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luta-nas-aulas-de-educacao-fisica

Publicado em NOVA ESCOLA Edição 239, 01 de Fevereiro | 2011

Prática Pedagógica

O lugar da luta nas aulas


de Educação Física
Ela é um conteúdo importante e agrega elementos como
equilíbrio, força e agilidade, que podem ser ensinados aos
alunos
Beatriz Santomauro

Abrir espaço no planejamento para


ensinar como atingir, desequilibrar
e derrubar um adversário pode
parecer um contrassenso em
tempos de tanta violência gratuita.
Mas não é se você souber diferenciar as lutas
(que são modalidades esportivas) das brigas
(essas, sim, manifestações de agressividade
desorganizadas). Tal como os esportes, os jogos
e as ginásticas, elas são temas importantes do
ensino de Educação Física.

Com características próprias - atividades que fazem parte da história e cultura


de diversos povos, têm regras e movimentos específicos -, elas podem ser
praticadas por todos os alunos, independentemente da força, da altura, do
sexo e da aptidão física de cada um.

Para trabalhar com esse assunto, o professor não precisa ser um atleta que
saiba lutar judô, por exemplo. O essencial é estudar o assunto - tal como se
faz com outros, como futebol e alongamento - e se dedicar para que as
informações apresentadas sejam compreendidas pela turma com clareza.
Outro ponto importante que o docente precisa ter claro é que o objetivo não
pode ser transformar os alunos em lutadores profissionais (como ocorre no
caso da prática de esporte de alto rendimento). A ideia é fazer com que eles
conheçam as características comuns às lutas, as técnicas, o histórico, as
vestimentas e os países em que as lutas são praticadas (e também vivenciem
movimentos básicos de cada modalidade).

Foi exatamente isso o que fez Joice Nozaki, quando lecionava para a 5ª e a 7ª
série da EMEF Professor Mario Marques de Oliveira, na capital paulista. Ela
criou um projeto sobre lutas, vencedor do Prêmio Victor Civita - Educador
Nota 10 no ano passado, visando aumentar o repertório cultural dos
estudantes, ampliar e complexificar as experiências motoras deles e mostrar
para a moçada que brigar é, definitivamente, outra coisa (leia mais sobre o
projeto na última página).

Trabalho com lutas permite explorar força e agilidade

Como já foi explicado, a meta do trabalho na escola não é fazer a garotada


lutar seguindo à risca as regras pertinentes a cada prática. O importante
mesmo é garantir uma diversidade de propostas de atividades - combinando
pesquisa, conhecimento de regras e, é claro, muito movimento.

"Ao proporcionar essas vivências diversas, o docente permite à garotada


conhecer novas possibilidades de movimentos, o que contribui para que a
memória corporal da turma ganhe outros elementos, diferentes dos
tradicionalmente realizados em jogos, como o futebol", explica Eduardo
Augusto Carreiro, mestre em Ciência da Motricidade Humana e gerente de
esportes e lazer do Serviço Social da Indústria (Sesi), em São Paulo.

Na prática, isso quer dizer elaborar aulas que explorem habilidades motoras e
capacidades físicas que envolvam os seguintes aspectos: força, flexibilidade,
equilíbrio e desequilíbrio, agilidade e corrida ou saltos. Esses são os
elementos básicos para qualquer luta. Sendo assim, vale convidar os
estudantes para experimentar um desafio de queda de braço ou para uma
briga de dedão, em que os oponentes dão as mãos, mantendo os polegares
levantados e, com o braço apoiado em uma mesa, tentar abaixar o dedão um
do outro, por exemplo. O importante é levá-los a compreender quão
fundamental é, em ambos os casos, empregar a força para vencer ao mesmo
tempo em que é fundamental não se descuidar do equilíbrio. Sem se
esquecer também de deixar claro que violência e deslealdade são alvos de
punição.

Há muitas outras atividades que você pode propor aos alunos para trabalhar
as habilidades exigidas pelas lutas. É possível, inclusive, inventar algumas e
convidar os alunos a fazer o mesmo.

As que privilegiam o equilíbrio são as que têm como desafio manter o corpo
estável mesmo diante de quedas e de tentativas de deslocamento do
adversário. Práticas que exigem força devem fazer com que a musculatura
vença a resistência para realizar algum movimento, como empurrar, elevar,
apertar e segurar. Atividades que envolvem agilidade ou rapidez são as que
pedem capacidade de deslocamento, tempo de reação curto entre o estímulo
recebido e o movimento realizado. Já as que têm como foco a flexibilidade
exigem movimentos amplos que atinjam maior amplitude articular para
sustentar algumas posturas, como as de chutes.

Para treinar a força, por exemplo, a turma pode praticar o cabo de guerra e,
para o equilíbrio, vivenciar atividades que exijam ficar em uma perna só e ao
mesmo tempo derrubar o adversário com algum tipo de golpe (leia a
sequência didática).

Ao combinar exercícios que exigem diferentes capacidades físicas, como força


e elasticidade, e outras habilidades motoras, como correr, rastejar e pular,
você ajuda os alunos a aprofundar seus conhecimentos sobre o próprio corpo
e a respeito dos movimentos que são capazes de fazer. E contribui para o
desenvolvimento do processo de aceitação da disputa como um elemento
das competições, e não como uma atitude de rivalidade frente aos colegas.

Jogos, esportes e lutas exigem movimentos comuns

Embora as lutas possam parecer um conteúdo um tanto quanto


desconectado dos esportes tradicionalmente praticados nas aulas de
Educação Física (futebol, vôlei, basquete e handebol), ao analisá-los com
cuidado fica fácil perceber como os pilares força, flexibilidade, equilíbrio e
desequilíbrio, agilidade e corrida ou saltos são comuns a todos. O que varia é
a exigência, em relação a cada um deles, requerida dos participantes.

"Uma das capacidades físicas importantes tanto para o basquete como para o
judô é a força. Porém as condições gerais em que ela aparece em cada
prática são distintas. No jogo, o contato entre adversários nada tem a ver
com o que ocorre na luta. Variam também os materiais e os movimentos, tal
como o objetivo. Enquanto no basquete o propósito é fazer cestas, a intenção
no judô é derrubar o oponente de costas para o chão", explica Carreiro.

Isso comprova como não basta o aluno ter desenvolvido certa capacidade
física num jogo se, no momento de utilizá-la em outro contexto, é preciso
outro foco. Quanto mais vivências diferentes os estudantes tiverem de certa
habilidade, mais hábeis e conscientes de seus movimentos eles serão.

Formar em etapas: o projeto da Educadora Nota 10

Joice Nozaki
Formada em Educação Física, a professora é especialista em Educação Física
escolar e, atualmente, faz mestrado na área de formação profissional.
1 Sensíveis
diferenças

A turma compara
imagens de brigas
e lutas e percebe
que as primeiras
são
desorganizadas,
enquanto as
outras têm regras.

2 Clube da luta

Os alunos experimentam atividades como o


braço de ferro e o cabo de guerra e confrontos
com bexigas (o objetivo era tentar estourar a do
colega), práticas que envolvem elementos como
força e equilíbrio.

3 Estudo focado

Para aprender
sobre esgrima,
capoeira e judô, os
estudantes
pesquisam a
história, as regras,
os trajes e os
atletas campeões.
"A meta foi
ampliar o leque de práticas corporais que a garotada conhecia", explica Joice.

4 Resultado final

As informações das pesquisas são socializadas e


todos são convidados a vivenciar o que
aprenderam durante os estudos.

"O trabalho elaborado por Joice tem objetivos


claros, intervenções corretas e ousadia, já que
as lutas nem
sempre ganham o
espaço que
merecem."

Fabio D'Angelo,
selecionador de
Educação Física do
Prêmio Victor
Civita - Educador
Nota 10.

Quer saber mais?

CONTATOS
Eduardo Augusto Carreiro
EMEF Professor Mario Marques de Oliveira, tel. (11) 5831-0145
Joice Nozaki

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