Você está na página 1de 3

Disciplina: Metodologia de Pesquisa em Artes Cênicas 1 (código 343455) Curso: Mestrado

Professores: Gilberto Icle e Sulian Vieira


Período: intensivo
Aluno: Rodrigo Ribeiro Bittes
Matrícula: 21/0025212

FICHAMENTO 1
Bolognesi – Experiência e história na pesquisa em artes.

Em seu artigo “Experiência e história na pesquisa em artes”, Mario Fernando Bolognese


tece reflexões a respeito da pesquisa no ramo das artes, que são de extrema importância para jovens
pesquisadores do Teatro como este que vos escreve. No princípio de seu artigo, além de ressaltar a
juventude da Arte enquanto ramo de pesquisa – especialmente em comparação com outros campos
do conhecimento, sobretudo das Ciências Naturais – o autor nos coloca a problemática da ausência
de uma teoria metodológica própria do campo das artes para o desenvolvimento de pesquisas. Em
suas palavras:

“[o]s pesquisadores em artes recorrem a teorias “estrangeiras”, adaptando-as, mutilando-as,


mas também ampliando-as e modificando sua abrangência e seu campo de ação”, assim, “é
comum que teorias literárias, por exemplo, sustentem alguns estudos em artes, sejam elas
fundamentadas na linguística, na semiologia, na crítica genética ou na história da literatura”
(BOLOGNESI, 2014, p. 146).

Em seguida, o autor passa a dissertar sobre a necessidade de delimitação de um objeto para a


a viabilização da pesquisa, e utiliza a metáfora de um “cerco” que deve se fazer em torno do objeto
pesquisado (Idem, p. 147). Com essa imagem, os principais elementos de uma pesquisa estão
ilustrados, sejam eles: a já mencionada delimitação do objeto de pesquisa, a escolha e o emprego de
um método e de princípios teóricos, e o mergulho em um terreno do desconhecido (Idem, p. 148).

No entanto, a pesquisa em artes possui especificidades que talvez não sejam comuns aos
demais campos de conhecimento. A primeira grande diferença apontada pelo autor é a de que, em
artes, não se busca a descoberta por verdades cumulativas e renovadoras, mas sim pela produção do
conhecimento (Idem, p. 149) que “tanto pode ser contraposição a outros, ou expansão do raio de
interpretações, como pode ser complementar, ou mesmo reiterativo e, neste caso, termina por ser
uma exemplificação, um reforço de algo sabido” (Idem, p. 150).

Além disso, o autor salienta que ao contrário da pesquisa em outros campos do saber, o
trabalho investigativo em artes tem a presença central do sujeito. Dessa maneira, não há o que ele
denomina de “ruptura epistêmica” entre pesquisador e objeto de estudo – “ao contrário, ela [a
experiência do sujeito] é parte integrante, ela é o próprio sujeito, especialmente quando se admite o
trabalho criativo e a investigação do conhecimento em artes como componentes intrínsecos à
subjetividade” (Idem, ibidem).

Nesta altura, o autor nos apresenta três modos principais de pesquisa em artes. O primeiro
deles é chamado de descritivo e se caracteriza pela apresentação do objeto a partir de uma postura
distanciada. A pesquisa tem caráter objetivo e muito se assemelha à pesquisa histórica, por
exemplo. O segundo modo é o interpretativo, que aprofunda a investigação em seus aspectos
imateriais e simbólicos e que se aproxima do especulativo e da articulação do pensamento. O
terceiro, por fim, chamado de analítico, é um intermediário entre os dois outros modos, e faz uma
espécie de comparação entre matéria e imaterialidade (objeto e subjetividade), ambas presentes na
pesquisa (Idem, p. 151).

Até agora entendemos, portanto, que a pesquisa em artes se diferencia da pesquisa de outras
áreas do conhecimento por razões metodológicas, pela história recente desse campo de
conhecimento como campo de pesquisa, pela presença essencial do sujeito e de sua experiência no
próprio trabalho de pesquisa e por conta da maneira de se construir conhecimento – que não é
cumulativa e nem busca encontrar verdades universais. Porém, além de todos esses fatores, as artes
enquanto fenômeno cultural e social têm um outro fator fundamental até aqui não abordado: a
presença dos espectadores, sobretudo nas artes “espetaculares [que, por conta da presença do
público] apresentam impasses epistemológicos para a abordagem de fenômenos no passado” (Idem,
p. 152 e 153).

Como superar essas dificuldades e conseguir abarcar texto e contexto, elementos materiais e
imateriais do fenômeno artístico em uma pesquisa em artes? A partir da reflexão de Walter
Benjamin, Bolognesi nos dirá que:

“A experiência na criação pode se transferir à pesquisa em artes, tornando-a sui generis e,


salvo maiores equívocos, este parece ser um elemento particular a pulsar a favor da
especificidade dos estudos em artes. O conhecimento prático e sensível do artista, quando
transferido e acionado pelo pesquisador, facilita a abordagem dos enlaces e desafios
poéticos da criação. A experiência de si ajuda a compreender a do outro” (Idem, p. 155).
Porém, nos sinaliza o autor, é preciso ter cautela quando há a união entre pesquisador e
artista, sobretudo quando decide-se por pesquisar o próprio processo criativo, como é o caso do meu
projeto de pesquisa, em particular. A advertência que Bolognesi apresenta é um alerta para um risco
que posso correr ao decidir investigar o processo de dramaturgia de ator e de criação de sonoplastia
em um solo autoral. Diz ele que, em casos como o meu, “o sujeito torna-se objeto de exposição e a
razão crítica tende a ser posta de lado”. Ainda, pondera ele, “[e]ssa postura egocêntrica se acentua
ainda mais quando a exposição e o suposto estudo de si vêm desprovidos de uma inserção histórica.
Abandonam-se, assim, os parâmetros do tempo e do espaço” (Idem, p. 155). Trata-se, sem dúvida,
de uma sentença dura para um jovem pesquisador que decidira recentemente investigar o próprio
processo criativo.

Apesar dessa grande advertência, creio que, ao evitar o que o autor indica como sendo a
falha principal das pesquisas que se assemelham à minha – isto é, a ausência de uma inserção
histórica e uma postura egocêntrica – pode-se realizar uma pesquisa rica em artes que, se não for
capaz de deixar um novo “tratado” sobre Teatro Físico, mímica, dramaturgias de ator ou
sonoplastia, pode, ao menos, expandir e registrar mergulhos e tentativas éticas e estéticas na junção
e intersecção desses campos de pesquisa.

Bibliografia:
BOLOGNESI, Mario Fernando. Experiência e história na pesquisa em artes. Art Research
Journal. V.1, n.1. Disponível em: https://doi.org/10.36025/arj.v1i1.5258

Você também pode gostar