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Cadernos de Publicações

n°1

1
Académicas
Gestão escolar democrática: Papel do conselho
de escola na gestão escolar democrática¹
Autores:
Nelson Lucas Mahetane Buque2
Carlos António Timana³

Resumo

O presente texto tem como objectivo descrever o papel do conselho da escola na gestão
escolar democrática. O mesmo resultou de uma leitura reflexiva das obras de Lück (2005,
2009), Burnit e Gunter (2013), Dourado (2005), Paro (2012), Drabach (2010), Libâneo (2001), Luluva
(2016), entre outras e, um trabalho de campo realizado sobre os membros de um conselho escolar
de uma escola pública no distrito da Manhiça, na província de Maputo. Apuramos, da pesquisa
bibliográfica, que uma gestão escolar só poderá ser considerada democrática somente se todos
os segmentos da sociedade participarem e contribuírem democraticamente no projecto político
pedagógico da escola e esta ser sensível aos factores sociais da comunidade em que está inserida.
Notamos unanimidade, nos autores consultados, sobre a necessidade de todos os seguimentos da
comunidade escolar terem representantes nos conselhos de escola para tornar a gestão escolar
democrática. Do trabalho de campo realizado constatamos que os conselhos de escola ajudam na
superação das desigualdades de género no ensino, diminuição do estigma, integração de alunos com
necessidades educativas especiais, materialização do direito de exprimir contrariedade, decidem
sobre as acções que merecem prioridade, as normas internas de funcionamento da escola, analisam
e decidem sobre as inquietações encaminhadas pelos diversos segmentos da escola, acompanham a
execução das acções pedagógicas, administrativas e financeiras e mobilizam a comunidade escolar
a participar em actividades conducentes á melhoria da qualidade do ensino. Constatamos, também,
que existem seguimentos da comunidade não representados no conselho de escola estudado e que
a presença frequente nos encontros, ordinários e extraordinários, é apenas por parte dos elementos
do micro ambiente escolar. Assim, fazemos apelo para que os demais segmentos da comunidade
tenham representatividade e participação assídua nos conselhos de escolas. O estudo teve como
limitação o facto de ser realizado sobre um único conselho de escola, o que espera ser ultrapassado
com a análise, no futuro, de outros conselhos de escolas.

Palavras – Chave: Conselho de escola; Gestão escolar democrática; Comunidade escolar.

Introdução
A necessidade de tornar as escolas autónomas, participativas, transparentes e plurais é, e continua
sendo, uma das preocupações em vários estudos da gestão escolar, de vários segmentos da sociedade
e em várias áreas das unidades escolares.
Testemunhamos, nos dias de hoje, como resultado dessas preocupações, o surgimento de legislações

1 II Encontro Nacional de Pesquisa em Educação, Maputo, 26 e 27 de Setembro de 2019.


2 Doutorando em Ciências da Educação, Universidade de Évora.
3 Licenciado em Organização e Gestão da Educação.

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que abrem as possibilidades de participação, através da representatividade, dos diversos segmentos da
sociedade, os incentivos para elaboração conjunta dos projectos educativos das escolas, construídos
e executados de forma participada, dentro de princípios de inclusão, legitimação e responsabilização
dos vários intervenientes na vida escolar e a adequação das medidas e das decisões às características
das escolas, aos recursos das escolas e às solicitações das comunidades escolares.

Estas medidas, embora não surjam aos cogumelos, continuamente e em todas as escolas, como é
de desejar, são de louvar e caracterizam, segundo Nóvoa (1995), Dourado (2006), Drabach (2010)
e Lück (2009), as escolas do futuro. Escolas essas, em que haverá maior participação comunitária no
acompanhamento da educação ali oferecida.

Assim, no presente texto, nos propomos a descrever o papel do conselho da escola na gestão
escolar democrática, através da caracterização, da análise crítica, da descrição da composição dos
conselhos das escolas, das formas e dos princípios de participação das comunidades na vida das
escolas. Tendo constituído a principal preocupação do estudo perceber, partindo de um conselho
de escola específico, a questão já levantada por Viegas (2008): como materializar a gestão escolar
democrática por meio do conselho escolar tendo em conta os seus principais papéis na gestão das
unidades escolares?

Consideramos, no âmbito deste estudo, conselho de escola como sendo um órgão colegial, uma
assembléia de pessoas, representantes de diversos segmentos do micro e do macro ambiente
escolar�, que se reúnem para deliberar, diante de uma ponderação reflectida em saber ouvir, respeitar
as ideias dos outros e exprimir contrariedades, sobre as questões do âmbito pedagógico, financeiro
e/ou administrativo das escolas. E a gestão escolar democrática, como uma gestão que prioriza a
participação de todos os segmentos que compõem o processo educativo, o pluralismo, a autonomia
e a transparência na definição dos rumos que a escola deve imprimir à educação de maneira a
efectivar essas decisões (Araújo, 2000, Lück, 2005, 2006, 2009, Paro, 2012, Drabach, 2010).

Achamos relevante a reflexão sobre este tema dada a sua actualidade, emergência nas escolas e em
debates educacionais é uma maneira de colocar a nossa singela contribuição na percepção do papel
que os conselhos de escola desempenham na gestão democrática do ensino, através de elementos
teóricos e práticos.

Gestão escolar democrática

A gestão escolar democrática traduz-se na participação da comunidade em aspectos pedagógicos,


administrativos e financeiros da escola e tem como objectivo fundamental envolver toda a
comunidade escolar na vida da escola através da participação efectiva na construção do projecto
político pedagógico e em todas as decisões que emergem da gestão escolar.
A participação da comunidade na gestão escolar democrática ocorre através da representatividade,

4 Entende-se por micro ambiente escolar o ambiente constituído por elementos internos às unidades escolares tais como alunos,
professores, directores e outros funcionários internos da escola e, por macro ambiente escolar as entidades externas a escola, tais como
pais e encarregados de educação, agentes económicos, associações locais, representações locais dos organismos internacionais, dos
órgãos do Estado que directa ou indirectamente exercem alguma influência sobre a escola.

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isto é, através da participação dos representantes dos diversos segmentos da comunidade escolar
nos órgãos colegiais. O conselho da escola constitui o principal órgão colegial tendo em conta a
sua formação e os seus fins, e também o que congrega além da direcção, professores e estudantes,
participantes dos demais órgãos e representantes da comunidade onde a escola está inserida.

De acordo com Dourado (2006) a gestão escolar democrática:

(...) faz parte da história de luta dos trabalhadores em educação e movimentos sociais organizados em defesa de
um projeto de educação pública de qualidade, social e democrática. Em diferentes momentos, tais lutas se travaram
para garantir maior participação dos trabalhadores em educação nos destinos da escola, no fortalecimento dos
conselhos escolares, na definição do projecto político pedagógico, na defesa da eleição de directores, da autonomia
escolar e de um crescente financiamento público (p. 51).

A esse respeito, Libâneo, Oliveira e Toschi (2007, p. 326) acrescentam ainda que “a gestão democrática,
por um lado, é actividade colectiva que implica a participação e objectivos comuns, por outro, depende também
de capacidades, responsabilidade individuais e de uma acção coordenada e controlada”. O envolvimento
da comunidade na vida da escola, segundo Libâneo (2001), possibilita, por um lado, o conhecimento,
a avaliação dos serviços oferecidos e a intervenção organizada nas actividades da escola e influência
na democratização da gestão e na melhoria da qualidade de ensino. E por outro lado, constitui o
caminho para construção de escolas flexíveis, autónomas, onde se assiste a responsabilização e o
planeamento colectivo. Para Samistraro e Junges (2014) a gestão escolar democrática: (…) pode
melhorar o que é específico da escola, “o seu ensino”. Isso se explica pelo facto de que o envolvimento dos
diferentes actores, equipa escolar, pais, alunos e comunidade em geral, no processo educacional propiciarão
um contacto maior e permanente entre si, o que pressupõe um conhecimento mútuo e significativo (p. 4).

Ainda sobre o envolvimento da comunidade na vida da escola, Viegas (2008) defende que esta
prática da gestão escolar quando considerada, (…) poderá constituir um caminho para a melhoria da
qualidade do ensino, se for concebida como um mecanismo capaz de inovar as práticas pedagógicas
da escola. Este é o grande desafio: como podemos, de facto, concretizar a gestão democrática por
meio do projecto político pedagógico e do conselho escolar (p. 126)?

Em Moçambique a gestão escolar democrática vem desde os anos 1962, nas zonas libertadas,
antes da independência, quando havia alguma mobilização da comunidade a participar na tomada de
decisões que diziam respeito à vida das escolas, passou pelo período pós-independência, através das
comissões de pais e de ligação escola- comunidade (Lei nº 6/92, de 6 de Maio) que incentivavam uma
maior ligação entre a comunidade e a escola e, pelo período actual, contexto da descentralização
administrativa (Diploma Ministerial nº 54/2003, de 28 de Maio), em que nascem os conselhos de
escola, órgão colegial que procura criar maior flexibilidade nos processos de tomada de decisão
através duma gestão participativa (Mazula, 1995, Uaciquete, 2011, Gomez, 1999).

Considerando que a gestão escolar democrática materializa-se pela participação activa e construtiva
da comunidade, dos alunos, dos pais e dos encarregados de educação na tomada de decisões, MINEDH
(2015) é de opinião de que esta pode melhorar as infraestruturas escolares, o equipamento e o

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ambiente escolar e promover o sucesso escolar, na medida em que esta participação resulta na
tomada de melhores decisões, na satisfação de todos os envolvidos e na melhoria das relações entre
a escola e o seu meio.

Lück (2005), Dourado (2005, 2006) e Paro (2012) sublinham que, a gestão escolar democrática,
enquanto processo de condução das escolas, baseia-se na participação e na deliberação colectiva
das decisões que definem a vida das instituições escolares. Por isso, segundo estes autores, a gestão
escolar democrática só tem êxito se a comunidade dos ambientes micro e macro das escolas
participarem de forma efectiva e activamente na vida da escola. Para Paro (2012) a gestão escolar
democrática deve ser desempenhada pelo director em conjunto com a participação da comunidade
escolar, numa “nova ética que desautorize a actual configuração autoritária da escola” (p. 80) e deve
conduzir à qualidade educacional e ao desempenho de todos os envolvidos.

Do que foi exposto até aqui leva-nos a concordar que o modelo de gestão escolar autoritária, não
democrático, em que as decisões e os cursos de acção que a escola deve seguir, são definidos pelos
directores das escolas e/ou seus pares, prevalecendo a vontade dos mesmos, resulta em ineficiências
administrativas, isto é, a escola, e consequentemente, o processo de ensino e aprendizagem, é
conduzido como algo que tem que acontecer só por acontecer, sem que haja troca de opiniões,
debates, transmissão de experiências, sem que se oiçam outras partes envolvidas, comprometendo,
dessa forma, a educação.

Assim, uma gestão escolar democrática deve caracterizar-se pela existência dos seguintes elementos
(Dourado, 2005, Paro, 2012 Lück, 2005, 2009, Luluva, 2016, Basílio, 2014, MINEDH, 2015, Burnit e
Gunter, 2013, Drabach, 2010):

• Uma maior participação da comunidade escolar (alunos, professores, pais e encarregados


da educação, grupos associativos locais, etc.) nas decisões e no dia-a-dia da escola, como
elemento básico para a democratização do ensino e para produção de avanços significativos
resultantes de opiniões diferentes;
• Uma maior satisfação da comunidade escolar (alunos, professores, pais e encarregados da
educação, grupos associativos locais, etc.) com as decisões e com dia-a-dia da escola;
• Um conselho escolar com todos os segmentos da comunidade nele representados, actuantes,
conscientes de seu papel nos destinos da escola e que auxilia na gestão escolar a partir da
discussão de temas que direccionam as acções das unidades escolares;
• Um projecto político pedagógico conjuntamente elaborado e que tem em conta os anseios,
preocupações e necessidades da comunidade escolar;
• Uma gestão escolar sensível aos factores sociais da comunidade que interferem na escola,
que busca parcerias com outros órgãos para o auxílio nas suas actividades, que valoriza as
contrariedades e cria condições favoráveis ao bom desempenho de toda comunidade escolar;
• Uma autonomia evidenciada nas dimensões financeira, política, administrativa, e pedagógica,
desenvolvidas de modo interdependente e a se reforçarem reciprocamente buscando não
criar um ambiente autoritário;

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• Um envolvimento activo, participativo, produtivo e flexível, de todos segmentos da comunidade
escolar com possibilidades de opinar e sugerir, tendo em vista a melhoria e o bom andamento
e o alcance dos objectivos da escola;
• Um ambiente de trabalho agradável onde há respeito, colaboração e onde todos os membros
assumem seu poder de exercer influencia na dinâmica destas unidades sociais e cumprem
suas funções tendo em vista o bom andamento e o alcance dos objectivos da escola.
• A gestão escolar democrática materializa-se, desta forma, através da inclusão nos processos
decisórios, de todos os seguimentos que compõem a comunidade escolar. Na prática é preciso
analisar, criticamente, como a comunidade está estruturada para que se possa ter a noção e
um direccionamento claro de como conceber uma gestão educacional inclusiva, explicitando
boas relações entre a escola e a comunidade e preocupando-se com a qualidade da educação
e da formação total das equipas de gestão, de docentes e discentes da instituição de ensino.
• Assim, o conselho de escola desempenha um papel importante na gestão escolar democrática
na medida em que sensibiliza a comunidade escolar a se envolver na tomada de decisões
sobre matérias que dizem respeito a vida da escola, busca outros pontos de vista sobre a
organização escolar que contribuem para melhorar o desempenho e organização do trabalho
na escola.

Conselho de escola e a gestão escolar democrática

Para que a gestão escolar seja democrática é imperioso que estejam representados, na composição
do conselho escolar, todos os segmentos que constituem a comunidade em que a escola está inserida,
uma vez que este órgão constitui um dos mais importantes mecanismos de democratização da
gestão de uma escola.

Alves (1999) aponta a importância de existência de um grupo de participantes da vida escolar


composto por representantes de professores, representantes do pessoal administrativo,
representantes de alunos, representantes de pais e encarregados de educação e empresários locais
que tomam decisões importantes sobre a vida da escola. Este grupo ao actuar de forma colegial
estará a contribuir para uma gestão democrática e para a melhoria significativa não só do ambiente
escolar, mas também da própria qualidade da educação.

Assim, quanto mais activa, ampla, representativa e aberta for a participação dos membros do
conselho escolar na vida da escola, maiores serão as possibilidades de fortalecimento dos mecanismos
de participação e decisões colectivas e mais democrática se torna a gestão escolar.

Em Moçambique, o conselho de escola é o órgão máximo de consulta, monitoria e de fiscalização


do estabelecimento de ensino e é constituído por pessoas de diferentes segmentos, isto é, director
da escola, representantes dos professores, representantes dos alunos, representante do pessoal
técnico administrativo, representantes dos pais e/ou encarregados de educação e representantes
da comunidade local, o número de representantes por cada categoria é definido dependendo do
número de estudantes matriculados na escola, nos moldes descritos na tabela seguinte (MINEDH,
2017).

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Tabela 1. Distribuição número de vagas dos membros do conselho escolar por tipo de escola.

Tipo 1 Tipo 2 Tipo 3


Grupo (+ de 1500 alunos) (500-1500 alunos) (< 500 alunos)
Nº de vagas Nº de vagas Nº de vagas
Director da escola 1 1 1
Representantes dos professores 3 3 2
Representantes do Pessoal técnico administrativo 1 1 1
Representantes dos pais/encarregados de educação 8 8 6
Representantes dos alunos 4 4 3
Representantes da comunidade 4 4 3
Total 21 21 16

Fonte: Adaptado de MINEDH (2015, 8).

Segundo MEC (2008), a participação destes diferentes segmentos da comunidade escolar no conselho
de escola prende-se com objectivo de assegurar uma boa gestão escolar, um bom aproveitamento
escolar, um bom desempenho dos professores e uma gestão transparente dos recursos por meio
das competências que lhe são atribuídas. Segundo o mesmo autor, compete ao conselho da escola:
(…) aprovar o plano de desenvolvimento da escola e garantir a sua implementação; aprovar o regulamento
interno da escola e garantir a sua aplicação; aprovar e garantir a execução de projectos de atendimento
psicopedagógico e material aos alunos, quando seja iniciativa da escola e aprovar os relatórios anuais da
escola (p. 17).

Portanto, nesta óptica, a comunidade escolar é um dos intervenientes da gestão da instituição


escolar, com a sua participação na gestão escolar espera-se que haja a promoção de actividades que
tendem a melhorar o desempenho da escola e dos seus intervenientes, a garantia do sucesso escolar
dos alunos, através de uma gestão escolar democrática.

De acordo com Basílio (2014), o conselho de escola materializa a gestão escolar democrática ao
desempenhar os seus papéis consultivo, deliberativo, fiscal e mobilizador, que consistem, segundo o
mesmo autor, em:
• Consultivo, refere-se ás competências que têm a ver com apreciar ou propor algo, ou seja,
refere-se não só à emissão de pareceres para dirimir as dúvidas e tomar decisões como
também às questões pedagógicas, administrativas e financeiras, no âmbito de sua competência;
• Deliberativo, refere-se às competências que têm a ver com aprovar e garantir a implementação
de plano anual da escola, regulamento interno, aprovar relatórios, orçamentos e, às tomadas
de decisão relativas às directrizes e linhas gerais das acções pedagógicas, administrativas e
financeiras quanto ao direccionamento das políticas públicas, desenvolvidas no âmbito escolar;
• Fiscal - refere-se ao acompanhamento e à fiscalização da gestão pedagógica, administrativa e
financeira da unidade escolar, garantindo a legitimidade de suas acções;
• Mobilizador, esta função tem a ver com a competência de persuadir aos pais e encarregados
de educação para apoiarem a escola, isto é, refere-se ao apoio e ao estimulo às comunidades

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escolar e local em busca da melhoria da qualidade do ensino, do acesso, permanência e aprendizagem
dos estudantes. É essencial a participação de todos os segmentos no Conselho Escolar. Essa
participação é o que tornará democrática a gestão da escola pública (p.52)

Figura 1: Papeis do conselho escolar

Fonte: Adaptado de Viega (2008)


Sobre a composição do conselho de escola, de modo a garantir uma gestão democrática
da instituição escolar, Burnit e Gunter (2013), são de opinião de que neste órgão devem estar
representados também os movimentos sociais organizados da comunidade comprometidos com
a educação (associações de moradores, sindicatos, instituições religiosas, conselhos comunitários,
conselho de saúde, vários grupos profissionais e ocupacionais, os diversos departamentos ou grupo
de trabalhadores), estes autores sublinham que a comunidade deve ser repartida tendo em conta a
realidade local.

Assim, uma gestão escolar só poderá ser considerada democrática no momento em que todos os
segmentos da sociedade participam e contribuem democraticamente na vida da escola, para tal estes
seguimentos devem estar representados no conselho de escola, por tanto, o conselho de uma escola
fortalece a democracia escolar e estabelece o envolvimento de todos os membros da comunidade
na escola e melhoria da qualidade do ensino.

Metodologia

Para a produção do presente trabalho usamos a metodologia de pesquisa qualitativa, visto que
o objectivo foi de procurar descrever, de forma detalhada, um fenómeno social, que é, o papel do
conselho de escola na gestão democrática das instituições de ensino. Esta modalidade de pesquisa
permite compreender de forma detalhada as características de um fenómeno social, o porquê e como

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do seu acontecimento, na perspectiva dos participantes, considera que existe uma relação dinâmica
entre o mundo real e o sujeito, que não pode ser traduzido em números absolutos ou percentuais,
que a interpretação de fenómenos e a atribuição de significados são actividades básicas no processo
da pesquisa, permite uma compreensão detalhada das motivações dos significados, tendo em conta
as características situacionais e do contexto apresentadas pelos entrevistados, em lugar da produção
de medidas quantitativas (Lundin, 2016, Gil, 2002, Richardson, 1999).

A abordagem qualitativa de pesquisa foi materializada através de um estudo de caso que, de acordo
com Ludke e André (2013), Yin (2005), Stake (2009), possibilita a descoberta de aspectos novos
ou pouco conhecidos do problema estudado. Assim, partindo do estudo do papel do conselho de
uma escola específica, que a consideramos o nosso estudo de caso, na gestão escolar democrática,
foi possível descobrir novos factos que permitiram compreender melhor este fenómeno, embora
não podemos generalizar a nossa compreensão para os outros casos, esta metodologia permitiu
perceber outros casos similares (Stake, 2009).

Estudo de caso é uma modalidade de investigação onde se explora um fenómeno contemporâneo,


limitado no tempo e na acção, onde o investigador recolhe informações detalhadas (Sousa & Baptista,
2011, Stake, 2009), é um processo empírico que investiga um fenómeno contemporâneo dentro do
seu contexto de vida real onde os limites entre o fenómeno e o contexto não estão claramente
definidos (Yin, 2005, Stake, 2009).

Em termos de técnicas para recolha de dados usamos a entrevista, a análise documental, a discussão
em grupo e a observação sistemática. As entrevistas, semiestruturadas, desenroladas a partir de um
esquema básico de questões, não aplicadas rigidamente do mesmo modo a todos membros do
conselho da escola em causa e elementos que directa ou indirectamente interagem com este órgão,
versavam sobre a representatividade, a composição, o papel, as formas de participação no conselho
e na gestão escolar, e permitiram o esclarecimento de questões levantadas durante a observação,
discussão em grupo e a análise documental.

A análise documental incidiu sobre um conjunto de documentos (convocatórias, cartas, actas,


relatórios, parecer, leis, fotografias, etc.) elaborados ou que dizem respeito ao conselho de escola
da instituição escolar estudada. Segundo Ludke e André (2013), quaisquer materiais escritos como
leis e regulamentos, normas, pareceres, cartas, memorandos, diários pessoais, autobiografias, jornais,
revistas, discursos, roteiros de programas de rádio e televisão até livros, estatísticos e arquivos
escolares, que possam ser usados como fonte de informação para compreensão de um fenómeno,
pode ser considerado objecto da análise documental. A análise documental, segundo Silveira e
Córdova (2009), recorre a fontes mais diversificadas e dispersas sem tratamento analítico, tais
como tabelas estatísticas, jornais, revistas, relatórios, documentos oficiais, cartas, filmes, fotografias,
pinturas, tapeçarias, relatórios de empresas e vídeos de programas de televisão. Esta técnica permite
identificar informações factuais nos documentos a partir das questões levantadas para sustentar a
pesquisa.

A análise reflexiva, sistemática, controlada e crítica destes documentos permitiu descobrir novos
factos e relações que ajudaram na compreensão do papel do conselho de escola na gestão escolar
democrática. Participaram no estudo, conforme foi dito, vinte e um membros do conselho da escola

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em estudo. As tabelas seguintes mostram a classificação dos participantes do estudo por sexo, idade,
nível de escolaridade (Tabela 02) e a classificação dos participantes por tempo em que é membro do
conselho escolar e por segmento representado (Tabela 3):

Tabela 2. Classificação dos participantes no estudo por sexo, intervalos de idade e nível de escolaridade.
Sexo Idade Nível de escolaridade
10 à 17 4 Primário 10
Masculino 10
18 à 35 4 Básico 3
36 à 45 9 Médio 6
Feminino 11
Mais de 45 4 Superior 2
Total 21

Fonte: Dados da pesquisa

Tabele 3. Classificação dos participantes por tempo no conselho da escola e por segmento representado.
Tempo no conselho da escola Segmento representado
Director da escola 1
Até 1 ano 2 Professores 3
Alunos 4

1 à 3 anos 12 Pessoal técnico administrativo 1

4 à 6 anos 5 Pais e/ou encarregados de educação 8


Mais de 6 anos 2 Comunidade 4
Total  21
Fonte: Dados da pesquisa

Resultados da pesquisa

Dos estudos realizados constatamos que os membros do conselho escolar com menos anos nesta
área têm uma percepção limitada em relação aos propósitos e ao papel do conselho da escola
na gestão escolar democrática. Estes novatos participam menos nos debates e nas discussões,
poucas vezes manifestam o seu parecer sobre um determinado assunto em análise. Com razão,
concordando com Alves (1999), o período de permanência num órgão colegial é um elemento
crucial para compreensão dos seus propósitos e para maximização do seu contributo. Na nossa
opinião achamos uma presença somente física dos segmentos ou que essas pessoas representam
e que a sua participação nas reuniões do conselho de escola tem pouco impacto no processo de
tomada de decisão.

Os processos participativos, colégios, para além de serem conquistas das organizações, precisam
de tempo porque são lentos, pois, todos os membros devem aprender e compreender, ao longo do
tempo, a importância do seu papel e de fazer parte de um órgão. Por isso, o facto de a escola estudada
ter um conselho, nele participarem membros da comunidade e estes darem alguma sugestão é um
passo a considerar rumo a uma gestão escolar democrática.

Também porque percebemos que este conselho de escola ajuda na superação das desigualdades

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de género no ensino, diminuição do estigma, integração de estudantes com necessidades educativas
especiais, materialização do direito de exprimir contrariedade, decide sobre as acções que merecem
prioridade, as normas internas de funcionamento da escola, analisa e decide sobre as inquietações
encaminhadas pelos diversos segmentos da escola, acompanha a execução das acções pedagógicas,
administrativas e financeiras e mobiliza a comunidade escolar a participar em actividades conducentes
a melhoria da qualidade do ensino.

Diversas abordagens teóricas explicam que a acção humana é largamente influenciada pelos
interesses, valores e ideologias. A existência de membros que se identificam com alguma filiação
partidária o facto de pertencer a este órgão escolar não significa qualquer benefício individual, apenas
tratar de defender os interesses do segmento a que representa e edificar um bem comum que é
a escola, discrepâncias nos níveis de instrução e de escolaridade, diminui os níveis de participação,
frequência nos encontros, apresentação de questionamentos, opiniões e nas votações de propostas,
isso avaliando pelas ausências frequentes de alguns membros, pela assiduidade, pelas interacções e
pela defesa dos interesses do grupo comunitário a que representa.

Notamos, com recurso a análise das actas, que os segmentos que se fazem presentes nos encontros
do conselho escolar em maior número e com maior frequência são os que pertencem ao ambiente
interno da escola, nomeadamente, o director, os representantes dos professores, os representantes
dos alunos e o representante do pessoal técnico administrativo.

Embora o objectivo da pesquisa fosse descrever o papel do conselho da escola na gestão escolar
democrática, surgiu, no decurso do estudo, uma questão que nos levou à outras reflexões, isto é,
até que ponto a gestão escolar é democrática, uma vez que registamos a existência de membros
que pouco participam e de segmentos da comunidade não representados no conselho da instituição
escolar. A tabela seguinte (Tabela 4) mostra alguns segmentos que registamos a sua presença na
comunidade escolar, mas que não estão representados no conselho escolar.

Percorremos a região estudada e tivemos, para além da oportunidade de observar, entrevistas com
as estruturas locais e alguns organismos representados na região, das quais apuramos a existência de
grupos da comunidade local não representados no conselho da escola estudada.

Tabela 4. Segmentos existentes na comunidade escolar que achamos que deviam fazer parte do conselho da escola
Segmento da comunidade escolar Descrição
Dados da pesquisa mostraram-nos existência de estudantes com
Estudantes com necessidade educativas especiais5
necessidades educativas especiais na escola estudada
Nove congregações religiosas (igrejas cristãs, evangélicas e
Conselho Cristão de Moçambique
protestantes)
Lhuvukani Varime, centro agropecuário, Nova Vila, cooperativa
Associação dos camponeses e criadores de gado
leiteira, associação dos criadores de gado bovino
Médicos locais Centro de saúde local, Associação de Médicos Tradicionais
Movimentos associativos locais Núcleo Académico de Desenvolvimento Local
Representações locais dos organismos que advogam
a educação. ATIONAID6, AMUDEIA7, ACIDECO8
Fonte: Dados da pesquisa 5 6 7 8

5 Estudantes que possuem os vários tipos de necessidades educativas especiais (Correia, 2002)
6 Organização Não-Governamental de ajuda humanitária
7 Associação das Mulheres Desfavorecidas
8 Associação Cristã Interdominical Nacional para o Desenvolvimento da Comunidade

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A eleição e votação são critérios que constituem a condição sine qua non na montagem de uma
estrutura para qualquer área. Nesses termos, com as respostas dos inqueridos, verificamos que alguns
dos membros (representantes dos alunos, representantes dos pais e/ou encarregados de educação
e dois membros da comunidade), foram indicados e posteriormente votados pelos pares. A eleição
e votação, para além de serem critérios importantes na montagem de estruturas democráticas, são
princípios basilares e importantes na definição de legítimos representantes num órgão colegial e um
exercício de cidadania em que cada um tem direito de votar e de ser eleito. Não sendo suficiente
a auscultação pública e consultas a respeito do comportamento social dos futuros membros do
conselho escolar na comunidade.

As evidências mostraram-nos, por um lado, que o processo de tomada de decisão no conselho de


escola é um acto democrático. Tanto os procedimentos de selecção de membros para compor as
comissões e subcomissões de trabalho, assim como as deliberações, são aprovadas pelo princípio
da maioria. Por outro lado, a falta de compreensão das competências, dos deveres e dos direitos do
conselho e dos membros do conselho escolar, comprometem a consolidação deste órgão.

Considerações finais

Uma gestão escolar só poderá ser considerada democrática somente se todos os segmentos da
sociedade participarem e contribuírem democraticamente no projecto político pedagógico da escola
e esta ser sensível aos factores sociais da comunidade em que está inserida. Um dos maiores desafios
para uma gestão escolar democrática é conseguir que todos os seguimentos da comunidade escolar
participem na vida das instituições escolares, de modo a gerar qualidade no processo de ensino e
aprendizagem, e para que os objetivos que foram propostos sejam alcançados contribuindo, assim,
para uma nova concepção de escola.

Um conselho escolar materializa a gestão democrática da instituição ao desempenhar os seus


papéis consultivo, deliberativo, fiscal e mobilizador, por tanto, o conselho de uma escola fortalece a
democracia escolar e estabelece o envolvimento de todos os membros da comunidade na escola e
melhoria da qualidade do ensino.

O nível de democraticidade no conselho escolar tirar é reduzido, devido, por um lado, a fraca
participação dos seus membros e por outro lado, á maneira como estes membros são escolhidos
nos seguimentos que representam. Isto leva-nos a afirmar que ainda não há uma verdadeira gestão
escolar democrática, embora o caminho para este fim esteja a ser percorrido.

Assim, fazemos apelo para que todos os segmentos da comunidade tenham representantes no
conselho escolar, que a comunidade seja repartida, tendo em conta a realidade local, que haja eleições
dentro dos segmentos para selecção dos seus representantes e estes sejam sujeitos à uma formação
inicial após a escolha.

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Académicas
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