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APRENDA A LER

E ENTENDER
o s MOVIMENTOS DO CORPO

Aprenda, por exemplo:


• Como se aproximar de alguém, eliminando as chances de ser evitado!

• Como ler o movimento dos ombros. (A pessoa com quem você se encon-
tra agora está de bom humor? Irritada? Amedrontada?)

• A linguagem corporal entre parceiros sexuais. Como transmitir sentimen-


tos e desejos sem palavras.

• Como entrar num ambiente cheio de estranhos, observar a postura do


corpo e dizer quem são as pessoas "importantes".

• Como usar a Linguagem do corpo para assumir a liderança de um


grupo.

• Como você pode usar essa "nova" linguagem para competir com a lin-
guagem verbal.
AGRADECIMENTOS

O autor gostaria de expressar sua gratidão às seguintes pessoas, pela ajuda


na preparação deste livro: dr. Arnold Buchheimer, Psicólogo e Professor-
Titular de Educação na City University of New York, dr. Albert E. Scheflen,
Professor-Titular de Psiquiatria no Albert Einstein College of Medicine,
Michael Wolff, Doutorando em Psicologia Social, City University of
New York, Jean Linden, Pesquisador, Interscience Information, Inc.

Este livro é dedicado a todos os passageiros do segundo vagão do


trem F do Independent Subway, linha que percorre a região Leste,
saindo da Quinta Avenida, às 5h22min da tarde.

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SUMÁRIO

1. O corpo é a mensagem 9
Uma ciência chamada cinesiologia • Um novo sinal do inconsciente •
Como diferenciar as garotas • Tocar ou não tocar • Um toque de solidão

2. Dos animais e territórios 14


A luta simbólica • Podemos herdar uma linguagem? • "O imperativo terri-
torial" • De quanto espaço o homem precisa?

3. Como lidamos com o espaço 21


Um espaço só seu • Uma ciência chamada proxêmia • espaço público e
social • Como diferentes culturas lidam com o espaço • Como o mundo
ocidental lida com o espaço

4. Quando o espaço é invadido 32


Defendendo zonas corporais • Conselho para aqueles que buscam status
• Como ser um líder • O espaço que mantemos inviolável • Do espaço e
da personalidade • Sexo e relacionamento impessoal • Como você age ao
sentar-se ao lado de alguém *

5. As máscaras que os homens usam 44


O sorriso que esconde a alma • Tire a máscara • A máscara que nunca
tiramos • Quando uma pessoa é uma não-pessoa? • O masoquista e o sádi-
co • Como deixamos a máscara cair

6. O maravilhoso mundo do toque 53

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Segure minha mão • As máscaras debilitantes • Você é o que sente ser •
Como romper a proteção • A festa em que era proibido falar •
Participando de jogos que fazem bem à saúde

7. A Silenciosa linguagem do amor 63


Atitudes, olhares e aproximações • Ela está disponível? • Vale a pena se
proteger? • Programas de "todos os tipos" • Escolha sua postura •
Encontros semi-sexuais

8. Posições, pontos e posturas 77


Um pedido de ajuda • O que sua postura diz? • Lugares diferentes, postu-
ras diferentes • O movimento e a mensagem • Posturas e apresentações •
Lutando pela posição • Três pistas para o comportamento da família

9. Piscar e acenar * 92
O Olhar que desumaniza • Um momento para olhar • O olhar incômodo
• Olhares indiscretos • Outras culturas, outros olhares • Um olhar demo-
rado para si mesmo • Quanto tempo dura um olhar?

10. Um alfabeto cfc> movimento 102


Haverá uma linguagem das pernas? • O ABC da linguagem do corpo •
Rotulando os cines • Cultura e cinesiologia • Siga o líder

11. Linguagem do corpo: Use e Abuse 113


Vamos conversar com os animais • Símbolos em um mundo sem sons •
Saúde mental por meio da linguagem do corpo • Falseando a linguagem
do corpo • Juntando tudo

Referências selecionadas 127

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Uma ciência chamada cinesiologia

Nos últimos anos, uma nova e intrigante ciência foi descoberta e passou
a ser aprofundada: a linguagem do corpo. Tanto o estudo científico quanto a
literatura sobre essa ciência foram denominados cinesiologia. A linguagem do
corpo e a cinesiologia baseiam-se em padrões de comportamento da comu-
nicação não-verbal, mas a cinesiologia ainda é tão nova como ciência que as
autoridades no assunto podem ser contadas nos dedos da mão.
Estudos clínicos revelaram que a linguagem do corpo pode contradizer
as comunicações verbais. Um exemplo clássico é uma jovem mulher que dizia
ao seu psiquiatra que adorava seu namorado enquanto balançava a cabeça de
um lado para outro, revelando um lado negativo subconsciente.
A linguagem corporal também lançou nova luz à dinâmica das relações
interfamiliares. Por exemplo, a forma como os integrantes de uma família, aõ se
sentarem, movem os braços e as pernas, pode ser bastante reveladora. Se a mãe
cruza as pernas primeiro e o resto da família faz o mesmo, ela estabelece a lide-
rança, visto que sua ação é seguida pelos familiares, embora tanto ela como os
familiares possam não estar conscientes disso. De fato, as palavras da mãe
podem negar sua liderança, pois ela pede conselhos ao marido e aos filhos. Mas,
um estudioso do assunto perceberia como essa família é constituída, a partir da
pista não-verbal dada pela mãe, a líder, para que seus familiares a sigam.

Um novo sinal do inconsciente

O dr. Edward H. Hess anunciou a uma convenção recente da American


College of Medicai Hypnotists (Faculdade Americana de Hipnose Médica) um

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novo sinal cinésico recém-decoberto. É a dilatação inconsciente da pupila
quando vemos algo agradável. Na prática, isso pode ajudar num jogo de
pôquer, se um jogador está procurando "adivinhar" a posição de seu adversá-
rio. Quando a pupila de seu adversário se dilata, ele pode ter certeza de que
o outro está com boas cartas. O jogador pode não perceber suas habilidades
de ler esse sinal, assim como seu adversário não sabe que está revelando sua
própria sorte.
O dr. Hess descobriu que a pupila de um homem normal aumenta de
tamanho duas vezes, ao ver a foto de uma mulher nua, e ele cita o uso do novo
princípio cinésico para detectar o efeito de um comercial de televisão:
enquanto a propaganda está sendo mostrada a uma audiência selecionada, os
olhos dos espectadores são fotografados. O filme é cuidadosamente estuda-
do para detectar quando há dilatação da pupila; em outras palavras, quando
há qualquer resposta inconsciente, favorável ao comercial.
A linguagem corporal pode incluir qualquer movimento reflexivo ou
não-reflexivo de uma pessoa, de todo o corpo ou parte dele, para transmitir
uma mensagem emocional ao mundo externo.
Para entender essa linguagem corporal não-verbalizada, os especialistas
em cinesiologia precisam levar em consideração diferenças culturais e
ambientais. O homem comum, sem conhecimento das especificidades cultu-
rais da linguagem do corpo, muitas vezes interpreta mal o que vê.

Como diferenciar as garotas

Allen era um garoto de uma pequena cidade que tinha ido visitar Ted,
numa cidade grande. Certa noite, a caminho do apartamento de Ted, onde
haveria uma festa, Allen viu uma jovem morena, atraente atravessar a rua à sua
frente e então começou a subir o quarteirão. Allen seguiu-a, admirado com
seu andar provocante. Mas, faltou a Allen captar a mensagem não-verbal que
ela lhe transmitiu!
Ele a seguiu, percebendo que a garota sabia que ele a seguia, e continua-
va a andar da mesma maneira insinuante. Allen tinha certeza de que se trata-
va de uma provocação.
Finalmente, o sinal fechou, Allen encheu-se de coragem e, aproximan-
do-se da moça, deu um sorriso irresistível e lhe disse: "Olá".
Para sua surpresa, ela virou-se furiosa e, cerrando os dentes, lhe disse:
"Se você não me deixar em paz eu vou chamar a polícia". Quando o semáfo-
ro mudou, ela desapareceu.
Allen ficou chocado, seu rosto enrubesceu de vergonha. Ele se apressou
para chegar ao apartamento de Ted, onde a festa já havia começado. Enquan-
to Ted lhe oferecia algo para tomar, ele contou a história ao amigo, que caiu
na risada.

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— Cara, você se enganou.
— Mas, Ted, nenhuma garota de família iria andar daquele jeito, se não
fosse para provocar alguém.
— Estamos próximos a moradores de origem hispânica. As meninas, ape-
sar de terem aparência expansiva, são muito recatadas —, Ted explicou.
O que Allen não entendeu é que numa cultura como a de muitos países
de língua espanhola, em que as meninas são vigiadas e há códigos estritos de
comportamento social, uma jovem pode exibir sua sensualidade com segu-
rança, sem medo de criar problemas. De fato, o andar que Allen interpretou
como uma provocação seria considerado natural, enquanto a postura ereta e
rígida de uma mulher americana provavelmente seria considerada sem graça
e nada natural.
Allen começou a circular pela festa e, aos poucos, esqueceu-se do vexame.
Quando a festa estava terminando, Ted chamou Allen de lado e lhe per-
guntou:
— Está interessado em alguém?
— Naquela Janet — disse Allen. — Cara, aquela eu gostaria de conhecer.
— Muito bem. Peça a ela para ficar. Margie também vai ficar e poderemos
jantar juntos.
— Não sei. Ela me dá a impressão de que eu não conseguiria nada com
ela.
— Está brincando!
— Não. A noite toda ela não permitiu que me aproximasse dela.
— Mas Janet gosta de você. Ela me disse.
— Mas — disse Allen perplexo —, por que será que ela é tão, tão, eu não
sei... parece que ela não queria me deixar tocar nela.
— É assim que ela reage. Você não entendeu a mensagem dela.
— Eu nunca entenderei esta cidade —, disse Allen, ainda surpreso, mas
feliz.
Allen descobriu que nos países latinos as meninas podem transmitir uma
mensagem direta de interesse por alguém, tornando, no entanto, qualquer
tipo de contato físico impossível. Em países onde é menos freqüente uma
menina andar acompanhada, ela constrói suas próprias defesas por meio de
uma série de mensagens não-verbais que indicam claramente: "não se apro-
xime". Quando o homem não pode, de acordo com as regras da cultura, apro-
ximar-se de uma menina estranha na rua, essa pode andar livremente, mais
solta. Numa cidade como Nova York, onde uma menina pode esperar quase
tudo, principalmente numa festa, ela aprende a enviar uma mensagem dizen-
do: " não se aproxime/'. Para isso, ela mantém uma postura rígida, cruza as per-
nas ao sentar-se, cruza os braços e usa outros gestos defensivos.
Toda situação envolve dois elementos da linguagem corporal, a transmis-
são e a recepção da mensagem. Se Allen tivesse sido capaz de receber as men-

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sagens corretamente, em termos da cidade grande, ele teria se poupado
daquela situação embaraçosa na rua e poderia ter sentido mais segurança para
se aproximar de Janet na festa de seu amigo.

Tocar ou não tocar

A linguagem corporal, além de enviar e receber mensagens, se entendi-


da e usada habilmente, também pode servir para romper defesas. Um homem
de negócios que estava tentando fechar um contrato muito lucrativo desco-
briu que interpretou erroneamente os sinais.
— Era um negócio — ele me disse — que seda lucrativo não só para mim
como também para Tom. Tom era de Bountiful e estava em Sait Lake City, que
não ficava longe, geograficamente, mas a quilômetros de distância, em termos
culturais. É uma cidade muito pequena, e Tom tinha certeza de que qualquer
um numa cidade grande seria c^paz de enganá-lo. Achç que, no fundo, ele esta-
va convencido de que o contrato seria bom para ambos, mas não confiava em
mim. Eu era o homem de negócios da cidade grande, lá em cima, comandando
e fazendo o negócio, e ele era o garoto inocente, prestes a ser trapaceado.
— Tentei quebrar a imagem que ele fazia de mim, como empresário de
uma cidade grande, pondo meu braço em seu ombro. E isso pôs tudo a perder.
O que meu amigo empresário fez foi violar a barreira de defesa de Tom
com um gesto não-verbal sem uma base estabelecida. Em linguagem corpo-
ral, ele estava tentando dizer: ''Confie em mim. Vamos nos aproximar". Mas
ele só conseguiu cometer um ataque não-verbal. Ao ignorar as defesas de
Tom, o empresário ansioso arruinou o negócio.
Muitas vezes, o tipo mais rápido e óbvio de linguagem corporal é o toque.
Tocar alguém com as mãos, colocar o braço no ombro de alguém, pode
expressar uma mensagem mais vívida e direta que centenas de palavras. Mas,
o toque precisa vir no momento e contexto certos.
Mais cedo ou mais tarde todo garoto aprende que tocar uma menina no
momento errado pode fazê-la esquivar-se abruptamente.
Há pessoas que tocam compulsivamente os outros, que parecem ignorar
todas as mensagens que recebem de amigos e companheiros. São pessoas que
tocarão e tentarão agradar aos outros em momentos em que estão sendo bom-
bardeadas de mensagens para não fazerem isso.

Um toque de solidão

Contudo, tocar ou agradar pode ser um sinal muito forte. Tocar um obje-
to inanimado pode servir como um sinal claro, ou como um apelo para ser

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compreendido. Veja o caso de tia Grace. Essa senhora idosa tornara-se o cen-
tro de uma discussão de família. Alguns familiares achavam que ela ficaria
melhor num asilo bem-dirigido e agradável, onde houvesse alguém para
tomar conta dela e ela tivesse muita companhia.
O resto da família achava que seria crueldade colocar Tia Grace "para
fora". Grace tinha uma renda generosa e um apartamento muito confortável,
e podia muito bem viver sozinha. Por que ela não poderia viver onde estava,
com independência e liberdade?
Tia Grace não interferiu muito na discussão. Sentou-se junto à família,
tocando seu colar e meneando a cabeça, pegando um pequeno vaso de ala-
bastro e acariciando-o, deslizando a mão pelo sofá de veludo, sentindo o enta-
lhe da madeira.
- O que a família decidir para mim esta bom - disse ela gentilmente - ,
não quero problema para ninguém.
A família não chegava a decisão alguma e continuou a discutir o proble-
ma, enquanto tia Grace tocava todos os objetos ao seu alcance.
Até que finalmente a família captou a mensagem. Era uma mensagem
muito óbvia. Incrível como ninguém a tivesse captado antes. Tia Grace toca-
va e acariciava tudo a seu alcance, desde que passou a viver sozinha. Toda a
família sabia disso, mas só naquele momento foram entendendo, um a um, o
que aquelas carícias estavam dizendo. Ela estava lhes dizendo em linguagem
corporal: 11 Estou sozinha. Estou muito carente de companhia. Ajudem-me.r
Tia Grace foi morar com uma sobrinha e um sobrinho, onde se tornou
uma mulher diferente.
Da mesma forma que tia Grace, todos nós, de uma maneira ou de outra,
enviamos nossas pequenas mensagens para o mundo. Dizemos:"Ajudem-me;
estou sozinho. Levem-me com vocês. Deixem-me só, estou deprimidd'. E rara-
mente enviamos nossas mensagens conscientemente. Acionamos sem perce-
ber nossa linguagem não-verbal. Erguemos uma sobrancelha, mostrando
descrença. Esfregamos o nariz, indicando perplexidade. Cruzamos os braços
para buscar isolamento ou proteção. Encolhemos os ombros por indiferença,
piscamos o olho numa situação de intimidade, tamborilamos com os dedos por
impaciência, enrugamos a testa devido a um esquecimento nosso.
São inúmeros os gestos e, embora alguns sejam deliberados e outros sejam
quase deliberados, alguns deles, como esfregar o nariz em sinal de perplexi-
dade ou cruzar os braços para buscar proteção, são os mais inconscientes.
O estudo da linguagem do corpo é um estudo da combinação de todos
os movimentos corporais, dos mais deliberados aos completamente incons-
cientes, incluindo aqueles que se aplicam apenas a uma cultura, ou os que
rompem todas as barreiras culturais.

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A luta simbólica

A relação entre a comunicação animal e humana só agora está começan-


do a ser entendida. Muitos de nossos conhecimentos sobre a comunicação
não-verbal vêm de experiências com animais. Os pássaros se comunicam pelo
canto, geração após geração, entoando a mesma seqüência de notas, a mes-
ma melodia simples ou complexa. Por muitos anos os cientistas acreditaram
que essas notas, esse canto dos pássaros, eram comportamentos hereditários,
como a linguagem dos golfinhos, o vôo de certas vespas e o coaxar dos sapos.
Atualmente, entretanto, há dúvidas de que sejam comportamentos here-
ditários. As experiências parecem indicar que o canto dos pássaros é apren-
dido. Os cientistas criaram certos pássaros isolados dos outros de sua espécie
e esses filhotes nunca foram capazes de reproduzir o canto típico da espécie.
De fato, os cientistas que criaram pássaros conseguiram ensinar a eles o
fragmento de uma canção popular para substituir a música da espécie. Um
pássaro que cresça isolado nunca será capaz de se acasalar, pois o canto dos
pássaros está envolvido em todo o processo de acasalamento.
Outro tipo de comportamento animal que há muito foi considerado ins-
tintivo é a briga simbólica dos cães. Quando dois machos se encontram,
podem reagir de diversas formas, mas a mais comum é rosnando, mordendo,
simulando uma briga mortal. O observador inexperiente irá separar os ani-
mais aparentemente irritados. O dono que conhece o cão observa a briga, per-
cebendo o quanto ela é simbólica.
Isso não nos leva a dizer que a briga não seja verdadeira. Os dois animais
estão realmente competindo pelo domínio. Um deles vencerá, por ser mais
agressivo, talvez mais forte e com investidas mais duras que as do outro. As

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brigas terminam quando ambos os cães percebem que um é o vencedor,
embora nenhum deles tenha sofrido qualquer lesão. Então, acontece uma
coisa curiosa. O cão derrotado deita-se, rola e expõe a garganta ao vencedor.
O vencedor reage simplesmente ficando sobre o derrotado, mostrando
suas presas e rosnando por um instante. Então, os dois se afastam e a briga é
esquecida.
Um procedimento não-verbal ocorreu. O derrotado diz: "Eu me rendo.
Você é mais forte e eu lhe exponho minha garganta vulnerável'.
O vencedor diz: "Realmente, sou mais forte e vou grunhir e mostrar essa
força, mas vamos deixar isso para lá e brincar."
É interessante fazer um aparte para observar que praticamente em
nenhuma espécie de animais superiores um membro da espécie mata outro
por qualquer razão, embora possam brigar entre si por vários motivos. Entre
corças machos em época de acasalamento, essas brigas semi-simbólicas
podem se tornar embates verdadeiros e, em seguida, curiosamente, os ani-
mais atacarão as árvores próximas e não um ao outro.
Certos pássaros, depois de demonstrar irritação e bater as asas no prelú-
dio de uma luta feroz, acertam suas diferenças atacando furiosamente o ninho.
O antílope pode usar os chifres para atacar, mostrando sua superioridade, mas
a luta, embora seja furiosa, nem sempre acabará em morte, mas sim num ritual
de derrota. Os animais aprenderam a arte de exibir relacionamentos por meio
de atuações próximas da linguagem do corpo. .
A controvérsia sobre a luta simbólica de cães e outros animais é se essa
conduta, esse tipo de comunicação, é herdada da mesma forma que os instin-
tos, se é inerente ao padrão genético da espécie, sendo transmitida de uma
geração a outra, ou se é aprendida a cada geração.
Mencionei que em algumas espécies de pássaros o canto deve ser apren-
dido; entretanto, em outras, o canto é realmente instintivo. Os pintarroxos
aprendem seu canto, enquanto os emberizas herdam a habilidade de entoar
o canto característico, independentemente de crescerem ou não em contato
com outros de sua espécie. Ao estudarmos qualquer comportamento no mun-
do animal devemos ser cuidadosos para não generalizar. O que é válido para
uma espécie de pássaros não é necessariamente válido para outra. O que é
válido para os animais nem sempre o é para os homens. A luta simbólica dos
cães é considerada herdada por muitos cientistas e, no entanto, um treinador
de cães me assegurou que esse comportamento é aprendido.
"Observe uma cadela quando seus filhotes estão brigando. Se um deles
vence e tenta se impor, a ponto de machucar o outro, a mãe imediatamente o
faz parar, ensinando-o a respeitar a derrota de seu irmão. Não, um cão preci-
sa aprender o comportamento simbólico."
Por outro lado, há cães, como os cães esquimós da Groenlândia, que
parecem ter uma enorme dificuldade para aprender o comportamento simbó-

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lico. Niko Tinbergen, naturalista holandês, diz que esses cães possuem terri-
tórios definidos para cada matilha. Os filhotes machos transgridem constan-
temente os limites desses territórios, e por isso são constantemente punidos
pelos machos mais velhos que estabeleceram os limites. Enquanto ainda são
filhotes, parecem não aprender os limites. Estes passam a ser respeitados
quando eles atingem a maturidade sexual.
Após a primeira cópula, tornam-se conscientes dos limites. Será esse um
processo de aprendizagem que foi reforçado com os anos e então se efetiva?
Ou será um processo instintivo que apenas se desenvolve com a maturidade
sexual?

Podemos herdar uma linguagem?

A herança do instinto não é uma questão simples, nem o é o processo de


aprendizagem. É difícil identificar o quanto um sistema de comunicação qual-
quer é herdado e o quanto é aprendido. Nem todo comportamento é apren-
dido, mais do que é herdado, mesmo nos humanos.
E isso nos traz de volta para a comunicação não-verbal. Haverá gestos e
expressões universais culturalmente independentes e verdadeiros para todo
ser humano em todas as culturas? Existem coisas que todo ser humano faz que,
de alguma forma, expressem um significado para todos os demais seres huma-
nos, independentemente da raça, cor, credo ou cultura?
Em outras palavras, um sorriso indica sempre alegria? Franzir a testa é
sempre sinal de desprazer? Quando balançamos a cabeça de um lado para
outro, isso significa sempre um não? Quando a balançamos de cima para
baixo, sempre indica um sim? Podemos afirmar que todos esses movimentos
são universais e, nesse caso, que a capacidade de fazer tais movimentos é
decorrente de uma dada emoção que herdamos?
Se pudéssemos encontrar um conjunto completo de gestos e sinais, então
nossa comunicação não-verbal poderia ser como a linguagem dos golfinhos
ou como a linguagem não-verbal das abelhas, que por certos movimentos
definidos pode atrair toda uma colméia a uma fonte de mel recém-descober-
ta. Esses movimentos da abelha são herdados, não precisando, portanto, ser
aprendidos.
Temos uma forma de comunicação herdada?
Darwin acreditava que as expressões faciais da emoção são similares
entre os seres humanos, independentemente da cultura. Ele fundamentou sua
crença na origem evolucionária do homem. No entanto, no início da década
de 50, dois pesquisadores, Bruner e Taguiri, escreveram, após trinta anos de
estudo, que as melhores pesquisas disponíveis indicavam que não havia um
padrão inato, invariável, que acompanhasse emoções específicas.

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E então, catorze anos depois, três pesquisadores, Ekman, Friesen (do
Langley Porter Neuropsychiatric Institute, Califórnia) e Sorenson (do National
Institute ofNeurological Diseases and Blindness) descobriram que novas pes-
quisas sustentavam a crença de Darwin.
Eles realizaram estudos na Nova Guiné, Bornéu, Estados Unidos, Brasil
e Japão, cinco culturas totalmente diversas, em três continentes diferentes, e
descobriram: "Os observadores, nessas culturas, reconhecem algumas das
mesmas emoções quando lhes é mostrado um conjunto de fotos com expres-
sões faciais".
De acordo com os três pesquisadores, isso contradiz uma teoria de que
as expressões faciais de emoção são aprendidas socialmente. Eles também
sentem que há concordância dentro de uma cultura quanto ao reconhecimen-
to de diferentes estados emocionais.
Eles acreditam que esse reconhecimento universal esteja apenas indire-
tamente relacionado à herança. Citam uma teoria que postula a existência de:
"... programas subcorticais inatos ligando certos evocadores a expressões
faciais universais para cada um dos afetos primários— interesse, alegria, sur-
presa, medo, raiva, tristeza, desgosto, desprezo e vergonha".
Em outras palavras, isso significa que o cérebro de todos os homens é
programado para voltar os lábios para cima quando estão contentes, e voltá-
los para baixo quando estão descontentes; franzir a testa, erguer as sobrance-
lhas, levantar um lado da boca e assim por diante, de acordo com o sentimento
que está sendo alimentado no cérebro.
Por outro lado, eles enumeram outras expressões e regras que "variam
de uma cultura para outra e são aprendidas desde muito cedo na vida ".
"Essas regras—dizem e l e s — prescrevem o que fazemos para exibir cada
afeto em diferentes ambientes sociais; variam com o papel social e as caracte-
rísticas demográficas e deveriam variar de acorco com as culturas."
Os pesquisadores tentaram evitar condicionamentos culturalmente
determinados o máximo possível. Assim, procuraram estudar regiões isoladas
e, quando possível, sociedades pré-letradas, sem contato nenhum com os
meios de comunicação, apesar da facilidade cada vez maior de acesso à tele-
visão, ao cinema e à imprensa.
O trabalho deles parece ter provado que podemos herdar, em nossa
constituição genética, reações físicas básicas. Podemos nascer com a capaci-
dade de nos comunicar não verbalmente. Podemos manifestar ódio, temor,
alegria, tristeza e outros sentimentos básicos, conhecidos por outros seres
humanos, sem nunca ter aprendido como fazer isso.
É claro que isso não contradiz o fato de muitos gestos terem significados
diferentes de uma sociedade para outra. Nós do Ocidente fazemos um aceno
com a cabeça para indicar não, e a balançamos de cima para baixo para indi-

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car sim, mas há sociedades na índia onde ocorre exatamente o oposto. O
movimento para cima e para baixo significa não e de um lado para outro, sim.
Podemos entender, então, que nossa linguagem não-verbal é parcial-
mente instintiva, parcialmente ensinada e parcialmente imitativa. Mais tarde
veremos como esse aspecto imitativo é importante na comunicação verbal e
não-verbal.

"O imperativo territorial"

Uma das coisas que é herdada geneticamente é a noção de território.


Robert Ardrey escreveu um livro fascinante, The Territorial Imperative (O
Imperativo Territorial), em que descreve essa noção territorial no reino ani-
mal e humano. Nesse livro, ele discute a delimitação e a guarda de territórios
por animais, pássaros, veados, peixes e primatas. Para algumas espécies os
territórios são temporários, mudando a cada estação. Para outras espécies ani-
mais, são permanentes. Ardrey acredita que" a natureza territorial do homem
é genética e impossível de ser erradicada", e apresenta uma justificativa inte-
ressante para sua opinião.
A partir desses extensos estudos de animais, ele descreve um código ina-
to de comportamento no mundo animal que vincula a reprodução sexual à
defesa territorial. A chave do código, segundo ele, é o território, e o imperati-
vo territorial é o impulso, nos animais e nos homens, para se apoderarem de
uma dada área e a defenderem.
Pode haver um impulso em todos os homens pela posse e defesa de um
território, e pode ser que boa parte desse impulso seja inata. Entretanto, nem
sempre podemos estender as conclusões de estudos com seres humanos para
o mundo animal e vice-versa.
O imperativo territorial pode existir em todos os animais e em alguns
homens. A cultura pode fortalecer esse imperativo em alguns homens e enfra-
quecê-lo em outros.
Mas, pouco se duvida que os seres humanos tenham necessidade de pre-
servar seu território, embora o grau de imperatividade ainda permaneça inde-
terminado. Uma das peças de teatro mais assustadoras dos tempos modernos
é Home (Lar), de Megan Terry. Postula um mundo do futuro em que a explo-
são populacional faz com que a noção de território seja descartada. Os
homens vivem em células, em uma gigantesca colméia de metal que abrange
todo o planeta. Famílias inteiras vivem suas vidas confinadas em um ambien-
te sem ver nem mesmo o céu ou a terra, ou qualquer outra célula.
Nessa profética história de terror, o território foi completamente abolido.
Talvez esta seja a razão do grande impacto da peça. Em nossas cidades moder-
nas, parecemos estar nos encaminhando para a abolição do território. Encon-
tramos famílias amontoadas e confinadas em ambientes que são fincados uns

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sobre os outros, chegando a alturas vertiginosas. Tomamos elevadores e
metrôs lotados, tão apinhados que não podemos mover os braços ou as per-
nas. No entanto, devemos entender o que acontece a um homem quando ele
está privado de todos os direitos territoriais.
Sabemos que o homem tem noção de território e precisa de um território
que o abrigue. Isso varia de um abrigo apertado do morador da cidade até um
espaço mais amplo, como uma casa e um terreno num subúrbio ou, ainda,
amplas áreas abertas no interior, que o homem aprecia.

De quanto espaço o homem precisa?

Não sabemos quanto espaço é necessário para cada indivíduo, mas é


importante determinar, em nosso estudo de linguagem do corpo, o que acon-
tece a um indivíduo quando esse abrigo, seja um espaço ou um território, é
ameaçado ou invadido. Como ele reage e como o defende, como abre mão
desse espaço?
Pouco tempo atrás almocei com um amigo psiquiatra. Sentamo-nos num
restaurante agradável, a uma pequena mesa elegante. Num determinado
momento ele tirou um maço de cigarros, acendeu um e colocou o maço per-
to de meu prato.
Ele continuou falando e eu continuei a ouvi-lo, mas fiquei perturbado por
alguma razão que não conseguia definir, e mais perturbado ainda quando ele
aproximou toda a guarnição de mesa para perto de mim, colocando-a ao lado
do maço, próximo ao meu lugar na mesa. Então, debruçando-se sobre a mesa,
ele tentou expor uma opinião. Tive dificuldade em apreciá-la porque estava
ficando cada vez mais perturbado.
Finalmente, ele ficou com pena de mim e me disse:
— Eu só lhe fiz uma demonstração de uma movimentação básica em lin-
guagem do corpo, em comunicação não-verbal.
— Qual era?— perguntei, confuso.
— Ameacei-o agressivamente e o desafiei. Coloquei-o numa posição em
que você deveria se impor, e isso o incomodou.
— Mas como? O que você fez? — perguntei a ele, ainda sem compreender.
— Movi meu maço de cigarro para começar — ele explicou. — Por uma
regra não verbalizada, dividimos a mesa ao meio, metade para mim e metade
para você.
— Essa divisão não foi consciente.
— É claro que não. A regra, no entanto, existe. Ambos estabelecemos um
território mentalmente. De modo geral, dividimos a mesa por um comando
não-verbal e civilizado. Entretanto, movi deliberadamente meu cigarro para
-na área, violando a regra. Sem saber o que eu tinha feito, você se sentiu amea-
çado, sentiu-se perturbado, e à medida que eu procedia agressivamente à vio-

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lação do território, movendo meu prato, meus talheres, e depois eu mesmo
invadindo seu espaço, você foi se sentindo cada vez mais perturbado, mas
continuou sem saber por quê.
Foi minha primeira demonstração do fato de que cada um possui zonas
de território. Carregamos essas zonas conosco e reagimos de formas diferen-
tes quando elas são quebradas. Desde então, tentei aplicar a mesma técnica
de invadir a zona de alguém quando a pessoa não está ciente do que eu estou
fazendo.
Ao sairmos para jantar noite dessas, minha esposa e eu dividimos uma
mesa num restaurante italiano com outro casal. Só para experimentar, movi a
garrafa de vinho para a "zona" de meu amigo. Então, lentamente, ainda con-
versando, comecei a invadir, colocando o guardanapo e a garrafa na zona
dele. Incomodado, ele mudou sua cadeira, deslocou-se para o lado, mudou
seu prato de lugar, seu guardanapo e, finalmente, num movimento compulsi-
vo, repentino, ele colocou a garrafa de volta no lugar.
Ele reagiu defendendo sua zona e retaliando.
Dessa brincadeira inocente surgem vários dados básicos. Não importa o
quanto a área em que os seres humanos vivam esteja lotada, cada um de nós
mantém uma zona ou território à nossa volta — uma área inviolável que ten-
tamos preservar. A maneira como defendemos essa área e como reagimos à
invasão dela e, ainda, como penetramos em outros territórios, pode ser obser-
vada e descrita e, em muitos casos, usada construtivamente. Esses são aspec-
tos da comunicação não-verbal. A guarda dessas zonas é um dos primeiros
princípios básicos.
Como guardamos nossas zonas e como agredimos as zonas dos outros
faz parte integral de como nos relacionamos com as pessoas.

20
Um espaço só seu

Entre os quacres, conta-se a história de um amigo urbano que visitou um


templo religioso numa pequena cidade do interior. Embora não fosse mais
usado, era uma construção adorável, e o quacre que morava na cidade gran-
de decidiu visitá-la num domingo, dia da celebração de cultos, apesar de lhe
terem dito que apenas um ou dois quacres ainda freqüentavam cultos lá.
Naquele domingo, ele entrou na igreja e não havia ninguém, o sol da
manhã batia nas janelas antigas com doze vidraças, as fileiras de bancos esta-
vam vazias e o silêncio era absoluto.
Sentou-se, deixando a paz do silêncio tomar conta dele. De repente,
ouviu uma tosse abafada e, ao olhar, viu um quacre com barba, próximo ao
banco onde ele estava sentado, um homem idoso que bem poderia ter saído
das páginas da história.
Ele sorriu, mas o velho quacre franziu a testa e tossiu novamente, e então
!he disse: "Desculpe-me se eu o ofendo, mas o senhor está sentado em meu
lugar".
Era surpreendente a insistência daquele senhor em sentar-se em seu
lugar, apesar de o templo estar vazio, mas isso acontece. Invariavelmente,
depois que você freqüenta qualquer igreja por um período de tempo, deter-
mina seu próprio lugar.
Em sua casa, o pai tem uma determinada cadeira e, embora possa tolerar
que um visitante sente-se nela, muitas vezes o faz contrariado. A mãe tem sua
cozinha e não gosta quando sua mãe a visita e assume a cozinha "dela".
Os homens têm seu lugar preferido no trem, seus bancos preferidos no
rarque, suas cadeiras preferidas em conferências, e assim por diante. É ape-

21
nas uma necessidade de possuir um território, de um lugar que seja seu. Talvez
seja uma necessidade inata e universal, embora seja moldada pela sociedade
e cultura numa variedade de formas. Um escritório pode ser adequado para
um profissional ou pode parecer pequeno demais, não devido ao tamanho
real da sala, mas à disposição da mesa e da cadeira. Se o funcionário apoiar o
corpo para trás sem tocar uma parede ou prateleira de livros, geralmente a sala
parece suficientemente grande. Mas, em uma sala mais ampla, se a mesa dele
for colocada de forma que ele toque uma parede ao se inclinar para trás, o
escritório pode lhe parecer apertado.

Uma ciência chamada proxêmia

O dr. Edward T. Hall, professor de antropologia na Northwestern Uni-


versity, há muito está fascinado em estudar a reação do homem ao espaço que
o cerca, a maneira como utiliza esse espaço e como seu uso espacial comuni-
ca certos fatos e sinais a outros homens. O Dr. Hall cunhou a palavra proxê-
mia para descrever suas teorias e observações sobre as zonas territoriais e
como usá-las.
O uso que o homem faz do espaço, acredita o dr. Hall, apóia-se em sua
capacidade de se relacionar com as outras pessoas, de senti-las como próxi-
mas ou distantes. Todo homem, diz ele, tem suas necessidades territoriais. O
dr. Hall dividiu essas necessidades, numa tentativa de padronizar a ciência da
proxêmia, e chegou a quatro zonas distintas em que a maioria dos homens
opera. Ele relaciona essas zonas como: 1) distância íntima, 2) distância pes-
soal, 3) distância social e 4) distância pública.
Como podemos inferir, as zonas simplesmente representam diferentes
áreas pelas quais nos movemos, áreas que aumentam à medida que a intimi-
dade diminui. A distância íntima pode ser próxima, ou seja: um contato real,
ou afastada, de 15 a 20 centímetros. A fase próxima da distância íntima é usa-
da para se fazer amor, para amigos muito próximos e para crianças em conta-
to com um dos pais ou entre si.
Quando você está numa distância bastante íntima, tem plena consciên-
cia de seu parceiro. Por essa razão, se tal contato acontece entre dois homens,
pode gerar estranheza ou constrangimento. É mais natural entre um homem
e uma mulher, em termos de intimidade. Quando um homem e uma mulher
não têm intimidade, uma situação de aproximação íntima pode provocar
embaraço.
Entre duas mulheres, em nossa cultura, uma situação de aproximação
íntima é aceitável, embora numa cultura árabe essa aproximação seja aceitá-
vel entre dois homens. Os homens freqüentemente andam de mãos dadas na
Arábia e em muitas localidades do Mediterrâneo.

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A fase de afastamento da distância íntima ainda é próxima o suficiente
para se dar um aperto de mãos, mas não é considerada uma distância aceitá-
vel entre dois homens adultos norte-americanos. Quando um metrô ou um
elevador os aproxima por estarem lotados, eles automaticamente observam
certas regras rígidas de comportamento e, ao fazerem isso, comunicam-se
com seus vizinhos.
Eles ficam o mais imóveis possível, tentando não tocar qualquer parte das
pessoas a seu lado. Se os tocam, afastam-se imediatamente ou mantêm os
músculos contraídos na área em que houve contato. Essa ação diz: " P e r d ã o
por ter invadido o seu espaço, mas a situação me forçou a isso e evidentemen-
te eu respeitarei sua privacidade e não deixarei que haja nenhuma intimida-
de entre nós''.
Se, por outro lado, eles relaxassem em tal situação e deixassem seus cor-
pos se moverem livremente contra o corpo da pessoa ao lado e se permitis-
sem sentir prazer com o contado e com o calor do corpo, estariam cometendo
a pior gafe social possível.
Muitas vezes vi mulheres num metrô lotado dizer a um homem, num tom
aparentemente inocente: "Não faça isto!" simplesmente porque o homem ti-
r.ha se esquecido das regras e relaxado, aproximando-se delas.
Nem devemos, numa condução coletiva ou num elevador lotado, enca-
rar ninguém. Há um determinado intervalo de tempo durante o qual podemos
olhar, e então devemos desviar o olhar rapidamente. O homem imprudente
que passa desse intervalo de tempo estabelecido arrisca todo tipo de conse-
qüências desagradáveis.
Recentemente, estava no elevador de um edifício empresarial junto com
um outro senhor. Uma jovem bonita entrou no 142 andar e meu amigo olhou
para ela distraído, mas demoradamente. Ela enrubesceu e quando o elevador
parou no saguão da recepção, virou-se e retrucou: " O senhor nunca viu uma
moça antes, seu ... seu velhaco imundo!"
Meu amigo, ainda na casa dos trinta, virou-se para mim perplexo,
enquanto ela saía e me perguntou: "O que eu fiz? Diga-me, o que eu fiz de
mal?'
Ele tinha rompido uma regra fundamental de comunicação não-verbal.
Olhe e desvie o olhar quando você estiver em contato íntimo com um estra-
nho."
A segunda zona de território estabelecida pelo dr. Hall é chamada de
zona de distância pessoal. Aqui, também, ele diferencia duas áreas, uma dis-
tância pessoal próxima e uma distância pessoal afastada. A área próxima é de
45 a 75 centímetros. Você pode pegar ou tocar a mão de seu parceiro a essa
distância.
Quanto ao significado, ele nota que uma esposa pode ficar dentro da
zona de distância pessoal próxima de seu marido, mas se outra mulher se des-

23
loca para essa zona, presume-se que tenha alguma intenção. E, no entanto,
esta é obviamente a distância confortável em reuniões sociais. Permite uma
certa intimidade e talvez descreva uma zona íntima, mais do que uma zona
pessoal. Mas, uma vez que a padronização nada mais é do que uma simples
tentativa feita pelo Dr. Hall em uma ciência ainda incipiente, pode ser neces-
sário fazer vários esclarecimentos antes que a proxêmia seja reconhecida.
A fase de afastamento da distância pessoal é fixada pelo dr. Hall entre 75
e 120 centímetros e chamada de limite do domínio físico. Você não pode tocar
facilmente seu parceiro a essa distância e, então, esta preserva uma certa pri-
vacidade a qualquer encontro. No entanto, a distância é pequena o suficien-
te para que certo grau de discussão pessoal possa ocorrer. Quando duas
pessoas se encontram na rua, geralmente param a essa distância uma da outra,
para conversar. Numa festa, elas tendem a se aproximar, situando-se na fase
próxima de distância pessoal.
Várias mensagens sãò transmitidas por essa distância e elas variam de:
"Estou mantendo-o ao meu alcance", para "Escolhi você para ficar um pouco
mais perto de mim que os outros convidados". Aproximar-se mais quando
você está num relacionamento pessoal distante com um conhecido é conside-
rado atrevimento ou, dependendo do arranjo sexual, sinal de interesse pela
pessoa. A distância pode expressar algo, mas, para que esta signifique algu-
ma coisa, deve ser acompanhada.

Espaço público e social

A distância social também tem uma fase de proximidade e uma fase de


afastamento. A fase de proximidades de 1,2 a 2,1 metros de distância e geral-
mente é a distância em que tratamos de negócios impessoais. E a distância que
assumimos quando, nos negócios, nos encontramos com o cliente de fora da
cidade, o novo diretor de arte ou com o gerente do escritório. É a distância
que a dona de casa guarda do profissional que faz consertos, do funcionário
de uma loja ou de um menino que lhe faz uma entrega em casa. Assume-se
essa distância numa reunião social informal, mas esta pode ser uma distância
manipuladora.
Um chefe utiliza exatamente essa distância para dominar um funcionário
que está sentado — uma secretária ou uma recepcionista. Para o funcionário,
ele tende a ser ameaçador e a ganhar altura e força. Ele está, na verdade, refor-
çando a situação "você trabalha para mim", sem ter de dizê-lo.
A fase de afastamento da distância social, de 2 metros a 3 metros e meio,
é observada em relacionamentos de negócios ou para relacionamentos sociais
mais formais. O "chefão" terá uma mesa suficientemente grande para colocá-
lo a essa distância de seus funcionários. Ele também permanece sentado a essa

24
distância e olha para um funcionário sem perder o status. Ele tem a visão do
homem de corpo inteiro.
Para voltar aos olhos, a essa distância não é apropriado olhar rapidamen-
te e desviar o olhar. O único contato que você tem é visual, e assim a tradição
dita que você dirija o olhar para a pessoa durante a conversa. Deixar de olhar
para a pessoa é o mesmo que excluí-la da conversa, de acordo com o dr. Hall.
No aspecto positivo, essa distância permite uma certa proteção. Você
pode continuar trabalhando à distância sem ser rude, ou pode parar de traba-
lhar e conversar. Em escritórios, é necessário preservar essa distância social
reservada entre a recepcionista e o visitante, para que ela possa continuar a
trabalhar sem ter de conversar com ele. Uma distância menor tornaria tal ação
indelicada.
Marido e mulher em casa à noite supõem essa distância social reservada
para relaxar. Eles podem conversar, se quiserem, ou simplesmente ler em vez
de conversar. O clima impessoal desse tipo de distância social torna-se quase
obrigatório, no caso de uma família numerosa, mas muitas vezes a família
>egue essa separação educada e seus membros devem ser aproximados para
„ma noite mais íntima.
Finalmente, o dr. Hall cita a distância pública como a extensão maior de
n essa sujeição territorial. Novamente, há uma fase próxima e outra distante,
uma distinção que pode nos fazer pensar por que não há oito distâncias em
ez de quatro. Mas, na realidade, as distâncias são estabelecidas de acordo
: ?m a interação humana, e não com a medida.
A fase próxima da distância pública é de 3,5 a 7,5 metros, e é adequada
rara reuniões mais informais, a distância que um professor guarda dos alunos
numa sala de aula ou que guarda um chefe, numa reunião com os operários. A
rase distante da distância pública, acima de 7,5 metros, geralmente é reservada
- comícios políticos, em que a distância também é um fator de segurança ou
garantia, como acontece com os animais. Certas espécies animais deixarão um
h rmem se aproximar somente a essa distância, antes de ir embora.
No entanto, quando se aborda o assunto em relação à espécie animal e à
.i -tância, há sempre o perigo de interpretar mal o verdadeiro sentido da dis-
pneia e das zonas territoriais. Um exemplo típico é o leão e o seu domador.
m leão se afastará quando um homem se aproximar demais e entrar em sua
: : na de "perigo". Mas, quando ele não puder mais retroceder e o homem con-
tinuar a avançar, o leão virará e se aproximará do homem.
O domador de leões tira vantagem disso e se aproxima do leão, na jaula.
I animal retrocede, como é de sua natureza, para o fundo da jaula, enquan-
t a domador do leão avança. Quando o leão não pode mais se afastar, ele se
ira e, novamente de acordo com sua natureza, avança sobre o domador,
~_gindo. Invariavelmente, ele avança seguindo em linha reta. O treinador,
unindo vantagem disso, coloca o estrado do leão entre ele e o leão. Este, apro-

25
ximando-se em linha reta, sobe no estrado para alcançar o treinador. Nesse
momento, o treinador afasta-se rapidamente da zona de perigo do leão, e o
leão pára de avançar.
A platéia, ao ver isso, acha que o leão se afastou devido ao chicote que o
treinador empunha, ou ao chicote e à cadeira, de acordo com suas próprias
necessidades e fantasias internas. Acha que ele está dominando um animal
perigoso. Essa é a comunicação não-verbal da situação. Isso é o que, em lin-
guagem do corpo, o treinador está tentando nos dizer. Mas aqui a linguagem
do corpo mente.
Na verdade, o diálogo entre o leão e o domador é o seguinte: Leão:"Saia
da minha esfera ou eu o atacarei'. Domador: "Estoufora de sua esfera ". Leão:
"Certo, Então eu paro por aqui'.
Não importa onde o "aqui" seja. O domador manipulou as coisas para
que o "aqui" seja o alto do estrado do leão.
Da mesma forma, a esfera pública distante de um político ou ator num
palco contém várias declarações em linguagem do corpo que são usadas para
impressionar a audiência, e não necessariamente dizer a verdade.
É a essa distância pública que é difícil falar a verdade ou, dizendo de
outro modo, a essa distância pública maior é mais fácil mentir com os movi-
mentos do corpo. Os atores sabem disso, e por séculos utilizaram a distância
entre o palco e a platéia para criar várias ilusões.
A essa distância os gestos do ator devem ser estilizados, afetados e muito
mais simbólicos que seriam a distâncias públicas mais próximas, sociais ou
íntimas.
Na tela de televisão, como num filme, a combinação de tomadas a distân-
cia e próximas requer outro tipo de linguagem do corpo. Um movimento da
sobrancelha ou da pálpebra ou um tremor do lábio num close-up pode trans-
mitir uma mensagem muito mais significativa que um movimento do braço ou
do corpo todo, a longa distância.
Num close-up, os movimentos gerais costumam se perder. Essa pode ser
uma das razões pelas quais os atores de televisão e de cinema têm tanta difi-
culdade para se adaptar ao palco.
O palco muitas vezes requer uma atuação rígida, correta, devido à distân-
cia entre os atores e os espectadores. Hoje, contrariando essa técnica, há cor-
rentes teatrais que tentam eliminar a distância pública entre o ator e o palco.
Misturam-se aos espectadores, ou convidam o público a dividir o palco
com eles. Uma peça, sob essas condições, deve ser muito menos estruturada.
Não se pode ter garantia de que o espectador reagirá da maneira desejada. A
peça, portanto, adquire uma estrutura mais solta, geralmente sem um roteiro
e apenas com a idéia central.
A linguagem do corpo, sob essas circunstâncias, torna-se um veículo difí-
cil para o ator. Ele deve, por um lado, abandonar muitos dos gestos simbóli-

26
s que usou, porque não funcionarão para distâncias curtas. Não pode con-
fiar na linguagem do corpo natural para as emoções que ele deseja projetar,
nà i importa o quanto ele "viva" seu papel. Logo, ele deve desenvolver um
- vo conjunto de símbolos e movimentos corporais estilizados que também
irão mentir para a audiência.
Se essa mentira em close-up será mais eficiente que mentir à distância do
pr scênio, não se sabe. Os gestos do palco tradicional têm sido aprimorados
m anos de prática. Há ainda um vínculo cultural envolvido com os gestos
palco. O teatro japonês kabuki, por exemplo, contém seus próprios ges-
: - refinados, tão culturalmente orientados, que mais da metade deles pode
-a-sar despercebida por uma platéia ocidental.

Como diferentes culturas lidam com o espaço

Há, entretanto, linguagens corporais que podem transcender linhas cul-


irais. Charlie Chaplin, em filmes mudos, com seus trejeitos, fazia movimen-
- tão universais que conseguia arrancar risadas praticamente de qualquer
- jura, inclusive de culturas tecnologicamente não avançadas da África.
: :retanto, a cultura ainda é o fator que orienta toda a linguagem do corpo, e
ss é verdadeiro para zonas corporais. O dr. Hall aborda as implicações inter-
_ varais de sua proxêmia. No Japão, por exemplo, quando as pessoas ficam
aito juntas, isso é sinal de afeto e agradável intimidade. Em certas situações,
Hall acredita que os japoneses preferem ambientes lotados.
Donald Keene, que escreveu Living Japan, observa que na linguagem
: onesa não há palavra para exprimir privacidade. Entretanto, isso não sig-
nifica que esse conceito não exista. Para os japoneses, a privacidade existe
: termos de suas casas. Eles consideram essa área como particular e se res-
- miem com qualquer intrusão. O fato de se reunirem com outras pessoas não
ifasta a necessidade de terem espaço para morar.
O dr. Hall vê isso como um reflexo do conceito japonês de espaço. Segun-
á - e. os ocidentais vêem o espaço como a distância entre objetos. Para nós,
.--paço é vazio. Os japoneses atribuem um significado tangível à forma e à
disposição do espaço. Isso se evidencia não só em seus arranjos florais e na
-ne. mas em seus jardins também, onde partes do espaço mesclam-se harmo-
n sãmente para formar um todo integrado.
Como os japoneses, os árabes também tendem a estar juntos. Mas, embo-
m em público eles estejam invariavelmente juntos, na vida privada, em suas
p" prias casas, os árabes têm espaço demais. As casas árabes são, se possível,
opaçosas e vazias, e as pessoas se reúnem numa área pequena. As divisões
entre os cômodos geralmente são evitadas porque, apesar do desejo de espa-
os árabes, paradoxalmente, não gostam de estar sozinhos e mesmo em
- -ias casas espaçosas preferem estar juntos aos familiares.

27
A diferença entre o "aconchego" árabe e a proximidade dos japoneses é
imensa. O árabe gosta de tocar em seu companheiro, senti-lo e cheirá-lo. Para
negar uma amizade sua respiração deve estar contida.
Os japoneses, em sua proximidade, mantêm a formalidade e a reserva.
Eles conseguem tocar e ainda assim manter limites rígidos. O árabe elimina
esses limites.
Juntamente com essa proximidade, há um empurrar e um compartilhar
no mundo árabe que os americanos acham desagradável. Para um america-
no, há limites num lugar público. Quando ele está esperando em fila, acredi-
ta que esse lugar dele é inviolável. O árabe não tem conceito de privacidade
num recinto público, e se puder furar fila, acha que é um direito seu fazer isso.
Da mesma forma que a inexistência de um vocábulo japonês para expres-
sar privacidade indica uma certa atitude com relação às pessoas, os árabes não
dispõem de uma palavra para estupro, o que indica certa atitude em relação
ao corpo. Para um norte-americano, o corpo é sagrado. Para o árabe, que cos-
tuma empurrar, puxar e até mesmo beliscar as mulheres em público, a viola-
ção do corpo é uma coisa de pequena importância. Entretanto, a violação do
ego por insulto é um problema sério.
Hall destaca que o árabe às vezes precisa estar sozinho, não importa o
quanto deseja ficar próximo de seu amigo. Para estar só, ele sirpplesmente cor-
ta as linhas de comunicação. Ele se retira, e esse recolhimento é respeitado
por seus colegas. É interpretado na linguagem do corpo como"Preciso de pri-
vacidade. Embora esteja com vocês, em contato com vocês e morando com
vocês, preciso me retirar em meu abrigo".
Se um árabe se retirasse na presença de um americano , este tenderia a
considerar isso um insulto. A retirada seria interpretada, em sua linguagem do
corpo, como um "tratamento frio". E seria interpretada como um insulto.
Quando dois árabes conversam, olham-se nos olhos com grande inten-
sidade. O mesmo olhar intenso, na cultura norte-americana, raramente ocor-
re entre homens. De fato, tal intensidade pode ser interpretada como um
desafio à masculinidade de um homem. "Não gostei do jeito que ele olhou para
mim, como se quisesse algo pessoal, estivesse procurando intimidade", é uma
reação típica de um americano ao olhar de um árabe.

Como o mundo ocidental lida com o espaço

Até aqui consideramos a linguagem do corpo em termos de diferenças


espaciais em culturas amplamente díspares, o Oriente e o Extremo Oriente em
oposição ao Ocidente. Entretanto, mesmo entre as nações ocidentais, há
amplas diferenças. Há uma diferença distinta entre a forma como um alemão,
por exemplo, lida com o espaço onde vive, e a maneira como um americano
o faz. O americano carrega uma bolha de 60 cm de privacidade em volta dele,

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e se um amigo conversa com ele sobre questões íntimas, eles se aproximarão
suficiente para que suas bolhas especiais se fundam. Para um alemão, uma
-ala inteira em sua própria casa pode ser uma bolha de privacidade. Se alguém
se intromete numa conversa íntima naquela sala sem incluí-lo, ele pode se
sentir ofendido.
Talvez, especula Hall, em contraste com o árabe, o ego do alemão seja
extraordinariamente exposto". Portanto, ele fará tudo para preservar sua
rsfera privada. Na Segunda Guerra Mundial, os prisioneiros de guerra alemães
riam abrigados em grupos de quatro numa barraca, num campo do exército.
Hall observa que assim que podiam, eles estabeleciam uma divisão da caba-
na para ganhar um espaço privado. Em tendas abertas, os prisioneiros alemães
untavam construir suas próprias unidades privadas.
O "ego exposto" do alemão pode ainda ser responsável por uma rigidez
de postura e pela falta de movimento corporal espontâneo. Tal rigidez pode
ser uma defesa ou máscara, para não revelar verdades demais por meio de
movimentos não resguardados.
Na Alemanha, as casas são construídas para se ter o máximo de privaci-
dade. Os quintais são bem murados e nas sacadas são postas telas. As portas
são invariavelmente mantidas fechadas. Quando um árabe quer privacidade
r r se recolhe para dentro de si, mas quando um alemão deseja privacidade,
e.e se isola num ambiente a portas fechadas. Esse desejo alemão de privaci-
da de, de uma zona privada definida que não invada a zona de ninguém, é
rxemplificado por seu comportamento em filas.
Recentemente, fui a um cinema situado numa comunidade germano-ame-
.ina. Esperava na fila para comprar o ingresso quando ouvi comentários
- ->re mim em alemão, enquanto nos mantínhamos em fila, organizadamente.
De repente, quando faltavam poucas pessoas para chegar a minha vez de
mprar o ingresso, dois jovens que, depois entendi, eram poloneses, entra-
-_m à frente da fila e tentaram comprar seus ingressos.
— Ei! Estamos esperando na fila, por que vocês não aguardam sua vez?
- a discussão logo começou.
— É isso mesmo. Voltem para a fila.
— Vão para o inferno! Estamos num país livre! Ninguém lhes pediu para
; -r>erar na fila — um dos poloneses gritou, aproximando-se da bilheteria à
força
— Vocês estão na fila feito cordeiros — o outro disse irritado. — É isso o
_ _ie há de errado com vocês, seus cabeças de repolho.
O início de tumulto foi controlado por dois policiais. Ao entrar no saguão,
- - me aproximei dos furões da fila.
— O que vocês estavam tentando fazer lá fora? Começar um tumulto?
— Só estávamos agitando um pouco — disse um deles, com um sorriso
. -elo. — Por que formar fila? É mais fácil ir direto à bilheteria.

29
Descobrir que eram poloneses me ajudou a entender a atitude deles. Ao
contrário dos alemães, que querem saber exatamente onde estão e acham que
somente a obediência a certas regras de conduta garante um comportamento
civilizado, os poloneses consideram que o comportamento civilizado não
deve respeitar as autoridades e regulamentos.
Embora os ingleses sejam diferentes dos alemães na forma de tratar o
espaço — eles valorizam pouco a privacidade de seu próprio quarto —, eles
também são diferentes dos americanos. Quando o americano deseja se isolar,
ele se retira. Possivelmente devido à falta de espaço privado e por crescerem
em berçários, os ingleses que querem ficar sós tendem a se recolher, numa ati-
tude introspectiva, como os árabes.
A linguagem do corpo dos ingleses que diz: "Estou procurando ter um
momento de privacidade, é muitas vezes interpretada pelos americanos
como: "Estou irritado com você e por isso o estou tratando com frieza".
O sistema social inglês atinge sua privacidade por meio de relacionamen-
tos cuidadosamente estruturados. Nos Estados Unidos, você conversa com o
vizinho devido ã proximidade. Na Inglaterra, ser vizinho de alguém não
garante que você o conheça ou fale com ele.
Há a história de um formando numa faculdade americana que encontrou
uma senhora inglesa num cruzeiro para a Europa. O rapaz foi seduzido pela
inglesa e eles tiveram um affair apaixonante.
Um mês depois, ele foi a um jantar muito formal em Londres, e entre os
convidados, para sua surpresa, viu a senhora X. Aproximando-se, cumpri-
mentou-a: — Olá! Como vai?
Olhando para ele com ar de superioridade, a senhora X respondeu:
— Acho que não fomos apresentados.
— Mas... — o jovem gaguejou perplexo —, certamente a senhora se lem-
bra de mim?
Então, mais encorajado, acrescentou:
— Pois no mês passado dormimos juntos durante a viagem, até chegar-
mos à Europa.
— E daí? — a senhora X perguntou friamente. — O que o faz pensar que
isso seria uma apresentação?
Na Inglaterra, as relações não se desenvolvem de acordo com a proximi-
dade física, mas sim conforme a posição social. Você não é necessariamente
amigo de seu vizinho, a menos que tenha a mesma condição social que ele. É
um fato cultural baseado na herança do povo inglês, mas também é resultado
dos habituais ajuntamentos ou aglomerações de pessoas na Inglaterra. Os
franceses, como os ingleses, também gostam de estar juntos, mas suas dife-
rentes heranças culturais levaram a um resultado cultural diferente. Embora a
aglomeração de pessoas tenha levado os ingleses a desenvolver um respeito

30
r.. mum pela privacidade, fez com que os franceses ficassem muito envolvi-
i s uns com os outros.
Um francês olha diretamente em seus olhos quando está falando com
:è. e olha diretamente para você. Em Paris, as mulheres são muito observa-
nas ruas. De fato, muitas mulheres americanas que voltam de Paris sen-
'.cm-se, de repente, nâo admiradas. Os franceses, com seu modo de olhar,
transmitem uma mensagem não-verbal. " Gosto de você. Posso nunca conhe-
.. -la ou falar com você, mas admiro-a."
Nenhum homem norte-americano olha para as mulheres dessa forma. Em
cz de admiração, isso seria interpretado como grosseria por um americano.
Na França, a aglomeração é parcialmente responsável pelo envolvimen-
d >s franceses. Também é responsável pela preocupação com espaço. Os
- arques franceses tratam o espaço de modo diferente dos americanos. Eles
. nzam suas áreas abertas; mesmo na cidade, do que se beneficia a arqui-
tetura.
Os americanos reagem ao espaço de um modo diferente. Em Nova York,
da de densamente habitada, a população desenvolve a necessidade de pri-
VJ idade. O nova-iorquino é conhecido tradicionalmente por sua atitude não
amigável e, no entanto, tal atitude é desenvolvida por respeito à privacidade
. -eu vizinho. Não querem invadir essa privacidade, e então ignoram-se uns
_ - utros em elevadores, metrôs, em ruas lotadas.
Marcham em seus pequenos mundos, e quando esses mundos são força-
- a se juntar, entram num estado catatônico para evitar uma interpretação
r _ aivocada de seus motivos.
Na linguagem do corpo, eles gritam:"Estou sendo forçado a encostarem
:' e mas minha rigidez lhe diz que eu não quis invadir seu espaço". A inva-
é a maior transgressão. Fale com um estranho em New York City e ele rea-
. - - de modo alarmado, assustado.
Só em épocas de grande crise as barreiras são derrubadas, e então perce-
- que os nova-iorquinos não são tão hostis, mas são tímidos e assusta-
- Durante a queda de energia na região nordeste dos EUA todos correram
: ara aiudar uns aos outros, para dar conforto, apoio, e durante aquelas pou-
a- i ngas horas a cidade se tornou um espaço coloroso e vital.
Então, a energia voltou e todos voltaram a suas zonas rígidas de privaci-
dade.
Fora de Nova York, em pequenas cidades norte-americanas, há uma ati-
e mais amigável, mais receptiva. As pessoas cumprimentam estranhos, sor-
. e muitas vezes conversam. Entretanto, em cidades muito pequenas,
or de :odos se conhecem e há pouca privacidade, o estranho pode ser trata-
. -i mesmo modo formal e reservado que na grande cidade.

31
Defendendo zonas corporais

À primeira vista, pode parecer difícil perceber o relacionamento exato


entre espaços, zonas ou territórios de uma pessoa e a cinesiologia, linguagem
do corpo. Mas, se não entendermos os princípios básicos de territórios indi-
viduais, não poderemos perceber o que acontece quando esses territórios são
invadidos. Nossas reações à invasão de nosso território pessoal estão muito
ligadas à linguagem do corpo. Deveríamos conhecer nosso comportamento
agressivo e nossas reações às agressões dos outros, para ficarmos atentos aos
sinais que estamos enviando e recebendo.
Talvez o relato mais tocante sobre a inviolabilidade das zonas corporais
seja um romance escrito por H. DeVere Stacpool, meio século atrás, intitula-
do The Blue Lagoon. É a história de um jovem náufrago que vive numa ilha
tropical em companhia de um velho marinheiro. O marinheiro cria o menino,
ensina-o a ser auto-suficiente e em seguida morre. O menino cresce sozinho,
conhece uma jovem polinésia e apaixona-se por ela. O romance trata do caso
amoroso dos jovens, que foi declarado tabu desde a infância. Ela cresceu proi-
bida de se permitir ser tocada por qualquer homem. A luta entre os dois para
que ela rompesse o condicionamento e permitisse que ele a tocasse forma
uma história fascinante e comovente.
Foi o reconhecimento precoce de como o ser humano pode se tornar
defensivo quanto às suas zonas corporais e à privacidade pessoal que levou
Stacpool a explorar esse tema, mas apenas na última década os cientistas
começaram a entender o significado complexo do espaço pessoal.
Num capítulo anterior, mencionei um psiquiatra que, com a ajuda de um
maço de cigarros, deu-me uma lição sobre a invasão de espaço. Ele, por sua

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vez, aprendeu muito do que sabia sobre a reação de pacientes em hospitais
para doentes mentais. Um hospital para doentes mentais é um microcosmo
fechado e, como tal, muitas vezes reflete e exagera atitudes do mundo exte-
rior. Mas, um hospital para doentes mentais também é um lugar muito espe-
cial. Os internos são mais suscetíveis ã sugestão e agressão que os homens e
mulheres psiquicamente saudáveis, e freqüentemente suas ações distorcem
as ações de pessoas normais.
O grau de agressividade de um paciente mental depende da posição da
outra pessoa. É um teste de dominância. Em qualquer hospital para doentes
mentais um ou dois pacientes se dirigirão aos superiores com um comporta-
mento agressivo, mas eles sempre podem ser intimidados por um dos aten-
dentes. Por sua vez, o atendente deve responder à enfermeira e ela é
subordinada ao médico.
Há uma verdadeira hierarquia nessas instituições e ela é refletida no mun-
do exterior em organizações como o exército, ou em empresas, onde há uma
ordem definida de domínio. No exército, o poder de comando é indicado por
um sistema de símbolos, tiras para os oficiais não comissionados e barras,
folhas, pássaros e estrelas para os comissionados. Mas, mesmo sem as insíg-
nias, a ordem hierárquica permanece. Vi internos, num banheiro, tratarem sar-
gentos com deferência, sem saber quem eles eram ou quais eram seus postos.
Os sargentos, por suas maneiras e porte, transmitiam uma mensagem corpo-
ral óbvia, que indicava a posição.

Conselho para aqueles que buscam status

No mundo dos negócios, onde não há insígnias e nem são usados outros
símbolos claros, o executivo demonstra a mesma capacidade de projetar uma
noção de superioridade. Como ele o faz? Que recursos ele usa para sujeitar os
subordinados, e como faz para lidar com colegas que ocupam uma posição
equivalente?
Uma tentativa de estudar isso foi feita por dois pesquisadores numa série
de filmes mudos. Eles colocaram dois atores para interpretar um executivo e
um visitante, e trocar de papéis em diferentes tomadas. Na cena, um homem
estava sentado à mesa enquanto o outro, fazendo o papel do visitante, bate à
porta, abre-a e se aproxima da mesa para discutir questões de negócios.
O grupo que assistiu aos filmes deveria classificar o executivo e o visitan-
te em termos de status. Um certo conjunto de regras começou a emergir das
classificações. O visitante mostrou o menor status quando parou à porta para
conversar com o homem que estava sentado. O status era considerado maior
quando ele andava até o meio da sala e maior quando ia diretamente até a
mesa e ficava de pé em frente ao executivo, que estava sentado.

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Outro fator que determinava o status, à vista dos observadores, era o
intervalo de tempo em que o visitante batia à porta e entrava e, para o execu-
tivo sentado, o tempo que este demorava para responder, após ouvir as bati-
das na porta. Quanto mais rápido o visitante entrava na sala, maior o status
dele. Em relação ao executivo, quanto mais se demorava para responder,
maior o status do executivo.
Deve ficar claro que o que está envolvido aqui é uma questão de territó-
rio. O visitante tem permissão para penetrar no território do executivo, e por
esse arranjo o executivo automaticamente assume um status superior.
O quanto o visitante penetra no território e a rapidez com que o faz ou,
em outras palavras, a maneira como desafia o espaço pessoal do executivo
indica seu próprio status.
O "chefe" entra na sala do subordinado sem ser anunciado. O subordina-
do aguarda fora da sala do executivo, até que tenha permissão para entrar. Se
o chefe estiver ao telefone, o subordinado pode sair sem ser notado e voltar
mais tarde. Se o subordinado está atendendo o telefone, o chefe geralmente
afirmará seu status ficando de pé diante de seu subordinado, até que ele mur-
mure: " Volto a ligar mais tardé', e então dê toda a atenção ao seu supervisor.
Há uma mudança contínua de status ou disputa para alcançar uma posi-
ção no mundo dos negócios, e portanto os símbolos que denotam status tor-
nam-se uma parte necessária da mudança. A maleta carregada por um
executivo é o símbolo mais óbvio, e todos nós sabemos da piada do homem
que só carrega seu almoço na maleta, mas insiste em carregar a maleta simples-
mente porque esta é importante para a imagem que ele precisa projetar. Con-
heço um padre e educador negro nos Estados Unidos que viaja muito pelo
país. Ele me disse que, quando ia para uma cidade do Sul, nunca entrava numa
área urbana ou um hotel sem usar terno e maleta. Esses dois símbolos lhe
davam uma certa autoridade que o diferenciava do negro na mesma cidade.
As grandes empresas instituem uma série de símbolos de status. Com a
venda de tranqüilizantes, uma grande empresa farmacêutica na Filadélfia
ganhou dinheiro suficiente para construir um novo prédio para abrigar seus
funcionários, cujo número estava crescendo rapidamente. A planta do edifí-
cio podia conter escritórios e salas de trabalho sem distinção, mas a empresa
fixou deliberadamente um símbolo de status na distribuição e divisão dos
escritórios. Os dos cantos no último andar eram reservados para o pessoal
mais graduado. Os escritórios de canto no andar inferior eram reservados para
o pessoal de chefia. Os executivos menos graduados, mas ainda importantes,
tinham escritórios sem as janelas de canto. Os subalternos tinham escritórios
sem janelas. Abaixo deles ficavam os funcionários que ficavam em cubículos.
Eles tinham paredes de vidro opaco e não havia portas, enquanto que os do
nível imediatamente inferior trabalhavam em cubículos com vidro transparen-
te. Os funcionários mais rasos tinham mesas numa sala aberta.

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A hierarquia foi estabelecida por uma equação, dependendo do tempo
de casa, da importância do cargo, do salário e do título acadêmico. O título de
doutorado em medicina, por exemplo, dava a qualquer um, não importando
o salário ou tempo de casa, o direito a um escritório fechado. O profissional
com mestrado podia ter ou não um escritório, dependendo de outros fatores.
De acordo com esse sistema, muitos outros detalhes poderiam demons-
trar o grau de status. Cortinas, tapetes, mesas de madeira em contraste a mesas
de metal, móveis, poltronas, cadeiras simples e, evidentemente, secretárias,
tudo isso estabelecia uma hierarquia.
Um elemento importante nesse conjunto era o contraste entre os cubícu-
los de vidro fosco e de vidro transparente. Ao ser visto pelos outros, o homem
no cubículo com vidro translúcido era automaticamente reduzido em sua
importância ou posto. Seu território era suscetível à invasão visual. Ele era bas-
tante vulnerável.

Como ser um líder

A abertura de um território e a invasão dele são funções importantes da


posição nos negócios. E a liderança? Por meio de que artifícios ou de que lin-
guagem do corpo um líder se afirma como tal?
Voltando aos anos que precederam a Segunda Guerra Mundial, Charlie
Chaplin fez um filme chamado O grande ditador. Como todos os filmes de
Chaplin, este envolvia muita linguagem do corpo, mas a seqüência mais sen-
sacional era aquela que se passava numa barbearia.
Chaplin no papel de Hitler e Jack Oakie interpretando Mussolini estão
sendo barbeados lado a lado. A cena concentra-se nas tentativas que cada um
deles faz para se colocar numa posição dominante, para afirmar sua superio-
ridade como líder. Presos em suas cadeiras e cobertos por uma capa, só há um
modo de atingir o domínio, e é controlando a altura das cadeiras. Eles podem
abaixá-la e levantá-la. Aquele que conseguir levantar mais a cadeira vence, e
a cena se desenrola em torno da tentativa que cada um deles faz para erguê-
la o máximo possível.
O mesmo posicionamento ocorre com os outros seres humanos. Todos
nós sabemos que devemos nos curvar diante de um rei, de ídolos, de altares.
Abaixar a cabeça e se curvar, em geral, são formas de demonstrar superiori-
dade ou inferioridade pela altura. São ações que transmitem a mensagem cor-
poral: "Você é superior, portanto, é quem domina".
Um jovem que conheço, com bem mais de 1,80 m de altura, teve muito
sucesso nos negócios devido a sua capacidade de mostrar compreensão pelos
colegas. Observando as atitudes dele em algumas transações de negócio bem-
sucedidas, percebi que, sempre que possível, ele parava, inclinava o corpo ou

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se sentava, para permitir que seu colega ficasse numa posição de domínio e
se sentisse superior.
Em família, geralmente o pai senta-se à ponta da mesa, caso ela seja retan-
gular ou oval. Muitas vezes, a presença de uma mesa redonda numa casa reve-
la a constituição da família. Da mesma forma, em discussões em grupo, em
torno de uma mesa, o líder automaticamente assumirá o comando sentando-
se à ponta.
A história do Rei Artur e os cavaleiros da távola redonda mostra que esse
conceito não é novo. A mesa era redonda para que não houvesse questão de
domínio e todos os cavaleiros pudessem compartilhar a mesma honra de
estarem sentados à mesa. Entretanto, essa idéia foi enfraquecida pelo fato de
que o próprio Artur, sempre que se sentava, tornava-se a figura dominante e
o status de cada um diminuía à medida que aumentava a distância entre o
lugar onde o cavaleiro estava sentado e o rei.
O escritório do diretor de uma grande empresa farmacêutica onde traba-
lhei possui, além de sua mesa e escrivaninha, um sofá, uma cadeira de braço
e uma mesa de café com uma ou duas cadeiras em volta. Esse homem anun-
cia a formalidade ou informalidade de uma situação pelo local onde se senta
ao receber um visitante. Se quer tratá-lo de uma maneira informal, ele conduz
o visitante até o sofá, à poltrona ou à mesa de café. Dessa forma, ao se posi-
cionar, ele indica o tipo de entrevista que o visitante terá. Se tiver de ser um
encontro extremamente formal, ele permanecerá sentado à sua mesa.

O espaço que mantemos inviolável

A necessidade de espaço pessoal e a resistência ã invasão do espaço pes-


soal é tão forte que mesmo numa multidão cada membro exigirá um certo
espaço. Esse fato levou um jornalista chamado Herbert Jacobs a tentar aplicá-
lo a multidões. Visto que a estimativa do tamanho de uma multidão tende a
variar conforme o observador seja ou não favorável a essa aglomeração, o
número de pessoas presentes em comícios de políticos, encontros pela paz e
manifestações é aumentado pelos participantes e subestimado pelas autorida-
des.
Jacobs, estudando fotos aéreas de multidões onde podia contar o núme-
ro de participantes, concluiu que as pessoas, em aglomerados densos, preci-
sam de 3 a 6 metros quadrados, enquanto as pessoas em aglomerados mais
abertos requerem uma média de 9 metros quadrados. O tamanho da multi-
dão, Jacobs finalmente concluiu, poderia ser medido pela fórmula, compri-
mento vezes largura dividido por um fator cie correção que levava a
densidade da multidão em conta. Esse cálculo podia determinar o número de
pessoas em qualquer aglomerado.

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Ao tratarmos de aglomerados, é importante perceber que o território pes-
soal das pessoas num aglomerado é destruído pelo próprio ato de se aglome-
rar. A reação a essa destruição pode, em alguns casos, mudar o humor da
multidão. Os homens reagem fortemente quando seu espaço ou território pes-
soal é invadido. Quando o aglomerado aumenta e fica mais compacto, a situa-
ção pode piorar. Um aglomerado menos denso pode ser mais fácil de
controlar.
A necessidade de espaço pessoal foi reconhecida por Freud. Para serem
atendidos, seus pacientes deitavam-se num divã, enquanto ele se sentava
numa cadeira, fora da visão deles. Dessa forma, não havia invasão do espaço
pessoal do paciente.
A polícia reconhece a importância do espaço pessoal de um indivíduo e
tira vantagem disso ao interrogar prisioneiros. Um livro-texto sobre interroga-
tório e confissão criminal sugere que o interrogador se sente próximo ao sus-
peito e que não haja mesa ou outro objeto entre eles. Qualquer tipo de
obstáculo, o livro adverte, dá ao homem que está sendo interrogado um cer-
to grau de alívio e confiança.
O livro também sugere que o interrogador, embora possa começar o
interrogatório com sua cadeira de 60 a 90 cm de distância, deve mover-se para
mais perto, à medida que o interrogatório prossegue,"até que um dos joelhos
do sujeito fique entre osjoelhos do interrogado f .
Comprovou-se, na prática, que essa invasão física do território do homem
pelo policial, à medida que ele é interrogado, é extremamente útil para rom-
per a resistência do prisioneiro. Quando as defesas territoriais de um homem
são enfraquecidas ou invadidas, sua segurança tende a diminuir.
Numa situação de trabalho, o chefe que tem conhecimento disso pode
fortalecer sua posição de liderança, invadindo espacialmente seu subordina-
do. Quanto mais o superior se debruçar sobre a mesa do funcionário, mais o
desequilibrará. O chefe de departamento que se aproxima do operário
enquanto está inspecionando seu trabalho faz com que o trabalhador se sin-
ta constrangido e inseguro. De fato, o pai que ralha com o filho debruçando-
se sobre ele está complicando a relação entre eles, provando e reforçando seu
próprio domínio.
Essa invasão do espaço pessoal pode ser usada para provocar medidas
defensivas nos outros, ou podemos, ao evitar a invasão, impedir também as
conseqüências, por vezes perigosas, que esta acarreta? Sabemos que é peri-
goso não guardar distância do carro que está à nossa frente, do ponto de vista
da física. Se o carro da frente brecar rapidamente, podemos nos chocar con-
tra ele. Mas não comentamos a reação provocada no motorista do carro da
frente, quando alguém "cola" nele.
Um homem que está dirigindo um carro muitas vezes perde uma parte
essencial de sua humanidade e, por estar protegido por uma máquina, fica

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destituído de suas características humanas. A comunicação corporal, que fun-
ciona tão bem para ele fora do carro, muitas vezes perde a função quando ele
está dirigindo. Todos nós já ficamos irritados quando alguém nos corta a fren-
te, e sabemos da fúria irracional, que às vezes pode invadir o motorista, ao ter
seu espaço invadido. A polícia tem dados estatísticos para mostrar que cente-
nas de acidentes são causados quando isso acontece, devido à perigosa rea-
ção daquele que foi "cortado". Numa situação social, alguns homens sonham
em agir ou reagir dessa forma. Sem a máquina, adotamos uma atitude civili-
zada e permitimos que as pessoas cortem a nossa frente para tomar um ôni-
bus ou um elevador.
Um carro, entretanto, parece se tornar uma arma perigosa nas mãos de
muitos motoristas. Pode destruir muitos de nossos controles e inibições. Não
sabemos por que isso acontece, mas alguns psicólogos teorizaram que isso se
deve, pelo menos em parte, à extensão de nossos territórios pessoais quando
estamos num carro. Nossas tonas de privacidade expandem-se, a zona de pri-
vacidade do carro se torna muito maior e nossa reação a qualquer invasão nes-
sa zona é maior ainda.

Do espaço e da personalidade

Têm sido feitos muitos estudos na tentativa de descobrir em que medida


a reação à invasão do espaço pessoal está relacionada com a personalidade.
Um deles, uma tese de mestrado de John L. Williams, determinava que, duran-
te uma conversa, os introvertidos tendiam a se manter a uma distância maior
das pessoas, em comparação aos extrovertidos. O homem que é reservado
precisa de maiores defesas para assegurar a inviolabilidade de seu estado de
isolamento. Outro estudo para uma tese de doutorado, feito por William E.
Leipold, chegou à mesma conclusão após realizar um experimento bastante
inteligente. Primeiro os estudantes recebiam um teste de personalidade para
determinar se eles eram introvertidos ou extrovertidos, e então eram manda-
dos para uma sala, para discutirem sua classificação.
Três tipos de instruções aos estudantes foram dados pelo pesquisador.
Foram chamados de instruções de stress, elogio e neutras. As instruções de
stress eram dadas para preocupar os estudantes." Vimos que as notas de nos-
so curso estão muito baixas e que você não está tentando dar o melhor de si.
Por favor, sente-se na sala ao lado até que o entrevistador possa falar com
você."
O estudante, então, entrava na sala com uma mesa e duas cadeiras, uma
na frente da mesa e outra atrás.
A entrevista de elogio começava com um estudante sendo informado de
que suas notas estavam boas e que ele estava indo bem. Na entrevista neutra,

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as instruções eram simplesmente: "Estamos interessados em saber o que você
está achando do curso".
Os resultados do estudo mostraram que os estudantes que eram elogia-
dos sentavam-se próximos da cadeira do entrevistador. Os estudantes que
sofreriam stress sentavam-se mais afastados e aqueles que receberam instru-
ções neutras sentavam-se no meio. Os introvertidos e os ansiosos sentavam-
se mais longe que os extrovertidos, sob as mesmas condições.
Com isso bem mapeado, o passo seguinte foi determinar as reações dos
homens e mulheres quando seu território era invadido. O dr. Robert Sommer,
professor de psicologia e titular do departamento de Psicologia da Universi-
dade da Califórnia, descreve uma série de experimentos conduzidos em um
ambiente hospitalar onde, vestindo o jaleco de médico para ganhar autorida-
de, ele invadia sistematicamente a privacidade dos pacientes, sentando-se
próximo a eles nos bancos e entrando nas enfermarias e salas onde ficam
durante o dia. Essas intrusões, ele relatou, invariavelmente incomodavam os
pacientes e os faziam retirar-se de suas cadeiras ou áreas especiais. Os pacien-
tes reagiam à intrusão física do dr. Sommer mostrando-se inquietos e final-
mente retirando-se do local.
Dessas observações e das observações de outras pessoas, o dr. Sommer
descobriu toda uma área da linguagem do corpo que o indivíduo usa quando
seu território privado é invadido. Além de se retirarem do local e se dirigirem
para outro lugar, há ainda uma série de outros sinais, como balançar o corpo,
balançar as pernas ou bater com os dedos em alguma superfície próxima. Ess-
es são os primeiros sinais de tensão, e eles expressam: " Você está próximo
demais. Sua presença me deixa incomodado".
A próxima série de sinais da linguagem do corpo é fechar os olhos, apro-
ximar o queixo do peito e encolher os ombros. Esses sinais indicam: "Vá
embora. Não quero você aqui. Você está me invadindo ".
O dr. Sommer cita outra pesquisadora no campo de invasão espacial,
Nancy Russo, que usou uma biblioteca como seu palco de atuação. Uma
biblioteca é um local perfeito para se observar reações. É uma atmosfera tran-
qüila, que induz à privacidade. Na maioria dos casos, quem chega à bibliote-
ca se isola dos outros pesquisadores, sentando-se a certa distância dos demais.
Nancy Russo tomava uma cadeira ao lado e então se aproximava ainda
mais da vítima, ou sentava-se bem em frente à pessoa. Embora ela não verifi-
casse nenhuma reação universal nas pessoas das quais se sentava perto, cons-
tatou que a maioria usava a linguagem do corpo para transmitir o que estava
sentindo. Ela descreveu "gestos defensivos, mudanças na postura, tentativas
de mover-se sem mcomodar o outro". Concluiu que se todos os sinais da lin-
guagem do corpo usados por uma pessoa fossem ignorados, esta acabaria por
mudar-se de lugar.

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Apenas um em cada oitenta estudantes cuja área foi invadida pela pes-
quisadora pediu verbalmente a ela para se afastar. O restante usou linguagem
do corpo para comunicar o desagrado que aquela proximidade provocava.
O dr. Augustus F. Kinzel, que trabalha no New York Psychiatric Institute
(Instituto Psiquiátrico de Nova York), desenvolveu uma teoria enquanto traba-
lhava no U. S. Medicai Centerfor Federal Prisoners (Centro Médico Norte-Ame-
ricano para Prisioneiros Federais) que pode apontar um meio de se detectar,
predizer e mesmo tratar o comportamento violento de um indivíduo.
Em seus primeiros estudos com animais, o dr. Kinzel notou que os ani-
mais freqüentemente reagirão com violência a qualquer intrusão de seu terri-
tório pessoal. Embora trabalhasse numa prisão em que os internos cumpriam
pena por ação violenta contra a sociedade, ele notou que certos homens pre-
feriam celas solitárias, apesar das privações impostas por elas. Descobriu que
esses mesmos detentos às vezes apresentavam reações violentas sem razão
aparente. Eles precisariam dç mais espaço para manter seu autocontrole?
O dr. Kinzel constatou que muitos deles, condenados por assalto com
violência, queixavam-se que suas vítimas tinham "tentado reagir", embora
uma investigação cuidadosa revelasse que eles tinham assaltado pessoas que
não reagiram, mas apenas se aproximaram deles. Os surtos de violência eram
provocados de forma similar dentro e fora do presídio; logo, a atmosfera do
presídio não podia explicá-los. O que poderia esclarecê-los?
Para descobrir, o dr. Kinzel conduziu um experimento na prisão, com
quinze detentos voluntários. Oito tinham histórico de violência e sete não. Os
homens deviam ficar de pé no centro de uma sala vazia enquanto o "experi-
mentador" se aproximava lentamente. Cada um deveria dizer: "Pare!" quando
este estivesse próximo demais.
Depois que o experimento foi repetido várias vezes, cada homem perce-
beu que tinha uma zona corporal, um território ou uma bolha definidos, um
espaço pessoal que o dr. Kinzel nomeou de "zona de amortecimento corporal'.
" O grupo violento", disse o dr. Kinzel," mantinha o experimentadora uma
distância duas vezes maior que o não violento". Suas zonas de amortecimento
corporal tinham uma densidade quatro vezes maior que as zonas dos integran-
tes do grupo não violento. Quando alguém se aproximava demais de um deles,
ele resistia como se o intruso estivesse "ameaçando" ou "transgredindo".
Nesse experimento, foi induzida em detentos violentos a mesma sensa-
ção que aquela por eles sentida quando atacaram outros prisioneiros por
"mexerem com eles". Esses homens, de acordo com o dr. Kinzel, entravam
num pânico infundado quando alguém invadia suas zonas corporais mais do
que o normal. Esse pânico e a violência resultante ocorriam a uma distância
que as outras pessoas considerariam normal.
Muito do que dr. Kinzel chama de "característica violenta em surto rápi-
do entre grupos de guetos 'superlotados' e a polícia" pode ser atribuído à fal-

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ta de entendimento, por parte da polícia, da inviolabilidade de zonas corpo-
rais. O estudo do dr. Kinzel parece indicar que estamos apenas começando a
entender as origens de reações violentas nos seres humanos, e como detectá-
las e contorná-las. Esses ataques de violência raramente ocorrem no reino ani-
mal, onde há um acordo tácito das necessidades territoriais existentes até que
o homem interfira.

Sexo e relacionamento impessoal

Quando se fala em invasão, o assunto tem uma forte ligação com a ques-
tão sexual. Uma garota que penetra o território de um homem encontra um
conjunto de sinais diferente do que encontraria se adentrasse o território de
uma mulher. Há mais aceitação e a possibilidade de um flerte diminui a pro-
babilidade de o homem se ressentir com a intrusão. A mesma situação rever-
tida, entretanto, geralmente coloca,a mulher numa posição defensiva.
O sinal que invariavelmente é enviado pelos intrusos é: "Não o conside-
ro como pessoa e, portanto, posso invadi-lo. Não me importo com você".
Esse sinal, no contexto de uma situação de negócios, pode ser desmora-
lizante para o funcionário e útil para o chefe. Pode, na verdade, reafirmar a
liderança do chefe.
Num metrô lotado há uma interpretação ligeiramente diferente de sinais.
Lá é importante que duas pessoas mantenham uma relação impessoal. Caso
contrário, o fato de elas serem forçadas a ficar tão intimamente próximas pode
ser estranho. A pessoa que invade outra verbalmente em um metrô lotado é
recriminada por fazer um galanteio embaraçoso. De fato, sua atitude pode ser
considerada um pouco grosseira. Aqui é necessário se afastar para resistir a
uma situação constrangedora. Nunca vimos filmes em que um rapaz e uma
garota encontram-se num metrô lotado. Simplesmente isso não é feito, nem
mesmo em Hollywood.
As pessoas só suportam metrôs lotados, segundo Sommer, porque os
passageiros tendem a desconsiderar os outros como pessoas. Se eles forem
forçados a reconhecer a presença de cada um devido a uma parada abrupta,
por exemplo, podem se ressentir da situação em que se encontram.
O contrário também é verdadeiro. Em uma situação em que as pessoas
não estão aglomeradas, uma pessoa se ressentirá ao ser ignorada. Nossa pes-
quisadora da biblioteca notou um homem que ergueu a cabeça e olhou para
ela friamente, indicando com linguagem do corpo: "Sou um indivíduo, com
que direito você está me invadindo?'
Ele estava usando linguagem do corpo para resistir à intrusão dela e, de
repente, ela se sentiu agredida, em vez de ser a agressora. Ela sentiu a desa-
provação desse homem com tanta intensidade que foi incapaz de prosseguir
o experimento pelo resto do dia.

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Sua incapacidade de continuar foi porque o homem, cuja privacidade ela
estava invadindo, deixou-a sem defesa e ela, pela primeira vez no experimen-
to, observou-o como ser humano e não como objeto. Essa capacidade de reco-
nhecer os outros como seres humanos é uma chave extremamente importante
para explicar como agimos e reagimos em linguagem do corpo, bem como
em todos os relacionamentos. O dr. Sommer destaca que um objeto, uma
"não-pessoa", não pode invadir o espaço pessoal de alguém, tanto quanto
uma árvore ou uma cadeira. Nem há qualquer problema em invadir o espaço
pessoal de uma não-pessoa.
Como exemplo, Sommer cita as enfermeiras de hospital que discutem a
condição do paciente ao lado de seu leito, ou a empregada negra numa casa
onde moram brancos, que serve o jantar enquanto os convidados debatem a
questão racial. Mesmo o servente que esvazia o cesto de lixo num escritório
pode não se incomodar em bater ao entrar, nem o ocupante do escritório se
preocupa com essa intrusão'. O servente não é uma pessoa real para ele. Ele é
ignorado como pessoa, assim como o funcionário no escritório é ignorado
como pessoa pelo servente.

Como você age ao sentar-se ao lado de alguém

A maneira como reconhecemos e reagimos a invasões inclui o que Som-


mer chama de "cerimônia de reconhecimento". Em circunstâncias normais,
quando você invade o território de outro numa biblioteca ou lanchonete,
envia um conjunto de sinais de deferência. Verbalmente você se desculpa e
pergunta: "Esse lugar está ocupado?". Em linguagem do corpo você abaixa os
olhos ao se sentar.
Quando você se senta num ônibus lotado, é recomendável que você olhe
para a frente e evite olhar para a pessoa que está sentada ao seu lado. Em
outras situações outros procedimentos são adotados.
Defender o espaço pessoal, de acordo com o dr. Sommer, envolve o uso
de sinais, gestos e posturas adequadas da linguagem do corpo, bem como a
escolha de um lugar. O que você faz quando se senta a uma mesa vazia e dese-
ja desencorajar outras pessoas a se sentarem junto com você? Que linguagem
do corpo você usa? Um estudo feito por Sommer entre estudantes universitá-
rios mostrou que, ao se sentarem a uma mesa vazia, quando queriam privaci-
dade, geralmente procediam de duas formas: podiam procurar privacidade
posicionando-se o mais longe possível de outras pessoas que pudessem dis-
traí-lo, ou tentar obter privacidade mantendo toda a mesa para si.
Se você procura privacidade se isolando dos outros, enfrenta o proble-
ma esquivando-se. Assume uma posição de retração, geralmente situando-se
no canto da mesa. Em linguagem do corpo você diz: "Compartilhe minha

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mesa se desejar, mas não me incomode. Estou aqui no canto para que a pes-
soa que se sentar aqui possa ficar o mais distante possível de mim".
A outra abordagem seria tentar manter toda a mesa para si. Seria uma ati-
tude ofensiva e quem agisse assim agressivamente se sentaria ao centro, e
estaria dizendo: " Deixe-me em paz. Você não pode se sentar sem me incomo-
dar, então encontre outra mesa!"
Entre outras conclusões do estudo do dr. Sommer, citamos as seguintes:
os estudantes que se retraem, que desejam estar o mais longe possível dos
outros, ficarão longe da porta. Aqueles que desejam monopolizar a mesa toda,
que estão na defensiva, estarão de frente para a porta. A maioria dos estudan-
tes que se isolou e tomou a defensiva, preferiu o fundo da sala e preferiu
mesas pequenas ou mesas encostadas na parede.
Em linguagem do corpo, os estudantes que se sentaram ao centro da
mesa estavam afirmando seu domínio, sua capacidade de lidar com a situação
e também seu desejo de ter a mesa para si.
O estudante que se sentou ao canto da mesa deixou implícito seu dese-
jo de ficar sozinho."Não me importo em dividira mesa, mas se ofizer, vou me
sentar bem longe. Você deveriafazer o mesmo. Dessa forma, podemos ter nos-
sa privacidade."
O mesmo acontece em bancos de parques. Se você quer privacidade e
sentar num banco vazio, será mais provável que você se sente numa das pon-
tas, indicando: " Se você precisar se sentar aqui também, há espaço suficiente
para me deixar só'.
Se você não quer compartilhar o banco, se posicionará no centro e comu-
nicará: "Quero este banco só para mim. Sente-se e estarã me invadindo".
Se você está disposto a dividir seu banco e sua privacidade, então se sen-
tará num dos lados, mas não na ponta.
Essas atitudes para preservar a privacidade refletem nossa personalida-
de. Indicam que o extrovertido tenderá a ir atrás de sua privacidade, impedin-
do que os outros se aproximem. O introvertido procurará a sua privacidade
compartilhando seu lugar com os outros, mas mantendo-se à distância. Em
ambos os casos, a linguagem do corpo envolvida inclui um conjunto diferen-
te de sinais, e não um sinal de movimento corporal, mas um sinal de localiza-
ção. " Sentei-me aqui e, ao fazer isto, digo: 'Não se aproxime' ou 'Sente-se aqui
mas não seja invasivo'."
Isto é parecido com o sinal que transmitimos quando o nosso corpo assu-
me várias posturas em relação ao ambiente: atrás da mesa num escritório, para
indicar:"Mantenha-se ã distância, devo ser respeitado"; no alto da cadeira do
juiz, o ponto mais alto do tribunal, para sinalizar:"Estou bem acima de vocêe
portanto meu julgamento é superior"-, ou próximo de outra pessoa, violando
sua zona pessoal, para dizer:" Você não tem direito nenhum. Eu invado o seu
espaço o quanto eu quiser e, portanto, sou superior".

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O sorriso que esconde a alma

Muitos são os métodos que usamos para defender nossas zonas pessoais
de espaço, e um deles é a máscara. A face que apresentamos ao mundo exte-
rior raramente é nossa verdadeira face. Mostrar o que realmente sentimos por
meio de expressões faciais ou de ações é um comportamento excepcional,
quase peculiar. Somos cuidadosos quando se trata de revelar expressões
faciais e corporais. O dr. Erving Goffman, em seu livro Behavior in public
places, afirma que uma das evidências mais claras desse procedimento é a for-
ma como cuidamos de nossa aparência pessoal, das roupas que escolhemos
e do modo como nos penteamos. Esses transmitem uma mensagem da lin-
guagem do corpo a nossos amigos e colegas.
O dr. Goffman acredita que em lugares públicos espera-se que o homem
padrão de nossa sociedade esteja bem-vestido e barbeado, com o cabelo pen-
teado e as mãos e rosto limpos. O estudo dele, escrito há anos, não levava em
conta os jovens de hoje, de cabelos longos, não barbeados e de aparência mais
descontraída ou descuidada, uma aparência que lentamente está ganhando
aceitação. Mas esta aparência é esperada ou formalizada. Está de acordo com
um ideal geral.
O dr. Goffman ressalta que há momentos, como nos horários de maior
movimento no metrô, em que as máscaras que usamos com tanto cuidado escor-
regam um pouco, e " num tipo de exaustão temporária, descuidada e justifica-
dd', mostramos o que realmente somos. Deixamos as defesas caírem e, cansados
ou exasperados, nos esquecemos de controlar nossos rostos. Procure observar
um ônibus, um metrô ou trem lotados durante a hora do rush, após um dia de
trabalho. Veja o quanto o ser humano desmascarado revela todas as suas faces.

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Dia após dia cobrimos esse ser humano desnudo. Controlamo-nos, com
medo de que nossos corpos gritem mensagens que nossas mentes, por des-
cuido, deixaram de esconder. Sorrimos constantemente, pois um sorriso é
sinal não apenas de humor ou prazer, mas também de desculpas, de defesa
ou até mesmo uma saída escapista.
Sento-me próximo a você num restaurante lotado. Um sorriso tênue diz:
"Não quero invadir seu espaço, mas este é o único lugar vago".
Meu corpo esbarra no seu num elevador apinhado e meu sorriso diz:
"Não estou sendo agressivo, mas me desculpe, de qualquerformd'.
O ônibus breca bruscamente e sou jogado contra alguém; meu sorriso
diz: "Não quis machucá-lo. Perdão".
E assim sorrimos o dia todo, quando na verdade nosso sorriso esconde nos-
sas irritações e constrangimentos. Na vida profissional, sorrimos aos clientes,
aos nossos chefes, aos funcionários; sorrimos para nossos filhos, para nossos
vizinhos, nossos maridos, esposas e .parentes, e muito poucos de nossos sorri-
sos têm grande significado. Eles simplesmente são as máscaras que usamos.
O processo de mascaramento vai além dos músculos faciais. Mascaramos
todo o corpo. As mulheres aprendem a sentar-se de certo modo para escon-
der a sensualidade, principalmente quando usam saias curtas. Os homens
usam roupa íntima que geralmente prende os órgãos genitais. As mulheres
usam sutiãs para manter os seios no lugar e mascarar sua sexualidade. Man-
temos uma postura rígida e abotoamos nossas camisas, fechamos os zíperes,
contraímos os músculos do estômago e apertamos a cinta, e praticamos uma
variedade de máscaras faciais. As expressões de nosso rosto variam, confor-
me estejamos em festas, na escola, em funerais e mesmo no presídio.
Num livro chamado Prison etiquette, o dr. B. Phillips observa que os pri-
sioneiros aprendem a usar uma expressão apática e sem personalidade.
Quando estão sós, entretanto, para compensar a apatia protetora do dia, os
detentos reagem intensamente, exagerando nos sorrisos, nas risadas e no ódio
que sentem dos guardas.
Com idade avançada, as máscaras que usamos freqüentemente se tornam
mais difíceis de usar. Certas mulheres, habituadas à sua beleza facial durante
toda a juventude, com o passar dos anos têm dificuldade, pelas manhãs, de
"recomporem o rosto". Os homens idosos tendem a perder a vaidade e
babam, ou ficam negligentes com sua aparência. Com o passar dos anos vêm
os tiques, as mandíbulas perdem a firmeza, as linhas de expressão ficam bem
marcadas e as rugas são visíveis.

Tire a máscara

Novamente, há certas situações em que a máscara cai. Num carro, quan-


do nossas zonas corporais são ampliadas, muitas vezes nos sentimos livres

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para deixar cair a máscara e, se alguém nos corta a frente ou encosta atrás de
nós, podemos perder a compostura e liberar as emoções, num momento de
descontrole, soltando todos os impropérios do mundo. Por que nos sentimos
tão fortes em situações tão insignificantes? Que grande diferença faz se um car-
ro nos corta a frente ou "cola" na traseira de nosso carro?
Mas, aqui está uma situação em que geralmente somos invisíveis e não
há necessidade de usar máscaras. Por isso, nossas reações podem ser exacer-
badas.
Deixar cair a máscara nos diz muito sobre a necessidade de usá-la. Em
instituições mentais, freqüentemente não se usam máscaras. O paciente men-
tal, como a pessoa idosa, pode negligenciar as máscaras mais aceitas. O dr.
Goffman descreve o caso de uma mulher que estava internada em uma insti-
tuição para mulheres e estava com uma peça íntima mal colocada. Na presen-
ça de todos, ela tentou acertá-la, levantando a saia, mas como não conseguiu,
simplesmente tirou o vestido e acertou a peça; em seguida, vestiu-se nova-
mente, com muita tranqüilidade.
Essa atitude de ignorar os recursos comuns de mascaramento, como rou-
pas, de negligenciar a aparência e o cuidado pessoal, muitas vezes é um dos
sinais mais claros do comportamento psicótico. Por outro lado, a melhora em
instituições mentais muitas vezes é avaliada pelo interesse que se tem pela
aparência pessoal.
Assim como o comportamento psicótico faz o paciente perder contato
com a realidade e torna sua comunicação verbal confusa, também o faz dizer
coisas distantes da realidade e provoca confusão na linguagem do corpo. Ele
perde ainda o contato com o mundo real. Faz declarações que pessoas normais
manteriam em segredo. Livra-se das inibições impostas pela sociedade e age
como se não tivesse mais consciência das pessoas que o estão observando.
E, no entanto, essa liberação da linguagem do corpo pode ser a chave
para entendermos melhor o paciente mentalmente perturbado. Embora uma
pessoa possa parar de falar, ela não pode parar de se comunicar por meio da
linguagem do corpo. Diz a coisa certa ou errada, mas não pode ficar sem di-
zer nada. Pode limitar ao máximo sua comunicação pela linguagem do corpo,
seja agindo de um modo peculiar, ou agindo normalmente, da forma que se
supõe que as pessoas devam agir. Em outras palavras, se ela se comportar de
uma forma normal, então enviará o mínimo de informações usando a lin-
guagem do corpo.
Mas, se agir de uma forma sadia, então, evidentemente, é uma pessoa sã.
Haverá outros critérios para identificarmos a sanidade? Logo, por definição, o
homem insano precisa demonstrar sua insanidade por meio de ações e, ao fa-
zer isso, envia uma mensagem ao mundo. Essa mensagem, no caso do men-
talmente perturbado, geralmente é um grito pedindo socorro. Isso lança uma

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perspectiva inteiramente nova sobre as ações estranhas das pessoas, mental-
mente perturbadas, e abre novos caminhos para a terapia.
O mascaramento não pode encobrir as reações involuntárias. Uma situa-
ção tensa pode nos fazer transpirar, e não há como mascarar isso. Em outra
situação desconfortável, nossas mãos ou pernas podem tremer. Podemos
encobrir essas reações colocando nossas mãos nos bolsos, sentando-nos para
tirar o peso das pernas, ou nos movimentando tão rapidamente que o tremor
não seja notado. O medo pode ser ocultado quando nos empenhamos vigo-
rosamente a fazer o que mais tememos.

A máscara que nunca tiramos

A necessidade de máscara muitas vezes é tão profunda que o processo


se torna permanente, e ela não pode ser tirada. Há certas situações, como a
relação sexual, nas quais o mascaramento deveria ser evitado para aproveitar-
mos o relacionamento amoroso ao máximo e, no entanto, muitos de nós
somos capazes de tirar a máscara apenas em total escuridão. Temos tanto
medo do que podemos dizer a nossos parceiros por meio da linguagem do
corpo, ou do que podemos revelar com nossos rostos, que tentamos eliminar
completamente a visão do ato sexual e erguemos uma barreira moral para nos
ajudar a fazer isso. "Não é decente olhar." "Os órgãos sexuais são feios". "Uma
moça decente não faz isso à luz do dia." E assim por diante.
Para muitas outras pessoas, a escuridão não basta para permitir o desmas-
caramento. Mesmo no escuro elas não conseguem se livrar das barreiras que
ergueram para se proteger durante o intercurso sexual.
Segundo o dr. Goffman, isso pode ser, em parte, responsável pela alta
incidência de frigidez apresentada por mulheres da classe média. Mas, em ter-
mos da prática sexual, Kinsey mostrou que as classes trabalhadoras apresen-
tam tantas barreiras ou mais. Se houver alguma diferença, a classe média tende
a ser mais aberta a experimentações e menos apta a encobrir suas emoções.
A chave para a maioria dos mascaramentos em nossa sociedade é fre-
qüentemente encontrada nos livros de etiqueta. Estes ditam o que é adequa-
do e o que não é em termos de linguagem do corpo. Um livro sugere que é
errado esfregar o rosto, tocar os dentes ou limpar as unhas em público. O que
fazemos com nosso corpo e rosto quando encontramos amigos ou estranhos
é cuidadosamente descrito por Emily Post. O livro de etiquetas dela descreve
até como ignorar as mulheres. Ela discute como ignorar alguém acintosamen-
te, "só por motivos muito sérios, se vocêfor mulher, e nunca para uma mulher
se vocêfor um homem".
Parte do que sabemos sobre o uso de máscaras é aprendido ou absorvi-
do de nossa cultura, e parte é ensinada especificamente. Mas a técnica de mas-
caramento, embora seja universal, varia de uma cultura para outra. Certos

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aborígines, para serem educados, devem conversar sem olhar nos olhos uns
dos outros, enquanto no Ocidente é educado dirigir o olhar para o parceiro
enquanto conversamos com ele.

Quando uma pessoa é uma não-pessoa?

Em qualquer cultura, há momentos em que deixar a máscara cair é per-


missível. Os negros no Sul dos Estados Unidos são conscientes do "olhar de
ódio" que um branco do Sul pode dirigir a eles sem nenhuma razão óbvia,
exceto a cor da pele. O mesmo olhar ou demonstração clara de hostilidade
sem máscara pode ser dado por um branco para outro branco, diante de uma
provocação, e nas culturas do Sul dos Estados Unidos um negro nunca tem
permissão para fazer isso a um branco.
Uma das razões pelas quais a máscara pode ser derrubada, neste caso, pelo
branco do Sul é que este não vê o negro como pessoa, considera-o um objeto
que não merece respeito. No Sul, entretanto, os negros têm seus sinais particu-
lares. Um negro pode indicar pelo olhar que ele também é um irmão, um negro,
embora sua pele seja tão clara que poderia passar por branco. Com outro tipo de
olhar pode sinalizar para outro negro, dizendo:"Estou passando por branco".
As crianças em nossa sociedade muitas vezes são tratadas como não-pes-
soas e os subalternos também. Sentimos, talvez conscientemente, talvez não,
que diante dessas não-pessoas não é necessário ter nenhuma máscara. Não
nos preocupamos com a mágoa que podemos causar a uma não-pessoa. Se
ela não tem sentimentos humanos, como estes podem ser feridos?
Essa atitude geralmente está associada a classes sociais. Pessoas de uma
classe social agirão sem máscaras com pessoas de uma classe inferior à sua;
pessoas de status mais elevado agirão assim com pessoas de status inferior. O
chefe pode não se incomodar em se mascarar diante de seus funcionários, nem
a patroa diante de sua empregada, muito menos o pai diante de seus filhos.
Estava num restaurante recentemente com minha esposa, e numa mesa
distante duas senhoras idosas estavam tomando um coquetel. Tudo nelas,
desde o uso de peles ao penteado, demonstrava riqueza e sua postura confir-
mava isso. No restaurante lotado elas conversavam tão alto que suas vozes
ecoavam em cada canto, embora fosse uma conversa íntima e particular. Para
manter a ilusão de privacidade, todos os presentes, inclusive nós, fingíamos
não ouvir ou conversávamos animadamente, para nos desligar da conversa
das duas senhoras.
Em linguagem do corpo essas duas mulheres estavam dizendo: "Vocês
não têm importância nenhuma para nós. Na verdade, não são pessoas reais.
São não-pessoas. O que queremos fazer é o que realmente importa, e portan-
to não podemos constranger ninguém".

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Em vez de usar seus corpos para sinalizar essa mensagem, essas senho-
ras usaram o volume de voz, e não era o entendimento do que diziam, mas o
volume de voz que usavam para falar que transmitia a mensagem. Aqui temos
a técnica incomum de ter duas mensagens transmitidas por um único meio, o
significado das palavras transmite uma mensagem, e a altura da voz transmi-
te outra.
Esses são casos em que a máscara é derrubada, mas de uma forma quase
desdenhosa. Tirar a máscara diante de uma não-pessoa, muitas vezes, não é
tirá-la verdadeiramente. Na maioria dos casos, mantemos nossas máscaras, e
a razão de as conservarmos é importante. Muitas vezes é perigoso, de uma for-
ma ou de outra, tirar a máscara. Quando nos aproximamos de um pedinte na
rua, se não queremos lhe dar nada, é importante fingir que ele não está lá e
que não o vemos. Firmamos a máscara no lugar, desviamos o olhar e passa-
mos rapidamente. Se nos permitíssemos tirar a máscara para ver o pedinte
como indivíduo, teríamos de enfrentar nossas consciências, mas nos sujeita-
ríamos a seu importunismo, a seus pedidos e à possível tentativa de nos deixar
constrangidos.
O mesmo acontece em tantos encontros casuais. Não podemos perder
tempo para trocar palavras e amabilidades, pelo menos nas áreas urbanas. Há
simplesmente muitas pessoas à nossa volta. Nos subúrbios ou no interior é
diferente, e há menos mascaramento.
Também, ao revelarmos nosso verdadeiro eu, nos abrimos a interpreta-
ções desagradáveis. O dr. Goffman deixa isso claro no ambiente de uma ins-
tituição mental. Ele descreve um homem de meia-idade, que andava com um
jornal dobrado e um guarda-chuva fechado, usando uma expressão de quem
está atrasado para uma reunião. Fazer-se passar por um homem de negócios
normal era extremamente importante para esse paciente, embora, na verda-
de, ele não estivesse enganando a ninguém além dele mesmo.
Nos países orientais, a máscara pode ser física. O costume de usar véus
serve basicamente para permitir que as mulheres escondam suas verdadeiras
emoções e se protejam de qualquer agressão masculina. Nesses países, a lin-
guagem do corpo é tão bem reconhecida que se torna um fato aceito a idéia
de que um homem, diante do menor sinal de encorajamento, tentará forçar
uma mulher ao intercurso sexual. O véu permite à mulher esconder a parte
inferior de sua face e qualquer gesto não intencional que possa ser interpre-
tado como encorajamento. No século XVIII, as mulheres usavam leques e
máscaras, que seguravam por uma haste, com a mesma finalidade.

O masoquista e o sádico

Em muitos casos, o mascaramento pode ser usado como um instrumen-


to de tortura psicológica. Veja o caso de Annie, casada com Ralph, um homem

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idoso, mais velho e mais instruído e muito consciente do fato de que Annie,
do ponto de vista intelectual e social, não se igualava a ele. No entanto, de
uma forma estranha e um pouco pervertida, Ralph amava Annie e achava que
ela era a melhor esposa para ele. Isso não o impedia de envolver Annie num
jogo que incluía um mascaramento complexo e preciso.
Todos os dias, quando Ralph voltava para casa, após o trabalho, havia um
ritual padronizado. Annie precisava estar com o jantar pronto exatamente às seis
e meia, nem mais cedo nem mais tarde. Ele chegava em casa às seis, tomava um
banho e lia o jornal da tarde até seis e meia. Depois, Annie o chamava para a
mesa e se sentava, observando-o furtivamente. Ralph sabia que ela o observa-
va. Ela, por sua vez, percebia que ele sabia. Mas nenhum dos dois admitia isso.
Ralph não dava nenhuma indicação de gostar ou não da refeição e,
enquanto comiam, Annie construía uma novela em sua cabeça. Ela sentia uma
ansiedade na boca do estômago. Será que Ralph gostou da comida? Quando
a refeição não lhe agradava; ela sabia o que esperar: uma noite fria, miserável
e um silêncio total.
Annie comia ansiosa, observando o rosto impassível de Ralph. Teria ela
preparado o prato corretamente? Temperou-o bem? Seguiu a receita, mas
acrescentou seus próprios temperos. Será que errou? Sim, deve ter sido isso!
Sentia o coração apertado, o corpo todo tenso. Não, Ralph não gostou. Sèus
lábios não estão esboçando um ligeiro desagrado?
Ralph, vivendo o mesmo drama, olhava e por um momento mantinha o
rosto impassível, enquanto Annie morria de angústia até finalmente ele dar
um sorriso de aprovação. Então, de repente, miraculosamente, Annie ficava
exultante de alegria. A vida é maravilhosa, Ralph é seu amado e ela se sente
extremamente contente. Ela retoma a refeição, agora saboreando a comida,
faminta e muito satisfeita.
Manipulando cuidadosamente sua máscara, controlando sua linguagem
do corpo, Ralph pratica seu ato de tortura ou recompensa. Ele usa a mesma téc-
nica à noite, quando ele e Annie estão deitados. Não lhe dá sinal do que sente,
nem se fará amor com ela, e Annie passa pelo mesmo jogo elaborado:"Será que
ele me tocará? Será que ele me ama? Como me comportarei se ele me rejeitar?'
"Quando finalmente Ralph se aproxima e a toca, Annie explode de paixão.
Contudo, não nos cabe decidir se Annie é vítima ou cúmplice. O uso de uma más-
cara para torturar é o que devemos considerar. O relacionamento sado-maso-
quista de Annie e Ralph beneficia a ambos de uma forma estranha, mas, para a
maioria dos usuários de máscaras, os benefícios de usá-las são mais realistas.

Como deixamos a máscara cair

Os benefícios do mascaramento, real ou imaginário, nos tornam relutan-


tes em deixar a máscara cair. Podemos, entre outras coisas, estar forçando um

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relacionamento que outra pessoa não deseja. Ou nos arriscamos a ser rejeita-
dos. No entanto, o próprio uso da máscara pode afetar relacionamentos que
desejamos ter. Ganhamos tanto quanto perdemos?
Veja o caso de Cláudia. Com seus trinta e poucos anos, Cláudia é atraen-
te. Por trabalhar numa grande empresa de investimentos, Cláudia entra em
contato com muitos homens durante o dia, e marca muitos encontros. Mas ela
ainda é solteira e, embora odeie admitir, ainda é virgem.
Não é esse o seu desejo, Cláudia insiste. Ela é uma mulher afetuosa e vê
com horror a perspectiva de vir a ser uma solteirona sem filhos. Então, por que
ela não consegue se envolver com um homem tanto do ponto de vista emo-
cional quanto sexual? Cláudia não entende por que, mas os homens com
quem se encontra percebem o que acontece.
"Ela não deixa você se aproximaf, um deles explicou. "Adoro a Cláu-
dia. No trabalho ela é uma grande colega e já saí com ela, mas no momento
em que se instala um certo clima, eia vira uma pedra degelo e envia uma men-
sagem muito clara. Não me toque. Não quero isso. Quem precisa disso?"
E quem precisa? Quem consegue ver por trás da fachada fria de Cláudia
a mulher afetuosa que ela é? Cláudia, sentindo terror de ser rejeitada, rejeita
primeiro, antes que qualquer clima se instaure. Dessa forma, ela nunca se dará
mal. Ela nunca é rejeitada porque quem rejeita primeiro é ela.
Tolice? Talvez, mas funciona, se ser rejeitada é a pior coisa que poderia
lhe acontecer. Para Cláudia é. Então, em vez de aproveitar uma oportunida-
de, ela vive sozinha.
A máscara de Cláudia é desnecessária e prejudicial, mas há máscaras
necessárias, impostas pela sociedade. A pessoa que se mascara de acordo com
essa regra pode querer desesperadamente usar a linguagem do corpo para se
comunicar, mas é incapaz de fazer isso, por costume.
Um exemplo desse uso de máscara é uma jovem amiga adolescente, uma
moça de dezessete anos que procurou minha esposa para ajudá-la.
"No caminho de volta para casa um rapaz toma o mesmo ônibus que eu
todos os dias, e ele desce no mesmo ponto e eu não o conheço, mas ele é boni-
to e eu gostaria de conhecê-lo, e acho que ele se interessa por mim, mas como
vou deixar que ele se aproxime?"
Minha mulher, pela experiência, sugeriu que ela carregasse alguns paco-
tes pesados da próxima vez que tomasse o ônibus, e tomasse um tombo cui-
dadosamente ensaiado, para que os pacotes voassem, assim que ela descesse
do ônibus.
Para minha surpresa, funcionou. O incidente suscitou a única reação pos-
sível, visto que eles eram os únicos passageiros que desceram do ônibus
naquela parada. Ele ajudou-a com os pacotes e ela foi obrigada a tirar a más-
cara. Ele, também, pôde tirar a máscara, e quando chegaram à casa dela, ela
conseguiu convidá-lo a entrar para tomar uma Coca, e assim foi.

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Na hora certa, portanto, a máscara deve ser tirada, deve ser derrubada
para que o indivíduo cresça e se desenvolva e qualquer relacionamento sig-
nificativo seja iniciado. O grande problema com todos nós é que, depois de
usarmos uma máscara a vida toda, não é fácil tirá-la.
Às vezes a máscara pode ser tirada quando é substituída por outra. O
homem que se veste de palhaço para um projeto de teatro amador muitas
vezes oculta suas inibições como o faz com sua vestimenta, e é capaz de dar
piruetas, brincar e "fazer palhaçadas" com desembaraço e liberdade.
O uso da escuridão como máscara permite a alguns de nós a liberdade
para fazer amor sem máscaras e, para outros, a máscara do anonimato serve
ao mesmo propósito.
Conheci homossexuais masculinos que me disseram ter encontros com
homens, desde a escolha do parceiro até a satisfação sexual, sem dizer seus
nomes nem saber os nomes de seus parceiros. Quando perguntava como eles
poderiam ficar tão íntimo's sem saber os nomes de seus parceiros, a resposta
era, invariavelmente: "Mas isso torna o encontro mais excitante. Posso relaxar
efazer o que quiser. Afinal, não nos conhecemos, e quem liga para o que faze-
mos ou dizemos?'
Até certo ponto, isso ocorre quando um homem visita uma prostituta. O
mesmo anonimato pode se manter e permitir, assim, mais liberdade.
Mas, esses são simplesmente casos de dupla máscara, de erguer outra
defesa para que uma delas possa ser derrubada. Juntamente com a constante
necessidade de vigiar a linguagem do corpo, manter um controle estrito dos
sinais que se envia, há também uma necessidade paradoxal de transmitir men-
sagens franca e livremente, de dizer ao mundo quem somos e o que quere-
mos, de gritar e receber respostas, de tirar a máscara e ver se a pessoa que
escondemos é um ser com seus direitos, em resumo, de ganhar a liberdade
para nos comunicar livremente.

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Segure minha mão

Tempos atrás, ofereci-me como voluntário para dar aulas de redação cria-
tiva a jovens em nossa igreja local. Harold, um dos jovens que freqüentou as
aulas, tinha catorze anos e era encrenqueiro desde a infância. Bonito, grande
para sua idade e muito falante, Harold fazia inimigos sem nem mesmo se
esforçar para isso, embora geralmente ele tentasse.
Na quinta aula, todos o odiavam e ele estava prestes a desfazer o grupo.
De minha parte, estava desesperado. Tentei de tudo, desde a compreensão e
receptividade ã irritação e disciplina, mas nada funcionou e Harold continua-
va a ser uma força insistente, destrutiva.
Então, certa noite, ele foi um pouco longe demais, ao mexer com as meni-
nas, e eu o agarrei com as duas mãos. Na hora que fiz isso, percebi meu erro.
O que poderia fazer agora? Deixá-lo ir? Ele se sentiria vitorioso. Bater nele?
Dificilmente, com a diferença de idade e tamanho.
Numa inspiração repentina, coloquei-o no chão e comecei a fazer cóce-
gas nele. Primeiro ele urrava de raiva, depois acabou caindo na risada. Só
quando ele me prometeu, ofegante, se comportar, eu o deixei se levantar e
descobri, ainda confuso, que tinha criado um monstro, como se fosse um
Frankenstein. Ao fazer cócegas, invadi sua zona corporal e impedi que ele a
usasse como defesa.
Daquele dia em diante, Harold passou a se comportar, e também se tor-
nou meu companheiro inseparável, pendurando-se em meu braço ou em meu
pescoço, empurrando-me ou esmurrando-me, e se aproximando fisicamente
de mim o máximo que podia.

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Retribuí a aproximação, e de alguma forma nós dois a favorecemos
naquela aula. O que me fascinou foi que, ao invadir sua esfera pessoal, vio-
lando seu território, me comuniquei com ele pela primeira vez.
Percebi, daquele encontro, que há momentos em que as máscaras preci-
sam cair e precisamos nos comunicar pelo contato físico. Não podemos alcan-
çar a liberdade emocional, em muitos casos, sem adentrar o espaço pessoal,
usando máscaras como proteção, para tocar, acariciar e interagir fisicamente
com outras pessoas. A liberdade talvez não seja algo individual, mas uma fun-
ção do grupo.
A consciência desse fato levou um grupo de psicólogos a formar uma
nova escola de terapia, baseada na linguagem do corpo, mas também preo-
cupada em romper com o processo de mascaramento por meio do contato
corporal.

máscaras debilitante.s

As crianças, antes de serem cerceadas pela nossa sociedade, exploram


seu mundo pelo toque. Elas tocam seus pais e se aninham em seus braços,
tocam a si mesmas, encontram prazer em sua genitália, segurança na textura
de seu cobertor, excitação ao sentir coisas frias, quentes, suaves ou ásperas.
Mas, ao crescerem, seu nível de percepção mediante o toque é reduzido.
O mundo tátil é restringido. Elas aprendem a proteger seu corpo, tornam-se
conscientes de suas necessidades corporais em termos de sua cultura e des-
cobrem que o uso de máscaras pode impedi-las de serem magoadas, embora
também as impeça de sentir diretamente as emoções. Elas acreditam que o
que perdem em expressão, ganham em proteção.
Infelizmente, à medida que as crianças se tornam adultas, as máscaras
muito freqüentemente ficam endurecidas e rígidas e deixam de ser uma pro-
teção para exercer uma função debilitante. O adulto pode achar que embora
a máscara o ajude a manter sua privacidade e impeça qualquer relacionamen-
to indesejado, também se torna algo limitante e impede os relacionamentos
que ele deseja ter.
Então, o adulto fica mentalmente imobilizado. Mas, por serem as quali-
dades mentais tão facilmente traduzidas em qualidades físicas, ele também se
torna fisicamente imobilizado. A nova terapia baseada em experiências no
Esalen Institute em Big Sur, Califórnia, com pesquisas feitas com grupos de
homens isolados que vivem na Antártica e em seminários realizados em todo
o mundo, chamados grupos de encontro, busca romper com essas imobiliza-
ções físicas e trabalhar retroativamente com a imobilização mental.
O dr. William C. Schutz escreveu muito sobre a nova técnica de grupos de
encontro, que tem por objetivo preservar a identidade do homem em meio à
pressão exercida pela sociedade de hoje. Para mostrar o quanto os sentimen-

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tos e os comportamentos são expressos em linguagem do corpo, o dr. Schutz
cita várias expressões interessantes que descrevem comportamentos e estados
emocionais em termos corporais. Entre eles estão: olhar por cima dos ombros,
ficar de queixo caído, empinar o nariz, mostrar os dentes e assim por diante.
O interessante é que essas expressões também são frases da linguagem
do corpo. Cada uma delas expressa verbalmente uma emoção e, também, um
ato corporal, físico, que sinaliza a mesma emoção.
Quando consideramos essas frases, podemos entender a sugestão do dr.
Schutz de que as "atitudes psicológicas afetam a postura e o funcionamento
do corpo". Ele cita a observação da dra. Ida Rolf, de que as emoções endure-
cem o corpo seguindo padrões estabelecidos. O homem que está constante-
mente infeliz habitua-se a franzir a testa e isso passa a fazer parte de seu
semblante. O homem agressivo, que impulsiona a cabeça para frente o tem-
po todo, desenvolve essa postura e não consegue mudá-la. As emoções dele,
de acordo com a dra. Rolf, fazem sua postura ou expressão congelar-se numa
dada posição. Por sua vez, essa postura organiza as emoções. Se você conge-
la a face com um sorriso habitual, a dra. Rolf acredita que isso afetará sua per-
sonalidade e fará com que você sorria mentalmente. O mesmo é válido para
o franzir da testa ou para posturas corporais menos óbvias.
O dr. Alexander Lowen, em seu livro Physical dynamics of character
structure(dinâmica física da estrutura de caráter), confirma esse conceito fas-
cinante ao afirmar que todos os problemas neuróticos são mostrados pela
estrutura e função do corpo. "Não bápalavras tão claras quanto a linguagem
da expressão corporal, depois que se aprendeu a interpretã-la", diz ele.
Ele vai adiante, ao associar a função corporal à emoção. Uma pessoa com
uma postura encurvada, acredita ele, não pode ter o ego forte de um homem
que mantém a coluna ereta. A coluna reta, por outro lado, é menos flexível.

Você é o que sente ser

Talvez o conhecimento dessa ligação entre a postura e a emoção faça um


exército exigir que seus soldados fiquem retos e rígidos. A esperança é que
eles venham a se tornar decididos e determinados. Certamente, o clichê do
velho soldado com uma "vara para manter as costas retas" e uma personalida-
de rígida tem um fundo de verdade.
Lowen acha que ombros retraídos representam raiva reprimida, ombros
erguidos estão relacionados ao medo, ombros retos indicam arcar com res-
ponsabilidade, ombros encurvados sinalizam que estão arcando com uma
carga, o peso de uma grande carga.
É difícil separar os fatos de fantasias literárias em muitas dessas sugestões
de Lowen, principalmente quando ele afirma que a sustentação da cabeça é

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uma função da força e da qualidade do ego. Ele fala de um pescoço longo,
que indica orgulho, ou de um pescoço curto, denotando força e resistência.
No entanto, parece haver muito sentido na relação que Lowen faz entre
os estados emocionais e suas manifestações físicas. Se o jeito de uma pessoa
falar, sentar-se, ficar em pé, movimentar-se, ou seja, se sua linguagem do cor-
po indica seu humor e personalidade e capacidade de se aproximar dos
outros, então deve haver formas de fazer uma pessoa mudar, alterando a lin-
guagem do corpo.
Schutz, em seu livro Joy (Alegria), nota que grupos de pessoas muitas
vezes sentam-se com os braços e pernas cruzados para indicar rigidez e reser-
va, resistência contra qualquer um que tente se aproximar. Pedir a uma pes-
soa para se destravar, descruzar as pernas e os braços, Schutz acredita,
também abrirá essa pessoa para a comunicação com o resto do grupo. O
importante é saber o que a pessoa está dizendo com esses braços e pernas cru-
zados, que mensagem está enviando. Também é importante para a própria
pessoa saber que mensagem pretende enviar. Ela deve identificar as razões
para sua própria tensão, a fim de poder aliviá-la.

Como romper a proteção

Como você rompe sua proteção? Como se aproxima dos outros? O pri-
meiro passo para se libertar precisa ser: entender a proteção, entender as defe-
sas que você construiu. Recentemente, num centro de treinamento e
aconselhamento na New York University, vi uma série de videoteipes de entre-
vistas entre conselheiros que estavam aprendendo a técnica de aconselha-
mento e crianças com problemas que estavam sendo aconselhadas.
Numa fita uma mulher branca, bem vestida, de aparência fina, muito gen-
til estava entrevistando uma menina negra, perturbada e extremamente intro-
vertida, de catorze anos. A menina sentou-se à mesa com a cabeça baixa,
escondendo o rosto, a mão esquerda cobrindo os olhos e a direita esticada
sobre a mesa.
À medida que a entrevista progredia, a mão esquerda da adolescente ain-
da escondia os olhos. Ela não olhava, embora fosse bastante articulada, mas
a mão direita deslizou pela mesa e aproximou-se da conselheira, os dedos
movendo-se, retraindo e avançando, agradando e convidando, pedindo com
um grito quase audível da linguagem do corpo:" Toque-me! Pelo amor de Deus
- toque-me! Pegue minha mão e meforce a olhar para você!'
A conselheira, inexperiente em técnicas de aconselhamento e assustada
com a experiência, uma de suas primeiras entrevistas, sentou-se com as per-
nas e os braços cruzados. A atitude física dela espelhava claramente sua atitu-
de mental. "Estou assustada e não consigo tocá-la. Não sei como lidar com a
situação, mas preciso me proteger."

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Como essa situação poderia ser desfeita?
O dr. Arnold Buchheimer, professor titular de educação na universidade,
explicou que o primeiro passo para destravar seria mostrar a fita de vídeo (gra-
vada sem o conhecimento da conselheira ou da orientanda) ao orientador.
Juntamente com isso, seguiu-se uma discussão profunda de como ela havia
reagido e por quê. A conselheira, então, seria incentivada a examinar seus pró-
prios medos e hesitações, sua própria rigidez e inflexibilidade, e a tentar na
próxima sessão conseguir primeiro um contato físico com a menina e depois
um contato verbal.
Antes da série de sessões de aconselhamento, a conselheira, treinando e
analisando seu próprio comportamento, foi capaz de chegar ao cerne do pro-
blema da menina num nível verbal, mas também físico; ela também conseguiu
abraçá-la e dar à menina um pouco do carinho de que ela precisava.
Sua reação física foi o primeiro passo para iniciar uma resposta verbal, no
momento apropriado para ajudar a menina. Nessa situação, a menina pediu,
por meio da linguagem do corpo, um contato físico. A cabeça baixa e a mão
cobrindo os olhos diziam: "Estou com vergonha. Não posso olhar para você.
Estou com medo". A outra mão, deslizando para o outro lado da mesa, dizia:
" Toque-me. Dê-me segurança. Faça contato comigo".
A conselheira, ao cruzar os braços e sentar-se com uma postura rígida,
dizia: " Tenho medo: não consigo tocá-la nem permitir que você invada min-
ha privacidade.
Só quando a invasão mútua tornou-se possível e houve contato físico
direto é que as duas se encontraram, dando e recebendo ajuda.
O contato ou invasão de privacidade necessária para romper as barreiras
e tirar a máscara nem sempre precisa ser físico. Pode ser verbal. Numa viagem
recente a Chicago, conheci um jovem notável que estava no mesmo hotel. Ele
tinha a capacidade incomum de demolir as máscaras e as barreiras das pes-
soas verbalmente. Certa noite, andávamos pela rua quando passamos por um
restaurante estilo, meados do século XIX. O porteiro estava trajado com um
uniforme típico do período e impunha sua presença.
Meu novo amigo parou e, para meu absoluto constrangimento, começou
uma conversa íntima com o porteiro, perguntando sobre sua família, suas
expectativas de vida e suas realizações. Pareceu-me uma atitude de péssimo
gosto. Não se invade a privacidade de um homem dessa maneira.
Eu tinha certeza de que a reação do porteiro seria ficar ofendido, cons-
trangido e se afastar. Para minha surpresa, nada disso aconteceu. O porteiro
respondeu, depois de um minuto de hesitação, e nem dez minutos depois ele
estava confessando suas esperanças, ambições e problemas a meu amigo.
Quando nos despedimos, ele estava encantado e entusiasmado. Chocado,
perguntei a meu novo amigo:
—Você costuma fazer isso sempre?

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Participamos de um jogo de salão, com uma ligeira diferença. Não há per-
dedores e o resultado final é um entendimento mais profundo das pessoas
com quem você está brincando. Há outros jogos destinados a estimular a
comunicação, a tornar a linguagem do corpo compreensível e a romper com
as barreiras que erguemos para nos proteger.

Participando de jogos que fazem bem à saúde

O dr. Schutz reuniu uma série desses "jogos de salão", alguns coletados
do Califórnia Institute of Technology, alguns da UCLA School of Business e
outros do National Training Laboratories em Bethel, Maine. Todos eles têm
o objetivo de romper as barreiras, desmascarar a si e aos outros e torná-lo
consciente da linguagem do corpo e de sua mensagem.
Um deles é chamado por Schutz como "Sentindo o espaço". Ele dá ins-
truções a um grupo de pessoas para se sentarem juntas no chão ou em cadei-
ras e, com os olhos fechados, esticarem as mãos e "sentirem" o espaço à sua
volta. Inevitavelmente, eles entram em contato com os outros, tocam e explo-
ram uns aos outros e reagem a esse contato e à intrusão do vizinho.
Algumas pessoas, ele observa, gostam de entrar em contato com certas
pessoas e com outras não. Algumas gostam de ser tocadas e outras não. As
interações, combinações e permutações possíveis muitas vezes farão as emo-
ções ocultas vir à tona. Se essas forem discutidas em seguida, aqueles que
tocam e os que são tocados podem encontrar uma nova consciência de si mes-
mos e dos vizinhos.
Outro jogo que Schutz chama de "pressão cega" requer que o grupo, com
os olhos fechados, se mova pela sala encontrando, tocando e explorando uns
aos outros com as mãos. O resultado final é semelhante àquele de "Sentindo
o espaço".
Além dessas explorações experienciais, Schutz sugere técnicas para
expressar sentimentos na linguagem do corpo. Por exemplo, ele faz um rela-
to de um jovem que evitava qualquer relacionamento direto que pudesse
magoá-lo. Era mais fácil para ele fugir do que arriscar-se a ser magoado. Para
que ele tomasse consciência do que estava fazendo, seu grupo de terapia ten-
tou fazê-lo dizer à pessoa de quem ele menos gostava no grupo seus verda-
deiros sentimentos em relação a ela. Quando ele protestou, dizendo que não
conseguiria fazer isso, pediram-lhe para sair do grupo e sentar-se num canto.
O isolamento físico dele o fez perceber que ele preferia se isolar a enfrentar
alguém com franqueza e sinceridade. Ele preferia se afastar de um grupo que
arriscar fazer algo que pudesse provocar uma situação desagradável, capaz de
fazer alguém antipatizar com ele.
Muito da técnica de grupos baseia-se na demonstração concreta de um
problema emocional.

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Em outro nível, expressa-se na linguagem do corpo o que já existia em
termos emocionais. Expressar emoções com o corpo, entretanto, permite
entendê-las melhor.
Na técnica de Schutz, o homem que sente um ódio reprimido, misturado
a um verdadeiro amor pelo pai, pode perceber essas emoções conflitantes e
lidar melhor com elas, fingindo que um objeto maleável, digamos um traves-
seiro, é seu pai. Ele é encorajado a bater no travesseiro enquanto expressa sua
raiva e fúria.
Muitas vezes, bater furiosamente no travesseiro (se este não romper e
encher o ar de plumas), levará aquele que está batendo a um estado emocio-
nal em que a hostilidade a esse pai pode ser liberada. Ao se expressar dessa
forma, em termos claramente físicos, ele deixa de sentir um profundo confli-
to e, por sua vez, é capaz de expressar seu amor pelo pai, um amor que sem-
pre foi escamoteado por ressentimento e hostilidade.
O que aconteceu a ele foi a liberação de uma emoção e da capacidade
de odiar, assim como de amar. Freqüentemente, em vez de um objeto inani-
mado como um travesseiro, as emoções podem ser liberadas em interações
entre pessoas.
Outra técnica para expor um homem a si mesmo é fazer um grupo de pes-
soas formar um círculo com os braços fechados e deixar que a pessoa que está
lutando para se entender lute para entrar no círculo. A maneira como ele lida
com a situação pode ajudá-lo a entender seu verdadeiro self e suas verdadei-
ras necessidades.
Algumas pessoas forçarão a entrada para fazer parte do círculo. Algumas
procurarão entrar conversando e outras usarão de malícia ou esperteza, como
fazer cócegas em um dos participantes até que ele se desloque deixando-o
entrar no círculo.
Quando um novo grupo de encontro está sendo formado, uma técnica
interessante, sugerida por Schutz, é fazer os participantes, um a um, ficarem
diante do grupo para serem examinados fisicamente, serem cutucados,
empurrados, observados, tocados e cheirados. Ele considera que isso torna a
realidade da pessoa mais clara para seus companheiros de grupo.
Eu sugeriria que outra técnica pudesse basear-se na linguagem do corpo.
Um membro do grupo pode ser observado pelos outros e, então, descrito em
termos de linguagem do corpo. O que ele está dizendo com seu andar, com
sua postura, seus gestos? O que pensamos que ele está dizendo é o que ele
realmente está dizendo?
Uma discussão dos sinais enviados e recebidos pode esclarecer alguns
aspectos a uma pessoa. Quais as mensagens que você envia? Seu andar
expressa a maneira como você realmente se sente, o modo que você acha que
sente ou como os outros o vêem? Enviamos certos sinais da linguagem do cor-

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po e é possível aprender mais sobre nós mesmos, ouvindo a interpretação que
os outros fazem deles.
Os psicólogos têm conhecimento disso há muito tempo, e a técnica de
filmar um homem em um relacionamento com outros, e então mostrar o filme
a ele e discutir seus próprios sinais, sua linguagem do corpo, provou ser efe-
tiva para que ele abra os olhos para a realidade.
Sem as técnicas aprimoradas de filmar e fazer videoteipes, como pode-
mos começar a entender nossos próprios sinais? Há várias formas, e talvez a
mais direta e mais fácil seja por meio de um jogo parecido com resolução de
charadas — mas diferente.
Um homem ou uma mulher num grupo sai da sala e em seguida volta de
novo, e, sem dizer nada, tenta entender uma idéia ou emoção como alegria,
êxtase, pesar ou desgosto. Sem apelar para gestos simbólicos, isso se torna um
problema de projeção da personalidade. Aquele que está tentando projetar a
idéia de repente tem ciência de si mesmo, de seus próprios gestos e sinais, de
como ele se porta e como se move.
Depois, quando o grupo discute o sucesso ou fracasso de sua tentativa
de se expressar usando a linguagem do corpo, ele toma consciência da rea-
ção deles aos sinais por ele enviados. Ele tentou transmitir timidez e conse-
guiu, em vez disso, arrogância? Ele expressou entusiasmo no lugar de dor,
auto-afirmação em vez de incerteza? No espelho maior da vida, será que ele
também confunde os seus sinais? Ou são corretamente interpretados?
Esta é uma questão que deveríamos considerar. Apresentamos nosso ver-
dadeiro eu ao mundo? As mensagens que nossos amigos recebem são aque-
las que pensamos enviar? Se não forem, isso pode ser parte de nosso fracasso
em nos integrar ao mundo. Essa pode ser a pista para entendermos nossos fra-
cassos na vida.
Outro jogo que pode ajudar o auto-entendimento é pedir a um grupo
para dar a um de seus integrantes um novo nome, um nome que seja adequa-
do aos seus movimentos corporais. Então a pessoa deve agir de acordo com
o novo nome que o grupo lhe deu. Muitas vezes, a liberdade repentina de agir
de uma nova maneira, de aceitar uma nova personalidade, servirá como uma
força libertadora e fará as inibições desaparecerem, permitindo que a pessoa
com novo nome entenda-se num nível diferente. Essa é a representação de
uma nova personalidade, mas também de uma personalidade que ela prefe-
riria ter.
Há outras variações de "representação" que podem se prestar à mesma
função. Um amigo meu me disse recentemente que em sua própria família ele
estava tendo problemas sérios entre a filha de dezessete anos e o filho, de ca-
torze. "Eles chegaram a ponto de não poderem ficar na mesma sala sem explo-
dir. Tudo o que elefaz está errado para ela, e ela sempre o está repreendendo."

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Seguindo a minha sugestão, ele tentou fazer um jogo não-verbal com os
dois, e disse a eles para fazerem tudo o que quisessem, sem usar palavras.
"Por um momento", ele me disse depois, " eles ficaram perdidos. Sem
palavras ela não conseguia criticá-lo, eparecia não saber o que fazer, de que
outra forma poderia se relacionar com ele. Então, ele se aproximou de onde
ela estava sentada e deu um sonisofranco para ela, e de repente ela o recebeu
nos braços, para a surpresa do resto da família."
O resultado disso, numa discussão posterior, foi que toda a família con-
cordou que, pelas ações dela, ela parecia fazer o papel de mãe dele. Ela real-
mente se sentia a mãe dele, e as constantes repreensões eram menos de
natureza crítica e mais de um amor possessivo de mãe. A linguagem do cor-
po dela, ao aconchegá-lo, tornou-a consciente disso e também a alertou. Pos-
teriormente, meu amigo me disse que, embora eles continuassem com sua
rixa, raramente era tão séria quanto antes e, por trás disso, havia um novo
entendimento e afeto entre-os dois.
O que acontece em qualquer relacionamento é que a própria linguagem
se torna uma máscara e um meio de ofuscar e confundir o relacionamento. Se
a linguagem falada é abolida e a única comunicação que resta é a linguagem
do corpo, a verdade encontrará uma forma de se impor. A linguagem falada,
em si, contribui muito para ocultar a verdadeira mensagem.
No amor e em encontros amorosos a palavra falada pode encobrir a ver-
dade. Um dos exercícios terapêuticos mais úteis para um casal é tentar, na total
escuridão, transmitir uma mensagem definida um para o outro, apenas com
elementos táteis da linguagem do corpo. Tentar dizer para seu parceiro: "Pre-
ciso de você. Eu o farei feliz!'. Ou "Estou zangado com você. Você não faz isto
ou aquilo de modo correto". " Você é exigente demais." " Você não está sendo
suficientemente exigente."
Sem as palavras, esses exercícios de sexualidade e amor podem se tornar
intensamente significativos e ajudar no desenvolvimento e crescimento de um
relacionamento. A mesma comunicação sem palavras, mas com o sentido
visual em vez de tátil, pode ser um segundo passo para fazer um relaciona-
mento amoroso amadurecer. De alguma forma, é muito mais fácil para mui-
tas pessoas olhar para o corpo do parceiro depois de tê-lo tocado.

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Atitudes, olhares e aproximações

Mike é um homem que nunca perde uma garota. Ele é capaz de entrar
numa festa cheia de estranhos e dez minutos depois sentir-se íntimo de uma
garota. Em meia hora ele já a conquistou e está indo para casa com ela — para
a casa dele ou dela, dependendo da que for mais perto.
Como Mike consegue isto? Outros homens que passaram metade da noite
ganhando coragem para se aproximar de uma garota verão Mike entrar e
dominar rápida e efetivamente. Mas eles não sabem por quê.
Pergunte às meninas e elas encolherão os ombros. "Não sei. Ele tem essa
antena ligada, acho que é isso. Eu recebo sinais, e respondo a eles, e a primei-
ra coisa que sei..."
Mike não é muito bonito. Ele é muito inteligente, mas não é isto o que o
torna atraente. Parece que Mike tem quase um sexto sentido. Se há uma meni-
na disponível, Mike a encontrará, ou ela o encontrará.
O que Mike tem?
Bem, se ele não é bonito nem é brilhante, tem algo bem mais importan-
te para esse tipo de encontro. Mike tem um comando inconsciente da lin-
guagem do corpo e usa-a com inteligência. Quando Mike entra numa sala,
transmite automaticamente sua mensagem. "Estou disponível, sou másculo.
Sou direto e sei como agir." E então, quando ele se aproxima da pessoa que
escolheu, os sinais dizem: "Estou interessado em você. Você me atrai. Há algo
excitante em você e eu quero descobrir o que é."
Veja Mike em ação. Veja-o fazer contato e sinalizar sua disponibilidade.
Todos nós conhecemos pelo menos uma pessoa como Mike, e invejamos sua
habilidade. Qual é a linguagem do corpo que ele usa?

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Bem, a atração de Mike, a clareza não-verbal de Mike, é uma combina-
ção de vários aspectos. A aparência dele faz parte disso. Não a aparência com
a qual nasceu; essa é comum, mas a forma como ele usa a aparência para trans-
mitir sua mensagem. Quando você olha para ele, há uma sensualidade defi-
nida nele.
"Evidentemente, uma mulher experiente dirá,"Mike é um homem muito
sexy." Mas sexy como? Não em seus traços físicos.
Se for pressionada, a mulher explicará: "É algo que ele tem, uma espécie
de aura".
Na verdade, não é nada disso, nada tão vago quanto uma aura. Em parte
é a maneira como Mike se veste, o tipo de calça que usa, as camisas, as jaque-
tas e as gravatas, a forma de ele pentear o cabelo, o comprimento da costele-
ta — tudo isso contribui para sua atração imediata, mas o mais importante é a
postura de Mike e seu jeito de andar.
Uma mulher descreveu isso como um "charme natural". Um homem que
conheceu Mike não foi tão generoso. "Ele é afetado." O que é considerado
agradável para uma mulher é perturbador ou desafiador e, portanto, detestá-
vel para um homem, e ele reagiu caracterizando a qualidade com desdém.
No entanto, Mike move-se com charme, um tipo de graça arrogante que
despertaria a inveja de um homem e atrairia uma mulher. Alguns atores têm
esse mesmo jeito de se movimentar; é o caso de Paul Newman, Marlon Bran-
do, Rip Tom e, com isso, eles podem transmitir uma mensagem claramente
sensual. A mensagem pode ser decomposta na forma como eles se portam, na
postura e na confiança de sua movimentação. O homem que tem esse andar
precisa de pouco mais para virar a cabeça de uma mulher.
Mas Mike tem esse algo mais. Ele tem dezenas de pequenos gestos, tal-
vez inconscientes, que enviam sua mensagem sexual. Quando Mike se apóia
na lareira de uma sala para apreciar as mulheres, os quadris estão ligeiramen-
te inclinados para frente, como se estivessem erguidos e as pernas geralmen-
te estão afastadas uma da outra. Há algo de sensual nessa postura.
Veja Mike quando ele fica em pé, nessa posição. Ele apóia os polegares
no cinto, bem acima dos bolsos, e os dedos apontam para baixo, em direção
aos genitais. Você certamente já viu a mesma posição centenas de vezes em
filmes de faroeste, em geral não tomadas com o herói, mas com o bandido
sensual, ao se recostar na cerca do curral, a figura da sensualidade ameaçada,
o vilão que os homens odeiam e as mulheres — bem, o que elas sentem é mais
complexo que ódio ou desejo ou medo e, no entanto, é uma combinação de
todas essas coisas. Com sua linguagem do corpo declarada, seus acessórios
de couro, a virilha proeminente e os dedos apontando para baixo, ele está
enviando um sinal óbvio, direto, mas efetivo. "Sou uma ameaça sexual. Sou
um homem perigoso quando estou só com uma mulher. Sou muito homem e
quero você!"

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Numa escala menor, menos gritante, Mike envia a mesma mensagem.
Mas, sua linguagem do corpo não pára aí. Isso serve para sinalizar suas
intenções, criar uma atmosfera, uma aura se você quiser. Fascina as mulheres
disponíveis e interessa ou mesmo irrita as não-disponíveis.
O próprio Mike explicou como proceder depois disso.
— Percebo qual é a mulher que está interessada. Como? É fácil. Pela for-
ma de ficar em pé ou sentada. E então faço minha escolha e chamo a atenção
dela. Se ela estiver interessada, responderá. Senão, esqueço.
— Como você chama a atenção dela?
— Olho um pouco mais demoradamente do que deveria, visto que não
a conheço. Não deixo que o olhar dela se desvie, e fixo o meu olhar, mais ou
menos assim.
Mas, não é apenas o olhar insistente de Mike que conta, como eu obser-
vei certa noite numa festa. Mike tem um instinto infalível para perceber a lin-
guagem do corpo defensiva de uma mulher e romper com suas barreiras. Os
braços dela estão cruzados defensivamente? Ele abre os seus. A postura dela
é rígida? Ele relaxa à medida que conversam. Ela está sem graça, com o rosto
contraído? Ele sorri e descontrai seu rosto.
Em suma, ele responde aos sinais corporais com sinais opostos e com-
plementares e, ao fazer isso, invade a consciência dela. Ignora seu fingimen-
to corporal e, como inconscientemente ela quer realmente se abrir, abre-se
para Mike.
Mike se aproxima de uma mulher. Depois do contato por sinais, quando
sua linguagem do corpo recebe a mensagem de sua disponibilidade, seu pró-
ximo passo é a invasão física, mas a invasão física sem toque.
Ele invade o território ou zona corporal da mulher. Aproxima-se o sufi-
ciente para que ela se sinta incomodada e, no entanto, não tão perto para que
ela possa fazer qualquer objeção, do ponto de vista racional. Mike não toca
sua presa desnecessariamente. A proximidade dele, sua intrusão no território
dela, é suficiente para mudar a situação entre eles.
Então, Mike leva essa invasão adiante, pela invasão visual, enquanto con-
versam. O que eles dizem não importa realmente. Os olhos de Mike falam
muito mais que sua voz. Eles passam demoradamente pelo pescoço da
mulher, pelos seios, pelo corpo dela. Detêm-se sensualmente e com promes-
sas. Mike toca a língua nos lábios, fixa os olhos e invariavelmente a mulher
fica inquieta e excitada. Lembre-se de que ela não é uma mulher qualquer,
mas aquela mulher suscetível que respondeu ao jogo inicial de Mike. Ela retri-
buiu as atenções dele, e agora está envolvida demais para protestar.
E, de qualquer modo, contra o que ela protestaria? O que Mike fez? Ele
não a tocou. Não lhe fez nenhuma observação sugestiva. Ele é, de acordo com
todos os padrões da sociedade, um cavalheiro perfeito. Se o olhar dele for

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insistente demais, é uma questão de interpretação. Se isso não lhe agrada, bas-
ta a ela ser áspera e se afastar.
Mas, por que ela não iria gostar? Mike a está cobrindo de atenção. No fun-
do, está dizendo:" Você me interessa. Quer-o conhecê-la melhor, mais intima-
mente. Você não é igual às outras mulheres. É a única mulher aqui que me
interessa".
Além da atenção que dispensa a uma mulher, Mike nunca comete o erro
de demonstrar interesse por mais de uma pessoa. Ele se concentra em alguém,
conversa apenas com uma mulher e usa fortemente sua linguagem do corpo.
Na maior parte das vezes, quando Mike sai com a garota de sua escolha, nor-
malmente não é necessário nenhum esforço de persuasão. Basta um simples:
"Vamos!"

Ela está disponível?


*

Como Mike escolhe sua presa? Que linguagem do corpo uma garota dis-
ponível numa festa usa para dizer:"Estou disponível. Estou interessada". Deve
haver um conjunto definido de sinais, porque Mike raramente se engana.
Uma garota em nossa sociedade tem um problema adicional nesse jogo
de encontros sexuais. Não importa o quanto ela possa estar disponível, con-
sidera-se grosseiro demonstrar isso abertamente. Isso a desvalorizaria. E, no
entanto, inconscientemente, ela deve deixar transparecer sua intenção. Como
ela faz isso?
Grande parte do tempo ela transmite sua mensagem pela postura ou
movimentação. Uma mulher disponível move-se de uma forma estudada. Um
homem pode dizer que ela está se exibindo, outra mulher a considerará afe-
tada, mas a movimentação de seu corpo, principalmente dos quadris e
ombros, demonstra sua disponibilidade. Ela pode sentar-se com as pernas
afastadas, de uma forma convidativa, ou pode fazer um gesto em que uma
mão toca o seio de uma forma displicente. Pode passar levemente a mão pelos
quadris enquanto fala ou, ainda, andar, fazendo um jogo lânguido com os
quadris. Alguns movimentos dela são estudados e conscientes, outros, com-
pletamente inconscientes.
Algumas gerações atrás, a disponibilidade das mulheres era vista de uma
forma burlesca pela rotina " venha me ver um dia", de Mae West. Uma geração
posterior voltou-se para o rosto angelical e para a voz sussurrada e ofegante
de uma Marilyn Monroe — uma falsa inocência. Hoje, numa época mais cíni-
ca, voltamos à sensualidade direta. Alguém como Raquel Welch transmite a
mensagem. Mas, essas não são as mensagens diretas dos filmes. Num ambien-
te fechado, uma sala de estar, o nível em que Mike atua, a mensagem é mais
discreta, muitas vezes tão discreta que o homem que não sabe usar a lin-
guagem do corpo pode ignorá-la completamente. Mesmo o homem que

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entende um pouco do assunto pode se enganar. Por exemplo, uma mulher
que cruza os braços pode transmitir o sinal clássico: " Estou fechada a qual-
quer tentativa de aproximação. Não lhe darei ouvidos".
Quando alguém cruza os braços, esta é uma interpretação comum,
conhecida pela maioria dos psicólogos. Como exemplo, foi publicada recen-
temente nos jornais uma reportagem sobre uma palestra do dr. Spock para
uma turma da Academia de Polícia. Os policiais foram extremamente hostis
ao médico, apesar de ele ser responsável pela forma como a maioria deles e
seus filhos foram criados. Eles demostraram sua hostilidade verbalmente, em
sua discussão, mas também muito mais claramente pela linguagem do corpo.
Na foto que ilustrou o artigo, as policiais estavam sentados com os braços cru-
zados, o rosto fechado e sisudo.
Eles estavam dizendo claramente: "Estou sentado aqui com a mente
fechada. Não importa o que você esteja dizendo, não estou disposto a ouvi-lo.
Simplesmente não conseguimos nosentendef. Essa é a interpretação clás-
sica dos braços cruzados.
Mas, há outra interpretação igualmente válida. Os braços cruzados
podem expressar: "Estou frustrado. Não estou conseguindo o que preciso.
Estou fechado, trancado. Deixe-me sair. Posso ser abordado e facilmente
disponível
Embora o homem que conhece pouco da linguagem do corpo possa
interpretar mal esse gesto, o homem que a atende melhor captará a mensa-
gem correta dos sinais complementares enviados pela garota. O rosto dela
está aflito e contraído de frustração? Ela está sentada numa posição rígida ou
relaxada? Ela desvia os olhos quando você tenta olhar para ela?
Todos os sinais corporais precisam resultar num todo expressivo, para
que um homem use efetivamente a linguagem do corpo.
A mulher que dá sinais claros de sua disponibilidade também age de uma
forma previsível. Ela faz vários trejeitos com o corpo para deixar claro que está
disponível. Como Mike faz, ela usa a intmsào territotial para deixar claras suas
intenções. Senta-se muito perto do homem em que está interessada, tirando
vantagem do desconforto que essa proximidade provoca. Quando o homem
se vira e demonstra inquietação, sem saber por que está perturbado, ela se
moverá, enviando outros sinais, aproveitando-se dessa situação de embaraço
para deixá-lo perturbado.
Embora um homem não possa tocar a mulher, se for agir respeitosamen-
te, é perfeitamente permissível para uma mulher, a essa altura do jogo, tocar
o homem. Esse toque pode acentuar a excitação do homem, em cujo territó-
rio ela penetrou.
Um toque no braço pode ser um golpe para desarmá-lo." Você tem fósfo-
ro?' Acender o cigarro para ela permite-lhe um momento de contato de pele
que pode ser efetivamente perturbador.

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O contato com a coxa de uma mulher, ou sua mão descuidadamente res-
valando pela coxa do homem pode ser devastador, se acontecer no momen-
to certo.
A aproximação direta de uma mulher pode ser feita não apenas pela lin-
guagem do corpo — acertar uma saia ao sentar-se próximo, descruzar as per-
nas, realçar os seios, inclinando o tronco para frente, os lábios pronunciados
— mas também pelo olfato. O perfume certo na quantidade certa, para dar um
aroma excitante, embora sutil, é uma parte importante da aproximação direta.

Vale a pena se proteger?

Mas, a visão, o toque e o cheiro ainda não representam o arsenal com-


pleto da mulher nessa guerra. O som é uma parte decisiva da abordagem. Nem
sempre é o que ela diz, mas a voz dela, o convite por trás das palavras, o tom
e a qualidade íntima, sedutora da voz.
As atrizes francesas entendem bem disso, mas o francês é uma língua que
se presta à sensualidade, não importa o que esteja sendo dito. Um dos núme-
ros de teatro de revista mais interessantes, fora da Broadway, a que já assisti,
consistia de um ator e uma atriz fazendo uma "cena" de um filme francês: cada
um enumerava uma lista de vegetais em francês, mas o tom de voz, a cadên-
cia e a inflexão vocal exalavam sensualidade.
Conforme descrito antes, neste livro, trata-se do uso de uma banda de
comunicação para transmitir duas mensagens. Na área do amor e do sexo, é
um uso muito comum. Para a mulher que demonstra claramente estar dispo-
nível, pode servir para desarmar o homem. É um truque usado, tanto pelos
homens quanto pelas mulheres, no jogo da sedução. Se você perturba seu par-
ceiro, deixando-o agitado, é relativamente fácil dar o bote final.
O truque de usar a voz para transmitir uma mensagem com um significa-
do verbal inócuo é extremamente eficaz porque a presa, masculina ou femi-
nina, não pode protestar, pelas regras do jogo. O atacante, se o protesto é feito,
sempre pode voltar atrás e dizer, com certa razão: "Mas o que eufiz? O que eu
disse?'
Isso envolve um esquema de proteção, pois não importa o quanto a per-
seguição do amor ou do sexo tenha sido intensa, não pode ser feita arriscan-
do-se a "quebrar a cara". Para muitas pessoas, especialmente se são inseguras,
dar-se mal é uma ocorrência devastadora e humilhante. Se ele (ou ela) tem
sucesso em sua investida, está preocupado em demonstrar respeito por sua
vítima, para poder manipulá-la. Para ser sexualmente agressivo, um homem ou
mulher precisa ter segurança e determinação suficientes, de modo a agir sem
a necessidade de forjar esquemas para se proteger de um possível fracasso.
Do outro lado da moeda, a pessoa sexualmente insegura, a presa na caça
inevitável, precisa evitar a humilhação de qualquer maneira, precisa se fazer

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respeitar. Isso a coloca numa desvantagem tremenda no jogo. O atacante pode
manipular a presa, ameaçando-a de humilhação.
Quando, por exemplo, o atacante adentra o território da presa e, usando
uma voz sedutora, fala sobre banalidades óbvias, o que a presa faz? Afasta-se
e arrisca erguer a sobrancelha. "O que você achou que eu queria?"
Supor que o atacante tem uma atração sexual por ela é atribuir mais va-
lor a si mesma do que ela realmente acredita possuir. Sofrer uma decepção
depois disso seria humilhante demais. Suponha que ela tivesse interpretado
mal as atitudes dele. Logo, na maioria dos casos, o atacante é bem-sucedido
em seu jogo.
O mesmo tipo de interação é usado pelo agressor sexual marginal, fora
de uma situação social. O homem marginal, com tara sexual, que tenta tocar
ou acariciar uma mulher ao vê-la passar pela rua no meio da multidão, depen-
de de seu susto e insegurança para mantê-la quieta. A mesma dinâmica está
em ação, e o medo de ser humilhada pode impedi-la de protestar. Ela supor-
ta ser perturbada por um pervertido que toca o seu corpo, ou se sujeita à mani-
pulação de um pervertido para não atrair atenção para si.
Sabemos que muitos pervertidos sexuais sentem satisfação ao se expor e
causar o constrangimento e a vergonha de suas vítimas. Se a vítima reagisse
rindo, ou mostrando alguma satisfação, ou mesmo agredindo-o, essa seria
uma experiência devastadora para o marginal.

Programas de "todos os tipos"

Falando em comportamentos que fogem dos padrões, entre homosse-


xuais masculinos ou femininos há sinais bem determinados de linguagem do
corpo que podem estabelecer a comunicação íntima. Os homossexuais "pas-
seando" pelas ruas podem identificar uma alma simpatizante sem trocar uma
só palavra.
" Fazer contato é relativamente simples, explicou recentemente, em uma
pesquisa, um jovem homossexual. "A primeira coisa a fazer é identificar seu
homem, e é difícil lhe dizer como sefaz isso, porque há vários pequenos sinais.
Alguns são o jeito de ele andar, embora muitos de nós andem como homens
heterossexuais. Na maioria das vezes, acho que é o contato pelo olhar. Você
olha e sabe. Ele o olha um pouco mais demoradamente, e então os olhos dele
podem viajar pelo seu corpo. Olhar rápido para a virilha, em seguida desvian-
do é, sem dúvida, uma pista."
Analisando seus próprios sinais, ele explica: "Passo por ele e então olho
para trás. Se há qualquer interesse, ele olhará para trás também. Então, deva-
gar, paro para olhar a vitrine de uma loja. Nos aproximamos um do outro ...
efazemos contato!"

69
" Os sinais são rígidos eformalizados, e ás vezes eles não são falados, mas
traduzem urna mensagem verbal." O dr. Goffman nos conta sobre um homos-
sexual que parou num bar "gay" para tomar um drinque, mas não tinha inte-
resse em arranjar companhia. Ele pegou um cigarro, quando viu que não tinha
fósforo. Percebeu que se pedisse fósforo a qualquer um do bar isso seria
entendido como um sinal: "Estou interessado. Evocê?"
No final, ele comprou uma caixa de fósforos do balconista.
Os sinais do homossexual para iniciar contato não são muito diferentes
dos sinais do homem que deseja se aproximar de uma mulher. Muito tempo
atrás, quando eu era soldado e estava de folga em Boston, um amigo me con-
venceu a sair com ele para "pegar mulheres".
Era inexperiente nisso, mas tive de bancar o "sabichão", pois não podia
confessar minha ignorância. Acompanhei-o e observei atentamente meu ami-
go. Meia hora depois ele tinha conseguido cinco garotas e escolheu duas para
nós. A técnica dele se baseava na linguagem do corpo.
Andando pelas ruas ou, mais apropriadamente, perambulando, ele cap-
tava o olhar de uma interessada, olhava-a mais demoradamente e erguia uma
sobrancelha. Se a garota andasse mais devagar, parasse para olhar a maquia-
gem, para arrumar a meia ou olhar uma vitrine na rua, esse era um dos vários
sinais de retorno que significavam: "Sei que você está me olhando e talvez este-
ja interessada. Vamos levar isso adiante'.
Meu amigo então parava, virava e seguia a garota por um quarteirão.
Segui-la, sem entrar em contato com ela, fazia parte do ritual e permitia que
ele iniciasse um contato verbal, fizesse comentários comigo, com outra pes-
soa, sobre o vestido dela, sua maneira de andar, seu olhar — tudo de uma for-
ma bem-humorada, um recurso que mantinha o respeito e evitava que ela
ficasse ofendida.
Primeiro ela fingia que as tentativas dele não eram bem recebidas. Se essa
fase demorasse demais, se estabeleceria um acordo mútuo de que essas ten-
tativas não eram aceitas. Se, no entanto, ela risse e respondesse a ele, ou fizes-
se comentários sobre ele a uma amiga, caso estivesse acompanhada, então
isso indicava um crescente interesse.
Eventualmente, a caçada terminava com meu amigo ao lado da garota,
conversando com ela com uma familiaridade evidentemente hesitante. Já vi a
mesma técnica usada hoje, entre adolescentes, e cada passo é rigidamente
esquematizado e o jogo deve ir até o fim. A qualquer momento, as negocia-
ções podem ser facilmente rompidas por um dos parceiros, sem que ninguém
se ofenda. Esse é um requisito fundamental para uma caçada tranqüila e bem-
sucedida.
O início de encontros entre certas espécies animais segue um ritual seme-
lhante. Observe dois pombos no parque, onde o macho circula, se exibe e
segue um procedimento formal para atrair a fêmea, enquanto ela finge indi-

70
ferença. Uma linguagem do corpo bem-definida é usada, entre os seres huma-
nos, e da mesma forma, no jogo da sedução.
O dr. Gerhard Nielsen, do Laboratório Psicológico da Universidade de
Copenhagen, descreve em seu livro, Studies in Self-Confrontation (Estudos
sobre Autoconfrontação), o uso extremamente importante da linguagem do
corpo no que ele chama de "dança da sedução" do adolescente norte-ameri-
cano.
Analisando o procedimento da sedução de um ponto de vista objetivo e
clínico, o dr. Nielsen descobriu vinte e quatro passos entre o " contato inicial
entre o jovem e a garota e o ato do coito". Esses passos dados pelo homem,
segundo ele, e as respostas dadas pela mulher, têm uma "ordem coerciva". Ele
explica isso dizendo que, quando um rapaz segura a mão da garota, deve
esperar até que ela pressione sua mão, indicando um "vá-em-frente", antes de
tomar o próximo passo de entrelaçar os dedos com os dela.
Um passo deve seguir o outrp, até que ele possa colocar seu braço no
ombro dela. Ele pode deslizar a mão pelas costas dela e se aproximar do seio,
por trás. Ela, por sua vez, pode bloquear essa tentativa, pressionando o braço
contra o tronco.
Depois do beijo inicial, e só então, ele pode tentar tocar o seio dela outra
vez, mas não espera realmente chegar lá antes de beijá-la repetidamente. O
protocolo proíbe-o de se aproximar do seio dela pela frente, assim como proí-
be o primeiro beijo antes de segurar a mão.
O dr. Nielsen sugere que o rapaz (ou a moça) seja rotulado "apressado"
ou "lento" em termos da ordem de cada passo, e não do tempo que leva para
cada iniciativa. "Pularpassos ou invertê-los é ser apressado", da mesma forma
que ignorar o sinal para ir em frente para o próximo passo, ou não passar para
o próximo passo, é ser lento.

Escolha sua postura

O dr. Albert E. Scheflen, professor-titular de psiquiatria no Albert Einstein


College of Medicine em New York City, estudou e estabeleceu padrões de insi-
nuação amorosa ou flerte e o que ele chama de "quase-flerte" nos seres huma-
nos. Esse quase-flerte é o uso do flerte ou insinuação para atingir metas não
relacionadas a um relacionamento sexual.
Todo comportamento humano é padronizado e sistemático, de acordo
com dr. Scheflen, e também é formado por pequenos segmentos regulares dis-
postos em grandes unidades. Isso é igualmente válido para o comportamen-
to sexual, e num estudo dos elementos que compõem nossas relações sexuais,
o dr. Scheflen constatou que em reuniões de negócios, em festas, na escola e
em muitos outros tipos de reuniões, as pessoas usavam esses elementos
sexuais, embora não tivessem um objetivo sexual em mente.

71
Ele chegou à conclusão de que os norte-americanos se portam sexual-
mente quando se reúnem sem objetivos sexuais, ou — e mais provavelmen-
te — que o comportamento sexual envolve certos sinais característicos da
linguagem do corpo quando não é usado com a finalidade de intercurso
sexual.
O que são esses padrões de comportamento sexual? Bem, de acordo com
as investigações do dr. Scheflen, quando um homem e uma mulher preparam-
se para um encontro sexual, embora não estejam cientes do que estão fazen-
do, passam por inúmeras mudanças corporais que os levam ao estado de
prontidão.
Os músculos de seus corpos se tornam ligeiramente tensos e "prontos
para a ação". O corpo fica mais reto, firme e alerta. Há menos "papada" no ros-
to e "bolsas" em volta dos olhos. A postura deles se torna mais jovial, seus estô-
magos se encolhem e os músculos da perna ficam contraídos. Mesmo os olhos
parecem mais brilhantes, enquanto a pele pode enrubescer-se ou ficar mais
pálida. Pode haver mudanças no odor de seus corpos, lembrando uma época
mais primitiva em que o olfato era um sentido extremamente importante nos
encontros sexuais.
A medida que ocorrem mudanças, o homem ou a mulher pode começar
a usar certos gestos que o dr. Scheflen chama de "comportamento de exibi-
ção" . Uma mulher tocará o cabelo ou verificará a maquiagem, arrumará as rou-
pas ou afastará o cabelo do rosto, enquanto o homem pode pentear o cabelo,
abotoar o casaco, arrumar as roupas, puxar as meias, arranjar a gravata ou
endireitar o vinco da calça.
Esses são sinais corporais que dizem: "Estou interessado. Você me agra-
da. Note-me. Sou um homem— uma mulher— atraenté'.
O segundo passo nesses encontros sexuais consiste de posicionamento.
Observe um homem e uma mulher numa festa, um casal que esteja se conhe-
cendo e apresentam um interesse sexual crescente um pelo outro. Como eles
se sentam? Eles ficarão de frente um para o outro. Inclinam-se um para o outro
e tentam bloquear uma terceira pessoa. Eles podem fazer isso dispondo seus
braços em círculo, ou cruzando os pés um de frente para o outro, para blo-
quear qualquer outra pessoa.
Às vezes, se um casal estiver dividindo um sofá e uma terceira pessoa
estiver numa poltrona de frente para eles, eles ficarão divididos entre duas
compulsões. Uma delas é o desejo de se fechar em seu próprio espaço, e a
outra é a responsabilidade social de ter de incluir a terceira pessoa. Eles
podem resolver o dilema tendo o melhor dos dois mundos. Podem cruzar as
pernas para indicar que estão num círculo fechado. Aquele que estiver à direi-
ta cruzará a perna direita sobre a esquerda. Quem estiver à esquerda há de
cruzar a perna esquerda sobre a direita. De fato, isso impede que uma tercei-
ra pessoa se junte a eles — da cintura para baixo. Entretanto, a responsabili-

72
dade social diante de uma terceira pessoa pode fazê-los virar a parte de cima
de seus corpos de modo a olharem-na diretamente, abrindo-se para ela.
Quando uma mulher numa reunião deseja colocar um homem numa
situação de intimidade, onde os dois possam formar uma unidade, ela age
como a mulher sexualmente agressiva o faz, mas num grau menor. Utiliza a
linguagem do corpo que inclui olhares sedutores, olhares demorados, coloca
a cabeça para um lado, mexe os quadris, cruza as pernas ou expõe o pulso ou
a palma da mão. Todos esses são sinais aceitos que enviam uma mensagem
sem o uso de palavras. " Venha e sente-se perto de mim. Eu o acho atraente.
Gostaria de conhecê-lo melhor."
Agora, vamos tomar uma situação sem conotação sexual. Na sala de con-
ferência de uma grande empresa industrial, um homem e uma mulher execu-
tiva discutem os custos de produção com outros executivos. Eles podem
enviar sinais que parecem ser os mesmos de um encontro sexual. Estão usan-
do a linguagem do corpo que em o.utras circunstâncias convidaria a avanços
sexuais e, no entanto, obviamente esses dois profissionais estão voltados para
a questão de negócios que têm em mãos. Eles estão mascarando seus verda-
deiros sentimentos e têm realmente um desejo sexual um pelo outro? Ou esta-
mos interpretando mal a linguagem do corpo deles?
Num seminário de faculdade um observador inexperiente interpreta os
sinais corporais de uma estudante como o convite para um encontro sexual
com o professor. Ele, por sua vez, reage como se estivesse de acordo. Estarão
eles flertando, ou esses sinais não têm uma conotação sexual? Ou há algo erra-
do com nossa interpretação da linguagem do corpo?
Em um seminário de psicoterapia de grupo, um psicoterapeuta usa a lin-
guagem do corpo para se aproximar de uma mulher. Ele está saindo da linha
e violando seu código de ética? Ou isso faz parte de sua terapia? Ou, novamen-
te, são sinais confusos?
Depois de cuidadoso estudo dessas situações e de outras semelhantes, o
dr. Scheflen constatou que freqüentemente sinais sexuais eram enviados
quando as pessoas envolvidas não tinham intenção de ter qualquer encontro
sexual. Entretanto, ele descobriu que os sinais da linguagem do corpo envia-
dos quando um encontro sexual era esperado não eram os mesmos que aque-
les enviados para outras finalidades. Havia diferenças sutis que anunciavam:
"Estou interessado em você e quero fazer negócios com você, mas não se trata
de interesse sexual'.

Encontros semi-sexuais

O que devemos fazer para deixar claro que não temos nenhuma inten-
ção de ordem sexual? Fazemos isso enviando outro sinal juntamente com o
primeiro, um pouco de linguagem do corpo além da linguagem do corpo

73
habitual, trata-se de outro caso em que dois sinais são enviados numa única
banda de comunicações.
Um modo de deixar um parceiro saber que os sinais sexuais não devem
ser levados a sério é referir-se, de alguma forma, ao fato de que se trata de uma
reunião de negócios, ou de uma aula, ou de um grupo de psicoterapia. Pode-
ria ser alguma coisa tão simples quanto um gesto ou um movimento dos olhos
ou da cabeça para uma autoridade, ou para os outros membros presentes.
Outro truque para separar sexo de negócios é emitir sinais incompletos
na linguagem do corpo sexual, omitir uma parte importante deles. Duas pes-
soas sentadas perto uma da outra, numa reunião de negócios, podem adotar
um relacionamento sexual olhando uma para a outra, mas podem manter-se
afastadas, ou colocar os braços para fora, para incluir outros em seu círculo
privado. Podem quebrar o contato com o companheiro com os olhos, ou
erguer a voz para incluir todos na sala.
Em cada caso, um elemento vital ao encontro sexual deve estar faltando.
O elemento que falta pode ser a ligação através do olhar, uma voz baixa e par-
ticular, braços dispostos de modo a incluir apenas o parceiro ou qualquer sinal
que indique intimidade.
Outra forma de deixar clara a ausência de interesse sexual é referir-se a
uma conversa com a esposa, um amigo ou noivo. Isso traz ã situação um enfo-
que adequado e esclarece ao parceiro: "Somos amigos, e não namoradots".
Isso nos faz voltar à crença do dr. Scheflen de que o comportamento ocor-
re em unidades específicas que formam padrões globais. Se alguma das uni-
dades for omitida, o padrão final será diferente. Nesse caso, o caráter sexual
desaparece, mas ainda com uma forte interação homem-mulher. Uma certa
rotina de negócios é seguida, mas condimentada por um forte sabor de sen-
sualidade, meio insinuante. Os participantes, sem qualquer expectativa de
satisfação sexual, ainda estão explorando o fato de que há diferença sexual
entre eles. Os homens de negócios usam sinais da linguagem do corpo para
conseguir um certo relacionamento. O intelectual usa-a como auxílio na sala
de aula, e o terapeuta usa-a para ajudar numa situação psicológica, mas todos
sabem que estão simplesmente explorando seu poder de sedução, e não obje-
tivando a satisfação sexual.
Não há, entretanto, garantia de que em qualquer parte dessas situações
a sexualidade não se desenvolverá. Não são raros os casos de professores
atraídos por alunas, de executivos atraídos por executivas, e de terapeutas por
pacientes, pois esses encontros envolvem um clima insinuante e até uma pro-
messa.
Esses encontros semi-sexuais ocorrem tão freqüentemente que fazem
parte de nossa cultura. Além de acontecer fora de casa, também ocorrem entre
pais e filhos, hóspedes e anfitriões, e mesmo entre duas mulheres ou dois
homens. Uma coisa que precisa ser esclarecida sempre nesse relacionamen-

74
to sexual-não-sexual é que não deve ser real. Desde o início, os esclarecimen-
tos devem ser feitos. Não se deve deixar a menor dúvida, para que um parcei-
ro de repente diga: "Mas eu pensei que você queria..."-, e outro protestar: "Ah,
não, não foi isso o que aconteceu, de forma alguma".
O dr. Scheflen observa que há alguns psicoterapeutas que usam esse jogo
de atração conscientemente, para envolver os pacientes na terapia. Uma
paciente desinteressada pode ser induzida a falar abertamente devido a uma
aproximação sexual por parte de seu terapeuta; sexual, evidentemente, em
termos de linguagem do corpo. Ele pode arranjar a gravata, a meia ou o cabe-
lo de uma maneira exibicionista, para transmitir interesse sexual, mas deve
deixar clara sua posição não-sexual.
O dr. Scheflen descreve a situação de uma família em uma consulta com
um terapeuta: a mãe, filha, avó e o pai. Sempre que o terapeuta conversa com
a filha ou a avó, a mãe, que se sentou entre elas, começa a transmitir sinais
sexuais em linguagem do corpo. Isso serviria para chamar a atenção do tera-
peuta para ela, um tipo de insinuação que é muito comum entre mulheres
quando não estão sendo o centro das atenções. Ela procurava ser atraente,
cruzava as pernas e as estendia, colocava a mão nos quadris e inclinava o cor-
po para a frente.
Quando o terapeuta respondeu inconscientemente às "investidas" dela,
arrumando a gravata ou inclinando-se para a frente, tanto a menina quanto a
avó, de cada lado da mãe, cruzaram as pernas, colocando a perna cruzada na
frente da mãe e, de fato, "fechando-a". Ela, por sua vez, parou de enviar os
sinais sexuais e recostou o corpo para trás.
Talvez o mais interessante sobre toda a charada fosse que ela era sempre
"fechada", pela filha e pela avó a um sinal do pai. O sinal — balançar o pé para
cima e para baixo! E tudo isso era feito pelo terapeuta, pelas mulheres e pelo
pai sem que qualquer um deles tivesse consciência de seu próprio uso de
sinais.
De um estudo cuidadoso de comportamento sexual-não-sexual,
Scheflen conclui que geralmente ele ocorre entre duas pessoas quando uma
se preocupa ou se afasta da outra por alguma razào. Num grupo grande, uma
família, uma reunião de negócios ou uma aula, isso também acontece quan-
do um participante é ignorado ou excluído pelos outros. O membro excluído
pode se exibir de uma forma sensual para voltar ao grupo. Quando outro inte-
grante de um grupo se retira, isso pode ser usado pelo resto do grupo para
chamá-lo de volta.
O importante de tudo isso é conhecer os sinais, identificar os sinais defi-
nidores e caracterizadores que distinguem as aproximações com intenções
sexuais das nâo-sexuais. Na opinião de Scheflen, elas são facilmente confun-
didas. Realmente, há pessoas que confundem regularmente tanto o envio
quanto o recebimento desses sinais sexuais e seus atributos. Há pessoas que,

75
por razões psicológicas, não podem levar um encontro sexual adiante, mas
ainda agem de uma maneira sexualmente sedutora, principalmente quando
não deveriam.
Essas pessoas, além de provocar investidas sexuais, interpretam as ações
das pessoas como tentativas de sedução, quando não é essa a intenção delas.
Essa é a "excitação" típica que todos nós conhecemos, ou a garota que tem
certeza de que todos a desejam.
Por outro lado, Scheflen cita aquelas pessoas que não identificam os
sinais característicos que lhes dizem que a aproximação de uma pessoa não
envolve nenhum interesse sexual. Essas pessoas ficam sem ação em situações
comuns, sem apelo sexual, e se retraem.
É difícil explicar como a linguagem do corpo usada nessas situações é
aprendida e como sabemos dar as interpretações e os esclarecimentos corre-
tos, além de identificar as características que podem destituir as aproximações
de qualquer apelo sexual. Alguns são aprendidos e outros são absorvidos da
cultura. Quando, por uma razão ou outra, um indivíduo se isolou dessa socie-
dade e não aprendeu a interpretar adequadamente esses sinais, pode enfren-
tar muitos problemas. Para ele, a linguagem do corpo pode ser desconhecida
no nível consciente e não usada no nível inconsciente.

76
Um pedido de ajuda

O paciente era pouco mais que um menino, dezessete anos, mas aparenta-
va menos. Pálido e magro, tinha um ar curioso, indefinido, como se alguém tives-
se pensado melhor e, desistindo de criá-lo, tentara apagar seus traços, mas só
conseguiu borrá-los. Vestia-se com descuido e desleixo, e sentava-se demons-
trando apatia, os braços cruzados, o olhar vago. Quando se mexia, seus movi-
mentos eram tensos e restritos. Quando descansava, ficava caído e passivo.
O terapeuta olhou para o relógio disfarçadamente, aliviado por ter termi-
nado o horário, e forçou um sorriso. "Por hoje é só, até amanhã."
O menino se levantou e encolheu os ombros: — Que amanhã?Não se
preocupe com amanhã. Tenho certeza de que não vou passar de hoje ã noite.
Não haverá nenhum amanhã para mim.
À porta, o terapeuta disse: "Agora, veja só, Don. Você ameaça se suicidar
toda semana, nos últimos seis meses".
O menino olhou para ele desanimado e foi-se embora, e o olhar do tera-
peuta tornou-se estático, olhando para a porta. Don era o último paciente do
dia, e deveria se sentir tranqüilo. Em vez disso, sua inquietação foi aumen-
tando. Tentou trabalhar com suas anotações por um momento, mas não con-
seguiu. Algo o incomodava, algo sobre o rapaz. Seria o jeito de falar, sua
ameaça de suicídio? Mas, Don tinha ameaçado se matar antes, muitas vezes.
Por que essa ameaça lhe parecia diferente?
Por que ele estava perturbado dessa vez? Ele se lembrou de que tinha se
sentido inquieto durante a sessão, pois o garoto mantivera-se passivo. Lem-
brou-se dos gestos dele, de se mover muito pouco, de sua incapacidade de
fixar o olhar.

77
Perturbado, o terapeuta tentou recapitular o que tinha ocorrido naquela
última hora. De alguma forma tinha se convencido de que dessa vez tinha sido
diferente, de que dessa vez o menino tinha a intenção de se suicidar. Entre-
tanto, o que ele tinha dito que fosse diferente? O que tinha dito que não dis-
sera em cada uma das sessões anteriores?
O terapeuta dirigiu-se ao console com o gravador escondido, que era sua
forma de preservar o conteúdo das sessões, e voltou a fita para ouvi-la. Não
havia nenhuma sugestão, nas palavras do rapaz, de qualquer coisa diferente
ou incomum, mas o tom de voz era monótono, sem vida. passivo.
Sua inquietude cresceu. De alguma forma, uma mensagem havia sido
transmitida naquela sessão. Ele tinha de confiar naquela mensagem, mesmo
sem saber decifrá-la. Finalmente, meio incomodado e meio aliviado, ligou para
sua esposa, disse-lhe que chegaria em casa mais tarde e foi até a casa do rapaz.
O resto da história é simples e deduzível. O terapeuta estava certo. O
menino tentou suicídio. Ele tinha ido direto para casa. tomou um vidro de
comprimidos da caixa de remédios da família e trancou-se no quarto. Feliz-
mente, o terapeuta chegou a tempo. Os pais foram avisados imediatamente e
o médico da família conseguiu lavar o estômago do menino com uma medi-
cação emética. Esse incidente teve um aspecto positivo: foi um marco na tera-
pia do garoto. Depois disso, o progresso foi imenso
— Mas por quê? — a esposa do terapeuta perguntou mais tarde. — Por
que você foi à casa do garoto?
— Não sei, — não foi nada que ele disse, mas alguma coisa gritava para
mim que dessa vez ele queria mesmo se matar. Ele me deu sinais mas não sei
agora — talvez fosse a expressão do rosto dele ou seus olhos, ou as mãos.
Talvez até a forma de ele se controlar e o fato de ele não rir da piada que fiz,
uma boa piada. Ele não precisou usar palavras. Tudo nele me dizia que dessa
vez ele estava determinado.
Esse incidente não aconteceu hoje, nem nos últimos dez anos, mas vinte
anos atrás. Hoje, quase qualquer terapeuta bom não só saberia interpretar a
mensagem, mas também saberia como a mensagem foi enviada, que pista o
menino tinha lhe dado.
O rosto inexpressivo, a postura impassível, as mãos cruzadas, tudo expres-
sava um significado tão claro quanto qualquer palavra. Na linguagem do corpo,
o menino estava dizendo ao terapeuta o que ele queria fazer. As palavras não
eram mais necessárias. Usou-as para gritar, em vão, muitas vezes, e teve de
recorrer a uma forma mais primitiva e básica de transmitir sua mensagem.

O que sua postura diz?

Desde que esse incidente aconteceu, vinte anos para cá, os psicólogos se
tornaram cada vez mais atentos à importância e utilidade da linguagem do cor-

78
po na terapia. O interessante é que embora muitos deles usassem a linguagem
do corpo na prática, poucos faziam isso conscientemente e muitos não tinham
idéia de todo o trabalho realizado no campo da cinesiologia por estudiosos
como o dr. Scheflen e o dr. Ray L. Birdwhistell.
O dr. Birdwhistell, professor titular de pesquisa em antropologia na Tem-
ple University, que iniciou a maioria dos trabalhos fundamentais sobre o
desenvolvimento de um sistema de notaçàol para a nova ciência da cinesi-
ologia, adverte que " nenhumaposição ou movimento corporal, em si e por si,
possui um significado preciso". Em outras palavras, nem sempre podemos diz-
er que cruzar os braços significa:"Não o deixarei se aproxima f, ou que esfre-
gar o nariz significa desaprovação ou rejeição, que dar tapinhas na cabeça é
sinal de aprovação e erguer os dedos indica superioridade. Essas são interpre-
tações ingênuas da linguagem do corpo e tendem a transformar uma ciência
num jogo. Às vezes são corretas e às vezes não, mas só fazem sentido no con-
texto de todo o padrão de comportamento de uma pessoa.
As linguagens corporal e oral, segundo o dr. Birdwhistell, dependem uma
da outra. A linguagem oral não nos dará todo o significado do que uma pes-
soa está dizendo, nem a linguagem do corpo sozinha nos dará o significado
completo. Se ouvimos apenas as palavras quando alguém está falando, pode-
mos distorcer muito, da mesma forma que se observássemos apenas a lin-
guagem do corpo.
Os psiquiatras em particular, de acordo com o dr. Birdwhistell, devem
estar atentos tanto à linguagem do corpo quanto à oral. Na tentativa de orien-
tá-los como fazer isso, ele publicou um artigo chamado " C o m m u n i c a t i o n
Analysis in Residency Setting' (Análise das comunicações no ambiente da
residência médica), em que explica alguns métodos usados para conscienti-
zar residentes, médicos recém-formados, sobre o potencial de comunicação
da linguagem do corpo.
Um detalhe interessante é que o dr. Birdwhistell ajudou a desenvolver o
conceito de "tempo moral de olhar". Ele acredita que uma pessoa pode obser-
var os olhos de outra, o rosto, o abdômen, as pernas e outras partes do corpo
por um determinado tempo, antes que seja criada uma tensão, tanto no obser-
vador quanto na pessoa observada.
Ao orientar médicos residentes, ele ressalta que quase toda parte do cor-
po que se movimenta pode conter alguma mensagem para o médico, mas
quando toda a sua explicação não basta, ele recorre a dois exemplos clássi-
cos da linguagem do corpo que são bastante elucidativos.
Um deles, ele explica, é uma jovem adolescente que precisa aprender o
que fazer com seus seios que acabaram de se desenvolver. Como ela deve
lidar com eles? Exibi-los, posicionando os ombros para trás? Ou deve colocar
os ombros para a frente e esconder os seios? O que ela deve fazer com os bra-
ços e ombros, e o que fazer com sua mãe que lhe diz toda hora: "Endireite as

79
costas. Orgulhe-se de seu corpo", e o resto do tempo diz: "Não ande 'empi-
nada ' desse jeito! Você não deve usar blusas tão apertada s".
Tenho uma amiga adolescente que é extremamente desinibida e segura
de si. Olhando-se no espelho enquanto experimentava um biquíni, ela disse
à mãe:
— Não são demais? Se eu morrer, pouco importa se cremarem meu cor-
po. Vou conservá-los em bronze para a posteridade.
A maioria das adolescentes não tem esse tipo de orgulho pelo corpo, e
os seios desenvolvidos recentemente se tornaram um problema. O médico
residente deve ser alertado que mudanças na postura de uma menina podem
indicar depressão, excitação, interesse por alguém, raiva, ou mesmo um pedi-
do de ajuda. Eventualmente, em sua própria prática, ele será capaz de reco-
nhecer e interpretar alguns dos diferentes problemas de seus pacientes
adolescentes ao observar sua postura.
Outro exemplo que o dr. Birdwhistell usa para residentes é o que ele
chama de "Admirável capacidade de distensão e contração do abdômen e do
ventre no homem".
Ao flertar, vimos que o homem contrairá os músculos abdominais e enco-
lherá a barriga. Se estiver deprimido, ele poderá relaxar demais esses múscu-
los e sua barriga ficará protuberante. O grau de tensão desses músculos pode
dizer muito sobre a condição emocional e mental de um homem. Devemos
perceber que o corpo todo é para a linguagem do corpo o que os órgãos da
fala representam para a linguagem oral.
O dr. Paul L. Wachtel do Downstate Medicai Center, State University of
New York, estudou a comunicação não-verbal em pacientes psiquiátricos e
publicou um artigo intitulado: "Uma Abordagem ao Estudo da linguagem do
corpo em Psicoterapia".
Cada movimento ou posição do corpo, de acordo com o dr. Wachtel, tem
funções adaptativas, expressivas e defensivas, algumas conscientes e outras
inconscientes. "Procuramosfazer uma avaliação clínica completa do que sig-
nifica o uso que um paciente faz de seu corpo", afirma ele.
Para obter seus dados, o dr. Wachtel filmou entrevistas psiquiátricas e
passou várias vezes os filmes, comparando a linguagem do corpo à comuni-
cação verbal. Uma coisa que ele aprendeu ao ver os filmes foi quando procu-
rar gestos significativos. Teoricamente, você poderia notá-los, ao ouvir um
paciente, mas na verdade os movimentos são rápidos demais e muitas vezes
passam despercebidos numa entrevista. O filme pode ser passado em câme-
ra lenta várias vezes, servindo como máquina do tempo para se rever qual-
quer parte de uma entrevista.
Um exemplo de como a linguagem do corpo ajuda, disse o dr. Wachtel,
ocorreu numa entrevista com uma pessoa extremamente problemática que
não sabia como se sentia em relação a um amigo com quem estava envolvida.

80
No filme, ele notou que sempre que ela estava irritada, fazia certos ges-
tos. Quando ela repetiu esses mesmos gestos ao mencionar o nome do ami-
go, ele conseguiu mostrar como ela se sentia em relação a ele. Entender suas
emoções é, evidentemente, o primeiro passo para lidar com elas.
O dr. Wachtel considera a linguagem do corpo uma tentativa consciente
ou inconsciente, por parte do paciente, de se comunicar com o terapeuta. Um
paciente que ele estudou reclinava-se para trás e batia as mãos quando o tera-
peuta tocava em certas áreas problemáticas. " Talvezf, disse o dr. Wachtel,
"essa seja uma expressão relativamente comum de resistência".

Lugares diferentes, posturas diferentes

Aceitar a idéia de que o homem usa mais de uma forma de comunicação


traz vantagens claras tanto para o psiquiatra quanto para o cidadão comum.
O psiquiatra pode aprender o que esperar de seu paciente e o cidadão comum
pode aprender muito sobre o que esperar de seus amigos, se entender que
eles reagem usando a linguagem do corpo e a oral.
Essa consciência da linguagem do corpo muitas vezes é a chave para rela-
cionamentos pessoais e pode ser o segredo que tantos homens usam ao mani-
pular os outros. Alguns homens parecem capazes de interpretar a linguagem
do corpo e manipular as pessoas com o corpo e com a voz.
Além disso, a consciência da linguagem do corpo de uma pessoa e a
capacidade de interpretá-la cria uma consciência da própria linguagem do
corpo. Quando começamos a receber e interpretar sinais que os outros estão
enviando, quando monitoramos nossos próprios sinais e conseguimos um
controle maior de nós mesmos, passamos a atuar com mais eficiência.
Entretanto, é muito difícil ganhar controle de todos os diferentes méto-
dos de comunicação. Há literalmente milhares de informações trocadas entre
os seres humanos, em questão de minutos. Nossa sociedade nos programa
para lidarmos com esses dados, embora num nível inconsciente. Se os trou-
xermos para nossa consciência, corremos o risco de os utilizar de maneira
incorreta. Se precisamos pensar no que estamos fazendo, freqüentemente se
torna muito mais difícil executar nossas ações. Uma mente alerta não é neces-
sariamente tão eficiente quanto uma inconsciente.
Apesar disso, os psiquiatras continuam a estudar todos os aspectos da
comunicação corporal. O dr. Scheflen interessou-se particularmente pelo sig-
nificado da postura em sistemas de comunicação. Num artigo na revista Psy-
chiatry, ele observa que a forma como as pessoas se posicionam nos diz muito
sobre o que está acontecendo, quando duas ou mais pessoas estão juntas.
"Os norte-americanos não usam mais que trinta gestos tradicional', o dr.
Scheflen escreve, e acrescenta que há ainda menos posturas corporais capazes
de transmitir qualquer significado na comunicação, e que cada uma delas ocor-

81
re num número limitado de situações. Para comprovar isso, ele observa que uma
postura como sentar-se recostando o tronco para trás raramente é assumida por
um vendedor que esteja tentando vender algo para um cliente influente.
Embora as diferentes posturas que os norte-americanos possam assumir
sejam reconhecidas por todos os cidadãos do país, isso não significa que todos
usem todas elas. Um estudante universitário de dezenove anos, de Nova York,
usará posturas diferentes de uma dona de casa do Centro-Oeste, e um operário de
construção no estado de Washington exibirá posturas diferentes de um vendedor
em Chicago. O dr. Scheflen acredita que um especialista em linguagem do corpo
poderia nos dizer de que parte do país seria um homem, pela forma de ele mover
a sobrancelha ao conversar. Tal especialista, entretanto, ainda não apareceu.
Todos nós reconhecemos diferenças regionais na linguagem do corpo
quando assistimos a uma apresentação de um mímico talentoso. Por gestos espe-
cíficos, o mímico pode nos dizer não só de que parte do mundo é o personagem,
mas também qual a sua ocupação profissional. Quando eu era universitário, na
época em que os jogadores de futebol americano eram heróis da faculdade, mui-
tos dos rapazes não atléticos imitavam o andar dos jogadores de futebol ameri-
cano, e com tamanha perfeição que chamavam a atenção das garotas.

O movimento e a mensagem

O dr. Birdwhistell, em seu trabalho em cinesiologia, tentou apontar que


gesto é usado para enviar cada mensagem. Uma das coisas que ele descobriu
é que todo norte-americano mexe a cabeça várias vezes durante uma conver-
sa. Se você filmar uma conversa típica entre dois norte-americanos e então
passar o filme em rotação mais lenta para estudar os elementos da postura,
notará um movimento da cabeça quando uma resposta é esperada. O movi-
mento da cabeça no final de cada sentença é um sinal para o outro falante
começar sua resposta.
Esta é uma das formas usadas para conduzir nossas conversas. Permite uma
troca sem a necessidade de dizer: "Você terminou? Agora vamos conversar".
É claro que os sinais serão diferentes em outras regiões do mundo. Teori-
camente, a observação de duas pessoas conversando daria uma boa pista da
nacionalidade delas.
Na língua inglesa, a mudança na entonação no final de uma sentença
pode ter vários significados. Se a entonação for ascendente, o emissor está
fazendo uma pergunta. Pergunte: "What time is it?" (Que horas são?) e obser-
ve como sua voz se eleva no "it". "How are you?" (Como vai você?). A entona-
ção é ascendente no "you". "Do you like your new job?" (Você gosta de seu
novo emprego?). Eleva-se no "job".*

* Em português, observa-se o mesmo esquema de entonação. (N.T.)

82
Este é um marcador lingüístico. O dr. Birdwhistell descobriu vários mar-
cadores cinésicos que suplementam os marcadores lingüísticos. Observe a
cabeça do homem quando ele faz uma pergunta. "What time is it?" A cabeça
dele ergue-se no "it". "Where are you going?" A cabeça dele ergue-se no
"going". Como a voz, a cabeça move-se para cima no fim da pergunta.
Esse movimento para cima no final de uma pergunta não se limita à voz
e à cabeça. A mão, também, tende a se erguer com a elevação da altura da voz.
Os gestos aparentemente insignificantes das mãos, que todos nós fazemos
quando conversamos, estão ligados à entonação e ao significado. As pálpe-
bras também se levantam ao final da pergunta.
Assim como a voz se eleva no final de uma pergunta, também abaixa ao
final de uma afirmação. "I like this book" (Eu gosto deste livro). Em "book", a
entonação é descendente. "I'd like some milk with my pie" (Eu queria tomar
leite para acompanhar a torta. Novamente, é descendente em "pie".
A cabeça também acompanha a entonação descendente no final da sen-
tença, e, de acordo com o dr. Birdwhistell, a mão e a pálpebra também abai-
xam.
Quando um emissor deseja continuar uma frase, sua voz manterá a mes-
ma entonação, sua cabeça permanecerá erguida, os olhos e as mãos ficarão
imóveis.
Essas são apenas algumas das mudanças na posição dos olhos, da cabe-
ça e das mãos que acompanham a fala. Raramente, se é que acontece, mante-
mos a cabeça numa posição por mais tempo que uma ou duas sentenças. Os
escritores sabem disso e também sabem que o movimento da cabeça está liga-
do não só ao que estamos dizendo mas também ao conteúdo emocional. Para
caracterizar uma pessoa "fria", que não demonstra nem sente emoções, um
escritor o fará parecer insensível, fisicamente imóvel. James Bond, nos filmes
feitos a partir das histórias do 007, de Ian Fleming, foi interpretado por Sean
Connery num estilo insensível. A face dele raramente mostra qualquer movi-
mento, mesmo diante da morte. Foi uma excelente caracterização, já que ele
representou um homem que não sentia emoções.
No folclore judaico, um golem (boneco do folclore judaico) é um ser que
não mostra expressão e, evidentemente, não sente emoções. A modelo impas-
sível mantém-se numa pose rígida, artificial, para não comunicar conotações
emocionais. Quando um homem e uma mulher normal conversam, olham ao
mesmo tempo para a direita, para a esquerda, para cima, para baixo. Piscam,
arqueiam as pálpebras, mordem os lábios, tocam o nariz — e cada movimen-
to está ligado ao que ele está dizendo.
Devido às enormes variações nos movimentos dos indivíduos, muitas
vezes é difícil ligar um movimento específico a uma mensagem específica,
mas mesmo assim, para parafrasear Marshall McLuhan, podemos dizer com
propriedade que o movimento é a mensagem. O dr. Scheflen, ao estudar ses-

83
sões de terapia psiquiátrica, verificou que quando o terapeuta explica algo ao
paciente, ele pode usar uma posição da cabeça, mas quando interpreta algum
comentário ou comportamento, usa outra posição. Quando ele interrompe o
paciente usa ainda uma terceira ou uma quarta posição para ouvi-lo.
O paciente também, quando ouve o terapeuta, assume certas posições
definidas. Em uma situação estudada pelo dr. Scheflen, o paciente põe a cabe-
ça para a direita quando age de uma maneira infantil, e mantém a cabeça ere-
ta quando fala de modo decidido e adulto.
A dificuldade em estudar e interpretar esses movimentos é que são movi-
mentos cinésicos pessoais, relacionados a eventos que ocorreram anterior-
mente com este ou aquele determinado paciente. Nem todos os pacientes
inclinam a cabeça para um lado quando agem de maneira infantil, e nem todos
os terapeutas fazem o mesmo movimento ao ouvir o paciente. No entanto, é
certo que o mesmo homem repetirá a mesma posição várias vezes. O dr.
Scheflen ficou surpreso ao constatar que esses movimentos de cabeça, que
eram repetidos durante uma entrevista de trinta minutos, fossem tão estereo-
tipados e rígidos; no entanto, ele enfatiza que nessa sessão, bem como em
muitas outras por ele estudadas, o paciente e o médico raramente usaram uma
grande variação de movimentos.
Então, não deveria ser muito difícil encontrar posições específicas para
uma pessoa e a seguir relacioná-las a frases ou tipos de frases, perguntas, res-
postas, explicações etc.

Posturas e apresentações

Movimentos da cabeça, das pálpebras e das mãos não são realmente


movimentos posturais, e o dr. Scheflen os chama de "pontos". Uma seqüên-
cia de vários pontos é por ele rotulada de "posição", que é muito mais próxi-
ma de uma postura. Uma posição, segundo ele, consiste de uma "mudança
postural grosseira envolvendo pelo menos metade do corpo". Uma posição
pode durar cerca de cinco minutos.
A maioria das pessoas numa situação social mudará sua posição de duas
a quatro vezes, embora o dr. Scheflen tenha observado psicoterapeutas, numa
situação de tratamento, manterem uma posição até por vinte minutos.
Para ilustrar o uso de posições, imagine uma situação em que um homem
está falando de um assunto específico. O ouvinte recosta-se na cadeira, os bra-
ços e as pernas cruzados, enquanto ouve as idéias do locutor. Quando o
ouvinte chega a um ponto em que discorda do locutor, ele muda de posição,
preparando-se para manifestar seu protesto. Ele pode debruçar-se e descru-
zar os braços e as pernas. Talvez ele levante uma das mãos, apontando o indi-
cador quando começa a refutar a idéia. Ao terminar, ele voltará à posição
anterior, os braços e as pernas cruzados — ou talvez passará a uma terceira

84
posição, mais receptiva, com os braços e as pernas descruzados enquanto se
inclina para trás, sinalizando que está aberto a sugestões.
Se você pegar todas as posições que um homem e uma mulher tomam
durante uma conversa, tem o que o dr. Scheflen rotula de "apresentação". Uma
apresentação pode durar algumas horas e terminar com uma mudança com-
pleta de localização. Sair da sala, dar um telefonema, pegar um cigarro, ir à
toalete — qualquer movimento para interromper a conversa encerra uma
apresentação. Se a pessoa volta, então inicia-se nova apresentação.
A função da postura na comunicação, o dr. Scheflen acredita, é marcar
essas unidades, pontos, posições e apresentações. As próprias unidades ser-
vem como pontuação para uma conversa. Posições diferentes relacionam-se
a diferentes estados emocionais, e muitas vezes esses estados podem ser
recapturados quando uma pessoa reassume a posição original em que eles
ocorreram. O psicoterapeuta cuidadoso e observador perceberá, depois de
um momento, quais posturas estão associadas a determinados estados emo-
cionais. Isso confirma os achados do dr. Wachtel. A mulher que ele estudou
fazia um determinado gesto quando estava irritada.
O cidadão comum que entende bem de linguagem do corpo e a usa con-
segue captar essas posturas, embora possa não ter consciência disso, e pode
relacioná-las aos estados emocionais das pessoas que conhece. Dessa forma,
ele pode se manter um passo à frente das outras pessoas, ao lidar com elas. Essa
arte pode ser ensinada às pessoas, pois é uma função de cuidadosa observação,
mas só pode ser aprendida quando se tem conhecimento de sua existência.
Antes de a postura passar por cuidadosa análise, os psiquiatras tinham
ciência dela. No início do capítulo, o terapeuta, ao contar uma piada ao
paciente, ficou atento para ver se esta causaria uma mudança na postura do
rapaz. Ele não sabia conscientemente que a depressão estaria ligada a uma
postura definida, à falta de ânimo e humor, a uma passividade e abatimento
geral, mas inconscientemente sabia que o estado do rapaz era preocupante,
tanto que aquilo o perturbou e ele finalmente tomou as medidas necessárias
para salvar seu paciente.
Assim como abaixar a cabeça indica o fim de uma frase, ou levantá-la
denota o fim de uma pergunta, as mudanças posturais maiores indicam pon-
tos finais em interações, o fim de um pensamento, o fim de uma frase. Por
exemplo, quando você muda sua postura e deixa de dirigir o olhar à pessoa
com quem está falando, muitas vezes significa que você terminou. Você quer
voltar a atenção para algum outro lugar, por um momento.
Um exemplo familiar, embora um pouco exagerado dessa mudança, é
quando uma criança não suporta mais ouvir o sermão de um dos pais. Ao dizer:
"Sim, sim, eu sei!', vira-se fisicamente indicando:" Chega!Deixe-me empazf."
Entretanto, Scheflen, assim como Birdwhistell e outros pesquisadores,
advertem que não devemos tentar associar mudanças específicas de posturas

85
a determinadas frases que expressamos oralmente. Devemos ter cuidado para
não afirmar que uma mudança de postura sempre tem um significado. "O sig-
nificado ou função de um evento", explica ele, "não é interpretado em si, mas
em relação a seu contexto". Uma mudança na postura significa que algo está
acontecendo. Nem sempre nos diz o que está acontecendo. Devemos estudar
a mudança em relação a todo o incidente para descobrir isso.
Noite dessas, assisti ao evangélico Billy Graham na televisão, e percebi
que ele possui várias mudanças posturais rígidas. Uma das prediletas é usar o
indicador da mão direita para acompanhar suas palavras, apontando para
cima quando promete recompensas celestiais e fazendo um gigantesco círcu-
lo ao bater insistentemente numa mesma tecla. Outro favorito é manter as
mãos paralelas e abertas, na frente do peito, movendo-as para cima e para
baixo com movimentos bruscos. Seu índice de audiência e o número de con-
versões pelas quais é responsável não deixam dúvidas quanto à eficiência de
suas posturas, embora um exame objetivo deixe claro que estas são bem-
ensaiadas e não inconscientes. A questão é que transmitem um contexto emo-
cional que acompanha as palavras, criam uma "aura".
O famoso filme King Kong tinha cenas em que o gorila gigante movia-se
de uma forma surpreendentemente realista. Esses resultados foram possíveis,
em grande parte, por causa do entendimento da linguagem do corpo por parte
dos diretores de cinema. Quando Kong segurava Fay Wray na palma de sua
mão e olhava para ela, ele balançava a cabeça para um lado, numa cópia fiel
de um "ponto" totalmente humano.
O reconhecimento da importância da linguagem do corpo para projetar
uma imagem humana e simpática levou homens em destacadas posições polí-
ticas a adotar várias generalidades da linguagem do corpo, na tentativa de atin-
gir aquele algo indefinível que chamamos de carisma.
John Kennedy era carismático e, não importava o que dizia, bastavam
alguns gestos, uma postura correta para cativar a audiência. Robert Kennedy,
que não era um homem alto, parecia ser bem alto pela forma como manipu-
lava sua postura. Johnson teve aulas de linguagem do corpo e tentou, sem
sucesso, mudar sua imagem e Richard Nixon também tinha muita consciência
da importância da linguagem do corpo e tentou usá-la conscientemente para
manipular a população. Esse uso da linguagem do corpo é uma bênção para
o ator que imita políticos. David Frye, um excelente mímico, baseia-se em
grande parte nessas posturas para tornar sua caracterização perfeita.

Lutando pela posição

A postura não é apenas um meio de marcar uma conversa, também é uma


forma em que as pessoas podem se relacionar quando estão juntas. O dr.
Scheflen dividiu todas as posturas que as pessoas assumem quando estão com

86
s outros, em três grupos: 1) inclusivo-não-inclusivo; 2) vis-à-vis ou orienta-
ção corporal paralela; e 3) congruência-incongruência.
A inclusâoou não-inclusão descreve a maneira como os membros de um
grupo incluem ou não as pessoas. Eles fazem isso colocando o corpo, braços
e pernas, em determinadas posições. Numa reunião social, um grupo de pes-
soas pode formar um pequeno círculo que exclui todas as demais. Se três
membros de um grupo estão se sentando num sofá, os dois em cada extremi-
dade podem "se fechar", virar-se um para o outro para incluir aquele que está
no meio, e excluir os outros. Dessa forma, eles recorrem à inclusão. Eles tam-
bém podem cruzar as pernas para se fechar em torno do integrante ou inte-
grantes centrais.
No capítulo anterior, vimos como a avó e a filha num grupo terapêutico
"fechavam" a mãe, tentando protegê-la das ousadias do terapeuta. Esse é um
recurso muito usado para manter "fora" aqueles que não são membros de um
grupo, ou para conservar os participantes no grupo.
Os braços e pernas dos participantes de um grupo, freqüentemente, são
usados de modo inconsciente para que o grupo fique protegido de qualquer
intrusão. Se você observa grupos exercendo qualquer função, em casamen-
tos, festas, reuniões ou à noite, em casa, notará o número de formas curiosas
que os integrantes usam para proteger o grupo. Um homem numa reunião
social pode colocar o pé sobre uma mesa de café para agir como barreira con-
tra pessoas de fora. Às vezes o sexo determinará a forma de os integrantes de
um grupo excluírem outros. O dr. Scheflen relata algo sobre um seminário
num hospital em que os funcionários do sexo masculino se colocaram entre
as funcionárias e um visitante do sexo masculino. Era como se eles quisessem
protegê-las das pessoas de fora, e, no entanto, não havia sexo envolvido nesse
esquema de proteção. As funcionárias fazem parte de um grupo que está auto-
maticamente protegido pelos homens.
Um indicador do status do grupo pode ser encontrado quando este se
dispõe em linha num sofá, ao longo de uma parede, ou numa conferência. Os
integrantes mais importantes tenderão a estar nos extremos.
Em nossa discussão sobre territórios pessoais, explicamos o significado
de zonas corporais em diferentes culturas. Quando homens americanos estão
numa situação em que suas zonas ou territórios são violados por um aglome-
rado de pessoas, muitas vezes reagem de formas curiosas. Dois homens que
estão num sofá, numa festa, ao se verem apertados um contra o outro, podem
virar as costas e cruzar as pernas, para se afastar. Cada um pode erguer o braço
que está próximo à pessoa ao lado e apoiar a mão no rosto, para funcionar
como mais uma barreira.
Se um homem e uma mulher são forçados a se sentar muito próximos e
de frente um para o outro, e eles não têm intimidade, podem cruzar os braços
e as pernas para se proteger e inclinar o corpo para trás. Uma boa maneira de

87
observar essas e outras defesas é experimentar, em festas, mover-se para os
territórios de outras pessoas, e ver de que forma elas reagem, quais as defesas
a que recorrem.
A segunda categoria de envolvimento da postura, o dr. Scheflen chama
de orientação corporal paralela ou vis-ã-vis. Simplesmente, esta sugere que
duas pessoas podem se relacionar do ponto de vista da postura, olhando uma
para outra ou sentando-se lado a lado, paralelamente, talvez voltadas para
uma terceira pessoa. Se três pessoas estão envolvidas, duas sempre estarão
paralelas e uma estará olhando para elas. Em grupos de quatro, duas duplas
paralelas se olharão.
Se as circunstâncias impedem as pessoas de arranjar todo o seu corpo
nessas posições, elas ajeitarão a cabeça, os braços e as pernas.
A disposição face a face geralmente ocorre num relacionamento profes-
sor-aluno, médico-paciente ou entre casais, em que há troca de sentimentos
ou informações. Disposições paralelas em geral indicam atividades que
requerem apenas uma pessoa. Ler, ouvir uma história, assistir à televisão ou a
um show, tudo isso pode ser feito por uma pessoa sozinha e também pode ser
feito em paralelo, quando mais de uma pessoa está envolvida.
Disposições face a face indicam uma reação entre duas pessoas envolvi-
das. Disposições lado a lado, quando usadas livremente, nos dizem que as
duas pessoas estão mais aptas a ficar neutras uma em relação à outra, pelo
menos nessa situação específica. A forma em que um casal numa festa ou reu-
nião social se posiciona nos diz muito sobre seu relacionamento. Numa situa-
ção lado a lado, a intimidade pode ser atingida quando as pessoas se
entreolham, virando a parte superior do corpo de frente uma para outra.
A última categoria, congruência-incongruência, abrange a capacidade
de os membros de um grupo se imitarem. Quando um grupo está em con-
gruência, a posição de um será imitada pelo outro e, em alguns casos, haverá
um espelhamento da imagem.
É interessante notar que quando um integrante de um grupo congruen-
te muda sua postura, os outros também mudarão. Em geral, a congruência de
posição num grupo indica que todos os membros estão de acordo. Se o grupo
tiver dois pontos de vista, os defensores de cada ponto de vista assumirão
posições diferentes. Cada subgrupo será congruente em si mesmo, mas não-
congruente com o outro subgrupo.
Velhos amigos, quando estão discutindo algo, adotarão posições con-
gruentes para mostrar que, apesar da discussão, ainda são amigos. Marido e
mulher que são muito próximos adotarão posturas congruentes quando um
está sendo atacado. Na linguagem do corpo, o outro está dizendo: "Eu o
suporto. Estou do seu lado".
As pessoas que desejam mostrar que estão acima do restante do grupo
podem assumir uma posição não-congruente. Em relacionamentos médico-

88
paciente, pai-filhos, professor-aluno, as posturas serão nâo-congruentes,
novamente para mostrar status ou importância. O homem que está numa reu-
nião de negócios e adota deliberadamente uma posição incomum faz isso na
tentativa de mostrar seu status superior.
Conheço um editor importante de uma editora que adota uma posição
muito curiosa durante as reuniões. Ele se inclina para trás e junta as mãos aci-
ma da cabeça, em seguida as mantém atrás da cabeça, os cotovelos estendi-
dos como asas. Isso o destaca imediatamente e indica seu status. Torna-o
superior aos outros homens na reunião.
Entretanto, disseram-me que um funcionário muito próximo desse pro-
fissional, depois de um determinado intervalo, copia exatamente a posição do
editor, dizendo em linguagem do corpo: "Estou do seu lado. Sou fiel a você,
meu líder". Ele pode estar dizendo ainda:"Estou tentando aproveitara impor-
tância que você reflete*'. Há também a possibilidade de ele estar dizendo:
"Estou tentando ganhar prestígio e tirá-lo de você".
O líder em qualquer reunião de família ou social, freqüentemente esta-
belece a posição para o grupo e, um a um, todos o seguem. Numa família, se
a esposa dita a posição, então é provável que ela tenha a voz mais forte nas
decisões e que, realmente, é ela quem controla.

Três pistas para o comportamento da família

Estude cuidadosamente a disposição de uma família à mesa. Quem se


senta primeiro e onde? Um amigo psicólogo que fez um estudo dos lugares à
mesa analisou a posição de uma família de cinco pessoas em termos do rela-
cionamento entre elas.
" Nessafamília", ele explicou," opai senta-se à cabeceira da mesa, etam-
bém é o membro dominante da família. Sua esposa não está competindo com
ele pelo domínio, e ela se senta á sua direita. A razão é que eles estão próximos
o suficiente para compartilhar certa intimidade ã mesa e, no entanto, tam-
bém estão próximos dosfilhos.
"Agora, o posicionamento dos filhos é interessante. Afilha mais velha,
que está em competição com a mãe pelo afeto do pai num nível inconsciente,
senta-se à esquerda do pai, em congruência com a posição da mãe.
"O mais novo está interessado na mãe, uma situação normal para um
menino, e se senta ã direita dela, um lugar longe do pai. A filha do meio, sen-
ta-se ã esquerda da irmã. A posição dela ã mesa, como a posição dela nafamí-
lia, é ambivalente."
É interessante notar, nesse arranjo, a colocação inconsciente de todos os
membros, de acordo com os relacionamentos interfamiliares. A escolha dessa
posição pode começar com a escolha da mesa. Há mais concorrência pelo
domínio em volta de uma mesa retangular que em uma mesa redonda.

89
O posicionamento do mando e da mulher é importante para a compreen-
são da constituição da família. Quando marido e mulher estão cada um numa
ponta da mesa, geralmente estão em conflito quanto à posição dominante na
família, mesmo que o conflito exista num nível inconsciente.
Quando marido e mulher escolhem sentar-se um na ponta e outro ao
lado, em geral eles estão seguros quanto aos papéis conjugais e resolveram
seu conflito um com o outro. Quem se senta à cabeceira?
Evidentemente, se a mesa for pequena e eles puderem ficar frente a fren-
te, essa talvez seja a posição mais confortável para a intimidade.
Posições numa mesa podem dar uma pista para o domínio numa família.
Outra pista para as relações interfamiliares consiste em observar se a família
é rígida ou aberta.
Um amigo fotógrafo foi contratado recentemente para tirar algumas fotos
informais de um candidato a prefeito numa grande cidade do Centro-Oeste.
Ele passou o dia com a família e voltou desapontado.
" Talvez eu tenha tirado uma foto decente, ele me disse. "Pedi a ele para
chamar seu cachorro efoi o único momento em que relaxou."
Quando lhe pediram para explicar, meu amigo disse: "A casa era um
daqueles lugares rígidos, o mais rígido que se pode ver. Revestimentos de
plástico nos abajures, tudo no lugar, tudo perfeito — sua pobre esposa me
seguia, pegando os cartuchos de flash e recolhendo as cinzas de meus cigar-
ros. Como eu poderia tirar uma foto espontânea?"
Eu sabia o que ele estava dizendo pois vi muitas famílias assim, lares que
representam uma família "fechada". Tudo na família é guardado, arrumado.
Mesmo as posturas deles são rígidas e impecáveis. Tudo está no lugar nessas
casas formais, arrumadas.
Podemos ter certeza, de modo geral, que a família de uma casa como essa
é menos espontânea, mais tensa, é menos provável que seus integrantes
tenham opiniões liberais, aceitem idéias diferentes, e muito mais provável que
se adaptem aos padrões da comunidade.
Por outro lado, a família "aberta" terá uma aparência dinâmica em sua
casa, uma aparência desarrumada, talvez desorganizada. Os familiares serão
menos rígidos, menos exigentes, mais livres e mais abertos na maneira de agir
e nas idéias.
Numa família fechada, cada membro provavelmente tenha sua própria
cadeira, seu próprio território. Na família aberta, raramente importa quem sen-
ta onde, quem chegar primeiro pega o lugar.
Numa linguagem do corpo, a família fechada sinaliza sua rigidez pelos
movimentos restritos, sua maneira formal e postura cuidadosa. A família aber-
ta indica sua abertura pelos movimentos mais soltos, posturas descuidadas e
pela informalidade. Sua linguagem do corpo grita:"Relaxe. Nada é importan-
te demais. Fique à vontade.

90
As duas atitudes refletem-se num sentido tátil, pelo comportamento da
mãe com os filhos. Ela é tensa, controladora, ou é tranqüila e descuidada? A
atitude dela influencia os filhos e está refletida em seu comportamento.
Esses, evidentemente, são os dois extremos. A maioria das famílias se
enquadra entre eles, tem certa dose de abertura e de fechamento. Algumas são
igualmente equilibradas e outras inclinam-se mais para um extremo que para
o outro. Uma pessoa de fora que esteja estudando qualquer família, pode usar
a abertura ou o fechamento como pista para compreendê-la. Uma terceira
pista, igualmente significativa, é a imitação na família.
Quem imita quem na família? Mencionamos antes que se a esposa toma
a dianteira, iniciando certos movimentos seguidos pelos demais familiares,
então provavelmente ela assumirá o papel dominante.
Entre irmãos e irmãs, o domínio pode ser facilmente identificado, obser-
vando-se a criança que se movimenta primeiro e notando aqueles que a
seguem.
O respeito na família pode ser entendido observando-se como a lin-
guagem do corpo é copiada. O filho copia os gestos do pai? A filha copia os
da mãe? Se isso acontece, podemos estar certos de que a família é bem cons-
tituída. Observe quando o filho começa a imitar os movimentos da mãe, e a
filha, os do pai. Esses são os primeiros sinais de advertência da linguagem do
corpo. "Estou no caminho errado. Preciso ser colocado no caminho certo."
O psicólogo responsável, ao tratar um paciente, tentará descobrir algo da
constituição familiar e, o mais importante, do lugar de seu paciente na família.
Tratar um paciente como indivíduo separado de sua família é ter pouca
compreensão da área mais importante de sua vida, seu relacionamento com
a família.
Alguns psicólogos estão começando a insistir na terapia familiar, e não é
improvável que um dia os terapeutas só tratarão pacientes dentro da estrutu-
ra da família, para que possam ver e entender todo o relacionamento familiar
e compreender como eles influenciaram o paciente.
Nosso primeiro relacionamento é com nossa família, nosso segundo é
:om o mundo. Não podemos entender o segundo sem explorar cuidadosa-
mente o primeiro.

91
O olhar que desumaniza

O cowboy montou em seu cavalo e os dedos pairaram sobre a arma


enquanto seus olhos, frios como gelo, provocavam calafrios nas costas do
bandido.
Uma situação familiar? Acontece em todo romance de faroeste, assim
como em toda história de amor, os olhos da heroína se derretiam enquanto os
olhos do herói queimavam ao olhar para os dela. Na literatura, mesmo na
melhor literatura, os olhos são de aço, de sarcasmo, sagazes, penetrantes, bri-
lhantes e assim por diante.
Serão realmente? Serão sempre assim? Existirá um olhar ardente, gelado
ou cortante? Na verdade, não há. Longe de serem janelas da alma, os olhos
têm uma função fisiológica, são simples órgãos da visão e nada mais, de cores
diferentes em diferentes pessoas, sem dúvida, mas nunca realmente capazes
de expressar emoção em si.
E, no entanto, lemos e ouvimos tantas vezes e mesmo falamos de olha-
res sábios, sagazes, bons, ruins, indiferentes. Por que há tal confusão? Tantas
pessoas podem estar erradas? Se os olhos não mostram emoção, então por que
a vasta literatura, as histórias e lendas sobre eles?
De todas as partes do corpo humano usadas para transmitir informações,
os olhos são a mais importante e podem emitir as nuances mais sutis. Isso con-
tradiz o fato de que os olhos não mostram emoção? Nem tanto. Embora o
globo ocular em si não mostre nada, o impacto emocional dos olhos ocorre
devido a seu uso e ao uso da face. A razão de eles confundirem tanto os obser-
vadores é porque pela duração do olhar, pela abertura das pálpebras, pelo

92
olhar de esguelha e por inúmeras pequenas manipulações da pele e dos
olhos, praticamente qualquer significado pode ser enviado.
Mas, a técnica mais importante do controle dos olhos é olhar, ou olhar
fixamente. Com o olhar podemos encantar ou afastar uma pessoa. Como?
Atribuindo a ela um status humano ou não-humano.
Dizendo-o de um modo simples, o controle por meio do olhar em nossa
sociedade se resume a dois fatos. Um deles, não olhamos fixamente (encara-
mos) para outro ser humano. Segundo, olhar fixamente é reservado para uma
não-pessoa. Observamos demoradamente uma obra de arte, uma escultura,
um cenário. Vamos ao zoológico e observamos os animais, os leões, os maca-
cos, os gorilas. Olhamos fixamente para eles pelo tempo que desejarmos, da
forma mais íntima que desejarmos, mas não olhamos fixamente para os huma-
nos, se queremos dar a eles um tratamento humano.
Podemos usar o mesmo olhar fixo para assistir ã apresentação de um artis-
ta de circo, mas não o consideramos .realmente um ser humano. Pagamos para
olhar para ele como objeto e, da mesma forma, podemos fixar o olhar num ator
que está no palco. O homem verdadeiro está mascarado por trás de seu papel,
para que nosso olhar não incomode nem a ele nem a nós. Entretanto, o novo
teatro que trás o ator para junto da platéia muitas vezes provoca uma sensação
desconfortável. Ao envolver a platéia, o ator de repente perde seu status de
não-pessoa e olhar fixamente para ele se torna embaraçoso para nós.
Como dissemos antes, um branco do Sul dos Estados Unidos pode olhar
fixamente para um negro da mesma forma, tornando-o, pelo olhar, um obje-
to em vez de uma pessoa. Se desejamos ignorar alguém, tratá-lo com certo
desprezo, podemos dar a ele o mesmo olhar, o olhar ligeiramente não focali-
zado que não o vê realmente, o olhar cortante da elite social.
Profissionais do setor de serviços que nos atendem, muitas vezes são tra-
tados dessa forma, como os garçons, garçonetes e crianças. Entretanto, esse
pode ser um esquema de proteção mútua. Permite àqueles que nos atendem
atuar eficientemente em seu universo, que se sobrepõe ao nosso, sem inter-
ferência demais de nossa parte, e permite-nos ficar à vontade, sem que o aten-
dente seja reconhecido como ser humano. O mesmo ocorre com crianças e
garçons. Seria constrangedor se cada vez que fôssemos servidos por um gar-
çom tivéssemos de nos apresentar e trocar palavras cordiais.

Um momento para olhar

Com desconhecidos, quando os reconhecemos como seres humanos,


devemos evitar olhar fixamente para eles e, no entanto, devemos também evi-
tar ignorá-los. Para considerá-los como pessoas em vez de objetos, usamos
uma desatenção deliberada e educada. Olhamos para eles o tempo suficien-
te para deixar bem claro que os estamos vendo e, então, imediatamente des-

93
viamos o olhar. Estamos dizendo, em linguagem do corpo:"Sei que você está
a f , e um momento depois acrescentamos: "Mas eu não sonharia em invadir
sua privacidade.
O importante nessa troca é que não encaramos aquele que reconhece-
mos como pessoa. Olhamos rapidamente e então desviamos o olhar. O reco-
nhecimento não é permitido.
Há fórmulas diferentes para a troca de olhares, dependendo do lugar onde
as pessoas se encontram. Se você passa por alguém na rua, pode olhar para a
pessoa até que esteja a cerca de dois metros e meio de distância, então você
deve desviar o olhar ao passar por ela. Antes de essa distância ser alcançada,
cada um sinalizará em que direção passará. Isso é feito com um breve olhar
naquela direção. Cada um se desvia ligeiramente e passa tranqüilamente.
O dr. Erving Goffman se refere a esse rápido olhar em Behavior in pub-
lic places (Comportamento em lugares públicos), dizendo que olhar de relan-
ce e abaixar os olhos é a linguagem do corpo para expressar: "confio em
você".
Para reforçar esse sinal, você olha diretamente para a outra face antes de
desviar o olhar.
Às vezes, é difícil seguir as regras, principalmente se uma das duas pes-
soas estiver usando óculos escuros. Torna-se impossível descobrir o que está
fazendo. Está olhando demoradamente para você, intencionalmente? Está
olhando para você, afinal? A pessoa que está usando óculos sente-se protegi-
da e acha que pode olhar sem ser notada. Entretanto, isto é um engano. Para
a outra pessoa, os óculos escuros parecem indicar que o usuário está sempre
olhando fixamente para ela.
Muitas vezes usamos essa técnica de olhar-e-desviar o olhar quando
encontramos pessoas famosas. Queremos assegurar que estamos respei-
tando a privacidade delas, que não sonharíamos em olhar para elas. O mes-
mo acontece com os aleijados ou deficientes físicos. Olhamos rapidamente
e então desviamos o olhar, antes que olhar possa ser considerado encarar.
É a técnica que usamos para qualquer situação incomum, em que um olhar
muito demorado seria embaraçoso. Quando vemos um casal exótico, usa-
mos essa técnica. Podemos usá-la quando vemos um homem com uma bar-
ba diferente, com um cabelo comprido demais, com roupas extravagantes.
Uma mulher com uma minissaia minúscula também pode atrair esse olhar-
e-desviar o olhar.
É claro que o oposto também é verdadeiro. Se desejamos menosprezar
uma pessoa, podemos demonstrar isso olhando por mais tempo do que seria
aceitável e educado. Em vez de baixar os olhos quando trocamos olhares, con-
tinuamos a encarar a pessoa. Aquele que desaprova um casamento ou namo-
ro inter-racial olhará descaradamente para tal casal. Se cabelos longos,

94
vestidos curtos ou barbas lhe desagradam, ele pode demonstrar isso com um
olhar mais demorado do que o aceitável.

O olhar incômodo

O olhar-e-desviar o olhar nos faz lembrar do problema que enfrentamos


na adolescência, com nossas mãos. O que fazemos com elas? Onde as colo-
camos? Os atores amadores também tomam consciência disso. De repente,
eles se conscientizam de suas mãos, reconhecendo-as como acessórios desa-
jeitados que devem ser usados com graça e naturalidade.
Da mesma forma, em certas circunstâncias, tornamo-nos conscientes de
nossos olhares como acessórios desajeitados. Para onde devemos olhar? O
que devemos fazer com nossos olhos?
Dois estranhos sentados um de frente para o outro num vagão-restauran-
te de um trem têm a opção de se apresentar e travar uma conversa inconseqüen-
te e talvez desinteressante durante a refeição, ou ignorar-se mutuamente e tentar
evitar o olhar do outro a todo custo. Cornelia Otis Skinner, ao descrever tal situa-
ção num ensaio, escreveu: "Eles lêem várias vezes o menu, brincam com os
talheres, inspecionam as unhas como se as estivessem vendo pela primeira vez.
Chega o momento inevitável em que se olham, mas eles desviam o olhar rapida-
mente e o dirigem para fora, apreciando a paisagem através dajaneld'.
O mesmo olhar desajeitado dita nosso comportamento em elevadores,
ônibus e metrôs lotados. Quando tomamos um elevador ou um trem cheio,
olhamos rapidamente e então desviamos o olhar imediatamente, sem encarar
ninguém. Dizemos, com nosso olhar: "Eu o estou vendo. Não o conheço, mas
você é um ser humano e eu não irei olhar para você demoradamente".
No metrô ou num ônibus, onde a necessidade nos obriga a ficar próxi-
mos dos outros passageiros durante longos trajetos, podemos ter dificuldade
para encontrar uma forma de não fixar o olhar em alguém. Olhamos sorratei-
ramente, mas desviamos o olhar antes de cruzar com o olhar da outra pessoa.
Ou lançamos um olhar vago, desviando-o dos olhos da pessoa e dirigindo-o
para a cabeça, a boca, o corpo — para qualquer lugar, menos para os olhos,
que são um ponto inaceitável para um olhar vago.
Se nossos olhares se encontram, às vezes podemos amenizar a mensagem
com um breve sorriso. O sorriso não precisa ser longo nem óbvio demais. Deve
dizer: "Perdão por ter olhado para você, mas nós dois sabemos quefoipor acasd\

Olhares indiscretos

O olhar que nos incomoda é uma ocorrência bastante comum e todos nós
já passamos por uma experiência dessas. Quase todas as ações e interações
entre seres humanos dependem de olhares mútuos. O falecido filósofo espa-

95
nhol José Ortega y Gasset, em seu livro Man andpeopleiO homem e as pes-
soas), falava do "olhar" como algo que vem diretamente de dentro de um
homem" com a precisão de uma bala de revólver". Ele achava que o olho, com
seus cílios e aberturas, a íris e a pupila, era equivalente a um "teatro inteiro
com seu palco e atores".
Os músculos dos olhos, Ortega dizia, são surpreendentemente sutis e,
por isso, todo olhar é diferenciado de outro olhar. Há tantos olhares diferen-
tes que é quase impossível numerá-los, mas ele citou:" o olhar que passeia pela
superfície da coisa olhada e o olhar que se fixa como um gancho; o olhar dire-
to e o olhar oblíquo, cuja forma extrema tem seu próprio nome: 'olhar com o
canto do olho'".
Ele também mencionou o "olhar de esguelha", que difere de qualquer
outro olhar oblíquo, embora seu eixo também esteja deslocado.
De acordo com Ortega, todo olhar nos diz o que vai dentro da pessoa que
olha, e a intenção de se comunicar com um olhar é mais genuinamente reve-
ladora quando aquele que olha não tem consciência de como olha.
Como outros pesquisadores da linguagem do corpo, Ortega advertiu que
um olhar em si não transmite um sentido completo, embora tenha um signifi-
cado. Uma palavra numa sentença também tem significado, mas apenas no
contexto da sentença podemos apreender o sentido completo da palavra. O
mesmo podemos dizer do olhar. Apenas no contexto de uma situação, um
olhar pode ser inteiramente compreendido.
Às vezes, queremos olhar sem sermos vistos. Ortega chamou esse olhar
de " olhar de esguelha". Em qualquer situação, podemos observar alguém e
olhar o tempo que desejarmos, contanto que a outra pessoa não esteja perce-
bendo que está sendo observada, contanto que nosso olhar passe desperce-
bido. No momento em que os olhos da pessoa se movem e encontram os
nossos, nosso olhar deve se desviar. Quanto mais habilidosa for a pessoa,
melhor ela será para dar esses olhares de soslaio.
Numa descrição atraente, Ortega rotula um olhar de "o mais efetivo, o
mais sugestivo, o mais adorável e encantador". Ele o considerou o mais com-
plicado, porque não é apenas furtivo, mas também é o oposto de furtivo, por-
que torna claro que está olhando. Este é o olhar dado com as pálpebras
entreabertas, o olhar sonolento ou calculista ou avaliador, o olhar de um pin-
tor para sua tela, ao afastar-se dela, ó que os franceses chamam de lesyeuxen
coulisse.
Descrevendo esse olhar, Ortega disse que as pálpebras estão quase
fechadas e parecem estar escondendo os olhos, mas de fato as pálpebras com-
primem os olhos e "enviam um olhar certeiro como uma flecha'.
"É o olhar que expressa sonolência, mas que por trás da nuvem de doce
dormitar está totalmente desperto. Qualquer um que tenha tal olhar possui
um tesouro."

96
Ortega disse que Paris atira-se aos pés de qualquer um com esse olhar.
Madame DuBarry, amante de Luís XV, parece que tinha esse olhar, e Lucien
Guitry também. Em Hollywood, Robert Mitchum certamente olhava dessa
maneira, e isso o tornou símbolo sexual durante muitos anos. Mae West
copiou-o e a atriz francesa Simone Signoret controlava esse olhar com tanta
perfeição que mesmo na meia-idade ela era considerada muito sensual e
atraente.

Outras culturas, outros olhares

O reconhecimento do olho como meio de comunicação, ou de um olhar


como tendo significado especial, não é novo. Olhar é algo a que sempre se
associaram emoções fortes e foi proibido, sob certas circunstâncias, na pré-
história e nas lendas. A mulher de Ló foi transformada numa estátua de sal por
olhar para trás, e Orfeu perdeu Eurídice por ter olhado para ela. Adão, quan-
do provou o fruto do conhecimento, teve medo de olhar para Deus.
O significado do olhar é universal, mas em geral não estamos conscien-
tes de como olhamos ou como somos olhados. A honestidade exige, em nos-
sa cultura, que olhemos alguém diretamente nos olhos. Outras culturas
possuem outras regras, como um diretor de uma escola de New York City des-
cobriu recentemente.
Uma jovem estudante porto-riquenha de quinze anos foi pega no ban-
heiro com um grupo de meninas por suspeita de terem fumado. As meninas
do grupo eram, em sua maioria, conhecidas por indisciplina. Mas, essa jovem,
Livia, não tinha nenhuma advertência, e no entanto o diretor, após uma breve
entrevista, convenceu-se de que ela era culpada e decidiu suspendê-la com
as outras.
— Não foi o que ela disse — declarou ele mais tarde. — Foi simplesmen-
te a atitude dela. Havia algo de sorrateiro e suspeito nela. Ela não me olhava
nos olhos.
Era verdade. Durante a entrevista com o diretor Livia fixou o olhar no
chão, numa atitude que admitia claramente sua culpa, e se recusou a olhar
para ele.
— Mas ela é uma boa menina — a mãe de Lívia insistia. Não era essa a
opinião do diretor da escola. Ele a considerava uma arruaceira e certamente
ela não procuraria as autoridades para protestar contra a suspensão que rece-
bera. Mas, para surpresa dele, ela procurou os vizinhos e amigos. Houve uma
manifestação de pais porto-riquenhos em frente à escola no dia seguinte, e
sérios prenúncios de um tumulto ameaçador.
Felizmente, John Flores ensinava literatura hispânica na escola e morava
muito próximo da família de Livia. John tomou coragem e pediu uma entre-
vista com o diretor.

97
— Conheço Livia e seus pais — disse ele ao diretor. — E ela é uma boa
menina. Tenho certeza de que houve um engano.
— Se houve algum engano — o diretor disse inquieto —, ficarei feliz em
retificá-lo. Há trinta mães lá fora, gritando, querendo a minha cabeça. Mas, eu
mesmo fiz perguntas à menina e parecia estar escrito 'culpada' no rosto dela,
ela nem olhava em meus olhos!
John deu um suspiro de alívio e então, com muito tato, pois ele era novo
demais na escola para cometer qualquer deslize, explicou alguns fatos bási-
cos da cultura de Porto Rico ao diretor.
— Em Porto Rico uma menina educada, uma boa menina — ele explicou
—, não olha diretamente para um adulto. Recusar-se a fazer isso é sinal de res-
peito e obediência. Seria tão difícil para Livia olhar diretamente para o senhor
quanto o seria para ela comportar-se mal, ou para a mãe dela procurá-lo para
fazer uma reclamação. Em nossa cultura, este é exatamente o comportamen-
to aceito para uma família respeitável.
Felizmente, o diretor era um homem que sabia admitir o que estava erra-
do. Chamou Livia e seus pais e os vizinhos mais exaltados até a diretoria e dis-
cutiu o problema mais uma vez. A explicação de John Flores deixou claro para
ele que Livia não estava evitando seus olhos por desacato, mas por respeito.
O que interpretou como um ar sorrateiro, ele agora percebeu, era timidez. De
fato, à medida que a conversa se desenrolou e os pais se acalmaram, ele per-
cebeu que Livia era mesmo uma menina doce e gentil.
O resultado de todo o incidente foi um relacionamento mais profundo e
significativo entre a escola e a comunidade — mas essa é uma outra história,
é claro. O que é de interesse particular nessa história é a estranha confusão do
diretor. Como ele interpretou tão mal todos os sinais do comportamento de
Livia?
Livia estava usando a linguagem do corpo para dizer: "Sou uma boa
menina. Respeito-o e à escola. Respeito-o demais para responderás suas per-
guntas, demais para olhar em seus olhos com coragem, sem vergonha, demais
para me defender. Mas, certamente, minha atitude lhe diz tudo isso".
Como uma mensagem tão clara poderia ser interpretada como "Eu o
desafio. Não responderei ãs suas perguntas. Não olharei em seus olhos por-
que gosto de enganar os outros. Serei esperta e evitarei responderás suas per-
guntas. .."
A resposta, evidentemente, é cultural. Culturas diferentes têm costumes
diferentes e, evidentemente, diferentes linguagens corporais. Elas também
atribuem olhares e significados diferentes aos mesmos olhares.
Nos Estados Unidos, por exemplo, um homem não deve olhar para uma
mulher demoradamente, a menos que ela lhe dê permissão por meio de um
sinal da linguagem do corpo, um sorriso, um olhar para trás, um encontro dire-
to dos olhos. Em outros países, aplicam-se regras diferentes.

98
Nos Estados Unidos, se uma mulher olha para um homem demorada-
mente, ela facilita uma aproximação verbal. O sinal dela diz:"Estou interessa-
da. Vocêpode se aproximar de mim". Em países latinos, embora movimentos
mais livres do corpo sejam permitidos, tal olhar poderia ser um convite dire-
to e um "sinal verde" para avançar fisicamente. Torna-se óbvio, então, por que
uma menina como Livia não olharia nos olhos do diretor.
Novamente, nos Estados Unidos, dois homens não têm permissão para
olhar um para o outro por mais que um breve período de tempo, a menos que
desejem brigar ou se tornar íntimos. Qualquer homem que olhe para outro
homem por muito tempo provoca constrangimento e o outro homem come-
ça a querer entender o que ele deseja.
Esse é outro exemplo da rigidez das regras do olhar. Se alguém olha para
nós e olhamos para os olhos dessa pessoa fixamente, é dever dela desviar o
olhar primeiro. Se ele não desviar o olhar enquanto lhe dirigimos o nosso
olhar, ficaremos constrangidos e saberemos que algo está errado. Outra vez,
isso nos deixa embaraçados e incomodados.

Um olhar demorado para si mesmo

Na tentativa de descobrir como algumas dessas regras de comunicação


visual funcionam, o dr. Gerhard Nielson, de Copenhagen, analisou os "olha-
res" dos sujeitos em seus estudos de autoconfrontação. Para descobrir quan-
to tempo, e quando, as pessoas sendo entrevistadas olharam para o
entrevistador, ele filmou entrevistas e passou-as várias vezes em câmara lenta.
Embora ele começasse com uma idéia vaga do tempo que um homem
olharia para outro durante uma entrevista, ficou surpreso ao descobrir como
havia poucos olhares. O homem que olhava para seu entrevistador mais tem-
po, ainda desviava o olhar 27% das vezes. O homem que olhava menos para
o entrevistador desviava o olhar 92% das vezes. Metade das pessoas entrevis-
tadas desviavam o olhar metade das vezes, enquanto estavam sendo entrevis-
tadas.
O dr. Nielson constatou que quando as pessoas falavam muito, olhavam
muito pouco para seus parceiros; quando elas ouviam muito, também olha-
vam muito. Ele relata que esperava mais, mas ficou surpreso ao constatar que
eles olhavam menos quando falavam mais.
Ele descobriu que quando as pessoas começam a falar, desviam o olhar
de seus interlocutores primeiro. Há um momento sutil, ele explica, no falar,
ouvir, olhar e desviar o olhar. A maioria das pessoas desvia o olhar imediata-
mente antes ou depois de começar a falar, uma de quatro vezes em que falam.
Poucos desviam o olhar metade das vezes em que começam a falar. Quando
acabam de falar, metade das pessoas olha para seus interlocutores.

99
Quanto ao motivo pelo qual as pessoas se recusam a olhar nos olhos de
seus interlocutores durante uma conversa, o dr. Nielson acredita que essa é
uma maneira de evitar distração.

Quanto tempo dura um olhar?

Outro estudo, conduzido pelo dr. Ralph V. Exline na University of


Delazare, envolveu 40 homens e 40 mulheres, todos calouros e segundanis-
tas. No estudo, um homem entrevistou 20 homens e 20 mulheres e uma
mulher entrevistou 20 de cada sexo. Metade dos estudantes foi questionada
por entrevistadores sobre assuntos íntimos, seus planos, desejos, necessida-
des e temores. A outra metade respondeu a perguntas sobre interesses de la-
zer, leitura, filmes, esportes.
O dr. Exline constatou que quando os estudantes eram entrevistados
sobre assuntos pessoais, eles não olhavam para o entrevistador com a mesma
freqüência que o faziam ao serem entrevistados sobre assuntos relacionados
a lazer. As mulheres, entretanto, em ambos os tipos de entrevista, olhavam
para os entrevistadores com mais freqüência que os homens.
O que parece ficar claro de ambos os estudos, e de outros de natureza
similar, é que quando alguém desvia o olhar enquanto está falando, isso geral-
mente significa que está expondo uma idéia e não quer ser interrompido.
O cruzamento de olhares nesse ponto seria sinal de interrupção quando
ele fizesse a pausa. Se ele faz uma pausa e não olha para a pessoa com quem
está conversando, significa que ele não terminou ainda. Está sinalizando: "É
isto o que eu quero dizer. O que você acha?'
Se você desvia o olhar da pessoa que está falando com você enquanto
está ouvindo, isso indica: "Não estou totalmente de acordo com o que você está
dizendo. Tenho algumas observações'.
Se você desvia o olhar enquanto está falando, isso pode significar: "Não
estou certo do que estou dizendo".
Se, enquanto está ouvindo, você olha para o interlocutor, sinaliza:"Con-
cordo com você', ou "Estou interessado no que você está dizendo".
Se, enquanto você está falando, olha para o ouvinte, pode estar sinalizan-
do: "Estou certo do que estou dizendo".
Há também elementos de ocultação quando se desvia o olhar do compa-
nheiro. Se você desvia o olhar enquanto ele está falando, você está sinalizan-
do: "Não quero que você saiba o que eu estou sentindo". Isso acontece
principalmente quando o parceiro é crítico ou insultante. É algo como um
avestruz enterrando a cabeça na areia. "Se não posso vê-lo, você não pode me
machuca f .
É por essa razão que as crianças se recusam a olhar quando estão sendo
repreendidas.

100
Entretanto, há mais complexidades aqui que o encontro de olhares... ou
o olhar de relance. Desviar o olhar durante uma conversa pode ser um meio
de esconder algo. Portanto, quando alguém desvia o olhar, podemos pensar
que ele está escondendo algo. Para enganar os outros, podemos olhar delibe-
radamente para nosso parceiro em vez de nos recusar a olhar para ele.
Além da duração e da direção dos olhares, há muitos sinais envolvidos
quando se fecham as pálpebras. Além do olhar com os olhos semicerrados
descritos por Ortega, Birdwhistell afirma que cinco jovens enfermeiras, numa
série de testes, relataram vinte e três posições diferentes do fechamento das
pálpebras que elas puderam distinguir.
Mas, concordaram que apenas quatro das vinte e três "significavam algu-
ma coisa". O novo teste permitiu que o dr. Birdwhistell rotulasse essas quatro
posições: "olhos abertos, pálpebras arqueadas, olhar de soslaio, olhos semicer-
rados".
Realizar o trabalho oposto, tentando fazê-las reproduzirem as posições
das pálpebras, não teve muito sucesso. Todas puderam reproduzir cinco das
vinte e três posições, mas apenas uma conseguiu reproduzir mais de cinco.
Usando um grupo de homens no mesmo tipo de experimento, ele verifi-
cou que todos podiam reproduzir pelo menos dez posições. Os homens
tinham mais facilidade para piscar, o que não era esperado. Alguns dos
homens conseguiam reproduzir quinze posições diferentes, e um — fantasti-
camente eloqüente em linguagem do corpo — chegou a trinta e cinco posi-
ções diferentes das pálpebras.
Ampliando o estudo para fazer comparações culturais, o dr. Birdwhistell
verificou que entre os japoneses, ambos os sexos eram similares no número
de posições das pálpebras que conseguiam reproduzir. Mas, mesmo os japo-
neses podiam reconhecer, nos outros, mais posições do que eram capazes de
reproduzir.
Quando o movimento das sobrancelhas é acrescentado ao movimento
das pálpebras, um número maior de sinais reconhecíveis é produzido. Alguns
cientistas verificaram até quarenta posições diferentes das sobrancelhas,
embora a maioria concorde que menos da metade delas é significativa. É ape-
nas quando movimentos significativos das sobrancelhas são combinados a
movimentos significativos das pálpebras e acrescentamos vincos da testa, que
as permutações e combinações são infindáveis.
Se cada combinação tem uma implicação diferente, então o número de
sinais que podemos transmitir com nossos olhos e a com pele em volta deles
é interminável.

101
Haverá uma linguagem das pernas?

À medida que a cinesiologia e a linguagem do corpo foram se tornando


mais conhecidas e entendidas, o que começou como curiosidade passou a ser
uma ciência, o que começou como um fato observável logo se tornou um fato
mensurável e, também, infelizmente, o que se tornou uma ciência também se
tornou uma situação sujeita a explorações.
Em momentos de stress, um bebê chupará o polegar, um homem roerá
as unhas ou morderá as juntas dos dedos, uma mulher levará a mão ao peito;
estes são gestos curiosos, mas uma compreensão da linguagem do corpo nos
faz perceber que a criança está sugando seu dedão para ter segurança, um
retorno simbólico ao conforto do seio da mãe. O homem passou a roer unhas
ou morder as juntas dos dedos, que são comportamentos socialmente aceitá-
veis, em lugar de chupar o polegar, que seria inaceitável, e a mulher leva a
mão ao peito de uma maneira defensiva, cobrindo e protegendo seus seios
vulneráveis. Na medida em que se busca compreender o significado desses
gestos, a curiosidade se torna uma ciência.
Saber que as pessoas levantam as sobrancelhas ou abaixam as pálpebras
para expressar uma emoção é um fato observável. Saber o grau exato em que
aquelas são erguidas ou o ângulo em que estas são abaixadas torna o fato
mensurável. O dr. Birdwhistell escreveu: "se associarmos a expressão 'olhar
desanimado' a 'erguimento bilateral da porção mediana da sobrancelha'
teremos um significado diferente do que se associarmos 'olhar desanimado' a
um erguimento unilateral da parte baixa da sobrancelha''. Da observação,
podemos afirmar que quando os olhos estão entreabertos e as pontas das

102
sobrancelhas estão erguidas, o rosto parece diferente do que quando os olhos
estão entreabertos e uma sobrancelha está ligeiramente erguida.
Infelizmente, a cinesiologia, ao relacionar fatos para se tornar uma ciên-
cia, também corre o risco de ser explorada. Por exemplo, o que podemos di-
zer quando alguém cruza as pernas? No início do livro falamos do uso de
pernas cruzadas para incluir ou excluir inconscientemente os participantes de
um grupo. Vimos como elas também podem ser usadas para se sentar da mes-
ma maneira, quando uma pessoa numa sala estabelece um padrão postural e
as outras a imitam. Se o líder cruza as pernas, os outros também cruzarão.
Cruzar as pernas também pode expressar caráter? Será que, da forma
como posicionamos as pernas ao sentar, damos uma pista de nossa natureza
interior?
Como acontece com todos os sinais da linguagem do corpo, não há uma
resposta simples, do tipo sim ou não. Cruzar as pernas ou mantê-las paralelas
pode ser um sinal do que a pessoa está sentindo, de seu estado emocional no
momento, mas também pode não ter significado algum. Tenho um amigo que
é escritor e escreve à mão. Ele cruza as pernas, colocando a perna esquerda
sobre a direita, e nunca o contrário. Numa reunião social recente, meu amigo
estava sentado à esquerda de sua esposa, a perna esquerda sobre a direita,
apontando para ela. A perna direita dela, cruzada sobre o joelho esquerdo,
apontava para ele.
Um psicólogo amador no grupo observou o casal e disse: "Vejam, eles
formam um círculo fechado, com as pernas cruzadas apontando um para o
outro e excluindo o resto do grupo — uma perfeita ilustração da linguagem
do corpo ".
Chamei meu amigo escritor de lado e disse:
— Sei que você se dá bem com sua esposa, mas não entendi bem esse
jogo de cruzar as pernas.
— Eu só consigo cruzar as pernas colocando a esquerda sobre a direita.
É porque escrevo meus primeiros rascunhos à mão, em vez de usar máquina
de escrever — ele explicou sorrindo.
— Mas, o que isso tem a ver com o jeito que você cruza as pernas?— per-
guntei, sem entender.
— Só posso cruzar a esquerda sobre a direita porque a vida toda cruzei
as pernas dessa maneira, e os músculos e ossos de minhas pernas se acostu-
maram a isso. Se eu cruzar da outra forma, sinto-me desconfortável. Agora,
automaticamente, cruzo minha perna esquerda sobre o joelho direito.
— Mas, como escrever à mão...?
— É simples. Não escrevo na mesa. Escrevo numa poltrona. Escrevo
sobre uma prancha que equilibro em meu joelho. Para erguer a prancha o sufi-
ciente, de modo que consiga escrever, preciso cruzar as pernas. Como sou
destro, escrevo voltado para o lado esquerdo. Portanto, cruzo as pernas de

103
forma que a esquerda fique mais alta, sobre a direita. Eu sempre fiz isso, e ago-
ra é a única posição na qual me sinto confortável. Por acaso, sentei-me à
esquerda de minha mulher. Outras noites, posso sentar-me à direita dela.
A moral aqui é que antes de fazer qualquer hipótese científica, todos os
fatos devem ser conhecidos. Para associarmos qualquer significado a pernas
cruzadas, devemos estar conscientes da condição fisiológica do corpo. O mes-
mo podemos dizer de braços cruzados. Há uma tentação terrível de atribuir
uma série de significados à direção em que cruzamos os braços. Parece ter
sido estabelecido que cruzar os braços às vezes é um gesto defensivo, um sinal
de que você não quer aceitar o ponto de vista de outro, ou então um sinal de
que você está inseguro e deseja se defender. Agora, essas e algumas outras
interpretações são válidas, mas quando nos referimos à direção em que estão
cruzados, o esquerdo sobre o direito ou o contrário, estamos num terreno
perigoso.
Cruze os braços sem pensar. Alguns de vocês colocarão o braço esquer-
do sobre o direito, alguns farão o contrário e, o mais importante de tudo, você
sempre cruzará os braços da mesma forma. Se cruzá-los de outro modo, se
sentirá estranho. Isso porque a forma em que cruzamos nossos braços, pon-
do o esquerdo sobre o direito ou o inverso, é um traço genético, um traço ina-
to, da mesma forma que usar a mão direita ou esquerda para escrever.
Entrelaçar os dedos das mãos também é genético. É o polegar da mão direita
ou esquerda que fica em cima?
Levando esses pontos em consideração, podemos ter alguma base ao
usar o gesto em si como sinal, mas estamos em terreno incerto quando fala-
mos da direção dos braços.
Os estudos mais sérios da linguagem do corpo se preocuparam com as
emoções transmitidas pelo movimento, e não com a natureza inata da pessoa
que transmite a mensagem. Na melhor das hipóteses, o sinal enviado, a lin-
guagem do corpo, foi usado para fazer a pessoa entender a si mesma. Quan-
do é usado para tentar determinar a personalidade ou o caráter em vez do
comportamento, parece cheio de contradições.

O ABC da linguagem do corpo

Numa tentativa de esboçar certos aspectos da linguagem do corpo e uni-


ficar a ciência, ou talvez de tornar a linguagem do corpo uma ciência, o dr. Ray
Birdwhistell escreveu um manual de pesquisa preliminar sobre o assunto, que
ele chama de An introduction to kinesics (Uma introdução à cinesiologia).
Basicamente, ele tentou reunir um sistema de notação para a cinesiologia, ou
a linguagem do corpo, para subdividir todos os movimentos relevantes em
seus movimentos básicos e atribuir-lhes símbolos — da mesma forma que um
coreógrafo divide a dança em passos básicos e atribui um símbolo a cada um.

104
O resultado é um pouco semelhante a pictogramas egípcios, mas, feliz-
mente, não tão difíceis de ler. Começando com os olhos, visto que eles são a
fonte mais comum de comunicação em linguagem do corpo, ele decidiu que
O é o melhor símbolo para indicar olhos abertos, — para olhos fechados.
Uma piscadela do olho direito então, fica ( — O ) , do olho esquerdo ( o —)•
Olhos abertos são ( O O) e assim por diante. O dr. Birdwhistell chama cada
um desses movimentos de um cine, ou o menor movimento que se possa
registrar.
A primeira premissa no desenvolvimento desse tipo de sistema de
notação para a linguagem do corpo, diz Birdwhistell, é supor que todos os
movimentos do corpo tenham significado. Nenhum deles é acidental. Uma
vez aceito esse pressuposto, podemos proceder a um estudo de todo movi-
mento. de seu significado e tentar rotulá-lo.
Acho que essa suposição básica é a mais difícil de aceitar. Talvez coçar o
nariz seja uma indicação de discordância, mas pode indicar que o nariz está
coçando. É aí que reside o verdadeiro problema em cinesiologia, em separar
os gestos insignificantes dos importantes, os significativos dos puramente
aleatórios, ou dos cuidadosamente aprendidos.
Quando uma mulher se senta com as pernas inclinadas, paralelas e ligei-
ramente cruzadas nos tornozelos, isso pode indicar uma mente organizada,
mas é muito mais provável que seja uma posição afetada ou mesmo um trei-
namento da escola de etiqueta. Certas escolas consideram essa pose femini-
na e graciosa, e sugerem que as mulheres se condicionem a se acomodarem
assim ao se sentar. Também é uma pose que permite a uma mulher com minis-
saia sentar-se numa posição confortável mas não tão reveladora. Nossas avós
consideravam essa pose "muito elegante".
Essas são algumas das razões por que devemos abordar a cinesiologia
com cautela, e estudar um movimento ou gesto apenas em termos do padrão
total do movimento e devemos entender o padrão do movimento em termos
da linguagem falada. Os dois, embora às vezes sejam contraditórios, são inse-
paráveis.
Para padronizar os movimentos corporais antes de torná-los pictogramas
cinésicos, devemos ter um ponto zero ou de repouso. Um movimento do
braço, por exemplo, só é significativo se soubermos a distância que abrange.
A única forma de determinarmos isso é estabelecendo um ponto zero padrão.
No trabalho do dr. Birdwhistell, ele fixou um ponto zero para "america-
nos de classe média". Esse é o estado semi-relaxado do corpo, a cabeça equi-
librada e voltada para frente, os braços ao lado do corpo e as pernas juntas.
Qualquer posição perceptível é um movimento distinto desse ponto zero.
É significativo que o dr. Birdwhistell limita seu trabalho a americanos da
classe média. Ele reconhece que mesmo em nossa cultura há uma falta sur-
preendente de uniformidade no movimento corporal. Pessoas da classe tra-

105
balhadora darão certas interpretações a movimentos, e essas não se aplicarão
aos círculos da classe média.
Entretanto, nos Estados Unidos, parece haver mais diferenças étnicas do
que de classe nos gestos. Embora ele não diga isso especificamente, suponho
que o dr. Birdwhistell esteja basicamente preocupado com a linguagem do
corpo de norte-americanos anglo-saxões, brancos, protestantes, da classe
média. Se assim for, seu estudo apresenta aos estudantes do assunto uma
quantidade imensa de dados. Eles devem absorver um sistema de interpreta-
ção não só para os americanos protestantes anglo-saxões, mas também para
ítalo-americanos, americanos judeus, indígenas, negros e assim por diante. Se
fosse elaborado um sistema diferente para cada uma dessas categorias, o
número total de sistemas seria excessivo. Deve ser encontrado um sistema
comum que possa ser aplicado a todas as culturas e a todos os grupos étnicos,
e acho que, com alguma variação, o sistema do dr. Birdwhistell cumprirá esse
papel.
O dr. Birdwhistell também ressalta que um movimento do corpo pode
não ter significado num contexto e, no entanto, ser extremamente significati-
vo em outro. Por exemplo, quando franzimos a testa e formamos vincos entre
os olhos, podemos simplesmente marcar uma idéia numa sentença ou, isso
poderia ser sinal de perturbação ou, ainda em outro contexto, de concentra-
ção profunda. Examinar a face isoladamente não nos dirá o sentido exato do
franzir da testa. Devemos saber o que aquele indivíduo está fazendo.
Outro ponto que o dr. Birdwhistell ressalta é que todos os nossos movi-
mentos significativos são aprendidos. São assimilados como parte da socieda-
de. Como ilustração da capacidade de aprendizagem dos seres humanos, ele
faz considerações sobre o movimento cinésico mais comum: aquele das pál-
pebras. Tendemos a pensar que os movimentos das pálpebras são movimen-
tos reflexos. Apertamos os olhos para nos proteger do excesso de luz, ou
piscamos para evitar que alguma poeira entre em nossos olhos, e também para
limpar o globo ocular.
Contradizendo isso, o dr. Birdwhistell cita os inúmeros casos de movi-
mento ocular aprendido. Os faquires nos cultos religiosos indianos podem
aprender a olhar para o sol sem piscar, ou enfrentar uma nuvem de pó sem
fechar os olhos. As meninas em nossa sociedade aprendem a "piscar quando
estão interessadas em alguém, mesmo quando não há necessidade de limpe-
za do globo oculaf. Ele sugere que exemplos como esses provam que nem
todo o movimento da pálpebra é instintivo e, ele acrescenta, que a movimen-
tação da pálpebra varia de uma cultura para outra, da mesma forma que a lin-
guagem.
O fato interessante aqui é que, quando uma pessoa bilíngüe muda o idio-
ma, também muda sua linguagem do corpo, seus gestos e os movimentos da
pálpebra.

106
Rotulando os cines *

Mesmo que, como mostramos num capítulo anterior, alguns gestos sejam
genéticos e não aprendidos—sorrisos, por exemplo — o dr. Birdwhistell enfa-
tiza que entre os homens a comunicação é uma arte aprendida e, visto que a
cinesiologia estuda os movimentos corporais que comuniquem alguma coisa,
podemos supor que a maioria dos movimentos também seja aprendida.
Apesar do fato de que a maioria das análises que o dr. Birdwhistell faz do
movimento corporal vem do estudo de filmes, passados repetidas vezes até
que traços casuais sejam reconhecidos e rotulados, ele faz uma advertência
para que não se confie demais nesse método. Se precisamos filmar o movi-
mento e exibir o filme repetidas vezes em câmera lenta para analisá-lo, até
conseguirmos notar certos movimentos — qual o valor do movimento que
descobrimos? Um movimento só será significativo se for facilmente sinaliza-
do e recebido. Ele acredita que os pequenos gestos captados por filme e que
passam despercebidos pelo olho humano não podem ter muito significado na
comunicação.
Entretanto, há um possível valor subliminar nesses gestos. Constatamos
que muitas vezes as imagens enviadas depressa demais para serem percebi-
das pelo olho consciente são reconhecidas e absorvidas pelo olho inconscien-
te. Esse é o aspecto interessante no campo da comunicação subliminar.
O dr. Birdwhistell não só faz distinção entre os gestos que notamos e
aqueles que não notamos, mas também entre aqueles que temos consciência
de fazer e aqueles que fazemos inconscientemente. Há tantos movimentos
possíveis que podemos fazer a cada minuto, que quase ninguém tem ciência
de fazê-los ou observá-los. Além do mais, enviamos esses sinais contínuos e
os recebemos e, em resposta ao que recebemos, enviamos mais.
O mais importante a perceber sobre a linguagem do corpo, de acordo
com o dr. Birdwhistell, é que não há movimento isolado. Sempre faz parte de
um padrão. Um romancista pode escrever: "Ela piscou para ele". Mas, a afir-
mação só tem significado porque o leitor conhece todos os outros gestos que
acompanham o piscar de olhos, e sabe, no contexto da situação escrita, que
aquela piscada significa um convite ao flerte.
O dr. Birdwhistell considera uma piscadela como um cine, a menor medi-
da da linguagem do corpo. Esse cine específico pode ser descrito como "o
abaixar de uma pálpebra, enquanto se mantém a outra relativamente imó-
vel'. Esse tipo de descrição, incidentalmente, tende a extrair do cine todas as
emoções associadas. Torna-se um simples fechar de um olho em vez de um
sinal de flerte.

* No original kines, palavra de origem grega (kinesis) que indica movimen-


to. (N.T.)

107
No desenvolvimento de um sistema de "escrita" da linguagem do corpo,
é necessário extrair toda emoção do movimento observado. Também é neces-
sário elaborar um sistema experimental para gravar e duplicar os cines. Para
isso o dr. Birdwhistell usa um ator ou estudante com facilidade de se expres-
sar em linguagem do corpo para tentar projetar movimentos diferentes e seus
significados a um grupo de estudantes. Pede-se ao grupo para diferenciar os
movimentos, mas não para adivinhar o que significa cada um deles.
"Este significa algo diferente deste outro?' é a pergunta habitual. Dessa
forma, o gravador descobre quando uma pequena amplitude de movimento
projeta uma impressão diferente. Para aquele movimento extra ele pode,
então, atribuir um significado.
De uma grande série de tais experimentos, o dr. Birdwhistell conseguiu
separar cines diferentes, para dizer em que ponto um eme adicional modifica
todo o movimento.
Por exemplo, pediu-se a um ator para passar as seguintes expressões a
um grupo de estudantes:

Traduzindo em termos descritivos, essa expressão seria uma piscadela do


olho esquerdo e com o olho virado para o canto esquerdo. A boca é normal,
mas a ponta do nariz está voltada para baixo. Tenta-se, então, fazer uma
segunda expressão parecida ao grupo de observadores. Diagramada, seria
assim:

Descrição: é uma piscadela com o olho direito, com o olho virado para o
canto esquerdo, a boca normal e o nariz para baixo.
Os observadores comentaram, ao responder sobre as diferenças: "Pare-
cem diferentes, mas não significam nada diferente'.
Uma peça pertinente de informação é, então, acrescentada ao corpo cres-
cente de dados sobre cinesiologia. Não importa com que olho o indivíduo pis-
cou. O significado é o mesmo. Nem importa o lado para onde o olho se volta.
Tenta-se, então, dar uma terceira instrução aos observadores.

Na essência, essa é a primeira piscadela sem que se olhe de soslaio e com


a ponta do nariz para baixo. O grupo de observadores concordou que esse
era o mesmo que a primeira expressão. A ciência da cinesiologia agora enten-

108
de que um olhar de esguelha em geral não significa nada em linguagem do
corpo. Finalmente, tentou-se uma quarta variação.

Nessa expressão, a piscadela é a mesma e o olhar de esguelha é manti-


do, quando o olho se fecha. A ponta do nariz é voltada para baixo, mas a boca
muda. Volta-se para baixo, de maneira pronunciada. Quando essa expressão
é demonstrada ao grupo, seu comentário é: "Bem, isso muda as coisas".
O dado que então vai para o arquivo cinésico é, uma mudança na posi-
ção da boca altera o significado.
Aqui, um estudo científico cuidadoso confirma o fato de que é menos
provável a comunicação vir de qualquer mudança do olho em si, do que de
uma mudança na face. Pensaríamos que olhar de esguelha e piscar alternada-
mente transmitiria significados diferentes, mas o dr. Birdwhistell mostra que
isso não acontece. Uma mudança real na expressão só é conseguida quando
a boca muda.
Evidentemente, ele não avalia a mudança da sobrancelha nessa seqüên-
cia. Se avaliasse, uma ligeira mudança em uma das sobrancelhas sinalizaria
um significado bem diferente. Erguer uma sobrancelha é um sinal clássico de
dúvida, erguer ambas as sobrancelhas, de surpresa, e abaixá-las indica inquie-
tação e suspeita.
O médico constatou que piscar ou fechar um olho, era significativo para
transmitir uma emoção. Olhar de esguelha não era significativo quando a boca
se mantinha na posição normal. Um olhar de esguelha com a boca pronun-
ciada, entretanto, era significativo. A ponta do nariz para baixo não significa-
va nada no contexto do piscar de olhos, mas em outros contextos era um sinal
significativo.

Cultura e cinesiologia

O rosto, como podemos ver, apresenta uma enorme variedade de expres-


sões possíveis, e quando voltamos um pouco atrás para considerar a cabeça,
acima e além da face, outro conjunto de movimentos se torna possível.
Acenos, tremores, giros, saltos, tudo isso é significativo. Mas, todos esses
movimentos possuem significados diferentes quando combinados a diferen-
tes expressões faciais e em diferentes situações culturais.
Um amigo meu leciona numa escola de pós-graduação onde há muitos
estudantes da índia. Esses estudantes, ele me diz, mexem a cabeça para cima
e para baixo para indicar não, e de um lado para outro para indicar sim. "Às
vezes acabo me distraindo quando explico um ponto extremamente compli-
cado e eles sinalizam o que eu entendo ser um 'não', mostrando estarem de

109

u c j j LI* t* rrrmwi
acordo com a idéia, e o que eu interpreto como um 'simquando discordam.
No entanto, sei que é apenas um problema cultural. Na verdade, eles estão
sinalizando o oposto do que eu recebo, mas isso não facilita as coisas para
mim. Sou tão doutrinado culturalmente que não consigo aceitara contra-
dição."
A doutrinação cultural em termos de linguagem do corpo é muito difícil
de superar. Conheço um professor de matemática em uma universidade que
originalmente estudava o Talmude na Alemanha e saiu no início da década de
30. Até hoje, quando leciona, retoma a postura de "orar" do estudante do Tal-
mude, culturalmente orientada. Ele se inclina para frente, curvando o corpo a
partir da cintura, e então levanta-se na ponta dos pés e se ergue, arqueando o
corpo para trás.
Mesmo quando lhe fizeram uma observação quanto à sua postura, de
uma forma jocosa, o professor não conseguiu controlar seu movimento cor-
poral. Não podemos subestimar a força dos traços culturais na linguagem
do corpo. Na Alemanha, durante o Nazismo, os judeus que tentavam pas-
sar por não-judeus muitas vezes se traíam pela linguagem do corpo. O
movimento das mãos deles eram mais soltos e abertos que o das mãos dos
alemães, e ao se disfarçarem, esses movimentos das mãos eram os mais difí-
ceis de controlar.
Devido a essa diferença cultural, um observador de uma nacionalidade
pode ver coisas na linguagem do corpo que passam completamente desper-
cebidas para alguém de nacionalidade diferente.

A descrição acima, olhos abertos com uma contração da parte média da


sobrancelha, narinas fechadas e a boca em repouso, seria a mesma para um
americano que a que vemos a seguir.

Entretanto, para alguém de origem italiana, haveria uma diferença sutil


na omissão da contração da parte média da sobrancelha. A primeira expres-
são poderia sugerir inquietação ou apreensão. A pista final, em cada caso, teria
de vir do contexto em que a expressão ocorreu.
É sempre um caso de complementaridade, como o dr. Birdwhistell enfa-
tiza, a linguagem do corpo no contexto da linguagem falada, dando pistas
para a ação e para o entendimento da mensagem. E, no entanto, não importa
qual seja a linguagem falada, a linguagem do corpo muitas vezes pode ofere-
cer uma pista à dinâmica da verdadeira situação.

110
Siga o líder

O dr. Birdwhistell menciona o caso de uma turma de meninos adolescen-


tes. Três meninos da turma eram o que ele chamava de "fortes vocalizadores", o
que poderíamos chamar de "tagarelas". Ao filmar a ação desse grupo, ele desco-
briu que os três "tagarelas" emitiam de 72% a 93% de todas as palavras faladas.
Havia dois líderes no grupo. Um deles era um dos "tagarelas". Vamos
chamá-lo de Tom. O outro líder era um companheiro calado, Bob. De fato, ele
era um dos meninos mais quietos do grupo. A análise cuidadosa mostrou que
Bob emitia apenas cerca de 16% das palavras faladas. O que, então, o tornou
líder?
Ao responder a essa pergunta, podemos ainda ajudar a esclarecer uma
questão mais geral: como se chega à liderança? É a capacidade de dar ordens
e conversar com os outros? Se for isso, como podemos suspeitar com base na
liderança de Tom, o que dizer de Bob, que falava tão pouco e, no entanto, era
líder também?
A resposta, o dr. Birdwhistell suspeitava, poderia estar na linguagem do
corpo. A liderança de Bob lhe parecia ser de natureza cinésica.
Ao estudar as filmagens do grupo em ação, verificou-se que Bob, com-
parado aos outros meninos," engajava-se em poucos atos não-relacionados' .
Atos não-relacionados, conforme o dr. Birdwhistell explica, são aqueles que
tentam começar algo novo, ou seja, não-relacionado ao que está sendo feito.
" Vamos pescar", quando a turma está pensando em jogar beisebol, ou " Vamos
à cidade, até tal loja, dar uma volta", quando a turma está preparada para
andar pela praia.
Bob raramente sugeria ao grupo para fazerem algo que os garotos não
estivessem prontos ou dispostos a fazer. Ele conduzia o grupo na direção que
este estivesse disposto a tomar, em vez de tentar forçá-lo a seguir uma direção
totalmente diferente. " Vamos nadar", se todos eles estivessem sentados na
praia, ou " Vamos até tal loja", quando estavam próximos da cidade.
Esse exemplo nos dá uma boa lição sobre liderança. O líder de maior
sucesso, em turmas ou na política, é sempre aquele que prevê a ação deseja-
da e impulsiona as pessoas para ela, que faz as pessoas fazerem o que elas
querem fazer. Bob sabia como fazer isso.
Mas, o mais interessante, do ponto de vista da linguagem do corpo, é que
Bob era "cinesicamente maturo". Ele fazia menos movimentos corporais des-
necessários que os outros meninos. Não balançava os pés à toa. Ele não colo-
cava a mão na boca, nem coçava a cabeça ou batia com os dedos em alguma
superfície. A diferença entre maturidade e imaturidade, muitas vezes, é
expressa pela linguagem do corpo. Muitos dos movimentos corporais sem sig-
nificado real indicam imaturidade. Uma pessoa amadurecida move-se quan-
do precisa, e o faz intencionalmente.

111
O menino que é um líder nato, que lidera um grupo na direção por ele
desejada, também é maduro o suficiente para canalizar seus movimentos cor-
porais para áreas úteis. Ouvir é uma dessas áreas. Cinesicamente, Bob era um
bom ouvinte. Ele copiava a postura do menino que estava falando. Ele dirigia
a conversa, juntamente com os movimentos adequados da face e da cabeça, e
não mexia a perna ou os pés ou recorria a todos os sinais da linguagem do cor-
po de um jovem para expressar:"Estou inquieto, chateado, desinteressado".
Devido a essa capacidade para ouvir, no sentido da linguagem do corpo,
o restante do grupo procurava Bob para lhe contar seus problemas e confiava
nele quando ele dava uma sugestão. Mas, era estranho, ou talvez óbvio demais,
que embora Bob falasse menos que os outros, sabia conversar muito bem. E
possível que os traços da linguagem do corpo que o tornavam líder fossem
refletidos em sua fala. Quando ele conversava, o que ele dizia era acatado.
Refletindo sobre isso, o dr. Birdwhistell dividiu o corpo em oito partes para
facilitar a investigação desses "pequenos movimentos". Além da cabeça e da
face, com seus símbolos pictográficos, ele dividiu outras áreas: tronco e ombros,
braço epulso, mãos e dedos, quadris, perna e tornozelos, pés epescoço.
Os sinais especiais para o movimento em cada uma dessas partes são
combinados com vários sinais direcionais. Esses assinalam t para uma posi-
ção superior, \ para uma posição inferior, -» para a frente, para trás e —I
que indica a continuidade de qualquer movimento ou posição.
Mas, depois da exposição desse sistema a pergunta que surge, inevitavel-
mente, é: quanto um sistema de notação contribui para o estudo da linguagem
do corpo? É importante registrar um incidente em termos cinésicos? Mesmo
quando a notação é combinada com uma gravação das palavras faladas, cer-
tamente há um uso limitado para essa combinação e esse uso provavelmente
é limitado a alguns estudiosos.
Entretanto, tal sistema de notação não precisa ser confinado a situações
de registro para estudo. Poderia, como o sistema de notação para a dança, ser
usado para "atribuir um escore" para falas e gerar eficiência máxima em áreas
como política e ensino. Poderia ser usado por terapeutas para "avaliar quan-
titativamente" sessões de terapia e como referência ao que o paciente expres-
sou com seu corpo e também com sua boca. Poderia ser usado por atores e
animadores e mesmo por homens de negócio.
De fato, quando você começa a pensar nisso, há bem poucas situações a
que tal sistema de notação não se aplicaria. Ainda não se pode determinar se
o sistema do dr. Birdwhistell passará a ser adotado, mas, eventualmente,
poderá até ser necessário.

112

Vamos conversar com os animais

Os estudos de um casal de pesquisadores, R. Allen e Beatrice T. Gardner,


da Universidade de Nevada, mostraram o quanto a linguagem do corpo é anti-
ga e ressaltaram sua supremacia sobre a palavra falada. Ponderando os vários
fracassos dos psicólogos em ensinar macacos antropóides a falar, os Gardner
decidiram tentar ensinar gestos. A linguagem do corpo é parte natural de todo
o comportamento animal, eles raciocinaram, e os símios têm bastante familia-
ridade com a linguagem do corpo, o que lhes permite aprender a usar gestos
para a comunicação. Pode-se dizer isso principalmente com relação a símios
antropóides, porque apresentam destreza manual.
Os Gardner decidiram ensinar a uma chimpanzé jovem, chamada
Washoe, a linguagem de sinais usada pelos surdos-mudos na América do
Norte. A chimpanzé teve toda liberdade na casa dos Gardner e recebeu brin-
quedos e muito carinho e afeto, e era cercada de humanos que usavam ape-
nas a linguagem de sinais para se comunicar.
Washoe, como é típico dos chimpanzés, imitava muito rapidamente os
gestos da linguagem de sinais de seus amigos humanos, mas esse trabalho
paciente levou meses até que ela pudesse reproduzi-los sob comando. Ela era
incentivada a se expressar quando tocavam sua mão, e qualquer "dicção erra-
da" era melhorada pela repetição do sinal de forma exagerada. Quando
Washoe aprendia corretamente um sinal, ela era recompensada com cócegas.
Se era forçada a treinar demais, ela se rebelava fugindo ou atirando-se ao chão
e fazendo birra, ou mordendo a mão de seu treinador.
Depois de dois anos de trabalho paciente, Washoe aprendeu cerca de
trinta sinais. Considerava-se que ela havia aprendido um sinal se o usasse sozi-

113
nha, de uma forma apropriada, pelo menos uma vez por dia, durante quinze
dias. Washoe aprendeu a colocar a ponta dos dedos na cabeça para indicar
"mais", a chacoalhar a mão aberta para indicar "pressa" e a deslizar a palma
pelo peito para expressar "por favor".
Ela também aprendeu os sinais para chapéu, sapatos, calças e outros arti-
gos de vestuário e os sinais para bebê, cachorro e gato. O surpreendente é que
ela usava esses últimos sinais para novos bebês, cães ou gatos quando os
encontrava. Uma vez ela chegou a usar o sinal para cachorro ao ouvir um lati-
do. Ela também inventou algumas sentenças simples:" Vaidocê' quando quer
ser levada a um arbusto de framboesa e "Abre comida bebida" quando quer
algo da geladeira.
O experimento ainda continua a ser realizado, e Washoe está aprenden-
do novos gestos e os incluindo em novas sentenças. A velha idéia do dr. Dolit-
tle, de conversar com os animais, pode ser possível com a linguagem do
corpo.
Entretanto, alguns naturalistas ressaltam que a linguagem do corpo entre
animais não é algo novo. Os pássaros sinalizam disposição sexual por meio
de danças elaboradas de cortejo, as abelhas sinalizam a direção de uma fonte
de mel por meio de padrões de vôo e os cães fazem uma série de sinais, des-
de rolar e passar-se por mortos a sentar e pedir comida.
O que é novo no caso de Washoe é o ensino de uma linguagem a um ani-
mal, e a iniciação do animal aos sinais dessa linguagem. É lógico que a lingua-
gem de sinais dos surdos-mudos deveria funcionar onde a falada falhou. A
perda da audição e a eliminação do mundo dos sons aparentemente torna o
indivíduo mais sensível ao mundo dos gestos e movimentos. Se assim for,
então uma pessoa surda dever ter uma compreensão mais sensível da lin-
guagem do corpo.

Símbolos em um mundo sem sons

Com isso em mente, o dr. Norman Kagan da Michigan State University


conduziu um estudo entre surdos. Eles viam filmes de homens e mulheres em
várias situações e deveriam supor o estado emocional dessas pessoas e descre-
ver que pistas da linguagem do corpo eles usaram para fazer suas suposições.
Devido às dificuldades técnicas, eles eram incapazes de usar a leitura labial.
"Ficou evidente para nós", o dr. Kagan disse, " q u e muitas partes do cor-
po, talvez qualquer parte, em alguma extensão, reflitam o estado emocional
de uma pessoa"
Como exemplo, conversar enquanto mexia as mãos ou brincava com um
anel e se movimentar sem parar eram interpretados pelos surdos como ner-
vosismo, embaraço e ansiedade. Quando os olhos e a face de repente "caíam",

114
quando a pessoa parecia "reprimir" sua expressão, ou quando seus traços
"desmontavam", isso era interpretado como culpa.
Movimentos involuntários excessivos eram rotulados como frustração, e
o movimento de encolher o corpo, como se " alguém estivesse se escondendo",
expressava depressão. Jogar a cabeça e todo o corpo para a frente, inclusive
os braços e ombros, era visto como expressão de uma pessoa enérgica, e o
estado de tédio era inferido quando a cabeça se inclinava para o lado e os
dedos eram movimentados. Um estado reflexivo estava associado à intensi-
dade do olhar, uma testa enrugada e um olhar abatido. Não querer ver nem
ser visto era interpretado quando alguém tirava os óculos ou desviava o olhar.
Essas interpretações eram feitas pelos surdos, e o som não fazia parte das
pistas transmitidas; no entanto, as interpretações eram precisas. Os gestos
eram interpretados dentro do contexto global de uma cena, mas a cena era
projetada sem palavras. Parece que a linguagem do corpo sozinha pode ser-
vir como meio de comunicação, se, tivermos a habilidade de entendê-la, se for-
mos extremamente sensíveis a todos os diferentes movimentos e sinais. Mas,
isso requer a hipersensibilidade de uma pessoa surda. Sua visão tornou-se tão
acurada, sua busca de um grande número de pistas é tão intensa que o con-
texto global de uma cena pode ser transmitido a uma pessoa surda por meio
da linguagem do corpo.
O verdadeiro valor da linguagem do corpo, entretanto, ainda permane-
ce na mistura de todos os níveis de comunicação da linguagem oral, e tudo o
que for transmitido no mesmo comprimento de onda, com a linguagem visual
incluindo a linguagem do corpo e a auto-imagem, e a comunicação se fazen-
do por outras bandas. Uma dessas bandas é a tátil, que às vezes se superpõe
à visual, mas é realmente uma forma de comunicação mais primitiva e básica.
De acordo com o falecido dr. Lawrence K. Frank, de Harvard, o conhe-
cimento que uma criança tem desse mundo começa com o toque de sua
mãe. com afagos e beijos, o toque oral do bico do seio, o calor e a seguran-
ça de seus braços. A educação dela prossegue com uma doutrinação de "não
tocar", para enquadrá-la nos "direitos de propriedade" de sua cultura, para
ensinar-lhe a noção de posse e pertinência. Como criança e adolescente, o
toque em seu próprio corpo, suas aventuras com a masturbação — o toque
de si mesmo —, a exploração durante a juventude do toque do amor, a
exploração mútua com seu parceiro sexual, todos esses são aspectos da
comunicação tátil.
Mas, esses são aspectos óbvios. Também nos comunicamos por meio do
tato coçando, dando tapinhas nas costas ou pressionando a mão contra obje-
tos. Dizemos: "Tenho consciência de mim. Estou me dando prazer e satisfa-
ção". Nós nos comunicamos com os outros pelo aperto de mãos, segurando
as mãos dos outros e por meio de todos os tipos de toque, dizendo: "Fique
seguro. Fique ã vontade. Você não está sozinho. Eu amo você'.

115
O ponto em que a linguagem do corpo cede lugar à comunicação tátil é
difícil de identificar. As barreiras são incertas e indefinidas demais.

Saúde mental por meio da linguagem do corpo

Talvez o maior valor da compreensão da linguagem do corpo resida no


campo da psiquiatria. O trabalho de dr. Scheflen mostrou-nos o quanto é
importante para os terapeutas usar a linguagem do corpo de forma conscien-
te, e o dr. Buchheimer e outros aplicaram o entendimento da linguagem do
corpo às áreas da autoconfrontação.
O dr. Buchheimer faz um relato de um grupo de pacientes adultos que
receberam tinta para pintura a dedo, para usar como recurso terapêutico.
"Esperávamos que a sensação depintar, à medida que espalhavam a tinta pelo
papel, os libertasse de algumas inibições que tornavam o processo terapêu-
tico lento. Para ajudá-los a entender o que estva acontecendo, eles foram fil-
mados trabalhando e então viram os filmes."
Uma paciente, segundo ele, teve um primeiro casamento ruim, destruí-
do em parte por sua incapacidade de ter satisfação sexual. Agora, em seu
segundo casamento, ela sentia que sua vida sexual estava muito melhor, mas
seu casamento ainda não estava "bem consolidado".
Produzindo um borrão escarlate e roxo com a tinta para pintura a dedo,
de repente, ela gritou: 11 Como isso parece sexy/', e no mesmo instante ela cru-
zou as pernas.
Quando o filme foi passado e ela foi confrontada com sua reação ao con-
ceito tátil da sexualidade, não pôde acreditar que tivesse reagido daquela for-
ma. Mas, numa discussão do significado da perna cruzada em termos de
linguagem do corpo, ela concordou que essa era uma forma simbólica de se
fechar e recusar o sexo. Isso acontecia especialmente no contexto de suas
outras ações, seu comentário sobre a pintura "sexy". Ela admitiu que ainda ti-
nha conflitos sexuais. Começou a entender, daquele momento em diante, que
seu segundo casamento estava sendo abalado devido aos mesmos problemas
que o primeiro e, ao entender isso, ela foi capaz de tomar as medidas adequa-
das para resolver o problema.
Esse é um exemplo clássico de como, ao entender como usou o gesto
simbólico de uma linguagem do corpo, ela pôde perceber a extensão de seus
problemas. O dr. Fritz Perls, o psicólogo que originou a Gestalterapia (terapia
psiquiátrica que usa a linguagem do corpo como uma de suas ferramentas
básicas), diz de sua técnica: " Tentamos apreender o óbvio, a superfície das
situações em que nos encontramos.
A técnica básica da gestalterapia, de acordo com o dr. Perls, não consis-
te em dar explicações ao paciente, mas em propiciar a ele a oportunidade de
entender e descobrir por si só. Quanto a isso, o dr. Perls diz:"Desconsidero a

116
maior parte do conteúdo do que o paciente diz e concentro-me mais no nível
não-verbal, já que este é o único que está menos sujeito ao auto-engano". O
nível não-verbal, evidentemente, é o da linguagem do corpo.
Para exemplificar o que o dr. Perls quer dizer, vamos escutar, às escondi-
das, uma das sessões dele com uma mulher de trinta anos. Essas conversas
foram tiradas de um filme de treinamento psiquiátrico.
PACIENTE: Estou assustada agora.
TERAPEUTA: Você diz que está assustada, mas está sorrindo. Não entendo
como alguém pode estar assustado e sorrir ao mesmo tempo.
Confusa, o sorriso da paciente se torna trêmulo e desaparece.
PACIENTE: Também desconfio de você. Acho que você entende muito bem.
Acho que você sabe quando eu fico assustada e rio, ou brinco para dissimular.
TERAPEUTA: Bem, você tem medo de se apresentar em público?
PACIENTE: Não sei. Estou muito consciente de você. Tenho medo de — de
que você me atacará e tenho medo de que você vai me pressionar num canto
e tenho medo disso. Quero que você fique ao meu lado.
Ao dizer isso, a paciente bate no peito inconscientemente.
TERAPEUTA: Você disse que eu a prensaria num canto e você mesma bate
no peito.
O dr. Perls repete o gesto dela de bater, e ela olha para a mâo dela como
se a estivesse vendo pela primeira vez, então repete o gesto, pensativa.
PACIENTE: Ah...
TERAPEUTA: O que você gostaria de fazer? Você é capaz de descrever esse
canto para o qual você gostaria de ir?
Voltando a olhar para os cantos da sala, a paciente de repente o identifi-
ca como um lugar onde ela poderia estar.
PACIENTE: Sim. É naquele canto no fundo, em que você está totalmentepro-
tegido.
TERAPEUTA: Então, você estaria mais segura de mim lá?
PACIENTE: Bem, sei que na verdade não estaria. Talvez um pouco mais
segura.
Ainda olhando fixamente para o canto, ela faz um aceno com a cabeça.
TERAPEUTA: Se vocêpudessefazer de conta que estava naquele canto, o que
faria lá?
Por um instante, ela reflete. Uma frase casual, num canto, agora se tor-
nou uma situação concreta.
PACIENTE: Eu me sentaria lã.
TERAPEUTA: Só ficaria sentada?
PACIENTE: Sim.
P or quanto tempo você ficaria
TERAPEUTA: sentada?
Quase como se estivesse mesmo no canto, a paciente adotou a posição
de uma menininha num banco.

117
PACIENTE: Não sei, mas é engraçado que você esteja dizendo isso. Faz-me
lembrar de quando eu era pequena. Toda vez que tinha medo, me sentia
melhor num canto.
TERAPEUTA: Tudo bem, você épequena?
Outra vez, confusa, pois seu comentário se tornou gráfico.
PACIENTE: Bem, não, maséa mesma sensação.
TERAPEUTA: Você épequena?
PACIENTE: Essas sensações mefazem lembrar disso.
Forçando-a a enfrentar a sensação de ser uma menina pequena, o tera-
peuta continua.
TERAPEUTA: Você é uma menina pequena?
PACIENTE: Não, não, não!
TERAPEUTA: Não. Quantos anos você tem?
PACIENTE: Trinta.
TERAPEUTA: Então não é uma menina pequena.
PACIENTE: Não!
Numa cena posterior, o terapeuta diz:
TERAPEUTA: Se você sefizer de burra e tola meforçará a ser mais explícito.
PACIENTE: Já me disseram isso antes, mas não engulo essa.
TERAPEUTA: O que você está fazendo com os pés agora?
PACIENTE: Balançando.
Ela ri porque o movimento dos pés a faz perceber que está fingindo. O
terapeuta também ri.
TERAPEUTA: Você está brincando agora.
Mais tarde, a paciente diz:
PACIENTE: Você está me tratando como se eu fosse mais forte do que sou.
Quero que você me proteja mais, seja mais amável comigo.
A voz dela mostra irritação, mas mesmo ao dizer isso, ela sorri.
O terapeuta imita o sorriso dela.
TERAPEUTA: Vocêpercebe que está sorrindo? Você não acredita numapala-
vra que está dizendo.
Ele também sorri, para desarmá-la, mas ela balança a cabeça.
PACIENTE: Sim, acredito.
Ela tenta conter o sorriso, mas o terapeuta levou-a a reconhecer o fato de
que sorri.
PACIENTE: Sei que você não acha que eu estou...
TERAPEUTA: Sem dúvida. Você está blefando. Você éfalsa.
PACIENTE : Você acredita — você está fala ndo sério?
Agora o sorriso dela é incerto, está desaparecendo.
TERAPEUTA: Sim. Você sorri, dá risada ese retorce. Éfalso.
Ele imita os movimentos dela, fazendo-a vê-los refletidos nele.
TERAPEUTA: Você está representando.

118
PACIENTE: Ah, estou muito magoada por isso.
Os sorrisos e risadas se foram e ela demonstra irritação pela voz e pelos
movimentos corporais.
TERAPEUTA: Você é capaz de expressar isso?
PACIENTE: Sim. Pode ter certeza de que não estou sendo falsa. Admito que
é difícil mostrar meu constrangimento. Odeio ficar constrangida, mas estou
sentida por ter-me chamado defalsa. Sóporque sorrio quando estou constran-
gida ou me protejo num canto isso não significa que estou sendo falsa.
TERAPEUTA: Você está sendo você mesma neste instante.
PACIENTE: Bem, estou furiosa com você.
Ela sorri de novo.
TERAPEUTA: Agora isto! Isto!
Ele imita o sorriso dela.
TERAPEUTA: Você fez isso para encobrir sua raiva de você mesma? Nesse
momento, nesse exato momento, vqcê sentiu o quê?
PACIENTE: Bom, nesse momento eufiquei furiosa, mas não fiquei constran-
gida.
O importante nessa sessão é a forma com que o dr. Perls capta a lin-
guagem do corpo da paciente, seu sorriso, balanço, e mesmo o seu desejo de
se sentar num canto, e mostra isso para ela, forçando-a a enfrentar o simbolis-
mo de sua própria linguagem do corpo. Ele mostra a ela que o sorriso e a risa-
da são apenas uma defesa para amenizar seus verdadeiros sentimentos, a raiva
que ela não se permite sentir porque pode ser destrutiva demais. Só no final
ela fica tão irritada que rompe com o sorriso defensivo e se expressa verda-
deiramente. Essa é uma autoconfrontação.
O que a linguagem do corpo pode fazer com a autoconfrontação, como
esses incidentes mostram, é conscientizar uma pessoa sobre o que ela está
fazendo com seu corpo, que contradiz o que ela está dizendo com a boca. Se
você percebe o que está fazendo com o corpo, seu entendimento de si se tor-
na muito mais profundo e significativo. Por outro lado, se você consegue con-
trolar a linguagem do corpo, pode romper as barreiras defensivas com as quais
se protege.

Falseando a linguagem do corpo

Recentemente, observei uma adolescente muito bonita num baile e a vi


parada perto da parede com uma amiga. Estava arrogante, orgulhosa e inaces-
sível como a Branca de Neve.
Eu conhecia a menina, e sabia que ela era tudo, menos fria e orgulhosa.
Perguntei a ela, depois, por que ela havia ficado tão distante.
"Eu estava distante?' disse ela realmente surpresa. "E os meninos? Ne-
nhum deles se aproximou de mim nem conversou comigo. Eu estava morren-

119
do de vontade de dançar mas ninguém me convidou." Ela acrescentou um
pouco tragicamente: " Sou a única adolescente na escola que fica sozinha.
Veja a Ruth. Ela tem a minha idade e dançou todas as músicas, evocêaconhe-
ce. Ela é horrorosa".
Ruth é horrorosa. Gorda e nada atraente, mas, ah... o segredo! Ruth sorri
para todos os meninos. Ruth não tem defesa nenhuma, nem proteção. Ela faz
um menino se sentir bem e seguro. Eles sabem que se a convidarem para dan-
çar ela aceitará. A linguagem do corpo dela garante isso. Minha bela e jovem
amiga, tão fria aparentemente, esconde sua melancólica timidez. Ela sinaliza:
"Fique longe. Não sou acessível. Se quiser, arrisque-se e me convide para dan-
çar". Que adolescente se arriscaria a ser rejeitado? Eles respeitam os sinais e
procuram Ruth.
Com a prática, minha jovem amiga pode aprender a sorrir e amenizar a
beleza, para ficar mais acessível. Ela aprenderá a linguagem do corpo para
indicar aos meninos:"Podem me convidar para dançar, que eu vou aceitar.
Mas, primeiro, ela precisa entender os sinais. Ela precisa se ver da forma como
aparece aos outros, deve confrontar-se e só então terá condições de mudar.
Todos nós podemos aprender que se expressamos o nós que queremos
ser, o nós que estamos escondendo, então podemos nos tornar mais acessí-
veis e nos libertar.
Há muitas formas de fazer isso, formas de "falsear" a linguagem do cor-
po para atingir um objetivo. Todos os autores de livros de auto-ajuda, sobre
como fazer amigos, como fazer as pessoas gostarem de você, sabem da impor-
tância da linguagem do corpo e da importância de falseá-la adequadamente
para indicar: " Sou um grande sujeito. Sou legal. Quero ser seu amigo. Confie
em mim". Aprenda e aplique os sinais adequados para essas mensagens e
você garantirá o sucesso no convívio social.
As escolas de etiqueta sabem disso e usam a mesma técnica para ensinar
as meninas como se sentar e andar e ficar de pé com graça. Se você duvida
disso, assista a um concurso de Miss Universo e veja como as concorrentes
foram treinadas a usar a linguagem do corpo para parecer charmosas e atraen-
tes. Às vezes, isso fica um pouco chamativo, mas você deve dar a elas um "A"
pela tentativa. Os gestos delas são ensaiados e precisos. Elas sabem o quanto
pode ser transmitido pela linguagem do corpo.
Os políticos aprenderam o quanto é importante a linguagem do corpo, e
usam-na para enfatizar e dramatizar suas falas e também para projetar uma
personalidade ou imagem mais agradável e aceitável. Franklin D. Roosevelt e
Fiorello LaGuardia tinham um domínio instintivo disso. Apesar do fato de
Roosevelt ser deficiente físico e nunca permitir que seu corpo aparecesse
numa posição que mostrasse isso (tinha plena consciência do impacto da lin-
guagem do corpo, se sua deficiência fosse mostrada), ele conseguia usar a
linguagem do corpo para transmitir outra imagem, acolhedora e honesta, um

120
filho do povo, e tudo por meio de gestos e movimentos corporais, mediante
um conhecimento surpreendente do vocabulário da linguagem do corpo, e
nào apenas do inglês, mas também do italiano e do iídiche.
Alguns homens não conseguem dominar a linguagem do corpo, não
importa o quanto tentem. Lyndon Johson nunca teve sucesso nisso. Os movi-
mentos de seus braços eram sempre exageradamente estudados e controla-
dos, como se ele estivesse realizando uma seqüência de movimentos
decorados.
O uso exagerado de uma quantidade limitada de gestos da linguagem do
corpo faz Richard Nixon ser uma figura bastante explorada pelos mímicos,
que só precisam captar um ou dois gestos e acentuá-los para transmitir uma
imitação excelente.
O dr. Birdwhistell, em sua colaboração no livro Explorations in commu-
nication (Explorações em comunicação), afirma que um "lingüista-cinesiolo-
gista" bem-treinado seria capaz dcdizer os movimentos que um homem está
fazendo, simplesmente ouvindo sua voz.
Se isso for verdadeiro, então há uma forte associação entre palavras e
movimentos. Quando um orador aponta em certa direção, deve fazer uma
declaração correspondente ao gesto. Quando, por exemplo, Billy Graham
anuncia: " Você se arriscará a não ir para o céu...", ele aponta para cima; e
quando acrescenta:" Você vai direto para o inferno.r, o dedo aponta justamen-
te para onde podemos acabar indo.
Essa é uma associação muito óbvia e direta, uma ligação entre sinal e
palavra; porém, é adequada e aceita por todos.
Assim como há associações adequadas, é fácil entender que alguns
homens distorcem essas associações e usam-nas inconsistentemente. Alguns
fazem isso com palavras. Eles gaguejam e balbuciam ou elevam ou abaixam
demais a voz e tiram toda a força do que dizem. É fácil gaguejar ou balbuciar
cinesicamente, usando o gesto errado para a palavra errada.
A platéia pode ouvir suas palavras e entendê-las, mas uma boa parte da
mensagem será perdida ou distorcida, e você estará enfrentando uma platéia
"fria". Não haverá emoção em sua fala, nem empatia ou nenhum carisma.
Assim como a linguagem do corpo inadequada pode ser confusa, foi bem
clara anos atrás ao ser usada pelo comediante Pat Paulson. Fingindo ser can-
didato a um cargo político, ele fez paródias adoráveis dos então candidatos,
tirando toda emoção de sua voz e tornando-a monótona, não revelando
nenhuma expressão do rosto, para eliminar ainda mais a emoção e, então,
muito inteligentemente, enriquecendo sua performance com movimentos
corporais inadequados. O resultado era um desastre pseudopolítico.
Infelizmente, o mesmo desastre pode ocorrer na vida real, quando um
político é inibido ou esquisito demais, não conseguindo usar os gestos corre-
tos, ou simplesmente desconhecendo-os. William J. Fullbright e Arthur Gold-

121
berg fizeram pesquisas e deram importantes contribuições à política norte-
americana, mas, quando faziam pronunciamentos em público, usavam tão
mal a linguagem do corpo que eles pareciam desinteressantes e monótonos.
O mesmo se pode dizer de George McGovern e, em menor grau, de Eugene
McCarthy.
A popularidade de McCarthy era maior entre os jovens que se interessa-
vam mais pelo que ele dizia e não pela forma como o dizia. Mas, para a gran-
de maioria dos americanos, a verdade é que muitas vezes a forma como as
coisas são ditas, a linguagem do corpo usada, é mais importante que o que
está sendo dito.
O outro McCarthy, Joseph McCarthy, algumas décadas atrás, tinha um
apelo assustadoramente forte, e captava os fundamentos da linguagem do
corpo que muitos evangélicos fundamentalistas dominam.
Embora sua política fosse difícil para muitas pessoas engolirem, George
Wallace usou a linguagem do Corpo durante a campanha presidencial para
projetar uma imagem "honesta". Uma análise cuidadosa da atuação dele, prin-
cipalmente suprimindo-se o som da filmagem, deixa claro que sua linguagem
do corpo expressava enfaticamente o conteúdo de sua fala.
William Buckley, de Nova York, é um homem cuja filosofia política está
longe de ser de centro, mas sempre teve uma grande audiência em suas apre-
sentações na televisão, uma audiência que só é parcialmente de centro. Seu
apelo é em sua apresentação, e não no que propõe. Além da linguagem do
corpo mais óbvia das mãos e da postura, que serve aos políticos que são vis-
tos à distância, Buckley tem um excelente comando das nuances mais sutis da
linguagem do corpo. Ele usa a face com notável facilidade, ergue as sobran-
celhas, deixa os olhos entreabertos, arqueia os lábios e as bochechas e apre-
senta uma variedade constante de expressões.
O efeito global é de dinamismo e animação, e ele acrescenta um toque
de sinceridade a suas declarações.
John Lindsay deixa transparecer a mesma sinceridade, mas os movimen-
tos cinésicos são um pouco esquecidos, moderados, menos exagerados que
os de Buckley, e temos uma noção de calma e conforto e algo mais — uma
franqueza envolvente que vem da moderação do movimento cinésico.
Ted Kennedy tem a mesma facilidade cinésica, auxiliada, como no caso
de Lindsay e Buckley, pela boa aparência. Isso lhe permite projetar uma sin-
ceridade inocente que pode ser completamente incoerente com o que ele está
fazendo, mas ainda assim, derruba nossas defesas.
Pierre Trudeau, do Canadá, tem a mesma sinceridade, mas um grau maior
de animação — provavelmente um reflexo de sua descendência francesa —,
permitindo que ele acrescentasse outra dimensão à sua imagem política. É um
homem sofisticado, da cidade, até mesmo um playboy, mas no bom sentido.

122
Sua linguagem do corpo nos diz: "Veja, estou aproveitando tudo o que vocês
gostariam de aproveitar. E indiretamente divido esse prazer".
Quando você começa a identificar os estilos no homem, os gestos, movi-
mentos e mímica facial, começa a entender como todas as figuras políticas
confiam na linguagem do corpo para tornar as palavras e imagens aceitáveis.
Os realmente bons, bons no sentido de quem consegue projetar qualquer
emoção com o corpo, nunca tiveram de se incomodar com o que diziam. Sem-
pre foi a forma como faziam algo que importava.
Foram todos bons atores, e os bons atores devem saber como usar a lin-
guagem do corpo. Um processo de eliminação garante que apenas aqueles com
um comando excelente da gramática e do vocabulário obtenham sucesso.
Evidentemente, há exceções notórias. Nelson Eddy foi uma delas. Ele se
tornou ator na década de 30 por saber cantar, e como é o caso de muitos can-
tores, nunca aprendeu a linguagem do corpo. Algumas de suas atuações (ain-
da apresentadas em programas que passam de madrugada), mostram gestos
duros, o movimento dos braços semelhantes aos de um robô. Compare-o com
Gary Cooper. Ele também tinha uma movimentação dura, mas usava-a para
projetar solidez e masculinidade, pois captou inconscientemente os movi-
mentos apropriados da linguagem do corpo.

Juntando tudo

À medida que os fatos sobre a linguagem do corpo são estudados e ana-


lisados e esta vai sendo elevada gradualmente à ciência, torna-se disponível
como ferramenta no estudo de outras ciências. Um relato recente, da 55a Con-
venção Anual da Speech Association of America, realizado pelo professor
Stanley E. Jones, mostra que ele aplicou os princípios da linguagem do corpo
para questionar a afirmação do dr. Hall de que a diferença básica entre as cul-
turas residia na forma de elas lidarem com o espaço. Os latino-americanos,
segundo ele, ficam mais próximos quando conversam do que os chineses ou
negros, e os árabes ficam ainda mais próximos que os latinos.
O professor catedrático Jones, depois de trabalhar durante dois anos no
Harlem, Chinatown, Little Italy e Spanish Harlem, todas áreas étnicas de Man-
hattan, em New York City, conseguiu evidências de que esse padrão muda.
Ele acredita que as condições de pobreza forçaram esses grupos de pessoas a
mudar alguns de seus comportamentos culturais. De acordo com ele, há uma
cultura da pobreza que é mais forte que qualquer origem subcultural étnica.
O professor Jones, discutindo seu trabalho numa entrevista dada à impren-
sa, disse:"Quando comecei a estudar os padrões de comportamento desubcul-
turas vivendo no 'cadinho' de Nova York, esperava constatar que mantinham
as diferenças. Em vez disso, fiquei muito surpreso ao descobrir que a pobreza
condicionava esses indivíduos a se comportarem com semelhança marcante!'.

123
Em áreas com alta densidade habitacional, onde predominam casas
pobres, o professor Jones verificou que praticamente todos, independente-
mente da origem étnica, ficavam a cerca de 30 centímetros de distância.
Este é um exemplo de como a linguagem do corpo, como ciência em
desenvolvimento, pode ser aplicada a um estudo sociológico, numa tentativa
de se descobrir em que medida a pobreza afeta a cultura. Os achados do pro-
fessor Jones parecem indicar que a cultura dos pobres americanos supera a
etnia e as distinções nacionais. Os Estados Unidos se tornaram um cadinho
cultural, mas é a pobreza que derruba as barreiras para produzir uma lin-
guagem do corpo comum.
Seria interessante levar esse trabalho adiante e ver que outras áreas além
do espaço, são influenciadas pela pobreza, ou conduzi-lo em outra direção e
ver se a riqueza também rompe com as regras étnicas da linguagem do corpo.
As forças econômicas seriam mais fortes que as culturais?
Os futuros estudantes interessados em linguagem do corpo terão inúme-
ras possibilidades de estudá-la, e a beleza de tudo isso é que uma quantidade
mínima de equipamentos é necessária. Embora eu tenha conhecimento de
vários estudos sofisticados feitos com videoteipe e filmes de dezesseis milí-
metros e envolvendo dezenas de estudantes voluntários, também sei de um
projeto muito interessante realizado por um menino de quatorze anos cujo
quarto dava visão a uma cabine telefônica de uma rua de Nova York.
Ele usou uma câmera de oito milímetros para filmar o máximo de seqüên-
cias de pessoas usando a cabine, de acordo com a verba que dispunha para
isso, e então usou o projetor da família para projetar o filme em câmera lenta,
enquanto anotava e identificava cada movimento.
Conheço outro estudante, mais velho, aluno de doutorado, que está estu-
dando a forma como as pessoas desviam umas das outras numa rua movimen-
tada e numa não tão movimentada.
" Quando há espaço suficiente, ele explicou," eles esperam atéficarem a três
metros de distância e então cada um dá ao outro um sinal, para quepossam des-
viar um do outro, seguindo direções oposta^'. Ele ainda não descobriu o sinal exa-
to ou como é usado para transmitir qual a direção que cada um seguirá.
Às vezes, é evidente que os sinais são confundidos e as pessoas vão uma
de encontro à outra, e ambas movem-se para a direita e, então, para a esquer-
da, ao mesmo tempo, e ficam nessa dança tola até pararem e se desculparem,
seguindo em frente. Freud chamou isso de encontro sexual. Meu amigo
chama isso de gagueira cinésica.
A linguagem do corpo como ciência está na infância, mas este livro explo-
rou algumas de suas regras fundamentais. Agora que você as conhece, exami-
ne-se e faça um exame de seus amigos e sua família. Por que você se move do
jeito que o faz? O que isso significa? Você é dominador ou subserviente em seu

124
relacionamento cinésico com os outros? Como você lida com o espaço? Você
é dono de si ou deixa que os outros o controlem?
Como você lida com o espaço numa situação de negócios? Você bate na
porta de seu chefe e então entra? Aproxima-se da mesa dele e o domina, ou
pára a uma distância, em sinal de respeito, e o deixa dominá-lo? Você permi-
te que ele o domine como meio de aplacá-lo ou como meio de controlá-lo?
Como você sai de um elevador quando está com colegas de trabalho?
Você insiste em ser o último a sair porque esse gesto de delicadeza demons-
tra sua superioridade nata? Ou sai primeiro, deixando que os outros sejam
gentis com você, aceitando a gentileza deles como se esse fosse o seu dever?
Ou disputa sua posição?" Você primeiro." "Não, tenha a bondade"
Qual desses comportamentos é o mais equilibrado? Qual deles o homem
seguro de si escolheria? Pense em cada um. Sua suposição é tão válida quan-
to a de um psicólogo treinado. Esta ainda é uma ciência incipiente.
Onde você se senta num auditório para assistir a uma palestra? No fun-
do, onde há certo anonimato, embora você possa perder alguns detalhes da
palestra, ou na frente, onde você pode ouvir e ver confortavelmente, mas
pode ser notado pelos outros?
Como você se comporta numa reunião informal? Você controla as mãos
tomando um drinque? Apóia-se num peitoril para se sentir seguro? Pode servir
como uma força imobilizadora para a metade de seu corpo e você não precisa
se preocupar com o que dizer em linguagem do corpo—ou pode ter uma preo-
cupação menor, sendo que a maneira como você se apóia o esteja traindo!
Onde você se senta? Numa cadeira no canto? Num grupo de amigos, ou
perto de um estranho? O que é seguro e o que é mais interessante? O que indi-
ca segurança e o que denota maturidade?
Comece a observar na próxima festa a que você for: quem são as pessoas
que dominam a reunião? Por quê? O quanto se deve à linguagem do corpo e
que gestos eles usam para fazer isso?
Note como as pessoas se sentam em carros de metrô. Como se distribuem
pelo espaço quando o carro está vazio? Como cruzam as pernas, os pés e os
braços?
Olhe para um estranho durante um tempo mais longo que o necessário
e veja o que acontece. Você pode estar sujeito a uma experiência desagradá-
vel e, por outro lado, pode ter experiências muito boas. Você pode se ver
falando com estranhos e gostar disso.
Você conhece o trabalho básico e algumas das regras. Esteve participan-
do do jogo da linguagem do corpo, inconscientemente, durante toda a vida.
Agora, comece a brincar conscientemente. Quebre as regras e veja o que
acontece. Será uma experiência surpreendente e, às vezes, um pouco assus-
tadora, uma aventura reveladora e engraçada, mas eu prometo que não será
desinteressante.

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