Você está na página 1de 6

Universidade de Brasília

Departamento de Engenharia Civil e Ambiental / FT


Geotecnia

CAPÍTULO 1 – PLANEJAMENTO INTEGRADO DE UMA BACIA


HIDROGRÁFICA

1.1 - INTRODUÇÃO

O Brasil, devido a sua grande extensão territorial e características físicas, aliadas à existência
de rios caudalosos, é um país com grande potencial para geração de energia hidrelétrica. Do
potencial conhecido até o presente, somente cerca de 25% foi explorado e corresponde às
usinas em operação e construção. Isso mostra que as fontes hidráulicas continuarão a
desempenhar importante papel no atendimento à crescente demanda de energia elétrica, pelo
menos ao longo das duas próximas décadas.

O potencial hidrelétrico brasileiro está estimado em 260 GW. Atualmente, 26% de todo o
potencial hidroenergético corresponde a usinas em operação e construção. Para se ter uma
idéia da distribuição deste potencial, a região amazônica detêm sozinha 113 GW, o que
corresponde a 43% do total estimado. De todo o potencial da região amazônica, apenas 4%,
até o presente momento, foi explorado.

1.2 - FINALIDADES DE UM RESERVATÓRIO

Atualmente, a implantação de barragens não visa apenas o aproveitamento da água somente


sob uma finalidade. Toda a bacia hidrográfica é estudada de modo a obter um aproveitamento
múltiplo do reservatório. Em geral as barragens, quanto às suas finalidades, são reunidas em
dois grupos:
 Barragens de Regularização – tem a finalidade de regularizar o regime hidrológico de um
rio, ou seja, armazenar água nos períodos de maior afluência e utilizar nos períodos de
déficit em relação à demanda.
 Retenção – tem a finalidade de reter água, sedimentos ou resíduos industriais.

As barragens de regularização possuem outros fins específicos tais como:


 Aproveitamento hidrelétrico – A formação de desnível, propiciada pela regularização,
favorece a criação de energia potencial hidráulica, que é transformada em energia elétrica.

Barragens – Apostila G.AP-AA006/01 – Capítulo 1 1. 1


Universidade de Brasília
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental / FT
Geotecnia

 Navegação – Esta é favorecida a jusante por meio da regularização das vazões no período
de estiagem e para montante por meio do afogamento de eventuais corredeiras e
cachoeiras.
 Abastecimento d´água – Para fins de irrigação, consumo industrial, doméstico etc.
 Outras finalidades – Criação de peixes, recreação, turismo etc.

1.3 – FASES DE ESTUDOS DE UMA BACIA HIDROGRÁFICA

1ª etapa – Estimativa do potencial hidrelétrico

Potencial hidrelétrico de uma bacia hidrográfica é aquele que pode ser técnica, econômica e
ambientalmente aproveitado em relação a uma determinada configuração específica de um
sistema elétrico, considerando usinas em operação, em construção ou planejadas, bem como
levando-se em conta cenários de utilização múltipla da água. A estimativa do potencial
hidrelétrico é feita por meio de análise preliminar, em escritório, das características
topográficas, hidrológicas, geológicas e ambientais da bacia hidrográfica, objetivando
verificar sua vocação para geração de energia elétrica.

2ª etapa – Inventário

Nesta etapa são levantados os possíveis locais para a construção de barramentos na bacia. Esta
escolha visa o aproveitamento múltiplo da bacia, sob os aspectos de geração de energia,
navegação, irrigação, controle de cheias etc. Também devem ser observadas as limitações
físicas, como presença de cidades, estradas, jazidas, parques nacionais, reservas minerais e
indígenas e áreas cultiváveis, bem como avaliados os custos de instalação e operação do
empreendimento.

A solução de um único reservatório é a mais apropriada, desde que não existam interferências.
Entretanto, devido às limitações quase sempre encontradas, os aproveitamentos são
posicionados ao longo do rio, procurando a melhor divisão de quedas do mesmo, isto é,
aquela que propicie o máximo de energia associada ao menor custo e o mínimo de efeitos
negativos ao meio ambiente.

Barragens – Apostila G.AP-AA006/01 – Capítulo 1 1. 2


Universidade de Brasília
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental / FT
Geotecnia

A Figura 1.1 exemplifica uma divisão de quedas, apresentando os locais barráveis dos rios
Tocantins e Araguaia e destacando os aproveitamentos em operação, em construção, em
processos de licitação e os que possivelmente estarão operando até 2010.

No inventário devem ser apresentadas ainda, além da divisão de quedas, as características de


cada aproveitamento e as respectivas estimativas de custo para sua implantação. A definição
mais precisa dos eixos dos barramentos é feita na fase seguinte, no estudo de viabilidade.

OPERAÇÃO
CONSTRUÇÃO
LICITAÇÃO 2001 ANEEL
LICITAÇÃO 2002 ANEEL
POSSÍVEIS ATÉ 2010

Total (calha principal) = 21,1 GW


Figura 1.1 – Aproveitamento hidrelétrico dos rios Tocantins e Araguaia (Coimbra, 2001).

3ª etapa – Viabilidade

Os estudos de viabilidade consistem na análise técnico-econômica dos possíveis eixos


definidos na fase de inventário e escolha da melhor alternativa de eixo para o barramento. No
estudo de viabilidade é definido o arranjo geral e realizada a comprovação técnico-econômica
do aproveitamento.

Barragens – Apostila G.AP-AA006/01 – Capítulo 1 1. 3


Universidade de Brasília
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental / FT
Geotecnia

Os estudos de viabilidade têm como objetivo concluir sobre a exeqüibilidade ou não do


aproveitamento através de avaliações, análises e definições fundamentadas nos custos e nos
benefícios múltiplos que podem ser obtidos. Auxiliam também na tomada de decisões quanto
à época de início de construção do aproveitamento hidrelétrico, na elaboração dos
documentos necessários para licenciamento ambiental e ações junto a órgãos públicos e
privados. Por fim, estes estudos visam otimizar a utilização dos recursos naturais existentes na
área do futuro aproveitamento, promovendo sua inserção na região.

4ª etapa – Projeto Básico

Nesta etapa tem-se a definição final da obra, com memoriais descritivos, especificações
técnicas, dimensionamento das estruturas, definição dos equipamentos, cronogramas e
orçamentos, o que permite à empresa ou ao grupo vencedor da licitação de concessão a
implantação do empreendimento diretamente ou através de contratação de outras companhias
para a execução das obras civis e do fornecimento e montagem dos equipamentos
hidromecânicos e eletromecânicos. No desenvolvimento do Projeto Básico deverão ser
mantidos os principais itens (nível d’água de montante e jusante, potência mínima e
coordenadas geográficas) fixados no edital de licitação do empreendimento e que foram
definidos na fase de Estudos de Viabilidade, de modo a manter, nesta fase de projeto, sua
energia assegurada.

Nessa etapa se realiza, também, o Projeto Básico Ambiental e são detalhados os programas
sócio-ambientais definidos nos estudos de viabilidade. Sob o ponto de vista geotécnico, são
realizadas sondagens, amostragens, ensaios específicos de campo e laboratório, estudo de
estabilidade de taludes, definição da seção típica da barragem e localização de áreas de
empréstimo, entre outros.

5ª etapa – Projeto Executivo

O projeto executivo consiste no detalhamento do projeto básico (obras civis, equipamentos


hidromecânicos e eletromecânicos), visando à execução da obra e a montagem de
equipamentos permanentes. Nesta etapa são tomadas todas as medidas pertinentes à
implantação do reservatório. Também deve-se preparar nesta fase os documentos "as built".

Barragens – Apostila G.AP-AA006/01 – Capítulo 1 1. 4


Universidade de Brasília
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental / FT
Geotecnia

1.4 - ÍNDICE CUSTO-BENEFÍCIO E ÍNDICE AMBIENTAL

1.4.1 – Índice Custo-Benefício Energético

Durante a fase de inventário são selecionadas as melhores alternativas de divisão de quedas,


ou seja, aquelas que resultem em máxima produção de energia elétrica, dentro dos limites
estabelecidos para o custo unitário de referência. Em cada uma destas alternativas, os
aproveitamentos deverão ser ordenados segundo o índice custo-benefício que cada um
apresenta ao ser incorporado como próxima adição à configuração do sistema de referência.

O índice custo-beneficio energético (ICBE), expressos em US$/MWh, é definido como a


relação entre o custo anual de cada aproveitamento e o benefício em energia firme obtido por
sua operação integrada no sistema. O Manual de Inventário Hidrelétrico de Bacias
Hidrográficas da Eletrobrás descreve o cálculo deste índice.

1.4.2 - Índice Ambiental

É o valor numérico que expressa a intensidade do impacto ambiental sobre a área de estudo,
variando em uma escala contínua desde zero (mínimo impacto) até um (máximo impacto).
Este índice é calculado considerando-se os impactos sobre ecossistemas aquáticos e terrestres,
modos de vida, organização territorial, base econômica e populações indígenas.

No entanto, uma estimativa preliminar do impacto que um aproveitamento hidrelétrico irá


causar pode ser obtida pela relação entre a área inundada pelo reservatório (km 2) e a potência
instalada (MW). A Tabela 1.1 ilustra o impacto causado por algumas usinas hidrelétricas
brasileiras.

Barragens – Apostila G.AP-AA006/01 – Capítulo 1 1. 5


Universidade de Brasília
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental / FT
Geotecnia

Tabela 1.1 – Índice de impacto ambiental de usinas hidrelétricas brasileiras.


Potência Área do Índice
UHE Estado / País Bacia instalada reservatório ambiental
(MW) (km 2) (Km 2/MW)
Balbina AM Rio Amazonas 250 2360 9.44
Belo Monte* PA Rio Amazonas 11000 400 0.04
Samuel RO Rio Amazonas 217 600 2.76
Lajeado** TO Rio Tocantins 903 630 0.70
Serra da Mesa GO Rio Tocantins 1293 1784 1.38
Tucuruí PA Rio Tocantins 7960 2430 0.31
Mal. Castelo Branco MA/PI Atlântico, trecho norte/nordeste 216 363 1.68
Itaparica PE/BA Rio São Francisco 1500 828 0.55
Moxotó BA/AL Rio São Francisco 440 93 0.21
Paulo Afonso IV BA Rio São Francisco 2460 17 0.01
Sobradinho BA Rio São Francisco 1050 4214 4.01
Três Marias MG Rio São Francisco 388 1142 2.94
Xingó SE/AL Rio São Francisco 3000 60 0.02
Funil RJ Atlântico, trecho lesle 216 39 0.18
Lajes RJ Atlântico, trecho lesle 144 30 0.21
Barra Bonita SP Rio Paraná 144 308 2.14
Capivara SP/PR Rio Paraná 662 515 0.78
Corumbá GO Rio Paraná 375 65 0.17
Emborcação MG/GO Rio Paraná 1192 455 0.38
Foz do Areia PR Rio Paraná 2511 139 0.06
Furnas MG Rio Paraná 1216 1450 1.19
Igarapava MG/SP Rio Paraná 210 39 0.19
Ilha Solteira SP/MS Rio Paraná 166 1200 7.23
Itaipu Brasil/Paraguai Rio Paraná 14000 1350 0.10
Itumbiara MG/GO Rio Paraná 2280 760 0.33
Marimbondo MG/SP Rio Paraná 188 438 2.33
Nova Ponte MG Rio Paraná 510 447 0.88
Porto Colômbia MG/SP Rio Paraná 320 140 0.44
Rosana SP/PR Rio Paraná 320 217 0.68
Salto Grande MG Rio Paraná 104 5.8 0.06
São Simão MG/GO Rio Paraná 1710 722 0.42
Segredo PR Rio Paraná 1260 82 0.07
Taquaruçu SP/PR Rio Paraná 515 74 0.14
Campos Novos* SC Rio Uruguai 880 24 0.03
Itá SC/RS Rio Uruguai 294 141 0.48
Machadinho SC/RS Rio Uruguai 1140 79 0.07
Obs.:
** Em construção
* Previsto para construção

Barragens – Apostila G.AP-AA006/01 – Capítulo 1 1. 6

Você também pode gostar