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HUMOR E PSICANÁLISE

O sentido do humor gera uma estranho gozo: permite desfrutar a certeza de que não existem
certezas.

A nossa proposta nesta apresentação é defender que o bom humor é um recurso importante na
psicanálise e que há já algum tempo a seriedade é um recurso a ser usado com parcimônia na
psicanálise.

Na verdade o humor alivia o desamparo e protege do desespero.o

Um pouco de história do humor


No auge da idade média, em torno do ano 1000 da nossa era, não era aceito como de bom tom uma
pessoa rir. Rir era uma arte do diabo e as pessoas que riam eram auxiliares do demônio e estavam
possuídas por ele. No seu livro "O Nome da Rosa" Humberto Eco conta uma história de crimes em
um mosteiro desta época, em que no fim se descobre que o autor das mortes era um monge que
matava as pessoas que queriam descobrir um livro. O livro motivo de tal ameaça seria o ultimo
exemplar existente da Comédia, de Aristóteles.

O monge temia que se o livro fosse descoberto as pessoas começariam a rir e com isto se acabaria
toda a autoridade do Papa, dos arcebispos e autoridades da Igreja, e por consequência, toda ordem
do mundo.

Assim estavam as coisasha1000 anos

Aos poucos, muito aos poucos as coisas foram se mudando

Neste tempo muitas pessoas morreram das mortes as mais trágicas. Principalmente mulheres.
Torturadas, queimadas, afogadas. Por padres. Ou a mando dos padres. Terrivelmente sérios.
Preocupados e puros. Sempre.

Também muito puros e santos os cruzados promoveram uma mortandade e uma devastação
inimaginável durante vários séculos. Os cabeças foram feitos santos, extremamente ricos e amigos
dos papas.

Uma grande mudança começou a ocorrer como lançamento do livro " O Elogio da Loucura" de
Erasmo de Rotterdam. A historia não é seria. Era padre.Homem mais célebre de seu tempo, filósofo,
embaixador, político, amigo de Tomás Moore. Estava acima de qualquer perseguição. Escreveu um
livro em que pôs em dúvidas as certezas de sua época. Elogiava e via lógica nos comportamentos
mais fora do comum.

A partir de certo momento a liberdade de pensamento começa a ser uma conquista cada vez maior.
Os Ensaios de Montaigne, as denúncias intemporais de De La Boetie com " A Servidão Voluntária" ,
Marx dizendo " Tudo que é sólido se desmancha no ar".

Ninguém segurava mais a bomba. Ia estourar.

No século XX temos " Do Riso" de BERGSON, Os Chistes e o Humor de Freud.


Deleuze, com base nos pressupostos estóicos, mostra os paradoxos como uma forma fundamental
do conhecimento,

Huizinga demonstra serem os jogos parte fundamental do aprendizado, da lógica, do


comportamento, da sociedade, da história, da filosofia da história. O lúdico é central na história do
homem.

Einstein e a teoria geral da relatividade, pela qual o tempo e o espaço não são estáveis, mas
influenciados pelas posição dos objetos.

A teoria quântica, pela qual você não pode determinar simultaneamente a posição e a direção de
uma partícula subatômica, domina o campo da microfísica.

Milan Kundera com "A Insustentável Leveza do Ser", " Risíveis Amores" e " O Livro do Riso e do
Esquecimento" impõe a estética da leveza na literatura.

Italo Calvino com as suas seis propostas para o próximo milênio, começando com a leveza e
continuando com a rapidez, a exatidão,a visibilidade, a multiplicidade e a consistência, define os
objetivos estéticos do seculo XXI. Faltou uma, devia ser o humor.

Ele morreu sem escrever sobre a consistência. Acredito em dúvida se a sexta virtude não deveria ser
o humor.

O teorema da incompletude, de Gödel, demonstra que todo sistema lógico tem seus limites, ou falha
em mostrar sua própria consistência. Nenhum sistema pode ser, ao mesmo tempo, completo e
consistente.

Mas restaram muitas coisas que se pretendem sérias. Quanto mais risíveis mais se pretendem sérias.
Seriedade tem sido a defesa das coisas cuja legitimidade deveria ser questionada, estar além da
seriedade é um bom indicador da contributividade. No mais das vezes a seriedade é apenas o receio
da crítica, a insegurança ou pior, a manipulação.

A legitimidade estaria mais do lado da leveza, da rapidez, da exatidão, da visibilidade, da


multiplicidade, da consistência, como defendeu Ítalo Calvino.E do humor, que esqueceu de escrever,
que ninguém é de ferro.

Abrão Slavutski escreveu "O humor é, ao mesmo tempo, uma coisa séria e engraçada".

O humor diminui a angústia ao permitir a descontração que suaviza o viver diante da difícil realidade.
Portanto, ter o sentido do humor é dispor de um poder no difícil jogo da existência. O humor é uma
forma de jogar, de brincar e de se rebelar diante da humilhação e do desamparo. É, também, a
capacidade simbólica de gerar prazer onde, geralmente, ocorreria a dor.

Assim revela outro lado das coisas, goza de tudo em busca de uma visão mais leve do mundo.

O humor não muda o mundo - pode sim mudar a vida; não é revolucionário, mas é sempre rebelde."

Em um texto intitulado O Humor Freud escreveu "o humor é um dom precioso e raro" .

Nele propõe um Supereu suave , leve, que acalme o Eu diante das angústias e pesos da vida.
A leveza
Caminhar com o fio da leveza não é salvador como com o fio de Ariadne, mas permite ver a realidade
por outro viés. Oferece uma esperança mais modesta, pois o humor não se pretende salvador, mas
aliviar o peso. É um curativo da alma como a arte.

A leveza conquista o artista que segundo Merleau-Ponty " é aquele que fixa e torna acessível aos
demais humanos o espetáculo de que participam sem perceber".

A ética do humor questiona as verdades, não se deixa empolgar e segue , em alguma medida, a Dom
Quixote, que sorri diante dos fracassos. Por isso o Supereu do bem-humorado é benigno e não sádico
e severo, goza da perfeição, tolera as falhas e até ri delas.

Segundo Kant, na Crítica do Juízo " Na piada inicia-se o jogo de pensamentos que.....me em também
com o corpo....dando uma sensação de bem estar à saúde".

A dignidade conferida pelo Humor é a coragem diante de riscos e gozar das pretensões vaidosas
tanto de si mesmo como dos outros. Enfim é perceber o caráter cômico da trágica condição humana.

O desamparo constitui o ser humano desde o nascimento até o fim da vida. É uma noção essencial
para entender se entender a complexidade do viver. O humor é uma das possibilidades de se
enfrentar o desamparo.

O humor é um sexto sentido, e nem todos são dotados deste sentido. Especialmente os que não
podem se afastar da realidade para ver tudo a uma certa distância.

O humor diminui o poder do masoquismo e consegue sorrir até diante da morte. Conta-se que um
guarda ofereceu um cigarros um condenado momentos antes de sua execução. O preso agradeceu e
respondeu: "Obrigado,mas por uma questão de saúde, não posso fumar".

A piada tem relações com o inconsciente. Quando se ri de uma piada é porque seu desfecho
expressou desejos agressivos ou sexuais.

Fráncis Bacon escreveu:"A imaginação foi dada ao homem para compensar o que ele não é, e um
senso de humor para consolá-lo pelo que ele é".

As paixões em geral suportam mal a irreverência do humor. Todo fanatismo, seja religioso, seria
político não suporta a irreverência do humor. O humor consola, alivia, diante das exigências tanto
pessoais como sociais. E o consolo é necessário, faz bem diante das críticas do supereu, das pressões
pulsionais, diante do fracasso e da culpa do sucesso.
Quem se mortifica não brinca, mas briga com a vida, briga com a familia, briga como amigos e com a
vida mesmo

Os britânicos criaram a noção de sentido no final do século XIX; sentido da beleza,sentido da honra,
sentido da moral, sentindo comum. Também havia o sentido do ridículo que definia a sensibilidade e
as coisas ridículas, que com o tempo foi substituído pelo sentido do humor. Rapidamente esta se
tornou em virtude cardeal e dizer que alguem tinha senso de humor passou a ser um grande elogio

O sentido do humor é uma habilidade de perceber incongruências, o engraçado do quotidiano,


escutar o duplo sentido de algumas palavras, enfim, ver o lado gracioso da vida.

Ter sentido do humor tem a ver a com pessoas criativas capazes de pensamento divergente. É
portanto a capacidade de com a linguagem e com as idéias.

O humor não exalta o sujeito nem a humanidade sua virtude é um meio sorriso.

Os adultos bem humorados são, em geral, os que conseguem mais facilmente criar, inventar, se
divertir no trabalhos e no amor.

O narcisismo não deve ser substituído por um amor ao objeto, mas ser transformado através de uma
redistribuição da libido.

A escuta analítica dependerá habilidade do analista de encontrar semelhanças escondidas nas livres
associações dos analisandos. Uma das características do ato analítico é a concisão, como nas piadas.

Há um aumento da tensão ao longo da piada, pois não se sabe o final, e este é desconcertante, é o
que faz rir.

Assim a interpretação analítica é uma resposta que iria de preferência para o lado da palavra
espirituosa.

Winnicott, em seu livro " O Brincar e a Realidade" escreveu " o que quer que se diga sobre o brincar
de criancas aplica-se também aos adultos..... Manifesta-se , por exemplo, na escolha de palavras, nas
inflexões de voz e na verdade, no sendo de humor"

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