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O capital social na criação de capital humano

- Em se tratando de ação social, há duas grandes correntes intelectuais que dedicam-se a


explica-la: uma é característica do trabalho da maior parte dos sociólogos, e enxerga o
ator como “socializado” e a ação governada por normas, regras e obrigações sociais. a
maior virtude desta linha teórica é sua capacidade de descrever a ação social num
determinado contexto, indicando as maneiras pelas quais ela é moldada, constrangida e
redirecionada pelo contexto social.
A outra corrente intelectual é característica de grande parte do trabalho de
economistas, e vê o ator sendo portador de interesses independentes, agindo de forma
independente e totalmente auto interessado. A principal virtude dessa corrente, segundo
Coleman, é um princípio de ação que ela toma como pressuposto: o de que indivíduos
tendem a agir de modo a maximizar a utilidade da ação (p. 95).
- Coleman se esforça para desenvolver uma orientação teórica que leve em conta
elementos de ambas as abordagens, aceitando o princípio racional da ação e, ao mesmo
tempo, levando em conta o contexto social em que ela é levada a cabo. Desta maneira,
Coleman pretende dar conta não só da ação de indivíduos como também do próprio
desenvolvimento de uma organização social. Para isto, o autor lança mão do conceito de
“capital social”.

Críticas e revisões

- Coleman argumenta que ambas as correntes possuem falhas graves. Por um lado, a
corrente sociológica tende a considerar o indivíduo como subjugado por seu ambiente,
sem observar forças motrizes que dê à ação um propósito ou direção. Basicamente,
concebe-se a ação como um produto do meio em que ela ganha forma.
- A corrente economista, por outro lado, vai de encontro à empiria, uma vez que as
ações das pessoas são moldadas, redirecionadas e constrangidas belo contexto social:
normas, confiança interpessoal, redes sociais e a organização social são importantes não
só para o funcionamento da sociedade, como também da economia.
- De toda forma, tanto na economia quanto na sociologia, pesquisadores têm examinado
a maneira em que a organização social afeta a atividade econômica. Partindo de
referências a outros autores, dentre os quais destaca-se Granovetter, Coleman argumenta
que “há uma falha [em economia] em reconhecer a importância de relações pessoais e
redes de relações na geração de confiança, no estabelecimento de expectativas e na
criação e manutenção de normas” (p. 97).
- “De forma geral”, diz Coleman, “pode-se dizer que a concepção da ação racional é
mantida, mas sobrepõe-se a ela a organização social e institucional – seja aquela
endogenamente gerada, como nas explicações funcionalistas de alguns economistas
institucionais, seja a de fatores externos, como o de trabalhos mais orientados pela
sociologia.
- O objetivo de Coleman, contudo, é o de importar o princípio da ação racional para a
análise de sistemas sociais, sem, com isso, descartar a organização social ao longo desse
processo – para isso, Coleman lança mão do conceito de capital social.

Capital social

- “Se começarmos com uma teoria da ação racional, na qual cada ator tem controle
sobre determinados recursos e interesses em alguns recursos e eventos, então o capital
social aparece como um tipo de RECURSO particular, disponível ao ator” (p. 98).
- O CAPITAL SOCIAL É DEFINIDO POR SUA FUNÇÃO.
- O capital social não é uma entidade singular, mas uma variedade de entidades
distintas, com dois elementos em comum: (1) eles consistem em certos aspectos da
estrutura social e (2) eles facilitam determinadas ações dos atores, sejam eles indivíduos
ou corporações, inseridos nessa estrutura.
- Como outras formas de capital, o capital social é produtivo, tornando possível a
realização de determinadas tarefas, em vista de determinados fins, que em sua ausência
não seriam possíveis.
- O capital social pode variar em suas formas, sendo uma delas útil para alguns fins e
inútil, ou talvez até danosa, para outros. (Lembra-me o momento negativo do
patrimonialismo).
- Ao contrário de outras formas de capital, o capital social é INERENTE à estrutura de
relações entre atores e não se acomoda nos atores em si e nem em implementos físicos
de produção. Coleman traz à tona alguns exemplos:
1. O mercado de venda de diamantes em atacado. “Ao negociar uma venda, um
mercador entregará a outro mercador, no processo de negociação, uma determinada
quantidade de pedras a serem examinadas à vontade, sem garantias legais que nenhuma
das pedras será trocada ou roubada. Essa troca de pedras para inspeção é importante
para o mercado de diamantes, sem a qual ele funcionaria de maneira muito menos
eficiente. Coleman observa que a venda de diamantes no atacado costuma apresentar-se
por meio de comunidades de mercadores relativamente fechadas (lações próximos,
identidade étnica, lações de família etc.). São esses laços que garantem àquilo que é
necessário para facilitar as transações no mercado. “Se qualquer membro dessa
comunidade quebrar expectativas, substituindo uma pedra por outro menos valiosa, ou
roubando, ele perderia laços familiares, religiosos e comunitários. A força desses laços
torna possíveis transações na qual a confiabilidade é dada como garantida, de modo que
as trocas ocorrem com maior facilidade.
2. Células revolucionárias de estudantes sul-coreanos. Em meados da década de 1980,
teorias revolucionárias eram compartilhadas por meio de grupos de estudos clandestinos
compostos por estudantes provenientes da mesma escola, igreja ou cidade natal. Esses
grupos de estudos se traduziam como a unidade básica de manifestações e outros tipos
de protesto. Neste caso, temos em vista dois tipos de capital social: (1) a mesma igreja,
escola e cidade natal, que permitiam a construção dos grupos de estudo e (2) o próprio
grupo de estudos, forma de organização que facilitava a oposição a um sistema político
intolerante.
3. Um mercado no Cairo, ao qual relações pessoais são importantes para a sua
manutenção enquanto organização. Mercadores indicam clientes entre si, levam pessoas
até o estabelecimento de conhecidos, e para algumas dessas atividades há comissões
inclusas. Desta forma, o mercado pode tanto ser visto como uma organização (uma “loja
de departamentos”) como um conjunto de indivíduos mercadores que contam, cada um,
com um extenso corpo de capital social ao qual podem recorrer.
- Os exemplos mostram como que o capital social pode implicar em resultados
diferentes, sejam econômicos ou não. Há algumas características do conceito, contudo,
significativas para a compreensão de como o capital social é capaz de gerar capital
humano.

Capital humano e capital social


- Da mesma forma que o capital físico é criado pelas transformações em materiais, de
modo a engendrar ferramentas que facilitam a produção, o capital humano é criado a
partir de transformações nas pessoas, trazendo à tona habilidades e capacidades que as
torna aptas a ação em novas maneiras.
- O capital social emerge através de mudanças nas relações entre pessoas, facilitando a
ação em certo sentido.
- Se o capital físico é observável em sua forma material, e o capital humano se traduz
em habilidades e conhecimento adquirido por indivíduos, o capital social é menos
visível, existindo nas relações entre pessoas e facilitando a produção (por exemplo, um
grupo no qual há um alto nível de confiança entre os membros é capaz de realizar muito
mais do que um grupo de pessoas em que isso não acontece).

Formas de capital social

- “O valor do conceito de capital social reside no fato de que ele identifica certos
aspectos da estrutura social por suas FUNÇÕES, assim como o conceito de cadeira
identifica certos objetos físicos pela sua função, apesar das diferenças em formas,
aparências e construção” (p. 101).
- A função identificada pelo conceito de capital social é o valor desses aspectos da
estrutura social para os atores na forma de recursos dos quais eles podem lançar mão
a fim de satisfazer seus interesses.
- “Ao identificar essa função de certos aspectos da estrutura social, o conceito de capital
social constitui tanto um auxílio na consideração de diferentes resultados na ação do
ator individual quanto como uma via para a realização da transição entre os níveis micro
e macro, sem elaborar os detalhes através dos quais isso ocorre” (Ibid.).
Por exemplo, ao considerar os grupos de estudos sul coreanos como capital
social que estes estudantes utilizam em suas atividades revolucionárias, afirma-se que
esses grupos constituem um recurso que auxilia na transposição da ação individual de
protesto para a revolta organizada.
- Para outros propósitos, alguém poderia querer entender os elementos que são cruciais
em termos de utilidade enquanto recursos em vista dos interesses dos atores,
examinando como eles emergiram em um caso particular. Mas o conceito de capital
social nos permite levar esses recursos em conta, mostrando a maneira em que eles
podem ser combinados com outros recursos para produzir comportamentos em
diferentes níveis sistêmicos ou, em outros casos, resultados diferentes para indivíduos.
- O conceito de capital social sinaliza ao analista que algo de valor foi produzido para
aqueles atores que têm determinado recurso à disposição, e que seu valor depende da
organização social. Diante disso, o segundo passo na análise seria “desempacotar” o
conceito para descobrir quais componentes de organização social contribuem para o
valor produzido.
- O que, em relações sociais, constitui recursos de capital úteis para indivíduos?

Obrigações, expectativas e nível de confiança das estruturas

- Diz-se que em algumas estruturas sociais as pessoas estão sempre fazendo algo umas
pelas outras. Se isso é verdade, temos uma situação em que a pessoa que presta um
favor, por exemplo, compromete a outra pessoa, favorecida, com uma dívida. Em outras
palavras, a pessoa que presta o favor ganha um crédito ante a pessoa favorecida
(lembremo-nos do mercado do Cairo).
- Essa forma de capital social depende de dois elementos: (1) o nível de confiança do
ambiente social, o que quer dizer que as obrigações são retribuídas; e (2) o nível
concreto de obrigações em jogo. Estruturas sociais diferem nessas dimensões, de modo
que os atores variam em relação ao segundo quesito, obrigações em jogo.
- Indivíduos em estruturas sociais com altos níveis de obrigações contam com mais
capital social ao qual podem recorrer. A densidade dessas obrigações significa, de fato,
que a utilidade geral dos recursos à disposição daquela estrutura social é amplificada
por sua disponibilidade a outrem quando necessária (p. 103).
- “Atores individuais em um sistema social também diferem no número de créditos com
os quais eles podem contar. Os casos mais extremos encontram-se em configurações
familiares hierarquicamente estruturadas, em que um patriarca controla um conjunto
extraordinariamente grande de obrigações ao qual ele pode recorrer a qualquer
momento para atingir seus objetivos. Próximo a esse exemplo estão vilas em
configurações tradicionais que são altamente estratificadas, contendo determinadas
famílias ricas que, por causa de sua riqueza, acumularam uma quantidade significativa
de créditos aos quais elas podem recorrer a qualquer momento. –
PATRIMONIALISMOI = ALTO NÍVEL DE CAPITAL SOCIAL EM TERMOS DE
OBRIGAÇÕES CRIADAS ENTRE SUPERIORES E SUBORDINADOS. Os
superiores concedem favores e benesses, enquanto os subordinados cumprem as ordens
do senhor, contribuindo para com a consolidação do poder patrimonial na medida em
que lhes interessa (ou que lhes é possível, dada a relação custo-benefício).
- Em total conexão com o texto de Ermakoff, Coleman argumenta que “em
configurações políticas como uma legislatura, o legislador em uma posição com amplo
acesso a recursos (um líder do senado, por exemplo) pode, por meio de seus recursos,
construir um conjunto de obrigações com outros legisladores, tornando possível a
aprovação de uma medida que, de outra forma, não seria aprovada. ESSA
CONCENTRAÇÃO DE OBRIGAÇÕES CONSTITUI UM CAPITAL SOCIAL NÃO
SÓ ÚTIL AO LEGISLATOR PODEROSO COMO TAMBÉM PARA AUMENTAR O
NÍVEL DE AÇÃO DE PARTE DA LEGISLATURA. = patrimonialismo estamental?
- Aqueles legisladores que se encontram nesse “clique” de créditos e débitos, relações
de obrigações, mostram-se mais poderosos do que aqueles que não participam da
relação = os subordinados podem colocar muito a perder quando decidem deixar a
relação patrimonial.

Canais de informação

- Uma forma importante de capital social é o potencial de informação inerente às


relações sociais. Informação é um elemento importante para prover uma base para a
tomada de ação.
- Uma forma pela qual informações podem ser adquiridas é a manutenção de relações
sociais que podem ter outros propósitos.

Normas e sanções efetivas

- Quando uma norma existe e é efetiva, ela constitui um canal poderoso, embora às
vezes frágil, de capital social (p. 104).
Normas em uma comunidade que apoiam que apoiam e proveem recompensas
efetivas para grandes realizações escolares facilitam em grande medida o trabalho
escolar.
- Uma norma prescritiva especialmente importante em uma coletividade, que constitui
uma forma relevante de capital social, é aquela que induz um indivíduo à abnegação a
fim de agir nos interesses da coletividade. Este indivíduo pode receber compensações
nas formas de status, honra, apoios diversos etc.
- Em alguns casos, essas normas são internalizadas; em outros, elas recebem o suporte
de recompensas externas para ações voltadas a outrem, sem interesses egoístas, e da
desaprovação de ações egoístas (p. 104-105). De todo modo, sendo as normas
internalizadas eu reforçadas por meio de sanções externas, elas são cruciais para a
superação o problema dos bens públicos existente em coletividades.
- Com isso, vemos que as normas consistem em formas poderosas de capital social.
Contudo, esse capital social não só facilita determinadas ações, como também restringe
outras. NORMAS EFETIVAS EM DETERMINADA ÁREAS PODEM, DE FATO,
REDUZIR O POTENCIAL DE INOVAÇÃO NESTA ÁREA E NÃO SÓ AÇÕES
DESVIANTES QUE PREJUDICAM OUTROS, MAS AÇÕES QUE PODEM SER
BENÉFICAS A TODOS.

Estrutural social que beneficia o capital social

- Todas as relações sociais e estruturas sociais facilitam algumas formas de capital


social. Atores estabelecem relações propositalmente e as mantêm quando elas proveem
benefícios. Alguns tipos de estrutura social, no entanto, são especialmente importantes
para facilitar algumas formas de capital social (p. 105).

Em que medida as redes sociais são fechadas

- Uma propriedade das relações sociais da qual depende a efetividade das normas é
aquilo que Coleman chama de “fechamento” (closure). Normas emergem como
tentativas de limitar efeitos negativos externos ou como tentativa de encorajar efeitos
positivos. Mas em muitas estruturas sociais onde essas condições existem, as normas
não emergem. A razão disso é que a medida em que a estrutura social é fechada é muito
pequena (p. 105).
- Isso tem relação com a questão do patrimonialismo puro mencionado por Ermakoff.
Quando o superior não precisa prestar contas e seus subordinados não se associam em
disputas por classes de cargos, cabe ao arbítrio do senhor desenvolver as relações de
acordo com seus interesses, consolidando seu poder patrimonial. Ao contrário, quando
os atores se associam e se apropriam de determinados cargos, codificando seu direito à
propriedade, eles forçam o senhor à prestação de contas, garantindo seus benefícios e
rendas. Isso só é possível numa estrutura de rede fechada, em que todos são capazes de
influenciar e monitorar minimamente a todos. Numa rede fechada, os subordinados
podem combinar forças para sancionar o superior (p.105-106).
- O quão fechada é uma estrutura social é um fator importante não só para a existência
de normas efetivas como também para outra forma de capital social: a confiabilidade de
estruturas sociais que permitem a proliferação de obrigações e expectativas. Furtar-se a
uma obrigação é uma forma de impor uma externalidade negativa a outro(s) ator(es).
Contudo, numa estrutura não fechada, a fuga pode ser sancionada, no limite, apenas por
aquele a quem deve-se a obrigação. “Reputação não é algo que possa emergir numa
estrutura aberta, e sanções coletivas que assegurariam confiabilidade não podem ser
aplicadas. Nesse sentido, podemos dizer que o fechamento cria confiabilidade numa
estrutura social (p. 107-108).

Organizações sociais apropriáveis

- Coleman prevê organizações sociais instituídas em vista de um objetivo específico


(por exemplo, um projeto de habitação numa cidade do leste dos Estados Unidos
durante a Segunda Guerra Mundial) que depois são apropriadas para outros propósitos
(no caso deste exemplo, para melhorar a qualidade de vida de forma geral) graças ao
capital social gerado graças à fundação da organização. Um outro exemplo é um clube
de sociabilidade de datilógrafos, que depois se torna um centro de referência para
contratação de datilógrafos (p. 108).
- “Uma organização criada para um propósito pode se disponibilizar para apropriação
para outros objetivos, constituindo um capital social importante para membros
individuais que têm à sua disposição os recursos organizacionais necessários para levar
a cabo determinadas atividades” (Ibid.).
- Relações multiplexas e simplexas: na primeira, as pessoas estão ligadas em mais de
um contexto (igreja, bairro, companheiro de trabalho, parentes etc.), enquanto na
segunda as pessoas estão ligadas através de somente uma dessas relações. A relação
multiplexa permite que recursos de uma relação sejam utilizados em outra (informação,
obrigações que uma pessoa deve a outra e é pago como um favor a uma terceira...).

Capital social na criação do capital humano

- O capital social é importante para a criação de capital humano na geração vindoura.


Tanto o capital social na família quanto na comunidade cumpre papeis na criação de
capital humano.

Capital social na família

- É comumente aceito, argumenta Coleman, que o “background familiar” cumpre um


papel importante na educação dos jovens. Contudo, esse background não é unívoco, e
pode ser separado em pelo menos três categorias: capital financeiro, capital humano e
capital social.
- O capital social nas famílias de estudantes diz respeito à intensidade e frequência das
relações entre pais e filhos. Se o capital humano (educação dos pais, que forma o
ambiente cognitivo no qual a criança é criada) possuído pelos pais não é
complementado com capital social intrínseco às relações sociais, o primeiro pode vir a
se mostrar quase que completamente irrelevante para o futuro educacional dos filhos (p.
110).

Capital social fora da família

- O desenvolvimento de um jovem não depende somente do capital social circunscrito


ao ambiente familiar, mas também do capital social da comunidade da qual o jovem faz
parte, que consiste nas relações sociais entre pais, no fechamento apresentado por essa
estrutura de relações e nas relações dos pais com as instituições dessa comunidade (p.
113).
- Em estruturas intergeracionais fechadas, os atores – tanto superiores quanto
subordinados – encontram-se em melhores condições de chegar a consensos sobre
determinadas situações e impor sanções a atores que estejam quebrando expectativas na
relação.
Aspectos de bens públicos do capital social

- Uma característica central ao capital social é a seguinte: “os tipos de estruturas que
fazem com que seja possível estabelecer normas e sanções que as reforcem não
beneficiam, em primeiro lugar, a pessoa ou as pessoas cujos esforços seriam necessários
para trazê-las à tona, mas, antes, beneficiam todos que fazem parte de tal estrutura” (p.
116).
- Coleman chama atenção para o fato de que as pessoas, por vezes, tendem a privilegiar
a acumulação de outros tipos de capital (financeiro, humano) em detrimento do capital
social, porque o último gera efeitos compartilhados por todos os membros de
determinada estrutura. Contudo, isso não impede que, mesmo fazendo cálculos voltados
a si mesmos e a seus círculos sociais mais próximos, as pessoas incorram em
compartilhamento de informações e relações de obrigações entre si.
- Por que, para Coleman, é possível que emerjam relações patrimoniais em
regimes burocráticos? “Normas são estabelecidas intencionalmente como meios de se
reduzir externalidades, e seus benefícios são geralmente capturados por aqueles
responsáveis por estabelece-las. Mas a capacidade de estabelecer e manter normas
efetivas depende das propriedades da estrutura social (por exemplo, em que medida ela
é fechada) sobre as quais o indivíduo não tem controle e, no entanto, são afetadas pela
ação do ator. Confiabilidade, informação e a quão fechada é são propriedades que
afetam a capacidade da estrutura de sustentar normas efetivas.
- Algumas formas de capital social têm a propriedade de apresentar benefícios que
podem ser aproveitados por aqueles que nele investem. Consequentemente, atores
racionais tenderão a investir nesse tipo de capital social. ORGANIZAÇÕES QUE
PRODUZEM UM BEM PRIVADO CONSTITUEM UM EXEMPLO MARCÁVEL
DISSO. É de se pensar se, no caso do patrimonialismo, no caso em que o ocupante de
determinado cargo se apropria deste cargo, não há um investimento racional de
coletividades de atores (mobilizando capital social intrínseca a determinada classe de
subordinados) para a codificação das relações com superiores, consolidando suas
posições. Isso porque, no patrimonialismo, a intenção dos atores pode ser a de
consolidar seu próprio poder e sua própria posição, à revelia de regras formais
inclinadas à produção do bem público.
- “O resultado é que há na sociedade um desequilíbrio nos investimentos relativos em
organizações que produzem bens privados para um mercado e aquelas associações e
relações nas quais os benefícios não são coletados – um desequilíbrio no sentido de que,
se as externalidades positivas criadas pela última forma de capital social pudessem ser
internalizadas, este capital passaria a existir em maior quantidade” (p. 118).
- “A qualidade de ‘bens públicos’ de grande parte do capital social significa que ele está
numa posição fundamentalmente diferente em relação à ação propositiva ante a maior
parte de outras formas de capital. O capital social é um recurso importante para os
indivíduos e pode afetar bastante sua capacidade de agir e sua percepção de qualidade
de vida. Eles têm a capacidade de alavancar, trazer à tona, criar capital social. No
entanto, na medida em que os benefícios da criação de capital social são experimentados
sobretudo por outrem que não o ator, não é incomum observar que não há muito
interesse na criação do capital social. O efeito disso é que a maioria das formas de
capital social são criadas ou destruídas como consequência de atividades outras. Esse
capital social advém ou desaparece sem depender da vontade de ninguém em especial e,
portanto, é ainda menos reconhecido e levado em conta na ação social do que sugeriria
seu caráter abstrato e de certo modo intangível” (p. 118).
- Nesse sentido, o efeito de organizações voluntárias e espontâneas podem ter efeitos
institucionais mais valiosos do que a mera imposição de normas, externalidades não
incorporadas pelos atores (eis o caso dos estudantes analisado por Coleman: o resgate
de laços comunitários e familiares pode ser tão ou mais importante do que a simples
organização e disponibilização de recursos escolares em si). No caso do
patrimonialismo, redes fechadas com laços fortes (com troca de recursos intensas e
frequentes entre participantes, de modo que todos tenham de certa forma influência
sobre todos, podem servir para mitigar uma tendência ao patrimonialismo puro, por
natureza instável e contraproducente, por um patrimonialismo estamental, em que a
prestação de contas é incentivada e relações são codificadas, portanto garantindo a
previsibilidade das ações, suscitando a estabilidade e, portanto, investimentos e
produtividade.

Conclusão
- O conceito de capital social refere-se ao capital incorporado nas relações entre
pessoas.
- Utiliza-se, neste conceito, elementos do paradigma da ação racional sem que, com
isso, assuma-se o caráter atomístico conferido aos agentes neste paradigma, levando-se
em conta as relações sociais em que estão engajados.
- Na explicação do capital social, três formas foram descritas: (1) obrigações e
expectativas, que dependem da confiabilidade do ambiente social; (2) capacidade de
troca de informação da estrutura social (que orienta a ação dos atores); (3) normas
acompanhadas de sanções (que possibilitam e suscitam determinados tipos de ação, ao
passo que constrange outros).
- Uma propriedade compartilhada por grande parte das formas de capital social, e que os
difere de outras formas de capital é seu aspecto de “bem público”: o ator, ou os atores,
que geram capital social normalmente aproveitam somente uma pequena parte de seus
benefícios, um fato que leva ao subinvestimento em capital social (p.119).

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