, IV, 3 vezes/dia) auxiliam na redução dos sintomas de endotoxemia. Ademais, a administração de pequenas doses de polimixina B (6.000 UI/kg, diluída em 300 a 500 ml de
solução salina, por via IV lenta) é considerada um tratamento experimental para neutralizar a endotoxemia sistêmica.
Como a sepse induz um estado catabólico no potro, o suporte nutricional é muito importante. Se o potro não estiver sendo tratado adequadamente, ele pode ser alimentado com leite ou substituto de leite em volume de até 15 a 25% do
seu peso corporal, a cada 24 h. Uma sonda nasogástrica permanente deve ser utilizada em potros com deficiente reflexo de sucção. A nutrição parenteral também pode auxiliar no fornecimento dos nutrientes adequados. A administração de
protetores gástricos (p. ex., ranitidina, cimetidina, omeprazol) pode atuar como adjuvante no tratamento dos neonatos enfermos.
A terapia sistêmica específica inclui lavagem das articulações com fluidos estéreis e administração de oxigênio por via nasal (2 a 10 l/min) ou ventilação para potros com pneumonia septicêmica. Úlcera de córnea pode ser tratada com
baixas doses de atropina tópica (embora possa causar íleo adinâmico), AINEs e antibacterianos de amplo espectro, mediante aplicação tópica. Entrópio geralmente necessita correção cirúrgica. Em alguns casos pode ser indicada a remoção
cirúrgica do umbigo infectado.
PROGNÓSTICO:  A recuperação da sepse neonatal depende da gravidade e da manifestação da infecção. A taxa de sobrevivência é de 50 a 81%, em centros de referência, dependendo da progressão da doença. Doença pulmonar neonatal
grave está associada à alta taxa de mortalidade (35 a 50%). O tempo em que os cuidados intensivos devem ser aplicados é de, no mínimo, 1 a 4 semanas. Diagnóstico precoce e tratamento intensivo favorecem a recuperação. Quando o potro
sobrevive aos sintomas iniciais, há grande probabilidade de que se torne um adulto saudável e útil. Um relato recente documentou que potros puro­sangue que sobreviveram à bacteriemia iniciaram atividades de corridas em condições
semelhantes aos seus irmãos, embora tenham arrecadado menos dinheiro.

COLISSEPTICEMIA (Colibacilose septicêmica, Doença septicêmica)

A sepse causada por Escherichia coli é uma doença comum de bezerros e, em menor extensão, de cordeiros com < 1 semana de idade. Pode se apresentar com sinais de sepse aguda ou de bacteriemia crônica localizada.
ETIOLOGIA  E  EPIDEMIOLOGIA:  A  doença  é  causada  por  sorotipos  específicos  de E. coli que  possuem  fatores  de  virulência  que  lhes  permitem  atravessar  a  superfície  da  mucosa  e  produzir  bacteriemia  e  sepse.  Entretanto,  o  principal
determinante da doença é a deficiência de imunoglobulinas circulantes como resultados da falha na transferência passiva das imunoglobulinas colostrais; a doença septicêmica devido à invasão de E. coli ocorre apenas nos bezerros com
deficiência de imunoglobulinas.
A colissepse é observada durante a primeira semana de vida, mais comumente dos 2 aos 5 dias de idade. A doença crônica localizada pode ser observada até 2 semanas de idade. A doença geralmente é esporádica e mais comum entre os
bezerros leiteiros do que nos de corte.
TRANSMISSÃO E PATOGENIA:  A invasão ocorre principalmente pela mucosa nasal e orofaringeana, mas também pode ocorrer através da via intestinal ou umbilical e pelas veias umbilicais. Há um período de bacteriemia subclínica que, com
cepas virulentas, é seguido de rápido desenvolvimento de sepse e morte por choque endotoxêmico. Um curso mais prolongado, com infecção localizada, poliartrite, meningite e, ocasionalmente, uveíte e nefrite, é observado com as cepas
menos virulentas. A doença crônica também se desenvolve em bezerros que adquiriram níveis marginais de imunoglobulinas circulantes. O microrganismo é excretado na secreção nasal e oral, urina e fezes; a excreção começa durante o
estágio bacteriêmico pré­clínico. A infecção inicial pode ser adquirida a partir de contaminantes ambientais. Em grupos de bezerros, a transmissão é direta pelo contato nasonasal, aerossóis urinários e respiratórios ou como resultado do
contato com o umbigo na amamentação ou pelo contato fecal­oral.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Nos casos agudos, o curso clínico é curto (3 a 8 h) e os sinais estão relacionados com o desenvolvimento de choque séptico. A febre não é proeminente e a temperatura retal pode estar subnormal.
Apatia e perda precoce do interesse de mamar são seguidas por depressão, pouca resposta a estímulos externos, colapso, decúbito e coma. Taquicardia, pulso fraco e tempo de preenchimento capilar prolongado são observados. As fezes são
moles e mucoides, mas diarreia grave não é observada nos casos mais simples. A mortalidade é de aproximadamente 100%. Em um curso clínico mais prolongado, a infecção pode ser localizada. Poliartrite e meningite são comuns; tremor,
hiperestesia, opistótono e convulsões são observados ocasionalmente, porém, letargia e coma são mais frequentes.
Uma leucocitose moderada, mas significativa, e neutrofilia são observadas no início, mas a leucopenia é marcante nos estágios terminais.
O fluido articular contém aumento de células inflamatórias e proteínas, e o FCE apresenta pleocitose e aumento na concentração de proteínas; o microrganismo pode estar evidente ao exame microscópico. Menos comumente, outras
bactérias, inclusive Enterobacteriaceae, Streptococcus spp e Pasteurella spp, produzem doença septicêmica em bezerros jovens. Esses microrganismos são mais comuns nos casos esporádicos do que como causas de surtos. Eles produzem
uma doença clínica semelhante, mas podem ser diferenciados por cultura. Como acontece na colissepticemia, o determinante primário destas infecções é a falha na transferência passiva de imunoglobulinas.
O diagnóstico é baseado no histórico e nos achados clínicos, na demonstração de uma grave deficiência de IgG circulante e, por fim, na demonstração do microrganismo no sangue ou tecidos. O sulfato de zinco ou a estimativa da
proteína total podem ser utilizados para rápida estimativa da IgG (p. 2415).
TRATAMENTO:  O tratamento requer o uso agressivo de antibióticos. Por não haver tempo para o antibiograma, a escolha inicial deve ser de um medicamento bactericida que tenha alta probabilidade de eficácia contra microrganismos
Gram–negativos. A terapia antibacteriana deve ser acompanhada de fluido, fármacos e outras terapias para choque endotóxico. A mortalidade é alta apesar do tratamento agressivo.
CONTROLE  E  PREVENÇÃO:  Os  bezerros  que  adquirem  concentrações  adequadas  de  imunoglobulinas  do  colostro  são  resistentes  à  colissepticemia.  Portanto,  a  prevenção  depende  primeiramente  das  práticas  de  manejo  que  assegurem  o
fornecimento adequado e precoce de colostro. A adequação das práticas do fornecimento de colostro deve ser monitorada e as estratégias corretivas devem ser aplicadas, quando necessárias. Nos rebanhos leiteiros da raça Holandesa da
América do Norte, a amamentação natural não garante concentrações adequadas de imunoglobulinas circulantes e os bezerros devem ser alimentados com 2 a 4 l de colostro de primeira ordenha (contendo uma massa mínima total de 100 g
de  IgG),  usando­se  uma  mamadeira  ou  sonda  esofágica,  até  2  h  após  o  nascimento;  este  procedimento  é  seguido  de  uma  segunda  alimentação  12  h  depois.  Os  testes  enzimáticos  rápidos  podem  auxiliar  na  seleção  do  colostro  com
concentrações  adequadas  de  imunoglobulinas.  A  concentração  de  imunoglobulinas  circulantes  necessária  para  a  proteção  contra  a  colissepticemia  é  baixa;  entretanto,  altas  concentrações  de  imunoglobulinas  circulantes  são  desejáveis
porque elas diminuem a suscetibilidade a outras doenças infecciosas neonatais.
Quando o colostro natural não estiver disponível para o bezerro recém­nascido, o substituto comercial do colostro contendo 25 g de IgG irá fornecer imunoglobulina suficiente para a proteção contra a colissepticemia se for administrado
no  início  do  período  de  absorção.  A  administração  parenteral  de  plasma  contendo  pelo  menos  4  g  e  preferencialmente  8  g  de  IgG  irá  proporcionar  alguma  proteção  para  os  bezerros  mais  velhos  que  não  mamaram  colostro  e  que  são
incapazes de absorver as imunoglobulinas a partir do intestino. Um pequeno volume de soro hiperimune é benéfico apenas se ele tiver anticorpos específicos contra o sorotipo associado ao surto. O risco de infecção precoce pode ser
minimizado pela higiene da área dos bezerros e pela desinfecção do umbigo ao nascimento. Para minimizar a transmissão, os bezerros criados em ambientes fechados devem ser mantidos em baias separadas (sem contato) ou mantidos em
abrigos individuais (casinhas).

CAUDRIOSE (Heartwater)

Caudriose é uma doença infecciosa e não contagiosa causada por riquétsia, que acomete ruminantes criados em áreas infestadas por carrapatos do gênero Amblyomma. Estas incluem as regiões da África, sul do Saara e ilhas Comores,
Zanzibar, Madagascar, São Tomé, Réunion e Maurício. A caudriose foi introduzida no Caribe e, ela e o seu vetor (A. variegatum), são endêmicos nas ilhas de Guadalupe e Antígua. A. variegatum, mas não a riquétsia, espalhou­se para
várias outras ilhas, apesar das tentativas de erradicação. A possível disseminação da doença no continente ameaça a pecuária industrializada do norte da América do Sul à América Central e sul dos EUA. Muitos ruminantes são suscetíveis,
inclusive algumas espécies de antílopes. Nas áreas endêmicas alguns animais podem tornar­se infectados subclinicamente e atuarem como reservatórios. As raças de bovinos de origem africana (Bos indicus) aparentam ser mais resistentes
do os bovinos das raças de B. taurus.
ETIOLOGIA  E  TRANSMISSÃO:   O  agente  etiológico  é  um  parasito  intracelular  obrigatório,  conhecido  como  Cowdria  ruminantium.  Evidências  moleculares  levaram  à  reclassificação  de  muitos  microrganismos  da  ordem  Rickettsiales  e,
atualmente, ele é classificado como Ehrlichia ruminantium.
Sob condições naturais, E. ruminantium é transmitida pelos carrapatos Amblyomma. Esses carrapatos de três hospedeiros se tornam infectados durante a fase larval ou ninfal e transmitem a infecção durante um dos estágios subsequentes
(transmissão transestadial). A progênie de um carrapato fêmea infectado, muito provavelmente, não é infectante (i. e., não há transmissão transovariana epidemiologicamente significativa). Portanto, a taxa de infecção nas populações de
carrapatos tende a ser baixa. A transmissão intraestadial pelos carrapatos machos também pode ocorrer, assim como algum grau de transmissão vertical da vaca para o bezerro (p. ex., via colostro), nas áreas onde a doença é endêmica.
E. ruminantium pode ser propagada experimentalmente por passagens seriadas, tanto pela inoculação de sangue infectado nos animais suscetíveis quanto pelo repasto das ninfas e das formas adultas do carrapato vetor infectado nos
animais  suscetíveis.  O  microrganismo  também  pode  ser  propagado  em  cultura  de  tecidos,  de  forma  mais  confiável  em  células  endoteliais,  mas  também  em  culturas  primárias  de  neutrófilos  e  linhagens  celulares  de  macrófagos.  À
temperatura ambiente, o material infectante perde sua infectividade em poucas horas, mas o microrganismo, juntamente com crioprotetores adequados, pode ser preservado, de forma viável, em nitrogênio líquido durante anos.
A  imunidade  à  caudriose  parece  ser  principalmente,  se  não  exclusivamente,  mediada  por  células.  Não  há,  ou  só  parcialmente,  proteção  cruzada  entre  diferentes  cepas  de  E.  ruminantium.  A  maioria  destas  cepas  é  infecciosa  para
camundongos, porém, não podem ser passadas seriadamente; entretanto, poucas são patogênicas para os camundongos infectados pela via IV. Uma destas, a cepa Kümm, pode até mesmo ser transmitida pela via intraperitoneal. As análises
moleculares demonstraram que a cepa Kümm é constituída por dois genótipos distintos do microrganismo.
ACHADOS CLÍNICOS, PATOGENIA E LESÕES:  Os sinais são súbitos e evidentes nas formas hiperaguda e aguda. Nos casos hiperagudos, os animais desenvolvem febre, que é seguida rapidamente por hiperestesia, lacrimejamento e convulsões.
Na forma aguda, os animais apresentam anorexia e sinais nervosos, como depressão, hipermetria, blefaroespasmo e os movimentos exagerados de mastigação. Ambas as formas culminam em prostração e convulsões. A diarreia é observada
ocasionalmente. Nos casos subagudos, os sinais são menos acentuados e o envolvimento do SNC é inconsistente.
Parece que E. ruminantium reproduz­se  inicialmente  nos  macrófagos;  em  seguida  o  microrganismo  invade  e  multiplica­se  no  endotélio  vascular.  Durante  o  estágio  febril,  e  por  um  curto  período,  o  sangue  dos  animais  infectados  é
infectante  para  os  animais  suscetíveis  se  subinoculado.  Os  sinais  e  as  lesões  estão  associados  a  lesões  funcionais  do  endotélio  vascular,  resultando  em  maior  permeabilidade  vascular,  sem  sinais  de  patologias  ultra  estruturais  ou
histopatológicas. A concomitante efusão de fluido nos tecidos e cavidades corporais leva à queda da pressão arterial e insuficiência circulatória geral. As lesões nos casos hiperagudos e agudos são hidrotórax, hidropericárdio, edema e
congestão dos pulmões e cérebro, esplenomegalia, petéquias e equimoses nas superfícies de mucosas e serosas e, ocasionalmente, hemorragia no trato gastrintestinal, particularmente no abomaso. As efusões tipicamente cor de palha são
ricas em proteínas de alto peso molecular, inclusive fibrinogênio, e o fluido rapidamente coagula ao ser exposto ao ar.
DIAGNÓSTICO:  Os casos clínicos devem ser diferenciados de uma grande variedade de doenças infecciosas e não infecciosas, especialmente das intoxicações por plantas, que se manifestam com sinais do SNC. Nos casos clínicos agudos de
áreas endêmicas, os sinais clínicos sozinhos podem sugerir a etiologia, porém, a demonstração das colônias do microrganismo no citoplasma das células endoteliais capilares é necessária para o diagnóstico definitivo. Tradicionalmente, isso
é feito com esfregaços obtidos pelo esmagamento da substância cinzenta cerebral ou cerebelar, corados com colorações do tipo Romanowsky. As colorações Diff­Quick ou CAM­Quick são adequadas para diagnosticadores experientes, mas
a utilização de Giemsa de baixa concentração durante 30 min fornece a melhor diferenciação de cor e homogeneidade. Os microrganismos presentes em material autolisado perdem a capacidade de se corar e o diagnóstico torna­se difícil.
Nos esfregaços de esmagamento da substância cinzenta cerebral, um fragmento de matéria cinzenta (de aproximadamente 3 × 3 mm) é macerado entre duas lâminas de microscopia; o material amolecido é então espalhado como em um
esfregaço sanguíneo, afastando­se uma lâmina da outra em direções contrárias. A ligeira elevação da lâmina extensora, aproximadamente a cada 5 a 10 mm, cria várias elevações espessas sobre a lâmina, a partir da qual os capilares são
dispostos em linha reta e paralela nas finas seções do esfregaço para facilitar o exame. As células endoteliais de todos os capilares em um esfregaço devem ser cuidadosamente examinadas quanto à presença de colônias roxas escuras de E.
ruminantium. As colônias devem ser identificadas baseando­se nas subestruturas identificáveis para diferenciá­las de qualquer outro material fagocitado; elas são caracterizadas por agrupamentos constituídos por grânulos individuais. O
tamanho dos grânulos pode varia entre os pacientes, esfregaços do mesmo caso e colônias do mesmo esfregaço, mas geralmente são uniformes em uma mesma colônia. Pequenas colônias geralmente apresentam poucos grânulos grandes,
enquanto colônias grandes são constituídas por vários microrganismos pequenos.
Com a utilização da coloração pelo método da imunoperoxidase, um diagnóstico definitivo pode ser realizado em qualquer amostra de tecido fixado em formol, mesmo em carcaças autolisadas. As cores contrastantes tornam a busca e a
identificação das colônias riquetsiais muito mais rápida, embora as subestruturas das colônias devam ser identificadas antes da confirmação do diagnóstico. Devido à natureza do teste, reações falso­positivas podem ocorrer com alguns
microrganismos  correlacionados.  Nos  esfregaços  de  esmagamento  do  cérebro,  Chlamydophila  pecorum  pode  ser  confundida  com  E.  ruminantium,  mas  as  técnicas  de  histopatologia  ou  imunoperoxidase  permitem  a  diferenciação.  O
sorodiagnóstico dos animais previamente expostos à doença, ou seja, recuperados da infecção subclínica ou clínica, ainda constitui um problema. Muitos testes estão atualmente em uso, inclusive vários testes de imunofluorescência indireta
e ELISAs. Todos os testes sorológicos, inclusive o ELISA que utiliza antígeno recombinante, têm problemas com reações cruzadas com o soro de animais infectados com um dos vários microrganismos de Ehrlichia ou Anaplasma (falso­
positivo) e com o fato de que os bovinos imunes expostos a infecções repetidas podem tornar­se soronegativos (falso­negativo). Sondas de DNA, disponíveis nas instituições de pesquisa, podem ser utilizadas em conjunto com a tecnologia
de PCR. A combinação da sonda pCS20 com as sondas de RNA ribossômico 16S de várias cepas são empregadas rotineiramente para examinar amostras de animais quando é necessária uma licença para movimentar os animais de áreas
endêmicas para áreas não endêmicas. Outra técnica que recentemente entrou em uso foi a PCR em tempo real.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Embora uma vacina atenuada e eficaz baseada na cepa Welgevonden tenha sido desenvolvida há vários anos, ela não está disponível comercialmente. Para fins práticos, não há vacina amplamente efetiva e
segura disponível para imunizar contra E. ruminantium. O controle da infestação de carrapatos é uma medida preventiva útil em alguns casos, mas pode ser difícil e onerosa de se manter em outros. A redução excessiva do número de
carrapatos, entretanto, interfere na manutenção da imunidade adequada por meio do desafio regular a campo nas áreas endêmicas, e periodicamente pode resultar em grandes perdas. Para a imunização, o “método de infecção e tratamento”
ainda está em uso no sul da África: sangue ovino infectado, contendo microrganismos virulentos é utilizado para a infecção, seguido pelo monitoramento da temperatura retal e antibioticoterapia após o desenvolvimento da febre. Em certas
condições, a infecção “controlada” é seguida pelo “tratamento de bloqueio” preventivo sem o registro da temperatura (bovinos no 14o dia [raças de Bos taurus suscetíveis] ou no 16o dia [raças de B. indicus resistentes]; ovinos e caprinos no
11o  dia).  Na  África  do  Sul,  um  implante  de  doxiciclina  está  disponível  para  inserção  SC  na  base  da  orelha  no  momento  da  infecção  IV.  Bezerros  jovens  (<  6  a  8  semanas  de  idade),  cordeiros  e  cabritos  (<  1  semana  de  idade)  são
relativamente resistentes e podem se recuperar espontaneamente de infecções naturais ou induzidas. Se forem imunizados precocemente, o tratamento de bloqueio pode ser evitado.
Para o tratamento, oxitetraciclina a 10 mg/kg ou doxiciclina a 2 mg/kg geralmente são eficazes para a cura, se administradas no início do curso da doença. Em ovinos, caprinos e nas raças de bovinos suscetíveis, uma dose mais alta (10 a
20  mg/kg)  de  oxitetraciclina  pode  ser  necessária,  especialmente  se  o  tratamento  for  tardio,  durante  a  reação  febril  ou  após  o  aparecimento  de  outros  sinais  clínicos.  Nestes  casos,  o  primeiro  tratamento  deve  ser  preferencialmente
administrado por via intravenosa. Uma segunda e terceira dose podem ser necessárias antes da redução da febre ou uma segunda injeção IM com uma formulação de tetraciclina de longa ação. O período de carência para utilização do leite e
da carne após o tratamento com a doxiciclina ou a oxitetraciclina de curta ou longa ação deve ser observado com base nos regulamentos do país. Os corticosteroides têm sido utilizados como terapia de suporte (prednisolona, 1 mg/kg),
embora exista um debate sobre a eficácia e a razões para o uso de drogas potencialmente imunossupressoras na doença infecciosa ativa.

DOENÇA DE WESSELSBRON

A doença de Wesselsbron é uma infecção aguda que acomete ovinos, bovinos e caprinos, provocada por um flavivírus transmitido por artrópodes. A ocorrência da infecção é comum, mas a manifestação da doença clínica é rara. As taxas de
mortalidade nos animais recém­nascidos podem alcançar 27% em ovinos e 18% em caprinos. A infecção nos animais adultos (ovinos, bovinos, caprinos, suínos e equinos) geralmente é subclínica, mas a doença pode ser grave em ovelhas
com patologia hepática preexistente. Podem ocorrer abortos ocasionais e hidrâmnio em ovelhas, assim como malformações congênitas do SNC e artrogripose em fetos ovinos e bovinos. Em humanos causa uma doença não fatal semelhante
à influenza.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O vírus, com propriedades típicas de um flavivírus hemaglutinante, não está muito bem caracterizado. Foi isolado de vertebrados e artrópodes em diversos países africanos e pesquisas sorológicas fornecem
evidências de sua ocorrência em outros países. Pela distribuição dos mosquitos do gênero Aedes associados à doença de Wesselsbron, supõe­se que a incidência seja maior do que a geralmente percebida. A alta prevalência de anticorpos em
localidades mais quentes e úmidas sugere que os herbívoros domésticos podem desempenhar um papel significativo na manutenção do vírus e a atividade viral parece ocorrer durante todo o ano. Em áreas mais secas, no entanto, os surtos
da doença são irregulares e tendem a ocorrer em conjunto com a febre do Vale Rift (p. 760), quando chuvas anormalmente fortes favorecem o aparecimento dos mosquitos que se reproduzem em águas paradas.
ACHADOS CLÍNICOS:  Após um período de incubação de 1 a 3 dias em cordeiros recém­nascidos, tornam­se evidentes sinais clínicos inespecíficos como febre, anorexia, apatia, fraqueza e aumento da frequência respiratória. A doença de
Wesselsbron e a febre do Vale Rift compartilham diversos sinais clínicos e características patológicas. A doença de Wesselsbron, no entanto, geralmente é branda, ocasionando taxas de mortalidade e aborto muito menores, além de lesões
hepáticas menos destrutivas. O vírus parece ser mais neurotrópico do que o da febre do Vale Rift, pois em infecções experimentais é observada teratologia fetal no SNC.
Lesões:  Nos  animais  jovens  e  recém­nascidos  são  observadas  icterícia  e  hepatomegalia  de  moderadas  a  graves  e  o  fígado  também  adquire  uma  coloração  de  amarelada  a  marrom­alaranjado.  Petéquias  e  equimoses  são  comumente
encontradas na mucosa do abomaso, cujo conteúdo apresenta­se com coloração marrom­chocolate. A histopatologia revela necrose do parênquima que varia de leve a extensa e grupos menores ou maiores de hepatócitos necróticos. As
lesões nos animais adultos geralmente são muito mais suaves.
DIAGNÓSTICO:  Os sinais clínicos e a epidemiologia, juntamente com a relativa alta mortalidade em cordeiros, são indicativos da doença. O vírus pode ser isolado de quase todos os órgãos de cordeiros que morreram durante o estágio clínico
da doença. A inoculação intracerebral em camundongos recém­nascidos é o melhor método de isolamento. A diferenciação entre o vírus da doença de Wesselsbron e o da febre do Vale Rift pode ser feita pela inoculação intraperitoneal em
camundongos desmamados, uma vez que o vírus da doença de Wesselsbron não ocasiona a morte destes, enquanto o da febre do Vale Rift sim. A confirmação da identidade do vírus pode ser realizada por neutralização viral.
O sorodiagnóstico vem sendo baseado na inibição da hemaglutinação, fixação de complemento e neutralização viral. A reação cruzada com outros flavivírus é evidente nos testes de inibição da hemaglutinação, mas nem tanto nos testes
de fixação de complemento, específicos para o soro bovino. De qualquer maneira, os títulos homólogos para a doença de Wesselsbron excedem os títulos de flavivírus heterólogos.
CONTROLE:  A produção de vacinas atenuadas foi descontinuada pouco antes do ano 2000. A incidência da doença é baixa em ovinos e a utilização imprudente da vacina em ovelhas prenhes resultou em grandes perdas econômicas devido a
abortos e malformações fetais. Tentativas de controle do mosquito vetor são de pequeno valor como medida preventiva.

DOENÇA DOS OVINOS DE NAIRÓBI

A doença dos ovinos de Nairóbi (DON) é uma doença viral de ovinos e caprinos transmitida por carrapatos e caracterizada por febre, gastrenterite hemorrágica, aborto e alta mortalidade. A doença foi identificada pela primeira vez perto de
Nairóbi, Quênia, em 1910 e o vírus da DON foi apresentado como o agente etiológico em 1917. A doença é endêmica no Quênia, Uganda, Tanzânia, Somália, Etiópia, Botswana, Moçambique e  República Democrática  do  Congo.  As
infecções em seres humanos são raras; entretanto, infecções acidentais foram descritas em funcionários de laboratórios resultando em febre, dores articulares e mal­estar geral. O rato de campo africano (Arvicathus abysinicus nubilans) é
um potencial reservatório. A DON é uma doença de notificação nos EUA e é uma das doenças listadas pela OIE.
ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  O vírus da DON pertence ao gênero Nairovírus, família Bunyaviridae, e possivelmente é o vírus conhecido mais patogênico para ovinos e caprinos. Ele é idêntico ou estreitamente relacionado com o vírus
Ganjam, uma infecção de ovinos, caprinos e humanos na Índia transmitida por carrapatos. Dados genéticos e sorológicos demonstraram que o vírus Ganjam é uma variante asiática do vírus da DON. Tanto o vírus Ganjan quanto o vírus da
DON são filogeneticamente mais relacionados com o vírus Hazara do que ao vírus Dugbe. Adicionalmente, o vírus da DON é sorologicamente relacionado com o vírus Dugbe, outra infecção de bovinos transmitida por carrapatos, e ao
vírus  da  febre  hemorrágica  da  Crimeia­Congo  (p.  679).  O  vírus  é  transmitido  pela  via  transovariana  e  transestadial  pelo  carrapato  marrom  da  orelha,  Rhipicephalus  appendiculatus,  no  qual  pode  sobreviver  por  até  800  dias.
Carrapatos adultos em jejum podem transmitir o vírus da DON por mais de 2 anos após a infecção. Outros carrapatos Rhipicephalus spp e Amblyomma variegatum também podem transmitir a doença. O vírus é eliminado na urina e nas
fezes, mas a doença não é transmitida pelo contato.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em surtos naturais, a doença geralmente ocorre 5 a 6 dias após a movimentação dos animais suscetíveis para áreas endêmicas infestadas com Rhipicephalus appendiculatus. Os sinais clínicos começam com aumento
acentuado da temperatura corporal (41°C a 42°C) que persiste por 1 a 7 dias. Leucopenia e viremia geralmente coincidem com a fase febril. A diarreia geralmente aparece 1 a 3 dias após o início da febre e piora à medida que a infecção
progride.  A  doença  se  manifesta  com  depressão,  anorexia,  secreção  nasal  mucopurulenta  e  sanguinolenta,  conjuntivite  ocasional  e  disenteria  fétida  que  causa  esforço  doloroso.  Os  animais  prenhes  frequentemente  abortam.  Nos  casos
hiperagudos e agudos o tempo decorrido entre o aparecimento da doença e o óbito geralmente é de 2 a 7 dias, mas pode chegar a 11 dias nos casos menos agudos. A infecção experimental demonstrou que a raça persa de cauda larga nativa
e que as raças europeias de ovinos são igualmente suscetíveis; entretanto, a taxa de mortalidade no campo é alta: 70 a 90% para nativas de ovinos e 30% para exóticas e mestiças. Os sinais clínicos nos caprinos são semelhantes ao dos
ovinos, porém, menos graves, embora mortalidade de 80% tenha sido relatada. A presença da imunidade colostral, além de proteger os cordeiros e cabritos da exposição precoce à infecção, também permite o desenvolvimento da imunidade
ativa, permitindo a sobrevivência nas áreas infestadas por carrapatos.
Lesões: As principais características no exame externo das carcaças são quartos traseiros sujos de fezes (ou com uma mistura de sangue e fezes) e desidratação, especialmente nos animais com diarreia prolongada. Também são comuns
conjuntivite  e  crostas  em  torno  das  narinas,  como  resultado  da  secreção  nasal.  Os  achados  de  necropsia  incluem  linfonodos  aumentados  e  edematosos,  leve  esplenomegalia  e  hemorragias  no  trato  GI  (particularmente  no  abomaso),
respiratório  e  genital  feminino,  vesícula  biliar,  baço  e  coração.  Hemorragias  petequiais  e  equimóticas  na  mucosa  do  ceco  e  cólon  são  frequentemente  aparecem  como  estrias  longitudinais  e,  às  vezes,  são  as  únicas  lesões  evidentes.
Hemorragias na subserosa podem ser observadas no ceco, cólon, vesícula biliar e rins. Conjuntivite e crostas secas ao redor das narinas são frequentemente observadas. Lesões histopatológicas comuns são: hiperplasia dos tecidos linfoides,
degeneração do miocárdio, nefrose e necrose coagulativa da vesícula biliar.
DIAGNÓSTICO:  A ocorrência da doença em ovinos e caprinos, com alta taxa de mortalidade, e acompanhada de infestação de carrapatos, é sugestiva, especialmente após a transferência para áreas endêmicas ou alteração na população de
carrapatos ocasionada por chuvas intensas e prolongadas. A confirmação dos sinais sugestivos e das lesões requer a detecção do vírus ou do antígeno viral e dos anticorpos. As amostras de escolha são o plasma de animais febris, linfonodos
mesentéricos, baço e soro. Equipamentos de proteção individual devem ser utilizados na necropsia e no manuseio do agente no laboratório. A inoculação em camundongos e a cultura de células podem ser utilizadas para o isolamento
primário do vírus. Os ovinos são os animais mais sensíveis para o isolamento, enquanto as linhagens de células renais de filhotes de hamster e de cordeiros ou de culturas de celulares de rins de hamster são as células mais sensíveis. A
imunodifusão em gel de ágar, fixação de complemento e ELISA podem ser valiosos para a detecção do antígeno em tecidos infectados ou em cultura tecidual. A detecção do ácido nucleico viral utilizando a PCR é o método mais rápido de
diagnóstico. Os anticorpos dos animais infectados ou recuperados podem ser detectados por imunodifusão, fixação de complemento, teste de imunofluorescência indireta, hemaglutinação e ELISA.
O diagnóstico diferencial deve incluir a peste dos pequenos ruminantes, febre do Vale Rift, caudriose e salmonelose.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Nenhum agente antiviral específico está disponível para o tratamento. Os animais não afetados do rebanho devem ser tratados com acaricidas (p. ex., piretroides em óleo, produtos de cipermetrina “pour­on”,
várias preparações para banho de imersão). O controle de carrapatos a longo prazo não é economicamente viável nas áreas endêmicas.
Nas áreas endêmicas, os sinais clínicos não são observados, a menos que sejam introduzidos animais suscetíveis. Tais animais devem ser vacinados, assim como aqueles que forem expostos por longos períodos ao carrapato vetor. Dois
tipos de vacinas experimentais foram desenvolvidos – uma vacina com vírus vivo modificado, atenuada em cérebro de camundongo, e uma vacina inativada com adjuvante oleoso. Uma única dose da vacina viva modificada produz rápida
imunidade; entretanto, a revacinação é necessária para a manutenção da proteção total. Duas doses da vacina inativada são necessárias para uma boa proteção. Nenhuma destas vacinas é produzida comercialmente.

FEBRE CATARRAL MALIGNA (Catarro maligno da cabeça, Snotsiekte, Febre catarral, Coriza gangrenosa)

A  febre  catarral  maligna  (FCM)  é  uma  doença  sistêmica  infecciosa  que  se  apresenta  como  um  complexo  variável  de  lesões  que  afeta  principalmente  os  ruminantes  e  raramente  os  suínos.  Ela  é,  principalmente,  uma  doença  de
bovinos domésticos, búfalos, bateng, bisões americanos e cervos. Além destes animais de criação, a FCM foi descrita em vários ruminantes em cativeiro de coleções mistas de zoológicos. Em algumas espécies, como o bisão e alguns
cervos, a FCM é aguda e altamente letal, capaz de afetar grande número de animais. Com exceções ocasionais, a doença nos bovinos é observada esporadicamente e afeta os animais individualmente. A FCM é tipicamente fatal; entretanto,
há surtos em que muitos animais são afetados, com evidência de recuperação e infecção leve ou inaparente em alguns casos. A FCM ocasionalmente se apresenta como alopecia crônica e perda de peso. Sua distribuição é essencialmente
mundial,  refletindo  a  distribuição  dos  principais  portadores,  os  ovinos  domésticos  e  gnus.  A  FCM  é  um  dos  principais  problemas  nas  atividades  de  criação  de  cervos  e  recentemente  emergiu  como  um  grave  ameaça  para  a  indústria
comercial de bisões.
ETIOLOGIA:   A  FCM  resulta  da  infecção  de  um  ou  mais  membros  de  um  grupo  de  ruminantes  por  gama­herpesvírus  do  gênero  Rhadinovírus.  Enquanto  o  grupo  de  rhadinovírus  de  ruminantes  atualmente  inclui  cerca  de  10  membros
conhecidos, sabe­se que só alguns são patogênicos sob condições naturais. Os principais portadores e seus vírus são: ovinos (herpesvírus­2 ovino), gnus (herpesvírus­1 alcelaphine) e caprinos (herpesvírus­2 caprino). Outra cepa de origem
não identificada causa FCM em cariacus. Praticamente todos os casos clínicos são causados por vírus de ovinos ou gnus.
Os vírus são mantidos nas populações de ovinos e gnus em padrões semelhantes, mas não idênticos. Os cordeiros geralmente são infectados com 1 a 2 meses de idade por aerossóis de outros indivíduos do rebanho e começam a eliminar
o  vírus  ativamente  ao  redor  dos  6  meses  de  idade.  A  eliminação  diminui  por  volta  dos  10  meses,  com  adultos  eliminando  menores  taxas  do  que  os  jovens.  Em  contrapartida,  os  filhotes  de  gnus  são  afetados  no  período  perinatal  por
transmissão horizontal e, ocasionalmente, intrauterina e eliminam ativamente o vírus até 3 a 4 meses de idade. A transmissão ocorre pela transferência das secreções nasais cheias de vírus pelo contato direto ou por via aerógena pouco
definida. Na África, a maioria dos casos de FCM associada aos gnus é observada na época de parição, entretanto, a FCM associada aos ovinos (FCM­AO) não segue o mesmo padrão. As ovelhas não eliminam o vírus por meio dos tecidos e
secreções placentárias não sendo observados episódios frequentes de eliminação na época do parto. Os únicos fatores racionais e constantes que contribuem para a sazonalidade da FCM­AO são as influências climáticas na sobrevivência do
vírus e os padrões de eliminação relacionados com a idade dos cordeiros. A epidemiologia do vírus da FCM caprina apresenta similaridade com a dos ovinos.
A  gravidade  dos  surtos  de  FCM­AO  depende  de  fatores  como  número  total,  densidade  populacional  e  espécies  de  hospedeiros  suscetíveis  envolvidos;  a  proximidade  de  contato  e  a  quantidade  de  vírus  eliminado  disponível  para
transmissão. Os casos são observados esporadicamente nas raças europeias de bovinos (Bos taurus), que são relativamente resistentes. Em contrapartida, os bateng, bisões e algumas, mas não todas, as espécies de cervídeos (p. ex., cariacus,
cervos–do­padre­david) são altamente suscetíveis. Com o desenvolvimento dos sistemas agropecuários, envolvendo a criação de bisões e cervos, a FCM tornou­se mais problemática. Ela é uma das principais causas de perdas relacionadas a
doenças infecciosas nas fazendas de cervos da Nova Zelândia. Nas criações de bisões expostas a um grande número de ovinos, as perdas podem ser devastadoras. Cerca de 800 animais morreram em um surto nos EUA em 2003.
Entre os animais que sobrevivem, a infecção permanece por toda a vida; algumas espécies suscetíveis, inclusive os bovinos e bisões, podem ficar latentemente infectados. A recrudescência de infecções latentes é possível e deve ser
considerada nos casos com histórico desconhecido de contato com portadores.
A FCM é transmitida apenas entre portadores e animais clinicamente suscetíveis. Os animais afetados não transmitem a infecção para o seu grupo.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os casos agudos de FCM são provocados pelo herpesvírus­2 ovino e herpesvírus­1 alcelaphine e são semelhantes clinicamente e patologicamente. O curso da doença pode variar de hiperagudo a crônico. Os casos da
doença em cervos geralmente são hiperagudos com morte súbita. Os cervos que sobrevivem durante alguns dias e os bisões desenvolvem diarreia hemorrágica, sangue na urina e opacidade de córnea antes de morrer. Febre alta (41 a
41,5°C) e depressão são comuns. Outros sinais que podem estar presentes são: inflamação catarral, erosões e exsudação mucopurulenta (afetando as mucosas do trato respiratório superior, ocular e oral), inchaço nos linfonodos, claudicação
e sinais nervosos (depressão, tremores, hiporresponsividade, estupor, agressividade, convulsões). Historicamente, a FCM foi descrita como tendo várias “formas” – branda, hiperaguda, cabeça e olhos, intestinal etc. Há pouca base para esta
classificação e é de pouca utilidade. Uma variação nos sistemas de órgãos envolvidos pode ser observada, às vezes, no mesmo surto e, em parte, está relacionada com o tempo de sobrevivência após o início da doença. Em média, o tempo
de morte nas raças europeias de bovinos é um pouco mais longa do que nos cervos, bisões, búfalos e bateng. Em bovinos, inchaço dos linfonodos e lesões oculares graves (panoftalmite, hipópio, erosões corneanas) são mais frequentes e
enterite  hemorrágica  e  cistite  são  menos  frequentes  do  que  em  cervos  e  bisões.  As  lesões  cutâneas  (eritema,  exsudação,  rachaduras,  formação  de  crostas)  são  comuns  nos  animais  que  não  sucumbem  rapidamente.  As  alterações
hematológicas são variáveis. Até 25% dos bovinos sofrem da doença crônica e às vezes a doença aumenta e diminui. A taxa de mortalidade nos animais clinicamente afetados geralmente aproxima­se de 95%. Entretanto, em circunstâncias
limitadas, a sobrevivência nos bovinos pode ser alta.
Lesões: A doença é sistêmica e as lesões podem ser encontradas em qualquer órgão, embora a frequência e a gravidade variem muito. As principais lesões são inflamação e necrose do epitélio da mucosa do trato respiratório, digestório e
urinário, infiltração subepitelial linfoide, proliferação linfoide generalizada, necrose e vasculite disseminada. Ulcerações e hemorragia nas mucosas são comuns. As hemorragias podem estar presentes em muitos órgãos parenquimatosos,
particularmente  nos  linfonodos.  A  lesão  histológica  clássica,  mas  não  patognomônica,  é  a  necrose  fibrinoide  de  pequenas  artérias  musculares,  mas  os  vasos  de  todos  os  tipos  podem  estar  inflamados,  inclusive  os  do  cérebro.  Nódulos
esbranquiçados proeminentes, representando proliferação intramural e perivascular, podem estar aparentes, particularmente nos rins.
DIAGNÓSTICO:  O  diagnóstico  da  FCM  é  baseado  nos  sinais  clínicos,  lesões  macroscópicas  e  histológicas  e  confirmação  laboratorial.  O  diagnóstico  diferencial  primário  inclui  a  diarreia  viral  bovina,  doença  da  mucosa,  peste  bovina,
rinotraqueíte  infecciosa  bovina  e  listeriose  e  febre  da  costa  leste  (theileriose).  Quando  o  envolvimento  do  SNC  é  proeminente,  a  FCM  pode  assemelhar­se  a  raiva  e  a  encefalite  por  carrapatos.  Um  histórico  de  contato  com  espécies
portadoras (ovinos, caprinos ou gnus) pode ser útil, embora casos recrudescentes sejam observados sem esse histórico. Testes laboratoriais confiáveis e específicos para anticorpos e DNA viral estão disponíveis. O teste de escolha para o
diagnóstico clínico é a PCR para detectar o DNA viral. Os tecidos preferidos para o teste são: sangue anticoagulado, rins, parede intestinal, linfonodos e cérebro.
A sorologia é utilizada para o levantamento dos animais sadios e é apenas indicativo de infecção – a infecção latente entre os animais suscetíveis pode fazer com que a sorologia seja inconclusiva para a doença atual. Vários testes com
soro estão disponíveis, inclusive a neutralização viral, a imunoperoxidase, imunofluorescência e ELISA. Os soroensaios policlonais são dificultados por reações cruzadas. O ELISA competitivo monoclonal atualmente é o mais específico e
detecta anticorpos contra todos os grupos de vírus conhecidos da FCM. Apenas a PCR pode discriminar os diferentes grupos.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O prognóstico é ruim. Nenhum tratamento proporciona qualquer benefício consistente. A redução do estresse dos animais afetados subclinicamente ou levemente é indicada. Não há vacina disponível. Ovinos
livres  do  vírus  podem  ser  obtidos  por  meio  do  desmame  precoce  e  isolamento.  A  outra  única  estratégia  efetiva  é  a  separação  dos  animais  portadores  dos  animais  suscetíveis.  Quando  um  grande  número  de  animais  potencialmente
eliminadores do vírus estão presentes, como em confinamentos de cordeiros, distâncias > 1 km podem ser necessárias para proteger espécies altamente suscetíveis como os bisões.

FEBRE DO VALE RIFT

A febre do Vale Rift (FVR) é uma doença zoonótica aguda ou hiperaguda dos ruminantes domésticos da África, Madagascar e da Península Arábica. Os sinais da doença tendem a não ser específicos, tornando difícil o reconhecimento dos
casos individuais. As infecções também podem ser inaparentes ou brandas. Durante as epidemias, a ocorrência de numerosos abortos e de mortes entre os animais jovens, juntamente com uma doença similar à influenza humana, tende a ser
característica.

ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O vírus da FVR pertence ao gênero Phlebovírus e é um Bunyavírus típico. Ele possui três segmentos, genoma de RNA de fita simples e sentido negativo, com peso molecular de 4 a 6 × 106 e cada um dos
segmentos, G (grande), M (médio) e P (pequeno), está contido em um nucleocapsídio distinto dentro do vírion. Não foram demonstradas diferenças antigênicas significativas entre os vírus da FVR isolados em muitos países e surtos, mas
foram observadas diferenças na patogenicidade. A doença é endêmica nas regiões tropicais, principalmente no leste e sul da África, embora a África ocidental e as áreas secas do norte da África também sejam afetadas. Uma epidemia
também foi relatada em 2000 na Arábia Saudita e no Iêmen. Os ciclos epidêmicos têm ocorrido em intervalos de 5 a 20 anos nas áreas secas. Os ciclos normalmente estão associados a períodos anormais de chuva pesada. Nos períodos entre
as epidemias, acredita­se que o vírus permanece dormente nos ovos do mosquito que se reproduz em águas de inundação, Aedes mcintoshi, presentes no solo seco e depressões na pastagem (dambos). Embora a transmissão transovariana
seja considerada a estratégia mais importante de sobrevivência interepidêmica do vírus, o ciclo inaparente da doença pode ocorrer em habitats nas margens das florestas. A FVR pode se espalhar por meio de mosquitos transportados pelo
vento ou pela movimentação de animais virêmicos. Com uma precipitação adequada, a infecção é mantida nos mosquitos e é transmitida para os ruminantes, que amplificam o vírus. O vírus é disseminado por várias espécies de mosquitos
ou mecanicamente por outros insetos característicos de outras regiões. Os picos de incidência de FVR ocorrem no final do verão. Após a primeira geada, tanto a doença como os vetores podem desaparecer. Em climas amenos, onde os
insetos vetores estão continuamente presentes, a sazonalidade não é observada.
Os  seres  humanos  também  são  rapidamente  infectados  por  meio  de  aerossóis  de  animais  infectados  em  rituais  de  abate  e  pela  exposição  a  tecidos  de  animais  infectados,  fetos  abortados,  picadas  de  mosquitos  e  procedimentos
laboratoriais. Os seres humanos podem atuar como hospedeiros amplificadores e introduzir a doença (via mosquitos) aos animais de áreas não infectadas.
ACHADOS CLÍNICOS:  O período de incubação é de 12 a 36 h em cordeiros. Pode ocorrer uma febre bifásica de até 41°C. Os animais afetados tornam­se apáticos e relutantes para se mover ou alimentar, podendo mostrar sinais de dor
abdominal. Os cordeiros geralmente morrem dentro de 2 dias. Os animais mais velhos podem morrer de forma aguda ou desenvolver uma infecção inaparente. Os animais doentes podem regurgitar e desenvolver diarreia fétida e icterícia,
que é comum em bovinos. Às vezes, o aborto pode ser o único sinal da infecção. Nas ovelhas prenhes, a taxa de mortalidade e de aborto varia de 5 a quase 100% em diferentes surtos e em diferentes fazendas. As taxas nos bovinos
geralmente são < 10%.
Lesões: As  lesões  hepáticas  são  similares  em  todas  as  espécies  e  variam  principalmente  conforme  a  idade  do  animal  infectado.  Nas  lesões  mais  graves,  observadas  nos  fetos  abortados  e  cordeiros  recém­nascidos,  o  fígado  encontra­se
moderadamente ou muito aumentado, macio, friável e com áreas irregulares de congestão. Numerosos focos necróticos branco­acinzentados estão invariavelmente presentes, mas eles podem não estar claramente visíveis. Hemorragia e
edema  na  parede  da  vesícula  biliar  e  mucosa  do  abomaso  são  comuns.  O  conteúdo  intestinal  é  marrom­chocolate  escuro.  Em  todos  os  animais,  o  baço  e  os  linfonodos  periféricos  estão  aumentados  e  edematosos  e  podem  apresentar
petéquias. Nos humanos, a FVR geralmente é inaparente ou associada à doença moderada a grave, não fatal, similar à influenza. Uma minoria pode desenvolver a doença grave com lesões oculares, encefalites e lesões hepáticas graves com
hemorragia.
DIAGNÓSTICO:  Deve­se suspeitar de FVR quando chuvas fortes anormais e inundações são seguidas pelo aumento da ocorrência de abortos e mortalidade entre animais recém­nascidos caracterizadas por hepatite necrótica, acompanhada de
hemorragias e doença similar à influenza em pessoas que trabalham com os animais ou seus produtos. Histopatologicamente, as lesões hepáticas nos cordeiros são graves e extensas. O vírus pode ser isolado rapidamente em tecidos de fetos
abortados e no sangue dos animais infectados. O título viral nestes tecidos geralmente é alto o suficiente para usar as suspensões dos órgãos como antígenos para um rápido diagnóstico na neutralização, fixação de complemento, ELISA,
teste de difusão em ágar­gel ou coloração de esfregaços de impressão de órgãos; entretanto, estes testes devem ser complementados pelo isolamento em camundongos lactentes e hamsters injetados intracerebralmente ou em culturas de
células como as de rins de filhotes de hamster (BHK­21), rins de macaco (Vero), CER, células de mosquito ou em culturas primárias de células de rins e testículos de cordeiros. A detecção do ácido nucleico viral pela PCR é possível e
testes de RT­PCR já foram descritos.
Todos os testes sorológicos convencionais podem ser utilizados para detectar anticorpos contra o vírus da FVR e são úteis nos estudos epidemiológicos. Em algumas áreas, entretanto, o levantamento sorológico pode ser complicado
devido às reações cruzadas entre o vírus da FVR e outros phlebovírus. Um ELISA para detecção de IgM pode demonstrar uma infecção recente usando uma única amostra de soro.
CONTROLE E PREVENÇÃO:  O controle dos vetores, o movimento dos animais para áreas de alta altitude e o confinamento dos animais em estábulos à prova de insetos geralmente não são práticos, são instituídos tardiamente e são de pouco
valor. A imunização permanece como a única forma efetiva para proteger os animais de criação. A estirpe Smithburn do vírus da FVR neuroadaptada em camundongos pode ser rapidamente produzida em grandes quantidades, tem baixo
custo e induz imunidade duradoura 6 a 7 dias após a inoculação. A vacina não deve ser utilizada para a proteção de animais prenhes, pois ela pode causar abortos, defeitos congênitos e hidrâmnio em ovinos; entretanto, o seu uso pode ser
considerado durante um surto, quando os possíveis efeitos adversos podem ser compensados pelos riscos de uma infecção natural. Embora não tenha sido provado, teoricamente é possível que o vírus atenuado volte a ser virulento. Estirpes
variantes de pequenas placas e estirpes com mutação induzida têm sido investigadas como potenciais estirpes para vacinas, porém elas não foram aceitas somo substitutas da estirpe Smithburn. Os surtos de FVR não podem ser previstos e
geralmente têm início súbito. Assim, é recomendável a imunização regular dos cordeiros, aos 6 meses de idade, de forma a garantir uma proteção por toda a vida. As proles das ovelhas suscetíveis podem ser imunizadas em qualquer idade.
Não é aconselhável o uso de vacinas vivas e atenuadas em países não endêmicos; vacinas de subunidades de DNA estão sendo desenvolvidas e podem oferecer uma melhor alternativa.
As ovelhas e as vacas prenhes devem ser vacinadas com a vacina inativada em formalina, que proporciona uma melhor imunidade em bovinos e é segura na gestação. Recomenda­se a revacinação após 3 meses de idade para induzir uma
imunidade que irá durar cerca de 1 ano e conferirá imunidade colostral à prole.
RISCO ZOONÓTICO:  As pessoas envolvidas nas atividades pecuárias devem ser alertadas sobre os potenciais riscos da exposição aos animais e tecidos infectados com o vírus da FVR.

FEBRE EFÊMERA (Enfermidade dos três dias)

A febre efêmera é uma doença viral não contagiosa transmitida por insetos que acomete bovinos e bubalinos na África, Oriente Médio, Australásia (exceto Papua Nova Guiné e Nova Zelândia) e sul asiático da antiga União Soviética. As
infecções inaparentes podem se desenvolver em búfalos africanos, búbalus, inhacosos, gnus, cervídeos e, possivelmente, caprinos. Baixos níveis de anticorpos foram relatados em várias espécies de antílopes e girafas, mas a especificidade
não foi confirmada.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O vírus da febre efêmera é classificado como um membro do gênero Ephemovírus da família Rhabdovidae (RNA de fita única em sentido negativo). O vírus é sensível ao éter e rapidamente inativado em pH
abaixo de 5 e acima de 10. Embora nenhuma evidência de diversidade imunogênica tenha sido relatada, a variação antigênica foi demonstrada com a utilização de anticorpos monoclonais e pelo mapeamento de epítopos.
O vírus pode ser transmitido dos bovinos infectados para os suscetíveis pela inoculação IV; quantidades tão pequenas como 0,005 ml de sangue coletado durante o estágio febril é infectante. Embora o vírus tenha sido recuperado de
algumas espécies de Culicoides e de mosquitos anofelinos e culicíneos coletados a campo, a identidade dos principais vetores não foi comprovada. Não ocorre transmissão por contato ou fômites. O vírus aparentemente não persiste nos
bovinos recuperados que, frequentemente, apresentam imunidade por toda a vida.
A prevalência, a extensão geográfica e a gravidade da doença variam de ano para ano, e epidemias ocorrem periodicamente. O início da epidemia é rápido; muitos animais são afetados dentro de dias ou em 2 a 3 semanas. A febre
efêmera  é  mais  prevalente  na  estação  das  chuvas,  nos  trópicos,  e  no  verão  e  início  do  outono,  nos  subtrópicos  ou  regiões  temperadas  (quando  as  condições  favorecem  a  multiplicação  dos  insetos  picadores);  a  doença  desaparece
abruptamente no inverno. A distribuição do vírus parece ser limitada pela latitude em vez da topografia ou da disponibilidade de hospedeiros suscetíveis. A morbidade pode ser tão alta quanto 80%; a mortalidade global geralmente é de 1 a
2%, embora possa ser maior nas vacas lactantes, touros em boas condições e animais de engorda (10 a 30%).
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais, que ocorrem subitamente e com diferentes graus de gravidade, podem incluir febre bifásica a polifásica (40 a 42°C), tremores, inapetência, lacrimejamento, secreção nasal serosa, salivação, aumento da
frequência cardíaca, taquipneia ou dispneia, atonia dos pré­estômagos, depressão, rigidez e claudicação, bem como diminuição súbita na produção de leite. Os sinais clínicos geralmente são brandos nos búfalos. Os bovinos afetados podem
ficar em decúbito e paralisados por 8 h a > 1 semana. Após a recuperação, a produção de leite geralmente não consegue retornar aos níveis normais até a próxima lactação. O aborto, com a perda total do período de lactação, ocorre em
aproximadamente 5% das vacas prenhes com 8 a 9 meses. O vírus parece não atravessar a placenta ou afetar a fertilidade da vaca. Touros, bovinos pesados e vacas leiteiras de alta produção são gravemente afetados, porém, a recuperação
espontânea geralmente ocorre dentro de alguns dias. Perdas mais insidiosas podem resultar em redução da massa muscular e baixa fertilidade de touros.
Lesões:  A  febre  efêmera  é  uma  doença  inflamatória.  As  lesões  mais  comuns  incluem  poliserosite  que  afeta  a  superfície  pleural,  pericárdica  e  peritoneal,  polisinovite  serofibrinosa,  poliartrite,  politendinite,  celulite  e  necrose  focal  dos
músculos esqueléticos. Edema generalizado de linfonodos e pulmões e atelectasia também podem estar presentes.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  baseia­se  quase  inteiramente  nos  sinais  clínicos  durante  a  epidemia.  Todos  os  casos  clínicos  apresentam  neutrofilia  com  a  presença  de  muitas  formas  imaturas,  embora  isto  não  seja  patognomônico.  A
inflamação serofibrinosa da bainha dos tendões, fáscias e articulações, juntamente com lesões pulmonares, pode fundamentar um diagnóstico presuntivo.
A confirmação laboratorial é feita por sorologia, e raramente por isolamento viral. O sangue total deve ser coletado dos bovinos doentes e dos aparentemente saudáveis em rebanhos afetados. As amostras devem ser suficientes para dois
esfregaços sanguíneos, 5 ml de sangue total em anticoagulante (não EDTA) e aproximadamente 10 ml de soro. A contagem diferencial de leucócitos nos esfregaços sanguíneos pode sustentar ou descartar o diagnóstico presuntivo.
O vírus foi melhor isolado por meio de inoculação em culturas celulares de mosquito (Aedes albopictus), com sangue desfibrinado, seguida de transferência para culturas de células renais de filhotes de hamster (BHK­21) ou de rim de
macaco (Vero) após 15 dias. Camundongos lactentes também podem ser utilizados para o isolamento primário por meio de inoculação intracerebral. Os vírus isolados são identificados pela PCR, testes de neutralização com antissoro
específico para o vírus da febre efêmera e ELISA com o uso de anticorpos monoclonais específicos. O teste de neutralização e o ELISA de bloqueio são recomendados para a detecção de anticorpos e apresentam resultados semelhantes.
Um aumento de 4 vezes nos títulos de anticorpos das amostras de soro pareadas coletadas em intervalos de 2 a 3 semanas confirmam a infecção.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   O  descanso  completo  é  o  tratamento  mais  efetivo  e  os  animais  em  recuperação  não  devem  ser  estressados  ou  utilizados  em  trabalhos  devido  ao  risco  de  recidiva.  Os  medicamentos  anti­inflamatórios
administrados no início e em doses repetidas por 2 a 3 dias são eficazes. A via de administração oral deve ser evitada, a menos que o reflexo de deglutição esteja funcional. Os sinais de hipocalcemia são tratados como na febre do leite (p.
1058). O tratamento com antibióticos para controlar a infecção secundária e a reidratação com fluidos isotônicos pode ser justificável.
As vacinas com o vírus atenuado parecem ser eficazes, mas só devem ser utilizadas nas áreas endêmicas. As vacinas com o vírus inativado não produzem proteção por longos períodos em desafios experimentais com o vírus virulento e
não podem garantir imunidade duradoura, mas estimulam a produção da imunidade produzida pela vacina com vírus vivo. Embora tenha sido descrito que a vacina de subunidade protege contra o desafio a campo e laboratorial, ela não está
comercialmente disponível. A eficácia do controle dos vetores ainda é incerta, pois os insetos vetores não estão totalmente identificados. Não há evidências de que os humanos possam ser infectados.

FEBRE HEMORRÁGICA DA CRIMEIA­CONGO

A febre hemorrágica da Crimeia­Congo (FHCC) é uma grave doença viral hemorrágica dos seres humanos adquirida a partir de carrapatos infectados, tecidos de animais silvestres ou domésticos infectados e pacientes humanos com a
doença.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O agente etiológico, o vírus da FHCC (gênero Nairovírus, família Bunyaviridae), é envelopado e com RNA de fita simples de senso negativo. O vírus foi relatado em uma extensa área que vai da África do
Sul, sul da Europa, Eurásia até regiões do oeste da China. O vírus está principalmente associado aos carrapatos do gênero Hyalomma, embora também já tenha sido isolado em outros gêneros de carrapatos ixodídeos. A distribuição global
do vírus aproxima­se da distribuição do carrapato Hyalomma spp. Análises recentes do genoma do vírus sugerem a existência de uma diversidade genética significativa correlacionada com a origem geográfica do vírus. Entretanto, as
anormalidades desses padrões sugerem que a dispersão dos carrapatos hospedeiros pelos animais silvestres migratórios, como pássaros, ou a movimentação dos animais de produção pelos seres humanos, podem perturbar a distribuição
geográfica “normal” das subpopulações do vírus da FHCC.
TRANSMISSÃO  E  PATOGENIA:   O  vírus  replica­se  no  carrapato  hospedeiro  quando  este  passa  da  fase  larval  para  o  estágio  adulto  (transmissão  transestadial)  e  também  pode  ser  transmitido  de  uma  geração  para  outra  (transmissão
transovariana). Assim, o carrapato não apenas é um vetor, mas como também pode ser um reservatório do vírus na transmissão vertical. Pequenos roedores, lagomorfos e pássaros foram incriminados como fontes de infecção para os
estágios imaturos dos carrapatos, enquanto a maior parte dos Hyalomma spp é multi­hospedeiro e utiliza grandes vertebrados como hospedeiro para o estágio adulto de seu ciclo de vida.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  Nas inoculações experimentais, os ovinos e os bovinos se tornam infectados, mas desenvolvem apenas um aumento leve e transitório da temperatura corporal com pouca evidência da doença clínica. Os
níveis de viremia e sua duração são relativamente baixos e curtos, e os anticorpos são detectáveis durante um breve período após o término da viremia. Alguns testes (principalmente o ELISA para IgG) podem detectar anticorpos pelo resto
da  vida  do  animal,  enquanto  outros  testes,  como  fixação  do  complemento  e  reação  de  imunofluorescência  indireta,  podem  detectar  anticorpos  por  curtos  períodos  após  a  infecção.  A  prevalência  de  anticorpos  nas  espécies  adultas  dos
animais de produção nas regiões endêmicas pode ser > 50%.
TRATAMENTO:  O fármaco antiviral ribavirina tem sido utilizado no tratamento da doença em seres humanos na África do Sul, embora o ensaio placebo­controlado não tenha sido concluído. A ausência significativa da doença clínica nos
animais de produção justifica o não tratamento.
CONTROLE E PREVENÇÃO:  As estratégias para o controle da infecção humana inclui a prevenção da picada dos carrapatos com a utilização de repelentes e proteção adequada durante o abate e manejo dos animais. O movimento dos animais
não infectados para as áreas endêmicas possibilita a amplificação d o vírus nos animais vertebrados e aumenta os riscos de doença ocupacional em açougueiros e funcionários de curtume; o controle dos carrapatos quando os animais não
infectados e os animais endêmicos estão misturados é fundamental. Os profissionais de saúde devem utilizar equipamentos de proteção individual e precauções básicas durante o tratamento dos pacientes suspeitos.

FEBRE PETEQUIAL BOVINA (Doença de Ondiri)

A febre petequial bovina é uma riquetsiose bovina caracterizada por febre alta, hemorragias e edema. Sua ocorrência foi confirmada apenas no Quênia e na Tanzânia, em altitudes > 1.500 m, embora também possa ocorrer nos países
vizinhos de topografia semelhante. A importância da febre petequial bovina está na ameaça que representa para o desenvolvimento dos rebanhos de leite nas montanhas do leste da África, porém, nenhum surto foi relatado por mais de uma
década.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  A doença é causada por Ehrlichia ondiri, uma riquétsia intracelular que se aloja nos vacúolos citoplasmáticos dos leucócitos circulantes. O microrganismo pode se multiplicar após a infecção experimental
em  bovinos,  ovinos,  caprinos,  antílopes,  duikers,  impalas,  gazelas  de  Thomson  e  gnus  e,  portanto,  provavelmente  na  maioria  dos  ruminantes  domésticos  e  silvestres.  Acredita­se  que E. ondiri  seja  endêmica  nos  ruminantes  selvagens,
particularmente nos antílopes, e esporadicamente atinge os bovinos domésticos que pastam em áreas marginais das florestas e arbustos.
A doença se restringe às áreas de arbustos ou margens de florestas, que apresentam muita sombra e com camada espessa de matéria orgânica que proporciona alta umidade relativa, e com uma população remanescente de antílopes e
duikers, dois ruminantes selvagens que provavelmente são os principais reservatórios da doença. A doença ocorre esporadicamente durante o ano todo em raças importadas de bovinos. A forma de transmissão da doença é desconhecida.
Como observado em outras riquetsioses, suspeita­se de um vetor artrópode, mas extensas tentativas de incriminar carrapatos, insetos picadores e ácaros fracassaram.
PATOGENIA:  A via de infecção não é conhecida, mas E. ondiri pode ser observada nos granulócitos circulantes (neutrófilos e eosinófilos) e monócitos enquanto o bovino está enfermo e no baço na necropsia. Os estudos com microscopia
eletrônica mostraram que E. ondiri também pode infectar  células  endoteliais  e  células  de  Kupffer  e  pode  estar  livre  nos  lúmens  dos  capilares  cardíacos.  Acredita­se  que  E.  ondiri  inicialmente  se  multiplica  no  baço,  com  subsequente
disseminação para outras áreas. Os danos no endotélio vascular poderiam explicam as hemorragias e o edema, como ocorre em outras infecções por riquétsias.
ACHADOS CLÍNICOS:  A doença é caracterizada por febre alta flutuante, apatia, baixa produção de leite e petéquias disseminadas nas membranas mucosas. Após um período de incubação de 4 a 14 dias, os animais desenvolvem febre alta, 2 a
3 dias depois, e a maioria dos animais apresenta­se apático e com petéquias na membrana mucosa, particularmente na superfície inferior da língua e na mucosa vaginal. Essas hemorragias aumentam durante vários dias e então regridem
quando o animal começa a se recuperar. Edema conjuntival acentuado e hemorragia (“olhos de ovo poché”) são característicos em alguns casos graves. Os sacos conjuntivais estão inchados e evertidos ao redor do globo ocular tenso e
protruso, podendo haver sangue no humor aquoso. As vacas prenhes podem abortar, mais provavelmente devido à febre alta. Outros sinais clínicos estão ausentes. A taxa de mortalidade nos casos não tratados pode ser alta, chegando a 50%
nos animais importados ou recém­introduzidos na área. As infecções latentes se desenvolvem após a recuperação de alguns animais, especialmente do gado local e dos antílopes. Após a recuperação da doença, os bovinos afetados ficam
imunes ao desafio experimental por 2 anos.
Lesões: Tipicamente, a eosinopenia e a linfopenia são marcantes, seguidas por uma neutropenia igualmente acentuada. A anemia é caracteristicamente uma sequela e os microrganismos podem ser observados em esfregaços sanguíneos e do
baço corados com Giemsa. À necropsia, as hemorragias disseminadas na mucosa e serosa e o edema são acompanhados de hiperplasia linfoide. Os órgãos frequentemente afetados incluem coração, trato gastrintestinal (dos pré­estômagos
ao cólon), fígado, vesícula biliar, rins e bexiga urinária O edema é caracterizado por um fluido gelatinoso no tecido conjuntivo intermuscular, linfonodos e abomaso. Não foram descritas anormalidades histológicas características, porém, há
proliferação vascular com edema endotelial acentuado e infiltração mononuclear moderada.
DIAGNÓSTICO:  Nas áreas onde a doença é endêmica, o histórico de transferência dos animais para áreas marginais de florestas, acompanhado de sinais clínicos e de lesões pós­morte, permite um diagnóstico presuntivo. O diagnóstico
definitivo requer a demonstração do microrganismo causal em esfregaços de sangue ou do baço corados com Giemsa, ou por microscopia eletrônica. E. ondiri cora­se de azul com o Giemsa e pode ser observado como pequenos corpúsculos
(0,4 μm), corpúsculos grandes (1 a 2 μm), grupos de corpúsculos pequenos e grandes e grupos ou mórulas de pequenos corpúsculos. Eles são observados em vacúolos citoplasmáticos e são frequentemente vistos em neutrófilos. Suspensões
teciduais (baço) também podem ser inoculadas em bovinos ou ovinos suscetíveis. Esfregaços sanguíneos do animal receptor devem ser feitos diariamente por até 10 dias, período no qual E. ondiri deve ser detectado nos neutrófilos. É difícil
diferenciar  esta  doença  de  outras  doenças  hemorrágicas  dos  bovinos,  como  a  febre  do  Vale  Rift,  tripanossomose  aguda  (doença  hemorrágica  por  Trypanosoma  vivax),  teileriose  aguda,  caudriose,  sepse  hemorrágica  e  intoxicação  por
samambaia.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A ditiosemicarbazona e a tetraciclina tem sido utilizadas com sucesso no tratamento inicial de casos experimentais, porém, são ineficazes nos casos avançados. A ditiosemicarbazona parece ser mais eficaz. Nas
áreas endêmicas, a doença pode ser prevenida evitando­se o acesso a áreas associadas a casos anteriormente relatados. Entretanto, essa estratégia nem sempre é prática.

FEBRE TRANSMITIDA POR CARRAPATOS (Febre da pastagem)

A febre transmitida por carrapatos é uma doença febril dos ruminantes domésticos e de vida livre de regiões temperadas da Europa. Ela é prevalente em ovinos e bovinos no Reino Unido, Irlanda, Noruega, Finlândia, Holanda, Áustria e
Espanha. A doença é transmitida pelo carrapato duro Ixodes ricinus. Uma doença similar, transmitida por outros carrapatos, foi descrita na Índia e África do Sul. Os principais hospedeiros são os ovinos e bovinos, mas os caprinos e cervos
também são suscetíveis.
ETIOLOGIA:  O agente causal, Anaplasma phagocytophilum, é atualmente classificado como um membro da ordem Rickettsiales, da família Anaplasmataceae, que inclui os agentes granulocíticos, formalmente conhecidos como Erlichia
phagocytophila, Erlichia equi e o agente da erliquiose granulocítica humana.
O microrganismo infecta eosinófilos, neutrófilos e monócitos, nessa ordem. As inclusões citoplasmáticas são visíveis como corpúsculos azul­acinzentados em esfregaços de sangue corados com Giemsa e podem conter uma ou mais
partículas riquetsiais de tamanhos e formas variáveis. Os variados tipos morfológicos nas inclusões citoplasmáticas não representam estágios de desenvolvimento, como nas clamídias, mas sim colônias riquetsiais no interior dos vacúolos
citoplasmáticos.
A doença é transmitida pelo carrapato duro I. ricinus. Os carrapatos adultos infectados na fase larval ou de ninfa podem ser transmissores, assim como as ninfas infectadas na fase larval, mas aparentemente as infecções não passam das
fêmeas adultas para as larvas via ovo. As riquétsias podem sobreviver nos carrapatos infectados por longos períodos e, como I. ricinus pode sobreviver > 1 ano sem se alimentar à espera de um novo hospedeiro, os carrapatos infectados no
estágio anterior podem permanecer infectados após longos períodos de hibernação. A transmissão imediata da infecção pela injeção de sangue contaminado sugere que o microrganismo possa ser transmitido mecanicamente por meio da
picada de insetos. Além disso, se os microrganismos relatados como causadores de uma doença similar nos ruminantes da Índia e África do Sul forem de fato A. phagocytophilum, é provável que outros carrapatos, além de I. ricinus estejam
envolvidos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Após a infestação com carrapatos infectados, o período de incubação pode ser de 5 a 14 dias, mas após a injeção com sangue infectado, o período de incubação é de 2 a 6 dias. Nos ovinos, o principal sinal clínico é uma
febre  súbita  (40,5°C  a  42°C)  durante  4  a  10  dias.  Outros  sinais  podem  estar  ausentes  ou  serem  brandos,  mas  os  animais  geralmente  apresentam  apatia  e  podem  perder  peso.  As  frequências  respiratória  e  cardíaca  geralmente  estão
aumentadas, com desenvolvimento frequente de tosse.
Nos bovinos, a doença é conhecida como febre da pastagem em muitas partes da Europa, inclusive Finlândia, Noruega, Áustria, Espanha e Suíça. A doença ocorre como uma pequena epidemia anual, quando as novilhas e vacas leiteiras
são transferidas para as pastagens na primavera e no início do verão. Dentro de dias, as vacas ficam apáticas e deprimidas, com acentuada perda de apetite e diminuição da produção de leite. As vacas afetadas geralmente apresentam tosse e
dificuldade respiratória. Os sinais clínicos são mais evidentes e mais longos nos animais recém­adquiridos do que nos animais do rebanho local. Frequentemente, a recomendação veterinária é a de manter o animal em observação após uma
queda abrupta da produção de leite.
Ocorrem abortos em ovelhas suscetíveis e vacas recém­introduzidas em pastos infestados por carrapatos durante os estágios finais da gestação, entre 2 e 8 dias após o início da febre. Com exceção das ovelhas que abortam, a morte pela
febre  transmitida  por  carrapatos  é  rara.  A  qualidade  do  sêmen  de  carneiros  e  touros  infectados  pode  ser  muito  reduzida.  A  variação  da  gravidade  dos  efeitos  clínicos  pode  estar  relacionada  com  diferenças  entre  cepas  de  A.
phagocytophilum ou a suscetibilidade dos hospedeiros.
Talvez o efeito mais significativo da infecção seja o grave comprometimento dos mecanismos de defesas humoral e celular, que resulta no aumento da suscetibilidade a infecções secundárias, como piemia por carrapatos, pasteurelose
pneumônica, encefalomielite ovina e listeriose.
Lesões: A febre transmitida por carrapatos é caracterizada por alterações hematológicas transitórias, mas distintas. Uma neutrofilia moderada desenvolve­se 2 a 4 dias após a infecção natural ou experimental e é seguida de grave leucopenia
devido à linfocitopenia e neutropenia. A linfocitopenia dura de 4 a 6 dias, enquanto a neutropenia desenvolve­se progressivamente e torna­se mais evidente cerca de 10 dias após a infecção. Estudos com anticorpos monoclonais, que
reconhecem os marcadores de superfície dos subgrupos de linfócitos, mostraram que tanto os linfócitos T quanto os linfócitos B estavam reduzidos. O número de eosinófilos circulantes também diminui por até 2 semanas. Após o período
febril, o número de monócitos pode aumentar. No pico da reação, > 90% dos neutrófilos e eosinófilos circulantes podem estar infectados. Os monócitos são predominantemente infectados durante os estágios finais da bacteriemia, enquanto
os granulócitos geralmente são infectados durante todo o período de bacteriemia. Também há relatos de diminuição do número de trombócitos circulantes durante o período febril e síndromes hemorrágicas ocasionais associadas à febre
transmitida por carrapatos provavelmente estão relacionadas com a redução de trombócitos circulantes.
DIAGNÓSTICO:  Em ovinos,  um  início  de  febre  alta  durante  a  primavera  e  o  verão,  em  áreas  infestadas  por  carrapatos,  associado  a  mudanças  hematológicas  e  à  presença  de  inclusões  no  interior  de  granulócitos  ou  à  detecção  de  DNA
específico  pela  PCR  são  diagnósticos.  A  PCR  e  outros  métodos  moleculares  são  úteis  principalmente  durante  os  estágios  finais  da  bacteriemia  primária  e  durante  a  infecção  persistente,  quando  é  difícil  a  detecção  dos  corpúsculos  de
inclusão nos esfregaços  sanguíneos.  A doença  clínica  geralmente  é  observada apenas em cordeiros jovens nascidos em áreas infestadas por carrapatos ou em animais mais velhos recém­introduzidos nessas áreas. A demonstração dos
corpúsculos de inclusão típicos nos esfregaços sanguíneos ou do DNA específico pela PCR deve indicar a associação da febre transmitida por carrapatos com casos de piemia por carrapatos e abortos, principalmente quando os abortos
ocorrem após a transferência dos animais prenhes de áreas livres para pastos infestados por carrapatos. A infecção pode ser estabelecida retrospectivamente pela demonstração do aumento dos títulos de anticorpos por imunofluorescência
indireta ou ELISA.
Nos bovinos leiteiros afetados, os principais sinais são abortos e súbita diminuição na produção de leite. Outro sinal clínico comum nos bovinos infectados é a doença respiratória após a introdução do rebanho em áreas de pastagem
infestadas por carrapatos. A febre transmitida por carrapatos também deve ser considerada quando ocorrem abortos e natimortos, principalmente em novilhas, logo após a introdução dos animais em pastos infestados por carrapatos. Além
disso, nas áreas onde a doença é enzoótica, os esfregaços sanguíneos devem ser examinados quanto à presença do microrganismo em todos os casos de aborto em ovinos e bovinos e quando a produção de leite é rapidamente reduzida após
retorno dos animais ao pasto.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O tratamento com oxitetraciclinas de curta ação é considerado o mais eficiente, uma vez que outros antibióticos como a penicilina, estreptomicina e ampicilina não previnem as recidivas. A sulfametazina
também é útil. Se os bovinos leiteiros forem tratados com oxitetraciclinas, a pirexia é reduzida rapidamente e a produção de leite é restabelecida em poucos dias.
Há três aspectos importantes de controle: controle do vetor, quimioterapia e imunidade. O controle efetivo pode ser obtido pela eliminação ou redução acentuada do contato com o carrapato vetor, mantendo ovinos e bovinos em pastagens
livres de carrapatos ou com a utilização de acaricidas. No manejo de ovinos, é comum manter as ovelhas e os cordeiros em um cercado, em pastagens relativamente livres de carrapatos até o cordeiro completar cerca de 6 semanas de idade.
O cordeiro também é beneficiado com a melhor nutrição da ovelha. O banho de imersão em cordeiros com 1 a 2 semanas de idade não é uma prática comum devido à dificuldade de arrebanhamento dos cordeiros em fazendas montanhosas
muito extensas, ao risco do cordeiro se perder de sua mãe e à relativa curta duração da proteção proporcionada pelos acaricidas, possivelmente devido ao pelo curto e à rápida taxa de crescimento dos cordeiros. Entretanto, dois banhos de
imersão com intervalos de 2 a 3 semanas ou o uso de preparações pour­on ou de outras aplicações tópicas em cordeiros, antes de serem levados dos piquetes maternidade para as pastagens de montanhas, são referidos como efetivos no
controle dos carrapatos. Os animais prenhes não devem ser transferidos de pastos livres para pastos infestados de carrapatos.
Nas áreas enzoóticas, o tratamento com tetraciclinas de longa ação pode ser utilizado como uma medida profilática. Quando os animais suscetíveis, particularmente ovelhas e vacas prenhes e cordeiros recém­nascidos, são levados de
áreas livres de carrapatos para áreas infestadas, pode ser necessário combinar o banho de imersão com o uso profilático das tetraciclinas de longa duração. O tratamento dos cordeiros nas primeiras 2 a 3 semanas de vida pode ser protetor
por até 3 semanas e auxilia na redução de infecções secundárias, como piemia por carrapatos, pasteurelose e colibacilose. Ele também pode melhorar a taxa de crescimento dos animais.
Vários  aspectos  da  imunidade  permanecem  controversos,  mas  geralmente  é  aceito  que  os  ovinos  e  bovinos  são  imunes  ao  desafio  após  a  recuperação  de  um  ou  dois  episódios  da  doença  clínica  causada  pela  febre  transmitida  por
carrapatos. A imunidade pode durar vários meses, mas diminui rapidamente se os animais forem removidos das áreas infestadas por carrapatos. As infecções secundárias geralmente são leves já que a imunidade residual persiste. Há graus
variáveis de proteção cruzada entre as cepas de A. phagocytophilum. Não há vacinas efetivas disponíveis para proteger os ruminantes contra a forma clínica da febre transmitida por carrapatos. Entretanto, se os animais suscetíveis forem
levados  para  pastagens  infestadas  por  carrapatos,  pode­se  optar  pela  infecção  intencional  dos  animais  e  realização  de  tratamento  com  oxitetraciclina  antes  ou  imediatamente  após  o  início  da  febre.  Isto  permite  a  multiplicação  do
microrganismo e, portanto, a estimulação das respostas imunes sem a ocorrência de uma doença clínica não controlada; uma duração mínima da bacteriemia pode ser necessária para o desenvolvimento da imunidade protetora. Como nem
todas as cepas de A. phagocytophilum apresentam proteção cruzada, cepas específicas da área devem ser utilizadas.
HISTOFILOSE

A histofilose, ou doença associada ao Histophilus somni, é uma doença comum nos rebanhos bovinos da América do Norte. Também foi relatado que a doença ocorre esporadicamente nos rebanhos de carne e leite em todo o mundo. H.
somni causa,  predominantemente,  uma  doença  septicêmica  aguda,  muitas  vezes  fatal,  que  pode  envolver  os  sistemas  respiratório,  cardiovascular,  musculoesquelético  ou  nervoso,  isoladamente  ou  em  conjunto,  nos  bovinos  confinados.
Enquanto o sistema reprodutivo geralmente é afetado sem nenhum sinal clínico ou sem outro envolvimento sistêmico, há relatos de aumento nas ocorrências de infertilidade no rebanho.
ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  H. somni é um cocobacilo pleomórfico, não encapsulado, não formador de esporos, imóvel, Gram­negativo que necessita de um meio de enriquecimento e atmosfera microaerófila para a cultura. A hemólise em
ágar­sangue ocorre dentro de 48 h devido à endotoxina produzida pela maioria dos isolados que causam a doença. As cepas patogênicas e não patogênicas devem ser bem diferenciadas. A virulência do microrganismo pode variar de acordo
com a região e o grupo etário.
H. somni é considerado um comensal das membranas mucosas de bovinos. As cepas patogênicas e não patogênicas de H. somni são encontradas na bainha e no prepúcio dos machos, na vagina das fêmeas e na passagem nasal de ambos
os sexos. Acredita­se que as secreções nasal e urogenital são as fontes do microrganismo. O microrganismo pode colonizar o trato respiratório, provavelmente após a inalação, e atingir a corrente sanguínea por essa via. A colonização do
trato reprodutivo de machos e fêmeas envolve a disseminação venérea.
EPIDEMIOLOGIA:  Os bezerros recentemente desmamados estão sob maior risco de infecção e morte pela histofilose do que os bezerros desmamados mais velhos, animais de sobreano ou animais maduros. O risco de infecção por H. somni é
maior no início do período de alimentação, com alto risco para os bezerros em confinamento e estabelecimento de picos de títulos para H. somni em cerca de 21 a 23 dias após a chegada. Embora os bezerros sejam geralmente expostos
ao H. somni no início do período de alimentação, foi relatado que o tempo médio entre o início da alimentação até morte dos bezerros por histofilose foi de 30 a 60 dias. A morte súbita decorrente de sepse hiperaguda geralmente ocorre
dentro de 21 dias após a chegada, embora ela possa ocorrer durante todo o período de alimentação. A manifestação da doença reprodutiva, inclusive vulvovaginite granular, aborto e mastite, pode afetar um ou mais bovinos dos rebanhos de
leite ou corte.
PATOGENIA:   É  provável  que  haja  necessidade  de  sepse  para  a  maioria  das  formas  da  histofilose.  As  cepas  de  H.  somni  que  causam  a  doença  aderem  ao  endotélio  dos  vasos,  resultando  em  contração,  exposição  do  colágeno,  adesão
plaquetária e formação de trombos. O mecanismo primário da doença provavelmente envolve um trombo em vez de um tromboembolismo, como se acreditava. Algumas cepas bacterianas podem se aderir aos vasos do endotélio da pleura,
miocárdio, pericárdio, membrana sinovial e outros tecidos (p. ex., cérebro, laringe). A interrupção do suprimento sanguíneo nestas áreas resulta na formação de um infarto, com destruição do tecido e formação de sequestro necrótico. O
desenvolvimento dos sinais clínicos está associado ao grau de envolvimento dos sistemas de órgãos. A suscetibilidade individual dos animais e as variações na preferência das cepas dos microrganismos pelos vasos de diferentes tecidos
podem ser importantes no desenvolvimento de diferentes formas da doença, porém, este assunto não tem sido muito estudado.
A aparente preferência do H. somni para diferentes sistemas de órgãos define a característica mutável da histofilose. Inicialmente a doença apresenta­se como uma síndrome encefalítica que muda para as formas pleurítica e miocárdica.
Observações pontuais sugerem que o microrganismo pode mudar novamente (p. ex., de miocardite focal para uma mais generalizada). Estudos microbiológicos recentes do microrganismo identificaram uma variedade de mecanismos que
contribuem para sua virulência diversa e capacidade de resistência ao tratamento.
Os problemas reprodutivos não foram associados à infecção sistêmica; a inflamação aparenta ser mais localizada, apesar da patogênese nestas situações não estar bem definida.
ACHADOS CLÍNICOS:  A  morte  súbita  geralmente  é  a  primeira  indicação  de  infecção  por H. somni  em  um  grupo  de  animais  confinados  e  frequentemente  é  confundida  pelos  funcionários  como  uma  evidência  de  um  distúrbio  do  trato
digestório,  como  timpanismo.  Depressão  profunda  foi  descrita  como  o  sinal  mais  notável  da  histofilose  encefalítica.  Outros  achados  são  determinados  pelo  sistema(s)  envolvido(s)  e  podem  incluir  respiração  rápida,  rigidez,  fraqueza
muscular, ataxia, claudicação e graves alterações de comportamento. Os animais afetados pela forma histofilose pleurítica geralmente são encontrados mortos, sem qualquer histórico de tratamento; se sobreviverem, eles podem exibir
dispneia extrema. Os animais com miocardite apresentam baixa tolerância ao exercício e podem entrar em colapso e vir a óbito quando movimentados para o tronco de contenção. Os animais com a forma encefalítica e depressão precoce
rapidamente ficam em decúbito, com sinais ocasionais de hiperestesia antes do óbito. Os animais encontrados mortos e confirmados com infecção por H. somni geralmente possuem histórico de tratamento para febre indiferenciada ou
depressão nos 14 dias precedentes.
Um exame individual mais detalhado geralmente revela um animal que está febril. Polipneia e/ou dispneia podem estar evidentes e são facilmente confirmadas por meio de auscultação. Hipoxemia associada a um mau funcionamento do
sistema pulmonar ou cardiovascular podem ser facilmente confundidos com outros sinais clínicos como depressão ou até mesmo cegueira. Uma amostra estéril de sangue obtida de um animal não tratado neste momento testa positivo
para H. somni em uma alta porcentagem dos casos.
Lesões: Bovinos confinados que morrem com suspeita de histofilose devem ser submetidos a exame necroscópico. Estes animais podem exibir um conjunto de achados pós­morte, inclusive pleurite fibrinosa sem broncopneumonia, lesão
focal  do  miocárdio  (frequentemente  no  músculo  papilar  do  ventrículo  esquerdo),  pericardite  fibrinosa,  broncopneumonia,  poliartrite  e  laringite  fibrinosa.  As  lesões  macroscópicas  pós­morte  menos  comuns  incluem  poliserosite,  gonite
fibrinosa e meningite fibrinopurulenta.
Nos animais que sobrevivem tempo suficiente para permitir o progresso da patologia, a porção fibrinosa das lesões torna­se necrótica e as áreas de infartos ou sequestros no coração ou na laringe se liquefazem e são encapsuladas,
formando um abscesso. As lesões no trato reprodutivo podem incluir vaginite supurativa, cervicite e endometrite.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico definitivo é baseado na amostragem e no exame dos tecidos afetados coletados durante a necropsia ou exame clínico. Historicamente, o isolamento do microrganismo do FCE, cérebro, sangue, urina, fluido
articular e outros órgãos ou fluidos internos, estéreis, é utilizado para confirmar o diagnóstico. Como H. somni é um comensal das membranas mucosas dos bovinos, a bactéria deve ser isolada em cultura predominante ou pura do trato
respiratório  ou  urogenital,  sendo  considerado  significativo  agente  etiológico.  Isto  pode  ser  difícil  uma  vez  que  o  tratamento  com  antimicrobianos  frequentemente  interfere  na  recuperação  do  microrganismo.  As  lesões  histológicas
características são supurativas com denso infiltrado de neutrófilos em todos os tecidos onde a bactéria está localizada. Atualmente o diagnóstico é confirmado por técnicas moleculares, como a coloração imunoistoquímica dos tecidos
corados com H&E ou um suabe de uma lesão recente submetido a um teste de PCR específico.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO:  O maior obstáculo para o sucesso do tratamento dos casos individuais de histofilose é a dificuldade para identificar os animais afetados no início do curso da doença devido a sua natureza rápida e fatal. O
tratamento com antimicrobianos é mais efetivo nos estágios iniciais da doença. Florfenicol (20 mg/kg, IM, repetido em 48 h, ou dose única de 40 mg/kg, SC,) pode ser o antimicrobiano de escolha se há suspeita de histofilose em um único
animal.
As evidências que sustentam o uso de tratamento profilático ou metafilático com antimicrobianos ou com suplemento antimicrobiano oral no alimento na chegada dos animais ao confinamento ou na ocorrência de casos, para reduzir a
mortalidade pela histofilose, são escassas. Isto contrasta com a evidência de que H. somni é suscetível in vitro a uma ampla gama de antimicrobianos, inclusive florfenicol, tilmicosina, tulatromicina, tetraciclinas, trimetoprima­sulfadoxina,
fluorquinolonas e ceftiofur. O mecanismo exato pelo qual o microrganismo é capaz de evitar os níveis sanguíneos não é bem conhecido.
Bacterinas contendo diferentes cepas do microrganismo têm sido utilizadas para imunizar os bovinos contra H. somni. A resposta humoral favorável gerada por uma única dose de vacina comercial foi melhorada quando reforçada com
uma segunda dose. Bezerros inicialmente imunizados antes do turn out (idade estimada de 2 meses) responderão a uma segunda imunização anamnesticamente na chegada ao confinamento após o desmame. Enquanto há relatos de proteção
com a utilização das atuais bacterinas e imunógenos contra a morbidade e mortalidade causada pela histofilose, a capacidade da imunização em proteger consistentemente os bovinos da doença é comprometida quando a imunização e a
mudança ocorrem ao mesmo tempo (ou seja, na chegada ao confinamento).

LEUCOSE BOVINA (Linfossarcoma bovino, Leucemia, Linfoma maligno)

O linfossarcoma bovino pode ser esporádico ou resultar da infecção pelo vírus da leucemia bovina (VLB); a última frequentemente é referida como leucose enzoótica bovina. O linfossarcoma esporádico nos bovinos não está relacionado
com a infecção pelo VLB. Apesar da falta de associação, os animais com linfossarcoma esporádico podem eventualmente ser infectados com o vírus. O linfossarcoma esporádico pode se manifestar de 3 formas principais: juvenil, tímica e
cutânea. O linfossarcoma juvenil ocorre frequentemente nos animais com menos de 6 meses de idade, o linfossarcoma tímico afeta os bovinos com 6 a 24 meses de idade e o linfossarcoma cutâneo é mais comum nos bovinos com 1 a 3
anos de idade.
ETIOLOGIA, TRANSMISSÃO E EPIDEMIOLOGIA:  A leucose enzoótica bovina é causada pelo VLB, um retrovírus oncogênico exógeno do tipo C relacionado com o grupo dos vírus T­linfotrópicos humanos. O VLB tem um genoma estável,
não causa viremia crônica e não possui um local preferido para a integração proviral. Apesar da ausência de locais preferidos para a integração proviral, os tumores gerados em um único indivíduo são tipicamente monoclonais e possuem
um único local de integração. Os vírus escapam da resposta imune devido ao baixo nível de replicação viral. Aparentemente a replicação é bloqueada em nível transcripcional, mas o mecanismo não está completamente esclarecido.
A prevalência da infecção pelo VLB varia de país para país. Muitos países europeus, Austrália e Nova Zelândia têm programas de erradicação em andamento e que levaram a taxas insignificantes de infecção por VLB. Embora os
programas de controle voluntários estejam em andamento nos EUA, a prevalência é alta quando comparada com grande parte do resto do mundo. As pesquisas mais recentes nos EUA estimam que 44% do gado leiteiro e 10% do gado de
corte estão infectados pelo vírus. A prevalência tende a aumentar no gado leiteiro com o aumento do tamanho do rebanho, enquanto o inverso ocorre no gado de corte. Em geral, a prevalência da infecção viral aumenta com a idade.
Os bovinos são infectados pelo VLB por meio de transfusão sanguínea e produtos do sangue que contêm linfócitos infectados. Uma vez infectado, o bovino desenvolve uma resposta de anticorpos por toda a vida, primariamente à
proteína gp51 do envelope e à proteína p24 do capsídio. Os linfócitos B abrigam o provírus integrado, mas raramente expressam as proteínas virais na superfície de suas células. O local exato da replicação e expressão viral e que induz a
resposta imune permanece indefinido.
Sob condições experimentais, a maioria das vias de exposição viral pode transmitir a infecção com sucesso. Entretanto, muitas destas vias são improváveis de serem encontradas naturalmente. Vários fluidos corporais, inclusive urina,
fezes secreções respiratórias, sêmen, fluidos uterinos e embrionários foram examinados em relação a sua capacidade de transmissão do VLB e foram considerados não infecciosos. Apenas em raras ocasiões o vírus foi encontrado nestes
fluidos. O colostro de vacas positivas para o VLB contém o vírus e mostrou­se infeccioso experimentalmente. Contudo, o colostro também contém grande quantidade de anticorpos e acredita­se que os efeitos protetores dos anticorpos
colostrais superam o potencial infeccioso quando o colostro é administrado de forma normal.
A maioria das transmissões do VLB é horizontal. O contato físico próximo entre bovinos positivos e negativos para o VLB é sabidamente um fator de risco. Muitas práticas de manejo foram implicadas na transmissão viral, inclusive
identificação, descorna, palpação retal, injeções e coleta de sangue. Os vetores como os tabanídeos e outros insetos hematófagos também podem transmitir o vírus. A transmissão vertical pode ocorrer pela via transplacentária (da fêmea
infectada  para  o  seu  feto),  intraparto  (pelo  contato  com  sangue  infectado)  ou  pós­parto  (da  fêmea  para  o  bezerro)  pela  ingestão  do  colostro  infectado.  Qualquer  material  que  esteja  contaminado  com  sangue  ou  rico  em  linfócitos  tem
potencial para infectar animais com o VLB.
PATOGENIA:  Há três principais formas em um bovino infectado pelo VLB. A maioria dos animais permanece persistentemente infectada e sem nenhum sinal clínico. Aproximadamente 29% dos bovinos infectados pelo VLB desenvolvem
linfocitose persistente, enquanto < 5% dos bovinos infectados com o VLB desenvolvem linfossarcoma.
A  linfocitose  persistente  é  referida  às  vezes  como  síndrome  pré­neoplásica,  porém,  não  há  qualquer  evidência  convincente  de  que  os  bovinos  infectados  são  mais  sujeitos  a  desenvolver  linfossarcoma.  Os  linfócitos  presentes  na
linfocitose persistente não são neoplásicos, embora possam ter pequenas alterações reativas compatíveis com esfregaços normais de bovinos. A linfocitose persistente é considerada uma condição benigna associada à infecção pelo VLB.
Por este motivo esta forma frequentemente é negligenciada. Entretanto, as vacas podem servir como reservatórios da infecção. O aumento da contagem de linfócitos é atribuído ao aumento de 45 vezes das células B CD5+ e de 99 vezes das
células B CD5­. Foi sugerido que as vacas com linfocitose persistente apresentam maior risco de passar a infecção do VLB para os seus bezerros no útero e podem apresentar queda da produção de leite e alteração dos componentes do leite.
O linfossarcoma é  raramente  visto  nos  animais  <  2  anos  de  idade  e  é  mais  comum  no  grupo  de  4  a  8  anos  de  idade.  Menos  de  5%  dos  bovinos  infectados  pelo  VLB  desenvolve  linfossarcoma.  O  linfossarcoma,  inclusive  a  forma
esporádica e enzoótica, é uma das principais causas de condenação no abate.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos associados ao desenvolvimento de lifossarcoma são muito variados, com o órgão afetado ditando os sinais clínicos predominantes.
O linfossarcoma juvenil é frequentemente caracterizado pelo início súbito de hiperplasia linfoide difusa com ou sem o envolvimento de órgãos viscerais. Perda de peso, febre, taquicardia, dispneia, timpanismo e paresia posterior foram
descritos nesta forma de linfossarcoma. Linfocitose intensa (> 50.000/μl) frequentemente acompanha esta forma fatal de linfossarcoma. O linfossarcoma tímico pode envolver o lobo cervical ou intratorácico, ou ambos. Os sinais clínicos
associados a esta forma de linfossarcoma dependem da localização e do tamanho do tumor. Um inchaço cervical pode ser evidente. Dispneia, timpanismo, distensão da jugular, taquicardia, edema anterior e febre foram documentados. A
população de células afetadas é a de linfócitos imaturos e pouco diferenciados. O linfossarcoma cutâneo se apresenta como placas cutâneas de 1 a 5 cm de diâmetro, na região do pescoço, dorso, traseiro e membro posterior. Os linfonodos
regionais também podem estar aumentados. Esta forma de linfossarcoma pode apresentar remissão espontânea; entretanto, podem ocorrer recidivas.
Lesões: Os  animais  com  linfossarcoma  associado  ao  VLB  geralmente  apresentam  lesões  nos  linfonodos  centrais  e  periféricos  levando  à  linfadenopatia.  As  lesões  no  abomaso  podem  levar  a  sinais  de  dor  abdominal  cranial,  melena  ou
obstrução da saída do conteúdo abomasal. A paresia dos membros pélvicos pode progredir para paralisia nos animais com lesões medulares extradurais. As lesões retrobulbares podem causar a protrusão do globo, resultando em queratite de
exposição e, eventualmente, proptose. As lesões no átrio direito podem ser leves e clinicamente indetectáveis ou podem causar arritmias, murmúrios ou falência cardíaca. As lesões uterinas podem levar a falhas reprodutivas e aborto. As
lesões dos órgãos internos envolvem tipicamente o baço, fígado ou rins e ureteres. As lesões do baço inicialmente são assintomáticas, mas podem resultar em ruptura do baço e exsanguinação na cavidade peritoneal. O linfossarcoma do
fígado frequentemente é assintomático, mas pode levar à icterícia e falência hepática. A doença no rim e no ureter pode levar a dor abdominal e subsequente desenvolvimento de hidroureter ou hidronefrose e sinais clínicos associados à
falência renal.

Leucose enzoótica bovina. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

O linfossarcoma pode surgir como massa nodular amarela acastanhada discreta ou um infiltrado tecidual difuso. O último padrão resulta em órgãos aumentados e pálidos, podendo ser facilmente interpretados erroneamente como uma
alteração degenerativa em vez de neoplasia. Histologicamente, a massa tumoral é composta por denso aglomerado de células linfocíticas monomórficas.
DIAGNÓSTICO:  O linfossarcoma frequentemente é incluído na lista de diferencial de muitas doenças devido à grande variedade de achados clínicos. O diagnóstico da infecção viral é feito por sorologia ou virologia, a linfocitose persistente é
identificada por hematologia e os tumores neoplásicos são identificados pelo exame histológico das biopsias. Sorologia positiva ou virologia para o VLB confirmam a infecção viral, porém, não confirmam a presença de linfossarcoma.
A sorologia é o método mais comum e confiável para o diagnóstico da infecção pelo VLB. A imunodifusão em gel de ágar ainda é reconhecida pela maioria dos países como o teste oficial de importação/exportação, mas o ELISA
geralmente é mais utilizado no diagnóstico de rotina. A sorologia não é confiável para os bezerros que ingeriram colostro de vacas positivas para o VLB devido à aquisição de anticorpos maternos que tipicamente diminuem aos 4 a 6 meses
de idade. A PCR é um teste sensível e específico para o diagnóstico da infecção do VLB nos linfócitos do sangue periférico. Este teste pode identificar o DNA proviral do VLB nos linfócitos dos animais infectados e diferencia os bezerros
positivos e negativos na presença de anticorpos maternos.
O diagnóstico de linfossarcoma deve ser feito pela citologia ou histopatologia. O diagnóstico citológico às vezes é difícil devido à frequente contaminação do aspirado com sangue.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Não há tratamento para a infecção viral ou para o linfossarcoma nos bovinos, embora os corticoides parenterais possam diminuir transitoriamente a gravidade dos sinais clínicos. Programas de erradicação
foram desenvolvidos, porém com sucesso variado, devido principalmente ao custo e à alta prevalência da infecção entre os bovinos dos EUA em relação ao custo econômico da doença. O protocolo de erradicação mais recomendado é: (1)
identificar  os  animais  infectados  utilizando  um  teste  sorológico;  (2)  descartar  imediatamente  os  animais  soropositivos;  (3)  testar  novamente  o  rebanho  30  a  60  dias  depois  e  (4)  usar  a  PCR  para  testar  os  bezerros  jovens  e  como  teste
complementar para esclarecer os resultados de testes em rebanhos com baixa prevalência da infecção. O teste e o descarte são repetidos até que todo o rebanho teste negativo. O teste é então repetido a cada 6 meses. O rebanho é declarado
livre quando não houver testes positivos por 2 anos. Os animais que serão introduzidos no rebanho devem ter dois testes negativos aos 30 e 60 dias antes da sua chegada.
Quando o teste e o descarte são métodos economicamente inviáveis, os programas de testes e segregação têm sido recomendados, mas raramente eles são implementados. Estes programas necessitam da execução de duas operações
completas de separação e requerem recursos adicionais, inclusive dinheiro, tempo e mão de obra.
PREVENÇÃO:  A eliminação da circulação do sangue dos animais infectados para os animais sadios é o ponto fundamental para os protocolos de prevenção. O fornecimento de colostro de vacas soronegativas para os bezerros é defendido.
Entretanto, a maioria das evidências epidemiológicas sugere que o efeito protetor dos anticorpos colostrais supera o risco de infecções, especialmente nos rebanhos com alta prevalência. A substituição do fornecimento de leite integral por
sucedâneo de alta qualidade de boa qualidade também pode ser considerada. Leite contendo sangue jamais deve ser fornecido aos bezerros.
O eletrocautério e outros métodos de descorna sem sangue devem ser utilizados. Os equipamentos empregados para castração, marcação, colocação de brinco ou implante devem ser limpos e desinfetados antes e após o uso em cada
animal se a expectativa de vida deles for de pelo menos 2 anos.
A transmissão nos bovinos adultos pode ser reduzida usando uma nova luva de palpação retal sempre que houver sangue visível na luva ou pelo uso luva de palpação retal de uso único. A inseminação artificial e a transferência de
embrião (com a utilização de receptoras negativas) podem limitar a transmissão. Nos rebanhos de corte, o uso de um reprodutor negativo pode limitar a transmissão, mas a monta natural não é um método comum de transmissão viral a
menos que haja algum trauma durante o acasalamento.
As recomendações, independentemente da idade do animal, incluem a desinfecção dos equipamentos que entraram em contato com sangue ou tecidos do corpo.? As agulhas descartáveis devem ser utilizadas uma única vez para coleta de
sangue e injeções IM. É preferível o uso de agulhas descartáveis para vacinação, mas o risco de transmissão do VLB pela vacinação via SC é baixo. Os troncos de contenção contaminados com sangue devem ser limpos entre os animais. O
controle de moscas ajuda a minimizar a transmissão associada aos tabanídeos. Transfusões sanguíneas e vacinas contendo sangue, como aquelas utilizadas para babesiose e anaplasmose, são potentes meios de disseminação, assim, os
doadores devem ser cuidadosamente selecionados.

LÍNGUA AZUL

A língua azul é uma doença viral, infecciosa, não contagiosa, transmitida por artrópodes, que acomete principalmente ruminantes domésticos e selvagens. A infecção com o vírus da língua azul (VLA) é comum em uma extensa faixa ao
redor do mundo, que até recentemente se estendia desde a latitude 35° S até a latitude 40­50° N. Desde a década de 1990, o VLA tem se expandido consideravelmente entre os paralelos 40° N e 50° N (p. ex., Europa). A maioria das
infecções com o VLA nos ruminantes selvagens e nos bovinos é subclínica. A língua azul (a doença causada pelo VLA) geralmente é considerada uma doença de raças melhoradas de ovinos, particularmente de raças produtoras de lã e
carne, embora também tenha sido registrada em bovinos e em algumas espécies de ruminantes selvagens, inclusive os veados­de–cauda­branca (Odocoileus virginianus), antilocapras (Antilocapra americana) e carneiros selvagens (Ovis
canadensis) na América do Norte, e os bisões­europeus (Bison bonasus) e iaques criados em cativeiro (Bos grunniens grunniens) na Europa.
ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  O vírus da língua azul é uma das espécies pertencentes ao gênero Orbivírus da família Reoviridae. Há pelo menos 24 sorotipos em todo o mundo, embora nem todos os sorotipos estejam presentes em todas as
áreas geográficas; por exemplo, 13 sorotipos (1, 2, 3, 5, 6, 10, 11, 13, 14, 17, 19, 22 e 24) tem sido relatados nos EUA e 8 sorotipos (1, 2, 4, 6, 9, 11 e 16) na Europa. A distribuição do VLA nos paralelos está relacionada com a presença
espacial e temporal das espécies de vetores de Culicoides hematófagos, os quais são os únicos transmissores naturais significativos do vírus, e com as temperaturas em que vírus é capaz de se replicar e de ser transmitido por esses vetores.
Há mais de 1.400 espécies de Culicoides em todo o mundo e menos que 30 espécies foram identificadas como vetores atuais ou potenciais do VLA. O ciclo contínuo do vírus nos vetores competentes de Culicoides e  nos  ruminantes
suscetíveis  é  crítico  na  epidemiologia  viral.  Nos  EUA,  o  principal  vetor  são C. sonorensis e C. insignis,  cujo  limite  da  distribuição  do  VLA  está  entre  as  regiões  sul  e  oeste.  Na  região  norte  e  leste  da  Austrália  o  principal  vetor  é  C.
brevitarsis, enquanto na África, sul da Europa e Oriente Médio é C. imicola. Na região norte da Europa os principais vetores são as espécies do complexo C. obsoletus­dewulfi. Em cada região geográfica, as espécies secundárias de vetores
também possuem uma importância local.
Os vetores tornam­se infectados com o VLA pelo repasto sanguíneo dos vertebrados infectados; a transmissão transovariana não tem sido relatada. A grande afinidade do vírus pelas células sanguíneas, especialmente a persistência das
partículas virais nas invaginações das membranas dos eritrócitos, contribui para a viremia prolongada na presença de anticorpos neutralizantes. O longo período de viremia nos bovinos (ocasionalmente até 11 semanas) e a preferência de
muitos vetores da espécie Culicoides pelo hospedeiro bovino proporciona um mecanismo de transmissão contínua da doença para os ruminantes domésticos nas regiões onde o período livre do vetor (inverno) é relativamente curto. A
transmissão mecânica por outros insetos hematófagos tem pouca importância.
O VLA não é contagioso, a concentração nas secreções e excreções é mínima e a transmissão via mucosa oral ou por aerossol é improvável. Entretanto, o sêmen dos touros virêmicos pode servir como uma fonte de infecção para vacas
submetidas à monta natural ou inseminação artificial. A transferência de embriões é considerada segura com a utilização de doadoras não virêmicas e de procedimentos adequados de lavagem dos embriões. A infecção transplacentária de
estirpes de campo do VLA da vaca para o feto, levando ao nascimento de bezerros virêmicos, é cada vez mais relatada nos bovinos da Europa, contudo, a importância epidemiológica deste mecanismo não é conhecida. A infecção acidental
em cães foi relatada nos EUA após a administração de uma vacina com vírus vivo modificado contaminada com VLA. Evidência sorológica da infecção por VLA tem sido verificada em grandes carnívoros da África, talvez como resultado
da ingestão de vísceras contaminadas com o vírus. Similarmente, linces­euroasiáticos criados em cativeiro morreram devido à língua azul após consumirem fetos e natimortos de ruminantes infectados, e o vírus foi isolados destes animais,
indicando a existência de uma VO da infecção. A importância epidemiológica do mecanismo de infecção oral é incerta.
ACHADOS CLÍNICOS:  O curso da doença em ovinos pode variar de hiperagudo a crônico, com taxa de mortalidade de 2 a 90%. Nos casos hiperagudos, a morte ocorre entre 7 e 9 dias de infecção, principalmente como resultado de edema
pulmonar  grave  que  ocasiona  dispneia,  secreção  nasal  espumosa  e  morte  por  asfixia.  Nos  casos  crônicos,  os  ovinos  podem  morrer  entre  3  e  5  semanas  após  a  infecção,  como  resultado  de  complicações  bacterianas,  especialmente
pasteurelose e exaustão. Nos casos leves geralmente ocorre recuperação rápida e completa. As principais perdas na produção incluem mortes, atraso no crescimento durante um período prolongado de convalescença, perda de lã e perdas
reprodutivas.
Nas ovelhas, o VLA causa danos vasculares endoteliais, resultando em mudanças na permeabilidade capilar e subsequente coagulação intravascular. Isto resulta em edema, congestão, hemorragia, inflamação e necrose. Os sinais clínicos
nas ovelhas são típicos. Após um período de incubação de 4 a 6 dias, ocorre febre de 40,5 a 42°C. Os animais ficam apáticos e relutantes para se moverem. Os sinais clínicos nos cordeiros jovens são mais aparentes e a taxa de mortalidade
pode ser mais alta (até 30%). Dois dias após o início da febre, sinais adicionais, como edema de lábios, nariz, face, região submandibular, pálpebras e, às vezes, orelhas; congestão de boca, nariz, cavidades nasais, conjuntiva e coroa do
casco; claudicação e depressão podem ser observadas. Secreção nasal serosa é comum, podendo depois se tornar mucopurulenta. A congestão do nariz e das cavidades nasais produz um efeito de “focinho ferido”, termo utilizado para
descrever a doença nos ovinos nos EUA. Os ovinos comem menos devido às feridas orais, uma vez que eles mantêm a comida na boca para amaciá­la antes de mastigá­la. Eles também podem produzir também uma secreção oral espumosa
no canto dos lábios. Em um exame minucioso, pequenas hemorragias podem ser observadas nas membranas mucosas do nariz e da boca. Ulceração se desenvolve quando os dentes entram em contato com os lábios e a língua, especialmente
nas áreas de maior atrito.
Algumas ovelhas afetadas apresentam edema intenso de língua, a qual pode se tornar cianótica (“língua azul”) e até projetar–se da boca. Os animais andam com dificuldade devido à inflamação da coroa casco. Uma coloração vermelha
púrpura é facilmente observada como uma banda na junção entre a pele e o casco. Na fase avançada da doença, ocorre claudicação ou torcicolo devido a danos no músculo esquelético. Na maioria dos animais afetados, pode ser observado
um crescimento anormal da lã como resultado da dermatite.
Os  sinais  clínicos  nos  bovinos  são  raros,  mas  podem  ser  similares  aos  observados  nos  ovinos.  Eles  geralmente  são  limitados  à  febre,  aumento  da  frequência  respiratória,  lacrimejamento, salivação,  rigidez,  vesículas  e  úlceras  orais,
hiperestesia e dermatite ulcerativa e vesicular. Os bovinos e ovinos suscetíveis e infectados durante a gestação podem abortar ou dar à luz a filhotes com malformações. As malformações incluem hidroanencefalia ou porencefalia, as quais
resultam em ataxia e cegueira ao nascimento. No veado­de–cauda­branca e no antilocapra, desenvolvem uma doença hemorrágica grave levando a morte súbita. As cadelas gestantes abortam ou dão luz a natimortos e depois morrem entre 3
e 7 dias.
DIAGNÓSTICO E LESÕES:  Os sinais clínicos típicos da língua azul permitem um diagnóstico presuntivo, especialmente nas áreas onde a doença é endêmica. A suspeita é confirmada pela presença de petéquias, equimoses ou hemorragias na
parede da base da artéria pulmonar e de necrose focal no músculo papilar do ventrículo esquerdo. Estas lesões altamente características geralmente são evidentes nas infecções clínicas graves, mas podem ser pouco observadas nos casos
leves ou convalescentes. Estas lesões frequentemente são descritas como patognomônicas para a língua azul, mas elas também têm sido observadas em outras doenças de ovinos como pericardite exsudativa, doença do rim pulposo e febre
do Vale Rift. Hemorragias e necroses geralmente são encontradas onde a abrasão mecânica danifica os capilares frágeis, como na superfície oposta da face vestibular dos dentes molares, no sulco do esôfago e nas dobras do omaso. Outros
achados de necropsia incluem edema e hemorragia subcutânea e intermuscular, mionecrose esquelética, hemorragias miocárdicas e intestinais, hidrotórax, hidropericárdio, pericardite e pneumonia.
Em  diversas  áreas  do  mundo,  a  infecção  do  VLA  em  ovinos,  e  especialmente  em  outros  ruminantes,  é  subclínica.  A  confirmação  laboratorial  é  baseada  no  isolamento  viral  em  ovos  embrionados  de  galinhas,  culturas  celulares  de
mamíferos ou insetos ou na identificação do RNA viral pela PCR. A identidade dos isolados pode ser confirmada pelos testes ELISA de antígeno de captura grupo­específico, PCR grupo­específico, imunofluorescência, imunoperoxidase,
teste de vírus neutralização sorotipo­específico, PCR sorotipo­específico ou hibridização com uma sequência gênica complementar de genes grupo ou sorotipo específico. Para o isolamento do vírus, amostra de sangue (10 a 20 ml) é
coletada o mais rápido possível dos animais febris com um anticoagulante como heparina, citrato de sódio ou EDTA e transportado a 4°C até o laboratório. Para armazenamento a longo prazo, onde a refrigeração não é possível, o sangue é
coletado em oxalato­fenol­glicina (OFG). O sangue a ser congelado deve ser coletado em tampão peptona lactose e mantido a temperatura igual ou inferior a ­70°C. O sangue coletado mais tardiamente, durante o período virêmico, não
deve ser congelado, pois a lise das hemácias no descongelamento libera os vírus associados às células, os quais podem ser neutralizados rapidamente pelos anticorpos humorais. Os vírus não permanecem estáveis por longos períodos a
­20°C. Nos casos fatais, as amostras de baço, linfonodos ou medula óssea são coletadas e transportadas ao laboratório a 4°C o mais rápido possível após o óbito.
A resposta sorológica nos ruminantes pode ser detectada 7 a 14 dias após a infecção e geralmente permanece por toda a vida após uma infecção a campo. Atualmente, as técnicas sorológicas recomendadas para a detecção de anticorpos
contra o VLA incluem a imunodifusão em ágar gel e ELISA por competição. Este último é o teste de eleição e que não detecta reação cruzada de anticorpos contra outros orbivírus, especialmente contra o vírus da doença epizoótica
hemorrágica (VDEH). Várias outras testes de soroneutralização, inclusive a redução em placa, inibição em placa e a neutralização por microtitulação, podem ser utilizadas para detecção de anticorpos específicos.
PREVENÇÃO E CONTROLE:  Não há tratamento específico para os animais com língua azul, a não ser descanso, fornecimento de alimentos macios e bom manejo. Complicações e infecções secundárias devem ser tratadas adequadamente
durante o período de recuperação.
A imunização profilática dos ovinos é a medida de controle mais eficaz contra a língua azul nas regiões endêmicas. Três vacinas polivalentes, cada uma contendo cinco diferentes sorotipos do VLA atenuados por passagens seriadas em
ovos embrionados de galinha, seguido pelo crescimento e seleção em placas de cultura celular, são amplamente utilizadas no sul da África e outros locais com epizootias de língua azul. Uma vacina monovalente com vírus vivo modificado
propagado em cultura celular está disponível para o uso em ovinos nos EUA. Vacinas vivas atenuadas não devem ser utilizadas nas estações em que o vetor Culicoides está presente em grande quantidade, pois eles podem transmitir o vírus
dos animais vacinados para os animais não vacinados, como por exemplo, para outras espécies de ruminantes. Isto pode resultar na recombinação de material genético e levar ao aparecimento de novas estirpes virais. Abortamento ou
malformações fetais, particularmente do SNC, podem ocorrer após a vacinação de ovelhas e vacas com a vacina contendo o vírus vivo atenuado durante a primeira metade e o primeiro trimestre da gestação, respectivamente. A imunidade
passiva nos cordeiros geralmente dura de 4 a 6 meses.
O controle da língua azul é diferente nas áreas onde a doença não é endêmica. Durante um surto, onde um ou número limitado de sorotipos podem estar envolvidos, a estratégia de vacinação depende do(s) sorotipo(s) que está(ão)
causando a infecção. A utilização de estirpes vacinais diferentes daquela(s) que está(ão) causando a doença leva a pouca ou nenhuma proteção e não é recomendada. O potencial risco de recombinação do vírus vacinal com uma estirpe
selvagem, da disseminação do vírus pelos vetores para outras espécies suscetíveis de ruminantes e a reversão da virulência das estirpes do vírus vacinal ou a produção de uma nova estirpe do VLA também devem ser consideradas. Devido
às estas incertezas, vacinas inativadas que não apresentam estes inconvenientes estão sendo desenvolvidas, sendo que algumas já chegaram ao mercado. O uso destas vacinas inativadas em incursões recentes do VLA no norte da Europa
tem desempenhado um papel importante no controle da propagação do vírus nas regiões onde uma cobertura significativa (> 80%) foi alcançada.
O controle dos vetores com o uso de inseticidas ou a proteção contra os vetores pode reduzir o número de picadas dos Culicoides e subsequente risco de exposição à infecção pelo VLA. Entretanto, apenas estas medidas não são efetivas
para interromper uma epidemia de língua azul e devem ser consideradas como medidas de atenuação para serem utilizadas juntamente com um programa de vacinação abrangente e vigoroso.

PARATUBERCULOSE (Doença de Johne)

A paratuberculose é uma enterite granulomatosa crônica contagiosa caracterizada, em bovinos, por diarreia persistente, perda de peso progressiva, debilidade e, eventualmente, morte. Ela é uma doença listada pela OIE, o que significa que
ela é uma doença prioritária para o comércio internacional. Acredita–se que o agente etiológico, Mycobacterium paratuberculosis, é capaz de infectar e causar doença em todos os outros ruminantes (p. ex., ovinos, caprinos, lhamas, cervos)
e animais selvagens em cativeiro ou de vida livre. A infecção também foi identificada em onívoros e carnívoros, como coelhos selvagens, raposas, doninhas e primatas não humanos. A distribuição é cosmopolita. Os programas nacionais de
controle  incluem  aqueles  estabelecidos  na  Austrália,  Noruega,  Islândia,  Japão,  Holanda  e  EUA.  A  maior  prevalência  é  no  gado  leiteiro,  com  20  a  80%  dos  rebanhos  infectados  em  muitos  dos  principais  países  produtores  de  leite.  As
informações sobre a prevalência em outras espécies são limitadas. A doença é de importância econômica para a indústria de caprinos na Espanha e de ovinos na Austrália.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  M. paratuberculosis é excretado em grande número nas fezes de animais infectados e em menor número no seu colostro e leite. Ele é resistente aos fatores ambientais podendo sobreviver na pastagem por mais de 1
ano; a sobrevivência na água é mais longa do que no solo. A infecção geralmente é adquirida por meio da via fecal­oral; a dose necessária para infectar um animal não é conhecida. A infecção é adquirida pela ingestão do microrganismo de
tetos contaminados durante o aleitamento, pelo consumo de leite, alimentos sólidos e água contaminados com o microrganismo ou pelo comportamento de lambedura e de limpeza em ambientes contaminados. Posteriormente, podem ser
observados estágios bacteriêmicos e infecção intrauterina. Após a ingestão e absorção pelas placas de Peyers do intestino delgado, o patógeno intracelular infecta os macrófagos do trato GI e os linfonodos associados. É possível que alguns
animais  possam  eliminar  a  infecção  por  meio  da  resposta  imune  mediada  por  células,  que  estimula  a  atividade  microbicida  dos  macrófagos,  mas  a  frequência  que  ela  ocorre  é  desconhecida.  Na  maioria  dos  casos,  o  microrganismo
multiplica­se e, eventualmente, provoca uma enterite granulomatosa crônica que interfere na absorção e o processamento dos nutrientes, levando à caquexia típica de infecções avançadas. Isto pode levar meses a anos para se desenvolver e
geralmente é paralelo a um declínio na imunidade mediada por células, um aumento de anticorpos séricos e bacteriemia com disseminação além do trato GI. A eliminação fecal começa antes do aparecimento dos sinais clínicos e os animais
nesta fase de “silêncio” da infecção são importantes fontes de transmissão.
ACHADOS CLÍNICOS:  A doença nos bovinos é caracterizada por perda de peso e diarreia nas fases tardias da infecção, mas os animais infectados podem parecer saudáveis por meses a anos. Nos bovinos, a diarreia pode ser constante ou
intermitente; em ovinos, caprinos e outros ruminantes, a diarreia pode não ser observada. Tipicamente, a diarreia não contém sangue, muco ou debris epiteliais e ocorre sem tenesmo. Ao longo de semanas ou meses, a diarreia torna­se mais
grave, ocorre perda de peso, a coloração da pelagem pode desaparecer e pode haver o desenvolvimento de edema intermandibular e ventral devido à perda de proteínas decorrente da enteropatia. Isso leva a baixas concentrações de proteína
total e albumina no plasma, embora os níveis de gamaglobulina permaneçam normais. Em bovinos e caprinos leiteiros, pode haver queda na produção do leite ou a produção pode não atingir os níveis esperados. Os animais permanecem em
alerta e a temperatura e o apetite geralmente estão normais, embora a sede possa estar aumentada. A doença é progressiva e termina em emaciação e morte. Em rebanhos infectados, a taxa de mortalidade pode ser baixa por vários anos,
porém até 50% dos animais podem estar infectados subclinicamente com perdas de produção associadas. A doença em ovinos e caprinos é semelhante, mas a diarreia não é uma característica comum e, nos casos avançados, eles podem
perder facilmente a lã. Em cervídeos (cervos e alces), a evolução da doença pode ser mais rápida.
Lesões: Uma série de patologias pode ser observada nos animais infectados, variando de completa ausência de lesões macroscópicas até o espessamento e enrugamento do intestino com aumento e edemaciação de linfonodos próximos.
Frequentemente, não há correlação entre os sinais clínicos e a gravidade das lesões. As carcaças podem estar emaciadas com perda de gordura pericárdica e perirrenal nos casos caquéticos mais avançados. As lesões intestinais podem ser
leves,  mas  tipicamente  a  parede  do  intestino  delgado  distal  apresenta­se  difusamente  espessada  com  mucosa  não  ulcerada  nas  dobras  transversais  proeminentes.  As  lesões  podem  estender­se  proximal  e  distalmente  ao  jejuno  e  cólon.
Linfangite serosa, aumento do linfonodo mesentério e de outros linfonodos regionais geralmente são aparentes. Histologicamente, há enterite granulomatosa difusa caracterizada por acúmulo progressivo de macrófagos epitelioides e células
gigantes na mucosa e submucosa intestinal. Poucos ou muitos microrganismos ácido­resistentes podem ser observados no interior dos macrófagos. Geralmente, não há correlação entre os sinais clínicos e a gravidade das lesões. Os ovinos,
caprinos e cervos às vezes desenvolvem focos caseosos com calcificação na parede intestinal e linfonodos.
DIAGNÓSTICO:  Há muitos testes comercialmente disponíveis para a paratuberculose, com vantagens, desvantagens e aplicação apropriada. Os testes objetivam a detecção do microrganismo nas fezes ou tecidos (cultura, PCR), a busca de
evidências de resposta imune celular à infecção (teste de pele, interferona­?) ou a detecção de anticorpos para os antígenos de M. paratuberculosis (ELISA, imunodifusão em gel de ágar). A utilização de diferentes testes em combinação
pode  aumentar  a  sensibilidade  do  diagnóstico.  Devido  à  biologia  da  infecção  e  a  necessidade  de  manejá­la  na  base  do  rebanho,  informações  de  diagnóstico  devem  ser  reunidas  para  um  grupo  de  animais  e  não  apenas  para  um  caso
individual. Um animal com sinais clínicos da doença tem maior probabilidade de apresentar evidência para o diagnóstico da infecção (excreção, produção de anticorpos) do que um animal no estágio pré­clínico da infecção. A necropsia
com cultura e histopatologia de múltiplos tecidos é o padrão­ouro para o diagnóstico definitivo. A coloração de Ziehl­Neelsen de amostras teciduais para bactérias ácido­resistentes geralmente revela grande quantidade de micobactérias nas
lesões; entretanto, em alguns casos, uma pesquisa cuidadosa pode não revelar a presença dos microrganismos. A coloração ácido­resistente de esfregaços de impressão do íleo de uma vaca com a patologia típica é um método rápido e de
baixo custo (embora de baixa sensibilidade) para chegar a um diagnóstico preliminar. A biopsia da espessura total das seções do íleo e dos linfonodos regionais para cultura e histopatologia pode levar ao diagnóstico definitivo; entretanto,
essa abordagem geralmente é restrita aos animais particularmente valiosos. M. paratuberculosis tem sido isolado em uma grande variedade de tecidos, mas os linfonodos mesentéricos e ileocecais, íleo e fígado são, frequentemente, os mais
recomendados para amostragem diagnóstica.
Os testes sorológicos são métodos rápidos e de baixo custo para a confirmação ante–mortem do diagnóstico clínico; a sensibilidade é > 85% nos animais clinicamente afetados. Eles também auxiliam na detecção da infecção em bovinos
clinicamente normais nos estágios finais da infecção e que estão eliminando grande quantidade de M. paratuberculosis; a sensibilidade é de cerca de 45%. Dentre os testes sorológicos, aqueles baseados na tecnologia de ELISA oferecem
maior especificidade e sensibilidade sendo os melhores métodos para determinar a prevalência da infecção em um rebanho. O uso quantitativo do ELISA para identificar os animais para o abate seletivo ou para o isolamento do rebanho
pode ser uma estratégia com boa relação custo­benefício para o controle da doença; valores elevados no ELISA estão associados a maior probabilidade de infecção e altas taxas de eliminação fecal. A cultura fecal é mais sensível e mais
específica que a sorologia, mas os microrganismos crescem vagarosamente (2 a 4 meses) e os testes são mais caros que a sorologia. A mistura de amostras fecais (p. ex., cinco amostras por mistura) ou a cultura do estrume dos locais da
fazenda onde os bovinos se encontram (amostras ambientais) podem estabelecer o estado infeccioso do rebanho a um baixo custo, apesar de alguma redução na sensibilidade do teste. A capacidade de isolamento deste patógeno varia
significativamente entre os laboratórios. A utilização de um laboratório que passou por testes de qualidade é recomendada. A maioria das cepas que infectam ovinos não cresce em meios sólidos, mas podem ser isoladas com o uso de
sistemas de meios de cultura líquidos. Sondas genéticas para um elemento específico do DNA de M. paratuberculosis, como a IS900, podem ser utilizadas em conjunto com a cultura ou diretamente em amostras fecais. Alguns laboratórios
informam que a PCR pode ser tão sensível e específica quanto a cultura fecal, além de ser muito mais rápida; outros laboratórios não acham que isso seja verdadeiro. O custo da análise é a principal desvantagem. O desempenho de PCR,
assim como os outros testes validados para o uso em bovinos, pode ser diferente quando utilizada com amostras de outras espécies.
Os testes de imunidade mediada por células, como o teste intradérmico de Johnin, o teste de transformação linfocitária e interferona­? são muito utilizados em bases de pesquisas e podem ser negativos nos casos clínicos avançados. O
genoma de M. paratuberculosis foi descrito e pode fornecer a base para novas abordagens diagnósticas.
Os testes que caíram em desuso, devido aos relatos de baixa sensibilidade e/ou especificidade, são o exame microscópico de amostras fecais com coloração de Ziehl–Neelsen e o teste de Johnin IV. O teste de fixação do complemento
(FC) também foi descrito como menos preciso em relação a outros testes sorológicos. O teste de FC ainda é exigido em muitos países para a importação de animais, embora muitos reagentes utilizados neste teste sejam feitos com diferentes
especificações em diferentes países, resultando em perda de padronização.
CONTROLE:  Nenhum tratamento satisfatório é conhecido. O controle requer boas práticas de higiene e de manejo satisfatórias para limitar a exposição de animais jovens ao microrganismo. Bezerros, cabritos ou cordeiros devem nascer em
áreas livres de estrume, devem ser separados de suas mães logo após o nascimento e, no caso de gado leiteiro, devem ser alimentados com mamadeira de colostro pasteurizado ou obtido de fêmeas negativas, e criados segregados dos
adultos e de seus estrumes até > 1 ano de idade. A utilização de sucedâneos do leite é recomendada em vez do leite residual, a menos que o leite seja pasteurizado. Programas de teste de rotina podem ajudar a concentrar os esforços no
controle da doença. Os testes de baixo custo (p. ex., ELISA) tem o maior custo­benefício para os rebanhos leiteiros comerciais que foram confirmados infectados pela cultura ou PCR. Os animais com resultados positivos, particularmente
aqueles que são grandes eliminadores do agente ou que apresentam resultados fortemente positivos no ELISA, devem ser encaminhados ao matadouro logo que for economicamente viável. A realização de novos testes anuais deve ser
contínua até que o rebanho apresente resultados que indiquem baixa prevalência de infecção (< 5%). Como a infecção intrauterina pode ocorrer, programas de controle mais agressivos incluem o abate dos bezerros de mães que possuem a
doença  ou  que  desenvolveram  os  sinais  da  doença.  Os  animais  de  reposição  devem  ser  obtidos  de  rebanhos  supostamente  livres  da  doença  e  estes  animais  devem  ser  testados  antes  de  serem  introduzidos  no  novo  rebanho.  Outros
procedimentos gerais para minimizar a contaminação fecal na fazenda também podem auxiliar, como por exemplo, elevar comedouros e bebedouros, fornecer água encanada em vez de água de lagoa e arar frequentemente os pastos para
dispersar as fezes. Os proprietários dos rebanhos devem ser avisados de que o controle da paratuberculose leva pelo menos 5 anos.
A formulação de vacinas para M. paratuberculosis varia conforme o fabricante. Em muitos países, o seu uso está sujeito à aprovação de agências reguladoras e pode ser restrito aos rebanhos altamente infectados. A vacinação em bezerros
< 1 mês de idade pode ser efetiva na redução da incidência da doença, mas não previne a eliminação do microrganismo e o aparecimento de novos casos no rebanho. A vacinação, portanto, não elimina a necessidade de um bom manejo e
sanitização. Na indústria de caprinos da Espanha e da Austrália, a vacinação tem aumentado a vida produtiva do rebanho. Bovinos inoculados com vacinas inativadas de células inteiras com óleo mineral desenvolvem granulomas, de
diâmetros variados, no local de inoculação (região da paleta) e podem reagir positivamente em testes subsequentes de tuberculina. A inoculação acidental pode resultar em reações agudas graves com necrose tecidual e sinovite e tendinite
crônica.
RISCO ZOONÓTICO:  Há  dados  conflitantes  sobre  o  envolvimento  do  agente  causal  na  doença  de  Crohn,  uma  enterite  crônica  granulomatosa  de  etiologia  desconhecida  em  humanos.  Entretanto,  M.  paratuberculosis  é  consistentemente
detectado pela PCR nos humanos com a doença de Crohn. Este fato juntamente com a sua ampla variedade de hospedeiros, inclusive primatas não humanos, indicam que a paratuberculose deve ser considerada de risco zoonótico até que a
situação seja esclarecida.

PASTEURELOSE EM OVINOS E CAPRINOS

Pasteurella e Mannheimia são cocobacilos beta­hemolíticos, Gram­negativos, aeróbios, imóveis, não formadores de esporos da família Pasteurellaceae. Esta família tende a habitar a superfície mucosa do trato alimentar, respiratório e
genital dos mamíferos. Muitos são conhecidos como invasores secundários oportunistas. Algumas espécies apresentam preferências para superfícies e hospedeiros específicos. A recente atualização dos dados filogenéticos resultou em
mudança de nomes com base na análise da sequência gênica. Como resultado, Pasteurella haemolytica biotipo A e T foram reclassificadas como Mannheimia haemolytica (biotipo A) e Pasteurella trehalosi (biotipo T). Cada isolado de M.
haemolytica e de P. trehalosi é designada com um biotipo e um sorotipo. M. haemolytica A2 é a cepa mais comum isolada em ovinos e caprinos com pasteurelose respiratória, embora as cepas A6, A13 e Ant tenham sido descritas em
ovinos e a cepa Ant, em caprinos. M. haemolytica A2 é rotineiramente descrita em casos de mastites de ovinos. P. trehalosi T3, T4 e T10 têm sido frequentemente associadas à forma sistêmica ou septicêmica da pasteurelose que afeta
cordeiros. Pasteurella multocida foi relatada como a causa da pasteurelose pneumônica em ovinos e caprinos.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  M. haemolytica e P. trehalosi são cosmopolitas e as enfermidades provocadas por estes microrganismos são comuns em ovinos e caprinos de todas as idades, embora a prevalência dos sorotipos pode variar de
acordo com a região e o rebanho. M. haemolytica, P. trehalosi e P. multocida são microrganismos comensais comuns das tonsilas e da nasofaringe de ovinos e caprinos sadios. Para que estes microrganismos causem uma infecção, uma
combinação de fatores estressantes, inclusive calor, superlotação, exposição a intempéries, má ventilação, manejo e transporte deixa os ovinos e caprinos suscetíveis às infecções respiratórias virais. Parainfluenza 3, adenovírus tipo 6, vírus
respiratório sincicial e, possivelmente, adenovírus bovino tipo 2, adenovírus ovino tipo 1 e 5 e reovírus tipo 1 causam uma infecção respiratória primária, que raramente é fatal, mas que predispõe a infecções secundárias por M. haemolytica.
Infecções  respiratórias  com  Mycoplasma  ovipneumoniae  e  Bordetella  parapertussis  também  foram  relatadas  associadas  a  infecções  secundárias  por  M.  haemolytica.  Acredita­se  que  a  combinação  de  fatores  estressantes  e  infecções
primárias quebra a integridade da barreira mucosa do trato respiratório inferior permitindo a colonização, proliferação e indução de danos teciduais significativos pela M. haemolytica.
A virulência de M. haemolytica e P. trehalosi é mediada pela ação de vários fatores, inclusive endotoxinas, leucotoxinas e polissacarídios capsulares, que proporciona vantagens à bactéria sobre a imunidade do hospedeiro. A leucotoxina
é  particularmente  importante  na  patogênese,  pois,  ela  é  especificamente  tóxica  para  os  leucócitos  dos  ruminantes,  resultando  na  deposição  de  fibrina  nos  pulmões  e  nas  superfícies  pleurais.  A  endotoxina  lipossacarídica  contribui  para
reações adversas nos pulmões e também leva a insuficiência circulatória sistêmica e choque. O polissacarídio capsular previne a fagocitose da bactéria e auxilia a adesão na superfície epitelial alveolar. A sobrevivência na fase aguda da
pasteurelose  pneumônica  depende  da  extensão  do  envolvimento  pulmonar  e  dos  danos  no  trato  respiratório  inferior.  Os  ovinos  e  caprinos  que  se  recuperam  podem  apresentar  problemas  respiratórios  crônicos,  inclusive  diminuição  da
capacidade pulmonar e da eficiência de ganho de peso de até 20% se o pulmão foi danificado.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  P. trehalosi causa principalmente sepse e pasteurelose sistêmica em ovinos jovens < 2 meses de idade. A forma sistêmica da pasteurelose causada pela P. trehalosi é caracterizada por febre, apatia, falta de
apetite e morte súbita em ovinos jovens. Acredita­se que o microrganismo move­se das tonsilas para os pulmões e passa para o sangue. Isto resulta em sepse e infecção localizada em um ou mais tecidos como articulações, úbere, meninges
ou pulmões.
DIAGNÓSTICO:  A diferenciação da pasteurelose de outras causas de doença respiratória é baseada na alta mortalidade e rápida progressão para a morte. O diagnóstico da forma pneumônica e septicêmica da pasteurelose é baseado no exame
à necropsia, achados macroscópicos e histopatológicos e isolamento do microrganismo em vários tecidos. As lesões incluem hemorragia subcutânea; necrose epitelial da língua, faringe, esôfago, ou, ocasionalmente, do abomaso e intestino;
aumento das tonsilas e linfonodos retrofaringeanos e lesões hiperagudas, multifocais, embólicas e necróticas no pulmão e fígado.
TRATAMENTO:  Os padrões de suscetibilidade aos antimicrobianos de M. haemolytica e P. trehalosi são  bons.  Amoxicilina­ácido  clavulânico,  ceftiofur  e  florfenicol  têm  boa  eficácia,  enquanto  apenas  5%  dos  isolados  podem  apresentar
resistência à tetraciclina. O ciprofloxacino parecer ser muito eficaz, mas o seu uso veterinário é proibido nos EUA. O tratamento é, com frequência, pouco compensador a menos que comece no início da doença devido à rápida progressão
dos danos pulmonares e a liberação de endotoxinas. Fluidoterapia e agentes anti­inflamatórios são importantes complementos à antibioticoterapia. Embora a pasteurelose septicêmica tenha uma suscetibilidade antimicrobiana favorável, a
resposta à terapia frequentemente é decepcionante. O uso de antibióticos profiláticos em cordeiros em risco pode ser benéfico.
PREVENÇÃO:  A  prevenção  da  pasteurelose  é  desejável  devido  aos  custos  econômicos  com  o  tratamento,  perdas  e  redução  do  ganho  de  peso  dos  animais  sobreviventes.  Vacinas  comerciais  estão  disponíveis  para  bovinos,  mas  elas  são
específicas apenas para M. haemolytica A1, e, experimentalmente, há muito pouca ou nenhuma proteção cruzada contra M. haemolytica A2. Vacinas comerciais para M. haemolytica A2 estão disponíveis no Reino Unido e há relatos de que
são benéficas na redução de perdas por morte e diminuição do ganho de peso devido às formas septicêmica e pneumônica da pasteurelose. Como não há vacinas comerciais nos EUA, os produtores são capazes de obter bacterinas autógenas
de seus rebanhos. Com a prevenção das viroses respiratórias com a utilização de um programa de vacinação espera­se uma redução da pasteurelose respiratória, mas não há vacinas comerciais disponíveis para o uso em ovinos e caprinos. O
uso  de  antibióticos  profiláticos,  principalmente  da  tetraciclina,  no  alimento  durante  os  meses  do  ano  com  maior  incidência  é  uma  prática  comum  de  manejo.  O  evitamento  e  a  redução  de  fatores  estressantes  conhecidos,  como  calor,
superlotação, exposição a intempéries, má ventilação, manejo e transporte também devem ser considerados.

PESTE BOVINA (Rinderpest)

Historicamente, o vírus da peste bovina estava distribuído amplamente por toda a Europa, Ásia e África, mas ele nunca se estabeleceu na América do Norte, América Central, ilhas do Caribe, América do Sul, Austrália e Nova Zelândia. Até
o final do século 20, a peste bovina era endêmica em vários países da África e da Ásia Menor, mas agora parece ter sido globalmente erradicada. A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), juntamente com
as principais autoridades veterinárias dos países afetados pela peste bovina e especialistas internacionais, desenvolveram uma estratégia para a erradicação mundial que evoluiu para o Programa Global de Erradicação da Peste Bovina
(PGEPB). De acordo com o PGEPB, desde 2001 nenhum caso da doença foi relatado.
A OIE também contribuiu com este objetivo mediante a divulgação de uma lista de estados membros livres da peste bovina, por motivos históricos (parte de continente não afetado, sem casos e sem vacinação para a peste bovina há 25
anos) ou, nos casos de países com histórico de endemia recente, pelo aceite de provas nacionais baseadas na pesquisa da doença, relatos da doença e sorovigilância dos animais não vacinados. A maioria dos países antigamente endêmicos já
recebeu a condição de país livre da doença. O objetivo da FAO é declarar formalmente que o mundo estará livre da doença em 2010. Neste contexto, são apresentados aqui a descrição da doença e os métodos utilizados no seu controle.
A peste bovina é uma doença de animais com cascos fendidos, caracterizada por febre, estomatite necrótica, gastrenterite, necrose linfoide e alta mortalidade. A forma endêmica constitui a praga mais letal conhecida entre os bovinos.
Todas as espécies da ordem Artiodactyla são variavelmente suscetíveis à peste bovina, embora, em termos práticos, o vírus tem sido mantido pela transmissão entre bovinos domésticos, búfalos domésticos e iaques. Entre os bovinos, as
raças de Bos taurus apresentam  complicações  clínicas  mais  graves  do  que  as  raças  de Bos indicus.  No  sul  da  Ásia,  onde  a  peste dos  pequenos  ruminantes  e  a  peste  dos  bovinos  há  lado  a  lado,  a  dificuldade  frequente  de  se  fazer  um
diagnóstico diferencial muitas fez com que ovinos e caprinos infectados pela peste dos pequenos ruminantes fossem incorretamente diagnosticados com peste dos bovinos. Entretanto, em alguns casos, os pequenos ruminantes estavam
infectados  com  a  peste  bovina,  possivelmente  subclinicamente,  e  tiveram  alguma  importância  epidemiológica  como  transmissores  do  vírus.  A  peste  bovina  também  afeta  algumas  raças  de  suínos  e  uma  grande  variedade  de  espécies
silvestres da ordem Artiodactyla por meio do contato com os bovinos infectados.
ETIOLOGIA  E  PATOGENIA:  O  agente  infeccioso  é  um  morbilivírus,  estreitamente  relacionado  com  o  vírus  da  peste  dos  pequenos  ruminantes  (p.  785),  da cinomose  (p.  821)  e  do  sarampo.  As  estirpes  do  vírus  da  peste  bovina  variam
acentuadamente em virulência para os bovinos. Além da estirpe vacinal, 3 linhagens filogenéticas distintas podem ser diferenciadas (1 asiática e 2 africanas), mas o soro de bovinos recuperados ou vacinados apresenta reação cruzada com
todas as estirpes nos testes de neutralização. O vírus é frágil e é rapidamente inativado pelo calor e luz, mas permanece viável por longos períodos nos tecidos resfriados ou congelados.
O vírus da peste bovina está presente em pequenas quantidades na secreção nasal e ocular 1 a 2 dias antes do aparecimento da febre; os níveis são altos nas secreções e excreções durante a primeira semana da doença clínica e diminuem
rapidamente, à medida que os animais desenvolvem anticorpos específicos e começam a se recuperar. A transmissão necessita de contato direto ou indireto próximo; a infecção ocorre pela nasofaringe e pulmão. Não há estado de portador;
o vírus se mantém por meio da transmissão contínua entre os animais suscetíveis. Em áreas endêmicas, os bovinos jovens se tornam infectados após o desaparecimento da imunidade materna e antes do início da imunidade vacinal, com
possíveis ciclos auxiliares em ungulados silvestres. Nas áreas epidêmicas, o vírus infecta a maioria dos animais suscetíveis e tende a se limitar, a menos que a população seja grande o suficiente para sustentar uma endemia.
Após o crescimento primário nos linfonodos associados à nasofaringe, o vírus prolifera por todo o tecido linfoide e se espalha através do sangue para as mucosas dos tratos GI e respiratório superior. Os danos teciduais são causados pela
citopatologia viral. Os antígenos virais induzem uma potente resposta imune que controla a infecção e permite a recuperação, se o dano tecidual não for muito grave.
ACHADOS CLÍNICOS:  O período de incubação de 3 a 15 dias é seguido de febre, anorexia e depressão; secreção oculonasal desenvolve­se 1 a 2 dias depois. Dentro de 2 a 3 dias, aparecem lesões necróticas puntiformes, que aumentam
rapidamente formando placas caseosas, aparecem na gengiva, mucosa bucal e língua. O palato duro e mole frequentemente são afetados. A secreção oculonasal torna­se mucopurulenta e o focinho fica seco e rachado. A diarreia, que é o
último  sinal  clínico,  pode  ser  aquosa  e  pode  conter  sangue,  muco  e  membrana  mucosa.  Os  animais  apresentam  dor  abdominal  grave,  sede  e  dispneia,  podendo  morrer  de  desidratação.  O  período  de  convalescência  é  longo  e  pode  ser
complicado por infecções concomitantes devido à imunossupressão. Nas áreas epidêmicas, a morbidade muitas vezes é de 100% e a mortalidade é de até 90%, mas nas áreas endêmicas, a morbidade é baixa e os sinais clínicos geralmente
são leves.
Lesões: As alterações patológicas macroscópicas são evidentes ao longo de todo o trato GI e trato respiratório superior, assim como áreas de necrose e erosão, congestão e hemorragia. Esta última forma a clássica “estria de zebra” no reto. Os
linfonodos podem estar aumentados e edematosos, com focos necróticos esbranquiçados nas placas de Peyer. O exame histológico revela necrose linfoide e epitelial com sincícios induzidos pelo vírus e inclusões intracitoplasmáticas e
intranucleares são frequentemente observadas.
DIAGNÓSTICO:  Os achados clínicos e patológicos são suficientes para o diagnóstico nas áreas endêmicas e após a confirmação laboratorial inicial de um surto. Nas áreas onde a peste dos bovinos é incomum ou inexistente, devem ser
utilizados  testes  laboratoriais  para  diferenciá­la  especialmente  da  diarreia  viral  bovina,  assim  como  da  febre  da  costa  leste,  febre  aftosa,  rinotraqueíte  infecciosa  bovina  e  febre  catarral  maligna.  O  isolamento  do  vírus  e  a  detecção  de
antígenos  virais  específicos  em  tecidos  afetados  utilizando  o  teste  de  imunodifusão  eram  o  padrão,  mas  testes  mais  simples,  rápidos  e  discriminantes  como  o  ELISA  de  captura  e  a  RT­PCR  foram  preferidos  no  final  da  campanha  de
erradicação. A técnica da RT­PCR permitiu a caracterização filogenética do vírus e ajudou a traçar a origem dos vírus nos novos surtos. A utilização de um teste rápido (penside test) para uso a campo também se mostrou útil nos estágios
finais da campanha de erradicação.
Antes da declaração oficial de erradicação, todos os casos de estomatite erosiva nos animais suscetíveis devem ser testados para a peste bovina. As amostras laboratoriais devem ser coletadas de vários animais durante os estágios iniciais
da doença clínica, preferencialmente antes do início da diarreia. Sangue total, tecido linfoide, baço e lesões intestinais devem ser coletados assepticamente e transportados rapidamente a 4°C ou em gelo.
CONTROLE:   Geralmente  não  se  tenta  o  tratamento,  mas  cuidados  de  enfermagem  com  fluidoterapia  de  suporte  e  antibioticoterapia  ajudam  na  recuperação  dos  animais  valiosos.  A  imunidade  ativa  é  considerada  vitalícia,  enquanto  a
imunidade materna geralmente dura de 6 a 11 meses. O controle nas áreas endêmicas é feito pela imunização de todos os bovinos e bubalinos domésticos > 1 ano de idade com uma vacina de cultura celular atenuada. Nestas áreas, os surtos
são controlados por meio de quarentena e “vacinação em anel” e, às vezes, por meio de abate. Nas epidemias, a doença pode ser eliminada pela imposição de quarentena e abate dos animais afetados e expostos. O controle da movimentação
dos animais é fundamental para o controle da peste bovina; muitos surtos ocorrem devido à introdução de bovinos infectados em rebanhos não infectados.

PESTE DOS PEQUENOS RUMINANTES

A peste dos pequenos ruminantes (PPR) é uma doença viral aguda ou subaguda de caprinos e ovinos, caracterizada por febre, estomatite necrótica, gastrenterite e pneumonia. Ela foi descrita pela primeira vez em 1942 na Costa do Marfim
e, subsequentemente, no Senegal, Gana, Togo, Benin e Nigéria. Os ovinos e os caprinos provavelmente são igualmente suscetíveis ao vírus, mas os ovinos podem ser mais resistentes aos seus efeitos clínicos. Enquanto a sorovigilância dos
rebanhos afetados frequentemente apresenta níveis mais elevados de prevalência em ovinos, isto pode refletir o fato de que uma alta proporção dos caprinos afetados morre. Os bovinos são apenas subclinicamente infectados. Os seres
humanos não estão em risco.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O vírus causal, um morbilivírus da família Paramyxoviridae, possui uma afinidade particular por tecidos linfoides e tecidos epiteliais dos trato GI e respiratório, onde ele produz as lesões características.
A  PPR  está  presente  no  oeste,  centro,  norte  e  leste  da  África,  no  Oriente  Médio  e  no  subcontinente  indiano  do  extremo  oriente  a  Bangladesh.  Em  ambas  as  massas  de  terra  o  vírus  ainda  está  se  espalhando.  Recentemente,  o  vírus
disseminou­se do Afeganistão para a Ásia central (Uzbequistão, Tajiquistão e Turcomenistão) e já se espalhou para o Tibet. Na África, uma barreira pouco compreendida que impedia a movimentação do vírus em direção ao sul do Sudão e
da Etiópia, foi quebrada e Quênia e Uganda estão atualmente infectados. No norte do continente a doença está presente no Marrocos.
Com a erradicação global da peste bovina e a compreensão de que a peste bovina nunca foi uma doença comum de pequenos ruminantes, a verdadeira natureza da PPR como um vírus com o potencial de causar epidemias graves, ou
mesmo pandemias, em pequenos ruminantes torna­se cada vez mais real.
Em nível local, tais epidemias podem eliminar uma população inteira de caprinos ou de ovinos de uma área afetada. Entre epidemias, a PPR pode assumir um perfil endêmico; suspeita­se que diferentes níveis de virulência viral podem
surgir dentro de um país infectado em função de diferentes cenários.
TRANSMISSÃO:  A transmissão ocorre por contato e o confinamento parece favorecer os surtos. As secreções e excreções dos animais doentes são fontes de infecção. Geralmente se aceita que não há o estado de portador; entretanto, casos de
PPR podem propagar a infecção durante o período de incubação. De acordo com o sistema de criação, parece que os caprinos urbanos errantes podem contribuir para a manutenção do vírus. Também há vários exemplos de comércio de
animais associados à disseminação da infecção e a necessidade de animais para festas religiosas geralmente aumenta o comércio de animais infectados.
Várias espécies de gazelas, oryx e cariacus são muito suscetíveis; estes animais e outros ruminantes selvagens podem desempenhar um papel na epidemiologia da doença, mas pouco ou nenhum dado está disponível sobre a infecção em
pequenos ruminantes selvagens. Os suínos são hospedeiros acidentais e não transmitem a doença para suínos ou caprinos suscetíveis e é improvável que eles desempenhem papel fundamental na epidemiologia da PPR. Embora os bovinos e
os búfalos domésticos sejam suscetíveis à infecção, não há evidências de que eles exibam sinais clínicos após a infecção natural ou experimental e de que transmitam a doença para as espécies suscetíveis.
ACHADOS CLÍNICOS:  A forma aguda da PPR é acompanhada de uma elevação súbita da temperatura corporal para 40 a 41,3°C. Os animais afetados parecem doentes e agitados e podem apresentar pelagem opaca, focinho seco, membranas
mucosas congestas e diminuição do apetite. No início, a secreção nasal é serosa, mais tarde, torna­se mucopurulenta e produz odor pútrido à respiração. O período de incubação geralmente é de 4 a 5 dias. Pequenas áreas de necrose podem
ser observadas na membrana mucosa no assoalho da cavidade nasal. A conjuntiva frequentemente está congesta e o canto medial pode exibir pequeno grau de crostas. Alguns animais afetados desenvolvem conjuntivite catarral profusa com
união das pálpebras. A estomatite necrótica afeta o lábio e a gengiva inferior e a margem da gengiva que circunda os dentes incisivos; nos casos mais graves, pode haver o envolvimento do coxim dentário, palato, bochechas e suas papilas e
língua. A diarreia pode ser profusa e é acompanhada de desidratação e emaciação; seguem­se hipotermia e morte, geralmente após 5 a 10 dias. Pode haver o desenvolvimento de broncopneumonia, caracterizada por tosse, nos estágios finais
da doença. Os animais prenhes podem abortar. As taxas de morbidade e mortalidade são maiores nos animais jovens do que nos adultos.
Lesões: Observam­se emaciação, conjuntivite e estomatite; as lesões necróticas são observadas na face interna do lábio inferior e na gengiva adjacente, nas bochechas perto das comissuras e na superfície ventral da língua. Nos casos graves,
as lesões podem se estender para o palato duro e faringe. As erosões são superficiais, com base sensível e avermelhada que, mais tarde, torna­se branco rosada; elas são delimitadas por um epitélio normal com uma margem bem demarcada.
Rúmen, retículo e omaso raramente estão envolvidos. O abomaso exibe erosões regularmente delineadas que possuem base sensível e avermelhada e com sangramento.
As lesões graves são menos comuns no intestino delgado do que na boca, abomaso ou intestino grosso. Estrias de sangue e, menos frequentemente, erosões podem estar presentes na primeira porção do duodeno e no íleo terminal. As
placas de Peyer são gravemente afetadas; placas inteiras de tecido linfoide podem se desprender. Geralmente, o intestino grosso é afetado gravemente, com lesões ao redor da válvula ileocecal, na junção cecocólica e reto. Este último exibe
estrias de congestão ao longo das pregas da mucosa, resultando na aparência de “listras de zebra” característica.
Podem aparecer petéquias nos cornetos nasais, laringe e traqueia. Placas de broncopneumonia podem estar presentes.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo é baseado nos achados clínicos, patológicos e epidemiológicos e pode ser confirmado pelo isolamento e identificação do vírus. Em nível de campo, o teste de imunodifusão em gel de ágar e o teste
rápido para a pen­side test (PPR) fornecem uma confirmação adequada para efeitos de informação. Entretanto, devido à dificuldade e o tempo necessário para o isolamento viral, técnicas como o ELISA de captura e a reação em cadeia da
polimerase  via  transcriptase  reversa  (RT­PCR)  são  as  técnicas  preferidas  pelos  laboratórios  de  referência.  As  amostras  necessárias  são:  sangue  não  coagulado,  linfonodos,  tonsilas,  baço  e  pulmão  inteiro.  A  detecção  de  altos  títulos  de
anticorpos neutralizantes nos animais sobreviventes é diagnóstico. A PPR deve ser diferenciada de outras infecções gastrintestinais agudas (p. ex., peste bovina), de infecções respiratórias (p. ex., pleuropneumonia contagiosa caprina) e de
outras doenças, tais como ectima contagioso, caudriose, coccidiose e intoxicação mineral.
CONTROLE:  As  autoridades  locais  e  federais  devem  ser  notificadas  quando  houver  suspeita  de  PPR.  A  erradicação  é  recomendada  quando  a  doença  aparece  nos  países  anteriormente  livres  da  PPR.  Não  há  um  tratamento  específico,
entretanto, o tratamento das complicações bacterianas e parasitárias diminui a mortalidade nos rebanhos afetados. Uma vacina atenuada foi preparada em cultura de células Vero; ela propicia proteção contra a doença natural por > 1 ano. A
vacina de cultivo celular para a peste bovina também foi utilizada com sucesso na imunização contra a PPR, mas, devido à erradicação global da peste bovina, o uso desta vacina pode mascarar qualquer evidência do reaparecimento do
vírus da peste bovina ou pode ser mal interpretada como uma evidência do reaparecimento daquele vírus. Atualmente, as vacinas homólogas para a PPR são amplamente utilizadas para o controle da doença.

PIEMIA CAUSADA POR CARRAPATOS

A  piemia  causada  por  carrapatos  afeta  os cordeiros  de  2  a  12  semanas  de  idade  e  é  caracterizada  por  debilidade, claudicação incapacitante e paralisia.  Os  abscessos  piêmicos  são  comuns  nas  articulações,  mas  podem  ser  encontrados
praticamente em qualquer órgão. A doença causa perdas econômicas significativas devido à debilidade e morte de cordeiros. A doença é enzoótica em muitas regiões do Reino Unido e Irlanda, onde o carrapato Ixodes ricinus é comum, e é
provável que esteja presente em outras áreas da Europa onde o mesmo carrapato é encontrado.
ETIOLOGIA:  Staphylococcus aureus é considerado o principal agente causador do abscesso piêmico, pois, o microrganismo tem sido isolado consistentemente de lesões superficiais e profundas, sendo raro encontrar outra bactéria. Supõe–se
que a bactéria, possa entrar na corrente sanguínea por meio da inoculação direta durante a alimentação do carrapato em feridas superficiais locais ou através do umbigo infectado. Entretanto, há evidências clínicas e experimentais de que I.
ricinus não atua simplesmente como um vetor que injeta diretamente o estafilococo na corrente sanguínea. O principal papel do I. ricinus é o de vetor do agente riquetsial Anaplasma phagocytophilum, que causa a febre transmitida por
carrapatos (p. 767), que por sua vez cria fatores favoráveis ao desenvolvimento da piemia. Os cordeiros afetados pela febre transmitida por carrapatos apresentam leucopenia grave e seus neutrófilos do sangue periférico são menos capazes
de fagocitar e matar S. aureus. Estudos experimentais demonstraram que os cordeiros com febre transmitida por carrapatos são mais suscetíveis à infecção experimental com S. aureus durante o período de neutropenia e que até 30% dos
cordeiros com febre transmitida por carrapatos podem desenvolver infecções estafilocócicas.
A  epidemiologia  da  doença  está  estreitamente  relacionada  com  a  biologia  do I. ricinus.  A  doença  está  limitada  a  áreas  com  populações  de I. ricinus e  às  estações  do  ano  climaticamente  favoráveis  à  alta  população  e  atividade  dos
carrapatos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os abscessos se formam em várias partes do corpo, principalmente em articulações, bainhas dos tendões e músculos, resultando em claudicação – daí o uso do termo “doença dos cordeiros aleijados”. Em alguns surtos,
> 30% dos cordeiros podem ser afetados; geralmente eles ficam apáticos e claudicantes e frequentemente apresentam perda de condição corporal. Abscessos internos sem lesões articulares podem resultar em nenhum sinal clínico além da
perda da condição corporal, porém, quando as lesões estão presentes no SNC, pode haver ataxia, paraplegia e outros sinais nervosos. A doença incapacitante tem a duração de dias ou semanas, mas a doença também pode aparecer como
uma sepse aguda. Ocasionalmente, podem ocorre mortes súbitas devido a múltiplos abscessos internos, sem outros sinais visíveis. Até 50% dos cordeiros afetados podem morrer e os cordeiros sobreviventes recuperam­se lentamente.
Lesões:  Com  exceção  das  articulações  e  de  outras  estruturas  superficiais,  os  abscessos  geralmente  são  encontrados  no  fígado,  pulmões  e  rins.  Eles  também  podem  estar  presentes  nas  meninges  da  medula  espinal,  no  pericárdio  e  no
miocárdio. O diafragma, o timo e as glândulas adrenais geralmente são menos afetados. Os carrapatos frequentemente são encontrados fixados nas áreas inflamadas.
DIAGNÓSTICO:  O histórico e os sinais clínicos são indicadores valiosos. A restrição da doença a áreas infestadas por carrapatos, sua ocorrência em estações de atividade dos carrapatos e a demonstração de A. phagocytophilum ou do DNA
específico pela PCR no sangue de cordeiros afetados ou de outros ovinos do rebanho são características diagnósticas. O isolamento de S. aureus das lesões e a ausência de outras bactérias ajudam a confirmar a piemia causada por carrapato.
A perda da condição corporal e o atraso no crescimento, sem claudicação, podem dificultar a identificação da doença causada por carrapato e a forma aguda pode ser confundida com outras doenças septicêmicas. A piemia causada por
carrapato também pode se assemelhar a outras infecções supurativas de recém­nascidos, inclusive doenças umbilicais e articulares devido a infecções por outras bactérias como os estreptococos e Arcanobacterium pyogenes.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O tratamento dos casos clínicos da piemia causada por carrapatos com penicilina ou tetraciclina pode ser efetivo, desde que as lesões não estejam muito avançadas.
O controle da infestação por carrapatos é a medida preventiva mais eficaz. Isto pode ser alcançado mantendo os cordeiros e ovelhas em terrenos planos, em pastagens livres de carrapatos durante as primeiras semanas de vida, ou com
banhos de imersão das ovelhas antes do parto e com a administração de acaricidas nos cordeiros em banhos de imersão ou com outras formas de aplicação tópica. Nos cordeiros jovens, as preparações pour­on de cipermetrina ou tópicas
aplicadas antes levar os cordeiros da maternidade para as pastagens são relatadas como efetivas no controle dos carrapatos.
A administração da oxitetraciclina de ação prolongada na época de risco pode ajudar a prevenir tanto a febre transmitida por carrapatos quanto a piemia causada por carrapatos nas primeiras semanas de vida. Uma única injeção com o
dobro da dose recomendada na terceira semana de idade pode reduzir significativamente a mortalidade e a morbidade de cordeiros novos em pastos infestados por carrapatos e a melhorar o ganho de peso e a condição corporal dos demais.
O  tratamento  profilático  com  um  antibiótico  de  longa  ação  pode  prevenir  o  desenvolvimento  da  febre  transmitida  por  carrapatos  por  até  3  semanas,  sem  pirexia  e  imunossupressão,  de  forma  que  a  incidência  da  piemia  causada  por
carrapatos e outras infecções, como pasteurelose e colibacilose, são reduzidas. Embora o tratamento com a oxitetraciclina possa inibir o desenvolvimento da imunidade, se os cordeiros eventualmente desenvolverem a febre transmitida por
carrapatos, eles estarão algumas semanas mais velhos e, aparentemente, menos suscetíveis à piemia causada por carrapatos. A exposição deliberada dos cordeiros a injeções, seguida de tratamento com oxitetraciclina, pode oferecer alguma
imunidade antes que os cordeiros entrem em áreas infestadas por carrapato; entretanto, as cepas específicas destas áreas devem ser utilizadas, pois, algumas cepas de A. phagocytophilum não apresentam reação cruzada.

SEPSE HEMORRÁGICA

A sepse hemorrágica (SH) é uma doença aguda e altamente fatal causada por sorotipos específicos de Pasteurella multocida. Acomete principalmente bovinos e bubalinos; acredita­se que estes últimos sejam mais suscetíveis. A SH não é
observada com frequência em suínos e é menos comum em ovinos e caprinos. A doença já foi relatada em bisões, camelos, elefantes, equinos e asininos e há a evidência da sua ocorrência em iaques. Uma pasteurelose aguda indistinguível
da SH é raramente observada em cervos, alces e outros ruminantes selvagens. Coelhos e camundongos de laboratório são altamente suscetíveis à infecção experimental.
A SH é a principal doença de bovinos e bubalinos na Ásia, África e alguns países do sul da Europa e Oriente Médio. A doença causa grandes perdas econômicas devido à morbidade e mortalidade. Ela é classificada pelos países do sul e
do Sudeste Asiático como a doença contagiosa mais importante dos bovinos e bubalinos. Embora a SH possa ser observada em qualquer época do ano, as piores epidemias ocorrem durante a estação das chuvas. A SH é mais comum nos
vales de rios e deltas do Sudeste Asiático entre os búfalos utilizados no cultivo de arroz. Os únicos surtos verdadeiros na América do Norte ocorreram em bisões no Parque Nacional de Yellowstone em 1965. A ocorrência na América
Central e na América do Sul não foi confirmada.
ETIOLOGIA:  A epidemia de SH é causada por um ou dois sorotipos de P. multocida, designadas de B:2 e E:2. O sorotipo E:2 apenas foi isolado na África; o sorotipo B:2 provoca a doença em outros lugares e também foi isolado de casos no
Egito e no Sudão. Os sorotipos antigenicamente relacionados com o sorotipo B:2 têm sido implicados em surtos da doença indistinguível da SH em cervos e alces. P. multocida é uma bactéria extracelular e a imunidade é principalmente
humoral.
TRANSMISSÃO, EPIDEMIOLOGIA E PATOGENIA:  Os animais são infectados por meio do contato direto ou indireto. Acredita­se que a fonte de infecção seja a saliva ou a secreção nasal de portadores assintomáticos ou de animais clinicamente
doentes. Cerca de 5% dos bovinos e bubalinos podem ser portadores do microrganismo nas regiões endêmicas.
Aventa­se a possibilidade de que os animais tornam­se suscetíveis em decorrência de vários fatores de estresse, como a inanição observada nos bovinos e bubalinos no início da estação chuvosa. A infecção natural é adquirida pela
ingestão ou inalação. O local inicial da proliferação é supostamente a região das tonsilas. A endotoxina parece ser o principal fator de virulência responsável pelos sinais clínicos e óbito. Nos animais suscetíveis, uma sepse desenvolve­se
rapidamente e a morte se dá dentro de 8 a 24 h após o desenvolvimento dos primeiros sinais. P. multocida do tipo B dos casos de SH produz hialuronidase, enquanto P. multocida do tipo E não produz. A importância desta enzima no
processo da doença não é conhecida. Exotoxinas não foram demonstradas nas cepas B e E.
A taxa de mortalidade é alta quando o agente é introduzido em regiões não afetadas ou não endêmicas. As perdas variam amplamente nas áreas endêmicas. As maiores perdas ocorrem durante as chuvas de monção no Sudeste Asiático e
acredita­se que os microrganismos, que podem sobreviver durante horas e provavelmente dias em solos úmidos e água, são transmitidos extensamente neste período.
ACHADOS CLÍNICOS:  Muitos casos são agudos ou hiperagudos, resultando em morte dentro de 8 a 24 h após o início. Como o curso é muito curto, os sinais clínicos podem ser facilmente negligenciados. Os animais inicialmente apresentam
apatia, seguida de relutância em se movimentar, salivação profusa e secreção nasal serosa. Inchaço edematoso é frequentemente observado, começando na região da traqueia e estendendo­se até a região parotídea, pescoço, peito e períneo.
As membranas mucosas apresentam­se congestas. Há angústia respiratória e geralmente o animal se deita e morre dentro de horas. Alguns casos podem durar vários dias. A recuperação é rara. Aparentemente não há forma crônica.
Lesões:  As  alterações  mais  evidentes  nos  animais  afetados  são  edema,  celulite,  hemorragias  difusas  e  hiperemia  geral.  Acredita­se  que  a  coagulopatia  induzida  pela  endotoxina  juntamente  com  os  danos  nas  células  endoteliais  são  os
responsáveis pelas hemorragias observadas nos casos a campo de SH. Na maioria dos casos há inchaço edematoso na cabeça, pescoço e região do peito; uma incisão nestes inchaços revela um fluido seroso claro ou cor de palha. O edema
também é encontrado na musculatura e as hemorragias petequiais subserosas, que são encontradas por todo o animal, são características específicas. O fluido sanguinolento geralmente é encontrado no saco pericárdico e nas cavidades
torácica  e  abdominal.  As  hemorragias  petequiais  são  particularmente  proeminentes  nos  linfonodos  faringianos  e  cervicais.  As  gastrenterites  são  observadas  ocasionalmente  e,  ao  contrário  da  pasteurelose  pneumônica,  a  pneumonia
geralmente não é extensa.
DIAGNÓSTICO:  Algumas características epidemiológicas e clínicas auxiliam no reconhecimento da SH. Históricos de surtos anteriores e falhas vacinais recentes possuem significado particular. Os casos esporádicos são mais difíceis de
diagnosticar clinicamente. A estação do ano, o curso rápido e alta incidência no rebanho, com febre e inchaço edematoso, indicam SH típica. As lesões de necropsia características ajudam no diagnóstico. Embora não seja difícil reconhecer
clinicamente surtos típicos, especialmente nas regiões endêmicas, salmonelose aguda, antraz, pasteurelose pneumônica e peste bovina devem ser considerados.
O diagnóstico presuntivo é baseado no isolamento de P. multocida do sangue e dos órgãos vitais do animal com sinais típicos. O diagnóstico definitivo depende da identificação do sorotipo B:2 (ou sorotipo estritamente relacionado) ou
E:2. Outros sorotipos causam várias infecções em bovinos e bubalinos, mas não a SH típica. O teste de proteção passiva em camundongos, utilizando soro de coelho imune a B:2 e E:2, é utilizado na Ásia e na África para identificar esses
sorotipos. Testes mais precisos, como hemaglutinação indireta, coaglutinação, contraimunoeletroforese e teste de imunodifusão, estão disponíveis em alguns laboratórios.
Se  ocorrer  decomposição  pós­morte,  o  agente  causal  pode  ser  mascarado  devido  ao  crescimento  excessivo  de  outras  bactérias.  Nestes  casos,  a  inoculação  subcutânea  de  pequena  quantidade  de  sangue  e  suspensão  de  tecidos  em
camundongos ou coelhos facilita a recuperação da pasteurela em cultura pura ou quase pura.
Os testes sorológicos não possuem valor no diagnóstico. Entretanto, o teste de hemaglutinação indireta e o teste de proteção passiva em camundongos são válidos para a determinação do estado imune do animal.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO:  Várias sulfonamidas, tetraciclinas, penicilinas e cloranfenicol (onde o seu uso é permitido) são efetivos, se administrados precocemente. Em razão do curso rápido da doença e frequente dificuldade de acesso
ao animal, a terapia antimicrobiana geralmente não é muito praticável. Entretanto, é essencial que as concentrações bactericidas dos agentes antimicrobianos sejam alcançadas no sangue o mais rápido possível. Assim, a administração
inicial IV de medicamentos, seguida pela administração por via SC ou IM é recomendada. Embora a resistência a múltiplos antibióticos tenha sido relatada para algumas cepas de P. multocida, ela não foi descrita para os sorotipos da SH.
A  principal  forma  de  prevenção  é  por  meio  da  vacinação.  Três  tipos  de  vacina  são  amplamente  utilizadas:  bacterina  simples,  bacterina  precipitada  com  alumínio  e  bacterina  com  adjuvante  oleoso.  A  mais  efetiva  é  a  bacterina  com
adjuvante oleoso – uma dose protege por um período de 9 a 12 meses; ela deve ser administrada anualmente. A bacterina precipitada com alumínio é administrada em intervalos de 6 meses. Os anticorpos maternos interferem na eficácia da
vacina em bezerros. As vacinas com adjuvante oleoso não são populares devido à dificuldade de administração e reações teciduais adversas ocasionais. Uma vacina viva intranasal preparada com os sorotipos B:3,4 de cervos está sendo
utilizada  no  Sudeste  Asiático,  com  relatos  de  sucesso.  Tentativas  para  elucidar  a  imunidade  de  longa  duração  da  vacina  de  P.  multocida  dependente  de  estreptomicina  apresentaram  resultados  variáveis  em  bovinos  e  bubalinos.
Recentemente, uma vacina viva atenuada com P. multocida do tipo B administrada pela via IM parece proporcionar proteção adequada aos bezerros contra o desafio experimental. Os animais que sobrevivem à infecção natural geralmente
desenvolvem forte resposta imunológica à exposição futura de cepas homólogas e, frequentemente, heterólogas.
RISCO ZOONÓTICO:  Os sorotipos de P. multocida que causam SH não foram isolados de infecções humanas. Entretanto, como muitos sorotipos de P. multocida têm potencial para infectar os seres humanos, precauções adequadas devem ser
tomadas.

SÍNDROME ARTRITE­ENCEFALITE CAPRINA

A  infecção  pelo  vírus  da  artrite­encefalite  caprina  (AEC)  manifesta­se  clinicamente  como  polisinovite­artrite  em  caprinos adultos  e,  ocasionalmente,  como  paresia  progressiva  (leucoencefalomielite)  nos  animais  jovens.  A  pneumonia
subclínica ou clínica intersticial, a mastite endurativa (“úbere duro”) e a fraqueza crônica também são atribuídas à infecção por esse vírus. Entretanto, a maior parte das infecções pelo vírus da AEC é subclínica. A infecção pelo vírus da
AEC diminui a produtividade dos caprinos leiteiros e é uma barreira para a exportação de caprinos da América do Norte.
A infecção pelo vírus da AEC está difundida entre os caprinos leiteiros na maioria dos países industrializados, mas, raramente, é encontrada entre as raças de caprinos nativas dos países em desenvolvimento, a menos que esses animais
tenham tido contato com caprinos importados. Em países como Canadá, Noruega, Suíça, França e EUA, a soroprevalência do vírus da AEC é > 65%.
ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA E PATOGENIA:  O vírus da AEC é um lentivírus envelopado, constituído por RNA de fita simples e pertencente à família Retroviridae. Há vários isolados geneticamente distintos do vírus que diferem no grau de
virulência.
Sob condições naturais, o vírus da AEC parece ser hospedeiro­específico, porém, a infecção experimental de ovinos com este vírus é possível. O contato prolongado de ovinos saudáveis com caprinos infectados geralmente não resulta
em infecção ou soroconversão, mas, os cordeiros que mamam em cabras infectadas soroconvertem e desenvolvem infecção persistente. A inoculação experimental do vírus da AEC nas articulações de cordeiros produz artrite, soroconversão
e articulações vírus­positivas.
A infecção por vírus da AEC está amplamente difundida nas raças de caprinos leiteiros, sendo incomum nos caprinos produtores de carne e lã. Isto pode ser atribuído à genética, práticas de manejo, como o fornecimento de colostro e
leite de uma fêmea para múltiplos cabritos, e práticas de pecuária industrial (p. ex., frequente introdução de novos animais no rebanho). A prevalência da infecção aumenta com a idade, mas não é influenciada pelo sexo. A maioria dos
caprinos é infectada em idade precoce, permanecendo soropositivos por toda a vida e desenvolvendo a doença meses a anos depois.
O principal meio de transmissão da AEC é através da ingestão do colostro ou leite de cabras infectadas com o vírus pelos cabritos. O fornecimento da mistura de leite ou colostro de várias fêmeas para os cabritos é uma prática de risco,
uma vez que poucos animais infectados disseminarão o vírus para um grande número de cabritos. A transmissão horizontal também contribui para a propagação da doença dentro dos rebanhos e pode ocorrer pelo contato direto, exposição a
fômites em cochos e bebedouros, ingestão de leite contaminado nas salas de ordenha ou uso seriado de agulhas e equipamentos contaminados com sangue. As formas incomuns de transmissão, indicadas por estudos experimentais, incluem
a transmissão intrauterina para o feto, a infecção do filhote durante o parto e a infecção através de acasalamento ou transferência de embrião.
A patogênese da AEC não está totalmente esclarecida. Os macrófagos do leite e do colostro infectados com o vírus são absorvidos intactos pela mucosa intestinal. A infecção é subsequentemente disseminada pelo corpo via células
mononucleares infectadas. A replicação viral periódica e a maturação dos macrófagos induzem a lesões linfoproliferativas características nos tecidos alvos, como pulmões, membrana sinovial, plexo coroide e úbere. A persistência do vírus
da AEC no hospedeiro é facilitada pela sua capacidade de ser sequestrado como provírus nas células do hospedeiro. A infecção induz uma forte resposta imune humoral e mediada por células, mas nenhuma é protetora.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos são observados em aproximadamente 20% dos caprinos infectados pelo vírus da CAE durante toda a sua vida. A manifestação mais comum da infecção é a polisinovite­artrite, que é principalmente
observada nos caprinos adultos, mas que também pode ocorrer em cabritos com 6 meses de idade. Os sinais da polisinovite­artrite incluem distensão da cápsula articular e vários graus de claudicação. As articulações do carpo são as mais
frequentemente envolvidas. O início da artrite pode ser súbito ou lento, mas o curso clínico sempre é progressivo. Os caprinos afetados perdem a condição corporal e geralmente têm poucos pelos. A encefalomielite geralmente é observada
nos cabritos com 2 a 4 meses de idade, mas já foi descrita em cabritos mais velhos e em caprinos adultos. Os cabritos afetados geralmente exibem fraqueza, ataxia e déficit de postura dos membros pélvicos. Hipertonia e hiper­reflexia
também são comuns. Ao longo do tempo, os sinais progridem para paraparesia ou tetraparesia e paralisia. Depressão, inclinação da cabeça, andar em círculo, opistótono, torcicolo e movimentos de pedalagem também foram descritos. A
pneumonia intersticial devido à infecção pelo vírus da AEC raramente produz sinal clínico nos cabritos. Entretanto, em caprinos adultos com evidência sorológica de infecção pelo vírus da AEC, a pneumonia intersticial crônica, que leva a
dispneia progressiva, foi documentada. A síndrome do “úbere duro”, atribuída à infecção pelo vírus da AEC, é caracterizada por glândula mamária firme e inchada e agalactia no momento do parto. A qualidade do leite geralmente não é
afetada. Embora a glândula mamária possa amolecer e produzir de pouca até quantidades normais de leite, a produção permanece baixa em muitas cabras que apresentam mastite endurativa.
Lesões: As lesões patológicas da infecção pelo vírus da AEC geralmente são descritas como linfoproliferativas com infiltração degenerativa de células mononucleares. As lesões nas articulações são caracterizadas pelo espessamento da
cápsula articular e pela proliferação marcada das vilosidades sinoviais. Nos casos crônicos, a calcificação dos tecidos moles, envolvendo cápsulas articulares, bainhas dos tendões e bursa, não é incomum. Destruição grave da cartilagem,
ruptura dos ligamentos e tendões e formação de osteófitos periarticulares, também foram descritas em casos avançados. As características microscópicas das lesões articulares incluem hiperplasia das células sinoviais, infiltração subsinovial
de células mononucleares, hipertrofia de vilosidades, edema e necrose sinoviais. As lesões macroscópicas associadas à forma neurológica da AEC incluem áreas inchadas assimétricas e de coloração marrom avermelhada, principalmente
nos  segmentos  de  medula  espinal  cervical  e  lombossacral.  Histopatologicamente,  essas  lesões  são  caracterizadas  por  infiltrados  inflamatórios  multifocais  de  células  mononucleares  e  vários  graus  de  desmielinização.  No  exame
macroscópico, os pulmões dos caprinos afetados são firmes e de coloração rósea acinzentada com múltiplos focos brancos pequenos e sem colapso. Os linfonodos bronquiais estão invariavelmente aumentados. Os achados histológicos
incluem pneumonia intersticial crônica com infiltração de células mononucleares nos septos alveolares e nas regiões perivasculares e peribronquiais. Nas fêmeas com enduração do úbere, a infiltração mononuclear no estroma periductular
destrói o tecido da glândula mamária normal.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo pode ser baseado nos sinais clínicos e no histórico. Artrite infecciosa causada por Mycoplasma spp  e  artrite  traumática  são  diagnósticos  diferenciais  para  artrite  induzida  pelo  vírus  da  AEC.  O
diagnóstico  diferencial  para  a  paresia  progressiva  e  paralisia  exibida  pelos  cabritos  deve  incluir  ataxia  enzoótica,  abscesso  na  medula  espinal,  nematodíase  cerebrospinal,  traumatismo  de  medula  espinal  e  anormalidades  congênitas  da
medula e coluna espinal. Se o exame neurológico indicar envolvimento cerebral, polioencefalomalacia, listeriose e raiva devem ser consideradas como possíveis causas. A forma pulmonar da linfadenite caseosa pode ter apresentação
clínica similar à da forma pulmonar da AEC em caprinos adultos.
Tanto o teste de imunodifusão em gel de ágar quanto o ELISA são considerados métodos confiáveis para o uso em programas de controle. O teste de imunodifusão em gel de ágar é relatado como mais específico, porém menos sensível
do que o ELISA. Um resultado de teste positivo em um caprino adulto sugere infecção, mas não confirma que os sinais clínicos sejam causados pelo vírus da AEC. Os cabritos infectados ao nascimento desenvolvem uma resposta de
anticorpos mensurável 4 a 10 semanas após a infecção. Entretanto, os testes positivos nos cabritos < 90 dias de idade geralmente refletem a transferência de anticorpos colostrais. Os testes negativos não descartam a infecção pelo vírus da
AEC,  pois,  o  tempo  de  soroconversão  pós­infecção  é  variável  e,  ocasionalmente,  alguns  caprinos  possuem  títulos  muito  baixos  que  podem  não  ser  detectáveis.  Baixos  títulos  de  anticorpos  são  comuns  no  final  da  gestação.  Devido  às
limitações dos testes sorológicos, o diagnóstico definitivo da AEC requer a demonstração das lesões características nas amostras de biopsia ou à necropsia. O isolamento viral ou a PCR, para demonstrar a presença do antígeno viral nos
tecidos, podem ser utilizados posteriormente para comprovar o diagnóstico.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:  Não  há  tratamento  específico  para  qualquer  uma  das  síndromes  clínicas  associadas  à  infecção  pelo  vírus  da  AEC.  Entretanto,  os  tratamentos  de  suporte  podem  beneficiar  alguns  caprinos.  A  condição  dos
caprinos com polisinovite­artrite pode ser melhorada com o casqueamento regular, uso de cama adicional e administração de AINES, como a fenilbutazona ou o ácido acetilsalicílico. Os caprinos com encefalomielite podem ser mantidos
durante semanas com bons cuidados de enfermagem. A terapia antimicrobiana é indicada para o tratamento de infecções bacterianas secundárias que podem complicar a pneumonia intersticial ou a mastite endurativa devido à infecção pelo
vírus da CAE. A provisão de alimentos de alta qualidade e de rápida digestibilidade para os caprinos positivos para o vírus da AEC pode retardar o início da síndrome de emaciação.
Nos rebanhos comerciais, um ou mais dos seguintes itens são recomendados para o controle da AEC: (1) isolamento permanente dos recém­nascidos desde o nascimento; (2) fornecimento de colostro tratado termicamente (45°C por 60
min) e leite pasteurizado; (3) testes sorológicos frequentes do rebanho (semestralmente), com identificação e segregação dos caprinos soronegativos e soropositivos; e (4) eventual descarte dos caprinos soropositivos. Se o programa de
controle incluir a segregação do rebanho em grupos soronegativos e soropositivos, os grupos devem ser separados por uma distância mínima de 1,8m e os equipamentos compartilhados devem ser desinfetados com compostos fenólicos ou
de amônia quaternária.

DOENÇA DE GLÄSSER (Polisserosite suína, Poliartrite infecciosa)
Suínos podem ser infectados por diferentes microrganismos antes dos desmame, mas alguns destes microrganismos são potencialmente patogênicos. Esse é o caso de Haemophilus parasuis, um microrganismo comensal do trato respiratório
superior  de  suínos  que  causa  doença  sistêmica  grave  caracterizada  por  polisserosite  fibrinosa,  artrite  e  meningite.  A  doença  causada  por  H.  parasuis  surge  repentinamente,  seu  curso  é  breve  e  ocasiona  altas  taxas  de  mortalidade  e
morbidade. Os animais jovens (4 a 8 semanas de idade) são os mais suscetíveis, embora doença esporádica possa ser observada em adultos (p. ex., introdução de animais adultos suscetíveis em um rebanho normal). Sobreviventes podem
desenvolver fibrose grave nas cavidades abdominal e torácica, que pode resultar em menor taxa de crescimento e condenação da carcaça no abatedouro. A doença de Glässer é cosmopolita e sua incidência parece que aumentou a partir da
introdução da síndrome respiratória e reprodutiva, em suínos (ver p. 818).
ETIOLOGIA:   O  agente  etiológico,  H.  parasuis,  é  uma  pequena,  bactéria  Gram­negativa  pleomórfica  da  família  Pasteurellaceae  que  requer  a  suplementação  com  fator  V  (NAD),  mas  não  o  fator  X  (hemina)  para  crescimento.  No
laboratório, H. parasuis cresce no ágar chocolate enriquecido; pode também ser cultivada em ágar­sangue com colônia satélite de Staphylococcus. Entretanto, H. parasuius é fastidioso e seu isolamento em cultura pura de animais doentes
normalmente é difícil e frequentemente complicada devido ao tratamento com antibióticos. Foram relatados 15 sorovares de H. parasuis, porém alta porcentagem de isolados avaliados não foi tipificado. Há relato de ampla diferença na
virulência dos sorovares. Sorovares 1, 2, 4, 5, 12, 13, 14 e alguns isolados não tipificados são normalmente isolados no caso de doença sistêmica, enquanto sorovar 3 e outros isolados não tipificados são frequentemente isolados do trato
respiratório superior. Os fatores envolvidos na invasão sistêmica pelo H. parasuis são ainda desconhecidos. Além disso, a correlação entre sorovar e virulência não é clara, e cepas pertencentes ao mesmo sorovar podem variar quanto à
virulência. Sorotipagem tem sido também utilizada como base para estabelecimento de critério de vacinação, mas a proteção cruzada entre os diferentes sorovares é variável e difícil de prever. Portanto, métodos atuais de identificação e
caracterização de H. parasuis são principalmente a genotipagem (métodos de sequenciamento ou finger­print).
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos são observados principalmente em suínos com 4 a 8 semanas de idade, embora a idade dos animais infectados possa variar, dependendo da imunidade materna adquirida.
A doença hiperaguda tem curso breve e pode ocasionar morte súbita sem lesões macroscópicas características; nesses casos pode­se notar petéquia em alguns órgãos, indicando septicepmia.
Os sinais clínicos típicos de doença de Glässer aguda incluem febre alta (41,5°C), tosse intensa, respiração abdominal, inchaços articulares e sinais do SNC como decúbito lateral, movimentos de pedalagem e tremores. Esses sinais
podem apresentar­se isolados ou em conjunto. Em animais com doença crônica pode haver redução da taxa de crescimento em consequência de fibrose grave nas cavidades torácica e peritoneal.
Relata­se dispneia e tosse não normalmente associadas à doença de Glässer, juntamente com isolamento de H. parasuis de pulmões de suínos com broncopneumonia catarral purulenta e mesmo pneumonia fibrino­hemorrágica.
Lesões: Doença  hiperaguda  pode  causar  petéquias  em  alguns  tecidos,  não  sendo  observadas  lesões  macroscópicas.  Histologicamente,  esses  suínos  apresentam  lesões  microscópicas  semelhantes  a  sepse,  como  CID  e  micro­hemorragias.
Aumento do fluido nas cavidades torácica e abdominal, sem a presença de fibrina, pode também ser notado em casos hiperagudo.
As  infecções  sistêmicas  são  caracterizadas  pelo  desenvolvimento  de  polisserosite  fibrinosa,  artrite  e  meningite.  O  exsudato  fibrinoso  pode  ser  observado  na  pleura,  pericárdio,  peritônio,  sinóvia  e  meninges,  sendo  geralmente
acompanhado de aumento da quantidade de fluido. A pleurite fibrinosa pode ser acompanhada de consolidação anteroventral (broncopneumonia catarral purulenta). Ausência de lesões macroscópicas características é também comum em
suínos que apresentam sinais de SNC. Os animais com doença crônica geralmente têm fibrose grave na pleura e pericárdio, que pode ou não ser notada na cavidade peritoneal.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico se baseia na constatação de lesões e sinais clínicos característicos, juntamente com a detecção de H. parasuis em suínos infectados, mediante isolamento ou método molecular, como PCR.
Como  os  métodos  de  diagnóstico  atuais  não  diferenciam  isolados  virulentos  e  não  virulentos,  é  importante  obter  amostra  apenas  de  sítios  sistêmicos,  como  pleura,  pericárdio,  peritônio,  articulações  e  cérebro.  O  isolamento  de  H.
parasuis do trato respiratório superior não é relevante para o diagnóstico de infecção sistêmica. A obtenção de amostras coletadas de animais clinicamente acometidos que foram submetidos à eutanásia aumenta as chances de isolamento.
Os diagnósticos diferenciais de doença de Glässer incluem infecções por Streptococcus suis, Escherichia coli septicêmica, Actinobacillus suis, Mycoplasma hyorhinis, Erysipselothrix rhusiopathiae e Salmonella choleraesuis.
TRATAMENTO E CONTROLE:  H. parasuis é um dos poucos microrganismos Gram–negativos que pode ser tratado efetivamente com penicilina sintética. Outros antimicrobianos que são utilizados incluem ceftiofur, ampicilina, enrofloxacino,
eritromicina, tiamulina, tilmicosina, florfenicol e sulfonamidas potencializadas. Os tratamentos individuais devem ser administrados por via parenteral para se obter efeito significativo, e todos os suínos do grupo infectado (não apenas
aqueles que apresentam sinais clínicos) devem ser tratados. O tratamento preventivo pode ser fornecido por meio da água ou alimentos com a medicação. Tanto as vacinas comerciais como as autógenas podem ser utilizadas no controle da
infecção por H. parasuis, embora sua eficácia seja variável. A ampla variação de sorovares e genótipos potencialmente patogênicos tem impedido o desenvolvimento de uma vacina universal para H. parasuis. A proteção homóloga entre os
isolados do mesmo grupo de sorovar é relativamente satisfatória, enquanto a proteção heteróloga é restrita a alguns sorovares.
Em um futuro próximo, estudos de genotipagem e genômicos devem auxiliar a determinar a imunidade cruzada entre cepas, identificar linhagens de clones e genes virulentos e auxiliar no desenvolvimento de métodos de controle da
doença mais confiáveis.

DOENÇA DO EDEMA (Enterotoxemia por Escherichia coli)

A doença do edema é uma toxemia hiperaguda causada por patógenos específicos de Escherichia coli, que acomete principalmente suínos lactentes em fase de crescimento rápido. Outros termos utilizados para designar a doença incluem
“edema intestinal” ou “edema visceral”, em razão do edema marcante de submucosa do estômago e do mesocólon.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  A doença do edema é causada por E. coli hemolítica, que produz pili F18 e a toxina Shiga 2e (Stx2e, também conhecida como verotoxina 2e ou VT2e). O pili F18 possui duas variantes antigênicas, F18ab e
F18ac; F18ab possui características da doença do edema e o F18ac está associado principalmente E. coli enterotoxigênica. E. coli produtora de toxina  Shiga  está  associada  à  doença  do  edema  e  comumente  pertence a quatro sorotipos
específicos: O138:K81:NM, O139:K12:H1, O141:K85a,b:H4 e O141:K85ac:H4. Entretanto, outros sorotipos de E. coli podem ser implicados e cepas do soro–grupo O147 tem sido dominante em partes dos EUA nos últimos anos. Essas
cepas O147 tipicamente contêm flagelo H17, mas alguns têm H14 ou H19.
Os suínos se infectam inicialmente pelo ambiente contaminado ou por meio da porca. A disseminação da infecção entre animais confinados é facilitada pela grande quantidade de E. coli patogênica  excretada  por  suínos  infectados.
Algumas  cepas  de  E.  coli  que  causam  doença  do  edema  também  carreiam  genes  para  enterotoxinas  e  podem  causar  diarreia,  além  de  doença  do  edema.  A  ingestão  de  cepas  de  E.  coli  causadoras  da  doença  do  edema  é  seguida  de
colonização do intestino de suínos, onde as células do epitélio intestinal apresentam receptores para o pili F18. A expressão dos receptores está relacionada com a idade; assim, suínos jovens são menos suscetíveis à colonização do que os
animais idosos. Alguns suínos transmitem uma mutação específica em um gene necessário para a expressão dos receptores e, portanto, são resistentes à infecção.
A resistência/suscetibilidade é determinada por um único locus com o alelo de suscetibilidade dominante e um alelo resistente recessivo; com isso é possível a seleção de animais resistentes, que podem ser identificados por um simples
teste PCR que identifica a presença ou ausência da mutação específica. Há certa preocupação sobre a seleção para resistência a E. coli F18+ devido a associação muito alta entre a presença do marcador para resistência a E. coli F18+ e a
presença do marcador de suscetibilidade a estresse, verificada em suínos da raça Landrace Suíço. Entretanto, essa associação não foi constatada em suínos da raça Belga.
A toxina Shiga 2e, produzida no intestino de suínos infectados é responsável pela maioria dos sinais clínicos e lesões observadas. Essa citotoxina inibe a síntese proteica, ocasionando à morte celular. A toxina é absorvida no intestino e
alcança  o  endotélio  vascular  em  locais  específicos  que  supostamente  possuem  altas  concentrações  do  receptor  da  toxina  globotetraosil  ceramida.  Estudo  recente  mostrou  que  as  cepas  de  E.  coli  que  causam  doença  do  edema  podem
colonizar os linfonodos mesentéricos e ai produzir Stx2e. este pode ser um sitio adicional de absorção da toxina na corrente sanguínea. A toxina Stx2e liga­se prontamente as hemácias do suíno, as quais podem transportar a toxina para
vários locais do organismo. Locais que são altamente suscetíveis à toxina incluem a submucosa do estômago, o mesentério do cólon, tecidos cutâneos da fronte e das pálpebras, laringe e cérebro. As lesões no endotélio vascular resultam em
edema, hemorragia, coagulação intravascular e microtrombose.
Dietas com alto teor de proteínas aumentam a suscetibilidade dos suínos à doença. Os fatores associados ao desmame, inclusive o estresse ao misturar suínos, mudanças na dieta e perda de anticorpos do leite a partir do intestino, parecem
ser elementos importantes na exacerbação da suscetibilidade de suínos desmamados à doença.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os  sinais  clínicos  variam  desde  morte  hiperaguda,  com  ausência  de  sintomas,  até  envolvimento  do  SNC  com  ataxia,  paralisia  e  decúbito.  A  doença  do  edema  geralmente  ocorre  1  a  2  semanas  após  o  desmame  e
tipicamente envolve os animais mais saudáveis no grupo. A doença é observada ocasionalmente em leitões lactentes ou adultos. A taxa média de morbidade varia de 30 a 40% e a taxa de mortalidade em animais infectados frequentemente é
superior a 90%. É comum a ocorrência de edema periocular, tumefação da fronte e da região submandibular, dispneia e anorexia.
Lesões: A doença do edema é principalmente uma enfermidade vascular e as lesões macroscópicas consistem de edema subcutâneo e edema da submucosa do estômago, particularmente na região glandular da cárdia. O fluido do edema
geralmente é gelatinoso e pode se estender até o mesocólon. O edema pode ser acompanhado de hemorragia. Filamentos de fibrina podem ser encontrados na cavidade peritoneal e é possível notar fluido seroso em ambas as cavidades,
pleural e peritoneal. Microscopicamente, nota­se angiopatia degenerativa em artérias e arteríolas e necrose das células dos músculos lisos da túnica média. As lesões de encefalomalácia focal no tronco cerebral são características e acredita­
se que sejam decorrências da lesão vascular, ocasionando edema e isquemia.
DIAGNÓSTICO:   O  histórico  clínico  de  morte  hiperaguda  de  animais  saudáveis,  bem­condicionados  e  recém­desmamados,  juntamente  com  a  constatação  de  edema  periocular  e  extenso  edema  do  estômago  e  mesocólon  são  úteis  no
diagnóstico. É possível notar um guincho característico devido do edema de laringe. Diarreia pode preceder os sinais da doença do edema quando a E. coli responsável também contém genes para enterotoxinas. Tipicamente, o estômago se
apresenta repleto de alimentos secos. O diagnóstico é facilmente estabelecido no caso de surto, no qual é possível notar ampla variação e sinais clínicos e lesões,. O diagnóstico é mais difícil quando apenas alguns animais são infectados ou
quando a doença se manifesta em um grupo etário atípico. O isolamento e a caracterização da E. coli são necessários para o diagnóstico definitivo. A cultura de intestino delgado e de cólon tipicamente mostra um grande crescimento de E.
coli hemolítica, mas em alguns casos o microrganismo pode já não estar presente no intestino no momento da morte. É possível demonstrar que E. coli hemolítica isolada é causadora de doença do edema por meio de PCR com amplificação
dos genes para pili F18 e Stx2e. A sorotipagem do isolado auxilia no rastreamento da persistência de um tipo específico de agente em uma propriedade. No entanto, pili F18 não é rapidamente expresso in vitro e pode não ser detectado nos
microrganismos submetidos a culturas de rotina.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Em razão de início súbito e curso rápido da doença, o tratamento geralmente é ineficaz. Pode­se adicionar medicamento na agua de beber para proteger suínos assintomáticos em um rebanho no qual foram
detectados casos da doença. Deve­se determinar a sensibilidade antimicrobiana da bactéria isolada de um suíno doente; deve­se substituir a medicação caso não seja efetiva. O controle também é difícil. Várias abordagens experimentais se
mostraram efetivas, mas nenhuma até agora é econômica. Esses métodos incluem alimentação com alto teor de fibras e dieta com baixo teor de proteína, redução da quantidade de alimento fornecidos aos suínos desmamados, vacinação por
via  sistêmica  com  toxoide  Stx2e,  vacinação  oral  com E. coli não  toxigênica  com  F18+,  imunização  sistêmica  passiva  com  antitoxina  e  imunização  oral  passiva  com  anticorpos  anti­F18.  Imunização  via  mucosa  com  fímbrias  de  F18
purificadas tem sido pesquisado, mas mostrou­se inefetiva, possivelmente porque a porção da fímbria de F18 que se liga ao intestino é uma fração pequena da estrutura fimbrial total. Recentemente, proteção incompleta foi relatada após a
vacinação de suínos com a porção receptora da fímbria F18 conjugada com a fímbria F4.
DOENÇA VESICULAR SUÍNA

A  doença  vesicular  suína  (DVS)  é  tipicamente  uma  doença  transitória  dos  suínos  na  qual  aparecem  lesões  vesiculares  nos  pés,  focinho  e  boca.  As  lesões  não  causam  graves  perdas  na  produção  e  os  surtos  recentes  da  infecção  foram
principalmente subclínicos. Entretanto, a infecção é de grande importância econômica, pois deve ser diferenciada da febre aftosa. Além disso, sua erradicação é cara e embargos à exportação de suínos e produtos de origem suína muitas
vezes são impostas aos países não livres da DVS.
Embora já tenha ocorrido a infecção em trabalhadores de laboratório e o vírus possa estar presente em ovinos e bovinos, supõe­se que os suínos sejam os únicos hospedeiros naturais. A doença foi identificada pela primeira vez na Itália
em 1966 e, subsequentemente, em Hong Kong, Japão, Tailândia e outros 16 países da Europa. Embora o vírus da DVS tenha sido erradicado no Japão em meados da década de 1970 e na maioria dos países europeus em meados da década
de 1980, ele ainda manteve­se endêmico na Itália e causou surtos esporádicos da doença em outros países europeus durante a década de 1990 e em Portugal nos anos de 2003, 2004 e 2007.
ETIOLOGIA:  O agente causal é um enterovírus da família Picornaviridae. Ele pertence à espécie de enterovírus B humano e acredita­se ter evoluído do vírus Coxsackie B5 humano, com o qual tem estreitas relações antigênica e genética.
Há apenas um sorotipo do vírus DVS, embora os isolados possam ser diferenciados pelo tipo antigênico e genético e podem diferir na virulência. O vírus da DVS é transmitido pelo contato direto ou indireto, ou pela ingestão de suínos e de
produtos de origem suína infectados. A infecção ocorre pela via oral ou por meio de abrasões na pele, podendo ocasionar viremia, eliminação viral pelas fezes e vesículas generalizadas cuja ruptura libera grandes quantidades do vírus.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os sinais primários são lesões vesiculares  recentes  ou  cicatrizadas,  nos  pés,  especialmente  na  coroa  do  casco,  e  em  outras  áreas  como  boca,  lábios  e  focinho.  As  lesões  podem  ser  leves  ou  inaparentes,
especialmente quando os suínos são mantidos sobre pisos macios. As lesões são similares às da febre aftosa (p. 670), do exantema vesicular em suínos (p. 805) e da estomatite vesicular (p. 668), contudo, os suínos afetados não perdem a
condição e as lesões cicatrizam­se rapidamente. Sinais nervosos têm sido descritos, mas raramente observados a campo.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico é confirmado pelos testes laboratoriais de amostras de epitélio, de fezes ou de soro. A detecção viral é feita pela pesquisa de antígenos por meio de ELISA, pelo isolamento viral ou pela RT­PCR. A sorologia é
feita pela detecção de anticorpos por ELISA ou pelo teste de vírus neutralização.
CONTROLE:  Os países livres da doença podem permanecer assim pelo controle da importação de suínos e dos produtos de origem suína ou assegurando que os produtos de origem suína sejam tratados (por calor ou outro meio) para matar o
vírus. A alimentação dos suínos com restos de alimentos deve ser proibida ou regulada para assegurar um cozimento adequado. Qualquer suspeita de surto deve ser relatada às autoridades competentes. Caso a doença apareça, o controle é
feito por meio de medidas zoosanitárias, inclusive as restrições na movimentação dos suínos. Não há vacina comercialmente disponível. Rigorosa vigilância sorológica é necessária para detectar infecções subclínicas nos rebanhos e os
rebanhos sororreagentes devem ser submetidos à inspeção clínica e testes de eliminação viral. O vírus permanece infectante por longos períodos; por isso, a desinfecção das instalações, dos caminhões e equipamentos deve ser completa. Os
desinfetantes mais efetivos são os álcalis fortes, embora os hipocloritos ou iodóforos contendo ácido possam ser utilizados quando não houver a presença de material orgânico.

DOENÇAS CAUSADAS POR CIRCOVÍRUS SUÍNO (Síndrome da caquexia multissistêmica pós­desmame, Síndrome dermatológica e
nefropática suína)

Um novo contaminante de célula de rim de suínos da linhagem PK­15 (ATCC­CCL33), não citopatogênico, semelhante a picornavírus, foi descrito em 1974. Mais tarde, mostrou–se que esse microrganismo era um vírus sem envelope
pequeno, contendo DNA circular com filamento único; esse agente foi denominado circovírus suíno (CVS). Relata­se que há ampla ocorrência de anticorpos contra CVS em suínos e que a infecção experimental com esse vírus em suínos
não resultaram em doença clínica, sugerindo que o CVS não é patogênico.
Uma nova doença foi descrita no oeste do Canadá no início e a metade dos anos 1990. A etiologia era desconhecida e a enfermidade foi denominada síndrome da caquexia multissistêmica pós­desmame (SCMPD). Os suínos acometidos,
principalmente aqueles recém­nascidos, apresentavam, em especial, baixa taxa de crescimento, doença debilitante e/ou caquexia; o exame histopatológico era caracterizado por lesões inflamatórias sistêmicas. No final dos anos 1990, foi
isolado um vírus aparentemente novo semelhante ao CVS de suínos com SCMPD. O novo vírus era antigenicamente e geneticamente distinto do contaminante CVS de culturas de células PK­15. Subsequentemente, o CVS isolado de suínos
doentes foram denominados circovírus suíno tipo 2 (CVS2) e o CVS original de culturas de células PK­15 como circovírus suíno tipo 1.
O CVS2 foi posteriormente associado a várias síndromes em suínos. Portanto, a terminologia das doenças causadas por circovírus suíno (DCVS) foi proposta coletivamente como SCMPD (também conhecida como doenças associadas ao
CVS [DACVS], na América do Norte), falha reprodutiva associada ao CVS2, síndrome dermatológica e nefropática suína e pneumonia proliferativa e necrosante. Tremor congênito tipo AII foi também considerado como uma potencial
DCVS, mas a maioria dos dados disponíveis não sustenta essa afirmação. Apenas SCMPD é considerada causa de impacto relevante na produção mundial de suínos, mas a introdução de vacinas eficientes no mercado tem melhorado muito
as consequências da doença.
SCMPD é considerada uma doença multifatorial em que o CVS2 é o principal microrganismo infeccioso. O CVS2 deve, também, ser incluído na lista de diagnósticos diferenciais de agentes que causam problemas reprodutivos. Embora a
síndrome dermatológica e nefropática suína seja considerada uma DCVS, a confirmação de CVS2 bem como o antígeno relacionado com essa doença imune é falha. O complexo doença respiratória suína e pneumonia proliferativa e
necrosante também são condições clínicas e patológicas multifatoriais, respectivamente, e suas ocorrências podem ser concomitantes com infecções por CVS2 e/ou SCMPD.
ETIOLOGIA  E  PATOGENIA:   Os  circovírus  são  pequenos  (17  a  22  nm  em  diâmetro),  sem  envelopes  e  com  um  único  filamento  de  DNA  circular.  Há  dois  tipos  de  circovírus  suíno,  embora  apenas  CVS2  seja  considerado  patogênico.
Recentemente, estudos filogenéticos mostraram que existem pelo menos três genótipos de CVS2 (CVS2a, b e c). Estudos recentes sugerem que uma alteração de genótipo (de a para b; CVS2c, foi detectado na Dinamarca durante os anos de
1980), coincidindo com importantes surtos de SCMPD na América do Norte, Japão e alguns países da Europa. Não está claro se há diferença na patogenecidade entre ou dentro dos genótipos CVS2.
Pesquisas sorológicas mostram que o CVS2 está disseminado em suínos, independente da prevalência de SCMPD na fazenda. Resultados de estudos sorológicos retrospectivos indicam que o CVS2 tem infectado suínos por mais de 5
décadas.
Inicialmente, SCMPD foi identificada em grupos saudáveis que estavam livres da maioria dos patógenos suínos comuns. Entretanto, em condições de campo, suínos que mostram sinais clínicos de SCMPD normalmente são infectados
com agentes múltiplos, inclusive parvovírus suíno, vírus da síndrome respiratória e reprodutiva suína, Actinobacillus pleuropneumoniae, Pasteurella multocida, Haemophilus parasuis, Staphylococcus spp e Streptococcus spp.
Várias tentativas de reprodução experimental de SCMPD foram publicadas. Algumas tentativas recentes (utilizando tecidos homogeneizados de suínos com SCMPD ou isolado de CVS2) reproduziram lesões histológicas semelhantes à
SCMPD,  mas  não  a  condição  de  caquexia.  Entretanto,  estudos  ocasionais  subsequentes  reproduziram  a  doença  clínica,  bem  como  lesões  compatíveis  com  SCMPD,  utilizando  presumivelmente,  apenas  CVS2,  como  inóculo.
Consequentemente, sugeriu­se que a infecção por CVS2, ligada a outros cofatores, foi necessária para o desenvolvimento consistente completo da doença clínica. Atualmente, parece que vários fatores, como idade e origem dos suínos,
condições ambientais, genética, natureza do inóculo de CVS2 utilizado e o estado imunológico do suíno no momento da infecção por CVS2 têm participação relevante na reprodução experimental consistente da doença. Na verdade, o
modelo mais consistente e de alta repetibilidade de SCMPD tem sido obtido utilizando cofatores infecciosos e não infecciosos como desencadeantes. O mecanismo pelos quais outros vírus ou a imunoestimulação pode desencadear caquexia
em suínos infectados com CVS2 ainda é desconhecido. Altas cargas de CVS2 no sangue, linfonodos e outros tecidos e em vias de excreção potenciais são associadas à manifestação da doença.
Quando a doença multissistêmica e a caquexia são evidentes, a lesão ao sistema imune é a principal característica, sugerindo que os suínos acometidos apresentam imunodeficiência adquirida. Depleção de linfócitos em tecidos linfoides,
alterações de subpopulações de células mononucleares no sangue periférico e o padrão alterado da expressão de citocinas têm sido demonstrados em suínos com SCMPD natural e experimental.
A identificação das células que sustentam a replicação do CVS2 é ainda controversa. A grande quantidade de antígenos do vírus CVS2 presente em macrófagos e em células dendríticas de suínos acometidos parece ser decorrência do
acúmulo de partículas virais. Entretanto, as células epiteliais e endoteliais parecem ser o alvo principal para replicação do CVS2, bem como um pequeno número de macrófagos e linfonodos.
Muito pouco é conhecido sobre a patogênese de outras doenças clínicas associadas à infecção por CVS2. O CVS2 é capaz de replicar em fetos, bem como em embriões livre de zona pelúcida. Além disso, um experimento com embriões
expostos ao CVS2 e então transferidos a porcas receptoras sugeriu que a infecção pode ocasionar morte embrionária. Transmissão transplacentária de CVS2 foi demonstrada. Entretanto, estudos utilizando porcas prenhes inoculadas por via
intranasal mostraram resultados variados.
A  síndrome  dermatológica  e  nefropática  suína  é  considerada  uma  reação  de  hipersensibilidade  tipo  III,  na  qual  o  antígeno  presente  no  complexo  imune  é  desconhecido.  Tem­se  aventado  a  possibilidade  de  que  o  CVS2  pode  ser  o
antígeno,  mas  não  há  prova  definitiva  indicando  que  o  CVS2  causa  lesões  da  síndrome  dermatológica  e  nefropática  suína.  Há  evidências  indiretas,  como  título  de  anticorpos  séricos  contra  CVS2  significativamente  alto  nos  suínos
acometidos, em comparação com suínos saudáveis e com suínos com SCMPD.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  O CVS2 é considerado um vírus onipresente nos países que apresentam ou não a doença causada por circovírus suíno (inclusive SCMPD). Infecção pelo CVS2 e SCMPD também foi descrita em javalis.
A doença é cosmopolita.
A transmissão pode ser por contato direto com suínos infectados. CVS2 tem sido detectado em quase todas as vias de excreção potenciais, como secreções nasal, ocular e brônquico; saliva; urina; e fezes. O vírus pode ser encontrado no
sêmen, mas a relevância prática disso é desconhecida. Inseminação artificial de fêmeas com sêmen infectado por CVS2 tem mostrado resultados contraditórios; alguns estudos sugerem a possibilidade de problemas reprodutivos associados.
Embora sem comprovação, considera­se que o contato com fômites contaminados, a exposição a alimentos ou produtos biológicos contaminados, o uso múltiplo de agulhas hipodérmicas ou a picada de insetos pode desempenhar um papel
na transmissão.
O  CVS2  pode  persistir  no  suíno  por  vários  meses,  em  condições  experimentais  e  a  campo.  Suínos  convalescentes  podem  albergar  o  vírus  por  longo  tempo,  representando  importante  fator  na  transmissão  da  doença.  O  CVS2  é
razoavelmente resistente aos desinfetantes utilizados comumente e à radiação; provavelmente, caso não se adotem medidas sanitárias rigorosas ocorre acúmulo do vírus no ambiente e infecção de novos grupos de suínos suscetíveis. O
declínio do título de anticorpo colostral em suínos está associado a início de SCMPD em leitões novos ou em suínos em fase de terminação. Há relato de infecção transplacentária por CVS2, mas isso não se sabe se porcas com infecção
uterina são capazes de transmitir a infecção ou se, alternativamente, desenvolvem SCMPD clínica subsequente.
Alguns relatos sugerem que outros animais, além de suínos, podem ser infectados com CVS2 ou com vírus semelhante ao CVS. Entretanto, resultados de estudos sorológicos para pesquisa de anticorpos contra CVS em bovinos e outros
animais d e produção são contraditórios e a indução experimental da doença com CVS1 ou CVS2 em animais pecuários, além de suínos, não têm mostrado sucesso.
ACHADOS CLÍNICOS:  Com frequência, em unidades de engorda ocorre doença multissistêmica com perda de peso, em suínos com 8 a 18 semanas de idade, embora a doença possa também acometer suínos mais velhos ou mais jovens.
Tipicamente, a taxa de morbidade varia de 5 a 20% entre grupos de leitões mais velhos ou em fase de terminação. Ocasionalmente, a taxa de mortalidade em suínos com sintomas de SCMPD pode ser > 50%. Além de perda por morte, a
ocorrência de SCMPD em suínos em fase de terminação pode causar aumento substancial no tempo necessário para atingir o peso de mercado, resultando em perda econômica ao produtor. Retardo no crescimento, caquexia e dispneia são
os sinais clínicos mais frequentemente verificados nos surtos. Palidez, anemia, icterícia, diarreia e linfadenopatia inguinal palpável também são notadas em alguns suínos afetados. É possível notar febre baixa (40 a 41°C) que dura vários
dias. Superlotação, baixa qualidade do ar, troca de ar insuficiente e mistura de grupos etários diferentes parecem exacerbar o curso da doença. Normalmente, apenas alguns poucos suínos do grupo exibem caquexia. O início da doença pode
ser agudo, ocasionando morte dentro de poucos dias, em alguns suínos. Outros suínos manifestam uma doença mais crônica e não ganham peso ou crescem.
Falhas reprodutivas caracterizadas por abortos tardios e natimortos, na ausência ou presença de outros patógenos de trato reprodutivo bem conhecidos, parecem ser a característica da infecção clínica pelo CVS2, em suínos. Muitas dessas
anormalidades foram descritas na América do Norte e normalmente ocorrem em grupos de suínos em fase de crescimento. Com base em dados experimentais, sugere­se que o retorno ao cio se deve à morte embrionária decorrente de
infecção intrauterina pelo CVS2. Entretanto, não há dados a campo sobre essa ocorrência.
Síndrome dermatológica e nefropática suína pode afetar filhotes e suínos em crescimento e, esporadicamente, animais adultos. A prevalência da síndrome em grupos acometidos é relativamente baixa (< 1%), embora haja relato ocasional
de alta prevalência (> 20%). Suínos com doença aguda grave morrem dentro de poucos dias após o início de sinais clínicos, devido à insuficiência renal aguda, com aumento significante dos teores séricos de creatinina e ureia. Suínos
sobreviventes tendem a recuperar e ganhar peso em 7 a 10 dias após o início da síndrome. Suínos acometidos manifestam anorexia, depressão, prostração, andar rígido e/ou relutância em se movimentar, bem como temperatura normal ou
febre  discreta.  Os  sinais  clínicos  mais  óbvios  na  fase  aguda  é  a  presença  de  pápulas  e  máculas  vermelhas  a  roxas  irregulares  na  pele  dos  membros  pélvicos  e  região  perineal,  embora  a  distribuição  pode  ser  generalizada  em  animais
gravemente acometidos. Com o tempo, as lesões se tornam recobertas por crostas escuras e gradualmente desaparecem (normalmente em 2 a 3 semanas), às vezes deixando cicatrizes.
Lesões: SCMPD é diagnosticada com base nas características histopatológicas verificadas nos suínos acometidos. Macroscopicamente, os linfonodos podem estar substancialmente aumentados e pálidos ao corte, o timo apresenta atrofia e as
tonsilas  são  mais  delgadas  que  o  normal.  Infarto  esplênico  também  pode  ser  notado  em  pequeno  número  de  suínos  com  SCMPD.  Histopatologicamente,  as  lesões  linfoides  são  características,  com  depleção  linfocítica  e  inflamação
granulomatosa, às vezes com células gigantes multinucleadas e corpúsculos de inclusão intracitoplasmáticos botrioides anfofílicos de diferentes tamanhos, causados por acúmulo de partículas de CVS2.
Lesões  no  pulmão  são  comuns  em  suínos  afetados;  a  gravidade  é  influenciada  pela  duração  da  doença  e  presença  de  infecções  concomitantes.  Lesões  pulmonares  macroscópicas  podem  incluir  desde  insuficiência  até  colapso,
endurecimento,  edema  pulmonar  difuso,  mosqueamento  e  consolidação.  Microscopicamente,  pode  ser  notado  grau  variável  de  pneumonia  intersticial  linfo­histiocítica  à  pneumonia  brônquica  granulomatosa  com  bronquiólise  e  fibrose
bronquiolar.
Macroscopicamente, o fígado pode parecer ictérico e/ou atrofiado em pequeno número de suínos afetados. Tecido conectivo interlobular pode ser proeminente. As lesões microscópicas variam desde uma necrose celular única (apoptose),
com discreta infiltração linfocítica nas zonas portais, até extensa hepatite linfo­histiocítica periporta com necrose difusa de hepatócitos. Os rins podem estar aumentados e mostram focos esbranquiçados dispersos ou difusos na superfície
cortical. As lesões microscópicas incluem infiltração linfo­histiocítica intersticial. Outras lesões notadas nos suínos acometidos incluem úlcera gástrica (provavelmente devido, em parte, ao período de fixação prolongado em suínos com
doença crônica) e miocardite linfo­histiocítica multifocal. Em suínos gravemente afetados, pode ser constatado infiltrado linfo­histiocítico praticamente em todos os tecidos.
Há poucos relatos de lesões em tecidos reprodutivos causadas pela infecção por CVS2. Relatam­se que os natimortos e os leitões recém­nascidos não viáveis apresentam congestão passiva crônica do fígado e hipertrofia cardíaca com
áreas multifocais de manchas no miocárdio. A característica histopatológica principal é fibrose e/ou necrose do miocárdio em fetos.
A síndrome dermatológica e nefropática suína é fácil de detectar do ponto de vista clínico, em razão da presença das pápulas e máculas vermelhas a pretas, as quais correspondem microscopicamente à necrose e hemorragia secundária à
necrose de capilares e arteríolas da derme e da hipoderme. Vasculite necrosante é uma característica sistêmica, porém mais evidente na pele, na pelve renal, no mesentério e no baço (também pode ocorrer infarto esplênico como decorrência
de vasculite necrosante de artérias e arteríolas esplênicas). À parte de lesões cutâneas, os suínos que morrem subitamente devido à síndrome dermatológica e nefropática suína têm rins firmes e aumentados bilateralmente, com uma camada
cortical granular fina e edema na pelve renal. O córtex renal apresenta lesões pequenas múltiplas na forma de pontos avermelhados, similares a petéquias hemorrágicas, os quais microscopicamente correspondem a glomérulos aumentados e
inflamados  (glomerulopatia  fibronecrosante).  Histologicamente,  também  nota­se  nefrite  intersticial  não  purulenta  moderada  a  grave,  com  dilatação  de  túbulos  renais.  Normalmente,  ambas  as  lesões,  renais  e  cutâneas,  são  verificadas;
todavia,  em  alguns  casos  as  lesões  de  pele  e  as  lesões  renais  podem  ocorrer  sozinhas.  Os  linfonodos  podem  estar  aumentados  e  avermelhados  devido  à  drenagem  de  sangue  de  áreas  hemorrágicas  (principalmente  a  pele).  No  exame
histopatológico normalmente constatam­se lesões semelhantes à SCMPD, como depleção de linfócitos e infiltração de histiócitos e/ou de células gigantes multinucleadas (embora menos grave) em tecidos linfoides de suínos acometidos.
DIAGNÓSTICO:  A definição de SCMPD incluem três principais critérios diagnósticos: 1) sinais clínicos de caquexia ou doença debilitante, 2) presença de lesões macro e microscópicas (moderadas a graves) características da doença, e 3)
presença  de  antígeno  ou  DNA  viral  (teor  moderado  a  alto)  nas  lesões  linfoides  microscópicas.  Para  a  visualização  de  DNA  e  antígeno  viral  nas  lesões  normalmente  se  utiliza  hibridação  e  imunoistoquímica  in  situ,  respectivamente.
Recentemente, propôs­se a definição de caso de rebanho, incluindo 2 principais critérios: 1) aumento significativo da taxa de mortalidade e do número de suínos anões ou suínos que falham em ganhar peso ou crescer, em comparação com
os valores prévios comuns na fazenda, e 2) obediência a 3 critérios individuais listados abaixo, em pelo menos 1 de cada 5 suínos examinados. Diagnósticos diferenciais incluem condições que causam aumento da taxa de mortalidade e
retardo do crescimento, como síndrome reprodutiva e respiratória suína, doença respiratória crônica, doença de Glässer, salmonelose e adenomatose intestinal suína.
Como o CVS2 é onipresente e o vírus replica em suínos, individualmente, por semanas a meses, o isolamento do vírus, a detecção de DNA do CVS2 no soro ou em tecidos, ou a detecção de anticorpos contra CVS2 no soro não é
suficiente para estabelecer o diagnóstico de SCMPD. Anticorpos contra CVS2 podem ser detectado por ELISA, imunofluorescência indireta ou coloração com imunoperoxidase de culturas de células infectadas. O isolamento viral pode ser
feito em várias linhagens de células de suínos (principalmente em células do rim), utilizando soro, lavado broncoalveolar ou homogeneizado de tecidos. O DNA viral pode ser detectado utilizando PCR, na maioria dos tecidos ou no soro de
suínos infectados. Várias amostras de tecidos de múltiplos suínos podem ser necessárias para detecção do vírus, no caso de doença crônica. A quantificação do vírus no soro por meio de PCR quantitativa em tempo real tem sido sugerida
como um método de diagnóstico potencial em suínos vivos. Entretanto, infecção por CVS2 é extremamente comum em suínos clinicamente normais e a interpretação do resultado positivo no teste PCR não é confiável.
O diagnóstico de problemas reprodutivos associados à infecção por CVS2 deve seguir os seguintes critérios: 1) abortos em gestação avançada e natimortos, às vezes com hipertrofia do coração fetal, 2) miocardite necrosante e/ou fibrose
extensa, e 3) grande quantidade de CVS2 nas lesões miocárdicas e em outros tecidos do feto. Diagnósticos diferenciais para falha reprodutiva associada à infecção por CVS2 incluem síndrome reprodutiva e respiratória suína, pavovirose
suína, pseudorraiva (doença de Aujeszky), leptospirose e outras doenças que causam aborto tardio, natimortos e leitões fracos.
O diagnóstico da síndrome dermatológica e nefropática suína é relativamente simples e inclui 2 principais critérios: 1) presença de lesões hemorrágicas e necrosantes na pele, principalmente nos membros pélvicos e na região perineal,
e/ou rim pálido e edemaciado com petéquias generalizadas na cortical, e 2) presença de vasculite necrosante sistêmica e gromerulonefrite necrosante e fibrinosa. Do ponto de vista de diagnóstico, a detecção de CVS2 não é incluída nos
critérios de diagnóstico.
Diagnósticos diferenciais da síndrome dermatológica e nefropática suína dependem das lesões mais significantes. Manifestações cutâneas podem ser confundidas com peste suína clássica, peste suína africana, erisipela suína, salmonelose
séptica, infecção por Actinobacillus suis, síndrome do estresse suíno, eritema transitório (pisos com urina, queimaduras químicas etc.) e outras sepses bacterianas. Diagnósticos diferenciais de lesões renais incluem peste suína africana e
peste suína clássica, erisipela suína e salmonelose séptica. A análise do perfil bioquímico sérico pode auxiliar na diferenciação da síndrome dermatológica e nefropática suína de outras doenças; os teores de ureia e creatinina encontram­se
muito aumentados.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Como a SCMPD é uma doença multifatorial, medidas de controle efetivas antes do advento das vacinas contra CVS2 visavam o controle e a erradicação dos fatores desencadeantes. As medidas de controle
mais amplamente utilizadas eram o uso de anticorpos para prevenir infecções bacterianas concomitantes, melhoria das medidas de biossegurança e sanitárias, como isolamento dos suínos infectados e desinfecção dos recintos após o seu
uso, diminuição dos fatores estressantes (p. ex., alta densidade populacional no grupo, ventilação inadequada, controle de temperatura inapropriado), e controle de infecções virais concomitantes, especialmente síndrome reprodutiva e
respiratória suína. Outra medidas de prevenção e controle anteriormente utilizadas para suínos jovens eram antecipação do tempo de início de injeções de vitaminas, injeção IP de soro obtido de suínos em fase de terminação e vacinação
contra patógenos comuns.
Atualmente, o controle de SCMPD é baseado no uso de vacinas contra CVS2. Há 4 vacinas comercializadas no mundo; a disponibilidade depende da aprovação em diferentes países. A primeira vacina comercial é composta de CVS2
inativado e foi aprovada para uso em fêmeas e marrãs. Posteriormente, outras 3 vacinas foram desenvolvidas, todas para uso em leitões com 2 a 3 semanas de idade, ou mais. Duas dessas vacinas são compostas de subunidades (proteína do
capsídio do CVS2 produzido em um sistema que emprega baculovírus) e a terceira é composta de vírus inativado elaborada substituindo o gene do capsídio do CVS1 não patogênico por aquele do CVS2. Além da significante redução da
taxa de mortalidade e de nanismo, essas vacinas parecem melhorar a uniformidade do lote e do peso ao abate, a taxa de conversão alimentar e a média de ganho de peso diário.
Todas essas vacinas comerciais contra CVS2 são compostas de isolados de CVS2a, mas foi demonstrada proteção cruzada contra CVS2b. Todas as vacinas contra CVS2 são capazes de induzir ambas as respostas imunes, celular e
humoral, as quais são as características fundamentais para o controle de infecção subsequente por CVS2, que ocorre em condições de campo.
Nenhum  tratamento  é  comprovadamente  efetivo  para  a  síndrome  dermatológica  e  nefropática  suína.  Hospitalização  imediata  e  cuidados  de  suporte  podem  permitir  a  sobrevivência  de  alguns  poucos  suínos.  Apenas  aqueles  casos
epizoóticos, com taxas de morbidade e mortalidade moderadas a altas, podem ser importantes em termos de perda econômica. Tratamento com antimicrobianos de amplo espectro não tem sido efetivo. Como o antígeno responsável pela
síndrome dermatológica e nefropática suína não é conhecido, não são indicadas medidas preventivas.

ENCEFALOMIELITE HEMAGLUTINANTE (Doença do vômito e emaciação, Encefalomielite por coronavírus)

Essa doença viral de suínos jovens caracterizada por vômito, constipação intestinal e anorexia resulta tanto em morte rápida como em emaciação crônica. Distúrbios motores devido à encefalomielite aguda (encefalomielite hemaglutinante)
também pode ser notado durante alguns surtos.
ETIOLOGIA, EPIDEMIOLOGIA E PATOGÊNESE:  O coronavírus causador, o vírus da encefalomielite hemaglutinante, é um tipo antigênico particular e cresce em vários tipos de culturas celulares suínas, nas quais provoca sincícios. Aglutina
hemácias de várias espécies animais. Os suínos são os únicos hospedeiros naturais. O vírus é disseminado por meio de aerossol.
A infecção parece estar disseminada na América do Norte, Europa Ocidental e Austrália. Em geral, permanece subclínica. O vírus é endêmico na maioria dos rebanhos reprodutores e em rebanho imune. As porcas imunes transferem os
anticorpos maternos para seus leitões, que ficam protegidos até que atinjam idade de resistência; desse modo, os surtos clínicos são raros. No entanto, se o vírus infectar um rebanho suscetível com leitões neonatais, as taxas de morbidade e
mortalidade podem ser altas.
O  vírus  se  replica  primeiramente  na  mucosa  nasal,  tonsilas,  pulmões  e,  em  extensão  muito  limitada,  no  intestino  delgado.  Desses  locais  de  entrada,  o  vírus  invade  o  núcleo  definido  do  bulbo  via  sistema  nervoso  periférico  e,
subsequentemente, alcança o tronco cerebral e, possivelmente, cérebro e cerebelo. Supostamente, o vômito é provocado pela replicação viral no gânglio sensorial vagal. A emaciação se deve ao vômito e ao retardo de esvaziamento do
estômago, resultante de lesões induzidas pelo vírus no plexo intramural. A infecção de neurônios cerebrais e cerebelares podem raramente causar distúrbios motores.
ACHADOS CLÍNICOS:  Ambas as síndromes clínicas, vômito e doença debilitante (VDD) e encefalite, se limitam quase que exclusivamente aos suínos < 4 semanas de idade. A forma de VDD tem período de incubação de 4 a 7 dias. Notam­
se ânsia e vômitos repetidos. Os suínos começam a mamar, mas logo param, afastam­se da porca e vomitam o leite que ingeriram. Eles mergulham suas bocas nas tigelas de água, mas bebem pouco, o que possivelmente é indicativo de
paralisia faringiana. O vômito persistente resulta em rápido declínio da condição corporal. Os suínos neonatos ficam desidratados, cianóticos, comatosos e morrem. Os suínos idosos continuam a vomitar, embora com menor frequência que
no estágio inicial da doença. Eles perdem o apetite e se tornam emaciados. Uma grande distensão do abdome cranial pode se desenvolver. Esse estado de “emaciação” pode persistir durante 1 a 6 semanas até morrerem de inanição. A taxa
de mortalidade aproxima­se de 100% na ninhada e os sobreviventes tornam­se permanentemente subdesenvolvidos.
A forma de encefalomielite também se inicia com vômito, geralmente 4 a 7 dias após o nascimento. O vômito continua intermitentemente por 1 a 2 dias, mas raramente é grave e não resulta em desidratação. Depois de 1 a 3 dias,
observam­se tremores musculares generalizados e hiperestesia. Os suínos tendem a andar para trás, geralmente terminando na posição de “cão sentado”. Eles logo se tornam fracos e incapazes de se levantarem e “apresentam movimentos
de pedalagem” dos membros. Também, nota­se cegueira, opistótono e nistagmo. Após poucos dias, apresentam dispneia, coma e morrem.
Do início ao desaparecimento, um surto em uma fazenda dura de 2 a 3 semanas. O desaparecimento da doença coincide com o desenvolvimento da imunidade em porcas em fase final de gestação, o que subsequentemente protege a
ninhada via anticorpos maternos.
Lesões: Nota­se caquexia e distensão abdominal em suínos com infecção crônica. Apresentam estômago dilatado e preenchido com gás. Microscopicamente, verifica­se manguito perivascular, gliose e degeneração neuronal na medula em 70
a  100%  dos  suínos  com  sinais  nervosos  e  em  20  a  60%  dos  suínos  que  apresentam  VDD.  Neurite  de  gânglios  sensoriais  periféricos,  particularmente  do  gânglio  trigêmeo,  é  uma  ocorrência  comum.  Degeneração  do  gânglio  da  parede
estomacal e manguito perivascular são notados em 15 a 85% dos suínos com VDD. As lesões são mais evidentes na região pilórica glandular.
DIAGNÓSTICO:  Na rotina, o diagnóstico laboratorial pode ser realizado mediante isolamento viral no tronco cerebral, caso os suínos sejam submetidos à eutanásia dentro de 2 dias após o aparecimento dos sintomas. É difícil isolar o vírus de
suínos infectados há mais de 2 dias.
Um aumento significante do título de anticorpos pode ser constatado em amostras do soro pareadas. A amostra de soro da fase aguda deve ser obtida imediatamente após o início da doença, pois os suínos podem já ter estabelecido um
baixo título de anticorpos quando surgem os primeiros sinais clínicos.
O diagnóstico diferencial inclui pseudorraiva (p. 1419) e encefalomielite causada por teschovírus (p. 1409). Sintomas respiratórios em suínos idosos e abortamento em porcas são parte de um surto de pseudorraiva. Na encefalomielite por
teschovírus, normalmente são envolvidos os suínos idosos.
CONTROLE:  Não há tratamento. Uma vez que os sinais clínicos tornam­se evidentes, a doença segue seu curso. Recuperação espontânea é rara. Os leitões nascidos de porcas não imunes durante um surto podem ser protegidos por meio da
injeção, ao nascimento, tanto de soro hiperimune como de soro proveniente de porcas selecionadas aleatoriamente por ocasião do abate. Entretanto, o lapso de tempo entre o diagnóstico e o fim da doença geralmente é muito curto para que
esse procedimento seja efetivo. A manutenção do vírus na fazenda (e, assim, de persistência de imunidade induzida natural nos suínos) evita surtos em leitões.

EXANTEMA VESICULAR DOS SUÍNOS (Virose dos leões­marinhos de San Miguel)

O exantema vesicular dos suínos (EVS) é uma doença aguda altamente infecciosa, caracterizada por febre e formação de vesículas no focinho, mucosa oral, sola dos pés, coroa do casco e entre os dedos.
Desde 1972, um vírus indistinguível do vírus do EVS (VEVS), designado como vírus dos leões­marinhos de San Miguel (VLMSM), tem sido isolado a partir de suabes retais e da orofaringe de filhotes de leões­marinhos da Califórnia
prematuros e com 4 meses de idade, filhotes de otária desmamados e mortos e filhotes lactentes de elefantes­marinhos. O vírus também foi isolado de lesões vesiculares de mamíferos marinhos, da carne comercial de foca produzida no
Alasca e de peixes do tipo perca, coletados de piscinas de maré na costa sul da Califórnia. Os VLMSM isolados tanto de peixes como de mamíferos marinhos são capazes de produzir o EVS nos suínos. Além disso, os calicivírus isolados a
partir de suabes retais e da orofaringe de bezerros leiteiros também causam exantema vesicular clínico nos suínos expostos. Um sorotipo de calicivírus, VLMSM­5, foi recuperado de lesões vesiculares nas palmas e plantas do pé de um
pesquisador que trabalhava com o vírus.
EVS, VLMSM e outros vírus relacionados são membros do gênero Vesivírus, família Caliciviridae. Vários sorotipos imunologicamente distintos têm sido demonstrados (13 tipos do VEVS de suínos e pelo menos 16 tipos de VLMSM de
fontes marinhas). Além disso, vários sorotipos têm sido nomeados de acordo com a espécie hospedeira na qual foram isolados: bovina, primata, cetácea, morsa, gambá, vison, coelho e calicivírus de répteis. Em alguns casos, os sorotipos
inicialmente isolados em animais terrestres (p. ex., calicivírus de répteis) foram encontrados posteriormente em mamíferos marinhos. Todos estes vírus (exceto VLMSM­8, VLMSM­12 e calicivírus de vison) constituem uma única espécie,
o vírus do exantema vesicular dos suínos.
Nos suínos, a doença clínica é indistinguível da febre aftosa (p. 670), da estomatite vesicular (p. 668) e da doença vesicular suína (p. 797). Originalmente restrita à Califórnia, o EVS tornou­se muito difundido nos EUA, durante a década
de 1950, mas uma campanha vigorosa para a erradicação da doença obteve sucesso. Em 1959, os EUA foram declarados livres do EVS e a doença foi classificada como uma doença exótica; ela nunca foi descrita como uma infecção natural
dos suínos em nenhuma outra parte do mundo.
O diagnóstico presuntivo nos suínos baseia­se na ocorrência de febre e na presença de vesículas típicas, que se rompem entre 24 e 48 h para formar erosões. O diagnóstico pode ser confirmado pelo ELISA, RT­PCR (inclusive RT­PCR
em tempo real) e microscopia eletrônica do tecido epitelial ou após a passagem em culturas de tecido suíno. Os testes de soroneutralização e microscopia imunoeletrônica também são utilizados.
Os casos suspeitos de exantema vesicular suíno devem ser notificados imediatamente às autoridades competentes. Os restos alimentares e os peixes devem ser cozidos antes de oferecidos aos suínos.

INFECÇÃO PELO VÍRUS DA ENCEFALOMIOCARDITE

A encefalomiocardite (EMC) é uma infecção viral importante de suínos e de mamíferos de zoológico. É causada por membros do gênero Cardiovírus, da família Picornaviridae, conhecido em várias partes do mundo. Embora todos os vírus
causadores de EMC se apresentem como um único sorotipo, vírus isolados em várias regiões e países podem diferir quanto a patogenicidade e virulência.
O suíno pode morrer subitamente em qualquer idade devido a insuficiência miocárdica associada ou pode ocorrer abortos próximo ao parto, mumificação fetal e insuficiência reprodutiva evidente. Cepas do tipo A causam problemas
reprodutivos em suínos, enquanto cepas do tipo B causam insuficiência cardíaca. A maioria dos surtos de infecção pelo vírus da EMC tem sido associada a animais mantidos em cativeiro em unidades de produção de suínos, primatas de
centros de pesquisa e em animais de zoológicos. Morte súbita frequentemente é a primeira indicação de infecção. Uma variedade de mamíferos exóticos tem sido afetada fatalmente com EMC em parques zoológicos nos EUA, Austrália e
outras  partes  do  mundo,  inclusive  elefante  africano,  rinoceronte,  hipopótamo,  bicho­preguiça,  lhama,  várias  espécies  de  antílope  e  vários  tipos  de  primatas  não  humanos  (chimpanzé,  orangotango,  babuíno,  macaco,  lêmure  etc.).  Um
episódio que levou à morte de leões em um zoológico nos EUA estava associado ao consumo de carcaça de elefante africano que havia morrido devido a EMC, e um surto espontâneo de EMC fatal foi relatado em elefantes africanos de
vida livre no Parque Nacional de Kruger, na África do Sul em 1995.
Vírus da EMC raramente são considerados causa de doença em pessoas; em humanos, não há relato de miocardite grave e infecção fatal aguda verificadas em várias outras espécies. Todavia, pesquisas sorológicas revelaram que a
infecção por vírus da EMC em humanos é comum em várias partes do mundo; na maioria dos casos é assintomática ou não detectada.
EPIDEMIOLOGIA:  Os cardiovírus são vírus pequenos, sem envelopes e quase sempre associados a roedores e a doença em outras espécies mamíferas tem sido frequentemente atribuídas ao aumento das populações de camundongos e ratos.
Essas, e provavelmente outras espécies de roedores, excretam o vírus nas fezes e urina, que podem contaminar alimentos e fontes de água de grandes mamíferos. A ingestão de roedores mortos ou que portadores de EMC pode ser outro
modo de infecção. Os suínos excretam vírus na secreção nasal e nas fezes durante os 3 primeiros dias de infecção experimental. Nesse breve período, o vírus pode ser transmitido a outros suínos, por contato. Os cardiovírus são resistentes
às condições adversas do ambiente e podem permanecer não infectantes por semanas a meses, sob condições favoráveis.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   A  doença  é  denominada  encefalomiocardite  pela  predileção  pelo  SNC  e  sistema  cardiovascular  em  camundongos  experimentais,  em  que  tanto  cepas  encefalotrópicas  quanto  cardiotrópicas  foram
identificadas. Entretanto, em suínos e animais de zoológico a ocorrência de mortes agudas e subagudas são quase sempre atribuídas aos efeitos destrutivos do vírus no miocárdio, resultando em insuficiência cardíaca, edema pulmonar e
transudação espumosa no trato respiratório. Os animais infectados frequentemente parecem asfixiados pelo fluido contido em seu próprio trato respiratório. Outros sinais clínicos podem incluir: febre, anorexia, apatia, tremores, cambaleio,
dispneia e paralisia. Há relato de taxa de mortalidade de aproximadamente 100% em leitões lactentes, mas é muito menor em animais mais velhos. Foram identificadas cepas do vírus da EMC com tropismo ao pâncreas e diabetogênicas em
camundongos experimentais, porém a importância desse achado em outros mamíferos foi estabelecida.
Sabe­se que o vírus da EMC atravessa a placenta de porcas e foi isolado de crias em casos de falhas reprodutivas devido à ocorrência de aborto próximo ao parto (107 a 111 dias de gestação), natimortos e mumificações. Os problemas
reprodutivos frequentemente persistem nos grupos afetados por 2 a 3 meses e podem acometer fêmeas com qualquer número de partos.
DIAGNÓSTICO:  Como  as  lesões  necrosantes  pálidas  do  músculo  cardíaco,  que  podem  ser  observadas  na  EMC  fatal,  também  são  constatadas  no  infarto  séptico  ou  na  deficiência  de  vitamina  E/selênio,  o  diagnóstico  definitivo  requer  o
isolamento e a identificação do vírus. Coração, fígado, rim e baço, coletados de animais com morte aguda ou de material de aborto, são as amostras de escolha para isolamento do vírus. Como o vírus da EMC é muito estável, ele pode ser
recuperado em tecidos congelados.
É possível o diagnóstico sorológico mediante neutralização viral, inibição da hemaglutinação ou ELISA, desde que se obtenham amostras de soro na fases aguda e na fase de convalescência, mas a frequência de EMC subclínica torna as
determinações séricas isoladas pouco válidas em fêmeas que abortaram. Entretanto a detecção de anticorpo contra vírus da EMC em natimortos ou em fetos mumificados grandes é relevante na infecção fetal, porque as imunoglobulinas
maternas não atravessam a placenta de porcas.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Não há tratamento específico para EMC, mas a mortalidade pode ser minimizada evitando­se estresse ou excitação em animais em risco. Parece que o vírus da EMC apresenta um ciclo em roedores e mais
provavelmente  infecta  suínos  e  animais  de  zoológicos  quando  há  alta  população  de  roedores.  Desse  modo,  é  fundamental  o  controle  de  roedores  para  minimizar  a  exposição  de  espécies  suscetíveis.  Também,  recomenda­se  o  descarte
imediato e apropriado dos animais mortos em decorrência da doença. O vírus da EMC é inativado pelo uso criterioso de vários desinfetantes indicados para animais de produção.
Foram patenteadas vacinas mortas para prevenção de miocardite em leitões desmamando, porém não estão disponíveis comercialmente nos EUA, exceto como produtos autógenos. O ímpeto atual para o desenvolvimento de vacinas se
deve largamente aos zoológicos e parques de diversão, onde a ocorrência de EMC é um problema. Há relato de sucesso com o uso de vacina de vírus atenuado por meio de engenharia genética em primatas, suínos e várias espécies de
animais de zoológicos que apresentam casco. Produção comercial de vacina contra vírus da EMC é limitada porque, aparentemente, não é necessária na maioria dos animais de produção domésticos.

INFECÇÃO POR VÍRUS NIPAH (Síndrome respiratória e neurológica suína, Síndrome da tosse suína)

A infecção pelo vírus Nipah é uma doença recentemente diagnosticada em suínos e pessoas, associada a um novo paramixovírus denominado vírus Nipah. Essa doença surgiu na Malásia, em 1998/1999. Estava associada à encefalite grave
entre  pessoas  expostas,  ocupacionalmente,  a  suínos  infectados  na  Malásia  e  em  Cingapura.  A  enfermidade  foi  erradicada  da  população  nacional  de  suínos  comerciais  após  adoção  de  medidas  de  controle.  Morcegos  frugívoros  do
gênero Pteropus parecem ser reservatórios do vírus.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O agente etiológico, o vírus Nipah (gênero Henipavírus, família Paramyxoviridae), é um vírus com envelope em sentido negativo e um único filamento de RNA. Esse vírus está intimamente relacionado com
o vírus Hendra (p. 741), o único outro membro do gênero. Os surtos em humanos na Malásia e em Cingapura foram seguidos de contato com suínos infectados e resultaram em encefalite, com taxa de mortalidade cerca de 40%. Considera­
se que o vírus foi introduzido na população suína a partir de 1 das 2 espécies de Pteropus, nas quais foram detectados anticorpos durante a investigação de um surto. Pteropus spp é encontrado desde o Pacífico ocidental até o Sudeste
Asiático, e do sul da Ásia até as ilhas da costa africana, inclusive Madagascar. Em várias espécies de Pteropus foram encontrados anticorpos, sugerindo que o vírus ou os vírus estreitamente relacionados ocorrem em outras áreas dentro do
alcance  desse  gênero  de  morcego.  Na  Malásia,  a  análise  genética  do  vírus  obtido  de  casos  clínicos  de  humanos  e  suínos  sustentou  fortemente  que  uma  única  introdução  do  vírus  se  espalhou  pela  população  de  suínos  comerciais.  Há
evidências de infecção em várias outras espécies de animais domésticos, inclusive cães, gatos e equinos. A encefalite humana causada pelo vírus Nipah, no sul da Ásia, tem sido uma ocorrência regular desde 2001 em Bangladesh e, mais
recentemente, em áreas vizinhas da Índia. Nessas áreas, a epidemiologia não incriminou espécies domésticas intermediárias, mas muito mais a transmissão direta a partir da raposa, o reservatório do vírus.
TRANSMISSÃO E PATOGÊNESE:  Acredita–se que a infecção em suínos foi transmitida de espécies de morcegos reservatórios para suínos. Uma vez o vírus introduzido na instalação de criação intensiva de suínos, a infecção dos animais do
local  foi  rápida  e  testes  sorológicos  sugeriram  que  quase  todos  os  suínos  de  uma  criação  infectada  foram  contaminados.  Acredita–se  que  a  transmissão  entre  recintos  se  deva  a  procedimentos  de  biossegurança  inapropriados  e  à
movimentação de animais infectados. Infecção experimental de suínos por vírus Nipah em uma instalação com alta biossegurança, em Geelong, sustenta que pode ocorrer prontamente transmissão entre suínos criados em contato próximo.
ACHADOS CLÍNICOS:  Devido ao perigo de infecção humana e por se tratar de uma emergência, durante uma epidemia natural as observações clínicas não foram detalhadas em condição de campo. Muitos suínos desenvolveram doença
respiratória  febril  com  tosse  grave,  que  originou  nomes  locais  para  a  doença,  como  “síndrome  da  tosse  suína”  e  “tosse  de  uma  milha”.  Encefalite  também  foi  notada  em  instalações  infectadas,  particularmente  em  porcas  e  varrões.  A
proporção de animais com cada forma da doença é incerta, embora a forma respiratória seja predominante. A mortalidade total nos recintos infectados também não foi bem documentada, mas provavelmente não é > 5% em todos os grupos
etários.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  laboratorial  pode  ser  obtido  mediante  isolamento  viral,  identificação  do  RNA  pelo  uso  de  PCR­transcriptase  reversa,  detecção  de  antígenos  em  tecidos  por  coloração  imunoistoquímica  com  anticorpos
específicos,  ou  testes  sorológicos,  como  ELISA  indireto  e  testes  de  neutralização  viral.  Em  termos  de  biossegurança,  o  vírus  é  considerado  como  nível  4  nos  EUA  e  na  Austrália,  e  restrição  laboratorial  rigorosa  nos  laboratórios  é  de
fundamental importância.
TRATAMENTO:  O tratamento dos suínos infectados não foi tentada durante os casos de emergência constatados na Malásia. Pessoas requerem cuidados intensivos, com ventilação mecânica para o controle da encefalite; não há tratamento
específico disponível. A ribavirina foi administrada a alguns pacientes e os estudos subsequentes em animais de laboratório sugerem que não é efetiva.
CONTROLE  E  PREVENÇÃO:   O  controle  epidêmico/epizoótico  na  Malásia  envolveu  procedimentos  rigorosos  de  quarentena  e  abate  de  todos  os  suínos  de  instalações  infectadas.  A  adesão  a  procedimentos  apropriados  de  quarentena  e
biossegurança  nas  instalações,  como  no  caso  de  outras  doenças  contagiosas,  é  de  fundamental  importância  na  prevenção  da  disseminação  da  infecção.  Vigilância  ativa  e  programas  de  abate  foram  efetivos  na  eliminação  do  vírus  da
população nacional de suínos comerciais e esse país permanece livre da doença. A presença do vírus em espécies de morcegos reservatórios em amplas áreas geográficas enfatiza a importância de um bom programa de vigilância e de
práticas de biossegurança, de modo a detectar precocemente a infecção e controlar a doença ao recinto onde surgiu, antes que ocorra reintrodução do vírus.
RISCO ZOONÓTICO:  A transmissão do vírus de suínos infectados às pessoas foi extensa em um recinto; um estudo sobre fatores de risco associados à infecção humana sugere que o contato próximo com suínos vivos infectados é o meio de
infecção de quase todas as infecções humanas pelo vírus Nipah.
Episódios  esporádicos  continuados  em  cavalos  e  subsequentes  casos  graves  da  doença  em  humanos,  em  alguns  desses,  enfatiza  a  importância  de  equipamento  de  proteção  pessoal  apropriado  durante  exame  clínico  veterinário  ou
procedimento pós­morte, quando há suspeita de infecção pelo vírus Hendra ou Nipah.

INFECÇÕES ESTREPTOCÓCICAS EM SUÍNOS

O  grupo  das  bactérias  estreptocócicas  é  composto  pelos  gêneros  Streptococcus,  Enterococcus  e  Peptostreptococcus.  As  bactérias  estreptocócicas  são  as  mais  patogênicas  e  constituem  um  importante  agente  infeccioso  dos  suínos.  As
bactérias estreptocócicas estão associadas a condições infecciosas em seres humanos, bovinos, ovinos, caprinos e equinos. Com relação aos suínos, S. dysgalactiae e S. zoopidemicus estão associados a condições supurativas esporádicas. S.
suis é  um  patógeno  de  suínos  jovens  e  é  o  principal  agente  infeccioso  de  leitões  recém­nascidos  e  recentemente  desmamados.  Sepse,  meningite,  poliserosite,  poliartrite  e  broncopneumonia  estão  associadas  às  infecções  por  S.  suis.  S.
porcinus está associado a condições supurativas, especificamente a condição conhecida como abscesso de mandíbula. Os enterococos habitam o trato intestinal e causam doenças em múltiplas espécies. Nos suíno, E. durans, E. faecium e E.
hirae estão associados a enterites e diarreia.

 INFECÇÃO POR STREPTOCOCCUS DYSGALACTIAE
Nos suínos, S. dysgalactiae do grupo C são sorovares beta­hemolíticos e são frequentemente encontrados na nas secreções nasal e traqueal, tonsilas e nas secreções vaginal e prepucial. Eles são os estreptococos beta­hemolíticos mais
importantes envolvidos em lesões em suínos. As secreções vaginais e o leite das porcas recém­paridas são as principais fontes de infecção para os leitões. Os estreptococos entram na corrente sanguínea via feridas na pele, umbigo e tonsilas.
Ocorre então bacteriemia ou sepse e os microrganismos colonizam um ou mais tecidos provocando artrite, endocardite ou meningite.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   A  infecção  geralmente  é  observada  inicialmente  nos  leitões  com  1  a  3  semanas  de  idade.  O  inchaço  das  articulações  e  a  claudicação  são  os  sinais  clínicos  mais  evidentes  e  persistentes.  Elevação  da
temperatura, prostração, pelos ásperos e inapetência também podem ser notados. As primeiras lesões consistem em edema periarticular, inchaço, membranas sinoviais hiperêmicas e fluidos sinoviais turvos. A necrose da cartilagem articular
pode ser observada 15 a 30 dias após o início da infecção, podendo se agravar. Fibrose e abscessos multifocais do tecido periarticular e hipertrofia dos vilos sinoviais também ocorrem. Ocorre endocardite, mas o diagnóstico ante mortem é
difícil. As lesões consistem em vegetações amareladas ou brancas de diferentes tamanhos, e que geralmente cobrem toda a superfície da válvula cardíaca afetada.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico da sepse, artrite ou endocardite estreptocócica é realizado por meio de necropsia e exame bacteriológico dos suínos afetados. Apenas um pequeno número de microrganismos ou nenhum microrganismo pode
ser isolado das articulações infectadas, especialmente quando a inflamação está avançada.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO:  Os estreptococos beta­hemolíticos são sensíveis aos antibióticos betalactâmicos. Os agentes antibacterianos de longa ação podem ser benéficos e o tratamento deve ser realizado antes do avanço da inflamação.
Não há relato recente sobre a vacinação contra estes estreptococos. Bacterinas autógenas têm sido utilizadas e há relatos de redução na incidência de artrite quando as porcas são vacinadas antes da parição.
A ingestão adequada do colostro pode garantir que os leitões recebam anticorpos protetores. Lesões traumáticas nos pés e nos membros devem ser minimizadas pela redução da abrasividade da superfície do chão da maternidade.
S. dysgalactiae não é reconhecido como um patógeno zoonótico.

 INFECÇÃO POR STREPTOCOCCUS PORCINUS
Streptococcus porcinus foi associado nos EUA com a enfermidade contagiosa de suínos em crescimento conhecida como linfadenite estreptocócica, abscesso mandibular ou abscesso cervical. A importância desta doença vem declinando
consideravelmente, não sendo reconhecida como uma entidade de importância econômica em outros países. A transmissão é possível pelo contato ou pela ingestão de alimentos e água contaminada por material purulento de abscessos
rompidos ou fezes infectadas pelo microrganismo. Os microrganismos infectam os suínos através da mucosa da faringe ou superfície das tonsilas e são carreadas para os linfonodos, primeiramente na região da cabeça e pescoço, onde os
abscessos são formados. Os abscessos podem ser observados no momento de abate e o aumento dos linfonodos na região da traqueia é evidente. S. porcinus também é ocasionalmente encontrado no muco vaginal das porcas e no sêmen e no
prepúcio dos cachaços. Estes casos são geralmente considerados como invasões secundárias.
S.  porcinus  é  sensível  às  penicilinas  e  a  terapia  com  antibióticos  geralmente  resolve  as  infecções  agudas  detectadas.  Contudo,  o  tratamento  com  antibióticos  geralmente  não  é  bem­sucedido  nos  casos  de  suínos  com  abscessos
estabelecidos ou na eliminação dos portadores. A resistência à tetraciclina tem sido relatada, contudo, pulsos de tetraciclina na ração em níveis terapêuticos de 400 g/ton são frequentemente utilizados em uma tentativa de controlar esta
condição. A vacinação (autógena) é possível, mas não tem sido utilizada largamente porque os abscessos cervicais não são um problema muito difundido.
Não há evidência de que S. porcinus possua potencial zoonótico, mas ele tem sido implicado em infecções geniturinárias e complicações na gravidez em mulheres.
 INFECÇÃO POR STREPTOCOCCUS SUIS
Streptococcus suis é um importante patógeno para os suínos. Assim como vários outros patógenos dos suínos, a bactéria pode ser facilmente encontrada no tecido das tonsilas e nas fezes de suínos clinicamente sadios.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  S. suis é um estreptococo pertencente ao grupo D de Lancefield e é caracterizado como uma bactéria anaeróbica facultativa, gram­positiva e imóvel, agrupada em cadeias de diferentes comprimentos. S. suis produz
a­hemólise  (hemólise  incompleta)  em  ágar­sangue  e  é  uma  bactéria  catalase  negativa.  Tem  distribuição  mundial  e  35  sorotipos  são  descritos.  O  número  de  sorotipos  que  expressam  virulência  é  pequeno  e  dependente  da  localização
geográfica. Os sorotipos 1 a 9 representam 70% dos isolados de S. suis nos laboratórios; o sorotipo 2 é o mais prevalente mundialmente. Embora a maioria dos leitões desmamados sejam portadores de S. suis, poucos possuem os sorotipos
capazes de induzir a doença após o desmame.
S. suis é encontrado no trato respiratório superior, particularmente nas tonsilas e cavidades nasais, mas o microrganismo também pode ser encontrado no trato genital e no trato digestório dos suínos. As infecções clínicas são observadas
principalmente nos leitões desmamados (2 a 5 semanas pós­desmame), suínos na fase de crescimento e, em menor frequência, nos leitões lactentes.
Portadores assintomáticos podem atuar como uma fonte de infecção para seus companheiros depois que eles são misturados e colocados na creche. A maioria dos estudos sobre fatores de virulência têm sido realizados com o sorotipo tipo
2.  O  sorotipo  2  possui  cepas  virulentas  e  avirulentas,  mas  a  caracterização  dos  fatores  de  virulência  é  incompleta.  O  polissacarídio  capsular  é  a  única  prova  da  presença  do  fator  de  virulência  (substância  C).  A  proteína  liberadora  de
muramidase (PLM) e o fator extracelular (FE) constituem as proteínas relacionadas com a virulência e que podem estar ativas nas infecções do tipo 2, contudo, não há um componente único da patogenicidade.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  S. suis está presente em todas as partes do mundo em áreas de criação intensiva de suínos. O tipo 2 é responsável pela maioria (90%) das infecções em suínos doentes em muitos países. A maioria dos suínos
clinicamente sadios são portadores de múltiplos sorotipos de S. suis. Os leitões tornam­se colonizados com S. suis no momento do parto, pelo contato com as secreções vaginais, ou na amamentação. A transmissão entre os rebanhos ocorre
pela movimentação e mistura de suínos portadores. A introdução destes em rebanho não infectado geralmente resulta no início subsequente da doença nos leitões desmamados e/ou nos suínos em crescimento. No entanto, alguns rebanhos
infectados que não apresentam a doença podem desenvolver a doença clínica na presença de outros fatores predisponentes como estresse e coinfecções com outros patógenos. Surtos de infecções por S. suis também tem sido frequentemente
relatados  com  coinfecções  com  o  vírus  da  síndrome  reprodutiva  e  respiratória  suína. S. suis também  pode  ser  transmitido  via  fômites  e  moscas.  A  importância  de  outras  espécies  animais  ou  pássaros  como  reservatórios  ou  vetores  da
infecção é desconhecida.
ACHADOS CLÍNICOS:  O primeiro sinal apresentado geralmente é a febre, a qual pode ocorrer inicialmente sem outros sinais evidentes. Isso é acompanhado de bacteriemia acentuada que pode persistir por vários dias se não for tratada.
Durante  este  período,  geralmente  ocorre  febre  oscilante  e  graus  variados  de  inapetência,  depressão  e  claudicação.  Em  casos  hiperagudos,  os  suínos  podem  ser  encontrados  mortos  sem  sinais  premonitórios.  A  meningite  é  a  principal
característica que fundamenta o diagnóstico presuntivo. Os sinais nervosos iniciais incluem depressão, incoordenação e adoção de posições não usuais, que podem rapidamente progredir para incapacidade de permanência em estação,
movimentos de pedalagem, opistótono, convulsões e nistagmo. A endocardite também é um achado frequente em leitões mais velhos. Os suínos afetados podem morrer subitamente ou apresentar sinais de dispneia, cianose e emaciação.
Inchaço das articulações e claudicação, indicativos de poliartrite, e sinais de doença respiratória podem ser observados em alguns surtos.
Lesões: As  lesões  são  observadas  principalmente  no  desmame  e  na  fase  de  crescimento  dos  suínos  e  estão  associadas  à  linfadenopatia,  meningite,  artrite,  serosite  e  endocardites.  As  lesões  podem  incluir  exsudatos  fibrinopurulentos  no
cérebro, inchaço das articulações, serosite fibrinosa e vegetações cardíacas. Esplenomegalia e hemorragias petequiais, indicando septcemia, também podem ser observados. As lesões de sepse, meningite ou poliartrite também podem ser
observadas em leitões lactentes.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo geralmente é baseado no histórico, nos sinais clínicos, na idade dos animais e nas lesões macroscópicas. O isolamento e a sorotipagem dos agentes infecciosos e a avaliação das lesões microscópicas
dos tecidos afetados confirmam o diagnóstico. A sorologia não está disponível nos testes de rotina. A caracterização genética é realizada em alguns laboratórios, e é particularmente útil para os estudos epidemiológicos.
O diagnóstico diferencial inclui poliserosite causada por Haemophilus parasuis ou Mycoplasma hyorhinis; meningite por H. parasuis; endocardite por Erysipelothrix rhusiopathiae; sepse por H. parasuis, Actinobacillus suis, Escherichia
coli, E. rhusiopathiae ou Salmonella Choleraesuis; e poliartrite causada por outros estreptococos, estafilococos, E. coli ou A. suis.
TRATAMENTO, CONTROLE E PREVENÇÃO:  O rápido reconhecimento dos primeiros sinais clínicos da meningite estreptocócica, seguido pelo imediato tratamento parenteral dos suínos afetados com antibiótico apropriado, é considerado
atualmente o melhor método para aumentar o número de animais sobreviventes. Os estágios iniciais da meningite podem ser de difícil detecção, assim grupos de suínos devem ser observados frequentemente após o desmame nas granjas
onde as infecções por S. suis são um problema. A resistência dos isolados à penicilina tem sido relatada, contudo a ação de amplo espectro dos antibióticos betalactâmicos como a ampicilina e a amoxicilina parecem manter alguma eficácia
no  tratamento  de  suínos  afetados.  Em  adição  aos  betalactâmicos,  outros  antibióticos  aprovados  nos  EUA  para  o  tratamento  das  infecções  por E. suis incluem  o  ceftiofur  e  as  fluorquinolonas.  A  medicação  na  água  de  bebida  pode  ser
realizada com o florfenicol, que é indicado para o tratamento das infecções por E. suis nos suínos. A amoxicilina também é frequentemente administrada na água de bebida como uma medida profilática. A administração de uma preparação
anti­inflamatória é recomendada para redução da inflamação dos tecidos afetados e melhora da condição geral de suínos com meningite por E. suis. O tratamento das porcas com antibióticos antes da parição para redução da transmissão do
patógeno para os leitões tem sido investigado, porém apresentou resultados variados.
As vacinas se mostraram ineficazes na prevenção de surtos. E. suis é um dos vários patógenos bacterianos que tem conseguido derrotar os esforços para erradicá­lo usando o desmame precoce dos leitões lactentes.
Os estreptococos são suscetíveis à ação de desinfetantes a base de aldeído, biguanida, hipoclorito, iodo e amônia quaternária.
RISCO ZOONÓTICO:  As infecções em seres humanos por S. suis podem resultar em sepse, meningite, perda permanente da audição, endocardite e artrite. A taxa de mortalidade pode chegar a 7% em alguns casos. A maioria dos casos
humanos tem sido atribuída ao S. suis do sorotipo 2. A transmissão para os humanos ocorre pela contaminação de feridas na pele ou de membranas mucosas com o sangue ou secreções de suínos infectados. Os produtores de suínos, os
funcionários das granjas e os veterinários correm maior risco de infecção. A doença é considerada subdiagnosticada e subestimada na maioria dos países.
PESTE SUÍNA AFRICANA

A peste suína africana (PSA) é considerada uma doença hemorrágica altamente contagiosa, em suínos. Essa enfermidade provoca uma ampla variedade de sinais clínicos e lesões muito semelhantes à peste suína clássica (p. 815). A PSA é
uma doença de importância econômica, sendo enzoótica em muitos países da África, em ilhas do Mediterrâneo e na Sardenha. Em junho de 2007, a PSA foi confirmada pela primeira vez na Georgia, região do Caucaso, e tem se espalhado
pelos países vizinhos.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O vírus da PSA é um DNA­vírus grande e com envelope que se replica principalmente nas células do sistema fagocítico mononuclear. Geralmente é considerado como o único membro da família de vírus
semelhante ao da peste suína africana (Asfarviridae). O longo período em que a PSA foi uma doença enzoótica na África levou à seleção de vírus com diferentes graus de virulência. Nenhum tipo antigênico distinto foi identificado, mas
genótipos diferentes foram notados por meio da utilização de enzimas de restrição dos genomas dos vírus obtidos de diferentes áreas geográficas, durante um longo período. O vírus é altamente resistente a uma ampla variação de pH e ao
procedimento de congelamento/descongelamento e pode manter a capacidade infectante por muitos meses à temperatura ambiente ou quando armazenado a 4°C. Nos fluidos corporais, inclusive no soro, o vírus é inativado em 30 min a
60°C, mas em carne suína não processada pode se manter viável por várias semanas; pode ser inativado apenas por aquecimento a 70°C durante 30 min. Embora o vírus da PSA possa se adaptar e se multiplicar em diversos tipos de células,
ele só se replica rapidamente na espécie suína.
A doença limita­se a todas as linhagens e tipos de suínos domésticos e a javalis selvagens da Europa. Todas as faixas etárias são igualmente suscetíveis. Na África, o vírus provoca infecção inaparente em 2 espécies de suínos selvagens –
javali  africano  (Phacochoerus  aethiopicus)  e  porco–do­mato  (Potamochoerus  porcus)  –  e  no  carrapato  mole  Ornithodoros  moubata.  Quando  a  doença  era  endêmica  no  sul  da  Espanha  e  Portugal,  uma  espécie  diferente  de  carrapato
mole, Ornithodoros erraticus, foi infectado pelo vírus. Muitos outros Ornithodoros spp, que não eram parasitos comuns de suínos domésticos e selvagens, foram infectados experimentalmente. PSA foi relatada em vários países africanos
no  sul  do  Saara,  sendo  de  ocorrência  enzoótica  ou  na  forma  de  epidemias  esporádicas  em  suínos  domésticos.  O  primeiro  caso  de  disseminação  fora  da  África  ocorreu  na  Europa  em  1957,  sendo  praticamente  erradicada.  A  segunda
introdução da PSA foi em 1960, quando a doença tornou­se enzoótica na Espanha e em Portugal e, subsequentemente, em 1978 na Sardenha. Durante a década de 1970, ocorreu importante propagação no Caribe e na América do Sul. Já na
Europa ocorreram surtos graves, porém limitados, na Bélgica (1985) e na Noruega (1986). Um programa rigoroso de erradicação teve êxito em Portugal (1993) e na Espanha (1995).
A disseminação da PSA fora da África é um evento relativamente raro. Porém em junho de 2007, a PSA foi confirmada em suínos da Georgia, na região do Caucaso, da antiga República Soviética. Análises genéticas revelaram que o
genótipo do vírus isolado na Georgia pode ser estreitamente relacionado com vírus circulantes em Moçambique, Madagascar e Zâmbia. Portanto, é provável que os suínos tenham sido infectados pelo vírus da PSA que foi transportado com
carne suína por navios que partiram do sudeste da África. Em julho de 2007 o surto se espalhou de 56 para 61 distritos da Georgia e, logo após, os surtos de PSA foram relatados em regiões vizinhas, inclusive na república autônoma da
Abkhazia, Armênia e Nagorno­Karabakh. Mais tarde, naquele ano, foram confirmadas infecções de javalis na Rússia e na Chechênia. Em 2008 a disseminação da doença continuou pelo Norte da Ossétia, chegando a mais de 1.000 km, em
Orenburg, mostrando o potencial de rápida disseminação por longas distâncias. Em outubro de 2008, foi oficialmente relatado o total de 21 surtos de PSA nas cinco divisões administrativas da Rússia. O vírus continua se disseminando
rapidamente para o leste, rumo a regiões e países com ampla população de suínos.
TRANSMISSÃO  E  PATOGENIA:  O  vírus  da  PSA  é  mantido  na  África  por  meio  de  um  ciclo  de  transmissão  natural  entre  javalis  africanos  e  o  carrapato  vetor O. moubata,  que  habita  as  tocas  desses  animais  e  das  quais  sua  eliminação  é
improvável. A disseminação do vírus dos reservatórios selvagens para os suínos domésticos pode ocorrer mediante a picada do carrapato infectado ou pela ingestão de tecidos de javali selvagem. Os vírus altamente patogênicos causam
doença aguda e todos os fluidos e tecidos corporais contêm grande quantidade de vírus infectante, desde o início dos sintomas da doença até a morte. Os suínos infectados com isolados menos virulentos podem transmitir o vírus a suínos
suscetíveis até 1 mês depois da infecção; o sangue permanece infectante por até 6 semanas, e pode ocorrer transmissão caso a paciente apresente sangramento. Os suínos, em geral, se infectam por via oronasal, por contato direto com suínos
infectados ou pela ingestão de restos alimentares que contenham carne suína ou produtos derivados de carne suína não processados. A via de infecção primária é o trato respiratório superior e o vírus se replica nas tonsilas e nos linfonodos
que drenam a cabeça e o pescoço; segue­se rapidamente uma infecção generalizada através da corrente sanguínea. Assim, há grande quantidade de vírus em todos os tecidos. Os fatores que induzem lesões hemorrágicas ainda não estão
definidos,  mas  disfunções  graves  no  mecanismo  de  coagulação  sanguínea  têm  um  papel  importante.  O  vírus  é  excretado  predominantemente  através  do  trato  respiratório  superior;  também  está  presente  em  secreções  e  excreções  que
contenham sangue.
Os  suínos  que  sobrevivem  à  infecção  por  isolados  menos  virulentos  tornam­se,  às  vezes,  permanentemente  infectados  por  toda  a  vida  e  apresentam  anticorpos  circulantes,  embora  não  excretem  ou  transmitam  o  vírus  aos  seus
descendentes, no interior do útero. Ainda não se sabe o seu papel na epidemiologia da doença, mas tornam­se resistentes à doença quando desafiados com genótipos virais relacionados. Esses vírus de desafio podem se replicar e serem
transmitidos, tanto direta quanto indiretamente, para outros suínos.
O principal fator na persistência da doença nos suínos domésticos na África é a presença de um grande número de animais errantes nas vilas e, em algumas regiões, dos carrapatos vetores em seus cercados.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Podem ocorrer as formas hiperaguda, aguda, subaguda e crônica e a taxa de mortalidade varia de 0 a 100%, dependendo da virulência da cepa que infectou o suíno. A doença aguda é caracterizada por curto
período de incubação, que varia de 5 e 7 dias, seguido de febre alta (até 42°C) e morte em 7 a 10 dias. Os sinais clínicos variam pouco e os animais apresentam perda de apetite, depressão e decúbito. Os sinais clínicos secundários incluem
hiperemia de orelhas e pele, abdome e membros, angústia respiratória, vômito, sangramentos nasal e retal e, às vezes, diarreia. Nos casos de surtos, o aborto é o primeiro evento observado. A gravidade e a distribuição das lesões variam de
acordo com a virulência da cepa viral. Hemorragias ocorrem predominantemente nos linfonodos, rins (sobretudo como petéquias) e coração; prevalência e distribuição de hemorragias em outros órgãos são variáveis. Na infecção por alguns
vírus nota­se baço aumentado e friável, aumento de fluido de coloração pálida ou sanguinolenta nas cavidades pleural, pericárdica e peritoneal ou edema e congestão pulmonar. Alguns vírus isolados na Europa causam sinais clínicos e
lesões inespecíficas. A doença crônica é caracterizada por emaciação, tumefação articular e sintomas respiratórios. Essa forma da doença é raramente observada nos surtos.
DIAGNÓSTICO:  PSA não pode ser diferenciada de peste suína clássica com base nos sinais clínicos e no exame pós­morte. As amostras de sangue, soro, baço, tonsilas e linfonodos gastro­hepáticos de casos suspeitos devem ser submetidas à
confirmação laboratorial. O vírus pode ser isolado por inoculação de culturas primárias de monócitos de suínos, nos quais produz hemadsorção de hemácias de suínos à superfície das células infectadas. O vírus da peste suína clássica não se
replica nessas células. Há isolados que não induzem a hemadsorção viral e alguns destes ocasionam doença letal. Esses isolados induzem apenas um efeito citopático em leucócitos de suínos. Nesses casos, a confirmação de PSA deve ser
feita  por  PCR  ou  ELISA  para  detecção  de  antígeno.  O  antígeno  viral  pode  ser  constatado  em  esfregaços  de  tecidos  infectados  ou  em  cortes  histológicos  corados  com  anticorpo  marcado  (estão  disponíveis  vários  testes  com  enzimas
marcadas, por exemplo, imunofluorescência) e DNA viral por PCR ou sonda de hibridação de ácidos nucleicos nos cortes histológicos. Os testes mais apropriados para detecção de anticorpos no soro e nos fluidos teciduais são ELISA,
imunofluorescência indireta e contraimunoeletroforese. Além desses, há inúmeros outros testes disponíveis.

Febre suína africana. Hiperemia generalizada em abdome e membros. Cortesia do Dr. C.A.L. Oura.

Outros diagnósticos diferenciais incluem infecção bacteriana hemorrágica e alguns tipos de produtos tóxicos.
CONTROLE:  Não há tratamento e todas as tentativas de desenvolvimento de vacinas não obtiveram sucesso. A prevenção, portanto, depende da proibição da entrada de suínos vivos, bem como de produtos cárneos, em áreas livres da PSA.
O sucesso dos programas de erradicação envolve um diagnóstico rápido, abate e descarte de todos os animais infectados. Devem ser aplicadas medidas sanitárias e estas incluem controle da movimentação dos animais e tratamento de
resíduos alimentares. Subsequentemente, deve ser realizada pesquisa sorológica dos animais em todas as fazendas, bem como o controle específico por zonas para que todos os animais infectados sejam identificados.

PESTE SUÍNA CLÁSSICA (Cólera suína, Febre suína)

A peste suína clássica (PSC) é uma doença contagiosa febril de suínos. Foi descrita pela primeira vez no início do século XIX, nos EUA. Mais tarde, uma enfermidade descrita na Europa denominada febre suína foi reconhecida como sendo
a mesma doença. Ambos os nomes continuam em uso, embora na Europa seja utilizado peste suína clássica para diferenciar da peste suína africana (p. 812). As duas enfermidades são clinicamente indistinguíveis, mas são provocadas por
vírus não relacionados. Devido ao grave impacto econômico, surtos de PSC são notificados à OIE.
A peste suína clássica pode causar epidemias devastadoras, particularmente nos países livres da doença. Nestes países, geralmente a vacinação é permitida apenas em casos de emergência. No caso de um novo surto há necessidade de
implementação de rigorosas medidas de controle, de modo a evitar a disseminação da doença como, por exemplo, descarte de suínos infectados ou com suspeita da infecção e restrição à movimentação de animais. Isso pode ter graves
consequências à indústria suína, especialmente em áreas de criação com alta densidade populacional. Por exemplo, durante a epidemia da doença na Holanda em 1997­1998 ocorreu infecção em 429 criações e cerca de 700.000 suínos
foram  descartados.  Mais  de  12  milhões  de  suínos  foram  mortos  para  estabelecer  o  controle  da  disseminação  da  doença.  A  conscientização  e  a  vigilância  são  essenciais  para  a  detecção  precoce  de  surtos  e  para  o  diagnóstico,  sendo
rapidamente instituídas medidas de controle para evitar a propagação do vírus. O “período de alto risco”, ou seja, o tempo entre a introdução do vírus e a detecção do surto, deve ser mantido o menor possível.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  A peste suína clássica é causada por um RNA­vírus pequeno com envelope, pertencente ao grupo Pestivirus, da família Flaviviridae. O vírus da PSC é antigenicamente relacionado com outros pestivírus,
denominados vírus da diarreia viral bovina (p. 319) e vírus da doença da fronteira de ovinos (p. 640), os quais estão disseminados nas populações de ruminantes e ocasionalmente podem infectar suínos. Embora não causem doença em
suínos e sejam eliminados depois de alguns dias, devem ser realizados testes de diferenciação de anticorpos, a fim de distinguir peste suína clássica daquela infecção causada por pestivírus em ruminantes.
O vírus da peste suína clássica infecta somente membros da família Suidae, como suínos e javalis, embora infecções experimentais possam induzir a doença em outras espécies. O vírus se multiplica em culturas de células de suínos,
notadamente na linhagem PK15, mas geralmente não causam efeito citopático visível na cultura. O vírus tem apenas um sorotipo, embora possa ser detectada variabilidade antigênica entre cepas. A tipificação da cepa para o mapeamento
epidemiológico pode ser realizada por sequenciamento genético do vírus, combinado com análise filogenética.
O vírus é moderadamente frágil e não sobrevive no ambiente, dificultando a disseminação a longas distâncias, pelo ar. Sobrevive por longo período em ambientes úmidos; em meios de cultura rico em proteína, como carne, outros tecidos
e fluidos corporais, particularmente mantidos sob refrigeração ou congelamento. Relata­se que o vírus sobrevive durante anos em carne suína congelada, ou meses, em carne curada.
A peste suína clássica é cosmopolita. É endêmica em países da América Latina, algumas ilhas do Caribe e em países asiáticos produtores de suínos. Em 2005, foi relatada a primeira ocorrência de peste suína clássica na África do Sul,
desde 1918. Austrália, Nova Zelândia, Canadá e EUA são livres de peste suína clássica, como a maioria dos países da Europa Oriental e Central, embora ocorram surtos esporádicos em alguns países europeus. A doença é endêmica em
vários países do Leste Europeu.
A principal fonte de infecção é o suíno – vivo ou carne suína mal cozida. Nas áreas endêmicas, a maior preocupação é a disseminação da doença pela movimentação de suínos infectados, os quais podem causar surtos remotos em locais
onde há ampla escala de transporte para terminação. Em partes da Europa, a população de javalis pode atuar como portadora.
Outro  importante  risco  é  a  introdução  acidental  do  vírus  por  meio  de  carne  suína  ilegalmente  importada  e  derivados  de  carne  oriundos  da  cadeia  de  produção  de  alimentos  suínos,  de  animais  alimentados  com  restos  de  alimentos
(“lavagem”). O vírus é rapidamente inativado pelo cozimento, fato que enfatiza a importância da regulamentação do tratamento térmico de restos de alimentos (“lavagem”). Em muitos países, a prática de fornecer restos de alimentos foi
banida.
A transmissão mecânica por meio de veículos e equipamentos, bem como por pessoas (principalmente veterinários) que visitam várias fazendas, é muito relevante para a disseminação entre áreas infectadas.
Se as fêmeas forem infectadas com cepas de virulência baixa a moderada durante a gestação, recuperando­se em seguida, o risco de que seus filhotes se tornem portadores é alto. Nem todos estes portadores persistentemente infectados
manifestam  sinais  clínicos  da  doença,  mas  podem  excretar  vírus  permanentemente.  Portanto,  é  particularmente  importante  o  exame  de  rebanhos  com  altas  taxas  de  falha  reprodutiva,  tremor congênito  ou  outras  anomalias  congênitas
inexplicáveis.
A provável via de transmissão aos javalis selvagens inclui “restos” ou lixo contaminados de suínos domésticos infectados. A consequência destas infecções depende principalmente do tamanho e da densidade das populações de javalis
selvagens  infectados.  Surtos  em  pequenas  populações  que  vivem  em  confinamentos  naturais,  como  vales,  tendem  a  ser  autolimitantes.  Por  outro  lado,  infecções  que  causam  surtos  em  grandes  áreas  e  com  alta  densidade  populacional
frequentemente tornam­se endêmicas.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  A doença se manifesta nas formas aguda e crônica e a virulência pode ser grave, com alta taxa de mortalidade, ou discreta ou até mesmo subclínica. Cepas de baixa virulência representam um problema
especial no diagnóstico; a única manifestação pode ser baixo desempenho reprodutivo e nascimento de leitões com anomalias neurológicas (p. ex., tremor congênito, p. 1345).
A forma aguda grave é caracterizada por febre, inapetência e depressão. O período de incubação tipicamente varia de 3 a 7 dias, com morte entre o décimo e o vigésimo dia após a infecção. A febre (> 41°C) persiste até o estágio terminal
da enfermidade, quando a temperatura corporal pode ser subnormal. Constipação intestinal é comum, seguida de diarreia. A principal lesão é vasculite generalizada, verificada em suínos vivos na forma de hemorragia e cianose cutânea,
notadamente  nas  extremidades.  Também,  pode  haver  eritema  generalizado.  A  vasculite  de  SNC  pode  causar  incoordenação  ou  mesmo  convulsões.  Na  necropsia  os  principais  achados  incluem  petéquias  disseminadas  e  hemorragias
equimóticas, especialmente nos linfonodos, rins, baço, bexiga e laringe. O infarto pode ser observado principalmente no baço. A maioria dos suínos apresenta encefalite não supurativa, com manguito vascular.
Na  doença  crônica,  os  suínos  geralmente  sobrevivem  por  até  3  meses.  Após  o  início  da  fase  febril  aguda,  esses  animais  apresentam  recuperação  aparente,  seguida  de  recidiva,  com  anorexia,  depressão,  febre  e  perda  progressiva  da
condição corporal. Histologicamente nota­se atrofia do timo e depleção linfoide. Úlceras em forma de botão podem se desenvolver no intestino, particularmente próximo da junção ileocecal.
DIAGNÓSTICO:  A primeira linha de diagnóstico é realizada pelo veterinário a campo. Como os sinais clínicos não são necessariamente típicos, geralmente deve­se realizar diagnóstico laboratorial e diferencial. O diagnóstico diferencial
inclui outras doenças hemorrágicas febris dos suínos, como peste suína africana, septicemias bacterianas (p. ex., salmonelose, erisipela etc.), intoxicação por anticoagulantes (derivados cumarínicos) e doença hemolítica do recém­nascido.
As lesões hemorrágicas devem ser diferenciadas daquelas observadas na dermatite suína e na síndrome nefropática e das lesões provocadas pela síndrome debilitante multissistêmica no pós­desmame (p. 798), que está disseminada em
muitos  países  produtores  de  suínos.  No  caso  de  cepas  de  baixa  virulência  do  vírus  da  peste  suína  clássica,  deve–se  considerar  várias  outras  causas  de  baixo  desempenho  reprodutivo  e  de  tremor  congênito,  inclusive  pseudorraiva,
parvovirose, diarreia viral bovina e doença da fronteira, bem como causas não infecciosas.
Os testes virológicos são essenciais para a confirmação do diagnóstico. Recomenda­se consulta ao laboratório antes do envio das amostras. Os tecidos apropriados incluem tonsilas, linfonodos maxilar ou submandibular, linfonodos
mesentéricos, baço, íleo e rins. Amostras de sangue total, colhidas com anticoagulante EDTA, podem ser utilizadas para isolamento viral de um animal vivo com doença aguda ou para detecção de antígeno ou de ácido nucleico. Amostras
de sangue sem uso de anticoagulante são obtidas quando há necessidade de testes sorológicos para pesquisa de anticorpo. Sorologia é o método de escolha para exame de porcas que pariram leitões com anomalias congênitas e triagem para
identificação viral, em particular em javalis e populações de suínos selvagens.
A  detecção  de  antígeno  pode  ser  realizada  por  meio  de  imunofluorescência  direta  em  cortes  teciduais  congelados,  especialmente  das  tonsilas.  A  leitura  desses  preparados  requer  profissional  experiente  e  altamente  capacitado.  Sua
principal vantagem é o rápido resultado. A detecção de antígeno também pode ser realizada por meio de ELISA. Entretanto, este teste tem baixa sensibilidade, sendo útil apenas para triagem de rebanhos suínos. Mais comumente, faz­se a
detecção de ácido nucleico viral utilizando a RT­PCR. Além disso, com o uso de primers apropriados, o teste RT­PCR permite diferenciar este vírus daqueles vírus da diarreia viral bovina e da doença da fronteira. Métodos padronizados
foram descritos e permitem fazer a triagem de grande número de amostras de sangue (pool), fornecendo rápido resultado, com alta sensibilidade. Isto é particularmente útil para triagem de rebanhos durante um surto.
Para o isolamento viral, culturas de células são inoculadas com suspensões teciduais ou com leucócitos, fixadas após 2 a 3 dias, e o vírus é detectado após teste com marcador imunológicos (utilizando marcadores fluorescentes ou
enzimas marcadas). Os resultados podem demorar 4 a 7 dias. Este método é trabalhoso e demorado. Entretanto, devido sua sensibilidade e especificidade é um método de referência no caso de um novo surto.
A caracterização do vírus com o uso de anticorpos monoclonais específicos ao vírus ou RT­PCR é realizada para diferenciar o vírus da peste suína clássica de outros pestesvírus. Nos testes de detecção de antígeno ou de isolamento viral
não devem ser confirmados até que se realize a caracterização do vírus.
Para o exame sorológico há disponibilidade de teste de neutralização viral e de ELISA. Como o vírus não é citopatogênico em cultura, o teste de neutralização requer um estágio de marcação imunológica adicional. ELISA é o teste
sorológico mais adequado para uso em larga escala, ou seja, como teste de vigilância epidemiológica. Alguns kits comerciais disponíveis para ELISA podem diferenciar anticorpos do vírus da peste suína clássica daquele da diarreia viral
bovina, embora seja recomendado teste confirmatório quando há ambas as doenças. Teste ELISA pode detectar anticorpos contra uma proteína viral específica e que não fazem parte daqueles denominados “marcadores de vacinas”. Tal
como  para  a  diferenciação  de  indivíduos  infectados  daqueles  vacinados,  foi  desenvolvido  um  teste  DIVA­ELISA  para  identificação  de  suínos  infectados  com  vírus  de  campo  daqueles  de  uma  população  vacinada  com  uma  vacina  de
subunidade disponível no mercado. Este procedimento ainda não é muito aceito para uso no campo e o ELISA para diferenciação de indivíduos infectados daqueles vacinados é menos sensível.
CONTROLE:  Na maioria dos países, a peste suína clássica é uma doença de notificação obrigatória. O controle é rigidamente regulamentado por leis e medidas sanitárias. Não há tratamento possível. Os suínos infectados devem ser abatidos
e  as  carcaças  enterradas  ou  incineradas.  Os  casos  confirmados  e  os  animais  contactantes  devem  ser  abatidos,  implementando­se  medidas  de  prevenção  da  doença  em  outros  suínos.  Essas  medidas  podem  envolver  o  abate  de  animais,
restrições de transporte de suínos ou vacinação, dependendo das regulamentações de controle da doença no local.
Em países onde o vírus é endêmico, os animais infectados são destruídos e a vacinação é utilizada para prevenir a disseminação adicional do vírus. Países livres de peste suína clássica geralmente implementam medidas rígidas para
impedir surtos da doença. Na União Europeia, onde o uso profilático de vacina é proibido, a vacinação de emergência pode ser utilizada para controlar surtos graves com o uso de vacina viva modificada convencional ou um marcador de
vacina. As vacinas com vírus vivo modificado são derivadas da cepa C lapinizada ou cepas adaptadas de culturas de células. Elas são efetivas e inócuas. Há alguns anos, uma vacina com subunidade contendo apenas glicoproteína da
superfície  viral  principal  foi  aprovada.  Como  os  suínos  com  infecção  natural  produzem  anticorpos  contra  essa  proteína,  teoricamente  a  combinação  de  marcador  de  vacina  e  teste  diagnóstico  específico  (DIVA­ELISA),  permite  a
diferenciação de suínos vacinados daqueles infectados. A vacina composta de subunidade é utilizada desde 2006,? na Romênia, para vacinação de emergência. Em surtos envolvendo javalis selvagens, a vacinação de emergência utilizando
iscas com vacina viva modificada foi utilizada com sucesso na Alemanha e em outros países da Europa.

SÍNDROME RESPIRATÓRIA E REPRODUTIVA SUÍNA

A síndrome respiratória e reprodutiva suína (SRRS) foi relatada pela primeira vez nos EUA em 1987. Desde então, os surtos de SRRS e o sucesso no isolamento do vírus tem confirmado a presença da doença na América do Norte e na
Europa.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O agente etiológico é um vírus da família Arteriviridae. O vírus é envelopado e o tamanho varia entre 45 e 80 nm. A inativação é possível após o tratamento com éter ou clorofórmio, contudo, o vírus é
muito estável sob congelamento, mantendo sua infectividade por até 4 meses a ­70°C. Quando a temperatura aumenta, a infectividade é reduzida (15 a 20 min a 56°C).
Após a infecção de um plantel saudável, a exposição de todos os membros da população reprodutora é inconsistente, encontrando­se subpopulações de porcas sadias, expostas e persistente mente infectadas. Esta situação é agravada ao
longo do tempo com a introdução de marrãs de reposição não adaptadas, o que provoca a disseminação do vírus dos animais portadores para aqueles que não foram previamente expostos.
O vetor primário responsável pela transmissão do vírus é o suíno infectado. A transmissão por contato foi demonstrada experimentalmente e a disseminação do vírus oriundo de uma única fonte de um grupo de reprodutores infectados já
foi descrita. A aquisição de animais infectados pode levar à introdução e coexistência de diversos isolados geneticamente diferentes do vírus SRRS em uma mesma granja. Estudos controlados indicaram que um suíno infectado pode ser
portador por longos períodos e os adultos são capazes de disseminar o vírus da SRRS por até 86 dias após a infecção, enquanto os leitões desmamados podem abrigar o vírus por até 157 dias. Experimentalmente, os varrões podem eliminar
o vírus no sêmen por até 93 dias após a infecção.
A transmissão do vírus por aerossol foi confirmada como uma via de transmissão indireta e dependente da patogenicidade do isolado. Isolados altamente virulentos, que produzem de altos títulos de vírus na corrente sanguínea e nos
tecidos, apresentaram frequência de disseminação via aerossóis significativamente maior do que a de isolados menos patogênicos. Fatores ambientais, como a direção e velocidade do vento também exercem um impacto significante sob
esta via de disseminação. O vírus da SRRS também pode ser transmitido por fômites, tais como agulhas contaminadas, botas, uniformes, veículos de transporte e contêineres. Os empregados da granja não representam um risco, a menos
que suas mãos estejam contaminadas com o sangue de suínos virêmicos. Finalmente, a transmissão por certas espécies de insetos (mosquitos [Aedes vexans] e moscas domésticas [Musca domestica]) foi relatada.
ACHADOS CLÍNICOS:  A  SRRS  apresenta  duas  fases  clínicas  distintas:  falha  reprodutiva  e  doenças  respiratórias  pós­desmame.  A  fase  reprodutiva  da  doença  inclui  o  aumento  do  número  de  leitões  natimortos,  fetos  mumificados,  partos
prematuros e recém­nascidos fracos. A ocorrência de natimortos e de fetos mumificados pode aumentar até 25 a 35% e os abortos podem ser > 10%. A anorexia e a agalaxia são evidentes em porcas lactantes e resultam em aumento (30 a
50%) da mortalidade pré­desmame. Os leitões lactentes apresentam uma respiração laboriosa característica e o exame histopatológico dos tecidos pulmonares revela pneumonia intersticial necrosante grave. O vírus da SRRS é capaz de
ultrapassar a placenta no terceiro e possivelmente no segundo trimestre da gestação. Os leitões também podem nascer virêmicos e transmitir o vírus por 112 dias após a infecção. O desempenho após o desmame também é afetado. A
infecção pelo vírus da SRRS resulta na destruição dos macrófagos alveolares maduros, o que leva à hipótese de que a infecção resulte na supressão do sistema imune, embora estudos controlados indiquem que o vírus pode induzir o
aumento de parâmetros específicos da resposta imune.
Os surtos da forma reprodutiva da SRRS têm sido relatados nos últimos 1 a 4 meses da gestação, dependendo do tipo de instalação e do estado de saúde inicial das porcas. Em contraste, a fase pneumônica no pós­desmame pode tornar­se
crônica, reduzindo o ganho de peso diário em cerca de 85% e aumentando a mortalidade em 10 a 25%. Outros patógenos também são frequentemente isolados com o vírus da SRRS em leitões de creche ou em adultos em terminação.
Diversas bactérias, como Streptococcus suis, Escherichia coli, Salmonella Choleraesuis, Haemophilus parasuis e Mycoplasma hyopneumoniae, e outros tipos de vírus, como o coronavírus respiratório suíno e o vírus da influenza  suína,
foram  relatadas.  Finalmente,  diferenças  na  resposta  clínica  ao  vírus  da  SRRS  também  podem  ser  decorrentes  de  variações  entre  as  estirpes.  Estudos  demonstraram  a  capacidade  de  diferentes  isolados  em  induzir  diferentes  graus  de
pneumonia intersticial em leitões originados de cesariana e privados de colostro após a inoculação intranasal.
DIAGNÓSTICO:  Os testes mais utilizados são o ELISA e a RIFI. Estes testes determinam os anticorpos IgG antivírus da SRRS. Estes testes não mensuram o nível de imunidade do animal e nem identificam se o animal é um portador. Os
títulos são detectados entre 7 e 10 dias após a infecção e podem persistir por até 144 dias. Altos títulos podem indicar infecção recente e a disseminação do vírus pode ocorrer na população estudada. Os testes para identificação do vírus da
SRRS  incluem  a  PCR,  isolamento  viral  e  imunoistoquímica.  Recentemente,  o  sequenciamento  do  ácido  nucleic  o  de  determinadas  regiões  do  vírus  está  comercialmente  disponível  e  demonstrou  ser  uma  excelente  ferramenta  para
investigações epidemiológicas a campo para confirmar a similaridade dos isolados obtidos em diferentes locais.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Atualmente, não há tratamento efetivo para SRRS aguda. Tentativas para a redução da febre com a utilização de AINE (ácido acetilsalicílico) ou estimulantes do apetite (vitamina B) parece promover benefícios
mínimos. O uso de antibióticos ou de bacterinas autógenas para reduzir os efeitos dos patógenos bacterianos oportunistas também foram relatados, porém, os resultados são inconclusivos.
A prevenção da infecção parece ser o principal meio de controle da doença. O conhecimento da prevalência da SRRS em marrãs e varrões de reposição, bem como o isolamento e a aclimatação adequada dos animais recém­chegados, são
medidas críticas na prevenção da introdução do vírus. Os suínos devem ser testados novamente na chegada à instalação de isolamento e 45 a 60 dias depois, antes da entrada no plantel. A eliminação da infecção existente com múltiplos
sítios de produção e desmame precoce segregado também foi relatada. Embora estas estratégias tenham obtido algum sucesso, os riscos de reinfecção a longo prazo parecem altos. A prevenção da disseminação viral por meio da redução da
população de leitões na creche também foi relatada. Esta prática é bem­sucedida quando a transmissão viral não está ocorrendo na população de porcas (geralmente 12 a 18 meses após o surto inicial), mas os leitões de creche e os suínos em
crescimento/terminação ainda continuam infectados. Todos os leitões da creche são removidos da granja para terminação em outro local. As instalações da creche são rigorosamente lavadas, desinfetadas e esvaziadas por 7 a 14 dias, para
então  serem  utilizadas  normalmente.  A  técnica  eliminou  com  sucesso  o  vírus  de  muitos  plantéis,  e  os  suínos  permaneceram  soronegativos  (por  >  1  ano)  na  idade  de  abate.  A  produtividade  na  creche  melhorou  em  relação  às  taxas  de
crescimento e de mortalidade.
As vacinas comerciais, com vírus vivo modificado e inativado, foram licenciadas e tem sido eficazes no controle de surtos e na prevenção de perdas econômicas.
Recentemente, demonstrou­se a possibilidade de erradicação da SRRS na granja. Métodos como despopulação/repopulação, teste e remoção, bem como a produção em plantéis fechados têm sido documentados como métodos eficazes
para  eliminação  do  vírus  plantéis  endemicamente  infectados.  Infelizmente,  inúmeras  tentativas  de  erradicação  têm  falhado  devido  à  introdução  de  novos  isolados  por  vias  não  identificadas.  Isto  tem  resultado  no  aumento  do  nível  de
biossegurança das granjas. Quarentena rigorosa, programas de testes, aquisição de animais de reposição e de sêmen livre do vírus da SRRS, utilização de sistemas de filtração de ar, higienização dos veículos de transporte e protocolos
rigorosos de deslocamento de fômites e dos funcionários entre as granjas são componentes críticos para um programa de controle eficiente.

TRIQUINELOSE (Triquinose)

A triquinelose é uma doença parasitária de importância em saúde pública, causada pelo nematoide Trichinella spiralis.  As  infecções  humanas  se  estabelecem  pelo  consumo  de  carne  infectada  mal  cozida,  geralmente  suína  ou  de  urso,
embora outras espécies também tenham sido implicadas. As infecções naturais ocorrem nos carnívoros selvagens; a triquinelose também é encontrada em equinos, ratos, castores, gambás, morsas, baleias e aves que consomem carne. A
maioria dos mamíferos é suscetível.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  Trichinella spp é considerada um complexo de 8 espécies, com 11 genótipos (T1 a T11), identificadas pela análise de DNA. Há poucas diferenças morfológicas e a identificação das espécies é baseada em
características como isolamento reprodutivo, infectividade em determinados hospedeiros e resistência ao congelamento. T. spiralis (T1) é a espécie mais comum que afeta os seres humanos e animais domésticos na maioria das regiões
temperadas;  ela  possui  alta  infectividade  para  suínos  e  roedores,  baixa  resistência  ao  congelamento  e  forma  cistos  musculares.  Outras  espécies  formadoras  de  cistos  incluem  a  T.  nativa  (T2),  encontrada  nos  carnívoros  árticos;  T.
britova (T3),  encontrada  principalmente  na  região  sul  da  Europa; T. murrelli (T5),  restrita  à  América  do  Norte, T.  nelsoni  (T7),  restrita  à  África  Oriental;  e  outros  3  genótipos  de  T.  nelsoni:  T6  (carnívoros  da  América  do  Norte),  T8
(carnívoros da África) e T9 (animais selvagens japoneses). Há 3 outras espécies: T. pseudospiralis (T4), T. papuae (T10) e T. zimbabwensis (T11) – que não formam cistos musculares.
A infecção geralmente ocorre pela ingestão de larvas encistadas no músculo. A parede cística é digerida no estômago e as larvas liberadas penetram nas mucosas duodenal e jejunal. Dentro de aproximadamente 4 dias, as larvas se
desenvolvem em adultos sexualmente maduros. Após o acasalamento, as fêmeas (3 a 4 mm) penetram profundamente na mucosa e liberam larvas vivas (até 1.500) durante 4 a 16 semanas. Após a reprodução, as formas adultas morrem e
geralmente são digeridas. As larvas jovens (0,1 mm) migram para os vasos linfáticos, são transportadas via sistema portal até a circulação periférica, e alcançam os músculos estriados, penetrando nas células musculares individuais. As
larvas crescem rapidamente (para 1 mm) e começam a espiralar no interior da célula, geralmente uma por célula. A formação da cápsula inicia­se em aproximadamente 15 dias após a infecção, e é completada entre 4 e 8 semanas, momento
em  que  as  larvas  são  infectantes.  As  células  se  degeneram  à  medida  que  a  larva  cresce  e  ocorre  a  calcificação  (em  diferentes  proporções  nos  vários  hospedeiros).  As  larvas  podem  permanecer  viáveis  nos  cistos  durante  anos  e  o  seu
desenvolvimento apenas continua se forem ingeridas por outro hospedeiro adequado. O diafragma, a língua, o masseter e os músculos intercostais estão entre os músculos com alta carga parasitária nos suínos.
Se as larvas passarem pelo intestino e forem eliminadas juntamente com as fezes antes da maturação, elas são infectantes para outros animais.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  DIAGNÓSTICO:  A  maioria  das  infecções  nos  animais  domésticos  e  selvagens  não  são  diagnosticadas.  No  ser  humano,  as  infecções  com  alta  carga  parasitária  produzem  enfermidade  séria  com  três  fases  clínicas
(intestinal, invasão muscular e convalescente) e mortes ocasionais.
Embora o diagnóstico ante mortem nos  animais,  exceto  em  humanos,  seja  raro,  pode­se  suspeitar  de  triquinelose  se  houver  um  histórico  de  ingestão  de  roedores,  carcaças  de  animais  selvagens  ou  de  carne  crua  infectada.  O  exame
microscópico de uma amostra de biopsia muscular (geralmente língua) pode ser confirmatório, mas não exclui necessariamente a triquinelose. O ELISA é um teste confiável para a detecção de anticorpos anti­Trichinella. A soroconversão
pode não ocorrer durante várias semanas após a infecção, embora quantidades muito pequenas como 0,01 larvas por grama de carne possa ser detectada.
CONTROLE:  Geralmente os animais não são tratados. O objetivo é prevenir a ingestão dos cistos musculares viáveis de Trichinella (triquinas) por qualquer animal, inclusive pessoas. Nos suínos, isto pode ser obtido com um bom manejo
que inclui o controle de roedores, cozimento dos restos de alimentos fornecidos aos suínos durante 30 min a 100°C (212°F), e prevenção do canibalismo (i. e., mordedura de cauda) e acesso a carcaças de animais selvagens.
A inspeção da carne para triquinas viáveis no momento do abate (por triconoscopia ou métodos de digestão) é efetiva na prevenção da infecção humana em muitos países. Na América do Norte, supõe­se que a carne suína possa estar
infectada; assim, os produtos do tipo “pronto para comer” devem ser processados por aquecimento, congelamento ou cura adequados para matar as triquinas antes da comercialização. Outros produtos de carne suína devem ser cozidos para
assegurar que todo o tecido tenha sido aquecido a uma temperatura interna = 58°C. O congelamento da carne suína a uma temperatura apropriada por um período adequado também é efetivo (­15°C por 20 dias, ­23°C por 10 dias ou ­30°C
por 6 dias). O congelamento pode não ser um método confiável para matar as triquinas presentes em outros tipos de carne que não a suína.

Trichinella spiralis em amostra obtida por biopsia muscular; 100x. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

CINOMOSE CANINA (Paraqueratose de coxim plantar, Hardpad disease)

A cinomose canina é uma doença viral sistêmica, altamente contagiosa, que acomete cães em todo o mundo. Clinicamente é caracterizada por febre difásica, leucopenia, formação de catarro nos sistemas respiratório e gastrintestinal e,
frequentemente,  complicações  neurológicas  e  pneumônicas.  A  doença  afeta  canídeos  (cães,  raposas,  lobos),  mustelídeos  (p.  ex.,  furão,  vison­americano,  cangambá,  carcaju,  marta,  texugo),  a  maioria  dos  procionídeos  (p.
ex., guaxinim, quati), alguns viverídeos (binturong), ailurídeos (panda vermelho), elefantídeos (elefante asiático), primatas (macaco japonês) e grandes felídeos.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  A cinomose canina é causada por um paramixovírus estreitamente relacionado com o vírus do sarampo e ao da peste bovina. O vírus envelopado é frágil, sendo sensível a solventes lipídicos como o éter e à
maioria dos desinfetantes, inclusive fenóis e compostos quaternários de amônio, sendo relativamente instável fora do hospedeiro. A principal via de infecção é por meio de gotículas de aerossol de animais infectados. Alguns cães infectados
podem eliminar o vírus por vários meses.
A replicação viral ocorre inicialmente no tecido linfático do trato respiratório. A viremia associada a células resulta na infecção de todos os tecidos linfáticos, seguida de infecção dos epitélios respiratório, gastrintestinal e urogenital, bem
como do SNC e nervo óptico. A doença ocorre após a replicação do vírus nesses tecidos. O grau de viremia e a extensão da disseminação viral aos vários tecidos são moderados pelo nível de imunidade humoral específica no hospedeiro
durante o período virêmico.
ACHADOS  CLÍNICOS:   Nota­se  febre  passageira  geralmente  entre  3  e  6  dias  após  a  infecção,  podendo  também  ocorrer  leucopenia  (especialmente  linfopenia)  durante  este  período;  estes  sinais  podem  passar  despercebidos  ou  serem
acompanhados de anorexia. A febre cessa por vários dias antes de ocorrer uma segunda onda febril, que dura mais de 1 semana. Esta pode ser acompanhada de secreção nasal serosa, secreção ocular mucopurulenta, letargia e anorexia.
Podem  seguir­se  sinais  respiratórios  e  gastrintestinais  geralmente  complicados  por  infecções  bacterianas  secundárias.  Raramente  é  observada  dermatite  pustular.  Pode  ocorrer  encefalomielite  associada  a  outros  sinais,  após  a  doença
sistêmica ou até mesmo na ausência de manifestações sistêmicas. Os cães que sobrevivem à fase aguda podem apresentar hiperqueratose dos coxins plantares (doença dos coxins ásperos) e do epitélio do plano nasal, assim como hipoplasia
do esmalte dos dentes com erupção incompleta.
Em geral, o curso prolongado da doença está associado à presença de sinais neurológicos; entretanto, não há uma maneira de prever se um cão infectado irá ou não apresentar as manifestações neurológicas. Os sinais neurológicos
incluem andar em círculos, inclinação persistente da cabeça, nistagmo, paresia a paralisia e convulsões focais ou generalizadas. São considerados sinais neurológicos clássicos contrações musculares involuntárias de um músculo ou de um
grupo muscular (mioclonia, coreia, espasmos e hipercinesia) e convulsões caracterizadas por salivação e movimentos mandibulares de mastigação (mascar chiclete).
Um cão pode exibir qualquer um ou todos estes sinais multissistêmicos durante o curso enfermidade. A infecção pode ser leve ou inaparente ou levar a uma doença grave com manifestação da maioria dos sinais anteriores. O curso da
doença sistêmica pode ser curto, de apenas 10 dias, mas o surgimento dos sinais neurológicos pode ser atrasado por várias semanas ou meses, como resultado da desmielinização crônica do SNC.
Os sinais clinicopatológicos são inespecíficos e incluem linfopenia, com possível achado de corpúsculos de inclusão viral em linfócitos circulantes já no início da doença. A radiografia torácica pode revelar padrão intersticial típico de
pneumonia viral.
A encefalite da cinomose crônica (encefalite do cão idoso [ECI]), uma afecção muitas vezes marcada por ataxia, movimentos compulsivos, tais como pressionar a cabeça ou andar continuamente, bem como hipermetria descoordenada,
pode ocorrer em cães adultos vacinados e sem histórico sugestivo de cinomose canina sistêmica. Embora o antígeno da cinomose canina tenha sido detectado no cérebro de alguns cães com ECI por métodos de imunofluorescência ou
métodos genéticos, animais com ECI não são fontes de infecção e o vírus com capacidade de replicação não foi isolado. Esta encefalite é causada pela reação inflamatória associada à infecção persistente do vírus da cinomose canina no
SNC, mas os mecanismos que deflagram esta síndrome ainda são desconhecidos.
Lesões:  A atrofia do  timo  é  um  achado  pós­morte  compatível  em  filhotes  infectados.  Hiperqueratose  do  nariz  e  coxins  plantares  é  encontrada  com  frequência  em  cães  com  manifestações  neurológicas.  Dependendo  do  grau  de  infecção
bacteriana secundária, também podem estar presentes broncopneumonia, enterite e pústulas cutâneas. Em casos de morte na fase aguda ou hiperaguda, são encontradas anormalidades apenas no sistema respiratório. Histologicamente, o
vírus da cinomose canina produz necrose dos tecidos linfáticos, pneumonia intersticial e corpúsculos de inclusão intranucleares e citoplasmáticos nos epitélios respiratório, urinário e gastrintestinal. As lesões encontradas no cérebro dos
cães  com  complicações  neurológicas  incluem  degeneração  neuronal,  gliose,  desmielinização  não  inflamatória,  infiltrado  inflamatório  perivascular,  leptomeningite  não  supurativa  e  corpúsculos  de  inclusão  intranucleares  (encontrados
predominantemente em células gliais).
DIAGNÓSTICO:  A cinomose deve ser considerada no diagnóstico de qualquer afecção febril em filhotes de cães com manifestações em múltiplos sistemas. Os sinais característicos por vezes surgem apenas tardiamente no curso da doença e
o quadro clínico pode ser modificado por toxoplasmose, neosporose, coccidiose, parasitoses e numerosas infecções virais e bacterianas concomitantes. A cinomose às vezes é confundida com outras infecções sistêmicas, como leptospirose,
hepatite infecciosa canina ou febre maculosa. Intoxicantes como chumbo ou organofosforados podem provocar sequelas no trato gastrintestinal ou neurológicas simultaneamente. Um estado febril, com presença de catarro e com sequelas
neurológicas justifica um diagnóstico clínico de cinomose.
Em cães com sinais multissistêmicos, esfregaços de conjuntiva, traqueia, vagina e outros tipos de epitélio, camada leucoplaquetária, sedimento urinário ou aspirado de medula óssea podem ser examinados por meio de imunofluorescência
ou PCR via transcriptase reversa (RT­PCR). A sorologia de IgM específica para o vírus também é útil nos estágios iniciais da doença. Títulos de anticorpos ou ELISA podem ser realizados no fluido cerebrospinal (FCE) e comparados com
os valores obtidos no sangue periférico; um valor relativamente maior no FCE é típico de infecção natural versus vacinação. Testes de imunofluorescência para o antígeno viral (IFA) ou hibridização fluorescente in situ do DNA viral podem
ser realizados em biopsias de coxins plantares ou da pele da face dorsal do pescoço.
À necropsia, o diagnóstico geralmente é confirmado pelas lesões histológicas, IFA ou ambas. Essas amostras frequentemente são negativas quando o cão só exibe manifestações neurológicas ou na presença de anticorpos circulantes (ou
ambos), devendo o diagnóstico ser realizado pela avaliação do FCE ou pela sorologia de IgM específica para o vírus.
TRATAMENTO:  Os tratamentos são sintomáticos e de suporte, direcionados à limitação da invasão bacteriana secundária, suporte ao equilíbrio de fluidos e controle das manifestações nervosas. Antibióticos de amplo espectro, soluções
eletrolíticas balanceadas, nutrição parenteral, antipiréticos, analgésicos e anticonvulsivantes são utilizados no tratamento e bons cuidados de enfermagem são essenciais. Nenhum tratamento isolado é específico ou alcança êxito uniforme.
Trabalhos experimentais in vitro com agentes antivirais são promissores, mas nenhum está disponível comercialmente.
Infelizmente, o tratamento das manifestações neurológicas agudas da cinomose canina é frequentemente insatisfatório. Se os sinais neurológicos forem progressivos ou graves, o proprietário deve ser aconselhado apropriadamente. Com a
instituição de tratamento agressivo logo no início, os cães podem recuperar­se completamente das manifestações multissistêmicas, mas em outros casos os sinais neurológicos podem persistir após o desaparecimento dos sinais respiratórios
e gastrintestinais. Os cães com alguma forma da doença neurológica crônica progressiva ou induzida por vacinas podem responder à terapia imunossupressora com anti­inflamatórios ou dosagens maiores de glicocorticoides.
PREVENÇÃO:  A imunização bem­sucedida dos filhotes com vacinas de vírus vivo modificado (VVM) da cinomose canina depende da ausência de interferência dos anticorpos maternos. Para superar essa barreira, os filhotes são vacinados
com  vacinas  de  VVM  na  sexta  semana  de  idade  em  intervalos  de  3  a  4  semanas  até  a  16a semana  de  idade.  Alternativamente,  vacinas  para  o  vírus  do  sarampo  induzem  imunidade  ao  vírus  da  cinomose  canina  na  presença  de  níveis
relativamente maiores de anticorpos maternos contra cinomose. As vacinas contra sarampo devem ser administradas por via intramuscular a filhotes com 6 a 7 semanas de idade e seguidas por pelo menos mais duas doses da vacina de
VVM contra cinomose quando estes completarem 12 a 16 semanas.
Diversas vacinas atenuadas contra cinomose estão disponíveis e devem ser utilizadas de acordo com as instruções dos fabricantes. As vacinas de VVM não devem ser aplicadas em cadelas em fase avançada de prenhez ou em início de
lactação. As vacinas de VVM podem produzir doença pós­vacinal em alguns cães imunossuprimidos. Uma vacina de vetor recombinante de varíola aviária que expressa proteínas do vírus da cinomose está disponível e tem se mostrado
segura e eficiente. Historicamente, a revacinação anual é padronizada, devido a possíveis quedas na proteção que podem ocorrer em situações de estresse, doença ou imunossupressão do cão, sendo muitas vacinas recomendadas como para
aplicação  anual.  Achados  recentes  indicam  que  a  imunidade  induzida  pelas  vacinas  de  VVM  pode  durar  3  anos  ou  mais.  Entretanto,  na  maioria  dos  casos  este  é  considerado  um  uso  não  recomendado  da  vacina;  assim,  a  decisão  de
revacinação em intervalos maiores do que 1 ano deve ser cuidadosamente avaliada, levando em consideração a prevalência local da doença, fatores de risco e as recomendações dos fabricantes e das organizações de classe.

DOENÇAS CAUSADAS POR RIQUÉTSIAS

 ERLIQUIOSE E INFECÇÕES RELACIONADAS
No passado, vários microrganismos intracelulares obrigatórios que infectavam células eucarióticas eram classificados como pertencentes ao gênero Ehrlichia, com base nas diferenças morfológicas e ecológicas. Com as novas técnicas de
análise genética, esses agentes foram reclassificados como pertencentes ao gênero Ehrlichia, Anaplasma e Neorickettsia, todos da família Anaplasmataceae. No entanto, ainda é comum o uso do termo “erliquiose” para descrever a infecção
causada por estes agentes.
ETIOLOGIA:  A erliquiose canina é causada principalmente por Ehrlichia canis, que infecta predominantemente os monócitos e, embora não seja considerada uma zoonose primária, ocasionalmente relata­se infecção humana por este agente.
Outro  agente  patogênico  comum  em  cães  é E. chaffeensis,  que  provoca  uma  forma  monocítica  da  doença;  é  a  principal  espécie  causadora  da  erliquiose  humana  nos  EUA.  Vários  relatos  publicados  de  erliquiose  monocítica  em  gatos
sugerem que a infecção felina pode ocorrer, embora raramente. E. ewingii, que infecta principalmente os granulócitos dos hospedeiros suscetíveis, foi isolada de cães e seres humanos no sul, oeste e centro­oeste dos EUA.
A. phagocytophilum, antigamente denominado E. equi e como agente causador da erliquiose granulocítica humana, tem sido relatado como causa da doença em cães. É conhecido por causar doença humana nos EUA, principalmente nos
estados do nordeste, centro­oeste e oeste. A infecção com este agente é mais apropriadamente referida como anaplasmose e o agente patogênico é encontrado predominantemente nos granulócitos.
A. platys, que infecta as plaquetas, é o agente causador da trombocitopenia infecciosa cíclica em cães.
EPIDEMIOLOGIA:  E. canis é transmitida pelo carrapato marrom do cão, Rhipicephalus sanguineus, que é encontrado em todo o mundo; consequentemente, a erliquiose monocítica canina também possui uma distribuição enzoótica mundial.
Carrapatos Rhipicephalus infectam­se com E. canis ao alimentar­se em cães infectados e transmitem a infecção para outros cães durante os repastos sanguíneos nos sucessivos estágios de vida. As transfusões de sangue, ou outros meios
pelos  quais  as  células  da  série  branca  infectadas  podem  ser  transferidas,  também  podem  transmitir  o  patógeno.  E.  chaffeensis  e  E.  ewingii  têm  ciclos  silvestres  no  ambiente  envolvendo  espécies  de  carrapatos  e  animais  selvagens
reservatórios. Nos EUA, E. chaffeensis e E. ewingii são transmitidas pelo Amblyomma americanum, o carrapato estrela, e acredita­se que o cariacu tem papel importante como hospedeiro reservatório. Os cães também são considerados
possíveis reservatórios de E. ewingii.
A. phagocytophilum é transmitido pelas espécies de carrapatos Ixodes; no nordeste dos EUA, a infecção é transmitida pelo I. scapularis, o carrapato de patas negras, ao passo que a infecção nos estados do oeste está principalmente
associada a I. pacificus, o carrapato de patas negras ocidental. Na natureza, o ciclo enzoótico provavelmente está mais associado aos pequenos roedores. Os seres humanos e os animais domésticos são os hospedeiros acidentais destes
patógenos. A transmissão entre humanos por meio de transfusão sanguínea foi relatada; o risco de infecções após transfusões de sangue em cães é desconhecido.
A. platys é transmitido por R. sanguineus (o carrapato marrom do cão) e é enzoótico em muitas partes dos EUA e do mundo. A infecção concomitante com E. canis pode ocorrer, pois o  mesmo  carrapato  vetor  é  o  responsável  pela
transmissão de ambos os agentes patogênicos.
ACHADOS CLÍNICOS:  Em cães, E. canis causa uma manifestação clínica potencialmente mais grave do que Ehrlichia spp. Os sinais surgem a partir do envolvimento do sistema hematológico e linforreticular, sendo geralmente a progressão de
aguda a crônica, dependendo da cepa do microrganismo e do estado imunológico do hospedeiro. Nos casos agudos há hiperplasia reticuloendotelial, febre, linfadenopatia generalizada, esplenomegalia e trombocitopenia. Sinais variáveis de
anorexia,  depressão,  debilidade,  rigidez  de  membros  e  relutância  em  andar,  edema  de  membros  ou  escroto,  tosse  e  dispneia  podem  ocorrer.  A  maioria  dos  casos  agudos  é  observada  nos  meses  mais  quentes,  coincidindo  com  a  maior
atividade do carrapato vetor. Casos crônicos podem se apresentar em qualquer época do ano.
Durante a fase aguda da infecção por E. canis em cães, o hemograma geralmente é normal, mas pode refletir uma anemia normocítica normocrômica leve, leucopenia ou leucocitose leve. Trombocitopenia é comum, mas petéquias podem
não ser evidentes e a diminuição das plaquetas pode ser leve em alguns animais. Vasculite e mecanismos imunomediados induzem à trombocitopenia e a tendências hemorrágicas. A aspiração do linfonodo revela hiperplasia. A morte é rara
durante esta fase; pode ocorrer recuperação espontânea e o cão pode permanecer assintomático ou desenvolver a doença crônica.
A erliquiose crônica causada por E. canis pode se desenvolver em qualquer raça, mas algumas raças como pastor alemão podem ser predispostas. A sazonalidade não é uma característica específica da infecção crônica, uma vez que o
aparecimento dos sinais crônicos pode ser variavelmente adiado após a infecção aguda. Nos casos crônicos, a medula óssea torna­se hipoplásica e linfócitos e plasmócitos se infiltram em vários órgãos. Os achados clínicos variam de acordo
com os órgãos predominantes afetados e podem incluir esplenomegalia evidente, glomerulonefrite, insuficiência renal, pneumonite intersticial, uveíte anterior, meningite com ataxia cerebelar associada, depressão, paralisia e hiperestesia.
Perda de peso grave é um achado proeminente.
De modo geral, o hemograma está claramente anormal nos casos crônicos. Trombocitopenia grave pode causar epistaxe, hematúria, melena, petéquias e equimoses na pele. Pode ocorrer pancitopenia grave variável (leucopenia madura,
anemia  não  regenerativa,  trombocitopenia  ou  qualquer  combinação  destas).  A  citologia  aspirativa  revela  linfonodos  reativos  e,  geralmente,  plasmocitose  acentuada.  Frequentemente  ocorre  hipergamaglobulinemia  policlonal  e,
ocasionalmente, monoclonal.
Outras infecções causadas por E. chaffeensis, E. ewingii ou A. phagocytophilum parecem clinicamente semelhantes à infecção aguda por E. canis, mas o curso clínico geralmente é mais autolimitante. Claudicações variáveis entre os
membros e febre de origem desconhecida podem estar presentes. Trombocitopenia e leucopenia ou leucocitose leve podem ocorrer durante o curso da infecção aguda, que é clinicamente mais discreta. Manifestação crônica em cães, como
verificado na infecção por E. canis, normalmente não é vista em outras infecções.
Os cães infectados com A. platys geralmente apresentam sinais mínimos de infecção ou nenhum, apesar da presença do microrganismo nas plaquetas. O principal achado é a trombocitopenia cíclica, recorrente em intervalos de 10 dias.
Geralmente, a natureza cíclica diminui e a trombocitopenia torna­se leve e resolve­se lentamente.
Lesões: Durante a fase aguda ou autolimitante das infecções por E. canis, as lesões geralmente são inespecíficas, mas a esplenomegalia é comum. Histologicamente há hiperplasia linforreticular e infiltrados perivasculares linfocitários e
plasmocitários. Nos casos crônicos, estas lesões podem ser acompanhadas de hemorragia generalizada e aumento da infiltração de células mononucleares nas regiões perivasculares de muitos órgãos.
DIAGNÓSTICO:   Como  a  trombocitopenia  é  um  achado  relativamente  consistente  com  estas  infecções,  a  contagem  de  plaquetas  é  um  importante  teste  de  triagem.  O  diagnóstico  clínico  pode  ser  confirmado  pela  visualização  dos
microrganismos dentro das células brancas ou plaquetas, vistos como corpúsculos de inclusão intracitoplasmáticos chamados de mórulas. Este método de diagnóstico carece de sensibilidade, pois um baixo número de microrganismos torna
o  achado  difícil.  Mais  comumente,  o  diagnóstico  é  feito  pela  combinação  de  sinais  clínicos,  títulos  de  anticorpos  séricos  positivos  no  teste  de  imunofuorescência  indireta  e  resposta  ao  tratamento.  Testes  “in­house”  para E.  canis  e  A.
phagocytophilum baseados em métodos de ensaios imunoenzimáticos também estão disponíveis. Como a resposta imune pode ser retardada por várias semanas, o teste sorológico pode não ser uma ferramenta de diagnóstico confiável no
início  do  curso  da  doença,  e  teste  de  soros  emparelhados  e  demonstração  do  aumento  dos  títulos  de  anticorpos  são  recomendados  para  confirmar  a  infecção.  A  reatividade  sorológica  cruzada  é  forte  entre E.  canis,  E.  chaffensis  e  E.
ewingii. Alguma reatividade cruzada com A. phagocytophilum também é observada. Essas reações devem ser consideradas em certas áreas geográficas. Em alguns locais, cerca de 50% dos cães infectados com E. canis também têm um
título para A. platys, o que provavelmente reflete uma infecção concomitante (a reatividade cruzada entre estes agentes não é observada).
A PCR vem sendo utilizada para detectar e identificar as espécies específicas de Ehrlichia e Anaplasma em pessoas e animais infectados. As amostras apropriadas para a PCR incluem sangue, aspirados de tecidos e biopsias de órgãos do
sistema  reticuloendotelial,  como  linfonodos,  baço,  fígado  ou  medula  óssea.  A  PCR  também  pode  ser  utilizada  para  detectar  a  eficácia  do  tratamento  em  eliminar  a  infecção.  A  PCR  não  está  rotineiramente  disponível  nos  laboratórios
comerciais, apesar de algumas escolas de veterinária e instituições de pesquisa oferecem o teste.
Durante  a  fase  aguda,  os  diagnósticos  diferenciais  incluem  outras  causas  de  febre  e  linfoadenomegalia  (p.  ex.,  febre macular  das  Montanhas  Rochosas, brucelose, blastomicose  e  endocardite),  doenças  imunomediadas  (p.  ex.,  lúpus
eritematoso sistêmico) e linfossarcoma.  Na  fase  crônica  da  infecção  por  E.  canis,  os  diagnósticos  diferenciais  incluem  toxicidade  de  estrogênio,  mieloptise,  pancitopenia  imunomediada  e  outras  doenças  multissistêmicas  associadas  a
disfunção orgânica específica (p. ex., glomerulonefrite).
TRATAMENTO:   A  droga  de  eleição  para  o  tratamento  da  infecção  por  Ehrlichia  ou  Anaplasma  spp  é  a  doxiciclina,  devido  sua  maior  penetração  no  meio  intracelular  e  suas  propriedades  bacteriostáticas  contra  as  riquétsias.  A  dose
recomendada para cães é 5 a 10 mg/kg, VO ou IV, 1 vez/dia, durante 10 a 21 dias. Tetraciclina (22 mg/kg, VO, 3 vezes/dia) também pode ser utilizada por = 2 semanas, nos casos agudos, e durante 1 a 2 meses, nos casos crônicos. Duas
doses de dipropionato de imidocarbe (5 a 7 mg/kg, IM), com intervalo de 2 semanas, são de eficácia variável contra erliquiose e frente a algumas cepas de Babesia. Nos casos agudos tratados com terapia antimicrobiana adequada, espera­se
que a temperatura corporal retorne ao normal dentro de 24 a 48 h após o início do tratamento. Nos casos crônicos associados à infecção por E. canis, as anormalidades hematológicas podem persistir por 3 a 6 meses, embora uma resposta
clínica  ao  tratamento  muitas  vezes  ocorra  muito  mais  cedo.  A  terapia  de  suporte  pode  ser  necessária  para  combater  o  prejuízo  e  a  disfunção  de  órgãos  específicos;  transfusões  de  plaquetas  ou  de  sangue  podem  ser  necessárias  se  a
hemorragia for extensa. Administração simultânea de antibióticos de amplo espectro pode ser necessária se o cão apresentar leucopenia grave. O título de anticorpos contra E. canis deve ser mensurado novamente 6 meses depois da doença,
a fim de confirmar a queda no título ou a soronegatividade, indicativa do sucesso da terapia. Títulos séricos que persistem em níveis baixos, mas positivos, devem ser avaliados após outro intervalo de 6 meses para assegurar que não há
elevação.
PREVENÇÃO:  A prevenção é reforçada pelo controle dos carrapatos nos cães. A prevenção da transmissão associada à transfusão de sangue pode ser realizada pela triagem de doadores soronegativos, embora novos doadores com resultados
negativos não possam ser presumidos como livres da infecção durante várias semanas, pois podem estar incubando a infecção. A administração profilática de tetraciclina em dose baixa (6,6 mg/kg, VO, 1 vez/dia) é eficaz na prevenção da
infecção por E. canis nos canis onde a doença é endêmica. O tratamento deve ser estendido por muitos meses (pelo menos por uma estação de carrapatos) para que o ciclo endêmico seja eliminado com sucesso.
RISCO ZOONÓTICO:  E. chaffeensis, E. ewingii e A. phagocytophilum são consideradas zoonoses. Apesar da ocorrência da doença nos animais e seres humanos, o envolvimento necessário de um carrapato vetor para a transmissão faz com que
os cães e outros animais infectados não representem um risco de transmissão direta em circunstâncias normais. A infecção nos cães pode indicar um risco aumentado de infecções humanas relacionadas com a exposição a carrapatos em uma
determinada área.

 FEBRE MACULOSA DAS MONTANHAS ROCHOSAS (Infecção por Rickettsia Rickettsii)
ETIOLOGIA:   A  febre  maculosa  das  Montanhas  Rochosas  (FMMR)  é  uma  doença  que  acomete  pessoas  e  cães,  causada  por  Rickettsia  rickettsii.  Esta  e  outras  riquétsias  estreitamente  relacionadas  com  o  grupo  da  febre  maculosa  são
consideradas endêmicas na maior parte da América do Norte, do Sul e Central. Estes agentes são transmitidos principalmente através da picada de carrapatos infectados. A capacidade das riquétsias geneticamente semelhantes, como R.
parkerii, de causar a doença clinicamente semelhante em cães é desconhecida. Devido à sua suscetibilidade à R. rickettsii e à taxa relativamente maior de exposição a carrapatos, os cães podem atuar como boas sentinelas para o risco de
infecção por R. rickettsii em pessoas. Vários casos da doença são frequentemente relatados em áreas geográficas definidas e infecções concomitantes podem ser vistas tanto nos cães como em seus proprietários.
EPIDEMIOLOGIA:  Nos EUA, Dermacentor variabilis (carrapato do cão americano) e o D. andersoni (carrapato de madeira das Montanhas Rochosas) são considerados os principais vetores de R. rickettsii. O microrganismo também tem
sido isolado de carrapatos Rhipicephalus sanguineus, que parece ser o principal vetor em algumas áreas localizadas do Arizona e também pode desempenhar um papel ainda pouco reconhecido em surtos em outros lugares nos EUA. Os
carrapatos R. sanguineus estão associados à transmissão de R. rickettsii na América Central. O patógeno é adquirido pelos carrapatos ainda nos estágios de larva e ninfa, durante a alimentação em hospedeiros vertebrados infectados e
também  é  transmitido  pelas  fêmeas  dos  carrapatos  aos  descendentes  através  da  transmissão  transovariana.  Estima­se  que  1  a  3%  dos  carrapatos Dermacentor spp  são  portadores  de  R.  rickettsii,  mesmo  nas  áreas  consideradas  de  alta
endemicidade.
A  soroprevalência  nos  cães  de  áreas  endêmicas  varia  de  4,3  a  77%,  mas  esses  valores  não  refletem  precisamente  as  taxas  de  infecção  devido  à  reação  cruzada  com  anticorpos  para  outras  riquétsias  geneticamente  semelhantes.  A
transmissão da FMMR por meio de transfusão sanguínea foi documentada em um único caso humano e deve ser considerada na seleção de cães doadores de sangue. A transmissão direta de cães para humanos ainda não foi relatada, embora
a infecção humana possa ocorrer pelo contato da pele lesionada ou conjuntiva com a hemolinfa ou excreções do carrapato durante a remoção de carrapatos ingurgitados dos animais de estimação.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os cães são altamente suscetíveis à infecção clínica por R. rickettsii; em contraste, a FMMR raramente é diagnosticada em gatos. Os primeiros sinais nos cães podem incluir febre (até 40,5°C), anorexia, linfadenopatia,
poliartrite, tosse, dispneia, dor abdominal, vômitos, diarreia, edema de face e edema de extremidades. Petéquias podem ser observadas na conjuntiva e mucosa oral nos casos graves. A hemorragia focal na retina pode ser constatada no
período inicial da doença. As manifestações neurológicas, tais como alteração do estado mental, disfunção vestibular e hiperestesia paraespinal podem ocorrer.
Trombocitopenia  é  comum.  A  leucopenia  se  desenvolve  durante  as  fases  iniciais  da  infecção  e,  em  casos  não  tratados,  é  seguida  de  leucocitose  progressiva.  As  anormalidades  na  bioquímica  sérica  podem  incluir  hipoproteinemia,
hipoalbuminemia, azotemia, hiponatremia, hipocalcemia e aumento da atividade das enzimas hepáticas. São esperadas taxas de letalidade entre 1 e 10%.
Lesões: Dano endotelial vascular ocorre devido aos efeitos citopáticos diretos das riquétsias. A gravidade da vasculite necrosante pode estar diretamente relacionada com a dose infectante. O dano endotelial vascular e a trombocitopenia
contribuem para o desenvolvimento de petéquias e equimoses. Os cães gravemente afetados podem desenvolver necrose das extremidades (necrose acral) ou coagulação intravascular disseminada.
DIAGNÓSTICO:  O teste sorológico preferencial é a titulação por imunofluorescência indireta. No entanto, devido à elevada incidência de reação cruzada de anticorpos para uma variedade de riquétsias não patogênicas do grupo da febre
maculosa,  bem  como  a  persistência  a  longo  prazo  de  anticorpos  após  a  infecção  aguda  da  FMMR,  o  diagnóstico  só  é  confirmado  com  a  constatação  de  um  aumento  de  quatro  vezes  no  título,  combinado  com  uma  síndrome  clínica
compatível. Os diagnósticos diferenciais incluem outras causas de febre de origem desconhecida. A resposta terapêutica geralmente é muito clara, como em outros riquetsioses caninas. Os animais com disfunção neurológica podem ter
manifestações residuais. A imunidade parece ser persistente após a infecção natural, portanto episódios recorrentes não devem ser atribuídos a FMMR.
TRATAMENTO:  O  tratamento  com  antibiótico  deve  ser  administrado  com  base  na  suspeita  clínica  sem  esperar  os  resultados  dos  testes  sorológicos,  porque  a  administração  tardia  pode  piorar  muito  o  prognóstico.  Doxiciclina  deve  ser
administrada  em  uma  dosagem  de  5  a  10  mg/kg,  VO  ou  IV,  1  vez/dia,  durante  10  a  21  dias.  Dose  de  22  mg  de  tetraciclina/kg,  VO,  3  vezes/dia,  durante  2  semanas  também  é  eficaz.  Pode  ser  necessário  tratamento  de  suporte  para
desidratação e diátese hemorrágica (hemorragia espontânea). Devido a alterações na integridade vascular, são aconselhadas taxas conservadoras de administração de fluidos. Precauções devem ser tomadas para o controle e remoção segura
dos carrapatos.

 INTOXICAÇÃO POR SALMÃO E FEBRE DA FASCÍOLA DE ELOKOMIN (Infecção por Neorickettsia spp)
A intoxicação por salmão (SPD) é uma doença aguda e infecciosa de canídeos, em que o agente infeccioso é transmitido pelas diversas fases de uma fascíola em um ciclo de vida gastrópode­peixe­cão. O nome da doença é incorreto, uma
vez que nenhuma toxina está envolvida. A febre da fascíola de Elokomin (EFF) é uma doença infecciosa aguda de canídeos, furões, ursos e guaxinins que é semelhante à SPD, mas que tem uma gama mais ampla de hospedeiros. Nos seres
humanos, Neorickettsia sennetsu provoca uma doença conhecida como febre Sennetsu, que não foi relatada como uma causa da doença em cães.
ETIOLOGIA:  A SPD é causada por N. helminthoeca e, às vezes, é complicada por um segundo agente, N. elokominica, causadora da EFF. O vetor destes agentes riquetsiais é uma pequena fascíola, Nanophyetus salmincola. Os cães e outros
animais são infectados pela ingestão de truta, salmão ou salamandras gigantes do Pacífico que contêm metacercárias encistadas da fascíola infectada pela riquétsia. No intestino do cão, a forma larval da fascíola excista e penetra na mucosa
duodenal, introduzindo as riquétsias. A fascíola em si produz pouca ou nenhuma manifestação clínica. Um relato recente de SPD em 2 ursos malaios de cativeiro ressalta a necessidade de considerar esta etiologia em espécies exóticas com
exposição e história clínica compatível.
EPIDEMIOLOGIA:  O ciclo de vida prossegue com a eliminação dos ovos infectados da fascíola nas fezes do hospedeiro. Os miracídios se desenvolvem a partir destes ovos e infectam o caramujo Oxytrema plicifer para formar as rédias. As
rédias  se  desenvolvem  em  cercárias  que  são  liberadas  a  partir  do  caramujo  e  penetram  no  salmão  ou  truta,  tornando­se  metacercárias  encistadas  infectantes.  O  ciclo  se  completa  quando  um  cão  ingere  o  peixe,  infectando­se  com  as
riquétsias. A transmissão por contato gaiola a gaiola, termômetros retais ou aerossóis é rara.
Não há predileção por idade, sexo ou raça; entretanto, a prevalência da doença é mais alta quando a disponibilidade de peixe é maior. Os peixes infectados são encontrados no Oceano Pacífico, de São Francisco até a costa do Alasca, mas
a SPD é mais prevalente entre o norte da Califórnia e o estuário de Puget, no estado de Washington. Eles também são encontrados no continente ao longo de rios de migração de peixes. Aparentemente, o fator de limitação geográfica é a
ocorrência do caramujo.
ACHADOS CLÍNICOS:  Na SPD, os sinais aparecem subitamente, geralmente entre 5 e 7 dias após a ingestão do peixe infectado, podendo ser retardados por até 33 dias e persistirem por 7 a 10 dias antes de culminar com a morte de até 90%
dos animais não tratados. A temperatura corporal chega a um pico de 40 a 42°C, 1 a 2 dias depois do surgimento dos sinais, diminuindo gradualmente por 4 a 8 dias até retornar ao normal. Frequentemente, os animais apresentam­se
hipotérmicos antes da morte. A febre é acompanhada de depressão e anorexia completa em praticamente todos os casos. Vômitos persistentes geralmente ocorrem entre os dias 4 ou 5. A diarreia ocorre entre 5 e 7 dias; ela frequentemente
contém  sangue  e  pode  ser  grave.  Há  desidratação  e  perda  de  peso  extrema.  Quando  grave,  os  sinais  GI  são  clinicamente  indistinguíveis  daqueles  da  infecção  por  parvovírus  canino.  Linfadenopatia  generalizada  desenvolve­se  em
aproximadamente  60%  dos  casos.  Exsudato  nasal  ou  conjuntival,  semelhantes  aos  de  cinomose,  podem  estar  presentes.  Neutrofilia  é  comum,  mas  pode  ocorrer  uma  leucopenia  evidente  com  desvio  degenerativo  à  esquerda.
Trombocitopenia é relatada em 94% dos casos. Os valores da bioquímica sérica são normais.
Clinicamente, a EFF é uma infecção mais branda do que a SPD. Sinais GI graves são menos comuns nas infecções por EFF, e linfadenopatia pode ser um achado mais pronunciado. As taxas de letalidade da EFF são mais baixas,
ocorrendo em 10% dos casos não tratados.
Lesões: A infecção parece afetar principalmente os tecidos linfoides e intestinos. Há aumento dos folículos linfáticos GI, linfonodos, tonsilas, timo e, em alguma extensão, o baço, com necrose microscópica, hemorragia e hiperplasia. Uma
enterite  variável,  muitas  vezes  hemorrágica  e  grave,  que  parece  surgir  a  partir  dos  folículos  linfáticos  danificados,  pode  ocorrer  em  todo  o  intestino  na  SPD,  sendo  menos  observada  na  EFF.  Focos  microscópicos  de  necrose  também
aparecem fora dos folículos linfáticos. A presença das fascíolas nas paredes do duodeno causa um pequeno dano tecidual. Meningite não supurativa ou meningoencefalite foi identificada em alguns cães.
DIAGNÓSTICO:  Ovos da fascíola são encontrados no exame de fezes em aproximadamente 92% dos casos, confirmando o diagnóstico. Os ovos são ovais, marrom amarelados, de superfície áspera, medindo cerca de 87 a 97 × 5 a 55 μm,
com um opérculo indistinto e uma pequena ponta romba na extremidade oposta. Durante o primeiro dia ou dois, poucos ovos são eliminados. Microrganismos intracelulares foram constatados por meio da aspiração de linfonodos em cerca
de 70% dos casos. Os diagnósticos diferenciais são: outras causas de febre de origem desconhecida, linfadenopatia generalizada, vômitos e diarreia. Quando ocorrer diarreia e conjuntivite exsudativa, a cinomose deve ser considerada.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  Atualmente, o único meio de prevenção é evitar o fornecimento de salmão, truta e peixes de água doce similares crus. Nos animais que se recuperam, uma resposta humoral imune profunda persiste, mas não
há resistência cruzada entre N. helminthoeca e N. elokominica. Várias sulfonamidas administradas por via oral ou parenteral são eficazes, assim como clortetraciclina, oxitetraciclina e cloranfenicol. Os animais geralmente vêm a óbito
devido  à  desidratação,  desequilíbrios  ácido­básicos  e  eletrolíticos  e  anemia.  Assim,  uma  terapia  de  suporte  muitas  vezes  é  essencial  para  a  manutenção  da  hidratação  e  do  equilíbrio  ácido­básico,  para  o  suprimento  das  necessidades
nutricionais e para o controle da diarreia. O uso criterioso de transfusão sanguínea pode ser útil.
 TIFO MURINO (Infecção por Rickettsia typhi, infecção por R. felis)
Rickettsia typhi, agente causador do tifo murino, e R. felis, são patógenos zoonóticos mantidos principalmente em roedores reservatórios (ratos, camundongos), que também podem estar associados a ciclos enzoóticos envolvendo gambás e
gatos domésticos. A infecção é transmitida aos seres humanos e outros animais pelo contato com pulgas infectadas.
EPIDEMIOLOGIA:  Acredita­se  que  a  infecção  em  humanos  ocorra  essencialmente  através  da  exposição  da  pele  lesionada  às  fezes  infecciosas  de  pulgas.  De  maneira  limitada,  também  pode  ocorrer  a  infecção  por  meio  da  aerossóis  de
materiais infectantes. Presumivelmente, cães e gatos são expostos de maneira similar. Embora de ocorrência mundial, atualmente menos de algumas centenas de casos humanos de tifo murino são relatados anualmente nos EUA. A infecção
zoonótica é principalmente relatada no Texas, Califórnia e Havaí, embora acredita­se haver subnotificação da doença.
ACHADOS CLÍNICOS:  A doença clínica associada à infecção canina e felina por R. typhi e R. felis não está bem documentada, mas a evidência de exposição, baseada na presença de anticorpos antirrickettsiais, foi observada, particularmente
em associação com surtos da doença em humanos. Enquanto o papel do possível reservatório para a infecção foi sugerido, particularmente para os gatos, a importância dos animais domésticos na manutenção dos ciclos enzoóticos ainda não
foi bem elucidada. No entanto, cães e gatos podem ao menos servir como uma fonte de pulgas que pode constituir um risco de transmissão para os seres humanos. O controle regular das pulgas é recomendado para reduzir o risco de
transmissão associado às pulgas para os seres humanos.
DIAGNÓSTICO:  O teste sorológico preferencial é a titulação de anticorpos por imunofluorescência indireta em soros pareados, sendo comumente utilizado em conjunto com as avaliações do ambiente próximo ao local do surto em humanos.
Há certo grau de reatividade cruzada com os anticorpos de outras infecções riquétsiais, inclusive R. rickettsii, de modo que as avaliações devem ser feitas com soros pareados. A PCR do sangue total também pode ser utilizada, mas a sua
utilidade na avaliação da infecção canina e felina é desconhecida uma vez que os animais podem não apresentar os sinais clínicos durante os períodos de riquetsemia, o que torna difícil a determinação do melhor momento para a avaliação.
TRATAMENTO:  Na ausência de sinais clínicos não é recomendado o tratamento específico. Se houver a suspeita da doença clínica associada à infecção por R. typhi ou R. felis em um cão ou gato, pode­se administrar doxiciclina na dosagem
de 5 a 10 mg/kg, VO ou IV, 1 vez/dia, durante 10 a 21 dias. Os animais devem passar por tratamento preventivo de rotina para o controle das pulgas. Programas de controle da infecção que envolva a remoção dos animais de uma área de
atividade enzoótica devem ser acompanhados de tratamento ambiental com inseticidas para evitar que as pulgas se alimentem em humanos após a remoção dos hospedeiros preferenciais.

HEPATITE INFECCIOSA CANINA

A hepatite infecciosa canina (HIC) é uma doença canina contagiosa e cosmopolita, com sinais que variam de ligeira febre e congestão das membranas mucosas à depressão grave, leucopenia acentuada e tempo de sangramento prolongado.
Também pode ocorrer em raposas, lobos, coiotes, ursos, linces e alguns pinípedes; outros carnívoros também podem ser infectados, mas sem desenvolver a doença clínica. Recentemente, a enfermidade tornou­se incomum nas áreas onde a
imunização é utilizada rotineiramente, mas surtos periódicos, que podem refletir uma manutenção da doença em animais silvestres ou de vida livre, reforçam a necessidade da continuidade da vacinação.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  A HIC é causada por um DNA­vírus não envelopado, o adenovírus canino tipo 1 (CAV­1), que antigenicamente é relacionado apenas ao CAV­2 (uma das causas da traqueobronquite infecciosa canina, p. 1598). O
CAV­1 é resistente aos solventes lipídicos (como o éter), ácidos e formalina. Pode sobreviver fora do hospedeiro por semanas ou meses, mas uma solução de hipoclorito de sódio (alvejante doméstico) a 1 a 3% constitui um desinfetante
efetivo.
A ingestão de urina, fezes ou saliva provenientes de cães infectados é a principal forma de infecção. Os cães que se recuperam eliminam o vírus na urina por = 6 meses. A infecção inicial ocorre nas criptas das tonsilas e nas placas de
Peyer, evoluindo para a viremia e infecção disseminada. As células endoteliais vasculares são o alvo primário, seguido pela infecção do parênquima hepático e renal, baço e pulmões. As lesões renais crônicas e turvação corneana (“olho
azul”) resultam das reações de complexos imunes que ocorrem após a recuperação da doença aguda ou subclínica.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os  sinais  variam  de  uma  ligeira  febre  até  o  óbito.  A  taxa  de  mortalidade  varia  entre  10  e  30%  sendo  tipicamente  mais  alta  nos  cães  muito  jovens.  Infecções  concomitantes  com  parvovírus  ou  cinomose  pioram  o
prognóstico. O período de incubação é de 4 a 9 dias. O primeiro sinal é uma febre > 40°C, que dura entre 1 e 6 dias e geralmente é bifásica. Se a febre for de curta duração, a leucopenia pode ser o único sinal, mas se persistir por mais de 1
dia, ocorre desenvolvimento da doença aguda.
Os sinais incluem apatia, anorexia, sede, conjuntivite, secreção serosa de olhos e nariz e ocasionalmente dor abdominal e vômito. Hiperemia intensa ou petéquias na mucosa oral, bem como aumento das tonsilas podem ser observados.
Pode ocorrer taquicardia desproporcional à febre. Pode haver edema subcutâneo na cabeça, pescoço e tronco. Apesar do envolvimento hepático, há uma notável ausência de icterícia na maioria dos casos clínicos.
O tempo de coagulação está diretamente correlacionado com a gravidade da enfermidade, como resultado da coagulação intravascular disseminada induzida pelo dano ao endotélio vascular, combinada com a falha do fígado em repor
rapidamente os fatores de coagulação consumidos. Pode ser difícil controlar a hemorragia, que se manifesta por sangramento ao redor dos dentes decíduos e por hematomas espontâneos. O envolvimento do SNC é incomum e tipicamente é
resultado de lesões vasculares. Os cães gravemente infectados podem desenvolver convulsões devido aos danos no córtex frontal do cérebro. Hemorragias do tronco cerebral podem resultar em paresia, sendo também descrito ataxia e
cegueira cortical. As raposas apresentam consistentemente sinais do SNC e convulsões intermitentes durante o curso da doença e uma paralisia pode envolver um ou mais membros ou o corpo inteiro. Sinais respiratórios geralmente não são
observados nos cães com HIC, porém tem­se isolado o CAV­1 de cães com sinais de traqueobronquite infecciosa, mesmo com elevados títulos sorológicos contra a doença parenteral.
Os achados clínico­patológicos refletem uma coagulopatia (tempo de protombina elevado, trombocitopenia e acúmulo de produtos da degradação da fibrina). Os cães gravemente afetados apresentam lesões hepatocelulares agudas (ALT
e AST aumentadas). A proteinúria é comum. Uma leucopenia persiste por todo o período febril. O grau de leucopenia varia e parece estar correlacionado com a gravidade da enfermidade
Na recuperação, os cães se alimentam bem, mas recuperam o peso lentamente. A atividade da transaminase hepática apresenta um pico por volta do 14° dia da infecção, diminuindo gradualmente após. Aproximadamente 25% dos cães
recuperados desenvolvem opacidade bilateral da córnea entre 7 e 10 dias após o desaparecimento dos sinais agudos, e que geralmente é resolvida espontaneamente. Nos casos leves, a opacidade corneana transitória pode ser o único sinal da
doença.
Por muito tempo acreditou­se que a hepatite crônica podia se desenvolver em cães com baixos níveis de anticorpos passivos quando expostos, mas estudos recentes baseados em PCR não confirmaram esta teoria.
Lesões: Os danos endoteliais resultam em hemorragias petequiais na serosa gástrica, linfonodos, timo, pâncreas e tecidos subcutâneos. A necrose das células hepáticas produz alterações de coloração variada no fígado, cujo tamanho pode
estar normal ou aumentado. Histologicamente, há necrose centrolobular com infiltrados neutrofílicos e monocíticos e inclusões intracelulares nas células hepáticas. A parede da vesícula biliar pode ficar edematosa e espessada. Podem ser
encontrados edema do timo e focos branco­acinzentados no córtex renal.
DIAGNÓSTICO:  Geralmente, o início abrupto da enfermidade e o sangramento são sugestivos de HIC, contudo a evidência clínica nem sempre é suficiente para diferenciar a HIC da cinomose (p. 704). O diagnóstico ante mortem definitivo
não é necessário para a instituição da terapia de suporte, mas pode ser obtido com testes comerciais de ELISA, testes sorológicos e PCR. Se clinicamente necessária, a distinção entre o CAV­1 e o CAV­2 é possível apenas por meio de PCR
ou polimorfismos de comprimento de fragmentos de restrição (RFLP). As alterações macroscópicas pós­morte no fígado e na vesícula biliar são mais conclusivas e o diagnóstico é confirmado pelo isolamento do vírus, imunofluorescência,
corpúsculos de inclusão intranucleares característicos no fígado, PCR ou por estudos de hibridização in situ por fluorescência do tecido infectado.
TRATAMENTO:  O tratamento é sintomático e de suporte. O objetivo da terapia é limitar as infecções bacterianas secundárias, manter o equilíbrio dos fluidos e controlar as hemorragias. A administração de antibióticos de amplo espectro e a
suplementação com soluções eletrolíticas balanceadas com dextrose 5% (IV) são indicadas. As transfusões de plasma ou de sangue total podem ser necessárias em cães gravemente doentes.
Embora a opacidade corneana transitória (que pode ser observada durante o curso da HIC ou estar associada à vacinação com vacinas de CAV­1 atenuado) geralmente não requer nenhum tratamento, uma pomada oftálmica de atropina
pode  aliviar  o  doloroso  espasmo  ciliar  que  às  vezes  pode  estar  associado.  Os  cães  com  opacidade  da  córnea  devem  ser  protegidos  de  luzes  intensas.  Os  corticosteroides  sistêmicos  são  contraindicados  para  o  tratamento  da  opacidade
corneana associada à HIC.
PROFILAXIA:  Encontram­se  disponíveis  vacinas  de  vírus  vivo  modificado  (VVVM),  frequentemente  combinadas  com  outras  vacinas.  Recomenda­se  a  imunização  contra  a  HIC  na  época  das  vacinações  contra  a  cinomose  canina.  Os
anticorpos maternos das cadelas imunes interferem na imunização ativa dos filhotes até que estes tenham entre 9 e 12 semanas de idade. As vacinas atenuadas do CAV­1 têm produzido opacidade bilateral ou unilateral transitória da córnea e
o  vírus  pode  ser  eliminado  na  urina.  Por  estas  razões,  estirpes  vivas  atenuadas  do  CAV­2,  que  proporciona  proteção  cruzada  contra  o  CAV­1,  são  preferencialmente  utilizadas  uma  vez  que  elas  apresentam  baixa  tendência  de  produzir
opacidade corneana ou uveíte e o vírus não é eliminado na urina. Historicamente, recomenda­se a revacinação anual contra a HIC. Evidências recentes indicam que a imunidade induzida pela VVVM do CAV­1 dura 3 anos ou mais, embora
este seja um uso não recomendado pelos fabricantes das vacinas disponíveis comercialmente.

HERPESVIROSE CANINA

A herpesvirose canina é uma grave infecção viral de filhotes de cães em todo o mundo, frequentemente com uma taxa de mortalidade de 100% nas ninhadas atingidas. Também pode estar associada à infecção do trato respiratório superior,
vaginite vesicular ou postite em cães adultos. Como é típica nas herpesviroses, a recuperação da doença clínica está associada à infecção latente pelo resto da vida. Apenas os canídeos (cães, lobos e coiotes) são suscetíveis conhecidos.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  A doença é causada por um DNA­vírus envelopado, o herpesvírus canino (HVC), sensível aos solventes lipídicos (como éter e clorofórmio) e à maioria dos desinfetantes. O HVC é relativamente instável fora do
hospedeiro.
Os filhotes são mais suscetíveis durante a primeira semana de vida, quando a temperatura corpórea permanece abaixo de 37°C, devido ao fato desta temperatura favorecer a replicação viral. A transmissão geralmente ocorre pelo contato
entre os filhotes suscetíveis e as secreções vaginais ou oronasais infectadas de sua mãe ou de outros cães com os quais os filhotes tenham contato durante as primeiras 3 semanas de vida. Após este período, a resistência natural à infecção
aumenta conforme os filhotes tornam­se capazes de manter uma temperatura corpórea mais elevada. A transmissão intrauterina também pode ocorrer.
A infecção dos animais suscetíveis resulta na replicação do HVC nas células da superfície da mucosa nasal, faringe e tonsilas. Caso os filhotes suscetíveis fiquem hipotérmicos, pode ocorrer viremia e invasão viral dos órgãos viscerais.
ACHADOS CLÍNICOS:  As mortes devido à infecção pelo HVC geralmente ocorrem em filhotes com 1 a 3 semanas de idade, ocasionalmente em filhotes de até 1 mês de idade e raramente em filhotes de até 6 meses. Tipicamente, o início é
súbito e a morte ocorre em menos de 24 h após a manifestação da enfermidade. Se os sinais clínicos forem observados, estes podem incluir letargia, diminuição da mamada, diarreia, secreção nasal e exantema eritematoso. Mais raramente é
possível notar vesículas bucais ou genitais. Cama atenção a ausência de febre. As radiografias torácicas mostram um padrão intersticial difuso e desestruturado típico de pneumonias virais, mas, em contraste com outras doenças virais de
filhotes, pode ser constatada leucocitose.
Cães  mais  idosos  expostos  ou  experimentalmente  inoculados  com  o  HVC  podem  desenvolver  rinite  leve,  podendo  esta  ser  parte  da  síndrome  da  tosse  dos  canis  (traqueobronquite  infecciosa,  p.  1376),  vaginite  vesicular  ou  postite.
Também há relatos de ulcerações na córnea na ausência de outros sinais no sistema respiratório superior. As infecções intrauterinas podem estar associadas a abortos, natimortos e infertilidade.
Lesões: As lesões macroscópicas características consistem em necrose focal disseminada e hemorragias. As lesões mais acentuadas são observadas nos pulmões, porção cortical dos rins, glândulas adrenais, fígado e trato gastrintestinal.
Todos os linfonodos estão aumentados, hiperêmicos e há dilatação do baço. Também podem ser encontradas lesões no SNC. A lesão histológica básica é a necrose com hemorragia no parênquima adjacente. Na maioria das vezes não há
reação inflamatória. Corpúsculos de inclusão intranucleares, basofílicos, pequenos e isolados são os mais comuns em áreas de necrose nos pulmões, fígado e rins, podendo ocasionalmente ocorrer como corpúsculos levemente acidofílicos
localizados no interior do espaço nuclear.
DIAGNÓSTICO:  A infecção pelo HVC pode ser confundida com a hepatite infecciosa canina (p. 831), mas não é acompanhada pelo espessamento e edemaciação da vesícula biliar, frequentemente associados a esta última. As áreas focais de
necrose  e  hemorragia,  especialmente  as  que  ocorrem  nos  rins,  a  distingue  da  hepatite  e  da  neosporose  (p.  708).  O  HVC  causa  doença  grave  apenas  em  filhotes  muito  jovens.  A  morte  rápida  e  as  lesões  características  a  diferenciam
da cinomose canina (p. 821).
Estão disponíveis testes de detecção de anticorpos por hemaglutinação, ELISA e imunofluorescência. O DNA viral pode ser identificado em amostras de tecido fresco e de fluidos pela PCR. O diagnóstico, entretanto, é tipicamente feito
pós­morte com o isolamento do vírus em amostras frescas de pulmão, fígado, rins e baço por meio de técnicas de cultura de células e subsequentemente identificação por PCR, sequenciamento, microscopia eletrônica de transmissão,
imunofluorescência ou hibridização in situ por fluorescência. Os tecidos devem ser encaminhados refrigerados, mas não congelados, ao laboratório.
TRATAMENTO:  A utilização de métodos terapêuticos tipicamente é pouco gratificante em filhotes afetados sistemicamente e o prognóstico para os filhotes que venham a sobreviver é reservado devido aos danos aos órgãos linfoides, cérebro,
rins e fígado, que podem ser irreparáveis.
Antes  do  aparecimento  de  sinais  clínicos  em  outros  filhotes  da  mesma  ninhada,  ou  de  ninhadas  próximas,  a  criação  em  incubadoras  com  temperatura  elevada  (35°C,  umidade  relativa  de  50%)  e/ou  imunização  passiva  com  soro
intraperitoneal pode reduzir as perdas nas ninhadas expostas. Estudos limitados com agentes antivirais como vidarabina são inconclusivos, mas seriam necessários o reconhecimento e o tratamento imediato para se obter sucesso.
CONTROLE:  Não há vacina disponível. As cadelas infectadas desenvolvem anticorpos e as ninhadas subsequentes à primeira ninhada infectada recebem anticorpos maternos pelo colostro. Os filhotes que recebem os anticorpos maternos
podem ser infectados pelo vírus, mas não ocorre a doença.
A remoção dos filhotes das cadelas afetadas por meio de cirurgia cesariana e a criação destes em isolamento preveniram mortes sob condições experimentais. No entanto, as infecções foram observadas mesmo em filhotes nascidos por
cesariana, provavelmente devido à transmissão intrauterina. Em situações naturais, as ninhadas subsequentes de cadelas infectadas provavelmente estarão protegidas pelos anticorpos maternos, assim, a realização de cesariana em uma
cadela com histórico de herpesvirose na ninhada anterior não é necessária.

LEISHMANIOSE (Leishmaniose visceral)

A leishmaniose é uma doença causada por protozoários parasitos do gênero Leishmania, transmitidos através da picada de fêmeas de flebótomos. Mais de 20 espécies de Leishmania foram descritas, a maioria das quais zoonóticas. O
parasito mais importante do gênero que afeta os animais domésticos é L. infantum, conhecido como L. chagasi na América Latina. Os cães são o reservatório principal para a leishmaniose visceral humana, causada por L. infantum, sendo
uma doença potencialmente fatal em cães e pessoas. Como os órgãos internos e a pele do cão são afetados, a doença canina é denominada leishmaniose viscerocutânea ou leishmaniose canina. Os gatos, cavalos e outros mamíferos podem
ser infectados pela L. infantum ou outras espécies de Leishmania. A doença nos gatos é mais rara do que nos cães, podendo ser de manifestação cutânea ou visceral. L. braziliensis, causadora da leishmaniose tegumentar canina, é bastante
difundida em algumas regiões da América do Sul, podendo sobrepor­se geograficamente à L. chagasi.
A leishmaniose canina é a principal zoonose endêmica em mais de 70 países. É prevalente no sul da Europa, África, Ásia, América do Sul e Central, e esporadicamente nos EUA. A leishmaniose também é de interesse nos países não
endêmicos, onde a doença importada constitui um problema veterinário e de saúde pública.
TRANSMISSÃO:  Leishmania é um parasito bifásico que completa seu ciclo biológico em 2 hospedeiros, um flebótomo que pode abrigar a forma extracelular promastigota flagelada e um mamífero onde se desenvolve a forma amastigota
intracelular do parasito.
A transmissão é um processo complexo que exige uma adaptação especial entre o hospedeiro flebótomo e a espécie de Leishmania transmitida. Há numerosas espécies de flebótomos e apenas uma minoria destes são vetores competentes
de Leishmania. Cães com ou sem sinais clínicos são infecciosos para os flebótomos, podendo transmitir a leishmaniose. A transmissão vertical congênita da leishmaniose canina de uma fêmea infectada para os seus filhotes foi relatada, mas
parece ser incomum. A transmissão por meio da transfusão de produtos derivados do sangue de cães infectados demonstrou causar infecção em receptores. A transmissão direta por meio do contato entre cães tem sido sugerida como um
meio de transmissão da doença na tentativa explicar a disseminação da infecção entre cães Foxhound mantidos em canis nos EUA, na ausência de vetores comprovados. Atualmente, a validade da transmissão direta é desconhecida.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os cães são infectados pelas formas promastigotas de L. infantum depositados na pele através da picada de flebótomos infectados. As formas promastigotas invadem os macrófagos do hospedeiro e se replicam como
amastigotas intracelulares. A resposta imune iniciada no momento da infecção parece ser o fator mais importante para determinar se uma infecção persistente irá se desenvolver e progredir de subclínica para doença clínica. O período de
incubação  pode  durar  meses  ou  anos,  durante  o  qual  o  parasito  se  dissemina  a  partir  da  pele  para  o  resto  do  corpo  do  hospedeiro  (principalmente  para  os  órgãos  do  sistema  hemolinfático).  A  idade,  raça,  características  genéticas  do
hospedeiro, nutrição, doenças concomitantes e outros fatores também podem influenciar a progressão da infecção para a doença clínica.
A leishmaniose canina é uma doença multissistêmica com um espectro altamente variável de respostas imunes e manifestações clínicas. Nas áreas endêmicas, a prevalência de cães portadores da infecção é muito maior do que a de cães
que demonstram a doença clínica. A manifestação clínica está associada a uma acentuada resposta de anticorpos que não confere proteção. Na verdade, os mecanismos imunomediados são responsáveis por grande parte da patologia da
leishmaniose canina.
O histórico típico relatado pelos proprietários de cães com a doença clínica causada por L. infantum inclui o aparecimento de lesões cutâneas, alterações oculares e epistaxe. Estas são frequentemente acompanhadas de perda de peso,
intolerância ao exercício e letargia. Os principais achados ao exame físico são lesões dermatológicas em 80 a 90% dos cães, linfadenomegalia em 62 a 90%, doença ocular em 16 a 81%, esplenomegalia em 10 a 53% e crescimento anormal
da unha (onicogrifose) em 20 a 31%. Outros achados clínicos podem incluir poliúria e polidipsia devido à doença renal, vômitos, colite, melena e claudicação devido a lesões articulares, musculares ou ósseas. Por vezes, os únicos sinais
presentes podem ser epistaxe, alterações oculares ou manifestações de doença renal sem alterações dermatológicas. As lesões dermatológicas associadas à leishmaniose canina incluem dermatite esfoliativa, que pode ser generalizada ou
localizada na face, orelhas e membros. Também são verificadas dermatite ulcerativa, nodular ou mucocutânea. Úlceras cutâneas sobre as orelhas ou outros locais podem estar associadas à hemorragia considerável. Uma forma leve de
dermatite papular foi relatada em cães sem outros sinais da doença. As lesões oculares ou perioculares incluem ceratoconjuntivite e uveíte.
Os achados laboratoriais incluem anemia não regenerativa ou, mais raramente, regenerativa leve a moderada em 60 a 73% dos cães; a trombocitopenia é menos comum. Os achados mais consistentes na bioquímica sérica de cães com
leishmaniose clínica são hiperproteinemia com hiperglobulinemia e hipoalbuminemia, frequentemente expressos por uma diminuição da razão albumina/globulina. Uma hiperglobulinemia evidente sem causa aparente em cães de regiões
endêmicas para Leishmania pode ser sugestiva de leishmaniose canina. Atividade muito elevada de enzimas hepáticas ou azotemia é encontrada em apenas uma minoria de cães infectados. Algum grau de patologia renal está presente na
maioria dos cães com leishmaniose canina. Insuficiência renal devido à glomerulonefrite pela ação dos imunocomplexos pode eventualmente ser desenvolvida e acredita­se ser a principal causa natural de morte. A presença de proteinúria
deve ser verificada e o estágio da doença renal deve ser avaliado pela determinação da razão proteína/creatinina na urina.
Lesões:  O  achado  histopatológico  típico  da  leishmaniose  canina  é  a  inflamação  granulomatosa  associada  a  um  número  variável  de  formas  amastigotas  de  Leishmania  nos  macrófagos.  A  imunidade  protetora  contra  os  parasitos
da Leishmania é mediada através das células CD4+TH  e a ativação de uma complexa cascata de mediadores de citocinas. Imunocomplexos circulantes e anticorpos antinucleares podem ser detectados nos animais com leishmaniose canina e,
conforme a infecção progride, ocorre a deposição dos complexos imunes nos rins, vasos sanguíneos e articulações. A glomerulonefrite associada aos complexos imunes renais é uma característica marcante da doença. Lesão renal, inclusive
glomerulonefrite e nefrite intersticial, é evidente na histopatologia da maioria dos cães infectados com L. infantum, mesmo se não manifestada clinicamente.

Cão com sinais cutâneos de leishmaniose. Cortesia do Dr. Gad Baneth.

DIAGNÓSTICO:  Os testes diagnósticos incluem o hemograma, perfil bioquímico, urinálise e um ou mais testes específicos para confirmar a infecção. A sorologia quantitativa é útil, especialmente quando os sinais clínicos compatíveis estão
presentes.  Títulos  elevados  de  anticorpos  são  encontrados  em  80  a  100%  dos  cães  com  a  doença  clínica  e  podem  ser  conclusivos  para  um  diagnóstico.  Vários  métodos  quantitativos  sorológicos  para  a  detecção  de  anticorpos  anti­
Leishmania foram desenvolvidos, inclusive ensaios de imunofluorescência indireta, ELISA e ensaios de aglutinação direta. Antígenos recombinantes purificados, tais como rK39, também são utilizados para a detecção da leishmaniose em
cães e seres humanos. Reatividade sorológica cruzada com tripanosomas pode ser encontrada nas regiões onde a infecção por Trypanosoma é prevalente, particularmente com T. cruzi na América Latina.
A  detecção  do  DNA  específico  do  parasito  por  PCR  permite  o  diagnóstico  sensível  e  específico  da  infecção.  Vários  ensaios  diferentes,  com  diferentes  sequências  alvo  usando  o  DNA  genômico  ou  cinetoplástico  (kDNA),  têm  sido
desenvolvidos. A PCR pode ser realizada com DNA extraído de tecidos, sangue ou mesmo a partir de amostras histopatológicas. Os ensaios baseados no kDNA são os mais sensíveis para a detecção direta nos tecidos infectados. As
amostras de medula óssea, linfonodo ou baço são superiores às amostras de sangue na maioria das técnicas atuais de PCR.
As formas amastigotas da Leishmania podem ser detectadas por meio de citologia de linfonodos, baço, impressões de pele ou medula óssea corados com Giemsa ou um corante comercial rápido. A detecção de amastigotas por citologia
por vezes é pouco gratificante devido ao baixo número de parasitos detectáveis mesmo em cães com doença clínica evidente. Os parasitos de Leishmania também podem ser observados em cortes histopatológicos de biopsias de pele ou de
outros órgãos infectados fixados em formol e emblocados em parafina. A identificação dos parasitos no interior dos macrófagos de tecidos pode ser difícil; a imunomarcação com coloração imunoistoquímica pode verificar a presença
de Leishmania no tecido.
A detecção da infecção em cães sem a doença clínica, com a finalidade de importação para países não endêmicos ou de utilização como doadores de sangue, deve ser feita pela PCR, que é a técnica mais sensível de diagnóstico. Estudos
transversais de populações de cães de áreas endêmicas têm mostrado que as taxas de infecção podem chegar a 65 a 80%. Normalmente, apenas cerca de 10 a 13% manifestam os sinais clínicos da doença, 26% são soropositivos e incluem
cães doentes e subclinicamente infectados e aproximadamente 40 a 60% são portadores positivos identificados apenas pela PCR de tecidos.
TRATAMENTO:  O principal protocolo utilizado para o tratamento da leishmaniose canina inclui o antimoniato de N­metilglucamina (não aprovado para a utilização em cães nos EUA) a 75 a 100 mg/kg, SC, por 4 a 8 semanas combinado
com o alopurinol (10 mg/kg, VO, 2 vezes/dia, por 6 a 12 meses). O alopurinol também pode ser utilizado como o único agente terapêutico na mesma dose. A miltefosina (não aprovado para a utilização em cães nos EUA) a 2 mg/kg, VO, 1
vez/dia, durante 4 semanas também pode ser combinada com o alopurinol (10 mg/kg, VO, 2 vezes/dia) como uma alternativa para o antimoniato de N­metilglucamina. A anfotericina B é uma potente droga leishmanicida que deve ser
utilizada com cautela devido ao potencial de nefrotoxicidade. É administrada a 0,5 a 0,8 mg/kg, IV, diluída em 10 a 60 ml de dextrose 5% durante 45 min, 2 vezes/semana, durante 1 a 2 meses, até alcançar uma dose cumulativa de 15
mg/kg. Frequentemente, o tratamento apenas propicia melhora clínica temporária nos cães e muitas vezes não elimina os parasitos. Os cães tratados podem permanecer portadores da infecção e pode ocorrer recidiva. Eles permanecem
infecciosos para os flebótomos.
Inseticidas repelentes tópicos específicos são eficazes na redução das picadas dos flebótomos e na transmissão da doença. Uma coleira impregnada com deltametrina e formulações spot­on de permetrina e imidacloprid demonstraram
conferir proteção contra as picadas de flebótomos. A aplicação de inseticidas protetores é recomendada para cães em áreas endêmicas para Leishmania, cães que viajam para locais de infecção e cães infectados (para reduzir o potencial de
transmissão). Uma vacina de fração purificada contra a leishmaniose canina é comercializada no Brasil e outras vacinas estão em desenvolvimento.
RISCO ZOONÓTICO:  A leishmaniose visceral humana causada por L. infantum é um grave problema de saúde pública nas áreas onde a leishmaniose canina é endêmica e os cães são os reservatórios da infecção. É principalmente uma doença
de crianças. A desnutrição tem sido reconhecida como um fator de risco e pode explicar por que essa doença é mais prevalente entre as crianças de países pobres do que entre aquelas de países ricos, apesar das altas taxas de prevalência nas
populações de cães. A doença humana também é prevalente em indivíduos imunodeprimidos; os pacientes HIV­positivos são agora o grupo de risco predominante para a leishmaniose humana no sul da Europa. A coinfecção de HIV e
leishmaniose foi relatada em mais de 33 países em todo o mundo e não responde bem ao tratamento. Os esforços para controlar a leishmaniose canina e a doença humana nas áreas endêmicas baseiam­se na interrupção da transmissão da
infecção e na prevenção da infecção da população canina.

PANLEUCOPENIA FELINA (Enterite infecciosa felina, Parvovirose felina)

A panleucopenia felina é uma doença viral altamente contagiosa e às vezes fatal observada em gatos em todo o mundo. Os filhotes são afetados de forma mais grave. O parvovírus causador da doença é muito resistente, capaz de persistir
por até 1 ano no ambiente se protegido por matéria orgânica. A observação de casos de panleucopenia por médicos veterinários atualmente é incomum, supostamente em função do uso disseminado da vacina. Entretanto, a taxa de infecção
permanece alta em populações de gatos não vacinados e a doença ocasionalmente é observada em filhotes de raça vacinados expostos a altas concentrações de vírus.
ETIOLOGIA, TRANSMISSÃO E PATOGENIA:  O vírus da panleucopenia felina (FPV) é estreitamente relacionado com o vírus da enterite dos visons e ao parvovírus canino tipo 2 (CPV), causador da enterite canina parvoviral. O FPV pode
causar a doença em todos os felídeos e alguns membros de famílias relacionadas (p. ex., guaxinim e vison), mas não prejudicam canídeos. Por outro lado, foi demonstrado que estirpes de CPV circulantes atualmente causam doenças
semelhantes à panleucopenia felina em gatos domésticos e grandes felídeos. Em algumas partes do mundo, o CPV está tornando­se uma causa de panleucopenia felina tão importante quanto o FPV. Acredita­se que a vacinação contra o FPV
proteja os gatos também contra a infecção por estas estirpes de CPV, mas não de maneira ideal.
As partículas virais são abundantes em todas as secreções e excreções durante a fase aguda da doença, podendo ser disseminadas nas fezes dos sobreviventes por até 6 semanas após a recuperação. Altamente resistentes à inativação, os
parvovírus  podem  ser  transportados  por  grandes  distâncias  via  fômites  (como  sapatos  e  roupas).  Os  parvovírus  podem,  no  entanto,  ser  destruídos  pela  exposição  por  10  min  à  temperatura  ambiente  a  soluções  de  alvejante  doméstico
(hipoclorito de sódio aquoso 6%), formaldeído 4% ou glutaraldeído 1%. Desinfetantes peroxigenados também são altamente efetivos.
Os gatos são infectados pela via oronasal quando expostos a animais infectados, suas fezes, secreções ou fômites contaminados. A maioria dos gatos andarilhos é exposta ao vírus durante o seu primeiro ano de vida. Os animais que
desenvolvem a infecção subclínica ou que sobrevivem à doença aguda apresentam uma vigorosa resposta imune, protetora e prolongada.
O FPV infecta e destroi ativamente as células em divisão na medula óssea, tecidos linfoides, epitélio intestinal, e, em animais muito jovens, cerebelo e retina. Em fêmeas prenhes o vírus pode se disseminar por via transplacentária,
causando reabsorção embrionária, mumificação fetal, aborto ou natimortos. A infecção de filhotes no período perinatal pode destruir o epitélio germinal do cerebelo, levando a hipoplasia cerebelar, incoordenação e tremores. A ataxia
cerebelar induzida pelo FPV é um diagnóstico relativamente raro, pois muitas fêmeas transferem passivamente anticorpos suficientes para seus filhotes para protegê­los durante o período de suscetibilidade.
ACHADOS  CLÍNICOS:   A  maioria  das  infecções  são  subclínicas,  devido  à  alta  soroprevalência  de  anticorpos  anti­FPV  em  gatos  saudáveis  não  vacinados.  Os  animais  que  adoecem  geralmente  têm  menos  de  1  ano  de  idade.  Em  casos
hiperagudos a morte pode ocorrer subitamente com pouco ou nenhum sinal (“filhotes fracos”). Nos casos agudos há febre (40 a 41,7°C), depressão e anorexia após o período de incubação de 2 a 7 dias. Geralmente ocorre vômito entre 1 e 2
dias após o início da febre, tipicamente bilioso e sem relação com a alimentação. A diarreia pode iniciar pouco depois, mas nem sempre ocorre. A desidratação extrema desenvolve­se rapidamente. Os gatos afetados podem permanecer
sentados por horas diante de sua tigela de água, embora não bebam muito. Em casos terminais apresentam hipotermia, podendo desenvolver choque séptico e coagulação intravascular disseminada.
Ao exame físico normalmente apresentam depressão profunda, desidratação e, por vezes, dor abdominal. A palpação abdominal, que pode induzir vômito imediato, pode revelar espessamento de alças intestinais e aumento dos linfonodos
mesentéricos. Nos casos de hipoplasia cerebelar, ataxia e tremores são observados, com nível de consciência normal. Lesões na retina, quando presentes, apresentam­se como focos acinzentados isolados.
A duração dessa doença autolimitante é raramente maior do que 5 ou 7 dias. A maior taxa de mortalidade é em filhotes jovens com menos de 5 meses de idade.
Lesões: Há tipicamente poucas lesões macroscópicas, embora a desidratação geralmente seja acentuada. As alças intestinais em geral estão dilatadas e podem estar com as paredes espessadas e hiperêmicas. Podem ocorrer petéquias ou
equimoses na superfície serosa do intestino. A infecção perinatal dos filhotes pode ser notada por um cerebelo notadamente pequeno. Histologicamente, as criptas intestinais geralmente estão dilatadas e contêm restos de células epiteliais
necróticas. Vilosidades fundidas e sem extremidades podem ser notadas. Corpúsculos de inclusão intranuclear eosinofílicos são ocasionalmente observados em amostras fixadas em formalina.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico presuntivo geralmente baseia­se em sinais clínicos compatíveis em animais inadequadamente vacinados e na presença de leucopenia (50 a 3.000 leucócitos/μl). A neutropenia é um achado mais consistente do
que a linfopenia. Uma contagem total de leucócitos maior que 2.000/μl está associada a um prognóstico reservado. Durante a recuperação da infecção, ocorre uma neutrofilia típica de rebote com acentuado desvio à esquerda. O diagnóstico
pode  ser,  às  vezes,  confirmado  utilizando­se  kits  de  teste  imunocromatográfico  para  a  detecção  fecal  do  antígeno  do  CPV  na  própria  clínica.  Contudo,  o  antígeno  fecal  apenas  é  detectável  durante  um  curto  período  após  a  infecção.
Resultados falso­negativos são comuns.
O diagnóstico diferencial inclui outras causas de depressão profunda, leucopenia e sinais gastrintestinais. Salmoneloses, infecções pelo vírus da leucemia felina (FeLV) e pelo vírus da imunodeficiência felina devem ser considerados.
Infecções concomitantes do FeLV e do FPV podem causar uma síndrome parecida com a panleucopenia em gatos adultos.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO:  O sucesso do tratamento de casos agudos requer fluidoterapia intensa e cuidados de enfermagem em unidade de isolamento. Gatos gravemente afetados por vezes desenvolvem distúrbios eletrolíticos (p. ex.,
hipopotassemia),  hipoglicemia,  hipoproteinemia,  anemia  e  infecções  oportunistas  secundárias.  A  antecipação  destas  possibilidades,  o  monitoramento  intenso  e  a  pronta  intervenção  podem  melhorar  o  prognóstico.  A  base  da  terapia  é
fluidoterapia IV de reposição e manutenção com solução cristaloide isotônica (p. ex., solução de lactato de Ringer com suplementação calculada de potássio). Vitaminas do complexo B podem ser adicionadas à infusão, juntamente com
glicose  a  5%  se  houver  comprovação  ou  suspeita  de  hipoglicemia.  Além  da  infusão  de  cristaloide,  a  transfusão  de  plasma  fresco  congelado  auxilia  na  manutenção  da  pressão  oncótica  e  fornece  fatores  de  coagulação  para  filhotes
hipoproteinêmicos gravemente enfermos. A transfusão de sangue total é preferível para pacientes com anemia grave. A antibioticoterapia parenteral de amplo espectro é indicada, mas medicamentos nefrotóxicos (p. ex., gentamicina e
amicacina) devem ser evitados até que a desidratação seja corrigida. A medicação antiemética (p. ex., metoclopramida, maropitant) pode promover algum conforto e permitir o fornecimento de comida leve e de fácil digestão. A nutrição
parenteral é indicada para os casos graves.
Excelentes  vacinas  inativadas  e  de  vírus  vivo  modificado,  que  fornecem  uma  imunidade  sólida  e  duradoura,  estão  disponíveis  para  a  prevenção  da  panleucopenia  felina.  As  vacinas  vivas  não  devem  ser  administradas  em  gatos
imunossuprimidos, doentes, fêmeas gestantes ou filhotes com menos de 4 semanas de idade. Muitas autoridades recomendam que os filhotes devem receber 2 ou 3 doses subcutâneas de vacina de vírus vivo modificado, em intervalos de 3 a
4 semanas. A primeira vacinação geralmente é aplicada entre 6 e 9 semanas de idade. A última dose da série inicial de vacinação não deve ser administrada antes que os filhotes completem 16 semanas de idade para assegurar que os
anticorpos maternos não inativem o vírus vivo modificado. A exposição ao vírus não deve ser permitida até a primeira semana após o término da série inicial de vacinação. Os gatos devem ser revacinados após 1 ano e depois a cada 3 anos
ou mais, embora alguns fabricantes continuem a recomendar vacinação anual de reforço.

PERITONITE INFECCIOSA FELINA

A peritonite infecciosa felina (PIF) é uma doença imunomediada desencadeada pela infecção por um coronavírus felino (FCoV). O FCoV pertence à família Coronoviridae, um grupo de vírus RNA simples de sentido positivo, envelopado,
que frequentemente é encontrado em gatos. Anticorpos específicos contra o coronavírus estão presentes em até 90% dos animais de gatis e em até 50% dos gatos que vivem sozinhos em ambientes domésticos. Contudo, apenas cerca de 5%
dos gatos infectados pelo FCoV desenvolvem PIF.
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA:  A PIF e as infecções pelo FCoV ocorrem com uma prevalência similar em todo o mundo, sendo encontradas em animais domésticos e selvagens. As estirpes do FCoV podem ser classificadas em sorotipos I e
II dependendo de sua correlação antigênica com o coronavírus canino (CCV), e as proporções destes sorotipos variam entre diferentes países. Nos EUA e Europa, de 70 a 90% das estirpes isoladas são do sorotipo I, e no Japão predomina o
sorotipo II. A maior parte dos gatos que desenvolve PIF está infectada com o sorotipo I, mas os dois sorotipos podem causar PIF e causar infecções clinicamente inaparentes.
O FCoV pertence ao mesmo grupo taxonômico que o vírus da gastrenterite, coronavírus respiratório suíno, CCV e alguns coronavírus humanos. Em muitas espécies, os coronavírus possuem um tropismo relativamente restrito a órgãos
específicos, infectando essencialmente as células dos sistemas respiratório e gastrintestinal. Porém, em gatos e camundongos, as infecções por coronavírus podem, em determinadas circunstâncias, envolver diversos órgãos. Os coronavírus
possuem uma especificidade relativamente baixa por espécies, o CCV, por exemplo, também pode infectar gatos. A PIF, no entanto, apenas ocorre em felídeos.
Além de gatos, outras espécies de felídeos podem ser suscetíveis, sendo o FCoV um patógeno importante também em felídeos não domesticados. Foram localizados indícios de infecção em 195 de 342 felídeos silvestres no sul da África,
inclusive animais em cativeiro e de vida livre. Também há uma alta incidência de PIF nos felídeos selvagens mantidos em cativeiro nos EUA e na Europa. Guepardos em cativeiro são muito propensos em desenvolver PIF, e acredita­se que
a predisposição destes à doença deve­se a uma deficiência na imunidade celular de origem genética.
ETIOLOGIA E PATOGENIA:  A PIF é causada por um coronavírus chamado vírus da peritonite infecciosa felina (PIFV). A maioria das mortes por doenças infecciosas em gatos é causada pela PIF. Uma possível explicação para o aumento da
prevalência da PIF são as mudanças no manejo e as condições de alojamento dos gatos domésticos. Com a introdução do uso de “caixas de areia”, mais gatos são mantidos permanentemente em ambientes internos, expondo­os a doses
maiores de FCoV, presentes nas fezes que anteriormente eram enterradas no exterior. Ambientes de aglomeração como abrigos e criatórios também podem aumentar o estresse dos animais e ampliar a exposição ao vírus.
Originalmente acreditava­se que estirpes do FCoV que causavam a PIF eram diferentes daquelas que causava a forma entérica, avirulenta. Por este motivo, foram subdividas em dois biotipos distintos, o coronavírus entérico felino e o
vírus da peritonite infecciosa felina. Atualmente sabe­se que estes biotipos não são espécies diferentes, mas sim representam variações de virulência de um mesmo vírus. Assim, a designação FCoV deve ser utilizada para a descrição de
todas as coronaviroses felinas.
Após o animal infectar­se com o FCoV por meio de ingestão (ou mais raramente, inalação), o epitélio intestinal é o principal local de replicação viral. Esta replicação citoplasmática do FCoV pode ocasionar a destruição das células
atingidas, levando à diarreia em alguns indivíduos. Em alguns gatos, a infecção permanece por um grande período sem causar nenhum sinal clínico, podendo neste caso ocorrer eliminação do vírus tanto de forma contínua ou intermitente,
tornando o indivíduo uma fonte de infecção para outros gatos. Antigamente acreditava­se que a forma avirulenta do FCoV permanecia confinada ao trato digestório, não atravessando a mucosa e não se alastrando além do epitélio intestinal
e dos linfonodos locais. Entretanto, foi possível detectar com a PCR a presença do vírus no sangue de animais saudáveis criados em domicílios endêmicos para o FCoV, indicando que a forma avirulenta pode sim causar viremia. É provável
que esta viremia em gatos que não desenvolvem PIF seja apenas de curta duração e de baixa intensidade.
A PIF é uma doença esporádica causada por variantes virais que se desenvolvem no organismo de um animal específico. Aonde quer que exista infecção pelo FCoV, há potencial para a ocorrência da PIF. A patogênese da PIF não é clara,
mas há duas hipóteses principais. A “teoria da mutação interna” é baseada no fato de que uma mutação que favoreça a replicação viral em macrófagos seja necessária e que os gatos são infectados com a forma avirulenta primária que se
replica em eritrócitos. Em algumas situações, entretanto, ocorre uma mutação em uma região do genoma viral que cria um novo fenótipo com capacidade de se replicar nos macrófagos. A existência de estirpes altamente virulentas de FCoV
capazes de consistentemente induzir a PIF apoia esta teoria em situações experimentais, mas nenhuma mutação coerente foi identificada até o momento.
A segunda hipótese é que qualquer estirpe do FCoV pode causar o desenvolvimento da PIF, sendo a carga viral e a resposta imune do indivíduo determinantes para o desenvolvimento ou não desta. É provável que tanto a genética viral
quanto a imunidade do hospedeiro desempenhem um papel. Em ambas as hipóteses, o evento patogênico fundamental para a manifestação da PIF é a replicação maciça do vírus nos macrófagos. Se o animal falha em eliminar os macrófagos
infectados com vírus capazes de replicação logo no início da infecção, a presença do vírus no interior dos macrófagos inicia uma reação imunomediada tipo Arthus fatal, a qual define a PIF.
Entre  os  fatores  que  facilitam  a  replicação  do  FCoV  no  intestino  (ampliando  a  probabilidade  de  mutação)  estão:  pouca  idade,  predisposição  racial,  estado  imune,  estresse,  tratamento  com  corticosteroides,  cirurgia,  dosagem  viral,
virulência e taxa de reinfecção quando em ambientes com muitos gatos. Os filhotes que desenvolvem PIF provavelmente foram expostos a uma dose viral alta em um momento de suas vidas em que seus sistemas imunes imaturos estavam
enfrentando outras infecções, assim como o estresse da vacinação, relocação e castração.
A PIF é uma doença de imunocomplexo, envolvendo antígeno viral, anticorpos antivirais e complemento. Semanas após a ocorrência da mutação, os vírus mutantes podem ser encontrados no ceco, colón, linfonodos intestinais, baço e
fígado, após a distribuição pelos macrófagos circulantes por todo o organismo, incluído o SNC. Há duas possíveis explicações para os eventos que se seguem após a disseminação viral a partir dos intestinos. O primeiro mecanismo proposto
é a de que os macrófagos infectados saem da corrente sanguínea permitindo a entrada do vírus nos tecidos. O vírus atrai os anticorpos, há a fixação do sistema complemento e mais neutrófilos e macrófagos são atraídos para a lesão; em
consequência, ocorrem as alterações granulomatosas típicas. A explicação alternativa é a de que a PIF ocorre como resultado de imunocomplexos circulantes no sangue que acabam por infiltrar­se nas paredes dos vasos sanguíneos, fixando
então o complemento e levando ao desenvolvimento das alterações granulomatosas. Presume­se que os complexos antígeno­anticorpo são reconhecidos pelos macrófagos, mas que não são apresentados, como seria esperado, às células
exterminadoras naturais (NK), e assim não são destruídos.
As consequências da formação de imunocomplexos em gatos dependem do tamanho destes complexos, da concentração de anticorpos e do conteúdo antigênico. A deposição de imunocomplexos provavelmente ocorre nos pontos de
maior pressão sanguínea e maior turbulência, condições presentes em bifurcações de vasos. As lesões por PIF são comuns no peritônio, rins e úvea.
Além dos vírus, os macrófagos liberam substâncias quimiotáticas conforme morrem, inclusive o complemento e os mediadores inflamatórios. A fixação do complemento leva a liberação de aminas vasoativas, causando a retração das
células endoteliais e consequente aumento da permeabilidade vascular. A retração das células endoteliais dos capilares permite assim a exsudação de proteínas plasmáticas, daí a formação dos característicos exsudatos ricos em proteínas. Os
mediadores inflamatórios ativam as enzimas proteolíticas que causam dano tecidual. A vasculite imunomediada leva à ativação do sistema coagulatório e à coagulação intravascular disseminada (CID). Desequilíbrios em várias citocinas
(como o aumento de TNF­a e a diminuição de interferona­?) aparecem precocemente nas infecções experimentais.
EPIDEMIOLOGIA E TRANSMISSÃO:  O FCoV e a PIF são um grande problema em casas com vários gatos. O vírus é endêmico em ambientes limitados e com vários indivíduos, como gatis, abrigos e lojas de animais. O FCoV é raro em gatos
não domiciliados, em geral, solitários e sem contato próximo com outros. Mais importante ainda é o fato de que os gatos não domiciliados não compartilham os mesmos locais para enterrar suas fezes, que representam a principal fonte de
infecção em ambientes fechados.
Apesar da prevalência do FCoV ser muito alta em ambientes com muitos gatos, apenas cerca de 5% dos animais nesta situação desenvolvem PIF, sendo a taxa menor ainda em casas com apenas um animal. O risco de desenvolver PIF é
mais elevado em gatos jovens e imunossuprimidos, pois a replicação viral é menos controlada, facilitando a ocorrência de uma mutação crítica. Mais da metade de gatos que apresentam PIF possuem menos de 12 meses de idade.
O vírus é eliminado principalmente pelas fezes. A via de infecção geralmente é a oronasal. Pouco após a infecção, o FCoV já pode ser encontrado na saliva, secreções do sistema respiratório e na urina. Quando gatos não infectados de
domicílios com múltiplos gatos entram em contato com o vírus pela primeira vez, é provável que todos os gatos se tornem infectados (e desenvolvam anticorpos); a maioria destes eliminará o vírus intermitentemente por semanas ou meses.
Alguns indivíduos irão desenvolver a forma crônica, tornando­se fontes contínuas de reinfecção para outros gatos. Os animais anticorpo­negativos muito provavelmente não eliminarão o FCoV, enquanto aproximadamente um terço dos
gatos anticorpo­positivos para o FCoV eliminará o vírus. Já foi demonstrado que gatos com altos títulos de anticorpos têm maior probabilidade de eliminar o vírus, sendo também a eliminação mais constante e com maior quantidade de
vírus. A maioria dos gatos com PIF elimina o FCoV sem mutação. A carga viral nas fezes parece diminuir após o desenvolvimento de PIF.
A principal fonte de FCoV para os gatos não infectados são as “caixas de areia” compartilhadas com os gatos que eliminam o vírus. A contínua reinfecção de um gato já infectado através destas caixas contaminadas parece ter um papel
importante na sobrevivência endêmica do vírus. Mais raramente, o vírus pode ser transmitido através da saliva, lambedura mútua, compartilhamento de vasilhas e por outras formas de contato próximo. A transmissão por gotículas oriundas
de espirro é rara, porém possível. É incerto se a transmissão do FCoV ocorre em grau significativo nas exposições felinas. A transmissão por piolhos ou pulgas é considerada improvável. A transmissão transplacentária pode ocorrer, mas
isto é muito incomum em circunstâncias naturais. A maioria dos filhotes removidos do contato com adultos liberando vírus até 5 a 6 semanas de idade não são infectados. É mais comum a infecção de gatinhos com idade entre 6 e 8
semanas, no momento em que seus anticorpos maternos diminuem, principalmente pelo contato com as fezes de suas mães ou de outros gatos que estejam excretando o vírus.
O FCoV é um vírus relativamente frágil, inativado à temperatura ambiente entre 24 e 48 h. É destruído pela maioria dos desinfetantes e detergentes de uso doméstico. Pode, no entanto sobreviver em condições secas (p. ex., em carro para
transporte de animais) por até 7 semanas. A transmissão indireta por fômites é, portanto, possível e o vírus pode ser transmitido através de roupas, brinquedos, e utensílios.
ACHADOS CLÍNICOS
Infecção por FCoV: Pode causar uma diarreia transitória e clinicamente leve e/ou vômitos devido à replicação do FCoV nos enterócitos. Filhotes infectados com o FCoV podem ter um histórico de crescimento retardado ou, mais raramente,
sinais no trato respiratório superior. Ocasionalmente o vírus pode causar diarreia grave e perda de peso, podendo esta não ser responsiva ao tratamento e continuar por meses. A maioria dos gatos infectados não apresentam sinais clínicos.
PIF:  Os sinais clínicos variam de acordo com os órgãos envolvidos. Vários deles, inclusive o fígado, rins, pâncreas, sistema nervoso central e olhos podem ser afetados. Os sinais clínicos e os achados patológicos são uma consequência da
vasculite e da falência de órgãos, como resultado de danos aos vasos sanguíneos que os irrigam. Em todos os casos de gatos com sinais clínicos inespecíficos, como perda de peso crônica ou febre resistente ao tratamento com antibióticos
de origem desconhecida e/ou recorrente, deve­se considerar a PIF entre os diagnósticos diferenciais.
O  período  entre  a  mutação  e  o  desenvolvimento  dos  sinais  clínicos  é  desconhecido  e  depende  do  sistema  imunológico  do  indivíduo.  A  doença  geralmente  torna­se  aparente  após  um  período  entre  algumas  semanas  a  2  anos  após  a
ocorrência da mutação. O tempo entre a infecção pelo FCoV e o desenvolvimento da PIF é ainda mais imprevisível, dependendo da ocorrência da mutação espontânea. Os gatos correm mais risco de desenvolver PIF entre 6 e 18 meses após
a infecção, diminuindo o risco para cerca de 4% 36 meses após a infecção.
Antigamente, distinguiam­se três formas diferentes de PIF: 1) forma efusiva, exsudativa e úmida; 2) forma não efusiva, não exsudativa, seca, granulomatosa e parenquimatosa; e 3) forma mista. A primeira forma era caracterizada por
formas efusivas de peritonite fibrinosa, pleurite e ou pericardite. A segunda forma era caracterizada por mudanças granulomatosas em diferentes órgãos inclusive olhos e SNC. Hoje em dia entende­se a que diferenciação entre estas formas
não é útil na prática (sendo valiosa apenas em uma abordagem diagnóstica), uma vez que sempre há efusão ou alterações granulomatosas em maior ou menor grau. Adicionalmente, as formas podem transformar­se uma na outra. Desta
maneira, a PIF pode apenas ser mais ou menos exsudativa ou produtiva em certos animais e em certas ocasiões.
Muitos gatos com PIF desenvolvem efusões, comumente representadas por efusões torácicas ou ascite. Mais raramente são encontradas efusões em outras regiões, inclusive o pericárdio e saco escrotal. Não obstante, menos de 50% de
todos os gatos que apresentam efusões realmente possuem PIF.
Em gatos com ascite frequentemente nota­se tumefação do abdome, podendo­se perceber onda de fluido abdominal. Em casos menos graves pode ser percebido, por palpação, fluido entre as alças intestinais. Por vezes, pode ser possível
localizar na palpação do abdome massas anormais, representativas de adesões omentais e viscerais ou linfonodos mesentéricos aumentados. Efusões torácicas podem causar dispneia, taquipneia, respiração pela boca e mucosas cianóticas.
Os  sons  cardíacos  apresentam­se  abafados.  Em  casos  com  efusão  pericárdica,  além  do  ruído  cardíaco  abafado,  podem  ser  constatadas  mudanças  típicas  no  ECG  e  ecocardiografia.  Os  animais  podem  permanecer  tanto  alertas  quanto
deprimidos.  Alguns  apresentam  anorexia,  enquanto  outros  possuem  apetite  normal  ou  até  mesmo  aumentado.  Podem  ainda  apresentar  febre,  perda  de  peso  e  icterícia.  As  efusões  podem  ser  visualizadas  por  métodos  diagnósticos  por
imagem (radiografia e ultrassonografia) e comprovadas por punção.
Em  gatos  sem  efusão  evidente,  onde  basicamente  estão  presentes  alterações  granulomatosas,  os  sinais  são  por  vezes  vagos,  inclusive  febre,  perda  de  peso,  letargia  e  perda  de  apetite.  Pode  ocorrer  icterícia.  Se  os  pulmões  forem
envolvidos, os gatos podem tornar­se dispneicos e as radiografias torácicas podem revelar densidades irregulares nos pulmões. A palpação abdominal pode revelar linfonodos mesentéricos aumentados e irregularidades nos rins e outras
vísceras. Os sinais clínicos presentes às vezes podem ser incomuns. Em alguns casos suspeita­se de tumores abdominais, sendo a PIF diagnosticada apenas na necropsia.
Frequentemente  são  encontradas  lesões  oculares,  sendo  mais  comuns  as  alterações  na  retina.  O  exame  de  retina  deve  ser  realizado  em  todos  os  gatos  com  suspeita  de  PIF.  Pode  estar  presente  na  vasculatura  retinal  uma  bainha  de
transudato, que aparece como linhas acinzentadas irregulares em ambos os lados dos vasos sanguíneos. Ocasionalmente podem ser localizadas na retina lesões granulomatosas, hemorragia ou descolamento. Estas alterações, no entanto, não
são pato gnomônicas, sendo semelhantes às verificadas em outras doenças infecciosas sistêmicas como toxoplasmose, infecções fúngicas, FIV ou FeLV.
Outra manifestação comum é a uveíte, que em casos brandos aparece como uma mudança na coloração da íris. Na maior parte dos casos a íris torna­se parcial ou totalmente marrom, embora no caso de olhos azuis estes possam por vezes
parecer esverdeados. A uveíte também pode causar turvamento da câmara anterior, sendo detectada por iluminação focal realizada em quarto escuro. Um grande número de células inflamatórias deposita­se na porção anterior da córnea e
causam precipitados que podem ser ocultos pela membrana nictante. Pode ocorrer ainda hemorragia na câmara anterior. Punção do humor aquoso revela pleocitose e proteína elevada.
Sinais neurológicos são comuns em gatos com PIF, sendo variáveis e refletindo a área afetada do SNC. Normalmente as lesões são multifocais. Os sinais clínicos mais comuns depois da ataxia são nistagmo e convulsões. Adicionalmente,
podem  ser  constatados  incoordenação,  tremor  intencional,  hiperestesia,  mudanças  de  comportamento  e  manifestações  de  anormalidades  de  nervos  craniais.  No  caso  do  envolvimento  dos  nervos  cranianos,  sinais  neurológicos  como
deficiências visuais e ausência de reflexo de ameaça, podem estar presentes. Quando as lesões estão localizadas em nervos periféricos ou na coluna pode ser observada claudicação, ataxia ou paresia progressiva. A presença de hidrocefalia
verificada em tomografia computadorizada é sugestiva da ocorrência de PIF neurológica. Em um estudo com 24 gatos com PIF com envolvimento neurológico, o exame pós­morte identificou hidrocefalia em 75% dos animais.
Há uma rara forma entérica nodular de PIF verificada em gatos jovens com diarreias e vômitos, associada a lesões intestinais granulomatosas. O único ou principal órgão afetado nestes casos é o intestino. As lesões são encontradas
normalmente apenas na junção ileocecocólica, mas podem estar presentes em outras áreas como colón e intestino delgado. Os gatos podem apresentar uma diversidade de sinais como resultado destas lesões, sendo a mais comum a diarreia
crônica. Vômitos e constipação intestinal podem ocorrer, e alguns gatos apresentam apenas obstrução gastrintestinal. A palpação do abdome por vezes revela uma área intestinal espessada. A hematologia pode mostrar números aumentados
de corpos de Heinz como resultado da absorção diminuída de vitamina B12.
A síndrome da pele frágil foi descrita em um animal com PIF, e outras lesões de pele, como lesões nodulares, papulares e pododermatite, também estar presentes. Doenças reprodutivas, morte neonatal e filhotes que definham não são
costumeiramente associados à PIF.
Lesões:  A  histologia  das  lesões  geralmente  é  patognomônica.  Amostras  coradas  com  hematoxilina  e  eosina  tipicamente  apresentam  inflamação  perivascular  mista  com  macrófagos,  neutrófilos,  linfócitos  e  células  plasmáticas.  Os
piogranulomas podem ser grandes e firmes, por vezes com necrose tecidual focal ou numerosas lesões menores. Os tecidos linfoides ocasionalmente apresentam depleção linfoide causada por apoptose.
DIAGNÓSTICO:  Um diagnóstico rápido e seguro da PIF é importante, mas pode ser difícil. As dificuldades surgem da falta de testes confirmatórios não invasivos em gatos que não apresentam efusões óbvias. A obtenção e a análise das
efusões são minimamente invasivas e muito mais sensíveis do que os testes hematológicos. Em gatos que não apresentam efusões, diversos parâmetros devem ser considerados para a determinação de quando serão realizados os testes
confirmatórios invasivos, inclusive o histórico, sinais clínicos, alterações constatadas laboratorialmente e títulos de anticorpos.

Hematologia  e  Bioquímica  Sérica:  Os  leucócitos  podem  estar  aumentados  ou  diminuídos.  A  linfopenia  é  comum,  causada  principalmente  por  apoptose  de  células  T  não  infectadas  (primariamente  células  CD8+  T)  como  resultado  da  alta
concentração  de  TNF­a  produzido  pelos  macrófagos  infectados.  Entretanto,  linfopenia  combinada  com  neutrofilia  pode  ocorrer  em  diversas  doenças  felinas  graves.  Uma  anemia  não  regenerativa  de  leve  a  moderada  é  outro  achado
inespecífico que pode ocorrer em praticamente todas as doenças crônicas de gatos.
O achado laboratorial mais comum em gatos com PIF é o aumento da concentração sérica de proteína total causada pelo aumento de globulinas, sobretudo gamaglobulina. A proteína total pode alcançar concentrações muito altas, de até
120 g/l (12 g/dl) ou mais. A relação albumina:globulina tem importância diagnóstica significativamente maior no diagnóstico diferencial do que a concentração de gamaglobulina ou de proteína total sérica, porque também pode ocorrer
diminuição do teor sérico de albumina pela diminuição da produção devido à perda de proteína ou insuficiência hepática. A perda de proteína em gatos com PIF também pode ser causada por glomerulonefrite secundária à deposição de
imunocomplexos, por enteropatia exsudativa (em caso de alterações granulomatosas nos intestinos) ou por extravasamento de fluidos ricos em proteínas por vasculite. Um valor de corte de 0,8 foi definido como o melhor para a razão entre
albumina e globulina. A eletroforese de proteínas séricas pode ser realizada em gatos suspeitos para distinguir uma hipergamaglobulinemia monoclonal de uma policlonal, de modo a diferenciar PIF (assim como outras infecções crônicas)
de tumores como mielomas múltiplos ou tumores de células plasmáticas. O valor do achado é, no entanto, limitado.
Outros  parâmetros  laboratoriais,  inclusive  enzimas  hepáticas,  bilirrubina,  ureia  (ou  BUN)  e  creatinina,  podem  estar  elevados  de  forma  variável,  dependendo  do  grau  e  da  localização  das  lesões  aos  órgãos,  mas  não  são  úteis  no
estabelecimento do diagnóstico. Icterícia e hiperbilirrubinemia por vezes são observadas e frequentemente refletem necrose hepática. Às vezes, a concentração de bilirrubina está aumentada em gatos com PIF, sem evidência de hemólise,
doença hepática ou colestase; este achado incomum é observado apenas em animais com sepse. O metabolismo da bilirrubina e a excreção biliar estão comprometidos, provavelmente, pelo alto teor de TNF­a, que inibe o transporte através
de me mbrana. Assim, bilirrubina elevada na ausência de hemólise e aumento da atividade de enzimas hepáticas fazem suspeitar de PIF.
Alta concentração sérica de a1­glicoproteína ácida (AGP) (> 3 mg/ml), uma proteína de fase aguda normalmente elevada em gatos com PIF, pode sustentar o diagnóstico, embora outras condições inflamatórias também a eleva, se ndo
assim inespecífica. Adicionalmente, a AGP também pode estar elevada em gatos assintomáticos infectados por FCoV, especialmente nos domicílios onde o vírus é endêmico.
Algoritmo para obter o diagnóstico definitivo em um gato com suspeita de PIF.

EFUSÃO FLUIDA:  Os testes realizados em efusões possuem uma importância diagnóstica muito maior do que os testes realizados no sangue. O fluido pode ser obtido através de aspiração com agulha fina guiada por ultrassonografia, ou no
caso de ascite, usando a “técnica do gato voador”. Apesar das efusões de coloração amarela clara e de consistência pegajosa serem consideradas típicas, apenas a presença de fluido com estas características nas cavidades não é definitiva
para o diagnóstico. O fluido pode ainda apresentar uma aparência diferente, sendo descritos alguns casos de efusão quilosa. Normalmente contém grande quantidade de proteínas (> 3,5 g/dl), compatível com exsudato, enquanto o conteúdo
celular  é  baixo  (<  5.000  células  nucleadas/ml),  assemelhando­se  a  um  transudato  puro  ou  modificado.  Os  principais  diagnósticos  diferenciais  para  estas  efusões  incluem  doença  inflamatória  hepática,  linfoma,  insuficiência  cardíaca  e
peritonite ou pleurite bacteriana. Tipicamente, a atividade da lactato desidrogenase (LDH) está elevada (> 300 UI/l). A citologia é variável, mas muitas vezes consiste predominantemente de macrófagos e neutrófilos, de maneira similar à
citologia verificada em gatos com serosite bacteriana ou linfoma, e a diferenciação geralmente pode ser feita pela presença de células neoplásicas (na citologia) ou pela presença de bactérias intracelulares (com o crescimento destas em
cultura).
O teste de Rivalta é um método simples e econômico, não necessitando de equipamento laboratorial especial e pode ser realizado facilmente em clínicas particulares. É muito útil para diferenciar as efusões causadas por PIF daquelas
causadas  por  outras  doenças.  A  alta  concentração  de  proteínas  e  as  altas  concentrações  de  fibrina  e  de  mediadores  inflamatórios  definem  o  resultado  positivo  da  reação.  Para  realizar  o  teste,  um  tubo  de  ensaio  transparente  (10  ml)  é
preenchido com aproximadamente 8 ml de água destilada e uma gota de ácido acético (vinagre altamente concentrado, 98%). Coloca­se cuidadosamente uma gota da efusão na superfície da solução. O resultado é negativo caso a gota
dissolva­se  e  a  solução  permaneça  límpida.  Se  a  gota  mantiver  sua  forma,  permanecer  na  superfície  ou  afundar  vagarosamente,  o  resultado  é  positivo.  O  teste  de  Rivalta  apresenta  valor  preditivo  positivo  alto  (86%)  e  valor  preditivo
negativo muito alto (96%) para a PIF. Resultados positivos podem ocorrer em casos de peritonite bacteriana ou linfoma. Estas efusões, no entanto são geralmente fáceis de diferenciar através de exame macroscópico, citologia ou cultura
bacteriana.
Fluido Cerebrospinal: A análise do fluido cerebrospinal (FCE) de gatos com sinais neurológicos de PIF pode revelar valores elevados de proteína (50 a 350 mg/dl, quando os valores normais são < 25 mg/dl) e pleocitose (100 a 10.000 células
nucleadas/ml) constituída principalmente por neutrófilos, linfócitos e macrófagos (achado relativamente inespecífico). Muitos gatos com sinais neurológicos de PIF apresentam FCE normal.
Mensuração de Anticorpos: Não há nenhum teste de pesquisa de anticorpos para a PIF; apenas os anticorpos anti­FCoV podem ser mesurados. A titulação de anticorpos no soro é amplamente utilizada como método diagnóstico. Entretanto, a
maioria  dos  animais  positivos  para  anticorpos  anti­FCoV  nunca  desenvolverão  PIF.  Assim,  os  títulos  de  anticorp  os  devem  ser  interpretados  com  extrema  cautela.  Os  testes  de  anticorpos  possuem  ainda  certo  papel  no  diagnóstico,  de
maneira mais importante, no manejo em ambientes com múltiplos gatos, desde que sejam utilizadas metodologias apropriadas e que os resultados sejam corretamente interpretados. Entretanto, estes testes apenas podem ser úteis quando o
laboratório é confiável. Títulos baixos ou médios não possuem valor diagnóstico. Valores muito altos, desde que cuidadosamente interpretados, podem ter certo valor diagnóstico. Gatos com altos títulos de anticorpos são mais predispostos
a eliminar o vírus e em maior quantidade. Assim, o título está diretamente correlacionado com a taxa de replicação viral e a quantidade de vírus nos intestinos. A mensuração de anticorpos pode ser útil na prática, por exemplo, para
determinar o prognóstico de um gato exposto ou se o animal exposto está eliminando o FCoV. A triagem em gatis, ou a triagem de um gato antes da introdução em um gatil livre do vírus são indicações adicionais.

Teste de Rivalta positivo em amostra obtida de um gato com PIF. Cortesia do Dr. Katrin Hartmann.

A mensuração de anticorpos em outros fluidos além do sangue (p. ex., efusões e FCE) vem sendo investigada. A presença de anticorpos nas efusões está correlacionada com a presença de anticorpos no sangue; assim, os títulos de
anticorpos nas efusões não são muito úteis. Um estudo investigando o valor diagnóstico da detecção de anticorpos no FCE relatou uma correlação muito boa para a presença de PIF quando comparado com a histopatologia, mas outros 2
estudos mais recentes com um número grande de gatos consultados em hospitais veterinários de instituições de ensino não revelou nenhuma diferença significativa nos níveis de anticorpos no FCE de gatos com sinais neurológicos devido à
PIF em comparação com os gatos com outras doenças neurológicas confirmados por exame histopatológico.
PCR via Transcriptase Reversa (RT­PCR): A RT­PCR para detecção do FCoV no sangue vem sendo utilizada com maior frequência como uma ferramenta de diagnóstico para a PIF. Até agora, no entanto, não foi desenvolvida uma PCR que
possa diagnosticar definitivamente a PIF. Além disso, os resultados da PCR não são fáceis de interpretar, podendo ser falso negativo (p. ex., porque o ensaio requer a transcrição reversa do RNA viral para DNA antes da amplificação do
DNA, e a degradação do RNA pode ser um problema potencial porque as RNAases são virtualmente onipresentes) ou falso positivo (p. ex., o ensaio não faz distinção entre as estirpes virulentas e avirulentas do FCoV, nem diferencia o
FCoV dos coronavírus de outras espécies). A viremia parece ainda ocorrer não só em gatos com PIF, mas também em portadores saudáveis. O RNA do FCoV foi detectado no sangue de gatos com PIF, mas também em gatos saudáveis ??
que não desenvolveram manifestação por um período de até 70 meses. Deste modo, os resultados dos testes de PCR devem ser interpretados cuidadosamente, e não podem ser utilizados como uma ferramenta para o diagnóstico definitivo.
PCR foi utilizada para detectar o FCoV em amostras fecais, sendo sensível e útil para documentar se um gato está eliminando FCoV nas fezes. A intensidade do resultado da PCR nas fezes correlaciona­se com a quantidade de vírus
presente nos intestinos. Estes resultados podem ser úteis na detecção de gatos que cronicamente eliminam grandes cargas de vírus e que representam um risco elevado em ambientes com muitos gatos.
Detecção  do  Complexo  Antígeno­Anticorpo:  Como  a  PIF  é  uma  doença  imunomediada  e  os  complexos  antígeno­anticorpo  desempenham  um  papel  importante  na  patogênese,  tem  se  sugerido  que  a  procura  de  imunocomplexos  específicos
circulantes no soro e nas efusões possa ser útil. A detecção de complexos antígeno­anticorpo específicos para coronavírus pode ser realizada utilizando­se um ELISA competitivo. A utilidade, no entanto, é limitada e o valor preditivo
positivo deste teste não é muito elevado (67%).
Imunocoloração  do  Antígeno  do  FCoV: Outros  métodos  para  detectar  o  vírus  incluem  a  detecção  de  antígeno  do  FCoV  em  macrófagos  utilizando  imunofluorescência  (em  efusões)  ou  imunoistoquímica  (em  tecidos).  A  imunomarcação  não
diferencia o FCoV inofensivo do FCoV causador da PIF, mas apenas o vírus causador da PIF é capaz de se replicar em quantidades suficientemente grandes nos macrófagos para produzir uma coloração positiva. Em um estudo recente no
qual um grande número de gatos com PIF confirmada e de controles com outras doenças (também confirmadas) foram investigados, a coloração imunofluorescente positiva do antígeno intracelular do FCoV nos macrófagos de efusões foi
100%  preditiva  para  a  PIF.  Infelizmente,  o  valor  preditivo  negativo  do  teste  não  é  muito  elevado  (57%),  e  isto  pode  ser  explicado  pelo  baixo  número  de  macrófagos  nos  esfregaços  de  efusões,  resultando  em  coloração  negativa.  A
imunoistoquímica pode ser utilizada para detectar a expressão de antígeno do FCoV no tecido e também possui valor preditivo positivo de 100%. No entanto, os métodos invasivos (p. ex., laparotomia ou laparoscopia) são geralmente
necessários para se obter amostras de tecidos apropriadas. Tanto a histologia (que por si só é confirmatória) quanto a coloração imunoistoquímica do antígeno nos macrófagos dos tecidos podem ser utilizadas para diagnosticar a PIF.
TRATAMENTO, CONTROLE E PREVENÇÃO:  O tratamento dos gatos com PIF é frustrante e limitado aos casos que respondem favoravelmente nos primeiros dias. O prognóstico de um gato com PIF é muito pobre. Em um estudo prospectivo
inclusive  43  gatos  com  PIF  confirmada,  a  sobrevida  média  após  o  diagnóstico  definitivo  foi  de  9  dias.  Alguns  gatos,  no  entanto,  podem  sobreviver  durante  vários  meses.  Fatores  que  indicam  um  prognóstico  pobre  e  um  tempo  de
sobrevivência curto são: baixo índice de Karnofsky (índice de qualidade de vida), baixa contagem de plaquetas, baixa contagem de linfócitos, elevada concentração de bilirrubina e uma grande quantidade de efusão. As convulsões devem
ser consideradas um sinal prognóstico desfavorável, pois são significativamente mais frequentes nos animais com lesões inflamatórias no córtex frontal. Os gatos que não apresentam nenhuma melhora no prazo de 3 dias após o início do
tratamento provavelmente não obterão nenhum benefício da terapia e a eutanásia deve ser considerada.
O  tratamento  de  suporte  visa  a  supressão  da  reação  imune  exagerada,  geralmente  com  a  utilização  de  corticosteroides.  No  entanto,  não  há  estudos  controlados  que  indiquem  que  os  corticosteroides  tenham  qualquer  efeito  benéfico.
Ocasionalmente há relatos de gatos tratados com corticosteroides que apresentaram melhora clínica por vários meses. As drogas imunossupressoras, tais como prednisona (2 a 4 mg/kg, VO, 1 vez/dia), têm sido sugeridas. Alguns gatos com
efusões são beneficiados com a remoção do líquido e com uma injeção de dexametasona na cavidade abdominal ou torácica (1 mg/kg até não se constatar mais nenhuma efusão).
Gatos com PIF devem ainda ser tratados com antibióticos de amplo espectro e com terapia de suporte (p. ex., fluidos SC). Um inibidor de tromboxano sintetase (cloridrato de ozagrel), que inibe a agregação plaquetária, tem sido utilizado
em alguns gatos e conduziu a alguma melhoria dos sinais clínicos. Há relatos de que a pentoxifilina, um medicamento que diminui a vasculite e inibe várias citocinas (tais como as interleucinas e o TNF­a), pode ser benéfica em alguns
animais.
Moduladores imunitários (p. ex., Propionibacterium acnes, acemanana) têm sido utilizados no tratamento de gatos com PIF sem evidência documentada de eficácia. Tem sido sugerido que estes agentes podem beneficiar os animais
infectados através da restauração da função imunológica comprometida. No entanto, uma estimulação não específica do sistema imune parece ser contraindicada nos casos de PIF, porque os sinais clínicos se desenvolvem e progridem como
resultado de uma resposta imunomediada. Alguns relatos mais antigos sugerem que a tilosina, que tem efeitos imunomoduladores, pode ser benéfica no tratamento de alguns gatos. Remissões de duração variável foram relatadas em casos
individuais, mas a PIF não foi confirmada em muitos destes casos. O modulador imunológico promodulin foi utilizado em 52 gatos com suspeita de PIF, que responderam favoravelmente ao tratamento; uma remissão rápida dos sinais
clínicos (anorexia, febre e efusão) foi verificada. No entanto, a PIF novamente não foi confirmada, e não havia um grupo de controle ou de acompanhamento a longo prazo no estudo.
Em  um  estudo,  29  gatos  suspeitos  de  apresentarem  PIF  foram  tratados  em  5  grupos  por  mais  de  6  semanas.  Os  grupos  receberam:  a)  ampicilina  (100  mg/kg/dia),  prednisolona  (4  mg/kg/dia)  e  ciclofosfamida  (4  mg/kg/dia);  b)
dexametasona (2 mg/kg no dia 1 e no dia 5) e ampicilina (20 mg/kg, 3 vezes/dia, durante 10 dias); c) interferona­a humano (6 × 105 UI/gato, 5 dias por semana, durante 3 semanas); d) indutor de paraimunidade (0,5 ml/gato/semana, durante
6 semanas); e) nenhum tratamento (controle). Entre 29% e 80% dos gatos vieram a óbito em um período de 3 anos (dependendo do grupo). Entretanto, a PIF também não foi confirmada nestes gatos e os critérios de inclusão permanecem
obscuros.
Vários estudos investigaram a eficácia de diversos medicamentos antivirais em gatos com PIF. Até o momento, nenhum deles provou ser efetivo. Um gato tratado com o melfalana, um agente alquilante do grupo mostarda de nitrogênio
que interage irreversivelmente com o DNA, respondeu bem ao tratamento por 9 meses, mas, após este período, desenvolveu enfermidade mieloproliferativa e morreu. O diagnóstico da PIF também não foi confirmado neste caso.
Os interferons têm sido utilizados frequentemente em gatos com PIF. A interferona­a humana tem um efeito antiviral direto, sendo comprovada a eficácia antiviral in vitro contra uma estirpe de FCoV causadora de PIF. Em um estudo
controlado,  gatos  com  PIF  confirmada  e  tratados  com  106  UI/kg  de  interferona­a  em  combinação  com  Propionibacterium  acnes  apresentaram  tempo  de  sobrevivência  significativamente  mais  prolongado  (cerca  de  3  semanas).  A
interferona­? felina foi licenciada para o uso veterinário em alguns países europeus e no Japão. Os gatos podem ser tratados parenteralmente com a interferona­? felina por longos períodos sem desenvolverem anticorpos. A replicação do
FCoV é inibida in vitro pela interferona­? felina, mas os resultados do tratamento são variáveis. Em um tratamento recentemente realizado, randomizado, duplo­cego com uso de placebo, não houve diferença estatística significativa entre o
tempo de sobrevivência média dos gatos tratados com a interferona­? ou com o placebo. Os gatos sobreviveram durante um período de 3 a 200 dias.
Manejo de Gatos Expostos: Quando um gato de um domicílio desenvolve PIF, todos os gatos que convivem no mesmo ambiente já terão sido expostos ao mesmo FCoV. Sob circunstâncias naturais, parece que o vírus causador da PIF não é
excretado em tais casos e que a PIF não é transmitida de gato para gato. Após o desenvolvimento da PIF, um gato eliminará menos FCoV “inofensivo” do que antes do desenvolvimento da doença. No entanto, em condições experimentais,
é possível transmitir o vírus causador a partir de um gato com PIF para outros gatos em contato. Ainda assim, parece ser relativamente seguro trazer de volta um gato com PIF para a mesma casa que tenha gatos que já entraram em contato
com a estirpe do FCoV, uma vez que estes gatos terão certa imunidade para esta estirpe específica. Não é recomendado permitir o contato entre um gato com PIF com qualquer novo gato que ainda não tenha sido exposto ao vírus.
Se um gato foi eutanasiado ou morreu devido à PIF, o proprietário deve esperar pelo menos 3 meses antes de adquirir outro gato. O FCoV pode permanecer infectante por pelo menos 7 semanas no ambiente, especialmente quando as
caixas de areia estão em uso. Outros gatos presentes na casa provavelmente estarão infectados e eliminando o FCoV. Os gatos são normalmente levados ao veterinário para uma avaliação após o contato com um gato com PIF ou com um
gato suspeito ou que sabidamente esteja excretando o vírus. O proprietário pode querer saber o prognóstico para o gato exposto ou se este está eliminando o vírus. Estes gatos provavelmente serão anticorpo­positivos, uma vez que 95 a
100% dos gatos expostos ao FCoV são infectados e desenvolvem anticorpos entre 2 e 3 semanas após a exposição. Poucos gatos podem ser resistentes à infecção pelo FCoV. Tem sido demonstrado que alguns gatos de ambientes endêmicos
para o FCoV, e com múltiplos gatos, permanecem continuamente anticorpo­negativos. O mecanismo de ação para essa resistência é desconhecido.
Embora os gatos expostos provavelmente tenham anticorpos, isso não está necessariamente associado a um prognóstico desfavorável. A maioria dos gatos infectados com o FCoV não irá desenvolver a PIF e muitos gatos em casas com
apenas um ou dois gatos eliminarão a infecção e irão tornar­se anticorpo­negativos dentro de alguns meses a anos (geralmente cerca de 6 meses.). Os proprietários devem ser aconselhados a esperar até que os testes de anticorpos de todos os
gatos sejam negativos ou até que a PCR das amostras fecais (4 amostras fecais testadas durante um período 2 semanas) sejam negativas antes de adquirir um novo gato. Se o teste de anticorpos é utilizado, os gatos devem ser testados
novamente (usando o mesmo laboratório) a cada 6 a 12 meses até que o resultado seja negativo. Alguns gatos permanecerão anticorpo­positivos por anos.
Manejo de Ambientes Domésticos com Vários Gatos: Na maioria dos ambientes domésticos com vários gatos, o FCoV é endêmico e a PIF praticamente inevitável. Casas com menos de 5 gatos podem tornar­se espontânea e naturalmente livres de
FCoV, mas em casas com mais de 10 gatos isto é quase impossível porque o vírus passa de um gato para outro, mantendo a infecção. Nestes ambientes endêmicos para o FCoV, como gatis, abrigos e lares adotivos, não há praticamente nada
a ser feito para evitar a PIF.
Várias táticas têm sido utilizadas para eliminar o FCoV de um gatil endêmico. A redução do número de gatos (especialmente de gatinhos com < 12 meses) e a manutenção da limpeza de superfícies suspeitas de contaminação pelo FCoV
podem minimizar a carga da população viral. Testes de anticorpos ou PCR fecal e segregação podem ser realizados para impedir a exposição. Cerca de um terço dos gatos anticorpo­positivos excretam o vírus e, assim, cada gato anticorpo­
positivo deve ser considerado infeccioso. Após 3 a 6 meses, os títulos de anticorpos podem ser testados novamente. Alternativamente, pode ser realizada a PCR de amostras fecais (várias) para detectar portadores crônicos do FCoV, e estes
gatos  podem  ser  removidos.  Em  ambientes  como  muitos  gatos,  40  a  60%  dos  animais  eliminaram  o  vírus  em  suas  fezes  em  um  determinado  momento.  Cerca  de  20%  eliminarão  o  vírus  persistentemente.  Se  um  gato  permanece
persistentemente positivo na PCR por mais de 6 semanas, este deve ser isolado.
Os filhotes de fêmeas que estejam eliminando o FCoV podem permanecer protegidos da infecção pelos anticorpos maternos até 5 a 6 semanas de idade. Um protocolo de desmame precoce para a prevenção da infecção tem sido proposto
e consiste no isolamento das fêmeas por 2 semanas antes do parto, quarentena estrita de mães e filhotes e desmame precoce com 5 semanas de idade. A remoção precoce dos gatinhos e a prevenção do contato com outros gatos podem
ajudar a manter os filhotes livres da infecção. Os gatinhos devem ser levados para uma nova casa (sem gatos infectados pelo FCoV) com 5 semanas de idade. Embora pareça simples, o protocolo exige salas de quarentena e procedimentos
para garantir que o vírus não seja introduzido. Cuidados especiais devem ser tomados durante este período para socializar os filhotes. O sucesso do desmame precoce e do isolamento depende de quarentena eficiente e de pequeno número
de gatos no domicílio (menos de 5).
Outra abordagem possível é maximizar a resistência hereditária à PIF em gatis de criação. A predisposição genética desempenha um papel no desenvolvimento da doença, mas não está completamente compreendida. Irmãos de ninhada
de gatinhos que tenham PIF têm uma maior probabilidade de desenvolver PIF do que outros gatos no mesmo ambiente. Um gato que teve 2 ou mais ninhadas em que os filhotes desenvolveram PIF não deve se reproduzir novamente. Uma
atenção especial deve ser dada aos pedigrees de machos onde a ocorrência de PIF apresenta­se maior do que a média. A reprodução de uma linhagem frequentemente usa extensivamente gatos valiosos e a eliminação desses animais pode
ter um efeito na melhoria da resistência geral da raça.
Em abrigos, a prevenção da PIF é praticamente impossível a menos que os gatos sejam rigorosamente separados e tratados apenas por meio de dispositivos de manipulação estéreis (comparável a de unidades de isolamento). O isolamento
muitas vezes não é eficaz porque o FCoV é facilmente transportado em roupas, sapatos, poeira e gatos. Parece haver correlação significativa entre o número de eventos de manipulação fora das gaiolas e a porcentagem de gatos anticorpo­
positivos. Os abrigos devem ter fichas de informação ou contratos por escrito, informando as pessoas sobre o FCoV e a PIF. Os envolvidos devem compreender que o FCoV é inevitável em ambientes com muitos gatos e que a PIF é uma
consequência inevitável da FCoV endêmica. Boas práticas de criação e instalações que podem ser limpas facilmente podem minimizar a propagação do vírus.
Vacinação:  Tentativas  de  desenvolver  vacinas  eficazes  apresentaram  pouco  sucesso.  No  entanto,  foi  licenciada  uma  vacina  que  incorpora  um  mutante  da  estirpe  DF2­PIFV  do  FCoV  sensível  à  temperatura,  que  pode  replicar­se  no
revestimento do trato respiratório superior em temperatura mais baixa, mas não à temperatura interna maior. Esta vacina é administrada pela via intranasal e produz uma imunidade local (anticorpos IgA) no local onde o FCoV inicialmente
penetra no corpo (orofaringe), assim como uma imunidade mediada por células. Esta vacina está disponível nos EUA e em muitos países europeus. Há questionamentos quanto à eficácia da vacina. A vacinação em um ambiente endêmico
para o FCoV ou em uma casa com casos conhecidos de PIF não é eficaz. Os testes de anticorpos podem ser benéficos antes da vacinação, uma vez que a vacina não será eficaz em gatos com contato prévio com FCoV. A maioria dos gatos
desenvolvem anticorpos após a vacinação, dificultando o estabelecimento e o controle de um ambiente livre de FCoV.
Tabela 7 – Medicamentos sugeridos para uso em casos de PIF*

Medicamento Comentário Recomendações da ABCD (nível MBE**)

Antivirais

Ribavirina Ativo in vitro, tóxico para gatos Não é recomendado (2)


Vidarabina Ativo in vitro, tóxico para gatos Provavelmente ineficiente (4)

Interferona­a humana SC, alta dose Embora seja eficaz in vitro, o tratamento com aplicação SC não foi efetivo em testes Ineficiente (2)


experimentais
Interferona­a humana SC, baixa dose Não há pesquisa Contraindicado (4)
Apenas atua como imunoestimulante se administrado por via oral; imunoestimulantes devem
ser evitados em casos de PIF

Interferona­? felina Um único estudo controlado (com uso de placebo, em infecções naturais) e um estudo não Nenhum benefício foi observado (estudo de nível 1); pode requerer mais estudos em vista de


controlado evidências clínicas empíricas (4)
Poliprenil imunoestimulante (medicamento Regulação da biossíntese de mRNA de citocina TH1. Estudo sem controle com 3 gatos sem Pode haver algum efeito benéfico em casos de PIF não efusiva (3); necessita estudo controlado
experimental) efusão; sobrevida prolongada.

Imunossupressores

Prednisolona/dexametasona (dose Sem estudo controlado; alguns animais apresentaram melhora e sobrevida de vários meses; Atualmente é o tratamento de eleição (3); se há efusão, pode ser útil a administração IP ou IT


imunossupressora) não cura PIF de dexametasona

Pentoxifilina Tratamento da vasculite Ineficiente em um estudo com um gato (4)


Cloridato de ozagrel Inibidor da síntese de tromboxano; controle da resposta inflamatória; utilizado com efeitos Necessita estudos controlados (3)
benéficos em 2 casos

Ciclosporina A Imunossupressor; não há estudo publicado Não recomendado; mais direcionada contra imunidade celular do que humoral (carência de


dados) (4)

Ciclofosfamida Imunossupressor; não há estudo publicado Deve ser considerado o uso combinado com glicocorticoides (4)


Clorambucila Imunossupressor; não há estudo publicado Deve ser considerado o uso combinado com glicocorticoides (4)

Azatioprina Tóxico para gatos; imunossupressor, sem estudo publicado Não recomendado (4)


Ácido acetilsalicílico (dose inibidora de Tratamento da resposta inflamatória e da vasculite; sem estudo publicado Pode ter algum efeito benéfico, mas pode ter efeitos adversos se utilizado em combinação com
plaquetas) altas doses de glicocorticoides

* Muitos dos tratamentos listados são considerados extrabula para tratamento de PIF.
** Medicina Baseada em Evidências (MBE): nível 1 = confirmado por ensaios clínicos aleatórios controlados na espécie­alvo; nível 2 = confirmado por estudos experimentais aleatórios controlados na espécie­alvo; nível 3 = sustentado
por uma série de casos, outros estudos experimentais e ensaios clínicos não aleatórios; nível 4 = baseado na opinião de especialistas, relato de casos e estudos em outras espécies. Modificado com autorização de Feline Infectious
Peritonitis. Guidelines of the European Advisory Board on Cat Diseases, © 2010 Advisory Board on Cat Diseases.

RISCO ZOONÓTICO:  Em razão da estreita relação antigênica entre os coronavírus de diferentes espécies de animais domésticos, e por ter sido um coronavírus derivado de animais em contato estreito com os seres humanos o causador do
surto em 2003 da chamada síndrome respiratória aguda grave (SARS), que ameaçou a saúde de milhares de seres humanos, surgiram preocupações sobre o possível risco do FCoV para as pessoas. No entanto, não há nenhuma indicação de
que o FCoV seja infeccioso para os humanos.

VÍRUS DA LEUCEMIA FELINA E DOENÇAS RELACIONADAS (Linfoma e leucemia felinos, Linfossarcoma)

Apesar da ampla utilização de vacinas, o vírus da leucemia felina (FeLV) continua sendo uma das principais causas de morbidade e mortalidade em gatos. Provoca uma variedade de neoplasias, e a infecção persistente também pode causar
grave imunossupressão e anemia intensa. O vírus é cosmopolita. Na natureza, o FeLV infecta gatos domésticos e alguns outros Felidae. Em ambiente laboratorial, células de uma variedade muito maior de espécies podem ser infectadas por
algumas estirpes do vírus.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  O FeLV é um retrovírus da família Oncovirinae. Outros oncovírus são: vírus do sarcoma felino, vírus da leucemia dos camundongos e dois tipos de vírus T­linfotrópicos humanos. Embora a oncogênese seja
um de seus efeitos mais graves, as oncoviroses causam muitas outras doenças, inclusive distúrbios degenerativos, proliferativos e imunológicos.
Há quatro principais subgrupos de FeLV de importância clínica. O vírus do subgrupo A (FeLV­A) é encontrado em todos os gatos infectados naturalmente. O FeLV­A é a forma viral original, arquetípica, sendo eficientemente transmitida
entre os gatos. As infecções pelo FeLV­A tendem a ser menos patogênicas do que a de outros subgrupos. Quase todos os gatos com infecção natural foram originalmente infectados pelo FeLV­A. Já no organismo de gatos infectados, o
FeLV­A às vezes modifica­se produzindo as formas mutantes FeLV­B, FeLV­C ou FeLV­T. O FeLV­B aumenta a frequência de doenças neoplásicas, o FeLV­C está fortemente associado ao desenvolvimento de hipoplasia eritroide e da
consequente a anemia grave, enquanto o FeLV­T possui propensão para infectar e destruir os linfócitos T, levando à depleção linfocitária e imunodeficiência. As viroses dos quatro subgrupos são detectadas (mas não são diferenciadas) com
o uso de kits de testes diagnósticos comumente utilizados para o FeLV.
A prevalência da infecção por FeLV está diretamente relacionada com a densidade populacional de gatos. As taxas de infecção são altas em gatis e instituições com múltiplos gatos, especialmente quando os animais têm acesso ao
exterior. Nos EUA, 2,6% dos gatos retirados da área atingida pelo furação de 2005 (costa do golfo) testados para o FeLV eram positivos.
Gatos saudáveis com infecção persistente são os principais reservatórios do FeLV. Os portadores excretam grande quantidade de vírus na saliva, e menores quantidades do vírus são excretadas no fluido lacrimal, urina e fezes. O contato
oronasal com saliva ou urina infectada é o meio mais provável de transmissão. O contato nasonasal, lambedura mútua, caixas de areia e pratos compartilhados facilitam a transmissão. A mordida por gatos infectados é um modo eficiente de
transmissão, mas relativamente incomum em gatos mantidos em ambientes internos 100% do tempo. A mordida pode ser o meio mais importante de infecção em gatos com acesso ao exterior.
A variação da resistência em função da idade é significativa e os filhotes novos são muito mais suscetíveis do que os adultos. O vírus pode ser transmitido verticalmente (in utero ou pelo leite) ou horizontalmente (por meio de secreções e
excreções). Por ser um vírus envelopado e frágil, e devido à resistência com o avanço da idade, a transmissão horizontal do FeLV entre adultos geralmente requer contato íntimo prolongado. Além disso, a dose necessária para a transmissão
oronasal do vírus é relativamente alta.
PATOGENIA:  Após a inoculação oronasal, o vírus replica­se primeiro nos tecidos linfoides da orofaringe, de onde são carreados pelo sangue nas células mononucleares até alcançar o baço, linfonodos, células epiteliais do intestino e bexiga,
glândulas salivares e medula óssea. Após esse período, o vírus aparece nas secreções e nas excreções destes tecidos e em plaquetas e leucócitos do sangue periférico. A viremia geralmente é evidente após 2 a 4 semanas de infecção. O
estágio agudo da infecção pelo FeLV (2 a 6 semanas após a infecção) raramente é detectado. É tipicamente caracterizada por febre leve, indisposição, linfadenopatia e citopenia do sangue.
Em cerca de 70% dos gatos adultos a viremia e a eliminação do vírus são transitórias, com duração de apenas 1 a 16 semanas. Alguns gatos continuam eliminando o vírus em secreções por algumas semanas a meses após cessar a viremia.
O vírus pode persistir na medula óssea por longos períodos, mas mesmo latente (sequestrado), a infecção geralmente desaparece dentro de 6 meses. Alguns gatos expostos ao FeLV (cerca de 30%) não produzem resposta imune adequada e
tornam­se persistentemente (permanentemente) virêmicos. A viremia persistente dos gatos desenvolve doença fatal após um período variável.
ANORMALIDADES CAUSADAS PELO FELV:  As anormalidades relacionadas com a infecção pelo vírus são inúmeras, inclusive imunossupressão, neoplasia, anemia, doenças imunomediadas, problemas reprodutivos e enterite.
A imunossupressão causada pelo FeLV é semelhante à causada pelo vírus da imunodeficiência felina (p. 867). Há maior suscetibilidade a infecções por bactérias, fungos, protozoários e outros vírus. Pode haver redução do número de
neutrófilos e linfócitos no sangue periférico dos gatos afetados, e as células ainda presentes podem estar disfuncionais. Muitos gatos positivos para o FeLV possuem baixas concentrações de fatores do sistema complemento no sangue,
contribuindo para a imunodeficiência e oncogenicidade associadas ao FeLV, pois o sistema complemento é vital para algumas formas mediadas por anticorpos de lise de células tumorais. Acredita­se que grande parte da imunodeficiência
causada pelo FeLV é devido ao alto nível de antigenemia viral.
Tumores linfoides ou mieloides (p.  ex.,  linfoma,  leucemia  linfoide,  mielose  eritrêmica)  desenvolvem­se  em  até  30%  dos  gatos  com  infecção  persistente  pelo  FeLV.  Embora  os  gatos  negativos  para  o  FeLV  (ou  seja,  não  virêmicos)
também possam desenvolver estes tumores, é possível que eles ainda sejam induzidos pelo FeLV, visto que muitos gatos negativos e com linfoma apresentam sequências virais passíveis de detecção por imunoistoquímica e PCR. Tais gatos
podem ter sido previamente infectados pelo FeLV, apesar de apresentarem resultados negativos nos testes para o vírus. A presença transitória do FeLV pode ter desencadeado o linfoma. Entretanto, a persistência do antígeno do FeLV
aumenta em 60 vezes o risco de linfoma em comparação a gatos FeLV negativos. O linfoma é a neoplasia mais frequentemente diagnosticada em gatos. Nos EUA, a maioria dos gatos com a forma mediastinal multicêntrica ou espinal de
linfoma são FeLV positivos. Entretanto, em algumas partes do mundo, estas formas de linfoma estão se tornando muito menos comuns, e a proporção com que ocorrem em gatos FeLV positivos vem diminuindo. Isso pode estar relacionado
com o controle efetivo do FeLV. As formas renais e gastrintestinais do linfoma são mais provavelmente encontradas em gatos FeLV negativos.
A  leucemia  é  uma  proliferação  neoplásica  de  células  hematopoéticas  originárias  da  medula  óssea.  As  linhagens  celulares  que  se  tornam  neoplásicas  são  os  basófilos,  neutrófilos,  eosinófilos,  monócitos,  linfócitos,  megacariócitos  e
eritrócitos. Nos gatos, as leucemias são fortemente associadas à infecção por FeLV e, às vezes (mas não sempre), associadas a células neoplásicas circulantes no sangue. As leucemias linfoides são subdivididas em aguda e crônica. A
leucemia linfocítica aguda é caracterizada por linfoblastos circulantes no sangue. Na leucemia linfocítica crônica há um aumento do número de linfócitos circulantes que possuem morfologia normal.
A anemia causada pelo FeLV geralmente é normocrômica não regenerativa. Frequentemente ocorre macrocitose idiossincrática. Aproximadamente 10% das anemias relacionadas com o FeLV são hemolíticas regenerativas. Esta forma de
anemia pode estar associada à hemobartonelose, hemólise imunomediada, ou ambas.
Imunocomplexos formados na presença de um moderado excesso de antígenos podem causar vasculite sistêmica, glomerulonefrite, poliartrite e vários outros distúrbios imunes. Nos gatos infectados pelo FeLV, o complexo imune forma­
se em condições onde há excesso de antígeno, pois os antígenos do FeLV são abundantes e os anticorpos IgG anti­FeLV são escassos. Estas condições são ideais para o desenvolvimento da doença imunomediada.
Problemas reprodutivos são comuns e há relatos de que 68 a 73% das fêmeas inférteis e 60% das que abortam são FeLV positivas (embora o aborto seja uma causa relativamente incomum de infertilidade em felinos). Morte fetal,
reabsorção e involução placentária podem ocorrer no segundo trimestre de gestação, presumivelmente como resultado da infecção uterina dos fetos pelo vírus transportado nos leucócitos maternos através da placenta. Ocasionalmente, as
fêmeas infectadas dão à luz a filhotes vivos virêmicos. As fêmeas com infecção latente (ou seja, não virêmicas) podem transmitir o vírus para seus filhotes pelo leite.
Enterite  pode  ser  verificada,  assemelhando­se  tanto  clinicamente  como  histopatologicamente  à  panleucopenia  felina.  Os  sinais  clínicos  incluem  anorexia,  depressão,  vômito  e  diarreia  (que  pode  conter  sangue).  Em  razão  da
imunossupressão concomitante associada ao FeLV, pode ocorrer sepse. As evidências sugerem que o FeLV e o vírus da panleucopenia felina atuem sinergicamente para produzir essa síndrome.
Outros distúrbios podem também se desenvolver. Ocasionalmente, o FeLV causa neuropatia que induz a anisocoria, incontinência urinária ou paralisia de membros pélvicos. Certos linfomas induzidos pelo FeLV podem produzir sinais
clínicos idênticos. Caso a terapia antineoplásica seja planejada, é importante distinguir neoplasia de neuropatia. O FeLV também pode causar distúrbios quase neoplásicos, como exostose cartilaginosa múltipla (osteocondromatose).
DIAGNÓSTICO:  Dois tipos de testes estão prontamente disponíveis para o uso clínico. O ensaio de imunofluorescência pesquisa a presença de antígenos estruturais do FeLV (p. ex., p27 ou outros antígenos fundamentais) no citoplasma das
células  suspeitas  de  infecção.  Na  prática  clínica,  os  esfregaços  de  sangue  periférico  geralmente  são  utilizados  para  a  imunofluorescência,  mas  podem  ser  utilizadas  preparações  citológicas  da  medula  óssea  ou  de  outros  tecidos.  A
imunofluorescência  é  considerada  a  metodologia  mais  confiável,  mas  requer  o  envio  a  laboratórios  comerciais,  atrasando  a  obtenção  do  resultado.  Os  gatos  positivos  na  imunofluorescência  são  considerados  como  persistentemente
virêmicos e têm prognóstico desfavorável a longo prazo.
O ELISA verifica a presença da p27 solúvel do FeLV, sendo um teste mais prático que pode ser realizado na clínica veterinária. O antígeno pode estar presente na ausência de partículas infecciosas virais intactas, pois os antígenos do
FeLV em excesso são liberados pelas células infectadas livres de partículas virais. O ELISA detecta mais a antigenemia do que a viremia. Diferentes kits de teste estão disponíveis, muitos possuindo sensibilidade e especificidade de 98%. A
acurácia pode ampliada utilizando­se tanto o ELISA quanto a imunofluorescência, no mesmo gato.
O diagnóstico das neoplasias induzidas pelo FeLV é similar ao de outros tumores. O exame citológico dos aspirados por agulha fina de massas tumorais, linfonodos, fluidos da cavidade corporal (p. ex., efusão pleural) e órgãos afetados
pode  revelar  linfócitos  neoplásicos.  O  exame  da  medula  óssea  pode  revelar  envolvimento  leucêmico,  mesmo  quando  o  sangue  periférico  apresenta­se  normal.  Biopsia  e  exame  histopatológico  dos  tecidos  anormais  geralmente  são
necessários para a confirmação do diagnóstico.
TRATAMENTO:  O  ideal  é  que  o  gato  com  FeLV  seja  identificado  rapidamente  e  tratado  para  erradicar  a  infecção  pelo  retrovírus  antes  de  ocorrer  o  desenvolvimento  das  doenças  relacionadas.  Infelizmente,  a  erradicação  de  infecções
retrovirais em qualquer estágio da doença é extremamente difícil. A maior parte dos gatos infectados são persistentemente virêmicos no momento do diagnóstico da infecção.
Muitos tratamentos são administrados como tentativas de reverter a viremia ou diminuir os sinais clínicos associados à infecção pelo FeLV. São abundantes os relatos de uso de agentes antivirais e agentes imunoterápicos que revertem a
viremia, atenuando os sinais clínicos e prolongando a sobrevivência. Estudos controlados usando gatos naturalmente infectados são incapazes de demonstrar efeitos benéficos com estas terapias.
Os gatos positivos para FeLV podem viver sem enfermidades importantes por muitos anos. Devem ser evitados estresse e fontes de infecção secundária. O gato deve permanecer dentro de casa 100% do tempo para reduzir o risco de
exposição a agentes infecciosos e evitar a transmissão do vírus para outros gatos. Cuidados profiláticos de rotina para gatos positivos são mais importantes que para os não infectados. As vacinações de rotina devem ser administradas com
base  no  risco  para  o  gato,  e  as  vacinações  contra  a  raiva  devem  seguir  a  legislação  local.  A  vacinação  contra  o  FeLV  não  deve  ser  administrada,  pois  não  há  evidência  sugerindo  benefícios.  Exames  físicos  para  detecção  de  parasitos
externos, infecções cutâneas, afecções dentárias, tamanho dos linfonodos e verificação do peso corporal devem ser realizados a cada 6 meses. É recomendada a administração de anti­helmínticos nestas visitas. Todos os gatos infectados
devem ser castrados. Os proprietários devem ser avisados e alertados a observar os sinais clínicos de doenças relacionada com o FeLV, particularmente infecções secundárias. O tratamento de tais infecções e outras enfermidades deve ser
mais agressivo e de maior duração, pois o comprometimento da imunidade deixa o gato menos apto a combater doenças naturalmente.
Tratamento do Linfoma: O linfoma felino pode ser tratado com drogas citotóxicas. Essas drogas podem causar toxicidade significativa se não forem dosadas e administradas corretamente (ver agentes antineoplásicos, p. 2779). A maioria das
drogas  citotóxicas  também  é  carcinogênica,  devendo  ser  manipulada  adequadamente.  Antes  de  iniciar  o  tratamento  com  essas  drogas,  os  médicos  veterinários  devem  se  familiarizar  com  a  sua  adequada  dosagem  e  administração,
monitoramento apropriado do paciente, efeitos de toxicidade e complicações, além de cuidados de manipulação segura, prevenindo a exposição de funcionários e de proprietários aos agentes e seus metabólitos. Tratados adequadamente, a
maioria dos gatos não apresenta efeitos tóxicos significativos e desfrutam de boa qualidade de vida.
Cerca de 50% dos gatos com linfoma que são tratados obterão a remissão completa (sem evidência clínica da doença). Gatos FeLV negativos que consigam a completa remissão vivem em média 9 meses, enquanto os FeLV positivos
vivem em média 6 meses. Gatos não tratados sobrevivem cerca de 6 semanas.
Muitos protocolos de tratamento do linfoma felino foram publicados, a maioria usando drogas similares com diferentes protocolos de administração. Um protocolo muito utilizado consiste em uma fase intensiva de indução (vincristina
0,75 mg/m2, IV, semanalmente por 4 semanas; ciclofosfamida 300 mg/m2, VO a cada 3 semanas no mesmo dia da vincristina; prednisona 10 mg/gato, VO, 1 vez/dia, ao longo do protocolo), seguida de uma fase de manutenção menos
intensiva (vincristina e ciclofosfamida administradas a cada 3 semanas no mesmo dia, prednisona é continuada diariamente). O tratamento é contínuo por 1 ano ou até uma recaída. Com esse protocolo, 79% dos gatos obtêm remissão e
sobrevivem 150 dias, em média. A mudança no protocolo de manutenção para 25 mg de doxorrubicina/m2, IV, a cada 3 semanas, propiciou remissão em 281 dias. Quando ocorrem recidivas, as drogas utilizadas podem ser trocadas e pode
ser obtida uma segunda remissão, que, no entanto, raramente prolonga­se tanto quanto a primeira.
Outro protocolo muito utilizado envolve uma dose inicial de L­asparginase (400 U/kg, IM) juntamente com vincristina (0,5 mg/m2). Inicia­se administração diária de prednisolona com dose inicial de 2 mg/kg, diminuindo­se para 1
mg/kg  ao  longo  de  4  semanas.  Na  segunda  semana  (uma  semana  após  o  início  com  L­asparginase  e  vincristina)  é  administrada  ciclofosfamida,  200  mg/m2.  Na  terceira  semana  administra­se  novamente  a  vincristina,  seguida  de
doxorrubicina na quarta semana (25 mg/m2, IV). Nenhum tipo de quimioterapia é administrado na quinta semana e então o tratamento é repetido, com exceção da L­asparginase. Na décima primeira semana, o regime quimioterápico é
repetido novamente, mas administrado em semanas alternadas por dois ciclos. Se o gato estiver em remissão completa, o tratamento é descontinuado. Quando ocorrer recaída, o protocolo é reiniciado desde a primeira semana. Há relatos de
sobrevivência média de 210 dias utilizando­se este protocolo.
Os protocolos quimioterápicos citados aplicam­se a todos os graus histopatológicos. A maioria dos linfomas é de grau intermediário ou elevado e clinicamente agressivo. Um subgrupo de linfoma de menor agressividade, identificado
como  linfoma  de  células  pequenas  ou  linfoma  linfocítico,  normalmente  ocorre  na  cavidade  abdominal  (intestinos  e  rins)  e  pode  ser  tratado  com  sucesso  com  uma  quimioterapia  menos  agressiva.  Nestes  casos,  vem  sendo  utilizada  a
administração oral de predinisolona (10 mg, 1 vez/dia) e clorambucila (15 mg/m2) por 4 dias consecutivos a cada 3 semanas. A utilização destas drogas no tratamento do linfoma de células pequenas envolvendo o trato gastrintestinal tem
produzindo uma sobrevivência média de 963 dias. Quando outros sistemas estão afetados obtém­se uma sobrevida média de 636 dias, existindo ou não enfermidade gastrintestinal.
Além do linfoma de células pequenas, o linfoma de grandes linfócitos granulares também pode afetar o trato gastrintestinal. Esta é uma enfermidade extremamente agressiva que responde à quimioterapia apenas em cerca de 30% dos
casos, apresentando uma sobrevida média de 57 dias. O linfoma de grandes linfócitos granulares normalmente apresenta formação de massas no intestino, enquanto no linfoma de células pequenas é encontrado um infiltrado mais difuso de
linfócitos malignizados nos órgãos afetados.
A leucemia linfocítica aguda é tratada com o mesmo protocolo do linfoma, mas em apenas cerca de 25% dos gatos é obtida remissão dos sintomas. Para esses, a média da remissão é de 7 meses. A leucemia linfocítica crônica é mais bem
tratada com clorambucila (2 mg/gato, VO) e prednisonolona (40 mg/m2, VO), administrados em dias alternados. Outras leucemias além das linfocíticas são raramente tratadas pois os gatos encontram­se extremamente doentes e muito
poucos acabam respondendo à terapia.
PREVENÇÃO E CONTROLE:  A realização de testes é imperativa nas seguintes situações: (1) em todos os filhotes na primeira consulta ao médico veterinário, possibilitando que os proprietários possam ser aconselhados sobre os gatos com
resultados positivos (como rotineiramente feito em casos de anormalidades congênitas); (2) em todos os gatos, antes da entrada em uma casa onde existam gatos não infectados; (3) em todos os gatos existentes em uma casa antes da entrada
de um novo gato não infectado; (4) em todos os gatos antes de sua primeira vacinação contra o FeLV.
As vacinas contra o FeLV destinam­se à proteção contra infecção pelo FeLV, ou ao menos à prevenção de viremia persistente. Os tipos de vacina incluem vírus morto inteiro, subunidade e criada por engenharia genética. As vacinas
podem ter efeito protetor variável e por isso as afirmações dos fabricantes e os estudos comparativos independentes devem ser levados em consideração cautelosamente. As vacinas são indicadas apenas para gatos não infectados, pois não
há benefício em vacinar animais FeLV positivos. Deve­se avaliar o risco de o gato ser exposto a animais FeLV positivos e usar as vacinas apenas nestes casos. Embora seja baixo o risco do desenvolvimento de tumor, a vacina vem sendo
associada ao desenvolvimento de sarcomas no local de vacinação. Os gatos não infectados em uma casa com gatos infectados devem ser vacinados, mas devem também ser utilizados outros métodos de proteção (p. ex., separação física). É
provável que a exposição constante a gatos infectados com o FeLV resulte em transmissão viral independentemente do estado vacinal.
RISCO ZOONÓTICO:  Algumas estirpes do FeLV podem se multiplicar em culturas de tecidos humanos. Esse fato leva à possibilidade de transmissão para os seres humanos. Vários estudos abordaram este conceito, e nenhum demonstrou
evidências da existência de qualquer risco zoonótico.
SISTEMA IMUNOLÓGICO

 Biologia do Sistema imunológico
Barreiras Físicas
Imunidade Adquirida
Resposta de Anticorpos (Imunidade Humoral)
Imunidade Mediada por Células
Memória Imunológica
Citocinas
Células Reguladoras
Imunidade Inata
Células de Imunidade Inata
Complemento
 Doenças Imunológicas
Doenças Causadas por Imunodeficiência
Imunodeficiências Primárias
Defeitos da Imunidade Inata
Deficiências da Imunidade Adquirida
Imunodeficiências Secundárias
Imunodeficiências Induzidas por Vírus
Função Imune Excessiva
Gamopatias
Neoplasias do Sistema imunológico
Resposta Imune Adquirida Excessiva
Reação Tipo I
Reação Tipo II
Reação Tipo III
Reação Tipo IV
Resposta Inata Excessiva
Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (Sepse)

BIOLOGIA DO SISTEMA IMUNOLÓGICO

Animais estão sobre constante ameaça de invasão por uma gama diversa de microrganismos que procuram invadir o corpo e explorar os seus recursos para se hospedar e se multiplicar. Para garantir sobrevivência e prevenir tal exploração, o
corpo combate esses invasores por meio de um conjunto complexo de mecanismos de defesa que podem atuar como uma série de barreiras. As defesas iniciais incluem as barreiras físicas contra invasores, como uma pele resistente e
espessa ou a habilidade de tossir e espirrar. A segunda linha de defesa é um sistema imunológico inato “hard wired” que depende da rápida resposta estereotipada para parar e matar bactérias e vírus invasores. Isto e tipificado pelo processo
de inflamação aguda e pela resposta clássica à enfermidade, como a febre. A terceira linha de defesa é o sistema imunológico adquirido, altamente complexo, adaptável, e incrivelmente efetivo.
As respostas imunes inatas são muito efetivas contra microrganismos oportunistas ou aqueles de baixa virulência, mas pela sua própria natureza não podem fazer mais do que retardar os invasores microbianos altamente patogênicos. A
longo  prazo,  a  resistência  e  sobrevivência  depende  da  imunidade  adquirida.  O  sistema  imunológico  adquirido  é  efetivo  contra  uma  variedade  de  patógenos.  Sua  efetividade  melhora  a  cada  vez  que  é  ativado,  em  resposta  a  invasores
microbianos. Como o corpo acumula células imunes de memória à medida que envelhece, a imunidade adquirida propicia uma barreira quase instransponível à maioria dos invasores potenciais. Na sua ausência, os animais morrem.
O sistema imunológico adquirido enfrenta desafios complexos. Muitos microrganismos diferentes, incluindo bactérias, vírus, protozoários e helmintos, podem tentar invadir o corpo. A ótima resposta imune a esta diversidade de invasores
deve também ser muito diversa. Por exemplo, invasores como bactérias que se instalam fora dos corpos celulares são melhores atacados pela resposta imune mediada por anticorpos (ou humoral), ao passo que os vírus como hospedeiros das
células são melhores destruídos pela morte das células infectadas por meio de mecanismos mediados por células.
Quando  o  corpo  é  invadido,  decisões  devem  ser  tomadas  para  que  ocorra  ótima  resposta  imune  –  imunidade  inata,  imunidade  adquirida,  ou  ambas?  Se  uma  resposta  imune  é  necessária,  deve­se  necessária  imunidade  mediada  por
anticorpos ou imunidade mediada por células? Uma vez ativado, como pode ser controlado? Uma vez ativada, pode ser “desligada”?

 BARREIRAS FÍSICAS
As barreiras físicas da superfície corporal têm importante papel na diminuição ou impedimento da invasão microbiana. Muitos poucos microrganismos podem penetrar na pele intacta; por outro lado, os invasores comumente penetram
através de feridas ou por inoculações, como acontece nas picadas de mosquitos. Uma vez curadas as feridas, rapidamente a barreira protetora é restabelecida. Uma população complexa de bactérias da pele normal tende eliminar novos
invasores,  enquanto  moléculas  antimicrobianas  do  suor  podem  matar  muitos  pretensos  invasores.  Nas  vias  respiratórias,  a  estrutura  do  trato  respiratório  superior  atua  como  um  filtro  efetivo  de  pequenas  partículas.  As  próprias  vias
respiratórias  superiores  são  revestidas  por  uma  camada  de  muco  aderente  que  pode  aprisionar  os  micróbios.  O  muco  contém  várias  proteínas  antimicrobianas,  como  as  defensivas  e  as  lisozimas,  e  surfactantes.  O  muco  “sujo”  é
constantemente substituído por material limpo pela a ação dos cílios que o leva até a faringe, onde é deglutido. A tosse e o espirro removem irritantes maiores das vias respiratórias e dos condutos nasais, sendo reações de defesa essenciais.
A defesa do intestino depende muito da presença da ampla e complexa flora comensal normal. Invasores potenciais podem ser aptos a colonizar o intestino na presença de população de micróbios comensais bem adaptados. Se tudo mais
falhar, os invasores podem ser rapidamente removidos do trato GI por meio de vômito e diarreia.

 IMUNIDADE ADQUIRIDA
Imunidade inata, embora seja crítica para a defesa orgânica, é insuficiente para garantir proteção. Ela perde a flexibilidade para responder otimamente a vários microrganismos. Por sua própria natureza, pode resultar em importante lesão
tecidual. Um terceiro mecanismo de defesa é necessário e pode atuar automaticamente em resposta à invasão microbiana, gerando resistência proporcional à ameaça, e melhora com novos desafios. Essas são as principais características do
sistema imunológico adquirido. A resposta imune adquirida envolve dois tipos principais: imunidade por anticorpos (humoral), direcionada contra invasores extracelulares, e imunidade contra invasores intracelulares, mediada por células.
Respostas imunes adquiridas são complexas e devem ser rigorosamente controladas. As defesas imunes do corpo representam um potente sistema, cujo uso deve ser cuidadosamente controlado para minimizar os danos ao tecido normal.
Como resultado, uma parte importante do sistema imunológico é direcionada à produção de células reguladoras, cuja função é assegurar que ocorra resposta imune adquirida apenas em situações apropriadas. A falha dessas vias reguladoras
pode resultar em doença ou morte.
O sistema imunológico adquirido atua por meio de uma série de etapas que devem ocorrer sequencialmente, para uma resposta imune mediada por anticorpos ou para uma resposta imune mediada por células. A primeira etapa envolve
captura e processamento de antígenos. Uma vez processados, esses antígenos se alojam na superfície celular onde estão disponíveis para reconhecimento por linfócitos que contêm receptores para antígenos específicos. Cada receptor de
antígeno é altamente específico e cada linfócito expressa somente uma forma simples de receptor antigênico. Desta forma, milhões de células apresentam potencial para reconhecer milhões de antígenos. Para assegurar que apenas antígenos
estranhos desencadeiem imunidade adquirida, células com receptores que se ligam e respondem a antígenos normais são seletivamente eliminadas no início do desenvolvimento. As células sobreviventes se localizam nos órgãos linfoides
em locais onde podem mais eficientemente detectar antígenos dos microrganismos invasores, desencadeando resposta a eles por meio de uma resposta imune. Há 3 principais populações de linfócitos. Células B, responsáveis pela produção
de anticorpos; células T efetoras, responsáveis pela resposta imune mediada por células; e células T reguladoras, que controlam essas respostas e minimizam respostas inapropriadas.

Resposta de Anticorpos (Imunidade Humoral)
Anticorpos são receptores de antígenos de células B produzidos em grande quantidade e secretados pelas células e enviados à corrente sanguínea, onde circulam como imunoglobulinas. São produzidos pelas células B e por plasmócitos
derivados de células B. Os anticorpos se ligam a moléculas estranhas, marcando­as para destruição por fagócitos ou por lise mediada por complemento. Plasmócitos são linfócitos B diferenciados otimizados para produzir e secretar grande
quantidade de anticorpos. Anticorpos são fundamentais para a defesa do hospedeiro contra invasores extracelulares, como a maioria das bactérias, alguns hemoparasitas e vírus que se instalam entre as células.
Células B oriundas da medula óssea e residentes em tecidos linfoides, como linfonodos, medula óssea, placas de Peyer e baço. Cada célula B é recoberta por várias centenas de receptores de antígenos idênticos e podem se ligar e
responder somente uma única molécula antigênica. Quando um micróbio penetra no organismo, inevitavelmente encontra células B que podem se ligar a alguns antígenos de sua superfície. Como resultado da ligação antigênica, e em
condições apropriadas, essas células B se multiplicam repetidamente e se diferenciam em duas subpopulações. Uma subpopulação, plasmócitos produtores de anticorpos, é capaz de aumentar consideravelmente a produção de anticorpos e
representa a principal fonte de anticorpos. A outra subpopulação de células B tornam­se células B de memória, que persistem nos tecidos linfoides por meses ou anos. Quando um animal tem contato com um antígeno pela segunda vez,
essas células B de memória respondem rapidamente, produzindo grande quantidade de plasmócitos (e mais células de memória). Como resultado, os animais aumentam a vasta resposta de anticorpos e o invasor é rapidamente eliminado.
Por sua vez, a exposição subsequente aos microrganismos induz um acúmulo de mais células de memória, resultando em melhor proteção, praticamente impedindo que o microrganismo cause doença naquele indivíduo. Esta resposta é a
base de todos os programas de vacinação.
Embora simples no conceito, a resposta das células B e a produção de anticorpos implicam em um mecanismo mais complexo devido à necessidade de assegurar seu rigoroso controle. Desta forma, geralmente um linfócito B não é capaz
de  responder a um antígeno  estranho,  a  menos  que  também  receba  “permissão” na forma de um segundo sinal das células denominadas células T auxiliares (células TH ).  Essas  células  TH h,  por  sua  vez,  apenas  podem  ser  ativadas  na
presença de antígenos, em condições rigorosamente controladas.
ANTICORPOS:  Os mamíferos utilizam 5 diferentes classes de anticorpos: imunoglobulina G (IgG), IgM, IgA, IgE e IgD. A classe de imunoglobulinas secretadas por células B e plasmócitos depende principalmente de sua localização.
Células localizadas nos órgãos linfoides secretam IgM e IgG, enquanto as células presentes nas superfícies corpóreas secretam IgM, IgA e IgE.
IgG é a imunoglobulina mais abundante na corrente sanguínea e desempenha importante função na ligação e eliminação de microrganismos que conseguem penetrar profundamente no corpo. IgM atua como um “back­up” para IgG,
sendo comumente confinada a corrente sanguínea. IgM é produzida no início da resposta de anticorpos, quando sua alta eficácia compensa sua baixa quantidade.
IgA é produzida por células B e plasmócitos presentes na superfície das mucosas. IgA é produzida e secretada em grande quantidade no trato respiratório superior, trato GI, lágrima, saliva etc. Complementa as barreiras físicas do corpo e
impede a invasão microbiana. IgE atua como “back­up” para IgA, sendo também produzida principalmente nas superfícies corpóreas. IgE é otimizada para impedir a invasão por parasitos, como helmintos ou artrópodes. Contudo, também
responde pela mediação da rápida inflamação aguda em estados alérgicos e deve mediar anafilaxia acompanhada de risco à vida. Acredita­se que a IgD tenha mínima importância funcional.
CÉLULAS T AUXILIARES:  A maioria das respostas de anticorpos é controlada pela necessidade de receber “aprovação” prévia das células TH . As células TH , por sua vez, são ativadas somente se estiverem ligadas a fragmentos antigênicos

disponibilizados por células apresentadoras de antígenos especializadas, denominadas células dendríticas.
Células dendríticas são células semelhantes ao macrófago, cuja função é sequestrar e processar antígenos estranhos. O seu nome se deve a muitos processos finos e filamentosos longos, ou dendritos, que se estendem ao longo dos tecidos
para formar uma rede de captura de antígenos efetiva. Por exemplo, na derme há uma subpopulação de células dendríticas (células de Langerhans), onde essa rede de dendritos enlaça microrganismos que tentam entrar no corpo através da
pele lesionada. Células dendríticas sequestram e fagocitam microrganismos invasores. Contudo, grandes fragmentos de antígenos estranhos persistem nas células dendríticas. Esses fragmentos antigênicos se ligam ao receptor de moléculas
(moléculas do MHC) nas células dendríticas. Uma vez formados, esses complexos antígeno­MHC se direcionam à superfície celular onde podem ser reconhecidos pelas células TH .
Os  receptores  de  células  dendríticas  que  se  ligam  e  apresentam  os  fragmentos  de  antígenos  são  proteínas  especializadas  codificadas  por  genes  agrupados  juntos  com  complexo  principal  de  histocompatibilidade  (MHC;  inicialmente
identificados  como  antígenos  que  provocam  rejeição  de  enxertos,  por  isso  seu  nome  incomum).  Há  vários  milhares  dessas  moléculas  de  MHC  expressas  em  uma  população  animal,  mas  há  relativamente  poucas  (3  a  6)  expressas  em
determinado animal. Como apresentam importante função na ligação de fragmentos do antígeno e na ativação de células TH , as moléculas do MHC efetivamente determinam se o individuo pode ou não responder a um antígeno estranho.
Um animal, individualmente, apresenta moléculas do MHC que podem se ligar a muitos, talvez à maioria, dos antígenos estranhos, mas não todos. Se um animal tem deficiência da molécula do MHC que pode se ligar a um antígeno, ele é
incapaz de responder àquele antígeno específico. O conjunto de antígenos aos quais um indivíduo pode responder (e contra os quais está protegido) é determinado pelo seu haplótipo do MHC. Todas as espécies de animais domésticos
possuem seu próprio MHC, exclusivamente. Os receptores codificados por esse genes são designados em termos de espécie­especificidade; desta forma, BoLA é o nome dessas moléculas em bovinos, ELA em equinos, SLA em suínos etc.
À  semelhança  das  células  B,  as  células  T  possuem  receptores  de  antígenos  específicos  em  sua  superfície,  os  quais  são  gerados  aleatoriamente  quando  as  células  são  formadas.  Assim  que  essas  células  T  maturam  no  timo,  aqueles
receptores que se ligam aos componentes corpóreos normais são eliminados. As células T sobreviventes podem responder apenas aos antígenos estranhos. Os receptores antigênicos das células T, assim como nas células B, são idênticos em
uma única célula, individualmente. Contudo, diferente das células B, os receptores podem reconhecer antígenos somente quando ligados às moléculas do MHC. Desta forma, quando as células dendríticas apresentam antígenos associados
ao MHC para as células T, somente aquelas células T com receptores apropriados se ligam às células dendríticas. Uma vez em contato, as células alteram os sinais que confirmam que as células T estão respondendo a antígenos proteicos
processados corretamente. Isto deve demorar algumas horas. Depois que as células T recebem todos os sinais necessários, elas começam a secretar uma mistura de citocinas que permitem que as células B ligadas respondam aos antígenos,
permitindo uma resposta de anticorpos.
Anticorpos são produzidos em resposta, e direcionados, a bactérias extracelulares. Por outro lado, a resposta mediada por células é direcionada contra vírus e bactérias intracelulares. A decisão sobre a forma apropriada de resposta imune
é definida nos estágios iniciais da resposta imune. Desta forma, há duas populações de células dendríticas que podem sequestrar e processar os antígenos. Uma população (células DC1) desencadeia imunidade mediada por células, enquanto
outras (células DC2) estimulam a produção de anticorpos. Essas populações de células dendríticas enviam diferentes mensagens às células TH  porque utilizam diferentes citocinas para sinalização: células DC1 secretam IL­12, enquanto
células DC2 secretam IL­1. Por sua vez, essas diferentes citocinas estimulam duas populações de células TH : TH 1, que propicia imunidade mediada por células, e TH 2, que promovem resposta de linfócitos B e produção de anticorpos.
Células TH 1 secretam uma mistura de citocinas tipificadas por interferona­? (IFN­?). Células TH 2 secretam uma mistura de citocinas tipificadas por IL­4. Células B comumente respondem otimamente a antígenos estranhos somente quando
estimuladas pela presença de IL­4 oriundo de células TH 2.

Imunidade Mediada por Células
Como  descrito  anteriormente,  a  resposta  imune  mediada  por  células  é  necessária  para  combater  invasores  intracelulares,  como  os  vírus  e  algumas  bactérias.  O  sistema  imunológico  impede  as  infecções  virais  por  eliminar  as  células
infectadas. As células responsáveis são denominadas células T efetoras (citotóxicas). Assim como as células TH , as células T efetoras se desenvolvem e são selecionadas no timo, de maneira que qualquer célula T capaz de matar células
saudáveis normais são eliminadas. As células T sobreviventes são liberadas para o organismo, onde circulam continuamente pelos tecidos à procura de células anormais.
Todas as células nucleadas produzem diversas proteínas quando sua função é normal. Contudo, células infectadas por vírus são forçadas pelos vírus a produzirem proteínas virais. O organismo requer que todas as células nucleadas
enviem  uma  amostra  de  suas  proteínas  recém­sintetizadas  para  a  superfície  da  célula.  Desta  forma,  uma  pequena  amostra  de  proteínas  recém­formadas  é  reservada  e  fragmentada  em  um  sistema  enzimático  complexo  denominado
proteasomo. Esses fragmentos de proteínas são, então, encaixados às moléculas do MHC e direcionados à superfície celular, onde ficam disponíveis para “inspeção” pelas células efetoras. Se esses receptores celulares não se ligam a um
antígeno nada acontece. Contudo, se esses receptores antigênicos se ligam a antígenos estranhos no complexo proteína­MHC, a célula T será sinalizada para matar as células ofensoras. Como as células B, as células T efetoras somente
atuam se recebem permissão das células TH , especificamente das células TH 1. As citocinas oriundas das células TH 1, especialmente IFN­?, devem ser apresentadas se uma célula T efetora está apta a matar o seu alvo.
As  células  T  efetoras  ligam­se  firmemente  às  células­alvo  e  então  sinalizam  para  cometer  “suicídio”  por  meio  de  apoptose.  A  célula  T  injeta  seu  alvo  com  enzimas  denominadas  granzimas,  que  desencadeiam  este  processo.  Como
resultado, as células T efetoras eliminam células infectadas por vírus, mas não as células saudáveis normais. A maioria das células T efetoras morre em poucos dias, uma vez que não são mais necessárias; no entanto, poucas sobrevivem e
se tornam células de memória que respondem rapidamente se o animal tem novo contato com o vírus.
Células efetoras T são especialmente efetivas para matar células­alvo produtoras de antígenos estranhos. Contudo, alguns microrganismos intracelulares, especialmente bactérias, são melhor destruídas por outros mecanismos mediados
por células. Nestes casos, o IFN­? oriundo de células TH 1 ativam macrófagos. Como resultado, as bactérias que podem sobreviver aos macrófagos não ativados são rapidamente destruídas pelos macrófagos ativados.

Memória Imunológica
O efeito da imunidade adquirida é, em grande parte, resultado da capacidade de reconhecer antígenos previamente reconhecidos, que permite elaboração de uma rápida resposta contra eles. Quanto mais um animal tem contato com um
antígeno, maior é a resposta imune. A memória imunológica depende da presença de populações persistentes de células de memória, que se acumulam à medida que o animal envelhece. Essas células de memória são duradouras ou, mais
provavelmente, se alteram muito lentamente. Em consequência, os animais devem produzir pequena quantidade de anticorpos contra antígenos vacinais, muitos anos após a vacinação. A memória mediada por células é também resultado da
presença de populações de células T de memória antigas. A eficiência da vacina na indução de imunidade duradoura depende, em grande parte, da habilidade de induzir populações de células de memória.

Citocinas
As células do sistema imunológico adquirido se comunicam de várias maneiras. Elas podem manter um contato físico e alterar os sinais através de receptores na área de contato ou sinapse imunológica. Exemplos incluem o contato entre
células TH  e células dendríticas ou entre células T efetoras e seus alvos. Células imunes podem também emitir sinais às células vizinhas por meio de secreção de pequenas proteínas sinalizadoras denominadas citocinas. Várias centenas de
diferentes citocinas foram identificadas. A sinalização celular induz secreção de uma mistura de citocinas que, então, se ligam a receptores ou a células vizinhas. As células­alvo recebem múltiplos sinais que devem se integrar para uma
resposta apropriada. Citocinas atuam por meio de seus receptores específicos e podem ou não desencadear a síntese de proteínas específicas. Podem promover a divisão e diferenciação da célula­alvo e induzir apoptose. Com centenas de
diferentes  citocinas  atuando  em  uma  mistura  complexa,  às  vezes  é  difícil  predizer  exatamente  como  uma  célula­alvo  específico  irá  responder.  As  principais  famílias  de  citocinas  incluem interleucinas,  que  mediam  a  sinalização  entre
leucócitos; interferons, que mediam interações entre células e têm importante atividade antiviral; fatores de crescimento, que regulam o crescimento e diferenciação de vários tipos celulares; e fator de necrose tumoral, que modula a reposta
inflamatória local.

Células Reguladoras
O sistema imunológico adquirido é rigorosamente regulado por várias populações diferentes de células. As mais importantes são as células Treg, as quais secretam uma mistura de citocinas que inibem a reposta imune convencional. Atuam
desativando a resposta imune, assim que se completa e os microrganismos forem eliminados. Células Treg também tem papel fundamental na prevenção do desenvolvimento da autoimunidade. Outra importante população de células T
reguladoras é denominada células TH 17. Essas células são assim denominadas porque secretam IL­17; regulam a resposta imune inata e o desenvolvimento da inflamação.

 IMUNIDADE INATA
Micróbios que conseguem penetrar as barreiras físicas do corpo são rapidamente detectados e as defesas inatas são ativadas. Inflamação aguda é a característica principal da imunidade inata. A primeira etapa da resposta inflamatória é a
detecção precoce de microrganismos invasores ou da lesão tecidual. A maior parte dos invasores é identificada por receptores padrões de reconhecimento que se ligam e reconhecem moléculas presentes nas superfícies dos micróbios. Há
diversos  receptores  padrões  de  reconhecimento,  sendo  os  mais  importantes  os  receptores  do  tipo toll  (TLR).  TLR  é  uma  família  de,  pelo  menos,  10  receptores  diferentes  encontrados  na  superfície  ou  no  citoplasma  de  células,  como
macrófagos,  células  epiteliais  intestinais  e  mastócitos.  Os  TLR  das  superfícies  das  células  ligam­se  a  moléculas  comumente  expressas  por  bactérias  extracelulares,  como  lipopolissacarídios  ou  lipoproteínas.  Por  outro  lado,  os  TLR
citoplasmáticos ligam­se a ácidos nucleicos de vírus intracelulares. Uma vez ligados a estas estruturas, os TLR desencadeiam produção de proteínas, como interleucina­1 (IL­1) ou interferona a (IFN­a).
A IL­1 e outras citocinas, produzidas em resposta à estimulação via TLR, desencadeiam eventos e induzem inflamação aguda. Eles iniciam a aderência de leucócitos circulantes à parede dos vasos próximos ao sítio da invasão. Em
seguida, esses leucócitos, especialmente neutrófilos, saem dos vasos sanguíneos e migram para os locais de invasão, atraídos por produtos microbianos, pequenas proteínas denominadas quimiocinas e moléculas de células lesionadas. Uma
vez no sítio de invasão, os neutrófilos ligam­se às bactérias invasoras, ingerindo­as por meio de fagocitose, matando os microrganismos invasores. Esta morte é largamente mediada por uma via metabólica denominada explosão respiratória,
que gera potentes oxidantes, como peróxido de hidrogênio e íons hipocloretos. Contudo, os neutrófilos têm reserva energética mínima e podem participar de alguns eventos fagocíticos antes de sua depleção.
Mesmo que a resposta inflamatória inicial seja efetiva na eliminação de invasores, o organismo deve ainda remover restos celulares, eliminar qualquer micróbio sobrevivente e neutrófilos mortos e reparar a lesão. Esta é tarefa para os
macrófagos. Macrófagos teciduais originam­se de monócitos sanguíneos. Eles, como os neutrófilos, são atraídos aos sítios de invasão microbiana e da lesão tecidual por quimiocinas e tecidos lesionados, onde eliminam qualquer invasor
sobrevivente. Também fagocitam e destroem qualquer neutrófilo remanescente, assegurando desta forma que os neutrófilos oxidantes sejam removidos sem extravasamento de produtos tóxicos os tecidos. Finalmente, uma subpopulação
desses macrófagos inicia o processo de reparação tecidual. Macrófagos que completam o processo destrutivo são otimizados para destruição microbiana e são denominados células M1. Macrófagos otimizados para reparação e remoção de
tecidos lesionados são denominados células M2.
Várias das moléculas produzidas como resultado de inflamação e destruição tecidual, como IL­1 e fator de necrose tumoral, podem alcançar a corrente sanguínea, onde circulam. Alcançam o cérebro e desencadeiam um conjunto de
respostas comportamentais; por exemplo, alteram o centro termorregulador e induzem febre, atuam no centro de controle de apetite para suprimir a fome, e agem no centro do sono para induzir sono e depressão. Também, mobilizam
reservas de energia do tecido adiposo e dos músculos. Acredita­se que essas mudanças de comportamento melhoram a defesa do organismo pelo redirecionamento de energia para a luta contra os invasores.
Citocinas circulantes oriundas do sítio inflamatório também atuam nas células hepáticas, fazendo com que secretem uma variedade de proteínas de fase aguda, assim denominadas porque seus teores sanguíneos se elevam acentuadamente
quando se instala inflamação aguda. Diferentes espécies apresentam diferentes proteínas de fase aguda, incluindo amiloide A sérica, proteína C reativa e diversas proteínas ligadoras de ferro. Proteínas de fase aguda atuam principalmente
promovendo a defesa inata.

Complemento
Embora a inflamação aguda seja fundamental para o processo de imunidade inata, o organismo possui outros mecanismos de defesa inata. Tecidos contêm peptídios antimicrobianos que podem se ligar a bactérias invasoras e mata­las. Esses
incluem moléculas semelhantes a detergente, como defensinas e catelicidinas, que podem causar lise da parede celular de bactérias; enzimas, como as lisozimas, que eliminam várias bactérias Gram­positivas; proteínas ligadoras de ferro,
como  hepcidina  e  haptoglobina,  que  inibem  o  crescimento  bacteriano  ao  privar  as  bactérias  de  sua  indispensável  fonte  de  ferro.  Talvez  a  mais  importante  dessas  defesas  inatas  seja  o  sistema  complemento,  que  consiste  em  um  grupo
complexo de quase 30 proteínas que atuam coletivamente para matar microrganismos invasores. A principal função do sistema complemento é ligar irreversivelmente certas proteínas denominadas C3 e C4 à superfície microbiana. Uma vez
ligados, esses componentes do sistema complemento podem matar micróbios por meio de ruptura, utilizando outras proteínas denominadas C9, ou simplesmente revestindo­os de forma que sejam rapidamente e efetivamente fagocitados.
O sistema complemento pode ser ativado por três vias. Uma via, denominada via alternativa, é desencadeada pela presença de superfície bacteriana que contém basicamente carboidratos que podem se ligar à proteína do complemento
C3. Uma vez ligado, C3 atua como uma enzima para ativar e ligar mais moléculas de C3. Estas bactérias revestidas de C3 são rapidamente e efetivamente fagocitadas e destruídas. Alternativamente, o C3 ligado à superfície pode ativar
componentes do complemento adicionais que, por fim, fazem com que a proteína denominada C9 se insira na parede celular bacteriana, causando ruptura da bactéria. A segunda via de ativação do complemento é desencadeada quando
moléculas  de  manose  de  carboidratos  da  superfície  bacteriana  se  ligam  a  proteínas  ligadoras  de  manose,  no  soro.  Essa  ligação  ativa  uma  via  enzimática  que  induz  ativação  de  C3  ou  C9.  A  terceira  via,  ou  via  clássica  de  ativação  do
complemento, é estimulada quando anticorpos se ligam à superfície microbiana. Assim, é desencadeada por respostas imunes adquiridas. À semelhança da via da manose, essa via, por fim, ativa C3 e C9. Devido sua habilidade potencial de
causar lesão tecidual grave, o sistema complemento é cuidadosamente controlado por vias reguladoras múltiplas e complexas.

Células da Imunidade Inata
A chave para uma resposta imune inata efetiva é o reconhecimento imediato do invasor e a rápida resposta celular. Vários tipos de células atuam como células sentinelas; três das mais importantes são macrófagos, células dendríticas e
mastócitos. Esses tipos celulares têm receptores de reconhecimento padrões, como receptores semelhantes ao receptor toll, e podem perceber a presença de microrganismos invasores. Também, apresentam vários outros receptores que
podem detectar microrganismos e lesão tecidual. Quando esses receptores são acionados eles sinalizam para as moléculas NF­?B produzirem citocinas, como IL­1, IFN­a e TNF­a. Também, liberam moléculas vasoativas e de dor, como
histamina, leucotrienos, prostaglandinas e peptídios especializados, que iniciam os eventos vasculares na inflamação.
A finalidade da inflamação é assegurar que células fagocíticas sejam ativadas prontamente no sítio de invasão microbiana. Isto envolve atração das células da circulação e estímulo para sua migração aos tecidos do sítio de invasão, onde
fagocitam e matam os invasores. Há 3 principais populações de células fagocíticas. Granulócitos são especialmente efetivos na fagocitose das bactérias invasoras. Fagocitam as bactérias invasoras, ativam uma via metabólica denominada
explosão respiratória e geram moléculas oxidantes letais, como peróxido de hidrogênio e íons hipocloreto, que matam a maior parte das bactérias fagocitadas. Outras células fagocíticas, como os eosinófilos, eliminam especificamente
parasitos invasores. Elas contêm enzimas que são otimizadas para matar larvas de helmintos migrantes. A terceira principal população de células matadoras são os macrófagos M1. Essas células migram para as áreas de invasão microbiana
mais vagarosamente do que os granulócitos. Contudo, são capazes de fagocitose sustentável e efetiva. Eles contêm um fator antimicrobiano altamente letal, o óxido nítrico, e assim podem matar microrganismos resistentes à ação dos
neutrófilos.
Embora os fagócitos sejam otimizados para matar bactérias invasoras, o organismo também é infectado por vírus. Células matadoras naturais (NK, natural killer) representam uma população de células otimizadas para matar células
infectadas  por  vírus.  As  células  NK,  uma  forma  de  linfócitos,  podem  matar  células  infectadas  por  vírus  ou  outras  células  anormais  que  não  expressam  moléculas  MHC  (complexo  principal  de  histocompatibilidade;  em  inglês,  major
histocompatibility complex) de classe I. Moléculas MHC de classe I ligam­se a receptores de células NK e bloqueia sua capacidade de matar. Na ausência desse sinal, as células NK ligam­se às células–alvo, injetam proteínas indutoras de
apoptose e as matam.
Quando a inflamação induz a ativação de macrófagos, eles secretam uma citocina denominada IL­23. Esta, por sua vez, atua em uma população de células T (denominadas células TH 17), fazendo com que secretem IL­17. A IL­17 recruta
granulócitos aos sítios de inflamação, infecção e lesão tecidual.

DOENÇAS IMUNOLÓGICAS

A principal função do sistema imunológico é a detecção e destruição de microrganismos invasores. Devido à grande diversidade de micróbios invasores, o sistema imunológico tem desenvolvido vários mecanismos de proteção igualmente
complexos. Isso pode ser classificado simplesmente como imunidade inata e imunidade adquirida (ver p. 864). A proteção da invasão microbiana dentro de poucos dias é de responsabilidade do sistema imunológico inato “hard wired”. A
proteção a longo prazo é responsabilidade do sistema imunológico adquirido.
Em geral, doenças associadas ao sistema imunológico podem se apresentar de duas formas: função imune insuficiente que causa imunodeficiência, manifestada pelo aumento da suscetibilidade a infecções, e doença resultante de função
imune excessiva, resultando em hipersensibilidades e autoimunidade.
Em determinadas condições, normalmente respostas imunes protetoras podem causar importante lesão tecidual. Em geral, a resposta imune inata excessiva se deve a estímulo inflamatório inapropriado que ocasiona, como efeito colateral,
lesão aos tecidos vizinhos, ou à produção de quantidade excessiva de citocinas inflamatórias. Por outro lado, a resposta imune adquirida excessiva pode causar lesão tecidual por múltiplos mecanismos. Uma classificação simples categoriza
a doença decorrente de resposta imune adquirida excessiva em 4 tipos distintos. Três desses tipos são mediados por anticorpos (Tipos I, II e III) enquanto o tipo IV é mediado por célula T.
Inflamação e destruição tecidual limitada são características normais das respostas imunes inata e adquirida. A doença clinica se manifesta quando esta inflamação é excessiva ou se instala em local inapropriado. Isto pode ser decorrência
de fatores ambientais externos, como a composição da microflora intestinal, juntamente com influências hormonais e genéticas.

DOENÇAS CAUSADAS POR IMUNODEFICIÊNCIA
Doenças  causadas  por  imunodeficiências  manifestam­se  clinicamente  como  predisposição  a  infecções.  Geralmente  são  diagnosticadas  quando  um  animal  é  levado  várias  vezes  ao  veterinário  com  infecções  que  seriam  normalmente  e
relativamente fáceis de tratar. Há dois principais grupos de doenças ocasionadas por imunodeficiência. Um grupo de doenças hereditárias decorrentes de mutações ou outras doenças genéticas. Essas enfermidades por imunodeficiência
congênita ou primária comumente se manifestam em animais muitos jovens (< 6 meses de idade). O segundo grupo é representado por doenças devido à imunodeficiência secundárias a alguns outros estímulos, como infecções virais ou
neoplasias. Essas doenças secundárias ou adquiridas tendem a ocorrer em animais adultos. Outra regra geral para diagnóstico de imunodeficiências é que defeitos nos sistemas imunes inato e mediado por anticorpos tendem a resultar em
infecções bacterianas descontroladas, em que defeitos do sistema imunológico mediado por células tendem a causar excessivas infecções virais e fúngicas.

 IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS

Defeitos da Imunidade Inata
Fagocitose é a principal característica da imunidade inata. Fagócitos mononucleares estão presentes nas membranas mucosas e pele e na corrente sanguínea, baço, linfonodos, meninges, membrana sinovial, medula óssea e ao redor de vasos
sanguíneos, por todo o corpo. Fagócitos são encontrados nos tecidos (histiócitos, macrófagos sinoviais, células de Kupffer etc.) ou no sangue (leucócitos polimorfonucleares e monócitos). Fagócitos contêm receptores de imunoglobulinas e
complemento em sua superfície, o que facilita o englobamento (opsonização) de material estranho revestido com anticorpos específicos (opsoninas) ou complemento, ou ambos. A fagocitose envolve quimiotaxia de fagócitos a tecidos
estranhos, nocivos ou lesionados; aderência de microrganismos à membrana plasmática de fagócitos; incorporação de organismos ao fagossomo; e ativação da explosão respiratória e enzimas lisossomais no fagossomo ocasionando morte e
destruição dos microrganismos.
DEFICIÊNCIAS NA FAGOCITOSE:  Deficiências na atividade fagocítica podem envolver defeitos adquiridos ou congênitos, em qualquer uma dessas fases, ou simplesmente ser decorrência de deficiência de células fagocíticas. Frequentemente
se  manifestam  como  aumento  de  suscetibilidade  às  infecções  bacterianas  de  pele,  sistema  respiratório  e  trato  gastrintestinal.  Essas  infecções  respondem  pobremente  aos  antibióticos.  As  deficiências  fagocíticas  secundárias  incluem
distúrbios que ocasionam redução intensa crônica de leucócitos. Infecção por vírus da leucemia felina, vírus da panleucopenia felina, vírus da imunodeficiência felina e pancitopenia canina tropical, bem como granulocitopenias idiopáticas,
granulocitopenias  induzidas  por  medicamentos  (anticancerígenos,  estrógenos,  anticonvulsivantes,  sulfonamidas  etc.)  e  distúrbios  mieloproliferativos,  são  algumas  das  condições  nas  quais  infecções  secundárias  podem  desencadear
complicações como risco à vida do paciente.
No sangue periférico ocorre diminuição cíclica de todos os elementos celulares, notadamente de neutrófilos, e isso reduz a resistência às infecções em algumas linhagens da raça Colly cinza e seus mestiços.
Em  pessoas,  as  anormalidades  congênitas  que  induzem  deficiência  da  fagocitose  são  bem  documentadas.  Deficiências  de  opsoninas,  fatores  de  complemento,  capacidade  quimiotática,  mieloperoxidase  e  da  ativação  de  enzimas
lisossomais são bem conhecidas em pessoas, mas não em outros animais. Em alguns cães da raça Setter Irlandês, a doença granulomatosa crônica (síndrome granulocitopática canina) é reconhecida como um defeito ligado ao cromossomo
X.  Algumas  linhagens  de  cães  da  raça  Weimaraner,  quando  filhotes,  desenvolvem  sepse  bacteriana  (quase  sempre  manifestada  como  infecções  ósseas  e  articulares).  Desconhece­se  a  causa  primária  dessa  enfermidade;  alguns  cães
acometidos apresentam teores de IgM e IgG menores do que o normal, e os seus leucócitos possuem defeito na atividade bactericida.
DEFICIÊNCIA NA ADESÃO DE LEUCÓCITOS:  A deficiência na adesão de leucócitos é uma imunodeficiência primária, herdada como uma característica autossômica recessiva. Foi descrita em pessoas, em cães da raça Setter Irlandês e em
bovinos da raça Holstein. Essa deficiência se deve à ausência de integrina, uma glicoproteína essencial presente na superfície dos leucócitos. Clinicamente, é caracterizada por infecções bacterianas graves e recidivantes, dificuldade na
formação  de  pus  e  retardo  da  cicatrização  de  ferimentos.  Os  animais  infectados  geralmente  apresentam  febre  intensa,  anorexia  e  perda  de  peso.  A  resposta  à  antibioticoterapia  comumente  é  baixa.  Pode  ocorrer  leucocitose  extrema
persistente (> 100.000 leucócitos/ml), devido à presença de, principalmente, neutrófilos maduros. A deficiência de integrina impede a saída de leucócitos dos vasos sanguíneos e sua entrada nos tecidos; desta forma esta alta leucocitose não
pode contribuir para a defesa dos tecidos contra infecções.
DEFICIÊNCIAS  DE  COMPLEMENTO:   Em  uma  linhagem  endogâmica  de  cães  da  raça  Spaniel  britânico  foi  descrita  deficiência  congênita  de  C3.  Esses  cães  manifestam  infecções  bacterianas  recidivantes,  especialmente  dermatopatias  e
pneumonias. Embora o complemento seja necessário para opsonização e quimiotaxia de neutrófilos, nem sempre se desenvolvem infecções bacterianas em pessoas ou animais de laboratório com essas deficiências devido à existência de
múltiplas vias do complemento, o que propicia a ativação do sistema, mesmo que uma via esteja bloqueada. O diagnóstico baseia­se em testes sanguíneos, nos quais nota­se teor de C3 < 30% do valor normal.
A deficiência congênita do inibidor de C1 foi relatada em pessoas e, raramente, em cães. Isto pode induzir à ativação descontrolada do complemento e inflamação. Os animais acometidos apresentam episódios recidivantes de edema
facial.
Não há tratamento específico para as deficiências de complemento. Vacinação e antibióticos geralmente são utilizados para prevenir e tratar infecções. Como em todas as doenças hereditárias, os programas de acasalamento subsequentes
devem ser cuidadosamente avaliados, de modo a prevenir a ocorrência da doença em futuras gerações.

Deficiências Na Imunidade Adquirida
IMUNODEFICIÊNCIAS DA RESPOSTA HUMORAL:  Essas deficiências podem ser adquiridas ou congênitas. Deficiências adquiridas são notadas em neonatos que não recebem, adequadamente, anticorpos maternos (falha de transferência de
imunidade passiva) ou em animais idosos, em decorrência de afecções que diminuem a síntese de imunoglobulinas ativas. A falha na transferência passiva de imunoglobulinas ocorre nas espécies que utilizam o colostro como principal
fonte de anticorpos maternos. Essa falha é comumente associada a problemas clínicos em bezerros, cordeiros e potros. A falha de transferência passiva pode ocorrer quando o animal jovem não mama apropriadamente nos primeiros dias de
vida ou quando o colostro da mãe contém baixos teores de anticorpos específicos. Também, podem ocorrer problemas na absorção intestinal de imunoglobulinas do leite. Nos potros, concentração de imunoglobulina < 400 mg/dl em uma
amostra de soro sanguíneo obtida após a amamentação indica falha de transferência passiva. A separação demasiadamente precoce dos bezerros de suas mães é um problema frequente nos rebanhos leiteiros e representa a principal causa de
falha de transferência passiva em bezerros de rebanhos leiteiros. Os animais recém­nascidos que não obtêm anticorpos maternos adequadamente, com frequência, sucumbem a infecções bacterianas ou virais fatais dos tratos gastrintestinal e
respiratório.
Hipogamaglobulinemia clinicamente significante pode estar associada a qualquer distúrbio que interfira na síntese de imunoglobulinas. Neoplasias como mieloma plasmocitário ou linfossarcoma, que secretam grande quantidade de
anticorpos monoclonais, podem estar associadas a deficiência marcante de imunoglobulinas. Isto pode acontecer porque as células tumorais competem com as células produtoras de imunoglobulinas normais, ou porque vias reguladoras
inibem a produção de imunoglobulinas. Animais com tumores que produzem anticorpos monoclonais podem apresentar infecções secundárias graves. Algumas infecções virais, por exemplo, cinomose e parvovirose canina, podem matar
destruir quantidade suficiente de linfócitos e danificar o sistema imunológico tão gravemente que a produção de anticorpos é praticamente interrompida.
Hipogamaglobulinemia congênita é reconhecida tanto sozinha quanto em combinação com deficiências na imunidade mediada por células. Deficiências nas subclasses de IgG são observadas em algumas raças de bovinos; a deficiência
de IgM foi descrita em equinos e deficiências de IgA foram relatadas em cães das raças Beagle, Pastor Alemão e Shar­Pei chinês. Bovinos com deficiência da subclasse IgG geralmente são assintomáticos. Os potros mais velhos com
deficiência de IgM apresentam infecções respiratórias. Cães com deficiência de IgA, assim como pessoas, manifestam principalmente infecções cutâneas e respiratórias crônicas e, possivelmente, alergias. A deficiência de IgA em cães da
raça Beagle parece decorrência de um defeito na secreção de IgA, pois há quantidade normal de células IgA­positivas. Alguns cães da raça Pastor Alemão podem apresentar teor de IgA mais baixo do que cães de outras raças, bem como
maior  prevalência  de  infecções  intestinais.  A  deficiência  de  IgA  em  cães  da  raça  Shar­pei  é  altamente  variável;  alguns  apresentam  teores  séricos  e  secretórios  insignificantes,  outros  possuem  concentrações  séricas  normais  e  teores
secretórios baixos ou insignificantes. Assim como ocorre em Pastor Alemão, os cães Shar­Pei acometidos apresentam mais problemas de alergia do que o esperado. Pacientes com essas síndromes de imunodeficiência podem ter uma
prevalência maior de doenças autoimunes e autoanticorpos do que o normal, como anemia hemolítica autoimune, trombocitopenia e lúpus eritematoso sistêmico. É necessário tratamento prolongado com antibióticos de amplo espectro, que
frequentemente não é efetivo.
Hipogamaglobulinemia transitória é relatada mais frequentemente em potros e filhotes de pequenos animais. Pode ser mais comum em filhotes de cães do tipo Spitz do que naqueles de outras raças. Isto se de à falha na produção de
imunoglobulinas em recém­nascidos, associada a um defeito na função de células Th e na resposta de linfócitos B a antígenos estranhos. Nessas condições, os filhotes de cães desenvolvem infecções respiratórias recidivantes com 1 a 6
meses de idade, mas se recuperam ao redor de 8 meses de idade. Os potros acometidos frequentemente desenvolvem sinais clínicos de hipogamaglobulinemia (quase sempre infecções respiratórias) com cerca de 6 meses de idade, quando
seus anticorpos maternos atingem uma concentração bastante baixa. Depois de 3 a 5 meses eles começam a produzir imunoglobulinas. O tratamento adequado com antibióticos e terapia de suporte geralmente ser suficiente.
DEFICIÊNCIAS NA IMUNIDADE MEDIADA POR CÉLULA:  As deficiências na resposta imune mediada por células estão associadas a aplasia de timo, com timo ausente ou muito pequeno. Isso é observado em algumas linhagens endogâmicas de
cães e bovinos; esses animais apresentam deficiências nas funções imunológicas mediadas por células, como blastogênese linfocitária, bem como desenvolvem disfunção hipofisária.
DOENÇA  POR  IMUNODEFICIÊNCIA  COMBINADA:   Se  ambas  as  respostas  imunes,  humoral  e  celular,  são  deficientes  tem­se  imunodeficiência  combinada  (IC).  Ela  se  deve  a  lesões  nos  progenitores  linfocitários  iniciais.  IC  recessiva  foi
identificada em potros da raça Árabe e em cães Basset Hound. Isto resulta de um defeito nas enzimas de reparação do DNA e impede a produção de receptores antigênicos funcionais. Casos esporádicos de IC foram relatados em cães das
raças  Poodle  toy,  Rottweiler  e  em  filhotes  de  raças  mestiças.  Cães  acometidos  são  frequentemente  assintomáticos  nos  primeiros  meses  de  vida  mais  tornam­se  progressivamente  mais  suscetíveis  a  infecções  microbianas  à  medida  que
diminui o teor de anticorpos. Filhotes com IC geralmente são normais até 6 a 12 meses de idade. A causa mais comum de morte por essa anormalidade é a cinomose, uma consequência da imunização de rotina com vacina de vírus vivo
modificado  contra  a  doença.  Potros  da  raça  Árabe  com  o  distúrbio  frequentemente  são  acometidos  por  pneumonia  causada  por  adenovírus  ou  outras  infecções  aos  cerca  de  2  meses  de  idade.  Os  potros  permanecem  persistentemente
linfopênicos. Amostras de soro antes da mamada do colostro não apresentam anticorpo IgM. Os teores de imunoglobulinas são normais após a amamentação, mas diminuem progressivamente depois desse período, em comparação com os
teores de potros normais. Na necropsia, é difícil identificar o timo, que possui arquitetura anormal Nos linofonodos, placas de Peyer e baço nota­se depleção intensa dos elementos linfoides. Um teste de PCR está disponível para confirmar
IC em potros, bem como a presença de gene em animais heterozigotos. Como resultado do uso desses testes a prevalência de IC em equinos tem diminuído significativamente.
IMUNODEFICIÊNCIAS SELETIVAS:  Grande número de doenças causadas por imunodeficiências ainda precisam ser bem estudadas, pois os mecanismos fisiopatogênicos exatos ainda são desconhecidos. Por exemplo, há predisposição racial
em  filhotes  de  cães  Rottweiler  por  infecções  graves  por  parvovírus  canino,  frequentemente  fatais  (ver  p.  423).  A  resistência  desses  animais  a  outras  doenças  permanece  essencialmente  normal,  e  não  se  conhece  a  causa  dessa
imunodeficiência seletiva.
Gatos da raça Persa são predispostos a dermatofitoses graves, às vezes, crônicas (ver p. 923). Em alguns desses gatos, infecções fúngicas se instalam na derme e causam doença granulomatosa (micetoma).
Visons, ou martas, com mutação da cor de pelame Aleutiana são suscetíveis à parvovirose crônica e desenvolvem um distúrbio denominado doença aleutiana (ver p. 2153). Outras linhagens de visons são suscetíveis à infecção por esse
vírus, mas não desenvolvem doença clínica.
Aspergilose focal e sistêmica (ver p. 680) e micoses causadas por fungos aparentados acometem algumas raças de cães. Raças de nariz longo, particularmente Pastor Alemão e seus mestiços, são predispostas à aspergilose focal nas vias
nasais. Aspergilose sistêmica é observada quase que exclusivamente em cães Pastor Alemão, sendo mais frequente na Austrália Ocidental do que em outras regiões. É caracterizada por pielonefrite, osteomielite e discoespondilite fúngicas.
O microrganismo causador pode ser facilmente isolado no sangue e na urina.

 IMUNODEFICIÊNCIAS SECUNDÁRIAS
Em animais adultos, imunodeficiências frequentemente ocorrem como consequência de infecções virais, desnutrição, estresse ou toxinas. São denominadas imunodeficiências secundárias. Imunodeficiências secundárias induzidas por vírus
são as mais importantes delas.

Imunodeficiências Induzidas por Vírus
Uma das maneiras em que os vírus sobrevivem em animais infectados é por meio de imunossupressão. Por exemplo, vírus da cinomose canina infecta e destrói linfócitos, causando importante imunodeficiência combinada em filhotes de
cães  acometidos.  A  infecção  está  associada  a  diminuição  progressiva  dos  teores  de  imunoglobulinas  e  aumento  da  suscetibilidade  a  microrganismos  controlados  pela  imunidade  muscular  celular,  como Pneumocistis  e  Toxoplasma.  A
infecção pelo vírus da parvovirose, tanto canina quanto felina, também causa diminuição significativa da resistência a infecções fúngicas, como aspergilose, mucormicose e candidíase, no período pós­recuperação imediato.
VÍRUS DA  LEUCEMIA  FELINA  (FELV):  Esta  infecção  está  associada  a  imunodeficiência  adquirida  e  maior  prevalência  de  infecções  secundárias  oportunistas.  Na  infecção  por  FeLV,  a  imunodeficiência  adquirida  é  multifatorial.  Os  gatos
infectados podem apresentar deficiência de neutrófilos, menor produção de anticorpos (especialmente contra antígenos bacterianos), redução da imunidade celular e concentrações variáveis de complemento. As respostas imunológicas
contra a infecção por FeLV também parecem suprimir a imunidade ao coronavírus que causa peritonite infecciosa felina (FIP), modo a induzir reativação de uma FIP quiescente (ver p. 852).
RETROVÍRUS SÍMIO TIPO D:  Esta infecção viral de macacos tem patogênese semelhante àquela da infecção por FeLV em gatos, mas pode induzir imunodeficiência ainda mais grave. Retrovírus tipo D dos macacos pode causar doença grave
em animais jovens criados em zoológicos e em centros de primatas com grande grupo de reprodutores. Embora a taxa de infecção no ambiente silvestre possa ser alta, esse vírus causa síndrome menos grave nas populações silvestres do que
nas cativas. Os macacos infectados morrem dentro de alguns meses, com febre, linfadenopatia e infecções oportunistas de SNC, trato respiratório e intestinos; tornam­se portadores assintomáticos vitalícios ou se recuperam completamente.
VÍRUS  DA  IMUNODEFICIÊNCIA DE  SÍMIOS  (VIS):  Este lentivírus está relacionado com o vírus da imunodeficiência humana. Na natureza há várias cepas de SIS. Hospedeiros comuns são primatas africanos, como o macaco­verde africano,
macaco mangabei escuro, mandril, babuíno e macaco guenon. A transmissão entre macacos infectados e não infectados provavelmente acontece por meio de picadas e exposição intrauterina. Não se encontra VIS nas populações nativas de
primatas asiáticos. VIS raramente provoca doença em espécies hospedeiras africanas. Se os animais se encontram sob alto estresse, como ocorre em cativeiros, alguns animais infectados podem desenvolver doença semelhante à AIDS. VIS,
especialmente aquele oriundo de macaco mangabey escuro, causa doença grave em macacos asiáticos (macacos rhesus, macaco­de­rabo­curto, macaco­rabo­de­porco, macaco Bonnet etc.). A imunossupressão associada a VIS pode durar
semanas ou anos. Encefalite (geralmente assintomática, exceto quanto debilitante) e linfomas são sequelas frequentes de infecções por VIS em macacos.
VÍRUS  DA  IMUNODEFICIÊNCIA FELINA (FIV):  Foi  identificado  em  gatos  domésticos  e  guepardos.  A  infecção  é  endêmica  em  gatos,  em  todo  o  mundo.  O  vírus  é  excretado  principalmente  pela  saliva  e  o  principal  modo  de  transmissão  é  a
mordedura.  Gatos  livremente  errantes  (silvestres  e  de  estimação),  machos  e  idosos,  representam  o  maior  risco  de  infecção.  A  infecção  por  VIS  é  incomum  em  gatos  de  raça  pura  que  vivem  em  gatis.  Após  a  infecção,  há  um  período
transitório de febre, linfadenopatia e neutropenia. Grande parte dos gatos se recupera a partir desse estágio e parece normal por meses ou anos antes de surgir imunodeficiência progressiva. Os gatos com imunodeficiência adquirida induzida
por FIV manifestam infecções secundárias oportunistas crônicas nos tratos respiratório, gastrintestinal (inclusive boca) e urinário, bem como na pele. Em gatos infectados por FIV a prevalência de linfoma FeLV­negativo, geralmente de
linfócitos B, e de doenças mieloproliferativas (neoplasias e displasias), é maior do que a esperada.
VÍRUS  SEMELHANTE  AO  DA  IMUNODEFICIÊNCIA  BOVINA:  Estes  lentivírus  isolados  originalmente  de  bovinos  com  linfocitose  permanente  e  hemolinfadenopatia.  Também  já  foi  isolado  de  bovinos  com  linfossarcoma  VLB­negativo.  A
prevalência total em bovinos parece ser cerca de 1%, embora, em alguns rebanhos, possa ser = 15%. Evidências preliminares indicam que o vírus não é patogênico.

FUNÇÃO IMUNE EXCESSIVA
Há diversos modos pelos quais a função imune excessiva pode causar doença ou morte. Essas incluem resposta inata excessiva, resposta adquirida excessiva e neoplasia de sistema imunológico.

 GAMOPATIAS
Gamopatias são condições nas quais nota­se aumento marcante dos teores séricos de imunoglobulinas. Podem ser classificadas em policlonais (aumento em das principais classes de imunoglobulinas) ou monoclonais (aumento em uma
única imunoglobulina homogênea).
Gamopatias policlonais  envolve  condições  que  causam  estimulação  prolongada  do  sistema  imunológico.  Essas  incluem  piodermatite  crônica;  infecções  virais,  bacterianas  ou  fúngicas  crônicas;  doenças  granulomatosas;  abscessos;
infecções  parasitárias  crônicas;  riquetsioses  crônicas,  como  pancitopenia  canina  tropical;  doenças  imunes  crônicas,  como  lúpus  eritematoso  sistêmico,  artrite  reumatoide  e  miosite  ou  neoplasias.  Essas  gamopatias  também  podem  ser
idiopáticas. Em alguns animais, inicialmente pode parecer monoclonal em razão da predominância de uma classe de imunoglobulinas (geralmente IgG). Tem sido relatada em gatos com peritonite infecciosa felina não efusiva e em cães
com pancitopenia canina tropical crônica.
Gamopatias monoclonais são caracterizadas pela produção de grande quantidade de um tipo de imunoglobulina. As gamopatias monoclonais são benignas (i. e., não associadas a doença primária) ou associadas a tumores secretores de
imunoglobulinas.
Os  tumores  que  produzem  anticorpos  monoclonais  se  originam  de  plasmócitos  (mieloma)  ou  de  linfoblastos  (linfossarcoma).  Os  mielomas  plasmocitários  podem  secretar  proteínas  íntegras  de  qualquer  classe  de  imunoglobulina  ou
subunidades de imunoglobulinas (cadeias leves ou pesadas). Em cães, as proteínas de mieloma são comumente dos tipos IgG ou IgA e, em menor quantidade, IgM. Os mielomas tipo IgA são particularmente comuns em cães da raça
Doberman Pinscher. As imunoglobulinas monoclonais produzidas por um linfossarcoma geralmente são da classe IgM, independente da espécie. Em gatos e equinos, as proteínas de mieloma quase sempre são IgG e, raramente, IgM, IgG3
(equinos) ou IgA.
Os sinais clínicos dependem da localização e da gravidade da neoplasia primária e da quantidade e do tipo da imunoglobulina secretada. Mielomas plasmocitários frequentemente se desenvolvem nas cavidades medulares dos ossos
chatos cranianos, costais e pélvicos, bem como nas vértebras. Fraturas patológicas dos ossos acometidos podem causar enfermidades de coluna vertebral, dor e claudicação.
A doença clinicamente evidente pode resultar da presença da proteína monoclonal propriamente dita. Por exemplo, algumas formas de amiloidose (ver p. 631) podem ser decorrência do deposito de imunoglobulinas de cadeia leve nos
tecidos (amiloide A sérica). A síndrome da hiperviscosidade acomete 20% dos cães com proteínas monoclonais IgM e IgA e pode ser notada quando o teor sanguíneo de proteínas é alto. Nessa síndrome, a viscosidade plasmática pode estar
aumentada, muitas vezes o valor normal, resultando em distúrbios vasculares graves, trombose e diátese hemorrágica. Depressão, cegueira e manifestações neurológicas podem ser causadas por hemorragia no sistema nervoso e na retina.
Algumas proteínas monoclonais tipo IgM atuam como crioglobulinas e se agregam in vitro e in vivo, quando o plasma é resfriado. Animais com crioglobulinemia desenvolvem gangrenosa com desprendimento das extremidades das orelhas,
pálpebras, dedos e cauda, especialmente durante clima com baixa temperatura. Animais com gamopatias monoclonais podem apresentar baixo teor de imunoglobulinas normais e, portanto, podem desenvolver infecções secundárias graves.
As neoplasias secretoras de imunoglobulinas comumente são tratadas com quimioterápicos apropriados. Pode ser necessário plasmaférese com intuito de diminuir a viscosidade sérica em animais com sinais clínicos de síndrome da
hiperviscosidade.

 NEOPLASIAS DO SISTEMA IMUNOLÓGICO
As células do sistema imunológico podem tornar­se neoplásicas. Isto resulta na produção de células tumorais que podem ser totalmente ineficientes e, por isso, devem causar imunodeficiências. Alternativamente, podem ser funcionais e
produzir grande quantidade de imunoglobulinas contra antígenos desconhecidos.
Em  pacientes  com  câncer,  as  células  tumorais  escapam  do  ataque  imunológico,  em  razão  da  imunossupressão  e  de  modificações  das  células  tumorais.  A  demonstração  de  que,  mesmo  volumoso,  o  tumor  invasivo  pode  regredir
completamente sob estimulação apropriada (p. ex., IL­2), indica que realmente é possível obter sucesso com tratamento de câncer por meio de manipulação imunológica.
Linfomas  são  um  dos  tumores  mais  prevalentes  em  cães  e  gatos.  A  resposta  imunológica  normal  requer  uma  proliferação  intensa  rápida  de  linfócitos.  No  entanto,  essa  proliferação  às  vezes  pode  ser  descontrolada,  resultando  em
neoplasias linfoides. Pelo fato de os linfócitos estarem presentes em todos os órgãos, o desenvolvimento do tumor pode ocorrer em qualquer órgão. As neoplasias podem ser multicêntricas, mediastinais, gastrintestinais, renais, nervosas ou
leucêmicas. É pouco comum nos olhos, pele ou nariz. Para determinar o estágio da doença são úteis contagens de células sanguíneas, perfil químico sérico, ultrassonografia abdominal, radiografia abdominal e exame de medula óssea. Para
caracterizar os linfomas de cães e gatos pode­se realizar corante fluorescente. Estes podem se originar tanto em linfócitos T quanto em linfócitos B.
A maioria dos casos de linfossarcoma canino, doença de Marek, leucose de bezerros e leucemia felina tem origem nos linfócitos T, como os timomas. Muitos linfomas de linfócitos T estão associados a imunossupressão simultânea
manifestada por meio de predisposição à infecções recidivantes.
Leucose  em  bovinos  e  ovinos  adultos,  leucemia  felina  alimentar  e  leucose  aviária  geralmente  se  originam  de  linfócitos  B.  Em  certas  condições,  os  linfócitos  B  neoplásicos  podem  se  desenvolver  em  plasmócitos.  Os  tumores
plasmocitários são denominados mielomas. Como os plasmócitos neoplásicos podem secretar imunoglobulinas, eles dão origem às gamopatias.

 RESPOSTA IMUNE ADQUIRIDA EXCESSIVA
Atividade  excessiva  do  sistema  imunológico  adquirido  pode  induzir  inflamação  e  lesão  tecidual,  autoimunidade  ou  amiloidose.  Por  muitos  anos  tem  se  classificado  as  resposta  imune  adquirida  excessiva  em  4  tipos,  com  base  nos
mecanismos envolvidos.

Reação Tipo I (Doença Atópica, Reação Anafilática)
Hipersensibilidade imediata ou Tipo I acompanha estas reações mediadas por IgE a outros antígenos não parasitários. Esta inflamação pode ser mínima ou localizada ou grave e generalizada. Nesta forma mais extrema pode causar uma
síndrome de choque letal denominada anafilaxia. A anafilaxia é uma manifestação sistêmica aguda da interação de um antígeno (alergênio) com anticorpos IgE, presentes em mastócitos e basófilos. Essa ligação do antígeno com anticorpos
IgE  ligados  às  células  desencadeia  a  liberação  de  mediadores  inflamatórios  biologicamente  ativos,  inclusive  histamina,  leucotrienos,  fatores  quimiotáticos  de  eosinófilos,  fator  ativador  de  plaquetas,  cininas,  serotoninas  e  enzimas
proteolíticas. Essas moléculas afetam diretamente o sistema vascular, causando vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular, e os músculos lisos, causando contração. Além disso, estimulam a migração de eosinófilos para o sítio de
origem da reação.
A intensidade da reação depende do tipo de antígeno, da quantidade de anticorpos IgE e de antígenos e da via de exposição. Se o animal é previamente sensibilizado pela exposição ao alergênio (antígeno) e produz anticorpos IgE, então a
injeção desses antígenos sensibilizantes diretamente na corrente sanguínea pode resultar em choque anafilático e reações relacionadas (erupções, urticária, edema conjuntival­facial. Se os alergênios sensibilizadores entram em contato com
membranas mucosas ou pele, as reações alérgicas tendem a ser mais localizadas. Há vários agentes que podem causar reações anafiláticas e alérgicas, inclusive o veneno da picada e do ferrão de insetos, vacinas, medicamentos, alimentos e
derivados de sangue.
ANAFILAXIA SISTÊMICA (REAÇÕES ANAFILÁTICAS GENERALIZADAS):  Choque anafilático se instala em animais sensibilizados, após exposição a vacinas ou medicamentos, ingestão de alimentos ou picada de insetos. Os sinais clínicos surgem
segundos a minutos depois da exposição ao alergênio. Na maioria dos animais domésticos, o pulmão é o órgão­alvo primário e os vasos porto­mesentéricos representam o alvo secundário; isso é reversível em cães. A degranulação de
mastócitos nos vasos pulmonares causa constrição das vias respiratórias bronquiais ou das veias pulmonares e congestão sanguínea e edema no leito vascular pulmonar, o que resulta em angústia respiratória grave. A degranulação de
mastócitos nos vasos portossistêmicos causa dilatação venosa e congestão sanguínea nos intestinal e no fígado.
Os sintomas podem ser localizados ou generalizados e incluem inquietação e excitação, prurido ao redor da cabeça ou no local de exposição, edema facial, salivação, lacrimejamento, vômito, dor abdominal, diarreia, dispneia, cianose,
choque, incoordenação, colapso, convulsões e morte. Nos cães, o principal órgão acometido por choque anafilático é o fígado e os sintomas estão associados à constrição nas veias hepáticas, o que resulta em hipertensão portal e acúmulo de
sangue  na  víscera.  Em  cães,  os  sintomas  gastrintestinais  são  mais  evidentes  do  que  os sinais  respiratórios.  A  terapia  de  suporte,  além  do  tratamento  da  angústia  respiratória,  consiste  na  administração  de  epinefrina  (tanto  local  quanto
sistêmica, quando necessário). Se necessário, pode­se utilizar fluido intravenoso para tratamento do choque, anti–histamínicos (por via sistêmica, para tratar anafilaxia aguda grave, ou VO, para controlar os sintomas crônicos de alergia ou
sinais alérgicos mais discretos) e corticosteroides.
O choque anafilático é tratado com injeção intravenosa de epinefrina para inibir a constrição brônquico e a vasodilatação portomesentérica. Pode ser necessário terapia de suporte para controlar a pressão arterial e a função respiratória.
Em razão do início hiperagudo dos sintomas, os anti­histamínicos propiciam poucos benefícios terapêuticos
Reações urticarianas (placas angioedematosas ou urticárias) na pele e no subcutâneo e edema agudo de lábios, conjuntiva e pele facial (angioedema face­conjuntival), são formas menos graves de hipersensibilidade tipo I. Erupção
cutânea é a reação menos grave e não deve ocasionar outras anormalidades clínicas. O edema face­conjuntival é mais grave e pode estar associado a anafilaxia sistêmica branda a moderadamente grave. Essas reações geralmente seguem à
administração de vacinas ou medicamentos, ingestão de certos alimentos ou picada de insetos. As reações urticarianas e o edema face­conjuntival ocorrem na maioria das espécies e se resolvem espontaneamente dentro de 24 h. Nem todas
as reações deste tipo são mediadas por hipersensibilidade tipo I (ver p. 912).
Alergia ao leite ocorre ocasionalmente em vacas e, com menor frequência, em éguas. Pode surgir quando as vacas produzem autoanticorpos IgE contra os componentes de seu próprio leite, notadamente contra a caseína. Quando há
aumento da pressão intramamária, essas proteínas lácteas entram na circulação e induzem hipersensibilidade do tipo I. A reação pode ser localizada ou sistêmica. A recuperação ocorre quando o animal é ordenhado.
REAÇÕES ANAFILÁTICAS LOCALIZADAS:
Rinite alérgica se manifestada por meio de secreção nasal serosa e espirros, sendo menos comum nos animais do que em pessoas. Frequentemente é sazonal e relaciona­se à exposição ao pólen. Rinite não sazonal pode estar associada à
exposição a alergênios presentes no ambiente, como bolores, descamações ou material de cama e alimentos. Nos equinos, a obstrução recorrente das vias respiratórias (ver p. 1570) provavelmente é uma reação à exposição crônica a bolores
presentes no feno mofado e em estábulos pouco ventilados. Coriza de verão é uma rinite alérgica sazonal que ocorre em bovinos das raças Guernsei ou Jersei mantidos em alguns tipos de pastagens em floração, no final do verão e início do
outono. A rinite alérgica pode ser diagnosticada por tentativa com base: (1) constatação de eosinófilos no exsudato nasal; (2) demonstração de uma resposta favorável a anti­histamínicos; (3) desaparecimento dos sintomas quando se remove
o alergênio causador ou, ocasionalmente; (4) quando a natureza deste é sazonal. O teste cutâneo não é um método confiável para diagnosticar alergias nasais em animais.
Bronquite alérgica crônica foi mais bem caracterizada em cães. Tosse seca estridente, curta e repetida, facilmente precipitada por esforço ou pressão na traqueia, é um sinal clínico característico. Essa doença pode ser sazonal ou ocorrer
o ano todo. Geralmente não está associada a outros sinais de doença. O exsudato brônquico é rico em eosinófilos e livre de bactérias. As radiografias torácicas são normais e pode ocorrer, ou não, eosinofilia periférica de baixo grau. A
afecção é tratada com dilatadores bronquiais e expectorantes (aminofilina e iodeto de potássio ou guaifenesina). Os glicocorticoides aliviam muito os sintomas, especialmente quando seu uso pode ser limitado a determinadas estações ou à
terapia com baixa dose em dias alternados. Geralmente não é possível evitar o(s) alergênio(s) causador(es).
Bronquiolite alérgica é mais comum em gatos. Manifesta­se por meio de tosse de baixo grau, chiado, discreta dispneia e aumento da densidade peribronquiolar nas radiografias, podendo ser confundida com outras enfermidades (asma
alérgica ou dictiocaulose pulmonar). No início da doença os sinais clínicos melhoram com o uso terapia anti­histamínica, mas se a doença se agravar podem ser necessárias doses moderadas a altas de corticosteroides. Quase sempre não se
identifica o alergênio causador.
Infiltrado pulmonar eosinofílico é mais frequente em cães, mas foi detectado em todas as espécies. Está associado a infiltrado inflamatório difuso nos pulmões e eosinofilia periférica acentuada; as concentrações séricas de globulinas
geralmente estão aumentadas. Diferente do que acontece na bronquite alérgica, os animais acometidos manifestam dispneia ou se cansam facilmente durante o exercício. O exsudato brônquico difuso contém muitos eosinófilos. Geralmente
não se identifica o alergênio causador específico. Glicocorticoides representam o tratamento de escolha. Uma síndrome semelhante está associada a infecções parasitárias residentes ou migratórias nos pulmões de animais jovens.
Asma alérgica é mais frequente em gatos, nos quais os sintomas são semelhantes àqueles verificados em pessoas. Ocorre mais frequentemente no verão e surge após a saída do animal ao ar livre; os episódios individuais podem ser
transitórios  e  leves,  ou  prolongados  e  graves  (estado  asmático).  As  crises  brandas  manifestam­se  por  chiado  e  tosse;  nos  episódios  graves  podem  ocorrer  dispneia  expiratória,  hiperextensão  pulmonar,  aerofagia,  cianose  e  dificuldade
marcante à inspiração.
Alergias intestinais (alergias alimentares) são frequentemente verificadas em cães e gatos, principalmente em gatinhos (ver p. 907 e 2450). Gastrite alérgica se manifesta na forma de vômitos que ocorrem 1 a > 12 vezes/semana, 1 a 2 h
após a alimentação. O vômito pode apresentar manchas de bile. Nos gatos, os vômitos podem ser o único sintoma; os cães também podem apresentar fezes intermitentemente líquidas. Cães e gatos com gastrite alérgica geralmente são
saudáveis, exceto pelos episódios de vômito, embora possa ocorrer perda de peso e da condição do pelame, em casos graves. Enterite alérgica está associada a inflamação moderada do intestino delgado, havendo grau discreto, ou nenhum,
de eosinofilia. O volume e a frequência de defecações geralmente são normais, mas a consistência das fezes varia de semiformadas a aquosas. As fezes podem ser muito fétidas, especialmente as de gatos. Os animais acometidos podem
emagrecer muito, apesar do bom apetite. Lesões cutâneas e má condição do pelame são mais associadas às alergias alimentares em gatos do que em cães. A alergia frequentemente se instala após surto de enterite viral, bacteriana ou por
protozoário (condição conhecida como “ruptura” alérgica). A enterite eosinofílica é a forma mais grave de doença intestinal alérgica; manifesta­se como inflamação intestinal moderada a grave e acentuada eosinofilia Diarreia e perdas de
peso e pelame são evidentes. A prevalência de colite alérgica é maior em gatos do que nos cães, embora geralmente não seja comum. Nos cães, comumente está associada a defecações frequentes e fezes moles, com muco e, às vezes,
sanguinolentas; nos gatos, se manifesta como fezes mais normais, recobertas ou com manchas de sangue fresco (Para diagnóstico e tratamento de alergia alimentar, ver p. 907).

Bronquiolite alérgica; imagem lateral. Cortesia do Dr. Ronald Green.

Dermatite atópica (ver p. 909) é uma dermatopatia crônica pruriginosa que acomete várias espécies, porém é mais estudada em cães. Os animais com dermatite atópica têm uma predisposição genética que induz produção excessiva de
anticorpos  reagentes  (IgE).  Estima­se  que  cerca  de  10%  da  população  de  cães  apresentam  atopia,  com  predisposição  em  animais  das  raças  Terrier,  Dálmata  e  Retriever.  A  dermatite  atópica  canina  frequentemente  se  deve  a  alergênios
inalados como, por exemplo, poeira domiciliar, pólen, bolores e descamações. Os cães com atopia várias vezes mordem os pés e as axilas. Nas áreas sem pelos, evidencia­se especialmente sudorese excessiva. As lesões cutâneas se agravam
em razão de lambedura, coceira, infestação por pulga e infecção bacteriana ou fúngica secundária. Nos gatos, as lesões cutâneas atópicas são miliares (crostas pequenas) e disseminadas, ou maiores e mais localizadas. As lesões localizadas
frequentemente são pruriginosas.
Em gatos, os alergênios alimentares provavelmente são causas mais comuns de lesões cutâneas do que os alergênios inalados. A “itch sweet” (ver p. 987) é uma dermatite alérgica sazonal de equinos, associada a picadas de alguns insetos,
especialmente Culicoides, que se alimentam à noite. Surgem lesões intensamente pruriginosas ao longo do dorso, desde as orelhas até a base da cauda e a área perianal. Podem­se observar reações alérgicas cutâneas semelhantes a picadas
de insetos ao redor das orelhas e da face de cães e gatos (Para diagnóstico e tratamento, ver p. 909).

Reação Tipo II (Reação Citotóxica Mediada por Anticorpo)
A reação tipo II ocorre quando um anticorpo se liga a um antígeno na superfície da célula. Esse anticorpo ligado pode, então, ativar a via clássica do complemento, resultando em lise celular, fagocitose ou citotoxicidade celular dependente
de anticorpo. Diversos antígenos podem desencadear essa destruição celular, mas na infecção em animais geneticamente predispostos parece ser a principal via desencadeadora. Anticorpos de reatividade cruzada podem se desenvolver
durante as infecções. Esses anticorpos de reatividade cruzada direcionados ao agente infeccioso se ligam ao tecido normal e resultam em citotoxicidade mediada por anticorpo. Por exemplo, em equinos com infecção estreptocócica pode
ocorrer reação cruzada entre os antígenos de Streptococcus equi e as membranas basais vasculares, provocando púrpura hemorrágica. Patógenos como, por exemplo, Babesia ou Haemobartonella, que parasitam células desencadeiam uma
resposta imunológica que destrói essas células, como parte de um mecanismo protetor. As manifestações mais comuns de hipersensibilidade tipo II envolvem células sanguíneas. Essas incluem anemia hemolítica, se há envolvimento de
hemácias, leucopenia,  quando  envolve  leucócitos,  ou  trombocitopenia,  envolvendo plaquetas. Anemia e trombocitopenia são mais comuns. Em determinadas circunstâncias o episódio citotóxico nas células epiteliais vasculares podem
causar vasculite, com extravasamento vascular.
ANEMIA HEMOLÍTICA AUTOIMUNE E TROMBOCITOPENIA:  A produção de autoanticorpos contra eritrócitos ou antígenos plaquetários induz anemia e trombocitopenia, as reações tipo II mais comuns. Anticorpos e complemento se fixam às
hemácias, direta ou indiretamente, por meio de um antígeno absorvido e, então, ocasiona a destruição dessas células, resultando em anemia grave com risco de vida ao animal. Nota­se trombocitopenia concomitante em 60% dos casos.
AHAI pode estar associada a lúpus eritematoso sistêmico ou com câncer linforreticula. Medicamentos, vacinas ou infecções também podem precipitar crises de anemia hemolítica ou trombocitopenia na maioria das espécies. No entanto,
causa a desencadeadora é desconhecida.
Há quatro formas básicas de AHAI: hiperaguda, aguda ou subaguda, crônica, doença da crioaglutinina fria e aplasia eritrocitária. A maioria dessas formas da doença é tratável e recidivas são comuns (ver p. 14).
AHAI  hiperaguda  é  observada  principalmente  nas  raças  de  cães  maiores,  de  meia­idade.  Os  cães  acometidos  manifestam  depressão  aguda  e,  dentro  de  24  a  48  h,  ocorre  diminuição  marcante  do  volume  globular  (VG),  com
hiperbilirrubinemia e icterícia de graus variáveis e, às vezes, hemoglobinúria. No início, a anemia não é responsiva, mas torna­se responsiva em 3 a 5 dias. Pode­se notar trombocitopenia. Geralmente, teste de antiglobulina é negativo;
esferócitos podem ou não ser encontrados, porém a aglutinação de hemácias em tubo ou em lâmina é evidente. A autoaglutinação não desaparece pela diluição com solução salina, daí o termo anemia hemolítica com aglutininas em salina.
O soro sanguíneo geralmente contém autoanticorpos que causam aglutinação da maior parte das hemácias do doador. O prognóstico de AHAI hiperaguda é ruim, mesmo no caso de terapia intensiva imediata. O procedimento mais efetivo é
a  imediata  administração  de  altas  doses  de  glicocorticoides,  mais  ciclofosfamida,  juntamente  com  transfusão  de  sangue  compatível.  Caso  seja  necessário  o  uso  de  sangue  incompatível,  o  animal  inicialmente  deve  ser  submetido  à
heparinização  e  mantido  com  heparina  nos  primeiros  10  dias.  Mesmo  sem  transfusão,  a  heparinização  pode  ser  benéfica  nas  primeiras  duas  semanas  ou  mais.  Substituto  de  hemoglobina  bovina  e  imunoglobulina  humana  podem  ser
utilizados para dar suporte ao paciente até que o tratamento imunossupressivo reduza a destruição de hemácias.
AHAI aguda representa a forma mais comum da doença; cães da raça Cocker Spaniel são predispostos à doença. Os sinais iniciais, em geral, são palidez e fadiga e, menos comumente, icterícia. Hepatoesplenomegalia é um sintoma
evidente. A contagem de leucócitos quase sempre aumenta em razão da hiperplasia da medula óssea. Autoaglutinação de hemácias é incomum e o teste de Coombs geralmente é positivo. Esses animais, várias vezes, respondem bem à
terapia com glicocorticoides. Caso não seja obtida uma resposta favorável dentro de 7 a 10 dias, devem­se adicionar medicamentos citotóxicos (ciclofosfamida ou azatioprina) ao protocolo terapêutico.
AHAI crônica difere da forma aguda; o VG diminui para um valor constante e assim permanece por semanas a meses. A medula óssea mostra­se normal ou torna­se hiper­responsiva e o teste de Coombs frequentemente é negativo.
AHAI  crônica  é  relativamente  mais  comum  em  gatos  do  que  nos  cães.  A  anemia  geralmente  é  responsiva  no  início  da  doença,  mas  responde  minimamente  ou  não  responde  quando  se  torna  grave.  O  tratamento  inicial  é  feito  com
glicocorticoides; caso não ocorra resposta dentro de 2 semanas, adicionam­se medicamentos citotóxicos ao tratamento.
Doença da crioaglutinina é uma anemia hemolítica autoimune que acomete cães e equinos. Em geral, a causa desencadeante é incomum e pode ser secundária a infecções, outras doenças autoimunes ou neoplasias. Os autoanticorpos
IgM podem ser aglutinantes ou não. Não ocorre aglutinação completa à temperatura do corpo, mas é possível que ocorra em temperatura um pouco mais baixa; desta forma é mais frequente em climas e estações mais frias. Os sintomas
iniciais são aqueles de uma doença hemolítica; no tipo aglutinante, também pode ocorrer obstrução vascular e consequente necrose de nariz, pontas das orelhas e cauda, dedos, escroto e prepúcio. O diagnóstico se baseia na autoaglutinação
reversível notada somente a 4°C. Em geral, o teste de Coombs direto é negativo para IgG e, com frequência, positivo para C3 e geralmente positivo para IgM, se o teste for realizado em baixa temperatura. A taxa de mortalidade é alta. Na
ausência de infecção ou neoplasia desencadeante, a doença é melhor controlada com altas doses de glicocorticoide, combinadas com ciclofosfamida.
Aplasia  eritrocitária  (ver  p.  12)  é  uma  variante  dos  distúrbios  anteriores,  sendo  mais  comum  em  cães.  Apresenta­se  em  duas  formas:  uma  acomete  filhotes  de  cães  pós–desmame  a  adolescentes;  a  outra  se  instala  em  adultos.
Diferentemente do que ocorre na AHAI, a medula óssea exibe depressão seletiva dos elementos eritroides; granulócitos e plaquetas não são influenciados. Portanto, a anemia periférica não é responsiva. Aparentemente, a crise imune é
direcionada contra as células­tronco eritroides e, geralmente, o teste de Coombs é negativo. O tratamento é o mesmo mencionado para AHAI crônica.
Trombocitopenia autoimune é comum, especialmente em cães. Ocorre mais em fêmeas do que em machos. Os sinais clínicos frequentes incluem hemorragias cutâneas e nas membranas mucosas. Melena, epistaxe e hematúria podem
ser  sintomas  associados  e  podem  causar  anemia  grave.  Às  vezes,  anemia  hemolítica  e  trombocitopenia  ocorrem  simultaneamente.  Trombocitopenia  autoimune  comumente  é  diagnosticada  com  base  na  baixa  contagem  de  plaquetas  no
sangue periférico, apesar de megacariocitose marcante na medula. Às vezes, pode haver ausência seletiva de megacariócitos na medula – uma condição semelhante à aplasia pura de hemácias. É difícil realizar testes para pesquisa de
anticorpos antiplaquetários e geralmente o diagnóstico baseia­se no quadro clínico e na resposta à terapia (ver p. 24).
Animais  com  trombocitopenia  autoimune  que  exibem  apenas  hemorragias  petequiais  e  equimóticas,  sem  perda  de  sangue  significativa  e  megacariócitos  na  medula,  inicialmente  são  tratados  com  glicocorticoides.  Os  sinais  clínicos
melhoram  e  a  contagem  de  plaquetas  começa  a  aumentar  depois  de  5  a  7  dias.  Se  a  contagem  plaquetária  não  aumenta  significativamente  após  7  a  10  pode­se  acrescentar  ciclofosfamida,  azatioprina  ou  vincristina  ao  tratamento  com
glicocorticoides.  Em  animais  com  megacariócitos  na  medula  e  com  perda  sanguínea  grave  é  desejável  uma  resposta  mais  rápida  à  terapia.  Tais  animais  são  tratados  com  injeção  única  de  vincristina,  combinada  com  uso  diário  de
glicocorticoide;  uma  resposta  favorável  ocorre  depois  de  3  a  5  dias.  Se  a  perda  de  sangue  representa  risco  à  vida  deve­se  administrar  sangue  total  rico  em  plaquetas.  Se  a  contagem  plaquetária  aumentar  no  7o dia,  mantém­se  apenas
glicocorticoides. Se não ocorrer qualquer resposta após 7 dias, deve–se administrar uma segunda dose de vincristina. Se a contagem de plaquetas ainda se encontra baixa depois de 2 semanas, a vincristina deve ser interrompida e deve­se
administrar ciclofosfamida ou azatioprina. Animais com trombocitopenia e sem megacariócitos respondem muito mais lentamente aos glicocorticoides ou à combinação de glicocorticoides e vincristina. O tratamento preferido para esses
animais é prednisolona e ciclofosfamida; não se deve esperar uma resposta muito antes de 1 a 2 semanas após o início da terapia. Esse tratamento pode ser descontinuado na maioria dos animais com trombocitopenia autoimune depois de 1
a 3 meses da normalização da contagem de plaquetas. Alguns animais apresentam trombocitopenia persistente, apesar da terapia com medicamentos, ou podem ser mantidos em remissão apenas com tratamento prolongado com alta dose.
Como alternativas pode–se permitir que o animal viva com trombocitopenia, se os sintomas forem mínimos, ou realizar terapia medicamentosa combinada prolongado com glicocorticoides e vincristina, azatioprina ou ciclofosfamida.
Esplenectomia pode ser útil; raramente é curativa quando utilizada como procedimento único, mas pode permitir o uso de doses mais baixas e mais seguras de medicamentos imunossupressores.
DERMATOPATIAS AUTOIMUNES:  Nessas doenças, os animais produzem autoanticorpos contra proteínas cimentantes intracelulares da epiderme. Isto promove proteólise local ocasionando a separação das células epidérmicas (acantólise) e o
desenvolvimento de vesículas na pele. Embora não seja estritamente uma reação Tipo II, é melhor considera­la aqui.
Pênfigo foliáceo é a forma mais comumente encontrada desta doença. É mais comum em cães do que em gatos e equinos, mas é ainda uma doença rara. É caracterizada clinicamente por erosões, ulcerações e incrustações espessas na pele
e junções mucocutâneas. A ausência de lesões na boca e a característica crostosa e espessa disseminada das lesões cutâneas permite diferenciar pênfigo foliáceo do pênfigo vulgar, muito mais raro. Autoanticorpos estão presentes na pele e
reagem com a substância cimentante intracelular. Esses autoanticorpos causam separação das camadas celulares cornificadas e não cornificadas. Inicialmente, utilizam­se altas doses de glicocorticoides, mas quando a doença está controlada
administra­se terapia com baixa dose, em dias alternados. Nos casos que não respondem a esteroides utiliza­se um medicamento imunossupressor mais potente, como ciclofosfamida ou azatioprina, juntamente com glicocorticoides. Em
animais que respondem mal à terapia inicial ou necessitam doses altas do medicamento para controlar as lesões, o prognóstico a longo prazo é ruim.
Pênfigo vulgar é muito menos comum do que o pênfigo foliáceo. Caracteriza­se por formações vesiculares ao longo das junções mucocutâneas da boca, ânus, prepúcio e vulva, bem como na cavidade bucal. Há pouco envolvimento de
outras áreas da pele. Como a epiderme dos animais é relativamente fina (em comparação com a pele humana), as bolhas se rompem rapidamente e formam erosões; em consequência, raras vezes se observam bolhas características. As
vesículas  se  desenvolvem  como  resultado  da  acantólise  suprabasilar.  Uma  infecção  bacteriana  secundária  frequentemente  complica  as  lesões  e,  se  não  for  tratada,  vários  casos  podem  ser  fatais.  A  doença  é  tratada  com  altas  doses  de
glicocorticoides, sozinhos ou combinados com outras drogas como, por exemplo, ciclofosfamida, azatioprina ou sais de ouro. É difícil manter a doença em remissão e o prognóstico a longo prazo é reservado a ruim.
Penfigoide bolhoso é uma doença de pele rara que acomete cães, sendo mais frequente em animais das raças Collie e Doberman Pinscher. As lesões são disseminadas, mas tendem a se concentrar na virilha. A pele envolvida assemelha­
se a uma queimadura grave. Também se observam bolhas subepidérmicas e podem estar repletas de eosinófilos. Nos cortes teciduais para exame imunoistopatológico observam­se autoanticorpos contra as proteínas da camada basal. O
tratamento de escolha é a combinação de prednisolona e azatioprina; a remissão é frequente, mas pode ser necessária terapia contínua com medicamentos, em doses relativamente altas, para manter a doença sob controle. O prognóstico a
longo prazo é ruim.
MIASTENIA GRAVIS:  Miastenia gravis uma doença autoimune, na qual são produzidos autoanticorpos contra receptores de acetilcolina das células musculares, causando degradação do receptor ou bloqueio da transmissão neuromuscular. As
manifestações clínicas caracterizam­se por fraqueza muscular extrema generalizada, exacerbadas por exercícios leves. Em cães, megaesôfago devido à paralisia dos músculos esofágicos é uma queixa primária ou associada comum. Em
pessoas, timomas frequentemente estão associados a miastenia gravis, mas são incomuns em espécies domésticas. A administração de anticolinesterásico de curta ação (cloreto de edrofônio) provoca aumento drástico da força muscular. O
tratamento deve ser feito com anticolinesterásico de ação prolongada. Terapia prolongada da doença com medicamentos imunossupressores é uma alternativa coerente. Podem ser detectados autoanticorpos contra receptores de acetilcolina
no soro dos animais acometidos, por meio de exame imunoistopatológico indireto, para o qual se utiliza músculo normal como substrato.

Reação Tipo III (Doença por Imunocomplexos)
Os complexos antígenos­anticorpos são depositados nos tecidos, causando inflamação aguda. Mediante a ativação da via clássica do complemento, os complexos produzem potentes substâncias indutoras de quimiotaxia, que ativam grande
número de neutrófilos. Essas células, especialmente quando liberam suas enzimas e produtos oxidantes, causam inflamação aguda e, possivelmente, grave lesão tecidual. As doenças por imunocomplexos são as mais comuns das doenças
imunológicas. Os locais mais acometidos são articulações, pele, rins, pulmão e cérebro.
O  prerrequisito  para  o  desenvolvimento  da  doença  é  a  presença  contínua  de  antígeno  e  anticorpos  solúveis.  Essas  formas  de  imunocomplexos  solúveis  se  depositam  na  membrana  basal  de  pequenos  vasos.  Os  imunocomplexos
depositados  ativam  a  via  clássica  do  complemento.  Os  fragmentos  de  complemento  atraem  neutrófilos,  tendo  também  ação  vasoativa  direta,  que  causam  vasculite.  Há  várias  razões  para  a  persistência  contínua  de  antígenos,  incluindo
infecções crônicas e algumas neoplasias, particularmente tumores linforreticulares. É possível a exposição prolongada aos antígenos quando há sua inalação. Por fim, alguns animais respondem aos seus próprios antígenos e isso representa
uma fonte de antígenos persistente. Em muitos casos não se consegue determinar a origem dos antígenos envolvidos nesses imunocomplexos. A localização dos imunocomplexos pode ser determinada pela via na qual o antígeno penetra no
corpo. Antígenos inalados provocam pneumonite; antígenos que entram através da pele causam lesões cutâneas locais; e antígenos que atingem a corrente sanguínea formam imunocomplexos que são depositados nos glomérulos renais ou
articulações.
Os sinais clínicos são variáveis, mas incluem febre, sintomas cutâneos (como eritema multiforme) e poliartrite (evidenciada por claudicação com desvio de membro ou tumefação e dor articular). Outros sinais são ataxia, alteração de
comportamento,  proteinúria,  isostenúria,  polidipsia,  poliúria  ou  sintomas  vagos  como,  por  exemplo,  vômito,  diarreia  e  dor  abdominal.  O  diagnóstico  baseia­se  na  exclusão  das  causas  mais  comuns  dos  sinais  clínicos.  As  evidências
consistentes para confirmar o diagnóstico incluem estabelecimento de uma relação temporal, caso a suspeita seja um medicamento, identificação de doenças infecciosas crônicas ou de neoplasias malignas e exames histopatológicos e
imunoistoquímicos  em  amostras  obtidas  por  biopsia  para  identificar  vasculite  ou  nefrite  imunomediada.  A  terapia  deve  incluir  tratamento  de  suporte,  remoção  do  agente  causador  ou  tratamento  da  doença  primária  (p.  ex.,  terapia
antimicrobiana apropriada para tratar infecção bacteriana, drenagem cirúrgica de abscessos ou tecidos infectados, terapia de dirofilariose, suspensão de medicamentos etc.). Pode ser necessário tratamento imunossupressivo para interromper
a formação contínua de imunocomplexos.
GLOMERULONEFRITE MEMBRANOPROLIFERATIVA:  Esta doença é causada por imunocomplexos que se formam na corrente sanguínea e são filtrados pelos glomérulos (ver p. 1654). Na verdade, os complexos insolúveis se instalam na
membrana  basal  do  glomérulo.  Dependendo  do  tamanho,  eles  podem  ser  depositados  na  superfície  subepitelial  ou  subendotelial  da  membrana.  Secundariamente,  instala­se  glomerulonefrite  como  consequência  de  doenças  infecciosas
crônicas, neoplásicas ou enfermidades imunológicas. Os animais com glomerulonefrite idiopática (> 50% dos casos) geralmente apresentam sintomas de nefropatias; glomerulonefrite secundária é uma parte relativamente menor de uma
doença mais grave.
Pneumonite por hipersensibilidade:
Quando os antígenos inalados encontram anticorpos na circulação das paredes dos alvéolos, formam­se imunocomplexos nas paredes alveolares, que desencadeiam inflamação aguda. Pneumonite por hipersensibilidade é mais comum em
grandes animais expostos a poeiras antigênicas. Os antígenos mais potentes são aqueles contidos em esporos de actinomicetos termofílicos oriundos de feno embolorado. A inalação desses esporos causa pneumopatia dos fazendeiros, em
pessoas, e uma condição semelhante em bovinos (ver p. 1550). Pneumonite por hipersensibilidade é caracterizada por desconforto respiratório que surge 4 a 6 h depois da exposição ao feno embolorado. O tratamento mais efetivo é a
remoção da fonte do antígeno; todavia, uma terapia com corticoesteroides pode ser útil.
LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO (LES):
Esta  doença  autoimune  complexa  acomete  cães;  é  rara  em  gatos  e  já  foi  descrita  em  grandes  animais.  Tem  duas  características  imunológicas  consistentes:  doença  por  imunocomplexo  e  tendência  a  produzir  diversos  autoanticorpos.
Clinicamente, reflete a combinação de mecanismos das reações Tipos II e III. Anticorpo contra ácidos nucleicos é a característica do diagnóstico de LES, mas, em muitos indivíduos, também são encontrados anticorpos contra hemácias,
plaquetas, linfócitos, fatores de coagulação, imunoglobulinas (fatores reumatoides) e tireoglobulina. Autoanticorpos contra os ácidos nucleicos, anticorpos antinucleares (ANA), não são significativamente patogênicos, mas são marcadores­
diagnóstico da doença. Imunocomplexos ou autoanticorpos da doença geralmente predominam em determinado animal. A deposição de imunocomplexos ao redor de pequenos vasos sanguíneos causa sinovite, reações dérmicas, erosões e
úlceras bucais, miosite, neurite, meningite, arterite, mielopatia, glomerulonefrite e pleurite. Glomerulonefrite é uma das principais complicações do LES, com risco à vida, em gatos, mas não em cães. Nos animais com LES também se
verifica psicose, principal sinal de LES em pessoas. Nos animais, anemia hemolítica autoimune ou trombocitopenia, ou ambas, constituem as manifestações de autoanticorpos mais comuns do LES em animais.
O LES se caracteriza por anticorpos antinucleares (ANA) e os testes para pesquisa desses anticorpos ou das células LE associadas podem auxiliar no diagnóstico. No entanto, alguns animais saudáveis podem apresentar ANA e nem todos
os animais com LES apresentam teor de ANA detectável no sangue. O diagnóstico de LES deve ser fundamentado na síndrome clínica geral (e não somente na presença ou ausência de ANA).
Geralmente, LES é tratado com glicocorticoides. No início, eles devem ser utilizados em altas doses diárias e quando nota­se remissão deve­se utilizar uma terapia com baixa dose, em dias alternados. O tratamento medicamentoso deve
continuar por um período = 2 a 3 meses, após o desaparecimento de todos os sinais clínicos. Ciclofosfamida ou azatioprina, ou ambas, devem ser utilizadas em combinação com glicocorticoides nos animais com LES de difícil controle
apenas com glicocorticoides.
VASCULITE:  Vasculite mediada por imunocomplexos é verificada nos animais, sobretudo em cães e equinos. As lesões são mais prevalentes na derme da parte distal dos membros e na membrana mucosa bucal, particularmente no palato e
na língua (cães) e nos lábios (equinos). Os envolvimentos nasal, auricular, palpebral, corneano e anal são incomuns. As lesões iniciais se manifestam como áreas avermelhadas que rapidamente originam erosões superficiais. Forma­se, de
imediato, uma crosta sobre as erosões dérmicas. Edema de membros é comum em equinos, sendo menos frequente, mas igualmente relevante, em cães. Em alguns animais, vasculite é uma característica do LES, no entanto geralmente é
idiopática. Nos cães, também é bem relatada vasculite induzida por medicamentos. A vasculite é detectada em exame histopatológico e imuno­histopatológico de amostras de materiais das bordas das lesões, obtidas por biopsias superficiais
e profundas.
A vasculite é tratada mediante a interrupção do uso de medicamentos desencadeantes da doença e, se necessário, com drogas imunossupressoras. Para tratar os casos não induzidos  por  medicamentos  empregam­se  glicocorticoides,
sozinhos ou combinados com outras drogas, como azatioprina ou ciclofosfamida.
PERIARTRITE NODOSA (POLIARTERITE NODOSA, POLIARTERITE NECROSANTE):
Esta rara doença de animais domésticos é causada pela deposição de imunocomplexos e inflamação da parede de artérias de pequeno e médio calibres. Entre os animais pecuários, é mais comum em suínos, e geralmente está associada a
erisipela e infecções estreptocócicas, sendo atribuídas as reações do Tipo III a esta bactéria ou a suas vacinas. Tem sido relatada em gatos, embora várias vezes seja confundida com a forma não efusiva de peritonite infecciosa felina.
OUTROS  TIPOS  DE  REAÇÕES  TIPO  III:   Púrpura  hemorrágica  dos  equinos  é  uma  forma  de  púrpura  não  trombocitopênica  (ver  p.  24)  que  frequentemente  é  secundária  à  infecção  respiratória  por  Streptococcus  equi;  é  mediada  por
imunocomplexos de anticorpos e antígenos estreptocócicos depositados nas membranas basais vasculares.
Uveíte anterior (ver p. 551) pode envolver, frequentemente, reações mediadas por imunocomplexos; várias vezes se instala no período de recuperação de hepatite infecciosa canina (ver p. 831), em razão da reação de anticorpos séricos
com as células endoteliais uveais que contêm o adenovírus canino Tipo 1. De modo semelhante, a uveíte equina recidivante (ver p. 553) está associada a reações imunológicas à infecção por Leptospira ou Onchocerca spp. Esta oftalmia
periódica se deve a uma crise autoimune. Anticorpos contra alguns sorovariantes de Leptospira podem apresentar reação com antígenos de retina e desencadear oftalmia grave. A uveíte causada por Toxoplasma e pelo vírus da peritonite
infecciosa felina também tem uma base imunológica.

Reação Tipo IV (Reações Imunológicas Mediadas por Células)
As  reações  imunológicas  mediadas  por  células  ocorrem  quando  antígenos  desencadeiam  uma  resposta  do  tipo  TH 1.  Diversas  citocinas  são  produzidas  por  macrófagos  ativados  ou  por  células  T  citotóxicas.  A  infiltração  de  células
mononucleares e a produção de várias moléculas inflamatórias por essas células nos tecidos resultam em doenças por reações imunes mediadas por células. Os antígenos geralmente responsáveis pelo desenvolvimento das reações tipo IV
são bactérias ou parasitos intercelulares, alguns vírus, substâncias químicas e (em algumas situações) antígenos celulares. Essas lesões comumente ocorrem na pele (dermatite alérgica de contato) quando o antígeno entra em contato com o
tecido tegumentar. Reações granulomatosas também podem ocorrer em locais de infecções persistentes. O diagnóstico baseia­se na exclusão de outras causas de doenças e no exame histológico. O tratamento objetiva identificar e eliminar a
fonte do antígeno responsável pela reação, além de terapia anti­inflamatória ou imunossupressora, se necessária.
Púrpura hemorrágica. Cortesia do Dr. Asmeeh M. Abutarbush.

Doenças  específicas,  em  que  reações  imunes  excessivas  ou  inapropriadas  são  as  causas  primárias,  são  relatadas  em  todas  as  espécies  de  animais  domésticos.  Contudo,  foram  melhor  caracterizadas  em  animais  de  companhia  e  de
laboratório. As manifestações clínicas e o tratamento são semelhantes nas diferentes espécies.
REAÇÕES GRANULOMATOSAS:  Essas reações a microrganismos como micobactérias, Coccidioides, Blastomyces e Histoplasma spp e, possivelmente, vírus da peritonite infecciosa felina, se devem a reações imunológicas crônicas mediadas
por células. Embora a imunidade mediada por célula controle efetivamente esses tipos de infecção, na maioria dos indivíduos, por motivos pouco compreendidas, esses mesmos mecanismos são parcialmente efetivos em outros pacientes. A
reação granulomatosa se instala ao redor do local onde há antígeno persistente. É caracterizada por estroma fibroso infiltrado por macrófagos, células gigantes e linfócitos.
CORIOMENINGITE LINFOCITÁRIA:  Nesta infecção viral de camundongos (ver p. 2135) ocorre destruição de células infectadas por vírus pelas células T, ocasionando lesão de sistema nervoso central (SNC).

ENCEFALITE EM CÃO GERIÁTRICO:  Esta doença (ver p. 821) pode também resultar de mecanismos imunes mediados por células, direcionados contra células persistentemente infectadas pelo vírus da cinomose. Em geral, o início da infecção
por este vírus é clinicamente inaparente e pode preceder a encefalite por muitos anos.
HIPERSENSIBILIDADE ALÉRGICA POR CONTATO:  Esta hipersensibilidade resulta da reação de substâncias químicas com proteínas dérmicas, as quais modificam as próprias proteínas. Essas proteínas modificadas desencadeiam uma resposta
imune mediada por célula, que causa inflamação e lesão cutânea (p. ex., reações pelas toxinas do carvalho e da hera, em pessoas). Essa reação foi bem descrita tanto em cães quanto em equinos e geralmente se deve ao contato com produtos
químicos sensibilizantes contidos em comedouros plásticos, coleiras plásticas e medicamentos aplicados na pele.
TIREOIDITE AUTOIMUNE:  Esta doença de cães é caracterizada pela destruição da glândula tireoide por um mecanismo autoimune que envolve componentes humorais (Tipo II) e mediados por células (Tipo IV). É particularmente prevalente
em animais das raças Doberman Pinscher, Beagle, Golden Retriever e Akita. Hipotireoidismo (ver p. 593) pode ser a única manifestação da doença ou pode ter um componente clínico ou subclínico de um distúrbio autoimune mais amplo,
como lúpus eritematoso sistêmico ou panendocrinopatia.
ADRENALITE AUTOIMUNE:  Esta síndrome foi descrita em cães. As glândulas adrenais são destruídas lentamente por um infiltrado linfocítico­plasmocítico. Quando há destruição suficiente do tecido glandular, os cães desenvolvem síndrome
de Addison (ver p. 599). Às vezes, a enfermidade está associada a tireoidite autoimune.
CERATITE SECA:  Esta síndrome acomete cães, havendo predisposição genética em cães da raça Cocker Spaniel. Pode ser primária ou secundária ao uso prolongado de sulfonamidas. Está associada à destruição imunomediada das glândulas
lacrimais; é semelhante à síndrome de Sjögren em pessoas. Os cães acometidos devem responder favoravelmente ao uso de colírio com ciclosporina.

 RESPOSTA INATA EXCESSIVA
Embora a inflamação aguda seja um mecanismo de defesa fundamental na imunidade inata, ela pode ocorrer em grau inapropriado e em locais onde causa inflamação indesejada, lesão tecidual ou doença sistêmica. Isso causa importante
lesão tecidual, com inabilidade de resposta.
ARTRITE REUMATOIDE CANINA:  Esta doença é consequência direta de inflamação excessiva descontrolada ao redor das articulações. Se manifesta inicialmente como claudicação inconstante, com tumefação dos tecidos moles ao redor das
articulações envolvidas. Dentro de semanas a meses, a doença se instala em articulações individuais e desenvolvem­se alterações radiográficas características. As alterações radiográficas iniciais consistem em tumefação de tecidos moles e
perda da densidade óssea trabecular na região articular. No osso subcondral observam­se áreas radiotransparentes semelhantes a cistos. A lesão proeminente é uma erosão progressiva na cartilagem e no osso subcondral, na área das ligações
sinoviais, e resulta em perda de cartilagem articular e colabamento do espaço articular. Ocorrem deformidades angulares e a luxação articular é uma sequela frequente. As deformidades são mais comuns nas articulações carpianas, tarsais e
falangianas, e menos frequentes no cotovelo e no joelho. As alterações no fluido sinovial indicam sinovite inflamatória estéril, com aumento da contagem celular total e alta proporção de neutrófilos na população de células do fluido
sinovial. Acredita­se que a inflamação excessiva se deve à deposição de imunocomplexos na sinóvia, com subsequente ativação do complemento.
Há relato de artrite erosiva em gatos. Tende a acometer gatos machos mais velhos e frequentemente está associada a infecção pelo vírus formador de sincício felino. O desenvolvimento da doença em gatos é muito mais insidioso do que
em cães.
A  artrite  reumatoide  canina  não  responde  bem  ao  tratamento  sistêmico  exclusivo  com  glicocorticoides.  Medicamentos  imunossupressores  com  atividade  anti­inflamatória,  como  ciclofosfamida  e  azatioprina,  são  utilizados  com
glicocorticoides para tratar essas enfermidades; o uso de AINE (por ex: ácido acetilsalicílico, carprofeno, etodolac, meloxicam) pode propiciar alívio dos sintomas.
SINOVITE PLASMOCÍTICA­LINFOCITÁRIA:  Possivelmente uma variante da artrite reumatoide, esta sinovite acomete cães de raças médias e grandes. Embora envolva várias articulações, a doença é mais frequente nos joelhos. A queixa mais
comum é claudicação de membro pélvico e movimento de gaveta dos joelhos. No fluido sinovial predominam linfócitos e neutrófilos polimorfonucleares, embora, em alguns casos, o fluido permaneça normal. Na inspeção macroscópica da
articulação nota­se proliferação amarelada na membrana sinovial e estiramento ou ruptura dos ligamentos cruzados. O tratamento utilizado é semelhante ao utilizado para artrite reumatoide canina, mencionado anteriormente.
Poliartrite  idiopática:  Esta  artrite  é  mais  comum  em  cães  grandes,  particularmente  naqueles  das  raças  Pastor  Alemão,  Doberman  Pinscher,  Retriever,  Spaniel  e  Pointer.  Nas  raças  toy,  é  mais  frequente  em  Poodle,  Yorkshire  Terrier,
Chihuahua ou em seus mestiços. Não há evidência de doença infecciosa crônica primária ou de lúpus eritematoso sistêmico. Artropatia frequentemente é o único sintoma.
O diagnóstico se baseia no histórico de febre cíclica que não responde ao uso de antibióticos, mal­estar e anorexia, com rigidez ou claudicação. Não se observa alteração óssea nas radiografias até que a doença esteja bem estabelecida.
Mesmo assim, as alterações radiográficas são discretas e podem mimetizar artropatia degenerativa. O fluido sinovial é de natureza inflamatória, porém estéril.
A doença pode ser controlada com uso diário de altas doses de glicocorticoides, seguido de terapia com baixa dose em dias alternados. Geralmente, pode­se interromper o tratamento depois de 3 a 5 meses. Os cães que não respondem
bem a este tratamento (> 50%) devem ser tratados com medicamentos imunossupressoras mais potentes, como azatioprina ou ciclofosfamida, além de glicocorticoides. Em alguns animais, sais de ouro podem ser úteis para exacerbar o
efeito da terapia com glicocorticoides.
MENINGITE IMUNOMEDIADA:  Acomete  cães  jovens  ou  jovens  adultos  das  raças  Beagle,  Boxer,  Pointer  alemão  de  pelo  curto  e  Akita;  contudo,  é  muito  rara  em  outras  raças  puras  ou  em  cães  mestiços.  Os  sinais  clínicos  consistem  de
episódios cíclicos de febre, dor e rigidez marcante do pescoço, relutância em se movimentar e depressão. Cada episódio dura 5 a 10 dias, com períodos intercalados de normalidade completa ou parcial, com duração = 1 semana. Durante as
crises,  aumenta  a  concentração  de  proteínas  e  a  quantidade  de  neutrófilos  no  fluido  cerebroespinal  (FCE).  A  lesão  é  uma  arterite,  que  atinge  principalmente  vasos  das  meninges  e,  às  vezes,  de  outros  órgãos.  Em  geral,  a  doença  é
autolimitante depois de vários meses; os episódios tornam­se mais graves e menos frequentes. A terapia com glicocorticoide reduz a gravidade das crises. Em alguns animais a doença se torna crônica e responde parcialmente ao tratamento.
Uma forma mais grave desse tipo de meningite foi descrita em uma ninhada de cães Bernese Mountain. Nessa raça, a doença foi um tanto cíclica, mas a resolução nos intervalos entre as crises foi menor do que em outras espécies. As
anormalidades do FCE lembram aquelas verificadas em outras raças. A enfermidade requer tratamento prolongado altas doses de glicocorticoides para manter os animais confortáveis.
Em cães da raça Akita com apenas 12 semanas de idade notou­se uma síndrome caracterizada por meningite, frequentemente associada a poliartrite. Os cães manifestaram episódios graves de febre (um tanto cíclicos), depressão, dor e
rigidez cervical e rigidez generalizada. Os cães acometidos tinham crescimento retardado e pareciam definhados. Essa doença respondeu mal à terapia combinada de glicocorticoides e medicamentos imunossupressores; a maioria dos cães
foi submetida à eutanásia quando eram adultos jovens. Nos cães Akita mais velhos, observa–se uma forma de doença mais branda e que responde melhor aos medicamentos, que pode estar associada a pênfigo foliáceo, uveíte e tireoidite
plasmocítica­linfocitária.
Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (Sepse)
Nas infecções graves ou na lesão tecidual extensa, grande quantidade de citocinas e oxidantes deixam a corrente sanguínea e causa uma forma de choque conhecida como síndrome da resposta inflamatória sistêmica (sepse). Várias doenças
infecciosas se caracterizam pela ativação de grande número de células imunes e consequente produção de grande quantidade de citocinas e mediadores inflamatórios, em curto período de tempo. As mais importantes delas são TNF­a, IFN­?
e IL­8, IL­6. Essas citocinas podem estimular a ativação de células T adicionais e liberação de mais citocinas. Como várias citocinas são tóxicas, esta “tempestade de citocinas” pode causar intoxicação grave, lesão tecidual, e até morte. Esta
imensa liberação de citocinas que resultam de trauma tecidual, infecções ou queimaduras, ocasionam choque séptico. Contudo, infecções por bactérias Gram­negativas, alguns vírus e hemoparasitas podem causar liberação excessiva de
citocinas e morte. Outra doença que envolve toxicidade por citocina é a síndrome do enxerto versus hospedeiro. Um dos mais importantes efeitos tóxicos é a ativação de células endoteliais, induzindo aumento da permeabilidade vascular e
coagulação intravascular.
CHOQUE SÉPTICO BACTERIANO:  Choque  séptico  é  o  nome  dado  à  síndrome  da  resposta  inflamatória  sistêmica  causada  por  infecções  graves  associadas  a  traumas,  isquemia  e  lesão  tecidual.  Animais  com  infecções  graves  geralmente
produzem grande quantidade de citocinas, que induzem acidose grave, febre, liberação de lactato nos tecidos, queda incontrolável da pressão sanguínea, aumento do teor plasmático de catecolaminas e, por fim, lesão renal, hepática e
pulmonar e morte. O equilíbrio procoagulante­anticoagulante é alterado, com elevação da atividade procoagulante endotelial, enquanto várias vias anticoagulantes são inibidas, ocasionando coagulação intravascular disseminada (CID) e
trombose capilar.
Todos esses efeitos são mediados pela excessiva expressão de receptores semelhantes ao receptor toll (TLR), induzindo liberação intensa e descontrolada de citocinas. O TLR desencadeia uma “tempestade de citocinas” oriundas de
macrófagos estimulados. As citocinas promovem danos às células do endotélio vascular, ativando­as de forma que aumenta a atividade procoagulante, ocasionando coagulação do sangue. O óxido nítrico causa vasodilatação e queda da
pressão sanguínea.
A instalação da lesão no endotélio vascular, por fim, causa insuficiência dos órgãos. A síndrome da disfunção múltipla dos órgãos é o estágio final do choque séptico grave. É caracterizada por hipotensão, perfusão tecidual insuficiente,
hemorragia incontrolável e insuficiência de órgãos causada por hipoxia, acidose tecidual, necrose tecidual e anormalidade metabólica local grave. A hemorragia intensa se deve à CID. A suscetibilidade dos animais ao choque séptico é
muito variável. Espécies que apresentam macrófagos intravasculares pulmonares (gatos, equinos, ovinos e suínos) tendem a ser mais suscetíveis do que os cães.
SISTEMA TEGUMENTAR

 Introdução
Dermatites
Problemas Dermatológicos
Diagnóstico das Dermatopatias
Exame Físico
Histórico
Procedimentos Laboratoriais para Dermatopatias
Problemas Dermatológicos Comuns
Alopecia
Prurido
Princípios da Terapia Tópica
 Anomalias Congênitas e Hereditárias do Sistema Tegumentar
Alopecia Hereditária e Hipotricose
Anomalias Congênitas Cutâneas
Anormalia Pigmentares
Defeitos na Integridade Estrutural
Manifestações Cutâneas de Defeitos Multissistêmicos e Metabólicos
Neoplasias Congênitas e Hereditárias e Hamartomas Múltiplos
Síndromes Hiperplásicas e Seborreicas

DERMATOPATIAS ALÉRGICAS

 Alergia Alimentar
 DERMATITE ALÉRGICA A PULGAS
 Dermatite Atópica
Dermatite Atópica Canina
Dermatite Atópica Felina
 Urticária

DERMATOPATIAS BACTERIANAS

 Dermatofilose
 Epidermite Exsudativa
 Furunculose Interdigital
 Piodermite

DERMATOPATIAS FÚNGICAS
 Dermatofitose
Bovinos
Cães e Gatos
Equinos
Suínos, Ovinos e Caprinos

NEOPLASIAS CUTÂNEAS

 Tumores Cutâneos e de Tecidos Moles
Sarcoide Equino
Sarcomas Anaplásicos e Indiferenciados
Tumores Cutâneos Linfocíticos, Histiocíticos e Relacionados
Mastocitomas Cutâneos
Tumores Linfoides Cutâneos
Tumores com Diferenciação Histiocítica
Tumor Venéreo Transmissível
Tumores de Origem Melanocítica
Tumores de Tecido Conjuntivo
Sarcomas de Tecidos Moles
Tumores da Bainha dos Nervos Periféricos
Tumores da Musculatura Lisa Cutânea
Tumores de Tecido Adiposo
Tumores Fibroblásticos Benignos
Tumores Fibro­histiocíticos
Tumores Vasculares
Tumores Epidérmicos e de Folículos Pilosos
Carcinomas de Célula Escamosa
Cistos Cutâneos Ceratinizados
Epiteliomas Cornificantes Intracutâneos
Lesões Papilomatosas Benignas Não Associadas a Vírus
Papilomas
Tumores de Folículo Piloso
Tumores de Glândulas Apócrinas Cutâneas
Tumores de Glândula Apócrina do Saco Anal
Tumores de Glândula Écrina
Tumores de Glândula Hepatoide
Tumores de Glândula Sebácea
Tumores e Carcinomas de Célula Basal
Tumores Neuroendócrinos Cutâneos Primários
Tumores Metastáticos

DERMATOPATIAS PARASITÁRIAS

 Carrapatos
Carrapatos Ixodídeos Importantes
Amblyomma spp.
Anomalohimalaya spp.
Bothriocroton spp.
Cosmiomma sp.
Dermacentor spp.
Haemaphysalis spp.
Hyalomma spp.
Ixodes spp.
Margaropus spp.
Nosomma sp.
Rhipicentor spp.
Rhipicephalus spp.
Carrapatos Argasídeos Importantes
Argas spp.
Carios spp.
Ornithodoros spp.
Otobius spp.
Controle de Carrapatos
 Helmintos Cutâneos
Dermatite por Pelodera
Elaeoforíase
Estefanofilariose
Habronemose Cutânea
Infecção por Parafilária
Parafilaria bovicola
Parafilaria multipapillosa
Infecções por Dracunculus
Oncocercose
 Infestação por Moscas Cuterebra em Pequenos Animais
 Larvas de Insetos em Bovinos
Dermatobia hominis 983
Lechiguana
Hypoderma spp.
 Moscas
Dípteros com Peças Bucais Picadoras
Maruins Picadores
Mosquitos
Borrachudos
Moscas do Chifre
Moscas dos Búfalos
Moscas dos Equinos e dos Veados
Moscas dos Estábulos
Moscas Hipoboscídeas ou Moscas­piolho
Moscas­Piolho dos Ovinos
Mosquitos­pólvora
Moscas Tsé­tsé
Dípteros com Peças Bucais Não Picadoras
Borrachudos Oculares
Moscas da Cabeça
Moscas da Face
Moscas que se Reproduzem no Lixo
Dípteros que Produzem Miíases
Moscas Produtoras de Miíases Facultativas
Moscas Produtoras de Miíases Obrigatórias
Mosca Varejeira Cinza
Bernes em Pequenos Animais
Mosca Tumbu Africana
Chrysomyia bezziana
Cochliomyia hominivorax
Pseudomiíase
 PIOLHOS
Pulgas e Dermatite Alérgica à Pulga
 Sarna
Bovinos
Cães e Gatos
Equinos
Ovinos e Caprinos
Suínos

DERMATOPATIAS VIRAIS

 Dermatose Ulcerativa dos Ovinos
Doenças do Tipo Varíola
Dermatopatia Nodular
Infecções por Orthopoxvirus em Gatos
Pseudovaríola Bovina
Varíola Bovina
Varíola Suína
Varíolas Ovina e Caprina
 Ectima Contagioso

MISCELÂNEA DE DERMATOPATIAS

 Acantose Nigricans
 Complexo Granuloma Eosinofílico
 Dermatose Nasal dos Cães
 Dermatoses Sistêmicas Diversas
 Feridas de Sela
 Fotossensibilização
Fotossensibilização Congênita em Ovinos
 HIGROMA
 Paraqueratose
 Pitiríase Rósea em Suínos
 Seborreia

SISTEMA TEGUMENTAR – INTRODUÇÃO

A pele é o maior órgão do corpo e, dependendo da espécie e da idade, pode representar de 12 a 24% do peso corporal do animal. A pele possui múltiplas funções, tais como: servir como uma barreira envolvente e promover proteção
ambiental, regular a temperatura, produzir pigmentos e vitamina D e percepção sensorial. Anatomicamente, a pele consiste das seguintes estruturas: epiderme, zona da membrana basal, derme, sistema apendicular e músculos e gordura
subcutâneas.
EPIDERME:  A epiderme é composta de múltiplas camadas de células, que consistem em ceratinócitos, melanócitos e células de Langerhans e de Merkel.
A função dos ceratinócitos é produzir uma barreira protetora. Eles são produzidos por células colunares basais aderidas à membrana basal. A taxa de mitose celular e a queratinização subsequente são controladas por vários fatores como:
nutrição, hormônios, fatores teciduais, células imunes da pele e genética. A derme também pode exercer controle significativo sobre o crescimento da epiderme. Existe a hipótese de que o fotoperíodo e os ciclos reprodutivos possam
acometer a epiderme nos animais. Os glicocorticoides diminuem a atividade mitótica; doenças e inflamação também alteram o crescimento epidérmico normal e a queratinização. Como os ceratinócitos migram em sentido ascendente, eles
são submetidos a um processo complexo de morte celular programada e queratinização. O objetivo desse processo é produzir uma camada compacta de células mortas denominada estrato córneo, que atua como barreira impermeabilizante
contra  perda  de  fluidos,  eletrólitos,  minerais,  nutrientes  e  água,  enquanto  previne  a  penetração  de agentes  infeciosos  ou  nocivos  à  pele.  O  arranjo  estrutural  da  queratina  e  do  conteúdo  lipídico  da  pele  são  críticos  para  esta  função.  O
precursor da vitamina D, o 7­deidrocolesterol, é formado na epiderme. A epiderme é mais espessa nos grandes animais. O estrato córneo é continuamente eliminado ou descamado.
Os melanócitos estão localizados na camada de células basais, na bainha radicular externa e nos ductos de glândulas sebáceas e sudoríparas. Eles são responsáveis pela produção dos pigmentos da pele e dos pelos (melanina). A produção
do pigmento está sob controle hormonal e genético.
As células de Langerhans são células dendríticas mononucleares que estão intimamente envolvidas com a regulação do sistema imunológico da pele. São danificadas por excessiva exposição à luz ultravioleta (UV) e glicocorticoides. Os
materiais antigênicos e alergênicos são processados por estas células e transportados para os linfócitos T locais e linfonodais, para induzir reações de hipersensibilidade. Proteínas da epiderme também podem se conjugar com haptenos
exógenos e tornando­se antigênicas.
Células de Merkel são células sensoriais especializadas associadas a órgãos sensoriais da pele, como as vibrissas (“bigodes”) e os coxins tilotríquios.
ZONA DA MEMBRANA BASAL:  Esta área atua como local para adesão das células epidérmicas basais e como barreira protetora entre a epiderme e a derme. Várias doenças de pele, inclusive diversas condições autoimunes, podem danificar
esta zona. As vesículas são exemplo de lesão à zona da membrana basal.

Pele com pelos. Ilustração por Dr. Georghe Constantinescu.
DERME:  A derme é uma estrutura mesenquimatosa que suporta, nutre e, em certo grau, regula a epiderme e seus apêndices. Consiste em uma substância basal, fibras dérmicas colágenas e células (fibroblastos, melanócitos, mastócitos e,
ocasionalmente, eosinófilos, neutrófilos, linfócitos, histiócitos e plasmócitos). Vasos sanguíneos responsáveis pela termorregulação, plexos nervosos associados a sensações cutâneas e nervos mielinizados e não mielinizados estão presentes
na derme. Nervos motores são primariamente adrenérgicos e inervam vasos sanguíneos e músculos piloeretores. Exceto em equinos, as glândulas apócrinas não parecem ser inervadas. Os nervos sensoriais são distribuídos na derme, nos
folículos pilosos e em estruturas táteis especializadas. A pele responde às sensações de tato, dor, prurido, calor e frio.
SISTEMA APENDICULAR:  Estas estruturas crescem para fora (e são contínuas com) a epiderme. Consistem de folículos pilosos, glândulas sebáceas e sudoríparas e estruturas especializadas (p. ex., garras e cascos). Os folículos pilosos dos
equinos e bovinos são simples, isto é, os folículos possuem um pelo emergindo de cada poro. Os folículos pilosos dos cães, gatos, ovinos e caprinos são compostos, ou seja, possuem um pelo central, circundado por 3 a 15 pelos menores,
todos saindo do mesmo poro. Animais com folículos pilosos compostos nascem com folículos simples que se desenvolvem em compostos.
O crescimento do pelo é controlado por diversos fatores, como dieta, hormônios e fotoperíodo. O estágio de crescimento do pelo é referido como anágeno e o seu período de repouso (pelo maturo) é referido como telógeno. A fase de
transição entre o anágeno e o telógeno é denominada catágeno. Animais, normalmente, trocam seus pelos em resposta a mudanças de temperatura e fotoperíodo; o que geralmente ocorre no início da primavera e do outono. O tamanho, a
forma e o comprimento do pelo são controlados por fatores genéticos, mas podem ser influenciados por doenças, medicamentos exógenas, deficiências nutricionais e fatores ambientais. Os hormônios têm efeito significativo no crescimento
dos pelos. A tiroxina inicia o crescimento do pelo, enquanto glicocorticoides inibem seu crescimento. As funções primárias da cobertura pilosa são proporcionar uma barreira mecânica para proteger o hospedeiro contra danos actínicos e
oferecer termorregulação. Na maioria das espécies, uma camada de ar entre os pelos secundários conserva o calor. Isso requer que os pelos estejam secos e à prova d’água; o pelame de clima frio de muitos animais é, muitas vezes, mais
longo e mais fino, para facilitar a conservação do calor. O pelame também pode ajudar a resfriar a pele. O pelame de clima quente (particularmente dos grandes animais) consiste em pelos mais grossos e curtos e menos pelos secundários.
Esta alteração anatômica permite que o ar se movimente facilmente através dos pelos, facilitando o resfriamento. O pelame também ajuda a esconder ou camuflar o animal.
As glândulas sebáceas são simples ou alveolares ramificadas, holócrinas, que secretam sebo no interior dos folículos pilosos e na superfície da epiderme. Estão presentes em grande número, próximas às junções mucocutâneas, espaços
interdigitais, região dorsal do pescoço, garupa, queixo e cauda; em algumas espécies, fazem parte do sistema de demarcação odorífica. Por exemplo, em gatos, as glândulas sebáceas estão presentes na face, no dorso e na cauda em altas
concentrações;  gatos  marcam  território  esfregando  sua  face  em  objetos  e  depositando  uma  camada  de  sebo  juntamente  com  feromônios  faciais  felinos.  Sebo  é  um  material  lipídico  complexo  contendo  colesterol,  ésteres  de  colesterol,
triglicerídios, ceras diésteres e ácidos graxos. O sebo é importante para manter a pele macia, flexível e com hidratação adequada. Também confere brilho ao pelame e tem propriedades antimicrobianas.
As glândulas sudoríparas (epitríquias [antigamente, apócrinas] e atríquias [antigamente, écrinas]) fazem parte do sistema termorregulador. A evaporação do suor da pele é o principal mecanismo de resfriamento do corpo de equinos e
primatas e, em menor proporção, de suínos, caprinos e ovinos. Há algumas evidências clínicas que sugerem haver uma sudorese limitada em caninos e felinos, havendo um papel menor de resfriamento corporal nestas espécies. Cães e gatos
fazem a termorregulação principalmente pelo arfar, salivar e espalhar esta saliva pelo seu pelame (gatos). Entretanto, a sudorese dos gatos ocorre através de seus coxins especialmente quando excitados, isso é mais comumente observado
pelas marcas de pegadas úmidas em superfícies, por exemplo, na mesa de exame.
MUSCULATURA E GORDURA SUBCUTÂNEAS:  O “músculo crispador” (panículo carnoso) é o principal músculo subcutâneo. A gordura subcutânea (panículo adiposo) tem muitas funções, como isolamento, reservatório para fluidos, eletrólitos
e energia e amortecimento de choques.

 DERMATITES
A inflamação da pele pode ser produzida por vários agentes, como irritantes externos, queimaduras, alergênios, traumatismos e infecções (bacterianas, virais, parasitárias ou fúngicas). Pode estar associada a doença interna ou sistêmica
intercorrente; fatores hereditários também podem estar envolvidos. As alergias formam um importante grupo de fatores etiológicos, especialmente em pequenos animais.
A resposta da pele à agressão é genericamente denominada de dermatite e manifesta­se como a combinação de prurido, descamação, eritema, espessamento ou liquenificação da pele, hiperpigmentação, seborreia oleosa, odor e perda de
pelos. A progressão da dermatopatia geralmente envolve um fator desencadeante (síndrome) que causa lesões primárias como pápulas, pústulas e vesículas. Prurido é um sinal clínico comum em muitas doenças e naquelas em que não há
um prurido inerente, a dermatite geralmente ocorre por infecções secundárias ou como resultado da produção de mediadores inflamatórios. Com o progresso das alterações inflamatórias, começam a se desenvolver crostas e descamação da
pele. Caso o processo envolva a derme mais profunda, poderá ocorrer exsudação, dor e descamação cutânea. Comumente infecções bacterianas e leveduriformes desenvolvem–se secundariamente, como resultado da inflamação cutânea.
Com  a  cronificação  da  dermatite,  sinais  agudos  de  inflamação  (como,  eritema)  ficam  menos  evidentes  e  as  lesões  primárias  tornam­se  obscurecidas  pelos  sinais  de  cronificação  (espessamento  da  pele,  hiperpigmentação,  descamação,
seborreia). Geralmente a pele torna­se ressecada, e mesmo que o prurido não seja um fator desencadeante, ele se frequentemente se desenvolverá nesta fase. A resolução da dermatite requer a identificação da etiologia e o tratamento das
infecções secundárias ou outras complicações.

 PROBLEMAS DERMATOLÓGICOS
Dermatite  é  um  termo  inespecífico  geralmente  utilizado  para  problemas  de  pele  até  que  o  histórico,  os  sinais  clínicos  e  o  exame  físico  possam  definir  o  problema  mais  precisamente.  Problemas  dermatológicos  descrevem  a  principal
categoria dos achados clínicos que podem ser causados por várias doenças de pele; muitas parecem semelhantes e são diferenciadas por fluxogramas diagnósticos e processo de eliminação. Os problemas dermatológicos mais comuns são:
prurido, alopecia, crostas e descamação, otite, feridas não cicatrizantes, nódulos e tumores e distúrbios ulcerativos. Em algumas espécies, como nos gatos, subcategorias de problemas dermatológicos (p. ex., prurido na cabeça e no pescoço,
alopecia simétrica, exsudação/dermatite eosinofílica etc.) podem ser bem reconhecidas. A identificação do principal problema dermatológico do paciente ajudará a criar uma lista de diagnósticos diferenciais específica ao paciente, bem
como selecionar cuidadosamente os testes diagnósticos apropriados. O problema dermatológico do paciente pode ou não ser a queixa principal do cliente. É importante ser sensível às percepções dos problemas ou queixas do cliente,
especialmente se odor ou alterações estéticas estiverem envolvidos e direcionar a terapia a elas (p. ex., banhos para minimizar o odor enquanto o problema­chave está sendo avaliado).

DIAGNÓSTICO DAS DERMATOPATIAS
O diagnóstico definitivo das causas das diversas doenças de pele requer histórico detalhado, exame físico e testes diagnósticos apropriados. Muitas doenças cutâneas parecem semelhantes e o diagnóstico definitivo é realizado com o tempo,
descartando­se outras possíveis causas, avaliando­se as respostas às terapias e/ou por processo de eliminação.
Histórico
O histórico dermatológico cuidadoso é essencial para interpretação dos achados do exame físico e escolha dos testes diagnósticos apropriados. Deve­se obter o histórico geral completo, inclusive informações sobre doenças anteriores,
vacinas, criação (instalações, práticas alimentares etc.), mudanças de atitude e consumo alimentar, práticas de eliminação, contato com outros animais e viagens nos últimos 6 a 12 meses. Isto deve ser seguido de um detalhado histórico
dermatológico. O uso de uma ficha dermatológica pré­empresta pode ser bastante útil nos casos crônicos ou complicados. O bom histórico é importante porque muitas doenças de pele que parecem semelhantes e são diferenciadas com base
na interpretação dos sinais clínicos e do histórico.
Devem­se obter as seguintes condições: (1) a queixa principal; (2) o tempo de evolução do problema; (3) a idade do animal quando a doença se manifestou inicialmente (predisposições distintas por idade são observadas em muitas
doenças,  como:  demodiciose  e  dermatofitose  em  animais  pediátricos  e  sinais  de  atopia  em  animais  de  1  a  3  anos);  (4)  a  raça  (predisposições  raciais,  como  a  predisposição  dos  cães  da  raça  Cocker  Spaniel  aos  distúrbios  primários  de
queratinização e dos Terriers à atopia); (5) a presença e gravidade de prurido (inclusive se o animal se lambe, esfrega, coça ou se morde – os proprietários frequentemente não associam uma lambedura com um sinal de prurido); (6) como a
doença começou e sua progressão (doenças que se iniciam com prurido podem levar a autotraumatismos e subsequente desenvolvimento de lesões secundárias [alopecia, seborreia] ou infecções [piodermas bacterianos ou por leveduras]; (7)
o tipo e progressão das lesões observadas pelo proprietário; (8) evidência de sazonalidade (sugestivo de pulgas, doenças alérgicas ou relacionadas com o clima); (9) a área do corpo onde a doença se iniciou (ou seja, há padrões regionais
observados  na  dermatite  atópica  [tipicamente  face  e  patas],  na  queiletielose  [principalmente  o  dorso],  na  escabiose  [principalmente  ventrais]  e  nas  endocrinopatias  com  perda  de  pelos  [em  geral  envolve  o  tronco  e  poupa  cabeça  e
membros]); (10) quaisquer tratamentos prévios e o grau de resposta a eles (p. ex., doenças que respondem a antibióticos sugerem etiologia bacteriana, prurido que responde a pequenas doses de glicocorticoides, anti­histamínicos ou ácidos
graxos  essenciais  sugere  dermatite  alérgica);  (11)  a  frequência  de  banhos  e  data  do  último  banho  (banho  recente  pode  obscurecer  ou  modificar  lesões  clínicas  importantes,  excesso  de  banhos  e  umidade  da  pele  podem  predispor  a
dermatopatias);  (12)  a  presença  de  pulgas,  carrapatos  ou  ácaros;  (13)  contato  com  outros  animais  (evidência  de  doença  contagiosa,  sugerindo  pulgas,  escabiose,  queiletielose  ou  dermatofitose);  (14)  ambiente  em  que  vive  o  animal
(mudanças  na  casa  podem  influenciar  o  desenvolvimento  de  certas  dermatopatias,  por  exemplo,  dermatite  de  contato  e  doenças  contagiosas);  e  (15)  sinais  ou  relatos  de  doenças  sistêmicas  (endócrinas  [ex.  hipotireoidismo  e
hiperadrenocorticismo] e doenças metabólicas [ex. diabetes melito, doenças renais ou hepáticas], já que a pele pode ser a primeira manifestação observada como sinal de doenças sistêmicas.

Exame Físico
O exame físico completo deve ser realizado sempre. Muitas doenças de pele são manifestações de doenças sistêmicas, por exemplo, hipotireoidismo e lúpus eritematoso sistêmico (ver p. 1042). O bom exame dermatológico requer inspeção
bastante próxima de todo o pelame e pele, sob iluminação forte; pode ser necessária lanterna para examinar a pele de grandes animais. É importante examinar o ventre dos animais, onde muitas lesões primárias e parasitos cutâneos são
notados.
Lesões  clínicas  são  descritas  de  várias  formas.  As  lesões  podem  ser  descritas,  de  modo  geral,  como  focal,  multifocal  ou  difusa,  quanto  à  distribuição,  seguidas  pela  descrição  da  região  afetada  (p.  ex.,  mucocutânea  ou  truncal).  Em
inspeção  mais  próxima,  as  lesões  podem  ser  posteriormente  descritas  como  primárias  ou  secundárias.  Lesões  primárias  são  máculas  ou  manchas  (áreas  de  descoloração  não  elevadas);  pápulas  ou  placas  (lesões  elevadas,  as  placas  são
coalescentes); pústulas, vesículas ou bolhas (lesões preenchidas por fluidos); vergão (saliências sólidas de pele e com paredes exuberantes e partes superiores achatadas, que surgem a partir da liberação de histamina); e nódulos ou tumores
(grandes  elevações  sólidas  na  pele).  Lesões  secundárias  incluem  colaretes  epidérmicos  (estágio  avançado  da  pústula),  cicatrizes,  escoriações  (áreas  de  autotraumatismo),  erosões  ou  úlceras  (perda  da  epiderme),  fissuras,  liquenificação
(aumento da espessura e hiperpigmentação da pele) e calosidades. Algumas lesões podem ser tanto primárias como secundárias, dependendo da etiologia da doença. Estas são: alopecia, escamas, crostas, cilindros foliculares (entupimento
de folículos pilosos com queratina visível), comedões (pontos pretos) e alterações pigmentares.

Procedimentos Laboratoriais para Dermatopatias
RASPADOS CUTÂNEOS:  Os raspados cutâneos fazem parte do arquivo de dados básico de todas as dermatopatias. Existem dois tipos de raspados cutâneos: superficiais e profundos. Os raspados superficiais não causam sangramento capilar e
proporcionam informações a partir da superfície epidérmica. Os raspados cutâneos profundos coletam material de dentro do folículo piloso; o sangramento capilar indica que a amostra foi suficientemente profunda. Os raspados cutâneos
são utilizados, primariamente, para determinar presença ou ausência de ácaros. O melhor modo de realizá­los é com o auxílio de uma espátula para raspado cutâneo, que é uma espátula fina, com peso de metal, comumente notado em
farmácias ou catálogos de produtos químicos. Estas espátulas são reaproveitáveis e não provocam lesões nos pacientes.
ESCOVAÇÃO DO PELAME:  Esta técnica, comumente referida como “escovação de pulgas”, é útil na coleta de grande quantidade de restos celulares cutâneos e na captura de parasitos cutâneos. As escovações são particularmente úteis para
encontrar pulgas, carrapatos, piolhos e alguns ácaros. Escovas de limpeza limpas ou escovas para animais podem ser utilizadas para coletar material em um recipiente plano (p. ex., prato de torta) em grandes animais.
EXAME DOS PELOS:  O exame microscópico das hastes pilosas pode servir para procurar evidências de autotraumatismos, dermatofitoses (requer agentes clarificantes e uma coloração especial), pelos displásicos e, às vezes, doenças genéticas
no pelame.
CITOLOGIA:  As citologias cutânea e auricular são úteis na identificação de dermatopatias bacterianas, fúngicas e, possivelmente, neoplásicas. Deve­se fazer, ao menos, 4 a 6 imprints; devem­se guardar várias lâminas para exame por um
laboratório de referência, se for necessário. Quando se faz um imprint da pele, a lâmina deve ser posta diretamente no local a ser amostrado. Um dedo indicador ou polegar deve ser colocado diretamente sobre a lâmina, exercendo uma forte
pressão. Alternativamente, pode­se usar fita de acetato limpa, para obter amostras da pele. Amostras adequadas produzirão uma “impressão digital” da superfície. Pelo menos uma lâmina deve ser fixada pelo calor, com um fósforo ou
isqueiro,  antes  de  ser  corada.  Na  maioria  dos  casos,  o  corante  Diff­Quick  é  adequado.  Em  animais  com  prurido,  o  material  deve  ser  raspado  abaixo  do  leito  ungueal  e  colocado  na  lâmina  para  fixação  com  calor,  coloração  e  exame
citológico. As amostras devem ser examinadas em aumento de 4× e 10× e em aumento maior, com óleo de imersão.
CULTURAS FÚNGICAS:  As dermatofitoses são melhor identificadas com cultura fúngica tanto em meio de teste dermatofítico como em ágar­Sabouraud simples. Preferem­se placas que são facilmente inoculadas; frascos de vidro com rosca no
topo são difíceis de inocular e obter amostras, sendo melhor evitá­los. As melhores amostras dos gatos são obtidas usando­se escova dental nova, esfregando­a agressivamente sobre as lesões. As amostras dos cães podem ser coletadas com
auxílio de escova dental ou com a técnica de arrancar os pelos. Em grandes animais, os pelos devem ser limpos suavemente, com álcool, antes da coleta, para minimizar o crescimento contaminante. Os organismos fúngicos intermediários e
profundos são melhor cultivados por laboratórios de referência, utilizando biopsia cutânea (6 a 8 mm de tamanho).
CULTURAS BACTERIANAS:  As pústulas intactas podem ser cultivadas por meio de rompimento com agulha estéril e da coleta com swab na lesão, para cultura estéril. As lesões não devem ser limpas antes da amostragem. As piodermites
profundas são melhor cultivadas a partir de uma biopsia cutânea (6 a 8 mm). Um laboratório de referência deve ser informado sobre os patógenos suspeitos, pois isso pode interferir na maneira como o exsudato será cultivado. Tratamentos
sistêmicos e tópicos devem ser suspensos por, no mínimo, 72 h antes da coleta da amostra.
BIOPSIA:  Biopsia cutânea é indicada em qualquer caso que pareça ser grave, incomum ou não responda à terapia apropriada. As lesões não devem ser limpas antes da biopsia, pois a patologia superficial é importante no diagnóstico de
muitas dermatopatias. Várias amostras de diversas lesões devem ser submetidas ao exame. Sempre que possível, deve­se biopsiar lesões primárias; por outro lado, frequentemente o relato não é muito útil na elaboração do diagnóstico ou na
restrição da lista de diagnósticos diferenciais. As amostras por biopsia requerem exame por patologista familiarizado com dermatopatias de animais. Não é necessária a imunofluorescência direta para diagnosticar dermatopatias autoimunes;
a histopatologia rotineira constitui o teste de escolha.
TESTES SANGUÍNEOS E URINÁRIOS DE ROTINA:  Na maioria dos casos dermatológicos, esses testes não ajudam a estabelecer o diagnóstico definitivo. Havendo sinais sistêmicos de enfermidade, hemograma completo, perfil bioquímico sérico e
urinálise podem ser úteis para a identificação da etiologia. Nos cães com infecções recidivantes, esses testes podem identificar doença subclínica subjacente.
TESTE CUTÂNEO INTRADÉRMICO:  Esse teste não é necessariamente exigido para determinar o diagnóstico de atopia. A reação de teste cutâneo intradérmico positiva indica exposição anterior a um alergênio particular. As alergias por agentes
inalados são melhor diagnosticadas com base na anamnese e em achados compatíveis no exame físico e o uso criterioso do teste cutâneo intradérmico ou de testes in vitro para alergias. Recomenda­se o teste cutâneo intradérmico para
animais que possuam indicação para imunoterapia em decorrência da gravidade ou da duração dos sinais alérgicos. Devem­se considerar as interações entre fármacos potenciais que possam interferir, antes de se realizar um teste cutâneo
intradérmico.
TESTES DIAGNÓSTICOS IN VITRO:  Os testes diagnósticos in vitro (testes ELISA ou RAST) constituem alternativas ao teste cutâneo intradérmico. Embora os testes in vitro sejam considerados menos confiáveis em razão do grande número de
resultados falso­positivos, a maioria das complicações na sua interpretação resulta da má seleção dos pacientes. Assim como nos testes cutâneos intradérmicos, os testes in vitro refletem a exposição e devem ser interpretados com base no
histórico e exame físico do paciente.

PROBLEMAS DERMATOLÓGICOS COMUNS
Os dois problemas dermatológicos mais comuns são alopecia e prurido.

 ALOPECIA (Queda de pelos)
A alopecia corresponde à ausência parcial ou completa de pelos em áreas onde eles se encontram presentes normalmente. Caso o paciente seja apresentado com o problema de queda de pelos e possua prurido, primeiramente deve­se
identificar o prurido (ver p. 896).
ETIOLOGIA:  Há muitas causas de alopecia; qualquer doença que afete os folículos pilosos pode provocar queda de pelos. Existem duas categorias etiológicas principais de alopecia: congênita ou hereditária e adquirida. A alopecia adquirida
é ainda dividida em duas categorias: inflamatória e não inflamatória.
A alopecia congênita ou hereditária (p. 899) é descrita em bovinos, equinos, cães, gatos e suínos. Foram desenvolvidas raças de ratos, camundongos, gatos e cães sem pelos, para interesses pessoais e de pesquisa. A alopecia congênita
pode ou não ser hereditária; ela é causada por falta de desenvolvimento dos folículos pilosos é aparente no nascimento ou após curto período do nascimento. Os animais com alopecias tardias nascem com pelames normais e ocorre queda de
pelos focais ou generalizadas, quando o animal troca o seu pelame juvenil ou quando se torna adulto jovem. Os exemplos são a calvície padrão dos cães da raça Dachshund, a alopecia por diluição da cor (mais comum em Doberman
Pinschers) e determinados tipos de displasias foliculares.
Alopecia adquirida engloba todas as outras causas de queda de pelos. Nesse tipo de alopecia, o animal nasce com pelame normal, apresenta ou já apresentou folículos pilosos normais em algum momento e é ou já foi capaz de produzir
pelos estruturalmente normais. A alopecia adquirida pode ser não inflamatória, como observado em alopecias endócrinas ou em alguns tipos de alopecia imunemediadas, ou inflamatória. A alopecia inflamatória adquirida é a forma mais
comum.  A  alopecia  adquirida  desenvolve­se  em  decorrência  de  doença  que  destrói  o  folículo  ou  a  haste  pilosa,  interfere  no  crescimento  dos  pelos  ou  da  lã  ou  causa  desconforto  (p.  ex.,  dor  e  prurido)  no  animal,  levando­o  ao
autotraumatismo e à queda de pelos.
As doenças que podem originar diretamente destruição ou danos na haste ou nos folículos pilosos são: dermatopatias bacterianas, dermatofitose, demodiciose, dermopatias inflamatórias graves à derme (como, celulite juvenil e piodermite
profunda), episódios traumáticos (p. ex., queimaduras e radiação) e, raramente, envenenamentos por mercúrio, tálio e iodo. Estas doenças tendem a ser inflamatórias.
As doenças que podem inibir ou retardar diretamente o crescimento do folículo piloso são: deficiências nutricionais (particularmente deficiências de proteínas), hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo e a produção ou administração
excessivas de estrógeno (hiperestrogenismo, tumor de células de Sertoli e injeções de estrógenos para evitar acasalamentos). Nos equinos, ovinos e cães, pode haver alopecia temporária durante a gestação ou a lactação ou várias semanas
depois de uma grave enfermidade ou febre. A acentuada perda de pelos (eflúvio) é comum em gatos com infecções respiratórias. Estes tipos de alopecia tendem a ser não inflamatórias, a menos que ocorra infecção cutânea secundária.
O  prurido  ou  a  dor  são  causas  comuns  de  alopecia  inflamatória  adquirida  nos  animais.  As  doenças  que  costumam  produzir  prurido  ou  dor  compreendem  dermatopatias  infecciosas  (p.  ex.,  piodermite  bacteriana  e  dermatofitose),
ectoparasitas, dermatopatias alérgicas (p. ex., atopias, alergias alimentares, alergias por contato e hipersensibilidade a insetos) e, mais raramente, dermatopatias neoplásicas. A fricção pode causar queda de pelos local (p. ex., cabrestos ou
coleiras mal ajustados). Raramente, a higiene pilosa excessiva pode ser a origem de queda de pelos em alguns animais, particularmente nos gatos.
A alopecia endócrina felina não é mais reconhecida como uma síndrome genuína, seu novo nome é alopecia simétrica adquirida felina. Até hoje, não existe evidência documentada de endocrinopatias nesses gatos e a alopecia simétrica
observada constitui sinal clínico de doença subjacente, mais comumente de doença pruriginosa. A causa mais comum de alopecia simétrica felina é dermatite alérgica a pulgas. Nos gatos que não possuam puliciose notória, recomenda­se
hemograma com diferencial; muitos gatos com dermatite alérgica a pulgas apresentam eosinofilia. Este achado pode auxiliar a convencer os clientes a obter o controle de pulgas como primeiro passo no diagnóstico.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:  Os  sinais  clínicos  de  queda  de  pelos  podem  ser  óbvios  ou  sutis,  dependendo  da  doença.  A  queda  de  pelos  congênita  ou  hereditária  é  comumente  simétrica  e  não  é  acompanhada  por  muitas  alterações
inflamatórias; em alguns casos, as áreas de queda de pelos se localizam em uma região (p. ex., os pavilhões auriculares) ou em áreas bem demarcadas.
Os sinais clínicos da queda de pelos adquirida são variados e frequentemente influenciados pela causa subjacente(s); o padrão da queda de pelos pode ser focal, multifocal, simétrico ou generalizado. Alterações inflamatórias, tais como
hiperpigmentação, lignificação, eritema, descamação, queda de pelos excessiva e prurido, são comuns. Algumas causas de alopecia adquirida podem predispor o animal ao desenvolvimento de dermatopatias secundárias, como piodermite
bacteriana  ou  seborreia.  O  prurido  é  variável,  dependendo  da  causa  primária.  Nas  alopecias  endócrinas,  a  queda  de  pelos  geralmente  desenvolve­se  com  padrão  simétrico  e  frequentemente  inicia­se  nas  áreas  de  desgaste;  o  prurido  é
incomum, a menos que ocorra infecção secundária. Ao contrário do que se imagina, geralmente a queda de pelos não é sinal clínico precoce de alopecia endócrina.
Muitos proprietários procuram assistência veterinária ao perceberem a queda de pelos excessiva. A queda poderá ser anormal (excessiva) se resultar em perda notória do pelame e áreas de alopecia. Uma causa comum de queda anormal é
a piodermite bacteriana. No entanto, se a queda não for acompanhada por perda de pelos irregular ou simétrica, ela provavelmente corresponderá somente a um estágio na reposição natural do pelame.
DIAGNÓSTICO: O diagnóstico preciso da causa de alopecia requer anamnese e exame físico cuidadosos. Os pontos­chave da anamnese são: reconhecimento das predisposições raciais para alopecias congênitas ou hereditárias; duração e
progressão das lesões e presença ou ausência de prurido, evidências de contágio ou problemas não dermatológicos, por exemplo, poliúria e polidipsia. No exame físico, deve­se observar a distribuição das lesões (focal, multifocal, simétrica
ou generalizada) e examinar os pelos para determinar se eles estão caindo do folículo piloso ou estão se quebrando – o último sugere prurido. Devem–se observar sinais de infecções cutâneas secundárias ou de ectoparasitas e realizar exame
não dermatológico cuidadoso.
Os  testes  diagnósticos  iniciais  englobam  raspados  cutâneos  para  ectoparasitas  (particularmente  para  os  ácaros Demodex),  escovar  os  pelos  à  procura  de  pulgas,  ácaros  e  piolhos,  imprints  da  pele  procurando  evidências  de  infecções
bacterianas ou por leveduras, culturas fúngicas para identificação de uma dermatofitose e exame dos pelos arrancados, procurando na haste e nas extremidades por evidências de dermatofitose ou de que os pelos foram arrancados por
mastigação. Em muitos casos de piodermite bacteriana, imprints da pele não mostram neutrófilos e/ou cocos, mas grande número de ceratinócitos descamados. Neutrófilos e cocos são vistos em amostras coletadas de pústulas íntegras ou
recentemente rompidas.
Caso estes testes não identifiquem ou sugiram uma causa subjacente, pode­se indicar uma biopsia cutânea para avaliar as estruturas foliculares pilosas, o número de folículos pilosos e a relação anágeno/telógeno, além de procurar sinais
de infecções cutâneas bacterianas, fúngicas ou parasitárias. Além disso, a biopsia cutânea é frequentemente necessária para confirmar causas congênitas ou tardias de queda de pelos e identificar causas inflamatórias ou neoplásicas. Deve­se
enviar para avaliação, biopsia cutânea de áreas normais e anormais. Hemograma, perfis bioquímicos séricos e urinálises geralmente são úteis quando se suspeita de uma endocrinopatia. Testes de função endócrina específicos podem ser
realizados com base nos achados de exames laboratoriais rotineiros ou dos sinais clínicos.
TRATAMENTO:  O sucesso da terapia depende da causa subjacente e do diagnóstico específico.

 PRURIDO (Coceira)
O prurido é definido como uma sensação desagradável de irritação da pele que provoca o desejo de coçar.
FISIOPATOLOGIA:  O prurido pode ser bem ou pobremente localizado. Ele pode se manifestar como sensação de queimadura de forma localizada ou difusa. Embora a pele seja ricamente inervada, não se conhecem receptores de prurido
especializados. A sensação de prurido é transmitida via conjunto especializado de fibras aferentes. Fibras mielinizadas que conduzem a sensação a 10 a 20 m/s transmitem uma sensação de picada do prurido, bem localizada. Em contraste, a
sensação  de  queimação  do  prurido  é  transmitida  por  fibras  não  mielinizadas  que  conduzem  a  sensação  a  2  m/s.  Ambas  as  fibras  entram  pela  raiz  dorsal  da  medula  espinal,  ascendem  em  direção  à  coluna  dorsal  e  atravessam  o  trato
espinotalâmico lateral. De lá, seguem para o tálamo e o córtex sensorial.
Os  mediadores  do  prurido  são  controversos  e  podem  variar  dependendo  da  espécie.  Esses  mediadores  incluem  histaminas  (liberados  pela  degranulação  de  mastócitos),  enzimas  proteolíticas  (proteases)  e  leucotrienos.  Proteases  são
liberadas por fungos, bactérias, degranulação de mastócitos e durante reações de antígeno­anticorpo. Leucotrienos, prostaglandinas e tromboxanos A2, os quais são derivados da quebra do ácido araquidônico, são proinflamatórios. Ácidos
graxos  essenciais,  particularmente  o  ácido  g­linolênico,  tem  sido  utilizados  para  controlar  a  inflamação  mediada  por  leucotrienos  e  tromboxano  A2.  A  sensação  de  prurido  pode  ser  afetada  por  uma  variedade  de  fatores,  como  tédio,
competição e ansiedade. Estresse pode potencializar o prurido via liberação de peptídio opiode.
ETIOLOGIA:  Prurido é sinal clínico e não diagnóstico ou doença específica. Em geral, as causas mais comuns de prurido são parasitos, infecções, doenças alérgicas da pele e causas diversas (p. ex., neoplasia cutânea). Muitas doenças que
não são pruriginosas (p. ex., endocrinopatias) tornam­se pruriginosas quando o paciente desenvolve infecção secundária por bactérias ou leveduras.
DIAGNÓSTICO:  Devem­se realizar anamnese dermatológica e exame físico completos. As causas parasitárias de prurido, como Demodex, pulgas e carrapatos, ácaros contagiosos e piolhos devem ser considerados, já que são mais comuns.
Raspados cutâneos podem ser decisivos para descartar ou não a presença de vários ácaros, inclusive Demodex. Entretanto, algumas infestações por ácaros (p. ex., Sarcoptes, Cheyletiella, Psoroptes e Chorioptes) podem não ser vistas no
raspado cutâneo. Se há suspeita de infestação por ácaros, deve­se tentar avaliar a resposta a ensaios terapêuticos. O medicamento mais comumente utilizado nesses casos é a ivermectina. Pulgas podem ser consideradas ou não com base no
histórico de controle de pulgas, na resposta desse controle ou na evidência de infestação de pulgas pelo exame de escovação. A prática de controle de pulgas também deverá excluir a infestação por piolhos.
O próximo grupo mais importante de doenças pruriginosas a serem descartadas é o das doenças infecciosas da pele. Estas incluem infecções bacterianas (principalmente infecções estafilocócicas, crescimento excessivo de Malassezia e
dermatofitose). Deve­se realizar cultura fúngica em qualquer gato que apresente prurido. A cultura fúngica também é bastante recomendada para cães recentemente adquiridos, qualquer animal com possível histórico de exposição e/ou
sinais clínicos compatíveis ou quando há histórico de humanos com doenças de pele. Infecções bacterianas ou por leveduras concomitantes são cada vez mais reconhecidas como causa comum de prurido em cães, gatos e grandes animais.
A piodermite bacteriana é subdiagnosticada em gatos e para descartá­la ou não, pode ser necessária avaliação da resposta ao ensaio terapêutico.
As causas infecciosas de prurido comumente induzem sinais clínicos de queda de pelos, descamação, descamações permeando os pelos, odor e/ou seborreia oleosa. Prurido podal e facial acentuado é comum em animais com infecções
concomitantes  por  bacterianas  e  leveduras.  Antes  de  afirmar  que  a  causa  do  prurido  é  alérgica  ou  realizar  biopsias  cutâneas  ou  outros  testes  diagnósticos  mais  caros  e/ou  invasivos,  devem­se  descartar  infecções  bacterianas  ou
leveduriformes intercorrentes. Deve ser prescrita terapia de 21 a 30 dias com um antibiótico efetivo contra Staphylococcus spp (p. ex., 30 mg de cefalexina/kg VO, 2 vezes/dia) e um antifúngico sistêmico (p. ex., cetoconazol, itraconazol ou
fluconazol 5 a 10 mg/kg VO, 1 vez/dia). Se o prurido regredir, sua causa era infecção microbiana.
É possível que o ponto de partida inicial esteja muito longe ou seja sazonal. Entretanto, se o prurido do animal não se alterar ou apresentar apenas pequena melhora, é mais provável que a causa primária seja alérgica (assumindo que as
causas parasitárias tenham sido descartadas). As causas mais comuns de prurido alérgico são: hipersensibilidade por picada de inseto (p. ex., alergia à pulga, alergia à picada de mosquito, picada de moscas), alergia alimentar e atopia. A
dermatite alérgica a pulga e a hipersensibilidade à picada de inseto são descartadas com base na resposta ao controle do inseto. Animais que não tenham hipersensibilidade à picada de inseto, mas apresentem prurido sazonal, provavelmente
possuem dermatite atópica. Os animais que apresentam prurido alérgico o ano inteiro podem ter atopia e/ou alergia alimentar. Alergia alimentar é descartada com base na resposta a ensaio dietético e desafio provocativo. O diagnóstico de
dermatite atópica é clínico; testes cutâneos intradérmicos e alérgicos in vitro mostram apenas um padrão de exposição antigênica. Esses testes são utilizados para determinar o conteúdo da vacina na imunoterapia.
TRATAMENTO:  O  sucesso  da  terapia  depende  da  identificação  da  causa  primária.  Pacientes  com  prurido  idiopático  ou  aqueles  em  que  o  tratamento  da  causa  primária  não  elimina  o  prurido  (p.  ex.,  pacientes  atópicos)  necessitarão  de
tratamento medicamentoso do prurido.
Anti­histamínicos:  A eficácia dos anti–histamínicos no tratamento do prurido é tem como base relatos de casos baseados em evidência. Os mais comumente utilizados são cloridrato de hidroxizina (2,2 mg/kg VO, 3 vezes/dia), difenidramina
(2,2 mg/kg VO, 2 vezes/dia), cloridrato de amitriptilina (2,2 mg/kg VO, 2 vezes/dia), cetirizina (5 mg/gato ou 5 a 10 mg/cão, 1 ou 2 vezes/dia) e fexofenadina (2 a 3 mg/kg VO, 1 ou 2 vezes/dia). O ensaio terapêutico de 7 a 10 dias com
qualquer anti–histamínico deve ser realizado para se observar o benefício máximo.
Ácidos Graxos Essenciais:  Ácidos graxos essenciais raramente são efetivos quando utilizados como agentes antipruriginosos únicos; entretanto têm ação sinérgica com anti–histamínicos e/ou glicocorticoides. Eles podem aumentar a eficácia dos
anti­histamínicos ou diminuir a dose do glicocorticoide. A dose exata não é conhecida, mas a recomendação atual é de 180 mg do ácido eicosapentaenoico/5 kg VO, 1 ou 2 vezes/dia.
Glicocorticoides:  São os medicamentos mais efetivos no controle de prurido. Entretanto, não podem ser seguramente utilizados por muito tempo devido seus efeitos adversos (ex. supressão da função da adrenal, risco de desenvolvimento de
diabetes  melito  e  risco  de  infecções  secundárias  do  trato  urinário).  Além  disso,  proprietários  raramente  toleram  seus  outros  efeitos  (polidipsia,  poliúria,  polifagia  e  respiração  ofegante)  por  longo  tempo.  Inicia­se  com  doses  anti­
inflamatórias de 0,5 a 1 mg/kg VO, 1 vez/dia, por 5 a 10 dias e, depois, em dias alternados. Formulações tópicas de acetato de triancinolona, em spray, são muito efetivas e boas alternativas aos esteroides orais.
Outros Agentes Antipruriginosos Sistêmicos: Outros antipruriginosos eficazes são: ciclosporina (5 mg/kg, VO, 1 vez/dia), pentoxifilina (10 a 25 mg/kg VO, 2 a 3 vezes/dia) e misoprostol (3 a 6 μg/kg VO, 3 vezes/dia). Destes, a ciclosporina A
modificada é a mais eficaz e é utilizada para o tratamento de alergias em cães. Também foi utilizada no tratamento de muitos gatos, com sucesso, porém não é aprovada pela FDA nesta espécie. Geralmente é administrada uma ou mais
vezes/dia, até que os sintomas alérgicos sejam controlados, após, a dose pode ser reduzida. A melhora é evidente em aproximadamente 2 semanas e por 4 a 6 semanas para o efeito máximo. Os efeitos adversos mais comuns são náuseas,
anorexia, vômito, fezes amolecidas e diarreia. Estes frequentemente resolvem­se após várias semanas.

PRINCÍPIOS DA TERAPIA TÓPICA
Ver p. 2620.
A terapia tópica é uma parte importante da dermatologia veterinária. Geralmente é benéfica na melhora da aparência cosmética ou do odor do animal, até o diagnóstico final. Pode ser benéfica como terapia adjuvante à terapia sistêmica.
Por fim, pode constituir o método de tratamento preferido no caso de algumas doenças, como as infestações por pulgas.
A seguir, há alguns parâmetros básicos que devem ser considerados ao prescrever terapia tópica: (1) o máximo de pelagem possível deve ser removido para o tratamento da doença de pele. As boas práticas de higiene podem ajudar
significativamente a encurtar o curso da doença. Além disso, facilitam a terapia tópica; (2) a cooperação do proprietário (e do animal) deve ser avaliada antes de prescrever qualquer terapia tópica; (3) os animais tendem a se limpar e retirar
os agentes tópicos e podem vomitar após a ingestão. O risco de toxicidade é uma constante preocupação para os clientes. As pomadas, os géis e os sprays locais são melhor utilizados com moderação, sob oclusão e para doenças específicas.
Tais medicamentos costumam doer agudamente quando aplicadas na pele, especialmente muitas das instiladas no interior das orelhas. Muitos agentes também podem emaranhar os pelos; (4) a água tépida é a temperatura de escolha para
banhar os animais; (5) o velho provérbio “se está molhado, seque e se está seco, molhe” apresenta certa verdade; no entanto, esse conselho não deve ser levado a extremos. As lesões exsudativas (p. ex., as áreas de dermatite piotraumática)
cicatrizarão  mais  rápido  se  forem  mantidas  limpas  e  cobertas  com  pomadas  ou  géis  antibióticos;  as  recomendações  anteriores  sugeriam  o  uso  de  adstringentes  agressivos.  A  pele  seca  e  lignificada  geralmente  fica  pruriginosa  e  o  uso
criterioso  de  emolientes  pode  ser  benéfico;  (6)  deve­se  monitorar  o  animal  de  perto  quanto  ao  possível  desenvolvimento  de  dermatite  de  contato  irritante  ou  alérgica,  decorrente  dos  agentes  tópicos.  Muitos  desses  possuem  bases  ou
ingredientes bastante semelhantes e a mudança de um para outro pode apenas exacerbar o problema; (7) os proprietários devem receber instruções cuidadosas e completas sobre como administrar a terapia.
TERAPIA COM XAMPU:  Os xampus são os tratamentos tópicos mais utilizados. Existem três classes amplas de xampus: de limpeza, antiparasitários e medicamentosos. Os xampus de limpeza removem a sujeira e o excesso de óleo do
pelame. São os xampus higiênicos caninos de administração livre, os xampus antipulgas e muitos produtos leves para seres humanos. Estes produtos espumam bem e devem ser enxaguados do pelame. Os xampus antiparasitários são os
“xampus  antipulgas”.  Na  maioria  dos  casos,  a  quantidade  de  inseticida  nesses  produtos  não  é  adequada  para  matar  todas  as  pulgas  em  uma  infestação  grave.  No  entanto,  são  excelentes  produtos  de  limpeza  rotineira.  Os  xampus
medicamentosos incluem os produtos antimicrobianos e antisseborreicos. Os xampus antismicrobianos mais empregados contêm clorexidina ou peróxido de benzoíla. Xampus de miconazol e cetoconazol são normalmente utilizados como
terapia adjuvante para o tratamento de infecções por Malassezia, mas não para dermatofitose. Há poucas evidências que sugerem que o uso desses produtos diminui o curso da infecção por dermatófitos. Os xampus antisseborreicos contêm
combinação de alcatrão, enxofre e ácido salicílico – ingredientes ceratoplásticos e ceratolíticos. O alcatrão é recomendado para seborreia oleosa e o enxofre e o ácido salicílico para o caso de seborreia descamativa. A maioria dos animais se
beneficia de produtos contendo os três agentes; entretanto os produtos de alcatrão são contraindicados para gatos.
Quando um xampu medicamentoso é utilizado, o animal deve ser lavado com um xampu de limpeza antes do medicamentoso e enxaguado bem. Xampus medicamentosos frequentemente não são bons agentes de limpeza, não espumam
bem ou não têm boa ação na presença de restos celulares orgânicos. Esses xampus devem ser aplicados uniformemente sobre a pelagem depois de diluídos na água. Sua diluição facilita o enxágue do pelame e minimiza o potencial de
irritação e de dermatite alérgica de contato. Dependendo do xampu, a concentração desse para a água poderá variar entre 1:3 e 1:4. Se possível, o xampu medicamentoso deve ser deixado em contato com a pele por um período de 10 min,
depois, deve­se enxaguá­lo completamente do pelame. O resíduo desse constitui uma causa comum de reações irritantes. Por fim, deve­se utilizar o xampu medicamentoso, em geral, 2 a 3 vezes/semana, durante os estágios iniciais da
terapia.
O uso de terapia com xampus antimicrobianos é crescente, devido à preocupação com o desenvolvimento de infecções estafilocócicas resistentes à meticilina.

ANOMALIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS DO SISTEMA TEGUMENTAR

As dermatoses congênitas podem ser genéticas ou surgirem durante a embriogênese, por causa de fatores não genéticos. As mutações genéticas que causam anomalias cutâneas podem estar presentes no nascimento ou tornarem­se aparentes
após semanas a meses. Estas manifestações de início tardio são denominadas de defeitos de desenvolvimento tardio. Tanto as dermatoses congênitas como as de desenvolvimento tardio são razoavelmente comuns em animais domésticos de
todas as espécies, com o maior número de defeitos bem definidos, descritos em bovinos e cães.

 ALOPECIA HEREDITÁRIA E HIPOTRICOSE
Alopecia é a ausência de pelos; a hipotricose, muito mais comum, corresponde à presença de pelos em quantidade menor que a normal. Embora esses defeitos possam ser generalizados, eles se desenvolvem comumente em padrões que
poupam as extremidades ou se correlacionam com a coloração do pelame. Tais defeitos ectodérmicos podem ser congênitos ou tardios e podem se associar com anexos anormais ou ausentes, defeitos em outras estruturas ectodérmicas (tais
como dentes, unhas e olhos) e outros defeitos do desenvolvimento ou esqueléticos. Há vários modos de herança em casos nos quais se estudou a ocorrência familiar. Displasia ectodérmica ligada ao cromossomo X foi recentemente relatada
em cães Pastor Alemão. As raças caninas sem pelos (p. ex., Pelado Mexicano, Cão Cristado Chinês e American Hairless Terrier) e felinas (Sphinx) são criadas por causa desses defeitos ectodérmicos. Descrevem­se muitos casos esporádicos
de defeitos ectodérmicos nos cães, mais frequentemente nos machos. Muitos cães afetados, inclusive a maioria das raças alopécicas, apresentam hipotricose macular ou padronizada, bem como anomalias dentárias associadas. Todos os
animais com desenvolvimento folicular anormal ficam propensos à formação de comedões, infecções do folículo piloso e granulomas pilosos por corpo estranho.
Pelo menos 13 tipos de hipotricose já foram descritos em bovinos, acometendo as raças Angus, Ayrshire, Brangus, Holstein–Friesian, Hereford, Hereford Mocho, Guernsei. Gelbvieh e Jérsei e nos mestiços de Normando­Maine, Anjou­
Charolês  e  cruzas  de  Simmental.  A  maior  parte  deles  apresenta  modos  de  herança  recessiva  autossômica  ou  ligada  ao  sexo.  Os  defeitos  associados  incluem  falha  no  desenvolvimento  dos  chifres,  hipoplasia  hipofisária,  macroglossia,
anomalias dentárias, coloração de pelame anormal e morte (hipotricose letal). Hipotricose viável, hipotricose com anodontia, semialopecia, alopecia riscada, displasia dos folículos pilosos pretos (Holstein) e hipotricose relacionada com a
mestiçagem (cauda de rato) são tipos específicos descritos nos bovinos.
Nos ovinos, a hipotricose é raramente descrita, com a síndrome mais conhecida acometendo a raça Dorset mocha. Esta síndrome envolve com maior gravidade os pelos faciais, mas a lã também fica com má qualidade. Nos caprinos, a
hipotricose se associa com bócio congênito. Nos suínos, conhecem­se 2 formas de hipotricose (nas raças pelado mexicano e alemão), com uma delas se associando com bócio e morte no indivíduo homozigoto.
Nos cães, há várias displasias foliculares tardias, inclusive alopecia por diluição da cor. Esta afecção é notada em alguns cães que possuem o genótipo de coloração de pelame dd, que converte os genótipos pretos em azuis e os genótipos
cor de fígado em bege ou castanho­claro. Esta síndrome é mais bem conhecida na raça Doberman pinscher, mas também é comumente observada a diluição de cor nos cães das raças Dachshund, Greyhound Italiano, Greyhound, Whippet e
Yorkshire Terrier e cães de caça com pelagens tricolor e também foi descrita em um pastor alemão. Recentemente, “Labrador Retriever prateados” com alopecia por diluição da cor foram relatados. Os cães afetados nascem com pelames
normais, mas antes de 1 ano de idade começam a desenvolver foliculite e hipotricose progressiva e restrita às áreas azuis ou castanho­claras. A displasia dos folículos pilosos pretos, uma hipotricose semelhante, mas de desenvolvimento
mais precoce e mais completo, é vista nos cães malhados de branco e preto. A hipotricose se desenvolve imediatamente após o nascimento e acomete somente as áreas de coloração preta. Esta síndrome é mais conhecida nos cães das raças
Papillon e Border Collie. Análises genéticas recentes em grande Munsterlanders indicam uma herança recessiva autossômica na raça. Também se descreve uma displasia folicular semelhante em raças não malhadas. Os outros tipos de
displasia folicular de etiologia incerta são a alopecia sazonal do flanco dos cães das raças Boxer e Airedale Terrier e várias síndromes lanosas e a alopecia pós­tosa nos cães Spitz. Hipotricose familiar na raça Irish Water Spaniel ocorre em
animais de 2 a 4 anos de idade, e sugere­se modo de herança dominante. A condição anteriormente conhecida como alopecia responsiva ao hormônio de crescimento em pomerânios e outras raças é agora conhecido como alopecia X,
refletindo a complexidade de fatores, a hereditariedade e, de outra maneira, influenciando estas síndromes.
Nos gatos, há displasia folicular na raça Devon Rex. Nos equinos, descrevem­se, ocasionalmente, alopecia por diluição de cor e displasia dos folículos pilosos pretos, especialmente na raça Appaloosa. Hipotricose progressiva congênita
foi descrita em Percheron azul. As anormalidades estruturais nas hastes pilosas dos cães e dos gatos incluem pelos tortos (raça felina pelo­de­arame americano), tricorrexe nodosa e espiculose (raça canina Kerry Blue terrier).

 ANOMALIAS CONGÊNITAS CUTÂNEAS
Epiteliogênese imperfeita (aplasia cutânea) é uma descontinuidade congênita do epitélio escamoso. Acomete bovinos (característica autossômica recessiva), equinos, suínos, ovinos, gatos e cães, sendo rara nas últimas 3 espécies. Nos
bovinos, as raças afetadas são: Holstein­Friesian, Hereford, Ayrshire, Jersey, Shorthorn, Angus, Dutch Black Pied, Swedish Red Pied e German Yellow Pied. É comum em suínos, nos quais grandes lesões são evidentes ao nascimento, como
descontinuidades bem delimitadas, vermelhas e brilhantes na pele ou nas membranas mucosas. Infecção e ulceração são as consequências iniciais. Um ou mais cascos ou garras podem estar deformados ou ausentes; em alguns animais
afetados,  ocorrem  outras  anomalias  congênitas  associadas.  A  afecção  é  fatal  quando  extensa,  mas  os  pequenos  defeitos  podem  ser  corrigidos  cirurgicamente.  A  avaliação  ultraestrutural  desta  condição  em  potros  American  Saddlebred
demonstrou relação com a epidermólise bolhosa juncional (p. 902).
Hipoplasia cutânea focal e hipoplasia subcutânea são defeitos hipoplásicos congênitos, circunscritos, de múltiplas ou das camadas cutâneas mais profundas nos suínos. As lesões se manifestam como depressões cutâneas nas quais
todas as camadas cutâneas ou as camadas gordurosas subcutâneas não se desenvolvem normalmente.
Nevo é um defeito de desenvolvimento cutâneo circunscrito, enquanto um hamartoma é uma massa hiperplásica formada como resultado de um defeito de desenvolvimento em qualquer órgão. Tanto os nevos quanto os hamartomas são
descritos como defeitos cutâneos congênitos, mas podem não ser óbvios no início da vida. Nos cães, é conhecida a ocorrência de nevos sebáceos, nevos epidérmicos pigmentados, nevos epidérmicos verrucosos lineares inflamatórios, nevos
comedônicos, nevos organoides lineares e hamartomas foliculares. Em equinos, há relatos de queratose de metatarso e nevo epidérmico linear. Indubitavelmente, ocorrem defeitos semelhantes em todas as espécies. Os nevos mistos ou
organoides consistem em coleções circunscritas de estruturas anexas densamente cheias (nevos pilossebáceos e pilossebáceosudoríferos). Os nevos colagenosos são nódulos compostos de hiperplasia colagenosa focal, que deslocam as
estruturas cutâneas normais. A maioria das lesões é alopécica, com superfícies irregulares e pigmentadas. Quando não são extensos, podem ser excisados; por outro lado, não existe nenhum outro tratamento efetivo conhecido.
Seios ou cistos dermoides surgem em equinos Puro Sangue Inglês e nos cães da raça Rhodesian Ridgeback (nos quais são hereditários) e, ocasionalmente, em outras raças caninas. Tratam­se de estruturas císticas revestidas de pele e em
cujo interior se acumulam pele descamada, pelos e resíduos glandulares. São causados por falha na separação completa do tubo neural da epiderme, durante a embriogênese; ocorrem na linha média dorsal e raramente se associam com
déficits neurológicos da medula espinal. Podem ser removidos por excisão cirúrgica.
Cistos foliculares se desenvolvem por uma morfogênese folicular pilosa anormal e pela retenção de produtos foliculares ou glandulares. Eles podem ser congênitos, quando causados por falha no desenvolvimento normal do orifício
folicular. Os cistos congênitos são mais comumente identificados nos ovinos das raças Merino e Suffolk. Os cistos periauriculares (dentígeros) ocorrem nos equinos e, embora já se encontrem presentes no nascimento, podem não ser
reconhecidos até a idade adulta. Os cistos de barbela surgem nos caprinos da raça Núbia a partir da fenda brônquico. Os cistos de barbela suínos ocorrem, com razoável frequência, em todas as raças. São crescimentos semelhantes a
mamilos no maxilar inferior.

 ANOMALIAS PIGMENTARES
Há vários relatos de associação entre a coloração da pele e do pelame e anormalidades do desenvolvimento nos animais domésticos. Algumas associações com hipotricose são discutidas no item sobre alopecia hereditária (p. 899).
Albinismo parece ser raro nos animais domésticos. O albinismo verdadeiro está sempre associado às íris róseas ou pálidas e com defeitos visuais e aumento no risco de neoplasias cutâneas induzidas por radiação solar. Ele é notado nos
ovinos islandeses e nos bovinos das raças Guernsey, Murboden Austríaco, Shorthorn, Suíço Marrom e Charolês. O albinismo deve ser diferenciado das manchas brancas extremas ou do piebaldismo ou do pelo branco dominante. Alguns
animais com piebaldismo extremo ou branco dominante apresentam associação com anomalias neurológicas, surdez ou morte intrauterina. A síndrome letal dos potros brancos é uma afecção que resulta do cruzamento de 2 equinos da
Paint­Horse, padrão Overo. Tanto nos cães quanto nos gatos de pelos brancos dominantes ou piebaldismo extremo pode haver associação com surdez uni ou bilateral e às vezes, com íris azuis ou heterocromia de íris. Os gatos brancos com
olhos azuis bilaterais têm uma chance de 75% de surdez. Nos cães, a surdez pode estar associada a pelagens da coloração merle, notada nos cães das raças Dálmata, Sealyham Terrier, Dogue Alemão arlequim, Collie e Bull Terrier branco.
Pode­se encontrar uma neutropenia cíclica (p. 31) nos cães da raça Collie cinza ou merle­pálido. Nos cães da raça Rhodesian Ridgeback, uma coloração de pelame clara se vincula com uma degeneração cerebelar. Na síndrome de Chédiak­
Higashi (p. 27) dos gatos e dos bovinos (Hereford, Preto Japonês e Brangus), diluição na coloração do pelame (coloração azul­fumaça nos gatos) se associa com anormalidades neutrofílicas e plaquetárias e diminuição da expectativa de
vida. Isso é herdado como uma característica autossômica recessiva. Os gatos tricolores machos (de pelagens cálico e casco de tartaruga) são estéreis, pois o gene da coloração laranja é ligado ao cromossomo X e recessivo e os machos
apresentam o genótipo XXY anormal.
As anormalidades pigmentares podem ser adquiridas e algumas delas podem ser hereditárias ou familiares, como o vitiligo. Como uma doença familiar, o vitiligo é mais reconhecido nos equinos da raça árabe (síndrome do desbotamento
dos equinos da raça árabe ou síndrome rósea); ele também pode ser familiar nos bovinos (da raça Holstein–Friesian) e nos gatos siameses e em algumas raças caninas (Tervuren Belga e Rottweiler). Os animais afetados desenvolvem uma
despigmentação macular cutânea um pouco simétrica que, ocasionalmente, também acomete o pelame, as unhas ou os cascos. O início ocorre em adultos jovens. A maioria das lesões aparece na face, especialmente no focinho ou no plano
nasal  ou  ainda,  ao  redor  dos  olhos.  A  despigmentação  pode  ser  intermitente.  Pode  haver  remissão  completa,  mas  é  rara.  Não  há  nenhuma  doença  sistêmica  ou  cutânea  associada.  Não  se  encontra  disponível  nenhum  tratamento;  os
tratamentos destinados a pessoas com vitiligo não proporcionam resultados cosméticos significativos nos animais.
Lentigem dos gatos machos laranja ou de face laranja é marcada pelo desenvolvimento de máculas pigmentadas e assintomáticas. As lesões são observadas primeiramente nos lábios e nas pálpebras, em animais com < 1 ano de idade.
Outros locais acometidos são o plano nasal e a gengiva. As lentigens não são pré­cancerígenas e não possuem consequência clínica.
Aurotriquia adquirida dos cães Schnauzer miniatura constitui uma síndrome familiar, na qual os pelos ao longo da linha média dorsal mudam para dourado, a partir do preto ou cinza normais desta raça. O início ocorre geralmente no
início da idade adulta. A alteração pode­se associar com um adelgaçamento no pelame, mas com nenhum outro sinal cutâneo ou sistêmico. Na maioria dos cães, a coloração do pelame reverte para o normal dentro de 1 a 2 anos.

 DEFEITOS NA INTEGRIDADE ESTRUTURAL
Esta categoria inclui defeitos genéticos nos elementos estruturais responsáveis pela integridade da epiderme e da junção dermoepidérmica, bem como algumas anomalias estruturais dérmicas.
Astenia cutânea (dermatosparaxe ou síndrome de Ehlers­Danlos) corresponde a um grupo de síndromes caracterizado por defeitos na produção de colágeno. Isso resulta em vários sinais clínicos, como pele frágil, hiperextensível e frágil;
frouxidão articular e outras disfunções teciduais conjuntivas. Esses defeitos do colágeno já foram descritos nos bovinos (raças Belga Azul e Branco, Charolês, Hereford, Holstein­Friesian e Simmental), em um caprino, em ovinos (das raças
Dala  Norueguês,  Border  Leicester–Southdown,  Finnish  Merino,  Romney,  Dorper  branco),  nos  suínos  (mestiços  de  Large  White­Essex),  equinos  (da  raça  quarto­de­milha  e  dos  mestiços  de  árabes),  coelhos  (da  raça  branco  da  Nova
Zelândia), gatos (das raças himalaia e pelo curto doméstico), visons e cães (uma ninhada de Garafiano Shepherds, esporadicamente em várias raças). O modo de herança já foi mostrado nos gatos das raças himalaia (recessivo) e pelo curto
doméstico (dominante).
As características clínicas são: pele frágil desde o momento do nascimento, ferimentos que curam com cicatrizes finas, retardo na cicatrização de ferimentos, pele pendular e formação de hematomas e higromas. Nos cordeiros, são
característicos ruptura no trato gastrintestinal e aneurismas arteriais e a doença é fatal nos cordeiros e nos bezerros. Nos equinos, o início é mais tardio e as lesões são bem circunscritas, consistindo em pele hiperextensível e um pouco frágil.
Nos cães e gatos, a doença não é fatal e os animais idosos desenvolvem dobras de pele penduradas e exibem uma forma extensa de cicatriz; alguns apresentam frouxidão articular e outros, anomalias oculares.
O diagnóstico baseia­se nos sinais clínicos e nos estudos histopatológicos da estrutura do colágeno, que requer amostras de controle das idades e das raças compatíveis. Para diagnóstico nos gatos e nos cães, desenvolveu–se um índice de
extensibilidade cutânea. Há relatos anedóticos da melhora dos cães afetados com suplementação de vitamina C. Nos gatos adultos, o principal diagnóstico diferencial é o hiperadrenocorticismo felino com fragilidade cutânea adquirida.
As síndromes de epidermólise bolhosa constituem um grupo de doenças congênitas e hereditárias que resultam de defeitos nas estruturas de fixação dermoepidérmicas. Estas doenças são conhecidas como doenças mecanobolhosas, pois
um  pequeno  traumatismo  cutâneo  resulta  em  separação  dermoepidérmica  com  formação  de  bolhas  flácidas  que  logo  se  rompem,  deixando  erosões  niveladas  e  brilhantes.  As  síndromes  são  classificadas  de  acordo  com  a
localização ultraestrutural do defeito dermoepidérmico: simples, na camada de células basais epidérmicas; juncional, na membrana basal; e distrófica, abaixo da membrana basal nas fibrilas ancoradas na subepiderme. Em grandes animais,
as lesões ocorrem mais comumente em gengiva, palato, lábios, língua e patas. Algumas formas de epidermólise bolhosa formam cicatrizes e a maior parte delas é fatal. Nos grandes animais, as síndromes de epidermólise bolhosa são
conhecidas em bezerros (das raças Simmental e Brangus), búfalos domésticos, cordeiros (das raças Suffolk, South Dorset Down, Blackface Escocês, Weisses Alpenschaf e Montanhês Galês) e potros da raça belga. Todas as 3 formas da
epidermólise bolhosa são bem caracterizadas em cães e gatos: a simples é descrita em cães Collie e pastor de Shetland; a juncional já foi descrita em um cão da raça Poodle toy, nos cães da raça German Shorthair Pointer, nos cães mestiços
e nos gatos Siameses e já foi identificada, por tentativa, na raça canina Beauceron. Epidermiólise bolhosa distrófica já foi descrita em gato de pelo curto doméstico, em Persa, além de Golden Retrievers e Akitas. As lesões podem estar
presentes no nascimento ou se desenvolver dentro das primeiras semanas de vida. As lesões mais graves ocorrem nas patas, com descolamento de cascos, unhas ou coxins podais, na membrana mucosa oral e na pele facial e perigenital
(erosões). Exceto pela epidermólise bolhosa simples, estas doenças são fatais.
Pênfigo crônico familiar benigno canino é um distúrbio mecanobolhoso causado por um defeito na aderência intercelular na epiderme. Esse distúrbio já foi descrito em uma família de cães da raça Setter inglês. Ele se desenvolve em
poucas semanas após o nascimento e causa lesões alopécicas formadoras de crostas nos pontos de pressão da pele, que aumentam de volume, lentamente, à medida que os filhotes crescem. A doença é benigna e ainda não se descreveu
nenhum tratamento. Acantólise familiar, descrita em bezerros da raça angus da Nova Zelândia, é uma síndrome semelhante. Esta síndrome fatal é descrita como uma característica autossômica recessiva. Os bezerros afetados desenvolvem
erosões, com colaretes e crostas, em áreas sujeitas aos traumatismos. Alguns bezerros exibem uma separação parcial dos cascos. O diagnóstico, tanto nos filhotes de cães como nos bezerros, é estabelecido por biopsia cutânea das lesões
recém–formadas.
Mucinose cutânea é provavelmente um problema familiar observado em algumas linhagens de cães da raça Shar­peis chineses. Os Shar­peis normais apresentam mais mucina cutânea que os outros cães, mas em alguns cães jovens, a
formação de mucina cutânea na derme é tão excessiva que a pele exibe acentuada formação de pregas e de vesículas mucinosas. O diagnóstico é feito por meio de punção cutânea das vesículas e observação dos fios de muco originários
destas, que possuem a mesma aparência do fluido articular normal ou, alternativamente, por biopsia cutânea. A síndrome é parcialmente responsiva a corticosteroides, mas esse tratamento é contraindicado, devido à idade jovem dos cães
afetados.  À  medida  que  os  cães  tornam­se  adultos,  a  gravidade  da  síndrome  pode  diminuir,  mas  ela  pode  ser  exagerada  com  o  desenvolvimento  de  dermatopatia  alérgica,  comum  na  raça.  O  principal  diagnóstico  diferencial  é  o
hipotireoidismo.

 MANIFESTAÇÕES CUTÂNEAS DE DEFEITOS MULTISSISTÊMICOS E METABÓLICOS
Síndrome do bezerro alopécico em fêmeas da raça Holstein, como o nome implica, se associa com hipotricose. Esta característica autossômica recessiva é letal para os fetos machos. Os bezerros comprometidos parecem normais no
nascimento, mas começam a perder a força e placas de pelos 1 a 2 meses mais tarde. A pele, então, fica espetada e enrugada e as pontas das orelhas podem se enrolar. Os bezerros salivam abundantemente e emagrecem e as fêmeas morrem
com 6 a 8 meses de idade. Desconhece­se o defeito metabólico subjacente. Uma síndrome de aparência similar, conhecida como anemia congênita, disqueratose e alopecia progressiva, é descrita em bezerros da raça Hereford mocho de
qualquer sexo. Apresentam anemia e tamanho pequeno ao nascimento e torna­se progressivamente mais grave. Alopecia, pelos enrolados anormais e hiperqueratose ao redor do focinho e das margens auriculares, tornando­se mais extensos
à medida que os bezerros amadurecem. Depois, a pele se enruga acentuadamente e desenvolvem anormalidades neurológicas. Os bezerros apresentam diarreia e morrem antes dos 6 meses de idade.
Vasculopatia familiar foi descrita em cães das raças Pastor Alemão e Parson Russell Terrier. Nesses cães, as lesões cutâneas se desenvolvem logo após a primeira vacinação do filhote e se exacerbam após as subsequentes vacinações. Os
principais sinais cutâneos são inchaço e despigmentação nos coxins plantares, que podem progredir para ulceração; afetam, tipicamente, todos os coxins podais. Também são características a formação de crostas e ulceração nas pontas das
orelhas  e  da  cauda  e  a  despigmentação  no  plano  nasal.  À  medida  que  o  cão  torna­se  adulto,  a  doença  pode  se  resolver,  mas  as  lesões  nos  coxins  podem  ser  tão  graves  que  justifiquem  a  eutanásia.  Nenhum  tratamento  conhecido  é
uniformemente efetivo, embora alguns cães pareçam responder a altas doses de corticosteroides. Uma forma grave de vasculite neutrofílica recentemente descrita em Shar­peis jovens pode ser de origem familiar.
Dermatomiosite familiar é uma doença inflamatória idiopática da pele e dos músculos dos cães jovens das raças Collie e Shetland Sheepdog. O modo de herança é descrito como autossômico dominante nos Collies, mas há algumas
evidências de um agente infeccioso não identificado na patogênese. Uma vasculopatia se associa com os estágios inflamatórios iniciais da doença na pele e na musculatura e em ambos os tecidos, a sequela final é atrofia. O início ocorre,
tipicamente, < 6 meses de idade, embora já se tenha registrado um episódio na idade adulta. A progressão das lesões é variável, podendo­se acometer os filhotes de cães individualmente dentro de uma ninhada, nas formas brandas a graves.
As lesões cutâneas aparecem em áreas de maior traumatismo e são observadas na face, nas pontas das orelhas, na ponta da cauda e nas superfícies laterais das extremidades. As lesões cutâneas, que consistem em erosões, formações de
crostas e alopecias, exacerbam­se com o calor e a exposição solar. Os músculos atingidos com maior gravidade são da cabeça e das extremidades. O diagnóstico é estabelecido pela avaliação dos companheiros de ninhada e da história
familiar, por biopsia cutânea, eletromiografia e biopsia muscular, que deve ser realizada no início do curso da doença. Há relatos de melhora com altas doses de corticosteroides, vitamina E e ácidos graxos ômega­3, mas os cães gravemente
afetados respondem pouco ao tratamento. Pentoxifilina (10 mg/kg, VO, 2 vezes/semana) foi benéfica em muitos cães.
Dermatose lupoide hereditária dos cães da raça pointer de pelo curto alemão é observada, pela primeira vez, quando o cão tem aproximadamente 6 meses de idade. Inicia com descamação e formação de crostas na cabeça e no dorso e
progride rapidamente para uma descamação generalizada, com eritema. A dermatopatia parece ser dolorosa ou pruriginosa. Os cães doentes ficam piréticos e desenvolvem linfadenopatia. Alguns deles desenvolvem uma enteropatia pouco
caracterizada; a maioria perde condição corporal. Como o nome indica, as amostras por biopsia cutânea revelam as particularidades de uma dermatite semelhante ao lúpus. A doença é progressiva e, por fim, fatal. Ainda não há relato de
tratamento efetivo.
Síndromes de deficiência de zinco hereditárias são mais conhecidas nos bovinos e já foram descritas nos cães. Nos bovinos, estas síndromes incluem paraqueratose hereditária, característica letal A46, doença edematosa e hipoplasia
tímica  hereditária.  As  raças  afetadas  são  Friesian,  Shorthorn,  Angus  e  Malhado  preto.  Estas  síndromes  tornam­se  aparentes  dias  a  semanas  após  o  nascimento  e  se  caracterizam  por  hiperqueratose  simétrica  e  preferencialmente  acral;
formação de crostas e definhamento; suscetibilidade a infecções e morte precoce. Os bezerros exibem conjuntivite, ptialismo, rinite, diarreia e frequentemente morrem por pneumonia. Na maioria das raças bovinas, a característica parece
ser autossômica recessiva e associar­se à má absorção intestinal de zinco dietético, que é mais ou menos responsiva à suplementação dietética com zinco. Em algumas raças, o defeito na absorção é absoluto, exigindo uma administração
parenteral de zinco para atingir a remissão. Como tais manipulações raramente se tornam possíveis nos animais de produção de alimentos, estas características tornam­se letais. O diagnóstico é estabelecido pela exclusão de dermatofilose
(p. 913) e biopsia cutânea (predominantemente uma paraqueratose), pela mensuração dos teores séricos de zinco e por achados de necropsia que incluem hipoplasias de timo e linfonodos.
Nos cães, há relatos de duas síndromes de deficiência de zinco familiar. Em Bull Terriers brancos, a acrodermatite letal se caracteriza por retardo no crescimento, dermatite hiperqueratótica acral e progressiva e dermatite pustular ao
redor das junções mucocutâneas. Esses sinais ficam aparentes com 10 semanas de idade e são posteriormente acompanhados de diarreia, pneumonia e morte antes dos 2 anos de idade. Nos cães idosos, hiperqueratose nos coxins podais e
paroníquia contribuem significativamente para a morbidade. Pode­se melhorar um pouco a gravidade da dermatopatia por meio do controle das infecções bacterianas e por Malassezia secundárias, podendo­se prolongar a vida dos cães com
tratamento clínico agressivo. Esses cães não respondem a uma terapia com zinco oral. A dermatopatia responsiva a zinco familiar, que se manifesta predominantemente por lesões cutâneas e é responsiva à suplementação oral com zinco,
é observada nos cães das raças Malamute do Alasca, Husky siberiano e Pointer de pelo curto alemão. Os sintomas surgem no desmame ou mais tarde e consistem em formação de crostas e hiperqueratose nas extremidades e nas junções
mucocutâneas. Frequentemente, as cadelas desenvolvem sinais associados a cio ou parto e lactação. As infecções secundárias por Malassezia são comuns. O diagnóstico é estabelecido por uma biopsia cutânea e resposta à suplementação
com zinco oral.
Tirosinemia já foi descrita em um filhote da raça Pastor Alemão. Foi comparada a um tipo de tirosinemia no homem e consequentemente, acredita­se que seja hereditária. As manifestações clínicas englobam erosões e ulcerações nos
coxins podais e no nariz e lesões bolhosas e despigmentação cutânea, queda de unhas e lesões oculares. Ela deve ser diferenciada da vasculopatia familiar dos cães da raça pastor alemão, descrita anteriormente. No filhote, os teores séricos
de tirosina estavam 20 a 30 vezes acima dos níveis normais e as amostras urinárias continham concentrações altas semelhantes.
Porfiria é um defeito hereditário no metabolismo da hemoglobina e dos seus subprodutos. Nos bovinos, o acúmulo de porfirinas aberrantes na pele aumenta a sensibilidade aos raios UV (A porfiria também é descrita em gatos e suínos,
mas não resulta em fotossensibilização). Nos bovinos, há 2 tipos de porfirias hereditárias. A protoporfiria bovina é descrita nos bovinos mestiços de Limousin e é hereditária como uma característica autossômica recessiva. Os sintomas são
fotodermatite e fotofobia. Bezerros comprometidos podem morrer, mas os animais adultos podem ser afetados menos gravemente. A porfiria eritropoética bovina (p. 1098) é mais comum e mais grave. É descrita em várias raças (Shorthorn,
Holstein­Friesian e Hereford) como uma característica autossômica recessiva. Além da fotossensibilização grave, os sinais são manchas marrom­avermelhadas nos dentes, ossos e urina; anemia regenerativa e interrupção no crescimento. Os
dentes e a urina dos animais afetados exibem fluorescência alaranjada sob iluminação com lâmpada de Wood. A biopsia cutânea também é útil no diagnóstico.
Deficiência na aderência leucocitária (p. 31) nos bovinos da raça Holstein é uma doença hereditária (autossômica recessiva) com muitas manifestações. É fatal antes da idade adulta. Nos bezerros, observam­se frequentemente lesões
cutâneas de dermatite e vasculite. A doença pode ser diagnosticada por métodos moleculares, como reação em cadeia de polimerase (PCR) de um tecido fresco ou fixado, propiciando a identificação dos bovinos afetados, portadores e
normais.

 NEOPLASIAS CONGÊNITAS E HEREDITÁRIAS E HAMARTOMAS MÚLTIPLOS
Neoplasias  congênitas  são  comuns  em  grandes  animais.  Mastocitose,  melanocitose,  linfossarcomas  cutâneos  e  hamartomas  vasculares  são  notados  em  bezerros.  Melanocitomas  podem  também  surgir  logo  após  o  nascimento  dos
bezerros, como doença hereditária. Esses são considerados benignos.
Melanomas  são  observados  em  suínos  das  raças  Duroc­Jersey  e  Sinclair  miniatura,  como  característica  familiar.  Estes  tumores  podem  sofrer  remissão  espontânea  ou  se  comportar  como  tumores  malignos.  Hamartomas  vasculares
e fibropapilomatose congênita também foram descritos em leitões e são doenças semelhantes.
Tumores congênitos são raros em cães e gatos. Um cão com um nevo pigmentado congênito gigante teve melanoma maligno que desenvolveu­se no interior da lesão. Em gatos, mastocitose benigna familiar é descrita em jovens siameses.
Observa­se síndrome de nevos colagenosos múltiplos em algumas famílias de cães da raça pastor alemão e denominada dermatofibrose nodular. Os cães acometidos são adultos. Podem apresentar dúzias destas lesões cutâneas e as
lesões nas patas frequentemente ulceram ou causam deformidades podais e claudicação. Tal síndrome é um marcador cutâneo quanto à ocorrência de cistadenocarcinoma renal e liomioma uterino. A colagenose dérmica progressiva é uma
doença semelhante dos suínos miniatura machos pós­púberes. Pode ser hereditária e caracteriza­se por placas firmes e simétricas no tronco, consistindo de feixes espessos de colágeno que substituem a derme e o panículo normais. A
conexão com malignidade interna não foi relatada.
Urticária pigmentosa é causada por hiperplasia dos mastócitos e foi descrita em gatos. Os gatos afetados apresentam erupção papular, crostosa, com máculas coalescentes na cabeça, pescoço e membros. O diagnóstico é realizado por
biopsia cutânea. Há evidências de histórico familiar.

 SÍNDROMES HIPERPLÁSICAS E SEBORREICAS
Há muitas anomalias que afetam a queratinização; algumas se associam com hipotricoses hereditárias (ver anteriormente), enquanto outras se vinculam a desarranjos metabólicos sistêmicos. As anomalias às quais ainda não se fez nenhuma
destas associações constituem um grupo diverso de síndromes que podem implicar partes localizadas do epitélio ou podem ser generalizadas. Entre as últimas afecções, incluem­se síndromes congênitas ou seborreicas familiares pouco
caracterizadas, entre elas a mais conhecida é a seborreia oleosa idiopática dos cães de raças Spaniels e dos gatos da raça Persa. Paraqueratose folicular congênita hereditária é uma síndrome recentemente reconhecida nas fêmeas de
rottweilers e huskies siberianos. É um grave defeito de queratinização associado a várias anormalidades não cutâneas.
Ictioses cutâneas se caracterizam por uma proliferação epitelial anormal e hipertrófica, com extenso acúmulo de escamas e hiperqueratose na superfície cutânea. Os casos são descritos predominantemente nos bovinos e nos cães, mas
também  se  conhecem  exemplos  de  galinhas  e  vários  modelos  de  camundongos  e  há  relato  em  uma  lhama.  Nos  bovinos,  a  gravidade  varia;  algumas  formas  são  letais  e  ocorrem  imediatamente  após  o  nascimento.  As  raças  bovinas
comprometidas são mocho vermelho, Friesian, Holstein, suíço marrom, Pinzgauer e Chianina.
As  dermatoses  ictiosiformes  caninas  também  são  heterogêneas  e  ocorrem  esporadicamente  em  várias  raças:  Doberman  Pinschers,  Rottweiler,  Setter  Irlandês,  Collie,  Springer  Spaniel  Inglês,  Cavalier  King  Charles  Spaniel,  Golden
Retriever, Labrador Retriever e Terriers (inclusive Parson Russell Terrier). Há algumas evidências de padrão de herança familiar no Parson Russell Terrier e Golden Retriever. Nos cães, o corpo fica recoberto de grandes descamações
aderentes, que podem descamar em lâminas grandes. O plano nasal e os coxins digitais costumam ficar bastante espetados em algumas formas e os últimos geralmente se associam com um desconforto aparente. O tratamento clínico é
difícil, mas os sinais podem melhorar com xampus ou soluções ceratinolíticos (como, dissulfetos de selênio, ácido láctico e peróxido de benzoíla) e com umectantes (p. ex., ácido láctico, ureia, propilenoglicol e preparações de ácidos graxos
essenciais). O uso experimental de retinoides sintéticos tem sido útil. Exige­se, frequentemente, controle da piodermite secundária.
Dermatose  psoriasiforme­liquenoide  acomete  os  cães  jovens  da  raça  Springer  Spaniel  Inglês  e  presume­se  que  tenha  origem  genética.  As  lesões  eritematosas  e  simétricas,  as  quais  consistem  de  pápulas  e  placas  nos  pavilhões
auriculares e na região inguinal, ficam cobertas de escamas, tornando­se crescentemente hiperqueratóticas, se não forem tratadas. Em alguns cães afetados, as lesões podem eventualmente se espalhar e lembrar uma seborreia oleosa grave.
Registram–se remissões espontâneas e curso intermitente. Alguns cães respondem ao tratamento com antibióticos ou a retinoides sintéticos, mas a maior parte deles é refratária à terapia.
Ptiríase rósea dos  suínos  é  uma  doença  familiar,  da  qual  ainda  não  se  conhece  o  modo  de  herança  (ver  p.  1048  para  achados  clínicos,  diagnóstico  e  tratamento). Dermatose  vegetante  dos  suínos  da  raça  Landrace  é  um  distúrbio
hereditário, possivelmente congênito, com herança autossômica recessiva. Nos estágios iniciais, deve ser diferenciada da ptiríase rosa. Trata­se de uma doença mais grave, que acomete tanto os cascos como a pele. As lesões começam como
máculas e pápulas e são escamosas, como na ptiríase rosa. Depois ficam cobertas de crostas preto­amarronzadas e se associam a coronites e deformidade do casco. Os leitões falham em se desenvolver e eventualmente, desenvolvem
pneumonia; a doença não é uniformemente fatal, mas os sobreviventes afetados ficam subdesenvolvidos. Não existe nenhum tratamento efetivo.
Hiperqueratose dos coxins plantares familiar é descrita nos cães das raças Irish Terrier e Dogue de Bordeaux. Todos os coxins de todas as patas ficam comprometidos desde filhotes, embora a doença não seja geralmente congênita.
Quando a hiperqueratose é grave, os calos, as fissuras e as infecções secundárias causam dor e claudicação. Não existe nenhuma outra lesão cutânea. O tratamento é sintomático, com imersão de ceratolíticos e emolientes e da tratamento da
piodermite bacteriana. Não há disponível nenhum relato do uso de retinoides sintéticos. Os principais diagnósticos diferenciais para hiperqueratose dos coxins plantares são síndrome hepatocutânea, distúrbios de queratinização e pênfigo.
Adenite sebácea granulomatosa é uma doença idiopática que destrói as glândulas sebáceas e em algumas raças caninas, associa­se com dermatose seborreica e alopécica grave. É hereditária nos cães da raça Poodle padrão e suspeita­se
que seja familiar nos Akitas. Se manifesta primeiramente nos adultos jovens, mas são conhecidos portadores inaparentes dentre os cães da raça Poodle. A hiperqueratose acentuada precede o desenvolvimento das anormalidades no pelame,
que começam como perda da capacidade de enrolamento dos pelos normais e progridem para alopecia macular. Os cães da raça Akita tendem a apresentar mais seborreia oleosa e menos alopecia que em Poodle. A resposta ao tratamento é
inconsistente  e  incompleta.  Os  cães  levemente  afetados  devem  ser  cuidados  com  xampus  antiseborreicos  e  tratamento  da  piodermite,  conforme  necessário.  Os  cães  gravemente  atingidos  se  beneficiam  do  uso  de  tratamentos  com
propilenoglicol ou óleo aquecido. Alguns cães respondem a uma suplementação oral com ácidos graxos ômega­3, outros, aos retinoides sintéticos. Já se registraram casos de remissão espontânea. Recentemente, a ciclosporina A modificada
(5 mg/kg, VO, 1 vez/dia) foi eficaz no tratamento de muitos cães.

ALERGIA ALIMENTAR (Reações adversas ao alimento)

As reações adversas ao alimento compreendem as reações alérgicas denominadas alergias alimentares, bem como as reações não alérgicas denominadas intolerância alimentar. Em um nível prático, estes termos são frequentemente trocados,
uma vez que os processos imunológicos precisos da maioria das reações adversas ao alimento geralmente são desconhecidas. As etiologias mais prováveis envolvem as reações imunológicas dos tipos I, III e IV, porém isto é conjetural na
maioria dos casos em pequenos animais. Alergias alimentares são muito raras em herbívoros. Neste capítulo, o termo alergia alimentar será utilizado para todas as reações adversas ao alimento.
Nota­se alergia alimentar em cerca de 10% dos casos de dermatite atópica dos cães e é quase equivalente à DA nos gatos. O histórico de prurido não sazonal, com pouca variação na sua intensidade de uma estação para a outra, na maioria
dos casos. A maioria dos relatos não sugere predileção racial; no entanto, um relato indicou aumento no risco relativo nos cães das raças Labrador Retriever, West Highland White Terrier e Cocker Spaniel. Hipersensibilidade alimentar foi
relatada em Soft Coated Wheaten Terrier em associação com enteropatia e nefropatia com perda proteica. A idade de início é variável, sendo de 2 meses aos 14 anos de idade. Um relato indicou que a maioria  das  alergias  alimentares
começa com < 12 meses de idade. Na alergia alimentar de aparecimento nos adultos, a maioria dos cães foi alimentada com o alergênio por mais de 2 anos.
A  distribuição  do  prurido  e  das  lesões  varia  acentuadamente  entre  os  animais.  Uma  doença  no  canal  auditivo,  que  se  manifesta  como  prurido  e  infecção  bacteriana  secundária  (geralmente  por  Staphylococcus  intermedius,
Pseudomonas spp, Proteus spp ou Escherichia coli) ou por leveduras (Malassezia pachydermatis), é comum e pode constituir a única queixa. Os outros padrões observados incluem blefarite, prurido generalizado, seborreia generalizada,
erupção papular ou padrão de distribuição que pode mimetizar atopia (patas, face e ventre) ou da dermatite alérgica a pulgas (região lombossacral dorsal e membros pélvicos). As áreas de envolvimento mais comuns são orelhas, patas,
região inguinal, área axilar, regiões proximais anteriores dos membros torácicos, região periorbitária e focinho. O grau de prurido geralmente ser moderado a grave. A resposta a glicocorticosteroides varia de ruim a excelente.
Não existe outro teste diagnóstico seguro além da dieta de eliminação alimentar rigorosa. Os testes sorológicos e intradérmicos para alergênios alimentares se mostraram não confiáveis. A dieta de eliminação alimentar ideal deve ser
equilibrada e nutricionalmente completa e não deve conter nenhum ingrediente que tenha sido oferecido anteriormente ao animal. Muitas dietas contêm novas fontes de proteínas ou carboidratos (p. ex., carne de veado e arroz). No entanto,
o ensaio dietético pode falhar se algum ingrediente anteriormente oferecido estiver presente na dieta de eliminação e o animal poderá ser alérgico a este item. O ponto­chave em qualquer ensaio com dieta de eliminação alimentar é que só é
possível oferecer ingredientes alimentares novos. Outra opção é o uso de dietas com proteínas hidrolisadas para moléculas com peso molecular pequeno, que não são alergênicas.
A dieta experimental deve ser oferecida por até 3 meses. Havendo resolução acentuada ou completa no prurido e nos sinais clínicos durante o ensaio com dieta de eliminação, pode­se suspeitar de alergia alimentar. Para confirmar a
existência de alergia alimentar e que a melhora clínica não foi apenas coincidência, o animal deverá ser provocado com os ingredientes alimentares oferecidos anteriormente, devendo ocorrer recidiva dos sinais clínicos. O retorno dos sinais
clínicos depois de uma provocação geralmente se dá entre 1 h e 14 dias. Uma vez confirmada a alergia alimentar, deve­se reinstituir a dieta de eliminação até que os sinais clínicos se resolvam, o que leva < 14 dias. Nesse ponto, devem­se
acrescentar os ingredientes individuais antes oferecidos na dieta de eliminação pelo período de até 14 dias. Se o prurido voltar, o ingrediente individual será considerado positivo na causa da alergia alimentar. Se o prurido não voltar, o
ingrediente individual não será considerado importante causador dos sinais clínicos.
O número de alergênios alimentares ofensores varia de 1 a 5 ingredientes. Os alergênios causadores frequentemente identificados na alergia alimentar canina são carne bovina, carne de frango, ovos, milho, trigo, soja e leite. Uma vez
identificados os alergênios ofensores, o controle da alergia alimentar deve ser feito por abstenção rigorosa desses alergênios. Doenças intercorrentes (tais como dermatite atópica ou alergia a pulgas) podem complicar a identificação das
alergias alimentares subjacentes. Infrequentemente, um cão irá reagir a novos alergênios alimentares com o tempo.
As apresentações clínicas da alergia alimentar nos gatos são: dermatite miliar, alopecia simétrica felina, complexo granulomatoso eosinofílico (primariamente a placa eosinofílica) e um prurido intenso na cabeça e no pescoço. Não se
observa nenhuma predileção racial, sexual ou etária. A idade de início varia de 3 meses a 11 anos. Em um estudo, entretanto, 46% dos gatos afetados ficaram sintomáticos com idade = 2 anos e os gatos siameses representaram 30% dos
casos.
A resposta aos glicocorticoides é variável, mas cerca de 2/3 dos gatos exibem, inicialmente, uma resposta excelente. Muitos gatos desenvolvem resposta deficiente aos glicocorticoides com a repetição do tratamento. Assim como na
alergia alimentar canina, deve­se oferecer uma dieta de eliminação por até 3 meses. Esta não deve conter nenhum ingrediente oferecido anteriormente. As dietas de eliminação alimentar podem ser difíceis para os gatos, pois muitos deles
quase sempre relutam em mudar suas dietas. Os gatos não devem passar fome ou serem forçados a ingerir uma dieta de eliminação nova por causa da natureza séria da lipidose hepática, que pode ser induzida pela anorexia prolongada.
O tempo de resposta às dietas de eliminação varia de 1 a 12 semanas. O tempo até a recidiva do prurido depois de um desafio com o alimento ofensor varia de 15 min a 10 dias. Nos gatos, os alergênios alimentares mais frequentemente
identificados são: carnes de peixe, bovina, frango e leite. Evitando­se os alergênios ofensores, os sinais clínicos associados à alergia alimentar serão controlados.
DERMATITE ATÓPICA (Dermatite por alergênio inalatório)

A dermatite atópica (DA) é uma doença de pele alérgica pruriginosa comum em cães e gatos. Geralmente classificada como hipersensibilidade tipo I (IgE ou IgG) e acredita–se acometer cerca de 10% da população canina. A incidência em
gatos não é relatada.
Em alguns cães, anticorpos IgE contra alergênios ambientais não podem ser mostrados. A dermatite semelhante à atopia (DSA) foi recentemente definida como uma dermatopatia pruriginosa em cães, com características de DA, porém
com testes negativos para anticorpos IgE.
ETIOLOGIA E PATOGÊNESE:  Acredita­se que animais com DA são geneticamente predispostos à sensibilidade aos alergênios ambientais. Os alergênios são proteínas que, quando inaladas ou absorvidas na pele, no trato respiratório ou no
trato  gastrintestinal  deflagram  a  produção  de  IgE  alergênio­específica.  Esta  IgE  alergênio­específica  se  fixa  aos  mastócitos  teciduais  ou  basófilos.  Quando  estas  células  entram  em  contato  com  o  alergênio  específico  novamente,  a
degranulação mastocitária resultará na liberação de enzimas proteolíticas, histamina, bradicininas e outras aminas vasoativas, levando à inflamação (eritema, edema e prurido). A pele é o principal órgão­alvo em cães e gatos, mas rinite e
asma podem também ocorrer em cerca de 15% dos animais afetados.

Dermatite Atópica Canina
ACHADOS CLÍNICOS:  Não há predileção sexual na DA canina. Há predileções raciais, porém a prevalência em uma raça depende amplamente da variabilidade genética e da região. Raças predispostas a desenvolver DA são: Shar­Pei, Fox
Terrier com pelo­de­arame, Golden Retriever, Dálmata, Boxer, Boston Terrier, Labrador Retriever, Lhasa Apso, Scottish Terrier, Shih Tzu e West Highland White Terrier. A idade de início é, geralmente, entre 6 meses e 3 anos. Os sinais
clínicos  costumam  ser  sazonais,  mas  podem  se  tornar  perenes  com  o  tempo.  O  prurido  é  o  sinal  característico  da  atopia  e  da  dermatite  semelhante  à  atopia  e  pode  ser  a  única  queixa.  Pés,  face,  orelhas,  superfície  flexural  das  pernas
dianteiras,  axilas  e  abdome  são  as  áreas  frequentemente  mais  atingidas.  As  lesões  se  desenvolvem  secundariamente  a  autotraumatismo  e  incluem  alopecia,  eritema,  descamação,  tingimento  salivar,  crostas  hemorrágicas,  escoriações,
liquenificação e hiperpigmentação. Piodermite estafilocócica superficial, dermatite por Malassezia, otite externa alérgica com infecções secundárias são complicações comuns. Otite crônica ou recidivante é a única queixa em um pequeno
número de animais.
DIAGNÓSTICO:  O  diagnóstico  é  baseado  nos  sintomas,  histórico  completo,  achados  do  exame  físico  e  exclusão  de  outras  causas  de  prurido.  Os  diagnósticos  diferenciais  compreendem  alergia  alimentar  (não  sazonal),  alergia  a  pulgas
(sazonal), alergias de contato e escabiose. Testes alérgicos (intradérmicos ou sorológicos) são medidas diagnósticas que mensuram altos teores de IgE circulante ou ligadas aos tecidos; isoladamente, não são suficientes para o diagnóstico. A
principal  razão  para  se  realizar  testes  alérgicos  intradérmicos  e  sorológicos  é  conhecer  os  alergênios  ofensores  e  formular  uma  imunoterapia  específica.  Os  resultados  dos  testes  são  significativos  somente  se  os  alergênios  ofensores
identificados forem compatíveis com o histórico ou sazonalidade do prurido. Os animais com sinais clínicos clássicos, porém testes alérgicos negativos são diagnosticados como dermatite alérgica semelhante à atopia. A imunoterapia pode
ser difícil ou impossível nestes animais.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Dermatite atópica (DA) e dermatite semelhante à atopia (DAS) são enfermidades que cursam por toda a vida, que não têm cura. Há 3 opções de terapia disponíveis para o controle de DA: evitar o(s) alergênio(s)
ofensor(es), terapia sintomática para o controle do prurido e imunoterapia (i. e., hipossensibilização, dessensibilização, vacina alérgica). Um bom plano de controle para dermatite atópica requer o uso de diferentes tratamentos. Educação
clara e frequente do cliente assegura que o proprietário tenha expectativas razoáveis da resposta. Avaliações progressivas e frequentes são necessárias para que o plano possa ser ajustado, quando necessário.
Evitar os alergênios é a melhor opção, porém geralmente é difícil, especialmente quando os alergênios são pólens, mofo e poeira. A redução da exposição pode ser alcançada ao manter os animais dentro de casa durante o pico das
estações, utilizando um filtro altamente eficaz nos sistemas de calefação e ar condicionado, cobrindo e mantendo limpa a cama semanalmente, substituindo a cama anualmente e utilizando xampus hipoalergênicos e rinses com água fria
para remover os alergênios acumulados na pele e pelame. Ademais, remover e controlar outros alergênios como pulgas e alimentos ajudará no controle do prurido.
A  terapia  sintomática  é  direcionada  ao  controle  dos  sintomas  primários  e  secundários  que  acompanham  a  DA.  Todas  as  piodermites  superficiais  e  dermatites  por  Malassezia  devem  ser  tratadas  agressivamente  com  antibiótico  ou
antifúngicos apropriados, até a cura clínica completa. A maioria requer duração mínima de 3 semanas e o tratamento deve se estender por 2 semanas após a cura clínica.
Ácidos graxos essenciais ômega­3 e ômega­6 podem ter algum benefício. Ácidos graxos ômega­6 (ácido linoleico) ajuda a diminuir a perda de água transepidérmica por reforçar a barreira lipídica epidérmica. Ácidos graxos ômega­3
(ácido eicosapentaenoico) interrompe a cascata do ácido araquidônico e a produção de mediadores inflamatórios. Os ácidos graxos essenciais atuam sinergicamente com anti­histamínicos na redução do prurido; anti­histamínicos isolados
possuem benefício modesto. A melhor resposta pode ser obtida quando anti­histamínicos e ácidos graxos essenciais são administrados em conjunto, porém é difícil avaliar se a melhora resulta dos efeitos sedativos dos anti­histamínicos ou
pelos efeitos anti­histamínicos verdadeiros do medicamento.
Os inibidores da calcineurina, como ciclosporina e tacrolimo, mostraram boa redução do prurido e melhora geral das lesões em cães e gatos com DA. Há relato de redução de 50% do prurido em 70% dos cães com DA que recebem
ciclosporina A, paralelamente à resposta observada com glicocorticoides, porém com menos efeitos colaterais. Alguns animais podem ser mantidos confortavelmente com este medicamento isolado. Pomada de tacrolimo é benéfica em
animais com lesões mais localizadas. Entretanto, os medicamentos desta categoria tendem a ser mais caros que outros utilizados no tratamento sintomático.
A pentoxifilina, um inibidor da fosfodiesterase, possui propriedades imunomoduladoras e foi mostrada redução do eritema e prurido em alguns cães.
Imunoterapia: A  imunoterapia  é  indiscutivelmente  a  melhor  opção  terapêutica  para  DA,  porque  é  a  única  terapia  que  potencialmente  provoca  a  remissão  dos  sinais  sem  necessidade  de  outros  medicamentos.  Permanece  o  tratamento  de
escolha da maioria dos dermatologistas e alergologistas. A hipossensibilização ou imunoterapia tenta aumentar a capacidade do animal de tolerar uma exposição a alergênios do ambiente (subjetivamente medida quando um indivíduo é
exposto a um alergênio identificado sem desenvolver sinais clínicos). Embora não se compreenda completamente o modo de ação da imunoterapia, a principal teoria afirma que os níveis de IgG aumentam durante os primeiros meses de
hipossensibilização e exercem efeito de bloqueio nos alergênios circulantes ao ligarem­se a eles e previnem a degranulação de mastócitos. Outra teoria afirma que a imunoterapia causa um desvio do TH2 em direção ao TH1, por aumentar a
expressão  de  interferona­?.  Depois  da  injeção,  entretanto,  níveis  de  IgE  alergênio–específicos  também  podem  aumentar  quando  se  inicia  a  imunoterapia,  por  causa  da  resposta  à  carga  alergênica  adicional  decorrente  das  injeções
imunoterápicas. Isso pode resultar em um aumento de prurido em alguns animais. Reduzindo a quantia de alergênio dado, frequentemente alivia­se esta reação e, com o tempo, os níveis de IgE alergênio­específica diminuem. No entanto, o
decréscimo nos níveis de IgE e a melhora clínica nem sempre correlacionam­se diretamente.
A  imunoterapia  é  melhor  considerada  para  animais  que  apresentam  sinais  clínicos  problemáticos  em  vários  meses  durante  o  ano.  O  animal  deve  também  ser  bastante  cooperativo  para  receber  injeções  alérgicas.  Os  critérios  para  a
hipossensibilização  bem–sucedida  são:  interpretação  apropriada  dos  resultados  dos  testes,  seleção  cuidadosa  dos  alergênios,  controle  adequado  de  infecções  secundárias,  controle  de  outras  alergias  (alimentar  ou  pulgas),  administração
sistemática  das  injeções  de  imunoterapia  e  comunicações  periódicas  entre  o  proprietário  e  o  veterinário.  O  compromisso  a  longo  prazo  necessário  entre  o  veterinário  e  o  proprietário  para  o  sucesso  da  imunoterapia  não  pode  ser
superestimado. O proprietário deve estar disposto a seguir precisamente as instruções, ser paciente e ser capaz de se comunicar efetivamente com o veterinário. O veterinário deve ser capaz de reconhecer e tratar outras causas primárias ou
secundárias de prurido (p. ex., otite, piodermite, dermatite por Malassezia, hipersensibildade à picada de insetos) que podem ocorrer. A terapia sintomática é necessária em quase todos os casos durante o período de indução e várias vezes
no ano. A terapia sintomática é composta não somente de medicamentos antipruriginosas (i. e., glicocorticoides, ácidos graxos essenciais, anti­histamínicos, ciclosporina oral, xampus e soluções de enxágue de uso tópico), mas também
terapia antimicrobiana específica.
A preparação da vacina envolve a seleção de alergênios individuais para cada animal em particular. A escolha do alergênio deve ser determinada pela correlação entre os alergênios positivos nos resultados dos testes e os alergênios
proeminentes durante o período do ano em que o animal apresenta o prurido. Se os resultados dos testes alérgicos forem positivos para pólens que não apresentam relevância clínica (i. e., grande quantidade de pólen presentes em um
período do ano em que o animal não apresenta o prurido, reação positiva para um alergênio que não existe em determinada área geográfica), então estas reações alérgicas são brandas (subliminares) ou são falso­positivas. De qualquer
maneira, esse alergênio não deverá ser incluído na vacina. Muitas vacinas veterinárias são extratos aquosos. O desenvolvimento e a manufatura dos extratos alergênios não estão padronizados; assim, o pólen de ambrósia americana de uma
manufatura não é necessariamente equivalente ao de outra. Exige­se que as companhias de suprimento de alergênios cultivem cada alergênio ou vacina para assegurar a sua esterilidade antes da liberação para um veterinário. Para manter a
esterilidade, as vacinas devem ser preservadas com fenol ou glicerina e são mantidas refrigeradas. As vacinas preservadas em fenol perdem sua potência mais rápido que as vacinas glicerinadas, mas as preservadas em glicerina podem
causar  reações  locais  nos  animais.  Atualmente,  a  maioria  das  vacinas  e  antígenos  é  conservada  com  fenol.  As  concentrações  das  vacinas  são  medidas  em  unidades  de  nitrogênio  proteico  (UNP)  por  mL  ou  relação  peso/volume  (p/v).
Nenhum desses métodos constitui uma mensuração precisa da potência biológica, mas a medida por UNP é geralmente preferida. Extratos de alergênios devem ser refrigerados para preservar sua vida de prateleira. Devem ser feitas vacinas
suficientes para durarem até 6 meses. A potência da maioria das vacinas é considerada inadequada após 1 ano.
As  principais  variáveis  implicadas  na  imunoterapia  com  hipossensibilização,  além  da  escolha  dos  alergênios,  são  a  frequência  das  injeções  e  a  dose  dos  alergênios  administrados.  Os  alergênios  devem  ser  administrados  por  injeção
subcutânea (SC). O número de alergênios em uma vacina individual deve­se limitar de 10 a 12, porque muitos alergênios em uma vacina podem diluir a concentração de cada alergênio individual, produzindo uma resposta inadequada.
Os protocolos de vacinação variam, mas geralmente possuem períodos de indução e de manutenção. Durante o período de indução, a dose do alergênio aumenta gradativamente até uma dose de manutenção arbitrária ser alcançada.
Depois de se administrar a dose máxima, deve­se prosseguir com o nível de manutenção. O intervalo entre as doses de manutenção pode variar de 3 a 4 dias até 3 semanas. O ajuste desses intervalos deve ser baseado na resposta do animal.
Proprietários devem ser avisados para não esperarem muita resposta por 6 meses e devem se comprometer a fazer, no mínimo, 1 ano de terapia, antes de decidir sobre a utilidade da imunoterapia. A melhor taxa de resposta é comparar a
diminuição  da  doença  ou  desconforto  entre  as  estações  semelhantes.  A  maioria  dos  proprietários  aprende  a  administrar  as  injeções  alérgicas  muito  bem,  enquanto  outros  precisam  de  ajuda  de  um  amigo  capacitado  ou  um  auxiliar  de
veterinário.

Dermatite Atópica Felina
DA felina é semelhante à DA canina. É uma doença pruriginosa na qual os gatos afetados apresentam reação de hipersensibilidade a alergênios ambientais inalados ou de contato. A idade de início é variável, mas geralmente começa antes
dos 5 anos. Os sinais podem ser sazonais ou não sazonais. Gatos de raça pura têm risco maior de apresentar o problema quando comparados a gatos de pelo curto doméstico. Como nos cães, o prurido nos gatos pode ter várias apresentações
clínicas (p. ex., dermatite miliar, alopecia simétrica, complexo granuloma eosinofílico e prurido intenso na cabeça e no pescoço), que são consistentes com o diagnóstico de DA, mas devem ser diferenciados de outras doenças com sinais
clínicos semelhantes. Diagnósticos diferenciais são: dermatofitose, alergia à pulga, várias infestações por ácaros (p. ex., Cheyletiella, Demodex, Notoedres, Sarcoptes, Otodectes), hipersensibilidade a picada de mosquito, alergia alimentar,
doença  autoimune  (p.  ex.,  pênfigo  foliáceo)  e  neoplasia  cutânea.  Revisão  completa  da  anamnese  e  exames  dermatológico  e  físico,  juntamente  com  escovação  das  pulgas,  raspados  cutâneos  e  culturas  fúngicas  são  os  primeiros  passos
obrigatórios. O diagnóstico de DA é definido quando outros diagnósticos diferenciais foram excluídos. Há uma excelente resposta a glicocorticoides inicialmente, porém diminui com o tempo.
Os testes alérgicos intradérmicos e os procedimentos de hipossensibilização são semelhantes aos utilizados nos cães, mas os resultados intradérmicos são mais difíceis de interpretar, pois as reações são menos drásticas e se dissipam mais
rapidamente nos gatos. As mesmas recomendações para evitar alergênios feita para cães, aplica­se aos gatos. A terapia sintomática envolve o controle de infecções secundárias e qualquer combinação de anti­histamínicos, ácidos graxos
essenciais, ciclosporina e glicocorticoides. A resposta à imunoterapia é semelhante à observada nos cães (ver anteriormente); proprietários são aconselhados a fazer a terapia por 1 ano antes de decidir sobre sua utilidade.

URTICÁRIA (Erupção urticariforme)

A  urticária  é  caracterizada  por  erupções  semelhantes  a  placas,  múltiplas,  formadas  por  edema  localizado  na  derme  e  que  costumam  se  desenvolver  e  desaparecer  subitamente.  Ocorre  em  todos  os  animais  domésticos,  mas  com  maior
frequência nos equinos. A urticária alérgica pode ser exógena ou endógena. A urticária exógena pode ser decorrência de produtos irritantes tóxicos da urtiga, de ferrões ou picadas de insetos, de medicamentos ou de produtos químicos (p.
ex., ácido carbólico, terebintina, dissulfeto de carbono ou óleo cru). Fatores não imunológicos, como pressão, luz solar, calor, exercícios, estresse psicológico e anormalidades genéticas, podem precipitar ou intensificar uma urticária. O
prurido não está sempre presente.
Os animais sensíveis, particularmente os cães de pelo curto e os equinos de raças puras, também podem exibir dermografismo, fenômeno no qual a pressão aplicada à pele produz lesões urticariformes lineares. A importância clínica é
desconhecida.
A urticária endógena ou “sintomática” pode­se desenvolver depois da inalação ou absorção de alergênios ingeridos ou administrações de medicamentos; é observada predominantemente nos equinos e nos cães. Nos equinos, é percebida
no  curso  de  afecções  gastrintestinais,  em  particular  constipação  intestinal  grave  ou  inflamação  da  mucosa  intestinal.  A  única  forma  de  urticária  em  bovinos  foi  descrita  em  ralas  das  Ilhas  do  Canal  (Jersei  e  Guernsey),  que
ficaram sensibilizadas à caseína do seu próprio leite (“alergia ao leite”); ocorre nos casos de retenção láctea ou de ingurgitamento incomum do úbere com leite. A urticária foi também observada nas cadelas durante o estro. Nos equinos
jovens, cães e suínos, pode se associar com parasitos intestinais. O edema angioneurótico é uma variante de risco de morte da urticária, na qual há edema subcutâneo difuso, em geral localizado na cabeça, nos membros ou no períneo. Em
equinos, dermatofitose (tinha) e pênfigo foliáceo podem parecer urticárias no início da doença.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os vergões ou placas aparecem em poucos minutos a horas após uma exposição ao agente causador. Nos casos graves, as erupções cutâneas são precedidas por febre, anorexia ou embotamento. Frequentemente, os
equinos ficam excitados e inquietos. As lesões cutâneas são salientes e redondas, têm a parte superior achatada e possuem 1 a 20 cm de diâmetro; podem ficar ligeiramente deprimidas no centro. Elas podem se desenvolver em qualquer
parte do corpo, mas principalmente no dorso, flanco, pescoço, pálpebras e pernas. Nos casos avançados, podem ser notadas nas membranas mucosas orais, nasais, conjuntivas, reto e vagina. Em geral, as lesões desaparecem tão rapidamente
quanto surgem, em poucas horas.
Nos ovinos, as lesões são observadas apenas no úbere e nas partes glabras do abdome. Nos suínos, as erupções são vistas ao redor dos olhos, entre os membros pélvicos, no focinho, abdome e no dorso.
Em geral, o prognóstico é favorável. As fatalidades são raras e provavelmente devam–se à anafilaxia ou ao angioedema associados, envolvendo as vias respiratórias.
A urticária crônica é um desafio diagnóstico. Todos os alergênios ambientais devem ser considerados como causas potenciais e deve­se instituir a eliminação da exposição, se for possível.
TRATAMENTO:  A urticária aguda geralmente desaparecer espontaneamente. Os glicocorticosteroides de ação rápida, como o succinato sódico de hidrocortisona ou succinato ou hemissuccinato sódico de prednisolona, são descritos como
úteis. A dexametasona (0,1 mg/kg) tem sido utilizada em cães, gatos e equinos. Os anti­histamínicos possuem valor questionável e podem induzir urticária se forem administrados por via intravenosa (IV). Pode­se administrar epinefrina nas
situações de risco de morte. As lesões desaparecem imediatamente, mas retornarão rapidamente se o alergênio não for eliminado. Geralmente, não há necessidade de tratamento local das lesões. Em equinos com urticária crônica, podem ser
utilizados o anti­histamínico hidroxizina, na dose de 0,4 a 0,8 mg/kg, 2 vezes/dia ou o antidepressivo tricíclico doxepina (que possui propriedades anti­histamínicas), na dose de 3 mg/5 kg.

DERMATOFILOSE (Infecção por Dermatophilus, Estreptotricose cutânea, Encaroçamento de lã, Strawberry footrot)

Esta  infecção  da  epiderme  é  cosmopolita,  porém  é  mais  prevalente  nos  trópicos,  erroneamente  é  denominada  dermatite  micótica.  As  lesões  são  caracterizadas  por  uma  dermatite  exsudativa  com  formação  de  crostas.  Dermatophilus
congolensis possui ampla variação de hospedeiros. Entre os animais domésticos, os mais afetados são os bovinos, ovinos, caprinos e equinos e, raramente, os suínos, cães e gatos. Ela é comumente denominada de estreptotricose cutânea em
bovinos, caprinos e equinos; nos ovinos, é denominada de encaroçamento de lã, quando as áreas lanosas do corpo estão afetadas. Nos rebanhos de camelos, a infecção se relaciona com secas e pobreza. Os isolados recentes de quelônios
podem representar uma espécie nova de Dermatophilus. Também é uma doença comum em crocodilos de fazenda (D. crododyli nov). Os poucos casos humanos descritos costumam se associar com a manipulação de animais doentes.
ETIOLOGIA, TRANSMISSÃO E EPIDEMIOLOGIA:  D. congolensis é um actinomiceto gram­positivo, anaeróbico facultativo e não ácido­resistente. É a única espécie atualmente aceita neste gênero, mas podem se encontrar presentes várias cepas
dentro de um grupo de animais durante um surto. Possui 2 formas morfológicas características – hifas filamentosas e zoósporos móveis. As hifas se caracterizam por filamentos ramificados (1 a 5 μm de diâmetro) que se fragmentam
fundamentalmente por septações transversais ou longitudinais, em conjuntos de células cocoides. As células cocoides amadurecem nos zoósporos ovoides flagelados (0,6 a 1 μm de diâmetro).
Desconhece­se o habitat natural do D. congolensis. As tentativas de isolá­lo do solo não foram bem­sucedidas, embora seja provavelmente um saprófita no solo. Acredita­se que seja disseminado por contato direto entre os animais, por
meio  de  ambientes  contaminados  ou  possivelmente,  por  picadas  de  insetos.  Foi  isolado  somente  do  tegumento  de  vários  animais  e  se  restringe  às  camadas  vivas  da  epiderme.  Os  animais  assintomáticos  cronicamente  infectados  são
considerados reservatórios primários.
Fatores como tempo prolongado de exposição à chuva, umidade e temperatura altas e ectoparasitas variados, que reduzem ou permeiam as barreiras naturais do tegumento, influenciam o desenvolvimento, a prevalência, a incidência
sazonal e a transmissão da dermatofilose. Carrapatos e piolhos são os principais fatores predisponentes em bovinos e ovinos, respectivamente.
O microrganismo pode permanecer na forma quiescente dentro da epiderme até que a infecção seja exacerbada por condições climáticas. As epidemias geralmente ocorrem durante a estação chuvosa. A umidade facilita a liberação de
zoósporos  das  lesões  preexistentes  e  a  penetração  subsequente  na  epiderme,  estabelece  um  novo  foco  de  infecção.  A  umidade  alta  também  contribui  indiretamente  para  a  disseminação  das  lesões  pelo  aumento  do  número  de  insetos
picadores, particularmente moscas e carrapatos, que atuam como vetores mecânicos. A infecção pode­se espalhar por meio de tosquia, banho de imersão ou introdução de um animal infectado em um rebanho ou lote.
Dermatofilose em equino. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

A dermatofilose é contagiosa somente porque qualquer redução na resistência cutânea sistêmica ou local favorece o estabelecimento da infecção e da doença subsequente.
PATOGÊNESE:  Para estabelecer a infecção, os zoósporos infecciosos devem alcançar um local da pele onde as barreiras protetoras normais se encontram reduzidas ou deficientes. O efluxo respiratório de baixas concentrações de dióxido de
carbono da pele atrai os zoósporos móveis para as áreas suscetíveis da superfície cutânea. Os zoósporos germinam para produzir hifas, que penetram na epiderme viva e subsequentemente alastram­se em todas as direções a partir do foco
inicial. A penetração das hifas causa reação inflamatória aguda. A resistência natural à infecção aguda se deve à fagocitose dos zoósporos infecciosos, mas quando a infecção se estabelece, há pouca ou nenhuma imunidade. Na maioria das
infecções agudas, a invasão filamentosa da epiderme interrompe­se em 2 a 3 semanas e as lesões cicatrizam espontaneamente. Nas infecções crônicas, os folículos pilosos infectados e as crostas constituem locais a partir dos quais ocorrem
invasões intermitentes dos folículos pilosos não infectados e da epiderme. O epitélio invadido se cornifica e se separa em forma de crosta. Nas crostas úmidas, a umidade potencializa a proliferação e a liberação de zoósporos das hifas. A
alta concentração de dióxido de carbono produzida pela densa população de zoósporos acelera o seu escape para a superfície cutânea, completando, portanto um ciclo de vida exclusivo.
ACHADOS CLÍNICOS:  A dermatofilose ocorre em animais de todas as idades, sendo mais prevalente nos animais jovens, cronicamente expostos à umidade e hospedeiros imunossuprimidos. As lesões no hospedeiro podem variar de agudas a
crônicas. Idade, sexo e raça parecem não acometer a suscetibilidade do hospedeiro. O prurido é variável. A maioria dos animais afetados recupera­se espontaneamente em até 3 semanas da infecção inicial (desde que uma maceração crônica
da pele não tenha ocorrido). Em geral, o início do tempo seco acelera a cicatrização. A resolução das lesões cutâneas não complicadas ocorre sem formação de cicatrizes. Estas infecções, em geral, possuem pequeno efeito na saúde geral.
Animais  com  graves  infecções  generalizadas,  muitas  vezes,  perdem  condição  e  há  dificuldade  na  movimentação  e  preensão  das  patas,  lábios  e  focinho;  estes  animais  são  frequentemente  enviados  para  o  abate  como  incuráveis.
Ocasionalmente. há mortes,  em  particular  de  bezerros  e  cordeiros,  por  causa  de doença generalizada com ou sem infecção bacteriana secundária e infestação secundária por moscas ou miíase. As principais consequências econômicas
incluem danos no couro dos bovinos, perda de lã nos ovinos e claudicação e queda do desempenho nos equinos que são gravemente afetados na região próxima à área da quartela. Os bovinos com lesões que envolvem > 50% da superfície
corporal são propensos à doença grave.
Lesões: Nos bovinos, ovinos e equinos, a distribuição das lesões macroscópicas geralmente se correlaciona com os fatores predisponentes que reduzem ou permeiam as barreiras naturais tegumentares. Nos bovinos, podem­se observar as
lesões em 3 estágios: (1) pelos emaranhados juntos, como lesões em “pincel”; (2) formação de crostas, à medida que as lesões iniciais coalescem; (3) acúmulos de material ceratinizado cutâneo, formando lesões verrucosas, com 0,5 a 2 cm
de diâmetro. As lesões típicas consistem em tufos em relevo e emaranhados de pelos. A maioria das lesões associadas a umedecimento prolongado da pele se distribui sobre a cabeça, superfícies dorsais do pescoço e do corpo e superfícies
laterais  superiores  do  pescoço  e  do  peito.  Os  bovinos  que  ficam  em  pé  por  longos  períodos  em  água  e  lama  profundas  desenvolvem  lesões  em  áreas  como  dobras  cutâneas  das  superfícies  flexoras  articulares.  Bovinos  de  leite  podem
apresentar lesões crostosas papulares no úbere. As lesões iniciadas por moscas picadoras (vetores mecânicos) são notadas primariamente no dorso, enquanto as induzidas por carrapatos ocorrem primariamente em cabeça, orelhas, axilas,
virilha e escroto.
As infecções crônicas de encaroçamento de lã se caracterizam por massas em forma de pirâmides, com material crostoso preso nas fibras de lã. As crostas ocorrem primariamente nas áreas dorsais corporais e impedem a tosquia do ovino;
as plantas espinhosas geralmente predispõem às lesões em lábios, pernas e patas. A strawberry footrot é uma dermatite proliferativa que acomete a pele da coroa do casco até o carpo ou o jarrete.
As lesões nos equinos com pelame de inverno longo são semelhantes às observadas nos bovinos, desenvolvendo­se como pelos emaranhados ou lesões em “pincel”, que levam à formação de crostas, com pus amarelo­esverdeado sob as
crostas maiores. No caso do pelame estival curto, o emaranhamento de pelos e a formação de crostas são incomuns; a perda de pelos, com efeito em “pincel” fino, pode ser extensa. O umedecimento persistente das quartelas em currais,
estábulos ou pastos úmidos leva à infecção no membro inferior; os membros brancos e as áreas de pele branca dos lábios e nariz são mais gravemente afetados. A doença generalizada também se associa com clima úmido prolongado.
Ocorrem surtos em haras com equinos previamente afetados.
O exame histopatológico das lesões revela as hifas ramificadas características com septações multidimensionais, células cocoides e zoósporos na epiderme. Os microrganismos costumam ser abundantes nas lesões ativas, mas podem ficar
esparsos ou ausentes nas lesões crônicas.
DIAGNÓSTICO:  O  diagnóstico  presuntivo  depende  amplamente  da  aparência  das  lesões  nos  animais  clinicamente  doentes  e  da  demonstração  do  D.  congolensis  em  esfregaços  corados  ou  cortes  histológicos  das  crostas.  O  diagnóstico
definitivo é realizado pela demonstração do microrganismos em preparações citológicas, isolamento por cultura e ou por biopsia de pele. Uma técnica de anticorpos fluorescentes indireta e um teste ELISA por diluição simples  foram
desenvolvidos para grandes pesquisas sorológicas e epidemiológicas. O teste diagnóstico mais prático é o exame citológico de crostas frescas e/ou imprints sob lesões recentemente avulsionadas. Crostas frescas são colocadas sobre uma
lâmina de microscópio com auxílio de uma lâmina de bisturi estéril junto a várias gotas de salina estéril. A lâmina é deixada secar ao ar e posteriormente corada com corante rápido de Giemsa ou Diff­Quik®. Os microrganismos são vistos
sob a imersão em óleo como 2 a 6 fileiras paralelas de cocos Gram­positivos que parecem pistas de ferrovia. Os diagnósticos diferenciais são: dermatomicoses na maioria das espécies, dermatopatias verrucosas ou com encaroçamento nos
bovinos; ectima contagioso e dermatose ulcerativa nos ovinos e dermatofitose e doenças descamativas imunomediadas nos equinos (p. ex., pênfigo foliáceo).
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Antigamente  pensava­se  que,  como  os  animais  agudamente  infectados  melhoravam  rápida  e  espontaneamente,  o  tratamento  era  indicado  apenas  por  motivos  cosméticas  nos  animais  de  produção­abate.
Entretanto, em algumas partes do mundo, a doença associa­se a mortalidade e morbidade significativas, perda de condição corporal, diminuição da produção de leite e aumento das contagens de células somáticas do leite. O tratamento é
recomendado  para  equinos  porque  estas  lesões  interferem  no  seu  uso  e  são  dolorosas.  Os  microrganismos  são  suscetíveis  a  uma  ampla  variedade  de  antibióticos:  eritromicina,  espiramicina,  penicilina  G,  ampicilina,  cloranfenicol,
estreptomicina, amoxicilina, tetraciclinas e novobiocina. Duas doses de oxitetraciclina de longa ação (20 mg/kg) com intervalo de um dia, demonstrou ser eficaz na cura de 85% dos bovinos e 100% dos ovinos, comparados com a cura de
71% (bovinos) e 80% (ovinos) que recebiam dose única. Nos animais de produção­abate, aplicações tópicas de calda sulfocáustica são adjuvantes à terapia antibiótica com custo­benefício. Inseticidas aplicados externamente são utilizados
frequentemente para controlar os insetos mordedores.
Em equinos, as lesões devem ser gentilmente umedecidas e removidas. A terapia tópica com xampus antibacterianos é efetiva como adjuvante terapêutico. Recomendam­se clorexidina e peróxido de benzoíla. O tratamento tópico com
iodo­povidona é superior ao tratamento único com oxitetracicilina parenteral (100 a 66% de eficácia, respectivamente).
O isolamento dos animais clinicamente afetados, o descarte dos animais afetados e o controle dos ectoparasitas constituem métodos utilizados para interromper o ciclo infeccioso. É importante evitar a maceração crônica da pelo e manter
os animais secos. Os níveis de zinco devem ser avaliados na alimentação dos bovinos, uma vez que deficiências de zinco foram associadas a surtos.
RISCO ZOONÓTICO:  A dermatofilose pode ser transmitida aos humanos. O contato direto com animal infectado pode provocar infecções nas mãos e braços. Animais afetados devem ser manipulados com luvas e recomenda­se a higiene das
mãos com sabonetes antibacterianos após o contato com animais infectados.

EPIDERMITE EXSUDATIVA (Doença do suíno gorduroso)

A epidermite exsudativa é uma dermatite generalizada que ocorre em suínos com 5 a 60 dias de vida e é caracterizada por início súbito, com morbidade de 10 a 90% e mortalidade de 5 a 90%. A forma aguda geralmente acomete leitões
lactentes, enquanto a forma crônica é mais comumente observada em leitões desmamados. Ela é descrita na maioria das áreas criadoras de suínos do mundo.
As lesões são causadas por Staphylococcus hyicus, que pode produzir uma toxina esfoliativa, porém parece incapaz de penetrar na pele intacta. Existem cepas virulentas e avirulentas. Abrasões nas patas e pernas ou lacerações no corpo
precedem a infecção. Tais lesões costumam ser provocadas por brigas ou superfícies abrasivas, como concreto novo. Os outros fatores predisponentes que podem acometer a gravidade e o progresso da doença incluem imunidade, higiene,
nutrição e a presença de ácaros da sarna ou qualquer dano à pele. Porcas adultas, que adquiriram alto nível de imunidade oriunda de exposição prévia, providenciarão proteção aos filhotes via colostro. A incidência geralmente é maior em
leitegadas ninhadas e em suínos livre de patógenos (SPF) recentemente introduzidos em rebanhos nos quais a maioria das reprodutoras é de primeira cria.
Os suínos desenvolvem resistência com a idade, mas é possível isolar S. hyicus da pele dos suínos idosos, da vagina das porcas e do divertículo prepucial dos cachaços. Esses portadores inaparentes servem como fonte de contaminação
para os rebanhos suscetíveis. Os suínos lactentes geralmente são infectados por suas mães, em alguns casos durante o nascimento, pelas porcas com infecção vaginal ou pelos locais de parição contaminados. Leitões lactentes são mais
comumente e gravemente afetados, mas ocorre infecção cruzada depois da mistura com outros leitões no desmame, com taxa de morbidade de até 80%. Entretanto, a mortalidade é normalmente baixa nesta faixa de idade. A incidência
parece aumentar com o aumento das densidades nas unidades de produção e possivelmente com o desmame precoce.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  Os primeiros sinais incluem apatia e eritema cutâneo em 1 ou mais leitões da leitegada. Os suínos afetados ficam rapidamente deprimidos e recusam a se alimentar. A temperatura corporal pode aumentar no
início da doença, mas depois permanece quase normal. A pele torna­se espessa e com manchas marrom­avermelhadas (máculas) ao redor de olhos, nariz, lábios e orelhas, das quais exsuda soro e sebo. As lesões aumentam de tamanho e
desenvolvem aparência vesicular ou pustular.
Epidermite exsudativa subaguda em face, membros e abdome ventral, em leitões lactentes. Cortesia do Dr. Ranald D. A. Cameron.

O corpo é rapidamente coberto com exsudato gorduroso e úmido de sebo e soro, que se torna crostoso. O acúmulo de sujeira confere uma coloração preta à área afetada. Também se desenvolvem vesículas e úlceras no disco nasal e na
língua. As patas quase sempre estão envolvidas, com erosões na faixa coronal e no talão; pode­se perder o casco, em casos raros. Na doença aguda, ocorre morte dentro de 3 a 5 dias. Nos animais idosos, a forma crônica da doença é
observada como lesões espetas e crostosas no corpo todo ou lesões discretas circunscritas, que não coalescem. A mortalidade é baixa, exceto quando os suínos comprometidos são bastante jovens e lactentes. Entretanto, a recuperação é
lenta e o crescimento é retardado e frequentemente associado à diarreia, emaciação e desidratação.
A necropsia dos suínos gravemente afetados revela desidratação acentuada, congestão pulmonar e inflamação nos linfonodos periféricos. Distensão dos rins e ureteres, com muco, cilindros e restos celulares celulares é comum nas formas
superaguda e aguda da doença. O diagnóstico diferencial deve ser feito com: sarna sarcóptica, deficiências nutricionais inclusive zinco (paraqueratose), dermatofitose e pitiríase rosa.
TRATAMENTO:  Muitos antibióticos inibem o microrganismo causador, como: amoxicilina, ampicilina, eritromicina, lincomicina, penicilina, tilosina, trimetoprima­sulfonamida, aminoglicosídios e cefalosporinas. O tratamento bem­sucedido
requer que o antimicrobiano seja administrado em altas doses no início da doença e pelo período de 7 a 10 dias. O êxito é maior quando se combina a terapia antimicrobiana com aplicações diárias de antissépticos em toda a superfície
corporal. O tratamento é menos eficaz nos suínos muito jovens e é ineficaz nos casos avançados. Nos surtos graves, os suínos contactantes também devem receber antibióticos por vários dias. As porcas parturientes e as suas instalações
devem ser desinfetadas completamente para evitar surtos. Higiene nas instalações de desmame e uso estratégico de medicamento na água ou no alimento por 3 a 5 dias ajudam a controlar surtos depois do desmame. Outros procedimentos
que podem diminuir a gravidade do surto são: corte dos dentes pontiagudos dos suínos recém­nascidos, fornecimento de cama macia, isolamento dos animais infectados e evitar a mistura de animais para diminuir o risco de lesões cutâneas
por brigas. Bacterinas autógenas foram utilizadas com algum êxito na redução da incidência da doença nos rebanhos cronicamente infectados.

FURUNCULOSE INTERDIGITAL

Os  furúnculos  interdigitais,  frequentemente  e  incorretamente  denominados  “cistos  interdigitais”,  são  lesões  nodulares  dolorosas  localizadas  nas  membranas  interdigitais  dos  cães.  Histologicamente,  estas  lesões  representam  áreas  de
inflamação piogranulomatosa nodular, que quase nunca são císticas. A síndrome dos cistos foliculares e comedões plantar ou palmar interdigital canina, recentemente reconhecida, pode ser um subtipo de furúnculos interdigitais ou uma
doença isolada.
ETIOLOGIA:  A causa mais comum é infecção bacteriana profunda. Muitas raças caninas (p. ex., shar­pei chinês, labrador retriever e buldogue inglês) são predispostas à furunculose interdigital bacteriana devido aos pelos eriçados e curtos
localizados na membrana entre os dedos ou à membrana interdigital proeminente ou a ambos. As hastes curtas dos pelos são facilmente forçadas para trás, no interior dos folículos pilosos, durante a locomoção (implantação traumática). O
pelo, ou seja, a queratina, facilita muito a inflamação da pele, sendo comuns infecções bacterianas secundárias. Menos comumente, corpos estranhos se encravam na pele. Demodiciose (p. 1022) pode ser uma causa primária de furunculose
interdigital. Dermatite atópica canina (p. 909) também constitui uma causa comum de furunculose interdigital recidivante.
A  etiologia  dos  comedões  e  cistos  plantares  e  palmares  interdigital  canino  é  indeterminada,  porém  provavelmente  relaciona­se  a  traumas,  resultando  em  hiperqueratose  infundibular  folicular  e  epidérmico,  acantose,  obstrução  ou
estreitamento da abertura folicular e retenção do conteúdo folicular.
ACHADOS CLÍNICOS E LESÕES:  As  lesões  iniciais  da  furunculose  interdigital  podem  aparecer  como  áreas  focais  ou  generalizadas  de  eritema  e  pápulas  na  membrana  das  patas  que,  se  forem  deixadas  sem  tratamento,  se  desenvolverão
rapidamente  em  nódulos  únicos  ou  múltiplos.  Os  últimos  costumam  ter  1  a  2  cm  de  diâmetro  e  são  roxo­avemelhados,  brilhantes  e  flutuantes;  podem  se  romper  quando  palpados  e  exsudar  um  material  sanguinolento.  Furunculose
interdigital é mais comumente notada no aspecto dorsal da pata, mas também pode ser notada ventralmente. As lesões costumam ser dolorosas e o cão obviamente pode claudicar com a(s) pata(s) afetada(s), lamber e morder as lesões. As
lesões causadas por corpo estranho (p. ex., barba de capim) são em geral solitárias e ocorrem frequentemente na pata dianteira; a recorrência não é comum nesses casos. Se a furunculose interdigital for causada por bactérias, poderá haver
vários nódulos, com lesões novas se desenvolvendo a medida que as outras se resolvem. Uma causa comum de recorrência é a reação granulomatosa à presença de queratina livre nos tecidos.
Os  cães  com  comedões  e  cistos  foliculares  interdigitais  tipicamente  apresentam  caudicação  e  tratos  drenantes.  As  lesões  de  pele  não  são  frequentemente  observadas,  a  menos  que  o  pelame  seja  aparado.  Áreas  de  alopecia  e  pele
semelhante a calos, firme e espessa, com comedões múltiplos são característicos.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico da furunculose é realizado somente com base nos sinais clínicos. Os principais diagnósticos diferenciais são lesões traumáticas, corpos estranhos, cistos e comedões foliculares e neoplasias, embora as últimas
sejam raras. Os testes diagnósticos mais úteis incluem raspados cutâneos para ácaros Demodex, imprints ou aspirados com agulha fina para confirmar a presença de infiltrado inflamatório. As lesões incomuns ou recidivantes devem ser
excisadas para exame histopatológico. As lesões solitárias podem exigir uma exploração cirúrgica para encontrar e remover os corpos estranhos, como barbas de capim.
O  diagnóstico  definitivo  dos  cistos  foliculares  plantares  ou  palmares  requer  biopsia  cutânea.  Entretanto,  suspeita­se  quando  o  exame  clínico  revela  tratos  drenantes  associados  às  lesões  semelhantes  a  calos  ou  formação  óbvia  de
comedões. São notados hiperqueratose compacta moderada a extensa e acantose da epiderme e infundíbulo folicular. Cistos foliculares constituídos por queratina são comuns. Frequentemente as lesões são complicadas infecção secundária
e furunculose bacteriana concomitante.
TRATAMENTO:  Os furúnculos interdigitais respondem melhor à combinação de terapias tópica e sistêmica. Recomenda­se a cefalexina (20 mg/kg VO, 3 vezes/dia ou 30 mg/kg VO, 2 vezes/dia) por 4 a 6 semanas na terapia inicial. Caso o
cão tenha recebido múltiplas terapias antimicrobianas, recomenda­se cultura bacteriana e antibiograma. Como as lesões são piogranulomatosas, a penetração do antibiótico pode ser difícil; portanto, podem ser necessárias > 8 semanas de
terapia antimicrobiana sistêmica para que as lesões se curem completamente. Com frequência, tais lesões são complicadas por infecções concomitantes por Malassezia spp. Cetoconazol, itraconazol ou fluconazol oral (5 a 10 mg/kg) por 30
dias pode ser indicado. A presença de Malassezia pode ser comprovada por exames citológicos de restos celulares do leito ungueal e/ou imprints da pele. Recomendam­se imersão das patas em água morna, com ou sem solução antibiótica
(p. ex., clorexidina) e aplicação de pomada de mupirocina. Alguns cães podem se beneficiar de faixas e bandagens com antibióticos. Anti­histamínicos administrados nas primeiras semanas de tratamento pode aliviar parcialmente o prurido,
se houver. Glicocorticoides são contraindicados.
A  furunculose  interdigital  recidivante  crônica  geralmente  ser  causada  por  terapia  antimicrobiana  inapropriada  (demasiadamente  curta,  dose  ou  medicamento  incorretos),  administração  concomitante  de  corticosteroides,  demodiciose,
predisposição  anatômica  ou  reação  de  corpo  estranho  à  queratina.  As  lesões  que  recidivam  apesar  da  terapia  também  podem  constituir  um  sinal  de  doença  subjacente,  por  exemplo,  atopia,  hipotireoidismo  ou  infecção  intercorrente
de Malassezia. As lesões nos cães confinados provavelmente recidivarão, a menos que se remova o animal das superfícies de arame ou de concreto. Em alguns casos crônicos, pode ser necessária excisão ou correção cirúrgica da membrana
interdigital, com podoplastia de fusão. Alternativamente, pulsoterapia antibiótica (terapia com a dose completa, 2 a 3 vezes/semana) ou terapia antibiótica crônica com dose baixa (p. ex., 500 mg/cão VO, 1 vez/dia) pode ajudar a manter a
remissão dos sinais e causar alívio da dor nos cães com lesões crônicas. Esta terapia é recomendada somente quando a causa incitante não é identificada (p. ex., piodermite idiopática), tratada (p. ex., predisposição anatômica) ou resolvida
(p. ex., infecções crônicas causadas por corpo estranho ou queratina).
O tratamento dos comedões ou cistos foliculares plantares ou palmares interdigitais pode ser efetuado efetivamente com terapia a laser. Os cuidados pós­operatórios são intensivos com hidroterapia e trocas de bandagens 1 a 2 vezes/dia.

PIODERMITE

Piodermite literalmente significa “pus na pele” e pode ser causada por lesões infecciosas, inflamatórias e/ou neoplásicas; qualquer condição que resulte em um acúmulo de exsudato neutrofílico pode ser denominada piodermite. Entretanto,
piodermite refere­se mais comumente a infecções bacterianas da pele. As piodermites são comuns nos cães e menos comuns em gatos.
Piodermites bacterianas são classificadas de acordo com a profundidade da infecção, a etiologia e se são primárias ou secundárias. Piodermites bacterianas, limitadas a epiderme e folículos pilosos, são classificadas como superficiais,
enquanto as que envolvem a derme profunda ou causam furunculose são classificadas como profundas. A classificação etiológica refere­se ao organismo patogênico envolvido na infecção (p. ex., estafilococos, estreptococos etc.). A maior
parte das infecções cutâneas é superficial e secundária a qualquer uma de várias outras afecções, mais notadamente alergias (alergia a pulgas, dermatite atópica ou alergias alimentares), doenças internas (particularmente endocrinopatias,
como hipotireoidismo ou hiperadrenocorticismo), afecções seborreicas (como doenças foliculares ou das glândulas sebáceas), doenças parasitárias (p. ex., Demodex canis) ou predisposições anatômicas (p. ex., dobras de pele). Por outro
lado, a piodermite primária ocorre em animais saudáveis, sem causa predisponente identificável; cura­se completamente com antibióticos apropriados e em geral se deve a Staphylococcus intermedius ou outros estafilococos.
ETIOLOGIA:   Piodermite  bacteriana  é  normalmente  desencadeada  pelo  supercrescimento/supercolonização  da  flora  normal  residente  ou  transitória.  S.  intermedius  é  o  agente  etiológico  mais  comumente  isolado  das  infecções  clínicas.
Entretanto, a classificação está mudando e testes fenotípicos recentes encontraram que S. pseudointermedius é o patógeno mais comum dos cães.
Também são bactérias residentes normais na pele canina: estafilococos coagulase­negativos, estreptococos, Micrococcus sp e Acinetobacter sp. Bactérias transitórias na pele canina são: Bacillus sp, Corynebacterium sp, Escherichia coli,
Proteus mirabilis e Pseudomonas sp. Esses microrganismos podem exercer um papel como patógenos secundários, mas frequentemente o S. intermedius é requerido para assegurar o processo patológico. As bactérias residentes normais na
pele  felina  são:  Acinetobacter  sp,  Micrococcus  sp,  estafilococos  coagulase­negativos  e  estreptococos  a­hemolíticos.  As  bactérias  transitórias  na  pele  felina  são:  Alcaligenes  sp,  Bacillus  sp,  Escherichia  coli,  Proteus  mirabilis,
Pseudomonas sp, estafilococos coagulase­positivos e coagulase­negativos e estreptococos a­hemolíticos.
O fator mais importante nas piodermites superficiais, que permite que uma bactéria colonize a pele, é a aderência ou “viscosidade” bacteriana aos ceratinócitos. As áreas úmidas e quentes na pele, como as dobras de pele, dobras faciais,
dobras do pescoço, áreas axilares, áreas interdigitais dorsais ou plantares, dobras vulvares e dobras da cauda frequentemente apresentam contagens bacterianas mais altas que as outras áreas da pele, com maior risco de infecção. Os pontos
de pressão, como cotovelos e jarretes, são propensos a infecções, talvez por irritação e ruptura foliculares devido à pressão repetida crônica. Qualquer doença de pele que mude o ambiente normalmente seco semelhante a um deserto para
um ambiente mais úmido pode predispor o hospedeiro a uma supercolonização da pele com bactérias residentes ou transitórias.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   O  sinal  clínico  mais  comum  de  piodermite  bacteriana  em  cães  e  gatos  é  a  descamação  excessiva;  escamas  estão  sempre  permeadas  por  pelos.  O  prurido  é  variável.  Em  cães,  a  piodermite  superficial
comumente  aparece  como  áreas  multifocais  de  alopecia,  pápulas  ou  pústulas  foliculares,  colaretes  epidérmicos  e  crostas  serosas.  O  tronco,  a  cabeça  e  as  extremidades  proximais  são  as  áreas  mais  afetadas.  As  raças  de  pelo  curto
frequentemente apresentam pápulas superficiais múltiplas que parecem semelhantes a uma urticária, pois a inflamação nos folículos e regiões adjacentes faz com que os pelos fiquem mais eretos. Geralmente os pelos possuem epilação
facilitada, característica importante que ajuda a distinguir a piodermite superficial da urticária verdadeira, na qual os pelos não epilam. Na piodermite bacteriana, os pelos afetados caem e progridem para áreas de alopecia focais de 0,5 a 2
cm de diâmetro. Nas margens destas áreas de perda de pelo, a formação suave de colaretes epidérmicos pode estar presente, mas pústulas foliculares e eritema são sempre ausentes em raças de pelo curto, dificultando o diagnóstico. Collies
e pastores de Shetland frequentemente apresentam áreas difusas de alopecia generalizada, com eritema suave e formação de colaretes epidérmicos na borda da área expandida, mimetizando frequentemente uma endocrinopatia. Raramente
se encontram pústulas e crostas.
Os sinais de dermatite profunda em cães são dor, crostas, odor e exsudação de sangue e pus. Eritema, inchaço, ulcerações, crostas hemorrágicas e bolhas, alopecia e tratos drenantes com exsudato serohemorrágico ou purulento também
podem estar presentes. Pode haver envolvimento de qualquer área, porém regiões como ponta do focinho, queixo, cotovelos, jarretes, áreas interdigitais e as soldras laterais são mais propensos a infecções profundas. Granulomas acrais por
lambedura e áreas de dermatite piotraumática também são manifestações clínicas de piodermite profunda. Furunculose interdigital (p. 918) é outra manifestação de piodermite profunda. Arestas de vegetais, queratina descamada das hastes
pilosas ou de folículos pilosos rompidos e outros corpos estranhos tem importante papel na reação inflamatória associada às piodermites profundas.
A piodermite superficial em gatos geralmente é causada por Staphylococcus intermedius e quase sempre é negligenciada e pouco diagnosticada. O sinal clínico mais comum é descamação, particularmente sobre toda a área lombossacral;
escamas permeadas nos pelos são sinais comuns. Raramente encontram­se pústulas intactas. Pioderma felino é uma condição comum em alergopatias cutâneas, doenças parasitárias e acne mentoniana felina.
Dermatite miliar pode ser uma manifestação clínica de piodermite superficial. Gatos com piodermites profundas se apresentam frequentemente com alopecia, ulcerações, crostas hemorrágicas e tratos drenantes. Placas eosinofílicas são
apresentações clínicas comuns de piodermite profunda secundária a doenças alérgicas. Piodermites profundas recidivantes não curáveis em gatos podem estar associadas a doenças sistêmicas, como infecções por vírus da imunodeficiência
felina ou leucemia viral felina ou micobacteriose atípica.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico de piodermite superficial geralmente é realizado pelos sinais clínicos – perda de pelo, escamas, eritema, pápulas, pústulas e colaretes epidérmicos. Os diagnósticos diferenciais da piodermite superficial são:
demodiciose, dermatite por Malassezia, dermatofitose e outras causas de foliculite, bem como doenças incomuns formadoras de crostas, como o pênfigo foliáceo. O diagnóstico da piodermite também deve incluir passos para identificar
quaisquer causas predisponentes.
A identificação das lesões dermatológicas descritas anteriormente permite um diagnóstico presuntivo de piodermite superficial. Os imprints diretos das pústulas intactas, das áreas subjacentes às crostas ou aos colaretes epidérmicos ou
das áreas eritematosas úmidas podem identificar cocos, bastonetes ou infiltrados de células inflamatórias. Os imprints das áreas de perda de pelos e escamas podem somente revelar grande número de ceratinócitos descamativos. Umas das
razões mais importantes de se fazer o decalque é determinar se há infecção intercorrente por Malassezia ou se há colonização excessiva; há uma relação simbiótica entre Staphylococcus e Malassezia, e ambos são notados em cerca de 50%
dos casos. A infecção não se resolverá sem terapia antimicrobiana sistêmica. São necessários vários raspados cutâneos profundos para descartar as infecções parasitárias, em particular Demodex canis. Deve ser feita cultura fúngica para
descartar dermatofitose. Obrigatoriamente devem­se realizar testes de cultura bacteriana e antibiogramas nos casos de piodermite profunda e piodermite superficial recidivantes.
Resultados mais precisos dos testes são obtidos diante pústulas intactas ou da ruptura induzida de lesões profundas. É necessário cuidado na interpretação dos resultados de cultura das amostras de lesões com crostas, pápulas, colaretes
epidérmicos e tratos fistulosos porque a contaminação é mais provável do que a de amostras obtidas de lesão fechada. Terapia antimicrobiana empírica é apropriada nas piodermites superficiais leves e de primeira infecção, sem nenhum
fator complicador.
As  condições  subjacentes  desencadeadoras  mais  comuns  para  a  piodermite  superficial  são  pulgas,  dermatite  alérgica  a  pulga,  atopia,  alergia  alimentar,  hipotireoidismo,  hiperadrenocorticismo  e  maus  cuidados.  Testes  diagnósticos
apropriados e tratamento destas condições predisponentes são obrigatórios. As causas mais comuns de piodermite bacteriana recidivante são falha na identificação destas condições predisponentes, terapia antimicrobiana não apropriada
(dose muito baixa ou duração muito curta da terapia), uso concomitante de glicocorticoides, antibiótico inapropriado ou dose incorreta.
TRATAMENTO:  O tratamento primário da piodermite superficial deve ser realizado com antibióticos apropriados por = 21 dias e preferencialmente, por 30 dias. Todas as lesões clínicas (exceto o recrescimento completo das áreas alopécicas
e a resolução das áreas hiperpigmentadas) devem estar resolvidas pelo menos 7 dias antes da interrupção dos antibióticos. As piodermites profundas, crônicas e recidivantes normalmente exigem 8 a 12 semanas ou mais para a resolução
completa.
Piodermites  bacterianas  que  aparecem  pela  primeira  vez  podem  ser  tratadas  com  terapia  antibiótica  empírica,  com  lincomicina,  clindamicina,  eritromicina,  sulfametoxazol­trimetoprima,  trimetoprima­sulfadiazina,  cloranfenicol,
cefalosporinas, amoxicilina com ácido clavulânico triidratado ou sulfadimetoxina­ormetoprima.
Amoxicilina, penicilina e tetraciclina são escolhas inapropriadas para o tratamento da piodermite superficial ou profunda porque não são efetivas em 90% dos casos. Fluorquinolonas não devem ser utilizadas como terapia empírica.
Piodermite profunda grave, piodermite recidivante ou piodermites bacterianas de primeira infecção que não respondem a terapia devem ser tratadas com base nas culturas e antibiogramas.
Os antibióticos tópicos podem ser úteis na piodermite superficial focal. Pomada de mupirocina a 2% penetra bem na pele e é útil na piodermite profunda, não é sistemicamente absorvida, não apresenta nenhuma sensibilização por contato
e não é utilizada como um antibiótico sistêmico, o que aumentaria a probabilidade de resistência cruzada. Não é muito eficaz contra bactérias Gram­negativas. A pomada não deve ser utilizada em gatos com algum histórico ou suspeita de
doença renal porque a preparação contém propilenoglicol. A neomicina provavelmente causa mais alergia por contato que as outras substâncias tópicas e possui uma eficácia variável contra as bactérias Gram­negativas. A bacitracina e a
polimixina B são mais eficazes contra as bactérias Gram­negativas que os outros antibióticos tópicos, mas são inativadas nos exsudatos purulentos.
A atenção com a higiene com frequência é negligenciada no tratamento da piodermite superficial e profunda. O pelo deve ser cortado em pacientes com piodermite profunda e cuidados profissionais de higiene são recomendados para
cães de pelagem média a longa com piodermite superficial generalizada. Isso removerá o excesso de pelos, que acumulam resíduos e bactérias e facilitará a higiene. Gatos de pelo longo também se beneficiaram do corte dos pelos.
Cães com piodermite superficial devem ser banhados 2 a 3 vezes/semana durante as primeiras 2 semanas de terapia e depois 1 a 2 vezes até a infecção ser resolvida. Cães com piodermite profunda podem precisar de hidroterapia diária.
Xampus medicamentosos podem ser pré­diluídos na proporção 1:2 até 1:4 antes da aplicação para facilitar ensaboar, espalhar e enxaguar. Xampus antibacterianos apropriados são: peróxido de benzoíla, clorexidina, clorexidina­cetoconazol,
lactato de etila e triclosana. A terapia com xampu ajudará a remover bactérias, crostas e escamas, bem como a reduzir prurido, odor e oleosidade associados à piodermite. A melhora clínica na piodermite superficial pode não ser evidente
antes de 14 a 21 dias e a recuperação pode não ser tão rápida como esperada.
Há preocupação crescente no desenvolvimento de estafilococos resistentes à meticilina (MRS). Para minimizar o desenvolvimento de MRS, devem­se utilizar antibióticos de menor espectro no tratamento das piodermites. Piodermite
bacteriana  recidivante,  pioderma  profundo  e/ou  pacientes  com  histórico  de  uso  extensivo  de  antibióticos  são  tratados  da  melhor  forma,  baseados  nos  resultados  da  cultura  e  antibiograma.  Terapia  antimicrobiana  tópica  agressiva
concomitante é útil. Evitar o uso de fluorquinolonas e cefalosporinas de segunda e terceira geração como terapia empírica é importante para minimizar o desenvolvimento de estafilococos multirresistentes.

DERMATOFITOSE (Tinha)

Dermatofitose é uma infecção de tecidos ceratinizados (pele, pelos e unhas) por 1 dos 3 gêneros de fungos coletivamente denominados de dermatófitos – Epidermophyton, Microsporum e Trichophyton (ver infecções fúngicas, p. 679). Estes
fungos  patogênicos  são  notados  mundialmente  e  todos  os  animais  domésticos  são  suscetíveis.  Nos  países  desenvolvidos,  as  maiores  consequências  econômicas  e  de  saúde  pública  provêm  da  dermatofitose  dos  gatos  domésticos  e  dos
bovinos. Umas poucas espécies de dermatófitos são habitantes do solo (geofílicos), por exemplo, M. gypseum e T. terrestre e causam doença nos animais expostos ao solo, por cavar ou revirar o solo. Outras espécies são adaptadas ao
hospedeiro  humano  (antropofílicas),  por  exemplo,  M.  audouinii  e  T.  rubrum  e  raramente  infectam  outros  animais.  Os  patógenos  animais  mais  importantes  mundialmente  são  M.  canis,  M.  gypseum,  T.  mentagrophytes,  T.  equinum,  T.
verrucosum e M. nanum. Estas espécies são zoonóticas, especialmente as infecções por M. canis nos gatos domésticos e por T. verrucosum nos bovinos e cordeiros. As espécies zoofílicas são transmitidas primariamente pelo contato com
indivíduos infectados e fômites contaminadas, como móveis, ferramentas de higiene ou cravos de ferradura. A exposição ao dermatófito nem sempre resulta em infecção. O estabelecimento da infecção dependerá de vários fatores, como a
espécie fúngica, idade do hospedeiro, imunocompetência, condição das superfícies cutâneas expostas, comportamento de higiene do hospedeiro e estado nutricional. A infecção deflagra a imunidade específica, tanto humoral como celular,
que confere uma resistência incompleta e de curta duração à infecção ou doença subsequente.
Na maioria das circunstâncias, os dermatófitos crescem somente nos tecidos ceratinizados e a infecção em avanço para quanto atinge as células vivas ou um tecido inflamado. A infecção começa em um pelo em crescimento ou no estrato
córneo, onde se desenvolvem hifas cordoniformes dos artrósporos infectantes ou dos elementos hifais fúngicos. As hifas podem penetrar na haste pilosa e a enfraquecer, o que, acrescido de inflamação folicular, leva ao sinal clínico comum
de queda macular de pelos. À medida que a infecção amadurece, desenvolvem–se grupos de artrosporos na superfície externa das hastes pilosas infectadas. Os pelos quebrados com esporos associados constituem fontes importantes para a
propagação  da  doença.  Conforme  se  desenvolvem  a  inflamação  e  a  imunidade  do  hospedeiro,  a  disseminação  da  infecção  é  inibida,  embora  esse  processo  possa  durar  várias  semanas.  Portanto,  para  a  maioria  dos  hospedeiros  adultos
saudáveis, as dermatofitoses são autolimitantes. Nos animais jovens ou debilitados e em alguma extensão nos Yorkshire terriers e nas raças de pelo longo de gatos domésticos, a infecção pode ser persistente e disseminada.
A dermatofitose é diagnosticada por meio de cultura fúngica, exame com lâmpada de Wood e exame microscópico direto dos pelos ou das escamas cutâneas. A cultura fúngica constitui o meio diagnóstico mais preciso. Pode­se utilizar o
meio de teste dermatofítico (MTD) no contexto clínico. As lesões escolhidas devem ter o pelo depilado no comprimento de cerca de 0,3 cm. A área deve ser gentilmente atingida com uma esponja umedecida com álcool e depois deve ser
seca, para reduzir a contaminação com fungos saprófitas. Devem­se coletar restos de pelos e escamas cutâneas para colocação no ágar, que deve ser depois folgadamente coberto para evitar o ressecamento. A incubação em temperatura
ambiente é suficiente, exceto quando se cultiva T. verrucosum dos alimentos dos animais de produção ou de lã, em casos nos quais se torna necessária incubação a 37°C. T. equinum requer ácido nicotínico se a cultura for de crescimento
primário e alguns isolamentos de T. verrucosum requerem tiamina ou tiamina e inositol.
O crescimento dermatofítico geralmente ficar aparente em 3 a 7 dias, mas pode exigir até 3 semanas em qualquer tipo de MTD. Os dermatófitos que crescem no MTD fazem com que o meio mude para vermelho no momento da primeira
formação de colônia visível. Os fungos dermatofíticos possuem micélios felpudos a granulares, com coloração branca a amarelada. As colônias contaminantes saprófitas são brancas ou pigmentadas e quase nunca produzem mudança de
coloração inicial no MTD. O diagnóstico definitivo e a identificação da espécie requerem a remoção das hifas e dos macroconídeos da superfície da colônia com uma fita de acetato e exame microscópico com coloração com azul de
algodão lactofenólico.
A lâmpada de Wood é útil nos exames de triagem para infecções por M. canis nos gatos e cães. Os pelos infectados fluorescem em verde­amarelado; no entanto, somente = 50% das infecções por M. canis fluorescem e as outras espécies
fúngicas nos animais não o fazem. Portanto, os exames com lâmpada de Wood negativos não são significativos. Podem ocorrer exames falso­positivos, especialmente nas dermatopatias seborreicas oleosas. Devem­se sempre cultivar os
pelos fluorescentes para confirmar o diagnóstico.
O exame microscópico direto dos pelos ou dos raspados cutâneos pode permitir um diagnóstico precoce pela demonstração das hifas ou dos artrósporos característicos na amostra. Esta técnica é mais útil no diagnóstico da dermatofitose
nos grandes animais do que nos pequenos. Devem­se examinar os pelos (preferivelmente os brancos) e os raspados provenientes da periferia das lesões, quanto a elementos fúngicos, em uma preparação úmida de hidróxido de potássio a
20% que tenha sido aquecida suavemente ou incubada em uma câmara de umidade durante a noite.
Há um teste sorológico de ELISA, para o diagnóstico da dermatofitose canina, desenvolvido para pesquisa, no entanto ainda não está disponível comercialmente. A sensibilidade e especificidade são altas e semelhantes à obtida por
cultura  em  MTD,  porém  resultados  positivos  podem  ser  observados  após  a  eliminação  da  infecção  por  dermatófitos.  A  reação  cruzada  com  outros  dermatófitos  não  permite  a  identificação  das  espécies,  o  que  é  importante  para  a
identificação da fonte de infecção.

Bovinos
Trichophyton  verrucosum  é  causa  frequente  de  dermatofitose  nos  bovinos,  porém  também  foram  isolados  T.  mentagrophytes,  T.  equinum,  Microsporum  gypseum,  M.  nanum,  M.  canis  e  outros.  A  dermatofitose  é  mais  comumente
reconhecida nos bezerros, nos quais as lesões perioculares não pruriginosas são mais características, embora geralmente possa se desenvolver uma dermatopatia generalizada. Relata­se que vacas e novilhas desenvolvem lesões com maior
frequência no peito e nos membros e os touros, na barbela e na pele intermaxilar. As lesões são características e discretas, constituídas por placas descamativas de queda de pelos, com formação de crostas branco­acinzentadas, mas algumas
apresentam­se com crostas espetas supurativas. A tinha, como um problema de saúde de rebanho, é mais comum no inverno e mais comumente reconhecida nos climas temperados e nas raças bovinas inglesas do que nas zebuínas.
Muitos tratamentos tópicos são realizados com êxito nos bovinos, mas como a recuperação espontânea é comum, é difícil comprovar a eficácia. Os animais valiosos ainda devem ser tratados individualmente, pois isso pode limitar a
progressão das lesões existentes e a propagação para outros no rebanho. As crostas espetas devem ser removidas gentilmente com uma escova e o material deve ser queimado ou desinfetado com solução de hipoclorito. As opções de
tratamento dependem das limitações no uso de alguns agentes nos animais destinados para abate. Os agentes descritos como úteis são: os lavados ou sprays de cal de enxofre 4%, de hipoclorito de sódio 0,5% (alvejante doméstico em 1:10),
clorexidina 0,5%, povidona–iodo 1%, natamicina e enilconazol. As lesões individuais podem ser tratadas com loções de miconazol ou clotrimazol. Encontra­se em uso uma vacina fúngica atenuada em alguns países exceto nos EUA; a
vacina tem sido utilizada nos programas de controle e erradicação, com diminuição do número de novos rebanhos infectados. A duração da imunidade é longa; A vacina previde o desenvolvimento das lesões clínicas, transmissão a outros
animais e contaminação ambiental. O programa de vacinação combinado com um protocolo de limpeza e desinfecção pode ajudar a eliminar os sinais de dermatofitose e erradica­la do rebanho. A vacinação auxilia amplamente na redução
da incidência da doença zoonótica nos tratadores de animais e família, veterinários e pessoas que trabalham em abatedouros e curtumes. Não se encontra disponível nenhuma vacina viva atenuada na América do Norte.

Cães e Gatos
Nos cães, cerca de 70% dos casos são causados por Microsporum canis, 20% por M. gypseum e 10% por Trichophyton mentagrophytes; nos gatos, 98% dos casos advêm de M. canis.  A  lâmpada  de  Wood  é  útil  no  estabelecimento  do
diagnóstico presuntivo da dermatofitose nos cães e nos gatos, mas não pode ser utilizada para descartar esta infecção. O diagnóstico definitivo deve ser estabelecido por uma cultura em MTD (ver anteriormente). A detecção da infecção nos
animais portadores assintomáticos é facilitada pela escovação do pelame com uma escova de dente nova e, então, pela sua inoculação em uma placa de cultura, por pressão das cerdas na superfície do meio.
A aparência clínica da tinha nos gatos é bastante variável. Os filhotes são mais comumente afetados. As lesões típicas consistem em alopecia focal, descamação e formação de crostas; a maior parte destas áreas se situa ao redor das
orelhas, na face e nas extremidades. Os gatos com infecções clinicamente inaparentes ainda podem servir como fonte de infecção para outros gatos ou pessoas. Ocasionalmente, a dermatofitose nos gatos causa dermatite miliar felina e é
pruriginosa. Os gatos com dermatofitose generalizada desenvolvem, às vezes, nódulos ulcerados cutâneos, conhecidos como granulomas dermatofíticos ou pseudomicetomas.
As lesões nos cães são classicamente alopécicas, com placas escamosas e com pelos quebrados. Os cães também podem desenvolver foliculite e furunculose regional ou generalizada, com pápulas e pústulas. Uma forma nodular focal de
dermatofitose  nos  cães  é  a  reação  de  quérion.  Nos  cães  adultos,  a  tinha  generalizada  é  incomum,  geralmente  sendo  acompanhada  por  imunodeficiência,  sobretudo  por  hiperadrenocorticismo  endógeno  ou  iatrogênico.  Nos  cães,  os
diagnósticos diferenciais das lesões clássicas de tinha são: demodiciose, foliculite bacteriana e dermatite seborreica.
Em cães e gatos de pelo curto, a dermatofitose geralmente ser autolimitante, mas a resolução pode ser acelerada pelo tratamento. O outro objetivo primário de terapia é evitar a contaminação ambiental e a propagação da infecção para
outros animais e pessoas. No entanto, não há estudos controlados que provam que o corte da pelagem diminui a duração da infecção, estudos clínicos suportam esta afirmação, pelo menos para os gatos com pelo longo e/ou dermatofitose
generalizada, mesmo se as lesões piorarem inicialmente ou se disseminarem. A descontaminação ambiental com alvejante (diluição de 1:10) ou solução de enilconazol (0,2%) é efetiva.
A  terapia  tópica  no  corpo  inteiro  pode  acelerar  a  cura  clínica  (e  não  a  cura  micológica)  e  diminuir  a  contaminação  ambiental.  Estudos  in  vitro  e  in  vivo  demonstraram  poder  antifúngico  de  imersões  de  calda  sulfocálcica  (1:16),
condicionadores  com  enilconazol  (0,2%),  miconazol  2%  e  a  combinação  de  xampu  com  miconazol  2%  e  clorexidina.  Estes  podem  ser  apropriados  como  terapia  adjuvante.  O  condicionador  de  enilconazol  ainda  não  está  disponível
rotineiramente nos EUA em formulação aprovada para cães e gatos. O uso tópico de condicionador de enilconazol demonstrou em um estudo, potencial para causar hipersalivação, fraqueza muscular idiopática e leve aumento da atividade
sérica de ALT. As lesões locais podem ser tratadas efetivamente com miconazol ou clotrimazol tópicos.
Nos casos crônicos ou graves e na tinha em raças felinas de pelo longo e nos Yorkshire terriers, indica­se terapia sistêmica. Foram utilizadas com sucesso: itraconazol, fluconazol, terbinafina, cetoconazol e griseofulvina. A formulação
micronizada de griseofulvina pode ser utilizada em cães (25 a 100 mg/kg, 1 vez/dia ou em doses divididas) e em gatos (25 a 50 mg/kg, diariamente, em doses fracionadas), sendo melhor absorvida quando administrada junto com refeições
gordurosas. As formulações ultramicronizadas utilizadas em medicina humana podem ser utilizadas em baixas doses (10 a 15 mg/kg). Não há preparação de griseofulvina veterinária atualmente aprovada para uso em cães e gatos nos EUA.
Os gatos podem desenvolver supressão de medula óssea, especialmente neutropenia, nas doses mais altas como reações idiossincrásicas. Este efeito é mais comum em gatos FIV­positivos. Tanto em cães como nos gatos, uma sequela
bastante comum da administração de griseofulvina são sinais gastrintestinais.
Outros tratamentos eficazes são: itraconazol (5 a 10 mg/kg, 1 vez/dia, ou pulsoterapia 5 a 10, 1 vez/dia, por 28 dias, seguida de administração em semanas alternadas – semana sim, outra não), cetoconazol (5 a 10 mg/kg, 1 vez/dia),
fluconazol (5 a 10 mg/kg, 1 vez/dia) e terbinafina (30 a 40 mg/kg, 1 vez/dia). Constatou­se concentração de terbinafina maior do que a concentração inibitória mínima nos pelos dos animais tratados durante 5,3 semanas, após 2 semanas de
tratamento diário. Isto pode indicar o seu uso potencial como medicamento em pulsoterapia após 2 semanas de tratamento diário. Nenhum destes medicamentos é aprovado para uso em animais domésticos nos EUA. Ainda, o cetoconazol
geralmente causa anorexia em gatos e não é utilizado tão frequentemente nesta espécie. Os tratamentos sistêmicos e tópicos da dermatofitose devem continuar por 2 a 4 semanas depois da cura clínica ou até que se obtenha uma cultura de
escova negativa. Geralmente, a cultura é submetida após o mínimo de 1 mês de terapia ou quando as lesões clínicas forem mínimas ou ausentes. Nas doenças crônicas e/ou em ambientes desafiadores, a interrupção do tratamento é mais
apropriada após 2 a 3 culturas fúngicas negativas consecutivas, obtidas com intervalos semanais ou a cada 2 semanas. A eficácia do lufenuron tanto no tratamento quanto na prevenção não foi comprovada.

Equinos
Trichophyton equinum e T. mentagrophytes são as principais causas de tinha em equinos, embora Microsporum gypseum, M. canis e T. verrucosum também foram isolados de alguns casos. Os sinais clínicos consistem em uma ou mais
placas de alopecia e eritema, descamação e formação de crostas, que se encontram presentes em graus variáveis. As lesões iniciais podem lembrar uma urticária papular, mas progridem para a formação de crostas e queda de pelos em
poucos dias. O diagnóstico é confirmado por cultura. Os diagnósticos diferenciais são: dermatofilose, pênfigo foliáceo e foliculite bacteriana. A transmissão ocorre por contato direto ou implementos de higiene e cravos de ferradura. A
maior parte das lesões é observada nas áreas da sela e da cintura (“coceira da cintura”).
O tratamento em geral é tópico, pois a terapia sistêmica é cara e não tem eficácia comprovada. Podem­se recomendar loções de corpo inteiro, como as descritas anteriormente para os bovinos e as lesões individuais são tratadas com
preparações de clotrimazol ou miconazol. Os implementos de higiene e os cravos de ferradura devem ser desinfetados e os equinos afetados devem ser isolados.

Suínos, Ovinos e Caprinos
Nos suínos, a dermatofitose geralmente é provocada por Microsporum nanum. As lesões correspondem a anéis de inflamação ou de manchas marrons, que se alastram centrifugamente até um diâmetro de 6 cm. As lesões são praticamente
assintomáticas em adultos e a tinha nos suínos geralmente tem pouca consequência econômica. Infecções zoonóticas em funcionários de fazenda não são comuns.
A tinha é um problema incômodo e comum nos cordeiros de exposição, mas é incomum nos rebanhos ovinos e caprinos de produção. As espécies infectantes são: M. canis, M. gypseum e T. verrucosum. Nos cordeiros, as lesões são mais
observadas na cabeça, mas as lesões disseminadas podem ficar aparentes sob a lã nos cordeiros tosquiados para exposição. Os cordeiros infectados não devem receber certificados de transporte para exposição até que haja resolução da
infecção. Como existem poucas evidências de que os cordeiros com rúmen funcional absorvam a griseofulvina em níveis eficazes, o tratamento é mais bem executado com soluções de hipoclorito de sódio ou condicionadores de enilconazol
(quando disponível). Nos cordeiros saudáveis, como nas outras espécies, estas infecções são autolimitantes, mas muitas vezes a resolução não fica evidente a tempo de salvar o uso do animal no circuito de exposições.

TUMORES CUTÂNEOS E DE TECIDOS MOLES

Os tumores cutâneos são as neoplasias diagnosticadas com maior frequência nos animais domésticos, em parte porque podem ser identificados facilmente e em parte pela exposição constante da pele ao ambiente externo, que predispõe o
tegumento à transformação neoplásica. Produtos químicos carcinogênicos, radiação ionizante e viroses foram implicados, mas fatores hormonais e genéticos também podem ter papel no desenvolvimento das neoplasias cutâneas.
A pele é uma estrutura complexa, composta por vários tecidos epiteliais (epiderme e anexos), mesenquimais (tecido conjuntivo fibroso, vasos sanguíneos, tecido adiposo) e neurais e neuroectodérmicos (nervos periféricos, células de
Merkel, melanócitos), todos com potencial para o desenvolvimento de tumores distintos. Em razão da diversidade dos tumores cutâneos, sua classificação é difícil e muitas vezes controversa. Também há controvérsia quanto ao critério
utilizado para definir se uma lesão que surge na pele ou em tecidos moles é neoplásica e, se for, se ela é benigna ou maligna. Para evitar confusão, os seguintes termos serão utilizados nessa discussão: Hamartoma (nevo) é um defeito de
desenvolvimento localizado, associado ao aumento de um ou mais elementos da pele. Um hamartoma sebáceo, por exemplo, se refere a uma região localizada da pele onde as glândulas sebáceas são extremamente proeminentes e, às vezes,
mal formadas. Embora por definição rigorosa os hamartomas estejam presentes ao nascimento, eles podem, ocasionalmente, demorar longo tempo para alcançar um tamanho clinicamente aparente e podem não ser diagnosticados antes que
o  animal  se  torne  adulto.  Para  confundir  ainda  mais,  algumas  lesões  com  aspectos  clínicos  e  histológicos  de  um  hamartoma  congênito  podem  se  desenvolver  em  animais  adultos.  É  difícil  diferenciar  tais  hamartomas  “adquiridos”  de
neoplasias epiteliais e mesenquimais benignas. Na literatura médica humana e em alguns textos veterinários, o termo “nevo” é utilizado como sinônimo de hamartoma. Uma neoplasia benigna é localizada, não infiltrativa e, em razão da
presença  de  uma  cápsula  que  a  envolve,  é  facilmente  excisada. Neoplasia  de  malignidade  intermediária é  localmente  infiltrativa  e  sua  extirpação  é  difícil,  porém  não  há  metástase. Neoplasia  maligna  é  infiltrativa  e  com  potencial
metastático.
Embora as neoplasias cutâneas sejam caracteristicamente nodulares ou papulares, elas também podem se apresentar como placas alopécicas generalizadas ou localizadas, placas e manchas eritematosas e pigmentadas, vergões ou úlceras
que não cicatrizam. A variabilidade de apresentações clínicas das neoplasias torna difícil diferenciar uma neoplasia de uma doença inflamatória; além disso, distinguir um tumor benigno de um maligno é ainda mais subjetivo, uma vez que
sarcomas ou carcinomas, no início do seu desenvolvimento, podem se apresentar como massas palpáveis encapsuladas discretas. Para estabelecer um diagnóstico definitivo, em geral, é necessário exame histopatológico. A exame citológico
também pode ser útil e, para algumas neoplasias (p. ex., tumor de célula redonda), o seu valor pode ser igual ou maior que o exame histopatológico.
A terapia depende muito do tipo de tumor, de sua localização e do tamanho, bem como das manifestações clínicas do animal. Para neoplasias benignas não associadas à ulceração ou disfunção clínica, não realizar tratamento pode ser a
alternativa mais prudente, em especial em cães idosos.
Para doenças neoplásicas mais agressivas ou tumores benignos que inibem a função normal ou são cosmeticamente inaceitáveis, há várias opções terapêuticas. Para a maioria, a intervenção cirúrgica com extirpação completa implica
maior chance de cura, com o menor custo e, em geral, com menos reações adversas. A lumpectomia é adequada para lesões benignas, porém, se há suspeita de malignidade, a lesão deve ser removida com margem cirúrgica ampla (3 cm).
Para os tumores que não podem ser completamente extirpados, a remoção parcial ou a diminuição de volume pode prolongar a vida do animal e aumentar a eficácia da radiação ou da quimioterapia. A criocirurgia também é uma opção,
embora seja mais efetiva em lesões superficiais benignas do que em neoplasias cutâneas malignas. A radioterapia possui maior valor para neoplasias infiltrativas que não são extirpáveis cirurgicamente ou quando a intervenção cirúrgica
pode causar comprometimento físico inaceitável. A quimioterapia pode ser utilizada como método primário para o tratamento de neoplasias malignas ou como terapia auxiliar à cirurgia ou radioterapia. Na pele, ela é mais comumente
utilizada para tratar tumores de células redondas (p. ex., linfossarcomas, mastocitomas, tumores venéreos transmissíveis etc.) ou tumores sólidos que não podem ser excisados completamente. Embora, em geral, sejam paliativas, remissões
longas podem ser obtidas às vezes. Outras formas de terapia incluem hipertermia, terapia a laser, terapia fotodinâmica, terapia antiangiogênica, terapia genética e imunoterapia.
Diagrama que mostra estrutura semelhante a um polvo, comum a várias neoplasias cutâneas malignas, razão pela qual alguns tumores não são completamente ou adequadamente extirpados na cirurgia. As margens completas, com frequência, não são “adequadas” ou amplas o suficiente para evitar
recidiva, devido às células residuais deixadas no leito tumoral e ao seu redor. Cortesia da Dra. Alice Villalobos.

 SARCOIDE EQUINO
Sarcoide equino é o tumor mais frequentemente diagnosticado nessa espécie, representando 20% de todas as neoplasias de equinos e 36% de todos os tumores de pele nesta espécie. Estudos recentes sugerem que não há predisposição
significativa quanto ao sexo ou idade.
O sarcoide equino raramente representa risco à vida do animal, mas pode comprometer o uso do animal, o que pode acarretar preocupação quanto ao seu impacto econômico. Eles também apresentam implicações importantes ao bem­
estar do animal, em particular em países em desenvolvimento, nos quais os equídeos, principalmente burros, são amplamente utilizados como animais de trabalho.
Sarcoides podem ocorrer como lesões únicas ou múltiplas, em formas diferentes, variando de pequenas lesões semelhantes a verrugas a grandes crescimentos ulcerados e fibrosos. Seis quadros clínicos são reconhecidas: 1) Oculto –
lesões achatadas, acinzentadas, alopécicas e persistentes; com frequência circulares ou quase circulares; 2) Verrucoso – acinzentado, de aparência escamosa ou verrucosa, que pode conter nódulos pequenos e sólidos; possível ulceração da
superfície; bem delimitados ou grandes, com áreas pouco definidas; 3) Nodular – nódulos sólidos múltiplos, discretos, de tamanho variável; podem ulcerar e sangrar; 4) Fibroblástico – massas de tecido, com pedúnculo estreito ou base
ampla e achatada, que sangra com facilidade; podem apresentar superfície úmida e hemorrágica; 5) Misto – misturas variadas de dois ou mais tipos; 6) Malevolente – um tumor raro e extremamente agressivo que se espalha extensivamente
por toda a pele; cordões de tecido tumoral dispersos como nódulos e lesões fibroblásticas ulceradas.
As lesões podem ocorrer em qualquer local do corpo, mas são mais comuns na região paragenital, partes ventrais do tórax e abdome e na cabeça. Com frequência, se instalam em locais de lesão e cicatriz prévias. O sarcoide equino pode
se assemelhar a outros tumores de pele, como fibropapilomas benignos e, também, outras condições cutâneas como tecido de granulação exuberante (carne esponjosa). Uma lesão individual em um equino pode ser difícil de diagnosticar,
mas vários tumores (com frequência de mais de um tipo) com aspectos característicos em um equino tornam o diagnóstico clínico razoavelmente fácil. O diagnóstico definitivo pode ser obtido por meio de biopsia, no entanto, a coleta de
uma amostra representa risco de estimular a expansão considerável e incontrolável da lesão.
O papilomavírus bovino (PVB), principalmente dos tipos 1 e 2, atualmente é considerado o principal agente etiológico do sarcoide equino. Em equinos, pode haver predisposição genética associada a antígenos leucocitários; raças e
linhagens particulares parecem ser mais suscetíveis à doença.
A forma de transmissão ainda não foi confirmada. O PVB­1 foi detectado recentemente em várias espécies de moscas comuns (p. ex., mosca doméstica, mosca dos estábulos) e, em razão da aparente predileção do desenvolvimento de
sarcoide em locais de feridas, propôs­se que as moscas podem atuar como vetores, uma vez que pousam em feridas de diversos animais. Alternativamente, a infecção pelo PVB pode ser transmitida por meio de práticas de manejo, como
compartilhamento de fômites contaminados, ou pode ser transmitida a feridas existentes a partir do pasto contaminado.
Não há terapia universalmente efetiva para sarcoide, e muitos tumores podem apresentar recidiva. Os sarcoide pedunculados com colo discernível podem ser removidos pela ligadura da sua base com fitas de borracha ou material de
sutura elástico, normalmente em combinação com preparações tópicas, assim que o tumor se desprende. Outros tratamentos empregados comumente incluem crioterapia, extirpação cirúrgica ou a laser ou modulação imune local (terapia
com bacilo Calmotte­Guérin). A radioterapia, mais comumente envolvendo implantes com 192Ir, é altamente efetiva no tratamento de tumores menos suscetíveis à terapia tradicional (p. ex., aqueles nos membros ou ao redor dos olhos). No
entanto, implantes de 192Ir têm alto custo e não estão amplamente disponíveis. Os sarcoides, com frequência, recidivam se tratados por extirpação cirúrgica, o que pode decorrer da ativação de PVB latente em tecidos aparentemente normais
vizinhos à lesão. Tumores maiores podem requerer a combinação de terapias (p. ex., desbridamento cirúrgico seguido de quimioterapia tópica).
Recentemente, vários tratamentos novos e promissores foram disponibilizados ou estão na fase final de testes clínicos. Esses incluem o uso de implantes intratumorais de cisplatina/emulsões e aplicação tópica de imiquimod. Também, há
relatos de sucesso na aplicação de cremes de aciclovir para uso único no tratamento de sarcoides achatados e ocultos ou a aplicação no leito da ferida de tumores maiores removidos por extirpação cirúrgica. O modo de ação do aciclovir não
é conhecido, mas ele tem custo relativamente baixo e tem uma ampla margem de segurança. O desenvolvimento de vacinas preventivas e/ou terapêuticas pode ter um papel importante nas estratégias de controle da doença no futuro, mas
estudos realizados até o momento mostraram sucesso limitado.
Um novo procedimento terapêutico usando pequenas moléculas de RNA que interferem na expressão do gene viral­alvo está sendo investigada atualmente. Essa técnica tem mostrado destruição seletiva de células de pele de equinos
infectada com PVB­1, in vitro.

 SARCOMAS ANAPLÁSICOS E INDIFERENCIADOS
É difícil caracterizar microscopicamente esses tumores mesenquimais malignos. Sarcomas indiferenciados não possuem características distintas (p. ex., padrões de arquitetura, características citoplasmáticas e nucleares, produtos celulares).
Sarcomas anaplásicos possuem a maioria das seguintes características: variações no tamanho e forma do núcleo, hipercromasia nuclear, irregularidade notável da cromatina, figuras mitóticas anormais e grande número de figuras mitóticas.
Dessa forma, sarcomas anaplásicos, em geral, são indiferenciados, mas os sarcomas indiferenciados não são necessariamente anaplásicos. Em ambos os casos, indica­se extirpação ampla; entretanto, o prognóstico geralmente é pior para
sarcomas anaplásicos do que para sarcomas indiferenciados.

 TUMORES CUTÂNEOS LINFOCÍTICOS, HISTIOCÍTICOS E RELACIONADOS

Cutâneos Mastocitomas (Mastocitomas, Sarcomas de mastócitos)
Esses tumores são as neoplasias malignas ou potencialmente malignas mais frequentemente detectadas em cães. Adicionalmente, formas viscerais e leucêmicas podem ser notadas. Aventou­se a possibilidade de etiologia viral, mas há
controvérsia. Os tumores podem ser observados em cães de qualquer idade (média de 8 a 10 anos). Podem se desenvolver em qualquer local da superfície corporal, bem como em órgãos internos, mas os membros (em especial as regiões
posteriores e superiores das coxas), o abdome ventral e o tórax são os locais mais comuns; aproximadamente 10% são multicêntricos. A localização dos tumores nas junções mucocutâneas ou na superfície ventral do corpo está associada a
um comportamento biológico mais agressivo. Muitas raças parecem predispostas, em especial Boxer e Pug (nos quais as neoplasias com frequência são múltiplas), Rhodesian Ridgeback e Boston Terrier. Os tumores variam acentuadamente
em tamanho e apenas a aparência clínica não permite o diagnóstico. Mais comumente, surgem como massas elevadas nodulares que podem ser macias a sólidas à palpação. Embora com frequência pareçam encapsulados, os mastocitomas
em cães raramente são discretos. Consistem de um denso agregado celular circundado perifericamente por um halo de menor número de mastócitos, que é palpado como pele normal. Os cães também podem desenvolver sinais clínicos
associados à liberação de produtos vasoativos dos mastócitos malignos. O sintoma mais comum é ulceração gastroduodenal, que pode ser notada em até 25% dos casos. O exame citológico de aspirados com agulha fina corados pelo Wright
ou de imprints podem ser utilizados para definir o diagnóstico de mastocitoma em cães. Todos os tumores cutâneos devem ser submetidos ao exame citológico de aspirado com agulha fina antes da extirpação, para excluir o diagnóstico de
tumor de mastócito. Se o cirurgião está ciente de que o tumor é um mastocitoma, um plano cirúrgico de extirpação ampla e profunda propicia melhor resultado. Todos os mastocitomas devem ser submetidos à biopsia para determinar as
margens e o estadiamento, uma vez que a citologia não substitui a histopatologia – apenas o exame histopatológico permite o prognóstico. Dois sistemas de estadiamento histopatológico foram definidos – o sistema Bostock, de 1973, e o
sistema Patnaik et al., de 1984. Para evitar confusão, é essencial saber qual o sistema utilizado.
Embora se acredite que haja uma variante benigna do tumor de mastócito canino, não há meios clínicos ou microscópicos para identificá­la. Além disso, mastocitomas pequenos podem permanecer quiescentes por longo tempo antes de
se tornarem agressivos. Em um estudo, verificou­se uma variante subcutânea do mastocitoma canino, sem envolvimento infiltrativo dérmico primário, em aproximadamente 10% das amostras de tecidos obtidas por biopsia. Essa variante
apareceu com maior frequência nos membros pélvicos; 66% dos casos foram submetidos à extirpação completa com margens profundas. Esses tumores apresentam estadiamento histológico intermediário, menor taxa de recidiva (apenas
9%) e tempo de sobrevida maior, com taxa de metástases de apenas 6%.
Mastocitoma na pata traseira esquerda em um cão da raça Basset Hound. Cortesia da Dra. Alice Villalobos.

Não se constata recidiva em até 65% dos mastocitomas que não foram completamente extirpados. Isso sugere que seu comportamento biológico nem sempre é agressivo e que o tratamento agressivo nem sempre é necessário. Colorações
especiais  podem  ser  utilizadas  para  distinguir  mais  adequadamente  os  estadiamentos  tumorais.  A  expressão  de  marcadores  de  proliferação  pode  ajudar  na  determinação  da  probabilidade  do  mastocitoma  não  removido  completamente
ocasionar recidiva ou metástase. Em um estudo com 30 mastocitomas, em 28 cães, a combinação de Ki­67 e escores de antígenos de núcleos celulares em proliferação foi indicador prognóstico para recidivas locais. A correlação entre os
resultados dos testes e o tempo de sobrevivência pode ser útil, mas nem sempre é confiável para predizer o prognóstico. Em razão da dificuldade de subclassificar os mastocitomas caninos, todos devem ser tratados como, ao menos,
potencialmente malignos, utilizando testes especializados para determinar se é necessário tratamento adicional.
O tratamento depende do estágio clínico da doença e do comportamento biológico agressivo previsto. Para tumores em estágio I (tumor solitário limitado à derme, sem envolvimento nodal), o tratamento de preferência é a extirpação
cirúrgica completa com margens amplas; devem ser removidos, no mínimo, 3 cm de tecido saudável ao redor das bordas palpáveis, na tentativa de retirar o nódulo e o halo de células neoplásicas ao seu redor. A citologia intraoperatória
(exame dos imprints das margens do tecido extirpado) pode guiar o cirurgião, que deve continuar removendo o tecido até que as margens estejam livres de mastócitos. Se o exame histológico sugere que o tumor se estende além das margens
cirúrgicas,  nova  excisão  deve  ser  realizada.  Como  alternativa,  uma  vez  que  os  mastócitos  são  sensíveis  à  radiação,  a  radioterapia  intraoperatória  ou  a  radioterapia  externa,  após  a  cirurgia,  pode  ser  curativa  se  o  tumor  remanescente  é
pequeno ou pode ser observado apenas microscopicamente. Radiação combinada com hipertermia pode ser mais efetiva do que apenas radiação, para controlar mastocitomas biologicamente agressivos e locais.
Até o momento, não há consenso quanto ao tipo de terapia para mastocitomas em estágios II a IV. Para tumores em estágio II (tumor solitário com envolvimento de linfonodos regionais), as opções terapêuticas incluem extirpação da
neoplasia e do linfonodo regional acometido (se possível), prednisolona e radioterapia, sozinhos ou combinados. Triancinolona ou fosfato sódico de dexametasona, misturado com soro do paciente e injetado de maneira uniforme nos tecidos
do leito tumoral no momento da cirurgia ou no pós­operatório também pode ser útil, em especial quando se combinada radioterapia intraoperatória e radioterapia externa após a cirurgia. Há discussão sobre injeções no leito tumoral de água
hipotônica, deionizada ou destilada, após extirpação incompleta. O tratamento do tumor em estágio III (múltiplos tumores dérmicos com ou sem envolvimento de linfonodos) ou em estágio IV (qualquer tumor com metástase distante e
recidiva com metástase), em geral, é paliativo. Uma terapia recomendada é prednisolona (2 mg/kg VO, por 5 dias, seguida de dose de manutenção de 0,5 mg/kg, 1 vez/dia) ou injeções intralesionais de triancinolona (1 mg/cm do diâmetro
do  tumor,  a  cada  2  semanas).  Tratamento  com  antagonistas  de  receptores  H1 e H2 para  controlar  os  efeitos  periféricos  e  gástricos  da  histamina,  respectivamente,  pode  ser  indicado  aos  animais  com  doença  sistêmica  ou  sinais  clínicos
relacionados com a liberação de histamina. Quimioterapia com alcaloides da vinca (vincristina, vimblastina), L­asparaginase e ciclofosfamida foi utilizada com alguma eficácia. Prednisona e vimblastina, utilizadas como quimioterapia
auxiliar à ressecção cirúrgica incompleta, aparentemente conferiram maior sobrevida, em comparação com cirurgia, exclusivamente, propiciando 1 a 2 anos livre da doença, em 57% dos cães, e sobrevida de 1 a 2 anos para 45% dos animais
com tumores em estágio III. Em 19 cães que receberam alta dose de lomustina, em intervalos de 21 dias, 42% dos mastocitomas mostraram respostas mensuráveis, variando de estável a parcial, com uma resposta completa. Neutropenia
surge sete dias após o tratamento, com contagens de 1.500 neutrófilos/μl.
Verificou­se  que  novos  fármacos  com  pequenas  moléculas  inibidoras  de  multiquinase  inibem  o  proto­oncogene  ativado  ou  modificado  do  receptor  de  tirosinoquinase  c­KIT,  que  está  associado  ao  desenvolvimento  de  mastocitomas.
Recomenda­se coletar amostras de tecido para determinar a agressividade biológica dos mastocitomas e para pesquisar a presença do receptor da tirosinoquinase c­KIT modificado, antes de iniciar o tratamento. Em um estudo com 202 cães,
com  ou  sem  tratamento  prévio,  com  mastocitomas  cutâneos  mensuráveis  em  estágio  II  ou  III,  sem  metástase  em  linfonodos  ou  em  víscera,  verificou­se  que  o  uso  de  mastinib  (12,5  mg/kg,  1  vez/dia)  foi  uma  opção  de  tratamento
relativamente segura e benéfica. Outro teste clínico concluiu que o uso do inibidor do receptor de tirosinoquinase toceranib (3,25 mg/kg VO, a cada 48 h) resultou em inibição da fosforilação da tirosinoquinase (KIT) em mastocitomas
caninos  e  obteve–se  benefício  clínico  com  o  uso  contínuo.  Os  oncologistas  veterinários  são  as  melhores  fontes  de  informação  quanto  à  aplicação  clínica  desses  novos  medicamentos  inibidores  da  tirosinoquinase,  no  tratamento  de
mastocitomas e vários outros tumores malignos.
Em gatos, os mastocitomas cutâneos são o segundo tipo de tumor de pele mais comum; no entanto, na prática a doença é verificada apenas ocasionalmente. Além dos tumores cutâneos, formas primárias esplênicas, sistêmicas, leucêmicas
e gastrintestinais foram reconhecidas. Há duas variantes distintas da forma cutânea – um tipo mastocitário análogo, mas não idêntico, aos mastocitomas cutâneos dos cães e um tipo histiocítico, único de gatos. Os mastocitomas cutâneos
felinos podem ser solitários ou múltiplos. Os tumores primários esplênicos, sistêmicos, recidivantes e múltiplos (5 ou mais) estão associados a um prognóstico reservado.
O tipo mastocitário é o mais comum. É encontrado principalmente em gatos com mais de 4 anos de idade e pode se desenvolver em qualquer local do corpo, sendo mais comum na cabeça e no pescoço. Os tumores são nódulos simples,
alopécicos, em geral com 2 a 3 cm de diâmetro, que ocasionalmente se estendem para a gordura subcutânea. Nódulos linfoides são comuns; eosinófilos são raros. Ao contrário dos mastocitomas em cães, os tumores em gatos geralmente são
benignos e a atipia e o comportamento biológico são pouco relacionados. A extirpação cirúrgica é o tratamento de escolha; 30% dos tumores apresentam recidiva após a cirurgia; alguns ocasionam metástase. Crioterapia pode ser uma boa
opção para tratar lesões pequenas múltiplas recidivantes, já que não requer anestesia. Tumores recidivantes podem responder à quimioterapia, radioterapia e uma nova terapia com pequenas moléculas­alvo (ver texto anterior).
O tipo histiocítico dos mastocitomas cutâneos em gatos é detectado principalmente em gatos Siameses com menos de 4 anos de idade. As lesões podem se desenvolver em qualquer local do corpo e aparecem como papulonódulos
subcutâneos múltiplos (miliares), pequenos (em geral 0,5 a 1 cm de diâmetro) e firmes. Normalmente, quanto mais velhos os gatos, menor o número de lesões. Pode ser difícil distinguir morfologicamente essa variante de uma resposta
inflamatória granulomatosa. Como há alguns relatos de cura espontânea desses tumores, pode não ser necessário tratamento.
Em equinos, os mastocitomas são tumores incomuns, em geral, benignos, embora metástases tenham sido relatadas e devam ser consideradas. Há dúvidas se eles são realmente uma neoplasia ou uma resposta inflamatória incomum; no
entanto, atualmente são considerados tumores causados por mutação funcional do proto­oncogene KIT. As lesões podem se desenvolver em qualquer parte do corpo, mas são mais comuns na cabeça e nas pernas. Tipicamente, há uma massa
solitária  na  derme  ou  na  gordura  subcutânea  que  pode  se  expandir  e  envolver  os  músculos  adjacentes.  Eritema  e  formação  de  pápula  (sinal  de  Darrier)  não  são  características  clínicas  do  mastocitoma  equino.  A  maioria  dos  equinos
acometidos é macho, com idade média de 7 anos, variando de 1 a 18 anos. O tumor surge como um nódulo composto por uma proliferação quase sempre monomórfica de mastócitos. À medida que a lesão progride, os mastócitos são
limitados a agregados em um estroma fibroso que circunda um grande foco de necrose liquefativa, que contém grande número de eosinófilos. Em estágios tardios, o foco necrótico passa por mineralização distrófica, e pode ser muito difícil
identificar os mastócitos. Uma vez instalada a mineralização, nota­se uma lesão arenosa ao corte. O sistema de estadiamento utilizado para graduar mastocitomas em cães não é confiável para uso em equinos em razão da variabilidade de
aparência histológica dos tumores nessa espécie. Alopecia e ulceração são características variáveis.
Uma variante de mastocitoma cutâneo é observada em potros recém­nascidos, nos quais as lesões podem se generalizar, porém, regridem com o tempo, o que sugere uma doença equina equivalente à urticária pigmentosa em pessoas.
A terapia convencional para mastocitoma equino metastático não é satisfatória. A extirpação é o tratamento de escolha; no entanto, há relatos de que as lesões ocasionalmente ocasionam metástases. Pesquisas estão prestes a desenvolver
inibidores da proteína tirosinoquinase e fármacos de “pequenas moléculas” a preços acessíveis, como o mesilato de mastinib e o fosfato de toracenib, que têm como alvos seletivos as formas mutantes dos receptores da tirosinoquinase c­
KIT.
Mastocitomas são raros em suínos e bovinos. Em suínos, a maioria aparece como nódulos cutâneos discretos e solitários. A maior parte é benigna, porém, variantes disseminadas e leucêmicas podem ocorrer. Em bovinos, a maioria é
maligna e caracterizada por nódulos cutâneos múltiplos, com frequência, acompanhados de envolvimento sistêmico; ocasionalmente, foram reconhecidas formas puramente cutâneas.

Tumores com Diferenciação Histiocítica
Esses tumores compreendem um grupo de doenças cutâneas pouco definidas, caracterizadas pela proliferação de histiócitos (macrófagos teciduais), na ausência de qualquer estímulo conhecido.
Histiocitomas cutâneos são  comuns  em  cães  e  raros  em  caprinos  e  bovinos;  é  questionável  se  as  lesões  podem  ser  encontradas  em  gatos.  Fortes  evidências  imunoistoquímicas  sugerem  que,  em  cães,  são  derivados  das  células  de
Langerhans (processamento intraepidérmico de antígenos). Esses tumores normalmente são observados em cães com menos de 3,5 anos, mas podem ocorrer em qualquer idade. As raças com maior risco são Buldogue Inglês, Scottish
Terrier, Greyhound, Boxer e Boston Terrier. A cabeça (inclusive o pavilhão auricular) e os membros são os locais de envolvimento mais comuns, onde os tumores surgem como nódulos solitários, proeminentes e, em geral, ulcerados e
livremente móveis. Apesar de serem neoplasias comuns, os histiocitomas nem sempre são fáceis de diagnosticar histologicamente e podem ser confundidos com inflamação granulomatosa, mastocitomas, plasmocitomas e linfossarcomas
cutâneos. Os histiocitomas caninos devem ser considerados benignos e a maioria deles se cura espontaneamente em 2 a 3 meses, sem tratamento. Uma vez estabelecido o diagnóstico, com frequência em exame citológico, a extirpação
cirúrgica é a opção.
Em caprinos e bovinos, os histiocitomas são extremamente raros e se comportam da mesma maneira descrita em cães. Os histiocitomas também foram relatados em gatos jovens; no entanto, representam mais provavelmente uma forma
histiocítica de mastocitoma em gatos.
Histiocitose cutânea está associada ao desenvolvimento de numerosas placas e nódulos envolvendo a derme ou a gordura subcutânea. É rara em cães e pode se desenvolver em animais de qualquer idade, sendo mais comum em adultos
jovens. Cães das raças Shar­Pei e Pastor Alemão podem ser predispostos. Os nódulos e as placas tendem a aumentar e diminuir, e as extremidades e o tronco são os locais mais envolvidos. As lesões não são pruriginosas e as de maior
tamanho podem ulcerar. A histiocitose cutânea raramente envolve órgãos internos, mas a natureza difusa e a aparência desagradável, em geral, forçam o proprietário a solicitar eutanásia. Várias formas de terapia foram tentadas, inclusive
glicocorticoides sistêmicos e uma combinação desses com quimioterapia. A resposta é variável; as lesões em alguns cães respondem de modo rápido e permanente, enquanto em outros há melhora transitória ou não há melhora alguma.
A histiocitose de cães da raça Bernese Mountain é uma doença sistêmica, familiar e de etiologia desconhecida, com duas manifestações – uma forma mais indolente e, em geral, cutânea, conhecida como histiocitose sistêmica e outra
mais  agressiva  na  qual  as  lesões  de  pele  são  raras,  conhecida  como  histiocitose  maligna.  A  histiocitose  maligna  raramente  tem  sido  detectada  em  outras  raças  caninas.  Na  histiocitose  sistêmica,  os  machos  (idade  média  de  início  dos
sintomas de 4 anos) são acometidos com maior frequência do que as fêmeas. Há múltiplos nódulos cutâneos, pápulas e placas que envolvem a pele (em especial do escroto), mucosa nasal e pálpebras. As lesões são mal delimitadas e
variavelmente alopécicas e podem ser ulceradas; se desenvolvem em surtos e regridem lentamente, recidivando apenas meses mais tarde. A doença clínica tende a ser mais grave a cada nova ocorrência de erupções. Embora a pele seja o
órgão­alvo primário, as lesões também podem se desenvolver em outros órgãos, inclusive linfonodos, baço e medula óssea. A doença pode ser manifestar como episódio clínico, mas é progressiva e, por fim, fatal.
Histiocitose maligna é observada em cães machos da raça Bernese Mountain (idade média de início dos sintomas de 7 anos) e, com menor frequência, em outras raças caninas. Pulmões, linfonodos e fígado são os órgãos mais comumente
acometidos e a doença tende a poupar a pele. Macroscopicamente, as lesões são massas firmes, solitárias e grandes, que podem ocupar grandes partes dos órgãos internos acometidos. A doença é rapidamente progressiva e não aumenta e
diminui como acontece na histiocitose sistêmica. Poucos cães sobrevivem por mais de seis meses.
Vários protocolos quimioterápicos foram utilizados para tratar ambas as formas. A fração 5 da timosina bovina pode ser benéfica na remissão dos sintomas, em especial na forma sistêmica. No entanto, ambas as formas da doença são
essencialmente fatais.

Tumores Linfoides Cutâneos
Plasmocitomas extramedulares caninos (histiocitomas atípicos, tumores neuroendócrinos cutâneos (p. 956), sarcomas de células reticulares, amiloidose nodular cutânea) são tumores cutâneos relativamente comuns. Apesar de sua origem
controversa, as células neoplásicas expressam caracteristicamente imunoglobulinas citoplasmáticas e podem provocar amiloide primário, deixando pouca dúvida quanto sua origem linfoplasmocitária. Esses tumores de cães e, raramente, de
gatos são vistos com maior frequência na cabeça (inclusive orelhas, lábios e cavidade bucal) e extremidades de animais adultos ou idosos. As raças maio suscetíveis são Cocker Spaniel, Airedale, Scottish Terrier e Poodle padrão. Os
tumores geralmente são pequenos (< 5 cm) e, às vezes, pedunculados. A maior parte dessas lesões está confinada localmente e a extirpação cirúrgica completa, porém conservadora, é o tratamento de escolha. Raramente, os plasmocitomas
extracutâneos podem ser invasivos localmente ou múltiplos (ou ambos), em especial quando se desenvolvem na cavidade bucal. A recidiva também pode estar relacionada com a presença de amiloide (p. 631). O tratamento desses tumores
permanece pouco definido. Para tumores recidivantes e invasivos, podem ser necessárias medidas mais agressivas durante a extirpação. Quando os tumores são múltiplos ou a extirpação cirúrgica não é possível, a radioterapia parece ser o
melhor tratamento. Para tumores resistentes à radiação, recomendam­se quimioterápicos, como melfalana, clorambucila e ciclofosfamida, bem como glicocorticoides.
O linfossarcoma cutâneo pode surgir como uma doença na qual a pele é o local de envolvimento inicial e primário ou pode ser secundário a uma doença sistêmica interna (ver p. 72, p. 772 e p. 852). Os linfossarcomas cutâneos não são
comuns, mas foram identificados em todas as espécies domésticas. Em geral, duas formas distintas são reconhecidas – uma forma epiteliotrópica (na qual há infiltração de linfócitos malignos na epiderme e anexos) e uma forma nodular não
epiteliotrópica. Ambas normalmente expressam antígenos de superfície e citoplasmáticos característicos de linfócitos T; isso, juntamente com a detecção frequente de, no mínimo, um pequeno foco de epiteliotropismo em muitos casos das
formas “não epiteliotrópicas” em cães e gatos sugerem que podem ser variantes diferentes de um mesmo tumor.
Linfossarcoma cutâneo epiteliotrópico (LCE, micose fungoide) é a forma mais frequentemente constatada de linfossarcoma cutâneo em cães e, indiscutivelmente, em gatos. É uma doença de cães de meia­idade ou idosos, com possível
predisposição em Poodle e Cocker Spaniel. Classicamente, as lesões progridem de manchas irregulares a placas e tumores; entretanto, uma ou qualquer combinação dessas três lesões primárias pode estar presente. Por exemplo, em uma
forma de LCE conhecida como reticulose pagetoide há envolvimento mínimo, ou nenhum, da derme e as lesões cutâneas sempre surgem como manchas eritematosas irregulares. Outra característica comum da doença em cães é a presença
de áreas de alopecia secundárias à atrofia folicular causada por infiltração de células neoplásicas na bainha externa e no lúmen dos folículos pilosos. Apesar de na maioria dos casos haver envolvimento cutâneo difuso, foram identificadas
formas limitadas principalmente às membranas mucosas ou aos coxins plantares. Em razão da aparência clínica variável desse tumor, o diagnóstico baseado em características clínicas pode ser muito difícil e estágios precoces podem ser
confundidos com doenças alérgicas, autoimunes, endócrinas, infecciosas ou seborreicas. Na maioria dos casos, a lesão está limitada à pele até uma fase mais tardia da doença. LCE com leucemia concomitante é conhecida como síndrome
de Sézary.
Em cães, LCE é uma doença de progressão lenta à moderada, para a qual foram propostos muitos tratamentos. Até o momento, todos parecem ser mais efetivos na melhora dos sintomas do que no prolongamento da vida dos cães
acometidos. A metocloretamina (mostarda nitrogenada) foi utilizada no passado como terapia tópica, mas como grandes áreas do corpo do cão podem ser afetadas (inclusive membranas mucosas) e em razão do seu potencial sensibilizante
em  pessoas  ela  não  é  utilizada  com  frequência.  A  doença,  com  frequência,  responde  de  maneira  transitória  aos  esteroides.  Fármacos  quimioterápicos,  como  combinações  de  adriamicina,  clorambucila,  ciclofosfamida,  doxorrubicina  e
vincristina, têm efetividade variável. A lomustina e os retinoides, com e sem glicocorticoides e altas doses de ácido linoleico, ocasionalmente propiciam remissão parcial ou completa.
Em gatos, LCE tende a se desenvolver em animais mais velhos. As lesões com frequência seguem uma progressão definida, aparecendo inicialmente como placas crostosas com prurido variável. Nas biopsias de lesões iniciais com
frequência tem­se diagnóstico de foliculite linfocítica mural. Em muitos casos em que se obtém esse diagnóstico, as lesões progridem para linfossarcomas cutâneos inequívocos. Ao contrário do LCE em cães, o epiteliotropismo, com
frequência, é extremamente discreto em gatos. Pouco se sabe a respeito da terapia ou se a terapia utilizada em cães pode ser eficiente em gatos.
O linfossarcoma cutâneo não epiteliotrópico (LCNE) é a forma mais conhecida de linfossarcoma cutâneo em todos os animais domésticos, exceto em cães e gatos. Em cães, o LCNE é mais comum em animais de meia–idade ou idosos.
As lesões são nódulos ou placas que se desenvolvem mais comumente no tronco. Em geral, os tumores são múltiplos, embora lesões solitárias possam ser notadas, em especial em gatos. Em muitos casos, o LCNE é macroscopicamente
indistinguível do estágio tumoral de LCE. Uma vez que o LCNE em cães, em geral, é mais agressivo do que LCE e o envolvimento sistêmico ocorre comumente na fase precoce da doença, o diagnóstico definitivo é importante. Várias
terapias, incluindo extirpação, quimioterapia e, com menor frequência, radioterapia foram utilizadas sozinhas ou em combinação. A extirpação é o tratamento de eleição quando a doença é limitada a um tumor solitário e a cura completa
ocasionalmente é obtida. Extirpação ou criocirurgia mais difusa raramente acarretam remissão dos sintomas por longo período. Quimioterapia ou protocolos quimioimunológicos utilizados para outras formas de linfossarcoma canino devem
ser considerados tratamentos paliativos. A remissão média é de, aproximadamente, 8 meses.
Em gatos, LCNE é uma doença de animais de meia­idade a idosos. A participação do vírus da leucemia felina permanece indefinido. As lesões são em forma de placas ou nódulos que podem ser solitários ou múltiplos, alopécicos ou com
pelos e ulcerados ou cobertos por uma epiderme intacta. LCNE felino é agressivo; mesmo quando se realiza extirpação completa de um nódulo solitário, a recidiva é comum. Até o momento, nenhuma terapia definitiva é conhecida, no
entanto, o uso da combinação de lomustina, esteroides e ácido linoleico pode ser útil.
Em  equinos,  LCNE  (linfossarcoma  nodular,  linfossarcoma  subcutâneo,  linfossarcoma  linfoistiocítico)  pode  ser  visto  em  animais  de  qualquer  idade,  porém,  é  mais  comum  em  animais  jovens  e  de  meia­idade.  Nódulos  firmes  e  não
ulcerados são mais comuns na gordura subcutânea da superfície ventral do corpo. Microscopicamente, dois tipos de linfossarcoma nodular foram detectados em equinos. O mais comum consiste em uma mistura de histiócitos e linfócitos
pequenos e bem diferenciados, ocasionalmente com características plasmocitoides; o segundo consiste em uma população monomórfica de grandes linfócitos atípicos, apenas com histiócitos ocasionais. A diferenciação entre essas duas
formas é importante, uma vez que a maioria dos casos de linfossarcomas cutâneos em equinos com células de características monomórficas tem envolvimento interno e a doença progride rapidamente. Ao contrário, a forma linfoistiocítica
raramente está associada a envolvimento interno e os equinos acometidos podem viver por anos. Com a progressão da forma linfoistiocítica, os nódulos tendem a se tornar mais frequentes na região cervical ventral. Em muitos casos, a
eutanásia pode ser justificada quando o envolvimento da faringe induz dispneia. Em razão do alto custo dos fármacos citotóxicos, em geral, a terapia é limitada à administração de glicocorticoides VO ou intralesional; a remissão, se ocorre,
geralmente é por um período curto.
Em bovinos, o linfossarcoma cutâneo é uma doença de animais jovens (em geral < 4 anos de idade). É um dos quadros da leucose bovina esporádica que não é transmissível. O termo leucose bovina esporádica normalmente é reservado
para as formas cutânea e tímica do linfoma em bezerros, que são definidas pela idade jovem de acometimento e pela distribuição dos tumores. A causa ou causas não são conhecidas. Apenas linfomas causados por infecção pelo vírus da
leucemia bovina devem ser denominadas leucose ou leucose bovina enzoótica. Pode também haver doenças linfossarcomatosas que não são classificadas nem como leucose bovina esporádica nem como leucose enzoótica, isto é, linfoma
multicêntrico de ocorrência esporádica de etiologia desconhecida. Presume­se que o linfossarcoma cutâneo de bovinos jovens não está associado à infecção pelo vírus da leucemia bovina (p. 772) e atualmente essa enfermidade não tem
causa conhecida. As lesões são tipicamente nodulares, envolvem a derme ou a gordura subcutânea e, com frequência, são ulceradas. Não há tratamento conhecido.

Tumor Venéreo Transmissível
Veja p. 1522. Esses tumores também podem se desenvolver inicialmente na pele que contém pelos, devido à inoculação através de lesões cutâneas.

 TUMORES DE ORIGEM MELANOCÍTICA
Esses  tumores  são  mais  comuns  em  cães,  equinos  tordilhos  e  suínos  miniatura;  são  incomuns  em  bovinos  e  caprinos  e  raros  em  gatos  e  ovinos.  A  terminologia  utilizada  para  descrever  lesões  melanocíticas  em  medicina  veterinária  é
diferente da utilizada em dermatologia humana. Em animais, os termos melanocitoma e melanoma maligno são utilizados para descrever proliferações melanocíticas benignas e malignas, respectivamente. Em pessoas, uma proliferação
melanocítica benigna (congênita ou adquirida) é denominada nevo e o termo melanoma, por definição, se refere à malignidade (i. e., em pessoas não há melanoma benigno). Além disso, embora a lesão por exposição solar seja causa
comum de tumores melanocíticos em pessoas, a lesão actínica raramente está associada ao desenvolvimento de tumores similares em animais domésticos.
Bovinos:  Neoplasias  melanocíticas  em  bovinos  se  desenvolvem  com  pouca  frequência  em  qualquer  local  do  corpo.  Podem  ser  encontradas  em  animais  de  qualquer  idade,  mas  costumam  ser  mais  comuns  em  animais  jovens;  formas
congênitas foram reconhecidas. Bovinos da raça Angus parecem predispostos. Mais comumente, esses tumores são massas nodulares grandes benignas, densamente pigmentadas na superfície de corte. A extirpação é curativa na maioria dos
casos; entretanto, variantes malignas raras foram reconhecidas, com metástases distantes.
Cães: Melanocitomas  cutâneos  são  diagnosticados  com  muito  mais  frequência  do  que  os  melanomas  malignos.  Eles  desenvolvem­se  mais  comumente  na  cabeça  e  nos  membros  torácicos  de  cães  de  meia­idade  ou  idosos.  Pode  haver
predileção por machos. Cães das raças Schnauzer miniatura e padrão, Doberman Pinscher, Golden Retriever, Setter Irlandes e Vizsla são as mais suscetíveis à neoplasia. Podem surgir como máculas ou manchas, como pápulas ou placas ou
como massas elevadas e, ocasionalmente, pedunculadas. A maioria possui superfície pigmentada. Apesar de, em geral, serem solitárias, as lesões podem ser múltiplas, sobretudo nas raças de risco. Esses tumores são benignos e a extirpação
completa é curativa.
Melanomas  malignos  se  desenvolvem  mais  comumente  em  cães  de  mais  idade  do  que  aquele  de  animais  que  desenvolvem  melanocitomas.  Schnauzer  miniatura  e  padrão  e  Scottish  Terrier  são  as  raças  de  maior  risco.  As  junções
mucocutâneas de lábios e cavidade bucal (p. 339) e os leitos ungueais são os locais mais comuns de seu desenvolvimento. Melanomas malignos em pele que contém pelos são raros e a maioria surge no abdome ventral e no escroto. Os
machos são acometidos mais comumente do que as fêmeas. A maioria dos melanomas malignos surge como nódulos proeminentes, geralmente ulcerados e com pigmentação variável. Quando presentes nas regiões mucocutâneas dos lábios,
os tumores podem ser pedunculados com uma superfície papilar; quando se instalam no leito ungueal surgem como tumefação do dígito, normalmente com perda da unha e destruição do osso adjacente, lembrando osteomielite. Quando há
infecção de unha em um cão idoso, radiografias e biopsia profunda, com punch, são indicadas para o diagnóstico. Melanomas malignos caninos são agressivos e possuem considerável potencial metastático.
O tratamento, em geral, consiste em extirpação completa; no entanto, a natureza infiltrativa do tumor pode torná­la difícil. Quando presente nos dígitos, a amputação é indicada; quando na mandíbula, uma hemimandibulectomia pode
permitir  uma  extirpação  completa,  além  de  aparência  cosmética  pós­cirúrgica  e  sobrevida  aceitáveis.  Em  um  estudo  notou­se  que  lesões  rostrais  na  maxila  ou  mandíbula  estavam  associadas  a  sobrevida  mais  longa,  de  10,9  meses.
Melanomas, em geral, são considerados insensíveis à radioterapia e não há protocolo quimioterápico altamente efetivo. A sobrevida varia de 1 a 36 meses, indicando que as variações individuais dos mecanismos de defesa do hospedeiro e a
agressividade do tumor influenciam o prognóstico. Em um estudo com 117 cães com tumores digitais, constatou­se que 24 eram melanomas e sobrevida média foi de 12 meses; 42% desses sobreviveram por 1 ano e 13% por 2 anos.
Uma  série  de  novas  terapias  gênicas  com  vacinas  xenogenéticas  usando  plasmídio  de  DNA  que  codifica  a  tirosinase  humana  podem  induzir  os  cães  a  produzir  anticorpos  e  respostas  citotóxicas  de  células  T,  que  podem  reduzir  os
melanomas. Em testes clínicos, a vacina contra melanoma canino mostrou potencial terapêutico para cães com melanoma avançado e foi aprovada para uso nos EUA.
Caprinos: Tumores melanocíticos em caprinos são raros. São mais comuns em animais de meia­idade ou idosos e, possivelmente, na raça Angorá. Pode haver predileção por localização na faixa coronária e no úbere. As lesões são observadas
como massas múltiplas ou solitárias com pigmentação variável na superfície de corte. A maioria tende a crescer rapidamente; metástases são comuns.
Equinos: A maioria das neoplasias melanocíticas ocorre em equinos tordilhos, nos quais a pelagem se torna cinza (ou branca) com a idade. São especialmente comuns nas raças Lipizzaner, Árabe e Percheron; 80% dos equinos cinza ou
brancos, dessas raças, podem ser acometidos. Em geral são notadas em equinos mais velhos, mas normalmente começam a desenvolver em animais com 3 a 4 anos de idade; o períneo e a base da cauda são os locais de desenvolvimento
mais comuns, mas esses tumores podem se instalar em qualquer local, inclusive na região parotídea. Os tumores, com frequência, são múltiplos e podem aparecer como nódulos coalescentes, pedunculados, que costumam se estender em um
arranjo linear até a base da cauda. Aumentam em tamanho e número com o tempo. Embora a maioria seja benigna, variantes invasivas, algumas com potencial metastático, podem se desenvolver. A maioria das lesões é preta ao corte.
Muitos  equinos  tordilhos  têm  evidência  de  envolvimento  de  linfonodos;  entretanto,  há  dúvida  se  o  envolvimento  é  decorrente  de  metástase  ou  se  melanócitos  intranodais  e  melanófagos  representam  um  estímulo  dos  melanócitos
extracutâneos normalmente presentes nos linfonodos. O tratamento consiste em remoção cirúrgica ou criocirurgia; entretanto, animais acometidos são predispostos ao desenvolvimento de tumores adicionais com o tempo. Pouco se sabe a
respeito da utilização de radioterapia ou de quimioterapia no tratamento de melanocitoma equino ou melanoma maligno. Relatos iniciais sugeriram que a cimetidina poderia ser útil no controle de recidiva, mas não foram apoiados por
estudos posteriores. Quimioterapia intralesional com cisplatina ou carboplatina, após a redução cirúrgica do volume, pode ser benéfica no tratamento de neoplasias grandes ou inoperáveis. A recidiva de tumores não induz resistência à
cisplatina e eles podem ser tratados uma segunda vez, às vezes, com bons resultados.
Neoplasias melanocíticas em equinos de outra cor são raras e geralmente encontradas no tronco e nas extremidades de equinos jovens (geralmente < 2 anos de idade). Podem representar expansão de uma lesão congênita. Tipicamente, os
tumores  surgem  como  nódulos  solitários.  A  maioria  é  benigna;  entretanto,  melanomas  congênitos  malignos  podem  se  desenvolver  com  pouca  frequência.  Esses  tumores  são  invasivos  e  com  baixo  potencial  metastático.  A  extirpação
cirúrgica ou a criocirurgia é o tratamento de escolha. Se os tumores forem benignos e extirpados cirurgicamente, o prognóstico é excelente. Para tumores invasivos, o prognóstico é reservado.
Gatos: Neoplasias melanocíticas cutâneas não são comuns e a maioria é notada na cabeça (em especial no pavilhão auricular), pescoço e extremidades distais de animais de meia­idade ou idosos. Uma associação com a cavidade bucal e as
regiões subungueais é bem menos definida do que em cães, e uma alta porcentagem é maligna. A extirpação é o tratamento de escolha.
Ovinos:  Neoplasias  melanocíticas  em  ovinos  são  mais  comuns  em  animais  de  meia­idade  ou  idosos,  mas  foram  diagnosticadas  em  neonatos.  São  mais  comuns  nas  raças  Suffolk  e  Angorá,  nas  quais  surgem  como  massas  múltiplas,
densamente pigmentadas, na derme ou no subcutâneo. Devem ser consideradas malignas; metástases são comuns.
Suínos: Neoplasias melanocíticas dos suínos são observadas como lesões congênitas e, esporadicamente, em animais adultos das raças Sinclair (Hormel) miniatura, Duroc e seus mestiços. O acasalamento selecionado nessas raças aumentou
a  prevalência dos tumores.  Essas  neoplasias  se  desenvolvem  antes  e  após o  nascimento,  em  qualquer  local  do  corpo.  Em  geral,  são  múltiplos  e  podem  aparecer  como  máculas  ou  manchas  pigmentadas,  com  bordas  lisas;  como  lesões
frequentemente ulceradas, proeminentes e pigmentadas; ou como tumefações azuladas, profundas e levemente elevadas. Melanomas profundamente invasivos, com frequência, estão associados a metástases. Linfonodos e pulmões são os
locais mais comuns de metástases. Nem todos os tumores se tornam invasivos, e muitos podem apresentar regressão espontânea associada a um infiltrado linfocítico intenso. Lesões melanocíticas em suínos não são tratadas; em razão da
natureza hereditária dessa doença, a prevenção por meio de acasalamento selecionado é recomendada se as lesões se tornam frequentemente na criação.

 TUMORES DE TECIDO CONJUNTIVO

Sarcomas de Tecidos Moles
Esse  grupo  de  neoplasias  malignas  inclui  sarcoides  equinos,  fibromatoses,  fibrossarcomas,  histiocitomas  fibrosos  malignos,  neurofibrossarcomas,  liomiossarcomas,  rabdomiossarcomas  e  variantes  de  lipossarcomas,  angiossarcomas,
sarcomas de células sinoviais, mesoteliomas e meningiomas. Como um grupo, os sarcomas são amplamente reconhecidos, mesmo sendo neoplasias pouco caracterizadas. A confusão advém, em parte, do fato de que os sarcomas das células
fusiformes mostram uma heterogeneidade morfológica muito maior do que os carcinomas; frequentemente, os padrões de um sarcoma misturam–se com os padrões de outro. Como consequência, é amplamente aceito que a célula de origem
de todos os sarcomas de tecidos moles é uma célula mesenquimal primitiva que pode se diferenciar em muitas outras. Isso torna difícil definir o critério histopatológico necessário para determinar um diagnóstico inequívoco de um sarcoma
de células fusiformes específico. Além disso, comparando as células neoplásicas mesenquimais com as células normais, elas são muito semelhantes, o que, no entanto, não traz implicações quanto à sua origem.
Uma segunda causa de confusão advém da dificuldade de determinar se os tumores são malignos ou benignos ou qual será o seu comportamento biológico em determinadas localizações ou raças. A maioria dos sarcomas das células
fusiformes dos animais domésticos é localmente infiltrativo e sua extirpação é difícil, mas raramente ocasiona metástase. Uma vez que, por definição, apenas os tumores malignos possuem potencial metastático, esses tumores devem ser
considerados benignos; no entanto, também por definição, as neoplasias benignas não são infiltrativas, e esses tumores devem ser considerados malignos e tratados agressivamente desde o início. Em patologia humana, os tumores de
células fusiformes mesenquimais infiltrativos e que não originam metástases foram definidos como sarcomas de malignidade intermediária, conceito utilizado a seguir.
Clinicamente, quatro princípios gerais relacionam os sarcomas de células fusiformes e os sarcomas de tecidos moles: quanto mais superficial a localização, maior a probabilidade de o tumor ser benigno (tumores profundos tendem a ser
malignos). Quanto maior o tumor, maior a chance de ser maligno. Um tumor de crescimento rápido tem maior chance de ser maligno do que o que se desenvolve lentamente. Tumores benignos são relativamente avasculares enquanto os
malignos tendem a ser hipervasculares.
A remoção é o tratamento de escolha; a extirpação ampla ou a amputação deve ser realizada quando for anatomicamente viável, uma vez que os sarcomas de células fusiformes geralmente se infiltram ao longo dos planos fasciais,
tornando difícil a determinação das margens periféricas do tumor pelo exame macroscópico. A melhor, se não a única, oportunidade de se remover por completo um sarcoma de célula fusiforme é durante a primeira abordagem cirúrgica.
Uma  biopsia  pré­cirúrgica  deve  ser  realizada  e  um  plano  cirúrgico  claro  deve  ser  definido,  incluindo  a  intenção  da  remoção  completa  com  amostras  para  biopsia  para  determinar  as  margens.  Esses  sarcomas  que  recidivam  têm  maior
potencial  para  metástases  e  o  período  de  recidiva  geralmente  diminui  em  cada  extirpação  subsequente.  Além  disso,  muitos  tumores  de  tecidos  moles  possuem  uma  pseudocápsula  que,  ao  exame  macroscópico,  dá  a  impressão  de  um
encapsulamento  completo;  esses  tumores  não  devem  ser  “desencapsulados”,  uma  vez  que  as  células  neoplásicas  quase  sempre  estão  presentes  nos  tecidos  conjuntivos  pericapsulares.  Muitos  sarcomas  podem  ter  a  forma  de  polvo,
com tentáculos que se estendem profundamente no leito tumoral. Exceto para os sarcoides equinos, a criocirurgia não costuma ser utilizada para esses tumores uma vez que alguns tipos, mais notavelmente os fibrossarcomas, são resistentes
ao congelamento. Os sarcomas de células fusiformes, em geral, não respondem bem às doses convencionais de radiação; entretanto, há relatos de controle por 1 ano com dose de, aproximadamente, 50% mais altas. A redução cirúrgica do
volume seguida de radiação também é uma opção para o controle local.
Alguns protocolos quimioterápicos para sarcomas se tornaram mais aceitáveis como métodos de tratamento. A maioria envolve o uso de adriamicina, geralmente em combinação com outros agentes, incluindo ciclofosfamida, vincristina,
dacarbazina e metotrexato. Alguns clínicos usam carboplatina intercalada com adriamicina. Apesar de a quimioterapia poder melhorar a qualidade e prolongar a vida dos animais acometidos, ela raramente é curativa.
Fibromatose  (fibromatose  agressiva,  desmoides  extrabdominais,  tumores  desmoides,  fibrossarcomas  de  baixo  grau,  fasciite  nodular)  é  uma  proliferação  esclerosante  e  infiltrativa  de  fibroblastos  bem  diferenciados  derivados  das
aponeuroses e das bainhas tendíneas. Em geral, é notada na cabeça de cães, em especial em Doberman Pinscher e Golden Retriever, nos quais são comumente diagnosticados como fasciite nodular. Em medicina veterinária, o termo fasciite
nodular  é  aplicado  a  duas  doenças  diferentes  –  uma  que  se  manifesta  como  fibromatose  e  outra  que  acomete  comumente  tecidos  perioculares  (conhecida  como  histiocitoma  fibroso  canino  [veja  a  seguir]).  As  fibromatoses  não  são
frequentemente diagnosticadas em gatos e em equinos. Macroscopicamente, as fibromatoses costumam ser indistinguíveis dos fibrossarcomas infiltrativos; no entanto, podem ser diferenciadas no exame histológico. Nódulos linfoides focais
estão espalhados por todos os tecidos. As fibromatoses são localmente infiltrativas e não apresentam potencial metastático. Se possível, a extirpação é o tratamento de escolha. Recidiva é comum e radioterapia pode ser benéfica para o
controle local.
Fibrossarcomas são tumores mesenquimais agressivos nos quais os fibroblastos são o tipo celular predominante. São os tumores de tecidos moles mais comuns em gatos; também são comuns em cães, mas raros em outros animais
domésticos.  Em  cães,  esses  tumores  são  mais  comuns  no  tronco  e  nas  extremidades.  Gordon  Setter,  Irish  Wolfhound,  Brittany  Spaniel,  Golden  Retriever  e  Doberman  Pinscher  são  raças  que  apresentam  predisposição  à  lesão.  Os
fibrossarcomas  variam  acentuadamente  em  tamanho  e  aparência.  Neoplasias  de  origem  dérmica  podem  parecer  nodulares.  Aquelas  de  origem  na  gordura  subcutânea  ou  em  tecidos  moles  subjacentes  podem  requerer  palpação  para
identificá­las. Se apresentam como lesões firmes e carnudas envolvendo a derme e a gordura subcutânea e, com frequência, invadem a musculatura junta aos planos fasciais. Quando os tumores são múltiplos, normalmente situam­se na
mesma  região  anatômica.  Os  fibrossarcomas  com  proteoglicanos  intersticiais  abundantes  (mucina  do  tecido  conjuntivo)  são  denominados  mixossarcomas  ou  mixofibrossarcomas.  Os  mixossarcomas  ainda  são  pouco  definidos  em
medicina veterinária e muitos deles podem ser caracterizados como variantes de lipossarcomas ou histiocitomas fibrosos malignos. Em cães, os fibrossarcomas são tumores invasivos e aproximadamente 10% ocasionam metástase. Os
fatores que definem se o fibrossarcoma pode ser completamente extirpado incluem habilidade do cirurgião, taxa de crescimento (definido pelo índice mitótico e extensão da necrose), grau de atipia celular e tamanho, localização e natureza
infiltrativa do tumor (que podem requerer diagnóstico por imagem para definição adequada).
Três formas de fibrossarcoma são reconhecidas em gatos: uma forma multicêntrica em animais jovens (em geral < 4 anos de idade) causada pelo vírus do sarcoma felino (VSF); uma forma solitária em animais jovens ou idosos, na qual o
VSF não tem participação; e um fibrossarcoma que se desenvolve nos tecidos moles onde os gatos são comumente vacinados (ver p. 2258). Uma associação com vacinas contra vírus da raiva e vírus da leucemia felina é mais bem definida
do que com vacinação contra outras doenças virais e bacterianas. O alumínio (um adjuvante comum em vacinas) foi detectado em fibrossarcomas induzidos por vacinas; uma proliferação prolongada de fibroblastos em resposta ao adjuvante
pode predispor à transformação neoplásica. Esses tumores parecem nódulos ou placas situados entre as escápulas, nos tecidos moles dos membros torácicos proximais ou, menos comumente, na região lombar. Apesar de serem comumente
classificados como fibrossarcomas, os sarcomas vacinais são extremamente heterogêneos e podem ser denominados de modo apropriado como histiocitomas fibrosos malignos (tumores de células gigantes), lipossarcomas, osteossarcomas
ou condrossarcomas.
O tratamento de escolha para fibrossarcomas é a extirpação cirúrgica ampla e profunda, mas uma vez que a maioria dos clínicos subestima a necessidade da remoção das margens de segurança, a recidiva é comum (> 70% em 1 ano após
a  cirurgia  inicial).  A  taxa  de  recidiva  é  >  90%  para  sarcomas  vacinais.  Mesmo  quando  a  extirpação  cirúrgica  é  clínica  e  histologicamente  completa,  ainda  pode  ocorrer  recidiva.  A  quimioterapia  com  carboplatina,  doxorrubicina  e
ciclofosfamida,  ou  dacarbazina  foi  recomendada  para  tumores  que  não  podem  ser  removidos  cirurgicamente.  Os  resultados  iniciais  de  modificadores  da  resposta  biológica  (utilizados  por  via  intratumoral  antes  da  extirpação  e  após
radioterapia) parecem promissores. Outros trabalhos sugerem que sua efetividade como auxiliar à cirurgia e à radioterapia pode aumentar os intervalos livres de tumores em até 20%, quando comparados com controles históricos.

Tumores de Bainha dos Nervos Periféricos
Neuromas  por  amputação  (neuromas  traumáticos)  são  proliferações  desorganizadas  não  neoplásicas  do  parênquima  e  do  estroma  dos  nervos  periféricos,  que  se  formam  em  resposta  à  amputação  ou  à  lesão  traumática.  São  mais
comumente identificados após amputação da cauda em cães ou neurectomia nas extremidades distais dos equinos. A apresentação clínica mais comum é um cão jovem que apresenta traumatismos constantes na ponta da cauda. Em equinos,
as lesões surgem como aumentos de volume firmes, com frequência doloridos, no local da cirurgia para neurectomia. A extirpação é curativa.
Neurofibromas  e  neurofibrossarcomas  (perineuromas,  neurilemomas,  tumores  da  bainha  nervosa,  hemangiopericitomas,  neurotecomas,  schwanomas)  são  tumores  de  células  fusiformes  que  se  originam  de  componentes  de  tecido
conjuntivo dos nervos periféricos. Acredita­se que eles se originam das células de Schwann, mas também podem ser oriundos de células mesenquimais, que produzem tecido conjuntivo não mielinizado que circunda as fibras nervosas
mielinizadas. Em cães, as formas desses tumores podem ser praticamente indistinguíveis dos hemangiopericitomas; podem ser o mesmo tumor.
Em cães e gatos, os tumores da bainha dos nervos periféricos da pele são diagnosticados em animais mais velhos. Em bovinos, suspeita­se de uma base genética, as lesões podem ser múltiplas e se desenvolver em animais jovens e velhos
e, em geral, são achados acidentais no matadouro; eles se originam dos nervos profundos da parede torácica e vísceras; o envolvimento cutâneo é raro. Independente da espécie, esses tumores parecem nódulos esbranquiçados e firmes.
Ocasionalmente, pode ser notada aderência aos nervos periféricos e são detectadas variações benignas e de malignidade intermediária. Os tumores benignos são mais comuns em bovinos, nos quais, em razão da sua natureza indolente, o
tratamento é opcional; além disso, tumores adicionais frequentemente se desenvolvem espontaneamente em outros locais, com o decorrer do tempo. Em cães, gatos e equinos, a maioria dos tumores é invasiva localmente, mas não origina
metástase. A extirpação completa é o tratamento de escolha. Quando as margens são estreitas ou insuficientes, a radioterapia pode aumentar o tempo livre de tumor.

Tumores da Musculatura Lisa Cutânea
Como  os  tumores  de  músculos  lisos  cutâneos  (liomiomas  e  liomiossarcomas)  não  são  detectados  ou  não  ocorrem  com  frequência  em  animais  domésticos,  raramente  são  diagnosticados.  Os  casos  relatados,  em  geral,  são  malignos  e
envolvem cães e gatos. Normalmente, tratam­se de massas cutâneas firmes. Os liomiomas são pequenos e tendem a ser limitados à derme, enquanto os liomiossarcomas são maiores e a maioria surge ou estende­se à gordura subcutânea. O
comportamento maligno dos tumores de músculo liso permanece pouco definido. A extirpação completa é o tratamento de escolha para liomiomas e liomiossarcomas.

Tumores de Tecido Adiposo
Lipomas são tumores benignos do tecido adiposo, talvez mais exatamente caracterizados como hamartomas. São comuns em cães, identificados ocasionalmente em gatos e equinos e raramente em outras espécies domésticas. Em cães,
costumam acometer animais mais velhos, fêmeas obesas, mais comumente no tronco e na região proximal dos membros. As raças em maior risco são Doberman Pinscher, Labrador Retriever, Schnauzer miniatura e cães mestiços. Gatos
Siameses mais velhos e castrados são predispostos e as lesões são vistas mais comumente no abdome ventral. A obesidade não parece ser um fator para desenvolvimento de lipomas, em gatos. Os equinos acometidos, em geral, têm < 2 anos
de idade. Os lipomas tipicamente surgem como massas macias, às vezes pedunculadas, discretas e nodulares e a maioria se move livremente. Em cães e gatos, > 5% são múltiplos. Em geral, esses tumores flutuam quando colocados em
formalina.
Uma variante rara desse tumor, a lipomatose difusa, foi identificada em cães da raça Dachshund, nos quais praticamente toda a pele é acometida, o que resulta em dobras proeminentes da pele no pescoço e no tronco. Muitos lipomas
unem­se imperceptivelmente ao tecido adiposo não neoplásico adjacente, tornando difícil saber se toda a lesão foi removida. Lipomas com estroma de tecido conjuntivo abundante (fibrolipomas), estroma cartilaginoso (condrolipomas) ou
um componente vascular proeminente (angiolipomas) também são relatados. Apesar de sua natureza benigna, os lipomas não devem ser ignorados devido sua tendência de crescimento com o tempo e porque sua apresentação macroscópica
pode ser indistinguível de lipomas infiltrativos ou de lipossarcomas (ver adiante). A extirpação é curativa. Em cães, a restrição dietética várias semanas antes da cirurgia pode permitir melhor definição das margens cirúrgicas do tumor.
Lipomas infiltrativos (lipomas intra e intermuscular) são raros nos cães e ainda menos comuns em gatos e equinos. Em cães, são mais comuns em fêmeas de meia­idade, em geral no tórax e nos membros. As raças (cães) em maior risco
são as mesmas mencionadas para lipomas. Esses tumores se apresentam como aumentos de volume pouco delimitados, macios e nodulares a difusos que, tipicamente, envolvem gordura subcutânea, musculatura subjacente e estroma de
tecido conjuntivo. Os lipomas infiltrativos, que atravessam os planos fasciais e passam entre os feixes do fuso musculoesquelético são considerados sarcomas de malignidade intermediária. Raramente ocasionam metástase. Recomenda­se
extirpação radical; pode ser necessária amputação.
Lipossarcomas são  neoplasias  raras  que  acomete  todos  os  animais  domésticos.  A  maioria  é  detectada  em  cães  machos  mais  velhos,  nos  quais  os  tumores  normalmente  se  desenvolvem  no  tronco  e  nas  extremidades;  cães  Shetland
Sheepdog e Beagle parecem predispostos. Em gatos, a infecção pelo vírus da leucemia felina tem sido associada de maneira infrequente com o seu desenvolvimento, no entanto, ainda não há definição se é apenas uma coincidência ou se
essa  infecção  realmente  desempenha  papel  importante  no  desenvolvimento  da  doença.  Os  lipossarcomas  são  nodulares  e  macios  a  firmes.  Podem  haver  exsudação  de  fluido  mucinoide,  quando  seccionados.  Muitos  apresentam  áreas
parcialmente encapsuladas palpáveis, mas não devem ser consideradas evidências de tumor benigno. Os lipossarcomas são neoplasias malignas de baixo potencial metastático, porém, com frequência são pseudoencapsulados. Extirpação
ampla é recomendada e recidiva é comum; portanto, deve–se realizar radioterapia pós­cirúrgica nos casos em que as margens foram insuficientes.

Tumores Fibroblásticos Benignos
Nevos colagenosos são defeitos de desenvolvimento benignos focais associados a aumento da deposição de colágeno na derme. São comuns em cães, incomuns em gatos e raros em grandes animais. Em geral, são encontrados em animais
de meia­idade ou idosos, com maior frequência nas extremidades distais e proximais, na cabeça, no pescoço e em áreas sujeitas a traumatismos. São nódulos dérmicos sésseis a proeminentes, com frequência com uma superfície papilar.
Duas  formas  são  observadas;  uma  desenvolve­se  na  derme  interfolicular  ou  na  gordura  subcutânea,  que  não  é  acompanhada  de  envolvimento  dos  anexos;  a  outra  forma  inclui  anexos  e  ocasiona  aumento  de  folículos,  geralmente
malformados, glândulas sebáceas e glândulas apócrinas. Essa última  forma  é  denominada displasia focal dos anexos.  A  extirpação  de  ambas  as  formas,  em  geral,  é  curativa;  embora  de  maneira  infrequente,  formas  expansivas  foram
identificadas e podem crescer tanto que se tornam muito grandes para serem removidas cirurgicamente.
Dermatofibrose nodular generalizada (dermatofibromas), raramente diagnosticada em cães da raça Pastor Alemão (acredita–se que seja uma característica autossômica dominante herdada) e ainda menos comumente em outras raças
caninas, é uma síndrome na qual múltiplos nevos colagenosos estão associados a cistadenocarcinomas renais e, em fêmeas, múltiplos liomiomas uterinos. As lesões de pele, inicialmente notadas em animais com 3 a 5 anos de idade, são
caracterizadas pelo desenvolvimento de múltiplos nevos colagenosos, variando de pouco palpáveis a grandes e nodulares, localizados geralmente nos membros, patas, cabeça e tronco. Podem apresentar distribuição simétrica. A doença
renal se desenvolve, aproximadamente, 3 a 5 anos após o surgimento das lesões de pele. Não há terapia conhecida para prevenir o desenvolvimento das neoplasias renais e uterinas.
Acrocórdons (apêndices cutâneos, fibromas moles, papilomas fibrovasculares) são lesões cutâneas distintas e benignas notadas em cães idosos. Essas lesões comuns podem ser solitárias ou múltiplas e podem se desenvolver em qualquer
raça, apesar de as raças de grande porte serem mais suscetíveis. Mais comumente, surgem como crescimentos exofíticos pedunculados, com frequência cobertos por uma superfície epidérmica verrucosa. O tratamento é opcional, mas
recomenda­se biopsia para confirmar o diagnóstico. Os acrocórdons são passíveis de extirpação cirúrgica, eletrocirurgia e criocirurgia, mas os cães que os manifestam são propensos ao desenvolvimento de outras lesões posteriormente.
Fibromas são proliferações celulares discretas, em geral de fibroblastos da derme. Histologicamente, podem se assemelhar aos nevos colagenosos ou aos apêndices cutâneos. Os fibromas ocorrem em todas as espécies domésticas, mas
acometem principalmente cães mais velhos. As raças mais propensas são Doberman Pinscher, Boxer (predispostos ao desenvolvimento de tumores múltiplos) e Golden Retriever. A cabeça e as extremidades são os locais mais acometidos.
Clinicamente, as lesões são discretas, em geral elevadas, com frequência alopécicas, originadas na derme ou na gordura subcutânea. À palpação, são firmes e flexíveis (fibroma duro) ou macias e flutuantes (fibroma mole). Essas lesões
são benignas e o tratamento é opcional; entretanto, a extirpação completa é recomendada, pois as lesões podem crescer bastante.

Tumores Fibro­histiocíticos
Esses  tumores  mesenquimais  pleomórficos  compostos  de  fibroblastos  e  células  histiocíticas  (geralmente  presentes  como  células  gigantes  multinucleadas)  permanecem  pouco  definidos  em  medicina  veterinária.  Uma  lesão
denominada histiocitoma fibroso canino (episcleroqueratite granulomatosa nodular, fasciite nodular, ceratoconjuntivite proliferativa, granuloma conjuntival, granuloma do Collie) é notada na junção episcleral e na córnea, principalmente
em cães da raça Colly jovens ou com meia­idade (2 a 4 anos), mas os padrões histológicos são mais sugestivos de uma resposta inflamatória granulomatosa do que de uma neoplasia. Como era de se esperar em processos inflamatórios não
infecciosos, essas lesões, em geral, respondem às injeções sublesionais de 10 a 40 mg de metilprednisolona.
Histiocitomas  fibrosos  malignos  (tumores  de  células  gigantes  extraósseas,  tumores  de  células  gigantes  de  tecidos  moles,  dermatofibrossarcomas)  são  encontrados  com  maior  frequência  na  pele  e  em  tecidos  moles  de  gatos;
ocasionalmente são verificados em equinos e mulas e raramente na pele de outros animais domésticos, inclusive cães. Em gatos, os histiocitomas fibrosos malignos são mais comuns nas extremidades distais da região cervical ventral de
animais mais velhos, mas também podem ser diagnosticados nos locais de vacinações. Em equinos e mulas, essas lesões foram descritas como tumores de células gigantes de tecidos moles. Acometem equídeos adultos jovens ou com meia­
idade; são aumentos de volume firmes, nodulares a difusos, superfície de corte esbranquiçada, com hemorragia variável. Histiocitomas fibrosos malignos são sarcomas de malignidade intermediária. São invasivos localmente e tendem à
recidiva após tentativa de extirpação completa, porém raramente causam metástase. Recomenda­se extirpação radical.

Tumores Vasculares
Hemangiomas da pele e de tecidos moles são proliferações benignas que se assemelham muito com vasos sanguíneos. Ainda não está definido se esses aumentos de volume são neoplasias, hamartomas ou malformações vasculares, e não
há  critério  que  permita  sua  diferenciação.  São  detectados  com  maior  frequência  em  cães,  ocasionalmente  em  gatos  e  equinos  e,  raramente,  em  bovinos  e  suínos;  são  achados  excepcionais  em  outros  animais  domésticos.  Em  cães,  são
tumores de animais adultos e se desenvolvem mais comumente no tronco e nas extremidades. Muitas raças caninas (incluindo Gordon Setter, Boxer e Airedale, Scottish e Kerry Blue Terrier) são consideradas mais suscetíveis. Os gatos
normalmente desenvolvem hemangiomas apenas quando adultos e as lesões são mais comuns na cabeça, extremidades e abdome. Em equinos, são mais comuns nas extremidades distais de animais jovens (< 1 ano de idade). Nos bovinos,
podem ser lesões congênitas ou podem acometer animais mais velhos. Bovinos leiteiros são predispostos ao desenvolvimento de hemangiomas disseminados (angiomatose) na pele e em órgãos internos. Em suínos, essas lesões, em geral, se
desenvolvem  na  pele  do  escroto  ou  da  região  perineal  de  animais  das  raças  Yorkshire,  Berkshire  e,  menos  comumente,  em  Chester  White.  Nas  duas  primeiras  raças,  acredita­se  que  a  doença  possa  ser  transmitida  geneticamente.  Os
hemangiomas são nódulos únicos ou múltiplos, circunscritos, com frequência comprimíveis e de coloração vermelha a preta. A epiderme de revestimento pode não ser afetada ou pode estar ulcerada ou papilar. Hemangiomas superficiais
pequenos que geralmente surgem como “bolhas de sangue” são conhecidos como angioceratomas. Quando os eritrócitos são esparsos ou ausentes no lúmen vascular, aplica­se o termo linfangioma. Os hemangiomas são benignos, mas sua
tendência a ulcerar e crescer bastante, associada à importância de confirmar o diagnóstico para estabelecer o prognóstico, indica a remoção. A extirpação é o tratamento de escolha, entretanto, em grandes animais nos quais as lesões podem
ser grandes e envolver as extremidades distais, a remoção pode ser difícil. Nesses casos, pode ser necessária criocirurgia ou radioterapia. Exceto em bovinos leiteiros com angiomatose, o desenvolvimento de tumores adicionais em novos
locais após a extirpação completa não é comum.
Hemangiopericitomas (sarcoma canino de células fusiformes, histiocitoma fibroso maligno canino, neurofibrossarcoma canino, perineuroma canino) são comuns em cães e raros (ou ausentes) em gatos. Esse tumor foi denominado
inicialmente em razão da presença de células fibroblásticas que circundam os pequenos vasos, no entanto, o nome apropriado continua controverso. Esses tumores se desenvolvem mais comumente nas extremidades distais e no tórax de
cães  idosos.  As  fêmeas  parecem  mais  predispostas,  além  de  cães  das  raças  Husky  Siberiano,  cães  mestiços,  Setter  Irlandes  e  Pastor  Alemão.  Os  hemangiopericitomas  tipicamente  se  apresentam  como  lesões  firmes,  multilobuladas  e
solitárias, com bordas irregulares, mais comuns na gordura subcutânea e, às vezes, na derme. Apresentam malignidade intermediária e potencial metastático limitado. A extirpação completa é o tratamento de escolha, mas em razão de sua
natureza infiltrativa, aproximadamente 30% apresentam recidiva. Se a primeira extirpação de qualquer sarcoma não for adequada, deve­se repetir a cirurgia para retirar por completo o leito tumoral. Na cirurgia, quimioterapia intralesional
com  carboplatina  e  radiação  intraoperatória  podem  aumentar  o  tempo  livre  de  tumor.  Também  pode­se  empregar  radioterapia  externa  como  uma  opção  para  o  controle  local  de  recidivas,  após  extirpação  incompleta  ou  com  margens
estreitas.
Angiossarcomas, indiscutivelmente os tumores de tecidos moles mais agressivos, são compostos de células que possuem muitas características funcionais e morfológicas do endotélio normal. Embora esses tumores geralmente sejam
classificados como hemangiossarcomas (com origem em vasos sanguíneos) e linfangiossarcomas (com origem em vasos linfáticos), essa distinção é arbitrária. O termo angioendotelioma também é utilizado. Esses tumores costumam surgir
espontaneamente, mas em cães com pelagem curta e, com frequência, branca, a lesão solar crônica ocasiona alteração no plexo vascular superficial, que inicialmente surge como hemangioma e progride para um tumor vascular maligno. As
raças propensas ao desenvolvimento de angiossarcomas induzidos por actina são Whippet, Greyhound Italiano, White Boxer e Pit Bull. Os patologistas, com frequência, diagnosticam essas lesões como hemangiossarcomas cutâneos.
Os angiossarcomas da pele e de tecidos moles acometem todos os animais domésticos, mas são mais comuns nos cães, geralmente em adultos ou animais mais velhos. Em cães, eles se desenvolvem com maior frequência no tronco,
quadril, coxas e extremidades distais. Além das raças propensas ao desenvolvimento dos angiossarcomas induzidos por actina, também são sujeitos cães das raças Irish Wolfhoun, Vizsla, Golden Retriever e Pastor Alemão. Em gatos, esse
tumor é observado mais comumente em animais mais velhos e machos castrados, nas extremidades e no tronco. Gatos com envolvimento cutâneo, subcutâneo ou visceral desenvolvem metástases distantes. A aparência dos angiossarcomas
pode  variar  acentuadamente.  Mais  comumente,  aparecem  como  nódulos  eritematosos  únicos  ou  múltiplos,  presentes  em  qualquer  local  da  pele  ou  de  tecidos  moles  subjacentes.  Com  menor  frequência,  surgem  como  equimoses  pouco
delimitadas. Todos os tumores crescem rapidamente, com frequência associados a grandes áreas de necrose e trombose, e são tipicamente vermelhos ou pretos, ao corte. Muitas vezes as neoplasias diagnosticadas como linfangiossarcomas
podem  ter  uma  quantidade  muito  menor  de  sangue  no  lúmem  e  os  espaços  vasculares  são  preenchidos  por  soro.  Tipicamente,  os  angiossarcomas  criam  seu  próprio  espaço  vascular  infiltrando­se  através  dos  tecidos  moles.  Metástases
distantes, em especial nos pulmões e no fígado, são comuns. Em outros animais domésticos, esses tumores não parecem se comportar de modo agressivo, sendo mais comum recidiva pós­secção do que metástases.
Para todas as espécies, a extirpação ampla é o tratamento de escolha. Hemangiossarcomas cutâneos caninos induzidos por luz solar, em geral, não possuem comportamento biológico agressivo, embora várias lesões possam continuar a
surgir ao longo de muitos anos. Lesões superficiais são facilmente controladas com crioterapia tópica, se necessário. Evitar a exposição à luz solar pode reduzir o desenvolvimento de novas lesões. Recentemente, relatou­se redução de
angiossarcomas com uso de quimioterapia auxiliar à base de vincristina, doxorrubicina e ciclofosfamida; entretanto, os efeitos da quimioterapia para controle sistêmico e da radioterapia para controle local e a sobrevida dos animais ainda
não foram definidos. O papel dos anti­inflamatórios não esteroides (AINE), como talidomida e piroxicam, ainda não é totalmente compreendido e pode variar de medicamento para medicamento. Pesquisadores têm a esperança de utilizar
compostos antiangiogênicos ou angiostáticos, como a canstatina canina, que interferem no suprimento sanguíneo aos tumores, controlando e prevenindo metástases; entretanto, ainda há pendência nos resultados de testes clínicos.

 TUMORES EPIDÉRMICOS E DE FOLÍCULOS PILOSOS
Os tumores de glândula ceruminosa são discutidos em tumores do canal auricular (p. 571).

Carcinomas de Célula Escamosa (Carcinomas epidermoides, carcinomas de célula espinhosa)

Acredita­se que se originam da epiderme ou do epitélio das regiões superficiais (infundibulares) da bainha da raiz externa do folículo piloso e são relatados em todas as espécies de animais domésticos. Embora a maioria dos tumores surja
sem causa antecedente, em muitas espécies, sobretudo em gatos brancos, a exposição prolongada à luz do sol é o principal fator predisponente. Os hábitos higiênicos dos gatos também os expõem a partículas carcinogênicas, como fumaça
de cigarro e coleiras antipulga. Além disso, uma forma única de carcinoma de célula escamosa felino associado à infecção por papilomavírus foi descrita (ver adiante).
Em cães, esses são os carcinomas com origem cutânea diagnosticados com maior frequência. Duas formas são reconhecidas – cutânea e subungueal. Os carcinomas de célula escamosa cutâneo são tumores de cães idosos, com maior
prevalência em Bloodhound, Basset Hound e Poodle padrão. As lesões comumente se desenvolvem na cabeça, extremidades distais, abdome ventral e períneo. A maioria dos carcinomas de célula escamosa cutâneo surge como nódulos e
placas firmes, elevadas e frequentemente ulceradas; às vezes podem ser extremamente exofíticos e possuir superfície parecida com a de uma verruga. A etiologia da maioria desses tumores não foi definida; no entanto, alguns são induzidos
por exposição prolongada ao sol. Esses normalmente se desenvolvem no abdome ventral, prepúcio, escroto e região inguinal em raças de pele branca e pelos curtos, como Dálmatas, Bull Terrier e Beagle. As lesões se desenvolvem em
regiões ventrais, pois a pele com poucos pelos oferece proteção mínima contra a radiação ultravioleta e, muitos animais deitam–se ao sol de costas ou, talvez, a radiação solar se reflita no chão. Antes do desenvolvimento do carcinoma, os
animais exibem zonas focais de lignificação, hiperqueratose e eritema, conhecidas como queratose solar (dermatose solar, queratose actínica e queratose senil).
Carcinomas de célula escamosa subungueal são mais comumente encontrados em cães Schnauzer gigante e padrão, Gordon Setter, Briard, Kerry Blue Terrier e Poodle padrão. Em geral, todas são raças de pelos negros e pelagem
escura,  associadas  ao  desenvolvimento  de  carcinomas  de  célula  escamosa  subungueal  em  vários  dígitos,  com  frequência  em  extremidades  diferentes.  As  fêmeas  possuem  uma  ligeira  predisposição  e  não  há  predileção  pelos  membros
torácicos ou pélvicos.
Em gatos, os carcinomas de célula escamosa cutâneos se desenvolvem mais comumente em razão de lesão solar crônica. Como consequência, normalmente se desenvolvem nos pavilhões auriculares, cristas frontais, pálpebras, nariz e
lábios de gatos que apresentam pele branca nessas áreas. Não há predileção racial ou por sexo. Assim como em cães, a queratose solar ou o carcinoma in situ (estágio superficial inicial), geralmente precedem o desenvolvimento do tumor
maligno. Recentemente, carcinógenos particulados associados aos pelos de animais expostos à fumaça de cigarro e coleiras antipulgas foram identificados como fatores de risco para gatos com carcinoma de célula escamosa oral. As lesões
que não são causadas pela exposição ao sol se desenvolvem mais comumente nos dígitos, mas as formas subungueais são incomuns.

Carcinoma de célula escamosa induzido pelo sol, em um cão de pele branca. Cortesia da Dra. Alice Villalobos.

Carcinomas de célula escamosa cutâneos são as neoplasias malignas mais comuns em equinos. Em geral, se desenvolvem em animais adultos ou idosos com pelagem branca ou com partes brancas; as raças em risco incluem Appaloosa,
Belga,  Paint  Americano  e  Pinto.  Embora  possam  surgir  em  qualquer  parte  do  corpo,  esses  tumores  se  originam  mais  comumente  de  áreas  não  pigmentadas,  com  poucos  pelos  e  próximas  às  membranas  mucosas.  Portanto,  as  regiões
periorbitais, lábios, nariz, ânus e genitália externa (em especial a bainha peniana) são os locais mais acometidos.
Em bovinos, esses tumores são mais comuns em raças com pelos brancos e pele pouco pigmentada (em especial Holandeses e Ayrshires) e, assim como em equinos, se desenvolvem ao redor das membranas mucosas, normalmente nas
junções mucocutâneas, em particular na região periocular e vulvar. Na Índia, os carcinomas de célula escamosa nos centros dos chifres são comuns em touros mais velhos. A causa mais comum é a lesão actínica. As queratoses solares, em
geral, precedem o desenvolvimento de um tumor invasivo; fatores genéticos, imunodeficiência e viroses também podem participar da fisiopatogenia.
Em ovinos, os carcinomas de célula escamosa têm importância econômica relevante em algumas partes do mundo. Em um estudo na Austrália, relata­se foram responsáveis por mais de um terço de todas as condenações antes do abate. A
raça Merino é mais predisposta, com maior prevalência nas fêmeas que nos machos. As lesões são mais comuns em áreas com poucos pelos, como orelhas, lábios, focinho e lábios vulvares, após terem sido externalizados pela técnica de
Mules para evitar o ataque de moscas. Tumores nesses locais desenvolvem–se em conjunto com a lesão solar, acentuando­se quando os animais ingerem plantas fotossensibilizantes. Tumores nas orelhas também podem ocorrer com maior
frequência após um procedimento de manejo, como a colocação de brincos. Os carcinomas de célula escamosa podem se desenvolver a partir de cistos foliculares em locais normalmente não expostos à luz solar.
Em caprinos, os carcinomas de célula escamosa se desenvolvem com maior frequência em fêmeas, nas quais as lesões se desenvolvem nas regiões perineal e vulvar e na pele dos tetos e do úbere. Machos e fêmeas podem desenvolver
tumores induzidos pelo sol, nas orelhas. Embora a raça Angorá seja mais predisposta, caprinos da raça Saanen, ocasionalmente desenvolvem essa neoplasia no úbere, em associação com papilomas. A participação de papilomavírus na
progressão do tumor ainda não foi esclarecida.
Os carcinomas de célula escamosa são extremamente incomuns em suínos.
Os carcinomas de célula escamosa, em sua maioria, são lesões solitárias; no entanto, tumores múltiplos podem se desenvolver em associação à lesão solar. Eles aparecem como lesões endofíticas ou exoendofíticas, sendo as primeiras,
massas dérmicas irregulares e elevadas cobertas com uma superfície ulcerada e as últimas como massas dérmicas irregulares e salientes cobertas por uma epiderme com papilas. Os gatos inicialmente desenvolvem crostas pequenas e feridas
na face que não cicatrizam. As lesões, em geral, persistem por meses antes de um defeito surgir nas pontas das orelhas, narinas e pálpebras. Os carcinomas de célula escamosa subungueais nos cães são identificados primeiramente por
claudicação ou malformação e infecção que mimetiza osteomielite crônica ou, ainda, perda dos coxins do dígito acometido. Em bovinos com envolvimento dos cornos, o primeiro sinal é o crescimento distorcido dos mesmos.

Carcinoma de célula escamosa em vaca. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Os carcinomas de célula escamosa são caracteristicamente invasivos aos tecidos moles e ósseos adjacentes. A remissão espontânea é rara em bovinos. Em pequenos animais, a sobrevida e o risco de metástase está relacionado com a
diferenciação histológica. Tumores bem diferenciados apresentam progressão lenta ou permanecem localizados; tumores indiferenciados têm maior probabilidade de desenvolver metástases ou recidiva 20 semanas após a extirpação. Em
geral, a falha no tratamento decorre do diagnóstico tardio e da falta de controle de uma doença local antes da metástase.
Para cães e gatos, a extirpação cirúrgica, tal como a amputação do dígito envolvido, do pavilhão auricular ou do focinho é o tratamento de escolha, recomendando­se no mínimo uma margem de 2 cm. Uma revisão de 117 tumores digitais
em cães mostrou que 25% das lesões eram carcinomas de célula escamosa e 66% eram lesões subungueais; 95% tiveram sobrevida de um ano após a amputação; no entanto, se a lesão se originava em outras partes do dígito, a sobrevida de
um ano era de 60%. A extirpação pode ser associada à radioterapia ou quimioterapia. Os carcinomas de célula escamosa felinos são mais radiossensíveis do que os tumores em cães. E ainda, a sobrevida de um ano nas neoplasias invasivas
foi < 10%. A criocirurgia e a hipertermia podem ser úteis na terapia local, em especial na fase inicial das lesões (carcinoma in situ), porém, estudos controlados ainda não foram feitos para determinar a eficácia dessas terapias. O implante
intralesional de quimioterápicos à base de 5­fluoruracila, cisplatina ou carboplatina com retinoides e a terapia fotodinâmica foram utilizados com sucesso variável. A injeção intratumoral em carcinomas de célula escamosa nasais em gatos
com carboplatina em uma emulsão oleosa com semente de gergelim resultou em uma resposta total de 70%, com taxa de sobrevivência de um ano, sem progressão da lesão, em, aproximadamente, 50% dos animais. Em cães com queratose
actínica  ventral  múltipla,  a  terapia  tópica  com  dinitroclorobenzeno  ou  5­fluoruracila  (5%)  pode  ser  benéfica.  Gatos  não  devem  receber  tratamento  com  5­fluoroacil.  Limitar  a  exposição  à  radiação  ultravioleta  pode  ajudar  a  prevenir
carcinomas de célula  escamosa  induzidos  por  sol,  em  cães  e  gatos.  Isso  pode  ser  obtido  com  uso  de  filme  com  filtro  UV  nas  janelas,  protetor  solar  e  manutenção  dos  animais  no  interior  da  residência  nas  horas  de  luz  solar  máxima.
Tatuagens, marcadores mágicos e protetores solares são utilizados com sucesso variável.
Em equinos, a radioterapia utilizando braquiterapia intersticial ou superficial é o tratamento de escolha para carcinomas de célula escamosa. Outras opções incluem implantes de 90Sr ou  192Ir, extirpação cirúrgica ampla (em especial de
neoplasias de terceira pálpebra, pênis e prepúcio) e criocirurgia. A imunoterapia, com vacina autógena feita de tecido tumoral suspenso em adjuvante de Freund ou com imunomoduladores inespecíficos utilizando Corynebacterium parvum,
mostrou alguma eficácia no tratamento de carcinoma de célula escamosa ocular ou de núcleo dos cornos em bovinos.
Carcinoma  de  célula  escamosa  multicêntrico  felino  in  situ  (doença  de  Bowen  felina)  é  uma  doença  de  gatos  velhos  (>  10  anos)  que  pode  estar  associada  à  imunossupressão.  Não  há  predisposição  definida  por  raça  ou  sexo.
Clinicamente,  as  lesões  parecem  pápulas  ou  placas  múltiplas,  discretas,  eritematosas,  pretas  ou  marrons  e  hiperceratóticas.  As  lesões  não  são  pruriginosas  e  ulceração  é  incomum.  O  seu  desenvolvimento  está  associado  à  presença  de
papilomavírus. O termo in situ se  refere  a  uma  proliferação  maligna  de  células  epidérmicas  e  da  bainha  externa  folicular  que  não  invade  a  derme  subjacente.  Infelizmente,  as  lesões  podem  progredir  com  o  passar  do  tempo  para  um
carcinoma invasivo. Metástases são extremamente incomuns. Essas lesões, em geral, se desenvolvem em gatos com doença sistêmica ou imunodeprimidos e acredita­se que sejam induzidas por vírus. Não respondem à terapia.

Cistos Cutâneos Ceratinizados
A maioria desses cistos representa malformações do folículo piloso. São comuns em cães, ocasionais em gatos, equinos, caprinos e ovinos e, raramente, em bovinos e suínos. O tratamento de escolha é a extirpação. Compressão vigorosa
das lesões é contraindicada, pois em geral, desencadeia uma grave resposta inflamatória semelhante a corpo estranho.
Cistos foliculares infundibulares (cistos epidermoides, cistos de inclusão epidérmica, erroneamente denominados cistos sebáceos) são os mais comuns. São dilatações císticas da porção superior da bainha externa do folículo piloso (o
infundíbulo) cercadas por uma camada de células epiteliais estratificadas cornificadas que são indistinguíveis da epiderme. O tamanho dos cistos varia de 2 mm a > 5 cm (lesões < 5 mm de diâmetro normalmente são denominadas milia).
Ovinos da raça Merino são os únicos animais domésticos em risco, nos quais esses cistos, com frequência, são múltiplos e podem evoluir para carcinoma de célula escamosa. Assim como todos os cistos foliculares, em geral, esses são
solitários, com lesões papulares a nodulares livremente móveis, parcialmente compressíveis à palpação e, ocasionalmente, possuem pequena abertura através da epiderme, por onde o conteúdo cístico pode ser drenado. Ao corte nota­se que
são preenchidos por um material cinza, marrom ou amarelado, granular e caseoso que constitui a queratina luminal.
Cistos do istmo catagênico (cisto tricolemal, cisto pilar, epitelioma cornificante intracutâneo cístico) são cistos foliculares que possuem um padrão de queratinização da porção inferior da bainha externa da raiz. Foram identificados
definitivamente apenas em cães e, raramente, em gatos.
Cistos  de  matriz  são  cistos  foliculares  nos  quais  a  parede  assemelha­se  ao  epitélio  do  bulbo  piloso  (a  matriz  do  folículo  piloso)  e  à  bainha  interna  da  raiz.  Ocorrem  predominantemente  em  cães  e  gatos.  Muitos  progridem  para
pilomatricomas (ver adiante).
Cistos híbridos (cistos panfoliculares) são cistos foliculares que têm uma combinação das características dos cistos de inclusão epidérmica, tricolemais e cistos da matriz e são encontrados predominantemente em cães e gatos. Muitos
progridem para tricoepiteliomas (ver adiante).
Cistos dermoides são malformações congênitas encontradas mais comumente na linha média dorsal da cabeça ou ao longo da coluna vertebral. São identificados comumente em cães das raças Boxer, Kerry Blue Terrier e Rhodesian
Ridgeback e em equinos Puro Sangue e, possivelmente, em ovinos Suffolk. Tipicamente múltiplos, eles diferem dos outros cistos foliculares, pois na superfície de corte apresentam eixos pilosos totalmente formados. São considerados os
únicos cistos de inclusão epidérmica verdadeiros, pois representam uma invaginação embrionária da epiderme com os anexos associados. Esses anexos são responsáveis pelos eixos pilosos vistos no lúmen dos cistos.
Ceratomas são lesões císticas na parede do casco ou, com menos frequência, na quartela ou talões de animais com cascos simples ou duplos. Com frequência, são secundários a lesões traumáticas. Apesar de normalmente assintomáticos,
costumam induzir claudicação e deformidades da parede ou da sola do casco, podendo estar associados à lise da falange distal. Ceratomas raramente têm > 5 cm de diâmetro e contêm queratina laminada de coloração branca a marrom, com
frequência com um centro necrótico associado à inflamação secundária. Quando há claudicação, o tratamento de escolha é extirpação cirúrgica e curetagem do osso adjacente, caso esteja acometido.
Dilatação de poros de Winer são neoplasias raras de folículos pilosos, notadas apenas em gatos mais velhos. Os machos podem ser predispostos e as lesões, em geral, se desenvolvem na cabeça. Clinicamente caracterizam­se por lesões
solitárias,  em  forma  de  cúpula,  com  a  aparência  de  um  comedão  gigante.  A  queratina  compactada  pode  protruir  para  a  superfície  (acima),  conferindo  à  lesão  uma  aparência  de  corno  cutâneo.  Essas  lesões  são  benignas  e  a  extirpação
completa é curativa.

Epiteliomas Cornificantes Intracutâneos (Ceratoacantoma, Acantoma ceratinizante infundibular)
Epiteliomas  cornificantes  intracutâneos  são  neoplasias  benignas  de  cães  e,  possivelmente,  de  gatos.  Assim  como  os  ceratoacantomas  em  pessoas,  essas  lesões  têm  origem  mais  provavelmente  nos  folículos  pilosos  e  não  na  epiderme
interfolicular. Podem se desenvolver em qualquer parte do corpo, sendo o dorso, a cauda e as extremidades os locais mais comuns. Os epiteliomas cornificantes intracutâneos são tumores de cães de meia­idade. As raças mais predispostas
são Elkhound Norueguês, Pastor Belga, Lhasa Apso e Bearded Collie, sendo que Elkhound Norueguês e Lhasa Apso apresentam risco de desenvolvimento de lesões generalizadas. A apresentação clínica mais característica é uma pápula ou
nódulo com um poro central cornificado que pode protruir acima da superfície epidérmica, com aparência de corno; no entanto, muitos desses tumores não têm continuidade com a epiderme e podem se apresentar unicamente como cistos
cornificados. Esses tumores são benignos e o tratamento é opcional, desde que o diagnóstico definitivo tenha sido estabelecido e não haja autotraumatismo, ulceração ou infecção secundária. A extirpação é curativa, no entanto, os cães estão
predispostos ao desenvolvimento de outros tumores com o decorrer do tempo. Para animais com a forma generalizada da doença, retinoides orais (p. ex., isotretinoína ou etretinato) podem propiciar benefícios terapêuticos.

Lesões Papilomatosas Benignas Não Associadas a Vírus
Para uma discussão sobre papilomas (verrugas virais), a mais comum das neoplasias cutâneas provocadas por vírus, ver p. 956. Lesões benignas proliferativas não associadas a infecção por papilomavírus podem apresentar morfologia
macroscópica semelhante àquela dos papilomas.
Hamartomas  epidérmicos  (nevos)  são  proliferações  raras  identificadas  apenas  em  cães,  com  maior  frequência  em  animais  jovens.  Em  cães  da  raça  Cocker  Spaniel,  a  doença  pode  ser  hereditária.  Macroscopicamente,  os  nevos
epidérmicos surgem como pápulas e placas pigmentadas, hiperceratóticas ou pápulas vagamente papilomatosas, que, ocasionalmente, são arranjadas em um padrão linear. Algumas formas são associadas a pústulas e células acantolíticas.
Eles  são  benignos,  mas  a  sua  aparência  é  desagradável  e  a  extensa  hiperqueratose  predispõe  à  infecção  bacteriana  secundária.  Lesões  localizadas  podem  ser  excisadas;  cães  com  múltiplas  lesões  ou  lesões  muito  grandes  para  serem
removidas cirurgicamente podem ser responsivos à terapia com isotretinoína ou etretinato. A hiperqueratose pode ser controlada transitoriamente com a utilização de xampus ceratolíticos e emolientes tópicos.
Papilomas congênitos dos potros são  raros  e,  provavelmente,  são  defeitos  de  desenvolvimento  e  não  resultado  de  infecção  por  papilomavírus.  Eles  são  encontrados  em  qualquer  área  do  corpo,  porém  são  mais  comuns  na  cabeça.
Animais Puro Sangue podem ser predispostos. As lesões, presentes ao nascimento, apresentam vários centímetros de diâmetro, alopecia e são pedunculadas e exofíticas, com uma superfície papilar assemelhando­se a uma couve­flor. São
benignos e a extirpação é curativa.
Disceratomas verrucosos caninos são neoplasias benignas raras de origem não conhecida, mas com aspectos histológicos de neoplasia folicular ou apócrina (ou ambas). Macroscopicamente, apresentam­se como pápulas verrucosas ou
nódulos com centro ceratótico umbilicado. A extirpação é curativa.

Papilomas (Verrugas)
Papilomavírus são vírus pequenos, com ácido desoxirribonucleico (DNA) de filamento duplo e pertencem à família Papovaviridae. Alguns mamíferos possuem vários papilomavírus distintos – humanos têm > 20; bovinos, 6; cães, 3; e
coelhos,  2.  Os  diferentes  papilomavirus,  em  geral,  apresentam  especificidade  considerável  quanto  à  espécie,  local  e  histologia.  Os  vírus  são  transmitidos  por  contato  direto,  fômites  e,  possivelmente,  por  insetos.  Os  papilomas  foram
descritos em todos os animais domésticos, aves e peixes. Papilomas múltiplos (papilomatose) na pele ou superfície mucosa geralmente são observados em animais mais jovens e normalmente são causados por vírus. Papilomatose é mais
comum em bovinos, equinos e cães. Papilomas solitários são mais frequentes em animais mais velhos e nem sempre são causados por infecção viral.
Quando as lesões são múltiplas, podem ser suficientemente características para confirmar o diagnóstico; no entanto, há muitas lesões semelhantes a verrugas e um diagnóstico definitivo requer a identificação do vírus ou de seu efeito
citopático nas células individuais – uma alteração conhecida como atipia coilocítica ou coilocitose.
Em bovinos, os papilomas são encontrados comumente na cabeça, pescoço e escápula e, ocasionalmente, no dorso e abdome. A extensão e a duração das lesões dependem do tipo de vírus, da área afetada e do grau de suscetibilidade. As
verrugas surgem aproximadamente dois meses após a exposição e podem durar = 1 ano. A papilomatose se torna um problema de rebanho quando um grupo grande de bovinos jovens suscetíveis se torna infectado. A imunidade, em geral,
se desenvolve 3 a 4 semanas após a infecção inicial, mas ocasionalmente há recidiva de papilomatose, provavelmente em razão da perda de imunidade.
Embora a maioria dos papilomas apareça como proliferações epidérmicas com superfície ceratótica semelhante à couve­flor (verruca vulgaris), alguns papilomavírus bovinos (papilomavírus bovino tipos 1 e 2) envolvem fibroblastos e
ceratinócitos da derme e parecem papulonódulos com superfície verrucosa. Tais fibropapilomas podem envolver órgãos sexuais, onde causam dor, desfiguração, infecção do pênis de touros jovens e distocia quando a mucosa vaginal de
novilhas é acometida.
Uma forma persistente de papilomatose cutânea com menor número de papilomas pode ser observada em rebanhos de bovinos mais velhos. Um papilomavírus bovino foi isolado de tumores de bexiga associados à ingestão de samambaia
(p. 3159) e em papilomas de trato GI superior de bovinos, na Escócia. Acredita­se que o papilomavírus atue como cocarcinógeno. Quando um papilomavírus tipo 1 ou 2 é injetado na pele de equinos, desenvolve­se um tumor dérmico
semelhante ao sarcoide equino.
Em equinos, papilomas pequenos e disseminados ocorrem no nariz, lábios, pálpebras, região distal dos membros, pênis, vulva, glândulas mamárias e na superfície interna do pavilhão auricular, em geral, secundários a abrasões brandas.
Podem ser um problema de plantel, em especial quando equinos jovens são mantidos juntos, mas há regressão em poucos meses, assim que ocorre desenvolvimento da imunidade do potro. Em geral, as verrugas persistem por mais de 1 ano
quando se desenvolvem em equinos mais velhos. Acredita­se que as chamadas placas auriculares também sejam uma forma plana de papiloma (verruca planum). Os papilomas equinos causam desfiguração, porém são benignos. Devem ser
distinguidos de sarcoide verrucoso equino (ver adiante).
Em  cães,  foram  descritas  três  manifestações  clínicas  de  infecção  por  papilomavírus  canino.  A  primeira  é papilomatose  das  membranas  mucosas, que  acomete  principalmente  cães  jovens.  Caracteriza­se  pela  presença  de  verrugas
múltiplas na membrana mucosa bucal, dos lábios ao esôfago (ocasionalmente) e na membrana mucosa conjuntival e da pele adjacente, que contém pelos. Quando a cavidade bucal é gravemente afetada, há interferência na mastigação e na
deglutição. Uma etiologia viral foi claramente estabelecida para essas lesões. A segunda apresentação clínica, os papilomas cutâneos,  é  indistinguível  das  verrugas  que  se  desenvolvem  nas  membranas  mucosas  ou  ao  redor  delas.  No
entanto, são mais frequentemente solitárias e acometem cães mais velhos. Cocker Spaniel e Kerry Blue Terrier podem ser as raças mais predispostas. Não foi estabelecida uma etiologia viral definitiva e as lesões podem ser confundidas
com apêndices cutâneos. Uma síndrome caracterizada por papilomatose em um ou mais coxins também foi descrita. Clinicamente, as lesões aparecem como cornos ceratinizados múltiplos e elevados. Uma etiologia viral foi sugerida, porém
não foi comprovada. A terceira apresentação são papilomas cutâneos invertidos, que parecem ter mais em comum clinicamente com os epiteliomas intracutâneos cornificantes. Nessa doença de cães jovens e adultos, as lesões comumente
se desenvolvem no abdome ventral, onde parecem papulonódulos elevados com um centro ceratótico. Raramente, papilomas virais em cães podem progredir para carcinomas de célula escamosa invasivo.
Em gatos, a infecção por papilomavírus aparece mais comumente como carcinoma de célula escamosa multicêntrico (p. 944). As lesões tipicamente verrucosas associadas à infecção por papilomavírus na maioria das espécies não estão
presentes. Os papilomas podem afetar a pele de caprinos e a infecção dos tetos foi relatada por induzir uma transformação maligna. Em ovinos, os papilomas são raros e sua apresentação mais comum é como fibropapilomas. Em suínos,
essas lesões são muito raras e, quando presentes, são identificadas como lesões solitárias ou múltiplas na face ou na genitália (para discussão sobre papilomatose em coelhos, ver p. 1948).
Um fibroma cutâneo acomete veados de cauda branca, veados de cauda preta, veados orelhudos e antílopes, alces e caribus. É causado por um papilomavírus que lembra o papilomavírus bovino, encontrado apenas no epitélio que recobre
os tumores.
A papilomatose infecciosa é uma doença autolimitante, embora a duração das verrugas varie consideravelmente. Uma série de tratamentos foi proposta, no entanto ainda não há concordância quanto à eficácia dos mesmos. A remoção
cirúrgica é recomendada se as verrugas forem suficientemente nocivas. No entanto, se a cirurgia for realizada no estágio inicial de crescimento das verrugas pode haver recidiva e estímulo ao crescimento; dessa forma, devem ser removidas
quando próximas ao seu tamanho máximo ou quando estiverem em regressão. Os animais acometidos devem ser isolados dos suscetíveis, porém, como o período de incubação é longo, é provável que muitos animais tenham sido expostos
antes que o problema seja detectado.
As vacinas possuem algum valor como prevenção, mas têm pouco valor no tratamento de bovinos que já apresentam as lesões. Uma vez que os papilomavírus são muito espécie­específicos, não se justifica o uso de vacina de uma
espécie, em outra.
Quando a doença se torna um problema de rebanho, pode ser controlada por meio da vacinação com uma suspensão de tecido da lesão no qual o vírus foi morto em formalina. Vacinas autógenas podem ser mais efetivas do que as
disponíveis comercialmente. Pode ser necessário iniciar a vacinação em bezerros com 4 a 6 semanas de idade, na dose de, aproximadamente, 0,4 ml, por via intradérmica, em dois locais. A vacinação deve ser repetida em 4 a 6 semanas e
com 1 ano de idade. A imunidade se desenvolve em poucas semanas, mas não está relacionada com nenhum mecanismo envolvido na regressão espontânea. Se o animal foi exposto ao vírus antes da vacinação, a imunidade necessária para
prevenir as verrugas pode ocorrer tardiamente. Um programa de vacinação deve ter sido implantado por, aproximadamente, 3 a 6 meses antes que seu valor preventivo seja evidente. A vacinação deve ser mantida por = 1 ano após a última
verruga desaparecer, pois as instalações ainda podem estar contaminadas. Baias, balaústres e outros materiais inertes podem ser desinfetados pela fumigação com formaldeído.

Tumores de Folículo Piloso
O folículo piloso é uma estrutura complexa, composta por 8 camadas epiteliais. Os tumores dessa estrutura são complexos e há necessidade de muitos trabalhos para caracterizá­los melhor. São mais comuns em cães, menos frequentes em
gatos e raros em outros animais domésticos.
Tricolemomas são neoplasias dos folículos pilosos de cães, raras e benignas, encontrados mais comumente na cabeça. Os cães da raça Poodle podem ser predispostos. Esses tumores derivam da porção inferior da bainha externa da raiz e,
normalmente têm áreas de transição para tumores de célula basal. Possuem pouco em comum com um tumor de mesmo nome em pessoas, que representa uma verruga antiga. Caracterizam–se como massas ovoides e firmes, com 1 a 7 cm
de diâmetro, que são encapsuladas, mas se expandem com o tempo. A extirpação é curativa.
Tricofoliculomas são tumores foliculares de cães, extremamente raros, compostos pela região inferior e do istmo de muitos folículos de abortação, em que seu conteúdo luminal é extruído para um infundíbulo cístico dilatado anormal.
Pouco se sabe se há predileção por idade, raça ou sexo. Considerado por alguns como hamartoma, em vez de uma neoplasia verdadeira, esses tumores são benignos e a extirpação cirúrgica completa é curativa.
Tricoepiteliomas são neoplasias císticas do folículo piloso de cães e, menos comumente, de gatos, nas quais todos os elementos do folículo piloso (infundíbulo, istmo e porções inferiores) e os padrões de cornificação que eles produzem
estão representados. O epitélio e a cornificação das porções infundibular e do istmo são predominantes. Foram detectadas formas benignas e malignas. Em cães, essas lesões podem ocorrer em qualquer idade, porém são mais comuns em
animais de meia­idade. Muitas raças são predispostas, incluindo Basset Hound, Bull Mastiff, Setter Irlandês, Poodle padrão, Springer Spaniel Inglês e Golden Retriever. Não há predileção sexual definida. Os tumores podem se desenvolver
em qualquer local do corpo, principalmente no tronco de cães ou na cabeça, cauda e extremidades de gatos. As formas benignas parecem nódulos císticos encapsulados palpáveis (1 a 5 cm de diâmetro) na derme e na gordura subcutânea. A
expansão dos cistos ou autotraumatismo pode induzir ulceração associada a extravasamento da queratina luminal, um material de aparência caseosa, condensada, granular e amarelada. A extirpação é curativa, no entanto, animais que
desenvolvem um tumor são propensos ao desenvolvimento de lesões adicionais em outros locais. Isso é especialmente verdadeiro em cães das raças Basset Hound e Springer Spaniel Inglês.
Tricoepiteliomas malignos são muito menos comuns do que tricoepiteliomas benignos e se diferem pela capacidade de invasão local, continuidade com a epiderme e associação com inflamação intensa, necrose e fibrose. Metástases não
são comuns. A extirpação cirúrgica ampla é o tratamento de escolha e, em geral, é curativa naqueles tumores invasivos, mas com potencial metastático mínimo.
Pilomatricomas (tumores de matriz pilosa, epiteliomas calcificantes [de Malherbe]) são neoplasias císticas de folículos pilosos verificadas quase que exclusivamente em cães. Diferentemente dos tricoepiteliomas, nos quais todos os
elementos do folículo piloso estão representados, nos pilomatricomas apenas as células da região da matriz da parte inferior do folículo piloso e o padrão de cornificação que eles produzem (eixo piloso e porção interna da raiz) estão
presentes. Formas benignas e malignas são notadas. Tumores benignos são mais comuns no tronco de cães de meia­idade; as raças de maior risco são Kerry Blue, Wheaten Terrier, Bouviers des Flandres, Bichon Frise e Poodle padrão.
Macroscopicamente, esses tumores são indistinguíveis dos tricoepiteliomas, porém seu conteúdo cístico quase sempre é granular em razão da mineralização. A extirpação é o tratamento de escolha. Assim como com os tricoepiteliomas, os
cães que desenvolvem essa lesão quase sempre desenvolvem outras, posteriormente.
Pilomatricomas  malignos  (tumor  maligno  de  matriz,  carcinoma  matricial)  são  raros  e  foram  identificados  com  maior  frequência  em  cães.  São  tumores  de  cães  idosos  caracterizados  macroscopicamente  por  lesões  solitárias  ou
multinodulares, variavelmente císticas, com frequência aderidas firmemente aos tecidos moles subjacentes. Como são invasivos, são de difícil extirpação e a recidiva é comum após tentativas de remoção cirúrgica. Em geral, ocorrem
metástases nos linfonodos que drenam a região e em órgãos internos, em especial nos pulmões. Recomenda­se cirurgia radical. A resposta à radioterapia ou à quimioterapia ainda não é conhecida.

Tumores de Glândulas Apócrinas Cutâneas
Existem dois tipos de glândulas sudoríparas: apócrinas e écrinas. As glândulas apócrinas são tubulares, com uma porção secretora em espiral e um ducto reto longo que desemboca no infundíbulo folicular. Nos animais domésticos, todos os
folículos pilosos possuem glândulas apócrinas. Em cães e gatos, essas glândulas também estão associadas ao saco anal e glândulas apócrinas modificadas, conhecidas como glândulas ceruminosas, estão presentes no meato acústico externo.
Na  maioria  dos  mamíferos,  elas  produzem  uma  substância  odorífera  oleosa,  com  função  de  atração  sexual,  marcação  territorial  e  sinalização  de  ameaça.  Em  equinos  e  bovinos,  essas  glândulas  participação  da  termorregulação  por
produzirem suor.
Tumores e malformações das glândulas apócrinas são mais comuns em cães e gatos. Foram caracterizadas três doenças das glândulas apócrinas da pele que contém pelos.
A dilatação cística de glândula apócrina (cisto de glândula apócrina, hiperplasia cística de glândula apócrina, cistomatose apócrina) é mais bem caracterizada como um hamartoma. Há duas formas: uma forma cística, na qual um ou
mais cistos se desenvolvem na derme média a superior, com pouca associação com folículos pilosos, e outra forma mais difusa, caracterizada por glândula apócrina dilatada por cisto, associada a múltiplos folículos pilosos em uma pele não
lesionada. As duas formas acometem cães de meia­idade ou idosos e, mais raramente, gatos. Os locais mais comuns de desenvolvimento das lesões são cabeça e pescoço. Em ambas as espécies, as lesões surgem como cistos dérmicos
flutuantes ou como bolhas translúcidas. A extirpação completa é curativa, no entanto, a cura da forma difusa pode ser difícil.
Adenomas de glândula apócrina são diagnosticados quase que exclusivamente em cães e gatos e, raramente, em equinos. Dois tipos são reconhecidos com base na aparência histológica, que lembra principalmente a porção secretora ou
ductal da glândula apócrina. Os adenomas apócrinos se assemelham à região secretora da glândula apócrina e são notados em cães e gatos mais velhos. As raças mais comumente afetadas são Chow Chow, Malamute do Alasca e Great
Pirineus. Os locais mais frequentes de desenvolvimento das lesões são cabeça, pescoço e extremidades. Em gatos, o adenoma de glândula apócrina ocorre mais em machos e não parece haver predileção racial. A grande maioria das lesões
surge na cabeça, sobretudo no pavilhão auricular. Em equinos, não há associação conhecida com idade, sexo ou raça e o pavilhão auricular e a vulva são as regiões mais acometidas por esses tumores. Em todas as espécies, essas neoplasias
aparecem como cistos firmes a flutuantes, raramente > 4 cm de diâmetro. Contêm quantidade variável de fluido límpido a amarronzado. Em gatos, o fluido luminal tem uma pigmentação escura e os cistos apócrinos podem ser confundidos
clinicamente com melanocitomas, em especial quando presentes na parte interna das orelhas. Os adenomas apócrinos ductulares são menos comuns. São encontrados em cães e gatos mais velhos e derivam ou mostram diferenciação em
ductos  apócrinos.  Em  cães,  esses  tumores  são  mais  prevalentes  nas  raças  Peekapoo,  Old  English  Sheepdog  e  Springer  Spaniel  Inglês.  Em  geral,  são  menores,  mais  firmes  e  menos  císticos  do  que  os  adenomas  apócrinos.  Como,  com
frequência,  consistem  de  uma  grande  população  de  células  basais  e  como  a  diferenciação  ductular  poder  ser  muito  discreta,  esses  tumores  geralmente  são  diagnosticados  histologicamente  como  tumor  de  célula  basal  (ver  p.  926).  Os
adenomas apócrinos e os adenomas apócrinos ductulares são benignos e a extirpação cirúrgica completa é curativa.
Os adenocarcinomas de glândula apócrina da pele que contém pelos são raros em todas as espécies domésticas, porém são identificados com maior frequência em cães e gatos mais velhos. Cães das raças Treeing Walker Coonhound,
Elkhound Norueguês, Pastor Alemão e cães mestiços apresentam maior risco de desenvolvimento desse tipo de tumor. Gatos da raça Siamesa podem ser predispostos. Em ambas as espécies, esse tumor ocorre com maior frequência nas
regiões axilar e inguinal – locais nos quais podem ser facilmente confundido clinica e histologicamente com adenocarcinoma de ducto de glândula mamária. Os adenocarcinomas das glândulas apócrinas, em geral, são maiores que os
adenomas e têm aparência clínica variável, podendo se apresentar como nódulos dérmicos fibrosados até placas ulceradas. São localmente invasivos e com frequência causam metástase aos linfonodos satélites. Menos comumente, há
metástase na pele e nos pulmões. A extirpação cirúrgica completa é o tratamento de eleição. Pouco se sabe a respeito da resposta ao tratamento auxiliar com quimioterápicos.

Tumores de Glândula Apócrina do Saco Anal
Esses tumores foram identificados de maneira definitiva apenas em cães; no entanto, alguns relatos anedóticos sugerem que também podem acometer gatos. As raças com maior risco são Cocker Inglês e Springer Spaniel mais velhos,
Dachshund,  Malamute  do  Alasca,  Pastor  Alemão  e  cães  mestiços.  Diferentemente  dos  tumores  das  glândulas  hepatoides  (ver  adiante),  não  há  predileção  por  sexo.  Normalmente,  as  lesões  aparecem  como  massas  profundas,  firmes  e
nodulares próximas ao saco anal. Com o crescimento das lesões, pode haver compressão do reto, induzindo à constipação intestinal. Alguns desses tumores estão associados a uma síndrome paraneoplásica caracterizada por hipercalcemia e
resultam  em  anorexia,  perda  de  peso,  poliúria  e  polidipsia.  Com  frequência  são  altamente  infiltrativos  no  canal  pélvico  e  comumente  (90%)  causam  metástase  nos  linfonodos  sublombares  ou  em  órgãos  internos  distantes  (40%).  O
tratamento  de  eleição  é  a  extirpação  cirúrgica  ampla,  incluindo  os  linfonodos  envolvidos.  Mesmo  que  o  tumor  não  possa  ser  totalmente  retirado,  a  cirurgia  pode  ser  de  grande  valor  em  cães  com  pseudo­hiperparatireoidismo,  pois  a
hipercalcemia está relacionada com a massa tumoral total. A quimioterapia auxiliar e a radioterapia também podem ser benéficas, porém poucos cães vivem mais de um ano após o diagnóstico do tumor.

Tumores de Glândula Écrina
As glândulas écrinas, que são glândulas sudoríparas espirais e tubulares, estão presentes nos coxins plantares de carnívoros, na ranilha de animais ungulados, no carpo de suínos e na região nasolabial dos ruminantes. Os tumores oriundos
dessas glândulas são extremamente raros e foram identificados apenas nos coxins de cães e gatos. A maioria deles é maligna e invasiva; foi relatado alto risco de metástases desses tumores aos linfonodos satélites.

Tumores de Glândula Hepatoide (Tumores de glândula perianal, Tumores de glândula circumanal)
Essas neoplasias comuns se desenvolvem a partir de glândulas sebáceas modificadas que são mais abundantes no tecido cutâneo ao redor do ânus, mas podem também estar presentes ao longo da linha média ventral, do períneo até a base
do crânio, nas regiões ventral e dorsal da cauda e na pele das regiões lombar e sacra. Uma vez que os andrógenos estimulam o desenvolvimento das glândulas hepatoides, a incidência de lesões proliferativas dessas glândulas em machos não
castrados é três vezes maior do que em fêmeas.
Os tumores benignos das glândulas hepatoides são classificados em hiperplasias e adenomas; no entanto, assim como nos tumores benignos das glândulas sebáceas, há uma progressão de hiperplasia para adenoma. Neste texto, serão
considerados como uma entidade única. Os adenomas das glândulas hepatoides são mais comuns em cães mais velhos. As raças mais afetadas são Husky Siberiano, Samoyed, Pequinês e Cocker Spaniel. Os tumores podem se desenvolver
em qualquer local onde há glândula, mas 90% se instalam na região perianal. Macroscopicamente, surgem como um ou (mais comumente) múltiplos nódulos intradérmicos de 0,5 a 10 cm de diâmetro. As lesões maiores, comumente
ulceradas e hemorrágicas, secretam um material ceratinoso quando se aplica pressão local. Tumores grandes podem comprimir o canal anal e dificultar a defecação. Até 95% dos cães machos respondem completamente à castração; aqueles
que não respondem devem ter o eixo hipófise­adrenal avaliado e, se não há anormalidade, o cão deve ser reavaliado quanto à presença de adenocarcinoma da glândula hepatoide de baixo grau. A extirpação pode ser utilizada rotineiramente
para remover tumores extremamente grandes ou ulcerados que apresentam infecção secundária. Cirurgia é o tratamento de eleição para fêmeas com adenoma de glândula hepatoide e pode ser necessária repeti­la, uma vez que a recidiva é
comum. Radioterapia também é uma opção e a taxa de cura é de 69%, para um período de 2 anos, no caso de tumor benigno. Criocirurgia é uma alternativa terapêutica, mas em razão de complicações como incontinência fecal, deve ser
utilizada  apenas  quando  os  tumores  não  são  passíveis  de  intervenção  cirúrgica.  O  dietilestilbestrol  foi  utilizado  no  passado  como  alternativa  à  castração,  mas  deve  ser  usado  com  extrema  cautela  em  razão  da  possibilidade  de  reações
adversas graves, como anemia aplásica e hiperplasia cística prostática, se utilizado.
Adenocarcinomas de glândula hepatoide são neoplasias incomuns em cães; em geral, surgem como lesões nodulares na região perianal. Esses tumores são notados em cães machos 10 vezes mais do que em fêmeas. As raças mais
propensas ao desenvolvimento dos tumores são Husky Siberiano, Malamute do Alasca e Buldogue. O exame histológico é o melhor método diagnóstico; no entanto, há controvérsia quanto à diferenciação de tumores malignos de baixo grau
e de adenomas hepatoides, uma vez que as formas bem diferenciadas podem ser confundidas com adenomas e as formas anaplásicas podem ser confundidas com adenocarcinomas de glândula apócrina com origem no saco anal. Esses
tumores têm potencial metastático e, com frequência, se disseminam aos linfonodos regionais. O tratamento consiste na extirpação cirúrgica ampla, incluindo os linfonodos envolvidos e, se possível, radioterapia subsequente. Esses tumores,
em geral, não respondem à castração ou à terapia com estrógenos e não se sabe se há benefícios da quimioterapia nos casos de doença metastática. O prognóstico é reservado.

Tumores de Glândula Sebácea
Os tumores e as formações semelhantes a tumores em glândulas sebáceas são comuns em cães, infrequentes em gatos e raros em outros animais domésticos. Com base na morfologia, mais do que nas características do comportamento,
foram descritas quatro categorias de proliferações benignas das glândulas sebáceas. Em pessoas, nas quais um esquema de classificação aproximadamente similar costuma ser utilizado tradicionalmente, foi proposto que todos os tumores
benignos das glândulas sebáceas são denominados sebaceomas.
Hamartomas de glândula sebácea são lesões solitárias relatadas apenas em cães. Essas lesões diferem dos adenomas e hiperplasias de glândula sebácea porque são lineares ou circunscritas, têm vários centímetros de comprimento ou
diâmetro e normalmente são identificadas logo após o nascimento.
Hiperplasia de glândula sebácea (hiperplasia sebácea senil) representa uma alteração senil de cães e gatos. Em cães, as raças mais suscetíveis são Manchester, Wheaten e Welsh Terrier. Em gatos, não há predileção racial, mas as
fêmeas desenvolvem essas lesões com maior frequência que os machos. Em ambas as espécies, a cabeça e o abdome são mais acometidos. Hiperplasia sebácea normalmente surge como massa papilar, raramente com mais de 1 cm de
diâmetro, frequentemente com uma superfície brilhante e ceratótica.
Adenomas de glândula sebácea são observados em todos os animais domésticos, mas são tão comuns em cães e gatos idosos que podem ser considerados como neoplasias principalmente de pequenos animais. As raças de cães mais
predispostas  são  Coonhound,  Cocker  Spaniel  Inglês,  Cocker  Spaniel,  Husky,  Samoyed  e  Malamute  do  Alasca;  a  raça  felina  mais  propensa  é  a  Persa.  Com  frequência,  esses  tumores  não  são  clinicamente  distinguíveis  das  hiperplasias
sebáceas em cães, mas tendem a ser maiores (tipicamente > 1 cm). Em geral, essas lesões são múltiplas e podem ocorrer em qualquer parte do corpo, mas são comumente verificadas na cabeça. Os adenomas sebáceos podem estar cobertos
por  uma  crosta  serocelular  e  exibem  inflamação  pleocelular  e  piodermite  superficial.  Epiteliomas  de  glândula  sebácea  são  uma  variante  dos  adenomas  sebáceos  e  apresentam  lóbulos  compostos  principalmente  por  células  basais
progenitoras e não por sebócitos maduros. Uma vez que, com frequência, apresentam lóbulos irregulares que se estendem para a derme profunda, ocasionalmente essas lesões podem ser confundidas com carcinoma sebáceo. Esses tumores
são encontrados em cães mais velhos e, raramente, em gatos. Caracterizam­se por serem nódulos ulcerados que podem ter vários centímetros de diâmetro; superfície epidérmica papilar e pigmentação são achados clínicos variáveis.
Adenocarcinomas de glândula sebácea são raros em animais domésticos. São notados quase que exclusivamente em cães e gatos e, em geral, em animais de meia­idade ou idosos. Cães das raças Cavalier King Charles Spaniel, Cocker
Spaniel, Scottish, Cairn e West Highland White Terrier apresentam maior risco. Pode haver predisposição em cães machos e em gatas. Essas lesões, com frequência, são ulceradas e podem ser indistinguíveis do epitelioma sebáceo ou de
outros carcinomas cutâneos. São localmente infiltrativos e podem originar metástase nos linfonodos regionais, em uma fase tardia da doença.
Uma vez estabelecido o diagnóstico, o tratamento de tumores benignos da glândula sebácea é opcional, a menos que apresentem infecção e inflamação secundárias. Para os adenocarcinomas malignos, a extirpação é o tratamento de
escolha, mas a remoção completa pode ser difícil em razão da natureza infiltrativa desse tumor; pode ser necessária radioterapia auxiliar. Mesmo os crescimentos benignos da glândula sebácea são recidivantes se não forem completamente
extirpados  mediante  cirurgia.  Além  disso,  os  animais  que  desenvolvem  adenoma  ou  hiperplasia  de  glândula  sebácea,  em  geral,  desenvolvem  novas  lesões  em  outros  locais  com  o  passar  do  tempo.  Não  há  protocolo  quimioterápico
estabelecido essas lesões. Retinoides orais podem prevenir a recidiva de hiperplasia sebácea, mas seu uso ainda permanece pouco definido e a consulta a um oncologista veterinário ou dermatologista é fortemente recomendada.

Tumores e Carcinomas de Célula Basal (Epiteliomas de célula basal, basaliomas, Tricoblastomas, Carcinomas de célula basoescamosa)
Tumores de célula basal representam um grupo heterogêneo de neoplasias epiteliais cutâneas verificados comumente em cães e gatos, ocasionalmente em equinos e raramente em outros animais domésticos. Essas neoplasias são compostas
por uma proliferação de pequenas células basofílicas que exibem morfologia remanescente das células progenitoras da epiderme e anexos. Com o exame mais minucioso desses tumores, foram descobertas evidências de diferenciação
(folicular, sebácea etc.), justificando uma reclassificação. Por exemplo, em cães, o que era conhecido no passado como tumor de célula basal é mais bem caracterizado como tricoblastoma, um tumor do bulbo do pelo (o local do folículo
que produz a haste pilosa).
Alguns esquemas de reclassificação sugeriram que o uso do termo tumor de célula basal seja restrito à neoplasia benigna em gatos (cuja derivação ainda deve ser definida). Uma vez que essa terminologia revisada está sendo adotada
lentamente, a terminologia tradicional será utilizada nesse texto. Isso significa que uma proliferação benigna de célula basal será denominada tumor de célula basal e uma proliferação maligna será denominada como carcinoma de célula
basal. Em animais domésticos, a maioria dos tumores de célula basal é benigna e se origina na derme média a profunda, indicando origem provável nos anexos cutâneos. Esses aspectos distinguem tumores de célula basal em animais
domésticos dos tumores em pessoas, cujas lesões são invasivas localmente (i. e., são carcinomas verdadeiros) e se originam na epiderme. Além disso, a exposição ao sol é uma causa comum de neoplasias derivadas das célula basal em
pessoas, porém seu papel na indução de tumores de célula basal nos outros animais ainda não está bem definido.
Tumores de célula basal em cães se desenvolvem mais comumente em animais de meia­idade a idosos. Muitas raças são predispostas, como o Griffon Apontador de pelo duro, Kerry Blue Terrier e Wheaten Terrier. Esses tumores são
encontrados com maior frequência na cabeça (em especial nas orelhas), pescoço e membros torácicos. Em gatos, os tumores de célula basal também ocorrem em animais idosos. As raças em maior risco são pelo longo doméstico, Himalaio
e Persa e os tumores podem se desenvolver em qualquer local do corpo. Em cães e gatos, esses tumores, em geral, surgem como massas firmes, solitárias, encapsuladas e, com frequência, alopécicas ou com nódulos ulcerados que podem
ser pedunculados; o tamanho varia de < 1 cm a > 10 cm de diâmetro. Em gatos, com maior frequência do que em cães, esses tumores são densamente pigmentados e ao corte pode ser difícil distingui­los de melanocitomas dérmicos.
Variantes císticos também são mais comuns em gatos. Embora os tumores de célula basal sejam benignos, são neoplasias expansivas e podem estar associadas à ulceração e inflamação secundárias. A extirpação completa é curativa.

Carcinoma de célula basal em um gato. Cortesia da Dra. Alice Villalobos.

Carcinoma de célula basal é encontrado com maior frequência em gatos do que em cães. Em gatos, ele se desenvolve com maior frequência em animais mais velhos e há predisposição em animais da raça Persa. Em geral, possuem
aparência  de  placas  ulceradas  na  cabeça,  extremidades  ou  pescoço.  Diferentemente  de  tumores  de  célula  basal  benignos,  esses  carcinomas  costumam  possuir  continuidade  com  a  epiderme,  são  invasivos  localmente  e  podem  ser
multicêntricos. Embora evidências de invasão vascular sejam verificadas em cortes histológicos, metástases locais ou sistêmicas raramente ocorrem. Consequentemente, a extirpação cirúrgica é o tratamento de eleição.
Em cães, a maioria dos carcinomas de célula basal apresenta evidências histológicas de cornificação, um aspecto em comum ao carcinoma de célula escamosa, por isso também são chamados de carcinomas de célula basoescamosa.
Esses  tumores,  em  geral,  são  observados  em  cães  velhos;  as  raças  São  Bernardo,  Scottish  Terrier  e  Elkhound  Norueguês  apresentam  maior  risco.  Ao  contrário  do  que  acontece  no  tumor  de  célula  basal  canino,  não  há  tendência  de
desenvolvimento de carcinoma de célula basoescamosa na cabeça, e essa lesão pode ser encontrada em qualquer parte do corpo, onde há continuidade com a epiderme, com aparência de placas e nódulos exoendofíticos. Essas neoplasias
invadem os tecidos locais, mas raramente causam metástase. O tratamento de escolha é a extirpação cirúrgica.

Tumores Neuroendócrinos Cutâneos Primários (Tumor da célula de Merkel, Histiocitoma atípico, Carcinoma trabecular, Plasmocitoma extramedular)
Em medicina veterinária, o diagnóstico de tumor oriundo de célula de Merkel (célula tátil neurossecretora de origem epitelial, presente na camada de células basais da epiderme) foi desacreditado e a maioria dos patologistas considera esse
tumor como um plasmocitoma extramedular. A ocorrência de tumor de célula de Merkel é mais provável em animais, porém não é reconhecido como tal.
 TUMORES METASTÁTICOS
A disseminação de uma neoplasia primária para a pele é incomum em animais domésticos. Ocasionalmente é notada em cães, menos comumente em gatos e raramente em equinos, bovinos, ovinos, caprinos e suínos. Embora todas as
neoplasias malignas sejam capazes de causar envolvimento cutâneo secundário, o potencial metastático é maior nos adenocarcinomas da glândula mamária, carcinomas de célula escamosa, carcinomas de células de transição, tumor venéreo
transmissível, adenocarcinomas pulmonares e angiossarcomas. Embora a aparência seja variável, as lesões comumente são papulonódulos múltiplos e ulcerados. Metástases cutâneas iniciais são caracterizadas por agregados de células
neoplásicas  em  vasos  dérmicos  superficiais  e  profundos.  Com  a  progressão,  essas  lesões  se  estendem  para  a  derme  e  são  associadas  à  destruição  de  estruturas  anexas.  Em  geral,  é  difícil  distinguir  a  neoplasia  primária  com  base  nas
características morfológicas de um sítio metastático. Isso ocorre porque apenas uma pequena população de células do tumor primário apresenta potencial para desenvolver metástase e essas células podem ter características microscópicas
diferentes.  Em  gatos,  adenocarcinomas  pulmonares  parecem  ocasionar  metástases  preferencialmente  nas  extremidades  distais,  e  quando  os  carcinomas  são  diagnosticados  em  vários  membros,  deve­se  realizar  exame  para  excluir  a
possibilidade de tumor no pulmão. As metástases cutâneas normalmente são características de tumores agressivos e estão associadas a um prognóstico reservado.

Carcinoma de glândula mamária inflamatório em um cão. Essa neoplasia maligna envolve os vasos linfáticos cutâneos. Cortesia da Dra. Alice Villalobos.

CARRAPATOS
Os carrapatos são ectoparasitas obrigatórios da maioria dos vertebrados terrestres, virtualmente em qualquer lugar em que esses animais são encontrados. Os carrapatos são ácaros grandes, portanto, aracnídeos, membros da subclasse Acari.
Eles são mais intimamente relacionados com as aranhas do que aos insetos. As aproximadamente 850 espécies descritas são exclusivamente hematófagas em todos os estágios de desenvolvimento. Os carrapatos transmitem uma maior
variedade de agentes infecciosos que qualquer outro grupo de artrópodes e em todo o mundo, são o segundo grupo em importância, apenas os mosquitos têm maior impacto na Saúde Pública e Veterinária. Alguns desses agentes são pouco
patogênicos aos animais de produção, mas podem causar doença em pessoas; outros causam doenças nos animais de produção, apresentando grande importância econômica. Além disso, os carrapatos podem causar lesões diretamente em
seus hospedeiros ao induzirem toxicoses (p. ex., enfermidade da transpiração (p. 724) e paralisia por carrapatos (p. 401), causadas por fluidos salivares que contêm toxinas), lesões na pele suscetíveis a infecções bacterianas secundárias e
infestações por miíases, anemia e morte. A movimentação internacional de animais infectados com os parasitos sanguíneos transmitidos por carrapatos, Theileria, Babesia, Anaplasma spp. e Ehrlichia (Cowdria) ruminantium, é amplamente
restrita.
A movimentação de animais de produção infestados por carrapatos por grandes distâncias, a introdução de espécies exóticas de carrapatos no ambiente de animais de produção e os agentes carreados pelos carrapatos aos quais os animais
não têm imunidade ou resistência inata são fatores importantes na distribuição extensa e prevalência de muitas espécies de carrapatos e de agentes transmitidos por eles. Muitas espécies introduzidas de carrapatos prosperaram nas pastagens
vastas e nos ambientes e se estabeleceram nos últimos séculos durante as explosões populacionais humanas e de animais de produção.
Duas das três famílias de carrapatos parasitam animais de produção: a Argasidae (argasídeos, “carrapatos moles”) e a Ixodidae (ixodídeos, “carrapatos duros”). Embora eles partilhem de algumas propriedades básicas, os argasídeos e os
ixodídeos  diferem  em  muitos  padrões  estruturais,  comportamentais,  fisiológicos,  ecológicos,  alimentares  e  reprodutivos.  Espécies  tropicais  e  subtropicais  podem  completar  1,  2  ou,  raramente,  três  ciclos  de  vida  anualmente.  Em  zonas
temperadas, em geral, há um ciclo anual; em regiões mais ao norte e em altas altitudes em regiões temperadas, são necessários 2 a 4 anos para a maioria das espécies. Há quatro estágios de desenvolvimento: ovo, larva, ninfa e adulto. Todas
as larvas possuem três pares de pernas; todas as ninfas e adultos têm quatro pares. Os adultos têm áreas genital e anal distintas na superfície ventral do corpo. O tarso dos membros anteriores de todos os carrapatos tem um aparelho sensorial
único – o órgão de Haller – para sentir o dióxido de carbono, estímulos químicos (odor), temperatura, umidade etc. Os feromônios estimulam o encontro, o reconhecimento de espécies, o acasalamento e a seleção do hospedeiro.
Certas espécies de carrapatos que parasitam animais de produção podem sobreviver durante vários meses e, ocasionalmente, alguns poucos anos sem alimento, se as condições ambientais permitirem. As preferências dos carrapatos por
determinados hospedeiros, em geral, são limitadas a determinados gêneros, famílias ou ordens de vertebrados; entretanto, alguns carrapatos estão excepcionalmente adaptados a uma variedade de hospedeiros, dessa forma, cada espécie deve
ser avaliada separadamente. As larvas e ninfas da maioria dos ixodídeos que parasitam animais de produção se alimentam em pequenos animais silvestres, como pássaros, roedores, pequenos carnívoros ou até mesmo lagartos.
Nos Argasidae, a superfície dorsal coriácea não apresenta uma placa dura (escudo). Os machos e as fêmeas de argasídeos parecem ser muito semelhantes, exceto pelo grande tamanho da fêmea e das diferenças da genitália externa. O
capítulo dos argasídeos (aparelho bucal) surge da parte anterior do corpo na larva, porém, da superfície ventral do corpo em ninfas e adultos.
Nos Ixodidae, a superfície dorsal do macho é coberta por um escudo. O escudo das fêmeas, ninfas e larvas cobre apenas a metade anterior da superfície dorsal. O capítulo dos ixodídeos surge da extremidade anterior do corpo em todas as
fases de desenvolvimento.

Parasitismo por Argasídeos
A fauna de argasídeos por todo o mundo compreende 185 espécies em quatro gêneros, conhecidos como Argas, Carios, Ornithodoros e Octobius na família Argasidae. Os Argasidae são altamente especializados em se abrigar em nichos e
fendas em madeiras ou pedras, em ninhos de hospedeiros ou em poleiros, tocas e grutas. Algumas espécies de argasídeos são conhecidas por sobreviverem sem alimentação por vários anos. A maioria desses parasitos coriáceos habita
ambientes  tropicais  ou  temperados  quentes  com  estações  secas  longas.  Os  hospedeiros  são  aqueles  que  descansam  em  grande  número  próximos  ao  micro­habitat dos  argasídeos  ou  voltam  de  tempos  em  tempos  para  descansar  ou  se
reproduzir nessa área.
Uma população de argasídeos tipicamente parasito apenas um único tipo de vertebrado e habita sua área de abrigo. Os argasídeos usam vários hospedeiros, por exemplo, as larvas se alimentam em um hospedeiro e caem no substrato para
fazer a muda; os vários estágios larvais se alimentam separadamente, caem e passam pela muda, os adultos se alimentam muitas vezes (mas não fazem muda). As ninfas e os adultos dos argasídeos se alimentam rapidamente (normalmente
em 30 a 60 min). As larvas de alguns argasídeos também se alimentam rapidamente; outras requerem vários dias para ingurgitar completamente. Os argasídeos adultos se reproduzem fora dos hospedeiros por várias vezes; depois, as fêmeas
depositam algumas centenas de ovos em vários lotes e se alimentam entre as oviposições.
A maioria das 57 espécies descritas de Argas spp. parasito pássaros que se reproduzem em colônias em árvores ou em áreas rochosas; outros parasitam morcegos que moram em grutas. Poucos se alimentam em répteis ou mamíferos
silvestres  e  nenhum  em  animais  de  produção.  Várias  espécies  se  tornaram  pestes  importantes  de  aves  domésticas  e  pombos;  entre  essas,  estão  vetores  de  Borrelia  anserina  (espiroquetose  aviária)  e  a
riquétsia Anaplasma (Aegyptianella) pullorum (egiptianelose). Argas spp. também causa paralisia por carrapato e muitos são vetores de uma variedade de arbovírus, alguns dos quais também infectam pessoas.
O gênero Carios inclui 88 espécies, a maioria das quais parasito mamíferos, em especial morcegos e roedores. Dependendo da espécie, eles habitam o covil ou poleiros de morcegos localizados em cavernas e buracos em árvores, ou
tocas  de  roedores.  Várias  espécies  parasitam  pássaros  que  nidificam  em  colônias  e  habitam  o  substrato  ou  sob  pedras  e  debris  ao  nível  do  chão  das  colônias  das  aves.  Muitas  dessas  espécies  parasitam  apenas  uma  única  espécie  de
hospedeiro ou um grupo de hospedeiros intimamente relacionados. No entanto, alguns Carios se alimentam em pessoas e animais domésticos, caso o hospedeiro primário não esteja disponível. C. kelleyi, um carrapato associado a morcegos
e habitats de morcegos, foi relatado como carreador de um novo grupo de Rickettsia causadora de febre maculosa e uma espiroqueta causadora de febre recidivante, intimamente relacionada com a Borrelia turicatae. Mostrou­se que o
carrapato de aves marinhas C. capensis transmite vírus do Nilo Ocidental para patinhos. C. puertoricensis e C. talaje americanos são vetores potenciais do vírus da peste suína africana.
A maioria das quase 37 espécies pertencentes ao gênero Ornithodoros se abriga em grutas, tocas e covas de animais em locais de clima quente e árido, e se alimentam em quase qualquer hospedeiro potencial que entre em seu habitat. As
larvas desse gênero nidícola, não se alimentam, o que pode estar relacionado com o fato de esses carrapatos habitarem tocas que podem abrigar hospedeiros de maneira irregular. Poucas espécies se adaptaram à vida em fendas nas paredes
onde animais de produção estão confinados e também são parasitos de pessoas. Determinadas espécies são vetores da espiroqueta da febre recidivante (Borrelia spp.) e do vírus da peste suína africana; algumas espécies causam toxicose e
uma espécie (O. coriaceus) transmite uma espiroqueta que causa aborto epizoótico bovino no oeste dos EUA. Várias toxinas salivares ou arbovírus transmitidos por Ornithodorus causam irritação ou doença febril em pessoas.
O único argasídeo do gênero Otobius (p. 958) apresenta três espécies, que não se alimentam no estágio adulto. O. megnini (ácaro espinhoso da orelha) é excessivamente especializado, tanto biologicamente quanto estruturalmente. Ele
infesta os canais auditivos de antílopes, carneiro montanhês e cervos da Virginia em biótopos de baixa pluviosidade no oeste dos EUA, México e oeste do Canadá. Bovinos, equinos, caprinos, ovinos, cães, vários animais de zoológico e
pessoas  são  infestados  de  maneira  similar.  O  parasito,  oculto,  já  foi  transportado  com  animais  de  produção  para  o  oeste  da  América  do  Sul,  Galápagos,  Cuba,  Havaí,  Índia,  Madagascar  e  sudeste  da  África.  Notavelmente,  os  adultos
apresentam aparelho bucal afuncional e permanecem sem se alimentar no solo, mas podem sobreviver por quase dois anos. As fêmeas podem depositar até 1.500 ovos em um período de 2 semanas. As larvas e dois estágios de ninfa se
alimentam  por  2  a  4  meses,  principalmente  no  inverno  e  primavera.  Pode  haver  duas  ou  mais  gerações  por  ano.  Pessoas  e  outros  animais  podem  apresentar  irritação  grave  por  infestações  do  canal  auditivo,  e  animais  de  produção
pesadamente infestados perdem condição corporal durante o inverno. Paralisia de hospedeiros pelo carrapato e infecções secundárias por larvas de miíases foram relatadas. O. megnini é infectado pelos agentes da febre Q, tularemia, febre
do carrapato do Colorado e febre maculosa das Montanhas Rochosas. Outra espécie, O. lagophilus, se alimenta na cabeça de lebres e coelhos do oeste dos EUA.

Parasitismo por Ixodídeos
Os ixodídeos compreendem mais de 600 espécies e ocupam muito mais habitats e nichos do que os argasídeos, e parasitam um maior número de vertebrados em uma variedade mais ampla de ambientes. A maioria das espécies de ixodídeos
tem ciclo biológico em três hospedeiros; outras têm ciclo em dois hospedeiros e poucos têm ciclo biológico em um hospedeiro. Cada estágio de desenvolvimento pós­embrionário dos ixodídeos (larva, ninfa, adulto) se alimenta apenas uma
vez, mas durante um período de vários dias. Os machos e as fêmeas da maioria das espécies que parasitam animais de produção se reproduzem enquanto estão no hospedeiro, embora alguns se reproduzam fora desse, no chão ou em tocas.
Os machos se alimentam menos do que as fêmeas, mas permanecem por mais tempo no hospedeiro e podem se reproduzir com várias fêmeas. Durante estações inativas, pouca ou nenhuma fêmea é encontrada se alimentando, ainda que os
machos possam permanecer aderidos aos hospedeiros. Tais machos podem contribuir para a transmissão de patógenos a novos animais suscetíveis por meio de transferências seriadas entre hospedeiros. Em geral, o pico de atividade das
populações de larvas e ninfas ocorre durante os intervalos das estações de adultos (“estações de repouso”), embora em algumas espécies haja sobreposição das dinâmicas sazonais das formas imaturas e adultas.
Os machos ixodídeos, exceto aqueles do gênero Ixodes, apresentam maturidade sexual apenas após começarem a se alimentar, após a qual se reproduzem com uma fêmea que está se alimentando. Apenas depois da reprodução as fêmeas
se tornam repletas e continuam o desenvolvimento dos ovos. Depois, elas se desprendem e se afastam do hospedeiro e, durante vários dias, depositam uma simples leva de muitos ovos sobre ou próximo ao chão, normalmente em fendas, ou
abaixo de pedras, folhas mortas ou debris. Dependendo da qualidade e da quantidade da nutrição da fêmea, pode conter 1.000 a 4.000 ovos, mas podem ter > 12.000. A fêmea morre após a postura dos ovos. Notavelmente, os ixodídeos
(exceto os de um e dois hospedeiros, os quais usam hospedeiros vertebrados como habitat por grande parte de suas vidas) passam > 90% de sua vida fora do hospedeiro, um fato de extrema importância no planejamento de medidas de
controle.  O  processo  de  alimentação  de  vários  dias  progride  lentamente;  a  forma  baloniforme,  característica  de  larvas  ingurgitadas,  ninfas  e  fêmeas,  se  desenvolve  apenas  durante  a  metade  final  do  dia  de  alimentação  e  é  seguida  de
desprendimento do carrapato. O tempo de queda, a certas horas do dia ou da noite, é regido por um ritmo circadiano muito associado ao ciclo de atividade do hospedeiro principal.
Também é importante, em especial para o entendimento da epidemiologia de doenças transmitidas por carrapatos, saber se as formas imaturas das espécies de ixodídeos se alimentam na mesma espécie de hospedeiro do que os adultos ou
em  pequenos  vertebrados.  Nos  locais  onde  os  pequenos  hospedeiros  são  escassos,  as  formas  imaturas  de  algumas  espécies  de  ixodídeos  podem  se  alimentar  nos  mesmos  animais  que  os adultos;  as  formas  imaturas  de  outras  espécies
raramente ou nunca o fazem.
A proximidade de hospedeiros aceitáveis, gradientes de temperatura do ar e umidade atmosférica durante o descanso e o período de busca estão entre os fatores que regulam o desenvolvimento de cada estágio e, em fêmeas, a oviposição.
IXODÍDEOS DE TRÊS HOSPEDEIROS:  A maioria dos ixodídeos apresenta ciclo de três hospedeiros. A larva eclodida recentemente busca um hospedeiro adequado, em geral na vegetação, se alimenta por vários dias, cai e sofre muda até ninfa,
que  repete  essas  atividades  até  a  muda  para  adulto.  Das  espécies  de  três  hospedeiros  que  parasitam  animais  de  produção  ou  cães,  poucas  têm  formas  imaturas  e  adultas  que  parasitam  o  mesmo  tipo  de  hospedeiro;  essas,  em  geral,
desenvolvem uma densidade populacional enorme. O sucesso das espécies de ixodídeos cujas formas imaturas requerem hospedeiros de tamanho pequeno depende da disponibilidade desses hospedeiros no chão e na pastagem. Os danos
naturais  inerentes  às  espécies  de  três  hospedeiros  foram  compensados  pelos  benefícios  proporcionados  pelas  práticas  de  criação  animal  para  as  espécies  adaptáveis  aos  carrapatos.  Apenas  certas  espécies  de  ixodídeos  específicas  de
herbívoros se adaptaram a coexistir com animais de produção, aí se encontra a resposta a vários problemas de carrapatos em fazendas na África, onde hospedeiros para adultos e formas imaturas são abundantes.
IXODÍDEOS DE DOIS HOSPEDEIROS:  Alguns ixodídeos, em especial aqueles que parasitam mamíferos errantes (e também pássaros em alguns casos) nos ambientes inclementes do Velho Mundo, desenvolveram um ciclo de dois hospedeiros,
no qual as larvas e ninfas se alimentam em um hospedeiro e os adultos em outro. Assim como nas espécies de três hospedeiros, os hospedeiros podem ser diferentes ou da mesma espécie. Parasitos de dois hospedeiros dos animas de
produção desenvolvem­se tanto em ambientes inclementes quanto brandos e são de difícil controle. Isso é especialmente verdadeiro para espécies de dois hospedeiros que se alimentam nas orelhas e na área perianal de animais de produção.
IXODÍDEOS  DE  UM  HOSPEDEIRO:   Dentre  os  carrapatos  de  maior  importância  econômica  estão  várias  espécies  de  um  hospedeiro.  Esses  parasitos  evoluíram  junto  a  herbívoros  que  circulam  em  áreas  extensas  nos  trópicos
(Rhipicephalus [Boophilus] spp., Dermacentor nitens etc.) ou em zonas temperadas (D. albipictus, Hyalomma scupense). Larvas, ninfas e adultos se alimentam em um único animal até a reprodução; depois as fêmeas ingurgitadas caem no
solo, onde depositam os ovos.
LOCAIS DE ALIMENTAÇÃO:  Cada espécie possui um ou mais locais de alimentação preferenciais no hospedeiro, embora em infestações densas, outras áreas possam ser utilizadas. Alguns se alimentam principalmente na cabeça, pescoço,
ombros e anca; outros nas orelhas; outros, ao redor do ânus e abaixo da cauda; e alguns nas vias nasais. Outros locais de alimentação comuns são axila, úbere, genitália masculina e vassoura da cauda. As formas imaturas e os adultos, em
geral, têm preferências diferentes. Agregações do Amblyomma spp., um ixodídeo grande e irritante, são reguladas por um feromônio de agregação­fixação produzido pelos machos, o que assegura que os carrapatos se instalem nos locais
menos vulneráveis à lambedura ou limpeza dos animais.

Carrapatos IxodÍdeos Importantes

 AMBLYOMMA SPP.
Mais da metade das, aproximadamente, 140 espécies conhecidas de Amblyomma são endêmicas do Novo Mundo. Os carrapatos Amblyomma são parasitos grandes de três hospedeiros. Eles possuem olhos e aparelho bucal longo e robusto,
são mais ou menos ornamentados e, em geral, são confinados às regiões tropicais e subtropicais. Os adultos e estágios imaturos de 37 espécies desse gênero parasitam répteis que, juntamente com pássaros que se alimentam no chão, com
frequência são hospedeiros da forma imatura de carrapatos Amblyomma que se adaptaram, no estágio adulto, a parasitarem mamíferos. Seu aparelho bucal longo torna os carrapatos Amblyomma especialmente difíceis de serem removidos
de forma manual e, com frequência, causam ferimentos graves na pele que podem ser infectados secundariamente por bactérias ou miíases.
Várias  espécies  africanas  de  Amblyomma  spp.  que  parasitam  animais  de  produção  são  vetores  de  Ehrlichia  (Cowdria)  ruminantium,  uma  riquétsia  que  causa  caudriose  (p.  753),  enquanto  espécies  de  Amblyomma  do  Novo  Mundo
carreiam agentes de erliquiose monocítica e granulocítica, bem como várias Rickettsia spp.
A. americanum, o carrapato estrela, é abundante no sul dos EUA, do Texas e Missouri até a Costa do Atlântico, e se estende ao norte até o Maine. Ao sul, sua distribuição se estende até o norte do México. Em razão das mudanças
climáticas, o alcance geográfico dessa espécie continua a se expandir.
O escudo é distinto em razão da ornamentação pálida em machos e uma evidente mancha prateada (“estrela”) próxima à margem posterior nas fêmeas. As larvas, ninfas e adultos não discriminam quanto à escolha do hospedeiro e
parasitam uma variedade de animais de produção, de companhia, silvestres, bem como pessoas. A atividade nos EUA é continua desde o início da primavera até o final do outono. Os locais de alimentação nos mamíferos domésticos e
selvagens, em geral, são áreas da pele com pelos escassos; as feridas nesses locais predispõem os animais de produção ao ataque da mosca Cochliomyia hominivorax.
Amblyomma americanum é vetor de Francisella tularensis, o agente etiológico da tularemia; Ehrlichia chaffeensis, causa erliquiose monocítica em pessoas; E. ewingii, causa erliquiose granulocítica em cães e pessoas; e Ehrlichia da
montanha Panola, descrita recentemente, intimamente relacionada com a caudriose, que é patogênica ao menos para caprinos e pessoas. Esse carrapato também transmite Rickettsia amblyommii, R. parkeri, Borrelia lonestari e Coxiella sp.,
intimamente relacionada ao agente da febre Q. Pode causar paralisia por carrapato em pessoas e cães. Adicionalmente, o vírus estrela (Bunyaviridae) foi isolado de um único carrapato A. americanum em estágio de linfa que foi removido de
uma marmota da madeira (Marmota monax) no Kentucky.
Amblyomma cajennense, o carrapato Caiena, apresenta distribuição desde a América do Sul até o sul do Texas. Essa espécie é mais comumente encontrada em habitats tropicais secos e em elevações baixas dos planaltos subtropicais.
Como com o A. americanum, cada estágio ativo é indiscriminado quanto à escolha do hospedeiro: animais de produção e uma ampla variedade de aves e mamíferos silvestres servem como hospedeiros. Pessoas sofrem irritações graves por
agrupamentos de larvas de A. cajenense (micuins) em áreas de bosques e de capim alto. A maioria dos adultos se liga a superfície ventral do corpo, em especial entre as pernas; alguns se alimentam em outros locais do corpo. A atividade é
contínua durante todo o ano. A. cajennense é um vetor de R. parkeri e foi mostrado como transmissor de Ehrlichia ruminantium experimentalmente. O vírus de Wad Medani (um Orbivirus, Reoviridae), vírus africano transportado para as
ilhas do Caribe por bovinos oriundos do Senegal infestados por A. variegatum, foi isolado de A. cajennense na Jamaica.
A. maculatum, o carrapato da Costa do Golfo, é uma peste importante em animais de produção, em particular bovinos, da América do Sul ao sul dos EUA. Os habitats ótimos são áreas quentes, com alta pluviosidade, próximas ao litoral.
As formas imaturas, em geral, parasitam pássaros e pequenos mamíferos; os adultos parasitam cervos, bovinos, equinos, ovinos, suínos e cães. A atividade de alimentação do adulto ocorre principalmente no final do verão e início do
outono, mas pode começar tardiamente após um verão seco. A maioria dos adultos infesta as orelhas, onde as feridas são infestadas posteriormente por bicheira. Adultos aglomerados se alimentando também podem causar irritação intensa
nas partes superiores do pescoço dos bovinos e no cupim dos bovinos Brahman.
A.  imitator  parasito  animais  de  produção  da  América  Central  ao  sul  do  Texas.  Ocasionalmente  pestes  de  animais  de  produção  na  América  tropical  são  A.  neumanni  (Argentina),  A.  ovale  e  A.  parvum  (Argentina  ao  México),  A.
tigrinum (grande parte da América do Sul) e A. tapirellum (Colômbia ao México).
A. testudinarium habita áreas florestais tropicais da Ásia, do Sri Lanka e Índia a Malásia e Vietnã, Indonésia, Bornéu, Filipinas, Taiwan e sul do Japão. Os adultos são particularmente abundantes em suínos silvestres e domésticos e
também infestam cervos, bovinos e outros animais de produção e pessoas. As formas imaturas parasitam pássaros e pequenos mamíferos, bem como pessoas. Na Índia e no Sri Lanka, os adultos de A. integrum e  A.  mudlairi  também
parasitam animais de produção, ungulados silvestres e pessoas.
A. hebraeum,  o  carrapato  malhado  do  sul  da  África,  habita  savanas  quentes  e  moderadamente  úmidas  da  África  do  Sul,  Namíbia,  Botsuana,  Zimbábue,  Malaui,  Moçambique  e  Angola.  Os  estágios  imaturos  alimentam­se  em  vários
pequenos mamíferos, pássaros que se alimentam no chão e em répteis. Os adultos infestam animais de produção, antílopes e outros animais selvagens. Os adultos se aderem ao corpo principalmente em áreas com relativamente poucos pelos
e causam ferimentos sérios, que se tornam infectados secundariamente por bactérias e larvas Chrysomyia bezziana. Como os outros carrapatos africanos (carrapatos malhados) do gênero Amblyomma que parasitam animais de produção, A.
hebraeum é um vetor importante de Ehrlichia ruminantium, e o principal vetor de Rickettsia africae, o agente da febre da picada do carrapato africano, no sul da África.
A. variegatum, o carrapato malhado africano tropical, é um parasito facilmente visualizado, com cores brilhantes, encontrado por todas as savanas subsaarianas ao sul, até a extensão do A. hebraeum e também ao sul da Arábia, em várias
ilhas nos oceanos Índico e Atlântico e no Caribe. Um programa de erradicação em andamento no Caribe, St. Kitts, St. Lucia, Montserrat, Anguilla, Barbados e Dominica certificou esses locais como provisoriamente livres em 2002, embora
St. Kitts tenha sido reinfestada em 2004. As preferências quanto ao hospedeiro são similares às do A. hebraeum, mas também incluem camelos. As picadas dos carrapatos adultos são graves, e podem resultar em feridas sépticas e abscessos,
inflamação  dos  tetos  de  vacas  e  lesão  considerável  à  pele.  Os  adultos  se  alimentam  principalmente  durante  estações  chuvosas  e  as  formas  imaturas  durante  estações  secas.  A  maioria  dos  adultos  se  adere  à  parte  inferior  do  corpo  dos
hospedeiros, na genitália e abaixo da cauda.
As lesões causadas por A. variegatum ao hospedeiro e a transmissão de E. ruminantium são similares àquelas provocadas por A. hebraeum, mas também incluem a disseminação da dermatofilose bovina aguda (p. 913). Esse carrapato não
é considerado um vetor efetivo do vírus da doença ovina de Nairobi, mas é um vetor secundário do vírus da febre hemorrágica da Crimeia­Congo. O vírus de Dugbe foi isolado de A. variegatum em seis países ao norte da linha do Equador;
as viroses de Thogoto e Bhanja também estão associadas a esse carrapato em várias áreas ao norte da linha do Equador. Notavelmente, o vírus da febre amarela foi isolado de A. variegatum coletado de bovinos na República da África
Central e foi mostrada a transmissão transovariana para a progênie de fêmeas infectadas. O vírus de Jos infecta A. variegatum da Etiópia ao Senegal e foi transportado nesse carrapato para a Jamaica.
A. lepidum, o carrapato malhado do leste da África, habita ambientes de savanas com xerófitas do norte da Tanzânia ao Sudão central. A. gemma, o carrapato malhado semelhante a joia, ocorre em ambientes similares da Tanzânia,
Somália, Quênia e Etiópia. Uma pequena variedade de carrapatos malhados dos búfalos, A. cohaerens, é abundante em bovinos das áreas montanhosas da Etiópia, mas da República Democrática do Congo à Tanzânia a maior parte das
variedades de A. cohaerens parasito  principalmente  búfalos  Cape.  Outros  carrapatos Amblyomma africanos  de  búfalos  Cape  e  vários  outros  grandes  mamíferos,  incluindo  animais  de  produção,  são  A.  pomposum  de  florestas  úmidas  e
montanhosas na Angola, República Democrática do Congo, Uganda, sul do Sudão, Quênia e Zimbábue, e A. astrion no oeste da África e na República Democrática do Congo.
Nas Américas do Sul e Central, várias espécies de Amblyomma parasitam animais de produção e cães, com frequência em grandes números. Entre eles, adultos de A. aureolatum e A. ovale se alimentam principalmente em carnívoros e A.
parvum  em  carnívoros  e  tatus.  A.  auricularium  foi  encontrado  em  hospedeiros  silvestres  das  famílias  Myrmecophagide  e,  ocasionalmente,  Didelphidae,  Caviidae,  Chinchilidae,  Hydrochaeridae,  Muridae,  Canidae,  Mustelidae  e
Procyonidae. A. pseudoconcolor, ocasionalmente, foi encontrado em hospedeiros silvestres da família Didelphidae. A. naponense é comum em porcos do mato e A. oblongoguttatum foi encontrado em uma variedade de hospedeiros em
vários países das Américas Central e do Sul. A anta sul americana (Tapirus terrestris) parece ser o principal hospedeiro do estágio adulto de A. latepunctatum, A. scalpturatum e A. incisum. A. dissimile é um parasito comum de répteis e
sapos verdadeiros do gênero Bufo, do norte da Argentina ao sul do México, nas ilhas do Caribe e sul da Flórida.
 ANOMALOHIMALAYA SPP.
Os  três  Anomalohimalaya  spp.  são  encontrados  nas  montanhas  da  Ásia  Central  –  Pamir,  Tian  Shan,  Tibete  e
Himalaia. Todos os estágios desses carrapatos de três hospedeiros parasitam roedores, musaranhos e, com menor
frequência, lebres.

 BOTHRIOCROTON SPP.
O  gênero  Bothriocroton  (antes  conhecido  como  Aponomma)  inclui  sete  espécies  de  carrapatos  indígenas  da
Austrália e Pápua Nova Guiné (B. oudemansi). O Bothriocroton spp. assemelha­se ao Amblyomma spp., mas não
possui olhos. Nesse grupo, B. aruginans é o parasito de fascólomos; B. concolor e B. oudemansi são ectoparasitas
de equidnas na Austrália e Pápua Nova Guiné, respectivamente. As outras quatro espécies desse gênero parasitam
quase exclusivamente répteis. B. hydrosauri, o carrapato do lagarto de língua azul, é o reservatório de Rickettsia
honei na ilha de Flinders, Austrália.

 COSMIOMMA SP.
O gênero Cosmiomma possui  uma  única  espécie, C. hippopotamensis,  encontrado  no  sudoeste  e  leste  da  África.
Ele se alimenta principalmente em rinocerontes brancos e negros e, com menor frequência, em antílopes.

 DERMACENTOR SPP.
Das 36 espécies de Dermacentor spp., 19 habitam zonas temperadas. Das espécies tropicais, D. nitens é o de maior
importância veterinária, embora outros possam transmitir infecções zoonóticas, e os adultos podem ser comuns em
animais  silvestres  como  porcos,  cervos  e  antílopes.  Os  estágios  imaturos  infestam  principalmente  roedores  e
lagomorfos.  Dermacentor  spp.  em  áreas  frias  e  D.  (Anocentor)  nitens  na  América  tropical,  possuem  ciclos
biológicos  especializados  e  dinâmica  de  atividade  sazonal,  cada  uma  das  quais  deve  ser  considerada
separadamente. À exceção de D. nitens, D. albipictus e D. dissimilis, o ciclo biológico do Dermacentor é típico do
padrão de três hospedeiros.
D. nitens, o carrapato tropical de um hospedeiro dos equinos, previamente classificado como gênero Anocentor,
é de importância veterinária considerável. Originalmente, ele parasitava cervos (Mazama) em florestas do norte da
América do Sul. Com a introdução dos Equidae e outros animais de produção no seu habitat, ele se adaptou a esses
animais.  Passando  toda  a  sua  vida  parasitária  profundamente  nas  orelhas  dos  hospedeiros,  esse  parasito  foi
facilmente disseminado por atividades humanas para outras áreas das Américas, incluindo Flórida e Texas. Além
das orelhas, cada estágio ativo pode infestar as passagens nasais e a crina, o abdome ventral e a área perianal. D.
nitens transmite Babesia caballi por via transovariana para as gerações sucessivas e é importante na indústria de
equinos de corrida. Ele também é um vetor experimental de Anaplasma marginale para os bovinos.
Outra espécie americana  de  um  hospedeiro, D. albipictus,  o  carrapato  do  inverno  ou  dos  alces,  se  estende  do
Canadá e norte dos EUA até o oeste dos EUA e o México. Uma forma castanha, esporadicamente denominada D.
nigrolineatus, se distribui do Novo México ao sul e leste dos EUA e pode ser classificado como uma subespécie,
se  não  for  classificado  como  espécie.  O  período  de  alimentação  de  larva­ninfa­adulto  em  um  único  hospedeiro
(alces,  cervos  ou  bovinos  e  equinos  domésticos)  se  estende  do  outono  até  a  primavera.  Hospedeiros  com
infestações maciças podem morrer. D. albipictus causa  a  “doença  do  alce  fantasma”  do  Canadá,  frequentemente
fatal,  é  um  vetor  secundário  do  vírus  da  febre  do  carrapato  do  Colorado,  vetor  experimental  de B.  caballi  e  um
vetor natural de A. marginale em Oklahoma.
No  México  e  América  Central, D. dissimilis  parasito  uma  variedade  de  hospedeiros  equídeos  e  ruminantes,  e
pode ser um carrapato de um hospedeiro em equinos.
O  carrapato  da  madeira  das  Montanhas  Rochosas,  D.  andersoni,  é  encontrado  do  oeste  do  Nebraska  às
montanhas do oeste (Cascades e Sierra Nevada) no norte do Novo México e Arizona, e no oeste do Canadá.
O carrapato americano do cão, D. variabilis, é encontrado a oeste de Cascades e Sierra Nevadas, no México, de
Montana ao Texas, ao leste até o Atlântico e no leste do Canadá. Ambas as espécies podem causar a paralisia por
carrapato  em  animais  de  produção,  silvestres  e  pessoas.  Eles  são  os  principais  vetores  de  Rickettsia  rickettsii,  o
agente da febre maculosa das Montanhas Rochosas (p. 827). D. andersoni também é o principal vetor do vírus da
febre do Colorado por carrapatos e transmite o vírus de Powassan, A. marginale, A. ovis e os agentes da tularemia e
da  febre  Q.  D.  variabilis  é  um  vetor  experimental  de  A.  marginale,  Babesia  caballi  e  B.  equi.  Adicionalmente,
vírus  sawgrass,  E.  chaffeensis  e  E.  ewingii  foram  detectados  em  D.  variabilis  adultos.  Os  adultos  de  ambas  as
espécies  parasitam  animais  de  produção  e  silvestres,  incluindo  cervos,  bisão  e  alces,  mas  aqueles  de  D.
variabilis  preferem  cangambás,  guaxinins,  pumas  etc.  e  cães  domésticos.  As  formas  imaturas  se  alimentam  em
roedores  e  outros  pequenos  mamíferos  silvestres.  Uma  espécie  relacionada,  biologicamente  similar,  D.
occidentalis, é restrita às terras baixas do Pacífico e aos pés de serra do Oregon até a baixa Califórnia e é um vetor
natural de A. marginale.
No  oeste  dos  EUA  e  México,  D.  parumapterus,  D.  hunteri  e  D.  halli  parasitam  várias  espécies  de  lebres  e
coelhos,  ovinos  da  montanha  e  queixadas,  respectivamente.  Esses  carrapatos  raramente  entram  em  contato  com
animais de produção. D. hunteri é um vetor experimental de A. marginale e A. ovis. Na Costa Rica e no Panamá;
o D. latus infesta antas.
Nas estepes, florestas e montanhas da Eurásia, D. marginatus, D. reticulatus e D. silvarum,  coletivamente,  são
vetores de várias viroses e Babesia bovis, B. caballi, B. equi, B. canis, Theileria ovis e A. ovis, juntamente com os
agentes da tularemia e da febre Q e encefalite da primavera­verão russa. D. marginatus é encontrado em florestas,
pântanos, semidesertos e zonas dos Alpes da França até o sudoeste da Sibéria, Cazaquistão, Região Autônoma da
China  de  Xinjiang  Uygur,  Irã  e  norte  do  Afeganistão.  D.  reticulatus  se  estende  da  Irlanda  e  Grã­Bretanha  ao
noroeste  da  Sibéria  e  Xinjiang,  China,  em  prados,  planícies  de  inundação  e  florestas  decíduas  e  de  coníferas
decíduas. D. silvarum se estende da região central da Sibéria e nordeste da China ao Japão em pântanos, prados,
florestas de arbustos e secundárias, lavouras e áreas de florestas de taigas. Alguns machos nas populações de cada
uma dessas três espécies permanecem grudados no hospedeiro durante o inverno. Os adultos e os estágios imaturos
podem  permanecer  no  solo  durante  o  inverno.  A  maior  atividade  dos  adultos  ocorre  do  início  da  primavera  ao
verão com uma diminuição do pico no outono. As larvas e ninfas são ativas da primavera até o outono. O ciclo
biológico pode se completar em um ano ou se estender por uma ou mais diapausas de verão ou inverno até 2 a 4
anos.
Aproximadamente, outras 12 espécies de Dermacentor spp.  habitam  certas  baixadas,  estepes  em  montanhas  e
áreas de semidesertos da Ásia temperada. Seus adultos comumente são observados em camelos, bovinos, equinos,
ovinos  e  caprinos.  Na  Ásia  tropical,  as  várias  espécies  de Dermacentor,  subgênero  Indocentor,  são  parasitos  de
porcos silvestres; eles também infestam animais silvestres maiores, porém raramente, se presente, se alimenta em
animais de produção.

 HAEMAPHYSALIS SPP.
Poucas  das  166  espécies  de  Haemaphysalis  parasitam  animais  de  produção,  porém,  aquelas  que  parasitam,  são
importantes economicamente na Eurásia, África, Austrália e Nova Zelândia. Alguns desses carrapatos parasitos de
cervos  selvagens,  antílopes  e  bovinos  se  adaptaram  aos  bovinos  domésticos  e,  em  menor  extensão,  a  ovinos  e
caprinos. Outras, originalmente específicas de vários ovinos e caprinos silvestres, se adaptaram principalmente às
raças domésticas desses animais. Algumas espécies africanas que evoluíram com carnívoros atualmente parasitam
cães  domésticos.  Formas  imaturas  de  espécies  que  parasitam  animais  de  produção,  em  geral,  se  alimentam  em
pequenos vertebrados, mas há poucas exceções notáveis. Todos Haemaphysalis spp.  possuem  ciclo  biológico  de
três  hospedeiros.  Eles  são  pequenos  (adultos  não  alimentados  medem  <  4,5  mm  de  comprimento),  castanhos  ou
avermelhados  e  sem  olhos.  A  maioria  tem  aparelho  bucal  muito  curto.  Espécies  diferentes  causam  paralisia  por
carrapato e são vetores  de  agentes  que  causam  febre  Q,  tularemia  e  brucelose,  e  de Theileria  orientalis,  T.  ovis,
Babesia major, B. motasi, B. canis, Anaplasma mesaeterum etc.
H.  punctata  é  amplamente  distribuído  em  locais  onde  ovinos,  caprinos  e  bovinos  se  alimentam  em  certas
florestas  abertas  e  pastagens  com  arbustos  do  sudoeste  da  Ásia  (Irã  e  antiga  União  Soviética)  a  boa  parte  da
Europa, inclusive sul da Escandinávia e Grã­Bretanha. Os estágios imaturos infestam pássaros, ouriços, roedores e
répteis. Além da transmissão de Anaplasma e Babesia spp., populações diferentes de H. punctata estão infectadas
por  vírus  da  encefalite  da  primavera­verão  russa,  vírus  Tribec,  vírus  Bhanja  e  vírus  da  febre  hemorrágica  da
Crimeia­Congo.
Adultos de H. sulcata parasitam animais de produção (principalmente ovinos e caprinos) do noroeste da Índia e
sul da antiga União Soviética até Arábia, Sinai e sul da Europa. Adultos de H. parva parasitam esses hospedeiros
do sudoeste da antiga União Soviética e Oriente Próximo até áreas do Mediterrâneo (exceto o Egito). As formas
imaturas de H. sulcata são  especialmente  comuns  em  lagartos,  mas  a  variedade  de  hospedeiros  das  larvas  e  das
ninfas de ambas as espécies são semelhantes aos do H. punctata.
H. longicornis é um parasito de cervos e animais de produção no Japão e nordeste da Ásia; há uma forma (raça)
bissexuada em áreas ao sul e uma raça com reprodução partenogênica em áreas ao norte. A última foi introduzida
na Austrália, Nova Zelândia e nas ilhas do Pacífico, onde ela preserva sua habilidade reprodutiva não habitual. As
formas  imaturas  normalmente  parasitam  pequenos  mamíferos  e  pássaros,  mas  também  podem  se  alimentar  em
animais de produção; as grandes densidades populacionais podem se tornar pragas sérias em cervos e em animais
de  produção.  Esse  carrapato  é  o  principal  vetor  de  Theileria  orientalis  e  também  transmite  Babesia  ovata,  B.
gibsoni  e  os  agentes  de  febre  Q,  encefalite  de  Powassan  e  encefalite  da  primavera­verão  russa.  Durante  a
alimentação das larvas pode ocorrer dermatite aguda em pessoas.
Outros carrapatos Haemaphysalis em animais de produção da Eurásia são H. inermi (das terras baixas do norte
do  Irã  e  sudoeste  da  antiga  União  Soviética  até  a  região  central  e  sudoeste  da  Europa  até  a  Itália),  H.
pospelovashtromae  (montanhas  do  sul  da  antiga  União  Soviética  e  Mongólia),  H.  kopetdaghicus  (áreas  do  Mar
Cáspio  e  montanhas  dos  países  da  antiga  União  Soviética  e  do  Irã)  e  H.  tibetensis,  H.  xinjiangensis  e  H.
moschisuga (China).
Das  várias  espécies  de  Haemaphysalis  que  parasitam  animais  de  produção  no  Sudeste  Asiático,  três  são
especialmente notáveis: H. bispinosa, encontrado no Paquistão, Bangladesh, Nepal, Butão, Sri Lanka e Malásia e
transmissor de Babesia spp. a bovinos, ovinos e cães; H. spinigera, o principal vetor do vírus da doença da floresta
de Kyasanur a pessoas no estado de Karnataka na Índia; e H. anomala que se estende das terras baixas do Nepal ao
Sri Lanka e as montanhas do noroeste da Tailândia.
Na Ásia temperada, outras 18 espécies de Haemaphysalis parasitam animais de produção: 9 no alto do Himalaia
e montanhas limítrofes e 9 no nordeste da antiga União Soviética, Coreia e Japão. Iaques e híbridos de iaques estão
entre  os  animais  de  produção  hospedeiros  dos  Haemaphysalis  himalaios.  Várias  espécies  himalaias  parecem
preferir ovinos e caprinos.
Na  África  Subsaariana,  quatro  espécies  de Haemaphysalis  infestam  animais  de  produção  nas  florestas  altas  e
baixas, úmidas, secundárias ou mata ciliar. Essas são H. parmata (Etiópia e Quênia, centro e oeste da África até
Angola), H. aciculifer (Etiópia a Camarões e Zimbábue, introduzidas na África do Sul), H. rugosa (sul do Sudão e
Uganda até Gana e Senegal) e H. silacea (Zululândia e leste do sul da África).

 HYALOMMA SPP.
Os carrapatos Hyalomma, com frequência, são os carrapatos que mais parasitam animais de produção, incluindo
camelos,  em  áreas  quentes,  áridas  e  semiáridas,  em  geral  em  baixadas  e  biotas  de  altitude  intermediária,  e  em
locais com estações secas longas do centro e sudoeste da Ásia ao sul da Europa e sul da África. Das 25 espécies
conhecidas de Hyalomma spp., aproximadamente 15 são vetores importantes de agentes infecciosos aos animais de
produção  e  pessoas.  O  ciclo  biológico  com  três  hospedeiros  predomina  nesse  gênero,  mas  algumas  espécies
possuem  também  ciclos  de  um  ou  dois  hospedeiros.  Algumas  espécies  de  três  hospedeiros  podem  desenvolver
ciclo com um ou dois hospedeiros, uma capacidade facultativa única a esse gênero de ixodídeos. Hyalomma são
carrapatos moderadamente grandes a grandes, com aparelho bucal longo.
No subgênero Hyalommasta, os estágios imaturos da espécie H. aegyptium parasitam jabutis, pequenos animais
silvestres  e  animais  de  produção  do  Paquistão  até  ambos  os  lados  da  bacia  do  Mediterrâneo.  Os  adultos  são
parasitos específicos de jabutis.
O subgênero Hyalommina é encontrado no subcontinente indiano e Somália. Cada uma das seis espécies possui
ciclo biológico de três hospedeiros. As formas imaturas parasitam pequenos mamíferos, em especial roedores. As
preferências  dos  adultos  para  seus  hospedeiros  entre  os  animais  de  produção  refletem  o  grupo  de  gazelas
selvagens,  bovinos,  caprinos  ou  ovinos  com  o  qual  cada  espécie  está  envolvida.  Duas  espécies  infestam
principalmente  bovinos  e  bubalinos  domésticos  –  H.  brevipunctata  (Índia  e  Paquistão)  e  H.  kumari  (Índia,
Paquistão,  Afeganistão,  noroeste  do  Irã  e  Tadjiquistão).  Três  espécies  normalmente  parasitam  ovinos  e  caprinos
–  H.  hussaini  (Índia,  Paquistão  e  União  de  Myanmar),  H.  rhipicephaloides  (áreas  do  Mar  Morto  e  do  Mar
Vermelho)  e  H.  arabica  (Iêmen  e  Arábia  Saudita).  H.  punt  (Somália  e  Etiópia)  se  alimentam  em  antílopes,
camelos, bovinos, ovinos e caprinos.
O subgênero Hyalomma contém 15 espécies de importância veterinária e de saúde pública. Três das 15 espécies
possuem  2,  3  e  4  subespécies,  respectivamente.  Dentre  essas,  a  principal  é  H.  anatolicum  anatolicum,  de  dois
hospedeiros,  considerados  um  dos  carrapatos  mais  nocivos  no  mundo,  amplamente  distribuído  em  camelos,
bovinos  e  equinos  em  ambientes  de  estepes  e  semidesertos  da  Ásia  Central  até  Bangladesh,  Oriente  Médio  e
Próximo,  Arábia,  sudeste  da  Europa  e  África,  ao  norte  da  linha  do  Equador.  As  formas  imaturas  e  adultas,  em
geral, infestam os mesmos tipos de hospedeiros. As ninfas e adultos que não se alimentaram passam a estação seca
e o inverno em fendas em paredes de pedra, estábulos e campos de ervas e sem cultivo. Quando as formas imaturas
infestam pequenos mamíferos, pássaros ou répteis, o ciclo biológico se passa em três hospedeiros. H.  anatolicum
anatolicum transmite Theileria annulata, Babesia equi, B. caballi, Anaplasma marginale, Trypanosoma theileri e,
no mínimo, cinco arboviroses; é um vetor do vírus da febre hemorrágica da Crimeia­Congo, em pessoas.
As  numerosas  formas  imaturas  e  a  forma  adulta  de  H.  anatolicum  anatolicum,  que  normalmente  parasitam
animais  de  produção,  causam  emaciação.  Os  estágios  imaturos  das  subespécies  H.  anatolicum  excavatum  (um
parasito  de  três  hospedeiros)  infestam  principalmente  roedores  que  vivem  em  tocas  em  alguns  biotas  um  pouco
diferentes, no mesmo ambiente de H. anatolicum anatolicum. Os adultos de ambas as subespécies podem infestar o
mesmo  animal.  A  distribuição  de  H.  anatolicum  excavatum  é,  de  alguma  forma,  mais  limitada  do  que  a  de  H.
anatolicum  anatolicum,  porém  sua  densidade  populacional  no  inverno,  em  geral,  é  maior.  Uma  espécie
intimamente relacionada, H. lusitanicum, substitui H. anatolicum anatolicum da região central da Itália a Portugal,
Marrocos e Ilhas Canárias; ela está associada à babesiose equina e bovina. Além dos animais de produção, cervos e
coelhos atuam como hospedeiros.
O complexo H. marginatum consiste em quatro subespécies, cada uma delas invariavelmente com ciclo de dois
hospedeiros.  Os  adultos  parasitam  animais  de  produção  e  herbívoros  silvestres.  As  formas  imaturas  parasitam
principalmente pássaros. Os roedores raramente são parasitados, se o forem. Lebres e ouriços são os hospedeiros
secundários. As subespécies são H. marginatum marginatum (áreas do Mar Cáspio do Irã e antiga União Soviética
até Portugal e noroeste da África), H. marginatum rufipes (sul do Saara até a África do Sul e também o vale do
Nilo e o sul da Arábia), H. marginatum turanicum (Paquistão, Irã, sul da antiga União Soviética, Arábia, parte do
nordeste da África – introduzido com ovelhas do Irã ao planalto sul africano de Karoo) e H. marginatum isaaci (Sri
Lanka  ao  sul  do  Nepal,  Paquistão  e  norte  do  Afeganistão).  As  subespécies  de  H.  marginatum  são  vetores
importantes  do  vírus  da  febre  hemorrágica  da  Crimeia­Congo  e  também  transmitem  agentes  infecciosos  aos
animais de produção e outras viroses que infectam animais silvestres, animais de produção e pessoas.
O  complexo  H.  asiaticum  consiste  em  três  subespécies  com  ciclo  de  três  hospedeiros  e  habitam  desertos,
semidesertos e estepes do sudoeste da China, Mongólia e sul da antiga União Soviética, até o Oriente Médio e o
Iraque. Os roedores são os principais hospedeiros dos estágios imaturos; lebres também podem ser infestadas. Os
adultos  parasitam  animais  de  produção,  em  particular  camelos.  As  subespécies  do  leste  ao  oeste,  H.  asiaticum
kozlovi, H. asiaticum asiaticum e H. asiaticum caucasicum, são de importância médica e veterinária.
Três  espécies  adicionais  de  Hyalomma  spp.  que  parasitam  camelos  e  outros  animais  de  produção,  com  ciclo
biológico  de  três  hospedeiros,  são  H.  dromedarii  (Índia  até  a  África,  ao  norte  da  linha  do  Equador),  H.
schulzei  (leste  do  Irã  até  a  Arábia  e  norte  do  Egito)  e  H.  franchinii  (Síria  até  a  Tunísia).  Os  estágios  imaturos
parasitam roedores e outros pequenos mamíferos, pássaros e répteis; as formas imaturas do H. dromedarii também
infestam animais de produção. H. dromedarii tem importância médica e veterinária; as outras duas espécies foram
pouco estudadas.
H.  detritum,  um  vetor  importante  de  Theileria  annulata,  possui  ciclo  biológico  com  três  espécies  de
hospedeiros; tanto os adultos quanto as formas imaturas parasitam animais de produção. Seus biótopos são áreas
úmidas em estepes, desertos e semidesertos do sul da China, Mongólia e terras baixas do Nepal até o sul da Europa
e norte da África. H. impeltatum se estende do Irã e Arábia até o norte da Tanzânia e Chade. Os adultos parasitam
animais  de  produção:  as  formas  imaturas  se  alimentam  em  roedores  e  outros  pequenos  mamíferos,  pássaros  e
répteis.
H. scupense, um parasito de bovinos e equinos no sudoeste da antiga União Soviética e sudeste da Europa, tem
ciclo biológico em um hospedeiro, não é comum (assim como as cepas canadenses de Dermacentor albipictus)  e
inverna nos hospedeiros, que sofrem intensamente pelo longo período de alimentação das numerosas larvas (final
do outono), ninfas (inverno), e adultos (primavera). H. scupense é um vetor de Theileria annulata e Babesia equi.
Além das várias espécies já mencionadas, as savanas africanas abrigam outras cinco espécies de Hyalomma spp.
de animais de produção e silvestres: H. truncatum (sudeste  do  Egito  ao  sul  da  África), H. albiparmatum  (sul  do
Quênia, norte da Tanzânia), H. erythraeum (leste da Somália e Etiópia e Iêmen), H. impressum (oeste do Sudão e
África  Ocidental)  e  H.  nitidum  (República  Centro­africana  e  África  Ocidental).  Os  estágios  imaturos  dessas
espécies  de  ciclo  biológico  com  três  hospedeiros,  em  geral,  infestam  pequenos  mamíferos  e,  com  menor
frequência, pássaros e répteis. H. truncatum, que causa sudorese e claudicação em bovinos, bem como paralisia do
carrapato em pessoas e ovinos, é vetor do vírus da febre hemorrágica da Crimeia­Congo, Coxiella burnetii (febre
Q) e Rickettsia conorii (tifo por carrapato africano, febre de Boutoneuse).

 IXODES SPP.
Estes  carrapatos,  que  representam  o  maior  gênero  da  família  Ixodidae,  contém  249  espécies  e  é  altamente
especializado  tanto  estrutural  quanto  biologicamente.  Até  o  momento,  todas  as  espécies  de Ixodes  spp.  possuem
ciclo  biológico  de  três  hospedeiros.  Quase  todos  habitam  zonas  de  florestas  tropicais  ou  temperadas  ou  com
bosques  e  arbustos;  poucos  são  adaptados  a  áreas  úmidas  em  semidesertos  ou  em  ninhos  de  colônias  de  aves
marinhas  do  ártico  ou  subantárticos.  Os  hospedeiros  são  uma  ampla  variedade  de  aves  e  mamíferos  e  poucos
répteis.  A  maioria  das  espécies  parasito  os  hospedeiros  nas  tocas  ou  aqueles  que  retornam  regularmente  até  as
grutas  e  cavernas  ou  colônias  de  nidificação  terrestre  ou  em  árvores.  As  poucas  espécies  de  Ixodes  spp.  que
parasitam artiodáctilos e perissodáctilos errantes são excepcionalmente adaptáveis; elas também parasitam animais
de produção e são pestes importantes ou vetores de agentes que infectam animais de produção e pessoas.
É especialmente importante I. ricinus da  Eurásia,  noroeste  da  África,  América  do  Norte  e  América  do  Sul.  I.
ricinus é  conhecido  como  carrapato  de  ovinos  e  o  protótipo  desse  grupo  habita  pastagens  relativamente  úmidas,
viçosas,  com  arbustos  e  florestas,  além  de  jardins,  arvoredos,  planícies  inundadas  e  florestas  de  boa  parte  da
Europa  até  o  Mar  Cáspio  e  norte  do  Irã,  bem  como  noroeste  da  África.  Seu  ciclo  biológico  é  de  2  a  4  anos,
dependendo  da  temperatura  ambiente  (Em  biotas  mais  secos  e  quentes  ao  leste  do  Mediterrâneo,  I.  ricinus  é
substituído por I. gibbosus, que completa o ciclo biológico em um ano). As larvas de I. ricinus se alimentam em
pequenos répteis, pássaros e mamíferos. As ninfas se alimentam em vertebrados de porte pequeno a médio, e os
adultos  se  alimentam  principalmente  em  herbívoros  e  animais  de  produção.  Todos  os  estágios,  em  especial  as
ninfas e os adultos, parasitam pessoas. Os machos de I. ricinus se alimentam pouco ou não se alimentam e podem
se  reproduzir  sobre  o  hospedeiro  ou  fora  dele.  Os  adultos  não  alimentados,  com  frequência,  se  reproduzem  na
vegetação.  O  pico  de  atividade  dos  adultos  ocorre  na  primavera;  em  algumas  populações,  há  um  pico  menor  de
atividade  de  adultos  no  outono.  As  principais  dentre  as  numerosas  doenças  arbovirais  transmitidas  por  I.
ricinus  são  encefalomielite  ovina,  encefalite  originária  de  carrapatos  e  febre  hemorrágica  da  Crimeia–Congo.
Outros  agentes  transmitidos  aos  animais  de  produção  são  Coxiella  burnetii,  Anaplasma  marginale,  Babesia
divergens  e  Anaplasma  phagocytophilum,  várias  cepas  causam  anaplasmose  granulocítica  bovina,  ovina  e  em
pessoas.
I. persulcatus, o carrapato da taiga, está intimamente relacionado com o I. ricinus e possui preferência similar de
hospedeiros. Ele se estende das montanhas do centro e leste da Europa, através das florestas de terras baixas do
Mar  Báltico  e  da  república  autônoma  russa  da  Carélia,  para  o  leste  em  direção  à  taiga  da  Sibéria,  aos  mares  do
Japão e Okhotsk e às ilhas ao norte do Japão. O ciclo biológico pode se completar em 3 a 4 anos, mas pode durar
até 7 anos em regiões com verão curto. É um dos principais vetores do vírus da encefalite primavera­verão russa e
de Borrelia burgdorferi. Adicionalmente, ele transmite Babesia spp., Ehrlichia muris e os agentes da anaplasmose
e tularemia humana e ovina.
Outros representantes asiáticos do grupo do I. ricinus incluem I.  sinensis  (da  China),  I.  kashmiricus  (do  norte
montanhoso  da  Índia,  Paquistão  e  Quirguistão),  I.  pavlovskyi  (do  sul  das  montanhas  siberianas  da  Rússia)  e  I.
kazakstani (da taiga de montanha e da floresta de decíduas do Cazaquistão, Quirguistão e Turcomenistão).
Nas  Américas,  representantes  do  grupo  I.  ricinus  incluem  I.  scapularis,  I.  pacificus,  I.  affinus,  I.  jellisoni,  I.
minor e I. muris. O I. scapularis se distribui por todo o leste e centro­norte dos EUA e sul do Canadá, e é vetor
de  Borrelia  burgdorferi,  o  agente  da  doença  de  Lyme,  e  Anaplasma  phagocytophilum,  que  causa  anaplasmose
granulocítica em pessoas, equinos e cães. Ele também transmite Babesia microti, o agente da babesiose humana,
nas  áreas  costeiras  de  Nova  York  a  Massachusetts.  O  principal  hospedeiro  do  I.  scapularis  adulto  é  o  cervo;
animais  de  produção  raramente  pastam  nas  zonas  arbóreas  habitadas  por  esses  carrapatos.  Os  adultos  de  I.
pacificus parasitam animais de produção da baixa Califórnia à Columbia Britânica e no interior de Idaho, Nevada e
Oregon. I.  pacificus  e  I.  neotomae  transmitem  os  agentes  da  doença  de  Lyme,  tularemia  e  a  riquétsias  da  febre
maculosa  das  Montanhas  Rochosas;  I.  pacificus  também  transmite  Anaplasma  phagocytophilum.  A  picada  do
carrapato causa úlceras de cicatrização lenta. Uma espécie relacionada, I. affinis, se distribui do sul da Carolina do
Sul e Flórida à Argentina. Ela é encontrada principalmente em animais silvestres e seu papel como vetor não foi
provado.
Na África, apenas quatro espécies do gênero Ixodes se  adaptaram  a  animais  de  produção.  A  principal  espécie
dentre essas é o carrapato sul­africano da paralisia (I. rubicundus) da vegetação úmida das colinas e montanhas do
planalto  sul­africano  de  Karoo.  As  suas  toxinas  salivares  causam  tetraplegia  flácida  nos  animais  de  produção,
pessoas, cães e chacais. Os estágios imaturos parasitam a lebre das rochas, outras lebres e musaranhos­elefante. Os
outros  parasitos  dos  animais  de  produção  nas  terras  altas  africanas  são  I.  drakenbergensis  (Natal),  I.
lewisi (Quênia) e I. cavipalpus (sul do Sudão até o Zimbábue e Angola).

 MARGAROPUS SPP.
Carrapatos do gênero Margaropus assemelham­se aos carrapatos Rhipicephalus (Boophilus), mas não apresentam
festões  ou  ornamentações.  Eles  são  caracterizados  por  membros  posteriores  muito  grandes  e  placa  mediana
alongada.  As  três  espécies  altamente  especializadas,  com  pernas  lustrosas  do  gênero  Margaropus  de  um
hospedeiro se restringem a áreas limitadas da África. M. reidi e M. wileyi são  registrados  nas  girafas  em  Sudão,
Quênia e Tanzânia, respectivamente. M. wileyi também é conhecido por parasitar zebras e gnus. M. winthemi, um
parasito de zebras, equinos e, com menor frequência, outros animais de produção e antílopes que se alimenta no
inverno, se restringe às montanhas da África do Sul e pode contribuir para uma perda de condição corporal durante
o inverno.

 NOSOMMA SP.
Os  adultos  da  única  espécie  desse  gênero,  N.  monstrosum,  parasitam  particularmente  os  búfalos  silvestres  e
domésticos, e também pessoas, animais de produção e animais silvestres em grande parte da Índia, terras baixas do
Nepal, Bangladesh, Tailândia e Laos. Os estágios imaturos parasitam principalmente roedores murídeos.

 RHIPICENTOR SPP.
O gênero Rhipicenthor é composto por duas espécies, R. bicornis e R. nuttalli, e ambos ocorrem apenas na África
Subsaariana. R. bicornis se alimenta em caprinos, bovinos, equinos, cães e carnívoros nas regiões central e sul da
África.  R.  nuttalli  tem  uma  distribuição  ampla  na  África  do  Sul.  Os  estágios  imaturos  se  alimentam  em
musaranhos­elefante.  Os  hospedeiros  preferenciais  dos  adultos  são  cães  domésticos,  leopardos  e  ouriços  sul
africanos. É provável que seja necessário um ano para completar o ciclo biológico desses carrapatos a campo.

 RHIPICEPHALUS SPP.
Aproximadamente 60 das 81 espécies de Rhipicephalus ocorrem na África Subsaariana. As outras espécies têm sua
origem  na  Eurásia  e  norte  da  África.  O  R.  sanguineus  e  o  R.  (Boophilus)  microplus  foram  disseminados  por
atividades  humanas  para  a  Ásia,  Austrália  e  para  as  Américas.  Os  adultos  da  maioria  das  espécies  parasitam
artiodáctilos,  perissodáctilos  ou  carnívoros  silvestres  e  domésticos.  Os  estágios  imaturos  se  alimentam
predominantemente em mamíferos pequenos; no entanto, dentre as espécies que parasitam roedores ou híraxes e
artiodáctilos,  poucas  apresentam  formas  imaturas  que  se  alimentam  no  mesmo  hospedeiro  dos  adultos.  O  ciclo
biológico  de  Rhipicephalus  spp.  é  tipicamente  de  três  hospedeiros,  mas  na  zona  de  clima  mediterrânea  (verão
quente e longo com baixa pluviosidade), R. bursa tem um ciclo de dois hospedeiros. Na África Subsaariana, com
estações secas, R. evertsi e R. glabroscutatum também possuem ciclos com dois hospedeiros. Por outro lado, cada
uma das cinco espécies do subgênero Boophilus tem ciclo biológico de um hospedeiro, que pode se completar em
3 a 4 semanas (ver a seguir).
Vários  Rhipicephalus  spp.  são,  há  muito  tempo,  difíceis  de  identificar  ou  foram  identificados  de  maneira
incorreta.  Os  conceitos  atuais  de  filogenética,  taxonomia  e  nomenclatura  de  carrapatos  se  baseiam  em  análises
moleculares.

Subgênero Boophilus spp.
Cada uma das cinco espécies de Rhipicephalus (Boophilus) spp. tem ciclo de um hospedeiro que pode se completar
em  3  a  4  semanas  e  resulta  em  uma  infestação  maciça  por  carrapatos.  Sob  essas  condições,  a  resistência  aos
acaricidas  se  torna  um  problema  importante  para  as  medidas  de  controle.  Bovinos  zebuínos,  que  serviram  por
séculos como hospedeiros de R. (B.) microplus na Índia, desenvolveu resistência à infestação por grande número
de  carrapatos  são  utilizados  (raça  pura  e  cruzamento)  em  programas  integrados  de  controle.  R.  (B.)  microplus,
considerado  o  carrapato  parasito  de  animais  de  produção  mais  importante  do  mundo,  foi  levado  de  florestas
habitadas por bovinos e cervídeos na Índia, para muitas áreas da Ásia tropical e subtropical, nordeste da Austrália,
Madagascar,  terras  baixas  costeiras  do  sudeste  da  África  à  linha  do  Equador,  e  boa  parte  da  América  do  Sul,
América  Central,  México  e  Caribe.  R.  (B.)  microplus  e  R.  (B.)  annulatus  foram  erradicados  dos  EUA  após  um
programa  de  controle  longo  e  de  custo  alto,  e  é  necessário  manter  vigilância  constante  para  evitar  a  sua
reintrodução.  R.  (B.)  annulatus  do  sul  da  antiga  União  Soviética,  Oriente  Médio  e  Mar  Mediterrâneo  foi
introduzido junto a animais de produção de colônias espanholas no nordeste do México, porém não se disseminou
na América Central. Na África, ao sul do Saara e norte da linha do Equador, o trânsito de bovinos provavelmente
contribuiu para muitas das populações de R. (B.) annulatus.
R. (B.) decoloratus, que está presente do sul da África ao Saara, está sendo substituído na parte sudeste dessa
área  por  R.  (B.)  microplus.  Em  zonas  mais  úmidas  do  oeste  da  África,  R.  (B.)  annulatus  se  mistura  com  ou  é
totalmente substituído por R. (B.) geigyi. Populações dispersas de R. (B.) geigyi são encontradas nas regiões leste,
sul  e  central  do  Sudão.  O  único  Boophilus  restrito  a  ovinos  e  caprinos  (e,  ocasionalmente,  equinos)
é R. (B.) kohlsi da  Síria, Iraque, Israel,  Jordânia,  oeste  da  Arábia  Saudita  e  Iêmen. R.  (B.)  microplus  é  um  vetor
experimental  de  Babesia  equi  e  foi  coletado  da  passagem  nasal  de  equídeos  no  Panamá.  Esse  carrapato  e
o  R.  (B.)  annulatus  são  os  principais  vetores  de  Babesia  bigemina,  Babesia  bovis  e  Anaplasma
marginale.  R.  (B.)  decoloratus  é  um  vetor  eficiente  de  B.  bigemina  e  A.  marginale,  mas  não  transmite  B.
bovis ou B. equi.

Subgênero Rhipicephalus spp.
A Ásia tropical é o habitat de  cinco  espécies  do  gênero Rhipicephalus  (Rhipicephalus)  spp.;  os  adultos  de  duas
espécies  parasitam  animais  domésticos.  R.  haemaphysaloides  infesta  todos  os  tipos  de  animais  de  produção  e
também antílopes selvagens, cervos, carnívoros e lebres no Sudeste Asiático continental (e também em Taiwan e
Filipinas), em direção ao oeste até Índia, Sri Lanka, Nepal, Paquistão e oeste do Afeganistão. R. pilans infesta os
animais  de  produção  e  animais  silvestres  na  Indonésia  e  Bornéu.  Os  estágios  imaturos  de  ambas  as  espécies  se
alimentam principalmente em roedores, mas também em musaranhos, lebres e pequenos carnívoros.
R. rossicus, R. schulzei e R. pumilio são espécies de importância médica e veterinária desde a Europa central até
o Cazaquistão. No sudoeste da Europa, R. pusillus infesta cães e coelhos europeus, raposas e porcos selvagens. R.
turanicus, como atualmente reconhecido, se distribui da China, sul da antiga União Soviética e Índia até o sul da
Europa e África até a África do Sul. Um membro do grupo R. sanguineus taxonomicamente difícil, “R. turanicus“
e  suas  várias  populações,  que  podem  representar  espécies  separadas,  requer  estudos  adicionais  quanto  à  sua
capacidade como vetor.
Uma espécie de dois hospedeiros reconhecida facilmente, R. bursa, se distribui do oeste da área europeia do mar
Mediterrâneo  até  Irã  e  Cazaquistão.  Os  adultos  e  os  estágios  imaturos  parasitam  animais  de  produção,  lebres,
cervos, ovinos e caprinos silvestres e pessoas. Ele causa a paralisia ovina e transmite o vírus da febre hemorrágica
da Crimeia–Congo e outros vírus para pessoas e Babesia, Theileria e Anaplasma spp. para os animais de produção.
O  carrapato  africano  do  gênero  Rhipicephalus  mais  bem  conhecido,  R.  sanguineus,  o  carrapato  dos  canis  ou
carrapato  marrom  dos  cães,  se  distribui  mundialmente  junto  com  os  cães  domésticos.  Ele  se  estabeleceu  em
construções  tão  ao  norte  quanto  o  Canadá  e  a  Escandinávia  e  tão  ao  sul  quanto  a  Austrália.  Na  África,  Oriente
Próximo e em partes do sul da Europa, os adultos parasitam carnívoros silvestres e domésticos, ovinos, caprinos,
camelos,  outros  animais  de  produção  e  vários  mamíferos  silvestres,  em  especial  lebres  e  ouriços.  Os  estágios
imaturos  na  natureza,  nessa  área,  se  alimentam  em  pequenos  mamíferos.  No  entanto,  nas  situações  urbanas,  em
qualquer lugar, os cães constituem virtualmente os únicos hospedeiros de estágios imaturos e de adultos. Pessoas
raramente  são  atacadas,  com  maior  frequência,  em  situações  nas  quais  crianças  brincam  e  dormem  em  contato
próximo  a  cães  maciçamente  infestados.  Foi  relatada  a  existência  de  cepas  de  adultos  de  R.  sanguineus  que  se
alimentam  em  bovinos  em  partes  do  México  e  no  Taiti.  Esse  carrapato  é  ativo  o  ano  inteiro  nos  trópicos  e
subtrópicos, mas é ativo apenas da primavera até o outono nas zonas temperadas. Observam–se, com frequência,
adultos  e  ninfas  recém–ativos  subindo  em  paredes  pelas  rachaduras  do  terreno.  R.  sanguineus  é  um  vetor
de  Babesia  canis,  Ehrlichia  canis,  Rickettsia  rickettsii,  R.  rhipicephali,  Rickettsia  conorii,  vírus  da  febre
hemorrágica  da  Crimeia–Congo  e  vírus  de  Thogoto.  No  centro­sul  dos  EUA,  R.  sanguineus  está  associado  à
disseminação  de  focos  de  Leishmania  mexicana.  Algumas  populações  americanas  tornaram­se  resistentes  aos
inseticidas. O parasito himenóptera de carrapatos (calcídeo), Hunterellus hookeri, infesta com frequência as ninfas
de R. sanguineus no leste da África.
R.  appendiculatus,  o  carrapato  marrom  das  orelhas,  constitui  uma  praga  importante  nas  savanas  frescas,
sombreadas, florestadas e com arbustos do sul do Sudão e leste da República Democrática do Congo até o Quênia
e  a  África  do  Sul.  Os  adultos  e  os  estágios  imaturos  se  alimentam  nas  orelhas  de  bovinos,  outros  animais  de
produção  e  antílopes,  mas  também  em  outras  áreas,  quando  a  infestação  é  maciça.  Os  estágios  imaturos  podem
infestar antílopes pequenos e carnívoros e, ocasionalmente, roedores. A atividade sazonal é intimamente associada
à temperatura e com períodos chuvosos. R. appendiculatus constitui o principal vetor do grupo de doenças causado
por Theileria parva (febre  da  Costa  Oeste,  doença  de  Corridor  e  teileriose  maligna  do  Zimbábue)  e  do  vírus  da
doença ovina de Nairobi; também é um vetor de Theileria taurotragi, Ehrlichia bovis, Rickettsia conorii e vírus de
Thogoto.  Infestações  maciças  nos  bovinos  Bos  taurus  suscetíveis,  às  vezes,  causam  toxemia  fatal,  perda  de
resistência a várias infecções e lesões graves nas orelhas do hospedeiro.
O  carrapato  intimamente  relacionado  R.  zambeziensis,  com  preferência  de  hospedeiros  semelhantes,  é
encontrado  nas  savanas  de  terras  baixas  mais  secas  na  Tanzânia,  Zimbábue,  Zâmbia,  Botsuana  e  na  região  sul­
africana  do  Transvaal;  ele  também  é  um  vetor  da  febre  da  Costa  Oeste.  Outras  espécies  aparentadas  com  R.
appendiculatus incluem R. nitens na Província do Cabo, na África do Sul e R. duttoni em Angola e na República
Democrática do Congo.
R. pulchellus, um parasito de zebras de cor marfim, também infesta animais de produção e animais de caça nas
savanas ao leste do vale do Rift, desde o sul da Etiópia até a Somália e o nordeste da Tanzânia. Os adultos e as
formas imaturas, em geral, infestam o mesmo hospedeiro; entretanto, as formas imaturas também se alimentam em
lebres,  e  as  larvas  (“carrapatos­semente”)  são  parasitos  que  causam  muita  irritação  em  pessoas. R.  pulchellus  se
alimenta nas orelhas e no abdome ventra, principalmente nas estações úmidas. Esse carrapato é vetor de Babesia
equi (entre as zebras), Theileria spp., Trypanosoma theileri, Rickettsia conorii, vários Bunyaviridae (vírus da febre
hemorrágica da Crimeia­Congo, vírus da doença ovina de Nairobi, vírus de Kajiado, vírus de Kismayo e vírus de
Dugbe) e do vírus de Barur.
Os  carrapatos  africanos  do  gênero  Rhipicephalus  de  dois  hospedeiros  são  subespécies  de  R.  evertsi  e  R.
glabroscutatum.  R.  evertsi  evertsi  (um  carrapato  de  pernas  grandes  e  vermelhas,  olhos  em  forma  de  contas  e
parasito  das  zebras  do  leste  da  África)  parasito  todos  os  tipos  de  animais  silvestres  e  animais  herbívoros  de
produção (mas raramente suínos). Os estágios imaturos e os adultos infestam os mesmos hospedeiros; os imaturos
também são relatados em lebres. Ele se distribui desde a África do Sul pelo leste da África, ao leste do rio Nilo, até
o sul do Sudão e também se estabeleceu nas montanhas do Iêmen. Ocorrem focos disseminados, introduzidos por
animais  domésticos,  a  oeste  do  rio  Nilo.  Os  estágios  imaturos  se  alimentam  no  canal  auditivo;  os  adultos  se
alimentam predominantemente ao redor do ânus e sob a cauda, mas também nas axilas, virilha e esterno. É comum
a ocorrência de um grande número de carrapatos em um único hospedeiro, sendo de difícil controle em razão de
sua concentração em locais de alimentação difíceis de atingir. O ciclo biológico é contínuo, por todo o ano, mas é
mais  lento  nas  estações  mais  frescas.  R.  evertsi  evertsi  transmite  Babesia  equi,  Theileria  parva  (vetor
secundário), Borrelia theileri, Rickettsia conorii e vírus de Kerai, Wad Medani e Thogoto. A subespécie ocidental
com pernas listradas (semelhante ao Hyalomma), R. evertsi mimeticus, encontrada desde o oeste de Botsuana até
Namíbia,  Angola  e  República  Democrática  do  Congo,  é  semelhante  às  subespécies  quanto  às  preferências  de
hospedeiro e locais de alimentação e ao ciclo biológico.
O pequenino R. glabroscutatum se tornou um parasito comum de ovinos, caprinos e outros animais de produção
nas savanas áridas e com arbustos pequenos do sudeste da Província do Cabo, na África do Sul. Também, infestam
os kudus e outros antílopes pequenos. Há poucos registros de estágios imaturos, sempre em roedores.
O grupo R. pravus, atualmente sob estudo taxonômico, consiste em quatro ou mais espécies nas quais os adultos
se alimentam de animais de produção e animais silvestres herbívoros (incluindo as lebres); os estágios imaturos se
alimentam  em  musaranhos­elefante  (insetívoros),  lebres  e  outros  mamíferos  pequenos.  R.  pravus,  um  carrapato
marrom de olhos convexos, ocorre nas savanas com arbustos e florestas do leste da África. Ele é infectado pelo
vírus  de  Kadam.  O  parente  próximo  R.  occulatus,  um  parasito  das  lebres,  e  um  outro  parasito  aparentado  dos
animais de produção ainda sem nome são encontrados no sul da África.
O grupo R. punctatus  de  parasitos  dos  animais  de  produção  e  de  artiodáctilos  silvestres,  difícil  de  classificar,
compreende  o  R.  punctatus  (Angola,  Moçambique  e  Tanzânia),  R.  kochi  (neavi  –  Botsuana  até  o  Quênia  e
República Democrática do Congo) e uma espécie ainda não nomeada do Zimbábue e África do Sul.
O  grupo  R.  capensis  também  se  encontra  sob  estudo.  Originalmente  parasito  do  búfalo  cafre,  essa  espécie
atualmente parasito animais de produção e silvestres na Namíbia e África do Sul (R. capensis e R. gertrudae), no
leste da África (R. compositus e R. longus) e oeste da África até o sudoeste do Sudão (R. pseudolongus).
Acima  de  1.800  m  de  altitude,  nas  regiões  de  florestas  e  arbustos  do  leste  da  África,  R.  hurti  e  R.
jeanelli infestam animais de produção, búfalos cafres e outros grandes animais de caça. R. hurti também habita as
montanhas na República Democrática do Congo. Ambas as espécies se alimentam principalmente nas orelhas dos
hospedeiros; R. jeanelli também se alimenta na vassoura da cauda.
R.  simus,  o  protótipo  do  grupo  R.  simus  e  há  muito  tempo  considerado  uma  espécie  bem  estabelecida,
atualmente é classificado em várias espécies. Na nova classificação, R. simus propriamente  dito  é  encontrado  no
centro  e  no  sul  da  África,  principalmente  ao  sul  da  latitude  8°S,  onde  é  um  vetor  experimental  competente
de Anaplasma marginale e A. centrale. No leste e norte da África, R. simus é substituído por uma espécie menos
pontilhada, R. praetextatus,  que  se  distribui  do  centro  da  Tanzânia  até  o  Egito.  Os  adultos  de  ambas  as  espécies
parasitam  animais  de  produção,  cães,  carnívoros  silvestres,  animais  de  tiro  de  tamanhos  grande  e  médio  e  o
homem. Sua ocorrência e densidade em animais de produção são inexplicavelmente erráticas. Os estágios imaturos
se alimentam em roedores escavadores comuns nas savanas. Ambas as espécies causam paralisia por carrapatos em
pessoas e transmitem Rickettsia conorii  e  Coxiella  burnetii.  No  Quênia,  R.  praetextatus  é  um  vetor  do  vírus  de
Thogoto e pode ser um vetor secundário do vírus da doença ovina de Nairobi. A oeste do rio Nilo, essas espécies
são substituídas por R. senegalensis e R. muhsamae.
Boa parte da literatura sobre R. tricuspis (Tanzânia à África do Sul) e R. lunulatus (oeste da África até a Etiópia
e a Tanzânia) está incorreta. O principal local de alimentação, tanto nos animais de produção como nos silvestres, é
a vassoura da cauda, mas outras partes do hospedeiro também podem ser utilizadas.
R. sanguineus e R. turanicus do grupo R. sanguineus já foram descritos anteriormente. As espécies relacionadas
incluem R. camicasi e R. bergeoni, no nordeste da África, R. guilhoni e R. moucheti, no oeste da África, e as duas
“formas” amplamente distribuídas de R. sulcatus, que estão sob estudo.
Duas  espécies  bastante  distintas  e,  com  frequência,  confundidas  com R. appendiculatus são  R.  supertritus  (da
província  sul–africana  de  Natal  até  o  sul  do  Sudão)  e  R.  muhlensi  (Quênia  e  do  sul  do  Sudão  até  o  centro  da
África). Os adultos de ambas as espécies parasitam bovinos, búfalos cafres, antílopes e grandes animais de caça; R.
supertritus também é encontrado em carnívoros.

CARRAPATOS ARGASÍDEOS IMPORTANTES

 ARGAS SPP.
A  maioria  das  57  espécies  conhecidas  de  Argas  spp.  é  específica  de  pássaros  e  morcegos;  algumas  espécies
parasitam  mamíferos  terrestres  silvestres  ou  jabutis  gigantes  de  Galápagos.  As  espécies  de  importância  na
transmissão  de  Aegyptianella  pullorum  e  Borrelia  anserina  às  aves  domésticas  são  Argas  persicus  (em  muitas
áreas  tropicais  e  subtropicais  do  mundo),  A.  arboreus  (boa  parte  da  África,  incluindo  o  Egito),  A.
africolumbae  (África  tropical),  A.  walkerae  (sul  da  África)  e  A.  miniatus  (América  do  Sul  e  América  Central).
Outras  espécies  que  infestam  aves  domésticas  parecem  transmitir  tanto  A.  pullorum  quanto  B.  anserina  (ver  p.
2957). A paralisia por carrapato é causada pelo repasto de A. persicus, A. arboreus, A. walkerae, A. miniatus, A.
radiatus  e  A.  sanchezi  (EUA).  Essas  e  outras  espécies  de  Argas  spp.  podem  causar  grande  irritação  quando  se
alimentam em pessoas.

 CARIOS SPP.
A  maioria  das  88  espécies  de  Carios  é  parasito  espécie­específica  de  morcegos  e  roedores.  Várias  espécies
infestam  ninhos  de  aves  em  rochas  e  cavernas.  Esses  carrapatos  normalmente  vivem  próximos  aos  seus
hospedeiros em cavernas,  árvores  ocas e  superfícies  rochosas  e,  dessa  forma,  raramente entram em contato com
animais  domésticos.  No  entanto,  em  locais  nos  quais  morcegos  ocupam  telhados  e  forros  de  casas,  os  parasitos
podem representar um problema para pessoas e seus animais de estimação. O carrapato C. kelleyi na América do
Norte e C. vespertilionis na  Europa,  que  na  natureza  se  alimentam  quase  que  exclusivamente  em  morcegos  que
habitam  cavernas  e  árvores  ocas,  são  encontrados  em  números  maciços  em  casas  em  associação  a  colônias  de
morcegos, sendo relatados ataques dos carrapatos a pessoas. Parasitos de ninhos de aves que vivem em colônias,
como  C.  amblus,  C.  capensis  e  C.  denmarki  podem  representar  uma  ameaça  a  colônias  de  reprodução  e  são
conhecidos como causa de morte em pintinhos.

 ORNITHODOROS SPP.
A  maioria  das  37  espécies  de  Ornithodoros  habita  locais  protegidos,  como  tocas,  grutas,  buracos,  rochedos  e
colônias de pássaros. Dentre as poucas espécies que parasitam animais de produção, O. savignyi e O. coriaceus são
excepcionais em razão da presença de olhos e por habitarem imediatamente abaixo ou acima do solo, sob a sombra
de árvores e pedras, onde os animais de produção e animais de caça descansam e dormem. O. savignyi, o carrapato
da areia, vive em áreas semiáridas da Namíbia à Índia e Sri Lanka e, com frequência, é muito abundante. Pessoas e
animais de produção amarrados sofrem irritação grave e toxicose por picadas de carrapato da areia; também foram
relatadas  paralisia  e  morte  de  animais.  O.  coriaceus,  o  “pajaroello”  dos  habitats  de  cerrado  de  carvalhos  em
encostas  do  norte  da  Califórnia  e  Nevada  até  Chiapias,  México,  ocupa  camas  de  cervos  embaixo  de  árvores  e
próximo a rochas grandes. Ele é bem conhecido por provocar irritação em cervos e bovinos e sua picada produz
uma  reação  cutânea  grave  em  pessoas.  O  aborto  epizoótico  bovino,  causado  por Borrelia crocidurae,  parece  ser
transmitido apenas por O. coriaceus. O. guerneyi abriga­se em solos sombreados por árvores em zonas áridas da
Austrália, onde cangurus e pessoas descansam; animais de produção raramente ou nunca ocupam essas áreas.
Dentre  as  numerosas  espécies  de  Ornithodoros  que  habitam  tocas,  várias  são  naturalmente  infectadas  com  o
vírus da peste suína africana (PSA) na África ou possuem a capacidade, confirmada por laboratório, de albergar e
transmitir o agente na Europa e nas Américas. O reservatório natural e o vetor do vírus da PSA é O. porcinus, que
é abundante em tocas de suínos africanos tropicais e também porcos­da­terra e porcos–espinho. Eles se adaptaram
secundariamente a habitações de pessoas e abrigos de animais domésticos, onde vivem em rachaduras nas paredes
e  no  chão.  As  populações  de  porcos  domésticos  nas  vizinhanças  de  porcos  silvestres  infectados  podem  ser
dizimadas pela peste suína africana (PSA). Suínos silvestres e domésticos não estão envolvidos na epidemiologia
de Borrelia duttoni, o agente da febre recidivante africana humana, que é transmitido pelo O. moubata. O vírus da
PSA  foi  transportado  em  carnes  infectadas  para  a  Espanha  onde  O.  marocanus,  que  habita  tocas  de  ratos  e
estábulos de porcos, é um vetor eficiente. O. marocanus também é um reservatório e vetor de Borrelia hispanica, o
agente da febre recidivante africana humana no noroeste da Espanha. A PSA foi igualmente introduzida no Brasil,
Haiti, República Dominicana e Cuba. Os carrapatos americanos O. turicata, O. dugesi e O. coriaceus são vetores
potenciais do vírus da PSA.
O. tholozani (O. papillipes, também O. crossi) infesta tocas, grutas, estábulos, cercas de barro e pedras e casas
de pessoas em meios semidesérticos, estepes e em ambientes com estação seca longa da China, sul da antiga União
Soviética, noroeste da Índia e Afeganistão até Grécia, nordeste da Líbia e leste das ilhas do Mediterrâneo. Vários
roedores,  ouriços,  porcos­espinho  e  animais  domésticos  carreiam  populações  de  O.  tholozani.  As  pessoas
desenvolvem febre recidivante persa grave, às vezes fatal, quando picados por O. tholozani infectado com Borrelia
persicus.
O. lahorensis,  originalmente  um  parasito  de  ovinos  silvestres  que  descansam  em  abrigos  de  rochedos,  é  uma
peste importante de animais de produção estabulados em terras baixas e montanhas do Tibete, Caxemira e sul da
antiga  União  Soviética  até  Arábia  Saudita  e  Turquia,  Grécia,  Bulgária  e  Iugoslávia.  O  ciclo  biológico  de
dois hospedeiros e a longa fixação de O. lahorensis no inverno é biologicamente notável. Ele é deletério para os
animais de fazenda mantidos por um longo período em estábulos altamente infestados durante o inverno; isso pode
causar  paralisia,  anemia  e  intoxicação  e  transmitir  os  agentes  da  piroplasmose,  brucelose,  febre  Q,  tularemia  e,
possivelmente, Borrelia persica, o agente da febre recidivante da Pérsia.
O. turicata parasito  roedores  que  vivem  em  tocas,  fendas  ou  grutas,  corujas,  cobras,  jabutis  e  também  porcos
domésticos e outros animais de produção no sul dos EUA e México. Ao contrário do padrão alimentar da maioria
dos  Ornithodoros,  as  formas  imaturas  de  O.  turicata  ingurgitam  em  menos  de  30  min,  mas  os  adultos  podem
permanecer  fixados  no  hospedeiro  por  até  dois  dias.  O.  turicata  foi  associado  a  doenças  em  suínos  e  reações
tóxicas graves e infecções secundárias podem ocorrer se pessoas forem picadas.
O.  furucosus  parasito  pessoas  e  animais  de  produção  em  casas  e  estábulos  no  noroeste  da  América  do  Sul.
Outras  pestes  de  animais  de  produção  e  pessoas  da  América  do  Sul,  provavelmente  parasitos  originários  de
queixadas, são O. braziliensis e O. rostratus.

 OTOBIUS SPP.
Otobius megnini,  que  é  altamente  especializado  biologicamente  e  estruturalmente,  infesta  os  canais  auditivos  de
antílopes, ovinos montanheses, cervos da Virgínia e cervos orelhudos em biotas com baixo índice pluviométrico do
oeste  dos  EUA  e  no  México  e  oeste  do  Canadá.  Bovinos,  equinos,  caprinos,  ovinos,  cães  e  pessoas  são
similarmente infestados. Esse parasito, oculto, foi transportado com animais de produção para o oeste da América
do  Sul,  Galápagos,  Cuba,  Havaí,  Índia,  Madagascar  e  sudeste  da  África.  Notavelmente,  os  adultos  possuem
aparelho bucal afuncional e permanecem no solo sem se alimentar, mas podem sobreviver por quase dois anos. As
fêmeas podem depositar até 1.500 ovos em um período de duas semanas. As larvas e os dois instares de ninfa se
alimentam por 2 a 4 meses, principalmente no inverno e primavera. Pode haver duas ou mais gerações por ano. As
pessoas  e  outros  animais  podem  sofrer  irritação  grave  pelas  infestações  dos  canais  auditivos  e  os  animais  de
produção  infestados  maciçamente  perdem  condição  corporal  durante  o  inverno.  São  relatadas  paralisia  por
carrapato e infecções secundárias por miíases. O. megnini é infectado por agentes da febre Q, tularemia, febre do
carrapato  do  Colorado  e  febre  maculosa  das  Montanhas  Rochosas.  A  segunda  espécie  de  Otobius  sp.,  O.
lagophilus, se alimenta nas cabeças de lebres e coelhos no oeste dos EUA.

CONTROLE DE CARRAPATOS
As principais razões para o controle de carrapatos são: proteger os hospedeiros da irritação provocada pela picada e
de perdas de produção, formação de lesões que podem se tornar secundariamente infectadas, danos ao couro e ao
úbere,  toxicoses,  paralisia  e,  sobretudo,  infecção  por  uma  ampla  variedade  de  microrganismos  patogênicos.  O
controle  também  evita  a  disseminação  de  espécies  de  carrapatos  e  de  doenças  por  eles  transmitidas  para  áreas,
regiões ou continentes livres destas enfermidades.

Controle Biológico e Cultural
Essas medidas podem ser direcionadas contra os estágios de vida livre e parasitário dos carrapatos. Os estágios de
vida  livre  da  maioria  das  espécies  de  carrapatos,  tanto  argasídeos  quanto  ixodídeos,  possuem  necessidades
específicas quanto ao microclima e estão restritos a um microhabitat particular, dentro de ecossistemas habitados
por  seus  hospedeiros.  A  destruição  desses  microhabitats  reduz  a  abundância  de  carrapatos.  A  alteração  do
ambiente  pela  remoção  de  determinados  tipos  de  vegetação  foi  utilizada  para  o  controle  do  Amblyomma
americanum em áreas de recreação do sudeste dos EUA e no controle de Ixodes rubicundus na África do Sul. O
controle de carrapatos argasídeos, como Argas persicus e A. walkerae em aves domésticas, pode ser realizado por
meio da eliminação de fendas em paredes e poleiros, que fornecem abrigo para os estágios de vida livre.
É possível também reduzir a abundância de espécies de carrapatos pela remoção de hospedeiros alternativos ou
hospedeiros de um estágio particular do ciclo biológico. Esse procedimento foi adotado algumas vezes no controle
de  carrapatos  ixodídeos  com  três  hospedeiros,  como  Rhipicephalus  appendiculatus,  Amblyomma
hebraeum e Ixodes rubicundus, na África, e Hyalomma spp., no sudeste da Europa e da Ásia.
Rotação  de  pastagens  ou  revezamento  de  pastos  foi  utilizada  para  o  controle  do  carrapato  ixodídeo  de  um
hospedeiro Rhipicephalus (Boophilus)  microplus,  na  Austrália.  Esse  método  também  pode  ser  aplicado  a  outros
carrapatos de um hospedeiro, nos quais a duração do período de revezamento é determinada pelo tempo de vida
relativamente  curto  da  larva  de  vida  livre  do  parasito.  No  entanto.  isso  possui  pouca  aplicação  para  carrapatos
ixodídeos de múltiplos hospedeiros ou carrapatos argasídeos, em razão dos longos períodos de sobrevivência de
ninfas e adultos não alimentados.
Predadores,  incluindo  pássaros,  roedores,  musaranhos,  formigas  e  aranhas,  desempenham  papel  importante  na
redução do número de carrapatos de vida livre em algumas áreas. No Novo Mundo, as formigas de fogo (Pheidole
megacephala)  são  predadoras  notáveis  de  carrapatos.  Os  carrapatos  ingurgitados  também  podem  ser  parasitados
por  larvas  de  algumas  vespas  (Hymenoptera),  mas  isso  não  promoveu  uma  redução  relevante  da  população  de
carrapatos.
Bovinos zebuínos (Bos indicus) e Sanga (cruzamento de B. taurus com B. indicus), que são as raças indígenas da
Ásia e da África, em geral, se tornam muito resistentes aos carrapatos ixodídeos após uma exposição inicial. Em
contraste,  as  raças  europeias  (B.  taurus)  normalmente  se  mantêm  bastante  suscetíveis.  A  resistência  das  raças
zebuínas  e  seus  cruzamentos  ao  carrapato  é  cada  vez  mais  explorada  como  meio  de  controle  dos  estágios
parasitários. A introdução de bovinos zebuínos na Austrália revolucionou o controle de R. (B.) microplus naquele
país. O uso de bovinos resistentes como meio de controle dos carrapatos também está se tornando importante na
África e nas Américas. Na África, as infestações por carrapatos ixodídeos nos animais de produção e em ungulados
silvestres  também  podem  ser  reduzidas  pelos  pica­bois  (Buphagus  spp.),  que  são  pássaros  que  se  alimentam  de
carrapatos fixados ao hospedeiro.

Controle Químico
Ver p. 2696.
O controle de carrapatos com acaricidas pode ser direcionado contra os estágios de vida livre no ambiente ou
contra os estágios parasitos nos hospedeiros. O controle dos carrapatos ixodídeos por tratamento da vegetação com
acaricidas foi feito em locais específicos (p. ex., ao longo de trilhos) em áreas de recreação dos EUA e em outros
locais, para reduzir o risco de parasitarem os humanos. Esse método não é recomendado para uso mais amplo, em
razão  da  poluição  ambiental  e  do  custo  do  tratamento  de  grandes  áreas.  Canis,  celeiros  e  residências  também
podem  requerer  tratamento  periódico  com  acaricidas  para  o  controle  dos  estágios  de  vida  livre  dos  carrapatos
ixodídeos, tais como o carrapato de canil, Rhipicephalus sanguineus.
Os estágios de vida livre dos carrapatos argasídeos, que infestam focos específicos como galinheiros, pombais,
chiqueiros e residências, são tratados com maior frequência e mais efetivamente com acaricidas.
O tratamento dos hospedeiros com acaricidas para matar larvas, ninfas e adultos de carrapatos ixodídeos fixados
e larvas de carrapatos argasídeos tem sido o método de controle mais amplamente utilizado. Na primeira metade do
século,  o  principal  acaricida  era  o  trióxido  de  arsênio.  Subsequentemente,  organoclorados,  organofosforados,
carbamatos, amidinas, piretroides e avermectinas foram utilizados em diferentes partes do mundo. A introdução de
novos compostos, tais como os fenilpirazóis, tem sido necessária em razão do desenvolvimento de resistência nas
populações de carrapatos.
Os  acaricidas  são  mais  comumente  aplicados  nos  animais  de  produção  nas  formas  de  banhos  de  imersão
e  sprays;  os  banhos  de  imersão  são  considerados  mais  efetivos.  Nos  últimos  anos,  vários  outros  métodos  de
aplicação de acaricidas foram desenvolvidos, incluindo a liberação lenta de medicamentos sistêmicos a partir de
implantes  e  bolus,  brincos  impregnados  com  acaricidas  convencionais  de  liberação  lenta,  pour­on  (que  são
aplicados  no  dorso  do  animal  e  difundem­se  rapidamente  por  toda  a  superfície  corpórea)  e  spot­on  (que  são
similares ao pour­on, porém com menor capacidade de difusão). Em aves, os acaricidas normalmente são aplicados
na forma de pó; em gatos, na forma de banhos ou pó; e em cães na forma de pó.
Por muitos anos, os piretroides e organofosforados formulados como pós, banhos ou coleiras foram utilizados
para  o  controle  de  carrapatos  em  cães  e  gatos.  Com  o  advento  dos  fenilpirazóis,  foram  introduzidos  sprays  de
longa  ação  e  formulações  spot­on  convenientes.  Recentemente,  os  piretroides  foram  introduzidos  como
produtos  spot­on  altamente  concentrados,  que  são  indicados  apenas  para  cães,  em  razão  da  sua  toxicidade  para
gatos. O uso desses piretroides concentrados não é aconselhável em cães que convivem com gatos na mesma casa.

Estratégias de Controle
Inicialmente,  as  principais  indicações  de  uso  dos  acaricidas  eram  a  erradicação  de  carrapatos,  prevenção  da
disseminação  de  carrapatos  e  das  doenças  transmitidas  por  eles  (quarentena)  e  o  controle  e  a  erradicação  de
doenças transmitidas por carrapatos. Os programas de erradicação foram efetivos em algumas regiões subtropicais
ecologicamente marginais, como o sul dos EUA e a região central da Argentina, onde Rhipicephalus (Boophilus)
spp.  e  babesiose  foram  erradicados,  e  no  sul  da  África,  onde  se  erradicou  a  febre  da  Costa  Leste  (causada
por  Theileria  parva  parva).  Os  programas  foram  menos  eficientes  em  áreas  tropicais  mais  favoráveis
ecologicamente, como o nordeste da Austrália, América Central, ilhas do Caribe e leste da África.
Nas áreas nas quais a erradicação não foi possível, o custo da manutenção de programas de controle intensivos,
com frequência, tem tornado esses programas proibitivos. Por essa razão, foram adotadas estratégias de controle
biológico  e  químico  integrados.  A  efetividade  dessas  estratégias  de  contenção  de  custos  requer  um  melhor
conhecimento  da  dinâmica  das  associações  entre  os  agentes  patológicos,  seus  hospedeiros  vertebrados,  os
carrapatos vetores e o ambiente. Medidas de quarentena rigorosa para prevenir reintroduções são obrigatórias em
países onde os carrapatos e as doenças transmitidas por eles foram erradicadas. Modelos climáticos, sistemas de
informação  geográfica  e  sistemas  inteligentes  (modelos  baseados  no  conhecimento  de  especialistas  e  na
inteligência  artificial)  estão  sendo  utilizados  para  identificar  áreas  não  afetadas,  nas  quais  as  pragas  podem  se
instalar se os carrapatos forem introduzidos.
O controle dessas doenças requer a utilização dos princípios de estabilidade endêmica e o desenvolvimento de
vacinas  recombinantes  melhoradas.  Uma  estratégia  atual  e  promissora  é  a  identificação  dos  sítios  receptores  no
intestino  intermediário  dos  carrapatos  vetores  e  o  desenvolvimento  de  anticorpos  que  se  ligam  a  esses  sítios,
evitando assim que os patógenos ingeridos pelo carrapato o infectem. Os bovinos que receberem os antígenos de
sítios receptores podem produzir anticorpos que serão ingeridos pelos carrapatos durante a alimentação.

Vacinas
Um  avanço  recente  de  muita  importância  foi  a  produção  de  uma  vacina  promissora  contra  R.  (B.)  microplus,
utilizando biotecnologia. O agente imunizante é um antígeno do carrapato, que normalmente não é encontrado no
hospedeiro. O mecanismo imune que a vacina estimula é diferente daquele envolvido na exposição aos carrapatos
(i.  e.  carrapatos  se  alimentando).  O  antígeno  é  derivado  de  um  extrato  bruto  das  fêmeas  adultas  parcialmente
ingurgitadas. Ele estimula a produção de um anticorpo que danifica as células intestinais dos carrapatos e os mata
ou reduz drasticamente seu potencial reprodutivo.
As perspectivas de desenvolvimento de vacinas similares contra outros ixodídeos vetores de doenças de grande
importância em bovinos ainda não está clara. Os carrapatos Rhipicephalus (Boophilus) são bons candidatos a essas
vacinas  por  possuírem  ciclo  biológico  de  um  hospedeiro  e  mostrarem  acentuada  preferência  por  bovinos  que,
provavelmente,  atuam  como  principal  reservatório  do  mais  importante  patógeno  transmitido  pelo  carrapato
(Babesia  spp.).  Por  outro  lado,  a  maioria  das  outras  espécies  de  carrapatos  vetores  de  doenças  importantes  aos
bovinos  (p.  ex.,  anaplasmose,  caudriose  e  teileriose)  apresenta  ciclo  de  três  hospedeiros,  e  não  infestam  apenas
bovinos, mas também espécies de ungulados silvestres, para os quais a utilização das vacinas não é viável. Além
disso,  muitos  ungulados  silvestres  hospedeiros  de  carrapatos  vetores  servem  como  reservatórios  desses  agentes
patológicos. Por essas razões, as vacinas contra carrapatos não boofilídeos vetores pode não ser capaz de erradicar
os carrapatos ou eliminar fontes importantes de doenças que eles podem transmitir.

HELMINTOS CUTÂNEOS

 DERMATITE POR PELODERA (DERMATITE RABDÍTICA)
Esta  é  uma  dermatite  rara,  não  sazonal,  aguda,  que  resulta  da  invasão  da  pele  por  uma  larva  de  nematódeo
saprófita,  de  vida  livre,  Pelodera  strongyloides.  A  larva  é  ubíqua  em  matérias  orgânicas  em  decomposição  e
próximas à superfície do solo úmido, porém apenas ocasionalmente são parasitos. A exposição da larva ocorre com
o contato direto com material infestado, como cama úmida e suja. As larvas podem não estar aptas a invadir a pele
saudável; dermatoses preexistentes ou condições ambientais que favorecem a maceração da pele, como exposição
constante à lama ou a cama úmida podem facilitar a invasão. Dermatites por Pelodera foram  descritas  em  cães,
bovinos, equinos, ovinos, cobaias e pessoas.
Tipicamente, as lesões limitam­se às áreas do corpo em contato com o material infestado, como extremidades,
abdome e tórax ventral e períneo. A pele afetada é eritematosa e parcial a completamente alopécica, com pápulas,
pústulas,  crostas,  erosões  ou  ulcerações.  O  prurido  é  em  geral  intenso,  mas  pode  ser  moderado  e  até  ausente.  O
diagnóstico diferencial inclui demodiciose, sarna sarcóptica canina, dermatofitoses, piodermites e outras doenças
cutâneas raras, causadas por infestações larvais como dermatite por ancilostoma, dirofilariose, dipetalonemíase e
estrongiloidíase.
O diagnóstico é facilmente confirmado pelo achado de larvas vivas e móveis de P. strongyloides nos  raspados
cutâneos das áreas afetadas. As larvas são cilíndricas, com cerca de 600 × 38 μm. O exame histopatológico das
biopsias de pele revela larvas nos folículos pilosos e na derme superficial e geralmente um infiltrado inflamatório
na derme. As larvas são facilmente cultivadas em placas de ágar­sangue a 25°C.
O tratamento efetivo consiste primariamente na remoção e destruição do material úmido e infectado da cama e a
transferência  do  animal  para  um  local  limpo  e  seco.  A  recuperação  espontânea  ocorre  usualmente.  Pode  ser
desejável  banhar  ou  aspergir  os  animais  afetados  com  uma  preparação  inseticida  ao  menos  duas  vezes  em
intervalos semanais. Se o prurido for grave, pode­se indicar o uso de corticosteroides, a curto prazo.

 ELAEOFORÍASE (Dermatose filariana, Cegueira com “olhos claros”, Ferida na cabeça)
Elaeophora schneideri é um parasito de veados orelhudos e veados de cauda preta encontrados nas montanhas do
oeste  e  do  sudoeste  dos  EUA  e  em  Nebraska;  também  pode  infectar  veados  de  cauda  branca  nas  regiões  sul  e
sudeste. Os parasitos adultos medem 60 a 120 mm de comprimento e geralmente são notados nas artérias carótida
comum  e  maxilar  interna.  As  microfilárias,  cerca  de  275  μm  de  comprimento  e  15  a  17  μm  de  espessura,
normalmente  são  notadas  nos  capilares  cutâneos  da  testa  e  da  face.  O  desenvolvimento  nos  hospedeiros
intermediários, moscas do gênero Tabanus e Hybomitra,  requer  cerca  de  2  semanas.  A  larva  infectante  invade  o
hospedeiro quando a mosca dos equinos se alimenta, migrando para artérias leptomeningeanas e se desenvolve até
a  forma  adulta  imatura  em  cerca  de  3  semanas.  Estas  jovens  adultas  migram  contra  o  fluxo  sanguíneo  e  se
estabelecem na artéria carótida comum, local onde continuam a crescer. Os parasitos alcançam a maturidade sexual
cerca de 6 meses mais tarde e começam a produzir microfilárias. A vida dos adultos é de 3 a 4 anos.
ACHADOS CLÍNICOS:  A doença clínica não foi relatada em veados orelhudos e veados de cauda preta; portanto são
considerados  hospedeiros  definitivos.  Quando  as  moscas  dos  equinos  transmitem  a  larva  infectante  aos  alces,
renas, ovinos e caprinos domésticos, veados sika e possivelmente, ao veado de cauda branca, a larva se desenvolve
nas artérias leptomeningeanas e causa necrose isquêmica do tecido cerebral, resultando em cegueira, dano cerebral
e  morte  súbita.  A  cegueira  nesses  animais  é  caracterizada  por  ausência  de  opacidades  nos  meios  refratários
oculares (cegueira com “olhos claros”).
Os ovinos e caprinos domésticos, especialmente cordeiros, cabritos e sobreanos podem morrer subitamente em 3
a 5 semanas após a infecção. O óbito geralmente ser precedido por incoordenação, andar em círculos e geralmente
convulsões  e  opistótono.  Vários  trombos  ocorrem  no  cérebro  e  nas  artérias  leptomeningeanas.  Uma  ou  mais  E.
schneideri jovens adultas acompanham cada trombo. Se os ovinos e os caprinos sobreviverem à infecção inicial,
uma  dermatite  profunda  e  sanguinolenta  se  desenvolverá  na  parte  superior  da  cabeça,  testa  ou  face  (“ferida  na
cabeça”)  em  6  a  10  meses  mais  tarde.  Outras  lesões  ocasionalmente  ocorrem  nos  membros  pélvicos,  abdome  e
patas. As lesões correspondem a dermatites alérgicas em resposta às microfilárias alojadas nos capilares. As lesões
persistem com períodos de cicatrização intermitente e incompleta por cerca de 3 anos, seguidas por recuperação
espontânea. Hiperplasia e hiperqueratose se desenvolvem na epiderme das áreas parasitadas.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  diferencial  inclui  cenurose  (Taenia,  p.  1398),  necrose  cerebrocortical  (p.  1383)  e
enterotoxemia (p. 657). Elaeoforose não deve ser considerada a menos que os ovinos ficaram em áreas endêmicas
durante  o  verão.  O  diagnóstico  em  cordeiros,  cabritos,  filhotes  de  alce  ou  bezerros  geralmente  é  realizado  na
necropsia;  numerosos  trombos  e  parasitos  são  notados  nas  artérias  carótida  comum,  maxilar  interna,  cerebrais  e
leptomeningeanas. O diagnóstico presuntivo em ovinos adultos baseia­se no histórico, localização e tipo de lesão.
A  lesão  cutânea  deve  ser  diferenciada  das  dermatoses  ulcerativas  (p.  1030).  A  confirmação  ocorre  quando  se
encontram  microfilárias  nas  lesões  ou  pela  recuperação  de  parasitos  adultos  postmortem.  Deve­se  macerar  uma
biopsia cutânea da lesão em solução salina isotônica e deixar descansar = 6 h em temperatura ambiente. A pele é
coada e o líquido é examinado para a pesquisa de microfilárias.
TRATAMENTO:  Sais de piperazina (220 mg/kg, VO) são efetivos. A recuperação completa ocorre em 18 a 20 dias.
Não há tratamento disponível para a forma cerebral da doença.

 ESTEFANOFILARIOSE (DERMATITE FILARIANA DOS BOVINOS)
Stephanofilaria  stilesi  é  uma  pequena  filária  parasito  que  causa  dermatite  circunscrita  ao  longo  da  linha  média
ventral  dos  bovinos.  Foi  relatado  em  todo  EUA,  mas  é  mais  comum  no  oeste  e  sudoeste.  Os  vermes  adultos
apresentam 3 a 6 mm de comprimento e em geral são notados na derme, logo abaixo da camada epidérmica. As
microfilárias  apresentam  50  μm  de  comprimento  e  estão  encapsuladas  por  uma  membrana  vitelina  esférica  e
semirrígida. O hospedeiro intermediário da S. stilesi é a fêmea da mosca do chifre, Haematobia irritans (p. 991).
As moscas do chifre alimentam­se na lesão contendo microfilárias, estas desenvolvem o terceiro estágio infectante
em 2 a 3 semanas. As larvas infectantes são introduzidas na pele quando a mosca do chifre se alimenta.
A dermatite se desenvolve ao longo da linha média ventral, geralmente entre a musculatura do peito e o umbigo.
Com a exposição repetida, a lesão dissemina­se e geralmente envolve a pele posterior ao umbigo. As lesões ativas
são  cobertas  por  sangue  ou  exsudato  seroso,  enquanto  lesões  crônicas  são  lisas,  secas  e  desprovidas  de  pelos.
Hiperqueratose e paraqueratose ocorrem na epiderme das áreas parasitadas.
Os raspados cutâneos profundos são macerados em solução salina isotônica e examinados ao microscópio para a
pesquisa  de  adultos  ou  microfilárias.  As  microfilárias  devem  ser  diferenciadas  das  microfilárias  de  Onchocerca
lienalis, O. gutturosa e Setaria spp, que são maiores (200 a 250 μm), e Pelodera strongyloides (ver anteriormente),
um  pequeno nematódeo  de  vida  livre  que  ocasionalmente  é  responsável  por  uma dermatite úmida superficial. O
esôfago rabditiforme da P. strongyloides não é notado nos nematódeos filariais.

Estefanofilariose cutânea. Cortesia do Dr. Sameeh M. Abutarbush.

Não há tratamento aprovado disponível para S. stilesi, mas aplicações tópicas de organofosforados (triclorfon 6 a
10%, 1 vez/dia ou em dias alternados, por 7 dias) mostraram­se efetivas contra outras espécies de Stephanofilaria.
A ivermectina foi efetiva contra microfilárias de S. zaheeri.

 HABRONEMOSE CUTÂNEA (FERIDA DE VERÃO, FERIDA DE JACK, BURSATTI)
Habronemose  cutânea  é  uma  doença  de  pele  dos  equídeos  causada  em  parte  por  larvas  de  vermes  estomacais
espirurídeos (p. 362). Quando as larvas emergem das moscas que se alimentaram em ferimentos preexistentes ou
da umidade das genitais ou dos olhos, elas migram para o interior dos tecidos, provocando irritação tecidual, que
desencadeia uma reação granulomatosa. A lesão torna­se crônica e retarda a cicatrização. O diagnóstico é baseado
nos achados de granulomas cutâneos gordurosos, não cicatrizantes, de coloração marrom­avermelhada que contêm
um  material  amarelo  calcificado  do  tamanho  de  grãos  de  arroz.  As  larvas,  reconhecidas  por  uma  protuberância
espinhosa na cauda, são notadas em raspados das lesões em algumas ocasiões. Muitos tratamentos diferentes foram
utilizados,  porém  a  maioria  apresenta  resultados  não  satisfatórios.  O  tratamento  sintomático  com  repelentes  de
insetos possui certo benefício e os organofosforados aplicados topicamente na superfície erodida podem matar as
larvas. A remoção cirúrgica ou a cauterização do tecido de granulação excessivo pode ser necessária. O tratamento
com  ivermectina  (200  μg/kg)  tem  sido  efetivo  e,  embora  possa  ocorrer  uma  exacerbação  temporária  das  lesões
(provavelmente  em  reação  às  larvas  mortas),  a  cura  espontânea  pode  ser  esperada.  Moxidectina  na  dose  de  400
μg/kg também parece ser ativa contra Habronema spp no estômago. O controle das moscas hospedeiras e a coleta
regular e o empilhamento do esterco associados à terapia anti–helmíntica podem reduzir a incidência.

 INFECÇÃO POR PARAFILÁRIA

Parafilaria bovicola
Essa  filária  parasito  de  bovinos  causa  lesões  subcutâneas  que  lembram  equimoses.  Também  foi  relatada  em
bubalinos (Bubalus bubalis). O verme é esbranquiçado; as fêmeas adultas possuem comprimento de 50 a 65 mm e
os  machos,  de  30  a  35  mm.  É  notado  na  Ásia  (Filipinas,  Japão,  Rússia,  Paquistão,  Índia),  na  Europa  (Bulgária,
Romênia,  França,  Suécia)  e  na  África  (Marrocos,  Tunísia,  Ruanda,  Burundi,  África  do  Sul,  Namíbia,  Botsuana,
Zimbábue).  Uma  espécie  foi  descoberta  no  Canadá  de  um  touro  importado  da  França,  porém  a P.  bovicola  não
parece ter se estabelecido nos continentes americanos e não foi relatada na Austrália.
A infecção por Parafilaria foi identificada como causa de perda econômica considerável nas indústrias de carne
bovina da África do Sul e da Suécia, apesar das diferenças climáticas. A doença acomete principalmente bovinos
de  corte  criados  em  áreas  de  savana  do  sul  da  África;  na  Suécia,  emergiu  como  um  problema  de  bovinos  em
pastagens de primavera, após o confinamento de inverno.
SINAIS  CLÍNICOS:   Os  únicos  sinais  externos  de  infecção  nos  gados  são  hemorragias  cutâneas  focais  (“manchas
hemorrágicas”)  que  podem  verter  por  algumas  horas  antes  de  coagular  e  secar  na  pelagem.  As  manchas
hemorrágicas são induzidas pela fêmea do parasito, que causa a formação de um pequeno nódulo, perfura a pele e
faz a ovoposição no sangue que sai do ferimento central. Os ovos minúsculos contêm o primeiro estágio larval do
parasito  (microfilária).  Em  ambos  os  hemisférios  norte  e  sul,  as  manchas  hemorrágicas  são  acentuadamente
sazonais, sendo mais comuns na primavera e no início do verão. A maioria das manchas ocorre ao longo do dorso
do animal, particularmente nos quartos dianteiros.
Os hospedeiros invertebrados são as moscas da face do gênero Musca (subgênero Eumusca), as quais ingerem
os  ovos  quando  se  alimentam  nos  pontos  hemorrágicos.  M.  autumnalis  foi  identificada  como  hospedeiro  na
Suécia, M. lusoria e M. xanthomelas na África do Sul e M. vitripennis na Ásia. O desenvolvimento até as larvas
infectantes de terceiro estágio nas moscas leva 10 a 12 dias. A transmissão para aos bovinos provavelmente ocorre
quando as moscas se alimentam nos ferimentos, pontos hemorrágicos parafilariais e secreções oculares.
Por causa do sangramento sazonal e dos nódulos cutâneos, infecções graves por P. bovinicola  foram  relatadas
como  causa  de  prejuízo  da  produtividade  dos  novilhos  de  tração  na  Índia;  entretanto  a  principal  importância
da  Parafilaria  ocorre  nos  países  produtores  de  carne,  pelos  danos  aos  tecidos  subcutâneos.  As  carcaças  dos
animais infectados apresentam lesões irregulares, edematosas, amarelo­esverdeadas que lembram equimoses. Estas
costumam ser superficiais, mas ocasionalmente músculos adjacentes são extensamente envolvidos. As lesões são
mais graves durante a primavera e verão.
Frequentemente  as  carcaças  aparadas  são  seriamente  desfiguradas  e  consequentemente  desvalorizadas.  Nos
casos  graves,  as  carcaças  podem  ser  condenadas.  As  lesões  são  mais  comuns  e  graves  em  touros  do  que  em
novilhos que, por sua vez, são menos gravemente afetados que as fêmeas.
DIAGNÓSTICO:   As  manchas  hemorrágicas  sazonais  são  esporadicamente  confundidas  com  aquelas  causadas  por
espinhos, arame, carrapatos ou picadas de outros insetos. Para a diferenciação, deve­se misturar sangue fresco ou
seco em água em um tubo de ensaio e centrifugar. Os ovos característicos são notados no exame microscópico do
sedimento.
As lesões da carcaça podem ser diferenciadas de hematomas pela presença de numerosos eosinófilos no imprint
corado  com  Giensa,  feito  a  partir  das  lesões.  Ademais,  os  tecidos  afetados  possuem  um  odor  característico,
desagradável e metálico.
Geralmente,  apenas  um  pequeno  número  de  vermes  está  presente  nas  carcaças  infectadas  e  com  frequência  é
difícil encontrá­los por causa da sua coloração e da reação inflamatória que acompanha. Os tecidos afetados podem
ser  incubados  com  solução  salina  morna  para  facilitar  a  descoberta  dos  parasitos.  Foi  desenvolvido  um  teste
ELISA para pesquisa de anticorpos contra P. bovicola.
TRATAMENTO E PREVENÇÃO:  Ivermectina (200 μg/kg) ou nitroxinila (20 mg/kg), administradas por via SC, reduz
o número e a extensão das lesões provocadas por Parafilaria. Os animais devem ser tratados no mínimo 70 a 90
dias antes do abate, permitindo tempo suficiente para cura das lesões. O intervalo entre o tratamento e o abate não
deve  ser  >  120  dias  porque  as  formas  larvais  não  afetadas  do  parasito  podem  induzir  novas  lesões  quando  se
tornam maduras.
Em  ensaios  na  Suécia,  o  uso  de  um  brinco  impregnado  de  piretroide  promoveu  bom  controle  das  moscas  e
reduziu em 75% as lesões por Parafilaria no abate. A colocação de brincos em todo o rebanho resultou no total
controle  do  parasito.  A  utilização  de  banhos  de  imersão  com  piretroides  sintéticos  com  poder  residual  ativo
também foi efetiva na redução da transmissão.
Pode ser possível triar minuciosamente os animais importados com teste ELISA para prevenir a disseminação da
doença  para  países  não  afetados  até  o  momento  ou,  em  conjunto  com  inseticidas  residuais  e  anti–helmínticos
efetivos, erradicar um novo foco de infecção.

Parafilaria multipapillosa
P.  multipapillosa  é  encontrada  no  tecido  subcutâneo  de  equinos  em  várias  partes  do  mundo;  é  especialmente
comum  nas  estepes  da  Rússia  e  no  leste  da  Europa.  É  similar  em  tamanho,  aparência,  ciclo  biológico  e
desenvolvimento  a  P.  bovicola.  As  moscas  hematófagas  Haematobia  spp  são  os  prováveis  hospedeiros
invertebrados.
Na primavera e no verão, o parasito causa nódulos cutâneos, particularmente na cabeça e na parte superior dos
quartos  anteriores.  O  sangramento  é  transitório,  mas  geralmente  é  profuso  (“sangramento  de  verão”)  e
posteriormente se resolve; outros nódulos hemorrágicos se desenvolvem com a movimentação do parasito para um
local diferente. Ocasionalmente os nódulos podem supurar. Os nódulos e o sangramento não são significativos e
interferem com o arreio de equinos de trabalho, porém geralmente é de baixa consequência. Os sinais clínicos são
patognomônicos.
Não há um tratamento satisfatório disponível, porém o controle das moscas pode reduzir a incidência.

 INFECÇÕES POR DRACUNCULUS
Dracunculus  insignis  é  encontrado  principalmente  no  tecido  conjuntivo  subcutâneo  dos  membros  de  guaxinins,
visons e outros animais, inclusive cães, na América do Norte e possivelmente outras partes do mundo. As fêmeas
(= 300 mm de comprimento) são muito maiores os machos (cerca de 20 mm). Eles provocam úlceras na pele dos
seus hospedeiros através das quais projetam sua extremidade anterior, no contato com água. As fêmeas produzem
larvas características com caudas longas e finas. As pulgas d’água (Cyclops sp) são hospedeiros intermediários nas
quais as larvas infectantes se desenvolvem. Os cães se infectam por meio da ingestão de água contaminada ou de
hospedeiros paratênicos (rãs).
Observam­se tratos inflamatórios subcutâneos serpentiformes e úlceras cutâneas edemaciadas, não cicatrizantes
e semelhantes a crateras. Infecções são raras, porém são ocasionalmente notadas nos animais que se encontram ao
redor de lagos pequenos ou corpos de água rasa e parada. O tratamento é feito pela remoção lenta e cuidadosa das
larvas do parasito. A administração de compostos miridazóis ou benzimidazólicos pode ser útil.
D.  medinensis,  o  verme  da  Guiné  encontrado  em  parte  da  África,  Ásia  e  do  Oriente  Médio,  apesar  de  ser
primariamente um parasito de pessoas, também é encontrado em cães e em outros animais.

 ONCOCERCOSE
A  classificação  taxonômica  das  3  espécies  de  Onchocerca  atualmente  reconhecidas  nos  EUA  e  outras  espécies
previamente  reconhecidas  está  em  debate.  O.  cervicalis  é  encontrado  no  ligamento  nucal  e  possivelmente  em
outros locais, em equídeos. Nos bovinos, O. gutturosa localiza­se no ligamento nucal e O.  lienalis  no  ligamento
gastresplênico.  Os  adultos  estão  associados  aos  tecidos  conjuntivos  e  são  muito  finos  e  com  3  a  60  cm  de
comprimento. As microfilárias são vistas na derme e, em raras ocasiões, no sangue periférico. As microfilárias não
possuem bainha e apresentam 200 a 250 μm de comprimento com cauda curta, afiada e pontuda. Culicoides  spp
(ver  p.  987)  é  o  hospedeiro  intermediário  de  O.  cervicalis,  enquanto  Simulium  spp  é  hospedeiro  de  O.
gutturosa e O. lienalis.
ACHADOS  CLÍNICOS:   O.  cervicalis  foi  associado  à  formação  de  fístula  na  cernelha,  mal  da  cabeça,  dermatite  e
uveíte,  em  equinos.  Entretanto,  devido  ao  grande  número  de  parasitos  em  equinos  sem  estas  doenças,  há
controvérsia quanto o papel das larvas na patogênese destas condições.
No ligamento nucal, os parasitos adultos induzem reações inflamatórias, variando de necrose edematosa aguda a
alterações granulomatosas crônicas, resultando em fibrose acentuada e mineralização. Nódulos mineralizados são
mais comuns em equinos idosos. Embora as lesões sejam notadas nestas áreas, presume­se que estejam associadas
a parasitos mortos; geralmente acredita­se que tratos fistulosos nas cernelhas e mal da cabeça não sejam causados
por infecções por O. cervicalis.
As  microfilárias  concentram­se  na  pele  da  linha  média  ventral.  Muitas  podem  ser  notadas  em  equinos  sem
dermatites bem como em equinos com dermatites de face, pescoço, peito, cernelhas, membros torácicos e abdome.
Estas  lesões  geralmente  são  caracterizadas  por  áreas  de  descamações,  crostas,  ulceração,  alopecia  e
despigmentação; podendo ser pruriginosas. A dermatite pode estar associada a reações imunológicas à morte das
microfilárias.  Embora  a  patogênese  destas  lesões  não  esteja  bem  definida,  o  tratamento  com  drogas
microfilaricidas  pode  resultar  em  melhora  drástica.  As  reações  alérgicas  à  picada  de  moscas  pequenas  podem
produzir lesões similares ou exacerbar a dermatite causada pelas microfilárias. Portanto, o diagnóstico de dermatite
associada à Onchocerca pode ser baseado na resposta ao tratamento microfilaricida.
As microfilárias também se alojam nos olhos dos equinos, porém não é consenso de que as microfilárias estejam
associadas às uveítes equinas (p. 553) ou outras lesões oculares em equinos.
DIAGNÓSTICO:   O  método  de  diagnóstico  mais  efetivo  é  a  biopsia  cutânea,  preferivelmente  com  obetnção  de
fragmento  com  espessura  total  =  6  mm.  O  tecido  deve  ser  picado  e  macerado  em  solução  salina  isotônica  por
várias  horas.  As  microfilárias  são  concentradas  e  coradas  com  novo  azul  de  metileno  depois  da  remoção  dos
pedaços  cutâneos.  Podem  ser  diferenciadas  microscopicamente  de  Setaria  spp,  que  é  encontrada  no  sangue  de
bovinos e equídeos, pela presença de uma bainha ao redor da Setaria.
TRATAMENTO:  Nenhum tratamento é efetivo contra a filária adulta. Ivermectina (200 μg/kg) e moxidectina (400
μg/kg) são eficazes (> 99%) contra microfilárias e propiciam melhora clínica evidente em equinos com dermatite
por Onchocerca spp. Uma pequena parte dos equinos infectados por O. cervicalis reage ao tratamento com edema
acentuado na linha média ventral 1 a 3 dias depois da terapia. Também já se descreveram lesões oculares. Estas
reações geralmente se resolvem espontaneamente, mas pode ser necessário tratamento sintomático.

INFESTAÇÃO POR MOSCAS CUTEREBRA EM PEQUENOS
ANIMAIS

Esta infestação parasitária oportunista de cães, gatos e furões é causada pela mosca–do­berne dos roedores ou dos
coelhos,  Cuterebra  spp  (ordem  Diptera,  família  Cuterebridae).  As  moscas  são  geralmente  hospedeiro  e  local­
específicas em relação ao ciclo de vida. No entanto, a Cuterebra spp dos coelhos é menos hospedeiro­específica e
se  associa  com  infestações  em  cães  e  gatos.  Raramente,  os  gatos  e  os  cães  podem  estar  infestados
por  Hypoderma  spp  ou  Dermatobia  hominis.  Furões  que  vivem  em  ambiente  externo  ao  domicílio  podem  ser
infestados por Hypoderma ou Cuterebra spp.
ETIOLOGIA:  As moscas adultas do gênero Cuterebra são grandes e semelhantes a abelhas e não se alimentam ou
picam. As fêmeas depositam seus ovos ao redor das aberturas de ninhos e tocas de animais, ao longo dos caminhos
percorridos pelos hospedeiros normais ou em pedras e vegetações nestas áreas. Uma mosca fêmea pode depositar 5
a  15  ovos  por  local  e  >  2.000  ovos  em  toda  a  sua  vida.  Os  animais  se  infestam  quando  passam  pelas  áreas
contaminadas;  os  ovos  eclodem  em  resposta  ao  calor  de  um  hospedeiro  vizinho.  No  hospedeiro­alvo,  as  larvas
entram  no  corpo  pela  boca  ou  pelas  narinas  durante  a  higiene  ou,  menos  comumente,  por  ferimentos  abertos.
Depois da penetração, as larvas migram para várias localizações subcutâneas espécie­específicas no corpo, onde se
desenvolvem e se comunicam com o ar através de um poro respiratório. Depois de cerca de 30 dias, as larvas saem
da  pele,  caem  no  solo  e  se  transformam  em  pupas.  A  duração  do  estágio  de  pupa  varia,  dependendo  de  fatores
ambientais e da diapausa invernal.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  DIAGNÓSTICO:   Lesões  por  Cuterebra  são  mais  comuns  no  verão  e  no  outono,  quando  as
larvas aumentam de tamanho e produzem um inchaço fistulante de cerca de 1 cm de diâmetro. Os cães, gatos e
furões são hospedeiros anormais do parasito; migrações aberrantes podem envolver cabeça, cérebro, vias nasais,
faringe e pálpebras. Na pele, observam­se lesões típicas ao redor da cabeça, do pescoço e tronco. Frequentemente,
o pelo fica emaranhado e há inchaço subcutâneo sob as lesões. Os gatos costumam limpar agressivamente a área.
A dor local é variável e geralmente se associa com infecções secundárias. Pode exsudar um material purulento da
lesão; os diagnósticos diferenciais mais comuns são abscesso ou corpo estranho.
Gatos de vida livre são mais propensos ao desenvolvimento das lesões em relação aos gatos domiciliados. Os
sinais  clínicos  geralmente  associam­se  ao  SNC  e  ocorrem,  tipicamente,  entre  julho  e  setembro.  Os  gatos  podem
apresentar depressão, letargia ou convulsões; infecções de vias respiratórias superiores ou temperaturas corporais
anormais (tanto hipertermia como hipotermia). Achados neurológicos comuns são cegueira, estado mental anormal
e  sinais  de  doença  prosencefálica  unilateral.  Os  sinais  vestibulares  idiopáticos  podem  decorrer  da  migração
aberrante do parasito.
O diagnóstico definitivo é feito pelo achado e identificação da larva. Em gatos, TC pode ajudar a identificar as
larvas. O segundo estágio larval tem 5 a 10 mm de comprimento e é de coloração cinza a creme. O terceiro estágio
larval é escuro, grosso, com espinhos e é o estágio mais notado pelos veterinários.
TRATAMENTO:  As lesões suspeitas devem ser exploradas cuidadosamente pela abertura e sondagem cuidadosas do
poro  respiratório  ou  fístula  com  pinça  mosquito.  Não  se  deve  apertar  a  lesão,  pois  isso  pode  romper  a  larva  e
provocar reação crônica de corpo estranho e infecção secundária. Existem relatos de anafilaxia associada à ruptura
larval cause anafilaxia. Caso seja possível, deve­se remover a larva inteira; abscessos recidivantes no local prévio
de infestação de larva de Cuterebra sugerem infecção residual ou pedaços de larva remanescentes. A área deve ser
lavada completamente com um jato com solução salina estéril, debridada (se necessário) e permitir cicatrizar por
granulação. A cura pode ser lenta. Gatos com cuterebríase no SNC podem ser tratados com ivermectina. Uma a
duas  horas  antes  da  aplicação  da  ivermectina  (400  μg/kg,  SC),  devem­se  aplicar  difenidramina  (4  mg/kg,  IM)  e
dexametasona (0,1 mg/kg, IV). A ivermectina não está aprovada para uso em gatos.

LARVAS DE INSETOS EM BOVINOS

A  hipodermose  dos  bovinos,  no  hemisfério  norte,  é  causada  por  larvas  (berne  de  bovinos)  de  moscas  do
gênero  Hypoderma  (ordem  Diptera,  família  Oestridae).  Hypoderma  tarandi  parasito  cervídeos  nativos  do
hemisfério  norte  e  renas  das  regiões  árticas.  Nas  Américas  Central  e  do  Sul,  as  larvas  (bernes  tropicais)
de Dermatobia hominis (ordem Diptera, família Cuterebridae) são parasitos importantes dos bovinos.

 DERMATOBIA HOMINIS
A  mosca  do  berne  tropical  ou  torsalo,  um  dos  parasitos  mais  importantes  dos  bovinos  na  América  Latina,  está
distribuída entre o sul do México e o norte da Argentina. Os estágios larvais são notados em muitos hospedeiros,
como bovinos, ovinos, caprinos, suínos, búfalos, cães, gatos, coelhos e o homem. Os bovinos e os cães são mais
comumente  afetados.  Acredita­se  que  D.  hominis  inicia  a  lesão  que  dá  origem  à  lechiguana,  uma  doença  de
bovinos (ver a seguir).
CICLO BIOLÓGICO:  A  mosca  adulta  tem  12  a  15  mm  de  comprimento  e  possui  expectativa  de  vida  curta  (1  a  9
dias). A mosca adulta deposita seus ovos em tipos diferentes de insetos (49 foram descritos como vetores de  D.
hominis  na  América  Latina;  predominantemente  mosquitos  e  moscas  muscoides),  que  os  transportam  para  os
hospedeiros homeotérmicos, nos quais eclodem à medida que os insetos se alimentam. As larvas penetram na pele
do animal em poucos minutos após eclodirem, e permanecem no tecido subcutâneo por 4 a 18 semanas. Durante
esse  período,  as  larvas  crescem  dentro  dos  bernes  com  orifícios  respiratórios.  Quando  maduras,  saem  do
hospedeiro, caem no solo, se entocam e tornam pupas. Depois do período de pupa, que dura 4 a 11 semanas, as
moscas emergem como adultas. O ciclo de vida completo leva 11 a 17 semanas.
A penetração da larva na pele é acompanhada de dor, inflamação local e formação gradual de pus. Os couros são
condenados no abate e a produção de leite e carne diminui.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Várias formulações de diferentes inseticidas de contato e sistêmicos estão disponíveis
para  o  tratamento.  Geralmente,  torsalos  são  suscetíveis  a  organofosforados  sistêmicos  e  endectocidas  lactonas
macrocíclicas, os quais podem ser aprovados e disponíveis na região.

Lechiguana
Lechiguana é uma doença esporádica e crônica dos bovinos e até o momento foi relatada somente no sul e sudeste
do Brasil, em áreas onde a infecção por D. hominis é comum. É caracterizada por tumefações subcutâneas grandes
e firmes, que se desenvolvem rapidamente, principalmente na área escapular e adjacências (tórax, pescoço, ombros
e costelas). A maioria dos bovinos afetados tem somente uma tumefação, mas ocasionalmente observam­se 2 áreas
tumefatas. Os linfonodos regionais estão aumentados e sem tratamento, torna­se enormes.
Mannheimia  granulomatis  foi  isolada  das  lesões  e  considerada  o  agente  causal.  A  lesão  que  dá  origem  à
lechiguana é iniciada pela larva de D. hominis. Consistentemente isola–se M. granulomatis das  lesões  da  doença
clínica  e  acredita­se  que  seja  a  principal  responsável  pelas  alterações  teciduais  características.  O  aumento  da
deposição  de  colágeno  parece  estar  associado  ao  envolvimento  de  uma  população  de  células  semelhantes  aos
fibroblastos,  que  expressam  mRNA  para  o  colágeno  tipo  I.  Demonstrou­se  que  macrófagos  ativados  pela  M.
granulomatis induzem a proliferação de fibroblastos. O habitat ou fonte da  M.  granulomatis  são  desconhecidos.
Não foram recuperadas de gados que não apresentavam lechiguana.
Histologicamente, as lesões consistem de proliferação focal de tecidos fibrosos com infiltração de plasmócitos,
eosinófilos, linfócitos e alguns neutrófilos. A lesão primária é uma linfangite eosinofílica, que resulta em abscessos
eosinofílicos, com rosetas ocasionais contendo bactérias no seu centro. Massas tumorais produzidas no subcutâneo
podem atingir o tamanho tão grande quanto 40 × 50 cm em 2 meses. Sem tratamento, a morte ocorre após 3 a 11
meses, provavelmente devido à inanição resultante das tumefações enormes.
Quando  bem  estabelecida,  a  doença  é  clinicamente  óbvia.  O  diagnóstico  é  confirmado  pelo  isolamento  de  M.
granulomatis e pela observação das lesões histopatológicas características.
Tratamento com cloranfenicol (3 g, 1 vez/dia, por 5 dias) ou mesilato de danofloxacino (1,25 mg/kg, 1 vez/dia,
por 3 dias) resulta em rápida resolução das tumefações, com regressão quase completa em 30 dias. A realização de
antibiograma é aconselhável antes do uso de outros antimicrobianos.
 HYPODERMA SPP
Duas espécies de Hypoderma, H. bovis e H. lineatum, são parasitos importantes dos bovinos. São notadas entre 25
e 60° de latitude no hemisfério norte, em > 50 países da América do Norte, Europa, África e Ásia. Na América do
Norte, H. lineatum, a larva de insetos de bovinos comum, é notada no Canadá, nos EUA e no norte do México; H.
bovis, a larva de insetos de bovinos do norte, é verificada geralmente ao norte do paralelo 35°. A ocorrência em
bovinos  e  no  bisão  americano  é  comum.  As  larvas  de  Hypoderma  spp  também  foram  encontradas  em  equinos,
ovinos, caprinos e pessoas. A prevalência de ambas as espécies do gênero Hypoderma diminuiu drasticamente na
América do Norte.
CICLO DE VIDA:  Hypoderma spp adulta, também conhecida como mosca do calcanhar, possui cerca de 15 mm de
comprimento, é peluda e possui aparência semelhante à de abelha. No final da primavera ou no início do verão, ela
prende  os  seus  ovos  nos  pelos  dos  bovinos,  particularmente  nos  membros  pélvicos  e  nas  regiões  corporais
inferiores. Os ovos eclodem em 3 a 7 dias e as larvas de primeiro estágio descem através dos pelos e penetram na
pele.  Normalmente,  as  larvas  de  primeiro  estágio  andam  pelos  planos  fasciais  entre  os  músculos,  ao  longo  do
tecido conjuntivo ou dos trajetos nervosos. Elas secretam enzimas proteolíticas que facilitam os seus movimentos.
Durante o outono e o inverno, elas migram em direção a 2 regiões diferentes, dependendo da espécie. As larvas
de  H.  lineatum  migram  para  o  tecido  conjuntivo  submucoso  da  parede  esofágica,  onde  se  acumulam  por  2  a  4
meses. As larvas de H. bovis migram para a região do canal espinal, onde são notadas na gordura epidural, entre a
dura­máter e o periósteo, por um período semelhante.

Bernes recobertos em uma vaca infestada por Hypoderma bovis. Cortesia do Dr. Jack Lloyd.

No início do inverno, as larvas chegam ao tecido subdérmico no dorso do hospedeiro, onde fazem orifícios por
onde respiram, na pele. Formam­se cistos ou tumefações ao redor das mesmas e estas sofrem 2 mudanças (segundo
e terceiro estágios). O estágio de berne dura 4 a 8 semanas. Finalmente, as larvas de terceiro estágio emergem dos
orifícios  de  respiração,  caem  no  solo  e  se  tornam  pupas.  As  moscas  emergem  das  pupas  em  1  a  3  meses,
dependendo das condições climáticas. As moscas adultas, que não se alimentam, vivem < 1 semana. O ciclo de
vida se completa em 1 ano.
Para as 2 espécies, os eventos sazonais são semelhantes, exceto que o ciclo de H. lineatum ocorre cerca de 6 a 8
semanas mais cedo que os de H. bovis. Esses eventos variam de 1 ano para o outro, mas se correlacionam com as
condições climáticas locais e regionais. As larvas aparecem pela primeira vez no dorso de bovinos em meados de
setembro, no sul dos EUA, mas não até o final de janeiro ou mais tarde, no norte dos EUA. As larvas aparecem
pela primeira vez no dorso durante a última metade de novembro no Texas e durante a primeira metade de março
em Montana. Quando se encontram presentes ambas as espécies, as larvas podem aparecer no dorso por cerca de 5
a 6 meses; quando só existe 1 espécie, elas podem aparecer por cerca de 3 a 4 meses. A oviposição (das moscas
fêmeas) encontra­se em seu pico em janeiro a março no sul dos EUA, e em maio a julho, no norte dos EUA.
ACHADOS CLÍNICOS E PATOGÊNESE:  Durante os períodos de iluminação solar nos dias quentes, os bovinos podem
correr,  agitando  as  caudas,  quando  são  perseguidos  por  moscas  do  calcanhar,  fêmeas,  particularmente  H.  bovis.
Nem  todos  os  estouros  de  rebanho  desse  tipo  resultam  de  ataques  de  moscas  do  calcanhar,  pois  esta  atividade
também é observada na ausência das mesmas.
Por  outro  lado,  nos  bovinos  normais,  as  larvas  de  H.  bovis  e  as  suas  secreções  na  gordura  epidural  do  canal
espinal  se  associam  ao  tecido  conjuntivo  dissolvido,  necrose  gordurosa  e  inflamação.  Às  vezes,  a  inflamação  se
estende para o periósteo e os ossos, produzindo uma área localizada de periostite e osteomielite. Ocasionalmente, o
epineuro e o perineuro também podem estar envolvidos. Nos raros casos graves, podem ocorrer paralisia ou outras
neuropatias. Semelhantemente, H. lineatum na submucosa esofágica pode causar inflamação e edema nos tecidos
circundantes  prejudicando  a  deglutição  ou  a  eructação.  No  entanto,  é  incomum  que  os  sinais  clínicos  do
parasitismo fiquem evidentes durante a fase migratória.
A penetração da pele por larvas recém–eclodidas pode produzir exantema hipodérmico, com maior frequência
nos bovinos idosos e anteriormente infestados. Os pontos de penetração ficam doloridos e inflamados e geralmente
exsudam  um  soro  amarelado.  Podem  ocorrer  bernes  no  dorso,  desde  a  base  da  cauda  até  os  ombros  e  da  linha
superior  até  aproximadamente  um  terço  da  distância  nas  laterais.  Em  geral,  os  cistos  são  firmes  e
consideravelmente salientes acima do contorno normal da pele. Em cada cisto, existe um orifício de respiração que
varia  em  tamanho,  de  uma  fenda  pequena  até  um  orifício  redondo  (3  a  4  mm  de  diâmetro)  para  larvas  mais
maduras.  Geralmente,  há  supressão  da  infecção  secundária;  no  entanto,  os  cistos  podem  ocasionalmente  se
desenvolver em grandes abscessos supurativos. O aparecimento da larva, a sua expulsão forçada ou a sua morte
dentro do cisto costumam resultar na cicatrização da lesão sem complicações. As carcaças e os couros dos bovinos
infestados com larvas de insetos apresentam evidências acentuadas da infestação e têm seu valor reduzido.
Um  animal  infestado  pode  ter  de  1  a  =  300  bernes,  mas  geralmente  tem  <  100;  os  rebanhos  infestados
frequentemente apresentam animais sem bernes. Os animais mais jovens infestam­se mais intensamente.
Se as larvas migrantes de Hypoderma morrem no tecido esofágico (H. lineatum) ou próximo à medula espinal
(H. bovis),  podem  causar  graves  reações,  às  vezes  fatais.  Estas  reações  parecem  se  relacionar  com  o  número  de
larvas de inseto, mas são raras.
A  morte  de  larvas  de  primeiro  estágio  de  H.  bovis  no  canal  espinal  de  bovinos  depois  do  tratamento  com
inseticida sistêmico resulta em rigidez, ataxia, fraqueza muscular e paralisia nos membros pélvicos. A recuperação
geralmente ser rápida e completa, mas ocasionalmente, a paralisia pode ser permanente.
A  morte  de  larvas  de  primeiro  estágio  de  H.  lineatum  no  tecido  conjuntivo  submucoso  esofágico  causa
inflamação na parede esofágica, disfagia, salivação e timpanismo. Da mesma forma, a recuperação geralmente ser
rápida e completa (48 a 72 h após o tratamento), mas nos casos graves, o timpanismo pode ser fatal. Pode haver
rompimento esofágico na tentativa de passar a sonda gástrica em um animal afetado.
DIAGNÓSTICO:   As  larvas  de  terceiro  estágio  podem  ser  diferenciadas  facilmente.  Em  geral,  as  de  H.  bovis  são
maiores,  não  possuem  nenhum  espinho  no  décimo  segmento  e  a  sua  placa  espiracular  tem  a  forma  de  funil;  as
de  H.  lineatum  são  menores,  possuem  espinhos  no  décimo  segmento  e  a  sua  placa  espiracular  é  achatada.  Nos
casos de timpanismo ou paralisia, a presença de larvas de inseto em desintegração, hemorragia e danos teciduais
associados distinguem os animais parasitados dos não parasitados.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Inseticidas  sistêmicos  em  várias  formulações  estão  disponíveis  para  o  tratamento.
Produtos  de  aplicação  pour­on  contendo  lactonas  macrocíclicas  (doramectina,  eprinomectina,  ivermectina  ou
moxidectina)  são  aplicados  uniformemente  ao  longo  da  linha  média  do  dorso.  Alguns  produtos  não  podem  ser
aplicados quando a pele ou pelame estiverem úmidos ou houver possibilidade de molhar os animais com chuva nas
próximas 6 h. O local de aplicação deve estar livre de lesões, lama ou esterco.
Nos  EUA,  o  registro  da  maioria,  se  não  todos  os  inseticidas  organofosforados  sistêmicos  para  bovinos  foram
cancelados e a prática de banhos de imersão ou aspersão para controle das larvas de insetos bovinas foi substituída
pelos tratamentos pour­on e/ou injetáveis.
Doramectina  e  ivermectina  são  sistemicamente  efetivas  contra  as  larvas  de  moscas  bovinas,  quando
administradas  por  via  SC.  A  ivermectina  também  está  disponível  em  pasta  oral.  Os  tratamentos  sistêmicos
injetáveis  e  pour­on  são  aprovados  para  o  controle  da  Hypoderma  e  outras  miíases  causadas  por  moscas,  em
muitos países.
Formulações pour­on  de  eprinomectina  e  moxidectina  são  aprovadas  para  o  tratamento  de  bovinos  de  corte  e
leite.  Por  outro  lado,  o  uso  de  medicamentos  para  controle  das  larvas  é  proibido  em  bovinos  leiteiro  em  idade
reprodutiva.  Como  os  resíduos  se  encontram  presentes  nos  bovinos  por  períodos  variáveis  após  o  tratamento,
devem­se observar estritamente os períodos de suspensão de todos os tratamentos.
Nas áreas onde o número de bernes é elevado, os bovinos, especialmente os bezerros, devem ser tratados o mais
cedo possível, após o final da estação das moscas do calcanhar. Não devem ser tratados até 8 a 12 semanas antes
do primeiro aparecimento das larvas no dorso dos animais, pois podem ocorrer reações adversas quando há morte
das larvas em migração.
Diante  da  impossibilidade  da  utilização  de  inseticidas  sistêmicos,  as  larvas  de  moscas  bovinas  podem  ser
controladas pela aplicação de tetraclorvinfós em pó nos bernes no dorso. Esse pó deve ser aplicado no dorso do
animal e deve ser colocado no interior dos orifícios larvais. Como novas larvas continuam a aparecer no dorso, o
tratamento deve ser repetido a cada 30 a 45 dias durante a estação do berne.
Nos pequenos grupos de animais tratáveis, a extração por instrumentos ou por expulsão manual (apertando­os)
das larvas individuais é eficaz. Raramente, quando se realiza esse procedimento sem cuidados, a larva é esmagada
dentro do cisto e resultando em reação anafilática.

MOSCAS

As moscas pertencem à ordem Diptera, uma ordem complexa e grande de insetos. A maioria dos membros desta
ordem possui 2 asas (1 par) como adultos. No entanto, há uns poucos dípteros sem asas. Os dípteros variam muito
em tamanho, preferência de fonte alimentar e estágio de desenvolvimento em que parasitam o animal ou produzem
uma patologia. Como adultos, os dípteros podem­se alimentar intermitentemente do sangue de vertebrados ou da
saliva, lágrimas ou muco. Estes dípteros são denominados de  parasitasparasitos  periódicos  e  podem  servir  como
hospedeiros  intermediários  para  parasitos  helmintos  ou  protozoários.  Também  podem  servir  como  vetores  de
bactérias, vírus, espiroquetas, clamídias etc. Como larvas, os dípteros podem se desenvolver no tecido subcutâneo,
das  vias  respiratórias  ou  do  trato  gastrintestinal  de  hospedeiros  vertebrados  e  produzir  uma  condição  conhecida
como miíase.

DÍPTEROS COM PEÇAS BUCAIS PICADORAS
Os  dípteros  hematófagos  podem  ser  classificados  de  várias  maneiras,  com  base  nos  sexos  que  se  alimentam  do
sangue  de  vertebrados  e  na  sua  preferência  alimentar.  Em  determinadas  espécies  de  dípteros,  só  as  fêmeas  se
alimentam  de  sangue  de  vertebrados,  o  que  é  necessário  para  a  postura  de  ovos;  estas  espécies  incluem
borrachudos,  mosquitos–pólvora,  maruins  picadores,  mosquitos,  moscas  dos  equinos  e  moscas  dos  veados.  Em
outras  espécies  de  dípteros  hematófagos,  tanto  o  macho  como  a  fêmea  se  alimentam  de  sangue  de  vertebrados;
estas espécies incluem as moscas dos estábulos, moscas dos chifres, moscas dos búfalos, moscas tsé­tsé, moscas­
piolho dos ovinos e moscas hipoboscídeas ou moscas­piolho.

 MARUINS PICADORES
Os “maruins picadores” pertencem à família Ceratopogondiae. Os maruins picadores são os Culicoides spp  mais
comuns.  Associam­se  aos  habitats  aquáticos  ou  semiaquáticos,  por  exemplo,  lama  ou  terra  úmida  ao  redor  de
correntes, açudes e brejos. Tratam­se de maruins pequenos (1 a 3 mm de comprimento) e que, semelhantemente
aos  borrachudos,  produzem  picadas  doloridas  e  sugam  o  sangue  de  seus  hospedeiros,  tanto  o  homem  como  os
animais de produção.
PATOLOGIA:  Culicoides spp  são  picadores  nocivos  que  podem  causar  irritação  e  perturbação  intensas.  Em  grande
número,  podem  deixar  os  animais  de  produção  nervosos  e  interrompem  o  seu  padrão  alimentar.  Esses  maruins
tendem a se alimentar nas áreas dorsal ou ventral do hospedeiro; a preferência de local de alimentação depende da
espécie  do  maruim  picador.  Eles  voam  somente  nos  meses  quentes  do  ano  e  são  mais  ativos  antes  e  durante  o
anoitecer. Se alimentam frequentemente na crina, cauda e barriga dos equinos. Os equinos tornam­se alérgicos às
picadas, coçando e esfregando estas áreas, provocando alopecia, escoriações e espessamento cutâneo. Esta afecção
possui vários nomes, como “hipersensibilidade por culicoides” no Canadá, “prurido de Queensland” na Austrália,
“Kasen”  no  Japão,  “prurido  do  suor”  e  “sarna  doce”.  Como  é  observada  frequentemente  durante  os  meses  mais
quentes do ano, ela ainda é denominada “dermatite de verão”. Esses mosquitos também servem como hospedeiros
intermediários  de  Onchocerca  cervicalis;  as  microfilárias  desse  nematódeo  são  notadas  na  pele  dos  equinos.  A
oncocercíase (p. 981) é uma dermatose não sazonal, semelhante à sarna doce, mas geralmente menos pruriginosa e
acomete  a  cabeça,  pescoço  e  barriga.  Esses  mosquitos  também  transmitem  o  vírus  da  língua  azul  (p.  805)  para
ovinos e bovinos.
DIAGNÓSTICO:   À  semelhança  dos  borrachudos  e  dos  mosquitos­pólvora,  os  maruins  picadores  são  coletados
preferencialmente no campo e não são notados nos animais. Diferentemente das asas claras e cheias de vênulas dos
borrachudos, as asas de Culicoides spp são mosqueadas. A identificação de Culicoides spp é melhor realizada por
um entomologista.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   As  larvas  podem  ser  atacadas  nos  solos  onde  reproduzem.  Devem­se  contactar
entomologistas de serviços de apoio a respeito das últimas recomendações aprovadas.
Bio  Kill  Stable  SprayTM,  uma  permetrina  modificada,  é  aprovada  para  pulverização  de  estábulos  e  baias  para
ajudar  no  controle  desses  maruins  picadores.  Equipamentos  de  aspersão  costais  ou  manuais,  pulverizadores
pressurizados  tipo  turbo  ou  aspersores  podem  ser  utilizados.  Uma  fina  pulverização  deve  ser  produzida  sob
pressão,  na  quantidade  de  500  a  750  ml  por  estábulo  (tamanho  do  estábulo:  3  ×  3,5  m  até  4  ×  4  m).  Todas  as
superfícies do estábulo devem ser pulverizadas. É necessária reaplicação após 7 a 10 dias. Após, aplicações a cada
3 a 4 semanas devem providenciar amplo acúmulo de produtos nas paredes.
Um  ventilador  pode  ser  utilizado  no  estábulo  para  criar  um  movimento  de  ar  em  volta  dos  equinos  porque
os  Culicoides  spp  não  são  bons  voadores.  Também,  podem  ser  utilizados,  com  eficácia  variável,  brincos  com
repelentes de mosquitos presos na crina e na cauda dos equinos (procedimento não aprovado nos EUA); piretroide
sinergizado  com  butóxido  de  piperonila,  aplicado  semanalmente;  butoxipolipropilenoglicol  800,  aplicado
diariamente;  cobertores  de  estábulo;  e  telas  finas  nas  portas  e  nas  janelas  dos  estábulos.  Ainda,  podem­se  usar
inseticidas  tópicos  como  piretrinas  (cipermetrina  ou  ciflutrin),  especialmente  em  formulações  pour  on  para
controle das pestes adultas nos grandes animais.

 MOSQUITOS
Os  mosquitos  são  membros  da  família  Culicidae.  Os  gêneros  importantes  incluem  Aedes,  Anopheles,  Culex,
Culiseta e Psorophora. Embora sejam dípteros pequeninos e frágeis, os mosquitos são talvez os mais vorazes dos
artrópodes hematófagos. Já se descreveram cerca de 300 espécies mundialmente, com cerca de 150 delas relatadas
nas regiões temperadas da América do Norte. Os mosquitos são notados em áreas diversas, como brejos salgados
das planícies costeiras até poços nevados acima de 4.300 m e minas de ouro na Índia, a 1.100 m abaixo do nível do
mar. O volume de água no qual os mosquitos se reproduzem varia desde aquele de uma lata ou de um buraco de
árvore até poços rasos e grandes superfícies de água parada, acumulada.
Os mosquitos depositam seus ovos na superfície da água parada (p. ex., Aedes spp e Psorophora spp) ou em um
substrato  (como  terra  úmida),  onde  os  ovos  eclodirão  depois  da  inundação  decorrente  de  uma  precipitação
chuvosa,  irrigação,  derretimento  de  neve  etc.  As  larvas  dos  mosquitos  são  conhecidas  como  “retorcedoras”,
enquanto as suas pupas também são conhecidas como “acrobatas”. Esses estágios são sempre aquáticos e ocorrem
em  uma  ampla  variedade  de  habitat.  Pode­se  produzir  um  grande  número  de  mosquitos  a  partir  dos  ovos
depositados  em  volumes  de  água  relativamente  pequenos.  Algumas  espécies  têm  várias  gerações  por  ano.  Os
hábitos  de  voo  dos  mosquitos  adultos  variam  conforme  a  espécie;  algumas  espécies  do  gênero  Aedes  migrarão
muitos quilômetros para o seu habitat larval aquático. Com ventos fortes, os mosquitos podem ser carregados por
grandes distâncias. Algumas espécies invernam como ovos, enquanto outras invernam como adultos.
PATOLOGIA:  Somente as fêmeas dos mosquitos consomem ativamente sangue para realizarem a postura de ovos.
Os  machos  se  alimentam  de  néctar,  sucos  de  plantas  e  outros  líquidos.  Os  mosquitos  incomodam  os  animais  de
produção, causam perda de sangue e transmitem várias doenças. Além disso, as toxinas injetadas no momento da
picada  podem  causar  efeitos  sistêmicos.  A  alimentação  de  um  grande  número  de  mosquitos  em  enxame  pode
causar  anemia  significativa  nos  animais  domésticos.  Embora  sejam  conhecidos  por  disseminar  malária,  febre
amarela, dengue e elefantíase no homem, os mosquitos talvez sejam mais bem conhecidos na medicina veterinária
como  os  hospedeiros  intermediários  do  verme  do  coração  de  cães,  Dirofilaria  immitis,  e  como  vetores  de
encefalites virais equinas, inclusive o vírus do Oeste do Nilo.
Anopheles quadrimaculatus é o hospedeiro intermediário da malária (causada pelo Plasmodium spp) no homem
e outros primatas. Aedes aegypti é o mosquito da “febre amarela”, que transmite o vírus desta enfermidade para as
pessoas. Psorophora columbiae é uma grave praga para os animais de produção e para o homem nos arrozais da
Louisiana e do Arkansas. Culex tarsalis é um vetor importante da encefalite equina ocidental e é notado no oeste,
centro e sul dos EUA. Aedes vexans é uma espécie incômoda importante notada no meio­oeste dos EUA.  Aedes
albopictus é  uma  espécie  asiática  recém­introduzida,  que  também  propaga  a  febre  amarela,  dengue  e  encefalites
equinas. Determinadas espécies do gênero Mansonia são pragas graves nos animais de produção da Flórida. Nas
Américas  Central  e  do  Sul,  a  mosca­do­berne  fêmea  adulta  (Dermatobia  hominis)  prende  seus  ovos  em  uma
espécie  de  mosquito  do  gênero  Psorophora,  que  depois  os  transmite  para  o  hospedeiro  mamífero  durante  sua
alimentação.
DIAGNÓSTICO:  Os mosquitos adultos são mais coletados no campo e não são notados nos animais. Possuem 3 a 6
mm de comprimento e são delgados, com cabeças esféricas e pequenas e pernas longas. As veias alares, o corpo, a
cabeça e as pernas são cobertos com escamas pequeninas, semelhantes a folhas. As antenas longas e filamentosas
possuem 14 a 15 segmentos e são plumosas nos machos da maioria das espécies. Também possuem probóscides
destinadas a lacerar os vasos sanguíneos pequeninos e sugar o sangue acumulado. A identificação da pletora das
espécies de mosquitos (estágios adulto, de larva e de pupa) é melhor realizada por um entomologista.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   O  controle  de  área  dos  mosquitos  geralmente  envolve  a  cooperação  de  muitos
indivíduos  e  pode  ser  realizado  com  êxito  por  funcionários  especializados,  com  equipamentos  apropriados.  As
áreas que podem servir como locais de reprodução para as larvas de mosquitos devem ser eliminadas ou reduzidas.
Além  disso,  os  programas  de  área  costumam  incluir  extenso  uso  de  larvicidas;  no  entanto,  os  larvicidas  de
mosquito podem destruir o equilíbrio ecológico normal dentro de um ecossistema. Recentemente, o uso de várias
espécies de peixes como controles biológicos, foi bem­sucedido. No caso de aparecimento maciço de mosquitos
adultos, particularmente quando a transmissão de doenças constitui uma preocupação, a aplicação de um inseticida
ativo contra o adulto pode ser necessária.
Aconselha­se cuidado com os programas de tratamento de área, pois muitos organismos não alvo (p. ex., peixes,
camarões e abelhas) podem ficar expostos a inseticidas. Deve­se consultar um entomologista de serviço de apoio
local sobre os materiais apropriados para emprego nos animais ou dentro das propriedades. Esses programas em
larga escala geralmente são coordenados por uma agência distrital de eliminação de mosquitos ou outras agências
governamentais.
É  difícil  para  o  pecuarista  individual  proteger  seus  animais;  os sprays residuais  não  evitam  o  contato  com  os
mosquitos  e  os  repelentes  disponíveis  não  conferem  proteção  adequada  durante  um  ataque  maciço.  A  proteção
contra mosquitos adultos pode ser proporcionada por aplicação no solo e, em alguns casos, no ar, de um inseticida
no  momento  da  ocorrência.  Dependendo  das  condições  locais,  esta  proteção  pode  ter  curta  duração.  Os  animais
valiosos devem ser abrigados em construções fechadas ou teladas e os mosquitos em seu interior devem ser mortos
com  uma  formulação  de  nebulização  ou  de  aerossol  de  um  inseticida  aprovado.  Pode­se  proporcionar  um  alívio
temporário por meio de aspersão ou de pastas comercialmente disponíveis.
Devem­se evitar as caminhadas com animais de estimação no início da manhã ou da noite, quando os mosquitos
estão  mais  abundantes,  para  reduzir  a  exposição  às  picadas.  Imidacloprid  tem  sido  utilizada  como  prevenção  e
tratamento tópico para carrapatos, pulgas e mosquitos em cães adultos e filhotes com 7 ou mais semanas de idade,
pesando > 0,91 kg. O composto parece repelir fêmeas adultas de mosquitos por até 4 semanas. Infelizmente, não
pode ser utilizado em gatos. Os mosquitos não são atraídos pela luz; logo, os dispositivos de eletrocussão não são
úteis para o controle de mosquitos e podem, na verdade, ser prejudiciais, ao poder destruir insetos benéficos que
frequentemente predam os mosquitos.
A  combinação  de  dois  compostos,  imidacloprid  e  permetrina,  atua  conjuntamente  para  repelir  e  eliminar  a
maioria  das  espécies  de  mosquitos  hematófagos,  que  frequentemente  alimentam­se  nos  cães.  Aplicação  mensal
deste  produto  irá  repelir  e  matar  os  mosquitos,  prevenindo,  portanto,  a  atividade  de  alimentação  sanguínea  e
auxiliando  ostensivamente  na  prevenção  da  transmissão  de  doenças  como  Dirofilaria  immitis  de  cão  para  cão.
Entretanto, este produto não deve ser utilizado em gatos.

 BORRACHUDOS
Os  borrachudos  são  membros  da  família  Simulidae.  Os  membros  desta  família  também  são  comumente
denominados de “mosquitos pretos” (embora a sua coloração possa variar de preto a cinza, amarelo e cor de oliva)
ou  “maruins­búfalo”  (porque  o  seu  tórax  faz  uma  corcova  sobre  a  cabeça,  conferindo­lhe  a  aparência  de  uma
corcova  bubalina).  Os  borrachudos  são  os  menores  dípteros  hematófagos, com  1  a  6  mm  de  comprimento.  Eles
possuem  asas  largas  e  sem  manchas,  com  veias  proeminentes  ao  longo  das  margens  anteriores.  Os  borrachudos
possuem  olhos  compostos;  os  olhos  das  fêmeas  são  distintamente  separados,  enquanto  os  dos  machos  são
contíguos, acima das antenas. Os palpos possuem 5 segmentos. As fêmeas dos borrachudos possuem peças bucais
semelhantes a tesouras, com bordas serrilhadas. As fêmeas necessitam de uma refeição sanguínea para fazerem a
ovoposição. Os machos se alimentam de néctar das flores.
Embora existam > 1.000 espécies de borrachudos, somente algumas são consideradas importantes como pragas.
Os borrachudos se alimentam de todos os tipos de animais de produção, animais silvestres, aves e do homem.
Os  borrachudos  se  distribuem  mundialmente,  em  áreas  onde  as  condições  permitem  o  desenvolvimento  das
formas imaturas. Larvas quase sempre são notadas em correntes de fluxo rápido, com água bem arejada; torrentes
montanhosas rasas são locais favoráveis para reprodução. Algumas espécies se reproduzem em rios maiores; outras
vivem em correntes temporárias ou semipermanentes. Os borrachudos são particularmente abundantes nas zonas
temperadas e subárticas do hemisfério norte, mas muitas espécies são notadas nos subtrópicos e nos trópicos, onde
outros fatores, além das temperaturas sazonais, afetam os seus padrões de desenvolvimento e de abundância.
As  larvas  dos  borrachudos  são  cilíndricas  e  se  prendem  por  meio  de  uma  grande  ventosa  posterior.  Na  sua
extremidade  anterior,  encontram­se  as  peças  bucais  e  um  par  de  órgãos  semelhantes  a  escovas.  As  larvas  são
carnívoras. Imediatamente abaixo das peças bucais, encontra­se um apêndice comparável a um braço, chamado de
pró­perna. As larvas se prendem nas rochas ou em outros objetos sólidos em rios, às vezes se prendem à vegetação
aquática  ou  emergente.  A  larva  madura  tece  um  casulo  triangular  no  solo  dos  rios.  A  pupa  alongada  possui  um
tubo respiratório dorsal e um ventral, cujos ramos flutuam para fora do casulo.
Os  borrachudos  produzem  de  1  a  6  gerações  por  ano,  dependendo  da  espécie  e  das  condições  climáticas.  A
atividade alimentar da fêmea adulta pode durar 2 a 3 semanas a 3 meses. Os borrachudos adultos podem voar de 12
a 18 km (8 a 11 milhas) a partir de fluxo rápido dos rios; também se sabe que enxames migratórios viajam pelo
vento por mais de 250 km.
PATOLOGIA:  Por  causa  das  suas  peças  bucais  pequenas  e  serrilhadas,  os  borrachudos  fêmeas  promovem  picadas
doloridas. Orelhas, pescoço, cabeça e abdome dos bovinos constituem os locais de alimentação favoritos. Além das
reações  locais  (vermelhidão,  prurido  e  vergões),  podem  ocorrer  afecções  gerais  que  variam  em  intensidade
conforme  a  sensibilidade  do  animal  e  o  número  de  picadas.  Os  ataques  de  um  grande  número  de  borrachudos
podem causar danos intensos e alta mortalidade nos animais de produção. O homem também pode ser atacado.
A  morte  pelo  ataque  de  borrachudos  aparentemente  resulta  de  uma  toxina  na  saliva,  que  aumenta  a
permeabilidade dos capilares e permite que o fluido do sistema circulatório extravase para a cavidade corporal e
dos espaços teciduais. O animal sucumbe rapidamente a um ataque em massa, mas pode se recuperar rapidamente
se  for  protegido  de  ataques  posteriores.  A  redução  nas  produções  láctea,  de  carne  e  de  ovos  pode  resultar  de
ataques  menos  extensos.  Determinadas  espécies  de  borrachudos  podem,  às  vezes,  causar  perdas  de  aves
domésticas,  tanto  por  um  ataque  direto  como  pela  transmissão  de  Leukocytozoon  spp.  Na  África,  Simulium
damnosum e S. neavei são vetores importantes de Onchocerca spp. S. neavei é um vetor importante de O. volvulus.
Na  América  Central,  S.  ochraceum,  S.  metallicum,  S.  callidum  e  S.  exiguum  são  vetores  importantes
de Onchocerca spp. S. ochraceum e S. metallicum também constituem maus picadores.
DIAGNÓSTICO:  Os borrachudos são notados mais frequentemente no campo e não nos animais. Os adultos podem
ser  identificados  por  seu  tamanho  pequeno,  dorso  com  corcova,  proeminente  formação  de  vênulas  na  região
anterior  das  asas,  além  de  peças  bucais  pequenas  e  serrilhadas.  A  identificação  dos  borrachudos  em  gênero  e
espécie deve ser melhor realizada por um entomologista.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Havendo  fundos  públicos  e  pessoas  treinadas  para  supervisão,  o  controle  em  larga
escala dos borrachudos será possível com o tratamento das correntes de reprodução com um larvicida aprovado.
Entretanto, o controle dos borrachudos é difícil pelo grande número de locais com água corrente apropriados para
reprodução.  As  correntes  podem  ser  tratadas  usando  produtos  naturais,  como  Bacillus
thuringiensis var israeliensis, um produto atóxico para mamíferos.
O  tratamento  das  correntes  e  rios  envolve  técnicas  semelhantes  àquelas  utilizadas  em  programas  para  reduzir
pernilongos.  Como  regra,  não  devem  ser  utilizados  pesticidas  devido  seus  efeitos  potencialmente  negativos  no
ambiente.  Os  tratamentos  com  pesticidas  que  envolvem  as  superfícies  de  água  ou  grandes  áreas  de  terra
encontram­se sujeitos à regulação governamental e devem ser feitos com a devida preocupação quanto aos efeitos
ambientais prejudiciais e resíduos nos produtos alimentares.
Os borrachudos adultos são pequenos o bastante para passar direto pelas telas de janelas ou podem entrar nas
casas  ou  na  pelagem  dos  animais  de  estimação.  Frequentemente,  as  fêmeas  adultas  de  moscas  preferem  se
alimentar fora das casas e durante as horas de luz do dia. Como os borrachudos se alimentam durante as horas de
luz do dia, é prudente limitar a exposição dos animais de estimação às correntes de fluxo rápido. Proprietários de
animais  de  estimação  preocupados  com  os  borrachudos  podem  usar  repelentes  de  insetos  livremente.  Aerossóis
com piretrinas apenas providenciam alívio temporário.
Em  decorrência  do  controle  amplo  da  área  dos  borrachudos  ser  difícil  e  caro,  os  criadores  de  animais  de
produção  frequentemente  recorrem  ao  uso  diário  de  repelentes  para  proteger  seus  animais.  Devem­se  contactar
entomologistas como serviços de apoio para as últimas recomendações aprovadas e tempos de retirada.

 MOSCAS DO CHIFRE
O nome comum da Haematobia irritans se deve ao fato de que estas moscas frequentemente formam grupos de
centenas ao redor da base dos chifres dos bovinos. Trata­se de uma infestação importante em bovinos, notada na
maioria dos países onde se criam bovinos. As populações são comuns na Europa, norte da África, Ásia Menor e
Américas. Por toda a América do Norte, a mosca do chifre é notada quase exclusivamente nos bovinos, mas elas
também podem se alimentar nos equinos, ovinos, caprinos e animais silvestres. A mosca do chifre é notada em um
número muito maior e por tempo mais longo no sul e sudoeste dos EUA.
A  mosca do chifre adulta  passa  a  vida  inteira  em  seu  hospedeiro  e  as  fêmeas  só o abandonam para realizar a
ovoposição nas fezes frescas de bovinos, onde ocorre o desenvolvimento de larvas e de pupas. No sul dos EUA, o
ciclo de vida pode ser de 1 semana, mas nos climas mais frescos e na primavera ou no outono, o desenvolvimento
pode levar 2 a 3 semanas. Em algumas áreas mais quentes (sul da Flórida e extremo sul do Texas), a mosca do
chifre se reproduz ativamente por todo o ano.
Quando  a  temperatura  do  ar  for  <  21°C,  a  mosca  do  chifre  forma  grupos  ao  redor  da  base  dos  chifres  dos
bovinos. Nos climas mais quentes, estas moscas formam muitos grupos nos ombros, dorso e região lateral; estas
áreas  são  menos  perturbadas  pelo  movimento  da  cauda.  Nos  dias  ensolarados  e  quentes,  a  mosca  do  chifre  se
acumula no abdome ventral.
As moscas recém­emergidas do estágio de pupa e que procuram por seu hospedeiro podem viajar 11 a 15 km,
mas geralmente o encontram em distâncias muito mais curtas. A migração raramente ocorre em qualquer grande
distância.  No  sul  dos  EUA,  as  populações  de  moscas  nos  animais  individuais  podem  ser  de  milhares,
especialmente nos touros que não receberem um tratamento químico; no norte dos EUA, elas podem não exceder a
100, embora os danos infligidos sejam semelhantes.
PATOLOGIA:  A mosca do chifre se alimenta frequentemente (até 20 vezes/dia), sugando sangue e outros fluidos; as
moscas  fêmeas  são  mais  agressivas  que  os  machos.  Esta  atividade  de  alimentação  causa  dor,  irritação  e  perda
sanguínea  nos  bovinos.  Os  animais  irritados  também  perdem  peso,  por  causa  da  alimentação  deficiente.  As
infestações intensas causam lesões ao longo da linha média ventral do animal. A mosca do chifre provoca grandes
perdas econômicas anuais nos EUA; a redução de 14% no ganho de peso nos bovinos em pastagens e perda de 5 a
6 kg/animal, em bezerros desmamados, são comuns. Nos bovinos leiteiros, pode reduzir a produção láctea em 10 a
20%. Estas moscas também atuam como hospedeiros intermediários de Stephanofilaria stilesi, uma filária parasito
que provoca lesões semelhantes a placas na parte ventral do abdome de bovinos.
DIAGNÓSTICO:  A mosca do chifre pode ser facilmente identificada por sua coloração escura, tamanho (cerca de 3 a
6 mm de comprimento, cerca de metade do tamanho de uma mosca dos estábulos) e da sua probóscide semelhante
a uma baioneta, que se projeta para a frente da cabeça.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A mosca do chifre é relativamente fácil de controlar com sprays químicos no animal
inteiro  e  com  dispositivos  de  autotratamento  (p.  ex.,  sacos  de  pó  ou  esfregadores  de  costas)  em  situação  de  uso
forçado. Sacos de pó são mais efetivos quando os bovinos são obrigados a passar por baixo deles diariamente para
receber  água  ou  suplementos  minerais.  Esses  sacos  depositam  inseticidas  ao  longo  do  dorso  dos  animais,  áreas
onde a mosca do chifre passa a maior parte do tempo. Esfregadores de costas permitem que os animais se tratem
quando se coçam. O inseticida deve ser diluído em óleo mineral de boa qualidade de acordo com as instruções da
bula. Aditivos alimentares são eliminados pelo animal para matar os estágios larvais que se desenvolvem nas fezes
frescas  dos  bovinos.  Todos  os  animais  devem  receber  a  dose  mínima  de  aditivo  alimentar  regularmente.
Reguladores  de  crescimento  de  insetos  também  podem  prevenir  o  desenvolvimento  de  larvas  nas  fezes  dos
bovinos. Quando utilizados de acordo com a indicação de bula, brincos bovinos impregnados com inseticidas (p.
ex.,  piretroides)  liberam  pequenas  quantidades  de  inseticidas  que  são  distribuídos  por  todo  o  animal  durante  a
higiene  ou  quando  o  animal  se  esfrega.  Os  animais  também  devem  receber  os  brincos  próximo  ou  no  início  da
estação das moscas e esses devem ser retirados próximo ou no final desta, devendo­se utilizar métodos alternativos
com  inseticidas  não  piretroides  próximo  do  final  desta  estação.  Formulações  de  inseticidas pour­on  também  são
efetivas contra moscas do chifre. Esses componentes são aplicados nos bovinos com as suas doses calculadas pelo
peso corporal do animal. A maioria desses inseticidas pour–on funciona como inseticida de contato.

 MOSCAS DOS BÚFALOS
As moscas dos búfalos, Haematobia irritans exigua, são semelhantes à mosca do chifre em tamanho, aparência e
nos hábitos alimentares e reprodutivos. A mosca é uma praga primária dos bovinos e dos búfalos, mas que também
se alimenta ocasionalmente em equinos, ovinos ou animais silvestres. Ela se distribui por todo o norte da Austrália
e Nova Guiné, sendo também notada em partes do sul, sudeste e leste da Ásia, bem como na Oceania; ela não é
notada na Nova Zelândia. O seu ciclo de vida é semelhante ao da mosca do chifre; o adulto sai do hospedeiro por
um período suficiente para a ovoposição em esterco fresco, onde ocorre o desenvolvimento. O ciclo de vida pode
levar 7 a 10 dias, dependendo das condições climáticas.
PATOLOGIA:  As moscas dos búfalos irritam e incomodam os animais, geralmente picando ao redor dos ombros e
da  cernelha.  Os  ferimentos  das  picadas  são  locais  de  instalação  de  miíases  (Chrysomyia  bezziana).  Em  clima
quente, as moscas infestam as partes sombreadas do corpo. Os animais afetados sofrem perda sanguínea e ficam
irritados pelas moscas; a eficiência alimentar e a produção podem ser afetadas adversamente.
DIAGNÓSTICO:  A mosca dos búfalos pode ser identificada por sua coloração escura, seu tamanho (cerca de metade
do tamanho de uma mosca dos estábulos) e sua probóscide semelhante a uma baioneta, que se projeta para frente
da cabeça.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Inseticidas devem ser evitados no tratamento das populações das moscas do búfalo.
Muitos dos produtos químicos utilizados no tratamento destas moscas resultam em resíduos na carne. As moscas
do  búfalo  desenvolveram  resistência  aos  piretroides  sintéticos  e  a  alguns  organofosforados.  Armadilhas  para  a
mosca do búfalo foram desenvolvidas na Austrália. A armadilha consiste em uma tenda circular de plástico claro,
na qual os bovinos caminham. As moscas são eliminadas dos bovinos ao serem capturadas na tenda, dentro da qual
elas  morrem  de  dissecação.  A  armadilha  remove  cerca  de  80%  das  moscas  cada  vez  que  o  bovinos  passa.
Geralmente o controle suficiente das moscas é realizado quando o bovinos passa pela armadilha todos os dias ou a
cada 2 dias.

 MOSCAS DOS EQUINOS E DOS VEADOS
Tabanus spp (mosca dos equinos) e Chrysops spp (mosca dos veados) são dípteros robustos, grandes (até 3,5 cm de
comprimento)  e  de  corpo  pesado,  com  asas  poderosas  e  olhos  bastante  grandes.  São  voadores  rápidos.  Estas
moscas são as maiores no grupo dos dípteros, no qual somente as fêmeas se alimentam de sangue de vertebrados.
As moscas dos equinos são maiores que as dos veados; e muitas são intensamente coloridas. As moscas dos veados
são de tamanho médio; possuem uma faixa escura passando da margem anterior para a posterior das asas e abdome
amarelo a marrom, com manchas pretas e faixas longitudinais.
As  moscas  adultas  dos  equinos  e  dos  veados  depositam  seus  ovos  em  áreas  próximas  às  coleções  de  água
expostas.  Os  estágios  larvais  são  notados  em  ambientes  aquáticos  a  semiaquáticos,  quase  sempre  enterrados
profundamente  na  lama,  no  fundo  dos  lagos  e  açudes.  Os  adultos  são  observados  no  verão,  particularmente  em
exposição à luz solar.
PATOLOGIA:  As fêmeas adultas de ambas as espécies se alimentam na vizinhança de coleções de água exposta e
possuem peças bucais semelhantes a tesouras, que utilizam para lacerar os tecidos e absorver o sangue que escorre.
Elas  consomem  0,1  a  0,3  ml  de  sangue  em  uma  única  alimentação.  As  picadas  são  doloridas  e  irritantes.  Estas
moscas  se  alimentam  primariamente  em  grandes  animais,  como  bovinos  e  equinos,  que  ficam  inquietos  quando
elas  se  encontram  presentes.  As  preferências  de  locais  incluem  o  lado  inferior  do  abdome  ao  redor  do  umbigo,
pernas,  pescoço  e  cernelha.  As  moscas  dos  equinos  e  dos  veados  se  alimentam,  muitas  vezes,  quase  sempre  em
vários  locais  antes  de  se  saciarem.  Quando  perturbadas  pelas  pancadas  da  cauda  ou  pelo  reflexo  panicular  do
animal, elas saem do hospedeiro e o sangue continua a escorrer do ferimento aberto. Estas moscas podem atuar
como transmissores mecânicos do antraz, anaplasmose, tularemia e anemia infecciosa equina.
DIAGNÓSTICO:  Estas moscas podem ser identificadas por seu tamanho grande, asas poderosas, olhos compostos e
peças bucais semelhantes a tesouras dilacerantes. A identificação de espécie das moscas adultas e larvais intactas
dos equinos e dos veados é melhor realizada pelo entomologista.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:  As  moscas  dos  equinos  e  dos  veados  são  as  mais  difíceis  de  controlar  de  todas  as
moscas  sugadoras  de  sangue.  Muitos  dos  compostos  adulticidas  utilizados  em  outras  moscas  matarão  as  moscas
dos  equinos  e  as  moscas  dos  veados.  No  entanto,  por  serem  consumidoras  intermitentes,  pois  pousam  no
hospedeiro por pouco tempo, podem não ficar expostas por um período suficientemente longo para serem afetadas.
Logo, exigem­se doses maiores desses compostos.
Armadilhas  para  as  moscas  dos  equinos  são  efetivas  quando  utilizadas  ao  redor  das  áreas  de  controle  de
confinamento  de  bovinos.  Para  animais  de  produção,  piretroides  pour­on  funcionam  com  repelentes  limitados.
Técnicas de autoaplicação normalmente não são efetivas para moscas dos equinos e veados.

Tabannus spp (mosca do cavalo). Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

Tentou­se  manipular  o  habitat  aquático  destas  moscas  para  remover  plantas  da  mata  desnecessárias  de  áreas
residenciais  ou  áreas  úmidas  de  drenagem.  A  aplicação  dos  inseticidas  na  água  pode  ter  efeitos  ambientais
prejudiciais.

 MOSCAS DOS ESTÁBULOS
A mosca dos estábulos, Stomoxys calcitrans, é frequentemente denominada “mosca doméstica picadora”. Ela tem
quase o mesmo tamanho e aparência geral da Musca domestica, a mosca doméstica. Ela é cinza­amarronzada, com
a mais externa das 4 listras torácicas sendo interrompida e o abdome com aparência enxadrezada. Ela possui uma
probóscide  afiada  como  agulha  e  semelhante  a  uma  baioneta  que,  quando  em  repouso,  protrai  para  frente,  da
cabeça.  As  asas,  quando  em  repouso,  ficam  amplamente  abertas  nas  pontas.  Estas  moscas  são  notadas
mundialmente e nos EUA, são notadas nos estados do meio­oeste e do sudeste.
As  formas  de  larva  e  pupa  se  desenvolvem  em  material  orgânico  em  decomposição,  como  cortes  de  capim  e
algas  ao  longo  das  praias.  No  meio­oeste  dos  EUA,  as  larvas  podem  ser  notadas  em  áreas  úmidas  ao  redor  das
bordas  de  pilhas  de  feno  e  de  poços  de  silagem.  Nos  locais  onde  os  bovinos  são  alimentados  com  feno,  a
reprodução pode ocorrer na borda da área de alimentação, onde o feno se mistura com urina e fezes. O ciclo de
vida no campo pode se completar em 2 a 3 semanas e os adultos podem viver = 3 a 4 semanas.
PATOLOGIA:   Tanto  o  macho  como  a  fêmea  da  mosca  dos  estábulos  são  ávidos  consumidores  de  sangue,
alimentando­se  em  qualquer  animal  homeotérmico.  As  moscas  dos  estábulos  permanecem  no  hospedeiro  por
curtos  períodos  de  tempo,  durante  os  quais  elas  obtêm  suas  refeições  sanguíneas.  Trata­se  de  uma  mosca  de
ambiente externo; no entanto, no final do outono e durante um clima chuvoso, ela pode entrar nos estábulos.
Os  equinos  são  os  hospedeiros  preferidos.  A  mosca  geralmente  pousar  no  hospedeiro  com  a  sua  cabeça
pontiaguda  para  cima  e  inflige  picadas  doloridas,  que  perfuram  a  pele  e  a  sangram  livremente.  Trata­se  de  uma
mosca sedentária, que não se movimenta no hospedeiro. As moscas dos estábulos geralmente atacam as pernas e o
abdome ventral e também podem picar as orelhas. Podem constituir um problema nos lotes de engorda do meio­
oeste  dos  EUA.  Os  danos  infligidos  nos  bovinos  são  causados  pela  picada  dolorida  e  pela  perda  sanguínea  e  a
irritação resulta em redução na eficiência em converter alimentos em carne ou leite. Nos animais de estimação, as
moscas dos estábulos preferem se alimentar nas pontas das orelhas dos cães com orelhas pontudas, especialmente
os cães da raça pastor alemão.
As moscas dos estábulos são vetores mecânicos do antraz, da surra e da anemia infecciosa equina. Também são
hospedeiros intermediários de Habronema muscae, um nematódeo de estômago de equinos.
DIAGNÓSTICO:   A  mosca  dos  estábulos  é  facilmente  identificada  pelo  tamanho  (aproximadamente  o  mesmo  da
mosca doméstica), coloração e probóscide semelhante a uma baioneta, que se projeta para frente da cabeça.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A principal consideração nos estábulos para o controle das moscas dos estábulos é a
sanidade, que pode ter um controle efetivo de até 90%. Deve­se manter limpa a área ao longo das cercas, sob os
depósitos de alimentos ou onde quer que possam se acumular esterco e palha ou material em decomposição, pois
esses proporcionam o meio para as larvas das moscas se desenvolverem. Havendo bons procedimentos de higiene,
o controle químico provavelmente será menos necessário. Vários inseticidas podem ser borrifados nos locais onde
as moscas podem estar repousando nos estábulos ou nas cercas.
As  moscas  dos  estábulos  se  alimentam  nas  partes  inferiores  dos  bovinos,  ao  redor  das  pernas  e  no  abdome,
inclusive o úbere. Elas, geralmente se alimentam 1 ou 2 vezes/dia, por pequenos períodos, minimizando assim, sua
exposição  aos  produtos  aplicados  nesta  área.  Frequentemente,  inseticidas  aplicados  nesta  parte  do  corpo  são
friccionados  contra  vegetação  densa  ou  lama  ou  enxaguados  quando  o  bovino  é  lavado  diariamente  antes  da
ordenha. Em determinadas condições pode­se fazer a aplicação direta de spray e de produto na forma de pó, para
proteger grandes animais. Os inseticidas utilizados para aplicação direta no animal geralmente possuem pouca ação
residual. Este tipo de aplicação é bastante trabalhoso. A combinação de dois compostos, imidacloprid e permetrina,
atua em conjunto para repelir Stomoxyx calcitrans. Aplicação mensal deste produto repele estas moscas e evita que
suguem sangue dos cães, porém o produto não elimina estas moscas.

 MOSCAS HIPOBOSCÍDEAS OU MOSCAS­PIOLHO
As moscas hipoboscídeas ou moscas­piolho, Pseudolynchia e Lynchia spp, são versões aladas das moscas­piolho.
Elas  infestam  muitos  pássaros  cantores,  aves  de  rapina  e  pombos.  A  mosca  dos  pombos,  P.  canariensis,  é  um
parasito importante dos  pombos  domésticos  em  todas  as  regiões  tropicais  e  subtropicais do mundo. São notadas
por todo o sul dos EUA e em direção ao norte, ao longo da costa atlântica, até a região da Nova Inglaterra. Estas
moscas marrom­escuras possuem asas longas (6,5 a 7,5 mm) e são capazes de voar rapidamente do hospedeiro.
PATOLOGIA:  As  moscas  hipoboscídeas  se  movem  rapidamente  nas  aves  hospedeiras,  picam  e  sugam  sangue  das
partes  que  não  são  bem  emplumadas.  Podem  servir  como  hospedeiros  intermediários  para  muitos  protozoários
sanguíneos  aviários  do  gênero  Haemoproteus.  As  moscas  dos  pombos  podem  atacar  facilmente  as  pessoas  que
manipulam aves adultas; a picada parece ser tão dolorida quanto uma ferroada de abelha e os seus efeitos podem
persistir por = 5 dias.
DIAGNÓSTICO:  A  inspeção  minuciosa  das  penas  eriçadas  e  da  pele  subjacente  revela  a  infestação  pela  aparência
exclusiva destas moscas aladas e de voo rápido.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A morte de qualquer mosca nos pássaros pode ser obtida pela pulverização das aves
com permetrina. A limpeza total do local e a destruição dos resíduos são essenciais para o controle. A pulverização
das instalações com permetrina, realizada junto com a limpeza, aliviará a infestação.

 MOSCAS­PIOLHO DOS OVINOS
A  mosca­piolho  dos  ovinos,  Melophagus  ovinus,  é  um  dos  parasitos  externos  mais  importantes  e  amplamente
disseminados em ovinos. Também existem moscas­piolho que parasitam veados na América do Norte (Lipoptena
depressa e Neolipoptena ferrisi).
As moscas­piolho são dípteros sem asas. O adulto tem cerca de 7 mm de comprimento e coloração marrom ou
avermelhada; é coberto com pelos cerdosos e curtos. A cabeça é curta e larga e as pernas são fortes e armadas com
garras robustas.
A fêmea origina uma única larva, completamente desenvolvida, que é cimentada na lã e se transforma em pupa
em  12  h.  A  mosca­piolho  jovem  sai  da  pupa  depois  de  cerca  de  22  dias.  As  fêmeas  vivem  100  a  120  dias  e
produzem aproximadamente 10 larvas durante esse período; os machos vivem cerca de 80 dias. O ciclo de vida
inteiro se passa no hospedeiro. As moscas­piolho que caem do hospedeiro geralmente sobrevivem < 1 semana e
representam baixo risco de infestação em um rebanho. A população de moscas­piolho aumenta durante o inverno e
o início da primavera, quando elas se propagam rapidamente pelo rebanho, particularmente quando os ovinos estão
reunidos em galpões fechados para se alimentar ou se abrigar.

Melophagus ovinus em ovino. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

PATOLOGIA:   Para  se  alimentar,  as  moscas–piolho  dos  ovinos  perfuram  a  pele  com  suas  peças  bucais  e  sugam
sangue.  Geralmente  se  alimentam  no  pescoço,  peito,  ombros,  flancos  e  na  garupa,  mas  não  no  dorso,  onde  há
poeira  e  outros  resíduos  acumulados  na  lã.  As  suas  picadas  causam  prurido  sobre  boa  parte  do  corpo  do
hospedeiro; os ovinos se morderão, coçarão e esfregarão, danificando a lã. O velo torna–se fino, rasgado e sujo. Os
excrementos  das  moscas­piolho  causam  descoloração  permanente,  que  provavelmente  reduz  o  valor  da  lã.  As
moscas­piolho também causam defeito no couro, chamado de “ruga”, que acomete o grau e o valor da pele ovina.
Os ovinos infestados, particularmente os cordeiros e as ovelhas prenhes, podem perder a vitalidade e definhar. As
infestações intensas podem reduzir consideravelmente a condição do hospedeiro e até causar anemia. As moscas­
piolho também transmitem Trypanosoma melophagium, um protozoário parasito não patogênico aos ovinos.
DIAGNÓSTICO:   Uma  inspeção  rigorosa  da  lã  suja  e  danificada  e  da  pele  subjacente  revela  a  infestação,  pela
aparência exclusiva destas moscas peludas e sem asas.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   A  tosquia  remove  muitas  pupas  e  adultos.  Consequentemente,  a  tosquia  antes  do
parto ovino e o tratamento subsequente das ovelhas com inseticidas para controlar as moscas­piolho remanescentes
podem reduzir muito a possibilidade dos cordeiros se infestarem intensamente. Os ovinos costumam ser tratados
depois da tosquia e os melhores resultados são obtidos com uso de inseticida que tenha atividade residual de = 3 a
4  semanas.  Desta  forma,  as  moscas  que  saem  das  pupas  também  são  eliminadas.  Os  tratamentos  modernos  de
controle de piolhos também controlam as moscas­piolho.
O banho de imersão é um método de tratamento eficaz. A submersão completa dos ovinos nos tanques assegura
a destruição de todas as moscas­piolho, mas na maioria dos casos, não mata as larvas em pupa; é necessário um
inseticida de longa ação para matar as moscas­piolho recém­emergidas das pupas. Os grandes rebanhos de ovinos
de  pastagem  devem  ser  tratados  em  um  tanque  de  banho  de  imersão  construído  permanentemente.  Os  rebanhos
menores e os de fazenda podem ser tratados, com êxito, em tanques portáteis de aço galvanizado ou em tanques
menores, banheiras ou sacos de banhos de imersão de lona.
A  pulverização  também  pode  ser  tão  eficaz  como  o  banho  de  imersão,  sendo  mais  conveniente  em  algumas
áreas. Utilizam­se comumente pressões de 7 a 14 kg/cm2, para lã curta, e de 21 a 28 kg/cm2, para lã longa.
Às vezes, também se utilizam banhos de imersão com ducha; os ovinos são mantidos em um cercado especial e
recebem  a  ducha  de  cima  e  de  baixo  até  que  o  velo  se  encontre  saturado.  O  escoamento  deve  retornar  para  um
sistema de recirculação e a concentração de inseticida utilizada é a mesma que a do banho de imersão normal. A
concentração do inseticida poderá cair rapidamente e tornar­se ineficaz caso as instruções de reposição não sejam
explicitamente seguidas.
O banho com jato envolve a aplicação forçada do inseticida por meio de um pente manual de jatos múltiplos,
passado pelo velo curto. Embora ele seja um pouco mais lento e menos eficaz que os banhos de imersão ou sprays,
pode ser vantajoso em rebanhos menores, pois é econômico e não requer uma instalação permanente.
As formulações spot­on ou pour­on dos piretroides mais recentes são fáceis de aplicar e bastante eficazes.
A  pulverização  dos  inseticidas  se  ajusta  bem  nas  práticas  de  controle  no  momento  da  tosquia.  É  rápida  e
econômica e evita molhar os animais. Encontram­se comercialmente disponíveis vários tipos de equipamento de
pulverização.

 MOSQUITOS­PÓLVORA
Os  mosquitos­pólvora  flebotomíneos,  Phlebotomus  spp  (mosquitos­pólvora  do  Velho  Mundo)  e  Lutzomyia  spp
(mosquitos­pólvora  do  Novo  Mundo),  são  membros  da  família  Psychodidae.  Esses  mosquitos  se  restringem
primariamente às regiões tropicais e subtropicais do mundo. Os membros desses gêneros são mosquitos pequenos
e  semelhantes  a  mariposas,  com  cerca  de  1,5  a  4  mm  de  comprimento.  As  patas  são  tão  compridas  quanto  às
antenas,  compreendendo  16  segmentos  que  apresentam  aparência  peluda  e  de  contas.  Eles  também  são
comumente conhecidos como “mosquitos da areia”, “mosquitos­mariposa” ou “maruins­coruja”. A característica
morfológica­chave  utilizada  na  sua  identificação  é  a  de  que  o  corpo  do  mosquito­pólvora  é  coberto  com  pelos
finos. As fêmeas possuem peças bucais perfurantes e se alimentam de sangue de vários animais homeotérmicos,
inclusive o homem. Muitas espécies se alimentam em répteis. Os mosquitos­pólvora machos sugam a umidade de
qualquer fonte disponível e parecem sugar a transpiração de pessoas. Eles tendem a ser ativos somente à noite e,
contrariamente  aos  borrachudos,  são  voadores  fracos;  o  seu  voo  é  detido  por  correntes  aéreas,  mesmo  as  mais
leves. Durante o dia, os mosquitos­pólvora procuram proteção nas fendas e cavernas, entre a vegetação e dentro
construções  escuras.  Frequentemente  procuram  proteção  dentro  de  tocas  de  roedores  e  tatus;  esses  mamíferos
servem como hospedeiros reservatórios para Leishmania spp. Os mosquitos–pólvora se reproduzem em ambientes
escuros e úmidos, com um suprimento de material orgânico que sirva como alimento para as larvas. Eles não se
reproduzem em ambientes aquáticos.
PATOLOGIA:   Esses  mosquitos  pequenos  servem  como  hospedeiros  intermediários  de  Leishmania  spp,  um
protozoário  que  infecta  as  células  reticuloendoteliais  dos  capilares,  baço  e  outros  órgãos,  podendo  também  ser
observada  em  monócitos,  leucócitos  polimorfonucleares  e  macrófagos  de  pessoas,  cães,  gatos,  equinos  e  ovinos
(ver p. 834).
DIAGNÓSTICO:  À semelhança dos borrachudos, os mosquitos­pólvora podem ser coletados com maior frequência
no campo e não são notados nos animais. Eles podem ser identificados por causa de seu tamanho pequeno e asas e
corpos peludos. A identificação do gênero e da espécie é melhor realizada por entomologista.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A pulverização de inseticidas sobre o habitat das larvas normalmente não é possível
pela dificuldade de acesso aos seus locais de reprodução. A remoção da vegetação densa desestimula a reprodução
dos  mosquitos–pólvora.  A  pulverização  de  inseticidas  residuais  ao  redor  das  casas  é  a  principal  maneira  de
controlar  estas  moscas;  entretanto,  é  ineficaz  para  espécies  que  picam  longe  das  casas.  De  maneira  geral,
populações de mosquito­pólvora foram reduzidas como resultado de intensos programas de controle de mosquitos.
Coleiras impregnadas com deltametrina podem ser recomendadas aos proprietários de cães para protegerem seus
animais das picadas destas moscas.

 MOSCAS TSÉ­TSÉ
As moscas tsé­tsé, Glossina spp, são moscas hematófagas importantes na África (latitudes 5°N a 20°S). Possuem
corpo  estreito,  são  amarelas  a  marrom­escuras  e  possuem  6  a  13,5  mm  de  comprimento.  Quando  em  repouso,
mantêm suas asas sobre o dorso, em configuração semelhante a uma tesoura. O tórax possui coloração esverdeada
opaca, com manchas ou listras indistinguíveis. O abdome é marrom claro a escuro.
Moscas de ambos os sexos são ávidas consumidoras de sangue. Uma cópula deixa uma mosca fêmea fértil por
toda a vida, durante a qual ela pode produzir até 12 larvas. Ela produz 1 larva por vez, retendo­a no útero; depois
de  cerca  de  10  dias,  a  larva  é  depositada  em  solo  solto  e  arenoso,  que  escava  e  em  60  a  90  min,  começa  a
transformação  em  pupa.  O  período  pupal  dura  em  média  cerca  de  35  dias  e  após,  o  adulto  emerge.  As  moscas
adultas se alimentam avidamente de sangue de vertebrados aproximadamente a cada 3 dias.
PATOLOGIA:  As moscas tsé­tsé servem como hospedeiros intermediários para várias espécies de tripanossomas que
causam  doenças  fatais  nos  animais  domésticos  (nagana)  e  humanos  (doença  do  sono  africana).  Tripanossomas
invadem o sangue, linfa, fluido cerebroespinal (FCE) e vários órgãos do corpo, como o fígado e o baço. A nagana,
um  complexo  relatado  nos  bovinos  causado  pelo  Trypanosoma  brucei,  já  ocorreu  em  amplas  áreas,  tão  grande
como  1/4  do  continente  africano.  A  doença  é  fatal  para  equinos,  muares,  camelos  e  cães.  Bovinos,  ovinos  e
caprinos  geralmente  sobrevivem,  exceto  quando  parasitados  por  algumas  cepas  do  protozoário.  Vários  animais
selvagens ungulados nativos da África não exibem qualquer evidência de lesão. Ver tripanossomíase, p. 35.
DIAGNÓSTICO:  As moscas tsé­tsé podem ser identificadas pela sua aparência semelhante à da abelha melífera, da
sua probóscide longa com o bulbo em forma de cebola na base e da sua venulação alar exclusiva, com a célula em
forma de cutelo ou de machadinha característica, no centro da asa.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:  A  mosca  tsé–tsé  pode  ser  controlada  por  atração  e  captura  (armadilhas  de  tsé­tsé),
limpeza do mato, telas de mosca, repelentes, inseticidas e técnicas de liberação de machos estéreis.

DÍPTEROS COM PEÇAS BUCAIS NÃO PICADORAS

 BORRACHUDOS OCULARES
Os  borrachudos  ou  mosquitos  oculares  (Hippelates  spp)  são  mosquitos  bastante  pequenos  (1,5  a  2,5  mm  de
comprimento), que se  reunem  frequentemente  ao  redor  dos  olhos,  bem  como em secreções mucosas e sebáceas,
pus e sangue.
Nas  regiões  desérticas  e  nos  contrafortes  montanhosos  do  sul  do  estado  norte­americano  da  Califórnia,  os
mosquitos Hippelates adultos estão presentes o ano inteiro; são perturbadores de abril até novembro. Durante os
meses  de  pico,  ficam  notáveis  no  início  da  manhã  e  no  final  da  tarde.  Reúnem–se  em  sombras  profundas,  com
entre  arbustos  densos  ou  em  uma  habitação.  Os  ovos  têm  cerca  de  0,5  mm  de  comprimento,  são  estriados  e
distintamente curvados. São depositados na superfície do solo ou abaixo dela. As larvas eclodem e se alimentam de
material orgânico em decomposição, inclusive de excrementos. O estágio larval dura 7 a 11 dias. Durante os meses
invernais, os estágios larvais e de pupa podem persistir por muitas semanas. O período de pupa ocorre próximo da
superfície e dura cerca de 6 dias. O ciclo biológico completo demora cerca de 21 dias. Os adultos geralmente são
voadores resistentes, tanto a favor como contra o vento.
PATOLOGIA:  Algumas  espécies  são  atraídas  para  os  órgãos  genitais  dos  mamíferos;  por  exemplo,  H.  pallipes  se
agrupam  ao  redor  do  pênis  dos  cães.  Esses  borrachudos  abordam  calmamente  seus  hospedeiros  mamíferos.
Costumam pousar a uma certa distância do local de alimentação e depois rastejar sobre a pele, ou voam e pousam
intermitentemente,  evitando  o  incômodo  ao  hospedeiro.  São  persistentes  e,  se  forem  espantados,  retornarão
rapidamente para continuar a se ingurgitar.
Tratam­se de moscas não picadoras; no entanto, as suas labelas possuem espinhos que escarificam o tecido do
hospedeiro e permitem a entrada de microrganismos patogênicos. Os mosquitos Hippelates quase sempre pairam
ao redor dos orifícios corporais dos bezerros, dos bovinos sobreanos, das novilhas prenhes e das vacas lactantes.
Alimentam­se  de  fluido  lacrimal,  secreções  corporais  gordurosas,  gotículas  de  leite  e  secreções  nas  pontas  dos
tetos dos animais. Os mosquitos Hippelates também servem como vetores de Arcanobacterium pyogenes (mastite
estival) e da Moraxella bovis (olho cor­de­rosa).
DIAGNÓSTICO:  Esses mosquitos pequenos possuem peças bucais do tipo absorvente. O mosquito lembra a mosca
doméstica em forma e estrutura e tem antenas arestadas e curtas.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Repelentes, como os recomendados para mosquitos, proporcionam alívio temporário
dos  borrachudos  oculares.  Aplicações  de  inseticidas  em  uma  grande  base  comunitária  (como  aconteceria  com  o
mata­mosquito)  podem  providenciar  o  controle  temporário  para  os  adultos,  porém  mais  adultos  invadem  a  área
tratada após a dissipação do inseticida.

 MOSCAS DA CABEÇA (Moscas de plantações)
As moscas da cabeça ou moscas de plantações, Hydrotaea irritans, são moscas não picadoras, notadas em grande
número  nos  países  do  norte  da  Europa,  especialmente  na  Dinamarca  e  na  Grã­Bretanha,  onde  são  pragas  em
bovinos, ovinos e outros animais de produção. Esta mosca lembra a mosca doméstica e possui cerca de 4 a 7 mm
de comprimento. Seu tórax é preto com manchas cinza, o abdome é verde­oliva e as bases das asas são amarelo­
alaranjadas.
As  moscas  da  cabeça  são  um  incômodo  para  os  animais  domésticos  e  o  homem,  pois  são  atraídas  para  boca,
nariz,  orelhas,  olhos  e  ferimentos  para  se  alimentarem  das  secreções.  Diferentemente  das  outras  espécies  do
gênero Hydrotaea, H. irritans produz uma geração por ano, com 3 estágios larvais. Os ovos depositados no final
do  verão  eclodem  larvas  dentro  de  poucos  dias.  O  estágio  saprófago  é  breve,  antes  do  desenvolvimento  para  o
estágio que preda outras larvas de insetos. A invernação ocorre como larvas de estágio final. Os adultos são mais
ativos do início de junho até o final de setembro e são comuns na vizinhança de moitas ou arvoredos, nos quais se
abrigam entre os períodos de alimentação.
PATOLOGIA:   Na  Grã­Bretanha,  os  ovinos  são  predominantemente  afetados.  Os  grandes  enxames  de  moscas,
atraídos pelo movimento dos animais, se reúnem para se alimentar das secreções oculares e nasais e dos resíduos
celulares na base de crescimento dos chifres. Para aliviar a irritação persistente, os ovinos se coçam e esfregam as
cabeças, que resulta na formação de ferimentos escarificados ou “cabeças quebradas”, especialmente na cabeça. As
moscas, atraídas pelo sangue, se instalam nestas lesões autoinfligidas e estendem nas margens destas por meio de
sua  atividade  alimentar.  Ovinos  de  todas  as  idades  são  comprometidos,  mas  com  maior  gravidade  as  raças  com
chifres e desprovidas de lã na cabeça.
As moscas da cabeça também atacam pessoas, veados, equinos, bovinos e coelhos. Embora não existam lesões
de cabeça correspondentes em bovinos, a ocorrência de mastite de verão (causada por Corynebacterium pyogenes)
e  a  atividade  sazonal  das  moscas  da  cabeça  estão  estreitamente  relacionadas,  especialmente  na  Dinamarca.  As
moscas da cabeça também podem estar envolvidas na disseminação de mixomatose nos coelhos.
TRATAMENTO E CONTROLE:  O desenvolvimento, a eclosão e a reunião das moscas da cabeça distantes das áreas
de fazenda impedem os métodos tradicionais de aspersão de inseticidas nos locais de reprodução e nos habitat de
repouso.  O  controle  do  local  de  contato  entre  os  insetos  adultos  em  alimentação  e  os  mamíferos  hospedeiros
também tem valor limitado. Nos ovinos, a aplicação de compostos organofosforados ou de derivados piretrínicos
nas  áreas  suscetíveis  da  cabeça  possuem  curta  duração,  o  que  exige  reaplicações  não  práticas  em  animais  de
criação  extensiva.  O  uso  de  brincos  impregnados  com  inseticidas  nos  bovinos  diminui  a  incidência  da  mastite
estival, presumivelmente pela redução na transmissão das moscas da cabeça.
A remoção dos animais de produção das localizações infestadas durante a estação das moscas constitui a única
maneira  completamente  efetiva  de  evitar  danos.  Quando  ocorrem  “cabeças  quebradas”,  o  abrigo  dos  ovinos
constitui o único método bem­sucedido de interromper danos por moscas adicionais.

 MOSCAS DA FACE
As moscas da face, Musca autumnalis, são assim conhecidas porque se acumulam ao redor dos olhos e do focinho
dos animais de produção, particularmente bovinos. Também podem ser notadas na cernelha, no pescoço, no peito e
nas áreas laterais do corpo. As suas peças bucais são adaptadas para absorver saliva, lágrima e muco. As moscas da
face geralmente não são consideradas consumidoras de sangue, pois as suas peças bucais não são perfuradoras ou
semelhantes  a  baionetas.  No  entanto,  elas  acompanham  as  moscas  hematófagas,  perturbam­nas  durante  o  seu
processo alimentar e depois lambem o sangue e os fluidos corporais que se acumulam na pele do hospedeiro. As
moscas da face são notadas em animais em ambientes externos e, em geral, não os acompanham para dentro dos
estábulos.
As moscas da face são vistas nos bovinos em pastagens por todo o sul do Canadá e a maior parte dos EUA. As
suas  peças  bucais  consistem  em  labelas  absorventes  e  existem  4  faixas  longitudinais  no  abdome.  Embora  sejam
semelhantes  em  aparência  à  mosca  doméstica  comum,  as  moscas  da  face  podem  ser  diferenciadas  por
aproximação,  pelos  ângulos  das  margens  interiores  dos  olhos  e  pela  coloração  distinta  da  face  e  do  abdome.  A
diferenciação das espécies requer a habilidade de um entomologista treinado.
Os bovinos são os principais hospedeiros das moscas da face nos EUA, mas estas também se alimentarão em
equinos e, provavelmente, em ovinos e caprinos. A mosca da face é uma praga nos bovinos em pastagens; ela não
se desenvolve em situações de lote de engorda e por isso, não é um parasito de bovinos confinados. A ovoposição
é  realizada  nas  fezes  frescas  de  bovinos  em  pastagem  e  eclodem  em  cerca  de  1  dia.  As  larvas  amareladas  se
desenvolvem em 2 a 4 dias e, quando maduras, deixam o esterco para se tornarem pupa no solo circundante. O seu
ciclo de vida completo, do ovo ao adulto, requer 12 a 20 dias, dependendo das condições climáticas. O adulto em
diapausa inverna dentro de construções e de outros locais protetores.
PATOLOGIA:   As  moscas  da  face  perturbam  o  hospedeiro  e  interferem  na  sua  produtividade.  As  fêmeas  se
alimentam de secreções faciais, como lágrima, muco nasal e saliva, para obter proteína para o desenvolvimento dos
ovos. A irritação ao redor dos olhos do hospedeiro estimula o fluxo de lágrimas, que atrai mais moscas.
As moscas da face também se alimentam de outras fontes de fluido, como sangue proveniente de ferimentos e o
leite nas faces dos bezerros. Como elas possuem espinhos ásperos e pequenos (dentes pré­estomais) em suas peças
bucais  absorventes,  podem  causar  irritação  e  danos  mecânicos  no  tecido  ocular  do  hospedeiro.  A  atividade
alimentar  das  moscas  da  face  potencializa  a  transmissão  da  Moraxella  bovis  (ver  p.  524).  As  moscas  da  face
também podem atuar como hospedeiros intermediários de Thelazia spp e Parafilaria bovicola.
DIAGNÓSTICO:   As  moscas  da  face  adultas  são  morfologicamente  semelhantes  às  moscas  domésticas.  Estas  2
espécies podem ser distinguidas apenas pelas pequenas diferenças na posição dos olhos e na coloração do abdome.
A identificação das espécies requer as habilidades de um entomologista treinado. Em geral, encontrando­se uma
mosca de tamanho médio se alimentando ao redor dos olhos e das narinas de um bovino ou equino, provavelmente
será uma mosca da face.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   O  controle  das  moscas  da  face  é  difícil.  Tem­se  feito  muito  esforço  utilizando­se
vários  inseticidas  e  técnicas  de  aplicação,  como  sacos  de  pó,  sprays  de  nebulização  e  formulações  de  secagem.
Também se utilizam inseticidas e reguladores de crescimento de insetos como aditivos alimentares. No entanto, os
resultados  costumam  ser  menos  que  satisfatórios.  A  introdução  de  brincos  impregnados  com  inseticidas
proporciona  um  controle  pouco  melhor,  mas  geralmente,  só  se  consegue  a  redução  sazonal  de  70  a  80%  nas
moscas da face, mesmo com a utilização de 2 brincos (1 em cada orelha) por animal.

 MOSCAS QUE SE REPRODUZEM NO LIXO
Os  seguintes  dípteros  adultos  costumam  ser  denominados  de  moscas  que  se  reproduzem  no  lixo:  Musca
domestica  (mosca  doméstica);  Calliphora,  Phaenicia,  Lucilia  e  Phormia  spp  (moscas  varejeiras  ou  das
garrafas);  Sarcophaga  spp  (moscas  da  carne);  Fannia  spp  (moscas  domésticas  pequenas);  Muscina  spp  (falsas
moscas  dos  estábulos);  e  Hermetia  illucens  (moscas­soldado  pretas).  Encontram­se  com  frequência,  grandes
populações  destas  moscas  adultas  ao  redor  das  instalações  onde  há  fezes  de  animais.  Os  estágios  larvais  podem
estar  presentes  em  ferimentos  cutâneos  contaminados  por  bactérias  ou  em  pelos  emaranhados  contaminados  por
fezes  (ver  p.  1002).  O  ciclo  de  vida  da  Musca  domestica  é  utilizado  como  exemplo  representativo  de  todas  as
moscas que se reproduzem no lixo.
A mosca doméstica é comumente notada junto às criações de animais de produção e aves domésticas, onde se
reproduz  facilmente  em  fontes  de  esterco  acumulado.  Trata­se  de  uma  mosca  de  tamanho  médio  (até  9  mm),
acinzentada,  com  4  faixas  torácicas  escuras  e  peças  bucais  não  picadoras  e  absorventes,  destinadas  a  sugar
alimentos semilíquidos (não existe nenhuma mandíbula ou maxilar). O lábio é expandido em 2 labelas, que podem
transportar fluidos e semifluidos.
Depois  da  oviposição,  o  ovo  branco  opalescente  em  forma  de  banana  (com  cerca  de  1  mm  de  comprimento)
eclode em 6 a 12 h sob condições ideais. Os ovos não são resistentes ao ressecamento e poucos parecem sobreviver
a temperaturas > 40°C ou < 15°C. As larvas podem se desenvolver em poucos dias até 3 semanas, dependendo da
temperatura e da disponibilidade de alimentos. Quando a temperatura para o desenvolvimento larval se encontra
ideal (cerca de 36°C), as larvas se transformam em pupas em cerca de 6 h. As pupas persistem 4 a 5 dias em clima
quente. Depois que os adultos saem do estágio de pupa, as moscas procuram alimentos e copulam em poucos dias.
O  ciclo  de  vida  geralmente  termina  em  cerca  de  3  semanas,  embora,  sob  condições  favoráveis,  ele  possa  se
completar em 10 a 14 dias. Nos climas temperados, acredita­se que a mosca doméstica inverne como uma pupa.
PATOLOGIA:  Mesmo que estas moscas não se alimentem de sangue, o incômodo para os animais causado pelo seu
movimento  pode  provocar  redução  no  desempenho.  Ademais,  estão  implicadas  na  transmissão  de  muitos
patógenos  (helmintos,  protozoários,  bactérias  e  vírus)  tanto  para  o  homem  quanto  aos  animais.  Frequentemente,
ocorrem  grandes  populações  destas  moscas  adultas  ao  redor  das  instalações  de  animais  de  produção  ou  aves
domésticas  mal  conservadas  e  estas  se  tornam  um  incômodo  público.  São  moscas  sinantrópicas,  isto  é,  que  se
associam  às  habitações  humanas.  As  moscas  são  consumidoras  de  “gotas  de  vômito”  e  voam  das  fezes  para  os
alimentos, espalhando bactérias de suas patas e do conteúdo gástrico regurgitado.
DIAGNÓSTICO:   Todas  as  moscas  adultas  que  se  reproduzem  no  lixo  possuem  peças  bucais  não  picadoras  e
absorventes semelhantes, destinadas a sugar alimentos semilíquidos. A identificação das moscas adultas deve ser
deixada para um especialista. As moscas domésticas são acinzentadas e de tamanho médio, com 4 faixas torácicas
escuras.  A  identificação  preliminar  das  moscas  varejeiras  ou  das  garrafas  pode  ser  feita  com  base  na  coloração
metálica  dos  adultos.  A  mosca  da  carne  é  de  tamanho  médio  e  acinzentada,  com  um  padrão  abdominal
enxadrezado.
TRATAMENTO E CONTROLE:  É necessário um programa completo de higienização para controlar as populações de
moscas próximas e no interior das instalações dos animais de produção e aves domésticas. Todos os acúmulos de
esterco  devem  ser  removidos  pelo  menos  2  vezes/semana  ou  manipulados  apropriadamente,  se  forem  guardados
nas  propriedades,  para  minimizar  a  reprodução  de  moscas.  Aplicando­se  práticas  de  controle  de  esterco  sólido,
devem­se  realizar  esforços  para  reduzir  a  umidade  no  esterco.  Utilizando­se  um  poço  de  esterco  líquido,  não  se
deve  permitir  que  o  esterco  se  acumule  acima  da  linha  d’água,  flutuando  ou  grudando  nas  laterais,  pois  isso
constitui  um  local  ideal  para  a  produção  de  moscas.  Inseticidas  devem  ser  considerados  como  suplementares  a
medidas de higienização e controle destinadas a evitar a reprodução de moscas. Sprays residuais proporcionam o
controle de 2 a 4 semanas com tratamento que deve ser aplicado nas superfícies de descanso de moscas. Podem­se
utilizar sprays de espaço, nebulizações ou nevoeiro, com “nocaute” rápido, mas sem ação residual, para redução
imediata de alto número de moscas adultas. Outras medidas para o controle de moscas adultas é o uso de fitas de
resina com inseticidas ou de várias iscas de moscas. Estas medidas também podem ser aplicadas diretamente nas
fontes de reprodução de moscas; no entanto, isso só deve ser considerado no caso de pontos de reprodução que não
possam ser eliminados pelas práticas normais de higienização.

DÍPTEROS QUE PRODUZEM MIÍASES
As larvas dos dípteros podem­se desenvolver no tecido subcutâneo ou nos órgãos de muitos animais domésticos,
produzindo uma afecção conhecida como miíase. Existem 2 tipos de miíases, com base no grau de dependência do
hospedeiro.  Nas  miíases  facultativas,  as  larvas  das  moscas  geralmente  possuem  vida  livre;  no  entanto,  sob
determinadas  circunstâncias,  estas  larvas  podem  se  adaptar  à  dependência  parasitária  em  um  hospedeiro.
Nas  miíases  obrigatórias,  as  larvas  das  moscas  são  completamente  parasitárias,  isto  é,  dependem  de  um
hospedeiro para completar o ciclo de vida. Sem hospedeiros, os parasitos obrigatórios morrerão.

 MOSCAS PRODUTORAS DE MIÍASES FACULTATIVAS
As  larvas  dos  seguintes  dípteros  costumam  ser  denominadas  de  produtoras  de  miíase  facultativas:  Musca
domestica (mosca doméstica); Calliphora, Phaenicia, Lucilia e Phormia spp (moscas varejeiras ou das garrafas);
e Sarcophaga spp (moscas da carne). São moscas sinantrópicas nos estágios adultos, isto é, associadas a habitações
humanas  e  voam  facilmente  das  fezes  para  alimentos.  Os  estágios  larvais  geralmente  estão  associados  aos
ferimentos cutâneos em qualquer animal doméstico, onde haja contaminação por bactérias ou pelos emaranhados
contaminados por fezes. Nos estágios larvais, as características distintas das placas espiraculares posteriores e do
esqueleto cefalofaringeano são exclusivas de cada espécie e utilizadas para a identificação.
O ciclo biológico da Musca domestica é utilizado como exemplo representativo das moscas que se reproduzem
no lixo (ver p. 1000). Várias espécies de moscas varejeiras causam miíases nos ovinos. Nos EUA e no Canadá, as
moscas  primárias  são  Phormia  regina  e  Protophormia  terraenovae  (moscas  varejeiras  pretas),  Lucilia
sericata (mosca  verde  das  garrafas).  L.  illustris,  Cochliomyia  macellaria  (bicheira  secundária)  e  algumas  outras
geralmente são invasoras secundárias. L. cuprina é a mosca primária mais importante na Austrália e na África do
Sul; a L. sericata na Grã­Bretanha; e L. cuprina, L. sericata e Calliphora stygia na Nova Zelândia.
PATOLOGIA:   Sob  condições  normais,  as  moscas  adultas  desses  gêneros  depositam  seus  ovos  nas  fezes  ou  nas
carcaças de animais em decomposição. Na miíase facultativa, as moscas adultas são atraídas por ferimento úmido,
lesão  cutânea  ou  pelame  emplastrado.  Um  local  comum  é  o  traseiro,  onde  as  moscas  podem  ser  atraídas  pela  lã
emplastrada com urina ou fezes. À medida que as moscas fêmeas adultas se alimentam nesses locais, elas põem
ovos que eclodem em 24 h em condições de umidade. As larvas (larvas de moscas) se movem independentemente
pela superfície do ferimento, ingerindo células mortas, exsudato, secreções e resíduos, mas não tecidos vivos. Esta
condição é conhecida como “ataque de moscas” ou ataque. As larvas irritam, lesam e matam as camadas cutâneas
sucessivas e produzem exsudatos. Podem fazer túneis através da epiderme afinada, até o tecido subcutâneo. Esse
processo  produz  cavidades  teciduais  na  pele,  que  medem  até  vários  centímetros  de  diâmetro.  Uma  vez
estabelecido,  o  ataque  pode  disseminar  rapidamente  e  atrair  mais  moscas  varejeiras,  tanto  secundárias  quanto
primárias.  Os  ataques  leves  podem  causar  perda  rápida  de  condição  e  os  ataques  maléficos  podem  ser  fatais.  A
menos que o processo seja detido por terapia apropriada, o animal infestado pode morrer por causa de a choque,
intoxicação, histólise ou infecção. Um odor penetrante, distinto e peculiar permeia o tecido infestado e o animal
afetado. As lesões avançadas podem conter milhares de larvas.
O  corpo  dos  ovinos  também  pode  ser  atacado  por  moscas.  Isso  geralmente  se  associa  com  chuvas  fortes,  que
causam  o  desenvolvimento  da  podridão  do  velo,  quase  sempre  caracterizada  por  descoloração  causada  por
infecções por Pseudomonas spp ou dermatofilose. Outros locais incluem os chifres dos carneiros machos, a lã ao
redor do seu prepúcio, o local que as patas com podridão do casco entram em contato com o velo e os ferimentos.
As  moscas  adultas  podem  ser  pragas  nas  clínicas  veterinárias,  fazendas  ou  granjas  aviárias.  As  moscas  são
consumidoras  de  “gotas  de  vômito”  próprias  e  voam  das  fezes  para  os  alimentos,  espalhando  bactérias  em  suas
patas e no conteúdo gástrico regurgitado.
Estas larvas de moscas também foram associadas a efeitos tóxicos nas galinhas. O botulismo (p. 2925), também
conhecido  como  “pescoço  flexível”  nas  galinhas,  foi  associado  à  ingestão  de  um  grande  número  de
larvas de Lucilia caesar, Phaenicia sericata e outras espécies de moscas. Clostridium botulinum se  multiplica  na
carniça, onde pode ser adquirido pelas larvas de moscas que se reproduzem neste meio e após, é transmitido para
as  galinhas  que  ingerem  estas  larvas.  Os  animais  mortos  devem  ser  descartados  rápida  e  seguramente,  de
preferência serem submetidos à incineração.
DIAGNÓSTICO:  A infestação pode ser identificada precocemente; o comportamento das ovelhas pode ser um bom
indicador  da  miíase.  Os  animais  afetados  tornam­se  deprimidos,  ficam  com  as  cabeças  para  baixo,  não  se
alimentam e tentam morder as áreas infestadas. Suspeita­se de bernes nos casos em que as larvas são associadas a
perfurações.
As espécies de moscas produtoras de miíase podem ser definitivamente identificadas pelo exame rigoroso das
larvas. A porção caudal das várias larvas de terceiro estágio que infestam um ferimento deve ser incisada com uma
lâmina  de  bisturi.  Coloca­se  as  extremidades  caudais  cortadas  com  a  superfície  de  corte  para  baixo  sobre  uma
lâmina  de  vidro,  cobertas  por  lamínula  e  ao  examiná­las  em  microscópio  composto,  pode­se  utilizar  uma  chave
dicotômica para identificar o(s) gênero(s) das moscas dentro do ferimento. As placas espiraculares exclusivas são
distintas para cada gênero em particular. Devem­se examinar várias amostras, pois pode haver mais de um gênero
dentro da lesão. As primeiras larvas a eclodir na lesão frequentemente criam um meio favorável e atraente para as
moscas  de  outros  gêneros.  Também  se  deve  considerar  a  possibilidade  de  uma  miíase  obrigatória  causada
por Cochliomyia hominivorax (ver p. 1004) ou Chrysomyia bezziana (ver p. 1005).
TRATAMENTO E CONTROLE:  A infestação de moscas varejeiras pode ser efetivamente controlada por cerca de 6 a 8
semanas  por  um  “arremate”  ou  “aparamento”  (i.  e.,  tosquia­se  a  lã  entre  as  pernas  e  ao  redor  da  cauda).  Uma
tosquia completa controla os surtos que envolvem outras partes do corpo. A lã removida do redor da cabeça e do
prepúcio pode evitar um ataque nestas áreas. Pode­se eliminar virtualmente o tingimento por urina da virilha de
ovelhas da raça merino pela remoção das pregas das nádegas (cirurgia de Mules) e reduzir bastante a contaminação
fecal com o corte de caudas na terceira articulação. Deve­se controlar a diarreia. Os odores e a umidade associada
atraem moscas e estimulam a oviposição, particularmente em um tempo quente e úmido.
A  quimioprofilaxia  consiste  no  umedecimento  até  uma  saturação  completa  das  áreas  suscetíveis  com
preparações  inseticidas  e  larvicidas  adequadas,  como  os  inseticidas  organofosforados  ou  a  ciromazina,  um
larvicida específico de banhos de imersão e sprays. O banho com jato é o procedimento mais eficaz – o inseticida é
forçado para o interior do velo, em geral nas nádegas, ao longo do dorso e na cabeça, sob alta pressão. A proteção
pode durar 6 a 8 semanas, mas quando a mosca primária for resistente (p. ex., L. cuprina na Austrália), pode durar
somente 2 a 3 semanas. As aplicações semanais de agentes como ronnel (a 2,5%) sob pressão em ferimentos até
estes  cicatrizarem  pode  ser  altamente  benéfica,  em  particular  no  caso  dos  bernes.  Antes  de  aplicar  agentes
adequados, deve­se remover toda a lã da área atacada e ao redor dela.
A  queima  ou  o  enterro  profundo  de  uma  carcaça  pode  ser  uma  valiosa  medida  higiênica  geral,  mas  pode  ter
pequeno efeito nos ataques primários. A fonte principal de moscas primárias são os ovinos atacados por elas. Na
Austrália,  tem­se  utilizado  uma  abordagem  de  manipulação  genética  para  controlar  uma  linhagem  de  mosca
varejeira;  as  moscas  machos  ficam  parcialmente  estéreis,  mas  transmitem  um  gene  que  causa  cegueira  nos
descendentes femininos.
O  tratamento  e  as  medidas  de  controle  de  miíases  nos  cães  e  nos  gatos  são  limitados.  Se  estas  larvas  forem
detectadas em pequenos animais, será necessária uma terapia imediata. Deve­se depilar o pelame para determinar a
extensão  da  lesão  e  remover  muitas  das  larvas.  A  remoção  das  larvas  de  bolsões  teciduais  profundos  pode  ser
difícil  e  pode  exigir  sedação  ou,  mesmo,  anestesia  do  animal.  Deve­se  examinar  a  lesão  em  dias  sucessivos;  as
moscas adultas põem ovos no ferimento em momentos diferentes e a eclosão das larvas pode não ser sincronizada.
Os  animais  deprimidos,  febris  e  prostrados  devem  ser  tratados  de  acordo  com  os  sinais  clínicos.  O  ideal  é  a
realização  de  cultura  e  antibiogramas  nas  amostras  ou  raspados  dos  ferimentos.  Encontrando­se  infecções
bacterianas ou fúngicas secundárias, aconselha­se a administração de antibióticos de largo espectro.
Com relação à prevenção, os proprietários devem ser instruídos sobre a efetividade do tratamento de todos os
ferimentos  cutâneos.  Os  animais  com  ferimentos  cutâneos  devem  ser  confinados  em  áreas  livres  de  moscas.  O
pelame  deve  ser  mantido  limpo  de  urina  e  fezes  e  não  se  deve  permitir  que  se  emaranhe.  Os  ferimentos
contaminados  e  os  pelos  emaranhados  emplastados  com  urina  e  fezes  atraem  rapidamente  moscas  adultas
produtoras  de  miíase.  O  controle  das  moscas  adultas  no  campo  e  a  destruição  dos  seus  locais  de  reprodução
constituem medidas preventivas excelentes. Todas as áreas não devem conter latas de lixo abertas e carcaças em
decomposição ou carniça.

 MOSCAS PRODUTORAS DE MIÍASES OBRIGATÓRIAS
Várias moscas dípteras produzem larvas que dão origem a um parasito e resultam em miíases obrigatórias. Apenas
uma mosca da América do Norte, Cochliomyia hominivorax, é invasora primária de ferimentos cutâneos recentes
não contaminados, em animais domésticos. Outra espécie de mosca de berne, Chrysomyia bezziana, é encontrada
na África e no sul da Ásia, inclusive Papua Nova Guiné.

Bernes em Pequenos Animais
As larvas das moscas do gênero Cuterebra são frequentemente denominadas de lobos, bernes, bernes dos coelhos
ou bernes dos roedores. Estas larvas de mosca infestam a pele de coelhos, esquilos, camundongos, ratos, esquilos
e,  ocasionalmente,  cães  e  gatos  (Ver  infestação  por  moscas  cuterebra  em  pequenos  animais,  p.  982,  para
informações sobre sintomas, diagnóstico e tratamento).

Mosca Varejeira Cinza
A  mosca  varejeira  cinza,  Wohlfahrtia  vigil,  é  responsável  pela  miíase  cutânea,  na  América  do  Norte,
particularmente  no  sul  do  Canadá  e  no  norte  dos  EUA.  As  moscas  adultas  foram  registradas  desde  os  estados
norte­americanos  da  Nova  Inglaterra  até  o  Alasca,  mas  a  maioria  dos  relatos  provém  das  seções  orientais  do
Canadá  e  das  vizinhanças  do  nordeste  dos  EUA.  Todos  os  relatos  de  infestações  ocorrem  na  pele  de  animais
saudáveis, particularmente na pele intacta dos jovens.
Todos  os  três  estágios  larvais  possuem  aparência  de  “larva  de  inseto”  e  espiráculos  posteriores  exclusivos  da
espécie. O primeiro estágio larval tem 1,5 mm ao eclodir e cresce até 3,5 mm no momento da sua muda para o
segundo  estágio.  O  terceiro  estágio  tem  7  a  18,5  mm  de  comprimento.  Sua  extremidade  posterior  é  estreita  e  é
coberta  por  muitas  fileiras  irregulares  de  espinhos  pequenos  que  possuem  pontas  escuras  e  se  orientam
posteriormente.  Esta  larva  é  mais  bem  adaptada  para  manter  a  fixação  em  tecidos  vivos.  Os  ganchos  orais  são
fortemente  desenvolvidos.  A  extremidade  posterior  da  larva  tem  sua  placa  espiracular  localizada  em  um  buraco
profundo, formado pelas margens do segmento. Os espiráculos posteriores têm fendas largas e peritremo forte.
A mosca varejeira cinza é larvípara – ela deposita as larvas em vez de ovos na pele saudável e não lesada dos
hospedeiros  adequados,  particularmente  dos  hospedeiros  suscetíveis,  particularmente  animais  jovens.  A  larva
penetra  na  pele  intacta  e  forma  um  inchaço  semelhante  a  um  furúnculo  (furuncular).  O  desenvolvimento  até  o
terceiro estágio larval infeccioso geralmente se completa em 9 a 14 dias. Os parasitos em seguida caem no chão, se
tornando  pupas,  cerca  de  11  a  18  dias,  variando  com  a  estação  do  ano  e  a  temperatura.  Quando  o  clima  frio  se
aproxima,  o  período  de  pupa  se  prolonga  muito.  Sob  condições  laboratoriais,  já  demorou  7  meses.  O  parasito
sobrevive no inverno na forma pupal. Os adultos saem da pupa e se acasalam depois de cerca de 3 a 4 dias. As
moscas  fêmeas  começam  sua  larviposição  cerca  de  1  semana  mais  tarde,  depositando  6  a  16  larvas  por  vez.  As
moscas fêmeas vivem por 35 a 40 dias; os machos raramente sobrevivem > 3 semanas.
PATOLOGIA:  As  fêmeas  de  W.  vigil  depositam  larvas  ativas  próximas  ou  diretamente  no  hospedeiro.  Embora  as
larvas geralmente penetrem na pele intacta, nos pequenos animais, a penetração pode ser mais profunda do que no
tecido dérmico, até na cavidade celômica.
A  primeira  indicação  de  que  um  animal  se  encontra  infestado  é  a  exsudação  de  soro  e  o  emaranhamento  do
pelame sobre o local de penetração. Nos animais de pele clara, uma área inflamatória pequena torna­se visível no
centro  ou  na  lateral,  onde  nota­se  um  pequeno  orifício.  Estas  lesões  podem  ser  palpadas  à  medida  que  se
desenvolvem. No terceiro ou quarto dia, as larvas têm 1,5 a 2 cm de comprimento e produzem lesões semelhantes
a abscessos, que lembram as lesões Hypoderma spp nos bovinos. Estas lesões variam em tamanho, forma, posição
e número de larvas que podem conter. O pelame fica frequentemente repartido sobre a parte superior das lesões e
revela uma abertura de 2 a 3 mm de diâmetro. A face posterior da larva fica visível por estas aberturas, através das
quais ela respira. Estas aberturas são geralmente circulares e bem definidas; no entanto, existindo várias larvas em
1 única lesão, a forma da abertura será bastante variável. Os pequenos animais infestados por = 5 larvas, por vários
dias, podem ficar emaciados e a pele pode ficar seca e perder o brilho.
A  penetração  das  larvas  na  pele,  o  desenvolvimento  no  tecido  subcutâneo  e  a  infecção  bacteriana  secundária
produzem irritação e inflamação intensas nos tecidos. As tentativas por parte do animal de remover as larvas ou
aliviar a irritação tendem a agravar a afecção. Os animais jovens podem morrer de exaustão. Também já se sugeriu
que  as  larvas  podem  produzir  secreções  tóxicas.  A  W.  vigil  já  foi  isolada  da  pele  de  crianças  jovens,
particularmente de bebês.
DIAGNÓSTICO:  As moscas varejeiras cinzas adultas não são parasitos e, como resultado, provavelmente não serão
observadas  pelo  proprietário  ou  pelo  veterinário.  Elas  são  moscas  acinzentadas  grandes  (cerca  de  13  mm  de
comprimento), com cerca de 2 vezes o tamanho da mosca doméstica. A superfície dorsal do tórax é marcada com 3
faixas longitudinais, enquanto a superfície dorsal do abdome tem 3 fileiras bem definidas de manchas pretas ovais,
que confluem entre si.
A  identificação  das  moscas  adultas  e  de  seus  estágios  larvais  associados  deve  ser  realizada  por  um
entomologista.  A  presença  de  inchaço  dérmico  com  abertura  central  pode  induzir  ao  diagnóstico  presuntivo  de
miíase por W. vigil. Só se pode fazer um diagnóstico definitivo depois da extração e identificação da larva típica.
Encontram­se disponíveis descrições e chaves dicotômicas extensas para os 3 estágios larvais. Frequentemente o
diagnóstico é feito por tentativa pelo histórico de residência ou viagem para uma área geográfica endêmica de W.
vigil.
TRATAMENTO E CONTROLE:  A larva deve ser extraída da pele. A aplicação de óleo cru, parafina líquida ou gel de
vaselina na abertura das lesões ocluirá as vias respiratórias das larvas. A aplicação de uma pequena quantidade de
clorofórmio ou éter na abertura pode ser útil, antes da remoção da larva com uma pinça. Também se pode injetar
cloridrato  de  lidocaína  no  interior  da  lesão  furuncular  para  facilitar  a  extração  da  larva.  Deve­se  tomar  grande
cuidado durante o processo de extração para evitar ruptura da larva no local, embora ainda não se tenha descrito
uma anafilaxia. Devem­se prescrever antibióticos.
Esse parasito geralmente infecta os visons jovens. Pode­se colocar 1 colher de chá de ronel na cama da caixa­
ninho como medida de controle; no entanto, não se deve utilizar esta substância na cama de filhotes com < 3 dias
de idade. Pode­se proporcionar proteção das gaiolas com o uso de uma tela aramada para manter as moscas para
fora.

Chrysomyia bezziana (Bicheira do Velho Mundo, Mosca oriental, Mosca varejeira de Bezzi)
Chrysomyia bezziana é encontrada na África, no subcontinente indiano e Sudeste Asiático, no norte de Taiwan, até
o sul de Papua­Nova Guiné. Esta mosca não é autóctone na Austrália. Por causa da sua distribuição geográfica, a
porta de entrada mais provável para C. bezziana nos EUA é pelo Havaí.
As  moscas  de  bicheira  adultas  geralmente  não  são  observadas  no  campo.  A  mosca  adulta  possui  um  corpo
verde­metálico­escuro,  com  segmentos  abdominais  com  faixas  estreitas  ao  longo  das  margens  posteriores.  As
pernas são pretas ou parcialmente marrons. A face é amarelo­alaranjada. O primeiro estágio larval provavelmente
passa  desapercebido  por  causa  de  seu  tamanho  pequeno,  até  3  mm  no  momento  da  sua  muda  para  o  segundo
estágio.  O  segundo  estágio  é  bastante  semelhante  ao  terceiro,  mas  tem  4  a  9  mm  de  comprimento.  A  larva  de
terceiro estágio é grande, com até 18 mm de comprimento. O corpo é composto de 12 segmentos, que possuem
faixas envolventes e largas de espinhos pequenos. Todos os 3 estágios têm uma aparência de “larva de inseto” e
possuem  espiráculos  posteriores  exclusivos  da  espécie.  A  extremidade  posterior  da  larva  tem  a  sua  placa
espiracular  localizada  em  uma  fenda  profunda  na  extremidade  do  oitavo  segmento  abdominal.  As  placas
espiraculares são grandes e bem­separadas. O peritremo e as 3 fendas respiratórias são amplos.
C. bezziana produz uma miíase particularmente terrível. As moscas fêmeas são atraídas pelos ferimentos abertos
no  homem  e  em  animais  domésticos  e  silvestres.  Elas  põem  seus  ovos  em  massas  de  150  a  500  na  borda  dos
ferimentos ou próximo de orifícios corporais. As larvas se desenvolvem até o terceiro estágio em cerca de 2 dias
depois  da  sua  eclosão.  Elas  escavam  profundamente  no  interior  do  ferimento,  de  forma  que  só  as  suas
extremidades posteriores ficam visíveis. O estágio larval inteiro dura 5 a 6 dias. O estágio de pupa dura 7 a 9 dias
em condições tropicais e mais tempo em condições mais frias. As moscas adultas saem das pupas posteriormente
para se acasalar, localizar um novo hospedeiro e continuar o ciclo. As moscas fêmeas se acasalam somente 1 vez
durante a sua vida – um fato preponderante na prevenção e no controle. Sob condições favoráveis, podem ocorrer
= 8 gerações por ano.
PATOLOGIA:   As  larvas  de  C.  bezziana  são  parasitos  obrigatórios  de  ferimentos,  e  nunca  se  desenvolvem  em
carcaças ou material orgânico em decomposição. Embora as moscas fêmeas sejam atraídas por ferimentos abertos,
ocasionalmente  põem  ovos  na  pele  macia  e  intacta  de  várias  partes  do  corpo,  especialmente  se  esta  estiver
contaminada com sangue ou secreção mucosa. Quando as larvas eclodem, elas escavam o hospedeiro, utilizando
suas  peças  bucais  com  ganchos  para  retirar  os  tecidos  e  lacerar  os  vasos  sanguíneos  finos.  As  larvas  são
hematófagas  vorazes.  Durante  a  fase  hematófaga,  só  as  extremidades  caudais  das  larvas,  com  seus  peritremos
enegrecidos, permanecem visíveis na superfície da lesão, permitindo que as larvas respirem. Em alguns ferimentos,
observam­se até 300 larvas. Nos ferimentos não tratados, a atividade destrutiva das larvas pode levar à morte do
animal em período bastante curto. Uma infestação secundária com moscas produtoras de miíases facultativas (ver
p. 1002) pode complicar o tratamento e o controle.
DIAGNÓSTICO:  Raramente a identificação das moscas adultas são observadas e a sua associação com os estágios
larvais  é  melhor  realizada  por  um  entomologista.  Só  se  consegue  fazer  um  diagnóstico  definitivo  depois  da
observação, extração e identificação das larvas típicas. Geralmente, o diagnóstico pode ser realizado com base em
um  histórico  de  viagem  a  uma  área  endêmica  para  C.  bezziana.  Presumindo­se  que  um  ferimento  se  encontre
infestado  por  larvas  de  C.  bezziana,  devem–se  coletar  amostras  e  enviá­las  para  funcionários  apropriados  de
erradicação.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   O  tratamento  da  bicheira  envolve  a  morte  das  larvas  nas  lesões,  promoção  da
cicatrização e evitar reinfestação secundária com larvas das moscas produtoras de miíases facultativas. A extensão
das lesões é determinada pela depilação da área e remoção de tantas larvas quanto possível. As larvas removidas
devem  ser  mortas  para  evitar  que  pupem  e  se  desenvolvam  em  moscas  adultas.  As  larvas  localizadas
profundamente dentro dos tecidos devem ser extraídas.
A ivermectina, em doses de 50, 100 e 300 μg/kg, administrada nos bovinos infestados, resultou em mortalidade
de  100%  das  larvas  por,  pelo  menos,  6,  12  e  14  dias,  respectivamente.  Dependendo  da  idade,  as  larvas
sobreviveram  em  ataques  estabelecidos  depois  do  tratamento  com  200  μg/kg.  A  mortalidade  foi  de  100%  nas
larvas  com  até  2  dias  de  idade,  porém  foi  menor  nas  larvas  mais  velhas.  No  entanto,  muitas  das  larvas  que
sobreviveram  à  terapia  com  ivermectina  falharam  em  se  desenvolver  para  o  estágio  adulto.  Depois  de  um
tratamento com 200 μg/kg, a proteção residual durou 16 a 20 dias, 2 a 3 vezes a da maioria dos emplastros com
inseticidas.
Devem­se realizar curativos apropriados em todos os ferimentos dos animais domésticos e também evitar todos
os procedimentos cirúrgicos eletivos durante a estação das moscas.
É importante considerar o fato de que as moscas fêmeas só se acasalam 1 vez durante sua vida para o controle
de C. bezziana. As pupas das moscas expostas à irradiação originam adultos estéreis, que podem ser liberados para
acasalar com moscas machos e fêmeas silvestres. Como resultado disso, não se produz nenhum descendente viável
no ambiente silvestre.

Cochliomyia hominivorax (Bicheira primária, Bicheira do Novo Mundo)
A  Cochliomyia  hominivorax  se  distribui  por  todas  as  regiões  neoárticas  e  neotropicais  do  hemisfério  ocidental.
Como resultado de intensos programas de erradicação estaduais, federais e internacionais, não se encontram mais
populações  sobreviventes  de  C.  hominivorax  nos  EUA  ou  no  México;  os  relatos  isolados  com  frequência  são
rastreados  até  uma  importação  de  animais  infestados  de  locais  onde  a  mosca  ainda  é  prevalente.  Encontram­se
populações sobreviventes nas Américas Central e do Sul e em determinadas ilhas do Caribe.
As moscas fêmeas adultas põem 200 a 400 ovos em fileiras que se sobrepõem como telhas em uma massa na
borda  de  um  ferimento  fresco.  Depois  de  12  a  21  h,  as  larvas  eclodem,  rastejam  para  o  interior  do  ferimento  e
escavam a musculatura. As larvas se alimentam dos fluidos dos ferimentos e de tecidos vivos. Após 5 a 7 dias, as
larvas crescem e saem dos ferimentos, caem no solo e se enterram para se tornarem pupas. O período de pupa varia
de 7 dias a 2 meses, dependendo da temperatura. O congelamento ou a manutenção das temperaturas do solo < 8°C
matam as pupas. Os adultos só se reproduzem 1 vez durante a vida, um fato que é utilizado no controle biológico.
Eles geralmente se acasalam quando têm 3 a 4 dias de idade e as fêmeas grávidas ficam prontas para ovipor com
cerca de 6 dias de idade. Em um tempo quente, o ciclo de vida pode­se completar em 21 dias. Só as moscas fêmeas
se alimentam e ovipõem nos ferimentos; os machos e as fêmeas virgens mais jovens se reúnem para acasalar na
vegetação, especialmente em florescimento.
PATOLOGIA:  Os ferimentos recém­infectados contêm larvas de mosca de bicheira de uma única idade; os ferimentos
maiores e mais velhos podem conter larvas de várias idades e de espécies de moscas diferentes. O fluido marrom­
avermelhado e fétido produzido no ferimento geralmente drena e pode corar os pelos ou a lã ao redor ou abaixo do
ferimento. À medida  que  o  incômodo  aumenta,  o  animal  infestado  procura  proteção, retirando­se para a sombra
mais densa disponível. Mesmo um ferimento pequeno e relativamente insignificante infestado por larvas de mosca
de  bicheira  atrai  não  somente  mais  destas  moscas  como  também  moscas  produtoras  de  miíases  facultativas.  Os
tecidos  necrosados  atraem  ainda  mais  moscas.  O  ferimento  pode  aumentar  gradualmente  por  causa  de  uma
infestação múltipla e, a menos que seja tratado, geralmente resulta na morte do animal.
DIAGNÓSTICO:  As larvas parasitárias são afiladas e possuem ganchos orais na extremidade estreita e espiráculos
respiratórios na extremidade larga. Os segmentos corporais são anelados com espinhos. As larvas com crescimento
completo podem alcançar 1,5 cm. Elas são frequentemente identificadas pela forma e aparência de “parafuso de
madeira” e podem ser distinguidas das larvas das moscas produtoras de miíases facultativas pelos tubos traqueais
pigmentados de escuro na face dorsal da extremidade posterior da larva de terceiro estágio. Esses tubos podem ser
visualizados facilmente através da cutícula larval.
As  moscas  de  bicheira  adultas  são  semelhantes  em  aparência  a  outras  moscas  varejeiras.  Elas  são  azuladas  a
verde­azuladas, possuem cabeça e olhos laranja­avermelhados e são ligeiramente maiores que a mosca doméstica.
São  difíceis  de  distinguir  das  outras  moscas  varejeiras  ou  das  garrafas.  A  identificação  das  moscas  de  bicheira
adultas provavelmente é melhor realizada por um entomologista.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Uma infestação de bicheira deve ser relatada às autoridades estaduais e federais. C.
hominivorax foi erradicada dos EUA, mas, às vezes, entra no país de modo sub­reptício em animais importados.
Nos  EUA,  suspeitando­se  de  um  ferimento  estar  infestado  por  larvas  de  bicheira,  deve­se  contactar  o  USDA
no http://www.aphis.usda.gov/index.shml.
As  bicheiras  nos  ferimentos  podem  ser  mortas  com  a  aplicação  direta  de  um  curativo  de  ferimento  chamado
“emplastro”. Tais emplastros, que contêm lindano ou ronel, podem ser difíceis de encontrar nos EUA, por causa do
programa de erradicação. Os emplastros são mais bem aplicados com um pincel de 2,5 cm e devem atingir todos os
muitos bolsões formados pelas larvas escavadoras nos ferimentos profundos. Também se deve aplicar uma camada
fina  na  pele  circundante,  para  protegê­la  de  uma  reinfestação.  Os  ferimentos  também  podem  ser  tratados  com
formulações em aerossol, pó ou espuma de cumafós, lindano ou ronnel. Como medida preventiva para proteger os
animais  de  uma  infestação  e  também  matar  as  larvas  nos  pequenos  ferimentos  difíceis  de  detectar,  os  animais
podem ser borrifados completamente com ronnel ou com cumafós, ou imersos neste último.
PROGRAMA DE ERRADICAÇÃO COM LIBERAÇÃO DE MACHOS ESTÉREIS:  Em 1958, o USDA iniciou um programa
nos  estados  do  sudeste  para  eliminar  a  bicheira  pela  técnica  de  liberação  de  machos  estéreis.  Quando  criadas
artificialmente  e  expostas  à  irradiação  pouco  antes  de  saírem  das  pupas,  as  moscas  machos  ficam  estéreis,  mas
permanecem  capazes  de  acasalar.  As  fêmeas  se  acasalam  somente  1  vez  e,  quando  acasaladas  com  um  macho
estéril,  põem  ovos  que  não  eclodem.  Portanto,  a  liberação  de  um  número  suficiente  de  machos  estéreis  em  uma
área por um período leva à erradicação. Em 1959, a bicheira já tinha sido erradicada do estado da Flórida.
Este programa foi expandido para cobrir o restante da área envolvida nos EUA e depois, por um acordo conjunto
México/EUA,  para  incluir  a  maior  parte  do  México.  Isso,  junto  com  o  uso  de  agentes  atraentes  de  moscas  de
bicheira e de um sistema de inseticidas que atraíam e matavam os adultos, estabeleceu a erradicação da bicheira no
México. Há interesse na expansão desta área por toda a América Central e o Caribe. No entanto, até que se atinja
tal objetivo, torna–se necessária uma vigilância constante por parte de todas as pessoas que lidam com animais no
sul  dos  EUA  e  no  México,  para  detectar  rapidamente  uma  infestação  e  erradicá­la  antes  das  moscas  se
reproduzirem e se disseminarem.

Mosca Tumbu Africana (Mosca das mangas, Mosca das larvas cutâneas, Verme de Cayor)
A  mosca  tumbu  africana,  Cordylobia  anthropophaga,  é  responsável  por  outra  miíase  semelhante  a  furúnculos
(furuncular) tanto no homem como nos animais na África, particularmente na região subsaariana.
As moscas adultas não são parasitos, portanto não são observadas pelo proprietário ou pelo veterinário. Tratam­
se  de  moscas  compactas  e  robustas,  que  possuem  6  a  12  mm  de  comprimento.  Elas  são  marron­claras,  com
manchas cinza­azuladas difusas no tórax e coloração cinza­escura na parte posterior do abdome. Possuem face e
pernas amarelas. As larvas de segundo e terceiro estágios são os estágios geralmente observados na pele do animal.
A  larva  de  segundo  estágio  tem  uma  forma  parecida  com  um  bastão  e  exibe  espinhos  cuticulares  pretos  e
grandes, orientados posteriormente e distribuídos de modo irregular pelos segmentos 3 a 8. Os segmentos 9 a 11
são  quase  nus  em  comparação  com  os  segmentos  precedentes.  Os  segmentos  têm  algumas  fileiras  de  espinhos
pálidos  e  pequenos,  posteriormente.  O  segmento  12  é  densamente  coberto  por  esses  espinhos.  O  segmento  13  é
indistintamente demarcado, não possuindo espinhos, porém 2 pares de processos curtos. Cada tubo traqueal se abre
através de 2 fendas ligeiramente encurvadas. A larva de segundo estágio possui 2,5 a 4 mm de comprimento. O
tamanho  da  larva  de  segundo  estágio  avançada  varia  muito,  assim  como  o  da  larva  de  terceiro  estágio.  A  larva
completamente madura tem 1,3 a 1,5 cm de comprimento. O corpo é cilíndrico, com 12 segmentos identificáveis.
Os espinhos curvos direcionados posteriormente se dispõem densamente pelo menos até o segmento 7; os últimos
5 segmentos podem ser cobertos parcial ou densamente com espinhos.
Depois da fertilização, a mosca­fêmea produz 100 a 500 ovos em forma de banana, geralmente depositando­os
em  solo  arenoso,  sombreado  e  seco,  frequentemente  contaminado  com  urina  ou  fezes.  Os  ovos  nunca
são depositados na pele do hospedeiro. Eles eclodem após 1 a 3 dias, e as larvas têm inicialmente 0,5 a 1 mm de
comprimento.  As  larvas  conseguem  sobreviver  por  até  15  dias  enquanto  esperam  pelo  hospedeiro  e  podem
penetrar em apenas 25 segundos. Depois da penetração, a larva reside em uma cavidade na derme e hipoderme.
Esta cavidade se comunica com o ambiente externo por meio de um poro respiratório central, que corresponde à
extremidade  caudal  da  larva  com  seus  espiráculos.  Há  1  larva  única  em  cada  cavidade,  dentro  da  qual  ela  se
desenvolve  até  o  segundo  e  o  terceiro  estágios.  As  larvas  requerem  7  a  15  dias  para  amadurecer  e  depois  saem
através do poro respiratório e caem no solo, onde se tornam pupas. As moscas adultas saem das pupas 10 a 20 dias
depois e o ciclo começa novamente.
Os  ratos  e  os  cães  constituem  os  hospedeiros  definitivos  comuns;  no  entanto,  podem  ser  infestados  humanos,
camundongos,  macacos,  mangustos,  esquilos,  leopardos,  javalis,  antílopes,  gatos,  caprinos,  suínos,  coelhos,
cobaias e galinhas.
PATOLOGIA:  Clinicamente, a infestação se caracteriza por uma pápula eritematosa pequena, que aparece 2 a 3 dias
depois da penetração larval. Dentro de dias, a pápula aumenta até que se torna um nódulo que se assemelha a um
furúnculo; justificando a descrição de miíase furunculoide. No centro do nódulo, encontra­se um poro através do
qual escoa fluido seroso. Esse fluido pode ser hemorrágico ou purulento e contém fezes larvais.
Os cães com pele macia e fina parecem ser hospedeiros mais adequados para o desenvolvimento larval que os de
pele espessa. Nos animais, os locais de infestação preferenciais são patas, genitais, cauda e região axilar. Nas áreas
endêmicas,  as  infestações  leves  em  cães  não  produzem  um  desconforto  clínico.  A  infestação  maciça  pode
promover inchaço e edema acentuados, especialmente se as larvas se encontrarem bem próximas entre si. As larvas
podem penetrar profundamente nos tecidos e causar danos consideráveis e mesmo morte.
DIAGNÓSTICO:  A presença de inchaço dérmico com uma abertura central pode levar ao diagnóstico por tentativa
de  miíase  causada  por  C.  anthropophaga.  Só  se  pode  fazer  o  diagnóstico  definitivo  depois  da  extração  e
identificação da larva característica. A identificação das moscas adultas e de seus estágios larvais associados deve
ser deixada para um entomologista.
Pode­se,  com  frequência,  fazer  um  diagnóstico  por  tentativa  pelo  histórico  de  residência  ou  viagem  para  uma
área geográfica endêmica para C. anthropophaga.  No  entanto,  o  parasito  já  foi  diagnosticado  em  viajantes  e  em
seus animais de estimação acompanhantes provenientes de áreas geográficas nas quais o parasito não existe.
TRATAMENTO  E  CONTROLE:   Podem­se  remover  as  larvas  cobrindo­se  o  poro  respiratório  com  um  composto
viscoso  e  espesso,  como  óleo  cru,  parafina  líquida,  esparadrapo  ou  vaselina.  Tampando­se  o  poro,  a  larva  fica
hipóxica e deixa a cavidade à procura de oxigênio. Uma leve pressão na borda da lesão também auxilia na remoção
da larva.
Pode­se injetar cloridrato de lidocaína, no interior da lesão furuncular, para facilitar a extração da larva com uma
pinça­mosquito.  A  excisão  cirúrgica  geralmente  é  desnecessária  e  não  se  justifica  enquanto  as  larvas  se
encontrarem  vivas,  mas  deverá  ser  utilizada  para  remover  as  larvas  mortas  ou  em  decomposição.  Deve­se  ter
grande  cuidado  durante  o  processo  de  extração  para  evitar  ruptura  da  larva  no  local,  embora  ainda  não  se  tenha
descrito uma anafilaxia. Devem­se prescrever antibióticos.
As moscas adultas devem ser mortas se forem observadas dentro de casa. Deve­se remover e destruir as larvas
dos animais que entram na casa. Todos os ratos devem ser mortos e queimados. A prevenção de uma infestação
depende  da  limpeza  e  desinfecção  regular  dos  locais  de  dormir  do  animal.  No  caso  de  animais  valiosos  (p.  ex.,
coelhos  da  Angorá),  pode­se  proporcionar  proteção  por  meio  da  manutenção  das  moscas  fora  dos  cercados  de
coelhos, utilizando uma tela aramada.
Como a mosca­fêmea adulta deposita seus ovos em solo arenoso, contaminado com fezes ou urina, o parasito
pode ser controlado no ambiente do animal de estimação por meio da remoção imediata de suas fezes e cobertura
dos locais de micção nas instalações com uma camada de cascalho.

 PSEUDOMIÍASE
Na pseudomiíase, as larvas dos dípteros são ingeridas acidentalmente e se encontram no trato gastrintestinal de um
animal, onde não são capazes de continuar seu desenvolvimento. Os cães ou gatos infestados por larvas de moscas
produtoras  de  miíases  facultativas  em  ferimentos  ou  em  seu  pelame  geralmente  ingerem  as  larvas  durante  os
processos de lambedura ou higiene. Estas larvas passam através do trato gastrintestinal e aparecem não digeridas
nas fezes. Também pode ocorrer eliminação de larvas de dípteros nas fezes, quando um cão ou gato errante ingere
carniça que contém larvas de insetos; estas larvas passam para o meio ambiente externo não digeridas.
Pseudomiíase também pode ocorrer se as fezes submetidas ao exame coproparasitológico não estiverem frescas.
Moscas adultas produtoras de miíases facultativas podem depositar seus ovos nas fezes e o desenvolvimento larval
se inicia.
Pode­se observar Eristalis tenax, a “larva de inseto de cauda­de­rato”, em calhas atrás de vacas em um estábulo
leiteiro. Estas larvas estão associadas a fezes líquidas e fezes que não foram removidas do ambiente. As larvas são
assim conhecidas por causa de seus poros respiratórios notados na ponta de um longo tubo respiratório semelhante
a um sifão, na porção final dos seus corpos. Muitos fazendeiros erroneamente supõem que as vacas defecam estas
larvas. As adultas são moscas de vida livre e não são parasitos.

PIOLHOS (Pediculose)

Várias  espécies  de  piolhos  mastigadores  ou  mordedores  (ordem  Mallophaga)  e  piolhos  sugadores  (ordem
Anoplura) são ectoparasitas obrigatórios dos animais domésticos. Muitos autores incluem os piolhos mastigadores
e  sugadores  na  ordem  Phthiraptera.  Os  piolhos  vivem  em  um  microambiente  provido  pela  pele  e  seus  pelos  ou
penas,  e  são  transmitidos  principalmente  por  contato  entre  hospedeiros.  Em  regiões  temperadas,  os  piolhos  são
mais abundantes durante os meses mais frios e, em geral, dificilmente são encontrados no verão. Os piolhos são
amplamente  hospedeiro­específicos,  vivendo  em  uma  espécie  ou  em  várias  espécies  intimamente  relacionadas.
Anoplura  parasitam  apenas  mamíferos,  no  entanto,  Mallophaga  infestam  tanto  mamíferos  quanto  aves  (ver  p.
2954).
ETIOLOGIA:  Os piolhos são insetos sem asas, achatados, e, em geral, com 2 a 4 mm de comprimento. As garras das
patas  são  adaptadas  para  agarrarem  e  se  moverem  entre  os  pelos  ou  penas.  Os  Mallophaga  têm  mandíbulas
mastigadoras  ventrais  e  se  alimentam  de  debris  da  epiderme,  principalmente  caspa,  secreções  e  descamações
cutâneas. O aparelho bucal também ajuda na fixação ao hospedeiro. A cabeça dos Mallophaga é mais larga que o
protórax.  Anoplura  são  hematófagos  e,  quando  seu  aparelho  bucal  não  está  em  uso,  os  estiletes  bucais  ficam
retraídos na cabeça.
Os ovos dos piolhos ou lêndeas são colados nos pelos dos hospedeiros mamíferos, próximos à superfície da pele,
e são pálidos, translúcidos e subovais. Os três estágios de ninfa, de tamanho crescente, são menores que os adultos,
porém assemelham­se a eles quanto aos hábitos e a aparência. São necessárias, aproximadamente, 3 a 4 semanas
para completar uma geração, porém, isso varia com a espécie.
Em climas temperados, os bovinos podem ser infestados com uma espécie de Mallophaga, o piolho mordedor
dos bovinos, Damalinia bovis, e por três espécies de Anoplura: o piolho de nariz longo dos bovinos, Linognathus
vituli;  o  piolho  azul  pequeno  dos  bovinos,  Solenopotes  capillatus;  e  o  piolho  de  nariz  curto  dos  bovinos,
o  Haematopinus  eurysternus.  A  infestação  por  múltiplas  espécies  não  é  incomum  em  bovinos,  em  especial  em
animais  jovens.  O  piolho  mordedor  de  bovinos  pode  ser  encontrado  na  linha  dorsal,  em  especial  na  região  da
cernelha, estendendo­se para a cabeça e base da cauda. O piolho azul pequeno dos bovinos é encontrado em locais
distintos, principalmente na cabeça e face, estendendo­se para a região da barbela em infestações pesadas. O piolho
de nariz curto dos bovinos é encontrado na metade anterior do hospedeiro, das orelhas à barbela e, em períodos de
clima  quente,  tende  à  maior  infestação  nas  porções  anteriores  do  corpo,  incluindo  as  orelhas.  O  piolho  de  nariz
longo  dos  bovinos  é  encontrado  amplamente  no  corpo  do  animal,  com  frequência  entre  as  outras  espécies.  No
início da infestação, eles podem ser encontrados em agrupamentos. Em infestações pesadas, essa espécie pode ser
encontrada em quase todo o corpo.
Haematopinus quadripertusus, o piolho da cauda dos bovinos, é um piolho tropical, sugador, que possui ampla
distribuição  em  áreas  subtropicais  (Califórnia,  Flórida  e  Costa  do  Golfo  nos  EUA).  Os  adultos  e  os  ovos  são
encontrados na vassoura da cauda; as ninfas podem ser encontradas em outras partes do corpo, incluindo o períneo
e a vulva. O piolho da cauda dos bovinos é conhecido por parasitar tanto raças europeias quanto zebuínas.
Haematopinus tuberculatus, o piolho dos búfalos aquáticos asiáticos, parece ter sido transferido aos bovinos em
várias partes do mundo, e é capaz de se manter em bovinos em clima tropical. Esses piolhos, normalmente, são
encontrados na região posterior e nos membros pélvicos, embora os ovos, em geral, sejam depositados no pescoço,
ombros e membros torácicos do hospedeiro.
Equinos e burros podem ser infestados por duas espécies de piolhos, Haematopinus asini, o piolho sugador do
equino,  e  Damalinia  equi,  o  piolho  mordedor  do  equino.  Ambas  as  espécies  possuem  distribuição  mundial.
Normalmente, o H. asini é encontrado nas raízes dos pelos do topete e da crina, ao redor da base da cauda e nos
pelos logo acima dos cascos. D. equi prefere fazer a oviposição nos pelos mais finos do corpo e é encontrado na
lateral do pescoço, no flanco e na base da cauda.
Os suínos domésticos são infestados por apenas uma espécie de piolho, Haematopinus suis, o piolho do porco.
Esse piolho sugador muito grande (5 a 6 mm) é comum em porcos domésticos em todo o mundo. As ninfas dos
piolhos, normalmente, são encontradas no interior das orelhas – com frequência profundamente, na pele atrás das
orelhas, nas pregas do pescoço, na parte interna das pernas e na parte interna dos flancos. Todos os estágios podem
ser encontrados abaixo da descamação da pele, em qualquer parte do corpo.
Os ovinos podem ser infestados com o piolho mordedor dos ovinos, Damalinia ovis, e três espécies de piolhos
sugadores: o piolho sugador do pé, Linognathus pedalis; o piolho da face e do corpo, L. ovillus;  e  o  piolho  azul
africano, L. africanus. Fora dos EUA, o D. ovis também é conhecido como piolho do corpo dos ovinos. O piolho
do pé dos ovinos é assim denominado, pois exceto em infestações muito pesadas, fica restrito às partes das patas
que têm pelos. O piolho da face, em geral, é encontrado em partes da pele dos ovinos com muitos pelos e, com o
aumento  da  população,  os  piolhos  se  espalham  para  outras  partes  do  corpo.  O  L.  africanus,  em  geral,  forma
agrupamentos,  com  frequência  no  flanco  de  ovelhas.  A  queda  da  lã  é  comum.  O L.  africanus  também  tem  sido
relatado em uma variedade de hospedeiros, incluindo cabras e várias espécies de veados.
Linognathus stenopsis, o piolho sugador dos caprinos, é encontrado tanto em raças de pelos curtos quanto em
Angorás.  Em  várias  partes  do  mundo,  também  foi  relatado  em  ovinos.  É  encontrado  com  maior  frequência  nas
áreas  dos  membros  pélvicos  e  dorso  que  apresentam  pelos  longos.  Infestações  pesadas  são  raras.  Damalinia
caprae, o piolho mordedor dos caprinos, é encontrado com maior frequência em caprinos de pelos curtos. Tanto
o D. crassipes quanto D. limbata (o piolho mordedor do Angorá) são sérios parasitos da raça Angorá.
Piolho picador dos bovinos, Damalinia bovis, na pele. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

Piolho sugador dos equinos, Haematopinus asini. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

Os  cães  ocasionalmente  são  infestados  com  Linognathus  setosus  (piolho  sugador  dos  cães),  Trichodectes
canis (piolho mordedor de cães) e, raramente, com Heterodoxus spiniger,  outra espécie de piolho  mastigador.  L.
setosus e T. canis também parasitam uma variedade de canídeos selvagens. Os cães que são negligenciados ou que
não  estão  saudáveis  apresentam  infestações  mais  pesadas  por  L.  setosus,  que  tende  a  preferir  raças  de  pelos
longos. T. canis prefere a cabeça, pescoço e cauda do hospedeiro, e é encontrado principalmente ao redor de feridas
e aberturas corporais. As infestações do piolho mordedor dos cães podem ser pesadas em animais muito jovens ou
muito  idosos.  Os  animais  infestados  se  coçam,  mordem  e  arranham  a  área  afetada  e  têm  pelame  grosso  e
emaranhado. T. canis atua como hospedeiro intermediário do cestódeo Dipylidium caninum, um parasito de cães,
gatos, raposas e, ocasionalmente, pessoas. H. spiniger, originalmente um parasito de marsupiais que foi transferido
ao dingo e então ao cão doméstico, é considerado raro na América do Norte. Embora de distribuição mundial, ele
parece ser mais comum em ambientes mais quentes e promove infestações mais pesadas em animais com condição
física  ruim.  H.  spiniger  também  é  um  hospedeiro  intermediário  de  D.  caninum  e  da  filária  Dipetalonema
reconditum.
O piolho Felicola subrostrata é  um  piolho  mastigador  que,  ocasionalmente,  parasito  gatos.  Os  piolhos  podem
ser  vistos  com  maior  frequência  em  gatos  mais  velhos,  de  pelos  longos,  que  não  são  capazes  de  se  higienizar
adequadamente.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  DIAGNÓSTICO:   A  pediculose  manifesta­se  por  prurido  e  irritação  dérmica  que  resulta  em
prurido,  fricção  e  mordedura  das  áreas  infestadas.  Comumente  verifica­se  aparência  definhada,  pelame  áspero  e
menor  produtividade  em  animais  de  fazenda.  Em  infestações  graves,  pode  haver  perda  de  pelos  e  escarificação
local.  Infestações  extremas  por  piolhos  sugadores  podem  causar  anemia.  Em  ovelhas  e  cabras,  o  prurido  e  a
fricção, com frequência, resultam em quebra das fibras dos pelos, o que confere à lã uma aparência de “arrancada”.
Em cães, a pelagem torna­se áspera e seca e, se a infestação for grande, os pelos podem estar emaranhados. Os
piolhos sugadores causam feridas pequenas que podem se tornar infectadas. O rastejar e as perfurações ou picadas
constantes da pele causam nervosismo no hospedeiro.
O  diagnóstico  baseia­se  na  presença  do  piolho.  O  pelo  deve  ser  repartido  e  a  pele  e  a  porção  proximal  da
pelagem devem ser examinadas cuidadosamente com uma luz, se o exame for conduzido em um espaço fechado.
Os pelos dos grandes animais devem ser repartidos na face, pescoço, orelhas, linha dorsal, barbela, anca, base da
cauda  e  vassoura  da  cauda.  Cabeça,  pernas,  patas  e  escroto  não  devem  ser  negligenciados,  em  particular  em
ovinos.  Em  pequenos  animais,  os  ovos  são  observados  prontamente.  Ocasionalmente,  quando  a  pelagem  está
emaranhada, os piolhos podem ser vistos ao separar a massa conjunta. Os piolhos mordedores são ativos e podem
ser observados se movimentando através dos pelos. Os piolhos sugadores, em geral, se movem mais lentamente e,
com frequência, seu aparelho bucal está inserido na pele.
Piolho sugador de cães, Linognathus setosus. Fêmea, acima, e macho, abaixo. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

A pediculose em animais de produção é mais prevalente durante o inverno; a gravidade é amplamente reduzida
com a chegada do verão. As infestações, tanto por piolhos mastigadores quanto por sugadores, podem ser graves.
Em rebanhos leiteiros, os bovinos jovens, as vacas secas e os touros podem escapar do diagnóstico precoce e sofrer
mais  gravemente.  Os  bezerros  jovens  podem  morrer  e  as  vacas  gestantes  podem  abortar.  O  tratamento  efetivo
resulta em melhora imediata.
A transmissão, em geral, ocorre pelo contato com o hospedeiro. O piolho que cai ou é retirado do hospedeiro
morre  em  poucos  dias,  porém  as  lêndeas  retiradas  podem  continuar  a  eclodir  por  2  a  3  semanas  se  o  clima  for
quente.  Além  disso,  instalações  desocupadas  recentemente  que  continham  bovinos  infestado  devem  ser
desinfetadas antes do uso por bovinos livre da infestação.
TRATAMENTO:  O controle de piolhos requer tratamento com inseticidas ou medicamentos efetivos (ver p. 2696 e p.
2657). Os produtos que podem ser utilizados são regulamentados pelo governo e quem utilizá­los deve ler e seguir
os  rótulos.  O  registro  de  vários  produtos  que  foram  listados  no  passado,  em  especial  algumas  formulações  de
organofosforados, foi cancelado e esses produtos não estão mais disponíveis legalmente para venda nos EUA. É
possível  que  alguns  produtos  que  ainda  estão  disponíveis  não  estejam  inclusos  na  discussão  a  seguir.  É
responsabilidade  do  usuário  assegurar  que  um  tratamento  particular  não  tenha  sido  cancelado.  As  formulações
classificadas  como  de  uso  restrito,  podem  ser  compradas  e  utilizadas  apenas  por  aplicadores  certificados  ou  por
pessoas sob supervisão direta. Precauções presentes nos rótulos a respeito da idade e raça do animal e frequência
de  tratamento  devem  ser  observadas.  Alguns  rótulos  de  produtos  indicam  a  reaplicação  em  duas  semanas  para
controlar uma infestação particularmente refratária.
Poucos compostos podem ser aplicados como spray em todo o corpo para controle dos piolhos. A aplicação leve
e fina de algumas formulações pode ser efetiva, enquanto outras podem requerer o embebimento dos pelos e da
pele.
A tolerância nula a muito baixa de resíduos de pesticidas no leite limita a utilização de inseticidas em vacas e
cabras leiteiras. O spray de permetrina pode ser aplicado nesses animais para controle dos piolhos. Além disso, os
bovinos  leiteiros  podem  ser  submetidos  à  aspersão  de  permetrina  potencializada  com  butóxido  de  piperonila
(PBO), cumafós, tetraclorvinfós, tetraclorvinfós mais diclorvós e amitraz. Alguns produtos aprovados para bovinos
de corte podem ser utilizados em bovinos de leite que ainda não chegou à idade reprodutiva. O período de carência
apropriado para o leite deve ser observado nesses animais. Bovinos de corte, ovinos e suínos podem ser aspergidos
com cumafós ou permetrina. Sprays de amitraz, fosmet e tetraclorvinfós podem ser utilizados em bovinos de corte
e suínos. A permetrina potencializada com PBO, spinosad, tetraclorvinfós e tetraclorvinfós com diclorvós podem
ser aplicados tanto em bovinos de corte quanto de leite. O spray de permetrina com PBO é aprovado para controle
de piolhos em ovinos. Equinos podem ser tratados com spray de permetrina ou de piretrina.
Em razão da facilidade de aplicação e do menor estresse ao animal tratado, o método pour­on se tornou um meio
de aplicação popular para uma variedade de inseticidas para o controle de piolhos, tanto sistêmicos quanto locais.
Bovinos  de  corte,  vacas  lactantes  ou  não,  ovinos,  suínos  e  cabras  não  lactantes  podem  ser  tratados  com
formulações pour­on de permetrina para controle de piolhos. Com frequência, a permetrina é potencializada com
PBO.  Formulações  tópicas  de  permetrina,  permetrina  com  diflubenzuron  e  piretrinas  estão  disponíveis  para
controle  de  piolhos  em  equinos.  Uma  vez  que  o  percentual  de  ingrediente  ativo  nas  formulações  pour­on
comerciais varia de 1 a 10%, é importante que a formulação seja aprovada para os animais tratados. Um pour­on
de permetrina com PBO também está disponível para controle de piolhos em bovinos de corte, vacas lactantes e
não lactantes e ovinos. Ciflutrina pour­on, permetrina com diflubenzuron e spinosad pour­on são  aprovados  para
bovinos de corte e bovinos de leite lactante ou não, mas a ?­cialotrina é aprovada apenas para bovinos de corte. O
amitraz pour­on é aprovado para uso em suínos.
Vários  compostos  antiparasitários  sistêmicos,  as  lactonas  macrocíclicas,  estão  disponíveis  como  formulações
pour­on para o controle dos piolhos nos bovinos, bem como uma variedade de outros parasitos internos e externos.
Uma  vez  que  esses  produtos  também  controlam  bernes  de  bovinos,  precauções  devem  ser  tomadas  para  evitar
reação  parasito­hospedeiro  (ver  p.  983).  Formulações  pour­on  de  doramectina,  eprinomectina,  ivermectina  e
moxidectina  são  efetivas  contra  os  piolhos  mastigadores  e  sugadores  de  bovinos  de  corte.  As  vacas  leiteiras  em
lactação  podem  ser  tratadas  com  eprinomectina  e  moxidectina  pour­on.  Fora  isso,  o  uso  de  medicamentos
sistêmicos para o controle de piolhos é proibido em animais produtores de leite em idade reprodutiva. Doramectina
e  ivermectina  também  estão  disponíveis  em  formulações  injetáveis,  e  a  ivermectina  está  disponível  como  pasta
oral;  no  entanto  elas  são  menos  efetivas  contra  piolhos  mastigadores  do  que  as  formas  pour­on  típicas.  A
doramectina injetável e a ivermectina injetável e premix são efetivas contra o piolho sugador dos suínos.
Os  piolhos  dos  bovinos  de  corte  podem  ser  controlados  ou  suprimidos  pela  utilização  de  dispositivos  de
autotratamento durante o inverno, como por exemplo, brincos inseticidas, borrachas para coçar as costas e sacos de
pó.  Os  brincos  inseticidas  que  contêm  uma  variedade  de  ingredientes  ativos  (p.  ex.,  clorpirifós,  diazinon,
endosulfan,  ?­cialotrina,  permetrina,  zeta­cipermetrina,  com  frequência  com  PBO)  controlam  e  auxiliam  no
controle  de  piolhos  mastigadores  e  sugadores  de  bovinos.  Alguns  brincos  contêm  apenas  um  princípio  ativo,
enquanto  outros  possuem  uma  mistura  desses.  Embora  muitos  dos  brincos  sejam  aprovados  para  controle  de
piolhos  em  bovinos  de  corte,  eles  podem  não  ser  aprovados  para  bovinos  leiteiros  lactantes.  As  populações  de
piolhos podem ser controladas em bovinos de corte e leiteiros, lactantes ou não lactantes, cabras leiteiras lactantes
ou não, ovinos e equinos com sacos de pó que contêm zeta­cipermetrina. As populações de piolhos também podem
ser reduzidas pelo uso de polvilhamento com cumafós, ciflutrin, tetraclorvinfós ou permetrina em bovinos de corte
ou  de  leite  e  cumafós,  permetrina  ou  tetraclorvinfós  em  suínos.  Equinos  também  podem  ser  polvilhados  com
cumafós. Para infestações graves, formulações em pó podem ser utilizadas para tratar a cama dos suínos.
Muitos  produtos,  como  shampoos,  sprays  e  pós,  estão  disponíveis  para  controle  de  insetos  em  animais  de
estimação; no entanto, piolhos raramente são mencionados nos rótulos. Os cães podem ser tratados com permetrina
ou  piretrina  com  PBO.  Gatos  também  podem  ser  tratados  com  piretrinas  potencializadas.  Doses  de  ivermectina
altas  o  suficiente  para  serem  efetivas  contra  piolhos  não  são  recomendadas  em  cães.  Alguns  tratamentos
tópicos spot­on para o controle de pulgas em cães e gatos também são indicados para o controle de piolhos. Esses
tratamentos,  em  geral,  são  aplicados  em  um  ou  mais  pontos  entre  as  escápulas.  A  imidacloprida,  imidacloprida
com permetrina e imidacloprida com moxidectina são aprovados para o controle de piolhos em cães. O tratamento
com fipronil mais (S)­metoprene é aprovado para controle de piolhos mastigadores tanto em cães quanto em gatos.
A imidacloprida e imidacloprida com moxidectina são aprovados para uso em gatos.
Na maioria dos países, agências regulamentadoras especificam os limites de resíduos de inseticidas nos tecidos e
regulam o uso de inseticidas em animais de produção. Todas essas regulamentações estão sujeitas a mudanças; leis
locais pertinentes e requerimentos devem ser determinados. O tratamento de animais de corte e de leite deve ser
restrito ao uso especificado no rótulo do produto, e todas as precauções devem ser observadas cuidadosamente.

PULGAS E DERMATITE ALÉRGICA À PULGA

Há  >  2.200  espécies  de  pulgas  reconhecidas  mundialmente.  Na  América  do  Norte,  apenas  poucas  espécies
infestam  comumente  cães  e  gatos:  Ctenocephalides  felis  (pulga  dos  gatos),  C.  canis  (pulga  dos  cães),  Pulex
simulans (pulga de pequenos mamíferos) e Echidnophaga gallinacea (pulga de aves domésticas). No entanto, de
longe,  a  pulga  mais  prevalente  em  cães  e  gatos  é  C.  felis.  A  pulga  dos  gatos  causa  uma  grave  irritação  nos
animais e no homem e é responsável pela dermatite alérgica a pulgas. Ela também serve como vetor de riquétsias
semelhantes ao tifo e de Bartonella sp e é hospedeira intermediária de parasitos filarídeos e cestódeos. Pulgas dos
gatos  já  foram  notadas  em  infestando  >  50  diferentes  hospedeiros  mamíferos  e  aves  por  todo  o  mundo.  Na
América  do  Norte,  os  hospedeiros  mais  comuns  são  os  canídeos  domésticos  e  silvestres,  felinos  domésticos  e
silvestres, guaxinins, gambás, furões e coelhos domésticos.
TRANSMISSÃO,  EPIDEMIOLOGIA  E  PATOGÊNESE:   As  pulgas  dos  gatos  depositam  seus  ovos  na  pelagem  do  seu
hospedeiro.  Esses  ovos  são  branco­perolados  e  ovais  com  extremidades  arredondadas  e  têm  0,5  mm  de
comprimento. Da pelagem, caem facilmente para cama, tapetes ou solo, onde a eclosão ocorre em cerca de 1 a 6
dias. As larvas de pulgas recém­eclodidas têm 1 a 5 mm de comprimento, são delgadas, brancas, segmentadas e
esparsamente recobertas com pelos curtos. As larvas têm vida livre, alimentam­se dos resíduos orgânicos notados
no ambiente e das fezes das pulgas adultas, que são essenciais para o desenvolvimento bem­sucedido. Estas larvas
evitam  a  luz  direta  e  se  movimentam  ativa  e  profundamente  nas  fibras  dos  tapetes  ou  sob  resíduos  orgânicos
(capins, ramos, folhas ou terra).
As larvas são suscetíveis ao ressecamento, sendo letais em exposições prolongadas em umidade relativa < 50%.
As áreas domiciliares com a umidade necessária são limitadas e os locais externos adequados são ainda mais raros.
O  desenvolvimento  das  pulgas  no  ambiente  externo  só  ocorre  onde  o  solo  for  sombreado  e  úmido  (umidade  do
solo de 1 a 20% é suficiente) e onde o animal de estimação infestado por pulgas passa uma quantidade de tempo
significativa,  de  forma  que  se  depositem  fezes  de  pulgas  adultas  no  ambiente  larval.  No  ambiente  de  dentro  de
casa,  as  larvas  de  pulga  provavelmente  sobrevivem  somente  no  microambiente  protegido  sob  um  tapete  ou  nas
rachaduras  entre  pisos  de  taco,  nos  climas  úmidos  e  em  pisos  de  concreto  não  terminados  em  porão  úmido.  O
estágio larval dura, em geral, 5 a 11 dias, mas pode se prolongar por 2 a 3 semanas, dependendo da disponibilidade
de alimentos e das condições climáticas.
Após completar o seu desenvolvimento, a larva madura produz um casulo semelhante à seda, no qual se torna
pupa.  Esse  casulo  é  ovoide,  possui  cerca  de  0,5  cm  de  comprimento,  é  esbranquiçado  e  vagamente  fiado.  Os
casulos  de  pulga  podem  ser  notados  no  solo,  na  vegetação,  nos  tapetes,  sob  os  móveis  e  nas  camas  de  animais.
Quando  a  pupa  se  encontra  totalmente  desenvolvida  (1  a  2  semanas),  a  pulga  adulta  sai  do  casulo  quando
apropriadamente estimulada por pressão física, dióxido de carbono, movimento no substrato ou calor.
O adulto pré­emergido (que já é uma pulga adulta completamente formada) residente no casulo é o estágio que
pode estender a longevidade da pulga. Se o adulto pré­emergido não receber o estímulo apropriado para sair do
casulo,  pode  permanecer  quiescente  no  interior  do  casulo  por  várias  semanas  até  a  chegada  de  um  hospedeiro
adequado.  A  saída  do  casulo  pode  ser  adiada  por  até  350  dias,  se  as  pulgas  adultas  pré–emergidas  estiverem
protegidas  do  ressecamento.  As  pulgas  recém­saídas  se  movem  para  a  parte  superior  das  fibras  do  tapete  ou  da
vegetação,  onde  encontrarão,  com  maior  probabilidade,  um  hospedeiro  passante.  Sob  condições  ideais  de
temperatura  (27°C)  e  umidade  relativa  (90%),  a  pulga  dos  gatos  recém  emergida  pode  sobreviver  por
aproximadamente  12  dias  antes  da  necessidade  de  alimentação  sanguínea;  em  umidades  relativas  de  50%,  este
intervalo  cai  para  cerca  de  3  dias.  As  pulgas  recém­emergidas  não  alimentadas  que  infestam  os  animais  de
estimação  e  picam  as  pessoas.  Geralmente  há  pouca  movimentação  inter­hospedeiro  das  pulgas  dos  gatos.  As
pulgas  dos  gatos  que  encontram  um  hospedeiro  preferido  (p.  ex.,  cão,  gato,  gambá  etc.)  não  sairão  de  seu
hospedeiro a menos que sejam forçadas por meio de uma atividade de higiene ou de inseticidas.
Dependendo da temperatura e da umidade, o ciclo de vida inteiro da pulga dos gatos pode se completar em até
12 a 14 dias ou pode se prolongar por até 350 dias. No entanto, sob a maioria das condições domésticas, as pulgas
dos gatos completam o seu ciclo de vida em 3 a 6 semanas.
As pulgas dos gatos adultas começam a se alimentar quase imediatamente quando encontram um hospedeiro. As
pulgas dos gatos fêmeas podem consumir 13,6 μl de sangue por dia, que corresponde a 15 × o seu peso corporal.
Depois de um trânsito rápido através da pulga, o sangue excretado se seca dentro de minutos em pelets ou molas
fecais tubulares longas preto­avermelhadas (“fezes de pulga”). As pulgas se acasalam depois de se alimentar e a
produção de ovos começa em 24 a 48 h após as fêmeas consumirem a sua primeira refeição sanguínea. As pulgas
fêmeas dos gatos podem produzir até 40 a 50 ovos ao dia durante uma produção máxima de ovos, em média a 27
ovos ao dia, durante 50 dias. As fêmeas individuais podem continuar a produzir ovos por > 100 dias.
A  pulga  dos  gatos  é  suscetível  ao  frio.  Nenhum  estágio  do  ciclo  de  vida  (ovo,  larva,  pupa  ou  adulto)  pode
sobreviver a < 3°C por vários dias. Portanto, as pulgas dos gatos sobrevivem aos invernos nos climas temperados
do  norte,  como  adultas,  em  cães  e  gatos  não  tratados  ou  em  pequenos  mamíferos  silvestres  (p.  ex.,  guaxinins  e
gambás) no ambiente urbano. À medida que esses animais passam por quintais na primavera ou constroem locais
de  ninho  em  espaços  apertados  nas  casas  ou  em  sótãos,  os  ovos  depositados  por  parte  das  pulgas  fêmeas
sobreviventes desenvolvem­se subsequentemente em adultos. As pulgas dos gatos também podem sobreviver ao
inverno como adultos pré­emergidos em microambientes protegidos do frio.
Nas infestações maciças, as pulgas podem causar anemia por deficiência de ferro, particularmente nos animais
jovens. Já se descreveram que as pulgas do gênero Ctenocephalides provocam anemia em aves domésticas, cães,
gatos, caprinos, bovinos e ovinos.
Ctenocephalides felis, a pulga comum de gatos. Cortesia da Merial Limited.

A  pulga  dos  gatos  também  se  envolve  na  transmissão  de  doenças.  O  tifo  murino,  causado  por  Rickettsia
typhi  e  R.  felis,  é  uma  doença  febril  leve  a  grave  do  homem,  caracterizada  por  dores  de  cabeça,  calafrios  e
exantemas cutâneos, com raro envolvimento dos rins e sistema nervoso central (SNC). A doença acomete pessoas
e  vários  pequenos  mamíferos  ao  longo  das  costas  sudeste,  sudoeste  e  do  Golfo.  Nos  EUA,  o  principal  ciclo  de
transmissão  envolve  gambás  e  pulgas  dos  gatos.  As  pulgas  dos  gatos  também  atuam  como  hospedeiros
intermediários do nematódeo filarídeo subcutâneo não patogênico de cães, Dipetalonema reconditum. Dipylidium
caninum,  o  cestódeo  intestinal  comum  de  cães  e  gatos  (e,  raramente,  de  crianças)  se  desenvolve  como  um
cisticercoide em C. felis, C. canis e Trichodectes canis. As larvas das pulgas ingerem os ovos deste cestódeo, que
se  desenvolvem  em  cisticercoide  na  pulga.  Quando  limpam  a  si  mesmos,  os  cães  e  os  gatos  podem  ingerir  as
pulgas infectadas liberando os cisticercoides.

Dermatite alérgica a pulgas
A  dermatite  alérgica  a  pulgas  (DAP)  ou  hipersensibilidade  à  picada  de  pulgas  é  a  doença  dermatológica  mais
comum de cães domésticos nos EUA. Os gatos também são acometidos por DAP, que é uma das causas principais
de dermatite miliar felina. A DAP é mais prevalente no verão, no entanto, nos climas quentes, as infestações de
pulgas podem persistir por todo o ano. Nas regiões temperadas do norte da América do Norte, a proximidade dos
animais de estimação e das suas pulgas com residências humanas cria condições que permitem um problema anual.
Os extremos de temperatura e a umidade baixa tendem a inibir o desenvolvimento das pulgas.
Quando  se  alimentam,  as  pulgas  injetam  saliva  contendo  uma  variedade  de  componentes  semelhantes  à
histamina, enzimas, polipeptídios e aminoácidos que variam de tamanho (40 a 60kD) induzem hipersensibilidade
dos  tipos  I,  IV  e  basofílica.  Os  cães  sem  pulgas,  expostos  intermitentemente  a  picadas  de  pulga,  desenvolvem
reações imediatas (15 min), tardias (24 a 48 h) ou ambas e teores detectáveis de anticorpos IgE e IgG circulantes.
Os cães expostos continuamente a picadas de pulga apresentam baixas concentrações desses anticorpos circulantes
e  não  desenvolvem  reações  cutâneas  ou  as  desenvolvem  posteriormente  e  em  um  grau  bastante  reduzido.  Isso
poderia  indicar  que  é  possível  desenvolver  naturalmente  uma  tolerância  imunológica  nos  cães  continuamente
expostos às picadas de pulga. Embora a fisiopatologia da DAP nos gatos seja pouco compreendida, podem existir
mecanismos semelhantes.
ACHADOS CLÍNICOS:  Os sinais clínicos associados à DAP são variáveis e dependem da frequência da exposição a
pulgas,  da  duração  da  doença,  da  presença  de  dermatopatia  secundária  ou  intercorrente,  do  grau  da
hipersensibilidade e dos efeitos de um tratamento anterior ou atual. O animal não alérgico pode apresentar poucos
sinais clínicos, além do prurido ocasional em decorrência da irritação pelas picadas de pulga. Os animais alérgicos
apresentarão, tipicamente, uma dermatite caracterizada por prurido.
Nos  cães,  o  prurido  associado  à  DAP  pode  ser  intenso  e  se  manifestar  no  corpo  inteiro.  Os  sinais  clínicos
clássicos  são  lesões  papulocrostosas  distribuídas  na  parte  inferior  do  dorso,  na  base  da  cauda  e  nas  áreas
posteriores  e  internas  das  coxas.  Os  cães  podem  ser  particularmente  sensíveis  nos  flancos,  regiões  caudais  e
mediais  das  coxas,  abdome  ventral,  parte  inferior  do  dorso,  pescoço  e  orelhas.  Os  cães  afetados  provavelmente
ficarão inquietos e desconfortáveis, passando muito tempo coçando, lambendo, esfregando e até mordiscando sua
pele.  O  pelo  pode  apresentar  machas  marrons  devido  à  lambedura  e  frequentemente  é  quebradiço.  Lesões
secundárias comuns incluem áreas de alopecia, eritema, hiperpigmentação cutânea, descamação, pápulas e pápulas
recobertas por crostas marrom­avermelhadas. Tipicamente, as áreas mais afetadas e mais evidentes são o flanco e
da  base  da  cauda.  Se  a  DAP  progredir  e  tornar­se  crônica,  as  áreas  se  tornarão  alopécicas,  liquenificadas  e
hiperpigmentadas e os cães desenvolvem infecções secundárias bacterianas ou leveduriformes.
Nos cães extremamente hipersensíveis, extensas áreas de alopecia, eritema e de autotraumatismo são evidentes.
Também  pode  ocorrer  dermatite  úmida  traumática.  À  medida  que  a  doença  se  torna  crônica,  o  cão  pode
desenvolver alopecia generalizada, grave seborreia, hiperqueratose e hiperpigmentação.
Nos gatos, os sinais clínicos variam de mínimos a intensos, dependendo do grau de sensibilidade. A dermatite
primária  é  uma  pápula,  quase  sempre  se  torna  crostosa.  Esta  dermatite  “miliar”  é  notada  tipicamente  no  dorso,
pescoço  e  face.  As  lesões  miliares  não  são  picadas  de  pulga  verdadeiras,  mas  a  manifestação  de  uma  reação
alérgica sistêmica que desencadeia prurido generalizado e erupção cutânea eczematosa. O prurido pode ser intenso,
evidenciado  por  lambeduras  repetidas,  coceira  e  mordeduras.  Os  gatos  com  DAP  podem  apresentar  alopecia,
dermatite facial, dermatite esfoliativa e dermatite na forma de “faixa de estrada” ou dorsal.

Dermatite alérgica à pulga, com descamação e eritema, em cão. Cortesia da Merial Limited.

DIAGNÓSTICO:  Vários  fatores  devem  ser  considerados  no  diagnóstico  de  DAP  como:  anamnese,  sinais  clínicos,
presença de pulgas ou de excrementos de pulga, resultados de testes intradérmicos e descarte de outras causas de
doenças dermatológicas.
A maioria dos casos ocorre no final do verão, correspondendo ao pico das populações de pulgas. Nesses casos, a
anamnese  pode  ser  altamente  sugestiva.  A  idade  de  início  também  é  importante,  pois  a  DAP  não  ocorre
normalmente  antes  de  1  ano.  Em  geral,  o  diagnóstico  é  feito  por  observação  visual  de  pulgas  no  animal  de
estimação infestado. A demonstração para o proprietário da presença de pulgas ou de excrementos de pulga é útil.
Uma repartição lenta dos pelos contra o sentido normal frequentemente revela excrementos de pulga ou pulgas em
movimentos  rápidos.  Os  excrementos  de  pulga  são  preto­avermelhados,  cilíndricos  e  em  forma  de  pelets  ou  de
vírgulas.  Colocados  em  água  ou  sobre  uma  toalha  de  papel  úmida  e  esmagados,  se  dissolvem  e  produzem  uma
coloração marrom­avermelhada.
É  provável  que  o  animal  hipersensível  ao  extremo  fique  virtualmente  livre  de  pulgas  pelo  comportamento  de
auto  higiene  excessivo.  Nesses  casos,  é  difícil  encontrar  evidências  de  pulgas,  dificultando  o  convencimento  do
proprietário  acerca  do  problema.  O  uso  de  um  pente  fino  de  pulgas  (aproximadamente  12  dentes/cm)  facilita  o
encontro  das  pulgas  e  dos  seus  excrementos.  O  exame  da  cama  do  animal  doméstico  quanto  a  ovos,  larvas  e
excrementos também é útil.
O  diagnóstico  presuntivo  de  DAP  pode  ser  confirmado  com  teste  cutâneo  intradérmico.  As  reações  positivas
imediatas  se  caracterizam  por  um  vergão  de  3  a  5  mm  maior  em  diâmetro  que  o  controle  negativo.
Alternativamente, a medida de um vergão positivo pode ser definida como uma resposta que é menor ou igual ao
ponto médio entre o tamanho da reação do controle positivo e do negativo. Recomendam­se observações de reação
imediata (15 a 20 min) e, se estas forem negativas, de uma reação tardia em 24 h. A reação tardia pode não ocorrer
como  um  vergão  discreto,  mas  como  uma  reação  eritematosa  difusa.  Uma  reação  positiva  não  indica
conclusivamente  que  a  afecção  clínica  seja  DAP  –  indica  apenas  que  o  animal  é  alérgico  ao  antígeno  da  pulga,
originário  de  uma  exposição  atual  ou  anterior.  A  confiabilidade  do  teste  cutâneo  intradérmico  nos  gatos  para
diagnosticar uma DAP é variável.
Testes  sorológicos  diretos  para  IgE  contra  antígenos  salivares  pulga­específicos  podem  ser  utilizados  como
auxiliares no diagnóstico de DAP.
Deve­se  diferenciar  a  DAP  de  outras  causas  de  doenças  dermatológicas.  A  presença  de  pulgas  ou  da  reação
positiva  ao  teste  intradérmico  não  descarta  outra  dermatopatia  responsável  pelos  sinais  clínicos.  Nos  cães,  os
diagnósticos  diferenciais  são:  dermatite  por  alergênio  inalatório  (atopia),  dermatite  alérgica  alimentar,  sarnas
sarcóptica  ou  demodécica,  outros  ectoparasitas  e  foliculite  bacteriana.  Nos  gatos,  outras  afecções  que  podem
resultar  em  dermatite  miliar  são:  parasitos  externos  (queiletielose,  trombiculose,  sarna  notoédrica  e  pediculose),
dermatofitose, hipersensibilidade a medicamentos, alergia alimentar, atopia, foliculite bacteriana e dermatite miliar
idiopática.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Ver também p. 2703.
As  medidas  de  controle  das  pulgas  têm  mudado  drasticamente  nos  últimos  anos.  O  desenvolvimento  de
inseticidas  e  do  antipulga  IGR,  com  formulações  em  doses  práticas  e  atividade  residual  prolongada  melhorou
muito a complacência do proprietário e ajudou a eliminar as infestações recidivantes. Os objetivos do controle das
pulgas são: eliminar as pulgas do animal, eliminar a infestação no ambiental e prevenir reinfestações subsequentes.
O  primeiro  passo  ainda  é  a  eliminação  das  pulgas  do  animal.  Isso  é  necessário  para  aliviar  o  desconforto  dos
animais. Um termo bastante empregado quando discutimos o controle da pulga é a taxa ou velocidade de morte dos
parasitos.  Entretanto,  é  importante  diferenciar  a  velocidade  da  eliminação  de  infestações  já  estabelecidas  e  a
velocidade  da  eliminação  de  pulgas  recentemente  adquiridas  após  a  aplicação  do  produto.  Um  produto  aplicado
topicamente  em  cães  e  gatos  pode  levar  várias  horas  (12  a  36  h)  até  que  seus  componentes  se  espalhem
suficientemente ou alcancem concentrações sistêmicas suficientes para eliminar todas as pulgas existentes. Se for
necessária uma taxa de morte mais rápida, um spray para pulgas ou nitempiram pode ser desejável.
Vários  inseticidas  disponíveis  atualmente  providenciam  excelente  eliminação  da  infestação  de  pulgas
estabelecida  nos  cães  e  gatos,  tais  como:  dinotefuran,  fipronil,  imidacloprid,  metaflumizona,  nitempiram,
selamectina,  spinosad  e  piretroides.  O  nitempiram  ou  spinosad  administrados  oralmente  eliminarão  as  pulgas
dentro  de  3  a  4  h,  enquanto  formulações  tópicas  na  forma  spot­on  com  efeito  residual,  contendo  fipronil,
imidacloprida ou selamectina demoram 12 a 42 h.
O segundo objetivo é eliminar as pulgas do ambiente onde vive o animal. Isso pode ser conseguido de várias
maneiras: (1) aplicação tópica de inseticidas residuais que matem pulgas recém­adquiridas (dentro de 24 h) antes
de iniciarem a reprodução; (2) administração tópica, injetável ou oral de IGR para interromper a reprodução das
pulgas; (3) aplicações repetidas de inseticidas e/ou IGR no ambiente; (4) combinações das anteriores.
Administrações de inseticidas residuais sistêmicos ou tópicos e a administração tópica, injetável ou oral de IGR
são  os  métodos  de  preferência  de  eliminação  das  pulgas.  Vários  desses  novos  inseticidas  e  IGR  mostraram­se
extremamente eficazes no controle das pulgas de animais que vivem em ambientes infestados. Estudos de campo
mostraram que o fipronil (com ou sem adição de (S)­metopreno), imidacloprida, lufenuron (com piretroide spray
ou comprimidos de nitempiram), selamectina e spinosad podem ser eficazes no controle das infestações de pulga,
sem necessitar de tratamento ambiental. Infestações de pulgas podem ser eliminadas com o uso regular, mensal de
produtos  tópicos  e  sistêmicos  porque  a  maior  parte  das  pulgas  morre  antes  da  reprodução  e/ou  são  diretamente
inibidas  de  reproduzirem.  Entretanto,  mesmo  que  o  inseticida  utilizado  por  via  sistêmica  ou  tópica  seja  100%
efetivo,  o  controle  da  infestação  comumente  demora  2  a  3  meses,  devido  aos  diferentes  estágios  das  pulgas  no
ambiente.
Caso  os  produtos  residuais  sejam  aplicados  em  dose  e  intervalos  apropriados,  é  possível  adequar  a  atividade
residual  entre  as  aplicações  para  matar  muitas  pulgas  recém–adquiridas  antes  do  início  da  produção  de  ovos.
Entretanto, é possível notar pulgas que sobrevivem e se reproduzem antes da próxima aplicação, por várias razões:
(1) atividade residual < 100% do tempo indicado na bula; (2) a taxa de morte das pulgas diminui durante a terceira
ou  quarta  semana;  (3)  reaplicações  do  produto  atrasadas  ou  infrequentes;  (4)  subdose  simples;  (5)  remoção
mecânica de inseticidas solúveis em água durante o banho ou natação. Esses problemas podem resultar em atraso
no controle ou completa falha do tratamento.
Nenhum  dos  produtos  residuais  para  pulgas  recentemente  disponíveis  tem  eficácia  de  100%  contra  todas  as
cepas de pulgas dos gatos, entre os períodos de reaplicação prescritos na bula, por causa da variabilidade genética
das  diferentes  populações  de  pulgas.  Muitos  dos  fatores  que  permitem  a  persistência  da  infestação  podem
possivelmente levar à seleção genética de pulgas resistentes. Pulgas resistentes devem ser capazes de produzirem
ovos  viáveis.  A  reprodução  deve  ser  interrompida  para  prevenir  infestações  de  pulgas  persistentes  e  seleção  das
resistentes. A reprodução pode ser prevenida pela administração tópica ou sistêmica de IGR, que possui atividade
ovicida residual prolongada, interrompendo o desenvolvimento posterior de pulgas, que mesmo após a redução da
atividade  residual  dos  inseticidas.  A  aplicação  de  metopreno  ou  piriproxifeno  no  pelame  dos  cães  e  gatos
rapidamente  mata  os  ovos  de  pulgas  em  desenvolvimento  além  da  atividade  ovicida  residual.  A  combinação  de
fipronil/(S)­metopreno  ou  outros  produtos  adulticidas/larvicidas  mostrou  atividade  contra  pulgas  adultas  e
propiciou  prolongada  atividade  ovicida  residual,  reduzindo  desta  forma,  o  potencial  de  seleção  genética.  Não
apenas a aplicação tópica de IGR mostrou atividade ovicida, mas a administração oral ou injetável (somente em
gatos)  de  lufenuron  também  mostrou  atividade  ovicida.  Embora  não  seja  um  IGR,  a  selamectina  também
demonstrou atividade ovicida em gatos.
Muitos proprietários de animais pensam erroneamente que os produtos para pulgas eliminam as todas as pulgas
recentemente adquiridas em segundos a minutos e as repelem. Entretanto, às vezes pode não haver repelência e os
produtos residuais não eliminam a maioria das pulgas em minutos. Geralmente as pulgas podem sobreviver por 6 a
24 h e consumir o sangue antes de serem eliminadas. Portanto, o exame minucioso dos animais tratados em um
ambiente  infestado  ocasionalmente  resulta  em  observações  de  poucas  pulgas  nos  animais  por  até  8  semanas  e
ocasionalmente por mais tempo, até que a infestação seja eliminada.
Outra complicação adicional para os proprietários de animais é a contaminação do quintal por animais silvestres,
cães  e  gatos  selvagens  ou  outros  animais  infestados.  Geralmente  os  proprietários  tratam  seus  próprios  animais
porém  não  realizam  o  tratamento  ambiental  frequentado  pelos  animais,  que  pode  estar  constantemente  infestado
por  pulgas de animais  silvestres  ou  selvagens  (especialmente  gatos).  Mesmo  os animais que saem por pequenos
períodos  estão  suscetíveis  à  infestação.  Ademais,  as  pessoas  podem  atuar  como  carreadores,  trazendo  as  pulgas
para o domicílio e infestando os animais não protegidos.
Nos  casos  de  infecções  maciças  ou  alergia  grave  em  humanos  ou  animais,  pode  ser  necessário  tratamento  do
ambiente com adulticidas e IGR. O controle pode ser alcançado pelo uso de inseticidas com atividade residual (ou
por  aplicações  repetidas  de  inseticidas  de  curta  ação)  em  combinação  com  IGR  para  prevenir  o
desenvolvimento de ovos e larvas de pulgas. Metopreno e piriproxifeno são dois IGR atualmente disponíveis para
aplicação  no  ambiente.  Inseticidas  e  IGR  podem  ser  aplicados  por  difusão  (aspersão  manual  ou  aerossóis
pressurizados) ou pela liberação total por meiod e aerossóis ou nebulização. Durante a aplicação, a superfície de
todos os tapetes e carpetes deve ser tratada adequadamente. Esforços devem ser direcionados para áreas onde se
acumulam  ovos  e  larvas  de  pulgas,  como  carpetes,  rachaduras,  ranhuras  em  chão  de  madeira,  atrás  de  rodapés,
debaixo de tapetes, embaixo de móveis (camas, mesas e sofás) e dentro de armários. Em infecções graves, uma
segunda  aplicação  pode  ser  necessária  em  7  a  10  dias  para  matar  os  adultos  recém–emergidos  de  casulos
escondidos profundamente dentro dos carpetes.
A  eliminação  das  pulgas  do  quintal  também  pode  ser  um  aspecto  importante  no  controle  dos  pulicídeos.  O
tratamento  do  ambiente  externo  (p.  ex.,  ciflutrina,  fenvalerato)  deve  ser  concentrado  nos  principais  locais  de
desenvolvimento  de  pulgas,  inclusive  microhabitats  protegidos,  como  casas  dos  cães,  interior  de  garagens,  sob
varandas  e  áreas  de  descanso  de  animais,  por  baixo  de  arbustos  ou  outras  áreas  sombreadas.  O  borrifamento  de
produtos de controle de pulgas sobre uma grande extensão de gramado, sem sombra, geralmente não é benéfico.
Proprietários devem também fazer o controle mecânico. Os procedimentos auxiliares são: lavagem de cobertores
de animais, descarte de tapetes e transportadores de animais; além disso, as áreas onde o animal dorme ou descansa
devem ser limpas totalmente com aspirador de pó para ajudar a remover ovos e larvas de pulgas. Travesseiros e
almofadas  de  sofás  e  cadeiras  devem  ser  removidos  e  aspirados,  com  atenção  especial  para  fissuras  dos  sofás  e
cadeiras e para as áreas debaixo dos sofás ou camas, onde ovos e fezes podem cair dos animais e se acumular.
Apesar  dos  esforços  dos  proprietários  dos  animais  de  estimação,  a  eliminação  total  das  pulgas  pode  não  ser
possível ou pode não ocorrer em tempo suficiente para controlar suficientemente os sinais clínicos da DAP. Deve­
se  instituir  uma  terapia  médica  de  suporte  para  controlar  o  prurido  e  a  dermatopatia  secundária  nos  animais
hipersensíveis. Frequentemente, exige­se terapia com glicocorticosteroides sistêmicos para controlar a inflamação
e o prurido associados. Pode­se administrar prednisona ou a prednisolona de curta ação, inicialmente na dose de
0,5 a 1 mg/kg, 1 vez/dia, diminuindo a dose e utilizando a terapia em dias alternados até que se administre a dose
mais baixa possível que ainda controle o prurido. Tão logo se obtenha o controle de pulgas, pode­se interromper a
terapia com glicocorticosteroides. Nunca se deve utilizar a terapia anti­inflamatória em substituição ao controle de
pulgas.
Infecção  bacteriana  secundária  da  pele  pode  estar  associada  à  DAP.  Comumente,  utilizam­se  antibióticos
sistêmicos  para  controlar  esta  piodermite  e,  por  consequência,  reduzir  a  inflamação  e  o  prurido.  A  escolha  do
antibiótico apropriado deve se basear nas culturas bacterianas e nos resultados dos antibiogramas.
A  hipossensibilização  consiste  na  administração  de  alergênios  a  um  animal  hipersensível,  regularmente,  na
tentativa  de  obter  o  estado  de  não  reatividade  clínica  à  picada  de  pulgas.  A  eficácia  dos  extratos  de  pulga
atualmente disponíveis é controversa.

SARNA (Acaríase cutânea, Infestação por ácaros)

 SARNA EM BOVINOS
SARNA SARCÓPTICA (ESCABIOSE):  Essa doença muito contagiosa dissemina­se por contato direto ou indiretamente,
por fômites. O agente causal, Sarcoptes scabiei var bovis, pode ser transmitido a pessoas e trata­se de uma doença
de notificação obrigatória. As lesões iniciais ocorrem na cabeça, pescoço e ombros, e podem se disseminar para
outras partes do corpo; o prurido é intenso. Pápulas progridem em crostas e a pele torna­se espessa e forma grandes
pregas.  Pode  ocorrer  o  acometimento  de  todo  o  corpo  em  seis  semanas.  O  diagnóstico  é  feito  por  raspados  de
pele profundos, biopsia de pele ou pela resposta à terapia. O tratamento é semelhante ao da sarna psoróptica (ver a
seguir).
SARNA  PSORÓPTICA:   É  uma  doença  de  notificação  obrigatória,  causada  por  Psoroptes  ovis,  não  transmissível  a
pessoas. É observada em bovinos de corte confinado ou a pasto, nas regiões central e oeste dos EUA, com maior
número  de  notificações  vindas  do  Texas,  Novo  México,  Oklahoma,  Kansas,  Colorado  e  Nebraska.  O  prurido
intenso  normalmente  começa  nos  ombros  e  garupa;  pápulas,  crostas,  escoriações  e  lignificação  são  comuns.  As
lesões  podem  cobrir  quase  todo  o  corpo;  infecções  bacterianas  secundárias  são  comuns  nos  casos  graves.  Pode
ocorrer  morte  em  bezerros  não  tratados,  perda  de  peso,  diminuição  da  produção  de  leite  e  aumento  da
suscetibilidade a outras doenças.
O tratamento pode ser realizado com banhos de spray ou imersão em tanque, aplicações tópicas de acaricidas
locais e formulações orais, tópicas ou injetáveis de medicamentos sistêmicos. A aspersão consome tempo, mas é
útil  em  rebanhos  pequenos,  enquanto  os  banhos  de  imersão  em  tanque  são  eficientes,  porém  de  custo  alto  e  de
manejo difícil (uso de volumes grandes de água, descarte da solução empregada). Nos EUA, spray de toxafeno 0,5
a  0,6%  (período  de  carência  de  28  dias),  2  banhos  de  imersão  com  cumafós  0,3%  (sem  período  de  carência),  2
banhos  de  imersão  com  fosmet  0,20  a  0,25%  (período  de  carência  de  21  dias);  ou  3  imersões  em  cal  sulfurada
quente 2% (sem período de carência) podem ser utilizados. Fora dos EUA, outros tratamentos estão disponíveis,
como foxima 0,1%, diazinon 0,075% e amitraz 0,025 a 0,050%. As imersões devem ser repetidas em intervalos de
10 a 14 dias. Apenas a cal sulfurada quente está registrada para uso em bovinos de leite em lactação. A aplicação
tópica de flumetrina (2 mg/kg, 2 vezes, com intervalo de 10 dias) também está disponível em outros países além
dos EUA. Formulações injetáveis de avermectinas (ivermectina e doramectina) e milbemicinas (moxidectina) são
aprovadas  para  controle  das  sarnas  psoróptica  e  sarcóptica  na  dose  de  200  μg/kg  (exceto  em  bovinos  de  leite
lactante). Apesar de o tratamento ser efetivo, os bovinos devem ser isolados por 2 semanas após o tratamento. A
eprinomectina está disponível em uma formulação pour­on na dose de 500 μg/kg, e é aprovada para o controle da
sarna sarcóptica (sem período de carência). Mais recentemente, uma formulação de moxidectina de longa ação foi
introduzida. O medicamento é administrado na dose de 1 mg/kg na base da orelha, mas não é indicado para uso em
vacas lactantes. Essa formulação também é aprovada para o controle de sarna sarcóptica e ajuda a controlar a sarna
corióptica.
Sarcoptes scabiei var bovis, fêmea. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

SARNA CORIÓPTICA (SARNA DA PERNA):  Essa doença de notificação obrigatória, causada por Chorioptes bovis, não
acomete pessoas. Ela é o tipo mais comum de sarna de bovinos nos EUA; é mais prevalente durante o inverno e,
com  frequência,  regride  espontaneamente  no  verão.  A  área  da  quartela  é  o  local  predileto  dos  ácaros.  Uma  alta
proporção de bovinos pode estar infestada, sem exibir sinais clínicos. As lesões começam como pápulas, crostas e
ulcerações nas pernas e podem se disseminar para o úbere, escroto, cauda e área do períneo. Os bovinos podem ser
tratados com crotoxifos spray 0,25% em alta pressão para deixar o animal completamente úmido; outras imersões
utilizadas para a sarna psoróptica bovina também são efetivas contra Chorioptes. As imersões devem ser realizadas
duas vezes, com intervalos de 10 a 14 dias. Imersões de cal sulfurada semanalmente por 4 a 6 vezes também são
efetivas.  Ivermectina,  doramectina,  eprinomectina  e  moxidectina  aplicadas  por  via  tópica  como  pour­on  a  500
μg/kg  são  efetivas  contra  sarna  corióptica.  As  formulações  injetáveis  desses  medicamentos  a  200  μg/kg  são
consideradas auxiliares no controle de Chorioptes.  Com  exceção  da  eprinomectina,  esses  medicamentos  não  são
aprovados para vacas leiteiras lactantes.
SARNA DEMODÉCICA:  Demodex bovis é transferido da vaca ao bezerro durante a amamentação e pode causar lesões
consideráveis no couro. Não há prurido, e as lesões consistem em pápulas foliculares e nódulos, em especial acima
de cernelha, pescoço, costas e flancos. Ulceração, abscessos e fístulas podem se desenvolver em razão da ruptura
folicular ou infecção secundária. O diagnóstico é definido pelo exame de raspado de pele profundo. A demodicose
bovina normalmente é benigna, embora seu curso possa se estender por muitos meses. A recuperação, em geral, é
espontânea; como consequência, o tratamento raramente é feito. Imersão de triclorfon (2%) em dias alternados, por
3 tratamentos, foi relatado como curativo.
SARNA PSORERGÁTICA (PRURIDO POR ÁCARO):  Psorergates bos foi relatada em bovinos nos EUA, Canadá e África
do  Sul.  Os  animais  acometidos  apresentam  alopecia  macular  e  prurido  discretos.  A  doença  não  causa  perda
econômica relevante, portanto, os animais normalmente não são tratados. Vários banhos e injeções de ivermectina
e milbemicina são efetivos no controle da infestação.

 SARNA EM CÃES E GATOS
SARNA SARCÓPTICA (ESCABIOSE CANINA):  A infestação por Sarcoptes scabiei var  canis  é  uma  doença  altamente
contagiosa de cães, encontrada em todo o mundo. Os ácaros são hospedeiro­específicos, porém animais (inclusive
pessoas) que entram em contato com cães infestados também podem ser acometidos. Os ácaros adultos têm 0,3 a
0,5 mm de comprimento, forma grosseiramente circular, sem uma cabeça distinta e com 4 pares de pernas curtas.
As fêmeas são quase duas vezes maiores que os machos. Todo o ciclo biológico (17 a 21 dias) é passado no cão.
As fêmeas cavam túneis no estrato córneo para depositar os ovos. A sarna sarcóptica é transmitida imediatamente
entre cães por contato direto; a infestação por contato indireto é menos frequente, mas pode ocorrer. O período de
incubação  é  variável  (10  dias  a  8  semanas)  e  depende  do  nível  de  exposição,  local  do  corpo,  número  de  ácaros
transmitidos  e  do  indivíduo.  Pode  haver  portadores  assintomáticos.  O  prurido  intenso  é  característico  e,
provavelmente, decorre da hipersensibilidade aos produtos do ácaro. As lesões primárias consistem em erupções
papulares que, em razão do auto traumatismo, dão origem a crostas espessas. Podem ocorrer infecções secundárias
bacterianas e por leveduras. Tipicamente, as lesões se iniciam no abdome ventral, peito, orelhas, cotovelos e pernas
e,  se  não  tratadas,  tornam­se  generalizadas.  Cães  com  a  doença  crônica  generalizada  desenvolvem  seborreia,
espessamento  grave  da  pele  com  formação  de  pregas  e  crostas,  linfadenopatia  periférica  e  emaciação;  cães
acometidos podem mesmo morrer. “Escabiose incógnita” foi descrita em cães bem cuidados; esses cães, infestados
com ácaros de escabiose, apresentam prurido, porém a demonstração dos ácaros nos raspados de pele é difícil, pois
as  crostas  e  descamações  são  removidas  por  banhos  regulares.  Formas  clínicas  atípicas,  incluindo  as  formas
localizadas,  que  provavelmente  estão  relacionadas  com  o  uso  intenso  de  inseticidas  ou  acaricidas,  são  cada  vez
mais observadas.
O  diagnóstico  baseia­se  no  histórico  de  prurido  grave  de  início  súbito,  possível  exposição  e  envolvimento  de
outros  animais,  inclusive  pessoas.  Determinar  o  diagnóstico  definitivo,  às  vezes,  pode  ser  difícil,  em  razão  do
raspado de pele negativo. A concentração e a flotação de vários raspados podem aumentar a chance de encontrar
ácaros,  ovos  e  fezes.  Vários  raspados  superficiais  extensos  devem  ser  feitos  nas  orelhas,  cotovelos  e  jarretes;
devem­se  escolher  áreas  não  escoriadas.  Flotação  fecal  pode  revelar  ovos  ou  ácaros.  Recentemente,  um  teste  de
ELISA  específico  e  sensível  para  a  detecção  de  anticorpos  específicos  tornou­se  disponível  comercialmente,  e
pode  ser  útil.  Se  os  ácaros  não  forem  encontrados,  mas  o  histórico  e  a  apresentação  clínica  forem  altamente
sugestivos de escabiose, é necessária a utilização de diagnóstico terapêutico.
Sarna sarcóptica (escabiose) em cão. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

O tratamento pode ser tópico ou sistêmico e deve incluir todos os cães contactantes. Para o tratamento tópico, os
pelos devem ser tosados, as crostas e sujidades removidas com banhos com um bom xampu antisseborreico e um
banho acaricida devem ser realizados. Cal sulfurada é altamente efetiva e segura para o uso em animais jovens; são
recomendados vários banhos de imersão, com sete dias de intervalo. O amitraz é um escabicida efetivo, embora
não seja aprovado em todos os locais com essa indicação e haja alguns relatos de falta de eficácia. Ele deve ser
aplicado como solução 0,025% com 1 a 2 semanas de intervalo, por 2 a 6 semanas, e não deve ser utilizado em
Chihuahuas, cadelas prenhes ou amamentando ou filhotes com menos de 3 a 4 meses de idade. Adicionalmente, o
proprietário deve observar determinadas precauções para evitar a autocontaminação. O spray de fipronil mostrou
ser efetivo, porém deve ser considerado como auxiliar no controle, e não como terapia primária.
Tratamentos  sistêmicos  de  escabiose  são  baseados  na  administração  de  lactonas  macrocíclicas,  algumas  das
quais são licenciadas com essa indicação. Dentre elas, a selamectina é administrada como formulação spot­on a 6
mg/kg, uma ou duas vezes, com intervalo de 1 mês. Esse medicamento parece ser seguro, mesmo em cães da raça
Colly sensíveis à ivermectina, e pode ser utilizado em cães com 6 semanas de idade ou mais velhos. Em alguns
países (mas não nos EUA), a moxidectina é registrada para o tratamento de escabiose. Ela está disponível como
formulação spot­on em combinação com um produto antipulgas (imidacloprida), e deve ser administrada em duas
doses de 2,5 mg/kg, com 4 semanas de intervalo. Cães com mais de sete semanas de idade e/ou que pesam < 1 kg
não devem ser tratados com essa formulação spot­on; adicionalmente, a absorção oral deve ser evitada em raças
sensíveis.  Outros  endectocidas,  como  a  milbemicina  oxima  e  a  ivermectina,  que  não  são  registradas  para  o
tratamento  de  sarna  sarcóptica  em  cães,  foram  consideradas  bastante  efetivas,  dependendo  da  dose  e  via  de
administração. A dose recomendada de milbemicina oxima é de 2 mg/kg VO, 2 vezes/semana por 3 a 4 semanas;
toxicidade potencial deve ser considerada em cães com mutação no gene MDR­1. A ivermectina (200 μg/kg, VO
ou SC, duas doses, com intervalo de 2 semanas) é muito efetiva e, normalmente, é curativa. A ivermectina nessa
dose é contraindicada em cães da raça Colly e seus mestiços. Reações de idiossincrasia em outras raças também
podem ocorrer. Além disso, o animal deve ser avaliado para dirofilariose antes de ser tratado com qualquer lactona
macrocíclica.
SARNA NOTOÉDRICA (ESCABIOSE FELINA):  Essa doença rara e altamente contagiosa de gatos adultos e filhotes é
causada por Notoedres cati,  que  pode  infestar  de  forma  oportunista  outros  animais,  inclusive  pessoas.  O  ácaro  e
seu  ciclo  biológico  são  similares  àqueles  da  escabiose  canina.  O  prurido  é  grave  e  são  observadas  crostas  e
alopecia,  em  particular  nas  orelhas,  cabeça  e  pescoço,  que  podem  se  tornar  generalizadas.  Os  ácaros  podem  ser
encontrados facilmente em raspados de pele. O tratamento consiste em banhos com cal sulfurada em intervalos de
7  dias.  O  uso  extrabula  do  amitraz  não  é  recomendado  em  gatos.  Tratamentos  não  aprovados,  mas  eficientes,
incluem  selamectina  (6  mg/kg,  spot­on),  moxidectina  (2,5  mg/kg,  spot­on)  e  ivermectina  (200  μg/kg,  SC).  Há
relatos de morte súbita em filhotes de gato após a aplicação de ivermectina.
SARNA OTODÉCICA:  Otodectes cynotis é causa comum de otite externa (p. 561), em especial em gatos, mas também
em cães. Este ácaro, que pertence à família Psoroptidae, normalmente é encontrado tanto no canal auditivo vertical
quanto  no  horizontal,  mas,  ocasionalmente,  são  observados  no  corpo.  Os  sinais  clínicos  incluem  balanços  de
cabeça, prurido auricular contínuo e cabeça pendente. O prurido é variável. Acúmulo de cerume marrom­escuro na
orelha e otite externa supurativa, com possível perfuração da membrana timpânica, podem ser verificados em casos
graves. Os animais acometidos e contactantes devem receber tratamento parasiticida apropriado nas orelhas e em
todo  o  corpo  durante  2  a  4  semanas.  Outros  tratamentos  efetivos  incluem  lactonas  macrocíclicas  sistêmicas.
Apenas  a  selamectina  e  a  moxidectina  (em  alguns  países  que  não  os  EUA)  são  aprovadas  para  o  tratamento  de
sarna otodécica; elas são administradas como formulação spot­on (ver anteriormente). Como regra geral, a limpeza
das orelhas com ceruminolítico apropriado é indicada com terapia tópica e, em especial, com terapia sistêmica.
QUEILETIELOSE  (CASPAS  ANDANTES):   Cheyletiella  blakei  infecta  gatos,  C.  yasguri  infecta  cães  e  C.
parasitovorax infecta coelhos, embora infestações cruzadas sejam possíveis. Essa doença é muito contagiosa, em
especial  em  animais  que  vivem  em  comunidades.  A  infestação  em  pessoas  é  frequente.  Não  são  comuns
infestações  por  ácaros  em  áreas  endêmicas  para  pulgas,  provavelmente  em  razão  do  uso  regular  de  inseticidas.
Esses ácaros têm 4 pares de patas e o aparelho bucal proeminente em forma de ganchos. Eles vivem na superfície
da  epiderme  e  permanecem  no  hospedeiro  durante  todo  o  seu  ciclo  biológico  (3  semanas).  As  fêmeas  do  ácaro
podem, no entanto, sobreviver por tanto tempo quanto 10 dias fora do hospedeiro. A doença clínica é caracterizada
por descamação, distribuição dorsal e prurido, que varia de ausente a grave. Os gatos podem desenvolver crostas
dorsais ou dermatite miliar generalizada. Podem existir carreadores assintomáticos. Os ácaros e os ovos podem não
ser  facilmente  encontrados,  em  especial  em  animais  que  tomam  banhos  com  frequência.  Impressões  em  fita  de
acetato, raspados de pele superficiais e o uso de pente para pulgas podem confirmar o diagnóstico.
Acaricidas tanto tópicos quanto sistêmicos são efetivos contra queiletielose, embora nenhum medicamento seja
licenciado  atualmente  com  essa  indicação.  É  necessário  tratar  todos  os  animais  contactantes  e  o  ambiente,
incluindo  a  cama  contaminada  e  o  material  de  cuidado  individual.  Medicamentos  tópicos  incluem  cal  sulfurada,
fipronil spot­on e spray,  piretrinas  e  amitraz  (os  dois  últimos  produtos  são  contraindicados  em  gatos).  O  uso  de
medicamentos  sistêmicos  fora  das  indicações  da  bula  inclui  selamectina  spot­on,  moxidectina  spot­on,
milbemicina oxima (VO) e ivermectina (SC). Deve­se ter cuidado para evitar ou minimizar os riscos de reações
adversas, como descrito anteriormente (p.1022). O período de tratamento depende do medicamento selecionado e
deve  ser  longo  o  suficiente  para  erradicar  os  ácaros  do  animal  e  do  seu  ambiente,  o  que  pode  ser  difícil  em
comunidades  de  animais  (colônias  de  reprodução,  canis).  Na  prática,  o  tratamento  dura  6  a  8  semanas  e  deve
continuar por algumas semanas além da cura clínica, até que a se consiga a cura parasitológica.
DEMODICOSE  CANINA:   Essa  doença  de  pele  em  cães  ocorre  quando  um  grande  número  de  ácaros  Demodex
canis habita seus folículos  pilosos  e  glândulas  sebáceas.  Em  pequeno  número,  esses ácaros fazem parte da flora
normal da pele de cães e não causam doença clínica. Os ácaros são transmitidos da mãe para o filhote durante a
amamentação, nas primeiras 72 h após o nascimento. Os ácaros passam todo o ciclo biológico no hospedeiro e a
doença  não  é  considerada  contagiosa.  A  patogênese  da  demodicose  é  complexa  e  não  é  completamente
compreendida;  as  evidências  de  predisposição  hereditária  para  a  doença  generalizada  são  fortes.  A
imunossupressão, natural ou iatrogênica, pode precipitar a doença em alguns casos. Foliculite profunda bacteriana
secundária, furunculose ou celulite podem ocorrer, levando ao prognóstico reservado.
Existem  duas  formas  clínicas  da  doença  (localizada  e  generalizada).  A  demodicose  localizada  ocorre  em  cães
com  <  2  anos  de  idade  e,  na  maioria  dos  casos,  em  especial  as  formas  localizadas,  parece  se  resolver
espontaneamente.  As  lesões  consistem  em  áreas  de  alopecia  focal,  eritema  e/ou  hiperpigmentação  e  comedões.
Normalmente  não  há  prurido,  ou  ele  é  leve.  Uma  porcentagem  desses  casos,  sobretudo  das  formas  difusas  de
demodicose  localizada,  evolui  para  a  forma  generalizada.  A  demodicose  generalizada é  uma  doença  grave,  com
lesões generalizadas, normalmente agravadas por infecções bacterianas secundárias (piodemodicose). Comumente
são acompanhadas por pododermatites. Quando há piodermas profundos, furunculoses ou celulite, os cães podem
apresentar manifestações sistêmicas com linfadenopatia generalizada, letargia e febre. O diagnóstico não é difícil,
uma  vez  que  raspados  de  pele  profundos  ou  pelos  arrancados  revelam  ovos  dos  ácaros  e  um  grande  número  de
formas  larvais.  Sempre  que  a  demodicose  generalizada  for  diagnosticada  em  um  cão  adulto,  deve­se  realizar
avaliação clínica para identificar a doença sistêmica subjacente.
A  demodicose  localizada  pode  não  ser  tratada.  O  prognóstico  para  essa  forma  normalmente  é  bom  e  a
recuperação  espontânea  é  frequente.  Em  contraste,  casos  de  demodicose  localizada  difusa  (que  pode  se
generalizar), demodicose generalizada, piodemodicose e pododemodicose, para a qual o prognóstico é reservado,
devem  ser  tratadas.  A  tosa  dos  pelos  e  a  limpeza  do  corpo,  em  especial  com  xampu  de  peróxido  de  benzoíla,
utilizado por sua atividade de limpeza folicular, podem ser necessárias. A imersão de todo o corpo em solução de
amitraz (0,025%) a cada 2 semanas permanece o único tratamento aprovado para a demodicose generalizada nos
EUA. Concentrações maiores (0,05%) e intervalos de aplicação mais curtos (1 semana) podem ser mais eficientes.
Outros  protocolos  experimentais  utilizando  imersões  diárias  da  metade  do  corpo  em  amitraz  foram  propostos
para  demodicose  generalizada  refratária.  Entre  as  lactonas  macrocíclicas,  apenas  a  milbemicina  oxima  (0,5  a  1
mg/kg,  VO,  1  vez/dia)  é  aprovada  para  demodicose  generalizada  em  alguns  países.  A  moxidectina  também  é
registrada  para  o  tratamento  de  demodicose  canina  em  alguns  países  fora  dos  EUA;  ela  está  disponível  como
formulação spot­on em combinação com produtos antipulgas (imidacloprida) e deve ser administrada a 2,5 mg/kg,
2  a  4  vezes,  com  4  semanas  de  intervalo.  Na  prática,  as  falhas  no  tratamento  com  esse  protocolo  aprovado  são
relatadas com frequência. Outros tratamentos sistêmicos de sucesso relatados incluem a moxidectina (400 μg/kg,
VO, 1 vez/dia) e ivermectina (300 a 600 μg/kg, VO, 1 vez/dia). Para a última, diferentes protocolos terapêuticos
foram propostos com aumento gradual da dose e amplo monitoramento do paciente para detectar qualquer sinal de
toxicidade.  A  ivermectina  é  contraindicada  aos  cães  da  raça  Colly  e  seus  mestiços.  No  entanto,  toxicidade
idiossincrática pode ocorrer em qualquer raça. O teste para a mutação do alelo MDR1 pode ser necessário antes do
início do tratamento. Corticosteroides locais e sistêmicos são contraindicados em qualquer animal com diagnóstico
de  demodicose.  Infecções  bacterianas  secundárias  devem  ser  tratadas  com  terapia  antimicrobiana  apropriada.  A
terapia antiparasitária deve ser mantida não apenas até a resolução dos sinais clínicos, mas até, no mínimo, dois
raspados  de  pele  negativos  consecutivos  obtidos  a  intervalos  de  um  mês.  Apenas  como  medida  profilática,  cães
demodécicos não devem ser utilizados para a reprodução.
DEMODICOSE FELINA:  A  demodicose  felina  é  uma  doença  de  pele  incomum  a  rara,  causada  por,  ao  menos,  duas
espécies de ácaros demodécicos. Acredita­se que o Demodex cati seja um habitante normal da pele do gato. É um
ácaro  folicular,  similar  ao  ácaro  canino,  porém  mais  estreito,  que  pode  causar  demodicose  localizada  ou
generalizada. A outra espécie de Demodex (em geral, denominada D. gatoi) é mais curta, com abdome largo, e é
encontrada apenas no estrato córneo. Ela causa uma demodicose superficial transmissível e contagiosa, que, com
frequência, causa prurido, e pode ser generalizada. Na demodicose folicular localizada, há uma ou várias áreas de
alopecia  focal,  normalmente  na  cabeça  e  no  pescoço.  Na  doença  generalizada  crostas,  alopecia  e  pioderma
secundário potencial de todo o corpo são observados. A forma generalizada, com frequência, é associada a outras
doenças imunossupressoras ou metabólicas subjacentes, como infecção pelo vírus da leucemia felina, infecção pelo
vírus  da  imunodeficiência  felina,  diabetes  melito  ou  neoplasias.  Em  alguns  casos,  otite  externa  ceruminosa  é  o
único sinal clínico.
O diagnóstico é realizado por meio de raspados de pele superficiais (D. gatoi) e profundos (D. cati), embora o
número de ácaros, com frequência, seja pequeno, em especial com D. gatoi. Avaliação médica é indicada em gatos
com  doença  generalizada.  Cultura  para  dermatófitos  é  essencial,  uma  vez  que  a  dermatofitose  e  a  demodicose
podem ser condições concomitantes. O prognóstico da demodicose generalizada não pode ser previsto, em razão
da  sua  relação  potencial  com  doenças  sistêmicas.  Em  alguns  casos,  há  remissão  espontânea.  Imersões  em  cal
sulfurada (2%) semanais são seguras e normalmente efetivas; amitraz (0,0125 a 0,025%) foi utilizado, porém não é
aprovado  para  uso  em  gatos  e  pode  causar  anorexia,  depressão  e  diarreia.  O  uso  de  antiparasitários  a  base  de
lactonas macrocíclicas foi relatado, mas a eficácia ainda não é conhecida.
TROMBICULOSE:   Essa  acaríase  comum,  sazonal  e  não  contagiosa  é  causada  por  um  estágio  larval  parasito  de
ácaros  de  vida  livre  da  família  Trombiculidae.  Ela  pode  afetar  carnívoros  domésticos,  outros  mamíferos
domésticos  e  silvestres,  pássaros,  répteis  e  pessoas.  Duas  espécies  comuns  encontradas  em  cães  e
gatos,  Neotrombicula  autumnalis  e  Eutrombicula  alfreddugesi,  são  relatadas  na  Europa  e  na  América
respectivamente. Adultos (ácaros da colheita) e ninfas se assemelham a pequenas aranhas e vivem em detritos em
putrefação. Em áreas temperadas, entre o verão e o outono, os cães e gatos podem adquirir das larvas parasitos ao
descansarem no chão  ou  andarem  em habitats  adequados.  Em  regiões  mais  quentes,  a  infestação  ocorre  durante
todo  o  ano.  As  larvas  (0,25  mm  de  comprimento)  se  aderem  ao  hospedeiro,  se  alimentam  por  alguns  dias  e  o
deixam após terem ingurgitado. Nesse momento, elas são facilmente identificadas como pontos imóveis, ovoides,
com  0,7  mm  de  comprimento,  alaranjados  a  vermelhos,  normalmente  encontrados  em  aglomerações  na  cabeça,
orelhas, patas e região ventral. A patogenicidade ocorre por meio de atividades traumática e proteolítica. Suspeita­
se de reações de hipersensibilidade em alguns animais, uma vez que o prurido pode variar de ausente a grave. As
lesões incluem eritema, pápulas, escoriações, queda de pelos e crostas. Quando presente, o prurido intenso pode
persistir, mesmo após a larva deixar o animal.
O diagnóstico baseia­se no histórico e nos sinais clínicos. A infestação é uma ameaça sazonal a cães e gatos de
vida livre. O diagnóstico diferencial inclui outras dermatites pruriginosas, principalmente a atopia. O diagnóstico é
confirmado por meio de exame cuidadoso das áreas afetadas. A avaliação microscópica de raspados de pele pode
ajudar a identificar as larvas, que possuem corpo de forma ovalada, que é densamente coberto por cerdas (pelos
táteis), 6 pernas longas e pedipalpos curvos que terminam em garras.
O manejo é difícil. A abordagem mais útil, se viável, consiste em manter os animais longe de áreas conhecidas
por  abrigar  um  grande  numero  de  ácaros,  para  evitar  reinfestações  durante  o  período  de  risco.  A  aplicação  de
repelentes  para  prevenir  infestações  promoveu  resultados  variáveis.  No  entanto,  amitraz,  fipronil  spray  e
piretroides  (apenas  em  cães)  podem  ser  utilizados  tanto  para  prevenção  quanto  para  o  tratamento  de  animais
infestados. O tratamento sintomático pode ser necessário em animais com prurido intenso.
ESTRAELENSIOSE:   A  estraelensiose  canina  é  uma  dermatite  parasitária  potencialmente  emergente,  rara,  não
contagiosa e esporádica, causada pelo encistamento temporário do estágio larval parasito de Straelensia cynotis na
epiderme.  Esse  ácaro  pertence  a  uma  família  próxima  à  família  Trombiculidae.  Até  o  momento,  o  seu  ciclo
biológico  é  amplamente  desconhecido,  e  a  doença  foi  relatada  apenas  na  França,  Portugal,  Espanha  e  Itália.  A
transmissão  ocorre  principalmente  em  cães  rurais  e  cães  de  caça  de  pequeno  porte,  provavelmente  por  meio  de
contato com solo contaminado, lixo e outros habitats terrestres de raposas. Não foi relatado contágio a congêneres
ou a pessoas. S. cynotis apresenta diferenças distintas de outros ácaros trombiculídeos, em especial na apresentação
clínica, aspectos histopatológicos e resposta ao tratamento.
A  estraelensiose  apresenta  surgimento  súbito  e  pode  ser  acompanhada  por  sinais  sistêmicos,  como  anorexia  e
prostração. As lesões são indolores, variavelmente pruriginosas e podem ser generalizadas ou multifocais, afetando
com  maior  frequência  a  região  dorsal  da  cabeça  e  tronco.  As  pápulas  eritematosas  características  e  os  nódulos
lembram  pequenas  crateras.  Descamação,  pústulas  e  crostas  podem  ser  observadas.  Os  diagnósticos  diferenciais
incluem  foliculite  bacteriana,  sarna  sarcóptica  e  lesão  à  bala.  O  exame  microscópico  das  amostras  obtidas  de
raspados profundos pode auxiliar na identificação das larvas (0,7 mm de comprimento, 0,45 mm de largura), cada
uma  em  um  cisto  de  parede  espessa.  As  larvas,  que  lembram  o  Neotrombicula,  são  visualizadas  com  maior
facilidade por histopatologia.
O  prognóstico  é  favorável;  a  autocura,  em  geral,  ocorre  após  vários  meses,  se  a  reinfestação  for  evitada.  No
entanto, o tratamento dos sinais clínicos é difícil. Amitraz pode ser efetivo.
LINXACARÍASE:  A linxacaríase felina é bastante comum, mas, até o momento, é uma dermatite parasitária restrita
geograficamente (Austrália, Havaí, Flórida, Texas, Brasil), causada pelo ácaro da pelagem Lynxacarus radovskyi,
que  pertence  à  família  Listophoridae.  O  ciclo  biológico  permanece  pouco  descrito,  e  essa  espécie  ainda  não  foi
relatada  em  outros  hospedeiros,  além  de  gatos.  A  infestação  tipicamente  ocorre  por  contato  direto,  mas  fômites
podem  ser  importantes  para  a  transmissão.  Os  sinais  clínicos  incluem  aparência  de  sal  e  pimenta  do  pelame,
prurido variável e alopecia. O diagnóstico se baseia na visualização dos ácaros (0,5 mm de comprimento), usando
uma  lupa  ou  o  isolamento  de  um  estágio  parasitário  em  raspados  de  pele  ou  fitas  de  acetato.  O  tratamento  com
sprays acaricidas, imersões em cal sulfurada semanais e ivermectina (300 μg/kg, SC) é efetivo. O único caso de
contágio de pessoas foi um relato que envolveu uma erupção cutânea transitória em um proprietário de um gato
com infestação maciça.

 SARNA EM EQUINOS
SARNA SARCÓPTICA:  Sarcoptes scabiei var equi é rara nos EUA, mas é o tipo de sarna mais grave em equinos. O
primeiro  sinal  é  um  prurido  intenso  em  razão  de  hipersensibilidade  aos  produtos  dos  ácaros.  As  lesões  iniciais
aparecem  na  cabeça,  pescoço  e  ombros.  As  regiões  protegidas  por  pelos  longos  e  as  partes  mais  inferiores  das
extremidades  normalmente  não  estão  envolvidas.  As  lesões  iniciam  como  pápulas  e  vesículas  pequenas  que
posteriormente evoluem para crostas. A alopecia e as crostas disseminam­se e a pele torna­se lignificada, formando
pregas  cutâneas.  Se  não  forem  tratadas,  as  lesões  podem  se  estender  por  todo  o  corpo,  levando  a  emaciação,
fraqueza generalizada e anorexia. Raspado de pele negativo não descarta a possibilidade da doença; a biopsia pode
estabelecer  o  diagnóstico.  Se  há  suspeita  de  sarna  sarcóptica,  os  animais  devem  ser  tratados.  Inseticidas
organofosforados e solução de cal sulfurada podem ser utilizados em spray, imersão ou aplicação com esponjas. O
tratamento deve ser repetido em intervalos de 12 a 14 dias por, no mínimo, 3 a 4 vezes. Como alternativa, pode–se
tentar  a  administração  oral  de  ivermectina  ou  moxidectina  na  dose  de  200  μg/kg.  Vários  tratamentos  são
necessários, com intervalos de 2 a 3 semanas. É importante tratar todos os animais contactantes.
SARNA  PSORÓPTICA:   Psoroptes  equi  é  rara  em  equinos;  provoca  lesões  em  regiões  do  corpo  com  muitos  pelos,
como topete e crina, base da cauda, abaixo do queixo, entre os membros pélvicos e nas axilas. P. cuniculi pode, em
algumas  ocasiões,  causar  otite  externa  em  equinos  e  pode  desencadear  meneios  cefálicos.  O  prurido  é
característico. As lesões iniciam como pápulas e alopecia e evoluem para espessamento e crostas hemorrágicas. Os
ácaros são mais facilmente recuperados em raspados de pele, quando comparados à sarna sarcóptica. O tratamento
é semelhante ao da sarna sarcóptica.
SARNA  CORIÓPTICA  (SARNA  DAS  PERNAS):  A  sarna  corióptica  é  comum  em  raças  pesadas  de  equinos.  As  lesões
causadas por Chorioptes equi iniciam como dermatite pruriginosa que acomete a parte distal dos membros ao redor
do casco e boletos. As pápulas são as primeiras a serem observadas, seguidas por alopecia, crostas e espessamento
da  pele.  Em  casos  crônicos,  ocorre  uma  dermatite  úmida  do  boleto.  Trata­se  de  um  diagnóstico  diferencial  para
dermatofilose (lã grumosa) em equinos de tração. Os sinais diminuem no verão, porém reaparecem com a volta do
clima frio. O curso da doença, em geral, é crônico sem tratamento, mas o prognóstico é favorável quando tratada.
Tratamentos tópicos recomendados para outras sarnas são efetivos.
Sarna corióptica em equino. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

SARNA DEMODÉCICA:  Demodex equi é rara em equinos. Os ácaros se alojam nos folículos pilosos e nas glândulas
sebáceas; D. equi se instala no corpo e D. caballi nas pálpebras e no focinho. A demodicose em equinos pode se
manifestar como alopecia e descamação macular ou como nódulos. As lesões surgem na face, pescoço, ombros e
membros  torácicos.  Não  há  prurido.  Essa  doença  foi  relatada  em  associação  ao  tratamento  crônico  com
corticosteroides. Não foram desenvolvidos regimes terapêuticos efetivos. O amitraz, utilizado em outras espécies, é
contraindicado em equinos pois pode causar cólicas graves e morte.
TROMBICULIDÍASE  (INFESTAÇÃO  POR  MICUIM,  INFESTAÇÃO  POR  ÁCAROS  DA  COLHEITA):   Os  ácaros  trombiculídeos
podem  parasitar  a  pele  de  equinos,  em  especial  no  final  do  verão  e  no  outono.  Os  ácaros  adultos  vivem  em
invertebrados e plantas; as larvas, normalmente, se alimentam em pequenos roedores, mas podem ser oportunistas
e se alimentar em pessoas e animais domésticos, inclusive em equinos. As lesões consistem em pápulas e vergões
gravemente  pruriginosos.  Não  é  necessário  tratamento  específico,  o  prurido  pode  ser  controlado  com
glicocorticoides. Repelentes podem ajudar a prevenir a infestação.
PRURIDO  POR  ÁCAROS  DA  PALHA  (ÁCARO  DA  FORRAGEM):   Esses  ácaros,  em  geral,  se  alimentam  de  matéria
orgânica em palhas e grãos e podem infestar a pele de equinos de forma oportunista. Pápulas e vergões surgem na
face  e  no  pescoço  se  os  equinos  forem  alimentados  em  um  comedouro  de  feno  e  no  focinho  e  pernas,  se  forem
alimentados no chão. O prurido é variável e pode ser controlado com glicocorticoides.

 SARNA EM OVINOS E CAPRINOS
SARNA SARCÓPTICA:  Sarcoptes scabiei var ovis é rara em ovinos; é uma enfermidade de notificação obrigatória nos
EUA.  Infecta  a  pele  desprovida  de  lã,  inicialmente  na  cabeça  e  face.  Em  cabras,  S.  scabiei  var  caprae  é
responsável por uma anormalidade de pele generalizada, caracterizada por hiperqueratose acentuada. As lesões, em
geral, começam na cabeça e pescoço. Em ambas as espécies, formulações injetáveis de ivermectina, doramectina
ou moxidectina a 200 μg/kg são tratamentos eficientes.
SARNA  CORIÓPTICA:   Chorioptes  bovis  é  comum  na  Europa,  Nova  Zelândia  e  Austrália,  durante  o  inverno.  Foi
erradicada  em  ovelhas  nos  EUA,  onde  é  uma  doença  de  notificação  obrigatória.  A  distribuição  das  lesões  é
semelhante a que ocorre em bovinos. C. caprae é bastante comum em cabras. Observam­se pápulas e crostas nas
pernas  e  nas  patas.  Se  necessário,  os  animais  podem  ser  tratados  utilizando  imersões  ou  sprays  que  contêm
organofosforados  (diazinon,  metrifonato,  propentanfós)  ou  piretroides  (deltametrina,  flumetrina)  conforme
permitido.
SARNA  PSORÓPTICA  (SARNA  OVINA):   Infestações  por  Psoroptes  ovis  são  de  notificação  obrigatória.  Não  há  casos
relatados  nos  EUA  desde  1970,  porém  a  sarna  ovina  ainda  está  presente  em  muitos  países,  inclusive  alguns  do
oeste  europeu.  Lesões  extensas,  descamativas  e  crostosas  se  desenvolvem  em  quase  todas  as  áreas  lanosas  do
corpo. O prurido intenso manifesta­se por mordidas e prurido. Os ovinos não tratados, com frequência, tornam­se
emaciados e anêmicos. Os ácaros, às vezes, são encontrados nas orelhas. Ivermectina e moxidectina (200 μg/kg),
administradas 2 vezes, em intervalos de 7 ou 10 dias, respectivamente, são efetivas. Doramectina (300 μg/kg) em
aplicação única também é efetiva. A imersão é mais efetiva se realizada duas semanas após a tosquia e deve ser
repetida  após  14  dias.  Tratamentos  aprovados  para  sarna  em  ovelhas  são  cumafós  0,3%,  fosmet  0,15  a  0,25%,
diazinon  0,03  a  0,1%  e  cal  sulfurada  aquecida  2%.  Fora  dos  EUA,  outros  sprays  ou  imersões,  tais  como
propentanfós, foxin, amitraz ou flumetrin, estão disponíveis.
A sarna psoróptica (sarna de orelha) em caprinos, causada por Psoroptes cuniculi, em geral, acomete as orelhas,
mas  pode  se  espalhar  para  a  cabeça,  o  pescoço  e  o  corpo  e  causar  irritação  grave.  Ela  acomete  particularmente
cabras Angorá, nas quais a pelagem é consideravelmente danificada. A doença em cabras Angorá foi relatada no
Texas. Apesar de o curso da doença ser crônico, o prognóstico é bom. Qualquer acaricida aprovado para uso em
ovinos elimina P. cuniculi em caprinos. As cabras de leite em lactação devem ser tratadas apenas com solução de
cal sulfurada.
SARNA DEMODÉCICA:  Essa  sarna  foi  relatada  em  ovinos  (Demodex ovis)  e  caprinos  (D. caprae),  nos  quais  causa
lesões  similares  às  dos  bovinos.  Em  caprinos,  pápulas  não  pruriginosas  e  nódulos  se  desenvolvem,  em  especial
sobre  a  face,  pescoço,  ombros  e  laterais.  Os  nódulos  contêm  um  material  espesso,  acinzentado  e  gorduroso  que
pode ser facilmente espremido; os ácaros podem ser encontrados nesse exsudato. A doença pode se tornar crônica.
As lesões localizadas em cabras podem ser incisadas, espremidas e infundidas com solução de Lugol iodado ou
rotenona  em  álcool  (1:3).  Para  casos  generalizados  em  cabras,  os  tratamentos  incluem  ronel  em  propilenoglicol
(180  ml  de  ronel  33%  em  1L  de  propilenoglicol),  aplicado  em  um  terço  do  corpo,  diariamente,  até  a  cura,  e
rotenona em álcool (1:3) aplicada em um quarto do corpo, diariamente. Triclorfon (2%) foi relatado como efetivo
para demodicose em ovelhas.
SARNA PSORERGÁTICA (PRURIDO POR ÁCARO, PRURIDO AUSTRALIANO):  Psorergates ovis é um ácaro comum da pele
de  ovinos  em  muitas  partes  do  mundo;  foi  erradicado  nos  EUA,  onde  é  uma  doença  de  notificação  obrigatória.
Essa enfermidade é caracterizada por prurido intenso generalizado e descamação, com emaranhamento e perda de
lã. Em razão do seu pequeno tamanho, é difícil encontrar os ácaros em raspados de pele. Essa doença pode causar
perdas  econômicas  relevantes  pela  perda  de  peso  e  dano  à  lã.  Imersão  ou  aspersão  com  cal  sulfurada  2  a  3%,
malation 0,2% ou cumafós 0,3% é efetiva no controle da doença; dois tratamentos com intervalos de 14 dias são
necessários.  Ivermectina  e  outras  avermectinas/milbemicinas  administradas  por  via  SC  foram  relatadas  como
curativas.

 SARNA EM SUÍNOS
A sarna sarcóptica (Sarcoptes scabiei var suis) é a única forma com alguma importância em suínos. Os ácaros são
tipicamente introduzidos no rebanho após a compra de reprodutores infestados, e a disseminação após o contato
direto é rápida. A não ser que oriundos de criatórios livres ou após o uso de programas de erradicação da sarna,
todos  os  rebanhos  suínos  devem  ser  considerados  potencialmente  infestados,  mesmo  que  acaricidas  sejam
utilizados  rotineiramente  em  alguns  grupos  de  animais.  A  sobrevivência  dos  ovos  dos  ácaros  longe  dos
hospedeiros é limitada; no entanto, a exposição por períodos tão curtos quanto 24 h em áreas que acabaram de ser
esvaziadas  e  que,  previamente,  eram  ocupadas  por  suínos  infestados  resultou  em  infestação.  Experimentos  em
laboratório  indicaram  que  os  ácaros  não  sobrevivem  >  96  h  a  temperaturas  <  25°C  ou  >  24  h  a  20  a  30°C.  A
sobrevivência foi < 1 h em temperaturas > 30°C.
Infestações  por  S.  scabiei  suis  são  correlacionadas  negativamente  com  ganho  de  peso  diário  e  conversão
alimentar em suínos. As lesões normalmente se iniciam na cabeça, em especial nas orelhas, e então se disseminam
por todo o corpo, cauda e pernas. Em geral, o prurido é intenso e associado a reações de hipersensibilidade aos
ácaros. Com a diminuição da hipersensibilidade, normalmente após vários meses, a pele espessa, áspera e seca é
coberta por crostas acinzentadas e grandes pregas cutâneas.
O  diagnóstico  é  realizado  pela  combinação  de  diferentes  abordagens:  escore  da  dermatite  avaliado  ao  abate,
índice de prurido, observação dos sinais clínicos de sarna, raspados de orelha ou pele para avaliação microscópica
e  ELISA  para  detecção  de  anticorpos  específicos.  A  utilidade  de  cada  critério  varia  de  acordo  com  a  idade  do
grupo. Essa abo rdagem global é particularmente útil durante uma campanha de erradicação.
A aspersão com lindano (0,05 a 0,1%) ou malation (0,05%) é efetiva; solução de clordano (0,25%) também pode
ser utilizada (o uso de alguns ou de todos esses produtos em animais de produção é proibido em alguns países).
Ivermectina e doramectina (300 μg/kg, SC) também são efetivas. Em razão do impacto econômico importante da
sarna  sarcóptica  na  indústria  suína,  programas  de  erradicação  locais,  regionais  e  nacionais  foram  desenvolvidos.
Eles  apresentam  uma  boa  relação  custo­benefício  e,  em  geral,  incluem  duas  administrações  de  ivermectina  ou
doramectina  (300  μg/kg,  SC)  em  todos  os  suínos  no  rebanho  nos  dias  0  e  14.  No  dia  7,  os  leitões  nascidos  no
decorrer  da  semana  anterior  também  são  tratados.  De  maneira  alternativa,  a  medicação  no  alimento  (premix  de
ivermectina,  100  μg/kg)  pode  ser  administrada  por  duas  semanas.  Nesse  caso,  os  leitões  lactentes  ou  os  suínos
doentes recebem duas doses, com intervalo de 14 dias, no início e no final da alimentação medicada (ivermectina
ou  doramectina,  300  μg/kg).  A  aplicação  local  de  acaricida,  normalmente,  não  é  necessária.  Após  o  tratamento,
emprega­se  um  protocolo  de  certificação,  que  se  baseia  na  combinação  de  avaliação  clínica  (grau  de  prurido  e
dermatite), parasitológica (raspados de orelha e pele) e dados sorológicos de um número representativo de animais
que pertencem a grupos de diferentes idades.
A  sarna  demodécica  também  é  observada  em  suínos  e  causa  lesões  cutâneas  similares  àquelas  verificadas  em
outros grandes animais. Não há tratamento confiável.

DERMATOSE ULCERATIVA DOS OVINOS (Ulceração de lábios e
membros, Balanopostite e Vulvite venérea)

A  dermatose  ulcerativa  é  uma  doença  infecciosa  dos  ovinos  causada  por  um  vírus  semelhante  ao  ectima  vírus.
Manifesta­se de 2 formas pouco distintas: uma caracterizada pela formação de úlceras ao redor da boca e do nariz
ou  nas  pernas  (ulceração  dos  lábios  e  da  perna)  e  a  outra,  por  ulceração  prepucial  e  peniana  ou  vulvar,
venereamente transmitida.
ACHADOS  CLÍNICOS:   A  lesão,  independentemente  da  localização,  é  uma  úlcera  com  superfície  escarificada,  que
sangra facilmente, varia em profundidade e extensão e contém material purulento cremoso e inodoro; é recoberta,
desde o início, com uma crosta.
As lesões faciais ocorrem no lábio superior, entre a borda labial e o orifício nasal, no queixo ou no nariz. Nos
casos  graves,  o  processo  ulcerativo  pode  perfurar  o  lábio.  As  lesões  podais  ocorrem  em  qualquer  lugar  entre  a
coroa do casco e o carpo ou tarso.
As lesões venéreas circundam parcial ou completamente o orifício prepucial e podem ficar tão graves a ponto de
produzirem  fimose.  Raramente,  o  processo  ulcerativo  pode  se  estender  até  a  glande  peniana,  de  forma  que  o
carneiro torna­se inabilitado para a reprodução natural. Nas ovelhas, o edema, a ulceração e a forma de crostas nos
lábios vulvares têm consequências menos sérias.
Não  ocorre  nenhuma  reação  sistêmica  inicial  discernível.  A  taxa  de  morbidade  é  de  geralmente  15  a  20%,
embora até 60% do rebanho possa ser infectado. Com frequência, a doença permanece não reconhecida até que as
lesões fiquem tão avançadas que os sinais de claudicação ou distúrbios na micção tornem­se aparentes.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  depende  completamente  do  reconhecimento  da  lesão  ulcerativa  característica.  A
diferenciação  entre  esta  lesão  e  a  do  ectima  contagioso  (p.  1037),  que  possui  característica  essencialmente
proliferativa, é fundamental. Na maioria dos casos, com a remoção das crostas, as lesões da dermatose ulcerativa
são crateriformes ou ulcerativas, enquanto as do ectima contagioso são proliferativas. A questão da semelhança dos
agentes  destas  2  afecções  ainda  não  se  encontra  claramente  definida,  mas  a  inoculação  de  ovinos  anteriormente
imunizados contra o ectima contagioso ajuda na elaboração do diagnóstico. Também é difícil, e em alguns casos,
impossível, diferenciar postite e vulvite ulcerativas (p. 1506) de dermatose ulcerativa sem recorrer à inoculação em
ovinos.
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  Os animais infectados devem ser isolados e aqueles com lesões genitais não devem
ser acasalados. A recuperação leva 2 a 8 semanas e não é amplamente influenciada pelo tratamento. Geralmente
não  a  terapia  não  é  instituída,  a  menos  que  os  animais  tenham  que  se  reproduzir  logo,  que  as  lesões  labiais
interfiram na ingestão de alimentos, que as lesões podais promovam claudicação ao ponto dos animais perderem
condição ou que as infecções bacterianas secundárias se tornem graves.
O  tratamento  consiste  na  remoção  das  crostas  e  de  todo  o  tecido  necrosado  das  úlceras  e  na  aplicação  de
qualquer uma das seguintes preparações: nitrato de prata (lápis estíptico), tintura de iodo forte, solução de sulfato
de cobre 30%, formaldeído 4%, cresol 5% (banho de imersão para ovinos) ou sulfa­ureia em pó. As lesões podais e
na região inferior dos membros pélvicos podem ser tratadas com soluções de sulfato de cobre ou de formaldeído
em bandejas de pedilúvio.

DOENÇAS DO TIPO VARÍOLA

As doenças do tipo varíola são doenças virais agudas que afetam muitos animais, inclusive o homem e as aves,
mas não os cães. Algumas doenças variolares também são zoonoses. Tipicamente, as lesões cutâneas e mucosas
são  disseminadas  e  progridem  de  máculas  para  pápulas,  vesículas  e  pústulas  antes  de  formarem  crostas  e
cicatrizarem. A maioria das lesões contém muitos corpúsculos de inclusão intracitoplasmáticos, que representam
locais  de  replicação  viral  nas  células  infectadas.  Em  algumas  poxviroses,  a  vesiculação  não  é  clinicamente
evidente, mas se podem observar microvesículas no exame histológico e, em algumas, as lesões proliferativas são
características.
A infecção é adquirida tanto por inalação quanto pela pele (p. ex., a varíola ovina). Em determinados casos (p.
ex., as varíolas aviária e suína), o vírus é transmitido mecanicamente por artrópodes picadores. A infecção pode ser
seguida por lesões generalizadas (p. ex., a varíola ovina) ou permanecer localizada (p. ex., a pseudovaríola bovina).
Utilizam­se cepas poxvirais com redução na virulência para imunizar contra algumas infecções, sendo o exemplo
clássico  a  erradicação  global  da  varíola  no  homem  pela  imunização  muscular  com  cepas  vivas  do  vírus  da
vaccínia.
Os  poxvírus  podem  ser  classificados  de  acordo  com  as  suas  propriedades  psicoquímicas  e  biológicas.
Imunologicamente, os vírus das varíolas humana, bovina, dos macacos etc., são proximamente relacionados com o
vírus da vaccínia e classificados dentro do gênero Orthopox. Os poxvírus aviários, os vírus do mixoma e alguns
dos outros poxvírus (p. ex., da varíola suína) são espécie­específicos. Os vírus do orf, da pseudovaríola bovina e da
estomatite papular bovina são parapoxvírus.
Na Europa, descrevem­se infecções cutâneas localizadas e, em alguns casos, uma doença generalizada fatal, nos
guepardos, leões e gatos domésticos infectados pelo vírus da varíola bovina (ver a seguir).
 DERMATOPATIA NODULAR
A dermatopatia nodular é uma doença infecciosa, eruptiva e, às vezes, fatal dos bovinos, caracterizada por nódulos
na pele e em outras partes do corpo. Uma infecção secundária quase sempre agrava a afecção. Tradicionalmente,
ocorre no sul e no leste da África, mas a partir dos anos de 1970, estendeu­se para noroeste, pelo continente, até a
África ocidental subsaariana. Também foi relatada em Israel.
ETIOLOGIA  E  EPIDEMIOLOGIA:   O  vírus  causador  se  relaciona  com  o  da  varíola  ovina.  A  cepa  prototípica  é
conhecida  como  o  poxvírus  de  Neethling.  A  dermatopatia  nodular  surge  na  forma  de  epidemia  ou
esporadicamente. Frequentemente, aparecem novos focos de infecção em áreas distantes não envolvidas no surto
inicial. A incidência é mais alta em clima de verão úmido, mas também pode ocorrer no inverno. É mais prevalente
ao  longo  de  cursos  d’água  e  em  terras  baixas.  Como  as  restrições  de  quarentena  projetadas  para  limitar  a
disseminação da infecção falharam, suspeita­se que insetos picadores tenham sido vetores; no entanto, ocorreram
surtos  sob  condições  nas  quais  os  insetos  poderiam  ser  praticamente  excluídos.  Como  a  doença  pode  ser
transmitida por meio de saliva infectada, deve­se aceitar a infecção por contato como um método de propagação.
Suspeita­se que os búfalos africanos sejam portadores no Quênia.
Pode­se  produzir  uma  infecção  artificial  por  inoculação  de  suspensões  de  nódulos  cutâneos  ou  do  sangue
coletado  durante  o  estágio  febril  inicial  ou,  ainda,  por  água  ou  alimento  contaminado  com  a  saliva  de  animais
infectados.
ACHADOS  CLÍNICOS:   Uma  injeção  subcutânea  de  material  infectado  produz  inchaço  doloroso  e  depois  febre,
lacrimejamento, secreção nasal e hipersalivação, seguidos pelas erupções características na pele e em outras partes
do corpo em cerca de 50% dos bovinos suscetíveis. O período de incubação é de 4 a 14 dias.
Os nódulos são bem circunscritos, redondos, ligeiramente salientes, firmes e dolorosos e envolvem a pele inteira
e  a  mucosa  dos  tratos  gastrintestinal,  respiratório  e  genital.  Os  nódulos  podem  se  desenvolver  no  focinho  e  nas
membranas  mucosas  nasal  e  oral.  Os  nódulos  cutâneos  contêm  uma  massa  tecidual  amarela  ou  cinza  cremosa  e
firme.  Os  linfonodos  regionais  aumentam  e  desenvolve–se  edema  no  úbere,  na  musculatura  do  peito  e  nos
membros.  Às  vezes,  ocorre  infecção  secundária  e  causa  supuração  e  descolamento  cutâneo  extensos;  como
resultado, o animal pode ficar extremamente emaciado e pode se justificar a eutanásia. Os nódulos regridem com o
tempo, ou a necrose cutânea resulta em áreas firmes e salientes claramente separadas da pele circundante. Estas
áreas escarificadas tornam­se ulceradas, se curam e cicatrizam.
A morbidade é de 5 a 50% e a mortalidade é geralmente baixa. A perda maior se deve à diminuição na produção
láctea, à perda de condição e à rejeição ou à redução no valor do couro.
DIAGNÓSTICO:   A  doença  pode  ser  confundida  com  a  pseudodermatopatia  nodular,  causada  por  um  herpesvírus
(herpesvírus  bovino  tipo  2).  Estas  doenças  podem  ser  semelhantes  clinicamente,  embora  em  algumas  partes  do
mundo as lesões por herpesvírus pareçam se restringir aos tetos e ao úbere das vacas, sendo a doença denominada
de mamite herpética (p. 1470).
A  pseudodermatopatia  nodular  é  uma  doença  mais  branda  que  a  dermatopatia  nodular  verdadeira,  mas  a
diferenciação  depende  essencialmente  de  isolamento  e  identificação  do  vírus.  Um  exame  histológico  e
ultraestrutural  dos  nódulos  pode  ser  útil.  Nos  nódulos,  podem­se  observar  corpúsculos  de  inclusão
intracitoplasmáticos  semelhantes  aos  da  varíola  ou  corpúsculos  de  inclusão  herpesvirais  intranucleares
eosinofílicos.
Dermatophilus congolensis também causa nódulos cutâneos nos bovinos (ver p. 913).
PREVENÇÃO E TRATAMENTO:  As restrições por meio de quarentena são de uso limitado. A vacinação com o vírus
atenuado proporciona o método de controle mais promissor. Também foram utilizados os poxvírus caprino e ovino
passados em cultura tecidual.
Recomenda­se  administração  de  antibióticos  para  controlar  a  infecção  secundária,  além  de  bons  cuidados  de
enfermagem.
 INFECÇÕES POR ORTHOPOXVIRUS EM GATOS
Infecções  por  orthopoxvirus  em  gatos  domésticos  ocorrem  de  forma  esporádica  no  Reino  Unido  e  na  Europa
ocidental. Um caso único de infecção por racoonpox vírus foi descrita em um gato no Canadá; o animal afetado
apresentou  uma  infecção  localizada  na  pata.  Os  gatos  afetados  costumam  apresentar  lesões  cutâneas  múltiplas,
embora também possam se observar sinais respiratórios e outros.
ETIOLOGIA E EPIDEMIOLOGIA:  Até o momento, com exceção de todos os casos de infecção por racoonpox vírus,
todos  os  otrhopox  vírus  isolados  dos  gatos  domésticos  foram  indistinguíveis  do  vírus  da  varíola  bovina  (ver  p.
1035).  A  varíola  bovina  ou  infecção  por  outros  vírus  intimamente  relacionados  também  foi  descrita  em  Felidae
capturados e em outras espécies (p. ex., elefantes, rinocerontes e tamanduás) em vários zoológicos europeus. No
entanto,  a  relação  de  alguns  desses  vírus  com  a  espécie  estabelecida  dentro  do  gênero  ainda  não  está  clara.  A
varíola  bovina  aparentemente  não  ocorre  nos  EUA,  embora  já  se  tenha  isolado  um  outro  ortopoxvírus  de
guaxinins. É possível que esse vírus também possa infectar outros hospedeiros. O vírus da varíola bovina também
é  infeccioso  para  o  homem  e  já  se  registrou  uma  transmissão  do  gato  para  homem.  Os  proprietários  devem  ser
alertados adequadamente.
Embora seja tradicionalmente descrita como uma doença dos bovinos, na realidade a varíola bovina é rara e, em
geral, aceita­se que os hospedeiros reservatórios do vírus são pequenos mamíferos silvestres. Acredita­se que os
gatos,  atualmente  os  hospedeiros  mais  reconhecidos  do  vírus  da  varíola  bovina,  infectam­se  quando  caçam.  A
maioria dos gatos afetados provém de ambientes rurais e sabidamente caçam roedores; a lesão inicial geralmente
ser descrita como originária de um ferimento pequeno e semelhante a uma mordedura. Nos gatos, a infecção tem
uma incidência sazonal acentuada, com a maioria dos casos ocorrendo entre setembro e novembro. A transmissão
entre gatos também pode ocorrer, mas geralmente resulta apenas em infecção subclínica. Os casos bovinos raros
provavelmente resultam do contato direto ou indireto com o hospedeiro reservatório, assim como alguns casos em
humanos. No entanto, também são possíveis transmissões do gato para o homem e do bovino para o homem.
A importância da doença e o seu reconhecimento relativamente recente no gato constituem um enigma. Ela pode
ter  sempre  estado  presente  na  população  felina,  sem  reconhecimento.  Alternativamente,  a  doença  pode  estar
aumentando  em  importância,  como  resultado  de  uma  alteração  na  epidemiologia  da  doença  no  hospedeiro
reservatório ou (talvez menos provável) na natureza do biotipo dominante do próprio vírus.
PATOGÊNESE:   A  porta  de  entrada  mais  comum  parece  ser  a  pele,  mas  a  infecção  oronasal  também  é  possível.
Depois  da  replicação  local  e  do  desenvolvimento  de  uma  lesão  cutânea  primária,  o  vírus  se  dissemina  para  os
linfonodos locais e desenvolve­se a viremia associada a leucócitos. A fase virêmica pode­se associar com pirexia e
depressão  e,  durante  esse  período,  pode­se  isolar  o  vírus  de  vários  tecidos,  como  pele,  ossos  turbinados  (e,  às
vezes, os pulmões) e órgãos linfoides. As lesões cutâneas secundárias disseminadas aparecem alguns dias depois
do início da viremia e continuam a aparecer lesões novas por 2 a 3 dias, quando a viremia diminui.
ACHADOS CLÍNICOS:  A maioria dos gatos afetados apresenta histórico de lesão cutânea primária única, geralmente
na  cabeça,  pescoço  ou  membro  torácico.  A  lesão  primária  pode  variar  de  ferimento  pequeno  e  crostoso  a  um
grande abscesso. Aproximadamente em 7 a 10 dias após o aparecimento da lesão primária, começam a aparecer
lesões secundárias generalizadas. No decorrer de 2 a 4 dias, elas se desenvolvem em pápulas ulceradas, circulares e
discretas,  com  cerca  de  0,5  a  1  cm  de  diâmetro.  As  úlceras  logo  ficam  recobertas  por  crostas  e  a  cicatrização
geralmente se completa com cerca de 6 semanas. Muitos gatos não exibem nenhum sinal além das lesões cutâneas,
mas  cerca  de  20%  deles  podem  desenvolver  coriza  discreta  ou  conjuntivite.  Alguns  gatos  também  podem
apresentar  pirexia,  depressão  e  inapetência  durante  a  fase  virêmica,  imediatamente  antes  e  durante  o
desenvolvimento inicial das lesões secundárias. Uma infecção bacteriana intercorrente, particularmente nas lesões
primárias,  pode  dar  origem  a  sinais  sistêmicos.  No  entanto,  a  maioria  dos  gatos  domésticos  se  recupera  sem
intercorrências. A doença pulmonar mais grave é incomum nos gatos domésticos, mas ocorre com frequência nos
guepardos e é fatal em ambas as espécies. Uma doença mais grave nos gatos domésticos com frequência associa­se
à  imunossupressão,  tanto  pelo  tratamento  com  corticosteroides  ou  associada  às  infecções  por  leucemia  ou
imunodeficiência viral felina.
Lesões:  Como  a  maioria  dos  gatos  sobrevive,  biopsias  cutâneas  geralmente  são  as  únicas  amostras  teciduais
disponíveis para exame histológico. As lesões iniciais consistem em áreas de hiperplasia e hipertrofia epidérmicas,
com vesiculações na camada de células espinhosas. Muitas das células epidérmicas limítrofes com tais vesículas
contêm corpúsculos de inclusão citoplasmáticos eosinofílicos característicos. Posteriormente, ocorrem ulceração e
necrose epidérmicas e substituição por um coágulo eosinofílico de células necróticas e fibrina. Há, na derme, um
forte exsudato com células inflamatórias mistas, circundando a lesão. À medida que a cicatrização prossegue, uma
fina  camada  de  epiderme  recobre  a  pele  por  baixo  das  crostas,  aparece  um  tecido  cicatricial  inicial  e  ocorre
infiltrado moderado de células predominantemente mononucleares.
Em  raros  casos,  nos  quais  a  doença  se  generaliza,  também  pode  haver  lesões  em  fígado,  pulmões,  traqueia,
brônquios, mucosa oral e intestino delgado.
DIAGNÓSTICO:   O  diagnóstico  presuntivo  pode  ser  realizado  com  base  nos  sinais  clínicos  de  lesões  cutâneas
múltiplas e bem circunscritas e, especialmente, se houver história de caça ou exposição a ambiente rural. Ainda,
deve­se  suspeitar  de  varíola  bovina  quando  as  lesões  cutâneas  não  respondem  aos  antibióticos.  Os  diagnósticos
diferenciais  são:  dermatite  miliar,  herpesvirose  ou  calicivirose  felinas,  granuloma  eosinofílico,  ferimentos  por
mordedura, dermatofitose e outras afecções bacterianas ou fúngicas crônicas.
Na  maioria  dos  casos,  pode­se  fazer  o  diagnóstico  presuntivo  rapidamente  a  partir  das  crostas  não  fixadas,
exsudatos ou material de biopsia, examinados quanto aos característicos vírions do orthopox em forma de tijolo,
por microscopia eletrônica. Um método de diagnóstico mais preciso e sensível é o isolamento do vírus em cultura
celular ou no corioalantoide de pintinhos. Caso não haja isolamento viral, também se poderá enviar o material de
biopsia fixado para exame histológico e o soro para a determinação de anticorpos para laboratórios.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Tanto nos gatos domésticos como nos guepardos, é importante que a varíola bovina
seja  diagnosticada imediatamente,  pois o  tratamento  com  esteroides,  que  é  sempre utilizado na terapia de outras
dermatopatias, é contraindicado. Embora nos guepardos a doença seja frequentemente grave, nos gatos domésticos,
o tratamento de suporte (antibióticos de largo espectro e fluidoterapia) geralmente ser bem­sucedido, com baixa a
mortalidade.
Como  parece  que  a  infecção  nos  gatos  domésticos  é  predominantemente  esporádica  e  adquirida  por  contato
fortuito com um animal silvestre reservatório infectado, é provável que não se indiquem medidas de controle. Nos
parques  de  animais  silvestres,  onde  os  grandes  felinos  encontram  em  risco  de  contato  com  pequenos  roedores
silvestres, e especialmente onde a doença já tiver ocorrido, a vacinação poderá ser útil. O vírus da vaccínia parece
ter  baixa  patogenicidade  nos  gatos  domésticos  e  os  guepardos  parecem  ser  refratários  ao  mesmo;  ainda  não  se
realizou nenhum experimento com vacinas com outros orthopoxvírus. Atualmente, o controle dos surtos entre os
grandes felinos depende do diagnóstico imediato e do isolamento dos animais afetados para reduzir a possibilidade
de  disseminação  entre  os  gatos.  As  propriedades  podem  ser  desinfetadas  com  alvejantes  de  hipoclorito  ou
detergentes. Em temperatura ambiente, os poxvírus são relativamente resistentes e podem permanecer infecciosos
nas crostas ressecadas por meses.

 PSEUDOVARÍOLA BOVINA (Nódulos dos ordenhadores, Paravacínia)
Esta  infecção  leve  e  comum  no  úbere  e  nos  tetos  das  vacas  é  causada  por  um  parapoxvírus  e  encontra­se
mundialmente disseminada. O vírus da pseudovaríola bovina se relaciona com o do ectima contagioso (p. 1037) e
com o da estomatite papilar bovina (p. 194). Estes parapoxvírus diferem morfologicamente do vírus da vaccínia e
dos  outros  poxvírus.  Possuem  uma  amplitude  limitada  de  hospedeiros,  não  podem  ser  propagados  em  ovos
férteis de galinha e crescerão em algumas culturas celulares, embora com relativa deficiência.
As  lesões  começam  como  pápulas  pequenas  e  vermelhas  nos  tetos  ou  no  úbere.  Estas  pápulas  podem  ser
seguidas rapidamente por formação de crostas, ou poderão se desenvolver vesículas ou pústulas pequenas antes de
as crostas se formarem. As crostas podem ser abundantes, mas é possível removê­las sem causar dor. Ocorre uma
granulação sob as mesmas, resultando em lesão saliente que cicatriza a partir do centro e deixa uma ferradura ou
um anel circular característicos de crostas pequenas. Esse estágio é alcançado em cerca de 7 a 12 dias. Algumas
lesões  persistem  por  vários  meses,  conferindo  aos  tetos  afetados  uma  sensação  áspera  e  aparência  grosseira,
podendo  formar  mais  crostas.  A  infecção  se  dissemina  lentamente  pelos  rebanhos  leiteiros  e  uma  porcentagem
variável  dos  bovinos  exibe  lesões  em  qualquer  momento.  Os  bovinos  podem  se  reinfectar  nas  lactações
subsequentes.
As  lesões  com  crostas  podem  ser  confundidas  com  leves  lesões  traumáticas  nos  tetos  e  no  úbere.  As  crostas
examinadas com microscópio eletrônico costumam exibir partículas virais características.
O controle da infecção dentro de um rebanho é difícil e depende essencialmente das medidas de higiene, como
banho  por  imersão  dos  tetos  para  destruir  os  vírus  e  prevenir  a  transmissão.  Uma  pequena  imunidade  parece  se
desenvolver.
Pessoas podem tornar­se infectados com nódulos vermelho­arroxeados pruriginosos, mas indolores, geralmente
presentes nos dedos ou mãos. Estas lesões causam alterações pequenas e desaparecem depois de várias semanas.

Parapoxvírus da pseudovaríola bovina (microscopia eletrônica, pequeno aumento). Cortesia do Dr. Paul Gibbs.

 VARÍOLA BOVINA
Nesta  doença  eruptiva  leve  das  vacas  leiteiras,  as  lesões  ocorrem  no  úbere  e  nos  tetos.  Embora  já  tenha  sido
comum,  atualmente  a  varíola  bovina  é  considerada  extremamente  rara  e  é  descrita  somente  na  Europa  ocidental
(ver p. 1032).
O vírus da varíola bovina está intimamente relacionado, em termos antigênicos, com os vírus da vaccínia e da
varíola  humana.  Realmente,  os  dois  primeiros  só  podem  ser  diferenciados  por  meio  de  técnicas  laboratoriais
sofisticadas.  Antes  da  vacinação  contra  a  varíola  humana  ter  sido  interrompida,  alguns  surtos  nos  bovinos  da
América do Norte e Europa se deviam à infecção com vaccínia originária de pessoas recém­vacinadas. As viroses
relacionadas  com  a  vaccínia  continuam  a  causar  surtos  ocasionais  de  infecções  nos  tetos  dos  gados  de  leite  da
América do Sul e nos búfalos do subcontinente Indiano. O vírus dissemina­se para os humanos, frequentemente
pelo contato com o bovinos. A epidemiologia destas viroses é desconhecida, porém foi sugerida que são endêmicas
e sobrevivem em hospedeiros reservatórios, exceto humanos.
A doença se dissemina por contato durante a ordenha. Depois de um período de incubação de 3 a 7 dias, durante
o qual os bovinos podem ficar levemente febris, aparecem pápulas nos tetos e no úbere. As vesículas podem não
ficar evidentes ou podem se romper facilmente, deixando áreas ulceradas e escarificadas que formam crostas. As
lesões  cicatrizam  dentro  de  1  mês.  A  maioria  das  vacas  de  um  rebanho  de  ordenha  pode  ser  atingida.  Os
ordenhadores poderão  desenvolver  febre  e  apresentar  lesões  nas  mãos,  nos  braços ou na face. Ocasionalmente a
varíola bovina pode causar doença generalizada e foram reconhecidas fatalidades.
A  varíola  bovina  ou  infecção  por  vaccínia  podem  ser  confundidas  com  a  mamite  herpética  bovina  (p.  1470);
como as lesões são superficialmente semelhantes, exige­se confirmação laboratorial. Os vírus da varíola bovina e
vaccínia podem ser facilmente visualizados por microscopia eletrônica. Enquanto não podem ser distinguidos entre
si, amas as morfologias diferem do notado na microscopia eletrônica dos vírus da pseudovaríola bovina e mamite
herpética viral. Os vírus da varíola bovina e vaccínia crescem facilmente em culturas celulares.
As medidas para evitar a disseminação da varíola bovina dentro de um rebanho devem se basear em isolamento
e higiene. Varíola bovina e vaccínia são causas importantes de zoonoses.

 VARÍOLA SUÍNA
A varíola suína é uma doença infecciosa aguda e frequentemente branda, caracterizada por erupções cutâneas e que
acomete  somente  os  suínos.  É  relatada  nos  EUA,  particularmente  no  meio­oeste  e  já  foi  descrita  em  todos  os
continentes, embora a incidência geral seja baixa.
Historicamente, o vírus da vaccínia esteve envolvido em alguns surtos, mas atualmente o vírus da varíola suína
parece  ser  a  única  causa.  A  doença  aqui  descrita  é  a  provocada  pelo  vírus  da  varíola  suína.  Este  é  distinto  dos
outros poxvírus e não protege contra infecção pelo vírus da vaccínia. Cresce em culturas de células suínas, mas não
em ovos embrionados. É relativamente termoestável e sobrevive por cerca de 10 dias a 37°C.
A doença é mais frequentemente observada em suínos jovens, com 3 a 6 semanas de idade, mas todas as idades
podem  ser  afetadas.  Após  o  período  de  incubação  de  cerca  de  1  semana,  podem­se  observar  áreas  vermelhas  e
pequenas,  frequentemente,  na  face,  nas  orelhas,  face  interna  dos  membros  pélvicos  e  abdome.  Estas  se
desenvolvem  em  pápulas  e,  em  poucos  dias,  surgem  pústulas  ou  vesículas  pequenas.  Os  centros  das  pústulas  se
ressecam, formam crostas e ficam circundados por uma zona inflamada e saliente, de forma que as lesões parecem
ser umbilicadas. Posteriormente, formam­se crostas escuras (com 1 a 2 cm de diâmetro), que conferem aos leitões
afetados  uma  aparência  manchada.  Estas  crostas  eventualmente  caem  ou  são  retiradas  com  fricção,  sem  deixar
cicatriz.  Podem  ocorrer  sucessivas  lesões,  de  forma  que  nem  todas  se  encontram  no  mesmo  estágio.  O  estágio
inicial  da  doença  pode  ser  acompanhado  de  ligeira  febre,  inapetência  e  embotamento.  Poucos  suínos  morrem
devido à varíola suína não complicada.
O  vírus  é  abundante  nas  lesões  e  pode  ser  transferido  de  um  suíno  para  o  outro  pelo  piolho  picador
(Haematopinus suis). A doença também pode ser transmitida, possivelmente entre fazendas, por outros insetos que
atuam como transportadores mecânicos.
Os  suínos  recuperados  ficam  imunes.  Não  existe  nenhum  tratamento  específico.  A  erradicação  dos  piolhos  é
importante.

 VARÍOLAS OVINA E CAPRINA
As  varíolas  ovina  e  caprina  são  doenças  graves  e  quase  sempre  fatais,  caracterizadas  por  erupção  cutânea
disseminada.  Ambas  as  doenças  encontram­se  restritas  a  partes  do  sudeste  da  Europa,  da  África  e  da  Ásia.  Os
poxvírus  dos  ovinos  e  caprinos  (capripoxvírus)  são  proximamente  aparentados,  tanto  antigênica  como  físico­
quimicamente. Também são relacionados com o vírus da dermatopatia de encaroçamento (ver anteriormente). Os
relatos  sobre  a  suscetibilidade  natural  dos  ovinos  ao  poxvírus  caprino  e  vice­versa  são  conflitantes;  pelo  menos
algumas cepas parecem ser capazes de infectar ambas as espécies.
O período de incubação da varíola ovina é de 4 a 8 dias e o da varíola caprina é de 5 a 14 dias. O quadro clínico
é  semelhante  nas  2  doenças,  mas  geralmente  ser  menos  grave  nos  caprinos.  Desenvolvem­se  febre  e  um  grau
variável  de  distúrbio  sistêmico.  As  pálpebras  tornam­se  inchadas  e  há  formação  de  secreção  mucopurulenta  e
crostas  nas  narinas.  Desenvolvem­se  lesões  cutâneas  disseminadas,  mais  facilmente  observadas  no  focinho,  nas
orelhas e áreas desprovidas de lã ou pelos longos. A palpação pode detectar lesões não facilmente observadas. As
lesões começam como áreas eritematosas na pele e progridem rapidamente para placas circulares e salientes com
bordas  congestas,  causadas  por  inflamação  local,  edema  e  hiperplasia  epitelial.  Embora  histologicamente  se
encontrem presentes microvesículas, as vesículas e pústulas não são clinicamente evidentes. O vírus é abundante
nas lesões cutâneas nesse estágio. À medida que as lesões começam a regredir, ocorre necrose dérmica e formam–
se crostas duras e escuras, que são precisamente separadas da pele circundante. A regeneração do epitélio sob as
crostas leva várias semanas. Quando se removem as crostas, permanece uma cicatriz com forma de estrela, sem
pelos ou lã. Nos casos graves, podem ocorrer lesões nos pulmões. Em alguns ovinos e em determinadas raças, a
doença pode ser leve ou inaparente.

Leitão com lesões discretas de varíola suína. Cortesia do Dr. Paul Gibbs.

Já se sugeriu que a transmissão pudesse ser aerógena ou por contato direto com as lesões ou, ainda, mecânico,
por meio de insetos picadores.
A doença em qualquer espécie deve ser diferenciada da infecção mais leve, ectima contagioso (Orf,  p.  1037),
que causa predominantemente lesões proliferativas e crostosas ao redor da boca.
A  infecção  resulta  em  imunidade  sólida  e  duradoura.  As  vacinas  de  vírus  vivos  atenuados  conferem  uma
imunidade  mais  longa  que  as  de  vírus  inativados.  Também  se  podem  utilizar  os  vírus  vivos  e  atenuados  da
dermatopatia de encaroçamento para vacina contra as varíolas ovina e caprina.

ECTIMA CONTAGIOSO (Orf, Dermatite pustular contagiosa,
Ferida bucal)
O ectima contagioso é uma dermatite infecciosa dos ovinos e caprinos que acomete principalmente os lábios de
animais jovens. A doença geralmente ser mais grave em caprinos do que nos ovinos. O homem é ocasionalmente
infectado por contato direto.
ETIOLOGIA  E  EPIDEMIOLOGIA:   O  poxvírus  causador  (um  parapoxvírus)  se  relaciona  com  os  vírus  da
pseudovaríola bovina (p. 1035) e da estomatite papilar bovina (p. 194). A infecção ocorre por contato. O vírus é
altamente  resistente  ao  ressecamento  ambiental  e  já  foi  recuperado  de  crostas  secas  após  12  anos.  Também  é
resistente ao glicerol e ao éter.
O ectima contagioso é cosmopolita, sendo comum em cordeiros jovens, no final do verão, outono e inverno, em
pastejo e nos lotes de engorda.
ACHADOS CLÍNICOS E DIAGNÓSTICO:  A  lesão  primária  se  desenvolve  nas  junções  mucocutâneas  dos  lábios  e  ao
redor  do  dente  incisivo  em  erupção,  mas  também  pode  se  estender  para  a  mucosa  da  cavidade  bucal.
Ocasionalmente,  notam­se  lesões  nas  patas  e  ao  redor  da  coroa,  locais  em  que  a  infecção  por  Dermatophilus
congolensis  comumente  causa  “strawberry  footrot”.  As  ovelhas  que  amamentam  cordeiros  infectados  podem
desenvolver  lesões  nos  tetos,  estendendo  para  a  pele  do  úbere.  As  lesões  se  desenvolvem  como  pápulas  e
progridem  pelos  estágios  vesiculares  e  pustulares,  antes  de  formar  crostas.  A  coalescência  de  muitas  lesões
discretas  geralmente  levar  à  formação  de  crostas  grandes  e  a  proliferação  do  tecido  dérmico  produz  uma  massa
verrucosa  sob  as  mesmas.  Quando  a  lesão  se  estende  para  a  mucosa  oral,  desenvolve­se  frequentemente  uma
necrobacilose secundária (p. 1545).
Durante o curso da doença (1 a 4 semanas), as crostas caem e os tecidos curam sem formar cicatriz. Durante os
estágios ativos da infecção, os cordeiros mais intensamente afetados não comem normalmente e perdem condição.
As  lesões  extensas  nas  patas  provocam  claudicação.  Mastites,  às  vezes  gangrenosas,  podem  ocorrer  nas  ovelhas
com lesões nos tetos.
A  lesão  é  característica.  A  doença  deve  ser  diferenciada  da  dermatose  ulcerativa  (p.  1030),  que  produz  uma
destruição  tecidual  e  úlceras  crateriformes.  O  ectima  geralmente  acomete  animais  mais  jovens  que  a  dermatose
ulcerativa,  embora  esse  critério  só  possa  ser  utilizado  presuntivamente.  Febre  aftosa  e  língua  azul  devem  ser
consideradas  caso  a  morbidade  seja  alta  e  os  sinais  clínicos  são:  salivação,  claudicação  e  febre.  Foliculite
por Staphylococcus acomete a pele do focinho e na região periocular. A demonstração direta do vírus em material
de  crosta,  por  microscopia  eletrônica  foi  substituída  pelo  PCR,  como  método  de  escolha  para  diagnóstico  de
ectima.  Historicamente,  a  diferenciação  positiva  poderia  ser  obtida  pela  inoculação  em  ovinos  suscetíveis  e
imunizados contra ectima.
TRATAMENTO E CONTROLE:  Antibióticos tópicos e parenterais podem auxiliar no combate da infecção bacteriana
secundária  das  lesões  cutâneas.  Nas  áreas  endêmicas,  devem­se  aplicar  repelentes  e  larvicidas  apropriados  nas
lesões para prevenir miíase. O vírus é transmissível ao homem e geralmente as lesões são restritas às mãos e à face,
são mais proliferativas, por vezes, bastante desconfortáveis. Os veterinários e os tratadores de ovinos devem tomar
precauções  protetoras  razoáveis  e  usar  luvas  descartáveis.  No  homem,  o  diagnóstico  é  estabelecido  pela
transmissão do vírus para ovinos; um teste de fixação de complemento pode ser útil.
Os  ovinos  recuperados  de  uma  infecção  natural  ficam  altamente  resistentes  à  reinfecção.  Apesar  da
multiplicidade das cepas virais imunogênicas, as vacinas comerciais contra uma cepa única atualmente utilizadas
produzem uma imunidade razoável em todas as partes dos EUA (com uma exceção ocasional). As falhas vacinais
parecem  ser  decorrentes  da  virulência  da  cepa  infecciosa  em  maior  grau  do  que  a  diferenças  na  antigenicidade
vacinal. Os ovinos imunizados contra o ectima contagioso permanecem suscetíveis à dermatose ulcerativa.
As vacinas vivas devem ser utilizadas com cuidado para evitar a contaminação de propriedades não infectadas e
os  animais  vacinados  devem  ser  isolados  do  lote  não  protegido  até  que  a  queda  das  crostas.  Uma  pequena
quantidade da vacina é passada sobre as escarificações cutâneas leves, geralmente na face interna da coxa, atrás
dos cotovelos e na prega caudal. Os cordeiros devem ser vacinados com cerca de 1 mês de idade. Para melhores
resultados,  sugere­se  uma  segunda  vacinação  cerca  de  2  a  3  meses  mais  tarde.  Os  cordeiros  não  imunizados
deverão ser vacinados antes de entrarem em lotes de engorda infectados.
ACANTOSE NIGRICANS

Acantose nigricans é uma condição clínica notada em cães, caracterizada por hiperpigmentação axilar e inguinal,
lignificação e alopecia.
ETIOLOGIA E ACHADOS CLÍNICOS:  Acantose nigricans é um distúrbio de hiperpigmentação, sem predisposição por
sexo. Acantose nigricans primária é uma genodermatose que acomete várias raças, mas em particular Dachshund.
Os  sinais  clínicos  normalmente  surgem  com  1  ano  de  idade,  nessa  raça.  Acantose  nigricans  secundária  pode
ocorrer em qualquer raça de cão, em qualquer idade; é mais comum em raças predispostas a doenças que resultam
em  inflamação  das  regiões  axilar  e  inguinal,  em  razão  de  anormalidades  de  conformação,  obesidade,
endocrinopatias (p. ex., hipotireoidismo, hiperadrenocorticismo, disfunção de hormônios sexuais), prurido axilar e
inguinal  associados  à  dermatite  atópica,  alergia  alimentar,  dermatite  de  contato,  distúrbios  primários  de
queratinização e infecções de pele (p. ex., piodermite estafilocócica, dermatite por Malassezia).
Os  sinais  clínicos  começam  com  aumento  da  pigmentação  nas  regiões  axilar  e/ou  inguinal.  Na  acantose
nigricans primária, a hiperpigmentação inicialmente é difusa e não inflamatória; tende a se desenvolver de maneira
uniforme  nas  áreas  afetadas.  Na  acantose  nigricans  secundária,  a  distribuição  é  na  forma  de  pápulas  e,  com
frequência, começa com aparência de renda. Pode não ocorrer em todas as áreas ao mesmo tempo. A inflamação é
branda,  mas  se  torna  mais  grave  com  o  tempo.  As  lesões  na  acantose  nigricans  secundária  não  estão
necessariamente  presentes  em  ambas  as  regiões,  axilar  e  inguinal,  tampouco  são  necessariamente  simétricas.  Na
acantose nigricans primária, o desenvolvimento de lesões inflamatórias secundárias (i. e., lignificação) ocorre mais
comumente  como  resultado  da  fricção  devido  à  conformação.  Acantose  nigricans  secundária  é  iniciada  por
inflamação e/ou fricção. As lesões podem se desenvolver em áreas de hiperpigmentação grave, com lignificação
marcante,  perda  de  pelos  e  seborreia.  Com  frequência,  essas  áreas  são  odoríferas  e  podem  estar  doloridas.  As
bordas  dessas  lesões,  em  geral,  são  eritematosas;  esse  é  um  sinal  de  piodermite  bacteriana  secundária  ou  por
levedura. Com o tempo, as lesões podem progredir e disseminar para a região ventral do pescoço, virilha, abdome,
períneo,  jarretes,  área  periocular  e  pavilhão  auricular.  O  prurido  é  variável  e  normalmente  é  resultado  de
crescimento microbiano secundário excessivo (dermatite por estafilococos ou Malassezia) ou prurido resultante de
uma doença primária.
DIAGNÓSTICO:  Os achados físicos compatíveis com o diagnóstico clínico de acantose nigricans não são difíceis de
reconhecer. Acantose nigricans primária é um diagnóstico de exclusão; acantose nigricans em um cão Dachshund
jovem  nem  sempre  é  causada  por  genodermatose.  Anamnese  minuciosa  e  exame  físico  são  necessários  para
identificar uma causa primária. Raspados de pele devem ser feitos para excluir demodicose, em especial em cães
jovens.  Imprints  são  úteis  para  confirmar  infecções  bacterianas  e  por  Malassezia.  Dependendo  dos  sinais  não
dermatológicos,  podem  ser  úteis  os  testes  de  função  de  tireoide  e  adrenal;  doenças  endócrinas  da  pele  não  são
pruriginosas, a menos que sejam acompanhadas de infecções secundárias na pele. Testes cutâneos intradérmicos,
teste alimentar, ou ambos, podem ser necessários. Biopsia cutânea normalmente não é necessária para confirmar a
doença primária e geralmente não facilitam a identificação da doença primária associada à doença secundária, com
possível  exceção  da  seborreia  primária.  Em  alguns  casos,  as  biopsias  de  pele  podem  identificar  infecções
bacterianas  secundárias  que  não  haviam  sido  reconhecidas  previamente.  A  presença  de  tais  infecções  é  comum;
neste  caso,  as  infecções  secundárias  têm  pouco  valor  diagnóstico.  Na  maioria  dos  casos,  é  útil  tratar  a  infecção
secundária bacteriana e/ou por Malassezia antes de realizar outros testes diagnósticos.
TRATAMENTO:   A  acantose  nigricans  primária  em  cão  Dachshund  não  é  curável.  Em  alguns  cães,  as  lesões  não
progridem  além  de  um  problema  cosmético.  Se  há  inflamação,  os  casos  iniciais  podem  responder  a  xampu
antimicrobiano e ao tratamento tópico local com glicocorticoides, por exemplo, spray de acetato de triancinolona
ou pomada de valerato de betametasona. Com a progressão das lesões, terapias sistêmicas mais agressivas podem
ser úteis. As seguintes terapias sistêmicas foram utilizadas, sozinhas ou em combinação, com graus variáveis de
sucesso:  200  UI  de  vitamina  E  VO,  2  vezes/dia,  por  2  a  3  meses;  1  mg  de  glicocorticoides/kg,  VO,  1  vez/dia,
durante 7 a 10 dias e, em seguida, em dias alternados; 2 mg de melatonina/cão, SC, 1 vez/dia, por 3 a 5 dias e, em
seguida,  semanalmente  ou  mensalmente,  conforme  a  necessidade.  O  tratamento  concomitante  das  infecções
bacterianas  secundárias  ou  por  Malassezia  é  útil  e  deve  ser  realizado  antes  da  terapia  sistêmica  com
glicocorticoides;  a  terapia  antimicrobiana  é  compatível  com  outras  terapias.  Xampus  antisseborreicos,  em  geral,
são benéficos para remoção do excesso de oleosidade e do odor, e devem ser utilizados com frequência (i. e., 2 a 3
vezes/semana).
Na acantose nigricans secundária, a maioria das lesões se cura após a identificação e correção da causa primária.
Alguma  hiperpigmentação  residual  pode  permanecer.  O  tratamento  de  crescimento  secundário  excessivo  de
bactérias  e  leveduras  é  crítico.  Se  o  cão  não  foi  tratado  previamente  para  infecção  estafilocócica  secundária  da
pele, indica­se terapia empírica com fármacos de espectro estreito, como trimetoprima­sulfonamida oral (15 a 30
mg/kg,  2  vezes/dia),  eritromicina  (10  a  20  mg/kg,  3  vezes/dia)  ou  lincomicina  (15  a  30  mg/kg,  2  vezes/dia).
Cefalexina (30 mg/kg, 2 vezes/dia) pode ser o medicamento de melhor custo­benefício em cães de grande porte.
Cães que recebem terapia prolongada ou tratamentos com vários medicamentos devem ser tratados com base nos
resultados  de  cultura  e  antibiograma;  estafilococos  resistentes  à  meticilina  estão  se  tornando  mais  comuns.  A
infecção  por  leveduras  pode  ser  tratada  com  sucesso  com  itraconazol,  cetoconazol  ou  fluconazol  (5  a 10  mg/kg
VO),  concomitantemente.  Os  cães  acometidos  se  beneficiam  bastante  da  terapia  com  o  uso  de  antimicrobiano
apropriado e de xampu antiseborreico (2 a 3 vezes/semana). Se as lesões forem causadas por fricção, emolientes
podem ser benéficos.
Os sinais clínicos se regridem lentamente, possivelmente no decorrer de meses.

COMPLEXO GRANULOMA EOSINOFÍLICO

A etiologia desse grupo de doenças que acomete gatos, cães e equinos é relacionada principalmente a uma reação
de  hipersensibilidade  primária.  Isso  é  particularmente  verdadeiro  em  gatos  e  equinos.  Hipersensibilidades  a
insetos, ambiente e dieta foram documentadas em gatos, enquanto hipersensibilidade a insetos foi observada em
alguns  equinos  e  em  pequeno  número  de  cães.  Predisposição  genética  e  infecções  bacterianas  também  foram
observadas em gatos. Em todas as espécies há casos idiopáticos.

Cães
Em  cães,  as  lesões  relatadas  como  granulomas  eosinofílicos  se  assemelham  histologicamente  aos  granulomas
eosinofílicos  de  gatos,  com  acentuada  degeneração  do  colágeno  circundado  por  um  infiltrado  granulomatoso  e
eosinofílico.  Essas  lesões  podem  ser  observadas  como  massas  vegetativas  ou  ulceradas  na  cavidade  bucal  ou,
menos comumente, como placas, nódulos ou pápulas nos lábios e outras áreas do corpo. Qualquer raça pode ser
afetada, mas Husky Siberiano e Cavalier King Charles Spaniel parecem mais suscetíveis.
A  maioria  das  lesões  responde  aos  corticosteroides  e  a  terapia  normalmente  implica  no  uso  de  prednisona  ou
prednisolona oral (0,5 a 2 mg/kg/dia, inicialmente, reduzindo a dose no decorrer de 20 a 30 dias). Há recidiva das
lesões em alguns cães, nos quais a terapia com dose baixa de corticosteroides, em dias alternados, é indicada.

Equinos
Em equinos, a doença foi denominada granuloma eosinofílico equino, com degeneração do colágeno, necrobiose
nodular do colágeno e granuloma colagenolítico. As lesões são nodulares, não ulcerativas e não pruriginosas. Elas
geralmente são encontradas nas áreas em que é colocada a sela, centro do tronco e área cervical lateral e podem ter
uma  área  central  cinza­esbranquiçada.  Lesões  antigas  podem  se  tornar  mineralizadas.  Picadas  de  insetos  e
traumatismos foram etiologias sugeridas, embora o início ocasional durante o inverno em regiões de clima frio e
em áreas que não estão em contato com a sela ou em áreas de cravo de ferradura sugiram causas multifatoriais. A
histologia  revela  áreas  multifocais  de  fibras  de  colágeno  circundadas  por  inflamação  granulomatosa  que  contém
eosinófilos. Assim, histologicamente, essa lesão é similar ao granuloma eosinofílico de gatos e cães.
Lesões  solitárias  podem  ser  tratadas  com  extirpação  cirúrgica  ou  injeções  sublesionais  de  corticosteroides.  As
lesões mineralizadas, com frequência, requerem extirpação. Acetonida de triancinolona (3 a 5 mg/lesão) ou acetato
de  metilprednisolona  (5  a  10  mg/lesão)  é  efetivo.  Não  deve  ser  administrado  mais  que  o  total  de  20  mg  de
acetonida  de  triancinolona  sublesional,  ao  mesmo  tempo,  em  razão  do  risco  de  laminite.  Equinos  com  lesões
múltiplas  devem  ser  tratados  com  prednisona  ou  prednisolona  oral,  na  dose  de  1,1  mg/kg,  1  vez/dia,  por  2  a  3
semanas.  Em  equinos  com  lesões  recidivantes,  testes  intradérmicos  de  alergia,  em  particular  com  antígenos  de
insetos, são recomendados. A hipossensibilização e o controle de insetos podem ser paliativos, em alguns casos.

Gatos
Em gatos, há três enfermidades que foram agrupadas no complexo.
ÚLCERA EOSINOFÍLICA:  Essa lesão bem circunscrita, eritematosa e ulcerativa, indolor e sem prurido, normalmente
é  notada  no  lábio  superior.  Algumas  são  associadas  à  hipersensibilidade  à  picada  de  pulgas.  A  progressão  para
carcinoma  de  célula  escamosa  é  extremamente  rara,  embora  sua  ocorrência  seja  relatada.  A  histologia  mostra
dermatite  ulcerativa  com  infiltrado  de  neutrófilos,  plasmócitos  e  predominância  de  células  mononucleares.
Fibroplasia discreta a moderada é comum. Eosinofilia tecidual ou periférica não é tão comum quanto nas placas
eosinofílicas e no granuloma linear.
PLACAS  EOSINOFÍLICAS:   Essas  lesões  proeminentes,  bem  delimitadas  e  eritematosas  são  encontradas  mais
comumente  na  face  interna  da  coxa  e  no  abdome;  essa  doença  é  extremamente  pruriginosa.  Pode  ser  verificada
linfadenopatia  regional.  A  histologia  mostra  dermatite  eosinofílica  difusa,  com  edema  epidérmico  inter  e
intracelular marcante e vesículas que contêm eosinófilos. Mastócitos podem estar presentes na derme. Eosinofilia
periférica é comum.
GRANULOMA  EOSINOFÍLICO:   Essas  lesões  tipicamente  proeminentes,  bem  delimitadas,  amareladas  a  róseas,
podem ser encontradas em qualquer parte do corpo, sendo mais comuns na parte posterior das coxas e na cavidade
bucal.  Quando  essa  lesão  ocorre  na  cabeça,  face,  pontes  nasais,  pavilhão  auricular  ou  coxins  plantares,  a  causa
indutora  pode  ser  picada  de  mosquito.  As  lesões  na  parte  posterior  da  coxa  normalmente  são  distintamente
lineares.  Histologicamente,  uma  resposta  inflamatória  granulomatosa  circunda  as  fibras  colágenas.  Eosinofilia
tecidual  e  periférica  são  marcantes  quando  as  lesões  situam­se  na  cavidade  bucal,  mas  variam  quando  as  lesões
estão na pele.
TRATAMENTO:  Distúrbios de hipersensibilidade (alergia a pulgas, alimentos ou inalantes) devem ser investigados
por meio da instituição de um controle rigoroso de pulgas, testes alérgicos (intradérmico ou in vitro)  e  testes  de
exclusão  de  alimentos.  Hipossensibilização,  controle  contínuo  de  insetos  e  manejo  dietético  devem  ser
empregados,  quando  apropriados.  Terapia  antimicrobiana  (amoxicilina­clavulanato,  cefalosporinas  ou
fluoroquinolonas) deve ser tentada empiricamente, em especial nos casos refratários. Se nenhuma causa primária
pode ser determinada e a doença é refratária, pode­se tentar corticosteroides, como acetato de metilprednisolona (4
mg/kg  IM,  uma  vez  a  cada  2  semanas,  no  total  de  2  ou  3  injeções),  prednisolona  oral  (2  a  4  mg/kg/dia)  ou
triancinolona oral (0,8 mg/kg/dia). A administração oral de corticosteroide deve ser reduzida para dias alternados
(ou  a  cada  3  dias,  no  caso  da  triancinolona)  e  as  doses  devem  ser  reduzidas  quando  utilizadas  em  tratamento
prolongado. O acetato de metilprednisolona injetável de longa ação não deve ser utilizado com mais frequência do
que a cada 8 a 12 semanas, em razão do risco de hiperadrenocorticismo e/ou diabetes melito. Dose de 0,2 mg de
clorambucila/kg, 3 vezes/semana, tem sido utilizada em casos refratários; requer monitoramento sanguíneo mais
intensivo, em razão do seu potencial para supressão de medula óssea; podem ser necessárias 6 a 12 semanas antes
que  a  resposta  seja  verificada;  caso  se  note  resposta  deve  ser  reduzir  a  dose  e  a  frequência.  Ciclosporina  (5
mg/kg/dia) tem sido utilizada em casos refratários. Isso pode requerer monitoramento laboratorial mensal quanto a
alterações  metabólicas  (p.  ex.,  renal),  embora  a  disfunção  de  órgãos  internos  seja  relativamente  rara.
Progestágenos,  como  acetato  de  megestrol  ou  acetato  de  medroxiprogesterona,  são  efetivos;  no  entanto,  não  são
recomendados em razão de suas reações adversas potenciais.

DERMATOSE NASAL DOS CÃES (Nariz do Colly, Dermatite solar
nasal)

Dermatoses nasais dos cães podem ser causadas por várias doenças. As lesões podem acometer a ponte nasal, o
plano  nasal,  ou  ambos.  As  porções  pilosas  do  nariz  são  afetadas  em  casos  de  piodermite,  dermatofitose  e
demodicose.  No  lúpus  eritematoso  sistêmico  ou  no  pênfigo,  com  frequência,  todo  o  focinho  se  apresenta  com
crostas (com exsudação sérica ocasional) ou úlceras. No lúpus sistêmico e discoide e, ocasionalmente, no pênfigo e
no linfoma cutâneo, o plano nasal apresenta despigmentação, eritema e, por fim, pode ulcerar. A aparência normal
do plano nasal se perde.
Dermatose  nasal  secundária  à  radiação  solar  provavelmente  é  uma  doença  rara  e  pode,  com  frequência,  ser
diagnosticada  erroneamente  como  uma  variante  de  lúpus.  Na  dermatite  solar  nasal  verdadeira,  as  áreas
despigmentadas  do  plano  nasal  são  afetadas  primeiramente  e,  ocasionalmente,  a  ponte  nasal  pode  se  tornar
inflamada e, às vezes, ulcerada. As lesões são mais graves no verão, embora o lúpus e o pênfigo também possam
apresentar essa variação sazonal.
Qualquer uma das doenças citadas anteriormente pode afetar a área periocular (ver também p. 880 e p. 878). O
surgimento  súbito  de  tumefação,  eritema  e  exsudação  nasal  com  frequência  se  deve  à  furunculose  eosinofílica;
acredita­se  que  essa  seja  causada  por  ferroada  ou  picada  de  insetos.  Leishmaniose,  uma  doença  causada  por
protozoário, pode ocasionar despigmentação do plano nasal.
O  tratamento  depende  da  etiologia.  Testes  diagnósticos  devem  incluir  raspados  de  pele,  culturas  fúngica  e
bacteriana,  biopsias  para  histopatologia  e  testes  imunológicos.  No  entanto,  os  testes  imunológicos  não  são  mais
utilizados  com  tanta  frequência  quanto  antigamente,  em  razão  do  maior  número  de  dermatopatologistas
veterinários, que são capazes de definir o diagnóstico com base apenas no exame histopatológico. Na suspeita de
lúpus eritematoso sistêmico deve­se coletar sangue para pesquisa de anticorpos antinucleares.
Se o diagnóstico é dermatite solar nasal, uma loção de corticosteroides tópica (valerato de betametasona 0,1%)
pode  auxiliar  no  alívio  da  inflamação.  A  exposição  à  luz  solar  deve  ser  rigorosamente  restringida.  Protetores
solares  tópicos  podem  ser  efetivos,  mas  devem  ser  aplicados,  no  mínimo,  2  vezes/dia.  O  tratamento  para
furunculose eosinofílica implica no uso de corticosteroides sistêmicos, prednisona ou prednisolona a 1 mg/kg, 2
vezes/dia, por 1 semana; em seguida a dose deve ser reduzida gradualmente.

DERMATOSES SISTÊMICAS DIVERSAS

Várias doenças sistêmicas causam lesões variadas na pele. Normalmente, as lesões não são inflamatórias e alopecia
é um achado comum. Em alguns casos, as alterações cutâneas são características de uma doença em particular; no
entanto,  com  frequência  as  dermatoses  não  estão  notadamente  associadas  a  uma  causa  primária  e  devem  ser
cuidadosamente  diferenciadas  de  dermatopatias  primárias.  Algumas  dessas  dermatoses  secundárias  são
mencionadas a seguir; ademais, são descritas nos capítulos sobre as enfermidades específicas.
As dermatoses podem estar associadas a deficiências nutricionais, em especial de proteínas, gorduras, minerais,
algumas vitaminas e microelementos. No entanto, são incomuns em cães e gatos alimentados com dietas modernas
e balanceadas. Cães da raça Husky Siberiano e, ocasionalmente, de outras raças, podem desenvolver uma doença
similar  à  paraqueratose  suína  e  requerem  zinco  adicional  em  sua  dieta  (2  a  3  mg  de  zinco/kg/dia).  Dermatoses
responsivas à administração de zinco suplementar também foram relatadas em bovinos, ovinos, caprinos e lhamas
e estão associadas à necessidade individual maior, e não à deficiência dietética.
Às  vezes,  dermatite  é  observada  em  associação  com  distúrbios  de  órgãos  internos,  como  fígado,  rins  ou
pâncreas.  Disfunção  do  parênquima  hepático  foi  associada  à  dermatite  necrótica  superficial  (síndrome
hepatocutânea,  dermatose  diabética),  relacionada  com  a  hipoaminoacidemia  em  cães  idosos  e,  raramente,  em
gatos. As lesões cutâneas incluem eritema, crostas, exsudação e alopecia na face, genitália e extremidades distais,
bem  como  hiperqueratose  e  ulceração  de  coxins  plantares.  A  doença  de  pele  pode  preceder  o  aparecimento  dos
sinais  de  doença  interna.  Os  a  chados  histopatológicos  são  diagnósticos  e  incluem  dermatite  superficial
perivascular a liquenoide, com hiperqueratose paraceratótica difusa acentuada e notável edema inter e intracelular
limitado  à  metade  superior  da  epiderme.  Hiperglucagonemia  também  foi  documentada  em  cães  com  essa
síndrome;  no  entanto,  os  cães  tendem  a  apresentar  disfunção  do  parênquima  hepático  mais  comumente  do  que
glucagonomas. Em cães, a terapia baseia­se em infusão IV de aminoácidos ou remoção cirúrgica do glucagonoma.
A  síndrome  da  fragilidade  cutânea  em  gatos  (pele  excessivamente  friável)  foi  observada  em  associação  com
neoplasia  pancreática,  lipidose  hepática  ou  disfunção  da  adrenal.  Neoplasias  pancreáticas  também  foram
associadas  a  crostas  em  coxins  e  alopecia  em  gatos.  Há  relato  de  uma  síndrome  de  dermatofibrose  nodular
generalizada em cães da raça Pastor Alemão e, ocasionalmente, em outras raças, associada à cistadenomas renais,
cistadenocarcinomas  ou  cistos  epiteliais  renais.  A  avaliação  histopatológica  dos  nódulos  cutâneos  revela  fibrose
densa do colágeno.
Intoxicações  por  sulfato  de  tálio  (veneno  de  rato,  p.  2740),  ergot  (p.  2599),  mercúrio  (p.  2661)  e  iodo  podem
causar  várias  alterações  cutâneas.  Hiperqueratose  pode  ser  causada  por  intoxicação  por  naftalenos  clorados,  em
bovinos.
Em cães, as dermatoses podem se desenvolver como resultado de disfunção endócrina (ver p. 574 e seguintes).
Em  machos  com  tumor  de  célula  de  Sertoli,  pode­se  notar  alopecia  bilateral  e  prurido  ocasional,  com  erupção
papular.  Cadelas  não  castradas  com  desequilíbrios  hormonais,  em  geral,  apresentam  prurido  e  erupção  papular,
aumento  de  volume  do  tecido  mamário  e  ciclos  estrais  frequentes.  As  lesões  de  pele  decorrentes  de  ambos  os
distúrbios  podem  começar  na  região  inguinal  ou  no  flanco  e  progredir  em  sentido  cranial.  As  dermatoses
sƒecundárias à castração não são comuns em cães e gatos; quando ocorrem, em geral, não são pruriginosas e há
alopecia discreta na região perineal ou inguinal.
Há relato de dermatose associada a hipotireoidismo (p. 593), com lesões de pele caracterizadas por diminuição
do crescimento piloso e alopecia bilateral simétrica. A pele torna­se seca, descamada, espessada e, às vezes, fria ao
toque. Piodermite e seborreia podem ser notadas e as bordas do pavilhão auricular podem apresentar descamação
excessiva. Em casos raros, pode haver mixedema cutâneo.
A produção deficiente de hormônios hipofisários raramente causa dermatose. Hipopituitarismo é caracterizado
por alopecia, em especial nas regiões da axila e na lateral do tórax e abdome. Hiperadrenocorticismo também se
manifesta  com  alterações  cutâneas,  como  hiperpigmentação,  alopecia,  seborreia,  calcinose  cutânea  e  piodermite
secundária.  Em  gatos,  a  pele  se  torna  extremamente  friável.  Na  diabetes  melito,  às  vezes  ocorrem  prurido  e
infecção secundária, em especial em gatos com infecção generalizada por Malassezia sp.
O ácaro nasal canino (Pneumonyssoides caninum,  p.  1586)  é  um  parasito  encontrado  na  cavidade  nasal  e  nos
seios nasais dos cães. A infecção por P. caninum em cães causa sinais clínicos inespecíficos do trato respiratório
superior,  como  espirros,  espirros  reversos,  rinite,  prejuízo  à  capacidade  de  farejamento,  bem  como  prurido  no
focinho.
Raramente, distúrbios neurológicos primários, em especial em cães, podem se manifestar como lesões cutâneas.
Esses  distúrbios  incluem  neuropatias  sensoriais  em  cães  das  raças  Pointer  Inglês  e  Dachshund  de  pelo  longo,
síndrome  da  cauda  equina,  pseudorraiva,  neoplasia  de  nervo  periférico  e  siringomielia  de  cães  da  raça  Cavalier
King Charles Spaniel. Os sinais clínicos, em geral, incluem prurido e/ou arranhadura, mas também se manifestam
como dor na síndrome da cauda equina e automutilação nas neuropatias sensoriais.
O  tratamento  dessas  enfermidades  depende  do  diagnóstico  etiológico  específico.  Uma  vez  estabelecidas  e
controladas, as lesões de pele, em geral, precisam apenas de tratamento sintomático (p. ex., controle do prurido),
até que elas desapareçam com a cura da doença primária.

FERIDAS DE SELA (Assadura pelo arreio)

A  área  situada  abaixo  da  sela  em  equinos  de  montaria  ou  a  região  da  cernelha  daqueles  animais  montados  com
arreio  é,  com  frequência,  um  local  de  lesões  cutâneas  e  dos  tecidos  moles  e  ósseos  mais  profundos.  Os  sinais
clínicos variam de acordo com a profundidade da lesão e as complicações causadas por infecção secundária. Os
ferimentos  que  afetam  apenas  a  pele  são  caracterizados  por  alterações  inflamatórias  que  variam  de  eritemas  a
pápulas, vesículas, pústulas e, por fim, necrose. Com frequência, a lesão tem início como uma inflamação aguda
dos folículos pilosos e progride para foliculite purulenta. Os locais acometidos apresentam alopecia e tumefação,
hipertermia  e  dor.  O  exsudato  seroso  ou  purulento  seca  e  forma  crostas.  Lesões  avançadas  são  denominadas
assaduras.  Quando  a  pele  e  os  tecidos  subjacentes  são  lesionados  mais  seriamente,  podem  se  desenvolver
abscessos.  São  caracterizados  por  tumefações  quentes,  flutuantes,  doloridas  e  das  quais  pode  ser  aspirado  um
fluido  purulento  ou  sero­hemorrágico.  As  lesões  graves  na  pele  e  no  tecido  subcutâneo  ou  em  tecidos  mais
profundos  resultam  em  necrose  seca  ou  úmida.  As  lesões  de  sela  crônicas  são  caracterizadas  por
foliculite/furunculose profundas (furúnculo), com fibrose, ou dermatite localizada, endurecida e proliferativa. As
lesões, em geral, são causadas pela colocação inadequada do arreio.
A  identificação  e  eliminação  da  parte  do  arreio  que  está  incomodando  são  mais  importantes  do  que  qualquer
outro  tratamento.  Escoriações  e  inflamação  da  pele  nas  regiões  sob  a  sela  e  arreios  são  tratadas  como  qualquer
outra  dermatose.  É  necessário  repouso  absoluto  das  partes  afetadas.  No  estágio  inicial  ou  agudo,  são  indicadas
soluções adstringentes (solução de Burow). Lesões crônicas e as que estão infectadas superficialmente podem ser
tratadas  com  aplicações  de  compressas  mornas  e  antibióticos  tópicos  ou  sistêmicos.  Os  hematomas  devem  ser
aspirados  ou  drenados.  O  tecido  necrosado  deve  ser  removido  cirurgicamente.  Nas  foliculites  e  furunculoses
graves, a escolha dos antibióticos com base nos resultados de cultura e antibiograma é sempre indicada. A recidiva
de hematomas, seromas e/ou o desprendimento da pele ao início do uso de sela em um equino Quarto­de­Milha
jovem ou Paint Horse devem levantar suspeitas de uma doença genética hereditária, a astenia dérmica equina. Um
teste de DNA simples, realizado em bulbo piloso da cauda, confirma o diagnóstico.

FOTOSSENSIBILIZAÇÃO

Fotossensibilização  ocorre  quando  a  pele  (em  especial  as  áreas  expostas  à  luz  solar  e  que  não  apresentam  uma
camada significativa de pelos protetores, lã ou pigmentação) se torna mais suscetível à luz ultravioleta em razão da
presença  de  agentes  fotodinâmicos.  A  fotossensibilização  difere  de  queimadura  solar  e  de  fotodermatite,  pois
ambas resultam em lesões de pele, sem a presença de agentes fotodinâmicos.
Na  fotossensibilização,  moléculas  instáveis  de  alta  energia  são  formadas  quando  fótons  reagem  com  agentes
fotodinâmicos. Essas moléculas de alta energia iniciam reações com moléculas da pele que são substratos, o que
causa a liberação de radicais livres que, por sua vez, resultam no aumento da permeabilidade da membrana celular
externa  e  da  membrana  lisossomal.  A  lesão  à  membrana  celular  externa  permite  o  extravasamento  de  potássio
intracelular e extrusão citoplasmática. A lesão da membrana lisossomal libera enzimas líticas dentro das células, o
que leva à ulceração, necrose e edema da pele. O tempo entre a exposição ao agente fotodinâmico e o início dos
sinais clínicos depende do tipo de agente, de sua dose e da exposição à luz solar.
A  fotossensibilização,  em  geral,  é  classificada  de  acordo  com  a  fonte  do  pigmento  fotodinâmico.  Inclui
fotossensibilização  primária  (tipo  I),  síntese  aberrante  de  pigmentos  endógenos  (tipo  II)  e  fotossensibilização
hepatógena  (secundária  ou  tipo  III).  Uma  quarta  categoria,  chamada  fotossensibilização  idiopática  (tipo  IV)  foi
descrita.
Uma ampla variedade de produtos químicos, inclusive alguns oriundos de bactérias e fungos, podem atuar como
agentes  fotossensibilizantes.  No  entanto,  a  maioria  dos  compostos  considerados  causas  importantes  de
fotossensibilização em medicina veterinária são derivados de plantas. Fotossensibilização ocorre em todo o mundo
e pode acometer qualquer espécie, mas é observada com maior frequência em bovinos, ovinos, caprinos e equinos.
FOTOSSENSIBILIZAÇÃO PRIMÁRIA:  Fotossensibilização primária ocorre quando o agente fotodinâmico é ingerido,
injetado  ou  absorvido  pela  pele.  Esta  agente  alcança  a  circulação  sistêmica  em  sua  forma  original,  onde  resulta
lesão  da  membrana  das  células  da  pele,  após  exposição  do  animal  à  luz  ultravioleta.  Exemplos  de  agentes
fotossensibilizantes  primários  incluem  hipericina  (do  Hypericum  perforatum  [erva  de  São  João])  e  fagopirina
(do Fagopyrum esculentum [trigo sarraceno]). Plantas das famílias Umbelliferae e Rutaceae contêm furocumarinas
fotoativas  (psoralenos),  que  causam  fotossensibilização  em  animais  pecuários  e  aves  domésticas.  Ammi
majus  (erva  do  bispo)  e  Cymopterus  watsonii  (salsa  da  primavera)  provocam  fotossensibilização  em  bovinos  e
ovinos, respectivamente. A ingestão de sementes de A. majus e A. visnaga causa fotossensibilização grave em aves
domésticas.  Espécies  de  Trifolium,  Medicago  (trevos  e  alfafa),  Erodium,  Polygonum  e  Brassica  foram
incriminadas  como  agentes  fotossensibilizantes  primários.  Muitas  outras  plantas  são  suspeitas,  mas  as  toxinas
responsáveis  ainda  não  foram  identificadas  (p.  ex.,  Cynodon  dactylon  [grama  bermuda]).  Adicionalmente,
derivados de alcatrão, como hidrocarbonetos tricíclicos aromáticos, e algumas sulfonamidas foram relatados como
causa  de  fotossensibilização  primária.  Anti­helmínticos  fenotiazinas  foram  considerados  causas  de
fotossensibilização primária em bovinos, ovinos, caprinos e suínos.
METABOLISMO ABERRANTE DE PIGMENTO:  Sabe­se que a fotossensibilização tipo II secundária ao metabolismo
aberrante de pigmento ocorre tanto em bovinos quanto em gatos. Nessa síndrome, os agentes fotossensibilizantes
porfirínicos são pigmentos endógenos oriundos de disfunções, hereditárias ou adquiridas, de enzimas envolvidas
na síntese do radical heme. Porfiria eritropoética congênita bovina (p. 1098) e protoporfiria eritropoética bovina (p.
909) são as doenças mais comumente relatadas nessa categoria.
Fotossensibilização em vaca. Cortesia do Dr. Dietrich Barth.

FOTOSSENSIBILIZAÇÃO  SECUNDÁRIA  (HEPATÓGENA):  A  fotossensibilização  secundária  ou  tipo  III  é,  de  longe,  o
tipo  de  fotossensibilização  observado  com  maior  frequência  em  animais  pecuários.  O  agente  fotossensibilizante
filoeritrina  (uma  porfirina)  se  acumula  no  plasma  em  razão  do  prejuízo  à  excreção  hepatobiliar.  A  filoeritrina  é
derivada  da  quebra  da  clorofila  por  microrganismos  presentes  no  trato  GI.  A  filoeritrina,  mas  não  a  clorofila,
normalmente é absorvida na circulação e excretada efetivamente pelo fígado, junto com a bile. A falha na excreção
de filoeritrina devido à disfunção hepática ou a lesão de ductos biliares aumenta sua concentração na circulação
sanguínea. Dessa forma, quando chega à pele pode absorver e liberar a energia da luz, dando início a uma reação
fototóxica.
A filoeritrina foi incriminada como o agente fototóxico nas seguintes condições: oclusão do ducto biliar comum,
eczema facial (p. 2602); lupinose (p. 2605); fotossensibilização congênita dos ovinos Southdown e Corriedale (ver
a  seguir)  e  intoxicação  por  várias  plantas,  inclusive  Tribulis  terrestris  (trepadeira),  Lippia  rehmanni,  Lantana
camara,  vários  cultivares  de  Panicum  spp.  (Kleingrass,  vassoura­grão,  sorgo),  Cynodon  dactylon,  Myoporum
laetum (ngaio) e Narthecium ossifragum (asfódelo dos charcos).
A  fotossensibilização  também  foi  relatada  em  animais  que  apresentavam  lesão  hepática  associada  a  várias
intoxicações: alcaloides pirrolizidínicos (p. ex., Senecio spp., Cynoglossum spp., Heliotropium spp., Echium spp.;
p.  2726),  cianobactérias  (Microcystis  spp.,  Oscillatoria  spp.),  Nolina  spp.  (grama  em  maço),  Agave
lechuguilla (lechuguilla), Holocalyx glaziovii, Kochia scoparia, Tetradymia spp. (escova de equinos ou escova dos
coelhos),  Brachiaria  brizantha,  Brassica  napus,  Trifolium  pratense  e  T.  hybridum  (trevo  alsike  e  trevo
vermelho), Medicago sativa, Ranunculus spp., fósforo e tetracloreto de carbono. É provável que a filoeritrina seja
o agente fototóxico na maioria dessas intoxicações.
FOTOSSENSIBILIZAÇÃO TIPO IV:  A fotossensibilização em que a patogênese é desconhecida ou em que o agente
fotodinâmico  não  é  identificado,  é  classificada  como  tipo  IV.  Exemplos  incluem  casos  de  fotossensibilização
primária em bovinos, possivelmente causados por Thlaspi arvense (erva fedida do campo), ainda que este vegetal
não  tenha  sido  relatada  como  causa  de  fotossensibilização.  Surtos  de  fotossensibilização  foram  relatados  em
bovinos expostos ao feno de alfafa estragado por contato com água, palha mofada e feno de grama rabo de raposa.
Suspeita–se  que  esses  casos  sejam  de  origem  hepatógena.  Ranunculus  bulbosus  (copo  de  manteiga),
presumivelmente,  foi  causa  de  fotossensibilização  hepatógena.  Outras  plantas  associadas  à  fotossensibilização
incluem trigo do inverno (bovinos), Medicago spp. (alfafa), Brassica spp. (mostradas) e Kochia scoparia (erva de
fogo).  Acredita­se  que  muitas  dessas  plantas  sejam  fotossensibilizantes  do  tipo  I.  Forragens  como  aveia,  trigo  e
trevo  vermelho  são  suspeitas  de  casos  de  fotossensibilização  e  podem  estar  associadas  a  condições  ambientais
específicas, como precipitação pluviométrica intensa.
ACHADOS  CLÍNICOS  E  LESÕES:   Os  sintomas  dermatológicos  associados  à  fotossensibilização  são  similares,
independentemente  da  causa.  Animais  com  fotossensibilização  apresentam  fotofobia  e  parecem  agitados  e
desconfortáveis logo após a exposição à luz do sol. Eles raspam ou esfregam as áreas pouco pigmentadas da pele
exposta  (p.  ex.,  orelhas,  pálpebras  e  focinho).  As  lesões  inicialmente  aparecem  em  áreas  de  pelos  brancos,  não
pigmentadas ou alopécicas, como nariz e úbere. No entanto, filoeritrinemia grave e luz solar intensa podem causar
lesões  cutâneas  típicas,  mesmo  em  animais  de  pelagem  preta.  O  eritema  se  desenvolve  rapidamente  e  logo  é
seguido  por  edema.  Se  a  exposição  à  luz  cessar  nesse  estágio,  as  lesões  se  curam  em  pouco  tempo.  Quando  a
exposição  é  prolongada,  as  lesões  podem  progredir  para  formação  de  vesículas  e  bolhas,  exsudação  serosa,
ulceração, formação de crostas e necrose de pele. O estágio final envolve o desprendimento da pele. Em bovinos e,
em  especial,  em  cervos,  a  exposição  da  língua  durante  lambeduras  pode  resultar  em  glossite,  caracterizada  por
ulceração e necrose profundas. Independente da cor da pelagem, os bovinos podem desenvolver epífora, edema de
córnea e cegueira.
Dependendo  da  causa  inicial  do  acúmulo  do  agente  fotossensibilizante,  outros  sinais  clínicos  podem  ser
observados.  Por  exemplo,  se  a  fotossensibilização  for  hepatógena,  pode  haver  icterícia.  Na  porfiria  eritropoética
congênita  bovina,  a  alteração  da  coloração  da  dentina,  dos  ossos  (e  outros  tecidos)  e  da  urina,  em  geral,
acompanham  as  lesões  cutâneas.  Fotodermatite  é  a  única  manifestação  observada  na  protoporfiria  eritropoética
bovina.
DIAGNÓSTICO:  O diagnóstico de fotossensibilização se baseia nos sinais clínicos, nas evidências ou no histórico de
exposição  a  agentes  fotossensibilizantes  ou  hepatotóxicos  e  nas  lesões  características.  A  fotofobia  combinada  a
eritema  e  edema  das  áreas  sem  pelos  e  despigmentadas  da  pele  é  fortemente  sugestiva  da  doença.  O  período  de
exposição aos agentes fotodinâmicos ou hepatotóxicos até o início dos sinais clínicos pode variar de várias horas a
10  dias.  Os  sinais  clínicos,  o  aumento  das  atividades  séricas  de  enzimas,  como  sorbitol  desidrogenase,
gamaglutamiltransferase  e  fosfatase  alcalina,  bem  como  do  teor  de  bilirrubina  direta  e  sinais  macroscópicos  ou
histológicos  de  doença  hepática  sustentam  o  diagnóstico  de  fotossensibilização  hepatógena.  O  diagnóstico
presuntivo  de  porfiria  se  baseia  no  histórico  (sexo,  idade,  raça)  combinado  aos  sinais  clínicos  e  o  diagnóstico
definitivo pode ser obtido por meio da mensuração dos teores de porfirina no sangue, fezes e urina.
TRATAMENTO:  O prognóstico para animais com fotossensibilização hepatógena e porfiria é reservado, no entanto,
o  prognóstico  para  animais  com  fotossensibilização  primária,  em  geral,  é  bom.  O  tratamento  envolve
principalmente medidas paliativas. Enquanto há fotossensibilidade, os animais devem ser mantidos completamente
à  sombra  ou,  de  preferência,  fechados  e  soltos  para  pastar  apenas  durante  a  noite.  O  estresse  grave  da
fotossensibilização  e  a  necrose  cutânea  extensa  podem  se  revelar  muito  debilitantes  e  aumentar  a  taxa  de
mortalidade.  Corticosteroides  administrados  por  via  parenteral  nos  estágios  iniciais  podem  ser  úteis.  Infecções
cutâneas  secundárias  e  supurações  devem  ser  tratadas  com  técnicas  básicas  de  manejo  de  feridas  e  o  ataque  de
moscas deve ser evitado. As lesões de pele cicatrizam muito bem, mesmo após necrose extensa.

Fotossensibilização Congênita em Ovinos
Ovinos  das  raças  Southdown  e  Corriedale  podem  herdar  uma  incompetência  hepatobiliar 

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