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Semba e Modinha

Ricardo Monteiro

Uma manifestação que transcende limites de tempo e espaço na


expressão musical brasileira consiste, primordialmente, em uma
dança de roda em ritmo sincopado em que um ou mais
dançarinos – freqüentemente, um casal – alternam-se ocupando
o centro com movimentos a que os tradicionais requebros de
quadris emprestam marcada sensualidade; não bastasse isso, a
forma clássica de se promover a alternância de dançarinos é a
célebre umbigada.
(Ricardo Monteiro)

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Uma manifestação que transcende limites de tempo e espaço na expressão musical
brasileira consiste, primordialmente, em uma dança de roda em ritmo sincopado em que
um ou mais dançarinos – freqüentemente, um casal – alternam-se ocupando o centro com
movimentos a que os tradicionais requebros de quadris emprestam marcada sensualidade;
não bastasse isso, a forma clássica de se promover a alternância de dançarinos é a
célebre umbigada.

Uma excelente fonte para sabermos algo sobre como eram o batuque e a umbigada
no início do século XIX nos é fornecida pelo viajante alemão Georg Wilhelm Freyreiss
(1789-1825):

Entre as festas, merece menção a dança brasileira, o Batuque. Os dançadores


formam roda e, ao compasso de uma guitarra (viola), move-se o dançador no
centro, avança e bate com a barriga na barriga de outro da roda, de ordinário
pessoa de outro sexo. No começo, o compasso da música é lento, porém, pouco
a pouco, aumenta e o dançador do centro é substituído cada vez que dá uma
umbigada; e, assim, passam noites inteiras. Não se pode imaginar uma dança
mais lasciva do que essa, razão também por que tem muitos inimigos,
saiba mais

especialmente entre os padres. Assim, por exemplo, um padre negou a absolvição


a um seu paroquiano, acabando, desta forma, com a dança, porém, com grande
descontentamento de todos. Ainda há pouco, dançava-se o batuque, em Vila Rica,
numa grande festa e na presença de muitas senhoras que aplaudiam
freneticamente. Raro é ver outra dança no campo, porém, nas cidades, as danças
inglesas quase que substituíram o batuque.

Escandalizando os europeus que aqui vinham bem como os setores mais tradicionais da
burguesia e aristocracia local, essa forma musical e coreográfica que, de modo genérico,
faz-se presente no côco, na roda de capoeira e no candomblé, logrou permanecer até os
dias atuais, apesar de seus primeiros registros confiáveis datarem ainda do século XVIII.
Sua primeira manifestação recebeu o nome de Batuque, termo que também persiste até
hoje sem grandes alterações.

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As origens dessa manifestação, por mais influências
que para ela venham a convergir, parecem apontar le mais repertório
clara e predominantemente para a África – ou, mais
precisamente, para Angola. O semba é ainda hoje
uma das grandes expressões coreográficas e
musicais daquela nação, e pouco ou nada difere, em
essência, da descrição apresentada acima. A própria
acepção etimológica de semba aponta, em última
análise, para o termo em kimbundo (um dos idiomas
mais falados de Angola), que designa nossa
umbigada.
Se o parentesco entre o semba e nosso samba é A ilustração acima foi feita
musicalmente evidente, a transição de um termo para pelo artista alemão Johann
outro merece uma explicação mais aprofundada. A Moritz Rugendas (1802-1858)
palavra samba corresponde ao infinitivo do verbo quando de sua permanência
kuzamba, que significa rezar. A prática dos rituais no Brasil na década de 1820.
religiosos africanos no Brasil, proibida pela Igreja, Nela, vê-se uma roda de
muitas vezes se valeu da abissal diferença entre os capoeira. A formação em
rituais africanos e europeus para passar círculo, a presença de
despercebida. A exuberância do batuque no instrumentos e o par
candomblé pode-nos dar uma idéia do quanto o uso dançando ao centro
da dança nos ritos religiosos, para um olhar constituem alguns dos
embrutecido pelo preconceito, poderia confundir-se elementos fundamentais da
com uma festa de grande envolvimento emocional estrutura do semba, uma das
por parte dos escravos. mais importantes matrizes da
música brasileira.
O ritual, comum em grande parte da África, de se
dançar ao som de cantos e tambores em uma roda
até atingir o êxtase religioso pode perfeitamente ter
sido o ponto de partida para que uma visão
equivocada por parte do colonizador confundisse
essa manifestação devocional com uma festa,
propiciando, assim, sua sobrevivência sob a forma
camuflada do entretenimento social.
De qualquer forma, por semba ou por samba
identificam-se elementos fundamentais para a
compreensão dessa manifestação tão cara à cultura
brasileira. Desse princípio coreográfico, originaram- A estrutura do semba repete-
se o lundu, o côco, a capoeira, o samba e tantas se nesta foto, que retrata o
outras expressões da cultura popular. Côco na Paraíba, registrada
pela Missão Folclórica de
Mário de Andrade em 1938. O
Côco, conforme vimos
anteriormente, representa a
convergência de duas
grandes matrizes da música
brasileira: o semba e a
cantoria.

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Curioso notar que uma vertente do samba-de-roda
baiano, fundindo-se ao axé, trouxe novamente à ordem
do dia, em especial com o trabalho do grupo
le mais repertório
Gerasamba/Tchan, o problema da alegada imoralidade
coreográfica e pobreza lítero-musical de uma
manifestação que, por trás da aparência de nova, de
fato estava tão profunda e intrinsecamente ligada à
tradição de que se originou que conseguiu, séculos
depois do estupor dos viajantes europeus, causar a
mesma fratura de sedução e rejeição na própria
população brasileira.
Unindo-se a técnicas da cantoria, o semba também se
faz presente nas origens do côco, lundu, partido alto e Nesta ilustração de
tantas outras formas cancionais, preenchendo, com Rugendas, vê-se um casal
novo revestimento musical, a milenar técnica da poesia branco dançando um lundu.
rímica. O lundu constitui o primeiro
Suavizado pela poesia, abrandada sua coreografia, o estilo de música popular
batuque verteu-se em lundu e ganhou os salões da brasileira de que se tem
burguesia brasileira do século XIX; evoluindo ainda notícia, tendo-se tornado
mais, despindo-se da dança, enriquecido melódica e extremamente popular já no
harmonicamente, ganharia o mundo a partir da década último quartel do século
de 60 do século XX com a bossa-nova. É a dança de XVIII.
roda fazendo o mundo girar.

É interessante observar como, ao longo dos séculos, sempre surge, no Brasil, uma
dança considerada extremamente imoral, mas que rapidamente cai no gosto do
grande público (algo assim como aconteceu há poucos anos com o fenômeno do
Gerasamba e seu Tchan). Uma descrição da época em que Rugendas esteve entre
nós revela-nos como o lundu era visto aos olhos europeus. O viajante Louis-
François de Tollenare assim descreve um lundu que assistiu em sua estada no
Brasil, entre 1816 e 1818:
Esta dança, a mais cínica que se possa imaginar, não é nada mais nem
menos do que a representação mais crua do ato do amor carnal. A dançarina
excita o seu cavalheiro com movimentos os menos equívocos; este
responde-lhe da mesma maneira, a bela se entrega à paixão lúbrica; o
demônio da volúpia dela se apodera, os tremores precipitados das suas
cadeiras indicam o ardor do fogo que a abrasa, o seu delírio torna-se
convulsivo, a crise do amor parece operar-se e ela cai desfalecida nos
braços do seu par, fingindo ocultar com o lenço o rubor da vergonha e do
prazer.
saiba mais

O seu desfalecimento é o sinal para os aplausos de todas as partes, os


olhos dos espectadores brilham de desejos por ela excitados, os seus
gritos reclamam que recomece a luta, e o que apenas se permitiria em um
alcouce é repetido até três vezes perante um público de uma grande cidade
civilizada. Há senhoras nos camarotes e estas não coram; não se pode
acusá-las de excessivo recato.

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A Choromela

le mais repertório
Conforme comentamos anteriormente, um dos ramos da
árvore do semba fundiu-se à cantoria, gerando um sem-
número de manifestações musicais. Todavia, vale destacar
um outro caminho seguido pelo tronco do semba: o da
música instrumental.
A música popular brasileira conheceu, aparentemente desde
sempre, tanto expressões cancionais quanto instrumentais.
No que tange à nossa música instrumental, parece possível
traçar uma linha histórica cujo ponto de partida
estabeleceremos em 1733, quando do translado do
Santíssimo Sacramento da Igreja do Rosário para a matriz
de Vila Rica (atual Ouro Preto, MG). Nessa ocasião, a
procissão fez-se acompanhar por uma música dançada,
organizada pela corporação dos instrumentistas de sopro,
Joaquim Antônio da
os choromeleiros (de charamela, instrumento musical
Silva Calado, Júnior
semelhante ao pífano e à flauta transversal, cuja difusão na
(1848-1880)
música brasileira dispensa comentários).
Foi um dos mais
Foi sobretudo em Minas Gerais, durante o ciclo do Ouro,
proeminentes chorões
que alguns escravos libertos com talento e formação musical
da segunda metade do
(a qual lhes era oferecida pelas igrejas, para as quais, em
século XIX. Admirado
contrapartida, passavam a tocar) começaram a se reunir
pelo imperador Dom
para realizar uma música leiga e de caráter popular. Assim
Pedro II, amigo de
como o que ocorreu na Itália, esses músicos, ciosos da
Chiquinha Gonzaga,
importância de suas mãos para a financeiramente inviável
professor de flauta do
e, para eles, indispensável atividade musical,
Imperial Conservatório
freqüentemente escolhiam a atividade de barbeiro como
de Música, o mulato
ofício profissional, atividade essa que, ao contrário do
Joaquim Calado foi um
trabalho de um pedreiro ou marceneiro, pouco risco oferecia
compositor virtuoso e
à integridade e à destreza de suas mãos.
de grande
popularidade. A ele,
devem-se, ao menos,
dois marcos históricos
importantes: a
contribuição para
consolidar o termo
“choro” devido ao nome
de seu conjunto, o
Choro Carioca (com
flauta, cavaquinho e
dois violões), e a
primeira apresentação,
em sala de concerto, de
um lundu – até então,
desmerecido por ser
“música de escravos”.

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Conta-nos um seu contemporâneo sobre Calado e sua capacidade de
improvisação, tão característica do choro:

Calado não era só músico para tocar de primeira vista, como também
para compor qualquer choro de improviso. Quantas vezes achava-se
tocando em um baile de casamento, batizado, aniversário ou outra
qualquer reunião e se, nesta ocasião, qualquer dama ou cavalheiro
saiba mais

pedisse para escrever um choro em homenagem ao festejado, Calado


não dizia que não: passava a mão em qualquer papel, quando não
trazia o próprio, riscava a lápis e zás! punha-se a escrever. Daí a
momentos, entregava-a a um chorão presente que, executando-a,
tornava-se um delírio para todos os convivas pela clareza e linda
inspiração.

Sobre a música de barbeiros, herdeiros musicais e profissionais dos choromeleiros, escreve


Manuel Antônio de Almeida, no episódio “Domingo do Espírito Santo”, do livro Memórias de
um sargento de milícias (c.1854):

Durante os 9 dias que precediam ao Espírito Santo, ou mesmo não sabemos se


antes disso, saía pelas ruas da cidade um rancho de meninos, todos de 9 a 11
anos, caprichosamente vestidos à pastora: sapatos de cor-de-rosa, meias brancas,
calção da cor do sapato, faixas à cintura, camisa branca de longos e caídos
colarinhos, chapéus de palha de abas largas, ou forrados de seda, tudo isto enfeitado
com grinaldas de flores, e com uma quantidade prodigiosa de laços de fita
encarnada. Cada um destes meninos levava um instrumento pastoril em que
tocavam, pandeiro, machete e tamboril. Caminhavam formando um quadrado, no
meio do qual ia o chamado imperador do Divino, acompanhados por uma música
de barbeiros, e precedidos e cercados por uma chusma de irmãos de opa levando
bandeiras encarnadas e outros emblemas, os quais tiravam esmolas enquanto
eles cantavam e tocavam.

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O imperador, como dissemos, ia no meio:
ordinariamente era um menino mais pequeno
que os outros, vestido de casaca de veludo verde, le mais repertório
calção de igual fazenda e cor, meias de seda,
sapatos afivelados, chapéu de pasta, e um
enorme e rutilante emblema do Espírito Santo
ao peito: caminhava pausadamente e com ar
grave.
Confessem os leitores se não era coisa deveras
extravagante ver-se um imperador vestido de
veludo e seda, percorrendo as ruas cercado por
um rancho de pastores, ao toque de pandeiro e O grande compositor e
machete. Entretanto, apenas se ouvia ao longe a maestro Anacleto de
fanhosa música dos barbeiros, tudo corria à Medeiros (1866-1907) é
janela para ver passar a Folia: os irmãos um dos grandes
aproveitavam-se do ensejo, e iam colhendo exemplos do papel das
esmolas de porta em porta. Bandas no
Enquanto caminhava, o rancho tocava a música desenvolvimento e
de barbeiros; quando parava, os pastores, difusão do Choro. À
acompanhando-se com seus instrumentos, frente da Banda do
cantavam; as cantigas eram pouco mais ou Corpo de Bombeiros,
menos no gênero e estilo desta: Anacleto organizou um
dos melhores e mais
O Divino Espírito Santo importantes conjuntos
É um grande folião, musicais de seu tempo.
Amigo de muita carne,
Muito vinho e muito pão.
Eis aí o que era a Folia, eis aí o que o compadre
e o afilhado encontraram no caminho.

A música de barbeiros é tida quase que com unanimidade pelos maiores pesquisadores
da história de nossa música como a predecessora direta de nossos grupos de choro e do
gênero que eles imortalizaram. Alguns traços chamam a atenção na linha histórica aqui
proposta: o caráter musicalmente semiletrado de seus componentes (ou seja, seus
componentes tinham algum estudo formal de música); o fato de seus integrantes tenderem
a viver de outra profissão (fenômeno que se estenderia ainda pelo século XX); a existência
de uma certa “vida dupla” entre um repertório “oficial” a ser tocado pelo grupo e outro de
caráter mais espontâneo e autoral, havendo, freqüentemente, a delegação de espaços
físicos diferentes para ambas as manifestações.
Tal estrutura sócio-musical define com propriedade uma longa fase da existência de nosso
choro, servindo igualmente para descrever a condição de vida de inúmeras Bandas
tradicionais e de seus músicos, em uma outra estrutura cuja atemporalidade e generalidade
geográfica nos chama a atenção. O Choro, o Dobrado e o Maxixe são três gêneros que
tiveram seu desenvolvimento estritamente relacionado às Bandas e sua forma de expressão
musical.

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Modinha

A modinha brasileira surgiu já em meados do século XVIII, com a figura legendária de


Domingos Caldas Barbosa e de outros compositores – em geral, mulatos – que, como ele,
aventuraram-se pela metrópole e lá tiveram sua criação documentada para a posteridade.

Domingos Caldas Barbosa (1740-1800), o poeta


árcade Lereno Selinuntino, mulato carioca, foi o
grande divulgador da modinha e do lundu em
Portugal no final do século XVIII. De fato, o próprio
termo modinha parece ter-se celebrizado por meio
dele. No que tange à construção da imagem da
brasilidade, observemos, além da nostalgia de
nossas “saudades”, a quadra:

Ah, nhanhá, venha escutar


Amor puro verdadeiro
Com preguiçosa doçura,
Que é Amor de Brasileiro.

Essa terna sensualidade, pautada pela construção de uma relação prazerosa com
a vida, ajudou em muito a constituir alguns dos estereótipos da brasilidade. Por
essas razões, alguns autores defendem que Caldas Barbosa mereceria ser
saiba mais

lembrado como o próprio pai do jeitinho brasileiro – termo que entra para a história
de nossa cultura ao aparecer, pela primeira vez, em seus versos:

Ai companheiro
Não será ou sim será
O jeitinho Brasileiro.

Marcando profundamente a música brasileira desde o final do século XVIII até a metade do
século XX, destaca-se tanto por sua longevidade quanto pela extraordinária influência que
exerceu sobre os demais gêneros nacionais. Não apresenta nenhum ritmo característico,
apenas a temática lírica e sentimental (com a ressalva do humor e erotismo das modinhas
que são, de fato, lundus) predomina claramente em seu repertório.

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Inicialmente marcada por traços nitidamente populares e brasileiros, a poética e a música
modinheira foram, ao longo do século XIX, paulatinamente se tornando eruditas,
aproximando-se da norma e das formas cultas mesmo por parte de seus autores anônimos
e populares, refinando-se de tal maneira que “desde os mestres da Escola Mineira até fins
do Romantismo, todos os nossos poetas ilustres foram melodizados em modinhas”
(ANDRADE, 1989, p.344).
Sua estrutura melódica tende a apresentar apenas uma ou duas (raramente, três) partes,
repetidas tantas vezes quanto necessário para a execução de diferentes estrofes da letra,
caracterizando-se ainda por sua tessitura quase sempre superior a uma 8.a bem como
pela presença de saltos iguais ou superiores a uma 6.a m. Em suma, tende a apresentar,
nas palavras de Oneyda Alvarenga, “a linha cheia de arabescos ondulosos, o uso intenso
de harpejos, os saltos largos” (ALVARENGA, 1950, p.286).
Quanto à rítmica, a confusão inicial setecentista entre a modinha e o lundu tendeu,
posteriormente, a reservar a presença da síncope a gêneros que por ela mesma se
definissem, separando, assim definitivamente, a modinha do lundu e de outros gêneros
sincopados. Da mesma forma, acabou solidificando-se em termos de andamento -
principalmente na fase de “decadência”, que iniciou no final do século XIX - a vocação da
modinha para os tempos de moderado a lento, ficando os andamentos mais vivos com os
gêneros sincopados.
A modinha, rítmica e historicamente, terminou por manter – e, não raro, exacerbar – seus
traços europeus, e as modinhas sincopadas, que tanto impressionaram os europeus
entre os séculos XVIII e XIX, acabaram respondendo à sua singularidade ao fundar gêneros
mais marcadamente nacionais tanto musical quanto poeticamente, como o próprio lundu,
o maxixe e, mais tarde, o samba (vale acrescer que é também claramente modinheira a
matriz melódica da marcha-rancho e do frevo-canção).
De qualquer forma, sua riqueza melódica, tão estranha às melodias de numerosos gêneros
populares marcados pela simplicidade, enriqueceu e influenciou definitivamente diversos
gêneros nacionais, legando inclusive à nossa MPB alguns traços característicos que a
destacam das demais músicas populares no panorama mundial.
Em seu período de declínio, a modinha, tornada erudita no século XIX, popularizou-se
novamente, difundindo e generalizando sua riqueza melódica para diversas manifestações
musicais nacionais. Poeticamente, tal popularização gerou, como efeito colateral, um pendor
poético pelos excessos e pelo rebuscamento que, justiça seja feita, chegou a contaminar
algumas vezes até mesmo a obra de mestres como Cartola e Nelson Cavaquinho, para
não falar do emprego de termos raros que até hoje certos letristas insistem em introduzir
nos sambas-enredo das grandes Escolas. Por outro lado, o legado de seu refinamento
melódico foi um fator definitivo para a viabilização de um movimento como a bossa-nova,
bem como para a saudável contaminação de brasilidade que permeia o pop nacional.

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Catulo da Paixão Cearense (1866-1946) foi
um dos mais célebres compositores de
modinhas conhecidos, em um gênero cuja
maior parte da produção é de autoria
anônima. Dono de uma bela voz de barítono
e de boa reputação na sociedade carioca, foi
uma das figuras fundamentais para a
ascensão do violão aos salões da alta
burguesia brasileira.
Foi também uma figura controversa. Boa parte
de sua fama firmou-se a partir de sua
habilidade em pôr letras nas canções que
lhe agradavam – o que nem sempre se dava
com o pleno consentimento dos demais
autores, cuja menção era não raro omitida,
como se Catulo fosse o único autor das obras.
Além disso, o forte pendor parnasiano de
saiba mais

Catulo deu a parte de sua poética um eruditismo e rebuscamento que se afastou


grandemente das vertentes que modernizaram a música brasileira a partir da
década de 1930, dando a muitas de suas canções um ar percebido hoje como
antiquado e exagerado. Por outro lado, a parte de sua obra que segue uma
estética mais popular e sertaneja imortalizou-se com clássicos insuperáveis,
como o célebre Luar do sertão.

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bibliografia

ALMEIDA, Manuel Antônio de. Memórias de um sargento de milícias. São Paulo:


Saraiva, 1977.

ALVARENGA, Oneyda. Música popular brasileira. Rio de Janeiro: Globo, 1950.

ANDRADE, Mário de. Dicionário musical brasileiro. Belo Horizonte: Itatiaia, 1989.

____ . Modinhas imperiais. Belo Horizonte: Itatiaia, 1980.

ARAÚJO, Mozart de et al. Enciclopédia da música brasileira. São Paulo: Arte


Editora, 1977.

____. A modinha e o lundu no século XVIII. São Paulo: Ricordi, 1963.

BARBOSA, Caldas. Viola de lereno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.

CASCUDO, Luiz da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. Belo Horizonte:


Itatiaia, 1988.

_____. Antologia do folclore brasileiro. São Paulo: Global, 2001.

CAZES, Henrique. Choro: do quintal ao municipal. São Paulo: Editora 34, 1999.

LIMA, Edilson de. As modinhas do Brasil. São Paulo: EDUSP, 2001.

ROMERO, Sílvio. Cantos populares do Brasil. Belo Horizonte: Itatiaia, 1985.

SIQUEIRA, Baptista. Modinhas do passado. Rio de Janeiro: Gráficas do Jornal


do Brasil, 1979.

VASCONCELOS, Ary. Raízes da música popular brasileira. Rio de Janeiro: Rio


Fundo, 1991.

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Anotações:

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