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A Per formance da Cultur a 
Identidade, Cultur a e Política num Tempo de Globalização 

Rita de Cácia Oenning da Silva 

2005

Antr opologia em Pr imeir a Mão é uma revista seriada editada pelo Programa de Pós­ 


Graduação em Antropologia Social (PPGAS) da Universidade Federal de Santa Catarina 
(UFSC). Visa à publicação de artigos, ensaios, notas de pesquisa e resenhas, inéditos ou não, de 
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de Castells. Coordenador do Programa de Pós­Graduação em Antropologia 
Social: Sonia Weidner Maluf. Sub­Coordenador: Oscar Calavia Sáez. 

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Antropologia em primeira mão / Programa de Pós Graduação em 
Antropologia Social, Universidade Federal de Santa Catarina.  —, 
n.1 (1995)­  .— Florianópolis : UFSC / Programa de Pós 
Graduação em Antropologia Social, 1995 ­ 
v. ; 22cm 

Irregular 
ISSN  1677­7174 

1. Antropologia – Periódicos. I. Universidade Federal de Santa 
Catarina. Programa de Pós Graduação em Antropologia Social.

A per for mance da cultur a 


Identidade, cultur a e política num tempo de globalização 1 
Rita de Cácia Oenning da Silva* 

(...) el estudio de las representaciones de la identidad  y de la alteridad no es, 
hablando  metafóricamente,  un  estudio  de  mecánica  sino  de  óptica,  de 
imágenes  deformadas,  reflejadas  o  refractadas,  de  focos  virtuales  y  de 
emisiones de atributos que se estructuran y reestructuran de continuo. 
(Manoel Gutiérres Estéves) 

Pr eâmbulo 
“Hoje fui ao centro prá comprar uns presentes pros amigos do Bogotá e entrei numa loja 
típica, de artesania pouco interessante, quando aconteceu um fenômeno da globalização. Escutei 
o  som,  o que  tinha tocado algo muito cursi, e  acatei que  era  "Saudade (Batucada)"  de Daniela 
Mercury,  mas Daniela não  cantou, e não era  em  Português. Nem nenhum idioma que  conheci: 
algo africano, eu acho,  mais que tudo porque os tambores eram africanos. Já  estranho na Santa 
Fé, mas depois olhei para a moça da loja, uma indígena bonita de 20 anos (Navajo, talvez) e ela 
estava bailando em meio da loja, ignorando o público, mas com um passo que jamais tinha visto. 
Menina  dançando  passos  navajos  (?)  com  uma  música  brasileira  tocada  com  tambores 
africanos... Na verdade, eu acho que ainda tem esperança para o futuro do mundo.” 
­­­­­ Original Message ­­­­­ 
From: Kurt Shaw 
To: <oenning@mbox1.ufsc.br> 
Sent: Friday, May 07, 2004 6:38 PM 
Subject: Globalização 

Apesar  do  remetente  da  mensagem  acima  ver  de  forma  muito  positiva  a 
“Globalização”, o receio de que o ‘progresso’ e a modernidade engulam por completo a 
tradição, eliminando a heterogeneidade cultural, faz ressurgir constantemente a pergunta 
cuja  resposta  positiva,  de  certa  forma,  foi  uma  certeza  para  Franz  Boas  durante  um 
período do seu trabalho em relação às “disappearing cultures”: pode a modernidade e a 
globalização  destruir  as  identidades  locais,  suas  tradições,  sua  linguagem, 
transformando  o  mundo  da  diversidade  cultural  em  um  “plasma  homogêneo  da 
cultura”? Esse mito, divulgado por alguns membros da chamada Escola de Frankfurt 2 , 


Artigo  apresentado  à  Banca  de  Qualificação  de  Doutorado­  PPGAS/UFSC  –  01/2005.  Agradeço 
especialmente a Laura Gil e Miguel Caribe empréstimo de textos; a Adiléia Bernardo, Cláudia Gonçalves 
e Kurt Shaw, que foram, durante esta prova, amigos e interlocutores; à Sandra Oenning da Silva e Deyvid 
Camargo, por me tirarem da leitura para passear,  rir e comer longe das letrinhas.

E­mail: <oenning@mbox1.ufsc.br>. 

Adorno foi um grande divulgador deste mito nos anos 40 dentro da Escola de Frankfurt. Opondo­se  às 
novas tecnologias, queria manter a  pureza das culturas “rústicas” e das elites. A Escola de Chicago, nas 
suas teorias de contraste (Redfield, Park), têm uma visão negativa da formação de cidades multiculturais, 
pois essas  fragmentariam os laços  sociais, provocando  o isolamento  e  o anonimato. Mais  recentemente, 
Richard Sennet, na obra Vida urbana y identidad personal, critica esse mito, pois diz que essa perspectiva 
da  cultura (a crise  da  cidade, da tradição) leva a  uma   romantização do  passado. A antropologia urbana 
brasileira com Ruben Oliven, Gilberto Velho, Eunice Durhan (Velho, 1979), desenvolve a mesma crítica.

persiste ainda hoje e, segundo Arjun Appadurai (1994), a tensão entre a homogeneidade 
e a heterogeneidade cultural é o problema central das interações  globais. Estudos 3  que 
abordam o contato entre grupos distintos e a disseminação do capitalismo pelo mundo, 
ao contrário da visão pessimista do fim das tradições, apontam o oposto daquilo que o 
mito  enuncia 4 .  Recorrendo  a  termos  como  a  “invenção  das  tradições”,  “culturas 
híbridas”,  “comunidades  imaginadas”,  “mundo  em  pedaços”,  “transnacionalismos”, 
“diásporas”,  e  mesmo  não  negando  as  assimetrias  e  os  novos  processos  de  exclusão 
discutidos  amplamente  por  Canclini  (2001),  esses  autores  vão  na  contramão  de  uma 
noção  de  cultura  estática,  com  identidades  essencialistas  e  primordialistas,  como  se 
supôs  por  algum  tempo  na  Antropologia 5 ,  e  ressaltam  a  agência  das  comunidades 
pesquisadas e a não linearidade nos processos de contato.  Respondendo a essa mesma 
questão, feita por um estudante preocupado com o perigo da americanização e de suas 
potências  multinacionais,  Roberto  DaMatta  (apud  Lacerda,  2003),  numa  conferência 
dada  na  Universidade  Federal  de  Santa  Catarina,  expõe  três aspectos  contemporâneos 
do  mundo  globalizado:  a  intensidade  dos  processos  locais  de  afirmação  étnica,  a 
emergência  de  transnacionalismos  de  toda  ordem  e,  finalmente,  a  progressão 
incalculável das viagens. DaMatta mostrava que a ascensão do individualismo moderno 
(Dumont,  [1983]  2000),  outro  mito  da  modernidade,  não  impede  inúmeros  rearranjos 
coletivos e identificações de toda espécie. 
Esses  aspectos  citados  por  DaMatta,  especificamente  ou  em  conjunto,  são 
notórios  nos  processos  migratórios  mundiais,  nos  movimentos  de  reivindicação 
identitária  (étnicos,  de  gênero,  religiosos,  geracionais/etários)  e  nas  tribalizações 
urbanas. Tais movimentos multiplicam­se pelo globo e motivam uma ampla discussão 
acadêmica  sobre  cultura,  etnicidade,  globalização  e  política,  mas  também,  em  certo 
grau,  são  reflexos  dessa  discussão,  tendo  em  vista  a  relação  entre  academia  e 


Entre esses Maybury­Lewis (2003),  Featherstone (1994), Appadurai (1994), Sahlins (1997), Friedman 
(1994), Cuche (1999), Menezes Bastos (1997), Rial (1995). 

Em tempos  de guerras e de  processos  de  xenofobia  extremados,  em que estados totalitários  impõem  a 
sua cultura como aquela que é digna de se expandir pelo globo, executando muitas vezes limpeza étnica, 
como alertam Maybury­Lewis (2003), Geertz (2001), Homi Bhabha e Edward Said (Barbosa, 2003), não 
estamos exatamente diante de um mito. 

Ver  Montero  (1997)  e  Cuche  (1999).  Isac  Schapera,  em  entrevista  concedida  a  Adam  Kuper  (2001), 
revela que esta temática era motivo de divisão entre os antropólogos europeus que trabalhavam com com 
temas africanos.  Adam  Kuper resume “Mas, na  verdade,  esse  era  o grande divisor.  O  grande debate na 
antropologia  sul­africana  era  entre  aqueles  que  diziam  que  a  sociedade  tradicional  era  a  coisa  a  ser  de 
algum  modo  protegida,  conservada,  revivida;  e  aqueles  outros,  como  você  (Isac  Schapera),  Radcliffe­ 
Brown e Macmillan, que diziam que a situação se havia modificado tão completamente nas últimas duas 
gerações,  que  falar  de  sociedade  tradicional  como  algo  ainda  vital  era  simplesmente  ridículo”  (Kuper, 
2001).

movimentos sociais 6 . A preocupação com, por assim dizer, o “homo/hetero” da cultura 
foi, e em alguns casos ainda é, perpassada por um paradoxo: por um lado, o medo da 
uniformização  cultural  e  a  tomada dos  “países  em desenvolvimento”  pelos  “impérios” 
modernos 7 ; por outro lado, o medo do esfacelamento total do mundo em etnias, tribos, 
personalidades  (Geertz,  2002)  cada  vez  mais  particularistas,  que  levaria  ao 
individualismo e ao narcisismo. Nem tanto ao céu nem tanto à terra, há hoje, sobretudo, 
uma  preocupação  em  entender  e  explicar  como  se  dá  o  fluxo  entre  essas  duas  vias 
extremadas  de  análise;  afirma­se  que  “a  fragmentação  étnica  e  cultural  e  a 
homogeneização modernista não são dois argumentos, duas visões opostas daquilo que 
está  acontecendo  hoje  no  mundo,  mas  sim  suas  tendências  constitutivas  da  realidade 
global” (Friedman, 1994:311). 
Neste  artigo,  retomando  a  discussão  sobre  o  contato  intersocietário 8 ,  abordo  a 
relação  entre  reivindicações  identitárias  contemporâneas  e  a  produção  de  conceitos 
acadêmicos 9 ,  considerando  a  maneira  pela  qual  agentes  (indivíduos  ou  coletividades) 
locais/regionais/nacionais  e  globais 10 ,  em  uma  época  em  que  a  autoria  é  valorizada, 
negociam  agendas  públicas  e  privadas  frente  a  instituições  e  valores  contemporâneos. 
Para  tanto,  debruço­me,  por  um  lado,  sobre  as  novas  formas  de  “estar  junto” 11 
promovidas  e  intensificadas  pelos  meios  de  comunicação,  pelas  viagens  e  pela 
virtualidade  das  relações,  cada  vez  mais  freqüentes;  por  outro  lado,  tematizo  novas 
formas  de  demarcar  identidades  e  fronteiras,  considerando  a  tensão  da  dupla 


Retornarei a esta temática, pois trata­se de um dos eixos centrais deste artigo. 

A grande narrativa dominante criticada por Sahlins (1997), a americanização, o macdonaldismo 
criticado por Rial (2004). 

Ver Cardoso de Oliveira (1976); Menezes Bastos (1997); Montero (1997). 

A  vasta  literatura  que  envolve  a  temática,  formada  por  alguns  títulos  já  clássicos  e  por  muitos  outros 
mais  recentes,  revela  vertentes  e  tensões  que  sempre  existiram  no  seio  dessa  matriz  epistemológica,  na 
tentativa  de  compreender,  explicar  e  conceituar  (e  em  alguns  casos  domesticar)  a  empiria.  Também 
revelam  os  limites  da  possibilidade  de  compreensão  dos  percursos  e  percalços  feitos  na    tentativa  de 
entender a alteridade e os  processos de contato dentro de  um  mundo onde os  poderes e saberes locais  e 
globais  estão  em  jogo.  Cabe  neste  ensaio  percorrer  alguns  desses  caminhos,  destacando  a  relação  da 
antropologia  com  a  empiria,  e  o  impacto  de  conceitos  como  “cultura”,  “etnicidade”  e  “agência” 
(categorias  políticas  por  excelência),  que  ligam  o  “nós”  e  o  “outros”  (considerando  que  “nós”  também 
somos “outros”) como meio de constituir a diversidade identitária contemporânea. 
10 
A  tensão  entre  local  e  global  não  é  recente  na  antropologia,  apesar  de  muitas  vezes  ser  assim 
anunciada, vide o particularismo histórico boasiano, o evolucionismo de Morgan, ou a discussão de 1913 
de Marcel Mauss e Durkheim sobre a noção de Civilização; nem se restringe à disciplina, vide a filosofia 
na discussão do “geral” e “particular” (Menezes Bastos, 1997). No Manifesto Comunista  encontramos  a 
preocupação de Marx com os processos mundializados de mercado e a expansão do modo capitalista. Em 
Weber e Durkheim, a visão sobre os efeitos da industrialização e da divisão social do trabalho no mundo 
das grandes transformações remete à discussão. Foi justamente a perspectiva global de Tylor, ao observar 
a diversidade de culturas e a suposição de uma origem comum, que o capacitou a formular o conceito de 
“cultura” pela primeira vez. 
11 
Maffesoli (1997); Appadurai (1994); Ribeiro (1996).

hermenêutica  apontada  por  Giddens  (1991)  entre  o  “empírico”  e  o  “acadêmico”. 12 


Pontuando os sujeitos da antropologia em diferentes períodos da disciplina, considero a 
questão da identidade e da política como centrais para pensar um sujeito contemporâneo 
performático, que  tanto  reivindica  uma  identidade  essencialista  quanto  foge  dela,  num 
jogo de espelhos que se dará na negociação permanente com o outro e consigo mesmo. 

A ar ena “movediça” da cultur a: a política do nós­eles 


A agência 
No  encontro  intersocietário antropológico,  a  noção de que  existe  um  “nós”  (os 
antropólogos) e um “eles” (os nativos), que seriam nossos objetos de curiosidade, e cuja 
cultura, modo de viver e filosofia devemos interpretar e dar visibilidade, trai a agenda 
antropológica,  quando  a  reflexividade  nativa  toma  corpo  em  ação  política.  Com  a 
emergência  dos  movimentos  sociais  (de  gênero:  movimento  feminista,  homossexual; 
geracional: 3 ª idade, infância; de grupos étnicos: negritude, indigenidade) vislumbra­se 
um  novo  ponto  nas  agendas  dos  antropólogos:  já  não  é  mais  somente  o  antropólogo 
quem  decide  reivindicar  os  direitos  dos  “seus  nativos”,  mas  são  os  “nativos”  que 
solicitam a presença do antropólogo, a fim de legitimar políticas  já encabeçadas pelos 
mesmos. 13  Os  movimentos  reivindicatórios  tomam  visibilidade  na  agenda  pública  e 
chegam  aos  “grandes  homens”  do  congresso,  de  agências  mundiais  como  a  ONU,  do 
Greenpeace,  pondo  em  destaque  saberes  e  direitos  de  suas  culturas 14 .  De  “objetos”, 
assumem­se  como  “sujeitos”  e  buscam  legitimidade 15  na  academia  –  que  reconhecem 
como  instrumento  de  algumas  reivindicações;  assim,  apresentam  mais  uma  vez 
“cultura”  e  “etnicidade”  como  “moedas  fortes  no  mercado”,  ou,  como  diria  Mauss, 
como  um  dom que  remete  a  uma  dádiva,  um  mana   que  circula  entre  o  nós  e  o  eles, 

12 
Ou,  como  fez  Bruno  Latour,  transformar  o  segundo  no  primeiro,  a  fim  de  se  tornar  um  “nativo 
relativo”, na expressão de Viveiros de Castro (2002). 
13 
Um  exemplo  interessante  é  descrito  pelo  antropólogo  Rafael  Menezes  Bastos  (Dioniso  em  Santa 
Catarina , Fpolis: Ed da UFSC, 1993), quando chamado para estudar a Farra do Boi e dar visibilidade à 
prática, cuja proibição era requerida pelo governo do Estado de SC e por parte da população. 
14 
Conklin (1995), Oakdale (2004). 
15 
Nessa arena, em busca da legitimidade, antropólogos também não fogem ao enfrentamento. Aí se situa 
a conhecida “rinha acadêmica” entre Obeyesekere e o irônico Marshal Sahlins. De quem são os nativos, 
afinal? Quem pode e quem não pode falar sobre o outro, expressar a sua própria interpretação sobre um 
objeto que se constrói? Obeyesekere, como oriental (ocidentalizado), numa volta aos Mitos e à história de 
vida, viagem e morte do capitão James Cook, proclama seu direito de falar sobre o encontro entre Cook e 
os havaianos já que não faz parte do mundo dos colonizadores como Sahlins, e supostamente não teria os 
mesmos  vícios  que  este  apresentaria  na  interpretação  dos  dados.  Nesse  caso,  a  própria  identidade  da 
antropologia e do antropólogo e suas interpretações estão em  pauta, tendo como pano de fundo a antiga

cujos  poderes  são  requisitados  para  afirmar  identidades  (essencialistas  ou  não)  que 
devem ser respeitadas na sua alteridade. 

O lugar  do outr o 
Se por um lado “o outro” toma sua agência 16  através da culture­consciousness17 
  , 
em  muitos  casos  fazendo  antropologia  dos  antropólogos,  ou  tomando­os  como  seu 
objeto de estudo 18 , por outro lado, na antropologia, o lugar da alteridade também varia 
muito ao longo da história da disciplina e remete a diferentes modos de relação com a 
empiria. Do “outro inferiorizado” da escala evolutiva de Morgan, cuja origem comum 
contrasta “primitivos” e “civilizados” (Montero, 1997), ao outro particular e homogêneo 
do  funcionalismo  inglês  de  Radcliffe­Brown  e  Malinowski  (Hanners,  1997;  Montero, 
1997) e do particularismo de Boas, cujas noções de diversidade e diferença inauguram 
um conceito de cultura irredutível, não comparável, “funda­se imaginariamente grupos 
étnicos  discretos  e  homogêneos  com  língua,  hábitos,  valores  e  psicologias  próprias  – 
logo,  com  uma  identidade  própria”  (Montero,  1997:59).  Com  estas  “comunidades 
étnicas”,  imaginadas por pesquisadores e administrações coloniais (Copans, 1999) 19 , a 
identidade  nacional  coloca­se  como  meio  de  domesticar  diferenças  e  particularidades, 
reforçando o Estado­nação. 

relação, discutida já  pelos  antropólogos  ingleses, entre o colonizador e  o colonizado. Sobre  o tema,  ver 


Kuper (2002) e Geertz (2001). 
16 
É  preciso  observar  processos  por  vezes  perversos  no  entendimento  da  “agência”  nativa.  Algumas 
ONGs  e  órgãos  internacionais  financiadores  de  projetos  em  áreas  indígenas  vêm  sistematicamente 
introduzindo  burocracias  “brancas”  nas  comunidades,  alegando  que  essas  são  agentes,  e  portanto  não 
devem depender de  brancos. Foi  surpreendente  ver um livro  preparado  por uma  ONG (São Paulo)  para 
formação  de líderes indígenas, que incluía  ensinar  aos  mesmos que em cada  reunião deveriam dar  boas 
vindas,  apresentar­se,  dar  a  palavra  às  pessoas,  e  depois,  ao  final,  recolher  canetas,  lápis,  borrachas, 
cadeiras,  e  finalmente  “apagar  a  luz”.  O  livro  dedicava  várias  páginas  a  explicar  esses  procedimentos 
básicos de “como se reunir”. 
17 
Sobre este aspecto, destaco os trabalhos de Oakdale (2004), Conklin (1995), Turner (1996) e Menezes 
Bastos (1996). 
18 
Elsje  Lagrou,  citando  Erikson,  Keifenheim  e  Calávia  Saez,  observa  que  os  Pano  são  conhecidos  na 
literatura  etnográfica  como  especialmente  “obcecados”  pelos  estrangeiros  e  por  todos  os  tipos  de 
“outros”.  Diz  que  o  intrigante  conceito  nawa,  para  o  qual  há  variações  na  maioria  desses  grupos,  é 
paradigmático da ambigüidade Pano com relação à definição de fronteiras entre o “eu” e o "outro”. 
19 
Copans  (1999),  ao  referir­se  ao  tema,  afirma  que  “numerosas  análises  das  tipificações  étnicas 
concluíram  que  foram  as  administrações  coloniais  que  inventaram  as  etnias,  categorizando  e 
diferenciando  oficialmente  grupos  com  fronteiras  móveis  e  com  identidades  mais  relacionais  que 
tradicionais” (:72). Para ele, as regularidades existiam, mas é o campo político moderno que lhes confere 
significação e que dá coerência e continuidade ao que é heterogêneo e descontínuo. Para uma abordagem 
mais detalhada sobre  esta questão, ver também Ella Shohat e Robert Stam, “Form  of  Imperial family  to 
the  transnational  imaginary:  media  spectatorship  in  the  age  of  Globalization”  (in:  Wilson,  R.  and 
Dissanayake, W., Global, Local. Cultural Production and the Transnacional imaginary, Duhan e Londres: 
Duke Press, 1996).

Até a metade do século XX, postula­se um outro relacional cujo estudo só pode 
ser feito na  interação com grupos vizinhos (Edmund Leach, [1964] e Max Glukmam), 
ou na relação face­a­face (Erving Goffman, [1959]), na qual, a partir de “uma realidade 
concreta de um grupo local de pessoas” (Leach, [1964]:29), a cultura passa a ser vista 
como  espaço de  conflito,  cujas  relações  e  os papéis  sociais  não  estão dados  a priori  e 
nunca estão em equilíbrio. Cachins e Chans, dois grupos vizinhos estudados por Leach, 
reportam­se aos rituais e à língua para se aproximarem e para se oporem aos demais (no 
grupo  e  fora  dele),  constituindo  assim  fronteiras  em  termos  rituais­simbólicos  e 
políticos.  Com  a  noção  de  estrutura  social  em  situações  práticas,  Leach  apresenta  os 
indivíduos de um determinado grupo ou etnia como agentes ativos, e atribui ao desejo 
de  ganhar  poder  um  dos  principais  móveis  de  suas  ações  –  e,  conseqüentemente,  de 
mudança  social.  Essa  perspectiva  é  contemporânea  da  “heresia”  do  deslocamento  do 
objeto antropológico dos sistemas coloniais para os centros de migração urbana (Velho, 
1979),  onde  foi  possível  verificar  que  sequer  o  Estado­nação  liquidou  as  diferenças 
identitárias; ao contrário, as reivindicações étnicas tornavam­se cada vez mais evidentes 
em um mundo onde a hegemonia nacional parecia mais contundente. 
A noção de uma identidade relacional ou construtivista (Agier, 2004) é assumida 
definitivamente  a  partir  dos  anos  60  com  os  clássicos  trabalhos  de  Frederich  Barth, 
Grupos Étnicos e suas fronteiras (Barth, 1969), e, quase na mesma época, de Roberto 
Cardoso  de  Oliveira,  Identidade,  Etnia  e  Estrutura  Social  (1976).  Mediante  um 
deslocamento  nos  estudos  de  etnicidade  “do  foco  das  relações  de  equilíbrio  e  das 
representações  de  consenso  para  as  relações  de  conflito  e  para  as  representações  de 
dissenso”  (Cardoso  de  Oliveira,  1976:47),  abrem­se  caminhos  para  uma  “cultura 
inventada”,  mas nem por isso menos original, cuja história da invenção será mais tarde 
objeto  central  dos  estudos  de  etnogênese.  A  obra  de  Barth  (1969)  é  considerada  um 
marco fundamental, pois a partir dela se acata de forma ampla que identificação étnica 
não  remete  à  cultura  e  à  sua  permanência.  Deslocando  a  análise  da  formação  da 
identidade  étnica  para  as  suas  fronteiras,  Barth  (1969)  afasta­se  de  perspectivas 
culturalistas.  Este  autor  apresenta  o  grupo  étnico  como  um  tipo  organizacional, 
considerando:  a  atribuição  categorial  na  dialética  exógeno/endógeno,  que  constitui  o 
poder de nomear, e pela qual os atores se identificam e são identificados pelos outros; as 
fronteiras  do  nós/eles,  produzidas  e  reproduzidas  pelos  atores  que  as  manipulam  no 
decorrer das interações sociais, que são mais ou menos estáveis e cuja manutenção não 
depende  da  permanência  de  suas  culturas;  a  fixação  de  símbolos  identitários,  que
10 

codificam  a  crença  na  origem  comum;  e,  finalmente,  a  importância  do  “realce”,  que 
abrange  o  conjunto  de  processos  pelos  quais  os  traços  étnicos  são  destacados  na 
interação social (Pontignat e Steiff, 1998:141,142). 
Roberto  Cardoso  de  Oliveira  propõe  que  se  observe  sistematicamente  a 
sociedade  nacional  em  sua  interação  com  as  etnias  indígenas  como  elemento  de 
determinação  da  dinâmica  do  contato  interétnico.  O  conceito  de  “fricção  interétnica”, 
um equivalente  lógico, mas não ontológico, da luta de classes, é usado para abordar a 
relação entre índios e brancos nos seus antagonismos. Diferenciando grupos étnicos de 
classes sociais, Oliveira diz que a ideologia é estratégica para analisar o comportamento 
interétnico,  pois  nos  estudos  de  situação  de  classe  dos  índios  a  etnia  seria  um 
sobredeterminador.  Para  esse  autor,  a  essência  da  identidade  étnica  é  a  noção  de 
contraste entre “nós” e “eles”: um se afirma negando o outro; em situações não raras de 
assimetria,  friccionam­se  em  “culturas de  contato”,  em que  a  identidade  é  evocada no 
confronto.  Tentando  desvendar  “etnicidade”  em  sua  dupla  dimensão,  a  de  estrutura 
social  e  de  identidade,  o  autor  afirma  que  no  tocante  à  estrutura  social,  os  grupos  de 
identidade  minoritária  possuem  organizações  próprias,  diferenciadas  ou  não  das 
sociedades  nacionais  em  que  se  inserem.  A  identidade  de  caráter  minoritário  está  em 
oposição  a  uma  identidade  majoritária,  associada  a  grupos  dominantes,  geralmente 
instalados nos aparelhos de Estado, cuja identidade não se aplicaria à noção de etnia. A 
etnia,  “uma  representação  social”,  “uma  relação”,  só  se  revela  dentro  de uma  relação 
assimétrica  –  está  concentrada  na  identidade  étnica,  numa  ideologia  de  caráter 
etnocêntrico, em cujo interior se condensam valores culturais mais expressivos do grupo 
minoritário, seja esse atual ou histórico. 
A  “consciência”  do  outro  relacional  remete  à  polêmica  crise  dos  “pós­ 
modernos”.  As  acaloradas  discussões  sobre  a  relação  da  antropologia  com  o 
imperialismo  e  o  colonialismo  (entre  as  décadas  de  60  e  80)  chamam  atenção  para  o 
“pós­colonialismo”, as novas identidades (da própria disciplina e dos “colonizados”), as 
discussões de gênero e, antes disso, para a questão da autoria antropológica, esta última 
provocando enorme debate e desconforto, especialmente dentro da antropologia  norte­ 
americana. 20  Tal  polêmica  aproxima  o  conceito  de    cultura  do  “simbólico”  (Rosaldo, 

20 
Os  chamados  “pós­modernos”  (Kuper,  2002)  buscam  desconstruir  antigas  categorias,  num  afã  de 
aproximar  ao  máximo  a  antropologia  da  literatura,  em  alguns  casos  confundindo­as.  Em  outros,  a  sua 
contribuição  vai  além do  que pareceu  mais uma  febre  momentânea, com  avanços teóricos fundamentais 
que se instituem em novas correntes, como a antropologia interpretativa, a antropologia simbólica. Estas 
atribuem grande importância à dialogia, ao simbólico e à hermenêutica.
11 

apud  Kuper,  2001).  Além  disso,  ao  aproximar  a  antropologia  do  “mundo  real”  numa 
“antropologia  engajada”,  quer  tomar  o  próximo  como  objeto  legítimo  (como  faz  a 
antropologia  urbana), rejeitando  a  exotização  do  “nativo”.  O  antropólogo  torna­se  um 
autor que produz um texto sobre um determinado grupo, e a antropologia uma atividade 
política.  É  no  “burburinho”  dos  inúmeros  movimentos  reivindicatórios  da  época 
(Ortner, 1994; Kuper, 2001), numa relação estreita com conceitos antropológicos como 
o  relativismo  cultural,  que  termos  como  “cultura”  e  “etnicidade”  viram  “palavras  de 
ordem”,  tensionados  com  os  direitos  humanos  universais.  Este  último,  de  resto,  é  um 
tema mal resolvido para a antropologia ainda hoje, já que a “cultura – es una intuición 
central de la antropología –  se forma dentro de un sistema de variaciones. Crece en la 
medida que se particulariza; cuando busca la unidad, se disolve” (Saés, 2000:340). 
Sendo a cultura processual, dinâmica, conflitiva, e, mais recentemente – segundo 
abordagem  pós­moderna  –,  polifônica,  multivocal,  emergente  (Langdon,  1997), 
carregada  de  símbolos  e  envolvida  em  subjetividades  de  atores  sociais  que  atuam 
constantemente,  negociando  valores  e  significados  –  ou  seja,  polissêmica  –,  parece 
fundamental  entender  que  além  de  ser  "uma  espécie  de  abrigo  virtual,  ao  qual  é 
indispensável nos referirmos para explicar um determinado número de coisas, sem que 
este  tenha  jamais  uma  existência  real"  (Lévi­Strauss,  [1977]:369),  é  importante 
considerar  que  a  identidade  se  transforma  numa  ferramenta  política 21  que  remete  a 
símbolos,  signos,  valores  elaborados  pelos  grupos  em  contraste  com  os  seus outros,  a 
serem  utilizados  especialmente  quando  o  contexto  reivindica,  e  reelaborados 
continuamente. 

Através dos “Panoramas globais” 
Apesar de não haver concordância entre os teóricos sobre o melhor termo para 
designar o período em que vivemos, isso é de pouca importância perante a unanimidade 
de  que  algo  no  mundo  contemporâneo  mudou.  As  novas  formas  de  comunicação  de 
massa,  as  interatividades  virtuais, a  expansão  do  mercado  mundial,  as  transformações 
das  grandes  e  pequenas  cidades  (Sassen,  2001),  a  junção  e  separação  de  grupos 
(Mayberry­Lewis,  2003),  as  reconfigurações  de  alianças  internacionais,  a  junção  de 
Estados­nação  em  blocos  internacionais  (Europeu,  Mercosul)  fazem  parte  de  um 
arcabouço que,  senão  completamente  novo,  evidencia  um  certo  ar de  “desarranjo”  em 

21 
Ver Copans (1999); Appadurai (1994); Friedman (1994); Carneiro da Cunha (1986).
12 

categorias  analíticas  da  modernidade,  como  etnia,  classe,  gênero  e  condição 


profissional,  que  antes  situavam  socialmente  os  indivíduos,  e  hoje  se  transformam  em 
fronteiras ambíguas, permeáveis e móveis – causando, de resto, um desconforto teórico­ 
metodológico, na  medida  em que  visões  panorâmicas  da  cultura  mundial  parecem por 
demais abrangentes aos olhos dos antropólogos acostumados a atentar para o contexto 
local. Como estudar o particular num mundo onde na esquina de nossas casas se pode 
comprar  os  mais  diversos  produtos  “ made  in”   a  preço  de  R$1,99,  1,98  22 ,  o  in 
referindo­se  normalmente  um  país  “oriental”,  mitologicamente  construído  pelo 
“ocidente”? num mundo onde índios brasileiros assistem ao vivo a queima de corpos na 
guerra do Iraque na TV? ou onde a guerra de imagens (Rial, 2004) sugere a manutenção 
de velhos mitos imperialistas, mas não consegue esconder mundos em total desacordo? 
ou  onde  fast­foods  prometem  oferecer  aos  viajantes  globais  o  conforto  do  gosto 
familiar,  sem  deixar  de  dar  seu  toque  cultural  particular?  Que  entendimento  locais 
puristas quereríamos extrair de “universos transpassados” como esses? 
Canclini (2003), auxiliado por autores como Sassen, Castells e Hannerz, sustenta 
que  para  uma  cidade  ser  alçada  à  categoria  de  global  deve  atender  aos  seguintes 
requisitos: “ter forte presença de empresas transnacionais, especialmente de organismos 
de gestão, pesquisa e consultoria; ter uma mistura multicultural de habitantes nacionais 
e estrangeiros; ter prestígio decorrente da concentração de elites artísticas e científicas; 
ter  alta  porcentagem  de  turismo  internacional”.    Essas  cidades  globais,  como  Nova 
York,  Paris,  Los  Angeles,  Londres,  Tóquio  e  Hong  Kong,  são  diferenciadas  daquelas 
“emergentes”  como  São  Paulo,  Cidade  do  México,  Chicago,  Moscou,  Barcelona  e 
Taipei,  pois,  nestas  últimas,  novos  modos  de  gestão  de  serviços  globalizados 
conviveriam com setores tradicionais. Certamente os fluxos entre local e global nessas 
cidades “globais” são muito mais  intensos, como também o parecem ser as formas de 
inclusão  e  exclusão  dos  grupos  que  nelas  convivem  (Canclini,  2003;  Shaw,  2002). 
Entende­se  que  o  fluxo  intensificado  das  imagens,  dos  mercados  e  das  pessoas  estão 
mais  diretamente  relacionados  a  grupos  como  o  terceiro  setor  (Bhabha,  1998), 
transmigrantes (Ribeiro, 2003), mediadores culturais 23  – os go­betweens (Velho, 2001) 

22 
Impossível  não notar as inúmeras lojas de R$1,99  que se alastraram rapidamente a  partir do final dos 
anos 90 na maioria das cidades brasileiras. 
23 
Para  Velho  (2001)  “Os  indivíduos,  especialmente  em  meio  metropolitano,  estão  potencialmente 
expostos a experiências muito diferenciadas, na medida em que se deslocam e têm contato com universos 
sociológicos,  estilos  de  vida  e  modos  de  percepção  da  realidade  distintos  e  mesmo  contrastantes.  Ora, 
certos indivíduos mais do que outros não só fazem esse trânsito mas desempenham o papel de mediadores 
entre diferentes mundos, estilos de vida e experiências” (:20).
13 

–, comunidades virtuais e vizinhanças virtuais (Appadurai, 1994), em que o efêmero das 
possibilidades  interativas  formula  sensibilidades,  valores,  espaços  de  convívio  e 
configurações  de  tempo­espaço,  que  só  podem  ser  entendidos  em  alguns  casos  com 
semânticas 24  ainda não bem apreendidas. 
Giddens (1991), referindo­se ao mundo contemporâneo como uma conseqüência 
da  modernidade,  aponta  certas  descontinuidades, tais  como  a  separação entre  tempo  e 
espaço,  o  desenvolvimento  de  mecanismos  de  desencaixe  (como  o  dinheiro)  e  a 
apropriação  reflexiva  do  conhecimento – descontinuidades  essas que  fornecem  chaves 
importantes  para  a  compreensão  de  eventos  atuais  e  instituições  modernas,  suas 
fronteiras  e  suas  virtualidades.  Para  o  autor,  as  dimensões  da  globalização  seriam  o 
sistema  de  Estado­nação,  a  economia  capitalista  mundial,  a  ordem  militar  e  a  divisão 
social  do  trabalho.  A  globalização  seria  uma  “intensificação  das  relações  em  escala 
mundial, que ligam  localidades distantes de tal maneira que acontecimentos locais são 
modelados  por  eventos  ocorrendo  muitas  milhas  de distância  e  vice­versa”  (1991:69); 
nessa  medida,  através  de  um  processo  dialético,  “a  transformação  local  é  tanto  uma 
parte da globalização quanto a extensão lateral das conexões sociais através do tempo e 
do espaço” (1991:70). “Não podemos ignorar que o que acontece na vizinhança tende a 
ser influenciado por fatores – tais como dinheiro mundial e mercado de bens – operando 
a  uma  distância  indefinida  da  mesma”  (1991:70),  de  modo que  o  resultado  não  é  um 
conjunto  generalizado  de  mudanças  que  atuam  numa  direção  uniforme,  mas  pode 
consistir  em  mudanças  mutuamente  opostas,  o  que  mostra  como  a  homogeneidade 
cultural parece inviável, e que “qualquer semelhança não é mera coincidência”. Parece 
que o mundo inteiro está perpassado por elementos do global. 
Num momento em que se anuncia que “tudo o que é sólido se desmancha no ar” 
e  a  relatividade  einsteiniana  se  torna  um paradigma,  num momento  em  que  os  fluxos 
transmigrantes,  as  comunidades  virtuais,  os  chats,  os  blogs  e  a  expansão  do  mercado 
internacional  reconfiguram  a  vida  das  cidades  e  de  seus  habitantes  (Sassen,  2001; 
Maffesoli, 1997), e apontam para conexões entre local e global antes nunca imaginadas; 
nesse  momento,  dizíamos,  temos  aí  elementos  que  se  colocam  como  empirias 

24 
Guimarães (2000), estudando sociabilidades virtuais, ao deparar­se com as categorias nativas on­line, 
como  por exemplo representações de  papel de gênero,  relembra a comparação  feita  pelo  pesquisador de 
salas  de  bate­papo  na  internet  Marcus  Leaning,  entre  o  mundo  virtual  e  a  literatura  colonial:  “Colonial 
literature sought to understand the new worlds by applying models from the known. This process was not 
a  complete  replacement  of  indigenous  features  with  known  ones  by  the  colonialist.  Rather,  the  process 
was  one  of  a  re­negotiation  of  concepts  and  cognitive  templates.  In  applying  a  model  of  gendered
14 

desafiantes  (Rial,  1995;  Guimarães,  2000), 25  e  abrem  possibilidades  analíticas  que 


pretendem  ir  além  dos  centralismos  e  dos  localismos,  apontados  por  Menezes  Bastos 
(1997)  como  núcleos  improdutivos  da discussão  sobre o  global na  disciplina 26 . Parece 
que  o  outro  se  torna  cada  vez  mais  virtual  27 e,  questão  já  apontada  por  Benedict 
Anderson [1983] pelo conceito de “comunidades imaginadas”, reavivou o debate sobre 
o binômio real/imaginado 28  – neste caso não apenas da cultura e da identidade (não só a 
étnica;  nunca  foi  só  ela),  mas  da  imagem,  do  amor,  da  cor  da  pele,  do  sexo,  da 
intimidade, de localidades, dos nacionalismos. 
Uma  inserção  em  estudos  sobre  globalização  mostra  a  centralidade  da 
desterritorialização  e  suas  dinâmicas  culturais  nos  transnacionalismos,  nos  novos 
agrupamentos  étnicos,  nos  movimentos  separatistas  e  formações  políticas.  Segundo 
Appadurai  (2001),  esses  crescentemente  operam  de  forma  a  transcender  as  fronteiras 
territoriais  específicas  e  de  identidades.  Para  o  autor,  a  desterritorialização  afeta  as 
lealdades  entre  grupos  e  as  estratégias  do  Estado;  portanto,  afeta  a  forma  com  que 
comunidades locais produzem seus significados. Para Appadurai (1996, 2001), a nova 
apreensão etnográfica exige repensar o papel da imaginação na vida social. Voltando­se 
aos “mundos imaginados” de Benedict  Anderson, ressalta a  importância de considerar 
os sonhos, fantasias, mitos e histórias, novos poderes da vida social moderna, para fazer 
uma “macroetnografia” do mundo desterritorializado. 

behavior to an unknown, cyberpace, we are applying a set of motifs to an unknown form” (Leaning, 1998 
apud Guimarães, 2000:148). 
25 
A antropóloga Carmen Rial (2004), enquanto estava na França (final dos anos 80), de olhos abertos aos 
fenômenos  sociais  mundiais  que  transitavam  à  sua  frente,  chama  a  atenção  para  um  novo  campo  para 
além  dos  velhos  estabelecidos  oceanistas,  africanistas  e  americanistas.  A  autora  pergunta:  “Seria 
conveniente, em nome da sacralidade das fronteiras do campo, fechar os olhos aos títulos de jornais que 
anunciavam  abertura  de  um  fast­food  em  Moscou,  ou  em  outras  cidades  situadas  fora  dos  limites 
geográficos do meu campo? Ou ainda, deveria desviar os olhos das filas de espera diante do fast­food em 
Budapeste,  deixar  de  escutar  o  relato  de  um  empregado  do  McDonald's  de  Londres,  passar  sem  entrar 
diante de um fast­food plantado no centro de Marraquesh? (Rial, 2004:04). 
26 
Entre os antropólogos, segundo Menezes Bastos (1997), a tensão constituinte da discussão entre global 
e local estaria entre os “centralistas” e os “localistas” (1997:05). O autor pontua a discussão  entre Wolf 
(Europe and the People without history) e Sahlins (Ilhas de História ). O primeiro se encaixaria  entre os 
centralistas, para quem “o nível local dos fenômenos sócio­culturais e históricos teriam realidade apenas 
pontual,  tipicamente  no  caso  das  relações  das  nações­estados  modernas  com  os  primitivos,  tudo  não 
passando  da  submissão  destes  últimos  a  uma  lógica  exterior,  proveniente  do  dominador  ocidental”.  No 
extremo  oposto  estariam  os  “localistas”,  representado  por  Sahlins,  para  quem  “a  problemática  deixa  de 
existir  pois  o  que  seria  nível  global  daqueles  fenômenos  (sócio­culturais  e  históricos)  se  desfaz  sob  o 
império da intradutibilidade de lógicas locais” (Menezes Bastos, 1997:05). 
27 
Ribeiro (1996); Friedman (1994); Appadurai (1994). 
28 
A  distinção  entre  realidade  e  imaginação  é  feita  desde  Aristóteles,  que  vê  a  imaginação  como  a 
possibilidade de  evocar  ou produzir imagens, independentemente da  presença do  objeto a que se refere. 
No caso deste texto, abordo este dois elementos não como duais, mas como Fichte propõe: a imaginação 
como produtora da realidade (Nicola Abbagnano, Dicionário de Filosofia , SP: Martins Fontes, 2000).
15 

O nacionalismo e sua relação com o Estado­nação é, para Arjun Appadurai, um 
dos  problemas  mais  importantes  para  as  Ciências  Humanas  na  atualidade,  pois  a 
emergência  de  “novos  patriotismos”,  como  o  do  Québec,  as  “etnicidades  modernas”, 
cuja  proporção  é  muito  maior  que  as  “etnias  tradicionalmente  estudadas  pela 
antropologia”, como as dos tamis,  sérvios e bascos, confrontam­se  violentamente com 
os Estados hegemônicos e contra outros grupos étnicos, e trazem um desafio ao próprio 
conceito de etnia. 
Transmigrantes readaptam a sua identidade nacional em territórios estrangeiros, 
muitas  vezes  etnicizando­se  (Ribeiro, 2003),  transformam  seu  território  nacional  num 
paraíso a ser reconquistado ou num porto seguro (real ou imaginário). O sentimento de 
pertença  nacional  e  étnica,  como  já  ocorria  entre  alemães  migrantes  do  século  XIX, 
conforme  Giralda  Seyferth,  ao  invés  de  evaporar,  intensifica­se;  a  rapidez  com  que 
alguns  grupos  (não  todos)  podem  ir  e  vir  permite  por  exemplo  que,  morando  no 
exterior,  continuem  com  uma  vida  no  seu  país  natal  e  invistam  nele  política  e 
financeiramente,  mantendo  vínculos afetivos,  econômicos  e  políticos  quase  cotidianos 
(Appadurai,  1994).  Um  exemplo  da  importância  que  transmigrantes  exercem  na 
building nation  é o  caso dos  Filipinos  nos  EUA  descritos  por  Basch,  Glick­Schiller  e 
Blanc  (1994).  Organizados,  mesmo  à  distância,  conseguem  mudar  o  governo  do  seu 
país. 
O campo social transnacional torna­se o palco de ininterruptas negociações entre 
grandes  interesses  estatais  e  econômicos,  onde  o  idioma  dos  Estados­nações,  seus 
símbolos,  seus  ícones  e  o  próprio  sentimento  nacional  não  desaparecem,  mas  são  até 
mesmo intensificados. Grünewald  diz que, “se a antropologia focaliza a interação social 
que cria as fronteiras étnicas, para os membros desses grupos o discurso étnico ressalta, 
na maioria dos casos, os conteúdos de sua origem, história, cultura ou raça – mesmo que 
esses  sejam  criados  no  presente  para  fins  de  auto­representação  ou  de  representação 
para os outros” (2003:5). Os exemplos estudados mostram que a “valorização do local’, 
a proliferação dos hibridismos, o “mundo em pedaços”, as “fronteiras sociais flexíveis”, 
as  “zonas  simbólicas”  de  contato,  o  favorecimento  do  jogo  tático  de  identidades  não 
impedem  a  tensão  com  categorias  universalizantes  de  sujeitos  e  de  coletividades,  que 
levam adiante o projeto moderno da expansão do Estado­nação, tão falado nas ciências 
humanas,  já  que  esse  trata  de  cumprir  com  alguns  artifícios  de  garantia  dos 
nacionalismos  ao  incutir  nos  seus  compatriotas  a  necessidade  da  segurança  (física  e 
simbólica) que o Estado oferece, mesmo para os transmigrantes. Mas também mostram
16 

a  formação de  novos  espaços de  convivência  como os “vizinhos  virtuais’  (Appadurai, 


1996),  “comunidades  afetivas”  (Lacerda,  2003),  as  comunidades  virtuais  em  que  a 
desterritorialização permite o “estar junto” de pessoas reais e imaginadas. São estudos 
que se iniciam e que têm muito a ensinar sobre mutações e conexões entre os universos 
“inter” e “trans”. 

O outro e o eu per for máticos 


Maffesoli  (1989)  e  Featherstone  (1990)  consideram  a  nossa  época  como  um 
período da estetização da vida cotidiana, da barroquização do mundo. Maffesoli (1997) 
aborda  a  materialidade  do  estar­em­conjunto  da  pós­modernidade  através  do 
“paradigma  estético”,  tentando  mobilizar  o  porquê  e  o  como  dos  múltiplos 
agrupamentos efêmeros da pós­modernidade. Para o autor, a transfiguração do político 
está justamente neste novo “estar junto” estetizado da vida cotidiana. 
A  agência  e  as  reivindicações  (étnicas,  de  gênero,  religiosas,  etárias),  a  cultura 
inventada,  as  comunidades  virtuais/imaginadas,  as  aglomerações  estetizadas,  o 
neotribalismo trazem à tona o que tem sido discutido pelos autores preocupados com o 
turismo cultural (Banduchi e Barreto, 2001): a alteridade gerida pela mimese. Como já 
foi  apontado  por  Goffman  (1969)  e  por  Barth  (1969),  ao  interagir  com  o  seu  “outro” 
imediato,  seja  ele  o  “não­índio”,  o  “não­nativo”,  o  “não­negro”,  o  “não­branco”  –  o 
outro  muda  conforme  o  contexto  e  a  exigência  da  fronteira  –,  os  “agentes”  tratam  de 
perceber  o  que  é  ser  “índio”  para  esse  outro  e,  na  perspectiva  da  aceitabilidade  no 
“mercado das etnias” 29 , passam a representar para esses o que os indígenas acham que 
os brancos acham que é ser índio. Essa manipulação da representação de si ou do grupo 
foi  acusada  muitas  vezes  de  “não  autêntica”,  tanto  nos  media   quanto  em  trabalhos 
acadêmicos,  colocando  comunidades  como  “engodos  culturais”,  e  considerando  a 
“cultura inventada” como uma farsa, um simulacro, já que “apelam para artifícios não 
originários” do seu próprio grupo. O que é preciso nesses casos, mais uma vez, é voltar­ 
se para o contexto e pesquisar onde e como se dá a representação do grupo, e como a 
“autenticidade”  é  reivindicada,  para  entender  o  que  se  passa  além  da  perspectiva  de 
“simulação”  que  muitas  vezes  impregna  o  olhar  do  pesquisador.  Segundo  Subirats 

29 
Ao usar a expressão “mercado das etnias”, não estou tentando anatematizar o uso variado dos atributos 
identitários  entre  os  grupos  sociais  como  pura  mercadoria,  mas  chamar  atenção  para  a  habilidade 
perceptiva  dos  grupos sociais em entender e usar de  forma  inteligente e  eficaz  os conceitos em  voga na 
academia, nos debates amplos das financiadoras, do próprio  Estado que  o  abrange, e por que  não dizer, 
dos atributos globais que chegam até esses.
17 

(1989),  “a  reprodução  do  mundo  como  simulacro  pressupõe  o  fim  do  sujeito  e  da 
história,  o  esvaziamento  consumado da  existência  na ordem  indiferenciada da  cultura, 
concebida como segunda natureza ou natureza programada” (1989:66). 
A  minha  preocupação  aqui  não  é  com o  autêntico ou  não autêntico da  cultura, 
mas  sim  com a  recorrência  do uso de  rituais,  espetáculos  ou  eventos  que  “encenam  a 
cultura” (Goffman, 1989), e a partir dessas chamar a atenção para a performatividade e 
a  narratividade  presentes  nesses  eventos  de  contato  identitários  (inter­  ou 
transsocietários), especialmente quando focamos aquelas personagens eleitas pelo grupo 
para  fazerem  a  mediação  cultural.  Nesse  caso,  etnicidade,  além  de  uma  ferramenta 
política e de um abrigo virtual carregado de símbolos, passa a ser também uma possível 
narrativa de si (e do seu grupo) em relação ao outro e, mais especificamente, como uma 
performance,  nos  termos  de  Bauman  (1977)  e  de  Briggs  (1990),  em  que  os  atores  ou 
grupos sociais, na experiência do evento da interação, estão tentando comunicar algo a 
um  público  que  os  avalia  constantemente,  de  modo  que  precisam  exibir  talento  e 
competência para adquirir legitimidade. Essa identidade performática, como a chamarei 
aqui,  não  se  limita  aos  grupos  indígenas  em  seus  contatos  com  as  comunidades 
nacionais (apesar de serem muito freqüentes entre alguns grupos, como os Kayapó, os 
Kamayurá, os Xavante, talvez  justamente por serem esses que têm se tornado visíveis 
nos meios de comunicação), mas se expande por todos os setores sociais que pretendem 
requerer  uma  identidade  de  grupo  (permanente  ou  momentânea);  além  disso  pode  ser 
observada  em  individualidades  como  propõe  Simmel  [1902],  quem,  ao  analisar  o 
homem  moderno  do  início  do  século  XX,  já  anunciava  que,  ao  viver  nas  cidades,  "a 
pessoa precisa enfrentar a dificuldade de afirmar a sua própria personalidade no campo 
abrangido  pelas  dimensões  da  vida  metropolitana”  (1979:22).  Para  Simmel  [1902], 
“onde o aumento quantitativo em importância e o dispêndio de energia assumem os seus 
limites, a pessoa se volta para as diferenças qualitativas, de modo a atrair, por alguma 
forma,  a  atenção  do  círculo  social,  explorando  sua  sensibilidade  e  diferenças.  (...)  o 
homem é tentado a adotar as peculiaridades mais tendenciosas, isto é, as extravagâncias 
especificamente  metropolitanas  do  maneirismo,  capricho  e  preciosismo.  Agora,  o 
significado  dessas  extravagâncias  não  jaz  absolutamente  no  conteúdo  de  tal 
comportamento,  mas  antes  na  sua  forma  de  'ser  diferente',  de  sobressair  de  forma 
notável e assim atrair atenção” (Simmel, 1979:22). 
Essa “metacultura” definida por Greg Urban como “culture that is about culture” 
ou o  “judgments  made  by  natives  about  similarietes  and  differences  with the  past  and
18 

change” (Urban apud Oakdale, 2004:02), mais do que uma problemática ontológica,  é 
uma  questão  de  reflexividade  (Giddens,  1991)  e  de  entendimento  das  regras  do  jogo 
estabelecidas  num  sentido  do  poder  foucaultiano  (relacional),  que  serve  não  somente 
para o contato com o “não­índio”, mas também, e especialmente, frente a especialistas 
de  todo  o  tipo  e  a  instituições  de  toda  ordem  e  abrangência,  tais  como  o  Estado,  a 
Nação,  os  meios  de  comunicação,  agências  financiadoras  de  projetos,  a  Igreja,  a 
academia, entre outras. 
Mauss [1936] refere­se à mimese da gestualidade social inscrita na manifestação 
cotidiana  das  atuações  corporais,  entendidas  como  realizações  e  montagens 
fisiopsicológicas;  neste  sentido,  o  corpo  é  ao  mesmo  tempo  instrumento  com  que  se 
molda o  mundo  e  substância  a  partir  da qual, por  usos  metafóricos  e  metonímicos,  se 
entende o mundo. 
Não  se  trata  de  acusar  o  outro  de  representar  aquilo  que  queremos,  porque  se 
sabe  que  o  processo  de  representação  de  si  é  cheio  de  efeitos  caleidoscópicos 
surpreendentes  (e  por  isso  mesmo  cabe  continuarmos  a  refletir  sobre  estes  últimos). 
Parece  que  é  preciso  olhar  além  da  desconfiança,  e  salientar  as  estratégias  de 
representação do “nós” e do “eu”, que são mais complexas e portanto menos estáticas e 
lineares do que se supôs serem na luta travada por alguns setores da disciplina, durante 
os  anos  80,  na  “recuperação  das  etnicidades”.  Para  Leslie  Baxter  e  Barbara 
Montgomery,  a  dialética  relacional  reconhece  diferenças  fundamentais  nas  interações 
relacionais  cronotipicamente  situadas,  diferenças  essas  que  representam  a 
multivocalidade da existência social. Essas diferenças serão, muitas vezes, mutuamente 
exclusivas  e  contraditórias  (Baxter  e  Montgomery  apud Mendes, 2002).  Assim  parece 
ser a identidade da pós­modernidade. 
Ao  focar  a  idéia  de  performatividade,  Judith  Butler  (2003)  diz  que  o  gênero  é 
uma  identidade  tenuamente  constituída  no  tempo,  instituída  num  espaço  externo  por 
meio  de  uma  repetição  estilizada  de  atos,  cujo  efeito  se  produz  pela  estilização  dos 
corpos – é uma temporalidade espacial. Gênero, para Butler, é um estilo corporal, um 
“ato”  que  é  tanto  intencional  como  performativo,  onde  performativo  sugere  uma 
construção dramática e contingente de sentido (2003:199). Para a autora, o eu do gênero 
é  permanentemente  estruturado  por  atos  repetitivos  que  buscam  aproximar  o  ideal  de 
uma base substancial de identidade, mas revelador, em sua descontinuidade ocasional, 
da falta de fundamento temporal contingente dessa “base”. Então, os atributos de gênero 
não  são  expressivos,  mas  performativos,  constituindo  efetivamente  a  identidade  que
19 

pretensamente  expressariam  ou  revelariam.  Portanto,  “não  há  identidade  pré­existente 


pela qual um ato ou atributo possa ser medido; e não há atos de gênero verdadeiros ou 
falsos, reais ou distorcidos” (Butler, 2003:199), assim como não deve haver identidades 
quaisquer  verdadeiras  ou  falsas,  imitação  de  uma  cultura  autêntica.  Se  não  há  sequer 
cultura  dada,  como  imitá­la?  Se  há,  voltamos  ao  princípio  da  discussão  da 
homogeneidade e da imutabilidade da cultura. 
Para além dos conflitos intersocietários nos estágios atuais da globalização, que 
não são poucos e cuja análise não é menos pertinente, quero fechar este texto pensando 
nas  micropolíticas  das  identidades  –  um  processo  que  envolve  a  interioridade  e  a 
exterioridade, e que transcende a dúvida entre real e  imaginado. A sua estetização e  a 
sua  performatividade,  capacidades  altamente  criativas,  inventivas,  perceptivas, 
politizadas  e  portanto  que  refletem  sobre  o  que  é  o  contato  com  o  outro  –  seja  ele 
presencial  imediato,  regional,  global,  ou  ainda  virtual  (mas  nem  por  isso  menos 
presente)  –  espalham­se  como  a  etnicidade  proposta  por  Carneiro  da  Cunha  (1986): 
como uma  linguagem  em  que  a  situação do  contato  e  as  muitas  informações  captadas 
nela, dadas num enquadramento adequado (Bateson, 1998), vão permitir que o grupo e 
os  seus  membros  expressem  as  suas  capacidades  criativas  e  as  suas  potências 
imaginativas,  recriando  a  mesmidade  da  cultura.  A  performance  entra  aqui  como  um 
elemento  essencial  e  não  mais  uma  farsa  ou  imitação,  pois  é  ela  que  permitirá  a 
estratégia do contato, que, segundo Rafael Menezes Bastos, é sempre uma tentativa de 
armistício,  talvez  sem  nunca  o  levar  a  cabo,  já  que  cisões  também  são  constitutivas: 
criam­se cisões dentro dos mais pequenos grupos, muitas vezes dentro de nós mesmos, 
saindo  da  mesmidade  estagnante.  Como  propõe  Maffesoli  (1997),  “é  preciso  saber 
aceitar  esses  meandros  de  uma  vida  efervescente  e  empática  que  não  se  deixa 
encurralar, a priori, num sistema de verdades preestabelecidas”, e que é capaz de criar 
igualdades  quando  a  diferença  inferioriza,  e  de  criar  diferenças  quando  a  igualdade 
descaracteriza. 
Assim, a cultura, a etnicidade (neste caso a identidade) são arenas pintadas com 
motivos  barrocos  mutantes,  nas  quais  estamos  todos  a  jogar  (ou  a  brincar),  por  vezes 
entendendo as regras do jogo, outras vezes inventando­as, ou ainda sendo surpreendidos 
por elas ou pela (in)comunicabilidade nelas. 
O problema desse “eu performático” é que a sua estética inclui os mais extremos 
exemplos  de  atuação  e de  legitimidade,  como  foi  a  de  Hitler  e  a  de  Stálin,  para  citar 
alguns,  e  mais  contemporaneamente  a  atuação  de  Bush,  ou  dos  paramilitares
20 

colombianos,  ou  dos  narcotraficantes  no  RJ  –  atores  que  vistos  um  a  um  parecem 
performances  individuais,  mas  que  enunciam,  explicitam  ou  instigam  performances 
coletivas que incluem sentimentos como a xenofobia, o desejo desenfreado pelo poder, 
os  nacionalismos  mais  fulminantes,  com  rituais  que  não  raro  incluem  sacrifícios  de 
sangue.  Mesmo  assim,  quero  enfatizar  a  sua  cultura  possível  –  combatível,  do  meu 
ponto  de  vista,  mas,  acima  de  tudo,  possível,  especialmente  quando  instigada  por 
“grandes homens” por nós mesmos inventados. 
No  sentido  delineado  nos  últimos  parágrafos,  podemos  dizer  que  o  jogo 
antropológico  é  também  uma  performance,  uma  forma  de  se  tornar  visível  perante  o 
outro  ajudando­o  a  criar  a  sua  narrativa  performática,  mas  também  criando  a  sua 
própria. É nessa perspectiva que o trabalho do antropólogo não se restringe ao contato 
com esse “outro nativo”, mas de si mesmo como outro (Eckert e Rocha, 1998), já que 
na narrativa do seu contato com o outro se depara com o si mesmo como um outro. E se 
para  Valeri  (1994)  o  jogo  oferece,  pois,  ao  adulto  o  espelho  em  que  se  deveria 
necessariamente  olhar  para  redescobrir  o  Si  ilusório  em  que  se  funda  o  Si  real,  eu 
proporia que nos jogos da identidade o Si é sempre ilusório, inventado, virtual, cheio de 
barroquismos e, ainda assim, real. 

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ANTROPOLOGIA EM PRIMEIRA MÃO 
Títulos publicados 
1. MENEZES BASTOS, Rafael José de. A Origem do Samba como Invenção do Brasil: Sobre o "Feitio de Oracão " 
de Vadico e Noel Rosa (Por que as Canções Têm Musica?), 1995. 
2. MENEZES BASTOS, Rafael José de e Herm enegildo José de Menezes Bastos. A Festa da Jaguatirica: Primeiro e 
Sétimo Cantos ­ Introdução, Transcrições, Traduções e Comentários, 1995. 
3. WERNER Dennis. Policiais Militares Frente aos Meninos de Rua, 1995. 
4. WERNER Dennis. A Ecologia Cultural de Julian Steward e seus desdobramentos, 1995. 
5. GROSSI Miriam Pillar. Mapeamento de Grupos e Instituições de Mulheres/de Gênero/Feministas no Brasil, 1995. 
6. GROSSI Mirian Pillar. Gênero, Violência e Sofrimento ­ Coletânea, Segunda Edição 1995. 
7. RIAL Carmen Silvia. Os Charmes dos Fast­Foods e a Globalização Cultural, 1995. 
8. RIAL Carmen Sílvia. Japonês Está para TV Assim como Mulato para Cerveja: lmagens da Publicidade no Brasil, 
1995. 
9. LAGROU, Elsje Maria. Compulsão Visual: Desenhos e Imagens nas Culturas da Am azônia Ocidental, 1995. 
10. SANTOS, Sílvio Coelho dos. Lideranças Indígenas e Indigenismo Of icial no Sul do Brasil, 1996. 
11. LANGDON, E Jean. Performance e Preocupações Pós­Modernas em Antropologia 1996. 
12. LANGDON, E. Jean. A Doença como Experiência: A Construção da Doença e seu Desafio para a Prática 
Médica, 1996. 
13. MENEZES BASTOS, Rafael José de. Antropologia como Crítica Cultural e como Crítica a Esta: Dois Momentos 
Extremos de Exercício da Ética Antropológica (Entre Índios e Ilhéus), 1996. 
14. MENEZES BASTOS, Rafael José de. Musicalidade e Ambientalismo: Ensaio sobre o Encontro Raoni­Sting, 
1996. 
15. WERNER Dennis. Laços Sociais e Bem Estar entre Prostitutas Femininas e Travestis em Florianópolis, 1996. 
16. WERNER, Dennis. Ausência de Figuras Paternas e Delinqüência, 1996. 
17. RIAL Carmen Silvia. Rumores sobre Alimentos: O Caso dos Fast­Foods,1996. 
18. SÁEZ, Oscar Calavia. Historiadores Selvagens: Algumas Reflexões sobre História e Etnologia, 1996. 
19.  RIFIOTIS,  Theophilos. Nos campos da Violência: Diferença e Positividade, 1997. 
20. HAVERROTH, Moacir. Etnobotânica: Uma Revisão Teórica. 1997. 
21. PIEDADE, Acácio Tadeu de C. Música Instrumental Brasileira e Fricção de Musicalidades, 1997 
22. BARCELOS NETO, Aristóteles. De Etnografias e Coleções Museológicas. Hipóteses sobre o Grafismo Xinguano, 
1997 
23.  DICKIE, Maria Amélia Schmidt. O Milenarismo Mucker Revisitado, 1998 
24.  GROSSI, Mírian Pillar. Identidade de Gênero e Sexualidade, 1998 
25.  CALAVIA SÁEZ, Oscar. Campo Religioso e Grupos Indígenas no Brasil, 1998 
26.  GROSSI, Miriam Pillar. Direitos Humanos, Feminismo e Lutas contra a Impunidade. 1998 
27.  MENEZES BASTOS, Rafael José de. Ritual, História e Política no Alto­Xingu: Observação a partir dos Kamayurá 
e da Festa da Jaguatirica (Yawari), 1998 
28.  GROSSI, Miriam Pillar. Feministas Históricas e Novas Feministas no Brasil, 1998. 
29.  MENEZES BASTOS, Rafael José de. Músicas Latino­Americanas, Hoje: Musicalidade e Novas Fronteiras, 1998. 
30.  RIFIOTIS, Theophilos. Violência e Cultura no Projeto de René Girard, 1998. 
31.  HELM, Cecília Maria Vieira. Os Indígenas da Bacia do Rio Tibagi e os Projetos Hidrelétricos, 1998. 
32.  MENEZES BASTOS, Rafael José de. Apùap World Hearing: A Note on the Kamayurá Phono­Auditory System 
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33.  SAÉZ, Oscar Calavia. À procura do Ritual. As Festas Yaminawa  no Alto Rio Acre, 1998. 
34.  MENEZES BASTOS, Rafael José de & PIEDADE, Acácio Tadeu de Cam argo: Sopros da Amazônia: Ensaio­ 
Resenha sobre as Músicas das Sociedades Tupi­Guarani, 1999. 
35.  DICKIE, Maria Amélia Schmidt. Milenarismo em Contexto Significativo: os Mucker como Sujeitos, 1999. 
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66. Menezes Bastos, Rafael José de. Les Batutas in Paris, 1922: An Anthropology of (In) discreet Brightness, 2004. 

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69. Apgaua, Renata. Rastros do outro: notas sobre um mal­entendido, 2004. 

70. Gonçalves, Cláudia Pereira. Política, Cultura e Etnicidade: Indagações sobre Encontros Intersocietários, 2004. 

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