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Vol. 1 Nº 2 págs. 137-143.

2003
https://doi.org/10.25145/j.pasos.2003.01.013
www.pasosonline.org

O turismo sertanejo como alternativa


econômica para o semi-árido1

Giovanni de Farias Seabra†


Departamento de Geociências – UFPB (Brasil)

Resumo: O Turismo Sertanejo é uma forma de lazer fundamentada na paisagem natural, no patrimônio
cultural e no desenvolvimento social das regiões interioranas do Brasil.Em virtude do seu caráter natural,
social, cultural ecológico e paisagístico, o Turismo Sertanejo insere-se na perspectiva
desenvolvimento/preservação ambiental dos sertões do País. Tem como principal objetivo promover a
compreensão integrada do meio ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo os
aspectos físicos, biológicos, sociais, econômicos, tecnológicos, culturais, científicos e éticos. De maneira
bastante sintética, pode-se dizer que o Turismo Sertanejo insere-se na categoria de turismo exótico, um
misto de agroecoturismo, com ênfase na valorização da identidade cultural regional e na melhoria das
condições de vida da comunidade local.

Palavras chave: Turismo Sertanejo; Desenvolvimento Social; Agro-ecoturismo

Abstract: The Sertanejo Tourism is a leisure form based in the natural landscape, in the cultural heritage
and in the social development of the interior areas of the Brasil. In virtue of its character natural, social,
cultural ecological and landscape, the Sertanejo Tourism interferes in the perspective environmental
development/preservation of the interiors of the Country. It has as main objective to promote the inte-
grated understanding of the environment in their multiple and complex relationships, involving the as-
pects physical, biological, social, economical, technological, cultural, scientific and ethical. In a quite
synthetic way, it can be said that the Sertanejo Tourism interferes in the category of exotic tourism, a
mixed of agro-ecotourism, with emphasis in the valorization of the regional cultural identity and in the
improvement of the conditions of the local community's life..

Keywords: Sertanejo Tourism; Social development; Agro-ecotourism


Doutor em Geografia Física, Prof. Adjunto do. E-mail: seabra@geociencias.ufpb.br

© PASOS. Revista de Turismo y Patrimonio Cultural. ISSN 1695-7121


138 O turismo sertanejo como alternativa …

Introdução Em 1998, o setor turístico movimentou


no Brasil 32 bilhões de dólares, como
É de domínio público a importância do resultado das viagens de 38 milhões de
setor turístico para a economia mundial, turistas domésticos e 5 milhões de turistas
nacional, regional e municipal. Sabe-se estrangeiros. Se forem computados apenas
também que o aperfeiçoamento do setor os viajantes estrangeiros, em 1999 o
turístico deve-se há décadas de estudos faturamento atingiu 4 bilhões de dólares.
voltados ao planejamento de sua Para o ano de 2003, a Embratur espera
estruturação. Pioneiros no setor, os aumentar para 6,5 milhões o fluxo de
europeus desenvolveram uma grande turistas estrangeiros e 57milhões o fluxo de
diversidade de segmentos, como o turismo turistas nacionais. O reflexo na economia
nos balneários mediterrâneos, o turismo de do País será da ordem de US$ 5,5 bilhões,
montanha, o turismo rural, o turismo correspondentes à receita cambial turística,
cultural, o turismo de eventos, o turismo de e geração de 500 mil novos empregos.
negócios, o agroturismo, o ecoturismo e Considerados bastante expressivos à
outros. primeira vista, esses números representam
Os exemplos de experiências externas, nada mais que o subaproveitamento do
seus erros e acertos devem ser tomados potencial turístico brasileiro, que ocupa o
como referencial no planejamento do 29º destino turístico mundial. No Brasil,
turismo interno. Contudo, é preciso cautela além da demanda turística ser ainda muito
na adoção de modelos e padrões insignificante, quando comparada a outros
importados, uma vez que o produto países, há uma grande concentração de
turístico é caracterizado pela diversidade e investimentos nos novos espaços
não pela homogeneidade dos lugares. As polarizados para este fim. Aeroportos são
especificidades ambientais e culturais do melhores equipados e vias expressas são
lugar turístico devem ser mantidas, abertas, servindo de ligação entre os
evitando-se a padronização paisagística e campos de pouso e os hotéis tipo resorts
cultural e o conseqüente desinteresse do Esses megahotéis estão localizados nas
turista. Nessa perspectiva, não se outrora praias distantes, verdadeiros
enquadra, por exemplo, os chamados paraísos ecológicos, agora próximos ao
carnavais fora de época, que incentivam a mundo civilizado e distantes das
invasão no sertão da cultura litorânea, comunidades tradicionais3.
onde recursos vultosos são aplicados sem Com o surgimento de novos espaços
qualquer retorno econômico ou benefício turísticos no litoral nordestino, problemas
social. ambientais e conflitos sociais passam a
Para que o turismo se desenvolva de existir, em razão da plastificação da
forma integrada aos outros setores da paisagem natural e cultural através da
economia, o seu planejamento deve conter implantação de empreendimentos hotelei-
estrutura sistêmica (Beni, 1997), possuindo ros. Conseqüentemente, os sítios de
conteúdo social, sem comprometimento da coqueiros, jaqueiras, mangueiras e frutas-
realidade paisagística e cultural local, pão, pontilhados de casinhas coloridas de
garantindo a descentralização política e pau-a-pique, são subitamente eliminados
econômica dentro de um modelo de da paisagem turística, devido à imediata
desenvolvimento autosustentável. valorização dos terrenos, com a abertura de
Quando comparado aos investimentos estradas asfaltadas e a chegada dos
na industria formal2, o turismo apresenta loteamentos4.
custos bastante reduzidos, tornando Entretanto, o modelo de turismo praia-
possível arrecadar recursos em curto prazo sol, já apresenta claros sinais de exaustão.
e criando uma infinidade de postos de Principalmente porque o principal produto
trabalho. Segundo dados da Embratur – turístico, a paisagem litorânea, está sendo
Instituto Brasileiro de Turismo, a indústria destruído pelos empreendimentos turísticos
turística mundial faturou US$ 4,5 trilhões e casas de veraneio. Vale lembrar que o
em 1999, permitindo a criação de 192 turismo é uma atividade cíclica: apresenta
milhões de empregos. um início, um meio e o fim (Gallero, 2000).
Giovanni de Farias Seabra 139

Sendo que o fim do turismo torna-se tanto Navio, no alto Sertão do Pajeú, em
mais próximo quanto maior for a velocidade Pernambuco.
de destruição do patrimônio natural e
cultural. Riacho do Navio, corre pro Pajeú
Quando se trata do litoral brasileiro, o O Rio Pajeú vai desaguar no São
patrimônio turístico está sendo destruído Francisco
de maneira acelerada e irresponsável. A O Rio São Francisco Vai bater no
velocidade dos empreendimentos meio do mar ...
transforma as paisagens naturais, o próprio
produto turístico, em lugar não turístico, Nesse ambiente extremamente seco na
onde o turista torna-se refém de uma maior parte do ano, o prenúncio das chuvas
estrutura fechada intramuros, sem tardias acontece quando o “mandacaru
nenhuma identidade com o lugar. flora na seca”, ou no canto da Pedra do
Tudo leva a crer que a praia é um caso Claranã, no lado Pernambucano da Serra
sem solução, pois o ciclo do turismo do Araripe.
encontra-se em sua fase terminal. Por isso, A pesquisa acadêmica possibilitou, por
antes que seja tarde, deve-se lançar um exemplo, a descoberta e mapeamento de
olhar para o interior - o domínio dos cavernas, cachoeiras e áreas de garimpo na
Sertões. Chapada Diamantina (Seabra, 1991; Neu,
1990). Fazem parte dos roteiros turísticos
Mas, ir ao sertão ver o quê? de Pernambuco, os brejos de altitude –
Taquaritinga e Triunfo, há décadas objetos
A Universidade cumpre um papel de estudo do geógrafo Gilberto Osório de
importante na identificação das Andrade. Atualmente desenvolve-se um
potencialidades turísticas do Sertão. Com turismo de base social no Parque Nacional
base em pesquisas, trabalhos de campo e o Serra da Capivara, em São Raimundo
contato direto com a população sertaneja, Nonato (Piauí), como resultado da
foi constado que o Sertão Nordestino possui identificação dos sítios arqueológicos, em
um potencial turístico de valor inestimável, trabalho coordenado pela arqueóloga Niéde
fundamentado no patrimônio natural, no Guidon.
patrimônio cultural e arqueológico e nos Na Paraíba, pesquisadores da
festejos juninos e religiosos. As informações Universidade Federal (Departamento de
levantadas e publicadas em teses, projetos Geociências) executam projetos voltados
e diversos trabalhos científicos, permitiram para o Planejamento do Turismo nos Brejos
criar os lugares turísticos no interior do de Altitude, incentivando o ecoturismo e o
País – é a chamada turistificação do lugar. turismo rural, através do uso das reservas
Com extensão de aproximadamente 1 florestais e da revitalização dos engenhos
milhão de quilômetros quadrados e de cachaça e de rapadura. Também são
população de 20 milhões de pessoas, o semi- objetos da pesquisa acadêmica o Sertão e o
árido nordestino é cercado de Cariri Paraibano.
características únicas. As precipitações Em Pernambuco, no ano de 1838, o
atmosféricas reduzidas e irregulares fanatismo sebastianista teve seu ápice, com
associadas às temperaturas elevadas, sacrifícios humanos executados do alto de
provocam o lasqueamento e desfolhamento pontões escarpados, na chamada Pedra do
das rochas, resultando em relevo com Reino, em São José do Belmonte. O fato é
formas bizarras, como pirâmides, pães-de- lembrado todos os anos, no último domingo
açúcar, cristas, serrotes, boqueirões e de maio, quando uma grande cavalgada
matacões. parte da cidade para a Pedra do Reino,
Nas distantes áreas interioranas atraindo visitantes de várias regiões e
despontam os lajedos cobertos por uma estados do Nordeste.
vegetação rala e espinhenta – é a caatinga
hiperxerófita. Os vales são rasgados por Uma alternativa econômica para o
rios e córregos pedregosos, totalmente secos semi-árido
a maior parte do ano, ou o ano todo. Um
desses leitos secos chama-se riacho do Dado ao seu caráter natural, cultural,
140 O turismo sertanejo como alternativa …

paisagístico, sócio-econômico, ecológico e De base fundamentalmente social, o


educativo, o turismo sertanejo insere-se na turismo sertanejo tem um perfil
perspectiva desenvolvimento/preservação agroecoturístico e cultural, possibilitando
ambiental das áreas interioranas do Brasil. ao turista vivenciar experiências
Seguindo no contra-fluxo do modelo participativas em meio à paisagem
economicamente concentrador que vigora sertaneja, deleitando-se com as
no País, o turismo sertanejo prioriza a apresentações folclóricas e culturais. Além
capacidade de suporte dos sistemas do mais, o turista é acomodado em
naturais e, ao mesmo tempo, incentiva o pequenas unidades hoteleiras familiares,
desenvolvimento sustentável dos sistemas nos pequenos centros urbanos e no campo,
econômico - sociais. onde os hábitos simples de vida são um
Encontra-se inserida nessa nova elemento a mais na paisagem,
proposta a compreensão integrada do meio proporcionando descanso, lazer e
ambiente em suas múltiplas e complexas crescimento pessoal ao visitante.
relações, envolvendo aspectos físicos, O cenário para o desenvolvimento desses
biológicos, sociais, econômicos, tecnológicos, recursos turísticos deve resultar,
culturais, científicos e éticos. O palco onde necessariamente de um esforço conjunto
se desenvolvem as ações do turismo entre os órgãos oficiais federais e estaduais,
sertanejo corresponde aos pequenos centros prefeituras, universidades, empresários,
urbanos interioranos (arquitetura, trade turístico e a mídia, cuja troca de
artesanato, culinária, folclore), bem como experiências possibilitará o resgate da
as áreas rurais contíguas, destacando-se as auto-estima do homem do sertão, bem como
paisagens naturais e agropecuárias. sua ascensão social através do incremento
De uma maneira bastante sintética, na produção econômica local.
pode-se dizer que o turismo sertanejo
insere-se na categoria de turismo exótico, O Turismo Sertanejo em Ouricuri
um misto de agroecoturismo, com ênfase na
cultura regional e no fortalecimento da Um exemplo de projeto bem sucedido,
auto-estima da comunidade local. para o desenvolvimento do turismo
Ao apresentar alternativas econômicas sertanejo em regiões semi-áridas, é o que
para o semi-árido nordestino, o turismo está sendo implementado pela ONG
sertanejo impulsiona a cadeia produtiva, CAATINGA - Centro de Assessoria e Apoio
tendo como base a descoberta e aos Trabalhadores e Instituições Não
identificação dos atrativos turísticos, sem Governamentais Alternativas, na zona rural
que haja descaracterização da paisagem de Ouricuri, no estado de Pernambuco
sertaneja e nem a perda da identidade (Seabra, 2001c). Com experiência na região
cultural do homem do sertão. Outro aspecto de quinze anos, o CAATINGA propõe, de
importante é a revitalização do padrão maneira aplicada, alternativas econômicas
arquitetônico urbano, a limpeza das cidades para as comunidades rurais, notadamente
e a revalorização das feiras livres, onde o no que diz respeito à agricultura de
artesanato e a culinária servirão como sequeiro ou com irrigação localizada (
incentivo cultural e econômico. construção de barragens subterrâneas), a
Neste panorama é idealizada uma nova melhoria do plantel de animais, a produção
modalidade de turismo alternativo de de mel de abelhas e o abastecimento de
custos reduzidos, uma vez que os recursos água para consumo humano, com a
turísticos já se encontram no local. Por construção de cisternas nas residências do
outro lado, a mão-de-obra é formada pelo campo. Outra iniciativa pioneira do
próprio homem sertanejo e sua família. CAATINGA diz respeito à implementação
Estes são os marcos conceituais que de um projeto de turismo social, captando
definem o turismo sertanejo, que se recursos, agregando renda e elevando o
caracteriza por ser uma atividade de lazer padrão de vida da população rural.
interativa com a paisagem interiorana, O Projeto de Turismo Social do
onde estão presentes o quadro natural, a CAATINGA (Seabra, 2001c) encontra-se em
cultura local e a participação integrada da sua fase inicial, que compreende:
comunidade residente.
Giovanni de Farias Seabra 141

• Identificar as potencialidades turísticas Parque Ecológico da Caatinga e, na outra, o


locais com base nos valores Parque Agroecológico. Em ambas as
paisagísticos e culturais; propriedades verificou-se ocorrência tanto
• Resgatar e incentivar a identidade da formação arbustiva, como da formação
cultural local; arbórea, com ocorrência de diversas
• Definir locais e roteiros turísticos na espécies nativas como tamboril, angico,
Região; ibiratanha, pau-branco, catingueira,
• Melhorar infraestrutura e jurema, quipá, mandacaru, joazeiro,
equipamentos rurais; aroeira, mulungu, cajarana, barriguda,
• Relacionar parceiros potenciais; burra leiteira, pau ferro, pau d’ arco,
• Capacitar representantes comunitários baraúna, umbuzeiro, umburana, cedro,
para inserção no Projeto; macambira, caroá, palmatória, coroa-de-
• Implantar oficinas de treinamento frade, mamão-de-veado, etc.
direcionadas à comunidade local; Muitas dessas árvores e arbustos são
• Divulgar o Projeto Turístico do utilizadas como medicamentos para a cura
CAATINGA nos diversos estados do de diferentes tipos de doenças, além do
Brasil, nas universidades federais e fabrico de cercas, casas, móveis,
instituições particulares de ensino artesanatos e um sem número de utensílios
superior. domésticos. Diversas espécies vegetais são
O cenário para implantação e desenvol- também usadas como suprimento
vimento do projeto de turismo social alimentar pelas famílias sertanejas
compreende o município de Ouricuri e seu durante os longos períodos secos.
entorno, localizado na Microrregião do No tocante à fauna silvestre destacam-
Araripe, no Sertão de Pernambuco. se o veado catingueiro, o queixada, o tatu, o
A cidade de Ouricuri possui localização peba, o lobo-guará, o sagüi, o camaleão, o
privilegiada, ao situar-se na Microrregião calango e diferentes espécies de cobra.
do Araripe, que está inserida na Entre as aves destacam-se juriti, beija-flor,
Mesorregião do Sertão Pernambucano. bem-te-vi, guinguirra, arribaçã, nambu,
Situa-se geograficamente em um seriema, rolinha e casaca-de-couro.
entroncamento que dá acesso à Araripina e A zona rural de Ouricuri, com
ao Piauí (oeste); Petrolina (sul); Recife aproximadamente 30.000 habitantes,
(leste)e Crato (norte). As rodovias integram possui características naturais e sócio-
Ouricuri a dezenas de municípios situados culturais próprias, o que configura-se na
no sertão, agreste e mata de Pernambuco e preservação da identidade da paisagem
dos estados do Ceará, Piauí, Rio Grande do sertaneja.
Norte, Paraíba e Bahia. Além das cisternas e barragens
Do ponto de vista fisiográfico a área subterrâneas, o CAATINGA implantou o
corresponde a uma superfície sertaneja Programa de Apicultura, possibilitando a
pediplanada, recoberta por vegetação de retirada de grande quantidade de mel-de-
caatinga arbóreo-arbustiva. O clima semi- abelhas de excelente qualidade,
árido (Bsh, na classificação de W. Köppen) proveniente das flores de várias espécies
da área determina a ocorrência de rios nativas, que conta com mercado seguro
intermitentes, cuja deficiência hídrica deve- dentro e fora do País.
se às elevadas temperaturas e à escassez e Com relação aos aspectos culturais da
irregularidade das chuvas. população são evidenciadas as festas e
A monotonia da paisagem aplanada é tradições, como folguedos, danças, e festejos
quebrada pela presença dos contrafortes da religiosos. A comida típica, as brincadeiras,
Chapada do Araripe e morros testemunhos os mitos, as lendas e os causos são traços
(inselbergues) encontrados isoladamente na marcantes da cultura popular. As histórias
planície. e as lendas da região são contadas em prosa
A cobertura vegetal é representada pela e verso, através da literatura de cordel e
caatinga, possuindo, em algumas proprie- embates dos repentistas.
dades, elevado estado de conservação. No Outro elemento cultural importante é a
projeto, dois sítios foram selecionados para Feira de Gado, realizada nas quintas-feiras,
visitas públicas, em um deles será criado o que reúne vaqueiros, comerciantes,
142 O turismo sertanejo como alternativa …

artesãos e violeiros de várias regiões. Neste eletricidade.


local são oferecidos pratos típicos diversos, A estratégia para consolidação do
representando o que há de melhor na projeto compreende a divulgação em nível
culinária sertaneja. A identidade cultural local, regional e nacional, através da
apresentada na Feira do Gado é um elo de participação em feiras, seminários,
ligação entre as culturas urbana e rural, congressos e apresentação de conferências
sendo, por isso, um atrativo turístico de em cursos técnicos e de nível superior.
grande valor. Como resultado da implementação deste
As habitações rurais espaçosas e projeto de turismo social rural, pretende-se
confortáveis, estilo casa grande, são marcos mobilizar, capacitar e integrar as
arquitetônicos do Período Colonial. Os comunidades rural e urbana ao projeto,
limites das propriedades são evidenciados proporcionando elevação do padrão de vida
pelas cercas de varas em-pé e deitada, da sociedade como um todo, fortalecendo a
trançada e de forquilha, construídas com identidade paisagística e cultural regional.
madeira, lenha e pedras do próprio local. Ao final de dois anos, o projeto estará
Na área de atuação do Projeto consolidado, apresentando um fluxo
CAATINGA, vislumbra-se em meio à permanente de turistas para o Município de
paisagem seca do semi-árido equipamentos Ouricuri.
alternativos que possibilitam condições
dignas de moradia, trabalho e qualidade de Considerações finais
vida para o homem sertanejo. O conforto
pode ser observado nas habitações amplas, A região semi-árida é veiculada na
construídas em alvenaria, eletrificadas, mídia como uma área marcada pela
com sanitários e cisternas. Algumas pobreza e a miséria. Lugar onde impera o
residências possuem meios de comunicação analfabetismo, a ignorância, a fome e a
modernos, como rádio, televisão e antenas doença.
parabólicas. Como meios de transporte Na zona rural de Ouricuri, município
local, são utilizados, principalmente, localizado no alto sertão pernambucano, a
automóveis, motocicletas e bicicletas. O ONG CAATINGA vem atuando há
cavalo é pouco usado como meio de dezesseis anos tornando possível, não
transporte dos moradores locais. Porém, o somente a convivência do sertanejo com
carro de boi é ainda bastante empregado no longos períodos secos, mas possibilitando
transporte de produtos diversos. melhor qualidade de vida com o
Na localidade do Jatobá ainda se desenvolvimento de técnicas direcionadas
encontram traços culturais tradicionais, ao abastecimento de água e à criação de
como o engenho de rapadura movido a alternativas econômicas através do
tração animal (boi) e o fabrico de alfinim associativismo.
(rapadura mole semelhante as suspiro) Nesse contexto, surgiu a proposta de
pelas mulheres do lugar. introdução na zona rutral do turismo social,
Durante os trabalhos de campo houve como mais um elemento para o aumento de
visita a algumas residências rurais, entre renda da comunidade.
as quais uma foi vistoriada para estudo de Passados seis meses desde o seu início, o
viabilidade para implantação de uma projeto de turismo social rural de Ouricuri
pousada rural de base familiar. Constatou- conta com equipamentos básicos para
se o estado satisfatório de conservação do recepção do turista na sede rural do
imóvel, a divisão dos ambientes internos e CAATINGA, como um alojamento para
externos, bem como o quintal, apropriado, quarenta visitantes, refeitório, auditório,
limpo e asseado, aprazível aos olhos, pelo museu e microônibus. Também foram
criatório de animais domesticados e a selecionadas algumas residências rurais
cobertura vegetal regional. Os imóveis que serão cadastradas como pousadas
possuem capacidade para receber no familiares. Além das visitas às
máximo dez visitantes por vez. Para maior propriedades rurais, os sítios Ponta da
comodidade do turista, as residências Serra e Campo Grande estão sendo
rurais são dotadas de cisternas, água adaptados para visitação pública,
encanada, sistema de saneamento, e respectivamente, o Parque Ecológico da
Giovanni de Farias Seabra 143

Caatinga e o Parque Agroecológico da NOTAS


Caatinga.
Atualmente o Projeto recebe turistas de 1
Artigo publicado na Revista Paraibana de
Recife, João Pessoa e Fortaleza (mais Geografia. Vol.3, Número 1, julho de 2001.
freqüentes) além de outras regiões do País.
2
Para acompanhamento dos visitantes, Dados da Embratur registram que cada novo
foram capacitados treze jovens emprego direto no país custa mais de US$ 100
pertencentes à comunidade, alguns deles já mil em indústrias de ponta, US$ 40 mil na
iniciados em trabalhos burocráticos e de indústria hoteleira, US$ 10 mil em bares e
administração. restaurantes e apenas US$ 500 no ramo de
artesanato.
Bibliografia 3
Nos últimos anos, o Programa de Desenvol-
Beni, Mário Carlos vimento Turístico do Nordeste - Prodetur/NE
aplicou R$ 6,4 bilhões na implantação de
1997 Análise Estrutural do Turismo. São
infraestruturas para viabilizar os
Paulo: Editora Senac.
empreendimentos turísticos. O programa é
Gallero, Álvaro Lopes
financiado pelo Banco Interamericano de De-
2000 Realidades del espacio del empleo en senvolvimento – BID, em parceria com os
el sector turístico. IV Encontro estados nordestinos, que bancam 50% dos
Nacional de Turismo com Base Local. investimentos. O modelo hoteleiro adotado,
Anais. Joinville: IELUSC, novembro. tipo Cancun, ocupa as áreas habitadas pelas
Neu, Claudia comunidades locais, impedindo-as de terem
1990 O garimpo manual de Igatu e seus acesso aos meios tradicionais de subsistência.
efeitos no meio ambiente.
FFLCH/UFPE. 4
As vias asfaltadas que cortam os sítios litorâneos
Seabra, Giovanni F em direção aos megaprojetos hoteleiros,
1991 Estudo geomorfológico da Região produzem, às suas margens, uma infinidade de
Cárstica de Andaraí: uma tipos de comércio, como postos de gasolina,
contribuição à conservação de borracharias, bodegas, pequenos restaurantes,
cavernas. Tese de Mestrado. motéis, lojas de material de construção e
Departamento de Geografia/UFPE. loteamentos.
1997 Fundamentos e Perspectivas da
Geografia. João Pessoa: Editora
UFPB.
2001a Pesquisa Científica: o método em
questão. Brasília: Editora UnB.
2001b Ecos do Turismo: o turismo ecológico
em áreas protegidas. Campinas:
Editora Papirus.
2001cPlano de Negócios CAATINGA:
Sistema I – Turismo Social. Ouricuri.

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