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ethos amador em uma ideologia. tardia3, ao mesmo tempo, uma nação que se cons-
Esta reação ideológica, entretanto, não consegue truía atenta às inovações européias – será responsável
prevalecer graças à “tendência à seriedade” dos pelo desenvolvimento peculiar deste esporte que, em
esportes destacada por Dunning (1985). A reação pouco tempo, reunirá milhares de pessoas em torno
das elites, ao invés de contradizer esse novo de sua prática e, em seguida, outros milhões nos tor-
direcionamento, também pode ser lida como uma neios internacionais como o sul-americano e as co-
demonstração dele, pois não é apenas a manutenção pas. Esse desenvolvimento peculiar está relacionado
do divertimento como princípio que faz as elites com o que Maguire (2002) chama de “a emergência
dirigentes rejeitarem o profissionalismo, mas também de formas mais intensas de nacionalismo e um vigo-
a possibilidade de serem derrotadas pelos times dos roso impulso nos processos de globalização” (p. 10)4.
“recém-chegados”. Essa nova orientação da prática
esportiva para os resultados gerará, cada vez mais, O futebol amador chega ao Brasil...
a necessidade de esportistas de alto-rendimento que Trazido pelos ingleses em finais de século XIX
são obrigados a se dirigirem aos outros e a participar e início do século XX, o futebol vai exigir a princí-
do esporte de maneira séria (DUNNING, 1985). O pio uma bola, o conhecimento das regras, um espaço
tempo livre não é mais suficiente para alcançar o e agentes predispostos a sua prática. Num primeiro
rendimento necessário à vitória. momento, isto estará sob posse apenas da elite: seja
Concomitantemente, uma nova etapa se inicia representada pelos jovens que retornavam de seus
no processo de esportivização dos passatempos ingle- estudos em universidades européias, seja por dirigen-
ses: a difusão e popularização global. Segundo Elias tes das fábricas ou dos professores das escolas (estas
(2003), práticas como o boxe, o turfe e o remo, foram existiam apenas para esta camada social). Com a po-
difundidas, pelo mundo, para em seguida termos a pularização do futebol, teremos a formação de clubes
chegada dos jogos com bola. É importante destacar suburbanos ou populares que consistiam naqueles
aqui que, mesmo chegando depois de outros espor- formados por trabalhadores, comerciantes, entre ou-
tes, o futebol terá uma posição de destaque no campo tros indivíduos que não atendessem aos critérios da
esportivo devido a sua grande popularidade. elite aristocrática do país5.
Essa nova etapa do processo de esportivização Com a presença dos novos clubes suburbanos,
marca a chegada dos primeiros esportes britânicos ao em pouco tempo, o campo futebolístico será marcado
Brasil, delineando-se o que chamaremos de um campo pelas tensões entre amadorismo e profissionalismo,
esportivo brasileiro. Chegando ao mesmo tempo em transformando-se o ethos amador em uma ideologia,
que alguns novos processos se desenvolvem no país – ou, pensando sob o prisma bourdesiano, em uma es-
como a industrialização, a urbanização, os meios de tratégia de conservação da posição ainda dominante
transporte e comunicação, entre outros –, os esportes no referido campo.
espraiam-se por todo o território. No caso particular A organização dos clubes em Ligas que visa-
do futebol, a especificidade da realidade brasileira – vam à manutenção de competições, dinâmica pró-
de um país em adaptação à recém abolida escravidão; pria do campo futebolístico, a princípio respondia
de economia dependente e uma revolução burguesa à necessidade de distinção entre os diversos clubes
que surgiam; aos poucos, apareciam, assim, espaços seus sócios. Radicalizando um impulso
de afirmação da tendência à seriedade dos esportes, que já se fazia presente em muitos outros
clubes da liga, o clube montava uma equi-
agregando as equipes que tinham desempenho des-
pe composta por atletas que, ao contrário
tacado. As resistências estarão sempre presentes. A
do que seria o padrão entre os amadores
criação de divisões demarca a necessidade de diferen- que disputavam até então o campeonato,
ciação. Os clubes suburbanos poderiam permanecer faziam claramente do futebol sua profissão.
na Liga, mas não “misturados” aos clubes de elite. Dedicando-se integralmente ao esporte, os
Com a crescente seriedade, como uma tendên- jogadores – muitos deles negros – conse-
guiam grande vantagem sobre os adver-
cia dos esportes de forma geral (ELIAS e DUNNING,
sários, que dividiam seus afazeres entre a
1985), a busca pela vitória e pelos resultados trará bola e o trabalho, sagrando-se campeões
um ponto de vantagem aos recém-chegados. Emerge naquele ano após uma vitória contra o São
a necessidade de atletas cada vez mais preparados e Cristóvão (p. 309).
treinados, não sendo suficiente o tempo livre de que
dispunham os amadores para alcançar a vitória, que A catarse desta contenda se dará na efetivação
em certo momento terá sua representatividade rela- do atleta como profissional na legislação trabalhista
cionada não a um clube, mas a uma nação6. O pro- aprovada no governo Vargas.
cesso de esportivização, que no Brasil se direciona ao
futebol amador, em pouco tempo tomará uma nova
Futebol x futebóis
direção: o futebol profissional.
Ao mesmo tempo em que equipes como o Bangu A realidade atual do futebol é estudada também
possibilitam a entrada de trabalhadores, o destaque por Damo (2003, 2007). Este autor considera a exis-
destes em campo gera premiações e contrapartidas tência de “futebóis”, a partir de quatro matrizes bá-
que, aos poucos, vão se tornando mais freqüentes e sicas: a bricolada, a comunitária, a escolar e a espe-
algumas se relacionam à transferência do tempo de tacularizada ou profissional. Conforme o raciocínio
trabalho na fábrica para o tempo de trabalho em de Damo, dispondo-se tais matrizes em termos da
campo. A busca pela vitória por parte dos clubes vai predominância entre profissionalismo e amadoris-
abrindo espaço ao exercício do futebol como um mo, elas podem ser pensadas da forma explicitada
meio de sobrevivência, com grande resistência. graficamente na ilustração 1, a seguir:
O momento histórico que destaca a disputa en-
tre amadores e profissionais está na vitória do Vasco
da Gama, em 1923, na primeira divisão do campeo-
nato da Liga carioca, considerado o primeiro clube
de “profissionais” a vencer um campeonato (LOPES
1994; 1998, SANTOS NETO, 2002). Segundo Pereira
(2000),
do trabalho não é nula, mas é precária” (p. 45). O au- território, o futebol é praticado em diferentes formas,
tor define essa matriz como um futebol intermediário que se consolidarão no cotidiano das cidades, entre
entre o espetacularizado e o bricolado. Em nossa ilus- elas, o que hoje convencionamos chamar de Futebol
tração, o futebol comunitário está posicionado como Amador.
o segundo espaço em que o profissionalismo é predo- Este futebol caracteriza-se pela sua prática não-
minante. Isso porque este futebol, também chamado profissional, realizada em campos localizados nas
de amador, possui na realidade social brasileira al- 8 ‘várzeas’ e/ou outros espaços disponíveis nas cidades,
gumas configurações muito próximas do profissional. com uma organização predominantemente local. Seu
Na realidade pernambucana que acompanhamos du- surgimento está vinculado à profissionalização do
rante a realização da pesquisa, por exemplo, alguns ti- futebol e sua permanência na cidade acontece apesar
mes da segunda divisão do futebol profissional apre- da disputa pelos espaços e da monopolização estética
sentam diferenças pouco perceptíveis, se comparados de um futebol profissional e de espetáculo.
ao futebol amador. Questões como espaço físico (os Fazendo um passeio pela cidade do Recife, en-
considerados estádios, mas que podem ser mais bem contraremos o futebol amador principalmente nos
visualizados se dissermos campos de várzea com campos concentrados na periferia, apertados entre os
sede), organização clubística (desde as questões do- barracos e as casas populares e atraindo vasta e di-
cumentais como estatuto e atas, até a existência de um versa platéia: feitos de areia ou barro, com arquiban-
grupo de dirigentes) e existência de várias equipes cadas ou não, vestiários apertados (quando existem),
(com as subdivisões específicas tais como: infantil, alambrados emendados e, em alguns casos, ilumina-
juvenil, adulto e veterano; este último predominante ção. Apesar de reduzido – se comparado ao que foi
das equipes amadoras), entre outras, retém caracte- no passado –, e de os campos deixarem de se localizar
rísticas bastante similares nas duas matrizes. nos espaços centrais da cidade, o futebol amador con-
tinua a existir principalmente nas áreas onde reside
a população mais pobre e que acaba tendo nele uma
Dos futebóis amadores de suas poucas práticas de lazer. Neste sentido, muito
mais do que o “oposto ao profissional”, nosso trabalho
Nascido das elites e fruto de um processo de di- identifica o futebol amador como uma “figuração so-
fusão complexo, o futebol brasileiro tem sua origem cial” diversa e dinâmica.
ligada à intermediação de agentes os mais diversos: A idéia central do conceito de figuração social
marinheiros, técnicos de ferrovias, operários de mi- (ELIAS, 2005) está no seu aspecto relacional em que
nas, professores dos estabelecimentos educacionais transparecem as múltiplas relações existentes entre
das colônias inglesas, jovens bacharéis egressos das os indivíduos, de forma interdependente. Mantendo
universidades européias, missionários europeus, o movimento próprio da dinâmica social – já que a
etc. Esta diversidade se manifesta na construção idéia de figuração denota uma formação em contínua
histórico-social deste esporte, que em pouco tempo mudança –, Elias pretende nos mostrar como a idéia
se populariza, tornando-se uma das grandes paixões de indivíduos (indivíduo no plural) está interligada
brasileiras. Ao longo de seu desenvolvimento neste com a idéia de sociedade.
Como um conceito bastante elástico, ele alcan- outro lado, é importante percebermos que o termo
ça os vários tipos de relações possíveis (seja de união, “comunitária” destaca um território específico da ci-
seja de oposição) e pode ser aplicado para os mais di- dade onde geralmente encontraremos esse futebol:
versos grupos sociais; desde um grupo de quatro pes- as comunidades. Assim, a matriz comunitária abran-
soas jogando cartas até uma nação inteira que abriga ge um conjunto de figurações sociais do futebol que
milhões de indivíduos. Formadas apenas por indiví- têm uma história própria – que se propaga de forma
duos (por isso sociais), as figurações sociais são flexí- oral, documental e iconográfica –, ocupa territórios
veis à noção de tempo. Em permanente movimento, específicos na cidade – em geral, são comunidades
as figurações sociais podem durar mais, ou menos, da periferia – e é construída por diferentes grupos
de acordo com sua consolidação na realidade social. agregados em torno do futebol, pelos mais diferentes
Considerando o futebol amador como uma fi- motivos e de forma organizada.
guração social, e com isso, diversa e dinâmica, este
trabalho demonstra a maneira como uma forma es-
pecífica de praticar o futebol (destacando aqui não só Rede de contatos e relações no futebol amador
a realização do jogo, mas as várias relações necessá- recifense
rias para um determinado tipo de prática), que en-
Neste trabalho, tendo como base teórica o con-
tendemos como um dos possíveis futebóis amadores
ceito de figurações sociais, buscamos identificar o
existentes, se consolidou na cidade do Recife.
mais próximo possível uma parte da figuração social
Longe de querer definir o futebol amador de ma-
que forma o futebol amador hoje. Procuramos fazer
neira simples, este trabalho demonstra sua diversida-
isso a partir da construção de uma “rede de contatos”
de, sua heterogeneidade no contexto social, a partir
durante a investigação com as equipes anteriormente
das inúmeras figurações que coexistem sob o nome
descritas.
de futebol amador, e de uma análise de sua posição
Vejamos a definição de figuração, segundo Elias
quando pensamos o futebol de forma geral.
(2005), a partir da analogia com um jogo de futebol.
Como vimos anteriormente, segundo Damo
(2007), temos alguns tipos de prática do futebol que Tomando como exemplo o futebol, po-
podemos analisar como uma matriz comunitária. O demos ver que uma configuração é uma
estrutura de jogo que pode ter uma hie-
autor define tal matriz como um futebol intermediário
rarquia de várias relações de “eu” e “ele”,
entre o espetacularizado e o bricolado. Usualmente, “nós” ou “eles”. Torna-se evidente que dois
pode ser chamada pelo nome abrangente de “futebol grupos de adversários, que têm entre si
amador”, por não possuir a característica destacada uma relação de “nós” e de “eles”, formam
anteriormente da relação de trabalho institucionali- uma configuração singular. Só podemos
zada. A denominação diferenciada que o autor em- compreender o fluxo constante do agrupa-
mento dos jogadores de um dos lados, se
prega justifica-se pela existência de outras matrizes
virmos que o grupo de jogadores do outro
que, igualmente, podem ser consideradas amadoras, lado também está num fluxo constante. Se
tendo em vista que nelas também não se estabelecem se pretende que os espectadores compre-
necessariamente relações formais de trabalho. Por endam e gostem do jogo, terão que estar
aptos a compreender o modo como estão cada lado – para seguir a configuração flui-
relacionadas as disposições mutáveis de da de cada uma das equipas (p. 142).
Neste estudo, somos os espectadores que pre- mutabilidade se apresenta num padrão de tempo di-
cisamos conhecer como estão relacionadas as várias ferenciado. E é a partir das várias relações exempli-
disposições mutáveis que formam o futebol amador. ficadas pelo autor – “eu” e “ele”, “nós” e “eles” – que
A diferença é que num nível mais estrutural – que daremos prosseguimento ao nosso estudo.
Elias (2005) enfatiza que não deve deixar de ser com- A análise empreendida neste trabalho parte de
preendida como uma formação de indivíduos – a uma figuração específica que se forma entre grupos
que nas suas relações formam o que denominamos de Em um primeiro momento, em nossa investiga-
futebol amador. A “rede de contatos” consiste na for- ção, buscamos analisar a rede de contatos construída
ma que utilizamos para selecionar as equipes a serem durante o trabalho de campo com as equipes, a partir
entrevistadas, com o objetivo de materializar, na pes- das lideranças de times, de forma que nos permitisse
quisa empírica, as características do nosso referencial perceber as principais relações que se dão na dinâ-
de análise, que se baseia na teoria elisiana. Partindo mica da figuração do futebol amador recifense atual.
do conceito de figurações sociais, a “rede de conta- Solicitando a indicação de outras equipes, ou apenas
tos” funcionou como uma reconstrução da figuração explorando um comentário espontâneo durante a en-
(ou parte dela) que nas relações entre equipes/clubes trevista, foi possível identificar algumas dessas rela-
formados pelos indivíduos é edificada, e aqui conven- ções. Entre as principais, destacamos:
cionamos chamar de futebol amador. - Rivalidade
Neste sentido, partindo do relato do primeiro en- - Respeito ao tempo / tradição
trevistado, que mencionou um time de várzea muito -Admiração pelo bom desempenho nos
organizado, demos início à rede. O prosseguimento campeonatos
de sua constituição ocorreu a partir da entrevista com -Amizade
cada equipe. Em grande parte, durante a entrevista, Nenhuma delas aparece desconectada das ou-
os entrevistados citaram times com os quais tinham tras; há um sentido de predominância. É importante
alguma relação. Em cada entrevista, escolhíamos um ressaltar que as relações tratadas, aqui, são aquelas
dos times que se destacava na conversa e buscávamos que se dão entre os grupos a partir, principalmente,
o contato. do ponto de vista dos dirigentes e/ou responsáveis pe-
Ressalte-se que, nesse contexto, as relações foram los clubes amadores.
consideradas um dado a ser organizado e analisado. Segundo Elias (2005), ao exemplificar o conceito
O motivo da indicação e a forma como foi indicado de configuração a partir de quatro indivíduos num
foram também registrados e transformados em ob- jogo de cartas, “a interdependência dos jogadores, que
jeto de análise, sendo importantes para a construção é uma condição prévia para que formem uma confi-
da rede de contatos. Assim, formamos uma teia que guração, pode ser uma interdependência de aliados
procura aproximar-se da figuração social que hoje ou de adversários” (p. 143). Em nossa investigação,
formam entre si os indivíduos no meio futebolístico numa perspectiva de análise mais estrutural, prevale-
amador, e que deve ser lida à luz de um momento ceram nas relações interdependências de aliados. Às
histórico-social específico, respeitando, assim, a idéia indicações e às menções aos clubes no estudo subjaz
do movimento como parte da natureza humana – e a idéia de algum tipo de parceria, pois os comentá-
conseqüentemente social –, tão importante à teoria rios eram sempre favoráveis. Existiu uma tendência
elisiana. nas entrevistas a valorizar os clubes parceiros e a não
Os motivos para a indicação surgiram durante mencionar aqueles com os quais houvesse algum
a conversa, falando-se de organização, de destaque, tipo de relação desagradável. Mesmo provocadas, as
de amizade, dando um exemplo, ou, em último caso, lideranças preferiram evitar fazer comentários sobre
pelo pedido da pesquisadora. equipes com as quais estabeleciam relações pouco
amistosas. Assim, mesmo que durante um jogo essas (organizado pela Prefeitura).
equipes tenham sido adversárias, no contexto mais A segunda relação a ser destacada é o respeito
geral, no momento do estudo, elas apresentaram rela- ao tempo de existência e à tradição. Ela aparece, so-
ções de aliadas. Isto nos remete diretamente à primei- bretudo, nos times “mais antigos”, como uma marca
ra relação: a rivalidade. importante, principalmente’ ao se considerar a rotati-
Esta relação é considerada como parte inerente vidade9 de times do futebol amador. A idéia de man-
ao futebol, existindo na realidade em duas formas: ter um clube amador está presente em todas as falas
uma rivalidade sadia e uma “outra” rivalidade – que como algo difícil e que exige muito trabalho e sacrifí-
seria “não-sadia”. A rivalidade sadia está relacionada cio. Assim, ter um clube com 60, 70 anos de existên-
à rivalidade em campo, à disputa entre as equipes, à cia é considerado, por si só, uma grande vitória e um
vontade de ganhar, e a uma “violência permitida” – elemento de reconhecimento.
que seriam ações como xingamentos, gritos, e discus- A terceira – a admiração pelo bom desempenho
sões durante o momento de jogo. A “outra” rivalida- nos campeonatos – é parte do futebol de forma ge-
de está ligada a uma “violência não-permitida”, que ral e esteve presente, permanentemente, neste estu-
extrapola os limites do que é considerado sadio. Esta do, agregada a outras relações. Aqueles times que se
está diretamente relacionada a atitudes de violência mantêm entre os primeiros colocados nas competi-
física como agressões e brigas. ções são reconhecidos por isso. Tal reconhecimento
Segundo os dirigentes, a rivalidade é mais for- ultrapassa a relação temporal. Assim, aqueles clubes
te entre os times do mesmo bairro, que disputam o que foram campeões ou estiveram entre os primei-
reconhecimento da mesma comunidade. Pudemos ros colocados nas competições durante um período
perceber que é mais forte naqueles clubes que têm de tempo acumulam certo prestígio; quanto maior
uma relação com a comunidade fortalecida, que se esse tempo, maior o reconhecimento. A proximidade
legitimam no meio futebolístico não só pelo seu de- temporal é um fator importante, mas, com base nesta
sempenho em jogo, mas pela sua popularidade, pela investigação, não nos é possível precisar até quantos
sua capacidade de mobilização. Já em clubes cuja in- anos de distância isso é considerado. Temos o exem-
teração com a comunidade é tênue ou nula, a relação plo do clube 10 de Novembro que não disputa a cate-
com times do mesmo bairro é menos tensa. Também goria “Adulto” desde 2006, mas é lembrado pelos seus
foi possível perceber que a priorização de diferentes destaques “de outrora”.
espaços de competição (por exemplo, o Campeonato A quarta é a amizade. A relação amigável entre
da Federação, em detrimento do Campeonato da duas equipes – principalmente na relação entre seus
Prefeitura) surge como um elemento apaziguador da dirigentes – parece estabelecer um padrão de reco-
rivalidade. Assim, por exemplo, os clubes entrevista- nhecimento, tendo em vista que esta de forma geral
dos, Botafogo e Floresta, que fazem parte do mesmo é uma relação muito enfatizada no futebol amador
bairro (Barro) e disputam campeonatos diferentes e que tem estreita relação com o surgimento das
tendem a possuir menos rivalidade do que o Real equipes e sua manutenção. A amizade é parte da ri-
da Mustardinha e outros times da mesma região que validade sadia que vimos anteriormente. Com ela,
disputam o Campeonato de Futebol Participativo garante-se certo controle de violência durante o jogo