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A linguagem e os mitos de ordem jurídica liberal

O texto traz a análise do uso das diferentes funções da linguagem no campo do


direito, ambiente em que o jurista liberal tinha que fazer com que as pessoas
acreditassem na realidade substancial das instituições jurídicas. Assim, ele demonstra
que, no “Império do Direito” a comunicação entre o legislador e os legislados se
apresenta hierarquizante e subordinante, uma vez que toda regra jurídica tem
característica dogmática e a função de assegurar os padrões de dominação vigentes,
junto a isso há a dependência das instituições de internalizar os valores de obediência
para que mantenham sua efetividade. Com isso, conclui que as leis, portanto, são
revestidas de aparente neutralidade que só é possível devido a dissimulação das funções
diretivas, operativas e fabuladoras que são mascaradas de informativas.

Também mostra a tendência da ordem político-jurídica liberal de aumentar a


abstração generalizante e indeterminante das normas para ser possível controlar as
relações sociais contraditórias a partir de processos jurídicos e de integrar o universo
dos litígios, incongruências e tensões decorrentes dessas relações mediante textos legais
que tem aparente objetividade, incapacidade e coerência. Assim, são ocultados os
valores e interesses materiais subjacentes ao sistema legal que foi criado pelo
liberalismo, que era baseado na ideia de sociedades relativamente estáveis e integradas
pelo mercado. Todavia, a tendência a crises cíclicas realçou a incapacidade do
capitalismo industrial de se autorregular, o que resultou numa maior necessidade da
intervenção normalizadora do Estado. O texto levanta a questão de como foi a reação
dessa ordem que começou a ter uma maior complexidade socioeconômica devido ao
capitalismo oligopolista e monopolista, da expansão das lutas sociais e generalização do
fenômeno burocrático. Como mostra o texto: “O que ocorre com o liberalismo jurídica-
político diante da explosão de litigiosidade, marcada pela ruptura da ordem social, que
caracteriza a sociedade de classes? ”.

Como resposta, traz a observação de que, ao invés de reforçar as suas formas


tradicionais, na realidade a reação vem com um abrandamento da rigidez hierárquica e
da coerência lógico-formal. Devido a isso, como resultado houve uma progressiva
desconfiguração de suas características básicas, sofrendo com maior expansão do
Estado por causa das crescentes complexidades socioeconômica, que aumentavam os
antagonismos sociais e a concentração de renda, coisas que estimularam a
burocratização das organizações formais. Nesse caso, a resposta do Estado foi o
aumento do poder de regulação, controle e planejamento, todo esse intervencionismo
dava a ideia de despolitizar as esferas privadas, contudo, por outro lado, as ações
públicas passavam por um processo de repolitização.

Essa repolitização ocorria devido a consagração dos interesses de grupos,


associações e movimentos que antes eram tutelados pelo direito privado. Tal estratégia
adotada pelo Estado dependeu da utilização de normas cada vez mais indeterminadas e
abstratas que representavam a concentração e todo processo decisório dentro a ordem
burocrática estatal, que na realidade só possuía uma aparência de formalismo jurídico
dotado de funcionalidade legitimadora que estava ligada aos interesses daqueles que
possuíam um maior poder de conflito, ou seja, classes, grupos ou associações mais
privilegiadas e de maior destaque social. Desse modo, quanto mais essa ordem fazia
com que as normas ordinárias se tornassem meros instrumentos com objetivo de
neutralizar os conflitos, mais aumentou o risco de uma politização total da vida social.

Assim, o autor apresenta a conclusão de que o Estado intervencionista hoje se


encontra em meio a um dilema, por um lado a impossibilidade de controlar a vida social
em todos seus pontos de conflito e por outro a necessidade do mesmo de desmobilizar e
controlar grupos descontentes. Isso fez com que o legislador tecnocrata passasse a
enfrentar o que no texto foi apresentado como “duplo desafio”, que é o de aprender a
conviver com a escassez de consenso e ao mesmo tempo maximizar as funções
diretivas, operativas e fabuladoras do discurso normativo, que passou a ser cada vez
mais abrangente, genérico, abstrato, programático e sem base material, mas que ainda
assim tinha a finalidade de apresentar os seus dirigentes como “heróis públicos”, ou
seja, como se eles fossem os “servidores do povo”.

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