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ORDEM DOS ADVOGADOS DE ANGOLA

CONSELHO INTERPROVINCIAL DA HUÍLA, NAMIBE E CUNENE

O Exercício Colectivo da Advocacia e o Quadro


Deontológico da Profissão-Breves Notas.

HORTÊNCIO DA CRUZ SANUMBUTUE

Lubango, 2018
Ordem dos Advogados de Angola
Conselho Interprovincial da Huíla, Namibe e Cunene.

= O Exercício Colectivo da Advocacia e o Quadro Deontológico da


Profissão-Breves Notas. =

Autor: Hortêncio Elias Tancredo da Cruz Sanumbutue, Advogado estagiário titular


da Cédula provisória n.º 3951;
Patrono: Dr. Raúl Carlos de Freitas Rodrigues, Advogado titular da cédula
profissional n.º 431.

Trabalho apresentado à Ordem dos Advogados de Angola como um dos


requisitos para obtenção da cédula profissional de Advogado.

Lubango, Abril de 2018

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ÍNDICE
I. INTRODUÇÃO ........................................................................................................1

II. DEONTOLOGIA PROFISSIONAL DO ADVOGADO .......................................3

2.1- Considerações gerais. ......................................................................................... 3

2.2- Deontologia na evolução histórica da advocacia. .............................................. 4

2.3- O advogado e a deontologia profissional em Angola. ....................................... 8

2.3.1- Paradigma normativo........................................................................................ 8

III. O EXERCÍCIO COLECTIVO DA ADVOCACIA .............................................13

3.1- Generalidades ................................................................................................. 13

3.2- A Realidade Angolana ................................................................................... 14

3.2.1- Regime Legal ..................................................................................................14

3.2.2- As Sociedades de advogados ..........................................................................14

3.2.3- As Associações de advogados ........................................................................17

3.3- A Deontologia e o Exercício Colectivo da Advocacia ................................. 20

IV. REGIME DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ADVOGADO NA PRÁTICA


COLECTIVA POR VIOLAÇÃO DE REGRAS DEONTOLÓGICAS- TRAÇOS
GERAIS. ......................................................................................................................... 24

4.1- Notas preliminares. ......................................................................................... 24

4.2- Roteiro geral do regime de responsabilidade. .................................................. 25

V. CONCLUSÃO ........................................................................................................28

BIBLIOGRAFIA ...........................................................................................................31

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I. INTRODUÇÃO
I. O Estado moderno procura, incessantemente, ser um Estado Democrático e de Direito. Primeiro, porque
alicerça-se na soberania popular e no respeito pelos cidadãos enquanto titulares do poder político e fim último
do Estado. Segundo, porque salvaguarda o primado da Constituição e da lei e, consequentemente, tutela e
garante o respeito pelos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos, erga omnes.

Tais premissas decorrem da formulação de Immanuel Kant, quando postula que o homem não é
objecto das normas jurídicas e do poder político, mas um fim em si mesmo, cuja suma e sacra
dignidade decorre do simples facto de existir, de ser pessoa, independentemente de quaisquer
valorações subjectivas, merecendo, portanto, a sua personalidade ser tutelada e protegida pelo Estado
por esta simples, mas magna razão1.
Esta construção, do chamado personalismo ético, corporiza hoje o princípio da dignidade da pessoa
humana, arcabouço dos ordenamentos jurídicos contemporâneos e, igualmente, esteio do Estado
angolano, oportunamente consagrado no art.1.º da Constituição da República de Angola2.
O que implica não só a afirmação da Justiça como fim do Estado, mas a sua concretização por via do
princípio da tutela jurisdicional efectiva3, numa lógica de que os cidadãos podem e devem recorrer
aos tribunais em caso de conflito entre particulares ou com o Estado, bem como diante de violações
de direitos4, não podendo os Tribunais denegar-lhes Justiça, inclusive mesmo em caso de
insuficiência normativa5.
Tal protecção não é meramente formal, visto que abarca, igualmente, um substrato material que se
traduz no direito à defesa, à justa defesa6, estatuindo mesmo o legislador constituinte a possibilidade7
de os cidadãos se fazerem sempre acompanhar e representar, perante qualquer entidade, por um
profissional cultor do Direito e conhecedor das leis, munido de eventual mandato forense, o
Advogado8.
Daí ressalta a vital importância da missão da advocacia, bem como o crucial interesse público a ela
subjacente, e a razão de esta hoje ter dignidade constitucional como instituição essencial à
administração da justiça nos termos do art. 193.º da CRA.
E porque, quanto mais nobre a empreitada, mais se exige do empreiteiro, sobre o exercício da
profissão de advogado, impendem um conjunto de deveres especiais de forum ético e moral que
devem nortear a sua actuação na busca incessante de justiça, mais do que qualquer interesse
patrimonial, sob pena de se tornar um mercenário indigno da toga9.

1
Cfr. Immanuel Kant, Fundamentação da Metafísica dos Costumes, tradução do alemão de Paulo Quintela,
Lisboa, Edições 70, 2007, págs. 76 e ss.
2
Doravante designada apenas por CRA. Sobre a essencialidade da dignidade humana no constitucionalismo
angolano vide Raul Vasques Araújo e Elisa Rangel Nunes, Constituição da República de Angola Anotada¸
edição dos autores, Luanda, 2014, pág. 181.
3
Sobre o princípio, vide José Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa
Anotada, Vol. I, 4ª edição revista e actualizada, Coimbra, Coimbra Editora, 2007, pág. 408.
4
Quer sejam subjectivos, absolutos, de personalidade ou de crédito.
5
Isto mesmo dispõe o art. 4.º do Código Civil angolano (CC), aprovado pelo Decreto-Lei nº 47344, de 25 de
Novembro de 1966, vigente, com as sucessivas alterações.
6
Como afirma José Gomes Canotilho in Estado de Direito, Colecção Cadernos democráticos, n.º 7, Fundação
Mário Soares, Lisboa, Gradiva, 1999, pág. 23.
7
Que mais do que ideal é necessária.
8
Cfr. art. 29.º n.º 2 da CRA.
9
Como adiante procuraremos demonstrar, tal construção ética, releva muito mais que a habilidade técnica e
científica.

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É assim, que o presente texto, procurando dar corpo ao imperativo regulamentar10 da elaboração de
um breve trabalho de investigação incidente sobre a chamada Ética e Deontologia profissional do
advogado, conjuga-o com a temática do exercício colectivo11 da mais nobre profissão forense, que
conta com um novo regime jurídico em Angola.
II. Desta feita, a abordagem, porque sintética, será descortinada em três partes essenciais. Num primeiro
momento, faremos uma incursão genérica à deontologia profissional do advogado, sua origem, evolução,
conteúdo e regime vigente em Angola, dedicando relativo enfoque ao dever geral de probidade como um dever
fundamental no exercício da advocacia que abarca entre si outros deveres éticos, dos quais destacaremos alguns
dos mais relevantes.

Posteriormente, seguir-se-á o estudo da panorâmica do exercício colectivo da advocacia; a sua


compreensão; o paradigma angolano bem como as modalidades existentes e, porque quid do trabalho,
as suas implicações nos princípios deontológicos da profissão.
Porque a imposição de deveres, só é efectiva, se acompanhada de um quadro sancionatório para os
potenciais prevaricadores, impõe-se a necessidade de traçarmos um breve quadro analítico, das
diversas formas de responsabilização do advogado em regime de prática profissional conjunta, bem
como da respectiva pessoa colectiva, quando violados deveres de natureza ética e deontológica.
Tarefa essa, que, porque profunda, é para já feita sem pretensões exaustivas, e que será retomada em
momento posterior, atentando mesmo às limitações formais da extensão do presente texto.
Por fim, apresentaremos sinteticamente as conclusões a que chegamos nesta parca investigação.
III. Antes de passarmos para a exposição do tema propriamente dito, impõe-nos o bom senso e a humildade
científica e profissional ressaltar que, primeiro: a presente abordagem é feita numa perspectiva teórica sem
quaisquer pretensões casuísticas concretas, não obstante as necessárias hipóteses exemplificativas. Segundo,
os homens falham e os erros acontecem, então antecipadamente desculpamo-nos pelas eventuais gralhas que
o material contenha e acolhemos com agrado as eventuais críticas a ele dirigidas.

10
Cfr. art. 5.º do Regulamento sobre estágio em vigor na Ordem dos Advogados de Angola, aprovado pelo
Conselho Nacional.
11
Entendemos nós que a designação ´´exercício conjunto´´ traduziria mais objectivamente a factualidade de
dois ou mais advogados exercerem a sua actividade profissional em conjugação de labor técnico ou mera
repartição de despesas, mas mau grado da maioria da doutrina e da lei, adoptaremos para efeitos de
uniformização semântica a expressão ´´colectivo``.

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II. DEONTOLOGIA PROFISSIONAL DO ADVOGADO

2.1- Considerações gerais.


I. A expressão ´´Deontologia`` tem na sua génese as locuções gregas deon, deontos (dever) + logos
(ciência)12, podendo etimologicamente traduzir o estudo dos deveres, numa perspectiva de antinomia
valorativa ética entre o ´´ser´´ e o ´´dever ser´´13.
Quando se aplique a uma profissão14, pode ser definida como o conjunto de normas jurídicas de
conteúdo predominantemente ético, específicas ou transversais, que regulam o exercício da
profissão15.
Esta tem como ratio, a necessidade de os profissionais, no exercício da sua função, atenderem não só
ao respeito das normas de forum técnico e científico aplicáveis, mas também deverem observar os
melhores padrões gerais de conduta moral exigíveis a qualquer indivíduo que viva em sociedade, bem
como os especiais limites éticos dele esperados para um cabal desempenho da sua função profissional.
Isto verifica-se de modo mais nítido e acentuado nas chamadas profissões liberais como a actividade
médica e a advocacia, por força do elevado pendor humanista a elas subjacente16. Visto que, de nada
adianta a perícia do obstetra que salva a vida de uma mulher depois de uma tentativa incauta de
aborto, com o fim de evitar a desonra do adultério, se ele próprio propalar tal facto em hasta pública,
pretendendo auto vangloriar-se da sua perícia e àquela acabar por cometer suicídio.
II. Do mesmo modo, é altamente censurável que a premissa constitucional da liberdade contratual
permita que o advogado renuncie ao mandato do seu constituinte17 porque a contraparte demandada
acenou-lhe com um cheque mais avantajado.
III. Assim, tais baluartes de construção ética visam garantir que o exercício das profissões mais nobres
tenha como alicerce um mínimo ético indispensável à dignidade da actividade em causa e daqueles
que a eles acorrem muitas das vezes desesperados em busca de alento.
IV. No caso particular do advogado, o seu papel enquanto ente fulcral na Administração da Justiça,
objectivado na defesa dos interesses dos cidadãos, não raras vezes os mais fracos, inclusive sem
qualquer remuneração nos primórdios, apenas movido pela ânsia honrosa por Justiça18, impõe-lhe o
respeito de inúmeros deveres, que fazem da advocacia um ´´verdadeiro sacerdócio`` de tão ´´penosas
e laboriosas´´ que são as exigências impostas19.

12
Cfr. James Strong, A concise dictionary of the words in The Hebrew Bible, New York, Abingdon Press,
1890, págs. 218 e 562.
13
Nas palavras de António Arnaut, Iniciação à Advocacia, 11ª Edição revista, Coimbra, Coimbra Editora,
2011, pág. 80.
14
Na acepção comum da palavra profissão traduz o ´´…exercício habitual de uma actividade económica como
meio de vida; ofício; ocupação…``, cfr. Dicionário da Língua portuguesa 2013, Porto, Porto Editora, 2012,
pág. 1295.
15
Orlando Guedes da Costa, Direito Profissional do Advogado, 7ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2010,
pág. 6.
16
São em regra definidas pelo seu carácter intelectual (sem natureza comercial ou industrial), pela
regulamentação do acesso, pela independência e carácter intuitu personae das relações estabelecidas com
terceiros. Cfr. Paulo Leal, Sociedades de Profissionais Liberais, na Revista de Direito e de Estudos Sociais,
Ano XXXII, n.ºs 1-2-3-4, 1990, apud Guedes da Costa, ob. cit. pág. 13.
17
Por razões de tradição decorrentes da natureza não mercantil da profissão, usaremos neste texto a expressão
´´constituinte`` ao invés de cliente.
18
Vide António Arnaut, ob. cit., pág. 19.
19
Jean de La Bruyére, Os personagens ou os costumes deste século, apud António Fernando Neto da Costa, A
Deontologia profissional no Estatuto da OAA, in Revista da OAA, II, Luanda, 1999, pág. 42.

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Tais vectores permitem, hoje, poder falar-se num verdadeiro ramo de direito objectivo autónomo: o
Direito Profissional do advogado20.
Ensina Orlando Guedes da Costa, que este consistiria no conjunto de normas que regulam o acesso e
o exercício da profissão de advogado, impondo deveres, atribuindo direitos, garantias e imunidades.21
V. Num plano geral, são comuns às profissões liberais e, especialmente exigíveis ao advogado, o dever
de uma elevada consciência moral (bondade, firmeza, prudência), a par (se não mesmo antes) da
consciência técnico-profissional da leges artis, o dever de probidade (integridade, rectidão,
honestidade e compostura) na vida pública e privada e, por último, o dever geral de urbanidade
(cortesia e educação para com todos)22.
VI. Assim, é da integral observância do rol de deveres e do exercício correcto e pleno dos seus direitos
que se consolida a dignidade do advogado e prestígio da classe23, sendo que esta transformação do
dever ser moral em dever jurídico apesar de intrínseca a natureza do advocatus, foi objecto de uma
longa e contínua construção, pelo que importa estudar sucintamente o seu desenrolar na história.

2.2- Deontologia na evolução histórica da advocacia.


I. Conforme já demonstrado, a deontologia profissional do advogado, é uma ética aplicada que deve
conformar a consciência e actuação do advogado, com verdadeira força de disciplina jurídica, porque
o seu conteúdo é hoje consagrado e garantido por lei24.
Esta remonta aos primórdios do exercício da prática forense e do Direito, tendo se acirrado com o
desenvolvimento da complexidade técnica da advocacia e a afirmação da sua importância social25.
A origem da advocacia traduz um percurso de um ofício esporádico dos homens justos, sem
verdadeira formação jurídica que, por altruísmo, ofereciam gratuitamente, a sua oratória a causa dos
indivíduos submetidos a julgamento, que depois passou a ser uma arte associada à eloquência que
servia de trampolim a carreiras políticas, até que, progressivamente, se foi profissionalizando
tornando-se hoje uma carreira técnica26.
II. Indissociável da própria evolução do Direito, enquanto ciência, esta remonta ao Período Pré-cristão,
às antigas civilizações orientais, com destaque para a Suméria, que apesar do carácter embrionário

20
Sobre tal qualificação vide Antonio Fernandez Serrano, La Abogacia en Espanã y en Mundo, Madrid, 1955,
apud Guedes da Costa, ob. cit. pág. 10.
21
Seguimos aqui de perto a conceptualização do autor in ob. cit. pág. 10.
22
Sobre os deveres gerais, vide, entre outros, António Arnaut, ob. cit. pág. 81 e ss. e António F. N. da Costa,
ob. cit. pág. 43.
23
Cfr. assertivamente afirma Neto da Costa. ob. cit. pág. 44.
24
Cfr. Vasco Grandão Ramos, Ética e deontologia profissional na Advocacia, in Revista da OAA, I, Luanda,
1998, pág. 237.
25
A abordagem do presente capítulo, como indica a epígrafe, terá como escopo especial a evolução histórica
da deontologia do Advogado e não a própria história da advocacia no geral, pelo que, sobre esta última faremos
apenas as referências indispensáveis.
26
Sobre as notas históricas da evolução da advocacia, enquanto profissão, recomenda-se em especial a clássica
obra de António Arnaut, já citada, que lhe dedica cinco interessantes capítulos nas págs. 17 e ss. Já mais
recentemente Orlando Guedes da Costa, com novos desenvolvimentos na ob. cit. nas págs. 15 e ss. Porque
incontornáveis serão fielmente seguidas neste ponto. Entre nós, vide também, o ensaio mais nacional de
Manuel António Dias da Silva, A Advocacia num mundo em Mudança, Lobito, Escolar Editora, 2014, pág. 19
e ss.

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dos seus sistemas judiciais, fortemente teocráticos, reconheciam a necessidade de um direito à
defesa27.
À medida que a tramitação processual foi vincando, surgiam também peritos, ´´especialistas`` da
prática jurídica que aconselhavam as partes, acompanhando-as também no forum, embora não
constituíssem uma verdadeira classe profissional, mas sobre os quais se impunham já algumas regras,
destacando-se a proibição no Egipto antigo de estes fazerem alegações orais sob pena de
ardilosamente influenciarem o Tribunal28.
III. Na Grécia Antiga, já o Código de Drácon e as Leis de Sólon (aproximadamente em 624 a.c. e 596
a.c.) determinavam que só os homens isentos de ´´infâmia`` e em ´´estado de pureza`` podiam
advogar, estando proibidos de fazer recurso à piedade e outros meios ilegítimos despidos de verdade
e justiça29. Exigia-se também que estes fossem homens dignos, respeitadores do sigilo profissional e
da cortesia e urbanidade30.
IV. Embebidos da experiência grega, os romanos revolucionaram os institutos jurídicos, transformando
a forma de se fazer e pensar o Direito31 , tendo a advocacia se tornado uma verdadeira profissão, com
imposição de regras de acesso, designadamente, as qualidades morais, classe social, formação
´´jurídica`` por via do chamado tirocinium fori com um patrono32.
Acentua-se a exigência do domínio técnico, por força da tendência formalista e codificadora do
Direito, numa prática forense centrada na oralidade eloquente de forte inspiração voltada a uma
defensória humanista. Surgem também as primeiras regras relativas à remuneração, que primeiro era
facultativa, numa lógica de gratificação de honra discricionária pelo beneficiário do patrocínio
forense (os honorários), e sua posterior proibição absoluta. Tendo depois, sido parcialmente
liberalizada com limites legais e proibida a quota litis.
Institucionalizou-se também o uso da toga perante os tribunais, surgindo aí as primeiras associações
de advogados que evoluíram para Colégios de classe de inscrição obrigatória33.
V. Após a queda do Império Romano verificou-se um extremo esmorecer das instituições do Direito,
primeiro no Ocidente, onde com o domínio dos ´´bárbaros`` nórdicos vincou a prática costumeira da
Justiça feudal e depois no Oriente, onde o esplendor da era justiniana foi progressivamente
influenciado pela visão teocrática do Islão. Pelo que, rareiam pontos de realce para a prática
advocatícia que quase desapareceu, exceptuando-se as lides do Direito Canónico34, de onde ressalta
o padroeiro dos advogados católicos, São Ivo35.

27
Isto mesmo se infere na interpretação do prólogo, epílogo e das normas do inovador Código de Hammurabi,
com claras referências à implementação da justiça, da prevenção da ´´opressão do fraco pelo forte``, e à
consagração do ónus da prova a cargo do lesado. Uma tradução não oficial está disponível em
http://www.mestremidia.com.br/ead/mod/resource/view.php?id=145, acedido em 19/01/2018.
28
Cfr. António Arnaut, ob. cit. pág. 18.
29
Idem, pág. 19.
30
Guedes da Costa, ob. cit. pág. 16.
31
Uma abordagem sintética e indicativa da evolução do Ius Romanum pode ser encontrada em Raúl Rodrigues
e Ana Rodrigues, Direito Romano, Lobito, Escolar Editora, 2014, pág. 17 e ss.
32
Vide António Arnaut, ob. cit. pág. 24.
33
Sobre os advocati em Roma, conferir António Santos Justo, Direito Privado Romano -I, 5ª edição, STVDIA
IVRIDICA 50, Coimbra, Coimbra Editora, 2011, pág. 285 e ss.
34
Vide Guedes da Costa, ob. cit. pág. 20 e Manuel Dias da Silva, ob. cit. pág. 33.
35
De seu nome Yves Hélory de Kermartin, 1253-1303, o ´´advogado dos pobres´´, foi um Juiz, padre, e
advogado francês, canonizado em 1347 mediante bula papal de Clemente VI. Sobre a sua vida e obra conferir
a publicação no website da OAP, disponível em
http://www.oa.pt/cd/Conteudos/Artigos/detalhe_artigo.aspx?sidc=31634&idc=8351&idsc=21852&ida=6598
0, acedido em 21/01/2018.

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VI. A partir daí a narrativa se desenrola em torno dos dois grandes sistemas jurídicos36, designadamente
o Common Law e o Romano-Germânico, tendo cada país da Europa Continental adquirido em
diferentes etapas e variedades locais, profissões jurídicas forenses37.

No que toca ao Common law, destaca-se a Inglaterra, onde a advocacia ressurge paulatinamente após
a conquista normanda em 1066. Aí, primeiro os proctors eclesiásticos, depois os narratores, e por
último os serjants e os attorneys, ascendentes directos dos actuais barrister e solicitors38, assumiram
o monopólio da defesa forense. Estas profissões foram sendo progressivamente regulamentadas, com
maior vigor no século XIX, num combate às ´´víboras`` que desprestigiavam a classe, tendo sido
fixadas regras de boas práticas éticas, bem como sanções disciplinares aos profissionais infractores39.
No Direito Inglês vigente, o regime deontológico dos advogados, está fixado em vários diplomas
estatais e estatutários com força de lei, destacando-se aqui o Legal Services Act, o Solicitors
Regulation Authority's Handbook e o Bar Standards Board Handbook, que em conjunto fixam um
paradigma de exercício liberal e independente da advocacia, com respeito pelos princípios basilares
da profissão e do seu código de conduta (confidencialidade, honestidade, perícia), regras relativas à
remuneração (admitindo-se inclusive a quota litis), o seu papel na defesa do Estado de Direito, com
especial protecção do client, numa lógica equiparada à especial protecção do Consumidor, inclusive
normas de compliance e boa governação e o consequente regime disciplinar40.
Os demais países da família Common law seguem em termos gerais o sistema inglês, pelo que,
importa realçar apenas o contexto dos Estados Unidos da América.
Ali, os attorneys at law, integram na sua maioria Sociedades de advogados (Law firms), onde as
regras de acesso e exercício da profissão são definidas pelos Estados federais e o poder disciplinar

36
Sobre os sistemas jurídicos em geral vide a magistral obra de Dário Moura Vicente, Direito Comparado,
Vol. I, 3ª Edição revista e actualizada, Coimbra, Almedina, 2014, págs. 61 e ss.
37
Um estudo interessante sobre a questão pode ser encontrado no tópico Legal profession da Encyclopædia
Britannica Online, disponível em https://www.britannica.com/topic/legal-profession, acedido em 21/01/2018.
38
Cfr. Cristhian Magnus de Marco, Evolução histórica da advocacia em perspectiva comparada: Brasil e
Inglaterra, pág. 18, disponível em https://dialnet.uniri0oja.es/descarga/articulo/4558595.pdf, acedido em
19/01/2018. A função do advogado tradicional é no sistema inglês bipartida entre estas duas figuras, cabendo
ao barrister a assistência jurídica altamente qualificada em regra perante as High Courts, enquanto que o
solicitor é o advogado do dia-a-dia, que representa as partes na prática de negócios jurídicos e junto dos Inferior
Courts, sendo os primeiros uma elite e estes últimos a maioria. Neste sentido vide Carlos Ferreira de Almeida
e Jorge Morais Carvalho, Introdução ao Direito Comparado, 3ª edição, reimpressão, Coimbra, Almedina,
2014, pág. 85.
39
Vide Cristhian M. Marco, ob. cit. pág. 20. Os solicitors são regulados e representados pela Law Society,
enquanto que para os barristers está o Bar Council, sendo que tais entidades equiparadas a Ordens profissionais
têm, igualmente, um importante papel na formação dos seus quadros detendo inclusive escolas de graduação
em Direito. Sobre estas vide o artigo ´´The Bar Council``, disponível em http://www.barcouncil.org.uk/about-
us/ acesso em 19/01/2018 e ´´The Law Society``, disponível em http://www.lawsociety.org.uk/about-us/ acesso
em 19/01/2018.
40
As versões vigentes destes diplomas podem ser encontradas online, designadamente: o Legal Services Act
de 2007, disponível em https://www.legislation.gov.uk/ukpga/2007/29/data.pdf, acesso em 19/01/2018; o Bar
Standards Board Handbook 3rd version de 11/17, disponível em
https://www.barstandardsboard.org.uk/media/1901336/bsb_handbook_version_3.1_november_2017.pdf,
acesso em 21/01/2018 e o Solicitors Regulation Authority's Handbook version 19 de 10/17, disponível em
http://www.sra.org.uk/solicitors/handbook/pdfcentre.page , acesso em 19/01/2018.

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exercido pelos Tribunais, com suporte nas normas deontológicas da American Bar Association
(ABA), designadamente o Model Rules of Professional Conduct41.
De entre outros, este postula o papel do advogado como defensor do Rule of law, a ampla admissão
da quota litis e da publicidade do serviço forense (objectiva e verdadeira), bem como regras relativas
ao sigilo profissional, conflito de interesses, protecção do client, renúncia de mandato, proibição de
relacionamento afectivo-sexual entre advogado e client posterior à celebração do contrato, habilidade
diligente na actuação, critérios indemnizatórios em caso de dano e o correspondente quadro
sancionatório.42
VII. No que toca ao sistema Romano-germânico, a França constitui o plano de maior destaque, de onde
deriva a primeira ordem profissional, o Barreau de Paris, que já no século XIII, tinha regras de acesso
e exercício da profissão.
Paradoxalmente, devido às animosidades pessoais de Napoleão contra a classe, a Ordem foi abolida
durante a revolução francesa tendo sido novamente institucionalizada em 1810, assumindo-se, de lá
para cá, como o representante da classe e detentor, do monopólio para o exercício da advocacia43.
O regime deontológico vigente tem como base o Règlement Intérieur National de la profession
d’avocat (RIN) do Conseil National Des Barreaux, que uniformizando as regras éticas dos vários
Barreaux locais postula o respeito pelos princípios essenciais da profissão e pela independência do
advogado, bem como os termos do sigilo profissional, conflito de interesses, publicidade (meramente
informativa), honra, lealdade, cortesia e actuação prudente do advogado enquanto ente essencial à
Justiça44.
As características do modelo francês são extensíveis à maioria dos países desta família jurídica,
exceptuando as devidas adaptações casuísticas45, sendo que, serve de base também a Portugal e à
generalidade dos países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)46.
VIII. A Organização das Nações Unidas tem, com suporte na Declaração Universal dos Direitos do Homem
e no Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, aprovados, os Princípios Básicos das
Nações Unidas relativas à função dos advogados que consagram que «…Os advogados, como agentes
essenciais da administração da justiça, devem manter em todos os momentos a honra e a dignidade

41
O exercício da advocacia nos E.U.A não carece de inscrição num organismo colectivo equiparado à nossa
Ordem, sendo que o vínculo com a ABA é livre e facultativo, apesar de constituir a regra, requerendo-se,
todavia, a aprovação num exame escrito (bar examination) que permite que o jurista possa ´´exercer a profissão
apenas no Estado ou Estados onde for admitido``. Cfr. Dário Moura Vicente ob. cit. pág. 309 e a página da
Encyclopædia Britannica Online já citada. No mesmo sentido vide Pascoal Barberán Molina, Manual prático
do Advogado, Lisboa, Escolar Editora, 2012, pág. 8.
42
O Model Rules of Professional Conduct da ABA foi aprovado em 1983 e tem sido objecto de sucessivas
emendas datando a última de Agosto de 2016. É aplicado em todos os Estados federados com excepção da
Califórnia, que tem um código próprio. Sobre a ABA e o seu código de conduta recomenda-se a sua webpage
disponível em
https://www.americanbar.org/groups/professional_responsibility/publications/model_rules_of_professional_
conduct.html , acedido em 22/01/2018.
43
Cfr. Manuel Dias da Silva, ob. cit. pág. 40 e Dário Moura Vicente, ob. cit. pág. 212.
44
Traços gerais sobre a advocacia em França podem ser encontrados na webpage
https://www.cnb.avocat.fr/en. A versão vigente do RIN (1/8/17) encontra-se disponível online em
https://www.cnb.avocat.fr/sites/default/files/rin_2017-03-31_consolidepublie-jo.pdf , acedido em 19/01/2018.
45
O Prof. Dário Moura Vicente, oferece as linhas gerais sobre o exercício da advocacia no sistema jurídico
romano-germânico cfr. ob. cit. pág. 212 e ss.. Igualmente, uma síntese comparativa de alguns modelos deste
sistema pode ser encontrada em Carlos Almeida, cfr. ob. cit. pág. 67.
46
Breves aproximações ao figurino português serão feitas no próximo capítulo, sendo as necessárias notas
históricas encontradas exaustivamente em António Arnaut, cfr. ob. cit. págs. 79 e ss.; bem como em Orlando
Guedes, ob. cit. págs. 203 e ss.

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da sua profissão…» devendo estes, nos termos dos princípios, proteger os direitos e interesses dos
seus clientes com lealdade, promovendo a causa da justiça, respeitando os direitos do homem e as
liberdades fundamentais reconhecidas pelo direito nacional e internacional, actuando sempre com
liberdade e diligência, em conformidade com a lei e com as normas e regras deontológicas
reconhecidas da sua profissão47.
Neste sentido vão também as normas do International Code of Ethics, adoptados em 1988, e dos
International Principles on Conduct for the Legal Profession de 2011, da International Bar
Association (IBA), que estatuem que os advogados devem manter sempre a honra e dignidade da
profissão, enunciando entre outros, a honestidade, integridade e justiça como princípios de conduta
internacionais48.

IX. No plano comunitário Europeu, o quadro deontológico incide especialmente na Carta dos princípios
fundamentais do advogado europeu e no Código de Deontologia dos advogados Europeus do Conseil
des Barreaux européens (CCBE). A primeira, enuncia a dignidade, a honra e independência no
exercício da profissão, bem como o respeito pelo Estado de Direito, confidencialidade, respeito pelo
Tribunal e colegas e razoabilidade na fixação da remuneração como princípios fundamentais. O
segundo é um verdadeiro código que desenvolve tais princípios, enumerando a honestidade,
probidade, rectidão e sinceridade como obrigações profissionais, sendo particularmente polémico por
ter introduzido um quadro de ligeira liberalização da publicidade pelos lawyers49.
X. Por último, destaca-se ainda no âmbito da região da África Austral, o acto constitutivo da Southern
African Development Community Lawyers Association (SADC LA), onde os entes representativos
dos advogados dos países da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) se obrigam
a promover a honra e integridade da profissão, velando pelos standards profissionais éticos50.
Fica assim patente que, hoje, o exercício da advocacia nos quatro cantos do globo, independentemente
da diversidade de ordenamentos e sistemas jurídicos, é indissociável das normas deontológicas que
alicerçam a profissão.

2.3- O advogado e a deontologia profissional em Angola.


2.3.1- Paradigma normativo.
I. Na deontologia profissional do advogado incluem-se todos aqueles deveres de conduta, de pendor
ético e moral, que são impostos aos advogados pela lei, usos, costumes e tradições da vida forense e
convenções entre particulares51.

47
Adoptados pelo VIII Congresso das Nações Unidas para a Prevenção do Crime e o Tratamento dos
Delinquentes, Havana, Cuba, de 1990 e com tradução disponível em https://portal.oa.pt/ordem/regras-
profissionais/legislacao-internacional/principios-basicos-das-nacoes-unidas-relativas-a-funcao-dos-
advogados/ acedido aos 22/01/2018.
48
Sobre a IBA, sua actividade e instrumentos legais, cfr. a webpage https://www.ibanet.org/ acedido aos
21/01/2018.
49
Uma versão comentada do texto vigente da Charter of Core Principles of the European Legal Profession
de 2006 e do Code of Conduct for European Lawyers de 2007 está disponível em
http://www.ccbe.eu/fileadmin/speciality_distribution/public/documents/DEONTOLOGY/DEON_CoC/EN_
DEON_CoC.pdf , acedido aos 22/01/2018.
50
Apesar de esta ser relativamente jovem, importa fazer nota negativa do facto de a Associação não ter até ao
momento um instrumento normativo, relativo aos princípios éticos fundamentais da profissão na região. Sobre
a história e actividade da SADC LA, cfr. o website http://www.sadcla.org/about-us/history-and-legal-structure,
acedido aos 22/01/2018.
51
Cfr. Vasco Grandão Ramos, ob. cit., pág. 240. Como adiante afloraremos, na prática colectiva da Advocacia,
os contratos de associação, sociedade e trabalho, são fontes particulares de regras deontológicas.

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II. Antes da chegada dos colonizadores a Angola, e mesmo durante tal período, nas comunidades
tradicionais remotas, não se encontram traços do advogado equiparado aos padrões ocidentais, em
virtude de tal paralelismo se mostrar incoerente por força das idiossincrasias próprias das culturas
africanas.
Todavia, verificava-se ali, a existência de um sistema judicial de matriz consuetudinária, com cariz
quase arbitral onde o soberano dirigia o julgamento auxiliado pelo conselho de anciãos, com um
´´profundo sentido de justiça``, tendo a igualdade como ´´regra primária do Direito bantu``52.
Na etnia ovimbundu, por exemplo, Moisés Mbambi avança um cenário em que, de entre os anciãos
que coadjuvam o soberano (soma), os olossekulu, alguns deles, os olongandji, desempenham a função
de advogado de defesa e outros de acusação, com forte recurso à sabedoria proverbial53. Parece-nos
ser legítimo inferir que só os anciãos de idoneidade moral irrepreensível são aceites pela comunidade
para assumir tal papel.
III. Já a advocacia moderna angolana, insere-se claramente no modelo romano-germânico, por força da
influência portuguesa, à qual deve as linhas gerais e principais características.
Assim, o Direito profissional do advogado em Angola tem no cume a Lei Magna, que no n.º 3 do seu
art. 193.º, delega a fixação das regras de exercício para o legislador ordinário e para os Estatutos da
Ordem dos advogados de Angola54; e este, consequentemente, para os seus regulamentos internos,
devendo, este poder regulamentar do esteio deontológico, ter como limites a obediência à
Constituição, à lei e à dignidade da pessoa humana nos termos do n.º 3 do art. 49.º da CRA.
No plano infraconstitucional destacam-se a Lei n.º 8/17, de 13 de Março - Lei da Advocacia, a Lei
n.º 16/16, de 30 de Setembro - Lei das Sociedades e Associações de Advogados 55, a Lei n.º 2/15, de
2 de Fevereiro - Lei Orgânica Sobre a Organização e Funcionamento dos Tribunais da Jurisdição
Comum e por último, sendo certamente como veremos o mais relevante, o Decreto n.º 28/96, de 13
de Setembro que aprova o Estatuto da Ordem dos advogados, com as alterações introduzidas pelo
Decreto n.º 56/05, de 13 de Maio56.
A primeira, determina o regime geral do exercício da advocacia em Angola nas suas diversas formas,
a definição dos actos próprios dos advogados, bem como as sanções decorrentes do exercício ilegal
da advocacia, relegando para o Estatuto e normas internas, a definição do conjunto de deveres éticos
e deontológicos.
IV. Esta opção de técnica legislativa, já verificada na revogada Lei n.º 1/95, de 6 de Janeiro – Lei da
advocacia, difere do postulado na primeira Lei da advocacia da Angola independente, a Lei n.º 9/82,
de 18 de Fevereiro, que apesar do espírito socialista da época, já reconhecia a importância da profissão
que devia (pelos menos em tese) ser exercida com independência e dignidade apesar de estatizada,

52
Uma pesquisa interessante do tema pode ser encontrada na obra do Padre Raúl Ruiz de Asuã Altuna, Cultura
Tradicional Banto, Luanda, 1993 apud Marcolino Moco, Estudos jurídicos Vol. I, Luanda, Caxinde Editora,
2008, pág. 141.
53
Cfr. Moisés Mbambi, O Direito Proverbial Entre Os Ovimbundu, in Jornal de Angola de 14 de Janeiro de
1990 e ainda Alain Souto Rémy, As ´´autoridades tradicionais`` angolanas, in Revista do Direito de Língua
Portuguesa, n.º 4, Lisboa, IDILP, 2014, pág. 15. Igualmente, um profundo ensaio do papel do Poder tradicional
na perspectiva política e administrativa tem a caneta de Carlos Feijó na obra A Coexistência Normativa Entre
o Estado e as Autoridades Tradicionais na Ordem Jurídica Plural Angolana, Coimbra, Almedina, 2012, págs.
255 e ss.. Entretanto, urge a necessidade dos estudiosos do Direito angolano, realizarem pesquisas e estudos
no sentido de desflorar e trazer a público, a riqueza e amplitude do papel das normas consuetudinárias e
respectivo Poder tradicional, na resolução de litígios.
54
Doravante designada apenas por Ordem ou pela sigla OAA.
55
Sobre esta teremos oportunidade de reflectir, no ponto 2 do capítulo seguinte.
56
Adiante referenciados pela siglas LA, LSAA, LOFTJC e EOA, respectivamente.

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consagrando em pormenor uma panóplia de direitos, deveres e garantias dos advogados, que
teoricamente não ficava em nada a dever ao figurino moderno.
V. Já a citada Lei n.º 2/15, cujo objecto é a definição da estrutura orgânica da função jurisdicional
comum, dedica o seu Capítulo XI aos advogados e defensores públicos, onde na esteira da CRA,
reconhece a essencialidade destes para o exercício da Administração da Justiça. Consagra que perante
os Tribunais, os advogados subordinam-se, exclusivamente, a critérios de legalidade e aos desígnios
deontológicos da profissão, devendo o poder judicial respeitar e tutelar os direitos, deveres, garantias
e privilégios definidos na lei e no EOA57.
VI. O EOA, por sua vez, é no plano legal, o prumo da Deontologia profissional do advogado em Angola,
estipulando no seu Capítulo V, o regime jurídico dos direitos e deveres de natureza ética e
deontológica, assumindo-se, na esteira do seu congénere português, um verdadeiro Estatuto do
advogado e não apenas da pessoa colectiva OAA58. Acresça-se que a sua interpretação deve ser feita
em consonância com a Lei n.º 3/12, de 13 de Janeiro - Lei de Bases das Associações Públicas, que
fixa o quadro geral de funcionamento das Ordens profissionais59.
Assim, o Estatuto, complementado pelo Código de Ética e Deontologia da OAA (ambos a carecerem
de urgente revisão e aprimoramento60), verdadeiras fontes de Direito61, agrupam os deveres em cinco
espécies, nomeadamente: deveres para com a comunidade; deveres para com a Ordem; deveres para
com o cliente; deveres recíprocos dos advogados e deveres para com os julgadores.
De entre os vários deveres elencados, ressalta o dever geral de probidade, que consideramos ser um
dos deveres deontológicos fundamentais do advogado em Angola62.
Como referenciado anteriormente, reza a história, que a advocacia, enquanto actividade intelectual
humana, resulta do espírito altruísta de homens eruditos, rectos, honestos e idóneos que quiseram
emprestar a sua eloquência a causa dos homens submetidos a julgamento, para que imperasse a
justiça.
É nesta senda que o art. 60.º do EOA estatui no seu n.º 1 que ´´O advogado deve, no exercício da
profissão e fora dela, considerar-se um servidor da justiça e do Direito e, como tal, mostrar-se digno
da honra e das responsabilidades que lhe são inerentes``.

57
Cfr. arts. 86.º e ss. da LOFTJC.
58
Vide em concreto o Título III do Estatuto da Ordem dos Advogados de Portugal (adiante designado pela
sigla EOAP), arts. 88.º e ss. na sua versão vigente aprovada pela Lei n.º 145/2015, de 9 de Setembro, disponível
em https://portal.oa.pt/ordem/regras-profissionais/estatuto-da-ordem-dos-advogados/, acedido aos 2/02/18.
59
Vide a al. h) do n.º 1 do art. 13 e art. 94.º da referida lei. Esta foi parcialmente revogada pelo Acórdão
314/2013 do Tribunal Constitucional, em virtude de algumas das suas normas ferirem o desiderato
constitucional da auto-regulação do exercício de profissões liberais e da independência administrativa e
funcional das Ordens profissionais perante ao Poder executivo.
60
Doravante designado pela sigla CEDP, foi aprovado em Assembleia Geral de Advogados nos dias 20 e 21
de Novembro de 2003. Na verdade, tal código parece corresponder a uma transcrição dos art. 60.º e ss. do
EOA, cujo preâmbulo é um empréstimo do Código de Deontologia dos Advogados Europeus, sendo que, salvo
melhor entendimento, pensamos que com os manifestos erros de formulação legiferante de que enferma
(assemelhando-se em muitos artigos a um manual e não a um texto normativo), era dispensável pois não
reflecte a dignidade de um Código aprovado em Assembleia Geral.
61
É entendimento, da doutrina dominante, que as normas emanadas pelos órgãos das Ordens profissionais, são
verdadeiras fontes imediatas de Direito e não meras soft laws, isto por força de uma interpretação actualista
que se impõe ao n.º 2 do art. 1.º do Código Civil. Por todos, cfr. Miguel Teixeira de Sousa, Introdução ao
Direito, reimpressão da edição de 2012, Coimbra, Almedina, 2017, pág. 150. Em sentido diverso, defendendo
uma interpretação ab-rogante de tal preceito vide a posição de José Lamego, Elementos de metodologia
jurídica, Coimbra, Almedina, 2016, pág. 20.
62
O sublinhado é nosso.

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Esta norma, enuncia uma cláusula geral ético-deontológica de onde derivam os deveres deontológicos
específicos do advogado em Angola, designada, pela doutrina, de dever geral de probidade ou de
integridade63.
Nela se enquadra a exigência de o advogado agir sempre com probidade, honestidade, integridade,
rectidão e lealdade tanto no exercício da profissão como na sua vida privada, fazendo jus à sua posição
de reserva moral da sociedade.
Neste sentido vai o excelso António Arnaut que entende que por força da função ético-social da
advocacia, se exige do advogado um ´´comportamento moral irrepreensível`` dentro e fora da
profissão, devendo ´´tal como a mulher de César, não apenas ser honesto, mas, parecê-lo``64.
Pensamos que tal extensão para o forum não profissional, não contrasta com o direito fundamental à
intimidade do advogado enquanto cidadão, salvaguardado pelo art. 32.º da CRA, nem com o direito
de personalidade da reserva sobre a intimidade da vida privada, consagrado no art. 80.º do CC, visto
que no caso estão em causa as condutas privadas do advogado (e não apenas do cidadão que é
advogado) publicamente escandalosas, desonrosas para quem as pratique, com repercussão na
profissão, afectando a sua dignidade profissional e lesando o bom nome da classe65.

Deste modo, a título de exemplo, a actuação do advogado que dolosamente se recusa a prestar
alimentos aos seus filhos, que se apresente ébrio às audiências judiciais, que se aproveite da
ignorância de familiares para benefício próprio em processo de partilha sucessória, arrogando-se por
hipótese em todos os casos ´´Sr. advogado, profissional liberal e intocável``, não obstante a eventual
subsunção de índole cível e/ou penal, é também matéria de índole deontológica, enquadrável na
cláusula geral de probidade, porque contrasta com a tutela do prestígio da profissão e desconforme à
responsabilidade social do causidicus.

A contraposição deste dever geral, ao interesse público subjacente à profissão, está na base da
imposição da generalidade dos deveres deontológicos específicos em vigor na OAA, resultantes do
regime combinado dos arts. 60.º à 73.º, 54.º do EOA e à plenitude do CEDP, designadamente:
independência; isenção; lealdade; zelo e diligência técnica; obediência à lei e não litigância de má fé;
sigilo profissional; não discussão pública de questões profissionais; proibição de publicitação
mercantil dos serviços forenses; urbanidade e correcção; trajo profissional; proibição da quota litis; e
dever de solidariedade entre colegas.

A análise pormenorizada destes deveres, tem sido matéria de abordagem da maioria dos trabalhos
desta natureza, elaborados pelos ilustres colegas advogados estagiários, pelo que, não sendo objecto
deste trabalho, não procederemos a um estudo analítico dos mesmos.

VII. Importa ainda fazer menção, ao facto de que a Lei n.º 34/11, de 12 de Dezembro - Lei de Combate
ao Branqueamento de Capitais e Financiamento do Terrorismo, impõe também obrigações especiais
aos advogados.

Destacam-se a obrigação de identificação correcta e cabal dos seus constituintes e a obrigação de


comunicação. Nesta última, introduz-se um figurino preocupante, mas comum no mundo moderno,
em que nos termos da lei, devem os advogados oficiosamente informar a Unidade de Informação

63
Nesse sentido vide António Arnaut, ob. cit. pág. 92; Manuel Dias da Silva, ob. cit. pág. 108 e ainda Orlando
Costa, ob. cit. pág. 13.
64
Cfr. António Arnaut, Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado, 14.ª Edição, Coimbra, Coimbra Editora,
2012, pág. 91.
65
Assim, também entende Orlando Guedes da Costa, ob. cit. pág. 11.

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Financeira, sobre as transacções em que intervenham (e respectivos detalhes), sempre que o montante
envolvido seja superior ao equivalente a USD 15.000,0066.

Abaixo deste valor, estes podem ´´de boa fé`` fazê-lo facultativamente, sempre que identifiquem
indícios de crimes de branqueamento, ficando isentados de qualquer responsabilidade civil, penal e
disciplinar67. Em qualquer dos casos, tais informações não podem ser obtidas durante a prática de
actos tradicionalmente caracterizadores e exclusivos da profissão. Apesar da lei, claramente,
transformar o advogado num ´´delator`` dos seus constituintes, o Tribunal Constitucional declarou-a
conforme à Constituição não entendendo que esta feria as garantias constitucionais de exercício da
advocacia68.

Definido que está, o plano legal das fontes da deontologia do advogado em Angola, interessa agora
olhar para o segundo vector desta abordagem, o modelo adoptado de exercício colectivo desta
profissão forense.

66
Vide o seu art. 13.º n.º 2.
67
Idem, n.º 1 e art. 18.º da mesma lei.
68
É o que se infere da leitura conjugada da al. g) do n.º 2 do art. 3.º e do art. 30.º. O argumento aduzido pelo
Tribunal no Acórdão n.º 330/2014 foi justamente o de a obrigação de comunicação imposta pela aludida lei,
incidir apenas sobre as situações da referida al. g) (v.g. na compra de imóveis, participações sociais e
estabelecimentos, constituição e gestão de sociedades) não se estendendo ao rol de actos próprios, actos do
advogado como a consulta jurídica e representação forense. Apesar de questionável, tal entendimento não é de
todo infundado, se tivermos em conta que os recentes casos de leaks mediáticos de documentos, Panama e
Paradise papers, demonstram que aqueles serviços não forenses são usados para auxílio de crimes de
branqueamento, cujo centro nevrálgico são Escritórios de Advogados.

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III. O EXERCÍCIO COLECTIVO DA ADVOCACIA
3.1- Generalidades
I. A natureza liberal do exercício da advocacia, e a consequente independência exigida ao profissional
forense acabou, naturalmente, fazendo com que a profissão fosse exercida de modo autónomo e
muitas das vezes até solitário. Todavia, tal paradigma foi progressivamente se alterando por razões
técnicas e económicas.
II. A evolução da ciência jurídica, levou a que os advogados tivessem de adaptar-se a novas exigências,
no exercício da sua actividade. Isto porque, a manifesta e cada vez maior complexidade dos vários
ramos especiais de Direito, associada à multiplicidade de diplomas legislativos, deu lugar a um
quadro de especialização dos advogados, tendencialmente integrados em equipas polivalentes, hábeis
de dar resposta às demandas do constituinte do mundo globalizado característico das economias de
mercado do século XXI69.
III. No plano económico, por força do aumento do custo de vida das cidades e, consequentemente, dos
factores de produção (v.g. imóvel, pessoal e material administrativos, impostos, telecomunicações,
transportes), da necessidade de os advogados mais prestigiados poderem manter consigo e atender,
de facto, uma vasta gama de constituintes singulares e institucionais, afigurou-se financeiramente
mais rentável que os advogados labutassem em grupos.
Tais entidades são assim sociedades civis ou comerciais resultantes da celebração de um contrato
destinado a constituir uma pessoa colectiva com personalidade jurídica própria, cujo objecto social é
a actividade económica de prestação de serviços jurídicos próprios da advocacia, com vista a obtenção
de lucro e respectiva repartição pelos sócios, entrando estes com obrigações de indústria e capital70.
Com ou sem responsabilidade limitada, e constituídas por várias categorias de membros (sócios,
associados, estagiários e paralegals) agrupados em departamentos especializados por serviço (v.g.
acessória extrajudicial, litígios judiciais) e/ou áreas de actuação (v.g. direito bancário, valores
mobiliários, fiscal, propriedade intelectual, família, penal), as sociedades de advogados subordinam-
se às mesmas regras impostas aos advogados, devendo muitas das vezes estar registadas na entidade
reguladora do exercício da actividade profissional.
Este modelo, tradicional no mundo anglo-saxónico com a predominância das law firms¸ constituídas
por até milhares de sócios, foi gradualmente afirmando-se no sistema romano-germânico. Este tende
a densificar-se, quanto maior for a cultura jurídica e democrática das populações e o consequente
reconhecimento da utilidade do advogado.
IV. Hoje, estas sociedades existem na generalidade dos países, com realce para as grandes sociedades de
advogados, que intervêm nas maiores transacções comerciais e financeiras, no quadrante societário e
em avultados contratos com o Estado.
O seu figurino estrutural, orgânico e as devidas peculiaridades, vão variando em cada ordenamento,
admitindo-se em alguns a criação de sociedades multidisciplinares integradas também por outros
profissionais liberais71 e proliferando-se a sua subordinação às normas de compliance e boa
governação.

69
Como dizia o saudoso Arnaut, o ´´advogado artesão`` e generalista, que se basta, munido apenas dos seus
Códigos Civil e Penal, bem como dos respectivos Códigos de Processo, está claramente a desaparecer, in
Iniciação à advocacia, pág. 45.
70
Em regra, são civis, havendo países onde se admite a forma comercial, como a Holanda. Sendo na
generalidade dos sistemas, exclusivamente integradas por advogados, tendo quase sempre a advocacia como
objecto social único.
71
Sobre as sociedades multidisciplinares vide as notas de Pascual Barberán Molina, ob. cit., pág. 12.

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3.2- A Realidade Angolana
3.2.1- Regime Legal
I. Estatui a LA que a prática da actividade forense advocatícia em Angola, pode ser desenvolvida em
Escritórios singulares ou colectivos72. Se no primeiro caso está em voga o advogado que exerce a sua
actividade isolado, no segundo, a lei admite a possibilidade de os advogados se organizarem em
Sociedades ou Associações. Tal postulado já se encontrava genericamente previsto no regime
transitório do art. 1.º do Instrutivo sobre publicidade73.
II. O quadro legal do exercício colectivo da advocacia é decalcado do regime conjugado dos art. 109.º
do EOA e art. 8.º da LA que remetem a disciplina da matéria, para a LSAA, cujo objecto nos termos
do seu preâmbulo é a ´´fixação de pressupostos para disciplina do exercício da advocacia sob a
forma societária ou associativa, bem como fixar as atribuições, o quadro organizacional e funcional
das sociedades e associações de advogados``.
Assim, é da LSAA que resulta o regime jurídico aplicável às formas de constituição, modificação,
extinção, organização e funcionamento das sociedades e associações de advogados, bem como o
regime de responsabilização pelos actos dos seus representantes e agentes74. Esta é complementada
pela disciplina do Regulamento da OAA, sobre o Registo das Sociedades e Associações de advogados
de 17 de Novembro de 2016.
Diga-se de passagem, que a aludida lei tem a peculiaridade de fugir do habitual copy paste legislativo
das normas portuguesas, na medida em que o seu figurino é ligeiramente inovador, no tocante às
Associações e Sociedades Unipessoais de advogados (inexistentes em Portugal). Todavia, poderia ter
se servido de algumas valências das mais recentes evoluções do regime das Sociedades de advogados
em Portugal e no mundo (v.g. regras de transparência na gestão, boa governação, depósito de contas
na Ordem, admissibilidade de um dos gestores não ser advogado)75.
III. Demarcado, genericamente, o suporte legal, faremos em seguida uma análise sintética sobre os
principais traços caracterizadores das duas formas de exercício colectivo da advocacia em Angola.
3.2.2- As Sociedades de advogados
I. No Direito Angolano, as sociedades de advogados são definidas como ´´sociedades civis constituídas
por um ou mais advogados e têm por objecto social o exercício a título societário da profissão de
advogado, com o fim de gerar lucros, a serem repartidos entre os sócios``, cuja firma é identificada
pelo aditamento Sociedade de advogados acrescido da indicação do regime de responsabilidade76.
Estas configuram uma modalidade típica especial em relação ao regime geral das sociedades civis
puras do 980.º CC, criadas e reguladas pela já citada LSAA77. Uni ou pluri-pessoais, estas impõem
que todos os sócios sejam sempre de indústria, só podendo estes ser advogados, com inscrição em

72
Assim dispõe o seu art. 8.º; ao contrário do sentido da linguagem corrente, o escritório não é uma potencial
pessoa colectiva, mas sim o local onde o advogado exerce a sua actividade e tem domicílio profissional, é o
estabelecimento do advogado, da sociedade ou da associação de advogados.
73
O sublinhado é nosso. Diploma aprovado pelo Conselho Nacional da OAA, aos 21 de Maio de 1999, cujo
conteúdo dos arts. 2.º e ss., entendemos estar derrogado pelo CEDPOAA. Já o art. 1.º está claramente
suplantado pelo regime da LSAA.
74
Art. 1.º e 4.º da LSAA.
75
A disciplina das Sociedades de advogados portuguesas era objecto de regulamentação avulsa pelo Decreto-
Lei n.º 229/2004, de 10 de Dezembro que fixava o Regime Jurídico das Sociedades de Advogados, sendo hoje
parte integrante da já citada versão vigente do EOAP (vide nota n.º 57), nomeadamente no Capítulo VI do seu
Título VI, arts. 213.º e ss., cuja interpretação deve ser subsidiada pela Lei n.º 53/2015, de 11 de Junho – Lei
Quadro das Sociedades de Profissionais e pela Lei n.º 2/2013, de 10 de Janeiro – Lei Quadro das Associações
Públicas Profissionais.
76
Cfr. arts. 5.º e 10.º da LSAA.
77
Como afirma António Menezes Cordeiro, Direito das Sociedades, II, Coimbra, Almedina, 2011, pág. 37.

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vigor na OAA, devendo tendencialmente concentrar o exercício da sua actividade na sociedade não
podendo nunca participar na estrutura de outras congéneres78.
O seu objecto social é única e exclusivamente o exercício da actividade de prestação serviços jurídicos
próprios da advocacia, nomeadamente os enunciados nos art. 4.º e 20.º e da LA. Estas detêm o
monopólio da prestação destes serviços por sociedades, não sendo admitidas no nosso ordenamento
jurídico, sociedades multidisciplinares, nem sociedades sob a forma ou tipo comercial com tal
objecto79.
II. Ao contrário das sociedades civis puras, cuja personalidade jurídica é discutível, o art. 8.º da LSAA
atribui expressamente às Sociedades de advogados, o estatuto pleno de pessoas colectivas, por via de
reconhecimento normativo condicionado, emergente do registo do contrato de sociedade na OAA80.
Em função disto, respondem civilmente pelo cumprimento das suas obrigações, podendo tal
responsabilidade ser comunicável aos sócios ou limitada ao património social em função do regime
adoptado no contrato de sociedade81.
Do enunciado normativo da LSAA, evidencia-se que nestas podem em regra existir várias categorias
de advogados: os sócios; os associados; os estagiários e para além destes visualizamos os paralegals
e consultores jurídicos.
III. Os sócios são os advogados subscritores do contrato de sociedade, que se obrigam a exercer em
conjunto a advocacia, repartindo os proveitos da actividade. Estes só podem exercer a profissão fora
da sociedade quando autorizados pelos Estatutos Sociais ou acordo parassocial. A LSAA evidencia
bem a natureza intuitu personae do mandato forense na medida em que os poderes de representação
são conferidos ao(s) advogado(s) sócio(s) e nunca à sociedade, sendo ipso facto extensíveis aos
demais sócios, salvo oposição expressa do mandante82. O que não afasta, contudo, a possibilidade de
os contratos de simples prestação de serviços, assessoria jurídica e consultas serem celebrados com a
própria Sociedade.
IV. Já os associados, são advogados que não são sócios, mas que exercem igualmente advocacia na
Sociedade. A LSAA, não faz qualquer menção à natureza do vínculo entre o associado e a sociedade,
pelo que só avaliando em concreto o estabelecido pelo contrato firmado entre as partes e pelo contrato
de sociedade, se pode esclarecer a questão.
O Direito profissional do advogado no Brasil, por exemplo, dispõe claramente que o associado não
tem vínculo laboral com a Sociedade, sendo a sua ligação com esta, fixada nos termos de um contrato
de associação onde aquele se obriga a prestar serviços de advocacia à sociedade, no horário, escritório,
com meios e pessoal desta, visando a execução das tarefas que lhe são atribuídas pela Sociedade, no
interesse dos clientes desta, mediante remuneração correspondente a uma percentagem dos
honorários recebidos pela sociedade nos processos onde intervenha, gozando da necessária
independência e liberdade de actuação83.

78
Art. 9.º da LSAA.
79
Conforme resulta do regime combinado do art. 21.º da LA e arts. 2.º e 12.º da LSAA.
80
Luís Menezes Leitão apresenta uma súmula das discussões doutrinais sobre a personalidade jurídica das
sociedades civis puras in Direito das Obrigações, Vol. III, Coimbra, Almedina, 2014, pág. 237.
81
Vide n.º 1 do art. 4.º e 22.º, todos da LSAA.
82
Nos termos do seu art. 9.º.
83
Algo que na lei angolana, se assemelha a um contrato comercial de conta em participação. Consultar arts.
15.º a 17.º do Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil aprovado pela Lei n.º 8.906, de 04
de Julho de 1994 e os arts. 37.º a 43.º do seu Regulamento Geral aprovado pelo Conselho Federal da Ordem
aos 6 de Novembro de 1994. Ambos foram objecto de várias alterações, estando as suas versões vigentes
disponíveis em http://www.oab.org.br/publicacoes/download?LivroId=0000002837 , acedido aos 21/01/2018.

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O Direito português que serve de lamparina à prática forense angolana e ao espírito da LSAA, tem
entendido que a natureza da relação do associado é uma questão de qualificação 84. Sendo que se
estiverem preenchidos os traços indiciadores do contrato de trabalho, terá o vínculo natureza laboral,
embora com as ressalvas impostas pela independência necessária e intrínseca à profissão do
advogado85. Posição essa que perfilhamos e que é sufragada pela nossa realidade objectiva.
Visto que, na maioria dos grandes escritórios de advogados em Angola, os associados
(frequentemente escalonados em seniores e juniores) labutam em regra exclusivamente para a
sociedade, em horário e processos atribuídos pelos sócios, com remuneração mensal fixa e eventual
sucess fee, subordinação técnica (na condução dos processos, cuja revisão final cabe aos sócios) e
jurídica (exercício do poder disciplinar e regulamentar), controlo de assiduidade, gozo de férias e com
menos frequência: licenças; pagamento dos subsídios de natal; férias e prestações familiares bem
como a devida retenção da contribuição para a segurança social86.
Assim, exercendo a sua função com as garantias do dispositivo do art. 24.º da LA e do art. 43.º do
EOA, este é um verdadeiro advogado de empresa, cujos direitos, deveres e termos de progressão de
carreira, devem estar previstos no contrato de trabalho e no de sociedade ou aprovadas pela
Assembleia de Sócios, culminando na sua admissão a sócio. Tal entendimento parece-nos, igualmente
plausível à luz do Direito do Trabalho, já que a Sociedade de advogados, o respectivo escritório e
advogado se enquadram genericamente nos conceitos legais de Empregador, Empresa e Trabalhador,
respectivamente87.
Não obstante isto, entendemos que tal relação laboral tem particularidades muito próprias, pelo que
devia ser objecto de regulamentação especial, sob pena de os defensores da lei, ficarem numa posição
de forte precariedade e latente violação dos seus direitos económicos e sociais constitucionalmente
consagrados. O que para além de caricato, é bizarro, visto que se o mesmo acontecesse com qualquer
outro indivíduo, é justamente ao advogado que se havia de recorrer para se procurar emendar a
situação.
V. Igual solução aplica-se ao advogado estagiário, que será considerado trabalhador em função do
vínculo firmado com a Sociedade, subordinando-se também ao seu patrono (à partida um dos sócios)
nos termos do EOA e do REOAA.
VI. Para além dos advogados, as Sociedades de advogados angolanas integram também os paralegais e os
consultores.
Os primeiros, são trabalhadores assalariados, em regra juristas em formação, que desempenham
funções de auxiliar de escritório, entre outras, preparando dossiers, fazendo pesquisa e organização

84
Cfr. Luís André Azevedo Dias Branco Lopes, A Face Oculta do Vínculo Laboral na Advocacia, Dissertação
de Mestrado em Direito, Universidade Católica Portuguesa, Porto, 2012, pág. 27, disponível em
https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/16858/1/%27A%20Face%20oculta%20do%20V%C3%ADncul
o%20Laboral%20na%20Advocacia%27%20-% 20Luis%20Branco%20Lopes%2C%20Universidade%20
Cat%C3%B3lica%20do%20Porto%2C%20Faculdade%20de%20Direito%2C%202012%2C%20Disserta%C
3%A7%C3%A3o%20de%20Mestrado.pdf , acedido aos 13/02/2018.
85
Recentemente, a OAP fez saber que elaborou e remeteu ao Parlamento e Governo portugueses, um
anteprojecto de regulamento da relação entre Associados e Sociedades de Advogados, de modo a aclarar as
eventuais ´´zonas cinzentas`` desta relação cfr. comunicado publicado em
https://portal.oa.pt/comunicacao/imprensa/2018/02/22/relacao-entre-associados-e-sociedades-vai-ter-
regulamento/ , acesso aos 23/02/2018. Nuno Gonçalo Poças in Advogados e proletários? Como resolver este
problema? faz uma abordagem interessante sobre a dramática precariedade da situação dos associados; artigo
que pode ser encontrado em http://observador.pt/especiais/advogados-e-proletarios-como-resolver-este-
problema/ , acesso aos 06/03/2018.
86
Sobre os factos indiciadores da relação laboral, vide Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, Direito do
Trabalho de Angola, 3.ª Edição, Coimbra, Almedina, 2014, pág. 64.
87
Assim resulta dos n.ºs 13, 14 e 27 do art. 3.º da Lei n.º 7/15, de 15 de Junho - Lei Geral do Trabalho (LGT).

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de factos, dados ou leis e dactilografando documentos, em suma trabalho manual (não científico, mas
que pressupõe conhecimentos jurídicos básicos) preparatório do labor técnico específico dos
advogados88.
VII. Os consultores, por sua vez, são profissionais altamente qualificados, das mais diversas áreas do saber
(apesar de a maioria ser jurista) em regra docentes universitários, jurisconsultos, investigadores,
antigos titulares de cargos políticos ou empresariais, a quem a Sociedade recorre para obter pareceres
técnicos sobre questões ou processos concretos, proferidos com a devida autonomia89.
Sendo que, todos estes sujeitos, integrantes e ao serviço da Sociedade de advogados, estão
subordinados às obrigações deontológicas do EOA, aplicando-se o mesmo ao staff administrativo90.
VIII. Por último, destaca-se o facto de a LSAA, impor a obrigatoriedade de as sociedades contratarem
seguro de responsabilidade civil que cobre os riscos inerentes aos eventuais danos derivados de actos
profissionais dos sócios, associados, estagiários e demais agentes ao seu serviço91.
IX. Em suma, as Sociedades de advogados Angolanas podem ser escrutinadas nos princípios da liberdade
contratual, da natureza não mercantil, da institucionalização e da responsabilidade. Isto porque, a lei
deixa uma larga margem de regulação pelo contrato de sociedade e consequente vontade dos sócios,
afasta de todo a natureza comercial das mesmas, remetendo-as subsidiariamente para o Código Civil,
reconhece o seu incontornável papel e atribui-lhes personalidade jurídica, que desemboca na sua
responsabilização pelos actos de todos os seus agentes.

3.2.3- As Associações de advogados


I. A LSAA apresenta como novidade, a concretização normativa do regime das Associações de
advogados92, caracterizadas por uma matriz identitária decalcada dos Colectivos de advogados da
época monopartidária e esboçada já pela anterior Lei da Advocacia93.
Independentemente do quadro legal, já eram uma realidade bem patente no panorama forense
nacional. Sendo frequente os jovens advogados, que terminam o estágio, associarem-se por forma a
trabalharem num espaço comum, com autonomia uns dos outros, mas partilhando experiências e
conhecimentos.
Esta opção, em regra, deve-se essencialmente ao facto de que individualmente ainda não têm créditos
de mercado suficientemente firmados para sustentar uma carreia totalmente a solo, nem clientela fixa,

88
Em Moçambique, a lei admite que os chamados assistentes jurídicos, possam litigar em causas de baixo
valor ou em crimes cuja moldura penal abstracta seja inferior à um ano de prisão. Cfr. art. 154.º do Estatuto da
Ordem dos Advogados de Moçambique, aprovado pela Lei n.º 28/2009, de 29 de Setembro disponível em
http://www.oam.org.mz/wp-content/Docs/1-Estatuto/Estatuto-da-Ordem-de-Advogados-de-Mocambique-
actual.pdf , acesso aos 12/03/2018.
89
EOA avança já, em termos genéricos o quadro destes (n.º 4 do art. 41.º), olhando em concreto para os
professores de Direito, não se podendo todavia interpretar este preceito em termos literais, já que a prática
demonstra a elaboração de pareres com conteúdo estritamente jurídico por outros profissionais, a título de
exemplo basta olhar para a ténue fronteira entre a Fiscalidade (disciplina económica a cargo de contabilistas)
e o Direito Fiscal.
90
Num contexto diferente, mas igualmente assertivo, Hermenegildo Cachimbombo faz reflexões pertinentes
sobre os contornos da deontologia num mundo globalizado que demanda Escritórios de Advogados
multifacetados in, O futuro da profissão jurídica: evolução do estatuto do Advogado e novos desafios que se
advinham, intervenção no III Congresso da União dos Advogados de Língua Portuguesa, publicada na Gazeta
do Advogado da OAA n.º 24, Luanda, OAA, 2014, pág.16.
91
Cfr. art. 25.º da LSAA, e o correspondente Regulamento sobre a matéria fixado por Despacho do Bastonário
da OAA aos 16 de Novembro de 2016.
92
Doravante também designadas pela sigla AA.
93
Como se depreende do artigo 3.º da revogada Lei n.º 1/95, Lei da Advocacia.

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e, portanto, precisam de repartir custos, sem, entretanto, fundir a sua actividade profissional, actuando
cada um nos seus próprios processos, não obstante a natural interacção técnica que também precisam
para a sua maturidade profissional. Podendo verificar-se igualmente, casos de advogados ´´seniores``
que não pretendem estar num escritório sozinhos, mas não prescindem da sua independência e
autonomia.
II. As Associações de Advogados constituem assim, entidades associativas privadas de regime especial,
compostas por dois ou mais advogados, que têm por objecto a criação, potenciação e facilitação de
condições de trabalho para a prestação individual de serviços jurídicos próprios da advocacia por cada
um dos membros, com o fito de proporcionar a estes, inputs e meios comuns para exercício da sua
actividade num ambiente de partilha técnica, material e sustentabilidade financeira94.
Estas, são tendencialmente compostas por advogados dedicados à especialidades ou ´´clientelas``
diversas, actuando, portanto, em nichos de mercado diferentes podendo, assim, coabitar
pacificamente de modo autónomo, sem representarem no entanto concorrência uns para os outros.
Por força das suas particularidades, afigura-se manifesto o desajustamento destas, com o regime geral
das Associações privadas95, tendo o legislador angolano procurado no fundo positivar um cenário que
já era visualizado no quotidiano, na tentativa de assegurar algum resguardo aos contornos dessa
relação, tendo, em nosso entender, adoptado algumas soluções questionáveis que as acabam tornando,
forçosa e infelizmente, num modelo transitório entre a prática individual e a Sociedade de advogados,
com poucas vantagens jurídicas concretas.
A primeira dessas opções, prende-se com o facto de a LSAA, expressamente, negar a atribuição de
personalidade jurídica a estas Associações, não sendo para os devidos efeitos consideradas pessoas
colectivas96.
Se tal posição se justificasse pelo facto de a actividade ser exercida individualmente pelos membros
e serem estes que devem responder pessoalmente pelos seus actos97, ela perde de vista o facto de que
a própria natureza das AA, implica que sejam celebrados contratos e praticados actos que dão lugar
à aquisição de bens próprios da Associação, bem como direitos e obrigações que não emerjam de
relações estritamente forenses, mas que dizem respeito a bens e serviços consumidos em interesse
comum.
Assim, os contratos dos trabalhadores administrativos, a electricidade, a água potável, a renda ou o
imposto predial do imóvel não deveriam ser imputados aos membros, mas à própria associação, já
que são os seus órgãos que gerem tais situações e recebem quotas dos membros para o efeito. Em
nosso entender, uma solução razoável, seria eventualmente configurar uma responsabilidade

94
Na esteira da classificação doutrinal dominante, afiguram-se verdadeiras corporações de fim interessado,
económico, mas não lucrativo. De entre outros vide Pedro Pais de Vasconcelos, Teoria Geral do Direito Civil,
8ª edição, Coimbra, Almedina, 2015, pág. 39 e Carlos Alberto Burity Da Silva, Teoria Geral do Direito Civil,
2ª ed., revista e actualizada, FDUAN, Luanda, 2014, pág. 332.
95
Fixado pela Lei 6/12, de 18 de Janeiro – Lei das Associações privadas. Importa realçar que nada obsta a
constituição de Associações privadas do regime geral entre Advogados, desde que prossigam fins enquadrados
no plano teleológico deste regime, como, por exemplo, seriam hipoteticamente a Associação dos ´´Jovens
advogados``, dos ´´Advogados criminalistas`` ou da ´´Mulher advogada angolana``. Igualmente parece
plausível a possibilidade de os advogados de ´´empresa`` constituírem associações sindicais ao abrigo da Lei
n.º 21-D/92 de 28 de Agosto - Lei Sindical.
96
Por força do disposto no n.º 2 do art. 38.º da LSAA, não são um centro autónomo de imputação de direitos
e obrigações. Sobre a função económica e social da atribuição da personalidade colectiva vide Carlos Alberto
da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4ª Edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto,
Coimbra, Coimbra Editora, 2005, pág. 269 e ss.
97
Como se consagrou no art. 43.º da LSAA; solução que apesar de cristalina no preceito legal, acarreta consigo
complicações práticas em caso de saídas de membros e consequentes partilha de património, bem como nas
hipóteses de responsabilidade por dívidas derivadas de actos não forenses.

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subsidiária ou até solidária dos membros por estas dívidas sociais não resultantes directamente da
actividade forense.
III. Uma segunda solução, diz respeito a um conjunto de confusões terminológicas no seu regime. Isto
porque, nos termos da lei, a sua firma deve terminar pelos aditamentos ´´Escritório de advogados``
ou ´´advogados``, o que no primeiro caso é criticável pelo facto de que conforme já mencionamos
não se pode confundir o espaço físico onde os advogados exercem a sua actividade, o Escritório, com
a organização em que estão integrados98. E mais ainda, parece-nos estranho (no mínimo), que os
advogados em Associação se designem simplesmente por ´´advogados``, enquanto os que constituam
uma Sociedade de advogados, devem, nalguns casos incluir, na sua firma a expressão ´´e/&
Associados``99.
Nesta senda, os indivíduos que subscrevem o contrato de Associação são legalmente designados de
modo cuidadoso como ´´Membros``, enquanto que os advogados que exercem a profissão numa
sociedade cuja estrutura societária não integram, são como vimos, apelidados de ´´Associados``,
numa aparente contradição semântica do legislador, quiçá justificada eventualmente pelas tradições
nominativas da classe100.
IV. Outra questão é relativa ao regime subsidiário aplicável à disciplina legal das AA prevista na LSAA,
que nos termos da lei, deve tal como as SA, fazer recurso ao regime jurídico das Sociedades Civis
puras. Ora, torna-se difícil perceber, como é que uma entidade designada ´´Associação``, com objecto
e fins aproximados ao das Associações privadas, seja em caso de vazio legal, regulada, não pelo
quadro legal das Associações, mas sim pelo figurino das ´´benditas e quase moribundas`` Sociedades
Civis, que têm uma natureza própria e distinta.
V. Superadas estas críticas, visualizam-se no plano subjectivo, os advogados ´´membros`` e respectivos
estagiários, não se descartando a existência de paralegais e consultores remunerados pela Associação
(que, recorde-se, não pode celebrar contratos) nos termos já referenciados no plano das SA. De forma
a tutelar situações de eventuais conflitos éticos de interesses e prejuízos para os constituintes, estatui-
se a impossibilidade de membros da mesma associação poderem representar partes litigantes entre si,
até porque, o mais provável de acontecer, são substabelecimentos pontuais de poderes entre os
membros, em caso de indisponibilidade momentânea.
Entretanto, em sede do figurino legal, nada obsta que um advogado possa ser membro de várias
associações, ao contrário do que acontece nas SA, nem há qualquer imposição de concentração
tendencial da sua actividade na Associação, podendo pacificamente ser membro da Associação A,
com escritório no município X, ter escritório autónomo no local Y e ser membro de outra Associação
no local Z. Todavia, tal liberdade pode ser derrogada pelo Contrato de Associação, o que nos parece
ideal.
VI. Por último, a sua estrutura orgânica interna, pressupõe a existência de um Órgão de Administração
(integrado por todos ou alguns membros) e eventualmente de uma Assembleia (especialmente se nem
todos os membros forem administradores), disciplina que por omissão da LSAA, resulta do 980.º e
ss. do CC, com forte primazia da regulação pela autonomia privada por meio do Contrato de
Associação, cuja conformidade com a lei e normas deontológicas é condição para o seu registo.
VII. No tocante à responsabilidade civil, a contratação de seguro obrigatório, é imposta aos membros
individualmente.
VIII. Em suma, as AA traduzem um modelo de exercício individual num ambiente colectivo motivado
pela repartição de despesas, num regime legal sem grandes vantagens jurídicas palpáveis, numa
relação que acaba naturalmente sendo de curta duração, impelindo os membros para a autonomia

98
Vide supra, nota 72.
99
É o que resulta do regime do art. 41.º e n.º 3 do art. 10.º, todos da LSAA.
100
V.g. art. 38.º, 39.º e 7.º da LSAA.

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plena de um escritório individual ou para a sua transformação em Sociedade de advogados e que é
regulada essencialmente pelo Contrato.

3.3- A Deontologia e o Exercício Colectivo da Advocacia


I. As exigências da prática jurídica contemporânea, não se compadecem apenas com profissionais
conhecedores da lei, exigem actores que saibam manipular a lei com ética, o que implica,
necessariamente, preocupar-se com as pessoas, tutelando a sua dignidade101. Os juristas, devem pois,
ser técnicos capazes de conciliar o conhecimento técnico das normas legais com uma actuação
pautada nos valores morais, visando ao mesmo tempo proteger o homem e construir o cidadão.
Como já parafraseado anteriormente «…no advogado, a rectidão de consciência é mil vezes mais
importante do que o tesouro dos conhecimentos. Primeiro, ser bom; depois, ser firme; por último,
ser prudente; a ilustração vem em quarto lugar; a perícia no fim de tudo»102.
E este plano parametrizador do esteio ético delimitador do exercício da advocacia, é imposto não só
ao advogado em prática individual, mas também aos causídicos que se unam para exercício comum
numa Sociedade de advogados, bem como àqueles que se vinculem para exercer a profissão num
espaço e ambiente comuns, mas de modo autónomo, numa AA e também às próprias entidades
colectivas103.
Isto porque, a tendência internacional é a supremacia da prática colectiva sobre o exercício individual,
onde se visualiza uma preponderância estonteante das Sociedades de advogados que, comandam o
´´mercado jurídico``, agindo como verdadeiras ´´empresas`` de serviços não mercantis, cujo carácter
liberal passa a ser discutível.
II. E num cenário também caracterizado pela exposição mediática (algo imediatista) da justiça, com fins
muitas das vezes inconfessos, não tutelados a priori pelo Direito (certamente até repugnados por
este), justifica-se, portanto, um olhar especial e atento aos baluartes éticos, orientadores do modus
actuandi dos advogados, seja qual for a forma jurídica que adoptem para organizar institucionalmente
o seu exercício profissional.
Impõe-se, a priori, a identificação dos deveres deontológicos, com maior probabilidade de violação
em sede do exercício colectivo. Parece-nos, que neste rol, enquadrar-se-ão especialmente: o dever
geral de probidade e actuação diligente (nas diversas nuances da sua incidência), o dever de sigilo e
confidencialidade, o dever de independência e isenção, lealdade, a polémica proibição de publicitação
mercantil dos serviços forenses, a não discussão pública de questões profissionais, a proibição da
quota litis, e o dever de solidariedade entre colegas e para com a comunidade.
III. São inúmeros os desenvolvimentos que se poderiam fazer para fundamentar tal entendimento. No
tocante ao dever geral de integridade, a sua própria abrangência, permite construir uma narrativa
segundo a qual, estar-se-ia perante o seu desrespeito, sempre que os advogados actuem em
contraposição à lei expressa e princípios gerais de Direito, quer seja litigando de má fé, quer seja

101
Como sabiamente afirma Flávio Pinto, O relacionamento do Advogado com o cliente e os deveres para
com a Comunidade, intervenção no III CONGRESSO da Ordem de Advogados de São Tomé, 2011, pág. 7,
disponível em http://www.oastp.st/pdf/deontologia_profissional.pdf, acesso aos 10/02/2018.
102
Cfr. Ángel Ossorio y Gallardo, El Alma de la Toga, Madrid, Editorial Reus, 2008, pág. 21.
103
O CEDP faz, no n.º 6 do seu art. 6.º, uma previsão curiosa neste sentido, estendendo o regime das
incompatibilidades do advogado aos demais membros do ´´colectivo`` com quem labute, posição que achamos
de difícil conformidade com o plano actual das Sociedades e Associações de Advogados da LSAA, atentando
primeiro, ao carácter intuitu personae das várias funções previstas no seu n.º 1, e depois ao facto de um simples
código com natureza regulamentar interna, não ter à partida substrato orgânico e material para limitar a
indivíduos o exercício de profissões, até porque tal estatuição não encontra acolhimento no figurino vigente
das incompatibilidades e impedimentos dos arts. 11.º e 12.º da LA, nem se coaduna com a racio do art. 33.º da
LSAA, que regula as situações em que um sócio esteja impossibilitado de exercer temporariamente a profissão.

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engendrando esquemas de fraude à lei, quer seja nos actos da sua vida privada indignos da rectidão
exigida aos servidores da justiça104.
O dever de sigilo, ressalta, igualmente, por força do facto natural de neste figurino colectivo, haver
um número maior de indivíduos com acesso aos dados sobre os processos, e demais informações
fornecidas pelos constituintes, pelo que se justifica uma atenção redobrada nesta matéria105.
Os deveres de independência, isenção e lealdade, tendencialmente suscitam também imbróglios,
devido à consequente questão dos conflitos de interesses106. Com a peculiaridade de, muitas das
vezes, verificar-se a colisão entre, por um lado, o interesse público de justiça e a satisfação do
interesse particular do constituinte, e, por outro, os próprios interesses económicos, políticos e
estratégicos dos advogados, em regra, especialmente nas SA e seus sócios.
O mesmo se pode dizer da tradicional não publicitação dos serviços do advogado que por si só, daria
lugar a um outro estudo, exclusivo e autónomo.
IV. Como avançamos nas razões de facto da prática colectiva, a partir de um dado estágio de
desenvolvimento das pessoas colectivas vocacionadas ao exercício da advocacia, estas tornam-se uma
verdadeira máquina, cuja estrutura requer alimentação constante. E porque na actual Sociedade da
Informação, a projecção da imagem é um dos maiores veículos de captação de clientes e seus
rendimentos, os advogados não escapam a isto, procurando, alguns, encontrar formas de fazê-lo,
conflituando mesmo com a discrição característica da classe, inerente mesmo à sua dignidade
social107.
V. Relacionada a este plano é, especialmente, pertinente hoje a questão da discussão pública nos media,
de processos judiciais em curso108. Visto que, para além da aberratio que ela representa em termos
éticos e processuais, fica-se com a impressão de que muitas vezes é usada para autopromoção do
advogado ´´comentador``, o que deveria desencadear não apenas a reacção do colectivo em que este
está inserido, mas da própria Ordem, que ao que parece, faz ´´ouvidos de mercador`` às constantes
violações à racio e letra da al. b) do art. 70.º e do art. 66.º do EOA. Todavia, não se pode afastar de

104
As notas gerais deste dever são as apresentadas supra em II.3.1. Sobre a litigância de má-fé, origem do
instituto, seus contornos e configuração, recomenda-se o estudo do Professor António Menezes Cordeiro,
Litigância de má-fé, Abuso do Direito de acção e culpa in agendo, 3ª edição aumentada e actualizada, Coimbra,
Almedina, 2014, págs. 45 e ss., 63 e ss.
105
O figurino legal deste dever é o fixado genericamente pelo 65.º do EOA. Para além da abundante doutrina
jurídica sobre o assunto, mais afloramentos podem ser encontrados em Henriques Moisés Ernesto, Relação
advogado-constituinte: o Sigilo profissional do Advogado¸ Relatório de final de estágio apresentado ao
CIPHOAA, inédito, 2016, págs. 7 e ss. Sobre a prudência especial exigida ao staff administrativo dos
escritórios vide Inácio de Almeida Muana, A Relação Advogado-Constituinte e o Sigilo Profissional como um
Dever Fundamental do Advogado, Relatório de final de estágio apresentado ao CIPHOAA, inédito, 2017, pág.
19.
106
Previstos de modo expresso nos arts. 60.º e 67.ºdo EOA.
107
O respectivo regime legal, resulta dos arts. 64.º do EOA, 7.º e b) do 8.º do CEDP. São disso exemplo, o
conteúdo de certos websites de escritórios de advogados, os ´´bombardeamentos´´ de newsletters via email de
que estes se servem, os patrocínios de livros e de actividades relacionadas ao sector da Justiça. Uma reflexão
relacionada ao assunto pode ser encontrada em Fátima Freitas, Breves considerações sobre a publicidade dos
Advogados, Revista da OAA n.º 2, Luanda, 1999, pág. 57 e ss. Em Portugal, à semelhança do resto do ocidente,
os lobbys das grandes sociedades foram mais fortes, e a publicidade da advocacia, apesar de não ser liberalizada
na plenitude, é amplamente admitida, permitindo-se por exemplo que os advogados possam incluir no seu
currículo profissional disponível na web, nomes de constituintes a quem já prestaram serviços. Lamentando
tais ´´modernismos`` veja-se, entre outros, António Arnaut, Iniciação à advocacia, ob. cit., pág. 11 e
igualmente em Estatuto da Ordem dos Advogados Anotado, ob. cit. pág. 108.
108
A expressão surge, aqui, numa perspectiva genérica, procurando abarcar, toda e qualquer situação com
substrato jurídico, com aptidão para reclamar a atenção dos órgãos do Estado com a missão de tutelar e garantir
a Justiça e o Direito, independentemente do início formal de um processo.

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todo a sua utilidade, especialmente nos casos em que o lesado é a colectividade (Estado), devendo
procurar garantir-se, em termos razoáveis, tanto o exercício do direito fundamental à informação e
liberdade de imprensa, como o respeito das diversas garantias constitucionais dos sujeitos passivos
dos processos judiciais, por força da ilimitável tutela do conteúdo da dignidade da pessoa humana de
todos os indivíduos.
VI. Outra polémica é relativa a quota litis, cuja tendência mundial, tem sido a da admissibilidade de
algumas das suas modalidades, por influxo da influência das grandes SA, que envolvidas em
avultados contratos, procuram fixar os seus honorários em percentagens do valor total da transacção,
situação que demonstra bem a vocação mercantil daquelas. Por outro lado, é cada vez mais frequente
no tráfego jurídico, a convenção da chamada sucess fee, correspondente a uma remuneração adicional
pelo desempenho exitoso do caso, com contornos muitas vezes dúbios109.
VII. Alude-se ainda, no caso das Associações de advogados, às eventuais violações ao dever de
solidariedade, cuja génese é logicamente decalcada da natureza do vínculo, do próprio contrato de
Associação, da LSAA, bem como do regime geral do EOA.110 Isto porque, em função da natural
construção egoísta do carácter humano, a Associação de advogados pode acabar vivenciando um
ambiente degenerado de concorrência, que será certamente perigoso para a colaboração saudável que
esteve na base do vínculo, bem para a lealdade exigida a todos os sujeitos no cumprimento dos
contratos, adivinhando-se eventualmente danos para os constituintes.
No plano das Sociedades, o dever de solidariedade para com a comunidade, permite construir um
paradigma de uma Responsabilidade social das SA, centrada na prestação social de serviços forenses,
através da chamada Advocacia pro bono, dirigida a todos aqueles que fora dos mecanismos da
defensória oficiosa por nomeação do Tribunal e da Assistência judiciária, procuram e precisam dos
serviços de advogado, mas que carecem de meios financeiros para custear honorários, sendo
directamente financiados pelos próprios advogados.
Assim, todo este quadro regulador de deveres pode ter aplicabilidade prática em diversas
circunstâncias, que cumpre analisar.
VIII. Num primeiro momento, as exigências de forum deontológico, surgem antes, mesmo, da constituição
da pretendida entidade colectiva, visto que tanto o Contrato de Sociedade, como o de Associação,
estão sujeitos a registo junto da OAA, que se traduz num verdadeiro reconhecimento normativo
condicionado para as Sociedades. Nesta última fase do processo constitutivo, está acometida ao
Conselho Nacional da OAA, a tarefa prévia de certificar a conformidade do Contrato com a lei e
regras deontológicas da profissão, que em caso de pronunciamento negativo impossibilitam o registo
do mesmo111.
Depois de constituídas, continuam sobre a égide da cortina deontológica da profissão, porque os seus
sócios e membros persistem igualmente vinculados à disciplina da Ordem, e no caso das Sociedades
podem, inclusive, como já avançamos, ser responsabilizadas pelos danos emergentes de actos
contrários ao quadro deontológico protagonizados pelos seus diversos agentes.
Mais do que isso, como veremos adiante, a Assembleia da Sociedade pode excluir o sócio que viole
gravemente disposições legais (onde se enquadra o regime deontológico do EOA), bem como deve

109
Resta saber, até onde se manterá o idealismo do legislador, quando chegar a hora de revisar o art. 54.º do
EOA. Sobre a quota litis, sua história e modalidades vide Manuel António Dias da Silva, ob. cit. pág. 131.
Sobre a sucess fee recomenda-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Justiça Português de 29-09-
2009 referente ao processo 6458/04.1TVLSB.S1, disponível em
http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/856ff4335bccd5c580257640003cd84c?
OpenDocument, consultado aos 27/08/2017.
110
É o que resulta do regime conjugado dos arts. 39.º da LSAA, 70.º do EOA e 13.º CEDP.
111
Como se depreende do regime dos arts. 7.º e 40.º da LSAA.

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excluir o sócio inibido de exercer a advocacia por força de sanção disciplinar, o que implica que se
todos os sócios estiverem nessa condição, a sociedade deve ser dissolvida112.
IX. No que toca às Associações, a pobreza do seu regime legal não suscita grandes abordagens, mas
pensamos que, em função do rol de obrigações com conteúdo deontológico previsto no contrato, é
possível excluir membros por violação destas, bem como por força de sanção disciplinar, nos termos
acima aludidos.
Isto, leva-nos à clara conclusão de que o regime deontológico vigente, resultante em particular, da
Lei da Advocacia, do Estatuto da Ordem dos advogados de Angola e do seu Código de Ética e
Deontologia Profissional, acompanha as Sociedades e Associações de advogados em todos as fases
das suas vicissitudes, isto é, constituição, actuação, modificação e extinção.
Todavia, pensamos que a LSAA poderia ter feito mais porque, ao que parece, centrou-se demasiado
na afirmação da institucionalização das entidades que criou e olvidou o facto de que a partir da sua
constituição, estas passam a possuir vontade própria, ainda que formada pelos titulares dos seus
órgãos, e por isso deveria ter sido prestada especial atenção ao seu Governo.
Aqui, o chamado Corporate governance, apesar de ser tradicionalmente relacionado com as
sociedades comerciais anónimas, pode, à semelhança do movimento mundial, acabar tendo um papel
relevante na gestão e actuação das Sociedades de advogados, dando-lhes com suporte nas regras
deontológicas, subsídios nos vectores da transparência, rectidão, compliance, gestão de riscos, em
suma, tudo que hoje se integra no conceito genérico de ´´boa governação``113.
Este conceito, em nosso entender, por via de imposição legal, regulamentar ou estatutária, deve
nortear especialmente as grandes Sociedades de advogados, que almejando a fasquia das centenas de
sócios e milhões em facturação, devem ter em conta certas exigências dos mercados do século XXI.
Sob pena de as máscaras próprias da organicidade colectiva, propiciarem esquemas de práticas ilícitas
por ilegalidade e/ou imoralidade que, no figurino actual, só seriam combatidos com rebuscados e
muitas das vezes infrutíferos exercícios de desconsideração da personalidade jurídica.

112
Cfr. nºs 1. e 6. do art. 21.º, n.º 2 do art. 34.º, e art. 35.º, todos da LSAA.
113
Sobre o governo das sociedades, vide por todos, porque adaptada a realidade angolana, a visão de Sofia
Vale in As empresas no Direito Angolano-Lições de Direito Comercial, edição da autora, Luanda, 2015, págs.
760 e ss.

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IV. REGIME DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ADVOGADO NA PRÁTICA
COLECTIVA POR VIOLAÇÃO DE REGRAS DEONTOLÓGICAS- TRAÇOS
GERAIS.

4.1- Notas preliminares. 114


I. Feita a definição do quadro geral da deontologia profissional do advogado, e das exigências
particulares ao exercício colectivo, quer seja em sede do plano de uma Associação de advogados,
quer seja numa Sociedade civil, urge a necessidade de uma breve abordagem sobre os mecanismos
sancionatórios, em caso de inobservância dos aludidos deveres.
Tal imposição de uma disciplina jurídica de deveres éticos e morais, de actuação subjectiva do
causidicus, acarreta consigo uma carga externa de tutela objectiva dos interesses subjacentes,
efectivada na estatuição de um regime de responsabilização jurídica pelo seu incumprimento,
correspondente à natureza do facto ilícito, com a finalidade destinada, não apenas de punir e corrigir
o prevaricador, de ressarcir danos aos eventuais lesados, mas também num prisma de prevenção geral.
Assim, a essencialidade da missão do advogado, enquanto interveniente essencial na administração
da justiça, que lhe atribui um conjunto de prerrogativas e garantias decorrentes da independência e
isenção que lhe são indispensáveis no exercício da função, implica necessariamente consequências
desfavoráveis sobre o mesmo, em decorrência de actos e condutas suas, contra legem, protagonizadas
por causa e no exercício da profissão115.
II. Este entendimento remonta aos primórdios da profissão, sendo tradicional descartar-se um eventual
princípio da irresponsabilidade absoluta do advogado, afirmando-se pelo contrário, imperativo, que
o Direito preveja remédios para os erros destes profissionais, porque humanos e portanto falíveis116.
Nesta senda, segue-se uma definição geral do paradigma responsabilizatório, na prática colectiva da
advocacia, numa lógica de que há limites éticos que os profissionais não podem relevar, visto que ´´o
desrespeito pelas pessoas, pelo direito de viver digna e humanamente, causando prejuízos aos demais
é imoral e eticamente inaceitável, para as relações estabelecidas no exercício da profissão``117.

114
O presente capítulo, é, como se indica no título, uma abordagem genérica e superficial sobre esta matéria,
não se comparando aos demais nem em extensão, nem em profundidade. Isto porque, a construção inicial do
presente trabalho, dedicava uma atenção especial e cuidada a esta temática, desembocando no capítulo mais
extenso do texto, onde se procurava fazer um ensaio analítico das diversas formas de responsabilização e
respectivos regimes. Entretanto, razões de ordem prática, relacionadas com a finalidade do presente relatório
e a gestão do factor chronos, não permitiram dar corpo a este exercício em tempo com a rigorosidade que se
impõe, atendendo mesmo ao facto de ser a parte com cunho mais tecnicamente jurídico do trabalho e portanto
demandar maior atenção; pelo que, a contragosto, entendemos postergar tal exercício, para momento próprio
e oportuno, para onde se remetem tais afloramentos, sendo esta uma empreitada que constitui compromisso
intelectual do autor. Para já, ficam apenas as presentes nótulas.
115
Adapta-se aqui uma visão centrada nos magistrados com a pena de Ana Celeste Carvalho in
Responsabilidade Civil por Erro judiciário, Coimbra, Almedina, 2012, pág. 29.
116
O enquadramento geral da responsabilidade do advogado e uma interessante retrospectiva histórica podem
ser encontrados em Nélia Daniel Dias, A responsabilidade civil do advogado- breves notas, Gazeta do
Advogado da OAA n.º 10, Luanda, OAA, 2007, pág. 24 e ss.
117
Não resistimos às palavras de António de Sousa Penelas in A ética e o futuro da profissão, intervenção no
57.º Congresso da União Internacional dos Advogados, publicada na Gazeta do Advogado da OAA n.º 22,
Luanda, OAA, 2013, pág. 38.

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4.2- Roteiro geral do regime de responsabilidade.
I. Como sabemos, os actos ilícitos do advogado podem dar lugar a várias espécies de responsabilidade
jurídica, em função da natureza da norma violada e do consequente mecanismo próprio de reacção.
Desta feita, vislumbra-se um cenário geral, onde por força da violação de deveres deontológicos se
pode admitir eventual responsabilidade disciplinar (estatutária ou laboral), penal, havendo danos,
civil e societária desde que preenchidos os requisitos e pressupostos específicos de cada uma.
II. Num plano inicial, se a conduta do advogado se considerar ilícita por desconformidade com as normas
regulamentares da OAA (Estatuto, Códigos, regulamentos e deliberações com força imperativa), será
o infractor sujeito à acção disciplinar instaurada pelos órgãos competentes da Ordem, incorrendo em
abstracto, numa medida de mera advertência, até a expulsão da Ordem e proibição definitiva e
permanente do exercício da advocacia118. Se esta actuação violar deveres processuais, e a proibição
estatutária do não recurso a manobras dilatórias ou ilegais, há a possibilidade de o próprio Tribunal
oficiar a Ordem para que esta aplique ao advogado, as sanções decorrentes da eventual litigância de
má-fé119.
III. Diversamente, tal como já anteriormente referenciado, não se vislumbra uma base legal para que a
Ordem possa sancionar disciplinarmente (ou mesmo dissolver) a própria Sociedade ou Associação
de advogados por práticas contrárias ao EOA, protagonizadas pelos titulares dos seus órgãos e demais
advogados que as integram; o que é efectivamente de lamentar. Veja-se por hipótese, a situação em
que uma Sociedade convenciona com determinada estação televisiva, que uma parte do valor
referente a avença devida pelo contrato de prestação de serviços jurídicos, servirá como contrapartida
para que sejam, exclusivamente, os seus advogados a fazerem comentários técnicos sobre questões
jurídicas durante a sua grelha de programação, com o fito de promoção da mesma. Pensamos nós,
que uma hipótese como esta, reclama não só sanções para os advogados que se prestem a tal papel,
mas também a própria Sociedade e sócios, porque obtêm benefícios directos de tais práticas ilícitas.
Como se evidencia no art. 80.º do EOA, as diferentes formas de responsabilização, têm cada uma,
natureza, conceitos e características próprias, pelo que a responsabilidade disciplinar não afasta a
possibilidade de o indivíduo sujeitar-se a acção penal ou ser civilmente demandado.
IV. Se a conduta violadora de regras deontológicas, preencher a previsão típica de um comportamento
que a lei configura como crime e para o qual prevê a correspondente pena, o advogado será então
sujeito ao Ius puniendi do Estado120. Apontam-se aqui duas categorias de crimes, os que exigem ao
agente a qualidade profissional de advogado e os que podem ser praticados por qualquer pessoa, mas
que quando praticados pelo advogado traduzam infracção disciplinar.
No primeiro caso, enuncia-se o crime de prevaricação p.p. no art. 289.º no Código Penal (CP), e no
Direito a constituir, os crimes de deslealdade profissional de advogado e violação de segredo de

118
Cfr. arts. 15.º da LA e 75.º e 86.º do EOA. As regras adjectivas da responsabilidade disciplinar estatutária
são fixadas pelo Regulamento Disciplinar dos Advogados (RDA) aprovado pelo Conselho Nacional da OAA,
aos 21 de Junho de 1999. Importa realçar que depois de esgotados os recursos hierárquicos na orgânica interna,
o advogado inconformado com a medida disciplinar, pode impugnar judicialmente a decisão nos termos gerais
da Lei n.º 2/94, de 14 de Janeiro, Lei da Impugnação dos Actos Administrativos, em função do disposto no
63.º da Lei de bases das Associações públicas.
119
Conforme dispõem os art. 62.º b) do EOA e 459.º do CPC. Como afirma Grandão Ramos, um exemplo
frequente de arguição de pretensões ilegais é o pedido de condenação da contraparte no pagamento de
honorários de advogado, sem previsão contratual e fora dos casos previstos para litigância de má-fé e no regime
das Custas Judiciais, cfr. ob. cit. pág. 242.
120
Em decorrência dos arts. 1.º do Código Penal e 1.º do Código de Processo Penal, nas suas versões vigentes.

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justiça previstos nos arts. 341.º e 342.º do anteprojecto do Código Penal angolano 121, cujos
pressupostos factuais contrariam os deveres deontológicos de sigilo e lealdade.
No segundo, destacam-se de entre outros crimes frequentemente relacionados com a vida forense, o
crime de suborno de testemunha falsa p.p. no § 2.º do art. 240.º do CP, os crimes de falsificação de
documentos p.p. nos arts. do 216.º e 219.º do CP. Ainda, os vários crimes de corrupção p.p. nos arts.
36.º e ss. da Lei 3/14, de 10 de Fevereiro- Lei das Infracções subjacentes ao branqueamento de
capitais, com a particularidade neste caso, de puderem ser sujeitas as penas as próprias Sociedades e
Associações de advogados, com realce para a sua eventual dissolução judicial122. De resto, qualquer
que seja o crime cometido pelo advogado, se violar a cláusula geral do dever de probidade do art. 60.º
EOA, constituirá também ilícito disciplinar123.
V. Por outro lado, nas Sociedades de advogados, a inobservância de normas deontológicas pelos
advogados Associados, estagiários, consultores, funcionários administrativos (estes também nas
Associações) vinculados por contrato de trabalho, pode suscitar responsabilidade disciplinar laboral
por configurar infracção disciplinar fundada no desrespeito dos seus deveres fixados pela lei e no
contrato de trabalho, o que permite dar corpo a eventual processo disciplinar, que tramitará pelas
regras gerais dos arts. 46.º e ss. da LGT.
VI. É certo também que nas situações onde a infracção deontológica, causa danos, incorre o advogado
e/ou as Sociedades de advogados na obrigação de indemnizar o lesado segundo as regras gerais do
art. 483.º CC. Esta obrigação resultará em regra da responsabilidade civil obrigacional por
incumprimento activo ou omissivo dos contratos de prestação de serviços e mandato, bem como das
actuações em sede de defensórias oficiosas e Assistência judiciária, subordinando-se ao regime do
art. 798.º e ss. Será diversamente aquiliana, a responsabilidade do advogado nas situações que lese
terceiros, como por exemplo, se em violação do dever geral de urbanidade, ofender o bom nome de
um colega ou magistrado, respondendo pelos possíveis danos patrimoniais e morais nos termos do
art. 484.º CC124.
Em todos os casos, em atenção à clássica premissa ubi commoda, ibi incommoda, a Sociedade
responde objectivamente por força do art. 22.º da LSAA e do regime geral do art. 500.º CC, sendo na
prática tal responsabilidade transferida para a seguradora contratada, não se descartando, contudo, o
justo direito de regresso nas situações culposas125.
VII. Fora destas situações, se determinado acto dos titulares dos órgãos da sociedade e seus agentes lesar
´´…interesses públicos a que a Ordem visa assegurar e defender nos termos dos seus estatutos…``,
e com isso se produzam danos, devem estes ser imputados à Sociedade de advogados, tendo a OAA,
com suporte no mecanismo do art. 26.º da LA, legitimidade activa para dar corpo a necessária acção
judicial.
Por último, no plano societário, o art. 21.º da LSAA, admite a possibilidade de a Assembleia da
Sociedade poder deliberar a exclusão de um sócio da sociedade por incumprimento gravoso de
obrigações de forum deontológico, previstas no regime legal da profissão, no pacto constitutivo e em
acordos parassociais. Em nosso entender, esta solução pode ser igualmente aplicável às Associações,

121
Na sua versão de 2014, a última publicamente divulgada pela Comissão da Reforma da Justiça e do Direito
em Angola, no defunto website www.crjd-angola.com.
122
É o que resulta do n.º 5 do art. 5.º e dos arts. 44.º e ss. da aludida lei, que consagram situações de
responsabilidade penal das pessoas colectivas que protagonizem ou tirem benefícios da prática do crime.
123
Desde que preenchidos os requisitos gerais da mesma, já esboçados com exemplos, supra, em II.3.1, pág.
11.
124
Mais desenvolvimentos podem ser encontrados em Orlando Costa, ob. cit., pág. 399 e ss. e Nélia Dias, ob.
cit., pág. 26.
125
Cfr. arts. 24.º e 25.º da LSAA

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por força de imposição clausular do contrato de Associação ou mesmo pela solução supletiva do seu
regime que remete para a a) do art. 1003.º do CC.
VIII. Fica então demostrado neste breve itinerário, que a forma institucional que dois ou mais advogados
adoptem para organizar o exercício da sua actividade, desencadeia obrigações resultantes do regime
geral da profissão, bem como obrigações especiais decorrentes da LSAA, o que implicará a sujeição
a um regime sancionatório multifacetado, que se aplica não apenas aos próprios advogados mas
também à entidade colectiva.

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V. CONCLUSÃO
Aqui chegados, podemos afirmar que esta breve incursão nos mares da contraposição entre os deveres
especiais da profissão e o modo de organização institucional do advogado, permitiu firmar as
seguintes conclusões:
• A deontologia profissional traduz o conjunto de normas jurídicas de conteúdo
predominantemente ético, específicas ou transversais que regulam o exercício da profissão
impondo ao profissional, não só o respeito das normas de forum técnico e científico aplicáveis,
mas também a observância dos melhores padrões gerais de conduta moral exigíveis a qualquer
indivíduo que viva em sociedade, bem como os especiais limites éticos dele esperados para
um cabal desempenho da sua função profissional;

• Visa garantir que o exercício das profissões mais nobres, tenha como alicerce um mínimo
ético indispensável à dignidade da actividade em causa e daqueles que a eles recorrem muitas
das vezes desesperados em busca de alento, verificando-se com maior incidência nas
chamadas profissões liberais, como a advocacia, por força do elevado pendor humanista a ela
subjacente, fazendo hoje parte do chamado Direito Profissional do advogado;

• Remonta aos primórdios da prática forense e do Direito, tendo se acirrado com o


desenvolvimento da complexidade técnica da advocacia e a afirmação da sua importância
social, hoje com verdadeira força de disciplina jurídica, porque o seu conteúdo é consagrado
e garantido por lei;

• O exercício da advocacia, é hoje indissociável das normas deontológicas que alicerçam a


profissão, com os últimos desenvolvimentos incidindo, não apenas, na conduta dos advocati,
mas também na actuação das entidades colectivas constituídas por estes;

• O Direito profissional do advogado em Angola tem no topo a CRA, estando a matéria


deontológica essencialmente estatuída no EOA e no CEDP, impondo-se que se faça a revisão,
o aprimoramento e a actualização de ambos;

• De entre os vários deveres fixados na lei, ressalta o Dever geral de probidade, que
consideramos ser um dos deveres deontológicos fundamentais do advogado em Angola,
configurando uma cláusula geral ético-deontológica de onde derivam os demais deveres
deontológicos específicos;

• Este impõe a adopção de um comportamento moral irrepreensível dentro e fora da profissão,


o que não representa uma intromissão na esfera pessoal do advogado enquanto pessoa e
cidadão, visto estarem em causa são as condutas privadas do advogado (e não apenas do
cidadão que é advogado) publicamente escandalosas, desonrosas para quem as pratique, com
repercussão na profissão, afectando a sua dignidade profissional e lesando o bom nome da
classe;

• Recentemente, por força dos ventos do combate ao terrorismo, a lei transformou o advogado
num quase ´´delator`` dos seus constituintes, obrigando-lhe a comunicar à UIF, todas as
transacções, relativas a certos actos fora do âmago da actividade forense, em que esteja
envolvido, o que foi legitimado pelo Tribunal Constitucional, com o argumento de que o
contexto internacional e a experiência prática o justificam, não obstante as críticas que
subsistem;

• A natureza liberal da advocacia sempre fez com que esta fosse exercida de modo solitário,
entretanto, exigências contemporâneas de pendor técnico e económico impuseram a tendência
de formação de equipas polivalentes, porque financeiramente mais sustentáveis e hábeis de
dar melhor resposta às demandas do constituinte do mundo globalizado;

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• Organizados em Associações de prática forense ou Sociedades civis, constituídas por até
milhares de membros, estas hoje assumem as rédeas dos serviços jurídicos especializados,
intervindo nas grandes transacções mercantis, estando a sua actuação subordinada às normas
de conduta profissional, compliance e boa governação;

• Em Angola, a profissão pode ser exercida em Escritórios singulares ou colectivos (Sociedades


ou Associações de advogados), resultando da LSAA o regime jurídico aplicável às formas de
constituição, modificação, extinção, organização e funcionamento das sociedades e
associações de advogados, bem como o regime de responsabilização pelos actos dos seus
representantes e agentes;

• O diploma inovou, mas peca, porque poderia ter se servido de algumas valências das mais
recentes evoluções do regime das Sociedades de advogados de direito comparado;

• No Direito Angolano, as Sociedades de advogados são definidas como sociedades civis de


regime especial, dotadas de personalidade jurídica, com um ou vários sócios, que devem ser
exclusivamente advogados, com a prática da advocacia como objecto social exclusivo, e firma
específica, enformadas nos princípios da liberdade contratual, da natureza não mercantil, da
institucionalização e da responsabilidade;

• Da LSAA, infere-se que nestas podem, em regra, existir várias categorias de advogados: os
sócios, os associados, os estagiários, devendo todos, tendencialmente concentrar o exercício
da sua actividade na sociedade, não podendo nunca os primeiros participar na estrutura de
outras congéneres, conferindo o mandato forense poderes de representação ao(s) advogado(s)
e nunca à sociedade, sendo, à partida, naturalmente extensíveis aos demais sócios;
diversamente entendemos que os contratos de simples prestação de serviços, assessoria
jurídica e consultas podem ser celebrados com a própria Sociedade;

• Todos estes sujeitos integrantes e ao serviço da Sociedade de advogados, estão subordinados


às obrigações deontológicas do EOA, aplicando-se o mesmo ao pessoal administrativo,
respondendo a sociedade pelos danos derivados dos actos de todos os seus agentes;

• Por outro lado, temos a positivação do regime das Associações de advogados, que eram já
uma realidade bem patente no panorama forense nacional caracterizadas por uma matriz
identitária decalcada dos Colectivos de advogados da época socialista e esboçada já na lei
desde 1995;

• São em regra compostas por jovens advogados que terminam o estágio (sem capacidade
financeira e clientela para sustentar um escritório), ou advogados ´´seniores`` (que não
pretendem estar num escritório sozinhos), associando-se de forma a trabalharem num espaço
comum, com independência e autonomia uns dos outros, mas repartindo despesas, partilhando
experiências e conhecimentos;

• As Associações de advogados são entidades associativas privadas de regime especial,


constituídas por dois ou mais advogados, que têm por objecto a criação, potenciação e
facilitação de condições de trabalho para a prestação individual de serviços jurídicos próprios
da advocacia por cada um dos membros, com o fito de proporcionar a estes, inputs e meios
comuns para exercício da sua actividade num ambiente de partilha técnica, material e
sustentabilidade financeira, reguladas essencialmente pelo pacto constitutivo;

• Pensamos que o regime das AA é um campo fértil para críticas, visto que a lei adoptou
algumas soluções questionáveis, com poucas vantagens jurídicas concretas, designadamente:
porque negou-lhes a atribuição de personalidade jurídica; criou um conjunto de confusões

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terminológicas no seu regime; e fixou-lhes uma disciplina subsidiária eventualmente
incorrecta, culminando numa relação que acaba natural e infelizmente sendo de curta duração,
impelindo os membros para a autonomia plena de um escritório individual ou para a sua
transformação em Sociedade de advogados;

• O plano parametrizador do esteio ético e deontológico da profissão, justifica um olhar especial


e atento aos baluartes éticos, orientadores do modus actuandi dos advogados, seja qual for a
forma jurídica que adoptem para organizar institucionalmente o seu exercício profissional;

• Os deveres deontológicos com maior probabilidade de violação em sede do exercício


colectivo, parecem-nos ser especialmente: o dever geral de probidade e actuação diligente; o
dever de sigilo e confidencialidade; o dever de independência e isenção; o de lealdade; a
polémica proibição de publicitação mercantil dos serviços forenses; a não discussão pública
de questões profissionais; a proibição da quota litis; e o dever de solidariedade entre colegas
e para com a comunidade;

• Concluímos que, o regime deontológico vigente, acompanha as Sociedades e Associações de


advogados em todos as fases das suas vicissitudes, isto é, constituição, actuação, modificação
e extinção.

• Entendemos que a LSAA poderia ter feito mais porque, ao que parece, centrou-se demasiado
na afirmação da institucionalização das entidades criadas, e olvidou o facto de que a partir da
sua constituição, estas passam a possuir vontade própria, e por isso deveria ter sido prestada
especial atenção ao seu Governo, dando-lhes, com suporte nas regras deontológicas, subsídios
nos vários vectores que hoje se integram no conceito de ´´boa governação``, de modos a
permitir combater eficazmente, práticas ilícitas escudadas na personalidade colectiva;

• Desde o alvorecer da profissão é tradicional configurar-se a possibilidade de


responsabilização do advogado, mostrando-se imperativo, que o Direito preveja remédios
para as falhas na actuação dos causídicos;

• Portanto, admite-se um figurino global, onde por força da violação de deveres deontológicos,
submerge uma eventual responsabilização de pendor: disciplinar, criminal, civil e societária,
desde que enquadradas as premissas de cada uma, o que implicará a imposição de um quadro
sancionatório plural, que se aplica não apenas aos próprios advogados, mas também, nalguns
poucos casos (lamentavelmente), à entidade colectiva.

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BIBLIOGRAFIA
I- Bibliografia fundamental consultada:
❖ ALMEIDA, Carlos Ferreira de, e CARVALHO, Jorge Morais, Introdução ao Direito Comparado, 3ª
edição, reimpressão, Coimbra, Almedina, 2014.
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edição dos autores, Luanda, 2014.
❖ ARNAUT, António, Iniciação à advocacia, 11ª edição revista, Coimbra, Coimbra Editora, 2011.
❖ ARNAUT, António, Estatuto da Ordem dos advogados Anotado, 14.ª edição, Coimbra, Coimbra
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❖ CANOTILHO, José Gomes, Estado de Direito, Colecção Cadernos democráticos, n.º 7, Fundação
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❖ CORDEIRO, António Menezes, Direito das Sociedades, II, Coimbra, Almedina, 2011.
❖ COSTA, Orlando Guedes da, Direito Profissional do advogado, 7ª edição, Coimbra, Coimbra Editora,
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❖ LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes, Direito do Trabalho de Angola, 3.ª edição, Coimbra,
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❖ LEITÃO, Luís Menezes, Direito das Obrigações, Vol. III, 9ª edição, Coimbra, Almedina, 2014.
❖ MOCO, Marcolino, Estudos jurídicos Vol. I, Luanda, Caxinde Editora, 2008.
❖ MOLINA, Pascoal Barberán, Manual prático do advogado, Lisboa, Escolar Editora, 2012.
❖ RODRIGUES, Raúl e RODRIGUES, Ana, Direito Romano, Lobito, Escolar Editora, 2014.
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❖ VICENTE, Dário Moura, Direito Comparado, Vol. I, 3ª edição revista e actualizada, Coimbra,
Almedina, 2014.

II-Publicações periódicas:
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III- Artigos consultados na internet:


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